Inclusao - Socioeducacional - Unidades 3 e 4

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Sônia Regina Victorino Fachini

Libras
Capítulo 3
Escola e Diversidade
Caro(a) Aluno(a)
Seja bem-vindo(a)!
Nesta unidade, abordaremos a escola e seu pa-
pel diante da diversidade que a compõe. Veremos seu
compromisso com a qualidade preconizada pela inclu-
são, observando as mudanças pertinentes desde o seu
contexto político, administrativo e didático-pedagógico.
Vamos lá?

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1. A Escola e a Diversidade

Para uma sociedade se constituir de maneira


bem sucedida, ela deve favorecer, em todas as áreas da
convivência humana, o respeito à diversidade que a com-
põe. Um país só alcança seu pleno desenvolvimento, se
garantir a todos os cidadãos, sejam eles crianças, jovens,
adultos ou idosos, as condições para uma vida digna, de
qualidade física, psicológica, social e econômica.

Nesse cenário, um papel fundamental é exerci-


do pela educação, que tem o comprometimento de pro-
porcionar a todos os cidadãos acesso ao conhecimento e
a capacidade de desenvolvimento de suas competências.
Assim, o efetivo exercício da cidadania se daria pela uti-
lização do conhecimento historicamente produzido pela
humanidade, apreendido no ambiente escolar.

Para que cada ação pedagógica seja resultado


de um processo de aprendizagem para o aluno, a escola
deve organizar os conteúdos curriculares de forma que
contribua para a sua formação enquanto agentes sociais.

Segundo Aranha (2004),

“Escola inclusiva é aquela que garan-


te a qualidade de ensino educacional a cada

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um de seus alunos, reconhecendo e respeitan-
do a diversidade e respondendo a cada um de
acordo com suas potencialidades e necessida-
des.
Assim, uma escola somente poderá ser
considerada inclusiva quando estiver organi-
zada para favorecer a cada aluno, indepen-
dentemente de etnia, sexo, idade, deficiência,
condição social ou qualquer outra situação.
Um ensino significativo é aquele que garante
o acesso ao conjunto sistematizado de conhe-
cimentos como recursos a serem mobilizados.
Numa escola inclusiva, o aluno é su-
jeito de direito e foco central de toda ação
educacional; garantir a sua caminhada no
processo de aprendizagem e de construção
das competências necessárias para o exercício
pleno da cidadania é, por outro lado, objetivo
primeiro de toda ação educacional.
Escola inclusiva é aquela que conhece
cada aluno, respeita suas potencialidades e
necessidades, e a elas responde com qualida-
de pedagógica.”

A participação consciente de todos os responsá-


veis pelo conjunto de ações educacionais efetivas – gesto-
res, professores, comunidade e família – é que farão com
que a escola se torne realmente uma escola inclusiva.

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2. Processo de Escolarização
no Contexto Inclusivo

Os últimos censos escolares demonstram que,


desde 1998, o número de alunos com deficiência, incluí-
do no ensino regular, tem aumentado, comprovando, no
que se refere ao acesso escolar, que as leis têm cumprido
seu papel. Entretanto, não se confirma a perspectiva de
qualidade preconizada pela inclusão, pois quando são
analisadas as condições oferecidas pelas escolas e as
necessidades dos alunos, verifica-se uma escolarização
insuficiente e precária.

A estrutura hierárquica das escolas públicas,


construída historicamente, as mantém em situação de de-
pendência administrativa, funcional e até mesmo peda-
gógica. Com isso sua autonomia torna-se cerceada e, no
que se refere ao corpo docente, a autonomia se limita às
ações internas das salas de aula. Essa formatação escolar
intimida e até mesmo coibe o desenvolvimento de ações
coletivas compromissadas com o cuidado individualiza-
do que a educação de cada aluno requer.

A proposta da inclusão democratiza o ensino e


coloca em pauta o funcionamento dos sistemas regular e
especial, gerando mudanças de paradigma a que a escola

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deve adequar-se, para recepcionar todos os alunos e não
mais o processo contrário. Com isso, repensar a prática
educativa se faz necessário e urgente.

Uma escola inclusiva pressupõe transforma-


ções na esfera educacional, ou seja, transformações de
ideias, de atitudes, e da prática das relações sociais, tanto
no contexto político, no administrativo, como no didáti-
co-pedagógico. Assim, na construção de uma escola in-
clusiva, mudanças na cultura da escolarização e nas suas
práticas são requeridas.

A escola preconiza que todas as crianças são


iguais e, nesse sentido, confunde a igualdade de direi-
tos com a igualdade de maneiras e modos de aprender.
Ao pregar a uniformidade, esquece que cada indivíduo é
único e acaba por fabricar sucessos e fracassos.

Segundo Perrenoud (2001, p.36):

“o sentido de uma atividade ou de uma


situação varia de uma criança para outra, se-
gundo sua personalidade, suas aspirações,
seus interesses, seu capital cultural, sua rela-
ção com o jogo e com o trabalho. Assim, é pre-
ciso diferenciar as atividades globais ou os
papéis individuais no contexto das mesmas
para que cada um encontre nelas um sentido
e a oportunidade de aprendizagens também
significativas.”

Desse modo, a escola deve buscar a transforma-


ção da prática educacional tradicional para um enfoque
inclusivo que atenda ao desenvolvimento da pessoa, uma
vez que o modelo de escola inclusiva busca verificar,
constantemente, o crescimento global do aluno, atentan-
do para uma educação mais individualizada, personali-

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zada, que irá satisfazer às necessidades básicas de cada
um deles.

Os ambientes de aprendizagem na escola inclu-


siva deverão ser estabelecidos de forma que o portador
de deficiência, seja ela qual for, tenha oportunidades de
participar e de se relacionar com o meio. O contato com
a diversidade dos pares, propiciado pelo ambiente, con-
tribui para a construção de uma sociedade na qual será
possível o exercício da cidadania, com direitos e deveres
iguais para todos.

Articular as temáticas educação e inclusão


torna-se uma tarefa indispensável, quando a sociedade
e o sistema escolar buscam meios de garantir a todos, o
cumprimento dos seus direitos e deveres previstos cons-
titucionalmente, dentre eles, a almejada educação de
qualidade.

A socióloga Marta Gil, em seu artigo “Deficiên-


cia mental e inclusão social”, comenta:

“É importante que o professor e toda


a comunidade escolar (diretor, funcioná-
rios, alunos) se lembrem de que todo alu-
no pode, a seu modo e respeitando seu tem-
po, beneficiar-se de programas educacionais,
desde que tenha oportunidades adequa-
das para desenvolver sua potencialidade.”

No ambiente de aprendizagem, os professores


devem estar preocupados com as potencialidades, os in-
teresses e a motivação de cada aluno e não se fixar às
defasagens dele, pois o potencial do aluno promove o ato
de aprender. Esses ambientes devem ser motivadores,
agradáveis, estimulantes e facilmente acessíveis a todos.

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3. A Atividade Docente no
Contexto Inclusivo

As crianças do novo século requerem dos pro-


fessores a utilização de estratégias de ensino mais diver-
sificadas e mais dinâmicas, adequadas à globalização
vivenciadas por eles no dia a dia. O professor deve abrir
sua escuta e proporcionar às crianças momentos em que
possam se expressar e serem ouvidas, de modo que suas
experiências de vida e riqueza pessoal, bem como suas
necessidades e carências, não sejam negligenciadas pelo
professor ou pela escola.

Nesse sentido, os alunos são transformados em


agentes do processo ensino-aprendizagem e não meros
receptadores.

Segundo Ferreira (2005, p.43):

“Há um consenso que inclusão impli-


ca celebrar a diversidade humana e as diferen-
ças individuais como recursos existentes nas
escolas e que devem servir ao currículo esco-
lar para contribuir na formação da cidada-
nia. Diversidade e diferenças constituem uma
riqueza de recursos para a aprendizagem na
sala de aula, na escola e na vida.”

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Inclusão é pressuposição de colaboração, na
qual os membros da comunidade escolar se apoiam mu-
tuamente e aprendem uns com os outros a partir da refle-
xão sobre as práticas docentes.

Inclusão reclama maior envolvimento entre a


família e a escola e entre a escola e a comunidade, para
juntos efetivarem o princípio de uma educação de quali-
dade para todas as crianças.

Corroborando Ferreira (2005), o educador


comprometido com a inclusão deve ter em mente que:
• a educação é um direito humano;
• as crianças estão na escola para aprender;
• há crianças que são mais vulneráveis à exclu-
são educacional do que outras;
• é da responsabilidade da escola e dos profes-
sores criar formas alternativas de ensino e aprendizagem
mais efetivas para todos.

Para que não haja evasão escolar, o aluno pre-


cisa ser motivado a frequentar a escola e participar das
atividades na sala de aula e para isso a metodologia de
ensino inclusiva deve possuir qualidade curricular e me-
todológica. Portanto precisa identificar barreiras à apren-
dizagem e planejar formas de removê-las para que cada
educando seja contemplado e respeitado em seu proces-
so de aprendizagem. O mesmo autor afirma que, nesse
contexto, a prática escolar deve estar fundamentada na
crença de que:
• em qualquer período de sua escolarização,
qualquer criança pode enfrentar dificuldades para apren-
der ou fazer parte da comunidade escolar;
• as dificuldades de aprendizagem que emer-
gem no dia a dia da escola/sala de aula constituem um
recurso para melhorar o ensino;

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• todas as mudanças geradas como resultado da
tentativa de responder às necessidades de aprendizagem
de uma dada criança oferecem melhores condições para
todas as crianças aprenderem.

Concluímos que a inclusão não depende de


diagnóstico ou categorias de deficiências baseadas em
níveis de habilidades/capacidades do aluno, e não segre-
ga ou discrimina nenhuma criança com base nas suas
características individuais. Pelo contrário, a inclusão
cria oportunidades contínuas para todos os alunos apren-
derem por meio do uso de estratégias diversificadas de
ensino ao mesmo tempo em que cria bases firmes para
a melhoria da escola e para a capacitação contínua dos
professores. (FERREIRA, 2005)

Texto Complementar

Considerações Contextuais e
Sistêmicas para a
Educação Inclusiva
Susan Stainback

As salas de aula, assim como os professores e


os alunos designados a ela, são únicas. Um modelo ou
uma prática que funcione em uma sala de aula não ne-
cessariamente servirá para uma outra. Similarmente, os
variados componentes que operam dentro de uma sala de
aula podem ter um impacto significativo nos resultados
educacionais obtidos pelos alunos.

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O papel do professor

Até um certo ponto, o professor sempre foi vis-


to como a fonte e o distribuidor do conhecimento, porém
isso não tem mais lugar na nossa sociedade. As mudan-
ças estão acontecendo cada dia mais. Para se esperar que
informações preconcebidas ou fatos serão suficientes
para conceder aos alunos de hoje em dia um sucesso da-
qui para frente. Do mesmo modo, com o grande número
de diversidades da natureza, dos interesses e das neces-
sidades de aprendizagem de cada indivíduo, particular-
mente em uma sala de aula inclusiva onde todos os alu-
nos, não obstante suas diferenças participem do processo
de aprendizagem, não se pode esperar de um professor
que ele dispense todo o seu conhecimento somente para
atender às necessidades de cada aluno individualmente.
Por essas razões, se aos alunos estiver sendo fornecida
uma educação que lhes possa servir com sucesso para
toda a sua vida, o papel tradicional do professor, como o
distribuidor do saber, tem que mudar.

Para dirigirem-se às necessidades dinâmicas


dos alunos, em um número crescente de salas de aula,
os professores estão assumindo o papel de organizado-
res de ambientação das salas de aula, das experiências
de aprendizagem, dos recursos e das condições dos pro-
cedimentos e das práticas para o ensino aprendizagem.
A participação do aluno, a interação e a aprendizagem
interdependente são o foco principal. Os recursos e as
técnicas para fornecer informações e dirigir o currícu-
lo de uma maneira que os alunos tenham não somente
as habilidades e as oportunidades, mas também a mo-
tivação e o foco para dirigirem as suas necessidades de
aprendizagem, são os desafios do professor.

Enquanto professores, continuaremos a ajudar

67
os alunos em seus anos de formação, para conseguirem
as habilidades básicas, tais como escrita, leitura, com-
preensão de textos e fala, porém existe um foco maior
que os ajudará a dominar e usar essas habilidades como
meio de aprendizagem e não como um fim.

Como professores necessitarão ser cada vez


mais, capazes de achar alternativas às habilidades bási-
cas tradicionais e recursos disponíveis para atender às
necessidades originais de cada um dos alunos dentro
de uma sala de aula. Alguns alunos talvez, precisem de
habilidades especiais básicas tais como Braille, equipa-
mentos para se comunicarem usando computadores, cal-
culadoras, assim podendo permitir que cada indivíduo
tenha as habilidades necessárias para lhes garantir suces-
so quando em sociedade. Enquanto os alunos progridem,
uma ênfase maior é dada a uma avaliação crítica mais
complexa do que se necessita para promover e praticar
a realização da tomada de decisões em suas vidas atuais
e no futuro. Assim como os alunos, nós, como profes-
sores, estamos sendo convidados a avaliar e tomar de-
cisões mais educacionais. Em relação aos interesses e à
direção que os alunos tomarão, exigirá nossa orientação
e a atenção em vez de simplesmente seguir um pacote de
currículo e de materiais previamente designados.

Resumindo, como professores estamos sendo


chamados a mudar o nosso estilo de ensino para desen-
volver a interdependência de indivíduos capazes de se-
rem auto-aprendizes por toda a vida. Não se pode mais
esperar de nós, professores, sermos complacentes com
um padrão educacional que seja aplicável a todos os alu-
nos. Em vez disso, deveremos ser mais pró-ativos em
providenciar habilidades e conhecimento que são neces-
sários para que cada indivíduo viva de forma produtiva

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sua vida, continuadamente, em um mundo de mudanças.

Para continuar lendo esse texto, vá até a Biblioteca virtual


no WEB ENSINO e acesse o arquivo revistainclusão3.pdf

Filme: Filhos do Silêncio.


Vamos preparar a pipoca?

Sinopse
Numa pequena cidade da Nova Inglaterra, Ja-
mes Leeds é o novo professor de linguagem de uma es-
cola para surdos. Idealista, é conhecido por usar mé-
todos nada convencionais em suas aulas. Assim, logo
ao chegar, é advertido pelo administrador da escola, Dr.
Curtis Franklin, para que não utilize sua tão falada cria-
tividade com os seus novos alunos.

Não intimidado com a advertência recebida,


Leeds põe em prática seus métodos, que incluem o uso
do rock’n roll, em alto volume, a fim de ensinar aos alu-
nos a sentirem as vibrações da música e a tentarem falar
foneticamente.

Mas um novo elemento entra em sua vida,


quando conhece a bela e atraente Sarah Norman, uma
excepcionalmente inteligente e extremamente amarga
jovem mulher. Sarah, já graduada pela escola, decidiu
permanecer lá, como empregada, a fim de se manter con-
finada em seu mundo de silêncio, que aparentemente lhe
dá mais segurança.

Ela logo se mostra interessada em Leeds, com


quem se comunica através da linguagem dos sinais. Ele
procura fazer com que ela passe a ler lábios e a falar um
pouco. Através da Sra. Norman, mãe de Sarah, ele toma
conhecimento que ela fora molestada sexualmente quan-

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do era adolescente, o que a tornou uma pessoa amarga.
Tal fato explica porque ela é tão hesitante nas tentativas
em que ele procura estreitar um relacionamento.

Passado algum tempo, Leeds consegue final-


mente se aproximar mais de Sarah e os dois terminam se
apaixonando, embora ambos tenham que aprender novas
formas de melhor comunicarem seus sentimentos.

Síntese do capítulo

Nesta unidade, estudamos que a inclusão se ca-


racteriza como um movimento em defesa da escola de
qualidade para todos, nas quais gestores, professores,
alunos, técnicos, profissionais, comunidade, devem estar
comprometidos. Também reconhecemos que a inclusão
democratiza o ensino e coloca em pauta o funcionamen-
to dos sistemas regular e especial, focando que o sistema
deve oportunizar aprendizagem a todos através da cria-
ção de bases firmes para a melhoria da escola e para a
capacitação contínua dos professores.

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Atividades

1) Após leitura desta unidade, que estratégias poderiam


ser desencadeadas para oferecer qualidade aos alunos e
repensar a prática educativa?

2) Você conhece o funcionamento da rede pública de


ensino em sua região? Como acontece a inclusão nessas
escolas públicas?

3) Qual a sua participação no processo de inclusão no


local onde trabalha?

71
Capítulo 4
Escola Inclusiva
Caro(a) Aluno(a)
Seja bem-vindo(a)!
Nesta unidade, faremos uma rápida
retrospectiva histórica da relação entre deficiência e ex-
clusão. Aprenderemos o conceito legal de portadores de
necessidades educacionais especiais e refletiremos sobre
a relação deficiência e exclusão.
Boas reflexões!

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1. A Escola Inclusiva

O conceito de inclusão abarca as diferentes


situações que levam à exclusão social e educativa de
toda uma comunidade escolar. E assim, faz referência
não somente aos alunos com necessidades educacionais
especiais, mas também a todos os alunos das escolas.
Ao defender a integração dos sujeitos com necessida-
des educacionais especiais às escolas comuns, estabe-
lece também a participação plena deles na vida escolar
e social dessa comunidade escolar. Por isso, a inclusão
assume que a convivência e a aprendizagem em grupo
é a melhor forma de beneficiar todos, não somente as
crianças rotuladas como diferentes. (FOREST & PEAR-
POINT, 1992).

Ao reivindicar uma ação educativa que res-


ponda de maneira mais eficaz à diversidade de todos os
alunos, a educação inclusiva propicia a implementação
de uma série de modelos, tais como: a escola especial
(Dessent, 1987), a escola efetiva para todos (Ainscow,
1991), a escola “adhocrática” (Skrtic, 1991b), a escola
heterogênea (Villa e Thousand, 1992) ou a escola inclu-
siva (UNESCO, 1994, Declaração de Salamanca). Todos
esses modelos se apoiam na crença de que é possível
identificar um conjunto de características organizativas

77
que tendem a fazer as escolas mais ou menos inclusivas.

O movimento de inclusão traz como premissa


básica a Educação para Todos. Esse documento ratificou,
ao longo de seus argumentos, que todas as pessoas têm
direito à educação, inclusive milhões de crianças, jovens
e adultos excluídos dos sistemas de ensino porque por-
tavam necessidades educacionais diferentes da maioria
dos estudantes.

Mas ...
quem são os “portadores de necessidades
educacionais especiais” no contexto escolar?

Segundo a Declaração de Salamanca 1994, (in-


trodução 3), “o termo ‘necessidades educacionais espe-
ciais’ refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas
necessidades educacionais especiais se originam em fun-
ção de deficiências ou dificuldades de aprendizagem”.

Portanto, o conceito de necessidades educa-


cionais especiais inclui, além das crianças deficientes,
aquelas que estejam experimentando dificuldades esco-
lares temporárias ou permanentes no contexto escolar,
alunos cuja repetência é contínua, porque são crianças
que vivem nas ruas, são forçadas a trabalhar, vivem em
condições de extrema pobreza, ou ainda, são desnutridas,
residem em locais distantes de quaisquer escolas, são ví-
timas de guerra ou conflitos armados, sofrem de abusos
físicos, emocionais e sexuais, ou aquelas que estão na
instituição educacional, por qualquer motivo que seja.

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2. Qual a Relação da
Deficiência com a Exclusão?

A compreensão mais primitiva que se tinha em


relação às deficiências, era aquela que atribuía à pessoa
deficiente, poderes mágicos e sobrenaturais, como se o
fato de possuir deficiências físicas fosse um fenômeno
totalmente fora do comum, e até mesmo eram repelidas
essas pessoas, que outras vezes eram tidas como abomi-
náveis, pois suas deficiências eram atribuídas a castigos
divinos, ou eram vistas com superstição e malignidade.
Segundo Fonseca, ( 1997, p. 65):

“Em Atenas, os deficientes eram aban-


donados em locais desconhecidos, para aí
ficarem sujeitos à implacável determinação
da luta pela sobrevivência”. Esparta aplicou
aos deficientes o processo de seleção mais de-
sumano e arbitrário que há memória.“Os Ron-
zanos, mais tolerantes, adotam os deficientes
para os exibirem em festividades suntuosas.”

Khater 1995 (p. 48) expõe que, com o advento


do cristianismo, a rejeição às pessoas deficientes dá lugar
à benevolência, agora elas são aquelas que necessitam de
caridade. O ser deficiente precisa de almas caridosas que

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se compadeçam e as ajudem a sobreviver nessa socieda-
de que as colocam à margem. A visão assistencialista,
dominante durante a Idade Média, é que faz surgir as
casas de assistência.

No período que concerne à Revolução France-


sa até o século XIX, a ideia de capitalismo mercantil e
de divisão social do trabalho, traz um novo paradigma.
Trata-se do modelo de característica da deficiência como
questão médica e educacional, encaminhando o deficien-
te para viver em convento ou hospício.

Surgem instituições especiais para abrigar tais


pessoas, que precisavam, segundo o entendimento da
época, serem educadas fora do contexto social, pois a
sociedade se encontrava extremamente distante de acei-
tar essas pessoas em seus padrões de humanidade. A
ideia de segregação perdurou até meados do século vin-
te, quando ocorrem grandes discussões sobre os direitos
humanos.

As duas guerras mundiais, 1914 e 1939, am-


pliaram o número de deficientes físicos. Estima-se que,
na II Guerra, o número de mortos superou os cinquenta
milhões, havendo ainda uns vinte e oito milhões de mu-
tilados. A fim de que pudessem propiciar uma atividade
remunerada e uma vida social digna aos soldados muti-
lados, os países oportunizaram um avanço ao desenvol-
vimento da reabilitação científica. A guerra do Vietnã,
na década de 60, produziu uma grande quantidade de
deficientes físicos, não só naquele país, mas também nos
EUA. Esse quadro provocou a formação de movimentos
de defesa dos direitos das minorias.

Observando a trajetória histórica do tema, per-


cebe-ser que é a partir da década de 1980, que importan-
tes convenções, declarações e legislações foram promul-

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gadas em todo o mundo, com o intuito de universalizar a
educação escolar e garantir a igualdade de oportunidades
educacionais a todas as pessoas, respeitando-se a diver-
sidade e diferenças entre elas. Destacam-se a Declaração
Mundial Sobre Educação para Todos e Plano de Ação
Para Satisfazer As Necessidades Básicas de Aprendiza-
gem, Jomtiem de 1990, a declaração de Salamanca e a
linha de ação sobre Necessidades Educativas Especiais
de 1994, que estabelece diretrizes para a igualdade de
oportunidades de escolarização para as pessoas com
necessidades educacionais especiais, eliminando-se, do
âmbito das escolas, qualquer forma de discriminação,
por questões étnicas, gênero, raça, idade, religião, cultura
e especialmente por tratar-se de portador de deficiência.

A lei nº 7853, de outubro se 1989, no artigo 2º,


inciso I, alínea f, traz o seguinte texto:

“...a matrícula compulsória em cursos


regulares de estabelecimentos públicos e
particulares de pessoas portadoras de defi-
ciência capazes de se integrarem ao sistema
regular de ensino.”

Infere-se que o conceito de integração é eviden-


ciado, pois a lei em questão não pressupõe a adequação
dos sistemas às necessidades específicas do aluno, mas
que o mesmo, possuindo capacidade para se integrar ao
sistema, não deve ser negado a ele tal oportunidade.

Os movimentos em favor da integração de


crianças com deficiência surgiram nos Países Nórdicos,
em 1969, quando se questionaram as práticas sociais e
escolares de segregação (MANTOAN, 2003). Nas situ-
ações de integração escolar, nem todos os alunos podem

81
ser inseridos nas turmas de ensino regular. Há uma sele-
ção prévia dos que estão aptos à inserção.

Foi nesse período das políticas de integração


que surgem as discussões relativas aos termos mais es-
pecíficos para indicar as pessoas caracterizadas por limi-
tações físicas, sensoriais ou cognitivas. O termo “pessoa
deficiente” toma o lugar de termos como aleijada, inca-
pacitada ou anormal, em decorrência do ano internacio-
nal da pessoa deficiente, em 1981. Aos poucos entra em
uso a expressão pessoa portadora de deficiência, que se
restringe para portador de deficiência e, em meados dos
anos 90, passa a ser pessoa com deficiência.

Segundo Sassaki (2003), a integração foi o úl-


timo estágio que antecedeu ao processo de inclusão das
pessoas com deficiências, mas a mudança de paradigma,
que vai da integração para a inclusão, ainda encontra for-
te resistência em todos os sistemas sociais comuns.

No paradigma atual da inclusão, a diversidade


cultural e social começa a lançar uma nova filosofia edu-
cacional e reabilitacional para os deficientes. Da homoge-
neidade ortodoxa, a Humanidade vai aceitando uma he-
terogeneidade tolerante. A semelhança indiferenciada dá
lugar à semelhança diferenciada (Fonseca, 1997, p. 69).

Texto Complementar

Quem é Deficiente: A Cidade ou as


Pessoas que têm uma Limitação Fí-
sica ou Sensorial?
Mara Gabrilli

82
Por muito tempo, as pessoas com deficiência
foram tratadas apenas por meio de políticas de assis-
tência social, sem que a sociedade, de uma forma geral,
compreendesse a complexidade do termo “inclusão”.
Incluir socialmente não significa ter pena ou criar apa-
ratos isolados e separados para atendimento, circulação
e atividades dessas pessoas. Isso é segregação. Incluir,
ao contrário, é estar preparado para acolher a TODOS.
Sem impor condições, sem ‘SEs’ - se ele melhorar, se ele
puder subir, se ele tiver condições.

Incluir é possibilitar que uma pessoa com de-


ficiência visual tenha autonomia para circular sozinha
pelos centros urbanos, junto com todo mundo; é criar
condições para que um surdo vá a uma peça de teatro,
junto com todo mundo; é oferecer recursos para que uma
criança com deficiência mental vá à escola e aprenda,
junto com todo mundo; é também dar acesso a uma pes-
soa como eu, que sou tetraplégica e ando em cadeira de
rodas, para chegar aos mais recônditos lugares, ao meu
trabalho ou a uma sala de cinema, como todo mundo.

A sociedade inclusiva assume para si a adequa-


ção, não deixa mais a responsabilidade ‘nas costas’ da
pessoa que tem uma deficiência. É a sociedade, em todos
os seus aspectos, que se adapta para o bem-estar de todos
seus cidadãos. Este é um princípio consagrado na Carta
das Nações Unidas, que reconhece a dignidade e o valor
inerente a todos os membros da família humana e os seus
direitos como iguais e inalienáveis.

Por isso, sinalizando os novos tempos, o pri-


meiro documento internacional de Direitos Humanos do
Século 21 é a Convenção Internacional dos Direitos das
Pessoas com Deficiência. Concluída e aprovada por una-
nimidade em 13 de dezembro do ano passado, contou

83
com participação da sociedade civil e consumiu quatro
anos de dedicação e esforço. Fizeram parte das assem-
bleias na ONU representantes de 192 países com cul-
turas, idiomas e regimes políticos diferentes entre si. A
diversidade na diversidade.

Eu tive a oportunidade de participar, em Nova


Iorque, da elaboração deste documento que tem um sig-
nificado histórico para centenas de milhões de pessoas
com deficiência de todo o planeta. Estima-se que somos
650 milhões em todo o mundo e a Convenção da ONU
ratifica todos os direitos desses cidadãos com deficiência
e, especificamente, proíbe a discriminação em todos os
aspectos da vida.

O Brasil assinou a Convenção em 30 de março,


em nome do Poder Executivo, e agora está no Congres-
so Nacional - Câmara dos Deputados e Senado Fede-
ral - para apreciação. A Convenção da ONU poderá ser
adotada no Brasil como lei ou como dispositivo consti-
tucional. Para ter valor de norma constitucional exigirá
quorum qualificado quando da aprovação no Poder Le-
gislativo - o parágrafo 3º, do artigo 5º, da Constituição
Federal, inserido pela Emenda Constitucional 45, estabe-
lece que “os tratados e convenções internacionais sobre
direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa
do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos
dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes
às emendas constitucionais.” Seria um grande avanço a
ser celebrado. Estamos determinados e trabalhando ati-
vamente para que isso aconteça. Os países que adotarem
a Convenção ficarão obrigados a eliminar leis, costumes
e práticas que representem discriminação contra as pes-
soas com deficiência.

84
Nossa Constituição é inclusiva
No entanto, antes mesmo da Convenção da
ONU, o Brasil já possui uma legislação avançada na ga-
rantia dos direitos das pessoas com deficiência. Fomos
modelo nas Nações Unidas, ainda que nossas leis não
sejam aplicadas corretamente. A Constituição Brasilei-
ra já garante igualdade e também o direito de ir e vir a
todo o cidadão nascido no solo do Brasil e, também, aos
estrangeiros residentes no País. Por que com os brasilei-
ros com deficiência seria diferente? Não são objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil cons-
truir uma sociedade livre, justa e solidária, e promover
o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação?
Nós, pessoas com deficiência, somos iguais em direitos
e obrigações. Ou será que não? Existem tantas barreiras
a serem superadas.

Tenho de reconhecer que nas últimas duas dé-


cadas o reconhecimento destas garantias constitucionais
avançou. As políticas de assistência social começaram
a ser postas de lado e as pessoas com deficiência estão
tendo a oportunidade de mostrar que podem exercer ple-
namente seus direitos civis, políticos, sociais, culturais e
econômicos. Isso mudou muita coisa, mas não tudo. Ain-
da são várias as barreiras que separam as pessoas com de-
ficiência da sociedade, como uma simples escada ou um
elevador apertado que impossibilitam uma pessoa como
eu de entrar, com dignidade, a uma edificação ou chegar
ao segundo andar dela. Essas são as barreiras físicas.

Um exemplo da vida cotidiana, que vem ocor-


rendo com frequência, ilustra bem a importância e a ne-
cessidade em se quebrar, cada vez mais, essas barreiras.
O Ministério Público e as Delegacias do Trabalho es-

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tão agindo com firmeza com as empresas para que elas
cumpram a Lei de Cotas (Lei 8.213/91). Para quem não
sabe, esta lei determina que empresas com mais de 100
funcionários tenham uma porcentagem de trabalhadores
com deficiência em seus quadros, que varia entre 2 e 5%,
sempre de acordo com o número de empregados. Este
tipo de ação afirmativa de reserva de vagas é comum nos
países europeus e, lá, atinge empresas com um número
bem menor de funcionários.

Apenas na Delegacia Regional do Trabalho em


São Paulo (DRT-SP) desde que o programa de inclusão
de pessoa com deficiência foi criado, em 2001, até maio
de 2006, cerca de 47 mil trabalhadores com deficiência
foram empregados. O trabalho é sempre de conscienti-
zação, em um primeiro momento, e tanto o Ministério
Público quanto as Delegacias do Trabalho se oferecem
como parceiros para o cumprimento da lei.

Pois bem, existem muitos casos de empresas


que ajustam sua conduta, abrem as vagas, reformam
suas edificações, encontram os candidatos apropriados
ao perfil da empresa, mas o trabalhador descobre que não
pode chegar até seu posto de trabalho. Por quê? Porque
as vias públicas não permitem sua circulação ou não há
ônibus adaptados a disposição. Triste, não é? Sempre
digo que não adianta investir maciçamente em uma área,
se não houver investimentos em outras que promovam
a infra-estrutura. Assim, como não adiantará renovar a
frota com ônibus adaptados se os terminais não forem
reformados em conjunto.

O que quero dizer é que as ações devem ter uma


visão holística. Isso significa promover políticas reunin-
do e compondo cada um dos elementos, sempre pensan-
do no todo.

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Uma visão do todo
Os governos ainda estão pouco acostumados a
lidar com a diversidade humana. E as questões das pes-
soas com deficiência estão em todos os setores: educa-
ção, trabalho, transporte, cultura, saúde, lazer, esporte,
habitação. É por isso que a Secretaria Especial da Pessoa
com Deficiência e Mobilidade Reduzida (SEPED) do
município de São Paulo - que ajudei a criar, em 2005,
e da qual fui a primeira titular antes de assumir minha
cadeira na Câmara Municipal neste ano - tem o menor
orçamento entre as secretarias municipais. Seu papel não
é executar as transformações nos diversos setores, mas
sim orientar os secretários de todas as pastas para que
incluam a todos em suas ações. É um papel pedagógico
mesmo, para fazer com que compreendam e incorporem
a ideia de que uma ação que não contempla uma pessoa
com deficiência está incompleta. Exclui uma parcela sig-
nificativa da população. Afinal, de acordo com o Censo
2000 do IBGE, as pessoas com deficiência representam
14,5% da população. Em números atualizados, são cerca
de 27 milhões de cidadãos que querem participar inte-
gralmente da vida em sociedade.

Se a cidade oferecer todas as condições para


que uma pessoa possa circular livremente, sob qualquer
aspecto, por toda sua área, podemos afirmar que esta é
uma cidade eficiente. Caso contrário, não é justo apontar
como deficiente uma pessoa que, por falta de estrutura
física, tem de ficar trancada em casa porque não tem au-
tonomia para ir, vir e permanecer aonde quiser. É mais
correto dizer que a cidade é deficiente do que apontar a
deficiência em alguém.

Basta um par de asas para que qualquer pessoa


possa voar!

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O primeiro obstáculo enfrentado pela pessoa
com deficiência é a barreira física, pois ela veta com-
pletamente a autonomia dessas pessoas. Mas, de fato, a
grande transformação não está em fazer das cidades um
imenso canteiro de obras. Mudar a cidade significa mui-
to mais do que isso. Começa com a mudança em seus
cidadãos.

Trabalho para que a sociedade entenda que,


apesar das diferenças corporais ou sensoriais, somos
todos iguais. Todos temos as mesmas necessidades, os
mesmos anseios.

Queremos amar, ser amados. Queremos com-


preensão. Queremos uma casa e uma família que nos
ampare. Queremos amigos que sejam testemunhas de
nossas vidas e partilhem as deles conosco. Queremos
trabalho, ter uma profissão que nos dê identidade. Quere-
mos saúde. Queremos educação para nossos filhos - que
temos ou viremos a ter. Queremos também o ‘chopinho’
alegre no final do dia. Ou pode ser um passeio pelo par-
que, uma seção de cinema ou de teatro. O justo lazer
descompromissado ou cultural. Todos desejam uma vida
digna e plena. Comigo é assim, como você não acontece
o mesmo?

A grande mudança é na atitude


A palavra cidade vem do latim civitate. No di-
reito público romano, civitate era o conjunto dos cidadãos
que constituíam uma cidade. Desta nobre palavra, ainda
se deriva o vocábulo cidadania que é a qualidade de ser
cidadão, o indivíduo no gozo de seus direitos. As cidades
precisam se transformar em um lugar para todos. Porque
a diversidade humana não é um peso, mas sim uma gran-
de riqueza. Uma riqueza inestimável, eu diria. Precisa-
mos valorizar essa riqueza e promover o encontro entre

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as pessoas. Parece tão simples, mas isso não acontece.

Imagino que a ausência das pessoas diferentes


do padrão dito ‘normal’ da população tenha sido ocasio-
nada pelo que chamamos de barreira atitudinal. Esta sim
é, para mim, a muralha a ser transposta, a dificuldade do
ser humano em entender o outro, compreender as suas
diferenças e as suas necessidades. Se derrubarmos essa
barreira e fizermos todos entenderem que é preciso pen-
sar também na acessibilidade da pessoa com deficiência,
dos anões, idosos e obesos, as barreiras físicas são tom-
badas automaticamente.

Se os arquitetos e urbanistas incorporarem que


desenham e projetam para uma gama tão ampla de ne-
cessidades humanas, não se esquecerão da acessibilida-
de universal em seus projetos. Se pensassem a estrutura
das edificações com os conceitos de desenho universal
arraigado, nem pestanejariam em colocar em suas obras
amplos elevadores e passagens para circulação. Isso se-
ria tão óbvio quanto fazer um pé direito acima de dois
metros e meio.

Mais importante que quebrar as inúmeras bar-


reiras arquitetônicas que existem nas cidades é quebrar
as barreiras de atitude. Mudar a atitude das pessoas é
muito mais forte. Colocar uma rampa não fará ninguém
deixar o preconceito de lado. No entanto, se quebrarmos
os preconceitos das pessoas certamente ajudarão a trans-
formar a cidade, construirão rampas e pontes para unir as
pessoas. Inclusão social se faz de dentro para fora.

É momento de um encontro direto com o urba-


no e o comprometimento com o civilizado. Afinal, se ur-
bano também é ser moderno, desenvolvido, acredito que
muitos deveriam se interessar pela acessibilidade, que é
um reflexo desses fatores.

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Por uma São Paulo acessível

Muitos fatores são necessários para tornar uma


cidade completamente acessível. O primeiro esbarra no
portão de casa. Literalmente. Estamos falando dos pas-
seios públicos, as nossas conhecidas calçadas. Em mui-
tos lugares, simplesmente eles não existem. Em outros,
são esburacados, cheios de desníveis, sem nenhuma
rampa. O prefeito de São Paulo, José Serra, já deu um
importante passo nesse sentido, quando fez o Decreto
45.904/05 que regulamenta o passeio público. Resumi-
damente, o decreto estabelece três divisões na calçada,
sendo a do meio totalmente livre de interdições e com
um calçamento adequado para ser acessível às pessoas
com ou sem deficiência.

As próprias edificações são outro aspecto im-


portante, afinal se as pessoas com deficiência saírem às
ruas, precisarão tomar algum rumo final. Se esse destino
for uma escola, um museu ou um hospital, esperamos
que essas pessoas consigam adentrar tais locais. É muito
fácil se deparar com escadas, degraus e buracos na ci-
dade. Também comum é a inexistência de rampas e de
comunicação para as pessoas com deficiência sensorial.
Quantos locais você reparou serem acessíveis? Preste
atenção a partir de hoje. É possível que você fique choca-
do com a ausência de recursos facilitadores para pessoas
idosas, obesos, gestantes, mães com carrinhos de bebê e
pessoas com deficiência.

Daí é que surge a nossa reivindicação de que to-


das as faculdades de arquitetura, urbanismo e engenharia
tenham uma disciplina obrigatória sobre acessibilidade e
sobre a norma técnica da Associação Brasileira de Nor-
mas Técnicas (ABNT), a NBR 9050. Esta norma está
nas Leis Federais que regem este tema e delimitam todas

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as regras de acessibilidade pelo território nacional.

Por último, um fator primordial nas grandes


cidades é o transporte. São Paulo é, apesar de ainda de-
ficitária nesse assunto, uma cidade inovadora no quesito
transporte adaptado. Temos o serviço Atende, que faz o
serviço porta a porta para os usuários inscritos nesse sis-
tema. Este serviço é inovador e já vieram pesquisadores
de fora do Brasil para estudar seu atendimento. Porém, o
Atende não consegue atender todas as pessoas com defi-
ciência para quaisquer programas.

Na escala de atendimento está priorizado o


atendimento à saúde. Futuramente, todas as pessoas
com deficiência deverão ser atendidas por um sistema de
transporte eficiente e sem restrições.

Quando entrei na SEPED havia 300 ônibus co-


muns adaptados em São Paulo. Hoje são 2.080. Segundo
a legislação – Leis 1.048 e 10.098, regulamentadas pelo
Decreto 5.296 em 2004 – toda a frota de ônibus em todas
as cidades do país deverá estar adaptada até o ano de
2.014. É o prazo natural para a renovação da frota e a
partir de agora nenhum ônibus novo poderá prescindir
de recursos de acessibilidade.
Não conseguiria, nem se quisesse, elencar aqui todos os
problemas dos grandes centros urbanos. Teria de passar
pela educação, saúde, emprego, cultura, assistência so-
cial, arte, entre muitos mais.

Espero, ao fim deste pequeno relato, ter trazido


o assunto “deficiência” para mais perto de vocês e colo-
cado esse tema – no mínimo – para o estudo comum.

Estar feliz é um estado de espírito que indifere


da condição física de cada um. As cidades estão reple-
tas de obstáculos e luto a cada dia para exterminar essas

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barreiras. Porém, não vou, e certamente outras pessoas
com deficiência, esperar isso acontecer para sermos feli-
zes. Vamos sair de casa e ajudar a “desconstruir” nossas
cidades.

Por uma São Paulo e um Brasil mais construtivos.


Por uma São Paulo e um Brasil acessíveis.
*MARA GABRILLI, 39 anos, vereadora em São Paulo
(PSDB), é psicóloga, publicitária e empreendedora social. Tetraplégica
há 13 anos, devido a um acidente de carro, foi a primeira titular da
Secretaria Especial da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida
instituída na cidade em 2005.

Síntese do capítulo

Nesta unidade, estudamos que o conceito de


inclusão abarca as diferentes situações que levam à ex-
clusão social e educativa do sujeito em idade escolar.
Aprendemos que o termo “necessidades educacionais
especiais” inclui, além das crianças deficientes, aquelas
que experimentam dificuldades escolares temporárias
ou permanentes no contexto escolar. Através de uma re-
trospectiva histórica, estudamos a relação da deficiência
com a exclusão.

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Atividades

1) Nesta unidade, o último parágrafo diz: “No paradig-


ma atual da inclusão, a diversidade cultural e social co-
meça a lançar uma nova filosofia educacional e reabilita-
cional para os deficientes. Da homogeneidade ortodoxa,
a Humanidade vai aceitando uma heterogeneidade tole-
rante. A semelhança indiferenciada dá lugar à semelhan-
ça diferenciada (Fonseca, 1997, p. 69)”.
Disserte sobre esse parágrafo, colocando seu
ponto de vista a partir de tudo que vimos até agora em
nossa disciplina.
Poste sua resposta no fórum dessa unidade.

2) Acesse o site do youtube e assista ao vídeo “MEC:


Necessidades Educacionais Especiais”. Que relação po-
demos estabelecer entre o vídeo assistido e os termos
“integração” e “inclusão”?

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