Livro Parque Natural PDF

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UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO

José Carlos Carles de Souza


Reitor
Rosani Sgari
Vice-Reitora de Graduação
Leonardo José Gil Barcellos
Vice-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação
Bernadete Maria Dalmolin
Vice-Reitora de Extensão e Assuntos Comunitários
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Vice-Reitor Administrativo

UPF Editora
Karen Beltrame Becker Fritz
Editora

CONSELHO EDITORIAL CORPO FUNCIONAL


Alvaro Della Bona Cinara Sabadin Dagneze
Carme Regina Schons Revisora-chefe

Cleci Teresinha Werner da Rosa Daniela Cardoso


Denize Grzybovski Revisora de textos

Elci Lotar Dickel Graziela Thais Baggio Pivetta


Giovani Corralo Revisora de textos

João Carlos Tedesco Sirlete Regina da Silva


Designer gráfico
Jurema Schons
Leonardo José Gil Barcellos Rubia Bedin Rizzi
Diagramadora
Luciane Maria Colla
Paulo Roberto Reichert Carlos Gabriel Scheleder
Auxiliar administrativo
Rosimar Serena Siqueira Esquinsani
Telisa Furlanetto Graeff
Carla D. Tedesco
Noeli Zanella
(Orgs.)

Parque Natural
Municipal de Sertão

2014

EDITORA
[email protected]
www.upf.br/editora
Copyright© das autoras

Cinara Sabadin Dagneze


Daniela Cardoso
Graziela Thais Baggio Pivetta
Revisão de textos e revisão de emendas
Sirlete Regina da Silva
Projeto gráfico e produção da capa
Rubia Bedin Rizzi
Diagramação

Este livro, no todo ou em parte, conforme determinação legal, não pode ser reproduzido por qual-
quer meio sem autorização expressa e por escrito do(s) autor(es). A exatidão das informações e dos
conceitos e as opiniões emitidas, as imagens, as tabelas, os quadros e as figuras são de exclusiva
responsabilidade do(s) autor(es).

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CEP 99052-900 - Passo Fundo - RS - Brasil
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Editora UPF afiliada à

Associação Brasileira
das Editoras Universitárias
Agradecimentos

À Universidade de Passo Fundo (UPF), pelo apoio aos pro-


jetos de pesquisa e extensão dos professores e pelo investimento
na formação de seus alunos por meio da concessão de bolsas
FUPF e Pibic. Também pela disponibilização de toda infraestru-
tura de laboratórios e de campo.
Aos estagiários do laboratório de Ecologia e Herpetologia
e acadêmicos do curso de Ciências Biológicas da Universidade
de Passo Fundo, pelo apoio nas atividades de campo.
À Prefeitura Municipal de Sertão, que, em diferentes ges-
tões, tem investido nas atividades desenvolvidas no Parque Na-
tural Municipal de Sertão.
À comunidade do Engler, especialmente ao Sr. Jose Lopes
que nos guiou, sempre com muita disponibilidade em antigas
trilhas. Ao Sr. Oldemar e Dona Chica pelo uso da propriedade
nos acampamentos da equipe de herpetologia e que sempre nos
receberam com carinho.
Ao Conselho de Pesquisa e Desenvolvimento (CNPq),
pelo auxílio financeiro nos estudos da herpetofauna (processo
n. 475796/2007-1), e pela bolsa de produtividade em pesquisa
concedida a R.L Cansian.
Ao Ibama/Sisbio, pelas licenças concedidas para os estu-
dos da herpetofauna (n. 14543-1/2009 e n. 26826-1/2011) e dos
mamíferos (n. 20110-1).
À Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das
Missões (URI-Erechim), pelo apoio financeiro e logístico ao de-
senvolvimento de projetos que envolvem a floresta, por meio do
Programa de Pós-Graduação em Ecologia. J. C. Budke agradece
à Fapergs e ao CNPq.
Ao Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente
(Comdema) do município de Sertão, que entendeu a iniciativa
da publicação deste livro, subsidiando-a.
Sumário

Apresentação........................................................................10
Capítulo 1
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão...................13
Introdução.................................................................................. 13
Caracterização geral da área..................................................... 14
Histórico de criação e dispositivos legais................................... 16
Agrovila Incra................................................................................... 16
Mudanças no nome da UC.............................................................. 18
Parcerias na busca pela preservação ambiental............................. 22
O papel do Ministério Público na gestão da UC.............................. 24
Perspectivas para a conservação.............................................. 25
Referências................................................................................ 26

Capítulo 2
Conservação, uso público e potencial de impacto
econômico no Parque Natural Municipal de Sertão:
um desafio que envolve a comunidade.................................28
Introdução.................................................................................. 28
Material e métodos .................................................................... 30
Potencial de visitação: capacidade de carga das trilhas................. 30
Potencial de impacto econômico local relacionado à visitação....... 32
Participação comunitária ................................................................. 32
Resultados e discussão............................................................. 32
Potencial de visitação do Parque..................................................... 32
Potencial de impacto econômico local............................................. 34
Participação comunitária ................................................................. 35
Perspectivas para conservação................................................. 38
Referências................................................................................ 39
Capítulo 3
As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão............41
Introdução.................................................................................. 41
Material e métodos..................................................................... 43
Coleta e análise dos dados.............................................................. 43
Resultados ................................................................................ 46
Composição florística e estruturação florestal................................. 46
Variações no gradiente borda-interior.............................................. 53
Discussão................................................................................... 57
Composição florística e estruturação florestal................................. 57
Variações no gradiente borda-interior.............................................. 60
Perspectivas para conservação................................................. 64
Referências................................................................................ 65

Capítulo 4
Anfíbios anuros do Parque Natural Municipal de Sertão......69
Introdução.................................................................................. 69
Material e métodos..................................................................... 71
Amostragem..................................................................................... 71
Análise de dados.............................................................................. 71
Resultados e discussão............................................................. 72
Perspectivas para a conservação.............................................. 78
Referências................................................................................ 79

Capítulo 5
Répteis do Parque Natural Municipal de Sertão...................82
Introdução.................................................................................. 82
Material e métodos..................................................................... 83
Análise de dados.............................................................................. 84
Resultados e discussão............................................................. 84
Perspectivas para a conservação.............................................. 87
Referências................................................................................ 88

Capítulo 6
Avifauna do Parque Natural Municipal de Sertão.................90
Introdução.................................................................................. 90
Material e métodos..................................................................... 91
Resultados e discussão............................................................. 92
Perspectivas para conservação................................................. 99
Referências.............................................................................. 100
Capítulo 7
Diversidade β de roedores e a conservação de
remanescentes florestais do Rio Grande do Sul.................102
Introdução................................................................................ 102
Material e métodos................................................................... 104
Análise de dados............................................................................ 106
Resultados e discussões......................................................... 107
Perspectivas para a conservação.............................................114
Referências...............................................................................117

Capítulo 8
Mamíferos do Parque Natural Municipal de Sertão............122
Introdução................................................................................ 122
Materiais e métodos................................................................. 123
Amostragem................................................................................... 123
Resultados e discussão........................................................... 124
Perspectivas para conservação............................................... 129
Referências.............................................................................. 130
Apresentação

[...] Isso nós sabemos. Todas as coisas são conectadas como o sangue
que une uma família. O que acontecer com a terra acontecerá com
os filhos e filhas da terra. O homem não teceu a teia da vida, ele é
dela apenas um fio [...].
(Versão de carta atribuída a um cacique indígena Seattle,
para o presidente dos EUA)

Unidades de conservação (UCs) são áreas naturais passí-


veis de proteção por suas características especiais – Sistema Na-
cional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), lei
n. 9.985/2000. As UCs têm a função de proteger populações,
habitats e ecossistemas ecologicamente viáveis do território na-
cional, preservando o patrimônio biológico existente. Também,
garantem usos indiretos e sustentáveis dos recursos naturais de
forma racional e ainda propiciam o desenvolvimento de outras
atividades econômicas às comunidades do entorno.
O Parque Natural Municipal de Sertão, com seus 570 ha,
é uma das maiores Unidades de conservação do norte do es-
tado do Rio Grande do Sul e contribui para a preservação de
um grande número de espécies animais e vegetais pertencentes
ao bioma Mata Atlântica. Entretanto, unidades de conservação,
para alguns setores da sociedade, foram associadas à ideia de
locais improdutivos, desprovidos de valor monetário. No entan-
to há valores indiretos, provenientes da conservação do territó-
rio e das espécies relacionadas àquele ambiente e seu entorno,
que, nesse momento, são incomensuráveis. Podemos citar casos
como a preservação das nascentes e da qualidade da água, o
Carla D. Tedesco, Noeli Zanella

controle climático e a manutenção da biodiversidade, os quais


vão muito além da valoração econômica e ambiental.
O Parque é o patrimônio abordado nesta obra, está sob a
gestão do município de Sertão e apresenta desafios e possibili-
dades, os quais ousamos apresentar e discutir.
Os capítulos que integram este livro não devem ser vistos
de forma isolada, pois apresentam um conjunto de resultados e
de informações que contribuem para o conhecimento da flora,
da fauna e da gestão. A obra apresenta também aspectos históri-
cos da criação do Parque, aspectos relacionados ao uso público
e ao seu potencial de impacto econômico, procurando oferecer
uma reflexão a respeito da biodiversidade. Além disso, aponta
perspectivas para a conservação da biodiversidade com respeito
e ética.
No primeiro capítulo, o Parque é situado no contexto da
região e do município, registrando os diferentes momentos da
sua história, assim como o importante envolvimento e compro-
misso de entidades regionais.
No capítulo seguinte, são abordados aspectos de uso in-
direto, como a visitação e o envolvimento da comunidade, os
quais são valorizados sem, no entanto, que seja preterida a con-
servação do Parque.
O terceiro capítulo destaca a vegetação arbórea, apresen-
tando informações a respeito do seu potencial de regeneração.
O texto avalia a composição da flora, a estrutura florestal e as di-
ferenciações que ocorrem ao longo do gradiente borda-interior
da vegetação arbórea, procurando verificar se a floresta reflete
as alterações advindas do efeito de borda.
A diversidade da fauna é outro assunto abordado em vários
capítulos, nos quais são ressaltadas informações importantes de
espécies associadas à floresta de araucária.
Do quarto ao oitavo capítulo são apresentados os grupos
da fauna, dentre os quais estão os anfíbios anuros, os répteis, as
aves, os roedores e os mamíferos.

- 11 -
Parque Natural Municipal de Sertão

É importante salientar que esta produção não tem a pre-


tensão de apresentar todas as espécies presentes no Parque, e
foram utilizadas diferentes metodologias para cada estudo.
Desejamos que este livro contribua com a conservação da
biodiversidade e que possamos ter outros olhares em relação
aos remanescentes de nossos ambientes naturais, por isso, a to-
dos, uma boa leitura.

Carla D. Tedesco e Noeli Zanella


Organizadoras

- 12 -
Capítulo 1
Criação do Parque Natural
Municipal de Sertão

Laura Benetti Slaviero*

Introdução
A história do Parque Natural Municipal de Sertão se con-
funde e se entrelaça com a história do Município de Sertão e,
antes ainda, com a chegada da estrada de ferro à região do Pla-
nalto Médio. Junto com os trilhos de ferro, vieram os imigrantes
europeus que fundaram a Seção Sertão, um povoado que per-
tencia ao distrito de coxilha, município de Passo Fundo. A par-
tir de então, a exploração madeireira foi adentrando nas vastas
áreas de mata ainda existentes nesse local, primeiramente como
uma necessidade básica de abertura de terras para moradias e
pequenas lavouras, e depois, movimentada pelo comércio ma-
deireiro instalado na região.
No início da década de 1960, os moradores da Seção Sertão
organizaram-se com o objetivo de emancipar o local por meio
de um plebiscito. Foi em 5 de novembro de 1963, conforme a lei
n. 4.597, que o então governador do estado, Sr. Ildo Meneghetti,
reconheceu Sertão como município. Nessa época, a região ain-

*
Bióloga. Mestre em Ecologia. Licenciadora Ambiental da Prefeitura Municipal
de Sertão - RS.
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

da era coberta por extensas matas de pinheiros, as quais foram,


nos primeiros tempos de povoamento, a principal fonte de ri-
queza de seus habitantes. Entre essas áreas, duas destacavam-se
pelo tamanho e pela exuberância, despertando o interesse de
muitos, tanto no sentido de comércio, quanto de preservação.
Tempos depois, com a organização da Agrovila Incra e com
o crescente interesse da administração municipal da época pela
preservação ambiental, houve a doação desses dois fragmentos,
por parte da União, para que o município ficasse responsável
por sua gestão. Desde então, o Parque Natural Municipal de Ser-
tão passou por vários momentos, os quais serão, brevemente,
relatados neste capítulo.

Caracterização geral da área


O Parque Natural Municipal de Sertão (PNMS) (Figu-
ra 1), caracteriza-se como pertencente à formação florestal
do tipo Floresta Ombrófila Mista, integrante do bioma Mata
Atlântica (Oliveira-Filho et al., 2006), conforme aprofunda-
mento apresentado no terceiro capítulo. É constituído de
duas áreas florestadas que totalizam 590,80 ha, localizados na
divisa entre as regiões do Alto Uruguai e do Planalto Médio,
ambas no norte do Rio Grande do Sul (coordenada central
da área maior 28°02’31” S, 52°13’28” W) (Figura 2). Sua área
está inserida na Bacia Hidrográfica dos rios Apuaê-Inhandava,
muito próxima à divisa com a Bacia Hidrográfica do rio Passo
Fundo. O Parque representa a maior área de mata nativa e a
segunda maior UC do norte do estado, perdendo em extensão
apenas para a Flona de Passo Fundo, localizada no municí-
pio de Mato Castelhano. A área apresenta relevo ondulado
com uma altitude aproximada de 650 m. O solo é uma associa-
ção predominante de Latossolo Vermelho Distrófico Típico
e Latossolo Vermelho Aluminoférrico, ou seja, solos profun-
dos, homogêneos e altamente intemperizados, com Neossolo

- 14 -
Laura Benetti Slaviero

Regolítico Eutrófico caracterizado como um solo mais novo,


pouco desenvolvido (Streck et al., 2008). O clima apresenta
temperatura média anual de 17,5 ºC, com precipitação média
anual de 1.800 mm, em regime de chuvas bem distribuídas
durante o ano. A área tornou-se um remanescente florestal
isolado com a ocupação da área de entorno pela exploração
madeireira e pelo preparo do solo para cultivo agrícola, fato
que aconteceu no decorrer da década de 1960.
À primeira vista, as florestas com pinheiros manifestam-se
em sua máxima pureza, em forma de dois grandes fragmentos.
Percebe-se a divisão inconfundível em dois andares de floresta,
o inferior de árvores de meia altura e algumas mais altas, e o su-
perior dominado pela Araucaria angustifolia Bertol Kuntze. Em
um olhar mais próximo, podem ser avistadas diversas espécies
de aves, pequenos e médios mamíferos e vários outros grupos
de animais que compõem a fauna nativa local, a qual será breve-
mente descrita nos capítulos que seguem.

Fonte: Laura B. Slaviero.


Figura 1 – Vista lateral do Parque Natural Municipal de Sertão.

- 15 -
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

Fonte: Relatório Preliminar do Plano de Manejo do PNMS, Florestal Alto Uruguai, 2014.

Figura 2 – Mapa de Localização do Município de Sertão e do Parque Natu-


ral Municipal de Sertão.

Histórico de criação e dispositivos legais


Agrovila Incra
Próximo à sede do município de Sertão, às margens da
RS 135, existia uma estação experimental da Embrapa, bem
como um escritório do Instituto Nacional de Colonização e

- 16 -
Laura Benetti Slaviero

Reforma Agrária (Incra). Nesse mesmo local, e no entorno, o


Incra possuía uma grande área de terras e de matos que esta-
vam sem uso definido.
Conforme relatos dos atuais moradores locais, na década
de 1970, com a construção da barragem Passo Real, em Cruz
Alta, atual município de Fortaleza dos Valos, surgiu a possibili-
dade de utilização dessas terras para assentar algumas das famí-
lias que seriam desalojadas das margens dessa barragem. Então,
no dia 24 de novembro de 1973, 29 famílias (entre elas Budke,
Matos, Dos Santos Nunes, Geier e Lauxen) foram levadas até o
entorno do escritório do Incra, ficando ali acampadas por cer-
ca de sessenta dias. Nesse período, uma das famílias desistiu e
mudou-se por conta para outro local. Finalmente, em 1974, fo-
ram sorteados os lotes para todas as famílias, surgindo a Agrovila
Incra. Cada lote era composto de terra aberta e área de mato,
e havia algumas áreas em comum: uma área central destinada
à comunidade como um todo, e duas áreas de reserva florestal,
conhecidas na época como Projeto Integrado de Colonização
Sarandi – Reserva Ronda Alta.
Após a divisão dos lotes, formaram-se grupos de quatro a
cinco famílias para a distribuição de máquinas agrícolas vindas
da Sagrisa. Para cada grupo, o Incra entregou um trator, um
arado, uma grade, um carroção e, mais tarde, uma plantadei-
ra. Todos plantavam, colhiam juntos e entregavam o produto
na cooperativa municipal para que então, os coordenadores
do Incra fizessem o balanço e dividissem os lucros entre to-
dos igualmente. Essa coordenação, realizada pelo Incra, durou
cinco anos. Com o tempo, os agricultores foram deixando os
grupos e conseguindo adquirir suas próprias máquinas, alguns
mudaram-se para outros locais e outros continuaram nesse
mesmo sistema ainda por algum tempo.
Na época, incentivados a cultivar a terra, os moradores da
Agrovila Incra conseguiam, com o Ibama de Passo Fundo, licen-
ças para retirada do mato. A madeira era vendida às serrarias
do município e a terra transformada em lavoura. Com o passar

- 17 -
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

dos anos e vendo que a atividade agrícola rendia bons lucros,


algumas invasões começaram a ocorrer. A estação experimental
da Embrapa foi invadida pelos moradores que ocuparam inclusi-
ve suas construções, as quais hoje pertencem ao município. Nas
duas áreas de reserva, outras invasões ocorreram, para implan-
tação de pequenas lavouras e cultivo de hortaliças. Atualmen-
te, restaram na região poucas famílias vindas da barragem Passo
Real e muitos lotes foram vendidos a outros produtores rurais.

Mudanças no nome da UC
No ano de 1996, após contatos com o Incra, foi outorgado
ao município de Sertão, por meio do Termo de Doação/Incra/
DFT/n. 15/96, de 8 de agosto de 1996, os imóveis de reserva de-
nominada lote número 8 – A, com 513,1078 ha e lote número
1 – A, com 77,7776 ha, totalizando uma área de 590,88 ha, de-
vidamente identificada e com lotes delimitados por esse Termo
de Doação (Figura 3). Dois anos depois, a Câmara Municipal de
Vereadores aprovou e, o então prefeito municipal, Dr. Jorge A. F.
Hermann sancionou a lei municipal n. 1.170/98, criando o Par-
que Natural Municipal de Sertão (lote 1 – A) e a Floresta Munici-
pal (lote 8 – A). Desde sua criação, o cargo de Chefe da Reserva
Florestal foi ocupado por várias pessoas.

- 18 -
Laura Benetti Slaviero

Fonte: Alos, 2006.

Figura 3 – Imagem de satélite do Parque Natural Municipal de Sertão. 1 - lote


número 8 – A (513,1078 ha); 2 - lote número 1 – A (77,7776 ha);
losango vermelho – Agrovila Incra.

Com a publicação da lei federal n. 9.985, de 18 de julho de


2000, conhecida como Sistema Nacional de Unidades de Con-
servação (SNUC), uma equipe de professores e de pesquisadores
da Universidade de Passo Fundo (UPF), iniciaram um movimen-
to de auxílio ao, então, Parque e Floresta Municipal de Sertão.
Ainda no ano de 2000, a UPF, juntamente com o Grupo
Ecológico Sentinela dos Pampas (Gesp) e a Empresa de Assis-
tência Técnica e Extensão Rural (Emater/Ascar) firmaram-se
como instituições parceiras do município na elaboração de um
projeto para implantação do Parque Municipal de Sertão, com
o intuito de obter recursos do Fundo Nacional de Meio Ambien-
te (FNMA) para a realização do plano de manejo da UC. Com
esse auxílio, nos primeiros meses de 2000, o município assinou

- 19 -
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

o Convênio MMA/FNMA n. 20/2000, conquistando cerca de


R$70.000,00 que deveriam ser gastos para colocar em prática
esse projeto. Esse foi um ano de grandes conquistas, mas tam-
bém de grandes decepções. Pelo termo de convênio, as insti-
tuições parceiras não poderiam realizar o plano de manejo e
a administração municipal viu-se de mãos amarradas. Mesmo
utilizando grande esforço em outras universidades da região e
buscando empresas particulares capacitadas para a elaboração
de um plano de manejo com esses recursos, ninguém se dispôs
a realizá-lo. Numa tentativa de conseguir mais tempo para aten-
der ao convênio, foi firmado um termo aditivo que prorrogava
o prazo para o final de 2001. Porém, como a situação manteve-
-se a mesma, os recursos foram devolvidos ao FNMA e nada foi,
efetivamente, realizado para a implantação do Parque.
Em 2002, um novo projeto de elaboração do plano de ma-
nejo do Parque Municipal de Sertão foi apresentado ao FNMA,
mas não foi obtido êxito na liberação de novos recursos. Nesse
momento, já estavam ocorrendo algumas pequenas invasões na
área do Parque e da Floresta municipal. Os próprios lindeiros,
moradores da Agrovila Incra, utilizavam-se da área para cultivo
de pequenas hortas e lavouras. Pessoas de outras regiões tam-
bém retiravam, ilegalmente, madeira e subprodutos florestais,
além de caçar no entorno e no interior da floresta.
A crescente evolução do cultivo agrícola da região, com
destaque para lavouras de soja, milho e trigo fez aumentar as
pressões antrópicas nas bordas da UC. Além das bordas, as duas
estradas que cortavam o lote 8 – A serviram de rota para outras
pequenas invasões e para retiradas clandestinas de madeira.
Em 2006, o município, sob nova administração, procurou
destinar mais atenção à UC, realizando adequações adminis-
trativas importantes. Em janeiro desse mesmo ano, foi realiza-
do o registro de toda a área no cartório de imóveis, contendo
todas as confrontações e as medidas de acordo com o Termo
de Doação do Incra. Mais tarde, foi sancionada a lei municipal

- 20 -
Laura Benetti Slaviero

n. 1.733/2006, que unificou a nomenclatura das duas áreas para


Parque Municipal de Sertão. A mudança de nome também foi
importante para adequação ao SNUC, bem como para fortale-
cer a forma de proteger os dois fragmentos integrantes da UC,
uma vez que a denominação Floresta Municipal permitia usos
mais intensos, quando comparados à categoria Parque.
Além disso, para que o Parque Municipal de Sertão entras-
se oficialmente no cenário da conservação ambiental do estado,
em 2007, foi realizado o cadastro da UC no Sistema de Unidades
de Conservação Estaduais (Seuc). A participação nesse cadastro
fez com que o parque fosse reconhecido em todo o estado e
pudesse participar de demandas por recursos financeiros que
objetivassem a preservação do meio ambiente.
Em 2009, a fim de dar mais visibilidade ao Parque, foram
colocadas placas indicativas de localização e de identificação do
Parque, placas de proibição à caça e placas informativas, as quais
cientificam ao visitante que se trata de uma unidade de conserva-
ção. Em julho desse mesmo ano, foi realizada audiência pública
com a presença de muitos lindeiros, dos professores e dos alunos
da Universidade de Passo Fundo que explanaram os trabalhos
realizados na UC, na qual a Patrulha Ambiental e o Ministério
Público informaram a situação de algumas invasões e como seria
a fiscalização das áreas do Parque dessa data em diante. Essas
ações foram fruto de um Termo de Compromisso Ajustamento
de Conduta Parcial assinado pelo município com o Ministério
Público, o qual será melhor descrito adiante.
Com o passar do tempo, surgiu a necessidade de nova
adequação da nomenclatura da UC, estando de acordo com o
SNUC e por solicitação para cadastramento do Parque no Ca-
dastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC). Foi san-
cionada, então, a lei municipal n. 1.974/2011 que permanece
vigente até hoje, mudando o nome para Parque Natural Muni-
cipal de Sertão.

- 21 -
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

Parcerias na busca pela preservação ambiental


O Parque Natural Municipal de Sertão tem recebido aten-
ção de várias instituições, principalmente por seu uso potencial
para conservação ambiental, ensino e pesquisa. Uma das primei-
ras parceiras da UC foi a Associação Amigos do Meio Ambiente
(AMA), que prestou auxílio do ponto de vista técnico ainda na
época de doação da área pelo Incra.
A Universidade de Passo Fundo (UPF) tem se constituído
em grande e incansável parceira do Parque na luta pela conser-
vação dessa área. Após a publicação da lei federal n. 9985/2000,
– o Instituto de Ciências Biológicas representado, na época, por
um grupo de biólogos, auxiliou na primeira tentativa de cria-
ção do conselho gestor para o Parque, mobilizando entidades
públicas e privadas locais. Infelizmente, por vários motivos, esse
trabalho não se concretizou.
Conforme já descrito, na busca por recursos, a UPF forne-
ceu todo apoio técnico e científico disponível na expectativa de
efetivação da área por meio de um plano de manejo. Além disso,
desde a criação da UC, a UPF tem realizado pesquisa em diver-
sas áreas de ensino, evidenciando a importância e o potencial lo-
cal para a preservação da biodiversidade. Foram realizados tra-
balhos na área de biodiversidade de anfíbios e répteis (Zanella
et al., 2013), encontrando, inclusive, exemplares ameaçados de
extinção (Paula et al., 2009; Zanella et al., 2009), além do pri-
meiro registro do anuro Melanophryniscus devincenzii no Brasil
(Zanella et al., 2007) e nova ocorrência de Taeniophallus affinis
(Günther, 1858) (Squamata, Serpentes, Dipsadidae) (Paula et
al., 2011). Em relação à fauna de mamíferos foram realizados
vários estudos (Luza et al., 2013), até mesmo atropelamentos
causados pela proximidade da UC com a RS 135 (Mamíferos
silvestre atropelados na rodovia RS 135, norte do Estado do Rio
Grande do Sul”) (Hegel et al., 2012). Na área de educação am-
biental foram realizados trabalhos integrados a um Programa de

- 22 -
Laura Benetti Slaviero

apoio ao uso público em unidades de conservação e em áreas


de preservação, sobre a capacidade de carga turística para tri-
lhas sugeridas para o Parque Natural Municipal de Sertão (ver
Capítulo 3).
A Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das
Missões (URI), Campus de Erechim, também tem realizado al-
guns trabalhos na área do Parque, principalmente relacionado
à flora (Capítulo 2). Foram realizados estudos de epífitas, efeito
de borda na regeneração florestal e na vegetação adulta, além
de estudos de variabilidade genética de uma espécie de sub-bos-
que (Trichilia elegans A. Juss.).
No ano de 2013, o Instituto Federal de Educação Ciência
e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS), Campus de Sertão
assinou convênio de cooperação, incluindo estudos no Parque
Natural Municipal de Sertão como objeto desse. Além disso, ou-
tra parceira recente é a ONG Conservar, de Passo Fundo, que
tem auxiliado nas buscas mais recentes por recursos para o pla-
no de manejo.
No município de Sertão, além do IFRS, há a Emaer/Ascar
que sempre auxilia o município em iniciativas para a valorização
do Parque. Da mesma forma, todas as instituições integrantes do
Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema)
atuam na conservação da UC.
Outro fato importante que fez e está fazendo a diferença
para a gestão do Parque Natural Municipal de Sertão é a integra-
ção na Rede de Unidades de Conservação do norte do Rio Grande
do Sul. Essa participação iniciou em 2010, quando foi esclarecido
o objetivo do projeto da Rede, a saber, integrar e fortalecer as
UCs do norte do estado, por meio de encontros, de trocas de ex-
periências e de momentos de capacitação para gestores e funcio-
nários, e, ainda, proporcionar maior articulação com instituições
públicas e sociedade civil organizada. A proposta era reunir todos
que estivessem dispostos a contribuir com a preservação da natu-
reza de forma regional. Dois anos mais tarde, uma das reuniões

- 23 -
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

da Rede de UCs foi realizada em Sertão, com apresentação do


Parque Natural Municipal de Sertão aos colegas de outras UCs,
que sempre se mostraram prontos a auxiliar na busca por recursos
para iniciar o plano de manejo e a efetiva implantação da área.
Recentemente, após muitos contatos com o ICMBio e com a
empresa Transmissora Sul Brasileira de Energia (TSBE), foi con-
quistado um recurso de compensação ambiental proveniente da
instalação de uma linha de transmissão de energia pela região. A
formalização do repasse ainda está em andamento, mas há gran-
de expectativa para que, enfim se consiga efetivar o plano de ma-
nejo do Parque.

O papel do Ministério Público na gestão da UC


Diante de algumas situações, no ano de 2005, foi desperta-
da a atenção do Ministério Público (MP) para as duas áreas do
PNMS. Foi aberto o inquérito civil n. 41/2005, solicitando infor-
mações a respeito da gestão dessas duas áreas, então, pertencen-
tes ao município. Dentro dos limites contextuais, as solicitações
feitas pelo Ministério Público foram atendidas e o inquérito civil
continuou a tramitar.
Com o passar do tempo e após várias trocas de correspon-
dências oficiais entre MP e município, em 2009, foi assinado
um Termo de Compromisso Ajustamento de Conduta Parcial,
comprometendo o gestor a zelar pela conservação e pela preser-
vação do Parque por meio de atitudes concretas, as quais eram
atendidas conforme os prazos estabelecidos. Entre essas atitu-
des, já citadas, a colocação de placas indicativas de localização e
identificação do Parque, entre outras.
Fruto desse termo, foi realizada uma audiência pública em
julho de 2009 com a presença de muitos lindeiros, professores e
alunos da UPF que explanaram os trabalhos realizados na UC.
Nessa ocasião, a Patrulha Ambiental (Patram) e o Ministério Pú-
blico informaram sobre a situação de algumas invasões e acerca

- 24 -
Laura Benetti Slaviero

de como seria a fiscalização das áreas do Parque dessa data em


diante. Essa reunião foi um marco para a conservação da UC,
pois, praticamente todos os lindeiros entraram em acordo com
a administração municipal, o Ministério Público e a Patram para
retirarem-se da área e cessarem as injúrias à floresta. A partir
disso, foram recuperadas várias pequenas clareiras do interior
da UC, que serviam de horta ou de lavoura, nas quais, além da
regeneração natural, foi realizado adensamento com mudas na-
tivas, provenientes de reposições florestais de alvarás de corte
liberados para a área urbana de Sertão. A grande maioria dos
lindeiros tornou-se parceiro do Parque, denunciando práticas
ilegais para a Patram e a prefeitura municipal.
Em 2011, dando continuidade às ações previstas no Termo
assinado com o MP, foram abertas valas para impedir a entrada
de pessoas não autorizadas em entradas clandestinas das duas
áreas do Parque. Evitou-se também, dessa forma, a retirada de
outros produtos do interior da floresta.

Perspectivas para a conservação


Parte da história do Parque ocorreu em torno da busca de
recursos externos para que sua gestão e estruturação fossem efe-
tivadas. Sabe-se que a gestão pública tem inúmeras demandas e,
em geral, a preservação ambiental não tem lugar privilegiado
entre essas. Os agentes ligados às UCs são forçados a buscarem o
auxílio externo e a articulação com os diversos setores da socie-
dade e com entidades que se mostrem parceiras. Além do que já
foi citado, há uma aprovação por parte da Câmara Estadual de
Compensação Ambiental (Ceca), de um pedido de recursos para
o Parque, cujo repasse está condicionado à instalação de uma
grande empresa, que possa encaminhar esses recursos à UC.
Existem alguns lindeiros que não aceitam a existência de
uma unidade de conservação próxima de suas propriedades, o
que é apenas um exemplo dos vários desafios a serem, ainda,

- 25 -
Criação do Parque Natural Municipal de Sertão

enfrentados. Sabe-se que existem algumas regras a serem segui-


das no entorno de UCs, como por exemplo, a não utilização de
agrotóxicos nas lavouras próximas. Esse, claramente, será um
dos maiores desafios a serem enfrentados também durante a im-
plantação do plano de manejo e efetiva gestão do PNMS.
Assim, como em outras esferas públicas de gestão de uni-
dades de conservação, e na área ambiental como um todo, o
ritmo dos acontecimentos é diverso. É preciso ter paciência e
persistência para fazer as coisas acontecerem. Nesse sentido,
existe a expectativa de que, para os próximos dois anos, consiga-
-se concluir o plano de manejo da área, uma vez que já existem
recursos destinados para tal. Espera-se também contar com a
colaboração das instituições parceiras, bem como conquistar
novos interessados em conservar um dos poucos grandes rema-
nescentes florestais que ainda restam na região.
Pelos estudos já realizados no local, que serão descritos
nos capítulos seguintes, percebe-se a grande potencialidade da
área para a preservação da biodiversidade regional. O turismo,
as atividades de ensino e de pesquisa são áreas que ainda podem
ser muito exploradas nessa UC. Certamente, ainda há muito a
ser descoberto em termos de diversidade de espécies, processos
ecológicos e contribuições do Parque Natural Municipal de Ser-
tão para o ecossistema regional como um todo.

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Laura Benetti Slaviero

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- 27 -
Capítulo 2
Conservação, uso público e potencial
de impacto econômico no Parque
Natural Municipal de Sertão:
um desafio que envolve a comunidade

Carla Denise Tedesco*


Paula Dall’Agnol de Oliveira*

Introdução
Uso público é o conjunto de atividades em ambientes na-
turais que envolvem recreação, educação e interpretação am-
biental. Essas atividades devem estar em conformidade com os
objetivos das Unidades de Conservação (Brasil, 2000), além de
promover e estimular a conservação da biodiversidade, a educa-
ção ambiental e a conscientização da importância de se manter
áreas naturais preservadas (MMA, 2006).
Para Parques Naturais Municipais são permitidas, de acor-
do com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, lei
que rege essas áreas protegidas, as atividades de visitação públi-
ca, as quais estão sujeitas às normas e às restrições estabelecidas
no plano de manejo da unidade e às normas do órgão responsá-
vel por sua administração (Brasil, 2006).

*
Instituto de Ciências Biológicas (ICB), Universidade de Passo Fundo (UPF).
Carla Denise Tedesco, Paula Dall’Agnol de Oliveira

De acordo com essas regras, o turismo pode gerar renda


para manutenção da unidade e comunidades do entorno. Além
disso, a experiência de visitar e conhecer a área natural pode
acabar sensibilizando moradores e turistas que virão a ajudar na
preservação (Nelson, 2012).
Áreas protegidas são, em geral, cercadas por produtores
rurais, e a cooperação desses nos esforços de conservação tor-
na-se essencial. Uma forma de envolver esse segmento é por
meio da geração de renda alternativa, da recreação, da edu-
cação ambiental e da alimentação. Com o desenvolvimento
de um programa de uso público da unidade, é possível que
os vizinhos entendam e sensibilizem-se com a área preservada
(Santos et al., 2011).
Observando as características regionais pode-se direcionar
um manejamento para se usufruir do ecoturismo em uma área
protegida, respeitando o meio ambiente e apoiando ações de
desenvolvimento das comunidades do entorno. Dessa manei-
ra, é necessário organizar uma cadeia produtiva (Santos et al.,
2011). Essas atividades relacionam-se e interagem em uma rede
de negócios composta por serviços de hospedagem, de alimen-
tação é de transporte turístico, entre outros (Brasil, 2011).
A comunidade local não deve ser excluída desse proces-
so, pois está intimamente ligada à cadeia produtiva e deve estar
inserida, desde o início do planejamento, atuando na sua im-
plementação e colhendo os resultados. Se a comunidade inte-
ragir será possível um sistema de troca que gere oportunidades
para a própria comunidade (Santos et al., 2011) bem como
para o Parque.
Esse capítulo objetiva incentivar uma articulação entre a
comunidade, em especial a do entorno (lindeira), e o Parque
Natural Municipal de Sertão, a fim de criar uma cadeia produ-
tiva local, visando acima de tudo a conservação desse que é o
maior fragmento de Mata Atlântica do norte do Rio Grande
do Sul.

- 29 -
Conservação, uso público e potencial de impacto econômico no Parque Natural Municipal de Sertão: um...

Material e métodos
Potencial de visitação: capacidade de carga das trilhas
Para avaliar o potencial de visitação (uso público) e subsi-
diar o plano de manejo do Parque foram desenhadas e avalia-
das duas trilhas (Figura 1) em termos de capacidade de carga
(Cifuentes, 1992). O desenho das trilhas utilizou como critério
a localização em áreas periféricas e o uso de antigas vias de
acesso/trilhas de deslocamento de moradores do entorno. Os
dados de campo foram coletados entre os meses de janeiro e
maio de 2010.

Fonte: Google, 2008.

Figura 1 – Localização das Trilhas 1 e 2, no lote 1, do Parque Natural Muni-


cipal de Sertão.

- 30 -
Carla Denise Tedesco, Paula Dall’Agnol de Oliveira

De acordo com a metodologia de Cifuentes (1992), foi


calculada a Capacidade de Carga Turística (CCT) das trilhas,
a partir de três níveis: Capacidade de Carga Física (CCF), que
permite calcular qual o número máximo de visitantes que a tri-
lha pode receber por dia; capacidade de Carga Real (CCR), que
determina o número de visitantes levando em consideração fa-
tores de correção; e Capacidade de Carga Efetiva (CCE), que
é o cálculo que representa a quantidade máxima de visitantes
na trilha em um intervalo de tempo que considera a CCR e as
condições de manejo do local. As fórmulas utilizadas para tais
cálculos podem ser consultadas em Tedesco et al. (2013).
O comprimento total da trilha foi obtido por meio de re-
gistro do Global Position System (GPS) e de trena de 50 m. A
cada intervalo de 50 m foram registrados indícios de erosão,
analisando área de solo exposto e raízes, presença de serrapi-
lheira e de sulcos. A avaliação foi realizada com quadrante de
0,5 m x 0,5 m.
Também foi avaliada a declividade em áreas com algum
grau de elevação. Para tanto, foram utilizadas duas estacas de
1,25 m e trena. As duas estacas foram fixadas, paralelamente,
restando 1 m acima do solo, com uma distância, também, de 1 m
entre essas. No local onde a ponta superior da estaca da parte
mais baixa estava horizontalmente em posição paralela com a
outra, procedeu-se a medição do espaço entre o ponto e o fim
da estaca, resultando em uma medida, que foi multiplicada por
cem. O resultado mostra a percentagem de elevação do local
medido. Com esses dados foram adotados os critérios: baixo
grau de dificuldade, para valores inferiores a 10% de declivida-
de; médio grau de dificuldade para valores entre 10% e 20%; e
alto grau acima de 20% de declividade (Cifuentes, 1992).
Utilizamos também das seguintes premissas: as trilhas são
lineares e seguem apenas um sentido, cada pessoa necessita de
2 m² para uma boa caminhada.

- 31 -
Conservação, uso público e potencial de impacto econômico no Parque Natural Municipal de Sertão: um...

Potencial de impacto econômico local relacionado à visitação


Com base no potencial de visitação estimado pela capaci-
dade de carga das trilhas do Parque calculamos o potencial de
impacto econômico municipal com a implantação da visitação
pública no Parque. Para tanto, utilizamos a metodologia Money
Generation Model (MGM), adaptada para a realidade brasilei-
ra (Medeiros et al., 2011). O resultado foi obtido pelo cálculo:
impacto econômico = número de visitantes X média de gastos
por visitante X multiplicador. Os valores médios de gastos por
visitante e multiplicadores foram adaptados à realidade local,
tendo como base o estudo indicado pelos autores já citados.
Para o valor de média de gasto por visitante, foram considerados
visitantes de um dia, em região rural, sem pernoite, com gastos
em alimentação (bares/restaurantes), transporte e aquisição
de produtos locais (em substituição a lojas de conveniência). O
valor médio de gastos por visitante utilizado no cálculo foi de
R$ 40,00. Para o multiplicador foi utilizado o fator 1,3 indicado
para uso em cenário conservador de expectativa de visitação.

Participação comunitária
A participação foi relatada por meio de registros das reuniões
realizadas e dados secundários de visitas a campo na comuni-
dade na qual está inserido o Parque, com a perspectiva de ser
analisada dentro da abordagem Freiriana (Freire, 1970; 2007).

Resultados e discussão
Potencial de visitação do Parque
Os resultados seguem a lógica de CCF > CCR > CCE. Al-
guns fatores de correção foram indicados de acordo com a ava-
liação de cada trilha. Outros fatores (social, precipitação e fau-
na) foram considerados iguais para todo Parque.

- 32 -
Carla Denise Tedesco, Paula Dall’Agnol de Oliveira

No Parque, são encontradas duas espécies ameaçadas na


categoria vulnerável (VU CI), o quati (Nasua nasua Linnaeus,
1766) e a cutia (Dasyprocta azarae Lichtenstein, 1823) (Rio Gran-
de do Sul, 2014). Para o cálculo do fator de correção da fauna
utilizamos essas espécies pela preocupação de conservação. Para
o cálculo do fator restritivo, considerou-se dois meses do final do
outono (abril e maio) e o início do inverno (junho), período em
que há a disponibilidade de pinhão e pouca ofertwa de folhas e
frutos para alimentação da fauna (Tabela 1, FCfaun).
O fator de correção declividade somente foi avaliado na ex-
tensão da Trilha 2, que apresentou elevação significativa (Tabela 1).
Os fatores de correção sulco e serrapilheira foram mais sig-
nificativos na Trilha 1 pelo fato de que há, aproximadamente,
950 m do percurso, costeando uma clareira que anteriormen-
te foi utilizada como lavoura. Nessa parte da trilha, registramos
menor quantidade de serrapilheira e maior índice de solo ex-
posto, indícios favoráveis à erosão. Essas condições resultaram
em grande diferença entre a CCE da Trilha 1 (29 visitantes/dia)
para Trilha 2 (69 visitantes/dia).
O tempo para percorrer cada trilha foi estimado em 1h 30 min,
e 1h, respectivamente (Tabela 1).
Por fim, capacidade de manejo seria claramente o parâme-
tro que mais reduziria o número de visitas, já que a unidade de
conservação ainda não tem gestor nem plano de manejo. Com a
elaboração e a implementação do plano de manejo, acredita-se
que essa realidade seja modificada. Se forem instalados todos os
recursos necessários, repercutirá, imediatamente, nos resultados
finais da Capacidade de Carga (Nascimento, 2008). Com base nes-
sa premissa, para esse cálculo, foi utilizado 80% de condições de
manejo, que seria o esperado com um plano de manejo efetivado,
bem como, estrutura física, financeira e humana devidamente im-
plantadas. Cifuentes et al. (1999) sugere, como critério satisfatório
para uma ótima capacidade de manejo, o valor de 75%, e Pecca-
tiello (2007) considera, ainda, que cada unidade de conservação
deve avaliar os seus aspectos particulares para estimar esse valor.

- 33 -
Conservação, uso público e potencial de impacto econômico no Parque Natural Municipal de Sertão: um...

Tabela 1 – Cálculo de Capacidade de Carga Turística em duas trilhas no


Parque Natural Municipal de Sertão - RS.

Capacidade de Carga Trilha 1 Trilha 2


CCF 4797 visitas/dia 6000 visitas/dia
FCsoc 0,11 0,11
FCprec 0,74 0,74
FCsolo 0,28 0,57
FCser 0,55 0,60
FCsul 0,84 0,69
FCdec - 0,96
FCfau 0,75 0,75
CCR 37,4 visitas/dia 86,4 visitas/dia
CM 0,8 0,8
CCE 29 visitas/dia 69 visitas/dia
CCF: Capacidade de Carga Física; FCsoc: Fator de Correção Social; FCprec: Fator de Correção Precipita-
ção; FCsolo: Fator de Correção Solo; FCser: Fator de Correção; FCsul: Fator de Correção Sulco; FCdec: Fator
de Correção Declividade; FCfau: Fator de Correção Fauna; CCR: Capacidade de Carga Real; CM: Capaci-
dade de Manejo; CCE: Capacidade de Carga Efetiva.

Os resultados da capacidade de carga deverão ser adequa-


dos ao plano de manejo, que certamente levará em considera-
ção, principalmente, a conservação da biodiversidade local e os
objetivos de pesquisa científica e de educação ambiental.

Potencial de impacto econômico local


Salienta-se que, neste trabalho, não foi avaliado o valor
econômico total, que estabelece que o valor de um recurso
ambiental pode ser obtido pela soma dos bens e serviços por
esse providos, independentemente desses benefícios receberem
preços de mercado (Pearce, 1993). Esse é o caso dos serviços
ambientais que as unidades de conservação do grupo de prote-
ção integral (Brasil, 2006), naturalmente, disponibilizam como:
biodiversidade, regularização de recursos hídricos, equilíbrio
climático, além da minimização da produção de gases do efeito
estufa (mercado de créditos de carbono) e do incentivo fiscal
governamental (ICMS Ecológico).

- 34 -
Carla Denise Tedesco, Paula Dall’Agnol de Oliveira

O valor do resultado do impacto econômico local equivale


a uma única visita no Parque. O resultado do cálculo considerou
que um ônibus tem em média 45 lugares, o que equivale à meta-
de da capacidade de carga avaliada para o Parque, logo:

Impacto econômico = 45 (visitantes/dia) x R$ 40,00 x 1,3


Impacto econômico = R$ 2.340,00/dia

É importante reforçar que o valor do multiplicador (fator


1,3) foi escolhido para esse cálculo por ser o indicado para uso
em cenários conservadores de visitação.
Com a elaboração e a implementação do plano de mane-
jo, espera-se que o Parque receba maior número de visitantes,
como ocorre em outras unidades de conservação da região,
quando o Parque apresentar uma infraestrutura mínima, de re-
cursos humanos e de divulgação de seus atrativos naturais.
O número de visitantes em unidades de conservação brasi-
leiras ainda é pequeno quando comparados a outros países. No
entanto, empiricamente, observam-se tendências de crescimen-
to do turismo no Brasil. O aumento da procura por atividades
recreativas em ambientes naturais e a estruturação das unidades
de conservação indicam um cenário promissor em termos do
impacto econômico da atividade no contexto local. Assim, con-
sideramos importante a valoração do uso público no que diz
respeito à visitação, que deverá estar associada a processos de
educação ambiental.

Participação comunitária
A participação da comunidade é fundamental tanto para a
criação como para a implementação de uma unidade de conser-
vação. Essa também é uma questão legal (art. 22 § 2, SNUC), já
que são previstas consultas públicas à população (Brasil, 2006).
A participação comunitária em unidades de conservação
decorre da necessidade de melhorar sua gestão e buscar a cria-

- 35 -
Conservação, uso público e potencial de impacto econômico no Parque Natural Municipal de Sertão: um...

ção de alianças com as comunidades do entorno, criando par-


cerias que colaborem no processo de conservação dessas impor-
tantes áreas (Miranda, 2012), além de potencializar a participa-
ção da comunidade na cadeia produtiva do turismo ecológico.
O processo participativo abre espaço para esclarecimentos
de dúvidas e exposição de sugestões. No processo de parceria, fa-
lar e saber ouvir, escutar e entender, compreender e se fazer com-
preendido são passos, aparentemente fáceis, que, no entanto, no
cotidiano mostram-se extremamente complexos (Miranda, 2012).
No ano de 2000, ainda quando as áreas do Parque perten-
ciam ao Incra, a prefeitura municipal, com apoio de cerca de
vinte profissionais da Universidade de Passo Fundo, encaminhou
projeto ao Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA). O proje-
to, que previa a elaboração do plano de manejo, foi aprovado, re-
sultando em recursos de R$ 72.000,00. O plano de manejo, objeto
da proposta ao FNMA não foi elaborado.
A comunidade de Sertão, por intermédio do Poder Legislati-
vo, transformou a área em unidade de conservação somente a par-
tir de 2006, com a promulgação da lei municipal n. 1.733/2006.
Antes e depois desse período, foram realizadas diversas reu-
niões, com o prefeito municipal, representantes da prefeitura
e professores da Universidade de Passo Fundo para viabilizar a
criação da unidade de conservação. Durante esse processo, tam-
bém ocorreram diversas visitas à área protegida, pois vários es-
tudos estavam sendo desenvolvidos e o contato com moradores
foi frequente. Também foi realizada uma reunião com o Institu-
to Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do
Sul (IFRS), Campus Sertão, a fim de viabilizar parcerias, as quais
objetivaram apoiar ações para o desenvolvimento da cadeia pro-
dutiva regional.
Em julho de 2009, foi realizada uma audiência pública con-
vocada pela prefeitura para cumprir um Termo de Ajustamento
de Conduta. Essa reunião contou com expressiva participação
da comunidade e de autoridades: lindeiros (18 representantes

- 36 -
Carla Denise Tedesco, Paula Dall’Agnol de Oliveira

de unidades familiares), Administração Municipal (4: Prefeito,


Vice-Prefeito e assessores), Ministério Público (1), Associação
Comercial de Sertão (1), Câmara Municipal (1), Universidade
de Passo Fundo (8: alunos e professores), Emater (1), Batalhão
Ambiental (3), Polícia Civil (1), e, ainda, outros participantes
que não assinaram a ata (Figura 2).

Fonte: C. D. Tedesco.
Figura 2 – Momento de socialização de resultados de pesquisas realizadas
pelo Curso de Ciências Biológicas da Universidade de Passo Fundo
e por colaboradores locais na audiência pública em julho de 2009.

Em fevereiro, março e maio do ano de 2010, foram realiza-


das outras reuniões com moradores do município com a finali-
dade de compreender a percepção dos moradores no entorno
do Parque Municipal de Sertão, para contribuir nas questões
socioambientais e econômicas do local (Casanova, 2010). A
autora conduziu o processo de desvelamento da realidade, em
uma pesquisa que aplicou estratégias de e para a educação am-
biental, demonstrando que essa forma de trabalhar é a de maior
interação com a comunidade.

- 37 -
Conservação, uso público e potencial de impacto econômico no Parque Natural Municipal de Sertão: um...

Analisando brevemente as interações entre os diferentes


atores comunitários, é possível perceber que os momentos de
maior participação (interação) podem, e devem, ser mais opor-
tunizados.
A premissa é de que, uma vez que a comunidade do entor-
no se veja envolvida nas deliberações, essa sinta-se mais engajada
com os objetivos de conservação. Para que esse processo ocorra,
é necessário que a comunidade empodere-se do conhecimento
(Boff, 1999). Quando todos opinam, criam, implantam, avaliam
e veem os resultados (Padua, 2012), a participação torna-se qua-
lificada e efetiva.
Assim, a questão central deste capítulo baseia-se nos se-
guintes princípios: a) o uso público no Parque pode ser uma
estratégia de conservação, mas esse uso tem limites; b) a comu-
nidade, principalmente a do entorno, pode gerar renda alterna-
tiva ao sustento familiar, com o desenvolvimento do ecoturismo;
c) o envolvimento da comunidade, dentro de uma perspectiva
participativa, é essencial para atingir os objetivos de conservação
e de desenvolvimento dessa cadeia produtiva.

Perspectivas para conservação


Como propostas que visem a conservação sugerimos: que a
elaboração do plano de manejo seja realizada de forma articula­
da com a comunidade e que se elabore um programa de uso
público que a envolva; que sejam envolvidos diferentes atores
no processo de implantação e implementação do Parque como:
comunidade lindeira, entidades, grupos ecológicos, Emater, as-
sociações, universidades, escolas, representantes do poder pú-
blico de diferentes esferas e organizações dos municípios; que
as ações/os contatos com a comunidade pautem-se por proces-
sos emancipatórios e que sejam evitadas interrupções nesse pro-
cesso; e ainda, que os entes públicos responsáveis pela gestão da
área sejam sensibilizados e comprometidos com os objetivos da
criação do Parque.

- 38 -
Carla Denise Tedesco, Paula Dall’Agnol de Oliveira

A manutenção dessa grande unidade de conservação no


meio norte do estado do Rio Grande do Sul, além de proteger a
natureza, também pode (e deve) promover a melhoria da quali-
dade de vida da comunidade, especialmente a mais próxima ao
Parque. Assim, pensando e agindo localmente, os objetivos de
conservação e proteção da natureza são atingidos globalmente.

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Conservação, uso público e potencial de impacto econômico no Parque Natural Municipal de Sertão: um...

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Capítulo 3
As florestas do Parque Natural
Municipal de Sertão

Laura Benetti Slaviero*


Jean Carlos Budke**
Rogério Luis Cansian***

Introdução
O estado crítico de fragmentação da paisagem ao longo do
domínio da Mata Atlântica, derivado, principalmente, da mu-
dança nos usos da terra, acarreta um crescente número de estu-
dos a respeito da distribuição de caracteres biológicos. Dentre
os principais caracteres avaliados, destacam-se inúmeras estima-
tivas de riqueza e de diversidade de organismos, endemismos,
raridade de espécies, as quais incluem abordagens que variam,
desde a escala do trabalho até os grupos de organismos analisa-
dos, seja taxonômica ou funcionalmente (Oliveira-Filho et al.,
2013). Esse arcabouço científico tem contribuído para o enten-
dimento dos padrões e processos associados à estruturação dos
diferentes habitats desse domínio biogeográfico, em especial,
na tentativa de fomentar ações de recuperação das paisagens
modificadas.

*
Programa de Pós-Graduação em Ecologia – URI.
**
Departamento de Ciências Biológicas – URI. Av. Sete de Setembro 1621, Ere-
chim, RS. CEP 99700-000. [email protected]
***
Departamento de Ciências Agrárias – URI.
As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

No sul do Brasil, o processo de fragmentação da paisagem


foi, historicamente, vinculado à remoção de áreas florestais,
principalmente com o ciclo da madeira oriundo da extração da
Araucaria angustifolia (Bertol) Kuntze (pinheiro-brasileiro) e de
diversas outras espécies florestais, muitas das quais, enquadra-
das, atualmente, como ameaçadas de extinção (MMA, 2008).
Nesse sentido, a tentativa de compreender os padrões de dis-
tribuição das espécies e sua distribuição potencial faz com que
os estudos fitogeográficos tornem-se cada vez mais relevantes,
ampliando a discussão para além do meio acadêmico, ao incluir
essas informações no processo de tomada de decisão sobre po-
líticas públicas voltadas à conservação da biodiversidade (Galin-
do-Leal; Câmara, 2003).
A dicotomia gerada pela fisionomia e pelo clima das flo-
restas úmidas costeiras em comparação às florestas estacionais
interioranas corresponde claramente a uma diferenciação flo-
rística, que gera uma substituição gradativa de espécies ao lon-
go das distintas formações florestais da Mata Atlântica sensu lato
(Oliveira-Filho et al., 2006; Jarenkow; Budke, 2009; Gonçalves;
Souza, 2014). O caráter fisionômico, essencial na definição de
unidades da vegetação, tem sido uma ferramenta amplamente
utilizada em sistemas de classificação. Por outro lado, a possibi-
lidade de se avaliar tipologias florestais a partir de listas de espé-
cies compiladas de inventários florestais, juntamente com as va-
riações ambientais detectadas ao longo do espaço, tem propor-
cionado uma análise muito consistente das peculiaridades veri-
ficadas em ambientes outrora unificados pelas feições visuais.
Um exemplo dessa aplicação pode ser verificado em Jarenkow e
Budke (2009), visto que os autores reconhecem três conjuntos
espacialmente definidos de áreas abrangidas pelas florestas com
Araucária, ou seja, embora reconhecidas como unidade fitofi-
sionômica (Floresta Ombrófila Mista), ocorre uma considerável
variação florística e, portanto, funcional, ao longo de sua área
de distribuição.

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Se a transição florística ocorre de forma pouco perceptível


entre formações florestais, ou seja, de modo gradativo ao longo
do espaço, ao nível de comunidade, deve ocorrer uma mescla
de espécies, com predomínio maior de algumas, dependendo da
distância dos contingentes migratórios iniciais. Da mesma forma,
espera-se que variações locais sejam importantes para a estrutu-
ração do mosaico florestal, condicionadas pelo ambiente e pelo
espaço, além de interações bióticas entre espécies (Dale, 1997).
O Parque Natural Municipal de Sertão corresponde a um
dos remanescentes florestais mais relevantes na área de transi-
ção entre o Planalto Médio e o Alto Uruguai no Rio Grande
do Sul. Fisionomicamente, a vegetação conserva as caracterís-
ticas típicas da Floresta Ombrófila Mista, com diversas espécies
compondo um dossel denso, de onde emergem as grandes
Araucárias. Por meio de uma análise da estrutura florestal e da
caracterização dos contingentes migratórios das espécies arbó-
reas, procuramos avaliar a contribuição de diferentes grupos de
espécies na estruturação do mosaico florestal, bem como suas
relações com a vegetação em regeneração e respectivos grupos
ecológicos, possibilitando uma compreensão maior dos padrões
associados a essa formação florestal.

Material e métodos
Coleta e análise dos dados
Para o levantamento do componente adulto (CA), foram
demarcadas 72 unidades amostrais de 10 m x 10 m organizadas
em oito transecções de 450 m, com nove unidades amostrais
cada, totalizando 0,72 ha. As nove unidades amostrais de cada
transecção foram divididas em três grupos sendo borda (as três
alocadas nos primeiros 50 m da transecção), meio (150 m dis-
tantes do grupo da borda) e interior (150 m distante do grupo
meio), todas distantes 10 m entre si dentro de cada grupo. As
transecções foram alocadas com distâncias equivalentes entre si
de aproximadamente 500 m, distribuindo-se por toda a borda

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

de uma parte do fragmento, historicamente menos antropizada


(Figura 1). Foram analisados todos os indivíduos arbóreos vivos,
com perímetro à altura do peito (PAP) ≥15 cm.
O levantamento do componente arbóreo regenerante
(CR) foi realizado em 72 subunidades de 5 x 5 m alocadas den-
tro dos limites das unidades amostrais utilizadas no levantamen-
to do CA. Foram contados na amostragem todos os indivíduos
com altura ≥ 1,00 m e diâmetro à altura do solo (DAS) ≤ 4,7 cm.
Os indivíduos situados sobre o limite das unidades amostrais
quando esses possuíam metade ou mais da sua estrutura presen-
te na unidade também foram amostrados. Todos os indivíduos
inventariados foram identificados ao nível de espécie

Figura 1 – Esquema representativo da área florestal do PNM Sertão, com a


área de estudo e detalhe da localização das unidades amostrais
dentro de cada transecção, com distâncias entre si e entre gru-
pos de borda, meio e interior.

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

A influência do gradiente borda-interior sobre as espécies


de ambos os componentes (CA e CR) foi verificada por meio de
análises de variância (anova), considerando os valores de altu-
ra, diâmetro, volume, área basal, número de indivíduos, densida-
de absoluta e dominância absoluta. Para isso, as unidades amos-
trais foram identificadas em três grupos, conforme a localização
no gradiente (borda, meio e interior). Foi avaliada a riqueza es-
pecífica em cada grupo por meio de curvas de rarefação (Gotelli;
Colwell, 2001), sendo os valores comparados por meio de análise
de variância (Anova) para se observar possíveis diferenças ao
longo do gradiente.
Foi utilizada análise de variância multivariada (Manova)
com testes de permutação para avaliar os efeitos da borda sobre
a composição e a abundância das espécies arbóreas adultas e em
regeneração. As abundâncias foram transformadas pela equação
log x+1 para evitar possíveis desvios quanto à normalidade dos
dados. Em seguida, adotou-se um teste de Mantel para se avaliar
a existência de dependência entre as matrizes de regeneração em
relação ao componente adulto. Em ambas as análises utilizou-se o
índice de Bray-Curtis como medida de similaridade entre unida-
des amostrais. Além disso, aplicou-se uma análise de coordenadas
principais (PCoA) sobre a matriz de abundância de espécies do
CA e CR, para se detectar os principais eixos de variação entre
ambientes, baseado nas distâncias de Bray-Curtis entre unidades
amostrais. As análises e os respectivos testes de significância fo-
ram realizados no programa Past 2.08b (Hammer et al., 2001).
O efeito das variáveis abióticas (temperatura, umidade relati-
va do ar, cobertura de dossel e espessura da camada de serrapilhei-
ra) sobre a distribuição das espécies do CR foi analisado por meio
de regressão linear múltipla, tendo como variável dependente os
dois primeiros eixos de ordenação da PCoA do CR, com auxílio
do programa SigmaPlot 11.0 (Systat Software, San Jose, CA). O
efeito dessas mesmas variáveis abióticas também foi analisado so-
bre os valores de riqueza e abundância, considerados como variá­
vel dependente das regressões lineares múltiplas realizadas.

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

Resultados
Composição florística e estruturação florestal
No levantamento das espécies arbóreas do Parque Natural
Municipal de Sertão (PNMS), desenvolvido com o método de
parcelas de largura fixa, foram amostradas 92 espécies arbóreas
ou de hábito arborescente, distribuídas em 35 famílias botânicas
(Tabela 1). Quanto ao componente adulto, foram inventariadas
75 espécies de 29 famílias, enquanto que, o componente rege-
nerativo abrangeu 81 espécies, de 33 famílias botânicas (Tabela
1). As famílias botânicas com maior riqueza foram Myrtaceae
(14), seguida por Fabaceae (9), Lauraceae (6), Sapindaceae
e Salicaceae, com cinco espécies cada. Os gêneros mais ricos
em espécies foram Eugenia (6), Myrsine (4), Ocotea, Ilex e Zan-
thoxylum, com três espécies cada. Destacam-se algumas espécies,
muito abundantes nas áreas de ocorrência da floresta com Arau-
cária, mas, que apresentaram baixa abundância ou ocorrência
restrira no PNMS (Figura 2).
Quanto aos parâmetros estruturais do componente adul-
to (CA), as espécies com maior densidade absoluta foram Rud-
gea jasminoides (Cham.) Müll.Arg. Matayba elaeagnoides Radlk.,
Coussarea contracta (Walp.) Müll.Arg. e Cupania vernalis Cam-
bess (Tabela 1). No que diz respeito à frequência absoluta, as
espécies com maior destaque foram Rudgea jasminoides, seguida
por Matayba elaeagnoides, Cupania vernalis, Nectandra megapotami-
ca (Spreng.) Mez e Casearia sylvestris Sw. Quanto à dominância
absoluta, as espécies com maior área basal foram Cedrela fissilis
Vell., seguida por Nectandra megapotamica, Matayba elaeagnoides,
Araucaria angustifolia e Rudgea jasminoides (Tabela 1).
Acerca dos parâmetros estruturais do componente rege-
nerativo (CR), as espécies com maior densidade absoluta foram
Rudgea jasminoides (Cham.) Müll.Arg. Trichilia elegans A. Juss.,
Nectandra megapotamica e Cupania vernalis (Tabela 1). No que tan-
ge à frequência absoluta, as espécies com maior destaque foram

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Rudgea jasminoides, seguida por Trichilia elegans, Allophylus guara-


niticus (A. St.-Hil.) Radlk., Nectandra megapotamica e Cupania ver-
nalis (Tabela 1).

Tabela 1 – Famílias, espécies, parâmetros estruturais do componente arbó-


reo adulto (CA) e regenerante (CR) do Parque Natural Municipal
de Sertão-RS, ordenadas por ordem de importância das famílias
do CA. DA = densidade absoluta (ind.ha-1); FA = frequência abso-
luta (%); DoA = dominância absoluta (m2.ha-1).
CA CR
Família/Espécie
DA FA DoA DA FA
RUBIACEAE 672,2 83,33 3,61 1679,2 98,61
Rudgea jasminoides (Cham.) Müll.Arg. 530,6 80,56 3,03 1420,8 97,22
Coussarea contracta (Walp.) Müll.Arg. 119,4 37,5 0,46 200 31,94
Coutarea hexandra (Jacq.) K. Schum. 20,8 11,11 0,10 6,9 4,17
Rudgea parquioides (Cham.) Müll.Arg. 1,4 1,39 <0,01 51,4 36,11
SAPINDACEAE 329,2 87,5 8,53 391,7 81,94
Matayba elaeagnoides Raldk. 130,6 54,17 5,86 25 16,67
Cupania vernalis Cambess. 105,6 56,94 2,00 162,5 52,78
Allophylus edulis (A. St.-Hil., Cambess.& A. 88,9 41,67 0,64 86,1 36,11
Allophylus guaraniticus (A. St.-Hil.) Radlk. 2,8 2,78 0,01 118,1 54,17
Diatenopteryx sorbifolia Radlk. 1,4 1,39 <0,01 - -
LAURACEAE 105,6 59,72 9,29 280,6 66,67
Nectandra megapotamica (Spreng.) Mez 65,3 45,83 6,16 177,8 54,17
Ocotea diospyrifolia (Meisn.) Mez 26,4 18,06 1,34 77,8 30,56
Nectandra lanceolata Nees 8,3 6,94 0,67 13,9 8,33
Ocotea puberula (Rich.) Nees 4,2 4,17 1,09 5,6 5,56
Ocotea pulchella (Nees) Mez 1,4 1,39 <0,01 4,2 4,17
Endlicheria paniculata (Spreng.) J. F. Macbr. - - - 1,4 1,39
SALICACEAE 159,7 65,28 1,77 95,8 51,39
Casearia silvestris Sw. 87,5 45,83 0,80 37,5 27,78
Banara tomentosa Clos 47,2 29,17 0,40 16,7 11,11
Casearia decandra Jacq. 25 15,28 0,55 36,1 26,39
Xylosma ciliatifolia (Clos) Eichler - - - 4,2 2,78
Banara parviflora (A. Gray) Benth. - - - 2,8 2,78

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

Cont.
FABACEAE 94,4 50 5,56 169,4 63,89
Ataleia glazioveana Baill 25 15,28 2,34 - -
Parapiptadenia rigida (Benth.) Brenan 23,6 19,44 2,12 61,1 31,94
Lonchocarpus campestris Mart. Ex Benth 22,2 11,11 0,43 30,6 12,5
Dalbergia frutescens (Vell.) Britton 8,3 8,33 0,07 61,1 36,11
Machaerium paraguariensis Hassl. 6,9 4,17 0,17 5,6 2,78
Albizia niopoides (Spruce ex Benth.) Burkart 4,2 4,17 0,36 2,8 2,78
Lonchocarpus nitidus (Vogel) Benth. 2,8 1,39 0,02 4,2 4,17
Inga marginata Willd 1,4 1,39 0,01 2,8 2,78
Machaerium stipitatum (DC.) Vogel - - - 1,4 1,39
MYRTACEAE 66,7 43,06 0,57 156,9 68,06
Campomanesia xanthocarpa O. Berg 20,8 19,44 0,20 23,6 20,83
Campomanesia guazumifolia (Cambess.) O. Berg 16,7 13,89 0,11 11,1 9,72
Eugenia subterminalis DC. 8,3 8,33 0,05 9,7 6,94
Eugenia rostrifolia D. Legrand 6,9 2,78 0,11 6,9 5,56
Myrciaria tenella (DC.) O.Berg 4,2 2,78 0,05 36,1 22,22
Eugenia uniflora L. 2,8 2,78 0,01 12,5 4,17
Myrceugenia miersiana (Gardner) D. Legrand 2,8 2,78 <0,01 19,4 8,33
Plinia peruviana (Poir.) Govaerts 1,4 1,39 0,01 4,2 4,17
Eugenia ramboi D. Legrand 1,4 1,39 <0,01 11,1 6,94
Myrcianthes pungens (O.Berg) D. Legrand 1,4 1,39 0,00 - -
Myrcia hebepetala DC. - - - 11,1 9,72
Eugenia pluriflora DC. - - - 6,9 2,78
Calyptranthes concinna DC. - - - 2,8 2,78
Eugenia involucrata DC. - - - 1,4 1,39
WINTERACEAE 45,8 27,78 0,96 6,9 6,94
Drimys brasiliensis Miers 45,8 27,78 0,96 6,9 6,94
CUNONIACEAE 34,7 26,39 1,51 23,6 9,72
Lamanonia ternata Vell. 34,7 26,39 1,51 23,6 9,72
EUPHORBIACEAE 31,9 12,5 0,60 25 11,11
Sebastiania brasiliensis Spreng. 27,8 8,33 0,39 23,6 9,72
Sapium glandulosum (L.) Morong 2,8 2,78 0,18 1,4 1,39
Sebastiania commersoniana (Baill.) L.B.Sm. & 1,4 1,39 0,02 - -
ANNONACEAE 25 18,06 0,16 29,2 19,44
Annona neosalicifolia H. Rainer 25 18,06 0,16 29,2 19,44
MELIACEAE 23,6 23,61 6,75 463,9 88,89

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Cont.
Cedrella fissilis Vell. 18,1 18,06 6,74 13,9 9,72
Trichilia elegans A. Juss. 5,6 5,56 0,01 450 87,5
PRIMULACEAE 16,7 15,28 0,09 93,1 52,78
Myrsine umbellata Mart. 13,9 12,5 0,06 87,5 50
Myrsine loefgrenii (Mez) Imkhan. 1,4 1,39 0,02 2,8 1,39
Myrsine laetevirens (Mez) Arechav. 1,4 1,39 <0,01 1,4 1,39
Myrsine coriacea (Sw.) R.Br. - - - 1,4 1,39
SAPOTACEAE 15,3 11,11 0,15 11,1 9,72
Chrysophyllum marginatum (Hook. & Arn.) 15,3 11,11 0,15 11,1 9,72
ARAUCARIACEAE 13,9 11,11 3,63 13,9 9,72
Araucaria angustifolia (Bertol.) Kuntze 13,9 11,11 3,63 13,9 9,72
ROSACEAE 13,9 8,33 0,90 9,7 8,33
Prunus myrtifolia (L.) Urb. 13,9 8,33 0,90 9,7 8,33
AQUIFOLIACEAE 11,1 9,72 0,09 20,8 12,5
Ilex brevicuspis Reissek 5,6 5,56 0,04 8,3 6,94
Ilex microdonta Reissek 2,8 2,78 0,02 12,5 6,94
Ilex paraguariensis A. St.-Hil 2,8 1,39 0,01 - -
RUTACEAE 11,1 5,56 0,07 6,9 5,56
Zanthoxylum rhoifolium Lam. 6,9 2,78 0,05 5,6 4,17
Zanthoxylum petiolare A. St.-Hil. &Tul. 2,8 1,39 <0,01 - -
Zanthoxylum kleinii (R.S.Cowan) P. G. Waterman 1,4 1,39 0,01 1,4 1,39
CORDIACEAE 8,3 8,33 0,33 4,2 2,78
Cordia americana (L.) Gottschling & J. E. Mill. 6,9 6,94 0,32 4,2 2,78
Cordia trichotoma (Vell.) Arráb. Ex Steud. 1,4 1,39 <0,01 - -
ELAEOCARPACEAE 5,6 5,56 0,43 16,7 12,5
Sloanea monosperma Vell. 5,6 5,56 0,43 16,7 12,5
ASTERACEAE 5,6 4,17 0,27 2,8 2,78
Vernonanthura discolor (Spreng.) H.Rob. 5,6 4,17 0,27 2,8 2,78
SOLANACEAE 5,6 5,56 0,02 37,5 26,39
Solanum sanctaecatharinae Dunal 1,4 1,39 <0,01 4,2 4,17
Brunfelsia pilosa Plowman 1,4 1,39 <0,01 2,8 2,78
Cestrum strigilatum Ruiz et Pav. 1,4 1,39 <0,01 16,7 12,5
Brunfelsia cuneifolia J.A. Schmidt 1,4 1,39 <0,01 13,9 11,11
BIGNONIACEAE 5,6 4,17 0,08 2,8 2,78
Jacaranda puberula Cham. 2,8 2,78 0,05 - -
Handroanthus heptaphyllus (Mart.) Mattos 2,8 1,39 0,02 2,8 2,78

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

Cont.
MALVACEAE 5,6 2,78 0,16 1,4 1,39
Luehea divaricata Mart. & Zucc. 5,6 2,78 0,16 1,4 1,39
LOGANIACEAE 5,6 2,78 0,08 9,7 8,33
Strychnos brasiliensis (Spreng.) Mart. 5,6 2,78 0,08 9,7 8,33
CANELLACEAE 4,2 2,78 0,33 9,7 9,72
Cinnamodendron dinisii Schwancke 4,2 2,78 0,33 9,7 9,72
POLYGONACEAE 2,8 2,78 0,01 - -
Ruprechtia laxiflora Meisn. 2,8 2,78 0,01 - -
ANACARDIACEAE 2,8 1,39 0,03 - -
Lithrea brasiliensis Marchand 2,8 1,39 0,03 - -
MELASTOMATACEAE 2,8 1,39 <0,01 29,2 12,5
Miconia cinerascens Miq. 2,8 1,39 <0,01 20,8 9,72
STYRACACEAE 1,4 1,39 <0,01 4,2 4,17
Styrax leprosus Hook. & Arn. 1,4 1,39 <0,01 4,2 4,17
CELASTRACEAE - - - 72,2 45,83
Maytenus dasyclada Mart. - - - 58,3 37,5
Maytenus aquifolia Mart. - - - 12,5 11,11
Schaefferia argentinensis Speg. - - - 1,4 1,39
SYMPLOCACEAE - - - 19,4 15,28
Symplocos pentandra Occhioni - - - 12,5 9,72
Symplocos tetrandra (Mart.) Miq. - - - 6,9 6,94
CANNABACEAE - - - 6,9 6,94
Celtis iguanaea (jacq.) Sarg. - - - 5,6 5,56
Celtis brasiliensis (Gardner) Planch. - - - 1,4 1,39
SIMAROUBACEAE - - - 4,2 4,17
Picrasma crenata (Vell.) Engl. - - - 4,2 4,17
PROTEACEAE - - - 2,8 1,39
Roupala brasiliensis Klotzsch. - - - 2,8 1,39
PICRAMNIACEAE - - - 1,4 1,39
Picrammia parvifolia Engl. - - - 1,4 1,39

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

A distribuição das espécies e dos indivíduos que fizeram


parte da amostra, divididos em grupos ecológicos de estratifi-
cação, de dispersão e de necessidades de luz para germinação
(Tabela 2) evidenciou que, para o componente arbóreo adulto
(CA), a maioria das espécies é de dossel, com estratégia de dis-
persão zoocórica e, também, dependentes de luz para germina-
ção. Ao se observarem as proporções de indivíduos amostrados,
verificou-se que os grupos ecológicos predominantes se manti-
veram. O componente arbóreo regenerante (CR) apresentou a
maioria das espécies nos mesmos grupos ecológicos dominantes
no componente adulto. Mas, ao se observar a proporção de indi-
víduos por grupo ecológico, ou seja, independente da espécie,
houve predomínio de indivíduos de sub-bosque, com dispersão
zoocórica e tolerantes à sombra (Tabela 2).

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

Fonte: J. C. Budke.

Figura 2 – A) Inga marginata Willd. (ramo e frutos); B) Mimosa scabrella Ben-


th. (ramo e flores); C) Dasyphyllum tomentosum (Spreng.) Cabrera
(ramo e flores); D) Lonchocarpus campestris Mart. ex Benth. (ramo
e frutos); E) Myrsine umbellata Mart. (ramo e flores) F) Trixis pra-
estans (Vell.) Cabrera (ramo e flores); G) Schinus terebinthifolius
Raddi (ramo e frutos); H) Baccharis cf. punctulata DC. (ramo e
flores); I) Rudgea parquioides (Cham.) Müll.Arg. (ramo e flores).

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Tabela 2 – Proporções de espécies e indivíduos do componente arbóreo


adulto e regenerante em grupos ecológicos do componente arbó-
reo adulto (CA) e regenerante (CR) do Parque Natural Municipal
de Sertão-RS. χ² = Qui-quadrado para uma amostra independen-
te; G = teste G para proporções em amostras independentes.

% espécies % indivíduos
Grupos Ecológicos G G
CA CR CA CR
Estratificação
Dossel 65 62 55 35
Emergente 10 9 0.4 ns 4 3 8.5*
Sub-bosque 25 29 41 61
χ² 48.5* 42.9* 41.6* 52.3*
Dispersão
Anemocoria 24 17 10 6
Autocoria 4 2 2.2 ns 2 1 1.4 ns
Zoocoria 72 80 88 93
χ² 73.2* 101.8* 135.4* 160.5*
Necessidade de Luz
Dependentes de luz 73 74 53 36
Pioneiras 6 3 1.1 ns 2 0 9.3*
Tolerantes a sombra 21 23 45 64
χ² 74.1* 80.4* 45.1* 61.7*
*p < 0,01; ns = não significativo

Variações no gradiente borda-interior


Quanto à diferenciação ao longo do gradiente de borda-
-interior, a altura máxima, o diâmetro médio e o volume médio
foram os únicos parâmetros estruturais que apresentaram dife-
rença significativa ao longo do gradiente borda-interior no CA
(Tabela 3). Foram encontradas árvores mais altas no interior
do remanescente e essa altura foi diminuindo à medida que se
aproximou da borda do fragmento florestal. Diferente disso, o
diâmetro médio diferiu significativamente apenas entre as uni-
dades amostrais do grupo borda e meio, sendo os maiores valo-

- 53 -
As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

res encontrados para o grupo borda. Quanto ao volume médio,


o interior do fragmento apresentou volume mais elevado e dife-
rente do meio, mas ambos não diferiram da borda do remanes-
cente, que obteve valores intermediários.
A riqueza não variou significativamente para o CA, porém,
para o CR foi observada maior riqueza nas unidades amostrais
da borda da floresta, de forma que nas curvas de rarefação de
espécies, foi observada (Figura 3) uma tendência à estabilização
mais nítida, quando comparadas ao observado na CA.

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Tabela 3 – Médias ± desvio padrão de variáveis estruturais do componente arbóreo adulto (CA) e regenerativo (CR) ao longo
do gradiente borda-interior do Parque Natural Municipal de Sertão-RS. Médias seguidas por letras iguais não dife-
rem pelo teste Tukey. S = riqueza específica. Demais abreviações, vide Tabela 1.

CA CR
Parâmetro
Borda Meio Interior F Borda Meio Interior F

Abundância 17,0±7,4 18,2±4,47 16,5±3,5 0,66 ns 36,5±12,6 41,3±13,7 33,1±10,7 2,6 ns

S 7,7±2,8 7,7±1,7 8,1±2,5 0,23 ns 13,3±3,4b 10,1±4,1a 10,0±3,3a 6,21*

1704,1 1825 1650 3658,3 4133,3 3316,6


DA 0,66 ns 2,6 ns
±740,4 ±447,4 ±352,6 ±1264,5 ±1377,3 ±1077,7

- 55 -
DoA 47,4±36,2 35,4±18,4 55,3±48,1 1,82 ns 85,7±35,8 108,2±40,0 94,1±38,3 2,12 ns

Altura máx. 17,9 ±4,1a 18,3±3,9a 22,5±5,4b 7,61* 5,7±8,2 4,7±1,0 5,1±2,3 0,25 ns

DAP médio 14,8±5,1a 11,5±2,1b 13,9±3,2ab 4,90* 14,6±2,5 15,7±2,3 16,0±1,6 2,46 ns
Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Vol. médio 0,51±0,5ab 0,3±0,2b 0,6±0,6a 3,11* 0,06±0,03 0,08±0,03 0,09±0,04 2,70 ns
* = p < 0,05; ns = não significativo
As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

Figura 3 – Curvas de rarefação de espécies esperadas para o componente


(A) arbóreo adulto (CA) e (B) regenerante (CR) do Parque Natu-
ral Municipal de Sertão-RS. B = borda; M = meio; I = interior.

A composição e a abundância de espécies demonstraram


ser influenciadas pelo gradiente de borda, apresentando uma
separação parcial entre a matriz do grupo borda em relação aos
demais grupos (meio e interior). Considerando as espécies e a
abundância do CA, a maior diferença foi encontrada entre os
grupos borda e meio (F=4,2, p=0,0003) (Tabela 4). Já no CR, o
grupo borda diferiu significativamente dos demais, apresentan-
do valores parecidos (F=9,6, p=0,0001 entre borda e meio; F=6,3,
p=0,0001 entre borda e interior), porém, quando comparados
os grupos meio e interior não foi encontrada diferença signifi-
cativa (F=1,4, p=0,18) (Tabela 4).

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Tabela 4 – Análises de variância multivariada – Manova entre diferentes


grupos (borda, meio, interior) amostrados no Parque Natural Mu-
nicipal de Sertão-RS. SQt = soma de quadrados total; SQe =
soma de quadrados entre grupos; CA = componente adulto; CR
= componente regenerante.

SQt SQe F p
CA-borda x interior 14,08 13,4 2,34 0,01
CA-borda x meio 12,7 11,61 4,29 0,0003
CA-meio x interior 10,52 9,934 2,73 0,0069
CR-borda x interior 10,51 9,238 6,357 0,0001
CR-borda x meio 9,965 8,233 9,67 0,0001
CR-meio x interior 7,638 7,412 1,4 0,18

A ordenação das matrizes de abundância entre os compo-


nentes arbóreo adulto (CA) e regenerativo (CR), além do teste
de Mantel, revelaram uma correlação significativa entre os com-
ponentes (Mantel = 0,46, p < 0,05). Nesse sentido, a análise de
regressão múltipla demonstrou que a temperatura apresentou-
-se relacionada com o primeiro eixo de ordenação da PCoA
(R²=0,43, p=0,02), enquanto que o segundo eixo de ordenação
da PCoA foi relacionado à espessura da camada de serrapilhei-
ra (R²=0,34; p=0,02). A riqueza por unidade amostral do CR
foi influenciada significativamente pela umidade relativa do ar
(R²=0,28, p=0,03). Já a abundância por unidade amostral do CR
mostrou-se influenciada significativamente pela espessura da ca-
mada de serrapilheira (R²=0,37, p=0,02).

Discussão
Composição florística e estruturação florestal
Diversos trabalhos têm destacado a elevada riqueza de espé-
cies de Myrtaceae e Fabaceae na composição da flora em flores-
tas subtropicais (Higuchi et al., 2013; Oliveira-Filho et al., 2013;
Jarenkow; Waechter, 2001). Myrtaceae tem se revelado como fa-
mília com elevada riqueza em todas as formações florestais no

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

Brasil meridional (Mélo et al., 2013; Loregian et al., 2012; Giehl;


Jarenkow, 2008). Para Fabaceae, na floresta classificada como es-
tacional, a riqueza e a abundância de indivíduos são atribuídas
principalmente à localização geográfica. A região do Planalto Mé-
dio, em continuidade à diluição da flora do Alto Uruguai, é coin-
cidente com o corredor de entrada de espécies estacionais (mesó-
filo) no Rio Grande do Sul, em oposição ao corredor litorâneo ou
atlântico de espécies, que ocorre na faixa de Floresta Ombrófila
Densa (higrófilas) (Jarenkow; Waechter, 2001). Essa posição in-
termediária no gradiente de continentalidade leste-oeste no sul
da América, já destacada em trabalhos fitogeográficos recentes
(Oliveira-Filho et al., 2013, Oliveira-Filho et al., 2006), com algu-
mas variáveis climáticas e geográficas parecidas com as florestas
mais úmidas, permitiu alta permeabilidade de espécies, como
destacado por Higuchi et al. (2013) e Jarenkow e Budke (2009).
Dessa forma, além de elevada contribuição de espécies caracterís-
ticas da floresta com Araucária, há grande participação de espé-
cies das florestas estacionais na composição da flora arbórea do
Parque Natural Municipal de Sertão, assim como, nos setores do
Planalto Médio e Alto Uruguai, no Rio Grande do Sul.
Em trabalho recente (Budke et al., 2012), uma análise de
distribuição de espécies ao longo da região Alto Uruguai, incluin-
do diversos inventários florestais regionais que incluem a transi-
ção com o Planalto Médio (Áurea, Caxias do Sul, Erechim, Itaára,
Nova Prata, Passo Fundo, São Marcos e Três Arroios, dentre ou-
tros) destacou que a sobreposição de espécies florestais oriundas
desses contingentes migratórios geram elevada riqueza de espé-
cies coocorrentes, tal como verificado para o PNMS (92 espécies
arbóreas amostradas), imprimindo, assim, elevada diversidade
regional. Cabe ressaltar que, embora a floresta com Araucária im-
prima seu caráter fitofisionômico prevalente, gerando uma uni-
dade visual característica e distinta de outras formações florestais,
uma observação detalhada da composição da flora revela sua ele-
vada similaridade com espécies da floresta estacional.

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Desse modo, a região é composta por uma flora predo-


minantemente estacional, mas que abriga diversas espécies da
floresta com Araucária, e não o contrário. Algumas espécies que
ocorrem tanto em florestas estacionais quanto em florestas com
Araucária podem caracterizar nitidamente as áreas de transição,
incluindo espécies amostradas no PNMS: Rudgea parquioides,
Coussarea contracta e Ilex microdonta, muitas das quais de ocor-
rência ampla na região, embora sempre em baixa densidade
(Budke et al., 2012).
A estrutura da vegetação arbórea do PNMS caracterizou-
-se de maneira semelhante a outros inventários florestais na re-
gião, com destaque para espécies de Sapindaceae, Lauraceae e
Salicaceae, Fabaceae e Myrtaceae como mais abundantes ou, de
maior frequência e dominância (Mélo et al., 2013). No que tange
à Rubiaceae, embora a família apresente apenas quatro espécies,
a área expôs elevada densidade de Rudgea jasminoides e Coussarea
contracta, espécies de pequeno porte (sub-bosque) e que exibem
distribuição agrupada na área, conferindo maior participação
dessa família na estrutura florestal. No inventário do componente
regenerativo, além de Rudgea jasminoides, a participação de espé-
cies de sub-bosque de Meliaceae (Trichilia elegans) e Sapindaceae
(Allophylus guaraniticus) facultou um dossel extremamente denso,
e com um sub-bosque igualmente denso, reflexo da ocorrência
dessas espécies de pequeno porte (Leyser et al., 2012).
Dentre os grupos ecológicos avaliados, a prevalência de
espécies formadoras de dossel e dependentes de luz para germi-
nação é outro padrão característico das formações florestais sul-
-brasileiras (Budke et al., 2005; Giehl et al., 2007; Loregian et al.,
2012). Para a grande maioria das espécies, prevaleceu a zooco-
ria como estratégia de dispersão, com espécies que apresentam
frutos, geralmente de pequeno tamanho, sendo em geral dis-
persas por aves. Um dado interessante é que as espécies de sub-
-bosque são preferencialmente zoocóricas, concordando com os
resultados de Giehl et al. (2007) para uma floresta estacional no

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

sul do Brasil, sugerindo maior eficiência da dispersão por ani-


mais do interior da floresta. Finalmente, as baixas proporções
de espécies autocóricas (autodispersão) encontrados na região
restringem-se, quase exclusivamente, à família Euphorbiaceae.
Da mesma forma que muitas espécies são zoocóricas, na maioria
dos trabalhos realizados na região tem-se verificado o predomí-
nio de espécies dependentes de luz para germinação em relação
às tolerantes à sombra (Loregian et al., 2012). Embora esse seja
um padrão comum em florestas em estádio avançado de suces-
são, muitos dos fatores responsáveis por essa configuração per-
manecem desconhecidos. Em especial, em áreas que sofreram
cortes seletivos ou que estão em estádios iniciais e médios de
regeneração verifica-se certa profusão de Araucaria angustifólia,
onde o manejo permite um estabelecimento sem interferências
antrópicas sobre a regeneração (Budke et al., 2012). Em rela-
ção às espécies e aos indivíduos amostrados para o componente
regenerativo, a análise dos grupos ecológicos forneceu infor-
mações semelhantes, com exceção da proporção de indivíduos
de espécies de sub-bosque, que apresentaram proporção muito
elevada em comparação ao componente adulto. Esse padrão re-
flete a elevada densidade de espécies tolerantes à sombra, con-
forme já destacado e permite concluir que o remanescente está
em estádio avançado de sucessão.

Variações no gradiente borda-interior


Observou-se que a vegetação adulta apresenta reflexos ní-
tidos, porém sutis da influência da borda, mesmo que essa possa
ser considerada relativamente recente em termos de desenvol-
vimento florestal (formada no decorrer da década de 1960). A
idade da borda, da própria floresta e o tipo de uso adjacente
podem afetar diretamente a composição vegetal dos remanes-
centes florestais (Wulder, 2009). Foi observado que o principal
parâmetro que demonstra essa influência sobre a vegetação

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

adulta é a altura máxima das árvores, significativamente maior


no interior da área. A força do vento, ou mesmo a exploração
madeireira, possibilitadas pela fragmentação de habitats, con-
tribuem para que árvores maiores tombem ou sejam retiradas
nas proximidade da borda (Pivello et al., 2006). A altura máxi-
ma juntamente com o volume e diâmetro médios, que também
apresentaram variações significativas ao longo do gradiente,
contradizem os resultados de Ribeiro et al. (2009a) que não en-
contraram habitats estruturalmente diferentes em área de inte-
rior e bordas florestais em um fragmento de floresta atlântica,
considerando um gradiente de 200 m.
A regeneração florestal também se apresentou influencia-
da pela presença da borda, embora não tenham sido os mesmos
parâmetros estruturais (altura, volume, diâmetro) do compo-
nente adulto a apontar esse efeito da fragmentação. A riqueza
de espécies do CR, maior nas unidades amostrais do grupo da
borda, corrobora conceitos clássicos, mas ainda extremamente
importantes no entendimento da dinâmica florestal (Laurance
et al., 1998). Gonzalez et al. (2010) consideraram borda e in-
terior de floresta como habitats distintos e conseguiram identi-
ficar uma importante contribuição da borda para a riqueza de
espécies de todo o fragmento. Esse aumento foi justificado pelos
habitats de borda atuarem como interceptores de propágulos ex-
ternos, de espécies dispersas pelo vento, que não conseguiriam
atingir o interior do fragmento, bem como por serem habitats
mais favoráveis ao estabelecimento de espécies dependentes de
luz (Gonzalez et al., 2010).
Assim como para a riqueza, a estrutura e a composição de
espécies também obtiveram resultados consideráveis que de-
monstram a diferenciação do grupo borda dos demais grupos de
ambos os componentes, sendo as maiores diferenças encontradas
entre borda e meio no componente adulto, e borda e os demais
na regeneração florestal. Além disso, o componente regenerante
não apresentou diferenças significativas entre as unidades amos-

- 61 -
As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

trais do meio e interior, exibindo o mesmo padrão já verificado


para a riqueza desse mesmo componente (Laurance et al., 1998).
Isso permite inferir que, ao considerar-se os parâmetros riqueza,
composição e abundância de espécies do CR, os efeitos de bor-
da não podem ser verificados ao longo de todo o gradiente aqui
considerado (450 m), mas apenas na primeira parte desse (cerca
de 250 m). Quando comparadas as riquezas e as abundâncias de
remanescentes florestais de diferentes tamanhos, Gonzalez et al.
(2010) observaram que o ambiente de borda aumenta propor-
cionalmente conforme o tamanho total do remanescente flores-
tal, mas ao atingir certo limite, o tamanho da borda permanece
inalterado. Laurance et al. (1998), estudando remanescentes da
floresta Amazônica, concluíram que tal limite é claro até 100 m,
podendo atingir 300 m em fragmentos maiores, conforme a ativi-
dade desenvolvida a partir da borda.
Apesar de responderem de forma diferenciada à presença
de uma borda florestal, os componentes adulto e regenerativo
apresentaram-se significativamente correlacionados. Ou seja, de
maneira geral, as espécies adultas apresentam-se também na re-
generação florestal, mesmo que essa esteja sendo influenciada
pelo efeito de borda em função do isolamento do fragmento na
paisagem (Marchesini et al., 2009). Em trabalho semelhante, em
uma floresta estacional, porém fora de um gradiente de borda,
Leyser et al. (2012) observaram que não havia correlação signifi-
cativa entre os componentes adulto e regenerante, considerando
a existência de um padrão de separação de nichos definindo-se
como a ocupação diferencial de cada porção de habitat pela es-
pécie. Além da correlação, observou-se um acréscimo de riqueza
do componente adulto ao regenerante, ao contrário do encon-
trado por Leyser et al. (2012) ao estudar a regeneração florestal
fora de um gradiente de borda. A formação de uma área de bor-
da cria diferentes condições abióticas que podem aumentar a ri-
queza arbórea total, favorecendo o estabelecimento de espécies
com diferentes estratégias de sobrevivência, principalmente as

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

adaptadas à borda florestal (Gonzalez et al., 2010). Porém, essas


são espécies diferentes das encontradas na formação original, in-
cluindo, muitas vezes, espécies exóticas e invasoras.
Neste trabalho, também foi verificado que a regeneração
florestal sofre efeito significativo de alguns fatores abióticos so-
bre sua composição e abundância. A temperatura e a umidade
relativa do ar são fatores integrantes dos efeitos de borda (Ho-
landa et al., 2010) e exerceram influência significativa sobre a
composição e a riqueza arbórea regenerante no gradiente anali-
sado. Temperaturas mais altas e níveis menores de umidade re-
lativa do ar e do solo conduzem a fenômenos como o aumento
da evapotranspiração (Holanda et al., 2010), modificando as ta-
xas de mortalidade e de recrutamento de plantas em ambientes
de borda. Com o passar do tempo, essas condições permitem a
instalação de comunidades com composição de espécies distin-
tas da original e, portanto, da comunidade do interior dos frag-
mentos (Laurance et al., 1998; Ribeiro et al., 2009b).
Foi observado que a abundância, por unidade amostral,
do componente arbóreo regenerante também foi influenciada
pela espessura da camada de serrapilheira. Alguns trabalhos
têm evidenciado fortes efeitos da serrapilheira sobre a emergên-
cia de plântulas (Dupuy; Chazdon, 2006), tanto dificultando
a emergência ou o acesso das raízes ao solo, quanto atuando
como filtro de luz, afetando a germinação de sementes sensí-
veis à luz. A presença desse elemento é fundamental na manu-
tenção da diversidade de plântulas, pois as espécies respondem
de maneira diferenciada à presença de serrapilheira (Molofsky,
Augspurger, 1992). Além disso, a espessura da camada controla
o recrutamento de espécies pioneiras (Dupuy; Chazdon, 2006)
e permite a germinação de espécies de outros grupos ecológi-
cos, como os tolerantes à sombra, por exemplo.
No PNMS, a fragmentação de habitats mostrou-se influente
sobre a comunidade arbórea por meio dos efeitos de borda, que
comprovaram agir de maneira diferenciada na floresta adulta e
regenerante. Os parâmetros estruturais revelaram a influência da

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As florestas do Parque Natural Municipal de Sertão

borda florestal sobre o componente arbóreo adulto, enquanto que


para o componente arbóreo regenerante, a riqueza apresentou
variações ao longo do gradiente analisado, sendo maior nas pro-
ximidades da borda, corroborando conceitos importantes nesse
sentido (Gonzalez et al., 2010). A distribuição e a abundância das
espécies arbóreas adultas foram influenciadas significativamente
pela temperatura e pela espessura da camada de serrapilheira, ao
passo que a riqueza sofre influência da umidade relativa do ar,
corroborando resultados já observados acerca da importância dos
fatores abióticos sobre a comunidade florestal em ambientes de
borda (Dupuy; Chazdon; 2006; Holanda et al., 2010).

Perspectivas para conservação


A descrição e a análise das florestas do Parque Natural Mu-
nicipal de Sertão permitiram a apreciação, a discussão e a com-
provação de um dos efeitos mais marcantes da fragmentação
de habitats florestais, o chamado efeito de borda. No que diz
respeito à estrutura da floresta, foi possível verificar que, mesmo
sendo relativamente recente, a formação da borda no remanes-
cente estudado já produziu mudanças: na estrutura, por meio
de variações em parâmetros como a altura máxima, o diâmetro
e o volume médios na floresta adulta; na riqueza e na frequência
da regeneração florestal, que variaram ao longo do gradiente de
borda analisado.
Atuando mais especificamente sobre o componente re-
generante, fatores abióticos como a temperatura média do ar,
a umidade relativa e a espessura da camada de serrapilheira
também tiveram, pelas análises realizadas, sua influência com-
provada. Ainda assim, e mesmo respondendo de maneira dife-
renciada aos efeitos da fragmentação florestal, o componente
arbóreo regenerante apresentou-se correlacionado ao compo-
nente adulto, permitindo, ao menos em parte, a manutenção
das espécies florestais presentes na área.

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Laura Benetti Slaviero, Jean Carlos Budke, Rogério Luis Cansian

Os mecanismos associados aos padrões e ao funcionamen-


to das florestas regionais começaram, recentemente, a serem
investigados. Pelos estudos até o momento realizados, a estru-
turação dessas florestas está fortemente associada a espécies
zoocóricas e dependentes de luz para germinação. Na área do
PNMS, tais características refletem que a área encontra-se em
estádio avançado de sucessão e, pelo cenário exposto, denota-se
que a região é peculiar e favorece o desenvolvimento de estudos
fitogeográficos. Em um âmbito mais ampliado, os padrões estru-
turais estão, inicialmente, sendo revelados.
Dentre os principais aspectos que remetem à continuida-
de da investigação científica nesses remanescentes, destacamos
que o processo de dinâmica florestal e os estudos de variabili-
dade genética poderão fornecer indícios para o entendimento
do processo de fragmentação florestal, exercendo pressão sobre
o desenvolvimento das populações vegetais e animais ao longo
desse remanescente, e de tantos outros que formam a paisagem
do Planalto Médio e do Alto Uruguai no Rio Grande do Sul.

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- 68 -
Capítulo 4
Anfíbios anuros do Parque Natural
Municipal de Sertão

Noeli Zanella*
Almir de Paula**
Samara Arsego Guaragni***
Leonardo de Souza Machado*

Introdução
Anfíbios são importantes componentes faunísticos am-
plamente distribuídos no planeta, estando ausentes apenas
em regiões de clima muito frio e em ecossistemas marinhos
(Duellman; Trueb 1986; Pough et al., 2008). São organismos
suscetíveis às alterações ambientais, devido a sua pele sensível e
permeável, e por possuírem um ciclo de vida bifásico, na maio-
ria das espécies, com adultos ocupando o meio terrestre e com
larvas no meio aquático. Por esses motivos, são importantes in-
dicadores ambientais, já que podem revelar a saúde de todo
um ecossistema (Duellman; Trueb, 1986; Tocher, 1998; Pough
et al., 2008).

*
Instituto de Ciências Biológicas, Universidade de Passo Fundo (UPF).
**
Universidade de Brasília, Instituto de Biologia, Departamento de Zoologia, La-
boratório de Herpetologia. Campus Darcy Ribeiro.
***
Departamento de Zoologia, Instituto de Biociências, Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS).
Anfíbios anuros do Parque Natural Municipal de Sertão

No Brasil, estima-se que existam cerca de 988 espécies, o


que faz do país um dos mais diversos em fauna de anfíbios anu-
ros (Segalla et al., 2014). Além da grande diversidade de espé-
cies, o país apresenta uma grande diversidade de biomas, dois
deles (Mata Atlântica e Cerrado) considerados áreas prioritárias
para a conservação (hotspots), isso porque possuem um elevado
grau de riqueza e endemismo de espécies (Myers et al., 2000).
A Mata Atlântica é um bioma particularmente rico em espécies
de anfíbios, se distribui por todo o litoral brasileiro, abrangendo
estados das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste, com
grande heterogeneidade de fisionomias que propicia a diversi-
dade de organismos encontrada (MMA, 1998).
O processo de fragmentação da Mata Atlântica com pro-
gressiva redução de remanescentes de florestas naturais originou
a perda de habitats naturais, devido à ação humana ao longo das
últimas décadas. Dentre as consequências mais severas desse pro-
cesso estão a alteração da riqueza e a composição das espécies
(Mähler Jr.; Larocca, 2009). Mas mesmo com essa fragmentação,
a Mata Atlântica brasileira apresenta um dos maiores níveis de
endemismos do mundo (Myers et al., 2000), e cerca de metade
desses remanescentes de grande extensão estão protegidos, na
forma de unidades de conservação (Galindo; Câmara, 2005).
Inventários faunísticos são importantes meios de registrar
a composição faunística de uma região e acompanhar a sua evo-
lução com o passar dos anos. Dessa forma, levantamentos, como
o do Parque Natural Municipal de Sertão, são de extrema im-
portância para o conhecimento da diversidade e para a conser-
vação das espécies da região.

- 70 -
Noeli Zanella et al.

Material e métodos
Amostragem
Amostramos os anfíbios, de forma sistematizada, entre
maio de 2008 e abril de 2010, e até janeiro de 2011 com pro-
curas adicionais. Durante todo o período, utilizamos três méto-
dos de amostragens: (1) Armadilhas de interceptação e queda
(AIQ) (pitfall traps) (Cechin; Martins, 2000), instaladas em qua-
tro parcelas na área. Cada uma das parcelas era composta por
oito recipientes com capacidade de 150 L e distantes 10 m entre
si, totalizando 32 recipientes, dispostos em linha reta dentro da
mata; (2) Na procura ativa (PA), percorremos trilhas em am-
bientes naturais, no interior da mata, em banhados e áreas do
entorno do fragmento, inspecionando tocas, troncos e pedras
durante o dia e a noite, em que, também, realizamos a escuta
de vocalizações; (3) Por fim, utilizamos encontros ocasionais da
equipe (EO), feitos durante o descolamento entre as parcelas
na área de estudo.

Análise de dados
O grau de similaridade do Parque Natural Municipal de
Sertão (PNMS) foi comparado com as localidades: Lagoa do Pei-
xe (LP) (Loebmann; Vieira, 2005), Parque Estadual de Itapeva
(Peva) (Colombo et al., 2008), Itaara (It) (Both et al., 2008),
Fazenda da Brigada (FB), Passo Fundo (Zanella, N. dados não
publicados), Sertão (PNMS) (Zanella et al., 2013), Santa Ma-
ria (SM) (Santos et al., 2008), Parque Nacional das Araucárias
(PNA) (Lucas; Marocco, 2011), Parque Estadual Fritz Plaumann
(PEFP) (Bastiani; Lucas, 2013). Para esta análise aplicamos o co-
eficiente de Jaccard (Cj) com posterior análise de agrupamento
e tais relações foram representadas por meio de dendrograma,
utilizando o programa Past (Hammer et al., 2001).

- 71 -
Anfíbios anuros do Parque Natural Municipal de Sertão

Resultados e discussão
Foram registradas 23 espécies de anuros distribuídas em
seis famílias (Figura 1): Brachycephalidae (n=1), Bufonidae
(n=3), Odontophrynidae (n=2), Hylidae (n=8), Leptodactyli-
dae (n=8) e Microhylidae (n=1). Armadilhas de interceptação e
queda foram responsáveis pelo registro de 19 espécies (82,6%),
procura ativa amostrou 15 (65,2%)e os encontros ocasionais
amostraram duas espécies (8,9%). Seis espécies foram exclu-
sivas das armadilhas de queda (26%) e três de procura ativa
(13%) (Tabela 1).
O método mais eficiente na amostragem da riqueza de espé-
cies de serrapilheira foi o de armadilhas de interceptação e que-
da, mesmo quando os dados mostram as coletas exclusivas por tal
método (29,2%). Estudos mostram a eficácia desses métodos, es-
pecialmente para espécies de serrapilheira (Dixo; Verdade, 2006;
Condez et al., 2009) e uma alta eficiência qualitativa das armadi-
lhas de queda é geralmente registrada para anfíbios (Vasconsce-
los et al., 2010). As espécies que foram exclusivas da procura ativa
(Dendropsophus minutus e Hypsiboas pulchellus), dificilmente seriam
capturadas pelos outros métodos, porque são espécies associadas
a ambientes de poças temporárias, tais como lagos e açudes (Kwet
et al., 2010), o que diminui as chances de coletá-las em armadi-
lhas de queda nas áreas de mata.
Registramos sete modos reprodutivos (sensu Haddad; Pra-
do, 2005) para as 23 espécies registradas na área. Os mais abun-
dantes foram: modo 1 (modo reprodutivo generalizado, carac-
terizado pela deposição de ovos e desenvolvimento de girinos
em ambientes lênticos) (10 espécies; 43,5%); modo 11 (n=5;
21,7%) e modo 30 (n=3; 13,0%) desova em ninho de espuma
depositado na superfície da água e em câmara subterrânea, res-
pectivamente com desenvolvimento dos girinos em ambientes
lênticos (Tabela 1).

- 72 -
Noeli Zanella et al.

A postura de ovos diretamente na superfície da água (modo


1) é o meio mais primitivo e generalizado de reprodução entre
os anuros (Duellman; Trueb, 1994). Pombal e Haddad (2005)
encontraram 52,6% das espécies com o modo 1, no sudeste do
Brasil. Zina et al. (2007) encontraram em 52% das espécies e
Santos et al. (2008) em 58,3% em uma área de Pampa-RS. Lucas
e Marocco (2011) também encontraram o modo 1 como o mais
comum, seguido do modo 11, em um remanescente de Flores-
ta Ombrófila Mista no estado de Santa Catarina. A ocorrência
de sete modos reprodutivos, neste estudo, representa 24,1% dos
modos reprodutivos conhecidos para a Mata Atlântica (Haddad;
Prado, 2005) e esses autores afirmam, ainda, que, em áreas al-
tamente heterogêneas, como a Floresta Atlântica, ocorre maior
diversidade de modos reprodutivos. Entretanto, o encontro do
maior número de espécies com o modo reprodutivo generaliza-
do pode estar indicando, entre outros fatores, a homogeneidade
do ambiente, contribuindo para a predominância desse modo
reprodutivo. A presença dos modos reprodutivos 11 e 30 (com
desova em ninho de espuma) também pode estar relacionada à
homogeneidade do habitat. Santos et al. (2008) sugerem que em
áreas subtropicais onde a sazonalidade climática é regida pela
temperatura e não pelas chuvas, a homogeneidade do habitat
talvez seja o fator mais importante para explicar a predominân-
cia de espécies que utilizam esses modos.
A taxocenose de anuros do PNMS está mais relacionada
à FB, com similaridade de aproximadamente 60% (Figura 2).
As duas áreas são de Mata Atlântica e estão mais próximas geo-
graficamente. A próxima área com maior similaridade é PNA,
seguida de PEFP, fechando um agrupamento com similaridade
elevada.
O padrão obtido entre a anurofauna das localidades com-
paradas parece coerente, com dois grandes agrupamentos, um
que engloba a planície costeira e a depressão central (It, LP,
SM e PEVA) e o outro, o planalto das araucárias (FB, St, PEFP e

- 73 -
Anfíbios anuros do Parque Natural Municipal de Sertão

PNA). As diferenças encontradas parecem estar relacionadas ao


tipo de ambiente, distintos nos dois grupos, e que influenciam a
composição das espécies.
Registramos uma espécie ameaçada de extinção, na cate-
goria Ameaçado – em perigo (Hypsiboas curupi) (Rio Grande do
Sul, 2014). Essa espécie é, geralmente, encontrada na vegetação
nas margens de riachos rasos, em áreas de floresta estacional
jan semidecidual
fev mar abr mai jun de
e florestas jul araucárias,
ago set out nov do
dentro dezdomínio da
144 15 103 67 38 76 30 96 83 115 127 96 990
Mata Atlântica (Garcia et al., 2007) e no Rio Grande do Sul já
73 19 40 32 8 4 7 72 68 63 59 52 497
foi registrada
20 3 8 para
23 o6Parque37 15 Estadual
24 26do Turvo,
66 25no município
18 de
271
Derrubadas
66 25 35 (Iop 9 et 1al., 2009). 1 8 21 56 45 267
53 5 8 9 2 1 6 59 37 30 210
20 2 12 11 7 3 3 2 49 20 17 146
7 1000 5 9 2 2 2 4 9 20 7 3 70
16 1 7 1 1 3 12 2 43
1 80013 2 1 1 9 9 1 37
Número indivíduos

1 1 5 1 2 3 2 1 16
1 600 1 1 1 4 2 4 14
2 1 2 2 2 5 14
1 1 2 1 5
1 400 2 1 4
1 1 1 3
200 3 3
1 1
0 1 1
Pg Lh Pb Lp Ri Rh Md Lm Pc1 Oa Ap Eb Pbi Ll 1
Hs

404 72 235 170 63 131 Espécies


55 203 212 418 365 265 2593

Figura 1 – Abundância de anfíbios anuros em armadilhas de queda entre


maio de 2008 a abril de 2010, no Parque Natural Municipal de
Sertão - RS. Ap = A. perviridis; Eb = E. bicolor; Hc=H. curupi;
Hf=H. faber; Ih= I. henselli; Ll=L. latrans; Lm=L. mystacinus;
Lp =L. plaumanni; Md= M. devincenzii; Oa=O. americanus;
Pb=P. bigibbosa; Pbi=P. biligonigerus; Pc=P. cuvieri; Pg= P.
gracilis; Rh=R. henseli; Ri=R. icterica; Sa=S.aromothyela;
Sf= S. fuscovarius; SS= S. squalirostris.

- 74 -
Noeli Zanella et al.

Figura 2 – Análise de agrupamento baseada no índice de similaridade de


Jaccard, comparando a composição de taxocenoses de anuros
de nove localidades no sul do Brasil, com a registrada no Parque
Natural Municipal de Sertão-RS. Lp= Lagoa do Peixe; PEVA=
Parque Estadual de Itapeva; It=Itaara; FB= Fazenda da Brigada;
PNMS= Parque Natural Municipal de Sertão; SM= Santa Maria;
PNA= Parque Nacional das Araucárias; PEFP= Parque Estadual
Fritz Plaumann.

- 75 -
Anfíbios anuros do Parque Natural Municipal de Sertão

Tabela 1 – Riqueza de espécies de anuros, metodologia aplicada e modo


reprodutivo das espécies no Parque Natural Municipal de Sertão,
no período de maio de 2008 a abril de 2010. AIQ= armadilha de
interceptação e queda; EO= encontros ocasionais; PA= procura
ativa; MR= modo reprodutivo.

Família Espécies Metodologia MR

Brachycephalidae Ischnocnema henselii (Peters, 1872) AIQ/EO 23


Bufonidae Melanophyniscus devincenzii Klappenbach, 1968 AIQ/EO/PA 1
Rhinella henseli (A. Lutz, 1934) AIQ 1 ou 2
Rhinella icterica (Spix, 1824) AIQ/PA 2

Hylidae Aplastodiscus perviridis A. Lutz, 1950 AIQ/PA 5


Dendropsophus minutus (Peters, 1872) PA 1
Hypsiboas curupi Garcia Faivovichi & Haddad, 2007 AIQ/PA 2
Hypsiboas faber (Wied-Neuwied, 1821) AIQ/PA 4
Hypsiboas pulchellus (Duméril & Bibron, 1841) PA 1
Scinax aromothyella Faivovich, 2005 AIQ 1
Scinax fuscovarius (A. Lutz, 1925) AIQ/PA 1
Scinax squalirostris (A. Lutz, 1925) PLT 1

Leptodactylidae Leptodactylus fuscus (Schneider, 1799) AIQ 30


Leptodactylus latrans (Steffen, 1815) PA 30
Leptodactylus mystacinus (Burmeister, 1861) AIQ/PA 11
Leptodactylus plaumanni Ahl, 1936 AIQ/PA 30
Physalaemus biligonigerus (Cope, 1861) AIQ 11
Physalaemus cuvieri Fitzinger, 1826 AIQ/PA 11
Physalaemus gracilis (Boulenger, 1883) AIQ/PA 11
Physalaemus lisei Braun & Braun, 1977 AIQ 11

Microhylidae Elachistocleis bicolor (Guérin-Menéville, 1838) AIQ/PA 1

Odontophrynidae Odontophrynus americanus (Duméril & Bibron, 1841) AIQ 1


Proceratophrys bigibbosa (Peters, 1872) AIQ/PA 1 ou 2

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Noeli Zanella et al.

Fonte: Noeli Zanella.


Figura 3 – Anfíbios registrados no Parque Natural Municipal de Sertão. a)
Dendropsophus minutus; b) Elachistocleis bicolor; c) Hypsiboas
curupi; d) H. faber; e) Ischnocnema henseli; f) Scinax fuscovarius;
g) S. squalirostris; h) Leptodactylus fuscus; i) L. mystacinus; j)
L. plaumanni; K) Melanophryniscus devincenzii; l) Physalaemus
cuvieri; m) P. gracilis; n) Rhinella icterica; o) R. henseli.

- 77 -
Anfíbios anuros do Parque Natural Municipal de Sertão

Perspectivas para a conservação


As principais causas do declínio de populações de anfíbios
estão associadas às constantes mudanças climáticas, à poluição, à
contaminação do solo e à introdução de espécies exóticas, bem
como às doenças causadas, principalmente por fungos (Kiese-
cker et al., 2001; Bosch, 2003; Toledo et al., 2007).
Espécies exóticas representam uma ameaça potencial aos
anuros. O Sus scrofa (javali), presente no Parque, pisoteia e alte-
ra, significativamente, os corpos d’água, resultado do hábito de
escavar e revirar o solo. Além disso, essa espécie oferece outros
riscos às espécies e aos ambientes naturais, tais como a predação
de ovos em ninhos de aves e os danos causados na vegetação na-
tiva (Deberdt; Scherer, 2007). O controle populacional da espé-
cie deve ser avaliado para minimizar os impactos encontrados.
A contaminação de corpos d’água do entorno por agro-
tóxicos pode ser uma das causas do encontro de anfíbios com
anomalias no interior do Parque. Conhecer as causas das ano-
malias é essencial para esclarecer os motivos da degradação
ambiental, das doenças e do declínio dos anfíbios (Ballengée;
Sessions, 2009). O desenvolvimento de experimentos, avaliando
se os agroquímicos apresentam relação com anomalias poderá
contribuir com respostas a essas questões. Também poderia ser
estimulada a agricultura de baixo impacto, resultando no incen-
tivo a outras possibilidades na cadeia produtiva que gerem ren-
da ao agricultor e diminuam os impactos no Parque.
Para minimizar os problemas encontrados no Parque,
sugerimos a intensificação da fiscalização por guarda-parques,
bem como o desenvolvimento de programas de educação am-
biental, especialmente direcionados aos moradores vizinhos.
A ocorrência de uma espécie ameaçada, que utiliza somen-
te a floresta é um indicativo da importância da área para a con-
servação da fauna regional.

- 78 -
Noeli Zanella et al.

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- 81 -
Capítulo 5
Répteis do Parque Natural
Municipal de Sertão

Almir de Paula*
Noeli Zanella**
Samara A. Guaragni***

Introdução
Existem, atualmente, cerca de 744 espécies de répteis co-
nhecidas no Brasil: 36 quelônios, seis jacarés, 248 lagartos, 68
anfisbenas e 386 serpentes e o país ocupa a segunda posição na
relação com maior riqueza de espécies (Bérnils; Costa, 2012).
No Rio Grande do Sul, foram registradas cerca de 126 espécies
(Bencke et al., 2009) que correspondem a 17% das registradas
para o Brasil. O grupo das serpentes é o mais rico no RS, corres-
pondendo a 68% das espécies de répteis (Bencke et al., 2009).
Dessas, trinta espécies encontram-se incluídas na lista vermelha
do Brasil ou lista vermelha da IUCN (Alves et al., 2012).

*
Universidade de Brasília, Instituto de Biologia, Departamento de Zoologia, La-
boratório de Herpetologia. Campus Darcy Ribeiro.
**
Instituto de Ciências Biológicas, Universidade de Passo Fundo (UPF).
***
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Instituto de Biociências,
Departamento de Zoologia, Campus do Vale.
Almir de Paula, Noeli Zanella, Samara A. Guaragni

Répteis são muito sensíveis a alterações ambientais, e a des-


truição dos habitats naturais tem sido um dos principais fatores
que influenciaram os declínios populacionais. O processo de
fragmentação da Mata Atlântica, incluindo a Floresta Ombró-
fila Mista, originou a fragmentação progressiva de remanescen-
tes de florestas naturais em pequenas manchas (Almeida et al.,
2010), isoladas por plantações, pelo desenvolvimento industrial
ou urbano. Dentre as consequências mais severas desse proces-
so estão a alteração da riqueza e a composição das espécies em
função das restrições de fluxo populacional e das perdas do
equilíbrio dinâmico da comunidade (Mähler Jr.; Larocca, 2009;
Almeida et al., 2010), especialmente para as espécies florestais,
que são ainda mais sensíveis às temperaturas altas, em forma-
ções abertas (Rodrigues, 2005).
O Parque Natural Municipal de Sertão é um fragmento
importante no norte do estado pelo tamanho e por agregar im-
portantes espécies animais. Aqui, são apresentadas informações
sobre os répteis encontrados no parque, pois inventários fau-
nísticos são instrumentos importantes para a elaboração de um
plano de manejo para a área.

Material e métodos
Amostramos os répteis entre maio de 2008 e abril de 2010,
utilizando três métodos complementares: (1) armadilhas de
interceptação e queda (Cechin; Martins, 2000) (AIQ), (Figura
1), que foram instaladas em quatro parcelas compostas por oito
recipientes com capacidade de 150 L e distantes 10 m entre si,
totalizando 32 recipientes, dispostos em linha reta dentro da
mata; (2) procura ativa (PA), onde percorremos trilhas em am-
bientes naturais, no interior da mata, em banhados e áreas do
entorno do fragmento, inspecionando tocas, troncos e pedras;
(3) e encontros ocasionais da equipe (EO) feitos durante o des-
colamento entre as parcelas na área de estudo.

- 83 -
Répteis do Parque Natural Municipal de Sertão

Fonte: Noeli Zanella.

Figura 1 – Armadilhas de interceptação e queda instaladas dentro do Par-


que Natural Municipal de Sertão.

Análise de dados
Para analisar a riqueza das espécies coletadas nas armadi-
lhas de queda, utilizamos os estimadores não paramétricos Boots-
trap e Jacknife de primeira ordem (Colwell; Coddington, 1994).
Para isso, cada mês foi considerada uma unidade amostral, re-
sultando em 24 amostras. Para verificar a relação da temperatu-
ra média sobre a abundância de serpentes, utilizamos uma aná-
lise de correlação de Spearman (rs).

Resultados e discussão
Registramos dez espécies de répteis, sendo nove espécies
pertencentes a duas famílias de serpentes (Figura 2). Dipsadidae
foi a família mais rica com sete espécies, Viperidae apresen-
tou duas espécies e Teiidae somente uma espécie (Tabela 1). A
maior parte das espécies foi coletada utilizando armadilhas de
interceptação e queda (n=7) e as mais abundantes, nesse mé-
todo, foram Atractus paraguayensis (41,5%), Oxyrhopus clathratus
(18,3%) e Bothrops jararaca (17%) (Tabela 1). Na procura ativa,
registramos três espécies (Bothrops jararaca, Oxyrhopus clathratus
e Tomodon dorsatus) e em encontros ocasionais registramos Philo-
dryas aestiva, Xenodon merremii e Salvator merianae.

- 84 -
Almir de Paula, Noeli Zanella, Samara A. Guaragni

Encontramos um aumento de ocorrência de serpentes


de outubro a janeiro, períodos de maior temperatura (rs=0,46;
P=0,02) (Figura 3). Essa tendência sazonal na atividade também
é registrada em outras comunidades, especialmente no sul do
Brasil (Zanella; Cechin, 2006; Di-Bernardo et al., 2007) e reflete
que a temperatura é um fator climático importante sobre os pa-
drões de atividade das serpentes (Lillywhite, 1987).

Fonte: Noeli Zanella.


Figura 2 – Répteis do Parque Natural Municipal de Sertão. A) Atractus
paraguayensis; B) Bothrops cotiara; C) Bothrops jararaca; D)
Oxyrophus clatratus; E) Salvator merianae; F) Xenodon merremii.

- 85 -
Répteis do Parque Natural Municipal de Sertão

As curvas de rarefação de espécies não estabilizaram


(Bootstrap = 9,86 ± 0,35; Jacknife 1 = 10,92 ± 1,33), indican-
do que, utilizando essa metodologia, não foram encontradas
todas as espécies que ocorrem na área. O número de espécies,
certamente, está aquém do que ocorre na região, pois em área
próxima foram registradas 14 espécies de serpentes, utilizando
metodologias semelhantes (Zanella; Cechin, 2006). Serpentes
são difíceis de serem amostradas porque ocorrem geralmente
em baixas densidades, são crípticas e possuem hábitos secretivos
(Greene, 1997). Em biomas florestais, como a Mata Atlântica,
comunidades de serpentes são compostas por muitas espécies
arborícolas e semiarborícolas (Martins; Oliveira, 1998; Marques;
Sazima, 2004), o que pode ter contribuído para a baixa riqueza
das espécies capturadas nas armadilhas. Como qualquer método
de amostragem, armadilhas de queda podem ser tendenciosas
para a fauna. As poucas espécies registradas no PNMS podem
estar refletindo a qualidade do fragmento ou o tipo de metodo-
logias utilizadas para a amostragem das serpentes.

20
24
18
Número de Indivíduos

16
Temperatura média

20
14
12 16
10
8 12
6
4 8
2
0 4
jan fev mar abr maio jun jul ago set out nov dez
Meses

Figura 3 – Número total de serpentes encontradas em armadilhas de queda e


a temperatura média no Parque Natural Municipal de Sertão - RS.

- 86 -
Almir de Paula, Noeli Zanella, Samara A. Guaragni

Tabela 1 – Répteis do Parque Natural Municipal de Sertão, no período de


maio de 2008 a abril de 2010.
Tipo de
Família Espécie Nome comum
registro
Dipsadidae Atractus paraguayensis Werner, 1924 AIQ
Echinanthera cyanopleura (Cope, 1885) Corredeira-do-mato AIQ
Oxyrhopus clathratus Duméril, Bibron e Duméril, 1854 Cobra-coral-falsa AIQ/PA
Philodryas aestiva (Duméril, Bibron e Duméril, 1854) Cobra-verde EO
Taeniophallus affinis (Günther, 1858) Cobra-cabeça-preta AIQ
Tomodon dorsatus Duméril, Bibron e Duméril, 1854 Cobra-espada AIQ/PA
Xenodon merremii (Wagler, 1824) Boipeva EO
Viperidae Bothrops cotiara (Gomes, 1913) Cotiara AIQ
B. jararaca (Wied, 1824) Jararaca AIQ/PA
Teiidae Salvator merianae Duméril e Bibron, 1839 Teiú EO
Método de amostragem: AIQ = armadilha de interceptação e queda, EO = encontro ocasional,
PA = procura ativa.

Perspectivas para a conservação


As principais ameaças aos répteis são a perda e a fragmen-
tação do habitat e a matança indiscriminada.
Propomos incluir, no plano de manejo em elaboração, um
Programa de Educação Ambiental para informar sobre as espé-
cies do Parque e sua importância, utilizando uma abordagem
educativa. O objetivo desse Programa é reduzir o número de
serpentes mortas ao serem encontradas pela comunidade do
entorno, bem como orientar os administradores e os potenciais
visitantes para as precauções e os cuidados exigidos ao deparar-
-se com serpentes peçonhentas, pois uma das mais abundantes
é a Bothrops jararaca.
Quanto à fragmentação, sugerimos que sejam realizados es-
tudos das potenciais conectividades do Parque com outras áreas,
visando à conservação dessa e de outras espécies do PNMS.
Nenhuma espécie registrada foi considerada em perigo
ou ameaçada na lista de espécies do Rio Grande do Sul (Rio
Grande do Sul, 2014), entretanto, os fragmentos de Floresta
Atlântica apresentam altos valores biológicos, conservando a

- 87 -
Répteis do Parque Natural Municipal de Sertão

integridade ecológica, protegendo a biodiversidade regional


e fornecendo populações-fonte para a recolonização de áreas
previamente degradadas (Ditt, 2002).

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- 89 -
Capítulo 6
Avifauna do Parque Natural
Municipal de Sertão

Élinton Luis Rezende*


Carlos Eduardo Agne**

Introdução
A bacia hidrográfica do rio Passo Fundo é uma das regiões
menos exploradas e, consequentemente, menos conhecida
ornitologicamente do Rio Grande do Sul. Apesar de vários re-
gistros terem sido divulgados recentemente na literatura rela-
cionada, tais como: Patagioenas cayennensis (Bonnaterre, 1792)
– pomba-galega, Parque Municipal de Pontão/Sagrisa; Leptodon
cayanensis (Latham, 1790) – gavião-de-cabeça-cinza, Reserva In-
dígena Nonoai (Bencke et al., 2003); Dryocopus galeatus (Tem-
minck, 1822) – pica-pau-de-cara-canela, Passo Fundo, Campus
UPF (Agne, 2005); Phaethornis pretrei (Lesson; Delattre, 1839)
– rabo-branco-acanelado, Campinas do Sul (Damiani, 2009);
Xenopsaris albinucha (Burmeister, 1869) – tijerila, Passo Fundo,
Campus UPF (Prestes; Martinez, 2011); Cypseloides senex (Tem-
minck, 1826) – taperuçu-velho, Nonoai (Oliveira, 2011). Inven-
tários avifaunísticos completos e devidamente publicados para a
região são inexistentes, apesar de Marchetto e Restello (2009)

*
Universidade de Passo Fundo – [email protected]
**
Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos - [email protected]
Élinton Luis Rezende, Carlos Eduardo Agne

apresentarem uma lista com 49 espécies de aves para o Parque


Municipal Ernesto Vitório Menen no município de Jacutinga,
esse trata-se apenas de um levantamento preliminar.
Contudo, algumas contribuições históricas e importantes
para a biodiversidade regional de aves foram dadas primeira-
mente por Emil Kaempfer, que coletou aves em Erebango, No-
noai e Ronda Alta, no final da década de 1920 (Belton, 1994).
Posteriormente, Oswaldo Camargo coletou aves em Passo Fun-
do entre o final da década de 1950 e início da década de 1960
(Belton, 1994). Willian Belton, com o mais expressivo estudo
sobre as aves do Rio Grande do Sul, que também percorreu a re-
gião, nas décadas de 1970 e 1980, observando e coletando aves.
No município de Sertão, Belton esteve apenas em 28 de novem-
bro de 1971 e 27 a 30 agosto de 1975, porém nenhum registro
específico para o município foi publicado (Belton, 1994).
Porque o Parque Natural Municipal de Sertão é um dos
principais remanescentes florestais da bacia hidrográfica do Rio
Passo Fundo e porque há a ausência de estudos avifaunísticos na
região, este estudo teve como objetivo inventariar a avifauna de
forma qualitativa com a finalidade de preencher essa lacuna da
ornitologia sul-rio-grandense.

Material e métodos
Para o levantamento de aves no Parque Natural Municipal
de Sertão (PNMS) foram realizadas duas expedições a campo,
em janeiro de 2013 (estação do verão) e em novembro de 2013
(estação da primavera).
As aves foram identificadas por meio de contatos auditivos
e visuais, os quais contaram com o auxílio de binóculos. Semrpe
que possível, as espécies foram fotografadas, e playbacks foram
utilizados para confirmar a presença ou a identificação dessas.
As trilhas e principalmente a estrada presente no PNMS foram
utilizadas para as observações.

- 91 -
Avifauna do Parque Natural Municipal de Sertão

Para a classificação, a nomenclatura e a sequência, utili-


zou-se as normas do Comitê Brasileiro de Registros Ornitológi-
cos (CBRO, 2014).

Resultados e discussão
Foram registradas para o PNMS 154 espécies de aves (Ta-
bela I), distribuídas em 48 famílias, representando aproxima-
damente 25% da riqueza de aves conhecidas para o Rio Gran-
de do Sul (Bencke et al., 2010). Nenhuma dessas encontra-se
ameaçada de extinção, tanto em nível global, nacional quanto
estadual. Porém, quatro espécies: a ema – Rhea americana (Lin-
naeus, 1758), o pica-pau-dourado – Piculus aurulentus (Temmin-
ck, 1821), o grimpeiro – Leptasthenura setaria (Temminck, 1824)
e a gralha-azul – Cyanocorax caeruleus (Vieillot, 1818) (Figuras 1
e 2) são consideradas pela IUCN (2013) como espécies quase
ameaçadas (NT). Com exceção da ema, que foi registrada nas
áreas abertas e limítrofes do PNMS, as demais, são todas espé-
cies florestais e endêmicas da Mata Atlântica, onde a destruição
e a descaracterização de seus habitats são as principais ameaças
(IUCN, 2013).
O coró-coró – Mesembrinibis cayennensis (Gmelin, 1789) (Fi-
gura 1) considerado ameaçado de extinção em nível estadual,
na categoria – em perigo – por Marques et al. (2002), foi, re-
centemente, rebaixado para a categoria NT (quase ameaçada),
devido ao significativo aumento no número de registros nos
últimos anos e consequentemente na área de distribuição no
estado (FZB, 2013). O registro do coró-coró para o PNMS é o
primeiro da espécie para a bacia do rio Passo Fundo.
Assim, como o coró-coró, o pica-pau-de-banda-branca –
Dryocopus lineatus (Linnaeus, 1766) (Figura 2) considerado, até
recentemente, ameaçado de extinção no Rio Grande do Sul, na
categoria vulnerável (Marques et al., 2002), é agora considerado
não ameaçado (FZB-RS, 2013).

- 92 -
Élinton Luis Rezende, Carlos Eduardo Agne

O cuiú-cuiú – Pionopsitta pileata (Scopoli, 1769) pequeno


psitacídeo florestal e endêmico da Mata Atlântica, considerado
por Bencke et al. (2003) como espécie quase ameaçada de ex-
tinção no Rio Grande do Sul, recentemente, foi rebaixada para
categoria (preocupação menor ou não ameaçado) (FZB, 2013).
Até então, o único registro, dessa espécie, conhecido para a re-
gião da bacia do rio Passo Fundo, provém das coletas de Osvaldo
Camargo para Passo Fundo, feita na metade do século passado.
A espécie, provavelmente, ocorre mais ao norte, especialmente
na Reserva Indígena de Nonoai, porém, não são conhecidos re-
gistros para o Parque Municipal da Sagrisa/Pontão1 e nem para
outros remanescentes florestais do Planalto Médio, como o Par-
que Estadual do Papagaio-Charão2 e Floresta Nacional de Passo
Fundo (ICMBio, 2012).
Destacamos, também, o registro do bacurau – Hydropsalis
albicollis (Gmelin, 1789) (Figura 1) apesar de ser uma espécie
amplamente distribuída pelo estado, não havia registros conhe-
cidos para a bacia do rio Passo Fundo.

1
Observações pessoais.
2
Observações pessoais.

- 93 -
Avifauna do Parque Natural Municipal de Sertão

Fonte: 1, 3 e 4: C. E. Agne; 2: L. S. Machado.

Figura 1 – Aves registradas no Parque Natural Municipal de Sertão: 1) coró-


coró (Mesembrinibis cayennensis); 2) bacurau (Hydropsalis al-
bicollis), 3) pica-pau-dourado (Piculus aurulentus; 4) grimpeiro
(Leptasthenura setaria).

Ao compararmos a riqueza observada do PNMS (n=154)


com a Floresta Nacional de Passo Fundo (n=195), ao longo de
mais de 10 anos de estudos (ICMBio, 2012), podemos concluir
que o inventário realizado foi bastante satisfatório. Por outro
lado, podemos afirmar que um grande número de espécies ain-
da deverá ser encontrado no PNMS com novas expedições a
campo, espécies naturalmente raras ou inconspícuas e espécies
ocasionais tendem a serem detectadas mais facilmente em mo-
nitoramentos de longo prazo.
Mesmo assim, algumas espécies comuns e abundantes na
região3 não foram detectadas durante os inventários como as

3
Observações pessoais.

- 94 -
Élinton Luis Rezende, Carlos Eduardo Agne

andorinhas, a família Hirundinidae, o beija-flor-de-topete (Ste-


phanoxis lalandi) e o bacurau-tesoura (Hydropsalis torquata).
Apesar da ausência de espécies ameaçadas de extinção no
PNMS, o Parque em estudo é uma unidade de conservação ex-
tremamente importante para a preservação da avifauna da bacia
hidrográfica do rio Passo Fundo, pois abriga um grande núme-
ro de espécies de sub-bosque como: Dysithamnus mentalis (Tem-
minck, 1823), Chamaeza campanisona (Lichtenstein, 1823), Sitta-
somus griseicapillus (Vieillot, 1818), Platyrinchus mystaceus Vieillot,
1818 e Chiroxiphia caudata (Shaw; Nodder, 1793) (Figura 2), in-
timamente relacionados com ambientes florestais bem preser-
vados e atualmente com distribuição restrita na região devido a
fragmentação e a descaracterização dos ambientes naturais.

Tabela 1 – Espécies de aves registradas no Parque Natural Municipal de


Sertão, classificação e sequência de acordo com CBRO (2014).
Nome do Táxon Nome comum Nome do Táxon Nome comum
Rheiformes Formicariidae
Rheidae Chamaeza campanisona tovaca-campainha
Rhea americana ema Dendrocolaptidae
Tinamiformes Sittasomus griseicapillus arapaçu-verde
Tinamidae Lepidocolaptes falcinellus arapaçu-escamado-
-do-sul
Crypturellus obsoletus nambu Dendrocolaptes platyrostris arapaçu-grande
Nothura maculosa perdiz Furnariidae
Anseriformes Furnarius rufus joão-de-barro
Anatidae Philydor rufum limpa-folha-de-testa-
-baia
Amazonetta brasilieneis pé-vermelho Heliobletus contaminatus trepadorzinho
Galliformes Syndactyla rufosuperciliata trepador-quiete
Cracidae Leptasthenura setaria grimpeiro
Penelope obscura jacuaçu Anumbius annumbi cochicho
Suliformes Synallaxis ruficapilla pichororé
Phalacrocoracidae Synallaxis cinerascens pi-puí
Phalacrocorax brasi- biguá Synallaxis spixi joão-teneném
lianus
Pelecaniformes Cranioleuca obsoleta arredio-oliváceo
Ardeidae Pipridae
Bubulcus ibis garça-vaqueira Chiroxiphia caudata tangará-dançador

- 95 -
Avifauna do Parque Natural Municipal de Sertão

Cont.

Ardea alba garça-branca- Tityridae


-grande
Syrigmas ibilatrix maria-faceira Schiffronis virescens flautim
Threskiornithidae Tityra cayana anambé-branco-de-
-rabo-preto
Mesembrinibis cayen- coró-coró Pachyramphus castaneus caneleiro
nensis
Theristicus caudatus curicaca Pachyramphus polychop- caneleiro-preto
terus
Cathartiformes Pachyramphus validus caneleiro-de-chapéu-
-preto
Cathartidae Platyrinchidae
Coragyps atratus urubu-de-cabeça- Platyrinchus mystaceus patinho
-preta
Accipitriformes Rhynchocyclidae
Accipitridae Leptopogon amauroce- cabeçudo
phalus
Elanoides forficataus gavião-tesoura Phylloscartes ventralis borboletinha-do-mato
Elanusleucurus gavião-peneira Tolmomyias sulphurescens bico-chato-de-orelha-
-preta
Ictinia plumbea sovi Poecilotriccus plumbeiceps tororó
Heterospizias meridio- gavião-caboclo Tyrannidae
nalis
Rupornis magnirostris gavião-carijó Tyranniscus burmeisteri piolhinho-chiador
Buteo brachyurus gavião-de-cauda- Camptostom aobsoletum risadinha
-curta
Gruiformes Elaenia parvirostris guaracava-de-bico-curto
Rallidae Elaenia mesoleuca tuque
Aramides saracura saracura-do-mato Myiopagis caniceps guaracava-cinzenta
Gallinula galeata frango-d'água- Myiopagis viridicata guaracava-de-crista-
-comum -alaranjada
Charadriiformes Phyllomyias fasciatus piolhinho
Charadriidae Serpophaga subcristata alegrinho
Vanellus chilensis quero-quero Myiarchus swainsoni irré
Recurvirostridae Pitangus sulphuratus bem-te-vi
Himantopus melanurus pernilongo-de- Machetornis rixosa suiriri-caveleiro
-costas-brancas
Jacanidae Myiodynastes maculatus bem-te-vi-rajado
Jacana jacana jaçanã Megarynchus pitangua neinei
Columbiformes Tyrannus melancholicus suiriri
Columbidae Tyrannus savana tesourinha
Columbina talpacoti rolinha-roxa Empidonomus varius peitica
Columbina picui rolinha-picuí Lathrotriccus euleri enferrujado
Patagioenas picazuro pombão Knipolegus lophotes maria-preta-de-penacho

- 96 -
Élinton Luis Rezende, Carlos Eduardo Agne

Cont.
Zenaidaa auriculata pomba-de-bando Vireonidae
Leptotila verreauxi juriti-pupu Cyclarhis gujanensis pitiguari
Leptotila rufaxilla juriti-gemedeira Vireo chivi juruviara
Geotrygon montana pariri Corvidae
Cuculiformes Cyanocorax caeruleus gralha-azul
Cuculidae Cyanocorax chrysops gralha-picaça
Piaya cayana alma-de-gato Troglodytidae
Crotophaga ani anu-preto Troglodytes musculus corruíra
Guira guira anu-branco Turdidae
Strigiformes Turdus rufiventris sabiá-laranjeira
Tytonidae Turdus leucomelas sabiá-barranco
Tyto furcata coruja-da-igreja Turdus amaurochalinus sabiá-poca
Strigidae Turdus subalaris sabiá-ferreiro
Megascops choliba corujinha-do-mato Turdu salbicollis sabiá-coleira
Athene cunicularia coruja-buraqueira Mimidae
Nyctibiiformes Mimus saturninus sabiá-do-campo
Nyctibiidae Passerellidae
Nyctibius griseus urutau Zonotrichia capensis tico-tico
Caprimulgiformes Ammodramus humeralis tico-tico-do-campo
Caprimulgidae Parulidae
Lurocalis semitorquatus tuju Setophaga pitiayumi mariquita
Hydropsalis albicollis bacurau Geothlypis aequinoctialis pia-cobra
Apodiformes Basileuterus culicivorus pula-pula
Trochilidae Myiothlypis leucoblephara pula-pula-assobiador
Chlorostilbon lucidus besourinho-de- Icteridae
-bico-vermelho
Hylocharis chrysura beija-flor-dourado Cacicus chrysopterus tecelão
Leucochloris albicollis beija-flor-de-papo- Cacicus haemorrhous guaxe
-branco
Coraciformes Icterus pyrrhopterus encontro
Alcedinidae Pseudoleistes guirahuro chopim-do-brejo
Megaceryle torquata martim-pescador- Agelaioides badius asa-de-telha
-grande
Trogoniformes Molothrus bonariensis chopim
Trogonidae Sturnella superciliaris polícia-inglesa
Trogon surrucura surucuá Thraupidae
Galbuliformes Saltator similis trinca-ferro
Bucconidae Saltator maxillosus bico-grosso
Nystalus chacuru joão-bobo Pyrrhocoma ruficeps cabecinha-castanha
Piciformes Tachyphonus coronatus tié-preto
Ramphastidae Lanio cucullatus tico-tico-rei
Ramphastos dicolorus tucano-de-bico- Lanio melanops tié-de-topete
-verde
Picidae Tangara sayaca sanhaço-cinzento

- 97 -
Avifauna do Parque Natural Municipal de Sertão

Cont.

Melanerpes candidus pica-pau-branco Tangara preciosa saíra-preciosa


Veniliornis spilogaster picapauzinho- Stephanophorus diade- sanhaço-frade
-verde-carijó matus
Piculus aurulentus pica-pau-dourado Paroaria coronata cardeal
Colaptes melanochloros pica-pau-verde- Pipraeidea melanonota saíra-viúva
-barrado
Colaptes campestris pica-pau-do- Pipraeidea bonariensis sanhaço-papa-laranja
-campo
Dryocopus lineatus pica-pau-de- Tersina viridis saí-andorinha
-banda-branca
Falconiformes Hemithraupis guira saíra-de-papo-preto
Falconidae Poospiza nigrorufa quem-te-vestiu
Caracara plancus carcará Poospiza cabanisi tico-tico-da-taquara
Milvago chimachima carrapateiro Sicalis flaveola canário-da-terra
Milvago chimango chimango Embernagra platensis sabiá-do-banhado
Falco sparverius quiriquiri Volatinia jacarina tiziu
Psittaciformes Sporophila caerulescens coleirinho
Psittacidae Cardinalidae
Pyrrhura frontalis tiriba Cyanoloxia brissonii azulão
Myiopsitta monachus caturrita Fringillidae
Pionopsitta pileata cuiú-cuiú Sporagra magellanica pintassilgo
Pionus maximiliani maitaca Euphonia chlorotica fim-fim
Passeriformes Chlorophonia cyanea gaturamo-bandeira
Thamnophilidae Passeridae
Dysithamnus mentalis choquinha-lisa Passer domesticus pardal
Thamnophilus rufica- choca-de-chapéu-
pillus -vermelho
Thamnophilus caeru- choca-da-mata
lescens

- 98 -
Élinton Luis Rezende, Carlos Eduardo Agne

Perspectivas para conservação


A fragmentação florestal, o consequente isolamento dos
remanescentes, o efeito de borda são as principais ameaças que
colocam em risco a avifauna que ocorre no PNMS. Dessa forma,
a criação de um corredor ecológico, conectando os principais re-
manescentes florestais do Planalto Norte do Rio Grande do Sul,
como a Floresta Nacional de Passo Fundo, o Parque Estadual
do Papagaio-Charão e o Parque Municipal da Sagrisa/Pontão
constitui um grande desafio para o futuro, a fim de evitar os
efeitos causados pela fragmentação florestal.
Dentre as espécies registradas no PNMS, algumas são con-
sideradas cinegéticas, como o jacuaçu – Penelope obscura Temmin-
ck, 1815 e o nambu – Crypturellus obsoletus (Temminck, 1815),
que sofrem imensa pressão de caça. Portanto, a segurança ou
a fiscalização da unidade por guarda-parques, associado com
programas de educação ambiental, especialmente com os mora-
dores vizinhos do parque, são ações extremamente importantes
para a preservação, não somente da sua avifauna, como de um
todo, de maneira geral.
Assim, como a continuidade de estudos científicos, com
monitoramentos de longo prazo para todos os grupos de fauna,
teremos resultados mais concretos e fidedignos, especialmente,
no diz respeito à riqueza de espécies do PNMS. Como mencio-
nado anteriormente, muitas espécies de aves ainda poderão ser
registradas para a área.

- 99 -
Avifauna do Parque Natural Municipal de Sertão

Fonte: C. E. Agne.

Figura 2 – Aves registradas no Parque Natural Municipal de Sertão: 1) Pica-


-pau-de-banda-branca (Dryocopus lineatus); 2) tangará-dança-
dor (Chiroxiphia caudata); 3) patinho (Platyrinchus mystaceus);
4) gralha-azul (Cyanocorax caeruleus).

Referências
Agne, C. E. Novos registros de aves ameaçadas de extinção no es-
tado do Rio Grande do Sul. Atualidades Ornitológicas, Curitiba,
v. 126, p. 8, jul./ago. 2005.

Belton, W. Aves do Rio Grande do Sul: distribuição e biologia. São


Leopoldo: Unisinos, 1994.

Bencke, G. A. et al. Aves. In: Fontana, C. S.; Bencke, G. A.;


REIS, R. E. (Eds.). Livro vermelho da fauna ameaçada de extinção no
Rio Grande do Sul. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2003. p. 189-479.

Bencke, G. A. et al. Revisão e atualização da lista das aves do


Rio Grande do Sul, Brasil. Iheringia, Porto Alegre, v. 100, n. 4,
p. 519-556, dez. 2010. Série Zoologia.

- 100 -
Élinton Luis Rezende, Carlos Eduardo Agne

Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos. Listas das aves do Bra-


sil. 11. ed. jan. 2014, Diponível em: <http://www.cbro.org.br>. Acesso
em: 20 jan. 2014.

Damiani, R. V. Primeiro registro de Phaethornis pretrei (Aves, Tro-


chilidae) para o Rio Grande do Sul, Brasil. Biotemas, Florianópolis,
v. 22, n. 2, p. 199-202, jun. 2009.

Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul. Reavaliação da Lista de


Espécies da Fauna Silvestre Ameaçada de Extinção no Rio Grande
do Sul, 2013. Diponível em: <http://www.liv.fzb.rs.gov.br/livcpl/?id_
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Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Pla-


no de manejo da Floresta Nacional de Passo Fundo, Rio Grande do
Sul. v. 1 – Diagnóstico, 2012. Disponível em: <http://www.icmbio.gov.
br/portal/images/stories/imgs-unidades-conservacao/Volume_I_PF_
maio_2012_final.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2014.

IUCN-2013. IUCN Red List of Threatened Species. Version 2013.2.


Disponível em: <http://www.iucnredlist.org>. Acesso em: 20 jan. 2014.

Marchetto, C.; Restello, R. M. Composição da avifauna do


Parque Municipal Ernesto Vitório Menin, Jacutinga - RS. Perspectiva,
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Marques, A. A. B. et al. Lista de Referência da Fauna Ameaçada


de Extinção no Rio Grande do Sul. Decreto n. 41.672, de 10 junho de
2002. Porto Alegre: FZB/MCT–PUCRS/PANGEA, 2002, 52 p.

Oliveira, S. L. Aves, Apodidae, Cypseloides senex (Temminck,


1826): Geographical distribution in the state of Rio Grande do Sul,
southern Brazil. CheckList, São Paulo, v. 7, n. 4, p. 473-475, jul. 2011.

Prestes, N. P.; Martinez, J. Primeiros registros de Xenopsaris


albinucha (Burmeister, 1869) para o estado do Rio Grande do Sul,
Brasil. Rev. Bras. Orn., São Paulo, v. 19, n. 3, p. 434-435, set. 2011.

- 101 -
Capítulo 7
Diversidade β de roedores e a
conservação de remanescentes florestais
do Rio Grande do Sul

André Luís Luza*


Noeli Zanella**
Alexandre Uarth Christoff***
André Felipe Barreto-Lima****
João Vademar Grando**

Introdução
Os padrões de variação na diversidade entre comunidades
são determinados principalmente por processos históricos (ex.:
especiação alopátrica e processos macroevolutivos de diversifi-
cação) e ecológicos (ex.: clima regional e variações na produ-
tividade) (Ricklefs, 1987; 2008). Em adição, a intensidade de
conversão de ecossistemas nativos determina a heterogeneidade
das paisagens e a dimensão, o grau de isolamento e a qualidade
da matriz no entorno das manchas de habitat disponíveis para

*
Laboratório de Ecologia de Comunidades, Universidade Federal do Rio Gran-
de do Sul (UFRGS).
**
Instituto de Ciências Biológicas, Universidade de Passo Fundo (UPF).
***
Museu de Ciências Naturais, Universidade Luterana do Brasil.
****
Instituto de Biociências, Departamento de Zoologia, Laboratório de Herpeto-
logia, CHUNB, Universidade de Brasília. Campus Darcy Ribeiro.
André Luís Luza et al.

as espécies (Pires et al. 2002; Pardini et al. 2009). Assim, ava-


liar os fatores gerando mudanças na estrutura das comunida-
des ecológicas em uma perspectiva regional pode auxiliar na
detecção dos efeitos da fragmentação de ecossistemas sobre a
biodiversidade.
Os roedores são importantes componentes dos ecossiste-
mas por desempenharem diversos serviços ecológicos. Dentre
os principais, esses seres compõem a base trófica dos consumi-
dores pela remoção e dispersão de sementes e predação de plân-
tulas, frutos, sementes e artrópodes (Carvalho et al. 1995, Iob;
Vieira 2008), regulando assim, a composição e a estrutura de co-
munidades de plantas e artrópodes. Roedores contribuem para
a ciclagem de nutrientes e para a estruturação do solo – princi-
palmente espécies fossoriais, e servem como recurso alimentar
para diversos mamíferos, répteis e aves predadoras (Medan et
al., 2011). Adicionalmente, algumas espécies são reservatórios
de doenças infecciosas relevantes para a saúde pública (ex. lep-
tospirose (Leptospira) e hantavirose (Hantavirus)) (Meerburg;
Singleton; Kijlstra, 2009), perfazendo a importância da manu-
tenção de populações de roedores em seus ambientes naturais.
Em paisagens fragmentadas, os padrões de diversidade de
roedores são, aparentemente, dependentes de processos de ex-
tinção e colonização de espécies. Estes processos podem gerar
uma diminuição na diversidade intrafragmento (diversidade
α) a despeito de um aumento da variabilidade espacial inter-
fragmentos (diversidade β) (Pardini et al., 2005). Porém, esses
mesmos padrões de diversidade entre comunidades podem ser
gerados por processos diferentes da perda de espécies. Alguns
métodos permitem-nos particionar quanto da variabilidade espa-
cial da diversidade é atribuída ao aninhamento/perda de espé-
cies (nestedness) ou à substituição de espécies (turnover) entre
comunidades (Baselga, 2010). O padrão de aninhamento pode
surgir pela ação de processos de perda de espécies – como extin-
ção (Patterson; Atmar, 1986), ou por diferenças no potencial de

- 103 -
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

colonização das espécies, podendo gerar comunidades menos


diversas que compõem um subconjunto aninhado de comunida-
des-fonte mais diversas (Patterson; Atmar, 1986). Por outro lado,
a influência da heterogeneidade ambiental faz com que espé-
cies selecionem habitats específicos, ocasionando uma elevada
substituição de espécies devido aos diferentes requerimentos de
nicho ecológico das espécies de roedores habitando os remanes-
centes florestais. Dessa forma, há a necessidade de compreender
quais processos geram variações nos padrões de diversidade de
roedores entre remanescentes florestais em uma perspectiva re-
gional. Isso permite-nos definir aspectos como a localização, o
tamanho e a distribuição espacial de unidades de conservação
(UCs), além de outras estratégias visando conservar a biodiversi-
dade (Legendre et al., 2005).
Em vista desses aspectos históricos e ecológicos, objetiva-
mos explorar a similaridade composicional e as causas de varia-
ções na composição de espécies de roedores em remanescentes
florestais do Rio Grande do Sul. Devido ao atual panorama re-
gional de fragmentação, de perda de espécies e aspectos rela-
cionados a biologia dos roedores, esperamos uma similar con-
tribuição de processos relacionados à substituição de espécies
e ao aninhamento como geradores de variações na diversidade
de roedores. Finalmente, consideramos os resultados do estudo
para a formulação de estratégias de manejo da paisagem e da
conservação da diversidade de roedores em remanescentes flo-
restais do sul do País.

Material e métodos
A fim de explorarmos as causas de variações regionais na
composição de espécies, realizamos uma revisão bibliográfica de
estudos de comunidades de pequenos mamíferos não voadores
florestais e de ecótonos campo-floresta no Rio Grande do Sul. Re-
gistramos se os pontos de captura foram sistematicamente organi-

- 104 -
André Luís Luza et al.

zados em grades amostrais ou em transecções, e se as amostragens


foram ou não sazonais. Dados de diferentes sítios, em um mesmo
estudo foram considerados separadamente. De cada sítio, extraí-
mos informações quanto à composição de espécies, esforço amos-
tral empregado (armadilhas/noite) e a abundância ou o número
total de capturas de cada área. Roedores não identificados ao nível
de espécie foram desconsiderados, bem como espécies com ape-
nas uma ocorrência. Para padronizarmos os métodos de coleta
de dados, consideramos somente estudos que utilizaram armadi-
lhas livetrap (Tomahawk, Sherman ou Young) e de queda (pitfalls)
dispostas em transecções ou em Y. A partir desses critérios, a ma-
triz de composição de roedores consistiu da presença ou ausên-
cia de 16 espécies em 15 sítios (unidades amostrais básicas) con-
templadas em 12 estudos, sendo sete artigos publicados, quatro
dissertações ou teses e um resumo de congresso (Tabela 1). Os
dados de Pedó, Freitas e Hartz (2010) foram coletados em áreas
não fragmentadas por processos antrópicos, sendo portanto
mantidos como “área-referência” quanto à composição e riqueza
de espécies de áreas naturais.

- 105 -
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

Figura 1 – Distribuição espacial dos estudos revisados na presente compila-


ção.

Análise de dados
Inicialmente, avaliamos a influência do esforço amostral
(armadilhas/noite) sobre a composição e riqueza de espécies
por meio de regressão linear simples. Essa análise mostrou que
o esforço amostral empregado explicou pouco da riqueza de
espécies encontrada em cada estudo (R2 = 0,0016; p = 0,88),
permitindo comparações das comunidades de roedores sem a
influência de diferenças de esforço de cada área. Da mesma for-

- 106 -
André Luís Luza et al.

ma, não registramos diferenças composicionais em estudos que


utilizaram um ou mais métodos de captura (SQ = 0,78; p = 0,17).
A fim de explorarmos variações regionais na composição de
espécies, realizamos uma análise de agrupamentos pelo método
de distância média (UPGMA) baseada na similaridade de Jaccard
(Legendre & Legendre, 1998), testando, em seguida, a nitidez de
grupos de unidades amostrais por reamostragem bootstrap (Pillar,
1999b). Adicionalmente, realizamos uma análise de coordenadas
principais da composição de roedores em cada remanescente
para explorarmos os padrões de distribuição regional das espé-
cies. O suporte de cada eixo de ordenação foi testado por meio
de reamostragem boostrap (1000 permutações) (Pillar, 1999a). So-
mente espécies com correlação positiva ou negativa superior a 0,5
com os eixos de ordenação foram incluídas no gráfico. Para defi-
nirmos os processos geradores de variações composicionais entre
sítios, particionamos a diversidade β (JAC) em um componente
de dissimilaridade gerado pela substituição de espécies (turnover
- JTU) e pelo aninhamento (nestedness - JNE) por meio da função
beta.multi (índice de diversidade β de Jaccard) implementada no
pacote betapart (Baselga; Orme, 2012). A partição da diversida-
de beta e as regressões lineares foram realizadas no programa R
(R Development Core Team, 2011), ao passo que as análises de
agrupamento e ordenação foram realizadas no programa Multiv
v 2.95 (por VD Pillar, disponível em: <http://ecoqua.ecologia.
ufrgs.br/ecoqua/MULTIV.html>.)

Resultados e discussões
Em um estudo anterior, registramos a ocorrência de dez
espécies de roedores no Parque Natural Municipal de Sertão
(PNMS), sendo as mais abundantes Oligoryzomys nigripes e Akodon
montensis (Figura 2) (Luza et al., 2013). Por meio de encontros
ocasionais, registramos, adicionalmente, a presença de Sphiggu-
rus villosus (Cuvier 1823 - Rodentia, Erethizontidae) e de Dasy-
procta azarae (Lichtenstein 1823 - Rodentia, Dasyproctidae), con-

- 107 -
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

siderando que D. azarae encontra-se ameaçada de extinção no


estado do Rio Grande do Sul (Rio Grande do Sul, 2014).

Fonte: A. L. Luza.

Figura 2 – Espécies de roedores capturadas no Parque Natural Municipal


de Sertão-RS em Luza et al. (2013). Da esquerda para a direita:
Oligoryzomys nigripes, Akodon montensis, Thaptomys nigrita e
Sooretamys angouya.

Os dados compilados mostraram que Oligoryzomys nigripes


(n = 14), Akodon montensis (n = 13), Sooretamys angouya (n = 12)
e Oligoryzomys flavescens (n = 11) foram registradas na maioria
dos remanescentes (Tabela 1). O maior número de espécies foi
registrado na área de Mata Paludosa (Tab. 1, nº 7 - 12 spp.) e na
Floresta Ombrófila Mista (Tab. 1, nº 9 - 11 spp.) no estudo de
Marinho (2003), e no Parque Natural Municipal de Sertão (Tab.
1, nº 12 - 10 spp. - Luza et al., 2013).
Registramos uma grande variação na similaridade com-
posicional entre as áreas analisadas, cujas áreas compõem dois
grupos nítidos de unidades amostrais composicionalmente dis-
tintas (Figura 3). O Grupo 1 teve grande variabilidade interna
na composição de espécies e foi composto por áreas de Floresta
Ombrófila Mista e Florestas Estacionais, enquanto que o segun-
do grupo esteve representado por áreas de Mata de Restinga da
Planície Costeira (Figura 3).

- 108 -
Figura 2: Espécies nativas de roedores capturadas no Parque Natural Municipal de Sertão – RS
em Luza et al. (2013). Da esquerda paraAndré Luís Luza etOligoryzomys
a direita: al. nigripes, Akodon montensis,
Thaptomys nigrita e Sooretamys angouya. Fotos: A. L. Luza.

Fig. 3: Similaridade
Figura 3 – composicional da fauna de roedores
Similaridade composicional de de
da fauna ambientes florestais
roedores do do
florestais Rio Grande
Rio Grande do Sul. Rótulos das áreas ver Tab. I. Rótulo das es-
do Sul. Rótulos das áreas ver Tab. I. Rótulo das espécies vide Resultados e discussões.
pécies vide Resultados e discussões.

Observamos que as espécies S. angouya, Akodon montensis


(akmo) e Brucepattersonius iheringi (brih) estiveram relacionadas
a remanescentes e Floresta Ombrófila Densa e Mista (3, 9 e 10)
e Floresta Estacional Decidual (13). Dentro do Grupo 1, houve
distinção entre três áreas de transição entre Floresta Ombrófila
Mista e Floresta Estacional Decidual. Estes sítios incluem o Par-
que onde estão incluídas o Parque Natural Municipal de Sertão
(12), a Floresta Nacional de Passo Fundo (4) e o Horto Florestal
de Erechim (5), que se distinguiram dos outros sítios pela ocor-
rência de Thaptomys nigrita (thni), O. flavescens (olfl) e Mus mus-
culus (mumu) (Figura 3). Pelo eixo II agruparam-se ainda áreas
de Floresta Ombrófila Mista como a Floresta Nacional de São
Francisco de Paula (1 e 2) e Mata Paludosa (8), caracterizadas
pela presença de Delomys dorsalis (dedo). Finalmente, pelo eixo
I distinguem-se composicionalmente as duas áreas de Mata de
Restinga (14 e 15), principalmente pela ocorrência de Deltamys
kempi (deke) e Scapteromys tumidus (sctu) (Figura 3).

- 109 -
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

A partição da diversidade β total (JAC = 0,88) demonstrou


que a baixa similaridade composicional entre os remanescentes
avaliados foi gerada pelo processo de substituição de espécies
(JTU = 0,83) e não pelo aninhamento (JNE = 0,05). Dentro de
cada grupo observamos o mesmo padrão, havendo maior subs-
tituição de espécies tanto entre sítios dentro do Grupo 1 (JTU =
0,73; JNE = 0,1; JAC = 0,83) quanto do Grupo 2 (JTU = 0,33; JNE
= 0,1; JAC = 0,43). Além disso, a substituição de espécies conti-
nuou preponderante mesmo com a inclusão das espécies que
ocorreram uma única vez (JAC = 0,9; JTU = 0,84; JNE = 0,06).
Em uma paisagem alterada na Mata Atlântica, Pardini et
al. (2005) constataram que a alta diversidade β entre fragmen-
tos foi possivelmente causada pelo processo de extinção de espé-
cies, baixa diversidadeprocesso de extinção de espécies, geran-
do uma baixa diversidade local (α) a despeito de uma grande
variabilidade espacial na diversidade de espécies. Nosso estudo
registrou o mesmo padrão de elevada variação na diversidade
de espécies, porém os processos que resultariam em um padrão
de aninhamento (ex.: extinção de espécies) foram pouco rele-
vantes mesmo em uma paisagem fragmentada e sob uma matriz
inóspita para muitas espécies. Assim, supomos que a heteroge-
neidade ambiental gerada por fatores como topografia e clima,
e as preferências de cada espécie por habitats específicos causa-
ram uma elevada substituição de espécies entre remanescentes
florestais.
O processo de substituição de espécies é altamente depen-
dente da capacidade de dispersão das espécies, que irá determi-
nar quais espécies irão colonizar ou recolonizar os sítios dispo-
níveis (Baselga, 2008). Se somente algumas espécies são capazes
de ocupar todas as manchas de habitat devido a sua alta eficiên-
cia dispersiva, as comunidades de roedores de remanescentes se-
riam pouco diversas e caracterizariam um subconjunto de espé-
cies de remanescentes florestais mais diversos. Porém, nossos re-
sultados indicam que os remanescentes florestais possuem tanto

- 110 -
André Luís Luza et al.

espécies com dispersão eficiente capazes de colonizar a maioria


dos remanescentes florestais quanto espécies restritas a determi-
nadas regiões (Baselga 2008). Espécies com baixa capacidade
de dispersão, geralmente, têm distribuição espacial restrita, e
incluem espécies endêmicas ou aquelas com requerimentos de
habitat altamente específicos – como aquelas registradas em am-
bientes pouco perturbados contemplados somente no interior
de UCs (Bonvicino et al., 2002). Similarmente ao registrado em
nosso estudo, variações na diversidade em escalas amplas leva-
ram Gering et al. (2003) a apontarem que a proteção de muitos
sítios dentro de ecorregiões seria uma ação mais efetiva para a
conservação de insetos do que ações que visem o aumento da di-
versidade dentro de grandes áreas. Dessa forma, consideramos
nossos resultados como subsídio para ações de conservação de
remanescentes florestais.

- 111 -
Tabela 1 – Composição de espécies de roedores de estudos realizados em remanescentes florestais do Rio Grande do Sul.
* Número médio de espécies.

Autores
Cademartori, Cademar- Pedó,
Dal Galiano Dalmagro Luza Melo Quintela Nº de
Marques, tori, Fabián e Galiano Freitas Marinho Horn
Berto et al. e Vieira et al. et al. et al. ocorrên-
e Pacheco Menegheti, (2010) e Hartz (2003) (2005)
(2012) (2007) (2005) (2013) (2013) (2012) cias
(2008) (2004) (2010)
Rótulos das áreas na Fig. 3 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15
Cricetidae
Oligoryzomys nigripes
1 1 1 1 - 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 14
(Olfers, 1818)
Akodon montensis
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 - - 13
(Thomas, 1913)
Sooretamys angouya
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 - 1 1 - - 12
(Fischer, 1814)
Oligoryzomys flavescens

- 112 -
- - 1 1 1 1 1 - 1 - 1 1 - 1 1 10
(Waterhouse, 1837)
Delomys dorsalis
1 1 1 - - 1 1 1 1 - 1 - - - - 8
(Hensel, 1873)
Thaptomys nigrita
- - 1 1 1 1 - - 1 1 - 1 1 - - 8
(Lichtenstein, 1830)
Brucepattersonius iheringi
1 - 1 - - 1 1 - 1 1 - - 1 - - 7

Família/espécie
(Thomas, 1896)
Euryoryzomys russatus
- - 1 - 1 - 1 1 1 - - - 1 - - 6
(Wagner, 1848)
Oxymycterus nasutus
- - - - - 1 1 - - - - 1 - - 1 4
(Waterhouse, 1837)
Akodon azarae
- - 1 - - - - - - - 1 1 - - - 3
(Fischer, 1829)
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

Akodon paranaensis
(Christoff, Fagundes,
- - - - - 1 - - - - 1 1 - - - 3
Sbalqueiro, Mattevi
&Yonenaga-Yassuda, 2000)
Cont.
Deltamys kempi
- - - - - - - - - - - - - 1 1 2
(Thomas, 1917)
Holochilus brasiliensis
- - - - - - 1 - - - - - - 1 - 2
(Desmarest, 1819)
Necromys lasiurus
- - - - - - - 1 1 - - - - - - 2
(Lund, 1840)
Scapteromys tumidus
- - - - - - - - - - - - - 1 1 2
(Waterhouse, 1837)
Akodon reigi
(González, Langguth & - - - - - - - - 1 - - - - - - 1
Oliveira, 1998)
Juliomys pictipes
- - - - - - - - - - - - 1 - - 1
(Osgood, 1933)
Nectomys rattus
- - - - - - 1 - - - - - - - - 1
(Pelzen, 1883)
Nectomys squamipes
- - - - - - - - - - - 1 - - - 1
(Brants, 1827)
Oxymycterus judex
- - - - - - - - - - - - 1 - - 1

- 113 -
(Thomas, 1909)
Oxymycterus rufus
- - - - - - 1 - - - - - - - - 1
André Luís Luza et al.

(Fischer, 1814)

Família/espécie
Wilfredomys oenax
- - - - - - - - 1 - - - - - - 1
(Thomas, 1928)
Echimyidae
Kannabateomys amblyonyx
- - - - - - - - - - - - 1 - - 1
(Wagner, 1845)
Euryzygomatomys spinosus
- - - - - - 1 - - - - - - - - 1
(Fischer, 1814)
Muridae
Mus musculus
- - - 1 - - - - - - - 1 - 1 - 3
(Linnaeus, 1758)
Rattus rattus
- - - - - - - - - - - - - - 1 1
(Linnaeus, 1758)
Nº de espécies 5 4 9 6 5 9 12 6 11 5 6 10 9 6 6 7,27 *
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

Perspectivas para a conservação


A perda e a fragmentação de habitats, causadas por ativi-
dades antrópicas, constituem as maiores ameaças aos mamíferos
terrestres no Brasil (Costa et al., 2005). Além disso, a compreen-
são dos processos causadores de variações nos padrões de diver-
sidade em uma perspectiva regional permite definir estratégias
de conservação da biodiversidade (Legendre et al., 2005). Ob-
servamos um padrão de alta substituição de espécies gerando
um padrão de baixa similaridade composicional de roedores
entre os remanescentes avaliados. Em vista disso, como esses
padrões poderiam contribuir para a formulação de estratégias
para a conservação de espécies em remanescentes florestais? Os
resultados demonstrados aqui tornam pertinente a discussão de
outro importante paradigma da biologia da conservação: con-
servar apenas uma grande área pode realmente contemplar a
conservação da diversidade de espécies de uma região?
A variação espacial na composição de espécies encontra-
da no presente estudo deveria subsidiar a implementação da
rede de unidades de conservação do norte do Rio Grande do
Sul. Ações como essa são urgentes, já que similarmente ao pa-
norama nacional de conservação de remanescentes florestais
da Mata Atlântica (Ribeiro et al., 2009), a paisagem do norte
do Rio Grande do Sul é composta principalmente por remanes-
centes florestais pequenos (85% < 5 ha) (Slaviero et al., 2007).
Assim como os poucos fragmentos grandes (dez com área > 500
ha), os fragmentos pequenos estão envoltos por uma matriz de
plantações ou pastagens anuais (Slaviero et al., 2007), muitas ve-
zes intransponíveis para maioria das espécies de mamíferos de
pequeno porte (Pires et al., 2002; de Castro; Fernandez, 2004).
Além disto, há uma grande distância entre os remanescentes de
grande porte da região. Cinco dessas UCs distam 30 km do Par-
que Natural Municipal de Sertão, três cerca de 70 km e duas
estão a mais de 100 km. Desse modo, entendemos que a rede de
unidades de conservação deveria gestar sobre o espaço prote-

- 114 -
André Luís Luza et al.

gido legalmente e sobre as áreas adjacentes, via um mosaico de


unidades de conservação e florestas de propriedades privadas
conectadas por corredores ecológicos.
Nesse contexto, Costa et al. (2005) apontaram que a ges-
tão da paisagem, visando aumentar a disponibilidade e a conec-
tividade entre habitats, compõem prioridades para o manejo
de regiões altamente fragmentadas. Remanescentes florestais
de maior porte, usualmente resguardam uma maior riqueza de
espécies e populações maiores do que remanescentes menores.
Populações ocupando remanescentes grandes supostamente
são mais estáveis no tempo e no espaço e menos sujeitas a ação
da estocasticidade populacional (ex. processo de deriva gênica)
e ambiental (ex.: tempestades) (Metzger et al., 2009). Assim, em
uma paisagem na qual os remanescentes protegidos estão a uma
larga distância e envoltos por uma matriz predominantemente
inóspita (Slaviero et al., 2007), a criação de mosaicos de unidades
de conservação por meio de corredores ou de trampolins ecoló-
gicos entre grandes e pequenos remanescentes compõem uma
boa alternativa para aumentar a conexão funcional e estrutural
entre fragmentos (Ribeiro et al., 2009; Tabarelli et al., 2010).
Essa forma de manejar a paisagem é extremamente relevante,
já que pequenos fragmentos compõem uma porção significativa
do que resta de floresta nativa na região (Slaviero et al., 2007)
e, portanto, podem servir para aumentar a conectividade entre
os poucos remanescentes de maior porte (Metzger et al., 2009).
Assim, a criação de corredores entre remanescentes grandes ou
UCs por meio de fragmentos pequenos, áreas de preservação
permanente, reservas legais ou mesmo sistemas agroflorestais
ou silvipastoris inseridos em propriedades particulares devem
ser prioridade. Essas ações podem evitar o isolamento e o em-
pobrecimento faunístico dos remanescentes causado pela extin-
ção local de espécies, atribuindo aos remanescentes pequenos o
papel de conectar ou mesmo constituir habitats ótimos ou sub-
-ótimos para a colonização de espécies (de Castro; Fernandez,

- 115 -
Diversidade β de roedores e a conservação de remanescentes florestais do Rio Grande do Sul

2004; Pardini et al., 2005; Tabarelli et al., 2010). Além disso, essa
configuração espacial de habitats é importante para roedores,
que geralmente obedecem a uma relação fonte-dreno quanto
às dinâmicas espaciais de colonização e extinção em manchas de
habitat (Pires et al., 2002; de Castro; Fernandez, 2004).
Em geral, os resultados encontrados no presente estudo re-
velam que conservar apenas uma extensa área não contemplaria
a plenitude da diversidade de roedores da região, considerando
que diversas espécies tiveram ocorrência restrita a determinados
sítios. O padrão de elevada variação na composição de espécies
deveria servir para a priorização da conservação de um grande
número de fragmentos de dimensões variadas, englobando os di-
ferentes habitats e os diversos requerimentos ecológicos das es-
pécies (Baselga, 2010). Visto que espécies endêmicas e habitat-
-especialistas ocorrem com maior frequência no interior de UCs
ou em remanescentes maiores (Bonvicino et al., 2002; Pardini et
al., 2005) e que fragmentos menores e isolados conservam uma
fauna de habitat-generalistas (Patterson; Atmar 1986; Pardini et
al., 2005) os processos de substituição de espécies podem indicar
que conservar diversos fragmentos pequenos em adição à conser-
vação de áreas extensas pode compor a ação mais representativa
para a conservação da biodiversidade regional (Patterson; Atmar,
1986). Tais ações priorizariam a conservação tanto de espécies ra-
ras como também espécies generalistas e tolerantes a ambientes
degradados, maximizando a diversidade regional e diminuindo
a extinção local de espécies (Wright; Reeves, 1992), permitindo,
concomitantemente, a perpetuidade de papéis ecológicos desem-
penhados pelos roedores. Ademais, sistemas pouco aninhados
oferecem uma oportunidade para a conservação de um elevado
número de espécies em reservas de menor área mas devidamente
planejadas e distribuídas espacialmente (Wright; Reeves, 1992), o
que pode compor uma estratégia viável para regiões severamente
fragmentadas como o norte do Rio Grande do Sul.

- 116 -
André Luís Luza et al.

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- 121 -
Capítulo 8
Mamíferos do Parque Natural
Municipal de Sertão
Samara Arsego Guaragni*
Maria Cristina Kurtz de Lima**
Noeli Zanella***
Almir de Paula****

Introdução
O bioma Mata Atlântica é considerado um dos locais de
maior diversidade do planeta. Apesar disso, ainda restam la­
cunas no conhecimento da mastofauna. A maioria das espécies
ameaçadas de mamíferos (68,9%) ocorre nesse bioma, o que
reflete o seu grau de destruição, que, atualmente, apresenta
apenas 8% de sua área original (Maury, 2002; Reis et al., 2006;
Chiarello et al., 2008).
Atualmente, no Brasil, são registradas 688 espécies de ma-
míferos (Reis et al., 2011), o segundo lugar quanto à diversida-
de (Reis et al., 2006; Hilton-Taylor et al., 2008). No Rio Grande
do Sul, são listadas 158 espécies e, desse grupo, 38 encontram-se
em alguma categoria ameaçada de extinção (Rio Grande do Sul,
2014).
*
Departamento de Zoologia, Instituto de Biociências, Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS).
**
Instituto de Ciências Biológicas, Universidade de Passo Fundo (UPF).
***
Laboratório de Herpetologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade de
Passo Fundo, BR 285 KM 171, Bairro São José, 99070-972, Passo Fundo, RS,
Brasil.
****
Universidade de Brasília, Instituto de Biologia, Departamento de Zoologia, La-
boratório de Herpetologia. Campus Darcy Ribeiro.
Samara Arsego Guaragni et al.

espécies de mamíferos de hábitos oportunistas e dietas fle-


xíveis podem ajustar-se a ambientes alterados e espécies especia-
listas acabam sendo afetadas, o que, muitas vezes, pode levar ao
desaparecimento local dessas (Faria-Côrrea et al., 2006).
De um modo geral, os mamíferos silvestres brasileiros di-
ficilmente são vistos na natureza. Isso deve-se, principalmente,
pelos hábitos discretos, crepusculares e noturnos e, ao serem
observados, sua identificação é dificultada pela brevidade da
visualização (Becker; Dalponte, 1999). Métodos baseados na
identificação de pegadas, visualizações ao longo de transectos
lineares e o uso de armadilhas fotográficas têm sido tradicional-
mente utilizados no estudo dos mamíferos de médio e grande
porte (Cullen Jr. et al., 2003; Mazim et al., 2004).
O objetivo desse estudo é contribuir com o conhecimento
da diversidade de mamíferos do Parque Natural Municipal de
Sertão, norte do Rio Grande do Sul.

Materiais e métodos
Amostragem
A amostragem foi realizada de julho de 2008 a agosto de
2009. Foram utilizados oitenta plots de areia, distribuídos em
quatro linhas, instaladas em cada fragmento, na borda e no in-
terior, identificadas como fragmento 1-borda (F1B), fragmento
1-interior (F1I), fragmento 2-borda (F2B) e fragmento 2-inte-
rior (F2I). Cada linha era composta por vinte plots, com distân-
cia de 10 m entre esses, instaladas sazonalmente por um período
de quatro a seis dias. Ao amanhecer eram verificadas, limpas e
iscadas com banana, laranja e pedaços de carne.
Foram estabelecidos transectos no interior do Parque para
a visualização de pegadas que foram registradas e fotografadas.
Também foram levados em consideração para análise os encon-
tros ocasionais de outros vestígios indiretos ou visualização dos

- 123 -
Mamíferos do Parque Natural Municipal de Sertão

animais (direta). Para a identificação das pegadas foi utilizada


bibliografia especializada (Becker; Dalponte, 1999; Oliveira;
Cassaro, 2005). As pegadas das espécies que não puderam ser
identificadas foram mantidas até família ou gênero.
O coeficiente de Jaccard foi utilizado para comparar a si-
milaridade entre os dois fragmentos. Também foi calculada a
constância de ocorrência das espécies para a amostragem dos
plots pela fórmula de Dajoz (1973): C = P x 100/N, em que P =
número de vezes que apareceu a espécie e, N = número de regis-
tros realizados. De acordo com os dados, formam-se as seguintes
categorias: constantes – presentes em mais de 50% das amostras;
acessórias – presentes entre 25 e 50%; ocasionais – presentes em
menos de 25% das amostras.
A análise de regressão foi utilizada para avaliar a riqueza
com os fatores abióticos (temperatura, pluviosidade e umida-
de). Para verificar se houve diferença no número de espécies,
utilizando os plots, foi aplicado o teste não paramétrico Qui-
-quadrado (X2) com um nível de significância de 5%.

Resultados e discussão
Foram registradas, utilizando todos os métodos, 14 espécies
de mamíferos silvestres, distribuídas em seis ordens (Tabela 1).
A ordem mais representativa foi Carnívora, com 42% das ocor-
rências. Rodentia apresentou 21%, Artiodactyla 14% e Cingula-
ta, Didelphimorphia e Primates com 7% cada.
Utilizando os plots houve o registro de nove espécies: Co-
nepatus chinga, Dasyprocta azarae (Figura 1), Dasypus novemcinctus,
Didelphis albiventris, Leopardus sp., Procyon cancrivorus (Figura 2),
Coendou spinosus e espécies não identificadas de Canidae e Crice-
tidae. Nos transectos foram registradas sete espécies: D. azarae,
D. novemcinctus, Leopardus sp., Mazama sp. Rafinesque (1817)
(Figura 3), Nasua nasua, P. cancrivorus e uma espécie não iden-
tificada de Canidae.

- 124 -
Samara Arsego Guaragni et al.

Nos encontros ocasionais foram registradas 11 espécies:


Sapajus nigritus, Cerdocyon thous, Dasyprocta azarae, Dasypus
novemcinctus (Figura 4), Didelphis albiventris, Mazama sp., N.
Nasua, P. cancrivorus, C. spinosus, Sus scrofa e um representante
de Canidae, não identificado.

Figura 1 – Pegada de Dasyprocta azarae. Figura 2 – Pegada de Procyon cancrivorus.

Figura 3 – Pegada de Mazama sp. Figura 4 – Pegada de Dasypus novemcinctus.

Fonte: Maria Cristina K. de Lima.

Na borda, foram registradas 13 espécies no F1B e dez es-


pécies no F2B. No interior, foram registradas quatro espécies no
F1I e quatro espécies no F2I (Tabela 1).
A metodologia que indicou o maior número de espécies
foi a de encontros ocasionais (n=11), seguida pelos plots (n=8)
e transectos (n=7). A similaridade entre as áreas, calculada pelo
coeficiente de Jaccard, foi de 0,48.
Quanto à constância de ocorrência: C. thous, D. azarae e D.
novemcinctus foram consideradas espécies constantes; C. chinga,

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Mamíferos do Parque Natural Municipal de Sertão

D. albiventris, Leopardus sp., P. cancrivorous, C. spinosus e Criceti-


dae foram considerados ocasionais.
A análise dos fatores abióticos não evidenciou relação com
a atividade dos mamíferos: temperatura (P = 0,21), pluviosidade
(P = 0,29) e umidade (P = 0,24). Não houve diferenças significa-
tivas na riqueza das espécies entre as estações do ano (P = 0,23).

Tabela 1 – Mamíferos no Parque Natural Municipal de Sertão, entre julho de


2008 a agosto de 2009.
Táxon Nome comum Metodologia Local
Ordem Didelphimorphia
Didelphis albiventris (Lund 1840) gambá P, EO F1B, F2B
Ordem Cingulata
Dasypus novemcinctus Linnaeus, 1758 tatu-galinha P, T, EO F1B, F1I, F2B, F2I
Ordem Primates
Sapajus nigritus (Goldfuss, 1809) macaco-prego EO F1B, F1I
Ordem Carnivora
Leopardus sp. Gray 1842 gato do mato P, T F1B, F2B
Canidae graxaim P, T, EO F1B, F1I, F2B,F2I
Cerdocyon thous (Linnaeus, 1758) cachorro do mato EO F1B
Conepatus chinga (Molina, 1782) zorrilho P F2B
Nasua nasua (Linnaeus, 1766) quati T, EO F1B
Procyon cancrivorus Cuvier, 1798 mão-pelada P,T, EO F1B, F2B, F2I

Ordem Artiodactyla
Sus scrofa (Linnaeus, 1758) javali EO F1B
Mazama sp. Rafinesque, 1817 veado-mateiro T, EO F1B, F2B
Ordem Rodentia
Cricetidae rato P, T F1B, F2B
Dasyprocta azarae (Lichtenstein, 1923) cutia P, T, EO F1B, F1I, F2B, F2I
Coendou spinosus F. Cuvier, 1823) ouriço-cacheiro P, EO F1B, F2B

O número de espécies encontrados neste estudo é, rela-


tivamente, baixo quando comparado com trabalhos de Kasper
et al. (2007a) que registraram, para o Vale do Taquari, 26 es-
pécies de mamíferos de médio e grande porte, e 29 espécies
para o Parque Estadual do Turvo (Kasper et al., 2007b). Apesar
disso, outros estudos em outras regiões de Mata Atlântica no RS
apresentam resultados semelhantes a esse estudo, como para a
região da Serra Geral com 16 espécies (Abreu Jr.; Köhler, 2009).
Essa discrepância em relação aos nossos resultados pode ter sido

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Samara Arsego Guaragni et al.

influenciada pelas metodologias aplicadas, já que Kasper et al.


(2007a; 2007b) utilizaram também armadilhas fotográficas, ar-
madilhas de solo (Shermann) e registros de animais atropelados
associados aos encontros ocasionais e transectos de pegadas.
Na literatura podemos encontrar outros estudos realiza-
dos em Mata Atlântica que também encontraram maior número
de registros para a ordem Carnivora (Prado et al., 2008; Abreu
Jr.; Köhler, 2009; Penido; Zanzini, 2012). Os representantes
dessa ordem são comumente encontrados em paisagens natu-
rais e/ou fragmentadas, pois muitas espécies apresentam alta
plasticidade ambiental e, portanto, adaptam-se em ambientes
antropizados, desde que não exijam recursos raros ou pouco
abundantes.
O maior número de espécies registradas nas bordas dos
dois fragmentos pode estar refletindo diferentes respostas à frag-
mentação e à perda do habitat. Animais mais sensíveis tornam-se
raros na borda dos remanescentes florestais, que são invadidos
por espécies não florestais e típicas de áreas abertas, geralmente,
adaptadas a ambientes perturbados e que acabam competindo
por recursos (Vieira et al., 2003). A perturbação excessiva ocasio-
nada principalmente pelo uso desordenado do ambiente é outro
fator que permite que espécies oportunistas e/ou generalistas
aumentem sua abundância (Fonseca; Redford, 1984; Cáceres,
2002). Esse fato reforça a ideia de que espécies raras (ou mais
especialistas) sejam as primeiras a se extinguirem do ambiente
natural após excessiva perturbação (Caughley, 1994; Bonvicino
et al., 2002, Chiarello et al., 2008).
O maior número de espécies registradas, pelos encontros
ocasionais, deve-se, provavelmente, ao maior esforço de campo
durante outras expedições realizadas no Fragmento 1 do Par-
que. Esse tipo de registro apresentou quatro espécies exclusivas:
Sapajus nigritus, C. thous, P. cancrivorous e S. scrofa. Sapajus nigritus
vive em bandos e são animais, predominantemente arborícolas,
que dificilmente forrageiam no chão, pouco propensos a impres-
sões de rastros no substrato (Kasper et al., 2007b), por isso sua

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Mamíferos do Parque Natural Municipal de Sertão

visualização apenas por esse método. C. thous foi o único canídeo


que permitiu sua visualização direta, tornando possível a iden-
tificação da espécie. Nas demais metodologias, não foi possível
identificar a espécie, pois essa ocorre em simpatria com Lycalopex
gymnocercus e suas pegadas são muito semelhantes.
P. cancrivorus é um carnívoro muito comum, porém, difi-
cilmente visualizado, motivo pelo qual a espécie foi registrada
somente por meio de vestígios indiretos (Reis et al., 2006; Cane-
vari; Vaccaro, 2007). Sus scrofa é uma espécie exótica e, devido
ao seu caráter invasor, é uma ameaça para as atividades agrope-
cuárias e para estabilidade de ambientes naturais.
A maior riqueza no F1, utilizando todos os métodos, pode
estar refletindo a estrutura e o tamanho do fragmento (500 ha)
e maior esforço amostral. Outro fator que pode ter interferido
nessa comparação é a qualidade do fragmento dois, no qual,
frequentemente, ocorria extração de madeira, caça e deposi-
ção de resíduos sólidos. A grande maioria de mamíferos ne-
otropicais depende das áreas de vegetação nativa preservadas
para se manter, com exceção de algumas poucas espécies que
proliferam e são capazes de manter populações viáveis em am-
bientes urbanos ou agrícolas, como alguns roedores e marsu-
piais (Umetsu; Pardini, 2007). A maior riqueza também pode
estar associada à heterogeneidade e à complexidade do habitat,
que é um dos principais fatores que determinam a ocorrência
e a distribuição de pequenos mamíferos não voadores (Pardini;
Umetsu, 2006).
Três espécies foram comuns às metodologias utilizadas:
Dasyprocta azarae, Dasypus novemcinctus e Canidae (graxaim) não
identificado. Esses animais toleram ambientes alterados e têm há-
bitos oportunistas, podendo viver tanto na borda quando no in-
terior dos fragmentos (Reis et al., 2006). No Parque do Turvo-RS,
D. azarae destaca-se como a espécie com o maior número de re-
gistro (Kasper et al., 2007b). Em um trabalho realizado na Mata
Atlântica-SC, entre as espécies com maior detectabilidade, des-

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Samara Arsego Guaragni et al.

tacam-se C. thous, D. azarae e D. novemcinctus (Fantacini, 2009),


corroborando os dados encontrados neste trabalho.
As espécies constantes encontradas neste estudo são de
ampla distribuição. Espécies acessórias não foram encontradas
e as ocasionais não oferecem informações claras que justifiquem
o agrupamento, sendo necessário aprofundar os estudos na área
com um período maior de coleta de dados e o uso de outras me-
todologias. Em um estudo em Sinimbú, Vale do Rio Pardo-RS,
das seis espécies ocasionais, cinco (D. novemcinctus, S. nigritus,
Alouatta guariba clamitans, Eira barbara e N. nasua) apresentam
a floresta como área de ocupação e é a única classificada como
constante, C. thous, caracteriza-se pela alta plasticidade e pela
tolerância a ambientes antropizados (Fonseca et al., 1996; Reis
et al., 2006).
Na área de estudo, a ausência de diferença na riqueza en-
tre as estações do ano pode ser atribuída à metodologia, que
provavelmente não tenha amostrado todas as espécies. Em um
levantamento realizado na RS 153, que dá acesso ao Parque,
Hegel et al. (2012) registraram espécies atropeladas que não
constam neste levantamento: gato-mourisco (Herpailurus yagua-
roundi), tamanduá-mirim (Tamandua tetradactyla), furão (Galictis
cuja), ratão-do-banhado (Myocastorcoypus), preá (Cavia aperea)
sugerindo o aumento de espécies na área de estudo.

Perspectivas para conservação


Os resultados desse estudo mostram que o Parque Natural
Municipal de Sertão abriga uma importante riqueza de mamífe-
ros silvestres, servindo como área de refúgio para esses animais.
No entanto, a fauna sofre pressão direta em função das
atividades agrícolas realizadas no entorno do Parque, além da
caça e do desmatamento ilegal que ocorrem frequentemente. A
falta de guarda-parques também dificulta a fiscalização, somado

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Mamíferos do Parque Natural Municipal de Sertão

a isso, há também a falta da demarcação dos limites do Parque o


que facilita o livre acesso da população aos fragmentos.
Com o objetivo de prevenir que essas espécies tornem-se
cada vez mais raras no Parque, consideramos de grande rele-
vância a prática de atividades de educação ambiental voltadas
à comunidade regional com o intuito de sensibilizar as pessoas
sobre a importância da manutenção desses remanescentes flo-
restais, não somente para flora e fauna, como para o bem-estar
e a qualidade de vida da população.
Além da preocupação com a população local, sugerimos
que durante a elaboração do plano de manejo da unidade de
conservação seja previsto um programa de monitoramento de
fauna, de forma a acompanhar e a auxiliar na manutenção de
populações viáveis e conservação da comunidade como um
todo.

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