Info 1141 STF

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Informativo 1141-STF
Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE
DIREITO ADMINISTRATIVO
CONCURSO PÚBLICO
▪ STF prorrogou validade da Lei 12.990/2014, que instituiu o sistema de cotas raciais em concursos públicos federais.

SERVIÇOS PÚBLICOS
▪ É constitucional o prazo de 25 anos, prorrogável por até 10 anos, para a outorga a particulares de concessão ou de
permissão dos serviços e das obras públicas de portos secos.

FGTS
▪ O FGTS, por ter uma função social a cumprir, está sujeito a critérios diferenciados do mercado financeiro em geral,
de modo que o índice oficial da inflação (IPCA) deve ser a referência mínima para a correção dos saldos dos depósitos
realizados nas contas a ele vinculadas.

DIREITO ADMINISTRATIVO MILITAR


▪ É inconstitucional lei estadual que proíbe militar afastado por falta grave de participar de concurso público.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
▪ A inclusão do terço de férias no cálculo da contribuição previdenciária patronal só vale a partir da publicação da ata
do julgamento sobre o Tema 985.

DIREITO ADMINISTRATIVO

CONCURSO PÚBLICO
STF prorrogou validade da Lei 12.990/2014, que instituiu
o sistema de cotas raciais em concursos públicos federais

Importante!!!
ODS 10

A Lei nº 12.990/2014 estabeleceu uma cota aos negros de 20% das vagas em concursos
públicos realizados no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das
fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas
pela União.
O art. 6º dessa lei previu que o sistema de cotas teria vigência pelo prazo de 10 anos, ou seja,
ele terminaria dia 10 de junho de 2024.
O Psol e a Rede Sustentabilidade ingressaram com ADI, no STF, pedindo a manutenção da
política de cotas para candidatos negros em concursos públicos mesmo após esse prazo.

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1


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De acordo com os partidos, não houve a efetiva inclusão social almejada pela política
afirmativa.
O STF, ao apreciar medida cautelar, deu interpretação conforme a Constituição ao art. 6º da
Lei nº 12.990/2014, a fim de que o prazo nele constante seja entendido como marco temporal
para avaliação da eficácia da ação afirmativa, determinação de prorrogação e/ou
realinhamento e, caso atingido o objetivo da política, previsão de medidas para seu
encerramento, ficando afastada a interpretação que extinga abruptamente as cotas raciais.
Em outras palavras, tais cotas permanecerão sendo observadas até que se conclua o processo
legislativo de competência do Congresso Nacional e, subsequentemente, do Poder Executivo.
STF. Plenário. ADI 7.654 MC-Ref/DF, Rel. Min. Flávio Dino, julgado em 17/06/2024 (Info 1141).

ASPECTOS GERAIS SOBRE A LEI 12.990/2014


O que a Lei estabelece?
A Lei nº 12.990/2014 determinou que deveria haver cotas para negros nos concursos públicos federais.
Assim, 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos realizados pela administração pública federal
devem ser destinadas a candidatos negros (art. 1º da Lei).

A lei obriga expressamente quais entidades?


Órgãos, autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista federais.

Número mínimo de vagas


A reserva de vagas será aplicada sempre que o número de vagas oferecidas no concurso público for igual
ou superior a 3 (art. 1º, § 1º).
Em outras palavras, se o concurso previr menos que 3 vagas, não haverá cotas para negros.

O que acontece se, ao reservar os 20% de vagas aos negros, surgir um número fracionado? Ex: em um
concurso para 9 vagas, 20% será igual a 1,8 vagas. O que fazer nesse caso?
• Se a fração for igual ou maior que 0,5 (cinco décimos): o número de vagas deverá ser aumentado para o
primeiro número inteiro subsequente. Ex: concurso para 9 vagas (20% = 1,8). Logo, será arredondado para
2 vagas destinadas a negros.
• Se a fração for menor que 0,5 (cinco décimos): o número de vagas deverá ser diminuído para o número
inteiro imediatamente inferior. Ex: concurso para 16 vagas (20% = 3,2). Logo, será arredondado para 3
vagas de negros.

Edital deverá informar o número de vagas da cota


O edital do concurso deverá especificar o total de vagas reservadas aos candidatos negros para cada cargo
ou emprego público oferecido.

Em 2016, a OAB ajuizou ação declaratória de constitucionalidade em defesa da Lei nº 12.990/2014


pedindo que o STF declarasse esta norma compatível com a CF/88. O que decidiu o Supremo?
O STF julgou procedente a ADC, declarando a constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014:
É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos
efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta.
STF. Plenário. ADC 41/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 8/6/2017 (Info 868).

Se quiser conhecer mais a respeito dos argumentos sobre a constitucionalidade dessa Lei, confira os
comentários no Info 868.

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CRITÉRIOS DE IDENTIFICAÇÃO DOS COTISTAS


Critério da autodeclaração
Segundo o art. 2º da Lei nº 12.990/2014, poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros
aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o
quesito cor ou raça utilizado pelo IBGE. Esse é o chamado critério da autodeclaração.

Declaração falsa
Se ficar constatado que o candidato fez declaração falsa sobre sua cor, a Lei prevê que ele será eliminado
do concurso.
Caso a declaração falsa somente seja constatada após o candidato já ter sido nomeado, a sua admissão
poderá ser anulada, após processo administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla
defesa.
Além disso, o candidato ainda poderá ser processado criminalmente.

Critério da heteroidentificação
O STF afirmou que o critério da autodeclaração é constitucional. Isso porque deve-se respeitar as pessoas
tal como elas se percebem.
Entretanto, a Corte afirmou que é possível também que a Administração Pública adote um controle
heterônomo, sobretudo quando existirem fundadas razões para acreditar que houve abuso na
autodeclaração.
Exemplos desse controle heterônomo: exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do
concurso; exigência de apresentação de fotos pelos candidatos; formação de comissões com composição
plural para entrevista dos candidatos em momento posterior à autodeclaração.

Cautelas no critério de heteroidentificação


Vale ressaltar que o controle heterônomo pode ser realizado, mas desde que observadas algumas cautelas
a fim de que não haja violação à dignidade da pessoa humana, devendo ser garantido o contraditório e a
ampla defesa aos candidatos interessados.

O STF considerou constitucional essa previsão legal:


É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que
respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa.
STF. Plenário. ADC 41/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 8/6/2017 (Info 868).

APLICAÇÃO DA LEI
A reserva de vagas tratada pela Lei nº 12.990/2014 vale para todos os três Poderes da União (Executivo,
Legislativo e Judiciário), além do MPU e DPU.
A Lei nº 12.990/2014 não se aplica para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. No entanto, caso
estes entes editem leis semelhantes, elas também são consideradas constitucionais.
Não ficou definido, neste julgamento, se as cotas valem também para concursos de remoção e promoção.
Isso porque este tema não constou do pedido nem foi discutido em memoriais.

PREENCHIMENTO DAS VAGAS


Os candidatos negros concorrem apenas às vagas da cota?
NÃO. Os candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas reservadas e às vagas destinadas à
ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso.
Ex: em determinado concurso, 80 vagas eram destinadas à ampla concorrência e 20 reservadas para
negros. João, que se autodeclarou preto no momento da inscrição, ficou em 25º lugar na lista de

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candidatos negros. Ao mesmo tempo, na lista de ampla concorrência, ele ficou em 79º lugar. Logo, ele
será nomeado nas vagas destinadas à ampla concorrência.

Candidato negro que foi aprovado nas vagas de ampla concorrência


Os candidatos negros aprovados dentro do número de vagas oferecido para ampla concorrência não serão
computados para efeito do preenchimento das vagas reservadas (art. 3º, § 1º).
Ex: em determinado concurso, 80 vagas eram destinadas à ampla concorrência e 20 reservadas para
negros. Pedro, que se autodeclarou preto no momento da inscrição, ficou em 19º lugar na lista de
candidatos negros. Ao mesmo tempo, na lista de ampla concorrência, ele ficou em 79º lugar. Logo, ele
será nomeado nas vagas destinadas à ampla concorrência e a sua vaga na lista da cota (19º lugar) será
utilizada por outro candidato negro.

Candidato negro que desiste da nomeação ou posse


Em caso de desistência de candidato negro aprovado em vaga reservada, a vaga será preenchida pelo
candidato negro posteriormente classificado.
Ex: em determinado concurso, 20 vagas eram reservadas para negros. Lucas, que se autodeclarou preto
no momento da inscrição, ficou em 20º lugar na lista de candidatos negros. Ocorre que ele desistiu de sua
nomeação em razão de ter passado em outro certame. Logo, a administração pública terá que convocar o
21º candidato negro.

O que acontece se as vagas reservadas aos candidatos negros não forem integralmente preenchidas?
Na hipótese de não haver candidatos negros aprovados em número suficiente para ocupar as vagas
reservadas, tais vagas remanescentes serão revertidas para a ampla concorrência e serão preenchidas
pelos demais candidatos aprovados, observada a ordem de classificação.
Ex: em determinado concurso, 4 vagas eram reservadas para candidatos negros. Ocorre que somente 3
candidatos negros fizeram a pontuação mínima exigida (nota de corte). Assim, essa quarta vaga poderá
ser preenchida por candidato não negro.

Nomeação dos candidatos


A Lei nº 12.990/2014 prevê a seguinte regra:
Art. 4º A nomeação dos candidatos aprovados respeitará os critérios de alternância e
proporcionalidade, que consideram a relação entre o número de vagas total e o número de vagas
reservadas a candidatos com deficiência e a candidatos negros.

Quanto aos critérios de alternância e proporcionalidade na nomeação dos candidatos, o STF exemplificou
a forma correta de interpretar a lei. No caso de haver 20 vagas, 4 seriam reservadas a negros, obedecida
a seguinte sequência de ingresso: primeiro colocado geral, segundo colocado geral, terceiro colocado
geral, quarto colocado geral, até que o quinto convocado seria o primeiro colocado entre os negros, e
assim sucessivamente.
Dessa forma, evita-se colocar os aprovados da lista geral primeiro e somente depois os aprovados por cotas.

VIGÊNCIA DO SISTEMA DE COTAS


O sistema de cotas para negros previsto na Lei nº 12.990/2014 estava previsto para durar até 10/06/2024.
Foi o que estabeleceu o art. 6º da Lei nº 12.990/2014:
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação e terá vigência pelo prazo de 10 (dez)
anos.

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Após esse período, as cotas para negros em concursos públicos da administração pública federal
acabariam, salvo se fosse verificado que a medida ainda seria necessária quando, então, deveria ser
editada uma nova lei prorrogando o prazo.
Ocorre que estava chegando o dia final e o Congresso Nacional não havia, ainda, aprovado nenhuma lei
prorrogando o prazo.
Diante disso, em 17/05/2024, o Partido Socialismo e Liberdade (Psol) e a Rede Sustentabilidade
ingressaram com ADI no STF formulando três pedidos:
1) a expansão da reserva de cotas para os concursos públicos estaduais, municipais e distritais;
2) a reserva das vagas mesmo quando o número ofertado de vagas for inferior a três; e
3) a prorrogação do prazo por tempo indeterminado.

Decisão monocrática
Em 26/05/2024, o Ministro Relator Flávio Dino deferiu a medida cautelar para conceder o terceiro pedido
acima. Em outras palavras, o Ministro determinou que o sistema de cotas deverá continuar, mesmo após
o prazo do art. 6º da Lei (10/06/2024), até que o Congresso Nacional termine de analisar o projeto de lei
que prevê a prorrogação das cotas. Confira o dispositivo da decisão:
“Ante o exposto, com fundamento no art. 10, § 3º, da Lei n. 9.868/1999 e no art. 21, V, do
Regimento Interno, concedo a medida cautelar, ad referendum do Plenário, para dar
interpretação conforme à Constituição ao art. 6° da Lei n° 12.990, de 9 de junho de 2014, a fim de
que o prazo constante no referido dispositivo legal seja entendido como marco temporal para
avaliação da eficácia da ação afirmativa, determinação de prorrogação e/ou realinhamento e, caso
atingido seu objetivo, previsão de medidas para seu encerramento, ficando afastada a
interpretação que extinga abruptamente as cotas raciais previstas na Lei nº 12.990/2014. Ou seja,
tais cotas permanecerão sendo observadas até que se conclua o processo legislativo de
competência do Congresso Nacional e, subsequentemente, do Poder Executivo.”

O Plenário do STF referendou a cautelar?


SIM.
O prazo estabelecido no art. 6º da Lei não foi previsto com o objetivo de encerrar definitivamente a ação
afirmativa. Na verdade, esse prazo tem três objetivos principais:
• Criar um momento específico para avaliar a eficácia da ação afirmativa;
• Permitir ajustes e melhorias no programa, se necessário;
• Estabelecer uma data para possível conclusão do programa, caso seus objetivos tenham sido alcançados.

O fim da vigência da ação afirmativa sem a devida avaliação de seu impacto e eficácia na redução das
desigualdades raciais, das consequências de sua descontinuidade e dos resultados já alcançados, além de
contrariar os objetivos da própria lei afronta regras da Constituição Federal que visam erradicar as
desigualdades sociais e construir uma sociedade justa e solidária, livre de preconceitos de raça, cor e
outras formas de discriminação:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
(...)
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.

Visando a concretização dos objetivos constitucionais, o Brasil assumiu o compromisso – por meio da
ratificação da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas

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(Decreto nº 19.932/2022), na forma do art. 5º, § 3º da CF/88 – de adotar políticas de promoção da


igualdade de oportunidades para pessoas ou grupos sujeitos ao racismo, à discriminação racial e forma
correlatas, incluindo medidas de caráter trabalhista.
Vale ressaltar, por fim, que tramita, no Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 1.958/2021 que trata
justamente do objeto da ADI ora analisada.
Nesse contexto, as cotas deverão continuar sendo observadas até que se conclua o processo legislativo
de competência do Congresso Nacional e, posteriormente, do Poder Executivo.
Após essa conclusão, prevalecerá a nova deliberação do Poder Legislativo, de modo que o conteúdo da
presente decisão cautelar poderá ser reavaliado.

Em suma, veja o que decidiu o STF:


Encontram-se presentes os requisitos para a concessão da medida cautelar, pois:
(i) há plausibilidade jurídica no que se refere à alegação de que, mesmo que sopesados os avanços já
alcançados pela ação afirmativa de cotas raciais instituída pela Lei nº 12.990/2014, remanesce a
necessidade da continuidade da política para que haja a efetiva inclusão social almejada; e
(ii) há perigo da demora na prestação jurisdicional, consubstanciado na data de encerramento do
período de vigência legal (10 de junho de 2024), o que pode gerar grave insegurança jurídica para os
concursos em andamento ou finalizados recentemente.
STF. Plenário. ADI 7.654 MC-Ref/DF, Rel. Min. Flávio Dino, julgado em 17/06/2024 (Info 1141).

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, referendou a medida cautelar
anteriormente concedida que deu interpretação conforme a Constituição ao art. 6º da Lei nº 12.990/2014,
a fim de que o prazo nele constante seja entendido como marco temporal para avaliação da eficácia da
ação afirmativa, determinação de prorrogação e/ou realinhamento e, caso atingido o objetivo da política,
previsão de medidas para seu encerramento, ficando afastada a interpretação que extinga abruptamente
as cotas raciais.

SERVIÇOS PÚBLICOS
É constitucional o prazo de 25 anos, prorrogável por até 10 anos, para a outorga a particulares
de concessão ou de permissão dos serviços e das obras públicas de portos secos
ODS 8, 9, 11 E 17

É constitucional o prazo de 25 anos, prorrogável por até 10 anos, para a outorga a particulares
de concessão ou de permissão dos serviços e das obras públicas de “portos secos”.
Todavia, esses períodos devem ser compreendidos como prazos máximos (ou prazos-limites),
na medida em que é vedado ao legislador fixar uma duração contratual aplicável, de forma
invariável e inflexível, a toda e qualquer concessão ou permissão.
É inconstitucional a prorrogação da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos
“portos secos” cujas outorgas iniciais não forem antecedidas de procedimento licitatório. Essa
prorrogação viola a regra da obrigatoriedade de prévia licitação (art. 175 da CF/88).
Ainda que a outorga inicial seja precedida de licitação, é inconstitucional a prorrogação direta
e automática — por força de lei — da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos
“portos secos”.
O STF modulou os efeitos da decisão para permitir que o Poder Público promova, no prazo
máximo de 24 meses contados da data da publicação da ata deste julgamento, as licitações de
todas as concessões ou permissões cuja vigência esteja amparada nos dispositivos

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mencionados e que estejam em desacordo com a interpretação ora conferida, findo o qual os
respectivos contratos ficarão extintos de pleno direito.
STF. Plenário. ADI 3.497/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 13/06/2024 (Info 1141).

O caso concreto foi o seguinte:


A Lei nº 9.074/95 estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços
públicos. O art. 1º, VI, dessa Lei previu que:
Art. 1º Sujeitam-se ao regime de concessão ou, quando couber, de permissão, nos termos da Lei
no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, os seguintes serviços e obras públicas de competência da
União:
(...)
VI - estações aduaneiras e outros terminais alfandegados de uso público, não instalados em área
de porto ou aeroporto, precedidos ou não de obras públicas.

Anos depois, foi editada a Lei nº 10.684/2003, que inseriu dois parágrafos no art. 1º da Lei nº 9.074/95:
Art. 1º (...)
§ 2º O prazo das concessões e permissões de que trata o inciso VI deste artigo será de vinte e cinco
anos, podendo ser prorrogado por dez anos.
§ 3º Ao término do prazo, as atuais concessões e permissões, mencionadas no § 2º, incluídas as
anteriores à Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, serão prorrogadas pelo prazo previsto no §
2º.

Na prática, o que isso representou?


Houve duas alterações nas regras de concessões e permissões para que empresas privadas explorem
portos secos:
i) o aumento, para 25 anos, prorrogáveis por mais 10 anos, do prazo para as novas concessões; e
ii) a prorrogação de todas as concessões e permissões que já estavam em vigor por mais 10 anos (art. 1º,
§§ 2º e 3º, da Lei nº 9.074/1995, com a redação dada pelo art. 26 da Lei nº 10.684/2003).

O que são Portos Secos?


São estações alfandegárias localizadas no interior, sob jurisdição alfandegária da Receita Federal, usados
como intermediários para movimentação de cargas no interior do país. Também conhecidos como Estação
Aduaneira Interior (EADI), nada mais são que depósitos alfandegados localizados em zona secundária, ou
seja, longe dos portos organizados.
Ex: produtores agropecuários de Mato Grosso do Sul estão longe dos portos marítimos de Santos, logo, o
porto seco localizado em Anápolis (GO) facilita o escoamento e exportação da produção.
Na prática, servem para agilizar a importação e a exportação de mercadorias. A criação desses portos
secos depende de celebração de contratos com o poder público (concessões e permissões)

ADI
O Procurador-Geral da República ingressou com ADI contra esses dois parágrafos.
No processo, a PGR argumentou que, em razão das prorrogações feitas pela lei, as permissões e
concessões para a exploração de portos secos vigorariam por tempo demais, causando prejuízos ao poder
público.
A situação seria ainda mais grave porque atualmente esse serviço seria prestado por empresas que não
participaram de licitação (procedimento de seleção que garante a mesma oportunidade a todos que
queiram explorar o serviço).

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A PGR sustentou que a lei impugnada conflita com o princípio da moralidade previsto no art. 37, caput, da
CF/88, bem como com o inciso XXI do mesmo artigo e com o art. 175 da CF/88, uma vez que permitiu a
prorrogação de concessões sem realização de licitação.

Os argumentos invocados pelo PGR foram acolhidos pelo STF?


Em parte, sim.

É constitucional — por ser razoável e proporcional — o prazo de 25 anos, prorrogável por até 10 anos,
para a outorga a particulares de concessão ou de permissão dos serviços e das obras públicas de “portos
secos”
Os prazos de duração de contratos para a prestação de serviços públicos por empresas privadas devem
viabilizar o equilíbrio entre os investimentos a serem realizados pela empresa (os gastos, feitos geralmente
no início do contrato) e as receitas obtidas por ela (os ganhos, recebidos ao longo do contrato). No caso
dos portos secos, a exploração do serviço exige investimentos altos por parte da empresa. Por isso, o
aumento da duração dos contratos de concessão e permissão pode ser necessário para que, com o tempo
adicional, as empresas consigam obter receitas suficientes para compensar as despesas.
O lapso temporal do contrato deve possibilitar o equilíbrio entre os gastos e as receitas obtidas pela
empresa prestadora de serviço público. Na espécie, o vulto dos investimentos a serem realizados e das
outras condicionantes contratuais de caráter econômico-financeiro demandam prazo mais dilatado para
sua amortização. Ademais, os referidos prazos não destoam dos assinalados para a outorga de outros
serviços públicos.
Todavia, esses períodos devem ser compreendidos como prazos máximos (ou prazos-limites), na medida
em que é vedado ao legislador fixar uma duração contratual aplicável, de forma invariável e inflexível, a
toda e qualquer concessão ou permissão.
Cabe ao administrador público definir, em cada situação concreta, o prazo de duração contratual e, se for
o caso, o de sua prorrogação, os quais podem ser até mesmo inferiores aos previstos pelo Poder
Legislativo.

É inconstitucional — por ferir a regra da obrigatoriedade de prévia licitação (art. 175, CF/88) — a
prorrogação da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos “portos secos” cujas outorgas
iniciais não forem antecedidas de procedimento licitatório
Conforme jurisprudência do STF, é vedada a possibilidade de manutenção de outorgas vencidas, precárias,
com prazo indeterminado, ou pactuadas sem licitação sob a égide da Constituição Federal de 1988, sendo
que eventual vício na contratação original também macula o prolongamento posterior da vigência.

Ainda que a outorga inicial seja precedida de licitação, é inconstitucional a prorrogação direta e
automática — por força de lei — da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos “portos
secos”
Em alguns casos, a prorrogação do prazo do contrato pode ser mais eficiente e trazer mais vantagens para
o poder público e os usuários do serviço do que a realização de nova licitação.
As regras previstas no art. 1º, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.074/95 (com a redação dada pelo art. 26 da Lei nº
10.684/2003) não autorizam a prorrogação automática dos prazos de duração dos contratos. É preciso
que os gestores públicos avaliem a situação de cada contrato para definir o prazo necessário, respeitando
o limite estabelecido pela lei.
A prorrogação se insere no âmbito da discricionariedade administrativa, conforme juízo de conveniência
e oportunidade, devendo estarem presentes os seguintes requisitos:
(i) lei que a autorize;
(ii) interesse público na continuidade da avença, devidamente averiguado e justificado pelo gestor;
(iii) anuência do contratado; e

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(iv) formalização em aditivo contratual.

Além disso, para as empresas que não participaram de licitação para a exploração de portos secos, os
contratos atuais não podem ser prorrogados. Nesses casos, por razões de segurança jurídica, o poder
público terá o prazo de 24 meses para realizar a licitação.

Em suma:
É constitucional — por ser razoável e proporcional — o prazo de 25 anos, prorrogável por até 10 anos,
para a outorga a particulares de concessão ou de permissão dos serviços e das obras públicas de “portos
secos”. Todavia, esses períodos devem ser compreendidos como prazos máximos (ou prazos-limites),
na medida em que é vedado ao legislador fixar uma duração contratual aplicável, de forma invariável e
inflexível, a toda e qualquer concessão ou permissão.
É inconstitucional — por ferir a regra da obrigatoriedade de prévia licitação (art. 175, CF/88) — a
prorrogação da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos “portos secos” cujas outorgas
iniciais não forem antecedidas de procedimento licitatório.
Ainda que a outorga inicial seja precedida de licitação, é inconstitucional a prorrogação direta e
automática — por força de lei — da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos “portos
secos”.
STF. Plenário. ADI 3.497/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 13/06/2024 (Info 1141).

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente a
ação para conferir interpretação conforme aos §§ 2º e 3º do art. 1º da Lei nº 9.074/1995, acrescidos pelo
art. 26 da Lei nº 10.684/2003, para que:

(i) relativamente ao § 2º:


(a) o prazo de outorga (e de sua eventual prorrogação) seja entendido como o prazo máximo (ou o prazo-
limite), devendo o administrador público definir, em cada caso concreto, o prazo de duração contratual
(e, se for o caso, o de sua prorrogação), podendo esses prazos, inclusive, serem inferiores aos fixados pela
norma; e
(b) somente sejam prorrogados os contratos de concessão ou permissão precedidos de licitação; e

(ii) com relação ao § 3º:


(a) a prorrogação não decorra direta e automaticamente da lei, devendo ser formalizada, em cada caso,
mediante aditivo contratual, se subsistir interesse público na continuidade da avença, o que deve ser
devidamente averiguado e justificado pelo administrador público;
(b) eventual prorrogação observe o prazo máximo (prazo-limite) de 10 anos, podendo ser realizada, no
caso concreto, por prazo menor se assim entender conveniente e oportuno o administrador público; e
(c) somente sejam prorrogados os contratos de concessão ou permissão precedidos de licitação e que, à
época da edição da norma, ainda não se encontrem extintos nem vigorem por prazo indeterminado.

Modulação dos efeitos


O Tribunal, também por maioria, modulou os efeitos da decisão para permitir que o Poder Público
promova, no prazo máximo de 24 meses contados da data da publicação da ata deste julgamento, as
licitações de todas as concessões ou permissões cuja vigência esteja amparada nos dispositivos
mencionados e que estejam em desacordo com a interpretação ora conferida, findo o qual os respectivos
contratos ficarão extintos de pleno direito.

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FGTS
O FGTS, por ter uma função social a cumprir, está sujeito a critérios diferenciados do mercado
financeiro em geral, de modo que o índice oficial da inflação (IPCA) deve ser a referência mínima
para a correção dos saldos dos depósitos realizados nas contas a ele vinculadas

Importante!!!
ODS 8, 10 E 16

A remuneração do FGTS não pode ficar abaixo da inflação (IPCA). Isso viola a Constituição, pois
faz com que os trabalhadores percam dinheiro, já que seu saldo do FGTS não acompanha o
aumento geral dos preços.
Portanto, quando a forma atual de remuneração do FGTS (TR mais juros de 3% ao ano) ficar
abaixo da inflação, o Fundo deverá compensar os trabalhadores, fazendo a remuneração
chegar até o índice oficial de inflação (IPCA).
Essa compensação teve a concordância das quatro maiores centrais sindicais do país, que
representaram os trabalhadores em negociação com o governo.
A decisão será aplicada ao saldo existente na conta do FGTS a partir da publicação da ata do
presente julgamento, que ocorreu em 17/06/2024.
Isso garante o direito de propriedade do trabalhador, ao mesmo tempo em que protege os
projetos sociais que são realizados com o FGTS. É que, além de funcionar como uma espécie de
poupança do trabalhador, o dinheiro do FGTS é usado para fins sociais importantes: ele ajuda
a financiar a compra de casas para pessoas de baixa renda e obras de saneamento básico e de
infraestrutura urbana. Se o índice a ser utilizado para a correção dos valores depositados no
FGTS fosse muito alto, os juros desses financiamentos aumentariam e isso prejudicaria a
parcela mais pobre da população que se beneficia desses projetos sociais.
STF. Plenário. ADI 5.090/DF, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, redator do acórdão Min. Flávio Dino,
julgado em 12/06/2024 (Info 1141).

FGTS
FGTS é a sigla para Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
Foi criado pela Lei nº 5.107/66 com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa.
Atualmente, o FGTS é regido pela Lei nº 8.036/90.
O FGTS nada mais é do que uma conta bancária aberta em nome do trabalhador e vinculada a ele no
momento em que celebra seu primeiro contrato de trabalho.
Nessa conta bancária, o empregador deposita todos os meses o valor equivalente a 8% do salário pago ao
empregado, acrescido de juros e atualização monetária (conhecidos pela sigla “JAM”).
Assim, vai sendo formado um fundo de reserva financeira para o trabalhador, ou seja, uma espécie de
“poupança”, que é utilizada pelo obreiro quando fica desempregado sem justa causa ou quando precisa
para alguma finalidade relevante, assim considerada pela lei.
Se o empregado for demitido sem justa causa, o empregador é obrigado a depositar, na conta vinculada
do trabalhador, uma indenização compensatória de 40% do montante de todos os depósitos realizados
na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos
dos respectivos juros (art. 18, § 1º, da Lei nº 8.036/90).
O trabalhador que possui conta do FGTS vinculada a seu nome é chamado de trabalhador participante do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
O FGTS possui natureza jurídica de direito social do trabalhador, sendo considerado, portanto, fruto civil
do trabalho (STJ. 3ª Turma. REsp 848.660/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 13/05/2011).

Qual é o papel da Caixa Econômica Federal no FGTS?


A Caixa Econômica Federal exerce o papel de agente operador do FGTS (art. 4º da Lei nº 8.036/90).
Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10
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Dentre outras funções, cabe à CEF:


• centralizar os recursos do FGTS;
• manter e controlar as contas vinculadas;
• emitir extratos individuais correspondentes às contas vinculadas (art. 7º, I).

Conselho Curador do Fundo


O FGTS será regido por normas e diretrizes estabelecidas por um Conselho Curador, composto por
representação de trabalhadores, empregadores e órgãos e entidades governamentais, na forma
estabelecida pelo Poder Executivo (art. 3º da Lei nº 8.036/90).
A Presidência do Conselho Curador será exercida pelo Ministro de Estado do Trabalho e Previdência ou
representante por ele indicado.
Os representantes dos trabalhadores e dos empregadores e seus suplentes serão indicados pelas
respectivas centrais sindicais e confederações nacionais, serão nomeados pelo Poder Executivo, terão
mandato de 2 (dois) anos e poderão ser reconduzidos uma única vez, vedada a permanência de uma
mesma pessoa como membro titular, como suplente ou, de forma alternada, como titular e suplente, por
período consecutivo superior a 4 (quatro) anos no Conselho.
O Conselho Curador reunir-se-á ordinariamente, a cada bimestre, por convocação de seu Presidente.
Esgotado esse período, não tendo ocorrido convocação, qualquer de seus membros poderá fazê-la, no
prazo de 15 (quinze) dias. Havendo necessidade, qualquer membro poderá convocar reunião
extraordinária, na forma que vier a ser regulamentada pelo Conselho Curador.
As reuniões do Conselho Curador serão públicas, bem como gravadas e transmitidas ao vivo por meio do
sítio do FGTS na internet, o qual também possibilitará acesso a todas as gravações que tiverem sido
efetuadas dessas reuniões, resguardada a possibilidade de tratamento sigiloso de matérias assim
classificadas na forma da lei.

Índice de correção monetária nas contas do FGTS


O dinheiro dos trabalhadores que está depositado nas contas do FGTS precisa ser corrigido mensalmente,
ou seja, deve incidir a correção monetária.
O índice utilizado para a correção monetária dos valores depositados a título de FGTS é a TR (Taxa
Referencial), que é o mesmo índice aplicado para a correção da poupança. Esse índice foi previsto pelo
art. 13 da Lei nº 8.036/90 e pelo art. 17 da Lei nº 8.177/91:
Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base
nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização
juros de (três) por cento ao ano.

Art. 17. A partir de fevereiro de 1991, os saldos das contas do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS) passam a ser remunerados pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos
de poupança com data de aniversário no dia 1º, observada a periodicidade mensal para
remuneração.

Desse modo, o FGTS tem rendimento igual à Taxa Referencial (TR) mais juros de 3% ao ano.
A TR é uma taxa de juros de referência calculada pelo Banco Central e serve para atualizar alguns tipos de
investimentos e empréstimos.

Declaração de inconstitucionalidade da TR para correção de condenações envolvendo a Fazenda Pública


O art. 1ºF da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009, previa que, nas condenações
impostas à Fazenda Pública, deveria incidir, como correção monetária, os índices oficiais de remuneração
básica da caderneta de poupança.

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11


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Desse modo, o legislador determinou que, se o Poder Público fosse condenado a pagar uma quantia, ela
deveria ser acrescida de correção monetária e que o índice aplicado, neste caso, seria a TR – Taxa
Referencial.
Ocorre que o STF declarou que essa previsão é inconstitucional. Isso porque a TR é um índice fixado ex
ante, ou seja, previamente, a partir de critérios técnicos não relacionados com a inflação considerada no
período. Em outras palavras, a TR é calculada antes de a inflação ocorrer. Assim, a remuneração da
caderneta de poupança – diferentemente de qualquer outro índice oficial de inflação – é sempre
prefixada. Essa circunstância deixa claro que existe uma desvinculação entre a remuneração da poupança
e a evolução dos preços da economia, isto é, a TR não capta a variação da inflação.
Por essa razão, diz-se que todo índice definido ex ante é incapaz de refletir a real flutuação de preços
apurada no período em referência. É o caso da TR (poupança).
Dessa maneira, como este índice não consegue manter o valor real da condenação, ele afronta à própria
decisão judicial, tendo em vista que o valor real do crédito previsto na condenação judicial não será o valor
que o credor irá receber efetivamente. Este valor terá sido corroído pela inflação.
Nesse sentido:
STF. Plenário. ADI 4357/DF, ADI 4425/DF, ADI 4372/DF, ADI 4400/DF, ADI 4357/DF, rel. orig. Min. Ayres
Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 13 e 14/3/2013.
STF. Plenário. RE 870947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20/9/2017 (repercussão geral) (Info 878).

Ações questionando o índice de correção do FGTS


Como vimos, a correção monetária envolvendo o FGTS também adota a TR.
Logo, diante dessas decisões do STF, o Partido Solidariedade ingressou com ADI, no STF, pedindo a
declaração de inconstitucional do art. 13 da Lei nº 8.036/90 e do art. 17 da Lei nº 8.177/91 na parte que
que eles preveem a Taxa Referencial (TR) como sendo o índice de correção dos depósitos nas contas
vinculadas do FGTS.
A alegação foi a seguinte: ora, se o índice TR foi considerado indevido nos demais casos deve também ser
considerado inadequado no caso das contas do FGTS.
O partido alegou que a aplicação da TR causa perdas aos trabalhadores, porque gera uma remuneração
tão baixa dos depósitos que não supera nem a inflação (isto é, o aumento geral dos preços de bens e
serviços). Logo, violaria o direito de propriedade dos trabalhadores.
Assim, foi pedida a declaração judicial de que a TR não constitui índice de correção monetária
considerando que não reflete corretamente a variação do custo da moeda.

O que decidiu o STF?


Vamos entender a decisão do STF em sete pontos:
1) A remuneração do FGTS não pode realmente ficar abaixo da inflação. Se o índice de remuneração do
FGTS ficar abaixo da inflação, estará havendo uma violação do direito de propriedade (arts. 5º, XXII e XXIII,
e 170, III, CF/88). Isso porque o trabalhador, mesmo com o dinheiro depositado no Fundo, estará perdendo
poder aquisitivo, já que seu saldo do FGTS não acompanhará o aumento geral dos preços.
2) O índice oficial de inflação é o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Este índice é
produzido pelo IBGE (fundação federal) e, por ser calculado por essa instituição, é considerado um índice
federal de correção monetária. O IPCA é um índice que mede a inflação de um conjunto de produtos e
serviços comercializados no varejo, destinados ao consumo final das famílias. Ele é utilizado como
parâmetro para metas de inflação, reajuste de impostos e contratos.
3) Logo, a remuneração do FGTS não pode ficar abaixo do IPCA.
4) O período anterior a esse julgamento não será afetado. No entanto, daqui em diante, quando a forma
atual de remuneração do FGTS (TR mais juros de 3% ao ano) ficar abaixo da inflação, o Fundo deverá
compensar os trabalhadores, fazendo a remuneração chegar até o índice oficial de inflação (IPCA).

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12


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5) A decisão será aplicada ao saldo existente na conta do FGTS a partir da data de publicação do resultado
do julgamento (17/06/2024).
6) Caberá ao Conselho Curador do Fundo (art. 3º da Lei nº 8.036/90) definir a forma dessa compensação.
7) Isso garante o direito de propriedade do trabalhador, ao mesmo tempo em que protege os projetos
sociais que são realizados com o FGTS. É que, além de funcionar como uma espécie de poupança do
trabalhador, o dinheiro do FGTS é usado para fins sociais importantes: ele ajuda a financiar a compra de
casas para pessoas de baixa renda e obras de saneamento básico e de infraestrutura urbana. Se o índice
a ser utilizado para a correção dos valores depositados no FGTS fosse muito alto, os juros desses
financiamentos aumentariam e isso prejudicaria a parcela mais pobre da população que se beneficia
desses projetos sociais.

Por que o STF não substituiu logo a TR por um outro índice?


O FGTS é um amparo ao trabalhador na hipótese de dispensa arbitrária que possibilita também o crédito
para o financiamento da casa própria aos menos favorecidos.
O rendimento do FGTS, se fosse mais oneroso do que o legalmente previsto, ensejaria restrições ao crédito
para o financiamento imobiliário em desfavor dos mais carentes, tendo em vista o custo financeiro.
Além disso, os Ministros afirmaram que há limitações para a atuação do Poder Judiciário, pois a
intervenção pública no domínio econômico é excepcional, em respeito ao primado da livre iniciativa, ao
zelo com a responsabilidade fiscal e à consequente mitigação de novas despesas obrigatórias, nos termos
do art. 167-A, incisos VII e VIII e art. 174, §1º, todos da CF/88:
Art. 167-A. Apurado que, no período de 12 (doze) meses, a relação entre despesas correntes e
receitas correntes supera 95% (noventa e cinco por cento), no âmbito dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, é facultado aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ao Ministério
Público, ao Tribunal de Contas e à Defensoria Pública do ente, enquanto permanecer a situação,
aplicar o mecanismo de ajuste fiscal de vedação da:
(...)
VII - criação de despesa obrigatória;
VIII - adoção de medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da
inflação, observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º
desta Constituição;

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na
forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para
o setor público e indicativo para o setor privado.
§ 1º A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional
equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de
desenvolvimento.

Outro fator que foi ponderado é a busca da previsibilidade da segurança jurídica da calculabilidade.
Além disso, o STF afirmou que deveria ser prestigiada a autonomia privada coletiva (art. 7º, XXVI, CF/88):
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de
sua condição social:
(...)
XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

Como assim? Por que falar em autonomia privada coletiva? Porque, no caso concreto, houve um acordo,
firmado no dia 03/04/2024, entre a Advocacia Geral da União e as quatro maiores centrais sindicais do
País, no sentido de que, nos anos em que a forma legal de atualização for inferior ao IPCA, caberá ao

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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Conselho Curador do Fundo — órgão tripartite, formado por empresários, trabalhadores e o governo —
determinar a forma de compensação.
O STF entendeu que essa medida, além de garantir o direito de propriedade do trabalhador — por permitir
que a correção monetária acompanhe o aumento geral dos preços — protege os projetos sociais a serem
realizados com o dinheiro do Fundo, o qual não funciona apenas como uma “poupança compulsória do
trabalhador”, mas também como um financiador da política habitacional, isto é, da aquisição da casa
própria por pessoas de baixa renda e da realização de obras de saneamento básico e de infraestrutura
urbana.

Em suma:
O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), por ter uma função social a cumprir, está sujeito a
critérios diferenciados do mercado financeiro em geral, de modo que o índice oficial da inflação (IPCA)
deve ser a referência mínima para a correção dos saldos dos depósitos realizados nas contas a ele
vinculadas, a fim de garantir a manutenção do poder aquisitivo do trabalhador (arts. 5º, XXII e XXIII, e
170, III, CF/88).
STF. Plenário. ADI 5.090/DF, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, redator do acórdão Min. Flávio Dino, julgado
em 12/06/2024 (Info 1141).

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente a
ação para determinar:
(i) a remuneração das contas vinculadas na forma legal (TR + 3% a.a. + distribuição dos resultados
auferidos) em valor que garanta, no mínimo, o índice oficial de inflação (IPCA) em todos os exercícios; e
(ii) nos anos em que a remuneração das contas vinculadas ao FGTS não alcançar o IPCA, que caberá ao
Conselho Curador do Fundo — art. 3º da Lei nº 8.036/1990) — definir a forma de compensação.

Modulação dos efeitos


O Tribunal atribuiu efeitos ex nunc à decisão, para que seus efeitos ocorram a partir da publicação da ata
do presente julgamento, que ocorreu em 17/06/2024.

DIREITO ADMINISTRATIVO MILITAR


É inconstitucional lei estadual que proíbe militar afastado
por falta grave de participar de concurso público

Importante!!!
ODS 16

É inconstitucional — por criar sanção de caráter perpétuo — norma que, sem estipular prazo
para o término da proibição, impede militares estaduais afastados pela prática de falta grave
de prestarem concurso público para provimento de cargo, emprego ou função na
Administração Pública direta ou indireta local.
STF. Plenário. ADI 2.893/PE, Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 17/06/2024 (Info 1141).

O caso concreto foi o seguinte:


No Estado do Pernambuco foi aprovada a Lei Complementar nº 49/2003 que, em seu art. 28, previu que
o militar estadual que for afastado por cometer uma falta grave fica proibido prestar concursos públicos
no âmbito estadual. Veja:

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Art. 28. O Militar do Estado afastado pela prática de falta grave, nos termos da legislação que lhe
for aplicável, não poderá participar de concurso público para provimento de cargo, emprego ou
função na administração pública estadual, direta ou indireta.

ADI
O Partido da República (antes denominado Partido Liberal) ingressou com ADI contra essa previsão
alegando que “Qualquer norma que estabeleça um juízo, apriorístico, sem sentença final transitada em
julgado, é inconstitucional e injusto”.

Esse dispositivo é inconstitucional?


SIM.
A norma em questão, que proíbe militares afastados por falta grave de participarem de concursos públicos
para cargos, empregos ou funções na Administração direta ou indireta do Estado de Pernambuco, não
estabelece um prazo para o fim dessa proibição.
Essa ausência de prazo configura uma penalidade administrativa de caráter perpétuo, o que não é
admitido, conforme decidiu o STF no julgamento da ADI 2.975. Nesse caso, o STF analisou o parágrafo
único do art. 137 da Lei federal nº 8.112/1993 (Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da
União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais – RJU):
O parágrafo único do art. 137 da Lei nº 8.112/90 proíbe, para sempre, o retorno ao serviço público federal
de servidor que for demitido ou destituído por prática de crime contra a Administração Pública,
improbidade administrativa, aplicação irregular de dinheiro público, lesão aos cofres públicos e
dilapidação do patrimônio nacional e corrupção.
Essa previsão viola o art. 5º, XLVII, “b”, da CF/88, que afirma que não haverá penas de caráter perpétuo.
STF. Plenário ADI 2975, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 04/12/2020 (Info 1001).

Em embargos de declaração, o STF decidiu que, nas hipóteses descritas no art. 137, parágrafo único, da
Lei 8.112/90, deverá ser aplicado o prazo de incompatibilidade de 5 anos previsto no caput do art. 137 ,
até que o Legislativo fixe outro.
Assim, os ex-servidores que forem demitidos por crime contra a administração pública, improbidade
administrativa, aplicação irregular de dinheiros públicos, lesão aos cofres públicos e dilapidação do
patrimônio nacional e corrupção somente poderão ser investidos em novo cargo público federal depois
do prazo de 5 anos.
STF. Plenário ADI 2975 ED, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso, julgado em 27/03/2023.

A conclusão foi que princípios e garantias penais podem ser aplicados ao direito administrativo
sancionador, com as devidas adaptações. Entre essas garantias, destaca-se a proibição de penas de caráter
perpétuo (CF, art. 5º, XLVII, "b"). Por isso, foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo que impedia
o retorno ao serviço público de servidores demitidos ou destituídos por infringir o art. 132, I, IV, VIII, X e
XI, do RJU.
A inconstitucionalidade decorre justamente da perpetuidade da sanção administrativa. Se houvesse um
prazo estipulado, não haveria violação ao art. 5º, XLVII, “b”, da Constituição Federal.
É importante notar que, no julgamento da ADI 2975, o STF admitiu que servidores que cometeram ilícitos
graves, como crimes contra a Administração Pública, improbidade administrativa, aplicação irregular de
dinheiros públicos, lesão aos cofres públicos, dilapidação do patrimônio nacional e corrupção pudessem
retornar ao serviço público se fossem aprovados em novo concurso.
Logo, esse mesmo raciocínio deve ser aplicado para militares do Estado que foram afastados por falta
grave.
Caso a falta grave do militar estadual mereça uma punição mais severa, dependendo de sua natureza, a
lei pernambucana deverá estabelecer um prazo ainda maior para o retorno à Administração Pública.

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A conclusão da Corte foi a seguinte:


É inconstitucional — por criar sanção de caráter perpétuo — norma que, sem estipular prazo para o
término da proibição, impede militares estaduais afastados pela prática de falta grave de prestarem
concurso público para provimento de cargo, emprego ou função na Administração Pública direta ou
indireta local.
STF. Plenário. ADI 2.893/PE, Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 17/06/2024 (Info 1141).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, conheceu parcialmente da ação e, nessa
extensão, a julgou procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei Complementar nº
49/2003 do Estado de Pernambuco.
Além disso, o Tribunal determinou que a Assembleia Legislativa e o governador do Estado de Pernambuco
sejam comunicados da presente decisão, a fim de que, se entenderem pertinente, deliberem sobre o prazo
de proibição de retorno ao serviço público dos policiais militares afastados em razão do cometimento de
falta grave, e que, até que eventualmente o façam, será adotado o prazo de 5 anos previsto no caput do
art. 137 da Lei nº 8.112/90.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
A inclusão do terço de férias no cálculo da contribuição previdenciária patronal
só vale a partir da publicação da ata do julgamento sobre o Tema 985
ODS 8 E 10

A mudança da jurisprudência é motivo ensejador para a excepcional modulação dos efeitos da


decisão que fixou a tese referente ao Tema 985 da repercussão geral (“É legítima a incidência
de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”), de
modo que, anteriormente à data de seu julgamento, no ano de 2020, devem ser mantidos
apenas os pagamentos já efetuados pelas empresas e não questionados judicialmente.
STF. Plenário. RE 1.072.485 ED/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Luís Roberto
Barroso, julgado em 12/06/2024 (Info 1141).

RELEMBRANDO O QUE O STF DECIDIU NO TEMA 985


Contribuições para a seguridade social
A CF/88 prevê, em seu art. 195, as chamadas “contribuições para a seguridade social”.
Consistem em uma espécie de tributo cuja arrecadação é utilizada para custear a seguridade social (saúde,
assistência e previdência social). Veja o texto da Constituição:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos
termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à
pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16


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II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre
aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art.
201;
III - sobre a receita de concursos de prognósticos;
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.

A CF/88 determina que os recursos arrecadados com as contribuições previstas no art. 195, I, “a” e II serão
destinados exclusivamente para o pagamento de benefícios previdenciários do RGPS (administrado pelo
INSS).
Em razão disso, a maioria dos autores de Direito Previdenciário denomina as contribuições do art. 195, I,
“a” e II de “contribuições previdenciárias”, como se fossem uma subespécie das contribuições para a
seguridade social. Nesse sentido: Frederico Amado.

Contribuições previdenciárias
A contribuição previdenciária é uma espécie de tributo cujo dinheiro arrecadado é destinado ao
pagamento dos benefícios do RGPS (aposentadoria, auxílio-doença, pensão por morte etc.)
Existem duas espécies de contribuição previdenciária:
PAGA POR QUEM INCIDE SOBRE O QUE
1ª) Trabalhador e demais segurados Incide sobre o salário de contribuição, exceto no caso do
do RGPS (art. 195, II). segurado especial.
2ª) Empregador, empresa ou Incide sobre a folha de salários e demais rendimentos do
entidade equiparada (art. 195, I, “a”). trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física
que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício.

Para que incida a contribuição previdenciária sobre os valores pagos aos empregados é necessário que a
verba paga tenha duas características cumulativas:
a) precisa ter natureza remuneratória; e
b) deve ter um caráter de habitualidade.

Vamos analisar se os valores pagos a título de férias estão, ou não, sujeitos à contribuição previdenciária.

Férias
O art. 7º, XVII, da CF/88 assegura aos trabalhadores o direito a férias anuais.
No mês das férias, o trabalhador, além de ter direito ao descanso, receberá uma verba adicional
correspondente a um terço a mais do seu salário normal. A isso chamamos de “terço constitucional de
férias” porque foi introduzido pela CF/88.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de
sua condição social:
(...)
XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário
normal;

Ex: João recebe o salário de R$ 1 mil. Na época das férias, ele receberá R$ 1.300,00, ou seja, o salário
normal (R$ 1 mil) acrescido de um terço (R$ 300,00).

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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Incide contribuição previdenciária sobre o salário do trabalhador pago durante as férias por ele
gozadas? Ex: no mês de março João estava de férias, mesmo assim, a empresa terá que pagar a
contribuição previdenciária?
SIM. Incide contribuição previdenciária sobre o pagamento de férias gozadas. Isso porque essa verba
possui natureza remuneratória e salarial, nos termos do art. 148 da CLT. Logo, integra o salário de
contribuição.
Em nosso exemplo, a alíquota da contribuição será aplicada sobre os R$ 1 mil.

Incide contribuição previdenciária sobre o valor do terço de férias gozadas? No momento de fazer o
cálculo da quantia que a empresa irá pagar como contribuição previdenciária, deverá a alíquota recair
também sobre o terço de férias?
• STJ: decidiu que não, ou seja, que não deveria incidir. Isso porque, para o STJ, o terço de férias gozadas
não teria natureza remuneratória e, além disso, não seria um ganho habitual do empregado. Logo, não
preencheu nenhum dos dois requisitos acima mencionados. Veja:
A importância paga a título de terço constitucional de férias possui natureza indenizatória/compensatória,
e não constitui ganho habitual do empregado, razão pela qual sobre ela não é possível a incidência de
contribuição previdenciária (a cargo da empresa).
STJ. 1ª Seção. REsp 1.230.957/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26/02/2014 (Recurso
Repetitivo – Tema 479) (Info 536).

Assim, em nosso exemplo, segundo o entendimento do STJ, a empresa teria que pagar a contribuição
previdenciária sobre o valor das férias (alíquota que incidirá sobre R$ 1.000,00), mas não sobre o valor do
terço de férias (300 reais).

• STF: seis anos depois do entendimento acima fixado, o STF decidiu de forma diversa. Confira:
É legítima a incidência de contribuição social, a cargo do empregador, sobre os valores pagos ao
empregado a título de terço constitucional de férias gozadas.
STF. Plenário. RE 1072485, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 31/08/2020 (Repercussão Geral – Tema
985) (Info 993).

Para o STF, o terço constitucional de férias preenche esses dois pressupostos.

Primeiro requisito: ser verba remuneratória


Segundo o Min. Marco Aurélio, quando se fala em natureza remuneratória, isso engloba todos “os
rendimentos pagos em decorrência do contrato de trabalho em curso”, com exceção das verbas
nitidamente indenizatórias. Verbas nitidamente indenizatórias seria aquelas “destinadas a recompor o
patrimônio jurídico do empregado, em razão de alguma perda ou violação de direito”.
O terço constitucional pago não teria caráter de verba indenizatória. Logo, seria remuneratória.

Segundo requisito: ter natureza de habitualidade


É habitual porque se trata de verba auferida, periodicamente, como complemento à remuneração.
Adquire-se o direito, conforme o decurso do ciclo de trabalho, sendo um adiantamento em reforço ao que
pago, ordinariamente, ao empregado, quando do descanso.
O contrário de habitual é eventual. Eventual é um recebimento desprovido de previsibilidade. Não se pode
dizer que seja o pagamento do terço constitucional de férias seja eventual. Isso porque ele se repete em
um contexto temporal e decorre de uma previsibilidade inerente ao contrato de trabalho.

Desse modo, como o tema envolve a interpretação do texto constitucional, o STJ teve que se adequar ao
entendimento fixado pelo STF:

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18


Informativo
comentado

(...) 1. O entendimento desta Corte Superior, acompanhando a jurisprudência do Supremo Tribunal


Federal, consolidou-se no sentido de ser legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito
a título de terço constitucional de férias (RE 1.072.485/PR - Tema 985).
2. Dispensável o pretendido sobrestamento do feito até que haja o julgamento definitivo do tema, tendo
em vista que a existência de precedente firmado pelo Plenário do STF, independentemente de seu trânsito
em julgado, autoriza o imediato julgamento dos processos com o mesmo objeto, não sendo necessário
aguardar o trânsito em julgado do acórdão ou a apreciação de eventual pedido de modulação de efeitos.
Acrescente-se que não há nos autos do RE 1.072.485/PR qualquer determinação quanto ao
sobrestamento do feito, razão pela qual não há óbice ao julgamento da matéria (AgInt no AREsp n.
2.132.912/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 20/3/2023, DJe de
4/4/2023.).
(AgInt no AgInt no AREsp n. 2.210.716/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma,
julgado em 29/5/2023, DJe de 1/6/2023.)

MODULAÇÃO DOS EFEITOS


Foram opostos embargos de declaração contra o acórdão proferido pelo STF no RE 1.072.485.
Os embargantes pediram a modulação dos efeitos da decisão considerando que houve alteração na
jurisprudência até então dominante.

O STF concordou com o pedido de modulação dos efeitos?


SIM. A Corte entendeu ser o caso de modular os efeitos do acórdão de mérito.
Conforme jurisprudência do STF, a modulação dos efeitos da decisão é excepcional, devendo ser utilizada
sobretudo diante da necessidade de resguardar a segurança jurídica, como na hipótese de alteração de
jurisprudência, tanto no âmbito do STF quanto no dos demais tribunais superiores.
E, nessa linha, o legislador incluiu o art. 927, § 3º, no CPC/2015, que possui a seguinte redação:
Art. 927.
(...)
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos
tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver
modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

Assim, no CPC/2015 fixou expressa a hipótese de modulação de efeitos em caso de alteração de


jurisprudência, tanto no âmbito do STF, quanto dos demais Tribunais Superiores.
A fixação da tese em 2020, anteriormente exposta, modificou a compreensão até então pacificada no
âmbito do STJ, em entendimento firmado sob a sistemática dos recursos repetitivos (REsp 1.230.957,
relator Ministro Mauro Campbell – Tema 479/STJ), bem como decorreu da atribuição de conotação
constitucional à questão que anteriormente era considerada infraconstitucional pelo STF ao fundamento
de que a discussão envolvia interpretação de lei federal.
Desse modo, resta clara a alteração de jurisprudência dominante do STJ, o que, por si só, já demandaria
atuação do STF a fim de assegurar que a segurança jurídica e a confiança no sistema integrado de
precedentes sofram os menores impactos negativos possíveis.
Soma-se a isso o fato de que o STF, ao menos desde 2011, vinha negando repercussão geral à discussão
referente à definição de natureza jurídica de verbas – se indenizatórias ou remuneratórias – para fins de
incidência da contribuição previdenciária, tanto patronal quanto do empregado.

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19


Informativo
comentado

Em suma:
A mudança da jurisprudência é motivo ensejador para a excepcional modulação dos efeitos da decisão
que fixou a tese referente ao Tema 985 da repercussão geral (“É legítima a incidência de contribuição
social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”), de modo que, anteriormente à
data de seu julgamento, no ano de 2020, devem ser mantidos apenas os pagamentos já efetuados pelas
empresas e não questionados judicialmente.
STF. Plenário. RE 1.072.485 ED/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Luís Roberto Barroso,
julgado em 12/06/2024 (Info 1141).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, deu parcial provimento aos embargos de
declaração, com atribuição de efeitos ex nunc à decisão de mérito que apreciou o Tema 985 da
repercussão geral, a contar da data da publicação da ata de julgamento (15/09/2020), ressalvadas as
contribuições já pagas e não impugnadas judicialmente até esse dia, que não serão devolvidas pela União.

EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir:


1) Há plausibilidade jurídica no que se refere à alegação de que, mesmo que sopesados os avanços já
alcançados pela ação afirmativa de cotas raciais instituída pela Lei nº 12.990/2014, remanesce a
necessidade da continuidade da política para que haja a efetiva inclusão social almejada. Por isso, o STF
prorrogou validade da Lei 12.990/2014, que instituiu o sistema de cotas raciais em concursos públicos
federais. ( )
2) É inconstitucional — por ser razoável e proporcional — o prazo de 25 anos, prorrogável por até 10 anos,
para a outorga a particulares de concessão ou de permissão dos serviços e das obras públicas de “portos
secos”. ( )
3) É inconstitucional a prorrogação da vigência dos contratos de concessão ou de permissão dos “portos
secos” cujas outorgas iniciais não forem antecedidas de procedimento licitatório. Essa prorrogação viola
a regra da obrigatoriedade de prévia licitação (art. 175 da CF/88). ( )
4) O FGTS, por ter uma função social a cumprir, está sujeito a critérios diferenciados do mercado financeiro
em geral, de modo que o índice oficial da inflação (IPCA) deve ser a referência mínima para a correção
dos saldos dos depósitos realizados nas contas a ele vinculadas. ( )
5) É constitucional lei estadual que proíbe militar afastado por falta grave de participar de concurso público.
( )
6) A mudança da jurisprudência é motivo ensejador para a excepcional modulação dos efeitos da decisão
que fixou a tese referente ao Tema 985 da repercussão geral (“É legítima a incidência de contribuição
social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”), de modo que, anteriormente à
data de seu julgamento, no ano de 2020, devem ser mantidos apenas os pagamentos já efetuados pelas
empresas e não questionados judicialmente. ( )

Gabarito
1. C 2. E 3. C 4. C 5. E 6. C

Informativo 1141-STF (21/06/2024) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20

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