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LIVRO NOVO

Melissa Vieira
LIVRO NOVO
Melissa Vieira

São José dos Campos

2018
Copyright © 2018 por Melissa Vieira.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou
reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização por escrito dos
responsáveis.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, empresas, acontecimentos e


incidentes são produtos da imaginação da autora ou usados de modo ficcional.
Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, acontecimentos ou
lugares é mera coincidência.

Revisão:
Diagramação:
Capa:
Imagem de capa:
Fontes da capa:

Catalogação na publicação (CIP)


Ficha Catalográfica feita pelo autor

V658i Vieira, Melissa, 1999-


LIVRO / Melissa Vieira. - São José dos Campos: edição do autor, 2018 ou 2019.
X p.; Xcm.

ISBN:

1. . 2. . I. Título. II. Autor.

CDD: B869.3
CDU:
Sumário

Prólogo – Carta à Hendrick 11

A viagem 13

A cidade das luzes 14

Um café para já 17

Ligação especial 18

A reunião 19

Questão de ponto de vista 23

A boate 25

O doente 27

O documento 28

Extremos 30

Teste particular 32

A última a saber 37

Ascensão e queda 38

A matriarca 41

Noite chuvosa 42

Outro lar 45

Reviravolta 47

A aposta 48
Boas notícias 50

Primeiras impressões 51

Fora de controle 54

A substituta 56

Nossos problemas 58

Consequências 59

A grande decisão 61

Nada pessoal 64

Novidade 65

Um bom motivo 66

A oportunidade 67

Como uma dama 69

O coquetel 70

Conversando com o rei 72

A esposa 75
O casamento 76
A todos os homens do mundo.
O que se crê senhor dos demais, não deixa de ser mais escravo do que
eles.
Jean-Jacques Rousseau.
Prólogo – Carta à Hendrick
Aqui estamos mais uma vez.
Você entra, me cumprimenta e vamos para aquela sala. A nossa sala.
Deito-me naquele sofá e você se senta à minha esquerda numa confortável
cadeira. Lá, você abre sua pasta e retira um papel repleto de anotações.
Anotações sobre mim, minha família, meus amigos... Meus demônios. De
alguns deles você me já ouviu falar tanto sobre que até parece que os conhece
pessoalmente.
Já fazem anos desde a primeira vez.
Esse apartamento mudou. Essa sala mudou. Eu mudei. Você mudou.
Ao mesmo tempo, anos depois, ainda o vejo de soslaio ajeitar seus óculos
empurrando o meio da armação com o indicador. Você o faz a cada dez
minutos aproximadamente. Certa vez eu te contei isso e você riu, admirado de
minha observação... E então anotou. Você anota tudo, ou pelo menos é a
impressão que tenho.
Depois de nos acomodarmos, você me pergunta como foi minha semana.
Se algo me estressou, o porquê, se dormi bem, se tive mais pesadelos... É
interessante como você sabe se menti. Se digo que ficou tudo bem e na verdade
não ficou você pergunta se tenho certeza.
“Nunca é nada demais”, você diz.
Então eu conto.
Eu não sei como você regula isso, mas às vezes temos a pauta de assuntos
proibidos. Normalmente eu não quero fazer essa parte, mas você insiste, diz
que é necessário. Mais do que aquilo que me deixa confortável. Começamos
então... E o fim por vezes é só um.
“Você quer chorar?”, pergunta.
Eu fico em silêncio.
“Você pode”.
As duas palavras mágicas. Com elas você me obriga a reabrir as feridas.
Com elas você me faz mergulhar no abismo do meu passado. Você traz à tona
os problemas, as discussões, os gritos... As lágrimas.
Você retira o véu que me impede de ser mais sentimento que razão. Você
retira de mim as responsabilidades. Você retira de mim a imposição do guardar
para si. Você retira de mim o “Acorde! Você precisa fazer dinheiro!”. Não há
espaço para isso aqui.
Aqui eu não sou o CEO. Aqui eu sou só eu. Somos só nós.
E enquanto não soubermos as respostas de tudo, enquanto não
encontrarmos a solução para todos os problemas, seguiremos aqui.
Eu e você. Você e eu.
É estranho como trazer os problemas de volta faz com que aos poucos eles
deixem de fazer diferença. Aos poucos, eles deixam vazios. E por vazios, não
digo os existenciais, mas sim os que eu quero ter. Aqueles que eu quero
preencher quando a hora chegar.
Quando ela chegar, eu sei que você vai estar aqui para me ouvir dizer.
Então você vai me ajudar, assim como me ajudou nos últimos nove anos.
Sentado à minha esquerda, com sua pasta e suas anotações.
Se vai estar tudo bem? Não... E tudo bem. Você diz que torce por mim e eu
acredito.
É por isso que você ainda está aqui.
É por isso que você não se despede dizendo que eu preciso ficar bem.
Porque eu não preciso.
Por isso você diz que amanhã é um novo dia. Porque amanhã eu posso não
repetir os erros de ontem.
Porque amanhã vai ser melhor... Ou não. E tudo bem.
Porque mesmo se estiver ou não, aqui estaremos mais uma vez.
A viagem
Enquanto assisto as gotas de chuva fina escorrerem pelo vidro do ônibus,
me despeço de minhas incertezas. Elas precisam ficar para o meu próprio bem.
O dia está tão nublado quanto meu coração. Sinto um aperto no peito ao me
lembrar de casa, mas cuido para que ele consiga se aquietar. Minha vontade é
fugir daqui, voltar para trás...
NÃO POSSO.
É tudo tão difícil no início, mas hoje pela manhã diluí o medo na água
fervendo de meu chá. Peço a Deus que cuide deles enquanto eu não estiver lá
para cuidar.
Minhas expectativas não são tão grandes. Sei do meu potencial, mas
algumas coisas na vida não dependem apenas de nós. A cidade é tão grande e eu
sou tão pequena... Sei que há espaço, mas ele é meu? Minha mãe me
perguntaria o porquê de não poder ser... Que otimista!
Sinto vontade de chorar todas as vezes que penso nas futuras noites
sozinha. Quem vai me ouvir lamentar sobre um dia ruim antes de dormir? É
claro que eu poderia ligar, mas ainda não sei como as coisas irão funcionar lá.
Lá. A cidade grande. Aquela que de noite é tão clara quanto de dia. A
cidade dos gigantes. A cidade das luzes. A cidade deles.
A minha oportunidade está com eles. Se ao menos eu fosse um deles... Eles
têm tantos nomes que é difícil guardar.
Eu estou indo lá para vê-los... Para que eles me vejam.
Estava longe de seus olhos. Eu precisava chegar mais perto se quisesse ser
vista e agora finalmente estou chegando.
Tenho um número de emergência. Eles me disseram que se algo desse
errado eu deveria ligar para ele.
Eu não sei de quem ele é, mas dizem que ele sabe quem eu sou. Na cidade
das luzes eu sou alguém para alguém.

———

Acabo de chegar. Ela é ainda mais bonita do que disseram.


Misturado ao cheiro de café, um aroma de esperança.
Sou bem vinda? Espero que sim.
As luzes daqui são tantas que sequer precisariam das estrelas.
A cidade das luzes
Sentada na cama, Megan comia um cup noodle. Próximo ao centro, aquele
hotel serviria até que ela encontrasse o local ideal para recomeçar. Com sonhos
que mal cabiam na mala e força de vontade para realizá-los, a jovem moça
sentia-se preparada para explorar aquela cidade e ver o que ela podia oferecer.
Megan havia vindo de uma cidade vizinha em busca de trabalho. Apesar da
vida confortável que levava com seus pais, com vinte e quatro anos e sonhos a
realizar, ela não podia ficar.
— Deixar que uma jovem menina tão boa, esforçada e inteligente perca as
oportunidades que a vida tem para lhe oferecer pelo comodismo de permanecer
nesta cidadezinha, é a pior das injustiças que se poderia cometer! — dizia o
advogado, que lhe deu seu primeiro e único emprego até então. — Vá e
conquiste o mundo, menina!
Como companhia naquela noite, ela tinha mais um cup noodle na sacola do
mercado caso sentisse fome, uma caixinha de sachês de chá, seu notebook, seu
celular e sua malas. Fitando um número que tinha salvo no celular, ela se
lembrou do diálogo que a trouxera até ali. Estava tentando pegar um cup noodle
na prateleira mais alta quando o rapaz se aproximou.
— Quer ajuda?
— O quê? — perguntou, virando-se. — Ah! Quero sim, por favor.
Ele esticou a mão e alcançou o pote azul.
— Aqui! — disse entregando a ela com um sorriso.
— Obrigada — respondeu com um sorriso tímido.
— Tudo bem.
Apesar de saber que não devia sair falando com todo mundo, aquele
homem pareceu bem apessoado para Megan. Tinha os cabelos castanhos
penteados para trás, a barba rala e usava um blazer preto por cima da camisa
branca e calça jeans. Como ainda não conhecia nada naquela cidade, resolveu
pedir uma informação.
— Desculpe, qual seu nome?
— Kenny. E o seu?
— Megan... Posso te fazer uma pergunta?
— Pode, apesar de tecnicamente você já ter feito.
— Ah! Pois é... — disse rindo, um pouco envergonhada — Você sabe se
tem algum hotel próximo daqui?
— Tem. Vários, na verdade.
— É que eu acabei de chegar e... Não conheço quase nada.
— Entendi... E chegou num lugar desconhecido à noite, que sorte —
respondeu irônico.
— É.
Kenny avaliou rapidamente se deveria ou não tomar uma decisão. A moça
aparentava ser uma boa pessoa e estava sozinha numa cidade desconhecida à
noite. Ele conhecia bem aquelas ruas e sabia do perigo que ela corria.
Ela é nova aqui, facilmente manipulável. Na rua, ela não vai durar muito.
Talvez me custe cobrar um favor ou dois, mas ela parece honesta.
— Olha Megan, acho que posso te ajudar. Tem um hotel a algumas quadras
daqui e o dono é um amigo meu.
— E você sabe quanto é a diária dele?
— É um pouco cara, mas ele está me devendo um favor. Se quiser, posso
conseguir que fique lá de graça.
— Verdade? — disse empolgada. — Bom, eu agradeceria muito!
— Espere um minuto — disse puxando o celular do bolso. — Vou falar
com ele.
— Ok.
Enquanto Kenny ligava para o dono do hotel, Megan aguardava
pacientemente. Ela não tinha muito dinheiro, então se conseguisse uma diária de
graça, seria ótimo. Com o viva voz ativado, ela pôde ouvir a conversa dos dois.
— Diga, Kenny! — atendeu.
— Greg! Tudo bem?
— Sim, e com você?
— Eu estou bem também.
— Que bom... E então? Por que ligou?
— Eu quero cobrar aquele favor! Lembra?
— Ah sim! Como não? Pois diga, do que precisa?
— Eu estou aqui com uma garota e ela acabou de chegar na cidade, sabe?
Aliás, o viva voz está ativado. Enfim, ela precisava de um lugar pra ficar. Então
eu pensei que um bom homem chamado Gregory Simons, pudesse deixá-la ficar
em seu luxuoso hotel gratuitamente.
Houve uma pausa do outro lado do telefone. Megan torceu por uma
resposta positiva.
— Você é um desgraçado, sabia?
Kenny riu.
— Eu sei que o horário do check-in já passou um pouco...
— Duas horas — interrompeu.
— Mas o que são duas horas para um amigo, não é, Greg? Lembre-se que
eu sempre movimento seu hotel! — insistiu.
Gregory suspirou.
— Traga ela para cá. Vou pedir para separarem um quarto.
— Que bom! — disse animado.
— Qual o nome dela?
— Megan.
— Ok.
— Obrigado Greg, eu sabia que você tinha um bom coração.
— Eu não vou te responder como deveria por respeito a ela, mas você sabe
o que eu ia dizer.
Kenny riu.
— Claro. Muito obrigado.
— Tudo bem. Até logo, então.
— Até.
Enquanto Kenny guardava o celular de volta no bolso, Megan não
conseguia deixar de sorrir. Um rapaz que simplesmente a havia ajudado a pegar
um cup noodle agora havia conseguido um hotel para ela!
Pessoas boas existem!, pensou, animada.
— Muito obrigada, Kenny.
— Sem problema. Você vai pegar mais alguma coisa aqui?
Ela olhou para a cesta de mercado enganchada em seu braço conferiu.
— Não, é só.
— Ok. Vem comigo. Eu vou pegar um energético, um cigarro e te levo ao
hotel.
— Não vou te atrapalhar? Posso pegar um Uber!
— Não, por favor. Essa cidade é perigosa a noite. Eu vou me sentir mal se
algo acontecer com você.
— Está bem.
Diante daquelas circunstâncias, Megan não poderia estar menos surpresa
com todas as coisas pelas quais já havia passado até aquele momento. Nem
todas as garotas tinham a sorte de conhecer um estranho no mercado que as
levaria em sua BMW até um hotel de luxo onde teria estadia gratuita até que
conseguisse um lugar fixo para ficar. Parecia bom demais para ser verdade, e
isso a deixava levemente preocupada. Gregory devia um favor a Kenny, não a
ela e, apesar de Kenny ter dito que não queria nada em troca, ela não podia
confiar que ele se mantivesse assim.
Eu vim aqui achar o meu lugar e vou encontra-lo.
Um café para já
Quarta-feira. 7:53.
Os saltos da moça ruiva batiam com força contra o asfalto enquanto ela
corria em direção à cafeteria. O grosso sobretudo preto cobria seu uniforme
casual: uma blusa social branca e uma saia lápis que, em dias frios como aquele,
vinha acompanhada de uma meia calça da cor de sua pele. Ela abriu a porta com
certa violência e correu em direção a uma conhecida atendente que, ao vê-la,
puxou um copo de café detrás do balcão e o colocou sobre ele.
— Bom dia! — disse, sorridente.
— Rachel! Rachel, rápido eu preciso de um...
— Macchiato médio — interrompeu, fazendo sinal para que ela parasse. –
Aqui está, com duas colheres de açúcar. Já fiz! Nem precisa esperar! Pegue o
café e vá, Amy!
— Minha nossa... Obrigada, Rachel! De verdade! — disse ainda ofegante.
— Certo, agora corra para não se atrasar mais ainda!
— Verdade! — disse pegando o café e dando as costas à atendente. —
Obrigada de novo!
A atendente provavelmente havia dito algo como "tudo bem", mas Amy
não teve tempo de ouvir. Havia acordado atrasada naquela manhã e agora
corria contra o tempo para chegar ao escritório no horário.
Ele não esperava por ninguém.
Troca de favores
O dia seguinte à chegada de Megan começou com uma visita de Kenny. Na
sacada do quarto, eles conversavam sobre os planos dela para aquela cidade.
— Então veio em busca de trabalho? — perguntava ele.
— É.
— E que experiência você tem? Vamos ver se consigo te ajudar!
— Eu trabalhava como secretária de um advogado.
— É? Bom! Rotina de escritório mesmo?
— Sim. Preencher planilhas, atender o telefone, marcar compromissos,
organizar a agenda, tudo!
— Que interessante. Você gosta de trabalhar com isso?
— Muito! Meu chefe era muito bom comigo.
— E por que decidiu abandonar tudo se você gostava?
— Na verdade, vir pra cá foi ideia do meu chefe. Eu admito que já vinha
pensando a algum tempo nisso, mas tinha receio. Foi ele quem me encorajou.
— Entendi.
— Minha mãe ficou com medo, mas meu pai me ajudou a fazê-la entender
que era o melhor pra mim. Lá não existem muitas possibilidades de
crescimento, de aprendizagem, entende? Aqui, no mínimo tem mais do que lá.
Kenny meneou a cabeça positivamente. Megan ainda não sabia, mas o
homem que naquele momento tomava café com ela conhecia as pessoas pelas as
quais ela buscava e, àquela altura, estava cada vez mais disposto a ajudá-la.
A força de vontade dela é admirável. Até me lembra uma pessoa, pensou.
Naquele momento, ele precisou tomar uma decisão: dar ou não uma chance
à garota nova?
Ela parece decidida do que quer e eu conheço quem pode ensiná-la e fazê-
la chegar longe, mas ela precisa merecer.
Foi quando uma ideia lhe ocorreu.
— Megan, eu acho que posso te ajudar mais uma vez.
— É? — perguntou, surpresa.
Ele deve conhecer muita gente!, pensou.
— Sim. Olha, eu sou acionista numa empresa e eu conheço pessoas desse
meio corporativo. Eu poderia conversar com eles e pedir uma chance pra você.
— Seria a segunda vez que você me faria algo muito bom.
— Pois é. Mas eu não vou fazer isso de graça. Quero que trabalhe como
minha secretária. Quero ver como você se porta, se faz as coisas direito,
entende? Se achar que é boa, vou te recomendar. É justo, não é?
Faz sentido, ele quer confirmar o que eu disse.
Ela meneou a cabeça positivamente.
— Ótimo, então vamos começar? — disse voltando para dentro do quarto
— Vou te levar para conhecer seu novo emprego!
— Já? — surpreendeu-se.
Ele riu.
— Segundo os relógios das secretárias de seus futuros chefes, na verdade,
você já está atrasada.

A reunião
De pé ao lado da mesa, Amy esperava por ele. Tendo checado que o café
estava em seu devido lugar, restava apenas que esperasse e tentasse controlar o
fato de estar ofegante.
Está tudo aqui, Amy. Calma. Você chegou no horário, pensou.
Quando o elevador parou naquele andar, Amy sentiu um arrepio percorrer
todo o seu corpo. Ela não tinha boas notícias.
Por que não vêm eles mesmos dar suas notícias ruins e ouvir os
xingamentos dos outros?
Apesar de estar se perguntando aquilo, de certa forma ela já sabia a
resposta. Existiam motivos claros para aquelas conversas não acontecerem.
Talvez fosse até pior que viessem!
Ele adentrou a sala, passou por ela, sentou-se, e tomou um gole do café,
como sempre. Uma tarefa de poucos segundos que para Amy durava uma
eternidade. Tendo meneado a cabeça positivamente, ela se aproximou e
preparou-se para o que iria dizer.
— Bom dia, senhor.
— Bom dia.
— O senhor Michael McKennan pediu uma reunião de emergência agora e
faz questão de que esteja presente.
— Ele disse do que se trata?
— Não.
Ele bufou.
— Já venho — disse levantando-se e levando o café consigo.
— Está bem, senhor.
Ele deixou a sala com uma expressão séria, mas Amy sabia que estava
irritado.
Se o dia já começou assim, salve-se quem puder até o horário de saída,
pensou, intimidada.

———

Enquanto Michael falava, na outra ponta da mesa ele escrevia. Havia sido
assim desde o começo da reunião. Os outros dois que ali estavam se alternavam
em olhar para o homem que falava e para o que escrevia, tentando entender o
motivo daquelas anotações.
— Nós somos uma empresa praticamente familiar! — dizia ele. — É
natural que tenhamos discussões e divergências de opinião, mas precisamos
entender que se não formos uma família unida, não seremos uma empresa
unida. Se a família se distancia, a empresa vai à falência. Falta comunicação
entre os setores e se não resolvermos isso o mais breve possível, não sei o que
faremos.
Quando Michael finalmente acabou de falar, o outro parou de escrever e
ficou olhando para o papel. Incomodado, resolveu puxar assunto com ele.
— Bom, eu acredito que nosso CEO tenha muito a dizer sobre o que acabei
de expor aqui a vocês, já que fez tantas anotações. Por que não começa expondo
sua opinião?
— Quer mesmo minha opinião? — disse levantando o olhar para ele e
encarando-o seriamente.
— Por favor! — desafiou. — Conte-nos o que tanto escreveu nesse papel.
— Esse papel aqui? — perguntou, pegando a folha e chacoalhando-a. —
Anotei minha lista de compras. Aliás... Amy! — chamou, ao que prontamente a
secretária atendeu e pegou o papel. – Tire uma foto disso e mande pro Noah.
— Sim, senhor, com licença — disse, se retirando.
— Achei interessante a forma como prestou atenção ao que eu disse
durante a reunião, senhor — disse Michael.
— O fato de eu estar fazendo outra coisa não justifica sua afirmação.
— Então diga o que achou!
— Sinceramente? Uma perda de tempo.
— Quer explicar?
— Está bem — disse se ajeitando na cadeira. — Primeiro você deveria
sentir vergonha de nos fazer ouvir tanta bobagem logo que chegamos para
trabalhar. Convocar uma reunião de emergência às oito horas da manhã para
falar sobre problemas familiares? Ah, por favor! Isso é discussão de jantar de
família! Eu vou dizer o que realmente acontece por aqui: Temos muitos nessa
empresa que acreditam que podem fazer seu trabalho de qualquer jeito porque
ninguém vai reclamar deles por serem amigos de alguns de nós da diretoria.
Isso é que não pode acontecer! É disso que deveríamos estar falando e não
dessa perda de tempo de família unida!
— Nossa família não é uma perda de tempo — respondeu Stephen, pai
dele, de Michael e Gabriel, que estava sentado à direita dele.
— Então agora você acha isso?
— Eu nunca pensei diferente!
— Ah não? Tem certeza? Se eu fosse você perguntaria à minha mãe!
— Serena diria a mesma coisa — respondeu Michael. — Não
responsabilize os outros por seus erros.
— Meus? Ah pelo amor de Deus! — disse pegando seu café e levantando-
se. — Eu já ouvi mentiras demais hoje! Se quiserem continuar com esse circo,
boa sorte. Vocês dois são palhaços mesmo! Eu vou para a minha sala fazer algo
que eu recomendaria que todos aqui fizessem para que efetivamente essa
empresa melhorasse: Trabalhassem.
Assim que ele se retirou, Stephen e Michael se entreolharam. Michael
meneou a cabeça negativamente.
— Gabriel!
— Pai? — respondeu prontamente.
— Saia — ordenou sem desviar os olhos para ele. — Preciso falar com
Michael.
— Está bem — disse se levantando e cumprindo a ordem.
Tendo Gabriel deixado a sala, outra reunião começou. Uma reunião que
provocaria graves mudanças na diretoria da McKennan Corporation.

Questão de ponto de vista


Enquanto Kenny terminava de acertar as contas com um entregador de
bebidas, Megan se ocupava em digitar as planilhas que ele havia pedido. Ela
precisava de dinheiro e recomendação e ele odiava ter de perder tempo
preenchendo planilhas. Não podia ser melhor para ambos.
— Tudo certo até agora? — perguntou, aproximando-se e sentando-se ao
lado dela.
— Sim, eu só não entendi uma coisa.
— O quê?
— Essas colunas de “adicional” e “serviço”... Em qual das planilhas eu
lanço! A mesma das garçonetes?
Ele sorriu maliciosamente.
— Megan, você sabe o que é aquilo ali? — disse apontando para algumas
barras de aço situadas num palco no canto do salão.
— Eu vi quando cheguei, mas preferi não perguntar.
— Sabe para que servem?
— Pole dance?
Ele meneou a cabeça positivamente. Tendo notado que ela começara a ligar
os fatos, ele se calou e esperou que ela mesma concluísse algo.
Carro de luxo, amigo de dono de hotel, boate, barras de pole dance, nomes
estranhos nas planilhas... É óbvio!, pensou ela.
— Kenny, por acaso esse lugar é o que eu estou pensando?
Ele riu.
— Depende. O que você acha que é?
— Um... Prostíbulo? — disse num tom quase que inaudível.
— Exatamente.
Megan meneou a cabeça positivamente. Ela se esforçou para parecer
indiferente, mas não conseguiu.
Que ótimo, estou trabalhando para um cafetão!, pensou, irônica.
— Sabe Megan, — continuou. — eu estou nisso há anos e eu sempre sei
que em alguma hora esse momento vai chegar, mas eu nunca sei como agir.
— Bom, não é algo muito comum.
— Pois é.
Ela permaneceu em silêncio por alguns segundos antes de perguntar:
— Dá dinheiro?
Ele sorriu.
— Dá sim.
— Não é perigoso? Quer dizer... Ficar na rua à noite... Sei lá.
Meneou a cabeça negativamente.
— Minhas garotas não ficam na rua, são acompanhantes de luxo.
— E isso é legalizado?
Ele bufou.
— Megan, as pessoas com as quais eu negocio são poderosas o suficiente
para criarem suas próprias leis. Vou te ensinar uma coisa: Seja amigo das
pessoas certas e não vai precisar se preocupar em das satisfações a ninguém.
— Você não acha errado usar do corpo de outras pessoas para enriquecer?
— E que tipo de mídia não faz isso?
— Mas é diferente, não?
— Acha mesmo? Todos nós nos sujeitamos a ser usados em troca de
dinheiro.
— Não pode achar que se trata da mesma coisa! Quer dizer... A meu ver, as
garotas saem perdendo!
— Alguém tem que perder para que outra pessoa possa ganhar, não?
— Isso me parece injustiça.
— Ou capitalismo, chame como quiser.
A boate
Com o carro parado em frente à boate, Megan e Dean aguardavam a
chegada de uma pessoa que ele fez questão de que ela conhecesse. Bem mais
arrumado do que Megan havia visto pela manhã, ele usava camisa preta, calça e
sapato social.
— E aí? Está pronta? — perguntou.
— É... Acho que sim — disse um pouco apreensiva.
— Não se preocupe. Lembre-se do que te mostraram hoje à tarde. Vai ser
fácil.
— Beleza.
Quando a pessoa que aguardavam chegou, Tyler bateu duas vezes no vidro
de Dean avisando-os.
— Vamos lá? — perguntou Dean animado, abrindo sua porta.
Megan respirou fundo antes de menear a cabeça positivamente.
— A boate já abriu, mas eu pedi pro Kenny te deixar esperá-la comigo
porque você não podia começar a trabalhar aqui antes de vê-la chegar —
completou.
Como Megan previa, fazia um frio terrível quando desceu do carro. Apesar
disso, ao ver a porta da boate logo à sua frente, resolveu não vestir a jaqueta.
Já vamos entrar, então não preciso, pensou.
Dean deu a volta no carro e parou ao seu lado. Quando Tyler abriu a porta
da boate, a música “Downtown” de Anitta e J Balvin tomou conta da rua. Lá
dentro, a luz vermelha e as máquinas de fumaça tomavam conta do local. Um
segurança manteve a porta aberta enquanto Tyler foi abrir a porta de seu carro.
O motivo de todo o alarde havia acabado de chegar.
Ela tinha lisos cabelos castanhos que iam até o meio de suas costas e belos
olhos verdes. Com uma cintura invejável e seios volumosos, ela desfilava com
um curto vestido preto de renda com mangas longas e saia rodada. Em suas
mãos, diversos anéis que, somados ao preço do sapato de salto em seus pés,
facilmente poderiam pagar alguns aluguéis de um apartamento. Dispondo de
toda a sensualidade possível, ela caminhou graciosamente até a porta da boate e
virou-se para Megan, acenando e fazendo sinal de que falaria com ela depois.
Impressionada com tamanha beleza, Megan apenas meneou a cabeça
positivamente e deixou que ela entrasse na boate.
Ela é tão bonita que parece de mentira!
— Vem comigo! — disse Dean, puxando Megan pela mão para dentro da
boate. — Vou te mostrar o que ela vai fazer.
De longe, os dois observaram o percurso dela. Decidida, caminhava
calmamente pelo salão, respondendo com acenos aos assovios dos clientes.
— Onde ela vai? — perguntou Megan.
— Você vai ver!
Ela passou pelas strippers e pelo bar, e logo chegou ao outro canto da
boate. Assim que encontrou seu alvo, sorriu. Sentado num sofá mexendo no
celular, ele ainda não a havia visto. Melhor para ela, faria uma surpresa.
Miyuki, que estava sentada ao lado dele, ao vê-la se aproximando se levantou.
Quando ela chegava, ele era só dela.
— E então? Já tem algum palpite de quem ela seja?
— Não, sei lá.
— Já vou te contar. Apesar de achar que você vai descobrir antes.
Do outro lado do salão, ela parou em frente a ele e ficou esperando. Sem
tirar os olhos do celular, ele disse:
— Atrasada.
— Estava ficando bonita pra você. A camisa cinza é a que te dei? —
perguntou, apontando para a camisa dele.
— É.
Ela mordeu o lábio.
— Está lindo.
Ele levantou o olhar para ela e a analisou de cima a baixo.
— E então? — perguntou ela.
Ele abriu os braços e deixou que ela se sentasse em seu colo. Assim que ela
o fez, colocou a mão em sua cintura e a puxou para ainda mais perto.
— Isso quer dizer que gostou?
— Quer dizer que é pra calar a boca e me beijar.
Ela sorriu maliciosamente.
— Eu sei que você não resiste a mim, Kenny.
Ao vê-la beijá-lo na boca, Megan olhou para Dean surpresa. Antes que ela
dissesse algo, ele fez a apresentação.
— Megan, aquela ali é a Madison. Ou, se preferir, a senhora Wright, esposa
do Kenny.
O doente
O relógio já apontava duas horas da manhã. Enquanto seu médico
terminava de escrever, ele tentava lutar contra a dor de cabeça terrível que o
atingia. Na noite anterior não conseguira dormir direito por conta da sinusite e
agora o cansaço só fazia com que a dor aumentasse. Seguindo ordens do
médico, estava deitado e mantinha o inalador no rosto.
— Aqui está! — disse entregando o papel à moça de pé ao lado dele.
— Obrigada doutor. E desculpe pela hora.
— Sem problemas — ele se virou para o rapaz. — Continue fazendo
inalação. Vai dormir melhor. E lembre-se de repousar. Um dia fora da empresa
não vai fali-la.
Ele meneou a cabeça positivamente um tanto quanto contrariado. Apesar de
não gostar da ideia, sabia que não melhoraria se não descansasse ao menos um
pouco.
— Bom, se estiver tudo bem, eu já vou.
— Está sim — respondeu a moça. — Vou levá-lo até a porta.
— Obrigado. E boa noite, senhor! — disse seguindo-a.
— Boa noite.
Quando pegou o celular para avisar que faltaria, sentiu-se estranho. Nunca
havia feito isso antes.
Um dia a menos não vai falir ninguém, relembrou, tentando fazer passar o
nervosismo.
Os grandes homens daquela cidade odiavam não ter as coisas sob seu
controle.
O documento
A cidade havia amanhecido nublada naquela quinta feira, preocupando
Amy quanto a seu horário de almoço por ter esquecido o guarda-chuva. Quando
seu horário se aproximou, no entanto, o sol e o calor apareceram e ela pôde ficar
tranquila... Mas não totalmente. Um envelope vermelho havia acabado de
chegar à sua mesa.
Envelopes vermelhos são sinônimos de problema!
— Senhor? — disse dando duas batidas na porta da sala. — Mandaram um
envelope vermelho.
— Me deixe ver — disse fazendo sinal para que ela entrasse.
Ela entrou rapidamente e entregou o envelope a ele. Em seguida saiu como
era o padrão de quando aquele tipo de envelope era entregue. Além de urgente,
era sigiloso ao destinatário.
O que será que diz ali?
Assim que ela deixou a sala, ele abriu o envelope e puxou a única folha
dentro dele. Não se tratava de nada extenso. Muito pelo contrário. Entendeu
perfeitamente do que se tratava logo na primeira frase do documento:

Comunicamos por meio desta que estamos efetuando a rescisão do seu


contrato de trabalho SEM JUSTA CAUSA, com base na legislação vigente,
devendo V. Sª. encerrar suas atividades de forma imediata.

Quando acabou de ler, virou a folha na tentativa de procurar qualquer


agradecimento por parte da empresa de sua própria família. NADA. Meneou a
cabeça negativamente.
— Vejo que já recebeu o envelope — disse uma voz masculina da porta da
sala.
Ele ergueu olhar em sua direção e viu que se tratava de Stephen. De alguma
forma, conseguiu esconder seu espanto e encará-lo seriamente.
— Prova de que sua visão permanece boa.
— Eu vim aqui porque não quero que entenda mal o conteúdo do envelope
— disse se aproximando.
— Não há nada cabível de má interpretação aqui. Você está me demitindo
sem justa causa. Ponto. Agora, não existe causa, mas existe um fator externo
que a motivou?
— Não entendi?
— Você cedeu a um pedido do Michael?
— Você sabe que eu poderia te demitir por justa causa por gritar conosco
naquela sala, não sabe? No entanto não o fiz.
— Ah, então eu devo ser grato por não ter sido algo pior? Eu vou encarar
sua omissão à minha pergunta anterior como um sim.
— Eu não... Por que você sempre distorce o que eu digo? — perguntou
irritado.
— Eu não distorço! Vocês é que são contraditórios! O que eu quero
entender é: se realmente é uma demissão sem ressentimentos, por que não há ao
menos um agradecimento ao meu trabalho nessa carta?
— O que você queria? Aplausos? Nós te pagávamos para fazer isso!
— Eu queria que pelo menos nessa hora, você fosse um pai — ele se
levantou irritado. — Eu queria que uma vez na vida você deixasse seu
materialismo de lado e percebesse que eu sou mais do que só uma máquina de
fazer dinheiro. Eu estou pedindo demais, pai? Ou devo chamá-lo de senhor
McKennan, já que eu sou só uma pessoa que foi paga para fazer algo nessa
droga de empresa?
— Não sei o que te dizer.
— Exatamente. Você não tem.
Stephen ficou calado por alguns segundos encarando-o. Não sabia o que
dizer.
— Você pode continuar trabalhando e juntar suas coisas depois que todos
saírem — disse dando às costas a ele e saindo da sala. — Depois que assinar
isso, me devolva e eu devolverei sua carteira de trabalho.
Ele meneou a cabeça negativamente. Antes de se sentar, fez uma
panorâmica daquela sala. Teria certo trabalho mais tarde.
Extremos
Sentada à mesa, usando um robe de seda azul com mangas de renda,
Madison fitava a xícara onde saboreava seu café enquanto Kenny, que havia
arrastado a cadeira para perto dela, dizia algo em seu ouvido.
uando Megan adentrou a cozinha, ela desviou rapidamente o olhar para ela
e sorriu, voltando a fitar a xícara em seguida. Desinteressada no conteúdo da
conversa, Megan se sentou a duas cadeiras de distância dos dois e foi arrumar
seu café.
— Então você vai sair? — perguntava Kenny.
— Daqui a pouco.
— Termino por aqui antes das duas horas.
— Fique tranquilo. Você sabe que eu não tenho pressa para fazer compras.
— Está bem — disse se levantando. — Até depois.
Antes que ele se afastasse, porém, ela agarrou seu braço e o puxou para si.
— Não esqueceu de nada?
Ele riu. Curvou-se e a beijou na boca.
— Pronto?
— Agora sim pode ir.
Enquanto Kenny deixava a cozinha, Madison ajeitou a cadeira dele de volta
ao lugar e se virou para Megan que, ao perceber que a observava, encarou-a.
— E então, Megan? O que achou de ontem? — perguntou.
— Não é tão difícil como pensei que fosse.
— Porque só serviu bebidas. Experimente se prostituir ou ser
acompanhante de luxo, como eu era.
—Desculpe a pergunta, mas... Qual a diferença?
— Eu era paga apenas para fazer companhia a homens ricos e poderosos
em eventos, festas, enfim.
— E por que alguém pagaria por companhia?
— Status. Homens ricos gostam de andar com mulheres bonitas por aí.
— Bizarro.
— Eu não era paga para questionar a sanidade alheia, apenas sorrir e fingir.
Megan meneou a cabeça positivamente.
— Conheci o Kenny assim. Eu havia acabado de chegar à festa com meu
contratante e o vi do outro lado do salão conversando com um rapaz. Ele estava
usando smoking, estava lindo! Não demorou muito para que ele me notasse.
Depois disso ele passou a noite toda me observando sempre que podia. Perto da
meia noite, meu contratante já estava bêbado e irritante, então eu o convenci a ir
embora pra casa antes que fizesse alguma idiotice e ele me pagou. Ele me
ofereceu carona, mas eu disse que pegaria um Uber. Fiquei parada na porta
esperando que ele fosse embora até que, assim que o carro passou pelo portão
da saída, senti alguém tocar meu braço. Eu me virei e ele estava ali, com aquele
olhar safado — disse mordendo o lábio. — Nunca vou esquecer do que me
disse.
— Fim do trabalho, acompanhante?
— Como sabia?
— Trabalho com elas. Sei reconhecer uma... E o ouvi contar a um amigo.
— Você é bem atento ao que acontece à sua volta, não?
— Sou atento ao que quero.
— E o que quer?
— Ainda não percebeu?
— Sim. Só quero ver até quando vai continuar jogando antes de ser direto.
— Qual seu preço?
— Eu não cobro quando eu gosto.
— Bom... Eu garanto que vai gostar.
Fitando a aliança em sua mão esquerda, Madison sorria.
— Mas e você? — perguntou, deixando as lembranças de lado. — Kenny
me contou que estava procurando emprego na cidade.
— Estou. Preciso mandar dinheiro para a minha mãe.
— Entendi... E você pretende trabalhar com o quê?
— Eu já trabalhei no escritório de um advogado. Acho que vou tentar um
emprego de secretária.
— Você tem roupa social?
— Não, mas eu vou sair hoje para comprar.
Madison meneou a cabeça positivamente.
— Faz bem. Precisa estar bem vestida se quiser se destacar. Já viu as
secretárias daqui?
— Não.
— Elas se vestem muito bem. Sabem se maquiar, pentear. São elas quem
recebem as pessoas nos escritórios. Precisam estar apresentáveis.
— Imagino.
— Olha... Quer ajuda? Também vou fazer compras. Posso te levar comigo.
— Só se não for te atrapalhar.
— Não vai! Vamos! Termine seu café enquanto me arrumo.
— Está bem.
— Ótimo! — disse se levantando, animada. — Eu já volto!
Enquanto Madison se arrumava, Megan ficou pensando sobre o que faria.
Tinha de ter cuidado para não estourar seu limitado orçamento. O mesmo,
porém, não se podia dizer de sua acompanhante.
Teste particular
Já fazia algum tempo que a garota de longos cabelos castanhos havia chego
ao local combinado e muitas pessoas circulavam por ali. Espiando rapidamente
as horas no celular, ela entendeu o motivo: 12:30, horário de almoço.
Do outro lado do parque, a uma distância considerável, um jovem rapaz
vendia copos d’água num carrinho, animado. Com calor, ela amaldiçoou o fato
de ter colocado uma calça jeans.
Droga, por que eu inventei de colocar essa coisa?
Passou a mão no bolso da calça e avaliou as opções.
Eu podia comprar um, mas e se ele chegar e eu não estiver aqui?
Mordeu o lábio e olhou para os lados, procurando-o. O calor a pressionava
a tomar uma decisão. Ela hesitou por alguns instantes, mas logo tomou coragem
e correu em direção ao vendedor, puxando desajeitada as notas do bolso e
tentando não derrubar o celular.
Se eu for rápida, volto antes de ele chegar!
Quando finalmente se aproximou, perguntou ainda ofegante:
— Quanto é? — disse, apontando para os copos.
— Um dólar.
Ela entregou a nota e ele lhe entregou um dos copos de plástico.
— Obrigada — disse, retirando o invólucro do copo e virando-o na boca.
O frescor da água gelada parecia aliviá-la completamente. A decisão de
correr até ali havia valido a pena. Quando terminou de beber, olhou para o lugar
de onde havia vindo e procurou pelo homem que esperava. Nada.
Se ele se atrasar, melhor pra mim, avaliou. Não vou precisar voltar
correndo e...
— Está esperando alguém? — perguntou uma voz masculina conhecida,
interrompendo seus pensamentos.
— Hã? O quê? — disse virando-se assustada.
— Perguntei se está esperando alguém — disse um tanto impaciente. —
Porque se estiver, não está no local combinado.
Ela olhou o homem de cima a baixo, tentando entender o que estava
acontecendo. Ela reconhecia a voz, mas não conseguia acreditar no que via.
É a voz que ouvi no telefone! Não é possível que seja ele!
— V-Você é o... — gaguejou.
— Kenny? Sim — interrompeu.
Uau! É ele mesmo!
O homem de terno cinza não se parecia com nada que ela havia imaginado.
Os cabelos ajeitados para trás, a barba rala e a aparência impecável encobriam
sua verdadeira identidade. Serviam de pele de cordeiro para o lobo.
— Vou ignorar que não tenha ficado onde pedi já que é sua primeira vez,
mas já aviso que isso não deve se repetir se for trabalhar pra mim, entendeu?
Ela meneou a cabeça positivamente, assustada.
— Certo, vamos — disse dando as costas a ela.
— E-está bem.
Ela jogou o copo numa lixeira que o vendedor trazia no carrinho e correu
para alcançar Kenny, que caminhava apressado sem olhar para trás.
O trajeto até o carro foi silencioso. Ainda nervosa, ela não sabia o que dizer
a ele e preferiu ficar quieta. Kenny se mantinha calado, concentrado nas pessoas
à sua volta. A ideia de ser confundido com um pedófilo lhe incomodava.
Ela parece mais nova do que diz ser. Tomara que não tenha mentido ou
vou me encrencar. Droga! Por que ela tinha que trocar de lugar?
O local do parque onde havia combinado de encontrá-la era menos
movimentado, mais discreto para que conversasse com ela. Aquela mudança, no
entanto, fez com que seus planos fossem por água abaixo. Quando chegaram à
entrada do parque, havia um sedã preto estacionado e Miyuki, de camiseta
preta, short cáqui e tênis, estava encostada na porta do passageiro esperando-os.
A presença de policiais deixou Kenny em alerta, que se adiantou:
— Escuta, você vai seguir até aquele sedã e fingir que conhece a garota.
Têm policiais ali. Eles me viram entrar no parque sozinho e vão me ver saindo
com uma garota que parece mais nova. Se suspeitarem que não te conheço, vão
querer fazer perguntas e a gente pode se dar mal, entendeu?
— Sim.
— Ótimo, agora põe um sorriso na cara e continua andando.
— Certo — disse forçando um sorriso.
Ao se aproximarem dos policiais, Kenny acenou para Miyuki, que sorriu.
— Achou ela? — gritou animada.
Kenny meneou a cabeça positivamente. Ele deu a volta apressadamente no
carro e se sentou no banco do motorista enquanto Miyuki cumprimentava sua
falsa conhecida.
— Olá! — disse, sorridente.
— Oi! — disse tentando parecer animada enquanto a Miyuki a abraçava.
A asiática a soltou e abriu a porta de trás do carro.
— Vá na frente! — disse, sinalizando para que a garota entrasse.
— Está bem — disse, abrindo a porta e entrando, um pouco apreensiva.
Logo que entrou, a garota sentiu um cheiro doce. Olhou para o lado e viu
que Kenny segurava a caixa de uma confeitaria conhecida da cidade.
— Entregue para o senhor Johnson, Miyuki — disse entregando a caixa a
ela. — Ele sabe o que é.
— Está bem, Kenny-sama.
— Qual o seu nome mesmo? — disse olhando para a garota.
— Karen.
— Quantos anos mesmo você disse que tinha, Karen?
— Vinte e um.
Ele meneou a cabeça positivamente e analisou-a de cima a baixo.
É, nada mal, pensou.
O olhar penetrante de Kenny deixou Karen um tanto quanto assustada.
Apesar de saber que para aquela situação era normal, não estava acostumada
àquele tipo de olhar.
— Coloquem o cinto — disse voltando-se para frente e ligando o carro. —
Prepare-se para descer, Miyuki. Eu não vou estacionar.
— Está bem.
Os três seguiram juntos por algumas quadras, até chegarem a um grande
complexo de escritórios.
— Aqui? — perguntou Miyuki enquanto adentravam a avenida.
— É. Quando eu parar, você desce. Ligue para o Tyler quando terminar.
— Entendido, Kenny-sama!
Quando o sinal ficou vermelho, Kenny parou e destravou a porta.
— Vai, vai, vai! — ordenou.
— Até logo! — disse saltando do carro rapidamente.
— Até.
Enquanto o sinal não abria, Kenny acompanhou o caminho de Miyuki até o
prédio. A garota iria entregar aqueles doces a um amigo de Kenny e fazer a
tradução de um documento em japonês que ele havia recebido. Vendo-a se
afastar, Karen pensava no que aconteceria com ela a partir daquele momento.
Nervosa, por um instante quis que ela voltasse.
Para tentar se distrair, Karen pegou o celular e resolveu fingir que
procurava algo. No entanto, ao notar que sua bateria estava prestes a chegar ao
fim, desistiu da ideia e colocou-o de volta no bolso.
— Sem bateria? — perguntou Kenny.
— O quê? — perguntou, assustada.
Como ele percebeu?
— Tome mais cuidado. Em emergências, precisa poder chamar alguém.
Karen engoliu em seco. Kenny sorriu, discretamente.
Eu não resisto a ver esses rostinhos assustados.
Ao chegarem a casa, Karen ficou impressionada e não era para menos.
Kenny morava numa luxuosa mansão, comprada com o dinheiro de suas ações e
claro, com o da prostituição. Parado em frente à ela, Tyler consertava o carro.
— É aqui — disse saltando do carro. — Me espere na porta, vou falar com
um amigo meu.
— Está bem.
Enquanto Karen saía do carro, Kenny se aproximou do carro parado mais à
frente e tocou o ombro de Tyler. Com as mãos sujas de graxa, ele brincou que
as limparia no terno de Kenny.
— Não se atreva — disse se afastando.
Tyler riu.
— Menina nova? — disse olhando para Karen.
— É.
— Parece boa.
— Vou descobrir… E isso aí? — disse apontando para o carro.
— Acho que é o câmbio.
— Sabe consertar?
— Não, mas já chamei o mecânico...
— Bom.
— Só que ele está num acidente e vai demorar — completou.
Kenny bufou.
— Pega — disse entregando a chave de seu carro. — Daqui a pouco a
Miyuki vai te ligar.
— Ok.
— Se precisar de alguma coisa, já sabe.
— Não te chamo.
— Isso aí, garoto — disse batendo em seu ombro.
Na porta, Karen aguardava tensa. Quando viu Kenny se aproximar, soube
que não haveria mais volta.
É agora, pensou.
Ele abriu a porta e fez sinal para que ela entrasse. Na sala, as garotas
discutiam sobre maquiagem e pouco se importaram com a presença dela.
— Venha! — disse fazendo sinal para que ela o acompanhasse.
Atrás de Kenny, Karen subia as escadas apreensiva. Apesar de a
oportunidade de ganhar dinheiro rápido lhe encorajar, a jovem menina não
conseguia relaxar naquela situação. Sabia que precisava de dinheiro, mas ir para
a cama com um desconhecido era estranho de qualquer forma. Ao chegarem ao
quarto, Kenny fez sinal para que ela entrasse primeiro e, tendo entrado, trancou
a porta. Karen colocou o celular no criado mudo e se sentou na cama.
— Já bebeu álcool, Karen?
— Já.
— Quer algo para se soltar? — disse apontando para uma estante com
bebidas.
— Não, obrigada.
— Está bem… Vamos lá então — disse desabotoando o paletó.
Calmamente, Kenny retirou o paletó e arregaçou as mangas da camisa
social branca. Depois se aproximou de Karen e fez sinal para que ela se
levantasse.
— Vamos lá, me mostre o que tem — disse sentando-se no lugar dela.
— Você quer que eu tire…
— Com certeza — adiantou-se. — Pode ficar com a lingerie. O resto, fora!
Despir-se na frente daquele desconhecido era realmente desagradável, mas
ela não tinha escolha. Enquanto a observava, Kenny alisava a barba e se
perguntava se todo aquele nervosismo era realmente apenas incômodo.
Já vi garotas nervosas, mas essa está até demais, estranhou.
— Eu não perguntei antes, mas... — arriscou uma teoria. — Você não é
virgem, é?
— Não.
— Por que está nervosa então?
— Porque… Eu nunca fiz esse tipo de coisa.
— Que tipo de coisa? Prostituição?
Ela meneou a cabeça positivamente.
— Se tem uma coisa que aprendi, é que é preciso ter sangue frio. As
pessoas pagam bem pelo serviço, mas vai precisar merecer, entendeu?
— Sim.
— Vi que está nervosa, por isso te sugeri beber. Tem sorte de eu me
importar porque se eu fosse um dos clientes eu não daria a mínima. Por ser um
teste, sou mais tolerante. Os clientes não querem saber dos seus problemas,
sentimentos, nada! Você tem uma função e deve fazê-la da melhor maneira
possível se quiser receber. São eles quem mandam, entendido?
— Sim.
— Então o que vai fazer?
— O que você mandar?
— Isso. Agora, de frente pra mim — disse, oferecendo-lhe a mão.
Ela segurou em sua mão e se aproximou, devagar.
— Muito bem — disse, soltando sua mão.
Ele puxou a carteira do bolso e retirou cinco notas de cem.
— Você quer?
— Sim!
— Vou deixar aqui junto com suas coisas, então — disse colocando as
notas por baixo do celular dela. — Agora, de joelhos!
Sem hesitar, Karen ajoelhou-se. Kenny meneou a cabeça positivamente e
colocou a carteira no criado mudo.
Dinheiro, a língua universal da obediência.
— Como eu disse, se quiser o dinheiro vai ter que fazer por merecer —
disse tocando o queixo de Karen e sorrindo maliciosamente. — Querida, pra
poder tirar 500 dólares da minha carteira vou te dar bastante trabalho. Está
pronta?
— Estou.
Preciso do dinheiro, relembrou.
— Ótimo. Pode começar… E não me machuque.
A última a saber
Em algum lugar, no alto de um luxuoso condomínio, a jovem mulher estava
impaciente ao telefone.
— Por que não me contou antes? Pai, você saber que eu não estou podendo
passar por esses estresses!
— Desculpe. Eu não quis preocupá-la!
— Você não conseguiu naquele momento, mas agora sim!
— Fique calma. Já está tudo bem!
— É que não me disseram nada e eu estava esperando!
— Eu sei. Eu expliquei tudo como você disse. Mas como eu já havia dito,
você vai saber se algo acontecer.
— Está bem. É só que... Eu queria ter certeza de que está tudo bem.
— Está sim. Agora se acalme e descanse. Você tem outra coisa para se
preocupar no momento.
— É... Verdade. Eu vou comer então, tá? Eu ligo se algo acontecer.
— Certo. Alimente-se bem, entendeu? Nada de gracinhas.
— Eu prometi a mim mesma que não me preocuparia nesse período.
— Faz muito bem. Você é linda de qualquer maneira.
— Obrigada.
— Vou voltar ao trabalho, ok?
— Ok pai. Bom trabalho. Até logo. E ah, não esqueça de me ligar!
— Pode deixar.
Assim que desligou o telefone suspirou, aliviada.
Eles querem me enlouquecer!
Ascensão e queda
Quando o relógio finalmente apontou o fim do expediente, outra tarefa
começou. Depois de quatro anos exaustivos de trabalho, quatro anos de
dedicação, ele se despedia daquela sala. Sentado em sua mesa, ele aguardava
que Amy viesse se despedir para começar a encaixotar todas aquelas coisas. Seu
motorista em breve chegaria para ajudá-lo a levar tudo para o carro e ele
pensava por onde deveria começar.
— Senhor, se o senhor não precisa de mais nada eu já estou indo — disse,
parando na porta já com o casaco e a bolsa em mãos.
— Você sabe o que aconteceu aqui hoje, não sabe? Você deve ter ouvido
quando meu pai entrou aqui.
Ela engoliu em seco. Havia ouvido a discussão sobre a demissão.
— Bom, eu não tive como não... — gaguejou. — Quer dizer...
— Tudo bem — interrompeu. — Vai me poupar uma explicação.
— O senhor me desculpe pela pergunta, mas... E eu?
— Se ainda se lembra, seu contrato é comigo e não com a McKennan,
então se eu não a demiti...
— Ah sim, tudo bem — disse, aliviada. — Obrigada.
— Amanhã quero que vá até a minha casa depois do almoço. Treze horas.
Vamos organizar minha agenda.
— Sim senhor.
— Pode ir então.
Ela deu as costas a ele e foi em direção ao elevador. No meio do caminho,
parou de repente e olhou para a sala dele. Ela já havia entrado naquela sala
várias vezes em todos aqueles anos e conhecia cada canto dela. Ele teria
bastante trabalho.
Eu já perdi meu emprego e sei como ele está se sentindo mesmo que não
queira admitir. Ele sempre foi muito generoso comigo. Sempre que pedi um
adiantamento para comprar remédios ou que pedi para sair e acompanhar um
de meus irmãos ao médico ele me ajudou mesmo não sendo obrigado a isso.
Agora ele precisa da minha ajuda e eu não posso ir embora.
Amy enxugou uma lágrima de seu rosto antes de voltar para trás. Ela iria
ajudá-lo a guardar suas coisas.
— Senhor, eu voltei — disse parando novamente na porta da sala.
— O que houve?
— Vim ajudá-lo a guardar suas coisas.
— Não! Pelo amor de Deus! Pode ir!
— Está tudo bem, senhor — ela apontou para a vidraça atrás dele. — Está
chovendo forte lá fora. Eu teria que esperar de qualquer forma. Além do mais, o
senhor já me ajudou muito. Preciso retribuir.
Ele meneou a cabeça positivamente.
— Obrigado, Amy.
— Disponha... — disse saindo da sala. — Vou deixar minhas coisas na
minha mesa.
— Aproveite e pegue suas coisas se é que tem algo aí ainda. Não vamos
mais voltar aqui.
— Ah, eu nunca deixo nada aqui. Está tudo certo.
— Senhor! — disse um rapaz loiro adentrando a sala. — Cheguei... E
trouxe as caixas.
O rapaz era o motorista que ele aguardava. De terno e gravata, o atlético
rapaz loiro de olhos castanhos trazia um carrinho com algumas caixas sobre ele.
— Ótimo, Jarrod — respondeu. — Traga aqui.
Aos poucos com a ajuda de Jarrod e Amy a sala foi se esvaziando. A
estante de livros que de início aparentou ser um problema com seis mãos
rapidamente deixou de sê-lo. Amy guardou as revistas que ficavam no outro
canto da sala e Jarrod removeu os quadros. Pouco mais de dez minutos depois, a
sala estava vazia, restando apenas as coisas que estavam sobre a mesa dele.
— Amy, pode ir. Obrigado pela ajuda.
— Sem problema, senhor.
— Senhor, vou levar essas caixas pro carro — disse Jarrod.
— Leve. Eu te encontro lá embaixo.
— Está bem.
Enquanto Jarrod e Amy se retiravam, ele foi até a sala de seu pai. Em cima
da mesa da secretária dele, pegou uma tesoura. Ao abrir a porta da sala,
imediatamente encontrou o que procurava: Um porta retrato com uma foto de
sua família. Nele, Stephen estava sentado em sua mesa e ele, Michael e Gabriel
estavam de pé atrás dele. Ele caminhou até a mesa onde o porta retrato estava,
pegou-o e retirou a foto de dentro dele. Com a tesoura, cortou-se da foto e
recolocou-a no seu devido lugar. Depois, retirou o crachá do bolso e jogou-o na
mesa de seu pai. Quando saiu da sala, recolocou a tesoura na mesa e colocou a
foto no bolso.
Se eu sou só um funcionário, não devo estar na foto da família agora, já
que fui demitido!
Quando retornou para sua sala, Amy e Jarrod já haviam descido para o
saguão. Sozinho, olhou para aquela sala uma última vez. Tinha tantas
memórias dali. Lembrava-se do exato dia em que seu avô o levou até lá e disse
que aquela era sua sala agora. Que momento de glória! No começo muitos
haviam duvidado de sua capacidade, mas logo perceberam o motivo de ele estar
lá.
Eu provei para todos eles que estavam errados.
Sentira aquela mesma sensação de despedida apenas uma única vez:
quando foi embora de casa. Agora, era hora de partir novamente. Junto à
sensação de despedida repetia-se a tristeza e a frustração com seus familiares.
Novamente saía para ficar longe deles.
Eles sequer me agradeceram.
Antes de efetivamente partir, pegou o celular, suas chaves e foi até sua
porta. Sua placa, que um dia fora colocada por seu avô, ainda estava ali. Ainda
podia ouvir a voz dele em sua cabeça.
— Essa aqui é a placa da sua sala. Eu confio em você.
Agora nada mais restava ali além do silêncio. Com cuidado, retirou sua
placa e foi embora. Na porta, um espaço vazio onde antes se lia:

ADAM RICHARD MCKENNAN


CEO
A matriarca
Na sacada da mansão, Serena e Stephen discutiam.
— Eu não estou acreditando que você foi capaz de fazer uma idiotice
dessas! — gritava, furiosa.
— Serena, foi necessário!
— Não, não foi! Foi pura teimosia! Que lindo Stephen! Seu pai vai adorar
saber sobre sua nova tendência de misturar vida pessoal e profissional!
— Serena, eu...
— Eu não sei se você tem medo ou se acha que vai perder o lugar —
interrompeu. — Mas sejamos francos, você parece uma criança! Quer competir
com o próprio filho? Devia ficar feliz com o que ele fez por aquela empresa,
pela maneira como ele evoluiu!
Enquanto ela falava, Stephen a encarava assustado. Ele não via Serena tão
irritada desde o incidente de quando Adam ainda era pequeno.
— Querer parar o Adam é a pior coisa que pode fazer! Ele é um trem vindo
em sua direção e ao invés de pegar carona no sucesso dele você está optando
por ficar parado no meio dos trilhos!
Ela deu às costas a ele e marchou irritada em direção à porta. Antes de
entrar, virou-se uma última vez e, apontando para ele, disse:
— Esse trem vai passar por cima de você, Stephen... Se já não passou!
Noite chuvosa
Megan esforçava-se para fazer seu trabalho da melhor maneira possível.
Trabalhar numa boate não era o emprego dos seus sonhos, mas era o que tinha
naquele momento e ao menos oferecia um lugar para ficar.
A tarde de compras com Madison fora muito proveitosa. A moça a havia
presenteado e pago as roupas para ela. De início não quis aceitar, mas ela
insistiu e Megan aceitou com a condição de lhe devolver o valor
posteriormente. Para Madison, não fazia muita diferença, mas concordou.
Eles estão sendo muito bons comigo. Eu os subestimei, pensou.
Do outro lado do salão, Kenny notou em meio a todos os clientes um em
especial. Sozinho num canto, ele estava cabisbaixo com um copo de uísque
vazio em mãos e parecia realmente triste. Quando percebeu de quem se tratava,
no mesmo instante se levantou e foi até a mesa onde ele estava.
— Adam! — disse, sentando-se. — Você está bem?
Ele meneou a cabeça negativamente
— O que você tem? Quer conversar? — insistiu.
— Kenny, me diga uma coisa! — disse, levantando a cabeça e encarando-o
irritado. — Você acha justo que alguém trabalhe por anos na empresa da
própria família e de repente seja demitido sem justificativa alguma e sem nem
uma droga de um agradecimento na carta de demissão?
— Você foi demitido? — sussurrou, assustado. — Quando foi isso?
— Hoje!
— Então foi por isso que marcaram uma reunião às pressas amanhã?
— Provavelmente.
— Por que não me contou?
— Kenny, eu não fiz mais nada desde que eu saí de lá além de ir pra casa
guardar minhas coisas e vir até aqui!
— Meu Deus... Alguém mais sabe?
— Não sei, mas provavelmente vai estar nos jornais amanhã.
— Então amanhã vou até lá dizer que deixei de ser sócio deles.
— Não, você não precisa fazer isso só por minha causa!
— Adam, sem você aquela empresa vai para o buraco!
— Eles vão achar outra pessoa. Talvez ele seja até melhor.
— Eu não confio de deixar meu dinheiro nas mãos de outra pessoa que não
seja você e eu acho que os outros acionistas também não! Nós investimos na
McKennan quando você entrou. Se você vai sair, nós vamos sair também!
— Não vou pressionar ninguém a fazer isso.
— Não vai precisar. Você vai ver! Amanhã, quando souberem, vão sair!
— Você acha?
— Exceto se quiserem jogar seu dinheiro fora. Mas se me perguntassem eu
recomendaria que não ficassem.
Ele meneou a cabeça positivamente e se levantou. Kenny o acompanhou.
— Eu acho que vou pra casa.
— Veio dirigindo? Quer que peça para te levarem?
— Não, o Jarrod está lá fora.
— Ah, ok.
Antes que ele fosse embora, Kenny o abraçou. Ele conhecia a trajetória de
Adam e partia seu coração ver seu melhor amigo daquela forma. Sabia que não
podia fazer muito por ele naquele momento, mas ao menos podia oferecer
apoio.
— Conte comigo se precisar de algo, entendeu?
— Sim. Eu agradeço.
— Você é uma boa pessoa. Vai se sair bem dessa.
— Obrigado.
— Hoje foi por minha conta, está bem? Vá descansar.
— Ok. Obrigado.
— Não foi nada.
Ainda cabisbaixo, Adam deixou a boate. Assim que ele saiu, Kenny virou-
se para a mesa para pegar o copo de uísque vazio. Foi quando notou que ele
havia esquecido o sobretudo e o celular na cadeira ao lado.
Adam está realmente mal, pensou, pegando as coisas dele.
Ele olhou rapidamente à sua volta procurando alguém para ajudá-lo e viu
Megan parada ao lado do balcão.
— Megan! — chamou. — Venha aqui!
— Oi! O que houve? — disse se aproximando.
— Sabe o rapaz com quem estava conversando?
— Sei.
— Vá atrás dele e entregue! — disse, entregando as coisas a ela. —
Rápido!
— Está bem!
Com as coisas de Adam em mãos, ela correu até a porta da saída. Ao vê-la,
Dean abriu a porta sem perguntar.
— Eu vou...
— Já vi! Corre! Estacionamento! — respondeu.
Ignorando a chuva forte que tomava conta da cidade, Megan correu até a
rua ao lado para procurar Adam. Do outro lado da rua, dois rapazes riam com
garrafas de bebida em mãos. Quando viu a luz do farol de um dos carros acesa,
correu até ele.
Espero que seja ele, pensou, tentando evitar molhar-se mais.
Ao chegar à frente do carro, deparou-se com um rapaz loiro ao volante. Por
um segundo amaldiçoou estar errada. Foi quando o rapaz abriu uma fresta da
janela e gritou:
— Aqui, senhorita!
Espiando para dentro do carro, viu que o homem que estava na boate estava
no banco de trás.
— Ah, que bom! — disse, correndo até ele.
De repente, Megan ouviu as risadas dos rapazes mais próximas. Ela se
virou para olhar e viu que agora os dois a aguardavam no fim da calçada.
— Vem pra cá, meu amor! — gritou um. — Vamos brincar!
Um arrepio percorreu sua espinha. O que ela ia fazer?
— Entra aqui! — chamou o homem que estava no banco de trás do carro.
Ela se virou de volta e viu que ele havia aberto sua porta.
— Vem! Rápido! — insistiu.
Sem pensar duas vezes, ela entrou.
— Tira a gente daqui, Jarrod! — ordenou o homem.
— Sim senhor — disse o motorista, ligando o carro mais que depressa.
— Era só o que me faltava nessa droga de dia: Brigar com bêbados!
Enquanto o carro disparava para longe dali, Megan só pensava em como
com apenas três dias naquela cidade podia estar passando por tanta coisa.
Só podia ser comigo!

———

Estranhando a demora de Megan, Kenny resolveu ver se Dean sabia onde


ela estava.
— Cadê a Megan? — perguntou à Dean.
— Não sei.
— Como não sabe? Não viu quando ela saiu?
— Vi, mas voltei aqui pra dentro! Estava chovendo muito!
— Que droga! — disse, meneando a cabeça negativamente.
— O que foi? — perguntou Tyler, aproximando-se.
— O Dean perdeu a Megan.
— Eu não perdi, eu só não sei onde ela está! — protestou.
— O que também é perder! — respondeu Tyler.
Enquanto os dois discutiam, Madison se aproximou de Kenny e entregou o
celular dela a ele. Adam havia mandado uma mensagem explicando o ocorrido.
Aliviado, ele tocou o ombro de Tyler e interrompeu a discussão:
— Voltem ao trabalho. Está tudo bem.
— O quê? Como assim? — perguntou, confuso.
— Eu já sei onde ela está.
— Já? E ela está bem?
Kenny olhou para Madison que o encarava sorridente e riu.
— Na verdade... Ela não poderia estar em lugar melhor.
Outro lar
Deitada na cama do quarto de hóspedes de Adam, Megan pensava em
como tudo acontecera tão rápido. Depois que Adam a tirou de onde estava, ele a
levou até ali e ordenou que seu mordomo Noah e sua empregada Danielle a
ajudassem com o que precisasse. Desde então havia tomado banho e secado seu
cabelo com um secador enquanto eles tratavam de suas roupas. De roupão,
aguardava que alguém lhe desse alguma direção.
Será que durmo? Espero por algo? Foi tudo tão rápido desde a confusão!
De repente, ouviu batidas na porta.
— Sim?
— Posso entrar? — disse Noah.
— Claro!
De calça, colete e camisa social branca dobrada na altura dos ombros, o
rapaz adentrou o quarto com elegância.
— Dani já lavou suas roupas e as deixou na secadora. Amanhã de manhã
depois que ela as passar, nós as devolveremos.
— Tudo bem, eu agradeço.
— A senhorita precisa de algo?
— Direção.
— Perdão?
— O que eu faço agora?
Ele não conseguiu conter o riso.
— A senhorita pode ver TV, ou... Eu não sei. Talvez dormir.
— Kenny sabe que estou aqui?
— Sim, meu senhor avisou.
— Ele ainda está acordado?
— Deve estar, mas já foi para o quarto.
— Eu queria agradecê-lo pelo que fez.
Ele olhou na direção do quarto de Adam e suspirou.
— Senhorita, eu acho melhor deixar isso para amanhã de manhã — disse,
voltando-se para ela com um olhar preocupado.
— Ele já foi dormir?
— Não sei, mas depois dos ocorridos de hoje creio que queira ficar
sozinho.
— Entendo. Tudo bem — disse um tanto quanto confusa.
— A senhorita precisa de mais alguma coisa?
— Acho que não.
— Tudo bem, então eu já vou. Se quiser água, deixei algumas garrafas no
frigobar. Pode usar o telefone que está no seu criado mudo se precisar ligar para
alguém. Amanhã às sete horas em ponto eu já estarei aqui se precisar de algo.
— Obrigada.
— Não há de quê. Quer que apague a luz? — disse, encaminhando-se para
a porta e pousando a mão sobre o interruptor.
— Pode apagar... Ah, você pode me acordar?
— Como quiser. Boa noite, senhorita.
— Boa noite.
Ele apagou a luz, saiu e fechou a porta. Ao voltar-se para a porta do quarto
de Adam, resolveu checar como estava. Aproximou-se então e tentou ouvir
algo. Ouviu apenas um barulho de água, que imediatamente atribuiu ao fato de
estar enchendo sua banheira.
— Senhor? — disse batendo na porta e abrindo-a.
— Entre, Noah! — respondeu calmamente.
Noah lançou o olhar para dentro e procurou por ele. Encontrou-o parado à
porta do banheiro, vestindo um roupão preto e abrindo um frasco de sal de
banho.
— Tentando relaxar, senhor?
— Sugestão do Hendrick.
Noah meneou a cabeça positivamente.
— O senhor precisa de mais alguma coisa?
— Só saber onde ela está. Até agora nem conversamos direito.
— No quarto, dormindo. Já chequei e não precisa de mais nada.
— Perfeito então... Ah! Amanhã, arrume a mesa do café.
— Sim senhor. A que horas?
— Às oito. Vou levantar às sete e meia.
— Está bem. Ajustarei meu relógio então.
— Faça isso. — disse, adentrando o banheiro. — Boa noite, Noah.
— Boa noite, senhor McKennan — disse, retirando-se e fechando a porta.
Enquanto apagava as luzes restantes e ajeitava suas coisas para ir embora,
Noah só conseguia pensar se a garota no outro quarto fazia ideia de onde estava
e com quem falaria na manhã seguinte.
Ele não passa pela vida de ninguém sem deixar sua marca.
Reviravolta
Quando Michael chegou à McKennan naquela manhã de sexta-feira, um
envelope vermelho o aguardava sobre sua mesa. Estranhando o fato, pegou o
envelope e resolveu ver logo de que se tratava. A incredulidade
instantaneamente tomou conta dele ao ler:

Comunicamos por meio desta que estamos efetuando a rescisão do seu


contrato de trabalho SEM JUSTA CAUSA, com base na legislação vigente,
devendo V. Sª. encerrar suas atividades de forma imediata.

— O quê? — gritou.
— É, Michael. — respondeu uma voz masculina atrás dele.
Ele se virou e se deparou com Stephen, encarando-o entristecido.
— Pai, o que é isso? Como assim? — disse, chacoalhando o papel.
— Serena ficou revoltada com a demissão do Adam. Não quero que ela
continue nervosa comigo e por isso tomei essa decisão.
— Não é justo! O que eu tenho a ver com isso?
— As discussões entre você e o Adam são recorrentes, Michael! Não
podemos deixar que isso atrapalhe a empresa!
— Mas pai, Adam foi embora!
— Como eu vou te explicar ... — ele levou as mãos até os lábios.
— Reunião agora, pai — chamou Adam, parando na porta da sala.
Michael olhou para Stephen com terror nos olhos.
— O quê? Ele voltou? — disse, quase que num sussurro.
Stephen meneou a cabeça positivamente, envergonhado. Adam sorriu.
— Adeus, Michael.
— Não! — gritou.
De repente, Michael estava de volta a seu quarto. O celular despertava às
sete horas e ele ainda estava em casa. Tudo fora apenas um pesadelo. Aliviado,
suspirou.
— Ok, não foi nada — disse, tentando se acalmar.
Ele parou o despertador e pegou seu terço sobre o criado mudo.
Só para garantir, pensou.
A aposta
Para Alice King, os homens daquela cidade transpiravam desespero.
Bastava apenas que ela estivesse no lugar e na hora certa para que seus “dotes”
a dessem alguma vantagem. Certo charme, uma voz mais sensual, talvez um
decote... Qualquer coisa que os fizesse abandonar sua autoridade e render-se aos
prazeres da carne já era de grande ajuda para que ela pudesse conseguir certos
favores.
O que Alice não sabia era que assim como ela os estudava, eles também a
observavam... E compartilhavam informações uns com os outros num grupo de
rede social, onde se dedicavam a transformá-la em piada. Enganava-se em
pensar que tirava proveito deles.
Aquela era mais uma manhã comum para Kenny. Ainda sonolento, ele
aguardava o início da reunião na sala de espera da McKennan. Na noite
anterior, havia ficado acordado até quatro horas da manhã mesmo sabendo que
precisaria estar na McKennan bem cedo. Agora, faltando cinco minutos para as
oito horas, lutava para permanecer acordado.
— Por que tão cedo? — balbuciou, levantando-se e caminhando em direção
à mesa do coffee break.
Kenny pegou um copo e serviu um pouco de café da garrafa para si. Numa
tentativa de aumentar o efeito da cafeína, resolveu tomá-lo sem açúcar, o que
considerou um erro quando segundos depois o líquido amargo desceu por sua
garganta.
— Que horror — sussurrou.
— Precisa de açúcar? – perguntou uma voz feminina ao longe.
— O quê? — perguntou, virando-se na direção da voz.
A alguns metros dele, a moça loira estava encostada na porta. Usando um
vestido cinza justo ao corpo, ela o encarava com malícia.
— Perguntei se precisava de açúcar — disse se aproximando.
— Ah... Não. Eu estou bem. Tomei-o sem açúcar pra ver se acordava.
Ela riu.
— Entendi... Já nos conhecemos? — perguntou.
— Não, mas podemos. Sou Alice King — disse, estendendo a mão.
— Kenneth Wright — disse cumprimentando-a.
Então é ela!
Já fazia algum tempo que Kenny tinha conhecimento da fama de Alice e
aguardava a hora de agir. Ela precisava de uma lição. Agora o momento certo
havia chego e ele não perderia aquela chance.
— Então você é a filha do senhor King? — perguntou para confirmar.
— Isso mesmo.
— É bonita como disseram. Na verdade, um pouco mais.
— Obrigada.
Eles são tão fáceis! Pensou, orgulhosa.
— Não foi nada.
Ela é tão oferecida que sequer me esforcei, gabou-se.
— Diga-me, o senhor pretende fazer algo hoje à noite?
— Infelizmente sim, pretendo. Por quê?
— Bom, podíamos jantar um dia desses.
— Seria ótimo.
— Então vamos fazer o seguinte: Você fica com meu telefone e quando
tiver tempo, me liga e marcamos.
— Ótima sugestão. Você é rápida, não?
— Por que ir devagar?
— Concordo — disse rindo e puxando o celular do bolso.
Enquanto ele digitava, Alice sorria orgulhosa. Já havia ouvido seu pai falar
dele, sobre como era rico. Kenny por sua vez, só pensava no que contaria
àqueles homens assim que se afastasse dela. Ela não sabia sobre o “trabalho
paralelo” dele.
Eles vão gostar de saber. Ela vai enlouquecer quando descobrir. Queria
muito estar lá para ver!
Se tinha algo que Alice não suportava, era o fato de seu pai andar com
prostitutas. Ela sempre se irritava quando esbarrava com elas e prometia a seu
pai que iria descobrir quem era o contato dele e fazer um escândalo quando o
encontrasse.
Pobre Alice, mal sabia que estava falando com ele.
Boas notícias
Ainda sonolento com o efeito dos remédios, o homem loiro esforçava-se
para ler a notícia no celular. O nome era conhecido e havia lhe chamado a
atenção. Quando conseguiu ler, mal acreditou. Em meio a toda aquela
frustração por ter de ficar repousando em casa, algo o fez sorrir.
— A-Amber... — gritou com a voz um pouco falha, antes de tossir.
— O que foi, querido? — disse vindo apressadamente do quarto.
— Eu estou lendo isso mesmo ou essa droga de remédio também me faz
alucinar? — disse virando o celular na direção dela.
— Deixe-me ver... Anunciada a demissão do CEO da McKennan
Corporation. A demissão teria ocorrido na tarde de ontem, mas só veio a
público nesta manhã. — ela voltou-se para o homem. — É ele?
Ele sorriu, meneando a cabeça positivamente.
— Por que está feliz? Ele não é seu amigo?
— É.
— Então?
— Ele é um dos meus melhores amigos... E nosso futuro CEO.
Primeiras impressões
Usando a mesma roupa da noite anterior que, graças à Noah e Danielle
agora estava seca, Megan tomava café. Havia tantas opções que precisou de
alguns segundos para escolher o que comer, mas logo se decidiu por um pedaço
de bolo de laranja e um pouco de suco. Propositalmente, Noah a havia colocado
sentada de frente para a sala, para que visse qual seria sua expressão ao ver
Adam. Ela, no entanto, não sabia disso.
Vamos ver o que a senhorita vai achar dele, pensou, animado.
A escolha de Megan foi interrompida quando Adam surgiu no corredor. Ao
vê-lo de terno preto, camisa branca e gravata preta com listras brancas, Megan
teve de se esforçar para esconder sua surpresa. Noah, que observava ao longe,
sorriu com os lábios fechados. Concentrado, digitando algo no celular, Adam
não reparou no que acontecia.
— Bom dia, senhor! — disse Noah, acompanhando-o até a mesa e puxando
sua cadeira.
— Bom dia, Noah — disse sentando-se, sem tirar os olhos do celular.
— O senhor vai querer ler o jornal?
— Não, não quero me estressar. Já sei qual a matéria da capa.
— Claro. Tem razão.
Enquanto Adam digitava, Megan o observava. Na noite anterior estava
escuro e, com a velocidade com que tudo aconteceu, ela não havia reparado
bem em como ele era. Agora, porém, finalmente conseguia vê-lo bem... E
gostava do que via.
Ele é lindo!
A atenção dele ao celular salvou Megan de ser pega olhando-o boquiaberta.
Ao perceber que o fazia, ela meneou a cabeça negativamente e voltou sua
atenção à comida. Noah, que a observava ao longe, virou-se de costas para
segurar o riso.
Parece que alguém gostou do que viu!
— Noah! — chamou Adam, deixando finalmente o celular de lado e
servindo-se do café.
— Senhor? — disse, virando-se e se aproximando.
— Alguém me ligou?
— Sim, senhor. O senhor Dylan Satt.
— Dylan disse o que queria?
— Quer que o visite para uma reunião hoje à noite.
Adam meneou a cabeça positivamente.
— Pode confirmar, então. Eu vou.
— Vou avisá-lo então, senhor. Com licença — disse, retirando-se.
De frente para Adam, Megan mastigava o bolo enquanto pensava se
deveria ou não começar uma conversa. Adam, por sua vez, ocupava-se em
adoçar o café em sua xícara.
Será que ele quer conversar? Pensou, cabisbaixa.
— Então você se chama Megan, senhorita? — perguntou, interrompendo
seus pensamentos.
Quando Megan ergueu o olhar para ele, perdeu o ar. Ele havia terminado de
se servir e a encarava. Os famosos olhos de Adam. Firmes, penetrantes... E por
que não, sedutores? Ele derrubava as pessoas com o olhar e a havia derrubado
naquele momento.
— I-isso — gaguejou. — Megan Kessler.
— Certo, Megan. É um belo nome — disse, estendendo a mão. — Me
chamo Adam.
— Prazer — disse, cumprimentando-o.
— Kenny me falou de você. Chegou à cidade há poucos dias?
— Exatamente.
— E o que faz aqui? Se é que me permite saber, claro.
— Eu queria novas oportunidades. Minha cidade é pequena, não havia
muito para mim lá. Eu queria... Mais.
— Entendo... E por onde pretende começar? Tem um plano?
— Eu… Não exatamente. Pensei em um emprego de secretária, mas não
conheço bem a cidade e não sei onde devo ir primeiro. É difícil, porque não sei
se devo focar em ir a escritórios de empresas ou a consultórios, por exemplo.
— Bom, eu sugiro que pense sobre isso. Tem de saber onde pretende ir
para traçar um plano de ação. Do contrário, ficará andando em círculos nessa
cidade, o que não é difícil dado seu tamanho.
— O que me sugere?
— Qualquer coisa, menos o que um terceiro lhe recomendar. O emprego é
seu, têm de escolher algo que goste. Aquele que diz que sabe o que é melhor
para você, na verdade está interessado em obter uma vantagem através do que
você fará.
Ela meneou a cabeça positivamente.
Ele é bem confiante. Parece ter certeza do que está falando.
— Entendi.
— Sobre trabalho, não se preocupe. Essa cidade oferece ótimas
oportunidades se souber aproveitá-las. Certamente vai encontrar algo que lhe
agrade.
— Espero que sim.
Enquanto Adam tomava outro gole do café, Megan se recordou do que
tinha de dizer a ele. Ele a havia salvado na noite anterior e ela precisava
agradecer. Um pouco envergonhada, mas sabendo que era importante, tomou
coragem e disse:
— Adam, eu queria agradecê-lo.
— Por?
— Ontem. Quer dizer... Você não tinha a obrigação de me ajudar e...
— Você fala sobre o que aconteceu no estacionamento? — interrompeu.
— Sim.
Ele meneou a cabeça negativamente.
— Não precisa me agradecer. Eu fiz o que achei que era certo. Eu me
sentiria culpado se a deixasse lá e depois soubesse que algo ruim aconteceu.
— Kenny me disse algo parecido no dia em que nos conhecemos.
— Ele é um homem bom. Teve sorte em encontrá-lo.
— Também tive sorte de encontrar você.
Ele ficou calado por um momento, encarando-a.
— Será?
Por um instante Megan ficou sem graça. Não sabia exatamente o motivo de
ele ter dito aquilo, mas esperava que significasse algo bom.
— Acho que sim — arriscou.
— Se é que posso lhe dar um conselho, não se engane pelas aparências,
senhorita Kessler. Nessa cidade você vai encontrar muitas pessoas. Pessoas
boas e ruins. Mas eis algo que aprendi com meu avô sobre todas elas: lembre-se
de quem estender a mão a você e, mais do que isso, lembre-se dos apertos de
mão que der — ele se aproximou para sussurrar. — Tenha cuidado ao escolher
a quem vai dever um favor.
Fora de controle
A reação dos acionistas à demissão de Adam certamente não foi das
melhores. Michael ainda não havia terminado de explicar o impacto de tal
mudança quando um dos acionistas se manifestou:
— Quem foi o imbecil que demitiu Adam McKennan? — perguntou
Frederick, que estava sentado ao lado de Gabriel na mesa.
Kenny se esforçava para não rir.
Como eu queria que o Adam estivesse aqui para ver isso!
— É, eu também queria saber! — apoiou outro.
— Eu também! — apoiou mais um.
— Mantenham a calma, senhores — pediu Michael. — Não há motivo para
preocupação. Já temos um novo CEO.
— Já? — perguntou Gabriel, confuso.
— Sim.
— Desde quando? Ninguém me chamou para a deliberação!
Houve silêncio na sala. Os acionistas se voltaram para Gabriel e em
seguida para Michael, esperando uma resposta.
Merda, pensou Michael.
— Gabriel, podemos conversar depois? — pediu.
— Não! Eu quero uma resposta agora!
— Gabriel, por favor! — pediu Stephen.
— Deixe-o responder, senhor McKennan! Todos estamos interessados em
saber! — pediu Frederick.
— Não creio que seja o momento ideal para discussões, senhor.
— Não se trata de uma discussão! Se trata de transparência! — respondeu
William, outro acionista que estava ao lado de Frederick. — Confiamos nosso
dinheiro a vocês! Têm a obrigação de nos dizer o que está acontecendo! E me
surpreende que seu Chefe de Marketing não saiba!
— Não tivemos tempo de fazer uma reunião com todos os membros da
diretoria, senhor Carter — respondeu Michael.
— Mas pelo visto tiveram tempo de deliberar! — retrucou, irritado.
— Senhor Carter, nós não...
— Senhores, senhores! Por favor! — interrompeu Kenny, chamando a
atenção para si. — Eu entendo o motivo de estarem irritados. É seu dinheiro,
têm razão de estarem assim. Porém, posso compreender a desorganização
devido à falta de tempo deles antes de uma reunião conosco. Apesar disso, faço
um pedido aos que, de alguma forma, deliberaram: sejam honestos com os
homens desta sala. Principalmente com Gabriel que, antes de ser Chefe de
Marketing, é irmão e filho de vocês — ele se voltou para Stephen. — Senhor
McKennan, eu já conversei com Adam e minha decisão de deixar de ser
acionista já foi tomada independentemente desta reunião. Compareci por mera
formalidade antes de efetuar a rescisão e agora peço sua licença para me retirar.
— Senhor Wright, por favor, queira aguardar o final da reunião. Não tome
nenhuma decisão precipitada. — respondeu Stephen.
— Não há nada precipitado aqui, senhor. Adam McKennan antes de ser
CEO é meu melhor amigo. Há quatro anos ele entrou nesta empresa e, bem
como muitos outros que estão aqui, eu o segui. Ontem ele foi demitido e,
seguindo seus passos, também irei embora.
— Senhor Wright, se o senhor se retirar, farei o mesmo — anunciou
Frederick.
— Senhor Thompson, faça o que julgar necessário — disse se levantando.
— Com licença.
Enquanto Kenny se retirava, os acionistas olhavam uns para os outros
buscando alguma direção. Deveriam segui-lo? Deveriam esperar para ouvir o
que Michael ainda tinha a dizer?
— Como disse, com licença — disse Thompson, cumprindo a promessa.
Gabriel bufou. Ele empurrou a cadeira violentamente para trás, levantou-se
e marchou irritado em direção à porta.
— Gabriel! — chamou Stephen.
Ele não respondeu. Após aquela cena, os acionistas não tiveram outra
reação senão levantarem-se também e se retirarem. Ao ver o último deles deixar
da sala, Michael suspirou.
— Pai!
— Sim, Michael?
— Acho que vamos precisar de outra reunião.
A substituta
— Bom dia! Olha só quem voltou! — disse Madison, assim que Megan
fechou a porta do carro.
A pedido de Kenny, Madison havia ido buscá-la. Depois de toda a confusão
da noite anterior, estava feliz por vê-la novamente.
— Bom dia! — disse risonha.
— Parece que teve uma noite agitada, não?
— Pois é.
— Pedimos desculpas por ontem. Pensamos que Dean estivesse de olho em
você.
— Tudo bem. Vocês não tinham como saber.
Ela meneou a cabeça positivamente.
— E quanto ao Adam? Gostou dele?
— Ele parece ser uma boa pessoa. Foi muito gentil.
— Ah, ele é fantástico. Kenny ficou relaxado quando soube que você
estava com ele... Mas e então? Pronta para procurar emprego?
— Sim. Eu só espero que Kenny não se incomode. Eu gosto do trabalho de
garçonete, mas...
— Mas quer um trabalho mais comum, não é? Eu sei. Está tudo bem.
— Mesmo?
— Claro! Olha, eu mal a conheço, mas admiro sua coragem de vir em
busca de algo novo. Eu conheço pessoas que jamais fariam isso! Gente que não
sabe fazer nada, sabe? Não aprendeu a arregaçar as mangas e trabalhar. Mas eu
garanto que lugar para pessoas como você, não falta por aqui. É só ir ao lugar
certo e falar com as pessoas certas.
— Adam me falou sobre isso.
— E é a mais pura verdade! Por isso, tomei uma decisão — disse virando-
se para ela. — Kenny tem uma festa daqui a uma semana. Donos de grandes
empresas estarão lá. Eu não vou poder ir, mas já arranjei uma substituta.
— Que bom!
— Você!
— Eu? — perguntou, assustada.
— Sim! — disse animada.
— Não, não. Por favor. Eu nunca fui a um evento desses.
— Bom, agora vai.
— Mas eu nem sei o que vestir, como me portar...
— É por isso que eu estou aqui! Vamos comprar um vestido pra você!
— Não! Chega de gastar seu dinheiro comigo!
— Megan, eu gasto meu dinheiro com quem eu quiser. Além do mais, não
dá pra cancelar. Já coloquei seu nome na lista.
— O quê? Sem me consultar?
— Eu já sabia que você ia fazer esse drama todo e me adiantei!
— Meu Deus do céu... — disse cobrindo o rosto com as mãos.
— Coloque o cinto! — disse se ajeitando de volta no banco e ligando o
carro. — Nós vamos comprar o vestido e quando chegarmos lá em casa
começamos suas lições de etiqueta. Não é um jantar, vai ser simples! Só precisa
aprender a sorrir e tomar champanhe. Consegue fazer isso?
— Eu não acredito que isso está acontecendo — dizia enquanto meneava a
cabeça negativamente e colocava o cinto.
— Consegue fazer isso? — insistiu.
— Agora vou ter que conseguir!
— Esse é o espírito, garota. Agora, vá pensando na cor do seu vestido. Eu
vou te levar onde compro os meus.
Depois da experiência naquela manhã, porém, era difícil para Megan
pensar em outra coisa senão naqueles olhos.
Nossos problemas
— Alô? — atendeu um tanto relutante.
— Adam, eu estou a ponto de surtar nessa empresa e preciso falar com
você! — disse, irritado.
— O que houve, Gabriel?
— Você acredita que nosso pai e o Michael tiveram a coragem de decidir
sobre o novo CEO sem mim?
Adam suspirou.
— Nada me surpreende vindo deles, você sabe.
— Adam, isso é um desrespeito! Eles decidiram sozinhos sobre a sua
demissão e agora decidiram sozinhos sobre isso!
— Quem eles escolheram?
— Eu saí no meio da reunião, mas acabei de descobrir que foi o Michael!
Você acredita? Nem sequer me perguntaram se queria o cargo!
— E você queria?
— Óbvio!
Ele meneou a cabeça negativamente.
Ele nem sabe o que um CEO faz.
— Gabriel, vamos direto ao ponto. Por que me ligou?
— Ora... Porque você precisa me ajudar!
— E como eu vou te ajudar? Eu não trabalho mais nessa empresa!
— Fale com o nosso avô, ele sempre te ouve!
— Gabriel, se quer conversar sobre seus problemas com nosso avô, vá
pessoalmente. Não sou eu quem tem que fazer isso.
— Mas Adam...
— Sem “mas”! Apenas vá!
Ele suspirou.
— Está bem, eu vou. Posso te ligar depois, então?
— Não vejo motivo, mas se vai deixá-lo melhor... ligue.
— Ok. Eu ligo, então. Até depois, Adam.
— Até! — disse, desligando.
E mais uma vez você está me trocando pelo Michael, pai.
Consequências
Então ele me fez recordar aquele maldito dia mais uma vez.
— Eu tinha seis anos. Naquele dia eu havia me machucado na escola,
então ligaram para minha mãe e ela pediu que nosso motorista me levasse para
fazer um curativo e me fizesse companhia em casa enquanto ela não chegasse.
Quando chegamos, ele me disse para pegar meus brinquedos enquanto buscava
o celular no carro. Mas assim que adentrei o corredor dos quartos, ouvi um
barulho vindo do quarto dos meus pais. Pensei que minha mãe já estivesse em
casa e fui até lá, mas quando abri a porta vi meu pai beijando uma mulher. Eu
estava acostumado a ver meus pais se beijarem... Mas ela não era minha mãe.
Quando me viram, se assustaram. Então eles começaram a discutir e ela pegou
a bolsa e passou correndo por mim. Ele foi atrás dela, mas quando percebeu
que não voltaria, ele se virou e me encarou sério. Ele me perguntou que droga
eu estava fazendo ali. Eu estava tão assustado que só consegui apontar para
meu joelho machucado. Então ele suspirou, veio até mim, se ajoelhou e disse
que não devia contar à minha mãe o que vi porque era segredo e que, no dia
seguinte, iria me levar a um lugar especial. Eu concordei mas, quando minha
mãe chegou, foi difícil esconder. Eu sabia que o que vi era errado. Eu achava
que meu pai só deveria beijar minha mãe.
— E aí?
— No dia seguinte, ele foi me buscar na escola. Ele mentiu para minha
mãe dizendo que íamos tomar sorvete. Ele me levou a um parque onde
encontramos a tal mulher, acompanhada de um garotinho loiro. O Michael. Ele
me contou que aquele era meu irmão. Eu perguntei se minha mãe sabia e ele
disse que não e que nem ia saber porque era segredo também. Depois de
comprarmos sorvete, voltamos para a casa e mentimos para minha mãe.
— Deve ter sido difícil.
— Foi, e muito. Meses depois, ela nos contou que estava grávida.
— Do Gabriel?
— Isso. Três dias depois, aquela mulher reapareceu dizendo que queria
falar com minha mãe. As duas discutiram muito e, quando ela finalmente foi
embora, minha mãe me chamou e pediu para que contasse o que sabia. Eu vi
que ela estava triste e contei. Não queria mais mentir. Naquele dia, quando
meu pai chegou, ela me mandou para meu quarto e eles discutiram feio na sala.
Depois da discussão, ela veio até mim e me puxou pelo braço. Lembro-me dela
dizendo que ia me levar dali. Ele disse que não deixaria e eles discutiram até
que ela foi para o quarto deles e saiu de lá puxando uma mala. Antes de ir
embora, ela beijou minha testa e disse que vinha me buscar.
— E seu pai?
— Assim que ela saiu, ele gritou comigo e disse que eu não havia feito o
que prometi. Eu comecei a chorar de medo e ele pegou um cinto e...
Aquela lembrança era amarga. Precisei de um momento para continuar.
— E me bateu. Depois saiu dizendo que já voltava. Eu me sentei num canto
e chorei. Muito. Ele voltou com a mulher e oMichael, me tratando como se
nada tivesse acontecido. A partir daquele dia, eles ficaram lá em casa.
— E a tal mulher te tratava bem?
— Não. Ela sempre brigava comigo. Quando eu dizia ao meu pai, ela
respondia dizendo que era birra. Depois de três semanas, ele não aguentava
mais me ouvir reclamar e fui morar com meu avô. Quando contei o que havia
acontecido, ele imediatamente chamou minha mãe para morar conosco.
— E ela foi?
— Sim. Meu pai ficou irritado, mas ele não se importou. Quando Gabriel
nasceu, ele ligou para meu pai e disse que tinha que registrá-lo, pois não era
justo que minha mãe assumisse a criança sozinha. Ele aceitou e veio.
— E a outra?
— Um dia meu pai chegou do trabalho e ela não estava lá, só o garoto. Ela
deixou um bilhete dizendo que, se ele ia assumir o Gabriel, ia ficar com a mãe
dele. Ele ainda tentou procurá-la, mas não encontrou. Então, arrependido e
sozinho, ele voltou rastejando para a minha mãe. Ela aceitou voltar pra casa,
mas disse que nunca mais teria sua total confiança. Hoje ela dita as regras e
ele não diz nada. Eu e meu avô a apoiamos.
— Ela aceitou o Michael?
— Sim. Ela disse que ele não tinha culpa dos erros da mãe.
— Ela estava certa.
— Apesar de ter minha família de volta, eu nunca mais vi meu pai da
mesma maneira. Enquanto estiveram separados, minha mãe me explicou que o
que ele havia feito era muito errado e que eu nunca deveria fazer aquilo.
Quando ele voltou, eu o via como um vilão, alguém que havia feito mal à
mulher que eu mais amava. Minha mãe desde então me diz para esquecer o que
aconteceu.
— Mas você nunca o fez, não é?
Como sempre, meus olhos se encheram de lágrimas.
— Eu tinha nojo dele.
— E o Michael?
Não consegui esconder meu deboche e bufei.
— Nós nunca fomos amigos. Quer dizer... Eu até tentei. Mas ele disse que
não queria falar comigo porque eu e meu irmão fizemos sua mãe ir embora.
— O que não é verdade. Você sabe disso, não sabe?
— Sei. E anos depois, as coisas ficaram ainda piores.
— Por quê?... Ah! O casamento!
— Sim, Hendrick. O casamento.
A grande decisão
— Queria falar comigo, Dylan? — perguntou Adam, sentando-se no sofá.
— Peço desculpas por estar te recebendo de pijama e com esse rosto
cansado, mas também peço para que considere que meu atual estado de saúde
me impediu de estar melhor apresentável.
— Não se incomode, está em sua casa.
— Meu pai sempre me disse que não devia fazer nenhum negócio se não
tivesse certeza de que estava em perfeita saúde antes, mas quando sou atingido
por uma sinusite ao mesmo tempo em que Adam McKennan é demitido, sinto-
me impedido de aplicar essa regra.
Adam sorriu. Dylan seguiu encarando-o por mais alguns segundos antes de
continuar:
— Você sabe o que vou te perguntar, não sabe?
— Posso imaginar.
— Preciso de você, mais do que em qualquer outro momento. Eu respeitei
sua decisão de seguir trabalhando com seu avô, mas agora você está livre e eu
quero que venha para a Satt!
Adam suspirou. Era difícil tomar uma decisão tão grande como aquela
tendo sido demitido no dia anterior.
— Eu te liguei assim que li o jornal esta manhã, Adam. Eu sei que pode
parecer cedo demais para pensar em outra coisa, mas eu precisava fazer essa
proposta e garantir que não perderia uma chance como essa. Não vou exigir
uma resposta imediata, eu só queria que soubesse das minhas intenções.
— Eu entendo, Dylan — disse meneando a cabeça positivamente. — E eu
agradeço que tenha me dado tempo para pensar. Tenho tantas coisas passando
por minha cabeça nesse momento...
— Imagino. Mas não deixe isso te chatear. Tenho certeza que os outros
homens, assim como eu, confiam em você e não vão se deixar enganar com esse
tipo de coisa. Vão precisar de muito mais se quiserem te derrubar! Se você não
fosse bom, aqueles homens não teriam deixado a reunião hoje de manhã por
você.
— Ficou sabendo disso?
— Adam, eu sempre sei das coisas.
Adam riu.
— Vamos ao que interessa? Tenho uma proposta difícil de recusar!

———

Sozinho em seu escritório particular, Adam bebia uísque enquanto lia


algumas revistas trazidas da empresa no dia de sua demissão. Algumas das
várias que continham matérias sobre ele.
“Adam McKennan: O homem do dinheiro”. “Conheça o homem para
quem deve confiar suas ações”. Foi isso que Dylan e aqueles homens
enxergaram em mim. Eu provei do que sou capaz.
A decisão de aceitar um novo emprego tão rapidamente, por si só já era
difícil. O desentendimento entre as famílias McKennan e Satt vinha para
complicar ainda mais a situação.
Tudo começou trinta anos antes, por conta de uma briga entre Charles e
Ethan, avôs de Adam e Dylan respectivamente. O motivo não era claro e a briga
se perdurou na geração seguinte entre Stephen e Anthony. O mesmo, porém,
não ocorreu com Adam e Dylan que, tendo se tornado amigos ainda crianças,
começavam a colocar um ponto final na discussão... Pelo menos no que dizia
respeito a Adam.
De um lado, Adam avaliava que aceitar o emprego na Satt seria uma ótima
oportunidade. Por outro lado, tinha grande respeito por seu avô e não queria que
ele interpretasse a decisão como uma traição. Para tirar sua dúvida, resolveu,
ainda que tarde da noite, ligar e tirar a dúvida.
— Alô? — atendeu a voz, levemente rouca.
— Vovô? Sou eu, Adam. Eu o acordei?
— Não, filho. Eu estava lendo. Precisa de algo?
— Eu preciso tomar uma decisão e quero saber sua opinião.
— Pois diga.
Adam suspirou.
— Dylan Satt me ofereceu um emprego.
— Você pretende aceitar?
— O que acha que devo fazer?
— O que você achar que deve! Escute... — ele fez uma pausa. — Eu sei
que lhe contei sobre meu desentendimento com a família dele e que talvez isso
esteja minando sua decisão. Mas não estamos falando de mim, estamos falando
de você. E essa briga não é sua.
— Eu temi que encarasse isso como uma afronta.
— Jamais! Você se dá bem com Dylan e, se está confortável para ir
trabalhar com ele, vá em frente. Eu nunca quis que seu pai comprasse essa briga
estúpida e dou graças a Deus que você e Dylan estejam mudando tudo isso.
— Então tudo bem?
— Claro! — disse, animado. — Vá até lá e coloque um McKennan na
diretoria da Satt! Faça como os astronautas e coloque nossa bandeira na lua!
Adam riu.
— Eu quero que você seja feliz — completou. — Se você estiver, eu
também estarei.
— Está bem. Obrigado, vovô.
— Disponha, filho. E ah, eu soube da demissão. Só não liguei antes porque
quis lhe dar um tempo sozinho. Eu sabia que nunca havia sido demitido e que
isso podia ser duro.
— Sem problema. Você acertou, eu queria mesmo ficar sozinho.
— Não se sinta culpado por isso. Sua mãe conversou comigo. O que
aconteceu foi ridículo. Ela me pediu para tentar devolver seu emprego, mas eu
resolvi conversar com você antes porque sequer sabia se o queria de volta...
— Eu não quero — interrompeu.
— Eu suspeitei que não quisesse.
— Não me entenda mal, é só que eu fui demitido como outro funcionário
qualquer, como se tudo que fiz não significasse nada!
— Eu serei eternamente grato ao que fez pela empresa nos últimos anos,
Adam. Se não querem reconhecer, o problema é deles. De minha parte, saiba
que tem meus parabéns. Estou orgulhoso! Eu acho que você não vai precisar,
mas se quiser, posso fazer uma carta de recomendação para você.
Adam sorriu.
Meu avô se orgulhou do meu trabalho. Meu objetivo foi cumprido.
— Obrigado, vovô.
— Disponha, filho. Agora, se já está mais tranquilo, eu vou voltar a ler,
está bem?
— Sim — respondeu, rindo. — Vou deixar você ler.
Charles riu.
— Obrigado, filho. Boa noite e fique bem.
— Eu vou, boa noite.
Agora que sabia a opinião de Charles, as coisas pareciam mais claras.
Diante de todo aquele apoio, Adam não podia negar: Ele tinha o respeito
daqueles homens. Decidido, ele se levantou e, num só gole, bebeu o restante do
uísque. Ele ia aceitar o emprego.
— É o homem do dinheiro que eles querem? Pois vão ter.
Naquela madrugada, mais uma vez teria muito trabalho pela frente. Desta
vez, lendo o contrato da Satt Corporation.
Nada pessoal
Na casa da piscina da mansão dos McKennan, Gabriel aproveitava uma
massagem relaxante. Depois de uma semana que considerava uma das mais
estressantes de sua vida, ele havia contratado uma jovem japonesa baixinha para
tirar a tensão de suas costas. Sua tranquilidade foi interrompida, porém, quando
Michael adentrou a sala, furioso.
— Eu não acredito que você estava aqui esse tempo todo, Gabriel! —
gritou. — Eu perguntei à empregada e ela mentiu que você saiu!
— Tecnicamente, eu saí de dentro de casa... E vim para a casa da piscina.
— respondeu, calmamente.
Michael bufou.
— Que seja! Não vim aqui para discutir isso. Preciso quem me entregue o
relatório dos nossos gastos com Marketing que Adam te pediu.
— Não tenho o relatório.
— O quê? — gritou, incrédulo. — Gabriel, quando pretendia fazer esse
relatório? Você sabia que isso é para ser entregue na segunda-feira?
— Claro! — disse apoiando os cotovelos na maca e encarando-o. — E você
sabia que hoje é sábado? E além do mais, eu já terminei, só não imprimi ainda!
— Então me mande o relatório por e-mail!
— Eu mandaria, mas como CEO, você deveria saber que no meu contrato
consta que eu trabalho de segunda à sexta então, a não ser que esteja disposto a
me pagar hora extra, o prazo de entrega que consta no e-mail do CEO que me
pediu esse relatório é segunda-feira e esse é o dia em que eu vou entrega-lo.
— Então é isso? Esse é seu plano?
— Sim. E depois daqui, eu vou me arrumar e encontrar uma das prostitutas
do Kenny que eu contratei.
Michael meneou a cabeça positivamente, sério, tentando esconder sua
raiva. Gabriel sorriu.
Não quer ajudar? Ok. Segunda-feira conversaremos, pensou Michael.
— Quer saber? Tem razão. Faça o que quiser, Gabriel. É seu dia de folga!
— Pois é! Obrigado.
— Tudo bem — disse saindo da sala, forçando um sorriso.
— Ah, Michael! Espere! — disse fazendo sinal para que ele parasse.
— O que é?
— Para o bem da nossa família, eu quero que você saiba que assim como a
demissão do Adam, isso é um assunto estritamente profissional, tá?
Michael percebeu a ironia, mas não quis discutir. Apenas saiu da sala
forçando um sorriso. Assim que ele fechou a porta, Gabriel começou a rir.
Você me ensinou tão bem, Adam!
Novidade
Sentado em sua cadeira preferida na sacada de seu quarto, Anthony Satt
saboreava seu café. Ao ver Dylan se aproximar, deixou a xícara na mesa ao lado
e se voltou para ele.
— Boa tarde, pai! — disse sentando-se.
— Boa tarde, Dylan! O que faz aqui?
— Vim compartilhar minha mais recente aquisição.
— E o que é?
— Temos um novo CEO.
— Novo CEO? Por quê? Não era você, até então?
— Sim, mas isso anda me desgastando.
— Sabe que não pode confiar um cargo tão importante a qualquer pessoa,
não sabe?
— Sei, mas não se preocupe. Fiz uma boa escolha.
— Quem?
— Adam McKennan.
Anthony fez uma expressão confusa.
— Um McKennan? Na diretoria da Satt? Você está em seu juízo perfeito?
— Pai, eu sei o que estou fazendo.
— Eu acredito, mas é estranho.
— Não se preocupe. Eu o conheço há anos. Sei que fará um bom trabalho.
Os números da McKennan foram ótimos nos anos em que ele esteve na
diretoria.
— Bom, eu disse outras vezes e repito: se acha que sabe o que está
fazendo, vá em frente. Tem meu apoio.
— Obrigado, pai. Agora, se me dá licença, é sábado à tarde e eu prometi à
Amber que faria compras com ela.
— Ela está bem?
— Está sim.
— Ok. Até logo então, Dylan. Cuide-se.
— Pode deixar, pai. Até.
Satisfeito com a aprovação do pai, Dylan se levantou e se encaminhou para
a porta. Quando saía da sacada, porém, Anthony chamou:
— Ei! Dylan!
— Sim? — perguntou, virando-se.
— Estou orgulhoso de você.
Dylan sorriu.
— Obrigado.
Um bom motivo
De um sofá no canto da boate, Kenny tinha visão de quase todo o salão. Ele
raramente se levantava dali, preferindo chamar Tyler ou Dean para resolver a
maior parte dos problemas. Haviam poucas exceções para isso como clientes
muito exaltados ou garotas que não estivessem trabalhando. Por isso, ao ver
Karen sentada num canto da boate apenas observando, soube que era um
problema que ele mesmo deveria resolver.
Com um copo de vodca em mão, ele se aproximou e sentou-se à mesa com
ela, empurrando o copo em sua direção. Assustada, ela se encolheu um pouco.
— Até quando você pretende ficar sentada aí?
— Desculpe, eu... — gaguejou.
— Eu não quero desculpas — interrompeu. — Eu quero que você trabalhe.
— Está bem.
— Beba — disse apontando para o copo. — É vodca. Vai tornar a coisa
mais fácil.
— Não, tudo bem.
— Eu não estou perguntando se você quer, eu estou mandando beber.
Lembra-se do que eu disse sobre ser tolerante? Isso não é mais um teste, beba!
Ela engoliu em seco.
Ele não vai aceitar um não como resposta, eu preciso beber.
Tremendo, ela pegou o copo e o aproximou da boca devagar, tentando
mentir para si mesma que aquilo teria gosto bom.
Tudo bem, vamos lá... Droga, eu odeio até o cheiro disso!
Querendo que aquilo acabasse logo, ela virou o copo de uma vez e o
devolveu a ele. Sentiu como se o líquido descesse queimando sua garganta.
Teve de cobrir a boca para não vomitar.
— Pronto?
— Sim.
— Agora vá circular porque, se serve de motivação, você já está me
devendo dinheiro.
Ela fez uma expressão confusa. Ele riu.
— O quê? Achou que eu ia te dar essa vodca sem cobrar? Não mesmo!
Ele me enganou!, pensou Karen.
— Vamos! Levante e coloque um belo sorriso no rosto! — disse se
levantando.
Irritada, ela se levantou e forçou um sorriso. Ele riu, satisfeito.
— Você tem uma noite longa pela frente, menina. A casa está cheia.
Acredite ou não, mais tarde você vai me agradecer por essa dose.
A oportunidade
Ao ver o amigo adentrar a sala, Adam não conseguiu deixar de sorrir. Uma
visita agradável no primeiro dia de trabalho. Assim que Amy fechou a porta,
Kenny olhou a sua volta e começou a rir.
— Como você veio parar aqui, McKennan?
— Me contrataram! — respondeu apontando para a cadeira
— Que incrível! Quer dizer... Na concorrência!
— Não é para provocar ninguém, mas eu não ligo para o que eles pensam.
Eu já conversei com meu avô e ele aprovou, então... Nada mais me importa.
Aqui eu tenho sossego.
— É... Eu via o quanto tudo aquilo te estressava. Fazia tempo que não te
via sorrir. Agora, olha só você! Todo feliz!
—Eles me receberam muito bem aqui.
— E isso também me deixa muito feliz. Sério. Você merece.
— Obrigado.
— Então, homem do dinheiro? Alguma coisa boa pra mim aqui?
— Quer investir aqui?
— Não sei, me diga se devo!
— Acabei de chegar, então não sei qual é a situação deles. Espere algumas
semanas e eu te digo.
— Tudo bem... Ah, mais uma coisa antes que eu esqueça!
— O que foi?
— Você se lembra da Megan, aquela menina que chegou a uns dias atrás?
— A que foi para o meu apartamento? Lembro.
— Isso mesmo. Eu estou usando a minha influência e ajudando ela a
conseguir um emprego como secretária.
— Desde quando você virou alguém que ajuda as pessoas?
— Desde que eu resolvi deixar de ser acionista por sua causa e tive tempo
livre para me entediar.
— Se você só estivesse entediado, estaria fazendo outra coisa.
— Não que eu discorde de você...
Eles riram.
— Mas olha, ela é boa. É sério — continuou.
— Boa no seu sentido ou no meu?
— Ela sabe fazer planilhas, contas e organizar coisas. Muito bem.
— Estou começando a entender.
— Ela é inteligente e... Sei lá, eu a vi trabalhar... Lá não é lugar pra ela,
Adam! Eu vejo meninas ali que, se não fizessem o que fazem passariam fome,
porque não sabem fazer nada direito! Mas a Megan? Não!
— E onde acha que é, então?
— Com alguém que a ensine, que aproveite o talento dela. Ela disse que
saiu da cidade onde morava por uma oportunidade, algo mais. Ali, eu não quero
e nem preciso ensinar nada, é óbvio. A Megan não precisa do óbvio. Por isso
estou pedindo sua ajuda.
Adam fitou o vazio e começou a pensar sobre o que Kenny havia dito. Ele
sempre analisava tudo muito bem antes de tomar uma decisão. Indecifrável, não
dava pistas do que faria a seguir, o que deixava Kenny e qualquer outra pessoa
apreensiva quanto a pedir qualquer coisa a ele.
Ele é CEO. O trabalho dele é tomar decisões. É inútil tentar descobrir o
que passa na cabeça dele nesses momentos, pensava Kenny.
— Com esse emprego novo, meu trabalho vai dobrar — declarou,
finalmente. — Isso significa que meu tempo também estará reduzido.
— Eu entendo, tudo bem — respondeu, percebendo para onde a fala de
Adam poderia se encaminhar.
— O trabalho da Amy também vai dobrar. E ela já trabalha bastante.
E ela vai precisar de ajuda! Ótimo!, pensou Kenny.
— Com isso, porém, não estou dizendo que vou emprega-la.
De volta ao pessimismo!
— Mas que quero o currículo dela para analisar — completou.
Kenny sorriu e entregou o envelope a Adam.
— Muito obrigado. Mesmo — disse estendendo a mão.
— Não agradeça ainda! Eu nem a entrevistei! — respondeu
cumprimentando-o.
— Eu garanto, Adam: Você não vai se arrepender.
Como uma dama
— É disso que eu estava falando! — exclamou Madison quando viu Megan
sair do provador.
— Ficou bom?
— Ficou ótimo! Você está linda!
Megan usava um lindo vestido de seda vermelho sem mangas, com decote
canoa e comprimento na altura de seus joelhos.

Como toque pessoal de Madison, trazia uma bolsa tiracolo preta. Simples,
mas elegante.
— A melhor parte é a bolsa — completou. — Mas com uma Yves Saint
Laurent não tem como errar.
— Por que tudo que você compra tem nome difícil?
— Ah, não é tão difícil! É Valentino, Manolo Blahnik, Salvatore
Ferragamo, Jimmy Choo... Você se acostuma com o tempo.
— Você também pode ir a qualquer loja e comprar uma bolsa preta sem
essa frescura de inicial aí na frente. E que não custa nem um terço do preço —
respondeu Kenny, descendo as escadas.
Madison revirou os olhos. Megan riu.
— Vamos, então? — perguntou Kenny.
— Sim.
Madison se levantou e caminhou até Megan. Ela ajeitou a bolsa em seu
ombro e exclamou:
— Cuide bem dela, ok?
— Pode deixar, Megan vai se sair bem — respondeu Kenny.
— Falei da bolsa!
Eles riram. Madison se aproximou de Kenny e ele a puxou para si pela
cintura. Ela nunca deixava que o marido saísse sem antes beijá-lo.
— Não demore, ok?
— Por quê?
— Surpresa — sussurrou.
— Ok.
Madison assistiu orgulhosa Kenny e Megan saírem. Esteticamente, podia
dizer que Megan estava perfeita para aquela noite. Restava apenas que aplicasse
corretamente as dicas de etiqueta dadas mais cedo.
Se ela fizer tudo direito, vão amá-la.
E algo lhe dizia que a moça não iria decepcioná-la.
O coquetel
— Não o vi ainda — comentou Stephen.
— Não sei se ele teria coragem de aparecer — respondeu Michael.
— Acha mesmo?
— O que ele faria aqui? Pai, agora ele é um homem desempregado!
— Com mais prestígio do que outros empregados — respondeu Gabriel,
aproximando-se com duas taças de champanhe e entregando uma à Stephen.
— É a sua terceira taça, não é? — perguntou Michael.
— Além de tomarem decisões por mim, vão controlar o que eu bebo?
— Gabriel, eu não vou discutir isso com você agora.
— Você não vai discutir porque sabe que está errado!
— Fizemos o que era melhor para a empresa!
— Ah, que conveniente pra você!
— Pare de agir como uma criança!
— Vocês misturam problemas pessoais com profissionais e eu sou a
criança?
— Já chega! — interrompeu Stephen. — Vocês me dão dor de cabeça!
— Sabe o que me dá dor de cabeça? Injustiça.
— Desculpem... Canapés? — interrompeu o garçom.
— Eu quero! — respondeu Gabriel, virando-se na direção dele.
— Não, obrigado — respondeu Michael.
— Escutem, nós temos problemas maiores para nos preocupar hoje —
relembrou Stephen.
— Tem mesmo — respondeu Gabriel, voltando-se para eles. — Olha só
quem chegou!
Quando Michael e Stephen olharam para a porta do salão, a surpresa tomou
conta de ambos.
Eu não acredito, pensou Michael.
— Ah, eu vou até lá! — disse Gabriel afastando-se, animado.

————

Do outro lado do salão, Kenny e Megan conversavam.


— O que está achando?
— Ah, é legal, até.
— Viu só? Não é tão ruim quanto parecia, é?
— Não mesmo. Só não entendo por que temos de ficar bebendo isso! —
disse apontando para a taça de champanhe.
— Porque é caro, como tudo aqui.
— Nem é tão bom! E você não devia beber, está dirigindo!
— Você acha que eu não consigo dirigir de volta pra casa tendo tomado
uma única taça de champanhe?
— Eu não pretendia fazer essa experiência!
— Ele chegou! — comentou um rapaz próximo aos dois.
— O quê? — perguntou Kenny.
— Ali! — disse apontando para a porta do salão.
Quando Kenny se virou e viu de quem se tratava, não conseguiu deixar de
sorrir.
— Não acredito! — exclamou.
— O que foi? — salão e sorriu.
— Veja você mesma! — disse virando-a.
De terno preto e camisa social azul marinho sem gravata, lá estava ele, com
um sorriso no rosto.
— Adam! — sussurrou surpresa.
— É isso aí! — comemorou.

———
Conversando com o rei
— Papai! – chamou Alice, sentando-se à mesa com seu pai. – Precisamos
conversar agora!
James não respondeu.
— Papai, está me ouvindo? – insistiu.
Ele levantou o olhar para ela rapidamente e voltou a comer.
— Papai, eu quero ir àquele coquetel amanhã com você. Eu sei que o Adam
vai e eu vou também.
Ele novamente levantou o olhar para ela e voltou a comer.
— Eu sei que você pensa que isso é idiotice, mas eu sei que eu consigo e
não vou desistir!
Ele deixou os talheres na mesa, pegou uma xícara e tomou um gole do café.
— Não vai dizer nada?
Ele meneou a cabeça negativamente. Sua expressão permanecia séria.
— Você pode ficar aí sentado tomando café e duvidando de mim se quiser,
mas eu já coloquei outros homens como ele aos meus pés e não vai ser diferente
desta vez – disse se levantando.
Ela deu a volta na mesa e puxou o queixo dele, obrigando-o a olhar para
ela.
— Quando eu colocar McKennan no meu nome eu vou esfregar isso na sua
cara, ouviu bem?
Ele fez sinal para que ela se aproximasse mais.
— O que foi? – disse curvando-se.
Num só golpe, ele agarrou os cabelos dela e colou seu rosto contra a mesa,
fazendo-a gritar.
— Você não vai fazer nada, sua imbecil. – sussurrou calmamente. — Você
é só uma cadela oportunista e ele sabe muito bem disso! Ele não vai cair nesses
seus truques baratos.
— Pai me solta, você está me machucando! – gritou.
— Se você vier à minha casa e falar como acabou de falar comigo de novo
eu sumo com você do mapa. Você me entendeu?
— Me solta!
— Entendeu? – gritou.
— Entendi!
Ele a empurrou e pegou os talheres. Ela se levantou e ajeitou o vestido.
— Eu vou embora pra casa. Você está louco!
— Adeus.
— E ah, eu vou àquele coquetel sim.
— Se você me envergonhar, eu te trago para casa pelos cabelos.
— Não vou te envergonhar. Aliás, você não estaria me xingando se
soubesse quem foi o último homem com quem saí.
— Quem?
— Kenneth Wright. Aquele ricaço que é acionista na McKennan.
Ele a encarou surpreso.
— Ah, então agora está surpreso? Pois é. Não sou uma imbecil, viu?
— Tem razão, não é. Você não é imbecil. É bem pior.
— O quê?
Ele começou a rir.
— Parabéns! Você conheceu o meu cafetão!
— Seu o quê? – disse horrorizada.
— Eu sempre saio com as prostitutas dele. Ele te enganou?
— Ah, que nojo! – berrou, esfregando as mãos em seus braços como se
aquilo de alguma forma a limpasse.
James gargalhava ao ponto de tossir. Ela corria desesperada de um lado a
outro pegando seus pertences para ir embora.
O plano de Kenny e dos empresários havia dado certo. Alice finalmente
havia experimentado do próprio veneno.
A entrevista
Quando a jovem jornalista adentrou na sala, o homem loiro ainda anotava
algo num pequeno pedaço de papel. Assim que se sentou, a secretária que a
havia trazido até ali deu a volta na mesa e curvou-se em direção ao ouvido dele,
sussurrando algo que ela não entendeu.
— Certo — disse erguendo o olhar rapidamente para Tate e voltando a
dirigir-se à secretária. — Muito bem. Saia.
Ele aguardou que ela fechasse a porta e voltou-se para Tate. Houve um
breve silêncio constrangedor até que, percebendo que ela aguardava que ele
dissesse algo, resolveu falar.
— E então? É você quem gostaria de me entrevistar?
— Sim. Obrigado por me receber, senhor Satt — disse estendendo a mão.
— É. Eu tinha um espaço livre na agenda — disse, ignorando o gesto de
Tate, que recolheu a mão envergonhada.
— Isso é ótimo. Eu agradeço.
— Que seja — disse dando com os ombros e recostando-se na cadeira. —
Eu não tenho o dia todo, então… Quer começar?
— Sim, sim. Claro! — disse puxando o gravador da bolsa. — Assim não
perdemos mais tempo.
— Mais tempo?
— Bom, eu espero que o senhor não se ofenda, mas… imagino que tenha
tido um imprevisto, por isso se atrasou um pouco.
— Eu não tive imprevisto algum, nem me atrasei.
— É que disseram que a entrevista seria às dez. São dez e meia.
— Escute… — disse desencostando-se da cadeira e apoiando os cotovelos
na mesa com uma expressão séria. — Eu não sei para qual jornal a senhorita
trabalha e, em verdade, nem me importa. Mas como presidente e dono dessa
empresa, a qual eu chego na hora em que me for conveniente, não vou tolerar
que venha me questionar sobre os meus atrasos. Agora, se puder fazer a
entrevista antes que eu peça a um segurança para mostrar-lhe à saída, seria de
bom proveito.
— Tudo bem, senhor. Perdoe-me. — disse, apavorada.
Sabia que era um homem difícil, mas não achei que era tanto.
Dylan Satt perdia a paciência facilmente. Quando precisava, sabia colocar
medo nas pessoas. Agora, sorria por dentro, contente por rebater a repórter à
altura.
Não me sento nessa cadeira por ser gentil.
A esposa
Já era tarde da noite quando Dylan deitou-se para dormir. Cansado, ajeitou-
se atrás da esposa e segurou sua cintura, puxando-a para si. Amber acordou
sentindo o toque do marido e se recostou para trás, colocando sua mão sobre a
dele e puxando-a para sua barriga.
— Finalmente! — sussurrou ainda sonolenta, sem abrir os olhos.
— Desculpe pelo atraso. Não consegui sair antes.
— Pensei que essa festa não fosse acabar nunca.
— Eu também, querida.
— Você estava curtindo a festa sem mim. — brincou, sabendo que Dylan
odiava coquetéis com a concorrência.
— Precisei curtir. Mas eu preferia ter ficado aqui com você, acredite.
— Eu sei — disse virando-se de frente para ele. — Aqui você não
precisaria fingir que está curtindo algo.
— Depende. Ia chamar sua família para jantar?
— Se isso acontecesse, nem eu ficaria feliz.
Dylan riu.
— Eu realmente teria curtido estar aqui, sabia?
— Agora você está… — disse empurrando-o e colocando-se sobre ele. —
E eu também.
— Que atrevimento!
— Senhor, devo informá-lo que seu cargo não lhe dá privilégio algum aqui.
— E eu devo informá-la de que deve ter atenção quanto ao barulho para
que os vizinhos não reclamem.
Amber tirou o robe e revelou a lingerie branca de renda.
— Sua preocupação com os vizinhos persiste, senhor Satt?
— De forma alguma.
— Imaginei.
O casamento
Então começamos a falar sobre o dia do tal casamento.
— O que houve no dia do casamento? Você já me contou algo sobre isso
antes, mas não me recordo muito bem.
— Na verdade, nem eu sei direito. Inicialmente eu nem queria ir, mas
aceitei depois que soube que Kenny também iria. Como não nos falávamos
muito, nem conhecia a noiva dele. Eu só sabia que ela se chamava Evelyn.
— Certo.
— Kenny e eu fomos juntos e sentamos no terceiro banco. Nós nos
sentaríamos mais atrás, mas minha mãe queria nos obrigar a sentar no
primeiro e, com muito custo, conseguimos convencê-la a nos deixar ficar ali.
— Por que não queria ficar na frente?
— Não fazia questão de demonstrar que estava lá. Duvidava que Michael
realmente quisesse que eu fosse. Achava que apenas havia sido educado.
— E quando o problema começou?
— Depois que o padre perguntou se eles aceitavam se casar. Michael disse
que sim e, na vez dela, ela ficou em silêncio. Ficamos esperando até que ela se
virou e disse que não. Michael perguntou o porquê, ela se virou para nós e
disse, olhando para mim: “Porque eu amo o Adam”.
Ele ergueu as sobrancelhas, surpreso.
— Tudo o que aconteceu em seguida foi uma grande confusão. Michael me
encarou furioso, eu não entendia o que estava acontecendo, ela veio até mim
querendo me abraçar, eu neguei e disse que ela era louca, ela saiu correndo da
igreja e Michael desceu do altar para me bater. Kenny então entrou na minha
frente e outros dois convidados vieram rapidamente segurar Michael. Enquanto
ele gritava todos os palavrões possíveis e minha mãe se desesperava, Kenny e
eu demos o fora de lá.
— Há quanto tempo foi isso?
— Três anos.
— E desde então, a relação de vocês que já era ruim...
— Se tornou ainda pior — completou. — Pois é.
Mas eu seguirei em frente.
Os pesadelos não serão donos dos meus pensamentos.
Eu seguirei fiel ao que acredito e ao que sou.
Ainda que eles tentem sem sucesso minar meu caminho com sua soberba.
Pois hoje eu sou tudo aquilo que eles tentaram ser um dia.
Eu não sou espelho dos erros dele, não mais. Eu renasci, me reconstruí, saí
do estático, do padrão, da comparação. Em verdade não sou mais que parte do
seu biológico. Eu lutei para enfim me afastar dos seus ideais, das aparências
entre nós. Deixei de ser como ele e me tornei eu, para mim e contra ele. Tenho
nome. Tenho reconhecimento. Deixei de ser a sombra encolhida num canto e
fui para fora, para frente, passei à sua frente e posso ouví-lo reclamar. Deveria
decepcionar-se consigo e não comigo. Eu lhe incomodo crescendo? Ora, não foi
para isso que me fizeste?
Eu não incomodava na escuridão, certo?
Pena que criaste luz.
— Não é mais meu menininho. Agora é um homem. Um grande homem
como seu...
Adam a encarou enquanto ela avaliava o que diria a seguir. Serena sabia
que dependendo da resposta ele se ofenderia.
— Como seu avô, querido — completou.
— Eu sei o que você ia dizer, mãe. Ia dizer que me pareço com ele.
— Mas cheguei à conclusão de que não parece. Aprendeu o que sabe com
seu avô, logo...
— Não chegou à conclusão alguma em alguns segundos, mãe. E eu não me
pareço com meu pai não porque aprendi com meu avô, mas porque eu repudio
as atitudes de homens como ele e jamais me portaria como tal... E você sabe
disso.
Cara senhora Kessler,

Acredite quando digo que conheci os mais variados tipos de pessoas em


minha vida. Em minha vasta experiência empresarial, tive a companhia de
pessoas de índole duvidosa, funcionários que executavam seu trabalho sem
vontade alguma e homens e mulheres que, mais interessados no dinheiro, pouco
se importavam (e até hoje continuam sem se importar) em ser boas pessoas.
Algumas vezes porém, tenho o privilégio de me deparar com verdadeiros
talentos. Sua filha é um deles.
Sei que talvez a senhora já tenha conhecimento disso pois mães conhecem
seus filhos melhor do que qualquer outra pessoa. Porém, meu objetivo com essa
carta é muito além de parabenizá-la pela ótima profissional que sua filha foi
para comigo. Venho por meio desta carta pedir-lhe desculpas. Desconheço o
que sua filha possa ter dito sobre mim, mas gostaria de explicar algumas coisas
que talvez ela tenha comentado ou a senhora tenha percebido por si mesma.
Peço desculpas por cada lágrima que sua filha derramou por minha causa.
Não convém explicar à senhora todos os motivos delas, mas basta que saiba que
admito ter errado com ela algumas vezes.
Peço desculpas por não ter dado o devido valor às coisas que ela fez por
mim. Megan sempre zelou pelo meu bem, sempre se preocupou com minha
saúde tanto física tanto mental e admito que fui incapaz de fazer o mesmo por
ela.
Peço desculpas por não ter demonstrado reciprocidade aos sentimentos
dela. Eu sei o quanto nosso relacionamento significava para ela e o quanto ela
adoraria que eu tivesse sido mais gentil, mais romântico, mais carinhoso. Mais
uma vez esclareço que não convém citar os motivos que me levaram a isso, mas
minha criação possui grande parcela de culpa. Nunca soube o que significava o
amor, o que era realmente gostar de alguém. Talvez por isso eu não tenha
sabido explicar a ela o que realmente sentia.
Megan era apenas um botão de rosa quando a conheci. Serei eternamente
grato por ter acompanhado seu desabrochar até tornar-se uma das flores mais
belas e perfumadas do jardim. Do meu jardim. Ela foi minha rosa. Ela foi e
ainda é uma das mulheres mais lindas que já conheci por dentro e por fora.
Apesar de tudo que fiz, em verdade digo que jamais quis machucá-la.
Minhas atitudes não foram das melhores e por isso escrevo essa carta à senhora.
Escrevo para dizer que sinto muito por todo o mal que causei a ela. Jamais quis
isso. Jamais imaginei que as coisas pudessem chegar a esse ponto. Eu a vi
entregar seu coração a mim e não soube o que fazer. Quando percebi, muitas
coisas não possuíam mais conserto. Muitas coisas já haviam sido ditas. Malas já
haviam sido arrumadas.
Não pretendo de forma alguma com esta carta apelar para seu bom coração
como forma de convencer sua filha a me procurar. Escrevo esta carta pois senti-
me na obrigação de prestar contas sobre isso para a senhora, uma vez que me
recebeu com tanto zelo e carinho em sua casa na última vez em que nos vimos e
por toda sua generosidade e hospitalidade para comigo. Sou eternamente grato a
senhora também.
Eu finalizaria dizendo para que cuide bem de Megan mas em sua
companhia ela certamente ficará bem. Ao menos melhor do que ela estava
comigo ficará. Finalizo então desejando os mais sinceros votos de felicidade,
prosperidade e sorte à sua família, apesar de achar que já têm toda a sorte do
mundo por terem alguém como Megan junto a vocês.

Fique bem, Senhora Kessler.

Atenciosamente,

Adam Richard McKennan

Ps: Sobre a pergunta que me fez na cozinha em minha última visita à sua
casa, sim, eu amo sua filha.
Título de capítulo n

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