Escola Que Protege

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EDUC

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à O PA R A T

Escola que
Protege:
enfrentando
a violência
contra crianças
e adolescentes
Lançada pelo Ministério da Educação
e pela UNESCO em 2004, a Coleção Edu-
cação para Todos é um espaço que visa,
por meio da divulgação de textos, docu-
mentos, relatórios de pesquisas e eventos
e estudos de pesquisadores, acadêmicos
e educadores nacionais e internacionais,
a aprofundar o debate em torno da busca
da educação para todos.
A partir desse debate, espera-se pro-
mover a interlocução, a informação e a for-
mação de gestores, educadores e demais
pessoas interessadas no campo da edu-
cação continuada, assim como reafirmar
o ideal de incluir socialmente um grande
número de jovens e adultos excluídos dos
processos de aprendizagem formal, no
Brasil e no mundo.
Para a Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade
(Secad), órgão do Ministério da Educação
responsável pela Coleção, a educação
não pode separar-se, nos debates,
de questões como desenvolvimento
socialmente justo e ecologicamente
sustentável; direitos humanos; gênero e
diversidade de orientação sexual; escola e
proteção a crianças e adolescentes; saúde
e prevenção; diversidade étnico-racial;
políticas afirmativas para afrodescendentes
e populações indígenas; educação para
as populações do campo; educação de
jovens e adultos; qualificação profissional e
mundo do trabalho; democracia, tolerância
e paz mundial.
O livro Escola que Protege: enfrentan-
do a violência contra crianças e adoles-
centes tem como objetivo compartilhar
com profissionais de educação, entre
outros, os conhecimentos acumulados so-
bre as diferentes formas pelas quais essa
violência se manifesta, os espaços sociais
que promovem as ações agressivas e as
principais situações de risco.
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Escola que
Protege:
enfrentando
a violência
contra
crianças e
adolescentes Vicente de Paula Faleiros
Eva Silveira Faleiros

2ª Edição

Brasília, 2008
Edições MEC/Unesco

SECAD – Secretaria de Educação Continuada,


Alfabetização e Diversidade
Esplanada dos Ministérios, Bl. L, sala 700
Brasília, DF, CEP: 70097-900
Tel: (55 61) 2104-8432
Fax: (55 61) 2104-8476

Organização das Nações Unidas para


a Educação, a Ciência e a Cultura
Representação no Brasil
SAS, Quadra 5, Bloco H, Lote 6, Ed. CNPq/IBICT/Unesco,
9º andar Brasília, DF, CEP: 70070-914
Tel.: (55 61) 2106-3500
Fax: (55 61) 3322-4261
Site: www.unesco.org.br
E-mail: [email protected]
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OS
EDUC

OD

à O PA R A T

Escola que
Protege:
enfrentando
a violência
contra
crianças e
adolescentes Vicente de Paula Faleiros
Eva Silveira Faleiros

2ª Edição

Brasília, 2008
© 2008. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da
Educação (Secad/MEC) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura (Unesco)

Conselho Editorial da Coleção Educação para Todos


Adama Ouane
Alberto Melo
Célio da Cunha
Dalila Shepard
Osmar Fávero
Ricardo Henriques

Coordenação Editorial
Coordenação: Fernanda Severo
Assistente e revisor: Fábio Peroni
Projeto gráfico: Carmen Machado
Diagramação: César Kieling
Tiragem: 42.000 exemplares

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

ESCOLA QUE PROTEGE: Enfrentando a violência contra crianças e adolescentes / Vicente de Paula
Faleiros, Eva Silveira Faleiros, Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade, 2008, 2ª edição

ISBN 978-85-60731-56-5

100 p. - (Coleção Educação para Todos; 31)

1. Crianças e adolescentes. 2. Violência infantil 3. Rede de proteção aos direitos humanos. I. Faleiros,
Vicente de Paula. II. Faleiros, Eva Silveira

CDU - 379.2 Fa

Os autores são responsáveis pela escolha e apresentação dos fatos contidos neste livro, bem como
pelas opiniões nele expressas, que não são necessariamente as da UNESCO e do Ministério da
Educação, nem comprometem a Organização e o Ministério. As indicações de nomes e a apresentação
do material ao longo deste livro não implicam a manifestação de qualquer opinião por parte da UNESCO
e do Ministério da Educação a respeito da condição jurídica de qualquer país, território, cidade, região
ou de suas autoridades, nem tampouco a delimitação de suas fronteiras ou limites.
Apresentação
A escola é um espaço privilegiado para a construção da cidadania, onde um
convívio harmonioso deve ser capaz de garantir o respeito aos Direitos Humanos e
educar a todos no sentido de evitar as manifestações da violência. Dentre os pro-
blemas mais pungentes que temos enfrentado no Brasil, estão as diversas formas
de violência cometidas contra crianças e adolescentes. A análise desse quadro
social revela que as marcas físicas visíveis no corpo deixam um rastro de marcas
psicológicas invisíveis e profundas. Combater a teia de violência que muitas vezes
começa dentro de casa e em locais que deveriam abrigar, proteger e socializar
as pessoas é uma tarefa que somente poderá ser cumprida pela mobilização de
uma rede de proteção integral em que a escola se destaca como possuidora de
responsabilidade social ampliada.
O Ministério da Educação, por intermédio da Secretaria de Educação Conti-
nuada, Alfabetização e Diversidade (Secad), desenvolveu em 2004 o Projeto Esco-
la que Protege, que tem como finalidade promover ações educativas e preventivas
para reverter a violência contra crianças e adolescentes.
No ano de 2006, estabeleceu-se como prioridade básica a formação de pro-
fessores e demais profissionais envolvidos com a educação para atuarem como
aliados na garantia dos direitos de crianças e adolescentes. A formação se con-
cretizou por meio de um curso de educação a distância, desenvolvido pela Univer-
sidade Federal de Santa Catarina, seguido de uma etapa presencial, realizada em
todas as regiões do Brasil por Universidades Federais e Estaduais.
Esta publicação, originalmente, foi elaborada como um instrumento didático
de apoio aos participantes do Curso Formação de Educadores: subsídios para
atuar no enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes. Devido ao in-
teresse despertado pela obra em sua primeira edição, optou-se por reeditá-la para
distribuição a toda a rede de proteção dos direitos de crianças e adolescentes.

Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e


Diversidade do Ministério da Educação
Sumário

Introdução ......................................................................................................... 11

Visão Histórica .............................................................................................. 13

Uma visão histórica da violência contra crianças


e adolescentes ........................................................................................ 15

Formas de Violência .................................................................................... 27

A violência contra crianças e adolescentes e suas


principais formas ............................................................................................ 29

Trabalho Infantil ............................................................................................ 55

Exploração do trabalho de crianças e adolescentes ............................ 57

Considerações Finais .................................................................................77

Redes de proteção de crianças e adolescentes .....................................79

Bibliografia recomendada ............................................................................. 87

Sobre o autor e a autora ........................................................................... 89


Introdução

Esta publicação tem como objetivo compartilhar com educadores e


educadoras informações sobre as diferentes formas de violência a que estão
submetidas nossas crianças e adolescentes, visando subsidiar ações práticas de
enfrentamento. Orientamo-nos pela noção de que o conhecimento e o diálogo
sobre a questão nos fortalecerão como grupo social capaz de combater a violência
com cuidado e proteção integrais.
A obra foi concebida como um convite a uma reflexão. Optamos por uma
linguagem objetiva, que oferecesse argumentos básicos até mesmo para pessoas
não familiarizadas com o assunto. Subdividimos o texto em três capítulos e
anexamos, ao final, uma relação das instituições que compõem a Rede de Proteção
de Crianças e Adolescentes, formada para enfrentar esse problema social, que
também ocorre em rede.
No primeiro capítulo, elaboramos uma breve retrospectiva histórica sobre
os riscos e vulnerabilidades enfrentados por crianças e adolescentes. Os fatos
resgatados demonstram a extensão e a intensidade das agressões que violam
os direitos humanos. Nesse cenário, surgem também as primeiras iniciativas de
consolidação dos espaços de proteção, bases legais e políticas públicas voltadas
para a promoção da guarda e do acolhimento de crianças e adolescentes. Mesmo
assim, a história não deixa dúvidas de que a violência está enraizada em nosso
cotidiano e muito mais próxima do que admitimos pensar.
O segundo capítulo apresenta algumas reflexões teóricas sobre a violência
e as deliberações expressas nos marcos legais de proteção das crianças e
adolescentes. Contemplamos diferentes tipos de violência: estrutural, simbólica,
institucional, negligência e abandono, física, psicológica, sexual e todas as suas
derivações de abuso, exploração comercial, pornografia, turismo sexual, tráfico de
seres humanos e trabalho infantil.
Longe de esgotar o assunto, esse apanhado de informações revela a
complexa rede de espaços sociais que promovem as ações agressivas e oferece
uma perspectiva atualizada da dimensão do problema a ser enfrentado na defesa
dos direitos das crianças e adolescentes em situação de risco e vulnerabilidade
social.

11
No último capítulo, apresentamos elementos para uma reflexão sobre o
trabalho de crianças e adolescentes no Brasil. As informações adaptadas para
esta obra são frutos de uma pesquisa mais ampla desenvolvida pelo Programa
Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil da Organização Internacional
do Trabalho. O balanço histórico do problema foi subdividido por faixas-etárias e
principais espaços de ocorrência, conferindo precisão ao diagnóstico. Paralelamente,
são observadas as supostas justificativas para uso da mão-de-obra infantil e as
propostas para a erradicação dessas atividades pela via da educação integral.
A realização desta publicação nos fez experimentar um sentimento de que
o percurso está iniciado. Evidencia-se, a partir do conhecimento coletado, que
ainda há muito que fazer para desconstruir as tradições cruéis que colocam em
risco o desenvolvimento pleno dos cidadãos em fase de formação. Nesse sentido,
almejamos oferecer para a comunidade, especialmente para os profissionais
envolvidos com crianças e adolescentes, elementos para cumprir seus
compromissos éticos como responsáveis pelo livre desenvolvimento das gerações
mais novas e para uma futura política de educação integral.

12
Visão
Histórica
Uma visão
histórica da
violência contra
crianças e
adolescentes

E
ste primeiro capítulo é um convite à reflexão, em uma perspectiva his-
tórica, sobre as vulnerabilidades da infância e da adolescência frente às
relações de violência. A história da violência contra crianças e adoles-
centes denota a persistência de diferentes tipos de agressões (físicas e
psicológicas) e a disseminação dessas práticas nas instituições sociais.

Um resgate das formas de agressão e proteção da


infância e da adolescência
As medidas legais de proteção e as instituições de acolhimento de crianças
e adolescentes representam espaços de enfrentamento a um problema que diz res-
peito a todos. Resgatando as diferentes formas de se ver a criança no decorrer da
história, os marcos legais e a atuação dos poderes públicos e da sociedade no sentido
de protegê-la, pode-se contextualizar uma trajetória que, embora tenha acumulado
conquistas significativas, ainda tem limites que precisam ser superados pela via da
mobilização de uma rede de proteção integral e da efetivação de políticas públicas.
O processo histórico permite visualizar como crianças e adolescentes foram,
ao longo do tempo, envolvidos em relações de agressões e maus tratos por diversas
instituições sociais. As gradativas transformações sócio-culturais, incluindo a carac-
terização desse grupo social como “sujeitos de direito”, exigiram a mobilização de
diferentes segmentos da sociedade pública e civil.
Para apresentar um panorama geral desses movimentos, resgatamos os prin-
cipais marcos da legalização e da institucionalização que hoje protegem crianças e
adolescentes.
Essa proteção está expressa no Estatuto da Criança e do Adolescente de
1990, em seu artigo 5º, que reflete a Convenção das Nações Unidas sobre os Direi-
tos da Criança de 1989: “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,
punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
fundamentais”.

Um pouco da história mundial sobre


crianças e adolescentes
A perspectiva da proteção integral, adotada no final do século XX, contra-
põe-se a uma perspectiva de disciplinamento e dominação das crianças perpetu-
ada historicamente. A violência contra crianças e adolescentes esteve presente na
história da humanidade desde os mais antigos registros, como afirma De Mause,
em uma visão bastante pessimista: “A história da infância é um pesadelo do qual
recentemente começamos a despertar. Quanto mais atrás regressamos na História,
mais reduzido o nível de cuidados com as crianças, maior a probabilidade de que
houvessem sido assassinadas, aterrorizadas e abusadas sexualmente”.
Essa visão precisa ser relativizada conforme as classes e grupos sociais e as
“maneiras de viver” desses diferentes grupos em seus respectivos contextos sociais.
Na Grécia Antiga, a alegria da criança filha de cidadão, educada no gineceu por
meio de mitos, fábulas e música, contrastava com a tristeza do filho do escravo,
de quem ressoava dolorido o lamento da venda próxima ou de destino ainda mais
cruel.
Em Esparta, o Estado assumia a responsabilidade de educar seus futuros
guerreiros em princípios cívicos e militares logo aos sete anos de idade. A pedagogia
militar de então: exercícios físicos realizados até a exaustão, fome e espancamentos.

 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Ministério da Justiça, Secretaria da Cidadania e Departa-


mento da Criança e do Adolescente. Brasília, 1990.
 DEMAUSE, Lloyd. The history of childhood. In: The New Psychohistory. New York: The Psychohistory Press,
1975.

16
Os jovens começavam a tomar parte na Assembléia com cerca de 15 anos e, depois
de passar por várias provas, eram, antes de completar 20 anos, incorporados como
cidadãos. Permaneciam alistados até os 30, 35 anos de idade. Uma dessas provas,
para a elite, consistia em matar um escravo que fosse encontrado pelas ruas da cida-
de. Aos escravos, era destinado somente o trabalho braçal.
Em Atenas, o serviço militar durava dois anos e somente se iniciava aos 18
anos de idade. Antes disso, a educação doméstica e em escolas de grandes mestres
predominava na vida da criança de elite. Platão recomendava a educação para a
cidadania, desde que controlada pelos magistrados e membros dos conselhos mais
elevados. Xenofonte considerava que o direito de palavra não deveria ser atribuído
ao povo, por sua ignorância, mas aos “sábios e aos melhores”. As mulheres atuavam
apenas na esfera doméstica, e as meninas, fortalecidas por exercícios físicos desde a
infância mais precoce, casavam-se aos 14 ou 15 anos de idade.
No Império Romano, meninos e meninas permaneciam juntos, protegidos
por seus deuses Lares, até os doze anos de idade. A partir daí, separavam-se. A eles,
tocava a vida pública, o aprimoramento cultural, militar e mundano. A elas, o casa-
mento, no mais tardar, aos 14 anos. Também essas regras se aplicavam à nobreza. À
plebe e aos escravos, restavam os trabalhos subalternos. O pátrio poder, em Roma,
durava até a morte do pai, quando o filho o sucedia como Pater Familias. Com o
advento do Cristianismo e a decadência do Império Romano, uma nova moralidade
foi-se gestando.
A Idade Média encerra o indivíduo nos limites territoriais do feudo, onde
ele pode contar com a comunidade, mas é também por ela vigiado. A partir de
uma releitura de Aristóteles, propõe-se a divisão das idades humanas, para fins de
educação, em períodos de sete anos. A infância duraria até os sete anos de idade; a
puerilidade, até os 14; a adolescência, até os 21. Para Isidoro, a adolescência prolon-
gava-se até os 35 anos de idade. Apesar dessas delimitações cronológicas, a caracte-
rização da infância como um estágio oposto ao da idade adulta não existia.
A formação de Cidades-Estado e de Estados Nacionais, com a ascensão da
burguesia comercial, a Reforma Religiosa e a ampliação da educação inauguram a
Idade Moderna. A sociedade busca um fortalecimento do espaço privado.
Segundo Ariès, somente a partir do Século XV é que surge o sentimento de
família, mas ainda até o século XVII “a vida era vivida em público”. Na Europa,

 ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC Ed., 1981.
 ARIÈS, 1981. Op. Cit. p.273.

17
“a civilização medieval havia esquecido a paidéia dos antigos e ainda ignorava a
educação dos modernos. Este é o fato essencial: ela ainda não tinha a idéia da edu-
cação. Hoje, nossa sociedade depende e sabe que depende do sucesso de seu sistema
educacional”.
Também na Idade Média, o colégio surgiu como instituição educacional. Ao
mesmo tempo, a família, ao resgatar crianças e adolescentes para dentro do lar,
experimenta crescentes relações de afetividade. Os mestres moralistas começam a
denunciar a frouxidão dos costumes. O Estado e a Igreja reagiram e assumiram a
responsabilidade educacional. Os adolescentes passam a formar grupos chamados
de “abadias” ou “corpos juvenis”.

Com o Iluminismo, ampliou-se a circulação de novas idéias durante os sécu-


los XVII e XVIII. A industrialização e o crescimento urbano acelerado tornam os
indivíduos anônimos. No século XIX, a adolescência passa a ser delimitada, identifi-
cada, esquadrinhada e controlada. As meninas começam a receber instrução formal.
Famílias ricas criticam os colégios (internatos, na maioria) por maus hábitos morais
e retiram seus filhos dessas escolas. As famílias pobres e camponesas, por outro lado,
vêem na possibilidade de enviar seus filhos para essas instituições a esperança de um
futuro melhor. Externato para o rico, internato para o pobre. A família é nuclear,
heterossexual, monógama e patriarcal. O pai tudo pode em relação aos filhos e à
mulher.

O século XX inaugura a linha de produção em série e a intensa exploração do


trabalho infanto-juvenil provoca, por um lado, mudanças nas famílias e problemas
sociais e de saúde coletiva e, por outro, o surgimento de políticas para a proteção de
crianças e adolescentes. De uma realidade do capitalismo industrial de meados do
Século XIX, em que as crianças trabalhavam por mais de 16 horas, avançamos, ao
final do século XX, para um paradigma de proteção integral.

Foi também no início do século XX que tivemos a ampliação dos conheci-


mentos da psicologia, que, debruçada sobre a constituição do sujeito infantil, contou
com a contribuição dos teóricos do desenvolvimento humano, destacando-se Freud,
Piaget, Vygotsky, Makarenko, Wallon e Watson. Apesar da diferença de posiciona-
mentos e matrizes teóricas, esses autores foram fundamentais para a construção de
uma concepção de infância e para a adaptação do processo educativo.

 ARIÈS, 1981. Op. Cit. p.276.

18
A violência contra crianças e adolescentes
no cenário brasileiro
Desde seu descobrimento, em 1500, até 1822, o Brasil foi uma colônia de
Portugal, dependendo econômica, política e administrativamente do poder instala-
do em Lisboa. As leis e as ordens para as crianças também vinham de Portugal e
eram aplicadas através da burocracia, dos representantes da corte e da Igreja Católi-
ca. A Igreja e o Estado andavam juntos, unindo a conquista armada e a religião. O
cuidado com as crianças índias pelos padres jesuítas tinha por objetivo batizá-las e
incorporá-las ao trabalho.
Os padres, embora não aceitassem os castigos violentos e a matança de ín-
dios pelos portugueses, fundaram casas de recolhimento ou casas para meninos e
meninas índias, nas quais, após separá-los de sua comunidade, impunham-lhes os
costumes e normas do cristianismo, tais como o casamento religioso e outros dog-
mas, com o intuito de introduzi-los na visão cristã do mundo.

A escravidão
A economia Brasileira dessa época dependia de exportações de riquezas na-
turais, como madeira e ouro, ou de produtos agrícolas. Para isso, foi muito utilizada
a mão-de-obra escrava proveniente da África.
Os escravos eram considerados uma mercadoria. A criação de crianças escra-
vas era mais cara que a importação de um escravo adulto, já que com um ano de
trabalho o escravo pagava seu preço de compra. Havia grande mortalidade de crian-
ças escravas. As mães eram alugadas como amas-de-leite. Essa era uma maneira de
separar os filhos de suas próprias mães.
A criança escrava, mesmo depois da Lei do Ventre Livre, em 1871, podia ser
utilizada pelo senhor desde os 8 até os 21 anos de idade se, mediante indenização
do Estado, não fosse libertada. Antes dessa lei, começavam bem cedo a trabalhar ou
serviam de brinquedo para os filhos dos senhores.

 Este capítulo foi compilado a partir do texto: FALEIROS, Vicente de Paula (Coord.) Crianças e Adolescentes:
Pensar & Fazer. Brasília: Curso de Ensino a Distância. CEAD- 1995. Vol. 1- Módulo 1. O material encontra-se
publicado na íntegra e sua utilização foi autorizada pelo autor.

19
A Roda: escondendo a ilegitimidade
Era grande o número de filhos ilegítimos, muitos deles filhos de senhores
com escravas. Segundo a moral dominante, a família normal era somente a família
legítima. Os filhos nascidos fora do casamento, com raras exceções, eram fadados
ao abandono. A pobreza também era causa de abandono. As crianças eram deixadas
nas portas das casas e, muitas vezes, comidas por ratos e porcos. Esta situação che-
gou a preocupar as autoridades, levando o vice-rei a propor, em 1726, duas medidas:
coleta de esmolas na comunidade e internação de crianças.
Para atender à internação de crianças ilegítimas foi implantada a Roda, um
cilindro giratório na parede da Santa Casa que permitia que a criança fosse co-
locada de fora sem que fosse vista de dentro, e, assim, recolhida pela Instituição
que criou um local denominado “Casa de Expostos”. O objetivo desse instrumento
era esconder a origem ilegítima da criança e salvar a honra das famílias. A grande
maioria dessas crianças enjeitadas ou expostas era branca ou parda, filhos de brancos
ou de brancos e negros. A primeira roda, na Bahia, foi criada em 1726, e a última
só foi extinta nos anos cinqüenta do século XX.
As crianças enjeitadas, uma vez colocadas na Roda, poderiam permanecer na
instituição até um ano e meio. Em geral, eram entregues a amas-de-leite alugadas
ou a famílias que recebiam pensões muito pequenas e utilizavam as crianças para o
trabalho doméstico.
Na Casa de Expostos, havia grande mortalidade. Em torno de 90% das crian-
ças morriam, por omissão ou falta de condições da própria Santa Casa ou por de-
sinteresse da Corte.
Além das Santas Casas, cabia às Câmaras Municipais cuidar dos abandona-
dos, podendo para isto criar impostos. Algumas Câmaras prestavam assistência aos
órfãos e abandonados através da colocação familiar, ou seja, entrega de crianças a
algumas famílias em troca de pagamento.
As instituições privadas e semi-oficiais cuidavam dos pobres de forma a favo-
recer os ricos, isto é, encaminhavam as crianças ao trabalho precoce, transformando-
as em futuros subalternos. Já em 1854 havia a intenção de recolher os meninos que
vagavam pelas ruas, segundo um decreto imperial daquele mesmo ano. Mas só em
1871 foi criado o asilo de meninos desvalidos. As meninas desvalidas indigentes
eram acolhidas na Santa Casa desde 1740. No final do século XIX, havia trinta
asilos de órfãos, sete escolas industriais e de artífices e quatro escolas agrícolas.

20
Higienismo e filantropia
Com a Proclamação da República, em 1889, precedida pela Abolição da Es-
cravidão, em 1888, não foi mudado o comportamento oficial relativo aos asilos. Os
asilos se expandiram, mas foi por iniciativa privada, já que as relações entre Igreja
e Estado foram abaladas. Predominou a política da omissão do Estado, apesar dos
discursos de preocupação com a infância abandonada.
Os higienistas, em geral médicos preocupados com a saúde da espécie, pro-
punham a intervenção no meio ambiente, nas condições higiênicas das instituições
e das famílias. O modelo de atenção à maternidade, implantado na Casa dos Ex-
postos da Santa Casa do Rio de Janeiro, onde uma sala de partos fora criada em
1822, foi questionado pelos higienistas. A principal crítica era à promiscuidade e à
falta de condições de higiene, com conotações morais, porque a Casa dos Expostos
estaria acobertando os filhos nascidos fora do casamento, o que para essa socieda-
de era considerado “pecado”. Havia uma preocupação médica com a mortalidade
infantil, com a amamentação e com a inspeção escolar. Nesse contexto, são criadas
creches em substituição à Roda, para propiciar condições para que os pais trabalha-
dores pudessem exercer suas funções.

Os tribunais
Desde o início do século XX, os juristas, em congressos internacionais da
Europa e América Latina, preocuparam-se com o combate à “criminalidade de me-
nores” de forma distinta da dos adultos. Na perspectiva de “salvar o menor” do
ambiente perigoso, propunham uma “nova Justiça para a infância, para corrigir os
desvios do bom comportamento”. Desde 1913 a idéia de criação de Tribunais para
Menores foi defendida pelo desembargador Ataulpho de Paiva. No Código de Me-
nores de 1927 fica estabelecida a distinção entre “abandonados” e “vadios”. Estes,
maiores de 14 e menores de 18 anos, eram submetidos a um processo penal especial,
ficando a critério do Juiz estabelecer a sanção segundo sua avaliação “ da boa ou má
índole” dos que eram julgados, com encaminhamentos para seu disciplinamento.

 Movimento conduzido por médicos e engenheiros que independentemente da área de formação eram
chamados de sanitaristas. Internacionalmente esse movimento se desenvolveu a partir do século XVIII. Seu
foco de atuação foi o ordenamento espacial em suas prerrogativas de controle das relações sociais por
meio de práticas de saneamento, educação higiênica, profilaxia dos ambientes e de doenças consideradas
infecto-contagiosas e instalação de postos de saúde. Inspirados em doutrinas francesas de limpeza física e
social, os agentes do sanitarismo previam a consolidação de uma sociedade renovada em termos de proje-
tos político-institucionais e livre dos “miasmas” proliferados pelo aglomeramento humano indisciplinado. No
Brasil, um dos expoentes máximos do higienismo foi Oswaldo Cruz.

21
Em 1902, o Congresso Nacional discutia a implantação de uma política
chamada de “assistência e proteção aos menores abandonados e delinqüentes”. Em
1903, foi criada a Escola Correcional 15 de Novembro. Em 1923, foi autorizada a
criação do Juizado de Menores, e, em 1924, foram criados o Conselho de Assistên-
cia e Proteção aos Menores e o Abrigo de Menores. Em 1927, toda essa legislação
é consolidada no primeiro Código de Menores.
O Código de 1927 cuidava, ao mesmo tempo, das questões de higiene da in-
fância e da delinqüência e estabelecia a vigilância pública sobre a infância. Vigilância
sobre a amamentação, os expostos, os abandonados e os maltratados, podendo reti-
rar o pátrio poder. O menor de 14 anos não era mais submetido ao processo penal
e, se fosse maior de 16 e menor de 18 e cometesse crime, poderia ir para prisão de
adultos em lugares separados destes. O juiz devia buscar a regeneração do menor.

A industrialização
A mão-de-obra escrava foi sendo substituída, a partir de 1860 e de forma
mais acentuada no final do século, pela dos imigrantes. Muitas crianças precisavam
trabalhar para complementar a renda familiar por causa do baixo salário dos pais.
Os industriais justificavam essa exploração como sendo uma proteção dos menores,
para evitar “que ficassem nas ruas”, e foram contra o primeiro Código de Menores,
que autorizava o trabalho a partir dos 12 anos se o menino estivesse freqüentando
o ensino primário, ou, caso contrário, a partir dos 14 anos.
O governo implantou, nas décadas de 30 e 40 do século passado, algumas
escolas de ensino profissional. Foram criados o Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (SENAI) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC),
cuja manutenção foi garantida através de descontos na folha de pagamento, autori-
zados pelo governo, mas controlados por empresários.
A promessa republicana de escola para todos foi um fracasso. A maioria da
população infantil não teve acesso ao ensino público ou privado, principalmente os
meninos e meninas da zona rural.

Cuidando da ordem e da raça


Uma revolução articulada por militares, setores das oligarquias regionais e das
classes médias levou Getúlio Vargas ao poder federal em 1930. Em 1937, através de
um golpe de Estado, Getúlio fica no poder até 1945. Foram criadas, nesse período,

22
as delegacias de menores, para onde eram enviados os meninos encontrados na rua
e considerados suspeitos de vício e crime. Foi criado ainda, em 1941, um Serviço
Nacional de Assistência aos Menores, o SAM, vinculado ao Ministério da Justiça
e Negócios Interiores, para extirpar a ameaça dos meninos “perigosos e suspeitos”.
Nos internatos do SAM, predominava a ação repressiva e o desleixo contra os in-
ternos, ao invés da ação educativa.
O SAM, que funcionou até 1964, foi muito criticado, principalmente pela
Igreja Católica, pois violentava, surrava e torturava crianças. Ao invés de ser um ór-
gão de proteção, tornou-se um órgão de repressão, que deixava as crianças à míngua,
com instalações em péssimas condições.
Criou-se também o Departamento Nacional da Criança (DNCr), que lutou
contra as “criadeiras”, mulheres que cuidavam de crianças e que eram considera-
das causadoras de doenças pela pobreza e falta de condições higiênicas. Estimulou
a amamentação materna e a vigilância dos bancos de leite. O DNCr estimulou
também a implantação de creches, junto com a Legião Brasileira de Assistência,
fortalecendo a presença das mães nos cuidados e criação dos filhos. Esta política
continuou até 1964.

Cuidando das obras e do poder na república democrática


As propostas de terminar com o SAM vieram da Igreja Católica e de outros
setores da sociedade, mas os burocratas e chefes autoritários do Ministério da Justi-
ça opuseram-se à mudança e à perda de poder sobre essa parcela da população. Vá-
rios esforços foram feitos para acabar com o SAM, através de projetos de lei, desde
1958. Somente em 1964, após o golpe de Estado, foi aprovada a sua extinção.
Ainda durante o período de atuação do SAM e do DNCr, houve ampliação
dos convênios com instituições privadas para o atendimento de crianças e adoles-
centes com a atribuição de per capitas, ou seja, o pagamento de um valor mensal por
criança atendida.
Esses convênios permitiram o crescimento de grande número de obras so-
ciais, embora, em sua maioria com a marca da corrupção. As entidades falseavam o
número de atendidos para receber mais dinheiro.

23
Cuidando da segurança nacional: a Funabem e o código de 1979
O golpe militar de 1964 mudou as relações de poder no Brasil. A oposi-
ção foi silenciada, os sindicalistas defensores de melhores salários foram afastados,
muitos militantes políticos foram presos e torturados. O poder foi centralizado, o
Congresso Nacional controlado e os governadores passaram a ser nomeados, em
nome da segurança nacional.
Com a extinção do SAM, no início de 1964, foi criada a Funabem - Funda-
ção Nacional do Bem-Estar do Menor, independente do Ministério da Justiça, com
autonomia e propósitos tais como evitar a internação de menores.
A doutrina da segurança nacional deu forma à organização política, à peda-
gogia e à estrutura física da Funabem. No paradigma da situação irregular vigente
nos Códigos de Menores de 1927 e de 1979, os menores de 18 anos que viessem a
cometer atos infracionais ou estivessem em situação de pobreza, ameaça moral ou
risco eram considerados, respectivamente, “marginais ou marginalizados”, diferen-
temente das crianças bem integradas na família, que eram consideradas “em situa-
ção regular”. Ao criar uma comissão parlamentar de inquérito sobre o assunto, em
1976, a Câmara dos Deputados também distinguiu as figuras de criança e menor
ao elaborar seu Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar
o problema da criança e do menor carentes no Brasil .
A Funabem estabeleceu um sistema de combate à marginalidade, fazendo
convênios com entidades privadas, estados e alguns municípios, que em sua maioria
visavam possibilitar internações e distribuição de per capita. Essa medida criava mais
problemas do que soluções para as crianças, como, por exemplo, o isolamento, os
maus tratos, a submissão e a aprendizagem de condutas contrárias à lei.
A política da Funabem não reduziu o processo de marginalização. Durante a
ditadura, acentuou-se a exclusão social, ou seja, a marginalização do menor pela po-
breza da família, pela exclusão da escola, pela necessidade do trabalho, pela situação
de rua que, não raramente, expõe os menores a toda sorte de violência, tais como
ações de grupos de extermínio.
Em 1979, criou-se um novo Código de Menores, no qual a exclusão era vista
como “doutrina da situação irregular”, o que significava patologia social, ou seja,
uma doença, um estado de enfermidade e, também, estar fora das normas.
Nessa perspectiva do Código, ser pobre era considerado uma doença, assim
 Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar o problema da criança e do menor
carentes no Brasil. Brasília: Coordenação de Publicações, 1976 (grifos nossos).

24
como também o eram as situações de maus tratos, desvio de conduta, infração e
falta dos pais ou de representantes legais. O médico era o juiz, que, pelo Código,
tinha o poder de decidir quais eram os interesses do menor nessa situação. O poder
do juiz era enorme, mas ele agia sobre os destinos da criança fundamentalmente
decidindo as questões relacionadas a sua internação, colocação, adoção ou punição.
O juiz era também o vigia dos espetáculos e atos de ir e vir das crianças. A verifica-
ção da situação irregular era policialesca (fosse feita por policiais ou não), e ao juiz
cabia pôr tudo em ordem. Enfim, no Código de 1979, os direitos da criança só eram
protegidos quando em situação de risco ou de “doença social”.

Cuidando dos direitos: democratização, participação


e proteção integral
Em oposição à doutrina da situação irregular, desenvolveram-se concepções
e movimentos que colocavam a criança como sujeito de direitos, de acordo com a
“doutrina da proteção integral”, em primeiro lugar, pela própria Organização das
Nações Unidas (ONU). Em segundo lugar, através dos juristas e dos movimentos
sociais Brasileiros na década de 1980, com a mobilização da sociedade e de alguns
setores do Estado, incluindo setores da própria Funabem. Essas mobilizações leva-
ram à Assembléia Constituinte de 1987 uma proposta que considerava a criança
como sujeito de direitos.

Para finalizar
O resgate histórico apresentado neste capítulo evidencia que maus tratos,
violência e abandono marcaram a trajetória da infância pobre no Brasil. Crianças
e adolescentes foram inseridos em um processo sócio-político de trabalho precoce,
futuro subalterno, controle político, disciplina e obediência vigiada, quadro que, ao
olhar de hoje, mostra-se completamente inadequado para o desenvolvimento de
crianças e adolescentes saudáveis. Somente no século XX a “doutrina da proteção
integral” formulou uma resposta a esses problemas, conferindo um lugar mais efeti-
vo para crianças e adolescentes nas relações de cidadania.

25
Referências

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Guanabara,


1981.

AZEVEDO, M.A. & GUERRA, V.N.A. Infância e violência fatal em família. São
Paulo: Iglu, 1998.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de ou-


tubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva,
1990.

DE MAUSE, Lloyd. The history of childhood. In: The New Psychohistory. New York:
The Psychohistory Press, 1975.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Ministério da Justiça,


Secretaria da Cidadania e Departamento da Criança e do Adolescente. Brasília,
1990.

FALEIROS, Vicente de Paula (Coord.). Crianças e Adolescentes: Pensar & Fazer.


Brasília: Curso de Ensino a Distância. CEAD- 1995. Vol. 1- Módulo 1.

CÂMARA DOS DEPUTADOS, Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito


destinada a investigar o problema da criança e do menor carentes no Brasil. Brasília:
Coordenação de Publicações, 1976.

26
Formas de
Violência
A violência
contra crianças e
adolescentes e
suas principais
formas

N
este capítulo vamos conhecer um pouco mais a fundo a problemática
da violência contra crianças e adolescentes: seus conceitos, formas e
autores. Questão polêmica de responsabilidade da família, da socieda-
de, do Estado e também da escola.

A violência: uma relação de poder


Um bom começo para compreendermos a questão da violência é conceituar
o problema, analisando a forma como ele está sendo tratado. Conceituar é explicar
a natureza do fenômeno em estudo, e um mesmo fenômeno pode ser explicado se-
gundo diferentes teorias. Atualmente, no Brasil, o marco teórico adotado para con-
ceituar a violência contra crianças e adolescentes tem por base a teoria do poder.
Todo poder implica a existência de uma relação, mas nem todo poder está
associado à violência. O poder é violento quando se caracteriza como uma relação de
força de alguém que a tem e que a exerce visando alcançar objetivos e obter vanta-
gens (dominação, prazer sexual, lucro) previamente definidos. A relação violenta, por
ser desigual, estrutura-se num processo de dominação, através do qual o dominador,
utilizando-se de coação e agressões, faz do dominado um objeto para seus “ganhos”.
A relação violenta nega os direitos do dominado e desestrutura sua identidade. O
poder violento é arbitrário ao ser “autovalidado” por quem o detém e se julga no di-
reito de criar suas próprias regras, muitas vezes contrárias às normas legais.

Violência contra crianças e adolescentes:


uma violação de direitos
A Constituição Brasileira, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e
a Normativa Internacional nessa área têm como base a teoria da universalidade dos
direitos humanos e os direitos peculiares à pessoa em desenvolvimento. O artigo
227 da Constituição e o artigo 4º do ECA (que o transcreve) definem os direitos da
população infanto-juvenil Brasileira, bem como os responsáveis por garanti-los.
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação
dos direitos referente à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária
(ECA, 1990).
A violação desses direitos constitui-se, pois, em violência delituosa, definida
no Código Penal. Segundo o ECA, em seu artigo 5º:
Nenhuma criança ou adolescente será sujeito de qualquer forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais (ECA, 1990).
A violência praticada contra crianças e adolescentes tem raízes históricas,
econômicas e culturais. Segundo Faleiros,
[...] violência, aqui, não é entendida como ato isolado, psicolo-
gizado pelo descontrole, pela doença, pela patologia, mas como
um desencadear de relações que envolvem a cultura, o imaginá-
rio, as normas, o processo civilizatório de um povo.
Embora os adultos sejam socialmente responsáveis e autorizados a exercer
poder protetor sobre crianças e adolescentes, esse poder deve ser exercido de forma

 ESTATUTO, 1990. Op. Cit.


 ESTATUTO, 1990. Op. Cit.
 FALEIROS, Vicente de Paula. Redes de exploração e abuso sexual e redes de proteção. In: Anais do Con-
gresso Nacional de Assistentes Sociais, 9.,1998, Brasília, 1998.

30
adequada. No entanto, é ainda corrente em instituições Brasileiras - família, escola,
igrejas, serviços de assistência e de ressocialização - a defesa e o exercício de uma
pedagogia perversa de submissão de crianças e adolescentes ao poder autoritário,
arbitrário e violento dos adultos. Infelizmente, ainda causa estranheza o fato de
crianças e adolescentes terem se tornado sujeitos de direitos a partir do advento do
ECA, razão pela qual se explicam as reações contrárias ao Estatuto.
A violência, de qualquer tipo, contra crianças e adolescentes é uma relação
de poder na qual estão presentes e se confrontam atores/forças com pesos/poderes
desiguais, de conhecimento, força, autoridade, experiência, maturidade, estratégias e
recursos. Segundo Minayo:
[...] a violência contra crianças e adolescentes é todo ato ou omis-
são cometido pelos pais, parentes, outras pessoas e instituições
capazes de causar dano físico, sexual e/ou psicológico à vítima.
Implica, de um lado, uma transgressão no poder/dever de prote-
ção do adulto e da sociedade em geral e, de outro, numa coisifi-
cação da infância. Isto é, uma negação do direito que crianças e
adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas em
condições especiais de crescimento e desenvolvimento.

Formas de violência contra crianças e adolescentes


A violência contra crianças e adolescentes é praticada de várias maneiras,
por diferentes autores/atores e em distintos lugares. A classificação mais usual das
geralmente denominadas formas de violência é: violência física, psicológica e sexual.
Classifica-se a violência sexual em abuso sexual e exploração sexual comercial; o abuso
sexual em intra e extra-familiar; a exploração sexual em prostituição, pornografia,
turismo sexual e tráfico de pessoas para fins sexuais. No entanto, uma análise mais
rigorosa dessa classificação revela imprecisões e lacunas que não podemos deixar de
considerar.
Cabe ressaltar que, na análise de situações concretas, verifica-se que essas di-
ferentes formas não são excludentes, mas sim cumulativas. Por exemplo, a violência
sexual é também violência física e psicológica; a violência física sempre é também
psicológica. Na exploração sexual comercial, encontram-se presentes, além da explo-
ração econômica, as violências estrutural, física, psicológica, social e moral. Por fim,
a violência simbólica estimula todas as formas de violência.

 MINAYO, M. C. S. (Org). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2001.

31
Violência estrutural: a expressão das desigualdades
O Brasil, um país com enormes desigualdades econômicas e sociais e histo-
ricamente classista, adultocêntrico, machista e racista, é extremamente violento com
crianças e adolescentes pobres. Trata-se de uma violência cumulativa e excludente.
Exemplos atuais da violência estrutural são os altos índices de mortalidade de
crianças e adolescentes, provocada por causas externas, ligadas ao tráfico de drogas,
atuação de gangues e extermínio de adolescentes em conflito com a lei, bem como
homicídios e acidentes de toda ordem.
Para Minayo, a violência estrutural
[...] caracteriza-se pelo destaque na atuação das classes, grupos
ou nações econômica ou politicamente dominantes, que se uti-
lizam de leis e instituições para manter sua situação privilegia-
da, como se isso fosse um direito natural.
Apesar das garantias democráticas, claramente expressas na Constituição de
1988 e no ECA, políticas públicas descomprometidas com o princípio constitu-
cional da prioridade absoluta a crianças e adolescentes, tornam o Estado um dos
principais responsáveis pela violência estrutural. Para vencer essa realidade o Gover-
no Federal vem implementando projetos, tais como: Escola que Protege, Sentinela,
PETI - Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e PAIR - Programa de
Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-Ju-
venil no Território Brasileiro.

Violência simbólica: a construção da inferioridade


O conceito de violência simbólica foi criado pelo sociólogo francês Pierre
Bourdieu para descrever o processo pelo qual a classe que domina economicamente
impõe sua cultura aos dominados. Bourdieu, juntamente com o sociólogo Jean-
Claude Passeron, parte do princípio de que a cultura, ou o sistema simbólico, são
arbitrários, uma vez que não se assentam na realidade, mas em mitos e preconceitos,
dados como naturais. São exemplos: a mulher é mais fraca do que o homem, os
negros são menos inteligentes do que os brancos, todo adolescente é revoltado, o
homossexual é um doente, os pobres são preguiçosos.

 MINAYO, M.C.S. A violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cadernos de Saúde Pública, Rio de
Janeiro, N. 10 (Suplemento 1), 1993. pp. 07-18.
 BOURDIEU, Pierre e PASSERON, Jean-Claude. A reprodução. Elementos para uma teoria do sistema de
ensino. Lisboa: s/ed.1970.

32
O sistema simbólico de uma determinada cultura é uma construção social, e
sua manutenção é fundamental para a perpetuação de uma determinada socieda-
de, através da interiorização da cultura dominante pelas pessoas. Ele se traduz na
imposição “legítima” e dissimulada dos valores e símbolos de poder que se tornam
naturais, inquestionáveis e mesmo invisíveis no dia-a-dia.

Assim, pode-se definir a violência simbólica como o exercício e difusão de


uma superioridade fundada em mitos, símbolos, imagens, mídia e construções so-
ciais que discriminam, humilham, excluem. Outra possível definição é a de que se
trata do estabelecimento de regras, crenças e valores que “obrigam o outro a consen-
tir”, pela obediência, dominação ou servidão.

A escola, como formadora, tem um papel fundamental na desconstrução da


violência simbólica e da cultura da inferiorização de gênero, de raça, de classe social
e de geração.

Violência institucional: a falta de cuidados de quem deveria proteger


A violência institucional, que se manifesta de diferentes formas (física, psi-
cológica e/ou sexual), se caracteriza por estar associada às condições específicas dos
locais onde ocorre, como instituições de saúde, escolas, abrigos.

As condições materiais das instituições também são exemplares da violência


estrutural. A carência de pessoal e de equipamentos, as filas de espera, a falta de ma-
terial, os horários inadequados de atendimento, a ausência de profissionais no traba-
lho e outras questões que conduzem ao não atendimento, ao atendimento precário e
ao desrespeito dos direitos dos usuários são manifestações desse tipo de violência.

Existe, em nível institucional, um outro tipo de violência que pode passar


despercebida, que é a negligência profissional. Sua manifestação caracteriza-se pelo
desprezo (por desinteresse, despreparo ou incompetência) pelas outras formas de
violência e de violação de direitos de crianças e adolescentes, ignorando os sinais de
risco e a existência de processos violentos em curso que poderão levar a violências
mais graves (como a sexual, por exemplo) ou até mesmo à morte.

 L’APICCIRELLA, Nadime. O Papel da Educação na Legitimação da Violência Simbólica. Revista Ele-


trônica de Ciências. Disponível em: http://www.cdcc.sc.usp.br/ciencia/artigos/art_20/violenciasimbolo.html.
Acesso em 01 maio 2006.

33
Negligência e Abandono: a negação da existência
A negligência é um tipo de relação entre adultos e crianças ou adolescentes
baseada na omissão, na rejeição, no descaso, na indiferença, no descompromisso, no
desinteresse, na negação da existência. Dados estatísticos de serviços de proteção e
assistência a crianças e adolescentes, disque-denúncia e SOS vêm revelando que a
negligência é uma das formas de violência mais freqüente.
A negligência nem sempre é claramente compreendida em todas suas formas
e extensão. Para a área da saúde, por exemplo, crianças negligenciadas são as que
apresentam baixo peso e as não vacinadas. Consideram-se também negligenciadas
as crianças que não freqüentam a escola. Há, no entanto, muitas formas e graus de
negligência, como por exemplo: o abandono (forma extrema); crianças não registra-
das; pais que não reconhecem sua paternidade; crianças “deixadas/entregues/dadas
sem papel passado” a familiares, conhecidos ou mesmo desconhecidos; crianças “pin-
gue-pongue”, que circulam de “mão em mão” e que “não são de ninguém”; crianças e
adolescentes que assumem responsabilidades de adultos (cuidam de si próprios e/ou
de irmãos pequenos, assumem todas as tarefas domésticas, contribuem com a renda
familiar e/ou se sustentam através da mendicância, trabalho infantil, prostituição);
meninos e meninas de rua, sem controle ou proteção e expostos à violência familiar
ou comunitária.
Muitas vezes, por preconceito, a negligência é considerada de exclusiva res-
ponsabilidade das mães. É importante reafirmar, contudo, que, segundo o artigo
4º do ECA, a família, a comunidade, a sociedade em geral e o Poder Público são
responsáveis pela proteção de crianças e adolescentes e devem assegurar a efetivação
de seus direitos.
A negligência é a negação e a falta de compromisso com as responsabilidades
familiar, comunitária, social e governamental. É a falta de proteção e de cuidado
da criança e do adolescente, a não existência de uma relação amorosa, a falta de
reconhecimento e de valorização da criança e adolescente como sujeitos de direitos.
É o desrespeito às suas necessidades e à sua etapa particular de desenvolvimento.
Crianças e adolescentes negligenciados vivem, pois, situações de abandono, de pri-
vação e de exposição a riscos.
É importante destacar que a negligência é o “primeiro estágio” e também “o
fio da meada” das diferentes formas de violência praticadas contra crianças e ado-
lescentes. Quando são protegidos, cuidados, amados e respeitados eles dificilmente
serão expostos a alguma forma de violência.

34
As conseqüências e seqüelas físicas, psicológicas e sociais da negligência so-
frida na infância e na adolescência são extremamente graves, pois se configuram
como ausência ou vazio de afeto, de reconhecimento, de valorização, de socializa-
ção, de direitos (filiação, convivência familiar, nacionalidade, cidadania) e de pleno
desenvolvimento.

Violência física: a mortificação do corpo


A violência física contra crianças e adolescentes é uma relação social de poder
que se manifesta nas marcas que ficam principalmente no corpo, machucando-o,
causando-lhe lesões, ferimentos, fraturas, queimaduras, traumatismos, hemorragias,
escoriações, lacerações, arranhões, mordidas, equimoses, convulsões, inchaços, he-
matomas, mutilações, desnutrição e até morte.
Ela apresenta-se em diferentes graus, cuja severidade e gravidade podem ser
medidas pela intensidade da força física utilizada pelo agressor, pelo grau de sofri-
mento causado à vítima, pela gravidade dos ferimentos ocasionados, pela freqüência
com que é aplicada e pelas seqüelas físicas e psicológicas que provoca.
São formas de violência física: a disciplina física abusiva com fins corretivos
(tapas, surras e agressões com qualquer tipo de objeto), torturas, privações físicas
deliberadas (de comer e de beber), restrições de movimentos (confinamento), priva-
ção ou transferência de abrigo (expulsão do lar, colocação em outra residência, in-
ternação), trabalho forçado e inadequado à idade e desenvolvimento do vitimizado,
eliminação física (assassinato) e violência sexual.
Essa violência é acompanhada pelo medo, pelo terror, pela submissão, pelo
espanto, pelo sofrimento psíquico, constituindo-se ao mesmo tempo em violência
psicológica. No âmbito familiar, essas manifestações se vinculam ao uso da força e
do poder na relação de superioridade ou autoridade que uma pessoa exerce sobre
outra que dela depende ou que a ela esteja vinculada por laços afetivos, de paren-
tesco ou de trabalho, dentre outros. A violência física é acobertada pelo silêncio,
negação ou mentiras, e, nos casos de referência a serviços de saúde, suas marcas são
muitas vezes justificadas como se tivessem sido causadas por acidentes.
A violência física praticada contra crianças e adolescentes é uma violação dos
direitos humanos universais e dos direitos peculiares à pessoa em desenvolvimento,
assegurados na Constituição Brasileira, no Estatuto da Criança e do Adolescente e
na Normativa Internacional. O Código Penal prevê como crimes as lesões corporais
dolosas e culposas (artigo 129).

35
A violência física é praticada principalmente na própria família, pelos geni-
tores ou responsáveis, avós, irmãos. No entanto, há outras pessoas que a praticam,
como: profissionais de instituições educacionais, de saúde, de assistência e principal-
mente da segurança, empregadores, grupos de extermínio e traficantes de drogas.
As situações de violência física são, muitas vezes, atendidas pelas instituições
da área da saúde que devem obrigatoriamente encaminhar os casos ao Conselho
Tutelar. Estas ocorrências, por se caracterizarem como crime, devem também ser
notificadas aos órgãos policiais.

Violência psicológica: a destruição da auto-imagem do outro


A violência psicológica é uma relação de poder desigual entre adultos dotados
de autoridade e crianças e adolescentes dominados. Esse poder é exercido através
de atitudes de mando arbitrário (“obedeça porque eu quero”), de agressões verbais,
de chantagens, de regras excessivas, de ameaças (inclusive de morte), humilhações,
desvalorização, estigmatização, desqualificação, rejeição, isolamento, exigência de
comportamentos éticos inadequados ou acima das capacidades e de exploração eco-
nômica ou sexual.
Essa forma de violência é muito freqüente e também a menos identificada
como uma violência, em função do alto grau de tolerância da nossa sociedade frente
a esse tipo de abuso. Praticamente ninguém denuncia ou responsabiliza pais, paren-
tes, professores, policiais, profissionais da saúde e da assistência, entre outros, que
desqualificam ou humilham crianças e adolescentes.
Diferentemente da violência física, a violência psicológica não deixa traços
imediatamente visíveis no corpo, mas destrói a auto-imagem do violentado e se
manifesta no comportamento da criança ou do adolescente. Essa violência provoca
traumas psicológicos que afetam o psiquismo, as atitudes e as emoções, traduzindo-
se até mesmo na incapacidade da criança em interagir socialmente dentro das con-
dições consideradas próprias de sua idade, podendo tornar-se passiva ou agressiva.
Não é raro que a vítima tenha uma imagem deteriorada de si mesma, com
baixa estima ou depressão. Pode tornar-se também extremamente ansiosa ou negli-
gente consigo, apresentando comportamentos de desatenção, alucinatórios e estra-
nhos, vindo até a perder a pulsão de vida e a energia que caracterizam uma criança.
Às vezes, a violência psicológica pode levar ao suicídio, quando as exigências ou o
abandono se tornam insuportáveis. Como uma forma de crueldade mental, pode
estar associada ou combinada com a violência sexual e com a violência física.

36
A violência psicológica situa-se no conceito geral de violência como uso ile-
gítimo da autoridade decorrente de uma relação de poder. Assim, no lugar de ofe-
recer a proteção, que é o seu dever, o adulto se relaciona com a criança por meio da
agressão verbal ou psicológica e do domínio, substituindo e invertendo o papel que
dele se espera. Essa inversão da proteção em opressão configura uma “despaternali-
zação”, ou seja, a negação das funções sociais e pessoais dos papéis de pai e mãe, do
poder familiar, muitas vezes ancorada em uma tradição autoritária da disciplina.
Nesse caldo cultural que transmite, de geração em geração, uma relação com-
plexa de dominação/submissão, parece normal, natural e mesmo inquestionável o
domínio do adulto macho, da mãe repressiva e dos chefes arbitrários. Esse auto-
ritarismo se expressa nas formas incorporadas de violência de gênero, de massacre
da individualidade, de opressão do subordinado. Não é somente na família que essa
violência se manifesta, mas também na escola, nos serviços públicos, nos meios de
transportes ou nas relações entre os próprios adolescentes ou com irmãos menores.
A violência psicológica tem como pressuposto a representação de que a
criança é alguém que somente age sob o medo, a disciplina e a intimidação, deven-
do aceitar intolerância do dominante. O lugar da criança, ao longo da história, foi
desenhado como lugar de objeto, de incapaz, de menor valor. Esse lugar é mantido
com estratégias que forçam crianças e adolescentes a serem obedientes sem discus-
são, a se submeter, por meio de punições que castigam qualquer desvio dessa ordem
estabelecida de cima para baixo.
As relações psicologicamente opressoras se expressam nas formas pelas quais
a família e os responsáveis pela criança usam sua autoridade. Em vez de buscar
atender às necessidades da criança, a autoridade é utilizada para dar vazão às ex-
pressões de um poder que quer impor ao outro seu desejo de mando ou de força,
desconsiderando as necessidades de desenvolvimento da criança e do adolescente e
a sua capacidade de compreensão de limites.
Os projetos familiares e os desejos dos pais, quando não bem elaborados,
podem constituir-se em violência psicológica. Crianças e adolescentes são muitas
vezes forçados a realizar projetos familiares quanto à profissão a seguir ou usados
como objeto de chantagem nas brigas de casais. Interferem também na violência
psicológica as situações de alcoolismo, de ciúmes e de vingança.
Do ponto de vista da intervenção profissional, a violência psicológica é
vista como uma questão de saúde mental, a ser tratada tanto no âmbito das
relações familiares quanto no contexto cultural. Assim, é preciso construir uma

37
intervenção em redes, levando-se em conta as relações das crianças e adolescen-
tes com todos os adultos que a cercam, incluindo, dentre outros, pais, parentes,
responsáveis e professores.
Essas relações precisam ser trabalhadas em suas múltiplas dimensões: cul-
tural, educativa e afetiva. Nesse trabalho, o sofrimento psíquico da criança deve
ser abordado como um dos focos da intervenção, buscando-se transformar as
relações de dominação, inclusive com o tratamento dos agressores, para inter-
romper o ciclo da violência.

Violência sexual e suas formas: o uso perverso


da sexualidade do outro
A violência sexual contra crianças e adolescentes é uma violação de direitos,
uma transgressão, uma relação de poder perversa e desestruturante. O combate a
essa forma de violência é dificultado pelo fato de que ela resulta muitas vezes do
envolvimento de diversos grupos que atuam em rede.
Esse tipo de violência caracteriza-se como uma violação dos direitos huma-
nos universais e dos direitos peculiares à pessoa em desenvolvimento: direito à inte-
gridade física e psicológica, ao respeito, à dignidade, ao processo de desenvolvimen-
to físico, psicológico, moral e sexual sadio e à proteção integral. A violência sexual
no âmbito familiar é uma violação ao direito à sexualidade segura e à convivência
familiar protetora.
Na exploração sexual comercial, é violado o direito de não ser explorado eco-
nomicamente, de não trabalhar antes dos 14 anos, e, após os 14 anos, de trabalhar
em condições dignas, sem perigo e não estigmatizantes. A violência sexual contra
crianças e adolescentes é inaceitável, além de ilegal. Ela fere a ética e transgride as
regras sociais e familiares de convivência mútua e de responsabilidade dos adultos
para com as crianças. Essa violência se contrapõe aos direitos humanos conquista-
dos pela sociedade. Ela nega a dignidade do outro, do ponto de vista de sua inte-
gridade física e psicológica.
Violência sexual é o abuso delituoso de crianças e adolescentes, em especial
de sua sexualidade, negando, inclusive, o direito das crianças e adolescentes a sua
sexualidade em desenvolvimento. É considerada um crime na nossa legislação. O
poder arbitrário do adulto agressor sobre as crianças e adolescentes desestrutura a
identidade da pessoa vitimada, caracterizando-se como um comportamento perverso.

38
Nessa forma de violência, se estabelece uma relação que:
a) deturpa as relações sócio-afetivas e culturais entre adultos e crianças/ado-
lescentes ao transformá-las em relações genitalizadas, erotizadas, comer-
ciais, violentas e criminosas;
b) confunde, nas crianças e adolescentes violentados, os papéis dos adultos,
descaracterizando as representações sociais de pai, irmão, avô, tio, professor,
religioso, profissional, empregador, quando violentadores sexuais; perde-se a
legitimidade da autoridade do adulto e de seus papéis e funções sociais;
c) inverte a natureza das relações entre adultos e crianças/adolescentes defini-
das socialmente, tornando-as: desumanas em lugar de humanas; negligen-
tes em lugar de protetoras; agressivas em lugar de afetivas; individualistas
e narcisistas em lugar de solidárias; dominadoras em lugar de democráticas;
controladoras em lugar de libertadoras; perversas em lugar de amorosas;
desestruturadoras em lugar de socializadoras;
d) estabelece, no ser violentado, estruturas psíquicas, morais e sociais deturpa-
das e desestruturantes, principalmente nos abusos sexuais de longa duração
e na exploração sexual comercial;
A violência sexual pode acontecer de várias formas: através do contato físico,
ou seja, por meio de carícias não desejadas, penetração oral, anal ou vaginal, com
o pênis ou objetos, masturbação forçada, dentre outros; e sem contato físico, por
exposição obrigatória a material pornográfico, exibicionismo, uso de linguagem ero-
tizada em situação inadequada.

Abuso Sexual
O abuso sexual contra crianças e adolescentes é um relacionamento interpes-
soal sexualizado, privado, de dominação perversa, geralmente mantido em silêncio
e segredo. Os episódios de abusos sexuais, longe de serem idênticos, distinguem-se
profundamente, seja pelo autor da violência sexual, seu grau de parentesco com a
vítima, autoridade e responsabilidade em relação ao vitimizado, idade e sexo da
vítima e do abusador, tipo de violência cometida, duração e freqüência e o local em
que ocorrem.
Nas situações de abuso sexual, crianças ou adolescentes são usados para gra-
tificação de um adulto ou mesmo de um adolescente mais velho, com base em uma
relação de poder que pode incluir desde manipulação da genitália, mama, ânus,

39
exploração sexual, voyeurismo, pornografia, exibicionismo, até o ato sexual com ou
sem penetração, com ou sem violência.
A dominação sexual perversa é uma construção deliberada, paciente e ri-
tualizada de um relacionamento perverso, que se mantém através da dominação
psicológica de longa duração. Começa por um processo de sedução, que consiste na
conquista sutil, que anula a capacidade de decisão da vítima, e acaba em sua domi-
nação e aprisionamento.
Furnisss, Perrone e Nannini identificam nos abusos sexuais repetitivos uma
dinâmica que gera uma sorte de “enfeitiçamento” que mantém a pessoa vitimizada
como que “seqüestrada” e envolvida em uma armadilha da qual não pode e nem
sabe como se livrar. Esse processo de aprisionamento é construído através de uma
trama emocional contraditória de amor/ódio, sedução/ameaça, o que faz com que
a vítima, aterrorizada, permaneça imobilizada ou “anestesiada”. Essa trama se man-
tém e se solidifica através de rituais, do silêncio, da chantagem e de uma forma de
comunicação muito particular.
A comunicação perversa é uma anticomunicação, um monólogo que tem por
objetivo ocultar, confundir, amedrontar e manter o poder através de não-ditos, si-
lêncios, reticências, subentendidos. Suas formas preferenciais de “comunicar” são:
a mentira, o paradoxo, o sarcasmo, o desprezo, a desqualificação, as mensagens de
duplo sentido, a tonalidade de voz fria, a intriga, o olhar dominador, as ordens.
A dominação sexual perversa exercida por adultos contra crianças e adoles-
centes pode ser incestuosa ou não, heterossexual ou homossexual. Ocorre, geral-
mente, em lugares fechados (residências, consultórios, igrejas, internatos, hospitais,
escolas) e inclui diferentes e variadas formas de relações abusivas.
É incestuosa quando o violentador é parte do grupo familiar (pai, mãe, avós,
tios, irmãos, padrasto, madrasta, cunhados). Nesses casos, considera-se família não
apenas a consangüínea, mas também as famílias adotivas e substitutas. Os violen-
tados conhecidos da vítima e/ou de sua família aproveitam-se da confiança que
gozam, do status, do papel e do poder que possuem, do lugar de privilégio que os
põe em contato direto e continuado com a vítima, da cobertura legal e pouco sujeita
a suspeitas de que dispõem.
Nas situações em que o abusador é amigo da família, invariavelmente exerce
uma espécie de fascinação, tanto sobre sua vítima como sobre seus familiares, apre-
 ABRAPIA. Maus tratos contra crianças adolescentes: proteção e prevenção. Guia de orientação para profis-
sionais de saúde. Rio de Janeiro: Autores e Agentes e Associados, 1992.
 FURNISSS, Tilman. (1993) Abuso sexual da criança: uma abordagem multidisci-
plinar, manejo, terapia e intervenção legal integrados. Porto Alegre, Artes Médicas.
PERRONE, Reynaldo; NANNINI, Martine. Violence et abus sexuels dans la famille – Une approche sys-
témique et communicationnelle. Paris: ESF Éditeur, 1995.

40
sentando-se como uma pessoa agradável, simpática, generosa, serviçal e atenta com
todos, mas muito especialmente com a vítima e seus pais. Em não poucas ocasiões,
favorece economicamente a família.

Exploração sexual comercial


Leal e Leal definem a exploração sexual comercial de crianças e adolescen-
tes como “uma relação de mercantilização (exploração/dominação) e abuso (poder)
do corpo de crianças e adolescentes (oferta) por exploradores sexuais (mercadores),
organizados em redes de comercialização local e global (mercado), ou por pais ou
responsáveis, e por consumidores de serviços sexuais pagos (demanda)”.10
Além de exploração econômica, a exploração sexual de crianças e adolescen-
tes no mercado do sexo é um abuso, uma violência, uma violação de direitos e um
crime. A exploração sexual comercial, por seu caráter econômico, deve ser estuda-
da e compreendida no contexto do sistema capitalista e da sociedade de consumo
globalizados e em suas articulações com as atividades econômicas dos territórios
onde ocorre. A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes ocorre em
um mercado específico, o mercado do sexo. Esse mercado abrange, de maneira pro-
fundamente articulada, o comércio do sexo e a indústria pornográfica. É sustentado,
fundamentalmente, pelo lucro gerado na exploração do trabalho sexual de mão-de-
obra adulta e infanto-juvenil.
O mercado do sexo é um mercado clandestino, pois funciona fora das nor-
mas legais de funcionamento comercial, sem registro, pagamento de impostos ou
emissão de notas fiscais. Como é um mercado ilegal, as empresas do mercado do
sexo tendem a funcionar com uma cobertura legal e um nome de fantasia que não
correspondem à verdadeira atividade comercial ou aos serviços de fato ofertados.
Enquadram-se nessa situação muitas boates, bares noturnos, hotéis e pousadas,
agências de modelos, agências de viagem e de turismo, entre outros. É interessante
notar que a clandestinidade do mercado do sexo é de certa forma ambígua, pois as
“mercadorias” comercializadas são altamente expostas.
A oferta de serviços sexuais, restrita durante séculos quase que exclusiva-
mente à prostituição, vem-se ampliando e diversificando. Com o desenvolvimento
da tecnologia, dos meios de comunicação de massa, da Internet e da sociedade de
consumo, bem como com a liberalização sexual, diversificou-se o comércio do sexo e

10 LEAL, Maria Lúcia Pinto e LEAL, Maria de Fátima (Org.). Pesquisa sobre tráfico de mulheres, crianças e
adolescentes para fins de exploração sexual comercial no Brasil. Brasília: CECRIA, 2002.

41
desenvolveu-se extraordinariamente a indústria pornográfica, ou seja, a produção de
mercadorias e serviços sexuais. Atualmente, encontra-se no mercado do sexo uma
grande variedade de produtos e serviços, com diversos níveis de qualidade e preço.
Há também uma significativa diversidade no perfil do grande número de consumi-
dores e de profissionais que esse mercado emprega.
Existe um enorme mercado consumidor de serviços sexuais. O sexo é uma
mercadoria altamente vendável e valorizada, e especialmente o sexo com jovens pos-
sui grande valor comercial. São muitos os produtos comercializados: pessoas, shows
eróticos, fotos, revistas, objetos, vídeos e filmes pornográficos. O mercado do sexo,
até por atuar, na maioria dos casos, na clandestinidade, é de alta lucratividade.
O conceito e as concepções da exploração sexual comercial de crianças e
adolescentes evoluíram nas duas últimas décadas. Durante muitos anos, a presença
de crianças no comércio sexual confundia-se com a prostituição infanto-juvenil.
O incremento do turismo sexual e o surgimento e rápida expansão do sexo via
Internet levaram à compreensão de que a pornografia, o turismo sexual e o tráfico
para fins sexuais são também formas de exploração de crianças e de adolescentes no
extremamente organizado mercado de produção e comercialização de “mercadorias”
sexuais.
Hoje também há melhor compreensão das dimensões política e ética do fe-
nômeno, encarado como uma questão de cidadania e de direitos humanos, cuja vio-
lação constitui um crime contra a humanidade. Há diversas visões a respeito do uso
de crianças e adolescentes no mercado do sexo: uma forma moderna de escravidão;
uma das piores formas de trabalho infantil (OIT); uma exploração sexual comercial
(concepção adotada no 1º Congresso Mundial contra a Exploração Sexual Comer-
cial de Crianças, realizado em agosto de 1996 em Estocolmo).
A seguir, serão apresentadas e dissecadas as diferentes formas da exploração
sexual comercial de crianças e adolescentes. É importante ressaltar que as distintas
modalidades da exploração sexual comercial são de tal modo articuladas e inter-re-
lacionadas que se torna difícil definir uma delas sem citar as demais. Um exemplo
claro disso é o tráfico de mulheres, que abastece os mercados da prostituição, por-
nografia e turismo sexual.

42
Prostituição
A prostituição é definida como a atividade na qual atos sexuais são nego-
ciados em troca de dinheiro, da satisfação de necessidades básicas (alimentação,
vestuário, abrigo) ou do acesso ao consumo de bens e serviços.
A prostituição tem diferentes formas, serviços e preços. Pode ser exercida
por garotas ou garotos de programa, em bordéis, nas ruas, em estradas, em barcos.
Testemunhos de vítimas, pesquisas e a bibliografia sobre essa problemática no Brasil
evidenciam que crianças e adolescentes envolvidos na prostituição trabalham, em
geral, nas ruas das cidades, nos portos, nas estradas ou em bordéis. Muitas vezes,
em especial na Região Norte, atuam em regime de escravidão, e normalmente estão
envolvidos nas articulações do turismo sexual e do tráfico para fins sexuais.
Muitas dessas crianças e adolescentes são moradores de rua, tendo vivencia-
do situações de violência física ou sexual e/ou de extrema pobreza e exclusão. De
ambos os sexos, são crianças, pré-adolescentes e adolescentes pouco ou não escola-
rizados. Desnecessário dizer que se trata de um trabalho extremamente perigoso e
sujeito a todo tipo de violência, repressão policial e discriminação.
Profissionais, pesquisadores e estudiosos da exploração sexual vêm questio-
nando a adoção do termo “prostituição” quando essa é praticada por crianças e ado-
lescentes. Consideram que esses não optam por este tipo de atividade, mas são
cooptados para praticá-la e, portanto, são prostituídos. São induzidos por adultos,
por suas próprias carências e imaturidade emocional, bem como pelos apelos da
sociedade de consumo. Neste sentido, não podem ser caracterizados como traba-
lhadores do sexo, mas sim como seres prostituídos, abusados e explorados sexual,
econômica e emocionalmente.
É importante chamar a atenção para o fato de que a prática sexual envol-
vendo adultos com crianças e adolescentes é considerada crime, mesmo quando
caracterizada como prostituição. Os clientes, os empregadores e os intermediários,
que induzem, facilitam ou obrigam crianças e adolescentes a se prostituir, são todos
considerados exploradores sexuais.

Pornografia
Trata-se da produção, exibição (divulgação), distribuição, venda, compra, pos-
se e utilização de material pornográfico. A pornografia encontra-se presente não só
em material normalmente considerado pornográfico (fotos, vídeos, revistas, espetá-

43
culos), mas também na literatura, fotografia, publicidade, cinema, quando apresen-
tam ou descrevem com claro caráter pedófilo situações envolvendo crianças deseja-
das, expostas e usadas sexualmente por adultos.
Por utilização de criança na pornografia se entende toda represen-
tação por qualquer meio, de uma criança dedicada a atividades se-
xuais explícitas, reais ou simuladas, ou toda representação das par-
tes genitais de uma criança com fins primordialmente sexuais.11

No Brasil, a pornografia infanto-juvenil é muito pouco estudada, havendo


uma ausência quase total de pesquisas e de bibliografia sobre as formas de explora-
ção sexual de crianças e de adolescentes. Pouco se sabe a respeito das vítimas, dos
aliciadores, dos produtores, dos distribuidores e dos consumidores desse material,
tampouco como funciona esse mercado específico, sua importância econômica, os
lucros auferidos, valores pagos por este tipo de trabalho, as condições de trabalho.
São desconhecidas também as conseqüências desse tipo de exploração sexual
para as vítimas, pois não há uma tradição em políticas públicas voltadas para esse
problema. As vítimas, apesar de estarem sempre expostas devido à própria natureza
da atividade, são paradoxalmente desconhecidas. Em síntese, são escassos, no Brasil,
produção teórica, material empírico, ou experiência acumulada de enfrentamento da
pornografia infanto-juvenil.
A pornografia infanto-juvenil na Internet constitui atualmente um dos mais
graves problemas a ser enfrentado pela sociedade, em nível nacional e internacional.
O rápido desenvolvimento desta nova modalidade de exploração sexual comercial
de crianças e adolescentes, sua imensa extensão, sua facilidade de acesso e gravidade
vêm mobilizando enormes esforços de organismos governamentais, não governa-
mentais e agências internacionais de proteção à infância.
O comércio eletrônico de pornografia infanto-juvenil é um negócio que en-
volve desde esquemas amadores até redes criminosas de alta complexidade. Por se
tratar de crime cibernético, de âmbito mundial, seu enfrentamento se depara com
enormes dificuldades operacionais e legais. No Brasil, a Polícia Federal e a Interpol
têm sua ação dificultada pela deficiência da legislação vigente.
Existem variadas formas de pornografia que envolvem crianças e adolescen-
tes, inclusive a difusão de imagens de abuso sexual de crianças de tenra idade, em

11 KEIROZ, Katia. Abuso sexual: conversando com esta realidade. Disponível em: www.cedeca.org.br/PDF/
abuso_sexual_katia_keiroz.pdf. Acesso em 30 Abr. 2006.

44
cenas de sexo perverso e sádico. Há sites que vendem espetáculos de pornografia
com crianças em tempo real, e mesmo de necrofilia. É importante destacar a estreita
articulação da pornografia infanto-juvenil com o tráfico de crianças e adolescentes
para fins sexuais.
A pornografia na internet exerce uma grande atração sobre crianças e adoles-
centes. Torna-se indispensável que os educadores (pais e professores) estejam pre-
parados para enfrentar essa questão discutindo-a com os jovens sob sua responsabi-
lidade e orientando-os sobre como se proteger dessas ações criminosas.

Turismo sexual
O turismo sexual pode ser autônomo ou vendido em excursões e pacotes
turísticos, que prometem e vendem prazer sexual “organizado”. É o comércio sexual,
em cidades turísticas, envolvendo turistas nacionais e estrangeiros e, principalmente,
mulheres jovens, de setores pobres e excluídos, de países do Terceiro Mundo.
O serviço sexual comercializado no turismo sexual é a prostituição, porém a
atividade está geralmente associada ao tráfico de pessoas para fins sexuais ou para tra-
balho escravo. O turismo sexual é, talvez, a forma de exploração sexual mais articulada
com atividades econômicas, inclusive com o próprio desenvolvimento do turismo.
As redes do turismo sexual muitas vezes são as mesmas que promovem e
ganham com o turismo em geral, podendo estar envolvidos profissionais (guias tu-
rísticos, porteiros, garçons, taxistas etc.) e empresas (agências de viagem, hotéis, res-
taurantes, bares, barracas de praia, boates, casas de show etc.).
Crianças e adolescentes que trabalham no turismo sexual em geral são pou-
co escolarizadas e vivenciaram situações de abandono, negligência, violência sexual,
pobreza e exclusão. Mais do que em outras modalidades de exploração sexual, o
turismo sexual é a atividade que mais responde, e de forma imediata, às demandas
da juventude pobre e excluída por uma inclusão social associada ao consumo (acesso
a boates, bares, hotéis, restaurantes, shoppings, butiques).
O turismo sexual e o turismo em geral desenvolveram-se simultaneamente no
Brasil a partir do final da década de 1980, principalmente em cidades litorâneas do
Nordeste Brasileiro. Na década de 1990, houve uma grande mobilização governa-
mental e não governamental visando o enfrentamento dessa problemática por meio
de ações em rede, algumas delas mantidas até hoje. Participam dessa rede a Secre-
taria Especial de Direitos Humanos, a EMBRATUR, o Ministério de Relações

45
Exteriores, companhias aéreas, órgãos da Segurança Pública, o Comitê Nacional de
Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes e organismos
internacionais, entre outros. No entanto, apesar de todos os esforços empreendidos,
o Brasil ainda não conseguiu erradicar essa forma de exploração sexual.

Tráfico de pessoas para fins sexuais


De acordo com as Nações Unidas tráfico de pessoas significa: “recrutamento,
transporte, transferência, abrigo e guarda de pessoas por meio de ameaças, uso da
força ou outras formas de coerção, abdução, fraude, enganação ou abuso de poder e
vulnerabilidade, com pagamentos ou recebimento de benefícios que facilitem o con-
sentimento de uma pessoa que tenha controle sobre outra, com propósitos de ex-
ploração. Isso inclui no mínimo, a exploração da prostituição de terceiros ou outras
formas de exploração sexual, trabalho ou serviços forçados, escravidão ou práticas
similares à escravidão, servidão ou remoção de órgãos”.12
A Assembléia das Nações Unidas em 1994 definiu o tráfico de pessoas como
[...] o movimento clandestino e ilícito de pessoas através de
fronteiras nacionais, principalmente dos países em desenvolvi-
mento e de alguns países com economias em transição, com o
objetivo de forçar mulheres e adolescentes a entrar em situa-
ções sexualmente ou economicamente opressoras e explorado-
ras, para lucro dos aliciadores, traficantes e crime organizado ou
para outras atividades (por exemplo, trabalho doméstico força-
do, emprego ilegal e falsa adoção).13
Segundo as normativas nacionais e internacionais, o tráfico de mulheres,
crianças e adolescentes para fins de exploração sexual comercial é crime, e uma
violação dos direitos humanos.
A prática das redes de tráfico envolve atividades de cooptação e/ou alicia-
mento, rapto, intercâmbio, transferência e hospedagem da pessoa recrutada para
essa finalidade. É importante destacar que, no tráfico nacional ou transnacional de
mulheres, crianças e adolescentes, as pessoas são exploradas não somente nas ati-
vidades sexuais comerciais (prostituição, turismo sexual, pornografia), mas também
por meio de trabalho forçado e escravo.

12 PROTOCOLO de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, especialmente de mulheres e


crianças. Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Artigo 3º. Op. Cit.
13 PROTOCOLO de Prevenção, Supressão e Punição do Tráfico de Pessoas, Op. Cit.

46
Muitas jovens, seduzidas pelo sonho de uma vida diferente e exitosa (ca-
samento e/ou vida em outros países, sucesso profissional, trabalho altamente re-
munerado), embarcam para outros estados do país ou para outros paises, onde são
forçadas a trabalhar no mercado do sexo.
As redes do tráfico de pessoas para fins sexuais costumam “maquiar” suas
atividades clandestinas e criminosas através de cobertura legal e o uso de nomes de
fantasia que não correspondem à verdadeira atividade comercial ou serviços oferta-
dos, como agências de modelos, agências de viagem, empresas de turismo, de oferta
de trabalho e emprego, de namoro-matrimônio e, mais raramente, por agências de
adoção internacional. Essa forma de atuar e os esquemas de segurança do crime
organizado, do qual fazem parte as redes de tráfico, tornam aparentemente invisível
essa modalidade de exploração sexual.
A primeira importante pesquisa nacional sobre o tráfico de mulheres, crian-
ças e adolescentes para fins de exploração sexual comercial no Brasil foi realizada
nos anos 2000, 2001 e 2002. Coordenada por Maria de Fátima Leal e Maria Lúcia
Leal, a pesquisa tornou-se referência obrigatória sobre esta realidade e identificou
a existência de um grande número de rotas nacionais e internacionais de tráfico e
um importante contingente de adolescentes do sexo feminino traficadas para fins de
exploração sexual comercial, turismo sexual e pornografia.14
No entanto, o Brasil ainda se ressente da ausência de uma maior consciência
da sociedade e de uma atenção especial de governantes e operadores das redes de
atenção e defesa de crianças e de adolescentes para a implementação de um mais
efetivo combate a esse tipo de crime.

Exploração econômica: uma das piores formas de violência


A exploração econômica ocorre quando crianças e adolescentes são constran-
gidos, convencidos ou obrigados a exercer funções e a assumir responsabilidades de
adulto, inapropriadas à etapa de desenvolvimento em que se encontram.
Essa exploração é uma das piores formas de violência, porque expõe suas
vítimas a muitas outras violências: negligência, agressões físicas e psicológicas e tor-
turas que, muitas vezes, resultam em morte.
O trabalho infanto-juvenil vem sendo pesquisado, denunciado e enfrentado
em nível nacional e internacional. No entanto, nos estudos sobre a violência contra

14 LEAL, Maria Lúcia Pinto e LEAL, Maria de Fátima (Org.). Pesquisa sobre tráfico de mulheres, crianças e
adolescentes para fins de exploração sexual comercial no Brasil. Brasília, CECRIA, 2002.

47
crianças e adolescentes, ele raramente é relacionado como uma das formas de vio-
lência, apesar de tratar-se de exploração econômica e violação dos direitos, punido
na forma da lei (artigo 5º do ECA).
Trata-se de negligência, como vimos anteriormente, quando crianças, por ve-
zes de tenra idade, são exploradas pelos pais, são “alugadas” para estranhos, mendi-
gam em meio ao trânsito, vendem em bares, moram na rua, têm de cuidar sozinhos
de suas vidas e até sustentam economicamente adultos. Crianças e adolescentes que
vivenciam esse tipo de relação parental são levadas a crer que têm obrigação de se
deixar explorar porque estão ajudando os pais.
Há crianças e adolescentes que trabalham, com a anuência ou negligência dos
pais, em atividades ilegais e altamente perigosas (correndo risco de vida), muitas
vezes em regime de escravidão. O tráfico de drogas, a prostituição, a pornografia e
mesmo a participação em roubos e assassinatos são atividades que estruturam per-
sonalidades anti-sociais.
Há também crianças e adolescentes, em geral do sexo feminino, que, traba-
lhando como domésticas e babás, são exploradas em jornadas de trabalho excessivas
e, não raro, abusadas sexualmente por patrões e/ou seus filhos.

Os autores e atores da violência contra


crianças e adolescentes
Quando se discute a violência contra crianças e adolescentes é comum focar-
se exclusivamente nos autores, adotando uma visão binária violentador-violentado.
No entanto, a violência ocorre em situações nas quais outros atores participam.
Normalmente há pessoas que têm conhecimento da violência e silenciam-se, per-
mitindo que a mesma se mantenha, ou até colaboram para que ela ocorra. Esses são
os coniventes e as redes que sustentam a violência, como veremos a seguir.
A violência contra crianças e adolescentes, que pode ser cometida tanto por
adultos (de ambos os sexos) como por outros adolescentes, é correntemente classifi-
cada como intra ou extra-familiar. A análise da realidade das situações de violência
tem revelado que essa classificação é demasiado genérica, não dando conta da diver-
sidade dos autores e atores envolvidos nessas situações.
Por outro lado, essa classificação refere-se fundamentalmente às violências
privadas, a relacionamentos interpessoais violentos, não considerando a violências
públicas, mercantilizadas, como a exploração sexual comercial.

48
Nas violências privadas, classificadas como violência intra e extra-familiar, é
importante identificar os atores que se encontram implicados. A violência intra-
familiar pode ser praticada tanto por pais ou responsáveis, como por parentes mais
ou menos próximos dos vitimizados (irmãos, avós, cunhados, tios, primos, entre
outros). Evidentemente, o mais importante é estabelecer nem tanto o parentesco
civil, mas sim o grau de autoridade do violentador sob a vítima.
Na violência extra-familiar, também é importante definir o grau de conheci-
mento e de convivência existente entre o autor e o violentado, ou seja, se o violen-
tador é:
a) ligado a familiares, com estreita convivência com a vítima (filho do padras-
to, segundo marido da avó, namorado da tia ou da irmã);
b) conhecido, com estreita convivência com a vítima (morador na mesma casa
ou no mesmo terreno, vizinho, professor ou outro profissional, religioso,
amigo da família, patrão, comerciante do bairro ou outros);
c) desconhecido da vítima.
Na violência pública, mercantilizada, extra-familiar, como a exploração sexual
comercial, por exemplo, os autores da violência podem ser desconhecidos (clientes,
internautas pedófilos) ou conhecidos (empregadores, gigolôs). Os demais atores,
que testemunham ou até estimulam a violência, são em geral conhecidos (amigas,
aliciadores, taxistas, donos de hotéis e de casas de show, fotógrafos e outros).

A Violência familiar: quando a família é espaço de violência


A estrutura familiar não é uma ilha isolada do contexto histórico, econô-
mico, cultural e social, mas um dos subsistemas em que se encontram presentes e
se enfrentam os poderes estruturados e estruturantes da sociedade. Autoritarismo,
machismo, preconceitos e conflitos em geral articulam-se com as condições de vida
das famílias, e as questões de poder se manifestam nas relações afetivas e na sexua-
lidade. É nesse contexto de poder que deve ser analisada e compreendida a violência
de adultos contra crianças e adolescentes. A violência familiar é, pois, uma forma de
relacionamento ancorada na história e na cultura Brasileira.
A grande maioria das famílias no Brasil são protetoras, milhões delas ao cus-
to de enormes sacrifícios. No entanto, também nessas famílias protetoras encon-
tram-se traços culturais, em diferentes graus, de relações familiares adultocêntricas,
machistas, autoritárias, que as tornam mais ou menos violentas.

49
É importante distinguir a violência doméstica da violência familiar. A violên-
cia doméstica refere-se ao lugar onde ela ocorre, na casa, no lar; a violência familiar
se refere à natureza dos laços parentais que unem as vítimas e os autores da violên-
cia. Não são, portanto, sinônimos.
Na violência doméstica podem viver e ser violentadas pessoas que não são da
família, como empregadas domésticas e agregados. A violência familiar pode ocor-
rer entre cônjuges, entre pais e filhos, entre irmãos, com parentes idosos, habitantes
ou não da mesma casa. Familiares podem se odiar e ser violentos a muitos quilôme-
tros de distância ou vivendo sob o mesmo teto. São exemplos disso o pai que nunca
reconheceu o filho, o filho que sequer conhece o pai, a mãe separada do marido que
não deixa os filhos verem o pai, filhos e pais que se agridem verbal ou fisicamente.
Muitas das agressões e violências praticadas por pais ou responsáveis contra
filhos crianças e adolescentes são, em geral, justificadas como “medidas educativas”
pelos autores e pelos demais atores coniventes com elas.
Todas as pesquisas, nacionais e internacionais, indicam que os familiares são
os maiores autores de violências contra crianças e adolescentes. São freqüentes a
violência física e psicológica praticada pelas mães e a violência sexual praticada pe-
los pais. Em seguida, nas estatísticas, aparece a violência praticada por conhecidos.
Desconhecidos raramente são autores de violência.

Os pactos de conivência e silêncio no abuso sexual e


as redes do mercado do sexo
A presença e a ação de redes de violência contra crianças e adolescentes são
cada vez mais evidentes para os que estudam e enfrentam essa problemática. Cen-
trar no binômio vitimizador/vitimizado a análise da violência contra crianças e ado-
lescentes implica desconsiderar a importância das redes familiares, comunitárias e
institucionais na ocultação e na manutenção das diversas formas dessa violência.
Muitas vezes, crianças e adolescentes violentados e dominados são vitimiza-
dos tanto pelo agressor como pela existência de redes e pactos de silêncio, tolerância,
conivência, medo, impunidade. Tanto membros da família como vizinhos, colegas,
profissionais da educação, saúde, assistência, segurança, ao silenciarem sobre as situ-
ações de violência que presenciam, conhecem, ou suspeitam protegem o violentador.
Não é raro o agressor manter outras pessoas, além da vítima, sob sua dominação.

50
Com a expansão crescente do mercado do sexo, as organizações e empresas
que atuam na exploração sexual comercial passaram a atuar em redes, articuladas
em nível nacional e internacional. O comércio e a indústria do sexo articulam-se
com outras redes de corrupção, como as de tráfico de pessoas e de drogas, e as de
pedofilia e de pornografia via Internet.
As redes de prostituição organizam o tráfico de pessoas para o comércio se-
xual, estabelecem “rotas”, abastecem prostíbulos, boates, casas de show e a indústria
pornográfica (produção de revistas, fotos, filmes, vídeos, objetos). O tráfico nacional
e internacional de pessoas é, por vezes, articulado com o turismo sexual. Trata-se da
globalização de mercados da contravenção, que atua através de redes clandestinas,
muito poderosas, mafiosas e violentas, vigiadas por fortes esquemas de segurança.
É importante ter presente que, sem essas redes privadas e societárias de si-
lêncio e de conivência, dificilmente haveria espaço para a grande incidência de vio-
lência contra crianças e adolescentes existente. Por isso, os artigos 13, 56 e 245 do
Estatuto da Criança e do Adolescente estabelecem que profissionais e dirigentes
das áreas de educação e de saúde são obrigados a notificar (comunicar oficialmente)
aos órgãos competentes todos os casos suspeitos ou confirmados de maus-tratos
contra crianças e adolescentes.

Para finalizar
A caracterização dos espaços sociais com maior incidência de violência e das
diferentes formas de ações agressivas que acabamos de ver revelam que a conduta
violenta está disseminada por toda a sociedade. Estamos mais perto dela do que
gostaríamos e ela é mais extensiva do que imaginamos. Em função dessas caracte-
rísticas intensivas e extensivas da violência, sua desarticulação somente poderá ser
alcançada se sua busca for adotada como um dever social de todos, em uma rede de
proteção integral.

51
Referências

ABRAPIA. Maus tratos contra crianças adolescentes: proteção e prevenção. Guia de


orientação para profissionais de saúde. Rio de Janeiro: Autores e Agentes e Associa-
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FALEIROS, Eva T. Silveira. Repensando os conceitos de violência, abuso e exploração


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lização do Abuso Sexual de Crianças e de Adolescentes no Distrito Federal. São Paulo:
Veras, 2001.

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FALEIROS, Vicente. Redes de Exploração e Abuso Sexual e redes de Proteção. Brasília,


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2006.

53
Trabalho
Infantil
Exploração
do trabalho
de crianças e
adolescentes

N
este capítulo abordaremos o trabalho de crianças e adolescentes, dando
ênfase aos direitos da infância e da juventude. Para erradicar o traba-
lho infantil, a principal medida que vem sendo adotada é a de atribuir
prioridade à educação. O direito à educação integral e de qualidade
pode garantir a crianças e adolescentes o direito fundamental de viver as experi-
ências desse período de sua vida como uma consolidação do desenvolvimento do
potencial e das capacidades humanas.

Uma reflexão sobre as possibilidades


e os limites da legislação
A questão jurídica acerca do trabalho de crianças e adolescentes é definida
na Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança, adotada em 20 de
novembro de 1989, na Consolidação das Leis do Trabalho de 1943, na Consti-
tuição Federal de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990 e na
Lei 10.097/00 sobre o adolescente aprendiz. O Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente (CONANDA), juntamente com o Fórum Nacional de
Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, também estabeleceu, em 2000, dire-
trizes para o enfrentamento do problema, e, em 2004, foi feito um Plano Nacional
de Erradicação do Trabalho Infantil e de Proteção do Trabalho do Adolescente pela
Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (CONAETI), reativada
pela Portaria nº 952 de julho de 2003 do Ministério do Trabalho e Emprego.
Apesar de todo esse amparo legal, crianças e adolescentes brasileiros conti-
nuam trabalhando, com a conivência de grande parte da opinião pública. Cultu-
ralmente, o uso da mão-de-obra infanto-juvenil tem sido socialmente aceito sob a
justificativa de atender às necessidades de aumento da renda familiar e de educar as
crianças pela disciplina do trabalho.

Um pouco da história do trabalho de crianças


e adolescentes no Brasil
No Brasil, instituiu-se a idade mínima de 12 anos para a entrada no mercado
de trabalho em 1891. As Constituições de 1934, 1937 e 1946 ampliaram a idade
mínima para 14 anos. Porém, em 1967, em plena ditadura militar, o limite foi redu-
zido novamente para 12 anos. Atualmente, a Constituição Brasileira determina que
a idade mínima para a entrada no mercado de trabalho é de 16 anos. O trabalho
noturno, perigoso ou insalubre (que pode ocasionar doenças) é permitido apenas a
maiores de 18 anos. Apenas na condição de aprendiz o adolescente pode exercer
trabalho remunerado, dos 14 aos 16 anos, com direitos trabalhistas garantidos, em
jornada e regime especificados na lei. Nos termos do art. 10 da Lei nº 10.097/2000,
“É proibido empregar menores de dezesseis anos de idade, salvo na condição de
aprendiz, a partir dos quatorze anos.”
Nos últimos cem anos, têm sido tênues as iniciativas concretas no sentido de
combater ou impedir a exploração do trabalho infanto-juvenil. É preciso indagar em
que medida essa prática estaria expressando resquícios da ideologia escravocrata.
Qualquer iniciativa que vise à superação dos efeitos do trabalho escravo ain-
da presentes em nossa sociedade deverá necessariamente levar em conta o passado
escravocrata, pois é lá que surgem algumas das explicações para a aceitação com
grande naturalidade da exploração da força de trabalho de crianças e adolescentes.
Afinal, esse foi um aprendizado que se deu no cotidiano das relações entre senhores
e negros, escravizados e libertos.
Alguns dados sobre o trabalho infantil no final do século XIX e no início do
século XX em São Paulo ajudam a dimensionar o que pode ter significado o iní-
cio do processo de industrialização para os pequenos operários. Em 1890, do total
de empregados em estabelecimentos industriais, 15% eram formados por crianças

58
e adolescentes. Nesse mesmo ano, o Departamento de Estatística e Arquivo do
Estado de São Paulo registrava que ¼ da mão de obra empregada no setor têxtil
da capital paulista era formada por crianças e adolescentes. Vinte anos depois, esse
equivalente já era de 30%, segundo dados do Departamento Estadual do Trabalho.
Já em 1919, segundo o mesmo órgão, 37% do total de trabalhadores do setor
têxtil eram crianças e jovens; e, na capital paulista, esses índices chegavam a 40%.
Mas não só na indústria havia exploração do trabalho infantil. De modo geral, as
cidades, apesar dos baixos salários, ofereciam mais oportunidades de trabalho, in-
clusive informais, como os de vendedor ambulante, engraxate e jornaleiro. Assim, o
espaço urbano representava um atrativo para a família inteira migrante do campo,
pois acenava com a possibilidade de emprego para os adultos e seus filhos. Entre
os operários, de uma maneira geral, o salário pago às crianças era entendido como
forma de complementar o orçamento familiar. No entanto, ao contrário dessa ex-
pectativa, o agenciamento de mão-de-obra de crianças e adolescentes pressionava
para baixo os salários dos trabalhadores adultos.
Para Russ, o trabalho pode ser compreendido como uma “atividade cons-
ciente e voluntária, pela qual o homem exterioriza, no mundo, fins destinados a
modificá-lo, de maneira a produzir valores ou bens sociais ou individualmente úteis
e satisfazer, assim, suas necessidades”. No entanto, pelo que se conhece da evolução
das formas de trabalho ao longo do tempo, pode-se afirmar que essa definição vale
mais para algumas sociedades do que para outras.
Ao mesmo tempo em que modificam o mundo pelo trabalho, os seres hu-
manos também se modificam, estabelecendo relações entre si, criando e renovando
culturas. Nesse sentido, o trabalho desenvolve capacidades do indivíduo e contribui
para seu desenvolvimento como ser humano. Por outro lado, o modo pelo qual
uma determinada sociedade se organiza para o trabalho e o tipo de relações que se
estabelecem na produção podem também levar à desumanização e à alienação do
ser humano.
Há trabalhos que embrutecem e deformam, além de não proporcionarem
condições para o ser humano escapar da situação de penúria e privação na vida
pessoal, familiar e social. É fácil incluir o trabalho infantil nessa última perspectiva.
A entrada precoce de crianças e adolescentes no mercado de trabalho, nas condições
atuais e históricas do capitalismo no Brasil, exemplifica bem essa perspectiva.

 RUSS, Jacqueline. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Scipione, 1994. p.297.

59
Trabalho de crianças e adolescentes no Brasil atual
Algumas formas de exploração do trabalho de crianças e adolescentes, como
a prostituição e a participação no tráfico de drogas, são especialmente trágicas. No
primeiro caso, o machismo que impera em amplos setores da sociedade favorece o
acobertamento e a tolerância dessa prática infame em muitas regiões; no segundo, a
falta de perspectiva, a escassez de recursos e a desesperança têm levado milhares de
crianças e adolescentes ao circuito do crime organizado, vislumbrando possibilida-
des de ganhos fáceis e imediatos.
Crianças e adolescentes envolvidos na prostituição e no tráfico de drogas
tornam-se ao mesmo tempo autores e vítimas de ações violentas, como tem sido
verificado em estatísticas sobre jovens infratores e sobre mortes em chacinas. Em
ambos os casos, crianças e adolescentes são expostos a todos os riscos que a vida
oferece nessas condições, sendo o pior deles o da perda do senso de dignidade da
existência humana.
Necessidade, oportunismo e incompreensão mesclam-se para explicar o tra-
balho precoce. A situação de pobreza obriga os pais tanto a utilizar os filhos como
mão-de-obra doméstica, quanto a oferecê-los no mercado de trabalho para aumen-
tar a renda familiar. Como uma das expressões da pobreza e da injusta distribuição
de renda, o trabalho infantil sempre se fez presente em nossa sociedade.
A década de 1980 foi marcada por grande instabilidade econômica, fazendo
com que o Brasil entrasse nos anos 1990 com um dos piores desempenhos entre os
países pobres do Terceiro Mundo no que diz respeito ao enfrentamento da pobreza
e da distribuição de renda.
A década de 1990 foi decisiva para o início do movimento contra o trabalho
infantil, tanto para a mobilização da sociedade civil como para a implementação de
políticas públicas de assistência social. Em 1992, o número de crianças e adolescen-
tes exercendo algum tipo de atividade econômica era de 9,7 milhões. A estimativa
do total de crianças e adolescentes (10 a 17 anos) trabalhando no Brasil em 1998 é
de 7,7 milhões. Isso aponta uma tendência de redução que, embora deva ser cele-
brada, é, no entanto, muito lenta ainda.
Em 2001, havia, segundo o IBGE, 5.482.515 pessoas ocupadas na faixa etá-
ria de 5 a 17 anos, sendo 3.570.216 homens e 1.912.299 mulheres. Do total, 45,2%
são empregados ou trabalhadores domésticos, 6,2% trabalham por conta própria e
41,2% são não remunerados. 37,4% são trabalhadores para o próprio consumo ou
na construção para o próprio uso (IBGE, 2003). Cabe notar que, em 2001, 31,5%

60
dos adolescentes na faixa etária de 15 a 17 anos estavam trabalhando; 11,6%, na
faixa de 10 a 14 anos; 1,8%, na faixa de cinco a nove anos, com maior participação
de meninos que de meninas.
Para conhecer melhor o fenômeno do trabalho precoce, é preciso desagregar
os dados por faixa etária. Os indicadores sobre a participação de crianças na força
de trabalho mostram que essa participação:
• cresce com a idade;
• é maior entre os meninos do que entre as meninas (com a ressalva da invi-
sibilidade e maior dificuldade de estimativa do trabalho doméstico);
• decresce com o aumento do nível de renda das famílias onde estão inseridas; e
• é mais elevada na área rural do que na urbana.

Trabalho infanto-juvenil por grupos de idade

Dos 5 aos 9 anos


Foi somente em 1993 que o Brasil assumiu oficialmente a existência de
crianças trabalhadoras com idades entre cinco e nove anos, em diferentes tipos de
trabalho e em diversos estados brasileiros. Esse reconhecimento tardio trouxe graves
conseqüências para a vida das crianças, se levarmos em conta que o país já dispunha
de legislação trabalhista regulamentando o acesso ao trabalho, além do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), promulgado em 1990.
Dados de 1995 mostravam que 3,6% (581.300) das crianças entre cinco e
nove anos trabalhavam no país, com uma jornada média semanal de 16,2 horas.
A maior parte (79,2%) do trabalho nessa faixa etária ocorria em ocupações típicas
da agricultura (três quartos dos chefes de família dessas crianças ocupavam-se em
atividades agrícolas), especialmente na pequena produção familiar, e predominan-
temente nos estados do Nordeste. Os dados de 1999 já mostram que o número
de crianças de cinco a nove anos trabalhando caiu para 375.000. Em 2001, havia
296.705 crianças ocupadas no trabalho.

 IBGE. Trabalho Infantil-2001. Rio de Janeiro: IBGE, 2003.


 IBGE, 2003. op. cit.

61
Dos 10 aos 14 anos
O número e a proporção de crianças trabalhadoras elevam-se substancial-
mente na faixa dos 10 aos 14 anos. Desta faixa etária, o contingente dos que traba-
lhavam em 1995 representava 18,7% (3,3 milhões), composto majoritariamente por
meninos (87,4%). Novamente, mais da metade (54,6%) moravam em áreas rurais.
Em 1999, esse contingente havia baixado para 2,5 milhões – 16,6% do total de
crianças e jovens entre 10 e 14 anos –, o que indicava uma tendência à redução.
Os meninos são mais precocemente empurrados para o trabalho do que as
meninas, em todo o país. No entanto, o trabalho infantil feminino doméstico é uma
das formas de trabalho mais difundidas e menos pesquisadas, devido a sua pouca
visibilidade. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD de
1998 mostram que quase 400 mil meninas na faixa de 10 a 16 anos trabalhavam
como empregadas domésticas. Em 2001, contavam-se 1.935.269 crianças e ado-
lescentes no trabalho na faixa de 10 a 14 anos. A regra geral é não terem carteira
assinada, e sua remuneração, em média, não chega a um salário mínimo.

No campo e na cidade
No item anterior você pôde vislumbrar um quadro geral do trabalho in-
fantil na história do Brasil e sua continuidade nos dias atuais. A seguir, você vai
conhecer um pouco mais da realidade de crianças e adolescentes brasileiros nos
diversos ambientes.
Conhecer a realidade do trabalho infantil implica conhecer também as con-
dições desumanas em que ele ocorre. As crianças trabalhadoras desenvolvem ati-
vidades penosas, perigosas, em ambientes insalubres – no mais, inadequadas tam-
bém para adultos. Vários desses aspectos podem ser mais facilmente identificados
no campo, na cultura da cana de açúcar, nas carvoarias, no sisal e nas pedreiras,
dentre outros.
Diversas informações sobre o trabalho infantil no Brasil foram colhidas por
fiscais das Delegacias Regionais do Trabalho e publicadas no Mapa de Indicativos
do Trabalho da Criança e do Adolescente. Algumas das atividades eram caracte-
rísticas de determinados estados brasileiros, e muitas delas infelizmente perduram
até hoje.
 BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria de Inspeção do Trabalho. Mapa de indicativos do
trabalho da criança e do adolescente. Brasília, 1999.

62
Segundo os levantamentos, milhares de crianças e jovens trabalhavam nos
canaviais e no engenho, principalmente em Alagoas, Bahia e São Paulo. Na safra,
faziam o corte da cana, ajudavam a transportar os feixes para o engenho e traba-
lhavam no cozimento do caldo da cana. Na entressafra, ajudavam os pais a limpar
o canavial. Esse tipo de trabalho expunha esses jovens a vários riscos de acidentes
– lesões por facão ou foice, queimaduras, picadas de cobras. Além disso, o transporte
até o local de trabalho era feito em veículos inadequados. As jornadas eram longas,
os salários baixíssimos e a situação era agravada pela falta de alimentação, de água
potável e de instalações sanitárias adequadas.
Sob o calor do sol e dos fornos que queimavam lenha para fazer carvão,
centenas de crianças e jovens trabalhavam em carvoarias, principalmente nos esta-
dos da Bahia, Goiás e Minas Gerais. Seu trabalho era encher os fornos com lenha,
fechá-los com barro e, depois, retirar o carvão. Ainda ajudavam no corte das árvores
para fornecer a lenha, no ensacamento do carvão e no carregamento dos caminhões.
Fumaça e calor faziam parte do ambiente de trabalho. A jornada excessiva, o traba-
lho noturno e a exposição a variações bruscas de temperatura comprometiam a saú-
de. Crianças e adultos trabalhavam sem proteção alguma e sem descanso semanal.
Em algumas localidades do Mato Grosso do Sul, constatou-se a existência
de trabalho semi-escravo, ou seja, a empresa fornecia alimentos e descontava seu
valor sem apresentar notas; na hora do acerto de salário, muitos trabalhadores ainda
ficavam devendo à empresa.
No sertão da Bahia e da Paraíba, crianças e adolescentes trabalhavam nas
plantações de sisal: cortavam as pontudas folhas e carregavam-nas para a máquina
de desfibrar, transportando também a fibra processada para a secagem. Nesse tra-
balho, não raro sofriam mutilações pelo uso da máquina e ainda eram expostos ao
ruído excessivo e à alta concentração de poeira.
Detectado em 12 estados brasileiros, dentre os quais estão Alagoas, Bahia e
São Paulo, o trabalho de crianças e adolescentes em pedreiras lembra os trabalhos
forçados que prisioneiros eram obrigados a realizar no passado. As crianças traba-
lhavam a céu aberto, em meio a explosões de rochas, provocadas com cartuchos
de pólvora. Com marretas e talhadeiras, quebravam os blocos de pedras sob o sol,
num esforço físico excessivo para suas idades. Também trabalhavam no polimento
e carregamento de pedras, inalando pó o tempo inteiro. A jornada era excessiva, o
trabalho, insalubre, ninguém usava óculos ou qualquer outro meio de proteção.

 HUZAK, Iolanda, AZEVEDO, Jô. Crianças de fibra. 3.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000. p.22.

63
Nos centros urbanos, o trabalho infantil é visível nas ruas e, especialmente,
nos depósitos de lixo. Crianças e adolescentes recolhem garrafas, latas, plástico e
papel para reciclagem e convivem com materiais contaminados e gases de fermen-
tação dos dejetos. Alimentam-se em meio a enxames de moscas. Além do que reco-
lhem para venda, costumam selecionar alimentos e objetos reaproveitáveis para uso
próprio. Com o que vendem, crianças conseguem obter a quantia de no máximo
R$ 2,00 por dia. É comum encontrar famílias inteiras trabalhando, numa jornada
ininterrupta, sem descanso semanal ou qualquer vínculo empregatício.
Pequenos trabalhadores nas cidades vêem-se por toda parte. São vendedores
de picolé, fruta, cigarro, biscoito, doces e balas; são guardadores de carro, jornaleiros
ou engraxates, dentre outras tantas atividades. Vendendo produtos diversos entre
veículos em congestionamentos, pontos de ônibus, em frente a centros comerciais
ou estádios de futebol, eles fazem parte da paisagem urbana, sendo por muitas vezes
vistos como estorvo ou mesmo como futuros marginais.
A rua é um local de trabalho cruel e perigoso: as relações que se estabelecem
com outros atores sociais (adultos agenciadores, policiais, traficantes e adultos de
rua) em muitos casos põem em risco sua vida. Além disso, esses meninos e meninas
fazem longos percursos a pé, alimentam-se de maneira e em horários inadequados
e, por vezes, trabalham em locais e horários impróprios para a idade, como bares ou
boates, à noite.
Nas cidades, além dos lixões e do trabalho nas ruas, outra forma de inserção,
menos visível, é o emprego doméstico e em pequenos empreendimentos (lojas, fá-
bricas e escritórios familiares ou de pequeno porte). Para os empregadores, o traba-
lho infantil apresenta-se como recurso barato e sem necessidade de regularização.
Embora talvez cause menor impacto, esse trabalho não perde suas características
e condições de exploração, exposição a riscos e prejuízo ao desenvolvimento das
crianças e jovens.
O trabalho doméstico, realizado geralmente por meninas, constitui freqüen-
temente uma forma de exploração oculta, como mencionado anteriormente. Na
maioria das vezes, as condições de vida e trabalho são inadequadas, muitas meninas
dormem no emprego – condição que favorece uma jornada de trabalho extrema-
mente alongada – e muitas chegam a sofrer humilhações e abusos sexuais.
Em 2001, o IBGE constatou a existência de 494.002 crianças e adolescentes
no trabalho doméstico, sendo 45,1% na faixa etária de cinco a 15 anos, ou seja, em

 HUZAK; AZEVEDO, 2000. Op. Cit. p.81.

64
situação de ilegalidade. É um tipo de trabalho existente em todo território nacional,
em condições de grande exploração, sem registro formal, em condições de humilha-
ção e muitas vezes de violência.
A PNAD de 2002 constatou o significativo número de cerca de três milhões
de trabalhadores infantis em situação ilegal, o que representava 8,2% de taxa de
trabalho de crianças e adolescentes.

O trabalho em sociedades indígenas brasileiras


Em muitas sociedades indígenas brasileiras, trabalhar é aprender a fazer jun-
to, pois o trabalho se caracteriza como momento de troca de experiência entre os
membros do grupo. O trabalho constitui assim importante aspecto da vida comuni-
tária de muitas sociedades indígenas, fornecendo as bases de uma organização social
de tipo igualitária, em que a família funciona como unidade básica de produção,
acumulando e trocando os conhecimentos indispensáveis à subsistência de todos os
seus membros.
A organização baseia-se na divisão sexual do trabalho: há tarefas masculinas
e tarefas femininas. Essa divisão do trabalho leva em consideração não só as tarefas
a serem realizadas, mas principalmente a idade e as condições físicas de seus parti-
cipantes, como uma forma de protegê-los.
Nas sociedades indígenas, essa aprendizagem visa propiciar à criança a apro-
priação de todos os conhecimentos de que necessitará em sua vida adulta. Para
uma criança ou adolescente indígena, fazer parte de uma família, e, portanto, de
uma unidade de produção, significa ser membro da sociedade. E isso quer dizer ter
funções e responsabilidades compartilhadas com as demais pessoas com as quais
convive, como produzir alimentos, confeccionar adereços e objetos artesanais para
o uso cotidiano, ritual e festivo, construir a própria habitação, participar da vida co-
munitária. Produção, família e sociedade acham-se articuladas e se orientam pelos
mesmos propósitos, o que faz com que educação e vida caminhem juntas.
Educar, nas comunidades indígenas, tem um sentido amplo. Significa ensinar
e aprender pela vivência direta nas várias situações cotidianas: saber é saber fazer.
Dessa forma, o aprendizado para o trabalho é incorporado nas práticas coletivas que
são, em si, educativas; em outras palavras, o trabalho integra o processo de socializa-
ção das crianças e jovens indígenas.

 IBGE, 2003. op. cit.

65
Segundo Kaka Werá Jecupé ( 1998) entre os índios guaranis
[...] o domínio sobre si mesmo começa na infância: as crianças
são conscientizadas da diferença entre alimentação e gula. Os ri-
tos de passagem criança-jovem-adulto têm por finalidade ética
atentar para o domínio dos reflexos, dos sentidos, dos desejos e
paixões. Nunca tais ritos tiveram ou têm por premissa a repressão
e sim o desafio de viver no espaço da liberdade. Por isso, não
se castigam os filhos, mas estimulam sua liberdade individual e
contam com o ciclo do tempo e das estações internas do ser para
aos poucos mostrar-se a responsabilidade da liberdade.

Trabalho infantil e o direito à infância


O trabalho na infância marca, quando não destrói, a vida digna e saudável
de crianças e jovens, tratados como se não tivessem direito a ter direitos, mesmo os
mais fundamentais.
A exploração brutal e os riscos de vida a que estão sujeitos os trabalhadores
infantis são flagrantes, como exemplifica esta descrição das condições de trabalho
experimentadas por um menino, numa pedreira no interior do Ceará:
O lugar não é para brincadeiras. Usa-se cartucho de pólvora
para fragmentar a pedra; lascas de pedra e aço dos instrumentos
voam para todo lado e inala-se pó o tempo inteiro. Ninguém
usa óculos nem qualquer outro equipamento de proteção. Aci-
dentes são rotina. [...]
No povoado de Taquara [...], Francisco, 11 anos, quebrava pedra como to-
dos os meninos: sentado no chão, no meio da poeira levantada pelas explosões a
dinamite, pelo entra-e-sai dos caminhões e sob o sol escaldante. Martelava pedra
com uma marreta, sobre uma pedra almofariz. Para cada carrinho de cinco metros
cúbicos de brita, Francisco recebe o equivalente a pouco mais de dez centavos de
dólar. Ele produz 20 carrinhos por semana; se a mãe vem junto, a produção chega
a 60 carrinhos.
Em todos os países que lutam pela eliminação do trabalho infantil, é consen-
so que a pobreza é a principal causa do ingresso precoce de crianças no mundo do

 JECUPÉ, Kaka Werá. A terra dos mil povos. História indígena do Brasil contada por um índio. São Paulo:
Peirópolis, 1998. p.93.
 HUZAK; AZEVEDO, 2000. Op. Cit. p.100.

66
trabalho. As famílias empobrecidas muitas vezes não encontram alternativas a não
ser buscar a complementação de renda por meio do trabalho dos filhos. Portanto, o
combate a essa forma de exploração não pode ser dissociado de outras políticas que
tenham como objetivo intervir na diminuição da pobreza.
Uma das maneiras de agir na busca da redução da pobreza é propiciar mais
e melhor educação às camadas pobres. Estudos recentes demonstram que o baixo
índice de escolaridade da população gera e realimenta as desigualdades sociais e a
concentração de renda. Investir na educação básica é uma estratégia para reduzir as
desigualdades e melhorar a qualidade de vida da população.10
No Brasil, a luta pela prevenção e eliminação do trabalho infantil está cen-
trada na garantia do direito à educação básica e associada a outras ações, como a
complementação da renda familiar e a implantação e desenvolvimento de progra-
mas sócio-educativos no período complementar à escola.
O Brasil é signatário da Declaração Mundial de Educação para Todos, con-
solidada em Jomtien em 199011, que aponta para a necessidade de a educação estar
apoiada numa concepção de aprendizagem que contemple o aprender a conhecer,
a fazer, a conviver e a ser. A perspectiva é a de que os cidadãos acessem e apreen-
dam os conhecimentos construídos e acumulados socialmente, que compreendam e
atuem criticamente não só na realidade social mais próxima, como também na mais
ampla, no sentido de modificação, preservação ou ampliação das conquistas sociais.
Trata-se, portanto, de incorporar os conhecimentos à própria prática, ao pró-
prio fazer do dia-a-dia. Para isso, é necessário desenvolver competências pessoais
que envolvam flexibilidade, criatividade e predisposição para um contínuo processo
de aprendizagem. Desenvolver plenamente o potencial presente em cada criança
não é tarefa somente da escola, mas da família e da sociedade como um todo.
Os programas sócio-educativos que se desenvolvem no contra-turno da esco-
la têm a função de criar oportunidades para que crianças de famílias de baixa renda
pratiquem esportes, desenvolvam atividades artísticas e culturais e competências so-
ciais, brinquem e tenham seu estudo acompanhado. A intenção não é a de substituir
ou repetir o que a criança faz na escola, mas complementar e enriquecer a educação
que ela recebe de seus professores e de sua família.
Complementar a educação das crianças é contribuir para a maior eqüidade
nas oportunidades educacionais. Assim, parte dos esforços para combater o trabalho

10 BARROS, Ricardo P., MENDONÇA, Rosane S. P. Determinantes da participação de menores na força de


trabalho. Brasília: IPEA, 1990.10 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA
E A CULTURA – UNESCO, Declaração Mundial de Educação para Todos, Jomtien, Tailândia, 1990.
11 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA – UNESCO,
Declaração Mundial de Educação para Todos, Jomtien, Tailândia, 1990.

67
infantil deve ser destinada a fortalecer essas ações complementares à escola. Nessa
perspectiva é que se justifica a luta por uma escola de qualidade, que garanta o
ingresso, regresso, permanência e sucesso da criança e, ao mesmo tempo, a luta por
espaços, públicos ou não, que ofereçam oportunidade de prática de esportes, arte,
cultura e lazer.

Combate ao trabalho de crianças e adolescentes


De acordo com Faleiros e Pranke12 a política de combate ao trabalho de
crianças e adolescentes foi constituída a partir de uma Rede Nacional de Com-
bate ao Trabalho Infantil, composta por fóruns e comissões estaduais de todo o
país. O Ministério Público do Trabalho vem contribuindo para promover todas as
articulações. Uma das características principais do Fórum é a presença de atores
governamentais e da sociedade, aos quais pode se agregar a escola. Destacam-se:
empresários, sindicalistas urbanos e rurais, agências internacionais, movimentos so-
ciais, organizações não governamentais e o próprio governo.

Organizações mobilizadas no combate ao trabalho infantil


• Empresas envolvidas: empresa amiga da criança da Fundação Abrinq –
1600 empresas cadastradas em 1999;
• Fóruns de Erradicação do Trabalho Infantil;
• Fórum Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI) - foi cria-
do em 1994 e contava com 43 entidades em 1999 e com 73 em 2004;
• Fóruns em quase todas unidades da Federação;
• OIT/IPEC - Programa Internacional de Eliminação do Trabalho In-
fantil, 1992;
• Marcha Global – pela erradicação do trabalho infantil – 1998;
• CONTAG – a partir de 1993 (parceria com a OIT), com predominância
para o Programa de Ações Integradas (PAI) na zona do sisal, na Bahia;
• CNTE realiza pesquisa sobre trabalho infantil em 1996;
• CUT- Secretaria de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, 1992;
12 Esta sub-unidade foi adaptada da síntese produzida por Faleiros e Pranke. O uso deste material foi autor-
izado pelos autores. FALEIROS, Vicente e PRANKE, Charles (Coords). Estatuto da Criança e do Adoles-
cente- uma década de direitos. Campo Grande: Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, 2001.

68
• Em 1994, o 5º Congresso inclui o tema “Do Direito da Criança e do Adolescente”;
• Membro do CONANDA em 1992 e ação com o DIEESE;
• UNICEF e UNESCO.
É fundamental destacar a emergência de uma nova cultura social em relação
ao trabalho de crianças e adolescentes, que passou da defesa de sua inserção no
trabalho à defesa da erradicação desse trabalho.
No século XIX, a revolução industrial colocou a infância nas fábricas, com
horas extensas, trabalhos intensos, salários reduzidos e condições insalubres.13
Somente em 1833 é que o Factory Act limitou, na Inglaterra, o trabalho dos
adolescentes de 13 a 18 anos a doze horas diárias e o de 9 a 13 anos a oito horas
diárias, fixando-se a proibição do trabalho abaixo dos nove anos, assim como o
trabalho noturno.14
Para compensar a retirada de certo número de crianças e adolescentes do tra-
balho, a indústria adotou o sistema de turnos. Da limitação e proteção do trabalho
das crianças, um dos primeiros freios à exploração capitalista, passou-se à luta por
sua eliminação, que é um dos objetivos centrais da Organização Internacional do
Trabalho, através do IPEC.
A passagem do paradigma da proteção do trabalho ao paradigma da erra-
dicação do trabalho infantil ainda está em processo, pois a própria OIT prioriza a
abolição do trabalho infantil em situações especialmente perigosas, como o trabalho
escravo, em minas e em ocupações que prejudicam a saúde ou a moral, como a
prostituição, o corte de cana e as carvoarias.
No Brasil, o trabalho de adolescentes vem sendo regulado pela Consolidação
das Leis do Trabalho de 1943, hoje com várias propostas de modificação no Con-
gresso Nacional. Na CLT, está clara a perspectiva de proteção, e cabe aos órgãos
fiscalizadores do Ministério do Trabalho controlar a aplicação da Lei.
Quanto à legislação, cabe destacar, nos últimos dez anos, além da ratificação
das referidas convenções, a promulgação da Lei 9854, de 27/10/99, que obriga as
empresas que queiram participar de licitações públicas ao cumprimento das garan-
tias dispostas no Art. 7, inciso XXXIII da Constituição Federal.
13 MARX, Karl, O Capital, Livro I. Editora Abril: São Paulo 1976.13 O limite de oito horas diárias para menores
de 13 anos só veio em 1836.
14 O limite de oito horas diárias para menores de 13 anos só veio em 1836.

69
Legitimadas por um expressivo e qualificado grupo de 190 pessoas da área,
reunidas pela OIT em Brasília em maio de 2000, as Diretrizes para Formulação de
uma Política Nacional de Combate ao Trabalho Infantil são listadas a seguir.
Eixos básicos das diretrizes de combate ao trabalho infantil
1. Integração e sistematização de dados sobre o trabalho infantil;
2. Análise do arcabouço jurídico relativo ao trabalho infanto-juvenil;
3. Promoção da articulação institucional quadripartite (Governo, Organiza-
ções de Trabalhadores e de Empregadores, e Organizações Não governa-
mentais);
4. Garantia de uma escola pública de qualidade para todas as crianças e ado-
lescentes;
5. Implementação dos efetivos controle e fiscalização do trabalho infantil;
6. Melhoria da renda familiar e promoção do desenvolvimento local integra-
do e sustentável.
Como se pode observar no quadro acima, a garantia de escola pública de
qualidade para todas as crianças e adolescentes é um dos eixos centrais no enfren-
tamento do trabalho infantil. Não menos importante é mudar a cultura segundo
a qual o trabalho da criança cria hábitos saudáveis de disciplina, ajuda a formar o
caráter e as faz “ser alguém na vida”. Colocar e manter as crianças na escola traz
melhores resultados do que fazê-las arriscar a vida, a saúde e o futuro no trabalho.
Além disso, a criança não pode ser responsabilizada pelo sustento dos pais
ou responsáveis. Eles é que são responsáveis pelo sustento das crianças. O programa
Bolsa Família, que tem como uma de suas origens o Bolsa Escola, tem como um
dos requisitos de concessão a inclusão escolar das crianças.
O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), implantado em
1996, tem três dimensões integradas: concessão de Bolsa Criança Cidadã, a manu-
tenção da jornada ampliada e o trabalho junto às famílias.
Além do programa PETI, existe o Programa Sentinela, destinado a combater
o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes. Trata-se de serviço espe-
cializado e continuado de enfrentamento ao abuso e à exploração sexual de crianças
e adolescentes que atua com vistas a construir, em um processo coletivo, a garantia
de seus direitos fundamentais, o fortalecimento da sua auto-estima e o restabeleci-

70
mento do seu direito à convivência familiar e comunitária, em condições dignas.
Efeitos perversos do trabalho infantil
O trabalho precoce de crianças e adolescentes interfere diretamente em seu
desenvolvimento:
• físico – porque ficam expostas a riscos de lesões, deformidades e doenças,
muitas vezes superiores às possibilidades de defesa de seus corpos;
• emocional – podem apresentar, ao longo de suas vidas, dificuldades para
estabelecer vínculos afetivos em razão das condições de exploração a que
estiveram expostas e dos maus-tratos que receberam de patrões e emprega-
dores;
• social: antes mesmo de atingir a idade adulta, realizam trabalho que re-
quer maturidade de adulto, afastando-as do convívio social com pessoas
de sua idade.
Ao mesmo tempo, ao ser inserida no mundo do trabalho, a criança é impedi-
da de viver a infância e a adolescência, deixando de exercer seus direitos. O traba-
lho priva crianças e adolescentes da vivência de experiências fundamentais para seu
desenvolvimento e compromete seu bom desempenho escolar, condição necessária
para a transformação dos indivíduos em cidadãos capazes de intervir na sociedade
de forma crítica, responsável e produtiva. Entre as crianças que trabalham há maior
repetência e abandono da escola.

Os direitos de crianças e adolescentes


Os direitos de crianças e adolescentes são assegurados pela Constituição
Brasileira e especificados no Estatuto da Criança e do Adolescente. O Estatuto
assegura a toda criança e adolescente os direitos básicos de viver, de desenvolver-se
saudavelmente, de educar-se e de receber proteção. Pensar a infância e a adolescên-
cia nessa perspectiva significa reconhecer que crianças e adolescentes necessitam de
atendimento e cuidados especiais para se desenvolver plenamente e que essas neces-
sidades constituem direitos do conjunto desse segmento social, sem discriminação
de qualquer tipo.
O principal objetivo do Estatuto é especificar os direitos de crianças e ado-
lescentes no que diz respeito à vida e à saúde, à liberdade, ao respeito e à dignidade,
à educação, cultura, esporte e lazer, e à profissionalização e proteção no trabalho.

71
Além disso, explicita claramente a condenação legal contra toda e qualquer forma
de ameaça ou violação desses direitos, sob forma de violência, exploração, discrimi-
nação ou negligência, responsabilizando o Poder Público pela implementação de
políticas sociais “que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmo-
nioso, em condições dignas de existência” (Art. 7º).
O Estatuto também assegura a crianças e adolescentes o direito à convivência
comunitária e familiar, à livre expressão de opiniões e crenças, o direito de brincar,
de praticar esportes e de se divertir. Cabe aos adultos preservar-lhes a integridade
física, moral e psíquica, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violen-
to ou constrangedor.
Cabe ao Estado oferecer ensino fundamental, obrigatório e gratuito, bus-
car a progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade para o ensino médio,
além de assegurar a oferta de creche e pré-escola para as crianças de até seis anos.
O Estatuto determina ainda que sejam oferecidos, ao adolescente trabalhador,
ensino noturno regular e atendimento especializado para os portadores de neces-
sidades especiais, estabelecendo a obrigação dos pais de matricular seus filhos na
escola e definindo como direito dos responsáveis a participação na definição das
propostas educacionais.
No que se refere ao trabalho de crianças e adolescentes, os artigos 60 a 69
do ECA são inteiramente dedicados ao tema. A legislação determina a idade mí-
nima de 16 anos para o ingresso no trabalho. O trabalho da criança de zero a 14
anos permanece terminantemente proibido. Ao adolescente entre os 14 e 16 anos
é facultado o trabalho na condição de aprendiz. Ao ingressar em um emprego, o
adolescente maior de 16 anos tem todos os direitos assegurados ao trabalhador na
CLT. O emprego doméstico somente pode ser efetivado, portanto, a partir dos 16
anos, com todos os direitos assegurados ao empregado.
O Estatuto determina, porém, em seu artigo 68, sobre o trabalho educativo,
que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do edu-
cando prevaleçam sobre o aspecto produtivo. A única possibilidade de trabalho sem
vínculo de emprego para o adolescente é a condição de estagiário, mas essa forma
de aprendizagem profissional é regida por legislação específica, que exige, entre ou-
tras coisas, que haja compatibilidade entre a atividade do estágio (“parte prática”)
e o horário escolar (“parte teórica”). A jornada de estágio não deve ultrapassar seis
horas diárias, o que objetiva priorizar a freqüência à escola diurna.
Para fazer valer os direitos que arrola, o Estatuto também determina a criação

72
de um sistema de garantia de direitos e de proteção integral, o que significa dizer
que não apenas descreve os direitos, mas cria mecanismos para que os mesmos pos-
sam ser assegurados na prática.
A proteção integral obriga todas as políticas sociais a se articularem para
viabilizar o atendimento às necessidades de crianças e adolescentes. A exigibilidade
torna legítima a defesa comunitária desse atendimento por meio dos Conselhos de
Direitos (nacional, estaduais e municipais) e dos Conselhos Tutelares.
O Estatuto institui, pois, direitos dos quais não podemos abrir mão e tam-
pouco podemos deixar de lutar para sua efetiva implementação.

Alegações usuais para “justificar” o trabalho infantil


Apesar de socialmente condenável e proibido por lei, ainda há quem procure
justificar a necessidade do trabalho infantil. Os argumentos freqüentemente usados
para justificar essa prática devem ser refutados.15 Vejamos:
“Crianças e jovens (pobres) devem trabalhar para ajudar a família a sobreviver”
É a família que deve amparar a criança, e não o contrário. Quando a família
se torna incapaz de cumprir essa obrigação, cabe ao Estado apoiá-la, não às crianças.
O custo de alçar uma criança ao papel de “arrimo de família” é expô-la a danos fí-
sicos, intelectuais e emocionais. É um preço altíssimo, não só para as crianças como
para o conjunto da sociedade, pois, ao privá-las de uma infância digna, de escola
e preparação profissional, reduzimos o valor dos recursos humanos que poderiam
impulsionar o desenvolvimento do país no futuro.
“Criança que trabalha fica mais esperta, aprende a lutar pela vida e tem condições
de vencer profissionalmente quando adulta”
O trabalho precoce nunca foi estágio necessário para uma vida bem-sucedida.
Ele não qualifica e, portanto, é inútil como mecanismo de promoção social. O tipo
de trabalho que as crianças exercem, rotineiro, mecânico, embrutecedor, impede-as
de realizar as tarefas adequadas à sua idade: explorar o mundo, experimentar dife-
rentes possibilidades, apropriar-se de conhecimentos, exercitar a imaginação.
“O trabalho enobrece a criança. Antes trabalhar que roubar”
Esse argumento é expressão de uma mentalidade segundo a qual, para crian-
15 OIT - ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO; CECIP - CENTRO DE CRIAÇÃO DE IMAGEM
POPULAR. Criança que trabalha compromete seu futuro. Brasília: OIT; Rio de Janeiro: CECIP, 1995. Fascí-
culo 1. A luta contra o trabalho infantil: ações da OIT. p.8-9.

73
ças e adolescentes (pobres, pois raramente se refere às das famílias ricas), o trabalho
é disciplinador - como se oferecesse uma solução contra a desordem moral e social
a que essa população estaria exposta. O roubo nunca foi e não é alternativa ao tra-
balho infantil. O lema que deve ser difundido para refutar esse argumento é “antes
crescer saudável que trabalhar”.
O trabalho infantil marginaliza a criança pobre, privando-a das oportuni-
dades que são oferecidas às outras. Sem poder viver a infância de forma adequada,
estudando, brincando e aprendendo, a criança que trabalha não é preparada para
vir a ser cidadã plena e tende a contribuir para a perpetuação do círculo vicioso da
pobreza e da baixa instrução.
Outro argumento presente na sociedade é o de que o “trabalho é um bom
substituto para a educação”. É usado principalmente no caso de crianças com di-
ficuldades no desempenho escolar. Muitas famílias, sem vislumbrar outras possibi-
lidades de enfrentamento das dificuldades, acabam incorporando a idéia de que é
melhor encaminhar seus filhos ao trabalho. Nesse caso, cabe à escola repensar sua
adequação a essa parcela da população, pois a função social da escola em uma socie-
dade democrática é permitir o acesso de todos os alunos ao conhecimento.
O trabalho de crianças e adolescentes, apesar de ainda ser aceito por parce-
la da sociedade brasileira, não tem justificativa. Para erradicá-lo, faz-se necessário
prover as famílias de baixa renda de recursos que assegurem a suas crianças um
desenvolvimento saudável e uma educação de qualidade.
Apesar das proteções legais existentes, os direitos da infância e da juventude
seguem sendo violados e os projetos que focam a proteção integral precisam ainda
consolidar-se com mais efetividade.

74
Referências

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http://www.fundabrinq.org.br/peac/Base/legislacoes/lei10097.htm.
DIEESE – DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E
ESTUDOS SÓCIO-ECONÔMICOS. O trabalho tolerado de crianças até quatorze
anos. Boletim. São Paulo, v.16, n.193, p.6-25, abr.1997.
FALEIROS, Vicente e PRANKE, Charles (Coords). Estatuto da Criança e do Ado-
lescente - uma década de direitos. Campo Grande: Universidade Federal de Mato
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HUZAK, Iolanda, AZEVEDO, Jô. Crianças de fibra. 3ª ed. Rio de Janeiro: Paz e
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IBGE. Trabalho Infantil-2001. Rio de Janeiro: IBGE, 2003.
RUSS, Jacqueline. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Scipione, 1994.
OIT - ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO; CECIP -
CENTRO DE CRIAÇÃO DE IMAGEM POPULAR. Criança que trabalha com-
promete seu futuro. Brasília: OIT; Rio de Janeiro: CECIP, 1995. Fascículo 1. A luta
contra o trabalho infantil: ações da OIT. p.8-9.

75
Considerações
Finais
Redes de
proteção de
crianças e
adolescentes

A
s redes sociais se definem como o compartilhamento de poder e de
recursos humanos e materiais de um conjunto social, formal ou infor-
mal, de atores, grupos e instituições, em um determinado território.
São tecidos sociais que se articulam em torno de objetivos e focos de
ação comuns, cuja teia é construída num processo de participação coletiva e de
responsabilidades compartilhadas, assumidas por cada um e por todos os partícipes.
As decisões são tomadas e os conflitos resolvidos democraticamente, buscando-se
consensos mínimos que garantam ações conjuntas.
A Rede de Proteção de crianças e adolescentes é o conjunto social consti-
tuído por atores e organismos governamentais e não governamentais, articulado
e construído com o objetivo de garantir os direitos gerais ou específicos de uma
parcela da população infanto-juvenil. Como exemplos, podem-se citar a Rede de
Proteção de Adolescentes em Conflito com a Lei, a Rede de Enfrentamento da
Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes e a Rede de Proteção dos Meni-
nos e Meninas de Rua, entre outras. Essas redes podem ter abrangência municipal,
estadual, nacional ou internacional.
Assim como ocorre com o Sistema de Garantia de Direitos, as Redes de
Proteção instaladas em diferentes municípios podem ser muito distintas. A articu-
lação entre organismos com diferentes funções, poderes e recursos pode ser uma ta-
refa de alta complexidade. A construção das redes exige, portanto, muita habilidade,
flexibilidade e persistência.
As Redes de Proteção dos direitos de crianças e adolescentes têm como mar-
co de referência o Sistema de Garantia de Direitos estabelecido no ECA. Como se
verifica no esquema a seguir, a garantia de direitos de crianças e adolescentes é res-
ponsabilidade de múltiplos organismos, governamentais e não-governamentais, em
nível federal, estadual e municipal, com diferentes funções, objetivos e instrumentos
de ação, como veremos a seguir.

 É um conjunto articulado de ações do Governo e da Sociedade Civil, previsto pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente, para garantir a execução de suas determinações. As instituições que integram o SGD são
encarregadas da elaboração, controle e fiscalização das políticas públicas voltadas para a infância e a ado-
lescência. Disponível em: http://www.estacaodajuventude-ba.org.br/transformese.htm. Acesso em: 02 mar.
2006.

80
ECA - Sistema de Garantia de Direitos

FUNÇÕES PROMOÇÃO ATENDIMENTO

• Formular políticas sociais • Manter programas e serviços de


públicas. saúde, educação, assistência,
cultura, profissionalização,
• Propor e destinar recursos
proteção especial.
OBJETIVOS orçamentários.
• Prestar atendimento.
• Gerir Fundos da Criança e do
Adolescente.

• Planejar ações integradas.

• Planejamento. • Execução de programas


e serviços de saúde,
• Dotação orçamentária.
educação, assistência, cultura,
• Plano de aplicação de profissionalização, proteção
recursos dos Fundos da especial.
INSTRUMENTOS Criança e do Adolescente.
• Assistência jurídica.
• Elaborar plano de garantia de
direitos (Conselhos Estaduais
e Municipais).

• Propor e realizar conferências


estaduais e municipais.*

• Secretarias de governo • Secretarias de governo


estaduais e municipais estaduais e municipais
executoras de políticas de
• Conselhos de Direitos da
saúde, educação, assistência,
Criança e do Adolescente
cultura, profissionalização e
(nacional, estaduais e
proteção especial.
ORGANISMOS municipais).
• ONG’s que mantêm programas
• Fundo da Criança e do
de atendimento.
adolescente (nacional,
estaduais e municipais).

* Essas conferências são fóruns de recomendações e avaliação das políticas para a infância e a adolescência
que devem ser realizadas articuladamente nos níveis nacional, estadual e municipal.

81
Continuação
CONTROLE /
VIGILÂNCIA / EXIGIBILIDADE/ DEFESA RESPONSABILIZAÇÃO
FISCALIZAÇÃO

• Acompanhar, fiscalizar • Exigir e defender direitos • Responsabilizar legalmente


e avaliar programas e assegurados em lei. os responsáveis pela
serviços governamentais violação de direitos.
e não-governamentais
da área da criança e do
adolescente.

• Acompanhamento, • Aplicação de medidas • Investigação policial.


fiscalização e avaliação. protetivas e sócio-
• Processo judicial.
educativas.
• Registro de entidades de
• Aplicação de penalidades e
atendimento (Conselhos de • Aplicação de medidas
sanções de natureza civil,
Direitos Municipais) jurídicas e extra-judiaciais
criminal e administrativa.
previstas em lei.

• Requisição de serviços
(Conselhos Tutelares).

• Ministério Público. • Ministério Público. • Delegacias de Polícia e


Delegacias Especializadas
• Conselhos de Direitos. •Conselhos de Direitos.
(da Mulher e DPCA)
• Varas da Infância e da • Conselhos Tutelares.
• Justiça (Varas da Infância
Juventude.
• Defensorias Públicas. e da Juventude, Varas
• Fóruns DCA. Especializadas em
• Varas da Infância e da
Crimes contra Crianças
Juventude.
e Adolescentes e Varas
• Defensorias Públicas Criminais).

• ONGs de defesa de • Centros de Defesa.


direitos.
• Ministério Público.
• Centros de Defesa.
• Defensorias Públicas.

• ONG’s e Universidades
que oferecem assistência
Jurídica

Adaptação por Eva Faleiros do esquema original de Wanderlino Nogueira Neto.

82
Organismos do sistema de garantia dos direitos de
crianças e adolescentes

Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente


Os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente (nacional, estaduais
e municipais) são órgãos do poder executivo, de caráter deliberativo e de compo-
sição paritária (50% dos membros indicados pelo poder público e 50% eleitos pela
sociedade civil), previstos no artigo 88º inciso II do ECA.
Suas principais atribuições são:
• Elaborar os Planos de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente,
indicando as políticas públicas e as ações que garantam a proteção integral
da criança e do adolescente;
• Controlar as ações de atendimento à infância e à juventude;
• Nomear e dar posse aos membros do conselho tutelar;
• Gerir o Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente: fixando os cri-
térios para a aplicação dos recursos e exercendo controle administrativo,
através de um gestor;
• Processar e julgar membros dos Conselhos Tutelares, através da instauração
do competente processo administrativo e disciplinar;
• Fazer a inscrição de programas de proteção e sócio-educativos de entidades
governamentais e não governamentais na forma dos artigos 90º e 91º do
ECA (Conselhos Municipais de Direitos).
Os Conselhos Municipais deliberam no âmbito do município, pautando-se
pelas resoluções do CONANDA (Conselho Nacional) e dos Conselhos Estaduais.

Conselhos Tutelares
Os Conselhos Tutelares são órgãos públicos municipais, previstos no ECA,
cuja missão institucional é zelar pelo cumprimento dos direitos de crianças e ado-
lescentes. Como sua criação gera despesas, cabe ao prefeito a iniciativa de criá-los.
Têm caráter permanente e gozam de autonomia hierárquica no cumprimento de
suas competências e atribuições, ou seja, não estão vinculados nem aos Conselhos
de Direitos nem à Secretaria de governo a que pertencem.

83
Cabe ao Conselho Municipal dos Direitos, sob fiscalização do Ministério
Público (ECA, art. 139º), regulamentar, organizar o processo de eleição de seus
membros pela comunidade e dar posse ao Conselho Tutelar.
Em relação às instituições de saúde e estabelecimentos de ensino fundamen-
tal, o Conselho Tutelar deve ser notificado, obrigatoriamente (Artigos 13º e 56º do
ECA):
a) dos casos de suspeita ou confirmação de maus tratos contra crianças e
adolescentes, sem prejuízo de outras providências legais por parte do de-
nunciante;
b) das situações de reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, após
esgotados os recursos escolares;
c) de elevados níveis de repetência.

Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente


Os Fundos (nacional, estaduais e municipal) dos Direitos da Criança e do
Adolescente (FDCA), definidos no ECA e nos planos de ação estabelecidos pelos
Conselhos de Direitos, são instrumentos de gestão e de controle dos recursos, tanto
orçamentários quanto oriundos de doações de particulares (dedutíveis do Imposto
de Renda), destinados à execução das ações de atendimento dos direitos de crianças
e adolescentes.
Os Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente são vinculados aos
Conselhos dos Direitos, que têm a competência precípua de deliberar sobre o orça-
mento destinado à população infanto-juvenil e seu Plano de Aplicação.

Varas da Infância e da Juventude


São órgãos do Judiciário responsáveis por aplicar as medidas judiciais neces-
sárias à garantia dos direitos de crianças e adolescentes. São dirigidas por juízes e,
quase sempre, possuem equipe psicossocial que tem por função subsidiar as decisões
judiciais. Atuam de forma integrada com os Conselhos Tutelares e com o Ministé-
rio Público.

84
Promotorias da Infância e Juventude
São órgãos do Ministério Público que têm como função institucional de-
fender e assegurar os direitos fundamentais de crianças e adolescentes, através da
aplicação de medidas judiciais previstas no ECA.

Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA)


São órgãos da Segurança Pública que exercem a função de polícia judiciária,
cabendo-lhe a apuração, através de Inquérito Policial, de ilícitos cometidos contra
crianças e adolescentes.

Fóruns dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA)


São articulações nacionais, estaduais ou municipais de entidades governa-
mentais e não governamentais de defesa dos direitos de crianças e adolescentes.

Centros de Defesa
São organizações não governamentais que atuam no campo da defesa jurídica
de crianças e adolescentes que têm seus direitos violados. Atuam, também, na divul-
gação dos direitos infanto-juvenis, na sensibilização da população local sobre esses
direitos e no controle da execução das políticas públicas.

Defensoria Pública
A Defensoria Pública é um órgão do Judiciário que visa garantir o direito de
assistência jurídica aos que não dispõem de meios para contratar advogado. Embora
não atue exclusivamente nas situações de violação de direitos de crianças e adoles-
centes, faz parte da Rede de Proteção dessa população.

Secretarias de governo estaduais e municipais executoras de


políticas públicas
Essas secretarias, como organismos fundamentais da Rede de Proteção, têm a
função de Atendimento, de garantir o acesso a saúde, educação, assistência, cultura,
profissionalização e proteção especial, ou seja, aos direitos assegurados no ECA.

85
A Escola tem também a função de Atendimento, ou seja, de proteger seus
estudantes crianças e adolescentes contra qualquer violação de seus direitos e de
oportunizar-lhes condições de pleno desenvolvimento escolar, mental, psicológico,
sexual, moral e social. Evidentemente, essas responsabilidades não são exclusivas da
Escola, mas de toda a Rede de Proteção, da qual ela é parte integrante e na qual
tem papel preponderante.

Organizações não governamentais (ONG’s)


Essas organizações da sociedade civil são parte integrante da Rede de Pro-
teção, nas funções de Promoção (nos Conselhos de Direitos), Atendimento (em
programas nas áreas de saúde, educação, assistência, cultura, profissionalização e
proteção especial), Controle (Fóruns DCA), Defesa e Responsabilização (Centros
de Defesa).

86
Bibliografia Recomendada

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lugar. Crianças e adolescentes no mercado de trabalho. São Paulo: ABET-Associação
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VIVARTA, Veet (Coord) Que país é este? Pobreza, desigualdade e desenvolvimento hu-
mano e social no foco da imprensa Brasileira. São Paulo: Cortez/Unicef/Andi, 2003.

89
Sobre o autor e a autora

Vicente Faleiros Doutor em Sociologia pela Université de Montréal (Canadá) e


Pós-doutor pela Écoles des Hautes Études en Sciences Sociales (Paris). Graduado
em Direito pela Universidade de Franca e em Serviço Social pela Universidade
de Ribeirão Preto (SP). Atualmente é pesquisador associado da Universidade de
Brasília, onde também lecionou nos níveis de graduação e pós-graduação e docen-
te-pesquisador da Universidade Católica de Brasília. Bolsista de Produtividade em
Pesquisa do CNPq com o projeto Geracionalidade, Imaginário e Violência.
Desempenhou diversas atividades na área educacional, como docente e pesquisador
convidado na Universidade Federal da Paraíba, Université Laval (Canadá) e Uni-
versidad Católica de Valparaiso (Chile). Desenvolveu ainda ações administrativas
para a qualificação do ensino e formação continuada nas universidades por onde
passou. Na Universidade de Brasília, atuou como coordenador do Departamento de
Serviço Social. Na Universidade de Valparaiso, ocupou o cargo de chefe de departa-
mento e atuou como membro da comissão de reforma curricular para a reconceitu-
ação do serviço social. Na Universidade Católica de Brasília, participou dos projetos
de pesquisa, criação e implantação do mestrado e da graduação de Psicologia e dos
Mestrados em Gerontologia e Política Social. Paralelamente, dedicou-se à produção
textual e possui mais de quarenta obras (individuais e em parceria com outros espe-
cialistas) que ampliaram os quadros teórico-conceituais e metodológicos da área.
Sua trajetória evidencia experiências na área de Políticas Públicas, Políticas Sociais
e Serviço Social com ênfase nos seguintes temas: criança e adolescente, assistência
social, saúde pública, previdência, regulação, teoria e metodologia do serviço social,
velhice/gerontologia e violência.

Algumas das publicações mais relevantes de autoria de Vicente Faleiros, correlatas


ao tema dessa obra, são:

FALEIROS, V. P. Abuso sexual de crianças e adolescentes: trama, drama e trauma. In:


LIana F Costa e Tânia Mara Campos de Almeida. (Org.). Violência no cotidiano:
do risco á proteção. 1 ed. Brasília, 2005, v.1, p. 107-124
FALEIROS, V. P. O fetiche da mercadoria na exploração sexual. In: Libório, R; Sousa
Sônia M.G.. (Org.). Exploração Sexual de crianças e adolescentes no Brasil. 1 ed.
São Paulo, 2004, v. 1, p. 51-72.

FALEIROS, V. P. A questão da violência. In: SOUSA Jr., José Geraldo et al. (Org.).
Educando para os Direitos Humanos. 1 ed. Porto Alegre, 2004, v. 1, p. 83-98.

FALEIROS, V. P. Estrategias de empowerment en trabajo social. 1. ed. Buenos Aires:


Lumen-Hvmanitas, 2003. v. 1. 235 p.

FALEIROS, V. P; FALEIROS, Eva T. Silveira. Circuito e curtos-circuitos.


Atendimento,defesa e responsabilização do abuso sexual contra crianças e adolescentes. São
Paulo: Veras, 2001. v. 1. 126 p.

FALEIROS, V. P. ; Pranke, Charles. Estatuto da criança e do adolescente, uma década


de direitos. Avaliando resultados e projetando o futuro. 1. ed. Campo Grande: Univer-
sidade Federal de Mato Grosso do Sul, 2001. v. 1. 216 p.

FALEIROS, V. P. Fundamentos e políticas contra a exploração e abuso sexual de crianças


e adolescentes. 1. ed. Brasília: Ministério da Justiça/Cecria, 1997. v. 1. 100 p.

FALEIROS, V. P. (Org.) Crianças e Adolescentes - Pensar e Fazer. Brasília: Editora


da UnB, 1995. v. 3. 214 p.

FALEIROS, V. P. Infância e processo político no Brasil. In: Irene Rizzini; Francisco Pi-
lotti. (Org.). A arte de governar crianças. 1 ed. Rio de Janeiro, 1995, v. 1, p. 47-98

92
Eva Faleiros Mestre pela Faculté de Service Social, Université Laval (Canadá).
Graduada pela Faculdade de Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (RS). Atualmente, é pesquisadora do CECRIA, ONG criada
em 1993, especializada em estudos, pesquisa, capacitação e banco de dados sobre a
violência contra crianças e adolescentes. Consultora dos projetos Banco de Dados
(RECRIA) e do Disque-Denúncia do CECRIA. Coordenadora do Movimento
Pró-Saúde Mental do Distrito Federal. Membro da Comissão Saúde Mental do
Conselho Nacional de Saúde, como representante do CFESS/FENTAS (Fórum
dos Profissionais da Área da Saúde) e membro da diretoria colegiada da INVER-
SO, ONG de Saúde Mental.
Desenvolveu atividades docentes, pesquisa, supervisão de estágios e coordenações
na área do Serviço Social nos níveis de graduação e pós-graduação. Iniciou sua car-
reira universitária nas Faculdades de Serviço Social da Pontifícia Universidade Ca-
tólica do Rio Grande do Sul e na Faculdade de Pelotas (RS), em seguida ingressou
na Universidade de Brasília. Lecionou e atuou como pesquisadora na Universidad
Católica de Valparaiso (Chile), CEGEP Lévis-Lauzon (Canadá) e Universidade
Federal da Paraíba (PB). Foi Vice-Presidente do Conselho de Direitos da Crian-
ça e do Adolescente do Distrito Federal, 1992-1994. De 1998 a 2000, participou
do Projeto Latino-Americano do Bureau International Catholique de L`Enfance
(BICE), como representante do Brasil/CECRIA no Uruguai. Realizou a coordena-
ção da pesquisa nacional Circuito e Curtos-circuitos no Atendimento, Prevenção,
Defesa e Responsabilização do Abuso Sexual de Crianças e de Adolescentes. MJ/
DCA/UNIFEM, 2000/2002.
Ao longo de sua carreira acumulou experiências na área de Serviço Social, Políticas
Públicas e Políticas Sociais com ênfase nos seguintes temas: crianças e adolescentes,
abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, violência e direitos humanos
de crianças e adolescentes, redes de proteção, assistência social, saúde pública e saú-
de mental.

Algumas das publicações mais relevantes de autoria de Eva Faleiros, correlatas ao


tema dessa obra:

FALEIROS, Eva T. Silveira. Relatório final do 1º Encontro Nacional de Meninos e


Meninas de Rua, maio/1986. In: Revista Serviço Social e Sociedade. SP, Cortez, nº
22, ano VII, dez. 1986, pp. 134-145.

FALEIROS, Eva T. Silveira. A criança e o adolescente – objetos sem valor no Brasil


Colônia e no Império (de 1500 a 1922). In: PILOTTI e RIZZINI (Org.). A Arte

93
de Governar Crianças. Rio de Janeiro: Editora Universitária Santa Úrsula/Amais
Livraria e Editora/IIN, 1995, pp. 221-236.

FALEIROS, Eva T. Silveira. Plano de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescen-


te do Distrito Federal. Brasília: CDCA/DF, 1993. (Coordenadora e redatora)

FALEIROS, Eva T. Silveira. Políticas públicas e estratégias contra a exploração sexual


comercial e o abuso sexual intrafamiliar de crianças e adolescentes, publicado pelo Brasí-
lia: CECRIA, 1998. (Redatora e organizadora)

FALEIROS, Eva T. Silveira. Repensando os conceitos de violência, abuso e exploração


sexual de crianças e de adolescentes. Brasília: CECRIA, 2000.

FALEIROS, Eva T. Silveira. Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual


Contra Crianças e Adolescentes. Brasília: CECRIA, DCA/Ministério da Justiça, 2000
(Membro da comissão de redação final - no prelo).

FALEIROS, Eva T. Silveira. Aspectos relevantes na definição de abuso sexual. In: OLI-
VEIRA, Antonio Carlos (Org.) Abuso sexual de crianças e adolescentes.Rio de
Janeiro, Editora Nova Pesquisa, 2003.

FALEIROS, Eva T. Silveira. A exploração sexual comercial de crianças e de adolescentes


no mercado do sexo. In: LIBÓRIO, Renata Maria Coimbra; SOUZA, Sônia M. Go-
mes de. (Org.) A exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil. São Paulo,
Casa do Psicólogo, 2004.

FALEIROS, Eva T. Silveira. O fio da meada – a denúncia e a notificação de situações de


abuso sexual contra crianças e adolescentes. In: Colóquio sobre o sistema de notificação
em violência sexual contra criança e adolescente. Brasília, Abaré/Comitê Nacional
de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes, 2004. (Re-
latório final)

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Coleção Educação para Todos
Volume 01: Educação de Jovens e Adultos: uma memória contemporânea, 1996-2004
Volume 02: Educação Anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal nº 10.639/03
Volume 03: Construção Coletiva: contribuições à educação de jovens e adultos
Volume 04: Educação Popular na América Latina: diálogos e perspectivas
Volume 05: Ações Afirmativas e Combate ao Racismo nas Américas
Volume 06: História da Educação do Negro e Outras Histórias
Volume 07: Educação como Exercício de Diversidade
Volume 08: Formação de Professores Indígenas: repensando trajetórias
Volume 09: Dimensões da Inclusão no Ensino Médio: mercado de trabalho, religiosidade e educação
quilombola
Volume 10: Olhares Feministas
Volume 11: Trajetória e Políticas para o Ensino das Artes no Brasil: anais da XV CONFAEB
Volume 12: O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje.
Série Vias dos Saberes n. 1
Volume 13: A Presença Indígena na Formação do Brasil. Série Vias dos Saberes n. 2
Volume 14: Povos Indígenas e a Lei dos “Brancos”: o direito à diferença. Série Vias dos Saberes n. 3
Volume 15: Manual de Lingüística: subsídios para a formação de professores indígenas na área de
linguagem. Série Vias dos Saberes n. 4
Volume 16: Juventude e Contemporaneidade
Volume 17: Católicos Radicais no Brasil
Volume 18: Brasil Alfabetizado: caminhos da avaliação. Série Avaliação n. 1
Volume 19: Brasil Alfabetizado: a experiência de campo de 2004. Série Avaliação n. 2
Volume 20: Brasil Alfabetizado: marco referencial para avaliação cognitiva. Série Avaliação n. 3
Volume 21: Brasil Alfabetizado: como entrevistamos em 2006. Série Avaliação n. 4
Volume 22: Brasil Alfabetizado: experiências de avaliação dos parceiros. Série Avaliação n. 5
Volume 23: O que fazem as escolas que dizem que fazem Educação Ambiental? Série Avaliação n. 6
Volume 24: Diversidade na Educação: experiências de formação continuada de professores. Série
Avaliação n. 7
Volume 25: Diversidade na Educação: como indicar as diferenças? Série Avaliação n. 8
Volume 26: Pensar o Ambiente: bases filosóficas para a Educação Ambiental
Volume 27: Juventudes: outros olhares sobre a diversidade Este livro foi composto em
Adobe
Volume 28: Educação na Diversidade: experiências e desafios na Caslon
educação Pro e bilíngüe
intercultural Helvética.
Volume 29: O Programa Diversidade na Universidade e a Construção de Papel mioloEducacional
uma Política ofset 90 g.
Anti-racista Para Mec/Bid/Unesco e para
Volume 30: Acesso e Permanência da População Negra no Ensino Superior
a Editora Publisher Brasil,
Volume 31: Escola que Protege: enfrentando a violência contra crianças e adolescentes
no outono de 2007.

97
Este livro foi
composto em Adobe
Caslon Pro e Helvética
para o MEC e a Unesco
em 2008.

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As informações reunidas nesta obra
fazem parte dos resultados de pesquisas
desenvolvidas pelo Programa Internacio-
nal para Eliminação do Trabalho Infantil
da Organização Internacional do Trabalho
e de observações colhidas no projeto Es-
cola que Protege, iniciado em 2004 pelo
Ministério da Educação, por intermédio
da Secad, com a finalidade de promover
ações educativas e preventivas para re-
verter a violência contra crianças e ado-
lescentes.
Esta obra tem sua origem no curso
Formação de Educadores: subsídios para
atuar no enfrentamento à violência con-
tra crianças e adolescentes, que buscou
agregar à formação de professores e
demais profissionais de educação subsí-
dios que viabilizassem sua atuação como
agentes fundamentais na missão de ga-
rantir os direitos de crianças e adolescen-
tes, por meio do enfrentamento de desafi-
os e da implementação de ações práticas.
A experiência de formação abrangeu
atividades de educação a distância, de-
senvolvidas pela Universidade Federal de
Santa Catarina, com etapas presenciais
realizadas em todas as regiões do Brasil
por Universidades Federais e Estaduais.
Em função do interesse despertado
pelo material bibliográfico utilizado no cur-
so de formação de educadores, a Secad/
MEC decidiu reeditar seu conteúdo para
distribuição à toda a Rede de Proteção de
Direitos de Crianças e Adolescentes.
ISBN 856073156-3

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