Abril 2022

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Número 4/22 – abril/2022 – Ref. 1228

NOTAS DA EDIÇÃO – Abril é o mês das cores azul e verde, lembrando sobre o au-
tismo e também da prevenção dos acidentes de trabalho. Clique nas cores para saber
mais.

Neste mês, temos cinco artigos de montagens úteis para o técnico e para o hobista,
além da continuação dos cursos sobre Python e de conceitos básicos sobre semicon-
dutores.

As edições impressas de Antenna, a partir de janeiro de 2021, podem ser adquiridas


na livraria virtual UICLAP (www.uiclap.com.br), sendo bastante fazer uma busca por
Antenna no sítio da livraria.

Lembramos, novamente, que o sucesso das montagens aqui descritas depende muito
da capacidade do montador, e que estas e quaisquer outros circuitos em Antenna são
protótipos, devidamente montados e testados, entretanto, os autores não podem se
responsabilizar por seu sucesso, e, também, recomendamos cuidado ao manipula-
rem-se as tensões secundárias e da rede elétrica comercial. Pessoas sem a de-
vida qualificação técnica não devem fazê-lo ou devem procurar ajuda qualificada.

SUMÁRIO

2 - ANTENNA – Uma História – Capítulo XVI...................................................................................................


Jaime Gonçalves de Moraes Filho
4 - CQ-RADIOAMADORES – Medidores de ROE............................................................................................
Ademir – PT9HP
7 – Audição Crítica de Caixas Acústicas..........................................................................................................
João Yazbek
10 - Semicondutores..........................................................................................................................................
Alfredo Manhães
21 - Projeto de Pré-amplificadores e Equalizadores RIAA Para Toca-Discos - Parte XIX................................
Álvaro Neiva
28 - TVKX – Ponta-cabeça........................................................................................................................
Jaime Gonçalves de Moraes Filho
32 – Análise do Amplificador Integrado Model 360...........................................................................................
Marcelo Yared
45 – Experimentos com Python Para Técnicos em Eletrônica – Parte V..........................................................
João Alexandre Silveira
54 - Monte um Testador de Transistores Bipolares de Potência......................................................................
Marcelo Yared
73 - Transformador de Isolamento, Variac e Fonte DC Ajustável......................................................................
Paulo Brites
78 – O Pequeno Notável.....................................................................................................................................
Álvaro Neiva e Miguel Nabuco

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ANTENNA – Uma História - Capítulo XVI
Jaime Gonçalves de Moraes Filho*

Através de um dos primeiros números de Antenna, tomamos co-


nhecimento de uma das maiores façanhas técnicas dos primór-
dio da radiodifusão - a transmissão de uma programação simul-
tânea entre dois estados, no caso entre o Rio de Janeiro e São
Paulo.

Hoje em dia, com a extrema facilidade nas comunicações, não


nos damos conta das dificuldades encontradas na década de
1920, quando a potência dos transmissores ficava em torno de
alguns poucos kW ( Rádio Educadora Paulista – 1 kW e Rádio
Club do Brasil – 0,5 kW), além da precariedade dos receptores,
com pouca sensibilidade de seletividade precária.

Some-se a isto o sistema de ligação ( link ) entre o transmissor e os estúdios, feito por
meio de uma linha telefônica, muitas vezes apresentando ruídos e zumbidos indesejá-
veis. Este mesmo sistema foi amplamente utilizado, claro, com novos aperfeiçoamen-
tos, até meados da década de 1960, quando os links em FM vieram a substituir os
cabos telefônicos.

Mas, retornando a outubro de 1926, vimos que, estando o Presidente da República,


Washington Luiz em visita ao Estado de São Paulo, seria pronunciado um importante
discurso nas dependências do “Theatro Santa Helena”, irradiado pela Rádio Educa-
dora Paulista, e que esta seria a oportunidade ideal para a execução de um experi-
mento técnico, a ser realizado pela primeira vez na América Latina: a transmissão
desde a cidade de São Paulo até o Rio de Janeiro, onde seria retransmitido pelo Rádio
Club do Brasil.

A única dificuldade estava no fato das duas cidades estarem distantes em cerca de
500km.

Para tal tarefa, foi necessário se recorrer ao departamento de engenharia da Light, que
naquela ocasião administrava todo o sistema telefônico, para que uma linha especial
fosse reservada para a transmissão dos sinais de áudio entre as duas emissoras entre
as dezoito e as vinte e três horas, sem qualquer interrupção.

* Professor de Física e Engenheiro de Eletrônica

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Segundo o relato original, precisamente às 18h, foi recebido nos estúdios do Rádio
Club do Brasil, um sinal, ainda bastante fraco, proveniente do Theatro Santa Helena.
Imediatamente foram ligados os amplificadores e filtros e em poucos instantes “a voz
de Leonardo Jones ribombava no vasto salão do Rádio Club”.

Para os ouvintes, foi algo inimaginável, devido à qualidade sonora, acostumados que
estavam a sofrer os efeitos da variação de volume periódica, conhecida por “Fading” e
bastante conhecida por aqueles que algum dia sintonizaram emissoras em Ondas Cur-
tas.

Lembrando que grande parte dos equipamentos de estúdio: misturadores, filtros e


“patches” foram em sua maioria projetados por Elba Dias, na época Diretor técnico do
Rádio Club e fundador da revista Antenna.

Concepção artística do link por linha telefônica ligando as cidades do Rio de Janeiro e
São Paulo para a transmissão simultânea da Rádio Educadora Paulista e o Rádio Club
do Brasil

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*A cargo de Ademir, PT9HP

Medidores de ROE
“Você já mediu as ondas `rodoviárias` de seu radinho?” Parece brincadeira, mas não
é! Na verdade, nosso amigo macanudo queria saber se o colega PX mediu correta-
mente a ROE – Relação de Ondas Estacionárias – que poderia prejudicar sua trans-
missão – ou melhor – reduzir sensivelmente a potência de saída de seu transmissor.

Sem falar que ROE alta significa problemas na antena (ou cabo) e pode queimar a
saída do aparelho.

E o macanudo pergunta: “Como funciona isso e como vou saber se a tal ROE está
baixa ou alta?”

A resposta deve levar em conta um pouquinho de teoria, mas fácil de entender. Vou
ilustrar do seguinte modo: Imagine você, macanudo, numa rodovia de várias pistas,
laaaaaarga, onde o trânsito flui sem problemas, todos na mesma velocidade. De re-
pente, você vê um maluco qualquer vindo em sentido contrário, a toda velocidade!

O resultado? Os veículos, que fluíam numa mesma direção e sem impedimentos, agora
precisam reduzir a velocidade, prejudicando o fluxo. Imagine agora se nesta via larga
vem não apenas um veículo em sentido contrário, mas vários deles! Caos total e aci-
dentes, correto?

Pois é. Quando a saída do radinho, que é de 50 Ω (ohms), está ligada a um cabo de


boa qualidade, também de 50 ohms e a uma antena afinadinha, dando também 50
ohms, pode ter certeza de que toda a potência do rádio fluirá para a antena e para o
espaço, sem nenhum retorno.

Agora, se houver um descasamento na antena, má qualidade do cabo coaxial ou até


mesmo desajuste na saída do radinho, o sinal de RF (radiofrequência) retornará, pelo
menos uma porcentagem dele, e o resultado é o explicado acima: redução na potência
do rádio, aquecimento dos transistores de saída e, dependendo do caso, até mesmo a
queima deles.

4
Medidor de ROE, da
marca Voyager.

Esquema de um medidor
de ROE simples.

Se quiser montar um,


abaixo temos mais deta-
lhes.

Montagem de um típico medidor de ROE

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O instrumento de medição pode ser um VU meter usado nos antigos aparelhos de som
ou um voltímetro, como o abaixo. Se não encontrar no mercado (não é muito difícil de
se achar), compre um multímetro analógico, daqueles pequenos, e use o VU.

Para calibrar a escala, coloque um resistor (carga fantasma) de 50 ohms, não indutivo,
na saída e ajuste o potenciômetro até o final da escala. Volte para a posição ROE e
veja o resultado. Se o ponteiro não se mexer, é sinal que está calibrado. Mesmo que
mexa alguns milímetros, não é problema.

Para fazer uma escala completa, você pode usar um resistor de 100 e 150 ohms como
carga fantasma. A ROE, com certeza, será alta. Marque estes pontos no seu medidor
e cuide para não os ultrapassar.

É bom lembrar que você precisa de um radinho operando em AM/FM (precisa de por-
tadora) para fazer estes ajustes. Se usar um resistor de carga de 15W ou 25W, você
terá vários segundos para fazer os testes, mas se usar um resistor de 100 e 150 ohms
de baixa dissipação, tipo um watt, cuidado!

Use uma caixinha metálica, pois ela fará a blindagem e a ligação terra dos conectores
coaxiais e os componentes que precisam de ligação à massa.

Pelo preço dos medidores, não compensa construir um, mas lembro a você que ensi-
namos não apenas macetes, mas também “gambiarras”, por isso, se quiser construir,
vá em frente!

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Audição Crítica de Caixas Acústicas
João Yazbek*

Tratamos, em vários artigos anteriores, do assunto caixas acústicas e subwoofers, es-


miuçando detalhes desses, com o objetivo de informar corretamente nossos leitores.

Vamos discutir agora o que se deve levar em conta na audição de caixas acústicas. A
audição crítica de caixas acústicas é uma arte que se aprende ao longo de anos de
prática e depende de conhecimento teórico e muita tempo de audição.

Logicamente, não estaremos aqui abordando o assunto de forma completa, mas algu-
mas orientações gerais podem ser de muita valia para ajudar o usuário ou o profissional
da área na árdua tarefa de escolher um conjunto de caixas acústicas.

Quem desejar se aprofundar nessa arte precisará passar a ouvir muita música ao vivo,
e quanto menos eletrônica a apresentação musical usar, melhor será o benefício. Isso
porque a referência utilizada será sempre aquilo que se ouve ao vivo, com o mínimo
de eletrônica interferindo na reprodução, e é nesse ambiente que o ouvido tem de ser
treinado e a memória auditiva tem de ser exercitada.

Partindo da premissa de que a eletrônica que está acionando as caixas acústicas em


avaliação é de boa qualidade e sua resposta em frequência é plana, vamos discutir
brevemente o que é bom, o que é ruim e o que pode ser percebido na audição de
caixas acústicas.

Iniciando pelos graves, verifique se a caixa tem graves rápidos, secos e se é possível
distinguir diferentes tons graves. Se você tem dúvida sobre isso, observe justamente o
oposto, que é muito fácil de ser observado em sistemas de áudio para carro de baixa
qualidade: caixas de graves sintonizadas de forma que os graves que saem dela são
sempre iguais, independente da música.

Isso é o que se chama de “graves de uma nota só”, onde a caixa está sempre em
ressonância pronunciada em torno de uma certa frequência e fica difícil distinguir a
musicalidade dos graves, pois tudo parece igual, independente do tipo de música re-
produzida.

Se você notar esse comportamento não musical em um conjunto em avaliação, você


está defronte a um sistema mal projetado e de baixa performance. Note também que
há caixas que não tem impacto nos graves, onde este parece não ter potência, de
forma que o som parece enlatado.

*Mestre em Engenharia Eletrônica

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O grave correto tem de ser potente, impactante, rápido, seco (ou seja, a caixa não deve
entrar em ressonância) e musical. Há produtos que atendem a todos esses requisitos
e tocam muito bem na faixa de graves, enquanto a maioria não se enquadra. Fuja
destes últimos.

Já na faixa dos tons médios, o maior problema é a coloração e a falta de abertura nas
frequências. Coloração é a introdução de artefatos sonoros que não estão presentes
no programa musical. No caso de um vocal, ela faz com que este se torne pouco na-
tural, independente do cantor ou do programa sendo reproduzido.

O vocal tem de se mostrar claro, aberto e próximo ao ouvinte. Por abertura entende-
se que o programa musical “salta à frente”, indicando uma maior sensação de envolvi-
mento, como se o cantor estivesse cantando mais próximo ao ouvinte e não tanto ao
fundo.

Boas caixas irão fazer com que o vocal esteja muito presente no ambiente, seja bem
claro e límpido. Para se concluir se uma caixa é boa em médios, procure ouvir grava-
ções com cantores masculinos e femininos de forma alternada, em passagens onde
há bastante predominância vocal.

Já na faixa dos agudos, o maior problema é a distorção, provocada por “drivers” de


baixa qualidade, que fazem o som agudo ser ardido e pouco natural. O som de instru-
mentos com conteúdo em alta frequência se torna árido e pouco musical, assim como
os tons mais agudos do vocal.

Os agudos têm de ser naturais e presentes, não podendo estar abafados ou ausentes
e nem se destacando excessivamente do restante do espectro musical durante o pro-
grama musical.

O casamento dos graves, médios e agudos tem de ser natural, e isso se chama de
balanço tonal. Ou seja, programas têm de ser reproduzidos sem ênfase ou atenuação
de qualquer parte do espectro de frequências. Logicamente, devemos, neste caso, le-
var em consideração que caixas pequenas não irão fornecer graves de impacto e talvez
necessitem ser auxiliadas por um bom subwoofer para serem razoáveis.

Observe, principalmente, notas produzidas por piano, pois este instrumento produz
tons graves, médios e agudos que devem ter intensidade uniforme, indicando bom ba-
lanço tonal.

No caso do uso de subwoofers, verifique como os graves produzidos por eles se inte-
gram ao som produzido pelas caixas do sistema.

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Os graves têm de ser uniformes, independente de serem mais baixos ou mais altos em
frequência. Se houver tendência de reforço em graves mais baixos e ausência de gra-
ves mais altos, pode haver uma região de frequências na transição do subwoofer para
o sistema de caixas que precisa ser mais bem ajustada através do controle de cross-
over do subwoofer.

Se mesmo assim isso não se resolver, pode haver um problema de casamento entre
as caixas e o subwoofer, que precisa ser mais bem trabalhado.

Verifique o desempenho da caixa nos quesitos de imagem musical e espaço sonoro


criado. Um certo vocal deve vir de uma posição precisa à frente do ouvinte, assim como
um certo instrumento deve ser ouvido sempre na mesma posição. Perceber isso requer
um pouco de treino e também que se ouça sempre o mesmo conjunto pré-determinado
de músicas.

Deve-se avaliar como a caixa se comporta em volumes baixos e em volumes altos. A


caixa deve reproduzir sons elevados sem compressão, e deve apresentar resolução
de detalhes em passagens mais baixas. É importante notar que, neste caso, a eletrô-
nica deve permitir que possamos obter esse resultado e para isso ela precisa exibir
resolução e potência elétrica suficientes para tal avaliação.

Se você estiver avaliando caixas de home theater, preste muita atenção nos vocais
reproduzidos pelas caixas centrais. Afinal, essa caixa tem que reproduzir muito bem
as vozes, de forma clara, natural e aberta, sem colorações, pois essa será a função
dela num sistema de home-theater. Use para essa avaliação filmes e telejornais.

Já caixas surround possuem exigências menores, dado que irão reproduzir, em sua
maioria, efeitos especiais e não precisam ter toda a precisão dos canais frontais.

Preste atenção, nos canais surround, na dispersão sonora entre caixas e entre os di-
versos conceitos de caixa, como já abordamos em coluna passada. Nesse caso, filmes
com efeitos especiais em profusão são recomendados.

Por fim, lembre-se de que as avaliações deste tipo terão componentes subjetivas, o
que requer bastante treino e atenção para que a audição crítica seja produtiva.

Procurar abstrair informações como marca, fabricante e preço é importante, pois não
necessariamente caixas mais caras ou de fabricantes mais famosos serão as mais
adequadas para as necessidades de audição de todos os ouvintes.

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SEMICONDUTORES
Junções e Diodos

Alfredo Manhães*

No artigo anterior foram apresentados conceitos introdutórios ao estudo dos semicon-


dutores. Agora iremos tratar do funcionamento do diodo, o mais simples dos compo-
nentes de estado sólido, tecendo considerações sobre os conceitos de dopagem e
junções.

Características Elétricas dos Semicondutores

Vimos em artigos anteriores que alguns materiais têm comportamento diferenciado


quanto à condução de corrente elétrica em função de sua estrutura atômica, sendo
classificados como condutores, semicondutores e isolantes. A principal diferença entre
eles é que os condutores sempre conduzem bem a corrente elétrica enquanto os iso-
lantes não conduzem. Já os semicondutores conduzem ou bloqueiam a corrente em
diferentes condições, apresentando resistividade intermediaria entre os condutores e
isolantes.

Figura 1 – Cristais de Germânio e Silício em seu estado natural.

*Mestre em Engenharia de Computação


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Sabemos que os átomos dos elementos químicos são formados pelo núcleo e pela
eletrosfera, onde circulam os elétrons em suas respectivas camadas (figura 2). Alguns
desses elétrons formam a camada de valência do átomo e estão disponíveis para es-
tabelecerem ligações químicas do tipo covalente (com compartilhamento de elétrons)
ou iônica (sem compartilhamento de elétrons), permitindo que diferentes elementos
interajam uns com os outros e modifiquem-se mutuamente, ou formem novas substân-
cias.

Figura 2 – Estrutura dos átomos de Silício (Si) e Germânio(Ge).

Os semicondutores são capazes de mudar sua condição de isolantes para condutores


com facilidade, por possuírem o que é denominado de banda proibida intermediária,
uma região localizada entre as bandas de valência, a camada de valência do átomo, e
a banda de condução, que é a região onde, sob ação de um campo elétrico, se forma
a corrente elétrica (figura 3).

Figura 3 - Bandas de Valência, banda proibida e banda de condução de condutores, se-


micondutores e isolantes.

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Quando os elétrons recebem uma certa quantidade de energia eles se tornam livres e
deixam a camada de valência, seguindo para a camada de condução. Essa modifica-
ção na forma como o semicondutor conduz corrente pode ser realizada a partir do
processo de dopagem, mostrado a seguir.

Dopagem

Os principais elementos semicondutores são o germânio e o silício, além de outros


como gálio, índio e arsênio, e seu comportamento, quando em estado de alta pureza,
é de não conduzir bem a eletricidade. Para melhorar a condução elétrica de materiais
semicondutores é utilizada uma técnica chamada dopagem, onde as superfícies do
material são tratadas e combinadas com substâncias diferentes, denominadas impu-
rezas químicas. Ao serem adicionadas ao elemento semicondutor, as impurezas am-
pliam a capacidade de conduzir corrente elétrica, gerando a formação de compostos
cristalinos de maneira controlada que atendam a certas especificações elétricas.

Há dois tipos de impurezas utilizadas em dopagem: as do tipo N e as do tipo P. As do


tipo N são o resultado da adição de fósforo ou arsênio ao semicondutor. Como ambos
possuem cinco elétrons na camada de valência, ao se formar ligações covalentes entre
quatro elétrons, um deles fica livre (elétron livre), se movimenta e gera corrente elétrica.
O termo N representa a carga negativa gerada no processo (figura 4).

Figura 4 – Processo de dopagem de silício com fósforo (tipo N).

A impureza do tipo P é produzida pela adição de boro ou gálio ao semicondutor. Ambos


possuem três elétrons na camada de valência, criando lacunas quando adicionados ao
silício. Há condução de corrente elétrica, mas com a ausência de um elétron gera-se
carga positiva, representada pelo P (figura 5).

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Figura 5 - Processo de dopagem de silício com boro (tipo P).

Outras impurezas químicas elementares que podem ser utilizadas em dopagem do tipo
P, agindo como aceitadoras de elétrons, são o alumínio, índio e tálio, todos trivalentes.
Já para a dopagem do tipo N podem ser utilizados o antimônio e bismuto, ambos pen-
tavalentes. Todos esses materiais permitem a constituição de cristais semicondutores
controlados.

Junções

As junções, também conhecidas por blocos construtivos de dispositivos, são o resul-


tado do contato íntimo entre dois materiais com estruturas energéticas diferentes. Po-
dem ser feitas entre dois metais, entre um metal e um semicondutor, entre dois semi-
condutores ou pelo contato íntimo de dois cristais dopados com impurezas de polari-
dades opostas.

A junção P-N ocorre pela ligação entre materiais do tipo P e do tipo N, de forma que se
mantenha um composto cristalino com continuidade. É um processo industrial que
exige cuidado já que a simples justaposição dos materiais não garante a continuidade
do retículo cristalino. É necessário observar que, além das impurezas químicas neces-
sárias, pode se formar uma camada indesejável de óxido na junção, descaracterizando
por completo o resultado desejado.
Há vários tipos de junção:
• Homojunção: neste tipo há uma interface de transição, dentro de um mesmo
semicondutor, entre as regiões tipo P e tipo N.
• Heterojunção: esta junção é obtida a partir de um material semicondutor co-
locado sobre um outro material semicondutor. Como cada um deles apresenta
a faixa de energia proibida característica, formam-se descontinuidades nas
bandas de valência e/ou de condução (normalmente em ambas).

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• Junção metal-semicondutor: constituída pelo contato de um metal com a su-
perfície de um semicondutor.
• Junção MOS (metal-óxido-semicondutor): apresenta duas interfaces, sendo
ela a estrutura básica dos transistores de efeito de campo tipo MOS ou MOS-
FET, que serão vistos em outro artigo.

A junção P-N (figura 4) é a base para construção dos diodos, sendo também a inte-
grante da maioria dos dispositivos semicondutores.

Figura 6 – Junção P-N.

Devido ao processo de recombinação entre um elétron e uma lacuna, na junção ocorre


uma difusão de elétrons do cristal tipo N ao P e das lacunas do cristal tipo P ao N.
Desta forma, o material do tipo N, inicialmente neutro, passa a ficar com ausência de
elétrons e torna-se positivo. No lado P da junção, a carga passa a ser negativa, e na
medida em que a difusão eletrônica ocorre, acumulam-se íons positivos na zona N e
íons negativos na zona P, gerando assim um campo elétrico (E) que atua sobre os
elétrons livres da zona N e sobre as lacunas da zona P com uma determinada força,
que é oposta ao fluxo de difusão até que um equilíbrio seja atingido.

Neste processo forma-se uma região que contém os átomos ionizados, sem cargas
livres, chamada região de depleção, cuja tensão de campo é chamada de barreira de
potencial (figura 7). A ddp é da ordem de 0,6V para cristais de silício e 0,3V para o
germânio.

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Figura 7 - Junção P-N onde nota-se a formação da barreira de potencial após a difusão
das cargas.

A interface da junção P-N é formada por uma transição entre dopagem P e N, cada
qual com sua concentração N de dopantes, que pode apresentar dois comportamentos:
transição abrupta ou linearmente gradual (figura 8). Há casos em que a transição ab-
rupta é mais adequada, e vice-versa. Também há situações em que uma forma de
transição intermediária é mais aplicável.

Figura 8 - Tipos de transição de dopantes numa junção P-N.

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Diodos

O diodo é o dispositivo semicondutor mais simples, tendo por base a junção P-N. Ele
é um componente eletrônico que permite a passagem da corrente elétrica somente em
um sentido, funcionando de maneira similar a uma válvula de retenção utilizada em
instalações hidráulicas, como mostrado na figura 9. A válvula se abre pela ação do
fluxo de água, que força o mecanismo e permite que haja movimentação de líquido em
um sentido na tabulação. Caso o líquido retorne com fluxo no sentido contrário a vál-
vula se fecha, impedindo o refluxo.

Figura 9 – Funcionamento de uma válvula de retenção.

De forma similar, um diodo permite que a corrente elétrica circule com facilidade em
um sentido, mas dificulta o fluxo de elétrons em sentido contrário.

Polarização dos Diodos


Os diodos são componentes que apresentam polarização positiva e negativa, tendo
em sua estrutura um cátodo (+) e um ânodo (-), cuja simbologia usual é mostrada na
figura 10.

Figura 10 – Simbologia típica para um diodo.

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É um componente que pode comportar-se como condutor ou isolante elétrico, depen-
dendo da forma como a tensão é aplicada aos seus terminais. Esse comportamento
pode ser obtido por polarização direta, quando é aplicada uma tensão positiva entre o
ânodo e o cátodo, e por polarização inversa, quando é aplicada uma tensão negativa
entre o ânodo e o cátodo (figura 11).

Figura 11 – Polarização do diodo.

Se a tensão da fonte for maior que a tensão interna do diodo, os portadores se repelirão
por causa da polaridade da fonte geradora e conseguirão ultrapassar a junção P-N,
deslocando-os e permitindo a passagem de corrente elétrica. Caso a polarização seja
inversa ocorrerá a atração das lacunas do ânodo (cristal P) pela polarização negativa
da fonte geradora e a atração dos portadores livres do cátodo (cristal N) pela polariza-
ção positiva da fonte geradora. Não haverá um fluxo de portadores livres na junção P-
N, ocasionando o bloqueio da corrente elétrica.

Os diodos apresentam uma resistência interna à passagem de corrente, e sendo menor


que 1 Ohm, é praticamente desprezível. Quando ocorre o bloqueio de corrente elétrica
no diodo por polarização inversa, ele não é total devido a presença de impurezas, o
que leva a uma pequena corrente da ordem de µA chamada de corrente de fuga, que
é quase desprezível. A curva característica de tensão versus corrente de um diodo de
potência é mostrada a seguir. (figura 12).

Figura 12 – Comportamento da corrente em função da polarização do diodo.

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As curvas características de tensão versus corrente em diodos de potência podem ser
obtidas a partir da equação do diodo ideal de Shockley:

Onde:
I – Corrente através do diodo
Is – Corrente de saturação reversa (corrente de fuga)
VD – Queda de tensão sobre o diodo
VT – Tensão térmica
n – Fator de idealidade, também conhecido como coeficiente de emissão ou fator de
qualidade

Assim como qualquer componente eletrônico, os diodos operam em determinados va-


lores de corrente elétrica, de acordo com as especificações do fabricante. Para cada
situação de polarização resulta um tipo de operação e aplicação possível. Caso ele
seja submetido a corrente ou tensão superiores às que ele suporta, poderá ser danifi-
cado e o circuito entrar em curto ou ficar aberto.

O efeito avalanche mostrado no gráfico ocorre quando o diodo é polarizado inversa-


mente. Na medida em que a tensão inversa cresce, cresce também o potencial elétrico
existente na barreira de potencial, que pode acelerar suficientemente os elétrons livres.
Esse aumento repentino da corrente reversa dissipa uma potência elevado o suficiente
para provocar a ruptura da junção P-N, danificando o diodo.

Exemplo de Diodo

Para exemplificar as características desse componente foi escolhido o 1N4007, um


diodo de uso geral. É normalmente construído para ser usado como retificador na se-
ção de alimentação de dispositivos eletrônicos, convertendo tensão CA em tensão CC,
associado a alguns capacitores de filtro. É um diodo da série 1N400x, em que também
existem outros diodos semelhantes de 1N4001 a 1N4007, sendo a única diferença prá-
tica entre eles a tensão inversa repetitiva máxima.

Além disso, ele também pode ser usado em qualquer aplicação onde haja a necessi-
dade de um diodo geral, sendo projetado para operar com altas tensões, com corrente
contínua média de 1000 mA, e dissipação de potência de 3W. É um componente de
tamanho reduzido e baixo custo, o que o torna atrativo para ampla variedade de apli-
cações, como carregadores de bateria, dobradores de tensão, retificação de corrente
etc.

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A seguir, é apresentado o datasheet do diodo 1N4007, fabricado pela empresa Vishay,
disponível em https://datasheetspdf.com/pdf-file/510276/VishaySiliconix/1N4007/1.

Existem inúmeros tipos de diodos, todos com larga aplicação em circuitos eletrônicos.
É o que veremos no próximo artigo. Até lá!

19
20
Projeto de Pré-amplificadores e Equalizadores RIAA Para Toca-
Discos - Parte XIX
Álvaro Neiva*

Fonte do PP5 (valvulado) e comutação do HPF

Vamos utilizar a mesma estrutura da fonte do PP4, regulador linear para a fonte de alta
tensão e regulador chaveado para os filamentos. Mas vamos usar todos os filamentos
ligados em paralelo, com tensão de 6,3V e corrente total de 1,4A, simplificando o pro-
jeto e montagem.

Transformador de força

Fig. 1

Fig. 2
*Engenheiro Eletricista
21
Fig. 3

Fig. 4

Fig. 5
22
DIAGRAMA DO PRÉ-AMPLIFICADOR (ver edição anterior)

A lista de material do pré-amplificador também se encontra na edição anterior.

Fig. 6

LISTA DE MATERIAIS DA FONTE

Seguindo a numeração do circuito e lista de material do pré-amplificador publicado na


edição anterior.

CAPACITORES
C1 capacitor eletrolítico, 47µF, 350V;
C2 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C3 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C4 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C5 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C6 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C7 capacitor poliéster metalizado, 1µF, 400V;
C8 capacitor poliéster metalizado, 2.2µF, 400V;
C9 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C10 capacitor poliéster metalizado, 100nF, 400V;
C11 capacitor eletrolítico, 220µF, 100V;
C12 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C13 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C14 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C15 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C16 capacitor eletrolítico, 2.200µF, 25V;
C17 capacitor poliéster metalizado, 2.2µF, 100V;
C18 capacitor eletrolítico, 220µF, 25V;

23
C19 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C20 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C21 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C22 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C23 capacitor poliéster metalizado, 100nF, 100V;
C24 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C25 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C26 capacitor poliéster metalizado, 100nF, 100V;
C27 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;
C28 capacitor cerâmico, 10nF, 500V;

INDUTOR
L2 indutor, 3µH, 2A;

Fig.7

TRANSFORMADOR DE ALIMENTAÇÃO
Potência: 50VA
Primário: 127/220V;
Secundário: 220V 0,15A, 12V 1,4A;

RESISTORES
P1 potenciômetro, Rtot=47K, linear;
R1 resistor, 330K, 5%, 1W;
R2 resistor, 100K, 5%, 1/2W;
R3 resistor, 100K, 5%, 1/2W;
R4 resistor, 100K, 5%, 1/2W;
R5 resistor, 120K, 5%, 1/4W;
R6 resistor, 180K, 5%, 1/4W;
R7 resistor, 27K, 5%, 1/4W;
R8 resistor, 680, 1%, 1/4W;
R9 resistor, 680, 1%, 1/4W;
R10 resistor, 150K, 5%, 1/2W;
R11 resistor, 47K, 5%, 1/4W;
R12 resistor, 2.2K, 5%, 1W;
R13 resistor, 10K, 5%, 1/4W;

24
SEMICONDUTORES
D1 diodo retificador, 1N4007;
D2 diodo retificador, 1N4007;
D3 diodo retificador, 1N4007;
D4 diodo retificador, 1N4007;
D5 diodo retificador, 1N4004;
D6 diodo retificador, 1N4004;
D9 diodo Zener, BZX79C27V;
M1 Infineon SPA11N60C3 MOSFET
M2 Infineon SPA11N60C3 MOSFET
D5 diodo retificador 1N4003;
D6 diodo retificador 1N4003;
D7 diodo retificador 1N4003;
D8 diodo retificador 1N4003;
D10 diodo LED verde;

DIVERSOS

01 Módulo regulador chaveado, entrada até 35V, saída ajustável 6,3V / 1,4A

Fig. 8

F1 fusível 0,5A para rede 127V, 0,3A para rede 220V;

Chave Liga/Desliga, 1 polo x 2 posições, alavanca;

Chave seletora de tensão (HH) 127V/220V, 2 polos x 2 posições;

Soquete IEC de três pinos para cabo de alimentação CA, com porta-fusível;

Chave para escolha de saída com ou sem filtro passa-altas, 2 polos x 2 posições, alavanca;
04 jacks RCA, para entradas e saídas;

25
Caixa chassis metálica;

Soquetes de nove pinos com blindagem, montados em suspensão, para as válvulas V1 e V2,
duas 7025A, 12AX7A ou ECC803-S, válvulas de baixo ruído e pouco suscetíveis a microfonia;

Soquetes comuns, montados em suspensão, ou uso de anel de silicone amortecedor para as


duas 6922 (figura 9).

Fig. 9

Pintar as blindagens de preto é recomendável para reduzir a temperatura da válvula.

Montar os soquetes numa suspensão de borracha ou uso do anel de silicone amorte-


cedor vai ajudar a evitar microfonia.

E vamos adiante.

No próximo artigo, vamos passar a usar realimentação para obter a resposta em fre-
quência desejada.

Referências:
1. Bohn, Dennis, editor. AUDIO HANDBOOK 1st ed. National Semiconductor
Corporation; 1976.
2. Holman, Tomlinson. AUDIO, “Dynamic Range Requirements of Phonographic
Preamplifiers”, July 1977.
3. Tomer, Robert B. ; Getting The Most Out of Vacuum Tubes, 1st ed. Howard W.
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Eletrônicos II; 1ª edição, Livros Técnicos e Científicos Editora S. A.; 1974.
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Wave‐filters. Bell System Technical Journal, 2: 1-46. doi:10.1002/j.1538-
7305.1923.tb00001.x (internet).
6. Cauer, W, "Die Verwirklichung der Wechselstromwiderstände vorgeschriebe-
ner Frequenzabhängigkeit", Archiv für Elektrotechnik, vol 17, pp355–388,
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German), (internet).
26
7. Maloberti, Franco; Davies, Anthony C.; A Short History of Circuits and Sys-
tems. River Publishers, 2016.© IEEE 2016.
8. Kuo, Frank F., Network Analysis and Synthesis, John Wiley & Sons, 1966.
9. Daryanani, Gobind, Principles of Active Network Synthesis and Design, Bell
Laboratories, John Wiley & Sons, 1976.
10. Van Valkenburg, M. E., Introduction to Modern Network Synthesis, John
Wiley & Sons, 1960.
11. Tedeschi, Frank P.; The Active Filter Handbook, Tab Books, 1979.
12. Stephenson, Frederick William; et al, RC Active Filter Handbook, John Wiley
& Sons, 1985.
13. Close, Charles M.; Circuitos Lineares, (The Analysis of Linear Circuits); tra-
dução: Ana Lucia Serio de Almeida, José Abel Royo dos Santos e José Car-
los Goulart de Siqueira (Escola Federal de Engenharia de Itajubá); Copyright
© 1966 by Harcourt, Brace Jovanovitch, Inc.; Copyright © 1975 by LTC - Li-
vros Técnicos e Científicos Editora S. A.
14. Desoer, Charles A.; Kuh, Ernest S.; Teoria Básica de Circuitos (Basic Circuit
Theory); tradução: Carlos Peres Quevedo; Copyright © 1969 by McGraw-Hill,
Inc.; Copyright © 1979 Ed. Guanabara Dois.
15. Texas Instruments, AN-346, High-Performance Audio Applications of The
LM833, agosto de 1985, revisado em maio de 2013.
16. Millet, Pete; LR Phono Preamps, disponível na internet em 21/09/2021, no en-
dereço: http://www.pmillett.com/file_downloads/LR%20Phono%20Pre-
amps.pdf
17. Jones, Morgan; Valve Amplifiers, 3rd ed., 2003, Elsevier Ltd.
18. Jones, Morgan; Building Valve Amplifiers, 2nd ed., 2014, Elsevier Ltd.
19. Self, Douglas; Small Signal Audio Design, 1st ed., 2010, Focal Press.
20. LM2596 SIMPLE SWITCHER©, 150kHz step down 3A Voltage Regulator
datasheet, Texas Instruments, 1999-2013.
21. Vogel, Burkhard; The Sound of Silence, 2008, Springer Verlag, Berlin, Heidel-
berg.
22. Motchenbacher, C. D., Connelly, J. A., Low-Noise Electronic System Design;
John Wiley & Sons, 1993.
23. Alley, Charles L., Atwood, Kenneth W.; Electronic Engineering, 3 rd ed., 1973,
John Wiley & Sons, Inc.
24. Spangenberg, Karl L., Vacuum Tubes; 1948, McGraw-Hill.
25. Blencowe, Merlin, Noise in Triodes with Particular Reference to Phono Pre-
amplifiers; AMS Neve Ltd Engineering Report, Journal of The Audio Engi-
neering Society, Vol. 61, N° 11, novembro de 2013.
26. Blencowe, Merlin, Designing Valve Preamps for Guitar and Bass; 2nd ed.,
2012, Wem Publishing.

27
Ponta-cabeça
Mais uma vez vamos encontrar nossos amigos na mesinha junto a parede, na padaria
do Mário, claro, conversando sobre eletrônica.

Estranhamente, dessa vez nada de televisores, amplificadores ou transmissores. O


assunto estava relacionado com... Automóveis!

- Eu sabia !!! Falei um milhão de vezes que tinha o dedo do Toninho na história.

- Ah! Agora sou o culpado? Quem reclamava todos os dias de dirigir à noite?

É melhor retornar um pouco no tempo e resumir a história toda, pois certamente você
não está entendendo nada... Vamos lá!

Ao reabrirem a oficina nossos amigos passaram a usar como veículo de serviço a velha
“Fiorino 95”, que tinha ficado com Carlito. Devido a falta de manutenção, os problemas
começaram a pipocar e, de tantos aborrecimentos, o trio resolveu efetuar uma troca,
negociando a camionete como entrada em um VW Gol 2018, em muito bom estado.

Depois do rebatimento em definitivo do banco traseiro, o hatch transformou-se em um


transporte de carga com lugar para dois passageiros.

Apesar da qualidade indiscutível do veículo, Zé Maria costumava a reclamar da ilumi-


nação noturna, sem que isso fosse levado muito à sério.

O fato é que há uns quinze dias atrás, o Gol começou a apresentar uma série de pro-
blemas, com o motor “engasgando” ou simplesmente deixando de funcionar “do nada”.
Levado a uma oficina de confiança, passou por uma análise através do “scanner”, sem
que nada de anormal fosse registrado.

*Engenheiro de Eletrônica

28
Como sempre, os amigos mais chegados passaram a entupir os ouvidos e as caixas
de mensagens com uma série de explicações e sugestões para resolver o problema.

Àquelas alturas, Toninho apostava na má qualidade do combustível e Zé Maria em


algum defeito na Central eletrônica, enquanto Carlito apostava que a culpa era do To-
ninho...Sabe-se lá como!

O problema agravou-se, e apesar de vários palpites, ninguém conseguia acertar a


causa das falhas e paradas. Carlito então cogitou de levar o Gol a uma concessionária,
porém a distância o obrigou a deixar tal opção como último recurso.

Ontem, resolvido a chegar a uma conclusão, Zé Maria, nosso aprendiz de Sherlock


Holmes, passou parte da manhã rabiscando e escrevendo frases no bloco de rascu-
nhos, até que, em um dado momento, deu de berrar, qual Arquimedes: - “Achei!!!
Achei!!! Carlito tinha razão! Toninho é o culpado.

A explicação veio em seguida, após Zé Maria ter ido até a calçada e feito sabe-se lá o
que no automóvel...

- Fazendo um retrospecto dos fatos, cheguei à conclusão de que o defeito começou a


se manifestar no dia 4, ou seja, quinze dias atrás. Antes disso, ninguém havia recla-
mado de nada. Restava saber o que aconteceu naquele dia... Foi quando me lembrei
de que Toninho havia substituído as lâmpadas convencionais, de filamento, dos faróis
por um conjunto de lâmpadas LED. Embora não tivesse muita certeza, fui observar as
tais lâmpadas. Veja essa daqui!

Lâmpada LED de reposição para uso automotivo


29
- Reparem aqui embaixo! Tem algum circuito eletrônico por baixo desse dissipador
aletado. E não deve ser coisa simples, porque a lâmpada tanto serve para 12 ou 24
Volts e ninguém iria ser louco de ligar um LED diretamente em uma fonte de 12V.

- Mas o que a lâmpada teria a ver com a instabilidade do motor?

- Simples, Toninho! Temos aqui na lâmpada um conversor DC-DC e este está lançando
na alimentação dos 12V sinais de alta-frequência, interferindo com o bom funciona-
mento da central eletrônica. Coisas da era da eletrônica! Aprenda de uma vez que nos
automóveis mais modernos, a chamada “eletrônica embarcada” não permite mais que
dispositivos acionados eletricamente sejam ligados, sem que se faça um estudo para
saber se o procedimento não irá trazer problemas futuros.

- E por falar em problemas futuros, o que faz essa Samsung de 40 polegadas de ca-
beça para baixo, na sua bancada?

- É do meu primo Marcelo , uma 40J5200. Tudo começou quando ele estava tentando
se conectar com o wi-fi. De uma hora para outra passou a ir direto para a Internet. Dali
em diante trava tudo e nenhum controle atua, permanecendo na tela do wi-fi. E se
desligar da tomada, nada acontece, repetindo o mesmo ciclo.

- Bom... diria então que a ‘main’ já era! Mas não estou entendendo a posição do tele-
visor.

- Isso já é o segundo capítulo da história. Meu primo Marcelo resolveu ele mesmo
substituir a placa e instalou uma do modelo de 48 polegadas. Voltou tudo a funcionar,
porém com a imagem invertida, de cabeça para baixo. Daí tentou de tudo, mas parece
que até mesmo o reset com o “MUTE 1 8 2 POWER não adiantou.

-Já adivinhei o final da coisa Como não conseguia inverter a imagem, virou o televisor
de cabeça para baixo e ficou assim até que alguém de casa desse a bronca.

- Isso mesmo, Zé Maria. Temos como resolver isto?

- Vamos lá, Toninho: apanhe o controle remoto do usuário. Digite aí MUTE 1 8 2 PO-
WER e aguarde um pouquinho só, até entrar no modo de serviço. Claro que agora está
tudo de cabeça para baixo. Agora selecione OPTIONS e depois TYPE. Escolha o seu
modelo de 40 polegadas e desligue o TV. Ao ser religado, estará com a tela normal.
Simples assim...

30
Menu de serviço TV Samsung

- Aprenda mais essa, Toninho! Picos de tensão na rede elétrica também podem pro-
vocar alterações na configuração de fábrica e fazer com que a imagem fique invertida.

-E tem mais: as placas são iguais, porém, é preciso configurá-las para o tamanho da
tela, caso contrário a imagem fica de ponta-cabeça!

- Isso é que é eficiência! Consertamos o TV sem sequer abrir o gabinete!

-Consertamos, não! Consertei! Você ficou de espectador, Toninho.

- Parou... Mês que vem vocês continuam a discussão!

De um relato do Fórum Tecnet, com a participação de: Daniel, Claucinei, Capa-


check e do site de Ricardo de Souza.

Relato sobre o Gol: Valmir Rabelo

31
Análise do Amplificador Integrado Gradiente Model 360

Marcelo Yared*

A Gradiente Eletrônica é por demais conhecida dos apreciadores dos equipamentos


de áudio nacional do passado, e, assim, dispensa apresentações.

Na segunda metade da década de 1970, a empresa investiu pesadamente em uma


nova linha de produtos, com novos leiautes e equipamentos mais sofisticados, e po-
tentes. A mudança ocorreu também nos projetos; novos circuitos, componentes impor-
tados, mais potência e melhor qualidade na montagem, resultado do natural cresci-
mento do mercado e da empresa.

A linha anterior de amplificadores integrados foi substituída por uma totalmente nova,
composta por quatro equipamentos, os Model 80, 120, 160 e 360. Destes, apenas o
Model 80 guardava alguma semelhança física com a linha antiga, num claro aprovei-
tamento do chassis dos modelos anteriores, o que faz sentido, se considerarmos que
ele era o mais barato, e, por consequência, mais acessível ao público consumidor,
numa faixa de mercado onde cada Cruzeiro a menos de custo importava.

Os equipamentos foram lançados em outubro de 1977, à exceção do Model 360. Foi o


início dos leiautes sem grafismos, painéis em alumínio escovado e sintonizadores com
indicação digital nos produtos da empresa.

Os Model 120 e 160 foram analisados pelo GAP Jr. e pelo Eng. Pierre Raguenet na
época, em Antenna. Foram muito elogiados, desde a montagem, recursos, caracterís-
ticas técnicas etc. O Model 80 e o Model 360 ficaram para estas edições online. Co-
meçaremos pelo Model 360.

*Engenheiro Eletricista

32
Reportagem de Antenna sobre o lançamento da nova linha Model da Gradiente, com o
pré-lançamento do A1 e do P1, em outubro de 1977

Modelo mais potente da linha, o Model 360 também apresenta um recurso incomum
para um amplificador integrado residencial da época: a possibilidade de se misturar
duas fontes de sinal. É dotado de um pequeno misturador, que permite a fusão dos
sinais de duas entradas de toca-discos.

33
Seu painel dianteiro é bonito e funcional. além do já citado mixer, disponibiliza controles
de graves, médios e agudos, seleção para dois pares de sonofletores, saída para fo-
nes, filtros, monitor para dois tape-decks e atenuador (mute).

O também bonito VU de led oferece duas sensibilidades (0dB e -20dB), com marca-
ções em dB e potência, para 8Ω de carga nominal.

O painel traseiro é bem projetado, com as conexões dispostas em blocos, de forma


racional.

Observa-se que o chassis do aparelho é o mesmo do ampliceptor Model 1450, lançado


antes, de forma que a Gradiente “sacrificou” uma entrada de alto nível para dar lugar
à segunda entrada de fonocaptor (phono II), assim, o equipamento não tem entrada
auxiliar, o que não é grande problema, pois dispõe de duas entradas para gravadores
e uma para sintonizador.

O fusível geral de proteção é interno, o que, em se tratando de aparelhos residenciais,


é até mais seguro, e o módulo de potência pode ser separado do pré-amplificador; uma
funcionalidade interessante. Três tomadas de energia, sendo uma comutada pelo am-
plificador, e o conjunto de conectores de pressão para os sonofletores complementam
o conjunto.

Quanto a estes últimos, a Gradiente sempre utilizou bornes de rosquear compatíveis


com pinos “banana”, que, emho, são muito melhores do que os conectores de pressão,
e, nesta linha, começou a usar bornes de rosquear pequenos, como o do terminal de
aterramento, mas, após uma gritaria, patrocinada pelos analistas de Antenna, diga-se
de passagem, passou a usar os conectores que podem ser vistos na foto acima.

De experiência própria, digo que são frágeis e propensos a problemas, se forem muito
manipulados; para conectar umas poucas vezes, e se esquecer deles, servem bem à
sua função, para cabos de bitola pequena.

34
O Model 360 é um projeto do Eng. Ruy Monteiro, e é diferente dos Model 80, 120 e
160, em sua concepção. Enquanto estes utilizavam os tradicionais transistores 2N3055
e 3055, além semicondutores fabricados no Brasil, o primeiro utilizava transistores de
saída e drivers fabricados no Japão, de características técnicas superiores, os mesmos
utilizados no Gradiente A1 e em alguns amplificadores americanos e japoneses, como,
por exemplo, nos Marantz. Com isso, foi possível utilizar-se tensões de alimentação
maiores e o fornecimento de mais potência de saída.

Par de transistores de saída utilizados no Model 360 (imagem do eBay)

Esses semicondutores foram descontinuados, mas ainda são procurados e, no eBay,


é possível encontrar-se vários vendedores, mas é necessário cuidado na compra, pois
há muitas falsificações. A capacitância entre base e emissor dos transistores originais
é de 3,6nF, aproximadamente, e essa informação pode ser útil para se evitar adquirir
falsificações (https://revistaantenna.com.br/transistores-falsos-como-reconhece-los/).

A montagem interna, apesar de não ser limpa de fios aparentes como nos modelos
menores, e bem razoável e dividida em placas impressas por funcionalidades. A ma-
nutenção é um pouco mais complicada, mas nada que seja impossível de se fazer.

35
Podemos observar a grande área dos dissipadores de calor e o transformador de bom
tamanho.

O Model 360 que analisaremos foi emprestado pelo colega Regivaldo, aqui de Brasília,
e está com o painel frontal bem conservado. Aparenta não ter sido submetido a reparos
e ter sido armazenado ou colocado em algum lugar e ter sido pouco movimentado, o
que foi bom, mas, pelo mesmo motivo, fez com que ele acumulasse muita poeira (muita
mesmo) internamente.

Antes de ligá-lo pela primeira vez o submetemos, então, a uma completa limpeza in-
terna, com álcool isopropílico, escovas, pincéis, aspirador de pó etc. Feito isto, proce-
demos à substituição de boa parte dos capacitores eletrolíticos originais, particular-
mente os das linhas de alimentação e de todos os do módulo de potência, submetidos
a mais calor e condições mais severas de corrente.

Isso é necessário em equipamentos dessa idade, particularmente em amplificadores,


por conta do exaurimento da vida útil desses componentes. Vejam abaixo, por exem-
plo, a condição dos capacitores principais de filtro, da Siemens. No capacímetro, eles
continuam mostrando valores muito próximos aos nominais, entretanto, vazamentos
como o mostrado podem danificar severamente as placas de circuito impresso e os
componentes próximos a eles.

36
Com os capacitores trocados, ligamos o equipamento e, durante as medições iniciais,
percebemos que um dos canais apresentava deformação na parte positiva da senoide
de teste, mesmo sem carga, apesar de não apresentar desvios de tensão contínua na
saída. Com certeza, com carga, haveria problemas.

Uma análise do problema revelou uma ocorrência não muito usual: o resistor de emis-
sor do transistor de saída da malha positiva estava aberto e o próprio estava em tran-
sistor em curto, bem como estava danificado o resistor do circuito de proteção desta
malha.

Por algum motivo, como um curto na saída ou uma falha do 2SD665 (sim, transistores
também envelhecem) o transistor entrou em curto, o que fez o estágio de proteção ser
acionado e o resistor de emissor, de alta capacidade de dissipação, abrir, protegendo
o restante do amplificador. Menos mal, e a troca dos três componentes recuperou a
plena saúde do estágio de saída.

No caso do transistor, como não está mais sendo produzido, optei por trocar o par do
canal defeituoso pelos MJ21193/21194 da ON Semi, com características semelhantes
e mais robustos. Vamos ver, mais adiante, nas medições de performance, se a troca
foi adequada ou não.

Passamos então ao ajuste da corrente de repouso e do nível DC à saída. O Model 360


não tem trimpots para estes procedimentos. O valor é ajustado e então é colocado um
resistor fixo, de valor aproximado ao desejado. Como não encontramos informação
sobre o valor utilizado pela Gradiente para a corrente de repouso, procedemos ao
nosso padrão, para distorção de transição ótima. O nível de tensão CC na saída estava
adequado e os valores foram mantidos.

Feito isso passamos aos testes iniciais de potência de saída e consumo, mas, infeliz-
mente, o controle de volume apresentava um defeito que impedia o correto ajuste do
volume e o equilíbrio entre os canais, assim, tivemos que providenciar um novo com-
ponente, que, felizmente, o Regivaldo tinha disponível.

37
Medições em bancada

As especificações divulgadas para o produto, conforme o site Audiorama, são as se-


guintes:
Potência por canal 80W RMS (8 Ohms, 0,04% THD)
120W RMS (4 Ohms)
Impedância de saída 4 a 16 Ohms
Resposta de Freqüência 10Hz - 60kHz a 1 Watt
20Hz - 50kHz (-0,5dB) a Pot. Máx.
Distorção Harmônica Total (THD) 0,04% (Pot. Máx., 8 Ohms)
Distorção por Intermodulação 0,1%
Fator de Amortecimento (Damping) 160 (1kHz, 8 Ohms)
Relação Sinal/Ruído 80dB (Phono)
85dB (Line)
Controle de tonalidade +/-10dB a 100Hz (Graves)
+/-6dB a 1,2kHz (Médios)
+/-10dB a 10kHz (Agudos)
Loudness (-30dB) +8dB a 100Hz, +4dB a 10kHz
Hi-Cut -7dB a 10kHz
Lo-Cut -7dB a 40Hz
Mute -20dB
Alimentação 120/220V (50/60Hz)
Consumo 30W (sem sinal)
450W (máx. sinal)

As medidas foram realizadas em 240VCA, para simular a condição de 120VCA da


chave, pois esta, em tese, permite maior potência para o estágio de saída, por conta
da forma do primário do transformador de força. Ambos os canais em carga.

Potência de no limite do ceifamento - 8Ω/1kHz – 94W

38
Potência de no limite do ceifamento - 4Ω/1kHz – 138W

Os consumos, nas condições acima, foram, respectivamente, de 289VA e de 456VA.

Observamos que, de forma consistente com as medições feitas em outros equipamen-


tos da linha Model, este amplificador entrega mais potência que a especificada. Vere-
mos, adiante, a distorção harmônica com referência às potências máximas, pois o fo-
lheto da Gradiente especifica (corretamente) a distorção definida para elas, em 8Ω.

Diafonia (crosstalk) - 8Ω/1kHz, a 1W

Resposta em frequência a 1W/8Ω - Ruído branco

39
A resposta em frequência, medida a partir da entrada Tuner, ficou um pouco prejudi-
cada pelo fato de os controles de tonalidade terem uma pequena imprecisão nas travas
de seus pontos centrais, e é menos extensa que a publicada, com pontos de -3dB em
20Hz e em aproximadamente 38kHz.

Então, medimos também diretamente na entrada do amplificador de potência, com o


resultado abaixo, consistente com o divulgado:

Distorção por intermodulação SMPTE a 1W/4Ω

Distorção por intermodulação SMPTE a 1W/8Ω

Distorção por intermodulação SMPTE a 10W/4Ω

40
Distorção por intermodulação SMPTE a 10W/8Ω

Distorção por intermodulação SMPTE a 50W/4Ω

Distorção por intermodulação SMPTE a 50W/8Ω

Distorção por intermodulação SMPTE no limite do ceifamento/4Ω

Distorção por intermodulação SMPTE no limite do ceifamento/8Ω

41
Distorção harmônica total a 1kHz/1W/4Ω

Distorção harmônica total a 1kHz/1W/8Ω

Distorção harmônica total a 1kHz/10W/4Ω

Distorção harmônica total a 1kHz/10W/8Ω

Distorção harmônica total a 1kHz/50W/4Ω

42
Distorção harmônica total a 1kHz/50W/8Ω

Distorção harmônica total no limite do ceifamento/4Ω

Distorção harmônica total no limite do ceifamento/8Ω

Os valores de distorção são bons, mas superiores aos divulgados, a partir de 10W.
como a resposta em frequência medida diretamente na seção amplificadora foi consis-
tente, fizemos medições em 8Ω, até o limite do ceifamento, nesta condição, e os resul-
tados foram consistentes com os publicados. A relação sinal ruído é boa mas inferior
à divulgada (85dB).

A 50W temos o gráfico abaixo, e, no ceifamento, acima de 80W do manual, o valor foi
de 0,05% e a relação sinal ruído ficou próxima do divulgado (85dB). São fortes evidên-
cias de que os valores divulgados foram medidos dessa forma.

43
Os filtros de graves e de agudos se mostraram mais agressivos que o especificado,
em torno de -10dB nas frequências indicadas, e o loudness conferiu.

Os controles de graves e agudos alcançaram ±12dB, contra os ±10dB especificados,


e o de médios, ±8dB, contra ±6dB. O nível de silenciamento (muting) cravou -20dB.

O fator de amortecimento medido foi de 42, a 1W/8Ω, um bom valor, mas abaixo do
especificado, entretanto (160).

Conclusões

O Gradiente Model 360 era o carro-chefe da linha Model, e tinha características técni-
cas objetivas, funcionalidades e design muito bons. A função de mistura de toca-
discos é interessante, uma boa economia de recursos e espaço para que desejasse
fazer gravações ou mesmo pequenas festas, pois o Model 360 tem potência para isso.

A análise objetiva mostrou um equipamento de boa performance e capaz de aguentar


os severos testes de potência, que são longos, sem problemas, Os dissipadores de
calor se aqueceram bastante, mas são internos e não ultrapassaram nenhum limite
perigoso. Quanto a isso, se ele for utilizado em potências elevadas é importante não
obstruir suas aberturas de ventilação.

Os valores de distorção foram melhores no canal com o par mais novo de transistores
de saída; são os de cor azul, nos gráficos, mas mesmo os originais apresentam boa
performance. Seus invólucros estão bastante oxidados; eles estavam muito sujos, o
que talvez tenha contribuído para isso.

Os recursos e a potência disponíveis o colocavam em uma categoria superior, sendo


poucos os concorrentes que ofereciam algo similar.

De resto, observamos que esta linha foi uma espécie de divisor de águas no processo
industrial da Gradiente: passou a fornecer informações técnicas de forma mais organi-
zada para o público e para os técnicos de manutenção, moveu parte de sua linha de
produção para Manaus e investiu na melhoria da montagem interna de seus equipa-
mentos, simplificando-a.

Esse amplificador é, até hoje, admirado e muito procurado pelos colecionadores de


equipamentos vintage, com razão. Talvez custe tão caro atualmente quanto custava
na época.

E encerramos por aqui. Até a próxima análise!

44
João Alexandre Silveira*

Sejam bem-vindos de novo à nossa série sobre experimentos com a linguagem Python
para técnicos, engenheiros, inventores e hobistas de Eletrônica. Cremos que, até aqui,
vimos a essência dessa interessante linguagem. Na parte IV discorremos sobre dicio-
nários e bibliotecas em Python. Lá, vimos que os dicionários são identificados por seus
elementos virem entre chaves - ‘{‘ e ‘}’; e por seus índices poderem vir na forma de
strings, uma sequência de caracteres alfanuméricos, e não por somente números in-
teiros, como nas tuplas e listas. Também falamos que bibliotecas são coleções de mó-
dulos e funções prontas que importamos para dentro do núcleo do Python, para acres-
centar novas funções à linguagem.

Nesta quinta parte, vamos ver o que são erros de sintaxe, que podem aparecer quando
estamos escrevendo um código em Python, e também como tratamos as exceções,
que podem ocorrer quando executamos um programa nessa linguagem.

Lá no primeiro artigo desta nossa série, em dezembro do ano passado, dissemos que
código fonte é a versão primeira de um programa de computador. É uma abstração
materializada, uma lista com instruções para uma máquina programável que devem
obedecer às regras de sintaxe da linguagem de programação escolhida. Essa lista,
quase sempre escrita em inglês, contém todas as tarefas que queremos que tal má-
quina execute, como, por exemplo, tomar dois números como entradas guardados em
duas variáveis, somar seus conteúdos e exibir o resultado numa tela. Temos aqui o
que se costuma chamar de Algoritmo; como uma receita culinária onde devemos obe-
decer a todas as instruções listadas para se chegar a um resultado desejado.

*Autor do livro “Experimentos com o Arduino”, disponível em www.amazon.com.br


45
O código fonte, após passar pelo interpretador (ou compilador) da linguagem escolhida,
gera o código objeto, o programa final, a linguagem montada com bits e bytes que o
computador entende.

Vamos fazer uma analogia com o projeto de um circuito eletrônico: procurando uma
solução eletrônica para uma necessidade que temos, primeiro mentalizamos de modo
muito objetivo as funções que nosso circuito deverá ter. Então rascunhamos numa fo-
lha de papel os blocos básicos desse circuito que idealizamos. Cada bloco poderá vir
a ser um circuito funcional que deverá se comunicar com os circuitos dos outros blocos;
e assim vamos abstraindo até chegarmos a um circuito único e o mais simples possível.
Normalmente o projeto da fonte de alimentação é a última etapa do nosso projeto.

Por fim, montamos todo ou em partes o circuito final; e testamos fisicamente cada es-
tágio numa protoboard, ou de modo virtual num simulador de circuitos em nosso PC.
É nessa fase, da prototipagem, que os problemas (as falhas ou erros no projeto) podem
surgir; como componentes eletrônicos (resistores, capacitores, transistores e outros)
mal dimensionados ou com defeito, incompatibilidade entre partes do próprio circuito,
e tantos outros.

Assim também é quando estamos desenvolvendo um programa de computador: a par-


tir de uma necessidade, a mãe da invenção, segundo o filósofo Platão, abstraímos uma
possível solução; agora não com componentes eletrônicos, mas com componentes da
sintaxe da linguagem de programação que dominamos. Aqui, igualmente, desenhamos
num papel os blocos básicos de construção do programa na forma de um fluxograma
e depois os abrimos em seus componentes funcionais menores: as variáveis, os ope-
radores lógicos e matemáticos, os laços de repetição, as funções e as bibliotecas que
precisamos importar. Tudo isso já vimos nos artigos anteriores.

Depois de montar todo o sistema num editor de textos (a nossa ‘protoboard’), ou numa
plataforma de desenvolvimento integrada (IDE), como o Colab que até aqui temos
usado, é hora de testar cada parte ou o todo no interpretador (ou no compilador) da
linguagem escolhida. É aqui que também vão aparecer as falhas e os erros de projeto
do nosso programa, que precisamos corrigir. Esses erros também podem ser de qual-
quer natureza, desde o mais comum, como erros de sintaxe e acesso a memória com
dados corrompidos, a conexão remota incompatível ou ausente, ou mesmo entradas
de informações incorretas pelo usuário.

Quase todas as linguagens modernas têm seus próprios métodos de correção de erros,
chamados de depuração (debuging, em inglês). O Python tem um sistema robusto de
detecção desses erros e falhas durante a compilação (translação) do código fonte em
código objeto; ou depois da compilação, quando da execução do programa.

46
Os erros que são detectados somente durante a execução do programa recebem o
nome de exceções (exceptions), quando então o programa trava e uma mensagem de
texto indicando o erro é enviada ao programador. Por exemplo, o usuário entra com
algum dado incorreto, como um denominador 0 em uma operação matemática de divi-
são.

Exceções são também erros, mas que só são detectados quando o programa está
sendo executado, pois interrompem o fluxo normal do programa (program crash); mas
muitos deles podem ser prevenidos se tratados antecipadamente ainda na fase do pro-
jeto, no código fonte. Esse tratamento de possíveis erros podem incluir alertas quando
da entradas incorretas pelo usuário (como no caso da divisão por zero); estabeleci-
mento de valores default se o usuário omitir uma entrada de dado obrigatória; ou um
salto (jump) para um bloco de comandos alternativo.

Os Erros e Falhas na criação de Scripts em Python

Uma falha muito comum que podemos cometer durante a criação do código fonte, prin-
cipalmente quando iniciamos numa nova linguagem de programação, é o erro de sin-
taxe; quando o comando que digitamos não é reconhecido pelo compilador do Python.
Pode acontecer também quando não obedecemos ao estilo da linguagem ou esque-
cemos de incluir alguma parte essencial da estrutura de um comando. Os erros de
sintaxe não podem ser prevenidos e tratados com alertas ou com valores default, como
nas exceções; aqui a compilação do código fonte é interrompida e também uma men-
sagem de erro (SyntaxError) é gerada para alertar o programador.

OK, mas vamos ver tudo isso no Colab. Primeiramente, vamos ver alguns exemplos
de erros de programação bastante comuns em scripts Python. Comecemos com um
script bem simples como o mostrado na tela abaixo.

47
Nessa tela temos um script que deve mostrar o resultado da divisão entre dois números
inteiros. A primeira linha requisita um número ao usuário e guarda o seu valor na vari-
ável ’a’. A segunda linha requisita outro número e o guarda na variável ‘b’. Na linha 4
o programa divide o primeiro número pelo segundo e guarda o resultado na variável
‘c’. Por fim, na linha 5, o script mostra o resultado dessa operação na tela do computa-
dor. Até aqui nenhuma surpresa, o resultado é 2.5 como vemos nessa primeira tela do
Colab. Note que o resultado é um número fracionário. Agora veja a segunda tela,
abaixo.

Nessa segunda tela, entramos para o segundo número, o denominador, com o valor 0.
Sabemos que não é possível a divisão de qualquer número por zero; por isso quando
o programa tenta fazer essa operação matemática na linha 4, o erro de entrada do
usuário é detectado e uma exceção é mostrada logo a seguir, sem mesmo chegar à
execução da linha 5, que deveria mostrar o resultado na tela. O compilador Python
aponta, depois da linha tracejada vermelha, para onde ocorreu a exceção (seta trace-
jada verde): na linha 4, quando ele tentava dividir o primeiro número entrado pelo se-
gundo. O tipo de erro também é indicado na última linha da tela: ZeroDivisionError e
ainda explicita a seguir que se trata de um erro de divisão por zero. Legal!, parece fácil
encontrar erros num código fonte Python, não? Mas, vamos continuar observando a
tela seguinte, ainda com o mesmo script que começamos.

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Nessa terceira tela estamos tentamos dividir um número inteiro por uma string. Aqui
também o compilador Python detectou uma exceção quando o script requisitou na linha
2 um número inteiro e entramos com a string ‘dois’. O programa foi travado nessa linha,
como podemos observar com a indicação da seta verde; as linhas seguintes sequer
foram executadas. Aqui temos uma exceção chamada de ValueError: não se pode fa-
zer operações matemáticas entre tipos diferentes, aqui um inteiro com uma string. Lem-
bre-se de que exceções são os erros que só são detectados quando o programa já
está sendo executado.

O Python não pode ‘adivinhar’ por si só se o usuário vai digitar o tipo correto exigido
pelo programa. Mas veremos mais adiante que o programador do código fonte, este
sim, pode tentar prever uma entrada errada pelo usuário e, se antecipando ao fato,
caso ocorra uma entrada errada, criar uma mensagem de alerta pedindo ao usuário a
entrada correta, sem travar o programa em execução.

Continuando, vamos incluir um laço de repetição if...else no script que temos no Colab,
agora forçando intencionalmente erros de sintaxe muitos comuns. Veja a tela a seguir.

Tente o leitor descobrir, observando o alerta do Python, onde está o erro. Dica: Veja o
apontador de erros: o sinal circunflexo que aparece na mensagem.

Como no exemplo anterior, o programa nos pede para entrar com dois números intei-
ros; mas agora tenta nos dizer se o resultado da divisão de um pelo outro é maior ou
igual a 3. Quando tentamos compilar esse script um erro de sintaxe ocorre na linha 6.
Veja que o compilador nos aponta onde está o erro: esquecemos de colocar os dois
pontos exigidos pelo laço if...else logo depois do else. Corrija o erro no código e o
execute de novo o script para o ver funcionando normalmente.

Outros erros comuns durante a criação do código fonte são: primt() - com ‘m’ em vez
de ‘n’; esquecer o recuo de 4 espaços (Tab) na estrutura de laços de repetição; não
converter para número inteiro com a função int() a entrada string na função input();
fazer uma operação lógica ou matemática sem declarar uma das variáveis; operações
lógicas ou matemáticas entre tipos diferentes; tentar usar uma biblioteca sem antes
importá-la.
49
A lista é imensa e se fôssemos tentar mostrar todos os exemplos de erros de sintaxe
aqui, esse artigo teria dezenas de páginas; somente errando e acertando com a prática
da linguagem poderemos dirimir todos os erros em nossos scripts em Python. Veja no
link [2] no final do artigo alguns exemplos de erros comuns de sintaxe.

Fazendo o Tratamento das Exceções

Voltemos ao código da página anterior e vamos fazer uma prevenção a um possível


erro de entrada pelo usuário para o segundo número, o denominador, na operação de
divisão entre inteiros. Veja a tela Colab a seguir.

Aqui o programa foi compilado e executado sem erros; se entrarmos com as entradas
requisitadas corretas nenhuma exceção é detectada. Entramos com 0 para o primeiro
número, o numerador, e com um número inteiro qualquer para o segundo, o denomi-
nador, o resultado da divisão foi também 0. Matemática pura. Mas, já sabemos que
para qualquer número no numerador e 0 no denominador teremos um erro; no Python,
isso será uma exceção que vai travar a execução normal do programa, o que não de-
sejamos que aconteça.

Então, para prevenir essa possível exceção adicionamos três linhas ao nosso código
fonte original. Vamos testar esse novo script entrando com 0 para o denominador. Veja
a tela a seguir.

50
O que fizemos de especial nesse script? Nada mudamos quanto às posições das vari-
áveis ‘a’ e ‘b’; mas colocamos o laço de repetição if...else do script original dentro de
um bloco chamado try; e por prevenção, criamos um alerta para o usuário dentro de
um bloco chamado except. O código dentro do primeiro bloco está ali para ser execu-
tado normalmente; mas é vulnerável a exceções dependendo da entrada de dados
pelo usuário. Caso ocorra mesmo uma exceção, será o código dentro do segundo
bloco é que será executado, não o do primeiro. Tranquilo?

Escrever códigos para computadores é uma forma de arte. Observe o script a seguir e
o compare com o anterior.

Qual é a diferença? Essa é o que poderíamos chamar de forma mais pitônica de es-
crever esse script. Pitônica? Sim, forma pitônica significa código que não apenas obe-
dece à sintaxe correta, mas que também segue as convenções da comunidade Python
e usa a linguagem da maneira que deve ser usada. Nesse código, primeiro testamos
dentro do bloco try se a operação aritmética de divisão entre dois números não gera
nenhuma exceção. Se sim, o comando dentro do bloco except é executado; se não,
esse bloco é ignorado e o bloco dentro do primeiro else que é executado. Confuso?
Então, vamos a mais alguns exemplos para deixar as coisas mais claras.

Na parte III de nossa série estudamos as listas em Python. Vimos que listas são vari-
áveis compostas onde podemos guardar não somente um único valor, mas coleções
de diferentes objetos; como números inteiros ou fracionários, strings de qualquer ta-
manho, outras listas com outras listas dentro; também tuplas e todo tipo de expressões
matemáticas ou lógicas. Vamos criar uma lista simples com somente 4 objetos, com-
ponentes de um circuito eletrônico qualquer. Veja a tela a seguir.

51
Ôpa!, cometemos um erro. Criamos uma lista com variáveis simples sem declarar an-
teriormente nenhuma delas. Vamos corrigir nosso código.

Putz!, erramos de novo. Agora atribuímos valores às variáveis mesclando números


inteiros com strings. Vamos tentar mais uma vez.

Agora sim! Criamos uma lista em Python com quatro objetos string; e mandamos im-
primir essa lista na tela. Agora vamos checar somente o quarto elemento de nossa
lista.

Essa era a exceção que queríamos mostrar: um erro de índice (IndexError). Estamos
tentando acessar em nossa lista um elemento que não existe: um quinto elemento.
Sabemos que o primeiro elemento de qualquer lista ou tupla em Python começa com
o índice 0; assim o correto acesso ao quarto elemento dessa lista deveria ser: lst_1[3].

Podemos criar, somente como exercício, uma prevenção contra esse tipo de exceção.
Vejamos o script na tela abaixo.

52
Veja que introduzimos mais um bloco ao nosso script: o bloco finally que, indiferente-
mente da ocorrência ou não de exceções quando da execução do nosso programa, vai
executar o código nele contido. A função len() nos informa quantos itens temos em
nossa lista, e já foi por nós aqui estudada.

Concluindo

Lembre-se de que os erros de programação em Python são detectados na compilação


do programa; exceções são detectadas na execução do programa e, também, que o
bloco try testa um código por possíveis exceções; o bloco except trata a ocorrência
dessas exceções.

Como vimos até aqui, aprender Python é fácil, talvez porque essa linguagem não seja
‘engessada’; existem muitas maneiras de escrever um mesmo script. O programador
é livre para escolher a forma que mais lhe convém; desde que, claro!, respeite sua
sintaxe; e preferencialmente a escreva de forma pitônica.

Até breve!

Links:

[1] Livro “Experimentos com Arduino”: procure por este título em https://www.ama-
zon.com.br/
[2] Pequena lista de erros em Python: https://www.tutorialsteacher.com/python/error-types-in-
python

53
Monte um Testador de Transistores Bipolares de Potência
Marcelo Yared*

Em Antenna de outubro de 2020, publicamos um


pequeno artigo, baseado numa discussão no fó-
rum DIYAudio, sobre como identificar transisto-
res falsos (revistaantenna.com.br/transistores-
falsos-como-reconhece-los/). A discussão citada
não é recente, e a falsificação de transistores e
de outros semicondutores é uma praga que
torna a vida dos experimentadores e técnicos de
manutenção muito mais difícil, faz tempo.

A discussão citada também nos mostra que este


é um problema mundial, mas, no Brasil, por
questões estruturais locais, a coisa é bem mais
complicada.

Enquanto no mundo desenvolvido, de uma forma geral, há a possibilidade de, a custos


razoáveis, adquirir-se tais componentes de fornecedores extremamente confiáveis, por
aqui, infelizmente, o comércio local, ou mesmo de Internet, muitas vezes, sequer tem
noção do que vende e comprar semicondutores virou uma loteria.

Por outro lado, tentar importar diretamente dos fornecedores de alta qualidade citados
nos leva à situação de ter que pagar, inclusive sobre o frete, algo em torno de 80%, ou
mais, de impostos e taxas. E isso para que o técnico ou engenheiro possa trabalhar e
fornecer serviço que seja seguro e confiável. Não se trata de importação de perfumes,
roupas, calçados de grife etc, mas, infelizmente, o tratamento tributário é igual.

Desde a publicação do artigo, temos visto boa receptividade e a aplicação dos concei-
tos lá expostos por vários técnicos e vendedores. No Mercado Livre, observei um ven-
dedor informando a capacitância CBE dos transistores. Por outro lado, outro vendedor,
com preços muito baixos para os transistores que anunciava, ao pedirem para medir a
capacitância de suas peças e informar, simplesmente disse que não tinha um capací-
metro para medir, apesar de sua propaganda mostrar uma loja de eletrônica imensa
na Santa Efigênia... No Youtube, há alguns vídeos demonstrando a técnica e, com isso,
a dificuldade para os falsificadores na venda de seus produtos deve aumentar.

Como em tudo na vida, há também exageros e interpretações errôneas do método,


mas o resultado geral é positivo.

*Engenheiro Eletricista
54
Entre as interpretações equivocadas, uma que vimos, recentemente, em um vídeo de
um montador de circuitos de áudio, nos chamou a atenção: definiu o método como
infalível. Sabemos que, em engenharia, de uma forma geral, não existe nada infalível
e temos que conhecer os limites dos métodos e processos que utilizamos para montar
ou fazer manutenção em circuitos eletrônicos.

E isto me motivou a apresentar este artigo, fruto de uma discussão entre mim e o prof.
Álvaro Neiva, acerca de como aumentar a confiabilidade na medição desses compo-
nentes. A ideia original surgiu há tempos, numa outra discussão, com o eng. João Yaz-
bek, que, como industrial, trava uma batalha constante contra as falsificações de com-
ponentes.

Coincidentemente, também, no mês passado, o prof. Paulo Brites nos brindou com um
valioso artigo sobre as limitações de medidores de ganho de corrente disponíveis nos
multímetros mais populares (revistaantenna.com.br/voce-sabe-o-que-e-hfe-hfe-ou-ẞ-
beta/), e nos deu uma explicação sobre o que representa essa medida.

Assim, complementando os dois artigos, apresentamos aos leitores um projeto prático


que permite testar transistores de potência e superar algumas das limitações das me-
dições de capacitância de emissor, e outras.

Permite também saber o ganho de corrente aproximado do dispositivo em regimes de


potência elevada, o que é muito útil para casarmos pares complementares, ou mesmo
casarem-se transistores em paralelo em fontes de alimentação e em outras aplicações.
A precisão, neste caso, não é absoluta, mas ajudará bastante o projetista e o reparador
e será mais fiel do que a fornecida pelos multímetros citados pelo prof. Paulo Brites.

Antes de entrarmos na descrição do circuito, esclarecemos que esta montagem não é


algo que esteja ao alcance do iniciante, apesar do conceito ser simples, ela tem com-
plexidades de construção e trabalha com potências e tensões mais elevadas. Ela é o
resultado prático da exploração de um conceito, e, assim, o montador experiente po-
derá adaptá-la para suas necessidades, alterá-la a gosto, usar o circuito parcialmente,
aproveitando fontes de alimentação que já tenha disponíveis etc. A imaginação e a
necessidade são os limites.

No artigo sobre a medição de capacitância em transistores, mostramos que alguns


deles, notadamente os mais antigos, apresentam valores baixo dessa característica,
se comparados aos mais modernos e, entretanto, não são falsos. Também vimos que,
dependendo do fabricante, o valor médio dela pode variar, ou seja, um componente
fabricado pela MOSPEC, outro pela ON e outro pela ST podem ter valores de CBE
bastante diferentes para a mesma denominação.

55
Tecnologias de fabricação diferentes e material diferente podem levar a características
elétricas diferentes, e isto, somado à característica citada anteriormente, pode levar a
erros e dificuldades no uso da capacitância como método de medição.

Por sorte, para a maioria dos transistores modernos, há uma padronização muito boa
nesses valores. Observamos que os bons e muito comuns 2SA1943 e 2SC5200 da
Toshiba, independente do lote, apresentam valores de CBE bem estáveis, entre 4nF e
6nF, e os seus equivalentes, de outros fabricantes, não necessariamente apresentarão
esses valores. Torna-se necessário considerar o fabricante quando da medição.

Por outro lado, certas falsificações utilizam pastilhas de transistores de potência menor,
colocando-as em invólucros de dispositivos mais potentes, e caros, assim, num caso
prático, um transistor MJ15003 marcado como ON Semi que medimos, apresentava
2,6nF de capacitância de junção BE, abaixo, mas algo próxima, da dos transistores
originais, em torno de 3,5nF. Ele não resistiu ao teste de tensão deste medidor, apesar
de apresentar uma capacitância mais alta que a dos falsificados em geral.

Os transistores bipolares de silício são utilizados generalizadamente em circuitos ele-


trônicos, sendo que existe uma categoria, usualmente chamada de transistores de po-
tência, responsável por controlar correntes elevadas, normalmente na casa dos am-
pères. Podem chegar às dezenas de ampères nessa função. Por isso, normalmente,
são caros. Como visto, uma corrente de alguns miliampères circulando entre a base e
o emissor desses componentes controla correntes da ordem de ampères em seu cole-
tor.

Tais componentes apresentam, normalmente, ganhos de corrente mais baixos do que


os dos transistores de média potência e de sinal. Importante entender esse comporta-
mento, de uma forma geral, que pode ser representado pela figura abaixo:

56
O gráfico é referente à característica de ganho de corrente (h FE) versus corrente de
coletor (IC) versus temperatura da junção, para uma dada configuração e para uma
tensão definida entre coletor e emissor, no caso do transistor 2SC5200 da Toshiba.

Imediatamente vemos que esse semicondutor apresenta ganho razoavelmente cons-


tante até, mais ou menos, 3A de corrente de coletor, o que é uma boa característica.
Também vemos que o ganho se altera significativamente conforme a temperatura da
junção aumenta, de forma positiva. Isso nos diz que temos que providenciar algum
controle de corrente para esses dispositivos, de forma a reduzir a corrente em sua base
conforme a temperatura aumenta, e cuidar adequadamente do dimensionamento do
dissipador do calor que ele possa produzir, no projeto.

Outra característica importante é a mostrada abaixo, para o mesmo transistor:

Da segunda figura, vemos que a corrente máxima que o 2SC5200 consegue manipular
é função da tensão aplicada entre seus terminais de coletor e emissor, e a partir de
10V, ela cai significativamente em condições de corrente contínua. Para correntes pul-
santes, não repetitivas, a sua capacidade depende da duração do pulso. Observamos,
também, que a referência de temperatura de invólucro dos gráfico é 25oC.

Os comportamentos acima descritos são comuns a quaisquer transistores bipolares.

57
O segundo gráfico nos mostra o que é conhecido como Área de Operação Segura, ou
SOA, em língua inglesa. São as condições de trabalho consideradas seguras para o
transistor, no que se refere à tensão aplicada e à corrente que o atravessa.

No caso do 2SC5200, o gráfico nos mostra que ele suporta, continuamente, aproxima-
damente 1A a 75V, ou seja, 75W em regime permanente, na condição de temperatura
especificada.

Os gráficos de SOA dos transistores normalmente se referem à condição contínua (CC)


ou a pulsos de 1s, ou um pouco mais que isso.

Em 99,9999% das falsificações, pega-se uma pastilha de um transistor de baixa po-


tência, coloca-se em um encapsulamento de um transistor mais potente (e mais caro)
e renumera-se, ou grava-se uma numeração que não corresponde à sua capacidade.

Os transistores com encapsulamento plástico da Toshiba, como o 2SC5200, por exem-


plo, são alguns dos mais falsificados, seguidos pelos metálicos MJ150XX e 2N3055,
vários Sanken etc. Então, se submetidos às condições máximas seguras, ou garanti-
das, dos fabricantes, os verdadeiros deverão “sobreviver”, e os falsos sucumbirão.

A ideia, aqui, é montar um circuito para testar essa condição, que permita a seleção de
corrente de base do transistor em teste, de forma a ter-se uma certa corrente de cole-
tor, para uma tensão entre coletor e emissor também selecionável, dentro do envelope
de operação segura do transistor.

O teste deverá ser realizado durante poucos segundos, pois é muito severo e mesmo
transistores originais podem não suportar essas condições durante muito tempo sem
ventilação muito poderosa ou mesmo refrigeração.

“Colando” uma definição do artigo do prof. Brites, sabemos que o ganho de corrente
(ẞ) pode ser definido por:
(IC/Ib)
Então, se controlamos a corrente de base, e, desta forma, obtemos uma corrente de
coletor, podemos saber o valor do ganho de corrente. Em nosso circuito, teremos uma
boa aproximação desse valor e, do ponto de vista prático, isso é mais que suficiente,
em nosso caso.

Chamaremos o transistor a ser testado de (DUT), do Inglês de Dispositivo Sob Teste.


Infelizmente em português a sigla resultante não cai bem, assim, vamos de DUT
mesmo. O diagrama conceitual, para um transistor NPN do dispositivo, é o seguinte:
58
V1 é uma fonte de tensão constante e I1 uma fonte de corrente constante. Todas as
duas podem ter seus valores alterados.

A1 e A2 são amperímetros. A1 mostra a corrente de base (Ib) e A2 a corrente de coletor


(IC). O voltímetro V mostra o valor da tensão no DUT.

Os instrumentos digitais de painel, baratos, disponíveis no mercado, utilizam o negativo


da alimentação também na referência de terra da medição, o que dificulta um pouco a
montagem, e implica algum cuidado quanto ao posicionamento deles no circuito.

Outra complicação, em um testador do tipo, é que as polaridades para os transistores


PNP e NPN são, obviamente, invertidas. Fazer um para cada tipo de transistor seria
desperdício de material, então, iremos inverter as polaridades das tensões aplicadas
no DUT conforme o tipo.

A fonte de tensão constante (V1) deve fornecer tensões mais altas que as disponíveis
para os reguladores integrados do mercado. Em nosso caso, como tínhamos um trans-
formador de 65VCA@2A em nossa sucata, a projetamos com componentes discretos,
para 75VDC estabilizados, porém , deixamos o ajuste ir até o limite do circuito, sem
estabilidade, pois, para correntes mais baixas, seria interessante dispor de mais tensão
para teste. Conseguimos aproximadamente 88VDC, sem carga.

Observem que tais valores já podem causar incômodo ou mesmo um choque elétrico,
assim, não recomendamos essa montagem para iniciantes ou pessoas com
pouca experiência.

Nada impede, porém, que tensões mais altas sejam aplicadas, pois muitos transistores
que serão testados podem trabalhar com bem mais que 80V entre coletor e emissor,
contudo, tensões acima desse limite são bem mais perigosas e, dependendo do caso,
podem levar a risco de morte. 75V a 1,5A já são suficientes para “torrar” qualquer tran-
sistor falso e representam condição de uso adequada para medições de ganho. A fonte
deverá ser reprojetada, naquele caso, ou deve ser utilizada uma externa.

59
Quanto à fonte de corrente, como a tensão direta máxima entre base e emissor do DUT
não pode passar de alguns poucos volts, optamos por utilizar o conhecido LM317 e
seu irmão para tensões negativas na função de corrente limitada, conforme abaixo:

Observe que VBE irá variar, até o limite aproximado de (VI – 4V). utilizaremos então
uma fonte de 9V, estabilizada, para garantirmos o uso dentro dos limites operacionais
do DUT.

Quanto à corrente, como o ganho em temperatura ambiente para esses dispositivos,


conforme os datasheets que analisamos, situa-se entre 50 e 100, para uma corrente
máxima de 1,5A, teremos Ib máximo de, aproximadamente, 30mA, logo, R1 mínimo
será de 1,2V/30mA=40Ω, ou o valor de comercial de 39Ω. Em série com ele teremos
um potenciômetro de 470Ω, de forma que a corrente mínima esteja na casa dos 2mA,
para os testes iniciais dos DUT.

Neste caso, considerada a simplicidade do circuito, e seu baixo custo, decidimos utili-
zar um LM317 para a geração de corrente de base para os NPN e o LM337 para a
corrente dos PNP. Um conjunto de relés fará a seleção.

Um temporizador com o CI 555 está previsto na solução, para limitar o tempo de teste,
forçadamente, a algo em torno de 2s, preservando o DUT. Ele foi colocado em uma
configuração que garante alguns segundos entre o acionamento do teste e o teste
subsequente, de modo a diminuir a dissipação na pastilha, independente da chave de
teste estar acionada ou não, continuamente.

Com o modelo básico, algumas noites no CAD e no simulador foram suficientes para
o esboço inicial do circuito, que foi posteriormente aprimorado em bancada.

Trabalhar com DC em regime constante demanda bastante atenção, pois os relés co-
muns não se dão muito bem com a dupla tensão alta/corrente alta em CC. O esquema
final segue abaixo:

60
Alguns pontos importantes em relação ao circuito:

- As duas fontes AC, de 65V e de 12V, devem ser isoladas entre si. Podem ser dois
enrolamentos separados em um mesmo transformador ou, como no meu caso, dois
transformadores diferentes;
- Um fusível no primário do transformador maior é mandatório e um no secundário de
tensão mais elevada é aconselhável;
- Os dois transistores dentro da área demarcada são montados em um dissipador de
calor, junto com seus resistores de emissor. O dissipador não precisa ser grande, mas,
na condição de curto, por exemplo, os transistores esquentarão bastante. Não econo-
mize alumínio. Eu usei um perfil em L ligado à caixa de alumínio do aparelho;
- os reguladores integrados não esquentam muito, mas pequenos dissipadores serão
bem-vindos;
- os transistores Q1 e Q4 podem ser qualquer um de média potência, desde que seu
VCEo seja de, no mínimo, 100V. Se a tensão a ser utilizada for maior que 90VCC,
utilize unidades com VCEo compatível, maior. O mesmo vale para C2;
- caso fontes CC externas estejam disponíveis, as pontes retificadoras podem ser des-
cartadas.
61
O circuito é simples na concepção, apesar da complexidade da comutação. Uma chave
de alavanca de três polos e duas posições seleciona a polaridade do transistor, inver-
tendo a fonte de tensão entre coletor e emissor, ao mesmo tempo em que aciona os
relés K1, K2 e K3, que selecionam a fonte de corrente de base adequada. K4 é acio-
nado pelo temporizador 555, através da chave normalmente aberta S1. Quando acio-
nada, a fonte de tensão é ligada ao DUT durante aproximadamente 2s, e depois des-
liga. Neste espaço de tempo os medidores de tensão e de corrente informarão os va-
lores aplicados no DUT.

Importante: a chave S2 (NPN/PNP) deve estar selecionada para a polaridade ade-


quada ANTES do teste, para evitar-se o risco de danos ao circuito.

Também, recomenda-se ajustar a corrente de base para o mínimo e a tensão VCE para
um valor compatível com o VCEo do DUT. Por exemplo, se o DUT for um 2N3055, sa-
bemos que seu VCEo máximo garantido, com base em aberto, é de 60V, assim, deve-
mos ajustar a fonte para algo próximo. Após medir-se a corrente de coletor, da primeira
vez, aguarda-se, no mínimo, uns 10s, para o calor da junção ser dissipado, e, aumen-
tando-se Ib, mede-se novamente. Deve ser respeitado o intervalo entre medições
acima informado, sempre.

O DUT deve estar preso a um dissipador adequado, pois o conjunto de 3 ou 4 testes


necessário irá gerar calor, e bastante. No caso do 2N3055, por exemplo, o limite de
60VCC com um teste de 1A de corrente de coletor faz o transistor dissipar, durante 2s,
60W. Antes do teste recomenda-se, também, verificar o datasheet para ver a condição
SOA para o transistor, ajustando-se o testador para limites seguros de operação.

Relés

Após montado o testador, começamos os testes práticos, utilizando alguns transistores


sabidamente falsos que tínhamos guardados para isso. Os relés que utilizamos são
aqueles miniatura, específicos para montagem em placa impressa. São dois contatos
reversíveis de 2ACC.

62
Para K1, K2 e K3, a corrente e a tensão de trabalho são baixas, entretanto, K4 comuta
a corrente de coletor durante 2s. Como a fonte de tensão tem limitação de curto em
torno de 2A, colocamos os dois contatos em paralelo, inicialmente, perfazendo 4A de
capacidade máxima, por precaução.

Após três ou quatro testes, com 60V, o relé K4 “colou”, e parou de comutar. Após
xingar o fabricante, que depois vi que era a Metaltex, que sempre produziu com boa
qualidade, pensei ter sido um problema com a peça em particular e a troquei.

Novamente, após 3 ou 4 testes, o outro relé também “colou”, aí, após xingar mais uma
vez o fabricante, resolvi apelar: adaptei um relé miniatura de um polo, de 10A, de outro
fornecedor, e comecei a testar novamente.

Desta vez, após uns 5 testes, com um transistor tendo entrado em curto, ouvi um es-
talo, forte, dentro da caixa e, ao abrir, lá estava o relé de 10A com um furo na carcaça;
o contato simplesmente havia “explodido” e derretido o encapsulamento plástico...

Comecei a achar que, ou esses componentes têm qualidade baixíssima, o que, hoje
em dia, não seria de se estranhar, ou, talvez, que o problema fosse outro: o projetista...
Assim, resolvi seguir o ditado que vivo repetindo para os outros: “quando tudo o mais
falhar, leia o manual...” e fui atrás dos datasheets dos relés. Eles existem...

Observei, então, que as especificações de relés têm uma “malandragem”, por assim
dizer: muitos fabricantes informam a capacidade de corrente contínua de comutação
do contato para um padrão, 30VCC, entretanto, a maior parte não informa a curva de
redução dessa capacidade em função da tensão de comutação, e, aí, pesquisando,
descobri que praticamente todos eles seguem, mais ou menos, a curva abaixo:

63
Esta curva foi retirada do datasheet de um relé especificado para 30A@30VCC e a
seta mostra a capacidade dele quando a tensão sobe para 85VCC... e você não está
lendo errado... é somente de 1A mesmo...

Ou seja, em corrente contínua, a vida dos relés normais é complicada. Isso porque, no
fechamento dos contatos, existe um compromisso com o tempo de comutação, que
tem que ser na casa de milissegundos, o que exige separação pequena entre eles.
Como a corrente é contínua, o arco formado prejudica de uma maneira muito maior os
contatos na abertura, conforme a tensão sobe. No caso do relé mostrado, a capacidade
de corrente cai 30 vezes com a tensão sendo em torno de 3 vezes maior.

Esta, pelo que pesquisei, é uma regra para os relés comerciais comuns, não importa
sua capacidade de corrente, a especificação é sempre feita para 30VCC. Não são to-
dos os fabricantes que mostram a curva de redução (a Metaltex não o faz) e, ao esco-
lher o relé, eu sabia que haveria um “derating”, por isso coloquei os contatos em para-
lelo... só não imaginava ele que fosse dessa ordem.

Uma opção seria colocar a comutação na corrente de base, e não no coletor, mas isso
implicaria deixar a tensão de coletor “viva”, sem teste, o que eu preferi não fazer.

Discutindo o assunto com o prof. Álvaro Neiva, ele lembrou-se de uma possibilidade:
a colocação dos contatos em série, para aumentar o “gap” total na abertura. A distância
dobra, tornando o arco decorrente da abertura do relé mais tolerável.

Uma pesquisa sobre o assunto mostrou também que o problema é comum para o pes-
soal que trabalha com correntes elevadas, seja em CA ou em CC, e que essa solução
é também bastante utilizada por eles. Em apenas um datasheet de um relé similar ao
Metaltex, de 2A, duplo, encontramos uma curva de “derating” utilizável:

64
O que sugere que a situação para esses relés pequenos pode ser melhor. Traçando
uma curva para a metade da tensão de medição que usaremos em 1,5A (algo em torno
de 38V), temos que a corrente máxima situa-se em torno disto, ou seja, a princípio,
algo que um relé de um contato de 30A não suporta a 75V, um de 2A com dois contatos
em série dá conta. Então, alteramos o esquema para essa forma de ligação.

E funcionou! Executamos vários testes a 1A e a 1,5A sem problemas. Mesmo com


curtos próximos a 2A, com a atuação da proteção, que também abaixa a tensão VCE,
ele saiu-se bem e funcionou adequadamente.

Medidores digitais

Outra questão importante é a escolha dos medidores. Como o prof. Paulo Brites mos-
trou, há muita coisa ruim no mercado, então, atenção. O problema aqui foi que, inicial-
mente, compramos um “combo” voltímetro+amperímetro de painel para a medição de
VCE e de IC com 4 dígitos; é bastante preciso e funcionou certinho, com um porém... a
amostragem é muito lenta. Como nossa medição não pode passar de alguns segun-
dos, pelo projeto, a informação sobre a corrente não podia ser lida corretamente.

Assim, tivemos que mudar para um “combo” de três dígitos, que, pelos datasheets, é
mais rápido que o outro. Funcionou, mas todos os dois são lentos. Pelo preço, entre-
tanto, não podemos reclamar.

O amperímetro para Ib funcionou bem, mas não conseguimos encontrar um miliampe-


rímetro digital no mercado nacional. O mais sensível era de 10A, o que, para a faixa
de 2mA a 30mA, não serviria. A solução: cortei o grosso fio de “shunt”, e soldei nele
um par de resistores de 1,5Ω, 2W, em paralelo. Coloquei um resistor de precisão como
carga para medição e coloquei mais um resistor de 6,8Ω, 1/8W em paralelo com os
primeiros, e a corrente no painel coincidiu com a esperada para o resistor de carga.

65
Para cada medidor no mercado, o ajuste do resistor de shunt pode ser diferente, assim,
os valores acima são exemplos, para o meu caso, em particular.

O miliamperímetro foi alimentado diretamente da fonte de 12V (saída de U2), que ali-
menta, também, as bobinas dos relés K1, K2 e K3, através de seu conector com fios
vermelho e preto finos.

O fio vermelho grosso (ou branco, em alguns amperímetros), deve ser ligado na junção
do conector MR1, na placa impressa, com o relé K1 e o preto, na junção entre MR1 e
o capacitor C1.

Quanto ao “combo”, nos modelos disponíveis, a tensão de alimentação máxima (fio


vermelho do conector menor), normalmente, não pode passar de 30V, e, como o con-
sumo de corrente é muito baixo, para manter as referências de terra dele isoladas, com
o resto da fonte de alta tensão, o alimentamos diretamente da tensão DC não regulada
(em torno de 90V), com um resistor de queda e um zener, na forma abaixo:

O circuito, à exceção dos transistores de passagem Q3 e Q5, foi montado em uma


placa impressa de 10cmx10cm, que ficou bem compacta e com muitos cabos conec-
tados.

Os transformadores utilizados estavam disponíveis em minha sucata e o conjunto, com


a placa impressa, os medidores, chaves e conectores foi acondicionado em uma caixa
de alumínio de 18cm x 12cm x 8cm.

A tampa foi aproveitada como base dos conectores e garras de jacaré para os DUT,
com uma chapa de alumínio de 12cm x 8,5cm, de 3mm de espessura, para reforço.
Um material sintético foi utilizado para isolar eletricamente o DUT do dissipador e ad-
quirimos no eBay o soquete para conexão sem solda dos transistores TO-3.

66
https://www.ebay.com/itm/313043615344

No lado esquerdo temos os furos para a colocação dos transistores TO-3, TO-3P e TO-
220, não isolados, e, à direita, isolados, os furos para os demais tipos. As garras de
jacaré serão utilizadas com todos, à exceção dos TO-3.

O isolante para os DUT pode ser qualquer um comumente utilizado para isso, como
mica, por exemplo. O que utilizei tem adesivo em um lado e serviu muito bem. Existem
outros no mercado, e a escolha não é crítica.

Novamente, lembramos que, por tratar-se de uma montagem mais complexa e para
uma função que não é das mais simples, o montador deve estar apto a modificá-la
conforme suas necessidades e possibilidades, particularmente quanto aos medidores
e transformadores. Aqueles que tiverem fontes externas de boa qualidade poderão
economizar bastante e aproveitar apenas o conceito, para construir seus testadores.

67
A montagem final pode ser vista abaixo.

68
O funcionamento é bastante simples, conforme já descrito: após selecionar a polari-
dade do transistor a ser medido, coloque-o no soquete e atarraxe firmemente os para-
fusos de fixação; imediatamente, o medidor de Ib deverá informar um valor de corrente.
Coloque o potenciômetro de Ib na posição de menor valor e ajuste VCE para o valor
desejado de teste.

Pressionando o botão T, um valor de corrente IC deverá aparecer no indicador azul, à


esquerda. O valor de corrente Ib é lido, em miliampères, com o ponto decimal na se-
gunda casa. Dividindo-se o valor de IC por Ib teremos o ganho de corrente aproximado
para aquela condição.

Com uns 10s de lapso de tempo entre cada medida, Ib pode ser elevada até que IC
alcance 1A ou mesmo até 1,5A. Se o led vermelho se acender e a corrente não passar
desses valores, tudo bem. Se aumentar até alcançar 2A, sem o aumento de Ib, encerre
o teste, pois com certeza o DUT está defeituoso ou é falso.

Lembre-se de que o VCEo máximo do datasheet do transistor deve ser respeitado no


ajuste da tensão. Transistores falsos, normalmente, não suportam esse tipo de teste.

Um ponto importante é a utilização de proteção para os olhos, quando dos testes. Com
transistores TO-3 é mais difícil, mas já vi transistores com encapsulamento plástico
arremessarem pedaços de material quando entraram em curto.

Para a fonte de tensão de nosso projeto recomendamos utilizar transistores TO-3 em


Q3 e Q5. Os 2N3773 são bastante adequados para tensões de até uns 120V. Foram
projetados, originalmente, para isso e têm uma boa área de SOA.

Utilizar um relé mais robusto, com os contatos em série, em K4, será bom, e aumentará
a vida útil do componente.

69
Abaixo, temos a placa impressa, invertida no lado do cobre, e a relação de material.

70
Lista de material

Ref. Valor

C1 2200u/25V Eletrolítico
C2 6800u/100V Eletrolítico
C3 150uF/16V Eletrolítico
C4 10nF/100V Poliéster metalizado
C5 1nF/250V Cerâmico
D1 KBL04 Ponte retificadora
D2 2W10 Ponte retificadora
D3 1N4744
D4 LED Vermelho
D5 1N4148
D6 1N4148
D7 1N4148
D8 1N4004
D9 1N4004
D10 1N4004
D11 LED Amarelo
T1 65VAC@2A Transformador
T2 12VAC@300mA Transformador
K1 a K4 Relé 2 DPDT Metaltex ML2RC2/12V ou similar
MR1 IB Amperímetro 100mA
MR2 VCE Voltímetro 100V
MR3 IC Amperímetro 10A
Q1 TIP31C
Q2 BC546
Q3 2N3773
Q4 TIP31C
Q5 2N3773
Q6 BC548
R1 27K
R2 4K7 2W
R4 0R39 5W
R5 4K7 2W
R6 10K Potenciômetro linear
R7 470R Potenciômetro linear
R8 3K3 1W
R9 4K7 1W
R10 39R
R11, R12 6K8
R13 10K
R14, R15 1K
R3, R16, R17 0R1 3W
S1 Chave push-button NO
S2 Chave 3 polos, 2 posições
U1 7809T
U2 7812T
U3 LM317T
U4 LM337T
U5 LM555C

71
Observem que, na placa impressa há a indicação de quatro jumpers que devem ser
conectados em S2. Sem eles, a montagem não funcionará.

Abaixo, vemos o “rescaldo” do trabalho de ajuste e aprendizado na medição da SOA.


Alguns dos transistores mostrados são falsos, mas, infelizmente, perdemos boas uni-
dades, algumas difíceis de se encontrar, por abusarmos dos limites de teste. Essa ex-
periência passamos para os leitores.

Para finalizar, lembramos que o circuito mostrado pode ser melhorado. Particular-
mente, com os ensinamentos de nosso colaborador Alexandre, acerca de programa-
ção Python, Arduino ou mesmo pelo uso de controladores adequados, com a automa-
tização dos processos de medição e de controle dos relés. Tudo poderia ser controlado
em tempo real, com a identificação do tipo de transistor e mostrado em uma matriz
LCD.

E, por enquanto, ficamos por aqui.

No próximo mês, iremos mostrar os resultados dos testes de diversos transistores, dos
mais comuns, verdadeiros e falsos, de diversas marcas e tipos. Até lá!

Referências

Millman e Halkias – Eletrônica, Volume 2 – Segunda Edição, McGraw-Hill;


HTTPS://toshiba.semicon-storage.com/info/docget.jsp?did=20668&prodName=2SC5200
HTTPS://www.ti.com/lit/ds/symlink/lm317.pdf
HTTPS://www.ti.com/lit/gpn/LM555-MIL

72
Transformador de Isolamento, Variac e Fonte DC
Ajustável - Parte I
Paulo Brites*

Por que precisamos de um transformador de isolamento?

Precisar não precisa, mas...

Mal comparando, o transformador de isolamento está para bancada do técnico repa-


rador assim como o cinto de segurança ou a cadeirinha para crianças está para o au-
tomóvel.

Aliás, isto acontece com todo dispositivo de segurança, só sentimos sua falta depois
do acidente e aí, dizem que foi uma tragédia; eu diria que foi uma omissão.

Mesmo correndo o risco de parecer um exagero de minha parte, eu diria que o trans-
formador de isolamento atua como uma espécie de “air bag” numa bancada de repa-
ração, principalmente depois das fontes chaveadas, usadas em, praticamente, todos
os equipamentos eletrônicos “atualmente”, nos últimos 30 anos, pelo menos.

Com relação à proteção do técnico contra um choque elétrico “indesejável” (sempre) a


tomada com três pinos poderia ser eficaz, se a indústria brasileira não a tivesse igno-
rado, usando de um eufemismo para boicotá-la - a norma técnica NBR14136 da ABNT-
e passado a vender equipamentos eletrônicos, até de alto valor, com tomadas de dois
pinos onde fase e neutro ficam indefinidos.

Sabe-se que, no Brasil, a questão de aterramento ainda é um tabu e muito mal com-
preendida, principalmente, pelos “pedrecistas” que, muitas vezes, ligam o terceiro pino,
de proteção, junto com o neutro.

Neste caso, é melhor mesmo que a tomada só tenha dois pinos.

Como dizem por aí, entre o ruim e o pior fica-se com o pior e “a gente vai levando”,
como diz a canção de Chico Buarque.

*Professor de Matemática e Técnico em Eletrônica

73
Por outro lado, se usássemos uma tomada “decente” com três pinos, mesmo que o
terceiro pino ficasse sem ligação, seria “ruim, mas não o pior”, e não correríamos o
risco de ligar fase e neutro invertidos, pois o terceiro pino serviria, pelo menos, de guia.
Já me estendi demais sobre este assunto e se o leitor quiser mais sobre ele, deixarei
links de alguns posts meus sobre o tema, no fim do artigo.

O objetivo desta introdução foi dar uma “acordada” na turma da bancada.

Voltando ao transformador de isolamento, quero reforçar que seu papel numa bancada
de reparos (principalmente) é fazer com que a tomada, onde iremos ligar a “criatura”
que está sendo examinada, fique totalmente “flutuante” da rede elétrica.

Desta forma, além de minimizar-se o risco de um técnico “distraído” levar um choque


elétrico, pode-se evitar a queima do osciloscópio (ai meu Deus!), por exemplo, quando
o “técnico distraído” está a examinar os “sinais vitais” de um “paciente moribundo” es-
tirado na sua bancada.

Mas isso é assunto a ser tratado com mais detalhes nas minhas aulas do Curso Des-
complicando o Osciloscópio com Paulo Brites.

E para que usar o Variac?

Talvez ele não seja essencial ou indispensável numa bancada de reparos mas, sem
dúvida, será uma “mão na roda” (desculpem o trocadilho) numa bancada de projetistas,
inventores ou makers como se diz atualmente.

E aqui vai um segredinho, o Variac sempre foi um dos meus “sonhos de consumo” que,
finalmente, consegui realizar antes de completar 100 anos de vida!

Pensando bem, por que não juntar o Variac com o transformador de isolamento no
meu “caixotão”?

Foi o que fiz e mostro como ligar os dois na figura 1.

Fig. 1 – Variac e transformador de isolamento

74
Embora a fig.1, diga mais que mil palavras, não custa chamar a atenção para um ponto
importante.

Repare que eu liguei a fase ou line da rede elétrica ao terminal “livre” do Variac.

O terminal do outro extremo do enrolamento do Variac será ligado ao neutro da rede


(eu disse neutro) e a um dos terminais do primário do transformador de isolamento e,
finalmente, o terminal referente ao cursor do Variac será ligado ao outro terminal do
primário do transformador de isolamento.

Desta forma, ao variarmos a tensão de entrada do transformador de isolamento girando


o botão do Variac, teremos uma tensão no secundário totalmente isolada da rede elé-
trica, que pode ir de zero volt até 127 volts, no meu caso.

Vale enfatizar, fortemente, que é obrigatório utilizar uma tomada brasileira, ou seja,
com três pinos, tanto na ponta do fio ligado ao Variac bem como na tomada da bancada
para garantir que a ligação fase e neutro sempre ocorra do modo correto.

Que tal colocar um voltímetro e um amperímetro no projeto?

Os Variacs vêm com um ridículo instrumento analógico para medir a tensão na saída,
que para ser ruim precisaria melhorar muito.

Pensando em substituí-lo por algo digital um pouco mais confiável resolvi fazer aquela
brincadeirinha de criança “uni-duni-tê” no Ali Express (elas, as crianças, ainda brincam
disso?) e o “escolhido” foi o PZEM-061 que você vê na fig.2.

Fig. 2 – Painel do PZEM-061

Com ele, podemos medir não apenas a tensão AC na saída do transformador de iso-
lamento, mas também a corrente na carga, potência em watts e a energia consumida
em watts-hora (não confunda potência com energia).
75
Entretanto, se você pretende utilizá-lo, recomendo que CLIQUE AQUI para ler o artigo
que publiquei no meu site sobre a modificação que terá que ser feita para alimentar o
bichinho.

Instalando o PZEM-061 no “caixotão”

A primeira providência foi preparar uma fonte DC independente que fornecesse a ten-
são para alimentar o PZEM-061, como eu explico no artigo que sugeri acima.

Como o consumo de corrente do dito cujo é inferior a 10mA e o regulador de tensão


HT7133 embutido nele permite ser alimentado como uma tensão entre 5,5 e 24V optei
por algo em torno de 9V.

Neste caso, a boa e velha fonte linear com transformador ainda parece ser a melhor
solução, uma vez que devemos manter o negativo da alimentação do display comple-
tamente isolado dos terminais do secundário do transformador de isolamento.

Para esta tarefa, utilizei pequenos transformadores de sucatas de caixas de som de


computadores e uma pequena ponte retificadora também obtida em alguma sucata,
pois, afinal, eu sou defensor do “não jogue no lixo”.

Montei duas fontezinhas destas como se vê na fig.3, pois irei precisar de uma separada
para alimentar o display DSN-VC288 que será utilizado na fonte DC ajustável sobre a
qual falarei na parte II deste artigo.

Fig. 3 – Fontes para alimentar os voltímetros/amperímetros

O próximo passo será fazer a ligação do PZEM-61 com o transformador de isolamento


e a tomada onde será ligada a carga, como vemos na fig.4.

76
Fig. 4 – Ligando o PZEM-061 ao transformador de isolamento

Embora eu tenha usado uma tomada padrão brasileiro com três pinos para ligar a
carga, isso não seria necessário, neste caso, uma vez que não temos mais fase e
neutro definidos na saída do transformador de isolamento.

Por enquanto é isso. Na parte II irei descrever a fonte DC ajustável de 0 a 180V que
inclui no “caixotão”.

Ah! Tem um vídeo no meu canal no Youtube mostrando detalhes da montagem e o


funcionamento. Leia o artigo aqui na Revista Antenna, assista o vídeo lá e não se es-
queça de comentar!

Links
https://www.paulobrites.com.br/padrao-de-tomada-brasileiro-pros-contras/
https://www.paulobrites.com.br/fio-terra-para-leigos/
https://www.paulobrites.com.br/a-eterna-polemica-terra-versus-neutro/

77
O Pequeno Notável
Parte I

Álvaro Neiva*
Miguel Nabuco

Nas edições de março de 2021 a março de 2022, apresentei um amplificador de pe-


quena potência (3W@1kHz/canal @ 8Ω), destinado ao uso com fones de média a alta
impedância (1W @ 24Ω, 135mW @ 600Ω), funcionando em classe A, push-pull, para
impedâncias maiores que 40Ω e em classe AB, para fones de impedâncias menores
até 8Ω; mas que foi robusto o suficiente para lidar com caixas acústicas de 8 ohms de
impedância nominal, e que ainda funciona depois de 5 anos, com duas caixas JBL
N38II, na minha sala...

Fig. 1

Fig. 2

*Engenheiro Eletricista

78
Logo veio a ideia de transplantar o DNA desse abusado para um corpo maior... nele
há detalhes como o deslocamento de bias do opamp e uma resistência interna relati-
vamente elevada, que mantém o fator de amortecimento em 20, responsáveis por uma
sonoridade bastante interessante.

Apesar de atender à maioria das situações de uso normal, afinal, a sala é pequena, as
caixas (figura 1), são eficientes (90dB/1W/1m), e têm 8Ω de impedância nominal. Em
situações com muita dinâmica ou com nível médio muito elevado, começa a faltar fô-
lego ao pequeno amplificador, mas isso demonstra muito bem o quanto o primeiro watt
de potência é importante... (como mostrou o Nelson Pass).

Um dia, o Miguel Nabuco me pergunta se tenho o projeto de um amplificador pequeno,


classe AB, para fazer os 5 canais de um sisteminha 5.1.

Pronto, nascia o AN-10!

Basicamente, a ideia seria aumentar a capacidade de corrente do estágio de saída,


que é um buffer de corrente, para não sobrecarregar o opamp e evitar a entrada em
ação da sua limitação de corrente. As tensões de alimentação permaneceriam as mes-
mas (±15V) e a impedância de carga poderia ser de até 4Ω. Sem a limitação de cor-
rente, poderíamos chegar a uns 9Vrms, ou seja, 10W@8Ω ou 20W@4Ω, de potência
contínua...

Para isso, adotei mais um estágio de ganho de corrente (Q2 e Q3), transformando em
pares Darlington os transistores do estágio de saída (Q4, Q5, Q6, Q7), agora mais
robustos, que funcionam como seguidores de emissor, complementares, em paralelo.

O esquema, com melhor definição, foi repetido na página 90.

Fig. 3

79
Também adotei uma fonte de corrente, com 4mA de capacidade, realizada por Q1, D3,
D4, R7 e R11, para fazer a polarização do estágio de saída e o deslocamento da pola-
rização do opamp de entrada.

O deslocamento de polarização ou “bias displacement” faz com que o estágio de saída


do opamp, que funciona em classe B ou AB, dependendo do opamp (os com maior
consumo de corrente, sem sinal, têm boa chance de serem AB), passe a funcionar em
classe A, para amplitudes da corrente de saída próximas do valor da corrente CC da
fonte.

Não usei o capacitor de “bootstraping”, como feito no amplificador para fones, porque
a fonte de corrente com transistor garantiria uma maior impedância interna e maior
isolação contra ruído presente na fonte de alimentação. Isso apesar da fonte de ali-
mentação ser dividida em duas seções, uma regulada, com baixo ruído, que alimenta
o opamp e os drivers Q2 e Q3, e outra, não regulada, para o estágio de saída apenas.

Essa opção vai permitir que o estágio de saída possa chegar mais perto da saturação
quando levar a tensão de saída do amplificador ao seu limite, aumentando a excursão
de saída, o que era uma das tarefas do capacitor de “bootstraping”, por manter sua
tensão CC praticamente constante durante cada ciclo de sinal amplificado.

Em relação à tensão de alimentação, adotei uma filosofia semelhante à empregada no


“circuito T” de Barth Locanthi (figura 4), usado no amplificador JBL SA600 de 1966,
usando duas fontes de alimentação separadas, uma para o estágio amplificador de
tensão (o opamp + Q3 e Q4), essa regulada em +-17V e outra, não regulada, para os
transistores de saída.

Fig. 4

80
Transistores escolhidos para a saída e suas características:

Fig. 5

Fig. 6

Fig. 7

81
Fig. 8

Fig. 9

Tendo em vista a baixa potência de saída, usar transistores menores e mais baratos
faz todo o sentido. Observando as curvas de ganho x I C, nas figuras 8 e 9, verificamos
que, acima de 1A, o ganho começa a cair... piorando acima de 3,5A. Isso indica uma
queda de linearidade (aumento de distorção) no estágio de saída.

Portanto, na hora de definir a quantidade de transistores na saída, além da simples


dissipação (limitada pela SOA) o comportamento do ganho no valor da corrente de pico
a ser fornecida também deveria ser avaliado. Por isso, nos gráficos (figuras 6 e 7),
escolhemos como valor de pico de corrente por transistor, segundo esse critério de
distorção, o valor máximo de 2,5A, correspondente a uma queda de 50% no H FE, apro-
ximadamente, considerando uma temperatura intermediária, no cruzamento entre as
curvas de 150°C e 25°C.

82
Fig. 10

Para achar a quantidade mínima de transistores para cada linha de alimentação, ou


pares de transistores complementares (N), vamos dividir a corrente de pico máxima
prevista, considerando-se a saturação do estágio de saída, pelo valor obtido do gráfico
para ICmáx (2,5A), limitado pela redução de ganho, para mínima distorção.

𝐼𝑝𝑖𝑐𝑜
𝑁=
𝐼𝐶𝑚á𝑥

𝑉𝐶𝐶 15𝑉
𝐼𝑝𝑖𝑐𝑜 ≅ ≅ = 5𝐴
𝑅𝐿 3Ω

Onde usamos 3Ω como valor para a resistência de carga RL porque está mais próxima
do valor de impedância mínima de um alto-falante de com 4Ω de impedância nominal.

5𝐴
𝑁= =2
2,5𝐴

Usaremos então 2 pares de transistores MJE15028/15029

A R$5,00 a peça, gastaríamos R$20,00 no total.

Agora, vamos dar uma olhada no gráfico da Área de Operação Segura (SOA, em in-
glês), desses transistores, mostrado na figura 7.

Esse gráfico mostra os limites de corrente, tensão e potência de um dispositivo eletrô-


nico, como, por exemplo, os transistores de potência, sejam bipolares ou MOSFETs.

83
Esse gráfico costuma mostrar num papel log-log (duas escalas logarítmicas) os con-
tornos de potência constante:

𝑃𝐷𝑚á𝑥 = 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒 = 𝐼𝐶 ∙ 𝑉𝐶𝐸

Onde PDmáx é a dissipação máxima para uma temperatura definida do encapsulamento,


usualmente 25°C, na forma de IC=f(VCE).

𝑃𝐷𝑚á𝑥 −1
𝐼𝐶 = = 𝑃𝐷𝑚á𝑥 ∙ 𝑉𝐶𝐸
𝑉𝐶𝐸

𝑃𝐷𝑚á𝑥 −1
𝐼𝐶𝑚á𝑥 = = 𝑃𝐷𝑚á𝑥 ∙ 𝑉𝐶𝐸
𝑉𝐶𝐸𝑚í𝑛

𝐼𝐶 𝑉𝐶𝐸𝑚í𝑛
= =1
𝐼𝐶𝑚á𝑥 𝑉𝐶𝐸

𝐼𝐶 𝑉𝐶𝐸𝑚í𝑛
log ( ) = log ( ) =0
𝐼𝐶𝑚á𝑥 𝑉𝐶𝐸

𝐼𝐶 𝑉𝐶𝐸
log ( ) = −log ( )
𝐼𝐶𝑚á𝑥 𝑉𝐶𝐸𝑚í𝑛

log(𝐼𝐶 ) − log(𝐼𝐶𝑚á𝑥 ) = log(𝑉𝐶𝐸𝑚í𝑛 ) − log(𝑉𝐶𝐸 )

log(𝐼𝐶 ) = log(𝑉𝐶𝐸𝑚í𝑛 ) + log(𝐼𝐶𝑚á𝑥 ) − log(𝑉𝐶𝐸 )

log(𝐼𝐶 ) = 𝐾 − log(𝑉𝐶𝐸 )

No papel log-log o gráfico dessa equação mostra-se uma reta com coeficiente angular
-1.

Para montar o gráfico no papel usa-se um fator de escala conveniente, usando VCEmín
e ICmáx, onde ICmáx é o limite de corrente do transistor e VCEmín um valor escolhido ou
VCEsat.

O gráfico de uma reta com inclinação -1 é bem mais fácil de lidar que uma curva do
tipo 1/x. Num gráfico linear, esses contornos seriam curvas, as hipérboles.

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Fig. 11

Em vermelho, a linha que corresponde a 2,5A de corrente. Acima de 5A e 10V (ainda


com P=50W), a inclinação da reta de dissipação constante (DC) muda, indicando o
início da região de 2ª ruptura, onde a dissipação precisa ser reduzida mais rapida-
mente. Observem que o aumento da área segura com a redução do tempo de aplica-
ção da potência só acontece por intervalos muito pequenos, 5ms ou menos, nesses
transistores.

Em laranja, os limites de SOA para 75°C e potência média constante (DC). O valor
escolhido para Icmáx atende à Área de Operação Segura (SOA), mesmo reduzida para
uma temperatura de 75°C.

Para reduzir a SOA, usamos o coeficiente de 0,4W/°C obtido nas especificações do


transistor:

𝑃𝐷 (75°𝐶) = 𝑃𝐷 (25°𝐶) − (75°𝐶 − 25°𝐶) ∙ 0,4𝑊/°𝐶 =

= 𝑃𝐷 (75°𝐶) = 50𝑊 − (50°𝐶) ∙ 0,4𝑊/°𝐶 =

= 𝑃𝐷 (75°𝐶) = 50𝑊 − 20𝑊 = 30𝑊

Como mostrado no gráfico abaixo (também do datasheet):

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Fig. 12

Em todos os pontos da nova área, o produto VCE x IC deve ser ≤ a 30W, caindo acima
de 12V, aproximadamente, na mesma taxa (como a reta paralela laranja), que a curva
DC, devido à entrada na região da segunda ruptura (second breakdown) ou disparo
térmico.

Qualquer combinação de corrente até a limite e VCE, aproximadamente até a tensão


de alimentação, positiva ou negativa, deve cair dentro da SOA.

Vamos investigar uma outra opção de transistor que poderia reduzir essa quantidade
de pares (N): MJE15032/15033, R$10,00 a peça.

Fig. 12

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Fig. 13

Em vermelho, o que seria a curva DC de SOA, para 30W, correspondente à tempera-


tura de 75°C. Até o limite da tensão de alimentação usada, a SOA é idêntica. Então,
não se justifica o custo maior.

Agora, vamos verificar a corrente de base nos transistores de saída, necessária para
obter a Ipico determinada:

5𝐴
𝐼𝐵𝑚á𝑥 = = 0,056𝐴 = 56𝑚𝐴, com o ganho típico obtido no gráfico de ganho x IC.
90

Isso vai levar a corrente de base dos transistores drivers para menos que 1mA, afas-
tando a possibilidade de limitação de corrente no opamp e reduzindo a distorção em
funcionamento normal.

Agora cabe comentar sobre os resistores R9, R10 e R19 e R20.

Como o circuito não tem limitadores de corrente abruptos, os chamados “Limitadores


VI”, usei esses quatro resistores e os resistores de emissor, para uma limitação mais
suave.

Além desse papel, esses resistores também funcionam como “base stoppers” intera-
gindo com a capacitância de entrada dos transistores de saída (R19 e R20) e drivers
(R9 e R10), para introduzir quedas na resposta em frequência do amplificador sem
realimentação que tornam o amplificador mais estável.

O pior caso em relação à dissipação vai ser um curto-circuito...

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Nesse caso, o uso apenas desses resistores não vai garantir a proteção neces-
sária sem limitar prematuramente a potência de saída.

Portanto, atenção em não colocar em curto com sinal a saída desse amplificador!

Foram previstos fusíveis na fonte, apenas para proteção contra sobrecarga por
funcionamento com impedâncias abaixo de 4Ω.

Até 4Ω, a dissipação normal no estágio de saída não deve passar de 2,2W de
potência média, por transistor [3]. Mais detalhes na próxima edição.

Alguns resultados:

Fig. 14

Tensão de saída e corrente de coletor com carga resistiva de 4Ω. Po=17W

Fig. 15

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Resposta em frequência com 4Ω de carga (figura 15).

Foi usado um integrador (não mostrado na figura 1) para zerar a tensão de offset.

Fig. 16

Potência dissipada por transistor.

Continua na próxima edição.

Até o próximo artigo!

Referências:

1. Self, Douglas. SMALL SIGNAL AUDIO DESIGN. 1ª edição 2010, Elsevier Ltd.
2. Self, Douglas. AUDIO POWER AMPLIFIER DESIGN HANDBOOK. 1ª edição
2010, Elsevier Ltd.
3. Bohn, Dennis, editor. AUDIO HANDBOOK 1st ed. National Semiconductor Cor-
poration; 1976.
4. Graeme, Jerald G. APPLICATONS OF OPERATIONAL AMPLIFIERS (THIRD
GENERATION TECHNICS). 1ª edição. Burr-Brown Research Corporation;
1973.
5. Metzler, Bob. AUDIO MEASUREMENT HANDBOOK. 1ª edição 1993, Audio
Precision, Inc.

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Diagrama Esquemático do Pequeno Notável
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