Edição Livro
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Melissa Vieira
LIVRO NOVO
Melissa Vieira
2018
Copyright © 2018 por Melissa Vieira.
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responsáveis.
Revisão:
Diagramação:
Capa:
Imagem de capa:
Fontes da capa:
ISBN:
CDD: B869.3
CDU:
Sumário
A viagem 13
Um café para já 17
Ligação especial 18
A reunião 19
A boate 25
O doente 27
O documento 28
Extremos 30
Teste particular 32
A última a saber 37
Ascensão e queda 38
A matriarca 41
Noite chuvosa 42
Outro lar 45
Reviravolta 47
A aposta 48
Boas notícias 50
Primeiras impressões 51
Fora de controle 54
A substituta 56
Nossos problemas 58
Consequências 59
A grande decisão 61
Nada pessoal 64
Novidade 65
Um bom motivo 66
A oportunidade 67
O coquetel 70
A esposa 75
O casamento 76
A todos os homens do mundo.
O que se crê senhor dos demais, não deixa de ser mais escravo do que
eles.
Jean-Jacques Rousseau.
Prólogo – Carta à Hendrick
Aqui estamos mais uma vez.
Você entra, me cumprimenta e vamos para aquela sala. A nossa sala.
Deito-me naquele sofá e você se senta à minha esquerda numa confortável
cadeira. Lá, você abre sua pasta e retira um papel repleto de anotações.
Anotações sobre mim, minha família, meus amigos... Meus demônios. De
alguns deles você me já ouviu falar tanto sobre que até parece que os conhece
pessoalmente.
Já fazem anos desde a primeira vez.
Esse apartamento mudou. Essa sala mudou. Eu mudei. Você mudou.
Ao mesmo tempo, anos depois, ainda o vejo de soslaio ajeitar seus óculos
empurrando o meio da armação com o indicador. Você o faz a cada dez
minutos aproximadamente. Certa vez eu te contei isso e você riu, admirado de
minha observação... E então anotou. Você anota tudo, ou pelo menos é a
impressão que tenho.
Depois de nos acomodarmos, você me pergunta como foi minha semana.
Se algo me estressou, o porquê, se dormi bem, se tive mais pesadelos... É
interessante como você sabe se menti. Se digo que ficou tudo bem e na verdade
não ficou você pergunta se tenho certeza.
“Nunca é nada demais”, você diz.
Então eu conto.
Eu não sei como você regula isso, mas às vezes temos a pauta de assuntos
proibidos. Normalmente eu não quero fazer essa parte, mas você insiste, diz
que é necessário. Mais do que aquilo que me deixa confortável. Começamos
então... E o fim por vezes é só um.
“Você quer chorar?”, pergunta.
Eu fico em silêncio.
“Você pode”.
As duas palavras mágicas. Com elas você me obriga a reabrir as feridas.
Com elas você me faz mergulhar no abismo do meu passado. Você traz à tona
os problemas, as discussões, os gritos... As lágrimas.
Você retira o véu que me impede de ser mais sentimento que razão. Você
retira de mim as responsabilidades. Você retira de mim a imposição do guardar
para si. Você retira de mim o “Acorde! Você precisa fazer dinheiro!”. Não há
espaço para isso aqui.
Aqui eu não sou o CEO. Aqui eu sou só eu. Somos só nós.
E enquanto não soubermos as respostas de tudo, enquanto não
encontrarmos a solução para todos os problemas, seguiremos aqui.
Eu e você. Você e eu.
É estranho como trazer os problemas de volta faz com que aos poucos eles
deixem de fazer diferença. Aos poucos, eles deixam vazios. E por vazios, não
digo os existenciais, mas sim os que eu quero ter. Aqueles que eu quero
preencher quando a hora chegar.
Quando ela chegar, eu sei que você vai estar aqui para me ouvir dizer.
Então você vai me ajudar, assim como me ajudou nos últimos nove anos.
Sentado à minha esquerda, com sua pasta e suas anotações.
Se vai estar tudo bem? Não... E tudo bem. Você diz que torce por mim e eu
acredito.
É por isso que você ainda está aqui.
É por isso que você não se despede dizendo que eu preciso ficar bem.
Porque eu não preciso.
Por isso você diz que amanhã é um novo dia. Porque amanhã eu posso não
repetir os erros de ontem.
Porque amanhã vai ser melhor... Ou não. E tudo bem.
Porque mesmo se estiver ou não, aqui estaremos mais uma vez.
A viagem
Enquanto assisto as gotas de chuva fina escorrerem pelo vidro do ônibus,
me despeço de minhas incertezas. Elas precisam ficar para o meu próprio bem.
O dia está tão nublado quanto meu coração. Sinto um aperto no peito ao me
lembrar de casa, mas cuido para que ele consiga se aquietar. Minha vontade é
fugir daqui, voltar para trás...
NÃO POSSO.
É tudo tão difícil no início, mas hoje pela manhã diluí o medo na água
fervendo de meu chá. Peço a Deus que cuide deles enquanto eu não estiver lá
para cuidar.
Minhas expectativas não são tão grandes. Sei do meu potencial, mas
algumas coisas na vida não dependem apenas de nós. A cidade é tão grande e eu
sou tão pequena... Sei que há espaço, mas ele é meu? Minha mãe me
perguntaria o porquê de não poder ser... Que otimista!
Sinto vontade de chorar todas as vezes que penso nas futuras noites
sozinha. Quem vai me ouvir lamentar sobre um dia ruim antes de dormir? É
claro que eu poderia ligar, mas ainda não sei como as coisas irão funcionar lá.
Lá. A cidade grande. Aquela que de noite é tão clara quanto de dia. A
cidade dos gigantes. A cidade das luzes. A cidade deles.
A minha oportunidade está com eles. Se ao menos eu fosse um deles... Eles
têm tantos nomes que é difícil guardar.
Eu estou indo lá para vê-los... Para que eles me vejam.
Estava longe de seus olhos. Eu precisava chegar mais perto se quisesse ser
vista e agora finalmente estou chegando.
Tenho um número de emergência. Eles me disseram que se algo desse
errado eu deveria ligar para ele.
Eu não sei de quem ele é, mas dizem que ele sabe quem eu sou. Na cidade
das luzes eu sou alguém para alguém.
———
A reunião
De pé ao lado da mesa, Amy esperava por ele. Tendo checado que o café
estava em seu devido lugar, restava apenas que esperasse e tentasse controlar o
fato de estar ofegante.
Está tudo aqui, Amy. Calma. Você chegou no horário, pensou.
Quando o elevador parou naquele andar, Amy sentiu um arrepio percorrer
todo o seu corpo. Ela não tinha boas notícias.
Por que não vêm eles mesmos dar suas notícias ruins e ouvir os
xingamentos dos outros?
Apesar de estar se perguntando aquilo, de certa forma ela já sabia a
resposta. Existiam motivos claros para aquelas conversas não acontecerem.
Talvez fosse até pior que viessem!
Ele adentrou a sala, passou por ela, sentou-se, e tomou um gole do café,
como sempre. Uma tarefa de poucos segundos que para Amy durava uma
eternidade. Tendo meneado a cabeça positivamente, ela se aproximou e
preparou-se para o que iria dizer.
— Bom dia, senhor.
— Bom dia.
— O senhor Michael McKennan pediu uma reunião de emergência agora e
faz questão de que esteja presente.
— Ele disse do que se trata?
— Não.
Ele bufou.
— Já venho — disse levantando-se e levando o café consigo.
— Está bem, senhor.
Ele deixou a sala com uma expressão séria, mas Amy sabia que estava
irritado.
Se o dia já começou assim, salve-se quem puder até o horário de saída,
pensou, intimidada.
———
Enquanto Michael falava, na outra ponta da mesa ele escrevia. Havia sido
assim desde o começo da reunião. Os outros dois que ali estavam se alternavam
em olhar para o homem que falava e para o que escrevia, tentando entender o
motivo daquelas anotações.
— Nós somos uma empresa praticamente familiar! — dizia ele. — É
natural que tenhamos discussões e divergências de opinião, mas precisamos
entender que se não formos uma família unida, não seremos uma empresa
unida. Se a família se distancia, a empresa vai à falência. Falta comunicação
entre os setores e se não resolvermos isso o mais breve possível, não sei o que
faremos.
Quando Michael finalmente acabou de falar, o outro parou de escrever e
ficou olhando para o papel. Incomodado, resolveu puxar assunto com ele.
— Bom, eu acredito que nosso CEO tenha muito a dizer sobre o que acabei
de expor aqui a vocês, já que fez tantas anotações. Por que não começa expondo
sua opinião?
— Quer mesmo minha opinião? — disse levantando o olhar para ele e
encarando-o seriamente.
— Por favor! — desafiou. — Conte-nos o que tanto escreveu nesse papel.
— Esse papel aqui? — perguntou, pegando a folha e chacoalhando-a. —
Anotei minha lista de compras. Aliás... Amy! — chamou, ao que prontamente a
secretária atendeu e pegou o papel. – Tire uma foto disso e mande pro Noah.
— Sim, senhor, com licença — disse, se retirando.
— Achei interessante a forma como prestou atenção ao que eu disse
durante a reunião, senhor — disse Michael.
— O fato de eu estar fazendo outra coisa não justifica sua afirmação.
— Então diga o que achou!
— Sinceramente? Uma perda de tempo.
— Quer explicar?
— Está bem — disse se ajeitando na cadeira. — Primeiro você deveria
sentir vergonha de nos fazer ouvir tanta bobagem logo que chegamos para
trabalhar. Convocar uma reunião de emergência às oito horas da manhã para
falar sobre problemas familiares? Ah, por favor! Isso é discussão de jantar de
família! Eu vou dizer o que realmente acontece por aqui: Temos muitos nessa
empresa que acreditam que podem fazer seu trabalho de qualquer jeito porque
ninguém vai reclamar deles por serem amigos de alguns de nós da diretoria.
Isso é que não pode acontecer! É disso que deveríamos estar falando e não
dessa perda de tempo de família unida!
— Nossa família não é uma perda de tempo — respondeu Stephen, pai
dele, de Michael e Gabriel, que estava sentado à direita dele.
— Então agora você acha isso?
— Eu nunca pensei diferente!
— Ah não? Tem certeza? Se eu fosse você perguntaria à minha mãe!
— Serena diria a mesma coisa — respondeu Michael. — Não
responsabilize os outros por seus erros.
— Meus? Ah pelo amor de Deus! — disse pegando seu café e levantando-
se. — Eu já ouvi mentiras demais hoje! Se quiserem continuar com esse circo,
boa sorte. Vocês dois são palhaços mesmo! Eu vou para a minha sala fazer algo
que eu recomendaria que todos aqui fizessem para que efetivamente essa
empresa melhorasse: Trabalhassem.
Assim que ele se retirou, Stephen e Michael se entreolharam. Michael
meneou a cabeça negativamente.
— Gabriel!
— Pai? — respondeu prontamente.
— Saia — ordenou sem desviar os olhos para ele. — Preciso falar com
Michael.
— Está bem — disse se levantando e cumprindo a ordem.
Tendo Gabriel deixado a sala, outra reunião começou. Uma reunião que
provocaria graves mudanças na diretoria da McKennan Corporation.
———
— O quê? — gritou.
— É, Michael. — respondeu uma voz masculina atrás dele.
Ele se virou e se deparou com Stephen, encarando-o entristecido.
— Pai, o que é isso? Como assim? — disse, chacoalhando o papel.
— Serena ficou revoltada com a demissão do Adam. Não quero que ela
continue nervosa comigo e por isso tomei essa decisão.
— Não é justo! O que eu tenho a ver com isso?
— As discussões entre você e o Adam são recorrentes, Michael! Não
podemos deixar que isso atrapalhe a empresa!
— Mas pai, Adam foi embora!
— Como eu vou te explicar ... — ele levou as mãos até os lábios.
— Reunião agora, pai — chamou Adam, parando na porta da sala.
Michael olhou para Stephen com terror nos olhos.
— O quê? Ele voltou? — disse, quase que num sussurro.
Stephen meneou a cabeça positivamente, envergonhado. Adam sorriu.
— Adeus, Michael.
— Não! — gritou.
De repente, Michael estava de volta a seu quarto. O celular despertava às
sete horas e ele ainda estava em casa. Tudo fora apenas um pesadelo. Aliviado,
suspirou.
— Ok, não foi nada — disse, tentando se acalmar.
Ele parou o despertador e pegou seu terço sobre o criado mudo.
Só para garantir, pensou.
A aposta
Para Alice King, os homens daquela cidade transpiravam desespero.
Bastava apenas que ela estivesse no lugar e na hora certa para que seus “dotes”
a dessem alguma vantagem. Certo charme, uma voz mais sensual, talvez um
decote... Qualquer coisa que os fizesse abandonar sua autoridade e render-se aos
prazeres da carne já era de grande ajuda para que ela pudesse conseguir certos
favores.
O que Alice não sabia era que assim como ela os estudava, eles também a
observavam... E compartilhavam informações uns com os outros num grupo de
rede social, onde se dedicavam a transformá-la em piada. Enganava-se em
pensar que tirava proveito deles.
Aquela era mais uma manhã comum para Kenny. Ainda sonolento, ele
aguardava o início da reunião na sala de espera da McKennan. Na noite
anterior, havia ficado acordado até quatro horas da manhã mesmo sabendo que
precisaria estar na McKennan bem cedo. Agora, faltando cinco minutos para as
oito horas, lutava para permanecer acordado.
— Por que tão cedo? — balbuciou, levantando-se e caminhando em direção
à mesa do coffee break.
Kenny pegou um copo e serviu um pouco de café da garrafa para si. Numa
tentativa de aumentar o efeito da cafeína, resolveu tomá-lo sem açúcar, o que
considerou um erro quando segundos depois o líquido amargo desceu por sua
garganta.
— Que horror — sussurrou.
— Precisa de açúcar? – perguntou uma voz feminina ao longe.
— O quê? — perguntou, virando-se na direção da voz.
A alguns metros dele, a moça loira estava encostada na porta. Usando um
vestido cinza justo ao corpo, ela o encarava com malícia.
— Perguntei se precisava de açúcar — disse se aproximando.
— Ah... Não. Eu estou bem. Tomei-o sem açúcar pra ver se acordava.
Ela riu.
— Entendi... Já nos conhecemos? — perguntou.
— Não, mas podemos. Sou Alice King — disse, estendendo a mão.
— Kenneth Wright — disse cumprimentando-a.
Então é ela!
Já fazia algum tempo que Kenny tinha conhecimento da fama de Alice e
aguardava a hora de agir. Ela precisava de uma lição. Agora o momento certo
havia chego e ele não perderia aquela chance.
— Então você é a filha do senhor King? — perguntou para confirmar.
— Isso mesmo.
— É bonita como disseram. Na verdade, um pouco mais.
— Obrigada.
Eles são tão fáceis! Pensou, orgulhosa.
— Não foi nada.
Ela é tão oferecida que sequer me esforcei, gabou-se.
— Diga-me, o senhor pretende fazer algo hoje à noite?
— Infelizmente sim, pretendo. Por quê?
— Bom, podíamos jantar um dia desses.
— Seria ótimo.
— Então vamos fazer o seguinte: Você fica com meu telefone e quando
tiver tempo, me liga e marcamos.
— Ótima sugestão. Você é rápida, não?
— Por que ir devagar?
— Concordo — disse rindo e puxando o celular do bolso.
Enquanto ele digitava, Alice sorria orgulhosa. Já havia ouvido seu pai falar
dele, sobre como era rico. Kenny por sua vez, só pensava no que contaria
àqueles homens assim que se afastasse dela. Ela não sabia sobre o “trabalho
paralelo” dele.
Eles vão gostar de saber. Ela vai enlouquecer quando descobrir. Queria
muito estar lá para ver!
Se tinha algo que Alice não suportava, era o fato de seu pai andar com
prostitutas. Ela sempre se irritava quando esbarrava com elas e prometia a seu
pai que iria descobrir quem era o contato dele e fazer um escândalo quando o
encontrasse.
Pobre Alice, mal sabia que estava falando com ele.
Boas notícias
Ainda sonolento com o efeito dos remédios, o homem loiro esforçava-se
para ler a notícia no celular. O nome era conhecido e havia lhe chamado a
atenção. Quando conseguiu ler, mal acreditou. Em meio a toda aquela
frustração por ter de ficar repousando em casa, algo o fez sorrir.
— A-Amber... — gritou com a voz um pouco falha, antes de tossir.
— O que foi, querido? — disse vindo apressadamente do quarto.
— Eu estou lendo isso mesmo ou essa droga de remédio também me faz
alucinar? — disse virando o celular na direção dela.
— Deixe-me ver... Anunciada a demissão do CEO da McKennan
Corporation. A demissão teria ocorrido na tarde de ontem, mas só veio a
público nesta manhã. — ela voltou-se para o homem. — É ele?
Ele sorriu, meneando a cabeça positivamente.
— Por que está feliz? Ele não é seu amigo?
— É.
— Então?
— Ele é um dos meus melhores amigos... E nosso futuro CEO.
Primeiras impressões
Usando a mesma roupa da noite anterior que, graças à Noah e Danielle
agora estava seca, Megan tomava café. Havia tantas opções que precisou de
alguns segundos para escolher o que comer, mas logo se decidiu por um pedaço
de bolo de laranja e um pouco de suco. Propositalmente, Noah a havia colocado
sentada de frente para a sala, para que visse qual seria sua expressão ao ver
Adam. Ela, no entanto, não sabia disso.
Vamos ver o que a senhorita vai achar dele, pensou, animado.
A escolha de Megan foi interrompida quando Adam surgiu no corredor. Ao
vê-lo de terno preto, camisa branca e gravata preta com listras brancas, Megan
teve de se esforçar para esconder sua surpresa. Noah, que observava ao longe,
sorriu com os lábios fechados. Concentrado, digitando algo no celular, Adam
não reparou no que acontecia.
— Bom dia, senhor! — disse Noah, acompanhando-o até a mesa e puxando
sua cadeira.
— Bom dia, Noah — disse sentando-se, sem tirar os olhos do celular.
— O senhor vai querer ler o jornal?
— Não, não quero me estressar. Já sei qual a matéria da capa.
— Claro. Tem razão.
Enquanto Adam digitava, Megan o observava. Na noite anterior estava
escuro e, com a velocidade com que tudo aconteceu, ela não havia reparado
bem em como ele era. Agora, porém, finalmente conseguia vê-lo bem... E
gostava do que via.
Ele é lindo!
A atenção dele ao celular salvou Megan de ser pega olhando-o boquiaberta.
Ao perceber que o fazia, ela meneou a cabeça negativamente e voltou sua
atenção à comida. Noah, que a observava ao longe, virou-se de costas para
segurar o riso.
Parece que alguém gostou do que viu!
— Noah! — chamou Adam, deixando finalmente o celular de lado e
servindo-se do café.
— Senhor? — disse, virando-se e se aproximando.
— Alguém me ligou?
— Sim, senhor. O senhor Dylan Satt.
— Dylan disse o que queria?
— Quer que o visite para uma reunião hoje à noite.
Adam meneou a cabeça positivamente.
— Pode confirmar, então. Eu vou.
— Vou avisá-lo então, senhor. Com licença — disse, retirando-se.
De frente para Adam, Megan mastigava o bolo enquanto pensava se
deveria ou não começar uma conversa. Adam, por sua vez, ocupava-se em
adoçar o café em sua xícara.
Será que ele quer conversar? Pensou, cabisbaixa.
— Então você se chama Megan, senhorita? — perguntou, interrompendo
seus pensamentos.
Quando Megan ergueu o olhar para ele, perdeu o ar. Ele havia terminado de
se servir e a encarava. Os famosos olhos de Adam. Firmes, penetrantes... E por
que não, sedutores? Ele derrubava as pessoas com o olhar e a havia derrubado
naquele momento.
— I-isso — gaguejou. — Megan Kessler.
— Certo, Megan. É um belo nome — disse, estendendo a mão. — Me
chamo Adam.
— Prazer — disse, cumprimentando-o.
— Kenny me falou de você. Chegou à cidade há poucos dias?
— Exatamente.
— E o que faz aqui? Se é que me permite saber, claro.
— Eu queria novas oportunidades. Minha cidade é pequena, não havia
muito para mim lá. Eu queria... Mais.
— Entendo... E por onde pretende começar? Tem um plano?
— Eu… Não exatamente. Pensei em um emprego de secretária, mas não
conheço bem a cidade e não sei onde devo ir primeiro. É difícil, porque não sei
se devo focar em ir a escritórios de empresas ou a consultórios, por exemplo.
— Bom, eu sugiro que pense sobre isso. Tem de saber onde pretende ir
para traçar um plano de ação. Do contrário, ficará andando em círculos nessa
cidade, o que não é difícil dado seu tamanho.
— O que me sugere?
— Qualquer coisa, menos o que um terceiro lhe recomendar. O emprego é
seu, têm de escolher algo que goste. Aquele que diz que sabe o que é melhor
para você, na verdade está interessado em obter uma vantagem através do que
você fará.
Ela meneou a cabeça positivamente.
Ele é bem confiante. Parece ter certeza do que está falando.
— Entendi.
— Sobre trabalho, não se preocupe. Essa cidade oferece ótimas
oportunidades se souber aproveitá-las. Certamente vai encontrar algo que lhe
agrade.
— Espero que sim.
Enquanto Adam tomava outro gole do café, Megan se recordou do que
tinha de dizer a ele. Ele a havia salvado na noite anterior e ela precisava
agradecer. Um pouco envergonhada, mas sabendo que era importante, tomou
coragem e disse:
— Adam, eu queria agradecê-lo.
— Por?
— Ontem. Quer dizer... Você não tinha a obrigação de me ajudar e...
— Você fala sobre o que aconteceu no estacionamento? — interrompeu.
— Sim.
Ele meneou a cabeça negativamente.
— Não precisa me agradecer. Eu fiz o que achei que era certo. Eu me
sentiria culpado se a deixasse lá e depois soubesse que algo ruim aconteceu.
— Kenny me disse algo parecido no dia em que nos conhecemos.
— Ele é um homem bom. Teve sorte em encontrá-lo.
— Também tive sorte de encontrar você.
Ele ficou calado por um momento, encarando-a.
— Será?
Por um instante Megan ficou sem graça. Não sabia exatamente o motivo de
ele ter dito aquilo, mas esperava que significasse algo bom.
— Acho que sim — arriscou.
— Se é que posso lhe dar um conselho, não se engane pelas aparências,
senhorita Kessler. Nessa cidade você vai encontrar muitas pessoas. Pessoas
boas e ruins. Mas eis algo que aprendi com meu avô sobre todas elas: lembre-se
de quem estender a mão a você e, mais do que isso, lembre-se dos apertos de
mão que der — ele se aproximou para sussurrar. — Tenha cuidado ao escolher
a quem vai dever um favor.
Fora de controle
A reação dos acionistas à demissão de Adam certamente não foi das
melhores. Michael ainda não havia terminado de explicar o impacto de tal
mudança quando um dos acionistas se manifestou:
— Quem foi o imbecil que demitiu Adam McKennan? — perguntou
Frederick, que estava sentado ao lado de Gabriel na mesa.
Kenny se esforçava para não rir.
Como eu queria que o Adam estivesse aqui para ver isso!
— É, eu também queria saber! — apoiou outro.
— Eu também! — apoiou mais um.
— Mantenham a calma, senhores — pediu Michael. — Não há motivo para
preocupação. Já temos um novo CEO.
— Já? — perguntou Gabriel, confuso.
— Sim.
— Desde quando? Ninguém me chamou para a deliberação!
Houve silêncio na sala. Os acionistas se voltaram para Gabriel e em
seguida para Michael, esperando uma resposta.
Merda, pensou Michael.
— Gabriel, podemos conversar depois? — pediu.
— Não! Eu quero uma resposta agora!
— Gabriel, por favor! — pediu Stephen.
— Deixe-o responder, senhor McKennan! Todos estamos interessados em
saber! — pediu Frederick.
— Não creio que seja o momento ideal para discussões, senhor.
— Não se trata de uma discussão! Se trata de transparência! — respondeu
William, outro acionista que estava ao lado de Frederick. — Confiamos nosso
dinheiro a vocês! Têm a obrigação de nos dizer o que está acontecendo! E me
surpreende que seu Chefe de Marketing não saiba!
— Não tivemos tempo de fazer uma reunião com todos os membros da
diretoria, senhor Carter — respondeu Michael.
— Mas pelo visto tiveram tempo de deliberar! — retrucou, irritado.
— Senhor Carter, nós não...
— Senhores, senhores! Por favor! — interrompeu Kenny, chamando a
atenção para si. — Eu entendo o motivo de estarem irritados. É seu dinheiro,
têm razão de estarem assim. Porém, posso compreender a desorganização
devido à falta de tempo deles antes de uma reunião conosco. Apesar disso, faço
um pedido aos que, de alguma forma, deliberaram: sejam honestos com os
homens desta sala. Principalmente com Gabriel que, antes de ser Chefe de
Marketing, é irmão e filho de vocês — ele se voltou para Stephen. — Senhor
McKennan, eu já conversei com Adam e minha decisão de deixar de ser
acionista já foi tomada independentemente desta reunião. Compareci por mera
formalidade antes de efetuar a rescisão e agora peço sua licença para me retirar.
— Senhor Wright, por favor, queira aguardar o final da reunião. Não tome
nenhuma decisão precipitada. — respondeu Stephen.
— Não há nada precipitado aqui, senhor. Adam McKennan antes de ser
CEO é meu melhor amigo. Há quatro anos ele entrou nesta empresa e, bem
como muitos outros que estão aqui, eu o segui. Ontem ele foi demitido e,
seguindo seus passos, também irei embora.
— Senhor Wright, se o senhor se retirar, farei o mesmo — anunciou
Frederick.
— Senhor Thompson, faça o que julgar necessário — disse se levantando.
— Com licença.
Enquanto Kenny se retirava, os acionistas olhavam uns para os outros
buscando alguma direção. Deveriam segui-lo? Deveriam esperar para ouvir o
que Michael ainda tinha a dizer?
— Como disse, com licença — disse Thompson, cumprindo a promessa.
Gabriel bufou. Ele empurrou a cadeira violentamente para trás, levantou-se
e marchou irritado em direção à porta.
— Gabriel! — chamou Stephen.
Ele não respondeu. Após aquela cena, os acionistas não tiveram outra
reação senão levantarem-se também e se retirarem. Ao ver o último deles deixar
da sala, Michael suspirou.
— Pai!
— Sim, Michael?
— Acho que vamos precisar de outra reunião.
A substituta
— Bom dia! Olha só quem voltou! — disse Madison, assim que Megan
fechou a porta do carro.
A pedido de Kenny, Madison havia ido buscá-la. Depois de toda a confusão
da noite anterior, estava feliz por vê-la novamente.
— Bom dia! — disse risonha.
— Parece que teve uma noite agitada, não?
— Pois é.
— Pedimos desculpas por ontem. Pensamos que Dean estivesse de olho em
você.
— Tudo bem. Vocês não tinham como saber.
Ela meneou a cabeça positivamente.
— E quanto ao Adam? Gostou dele?
— Ele parece ser uma boa pessoa. Foi muito gentil.
— Ah, ele é fantástico. Kenny ficou relaxado quando soube que você
estava com ele... Mas e então? Pronta para procurar emprego?
— Sim. Eu só espero que Kenny não se incomode. Eu gosto do trabalho de
garçonete, mas...
— Mas quer um trabalho mais comum, não é? Eu sei. Está tudo bem.
— Mesmo?
— Claro! Olha, eu mal a conheço, mas admiro sua coragem de vir em
busca de algo novo. Eu conheço pessoas que jamais fariam isso! Gente que não
sabe fazer nada, sabe? Não aprendeu a arregaçar as mangas e trabalhar. Mas eu
garanto que lugar para pessoas como você, não falta por aqui. É só ir ao lugar
certo e falar com as pessoas certas.
— Adam me falou sobre isso.
— E é a mais pura verdade! Por isso, tomei uma decisão — disse virando-
se para ela. — Kenny tem uma festa daqui a uma semana. Donos de grandes
empresas estarão lá. Eu não vou poder ir, mas já arranjei uma substituta.
— Que bom!
— Você!
— Eu? — perguntou, assustada.
— Sim! — disse animada.
— Não, não. Por favor. Eu nunca fui a um evento desses.
— Bom, agora vai.
— Mas eu nem sei o que vestir, como me portar...
— É por isso que eu estou aqui! Vamos comprar um vestido pra você!
— Não! Chega de gastar seu dinheiro comigo!
— Megan, eu gasto meu dinheiro com quem eu quiser. Além do mais, não
dá pra cancelar. Já coloquei seu nome na lista.
— O quê? Sem me consultar?
— Eu já sabia que você ia fazer esse drama todo e me adiantei!
— Meu Deus do céu... — disse cobrindo o rosto com as mãos.
— Coloque o cinto! — disse se ajeitando de volta no banco e ligando o
carro. — Nós vamos comprar o vestido e quando chegarmos lá em casa
começamos suas lições de etiqueta. Não é um jantar, vai ser simples! Só precisa
aprender a sorrir e tomar champanhe. Consegue fazer isso?
— Eu não acredito que isso está acontecendo — dizia enquanto meneava a
cabeça negativamente e colocava o cinto.
— Consegue fazer isso? — insistiu.
— Agora vou ter que conseguir!
— Esse é o espírito, garota. Agora, vá pensando na cor do seu vestido. Eu
vou te levar onde compro os meus.
Depois da experiência naquela manhã, porém, era difícil para Megan
pensar em outra coisa senão naqueles olhos.
Nossos problemas
— Alô? — atendeu um tanto relutante.
— Adam, eu estou a ponto de surtar nessa empresa e preciso falar com
você! — disse, irritado.
— O que houve, Gabriel?
— Você acredita que nosso pai e o Michael tiveram a coragem de decidir
sobre o novo CEO sem mim?
Adam suspirou.
— Nada me surpreende vindo deles, você sabe.
— Adam, isso é um desrespeito! Eles decidiram sozinhos sobre a sua
demissão e agora decidiram sozinhos sobre isso!
— Quem eles escolheram?
— Eu saí no meio da reunião, mas acabei de descobrir que foi o Michael!
Você acredita? Nem sequer me perguntaram se queria o cargo!
— E você queria?
— Óbvio!
Ele meneou a cabeça negativamente.
Ele nem sabe o que um CEO faz.
— Gabriel, vamos direto ao ponto. Por que me ligou?
— Ora... Porque você precisa me ajudar!
— E como eu vou te ajudar? Eu não trabalho mais nessa empresa!
— Fale com o nosso avô, ele sempre te ouve!
— Gabriel, se quer conversar sobre seus problemas com nosso avô, vá
pessoalmente. Não sou eu quem tem que fazer isso.
— Mas Adam...
— Sem “mas”! Apenas vá!
Ele suspirou.
— Está bem, eu vou. Posso te ligar depois, então?
— Não vejo motivo, mas se vai deixá-lo melhor... ligue.
— Ok. Eu ligo, então. Até depois, Adam.
— Até! — disse, desligando.
E mais uma vez você está me trocando pelo Michael, pai.
Consequências
Então ele me fez recordar aquele maldito dia mais uma vez.
— Eu tinha seis anos. Naquele dia eu havia me machucado na escola,
então ligaram para minha mãe e ela pediu que nosso motorista me levasse para
fazer um curativo e me fizesse companhia em casa enquanto ela não chegasse.
Quando chegamos, ele me disse para pegar meus brinquedos enquanto buscava
o celular no carro. Mas assim que adentrei o corredor dos quartos, ouvi um
barulho vindo do quarto dos meus pais. Pensei que minha mãe já estivesse em
casa e fui até lá, mas quando abri a porta vi meu pai beijando uma mulher. Eu
estava acostumado a ver meus pais se beijarem... Mas ela não era minha mãe.
Quando me viram, se assustaram. Então eles começaram a discutir e ela pegou
a bolsa e passou correndo por mim. Ele foi atrás dela, mas quando percebeu
que não voltaria, ele se virou e me encarou sério. Ele me perguntou que droga
eu estava fazendo ali. Eu estava tão assustado que só consegui apontar para
meu joelho machucado. Então ele suspirou, veio até mim, se ajoelhou e disse
que não devia contar à minha mãe o que vi porque era segredo e que, no dia
seguinte, iria me levar a um lugar especial. Eu concordei mas, quando minha
mãe chegou, foi difícil esconder. Eu sabia que o que vi era errado. Eu achava
que meu pai só deveria beijar minha mãe.
— E aí?
— No dia seguinte, ele foi me buscar na escola. Ele mentiu para minha
mãe dizendo que íamos tomar sorvete. Ele me levou a um parque onde
encontramos a tal mulher, acompanhada de um garotinho loiro. O Michael. Ele
me contou que aquele era meu irmão. Eu perguntei se minha mãe sabia e ele
disse que não e que nem ia saber porque era segredo também. Depois de
comprarmos sorvete, voltamos para a casa e mentimos para minha mãe.
— Deve ter sido difícil.
— Foi, e muito. Meses depois, ela nos contou que estava grávida.
— Do Gabriel?
— Isso. Três dias depois, aquela mulher reapareceu dizendo que queria
falar com minha mãe. As duas discutiram muito e, quando ela finalmente foi
embora, minha mãe me chamou e pediu para que contasse o que sabia. Eu vi
que ela estava triste e contei. Não queria mais mentir. Naquele dia, quando
meu pai chegou, ela me mandou para meu quarto e eles discutiram feio na sala.
Depois da discussão, ela veio até mim e me puxou pelo braço. Lembro-me dela
dizendo que ia me levar dali. Ele disse que não deixaria e eles discutiram até
que ela foi para o quarto deles e saiu de lá puxando uma mala. Antes de ir
embora, ela beijou minha testa e disse que vinha me buscar.
— E seu pai?
— Assim que ela saiu, ele gritou comigo e disse que eu não havia feito o
que prometi. Eu comecei a chorar de medo e ele pegou um cinto e...
Aquela lembrança era amarga. Precisei de um momento para continuar.
— E me bateu. Depois saiu dizendo que já voltava. Eu me sentei num canto
e chorei. Muito. Ele voltou com a mulher e oMichael, me tratando como se
nada tivesse acontecido. A partir daquele dia, eles ficaram lá em casa.
— E a tal mulher te tratava bem?
— Não. Ela sempre brigava comigo. Quando eu dizia ao meu pai, ela
respondia dizendo que era birra. Depois de três semanas, ele não aguentava
mais me ouvir reclamar e fui morar com meu avô. Quando contei o que havia
acontecido, ele imediatamente chamou minha mãe para morar conosco.
— E ela foi?
— Sim. Meu pai ficou irritado, mas ele não se importou. Quando Gabriel
nasceu, ele ligou para meu pai e disse que tinha que registrá-lo, pois não era
justo que minha mãe assumisse a criança sozinha. Ele aceitou e veio.
— E a outra?
— Um dia meu pai chegou do trabalho e ela não estava lá, só o garoto. Ela
deixou um bilhete dizendo que, se ele ia assumir o Gabriel, ia ficar com a mãe
dele. Ele ainda tentou procurá-la, mas não encontrou. Então, arrependido e
sozinho, ele voltou rastejando para a minha mãe. Ela aceitou voltar pra casa,
mas disse que nunca mais teria sua total confiança. Hoje ela dita as regras e
ele não diz nada. Eu e meu avô a apoiamos.
— Ela aceitou o Michael?
— Sim. Ela disse que ele não tinha culpa dos erros da mãe.
— Ela estava certa.
— Apesar de ter minha família de volta, eu nunca mais vi meu pai da
mesma maneira. Enquanto estiveram separados, minha mãe me explicou que o
que ele havia feito era muito errado e que eu nunca deveria fazer aquilo.
Quando ele voltou, eu o via como um vilão, alguém que havia feito mal à
mulher que eu mais amava. Minha mãe desde então me diz para esquecer o que
aconteceu.
— Mas você nunca o fez, não é?
Como sempre, meus olhos se encheram de lágrimas.
— Eu tinha nojo dele.
— E o Michael?
Não consegui esconder meu deboche e bufei.
— Nós nunca fomos amigos. Quer dizer... Eu até tentei. Mas ele disse que
não queria falar comigo porque eu e meu irmão fizemos sua mãe ir embora.
— O que não é verdade. Você sabe disso, não sabe?
— Sei. E anos depois, as coisas ficaram ainda piores.
— Por quê?... Ah! O casamento!
— Sim, Hendrick. O casamento.
A grande decisão
— Queria falar comigo, Dylan? — perguntou Adam, sentando-se no sofá.
— Peço desculpas por estar te recebendo de pijama e com esse rosto
cansado, mas também peço para que considere que meu atual estado de saúde
me impediu de estar melhor apresentável.
— Não se incomode, está em sua casa.
— Meu pai sempre me disse que não devia fazer nenhum negócio se não
tivesse certeza de que estava em perfeita saúde antes, mas quando sou atingido
por uma sinusite ao mesmo tempo em que Adam McKennan é demitido, sinto-
me impedido de aplicar essa regra.
Adam sorriu. Dylan seguiu encarando-o por mais alguns segundos antes de
continuar:
— Você sabe o que vou te perguntar, não sabe?
— Posso imaginar.
— Preciso de você, mais do que em qualquer outro momento. Eu respeitei
sua decisão de seguir trabalhando com seu avô, mas agora você está livre e eu
quero que venha para a Satt!
Adam suspirou. Era difícil tomar uma decisão tão grande como aquela
tendo sido demitido no dia anterior.
— Eu te liguei assim que li o jornal esta manhã, Adam. Eu sei que pode
parecer cedo demais para pensar em outra coisa, mas eu precisava fazer essa
proposta e garantir que não perderia uma chance como essa. Não vou exigir
uma resposta imediata, eu só queria que soubesse das minhas intenções.
— Eu entendo, Dylan — disse meneando a cabeça positivamente. — E eu
agradeço que tenha me dado tempo para pensar. Tenho tantas coisas passando
por minha cabeça nesse momento...
— Imagino. Mas não deixe isso te chatear. Tenho certeza que os outros
homens, assim como eu, confiam em você e não vão se deixar enganar com esse
tipo de coisa. Vão precisar de muito mais se quiserem te derrubar! Se você não
fosse bom, aqueles homens não teriam deixado a reunião hoje de manhã por
você.
— Ficou sabendo disso?
— Adam, eu sempre sei das coisas.
Adam riu.
— Vamos ao que interessa? Tenho uma proposta difícil de recusar!
———
Como toque pessoal de Madison, trazia uma bolsa tiracolo preta. Simples,
mas elegante.
— A melhor parte é a bolsa — completou. — Mas com uma Yves Saint
Laurent não tem como errar.
— Por que tudo que você compra tem nome difícil?
— Ah, não é tão difícil! É Valentino, Manolo Blahnik, Salvatore
Ferragamo, Jimmy Choo... Você se acostuma com o tempo.
— Você também pode ir a qualquer loja e comprar uma bolsa preta sem
essa frescura de inicial aí na frente. E que não custa nem um terço do preço —
respondeu Kenny, descendo as escadas.
Madison revirou os olhos. Megan riu.
— Vamos, então? — perguntou Kenny.
— Sim.
Madison se levantou e caminhou até Megan. Ela ajeitou a bolsa em seu
ombro e exclamou:
— Cuide bem dela, ok?
— Pode deixar, Megan vai se sair bem — respondeu Kenny.
— Falei da bolsa!
Eles riram. Madison se aproximou de Kenny e ele a puxou para si pela
cintura. Ela nunca deixava que o marido saísse sem antes beijá-lo.
— Não demore, ok?
— Por quê?
— Surpresa — sussurrou.
— Ok.
Madison assistiu orgulhosa Kenny e Megan saírem. Esteticamente, podia
dizer que Megan estava perfeita para aquela noite. Restava apenas que aplicasse
corretamente as dicas de etiqueta dadas mais cedo.
Se ela fizer tudo direito, vão amá-la.
E algo lhe dizia que a moça não iria decepcioná-la.
O coquetel
— Não o vi ainda — comentou Stephen.
— Não sei se ele teria coragem de aparecer — respondeu Michael.
— Acha mesmo?
— O que ele faria aqui? Pai, agora ele é um homem desempregado!
— Com mais prestígio do que outros empregados — respondeu Gabriel,
aproximando-se com duas taças de champanhe e entregando uma à Stephen.
— É a sua terceira taça, não é? — perguntou Michael.
— Além de tomarem decisões por mim, vão controlar o que eu bebo?
— Gabriel, eu não vou discutir isso com você agora.
— Você não vai discutir porque sabe que está errado!
— Fizemos o que era melhor para a empresa!
— Ah, que conveniente pra você!
— Pare de agir como uma criança!
— Vocês misturam problemas pessoais com profissionais e eu sou a
criança?
— Já chega! — interrompeu Stephen. — Vocês me dão dor de cabeça!
— Sabe o que me dá dor de cabeça? Injustiça.
— Desculpem... Canapés? — interrompeu o garçom.
— Eu quero! — respondeu Gabriel, virando-se na direção dele.
— Não, obrigado — respondeu Michael.
— Escutem, nós temos problemas maiores para nos preocupar hoje —
relembrou Stephen.
— Tem mesmo — respondeu Gabriel, voltando-se para eles. — Olha só
quem chegou!
Quando Michael e Stephen olharam para a porta do salão, a surpresa tomou
conta de ambos.
Eu não acredito, pensou Michael.
— Ah, eu vou até lá! — disse Gabriel afastando-se, animado.
————
———
Conversando com o rei
— Papai! – chamou Alice, sentando-se à mesa com seu pai. – Precisamos
conversar agora!
James não respondeu.
— Papai, está me ouvindo? – insistiu.
Ele levantou o olhar para ela rapidamente e voltou a comer.
— Papai, eu quero ir àquele coquetel amanhã com você. Eu sei que o Adam
vai e eu vou também.
Ele novamente levantou o olhar para ela e voltou a comer.
— Eu sei que você pensa que isso é idiotice, mas eu sei que eu consigo e
não vou desistir!
Ele deixou os talheres na mesa, pegou uma xícara e tomou um gole do café.
— Não vai dizer nada?
Ele meneou a cabeça negativamente. Sua expressão permanecia séria.
— Você pode ficar aí sentado tomando café e duvidando de mim se quiser,
mas eu já coloquei outros homens como ele aos meus pés e não vai ser diferente
desta vez – disse se levantando.
Ela deu a volta na mesa e puxou o queixo dele, obrigando-o a olhar para
ela.
— Quando eu colocar McKennan no meu nome eu vou esfregar isso na sua
cara, ouviu bem?
Ele fez sinal para que ela se aproximasse mais.
— O que foi? – disse curvando-se.
Num só golpe, ele agarrou os cabelos dela e colou seu rosto contra a mesa,
fazendo-a gritar.
— Você não vai fazer nada, sua imbecil. – sussurrou calmamente. — Você
é só uma cadela oportunista e ele sabe muito bem disso! Ele não vai cair nesses
seus truques baratos.
— Pai me solta, você está me machucando! – gritou.
— Se você vier à minha casa e falar como acabou de falar comigo de novo
eu sumo com você do mapa. Você me entendeu?
— Me solta!
— Entendeu? – gritou.
— Entendi!
Ele a empurrou e pegou os talheres. Ela se levantou e ajeitou o vestido.
— Eu vou embora pra casa. Você está louco!
— Adeus.
— E ah, eu vou àquele coquetel sim.
— Se você me envergonhar, eu te trago para casa pelos cabelos.
— Não vou te envergonhar. Aliás, você não estaria me xingando se
soubesse quem foi o último homem com quem saí.
— Quem?
— Kenneth Wright. Aquele ricaço que é acionista na McKennan.
Ele a encarou surpreso.
— Ah, então agora está surpreso? Pois é. Não sou uma imbecil, viu?
— Tem razão, não é. Você não é imbecil. É bem pior.
— O quê?
Ele começou a rir.
— Parabéns! Você conheceu o meu cafetão!
— Seu o quê? – disse horrorizada.
— Eu sempre saio com as prostitutas dele. Ele te enganou?
— Ah, que nojo! – berrou, esfregando as mãos em seus braços como se
aquilo de alguma forma a limpasse.
James gargalhava ao ponto de tossir. Ela corria desesperada de um lado a
outro pegando seus pertences para ir embora.
O plano de Kenny e dos empresários havia dado certo. Alice finalmente
havia experimentado do próprio veneno.
A entrevista
Quando a jovem jornalista adentrou na sala, o homem loiro ainda anotava
algo num pequeno pedaço de papel. Assim que se sentou, a secretária que a
havia trazido até ali deu a volta na mesa e curvou-se em direção ao ouvido dele,
sussurrando algo que ela não entendeu.
— Certo — disse erguendo o olhar rapidamente para Tate e voltando a
dirigir-se à secretária. — Muito bem. Saia.
Ele aguardou que ela fechasse a porta e voltou-se para Tate. Houve um
breve silêncio constrangedor até que, percebendo que ela aguardava que ele
dissesse algo, resolveu falar.
— E então? É você quem gostaria de me entrevistar?
— Sim. Obrigado por me receber, senhor Satt — disse estendendo a mão.
— É. Eu tinha um espaço livre na agenda — disse, ignorando o gesto de
Tate, que recolheu a mão envergonhada.
— Isso é ótimo. Eu agradeço.
— Que seja — disse dando com os ombros e recostando-se na cadeira. —
Eu não tenho o dia todo, então… Quer começar?
— Sim, sim. Claro! — disse puxando o gravador da bolsa. — Assim não
perdemos mais tempo.
— Mais tempo?
— Bom, eu espero que o senhor não se ofenda, mas… imagino que tenha
tido um imprevisto, por isso se atrasou um pouco.
— Eu não tive imprevisto algum, nem me atrasei.
— É que disseram que a entrevista seria às dez. São dez e meia.
— Escute… — disse desencostando-se da cadeira e apoiando os cotovelos
na mesa com uma expressão séria. — Eu não sei para qual jornal a senhorita
trabalha e, em verdade, nem me importa. Mas como presidente e dono dessa
empresa, a qual eu chego na hora em que me for conveniente, não vou tolerar
que venha me questionar sobre os meus atrasos. Agora, se puder fazer a
entrevista antes que eu peça a um segurança para mostrar-lhe à saída, seria de
bom proveito.
— Tudo bem, senhor. Perdoe-me. — disse, apavorada.
Sabia que era um homem difícil, mas não achei que era tanto.
Dylan Satt perdia a paciência facilmente. Quando precisava, sabia colocar
medo nas pessoas. Agora, sorria por dentro, contente por rebater a repórter à
altura.
Não me sento nessa cadeira por ser gentil.
A esposa
Já era tarde da noite quando Dylan deitou-se para dormir. Cansado, ajeitou-
se atrás da esposa e segurou sua cintura, puxando-a para si. Amber acordou
sentindo o toque do marido e se recostou para trás, colocando sua mão sobre a
dele e puxando-a para sua barriga.
— Finalmente! — sussurrou ainda sonolenta, sem abrir os olhos.
— Desculpe pelo atraso. Não consegui sair antes.
— Pensei que essa festa não fosse acabar nunca.
— Eu também, querida.
— Você estava curtindo a festa sem mim. — brincou, sabendo que Dylan
odiava coquetéis com a concorrência.
— Precisei curtir. Mas eu preferia ter ficado aqui com você, acredite.
— Eu sei — disse virando-se de frente para ele. — Aqui você não
precisaria fingir que está curtindo algo.
— Depende. Ia chamar sua família para jantar?
— Se isso acontecesse, nem eu ficaria feliz.
Dylan riu.
— Eu realmente teria curtido estar aqui, sabia?
— Agora você está… — disse empurrando-o e colocando-se sobre ele. —
E eu também.
— Que atrevimento!
— Senhor, devo informá-lo que seu cargo não lhe dá privilégio algum aqui.
— E eu devo informá-la de que deve ter atenção quanto ao barulho para
que os vizinhos não reclamem.
Amber tirou o robe e revelou a lingerie branca de renda.
— Sua preocupação com os vizinhos persiste, senhor Satt?
— De forma alguma.
— Imaginei.
O casamento
Então começamos a falar sobre o dia do tal casamento.
— O que houve no dia do casamento? Você já me contou algo sobre isso
antes, mas não me recordo muito bem.
— Na verdade, nem eu sei direito. Inicialmente eu nem queria ir, mas
aceitei depois que soube que Kenny também iria. Como não nos falávamos
muito, nem conhecia a noiva dele. Eu só sabia que ela se chamava Evelyn.
— Certo.
— Kenny e eu fomos juntos e sentamos no terceiro banco. Nós nos
sentaríamos mais atrás, mas minha mãe queria nos obrigar a sentar no
primeiro e, com muito custo, conseguimos convencê-la a nos deixar ficar ali.
— Por que não queria ficar na frente?
— Não fazia questão de demonstrar que estava lá. Duvidava que Michael
realmente quisesse que eu fosse. Achava que apenas havia sido educado.
— E quando o problema começou?
— Depois que o padre perguntou se eles aceitavam se casar. Michael disse
que sim e, na vez dela, ela ficou em silêncio. Ficamos esperando até que ela se
virou e disse que não. Michael perguntou o porquê, ela se virou para nós e
disse, olhando para mim: “Porque eu amo o Adam”.
Ele ergueu as sobrancelhas, surpreso.
— Tudo o que aconteceu em seguida foi uma grande confusão. Michael me
encarou furioso, eu não entendia o que estava acontecendo, ela veio até mim
querendo me abraçar, eu neguei e disse que ela era louca, ela saiu correndo da
igreja e Michael desceu do altar para me bater. Kenny então entrou na minha
frente e outros dois convidados vieram rapidamente segurar Michael. Enquanto
ele gritava todos os palavrões possíveis e minha mãe se desesperava, Kenny e
eu demos o fora de lá.
— Há quanto tempo foi isso?
— Três anos.
— E desde então, a relação de vocês que já era ruim...
— Se tornou ainda pior — completou. — Pois é.
Mas eu seguirei em frente.
Os pesadelos não serão donos dos meus pensamentos.
Eu seguirei fiel ao que acredito e ao que sou.
Ainda que eles tentem sem sucesso minar meu caminho com sua soberba.
Pois hoje eu sou tudo aquilo que eles tentaram ser um dia.
Eu não sou espelho dos erros dele, não mais. Eu renasci, me reconstruí, saí
do estático, do padrão, da comparação. Em verdade não sou mais que parte do
seu biológico. Eu lutei para enfim me afastar dos seus ideais, das aparências
entre nós. Deixei de ser como ele e me tornei eu, para mim e contra ele. Tenho
nome. Tenho reconhecimento. Deixei de ser a sombra encolhida num canto e
fui para fora, para frente, passei à sua frente e posso ouví-lo reclamar. Deveria
decepcionar-se consigo e não comigo. Eu lhe incomodo crescendo? Ora, não foi
para isso que me fizeste?
Eu não incomodava na escuridão, certo?
Pena que criaste luz.
— Não é mais meu menininho. Agora é um homem. Um grande homem
como seu...
Adam a encarou enquanto ela avaliava o que diria a seguir. Serena sabia
que dependendo da resposta ele se ofenderia.
— Como seu avô, querido — completou.
— Eu sei o que você ia dizer, mãe. Ia dizer que me pareço com ele.
— Mas cheguei à conclusão de que não parece. Aprendeu o que sabe com
seu avô, logo...
— Não chegou à conclusão alguma em alguns segundos, mãe. E eu não me
pareço com meu pai não porque aprendi com meu avô, mas porque eu repudio
as atitudes de homens como ele e jamais me portaria como tal... E você sabe
disso.
Cara senhora Kessler,
Atenciosamente,
Ps: Sobre a pergunta que me fez na cozinha em minha última visita à sua
casa, sim, eu amo sua filha.
Título de capítulo n
Texto do livro.