Fantástico Sr. Raposo - Roald Dahl

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REVISÃO TÍTULO ORIGINAL

Helena Guimarães Bittencourt Fantastic Mr. Fox


Marisa Rosa Teixeira
ILUSTRAÇÕES DE CAPA E MIOLO
Quentin Blake

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

D129f
Dahl, Roald
Fantástico Sr. Raposo [recurso eletrônico] / Roald Dahl ; ilustração Quentin
Blake ; tradução Jeferson Luiz Camargo. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Galera Júnior,
2023.
recurso digital
Tradução de: Fantastic Mr. Fox
Formato: epub
Requisitos do sistema: adobe digital editions
Modo de acesso: world wide web
ISBN 978-65-84824-21-8 (recurso eletrônico)
1. Ficção. 2. Literatura infantojuvenil inglesa.. 3. Livros eletrônicos. I. Blake,
Quentin. II. Camargo, Jeferson Luiz. III. Título.
23-85447
CDD: 808.899282
CDU: 82-93(410.1)

Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária - CRB-7/6439

FANTASTIC MR. FOX © The Roald Dahl Story Company Limited, 1970. Roald
Dahl é uma marca registrada de The Roald Dahl Story Company Ltd.

Todos os direitos reservados.


Proibida a reprodução, no todo ou em parte, através de quaisquer meios.
Os direitos morais do autor foram assegurados.

Texto revisado segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990.

Direitos exclusivos de publicação em língua portuguesa somente para o Brasil


adquiridos pela
EDITORA GALERA RECORD LTDA.
Rua Argentina, 120 - Rio de Janeiro, RJ - 20921-380 - Tel.: (21) 2585-2000, que se
reserva a propriedade literária desta tradução.
Produzido no Brasil

ISBN 978-65-84824-21-8

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Para Olivia
Sumário

Os três fazendeiros
Sr. Raposo
A caçada
As pás terríveis
Os tratores terríveis
A corrida
“Não vamos deixá-la escapar”
As raposas começam a morrer de fome
O plano do Sr. Raposo
O Galinheiro-Número-Um do Boque
Dona Raposa tem uma surpresa
O Texugo
O superdepósito do Bunco
As dúvidas de Texugo
A adega secreta do Bino
A mulher
A grande festa
Ainda esperando
Os três fazendeiros

Lá embaixo, no vale, havia três fazendas. Seus donos eram homens muito
ricos, mas também muito malvados. Para falar a verdade, os três eram
incrivelmente malvados e mesquinhos. Chamavam-se Boque, Bunco e
Bino.
Boque criava galinhas. Na sua fazenda havia milhares de galinhas. Ele era
gordo como um elefante, já que todos os dias no café da manhã, no almoço
e no jantar Boque comia três frangos assados com bolinhos de carne.
Na fazenda de Bunco eram criados milhares de patos e gansos. Bunco era
pequeno e barrigudo. Era tão baixinho que qualquer poça de água era funda
demais para ele. Seu prato predileto eram bolinhos recheados com patê de
fígado de ganso. De tanto comer os tais bolinhos, Bunco estava sempre com
dor de barriga. E por causa da dor de barriga ele vivia de mau humor.
Bino criava perus e plantava maçãs. Milhares de perus passavam o dia
debaixo das macieiras de seu pomar. Bino nunca comia nada. Em
compensação, bebia garrafas e mais garrafas de vinho de maçã, que ele
próprio fabricava. Era magro como um palito, e o mais inteligente dos três.

Boque, Bunco e Bino,


Um gordo, um nanico e um fino.
Boque gordão, cara de balão,
Bunco nanico, cara de penico,
E o magrela do Bino, cara de pepino.

Era assim que as crianças cantavam sempre que encontravam os


fazendeiros.
Sr. Raposo

Numa colina, acima do vale, havia uma floresta. Na floresta havia uma
árvore imensa. Embaixo da árvore havia uma toca. Nessa toca viviam Sr.
Raposo, Dona Raposa e suas quatro raposinhas.
Todos os dias, ao anoitecer, Sr. Raposo perguntava para Dona Raposa:
— Então, querida, o que vamos comer esta noite? Uma galinha bem gorda
do Boque? Um pato ou um ganso do Bunco? Ou, quem sabe, um belo peru
do Bino?
Assim que Dona Raposa fazia sua escolha, o Sr. Raposo descia para o vale
e, na escuridão da noite, acabava conseguindo o que queria.
Os três fazendeiros ficavam ensandecidos de raiva. Boque, Bunco e Bino
não davam nada de graça, por isso ficavam furiosos quando algo deles era
roubado. Todas as noites cada um dos três pegava sua espingarda e se
escondia num canto escuro da sua fazenda, esperando o ladrão aparecer.
Sr. Raposo, porém, era bem mais esperto do que eles: só se aproximava de
uma das fazendas quando o vento soprava em sua direção. Quando o dono
da fazenda estava escondido por perto, o vento trazia o cheiro dele até o
nariz da raposa. Portanto, quando Boque estava escondido atrás do
Galinheiro-Número-Um, Sr. Raposo sentia o cheiro dele a uns cem metros
de distância, mudava de direção e atacava o Galinheiro-Número-Quatro, do
outro lado da fazenda.
— Maldito bicho piolhento! — berrava Boque.
— Que vontade de esganá-lo! — reclamava Bunco.
— Precisamos matá-lo! — gritava Bino.
— Mas de que jeito? — perguntava Boque. — Como vamos fazer para
agarrar esta raposa sem-vergonha?
Certo dia, limpando lentamente o nariz com seus dedos compridos, Bino
afirmou:
— Eu tenho um plano!
— Até hoje você não teve um plano que prestasse — disse Bunco.
— Cale a boca e escute — esbravejou Bino. — Amanhã à noite nós três
vamos ficar escondidos bem ao lado da toca onde mora a raposa. Vamos
esperar até ela resolver sair. Aí então… bang-bang! Bang-bang!
— Muito espertinho — disse Bunco —, só que nós não sabemos onde fica
a toca.
— Meu caro Bunco, isso eu já descobri — afirmou Bino, que era o mais
esperto dos três. — Fica bem no alto da colina, no meio da floresta, embaixo
de uma árvore enorme…
A caçada

— Então, querida — começou o Sr. Raposo —, o que vamos comer esta


noite?
— Acho que um delicioso pato cairia muito bem — respondeu Dona
Raposa. — Por favor, querido, traga dois patos bem gordos. Um para nós
dois e outro para as crianças.
— Pois então vamos comer pato! Os melhores patos do Bunco! —
declarou Sr. Raposo, todo entusiasmado.
— Mas cuidado, hein! — advertiu Dona Raposa.
— Querida, sinto o cheiro daqueles valentões a quase dois quilômetros de
distância — explicou Sr. Raposo. — Já até consigo distinguir o cheiro de
cada um. Boque é fedido como carne de galinha estragada. Bunco tem
sempre um cheiro horrível de fígado de ganso. E Bino vive soltando arrotos
de vinho de maçã.
— Está bem, mas mesmo assim tome cuidado — aconselhou Dona
Raposa. — Você sabe muito bem que os três não veem a hora de agarrar
você.
— Não se preocupe comigo — disse Sr. Raposo. — Até mais tarde.
Sr. Raposo não estaria tão confiante se soubesse exatamente onde os três
fazendeiros estavam esperando por ele.
Boque, Bunco e Bino estavam agachados atrás de uma árvore, cada um
segurava uma espingarda carregada, bem pertinho da toca. Para piorar as
coisas, escolheram muito bem onde ficar. Colocaram-se contra o vento, de
modo que Sr. Raposo não pudesse “sentir o cheiro” deles.

Sr. Raposo subiu pelo túnel escuro até a entrada da toca. Pôs a cara
comprida para fora, sentiu a brisa noturna e aguçou as narinas, tentando
farejar algum perigo.
Avançou alguns centímetros e parou.
Farejou mais uma vez.
Avançou um pouquinho mais. A parte da frente do corpo estava todinha
para fora da toca.
Seu focinho preto não parava de se mexer, para lá e para cá, farejando,
procurando algum cheiro que significasse perigo. Não encontrou nada.
Estava prestes a sair em direção à floresta quando ouviu um barulhinho,
como se alguém tivesse pisado muito de leve em algumas folhas secas.
Sr. Raposo abaixou-se e ficou imóvel, deitado no chão. Aguçou os ouvidos
e permaneceu parado por um bom tempo, mas não ouviu mais nada. “Deve
ter sido um ratinho-do-campo”, pensou ele.
Resolveu avançar um pouco mais, bem devagar. Quando seu corpo já
estava todo para fora da toca, Sr. Raposo deu uma última olhada ao redor,
por precaução. A mata estava escura e silenciosa, e a lua brilhava no céu.
Foi então que seus olhos, ótimos para enxergar no escuro, perceberam um
ligeiro brilho por trás de uma árvore. Não havia dúvidas de que era um
raiozinho prateado da lua refletindo numa superfície de metal. Sr. Raposo
ficou imóvel, observando. O que seria aquilo? E agora estava se movendo!
Subindo, subindo… nossa! O cano de uma espingarda! Mais rápido que uma
faísca, Sr. Raposo pulou de volta para a toca, no mesmo instante em que a
mata inteira parecia explodir ao seu redor. Bang-bang! Bang-bang! Bang-
bang!
A fumaça dos tiros empesteava o ar. Boque, Bunco e Bino saíram do
esconderijo e correram em direção à toca.
— Será que conseguimos? — eles se perguntavam.
Um deles iluminou a entrada da toca com uma lanterna. E, no foco de luz,
ali no chão, os três homens viram espalhados os restos de… um rabo de
raposa. Bino abaixou-se e apanhou um pedaço de pele.
— Pegamos o rabo, mas a raposa escapou — disse ele, jogando para longe
o que tinha sobrado do rabo do Sr. Raposo.
— Maldito bicho piolhento! — exclamou Boque. — Atiramos tarde
demais. Devíamos ter mandado bala assim que ele colocou a cabeça para
fora.
— Agora é que essa raposa vai tomar mil cuidados antes de sair daí outra
vez — afirmou Bunco.
Bino tirou um cantil do bolso, tomou um gole grande de vinho de maçã e
falou:
— Vai demorar pelo menos três dias para ela sair atrás de comida
novamente. Eu é que não vou ficar aqui sentado, esperando. Vamos cavar,
abrir essa toca e arrancar a raposa à força.
— Ah! — exclamou Boque —, agora sim você está dizendo alguma coisa
que preste. Vamos desenterrar a raposa. Sabemos que ela está aí dentro e
vamos pegá-la.
— Estou achando que nessa toca mora uma família inteira de raposas —
disse Bunco.
— Então acabaremos com todas — respondeu Bino. — Vamos pegar as
pás!
As pás terríveis

Dentro da toca, Dona Raposa cuidava carinhosamente do ferimento do


Sr. Raposo. Enquanto fazia os curativos, ela dizia desconsolada:
— Era o rabo mais bonito deste mundo.
— Está doendo muito — reclamou Sr. Raposo.
— Eu sei, meu amor, mas a dor já vai passar.
— Não fique triste, papai, logo ele vai crescer de novo — disse uma das
Raposinhas.
— Não vai crescer nunca mais, filho. Vou ficar sem rabo pelo resto da vida
— lamentava o Sr. Raposo.

Naquela noite ninguém comeu nada. As crianças e Dona Raposa logo


pegaram no sono. Mas o Sr. Raposo não conseguia dormir, de tanta dor.
Deitado no seu canto, ele pensava: “Afinal de contas, tive muita sorte por ter
escapado com vida. Mas o pior é que agora descobriram nossa toca. Temos
de nos mudar daqui o mais depressa possível. Não vamos mais ter sossego
se…”
Mas o que era aquilo? Sr. Raposo olhou para o teto da toca. Um barulho
estranho vinha lá de cima. Logo percebeu o que estava acontecendo. Era o
som mais apavorante que uma raposa poderia ouvir: o crof, crof, crof das pás
que vinham cavoucando a terra, abrindo caminho para baixo.
— Acordem! — gritou ele. — Estão tentando nos arrancar daqui!
Dona Raposa acordou num segundo. Ficou sentada, tremendo de medo.
— Tem certeza? — ela perguntou, baixinho.
— Certeza absoluta! Preste atenção!
— Eles vão matar meus filhos! — gritou Dona Raposa.
— Nunca! — exclamou Sr. Raposo.

— Mas é o que eles querem fazer, querido. Você sabe que é —


choramingava Dona Raposa.
As pás continuavam com seu assustador crof, crof, crof. Pedrinhas e
punhados de terra despencavam por todo lado.
— O que estão tentando fazer com a gente, mamãe? — perguntou uma
das Raposinhas com os olhos pretos arregalados de medo. — Será que eles
têm cachorros?
Dona Raposa não parava de chorar. Aproximou-se dos filhotes e abraçou-
os com força.
De repente, ouviram o barulho mais terrível de todos e a ponta afiada de
uma pá atravessou o teto da toca. Então Sr. Raposo teve uma ideia.
Começou a pular e gritar desesperadamente:

— Já sei o que fazer! Vamos lá! Não podemos perder tempo! Por que não
pensei nisso antes?
— Pensou no que, papai?
— Raposas cavam muito mais depressa do que gente! — gritou Sr.
Raposo, já começando a cavar. — Ninguém no mundo consegue cavar mais
rápido do que nós! Vamos, cavem, cavem, cavem!
Voava terra por todo lado. Sr. Raposo cavava furiosamente com as patas da
frente. Dona Raposa e as quatro Raposinhas não perderam tempo e
começaram a cavar também.
— Para baixo! — ordenou Sr. Raposo. — Temos que fazer um buraco
bem fundo! O mais fundo possível!

O túnel foi ficando comprido, furando a terra, descendo sempre. A família


inteira cavava sem parar. Suas patas se moviam tão depressa que nem dava
para vê-las. O crof, crof, crof das pás foi ficando cada vez mais distante.
Mais ou menos uma hora depois, Sr. Raposo parou de cavar. Gritou para
que todos parassem também. Olharam para trás e viram o túnel imenso que
tinham cavado. Era tão comprido que ninguém conseguia ver o fim dele.
— Ufa! — declarou Sr. Raposo, aliviado —, acho que conseguimos! Eles
nunca vão cavar tão fundo assim. Bom trabalho, pessoal!
Sem fôlego, sentaram para descansar. Dona Raposa olhou para os filhos e
disse:
— Devemos a vida ao seu pai. Se não fosse por ele, agora estaríamos todos
mortos. O pai de vocês é uma raposa fantástica.
Sr. Raposo olhou com carinho para a esposa e sorriu. Ele amava Dona
Raposa mais do que nunca quando ela dizia essas coisas.
Os tratores terríveis

Boque, Bunco e Bino cavaram até o sol nascer. O buraco que fizeram era
tão grande que dentro dele cabia até uma casa. Mesmo assim, não
conseguiram alcançar a raposa. Estavam muito cansados e de mau humor.
— Que droga! — exclamou Boque. — Quem foi que teve essa maldita
ideia?
— Foi o Bino — respondeu Bunco.
Boque e Bunco olharam para Bino, que estava bebendo mais um gole de
vinho de maçã. Ele guardou o cantil sem oferecê-lo aos outros e disse,
furioso:
— Escutem aqui, eu quero aquela raposa! Tenho que pegá-la! Não vou
desistir enquanto ela não estiver pendurada na porta da minha varanda,
mortinha, mortinha! Entenderam?
— É, mas não vai ser desse jeito que vamos conseguir alguma coisa —
disse Boque. — Já estou cheio de ficar aqui cavoucando!
Bunco estava mais mal-humorado do que nunca. Olhou para Bino e
perguntou:
— E então? Será que você não tem mais nenhuma ideia idiota?
— O quê?! — gritou Bino. — Não consigo ouvir.
Bino nunca tomava banho, e por isso seus ouvidos estavam imundos.
Tinha de tudo lá dentro: terra, pedaços de chiclete, cera, moscas mortas. De
tanta sujeira, ele não conseguia ouvir.
— Fale mais alto. — pediu Bino.
— Eu perguntei se você não tem mais alguma das suas ideias estúpidas —
insistiu Bunco, berrando.
Bino coçou a cabeça com as unhas compridas e sujas. Pensou um pouco e
disse:
— Nós precisamos é de máquinas superpotentes para cavar mais rápido e
mais fundo. Precisamos de… escavadeiras mecânicas. Vamos pegar essa
raposa em cinco minutos com uma escavadeira mecânica.
Boque e Bunco tinham de admitir, era uma ótima ideia. Bino estava
orgulhoso de si e começou a dar as ordens:
— Pois muito bem, vamos lá. Boque, você fica aqui e não deixe a raposa
escapar. Eu e Bunco vamos buscar as máquinas. Se essa peste tentar sair daí,
mande bala.
Bino saiu andando na frente e Bunco foi atrás. Boque continuou sentado
no mesmo lugar, com a espingarda apontada para a toca da raposa.
Não demorou muito para Bunco e Bino voltarem. Cada um vinha
dirigindo um trator enorme, desses com escavadeiras mecânicas. Faziam um
barulho infernal. As máquinas eram pretas e pareciam dois monstros
assassinos e desumanos, com uma boca gigantesca escancarada, pronta para
engolir qualquer coisa.
— Lá vamos nós! — gritou Bino.
— Morte à raposa! — berrou Bunco.
As máquinas entraram em ação. Terra e pedras voavam por todo lado, os
arbustos eram arrancados e as flores esmagadas. A árvore que protegia a
toca do Sr. Raposo tremia como gelatina. O barulho era insuportável.
No fundo do túnel, as raposas estavam encolhidas, escutando o rugido
pavoroso que vinha lá de cima.
— O que está acontecendo, papai? — gritavam as Raposinhas. — O que
eles estão fazendo?

Sr. Raposo também não estava entendendo nada.


— É um terremoto! — gritou Dona Raposa.
— Olhem! — exclamou uma das Raposinhas —, nosso túnel ficou menor!
Estou vendo a luz do dia!
Era verdade. O túnel havia encurtado e já dava para ver as escavadeiras
que se aproximavam.
— Tratores! — gritou Sr. Raposo. — E escavadeiras mecânicas! Depressa,
comecem a cavar! Depressa! Depressa!
A corrida

E assim teve início uma corrida desesperada. As máquinas iam engolindo


a terra atrás das raposas. No começo, a colina estava assim:

Mais ou menos uma hora depois, enquanto as máquinas removiam mais e


mais terra do topo da colina, ficou assim:
Às vezes as raposas ganhavam terreno e o rugido das máquinas
enfraquecia. Mas as máquinas eram muito rápidas e logo já estavam de novo
em cima da família de raposas. Sr. Raposo não parava de repetir:
— Depressa, cavem, nós vamos conseguir!
A corrida parecia não ter fim. Houve um momento em que uma das
escavadeiras quase apanhou Dona Raposa.
— Não parem de cavar! — disse Sr. Raposo. — Não desistam!
— Não parem de cavar! — berrava Boque, que observava tudo, enquanto
Bunco e Bino dirigiam as máquinas. — Já estamos quase alcançando a
raposa!
— Já conseguiu vê-la? — gritou Bino.
— Ainda não, mas acho que agora vocês estão bem perto!
— Vou arrancá-la daí com a minha escavadeira! — gritava Bunco. — Não
vai sobrar nem um pedacinho dessa raposa maldita!
Já era hora do almoço e nada de as máquinas alcançarem as raposas. Mas
continuavam cavando, e as raposas fugindo. A colina agora já estava assim:
Os fazendeiros não paravam nem para comer. Mal podiam esperar para
conseguir o que queriam.
— Ei, você aí, bicho piolhento! — berrou Boque. — Desta vez você não
escapa!
— Você comeu seu último ganso! — gritou Bunco. — Nunca mais vai
rondar a minha fazenda!
Os três homens estavam fora de si. Bino, o magricela, e Bunco, o nanico,
dirigiam suas máquinas furiosamente, acelerando sem parar e triturando a
terra a toda velocidade. Boque, o gordão, pulava feito um sapo e gritava:
— Mais rápido! Vamos, mais rápido!
Lá pelas cinco da tarde, era isso que a colina havia se tornado:
O buraco já estava do tamanho de uma cratera de vulcão. Os três
fazendeiros faziam tanto barulho e tanta confusão, que um monte de gente
veio correndo das cidades vizinhas para ver o que estava acontecendo. As
pessoas se aglomeravam ao redor da cratera, olhando lá para baixo, onde
estavam Boque, Bunco e Bino.
— Ei, Boque! O que está acontecendo?
— Estamos atrás de uma raposa!
— Parece até que vocês perderam o juízo!
As pessoas não paravam de rir dos três fazendeiros.
E eles ficaram ainda mais furiosos. Estavam mais decididos do que nunca,
não iriam desistir enquanto não matassem a raposa.
“Não vamos deixá-la escapar”

No final da tarde, Bino desligou o motor e desceu de sua máquina. Bunco


fez a mesma coisa. Estavam muito cansados e doloridos depois de passar o
dia inteiro dirigindo os tratores, sem parar, e também estavam famintos.
Então os três fazendeiros foram caminhando lentamente em direção à toca
da raposa, ao fundo do buraco imenso. Bino estava com a cara vermelha de
tanta raiva. Bunco estava proferindo xingamentos furiosos contra a raposa.
De repente, Boque começou a gritar:
— Maldito bicho piolhento! Bicho fedorento! Raposa de uma figa! —
exclamou ele. — O que vamos fazer agora?
— Pois vou lhe dizer o que nós não vamos fazer — disse Bino, mais
vermelho que um pimentão. — Não vamos deixá-la escapar! — Não vamos
deixá-la escapar nunca! — declarou Bunco.
— Nunca, nunca e nunca! — exclamou Boque.
Bino se agachou, enfiou a cabeça na entrada da toca e gritou:
— Ouviu isso, raposa? Fique sabendo que não vamos desistir! Só
voltaremos para casa quando você estiver morta! Acabada! Destruída!
Então Boque, Bunco e Bino juraram solenemente que não voltariam para
suas fazendas enquanto não pegassem a raposa.
— Qual será o próximo passo? — perguntou Bunco.
— Vamos te empurrar nesse buraco para que você capture a raposa, —
respondeu Bino. — Vamos, pode ir entrando!
— Nem morto! — gritou Bunco, se afastando assustado.
Bino soltou uma gargalhada estridente. Quando sorria, deixava à mostra
seus dentes cheios de cáries. Parecia que tinha mais cáries do que dentes.
— Bom, só temos uma coisa a fazer — continuou Bino —, matar a raposa
de fome. Vamos acampar aqui e vigiar a toca dia e noite. Ela vai acabar
saindo. Ela tem que sair.
Então Boque, Bunco e Bino mandaram buscar barracas, cobertores e
comida em suas fazendas. E ali mesmo, na colina esburacada, montaram um
acampamento.
As raposas começam a morrer de fome

Naquela noite, os fazendeiros armaram as três barracas ao redor da toca do


Sr. Raposo. Os três jantaram ali mesmo. Boque comeu três frangos assados
com bolinhos de carne, Bunco devorou seis bolinhos fritos recheados com
patê de fígado de ganso, e Bino bebeu dois galões de vinho de maçã.
Mesmo enquanto comiam, não desgrudavam das espingardas.
Boque pegou um frango tostado e cheiroso e o segurou bem na entrada da
toca.
— Está sentindo o cheirinho, raposa? — gritou ele. — É um franguinho
macio e saboroso! Por que não sobe até aqui para comer um pedaço?
O delicioso cheiro de frango entrou pelo túnel até chegar ao lugar onde as
raposas estavam encolhidas.
— Papai — disse uma das Raposinhas —, será que a gente não podia
subir bem de mansinho e arrancar o frango da mão dele?
— Nem pense nisso! — disse Dona Raposa. — É exatamente o que eles
querem que você faça!
— Mas estamos com tanta fome! Até quando vamos ter que ficar sem
comer?
Dona Raposa e Sr. Raposo ficaram em silêncio. Eles também não sabiam
a resposta.
Quando a noite chegou, Bunco e Bino acenderam os possantes faróis dos
tratores para iluminar a cratera.
— Agora — disse Bino — vamos nos revezar para vigiar a toca da raposa
durante a noite. Enquanto dois dormem, um fica de olhos bem abertos.
Vamos nos revezar de hora em hora.
— E se a raposa fizer um túnel por baixo da colina e escapar pelo outro
lado? — perguntou Boque. — Ninguém pensou nisso, não é?
— Óbvio que eu pensei — disse Bino, fingindo que tinha pensado
mesmo.
— Tudo bem, sabichão. Qual é a sua ideia? — perguntou Boque.
Bino catou uma sujeira de dentro do ouvido antes de falar.
— Quantos homens trabalham nas fazendas de vocês? — perguntou ele.
— Na minha fazenda trabalham trinta e cinco — respondeu Boque.
— Na minha, trinta e seis — disse Bunco.
— Eu tenho trinta e sete homens trabalhando para mim — disse Bino. —
No total, temos cento e oito homens. Se todos pegarem suas armas e
cercarem a colina, quero só ver essa raposa escapar!
Então cada um mandou ordens para sua fazenda, e em pouco tempo os
cento e oito homens formavam um círculo em volta da colina. Os
empregados de Boque, Bunco e Bino estavam armados com pedaços de pau,
espingardas, machados e revólveres. Ninguém iria conseguir escapar da
colina naquela noite. Ninguém mesmo.
No dia seguinte, todos permaneceram vigilantes. Boque, Bunco e Bino
ficaram sentados em seus banquinhos enquanto olhavam fixamente para a
toca da raposa. Eles nem conversavam, apenas ficaram sentados lá com as
espingardas no colo.
De vez em quando Sr. Raposo ia bem de mansinho até a boca do túnel,
dava uma farejada e voltava para baixo, dizendo:
— Ainda estão lá.
— Tem certeza? — perguntava Dona Raposa.
— Não tenho a menor dúvida — respondia Sr. Raposo. — Estou sentindo
o cheiro de Bino. Ele é muito fedido.
O plano do Sr. Raposo

Aquela lenga-lenga durou três dias e três noites.


— Quanto tempo uma raposa aguenta ficar sem água e comida? —
perguntou Boque no terceiro dia.
— Três dias no máximo — respondeu Bino. — Logo ela vai tentar sair.
Vai ser obrigada.
Bino tinha razão. No fundo do túnel, as raposas estavam começando a
morrer de fome.
— Eu quero água. Nem que seja só um pouquinho — disse uma das
Raposinhas. — Por favor, papai, faça alguma coisa!
— E se a gente tentasse sair correndo, papai? — perguntou a Raposinha
mais nova.
— Parem com essa conversa! — disse Dona Raposa, nervosa. — Ninguém
vai subir até lá para dar de cara com aquelas espingardas. Prefiro que
fiquemos todos aqui para morrermos em paz.
Já fazia um tempão que Sr. Raposo não dizia nada. Estava sentado imóvel,
de olhos fechados, parecia nem ouvir o que os outros diziam. Mas Dona
Raposa sabia que ele estava tentando achar desesperadamente uma saída
para a situação. Algum tempo depois Sr. Raposo se levantou e encarou a
esposa, os olhos brilhando.

— O que foi, querido? — perguntou Dona Raposa.


— Acabei de ter uma ideia — respondeu Sr. Raposo.
— O quê? — gritaram as Raposinhas. — Que ideia, papai? Vamos, diga
logo que ideia você teve!
— Por favor, querido! — disse Dona Raposa. — Fale logo no que você
está pensando!
— Bem…
Sr. Raposo começou a falar e parou. Deu um suspiro, balançou a cabeça e
sentou de novo.
— Não adianta — lamentou ele. — Não vai dar certo. É impossível.
— Por que é impossível, papai? — perguntou a Raposinha mais velha.
— Porque teríamos de cavar muito mais. Há três dias não comemos nada.
Estamos muito fracos.
— Não estamos não, papai! — gritaram as Raposinhas. — Ainda temos
muita força! Você vai ver só como temos! E você também tem!
Sr. Raposo olhou para os filhos e sorriu. Que filhos maravilhosos eu tenho
pensou ele. Estão morrendo de fome e sem beber água há três dias, mas não
desistiram. Não posso decepcioná-los, pensou Sr. Raposo.
— Então… acho que podemos tentar? — arriscou Sr. Raposo.
— Vamos! — gritou uma Raposinha.
— Vamos, vamos logo! — gritou outra Raposinha.
— Vamos lá, papai! O que é que a gente tem que fazer?

Dona Raposa se levantou devagar. Era quem mais estava sofrendo ali,
estava muito fraca e já não conseguia ficar de pé.
— Me perdoem, acho que não vou poder ajudar muito — desculpou-se
ela.
— Você vai ficar aí bem quietinha, querida — disse Sr. Raposo. — Pode
deixar que nós cuidamos disso.
O Galinheiro-Número-Um do Boque

— Agora vamos cavar numa direção muito especial — disse Sr. Raposo.
As quatro Raposinhas prestaram bastante atenção nas ordens do pai e logo
começaram a cavar. O túnel foi crescendo devagarinho.
— Papai, para onde estamos indo? — perguntou uma das Raposinhas.
— Ainda não posso dizer — respondeu Sr. Raposo —, pois o lugar que
espero que possamos chegar é tão maravilhoso que vocês iriam perder a
cabeça com tanta expectativa. Mas, se não conseguirmos (o que é bem
possível), então vocês morreriam de decepção. E não quero decepcionar
vocês, minhas Raposinhas.
Eles trabalharam sem parar. Já não sabiam se era dia ou noite, pois dentro
do túnel era sempre escuro. Finalmente, depois de muito tempo, Sr. Raposo
pediu para pararem.
— Acho que está na hora de dar uma espiada lá em cima — disse ele —,
tomara que eu esteja certo.
Começaram, então, a cavar bem devagarinho para cima, na direção da
superfície. Foram subindo, subindo… até que, de repente, toparam com
alguma coisa sólida. Sr. Raposo se ergueu para tentar descobrir o que era
aquilo.
— É madeira! — exclamou baixinho. — Madeira de assoalho.
— E daí, papai? — perguntou a Raposinha mais velha.
— E daí que, se eu não estiver enganado, isso quer dizer que estamos bem
embaixo da casa de alguém — sussurrou Sr. Raposo. — Agora fiquem bem
quietinhos que eu vou dar uma espiada.
Com todo o cuidado, Sr. Raposo começou a empurrar uma das tábuas do
assoalho. De repente, a madeira despregou do chão, causando um barulhão.
As Raposinhas taparam os olhos e se encolheram, assustadas. Mas nada
aconteceu, e Sr. Raposo empurrou mais uma tábua. Com todo o cuidado do
mundo, ele enfiou a cabeça pela abertura e não conteve um grito de alegria.

— Conseguimos! Conseguimos logo de primeira! Conseguimos!


Conseguimos! — gritava ele.
Rapidamente, Sr. Raposo passou pela abertura do assoalho e, lá em cima,
logo dançava e pulava de alegria.
— Venham! Subam vocês também! — dizia ele. — Venham ver onde
estamos! É maravilhoso! Corram, venham ver, minhas Raposinhas! Viva!
Viva! Oba! Viva!
As quatro Raposinhas subiram correndo e, por alguns momentos, acharam
que estavam sonhando. Estavam dentro de um barracão enorme, cheio de
galinhas. Milhares de galinhas brancas, pretas, amarelas. Galinhas gordas e
suculentas!
— O Galinheiro-Número-Um do Boque! — gritava Sr. Raposo. —
Exatamente aonde eu queria chegar! Acertamos em cheio! E logo na
primeira tentativa! Isso é fantástico! E, se me permitem, muito esperto da
minha parte!
As Raposinhas pulavam de alegria. Corriam para todos os lados, caçando
as galinhas.
— Esperem! — gritou Sr. Raposo. — Calma! Temos que fazer tudo
direitinho. Primeiro, vamos todos beber água.
Correram para o bebedouro das galinhas e tomaram água! Depois, Sr.
Raposo escolheu as três galinhas mais gordas e matou-as com muita
agilidade.
— Todos de volta para o túnel! — ele ordenou. — Depressa! Não
podemos perder tempo com bobagens! Vamos logo! Ou vocês não querem
comer essas galinhas?
Então, uma após a outra, as Raposinhas voltaram bem depressa para o
túnel escuro. Sr. Raposo recolocou as tábuas no lugar para ninguém
desconfiar que haviam mexido ali. Em seguida, deu as três galinhas para a
Raposinha mais velha.
— Meu filho, leve estas galinhas para a sua mãe — disse ele. — Diga a ela
para preparar uma grande festa. Diga que logo estaremos de volta, assim
que resolvermos algumas coisinhas por aqui.
Dona Raposa tem uma surpresa

A Raposinha saiu correndo de volta pelo túnel, levando as três galinhas


gordas. Só em pensar na surpresa da Dona Raposa, ela ficava ainda mais
contente. O túnel era muito comprido, mas a Raposinha não parou nem
uma vez. Quando chegou, atirou-se em cima de Dona Raposa.
— Mamãe! — gritou, quase perdendo o fôlego. — Acorde, mamãe! Veja o
que eu trouxe!
Dona Raposa, que estava mais fraca do que nunca por causa da fome,
abriu um pouquinho os olhos e viu as galinhas.
— Estou sonhando — disse ela baixinho, e fechou os olhos de novo.
— Não é sonho não, mamãe! São galinhas de verdade! Olhe! Não vamos
morrer de fome!
Dona Raposa arregalou os olhos e sentou-se rapidamente.
— O quê? Galinhas? — gritou ela, em choque. — Onde foi que…?
— No Galinheiro-Número-Um do Boque! — respondeu a Raposinha. —
Cavamos um túnel que foi dar direto lá. Tinha galinha saindo pelo ladrão!
Papai disse para você preparar uma festa. Logo eles vão estar de volta.
Só de olhar as galinhas, Dona Raposa já começou a sentir-se melhor.
Levantou-se muito entusiasmada.
— Pois então vamos fazer essa festa — disse ela. — Seu pai é mesmo um
raposo fantástico. Vamos, venha me ajudar a preparar estas galinhas!
Enquanto isso, no túnel, o fantástico Sr. Raposo dava novas ordens.
— Agora vai ser mais fácil, minhas Raposinhas — dizia ele. — O lugar
aonde eu quero chegar não deve ser muito longe.
— E aonde você quer chegar, papai?
— Sem perguntas, minha gente! Vamos cavar!
O Texugo

Sr. Raposo e as três Raposinhas que ficaram começaram a cavar bem


depressa. Estavam tão felizes, que até esqueceram do cansaço e da fome.
Logo teriam uma festa de arromba, e apenas isso importava. Quando se
lembravam do bobalhão do Boque sentado na colina, quase morriam de rir.
Era uma delícia pensar que as galinhas que iriam comer pertenciam
justamente ao fazendeiro que queria matá-los de fome.
— Continuem cavando, crianças. — disse Sr. Raposo — Estamos quase
lá.
De repente, uma voz grossa soou acima de suas cabeças:
— Quem está aí?
As raposas levaram o maior susto. Olharam para cima e viram uma
carinha comprida, pontuda, peluda e preta espiando por um buraquinho no
teto do túnel.
— Texugo! — gritou Sr. Raposo.
— Raposão! — gritou o Texugo. — Puxa vida, que bom que finalmente
encontrei alguém! Estive cavando em círculos faz três dias e três noites e não
faço ideia de onde estou!
Texugo alargou o buraco do teto e pulou para junto das raposas. O filho
dele, Texuguinho, desceu logo atrás.
— Por acaso você sabe o que está acontecendo lá na colina? — perguntou o
Texugo, nervoso. — Parece o fim do mundo! A floresta está desaparecendo
e tem homem de espingarda por todos os lados! Nós estamos presos aqui
debaixo da terra, nem à noite conseguimos sair. Vamos acabar morrendo de
fome!
— O que você quer dizer com nós? — perguntou Sr. Raposo.
— Nós, ora! Nós cavadores, que vivemos aqui embaixo. Eu, você, a
Toupeira, o Coelho e nossas famílias. Nem a Doninha, que é tão esperta,
está conseguindo sair dessa. O que vamos fazer, Raposão? Acho que é o fim!
O Sr. Raposo olhou para seus três filhotes e sorriu. As Raposinhas
olharam para ele e sorriram de volta, cúmplices, pois sabiam de seu segredo.
— Amigo Texugo — disse Sr. Raposo —, eu sou o único culpado dessa
encrenca toda…
— Sei muito bem que a culpa é toda sua! — disse Texugo. — Aqueles
fazendeiros não vão sossegar enquanto não pegarem você. E o pior é que
todos nós que moramos aqui na colina também estamos condenados.
Texugo se sentou e abraçou seu filhote, Texuguinho. Olhou tristemente
para Sr. Raposo.
— Estamos perdidos — choramingou baixinho. — Minha mulher está tão
fraca que não consegue nem sair do lugar.
— Nem a minha! — disse Sr. Raposo. — Mas acontece que, neste exato
momento, ela está preparando um grande banquete com as galinhas mais
gordas e apetitosas deste mundo…
— Pare com isso! — gritou Texugo. — Não é hora para brincadeiras!
— Mas é verdade! — gritaram as Raposinhas. — Papai não está
brincando! Temos um monte de galinhas!
— E, já que a culpa é toda minha — disse Sr. Raposo —, todo mundo está
convidado para o meu banquete: você, a Toupeira, o Coelho, a Doninha e as
famílias de vocês. Há comida para todos, eu garanto!
— É sério? — gritou Texugo. — Você não está brincando mesmo?
Sr. Raposo chegou bem pertinho do Texugo e perguntou com uma voz de
mistério:
— Sabe de onde estamos vindo?
— De onde?
— Do Galinheiro-Número-Um do Boque!
— Não acredito!
— Pode acreditar. Você chegou na hora certa. Ainda temos que fazer
umas coisinhas, e você pode nos ajudar. E, enquanto isso, o Texuguinho
pode ir dar a boa notícia aos outros!
Na mesma hora o Texuguinho se levantou, pronto para correr.
— Vá, meu amiguinho — disse Sr. Raposo —, e diga que estão todos
convidados para o banquete. É só seguir por este túnel que vocês chegarão à
minha casa!
— Pois não, Sr. Raposo! — disse o Texuguinho. — É pra já! Obrigada!
O Texuguinho passou pelo buraco no teto do túnel e desapareceu.
O superdepósito do Bunco

— Nossa! — exclamou Texugo — O que aconteceu com o seu rabo,


Raposão?
— Por favor, não toque nesse assunto — disse Sr. Raposo. — É muito
triste para mim.
Estavam cavando um novo túnel em silêncio. O túnel estava crescendo
depressa, pois Texugo era um ótimo cavador. Logo eles estavam cavando
por baixo de outro assoalho de madeira. Sr. Raposo deu um sorriso maroto.
— Se eu estiver certo, meu caro Texugo — disse ele —, estamos embaixo
da fazenda do malvado Bunco. Para falar a verdade, acho que estamos
exatamente na parte mais interessante da fazenda.
— Patos e gansos! — gritaram as Raposinhas, lambendo os beiços. —
Patos macios e gansos apetitosos!
— Isso mesmo! — exclamou Sr. Raposo.
— Mas como você sabe onde estamos? — perguntou Texugo.
Sr. Raposo deu mais um sorriso maroto.
— Conheço estas fazendas como se fossem a palma da minha mão —
disse ele. — Para mim, andar lá em cima é a mesma coisa que andar aqui
embaixo.
Sr. Raposo ficou na ponta dos pés e pressionou as tábuas do assoalho. Em
seguida enfiou a cabeça pela abertura.
— A-há! — gritou ele, saltando até o cômodo. — Acertei em cheio de
novo! Vamos, subam, venham ver!
Num piscar de olhos, Texugo e as três Raposinhas já estavam lá em cima
também. Ficaram boquiabertos com o que viram, tão maravilhados que
parecia um sonho feito especialmente para animais famintos.
— Muito bem, amigo Texugo — declarou Sr. Raposo —, isto aqui é o
superdepósito do Bunco! Nestas prateleiras ele guarda os melhores produtos
de sua fazenda antes de mandar para os mercados.
Havia prateleiras por toda parte, e elas estavam cheias de patos e gansos
apetitosos, depenados e prontos para assar. Também havia um monte de
presuntos defumados e alguns pedaços suculentos de bacon.
Sr. Raposo pulava de alegria.
— O que vocês acham, hein? — gritava ele. — Não é uma maravilha?
De repente, as três Raposinhas e Texugo, que estavam morrendo de fome,
avançaram para cima de toda aquela comida deliciosa.
— Parem! — ordenou Sr. Raposo. — Vamos com calma! Eu é que escolho
as coisas aqui.
Então eles pararam, lambendo os beiços de fome. Sr. Raposo começou a
andar pelo superdepósito, olhando tudo cuidadosamente. De vez em
quando batia com o dedo num ganso ou num presunto. Estava com tanta
água na boca, que um fio de saliva escorreu da boca e caiu no chão.
— Eles não podem saber que estivemos aqui — disse Sr. Raposo. —
Precisamos deixar tudo limpo e em ordem, para ninguém desconfiar. Por
isso só vamos pegar quatro patos bem gordos e macios.
Sr. Raposo correu até uma das prateleiras e foi pegando os patos.
— Nossa, como parecem deliciosos esses patos. Não é à toa que Bunco
colocou um preço especial para eles no mercado... ei, Texugo! — gritou ele
—, me dê uma mãozinha aqui… E vocês também, crianças, venham ajudar.
Vamos lá... nossa, como vocês estão famintos, dá pra ver só de olhar... acho
melhor levarmos alguns gansos também... três é o suficiente... vamos levar
os maiores... e que tal levarmos alguns presuntos defumados apetitosos...
adoro presunto defumado, sabe? Pode pegar aquela escada ali no canto?
Sr. Raposo subiu pela escada e pegou três presuntos defumados magníficos
das prateleiras.
— E o que você acha de bacon, amigo Texugo?
— Adoro bacon! — exclamou Texugo, dançando de felicidade. —
Podemos levar pelo menos um pedaço, aquele enorme lá no alto da
prateleira.
— E cenouras, papai! — disse a Raposinha mais nova. — Precisamos
levar algumas cenouras também.
— Que ideia mais boba — respondeu Sr. Raposo. — Nós não comemos
cenouras.
— Mas não é para nós, papai, é para os Coelhos. Eles só comem legumes.
— Puxa vida, você tem razão! — exclamou Sr. Raposo. — Vamos levar
uma porção grande de cenouras!
Rapidamente todas aquelas coisas deliciosas já estavam empilhadas no
chão do superdepósito. As Raposinhas não saíam de perto, não conseguiam
parar de remexer os focinhos e seus olhos brilhavam como estrelas.
— E agora — disse Sr. Raposo —, nosso amigo Bunco terá que nos
emprestar aqueles dois carrinhos ali.
Então ele e o Texugo alcançaram os carrinhos e os abarrotaram
completamente de patos, gansos, presunto, bacon e cenouras. Passaram os
carrinhos rapidamente para baixo através da abertura no assoalho e
desceram todos para o túnel. Sr. Raposo recolocou as tábuas no lugar.
Fizeram tudo tão direitinho, que ninguém poderia imaginar que haviam
estado lá. Então Sr. Raposo chamou duas das Raposinhas e disse:
— Agora vocês vão levar esses carrinhos para sua mãe. Corram o mais
rápido que puderem! Digam a ela que o nosso banquete tem que ser digno
de um banquete de reis, pois teremos convidados para jantar. Digam
também que o restante de nós vai voltar logo, só falta uma coisa que
precisamos fazer e que… eu a amo muito.
— Pode deixar, papai! — responderam as duas Raposinhas, e dispararam
pelo túnel.
As dúvidas de Texugo

— Só mais uma visitinha! — exclamou Sr. Raposo.


— Aposto que sei aonde vamos — disse a Raposinha mais nova, que havia
ficado com eles.
— Aonde? — perguntou o Texugo, curioso.
— Bom — disse a Raposinha —, estivemos no galinheiro do Boque e no
superdepósito do Bunco. Agora só falta a fazenda do Bino. Acertei, papai?
— Acertou — disse Sr. Raposo. — Mas você não sabe a que parte da
fazenda nós vamos.
— E qual é? — perguntaram Texugo e a Raposinha ao mesmo tempo.
Sr. Raposo fez um ar de suspense e disse:
— Esperem para ver. E agora… vamos cavar!
Os três cavoucavam a terra num ritmo alucinante. O túnel aumentava. De
repente, Texugo parou de cavar e disse:
— Raposão, você não está nem um pouco preocupado?
— Preocupado? — perguntou Sr. Raposo. — Com o quê?
— Ora, com essa roubalheira toda.
Sr. Raposo olhou firme para Texugo, sacudiu a terra que estava grudada no
bigode e falou:
— Meu velho e querido monte de pelos, por acaso você conhece alguém
no mundo que não roubaria algumas galinhas se seus filhos estivessem
morrendo de fome?
Houve um breve silêncio enquanto Texugo refletia profundamente sobre o
assunto. Sr. Raposo continuou:
— Acho que você está exagerando um pouco com essa história de
roubalheira.
— Não sei, não! Não sei, não! — respondeu Texugo.
— Olhe aqui — disse Sr. Raposo —, Boque, Bunco e Bino estão lá em
cima, prontos para nos matar. Acho que você sabe disso, não sabe?
— Sei, Raposão, óbvio que sei — disse Texugo.
— Só que nós não vamos fazer como eles. Não vamos matar ninguém.
— É, acho que não — disse Texugo.
— Isso nunca passaria pela nossa cabeça — disse Sr. Raposo. — A única
coisa que vamos fazer é pegar um pouquinho de comida daqui e dali, para
ninguém morrer de fome. Certo?
— Não há outro jeito… — disse Texugo.
— Se eles querem ser malvados, problema deles — disse Sr. Raposo. —
Mas nós, aqui de baixo, somos gente decente e só queremos paz.
Sr. Texugo inclinou a cabeça para um lado e sorriu.
— Raposão — disse Texugo —, eu amo você.
— Obrigado — disse Sr. Raposo. — E agora vamos continuar cavando.
Não demorou cinco minutos e as patas dianteiras de Texugo atingiram
uma coisa lisa e dura.
— O que é isso? — perguntou ele. — Parece uma parede.
Ele e Sr. Raposo afastaram a terra para os lados, e lá estava: era uma
parede.
— Que ideia mais esquisita construir uma parede por baixo da terra! —
disse Texugo. — Quem será que fez isso? E por quê?
— Muito simples — respondeu Sr. Raposo. — É a parede de uma sala
subterrânea. E acho que é exatamente este o lugar que estou procurando.
A adega secreta do Bino

Sr. Raposo examinou a parede com muito cuidado. Percebeu que o


cimento entre os tijolos estava bem velho, e era só esfregar um pouco que
esfarelava tudo. Então foi raspando o cimento até conseguir tirar um tijolo
da parede. De repente, no buraco do tijolo, apareceu uma carinha feia com
dois olhos pretos e brilhantes.
— Suma daqui! — disse a carinha. — Este lugar já tem dono.
— Puxa vida! — disse Texugo. — É o Rato!
— Bicho atrevido! — disse Sr. Raposo. — Sabia que ia acabar
encontrando você!
— Suma daqui! — guinchou o Rato. — Desapareça! Este lugar é meu!
— Cale a boca! — disse Sr. Raposo.
— Não calo! — o Rato guinchou de novo. — Daqui não saio. Eu cheguei
primeiro!

Sr. Raposo deu um sorriso enorme e seus dentes brancos e pontudos


brilharam como faíscas.
— Escute aqui, meu querido Rato — disse Sr. Raposo —, eu estou
morrendo de fome e acho que você daria um ótimo aperitivo!
Foi o suficiente. O Rato desapareceu. Sr. Raposo deu outras boas risadas e
começou a arrancar mais tijolos da parede. Quando o buraco já estava bem
grande, Sr. Raposo passou por ele e entrou na sala subterrânea. Texugo e a
Raposinha foram atrás dele.
Aquela sala subterrânea era, na verdade, uma adega imensa, úmida e
escura.
— É isso! — gritou Sr. Raposo.
— Isso o quê? — perguntou Texugo. — Não tem nada aqui dentro!
— Onde estão os perus, papai? — perguntou a Raposinha.
— Ele ama perus tostadinhos — disse Sr. Raposo. — Mas não precisamos
dos perus do Bino, filhote. Já temos comida o suficiente.
— Mas, então, o que viemos fazer aqui?
— Olhem bem para essas paredes — disse Sr. Raposo. — Não estão
vendo nada de interessante?
Texugo e a Raposinha fecharam os olhos e foram abrindo de novo, bem
devagar, para se acostumarem com a escuridão. Só então perceberam que as
paredes daquela sala subterrânea eram cobertas de prateleiras cheias de
garrafas. Havia centenas delas, e ao chegarem um pouquinho mais perto
conseguiram ler nos rótulos das garrafas: VINHO DE MAÇÃ.
— Papai! — sussurrou a Raposinha. — Meu Deus, papai! É o famoso
vinho de maçã do Bino!
— Exatamente — respondeu Sr. Raposo.
— Que maravilha! — exclamou Texugo.
— A adega secreta do Bino — disse Sr. Raposo. — Mas façam silêncio,
por favor. Esta adega fica bem embaixo da casa da fazenda.
— Vinho de maçã é ótimo para texugos — disse Texugo. — É como
remédio, nós tomamos um copo grande três vezes ao dia e outro na hora de
dormir.
— Agora sim, nosso banquete está completo! — concluiu Sr. Raposo.
Enquanto conversavam, a Raposinha estava tão entusiasmada que pegou
uma garrafa da prateleira e tomou um gole do vinho de maçã.
— Uau! — disse ela, quase sem fôlego. — Uau!
Uau!
O vinho de maçã do Bino não era como qualquer vinho barato de
mercado. Era vinho de maçã de verdade, desses que ardem na garganta,
queimam o estômago e fazem sair lágrimas dos olhos.
— Ah-h-h-h-h-h! — dizia a Raposinha. — Isto sim é que é vinho de
maçã!
— Agora chega. — Interrompeu Sr. Raposo, e tirou a garrafa da
Raposinha.
Mas Sr. Raposo não resistiu e também tomou um gole.
— É inacreditável! — disse ele enquanto retomava o fôlego. — Que
delícia de vinho! É perfeito!
— Agora é a minha vez — disse Texugo.
Depois de tomar um gole imenso do vinho, Texugo quase caiu para trás,
os olhos piscando, enevoados do álcool.
— Nossa, Raposão, isto aqui é a bebida dos deuses!
— Parem com essa droga de barulho — interrompeu o Rato, aos berros.
— E devolvam a minha garrafa.
O Rato estava na prateleira mais alta da adega, espiando por trás de uma
garrafa. Enfiado no gargalo da garrafa havia um tubinho de borracha, que
ele usava de canudinho para tomar o vinho de maçã.
— Você está bêbado! — disse Sr. Raposo.
— Não é da sua conta! — guinchou o Rato. — E, se vocês continuarem
com essa bagunça, seus idiotas, os homens vão acabar descobrindo a gente
aqui! Caiam fora e me deixem beber em paz.
Naquele exato momento, uma voz de mulher gritou da parte de cima da
casa:
— Depressa, Mabel, traga o vinho! Você sabe que o Sr. Bino não gosta de
esperar! Principalmente depois de ter passado a noite inteira numa barraca!
Os animais ficaram paralisados de medo. Ficaram totalmente imóveis. De
repente, crééééé. Alguém abriu a porta da adega. Tóc-tóc, tóc-tóc. Alguém
estava descendo a escada de madeira que levava até as garrafas.
A mulher

— Escondam-se! Depressa! — sussurrou Sr. Raposo.


Ele, Texugo e a Raposinha subiram numa das prateleiras e se encolheram
atrás de uma fileira de garrafas cheias de vinho. Uma mulher gorda desceu
até a adega. Ela parou de repente, olhou para um lado, olhou para o outro
lado. Fez um barulho esquisito com o nariz e foi direto na direção onde Sr.
Raposo, Texugo e a Raposinha estavam escondidos. Quando parou, a única
coisa que a separava deles era uma fileira de garrafas de vinho. A mulher
estava tão perto que dava até para escutar a sua respiração. Espiando pelos
vãozinhos entre duas garrafas, Sr. Raposo viu que ela estava carregando um
enorme rolo para massa.
— Quantas garrafas eu pego, Dona Bina? — gritou a mulher.
— Três garrafas, Mabel! — gritou a voz lá de cima.
— Mas ontem Sr. Bino tomou quatro, Dona Bina.
— É, mas hoje ele vai tomar menos! — gritou de novo a voz lá de cima.
— Ele disse que hoje aquela raposa sai da toca com certeza! Ela não vai
aguentar mais um dia sem comer.
A mulher estendeu o braço e pegou uma garrafa de vinho de maçã da
prateleira. Por um triz não pegou a garrafa que estava escondendo o Sr.
Raposo.
— Não vejo a hora de essa raposa nojenta aparecer bem mortinha! —
exclamou ela. — E, por falar nisso, Dona Bina, seu marido prometeu que ia
me dar o rabo da raposa de lembrança.
— Xi, Mabel, você está sem sorte! — gritou Dona Bina lá de cima. — O
rabo foi destruído, você não sabia?
— Como assim?
— Meteram bala no rabo da raposa, mas ela escapou mesmo assim.
— Que droga! — disse a mulher. — Eu queria tanto aquele rabo!
— Ah, mas você pode ficar com a cabeça, Mabel. O que você acha de
empalhar a cabeça da raposa e pendurá-la na parede do seu quarto? Agora
suba logo com o vinho!
— Sim, senhora — disse a mulher, pegando mais uma garrafa da
prateleira.
Sr. Raposo estava apavorado. Se ela pegasse mais uma, eles seriam descobertos.
A Raposinha tremia sem parar e Texugo suava frio.
— Acho que vou pegar só duas garrafas, Dona Bina! — gritou a mulher.
— Ora, Mabel, traga quantas quiser, mas ande logo!
— Então vou levar duas mesmo — disse a mulher. — O Sr. Bino anda
bebendo demais.
A mulher voltou para a escadinha de madeira levando uma garrafa em
cada mão e o rolo para massas debaixo do braço. Antes de começar a subir
os degraus, ela deu uma cheirada no ar.
— Esta adega está cheia de ratos, Dona Bina! — gritou ela. — Estou
sentindo o cheiro.
— Então venha buscar o veneno aqui na cozinha e depois espalhe por
todos os cantos da adega.
— Sim, senhora — disse Mabel.
Assim que a mulher fechou a porta, Sr. Raposo saiu de trás das garrafas.
— Depressa! — ordenou ele. — Cada um pegue uma garrafa e saia
correndo!
— Eu não disse? — guinchou o Rato. — Fomos descobertos. Agora
tratem de sumir daqui e não voltar nunca mais, seus idiotas. Este lugar é
meu!
— Você vai ser envenenado — disse Sr. Raposo.
— Bobagem! — disse o Rato. — É só olhar onde irão colocar o veneno e
não chegar perto. Ela nunca vai me pegar!
Sr. Raposo, Texugo e a Raposinha atravessaram correndo a adega, cada
um levando uma garrafa cheinha de vinho de maçã.
— Adeus, Rato! — gritaram os três, desaparecendo pelo buraco da parede.
— E muito obrigado por este vinho delicioso!
— Ladrões! — gritava o Rato. — Assaltantes! Bandidos!
A grande festa

De volta ao túnel, eles pararam um pouco para que Sr. Raposo recolocasse
os tijolos na abertura da parede. Enquanto ia tapando o buraco, ele falava
baixinho:
— Ainda consigo sentir o gosto daquele vinho de maçã delicioso — disse
ele — Que sujeitinho sem-vergonha aquele Rato!
— Não tem um pingo de educação — disse Texugo. — Para falar a
verdade, nunca vi um rato bem-educado em toda a minha vida.

— E além disso ele bebe demais — disse Sr. Raposo, colocando o último
tijolo no lugar. — Bom, acabamos! Agora, vamos ao banquete!
Eles pegaram as garrafas de vinho e saíram correndo. Sr. Raposo ia na
frente, seguido pela Raposinha, e por último vinha Texugo. Corriam à toda
pelo túnel. Passaram pelo desvio que levava ao superdepósito do Bunco,
depois pelo que ia dar no Galinheiro-Número-Um do Boque, e então
começaram a subir pelo longo caminho que levava à toca da Raposa.
— Não desanimem! — gritava Sr. Raposo. — Vamos chegar daqui a
pouco! Pensem na comida que nos espera! Pensem neste vinho de maçã
delicioso que estamos levando! Pensem na festa que vamos ter!
Enquanto corria, Sr. Raposo ia cantando:
Estou de volta, e não vou sozinho
Levo amigos, comida e muito carinho.
Quero primeiro beijar minha amada
Depois um pratão de galinha ensopada
E pra terminar uma taça de vinho.

Texugo também se pôs a cantar:


Estamos chegando ao fim do caminho
Quero comer um pato quentinho
Não estou aguentando esta fome danada
Também quero pastel, croquete e empada
E pra terminar uma taça de vinho.

Ainda estavam cantando quando contornaram a última curva do caminho


e deram de cara com um espetáculo deslumbrante: uma imensa sala de
jantar tinha sido escavada pelos que ficaram ali. Bem no meio havia uma
mesa enorme e sentados ao redor dela estavam Dona Raposa e três
Raposinhas, Dona Texugo e três Texuguinhos, o casal Toupeira e quatro
Toupeirinhas, o casal Coelho e cinco Coelhinhos, e o casal Doninha e seis
Doninhazinhas.
A mesa estava abarrotada de frangos, patos, gansos, presuntos, bacon e
cenouras. Os animais não aguentaram esperar por Sr. Raposo, Texugo e a
Raposinha, e já estavam todos comendo.
— Querido! — gritou Dona Raposa, levantando-se e abraçando Sr.
Raposo. — Não conseguimos esperar! Mas sei que vocês vão nos perdoar!
Então ela abraçou a Raposinha mais nova. Dona Texugo também se
levantou e abraçou Texugo, e todos se abraçaram. Todos gritavam de alegria
quando as garrafas de vinho foram colocadas na mesa. No fim, os animais
voltaram correndo para seus lugares e Sr. Raposo, Texugo e a Raposinha
sentaram-se também.
Eles estavam com tanta fome, que durante um bom tempo só se ouviam
os nhac-nhac das mordidas e os tec-roc-roc dos dentes mastigando, roendo e
mastigando de novo toda aquela comida deliciosa. De vez em quando,
também se ouvia um glup-glup… uau! de quem tomava um gole do vinho de
maçã.
Quando acabaram, Texugo se levantou, ergueu uma taça de vinho e disse:
— Um brinde! Quero que todos vocês se levantem e façam um brinde ao
nosso querido amigo que hoje salvou as nossas vidas: o Sr. Raposo!

— Viva o Sr. Raposo! — gritaram todos, de pé com as taças erguidas. —


Viva o Sr. Raposo! Que ele viva muitos e muitos anos!
Dona Raposa também ergueu a taça e disse:
— Não vou fazer nenhum discurso. Só quero dizer uma coisa: MEU
MARIDO É UM RAPOSO FANTÁSTICO!
Todos aplaudiram e trocaram brindes. E então foi a vez de Sr. Raposo
falar:
— Esta comida deliciosa… — ele começou a dizer, e parou.

Seguiu-se o maior silêncio. Todos ficaram olhando para ele. De repente,


Sr. Raposo soltou um imenso arroto. Todos caíram na gargalhada e bateram
mais palmas. Então ele continuou:
— Esta comida deliciosa, meus amigos, é uma cortesia dos Senhores
Boque, Bunco e Bino. Espero que tenham aproveitado tanto quanto eu.
Aí, sim, todos riram ainda mais. Depois de muitas risadas e muitos
brindes, Sr. Raposo voltou a falar:
— Agora, meus amigos, vamos falar sério. Temos que pensar no dia de
amanhã e em todos os outros dias que virão. Para começar, se sairmos daqui
vamos ser mortos na hora, certo?
— Certo! — responderam todos.
— Vamos levar um tiro antes de dar um passo sequer — disse Texugo.
— É isso mesmo — disse Sr. Raposo. — Mas, sinceramente, quem gostaria
de sair? Somos todos cavadores e não nos damos bem no mundo lá fora.
Para nós, é um mundo cheio de inimigos. Só saímos porque temos que
conseguir alimento para nossas famílias. Mas agora, meus amigos, temos
uma grande novidade: um túnel muito seguro que vai dar nos três melhores
depósitos de comida do mundo!
— E temos mesmo — disse Texugo. — Eu vi todos eles!
— Sabem o que significa isso? — perguntou Sr. Raposo. — Significa que
nunca mais teremos que sair daqui!
Na mesa os animais se agitavam e comentavam entre si a proposta do Sr.
Raposo, que continuou falando:
— Portanto, convido todos vocês a viverem aqui comigo para sempre —
prosseguiu Sr. Raposo.
— Para sempre?! — exclamaram os animais. — Que maravilha! Nunca
mais vão atirar em nós!
— Vamos fazer uma cidadezinha subterrânea — prosseguiu Sr. Raposo
—, com ruas e casas para todos nós. Cada família terá a sua casa. Os
Texugos, as Toupeiras, os Coelhos, as Doninhas e as Raposas terão suas
casas particulares. E todos os dias irei buscar comida para todos. E todos os
dias comeremos como reis.
A alegria tomou conta da mesa. Os animais se abraçavam, se beijavam,
riam de felicidade.
Ainda esperando

Lá fora, na colina esburacada, bem ao lado da entrada da toca da Raposa,


Boque, Bunco e Bino continuavam sentados segurando as espingardas.
Começava a chover e a água descia jorrando pelo pescoço dos homens e
empoçava os seus sapatos.

— Essa Raposa vai ter que sair daí — disse Boque.


— O bicho deve estar morto de fome — confirmou Bunco.
— Isso mesmo, ela vai tentar escapar já, já — disse Bino. — Fiquem
atentos!
E lá ficaram sentados, esperando a Raposa sair.
E, pelo que sei, estão esperando até hoje.
Este e-book foi desenvolvido em formato ePub
pela Distribuidora Record de Serviços de Imprensa S. A.
Fantástico Sr. Raposo

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https://pt.wikipedia.org/wiki/Roald_Dahl

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Twitter da Roald Dahl Story Company:


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Página do autor no Goodreads:


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A fantástica fábrica de chocolate
Dahl, Roald
9786584824065
160 páginas

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As portas da Fantástica Fábrica de Chocolate vão se abrir! Pegue o


seu bilhete dourado e embarque nesta incrível (e muito doce)
aventura com Charlie, Willy Wonka e os Umpa-Lumpas. A
Fantástica Fábrica de Chocolate, clássico da literatura mundial em
uma edição com capa inédita de Isadora Zeferino.
Charlie nunca teve muita sorte na vida. Ele mora em um casebre
com os pais e os quatro avós, todos dividindo o parco espaço e
tendo que jantar sopa de repolho rala todas as noites. Mas Charlie
não quer repolho. O que ele quer, a comida que ele mais ama no
mundo, é CHOCOLATE! E o mais triste é que bem pertinho da sua
casa existe a enorme, estupenda, magnífica, fantástica Fábrica de
Chocolate! O sonho de qualquer criança.

Mas ninguém entra nem sai da Fábrica há anos. Willy Wonka


(simplesmente o maior inventor e fabricante de chocolates que já
existiu!) se tornou muito recluso e os portões da Fábrica se abrem
apenas para enviar carregamentos de doces e chocolates. É tudo
tão misterioso que ninguém nem sabe quem são os funcionários
que trabalham lá...

Porém, tudo muda quando repentinamente Willy Wonka anuncia


que vai liberar cinco bilhetes dourados para cinco crianças
sortudíssimas poderem visitar a Fantástica Fábrica de Chocolate.
Para Charlie, encontrar o bilhete seria melhor do que ganhar na
loteria. Basta agora apenas torcer por uma barrinha premiada que
seja!

Um dos maiores clássicos da literatura infantil, A Fantástica Fábrica


de Chocolate é uma das obras mais conhecidas de Roald Dahl.
Com diversas adaptações para o cinema, a história encanta leitores
há gerações.

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Fantástico Sr. Raposo
Dahl, Roald
9786584824232
96 páginas

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Conheça a história do Sr. Raposo e sua família que, ao


encontrarem uma armadilha muito bem feita, vão precisar de
um plano fantástico para escapar! Do célebre autor britânico
Roald Dahl, Fantástico Sr. Raposo é um clássico da literatura
infantil mundial.
Em um vale onde havia três fazendas, alguém está roubando
animais valiosos dos três fazendeiros mais malvados da região:
Boque, Bunco e Bino. Quando descobrem que o ladrão é o Sr.
Raposo, eles decidem bolar um plano para se livrar de uma vez por
todas da família de raposas.

Mas os malvadões vão precisar ser muito astutos, pois mal


imaginam que esta raposa não é boba e tem seu próprio plano
fantástico para escapar da armadilha...

"Esta reedição do clássico de 1970 conta a história do esperto Sr.


Raposo, sua amada esposa e seus quatro filhotinhos, que, juntos,
conseguem ser mais espertos que os fazendeiros mais malvados de
todos os tempos. As livrarias vão considerar ter esta novíssima
reedição em seus catálogos." — Booklist

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A terra dos meninos pelados
Ramos, Graciliano
9788501403629
84 páginas

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Graciliano Ramos, um dos maiores escritores brasileiros do século


XX, traz em seu livro infanto-juvenil, A Terra dos Meninos Pelados, a
história de Raimundo, um menino diferente de todos os outros por
ter um olho preto, o outro azul e a cabeça careca. Cansado de ser
alvo de chacota na escola e nas ruas da cidade, Raimundo parte em
uma viagem fantástica para um lugar onde as pessoas saibam
conviver com as diferenças.

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As bruxas (Ed. especial)
Dahl, Roald
9786584824201
208 páginas

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As bruxas querem trucidar, triturar e sumir com todas as


crianças! Será que vão conseguir? Clássico da literatura infantil
do autor britânico Roald Dahl, conheça As bruxas em uma
edição com capa exclusiva de Isadora Zeferino (@imzeferino).
Este não é um conto de fadas.

É uma história sobre bruxas de verdade.

Elas vestem roupas comuns, têm empregos comuns e se parecem


bastante com pessoas comuns.

Mas estão longe de serem comuns...

O mais importante de tudo é que elas odeiam crianças.

E a Grã-Bruxa, líder de todas as bruxas, tem um plano para fazer


toda e qualquer criança desaparecer do mundo.

Isto é, a não ser que um menino e a sua vovó consigam impedi-la.

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Desastre no casamento real - Diário de uma
princesa improvável - vol. 2
Cabot, Meg
9788501112293
304 páginas

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Meg Cabot convida os leitores a comparecerem a um casamento


real genoviano. A história de Olivia Grace Clarisse Mignonette
Harrison continua nessa nova aventura no segundo livro da série
Diário de uma princesa improvável. Sua meia-irmã, a princesa
Mia Thermopolis, anda tão ocupada governando o país que mal
tem tempo para o próprio casamento. O castelo está tomado por
convidados, fornecedores e membros mais distantes da família
real. Para um evento tão cuidadosamente planejado, parece que
muitas coisas estão dando errado. Com tudo isso acontecendo,
será que a jovem princesa conseguirá impedir que o casamento
real se transforme em um desastre real?

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