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Título: Anastomose coloanal primária com reservatório colônico e ileostomia protetora

versus anastomose coloanal com maturação tardia à Simonsen; comparação resultados


perioperatórios e da qualidade de vida.

Introdução: O avanço técnico na cirurgia colorretal e aperfeiçoamento dos princípios


oncológicos, definindo margens oncológicas distais de 1 a 2 cm, ao invés de 5 cm,
possibilitou a confecção de anastomoses coloanais, diminuindo a incidência de colostomia
definitivas, possibilitando o tratamento sem prejuízos dos objetivos oncológicos. Entretanto, o
tratamento da neoplasia de reto ainda é desafiador, com grande dificuldade técnica e grande
receio na melhor abordagem cirúrgica¹.
Há diferentes técnicas cirúrgicas no tratamento do adenocarcinoma de reto ultra baixo como
excisão local, ressecção anterior baixa transabdominal e amputação abdominoperineal. A
escolha da abordagem depende do acomentimento locorregional, margens radiais e distais,
distância da borda anal, sempre respeitando os limites máximos ao redor do reto
possibilitando excisão total do mesorreto e margens livres. A margem distal é o grande
desafio na escolha da abordagem cirúrgica, devido à dificuldade técnica, intercorrências
anastomóticas, necessidade de ostomias protetoras, além do aumento de morbidade
cirúrgica².
A anastomose coloanal primária a menos de 5 cm da borda anal são o grupo de maior risco
para deiscencia, podendo ultrapassar os 30 % em mãos pouco experiente³.
Alternativa à anastomose coloanal primária, principalmente para pacientes que recusam o
uso de ostomias ou aqueles com risco aumentado de deiscência é a anastomose de
maturação tardia à Simonsen, técnica pouco utilizada nos dias atuais, descrita em 1960,
permite facilidade técnica, taxa de deiscência baixas, não necessidade ostomia proteção e
preservação esfincteriana 4. Entretanto, o paciente permanece com coto retal na região
perineal por 14 dias, risco de estenose e maior prevalência de incontinência. A técnica
consiste na realização da retossigmoidectomia videolaparoscópica com excisão total do
messorreto (ETM), o reto é amputado mantendo margem distal do tumor > 1 cm, feito a
mucosectomia circunferencial do reto remanescente acima da linha pectínea e exteriorização
segmento colônico pelo anus de aproximadamente 5 cm. Fixado com 4 pontos cardinais
dados entre o anel anorretal e a camada seromuscular do cólon rebaixado, após 14 dias é
feita amputação do segmento extra do cólon na altura da linha pectínea. A anastomose é
confeccionada por segunda intenção, provocada pelo contato com a serosa e submucosa,
não sendo necessário sutura manual.
Independente da técnica utilizada e avanços na terapias oncológicas, a cirurgia ainda é a
opção com maior possibilidade curativa, no entanto, os distúrbios funcionais constituem um
grande problema para muitos pacientes, com sintomas que variam de episódios diários de
incontinência a defecação obstruída e constipação. Embora tais sintomas tenham um
impacto imenso na qualidade de vida do paciente, atualmente não há tratamento específico.
Em vez disso, o manejo é empírico e baseado em sintomas, usando terapias existentes para
incontinência fecal, urgência fecal e distúrbios evacuatórios retais. Tais sintomas têm sido
coletivamente referidos como síndrome de ressecção anterior baixa (LARS)5.

Objetivo: Comparar resultados perioperatórios e a prevalência da síndrome ressecção


anterior baixa(LARS) em pacientes com câncer de reto ultra baixo submetidos ao tratamento
cirúrgico utilizando anastomose coloanal com bolsa em J e ileostomia protetora versos
anastomose coloanal à Simonsen.
Metodologia: Foi realizado um estudo coorte retrospectivo com levantamento de dados
contidos nos prontuários e aplicação do Score de LARS para avaliação da qualidade de vida
nos pacientes com diagnóstico adenocarcinoma reto, estadiamento T2-T4, Nx, M0, distando
no máximo à 5 cm da borda anal, com margem distal de no minimo 1 cm e submetidos a
radioquimioterapia neoadjuvante (short course), associado à ressecção anterior baixa
videolaparoscópica com anastomose coloanal com bolsa em J e ileostomia derivativa(
grupo1) versos anastomose colonanal à Simonsen( grupo2), entre os anos 2016-2021, no
Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Foram selecionados 53
pacientes, sendo excluídos 9 pacientes que perderam seguimento por motivos não
relatados, 8 pacientes que vieram a óbito, por motivos não relacionados à cirurgia, 4
pacientes com alterações na manometria realizada previamente à cirurgia, não sendo
realizada anastomose. Divididos em dois grupos de acordo com a anastomose realizada e
comparada às complicações perioperatórias, taxa mortalidade, eficácia oncológica, tempo de
internação, custo ato cirúrgico, estenose anastomótica e prevalência de LARS. O estudo foi
autorizado pelo comitê de ética e pesquisa e regulamentado pela plataforma Brasil.

Resultados: Foram selecionados 32 pacientes, sendo 18 homens (56,25%) e 14


mulheres (43,75%) divididos em dois grupos. O primeiro grupo composto por pacientes
com anastomose coloanal primária com 19 pacientes (59,3%) e o segundo com
anastomose à Simonsen com 13 pacientes (40,7%). comparamos a prevalência das
complicações perioperatórias, como deiscência da anastomose, abscesso pélvico,
hematoma pélvico, necrose cólon rebaixado, presença distúrbio hidroeletrolítico,
intercorrências fechamento ileostomia e na amputação coto colônico.
A prevalência de deiscência da anastomose no 1° grupo foi de 4 pacientes (21,05%),
sendo associado a abscesso pélvico em 2 casos, ambos necessitando abordagem
cirúrgica. O 2° grupo a deiscência é avaliada após a amputação do coto, presente em 2
pacientes (15,38%), com resolução espontânea após uso de antibióticos.
Relatados 1 (5,26%) pacientes com hematoma pélvico no 1° grupo e nenhum caso no 2°
grupo.
Avaliado presença necrose cólon rebaixado, no 1° grupo foi evidenciado através
secreção mucosanguinolenta ou mucosa isquêmica em 1 paciente de cada grupo.
Encontramos em 9 pacientes (47,36%) algum distúrbio hidroeletrolítico no 1° grupo e
no 2° grupo pacientes 4 (30,76%).
A deiscência no fechamento da ileostomia ocorreu em 2 (10,52%) pacientes, hérnia
incisional e em 1 paciente (5,26 %). Apenas a deiscência foi encontrada como
intercorrência na amputação do coto.
Comparando a taxa de mortalidade, no 1° grupo de 10,52%, secundário a
complicação séptica por abscesso pélvico e hérnia interna precoce. No 2° grupo, tivemos um
caso, secundário fístula entérica acidental. Avaliando a eficácia oncológica entre os
grupos, número de linfonodos (<12), margem distal comprometida não foram descritas.
Margem radial acometida ocorreu em 3 (15,7%) pacientes no 1° grupo e 7 (53,84 %)
casos no 2° grupo. Somando o tempo de internação da retossigmoidectomia e fechamento
posterior da ileostomia, obtivemos uma média de 12 dias. A anastomose à Simonsen, o
paciente não aguarda internado, recebe alta dependendo das condições clínicas e após 14°
dias retorna para amputação, sendo observado uma média de 9 dias de internação. Não
tivemos acesso aos custos do ato cirúrgico, acreditamos ser superior no 1° grupo
justificado pelo uso dos grampeadores lineares. Utilizamos o score LARS, para avaliar a
qualidade de vida pós-operatória, foi aplicado questionário e identificamos a prevalência
global de 72% . Comparando os grupos a prevalência foi de 68% versus 76% . Estenose
anastomótica, foi avaliada através do exame físico, presente em 2 pacientes do 1° grupo e
38,4% no segundo grupo.

Discussão:

A segurança da cirurgia colorretal melhorou drasticamente nos últimos 50 anos, devido a


melhorias no preparo pré-operatório, profilaxia antibiótica, técnica cirúrgica e manejo
pós-operatório. No entanto, complicações continuam a ocorrer e uma das maiores
preocupações pós operatórias é a deiscência anastomótica, que pode variar de 3,6 a 16%
podendo chegar a até 30% em obesos, pelve estreita, canal alongado, desnutridos, reto
remanescente menor que 1 cm da linha pectínea, tumores localmente avançados³. Nos
grupos avaliados a incidência foi razoavelmente menor no segundo grupo e não necessitou
de reabordagem cirúrgica, pois como a maturação secundária possibilita drenagem
espontânea de conteúdos pélvicos como hematoma e pus, porém os pacientes se queixam
da dificuldade higiênica. O hematoma pélvico presente em até 4,8 % das cirurgias retais ou
pélvicas 6, foi evidenciado apenas no primeiro grupo em 5,26 %. A isquemia do segmento
colônico abaixado para anastomose, está associada a múltiplos fatores como aterosclerose,
condições nutricionais, fatores coagulação, estresse cirúrgico alterações anatômicas na
arcada de riolan, tração cirúrgica, pode ocorrer em até 2% dos casos 7. Nos grupos
avaliados, não houve diferença relevante, visto que o paciente do primeiro grupo, necessitou
ser reabordado e optamos pelo abaixamento colônico sugerido por Simonsen e no segundo
grupo foi realizado apenas tração cólon rebaixado por via perineal, delimitando a isquemia e
não impossibilitando a anastomose por segunda intenção.
Pacientes submetidos a grandes cirurgias, apresentam a possibilidade desenvolver algum
distúrbio eletrolítico em até 55% dos casos 9, devido a perdas hídricas, hemólise, trauma,
íleo paralítico. A prevalência na cirurgia colorretal não está bem caracterizada, dos 32
pacientes avaliados 40,26% apresentaram algum distúrbio, sendo maior no primeiro grupo
com 47,6%. Fato que pode ser agravado a grande perda causada pela ileostomia somada
aos fatores já citados, além disso A desidratação afeta até 30% dos pacientes após a
criação da ileostomia de alça e é a causa mais comum de readmissão hospitalar após a
cirurgia de ileostomia 8,10.
A necrose estromal no pós-operatório imediato chega a 14, a mobilização adequada do
intestino, a preservação do suprimento sanguíneo para o estoma são fatores importantes
para evitar essa complicação 11. Outras complicações como desabamento, sangramento,
estenose não foram evidenciadas no presente estudo. A taxa de Hérnia incisional no
fechamento de ostomias pode chegar a 18%12, sendo encontrado em 10,52% dos pacientes
com o trânsito intestinal reconstruído. A taxa de hérnias incionais pode ser reduzido com a
utilização de tela, caindo para 8% 13. Complicação ainda mais grave é a fístula
anastomótica. Ocorre geralmente em até 3% das enteroanastomoses, podendo chegar a
9,4% no fechamento da ileostomias, devido hérnia incisional, dissecção traumática das alças
de delgado 14.
A mortalidade da cirurgia colorretal ainda é algo assustador, podendo chegar em até 35%
incluindo múltiplos fatores perioperatórios 11. A taxa de complicação entre os grupos foi
semelhante, seria necessário avaliar outros fatores para assegurar qual técnica é melhor.
A incidência de lesão do intestino delgado durante a cirurgia colorretal é entre menos de 1 e
3% para técnicas abertas e laparoscópicas. O risco de enterotomia inadvertida aumenta com
a cirurgia abdominal prévia, enquanto a lesão do duodeno é mais provável de ocorrer
durante a mobilização do cólon direito 15 16. A lesão do intestino delgado ocorreu em 3,1 %
no presente estudo .
Os padrões oncológicos são a principal meta a ser alcançada durante a cirurgia, como
margem distal, número de linfonodos, margem radial,entre outras não houve diferença entre
os grupos. O acometimento da margem radial mais prevalente no segundo grupo é
justificado pela opção em realizar a anastomose a Simonsen em casos com estádio T4 ,
gerando viés nos dados.
O tempo de internação em cirurgias colorretais em média pode chegar em até 18 dias 17, a
média de internação apresentada foi de 11 dias, sendo 12 dias para o primeiro grupo e 9
dias para o segundo grupo. Importante ressaltar a importância da recuperação multimodal
após a cirurgia, propondo uma abordagem integrada e multidisciplinar que requer
participação e comprometimento do paciente, cirurgiões, anestesiologistas, especialistas em
dor, equipe de enfermagem, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, serviços sociais e
administração hospitalar 18.
Estima-se que entre 25 e 80 % dos pacientes desenvolvam um ou mais sintomas de LARS
após uma cirurgia retal poupadora de esfíncter19. Cerca de 50% dos pacientes ainda relatam
sintomas mais de 10 anos após a cirurgia20. A prevalência total encontrada foi de 72%,
apresentando pouca diferença entre os grupos.

Conclusão:
O câncer de reto baixo apesar de inúmeros avanços ainda é extremamente mórbido, com
grande dificuldade técnica e grande incidência de ostomias definitivas, principalmente em
estadiamento localmente avançado. Comparando os resultados das duas técnicas,
observamos que a anastomose à Simonsen apresentou resultados semelhantes nos
parâmetros oncológicos como número de linfonodos e margem distal, além de apresentar
menor taxa distúrbios eletrolíticos e menor tempo de internação. Porém apresentou maior
taxa estenose anastomótica e maior pontuação para LARS.

Referência:

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