Fantástico Sr. Raposo - Roald Dahl
Fantástico Sr. Raposo - Roald Dahl
Fantástico Sr. Raposo - Roald Dahl
D129f
Dahl, Roald
Fantástico Sr. Raposo [recurso eletrônico] / Roald Dahl ; ilustração Quentin
Blake ; tradução Jeferson Luiz Camargo. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Galera Júnior,
2023.
recurso digital
Tradução de: Fantastic Mr. Fox
Formato: epub
Requisitos do sistema: adobe digital editions
Modo de acesso: world wide web
ISBN 978-65-84824-21-8 (recurso eletrônico)
1. Ficção. 2. Literatura infantojuvenil inglesa.. 3. Livros eletrônicos. I. Blake,
Quentin. II. Camargo, Jeferson Luiz. III. Título.
23-85447
CDD: 808.899282
CDU: 82-93(410.1)
FANTASTIC MR. FOX © The Roald Dahl Story Company Limited, 1970. Roald
Dahl é uma marca registrada de The Roald Dahl Story Company Ltd.
ISBN 978-65-84824-21-8
Os três fazendeiros
Sr. Raposo
A caçada
As pás terríveis
Os tratores terríveis
A corrida
“Não vamos deixá-la escapar”
As raposas começam a morrer de fome
O plano do Sr. Raposo
O Galinheiro-Número-Um do Boque
Dona Raposa tem uma surpresa
O Texugo
O superdepósito do Bunco
As dúvidas de Texugo
A adega secreta do Bino
A mulher
A grande festa
Ainda esperando
Os três fazendeiros
Lá embaixo, no vale, havia três fazendas. Seus donos eram homens muito
ricos, mas também muito malvados. Para falar a verdade, os três eram
incrivelmente malvados e mesquinhos. Chamavam-se Boque, Bunco e
Bino.
Boque criava galinhas. Na sua fazenda havia milhares de galinhas. Ele era
gordo como um elefante, já que todos os dias no café da manhã, no almoço
e no jantar Boque comia três frangos assados com bolinhos de carne.
Na fazenda de Bunco eram criados milhares de patos e gansos. Bunco era
pequeno e barrigudo. Era tão baixinho que qualquer poça de água era funda
demais para ele. Seu prato predileto eram bolinhos recheados com patê de
fígado de ganso. De tanto comer os tais bolinhos, Bunco estava sempre com
dor de barriga. E por causa da dor de barriga ele vivia de mau humor.
Bino criava perus e plantava maçãs. Milhares de perus passavam o dia
debaixo das macieiras de seu pomar. Bino nunca comia nada. Em
compensação, bebia garrafas e mais garrafas de vinho de maçã, que ele
próprio fabricava. Era magro como um palito, e o mais inteligente dos três.
Numa colina, acima do vale, havia uma floresta. Na floresta havia uma
árvore imensa. Embaixo da árvore havia uma toca. Nessa toca viviam Sr.
Raposo, Dona Raposa e suas quatro raposinhas.
Todos os dias, ao anoitecer, Sr. Raposo perguntava para Dona Raposa:
— Então, querida, o que vamos comer esta noite? Uma galinha bem gorda
do Boque? Um pato ou um ganso do Bunco? Ou, quem sabe, um belo peru
do Bino?
Assim que Dona Raposa fazia sua escolha, o Sr. Raposo descia para o vale
e, na escuridão da noite, acabava conseguindo o que queria.
Os três fazendeiros ficavam ensandecidos de raiva. Boque, Bunco e Bino
não davam nada de graça, por isso ficavam furiosos quando algo deles era
roubado. Todas as noites cada um dos três pegava sua espingarda e se
escondia num canto escuro da sua fazenda, esperando o ladrão aparecer.
Sr. Raposo, porém, era bem mais esperto do que eles: só se aproximava de
uma das fazendas quando o vento soprava em sua direção. Quando o dono
da fazenda estava escondido por perto, o vento trazia o cheiro dele até o
nariz da raposa. Portanto, quando Boque estava escondido atrás do
Galinheiro-Número-Um, Sr. Raposo sentia o cheiro dele a uns cem metros
de distância, mudava de direção e atacava o Galinheiro-Número-Quatro, do
outro lado da fazenda.
— Maldito bicho piolhento! — berrava Boque.
— Que vontade de esganá-lo! — reclamava Bunco.
— Precisamos matá-lo! — gritava Bino.
— Mas de que jeito? — perguntava Boque. — Como vamos fazer para
agarrar esta raposa sem-vergonha?
Certo dia, limpando lentamente o nariz com seus dedos compridos, Bino
afirmou:
— Eu tenho um plano!
— Até hoje você não teve um plano que prestasse — disse Bunco.
— Cale a boca e escute — esbravejou Bino. — Amanhã à noite nós três
vamos ficar escondidos bem ao lado da toca onde mora a raposa. Vamos
esperar até ela resolver sair. Aí então… bang-bang! Bang-bang!
— Muito espertinho — disse Bunco —, só que nós não sabemos onde fica
a toca.
— Meu caro Bunco, isso eu já descobri — afirmou Bino, que era o mais
esperto dos três. — Fica bem no alto da colina, no meio da floresta, embaixo
de uma árvore enorme…
A caçada
Sr. Raposo subiu pelo túnel escuro até a entrada da toca. Pôs a cara
comprida para fora, sentiu a brisa noturna e aguçou as narinas, tentando
farejar algum perigo.
Avançou alguns centímetros e parou.
Farejou mais uma vez.
Avançou um pouquinho mais. A parte da frente do corpo estava todinha
para fora da toca.
Seu focinho preto não parava de se mexer, para lá e para cá, farejando,
procurando algum cheiro que significasse perigo. Não encontrou nada.
Estava prestes a sair em direção à floresta quando ouviu um barulhinho,
como se alguém tivesse pisado muito de leve em algumas folhas secas.
Sr. Raposo abaixou-se e ficou imóvel, deitado no chão. Aguçou os ouvidos
e permaneceu parado por um bom tempo, mas não ouviu mais nada. “Deve
ter sido um ratinho-do-campo”, pensou ele.
Resolveu avançar um pouco mais, bem devagar. Quando seu corpo já
estava todo para fora da toca, Sr. Raposo deu uma última olhada ao redor,
por precaução. A mata estava escura e silenciosa, e a lua brilhava no céu.
Foi então que seus olhos, ótimos para enxergar no escuro, perceberam um
ligeiro brilho por trás de uma árvore. Não havia dúvidas de que era um
raiozinho prateado da lua refletindo numa superfície de metal. Sr. Raposo
ficou imóvel, observando. O que seria aquilo? E agora estava se movendo!
Subindo, subindo… nossa! O cano de uma espingarda! Mais rápido que uma
faísca, Sr. Raposo pulou de volta para a toca, no mesmo instante em que a
mata inteira parecia explodir ao seu redor. Bang-bang! Bang-bang! Bang-
bang!
A fumaça dos tiros empesteava o ar. Boque, Bunco e Bino saíram do
esconderijo e correram em direção à toca.
— Será que conseguimos? — eles se perguntavam.
Um deles iluminou a entrada da toca com uma lanterna. E, no foco de luz,
ali no chão, os três homens viram espalhados os restos de… um rabo de
raposa. Bino abaixou-se e apanhou um pedaço de pele.
— Pegamos o rabo, mas a raposa escapou — disse ele, jogando para longe
o que tinha sobrado do rabo do Sr. Raposo.
— Maldito bicho piolhento! — exclamou Boque. — Atiramos tarde
demais. Devíamos ter mandado bala assim que ele colocou a cabeça para
fora.
— Agora é que essa raposa vai tomar mil cuidados antes de sair daí outra
vez — afirmou Bunco.
Bino tirou um cantil do bolso, tomou um gole grande de vinho de maçã e
falou:
— Vai demorar pelo menos três dias para ela sair atrás de comida
novamente. Eu é que não vou ficar aqui sentado, esperando. Vamos cavar,
abrir essa toca e arrancar a raposa à força.
— Ah! — exclamou Boque —, agora sim você está dizendo alguma coisa
que preste. Vamos desenterrar a raposa. Sabemos que ela está aí dentro e
vamos pegá-la.
— Estou achando que nessa toca mora uma família inteira de raposas —
disse Bunco.
— Então acabaremos com todas — respondeu Bino. — Vamos pegar as
pás!
As pás terríveis
— Já sei o que fazer! Vamos lá! Não podemos perder tempo! Por que não
pensei nisso antes?
— Pensou no que, papai?
— Raposas cavam muito mais depressa do que gente! — gritou Sr.
Raposo, já começando a cavar. — Ninguém no mundo consegue cavar mais
rápido do que nós! Vamos, cavem, cavem, cavem!
Voava terra por todo lado. Sr. Raposo cavava furiosamente com as patas da
frente. Dona Raposa e as quatro Raposinhas não perderam tempo e
começaram a cavar também.
— Para baixo! — ordenou Sr. Raposo. — Temos que fazer um buraco
bem fundo! O mais fundo possível!
Boque, Bunco e Bino cavaram até o sol nascer. O buraco que fizeram era
tão grande que dentro dele cabia até uma casa. Mesmo assim, não
conseguiram alcançar a raposa. Estavam muito cansados e de mau humor.
— Que droga! — exclamou Boque. — Quem foi que teve essa maldita
ideia?
— Foi o Bino — respondeu Bunco.
Boque e Bunco olharam para Bino, que estava bebendo mais um gole de
vinho de maçã. Ele guardou o cantil sem oferecê-lo aos outros e disse,
furioso:
— Escutem aqui, eu quero aquela raposa! Tenho que pegá-la! Não vou
desistir enquanto ela não estiver pendurada na porta da minha varanda,
mortinha, mortinha! Entenderam?
— É, mas não vai ser desse jeito que vamos conseguir alguma coisa —
disse Boque. — Já estou cheio de ficar aqui cavoucando!
Bunco estava mais mal-humorado do que nunca. Olhou para Bino e
perguntou:
— E então? Será que você não tem mais nenhuma ideia idiota?
— O quê?! — gritou Bino. — Não consigo ouvir.
Bino nunca tomava banho, e por isso seus ouvidos estavam imundos.
Tinha de tudo lá dentro: terra, pedaços de chiclete, cera, moscas mortas. De
tanta sujeira, ele não conseguia ouvir.
— Fale mais alto. — pediu Bino.
— Eu perguntei se você não tem mais alguma das suas ideias estúpidas —
insistiu Bunco, berrando.
Bino coçou a cabeça com as unhas compridas e sujas. Pensou um pouco e
disse:
— Nós precisamos é de máquinas superpotentes para cavar mais rápido e
mais fundo. Precisamos de… escavadeiras mecânicas. Vamos pegar essa
raposa em cinco minutos com uma escavadeira mecânica.
Boque e Bunco tinham de admitir, era uma ótima ideia. Bino estava
orgulhoso de si e começou a dar as ordens:
— Pois muito bem, vamos lá. Boque, você fica aqui e não deixe a raposa
escapar. Eu e Bunco vamos buscar as máquinas. Se essa peste tentar sair daí,
mande bala.
Bino saiu andando na frente e Bunco foi atrás. Boque continuou sentado
no mesmo lugar, com a espingarda apontada para a toca da raposa.
Não demorou muito para Bunco e Bino voltarem. Cada um vinha
dirigindo um trator enorme, desses com escavadeiras mecânicas. Faziam um
barulho infernal. As máquinas eram pretas e pareciam dois monstros
assassinos e desumanos, com uma boca gigantesca escancarada, pronta para
engolir qualquer coisa.
— Lá vamos nós! — gritou Bino.
— Morte à raposa! — berrou Bunco.
As máquinas entraram em ação. Terra e pedras voavam por todo lado, os
arbustos eram arrancados e as flores esmagadas. A árvore que protegia a
toca do Sr. Raposo tremia como gelatina. O barulho era insuportável.
No fundo do túnel, as raposas estavam encolhidas, escutando o rugido
pavoroso que vinha lá de cima.
— O que está acontecendo, papai? — gritavam as Raposinhas. — O que
eles estão fazendo?
Dona Raposa se levantou devagar. Era quem mais estava sofrendo ali,
estava muito fraca e já não conseguia ficar de pé.
— Me perdoem, acho que não vou poder ajudar muito — desculpou-se
ela.
— Você vai ficar aí bem quietinha, querida — disse Sr. Raposo. — Pode
deixar que nós cuidamos disso.
O Galinheiro-Número-Um do Boque
— Agora vamos cavar numa direção muito especial — disse Sr. Raposo.
As quatro Raposinhas prestaram bastante atenção nas ordens do pai e logo
começaram a cavar. O túnel foi crescendo devagarinho.
— Papai, para onde estamos indo? — perguntou uma das Raposinhas.
— Ainda não posso dizer — respondeu Sr. Raposo —, pois o lugar que
espero que possamos chegar é tão maravilhoso que vocês iriam perder a
cabeça com tanta expectativa. Mas, se não conseguirmos (o que é bem
possível), então vocês morreriam de decepção. E não quero decepcionar
vocês, minhas Raposinhas.
Eles trabalharam sem parar. Já não sabiam se era dia ou noite, pois dentro
do túnel era sempre escuro. Finalmente, depois de muito tempo, Sr. Raposo
pediu para pararem.
— Acho que está na hora de dar uma espiada lá em cima — disse ele —,
tomara que eu esteja certo.
Começaram, então, a cavar bem devagarinho para cima, na direção da
superfície. Foram subindo, subindo… até que, de repente, toparam com
alguma coisa sólida. Sr. Raposo se ergueu para tentar descobrir o que era
aquilo.
— É madeira! — exclamou baixinho. — Madeira de assoalho.
— E daí, papai? — perguntou a Raposinha mais velha.
— E daí que, se eu não estiver enganado, isso quer dizer que estamos bem
embaixo da casa de alguém — sussurrou Sr. Raposo. — Agora fiquem bem
quietinhos que eu vou dar uma espiada.
Com todo o cuidado, Sr. Raposo começou a empurrar uma das tábuas do
assoalho. De repente, a madeira despregou do chão, causando um barulhão.
As Raposinhas taparam os olhos e se encolheram, assustadas. Mas nada
aconteceu, e Sr. Raposo empurrou mais uma tábua. Com todo o cuidado do
mundo, ele enfiou a cabeça pela abertura e não conteve um grito de alegria.
De volta ao túnel, eles pararam um pouco para que Sr. Raposo recolocasse
os tijolos na abertura da parede. Enquanto ia tapando o buraco, ele falava
baixinho:
— Ainda consigo sentir o gosto daquele vinho de maçã delicioso — disse
ele — Que sujeitinho sem-vergonha aquele Rato!
— Não tem um pingo de educação — disse Texugo. — Para falar a
verdade, nunca vi um rato bem-educado em toda a minha vida.
— E além disso ele bebe demais — disse Sr. Raposo, colocando o último
tijolo no lugar. — Bom, acabamos! Agora, vamos ao banquete!
Eles pegaram as garrafas de vinho e saíram correndo. Sr. Raposo ia na
frente, seguido pela Raposinha, e por último vinha Texugo. Corriam à toda
pelo túnel. Passaram pelo desvio que levava ao superdepósito do Bunco,
depois pelo que ia dar no Galinheiro-Número-Um do Boque, e então
começaram a subir pelo longo caminho que levava à toca da Raposa.
— Não desanimem! — gritava Sr. Raposo. — Vamos chegar daqui a
pouco! Pensem na comida que nos espera! Pensem neste vinho de maçã
delicioso que estamos levando! Pensem na festa que vamos ter!
Enquanto corria, Sr. Raposo ia cantando:
Estou de volta, e não vou sozinho
Levo amigos, comida e muito carinho.
Quero primeiro beijar minha amada
Depois um pratão de galinha ensopada
E pra terminar uma taça de vinho.