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Como a Psicologia

contribui para o estudo


da relação médico-
paciente?

1.1 INTRODUÇÃO
A Psicologia Médica é o ramo da Medicina que tem a Psicologia
como campo interdisciplinar específico. Pode ser definida como o
estudo das relações médico-paciente e das ações psicológicas na
prática médica em geral, que se constitui como uma ciência única
e independente da Psiquiatria e da Psicologia.
Grandes contribuições à Psicopatologia vieram da Psicologia
Médica, em especial das relacionadas a Ernst Kretschmer (1888-
1964) e Sigmund Freud (1856-1939), que recomendavam a
especialização em psicanálise das distintas especialidades
médicas, aperfeiçoando os profissionais na lida com os processos
transferenciais da relação médico-paciente. Os conceitos de
psicanálise a seguir foram retirados das obras de Sigmund Freud,
resumidas no livro Noções básicas de Psicanálise (1987), de
Charles Brenner.
1.2 CONTRIBUIÇÕES DE FREUD
A transferência e a contratransferência são uma forma de
projeção típica da relação terapêutica entre paciente e médico e
podem caracterizar-se de forma positiva, com sentimentos de
afeto e admiração, ou negativa, com sentimentos de
agressividade e resistência, dependendo dos laços inconscientes
e emocionais que emergem dessa relação.
Denominamos “transferência” as projeções relacionadas a
reações emocionais do paciente, dirigidas ao médico, com base
nos conflitos infantis dos pacientes com relação às figuras
paterna e materna. A “contratransferência” envolve sensações,
sentimentos e percepções que brotam no médico, emergentes do
relacionamento terapêutico com o paciente, também com base
em seus conflitos inconscientes. Espera-se que o médico esteja
preparado emocionalmente para saber lidar com tais conflitos.

#importante
Transferências são as projeções do
paciente dirigidas ao médico, enquanto
as contratransferências são projeções do
médico em relação ao paciente.

1.3 INCONSCIENTE
Freud iniciou seus estudos pela utilização da técnica da hipnose
como forma de acesso aos conteúdos mentais no tratamento da
histeria. Ao observar melhora, elaborou a hipótese de que a causa
da doença era psicológica, não orgânica. Essa hipótese serviu de
base para seus outros conceitos, como o do inconsciente. Assim,
abandonou o uso de hipnose em pacientes com histeria, em favor
da interpretação de sonhos e da livre associação como vias de
acesso ao inconsciente.
Freud procurou uma explicação à forma de operar do
inconsciente, propondo uma estrutura particular. No primeiro
tópico, recorreu à imagem do iceberg, em que o consciente
corresponde à parte visível, e o inconsciente corresponde à parte
não visível, ou seja, à parte submersa do iceberg. Em sua teoria,
Freud estava preocupado em estudar o que levava à formação
dos sintomas psicossomáticos.
1.4 ID, EGO E SUPEREGO
Quando sua preocupação se voltou para a forma como se dava o
processo da repressão, Freud passou a adotar os conceitos de id,
ego e superego.
O id representa os processos primitivos do pensamento e
constitui, segundo Freud, o reservatório das pulsões, e, dessa
forma, toda a energia envolvida na atividade humana seria
advinda do id. Inicialmente, considerou que todas essas pulsões
seriam de origem sexual. Posteriormente, introduziu o conceito
das pulsões de morte, que atuariam no sentido contrário ao das
pulsões de agregação e preservação da vida. O id é responsável
pelas demandas mais primitivas e perversas.
O superego, a parte que contra-age ao id, representa os
pensamentos morais e éticos internalizados.
O ego permanece entre ambos, alternando nossas necessidades
primitivas e crenças éticas e morais. É a instância na qual se inclui
a consciência. Um eu saudável é aquele que tem a habilidade para
adaptar-se à realidade e interagir com o mundo exterior de uma
maneira que seja cômoda para o id e o superego.
1.5 EROS E TÂNATOS
Freud estava especialmente interessado na dinâmica dessas três
partes da mente. Argumentou que essa relação é influenciada por
fatores ou energias inatas, que chamou de pulsões. Descreveu
duas pulsões antagônicas: eros, a pulsão sexual com tendência à
preservação da vida, e tânatos, a pulsão da morte, que levaria à
desagregação de tudo o que é vivo, à destruição. Ambas não
agem de forma isolada, estão sempre trabalhando em conjunto.
1.6 CONTRIBUIÇÃO DE KÜBLER-ROSS
A psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross, em sua obra Sobre a
morte e o morrer (1985), pesquisou e trabalhou com o tema do
luto, descrevendo cinco fases desse processo. Existem
pensamentos e comportamentos comuns às pessoas que
passam por cada uma dessas fases, e a descrição delas pode
facilitar a compreensão e a percepção sobre o que ocorre com as
pessoas que vivenciam o luto.
▶ Fase 1 — negação: É uma defesa psíquica, em que o indivíduo
acaba negando o problema, tentando encontrar algum jeito de
não entrar em contato com a realidade e geralmente não quer
falar sobre o assunto;
▶ Fase 2 — raiva: nessa fase, o indivíduo revolta-se com o mundo,
sente-se injustiçado e não se conforma que isso está
acontecendo com ele;
▶ Fase 3 — barganha: essa é a fase na qual o indivíduo começa a
negociar; por exemplo, prometendo que será uma pessoa melhor
se sair daquela situação;
▶ Fase 4 — depressão: a pessoa retira-se para seu mundo interno,
isolando-se e considerando-se impotente perante o que ocorre;
▶ Fase 5 — aceitação: o indivíduo não sente mais desespero e
consegue enxergar a realidade como realmente é, assimilando
por completo a perda ou a morte.

Como a Psicologia
contribui para o estudo
da relação médico-
paciente?
A Psicologia Médica contribui para melhor
compreensão dos mecanismos psicológicos que
norteiam tanto a relação médico-paciente quanto a do
paciente com uma patologia ou perda em sua vida.
Associação Médica do Paraná
O processo seletivo da AMP tem duas fases: a primeira é um
exame de múltipla escolha e a segunda é a defesa do currículo ou
uma prova prática. Para a primeira fase você terá que responder
100 questões, com cinco alternativas cada, nas áreas de Clínica
Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia e
Medicina Preventiva e Social.
Para a prova da primeira fase, espere encontrar questões mistas.
Para Cirurgia, por exemplo, as perguntas costumam ser mais
diretas e conceituais, enquanto para Clínica Médica são mais
comuns casos clínicos. Estude com mais atenção os temas:
atendimento inicial ao politraumatizado, Cirurgia Vascular,
queimaduras, Ortopedia, hemorragia digestiva, abdome agudo,
Oncologia Gastrintestinal, insuficiência cardíaca, meningite,
endocardite, cefaleia, dislipidemia e pneumonia.
Também não se esqueça de estudar sangramento na gravidez,
ciclo ovariano, alterações da gravidez, pré-natal, parto, doenças
malignas da mama, vulvovaginites e cervicites, síndromes
respiratórias na infância, meningites, traumas na infância e
adolescência, aleitamento e reanimação neonatal. Sistema Único
Saúde (SUS), atestado de óbito, saúde do trabalhador e
Epidemiologia são temas importantes para as questões de
Medicina Preventiva e Social, mas de todas as cinco áreas essa é
a que ganha menor destaque na prova.
AMP | 2020
Um médico residente do primeiro ano avalia um paciente com
história de ascite de grande volume e derrame pleural à direita
que, ao final da investigação, fecha o diagnóstico de cirrose com
hidrotórax hepático. Uma semana após este diagnóstico, outro
paciente interna no serviço por derrame pleural à direita e ascite
discreta, o mesmo residente ao lembrar o caso recente, em seu
raciocínio intuitivo, coloca o hidrotórax hepático como
diagnóstico provável, sendo que o diagnóstico final é de neoplasia
metastática. O atalho cognitivo que gerou a hipótese diagnóstica
errônea no segundo caso é o de:
a) heurística da ancoragem
b) heurística da simplicidade
c) heurística de disponibilidade
d) heurística de representatividade
e) nenhum atalho cognitivo foi utilizado
Gabarito: c
Comentários:
a) A heurística da ancoragem envolve ajuste insuficiente da
probabilidade inicial de doença — para cima ou para baixo — após
um exame positivo ou negativo, isto é, apegando-se ao
diagnóstico inicial. Por exemplo, após realizar um exame
altamente sensível que resultou negativo, o médico continua
acreditando na existência do diagnóstico que motivou o pedido
do exame.
b) Também conhecida como navalha de Ockham, é um tipo de
raciocínio que orienta para a hipótese mais simples possível a
acomodar todos os sinais e sintomas apresentados pelo paciente.
Contudo, não há nenhuma base biológica que determine a
correção desse raciocínio.
c) A heurística de disponibilidade é um fenômeno descrito pelos
psicólogos Amos Tversky e Daniel Kahneman, no qual ocorre viés
cognitivo em que as pessoas predizem a frequência de um evento
baseando-se no quão fácil conseguem se lembrar de um exemplo
semelhante. No caso do enunciado, as apresentações clínicas dos
dois pacientes foram parecidas, o que fez o residente pensar
imediatamente no mesmo diagnóstico para ambos, dando menor
peso a outras informações que são importantes para orientar o
raciocínio clínico, como aspecto epidemiológicos e antecedentes
pessoais e familiares.
d) Na heurística da representatividade um evento é considerado
ou percebido como tendo uma grande probabilidade de ocorrer
quando é representativo ou típico de um tipo de situação, isto é,
quando tem um elevado grau de semelhança com as principais
características desta situação. Por exemplo, diante da tríade
sudorese, cefaleia e palpitações, o médico prontamente
considera o diagnóstico de feocromocitoma, apesar de outras
condições serem mais comuns e poderem também cursar com os
mesmos sintomas.
e) Foi utilizada heurística de disponibilidade.
O que investigar em um
exame psíquico
completo?

2.1 PSICOPATOLOGIA
A Psicopatologia propõe-se a conhecer e descrever os
fenômenos psicopatológicos para, dessa forma, oferecer à
Psiquiatria as bases para a compreensão e o estudo do psiquismo
humano. Compete a ela reunir materiais para a elaboração do
conhecimento dos fenômenos com o qual a Psiquiatria possa
coordenar a sua ação diagnóstica, curativa e preventiva. Como
dito por Paulo Dalgalarrondo, em seu livro Psicopatologia e
semiologia dos transtornos mentais (2008): “A semiologia é a
base, o pilar fundamental da atividade médica. Saber observar
com cuidado, olhar e enxergar, ouvir e interpretar o que se diz,
saber pensar, desenvolver um raciocínio clínico crítico e acurado
são as capacidades essenciais do profissional de saúde”. O
diagnóstico em Psiquiatria é feito com base no exame psíquico,
excluindo outras patologias clínicas que possam cursar com
alterações no psiquismo.
2.2 FUNÇÕES PSÍQUICAS E SUAS
ALTERAÇÕES
2.2.1 Consciência
Consciência é a capacidade do indivíduo de entender o que está
acontecendo dentro e fora de si mesmo, estando desperto e
funcionante. As alterações da consciência podem ser
quantitativas e qualitativas.
Em seu aspecto quantitativo, a consciência vai do grau de maior
alerta, o estado vígil, passando pela sonolência, torpor
(obnubilado), estupor (semicomatoso) e coma.
O paciente sonolento usualmente fica dormindo e acordando;
com algum esforço, desperta e estabelece contato. O torporoso
acorda com dificuldade, não plenamente, despertando e
permanecendo confuso. No estupor, ele só acorda mediante
estímulos muito vigorosos, não sendo capaz de se manter alerta
espontaneamente. No estado comatoso, não acorda,
apresentando o maior grau de rebaixamento do nível de
consciência.
Qualitativamente, a consciência é avaliada como a aptidão em
apreender todos os fenômenos interiores ou exteriores e integrá-
los a um contexto real das circunstâncias ocorridas no presente,
no passado e que ocorrerão futuramente. As alterações
qualitativas são apresentadas a seguir.
2.2.1.1 Estado crepuscular

É um estreitamento transitório da consciência, com a


conservação de atividade mais ou menos coordenada e mais ou
menos automática. Normalmente, há a falsa aparência de que o
paciente está compreendendo a situação. Em geral, a percepção
do mundo exterior é imperfeita ou de todo inexistente. Os
estados crepusculares costumam desaparecer rapidamente, mas,
em alguns casos, podem durar muitos dias. Iniciam-se e terminam
de modo súbito, acompanhados de amnésia em relação às
vivências acessuais.
2.2.1.2 Dissociação da consciência

Ocorre fragmentação ou divisão do campo da consciência, com


perda da unidade psíquica do ser humano. Observa-se estado
semelhante ao sonho, podendo ocorrer em estados dissociativos
e de ansiedade intensa.
2.2.1.3 Transe

É o fenômeno em que a pessoa se sente transformada em outra,


como uma “despersonalização”. Desaparece a relação entre o
corpo e os objetos do meio exterior, como impossibilidade de
estabelecer a distinção entre o que é próprio e o que pertence ao
exterior. Pode ocorrer em contextos religiosos (não sendo
patológico), em casos neurológicos ou no início de psicoses.
2.2.1.4 Polarização da consciência ou estado hipnótico

É a orientação forçada da consciência em determinado sentido,


segundo forte tendência afetiva. É uma atitude mais focal e
profunda do que o estado crepuscular e nem sempre sugere
estado patológico. É possível que, tocado por intensa motivação
afetiva, o indivíduo concentre toda a sua consciência em um dado
ponto — música ou imagem —, desconsiderando os demais
estímulos à sua volta.
2.2.2 Atenção
A atenção é um processo psíquico que concentra a atividade
mental sobre determinado ponto, traduzindo um esforço mental,
e resulta de atividade deliberada e consciente do indivíduo. Existe
a atenção voluntária, que é ativa e intencional — capacidade de ler
um livro, por exemplo — e existe a atenção espontânea, que
ocorre por algum interesse incidental e momentâneo por algum
objeto — capacidade de parar de ler o livro para focar em algum
barulho que acontece no momento, por exemplo.
Investigação é dividida em:
▶ Atenção: normal ou euprosexia;
▶ Hiperprosexia: estado de atenção exacerbada;
▶ Hipoprosexia: diminuição global da atenção;
▶ Aprosexia: abolição total da capacidade de atenção;
▶ Hipertenacidade: atenção voltada demasiadamente a algum
estímulo específico, com diminuição da atenção espontânea;
▶ Hipotenacidade: atenção afastada com demasiada rapidez do
estímulo específico, com diminuição da atenção voluntária.
2.2.3 Orientação
Pode-se definir orientação como um complexo de funções
psíquicas pelo qual tomamos consciência da situação real em que
nos encontramos. A orientação pode ser inferida da avaliação do
estado de consciência e está intimamente ligada às noções de
tempo e espaço.
Em geral, o primeiro sentido de orientação perdido é o do tempo;
depois, o do espaço, que envolve deslocamento e localização e,
em um estado mais grave, a “desorientação do próprio eu” —
identidade e corpo.
Orientação é dividida da seguinte maneira:
▶ Autopsíquica: o paciente reconhece dados de identificação
pessoal e sabe quem é;
▶ Alopsíquica: o paciente reconhece os dados do ambiente:
▶ Temporal: dia, mês e ano em que está; em que parte do dia se
localiza (manhã, tarde e noite);
▶ Espacial: em que lugar se encontra e para que está lá; a cidade
onde está; como chegou ao consultório.
2.2.4 Sensopercepção
Sensação é o fenômeno elementar gerado por estímulos físicos,
químicos ou biológicos, que produzem estimulação dos órgãos
receptores. Percepção é a tomada de consciência de tal estímulo
sensorial. Podem acontecer alterações quantitativas e
qualitativas.
2.2.4.1 Quantitativas

▶ Hiperestesia:
▷▷ Intoxicação por alucinógenos, epilepsia;
▷▷ Aumento das formas de sensibilidade.
▶ Hipoestesia:
▷▷ Quadros depressivos;
▷▷ Diminuição das formas de sensibilidade.
▶ Anestesia: abolição de todas as formas de sensibilidade.

2.2.4.2 Qualitativas

▶ Ilusão: é a percepção deformada da realidade, de um objeto real


e presente, uma interpretação errônea do que existe. Pode
acontecer em rebaixamento do nível de consciência ou
esgotamento afetivo e fadiga grave;
▶ Alucinação: é a percepção real de um objeto inexistente, ou seja,
sem um estímulo externo. Dizemos que a percepção é real, tendo
em vista a convicção inabalável que a pessoa manifesta em
relação ao objeto alucinado; portanto, será real para ela. As
alucinações podem ser auditivas — entre elas, podem ocorrer
sonorização do pensamento, quando o paciente ouve os próprios
pensamentos, e publicação do pensamento, quando o paciente
sente que as pessoas escutam o que ele pensa —, auditivo-
verbais — mais comuns —, visuais, olfativas, gustativas,
cenestésicas — corpórea (“cabeça encolhendo”) —, cinestésicas
— movimento (“corpo voando”) — e sinestésicas — envolvem mais
de um sentido. Também existem as alucinações hipnagógicas,
que acontecem ao adormecer, e hipnopômpicas, que acontecem
ao despertar;
▶ Pseudoalucinação: não apresenta os aspectos vivos e
corpóreos da alucinação e é menos nítida. Ocorre em casos de
psicoses orgânicas, intoxicações ou estados afetivos intensos;
▶ Alucinose: é um quadro alucinatório sem perda da consciência
da realidade; o paciente percebe a alucinação como estranha à
sua pessoa. Acontece em casos de alcoolismo;
▶ Despersonalização: o paciente tem a sensação de que seu
corpo não lhe pertence;
▶ Desrealização: o ambiente ao redor parece estranho e irreal.

#importante
Ilusão é a percepção deformada da
realidade, uma interpretação errônea do
que existe; enquanto alucinação é a
percepção real de um objeto inexistente.

2.2.5 Memória
Memória é a capacidade de registrar, manter e evocar fatos
passados. Há quatro dimensões principais do seu funcionamento:
▶ Percepção: modo como o sujeito percebe os fatos e atitudes em
seu cotidiano e os reconhece psiquicamente;
▶ Fixação: capacidade de gravar imagens na memória;
▶ Conservação: tudo o que o sujeito guarda para o resto da vida —
a memória aparece como um todo e é um processo tipicamente
afetivo;
▶ Evocação: atualização dos dados fixados — nem tudo pode ser
evocado.
A função mnésica pode ser avaliada pela rapidez, precisão e
cronologia das informações oferecidas pelo próprio paciente,
assim como a observação da capacidade de fixação. A memória
pode ser imediata, de curto ou de longo prazo.
Podem existir as alterações quantitativas: hipermnésia, que é a
aceleração psíquica; hipomnésias ou amnésias. Essas últimas
podem ser anterógradas — o paciente não consegue fixar
memória a partir do evento que causou o dano cerebral — ou
retrógradas — perda da memória para fatos ocorridos antes do
trauma. Podem, também, ocorrer amnésias lacunares ou
seletivas.
O exame da memória passada (retrógrada) é feito com perguntas
sobre o passado do paciente e data de acontecimentos
importantes. Contradições nas informações podem indicar
dificuldades.
Com relação à memória recente (anterógrada), podem ser feitas
perguntas rápidas e objetivas, como “O que você fez hoje?”, ou
dizer um número de quatro ou cinco algarismos ou uma série de
objetos e pedir para que o paciente os repita após alguns minutos.
Para o exame da memória de retenção, pode-se pedir a ele que
repita algarismos na ordem direta e depois inversa.

#importante
A amnésia pode ser anterógrada — o
paciente não fixa a memória a partir do
evento que causou o dano —, retrógrada
— perda para fatos ocorridos antes do
trauma —, lacunar ou seletiva.

A maior parte das alterações da memória provém de síndromes


orgânicas, como amnésia, hipermnésia ou hipomnésia. As
alterações qualitativas, ou paramnésias, são lembranças
deformadas, que não correspondem à sensopercepção original.
Alterações da memória podem ocorrer como:
▶ Ilusões mnêmicas: acréscimos de elementos falsos a um núcleo
verdadeiro;
▶ Alucinações mnêmicas: criações imaginativas;
▶ Confabulações: fantasias que preenchem vazios de memória —
podem ocorrer na síndrome de Korsakoff.
2.2.6 Afetividade
A afetividade compreende o estado de ânimo ou de humor, os
sentimentos, as emoções e as paixões, e reflete sempre a
capacidade de experimentar sentimentos e emoções. É ela que
determina a atitude geral do indivíduo diante de qualquer
experiência vivencial, promove os impulsos motivadores e
inibidores, percebe os fatos de maneira agradável ou sofrível,
confere disposição indiferente ou entusiasmada e determina
sentimentos que oscilam entre dois polos: depressão e euforia.
A afetividade divide-se, basicamente, em:
▶ Humor: estado de ânimo; é a disposição afetiva de fundo, que
penetra em toda a experiência psíquica do indivíduo. Algumas
alterações de humor são:
▷▷ Hipertimia: euforia;
▷▷ Hipotimia: depressão;
▷▷ Disforia: irritabilidade, mau humor.
▶ Afeto: o tônus emocional que acompanha uma ideia ou
representação mental.
Alterações afetivas classificam-se em:
▶ Labilidade afetiva: estado especial em que se produz a mudança
rápida e imotivada do humor, sempre acompanhada de
extraordinária intensidade afetiva;
▶ Ambivalência afetiva: acentuações afetivas opostas e,
basicamente, simultâneas nos indivíduos;
▶ Embotamento afetivo: perda de todo tipo de vivência afetiva;
ausência dos nexos afetivos;
▶ Anedonia: incapacidade de sentir prazer com determinadas
atividades da vida antes prazerosas; muito comum nas
depressões;
▶ Hipomodulação: inadequação ou distanciamento afetivo.

2.2.7 Pensamento
Por meio do pensamento ou do raciocínio, o ser humano é capaz
de manifestar suas possibilidades de adaptar-se ao meio. É por
ele que conceitos são elaborados, os juízos são articulados,
construídos e comparados, os problemas são solucionados,
conhecimentos são adquiridos e ideias são desenvolvidas,
transformadas e criadas.
É importante a investigação do curso, da forma e do conteúdo do
pensamento.
2.2.7.1 Curso

Trata-se da velocidade com que o pensamento é expresso e pode


ir do acelerado ao lentificado.
2.2.7.2 Forma

As formas de pensamentos são descritas como:


▶ Fuga de ideias: pessoas afetadas mudam de assunto a todo
instante, sem concluí-los ou dar continuidade, em uma aceleração
do fluxo do pensamento; é a forma extrema do taquipsiquismo —
comum na mania;
▶ Interceptação ou bloqueio: há interrupção brusca do que vinha
falando, e o assunto pode ser retomado como se não o tivesse
interrompido — comum na esquizofrenia;
▶ Prolixidade: é um discurso detalhista, cheio de rodeios e
repetições, com certa circunstancialidade; há introdução de
temas e comentários não pertinentes ao que se está falando;
▶ Arborização: há perda da direcionalidade, sem conclusão do
raciocínio — comum nos episódios maníacos;
▶ Circunstancialidade: o paciente dá voltas em torno do tema sem
conseguir atingi-lo — comum em casos de transtorno obsessivo-
compulsivo;
▶ Descarrilamento: há mudança súbita do que se está falando;
▶ Perseveração: há repetição dos mesmos conteúdos de
pensamento — comum na demência.
2.2.7.3 Conteúdo

As perturbações no conteúdo do pensamento estão associadas a


determinadas alterações, como as obsessões, as fobias e,
especialmente, os delírios.
Para classificar uma ideia como delirante, deve-se considerar
alguns aspectos: a incorrigibilidade — não há como modificar a
ideia delirante por meio de correções; a influenciabilidade — a
vivência é muito intensa; chega a ser mais fácil o delirante
influenciar a pessoa dita normal; a incompreensibilidade — não
pode ser explicada logicamente. O delírio é uma convicção íntima
e irremovível, contra a qual não há argumento.

#importante
Uma ideia delirante deve ter aspectos
como incorrigibilidade,
influenciabilidade e
incompreensibilidade.

Os delírios podem ser primários, representando o núcleo da


doença, ou secundários, que são consequentes a situação social,
manifestação afetiva ou disfunção cerebral.
São perturbações no conteúdo do pensamento:
▶ Ideia delirante: também chamada de delírio verdadeiro, é
primária e ocorre com lucidez de consciência; não é consequência
de qualquer outro fenômeno. É o conjunto de juízos falsos, que
não se sabe como eclodiu;
▶ Ideia deliroide: é secundária à perturbação do humor ou
situação afetiva traumática, existencial grave ou uso de droga. Há
compreensão dos mecanismos que a originaram;
As ideias delirantes podem ser agrupadas em três temas típicos:
▶ Expansão do eu: grandeza, ciúme, reivindicação, genealogia,
misticismo, de missão salvadora, deificação, eroticismo, invenção
ou reforma, ideias fantásticas, excessiva saúde, capacidade física,
beleza;
▶ Retração do eu: prejuízo, autorreferência, perseguição,
influência, possessão, humildade, experiências apocalípticas;
▶ Negação do eu: hipocondria, negação e transformação
corpórea, autoacusação, culpa, ruína, niilismo, tendência ao
suicídio.
2.2.8 Linguagem
A linguagem é considerada um processo mental
predominantemente consciente, significativo, além de ser
orientado para o uso social. É um processo dinâmico que se inicia
na percepção e termina na palavra falada ou escrita e, por isso, se
modifica constantemente.
As alterações mais comuns são:
▶ Disartria: má articulação de palavras;
▶ Afasia: perturbação por danos cerebrais que implica dificuldade
ou incapacidade de compreender e utilizar os símbolos verbais;
▶ Verbigeração: repetição incessante de palavras ou frases;
▶ Parafasia: emprego inapropriado de palavras com sentidos
parecidos;
▶ Neologismo: criação de palavras novas;
▶ Jargonofasia: “salada de palavras”;
▶ Mussitação: voz murmurada em tom baixo;
▶ Logorreia: fluxo incessante e incoercível de palavras;
▶ Pararresposta: responde a uma indagação com algo sem
relação alguma com o que foi perguntado.
2.2.9 Vontade/volição
A vontade, relacionada aos atos voluntários, é uma disposição
(energia) interior com o princípio de alcançar um objetivo
consciente e determinado.
O indivíduo pode apresentar-se normobúlico (vontade normal), ter
a vontade rebaixada (hipobulia), uma exaltação patológica
(hiperbulia), responder a solicitações repetidas e excessivas
(obediência automática), concordar com tudo o que é dito, mesmo
que sejam juízos contraditórios (sugestionabilidade patológica),
realizar atos contra a sua vontade (compulsão), duvidar
exageradamente do que quer (dúvida patológica), opor-se de
forma passiva ou ativa às solicitações (negativismo), repetir de
forma automática as palavras ou ações do entrevistador (ecolalia
e ecopraxia).
2.2.10 Psicomotricidade
A psicomotricidade pode estar normal, diminuída (hipocinesia),
inibida (acinesia) ou exaltada (hipercinesia). O paciente pode
apresentar maneirismos (movimentos bizarros e repetitivos),
estereotipias posturais (repetições automáticas e uniformes),
automatismos, flexibilidade cérea (tendência a manter-se na
posição colocada pelo examinador), cataplexia (perda abrupta do
tônus muscular), tiques motores e alterações na marcha.
2.2.11 Consciência do eu
Este item refere-se ao fato de o indivíduo ter a consciência dos
próprios atos psíquicos, a percepção do seu eu, como o sujeito
apreende a sua personalidade.
São características formais do eu:
▶ Sentimento de unidade: “Eu sou uno no momento”;
▶ Sentimento de atividade: consciência da própria ação;
▶ Consciência da identidade: “Sempre sou o mesmo ao longo do
tempo”;
▶ Cisão sujeito-objeto: consciência do eu em oposição ao exterior
e aos outros.
2.2.12 Inteligência
O que se faz na avaliação da inteligência não é o que chamamos
de “avaliação fina”, realizada por meio de testes; o objetivo é
constatar se o paciente está dentro do considerado padrão de
normalidade, conseguindo resolver os problemas básicos da vida.
Devem-se considerar sempre o contexto sociocultural e a
escolaridade do paciente. As deficiências de inteligência são os
retardos mentais, em todos os seus níveis.
2.3 EXAME DO ESTADO MENTAL — EXAME
PSÍQUICO
O exame psíquico consiste na detalhada avaliação das funções
psíquicas, bem como das impressões e das observações feitas
pelo examinador enquanto está em contato com o paciente. Deve
ser sempre acompanhado de anamnese completa, com
identificação, queixa principal, história da doença atual, história
patológica pregressa, história pessoal e familiar. Todo paciente
psiquiátrico deve ser submetido, ainda, ao exame físico.

#importante
O exame psíquico deve ser completo e
deve espelhar exatamente o estado
mental do paciente no período
analisado.

Quanto ao psiquismo do paciente, deve-se seguir um roteiro


básico de observação da impressão geral do paciente, conforme
mostrado a seguir:
▶ Apresentação: tipo constitucional, condições de higiene pessoal
e do vestuário, cuidados pessoais;
▶ Atividade psicomotora e comportamento: mímica — atitudes e
movimentos expressivos da fisionomia (triste, alegre, ansioso,
temeroso, desconfiado, esquivo, dramático, medroso etc.);
gesticulação (ausência ou exagero); motilidade — toda a
capacidade motora (inquieto, imóvel, incapacidade de manter-se
em determinado local); deambulação — modo de caminhar (tenso,
elástico, largado, amaneirado, encurvado etc.);
▶ Atitude para com o entrevistador: cooperativo, submisso,
arrogante, desconfiado, apático, superior, irritado, indiferente,
hostil, bem-humorado etc.;
▶ Atividade verbal e linguagem: normalmente responsivo ao
entrevistador, não espontâneo (tipo pergunta e resposta), fala
muito ou pouco, exaltado ou taciturno;
▶ Estado de consciência;
▶ Atenção espontânea e voluntária;
▶ Orientação auto e alopsíquica;
▶ Afetividade: humor, tônus afetivo;
▶ Sensopercepção: ilusões, alucinações;
▶ Pensamento: alteração de forma, curso e conteúdo;
▶ Memória de curto e longo prazos;
▶ Vontade e pragmatismo;
▶ Inteligência: raciocínio e abstração;
▶ Crítica de seu estado, da doença;
▶ Planos para o futuro.

2.3.1 Exemplo de exame psíquico


Paciente trajado e asseado adequadamente; vígil, gesticulando
muito, inquieto, por vezes saindo da cadeira para andar pela sala;
coopera com o entrevistador, mas se mostra um tanto irritado
com as perguntas; linguagem um tanto exaltada, por vezes
prolixo; atenção espontânea e voluntária preservadas; orientado
auto e alopsiquicamente; humor exaltado, afeto expandido;
pensamento expansivo, mas sem alteração de curso;
pragmatismo preservado; inteligência sem rebaixamento; crítica
parcial do estado mórbido.
2.4 CLASSIFICAÇÕES EM PSIQUIATRIA
São usadas, exclusivamente, para uniformizar a linguagem médica
e como objeto de pesquisa.
2.4.1 DSM-5
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais é uma
publicação da American Psychiatric Association, Washington D.C.,
sendo a sua 5ª edição conhecida pela designação DSM-5.
Fornece critérios de diagnóstico para a generalidade das
perturbações mentais, incluindo componentes descritivos, de
diagnóstico e tratamento, constituindo um instrumento de
trabalho de referência para os profissionais da saúde mental.
No DSM-5, os diagnósticos psiquiátricos são formulados de
acordo com uma avaliação multiaxial, que estabelece cinco eixos:
▶ Diagnóstico do transtorno mental;
▶ Transtornos de personalidade ou retardo mental;
▶ Condições médicas gerais;
▶ Psicossociais ou eventos associados;
▶ Avaliação global do nível de funcionamento psicossocial.

2.4.2 CID-11
A Classificação Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde — também conhecida como Classificação
Internacional de Doenças — CID-11 — foi publicada pela
Organização Mundial da Saúde (OMS) em junho de 2018,
apresentada para adoção em maio de 2019 — durante a
Assembleia Mundial da Saúde — entrando em vigor em 1º de
janeiro de 2022. As principais mudanças na CID-11 em Psiquiatria
foram a inclusão do gaming disorder (distúrbio em jogos
eletrônicos) e da síndrome de burnout, como “problemas gerados
e associados ao emprego ou desemprego”.
A CID-11 fornece códigos relativos à classificação de doenças e
de grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais,
queixas, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos
ou doenças. A cada estado de saúde é atribuída uma categoria
única à qual corresponde um código CID-11. Essa é a classificação
usada para laudos, atestados e pareceres médicos.

#importante
Documentos médicos com fins judiciais
devem utilizar a CID-11, enquanto o DSM-
5 é usado em prontuários e discussões.
O que investigar em um
exame psíquico
completo?
Um exame psíquico completo deve ser iniciado assim
que visualizarmos o paciente, atentando para sua
apresentação, atividade psicomotora e
comportamento, atitude para com o entrevistador,
atividade verbal e linguagem, estado de consciência,
atenção espontânea e voluntária, orientação auto e
alopsíquica, afetividade, sensopercepção, pensamento,
memória de curto e longo prazos, vontade e
pragmatismo, inteligência, crítica de seu estado e
planos para o futuro.
Associação Médica do Rio Grande do Sul - Processo
Seletivo Unificado
O processo seletivo da AMRIGS-PSU é uma avaliação com
questões mais diretas e objetivas de múltipla escolha, que
abordam casos clínicos, o uso de imagens, achados de exames,
hipóteses diagnósticas e questionamento de tratamentos.
Há temas mais recorrentes e que merecem atenção. Em Clínica
Médica são cobradas: Psiquiatria — psicofarmacologia e outros
tratamentos em Psiquiatria; Infectologia — tipos de infecções;
Cardiologia — temas relacionados a hipertensão arterial
sistêmica. Cirurgia Geral tem foco em hérnias de parede
abdominal, abdome agudo, tratamento cirúrgico da obesidade e
cirurgia metabólica.
Em Ginecologia, preste atenção em anticoncepção, HPV e
neoplasias intraepiteliais cervicais, patologias neoplásicas e
câncer de endométrio. Em Pediatria são relevantes Neonatologia,
aleitamento materno e desenvolvimento. Por fim, Saúde Coletiva
cobra estudos epidemiológicos, Medicina de Família e
Comunidade e análise de métodos diagnósticos.
AMRIGS-PSU | 2021
Menino de 8 anos é trazido à consulta pelos pais. Ambos referem
que o filho está “sempre agitado”, que é incapaz de brincar
calmamente, que com frequência fala demais e interrompe os
outros, apresentando muita dificuldade em esperar a sua vez (por
exemplo, em uma fila). Além disso, evita ou reluta em se envolver
em atividades que exijam esforço mental, é bastante
desorganizado nas suas tarefas diárias e repetidamente perde
coisas (seu material escolar, seus óculos, entre outros). O menino
confirma as informações trazidas pelos pais. Em função dessa
sintomatologia, você realiza o diagnóstico de Transtorno de
Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) subtipo combinado e
indica tratamento psicoterápico e farmacológico. Sobre o
tratamento farmacológico do TDAH em crianças, é correto
afirmar que:
a) a terapia farmacológica não é considerada o tratamento de
primeira linha
b) os estimulantes do sistema nervoso central são
contraindicados para uso em crianças com anormalidades e
riscos cardíacos conhecidos
c) o metilfenidato é altamente eficaz nesse Transtorno, porém
apresenta muitos efeitos adversos
d) ao contrário do que se pensava anteriormente, a administração
contínua do metilfenidato por muitos anos, sem qualquer
interrupção, não apresenta queda em centímetros durante o
processo de crescimento
Gabarito: b
Comentários:
a) Atualmente, o tratamento se baseia em tratamento
farmacológico e psicoterápico, sendo o farmacológico muitas
vezes usado isoladamente devido às dificuldades em se
conseguir seguimento terapêutico adequado, bem como
profissionais habilitados para tal.
b) Fazem parte das contraindicações do uso de metilfenidato:
▶ Problema exclusivo de aprendizado, deficiência de escolaridade
decorrente de má adaptação escolar, projeto pedagógico sem
singularidade, relação professor-aluno inadequada, propostas de
reforço de atividades que expõem a criança/adolescente a
conflito diante dos colegas, gerando discriminação e maus-tratos
entre pares;
▶ Discinesias, tiques motores, síndrome de Gilles de la Tourette;
▶ Glaucoma;
▶ Hipertireoidismo;
▶ Arritmias cardíacas;
▶ Angina pectoris;
▶ Hipersensibilidade à droga e seus componentes;
▶ Psicoses;
▶ Hipertensão severa.
c) Trata-se de medicação segura e bastante utilizada para tal
propósito.
d) Observa-se que a redução de apetite é dose-dependente. Já a
insônia, a cefaleia, a dor abdominal e a tontura não foram
influenciadas pela quantidade ingerida. Quanto à redução do
apetite, é importante ressaltar com os pais a efemeridade do
fenômeno e incentivar o uso de alimentos mais calóricos e
polivitamínicos que compensem a perda de peso e a baixa ingesta
alimentar.
Como diagnosticar e
diferenciar delirium de
demência?

3.1 INTRODUÇÃO
O agrupamento dos transtornos mentais orgânicos compreende
uma série de transtornos mentais reunidos, tendo em comum
uma etiologia demonstrável como doença, lesão cerebral ou
outro comprometimento que leva à disfunção cerebral. A
disfunção pode ser primária, em ação direta sobre o sistema
nervoso, ou secundária. O comprometimento que ocorre é o das
funções cognitivas — memória, linguagem, atenção; por vezes,
precedido de deterioração do controle emocional, do
comportamento social ou da motivação. As principais síndromes
mentais orgânicas são o delirium e a demência.
3.2 DELIRIUM
3.2.1 Definição
Delirium, ou estado confusional agudo, é uma síndrome clínica
caracterizada por rebaixamento súbito do nível de consciência,
comprometimento da atenção, distúrbios da percepção
(distorções, ilusões e alucinações), distúrbio da capacidade de
compreensão e de abstração, delírios pouco estruturados e
fugazes, déficit de memória de fixação e relativa preservação da
memória remota, desorientação — mais comumente no tempo —,
comprometimento da atividade psicomotora (aumento ou
redução), alteração do ciclo sono-vigília, transtornos emocionais
(depressão, ansiedade, medo, irritabilidade, euforia, apatia,
perplexidade), com início abrupto dos sintomas e flutuação ao
longo do dia, tendendo a piorar à noite. Tem duração limitada, em
geral dias ou semanas, e os sintomas desaparecem quando o
fator de causa é identificado e tratado.
3.2.2 Epidemiologia
Trata-se de um transtorno bastante frequente, principalmente
entre pacientes internados. Dados revisados da literatura médica
apontam delirium em cerca de 30% dos pacientes que estão em
unidades cirúrgicas de tratamento intensivo e unidades cardíacas
de cuidados intensivos, e 40 a 50% dos que estão se
recuperando de cirurgias por fraturas de quadril. O delirium pode
acometer até 80% dos pacientes criticamente enfermos sob
ventilação mecânica, segundo estudos americanos e canadenses.
Porém, é comumente subdiagnosticado; aproximadamente 70%
dos casos não são reconhecidos pelos médicos, o que leva a
aumento nas taxas de mortalidade e morbidade, declínio da
capacidade funcional e prolongamento das internações
hospitalares.
3.2.3 Etiologia
▶ Causas extracranianas: infecções sistêmicas, transtornos
metabólicos, hipóxia, hipercapnia, hipoglicemia, desequilíbrio
eletrolítico, doença hepática ou renal, deficiência de tiamina,
estados pós-operatórios e trauma;
▶ Causas intracranianas: infecções, como meningite e encefalite,
encefalopatia hipertensiva, estados convulsivos pós-ictais,
sequelas de traumatismo craniano, lesões focais do lobo parietal
direito e lesões da superfície inferomedial do lobo occipital;
▶ Abstinência de substâncias: álcool (delirium tremens),
anfetaminas e relacionadas, sedativos, hipnóticos e ansiolíticos e
outras substâncias;
▶ Medicamentos: anestésicos, cardiovasculares, analgésicos,
antimicrobianos, antiasmáticos, antiparkinsonianos,
anticonvulsivantes, corticosteroides, anti-histamínicos,
relaxantes musculares, anti-hipertensivos e anticolinérgicos
(psicotrópicos);
▶ Toxinas: anticolinesterase, dióxido de carbono,
organofosforados, substâncias voláteis, monóxido de carbono,
combustíveis ou tintas.
3.2.4 Subtipos de delirium
Existem cinco subtipos de apresentação clínica para o delirium.
São eles:
▶ Delirium subsindrômico: pouco reconhecido, preenche apenas
parcialmente os critérios diagnósticos;
▶ Delirium hipoativo e seu extremo, o subtipo catatônico: apatia e
redução da capacidade de respostas. Associado a maior
mortalidade, é o menos diagnosticado e usualmente confundido
com quadro depressivo;
▶ Delirium hiperativo e seu extremo, o subtipo excitado:
inquietação, agitação e labilidade emocional, sendo mais
facilmente detectado;
▶ Delirium misto: alternância entre os tipos hipo e hiperativo;
▶ Delirium prolongado ou persistente: presenciado em diversos
cenários, inclusive após a alta hospitalar, geralmente em
pacientes com comprometimento cognitivo basal ou com
sequelas.
3.2.5 Diagnóstico
Quando se suspeita do diagnóstico de delirium, é essencial tentar
encontrar e tratar a causa-base, que deve ser o foco principal do
manejo. Deve-se fazer exame físico completo, revisão de
prontuário — procurando, principalmente, por mudanças de
comportamento, inclusão de novas drogas ao regime e resultados
de exames complementares — e solicitar exames laboratoriais e
de imagem adequados. É importante a solicitação de todos os
exames laboratoriais, pois sempre haverá causa orgânica no
delirium.
O Confusion Assessment Method (CAM) é um instrumento para
diagnóstico de delirium que se apoia em quatro critérios:
▶ Critério 1: início agudo ou curso flutuante;
▶ Critério 2: desatenção;
▶ Critério 3: pensamento desorganizado;
▶ Critério 4: nível alterado de consciência.
O diagnóstico de delirium requer a presença dos critérios 1 e 2
associados aos critérios 3 ou 4.
▶ Exames básicos: hemograma completo com diferencial de
leucócitos, eletrólitos, índices renais e hepáticos, glicemia; testes
de função da tireoide; testes sorológicos para sífilis; teste
sorológico para HIV; análise de urina; eletrocardiograma;
eletroencefalograma; radiografia torácica; e triagem para drogas
no sangue e na urina.
▶ Exames adicionais: cultura de sangue, urina; concentração de
ácido fólico e B12; tomografia computadorizada ou ressonância
magnética do cérebro; punção lombar e exame do liquor.
3.2.5.1 Diagnósticos diferenciais

▶ Demência, em que o curso é mais lento e insidioso e não há


rebaixamento do nível de consciência. Porém, ambas as
condições podem coexistir;
▶ Mania ou outro transtorno psicótico, em que o paciente também
apresenta alucinações, delírios, pensamento desorganizado e
agitação, mas não tem alteração da consciência;
▶ Depressão, que se confunde, sobretudo, com o subtipo
sonolento de delirium.
3.2.6 Tratamento
O tratamento da condição médica que induz à agitação é primário.
Posteriormente, se necessário, deve-se sedar com neuroléptico
de alta potência e baixa interferência em parâmetros vitais:
haloperidol (Haldol®), 5 mg, IM, a cada 30 minutos, até obter
sedação, com possibilidade de dose máxima entre 45 e 100 mg,
em 24 horas. Pode-se utilizar neuroléptico atípico, como
risperidona, 1 a 2 mg, VO, ou ziprasidona, 40 mg, VO.
Deve-se manter cerca de metade da dose inicialmente eficaz,
intramuscular ou oral, com redução progressiva à medida que os
sintomas remitem. A dose de manutenção em idosos deve ser
menor: 1 mg, VO, a cada 12 horas.
3.3 DEMÊNCIA
3.3.1 Definição
A demência é uma síndrome progressiva que apresenta múltiplos
comprometimentos da função cognitiva.
As três características principais são:
▶ Esquecimento ou problemas com a memória;
▶ Problemas de comportamento, como agitação, insônia, choro
fácil e comportamentos inadequados;
▶ Perda das habilidades adquiridas durante a vida, como dirigir,
vestir a roupa, gerenciar a vida financeira, cozinhar etc.
3.3.2 Etiologia
A demência pode ter várias causas, algumas delas reversíveis
(15% dos casos). A mais comum é a doença de Alzheimer (50%
dos casos), seguida da demência vascular (15% dos casos).
Outros fatores que podem causar demência são:
▶ Drogas e toxinas;
▶ Tumores cerebrais;
▶ Traumatismo cranioencefálico;
▶ Hidrocefalia de pressão normal;
▶ Transtornos neurodegenerativos, como Parkinson, Huntington,
Pick;
▶ Infecções, como sífilis, encefalite, HIV;
▶ Transtornos nutricionais e metabólicos.

3.3.3 Diagnóstico
Devem ser solicitados exames laboratoriais tanto para
diagnóstico quanto para tentar estabelecer a etiologia da
demência. São os mesmos exames realizados nos casos de
delirium.
3.3.3.1 Doença de Alzheimer

A doença é diagnosticada depois de excluídas as demais causas de


demência, já que seu diagnóstico definitivo é o exame anatomopatológico
do cérebro. Ocorre quadro de início insidioso, sendo os déficits de memória
os primeiros sintomas. A doença progride em fases:

▶ Fase inicial:
▷▷ Distração;
▷▷ Dificuldade para lembrar nomes, palavras e números;
▷▷ Dificuldade para aprender coisas novas;
▷▷ Desorientação em ambiente familiar;
▷▷ Redução das atividades sociais.
▶ Fase intermediária:
▷▷ Perda marcante da memória e das funções cognitivas;
▷▷ Deterioração das habilidades verbais;
▷▷ Alterações de comportamento;
▷▷ Delírios e alucinações;
▷▷ Incapacidade de convívio social;
▷▷ Fugas ou perambulação pela casa;
▷▷ Início da perda do controle esfincteriano.
▶ Fase avançada:
▷▷ Tendência da fala desaparecer;
▷▷ Delírios e alucinações continuam;
▷▷ Transtornos de comportamento;
▷▷ Perda do controle da bexiga e dos intestinos;
▷▷ Tendência a ficar acamado;
▷▷ Dificuldade para engolir alimentos, necessitando de sonda
para alimentação.
Vários estudos demonstraram que a doença de Alzheimer é
idade-dependente e que o risco aumenta em familiares,
demonstrando que a genética está fortemente relacionada. A
hereditariedade está muito mais marcada na chamada doença de
Alzheimer familiar (15 a 20%), cujo início é precoce, antes dos 65
anos, do que na doença de Alzheimer esporádica (80 a 85%),
caracterizada pelo aparecimento em idades mais avançadas. A
forma familiar está relacionada à herança autossômica dominante
com penetrância idade-dependente. Já na forma esporádica, há
um padrão de alta frequência e baixa penetrância, distúrbio
relacionado a um único gene ou um modelo multifatorial com
múltiplos genes e/ou fatores não genéticos. O componente
genético parece variar de família para família: algumas
fortemente relacionadas, outras sem grande relevância.
3.3.3.2 Demência vascular

A demência vascular é causada por várias enfermidades, que têm


em comum origem vascular, derrame ou trombose, além da
obstrução de pequeninas artérias cerebrais (Binswanger), ou por
causas cardiorrespiratórias — parada cardíaca ou outra causa de
falta de oxigênio no cérebro.
Apresenta quadro clínico de demência mais agudo (repentino)
após evento neurológico, como derrame ou trombose. O
diagnóstico é feito pelo exame clínico e por tomografia
computadorizada ou ressonância magnética de crânio.

#importante
Suspeita-se de demência vascular na
presença de quadro abrupto, alterações
no exame neurológico e histórico de
doença cardiovascular.

3.3.4 Tratamento das demências


Se for por causa reversível, as demências devem ser tratadas o
mais rápido possível. Nas degenerativas, devem-se manejar os
transtornos de comportamento com antipsicóticos em doses
baixas — Haldol®, 1 a 2 mg/d; risperidona, 1 a 2 mg/d. A doença de
Alzheimer pode estabilizar-se com um inibidor de colinesterase,
como rivastigmina, donepezila e tacrina. Na demência vascular,
deve-se controlar a doença de base para prevenir novos infartos.
São fundamentais orientação familiar e suporte psicossocial.
3.4 DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
A depressão é o estado psiquiátrico mais comum que pode
apresentar-se sob a forma de demência. O termo
pseudodemência indica que portadores de doença depressiva
podem apresentar quadro demencial. Quando convenientemente
tratados, respondem muito bem, chegando frequentemente à
remissão completa do quadro demencial, o que não acontece nas
demências de Alzheimer ou vascular.
Quadro 3.1 - Delirium versus demência
Quadro 3.2 - Doença de Alzheimer versus demência vascular

Como diagnosticar e
diferenciar delirium de
demência?
Para o diagnóstico e a distinção entre delirium e
demência, devemos observar o quadro clínico, a
evolução e a reversibilidade da patologia. O delirium é
agudo e ocorre em pacientes sem antecedentes de
alterações de memória. É um quadro flutuante, de curta
duração, que melhora quando a causa de base é
identificada e tratada (reversível). Ocorre prejuízo da
atenção, déficit de memória recente e são comuns
delírios e alucinações.
A demência é um quadro insidioso e progressivo,
geralmente irreversível. A consciência geralmente se
preserva, e delírios e alucinações são comuns apenas
na progressão da patologia.
Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade
Estadual Paulista
Para a primeira etapa da FMB-UNESP, o candidato precisa realizar
uma prova de 100 questões de múltipla escolha, com quatro
alternativas cada. Já na segunda etapa será avaliado o currículo
do candidato.
Para a prova, é importante estudar as especialidades de Pediatria,
Saúde Coletiva, Ginecologia e Obstetrícia, que são as áreas de
conhecimento mais cobradas. Considere que as áreas de Clínica
Médica, Cirurgia Geral e Medicina Preventiva e Social também
farão parte das avaliações.
A dica é prestar uma atenção especial em Neonatologia, Sistema
Único de Saúde (SUS), doenças estruturais do sistema
cardiovascular, medidas de frequência, estudos epidemiológicos,
Medicina Legal, leis orgânicas de saúde, atenção primária à saúde
e Estratégia Saúde da Família, doenças infecciosas, infecções
sexualmente transmissíveis e AIDS. Esses temas foram os mais
recorrentes nas últimas edições da prova.
FMB-UNESP | 2020
Para o diagnóstico de delirium, segundo o algoritmo Confusion
Assessment Method, são obrigatórias as seguintes
características:
a) pensamento desorganizado ou incoerente e déficit de memória
b) déficit de memória e dificuldade para manter a atenção
c) agitação e modificação aguda do estado mental
d) modificação aguda do estado mental e dificuldade para manter
a atenção
Gabarito: d
Comentários:
a) Veja o comentário geral na alternativa correta.
b) Veja o comentário geral na alternativa correta.
c) Veja o comentário geral na alternativa correta.
d) O Confusion Assessment Method é um instrumento para
diagnóstico de delirium que se apoia em quatro critérios:
▶ 1: início agudo ou curso flutuante;
▶ 2: desatenção;
▶ 3: pensamento desorganizado;
▶ 4: nível alterado de consciência.
O diagnóstico de delirium requer a presença dos critérios 1 e 2
associados aos critérios 3 ou 4.
Intoxicação e abstinência:
o que fazer?

4.1 CONCEITOS GERAIS


Os conceitos definidos segundo o Compêndio de Psiquiatria:
Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica (2017) e o
Consenso de Abuso e Dependência do Álcool (2002), da
Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), estão apresentados a
seguir.
4.1.1 Substâncias psicoativas ou drogas
Substâncias psicoativas, ou drogas, são substâncias que alteram
o comportamento do usuário e o induzem a usá-las novamente.
São classificadas de acordo com o efeito que causam no cérebro,
em depressoras (álcool, inalantes, opioides), estimulantes
(cocaína, nicotina e anfetamina) e alucinógenas (LSD).
4.1.2 Abuso de substâncias
A característica essencial do abuso de substâncias é um padrão
mal adaptativo de uso, manifestado por consequências
significativamente danosas e recorrentes, relacionadas ao uso
repetido da substância.
Em decorrência do abuso, pode haver fracasso repetido em
cumprir obrigações importantes, uso repetido em situações em
que isso apresenta perigo físico, problemas legais, sociais e
interpessoais. Tais problemas devem ser recorrentes — com
recaídas — durante um período de 12 meses. A diferença entre
dependência e abuso de substâncias diz respeito à tolerância —
aumento na quantidade consumida —, à abstinência — crise por
falta da substância — ou a um padrão de uso compulsivo.
Embora um diagnóstico de abuso de substâncias seja mais
provável em indivíduos que começaram recentemente a
consumi-las, alguns indivíduos continuam por longo período
sofrendo as consequências sociais adversas relacionadas a ela,
sem desenvolverem evidências de dependência de substância. A
categoria “abuso de substância” não se aplica à nicotina e à
cafeína.
4.1.3 Dependência
Dependência é a presença de um agrupamento de sintomas
psicofisiológicos, indicando que a pessoa continua a usar a
substância apesar dos problemas significativos relacionados a
ela. Há um padrão de uso repetido que, em geral, resulta em
tolerância, abstinência — dependência física — e comportamento
compulsivo de consumo da droga, com impulso irrefreável para
consumi-la — dependência psicológica.
Um diagnóstico de dependência de substância pode ser aplicado
a toda classe de substâncias, exceto à cafeína. Os sintomas de
dependência são similares entre as várias categorias de
substâncias, mas, para certas classes, alguns são menos salientes
e, em certos casos, nem todos os sintomas se manifestam.
São requisitos básicos da dependência:
▶ Forte desejo ou compulsão para consumir a substância;
▶ Dificuldade no controle de consumir a substância em termos do
seu início, término ou níveis de consumo;
▶ Estado de abstinência fisiológica quando foi cessado ou
reduzido o uso — sintomas de abstinência ou uso da substância
para aliviá-los;
▶ Evidência de tolerância, de tal forma que doses crescentes da
substância psicoativa são requeridas para alcançar efeitos
originalmente produzidos por doses mais baixas;
▶ Abandono progressivo de prazeres ou de interesses
alternativos em favor do uso da substância psicoativa, aumento
do tempo necessário para obter ou tomar a substância psicoativa
ou para recuperar-se dos seus efeitos;
▶ Persistência no uso da substância a despeito de evidência clara
de consequências manifestamente nocivas, como dano ao fígado
por excesso de álcool, depressão consequente a período de
consumo excessivo da substância ou comprometimento
cognitivo relacionado à droga.
Para haver dependência, deve haver abstinência, comportamento
compulsivo de consumo com impulso irrefreável e tolerância. O
uso diário de substância não é critério para dependência.
4.1.4 Tolerância
Tolerância é a necessidade de crescentes quantidades da
substância para atingir o efeito desejado ou um efeito
acentuadamente diminuído com o uso continuado da mesma
quantidade da substância. O grau em que a tolerância se
desenvolve varia imensamente. Indivíduos em uso intenso de
opioides e estimulantes podem desenvolver níveis substanciais —
multiplicados por dez — de tolerância. Em geral, a tolerância ao
álcool é muito menos extrema do que no caso das anfetaminas.
Muitos tabagistas consomem mais de 20 cigarros por dia,
quantidade que teria produzido sintomas de toxicidade quando
começaram a fumar. Os indivíduos em uso intenso de maconha,
em geral, não têm consciência de que desenvolveram tolerância,
embora esta tenha sido demonstrada em estudos com animais e
em alguns indivíduos.
4.1.5 Síndrome de abstinência
A síndrome de abstinência é uma alteração comportamental mal
adaptativa, com elementos fisiológicos e cognitivos, que ocorre
quando as concentrações de uma substância no sangue e nos
tecidos declinam em um indivíduo que manteve uso intenso e
prolongado dela. Após o desenvolvimento dos sintomas
desagradáveis de abstinência, a pessoa tende a consumir a
substância para aliviá-los ou evitá-los, tipicamente o dia inteiro,
começando logo após o despertar. Os sintomas de abstinência
variam imensamente entre as classes de substâncias, de modo
que são oferecidos conjuntos separados de critérios de
abstinência para a maioria das classes. Sinais acentuados e, com
frequência, facilmente mensuráveis de abstinência são comuns
com álcool, opioides e sedativos, hipnóticos e ansiolíticos. Os
sinais e sintomas de abstinência com frequência estão presentes,
mas podem ser menos visíveis no caso de estimulantes, como
anfetaminas, cocaína e nicotina. Nenhuma abstinência
significativa é vista, mesmo após o uso repetido de alucinógenos.
Tolerância e abstinência estão presentes na dependência de
substâncias e ausentes no abuso de substâncias.
4.1.6 Intoxicação
A intoxicação é o desenvolvimento de uma síndrome reversível
específica, ocasionada pela recente ingestão de uma substância,
ou exposição a ela.
Diferentes substâncias podem produzir síndromes similares ou
idênticas. Alterações comportamentais ou psicológicas
clinicamente significativas e mal adaptativas, em razão do efeito
da substância sobre o Sistema Nervoso Central (SNC) —
beligerância, instabilidade do humor, prejuízo cognitivo,
comprometimento da memória, prejuízo no funcionamento social
ou ocupacional —, que se desenvolvem durante ou logo após o
uso da substância. Os sintomas não são atribuídos a uma
condição médica geral nem são mais bem explicados por outro
transtorno mental.
Quadro 4.1 - Alguns agentes tóxicos para os quais existem antídotos

Na intoxicação por ADT, pode-se encontrar agitação ou sedação,


midríase, taquicardia, convulsões generalizadas, perda da
consciência, depressão respiratória, arritmia cardíaca, parada
cardíaca e morte. Tendo em vista a grande afinidade proteica dos
ADTs, sua eliminação por diálise ou diurese é muito difícil. Nos
casos de intoxicação, indica-se o uso de anticolinesterásicos —
fisostigmina ou Prostigmine® intramuscular ou intravenosa — e
medidas de sustentação geral.
Na intoxicação por anticolinesterásico, como os
organofosforados, as manifestações tóxicas devem-se à inibição
da acetilcolinesterase no sistema nervoso. Manifestações
muscarínicas incluem miose, lacrimejamento aumentado,
broncoespasmo, visão turva, broncorreia, diaforese, salivação,
bradicardia, hipotensão, incontinência urinária e motilidade
gastrintestinal aumentada. Manifestações nicotínicas incluem
fasciculações, fraqueza muscular, hipotensão, cãibras e paralisia
respiratória. Toxicidade do SNC gera ansiedade, fala pastosa,
alterações do estado mental — delirium, coma e convulsões — e
depressão respiratória.
4.2 DADOS EPIDEMIOLÓGICOS
Dados epidemiológicos dos transtornos mentais decorrentes de
substâncias psicoativas:
▶ Vinte por cento da população utiliza substâncias psicoativas no
decorrer da vida;
▶ Quinze por cento, no mínimo, podem ser classificados como
dependentes químicos;
▶ Dez a 12% usam mais de uma droga concomitantemente;
▶ A incidência de dependência química é de duas a seis vezes
maior no homem;
▶ A dependência química evolui do álcool para drogas mais
pesadas;
▶ Há cerca de cento e cinquenta mil óbitos por ano por alcoolismo
nos Estados Unidos;
▶ Quinze por cento dos dependentes químicos cometem suicídio
— incidência 20 vezes maior do que na população em geral.
4.3 ÁLCOOL
4.3.1 Mecanismo de ação
Quando consumido, o álcool passa pelo estômago e começa a ser
absorvido no intestino, caindo na corrente sanguínea. Ao passar
pelo fígado, começa a ser metabolizado. A primeira substância
formada pelo álcool chama-se acetaldeído, que depois é
convertido em acetato por outras enzimas. Essas substâncias,
como o álcool excedente, são eliminadas pelos rins. As que,
eventualmente, voltam ao fígado, são transformadas em água e
gás carbônico expelido pelos pulmões. A passagem do intestino
para o sangue ocorre conforme a velocidade com que o álcool é
ingerido; já o processo de degradação do álcool pelo fígado
obedece a um ritmo fixo, podendo ser ultrapassado pela
quantidade consumida. Quando isso ocorre, tem-se a intoxicação
pelo álcool — estado de embriaguez. Como a quantidade de
enzimas é regulável, um indivíduo em uso contínuo de álcool
produzirá mais enzimas metabolizadoras do álcool, tornando-se
mais “resistente” a ele. A presença de alimentos no intestino
lentifica a absorção do álcool. Apesar de ser altamente calórico, o
álcool não fornece material estocável, assim a energia oferecida é
utilizada enquanto ele circula ou é perdida. O dano físico direto do
álcool sobre o cérebro é um fato inquestionavelmente
confirmado. A parte mais afetada costuma ser o córtex pré-
frontal, responsável pelas funções intelectuais superiores, como
raciocínio, capacidade de abstração de conceitos e lógica. Os
mesmos estudos que investigam as imagens do cérebro
identificam uma correspondência linear entre a quantidade de
álcool consumida ao longo do tempo e a extensão do dano
cortical. Quanto mais álcool, maior o dano. Depois do córtex, as
áreas envolvidas são as relacionadas com a memória e o cerebelo,
que é a parte responsável pela coordenação motora. O estresse
oxidativo, decorrente do metabolismo do etanol, produz alto nível
intracelular de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio, que são
os pontos cardeais da patogênese de uma série de complicações
clínicas relacionadas ao álcool, como hepatopatia alcoólica,
pancreatopatia alcoólica, miocardiopatia alcoólica, alterações
hematológicas etc. A peroxidação de lipídios, formando ácidos
graxos, também contribui com as lesões orgânicas advindas do
metabolismo do álcool. A ação do etanol interfere em
macromoléculas celulares, em ácidos nucleicos e na cascata de
sinalização intra e extracelular, altera as mitocôndrias e produz
dano no retículo endoplasmático, no DNA e nos ribossomos.
4.3.2 Intoxicação
Os estados de intoxicação e embriaguez normalmente são
obtidos de modo voluntário. Neles, a pessoa tem alteração da fala
— fala arrastada —, incoordenação motora, ataxia, nistagmo,
prejuízos na memória e atenção, estupor ou coma nos casos mais
extremos. Em geral, junto a essas alterações neurológicas,
apresenta-se um comportamento inadequado ou impróprio da
pessoa intoxicada. O tratamento consiste em medidas gerais de
suporte à vida e atenção para trauma cranioencefálico e
broncoaspiração de vômitos, bastante comuns. O intoxicado deve
sempre receber tiamina antes do início do soro glicosado, para
prevenir complicações como a síndrome de Wernicke-Korsakoff
(SWK).
A embriaguez patológica é uma condição em que, com ingestão
de pequenas doses de álcool, há comportamento violento,
crepuscularização da consciência e amnésia lacunar.
4.3.3 Abuso
O critério de abuso existe para caracterizar as pessoas com
eventuais problemas em razão de consumos excessivos de álcool
em curtos períodos de tempo. Para o diagnóstico, é preciso que o
paciente esteja tendo problemas com álcool durante, pelo menos,
12 meses e apresente, pelo menos, uma das seguintes situações:
▶ Prejuízos significativos no trabalho, na escola ou na família,
como faltas ou negligências nos cuidados com os filhos;
▶ Exposição a situações potencialmente perigosas, como dirigir
ou manipular máquinas perigosas embriagado;
▶ Problemas legais, como desacato a autoridades ou a superiores;
▶ Persistência no uso de álcool, apesar do apelo das pessoas
próximas para que interrompa o uso.
4.3.4 Dependência
Para o diagnóstico de dependência alcoólica, é preciso que o
usuário venha tendo problemas decorrentes do uso de álcool
durante 12 meses seguidos e preencher, ao menos, três dos
seguintes critérios :
▶ Tolerância ao álcool: marcante aumento da quantidade ingerida
para produção do mesmo efeito obtido no início, diminuição dos
sintomas de embriaguez ou, ainda, diminuição de outros sintomas
resultantes do consumo de álcool, apesar da contínua ingestão;
▶ Sinais de abstinência: após a interrupção do consumo de álcool,
o indivíduo passa a apresentar sudorese excessiva, aceleração do
pulso (acima de 100), tremores nas mãos, insônia, náuseas e
vômitos, agitação psicomotora, ansiedade, convulsões e
alucinações táteis. A reversão desses sinais com a reintrodução
do álcool comprova a abstinência;
▶ O dependente de álcool, geralmente, bebe mais do que
planejava;
▶ Persistente desejo de voltar a beber ou incapacidade de
interromper o uso;
▶ Emprego de muito tempo para obter a bebida ou recuperar-se
do seu efeito;
▶ Persistência na bebida, apesar dos problemas e dos prejuízos
gerados, como perda do emprego e das relações familiares.
Outro instrumento cada vez mais utilizado para avaliação de
dependência ao álcool é o questionário Cut down, Annoyed by
criticism, Guilty and Eye-opener (CAGE). Ele é composto por
quatro perguntas, de fácil memorização, sendo bastante preciso
para identificar pacientes dependentes de álcool, conforme a
definição dos critérios diagnósticos. Duas respostas afirmativas
sugerem indicação positiva de dependência de álcool. As
perguntas são:
▶ Cut down (diminuir): você já pensou em largar a bebida?
▶ Annoyed (aborrecido): você já ficou aborrecido quando outras
pessoas criticaram o seu hábito de beber?
▶ Guilt (culpa): você já se sentiu mal ou culpado pelo fato de
beber?
▶ Eye-opening (ao despertar): você já bebeu pela manhã para ficar
mais calmo ou se livrar de uma ressaca?
Diante de um caso de dependência, ainda podemos categorizar
cada indivíduo de acordo com a classificação de Cloninger, que
toma por base a epidemiologia e a genética do dependente,
servindo para identificar comportamentos e estabelecer a melhor
abordagem terapêutica para o alcoolismo. Cloninger classificou o
alcoolismo em dois tipos:
▶ Alcoolismo tipo I ou alcoolismo decorrente do meio, que é a
forma mais frequente, com igual equivalência em ambos os sexos,
de progressão lenta e de início após os 20 anos de idade,
associada à personalidade passivo-dependente;
▶ Alcoolismo tipo II, que foi definido como o alcoolismo
exclusivamente masculino, com início antes dos 20 anos de idade,
de rápida progressão para a dependência em sujeitos muito
impulsivos, e com tendência à personalidade antissocial.
4.3.5 Abstinência
A síndrome de abstinência constitui-se no conjunto de sinais e
sintomas observados nas pessoas que interrompem o consumo
de álcool após longo e intenso uso. As formas mais leves de
abstinência apresentam tremores, aumento da sudorese,
aceleração do pulso, insônia, náuseas, vômitos e ansiedade
depois de 6 a 8 horas desde a última bebida. A síndrome de
abstinência leve limita-se a tremores, insônia e irritabilidade. A
síndrome de abstinência torna-se mais perigosa com o
surgimento do delirium tremens.
Graus de abstinência dos transtornos mentais orgânicos:
▶ Grau I: ansiedade, irritabilidade;
▶ Grau II: grau I e alucinações;
▶ Grau III: grau II e convulsões;
▶ Grau IV: delirium tremens.

4.3.5.1 Delirium tremens


O delirium tremens é uma forma mais intensa e complicada da
abstinência, que se inicia, geralmente, após 72 horas da última
ingesta. Delirium é um diagnóstico inespecífico em Psiquiatria,
que designa estado de confusão mental — a pessoa não sabe
onde está, em que dia está, não consegue prestar atenção em
nada, tem comportamento desorganizado, além de fala
desorganizada ou ininteligível, e à noite pode ficar mais agitada do
que durante o dia. A abstinência e várias outras condições
médicas não relacionadas ao alcoolismo podem causar esse
problema. Um traço comum no delirium tremens, mas nem
sempre presente, são as alucinações táteis e visuais, em que o
paciente vê insetos ou animais asquerosos próximos ou pelo seu
corpo, podendo levá-lo a um estado de agitação violenta. Trata-se
de uma condição potencialmente fatal, principalmente nos dias
quentes e nos pacientes debilitados. A fatalidade, quando ocorre,
é atribuída ao distúrbio hidroeletrolítico.
4.3.6 Tratamento
O tratamento, segundo a diretriz Abuso e dependência de álcool,
da ABP em conjunto com a Sociedade Brasileira de Medicina de
Família e Comunidade, de 2012, e o consenso Abuso e
Dependência do Álcool, da ABP, de 2002, é:
▶ Reposição vitamínica: tiamina intramuscular, nos primeiros sete
a 15 dias; após esse período, por via oral. Doses de 300 mg/d de
tiamina são recomendadas com o objetivo de evitar a SWK, que
cursa com ataxia, confusão mental e anormalidades de
movimentação ocular extrínseca; esta última, nem sempre
presente;
▶ Benzodiazepínicos: a prescrição deve basear-se em sintomas.
Dessa forma, as doses recomendadas são as que, em média, o
paciente pode receber em determinado dia. O diazepam é usado
na dose de 20 mg/d, VO, com retirada gradual ao longo de uma
semana. O clordiazepóxido pode ser usado até 100 mg/d, VO, com
retirada gradual ao longo de uma semana. Nos casos de
hepatopatias graves: lorazepam, 4 mg/d, VO, com retirada gradual
em uma semana.
Deve-se sempre administrar tiamina antes da glicose no
tratamento da abstinência, a fim de evitar a síndrome de
Wernicke-Korsakoff.
4.3.6.1 Tratamento das complicações

▶ Convulsões: a maioria das crises é do tipo tônico-clônica


generalizada. As crises convulsivas correspondem à
manifestação relativamente precoce da abstinência; mais de
90% ocorrem até 48 horas após a interrupção do uso de álcool —
pico entre 13 e 24 horas — e estão associadas à evolução para
formas graves de abstinência. Cerca de um terço dos que
apresentam crises evolui para delirium tremens, se não tratado.
Em 40% dos casos, as crises ocorrem isoladamente. Nos
pacientes que apresentam mais de uma crise, ocorrem, em geral,
em número limitado. O diazepam, ou um benzodiazepínico de
ação longa, é a medicação de escolha, na dose de 10 ou 20 mg
VO. O uso intravenoso é especialmente indicado durante os
episódios convulsivos;
▶ Delirium tremens: forma grave de abstinência, geralmente se
inicia entre um e quatro dias após a interrupção do uso de álcool,
até três ou quatro dias. Caracteriza-se por rebaixamento do nível
de consciência, com desorientação, alterações sensoperceptivas,
tremores e sintomas autonômicos, como taquicardia, elevação da
pressão arterial e da temperatura corporal. Doses elevadas de
benzodiazepínico são necessárias, mas o uso associado de
neurolépticos é, em maior parte, indicado. O tratamento
farmacológico inclui diazepam, 60 mg/d, ou lorazepam, até 12
mg/d, em casos de hepatopatia grave, e haloperidol, 5 mg/d.
4.3.7 Efeitos crônicos
Os alcoólatras crônicos podem desenvolver algum problema
grave de memória. Há dois tipos: a chamada SWK e a demência
alcoólica.
4.3.7.1 Síndrome de Wernicke-Korsakoff (síndrome amnésica)

A SWK caracteriza-se por incoordenação motora, movimentos


oculares rítmicos, como durante uma leitura (nistagmo), e
paralisia de certos músculos oculares, provocando algo parecido
ao estrabismo para quem antes não o possuía. Além desses sinais
neurológicos, o paciente pode estar em confusão mental, ou, se
com a consciência clara, apresentar prejuízos evidentes na
memória recente — não consegue gravar o que o examinador
falou cinco minutos antes. Muitas vezes, para preencher as
lacunas da memória, o indivíduo inventa histórias — denomina-se
fabulação.
Tal quadro deve ser considerado emergência, pois requer
imediata reposição da vitamina B1 (tiamina) para evitar o
agravamento da situação. Os sintomas neurológicos, já citados,
são rapidamente revertidos com a reposição da tiamina, mas o
déficit da memória pode tornar-se permanente.
4.3.7.2 Síndrome demencial alcoólica

A síndrome demencial alcoólica é semelhante à demência


propriamente dita, como a de Alzheimer. No uso intenso e
prolongado, mesmo sem a SWK, o álcool pode provocar lesões
difusas no cérebro, prejudicando, além da memória, a capacidade
de julgamento, de abstração de conceitos; a personalidade pode
alterar-se; todo o comportamento fica prejudicado. A pessoa
torna-se incapaz de se sustentar.
4.3.8 Tratamento
Segundo a diretriz Abuso e dependência de álcool, de 2012, o
tratamento é complexo, pois depende, principalmente, da
motivação do indivíduo para parar de beber. Podem-se usar
medicações (naltrexona, acamprosato) para diminuir o desejo
pelo álcool, e devem-se prevenir recaídas, especialmente, com
consultas pouco espaçadas, psicoterapia ou grupos de ajuda.
A internação deve ocorrer se o paciente não consegue parar de
beber e apresenta danos físicos que o coloquem em risco, se tem
outro transtorno psiquiátrico associado em estado grave ou se as
recaídas são muito constantes.
4.4 COCAÍNA
4.4.1 Mecanismo de ação
Ocorre bloqueio da recaptação de dopamina, aumentando tal
substância na fenda sináptica. Há, então, aumento da transmissão
de estímulos da sensibilidade e do número de receptores. A
dopamina aumenta a atividade psicomotora, provoca
comportamentos estereotipados e reduz o consumo de
alimentos, além de estar relacionada aos centros límbicos,
responsáveis pelo prazer. A associação do consumo de cocaína e
infarto do miocárdio vem sendo estudada.
4.4.2 Intoxicação aguda
Os sintomas mais comuns são:
▶ Taquicardia ou, menos frequentemente, bradicardia;
▶ Midríase, tornando mais difícil estar em ambientes claros;
▶ Elevação da pressão sanguínea ou, menos constantemente,
diminuição da pressão;
▶ Calafrios, náuseas e vômitos;
▶ Perda de peso consequente à anorexia;
▶ Agitação psicomotora ou, menos frequentemente, retardo
psicomotor;
▶ Dores musculares, diminuição da capacidade respiratória e
arritmias cardíacas.
Tanto o crack como a merla também são derivados da coca, com
efeitos semelhantes. Porém, a via de uso dessas duas formas
confere diferenças importantes; assim que fumados, o crack e a
merla alcançam o pulmão, que é intensamente vascularizado e
apresenta grande superfície, levando à absorção instantânea.
Caem quase imediatamente na circulação, chegando
rapidamente ao cérebro, aparecendo os efeitos muito mais
rapidamente do que por outras vias. Pela via pulmonar, os
primeiros efeitos já ocorrem em 10 a 15 segundos; pela via
inalatória, após 10 a 15 minutos e, pela via intravenosa, em 3 a 5
minutos. A duração dos efeitos, contudo, é muito rápida: em torno
de 5 minutos, ao passo que, após injetar ou cheirar, é de cerca de
20 a 45 minutos, respectivamente. Essa duração efêmera dos
efeitos faz com que o usuário volte a utilizar a droga com mais
frequência — praticamente a cada 5 minutos —, gerando
compulsão, popularmente denominada “fissura”, uma vontade
incontrolável de sentir os efeitos de prazer provocados pela
droga.
Uma dose alta da droga pode desencadear um quadro de
overdose, ou seja, falência de um ou mais órgãos, com alto risco
de morte. A overdose pode acometer tanto usuários crônicos
quanto eventuais. A dose letal é incerta, dependendo de fatores
como tolerância e pureza da droga consumida. Ocorre aumento
do tônus simpático por bloqueio da recaptação das monoaminas
no SNC.
Os sintomas mais comuns na overdose são:
▶ Agitação psicomotora;
▶ Arritmia cardíaca;
▶ Angina ou infarto agudo do miocárdio;
▶ Acidente vascular cerebral;
▶ Convulsões.

4.4.3 Abstinência
A interrupção do uso contínuo de cocaína é, em geral, seguida de
uma crise que pode ser vista como síndrome de abstinência, na
qual a exaltação dá lugar a apreensão, depressão profunda,
sonolência e inércia. A abstinência pode durar até dez semanas, e
são frequentes as recaídas.
A cocaína possui ação parecida com a dos antidepressivos,
portanto, a abstinência dela leva a sintomas depressivos.
4.4.4 Efeitos crônicos
Síndrome psicótica com delírios paranoides, alucinações visuais e
auditivas e ideias de autorreferência. Nas grávidas que usam
cocaína, foram descritos efeitos teratogênicos, incluindo
anormalidades do trato urinário e deformidade dos membros do
feto.
4.4.5 Tratamento
Basicamente são tratados os sintomas depressivos, ansiosos ou
psicóticos produzidos pela droga ou pela abstinência. O
tratamento é sintomático e de manutenção; na psicose cocaínica,
aplica-se haloperidol, 5 mg, IM ou VO, a cada 6 horas, ou
tioridazina, 25 a 50 mg, a cada 8 horas.
4.5 CANNABIS (MACONHA)
Durante a fase de intoxicação, o usuário apresenta hiperemia
ocular, aumento do apetite, xerostomia e taquicardia. Acontece,
ainda, aumento da sensibilidade aos estímulos externos,
revelando cores e detalhes antes não percebidos. A percepção do
tempo também é afetada, passando a ser sentido como se
estivesse mais lento. Sensações de que o mundo está diferente,
distante ou de que houve uma mudança em si mesmo, como se
não fosse a mesma pessoa ou se estivesse sonhando, também
podem ocorrer. Como efeito imediato, há prejuízo na memória de
curto prazo, na atenção e na capacidade de recordação e de
retenção do conhecimento. Há dificuldade para a realização de
tarefas que apresentem múltiplas etapas. A capacidade de
traduzir em palavras o que se pensa também fica lesada. Além
disso, as capacidades motoras ficam prejudicadas, como a de
exercer a força muscular original. Inibição dos reflexos,
incoordenação e desequilíbrio podem acontecer em doses mais
altas.
4.5.2 Efeitos em longo prazo
Têm sido muito estudados os prejuízos permanentes que a
maconha pode causar após o uso intenso durante tempo
prolongado (mais de dez anos). Os achados não são conclusivos;
não se pode, por enquanto, confirmar nem descartar efeitos
como a síndrome amotivacional — indivíduo apático, sem
persistência em seus objetivos —, embora ela se manifeste em
muitos usuários. Os testes neuropsicológicos não puderam
detectar prejuízos, assim como os testes de imagens. A ausência
de alterações nos exames não pode ser considerada ausência de
prejuízo; é possível que este só aconteça a uma parte dos
usuários, ou que os instrumentos e as técnicas de pesquisa ainda
não sejam capazes de localizar o problema.
4.5.3 Dependência e abstinência
A maioria não se torna dependente, e a minoria desenvolve
síndrome de uso compulsivo da droga. Na abstinência, os
sintomas são irritabilidade, insônia, tremores, visão turva e
incoordenação dos movimentos.
4.5.4 Tratamento
O tratamento baseia-se nos mesmos princípios de outras drogas.
Deve-se incentivar a abstinência e tratar seus efeitos
sintomaticamente. Grupos de apoio e psicoterapia são de grande
ajuda.
4.6 OPIOIDES
4.6.1 Definição
Opioide é um termo designado para qualquer substância,
endógena ou sintética, similar à morfina. São elas: heroína, ópio,
codeína, metadona, fentanila e meperidina.
4.6.2 Intoxicação aguda
Pode haver sonolência e até inconsciência, miose, depressão
respiratória, resposta reduzida à dor, bradicardia, convulsões e
coma. Tríade clássica: coma, pupilas “em ponta de alfinete” e
depressão respiratória. Trata-se de uma emergência, devendo-se
garantir suporte à vida e medicar o paciente com naloxona
(antagonista opioide).
4.6.3 Dependência e abstinência
A tolerância desenvolve-se rapidamente. Todavia, os sintomas de
abstinência sucedem unicamente com uso crônico e parada
abrupta. Na abstinência ocorrem sudorese, midríase, ansiedade e
fissura, lacrimejamento, rinorreia, tremores, diarreia, náuseas e
vômitos, dor muscular e nas articulações, taquicardia, aumento da
pressão arterial, calafrios e insônia.
4.6.4 Tratamento e complicações
A metadona pode evitar sintomas de abstinência. As
complicações são atribuídas ao uso intravenoso —
tromboflebites, úlceras, meningite bacteriana, hepatites e HIV — e
podem ser evitadas, por exemplo, com agulhas descartáveis.
4.7 INALANTES
4.7.1 Intoxicação aguda
Os inalantes causam euforia, desinibição, zumbidos, ataxia, risos
imotivados e fala pastosa. Com doses mais altas, podem ocorrer
arritmia cardíaca, depressão do SNC com convulsões, coma e
morte.
4.7.2 Efeitos em longo prazo
Não há evidências de tolerância ou abstinência. As principais
complicações crônicas são atrofia cortical e cerebelar,
insuficiência renal crônica e hepatite tóxica.
4.8 SEDATIVOS E HIPNÓTICOS
(BENZODIAZEPÍNICOS)
4.8.1 Abstinência
A abstinência tem início de dois a dez dias após a parada do uso.
Podem advir irritabilidade, insônia, tremores, sudorese,
palpitação, cefaleia, dores musculares e déficits de memória.
Os benzodiazepínicos não são indicados por períodos
prolongados, devendo-se diminuir gradualmente a sua dosagem,
até a retirada do medicamento.
4.8.2 Efeitos em longo prazo
O risco de dependência é muito grande, e podem ocorrer piora da
memória e da coordenação motora, sonolência, tontura, quedas e
fraturas. Benzodiazepínicos devem ser sempre introduzidos por
curto espaço de tempo, para evitar dependência.
4.9 ALUCINÓGENOS
4.9.1 Definição
Os alucinógenos são substâncias naturais (cogumelos) e
sintéticas (LSD) que causam alucinações e perda de contato com
a realidade. Os principais efeitos ocorrem no sistema
serotoninérgico. A tolerância desenvolve-se rapidamente, mas
não existe dependência ou abstinência.
4.9.2 Intoxicação aguda
Podem ocorrer ansiedade, ideação paranoide, medo de perder o
juízo, despersonalização, desrealização, comprometimento da
crítica, ilusões, alucinações, midríase, taquicardia, sudorese, visão
turva, tremores e incoordenação motora.
4.9.3 Efeitos em longo prazo
Mesmo com pouco ou único uso, pode haver fenômeno de
flashback — alucinações dias após a ingestão —, transtorno
psicótico prolongado e bad trip — pânico, depressão e
comportamento suicida.
4.10 ANFETAMINAS
4.10.1 Definição
A mais conhecida é a metanfetamina, ou ecstasy, de uso
recreativo. Porém, as anfetaminas também podem ser utilizadas
para o tratamento de doenças psiquiátricas, como o transtorno
de déficit de atenção e hiperatividade.
4.10.2 Intoxicação
O indivíduo sob sua ação tem insônia, inapetência, sente-se cheio
de energia e fala mais rápido. Quem toma anfetaminas é capaz de
executar uma atividade qualquer por mais tempo, sentindo
menos cansaço, o qual só aparece horas mais tarde, quando a
droga já não está mais presente no organismo; com uma nova
dose, as energias voltam, embora com menos intensidade. De
qualquer modo, as anfetaminas fazem com que o organismo reaja
além de suas capacidades, exercendo esforços excessivos, o que,
logicamente, é prejudicial à saúde. Causam midríase, taquicardia e
aumento da pressão sanguínea — crise hipertensiva. Se uma
pessoa exagera na dose, fica mais agressiva, irritadiça e começa a
suspeitar de que outros estão tramando contra ela — chamado
delírio persecutório. Os sinais físicos ficam também muito
evidentes: midríase acentuada, pele pálida devido à contração
dos vasos sanguíneos e taquicardia. Tais intoxicações são graves,
e a pessoa, geralmente, precisa ser internada até a
desintoxicação completa. Algumas vezes, durante a intoxicação, a
temperatura aumenta muito, o que é bastante perigoso, pois pode
levar a convulsões.
4.10.3 Abstinência
Chega a atingir quase 90% dos usuários. A pessoa sente grande
falta de energia (astenia), tornando-se bastante deprimida,
ansiosa e agitada.
4.11 NICOTINA
4.11.1 Mecanismo de ação e intoxicação
A nicotina age como agonista nicotínico de receptores de
acetilcolina. Na intoxicação, podem ocorrer cefaleia, náuseas e
tontura.
4.11.2 Abstinência
Ocorrem humor disfórico ou deprimido, insônia, irritabilidade,
ansiedade, inquietação e dificuldade de concentração. Entre as
perturbações físicas, estão bradicardia e aumento do apetite e do
peso.
4.11.3 Tratamento
De acordo com a publicação Causas e prevenção: tabagismo, de
2018, do Instituto Nacional de Câncer (INCA), 428 pessoas
morrem por dia no Brasil em decorrência do tabagismo,
contabilizando 12,6% de todas as mortes registradas no país. Ao
todo, 156.216 mortes poderiam ser evitadas todos os anos, caso o
uso de tabaco fosse eliminado. O INCA ainda aponta que R$ 56,9
bilhões são perdidos a cada ano em função de despesas médicas
e perda de produtividade decorrentes do tabaco.
A avaliação global do paciente e do grau de dependência a
nicotina é fundamental para estabelecer um planejamento
terapêutico na cessação do tabagismo. A avaliação é feita pelo
questionário de tolerância de Fagerström, que também ajuda na
tomada de decisão sobre a conduta individualizada. Recomenda-
se o tratamento farmacológico a todo fumante acima de 18 anos,
com consumo maior do que 10 cigarros/dia, sendo essa uma
medida efetiva para a cessação do tabagismo.
Verifica-se o grau de interesse do paciente em parar de fumar, de
acordo com o modelo que o classifica em fases motivacionais
comportamentais:
▶ Pré-contemplativa: não quer parar de fumar;
▶ Contemplativa: pensa em parar de fumar;
▶ Ativa: preparado para iniciar tratamento;
▶ Manutenção e recaída: voltou a fumar.
Deve-se avaliar o grau de dependência à nicotina, saber sobre
experiência pregressa com fármacos para tabagismo e
considerar a presença de comorbidades. A prescrição deve
considerar todos esses aspectos acrescidos das
contraindicações, efeitos colaterais e precauções para o uso.
Para tratamento, segundo o Protocolo Clínico e Diretrizes
Terapêuticas — Dependência à Nicotina, podem ser usados:
▶ Adesivos de nicotina: 21 mg, 14 mg e 7 mg, em 24 horas, e 15
mg, 10 mg e 5 mg, em 16 horas. A dose deve ser prescrita
considerando-se o consumo médio de cigarros/dia, variando de
14 a 21 mg/d, com o objetivo de controlar os sintomas de
abstinência, podendo aumentar a dose a critério médico;
▶ Goma de nicotina ou pastilhas: 4 e 2 mg. Fumantes de 25
cigarros ou mais devem utilizar gomas ou pastilhas de 4 mg e
fumantes de menos de 25 cigarros/dia devem utilizar gomas de 2
mg. As gomas devem ser consumidas a cada 1 ou 2 horas ao
longo de 6 semanas, com redução progressiva do consumo até a
14ª semana;
▶ Bupropiona: comprimidos de 150 mg de cloridrato de
bupropiona de liberação prolongada. Iniciar com 150 mg, 1x/d, no
quarto dia prescrever 150 mg, 2x/d, usualmente por 12 semanas;
▶ Vareniclina: comprimidos de 0,5 e 1 mg de tartarato de
vareniclina. Iniciar com 0,5 mg, 1x/d. No quarto dia, prescrever 0,5
mg, 2x/d, no sétimo dia prescrever 1 mg, 2x/d, por 12 ou 24
semanas.
A terapia com bupropiona e vareniclina não requer cessação
imediata do tabagismo. Recomenda-se a interrupção deste a
partir do oitavo dia após o início desses medicamentos.
Embora não tenham aprovação do Food and Drug Administration
(FDA) para tratamento do tabagismo e provoquem muitos efeitos
colaterais, existe evidência científica de que a nortriptilina e a
clonidina sejam superiores ao placebo no tratamento do
tabagismo, podendo contribuir em situações em que os
medicamentos considerados de primeira linha não podem ser
utilizados.
Figura 4.1 - Questionário de tolerância de Fagerström

Fonte: adaptado de Diretrizes clínicas na saúde suplementar — Tabagismo, 2011.


Intoxicação e abstinência:
o que fazer?
Em todos os pacientes psiquiátricos, devemos
investigar a existência ou não de intoxicação e de
abstinência de substâncias psicoativas. A
sintomatologia auxilia no diagnóstico, que orienta o
tratamento específico para cada substância.

Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte


São duas etapas para a seleção da Santa Casa-BH. A primeira
conta com uma prova de múltipla escolha, com 75 questões. São
cerca de 15 questões para cada uma das áreas de conhecimento:
Cirurgia Geral, Clínica Médica, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia
e Medicina Preventiva e Social. Já na segunda etapa, você deverá
apresentar seu currículo para a análise da banca examinadora.
Na primeira etapa, considerando os anos anteriores, é possível
esperar questões sobre Oncologia, abdome agudo, trauma,
Cirurgia Geral, ASA, classificação de choque e cuidados no
perioperatório, com questões mais diretas e conceituais. Já na
área de Clínica Médica, Cardiologia, HIV e tuberculose são os
temas mais recorrentes.
Aposte também em Sistema Único de Saúde (SUS),
Epidemiologia, atenção primária e análise de métodos
diagnósticos, parto, climatério, incontinência urinária,
endometriose e fisiologia de gestação, modificações do
organismo materno, pré-natal, anticoncepção, e infecções
sexualmente transmissíveis. Não esqueça de estudar para
Pediatria, que apresenta questões mais extensas e detalhadas
sobre síndromes gastrintestinais e respiratórias, aleitamento,
imunizações, desenvolvimento fisiológico, e eventualmente,
doenças exantemáticas.
SANTA CASA-BH | 2020
Em relação aos efeitos adversos dos opioides no tratamento de
dor, assinale a alternativa incorreta.
a) a constipação intestinal é comum em qualquer dose de opioide,
e a tolerância a esse efeito colateral não se desenvolve ao longo
do tempo
b) neurotoxicidade induzida por opioides inclui mioclonia,
hiperalgesia, delírio e convulsões
c) náusea devido ao uso de opioides pode ocorrer com o início da
terapia
d) depressão respiratória é comum com o uso de opioides,
mesmo quando utilizados em baixas doses
Gabarito: d
Comentários:
a) A constipação é efeito colateral comum ao uso de opioides,
ocorrendo em 40 a 90% dos casos, e pode ocorrer após uma
única dose. A tolerância a náuseas e sedação podem ocorrer ao
longo do tempo, porém o mesmo não ocorre com a constipação.
b) Na hiperalgesia induzida por opioide, o efeito analgésico
diminui ao longo do tempo, e o paciente pode ter agravamento da
dor. A mioclonia e depressão do sistema nervoso central podem
ocorrer ao efeito anticolinérgico da medicação.
c) Náuseas e vômitos ocorrem em 10 a 40% dos pacientes. O
efeito costuma cessar em cinco a 10 dias do uso da medicação.
d) A depressão respiratória é evento pequeno — 0,002 a 1,2%. O
risco é aumentado em pacientes com apneia, obesidade mórbida
e Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC).
O que é psicose e quais as
principais características
da esquizofrenia?

5.1 DEFINIÇÃO
O termo “psicose” tem recebido, historicamente, diversas
definições diferentes, nenhuma com aceitação universal. A mais
estreita está restrita a delírios ou alucinações proeminentes, sem
crítica por parte do paciente. Ainda mais ampla é a definição que
igualmente inclui outros sintomas positivos da esquizofrenia,
como discurso desorganizado, comportamento amplamente
desorganizado ou catatônico.
De acordo com o glossário da American Psychiatric Association, o
termo “psicótico” refere-se a um amplo comprometimento do
teste da realidade.

#importante
Na psicose, é possível encontrar delírios,
alucinações e comportamento
desorganizado, podendo estar presentes
em várias condições ou patologias:
esquizofrenia, transtornos de humor
(mania ou depressão), intoxicação e
abstinência de substâncias químicas, uso
de medicamentos e delirium.

As definições dos transtornos a seguir são encontradas no


Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5)
e na Classificação Internacional de Doenças (CID-11).
▶ Esquizofrenia: trata-se de uma perturbação que dura, pelo
menos, seis meses e inclui, no mínimo, um mês de sintomas da
fase ativa; isto é, apresenta dois ou mais sinais, como delírios,
alucinações, discurso desorganizado, comportamento
amplamente desorganizado ou catatônico e sintomas negativos.
▶ Transtorno esquizofreniforme: caracteriza-se por quadro
sintomático equivalente ao da esquizofrenia, exceto por sua
duração — ou seja, a perturbação dura de um a seis meses — e
ausência da exigência de declínio no funcionamento.
▶ Transtorno esquizoafetivo: trata-se de uma perturbação em que
episódio de humor e sintomas da fase ativa da esquizofrenia
ocorrem juntos e foram precedidos ou seguidos por, pelo menos,
duas semanas de delírios ou alucinações sem sintomas
proeminentes de humor.
▶ Transtorno delirante: caracteriza-se por, pelo menos, um mês de
delírios não bizarros sem outros sintomas da fase ativa da
esquizofrenia.
▶ Transtorno psicótico breve: trata-se de uma perturbação
psicótica com duração maior que um dia e remissão em um mês.
▶ Transtorno psicótico compartilhado: trata-se de uma
perturbação que se desenvolve em indivíduo influenciado por
outra pessoa com delírio estabelecido de conteúdo similar.
▶ Transtorno psicótico devido a uma condição médica geral: os
sintomas psicóticos são considerados consequência fisiológica
direta de uma condição médica geral.
▶ Transtorno psicótico induzido por substância: os sintomas
psicóticos são considerados consequência fisiológica direta de
droga de abuso, medicamento ou exposição à toxina.
▶ Transtorno psicótico sem outra especificação: está incluído na
classificação de quadros psicóticos que não se encaixam nos
critérios dos transtornos psicóticos específicos mencionados
anteriormente, ou de sintomatologia psicótica acerca da qual
existem informações inadequadas ou contraditórias.
5.2 ESQUIZOFRENIA
5.2.1 Características gerais
Os transtornos esquizofrênicos caracterizam-se, em geral, por
distorções fundamentais de características do pensamento e da
percepção e por afetos inapropriados ou embotados.
Usualmente, mantêm-se claras a consciência e a capacidade
intelectual, embora certos déficits cognitivos possam evoluir no
curso do tempo.
A evolução dos transtornos esquizofrênicos pode ser contínua,
episódica com déficit progressivo ou estável, ou comportar um ou
vários episódios seguidos de remissão completa ou incompleta.
Não se deve fazer diagnóstico de esquizofrenia quando o quadro
clínico comporta sintomas depressivos ou maníacos no primeiro
plano, a menos que se possa estabelecer, sem equívoco, que a
ocorrência dos sintomas esquizofrênicos tenha sido anterior à
dos transtornos afetivos. Além disso, não se deve fazer o mesmo
diagnóstico quando se manifestam doença cerebral, abstinência
de droga ou intoxicação por ela. A esquizofrenia é uma doença
caracterizada por desorganização de diversos processos mentais.
Culturalmente, o esquizofrênico representa o estereótipo do
“louco”, um indivíduo que produz grande estranheza social em
razão do seu desprezo para com a realidade reconhecida.

#importante
Os transtornos esquizofrênicos não
podem ser diagnosticados durante
doença cerebral, abstinência,
intoxicações ou outros transtornos que
possam alterar o paciente.

5.2.2 Histórico
Em 1896, Emil Kraepelin cunhou o termo “dementia praecox”
para uma doença que tendia a começar relativamente cedo e
produzir prejuízo claro e persistente em aspectos das funções
cognitivas e comportamentais. No início, ele considerava a
doença com curso crônico e prognóstico ruim, porém, no
decorrer de sua vida profissional, acompanhou grande amostra
de pacientes e observou que 12,5% se recuperaram.
Em 1908, Eugen Bleuler modificou o termo para esquizofrenia (do
grego schizo, cindido/dividido; e phrén, mente), para ele, o sintoma
mais importante era a fragmentação na formulação e na
expressão do pensamento — o “afrouxamento de associações”.
Identificou os “As” bleulerianos: Associações (dissociações) no
processo do pensamento; Ambivalência; Autismo; Afeto
embotado; Avolição e Atenção prejudicadas. Kurt Schneider,
interessado em identificar sintomas patognomônicos, como
Bleuler, estabeleceu uma hierarquia de sintomas para o
diagnóstico da esquizofrenia, de acordo com sua importância.
Tais concepções influenciaram as classificações e os critérios
atuais, como o DSM-5 e a CID-11.
A hierarquia é dividida em sintomas de primeira e segunda ordem.
Os de primeira ordem não são obrigatórios para o diagnóstico de
esquizofrenia.
▶ Primeira ordem: percepção delirante, alucinações auditivas
(vozes que fazem comentários e/ou que dialogam entre si),
sonorização do pensamento, roubo do pensamento, vivências de
influência sobre o pensamento, difusão do pensamento e eco do
pensamento;
▶ Segunda ordem: intuição delirante, perplexidade, humor
depressivo ou exaltado e vivência de empobrecimento afetivo.
5.2.3 Prevalência
Cerca de 1% da população é acometida pela doença, geralmente
iniciada antes dos 25 anos, sem predileção por qualquer camada
sociocultural. O diagnóstico baseia-se, exclusivamente, na
história psiquiátrica e no exame do estado mental. É
extremamente raro o aparecimento de esquizofrenia antes dos 10
ou após os 50 anos, e parece não haver nenhuma diferença na
prevalência entre homens e mulheres.
5.2.4 Curso
A idade média de início do primeiro episódio psicótico de
esquizofrenia situa-se na primeira metade da casa dos 20 anos
para homens e no final da casa dos 20 para as mulheres. O início
pode ser abrupto ou insidioso, mas a maioria apresenta algum
tipo de fase prodrômica, manifestada pelo desenvolvimento lento
e gradual de uma variedade de sinais e sintomas — retraimento
social, perda do interesse pela escola ou pelo trabalho,
deterioração da higiene e dos cuidados pessoais, comportamento
incomum e ataques de raiva. Os membros da família podem
encontrar dificuldades para interpretar tal comportamento,
presumindo que a pessoa está “passando por uma fase”. Por fim,
o aparecimento de alguns sintomas da fase ativa marca a
perturbação como esquizofrenia.
A idade de início pode ter importância tanto fisiopatológica
quanto prognóstica. Os indivíduos com início precoce são, mais
frequentemente, do sexo masculino e têm ajustamento pré-
mórbido mais fraco, aquisição educacional inferior, mais
evidências de anormalidades estruturais do cérebro, sinais e
sintomas negativos mais proeminentes, mais evidências de
prejuízo cognitivo — avaliados com testes neuropsicológicos — e
pior prognóstico. Inversamente, os indivíduos com início mais
tardio são, com frequência, do sexo feminino, têm menos
evidências de anormalidades estruturais do cérebro ou prejuízo
cognitivo e apresentam melhor prognóstico.
A maioria dos estudos sobre curso e resultado da esquizofrenia
sugere que o desenvolvimento seja variável. Alguns indivíduos
apresentam exacerbações e remissões, enquanto outros
permanecem cronicamente doentes. A variabilidade na definição
e na determinação impossibilita a previsão acurada do resultado
da esquizofrenia em longo prazo. A remissão completa, isto é,
retorno ao pleno funcionamento pré-mórbido, provavelmente,
não é comum. Daqueles que continuam enfermos, alguns
parecem ter curso razoavelmente estável, ao passo que outros
apresentam piora progressiva associada à incapacitação severa.
Logo no início da doença, os sintomas negativos podem ser
proeminentes, aparecendo, primariamente, como aspectos
prodrômicos.
Posteriormente, surgem os sintomas positivos. Uma vez que são
particularmente suscetíveis ao tratamento, na maioria diminuem,
mas, em muitos indivíduos, os sintomas negativos persistem
entre os episódios de sintomas positivos. Há um grupo de fatores
associados a um melhor prognóstico: bom ajustamento pré-
mórbido, início agudo, idade mais tardia de aparecimento, eventos
estressores, perturbação do humor associada, breve duração dos
sintomas da fase ativa, bom funcionamento entre os episódios,
mínimos sintomas residuais, ausência de anormalidades na
estrutura cerebral, funcionamento neurológico normal, história
familiar de transtorno do humor e ausência de história familiar de
esquizofrenia.
5.2.5 Padrão genético
O DSM-5 aponta que existe forte contribuição dos fatores
genéticos na determinação do risco para esquizofrenia, embora a
maioria dos indivíduos com diagnóstico do transtorno não tenha
história familiar de psicose. Essa tendência é atribuída a um
espectro de alelos de risco, que são associados a outros
transtornos mentais, incluindo transtorno bipolar, depressão e
transtorno do espectro autista. Os parentes biológicos em
primeiro grau de indivíduos com esquizofrenia estão em risco 10
vezes maior para a doença do que a população geral.
As taxas de concordância para esquizofrenia são maiores em
gêmeos monozigóticos do que em gêmeos dizigóticos. Adoções
têm mostrado que os parentes biológicos de indivíduos com
esquizofrenia têm risco substancialmente aumentado para a
doença, enquanto os parentes adotivos não apresentam aumento
no risco. Embora muitas evidências sugiram a importância de
fatores genéticos na etiologia da esquizofrenia, a existência de
uma taxa substancial de discordância em gêmeos monozigóticos
também indica a importância de fatores ambientais.
5.2.6 Diagnóstico
Os sintomas característicos da esquizofrenia podem ser
agrupados, genericamente, em dois tipos: positivos e negativos.
Os positivos são os mais floridos e exuberantes; os negativos são,
em maior parte, os déficits, mostrados a seguir:
▶ Positivos:
▷▷ Alucinações: mais comuns auditivas e visuais e, menos
comuns, táteis e olfativas;
▷▷ Delírios: persecutórios, de grandeza, de ciúmes, somáticos,
místicos, fantásticos;
▷▷ Perturbações da forma e do curso do pensamento:
incoerência, prolixidade, desagregação;
▷▷ Comportamento desorganizado, bizarro;
▷▷ Agitação psicomotora;
▷▷ Negligência dos cuidados pessoais.
▶ Negativos:
▷▷ Pobreza do conteúdo do pensamento e da fala;
▷▷ Embotamento ou rigidez afetiva;
▷▷ Prejuízo do pragmatismo;
▷▷ Incapacidade de sentir emoções e sentir prazer;
▷▷ Isolamento social;
▷▷ Diminuição de iniciativa e da vontade.
Alguns sintomas, embora não sejam específicos da esquizofrenia,
são de grande valor para o diagnóstico, como os seguintes:
▶ Audição dos próprios pensamentos — sob a forma de vozes;
▶ Alucinações auditivas que comentam o comportamento do
paciente;
▶ Alucinações somáticas;
▶ Sensação de ter os próprios pensamentos controlados;
▶ Irradiação desses pensamentos;
▶ Sensação de ter as ações controladas e influenciadas por algo
exterior.
Os sintomas positivos da esquizofrenia são mais facilmente
revertidos com medicação, enquanto os negativos tendem a ser
mais refratários.
Habitualmente, o surgimento da esquizofrenia é notado quando a
família e os amigos observam que a pessoa mudou de
comportamento. Ela passa a ter mau rendimento em áreas
significativas da vida cotidiana, como na escola, no trabalho ou
nas relações sociais e familiares. Comumente, há notável falta de
interesse por cuidados pessoais.
São sentimentos experimentados pelos próprios pacientes:
▶ Perplexidade: no começo da doença, relatam sentimento de
estranheza sobre a experiência, alguma confusão sobre de onde
vêm os sintomas — normalmente, alucinações — e se perguntam
por que sua experiência diária tem mudado tanto;
▶ Isolamento: o esquizofrênico experimenta sensação intensa de
ser diferente dos demais e de estar separado de outras pessoas.
O isolamento social e a evitação de contatos tornam-se
evidentes;
▶ Ansiedade e medo: na maior parte, a experiência cotidiana é
invadida por sensação geral de mal-estar e ansiedade.
Evidenciam-se os períodos de terror intenso, causados por um
mundo dentro do qual tudo parece perigoso e incontrolável,
normalmente atribuído às origens externas e mágicas.
5.2.7 Critérios diagnósticos – DSM-5
5.2.7.1 Sintomas característicos

Dois ou mais dos seguintes, cada qual presente por uma porção
significativa de tempo durante o período de um mês, ou menos,
se tratados com sucesso:
▶ Delírios;
▶ Alucinações;
▶ Discurso desorganizado — frequente descarrilamento ou
incoerência;
▶ Comportamento amplamente desorganizado ou catatônico;
▶ Sintomas negativos, como embotamento afetivo, alogia ou
avolição.
Caso os delírios sejam bizarros ou as alucinações consistam em
vozes que comentam o comportamento ou os pensamentos da
pessoa, ou duas ou mais vozes conversando entre elas, apenas
um dos sintomas descritos é necessário para o diagnóstico de
esquizofrenia.
5.2.7.2 Disfunção social/ocupacional

Por uma porção significativa do tempo, desde o início da


perturbação, uma ou mais áreas importantes do funcionamento,
como trabalho, relações interpessoais ou cuidados pessoais,
estão acentuadamente abaixo do nível alcançado antes do início
— ou, quando o início se dá na infância ou na adolescência,
fracasso em atingir o nível esperado de aquisição interpessoal,
acadêmica ou ocupacional.
5.2.7.3 Duração

Sinais contínuos da perturbação persistem por, pelo menos, seis


meses, período que deve incluir, no mínimo, um mês de sintomas
ou menos, se tratados com sucesso, que satisfaçam os sintomas
da fase ativa, e podendo incluir períodos de sintomas
prodrômicos ou residuais. Durante esses períodos, os sinais da
perturbação podem ser manifestados apenas por sintomas
negativos ou por dois ou mais sintomas característicos presentes
de forma atenuada — crenças estranhas, experiências
perceptuais incomuns.
5.2.7.4 Exclusão de transtorno esquizoafetivo e transtorno do
humor

O transtorno esquizoafetivo e o transtorno do humor, com


aspectos psicóticos, são descartados quando nenhum episódio
depressivo maior, maníaco ou misto ocorre concomitantemente
aos sintomas da fase ativa; se os episódios de humor ocorreram
durante os sintomas da fase ativa ou se sua duração total foi
breve em relação à dos períodos ativo e residual.
5.2.7.5 Exclusão de substância e condição médica geral

Quando a perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos diretos


de uma substância — droga de abuso, medicamento — ou à
condição médica geral.
5.2.7.6 Relação com transtorno invasivo do desenvolvimento

Se há história de transtorno autista ou outro transtorno invasivo


do desenvolvimento, o diagnóstico adicional de esquizofrenia é
feito apenas se delírios ou alucinações proeminentes também
estão presentes por, pelo menos, um mês, ou menos, se tratados
com sucesso.
5.2.8 Achados laboratoriais
Não foram identificados achados laboratoriais diagnósticos de
esquizofrenia. Entretanto, uma variedade de achados
laboratoriais anormais foi encontrada em grupos de indivíduos
com esquizofrenia, em comparação com os controles.
Anormalidades estruturais do cérebro mais comuns incluem
aumento do sistema ventricular e sulcos proeminentes no córtex.
Diversas outras anormalidades também foram notadas com o uso
de técnicas de imagens mais apuradas — tamanhos temporal e
hipocampal diminuídos, aumento no tamanho dos gânglios basais,
diminuição do tamanho do cérebro. Técnicas de imagens
funcionais indicam que alguns indivíduos podem ter fluxo
sanguíneo cerebral ou utilização de glicose anormais em regiões
cerebrais específicas — córtex pré-frontal.
Avaliações neuropsicológicas podem mostrar ampla faixa de
disfunções — dificuldade para mudar o conjunto de respostas,
focalizar a atenção, formular conceitos abstratos. Achados
neurofisiológicos incluem lentidão nos tempos de reação,
anormalidades no acompanhamento visual ou prejuízos nas
comportas sensoriais.
Achados laboratoriais anormais podem, também, ser notados
como complicação da esquizofrenia ou do seu tratamento. Alguns
indivíduos bebem quantidades excessivas de líquidos —
“intoxicação hídrica” — e desenvolvem anormalidades na
densidade específica da urina ou desequilíbrios eletrolíticos.
Elevação da creatinofosfoquinase pode resultar da síndrome
neuroléptica maligna.
5.3 TRANSTORNO DELIRANTE
A característica essencial do transtorno delirante é a presença de
um ou mais delírios não bizarros que persistem por, pelo menos,
um mês. Exceto pelo impacto direto dos delírios, o funcionamento
psicossocial não é acentuadamente prejudicado, e o
comportamento não é de modo evidente estranho ou bizarro. Se
episódios de humor ocorrem concomitantemente com os delírios,
sua duração total é breve, comparada com a duração total dos
períodos delirantes. Os delírios não se devem aos efeitos
fisiológicos diretos de uma substância, como cocaína, ou
condição médica geral, como doença de Alzheimer ou lúpus
eritematoso sistêmico.
Embora seja importante determinar se os delírios são bizarros
para a distinção entre transtorno delirante e esquizofrenia, esse
caráter pode ser difícil de ser julgado, especialmente entre
diferentes culturas. Os delírios são considerados bizarros quando
claramente implausíveis, incompreensíveis e não extraídos de
experiências comuns da vida — a crença de um indivíduo de que
um estranho retirou seus órgãos internos e os substituiu pelos de
outra pessoa sem deixar quaisquer cicatrizes ou ferimentos. Em
comparação, os delírios não bizarros envolvem situações que
poderiam concebivelmente ocorrer — ser seguido, envenenado,
infectado, traído pelo cônjuge.
O funcionamento psicossocial é variável. Alguns indivíduos
podem parecer relativamente reservados em seus papéis
interpessoais e ocupacionais. Em outros, o prejuízo pode ser
substancial e incluir baixo ou nenhum funcionamento ocupacional
e isolamento social. Quando presente no transtorno delirante, um
fraco funcionamento psicossocial decorre diretamente das
próprias crenças delirantes. Por exemplo, um indivíduo
convencido de que será assassinado por criminosos pode
abandonar seu emprego e recusar-se a sair de casa. Esse
comportamento é uma tentativa compreensível de evitar ser
identificado e morto por seus supostos assassinos.
Em comparação, o fraco funcionamento na esquizofrenia pode
ser atribuído aos sintomas tanto positivos quanto negativos,
particularmente, avolição. De modo similar, uma característica
comum a indivíduos com transtorno delirante é a aparente
normalidade de seu comportamento e aparência quando suas
ideias delirantes não estão sendo questionadas ou postas em
prática.
Em geral, os funcionamentos social e conjugal estão mais
propensos a sofrer prejuízos do que os funcionamentos
intelectual e ocupacional.
5.3.1 Critérios diagnósticos – DSM-5
Os critérios diagnósticos são os seguintes:
▶ Delírios não bizarros, isto é, envolvendo situações que ocorrem
na realidade, como ser seguido, envenenado, infectado, amado a
distância, traído por cônjuge ou parceiro romântico ou ter uma
doença, com duração mínima de um mês;
▶ Os critérios para esquizofrenia jamais foram satisfeitos;
▶ Exceto pelo impacto do(s) delírio(s) ou de suas ramificações, o
funcionamento não está bastante prejudicado, e o
comportamento não é visivelmente esquisito ou bizarro;
▶ Se episódios de humor aconteceram durante os delírios, sua
duração total foi breve em relação à dos períodos delirantes;
▶ A perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de
uma substância — droga de abuso, medicamento — ou de
condição médica geral.
Alucinações táteis e olfativas podem estar presentes no
transtorno delirante, se relacionadas ao tema dos delírios.
5.3.2 Tipos
Os tipos seguintes são atribuídos com base no tema
predominante do(s) delírio(s):
▶ Erotomaníaco: delírios de que outra pessoa, geralmente de
situação mais elevada, está apaixonada pelo indivíduo;
▶ Grandioso: delírios de grande valor, poder, conhecimento,
identidade ou de relação especial com uma divindade ou pessoa
famosa;
▶ Ciumento: delírios de que o parceiro sexual é infiel;
▶ Persecutório: delírios de que o indivíduo, ou alguém próximo a
ele, está sendo, de algum modo, maldosamente tratado;
▶ Somático: delírios de que tem algum defeito físico ou condição
médica geral;
▶ Misto: delírios característicos de mais de um dos tipos
anteriores, sem predomínio de nenhum deles;
▶ Não especificado.

5.4 TRANSTORNO PSICÓTICO BREVE


A característica essencial do transtorno psicótico breve é uma
perturbação que envolve o início súbito de, pelo menos, um dos
sintomas psicóticos positivos.
Um episódio de perturbação dura, no mínimo, um dia e, no
máximo, um mês, e o doente tem pleno retorno ao nível pré-
mórbido de funcionamento.
A perturbação não é mais bem explicada pela definição de
transtorno do humor com aspectos psicóticos ou transtorno
esquizoafetivo ou esquizofrenia, nem é atribuída aos efeitos
fisiológicos diretos de uma substância — alucinógeno — ou
condição médica geral — hematoma subdural.
5.4.1 Critérios diagnósticos – DSM-5
Presença de um ou mais dos seguintes sintomas:
▶ Delírios;
▶ Alucinações;
▶ Discurso desorganizado — descarrilamento ou incoerência
frequentes;
▶ Comportamento amplamente desorganizado ou catatônico.
Não incluir sintoma que seja padrão de resposta culturalmente
sancionado no diagnóstico de transtorno psicótico breve.
5.4.2 Especificação
▶ Com estressor(es) acentuado(s) – psicose reativa breve: se os
sintomas ocorrem logo após e aparentemente em resposta a
eventos que, em particular ou em conjunto, seriam estressantes
demais para qualquer pessoa em circunstâncias similares na
cultura do indivíduo;
▶ Sem estressor(es) acentuado(s): se os sintomas psicóticos não
ocorrem logo após ou aparentemente não consistem em
respostas a eventos que, em particular ou em conjunto, seriam
estressantes demais para qualquer pessoa em circunstâncias
similares na cultura do indivíduo;
▶ Com início no pós-parto: se o início ocorre em quatro semanas
pós-parto.
5.5 TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS
PSICÓTICOS
O tratamento consiste no uso de antipsicóticos em monoterapia
ou associação, psicoterapia e internação, se necessário.

O que é psicose e quais as


principais características
da esquizofrenia?
Psicose é a quebra de contato com a realidade, com o
paciente apresentando sintomas como delírios
(alteração do pensamento), alucinações (alteração de
um dos cinco sentidos) e comportamento
desorganizado. A psicose pode estar presente em
várias condições ou patologias: esquizofrenia,
transtornos de humor (mania ou depressão),
intoxicação e abstinência de substâncias químicas, uso
de medicamentos e delirium.
A esquizofrenia é uma patologia diagnosticada quando
dois ou mais dos seguintes sintomas ocorrem durante o
período de um mês: delírios, alucinações,
desorganização do discurso, comportamento
desorganizado ou catatônico e sintomas negativos —
embotamento afetivo, alogia e avolição. Sinais
contínuos da perturbação persistem por, pelo menos,
seis meses, período que deve incluir, no mínimo, um
mês de sintomas, ou menos, se tratados com sucesso,
que satisfaçam os sintomas da fase ativa, podendo
incluir períodos de sintomas prodrômicos ou residuais.

Associação Médica do Rio Grande do Sul - Processo


Seletivo Unificado
O processo seletivo da AMRIGS-PSU é uma avaliação com
questões mais diretas e objetivas de múltipla escolha, que
abordam casos clínicos, o uso de imagens, achados de exames,
hipóteses diagnósticas e questionamento de tratamentos.
Há temas mais recorrentes e que merecem atenção. Em Clínica
Médica são cobradas: Psiquiatria — psicofarmacologia e outros
tratamentos em Psiquiatria; Infectologia — tipos de infecções;
Cardiologia — temas relacionados a hipertensão arterial
sistêmica. Cirurgia Geral tem foco em hérnias de parede
abdominal, abdome agudo, tratamento cirúrgico da obesidade e
cirurgia metabólica.
Em Ginecologia, preste atenção em anticoncepção, HPV e
neoplasias intraepiteliais cervicais, patologias neoplásicas e
câncer de endométrio. Em Pediatria são relevantes Neonatologia,
aleitamento materno e desenvolvimento. Por fim, Saúde Coletiva
cobra estudos epidemiológicos, Medicina de Família e
Comunidade e análise de métodos diagnósticos.
AMRIGS-PSU | 2021
Usuários com doenças psiquiátricas crônicas e refratárias
deveriam ser direcionados, para acompanhamento, aos Centros
de Atenção Psicossocial (CAPS), reservando os demais casos
para os níveis de Atenção Primária e Secundária. Muitos desses
usuários dos CAPS apresentam diagnóstico de Esquizofrenia.
Dentre os psicofármacos listados a seguir, assinale o mais eficaz
para pacientes com esse diagnóstico e que não responderam aos
fármacos habituais.
a) haloperidol
b) clorpromazina
c) quetiapina
d) clozapina
Gabarito: d
Comentários:
a) Veja o comentário geral na alternativa correta.
b) Veja o comentário geral na alternativa correta.
c) Veja o comentário geral na alternativa correta.
d) A clozapina é um antipsicótico de segunda geração com maior
eficácia nos quadros psicóticos, como a esquizofrenia. Entretanto,
apresenta efeitos colaterais importantes, entre eles o risco de
agranulocitose, que requer monitoramento com hemogramas
semanais por pelo menos 18 semanas e, após, hemogramas
mensais enquanto durar o uso da clozapina. Por conta desses
efeitos, é um psicofármaco que está restrito ao uso após
refratariedade aos antipsicóticos habituais, sendo o fármaco de
escolha na esquizofrenia refratária.
Como diagnosticar um
transtorno de humor?

6.1 TRANSTORNO DEPRESSIVO


A depressão é uma doença “do organismo inteiro”, que
compromete o físico, o humor e, em consequência, o
pensamento. Ela altera a maneira como o indivíduo vê o mundo e
sente a realidade, entende as coisas, manifesta emoções, sente a
disposição e o prazer com a vida, além de afetar a forma como se
alimenta e dorme, como se sente em relação a si mesmo e como
pensa sobre as coisas.
A depressão, de modo geral, resulta em uma inibição global da
pessoa, afeta a parte psíquica e as funções mais nobres da mente
humana, como a memória, o raciocínio, a criatividade, a vontade, o
amor, o sexo e a parte física. Tudo parece difícil, problemático e
cansativo para o deprimido.
A pessoa deprimida não tem ânimo para os prazeres nem para
quase nada na vida; pouco adiantam os conselhos para que
passeie, encontre pessoas diferentes, frequente grupos
religiosos ou pratique atividades. Ela sabe e tem consciência das
coisas boas da vida, sabe que tudo poderia ser bem pior, pode até
saber que os motivos do seu estado sentimental não são tão
importantes; entretanto, apesar de não desejar estar muito
deprimida, continua dessa forma.
Segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), de
2017, a prevalência da depressão no Brasil já é a segunda maior
carga de incapacidade, sendo o maior índice na América Latina.
São mais de 11 milhões de brasileiros diagnosticados com a
doença, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde
(PNS). A prevalência registrada é maior entre as mulheres (10,9%)
do que nos homens (3,9%).
A doença é, essencialmente, um transtorno episódico e
recorrente. Cada episódio depressivo dura, em geral, alguns
meses, seguido de um período normal. Em cerca de 20% dos
casos, porém, a depressão segue um curso crônico e sem
remissão, ou seja, é contínua, especialmente quando não há
tratamento adequado disponível.
A taxa de recorrência para aqueles que se recuperam do primeiro
episódio fica em torno de 35% dentro de dois anos, e cerca de
60% dentro de 12 anos. A taxa de recaídas é mais alta nas
pessoas com mais de 45 anos.
Um dos resultados particularmente trágicos desse distúrbio é o
suicídio, que continua a ser um dos resultados frequentes — cerca
de 15 a 20% dos pacientes depressivos o cometem — e evitáveis
da depressão.
Os sintomas da depressão são muito variados, desde as
sensações de tristeza, passando pelos pensamentos negativos,
até as alterações da sensação corpórea, como dores e enjoos.
6.2 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
6.2.1 Depressão maior
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais (DSM-5), é um quadro de sintomas intensos, em que,
necessariamente, devem ocorrer pelo menos cinco dos sintomas
a seguir, sendo que, obrigatoriamente, o sintoma 1 ou 2 devem
estar presentes, com quadro que dura, no mínimo, duas semanas:
▶ Sintoma 1: anedonia;
▶ Sintoma 2: humor polarizado para depressão;
▶ Sintoma 3: hiperfagia ou perda de apetite;
▶ Sintoma 4: insônia ou hipersônia;
▶ Sintoma 5: agitação ou lentificação psicomotora;
▶ Sintoma 6: fadiga ou perda de energia;
▶ Sintoma 7: sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou
inadequada;
▶ Sintoma 8: capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se;
▶ Sintoma 9: pensamentos de morte recorrentes, ideação suicida,
tentativa de suicídio.
O número e a gravidade dos sintomas permitem determinar
quatro graus de um episódio depressivo, segundo a Classificação
Internacional de Doenças (CID-11):
▶ Leve: o paciente sofre com a presença dos sintomas, mas,
provavelmente, será capaz de desempenhar a maior parte das
suas atividades sociais e ocupacionais;
▶ Moderado: em geral, estão presentes quatro ou mais dos
sintomas citados, e o paciente, aparentemente, tem muita
dificuldade para continuar a desempenhar as atividades de rotina;
▶ Grave sem sintomas psicóticos: vários dos sintomas estão
presentes, tipicamente a perda da autoestima e ideias de desvalia
ou culpa. As ideias e os atos suicidas são comuns, e observa-se,
de modo habitual, uma série de sintomas físicos;
▶ Grave com sintomas psicóticos: acompanhada de alucinações,
ideias delirantes, lentidão psicomotora ou estupor de gravidade,
tal que todas as atividades sociais e ocupacionais se tornam
impossíveis de serem realizadas. Pode existir o risco de morrer
por suicídio, desidratação ou desnutrição.
6.2.2 Depressão atípica
Ocorrem sintomas menos comuns, como ansiedade, hiperfagia,
hipersônia e irritabilidade.
Figura 6.1 - Grupos da depressão atípica

Fonte: elaborado pelo autor.


Quando os sintomas são de natureza física, aparecem em
qualquer órgão ou sistema. Quando psíquicos, manifestam-se por
meio de determinadas emoções que equivalem aos sentimentos
depressivos, embora tenham outro aspecto.
Diz-se “predominantemente” porque haverá predomínio de
sintomas físicos ou psíquicos em cada caso, mas a mesma pessoa
pode apresentar tanto sintomas físicos como psíquicos ao
mesmo tempo. É o que acontece com mais frequência, ou seja, a
pessoa, além da ansiedade, da fobia ou do pânico (sintomas
psíquicos), apresenta, ainda, palpitação, sudorese,
formigamentos, tontura, hipertensão e taquicardia (sintomas
físicos) etc.
Há também a depressão reativa a alguma situação vivencial
traumática e a depressão secundária a uma condição orgânica,
como tumores e hipotireoidismo.
6.2.3 Distimia
O traço essencial da distimia é o estado depressivo leve e
prolongado. Pelos critérios diagnósticos do DSM-5, são
necessários dois anos de período contínuo predominantemente
depressivo para os adultos e um ano para as crianças; para elas, o
humor pode ser irritável em vez de depressivo. Outros sintomas
que acompanham são:
▶ Insônia ou hipersônia;
▶ Alta de energia ou fadiga;
▶ Baixa da autoestima;
▶ Dificuldade de concentrar-se ou tomar decisões;
▶ Sentimento de falta de esperança;
▶ Descontrole do apetite.

#importante
Na presença de quadros depressivos
prolongados, acima de dois anos, sem
comprometimento no trabalho e na vida
social, deve-se suspeitar de distimia.

6.2.4 Estados de humor no período pós-parto


Há três formas de depressão no pós-parto, uma mais leve e mais
comum, chamada pelos americanos de “blues postpartum” — a
disforia —, outra chamada de depressão pós-parto, e a psicose
puerperal.
O blues é uma condição benigna que se inicia nos primeiros dias
após o parto, mais precisamente de dois a cinco dias, dura de
alguns dias a poucas semanas, é de intensidade leve, autolimitada
e cede espontaneamente. Caracteriza-se, basicamente, pelo
sentimento de tristeza e o choro fácil, que não impedem a
realização das tarefas de mãe. Aproximadamente metade das
mulheres é acometida pelo blues no pós-parto.
Os sintomas dessa síndrome iniciam-se logo nos primeiros dias
do pós-parto, diminuindo por volta do 15º dia, e se resolvem
pouco depois. Uma das características do diagnóstico é que seus
sintomas característicos não são considerados suficientes para
causar sérios danos ao desempenho da mulher, o que é diferente
da depressão pós-parto.
Em algumas mulheres, no entanto, o transtorno inicialmente tido
como blues persiste, e evolui para um quadro mais grave de
depressão pós-parto.
Em algumas mulheres, no entanto, o transtorno inicialmente tido
como blues persiste, e evolui para um quadro mais grave de
depressão pós-parto.
A depressão pós-parto é uma depressão propriamente dita, que
recebe tal classificação sempre que iniciada nas seis primeiras
semanas após o parto, segundo a CID-11. Sua manifestação
clínica é igual à das depressões, ou seja, é prolongada e
incapacitante, e requer o uso de antidepressivos. Seu principal
problema reside no uso das medicações. Recomenda-se o uso de
paroxetina ou sertralina, que não prejudicam a criança na
amamentação.
A psicose puerperal acomete menos de 1% dos casos, com início
de até duas a três semanas após o parto. Inicia-se com sintomas
depressivos, que rapidamente progridem para delírios,
alucinações e agitação psicomotora.
O quadro dura de seis a 12 semanas, e o tratamento consiste em
separar a mãe da criança, e em usar neurolépticos. Ocorrem
infanticídios em 2% dos casos e suicídio em 1%.
6.2.5 Disforia
A disforia caracteriza-se pela mudança repentina e transitória do
estado de ânimo, com sentimento de tristeza, pena e angústia. É
um mal-estar psíquico, acompanhado por sentimentos
depressivos, tristeza, melancolia e pessimismo.
6.2.6 Depressão secundária a patologias clínicas ou
medicamentos
Um quadro depressivo pode ser secundário a uma patologia
orgânica, que pode ser sistêmica ou, principalmente, cerebral.
Hipotireoidismo, lúpus eritematoso sistêmico, doença de
Parkinson, acidentes vasculares cerebrais próximos ao lobo
frontal e dependência de álcool são exemplos de patologias que
cursam com frequência com quadro depressivo.
Algumas medicações também podem causar sintomas
depressivos, as mais comuns estão no Quadro 6.1.
Quadro 6.1 - Medicações que podem causar depressão

O tratamento da depressão secundária à patologia clínica e ao


uso de medicamentos é semelhante ao tratamento da depressão
comum, somando-se ao antidepressivo o tratamento da doença
clínica ou a substituição da medicação que causa os sintomas,
quando possível.
6.2.7 Tratamento dos estados depressivos
O tratamento é realizado com antidepressivos e psicoterapia.
Deve-se avaliar a necessidade de internação, caso seja
identificado o risco de suicídio.
6.3 TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR
A alternância de estados depressivos com maníacos caracteriza
tal distúrbio. Muitas vezes, o diagnóstico correto só é feito depois
de muitos anos. Uma pessoa com depressão e que, 10 anos
depois, tenha um episódio maníaco, apresenta, na verdade, o
transtorno bipolar; no entanto, seu diagnóstico só poderia ser
possível com o surgimento da fase maníaca.
A depressão no transtorno bipolar é igual à depressão comum,
mas uma pessoa deprimida com transtorno bipolar não recebe o
mesmo tratamento do paciente unipolar.
Tal transtorno geralmente se inicia em torno dos 20 a 30 anos,
mas pode começar mesmo após os 70 anos. O início pode ser
tanto pela fase depressiva como pela fase maníaca,
gradualmente ao longo de semanas, meses ou abruptamente em
poucos dias, já com sintomas psicóticos, o que, muitas vezes,
causa a confusão com síndromes psicóticas puras. Além dos
quadros depressivos e maníacos, há também os quadros mistos
— sintomas depressivos simultâneos aos maníacos —, muitas
vezes confundindo os médicos e retardando o diagnóstico da
fase em atividade.
Figura 6.2 - Tipos de transtorno afetivo bipolar
Fonte: elaborado pelo autor.

6.3.1 Fase maníaca


O estado de humor está elevado, há alegria contagiante ou
irritação agressiva. É acompanhada de elevação da autoestima e
de sentimentos de grandiosidade, podendo chegar à
manifestação delirante de grandeza, considerando-se uma
pessoa dotada de poderes especiais. Há aumento da atividade
motora com grande vigor físico e, apesar disso, com diminuição
da necessidade de sono e dificuldade de ficar parado e de
concentrar-se nas tarefas. Nessa fase, o paciente literalmente “ri
da própria desgraça”.
Inicialmente, quando os sintomas ainda não se aprofundaram, o
paciente sente-se como se fosse ou pudesse ser uma grande
personalidade; com o aprofundamento do quadro, tal ideia torna-
se uma convicção delirante.
O senso de perigo fica comprometido, e o indivíduo envolve-se
em atividades que apresentam risco tanto para integridade física
como patrimonial. O comportamento sexual torna-se
excessivamente desinibido, mesmo promíscuo, com numerosos
parceiros em um curto espaço de tempo.
Os pensamentos são incontroláveis para o próprio paciente; para
as outras pessoas, a grande confusão de ideias, na verdade, diz
respeito à interrupção de temas para que se iniciem outros, os
quais, por sua vez, também não são concluídos, e assim por
diante. Essa aceleração do pensamento, com consequente perda
da lógica, denomina-se fuga de ideias.
Pelo DSM-5, um episódio de mania é caracterizado por período
distinto de humor anormal e persistentemente elevado,
expansivo ou irritável e aumento anormal e persistente da
atividade dirigida a objetivos ou da energia, com duração mínima
de uma semana e presente na maior parte do dia, quase todos os
dias — ou qualquer duração, se a hospitalização se fizer
necessária. Durante o período de perturbação do humor e
aumento da energia ou atividade, três (ou mais) dos sintomas que
serão descritos a seguir (quatro, se o humor é apenas irritável)
estão presentes em grau significativo e representam mudança
notável do comportamento habitual.
Principais características da fase maníaca e hipomaníaca (DSM-
5):
▶ Diminuição do sono;
▶ Hiperatividade;
▶ Aceleração do pensamento;
▶ Ideias de grandiosidade;
▶ Sintomas psicóticos;
▶ Pressão de discurso;
▶ Aumento da autoestima.

6.3.2 Fase hipomaníaca


Pelo DSM-5, é caracterizada por um período distinto de humor
anormal e persistentemente elevado, expansivo ou irritável e
aumento anormal e persistente da atividade ou energia, com
duração mínima de quatro dias consecutivos e presente na maior
parte do dia, quase todos os dias. Também são necessários três
ou mais dos sintomas listados na fase maníaca, porém, o episódio
não é suficientemente grave a ponto de causar prejuízo
acentuado no funcionamento social ou profissional, ou para
necessitar de hospitalização.
Existindo características psicóticas, por definição, o episódio é
maníaco.
6.3.3 Ciclotimia
Flutuação crônica — dois ou mais anos — do humor, com vários
períodos com sintomas hipomaníacos que não satisfaçam os
critérios para episódio hipomaníaco e diversos outros períodos
com sintomas depressivos que não satisfaçam os critérios para
episódio depressivo maior. Os sintomas não são suficientes e
duradouros para que se considere transtorno afetivo bipolar, e a
pessoa permanece dessa maneira a maior parte do tempo.
6.3.4 Tratamento
O tratamento é realizado com estabilizadores de humor. Na
presença de agitação e psicose, deve-se associar um
antipsicótico. Podem ser necessárias internação e contenção
física para preservar o paciente.

Como diagnosticar um
transtorno de humor?
O diagnóstico de um transtorno de humor é clínico,
baseado na psicopatologia observada no exame
psíquico e no histórico da patologia do paciente. Não se
deve esquecer que alterações de humor podem ser
secundárias a patologias clínicas ou ao uso de
medicamentos ou substâncias psicoativas.
Associação Médica do Rio Grande do Sul - Processo
Seletivo Unificado
O processo seletivo da AMRIGS-PSU é uma avaliação com
questões mais diretas e objetivas de múltipla escolha, que
abordam casos clínicos, o uso de imagens, achados de exames,
hipóteses diagnósticas e questionamento de tratamentos.
Há temas mais recorrentes e que merecem atenção. Em Clínica
Médica são cobradas: Psiquiatria — psicofarmacologia e outros
tratamentos em Psiquiatria; Infectologia — tipos de infecções;
Cardiologia — temas relacionados a hipertensão arterial
sistêmica. Cirurgia Geral tem foco em hérnias de parede
abdominal, abdome agudo, tratamento cirúrgico da obesidade e
cirurgia metabólica.
Em Ginecologia, preste atenção em anticoncepção, HPV e
neoplasias intraepiteliais cervicais, patologias neoplásicas e
câncer de endométrio. Em Pediatria são relevantes Neonatologia,
aleitamento materno e desenvolvimento. Por fim, Saúde Coletiva
cobra estudos epidemiológicos, Medicina de Família e
Comunidade e análise de métodos diagnósticos.
AMRIGS-PSU | 2021
Pacientes com esse transtorno se caracterizam por ter um
distúrbio do humor crônico e flutuante, com muitos períodos de
hipomania e de depressão menor. Apresentam dificuldades
conjugais devido à natureza imprevisível de suas mudanças de
humor e a irritabilidade acentuada. Também é comum, nesses
pacientes, o abuso de álcool e outras substâncias. Assinale o
diagnóstico que corretamente se relaciona com a descrição
sintomatológica apresentada.
a) transtorno distímico
b) transtorno ciclotímico
c) transtorno de humor bipolar tipo I
d) transtorno de humor bipolar tipo II
Gabarito: b
Comentários:
a) No transtorno distímico, atualmente chamado de transtorno
depressivo maior persistente, há a presença de sintomas
depressivos durante dois anos, sem a presença de sintomas de
hipomania.
b) O transtorno ciclotímico é caracterizado por períodos de
sintomas hipomaníacos e sintomas depressivos por um período
de dois anos, mas que não satisfazem os critérios para depressão
maior ou hipomania.
c) Para o diagnóstico de transtorno bipolar tipo I, é necessária a
presença de pelo menos um episódio maníaco. Episódios de
depressão maior também estão presentes.
d) Para o transtorno bipolar tipo II, é necessário períodos de
hipomania e os episódios de depressão são episódios de
depressão maior.
Como diagnosticar e
diferenciar os transtornos
de ansiedade?

7.1 INTRODUÇÃO
A ansiedade é o grande sintoma de características psicológicas
que mostra a intersecção entre o físico e o psíquico, uma vez que
tem claros sintomas físicos, como taquicardia, sudorese,
tremores, tensão muscular, aumento das secreções, aumento da
motilidade intestinal e cefaleia. Trata-se de um sinal de alerta, que
adverte sobre perigos iminentes e capacita o indivíduo a tomar
medidas para enfrentar ameaças. O medo é a resposta a uma
ameaça conhecida, definida; a ansiedade é uma resposta a uma
ameaça desconhecida, vaga.
A ansiedade prepara o indivíduo para lidar com situações
potencialmente danosas ou qualquer ameaça à unidade ou
integridade pessoal, tanto física como moral. Dessa forma, ela
prepara o organismo para tomar as medidas necessárias para
impedir a concretização desses possíveis prejuízos. Portanto, é
uma reação natural e necessária para a autopreservação. Não se
trata de um estado normal, mas de uma reação. As reações de
ansiedade normais não precisam ser tratadas porque são naturais
e autolimitadas. Os estados de ansiedade anormais, que
constituem síndromes de ansiedade, são patológicos e requerem
tratamento específico.
Figura 7.1 - Níveis de ansiedade

Fonte: elaborado pelo autor.

7.2 TRANSTORNO DE PÂNICO


O transtorno de pânico caracteriza-se por crises súbitas e
imprevisíveis de elevada ansiedade e medo, com taquicardia,
sudorese, tontura, dor no peito, falta de ar e sensação de morte
ou de perda de controle. Para definir o transtorno, devem ocorrer
vários ataques de pânico em um período de, pelo menos, um mês,
sem que haja circunstâncias com perigo objetivo.
As crises de ansiedade no pânico duram aproximadamente 10
minutos e costumam ser inesperadas, ou seja, não seguem
situações especiais, como na fobia simples ou na fobia social,
podendo surpreender o paciente em ocasiões variadas. Todavia,
alguns desenvolvem o episódio de pânico diante de determinadas
situações pré-conhecidas, como ao dirigir automóveis, diante de
grande multidão ou dentro de transportes públicos. Nesse caso,
dizemos que o transtorno de pânico é acompanhado de
agorafobia. Na presença desta, o transtorno é duas vezes mais
prevalente entre mulheres.
São sintomas mais frequentes do transtorno de pânico, segundo
o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-
5):
▶ Palpitações ou ritmo cardíaco acelerado;
▶ Sudorese;
▶ Tremores;
▶ Sensações de falta de ar ou sufocamento;
▶ Dor ou desconforto no peito;
▶ Náusea ou desconforto abdominal;
▶ Sensação de tontura, instabilidade ou desmaio;
▶ Desrealização — sensações de irrealidade — ou
despersonalização — estar distanciado de si mesmo;
▶ Medo de perder o controle ou enlouquecer;
▶ Medo de morrer;
▶ Parestesias — anestesia ou sensações de formigamento,
especialmente nos membros inferiores ou nos superiores;
▶ Calafrios ou ondas de calor.
Segundo o DSM-5, a estimativa de prevalência de 12 meses para
o transtorno de pânico nos Estados Unidos e em vários países
europeus é de 2 a 3% em adultos e adolescentes, o que significa
uma prevalência alta, sendo ainda mais alta quando os critérios
para diagnóstico não são inteiramente preenchidos, ou melhor, se
forem consideradas as crises parciais e os quadros de ataques de
ansiedade atípicos.
O transtorno de pânico, em geral, inicia-se depois dos 20 anos,
sendo igualmente prevalente entre homens e mulheres. Portanto,
em sua maioria, as pessoas acometidas de pânico são jovens ou
adultos jovens e estão na plenitude da vida profissional.
O tratamento deve ser realizado com antidepressivos,
preferencialmente inibidores seletivos da recaptação da
serotonina, em dose mais baixa do que a utilizada em casos de
depressão. No início do tratamento, pode ser associado um
benzodiazepínico de ação rápida ou intermediária, como
lorazepam ou alprazolam, para melhora mais rápida das crises.
Paralelamente à medicação, deve-se indicar psicoterapia, em
especial da linha cognitivo-comportamental, que focaliza a
redução dos sintomas e a parada das crises.
7.3 TRANSTORNO DE ANSIEDADE
GENERALIZADA
Segundo critérios do DSM-5, o transtorno de ansiedade
generalizada é caracterizado por preocupação ou ansiedade
excessivas, com motivos injustificáveis ou desproporcionais. Para
o seu diagnóstico, é preciso que outros transtornos de ansiedade,
como pânico e fobia social, tenham sido descartados. É
necessário também que essa ansiedade excessiva dure mais de
seis meses continuamente e que seja diferenciada da ansiedade
normal ou da causada por alguma doença física ou substância.
São sintomas presentes no transtorno de ansiedade generalizada,
segundo o DSM-5:
▶ Dificuldade para relaxar ou sensação de que está a ponto de
“estourar”, no limite do nervosismo;
▶ Cansaço com facilidade;
▶ Dificuldade de concentração e frequentes esquecimentos;
▶ Irritabilidade;
▶ Tensão muscular;
▶ Dificuldade para dormir ou sono insatisfatório.
Por fim, um critério presente em todos os transtornos mentais é o
prejuízo no funcionamento pessoal ou marcante sofrimento.
Ainda segundo o DSM-5, as mulheres são duas vezes mais
acometidas pela ansiedade generalizada do que os homens. A
prevalência desse transtorno na população é relativamente alta,
em torno de 3% da população geral, sendo também o tipo mais
frequente do grupo dos transtornos de ansiedade. Nos períodos
naturais de estresse, os sintomas tendem a piorar. As mulheres
abaixo de 20 anos são as mais acometidas, podendo, contudo, ter
início na infância ou em idades mais avançadas — apesar da idade
avançada diminuir as chances do surgimento de transtornos de
ansiedade.
O tratamento é realizado com antidepressivos e/ou
benzodiazepínicos de ação prolongada (diazepam), acompanhado
de psicoterapia.

#importante
A ansiedade ocorre em picos de poucos
minutos no pânico e em platô de
semanas no transtorno de ansiedade
generalizada.
7.4 TRANSTORNO OBSESSIVO-
COMPULSIVO
O transtorno obsessivo-compulsivo consiste na combinação de
obsessões e compulsões. Segundo o DSM-5, obsessões são
pensamentos recorrentes e insistentes, caracterizados por serem
desagradáveis, repulsivos, contrários à índole do paciente e
incontroláveis. Como o paciente perde o controle sobre os
pensamentos, muitas vezes passa a praticar atos que, por serem
repetitivos, tornam-se rituais. Esses atos objetivam prevenir ou
aliviar a tensão causada pelos pensamentos; assim, as
compulsões podem ser secundárias às obsessões. As
compulsões são gestos, rituais ou ações sempre repetitivas e
incontroláveis. Um paciente que tenta evitá-las acaba submetido
a uma tensão muito grande, por isso sempre cede. Não ocorre
perda do juízo, e o indivíduo sempre percebe o absurdo ou o
exagero do que se está passando; no entanto, como não sabe o
que acontece, teme estar enlouquecendo e, pelo menos no
começo, tenta esconder seus pensamentos e rituais. No
transtorno obsessivo-compulsivo, os dois tipos de sintomas
quase sempre estão juntos, mas pode haver a predominância de
um em relação ao outro.
Tal transtorno apresenta dois picos de incidência. O primeiro, na
infância, e o segundo, em torno dos 30 anos. A incidência é
aproximadamente a mesma entre homens e mulheres, com
pequenas diferenças de um estudo para outro. Entre as crianças,
observa-se o aparecimento um pouco mais comum nos meninos.
O tratamento é realizado com antidepressivos. No início, podem-
se utilizar benzodiazepínicos para o alívio rápido dos sintomas.
Destaca-se a importância da psicoterapia, em especial da linha
cognitivo-comportamental.
7.4.1 Sintomas obsessivos mais comuns
▶ Sentir medo de contaminar-se por germes;
▶ Imaginar que tenha ferido ou ofendido outras pessoas;
▶ Imaginar-se perdendo o controle, realizando violentas
agressões;
▶ Ter pensamentos sexuais urgentes e intrusivos;
▶ Ter dúvidas morais e religiosas;
▶ Ter pensamentos proibidos.

7.4.2 Sintomas compulsivos mais comuns


▶ Lavar-se para se descontaminar;
▶ Repetir determinados gestos;
▶ Verificar se as coisas estão como deveriam, como porta
trancada, gás desligado;
▶ Conferir objetos;
▶ Contar objetos;
▶ Ordenar ou arrumar objetos;
▶ Rezar.

7.5 FOBIA SOCIAL


Segundo critérios do DSM-5, a fobia social é a intensa ansiedade
gerada quando o desempenho do paciente é submetido à
avaliação de outras pessoas. Tal ansiedade, ainda que
generalizada, concentra-se sobre tarefas ou circunstâncias bem
definidas. É comum sentir-se acanhado quando se é observado, o
que é, até certo ponto, normal e aceitável. Passa-se a considerar
tal vergonha ou timidez como patológicas quando a pessoa
começa a sofrer algum prejuízo pessoal por causa dela, como
deixar de concluir um curso ou uma faculdade devido a uma
apresentação pública ou por não conseguir se expressar diante
de um avaliador.
Observam-se, entre os fóbicos, tremores, sudorese, sensação de
“bolo na garganta”, dificuldade para falar, mal-estar abdominal,
diarreia, tonturas, falta de ar e vontade de sair o quanto antes do
local onde está.
A preocupação por antecipação desperta a ansiedade
antecipatória, fazendo com que o paciente, vários dias antes de
uma apresentação, sofra ao imaginar-se na situação.
As situações que geram maior desconforto aos pacientes,
geralmente, são:
▶ Escrever ou assinar em público;
▶ Falar em público;
▶ Dirigir ou estacionar um carro enquanto é observado;
▶ Cantar ou tocar um instrumento musical;
▶ Comer ou beber em público;
▶ Ser fotografado ou filmado;
▶ Usar sanitários públicos (mais para homens).
As pessoas mais afetadas pela fobia social são os homens, ao
contrário da maioria dos transtornos de ansiedade, que
predomina entre as mulheres. A idade média de início do
transtorno de ansiedade social nos Estados Unidos, segundo o
DSM-5, é 13 anos, e 75% dos indivíduos têm idade de início entre
8 e 15 anos. O transtorno inicia-se com história infantil de inibição
social ou timidez. O início na idade adulta é relativamente raro e é
mais provável ocorrer após um evento estressante ou humilhante
ou após mudanças na vida que exigem novos papéis sociais — por
exemplo, casar-se com alguém de uma classe social diferente,
receber uma promoção no trabalho. Entre as pessoas que buscam
atendimento clínico, o transtorno tende a ser particularmente
persistente.
O tratamento medicamentoso é feito com os benzodiazepínicos
ou os antidepressivos inibidores da recaptação da serotonina, que
permitem recuperação entre 70 e 90%. É pouco provável
melhora de 100%, embora algumas pessoas atinjam percentuais
bem próximos a esse.

#importante
Todos os transtornos têm em comum o
prejuízo social gerado por eles.

7.6 TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-


TRAUMÁTICO
O transtorno de estresse pós-traumático, segundo o DSM-5,
pode ser entendido como a perturbação psíquica decorrente e
relacionada a um evento ameaçador ao paciente, ou sendo este
apenas testemunha de uma tragédia. Consiste em um tipo de
recordação de revivescência, em que, além de recordar as
imagens, o paciente sente como se vivesse novamente a tragédia
com todo o sofrimento que ela causou. Para o diagnóstico, é
essencial que a pessoa tenha experimentado ou testemunhado
um evento traumatizante ou gravemente ameaçador; separação
conjugal, repetência e demissão do emprego não são
considerados eventos ameaçadores. É necessário também que
ela tenha apresentado uma resposta marcante de medo,
desesperança ou horror imediatamente após o evento. Após isso,
pode passar a ter recordações vivas, intrusivas (involuntárias e
abruptas), incluindo a lembrança do que pensou, sentiu ou
percebeu enquanto vivia o trauma. Podem ocorrer pesadelos
baseados no tema, e as situações que lembram o evento causam
intenso sofrimento e são evitadas. O tratamento mais efetivo é a
psicoterapia, embora antidepressivos também possam beneficiar
o paciente.
7.7 SÍNDROME DE BURNOUT
A síndrome foi incluída na nova Classificação Internacional de
Doenças (CID-11) como um “fenômeno ligado ao trabalho”. O
conceito é de uma síndrome resultante do estresse crônico no
local de trabalho que não foi gerenciado satisfatoriamente. É
caracterizada por três aspectos principais que ocorrem no
contexto profissional:
▶ Sentimentos de exaustão ou esgotamento de energia;
▶ Aumento do distanciamento mental do próprio trabalho, ou
sentimentos de negativismo ou cinismo relacionados ao próprio
trabalho;
▶ Redução do desempenho profissional.
7.8 TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS DE
ANSIEDADE
O tratamento de todos os transtornos ansiosos é realizado com
antidepressivos e benzodiazepínicos — estes, por curto período,
para alívio imediato das crises. A terapia da linha cognitivo-
comportamental auxilia bastante no tratamento.

Como diagnosticar e
diferenciar os transtornos
de ansiedade?
Os estados de ansiedade anormais, que constituem
síndromes de ansiedade, são patológicos e requerem
tratamento específico. O diagnóstico dos diferentes
tipos de transtornos é baseado no quadro clínico. É
importante saber diferenciar os tipos de transtornos:
▶ Síndrome do pânico: crises imprevisíveis com
sintomas físicos intensos e de curta duração;
▶ Transtorno de ansiedade generalizada: ansiedade
elevada, na maior parte do tempo, com sintomas físicos,
por pelo menos seis meses;
▶ Transtorno obsessivo-compulsivo: misto de sintomas
obsessivos e compulsivos, estes agindo como
neutralizadores dos primeiros;
▶ Fobia social: ansiedade elevada quando em avaliação
de outras pessoas;
▶ Transtorno de estresse pós-traumático: decorrente de
situação ameaçadora de forte intensidade;
▶ Síndrome de burnout: síndrome resultante de estresse
crônico relacionada ao trabalho.

Associação Médica do Rio Grande do Sul - Processo


Seletivo Unificado
O processo seletivo da AMRIGS-PSU é uma avaliação com
questões mais diretas e objetivas de múltipla escolha, que
abordam casos clínicos, o uso de imagens, achados de exames,
hipóteses diagnósticas e questionamento de tratamentos.
Há temas mais recorrentes e que merecem atenção. Em Clínica
Médica são cobradas: Psiquiatria — psicofarmacologia e outros
tratamentos em Psiquiatria; Infectologia — tipos de infecções;
Cardiologia — temas relacionados a hipertensão arterial
sistêmica. Cirurgia Geral tem foco em hérnias de parede
abdominal, abdome agudo, tratamento cirúrgico da obesidade e
cirurgia metabólica.
Em Ginecologia, preste atenção em anticoncepção, HPV e
neoplasias intraepiteliais cervicais, patologias neoplásicas e
câncer de endométrio. Em Pediatria são relevantes Neonatologia,
aleitamento materno e desenvolvimento. Por fim, Saúde Coletiva
cobra estudos epidemiológicos, Medicina de Família e
Comunidade e análise de métodos diagnósticos.
AMRIGS-PSU | 2021
Um jovem de 21 anos vem à consulta com queixas vagas e
inespecíficas. Ao longo do atendimento, ele lhe conta que está
com muito receio de apresentar o seu Trabalho de Conclusão de
Curso (TCC) e que está pensando, inclusive, em desistir de fazê-lo,
tal o grau incapacitante de ansiedade que sente. Você, então,
decide prescrever propranolol para essa fobia de desempenho.
Assinale, dos efeitos adversos a seguir, aquele que NÃO se
relaciona com esse medicamento.
a) broncoespasmo
b) impotência
c) constipação
d) fadiga
Gabarito: c
Comentários:
a) Veja o comentário geral na alternativa correta.
b) Veja o comentário geral na alternativa correta.
c) Entre todos os efeitos colaterais listados, a constipação é o
único que não está associado ao uso do propranolol. A
constipação costuma ser observada em fármacos com ação
anticolinérgica importante, como antidepressivos tricíclicos,
antipsicóticos de segunda geração, entre outros.
d) Veja o comentário geral na alternativa correta.
Como diferenciar
corretamente os
transtornos alimentares?

8.1 ANOREXIA NERVOSA


A anorexia nervosa é um distúrbio alimentar no qual o indivíduo se
furta à manutenção do peso corpóreo em um nível mínimo normal
adequado para a idade e altura, restringindo a ingesta calórica em
relação às necessidades. Peso significativamente baixo é definido
como um peso inferior ao peso mínimo normal ou, no caso de
crianças e adolescentes, menor do que o minimamente esperado.
Há medo intenso de ganhar peso ou tornar-se “gordo”, mesmo
com o peso abaixo do normal. Além disso, há perturbação no
modo de vivenciar o peso ou a forma do corpo, influência indevida
do peso ou da forma do corpo sobre a autoavaliação, ou negação
do baixo peso corpóreo atual.
Nas mulheres pós-menarca, ocorre amenorreia, isto é, a ausência
de pelo menos três ciclos menstruais consecutivos. Considera-se
que uma mulher tem amenorreia caso sua menstruação ocorra
apenas depois da administração de hormônio estrogênico.
8.1.1 Tipos
Figura 8.1 - Tipos de anorexia nervosa
Fonte: elaborado pelo autor.

A anorexia nervosa raramente se inicia antes da puberdade, mas


há indícios de que a gravidade das perturbações mentais
associadas pode ser maior entre os pacientes mais jovens que
desenvolvem a doença. Entretanto, também há dados que
sugerem que, quando a doença se inicia durante os primeiros
anos da adolescência, entre 13 e 18 anos, pode estar associada a
melhor prognóstico. Mais de 90% dos casos de anorexia nervosa
ocorrem em mulheres.
Um hábito comum entre os anoréxicos consiste na obsessão por
guardar/estocar comida.

#importante
Nos distúrbios de anorexia nervosa, é
marcante a perda de peso ou a
manutenção de um peso abaixo do
normal, ao contrário da bulimia, em que
os pacientes costumam ganhar peso ou
apresentar sobrepeso.

8.1.2 Gravidade
A gravidade do transtorno é baseada no Índice de Massa
Corpórea (IMC). Os intervalos a seguir são derivados das
categorias da Organização Mundial da Saúde para baixo peso em
adultos; para crianças e adolescentes, deve-se utilizar os
percentis do IMC correspondentes à faixa etária.
O nível de gravidade pode ser aumentado de maneira a refletir
sintomas clínicos, o grau de incapacidade funcional e a
necessidade de supervisão.
▶ Leve: IMC maior ou igual a 17 kg/m2;

▶ Moderada: IMC 16 a 16,99 kg/m2;

▶ Grave: IMC 15 a 15,99 kg/m2;

▶ Extrema: IMC menor que 15 kg/m2.

8.1.3 Tratamento
Dependendo das condições clínicas, muitas vezes é necessário
proceder à internação para o restabelecimento da sua saúde em
ambiente hospitalar, como no caso de IMC abaixo de 15 ou
ideação suicida. Em caso de regime de hospitalização, procede-se
à correção hidroeletrolítica, à dieta hipercalórica — mesmo contra
a vontade do paciente —, à correção de possíveis alterações
metabólicas e ao início do tratamento psiquiátrico.
A psicofarmacoterapia é indispensável, normalmente feita com
antidepressivos tricíclicos que tenham como efeito colateral o
estímulo do apetite e o ganho de peso — caso da maprotilina,
amitriptilina ou clomipramina. Na necessidade de sedação, o que
quase sempre acontece, recomenda-se que seja feita com
neurolépticos e, preferencialmente, com aqueles que também
aumentam o apetite — caso da levomepromazina.
Devem estar associados psicoterapia e acompanhamento
nutricional. Mesmo após a melhora, é importante saber que as
recaídas são frequentes. No caso da internação, a taxa de recidiva
imediata é superior a 25%. Portanto, o acompanhamento desses
pacientes deve ser feito durante anos.
8.2 BULIMIA NERVOSA
A bulimia nervosa é um transtorno alimentar caracterizado por
episódios recorrentes de compulsão periódica, que possuem os
seguintes aspectos:
▶ Ingestão, em um período limitado de tempo (2 horas), de uma
quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria
das pessoas consumiria durante um período similar e sob
circunstâncias similares (binges);
▶ Sentimento de falta de controle sobre o comportamento
alimentar durante o episódio: sentimento de incapacidade de
parar de comer ou de controlar o que ou quanto está comendo;
▶ Comportamento compensatório inadequado e recorrente, com
o fim de prevenir aumento de peso, como autoindução de vômito,
uso indevido de laxantes, diuréticos, enemas ou outros
medicamentos, jejuns ou exercícios excessivos (vigorexia):
▷▷ A compulsão alimentar e os comportamentos compensatórios
inapropriados ocorrem, em média, no mínimo uma vez por
semana durante três meses. A autoavaliação é indevidamente
influenciada pela forma e pelo peso do corpo;
▷▷ O distúrbio não ocorre exclusivamente durante episódios de
anorexia nervosa.
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais (DSM-5), a prevalência de 12 meses de bulimia nervosa
entre jovens do sexo feminino é de 1 a 1,5%. A maioria dos
pacientes com bulimia nervosa é do sexo feminino, na proporção
de 9:1. O início dos sintomas vai dos últimos anos da adolescência
até os 40 anos, com média de início por volta dos 20 anos.
Algumas profissões, em particular, parecem apresentar maior
risco, como as de jóqueis, atletas, manequins e pessoas ligadas à
moda em geral. Aspectos socioculturais são importantes, na
medida em que a doença parece também mais comum em
classes econômicas mais elevadas.
8.2.1 Tratamento
Quando necessária, a internação acontece por complicações
associadas, como depressão com risco de suicídio, perda de peso
acentuada com comprometimento do estado geral,
hipopotassemia seguida de arritmia cardíaca e casos de
comportamento impulsivo — abuso de álcool, drogas,
automutilação, cleptomania e promiscuidade sexual.
Os antidepressivos têm demonstrado maior eficácia na
diminuição dos episódios bulímicos e são indicados os tricíclicos
ou inibidores seletivos de recaptação da serotonina, como a
fluoxetina e a fluvoxamina, mesmo na ausência de depressão
coexistente. Devem estar associados psicoterapia e
acompanhamento nutricional.

#importante
Na bulimia, geralmente há sobrepeso,
uma vez que vômitos e diarreia não
contribuem para a perda de peso.

8.3 TRANSTORNO ALIMENTAR


RESTRITIVO/EVITATIVO
A principal característica diagnóstica do transtorno alimentar
restritivo/evitativo é a esquiva ou a restrição da ingestão
alimentar (critério A), manifestada por fracasso clinicamente
significativo em satisfazer as demandas de nutrição ou pela
ingestão energética insuficiente por meio da ingestão oral de
alimentos. Um ou mais dos seguintes aspectos-chave devem
estar presentes: perda de peso e deficiência nutricional
significativas, ou impacto relacionado à saúde; dependência de
alimentação enteral ou de suplementos nutricionais orais;
interferência marcante no funcionamento psicossocial. A
determinação da perda de peso e deficiência nutricional é um
julgamento clínico.
O transtorno é mais comum na fase de lactente ou na primeira
infância e pode persistir na idade adulta. Da mesma maneira, a
evitação baseada em características sensoriais dos alimentos
tende a surgir na primeira década de vida, mas pode persistir na
idade adulta. Em vez de perder peso, crianças e adolescentes que
não concluíram o crescimento não atingem os aumentos de peso
e altura esperados em sua trajetória do desenvolvimento.
8.4 TRANSTORNO DE COMPULSÃO
ALIMENTAR
Segundo o DSM-5, o transtorno é caracterizado por episódios
recorrentes de compulsão alimentar, associados a três (ou mais)
dos critérios apresentados a seguir:
▶ Comer muito e mais rapidamente do que o normal;
▶ Comer até sentir-se incomodamente repleto;
▶ Comer grandes quantidades de alimento, quando não está
fisicamente faminto;
▶ Comer sozinho por embaraço, devido à quantidade de alimentos
que consome;
▶ Sentir repulsa pelo ato, apresentar depressão ou demasiada
culpa após comer excessivamente.
Ocorre, ainda, acentuada angústia relativa à compulsão alimentar,
e há inexistência de comportamentos compensatórios
inadequados — por exemplo, purgação, jejuns e exercícios
excessivos. Os episódios de compulsão alimentar ocorrem, em
média, ao menos uma vez por semana durante três meses.
A compulsão não acontece durante o curso de anorexia nervosa
ou bulimia nervosa.
O tratamento é multiprofissional, com nutricionista, psicólogo e
psiquiatra. Podem ser utilizados antidepressivos, como a
fluoxetina, para melhora da impulsividade (compulsão) alimentar.
Como diferenciar
corretamente os
transtornos alimentares?
Os transtornos alimentares devem ser diagnosticados e
diferenciados pelas suas características clínicas e
alterações físicas e comportamentais. Na anorexia
nervosa, há IMC baixo, restrição alimentar, distorção da
imagem corporal e alterações como amenorreia. Na
bulimia nervosa, o IMC tende a ser mais alto, ocorrem os
binges e comportamentos purgativos compensatórios.
O transtorno restritivo/evitativo caracteriza-se por
baixo peso e restrição alimentar, sem distorção da
imagem corporal, sendo comum em crianças. A
compulsão alimentar diferencia-se da bulimia nervosa
pela ausência de mecanismos compensatórios para
perda de peso.
Hospital Israelita Albert Einstein
O processo seletivo do HIAE é dividido em duas fases. Na
primeira, há uma prova teórica, enquanto na segunda, é realizada
a prova prática, a entrevista individual e a análise do currículo do
candidato por um profissional designado pela coordenação de
cada um dos programas.
Para a primeira etapa, estude o conteúdo para as especialidades
de Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e
Obstetrícia e Medicina Preventiva e Social. Você deverá
responder 50 questões de múltipla escolha, com caráter mais
direto. Cada questão apresenta cinco opções de alternativas
cada, com apenas uma resposta correta.
Alguns dos temas mais recorrentes são: trauma abdominal e
torácico, atendimento inicial ao politraumatizado, Cirurgia
Vascular, doenças inflamatórias intestinais, doenças
cardiometabólicas, pneumologia, Neurologia, Psiquiatria,
principalmente intoxicações medicamentosas, distúrbios
hidroeletrolíticos, cefaleias, insuficiência cardíaca congestiva,
diabetes mellitus e hipertensão arterial sistêmica e taquiarritmia
Também estude com atenção imunização, infecção das vias
aéreas superiores, síndromes gastrintestinais e desidratação na
infância, asma, reanimação neonatal, puericultura, distúrbios
acidobásicos, parto, anticoncepção, câncer de colo de útero,
prematuridade, assistência pré-natal, doenças benignas da
mama, Sistema Único de Saúde (SUS), análise de métodos
diagnósticos, vigilância epidemiológica e prevenção.
Já a prova prática terá três estações e estará baseada em casos
clínicos. Nas estações, o candidato poderá interagir com atores
atuando como pacientes, profissionais de saúde ou simuladores.
É importante destacar que você será cobrado pelas suas
habilidades de trabalhar em equipe e comunicar-se, sua ética e
empatia, além dos conteúdos teóricos.
HIAE | 2020
Pagofagia é tratada habitualmente com:
a) folato
b) ferro
c) cobalamina
d) sertralina
e) eritropoetina
Gabarito: b
Comentários:
a) Veja o comentário geral na alternativa correta.
b) Pagofagia é uma necessidade obsessiva em consumir gelo,
sendo por isso uma variante da pica, que é a compulsão por
comer substâncias não nutritivas. Pica está normalmente
associada a deficiência de ferro.
c) Veja o comentário geral na alternativa correta.
d) Veja o comentário geral na alternativa correta.
e) Veja o comentário geral na alternativa correta.
O que são transtornos de
personalidade e como
diferenciá-los?

9.1 INTRODUÇÃO
Indivíduos com distúrbios de personalidade estão entre os
usuários mais assíduos dos serviços de emergência,
representando, para o médico, casos bastante complexos,
confusos e que consomem muito tempo e energia.
O correto diagnóstico e a abordagem desse tipo de paciente são
fundamentais para que o seu comportamento não influencie a
avaliação e a conduta objetiva do caso.
Definição e sintomas do transtorno de personalidade:
▶ Definição: de acordo com a Classificação Internacional de
Doenças (CID-11), esse agrupamento compreende diversos
estados e tipos de comportamento clinicamente significativos
que tendem a persistir e são a expressão característica da
maneira de viver do indivíduo e de seu modo de estabelecer
relações consigo próprio e com os outros. Alguns desses estados
e tipos de comportamento aparecem precocemente durante o
desenvolvimento individual, enquanto outros são adquiridos mais
tardiamente durante a vida. Eles representam desvios extremos
ou significativos das percepções, dos pensamentos, das
sensações e sobretudo das relações com os outros em
comparação àquelas de um indivíduo médio de dada cultura. Tais
tipos de comportamento são, em geral, estáveis e englobam
múltiplos domínios da conduta e do funcionamento psicológico.
Com frequência, são associados a sofrimento subjetivo e a
comprometimento de intensidade variável do desempenho social;
▶ Sintomas: iniciam-se na adolescência e continuam por toda a
vida adulta, podendo ser atenuados na velhice. Em graus variados,
o distúrbio influencia todas as facetas da personalidade, incluindo
cognição, humor, comportamento e relacionamento interpessoal.
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5), diferentemente da CID-11, os transtornos da
personalidade estão reunidos em três grupos, com base em
semelhanças descritivas. O grupo A inclui os transtornos da
personalidade paranoide, esquizoide e esquizotípica. Indivíduos
com esses transtornos frequentemente parecem esquisitos ou
excêntricos.
O grupo B inclui os transtornos da personalidade antissocial,
borderline, histriônica e narcisista. Indivíduos com esses
transtornos costumam parecer dramáticos, emotivos ou
erráticos. O grupo C inclui os transtornos da personalidade
evitativa, dependente e obsessivo-compulsiva. Indivíduos com
esses transtornos com frequência parecem ansiosos ou
medrosos.
Deve-se observar que esse sistema de agrupamento, embora seja
útil em algumas pesquisas, apresenta sérias limitações e não foi
consistentemente validado. É também bastante frequente que
pessoas apresentem diagnóstico ou características de mais de
um transtorno de personalidade.
Estimativas de prevalência para os diferentes grupos no DSM-5
sugerem 5,7% para os transtornos do grupo A, 1,5% para os do
grupo B e 6% para os do grupo C, com 9,1% para qualquer
transtorno da personalidade, indicando concomitância frequente
de transtornos de grupos diferentes.
Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related
Conditions, de 2001/2002, sugerem que cerca de 15% dos
adultos dos Estados Unidos apresentam pelo menos um
transtorno da personalidade.
9.2 DEFINIÇÃO
O distúrbio de personalidade resulta de interações complexas
entre constituição pessoal, temperamento, experiências
pessoais, relacionamento familiar e oportunidades de aquisição
de modelos comportamentais — fatores constitucionais e
ambientais.
Figura 9.1 - Características dos distúrbios de personalidade primário e secundário
Fonte: elaborado pelo autor.

São condições médicas mais comuns que podem causar


alteração na personalidade:
▶ Epilepsia;
▶ Doenças endócrinas;
▶ Doenças cerebrovasculares;
▶ AIDS;
▶ Traumatismos cranianos;
▶ Tumores cerebrais;
▶ Esclerose múltipla;
▶ Doença de Huntington;
▶ Envenenamento por metais pesados, como manganês e
mercúrio;
▶ Neurossífilis.

9.3 TIPOS DE TRANSTORNOS


Segundo o DSM-5, os transtornos são caracterizados por:
▶ Grupo A: caracterizado por parecer estranho ou excêntrico.
Contempla os seguintes transtornos de personalidade e suas
características distintivas:
▷▷ Paranoide: pessoas com alto grau de desconfiança e suspeita
sobre os outros. Podem apresentar medo de perseguição e/ou de
serem enganadas;
▷▷ Esquizoide: costumam apresentar alto grau de desinteresse
em outras pessoas e embotamento social. Geralmente vivem
solitários, sem vínculos;
▷▷ Esquizotípico: pessoas com comportamentos e pensamentos
excêntricos ou bizarros.
▶ Grupo B: caracterizado por parecer dramático, emocional ou
errático. Contempla os seguintes transtornos de personalidade e
suas características distintivas:
▷▷ Antissocial: irresponsabilidade social, desrespeito por outros,
falsidade e manipulação dos outros para ganho pessoal. Possuem
frieza afetiva e não estabelecem vínculos duradouros;
▷▷ Borderline: alta instabilidade emocional, com intolerância a
abandonos e críticas e mudanças de atitude súbitas e de forma
impulsiva. Tendência a automutilação, abuso de substâncias
psicoativas e suicídio pela impulsividade;
▷▷ Histriônico: possuem necessidade de buscar atenção, teatrais
e emotivos;
▷▷ Narcisista: costumam apresentar autoestima frágil e
desregulada, apesar de aparentarem grandiosidade sobre a
própria imagem.
▶ Grupo C: caracterizado por parecer ansioso ou apreensivo.
Contempla os seguintes transtornos de personalidade e suas
características distintivas:
▷▷ Esquivo: costumam evitar contato interpessoal por causa de
sensibilidade à rejeição;
▷▷ Dependente: constante submissão e necessidade de ser
cuidado, dificuldade para tomar decisões;
▷▷ Obsessivo-compulsivo: costumam ser pessoas rígidas,
perfeccionistas e obstinadas, que apresentam pensamentos ou
comportamentos repetitivos que causam prejuízo às suas
atividades diárias.
9.4 TRATAMENTO
9.4.1 Psicoterápico
O tratamento psicoterápico deve sempre ser indicado e
incentivado. Independentemente do tipo de psicoterapia
(psicodinâmica, de suporte ou cognitivo-comportamental), é o
tratamento que mais beneficia o paciente, melhorando seu
comportamento em médio e longo prazos.
9.4.2 Medicamentoso
O tratamento medicamentoso é reservado para emergências e
comorbidades com doenças psiquiátricas — ansiedade,
transtornos de humor e psicoses.

O que são transtornos de


personalidade e como
diferenciá-los?
Transtornos de personalidade são diagnosticados pela
curva de vida do paciente. São evidenciados por
comportamentos disfuncionais, que tendem a persistir
e são a expressão característica da maneira de viver do
indivíduo e de seu modo de estabelecer relações
consigo próprio e com os outros. A diferença entre os
diversos transtornos está em suas características
clínicas, e o paciente pode inclusive ter traços de dois
ou mais transtornos.
Associação Médica do Rio Grande do Sul - Processo
Seletivo Unificado
O processo seletivo da AMRIGS-PSU é uma avaliação com
questões mais diretas e objetivas de múltipla escolha, que
abordam casos clínicos, o uso de imagens, achados de exames,
hipóteses diagnósticas e questionamento de tratamentos.
Há temas mais recorrentes e que merecem atenção. Em Clínica
Médica são cobradas: Psiquiatria — psicofarmacologia e outros
tratamentos em Psiquiatria; Infectologia — tipos de infecções;
Cardiologia — temas relacionados a hipertensão arterial
sistêmica. Cirurgia Geral tem foco em hérnias de parede
abdominal, abdome agudo, tratamento cirúrgico da obesidade e
cirurgia metabólica.
Em Ginecologia, preste atenção em anticoncepção, HPV e
neoplasias intraepiteliais cervicais, patologias neoplásicas e
câncer de endométrio. Em Pediatria são relevantes Neonatologia,
aleitamento materno e desenvolvimento. Por fim, Saúde Coletiva
cobra estudos epidemiológicos, Medicina de Família e
Comunidade e análise de métodos diagnósticos.
AMRIGS-PSU | 2021
Os Transtornos de Personalidade (TP) são comuns e crônicos e
ocorrem em 10 a 20% da população geral. Pessoas com TP
apresentam uma propensão muito maior a recusar auxílio
psiquiátrico e negam seus problemas. Dentre os TP, um se
caracteriza por usar a aparência física para atrair a atenção para
si, apresentar um padrão difuso de emocionalidade, buscar a
atenção em excesso, possuir um estilo de discurso que é
excessivamente impressionista e carente de detalhes e
considerar as pessoas mais íntimas do que na realidade o são.
Assinale a seguir a qual Transtorno de Personalidade se refere
essa descrição.
a) narcisista
b) esquizoide
c) histriônica
d) limítrofe (borderline)
Gabarito: c
Comentários:
a) O transtorno de personalidade narcisista é caracterizado pela
necessidade de admiração, grandiosidade e falta de empatia,
fazendo parte dos transtornos do cluster B.
b) O transtorno de personalidade esquizoide é um transtorno do
cluster A, caracterizado pela dificuldade de interações sociais,
isolamento e dificuldades de comunicação.
c) O transtorno de personalidade histriônica é caracterizado por
esse padrão de necessitar chamar atenção a partir da aparência,
com discursos impressionistas e exuberantes, com forte
componente sedutor e por vezes sexual.
d) O transtorno de personalidade borderline é caracterizado pela
expressão emocional em excesso, com medo do abandono,
sentimentos de vazio e automutilações.
Como diferenciar os
transtornos somatoforme,
dissociativo e factício?

10.1 TRANSTORNOS SOMATOFORMES


A característica principal dos transtornos somatoformes é a
presença de sintomas físicos, que sugerem alguma doença
orgânica ou física e não são produzidos intencionalmente.
Ocorrem associados à busca persistente de assistência médica.
Apesar de os médicos nada encontrarem de anormal, as queixas
persistem e, quando há alguma alteração orgânica, esta
normalmente não justifica a queixa.
Porém, para que haja diagnóstico de transtorno somatoforme,
deve haver, junto às queixas, algum sofrimento ou prejuízo no
funcionamento social ou ocupacional.
A diferença entre os transtornos somatoformes e as doenças
psicossomáticas está no fato de estas últimas apresentarem,
além da queixa, de fato, alguma alteração orgânica constatável
clinicamente.
A importância clínica dos transtornos somatoformes é totalmente
determinada pela sua enorme prevalência, portanto, pela
assiduidade com que os pacientes se utilizam dos sistemas de
saúde.
10.1.1 Transtorno de somatização
O transtorno de somatização é o mais comum, cuja característica
principal é a elaboração de múltiplas queixas somáticas, que são
recorrentes e clinicamente significativas, resultando em algum
tratamento médico.
No transtorno de somatização, normalmente, há história de dor
incaracterística e de difícil explicação médica que acomete,
sobretudo, a cabeça, as costas, as articulações, as extremidades e
o tórax, ou história de comprometimento nas funções de órgãos,
como em relação às menstruações, ao intercurso sexual, à
digestão ou ao funcionamento intestinal.
As queixas levam a frequentes exames médicos, radiográficos,
tomográficos e mesmo a cirurgias exploratórias desnecessárias.
Como os portadores do transtorno de somatização são
previamente histeriformes, em geral, descrevem suas queixas em
termos dramáticos, eloquentes e excessivos ou, curiosamente, ao
contrário, ou seja, completamente indiferentes à sugerida
gravidade do problema.
Frequentemente, ocorre longo histórico de hospitalizações e
extensa trajetória médica, muitas vezes em busca de tratamento
com vários médicos ao mesmo tempo. Para o diagnóstico, deve
haver, pelo menos, dois anos de sintomas múltiplos, sem
explicação clínica, recusa pelo paciente de que não há explicação
física para os sintomas e prejuízo em seu funcionamento social e
familiar.
O transtorno é mais comum em mulheres e inicia-se na idade
adulta, após os 30 anos. A dependência e abuso de sedativos e
analgésicos é bastante frequente.
10.2 TRANSTORNOS DISSOCIATIVOS
(CONVERSIVOS)
Segundo a CID-11, os transtornos dissociativos, ou de conversão,
caracterizam-se por perda parcial ou completa das funções
normais de integração da memória, da consciência, da identidade
e das sensações imediatas, e do controle dos movimentos
corpóreos. Os diferentes tipos de transtornos dissociativos
tendem a desaparecer após algumas semanas ou meses, em
particular quando a ocorrência se associa a acontecimento
traumático. A evolução pode igualmente acontecer para
transtornos mais crônicos, particularmente paralisias e
anestesias, quando o transtorno está ligado a problemas ou
dificuldades interpessoais insolúveis.
No passado, esses transtornos eram classificados, entre diversos
tipos, como “histeria de conversão”. Admite-se que sejam
psicogênicos, uma vez que ocorrem em relação temporal estreita
com eventos traumáticos, problemas insolúveis e insuportáveis,
ou relações interpessoais difíceis. Os sintomas revelam
frequentemente a ideia que o sujeito faz de uma doença física.
O exame médico e os exames complementares não permitem
colocar em evidência um transtorno físico — em particular
neurológico — conhecido. Os sintomas podem ocorrer em relação
temporal estreita com estresse psicológico, aparecendo e
desaparecendo frequente e bruscamente.
Convém atentar-se à produção dos sintomas, se é consciente ou
inconsciente e se há ganho secundário, para fazer o correto
diagnóstico dos transtornos.
10.2.1 Amnésia psicogênica ou dissociativa
Define-se amnésia psicogênica ou dissociativa uma súbita
incapacidade para lembrar informações pessoais importantes e
anteriormente armazenadas na memória. Trata-se de algo muito
mais profundo que um esquecimento simples e, para que se
possa dar esse diagnóstico, ele deve ocorrer na ausência de outro
transtorno cerebral concomitante, como traumatismos cranianos
e estados pós-convulsivos. A amnésia psicogênica pode seguir-se
a acidentes catastróficos, como guerra, acidentes aéreos ou fatos
vivenciais traumáticos ou moralmente muito condenáveis, como
assaltos e estupros. Há incapacidade de recordar informações
pessoais importantes, em geral de natureza traumática ou
estressante, demasiadamente extensa e delimitada para ser
explicada pelo esquecimento normal.
10.2.2 Fuga psicogênica
Nesse tipo de alteração, o distúrbio predominante consiste em
afastamento súbito e inesperado de casa ou do local de trabalho
e a incapacidade de recordar seu passado, portanto, é um sintoma
superposto à amnésia psicogênica.
Há desejo incontido de afastar-se de experiências
emocionalmente dolorosas, mas, durante o período em que o
paciente está foragido, pode se comportar de modo
aparentemente normal ao julgamento dos outros. O principal
diagnóstico diferencial é o comportamento do estado
crepuscular, que pode acontecer na epilepsia do lobo temporal.
10.2.3 Estupor dissociativo
O estupor dissociativo compreende a diminuição importante ou a
ausência dos movimentos voluntários e da reatividade normal a
estímulos ópticos, auditivos e táteis externos, sem que os exames
clínicos e complementares mostrem evidências de causa física.
Além disso, dispõem-se de argumentos em favor de origem
psicogênica do transtorno, na medida em que é possível
evidenciar eventos ou problemas estressantes recentes.
10.2.4 Convulsões dissociativas
Os movimentos observados no curso das convulsões
dissociativas podem assemelhar-se, de perto, aos observados no
curso das crises epilépticas; todavia, a mordedura de língua, os
ferimentos por queda e a incontinência urinária são raros. Além
disso, a consciência está preservada ou substituída por estado de
estupor ou transe.
10.2.5 Anestesias dissociativas
Os limites das áreas cutâneas anestesiadas correspondem,
frequentemente, às concepções pessoais do paciente, mais do
que às descrições científicas. Pode haver, igualmente, perda de
um tipo de sensibilidade com conservação de outras
sensibilidades, não correspondendo a nenhuma lesão neurológica
conhecida.
A perda de sensibilidade pode ser acompanhada de parestesias.
As perdas da visão e audição raramente são totais nos
transtornos dissociativos.
10.2.6 Síndrome de personalidade múltipla
O transtorno de personalidade múltipla ou transtorno dissociativo
de identidade é outro sintoma que pode estar presente no
transtorno dissociativo. Esse quadro caracteriza-se pela
existência de duas ou mais personalidades distintas e separadas
em uma só pessoa, cada uma determinando comportamentos,
atitudes e sentimentos próprios. Quando o paciente manifesta
determinada personalidade, há amnésia em relação à outra. A
transição de uma personalidade para outra é, frequentemente,
súbita e dramática. As personalidades assumidas podem
representar identidades criadas subjetivamente e que atendem a
anseios subterrâneos do indivíduo, bem como entidades
sobrenaturais e possessivas.
10.2.7 Transtorno de despersonalização e desrealização
Muito semelhante à personalidade múltipla, é a forma de histeria
denominada despersonalização, caracterizada por alteração
persistente ou recorrente na percepção de si mesmo, como a
experiência de sentir-se separado do próprio corpo, de agir
mecanicamente ou de estar em um sonho. Em vez de sentir-se
“possuído” por outra personalidade, há sensação de irrealidade
para com o próprio corpo. Entre as causas orgânicas que mais
apresentam o sintoma da despersonalização, está a epilepsia, que
deve ser prontamente distinguida do transtorno dissociativo.
Normalmente, a despersonalização é acompanhada de grande
sensação de ansiedade.
A desrealização também pode estar presente, vivenciada como
um sentimento de que o mundo externo é estranho ou irreal. A
pessoa com desrealização pode perceber, também, alteração
insólita no tamanho ou na forma dos objetos, percebendo-os
maiores do que são (macropsia) ou menores (micropsia), assim
como podem parecer estranhas ou mecânicas as pessoas à sua
volta.
10.2.8 Síndrome de Ganser
A síndrome de Ganser caracteriza-se por “respostas
aproximativas”: quando se pergunta quanto são 2 + 2, por
exemplo, a resposta é 5. É acompanhada de vários outros
sintomas dissociativos.
10.3 TRANSTORNO FACTÍCIO
Antigamente chamado de síndrome de Münchausen, o transtorno
factício é definido pela presença de sintomas físicos ou
psicológicos, intencionalmente produzidos ou simulados com a
finalidade de assumir o papel de doente. O julgamento de que
determinado sintoma é intencionalmente produzido por
evidências diretas e pela exclusão de outras causas. Por exemplo,
um indivíduo que se apresenta com hematúria é descoberto com
anticoagulantes em seu poder, nega tê-los consumido, mas os
exames de sangue acusam sua ingestão. Cabe notar que a
presença de sintomas factícios não exclui a coexistência de
sintomas somáticos ou psicológicos verdadeiros.
No caso de crianças, quando a mãe intencionalmente produz
algum sintoma no filho pequeno, visando mantê-lo no papel de
paciente, o transtorno é chamado de transtorno factício por
procuração, ou Münchausen por procuração.
Os transtornos factícios são diferenciados de atos de simulação.
Nesses últimos casos, o indivíduo também produz os sintomas de
modo intencional, porém, com um objetivo obviamente
perceptível quando as circunstâncias ambientais se tornam
conhecidas, por exemplo, a produção intencional de sintomas
para livrar-se de uma prova ou de uma viagem. Da mesma forma,
seria um ato de simulação se um indivíduo hospitalizado para
tratamento de transtorno mental simulasse piora da doença para
evitar a transferência para outro hospital menos desejável. Em
contrapartida, no transtorno factício, a motivação é uma
necessidade psicológica de assumir o papel de enfermo,
evidenciada por ausência de incentivos externos para o
comportamento. A simulação pode ser considerada adaptativa
sob certas circunstâncias, mas, por definição, o diagnóstico de
transtorno factício sempre indica psicopatologia.
Como diferenciar os
transtornos somatoforme,
dissociativo e factício?
Para diferenciar os transtornos somatoformes,
dissociativos e factícios, deve-se observar se a
produção de sintomas pelo paciente é voluntária ou
não, e se ocorre ganho secundário com a posição de
doente.
Universidade Federal do Ceará - Processo Seletivo
Unificado
O processo seletivo UFC-PSU é composto por duas fases: um
exame escrito, seguido da análise curricular do candidato. É
preciso ter em mente que na prova escrita deverão ser
respondidas 100 questões de múltipla escolha, com quatro
alternativas cada. Não deixe de estudar as áreas do
conhecimento de Clínica Médica, Cirurgia Geral, Pediatria,
Ginecologia e Obstetrícia e Medicina Preventiva e Social.
Lembrando que uma boa pontuação nas questões da área da
Medicina Preventiva pode te ajudar a ser melhor colocado nessa
avaliação.
A prova geralmente apresenta uma grande quantidade de
questões sobre casos clínicos, então estude tratamentos,
diagnósticos e melhores condutas. Alguns dos temas que você
pode esperar encontrar na avaliação são Medicina de Família e
Comunidade, atenção primária à saúde e Estratégia Saúde da
Família, Neonatologia, parto, assistência ao pré-natal, doenças
infecciosas, doenças alérgicas em Pediatria, aleitamento materno,
cuidados pré-operatórios e atendimento inicial ao
politraumatizado.
UFC-PSU | 2021
Adolescente de 13 anos compareceu à consulta no ambulatório
do adolescente acompanhada da irmã de 16 anos. A queixa
principal foi “receber remédios para vermes”. Durante a consulta
o médico observou que Joana é tratada por “porcaria” pela irmã.
Quando questionada sobre o “apelido” a irmã relatou que todos
na família a tratam por esse apelido desde criança. Ao examinar
Joana, observou cortes superficiais em antebraços, poupando os
punhos. Joana relatou que constantemente corta os braços com a
faca para "diminuir a angústia".
Considerando o caso e a atenção à saúde da criança e do
adolescente em situação de violência, assinale a alternativa com a
hipótese diagnóstica provável e conduta mais adequada.
a) trata-se de violência física e o caso deve ser notificado ao
conselho tutelar
b) trata-se de violência psicológica e a adolescente deve ser
acompanhada por equipe multiprofissional e interdisciplinar
c) trata-se de síndrome de Münchausen por procuração e deve
analisar a saúde mental materna com referência ao CAPs ou
matriciamento com psiquiatra
d) trata-se de automutilação e configura violência física contra a
adolescente e deve-se notificar o caso ao conselho tutelar e
realizar o acompanhamento multiprofissional
Gabarito: b
Comentários:
a) Aparentemente os cortes superficiais não foram causados pela
família e, sim, pela própria paciente, o que não caracteriza uma
violência física.
b) O fato de a família chamar a paciente de "porcaria" indica que
há um quadro de violência psicológica importante na família,
sendo necessário o acompanhamento dessa família por equipe
multiprofissional.
c) A síndrome de Münchausen só estaria caracterizada caso
houvesse indícios de que a paciente está forjando sintomas com
o objetivo de alcançar atenção médica. Entretanto, o que se
apresenta é que a violência psicológica foi presenciada pelo
médico, o que levou à automutilação da paciente.
d) Há indícios de que os cortes sejam provenientes de
automutilação, em virtude da violência psicológica sofrida pela
paciente na família. Não há indícios de agressão física no
enunciado.
Quais as principais
patologias psiquiátricas
da infância?

11.1 RETARDO MENTAL


A característica essencial do retardo mental é um funcionamento
intelectual significativamente inferior à média, acompanhado de
limitações significativas no funcionamento adaptativo em, pelo
menos, duas das seguintes áreas de habilidades: comunicação,
autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais/interpessoais,
uso de recursos comunitários, autossuficiência, habilidades
acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança. O início deve
ocorrer antes dos 18 anos.
O retardo mental apresenta muitas etiologias diferentes e pode
ser visto como uma via final comum de vários processos
patológicos que afetam o funcionamento neurológico do
paciente. A taxa de prevalência do retardo mental é de
aproximadamente 1%, conforme estimativas.
Os fatores etiológicos podem ser primariamente biológicos ou
psicossociais, ou alguma combinação de ambos. Em
aproximadamente 30 a 40% dos indivíduos vistos em contextos
clínicos, não é possível determinar nenhuma etiologia para o
retardo mental. Os principais fatores predisponentes incluem:
▶ Hereditariedade (cerca de 5%): esse fator inclui erros inatos do
metabolismo, herdados, em sua maior parte, por meio de
mecanismos autossômicos recessivos (doença de Tay-Sachs),
outras anormalidades em gene único com herança mendeliana e
expressão variável (esclerose tuberosa) e aberrações
cromossômicas (síndrome de Down por translocação, síndrome
do X frágil);
▶ Congênitas: alterações precoces do desenvolvimento
embrionário — aproximadamente 30%. Esses fatores incluem
alterações cromossômicas (síndrome de Down) ou dano pré-natal
causado por toxinas, em razão do consumo materno de álcool ou
infecções;
▶ Problemas da gravidez e perinatais — aproximadamente 10%.
Esses fatores incluem desnutrição fetal, prematuridade, hipóxia,
infecções virais, trauma e outras;
▶ Condições médicas gerais adquiridas no início da infância — em
torno de 5%. Esses fatores incluem infecções, traumas e
envenenamento, devido ao chumbo ou outros metais;
▶ Influências ambientais e outros transtornos mentais — cerca de
15 a 20%. Esses fatores incluem privação de afeto e cuidados,
bem como de estimulação social, linguística e outras, e
transtornos mentais severos, como o transtorno autista.
O funcionamento intelectual geral é definido pelo Quociente de
Inteligência — QI ou equivalente. Um funcionamento intelectual
significativamente abaixo da média é definido como QI de cerca
de 70 ou menos.
Prejuízos no funcionamento adaptativo, em vez de baixo QI,
geralmente são os sintomas visíveis. O funcionamento adaptativo
refere-se ao modo como os indivíduos enfrentam as exigências
comuns da vida e o grau em que satisfazem os critérios de
independência pessoal esperados para a idade, bagagem
sociocultural e contexto comunitário específicos. Pode ser
influenciado por vários fatores, como educação, motivação,
personalidade, oportunidades sociais e vocacionais, além de
transtornos mentais e condições médicas gerais que podem
coexistir com o retardo mental.
Quatro níveis de gravidade podem ser especificados, refletindo o
atual nível de prejuízo intelectual:
▶ Leve — nível de QI 50-55 a aproximadamente 70: esse grupo
constitui o maior segmento, com cerca de 85% dos indivíduos
com o transtorno. Em seu conjunto, as pessoas com tal nível de
retardo mental desenvolvem habilidades sociais e de
comunicação durante os anos pré-escolares — de 0 a 5 anos —,
têm mínimo prejuízo nas áreas sensitivo-motoras e, com
frequência, não são facilmente diferenciadas de crianças sem
retardo mental até uma idade mais tardia. São chamadas de
“educáveis”. No fim da adolescência, podem atingir habilidades
acadêmicas equivalentes, aproximadamente, ao sétimo ano
escolar;
▶ Moderado — nível de QI 35-40 a 50-55: esse grupo constitui
cerca de 10% dos indivíduos acometidos. A maioria adquire
habilidades de comunicação durante os primeiros anos da
infância. Beneficiam-se de treinamento profissional e, com
moderada supervisão, podem cuidar deles mesmos. Também
podem beneficiar-se do treinamento em habilidades sociais e
ocupacionais, mas, provavelmente, não progredirão além do nível
de terceiro ano em temas acadêmicos. São chamados de
“treináveis”;
▶ Severo — nível de QI 20-25 a 35-40: grupo constitui de 3 a 4%
dos indivíduos com retardo mental. Durante os primeiros anos da
infância, adquirem pouca ou nenhuma fala comunicativa. Durante
o período da idade escolar, podem aprender a falar e ser treinados
em habilidades elementares de higiene, mas se beneficiam
apenas em grau limitado da instrução em matérias pré-escolares,
como familiaridade com o alfabeto e contagem simples, embora
possam dominar habilidades como reconhecimento visual de
algumas palavras fundamentais;
▶ Profundo — nível de QI abaixo de 20-25: grupo constitui cerca
de 1 a 2% dos indivíduos com retardo mental. A maioria tem uma
condição neurológica identificada como responsável pela
condição. Durante os primeiros anos da infância, apresentam
prejuízos consideráveis no funcionamento sensitivo-motor. Um
desenvolvimento mais favorável pode acontecer em ambiente
altamente estruturado, com constante auxílio e supervisão e, no
relacionamento individualizado, com alguém responsável por
seus cuidados.
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5), os vários níveis de gravidade são definidos com base no
funcionamento adaptativo, e não em escores de QI, uma vez que é
o funcionamento adaptativo que determina o nível de apoio
necessário.
11.2 TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE
São características do transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade, de acordo com o DSM-5:
▶ Transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na
infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a vida;
mais comum em crianças e adolescentes encaminhados para
serviços especializados;
▶ Sintomas: desatenção, hiperatividade e impulsividade;
▶ Incidência:
▷▷ Ocorre em 3 a 5% das crianças em idade escolar. Em mais da
metade dos casos, o transtorno acompanha o indivíduo na vida
adulta, embora os sintomas de inquietude sejam mais brandos;
▷▷ As meninas apresentam maior proporção de desatenção e, por
incomodar menos, são levadas com menor frequência a
tratamento. Por isso, achava-se que o transtorno acontecia mais
entre meninos;
▶ Diagnóstico: clínico, sem necessitar de qualquer exame
complementar — os sintomas devem começar a causar prejuízo
antes dos 12 anos, devendo ocorrer seis sintomas de desatenção
e/ou seis sintomas de hiperatividade/impulsividade por mais de
seis meses, na ausência do curso de outras doenças.
11.2.1 Tipos de transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade
▶ Predomínio de desatenção:
▷▷ Não tem sintomas do outro;
▷▷ Não presta atenção a detalhes e erra por descuido;
▷▷ Tem dificuldade para manter a concentração nas atividades;
▷▷ Não ouve quando lhe falam diretamente;
▷▷ É desorganizado — caderno, quarto;
▷▷ Distrai-se facilmente por estímulos que não têm relação com o
que está fazendo;
▷▷ Não persiste nas tarefas que exigem esforço mental
continuado;
▷▷ É “esquecido”;
▷▷ Tem dificuldade para seguir instruções ou terminar tarefas;
▷▷ Perde coisas.
▶ Predomínio de hiperatividade/impulsividade:
▷▷ É irrequieto com mãos e pés quando sentado;
▷▷ Não para sentado quando necessário;
▷▷ É muito agitado;
▷▷ Fala demais;
▷▷ Tem dificuldade para esperar a sua vez;
▷▷ Interrompe as conversas e intromete-se nelas ou nas dos
outros;
▷▷ Tem sensação de inquietude;
▷▷ É barulhento para jogar ou divertir-se;
▷▷ Salta com as respostas antes de terminar as perguntas.
▶ Combinado — características mescladas.

11.2.2 Tratamento
O tratamento é realizado com a família, a criança e a escola.
Terapia, principalmente da linha comportamental, apresenta boa
eficácia. Quanto à farmacologia, o principal medicamento
utilizado é o metilfenidato (Ritalina®). Alternativas são os
antidepressivos (tricíclicos, bupropiona) e os anti-hipertensivos
(clonidina). Quanto à eficácia do tratamento, em 70% dos casos
há diminuição de, pelo menos, 50% dos sintomas com a
medicação.
11.3 TRANSTORNOS DO ESPECTRO
AUTISTA
Trata-se de um grupo de transtornos caracterizados por
alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e
modalidades de comunicação e por um repertório de interesses e
atividades restrito, estereotipado e repetitivo.
As características essenciais do transtorno do espectro autista
são, segundo o DSM-V, prejuízo persistente na comunicação
social recíproca e na interação social e padrões restritos e
repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. Esses
sintomas estão presentes desde o início da infância e limitam ou
prejudicam o funcionamento diário.
Os sintomas costumam ser reconhecidos durante o 2º ano de
vida (12 a 24 meses), embora possam ser vistos antes dos 12
meses de idade, se os atrasos do desenvolvimento forem graves,
ou percebidos após os 24 meses, se os sintomas forem mais
leves.
As características comportamentais tomam-se inicialmente
evidentes na primeira infância, com alguns casos apresentando
falta de interesse em interações sociais no 1º ano de vida.
Algumas crianças apresentam platôs ou regressão no
desenvolvimento, com uma deterioração em comportamentos
sociais ou uso da linguagem, frequentemente durante os 2
primeiros anos de vida. Tais perdas são raras em outros
transtornos, podendo ser um útil sinal de alerta para identificação
do transtorno do espectro autista. Geralmente, é acompanhado
de outras manifestações inespecíficas, como fobias, alterações
do sono ou da alimentação, crises de hétero ou
autoagressividade.
O tratamento medicamentoso, quando necessário, visa à melhora
do comportamento. Podem ser utilizados antipsicóticos, como
risperidona, ou antidepressivos, como fluoxetina, para diminuição
da impulsividade e agressividade.

#importante
Para o diagnóstico investiga-se
perturbação característica do
funcionamento em cada um destes três
domínios: interações sociais,
comunicação e comportamento
focalizado e repetitivo.

11.4 DISLEXIA
A característica essencial da dislexia é um comprometimento do
desenvolvimento das habilidades de leitura, não atribuíveis
exclusivamente à idade mental, transtornos de acuidade visual ou
escolarização inadequada. A capacidade de compreensão da
leitura, o reconhecimento das palavras, a leitura oral e o
desempenho de tarefas que necessitam da leitura podem estar
comprometidos. Pode haver associação a transtornos emocionais
e do comportamento durante a escolarização. Pessoas com
dislexia não apresentam retardo mental, e não há tratamento
medicamentoso para ela. O tratamento exige a participação de
especialistas em várias áreas — Pedagogia, Fonoaudiologia,
Psicologia etc.

Quais as principais
patologias psiquiátricas
da infância?
As principais patologias psiquiátricas da infância são
retardo mental, transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade, transtornos do espectro autista e
dislexia.
Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São
Paulo
A Santa Casa-SP tem um processo seletivo com duas fases. Na
primeira, você realizará uma prova de múltipla escolha, com 100
questões, para cada uma delas há cinco alternativas. As questões
são distribuídas igualmente entre os temas de Clínica Médica,
Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia e Medicina
Preventiva e Social.
Estude com atenção os seguintes temas: trauma, abdome agudo,
atendimento inicial, pancreatite aguda, litíase biliar e cuidados
pós-operatórios. Também merecem reforço os temas: terapia de
reposição hormonal, incompatibilidade Rh, gemelaridade,
hemorragia pós-parto, violência sexual, anticoncepção, parto, pré-
natal, câncer de cólon uterino, clínica ampliada, prevenção
quaternária, ensaios clínicos, Sistema Único de Saúde (SUS),
estudos epidemiológicos, Medicina Legal, atenção primária e
análise de métodos diagnósticos.
Não se esqueça de estudar fibrose cística, anemia falciforme,
aleitamento, vacinação infantil, doenças exantemáticas, doenças
glomerulares, infecção por vias aéreas, ACLS, infarto agudo do
miocárdio, acidente vascular cerebral, tuberculose, infecções
sexualmente transmissíveis e sepse. Prepare-se também para
questões com eletrocardiogramas, pois são comuns neste
processo seletivo.
Já a segunda fase está dividida entre uma prova prática e a
análise e arguição do currículo. A prova prática será realizada em
ambientes sucessivos. Serão cinco estações práticas, também
relacionadas às cinco áreas básicas que serviram de tema para a
primeira fase. A avaliação será inteiramente documentada por
meios gráficos ou eletrônicos. Na segunda etapa, além da análise
do currículo, há uma entrevista, então, se você conseguir chegar
nesta etapa, esteja preparado.
SANTA CASA-SP | 2020
Um adolescente de catorze anos de idade compareceu à consulta
ambulatorial, referindo tristeza por término de namoro há duas
semanas. Além disso, relatou diminuição no rendimento escolar,
há dois meses, por ter muito sono durante as aulas e dificuldade
para prestar atenção. Ao exame físico, o médico constatou lesões
cicatriciais de ferimentos cortocontusos em ambos os membros
superiores.
Com base nessa situação hipotética, assinale a alternativa que
apresenta a conduta que não é recomendada:
a) abordar o paciente em ambiente acolhedor e estimar o risco de
tentativa de suicídio
b) demonstrar compreender as emoções do paciente que
motivaram suas ações e verificar transtornos psiquiátricos
coexistentes
c) determinar tipo, quantidade e gravidade das lesões e a
disposição do paciente para aderir ao tratamento
d) avaliar a data da última vacinação para tétano ou aplicar reforço
e checar alguns dados laboratoriais, incluindo pesquisa para
anticorpos de hepatite C
e) notificar a família, internar o paciente e iniciar tratamento
específico
Gabarito: e
Comentários:
a) Veja o comentário geral na alternativa correta.
b) Veja o comentário geral na alternativa correta.
c) Veja o comentário geral na alternativa correta.
d) Veja o comentário geral na alternativa correta.
e) A avaliação deve ser realizada em tom amistoso, acolhedor e
livre de julgamentos, devendo ser consideradas as seguintes
variáveis: grau de perigo, grau de intencionalidade e grau de
violência contra si mesmo. Além disso, é preciso verificar se é um
ato isolado ou faz parte de uma história de autoagressões
recorrentes, seguido de avaliação de presença de quadro
psiquiátrico e análise dos contextos familiar, social e ambiental,
devendo ser encaminhado para acompanhamento
psicoterapêutico. A hospitalização deverá ser indicada como
medida de cuidado se os fatores de risco superarem os de
proteção. Consideram-se relevantes nessa avaliação:
probabilidade elevada de tentativa de suicídio, história de
tentativas anteriores, uso de meio violento, ambiente
desfavorável (conflitos familiares, violência doméstica, abuso
sexual ou falta de condições da família de dar apoio e proteção ao
paciente) ou presença de transtorno mental descompensado,
principalmente depressão ou sintomas psicóticos.
Como se deve avaliar e
manejar emergências
psiquiátricas?

12.1 AGITAÇÃO PSICOMOTORA


Agitação psicomotora, a emergência mais comum em Psiquiatria,
caracteriza-se por atividade motora excessiva, associada a
sentimento de tensão interna. A atividade, geralmente, é
improdutiva e repetitiva, como caminhar a esmo, mexer-se em
excesso, retorcer as mãos, puxar as roupas e não conseguir ficar
sentado e quieto. Muitas vezes, associa-se a comportamento
violento, que conduz ou ameaça conduzir dano físico em pessoas
ou objetos.
Diante de paciente em quadro de agitação psicomotora, devem-
se avaliar, concomitantemente, alteração no nível de consciência,
etiologia do quadro de agitação e risco de violência.
Como o estado de agitação psicomotora pode ser o sintoma de
apresentação de amplo espectro de distúrbios clínicos ou
psiquiátricos, é importante verificar rapidamente se não se trata
de uma emergência clínica e se o paciente está ameaçando a
própria segurança ou a segurança da equipe. Por isso, a história
clínica deve ser realizada junto ao exame físico e psíquico, bem
como com algum tipo de intervenção física ou medicamentosa, se
imperativa.
É
É importante informar-se sobre:
▶ Quando iniciou o quadro de agitação;
▶ Características da agitação: ansiedade, inquietação física,
agitação verbal, estado confusional;
▶ Se o quadro já ocorreu outras vezes;
▶ Doenças e tratamentos clínicos;
▶ Doenças e tratamentos psiquiátricos;
▶ Uso de medicamentos, álcool ou drogas;
▶ História de trauma cranioencefálico;
▶ Presença de febre;
▶ Eventos recentes estressores — cirurgias, doenças, rompimento
de relacionamentos, falecimento na família.
12.1.1 Etiologia
A agitação psicomotora pode ser sintoma ou sinal de transtorno
orgânico agudo (delirium), psicose ou síndrome maníaca e
síndrome ansiosa.
12.1.1.1 Transtorno orgânico agudo (delirium)

O delirium deve ser diferenciado entre evidência de doença


orgânica ou evidência de intoxicação ou abstinência de
substância química.
12.1.1.2 Psicose ou síndrome maníaca
Nas psicoses, ocorrem delírios, alucinações, discurso desconexo
e incoerente, diminuição da atenção, irritabilidade e aumento da
atividade motora.
O diagnóstico específico será estabelecido após o controle da
agitação. Algumas possibilidades são surto esquizofrênico,
psicose reativa ou psicose por drogas.
A síndrome maníaca é bastante parecida com a psicose. No
entanto, o paciente apresenta, como sintoma predominante,
alteração do humor, tendo-o anormalmente elevado e expansivo,
com a autoestima elevada, grandiosidade, pensamento rápido e
aumento de atividades rotineiras e que causam prazer, como sexo
e compras.
12.1.1.3 Síndrome ansiosa

O sintoma mais proeminente é a agitação ansiosa. O paciente, em


geral, não apresenta psicose ou discurso bizarro. O diagnóstico
específico será realizado em um momento posterior, por
especialista, quando a agitação estiver controlada. Alguns
possíveis diagnósticos são agorafobia, transtorno de pânico,
transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de estresse
pós-traumático, transtornos dissociativos ou conversivos e
transtorno de personalidade.
12.1.2 Conduta
Deve-se tentar, primeiramente, abordagem verbal, dialogando a
sós com o paciente e em ambiente tranquilo; informar a finalidade
da presença do médico e explicar os procedimentos que serão
realizados. Muitas vezes, essa conduta é impraticável e, em caso
de risco para o paciente ou para a equipe, deve ser contido
fisicamente, observando-se alguns cuidados:
▶ Durante todo o procedimento, o paciente deve ser sempre
esclarecido sobre o que está sendo feito e o motivo para tal;
▶ O ideal é o envolvimento de cinco pessoas, e uma delas
coordena e comunica-se com o paciente;
▶ A medicação a ser administrada deve estar pronta e ser
realizada tão logo seja possível, caso o paciente continue agitado
após a contenção;
▶ As faixas de contenção devem ser de material resistente. Deve-
se tomar cuidado para que os membros não fiquem torcidos, de
forma a causar tração de nervo ou alguma lesão por compressão;
▶ A posição mais indicada é a lateral, com a cabeça levemente
elevada, o que previne aspiração;
▶ O paciente deve ser observado em relação à segurança e ao
conforto, aos sinais vitais e ao nível de consciência,
aproximadamente a cada 30 minutos;
▶ As contenções devem ser retiradas com equipe adequada e
suficiente para conter novamente o paciente, caso seja
necessário.
Mesmo quando se encontra uma causa orgânica para a agitação,
pode ser necessário tratamento sintomático. Nos casos de
identificação de causa orgânica, geralmente a agitação é
revertida após o tratamento da causa-base.
Se necessário, deve-se sedar com haloperidol intramuscular.
Somente em casos de abstinência por álcool que a sedação deve
ser feita com benzodiazepínicos, como diazepam ou lorazepam —
pois antipsicóticos diminuem o limiar convulsivo, e esses
pacientes tendem a convulsionar. Se a agitação decorrer de
psicose ou mania, o tratamento da causa-base ficará para um
segundo momento, sendo realizada na Emergência somente a
sedação do paciente, com haloperidol por via oral ou
intramuscular. Em casos de síndrome ansiosa, a sedação é feita
com benzodiazepínico via oral — lorazepam, clonazepam ou
diazepam.
Na Emergência, apesar de já ter formulado um diagnóstico, deve-
se apenas sedar o indivíduo, deixando a conduta de um
tratamento específico para a equipe especializada que cuidará,
posteriormente, do paciente.
Após o controle da agitação, devem-se avaliar riscos e optar por
internação, caso o paciente esteja incapaz de controlar seus
impulsos, apresente ideação suicida, esteja psicótico ou pareça
ter risco elevado de violência recorrente ou contínua. Caso não
seja necessária internação, dá-se sempre alta para o paciente,
além de encaminhá-lo para serviço ambulatorial.
A contenção física sempre antecede a contenção química na
agitação psicomotora.
12.2 TENTATIVA DE SUICÍDIO
O suicídio é compreendido como um ato multidimensional, que
resulta de uma interação complexa entre diversos fatores. Vários
estudos de revisão bibliográfica apontam fatores de risco para o
suicídio que podem ser de natureza clínica ou social.
12.2.1 Fatores de risco para o suicídio
Os fatores de risco para suicídio são:
▶ Depressão grave, particularmente, no início da doença. Setenta
por cento dos suicídios decorrem de uma fase depressiva;
▶ Histórico familiar ou pessoal prévio de depressão ou tentativas
de suicídio, abuso de álcool ou outras substâncias;
▶ Psicose;
▶ Agitação;
▶ Ansiedade grave;
▶ Insônia;
▶ Sexo masculino — apresentam tentativas brutais e mais bem-
sucedidas;
▶ Idade avançada — principalmente em associação a outras
doenças clínicas — e adolescentes, devido à impulsividade;
▶ Falta ou perda de apoio social;
▶ Encarceramento;
▶ Perda recente;
▶ Crise pessoal ou causa para vergonha;
▶ Falta de tratamento psiquiátrico ativo e mantido;
▶ Doença crônica;
▶ Profissionais de saúde.

12.2.2 Conduta do médico


O médico deve proceder de acordo com a seguinte conduta:
▶ Segundo o Prevenção do suicídio: um recurso para conselheiros
(2006), da Organização Mundial da Saúde, deve-se sempre
perguntar sobre a ideação e o planejamento suicida de um
paciente psiquiátrico;
▶ Quanto mais planejado, mais perigoso, pois pode haver novas
tentativas, caso a última não tenha dado certo;
▶ Qualquer distúrbio psiquiátrico associado ao uso de álcool
aumenta o risco de suicídio;
▶ Isolamento social, falta de amigos, não ser casado, não morar
com outra pessoa, não ter filhos, não ser religioso aumentam o
risco de suicídio, se associados a algum transtorno mental;
▶ Nunca desconsiderar os avisos. Noventa por cento de quem
tenta o suicídio avisa antes;
▶ Quem já fez uma tentativa tem 30% a mais de chances de
repeti-la do que quem nunca tentou;
▶ Nas psicoses agudas com pensamentos suicidas, ou
depressões delirantes com ideias de suicídio, caso não seja
possível hospitalizar o paciente, o acompanhante deve estar
alerta todo o tempo, atentando-se para janelas trancadas, armas,
venenos, comprimidos, facas, garfos, fios etc.
O tratamento do paciente com ideação e planejamento suicida
deve ser sempre realizado com internação psiquiátrica. As
medicações variam de acordo com a doença de base, por
exemplo, pacientes psicóticos são medicados com antipsicóticos;
pacientes deprimidos, com antidepressivos.
Como se deve avaliar e
manejar emergências
psiquiátricas?
As principais emergências psiquiátricas são agitação
psicomotora e tentativa de suicídio. Na agitação
psicomotora, deve-se avaliar em conjunto, e o mais
rápido possível, alteração de nível de consciência,
etiologia da agitação e segurança do paciente e da
equipe.
A agitação pode ser decorrente de várias patologias
psiquiátricas, como delirium, psicose de qualquer
natureza, intoxicação ou abstinência de substâncias
psicoativas ou até ansiedade. A conduta inicial, caso o
paciente não se acalme e esteja em risco de agredir-se
ou agredir alguém da equipe, é a contenção física,
seguida de contenção química, de acordo com a
etiologia da agitação. O paciente deve ser encaminhado
a posteriori ao serviço de Psiquiatria.
O suicídio deve ser abordado sempre de forma direta;
caso o paciente apresente ideação com planejamento
suicida, deve-se proceder à internação psiquiátrica para
preservação da sua vida.
Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte
São duas etapas para a seleção da Santa Casa-BH. A primeira
conta com uma prova de múltipla escolha, com 75 questões. São
cerca de 15 questões para cada uma das áreas de conhecimento:
Cirurgia Geral, Clínica Médica, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia
e Medicina Preventiva e Social. Já na segunda etapa, você deverá
apresentar seu currículo para a análise da banca examinadora.
Na primeira etapa, considerando os anos anteriores, é possível
esperar questões sobre Oncologia, abdome agudo, trauma,
Cirurgia Geral, ASA, classificação de choque e cuidados no
perioperatório, com questões mais diretas e conceituais. Já na
área de Clínica Médica, Cardiologia, HIV e tuberculose são os
temas mais recorrentes.
Aposte também em Sistema Único de Saúde (SUS),
Epidemiologia, atenção primária e análise de métodos
diagnósticos, parto, climatério, incontinência urinária,
endometriose e fisiologia de gestação, modificações do
organismo materno, pré-natal, anticoncepção, e infecções
sexualmente transmissíveis. Não esqueça de estudar para
Pediatria, que apresenta questões mais extensas e detalhadas
sobre síndromes gastrintestinais e respiratórias, aleitamento,
imunizações, desenvolvimento fisiológico, e eventualmente,
doenças exantemáticas.
SANTA CASA-BH | 2020
Em relação às intoxicações exógenas, assinale a alternativa
incorreta.
a) bicarbonato de sódio via oral deve ser administrado após a
ingestão de ácidos, a fim de neutralizar quimicamente estes
agentes
b) N-acetilcisteína pode ser útil nas intoxicações por
acetaminofeno
c) não se deve induzir êmese após a ingestão de álcalis
d) agitação, psicose e convulsões podem ser tratadas com
benzodiazepínicos nas intoxicações por anfetaminas
Gabarito: a
Comentários:
a) Neutralização do produto tóxico ácido ou básico é, de um modo
geral, contraindicada, pois, como a maioria das reações de
neutralização liberam calor, aumentam os riscos de lesão ou de
agravamento de lesões mucosas.
b) A acetilcisteína tem um efeito poupador de glutationa,
prevenindo a formação de metabólitos hepatotóxicos do
acetaminofeno. Sua principal indicação terapêutica é a
intoxicação por esse medicamento.
c) A indução de vômito é contraindicada após a ingestão de
produtos cáusticos. Mesmo em outras circunstâncias, a validade
desse método é discutível, pois sua eficácia depende da rapidez
de execução, que não ocorre na quase totalidade dos casos.
d) Benzodiazepínicos são medicações de primeira escolha para
tratamento de intoxicação por anfetaminas, incluindo os quadros
contidos nessa alternativa. Em situações de agitação extrema,
pode ser necessário prescrever um antipsicótico em associação.
Deve-se ainda atentar para os casos de hipertermia, que também
indicam sedação com benzodiazepínico.
Quais são as principais
classes de medicações
psiquiátricas?

13.1 ANTIDEPRESSIVOS
Acredita-se que o efeito antidepressivo se deve ao aumento da
disponibilidade de neurotransmissores no Sistema Nervoso
Central (SNC), notadamente da serotonina (5-HT), da
noradrenalina (NE) e da dopamina (DA). Ao bloquearem
receptores 5-HT2, da 5-HT, os antidepressivos também
funcionam como antienxaquecosos. O aumento de
neurotransmissores na fenda sináptica ocorre por meio do
bloqueio da recaptação da NE e da 5-HT no neurônio pré-
sináptico ou, ainda, da inibição da monoaminoxidase (MAO),
enzima responsável pela inativação desses neurotransmissores.
Podem-se dividir os antidepressivos em quatro grupos:
▶ Antidepressivos tricíclicos (ADTs);
▶ Inibidores seletivos de recaptação da 5-HT;
▶ Inibidores da MAO (IMAOs);
▶ Outros antidepressivos.
13.1.1 Antidepressivos tricíclicos
▶ Amitriptilina (150 a 300 mg/d);
▶ Clomipramina (150 a 300 mg/d);
▶ Imipramina (150 a 300 mg/d);
▶ Nortriptilina (50 a 150 mg/d).
Os ADTs impedem a recaptação de NE e 5-HT, resultando no
aumento dos neurotransmissores na fenda sináptica. Parece
haver, também, diminuição de receptores pré-sinápticos do tipo
alfa-2, cuja estimulação pela NE da fenda por mecanismo de
feedback negativo inibiria a liberação de NE.
Assim, quanto menor o número desses receptores, menor sua
estimulação e, consequentemente, mais NE seria liberada na
fenda. Portanto, há dois mecanismos relacionados à recaptação:
um inibindo diretamente a recaptação e outro diminuindo o
número dos receptores.
É importante, com relação à farmacocinética dos ADTs, o
conhecimento do período de latência para a obtenção dos
resultados terapêuticos. Normalmente, esses resultados são
obtidos após um período de 15 até 30 dias depois do início da
utilização. Os ADTs são potentes anticolinérgicos, e, por essa
característica, seus efeitos colaterais são acentuados e ocorrem
logo no início do tratamento, sem período de latência.
Os principais efeitos colaterais dos antidepressivos tricíclicos são:
▶ Oftalmológicos: há dificuldade de acomodação visual;
▶ Gastrintestinais: secura na boca ocorre em quase 100% dos
pacientes, resolvida com ingesta aumentada de água.
Constipação intestinal também acontece em quase 100% das
vezes e é resolvida com mudança no hábito alimentar ou uso de
laxantes;
▶ Cardiocirculatórios: os ADTs podem provocar aumento na
frequência cardíaca, mas as taquicardias importantes são raras.
Outro efeito circulatório que pode molestar o paciente é a
hipotensão postural;
▶ Geniturinários: a retenção urinária pode ser observada,
principalmente, em homens e portadores de adenoma de
próstata. Com muita frequência, encontra-se disúria em ambos os
sexos. Na esfera sexual, podem ocorrer diminuição da libido,
retardamento do orgasmo e, mais raramente, anorgasmia (em
ambos os sexos);
▶ SNC: sedações iniciais e sonolência são encontradas no início
do tratamento, diminuindo sensivelmente após os seis primeiros
dias. Em doses terapêuticas, insônia, agitação e aumento da
ansiedade não são comuns. Em indivíduos mais idosos, pode-se
encontrar a chamada síndrome anticolinérgica central, com
agitação, confusão mental, delírios e alucinações. Então,
considera-se o uso de doses menores em tais pacientes. Em
predispostos, podem ocorrer convulsões do tipo generalizadas
pelo fato de os ADTs diminuírem o limiar convulsígeno;
▶ Alterações gerais: tremores finos das mãos são observados
com certa frequência e respondem muito bem aos
betabloqueadores (propranolol). Sudorese excessiva pode
também incomodar o paciente, mas não necessita de cuidado
especial. É comum ganho de peso, e, algumas vezes, os pacientes
referem impulso para comer doce.
Os ADTs estão indicados para o tratamento dos estados
depressivos de etiologia diversa: depressão associada a
esquizofrenia e distúrbios de personalidade, síndromes
depressivas senis ou pré-senis, distimia, depressão de natureza
reativa, neurótica ou psicótica, síndromes obsessivo-compulsivas,
fobias e ataques de pânico, estados dolorosos crônicos, profilaxia
de enxaqueca e enurese noturna (a partir de 5 anos e com prévia
exclusão de causas orgânicas). A amitriptilina está mais indicada,
também, aos casos de ansiedade associados a depressão,
depressão com sinais vegetativos, dor neurogênica, anorexia e
casos de dor crônica grave (câncer, doenças reumáticas, nevralgia
pós-herpética, neuropatia pós-traumática ou diabética).
Clomipramina está mais indicada a casos de transtorno
obsessivo-compulsivo e outros transtornos do espectro ansioso.
É importante lembrar: a nortriptilina é mais indicada para idosos
por ter menor efeito anticolinérgico; os tricíclicos são
contraindicados no primeiro trimestre da gestação; devem-se
solicitar sempre ecocardiograma e hemograma, pelo risco de
leucopenia e plaquetopenia; e deve-se introduzir medicação em
dose baixa e aumentar, progressivamente, até a dose terapêutica.
As contraindicações aos ADTs são bloqueio de ramo ventricular,
glaucoma de ângulo fechado, prostatismo e pós-infarto agudo do
miocárdio.
13.1.2 Inibidores seletivos de recaptação da serotonina
▶ Citalopram (20 a 60 mg/d);
▶ Fluoxetina (20 a 80 mg/d);
▶ Paroxetina (20 a 40 mg/d);
▶ Sertralina (50 a 200 mg/d);
▶ Escitalopram (10 a 20 mg/d).
O efeito antidepressivo dos inibidores seletivos de recaptação da
serotonina (ISRSs) parece ser consequência do bloqueio seletivo
da recaptação da 5-HT. A fluoxetina foi o primeiro representante
dessa classe de antidepressivos e tem um metabólito ativo, a
norfluoxetina. Este metabólito é o ISRS que se elimina mais
lentamente do organismo. A incidência de efeitos colaterais
anticolinérgicos, anti-histamínicos e alfabloqueadores, assim
como o risco de superdosagem, é menor nos ISRSs do que nos
ADTs. Entretanto, a fluoxetina tem se associado a alguns casos de
acatisia, especialmente quando a dose é muito alta, e a
estimulação do SNC parece maior com a fluoxetina do que com
outros ISRSs. A paroxetina origina mais sedação, efeitos
anticolinérgicos e extrapiramidais que outros ISRSs. Têm-se
relatado sintomas de abstinência com a supressão brusca do
tratamento com a paroxetina.
Os ISRSs estão indicados para o tratamento dos transtornos
depressivos, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno do
pânico, transtornos fóbico-ansiosos, neuropatia diabética, dor de
cabeça tensional crônica e transtornos alimentares. A fluoxetina
tem ação anorexígena, com discreta redução do peso corpóreo
durante os primeiros meses. Há recuperação do peso com a
continuidade do seu uso.
Os ISRSs representam uma boa escolha para pacientes com
comorbidades clínicas, principalmente cardiovasculares, mas
estão contraindicados para insuficiência hepática — metabolismo
hepático (citocromo p450).
O uso é recomendado pela manhã — pois pode causar insônia se
tomado mais tardiamente — e os efeitos colaterais são diarreia,
náuseas, dispepsia, insônia, cefaleia, diminuição da libido e
alteração na ejaculação.
13.1.3 Inibidores da monoaminoxidase
▶ Tranilcipromina (50 mg/d);
▶ Moclobemida (300 a 600 mg/d).
Os chamados IMAOs promovem o aumento da disponibilidade da
5-HT por intermédio da inibição da monoaminoxidase
responsável pela degradação desse neurotransmissor
intracelular. Não são drogas de primeira escolha para depressão,
mas são excelentes nas depressões atípicas e nas fobias sociais.
Os de inibição irreversível (tranilcipromina) têm o inconveniente
de exigirem restrição para alimentos com tiramina, como queijos,
vinhos e feijão. Os principais efeitos colaterais são hipotensão
postural, bradicardia, tremores, sudorese, insônia e disfunções
sexuais. Não devem ser utilizados com ISRS, pois podem
desencadear síndrome serotoninérgica — hipertermia, mioclonia,
hipertensão, hiperatividade, tremor e sedação.
13.1.4 Antidepressivos atípicos
Os antidepressivos atípicos são os mais modernos, com melhor
perfil de efeitos colaterais. A eficácia, no entanto, é semelhante à
dos anteriores.
▶ Venlafaxina (serotoninérgico, noradrenérgico, dopaminérgico):
150 a 225 mg/d;
▶ Desvenlafaxina (serotoninérgico, noradrenérgico): 50 a 200
mg/d;
▶ Reboxetina (noradrenérgico): 8 a 10 mg/d;
▶ Fluvoxamina (serotoninérgico): 100 a 300 mg/d;
▶ Mirtazapina (serotoninérgico, noradrenérgico, dopaminérgico):
15 a 45 mg/d;
▶ Trazodona (serotoninérgico): 150 a 600 mg/d;
▶ Duloxetina (serotoninérgico, noradrenérgico): 60 a 120 mg/d.
Quadro 13.1 - Principais indicações para uso dos antidepressivos

13.1.5 Antidepressivos multimodais


Em 2016, começou a ser comercializado o primeiro
antidepressivo multimodal no Brasil, a vortioxetina, com nome
comercial de Brintellix®. Trata-se de um modulador
serotoninérgico, ou seja, age ao mesmo tempo como antagonista
e agonista de múltiplos receptores 5-HT, também inibindo a
recaptação da serotonina. Com dosagem recomendada de 5 a 20
mg/d, os efeitos colaterais descritos até o momento são os
mesmos que os dos ISRSs, porém, com menor impacto na função
sexual.
13.2 ANTIPSICÓTICOS
Os antipsicóticos podem ser divididos em três grupos:
▶ Antipsicóticos sedativos;
▶ Antipsicóticos incisivos;
▶ Antipsicóticos atípicos e de última geração.

13.2.1 Antipsicóticos sedativos


▶ Clorpromazina (50 a 800 mg/d);
▶ Levomepromazina (25 a 50 mg/d);
▶ Tioridazina (50 a 300 mg/d);
▶ Trifluoperazina (2 a 4 mg/d);
▶ Amissulprida;
▶ Sulpirida (200 a 800 mg/d);
▶ Periciazina (60 mg/d) — muito usada em casos de agitação,
irritabilidade ou agressividade em outros problemas psiquiátricos,
como demência ou retardo mental.
Os antipsicóticos sedativos são aqueles cujo principal efeito é a
sedação, ao contrário dos antipsicóticos incisivos, como o
haloperidol, que o efeito principal é a remoção dos chamados
sintomas produtivos — delírios e alucinações. Os antipsicóticos
sedativos têm melhor indicação aos casos de agitação
psicomotora. Usados para o tratamento dos distúrbios psicóticos,
são eficazes na esquizofrenia, na fase maníaca da doença
maníaco-depressiva e para o controle de náuseas e vômitos
É
graves em pacientes selecionados. É uma terapêutica alternativa
aos benzodiazepínicos no tratamento de curto prazo da
ansiedade não psicótica — em não mais que 12 semanas.
13.2.2 Antipsicóticos incisivos
▶ Flufenazina;
▶ Penfluridol;
▶ Haloperidol (5 a 15 mg/d);
▶ Pimozida (4 a 16 mg/d);
▶ Pipotiazina (10 a 20 mg/d) — há também injetável; a dose varia
de 25 a 200 mg de pipotiazina undecanoato e palmitato de
pipotiazina;
▶ Zuclopentixol (50 a 75 mg/d).
O grupo farmacológico a que pertencem os antipsicóticos
incisivos é o das butirofenonas e substâncias a elas relacionadas.
Sua ação antipsicótica deve-se ao bloqueio dos receptores pós-
sinápticos dopaminérgicos D2 nos neurônios do SNC — sistema
límbico e corpo estriado.
Para produzir a ação antipsicótica, agem com bloqueio seletivo
sobre o SNC, que ocorre por competitividade dos receptores
dopaminérgicos pós-sinápticos, no sistema dopaminérgico
mesolímbico, e aumento do intercâmbio de DAs no nível cerebral.
São indicados para tratamento de distúrbios psicóticos agudos e
crônicos, incluindo esquizofrenia, fase maníaca do transtorno
afetivo bipolar, psicose induzida por substâncias, transtorno
delirante persistente, problemas severos de comportamento em
crianças, como hiperatividade grave, síndrome de Tourette,
autismo infantil, alívio da sintomatologia da demência senil e dor
neurogênica crônica.
13.2.3 Antipsicóticos atípicos e de última geração
▶ Amissulprida (600 a 1.200 mg/d);
▶ Clozapina (150 a 900 mg/d) — o uso dessa medicação requer
cuidados básicos com os glóbulos brancos. Antes, no começo e
durante todo o tratamento, o paciente deve fazer exames de
sangue. A dose da medicação deve ser aumentada de forma que
não afete o sistema imunológico;
▶ Olanzapina (5 a 20 mg/d);
▶ Quetiapina (50 a 800 mg/d);
▶ Risperidona (2 a 6 mg/d);
▶ Zuclopentixol (50 a 75 mg/d);
▶ Aripiprazol (10 a 30 mg/d);
▶ Ziprasidona (40 a 160 mg/d);
▶ Paliperidona (3 a 12 mg/d).
▶ Lurasidona (40 a 140 mg/dia).
São os antipsicóticos mais recentemente lançados no mercado e
não se classificam como fenotiazínicos (sedativos) nem como
butirofenonas (incisivos). Esses medicamentos têm se mostrado
um novo e valioso recurso terapêutico nas psicoses refratárias
aos antipsicóticos tradicionais, nos casos de intolerância aos
efeitos colaterais extrapiramidais, bem como nas psicoses com
sintomas negativos predominantes, em que os antipsicóticos
tradicionais podem ser ineficazes.
São indicados para os casos de esquizofrenia e outras psicoses
em que os sintomas positivos — delírios, alucinações,
pensamento desordenado, hostilidade e medo — ou os negativos
— indiferença afetiva, depressão emocional e social, pobreza de
linguagem — são predominantes.
13.2.4 Ação farmacológica dos antipsicóticos
Apesar dos antipsicóticos tradicionais bloquearem receptores
adrenérgicos, serotoninérgicos, colinérgicos e histaminérgicos,
todos têm em comum a ação farmacológica de bloquear os
receptores dopaminérgicos. É em relação a estes últimos que os
estudos têm demonstrado os efeitos clínicos dos antipsicóticos.
O bloqueio dos outros receptores, além dos dopaminérgicos,
estaria relacionado mais aos efeitos colaterais da droga do que
aos terapêuticos. Os receptores da DA mais conhecidos são o D1
e o D2, ambos pós-sinápticos, além dos receptores localizados no
corpo do neurônio dopamínico e no terminal pré-sináptico. A
atividade terapêutica dos antipsicóticos parece estar relacionada,
principalmente, com o bloqueio da DA nos receptores pós-
sinápticos do tipo D2.
A DA liberada próxima aos capilares da circulação porta-
hipofisária chega à hipófise anterior e acaba, entre outros efeitos,
por aumentar a liberação secundária de prolactina. A hipotensão,
sedação e tontura, efeitos colaterais comuns aos antipsicóticos
tradicionais, normalmente ocorrem devido à capacidade desses
medicamentos bloquearem também os receptores alfa-
adrenérgicos.
Os antipsicóticos tradicionais, como a clorpromazina e o
haloperidol, são eficazes em mais de 80% dos pacientes com
esquizofrenia, atuando, predominantemente, nos sintomas
chamados produtivos ou positivos — alucinações e delírios — e,
em grau muito menor, nos chamados sintomas negativos —
apatia, embotamento e desinteresse.
13.2.5 Efeitos colaterais

#importante
Os efeitos extrapiramidais são mais
comuns com o uso de antipsicóticos
típicos.

Entre os efeitos colaterais provocados pelos antipsicóticos, o


mais estudado é a chamada impregnação antipsicótica ou
síndrome extrapiramidal. Essa situação é o resultado da ação do
medicamento na via nigroestriatal, em que parece haver balanço
entre as atividades dopaminérgicas e colinérgicas. Dessa forma, o
bloqueio dos receptores dopaminérgicos provocará supremacia
da atividade colinérgica e, consequentemente, liberação dos
sintomas ditos extrapiramidais. Esses efeitos colaterais, com
origem no SNC, podem ser divididos em cinco tipos, conforme
segue.
13.2.5.1 Distonia aguda

A distonia aguda é frequente nas primeiras 48 horas de uso de


antipsicóticos, portanto, é uma das primeiras manifestações de
impregnação pelo antipsicótico. Clinicamente, observam-se
movimentos espasmódicos da musculatura do pescoço, da boca,
da língua e, algumas vezes, um tipo de crise oculógira. O
tratamento desse efeito colateral é feito à base de
anticolinérgicos injetáveis intramusculares (biperideno), sempre
eficazes em poucos minutos.
13.2.5.2 Parkinsonismo medicamentoso

Em geral, acontece após a primeira semana de uso dos


antipsicóticos. Clinicamente, há tremor de extremidades,
hipertonia e rigidez muscular, hipercinesia e fácies inexpressiva. O
tratamento com anticolinérgicos ou antiparkinsonianos
(amantadina) é igualmente eficaz. Para prevenir o aparecimento
desses desagradáveis efeitos colaterais, pode-se optar pelo uso
concomitante de biperideno por via oral.
13.2.5.3 Acatisia

Ocorre, em geral, após o terceiro dia de medicação e é


clinicamente caracterizada por inquietação psicomotora, desejo
incontrolável de movimentar-se e sensação interna de tensão. O
paciente assume postura típica de levantar-se a cada instante,
andar de um lado para outro e, quando compelido a permanecer
sentado, não para de mexer as pernas. A acatisia não responde
bem aos anticolinérgicos, e o clínico é obrigado a decidir-se entre
a manutenção do tratamento antipsicótico com aquele
medicamento e com aquelas doses e o desconforto da
sintomatologia. Com frequência, é necessária a diminuição da
dose ou a mudança para outro tipo de antipsicótico. Quando isso
acontece, normalmente se deve recorrer aos antipsicóticos
atípicos ou de última geração.
13.2.5.4 Discinesia tardia

Aparece após o uso crônico de antipsicóticos, em geral, após dois


anos. Clinicamente, é caracterizada por movimentos
involuntários, sobretudo da musculatura orolinguofacial, havendo
protrusão da língua com movimentos de varredura laterolateral,
acompanhados de movimentos sincrônicos da mandíbula. O
tronco, os ombros e os membros também podem apresentar
movimentos discinéticos. A discinesia tardia não responde a
nenhum tratamento conhecido, embora, em alguns casos, possa
ser suprimida com a readministração do antipsicótico ou,
paradoxalmente, aumentando a dose já utilizada.
A discinesia tardia tem sido menos frequente depois do advento
dos antipsicóticos atípicos ou de última geração.
13.2.5.5 Síndrome antipsicótica maligna

Trata-se de uma forma raríssima de toxicidade provocada pelo


antipsicótico. É uma reação adversa que depende mais do agente
agredido do que do agente agressor, como uma espécie de
hipersensibilidade à droga. Clinicamente, observa-se grave
distúrbio extrapiramidal acompanhado por intensa hipertermia —
de origem central —, aumento da creatinofosfoquinase,
diminuição da pressão arterial e distúrbios autonômicos. Leva a
óbito uma proporção de 20 a 30% dos casos e independe da dose
de antipsicótico utilizada. A conduta compreende suspensão do
antipsicótico, internação em unidade intensiva, hidratação e
utilização de agonista dopaminérgico (bromocriptina) e
miorrelaxantes (dantroleno).
Além dos efeitos adversos dos antipsicóticos tradicionais sobre o
SNC, são observados reflexos de sua utilização em nível
sistêmico, conforme descrito a seguir:
▶ Autonômicos: secura da boca e da pele, dificuldade de
acomodação visual e, mais raramente, retenção urinária;
▶ Cardiovasculares: alterações eletrocardiográficas, como
aumento do intervalo PR, diminuição do segmento ST e
achatamento de onda T — essas alterações são benignas e não
costumam ter significado clínico. Das alterações
cardiovasculares, a mais comum é a hipotensão;
▶ Endocrinológicos: amenorreia e, menos frequentemente,
galactorreia e ginecomastia;
▶ Gastrintestinais: constipação intestinal e boca seca, que
também podem ser observadas durante o tratamento, como
consequência dos efeitos anticolinérgicos.
13.3 ANSIOLÍTICOS E HIPNÓTICOS
13.3.1 Benzodiazepínicos
▶ Alprazolam
▶ Bromazepam
▶ Clobazam
▶ Clonazepam
▶ Clordiazepóxido
▶ Cloxazolam
▶ Diazepam
▶ Lorazepam
Quando se mencionam ansiolíticos, trata-se praticamente dos
benzodiazepínicos, uma das drogas mais usadas no mundo e,
talvez por isso, considerada problema da saúde pública nos países
mais desenvolvidos. Os benzodiazepínicos são capazes de
estimular no cérebro mecanismos que normalmente equilibram
estados de tensão e ansiedade. Aparentemente, o efeito
ansiolítico dos benzodiazepínicos relaciona-se ao sistema de
neurotransmissores gabaérgicos do sistema límbico. O ácido
gama-aminobutírico é um neurotransmissor com função
inibitória, capaz de atenuar as reações serotoninérgicas
responsáveis pela ansiedade. Os benzodiazepínicos seriam,
então, agonistas (simuladores) desse sistema, agindo nos
receptores gabaminérgicos. Como consequência dessa ação, os
ansiolíticos produzem depressão da atividade do cérebro que se
caracteriza por diminuição de ansiedade, indução de sono,
relaxamento muscular, redução do estado de alerta e aumento
limiar de convulsão.
É importante notar que os efeitos dos benzodiazepínicos podem
ser fortemente aumentados pelo álcool, e a mistura pode ser
prejudicial.
Naturalmente, pode-se valer dos benzodiazepínicos como
coadjuvantes do tratamento psiquiátrico, quando a causa-base da
ansiedade não é prontamente resolvida. No caso de paciente
deprimido e, consequentemente, ansioso, os benzodiazepínicos
podem ser úteis enquanto o tratamento antidepressivo não
exerce o efeito desejável. Trata-se, nesse caso, de uma
associação medicamentosa provisória e benéfica ao paciente.
Entretanto, com a progressiva melhora do quadro depressivo, não
haverá mais razões clínicas para a continuação dos
benzodiazepínicos e/ou ansiolíticos.
13.3.2 Zolpidem
Trata-se de um fármaco hipnótico, do grupo das imidazopiridinas,
não benzodiazepínico, de rápida ação e de curta meia-vida. É
utilizado na dose de 5 a 10 mg/d, para o tratamento em curto
prazo da insônia — de duas a seis semanas.
O zolpidem deve ser usado com cautela, pois tem potencial de
causar amnésia anterógrada, descoordenação motora, fadiga,
tonturas, alucinações e sonambulismo.
Os principais efeitos colaterais são sedação e sonolência,
variáveis de indivíduo para indivíduo, de acordo com a dose do
medicamento. Os casos de dependência aos benzodiazepínicos
se restringem, na maioria das vezes, ao uso muito prolongado e
com doses acima das habituais. Há tendência atual em considerar
o fenômeno da dependência ao benzodiazepínico, até certo
ponto, mais ligado aos traços da personalidade do que de alguma
característica da droga.
13.4 ESTABILIZADORES DE HUMOR
▶ Carbamazepina
▶ Oxcarbazepina
▶ Carbonato de lítio
▶ Ácido valproico
▶ Divalproato de sódio
▶ Lamotrigina
▶ Gabapentina
▶ Topiramato
Os estabilizadores de humor são substâncias não essencialmente
antidepressivas nem sedativas. Internacionalmente,
reconhecem-se algumas substâncias capazes de desempenhar
tal papel: o lítio; a carbamazepina; o ácido valproico; e mais
recentemente, o divalproato de sódio. Alguns outros
anticonvulsivantes estão sendo estudados quanto à eficácia
como estabilizadores do humor, como a lamotrigina e a
gabapentina.
As indicações exclusivas para os estabilizadores de humor são os
transtornos afetivos bipolares e os episódios de mania (euforia)
ou hipomania.
13.4.1 Carbamazepina
A carbamazepina é metabolizada no fígado, e um metabólito seu
tem atividade anticonvulsivante, antidepressiva e antineurálgica.
Tem ação importante como estabilizador de humor por agir no
sistema gabaérgico, nos canais de sódio, além de bloquear os
canais de cálcio.
As reações adversas podem ocorrer em pacientes que
apresentam letargia, debilidade, náuseas, vômitos, confusão ou
hostilidade, anomalias neurológicas ou estupor, devendo-se
suspeitar de hiponatremia. São de incidência mais frequente
visão turva, cefaleia contínua, aumento da frequência de crises
convulsivas, sonolência e debilidade. Em diabéticos, pode haver
aumento nas concentrações de açúcar na urina.
13.4.2 Carbonato de lítio
O lítio não se une às proteínas plasmáticas nem é metabolizado, e
elimina-se 95% de forma inalterada pelo rim. A eliminação é
inicialmente rápida e, após tratamento prolongado, torna-se mais
lenta. Na forma ativa, 80% do lítio pode ser reabsorvido no túbulo
proximal. O início de sua ação terapêutica pode demorar de uma a
três semanas. É o medicamento de primeira escolha para o
começo do tratamento, principalmente em casos de mania.
Como reações adversas podem advir frequência de micção
aumentada, aumento da sede, náuseas, tremor das mãos,
desvanecimentos, taquicardia, pulso irregular, dispneia de
esforço, sonolência e confusão. Como contraindicações estão
gravidez — efeito teratogênico —, lactação e disfunção renal ou
cardíaca grave.
13.4.2.1 Precauções

O lítio é excretado no leite materno. Em alguns lactentes, foram


descritos sinais de toxicidade, como hipotonia, hipotermia,
cianose e alterações ao eletrocardiograma. Os idosos necessitam,
geralmente, de dose menor, devido ao volume de distribuição e à
velocidade do clearance renal estarem reduzidos. O lítio é
potencialmente tóxico para o SNC, inclusive em concentrações
séricas dentro do alcance terapêutico. Deve ser administrado
com precaução na presença de doença cardiovascular — pode
exacerbar-se —, de alterações do SNC — epilepsia e
parkinsonismo —, de desidratação grave — aumenta o risco de
toxicidade — e de insuficiência renal ou retenção urinária. A
toxicidade por lítio pode aparecer em concentrações séricas
terapêuticas ou próximas a elas. Durante a fase maníaca aguda, o
paciente pode ter grande capacidade para tolerar o lítio, dado que
diminui a reabsorção de sódio pelos túbulos renais.
Recomendam-se consumo de cloreto de sódio e adequada
ingestão de líquidos, de 2,5 a 3 L/d. Sua administração deve ser
cuidadosa nos casos de bócio ou hipotireoidismo, já que pode
agravá-los. Antes e durante o tratamento, recomenda-se efetuar
a determinação da função renal, além da contagem de leucócitos
e eletrocardiogramas. É aconselhável efetuar exames do lítio
sérico durante o tratamento:
▶ Faixa terapêutica: litemias entre 0,6 e 1,2 mEq/L. Dose
aproximada de 900 a 1.200 mg/d;
▶ Litemia acima de 1,5 — intoxicação: náuseas, vômitos, diarreia,
tremores grosseiros, moleza e disartria;
▶ Intoxicação grave (superior a 2): turvação da consciência,
hipertonia muscular, fasciculação, hiper-reflexia, convulsões,
coma;
▶ Soro fisiológico positivo: diuréticos osmóticos para estimular a
excreção renal;
▶ Entre 2 e 4: monitorização de eletrólitos, litemia e
eletrocardiograma;
▶ Litemia acima de 4: hemodiálise ou diálise peritoneal.

13.4.3 Ácido valproico


Apresenta boa ação estabilizadora de humor, principalmente em
estado misto do transtorno afetivo bipolar.
As reações adversas podem ser com náuseas, vômitos, dor
abdominal, aumento de peso, dor na barriga e alopecia. Não deve
ser usado por grávidas nem por lactantes; pode inibir a
cicatrização e não deve ser usado por pacientes com
hepatotoxicidade ou distúrbio no ciclo da ureia.
13.5 ELETROCONVULSOTERAPIA
A eletroconvulsoterapia (ECT) é um tipo de tratamento biológico
para transtornos mentais altamente eficaz e extremamente
seguro. Desde o seu princípio, na década de 1930, a ECT foi
utilizada para condições psiquiátricas nas quais outros
tratamentos tiveram pouco ou nenhum benefício.
13.5.1 Técnica
O tratamento consiste na aplicação de uma carga elétrica no
cérebro, com o paciente anestesiado — é feita anestesia geral,
que dura em torno de 5 minutos. Essa carga produz uma descarga
do cérebro, originando uma convulsão, a qual é bastante diferente
da que ocorre nas pessoas com epilepsia, pois é administrada ao
paciente uma medicação que promove relaxamento muscular
junto à anestesia. Durante a aplicação, faz-se controle do
funcionamento cardíaco — monitorização por meio de
eletrocardiograma — e da oxigenação do sangue — por
intermédio de oxímetro —, além do controle da pressão arterial.
Os aparelhos utilizados para a ECT atualmente são muito
desenvolvidos, permitindo uma carga de energia adequada para
cada paciente. Pode-se realizar a aplicação bilateral, com os
eletrodos posicionados nas têmporas, ou unilateral, com um
eletrodo posicionado na têmpora e outro na região superior da
cabeça. Durante o procedimento, realiza-se eletroencefalograma
para controle da crise.
13.5.2 Indicações
A principal indicação para o uso de ECT é a depressão,
especialmente se grave ou resistente ao tratamento com
remédios, ou aos casos com risco elevado de suicídio. A eficácia
nesse transtorno é de cerca de 90%, comparada com as
medicações, em torno de 70%. Idosos, que são mais sensíveis aos
efeitos colaterais das medicações antidepressivas, podem se
beneficiar bastante com a ECT. Também pode ser utilizada para
casos em que haja catatonia, síndrome comum na esquizofrenia,
na qual a pessoa fica completamente parada, sem falar e sem
alimentar-se. Para pacientes com transtornos mentais durante a
gestação, como depressões e psicoses, a ECT é o tratamento
mais seguro, pois os remédios podem fazer mal à criança,
causando malformações, especialmente no primeiro trimestre da
gravidez. Indivíduos com esquizofrenia ou transtorno bipolar do
humor em fase de mania também podem beneficiar-se com a
ECT, sobretudo quando o quadro é grave e/ou as medicações não
obtiveram resultado satisfatório.

#importante
A eletroconvulsoterapia é a primeira
indicação em gestantes bipolares, idosos
com ideação suicida e catatônicos.

13.5.3 Riscos
Antes do início das aplicações, por questão de segurança
relacionada ao risco da anestesia, é sempre realizada avaliação
pré-ECT, que consiste em:
▶ Exames laboratoriais — hemograma, glicemia, nível sérico de
potássio;
▶ Eletrocardiograma e avaliação cardiológica;
▶ Avaliação odontológica;
▶ Exame de fundo de olho ou tomografia de crânio;
▶ Radiografia de tórax.
Apesar de ser um tratamento muito seguro, há algumas
condições nas quais há risco aumentado, por isso há
contraindicação relativa ao uso da ECT. É claro que, caso o risco
de ficar sem ECT seja maior, deve-se fazê-la, tomando os devidos
cuidados. As contraindicações relativas são: infarto do miocárdio
recente, até seis meses; condições que aumentem a pressão
intracraniana, como tumores ou hematomas; aneurisma cerebral
ou sangramentos cerebrais. Arritmias devem ser avaliadas por
cardiologista, pois a maioria não contraindica a ECT.
13.5.4 Efeitos colaterais
São dois os principais efeitos colaterais da ECT: dor de cabeça,
que costuma melhorar com analgésicos comuns e alterações na
memória, que é recuperada completamente em seis meses. Com
as técnicas modernas, esses efeitos são leves e pouco
frequentes.
13.5.5 Curso do tratamento
A ECT costuma ser realizada três vezes por semana, com uma
média de 6 a 12 aplicações para apresentar o seu efeito — mínimo
de 1 e máximo de 20 aplicações. Pode ser feita com o paciente
internado ou em regime ambulatorial — ele vem de casa para a
sessão e, ao acordar da anestesia, retorna. A frequência e o
número das aplicações são decididos pelo consenso entre o
médico que indicou a ECT e a equipe especializada. Se o paciente
responde bem ao tratamento, pode ser realizada a ECT de
manutenção, na qual as aplicações se tornam espaçadas: no
começo, semanalmente; depois, quinzenalmente e, por fim,
mensalmente.
13.6 ESTIMULAÇÃO TRANSMAGNÉTICA
A estimulação magnética transcraniana repetitiva (TMS) de alta
frequência sobre o córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo
apresenta resultados satisfatórios e significativos no tratamento
de pacientes com depressão maior. É uma técnica
neurofisiológica que permite a indução de um campo magnético
no cérebro de maneira indolor e não invasiva. A TMS é aplicada
colocando-se uma espiral metálica envolta em plástico (bobina)
sobre a cabeça para a emissão de pulsos magnéticos que atuam
sobre o cérebro de maneira focalizada. Dependendo da
frequência, os estímulos podem aumentar ou diminuir a atividade
da área cerebral atingida e, assim, pode-se aplicar
terapeuticamente modulando (equilibrando) o funcionamento
neuronal, de acordo com o problema apresentado.
13.7 PSICOTERAPIA
A psicoterapia é uma possibilidade de tratamento que visa à
abordagem das dificuldades afetivas ou mentais do paciente para
a sua melhora global. É uma excelente aliada ao tratamento
farmacológico na maioria dos pacientes.
Existem vários tipos de psicoterapia, com técnicas variadas para a
sua aplicação. A melhor é a que atende satisfatoriamente às
expectativas tanto do terapeuta quanto do paciente. Algumas são
citadas a seguir.
13.7.1 Psicanálise
A psicanálise é um método de tratamento psíquico e de
investigação do inconsciente, desenvolvido por Sigmund Freud
(1856-1939). Freud desenvolveu os conceitos de transferência e
contratransferência. Em uma perspectiva psicanalítica, a
transferência ocorre quando o indivíduo, durante o processo de
exploração dos conteúdos internos da psique, por meio da
associação livre, começa a projetar no analista atitudes e
sentimentos infantis. É por meio dela que o terapeuta pode
auxiliar o paciente. Partindo da transferência, recriam-se
situações capazes de organizar muitos níveis de experiências,
vínculos e diferenciações. A contratransferência é a projeção e a
distorção do vínculo que parte do terapeuta para o paciente.
13.7.2 Psicoterapia cognitiva
Sistema de terapia cujo princípio básico é que as cognições —
pensamentos, crenças, interpretações — de um indivíduo diante
das situações influenciam suas emoções e seus
comportamentos. O terapeuta atua sobre as cognições, a fim de
alterar as emoções e os comportamentos que as acompanham.
13.7.3 Psicoterapia comportamental
Esse é o nome dado à abordagem fundamentada no
behaviorismo radical de Skinner. Caracteriza-se por preocupar-se
com a comprovação científica de seus procedimentos. O
terapeuta comportamental investiga vários aspectos do
comportamento — motores, afetivos, cognitivos — e busca
estabelecer relações do tipo de comportamento com as
condições físicas e sociais em que este ocorre. Estilo de terapia
bastante utilizado para alívio de sintomas de doenças mentais.
13.7.4 Psicologia analítica
A psicologia analítica foi criada por C. G. Jung. Apesar de ter
muitos aspectos em comum com a psicanálise, Jung acentua a
importância do simbolismo cultural e arquetípico na formação da
personalidade.
13.7.5 Psicodrama
Muito parecida com o teatro, esta modalidade de psicoterapia foi
desenvolvida por J. L. Moreno. Sua linha de ação é o desempenho
dos vários papéis por parte do paciente em seu cotidiano.
Quais são as principais
classes de medicações
psiquiátricas?
As principais classes de medicações psiquiátricas são:
antidepressivos, utilizados em quadros de depressão
unipolar e transtornos de ansiedade; antipsicóticos,
utilizados em quadros de agitação, psicose, transtorno
bipolar e como potencializadores de antidepressivos;
ansiolíticos e hipnóticos, usados no tratamento de
ansiedade de curta duração e insônia, respectivamente;
estabilizadores de humor, usados no tratamento de
transtorno afetivo bipolar, controle da impulsividade e
como potencializadores de antidepressivos.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Na primeira fase da PUC-RS, atente-se para os temas de Bioética
e Epidemiologia. No geral, a prova contém 60 questões, com
quatro alternativas, divididas entre as áreas de Cirurgia Geral,
Clínica Médica, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria e Medicina de
Família e Comunidade. Esteja preparado para perguntas sobre
Sistema Único de Saúde (SUS), atendimento primário e
Cardiologia. Na fase seguinte, apenas para alunos aprovados, será
realizada uma avaliação curricular. Por isso é importante ficar
atento à formatação e à entrega.
PUC-RS | 2020
Quanto ao tratamento farmacológico da esquizofrenia, afirma-se:
I - Antes de se considerar um paciente resistente a determinada
droga, é necessário um período de 4 a 6 semanas de
administração de doses adequadas do fármaco sem que exista
qualquer resposta ao tratamento.
II - A clozapina, a despeito de apresentar risco de efeitos adversos
potencialmente graves (como a agranulocitose), é reconhecida
por ser um antipsicótico mais eficaz que os demais antipsicóticos
típicos, particularmente em casos refratários.
III - O aparecimento de efeitos colaterais extrapiramidais (como
distonias, impregnação e tremores) é indicação de suspensão de
uso de antipsicóticos típicos.
Estão corretas as afirmativas:
a) I e II, apenas
b) I e III, apenas
c) II e III, apenas
d) I, II e III
Gabarito: a
Comentários:
a) I - Correta. O Schizophrenia Algorithm da International
Psychopharmacology Algorithm Project (IPAP) define que um
paciente é considerado como refratário se não responder a dois
ensaios clínicos de quatro a seis semanas de duração de
monoterapia com dois Antipsicóticos de Segunda Geração (ASG),
ou a dois ensaios com um Antipsicótico de Primeira Geração
(APG), se não estiverem disponíveis ASGs.
II - Correta. A clozapina é o único agente comprovadamente
eficaz no tratamento da esquizofrenia refratária.
III - Incorreta. Os efeitos extrapiramidais podem ser tratados com
associação de outras drogas, como anticolinérgicos,
benzodiazepínicos e betabloqueadores, não implicando
necessariamente a suspensão do antipsicótico atípico.
b) Veja o comentário geral na alternativa correta.
c) Veja o comentário geral na alternativa correta.
d) Veja o comentário geral na alternativa correta.

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