Ação Penal Privada

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AÇÃO PENAL PRIVADA (AÇÃO PENAL PÚBLICA DE INICIATIVA PRIVADA)

Mesmo figurando a infração penal como matéria de interesse público, optou o Estado em delegar ao
particular a iniciativa para o oferecimento da ação penal em situações excepcionais.
O legislador preferiu conceder ao particular a iniciativa do oferecimento da inicial em alguns crimes,
pois entendeu que afetam tão intimamente a vítima que o seu processamento traria a esta
consequências maiores do que a própria infração penal (vitimização secundária).
Para identificarmos as infrações penais que se promovem mediante ação penal de iniciativa privada
basta verificar os dizeres “somente se procede mediante queixa”, ou ainda “nos crimes previstos
neste capítulo somente se procede mediante queixa”.
Como exemplo de infrações penais que reclamam a propositura da ação penal de iniciativa privada,
podemos citar: Crimes contra a honra (art. 145 do CP) e Crime de Dano, contra o patrimônio privado
(art. 163 do CP).
Vale lembrar que a petição inicial da ação penal privada é denominada de queixa ou queixa-crime.

Princípios gerais da ação penal privada


Princípio da conveniência (oportunidade)
Este princípio exprime, praticamente, o contrário do princípio da obrigatoriedade da ação penal
pública, pois enquanto naquela espécie de ação penal o seu titular (MP) estava obrigado a oferecer a
denúncia, nesta fica totalmente a critério de seu titular (ofendido/vítima ou representante legal)
oferecê-la, caso entenda adequado.

Princípio da disponibilidade
Mesmo após oferecer a queixa-crime, o querelante/ofendido ou seu representante legal poderá dela
desistir, entendendo que não tem mais interesse em ver o autor do crime sendo processado,
vigorando, assim, o princípio da disponibilidade.
Referido princípio é o oposto do princípio da indisponibilidade aplicado à ação penal pública, em que
o membro do Ministério Público, após oferecer a denúncia, não pode mais desistir da mesma.
Já o querelante poderá a todo tempo dispor da queixa-crime através das causas extintivas da
punibilidade, aplicadas exclusivamente à ação penal privada, no caso, o perdão do ofendido aceito e a
perempção.

Princípio da indivisibilidade (art. 48 do CPP)


Por tal princípio se tem que a queixa-crime deve ser proposta contra todos os autores e partícipes
que concorreram para a prática da infração penal.
Com efeito, não poderá o titular da ação penal privada optar por oferecer a queixa contra alguns dos
autores em detrimento de outros, dispondo o art. 48 do CPP que a queixa contra qualquer dos
autores do crime obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua
indivisibilidade.
Ao MP incumbe atuar como fiscal da lei.
Segundo Tourinho Filho, “tão importante é esse princípio que se o ofendido renunciar ao direito de
queixa, isto é, se abdicar do direito de promover a ação penal quanto a um dos culpados, a todos se
estenderá sua abdicação, conforme dispõe o art. 49 do CPP”.

Princípio da intranscendência (intransmissibilidade)


É princípio aplicado à ação penal pública e privada.
A interpretação que se faz desse princípio é a de que o oferecimento da ação penal pública (denúncia)
ou privada (queixa) só poderá ser promovida em face da pessoa que seja responsável pela prática da
infração penal, não podendo ser oferecida contra outras pessoas, ainda que tenham alguma
responsabilidade no âmbito civil.
Esse princípio decorre da responsabilidade subjetiva no âmbito penal, em que somente poderão ser
considerados culpados penalmente aqueles que praticaram o delito.

Espécies (modalidades) de ação penal privada


A ação penal privada apresenta-se sob três modalidades (espécies):

a) Ação penal privada exclusiva (propriamente dita/principal)


Esta é a modalidade regra e somente pode ser exercida pela vítima ou quem legalmente a represente,
ou no caso de morte ou ausência declarada por decisão judicial no juízo civil, por qualquer uma das
pessoas citadas no art. 31 do CPP (Cadi – cônjuge, ascendente, descendente ou irmão).
A substituição na titularidade da ação penal privada exclusiva poderá ocorrer antes do oferecimento
da queixa-crime, no prazo de seis meses, contados a partir do fato criminoso ou do conhecimento de
quem seja o seu autor, se antes desconhecido, sob pena de decadência, ou, após o seu oferecimento,
no prazo de sessenta dias do falecimento ou declaração de incapacidade da vítima, sob pena de
perempção, nos termos do art. 60, inciso II, do CPP.
Devemos verificar que ao encontrarmos a frase “somente se procede mediante queixa” ou “nos
crimes previstos neste capítulo somente se procede mediante queixa”, estamos diante de crime de
ação penal privada exclusiva/propriamente dita/principal.
É fato que em todo crime de ação penal privada exclusiva pode haver a substituição da titularidade
pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (Cadi). Na verdade, esta é a característica básica
que a difere da ação penal privada personalíssima.

b) Ação penal privada subsidiária (substitutiva) da pública (art. 29 do CPP e art. 5o, inciso LIX, da CF)
A ação penal privada subsidiária da pública é conhecida como queixa-crime subsidiária ou queixa
subsidiária.
Só ocorrerá essa hipótese de ação penal privada, quando, se tratando de crime de ação penal pública,
o membro do Ministério Público permanecer completamente inerte no prazo para oferecimento da
denúncia, ou seja, não oferece a denúncia, não requer o arquivamento e não requer novas
diligências. Com a inércia, surge para a vítima ou seu representante legal o direito/legitimidade para
oferecer a queixa subsidiária.

c) Ação penal privada personalíssima


A ação penal privada personalíssima cabe exclusivamente ao ofendido, que figura como seu único
titular.
Não será possível, portanto, que a queixa seja oferecida por representante legal ou pelo cônjuge,
ascendente, descendente ou irmão.
Atualmente, o único crime que se processa mediante ação penal personalíssima é previsto no art. 236
do CP (induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento), em que apenas o cônjuge
enganado poderá intentar a ação. Dessa maneira, se vier a falecer, ou for declarado ausente por
decisão prolatada no âmbito civil, haverá uma hipótese de extinção de punibilidade às avessas, isto
porque ninguém mais poderá acionar o autor do delito, não sendo, portanto, punido pelo crime
praticado.
Prazo para oferecimento da queixa-crime (art. 38 do CPP)
O prazo para oferecimento da ação penal privada, em regra, terá início da data do efetivo
conhecimento da autoria delitiva. Com efeito, será contado o prazo de 6 (seis) meses a partir do
conhecimento de quem é o autor do delito, nos casos de ação penal privada exclusiva (propriamente
dita/principal).
Para o caso da ação penal privada personalíssima, só começará a fluir o prazo a partir do trânsito em
julgado da sentença civil que reconhecer o impedimento, ou seja, que anular o casamento, nos
termos do parágrafo único do art. 236 do CP.
Em se tratando de ação penal privada subsidiária (substitutiva), o prazo para oferecimento da queixa
subsidiária também será de seis meses, contudo, contados da perda do prazo para oferecimento da
denúncia pelo MP.
Vale lembrar que a contagem do prazo para oferecimento da queixa, deve ser feito nos moldes do art.
10 do CP, ou seja, deve ser incluído o dia do início (data do conhecimento da autoria delitiva, no caso
de ação penal privada exclusiva e personalíssima; e data da perda do prazo para oferecimento da
denúncia pelo MP, na hipótese de ação penal privada subsidiária da pública).

Aditamento da queixa (arts. 45 e 46, § 2o, do CPP)


Via de regra, o aditamento da queixa é realizado para a correção de erros, devendo fazê-lo o MP ou o
querelante quando entender necessário.
A possibilidade de aditamento da queixa vem prevista nos arts. 45 e 46, § 2o, do CPP.

Causas extintivas da punibilidade exclusivas da ação penal privada (art. 107 do CP)

Renúncia (art. 107, inciso V, 1o parte, do CP)


A renúncia é causa extintiva da punibilidade, prevista no art. 107, inciso V, 1a parte, do CP, somente
gerando efeitos se manifestada antes do início da ação penal privada. Vale lembrar ainda que essa
causa extintiva deverá ocorrer dentro do prazo decadencial de 6 (seis) meses para o oferecimento da
queixa-crime.
Ricardo Antonio Andreucci define a renúncia como “a abdicação do ofendido ou de seu representante
legal do direito de promover a ação penal privada”.
Cabe lembrar que o art. 49 do CPP, ao tratar desse tema, impõe que o oferecimento da renúncia em
relação a um dos autores do crime a todos se estenda.
Já quanto sua classificação, poderá a renúncia ser expressa ou tácita.
A renúncia expressa, nos termos do art. 50 do CPP, é realizada através de declaração assinada pela
vítima, por seu representante legal ou ainda por procurador com poderes especiais.
A renúncia tácita, por outro lado, consiste na prática de ato incompatível com o interesse de oferecer
a queixa contra o autor da infração penal, como no caso do ofendido que fica noivo da autora do
crime contra a sua honra, antes de cessar o prazo para oferecimento da ação penal privada.
Vale dizer que, por força do art. 57 do CPP, a renúncia tácita aceita todos os meios de prova, pois em
alguns casos pode haver dúvida sobre a renúncia, devendo ser produzida prova para tanto.
Por força da Lei 9.099/1995, caberá renúncia na ação penal pública condicionada, nas infrações
penais de menor potencial ofensivo, quando há composição dos danos civis devidamente
homologada, de acordo com o art. 74, parágrafo único. Endossando esse entendimento encontramos,
entre outros, Damásio Evangelista de Jesus e Flávio Monteiro de Barros.
Em sentido contrário, entendendo que a renúncia só cabe na ação penal privada, Julio Fabbrini
Mirabete.

Perempção (art. 107, inciso IV, do CP)


A perempção é causa extintiva da punibilidade, prevista no art. 107, inciso IV, do CP que,
diversamente da renúncia, incide após o oferecimento da ação penal privada.
Importa, assim, na perda do querelante do direito de continuar promovendo a ação privada, em
virtude da sua inércia, desídia, desatenção. Nesses termos, havendo pluralidade de querelantes, a
perempção atingirá individualmente aquele que se demonstrou inerte.
A perempção se aplica única e exclusivamente à ação penal privada exclusiva, pois na ação penal
privada subsidiária da pública, a desídia do querelante não ocasiona a extinção da punibilidade do
querelado, facultando-se ao MP retomar o curso da demanda (vale lembrar que, na ação penal
privada subsidiária da pública, há a atuação do querelante em face do não oferecimento da denúncia
pelo MP no prazo legal).
Todas as hipóteses de perempção estão elencadas no art. 60 do CPP, em um rol taxativo:
I – quando iniciada a ação penal privada, o querelante deixa de promover o andamento do processo
durante trinta dias seguidos;
II – quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para
prosseguir no processo, dentro do prazo de sessenta dias;
III – quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a
que deva estar presente, ou deixar de formular pedido de condenação nas alegações finais;
IV – quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.

Perdão do ofendido aceito (art. 107, inciso V, 2o parte, do CP)


O perdão do ofendido aceito é causa extintiva da punibilidade prevista no art. 107, inciso V, 2o parte,
do CP, que apenas incidirá após o oferecimento da ação penal privada e antes do trânsito em julgado
da sentença penal condenatória.
O perdão opera, na verdade, como uma desistência do prosseguimento do feito ou como o
desinteresse no tocante à uma condenação irrecorrível contra o querelado.
Contudo, consiste em ato bilateral, ou seja, só terá o efeito de extinguir a punibilidade se for aceito
pelo querelado. Desta forma, não basta o querelante conceder o perdão ao querelado, devendo este
aceitá-lo para que produzam seus jurídicos efeitos.
Tratando-se do concurso de pessoas, o perdão ofertado a um dos querelados, a todos se estenderá;
em outras palavras, se o querelante ofertou o perdão a um dos agentes, mas não aos outros, todos
terão a oportunidade de aceitar ou rejeitar o perdão, nos moldes do art. 51 do CPP.
A aceitação do perdão, por outro lado, é ato personalíssimo e somente produzirá seus efeitos em
relação ao querelado que aceitou o perdão, devendo o processo continuar, ou a sentença
condenatória transitar em julgado, se o feito estiver nesta fase, em relação àqueles que rejeitaram o
perdão.
De certo há sentido em não aceitar o perdão, pois imagine aquele indivíduo contra quem fora
proposta uma ação penal privada, mas que não cometeu o delito que lhe está sendo imputado na
queixa-crime. Certamente este não aceitará o perdão, provará sua inocência e poderá ingressar com
as medidas judiciais cabíveis contra o autor da queixa.
Ainda sobre a aceitação do perdão do ofendido, importante ressaltar que esse poderá ser aceito pelo
querelado por meio de procurador com poderes especiais, nos termos do art. 55 do CPP.
Quanto à sua classificação, o perdão do ofendido poderá ser expresso, tácito, processual e
extraprocessual.
Será classificado como expresso o perdão efetivado por meio de declaração expressa nos autos,
devendo o querelado ser intimado para, no prazo de três dias, manifestar-se sobre a proposta, de
acordo com o disposto na 1o parte do art. 58 do CPP.
Por sua vez, será tácito quando, notificado do perdão concedido pelo ofendido, o querelado
permanecer em silêncio no prazo legal de três dias, nos termos do art. 58, 2a parte, do CPP.
Finalmente, o perdão classificado como processual é aquele que ocorre dentro dos autos do
processo, enquanto que o extraprocessual ocorre fora dos respectivos autos, devendo constar de
declaração assinada pelo querelado, por seu representante legal ou procurador com poderes
especiais, de acordo com o disposto no art. 59 do CPP.

Reconhecimento das causas extintivas da punibilidade de ofício (art. 61 do CPP)


As causas extintivas de punibilidade, por consistirem em matéria de ordem pública, podem ser
reconhecidas de ofício pelo juiz. Tal reconhecimento pode ocorrer em qualquer fase do processo, nos
moldes do caput do art. 61 do CPP.
Logo, mesmo não havendo pedido expresso da parte interessada, deverá o magistrado reconhecer
extinta a punibilidade do agente.
Tal reconhecimento se dará nos autos principais, quando houver pedido da parte interessada, não
necessitando autuá-lo em autos apartados, isto porque, por se tratar de matéria de ordem pública,
resta inaplicável o parágrafo único do art. 61 do CPP.

CURY, Rogério; CURY, Daniela. Série Método de Estudo OAB - Processo Penal. Rio de Janeiro: Grupo
GEN, 2018.

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