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A FORMAÇÃO MATEMÁTICA DE PROFESSORES DA


EDUCAÇÃO PRIMÁRIA NA ESPANHA:
CONTRIBUIÇÕES PARA A REALIDADE BRASILEIRA

THE MATHEMATICS EDUCATION OF ELEMENTARY


SCHOOL’ TEACHERS IN SPAIN: CONTRIBUTIONS TO
BRAZILIAN REALITY

Reginaldo Fernando Carneiro


Universidade Federal de São Carlos, Brasil
[email protected]
Cármen Lúcia Brancaglion Passos
Universidade Federal de São Carlos, Brasil
[email protected]
Jose Luis Lupiáñez
Universidade de Granada, Espanha
[email protected]

RESUMO

Este artigo tem como objetivo refletir sobre algumas possibilidades para a
formação matemática do professor dos anos iniciais do Ensino
Fundamental, a partir da experiência do primeiro autor do texto em seu
estágio de doutorado realizado no Departamento de Didática da Matemática
da Universidade de Granada – Espanha. Adotamos como metodologia de
pesquisa a abordagem qualitativa e, para a produção e a análise de dados,
nos pautamo-nos nos documentos oficiais do curso de formação de
professores da Universidade de Granada, nas ementas das suas quatro
disciplinas relacionadas à matemática, assim como nos documentos
fornecidos aos alunos por aquela instituição. A análise dos dados evidenciou
que a diversidade de práticas propostas pode fazer com que os futuros
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28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil

docentes adquiram os conhecimentos necessários para o ensino e assumam


uma atitude de reflexão e também de busca por diferentes formas de ensinar
matemática. O curso forma apenas para atuar na Educação Primária, e há
uma carga horária de trabalho considerável relacionada à formação
matemática, provida pelas disciplinas do curso, cuja forma de organização
prevê aulas teóricas e seminários de prática. Nestes últimos, são
desenvolvidas atividades que utilizam materiais manipuláveis e recursos
computacionais que podem contribuir para a formação do professor.
Palavras-chave: Formação de professores, ensino e aprendizagem da
matemática, educação primária.

ABSTRACT

This article aims to reflect on some possibilities for mathematics education


of the Elementary School teacher from the experience of the first author of
this text in his doctoral stage, developed at the Department of Didactics of
Mathematics at University of Granada – Spain. We adopted qualitative
approach as a research methodology and for the data production and
analysis we relied on the official documents of the teachers’ education
course at the University of Granada, on the contents of disciplines related to
mathematics as well as on the documents provided to the students. Data
analysis showed that the diversity of practices proposed may not only make
future teachers acquire the knowledge required to teach but may also spark
an attitude of reflection and encourage them to look for different ways to
teach math. In addition, the course educates to only instruct in an
Elementary School and there is considerable workload related to
mathematics education due to the four mathematical disciplines of the
course. Finally, the organization of the disciplines, with lectures and
seminars of practice such that the latter are developed activities to use
manipulative materials as well as computational resources, can contribute to
teachers’ education.
Keywords: Teachers’ education, mathematics’ teaching and learning,
elementary school.
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1 Introdução

O pedagogo, no Brasil, é formado para atuar na Educação Infantil, nos anos


iniciais do Ensino Fundamental e também na Educação de Jovens e Adultos. Alguns
cursos de Pedagogia também habilitam para a atuação na orientação, na supervisão e na
administração escolar. Por isso, esse curso contempla uma gama de conhecimentos
relativos às diversas disciplinas presentes no currículo escolar, além das referentes às
outras habilitações. No entanto, pretendendo formar em todas essas habilitações, não
proporcionará uma formação aligeirada e superficial, com prejuízo da qualidade? Como
é a formação matemática desse docente? Quais conteúdos e metodologias são abordados
nesses cursos? Como é essa abordagem?
Em um levantamento, Batista e Lanner (2007) encontraram no estado de São
Paulo 193 instituições que ofereciam 316 cursos de Pedagogia. Contudo, apenas 55%
deles tinham em seus currículos disciplinas voltadas para a formação matemática e/ou
estatística do futuro professor, mas não era possível afirmar que essas disciplinas
tivessem como objetivo preparar os docentes para ensinar matemática ou estatística.
De acordo com Gatti (2010), em levantamento realizado em 71 cursos de
Pedagogia distribuídos por todo o País, a análise das ementas das disciplinas revelou
que apenas 7,5% destas se referem aos conteúdos que devem ser ensinados nesse nível
de ensino e que na “grande maioria dos cursos analisados, eles são abordados de forma
genérica ou superficial, sugerindo frágil associação com as práticas docentes” (GATTI,
2010, p. 1372).
A investigação de Curi (2005) evidenciou que as disciplinas referentes à
matemática, quando são oferecidas nos cursos de Pedagogia, têm uma carga horária
muito reduzida, sendo de 36 a 72 horas, o que totaliza apenas 4% da carga total do
curso. Além disso, ressaltou que as informações sobre os temas abordados nas
disciplinas eram muito gerais como, por exemplo: “estudo de métodos de ensino e
aprendizagem para a construção de conhecimentos matemáticos, conteúdos, métodos,
planejamento e avaliação, análise das teorias do conhecimento” (CURI, 2005, p. 6).
Referente aos conteúdos matemáticos abordados, o destaque era para a construção do
número e as quatro operações e, muito raramente, era indicado nas ementas o ensino de
geometria e do tratamento da informação.
Dessa forma, a prática profissional desses docentes acaba por reproduzir a dos
professores que tiveram durante sua vida escolar, que, de acordo com Nacarato,
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Mengali e Passos (2009), têm forte influência na sua identidade e na constituição do seu
modelo de aula. Via de regra, os futuros professores, que estão cursando a formação
inicial, tiveram um ensino de matemática focado nas operações aritméticas a partir de
algoritmos. Assim, essa formação deve possibilitar ao docente “construir um currículo
de matemática que transcenda o ensino de algoritmos e cálculos mecanizados,
principalmente nos anos iniciais, onde está a base da alfabetização matemática”
(NACARATO; MENGALI; PASSOS, 2009, p. 32).
Além disso, os futuros docentes demonstram “trazer marcas profundas de
sentimentos negativos em relação a essa disciplina, as quais implicam, muitas vezes,
bloqueios para aprender e para ensinar” (NACARATO; MENGALI; PASSOS, 2009, p.
23), que explicitam frustrações, inseguranças e medos e que poderão repercutir no modo
como serão ministradas suas aulas nos anos iniciais de escolarização.
Dessa forma, continua a ser de fundamental importância a realização de pesquisas
sobre a formação matemática do professor dos anos iniciais, pois os aspectos
apresentados indiciam , que esses cursos parecem não formar adequadamente o docente
que ensinará matemática.
Considerando o exposto acima, o objetivo deste artigo é discutir e refletir sobre
algumas possibilidades para a formação matemática do professor dos anos iniciais do
Ensino Fundamental, a partir da experiência do primeiro autor deste texto em seu
estágio de doutorado realizado no início de 2012 no Departamento de Didática da
Matemática da Universidade de Granada – Espanha.

2 A formação de professores que ensinam matemática

Compreendemos a formação de professores como sendo um continuum


(MIZUKAMI et al., 2003), que se inicia durante a vida escolar e deve prosseguir por
toda a carreira do professor. Nesse sentido, as licenciaturas têm um papel importante e,
apesar de não serem o início nem o fim do desenvolvimento profissional docente,
devem ter características que despertem no futuro professor a necessidade de
aprendizagem constante, de reflexão e investigação sobre sua prática; e que promovam
a aquisição de conhecimentos necessários à sua atuação em sala de aula.
Esses aspectos devem ser discutidos na formação, e é importante prover espaços
para a reflexão, com o objetivo de romper com algumas concepções dos futuros
professores; fazer com que aprendam a pensar como docentes; e dar a eles uma ideia
inicial da complexidade da profissão.
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Nesse processo de aprendizagem da docência está envolvida a base de


conhecimento para o ensino, que incorpora conhecimentos de diferentes tipos e origens,
compreensões, habilidades e disposições, que possibilitam que o docente desenvolva
situações de ensino e aprendizagem em diferentes contextos educacionais, níveis,
modalidades de ensino e áreas de conhecimento (SHULMAN, 2004).
Diante das ideias de Shulman e seus colaboradores, Mizukami (2004) enfatiza que
os conhecimentos docentes podem ser agrupados em: conhecimento do conteúdo
específico, conhecimento pedagógico geral e conhecimento pedagógico do conteúdo.
O conhecimento do conteúdo específico consiste na compreensão de fatos,
conceitos, processos e procedimentos de uma área específica (MIZUKAMI, 2004).
Shulman (2004) afirma que é fundamental que o docente conheça os conteúdos
específicos das disciplinas, suas estruturas sintáticas e substantivas, seu processo de
construção e seu uso. Para o autor, é importante que os professores compreendam “o
que” e “o porquê” dos conhecimentos, dos fenômenos e dos saberes, ou seja, não é
suficiente que o docente saiba definir conceitos: ele deve também conhecer a estrutura
de determinada área de conhecimento, saber as formas de organização de seus
conteúdos, compreender por que determinados conceitos são aceitos cientificamente e
outros não, conhecer a importância e as relações que pode haver entre eles e com outras
áreas do conhecimento.
A categoria conhecimento pedagógico geral “transcende uma área específica”
(MIZUKAMI, 2004, p. 9), pois envolve os conhecimentos sobre os alunos; as teorias
sobre os processos de ensino e de aprendizagem; a familiaridade com os contextos; os
fins educacionais; as políticas públicas; os programas educacionais; os fundamentos
históricos e filosóficos da educação; as diferentes metodologias de ensino; as formas
como as matérias podem ser abordadas pelos livros didáticos, pelas propostas
curriculares, pelos softwares etc. A inter-relação entre esses dois conhecimentos resulta
na categoria conhecimento pedagógico do conteúdo, que, para Shulman (2004), abrange
os saberes do docente acerca de como ensinar um conteúdo. Para o autor, é fundamental
que o professor saiba utilizar os diferentes modos de representação de um conceito e/ou
ideia, como analogias, exemplos, explicações, ilustrações etc.; tenha conhecimentos
sobre como os alunos aprendem determinados conteúdos, as dificuldades que enfrentam
nesse processo e os conhecimentos prévios dos estudantes acerca dos assuntos e tópicos
ensinados; e conheça os aspectos que facilitam e/ou dificultam a compreensão de um
conteúdo.
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Outro aspecto considerado fundamental na formação inicial refere-se à reflexão. O


pesquisador Donald Schön desenvolveu os conceitos de reflexão-na-ação, reflexão-
sobre-a-ação e reflexão sobre a reflexão-na-ação.
A reflexão-na-ação é a tomada de decisões e atitudes nas diversas situações de
sala de aula com as quais o professor se depara, em que age baseado em seus
conhecimentos e experiências, ou seja, “pensa frequentemente no que está fazendo
enquanto faz” (SCHÖN, 1988, p. 243). Ainda para Schön (1988, p. 72), “quando
alguém reflete na ação se converte em um investigador do contexto prático. Não fica
dependente da teoria e das técnicas estabelecidas, sendo que constitui uma nova teoria
de um caso único”.
Outro momento da reflexão, que ocorre fora da sala de aula, é a reflexão-sobre-a-
ação e a reflexão sobre a reflexão-na-ação, que permitem a análise das decisões e das
atitudes tomadas durante o desenvolvimento da aula. Para esse autor (1992, p. 83),
“após a aula, o professor pode pensar no que aconteceu, no que observou, no significado
que lhe deu e na eventual adopção de outros sentidos. Reflectir sobre a reflexão-na-
acção é uma acção, uma observação e uma descrição, que exige o uso de palavras”.
É nessa perspectiva que compreendemos a importância de propiciar ao futuro
professor a oportunidade de refletir desde a formação inicial, para que, ao atuar, busque
melhorar sua prática profissional.

3 Metodologia e instrumentos de produção de dados

Temos como objetivo refletir e discutir sobre algumas possibilidades para a


formação matemática do professor dos anos iniciais do Ensino Fundamental, a partir da
formação que é colocada em prática na Universidade de Granada.
Para tanto, adotaremos como metodologia a abordagem qualitativa (BOGDAN;
BIKLEN, 1994; LÜDKE; ANDRÉ, 1986) e, para a produção e a análise de dados, nos
pautar-nos-emos nos documentos oficiais do curso de formação de professores para os
anos iniciais da Universidade de Granada, nas ementas das disciplinas relacionadas à
matemática e nos documentos fornecidos aos alunos por aquela instituição.
Na perspectiva de Laville e Dionne (1999), documento é toda fonte de informação
que já existe, e esse instrumento auxilia o pesquisador, pois “aporta informação
diretamente: os dados estão lá, resta fazer sua triagem, criticá-los, isto é, julgar sua
qualidade em função das necessidades da pesquisa, codificá-los ou categorizá-los”
(LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 167).
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De acordo com Calado e Ferreira (2004, p. 2), os documentos em uma pesquisa


podem ter importância central, ou seja, “os documentos são alvos de estudos por si
próprios” ou podem complementar as informações obtidas por outros instrumentos,
como questionários ou entrevistas. Neste estudo, assumem papel central, visto que nos
permitirão compreender a formação matemática dos futuros professores em um contexto
específico.
Ainda segundo essas autoras (CALADO; FERREIRA, 2004), um primeiro
momento se refere à recolha dos documentos e é composto pela localização e pela
seleção dos documentos, tarefas determinadas pela própria investigação, que orienta o
pesquisador para determinadas fontes. Os documentos utilizados neste estudo são
denominados fontes inadvertidas, ou seja, são “resultantes do normal funcionamento do
sistema de estudo, [e] são usadas pelo pesquisador com uma finalidade diferente
daquela com que foram criadas” (CALADO; FERREIRA, 2004, p. 4).
Um segundo momento é a análise, propriamente dita, dos dados obtidos nos
documentos, que, de acordo com Flores (1994, apud CALADO; FERREIRA, 2004, p.
3), “implica um conjunto de transformações, operações e verificações operadas a partir
dos mesmos [documentos] com a finalidade de lhes ser atribuído um significado
relevante em relação a um problema de investigação”.
Esse processo de análise, nesta pesquisa, exigiu várias leituras dos dados; o
cruzamento de informações que, a princípio, pareciam desconexas e a interpretação
destas; e uma análise rigorosa para que a investigação não se limitasse ao relato de
experiências.

4 A formação matemática do professor de Educação Primária na Universidade


de Granada

O curso Grado en Maestro em Educación Primaria, da Universidade de Granada,


devido ao processo de Bolonha – declaração assinada por representantes de países
europeus em 1999 na cidade italiana de Bolonha que propunha mudanças conjuntas na
formação em nível superior para a criação do Espaço Europeu de Ensino Superior
(EEES) –, passou por modificações que foram colocadas em marcha a partir do curso
2010-2011. Dentre as mudanças, uma das mais importantes foi a adoção do Sistema
Europeu de Transferência de Créditos ou European Credits Transfer System (ECTS),
que se centra na carga horária necessária de trabalho do estudante, para alcançar os
objetivos de determinada disciplina; ou seja, além da quantidade de horas de aulas,
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contabiliza-se também quanto tempo o aluno terá que dedicar-se àquela disciplina, com
a realização de trabalhos, atividades e estudos individuais e em grupo. Nesse sistema,
um crédito corresponde a 25 horas de trabalho.
A educação primária na Espanha, de acordo com a Ley Orgánica de Educación
(ESPANHA, 2006), engloba seis anos de escolarização de crianças entre 6 e 12 anos.
Dessa forma, equivale às séries iniciais no Brasil e abrange também o 6º ano do Ensino
Fundamental.
O Grado en Maestro en Educación Primaria tem duração de quatro anos e, no
ano letivo 2010-2011 e também 2011-2012, onze turmas iniciaram o curso, com
aproximadamente 65 alunos em cada uma delas.
Esse curso forma o professor para atuar apenas na Educação Primária, sendo
possível, no 4º ano, escolher uma menção – Educação Especial, Educação Física,
Educação Musical e Língua Estrangeira – e, para isso, o estudante deverá cursar um
mínimo de 30 créditos referentes a disciplinas de uma dessas menções
(UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]a).
O curso tem quatro disciplinas relacionadas a matemática e seu ensino e
aprendizagem, como podemos ver no Quadro 1 abaixo:

Quadro 1 – Disciplinas do curso

Total de Tipo de
Disciplinas Ano Créditos
Horas disciplina
Bases matemáticas para la Educación
1º 9 225 Obrigatória
Primaria
Enseñanza y aprendizaje de las
2º 6 150 Obrigatória
matemáticas en la Educación Primaria
Diseño y desarrollo del currículum de
3º 7 175 Obrigatória
Matemáticas en la Educación Primaria
Competencias matemáticas en Educación
4º 6 150 Optativa
Primaria
Fonte: UNIVERSIDAD DE GRANADA ([201-]a)

Como as mudanças propostas pelo processo de Bolonha foram colocadas em


prática a partir de 2010, no momento do estágio de doutorado, apesar de haver os
documentos oficiais do curso, apenas as disciplinas Bases matemáticas para la
Educación Primaria e Enseñanza y aprendizaje de las matemáticas en la Educación
Primaria haviam sido desenvolvidas com alunos, sendo a primeira nos cursos 2010-
2011 e 2011-2012 e a segunda estava em desenvolvimento no curso 2010-2011. Por
isso, neste texto, nos centrar-nos-emos somente nessas duas disciplinas.
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Interessante destacar que, segundo o Guia Docente: Bases matemáticas para la


Educación Primaria (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]b), a quantidade total de
horas das disciplinas está distribuída em aulas teóricas, seminários de prática, tutoria e
trabalho autônomo do estudante. Os créditos teóricos são desenvolvidos em aulas
presenciais, em que a responsabilidade pelo ensino fica a cargo do professor. Nos
seminários de prática, os estudantes desenvolvem atividades práticas relacionadas com
o que foi discutido nas aulas teóricas, tiram dúvidas e interagem a partir das
intervenções do professor e dos colegas; na tutoria individualizada, eles são atendidos
pelo docente da disciplina e busca-se resolver as dificuldades verificadas sobre os temas
estudados e as tarefas que devem realizar. As atividades e os estudos realizados pelos
alunos, de forma individual ou em grupo, também compõem o total de horas da
disciplina.
A disciplina Bases matemáticas para la Educación Primaria aborda os conteúdos
matemáticos trabalhados nesse nível de ensino, na perspectiva do ensino e
aprendizagem, e as aulas são distribuídas em três horas de aulas teóricas semanais e
uma hora e meia de seminário de prática. Segundo o Guia Docente da disciplina
(UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]b, p. 1), o objetivo geral é:

Estudar, analisar e refletir sobre os conceitos e procedimentos matemáticos,


suas formas de representação e modelização, fenomenologia e aspectos
históricos dos mesmos, utilizando materiais e recursos sobre os blocos
matemáticos da Educação Primária: números e operações; medida, estimação
e cálculo; geometria (as formas e figuras e suas propriedades); tratamento da
informação, azar e probabilidade.

Além disso, esse documento (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]b, p. 2)


também apresenta uma lista de competências que devem ser desenvolvidas no decorrer
da disciplina, dentre as quais destacamos:

Desenvolver competências matemáticas básicas (pensar e raciocinar,


argumentar e justificar, comunicar, modelizar, elaborar e resolver problemas,
representar, utilizar linguagem simbólica, formal e técnica e as operações e
empregar suportes e ferramentas tecnológicas) sobre os blocos de conteúdos
matemáticos escolares.
Conhecer e utilizar materiais e recursos didáticos, assim como tecnologias da
informação e comunicação, que sirvam para o ensino e aprendizagem da
matemática.
Formular e resolver problemas matemáticos vinculados à vida cotidiana.

Os seminários de prática abordam todos os blocos de conteúdos matemáticos e


são desenvolvidos a partir do uso de materiais manipulativos e recursos informáticos,
mas podem ser utilizados também para resolver exercícios, problemas e sanar dúvidas.
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Segundo esse Guia (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]b, p. 3), os seminários têm


dois objetivos:

explorar e experimentar atividades matemáticas para introduzir-se no


trabalho com novas noções matemáticas ou para aprofundar os estudos de
noções já introduzidas em sessões anteriores; contribuir para conhecer e
utilizar um grande número de materiais e recursos [...] que podem ser
empregados no ensino e aprendizagem de matemática.

Nesse Guia é disponibilizada também uma lista de livros e sites que serão
referências para os alunos, sendo a referência básica o livro Matemáticas para maestros
de Educación Primaria (SEGOVIA; ROMERO, 2011), de autoria dos professores do
Departamento de Didática da Matemática. Há ainda menção aos critérios de avaliação,
segundo os quais os estudantes são avaliados por meio de provas escritas (40% da nota
final), trabalhos realizados individualmente ou em grupo e pela participação (40% da
nota final) e frequência às aulas (20% da nota final).
A disciplina está dividida em sete temas – número natural e sistemas de
numeração; aritmética; números racionais; figuras geométricas; transformações planas e
orientação espacial; magnitudes e suas medidas; e introdução a estatística e
probabilidade – e, para cada tema há um Guión del Tema, documento que apresenta
seus objetivos e conteúdos, suas referências, as orientações para o trabalho, o
cronograma, alguns questionamentos que serão respondidos ao longo do estudo e várias
atividades.
Exporemos agora algumas atividades retiradas dos temas: aritmética, figuras
geométricas e magnitudes, para exemplificar e também para discutir aspectos que
compreendemos serem muito importantes na formação do professor da Educação
Primária.
Do tema 2 – Aritmética –, destacamos a discussão sobre as operações
fundamentais, que tem como um dos objetivos, entre vários outros, conhecer o
significado das operações com números naturais, os contextos e as situações a que estes
estão associados, assim como justificar os algoritmos tradicionais utilizados para
realizar as operações.
As ideias implícitas no Guión (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]d) deste
tema compartilham da concepção de que as operações devem ser ensinadas a partir das
estruturas aditivas e multiplicativas e que há diferentes conceitos implícitos nas
operações que não limitam a adição ao processo de juntar coisas de mesma natureza; a
subtração a uma operação inversa da adição, ou seja, à ideia de tirar uma quantidade de
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outra; a multiplicação ao processo de adicionar, repetidamente, parcelas iguais; e a


divisão à ideia de reconhecer quantas vezes alguma coisa cabe em outra (PASSOS;
ROMANATTO, 2010).
Algumas atividades propõem que os alunos resolvam, analisem, formulem e
trabalhem com diferentes tipos de problemas e também utilizem a calculadora. Por
exemplo (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]d, p. 3-4):

Indique de que tipo é o seguinte problema: “Ignácio tem 50 figurinhas mais


que Fernanda que, por sua vez, tem 20 figurinhas a menos que Adela, que
tem 80 figurinhas. Quantas figurinhas têm Ignácio e Fernanda?”.

Formule um problema que se resolva com subtrações correspondentes aos


tipos de transformação e combinação.

Invente um problema que tenha mais de uma solução e cuja resolução seja
com operações da estrutura aditiva.

Formule problemas que se resolvam com a divisão 135:3, de forma que em


um se realize uma partição (divisão partitiva) e em outro uma medida
(divisão quotitiva).

Compreendemos que a resolução, a análise, a formulação e também a abordagem


de diferentes problemas que não apenas os convencionais (SMOLE; DINIZ, 2001) são
de fundamental importância na formação inicial de professores. Para Onuchic e
Allevato (2004, p. 222), o foco do ensino de Matemática deve ser a compreensão, pois
assim o aluno é capaz de

[...] relacionar uma determinada ideia matemática a um grande número ou a


uma variedade de contextos, relacionar um dado problema a um grande
número de ideias matemáticas implícitas nele, construir relações entre as
várias ideias matemáticas contidas num problema.

Com o foco na compreensão, a resolução de problemas se torna uma atividade


para aquisição de um novo conhecimento e um processo que possibilita aplicar algo
anteriormente construído. De acordo com Onuchic e Allevato (2004), trabalhar com
resolução de problemas possibilita que o aluno atente para as ideias inerentes ao
problema, ou que se conecte a ele, reflita sobre elas e busque “dar sentido” à situação,
assim como proporciona que o aluno se envolva nos seguintes procedimentos:
raciocínio e prova, comunicação, conexões e representações. Outro apontamento das
autoras se refere ao fato de que os problemas podem oferecer dados importantes para
avaliar a aprendizagem dos alunos, e, a partir disso, o professor pode reorganizar as
situações de ensino e aprendizagem.
Além disso, é importante que o professor não se limite a propor aos alunos
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problemas do tipo convencional e aborde situações que, sem solução aparente,


requeiram a busca e a seleção de estratégias e conhecimentos. Um problema que não
seja do tipo convencional é aquele que instiga o aluno, permitindo que ele crie, reflita e
teste diversas hipóteses de solução. Stancanelli (2001) apresenta diferentes tipos de
problemas: problemas sem solução; problemas com mais de uma solução; problemas
com excesso de dados; problemas de lógica; de estratégia, entre outros importantes, que
devem ser abordados na formação inicial de professores.
Além disso, solicita-se que os estudantes justifiquem os algoritmos tradicionais
utilizados para as operações e também que “busquem, descrevam e justifiquem
algoritmos da adição e subtração diferentes dos usuais” (UNIVERSIDAD DE
GRANADA, [201-]d, p. 3). Ainda se indica que descrevam as estratégias utilizadas na
realização de operações, apontando as propriedades que foram usadas: (a) 371 + 634 =
1000 +1+ 4 = 1000 + 5 = 1005; (b) 148 + 77 = 150 + 75 =200 + 25 = 225; (c) 615 - 234:
(615-200), 415, -34, (415-30), 385, -4, 381; (d) 73 - 27, 53 - 7, 56 - 10, 46. Ou que
analisem as estratégias usadas por diferentes estudantes para resolver a adição 567 +
259; e, depois, que usem as mesmas para resolver 1367 + 498.

200 – 567, 667, 767 259 600 567


50 – 777,787, 797, 807, 817, - 33 + 226 + 259
9-818, 819, 820, 821, 822, 823,
226 826 700
824, 825, 826 110
16
Trabajo de María Trabajo de Pedro
826

Trabajo de Carlos

A discussão com os futuros professores é para que não apenas resolvam


problemas matemáticos, mas também procurem analisar e levantar hipóteses sobre
diferentes estratégias de resolução de problemas, para poder suscitar tal prática em seu
trabalho com os alunos, não considerando apenas o resultado, mas buscando
compreender todo o processo desenvolvido, para o caso de ser necessário intervir.
Essa reflexão é importante, porque, segundo Schön (1992), exige do professor a
capacidade de ver cada aluno como um indivíduo único e ter noção de seu grau de
compreensão e dificuldade; isto é, somente com a compreensão dos processos de
aprendizagem do aluno é que será possível ao professor uma intervenção adequada para
fazê-lo avançar.
Quando este se depara com uma situação conflituosa e passa a refletir para
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solucioná-la, segue alguns caminhos:

Primeiramente, um momento de surpresa: um professor reflexivo permite-se


ser surpreendido pelo que o aluno faz. Num segundo momento, reflecte sobre
esse facto, ou seja, pensa sobre aquilo que o aluno disse ou fez e,
simultaneamente, procura compreender a razão por que foi surpreendido.
Depois, num terceiro momento, reformula o problema suscitado pela situação
[...]. Num quarto momento, efectua uma experiência para testar a sua nova
hipótese, por exemplo, coloca uma nova questão ou estabelece uma nova
tarefa para testar a hipótese que formulou sobre o modo de pensar do aluno
(SCHÖN, 1992, p. 83).

Ainda, para esse autor, esse processo depende das representações múltiplas do
professor. Isso significa que são muito importantes suas experiências, seus valores, seus
juízos e sua história de vida, pois cada indivíduo, como um sujeito único e constituído
pela inter-relação de todos esses elementos, agirá de uma forma diferente.
O professor precisa compreender, através da reflexão-na-ação, quais são as
representações figurativas do aluno, os “agrupamentos situacionais, contextualizados: as
relações que se estabelecem na maior proximidade possível das experiências
quotidianas” (SCHÖN, 1992, p. 85), para coordená-las com as representações formais –
o saber escolar – não de maneira a excluir a primeira, mas de modo a associá-las.
Essa associação apenas acontece se houver confusão, ou seja, não se aprende sem
ficar confuso e, para Schön (1992), o docente tem que dar valor à confusão do aluno e
também à sua própria confusão, porque, se ele mesmo não ficar confuso, não conseguirá
reconhecer o problema que precisa de resposta.
Retomando a apresentação das atividades, no tema 4 – Figuras geométricas – é
indicado, como um dos objetivos, conhecer e utilizar materiais e recursos para o ensino
de geometria plana e espacial. Dele destacamos as seguintes atividades: “Construa com
régua e compasso, se é possível, um triângulo de lados 3, 4 e 5 unidades e indique que
triângulo é. Faça o mesmo para um com lados 1, 2 e 4 unidades” (UNIVERSIDAD DE
GRANADA, [201-]e, p. 3). Ou, ainda, “defina e desenhe os cinco poliedros regulares.
Justifique porque há somente cinco” (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]e, p. 4).
Do tema 6 – Magnitudes e suas medidas – constam no Guión del Tema:
Magnitudes y sus medidas (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]f) as seguintes
atividades: “Enumere ao menos quatro magnitudes que sejam comuns aos seguintes
objetos: (a) criança, cachorro e peixe; (b) mesa, carro, pessoa; (c) copo, caixa e garrafa.
Identifique quantidades de magnitude referentes aos objetos” (p. 2). Outra atividade é:
“Em uma figura se representa uma circunferência, um quadrado circunscrito e um
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hexágono regular inscrito. Se tomamos o diâmetro da circunferência D como unidade de


medida. Qual é a medida do perímetro do quadrado e do hexágono? E o comprimento
da circunferência?” (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]f, p. 2).
Novamente, nessas atividades, podemos verificar que se busca, além de resolver
problemas, analisar situações que envolvem conceitos da matemática e que são
importantes que sejam discutidos na formação de professores.
Na disciplina Enseñanza y aprendizaje de las matemáticas en la Educación
Primaria são estudados os

fundamentos da didática da matemática, ensino e aprendizagem da


matemática de Primária, o ensino e aprendizagem dos distintos blocos
temáticos [...] nos aspectos cognitivos (aprendizagem matemática, erros e
dificuldades) e didáticos (tarefas e atividades, materiais e recursos), referidos
ao sentido numérico, de medida, espacial e estocástico (UNIVERSIDAD DE
GRANADA, [201-]c, p. 1).

As competências destacadas nesse Guia (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-


]c, p. 2) para a disciplina são:

Conhecer as áreas curriculares da Educação Primaria, a relação


interdisciplinar entre elas, os critérios de avaliação e o corpo de
conhecimentos didáticos em torno dos procedimentos de ensino e
aprendizagem da matemática.
Elaborar, planejar e avaliar processos de ensino e aprendizagem da
matemática tanto individualmente como em colaboração com outros
professores e profissionais da escola.
Refletir sobre as práticas de aula para inovar e melhorar o trabalho docente.
Adquirir hábitos e destrezas para a aprendizagem autônoma e cooperativa e
promovê-la entre os estudantes.
Conhecer e aplicar nas aulas as tecnologias da informação e comunicação no
ensino de matemática.

Da mesma forma que a disciplina de Bases matemáticas para la Educación


Primaria, esta tem as aulas teóricas de duas horas semanais e os seminários de prática
de uma hora. Esta disciplina está dividida em cinco temas: matemática, cultura e
sociedade; sentido matemático; aprendizagem da matemática; o ensino da matemática;
ensino e aprendizagem dos blocos de conteúdos matemáticos da Educação Primária.
No entanto, segundo o Guia Docente (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]c),
a disciplina terá dois momentos: o primeiro engloba os quatro primeiros temas em que
há a apresentação de temas de referências e realização de práticas; e o segundo inclui a
realização de um trabalho prático dos alunos para exercitar as destrezas apresentadas na
análise didática (GÓMEZ, 2007; LUPIÁÑEZ, 2009) dos conteúdos matemáticos da
Educação Primária. Assim é destacada a importância do trabalho autônomo, pois os
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alunos terão que “exercitar qualidades analíticas e de planejamento, para iniciar-se na


elaboração de tarefas de ensino e análise do processo de aprendizagem da matemática”
(UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]c, p. 4).
A avaliação é constituída por provas escritas (40%), trabalhos realizados
individualmente e em grupo (40%) e participação e frequência às aulas (20%).
Para ilustrar, apresentaremos uma atividade de cada um dos três primeiros temas
que já tinham sido desenvolvidos quando da escrita deste artigo, pois, como já
mencionado, a disciplina ainda estava sendo ministrada.
O tema 1 – Matemática, cultura e sociedade – tem como objetivo “analisar o papel
da matemática no sistema educativo e no currículo; conhecer de maneira crítica as
finalidades da educação matemática na Educação Primária; e descrever e valorar a
importância social e cultural da matemática” (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-
]g, p. 1). No seminário de prática, uma das atividades propõe a análise de uma tirinha e
pede que os alunos respondam algumas questões.

Questões:
1) Que matemática sabe esse menino?
2) O que ele não sabe?
3) Identifique a matemática que utiliza
quando: joga cartas, constrói
cometas, faz compras, estuda e
aprende o que é uma soma.
4) Justifique a utilidade que tem a
matemática que utiliza esse menino
nessas tarefas e identifique em que
situações é útil.

Figura 1 – Tirinha
Fonte: Guión del Tema: Matemática, cultura y sociedad (UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]g)

Essa atividade possibilita a discussão dos conceitos matemáticos que podem fazer
parte de situações da vida cotidiana, pois, a partir das questões propostas, os futuros
professores poderão relacionar os diferentes conteúdos matemáticos presentes nas
atividades que o menino sabe realizar na tirinha. Porém, isso não quer dizer que o
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menino tenha clareza de que, para realizá-las, é preciso saber matemática.


Nesse contexto, o documento que estabelece o currículo e regula a Educação
Primária (ESPANHA, 2007, p. 71) destaca como um dos objetivos “utilizar o
conhecimento matemático para compreender, avaliar e produzir informações e
mensagens sobre fatos e situações da vida cotidiana e reconhecer seu caráter
instrumental para outros campos de conhecimento”.
Entretanto, não podemos considerar que apenas devam ser ensinados aos alunos
conteúdos matemáticos que, de alguma forma, estejam relacionados ao cotidiano, pois,
como evidenciam os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p. 19), muitos
conteúdos importantes não seriam ensinados ou porque não fazem parte da realidade
dos alunos ou ainda por não serem do interesse deles; e, assim, “essa postura leva ao
empobrecimento do trabalho, produzindo efeito contrário ao de enriquecer o processo
ensino-aprendizagem”.
Portanto, na formação inicial devem ser propostas discussões para aclarar essas
ideias, pois a matemática que faz parte de situações cotidianas é importante, mas o
ensino dessa matéria não pode ficar restrito a esses conteúdos.
O tema 2 – Sentido matemático – tem como objetivo “conhecer conceitos básicos
de didática da matemática (sentido numérico, sentido espacial, sentido de medida e
pensamento aleatório) que organizam o ensino da matemática na Educação Primária”
(UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]h, p. 1). Dele destacamos uma atividade que
tem como foco o sentido espacial, em que os alunos tinham que formar todas as
possíveis peças do Pentaminó com cinco quadrados e depois identificar e justificar quais
dentre elas podiam formar caixas abertas, ou seja, formar um cubo sem uma face.
Por fim, o tema 3 – Aprendizagem da matemática – explicita como objetivos,
segundo o Guión del Tema: Aprendizaje de la matemática em Primaria
(UNIVERSIDAD DE GRANADA, [201-]i, p. 1): “caracterizar os elementos que
determinam a análise cognitiva de um conteúdo matemático da Educação Primária;
identificar erros e dificuldades na aprendizagem de conteúdos matemáticos; identificar
tarefas que favoreçam alcançar as expectativas da aprendizagem matemática”. Uma das
atividades propostas solicita que os alunos busquem, em livros destinados aos
professores, exemplos de possíveis dificuldades matemáticas dos alunos para aprender o
conceito de posição do sistema de numeração decimal.
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5 Algumas considerações

Tivemos como objetivo, neste artigo, discutir e refletir sobre algumas


possibilidades para a formação matemática do professor dos anos iniciais do Ensino
Fundamental, a partir da formação que é proporcionada na Universidade de Granada
pelos professores do Departamento de Didática da Matemática.
As práticas das disciplinas podem fazer com que os futuros professores tenham
uma formação matemática mais ampla e adquiram os conhecimentos do conteúdo
específico e também conhecimentos pedagógicos do conteúdo (SHULMAN, 2004)
necessários para o ensino. A diversidade de práticas propostas que se centram tanto no
conteúdo matemático como também na forma de ensinar e aprender nos dá indícios de
que os futuros docentes poderão ter uma atitude de reflexão e também de busca por
diferentes formas de ensinar matemática.
Além disso, chama-nos atenção o fato de os estudantes terem pelos menos três
disciplinas em que são discutidos aspectos relacionados à matemática, o que
consideramos um grande avanço em relação ao que evidenciam as pesquisas brasileiras
sobre essa temática: disciplinas com cargas horárias reduzidas, cujas ementas não
trazem com clareza os conteúdos que são abordados (CURI, 2005; GATTI, 2010);
muitos cursos nem sequer têm em seus currículos disciplinas com esse objetivo
(BATISTA; LANNER, 2007). Esse fato é muito preocupante, pois como irão os futuros
docentes ensinar matemática, se essa tarefa não é abordada nos cursos de formação
inicial? Como já discutido, irão reproduzir a forma como aprenderam matemática em
sua vida escolar, o que não é suficiente para que seus futuros alunos aprendam.
Além disso, destacamos como outro aspecto positivo do curso da Universidade de
Granada o fato de formar docentes apenas para a atuação nas séries iniciais do Ensino
Fundamental, o que exclui do currículo disciplinas relacionadas com a Educação
Infantil, com a Educação de Jovens e Adultos e também com a gestão, a administração e
a supervisão escolar. E, talvez por isso, haja possibilidade de ter várias disciplinas
relacionadas à matemática.
Outro aspecto que julgamos valioso é a forma como são organizadas as
disciplinas, com aulas teóricas e também com os seminários de prática, estes com
possibilidade de desenvolver atividades estritamente relacionadas com o ensino e a
aprendizagem da matemática, visto que buscam abordar a utilização de materiais
manipuláveis e também de recursos informáticos.
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Além disso, a disciplina Bases matemáticas para la Educación Primaria não está
apenas focada nos conteúdos matemáticos, que, de certa forma, são vistos pelos futuros
professores durante toda sua vida escolar, mas busca também abordar aspectos como a
justificativa dos algoritmos das operações aritméticas e a busca de outros que não são
tradicionais. Da mesma forma, a disciplina de Enseñanza y aprendizaje de las
matemáticas en la Educación Primaria discute aspectos relacionados à importância da
matemática na sociedade, ao ensino e à aprendizagem, etc. Ainda, compreendemos que
essas disciplinas estão pautadas na resolução de problemas e abordam os fundamentos
da matemática, que são de grande importância para a formação dos professores.
Com isso, compreendemos que essas práticas proporcionadas no curso dessa
Universidade podem promover o desenvolvimento da reflexão nos docentes e
proporcionar “uma sólida formação teórico-prática que alavanque e alimente processos
de aprendizagem e desenvolvimento profissional ao longo de suas trajetórias docentes”
(MIZUKAMI, 2006, p. 216).
Corroborando essa afirmação, para Imbernón (2006, p. 60), a formação deve
proporcionar ao professor uma “bagagem sólida nos âmbitos científico, cultural,
contextual, psicopedagógico e pessoal que deve capacitá-lo a assumir a tarefa educativa
em toda a sua complexidade, atuando reflexivamente com a flexibilidade e o rigor
necessário”. Esse autor ainda destaca a necessidade de uma formação que gere a atitude
de buscar e valorizar a atualização por toda a carreira, devido às mudanças que ocorrem
constantemente.
Por fim, compreendemos que essa formação matemática de professores realizada
na Universidade de Granada pode fazer com que os futuros professores adquiram esses
aspectos aqui apontados. Esperamos, com este artigo, contribuir para a discussão sobre
a formação que ocorre no Brasil.

Agradecimentos

Agradecemos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –


CAPES – (Processo nº 8866/11-2) pelo financiamento do estágio de doutorado no
exterior.

Referências

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currículos de pedagogia das instituições de ensino superior do Estado de São Paulo:
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