Dislipidemia

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Patologia da Nutrição e Dietoterapia nas

Enfermidades do Sistema Cardiovascular:


Dislipidemia

Apresentação
Existe uma comprovada relação entre as dislipidemias e o aparecimento de doenças
cardiovasculares, sendo estas umas das maiores causas de mortalidade da atualidade no mundo
inteiro. A Nutrição exerce um papel fundamental no controle e prevenção dessas doenças,
tornando imprescindível o conhecimento sobre os cuidados dietoterápicos que devem ser
observados.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar sobre os tipos de ácidos graxos que compõem
as gorduras, a relação das lipoproteínas com o aparecimento das dislipidemias e o manejo
nutricional que deve ser aplicado para o paciente com dislipidemia.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Descrever o que são e quais as funções dos ácidos graxos e das lipoproteínas.
• Reconhecer os conceitos e as classificações das dislipidemias.
• Identificar os cuidados dietoterápicos que devem ser tomados no tratamento das
dislipidemias.
Infográfico
As dislipidemias representam um dos principais fatores de risco para o surgimento das doenças
cardiovasculares e podem predispor a eventos graves, que conferem risco à vida dos indivíduos,
como por exemplo, a ocorrência de infarto do miocárdio.

As gorduras alimentares e o seu metabolismo estão relacionadas diretamente com as dislipidemias,


sendo que a terapia nutricional representa um fator essencial no seu tratamento e prevenção. Veja
as principais funções das lipoproteínas e alguns conselhos sobre o consumo de gorduras.

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Conteúdo do livro
Você já sabe para que servem os ácidos graxos e as lipoproteínas? No capítulo Patologia da
nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular: dislipidemia, você vai
encontrar essas respostas, além de conceitos e classificações das dislipidemias, assim como seu
manejo nutricional. O capítulo faz parte do livro Patologia da nutrição e dietoterapia, base teória
desta Unidade de Aprendizagem.

Boa leitura.
PATOLOGIA DA
NUTRIÇÃO E
DIETOTERAPIA

Sandra Muttoni
Revisão técnica:
Juliana S. Closs Correia
Nutricionista (Centro Universitário São Camilo)
Mestre em Biologia Odontológica (UNITAU)
Especialista em Metodologia do Ensino Superior (UniSL)
Coordenadora do Curso de Nutrição do UniSL
Secretária da Associação Brasileira de Educação
em Nutrição (ABENUT)

M992p Muttoni, Sandra.


Patologia da nutrição e dietoterapia / Sandra Muttoni ;
revisão técnica: Juliana S. Closs Correia. – Porto Alegre :
SAGAH, 2017.
373 p. : il. ; 22,5 cm.

ISBN 978-85-9502-100-6

1. Nutrição - Doença. 2. Dietoterapia. 3. Nutrição –


Alimentação I. Título.

CDU 616.39

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094


UNIDADE 3
Patologia da nutrição
e dietoterapia nas
enfermidades do sistema
cardiovascular: dislipidemia
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever o que são e quais as funções dos ácidos graxos e das


lipoproteínas.
 Reconhecer os conceitos e as classificações das dislipidemias.
 Identificar os cuidados dietoterápicos que devem ser tomados no
tratamento das dislipidemias.

Introdução
É comprovado a existência de uma relação entre as dislipidemias e o
aparecimento de doenças cardiovasculares, estas estão entre as maiores
causas de mortalidade na atualidade no mundo. A Nutrição exerce um
papel fundamental no controle e prevenção destas doenças, tornando
imprescindível o conhecimento sobre os cuidados dietoterápicos que
devem ser observados.
Neste texto, você vai estudar sobre os tipos de ácidos graxos que
compõe as gorduras, a relação das lipoproteínas com o aparecimento
das dislipidemias, e o manejo nutricional que deve ser aplicado para o
paciente com dislipidemia.
202 Patologia da nutrição e dietoterapia

Ácidos graxos e lipoproteínas: o que são, onde


estão e para que servem?
As gorduras e os lipídeos representam em torno de 34% da energia advinda da
dieta humana. Os lipídios são ricos em energia, fornecendo 9 kcal/g, estes ficam
armazenados nas células adiposas (de gordura) localizadas nos depósitos na
estrutura do corpo humano, sendo essenciais para a sobrevivência do indivíduo.
Na alimentação, basicamente são encontrados três tipos de lipídios: os
triglicerídeos (TG) – que representam 90% dos lipídios que ingerimos, os
fosfolipídios e o colesterol. As principais funções dos TGs são:

 servir como reserva de energia;


 compor as membranas celulares;
 prover ácidos graxos essenciais;
 regular o metabolismo celular, e;
 funções celulares específicas e serem emulsionantes.

Para que você compreenda de uma forma mais especifica, os fosfolipídios


formam a estrutura básica das membranas celulares, enquanto que o colesterol
é o precursor de hormônios, dos ácidos biliares e da vitamina D, além de estar
presente nas membranas celulares e atuar na fluidez destas e na ativação de
enzimas encontradas lá. Os TG são compostos por uma molécula de glicerol
e três de ácidos graxos, e representam umas das formas de armazenamento
de energia mais importantes no organismo, depositados nos tecidos adiposo
e muscular.
Os ácidos graxos (AG), por sua vez, são ácidos orgânicos que contém de 2
a 24 átomos de carbono em sua composição, possuem um grupo de carboxila
único e uma cadeia hidrocarbonada não polar, que é responsável por conferir
à maioria dos lipídios da natureza a sua característica oleosa e gordurosa, e
insolúvel em água. Raramente os AGs estão livres na natureza, estando normal-
mente ligados a outras moléculas por seu grupo principal de ácido carboxílico
hidrofílico,ou seja, com afinidade por água. Os ácidos graxos são classificados
pelo comprimento da cadeia de carbono, pelo número de duplas ligações na
cadeia de carbono, e pela configuração das duplas ligações. Cada espécie
de plantas e animais apresenta ácidos graxos de cadeias de comprimentos e
saturação específicos à sua necessidade estrutural e metabólica. Em relação
à saturação, cada carbono em uma cadeia de ácido graxo possui quatro locais
de ligação com o hidrogênio. Assim, esta longa cadeia hidrocarbonada, por
exemplo, pode ser totalmente saturada, ou seja, conter apenas ligações simples,
Patologia da nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular 203

ou insaturada, com uma ou mais duplas ligações. Se possuírem somente uma


dupla ligação, são denominados monoinsaturados, e com mais de uma dupla
ligação são os poli-insaturados.
Os ácidos graxos saturados (SFA) podem ser divididos em dois grupos:

 os de cadeia média (que contém entre 8 e 12 átomos de carbono na


cadeia), e;
 os de cadeia longa (acima de 14 átomos de carbono).

Os principais ácidos graxos saturados de cadeia longa são:

 láurico (12:0), encontrado no óleo de coco;


 mirístico (14:0), encontrado no leite e seus derivados;
 palmítico (16:0), encontrado na gordura animal, e no óleo de palma,
sendo o mais abundante na alimentação humana, e;
 o esteárico (18:0), presente na gordura do cacau.

À temperatura ambiente, os ácidos graxos saturados de cadeia longa encon-


tram-se no estado sólido, à exceção do óleo de coco, que é altamente saturado,
porém semilíquido à temperatura ambiente, em razão de que os ácidos graxos
predominantes são curtos, possuindo entre 8 e 14 carbonos de comprimento.
Sobre os ácidos graxos monoinsaturados, o mais comum encontrado
na natureza é o oleico (C18:1), seria o ômega-9, presente no óleo de oliva,
óleo de canola, oleaginosas (castanha, amêndoa, nozes), azeitona e abacate.
Já os AGs poli-insaturados podem ser classificados como ômega-3 (eico-
sapentaenoico, docosahexaenoico e linolênico), ou ômega-6 (linoleico), de
acordo com a presença da primeira dupla ligação entre os carbonos, a partir
do grupo hidroxila. Entre os poli-insaturados, o ácido linoleico (ômega-6) é
o mais abundante e consumido, sendo considerado essencial, pois não pode
ser sintetizado pelos seres humanos e outros mamíferos, e por isso deve ser
obtido através do seu consumo.

 As principais fontes de ômega-6 são: os óleos vegetais, como girassol,


milho e soja.
 O ômega-3 pode ser encontrado em: vegetais, como linhaça e soja, e
em peixes de águas muito frias e profundas, como salmão, sardinha,
cavala e arenque.
204 Patologia da nutrição e dietoterapia

Assim, como podemos concluir, os ácidos graxos que formam os triglice-


rídeos refletem os constituintes de ácido graxo da planta ou do animal.

Lipoproteínas
Você já estudou sobre o colesterol, fosfolipídios, TG e ácidos graxos livres
(AGL), e como eles são os principais lipídios encontrados no plasma humano.
Estes exercem funções vitais para o organismo, mas como você sabe, estas
moléculas são insolúveis em água. Por esta razão, para que cheguem aos
tecidos e executem suas funções, elas devem ser transportadas por complexas
moléculas solúveis em água, que são denominadas lipoproteínas. A exceção
está em relação aos AGL, que são transportados pela albumina.
As lipoproteínas são compostas por uma porção nãopolar e hidrofóbica,
que contém os triglicerídeos e o colesterol esterificado,estes cobertos por uma
superfície polar hidrofílica, formada por fosfolipídios, colesterol livre e prote-
ínas. As proteínas são componentes-chave das lipoproteínas, pois atuam como
cofatores enzimáticos e participam da ligação com os receptores celulares.
Estas proteínas são denominadas de apoproteínas e são divididas em grupos
A, B, C, D e E, e cada grupo possui os seus respectivos subgrupos. De acordo
com as suas propriedades físicas, densidade e mobilidade eletroforética, as
lipoproteínas são classificadas como mostraremos a seguir:

 Quilomícrons: são formados nas células epiteliais intestinais e secreta-


dos nos vasos linfáticos, para então alcançarem a circulação sistêmica.
Seu tamanho e composição estão relacionados com os constituintes
lipídicos da dieta. Sua função é transportar os triglicerídeos e o colesterol
da dieta ou exógenos do lúmen intestinal para os sítios metabólicos, ou
para estoque. As apoproteínas que compõe os quilomícrons são: Apo
B-48, A-I, A-II e A-IV.
 VLDL (Verylowdensitylipoprotein): são lipoproteínas de muito baixa
densidade que são formadas pelo fígado, onde seu principal compo-
nente é o triglicerídeo, embora,o colesterol, os ésteres de colesterol e
os fosfolipídios também sejam encontrados na sua composição. Sua
função é transportar os triglicerídeos sintetizados endogenamente
e o colesterol para os tecidos periféricos, para que os ácidos graxos
possam ser utilizados como fonte de energia ou estocados como TG. As
apoproteínas encontradas nas VLDL são: Apo B-100, Apo C e Apo E.
 LDL (Low-densitylipoprotein): as lipoproteínas de baixa densidade
são as maiores transportadoras de colesterol para o tecido nervoso,
Patologia da nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular 205

membranas celulares e outras células que necessitam de colesterol para


as suas funções metabólicas, incluindo síntese de hormônios esteroides.
Normalmente, a formação de LDL ocorre após a ação enzimática sobre
a VLDL. A Apo B-100 é a apoproteína encontrada na estrutura da LDL.
 HDL (High-densitylipoprotein): as lipoproteínas de alta densidade são
sintetizadas pelo fígado, pelo trato gastrintestinal e pela degradação
enzimática dos quilomícrons e das VLDL. Seus maiores componentes
lipídicos são os ésteres de colesterol, e eles contêm a maior quantidade
de proteínas do que qualquer outra lipoproteína. As maiores apoproteínas
encontradas são a Apo A-I e Apo A-II. A HDL é uma lipoproteína de
extrema importância, pois cabe a ela participar do transporte reverso
do colesterol, quando o colesterol presente nos tecidos periféricos é
levado de volta ao fígado para a sua reutilização.
 Lipoproteína (a): é produzida pelo fígado e tem estrutura similar a LDL,
mas é caracterizada pela presença de uma proteína adicional chamada
apoproteína (a), Apo(a). Seu metabolismo, no entanto, é distinto da
LDL, pois ela possui meia-vida maior do que a LDL e não é removida
do plasma pelos receptores de LDL. A função fisiológica da Lp(a) não
é conhecida, mastêm sugeridoevidências de que ela está associada à
formação e progressão da placa aterosclerótica.

Existem dois ciclos de transporte dos lipídios no organismo humano:


 o ciclo exógeno para o fígado;
 o endógeno para os tecidos extra-hepáticos.
No primeiro ciclo participam os quilomícrons e seus remanescentes,estes levam
as gorduras do intestino (advindas do consumo dietético) para as células do fígado.
Enquanto que no segundo ciclo (endógeno) as VLDL e LDL estão envolvidas, res-
ponsáveis por carregar o colesterol do fígado para os tecidos extra-hepáticos. De
forma simultânea está ocorrendo o transporte reverso do colesterol, onde a HDL está
captando o colesterol livre dos tecidos extra-hepáticos para serem excretados na bile
como ácidos biliares ou colesterol livre.
206 Patologia da nutrição e dietoterapia

Dislipidemias: conceitos e classificações


As dislipidemias correspondem a alterações dos níveis sanguíneos dos lipí-
dios circulantes no plasma. Quando estes níveis estão aumentados, têm-se as
hiperlipidemias, que são classificadas em hipercolesterolemia (aumento de
colesterol) e hipertrigliceridemia (aumento de triglicerídeos).

O termo dislipidemia é o mais correto a ser utilizado em relaçãoao termo hiperlipi-


demia, porque essas alterações podem ser tanto de natureza quantitativa quanto
qualitativa e, por esta razão, dislipidemia se aplica melhor a ambas as situações. No
caso da HDL, por exemplo, a anormalidade está relacionada às baixas concentrações
sanguíneas desta lipoproteína. As dislipidemias estão intimamente relacionadas com
a ocorrência de doença aterosclerótica cardiovascular (DAC), e também de outras
doenças, como a pancreatite.

Os exames laboratoriais permitem classificar as dislipidemias. Para que


essa classificação ocorra, a coleta de sangue deve ser realizada após o paciente
realizar um jejum de 12 horas para que possa ser feita a análise das concen-
trações séricas de triglicerídeos, como também para o cálculo do colesterol
da LDL (LDL-c). As determinações do colesterol total (CT), apo B, apo A-I e
colesterol da HDL (HDL-c) não necessitam que seja realizado o jejum. Ainda,
para que seja determinado o perfil lipídico do indivíduo, é importante que o
mesmo esteja com a sua dieta habitual, estado metabólico e peso estáveis
por pelo menos duas semanas antes da realização dos exames. Além disso, a
ingestão de álcool e a prática de atividade física vigorosa devem ser evitadas
nas 72 e 24 horas que antecedem a coleta de sangue, respectivamente. Tendo
sido observados todos esses cuidados, os valores referenciais para avaliação
do perfil lipídico estão apresentados na Tabela 1:
Patologia da nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular 207

Tabela 1. Valores referenciais do perfil lipídico para adultos maiores de 20 anos.

Valores (mg/dL) Categoria

Lipídeos < 200 Desejável


colesterol total 200-239 Limítrofe

≥ 240 Alto

LDL-c < 100 Ótimo

100-129 Desejável

130-159 Limítrofe

160-189 Alto

≥ 190 Muito alto

HDL-c > 60 Desejável

< 40 Baixo

Triglicerídeos < 150 Desejável

150-200 Limítrofe

200-499 Alto

≥ 500 Muito alto

Colesterol não HDL < 130 Ótimo

130-159 Desejável

160-189 Alto

≥ 190 Muito alto

Fonte: Xavier et al. (2013, p. 3).

De acordo com a sua etiologia, as dislipidemias podem ser classificadas


como:

 primárias: quando são resultantes de alterações genéticas e ambientais,


ou;
 secundárias: quando aparecem devido a outras doenças ou uso de de-
terminados medicamentos.
208 Patologia da nutrição e dietoterapia

Nas dislipidemias primárias, que não tem causa aparente, pode ser realizada
a sua classificação genotípica, onde serão chamadas de monogênicas quando
forem causadas por mutações em só um gene, e poligênicas quando causadas
por associações de múltiplas mutações que isoladamente não seriam respon-
sáveis por grande repercussão. Você também pode classificar as dislipidemias
fenotipicamente, por meio de análises bioquímicas que consideram os valores
de CT, LDL-c, TG e HDL-c, e são divididos nos grupos apresentados a seguir:

 Hipercolesterolemia isolada: corresponde à elevação isolada do LDL-c


(≥ 160 mg/dL).
 Hipertrigliceridemia isolada: corresponde à elevação isolada dos TGs
(≥ 150 mg/dL). Esta medida reflete o aumento do número e/ou volume
de partículas ricas em TG, como VLDL, lipoproteína de densidade
intermediária e quilomícrons.
 Hiperlipidemia mista: corresponde a valores aumentados de LDL-c
(≥ 160 mg/dL) e TG (≥ 150 mg/dL).
 HDL-c baixo: corresponde à redução do HDL-c (homens < 40 mg/dL
e mulheres < 50 mg/dL) isolada ou em associação com o aumento de
LDL-c ou de TG.

Já as dislipidemias secundárias são consequências de doenças subjacentes.


Nestes casos, o diagnóstico e tratamento da doença em questão são impres-
cindíveis para o sucesso do tratamento da dislipidemia. Alguns exemplos
de doenças e substâncias que podem causar dislipidemias: hipotireoidismo,
doenças renais (síndrome nefrótica e insuficiência renal crônica) e a diabetes
mellitus, bem como o uso de medicamentos, como diuréticos, corticoides,
retinóides, betabloqueadores e estrógenos.

A maioria dos pacientes com dislipidemias não apresentam sintomas ou sinais decor-
rentes diretamente da alteração do seu perfil lipídico. No entanto, em alguns casos
mais raros de dislipidemias graves (que tem geralmente um componente familiar),
pode ocorrer acúmulo de material lipídico em determinados locais, como: olhos,
pele, tendões e sistema nervoso. Alguns exemplos destas alterações são os xantomas
eruptivos, tuberosos e tendinosos, e o arco halo córneo.
Patologia da nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular 209

Manejo nutricional nas dislipidemias


Existem diversos fatores de risco para a ocorrência de doenças cardiovascu-
lares, tais como:

 aumento da idade;
 história familiar de doença cardiovascular prematura;
 tabagismo;
 hipertensão arterial sistêmica;
 diabetes;
 obesidade;
 estresse;
 aumento dos níveis de colesterol total (especialmente dos níveis de
LDL-c).

A dieta exerce um papel fundamental para diversos destes fatores, e por isso
a terapia nutricional sempre deve ser adotada. Para o tratamento do paciente
dislipidêmico, deve ser levado em conta o tipo de prevenção cardiológica es-
perado, o nível de LDL-c e triglicerídeos encontrados, e a presença de fatores
de risco. O sucesso do tratamento irá depender da adesão do paciente à dieta,
da correção do estilo de vida (perda de peso, atividade física e cessação do
tabagismo), mas também da influência genética da dislipidemia.
Particularmente em relação à hipercolesterolemia, o consumo de determi-
nados tipos de ácidos graxos exerce influência sobre o perfil lipídico, onde
ácidos graxos saturados elevam o colesterol plasmático e são considerados
aterogênicos. Aqui estão exemplos destes ácidos graxos para você: ácido
láurico (encontrado no óleo de coco), ácido mirístico (encontrado nas gor-
duras animais, leite e seus derivados), e o ácido palmítico (encontrado nas
gorduras animais e no azeite-de-dendê). Em contrapartida, os ácidos graxos
monoinsaturados e poli-insaturados estão associados com a diminuição dos
níveis de colesterol total e LDL-c, além de serem antitrombóticos e inibirem
a agregação plaquetária.
A gordura trans, por sua vez, surgiu a partir da hidrogenação de ácidos
graxos insaturados, sendo utilizada para a produção de margarina e gordura
vegetal hidrogenada. A hidrogenação destas gorduras possibilitou que gor-
duras que se apresentavam no estado líquido à temperatura ambiente fossem
utilizadas no estado sólido, o que trouxe uma série de benefícios culinários,
especialmente para a indústria de alimentos. Entretanto, o que se evidenciou
mais tarde, é que as gorduras trans possuíam propriedades físicas, químicas e
210 Patologia da nutrição e dietoterapia

metabólicas semelhantes às dos ácidos graxos saturados, mas com um prejuízo


adicional, porque além de elevar o LDL-c, reduziam o HDL-c. Atualmente
o controle dietético do paciente com dislipidemia deve prever uma restrição
rigorosa de produtos que contenham gorduras trans.
O colesterol, como já vimos, possui uma série de funções vitais para o
organismo e como fonte alimentar é encontrado somente nos alimentos de
origem animal, tais como: leite integral e derivados, carnes vermelhas gordu-
rosas, peles de aves, bacon, embutidos (presunto, salame, mortadela), gema
de ovo, vísceras (fígado, coração, língua), e frutos do mar (lagosta, camarão,
ostra, marisco). Embora esteja presente em todos estes alimentos, a maior
parte da síntese do colesterol é realizada pelo fígado. No entanto, pacientes
com hipercolesterolemia também devem controlar a ingestão de alimentos
ricos em colesterol.
Em relação à hipertrigliceridemia, medidas terapêuticas devem ser adotadas
quando os níveis de triglicerídeos atingem valores superiores a 150 mg/dL, e
a intervenção dietética entra como o primeiro passo do tratamento.
No caso de pacientes com níveis muito elevados de TG e portadores de
hipertrigliceridemia primária é recomendado uma redução severa da gordura
total da dieta. Quando a hipertrigliceridemia é secundária à obesidade ou
diabetes, recomenda-se dieta hipocalórica e controle do diabetes, respecti-
vamente adequado à cada situação. Também é recomendada a restrição do
consumo de álcool.
A American Heart Association (AHA – Associação Americana do Coração)
estabelece recomendações dietéticas para o tratamento das hipercolesterole-
mias, que o profissional nutricionista deve seguir no momento de planejar o
plano dietético do paciente. Estas recomendações estipulam que:

 25 a 35% das calorias totais da dieta devem vir da gordura total da


dieta; sendo que os ácidos graxos saturados devem contribuir com
< 7% das calorias totais, os ácidos graxos poli-insaturados com até 10%
das calorias totais, e os ácidos graxos monoinsaturados com até 20%
das calorias totais da dieta.
 50 a 60% das calorias totais da dieta devem ser fornecidas pelos
carboidratos.
 Proteínas devem responder por aproximadamente 15% das calorias
totais da dieta.
 A quantidade de colesterol da dieta deve ser < 200 mg/dia.
 A quantidade de fibras da dieta deve alcançar entre 20 a 30 g/dia.
Patologia da nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular 211

 As calorias totais da dieta devem ser planejadas com o intuito de atingir


o peso desejável de cada paciente.

Como você pode observar, o tratamento dietoterápico para as dislipidemias


sempre iniciará com o controle do consumo de gorduras, onde o profissional
nutricionista deverá indicar as quantidades e a frequência do consumo destes
alimentos, e também as possíveis substituições destes alimentos e o modo de
preparo dos mesmos, sempre procurando respeitar os hábitos alimentares e o
estilo de vida do paciente, uma vez que a adesão ao tratamento é fundamental
para o sucesso do mesmo. Informar o paciente sobre a importância da adesão
ao tratamento e a mudança no estilo de vida, é essencial para o engajamento
do mesmo no processo de mudança.
A dietoterapia para o controle das dislipidemias deve ter os seguintes
objetivos:

 reduzir os níveis de colesterol total, LDL-c e TG;


 controlar a ingestão de gorduras saturada e colesterol;
 aumentar o consumo de fibras;
 promover uma nutrição adequada e o fornecimento energético correto;
 transformar os hábitos alimentares de forma permanente;
 alterar os fatores de risco que são modificáveis pela dieta, atuando na
prevenção das doenças cardiovasculares.
212 Patologia da nutrição e dietoterapia

O ovo já foi motivo de muita controvérsia em relação ao seu consumo e o cuidado


nutricional para pacientes com hipercolesterolemia. Isso porque um simples ovo pode
conter de 50 a 250 mg de colesterol, dependendo do seu tamanho. Por esta razão,
as recomendações atuais restringem o consumo deste alimento. No entanto, estas
recomendações estão sendo revistas e, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia na
I Diretriz sobre o consumo de gorduras e saúde cardiovascular, parece que o consumo
de um ovo ao dia pode ser aceitável, desde que outros alimentos ricos em colesterol
sejam limitados na dieta. Quanto a isso, a forma de preparo do ovo também deve ser
observada, uma vez que prepará-lo frito ou mexido implica na adição de gorduras,
aumentando as calorias e, dependendo o tipo de gordura, também o colesterol.
Vale lembrar que o ovo é um alimento de baixo custo e excelente fonte de muitos
nutrientes, como vitaminas, sais minerais, proteínas de alta qualidade e lipídeos que
aumentam a biodisponibilidade de vários destes nutrientes. Estes lipídios, minerais e
vitaminas estão presentes quase exclusivamente na gema, sendo a clara responsável
pela fonte proteica.
Patologia da nutrição e dietoterapia nas enfermidades do sistema cardiovascular 213

1. São funções do colesterol: celulares e outras células que


a) Conter uma molécula de glicerol necessitam de colesterol para
e três de ácidos graxos. suas funções metabólicas.
b) Ser precursor da vitamina D. c) Participar do transporte
c) Armazenar energia no tecido reverso do colesterol.
adiposo e muscular. d) Não tem uma função conhecida,
d) Formar a estrutura básica mas evidências têm sugerido
das membranas celulares. que ela está associada à
e) Representar 90% dos formação e progressão da
lipídios que ingerimos. placa aterosclerótica.
2. Quantos átomos de carbono e) Transportar os triglicerídeos
contém a cadeia do ácido sintetizados endogenamente
graxo saturado mirístico? e o colesterol para os tecidos
a) 8. periféricos, para que os ácidos
b) 12. graxos possam ser utilizados
c) 16. como fonte de energia ou
d) 18. estocados como TG.
e) 14. 5. São recomendações da AHA para o
3. São fontes de ômega-3: tratamento das hipercolesterolemias:
a) Óleo de oliva. a) < 7% das calorias totais da dieta
b) Óleo de girassol. devem advir dos AG saturados.
c) Nozes. b) Carboidratos devem
d) Peixes de águas muito corresponder a 45% das
frias e profundas. calorias da dieta.
e) Óleo de milho. c) A maior parte das calorias
4. Qual o papel da lipoproteína HDL? da dieta deve ser composta
a) Transportar os triglicerídeos e o por proteínas, especialmente
colesterol da dieta ou exógenos as de alto valor biológico.
do lúmen intestinal para os sítios d) A quantidade de colesterol da
metabólicos, ou para estoque. dieta deve ser < 400 mg/dia.
b) Transportar colesterol para o e) A quantidade de fibras da dieta
tecido nervoso, membranas deve alcançar entre 10 a 15 g/dia.
214 Patologia da nutrição e dietoterapia

Referência

XAVIER, H. T. et al. V Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose. Ar-


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text>. Acesso em: 30 mar. 2017.

Leituras recomendadas
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composição corporal na predição do percentual de gordura e perfil lipídico em es-
colares. Revista Paulista de Pediatria, São Paulo, v. 30, n. 4, p. 520-528, 2012. Disponível
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FARRET, J. F. Nutrição e doenças cardiovasculares: prevenção primária e secundária.
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lipoproteína-E sobre a relação perfíl lipídico, atividade física e gordura corporal.
Revista Brasileira de Cineantropometria e Desempenho Humano, v. 14, n. 2, p. 221-231,
2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbcdh/v14n2/v14n2a11.pdf>. Acesso
em: 30 mar. 2017.
SANTOS, R. D. et al. I Diretriz sobre o consumo de Gorduras e Saúde Cardiovascular.
Arquivos Brasileiros de Cardiologia, São Paulo, v. 100, n. 1, supl. 3, p. 1-40, 2013. Disponível
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0066-782X2013000900001&script=sci_
arttext>. Acesso em: 30 mar. 2017.
SCHWERTZ, M. C. et al. Efeito hipolipidêmico do suco de camu-camu em ratos. Revista
Nutrição, Campinas, v. 25, n. 1, p. 35-44, jan./fev. 2012. Disponível em: <http://www.
scielo.br/pdf/rn/v25n1/a04v25n1.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2017.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Conteúdo:
Dica do professor
Existem alguns fatores dietéticos, os chamados compostos funcionais, que ainda não tiveram total
comprovação de seus efeitos benéficos na prevenção das dislipidemias e do risco cardiovascular.

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Exercícios

1) São funções do colesterol:

A) Conter uma molécula de glicerol e três de ácidos graxos.

B) Ser precursor da vitamina D.

C) Armazenar energia no tecido adiposo e muscular.

D) Formar a estrutura básica das membranas celulares.

E) Representar 90% dos lipídios que ingerimos.

2) Qual o papel da lipoproteína HDL?

A) Transportar os triglicerídeos e o colesterol da dieta ou exógenos do lúmen intestinal para os


sítios metabólicos, ou para estoque.

B) Transportar colesterol para o tecido nervoso, membranas celulares e outras células que
necessitam de colesterol para suas funções metabólicas.

C) Participar do transporte reverso do colesterol.

D) Não tem uma função conhecida, mas evidências têm sugerido que ela está associada à
formação e progressão da placa aterosclerótica.

E) Transportar os triglicerídeos sintetizados endogenamente e o colesterol para os tecidos


periféricos, para que os ácidos graxos possam ser utilizados como fonte de energia ou
estocados como TG.

3) São recomendações da AHA para o tratamento das hipercolesterolemias:

A) <7% das calorias totais da dieta devem advir dos AG saturados.

B) Carboidratos devem corresponder a 45% das calorias da dieta.

C) A maior parte das calorias da dieta deve ser composta por proteínas, especialmente as de alto
valor biológico.
D) A quantidade de colesterol da dieta deve ser < 400 mg/dia.

E) A quantidade de fibras da dieta deve alcançar entre 10 a 15 g/dia.

As dietas hospitalares podem sofrer várias modificações. As modificações químicas estão


4) relacionadas com:
A)
Características qualitativas.

B)
Exclusão de macronutrientes.

C) Aumento obrigatório do valor calórico.

D)
Redução considerável e necessária do valor calórico.

E)
Exclusão de micronutrientes.

5) Como é classificada a condição onde o paciente apresenta pressão arterial sistólica entre
121 e 139 mmHg e/ou pressão arterial diastólica entre 81 e 89 mmHg?

A)
Pré-hipertensão.

B)
Hipertensão.

C)
Hipertensão mascarada.

D)
Hipertensão do avental branco.

E)
Normotensão.
Na prática
O consumo de gorduras é fundamental para o organismo. Muitos processos metabólicos dependem
das gorduras para acontecer, assim como o transporte e armazenamento de diversas substâncias,
sendo que a própria membrana celular apresenta lipídio em sua composição.

Entretanto, é preciso saber consumir de maneira adequada as fontes benéficas de gordura


(insaturadas) e restringir aquelas que estão envolvidas com o surgimento das dislipidemias
(saturadas, trans e colesterol). Ou seja, a qualidade da gordura consumida é fundamental para a
prevenção e o tratamento das dislipidemias, sem a necessidade de oferecer uma dieta hipolipídica.
Assim, este é um dos principais papéis do nutricionista: elaborar planos alimentares que
contemplem tais recomendações.

Observe a seguir formas de analisar fontes de gordura por grupos de alimentos e sugestões para
substituição no cardápio do dia a dia.
Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Influência do gene da apolipoproteína-E sobre a relação perfíl


lipídico, atividade física e gordura corporal

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Parâmetros antropométricos e de composição corporal na


predição do percentual de gordura e perfil lipídico em escolares

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Disponibilidade domiciliar de lipídeos para consumo e sua


relação com os lipídeos séricos de adolescentes

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Efeito hipolipidêmico do suco de camu-camu em ratos


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V Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da


Aterosclerose

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