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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA

CAMPINA GRANDE - CAMPUS I


CENTRO DE EDUCAÇÃO – CEDUC I
CURSO: LICENCIATURA PLENA EM HISTÓRIA

RAFAEL DOS SANTOS CAMPOS

NOS ENTRELAÇOS DA MEMÓRIA, NAS TRAMAS DA HISTÓRIA:


REPRESENTAÇÕES DA ESCOLA AGRÍCOLA ASSIS CHATEAUBRIAND UEPB
DE LAGOA SECA – PB (1962-1992)

CAMPINA GRANDE – PB
2013
RAFAEL DOS SANTOS CAMPOS

NOS ENTRELAÇOS DA MEMÓRIA, NAS TRAMAS DA HISTÓRIA:


REPRESENTAÇÕES DA ESCOLA AGRÍCOLA ASSIS CHATEAUBRIAND UEPB
DE LAGOA SECA – PB (1962-1992)

Monografia apresentada ao Curso de


História da Universidade Estadual da
Paraíba, em cumprimento à exigência
para obtenção do grau de Graduado em
História.

Orientadora:
Profª Drª Patrícia Cristina de Aragão Araújo

CAMPINA GRANDE – PB
2013
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL – UEPB

C198n Campos, Rafael dos Santos.


Nos entrelaços da memória, nas tramas da história
[manuscrito] : representações da Escola Agrícola Assis
Chateaubriand UEPB de Lagoa Seca – PB (1962-1992) /
Rafael dos Santos Campos. – 2013.
94 f. : il. color.

Digitado.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em
História) – Universidade Estadual da Paraíba, Centro de
Educação, 2012.

“Orientação: Profa. Dra. Patrícia Cristina de Aragão


Araújo, Departamento de História”.

1. Historiografia 2. Escola Agrícola Assis


Chateaubriand 3. Memória I. Título.

21. ed. CDD 907.2


DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha família. Vocês foram suporte em


tudo o que fiz na vida… este trabalho é nossa vitória, conquista
nossa!
AGRADECIMENTOS

Longe de ser uma simples recomendação acadêmica, esta parte para mim é
tão importante quanto todo o restante deste trabalho.

Em nossa pequena/grande existência traçamos nosso percurso nunca a sós.


A vida é algo estranho e paradoxal. Ela é marcada pela dependência/
independência. Somos autônomos, porém totalmente dependentes do outro. Essas
contradições lógicas permeiam nosso andar diário, porém são evidentes verdades.

Agradeço a Deus, que me soprou nas narinas o fôlego da vida, me fez ver
beleza na existência, me trouxe luz, esperança, amor e amparo. Participou junto
conosco da natureza humana, da existência temporal. Amou-nos. Chorou. Sofreu.
Manifestou-se em carne na pessoa de Jesus Cristo trazendo luz e salvação a todos
os seres humanos e mantendo real Sua presença em minha vida.

Agradeço à minha família. Minha Mãe, Maria Gorete: deu-me à luz. Cuidou
de mim. Amou-me. Sempre quis o melhor pra mim e muito se doou para isso
acontecer. Foi mãe e pai em minha vida. Te amo... Vovó: cuidou de mim como um
filho, contou histórias e aturou minhas chatices. Te amo... Paim: você esteve lá nas
horas difíceis, cuidou de mim. Te amo… Vocês foram meu suporte. Sem vocês não
teria chegado a lugar nenhum. Minha vitória é sua vitória. Esta humilde conquista,
dedico a vocês. Como posso agradecer o que fizeram? Devo tudo a vocês. Muito
obrigado!

Minha Esposa e companheira Rebeca: sempre, sempre e sempre me


apoiou em todas as loucuras que sonhei, nunca me deixou desistir de nada. Você
que sempre me aturou e me amou, apesar dos pesares. Obrigado. Minha filha, Ana
Sophia, linda (!), que com seu sorriso irradia minha vida com a mais pura paz que
um ser pode conceder a outro, com seu amor sincero me restaura a alegria e seus
gestos carinhosos me fazem feliz.

Agradeço à família de minha esposa: Minha Sogra, Marister. Obrigado


pelas comidas deliciosas, principalmente os retoques nas mesmas pensando em
mim. Seus cardápios são dignos de honra. Você cuidou de minha filha como sendo
sua. Agradeço à meu Sogro que também me apoiou para que pudesse concluir este
curso. Agradeço também à Raquel, irmã de Rebeca, que querendo ou não, muito
me ajudou cuidando de minha filhinha para que eu pudesse estudar.

Agradeço a instituição Escola Agrícola Assis Chateaubriand UEPB


Campus II, e ao professor Mário Sérgio por ter me recebido com muito carinho e
confiança, e por toda a sua disposição em me ajudar nesta pesquisa.

Agradeço a Fábio, ex-funcionário da escola, que me prestou grande auxílio


na pesquisa e na organização dos documentos escolares, sempre com paciência, e
isso é tão importante…

Agradeço a meus entrevistados. Joaquim Vitoriano Pereira, muito obrigado


por gentil e humildemente me receber em sua residência, mesmo sem me conhecer.
Sua cordialidade e disponibilidade são exemplos de humanidade.

Maria de Lourdes Araújo, você foi muito encorajadora neste trabalho. Sou
grato por todo o seu entusiasmo em me ajudar na pesquisa na Escola Agrícola, sua
energia é contagiante. Recebeu-me em sua casa com muita paciência e interesse.

Neuza dos Anjos, a senhora que ficou até 16horas numa tarde de domingo
sem almoçar pra me conceder uma entrevista. Foi muito gentil e amigável sempre
me falando com muito entusiasmo e se mostrando disposta a me ajudar no que
pudesse. Agradeço a todos vocês pelo carinho, atenção e tempo concedidos.

Qual o valor dos gestos de vocês?

Não agradeço à orientadora nenhuma! Até porque não tenho uma. Tenho sim
uma amiga, sincera, atenciosa e paciente que espero ter por toda a vida. Patrícia
Cristina nunca esquecerei que desde o primeiro ano de graduação você muito me
aconselha, me puxa a orelha, sempre instiga a querer mais e a buscar o melhor.
Tudo o que você fez por mim está registrado em minha memória. Este trabalho só foi
possível graças a você! Sou grato eternamente.

Agradeço aos professores banca examinadora. Professor Alberto Edvanildo


Sobreira Coura e Maria Lindaci Gomes de Souza que se dispuseram a ler meu
trabalho e fazer suas considerações que desde já são muito bem-vindas! Agradeço
pela disponibilidade em ler o nosso texto para o aperfeiçoamento e enriquecimento
do mesmo. Muito obrigado pela grande gentileza.
Agradeço ao curso de História e à instituição UEPB, que tornaram possível
minha formação. Especialmente à Socorro Morais que sempre, sempre e sempre
me recebeu bem na coordenação deste curso, nos orientou em tudo e sempre se
dispôs a ajudar. Eu era um dos alunos que dizia em coro com muita gente: “Socorro
é a luz daquele CEDUC!”.

Agradeço a todos os professores que tive nesta instituição. Garanto que com
cada um de vocês aprendi algo de bom na minha formação docente.

Agradeço a todos os meus amigos e colegas que encontrei na vida, pois me


impulsionaram e acreditaram na minha capacidade, que me inspiraram direta e
indiretamente, de um jeito ou de outro. Instigaram-me a estudar mais, provocando,
discordando e discutindo intelectualmente. Muitos torceram e acreditaram em mim,
às vezes, mais do que eu mesmo. Especialmente a alguns, os mais chegados, por
ordem alfabética, para não haver discriminação: Alex Albino, Elisabeth Barros,
Francisco Siqueira e Rebeca Campos. Também aos das antigas: Clayton
Carvalho, Itapoan Barbosa, José Amaro (Mizinho), vocês me instigaram a passar no
vestibular. Eduardo (Dudu Geógrafo) valeu pelas dicas nas edições das fotos, slides
e formatação do texto. E a todos os outros que também contribuíram para minha
formação e acreditaram em mim. Valeu pela força galera!

Por fim, aqui vai uma “mistureba”: não poderia deixar de agradecer
sinceramente às bandas de Rock/Heavy Metal que ouvi desde minha adolescência,
fui muito inspirado pelo que ouvi. Agradeço também a todos os pensadores:
filósofos, historiadores, teólogos, dentre outros, que encontrei ao longo de minha
graduação: vocês me inspiraram e me deram forças para superar as barreiras
intelectuais, me instigando a querer mais. Fui moldado e lapidado por tudo o que
escutei e li, muito me inspirei e aprendi ouvindo boa música, lendo boas literaturas.
Hoje sou quem sou graças a essa mistura de influências e ritmos.
“Daqui desse momento
Do meu olhar pra fora
O mundo é só miragem
A sombra do futuro
A sobra do passado
Assombram a paisagem
[…]
A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo

A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito
Só o que me interessa”

Lenine
RESUMO

O presente estudo aborda a memória e a história da Escola Agrícola Assis


Chateaubriand, de Lagoa Seca - PB, com o objetivo de compreender a
trajetória desta instituição no campo da História Cultural em interface com a
História da educação. Para tanto, discute a memória da escola
consubstanciada nas histórias de vida dos sujeitos, representados por uma
ex-aluna, uma ex-professora e um ex-gestor, bem como analisa os
documentos escolares como atas de reunião, fotografias e regimentos que
fazem parte do acervo da escola. Verifica também as práticas educativas
exercidas no cotidiano escolar, a partir do pensamento de Certeau (2008), e os
lugares de memória da escola através de diálogos com Nora (1993). Adota a
História Oral como aporte teórico-metodológico considerando narrativas de
docentes e discente que fizeram parte da instituição. O referencial teórico da
pesquisa fundamenta-se nas concepções de Julia (2001), Freitas
(2006), Chartier (1991), Ricoeur (2010) e Halbwachs (2008). Nessa perspectiva,
considera que a tessitura da história dessa instituição pode contribuir para
que a história e a memória escolar sejam preservadas, contribuindo para a
ressignificação e contextualização da educação do município de Lagoa Seca.

Palavras-chave: Memória. Escola. História da Educação. Representações.


ABSTRACT

This paper brings forth the results of a research previously done regarding the
memory and history of the Escola Agrícola Assis Chateaubriand, located in the
city of Lagoa Seca, state of Paraíba. Our goal was to comprehend the history of
said institution as far as its cultural history goes, along with the history of
education, approaching the school's memory by way of the life history of a
former student, a former teacher, and a former principal, as well as through
documents, such as the school's meeting logs, photographs and rules. We
also analyzed the school's daily educational practices under the guidance of
CERTEAU (2008) and the school's memory place under the guidance of NORA
(1993). We worked with oral history as the methodological approach, making
use of the narratives given to us by the faculty members and former student
that were involved with the school. We also made use of documental sources
such as the school's meeting logs, photographs and rule. The theoretical
referential for the research is based on the ideas of JULIA (2001), FREITAS
(2006), CHARTIER (1991), RICOEUR (2010) and HALBWACHS (2008). We
consider the structuring of the history of a school can make so the the memory
of said school lasts, and, thus, giving a new way to see and insert the school in
the city's educational history.

Key – Words: Memory. School. History Education. Representations


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................13

2. MEMÓRIA E HISTÓRIA DAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES: UMA


ABORDAGEM NO CONTEXTO DA HISTÓRIA CULTURAL...................................27
2.1. A HISTÓRIA CULTURAL E OS ESTUDOS SOBRE INSTITUIÇÕES
ESCOLARES.............................................................................................................27
2.2. MEMÓRIA E HISTÓRIA DA ESCOLA...............................................................35

3. NAS TESSITURAS DA HISTÓRIA: TRAJETÓRIA DA ESCOLA AGRICOLA


ASSIS CHATEAUBRIAND........................................................................................41
3.1. TRAJETOS E PERCURSOS DA HISTÓRIA DA ESCOLA AGRÍCOLA ASSIS
CHATEAUBRIAND....................................................................................................41
3.2. PRÁTICAS EDUCATIVAS NOS TERRITÓRIOS DA ESCOLA
AGRÍCOLA................................................................................................................51

4. REPRESENTAÇÕES E NARRATIVAS SOBRE A ESCOLA ASSIS


CHATEAUBRIAND DE LAGOA SECA.....................................................................61

4.1. ESPAÇO ESCOLAR, REPRESENTAÇÕES E MEMÓRIAS..............................62

4.2. TECENDO HISTÓRIAS E RESSIGNIFICANDO MEMÓRIAS............................72

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................83

REFERÊNCIAS..........................................................................................................86

APÊNDICES...............................................................................................................91
13

INTRODUÇÃO

A memória e história do espaço escolar, enquanto campo de estudo fazem


parte atualmente do debate educacional, interessando sobretudo, ao contexto da
história da educação. Neste sentido, desenvolver uma pesquisa e estudo sobre a
instituição escolar, considerando esses aspectos das memórias e histórias, é pensar
também sua relação com a cidade e as mudanças que ali foram sendo
operacionalizadas.

Abordar a história e a memória de uma instituição escolar implica perscrutar


sua cultura, a construção das identidades dos sujeitos que nela inseriram, bem como
as ações do cotidiano e as relações de poder que permeiam o espaço escolar e
também conhecer quais representações os sujeitos que nela atuaram projetam
sobre si mesmos.

Compreender a história da escola proporciona aos educadores e aos demais


sujeitos que a constituem, uma reflexão sobre o lugar e o espaço em que atuam
como seres históricos. Desse modo, concordamos com Fonseca (2008) quando diz
que

ninguém escapa de uma história da educação, uma vez que somos


todos sujeitos dela, de uma maneira ou de outra, frequentando ou
não a escola, nos cultos, nas igrejas, nas festas, nas famílias, nas
ruas, na roça, na cidade, com amigos […] Para nós, historiadores da
educação, uma constatação evidente é a de que investigar os
processos do aprender é fundamental para ampliarmos a
compreensão das formas de como em tempos e espaços distintos,
homens e mulheres organizam sua vida, seus fazeres e suas ideias,
enfim, seu modo de ser e estar no mundo (FONSECA, 2008, p. 8).

Conforme essa perspectiva, através de uma história da educação podemos


compreender melhor as formas de sociabilidade, de ser e estar no mundo,
compreender as visões e necessidades dos atores nos contextos locais, pois o viés
educacional é tão importante quanto as estruturas políticas e sociais.

Uma instituição, não importando sua natureza, não emerge do nada, sem
uma contextualização, pois o próprio conceito realça a ideia de algo constituído pelo
ser humano. Essa criação não surge espontaneamente, mas se desenvolve através
do tempo, num dado cenário histórico e numa dada temporalidade específica.
Assim,
14

as instituições são criadas como unidades de ação. Constituem-se,


pois como um sistema de práticas com seus agentes e com os meios
e instrumentos por eles operados tendo em vista as finalidades por
elas perseguidas. As instituições são, portanto, necessariamente
sociais, tanto na origem, já que determinadas pelas necessidades
postas pelas relações entre os homens, como no seu próprio
funcionamento, uma vez que se constituem como um conjunto de
agentes que travam relações entre si e com a sociedade à qual
servem (SAVIANI, 2007, p. 5).
No caso deste estudo não seria diferente, pois as instituições escolares assim
como o processo de escolarização, mesmo tendo suas raízes remontando ao
período colonial, surgiram de maneira significativa no Brasil no final do século XIX e
início do século XX, que é o período que a escolarização ganha um estatuto central
na vida cultural do Brasil (CASTANHO, 2007).

Já na Paraíba, a institucionalização das escolas acontece por volta de 1911, o


que confirma o seu caráter histórico e político (ARAÚJO, 2007). Toda instituição
sempre tem papéis sociais a serem cumpridos, e com relação à escola, essa
dinâmica é mais visível e uma vez que é mais cobrada, pois culturalmente, atribuiu-
se a ela o papel de educar. Sabemos que as expectativas educacionais são partes
integrantes da vida da sociedade, pois interferem no desenvolvimento da
comunidade e na vida ativa dos cidadãos. Dessa forma, a proposta deste trabalho
se torna importante, pois, conforme Castanho (2007) aponta

a escolarização, entendida como fenômeno de institucionalização da


educação e também com centralidade escolar no âmbito cultural, isto
é, nas consequências culturais da escola, firmou-se decisivamente
no país (CASTANHO, 2007, p. 51).

Nessa perspectiva, visa contribuir para a História da Educação no município


de Lagoa Seca, objetivando ressignificar à importância histórica da Escola Agrícola
Assis Chateaubriand UEPB Campus II de Lagoa Seca para o próprio município.
Assim, pretendemos possibilitar a professores, alunos e demais interessados
conhecimentos sobre a História da Educação da cidade.

Pretendemos então, compreender a história dessa instituição no campo da


História Cultural em interface com a História da Educação, abordando a memória da
escola consubstanciada nas histórias de vida de professores e alunos, considerando
suas práticas educativas e os lugares de memória da escola. Acreditamos que sem
15

uma ressignificação das memórias dos sujeitos a história da escola pode cair no
esquecimento.

Buscamos ainda perceber como professores e alunos elaboram suas


representações da escola através de suas vivências cotidianas, das festividades
escolares e suas relações de sociabilidades no interior da instituição. Também
analisar os depoimentos orais dos sujeitos que participaram ativamente da escola
para que conforme Castanho (2007)

a história institucional da educação não seja uma descrição interna


das unidades educativas, mas evolua para um conhecimento
totalizante do fenômeno educacional, que sem embargo, inclui a vida
de tais unidades” (CASTANHO, 2007, p. 41).
Com esse propósito, problematizamos sobre a Escola Agrícola verificando
seu cotidiano através das memórias de ex-alunos e professores, bem como as
maneiras como estes abordam suas vivências e constroem suas visões sobre a
instituição, a fim de perceber como é representada no contexto da História da
Educação de Lagoa Seca. Assim, buscamos notabilizar suas práticas educativas no
contexto da cultura escolar, com a finalidade de preservar a memória local em torno
da relevância dessa instituição.

Importa ainda pensar qual a relação da escola com a comunidade para que
assim façamos uma análise nesse âmbito, pois chamamos atenção para o fato de
que o espaço escolar se estende para além do espaço físico: desloca-se para as
memórias dos sujeitos portadores de suas lembranças. Os saberes produzidos na
escola são inculcados pelos indivíduos que serão os futuros profissionais que irão
atuar pelo mundo afora levando consigo os saberes e fazeres da cultura escolar.
Albuquerque Júnior (2008) aborda o sentido sensorial que perpassa as relações e os
ambientes:

os espaços não se resumem a sua dimensão física, o que faz um


supermercado não é apenas suas paredes e prateleiras, mas as
relações humanas, as relações sociais, as redes de códigos sociais e
culturais que ali se desenrolam. São as práticas que trabalham este
espaço, que o tornam vivência e experiência, são os sentidos que
seus praticantes lhe dão, são os desejos, fantasias, sonhos, imagens
que sobre ele se projetam, que o constitui como espaço social,
cultural e histórico. Um espaço é um reticulado de ações, de
deslocamentos, de trajetórias, é uma rede de relações de toda
ordem, é uma trama de sentidos, é a projeção de imagens, sonhos,
desejos, projetos, utopias. Um espaço é feito de natureza, de
sociedade e de discurso (ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2008, p. 108).
16

Todavia, o percurso de investigar a história de uma instituição escolar requer


a demarcação de uma temporalidade. Assim, Sanfelice (2007) adverte que “quando
se toma a decisão de pesquisar a história de uma instituição escolar ou de uma
instituição educativa, o condicionante inicial que se põe é o da temporalidade”
(SANFELICE, 2007, P, 76). Sendo assim, escolhemos como recorte temporal o
período compreendido entre 1962-1992, pois coincide com a fundação da escola, na
época chamada de Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand e também por registrar as
maiores inovações que a escola passou, devido à inclusão pela Furne. Esse
momento compreendeu a gestão do professor Joaquim Vitoriano, um dos nossos
entrevistados, que de 1970 até 1992 foi o gestor da escola.

Esta instituição escolar foi instalada no sítio Imbaúba de Lagoa Seca em 1967
(SANTOS, 2011). Porém observamos que em relação ao tema História e Memória
não há trabalho escrito nem livro publicado e nem mesmo bibliografia referente à
história da escola, nem estudos sobre a História da Educação do município.
Portanto, trata-se de um tema inédito, sobretudo para a linha de pesquisa de Ensino
de História deste curso. Deste modo ressaltamos que este estudo significa uma
oportunidade de registro para a História da escola pelo viés da História da Educação
adotando os aportes teórico-metodológicos da História Cultural.

Para o curso de História, a proposta também se mostra inovadora, pois em


nossa pesquisa percebemos que não havia nenhum trabalho que se reportasse a
história desta instituição, sobretudo, na perspectiva mencionada. Este fato abre
possibilidades para estudos futuros e históricos sobre instituições escolares, que
possam articular História e Educação à luz da História Cultural. Nesse sentido,
acreditamos na sua relevância, tanto para a Universidade Estadual da Paraíba
Campus I, quanto para a compreensão da História da Educação no município de
Lagoa Seca, uma vez que pretende contribuir para os registros da educação local.

Como professor de História na cidade de Lagoa Seca, considero de


significativa importância ampliar meus conhecimentos sobre a História da Educação
neste município, na expectativa de que essa proposta funciona também como fonte
de pesquisa e estudo para outros historiadores.

Partindo destes pressupostos, senti necessidade de refletir e compreender o


contexto social e educacional no qual me insiro como docente e cidadão do
17

município, e assim reinterpretá-lo, dotá-lo de sentido, através de uma efetiva


participação para que, através deste trabalho, eu possa também contribuir para a
memória escolar do município e o contexto da história da educação, ressaltando
como a instituição se tornou importante tanto pelos seus significados educacionais
como por ser um espaço de visibilidade local e regional.

A escola atendeu e atende ao público local e também oriundo de diversos


estados do nosso país, tendo possuído, inclusive, alunos de outros países. Ela é de
fundamental relevância para a comunidade, pois promove o desenvolvimento local
através de projetos, bem como forma a ampla variedade de alunos que se
tornaram/ão futuros profissionais ao término de seus respectivos cursos. É uma
escola de médio porte e tem forte representatividade na cidade para seus
moradores.

A Escola Agrícola Assis Chateaubriand está localizada no Campus II da


UEPB (Universidade Estadual da Paraíba), na cidade de Lagoa Seca, no sítio
Imbaúba. Ao longo de nossa discussão, no percurso deste texto, utilizaremos a sigla
EAAC quando estivermos chamando atenção sobre a escola.

A pesquisa compreendeu as seguintes etapas: inicialmente, fizemos um


levantamento bibliográfico em busca de fontes sobre o tema; depois realizamos as
leituras teóricas e históricas que nos deram suporte para a investigação e análise,
seguidas das discussões de autores que tomamos por referência para a abordagem
em torno da temática do nosso interesse.

Num segundo momento, empreendemos a pesquisa de campo, onde


visitamos, em busca de fontes para o estudo, a Câmara Municipal da Cidade de
Lagoa Seca e a própria Escola lócus, na busca de vestígios da memória desta
escola, a partir de fotografias, atas de reuniões, diários de classe, dentre outros
documentos que embasaram nossa compreensão para a escrita de nosso trabalho.

Fotografamos toda a documentação que nos deu suporte, a partir da


colaboração da gestão escolar e dos funcionários que atuam no local atualmente.
Depois organizamos o material recolhido, para seleção e análise. Realizamos as
entrevistas com os sujeitos que atuaram na escola, na condição de gestor, aluna e
professora para posterior transcrição.
18

Os sujeitos de nossa pesquisa foram: Maria de Lourdes Araújo, 54 anos, que


estudou na EAAC de 1970 a 1978, ex-aluna que mantém uma relação afetuosa com
a escola, tendo em vista que nos anos 80 retornou para atuar como secretária,
função que exerce até os dias de hoje; Neuza dos Anjos, de 63 anos, técnica em
agropecuária e ex-professora, que lecionou de 1980 a 1985 na escola. E o professor
Joaquim Vitoriano Pereira, ex-militar e professor, que atuou como gestor da
instituição por mais de 20 anos.

Compreendemos que a prática educacional não circula apenas na relação


entre gestor-professor-aluno, mas perpassa as formas organizacionais do espaço
escolar, ou seja, a forma de como se dá a constituição do espaço físico incorpora a
relação interpessoal que se constitui entre todos os funcionários, a exemplo do
vigilante, da merendeira, da auxiliar de serviços e da secretaria escolar. Porém
devido ao limite de tempo para estudo, seria completamente inviável abarcar essas
categorias de sujeitos.

Nosso inventário das fontes foi composto por arquivos documentais, que
fizeram parte da História da Escola, os quais estavam disponíveis, bem como
fotografias escolares, cadernetas, atas de reuniões, regimentos internos e projetos
políticos pedagógicos. Assim as fontes orais, ou seja, os depoimentos dos sujeitos
pesquisados, foram selecionados de acordo com o recorte temporal estabelecido
para estudo.

Recorremos à Câmara Municipal de Vereadores da Cidade de Lagoa Seca


em busca de subsídios documentais, onde procuramos por atas de reunião das
sessões realizadas que tivessem alguma ligação com a Escola Agrícola; num
momento posterior, fizemos entrevistas com os sujeitos de nossa pesquisa,
registradas em câmeras digitais, adotando-se o recurso áudio-digital, gravando cada
uma delas e transcrevendo-as. Assim, analisamos todo material recolhido, tanto em
documentação quanto em entrevista, afim de iniciar a escritura do presente estudo.

As dificuldades sempre se apresentam quando utilizamos documentação:


sempre lacunar, exige de nós esforço de inteligibilidade, crítica, comparação e
ordenação (VEYNE, 1998). Portanto, uma história satisfatória, que leve em
consideração um olhar plural não deve desprezar os documentos e as
reminiscências permanentes nas memórias dos sujeitos históricos.
19

Trabalhamos com o conceito de memória que abarca o campo da memória


coletiva e o da memória individual. Fundamentamos nosso pensamento a partir do
conceito de memória coletiva em Maurice Halbwachs (2006). Também dialogamos
com a questão da memória e do esquecimento a partir dos estudos e apontamentos
de Jacques Le Goff (2003), Michel Pollak (1989) e Paul Ricoeur (2007). Dialogamos
também com a concepção de cultura escolar fundamentando as proposições nas
considerações de Julia (2001) que aponta

a cultura escolar como um conjunto de normas que definem


conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de
práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a
incorporação desses comportamentos; normas e práticas
coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas
(finalidades religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de
socialização). Normas e práticas não podem ser analisadas sem se
levar em conta o corpo profissional dos agentes que são chamados a
obedecer a essas ordens e, portanto, a utilizar dispositivos
pedagógicos encarregados de facilitar sua aplicação, a saber, os
professores primários e os demais professores (JULIA, 2001, p. 10 –
11).

Nesse sentido, as finalidades dessa cultura escolar podem ser buscadas


dentro da escola, procurando entender as formas de organização e funcionamento,
as trocas culturais operadas pelos diversos sujeitos que nela atuaram,
compreendendo-as para além desta e de sua estrutura física. A cultura escolar pode
ser pensada e representada através das formas de atuação de professores e alunos,
no passado e no presente, e que marcas eles imprimiram na vida de alunos e na
memória da escola.

Utilizamos a História Oral como uma ferramenta e método, pois, conforme


definiu Freitas (2006) “é um método de pesquisa que utiliza a técnica da entrevista e
outros procedimentos articulados entre si, no registro de narrativas da experiência
humana” (FREITAS, 2006, p. 18). Neste enquadramento a metodologia utilizada e
sua forma de realização podem ser denominadas de Moderna História Oral: que,
segundo Freitas (2006) é “aquela cujo método consiste na realização de entrevista
que utiliza um gravador, além de estratégias, questões práticas e éticas relacionadas
ao uso desse método” (FREITAS, 2006, p. 27).

A experiência com História Oral além de nos subsidiar com novas


perspectivas para o entendimento histórico, também nos permite ressignificar as
20

práticas desenvolvidas pelo indivíduo, portador de experiências, captando-as a partir


das reminiscências de suas vivências, pois privilegia essa voz (FREITAS, 2006).
Para Michael Pollak (1989) este método “ao privilegiar a análise dos excluídos, dos
marginalizados e das minorias, a história oral ressaltou a importância de memórias
subterrâneas” (POLLAK, 1989, s/p).

Os depoimentos orais constituem uma rica fonte e forma de abordar o


passado, ou ao menos uma parte dele, pois através das narrativas orais “é possível
conhecer a história das instituições escolares em arquivos que não sejam somente
os propriamente escolares” (MIGUEL, 2007, p. 34). A memória, neste sentido, torna-
se para o historiador um acervo significativo de informações.

Para o historiador, a experiência de pesquisa vai além das ditas fontes


“mortas” (documentos). O passado, por sua vez morto, pois é outro que já foi (REIS,
2011), é reanimado através dos depoimentos orais, pois trata de memórias
articuladas às pessoas vivas que mantêm em suas memórias vestígios deste
passado. Os depoentes se emocionam ao lembrar suas histórias de vida. Deste
modo as memórias trazem alegrias, tristezas, reflexões de possibilidades sobre o
que poderia ter sido; angústias e emoções. O contato com o passado oferece uma
experiência única, pois nos permita fazer mergulhar na visão oferecida pelo nosso
interlocutor.

Nos referenciais teóricos nos apropriamos dos conceitos de Michel de


Certeau (2008), para quem é preciso buscar a proliferação de práticas que se fazem
a todo instante, nas artes do fazer do cotidiano, que tornam os sujeitos seres
autônomos, criadores e livres através de suas operações culturais. Certeau nos
permite pensar como os docentes da escola, em seu cotidiano escolar criavam
situações de ensino na sala de aula e como as guardam em suas memórias.

Os conceitos de “cotidiano” e “práticas” são relevantes, pois procuramos


articulá-los com nosso objeto de estudo a partir das possibilidades invocadas por
Certeau e pelos estudos de Duran (2007), ela assinala

ao atribuir às práticas o estatuto de objeto teórico, Certeau busca


encontrar os meios para “distinguir maneiras de fazer”, para pensar
“estilo de ação”, ou seja, fazer a teoria das práticas, no seguinte
sentido: propor “algumas maneiras de pensar as práticas cotidianas
dos consumidores, supondo no ponto de partida que elas são do tipo
21

tático”. […] esta análise das práticas “vai e vem cada vez novamente
captada […], brincalhona, fujona” (DURAN, 2007, p. 119).

Estas práticas são táticas, uma vez que são praticadas pelos sujeitos de
maneira hábil de acordo com sua própria vontade livre e criadora. Resistem às
imposições do poder, as do estratégicas, que segundo Certeau (2008), se inserem
num campo de sistema meticulosamente engenhoso e pensado.

Assim, “essas ‘maneiras de fazer’ constituem as mil práticas pelas quais os


usuários se reapropriam do espaço organizado pelas técnicas da produção sócio-
cultural” (DURAN, 2006, p. 41). Com estes conceitos podemos analisar de que modo
os ex-docentes da EEAC reagiam mediante as políticas educacionais impostas pelo
estado, como eles subvertiam as lógicas do poder instituído. Permite-nos ainda
pensar, como os alunos, sujeitos da sala de aula, inventavam seu cotidiano a partir
deste espaço, guiado pelo professor, articulando sua liberdade com as normas
escolares.

Certeau (2008) aponta-as como a criação anônima dos sujeitos, suas práticas
ordinárias, comuns, relativas às maneiras de ser e estar no mundo, a maneira de se
deslocar frente às imposições do poder, seja ele manifestado nas ordens e diretrizes
da instituição escolar ou manifestas através de políticas escolares.

Pensar o cotidiano escolar, à luz de Michel de Certeau, implica dialogar com


práticas e astúcias dos indivíduos; considerar coisas banais e ordinárias, sem
nenhuma pretensão de buscar um sistema organizado, fechado e coerente, mas um
conjunto de ações improvisadas e inovadoras que pessoas realizavam em ação no
dia-dia. Concordamos com Duran (2007) que aponta:

pesquisar o cotidiano escolar é justamente captar essas artes de


fazer, essas operações que acontecem nas escolas, realizadas por
professores e alunos […] as invenções cotidianas representam asa
diferentes formas de os professores se ajustarem a essa política, as
diferentes formas de reorganizarem o cotidiano de suas práticas.
Tais invenções do/no cotidiano vão produzindo uma “cultura”,
saberes pedagógicos na escola, saberes produzidos por professores
e alunos, na dialeticidade da vida cotidiana, na concretude do
cotidiano escolar (DURAN, 2007, p. 126 e 127).
Essa modalidade de ação é criadora, pois o sujeito é livre, ele burla a ordem
que lhe é imposta e cria a todo instante suas maneiras de agir. Ou seja, age
conforme um artista. Deste modo, utilizamos a categoria “cotidiano” fundamentados
22

em Duran (2007) a partir dos estudos de Certeau (2008), como uma maneira de
pensar a escola, os professores e alunos da EEAC em seus respectivos contextos,
procurando focalizar as questões rotineiras, suas práticas, os acontecimentos diários
mais triviais, os conflitos em sala de aula e os hábitos que configuram seus rituais.
E, no caso dos professores, como se dão suas práticas educativas. Esse
movimento, viável somente a partir dos depoimentos dos sujeitos, ofereceu estas
possibilidades de compreender o cotidiano escolar no período recortado para
estudo.

Duran (2007) ainda salienta que

falar de práticas, de criações e artes da escola e de outros lugares é


pensar e pesquisar o cotidiano com Michel de Certeau, cuja proposta
é a de uma inversão de perspectiva, de um deslocamento da
atenção: dos produtos recebidos para a criação anônima. Encontrar
sentidos nas artes de fazer de professores e alunos e considerar a
legitimidade dos saberes e valores que permeiam tais práticas
subterrâneas do coletivo escolar, suas estratégias e táticas próprias
– este o deslocamento de perspectiva presente em pesquisas do
cotidiano que se ocupam das “artes de fazer” dos praticantes, na
busca da compreensão de suas regras próprias e de seu
desenvolvimento (DURAN, 2007, p.120).
Neste estudo, buscamos o fio condutor que Certeau (2008) nos possibilita
para pensar as “maneiras de fazer” dos indivíduos neste espaço. Esta maneira de
enxergar uma realidade passada possibilita a um historiador da educação, capturar
a história despercebida, silenciosa, prestes a cair no esquecimento, pois os sujeitos
pesquisados provavelmente não têm registro escrito dessas práticas que
constituíram sua jornada no espaço institucional da Escola Agrícola. Assim essa
reconstrução, evocada pelos depoimentos dos sujeitos oferece-nos total suporte
para (re)construirmos uma história-memória no ambiente analisado.

Para um historiador da educação e das instituições escolares, a História


Cultural é rica em abordagens e métodos que podem ser utilizados. Um dos grandes
nomes desta vertente é o historiador Roger Chartier, do qual selecionamos os
conceitos de “apropriação” e “representação”. De acordo com Silva (2010):

a noção de representação, no sentido de tornar presente uma


ausência, ajuda-o a representar as relações de poder político com as
representações sociais e, “sobretudo, dos indivíduos ou dos grupos
com o mundo social” (SILVA, 2010, p. 315).
23

Esse conceito traz à tona esta presença ausente, a presença de um passado


ressignificado, conforme as astúcias do sujeito. Assim importa-nos, através dessa
noção, pensar de que modo os sujeitos da pesquisa representam a história da
instituição através de seus depoimentos, e como veem a escola e se apropriam de
suas memórias.

Para o tema das instituições escolares

a representação [também] traduziria o sentido atribuído ao papel


desempenhado pela instituição escolar, envolvendo a tradição
(memórias), a bibliografia selecionada, a prefiguração (planejamento
das ações, os modelos pedagógicos, os estatutos, o currículo e a
disposição das agentes encarregados do funcionamento institucional
(SAVIANI, 2007, p. 25).
Assim, as concepções de representação e apropriação andam de mãos
dadas. Roger Chartier entende apropriação como visando “uma história social dos
usos e das interpretações, relacionadas às suas determinações fundamentais e
inscritos nas práticas específicas que os produzem” (CHARTIER, 2002, p. 68).

Nessa perspectiva, os sujeitos se apropriam de suas memórias e de seu


passado, e o trazem de volta através de suas falas em seus depoimentos,
representando-os e dotando-os de sentidos, de acordo com usos e leituras
particulares que fazem dele. Esta interpretação se refere ao modo de como o sujeito
se apropria de suas memórias, fazendo com estas uma “refiguração” pessoal. A
memória não está inerte, mas pode ser acionada e reconfigurada de acordo com os
interesses e circunstâncias do sujeito. Deste modo esta apropriação

corresponderia à materialidade-conteúdo em ato, compreendendo as


práticas pedagógicas propriamente ditas mediante as quais se
realizam as aprendizagens entendidas como incorporações do
ideário pedagógico, definindo-se a identidades dos sujeitos e da
instituição e seus respectivos destinos de vida (SAVIANI, 2007, p.
25)
Aquilo que os sujeitos tomam para si também pode ser compreendido como
“invenções de sentido limitadas pelas determinações múltiplas que definem, para
cada comunidade, os comportamentos legítimos e as normas incorporadas”
(CHARTIER, 2002, p. 92). No nosso interesse, caso convém pensar tais
comportamentos e normas incorporadas no que se refere ao âmbito da instituição
escolar.
24

Conforme apontado acima, o roteiro das entrevistas foi estruturado para


atender à funcionalidade da escola, visando ressaltar os aspectos citados e discuti-
los. Em nossa pesquisa também articulamos à realidade do estudo o conceito de
“identidade”. Hall (2006) distingue três concepções de Identidade. Dentre as quais, o
que ele chama de “sujeito pós-moderno” chama nossa atenção:

a identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e


transformada continuamente em relação às formas pelas quais
somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos
rodeiam. É definida historicamente e não biologicamente. O sujeito
assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades
que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente. Dentro de nós
há identidades contraditórias, que empurrando em diferentes
direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo
continuamente deslocadas. Se sentimos que temos uma identidade
unificada desde o nascimento até a morte é apenas porque
construímos uma cômoda estória sobre nós mesmos ou uma
confortadora “narrativa do eu”. A identidade plenamente unificada,
completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à
medida em que os sistemas de significação e representação cultural
se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade
desconcertante e cambiantes de identidades possíveis, com cada
uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos
temporariamente (HALL, 2006, p. 12 e 13).

O contexto apresentado pelo autor aponta para a plasticidade das relações


identitárias. A identidade, conforme Hall (2006) enfatiza de acordo com a perspectiva
da pós-modernidade, não é perene, mas imbricada nas relações sociais e culturais
do indivíduo. Deste modo pensamos que a construção da identidade seja uma
condição relacional e discursivamente elaborada nas interações socioculturais.

O indivíduo é um ser social, atua e cria relações nos mais diversos campos
em sua vida. Seu mundo é cultural e dinâmico, marcado pelo movimento e
deslocamentos. Neste sentido, é importante pensar através desta categoria de
análise que concepções esses sujeitos adotam sobre si mesmos, como se
percebem em relação à em escola, de que modo se situam em seu meio social.
Suas narrativas podem revelar as apropriações escolares e os saberes
adquiridos/trocados na instituição educativa.

No presente estudo utilizamos algumas imagens fotográficas dos arquivos da


EAAC. A imagem não é meramente uma reprodução da verdade do que aconteceu
25

no passado, mas um texto a ser lido, podendo na pesquisa histórica, apresentar


múltiplas possibilidades de análise do fenômeno social em questão.

Assim consiste numa importante fonte para o campo da pesquisa histórica,


pois o historiador ao utilizar este artefato cultural se aproxima da realidade vivida, o
que lhe oferece recursos interpretativa, leituras, dando-lhe novos significados, a
partir das representações contextuais.

A fotografia pode ser lida de vários ângulos e muitas questões podem ser
lançadas a partir dela. Dependendo do problema, é possível chegar a mais de uma
leitura sobre o mesmo arquivo fotográfico que ganha diferentes contornos. Conforme
Oliveira (s/d) “a compreensão do significado de algumas imagens e o motivo pelo
qual foram construídas altera o conteúdo das imagens e amplia sua visão”
(OLIVEIRA, s/d, s/p).

Esse artefato significa uma forma de expressão cultural que procura registrar
aspectos que representam um povo. Por isso, acreditamos na força que o produto
iconográfico pode proporcionar ao historiador da educação. De acordo com
conforme Oliveira (s/d)

a fotografia está começando a povoar as pesquisas em História da


Educação, mostrando-se como uma fonte bastante rica para
trabalhos quem envolvem arquitetura escolar, cotidiano escolar e,
também, memórias de alunos e professores (OLIVEIRA, s/d, s/p)

e além disso oferece uma possibilidade de reconstrução da memória e da história.

Porém muitas vezes a imagem fotográfica limita-se apenas à uma espécie de


confirmação do texto escrito ou de um depoimento concedido: “as fotografias, muitas
vezes limitam-se a ilustrar a análise verbal […] a imagem acaba servindo como
mostruário do texto, ocultando informações e interpretações próprias ou
complementares do texto escrito” (OLIVEIRA, s/d, s/p).

Utilizamos as imagens fotográficas como fontes históricas que representam


uma realidade a partir de um ponto de vista, realçando os aspectos significativos do
objeto a ser captado. Deste modo, é possível perceber várias características de uma
época ou de um contexto específico. Mauad (1996) afirma que “a fotografia é uma
elaboração do vivido, o resultado de um ato de investimento de sentido, ou ainda
26

uma leitura do real realizada mediante o recurso a uma série de regras que
envolvem, inclusive, o controle de um determinado saber de ordem técnica”
(MAUAD, 1996, s/p).

Diante do exposto, o estudo está organizado em 3 capítulos. Nesta


introdução, apontamos quais as diretrizes e caminhos haveríamos de percorrer ao
longo do texto, expondo objetivos, justificativa, problematização e metodologia, bem
como a fundamentação teórica.

No segundo capítulo de “as instituições escolares no contexto da história da


educação” apresentamos a abordagem das instituições escolares no contexto do
saber histórico atual. Com tal propósito, expomos brevemente de que forma a
Escola dos Annales contribuiu para o alargamento das fontes e métodos de
pesquisa para, em seguida, demonstrarmos como a história das instituições
escolares passou a ser visualizada no campo da pesquisa histórica. Buscamos
esclarecer qual nossa concepção de história, pois consideramos que dentre as
várias acepções existentes na historiografia. Julgamos pertinente evidenciar qual a
nossa perspectiva. E, por fim, fundamentamos alguns conceitos utilizados no
presente estudo.

No terceiro capítulo intitulado de “nas tessituras da história: trajetória da


Escola Agrícola Assis Chateaubriand”, tecemos nosso texto ressignificando a
história desta instituição a partir de uma leitura das fontes históricas que foram os
testemunhos orais, os documentos impressos escolares e as fotografias da mesma.

No quarto capítulo intitulado de “representações e narrativas sobre a Escola


Assis Chateaubriand de Lagoa Seca” dialogamos com os sujeitos que atuaram na
escola, analisando suas narrativas, percebendo de que modo representam suas
trajetórias, e em que medida preservam suas memórias, pensando, a partir destes
depoimentos, sobre a cultura escolar desta instituição.
27

2. AS INSTITUIÇÕES ESCOLARES NO CONTEXTO DA HISTÓRIA DA


EDUCAÇÃO

Este capítulo enfoca o estudo das instituições escolares no contexto da


Historia da Educação consubstanciado nas relações com a memória. Para tal,
discutimos de que forma essa temática passou a ser visualizada no campo da
pesquisa histórica articulada à educação. Contexto organizado por fluxo externo,
decorrente da ampliação da noção de “fonte histórica” proposta pela Escola dos
Annales, que permitiu a ressignificação do conceito de história, e por um fluxo
interno, impulsionado pelos historiadores da educação no Brasil e suas pesquisas
com esta temática.

2.1. A HISTÓRIA CULTURAL E OS ESTUDOS SOBRE INSTITUIÇÕES


ESCOLARES

A partir das contribuições da “Nova História”, também chamada de Nova


História Cultural, ocorreram inovações significativas, fomentando um paradigma que
revolucionou a área, no que tange aos conceitos, abordagens e métodos, alterando
procedimentos na pesquisa de fontes que possibilitaram a (re)construção da
História. O novo cenário apontou o caráter progressivo do conhecimento histórico,
que não é estático e imutável, mas evolui conforme as questões do presente.

O movimento da Escola dos Annales é o primeiro aspeto a destacado, uma


vez que o historiador da Educação passa a reavaliar a metodologia e a teoria da
história utilizadas. De acordo com Reis (2011) “a teoria são as fundações, as vigas,
as cintas, os pilares, as tubulações elétricas, eletrônicas, hidráulicas, enfim, a
estrutura da obra, com seus pesos, materiais e formas” (REIS, 2011, p. 10).

Nos anos de 1930, os pressupostos dos Annales permitiram outra semântica


para o termo História, rejeitando profundamente o modelo proposto pelos
historiadores metódicos ou tradicionais. Os Annales queriam fazer desta uma ciência
social, um estudo cientificamente conduzido em descontinuidade ao modelo anterior,
propondo um problema em relação ao seu objeto de estudo especificamente
delimitado, seguido de uma justificativa, hipóteses e fundamentação teórica (REIS,
2004; 2006).
28

A concepção de fonte histórica sofreu alterações ao longo da historiografia,


tornando possível uma pesquisa na área da educação. De acordo com Silva (2012)
a escola Metódica ou Positivista entende a fonte histórica como registro escrito e
oficial, contendo em si mesmo a verdade sobre determinado aspecto ou fato do
passado. Essa premissa teria fundamentado as pesquisas e as conclusões
históricas até meados da década de 30 expondo trajetórias dos grandes heróis e
personagens, pois eram os protagonistas dos documentos chamados oficiais. Silva
(2012) aponta que

para os metódicos – ou positivistas, como hoje são mais conhecidos


– a História era feita de documentos escritos, sendo a principal tarefa
do historiador recolhê-los e submetê-los à crítica externa e à crítica
interna para comprovar sua autenticidade. Nessa concepção, os
documentos transmitiam o conhecimento histórico por si, e ao
historiador só cabia coletá-los e agrupá-los, não questioná-los.
Assim, segundo essa corrente teórica, o documento era a prova
concreta e verídica de um passado imutável que não precisava ser
interpretado (SILVA, 2012, p. 18).

Ferreira (2011) confirma esta interpretação e leitura das fontes históricas na


Escola Metódica quando considera que “as fontes escritas, preferencialmente
oficiais, ganharam o status de documentos verdadeiros para uma historiografia
preocupada, sobretudo, com o encadeamento cronológico dos acontecimentos
políticos nacionais” (FERREIRA, 2011, p. 63).

A fonte histórica, na concepção tradicional, considerava documentos que


transmitiriam a verdade do passado por si, desde que passassem pela crítica
externa e interna, ou seja, pelas provas de autenticidade documental. Desse modo,
após esta confirmação, não haveria necessidade de outras fontes que no processo
de investigação.

Todavia, o movimento que se iniciou com a insatisfação de Marc Bloch e


Lucien Febvre com a história política produzida pelas gerações anteriores e com a
concretização da nouvelle histoire através da revista Annales d’Histoire Economique
et Sociale em 1929, deu uma nova dimensão à noção de fonte histórica, resultando
portanto, numa prática historiográfica exercitada pelas novas gerações de
historiadores herdeiros da tradição dos Annales. Febvre denunciava a falta de
atenção dos historiadores ao conhecimento de aspectos da realidade importantes
para uma compreensão histórica mais apurada (REIS, 2004; BURKE, 2010).
29

Nessa perspectiva, a História deveria se valer de tudo o que fosse vestígio do


passado. Marc Bloch apud Karnal (2011) chama a atenção deste aspecto ao
enfatizar que “ao determinar que a busca do historiador seja guiada por tudo o que
fosse humano, […] demonstra que, ao mesmo tempo em que se amplia o campo do
historiador, amplia-se necessariamente, a tipologia da sua fonte” (KARNAL, 2011, p.
14). Desse modo, registrou-se uma renovação metodológica com a influência das
ciências sociais e da introdução da interdisciplinaridade, que foram adicionadas ao
campo da pesquisa histórica, exigindo assim novas fontes de pesquisa (REIS, 2004;
BURKE, 2010).

A Escola dos Annales proporcionou à História uma reviravolta, pois esta se


tornou paradigmática, incorporando novos objetos e análises adquirindo, portanto,
alcance mundial. Para Reis (2004) “houve uma revisão e reconstrução do conceito
de homem, de humanidade, de história” (REIS, 2004, p. 21), sendo assim diferentes
caminhos foram trilhados na busca do fazer historiográfico.

Os Annales abriram o debate a respeito de novos problemas, abordagens e


objetos, assim “a história sofreu uma modificação profunda em seu campo de
análise” (REIS, 2004, p.22). Assim, não há mais ênfase, como na história tradicional
que privilegiava um olhar teleológico. Com a influência das Ciências Sociais essa
área do conhecimento passou a se preocupar, com os mais diversos aspectos da
vida, desde os mais triviais aos mais catastróficos.

Com as diferenças na concepção de História, registradas da primeira à


terceira geração dos Annales, é possível pontuar as mudanças principais propostas
por esse movimento: o diálogo com outras ciências (interdisciplinaridade), a história
como um estudo cientificamente conduzido, pois a historiografia seria somente o
resultado do trabalho do historiador sobre seu tema, sendo, portanto não um retrato
do passado, mas uma visão particular ou “representação” dele. Os historiadores dos
Annales passaram a adotar outro tipo de abordagem daquela praticada pelos
positivistas: uma História-problema, que buscava nas fontes as respostas para suas
questões, e estas norteavam suas pesquisas (REIS, 2000; 2006).

Assim, interessa-nos saber para nosso campo de estudo e análise, o avanço


mais significativo que a escola dos Annales proporcionou: o alargamento da noção
de fonte histórica. Este conceito foi ressignificado pelos historiadores da Nouvelle
30

Histoire ocorrendo uma enorme ampliação do que seria considerado um vestígio ou


uma fonte. Desde então, praticamente tudo configura indício de verificação.
Conforme Reis (2004) qualquer vestígio deixado pelo ser humano passou a ser
objeto de valor para a pesquisa histórica:

os documentos não são mais ofícios, cartas, editais, textos explícitos


sobre a intenção do sujeito, mas listas de preços, de salários, séries
de certidões de batismo, óbito, casamento, nascimento, fontes
notarias, contratos, testamentos, inventários (REIS, 2004, p. 23).

O alargamento dos campos da História é outro fator de confluência essencial,


pois permitiu a abertura de abordagens. Isso propiciou o diálogo interdisciplinar a
partir da introdução de novas fontes e subsídios para os estudos e pesquisas.

A ascensão da História Quantitativa, da História do Cotidiano, da


História da Sexualidade, da História de Gênero e de tantos outros
novos campos ao longo do século XX trouxe, inexoravelmente, um
esgarçamento quase absoluto do limite do termo “documento
histórico” (KARNAL, 2011, p. 14).
Graças a essa renovação, a História dominante e praticada nos anos de
1960, que priorizava as estruturas sociais e a quantificação, também entrou em crise
a partir dos anos 1980 (CHARTIER, 2010). Assim, seus objetivos deixaram de ser
apenas os aspectos estruturantes:

O objeto da história não são, portanto, ou não são mais, as


estruturas e os mecanismo que regulam, independentemente de
qualquer influência objetiva, as relações sociais, mas as
racionalidades e as estratégias executadas pelas comunidades,
parentelas, famílias, indivíduos (CHARTIER, 2010, p. 84).
À luz do exposto, situamos nosso trabalho no campo da História Cultural,
adotando o sentido de Barros (2010) “toda historiografia que se tem voltado para o
estudo da dimensão cultural de uma determinada sociedade historicamente
localizada” (BARROS, 2010, p. 56).

De acordo com este autor, a História Cultural abriga diversas possibilidades


de tratamento e análises, não se limitando a tratar apenas do que se chama de
“cultura letrada”. “A História Cultural enfoca não apenas os mecanismos de
produção dos objetos culturais, como também os seus mecanismos de recepção”
(BARROS, 2010, p. 58).

Várias modalidades historiográficas são possíveis, inserindo-se os sistemas


educativos e as instituições escolares. Noções como as de “representação” e
31

“práticas” são instrumentos de trabalho úteis para um historiador envereda nessas


novas discussões.

Desde a década de 1970 as pesquisas sobre as “instituições escolares”,


foram objeto de estudo, porém a temática adquiriu maior visibilidade na pesquisa
histórica no Brasil, a partir dos anos de 1990.

Tais pesquisas em sua maioria têm sido realizadas no âmbito dos programas
de pós-graduação em Educação (PPGEs), com vistas à produção de dissertações
de mestrado, teses de doutorados ou publicações em periódicos especializados. De
acordo com a pesquisa realizada por Buffa (2007), na década de 1970 foram raros
os estudos sobre instituições escolares. Na década de 1980 houve trabalhos mais
significativos dedicados ao tema.

Os estudos nessa perspectiva no Brasil se desenvolveram a partir dos anos


1990. Muito embora alguns tenham sido efetivados antes desta data, apresentando
um viés mais sociológico que histórico. Por isso observamos, conforme Buffa (2007),
que os estudos sobre instituições escolares na História da Educação têm ocorrido
com mais ousadia em termos numéricos a partir da década mencionada (BUFFA,
2007).

Neste contexto, a História da Educação se insere como um campo de


pesquisa articulado e fecundo para o trabalho do historiador, mesmo que não
possua um quadro de teórico-metodológico próprio (SANFELICE, 2007). No Brasil
quem melhor representa e traz as produções mais significativas neste campo é o
HISTEDBR, segundo destaca Sanfelice (2009):

O Grupo de Pesquisa História, Sociedade e Educação no Brasil


(HISTEDBR) mesmo têm contribuído com significativa produção e
aberto vários espaços para a pesquisa e o debate voltado à História
da Instituições escolares e/ou educativas (SANFELICE, 2009, p.
193).
Observamos que a temática das instituições escolares se tornou muito
fecunda, pois nos permite pensar o universo histórico do ambiente pesquisado,
definindo sua trajetória, a fim de apresentar sua historiografia. De acordo com
Saviani (2007)

propor-se a reconstruir historicamente as instituições escolares


brasileiras implica admitir a existência dessas instituições que pelo
32

seu caráter durável, têm uma história que nós não apenas queremos
como necessitamos conhecer (SAVIANI, 2007, p. 24)
Segundo as proposições do autor “caracterizar os elementos básicos
constitutivos da instituição escolar para efeitos de sua reconstrução histórica”
(SAVIANI, 2007, p. 24). Deste modo cabe ao pesquisador da História da Educação
identificar suas fontes na instituição escolar e escolher sua perspectiva de trabalho.

Nesse sentido, é possível pensar por vários vieses uma instituição escolar,
pois a História através de suas várias vertentes, como por exemplo, a História
Social, a História Política ou a História Cultural, como um caleidoscópio, permite-nos
várias opções teóricas e metodológicas. Assim, cada vez que o historiador se
aproxima da realidade escolar com uma lente teórica diferente, descobrirá novos
caminhos e possibilidades de pesquisa e, portanto, novas histórias. Nesses termos,
um historiador da Educação, através dos aportes teóricos e metodológicos da
História Cultural pode pensar as práticas do universo escolar no seu cotidiano, ou
ainda perceber como alguns sujeitos que lá atuam representam esses espaços.
Logo, se vê diante de um grande acervo histórico, pois a instituição escolar, assim
como outras instâncias, possui enorme acervo documental, passivo de
problematização, investigação e contextualização.

Podem ser considerados os documentos oficiais como os não-oficiais, além


do universo simbólico e imaginário, as mentalidades, as práticas educacionais, as
representações da memória e da Escola, o contexto político, a função social da
escola, ou seja, sua importância para o município. Seu papel junto à comunidade, o
mundo das relações de poder entre os órgãos governamentais e a Escola, bem
como os micro poderes que perpassam as relações entre gestores e professores e
entre estes e o alunado. As mudanças das propostas pedagógicas e a história da
Instituição podem ser percebidas a partir da compreensão das políticas educacionais
municipais constituindo uma diversidade de enfoques.

O que notamos é que, além de complexas, as instituições não são artefatos


sem contextos, são datadas e localizadas, dotadas de racionalidade e
funcionalidade próprias. Conforme as considerações expostas, entendemos que são
um importante objeto de pesquisa para o historiador da educação, pois não surgem
sem propósitos nem planejamento, assim como o lócus de nossa pesquisa, a Escola
Agrícola, cuja história de relevância merece ser preservada.
33

2.2. MEMÓRIA E HISTÓRIA DA ESCOLA: ENTRE OS DITOS E OS NÃO DITOS

Para fins metodológicos, o historiador precisa delimitar qual sua concepção


de história, pois na tradição deste fazer milenar existem várias acepções diferentes e
por muitas vezes, conflitantes. A História não toca a realidade do passado enquanto
tal, ou seja, o que de fato ocorreu, de forma correspondente, mas considera a
representação dessa realidade, segundo registros que a legitimam.

Trata-se de um texto escrito e avaliado, verificado com uma ordenação lógica


interna que lhe dá validade. A História transita entre literatura ficcional e um texto
com pretensões de verdade (RICOEUR, 2007), pois seu objetivo é a realidade, é
tratar do que de fato ocorreu, mas de forma textual numa rede de configuração
literária.

Nesse sentido, a História da instituição que pretendemos traçar é um artefato


literário com pretensão verdadeira, pois é baseado nas memórias de sujeitos que
atuaram no espaço escolar pesquisado, através de documentos escolares que nos
remetem a uma realidade passada.

De acordo com Jenkins (2011) “passado e história são coisas diferentes”


(JENKINS, 2011, p. 24). Ou seja, não coincidem necessariamente. Isso porque o
passado não depende da História, mas esta depende do passado para não ser um
texto de ficção pura que não é o objetivo desta ciência, que pretende ser um texto
com intenções de verdade (CHARTIER, 2002; RICOEUR, 2007).

A história é sempre menos que o passado, pois ambos não são


necessariamente correspondentes: é um texto escrito que busca representar o
passado, e este por sua vez, é todo o universo que ficou para traz. O passado seria
o que ocorreu, e a história é a tentativa de historiadores trazerem (re)conhecimento
do que se passou através de relatos (JENKINS, 2011).

Quando refletimos sobre o fazer historiográfico ou na “operação


historiográfica”, como afirma Certeau (2010), lembramo-nos da arte de um pintor.
Este tem diante de si a realidade, sua musa, que tentará retratar com fidelidade e
veracidade, então tenta se aproximar dela ao máximo, com suas ferramentas, pincel,
tela branca, tinta, de modo a executar seu trabalho da melhor maneira possível.
34

Mas sua obsessão ou compromisso pela fidelidade e veracidade (RICOEUR,


2007), entendida como verossimilhança, não o impedirá de imprimir suas marcas e
impressões: a obra é sua, fruto de suas mãos, portanto, seu trabalho, e conterá seus
traços, aquilo que lhe é peculiar, sua visão sobre as coisas. Deste mesmo modo o
historiador tem diante de si vestígios manifestos em documentos, relatos de vida,
memórias de pessoas, narrativas de um passado vivido.

Com a ajuda dos aportes teóricos e metodológicos, se portará como um


tecelão: ligará os fios para que a tessitura de sua história faça sentido. Irá narrar o
passado, contar algo que pretende ser verídico, porém sua escrita nunca será
desinteressada, um texto que contém sua subjetividade, pois é fruto de sua pesquisa
organizada segundo uma ordenação lógica particular.

O trabalho de ambos (pintor e historiador) não deverá incorrer em algo


totalmente ficcional, pois perdendo seu tom de verdade, não atenderá aos seus
pares, que anseiam por um resultado que reflita ou represente a realidade.
Entretanto, tal trabalho nunca deixará de conter não-verdades, ficções, hipóteses,
uma marca artística que não corresponde à realidade vista (pintor) e pesquisada
(historiador).

O historiador em seu ofício faz escolhas de acordo com suas necessidades,


suas questões e problemas, numa seleção criteriosa e não absoluta pois, como
afirma Veyne (1998) “quanto muito, pode-se pensar que certos fatos são mais
importantes que outros, mas mesmo essa importância depende, totalmente, dos
critérios escolhidos por cada historiador e não tem uma grandeza absoluta” (VEYNE,
1998, p. 29).

Assim seleciona, recorta, configura os dados de forma que possa atribuir


sentido e aos vestígios. Partimos destes aspectos e chamamos atenção para o que
Veyne (1998) expõe quando indaga: “quais são, pois, os fatos dignos de suscitar a
atenção do historiador? Tudo depende da trama escolhida, um fato não é nem
interessante nem deixa de ser” (VEYNE, 1998, p.43). Com isso, evidenciamos que o
historiador não despreza o peso de outros acontecimentos, mas a escolha deste ou
daquele evento, ou de um documento em particular, contém uma dimensão relativa
à nossa pesquisa. Salienta o autor:
35

os fatos não existem isoladamente, no sentido de que o tecido da


história é o que chamaremos de uma trama, de uma mistura muito
humana e muito pouco “científica” de causas materiais, de fins e de
acasos; de uma fatia da vida que o historiador isolou segundo sua
conveniência, em que os fatos têm seus laços objetivos e sua
importância relativa (VEYNE,1998, p. 42).
Deste modo, o nosso estudo compreende um período que julgamos
apropriados para a percepção de alguns aspectos, mencionados na introdução, pois
seria inviável produzir uma história totalizante, que pretendesse dar conta de tudo. A
assertiva de Veyne (1998) corrobora nossa intenção:

o objeto de estudo nunca é a totalidade de todos os fenômenos


observáveis, num dado momento ou num lugar determinado, mas
somente alguns aspectos escolhidos; conforme a questão que
levantamos, a mesma situação espaço-temporal pode conter um
certo número de objetos diferentes de estudo (VEYNE, 1998, p.44).
Nesse sentido nossa concepção de História é “narrativa”, conforme propôs
Ricoeur (2011), no paradigma da narrativa histórica, no campo da historiografia, na
década de 1980. Para ele, a narrativa inscreve o lugar da História. Na sua obra
“Tempo e Narrativa Tomo I” Ricoeur (2011), ressalta à impossibilidade de apreensão
do tempo pelo discurso.

Esta tese se torna de grande importância em nossa reflexão, pois evidencia o


que os sujeitos por nós pesquisados fizeram, articulando tempo e narrativa,
sintetizando anos de experiência, numa trajetória que é contada pelo calendário que
registrou suas vivências na escola. O agenciamento dos fatos ocorreu mediante
questões que acionaram por suas memórias, instigando narrativas que buscaram e
tenta dar um sentido para o representando assim seu passado e sua história
naquela instituição. Para Ricoeur (2011)

existe, entre a atividade de narrar uma história e o caráter temporal


da experiência humana, uma correlação que não é puramente
acidental, mas apresenta uma forma de necessidade transcultural.
Ou, para dizê-lo de outra maneira: o tempo torna-se tempo humano
na medida em que está articulado de modo narrativo, e a narrativa
alcança sua significação plenária quando se torna uma condição da
existência temporal (RICOEUR, 2011, p.93).
Partindo desses pressupostos, a História, portanto, se torna atividade de
composição, uma obra de síntese, pois se apoia no agenciamento dos fatos
originando, portanto uma inteligibilidade ao episódio narrado. Os acontecimentos ou
fatos do passado simplesmente aconteceram e se perderam no tempo. O historiador
tenta recuperá-los representando-os. Esta narrativa se afasta da fábula ou da ficção,
36

pois é respaldada pelos testemunhos documentais que pretendem ser verdadeiros,


e pelos testemunhos orais que extraídos da memória, pretendem alcançar fidelidade
(RICOEUR, 2010).

Chartier (2002) concorda com Ricoeur (2011) sobre este viés na escritura
historiográfica, ao apontar que os historiadores tomaram consciência que a história
também é um discurso que pertence necessariamente ao gênero da narrativa e dela
nunca se afastou.

A escrita da história que trata sobre uma instituição escolar traça um perfil de
pessoas que representam suas vidas através de depoimentos. Assim, estes sujeitos
contam sua história, através da intriga, conforme expôs Ricoeur (2011),
representando sua esta mesma História no espaço institucional. Assim recriam a
realidade de seu passado através dos depoimentos orais, rearticulando a
experiência temporal através do agenciamento de suas falas. Os episódios narrados
fazem jus ao que Ricoeur (2011) elucida, pois suas narrativas aliam o tempo
passado ao constante diálogo com o presente, buscando na memória os fios do
acontecimentos.

Portanto, pensamos que a História é realista e literária. Realista, pois se


pretende verdadeira em sua intenção de representar adequadamente uma realidade
vivida. E literária, porque (re)significa o passado, ou um fragmento dele, através de
uma comunicação viva, na qual o historiador interpreta e se apropria do texto,
conferindo-lhe legitimidade e verdade.

Trata-se de um construto do historiador, que imagina, agencia os fatos,


segundo seu problema, num texto assinado, conforme nos advertiu White (apud
Reis, 2010). Esta (re)construção (re)interpreta o passado, abordado graças à
imaginação do historiador, que usa das figuras de linguagens literárias e “imita em
sua escrita os modelos da configuração literária”, e as “grandes obras de história são
também grandes obras poéticas (REIS, 2010, p. 65).

A História é um discurso permitido e possível a partir de um lugar social do


autor. Ela é legítima do ponto de vista social, intelectual, profissional e estético
(BLOCH, 2001). Desta forma, seu discurso se torna mais transparente, sem perder
de vista a prática “cientificamente conduzida”. Conforme nossas proposições a
escrita da História de uma instituição escolar deve também levar em conta os
37

depoimentos dos sujeitos que nela atuaram, a fim de contribuírem com suas
memórias para o registro de uma dada época.

Neste estudo, ressaltamos o papel do discurso da memória dos sujeitos


entrevistados: uma ex-aluna, uma ex-professora e um ex-gestor da Escola Agrícola,
na construção de nossa narrativa histórica. Não podemos perder de vista que o
discurso em uma entrevista significa a memória de uma lembrança, que se torna
essencial ao processo de resgate e preservação do passado.

Mesmo que a História trate dos mortos, nossa intenção aqui é realizar uma
abordagem sobre um passado que se encontra ativo nas memórias dos sujeitos,
vestígios orais e almejamos então, (re)articular e ressignificar memórias, histórias de
vida, fazer (re)aparecer o que já se foi e não é mais, através de nossa escrita.

A memória é fonte de informação, fruto da experiência humana no tempo,


daquilo que nos torna seres marcados por rastros do que se foi pista dessa
existência temporal, situada em um dado contexto permeado por relações espaciais,
das quais esta memória se torna vestígio. Buscamos, dessa forma, através das
histórias de vidas na EAAC, romper com o silêncio e o esquecimento. Assim,
entendemos que

a memória é um elemento essencial do que se costuma chamar


identidade, individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades
fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje, na febre e na
angústia (LE GOFF, 2003, p. 469).

Pretendemos, a partir deste trabalho, apontar de acordo com Halbwachs


(2008), que a memória da Escola Agrícola tanto faz parte da história de vida de
nossos depoentes como se encontra nos dispositivos e arquivos, e demais fontes
que fazem parte da trajetória desta instituição escolar. Ainda concordamos com Le
Goff (2003) quando salienta que

a memória, na qual cresce a história, que por sua vez a alimenta, e


procura salvar o passado para servir ao presente e ao futuro.
Devemos trabalhar de forma que a memória coletiva sirva para a
libertação e não para a servidão dos homens (LE GOFF, 2003 p.
471).
Os depoimentos e relatos dos indivíduos são suas representações sobre seu
próprio passado (CHARTIER, 1991), reconhecidas como fontes históricas. Também
entendemos esta memória como seletiva, pois os sujeitos narram o que lhes
convêm. Mas não podemos abandonar a força das representações produzidas pela
38

memória daqueles que depõem sobre o passado. Os depoimentos que os sujeitos


da escola nos concederam ressignificam fragmentos de suas histórias traduzindo as
representações do espaço escolar.

Ao discutirmos sobre a memória da escola enfatizamos que esta não é


isolada e reflete acontecimentos individuais e coletivos do espaço social dos
sujeitos. Assim, “o estudo da memória social é um dos meios fundamentais de
abordar os problemas do tempo e da história, relativamente aos quais a memória
está ora em retraimento, ora em transbordo” (LE GOFF, 2003, p. 422).

Deste modo, percebemos que a memória nos traz algo que não é
necessariamente a reconstrução verdadeira do que se passou, mas nos oferece
fragmentos deste passado, pois acreditamos, conforme Ricoeur (2007) que se a
memória lembra, ela lembra de algo que a antecede, obedecendo às suas nuances
e limitações. Percebemos que a memória também é condição de acesso ao
passado, pois se é memória, o é de algo que se passou (RICOEUR, 2007).

Nos estudos sobre memória, Halbwachs (2006) assinala que toda nossa
lembrança será coletiva, porque é contextual e relacionada com algo ou alguém.
Paul Ricoeur (2007) confirma este pensamento, salientando onde deixa claro que a
pergunta do que se lembra? deve anteceder à de quem se lembra?, pois, admite-se
o sujeito eu, a priori, como o portador único da memória, excluindo portanto a
análise da memória coletiva (HALBWACHS, 2006, P. 23).

A memória é múltipla, pois pertence a um sujeito, e este é social e histórico.


Por isso, concordamos com Halbwachs (2006) que afirma que a memória é coletiva,
pois os seres que a possuem são relacionais, inseridos numa sociedade, que fazem
parte da família, escola, trabalho, do outro. Logo, os sujeitos humanos são históricos
por excelência:

nossas lembranças permanecem coletivas e nos são lembradas por


outros, ainda que se trate de eventos em que somente nós
estivermos envolvidos e objetos que somente nós vimos. Isso
acontece porque jamais estamos sós. Não é preciso que outros
estejam presentes, materialmente distintos de nós, porque sempre
levamos conosco e em nós certa quantidade de pessoas que não se
confundem (HALBWACHS, 2006, p. 30).
39

O historiador destaca que a memória individual tem por base a memória


coletiva, pois aquela é sempre gerada dentro desta. Para ele, toda lembrança é
instituída no interior de um grupo, portanto coletiva. Assim, é possível falar de

memória coletiva quando evocamos um fato que tivesse um lugar na


vida de nosso grupo e que víamos, que vemos ainda agora no
momento em que o recordamos, do ponto de vista desse grupo [pois]
não há lembranças que reaparecem sem que de alguma forma seja
possível relacioná-las a um grupos” (HALBWACHS, 2006, p. 41–42).
A lembrança existe, e pode ser resgatada, mesmo que insuficiente e em
parte. Nesse raciocínio a memória individual não é negada, mas tem seu
funcionamento sempre num contexto particular, sendo este plural e coletivo. Por
isso, afirma que esta memória (individual)

não está inteiramente isolada e fechada. Para evocar seu próprio


passado, em geral a pessoa precisa recorrer às lembranças de
outras, e se transporta a pontos de referência que existem fora de si,
determinados pela sociedade. Mais do que isso, o funcionamento da
memória individual, não é possível sem esses instrumentos que são
as palavras e as ideias, que o indivíduo não inventou, mas toma
emprestado de seu ambiente (HALBWACHS, 2006, p.72).
A memória confunde-se com a fantasia (imaginação), pois ambas produzem
imagens, pinturas gravadas na mente. Segundo Ricoeur (2007) é possível distingui-
las, pois a memória é marca temporal, ela se lembra de algo, rememora o que
ocorreu num percurso do tempo marcado pelo antes e depois. A imaginação é
voltada para a fantasia, para o irreal, ela não tem uma temporalidade. Ou seja, não
há distância temporal, pois não houve um acontecimento situado.

A memória pode ser resgatada naturalmente quando nos lembramos de algo


sem que façamos esforço. Vez ou outra algo nos sobrevêm de repente, mas muitas
vezes, em outros contextos, nos esforçamos para lembrar. Este é o exercício de
memória chamado de recordação, pois somos impulsionados a (re)lembrar
(RICOEUR, 2007)

A fim de inscrever estas lembranças contra o esquecimento, buscamos dar


voz aos sujeitos produtores de memórias e de história no espaço da instituição
escolar, integrando e articulando o conhecimento documental, pois concordamos
com Pollak (1989), ao afirmar que

a memória, essa operação coletiva dos acontecimentos e das


interpretações do passado que se quer salvaguardar, se integra,
como vimos, em tentativas mais ou menos conscientes de definir e
40

de reforçar sentimentos de pertencimento e fronteiras sociais entre


coletividades de tamanhos diferentes: partidos, sindicatos, igrejas,
aldeias, regiões, clãs, famílias, nações etc. A referência ao passado
serve para manter a coesão dos grupos e das instituições que
compõem uma sociedade, para definir seu lugar respectivo, sua
complementariedade, mas também as oposições irredutíveis
(POLLAK, 1989, s/p).
Na historiografia sobre instituições escolares não se deve desprezar o papel
do trabalho de memória que é indissociável das formas de organização social da
vida dos sujeitos, pois estes foram atuantes no espaço escolar, produzindo sentidos,
formas de organização, práticas sociais, educativas, vivências e experiências, bem
como de resistências. Eles conhece o jogo de poder que permeia as relações sociais
diante de outros indivíduos e das normas educacionais ditadas pelos projetos
pedagógicos escolares.
41

3. NAS TESSITURAS DA HISTÓRIA: TRAJETÓRIA DA ESCOLA AGRICOLA


ASSIS CHATEAUBRIAND

Neste capítulo traçamos uma narrativa sobre a história da escola, desde sua
fundação quando ainda se chamava Ginásio Agrícola até o final da década de 1980.
Delineamos nosso texto de acordo com o que foi possível tecer a partir das fontes
orais, dos documentais impressos e das fotografias escolares. Buscamos intercalar
no nosso texto as narrativas dos sujeitos da pesquisa, a partir de suas
representações sobre a história da escola junto com os documentos de atas de
fundação, regimentos internos e fotografias escolares, para assim podermos
ressignificar a história e a memória desta instituição escolar.

3.1. TRAJETOS E PERCURSOS DA HISTÓRIA DA ESCOLA AGRÍCOLA ASSIS


CHATEAUBRIAND

O marco inicial da fundação do Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand foi nos


anos 1960 que de acordo com o documento de Ata de Fundação, esta instituição foi
fundada em 20 de outubro de 1962 e funcionava em Campina Grande. Depois de
“várias reuniões informais e trabalhos preliminares da Diretoria da Associação Rural
de Campina Grande e demais interessados pela criação do Ginásio Agrícola de
Campina Grande” (ATA DE FUNDAÇÃO, 1962) desta vez se reuniram com caráter
oficial e excepcional na sede da Associação Rural localizada à época, na Rua João
Tavares Cavalcanti, onde vários ilustres compareceram. O primeiro Diretor da
escola, que também foi nomeado na data de fundação, foi João de Sousa Barbosa e
atuou na gestão da escola até 1969, tendo como vice o Sr. Raymilson Monteiro
Viana. Deste modo, o Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand foi criado

através de um convênio com a Superintendência de Ensino Agrícola


e Veterinário de Ministério da Agricultura e Veterinária [tendo
recebido este nome] em homenagem ao renomado jornalista
paraibano. Sua regulamentação só aconteceu 13 anos depois, em
1975, pela Lei 6226/75 e pelo Decreto 76323/75 (REVISTA 50
ANOS).
Na fotografia abaixo vemos o primeiro gestor do Ginásio Agrícola e um dos
fundadores do Ginásio Severino Duarte de Souza que também foi gestor da
instituição:
42

Imagem 1
Fotografia do Ginásio Agrícola na década de 1960: da direita para esquerda o Professor João
de Sousa Barbosa e o Professor Severino Duarte
(Fonte: Acervo da EAAC)

Antes de sua mudança para Lagoa Seca o Ginásio Agrícola funcionou em


locais provisórios, durante os cinco primeiro anos, a exemplo do Colégio Anita
Cabral e Colégio Integração da Furne. Mudou-se para o Sítio Imbaúba em Lagoa
Seca, sua atual sede, somente em 22 de outubro de 1967. Atualmente, conta com
uma área de 30 hectares. De acordo com o “Plano de Aplicação da Reforma Do
Ensino do 1º Grau de acordo com a lei 5692, de 11 de agosto de 1971” a escola foi
criada “com o fim específico do ensino profissionalizante na área agrícola” (1973).

Abaixo temos uma fotografia da década de 1960, quando da fundação da


escola, esta que funcionava no colégio Anita Cabral em Campina Grande:
43

Imagem 2:
A terceira pessoa, da esquerda para direita é o gestor João de Souza Barbosa. E o quinto, no
mesmo sentido é o professor Severino Duarte

Imagem 3:
Sala de Aula do Ginásio Agrícola na década de 1960, no colégio Anita Cabral, contando com a
presença de João Barbosa Severino Duarte
44

A fotografia acima mostra uma turma do Ginásio Agrícola no colégio Anita


Cabral, este situado em Campina Grande. Deste modo, mesmo que a não haja data
e nem informações a respeito dela, podemos concluir que é anterior à 1967, a época
da vida do Ginásio para Lagoa Seca.

No período da fundação, oferecia no currículo as seguintes disciplinas,


constando seus respectivos professores já na Ata de Fundação: Português,
Matemática, História, Iniciação das Ciências, Inglês, Geografia e Educação Física.
Também continha conteúdos específicos da área agrícola tais como: Agricultura,
Criação de animais domésticos, Noções de Economia e administração Rural, Prática
Agro-Pecuária (sic), Noções de Enfermagem, Pequena Cirurgia e Defesa Sanitária,
Industrialização e Conservação de produtos Agro-Pecuário (sic), Higiene
Enfermagem e Socorro de Emergência além de Desenho Técnico. Percebe-se como
era ampla a oferta de disciplinas contemplando vária áreas do conhecimento.
Temos, portanto, um perfil ginasial e um perfil agrário/rural, que conforme a proposta
do ginásio tinha como finalidade “oferecer uma educação voltada para o
aperfeiçoamento de técnicas agrícolas, a fim de orientar melhor os filhos dos
produtores rurais do município” (SANTOS, 2011, p. 34).

Somente em fevereiro de 1963, de acordo com a Ata de Reunião, o diretor


deste período convocou uma reunião com o corpo docente “com a finalidade de
organizar o currículo e determinar as disciplinas” (Ata de Reunião, 22 de fevereiro
1963). Desde o início, em 1962, funcionava como uma unidade de instituição escolar
básica, depois foi ampliada para Curso Técnico de formação de agricultores, tendo o
seu primeiro Estatuto sido elaborado em julho de 1963, conforme registrado em Ata
do dia 25. Santos (2011) não nos esclarece sobre os processos e conflitos que
fizeram com que a Escola fosse transferida para Lagoa Seca, mas nos possibilita a
proficuidade da terra do sítio Imbaúba ali localizado:

A princípio a escola funcionava em Campina Grande, mantendo um


convênio entre a superintendência de Ensino Agrícola e Veterinário
do Ministério da Agricultura e Veterinária. […] Foi então que em 22
de outubro de 1967 o Colégio migrou para sua SEDE atual no sítio
Imbaúba, localizado no Bairro da Vila Florestal, no município de
Lagoa Seca. Com uma área de 2 hectares, o Colégio fica apenas 2
Km da cidade e a 10 Km de Campina Grande. Com o nome de
Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand, teve seu curso regulamentado
em 1975, pela Lei 6226/75 e pelo Decreto 76326/75 (SANTOS, 2011,
p. 34).
45

O Ginásio Agrícola então mudou-se para Lagoa Seca, devido ao caráter


agrícola da cidade e da região, uma vez que a produção de hortifrutigranjeiros era
excelente na área em que a escola se instalou, facilitando assim as atividades que a
instituição pretendia oferecer. A década de 1960 foi para o município de Lagoa Seca
um período significativo, tempo em que se emancipou de Campina Grande, cidade
da qual foi distrito até 1964. Em 1967, quando da transferência do Ginásio, o no
município foi administrado pelo primeiro prefeito interino eleito por votação direta em
01 de Novembro de 1964, o Senhor Francisco Camilo de Oliveira. A Câmara
municipal contava com apenas sete vereadores. Lagoa Seca ainda era muito pobre
e “não tinha uma economia independente que pudesse manter a cidade sem a ajuda
de Campina Grande” (SANTOS, 2007, p. 131).

A Escola trouxe mudanças para esse contexto municipal, interferindo


positivamente na vida das pessoas, criando possibilidades de ingresso na vida
profissional através de um curso técnico. Segundo nos informa Maria de Lourdes
Araújo, foi apenas a partir da vinda da escola para Lagoa Seca, que os alunos
tiveram acesso profissionalizante na área agrícola. A partir de então, não seria
necessário o deslocamento para Campina Grande, antiga sede desta escola, o que
facilitou a qualificação desses jovens.

Em 1967, a cidade de Lagoa Seca havia sido emancipada apenas há 3 anos,


tendo como principal atividade econômica a “fiação do sisal e a produção de farinha
de mandioca” (SANTOS, 2007, p. 120). Nesta época havia poucas instituições
escolares, que por sua vez, eram improvisadas, pois as primeiras funcionavam nas
casas de moradores antigos que continham poucos recursos. A primeira escola
pública, por exemplo, surgiu em 1930 no sítio chamado Floriano, funcionando na
casa de José Jerônimo da Costa (SANTOS, 2007).

As práticas escolares se davam nas instituições religiosas da cidade como o


Colégio Marista, dedicado à formação de indivíduos para a vida religiosa que
funcionou no município desde 1953 e no Convento Ypuarana onde existia desde
1941 o Colégio Seráfico Santo Antônio, que tinha como professores frades
franciscanos e que formava inúmeros cidadãos, inclusive provenientes de outras
regiões do país (SANTOS, 2007).
46

As atas de reuniões entre a gestão e os docentes revelam como era o


cotidiano da instituição e quais diálogos permeavam esses encontros. Já no fim do
segundo ano letivo do Ginásio Agrícola, a partir dos registros na ata pesquisada, o
gestor João de Sousa Barbosa chamava atenção para a ausência dos docentes em
suas atividades escolares como é o caso da ata de reunião de 28 de outubro de
1964, afirmando que o encontro seria “para tratar de assuntos importantes em pauta,
merecedores de apreciação urgente e inadiável” (Ata de Reunião, 1964). O diretor
do Ginásio afirmou que “a frequência às aulas dos professores no ano letivo de 1964
era insuficiente, em sua maioria, para satisfazer as exigências regulamentares do
currículo” (Ata de Reunião, 1964).

Esse problema repercutiu de maneira efetiva, tanto que na “Ata da Sessão


Ordinária da Congregação do Ginásio Agrícola ‘Assis Chateaubriand’” de 15 de
dezembro deste mesmo ano, o diretor mencionou o assunto novamente “fazendo
elogios e restrições a outros” docentes, destacando alguns nomes e omitindo outros.

Pelas atas de reuniões pesquisadas, percebemos como era a relação entre a


escola e Associação Rural da Cidade de Campina Grande, no que se refere às
discussões e encaminhamentos feitos para o Ginásio Agrícola. Na reunião de julho
de 1967, houve uma sessão extraordinária com essa entidade e os membros do
Ginásio Agrícola

para discutir e decidir sobre a proposta de integração e transparência


do patrimônio do Ginásio Agrícola “Assis Chateaubriand” para a
Fundação Universidade Regional do Nordeste (FURN [sic]) o
primeiro localizado no município de Lagoa Seca e o segundo no
município de Campina Grande (Ata de Reunião, 1963)
momento em que foi aprovada por unanimidade a proposta de vincular o
Ginásio Agrícola à FURNE, tendo assim se tornado “Escola Integrada da
Universidade Regional do Nordeste” (Regimento, 1976).

Neste período a proposta da escola seria preparar o alunado, através da


formação para o mercado de trabalho, em razão de haver um curso técnico voltado
para esse objetivo. Conforme o “Plano de aplicação de Reforma de ensino do 1º e 2º
Graus de acordo com a lei 5692, de 11 de agosto de 1971” o “Colégio Agrícola
‘Assis Chateaubriand’ foi criado numa zona rural com o fim específico do ensino
profissionalizante’ (sic) na área agrícola, e baseado no Art. 30 da Resolução nº
47

38/72 do C.E.E.” (PLANO DE APLICAÇÃO DE REFORMA DE ENSINO DO 1º E 2º


GRAUS DE ACORDO COM A LEI 5692, DE 11 DE AGOSTO DE 1971, 1973).

O contexto das décadas de 1960 a 1980 em âmbito nacional foi marcado pelo
período ditatorial, que durou de 1964 até 1985. O objetivo Ginásio Agrícola parecia
estar atrelado às mudanças educacionais sugeridas pelo Governo Federal, que
implementou reformas na educação em todo o Brasil (ZOTTI, 2004). Essas reformas

tinham a essencial função de alinhar o sistema educacional aos


objetivos do Estado capitalista militar, adequando-o á ideologia do
“desenvolvimento com segurança”[…] “a educação estará novamente
a serviço dos interesses econômicos que fizeram necessária a sua
reformulação” (ZOTTI, 2004, p. 142).
Na década de 1970, a EAAC passou por grandes dificuldades, conforme
declarou Maria de Lourdes Araújo (2013): “era uma escola simples […] A escola era
pobre”.

De acordo com regimento escolar à época da gestão do professor Joaquim


Vitoriano, e desde então já integrada à Furne, manteve-se o mesmo propósito da
década anterior, que era oferecer formação integral:

a Escola integrada, órgão suplementar da Universidade Regional do


Nordeste, tendo por objetivo proporcionar aos seus alunos a
formação integral necessária ao desenvolvimento de suas
potencialidades como elementos de auto-realização, qualificação
para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania,
ministrará o ensino de primeiro e de segundo graus (Regimento de
1976).
48

Imagem 4
A EAAC já na década de 1970 vincula-se à FURNe, tornando-se uma extensão da Universidade.
(Acervo da EAAC)

O que diferia a proposta deste regimento para o documento de 1973 era o


acréscimo de que além de preparar o cidadão para o exercício da cidadania, a
escola ministraria “cursos de aperfeiçoamento e reciclagem para satisfazer às
exigências do mercado de trabalho, observadas, em cada caso, a legislação e as
normas especificamente aplicáveis” (REGIMENTO de 1973).

Deste modo, a escola segue mantém as propostas curriculares das


instituições escolas agrícolas do Brasil, além de obedecer às diretrizes curriculares
nacionais vigentes no período militar. A partir deste momento, foram implementados
o ensino de primeiro e segundo graus, que corresponde atualmente aos ensino
fundamental e médio.

Foi neste período que o professor Joaquim Vitoriano Pereira ingressou no


colégio como gestor, época que fiscalizava o vestibular da URNE. Assumiu a EAAC,
o então Ginásio Agrícola, em 1972, por falta de direção naquele momento. Isto fica
evidente quando afirmava:
49

Eu era inclusive diretor do Colégio Agrícola, aliás, eu era diretor


também do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade. Aí o
reitor perguntou: “rapaz como é que eu faço agora, você ser diretor
das duas coisas, or lá e cá”? Eu digo: “faça o seguinte: agregue o
colégio ao CCT eu tomo conta de tudo”. Eu fiquei chefe do, do, dos
do Centro de Ciências e Tecnologia (JOAQUIM VITORIANO
PEREIRA, 2013).
Sua atuação gestor ao longo dos anos mostra que havia dinamicidade em
suas práticas, tanto na agricultura quanto na educação, mesmo diante das
dificuldades por falta de recursos que a universidade enfrentava:

Na época a universidade não tinha recursos, professor a gente


arranjada esporadicamente, emprestado, convidada. Aí nós fomos
mobilizando, nós pegamos a grade curricular da Escola Técnico
Agrícola, e essa escola nós formamos de acordo com a lei
(JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).
Esta instituição, mesmo criada há quase uma década, passava por muitas
dificuldades em relação ao corpo de funcionários, desde os docentes até o pessoal
da parte logística e secretaria, conforme nos relata Joaquim Vitoriano Pereira:

Eu por exemplo, a escola tinha alguns funcionários colocado por lá


através de canais políticos, através da política. Pessoas nos lugares
errados. Eu sei que um escrevente datilógrafo num conhecia nem
uma máquina de escrever e outros escreventes analfabetos. E eu
convidei toda a escola, eu pegava uma ferramenta, uma foice e
convidava todos os funcionários, e vamo ajeitar a cerca do colégio
todo mundo ia. Com o tempo eu vi que esse pessoal estava com
mais saúde, estava trabalhando […] fazia as coisas sem coação,
fazia de boa vontade, e com isso a gente fez tudo o que foi feito lá foi
feito na base da cooperação, da compreensão e do respeito
(JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).
50

Imagem 5: Duas das primeiras secretárias do Ginásio Agrícola


(Fonte: Acervo da EAAC)

Esta fotografia revela o espaço da secretaria do Ginásio Agrícola da década


de 1960 mostrando o cotidiano do funcionamento burocrático e de logística da
escola.
51

3.2. PRÁTICAS EDUCATIVAS NOS TERRITÓRIOS DA ESCOLA AGRÍCOLA

Apesar dos desafios e com a escola estando próxima da falência e do


fechamento, o gestor lutou para mantê-la, contando com o apoio do corpo de
funcionários, tido por ele como “um pessoal disposto a trabalhar e a cooperar”,
mesmo que sem retorno financeiro. Ele conta que tudo era utilizado para finalidades
de ensino. Até mesmo um bosque se transformou em sala de aula:

Na falta de carteira. Nós tínhamos um bosque de cajueiros de frente


a cantina. Hoje tem uns prédio lá, umas construções. Aali era um
bosque de cajueiro cheio de cajueiro. Eu mandei limpar e transformei
o bosque em sala de aula. Um ônibus servia de sala de aula. Aqui
tinham 8 salas e eu tinha 520 alunos, então não cabia. Eu dava, eu
mandava o professor dar aula dentro do ônibus, digo: “leve os aluno
lá pra debaixo do cajueiro, senta, ajeitei lá os galho, sentem nos
galhos dos cajueiro, senta no chão”. […] E assim a gente levou
a vida (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).
Devido à falta de recursos básicos para a manutenção da escola, qualquer
lugar poderia ser “adaptado” como local de aulas. Estes espaços informais acolhiam
as práticas educativas: poderia ser num bosque, conforme nos disse o ex-gestor, um
galho de uma árvore servir de cadeira, e até mesmo um ônibus funcionava como
sala. Parece-nos que o que realmente importava para este gestor era que fossem
desenvolvidas práticas de ensino, para além dos problemas estruturais. Percebemos
que sua concepção de educação está muito além do que se possuir um conjunto de
saberes para serem transmitidos, saberes “móveis”, que circulam em qualquer local,
para além dos espaços instituídos.

Essas dificuldades permeavam a década de 1970, pois a própria localidade


para a qual a escola mudou-se, era uma região desfavorecida economicamente.
Portanto, não poderia oferecer recursos ou ajuda à escola. Pelo contrário, a escola
prestou grande serviço à educação local:

Olhe quando eu cheguei em Lagoa Seca, a escola agrícola estava se


arrastando. As escolinhas que haviam na zona rural eram só pra
constar. Era a professora como eu já falei, a sala de aula, o banco
que os alunos se sentavam eram dois tamboretes com uma tábua,
que o aluno se sentavam e as vezes caía. A professora tava dando
explicação, tinha que as vezes soprar o fogo […] era ainda uma
escola desse tipo. Com a escolinha a Escola Agrícola, eu acho, foi
um pulo bem grande que o município deu com a melhoria da Escola
Agrícola e o crescimento dela. […] Foi de grande valia, foi de grande
importância na vida do profissional de Lagoa Seca (JOAQUIM
VITORIANO PEREIRA, 2013).
52

Conforme constatamos, Joaquim Vitoriano Pereira (2013) nos mostra que no


contexto da História da Educação de Lagoa Seca, a escola agrícola trouxe
significativa contribuição melhorando as perspectivas da comunidade local. A
importância histórica da escola se reflete na formação de jovens para o mercado de
trabalho, uma vez eu proporcionou novas oportunidades na vida profissional da
região.

O Ginásio Agrícola contribuiu para a história educacional local, pois oferecia à


comunidade atividades diversificadas, conforme enfatiza Joaquim Vitoriano Pereira:

Agente dava cursos pra comunidade. Teve o curso de apicultura,


criador de abelhas, né? A gente dava esses curso pra comunidade.
Então a gente isolava, tinha lá o apiário […] era um criatório de
abelhas. Os alunos faziam a matrícula. As vezes era patrocinado por
um órgão da Emater e com esses curso a gente arranjava alguns
recurso pra comprar comeia (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA,
2013).
Podemos perceber a importância da instituição tanto para o gestor como para
a ex-aluna, Maria de Lourdes Araújo, ao mencionar os tempos de escola e o papel
dela na comunidade: “Agora, o pessoal de Lagoa Seca, quase todo mundo estudou
lá, muita gente estudou lá” (MARIA DE LOURDES ARAÚJO, 2013). Pela perspectiva
de Maria de Lourdes Araújo (2013), a escola trouxe mudança significativa para a
vida local:

Ela deu uma contribuição muito boa, porque tem muitos profissionais
hoje espalhados em todo o Brasil. Não é só aqui, é em todo o Brasil.
Profissionais que estão trabalhando na EMATER, é […] Banco do
Nordeste, em fazendas na Bahia, no sul, que são alunos daqui, que
foram alunos daqui[…] Semana passada veio um aluno, que estudou
aqui, terminou o curso, terminou em 85 e ele já foi[…] foi embora pra,
pra São Paulo, trabalhou dentro da área, saiu, já saiu fora, já foi
político, e eu sei que eles tão bem, mas ele agradece à escola
(MARIA DE LOURDES ARAÚJO, 2013).
A escola se tornou importante para o contexto local e social de Lagoa Seca.
Muitos cidadãos da própria de cidade e de fora ali estudaram e depois atuaram em
diversas outras áreas pelo Brasil afora. Conforme destaca Maria de Lourdes Araújo
(2013):

Outros em Roraima já foram prefeito, ingressaram na vida política


[…] mas a coragem que eles tiveram de sair foi a escola que
contribuiu, foi a escola que contribuiu. E muitos aqui em Lagoa Seca
ainda, como Edson que tem a farmácia dele foi devido à escola,
Ednaldo que foi professor daqui, veio da escola […] Reginaldo Tomé
é um comerciante hoje? É. Mas ele fez o curso dele aonde? Na
53

escola. Na escola. E muitos que tem por aí! (MARIA DE LOURDES


ARAÚJO, 2013)

Esses relatos nos permitem refletir sobre a importância dos lugares de


memória para os sujeitos, pois, “o lugar de memória é um lugar duplo: um lugar de
excesso, fechado sobre si mesmo, fechado sobre sua identidade, e recolhido sobre
seu nome, mas constantemente aberto sobre a extensão de suas significações”
(NORA, 1993, p.27). Assim a identidade que a escola constrói sobre si também se
desdobra na memória dos sujeitos que dela participaram.

A representação de Maria de Lourdes Araújo (2013) sobre a EAAC


corresponde a um espaço de preparação para a vida, pois formou os sujeitos para
suas atividades futuras. Depois de suas respectivas formações, os sujeitos
ingressavam na vida profissional com sucesso, em razão dos conhecimentos ali
adquiridos. Os filhos de agricultores locais e alunos de outras cidades e regiões
ingressaram no mundo do trabalho através do curso técnico realizado na instituição.

Do ponto de vista curricular, a escola seguia o programa e o currículo dos


demais estabelecimentos agrícolas nacionais, conforme relata Joaquim Vitoriano
Pereira (2013):

Olhe a organização vinha do MEC. As escolas agrícolas tem a grade


curricular, já vem pronta. Nós apenas organizamos o efetivo e damos
cumprimento às ordens, porque a escola é padrão. Cê tem que
seguir. Um técnico agrícola feito aqui ele tem a mesma capacidade
do técnico agrícola feito no Rio Grande do Sul, no Mato Grosso,
porque a escola obedece a um padrão, um currículo, currículo é o
mesmo. Tem algumas variadas, variedades regionais, pode
influenciar e de princípio a carga horária é a mesma (JOAQUIM
VITORIANO PEREIRA, 2013).

Porém, notamos que pelo fato de o colégio pertencer à universidade, suas


normas educacionais, sua grade curricular e sua prática de ensino estavam
necessariamente subordinados a essa:

É o seguinte, nós tínhamos a secretaria de ensino da universidade. O


colégio participava, ela não participava não, o colégio era da
universidade. Então tudo sobre o ensino estava subordinado a
secretaria de ensino da universidade. Então toda programação tinha
de seguir a programação da academia (JOAQUIM VITORIANO
PEREIRA, 2013).
54

Este pertencimento à universidade acarretou imposição de normas e de


critérios, que o Ginásio Agrícola teria que acatar. O Professor:

Houve lá um movimento pra exigir farda, eu: “peraí, farda?” Aí numa


reunião na universidade aí o reitor pra num ficar por baixo botou em
votação no consumo, no conselho universitário, e eu fazia parte do
conselho universitário. Eu alegava de que não era possível exigir
farda dos alunos, o aluno tinha que vim com a roupa tivesse. Aí […]
mas ele botou em votação e eu perdi. Então ficou decretado pela
reitoria o uso da farda, mas o reitor transmitiu pra mim o direito de
marcar a data do início do uso dessa farda, e eu: “tá certo”. Aí
terminou a reunião eu fui pra lá. Alguns meses depois eu voltei a
universidade, o reitor perguntou: “e a farda dos alunos? Eu digo: “já
combinei”. [Reitor] “Combinou o que?” Aí eu digo: “eu dei um prazo
de 365 por ano pra eles arranjarem a farda”. [Reitor] “Mas 365 dias o
ano passa”. Eu digo: […] “eles num pode comprar a farda, passa o
ano estudando sem farda, esperando arranjar condições de comprar
a farda”. Aí ele disse: “é você tá certo”. Ele nunca mais me cobrou a
farda (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).
Observamos a imposição de normas que não se adequavam ao perfil dos
alunos da instituição, pois segundo Joaquim Vitoriano Pereira (2013), o alunado do
Ginásio Agrícola era, em sua maioria, pobre: “como uma grande parte de alunos
eram, grande parte, não, a totalidade era muito pobre, precisavam”. Ficou evidente
no depoimento, a relação de poderes que perpassava o espaço do Ginásio Agrícola:
uma norma que o reitor da universidade quis impor sobre o uso de fardas para todos
os alunos, apesar de conhecer a situação socioeconômica do alunado.

Contudo o gestor conseguiu burlar a imposição do reitor, através de suas


habilidades em conseguir dizer “sim”, mas sem necessariamente aderir à norma. Na
prática, burlou com arte e sabedoria a decisão o conselho da universidade. Sua
maneira de dizer e consentir consistiu, de fato, numa estratégia de inconformidade,
numa tática de astúcia e drible em meio ao peso da decisão institucional.

A universidade não tinha recursos financeiros e, segundo Maria de Lourdes


Araújo (2013), pretendia fechar o Ginásio Agrícola

Porque a própria universidade na época não fazia um esforço pra


que a escola existisse, num tinha um mínimo esforço. Queria fechar
a escola, pelo contrário […] no reitorado do professor Sebastião, a
gente sofreu muito, muito ali. Ia pegar pagamento quando começou
trabalhar, atrás de pagamento. Num tinha, voltava todo mundo. A
gente passou seis meses ali dentro sem receber um centavo. Seis
meses! De uma greve que teve […] seis meses! A nossa sorte que
aqui não pagávamos aluguel, nem eu e nem pai. Mas muitos em
Campina foram despejados, foram humilhados no comércio. […]
55

você passar seis meses sem passar nem um centavo, num é


brincadeira não viu? […] No governo do nosso querido Burity (MARIA
DE LOURDES ARAÚJO, 2013).

As relações entre o Ginásio Agrícola e a universidade não pareciam ser


promissoras, segundo nos parece e de acordo com os depoimentos. O atraso do
salário dos funcionários durante seis meses acarretou transtornos de ordem social e
moral. Os funcionários passaram dificuldades econômicas, pois ficaram sem renda.
Aqueles que tinham seu trabalho no campo e viviam de sua própria colheita
poderiam ainda manter sua casa, situação de Maria de Lourdes Araújo.

A escola tinha suas maneiras de operar, e as reuniões eram organizadas de


acordo com as discussões a respeito das dificuldades enfrentadas. O professor
Joaquim Vitoriano Pereira explica como se dava esses encontros:

Ora agente fazia uma reunião por mês, às vezes duas.


Convidava os professores, e conversava somente as
dificuldades, porque as soluções, agente conversava sobre as
soluções, mas ficava tudo no campo da hipótese na tentativa
(JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).
Nestas reuniões eram discutidos todos os problemas, inclusive aqueles
relativos às finanças da instituição, como o mesmo professor:

Agente discutia exatamente […] os professores compareciam,


cada um expunha as suas dificuldades que já eram
conhecidas, porque as dificuldades eram generalizadas. O que
a gente fazia era o seguinte: era pedir mais tolerância, mais
amor pela profissão, e vamos segurar a barra até o colégio
criar sangue, porque ele num tem e isso aconteceu, graças ao
apoio e a cooperação de todos que trabalhavam lá (JOAQUIM
VITORIANO PEREIRA, 2013).

Muitas alterações foram feitas na educação em Lagoa Seca com a vinda da


EAAC, alterando a trajetória deste município, conforme Joaquim Vitoriano Pereira
(2013) esclarece. Percebemos, deste modo, um pouco do funcionamento
educacional local no contexto da década de 1970: havia métodos de educação
informais que eram encaminhados por alunas da Escola Normal de Campina
Grande, que estudavam em Campina e atuavam em Lagoa Seca.

O gestor ressalta ainda que durante sua administração a prefeitura da cidade


mantinha uma relação amistosa com a direção do colégio havendo alguns diálogos
com o então prefeito. Neste sentido o ex-gestor assinala que:
56

Era a melhor possível. O prefeito as vezes conversava comigo.


Quando nós levamos as escolinhas do município pra estudar no
colégio, pra compor o colégio. Com essa pergunta: “e as
professorinhas”? Eu digo: “as professorinhas que dava aula em casa,
a sala de aula era a sala de janta da família, a professora dava a
aulinha dela atiçando o fogo ficava as vizinha da cozinha, a criança
recém nascida, recém nascida não, se arrastando, se arrastando
dentro da sala de aula, quer dizer, bloqueando a atenção dos alunos.
Mas mesmo assim funcionava e com isso nós levamos tudo lá pro
colégio e lá o ambiente ficou outro. Eu fiquei com as professorinhas
como servente, auxiliar de serviço e outros serviço que podiam fazer
em prol da escola, merendeiras. E assim nós botamo a escola pra
funcionar sem choro e sem lágrima. Foi uma beleza, pra mim aquilo
foi uma glória (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).”
A EAAC alterou o quadro educacional do município, com a inserção das
professoras em um ambiente institucional, retirando-as das práticas informais
executadas em suas residências. Essas profissionais passaram a assumir um papel
profissional desde então, nas mais diversas áreas. As práticas escolares da
comunidade vizinha, no sítio imbaúba de Lagoa Seca, eram antes exercidas nas
casas das professoras, de modo improvisado e com interferência de outros
problemas, que prejudicavam as tentativas de ensinar.
O quadro educacional da escola, seu corpo docente, era incompleto e na
década de 1970 possuía qualificação. Isso foi um grande desafio para o gestor
Vitoriano:
Os problemas? Olha tinha tantos, a começar pelo corpo docente.
Não tinha um pessoal qualificado. O técnico agrícola podia ensinar
em algumas situações, mas lá, o grande número de técnico agrícola
entrou como professor, e professor do próprio nível (JOAQUIM
VITORIANO PEREIRA, 2013).
Algumas das professoras retiradas da zona rural passaram a lecionar na
escola, devido a um convênio com a Escola Normal de Campina Grande, pois a
partir de 1971, com o surgimento da LDB deste mesmo ano, a EAAC passou a
funcionar com o 1º Grau completo. Com este mesmo convênio, as alunas após o
término do primário, iam para a Escola Normal para receberem treinamento e depois
retornarem para a EAAC e ingressarem no corpo docente (REVISTA 40 anos).

Podemos compreender como as atividades da escola eram desenvolvidas na


década de 1970, a partir da narrativa de Maria de Lourdes Araújo (2013) quando
esta nos fala sobre a escola Agrícola, que na sua época se chamava Ginásio
Agrícola. Ao indagarmos sobre o cotidiano da escola no período em que era aluna,
ala relembra que:
57

Era uma escola simples, ela funcionava como Ginásio Agrícola,


Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand. Ela tinha o ensino
fundamental, que na época chamava-se primário, alfabetização que
era o primário né? Até a 8ª série. Aí em 73 ela funcionou o curso
técnico, com o nível médio, funciona até hoje, que a escola hoje tá
com 50 anos. E ela funcionava [...] era integrado na época, que era o
técnico agrícola, o agropecuário com o [...] como é [...] O integrado.
Então ela funcionava, era um período de 4 anos dois turnos: 3 anos
os dois turnos, manhã e tarde. E era uma escola simples, que os
professores não eram daqui, eram todos de Campina, vinham todos
de fora. Tinha [...] o pessoal quando começou o nível médio eles
tinham de pagar porque era da da Urne, funcionava como uma
escola da Urne (MARIA DE LOURDES ARAÚJO, 2013).
Ela ainda nos fala sobre o encerramento do que se chamava de 1ª grau à
época: “77 […] foi quando realmente encerrou o período de nível médio, núcleo
comum. A 8ª série encerrou por aí em 77, aí ficou só o 2º grau” (MARIA DE
LOURDES ARAÚJO, 2013). Percebemos ainda que, a partir de 1973, 11 anos após
sua criação, a escola começou a funcionar como curso de técnico agrícola e a
oferecer o ensino médio vinculado a este. Neste período a EAAC se desenvolveu
com muito esforço e trabalho coletivo, assim como ocorreu nas outras décadas:

Nós construímos um açude, aumentado a produção de verduras. Os


alunos das escolinhas que funcionava em torno da Escola Agrícola
foram estudar no colégio. Nós tínhamos, nós criamos o primário
também na época. O primário Ginásio Técnico Agrícola. Eu cheguei
a botar 520 alunos. Isso sem dinheiro, isso sem ordem. E a coisa foi
funcionando e pegou, pegou que firmou. Nós começamos formar os
primeiros técnicos. Os alunos começaram a arranjar emprego e
assim fechamos o círculo fechando o segundo grau completo
(JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).

Pelo depoimento verificamos que as dificuldades sempre estiveram latentes


na escola, mas mesmo assim o esforço do gestor e dos demais funcionários fez com
que ela fosse progredindo. Com a formação dos primeiros técnicos agrícolas a
situação econômica dos alunos foi alterada, pois logo arranjaram empregos, que
mudaram sua condição financeira, repercutindo assim na sua vida familiar.

No que se refere a trajetória do Senhor Joaquim Vitoriano Pereira, assumiu a


gestão da escola somente 10 anos após sua criação, e naquele período a instituição
se encontrava com um funcionamento inadequado, mesmo já possuindo regimento
próprio, que era regulamentado pelas normas do MEC e seguia as diretrizes
educacionais nacionais, conforme nos disse Joaquim Vitoriano Pereira (2013).
58

Sobre o cotidiano da escola, a narrativa de Maria de Lourdes Araújo informa


que a escola também tinha atividades relacionadas com o campo, de acordo com as
disciplinas oferecidas pelo curso técnico, voltado às práticas agrícolas. Sendo assim
os alunos trabalhavam diretamente com a terra:

A gente tinha que ir para o campo fazer uma aula de P.A.O., o que
era o P.A.O? O Programa Orientado Agrícola. A gente ia trabalhar:
plantar canteiro, limpar, com o professor de técnico agrícola. […]
Tinha aula de educação física e tinha aula interna né? Tinha aula
teórica e a prática. […] A rotina era essa (MARIA DE LOURDES
ARAÚJO, 2013).

Ressaltamos que ocorreram ainda mudanças curriculares que a escola


passou a obedecer, a partir de 1973, pois os alunos de 5ª e 6ª série do 1º grau
passaram a ter aulas práticas nos diversos setores profissionalizantes já que o
objetivo da escola era oferecer o ensino e a formação no setor agrícola.

A década de 1980 foi um período difícil, pois ainda existiam diversas


dificuldades financeiras. Apesar de EAAC já ser parte da universidade e ter sido
criada há quase duas décadas, ainda enfrentava crises: “a universidade era pobre,
não tinha recursos […] nós não tínhamos estrutura” (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

No que se refere ao perfil do aluno da Escola Agrícola, não houve mudanças


nessa década, pois este perfil ainda era de alunos em sua maior parte pobres,
conforme nos disse Neuza dos Anjos (2013): “tinha alguns aluno que passava por
dificuldade, porque eles eram de família pobre, vinham de fora, não tinha, a escola
não oferecia muita coisa”.

Com relação às disciplinas, a escola mantém a regularidade sugerida pelas


normas curriculares nacionais, padronizadas, semelhantes às Escolas Agrícolas do
Brasil. Neuza dos Anjos também nos fala quem a organizava o currículo na década
em que ela lecionou:

Era a coordenadora do curso, é […] Bernadete, e Alzemira que era


nossa supervisora, que ela supervisionava todo ensino, toda parte de
ensino nosso. Era elas quem elaborava currículo. Ai era quando nóis
professor e elas também ia pra Bananeira e lá agente organizou o
currículo pra ficar tudo igual pra num ficar diferenciado […] como era
tudo do mesmo Estado os currículo tinha de ser igual e as disciplina
também (NEUZA DOS ANJOS, 2013).
59

Este currículo era estável, pois “entre 1973 e 1997, o curso técnico em
agropecuária foi conduzido para capacitação de mão-de-obra, do setor através do
sistema profissionalizante e o ensino médio, o antigo 2º grau” (Revista 40 anos). No
que se refere à parte financeira da escola, já na década de 1980, período este que a
EAAC estaria perto de completar seus vinte anos de funcionamento regular, as
dificuldades financeiras ainda não estariam superadas, e os docentes enfrentavam
muitas dificuldades, com a ausência de suporte escolar e materiais pedagógicos
para que sua prática pudesse ser efetiva. Conforme Neuza dos Anjos (2013) nos diz,
eram a

falta de material pra prática. Que a prática que eu podia dar, que na
época, que eu me senti em condições de dar era uma prática bem
melhor. Infelizmente a escola não me oferecia equipamentos no mais
a dar. […] O recurso financeiro era muito pouco (NEUZA DOS
ANJOS, 2013).
Ainda pontuando as dificuldades, Neuza dos Anjos (2013) chama a atenção
para a determinação e dedicação dos profissionais que ali atuaram:

Só aquele cara o professor que tivesse o espírito mesmo de, de


gostar do do, que gostasse mesmo de ensinar do contrário […] Por
dinheiro a escola tinha fechado quantas vezes tivesse sido criada.
Mas como a vontade dos professores e o corpo docente, era um
corpo docente que tinha amor àquilo que fazia ai ela permaneceu
indo […] bem obrigado. (NEUZA DOS ANJOS, 2013).
Com relação ao planejamento escolar, a década não trouxe muitas
novidades, pois os procedimentos das reuniões eram os mesmos:

As reuniões era mensal. Nós tínhamos o diretor, Vitoriano, tínhamos


uma educadora locacional que era Dona Bernadete era
coordenadora do curso. Tínhamos a supervisora dos professores que
era Alzemira. O corpo era todo completo: tínhamos uma assistente
social e tínhamos […]. Então, a gente se reunia geralmente tinha
reuniões só dos profe […] dos docente com a diretoria e com o
professor Vitoriano e a diretora do a coordenadora do curso que era
Bernadete e Alzemira que era coordenadora nossa dos professores.
E agente discutia sempre sobre o ensino. Nós íamos pra Bananeiras,
nos reuníamos com o pessoal de lá a gente, o núcleo de lá era o
mesmo de a gente, Bananeiras fazia vis […] a gente fazia muita visita
lá em Bananeiras. […] Tinha reunião também lá em Bananeiras com
o pessoal da Escola Agrícola de Bananeiras. […] Depois da reunião
agente se reunião separado com […] separado com a assistente
social, com a educadora locacional (NEUZA DOS ANJOS, 2013).
Para a professora, a escola transformou a vida dos jovens que por lá
passaram, possibilitando oportunidades no mercado de trabalho, pois segundo a
mesma:
60

Saíam profissionais para o mercado de trabalho bem formado. […]


Porque todos os meus ex-alunos, quase todos se empregaram
dentro da área. Passaram no concurso da Emater, empresa privada,
eu mesmo arranjei um bocado de emprego ai pra alguns, empresa
privada, empresa pública. E quase todos foram bem sucedidos,
foram poucos os que ficaram sem fazer nada, eles tinham uma
formação profissional (NEUZA DOS ANJOS, 2013).
Desde a criação da EAAC, em 1962, até o final da gestão do diretor Joaquim
Vitoriano Pereira, em 1992, a situação financeira da instituição sempre foi difícil. Ela
não obteve recursos financeiros da prefeitura nem do Estado, ou mesmo do
Governo Federal, e até a própria universidade não oferecia condições para um bom
funcionamento. Podemos concluir que possivelmente isso decorria da política do
Estado Brasileiro que na área educacional, segundo Zotti (2004):

[no período militar] “o Estado se descomprometeu gradativamente de


financiar a educação pública: os recursos estavam comprometidos
com o capital privado, repassando, ainda assim, verbas para as
escolas particulares” (idem, ibidem). A grande parcela da população
nem sequer tem acesso à escola básica, enquanto a iniciativa
privada domina o pré-escolar, cresce no 2º grau e é majoritária no
ensino superior (ZOTTI, 2004, p. 141).
Os investimentos do governo no período militar estavam atrelados ao
interesses nas áreas de capital instrumental e privado, cujo retorno e aplicabilidade
eram regidos pelas leis do mercado neoliberal, que mesmo antes da queda do muro
de Berlim pretendia se tornar globalizado.

A EAAC teve diretores atuantes mesmo em face das dificuldades enfrentadas,


pois em sua trajetória ao longo desses 50 anos, todos contribuíram em suas
administrações para o crescimento e manutenção da escola. Até a década de 1990,
passaram pela gestão os seguintes nomes que devem ser lembrados: João de
Sousa Barbosa, Severino Duarte, Walter Galdino, João Carvalho, Joaquim Vitoriano
Pereira, Maria Bernadete, José Paulo de Amorin, Eduardo da Silva Pinheiro, Carlos
Pereira Gonçalves e Elizabeth Vitoriano (filha do professor Joaquim Vitoriano
Pereira).
61

4. REPRESENTAÇÕES E NARRATIVAS SOBRE A ESCOLA ASSIS


CHATEAUBRIAND DE LAGOA SECA

Neste capítulo refletimos sobre a história e memória da EAAC, no contexto da


História da Educação de Lagoa Seca, consubstanciadas nos documentos impressos
disponibilizados, para a realização desta pesquisa e nas memórias dos
entrevistados. Analisamos suas narrativas e suas memórias sobre a instituição, a fim
de perceber como constroem suas identidades e representações, a partir das
experiências vivenciadas no espaço escolar.

Partimos do pressuposto que as histórias de vida dos sujeitos ditos comuns


são ricas evidências para a construção da pesquisa histórica e particularmente para
este estudo. Assim, a vida de aluno, professora e gestor constituem importantes
nuances para reconstituir a memória da escola no contexto da história da educação.

Estas memórias lhes concede uma imagem do passado, talvez confundida


com imaginação (RICOEUR, 2010), mas que nos oferece o ponto de vista desses
sujeitos, suas representações, suas apropriações (CHARTIER, 1991) do mundo de
seu passado. A narrativa oral tem significativo valor neste estudo, pois articulada aos
documentos escritos e imagéticos, permite-nos visualizar e compreender a trajetória
temporal da instituição escolar. Essa narrativa se constitui numa tática de
composição original (CERTEAU, 2008), poética, um modo espontâneo para de falar
de si e do outro, de compor uma tessitura, que agencia os fatos, agregando memória
e história.
62

4.1. ESPAÇO ESCOLAR, REPRESENTAÇÕES E MEMÓRIAS

“A escola pra mim é minha casa, minha


vida” (Maria de Lourdes Araújo, 2013).

“Aquela escola era tudo que eu tinha na


vida […] e quando eu saí de lá […] foi como
se eu tivesse deixado […] eu tivesse saído e
deixado meu coração á” (Neuza dos Anjos,
2013).

Aprofundar-se na História de uma escola possibilita ao historiador da


educação adentrar no universo escolar, problematizando seu tema em relação às
fontes encontradas. Essa história não se restringe apenas a uma trajetória linear
com datas de entrada e saída de gestores, mas revela dados importantes que se
adentre numa trajetória com suas múltiplas dimensões. Desse modo, importa
perceber os vários aspectos que configuram a escola postura que, conforme
Sanfelice (2006), consiste em

mergulhar no interior de uma Instituição Escolar, com o olhar do


historiador, é ir em busca das suas origens, do seu desenvolvimento
no tempo, das alterações arquitetônicas pelas quais passou, e que
não são gratuitas; é ir em busca da identidade dos sujeitos
(professores, gestores, alunos, técnicos e outros) que a habitaram,
das práticas pedagógicas que ali se realizaram, do mobiliário escolar
que se transformou e de muitas outras coisas. Mas o essencial é
tentar responder à questão de fundo: o que esta instituição singular
instituiu? O que ela instituiu para si, para seus sujeitos e para a
sociedade na qual está inserida? Mais radicalmente ainda: qual é o
sentido do que foi instituído? (SANFELICE, 2006, p. 24).

Interpelar o passado da escola nos possibilita pensar questões específicas,


pois cada instituição possui sua importância particular, sua memória e identidade
próprias, ou seja, uma historicidade que expressa e perpassa sua trajetória, assim
como abre perspectivas para se entender o contexto da educação da cidade.
Sanfelice (2006) aponta que

os historiadores, dentre outras razões, apontam que suas


preocupações não são apenas as de registrar o passado e/ou o
presente, por meio de uma narrativa baseada em fontes, mas de
compreender e interpretar a própria educação praticada em uma
dada sociedade e que se utiliza das instituições escolares, como um
63

espaço privilegiado para executá-la. A singularidade das instituições


educativas mostra e esconde como ocorreu e/ou ocorre o fenômeno
educativo escolar de uma sociedade (SANFELICE, 2006, P. 24).

Nesse sentido, abordar essas memórias trazem à tona momentos vividos e


experiências significativas da realidade em análise. A memória, portanto ressignifica
as práticas escolares. Cada escola possui sua lógica interna, apesar de inserir numa
configuração cultural e política mais abrangente, relacionada à cultura nacional. As
escolas “produzem uma cultura interna que as diferencia uma das outras”
(CARVALHO, s/d, p.6) criando assim sua própria identidade e visibilidade contextual.

Consideramos que, para além de um de mero sistema de reprodução de


conhecimentos, a escola viabiliza a construção de saberes e práticas que produzem
efeitos sobre a sociedade, a comunidade e a cultura. Acreditamos ser importante o
aspecto cultural da EAAC, porque sabemos que a escola também é produtora de
cultura, pois conforme Carvalho (s/d)

a escola é, sem dúvida, uma instituição cultural e são as próprias


reformas educativas que reflectem [sic] as ideologias impressas no
contexto social e político macro. Está-se, portanto, a falar de uma
dimensão cultural e ideológica da educação enquanto base e
transmissor estrutural da reprodução social (CARVALHO, s/d, p. 3).

A EAAC mantinha seus próprios padrões de funcionamento regular, ela


possuindo “o princípio da homogeneidade (das normas, espaços, tempos, alunos,
professores, saberes e processes de inculcação) que constitui uma das marcas mais
distintas da cultura escolar” (CARVALHO, s/d, p. 4)

Por essa razão um dos caminhos para se abordar sua trajetória pode ser a
análise de seus modos de operar e funcionar, através do (re)conhecimento da sua
cultura escolar, que adotamos como campo de investigação. Assim, concordamos
com a perspectiva de JULIA (2001) que define cultura escolar

como um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar


e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a
transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses
comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que
podem variar segundo as épocas (finalidades religiosas,
sociopolíticas ou simplesmente de socialização (JULIA, 2001, p. 10).
64

Estas normas compõem um conjunto de práticas caracterizam a


individualidade escolar em sua relação com a cultura e a sociedade, tornando-a
portadora de identidade própria:

a escola é, sem dúvida, uma instituição cultural e são as próprias


reformas educativas que reflectem [sic] as ideologias impressas no
contexto social e político macro. Está-se, portanto, a falar de uma
dimensão cultural e ideológica da educação enquanto base e
transmissor estrutural da reprodução social (CARVALHO, s/d, p. 3).

Assim, torna-se importante percebermos como era o cotidiano dentro e fora


da sala de aula da EAAC. “Julia [Dominique] convidava os historiadores da
educação a se interrogarem sobre as práticas cotidianas, sobre o funcionamento
interno da escola” (GONÇALVES, p. 144, 2004).

Tais práticas não eram estáticas, mas dinâmicas, rompendo com os


empecilhos das regras escolares. Havia, na EAAC, uma troca de saberes entre
outras universidades sugerindo a repercussão de técnicas e novas formas de se
trabalhar com a agricultura. Neuza dos Anjos relata que

Nesse tempo eu era amiga dos professores da UFCG aí de


Bodocongó, e tinha dois professores que ia lá na escola pedir uma
área a mim e ao diretor Vitoriano, pra plantar algumas culturas pra
mostrar ao curso que eles eram engenheiros agrícolas, eles davam
aula no curso de engenharia agrícola. Então, eu conheci o professor
Mário, que era lá do Equador, mas ele tem uma propriedade em
Pernambuco e ele trouxe, eu pedi […] ele disse que tinha cacau na
propriedade dele. Eu fiquei louca, aí eu mandei ele trazer uns frutos
pra mim e ele trouxe vinte frutos de cacau maduro. Assim, eu levei
pra sala de aula, amolei um canivete, cortei fruto, mostrei a semente,
botei pra secar […] aí levei, fiz uma semente dele e plantei na escola
(NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Além do contato e das trocas de saberes e técnicas oriundas de outras


universidades, havia um enorme interesse pelo trabalho, uma paixão que pulsava
nesta docente: “eu fiquei louca”, mostrando assim o afeto e o prazer de exercer sua
profissão numa escola que passou por períodos de dificuldades.

A professora Neuza dos Anjos (2013) continua: “Eu tinha um dia na semana
que o diretor me dava, pra eu entrar em contato com outras empresa, vendedores
de material, de medicamento, de semente, eu sempre tava me renovando”.
Podemos perceber neste intercâmbio de conhecimentos como uma forma de trocas
65

culturais, pois cada sujeito possui seu conjunto particular de saberes e esse
intercâmbio oportuniza uma relação proveitosa para as “artes de fazer” (CERTEAU,
2008). Essa partilha não ficava atrelada apenas a outras universidades ou
empresas, mas também ocorria com pessoas do exterior, conforme a professora
declara:

Eu tinha um professor holandês, dois professores holandês, lá no


curso técnico. Quando um soube da Holanda que eu tava ensinando
lá, ele veio bater aqui no Brasil, foi até lá na escola, aí ele ficou
mandando. Ele ficou perguntando qual era as cultura que eu ia
ensinar, aí eu disse. Ele ficou mandando todo ano, nove caixas de
batatinha holandesa, da Holanda pra mim. Mandava pra Emepa e
mandava pra mim. […] Aí eu só precisava mandar pra ele: plantar no
experimento medido. Espaçamento, tudo medido a área, medida,
espaçamento, adubação, combate a praga de solo, adubação,
adubação química e e e […] e orgânica, […] tudo cientificamente
falado, entendeu? Depois eu só precisava colher essa batatinha,
pesar e mandar o resultado de quantas toneladas por hectares, aqui
no Brasil, que era a batata que eles tavam testando, batata semente
no solo brasileiro (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

O cotidiano era assim pautado pela relação de produção científica com viés
internacional, em colaboração com pesquisadores do exterior, visando a pesquisa
de implantação de batatas holandesas no Brasil, através da contribuição da EAAC e
mais especificamente da professora Neuza dos Anjos (2013). O professor Joaquim
Vitoriano Pereira (2013), ex-gestor da EAAAC, também expôs essa relação de
intercâmbio entre saberes e práticas envolvendo os holandeses, enfatizando:

Recebemos da Holanda dois agrônomos engenheiros, engenheiro


agrônomo, um havia trabalhado no Canadá e outro nos Estados
Unidos. […] Na época, o a Holanda tinha um convênio com o Brasil,
de ajuda mútua e a população de Holandeses de recreadoras
completou o quadro. E assim que formou um Ginásio Agrícola com
as oito séries (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).

Através das narrativas dos entrevistados, buscamos entender o


funcionamento da escola, conforme Silva (s/d)

Abordar a cultura escolar de uma instituição, então é estudá-la a


partir de seu funcionamento interno, como por exemplo o que
acontece nas aulas, isto é, como o conjunto de disciplinas se
transforma em conhecimento, o que acontece nas festas, nos
recreios, na correspondência com os pais. Como as normas
disciplinares moldam o comportamento dos alunos e influenciam em
sua vida adulta. Qual o papel desempenhado pelas atividades
66

artístico-culturais e pela educação física na formação dos alunos


(SILVA, s/d, p. 2).

Assim, verificamos o papel que a memória representa na (re)construção e na


ressignificação de uma identidade para a EAAC. No contexto da fala de Maria de
Lourdes Araújo, aspectos históricos e culturais que possibilitam pensar várias
dimensões da Escola Agrícola, dentre elas as representações e a construção da
identidade. Ela narra sobre sua representação da cultura escolar demonstrando o
funcionamento cotidiano na sala de aula:

Ah, professor eles ficavam copiando, ditando as atividades pra gente


copiar, ficava no quadro negro na época né? E e eles ficavam
escrevendo a vida toda com aquele giz, é […] ditando pra gente,
tinha um “bendito ditado” […] a gente ficava fazendo o ditado, as
tarefas que tinha, tinha tarefas pra casa a gente tinha de levar no
outro dia, […] leituras, […] tinha as provas (MARIA DE LOURDES
ARAÚJO, 2013).

Entendemos assim trabalho docente, que se materializava em atividades


simples que apontavam o fazer diário e as formas de ser da escola: a escrita no
quadro negro, os textos ditados pelo professor, aspectos que poderiam significar a
ausência de material didático, pois segundo os entrevistados, a escola era pobre. As
tarefas para casa, a fim de verificar os saberes escolares, as leituras em sala e por
fim as provas consistiam no método adotado para se perceber e avaliar o
rendimento escolar do alunado.

A professora Neuza dos Anjos (2013), ao relembrar o cotidiano vivenciado na


escola traz à tona em suas recordações momentos indeléveis de suas experiências,
que compõem a memória de sua vida e criam as representações do lugar:

Ia pro quadro botava todos os tópicos da cultura que eu ia dar, da


criação que eu ia dar se fosse avicultura. Botava todos os tópicos
daquela aula que eu ia falar, preparava um rascunho até as aula que
eu ia dar. E os alunos copiavam só aqueles tópicos. Aí, quando
faltavam quinze dias pra prova, eu distribuía uma apostila pra todos
os aluno da sala, sentava com eles, e eles, nós eles liam a apostila
comigo e a gente ia discutir e tirar todas as dúvida que tinha no meio
da aula naquela disciplina, né? (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Através de seu depoimento, a professora Neuza dos Anjos revela sua


metodologia, os modos e as maneiras de fazer utilizadas em sala de aula, de acordo
67

com sua concepção de educação e de planejamento escolar. As considerações de


Silva (s/d) são importantes para pensar essas práticas do professor:

As práticas escolares demonstram que cada professor interpreta de


modo pessoal o conteúdo das disciplinas – mesmo que haja um
planejamento idêntico para uma rede de escolas costuma-se dizer
que quando se fecha a porta da sala de aula, ninguém consegue
controlar completamente o professor. Aquele é o território de seu
domínio e lá ele detém uma ampla liberdade de manobra. Esta
“liberdade” viria do conhecimento que ele possui sobre o que
funciona ou não com os seus alunos (SILVA, s/d, p. 1).

No que se refere à relação entre professor-aluno as palavras de Neuza dos


Anjos (2013) sugerem uma dinâmica amigável:

Às vezes tocava eu me empolgava com a aula e eu ficava, […] mas


os menino começa a conversar e a perguntar e eu me estirando. […]
Nunca eu dei uma aula […] naquela escola pra num surgir um monte
de pergunta até de outras área (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Esta relação em sala de aula também mostra os contornos da cultura escolar


desta instituição, pois traz à tona os modos de proceder da professora em sala, sua
maneira de se relacionar com sua turma. Através desta fala ainda podemos
perceber a boa relação mantida com os alunos que apesar de em algumas vezes a
aula ter acabado, eles continuavam a ouvir a professora e a questionarem,
participando ativamente das aulas.

Contudo, a maneira como as disciplinas eram distribuídas fazia parte do


planejamento da escola, que criava cotidianamente seus modos de fazer, segundo
entende Certeau (2008). As atividades de campo na EAAC, além de integra com o
currículo, eram pensadas para operacionalizar a teoria vista em sala de aula. O
depoimento a seguir permite essa compreensão:

O que é que eu fazia? Levava meus aluno, eu tinha sempre meu


material […] eu saía pelo sítio […] eu levava meus aluno nem que
fosse num ônibus que eu fretasse com meu próprio dinheiro,
qualquer jeito eu levava. Meus aluno pra dá aula prática: ver uma
matriz na maternidade, ver uma, uma leitagada de, de uma ,uma,
uma matriz com uma leitagada de porquinho novinho, um, ver um
parto de suíno (NEUZA DOS ANJOS, 2013).
68

Imagem 6: cotidiano da escola já no início da década de 1990


(Acervo da EAAC)

A fotografia demonstra o cotidiano das atividades agrícolas na EAAC, já na


década de 1960, notabilizando a continuidade no tempo das práticas agrícolas.
Essas atividades tinham o objetivo de aproximar os alunos dos ensinamentos
teóricos. Entretanto, a possuía uma diversidade de trabalhos propostos no cotidiano
em relação ao plantio que não necessariamente estavam atrelados ao currículo
escolar: eram parte da prática pedagógica da professora Neuza dos Anjos (2013),
que tinha uma postura ativa:

Então minhas cultura na escola era: avicultura, suíno cultura com os


dois segundo ano. E aos dois terceiro eu ensinava a cultura da cana-
de-açúcar, café, cacau, arroz, amendoim, soro, batatinha, abacaxi,
café, essas eram as cultura, eu só ensinava as grandes culturas. […]
eu plantei na escola todas as cultura que você, que eu disse a você
(NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Cotidianamente, os alunos estudavam as disciplinas da área pedagógica do


currículo proposto e aquelas relativas às questões agrícolas. Essa rotina garantia à
escola sua própria cultura, cuja organização era peculiar. Carvalho (s/d) aponta
69

para a existência, em cada escola, de um conjunto de factores [sic]


organizacionais e processos sociais específicos que relativizam a
cultura escolar (enquanto expressão dos valores, hábitos,
comportamentos, transmitidos pela forma escolar de educação a
partir de determinações exteriores) (Barroso, 2004) e que, por isso,
demonstram que não se trata de um receptáculo passivo de
instruções exteriores, mas um elemento activo [sic] na sua
reinterpretação e operacionalização (CARVALHO, s/d, p. 6).

Percebemos que as disciplinas escolares fixam modos de aprender e formas


de proceder para os sujeitos, através de normas e diretrizes à serem cumpridas e
relembradas pelos alunos, demarcando assim comportamentos e subjetivando os
valores da instituição.

No que se refere ao contexto da cultura escolar da EAAC, representada


através das festividades e outras manifestações culturais não curriculares, o ex-
gestor lembra como eram realizadas as festas que faziam parte do calendário
escolar, destacando as atividades durante seu período de gestão:

Olha, universidade tinha as festas eu nem me lembro mais. O


Colégio Agrícola tinha a semana ruralista, associação rural,
apresentação de produtos, visita do parque, exposição de animais
[…] Todo ano tinha, então a gente pegava uma semana de
exposição e os aluno viam, cada professor, expor a sua cultura. E a
gente tinha uma amostragem real da vida ruralista” (JOAQUIM
VITORIANO PEREIRA, 2013).

Ainda sobre os aspectos da cultura escolar da instituição, Maria de Lourdes


Araújo (2013) nos mostra as ricas manifestações que a escola promovia para seus
alunos, conforme ela destaca:

Tinha a banda completa da escola […], tinha um museu […], tinha


[...] é […] peças de teatro, tinha os holandês que vinha pra fazer
trabalho com a gente, trabalho de de […] oh meu Deus, me fugiu à
memória […] de artesanatos. Eles vinham pra ensinar bordar,
costurar, tinha uma holandesa que trabalhava com a gente (MARIA
DE LOURDES ARAÚJO, 2013).
70

Imagem 7
fotografia da década de 1960: a banda do Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand
(Fonte da EAAC)

Imagem 8
O Ginásio Agrícola Assis Chateaubriand participava das manifestações culturais e seguia o
calendário nacional em suas manifestações cívicas
(Fonte da EAAC)
71

Podemos perceber a partir da fala de Maria de Lourdes Araújo e das duas


fotografias escolares um vislumbre das manifestações culturais do Ginásio na
década de 1960, mostrando as meninas da escola que faziam parte da banda da
mesma que desfilava geralmente no dia 7 de setembro, conforme as atividades do
calendário escolar.

Imagem 9
Banda do Ginásio Agrícola em desfile na cidade de Campina Grande na década de 1960
(Fonte da EAAC)

I
Imagem 10
Apresentação cultural em Campina Grande na década de 1960
(Fonte da EAAC)
72

Na década de 1960 o Ginásio possuía uma banda, conforme as imagens


acima e a fala de Maria de Lourdes Araújo, que participava das atividades culturais
promovidas pela escola e também pela cidade de Campina Grande, sendo que o dia
7 de setembro era o principal dia de desfile e apresentação desta banda.

4.2 TECENDO HISTÓRIAS E RESSIGNIFICANDO MEMÓRIAS

Na década de 1970 a EAAC possuía um museu e uma banda que promovia


desfiles, sobretudo referentes ao dia 7 de setembro, pois era parte do calendário
escolar. As atividades extra-curriculares se davam de várias formas tais como peças
de teatros, trabalhos e a participação de holandeses que colaboravam através de
artesanatos, bordados, costura, etc. Esses momentos foram significativos ne
experiência dos alunos, segundo enfatiza Maria de Lourdes Araújo (2013):

E então, assim: dia do índio, saía todo mundo saía pra o museu do
índio pra visitar […] tinha o dia do índio ia fazer o trabalho lá no
convento. […] Tempo da páscoa, São João, quadrilhas que era os
professores, diretores que organizava… e a gente participava ali
dentro, dançando a quadrilha, brincando… tinha […] o desfile de 7 de
setembro, isso aí era imperdoável, isso aí era imperdoável, tinha…
num tinha que num participasse […]. E a gente era aquela alegria pra
fazer aquilo: quando era o tempo de São João, tempo da páscoa […],
dia das mães, era organizado […] Tinha o desfile do 7 de setembro,
esse aí era imperdoável […] esse aí era imperdoável, tinha, num
tinha quem num participasse! […] Quem era o nosso instrutor era
quem? O coronel Gonzaga, pai do dodo pró-reitor Sandir […] que o
pró-reitor de administração do RH, professor Sandir, e coronel
Gonzaga era o Coronel Gonzaga era o pai dele. […] No dia 7 de
setembro, tinha os ensaios todo mundo ensaiava e no dia 7 tinha que
desfilar se faltasse já viu como era. […] E a gente era aquela alegria
pra fazer aquilo quando era o tempo do São João, tempo da Páscoa,
era as festinha da gente era só essa, dia das mães, que era
organizado, e as vezes a gente ia, mainha num gostava muito de
festa, às vezes [eu] ia sozinha e […] chorava porque ela num ia […]
aí […] era assim que a gente convivia, as festivadades era essa, tudo
dentro do padrão da escola (MARIA DE LOURDES ARAÚJO, 2013).

Percebemos através da fala de Maria de Lourdes Araújo (2013) que as


atividades extra-curriculares consistiam em visitar museus, dentre os quais o de
Lagoa Seca. Na época, existia o Museu do Índio que estava localizado no Convento
73

Ypuarana da cidade. Organizar as atividades para os desfiles e as comemorações


festivas como páscoa e São João, também eram comuns na rotina escolar.

As narrativas são portadoras de muitos sentidos, pois revelam a cultura


escolar da EAAC. Notamos ainda que as comemorações aconteciam de acordo com
o calendário cívico e festivo do ano letivo, que seguia o calendário nacional, na
comemoração das datas: páscoa, dia das mães, São João e 7 de setembro. De
acordo com Maria de Lourdes Araújo (2013), os alunos gostavam de participar das
preparações desses eventos.

Ressaltamos ainda neste depoimento o que foi dito e o não dito, Maria de
Lourdes Araújo em sua narrativa revela que o desfile do dia 7 de setembro era
obrigatório, não podendo ninguém se ausentar. Logo depois chama a atenção para
a figura do instrutor na época, o coronel Gonzaga. O não-dito aqui, no nosso ponto
de vista, se refere à obrigatoriedade do desfile e ao fato de que nenhuma ausência
seria “perdoada”. Um militar agiria conforme o Regime Ditatorial da época em sua
fase mais evidente e atuante no Brasil. Dessa forma, sua performance contribuiu
diretamente para a cultura escolar da EAAC, sobretudo pela subjetivação de práticas
nas festas cívicas e a noção de “disciplina” e “obediência”, inerentes à formação
militar.

No contexto da época escolar de Maria de Lourdes Araújo (2013),


percebemos qual era o seu perfil social e as condições econômicas de sua família:

Teve uma época que funcionou os dois expedientes, manhã e tarde,


mas eu só ficava um expediente lá, porque a gente tinha que pagar o
almoço, e na época num tinha condições era aquela agonia […] só o
pessoal que tinha mesmo os filhinhos de papai de Campina que
vinha, que pagava os almoço deles né? Que tinha. Na época era
quanto? Três cruzeiros, quem é que tinha por aqui? Ninguém tinha. E
quando mainha me dava pra comprar almoço eu comprava cigarro.
Era assim que a gente, meu período lá foi tudo isso (MARIA DE
LOURDES ARAÚJO, 2013).

Quando a EAAC adotou o ensino integral tendo um funcionamento regular em


dois turnos, nossa depoente não poderia comparecer nos dois, pois sua família não
possuía condições suficientes para mantê-la lá e pagar seu almoço. E as vezes
quando sua mãe lhe concedia algum dinheiro para tal fim almoçar, ela burlava os
planos e comprava cigarros.
74

A representação de seu passado nesta instituição transparece afeto: “meu


período lá foi tudo isso”. Quando um sujeito narra uma história, ele sempre
condensa uma grande temporalidade. No caso da aluna, permaneceu por um
período de 8 anos na instituição. Entretanto, tivemos acesso a fragmentos que não
retratam este tempo longo, pois é impossível ao narrador depor sobre tudo o que
aconteceu. Quando este sujeito narra, expõe seu ponto de vista, sua representação
e elaboração, num trabalho de memória, seu encadeamento lógico dos fatos
(VEYNE, 1998).

A representação construída por Maria de Lourdes Araújo da EAAC é bastante


positiva, pois narra com orgulho o tempo em que fez parte da instituição. Sua
narrativa sobre qual o significado de ter sido aluna da EAAC, reflete a importância
desse fato em sua vida: “ah meu amigo, o orgulho! O orgulho, eu aprendi muito lá na
escola (ARAÚJO, 2013)”. Deste modo percebemos que a EAAC foi capaz de
construir ao longo do tempo uma cultura e uma identidade específica, singular, que
marcou a vida de gerações. Chartier (1991) nos esclarece este conceito, ressaltando
que

a representação faz ver uma ausência, o que supõe uma distinção


clara entre o que representa e o que é representado; de outro, é a
apresentação de uma presença, a apresentação pública de uma
coisa ou de uma pessoa (CHARTIER, 1991, p.184).

Essa representação traz a presença do ausente ressignificada pelo sujeito


através de seu passado atualizado e de sua memória que seleciona e organiza os
fatos. Nessa perspectiva, emerge a importância da memória na construção e
ressignificação da identidade da EAAC: uma memória que traz orgulho, afeto,
carinho pela instituição, como um espaço de saudades e que apesar das
dificuldades vivenciadas, comporta lembranças agradáveis para a aluna. Conforme
Le Goff (2003), “a memória é um elemento essencial do que se costuma chamar
identidade, individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos
indivíduos e das sociedades de hoje, na febre e na angústia” (LE GOFF, 2003,
p.469).

Nesse sentido, nas representações elaboradas pelos depoentes a Escola


Agrícola é entendida como um espaço de saudade. Conforme Albuquerque Júnior
(s/d,) esta relação
75

implica uma dada forma de leitura do tempo e da história, uma certa


maneira de se relacionar memória e história, uma certa forma de
posicionar perante o presente e uma certa forma de se pensar e
esperar o futuro”, que se dá pela introspecção do sujeito, que gosta
de lembrar e tem saudades de seu passado (ALBUQUERQUE
JÚNIOR, s/d, p. 3).

Sobre tal aspecto, Maria de Lourdes Araújo (2013) declara afetuosamente


que: “a escola pra mim, é minha casa, minha vida! Pra mim lá é tudo isso” (MARIA
DE LOURDES ARAÚJO, 2013). Essas palavras atestam esse lado afetivo, um amor
que chega a ser comparado ao amor familiar e esse laço construído pela aluna ao
longo dos anos, demonstra o valor emocional que ela transfere à escola.

Neuza dos Anjos (2013), através de sua narrativa permeada de emoção, se


emociona quando nos conta que:

Quando eu saí da Escola Agrícola de Lagoa Seca eu sofri muito,


chorei muito. Aquela escola era tudo que eu tinha na vida. Passei
sete anos lá dentro com mais cinco ensinando, fez onze anos. Era
como se fosse minha casa. Eu saí da sala partida, mas infelizmente
o salário que a Universidade oferecia na época não dava mais pra
sustentar minha família (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Estas palavras refletem sensibilidades, representam elementos guardados em


sua memória, que enfatizam o pertencimento àquele lugar. Em outro momento, diz
que: “e quando eu saí de lá […] foi como se eu tivesse deixado […] eu tivesse saído
e deixado meu coração lá sabe? Eu adorei uma sala de aula” (NEUZA DOS ANJOS,
2013). Aonde quer que ela vá, a Escola Agrícola Assis Chateaubriand de Lagoa
Seca irá com ela, através de sua memória, evocando lembranças.

Além de ser um espaço de saudades na vida de nossa entrevistada, a EAAC


constitui um “lugar de memória”, como nos disse Nora (1993), “são, antes de tudo,
restos. A forma extrema onde subsiste uma consciência comemorativa numa história
que a chama” (NORA, 1993, p. 12). Nessa perspectiva, “lugares de memória” e
“lugares de história” poderiam ser objeto da investigação dos historiadores, e seriam
responsáveis por compreender os processos de produção social de memórias,
articulando o seu papel na construção do conhecimento histórico e na consolidação
das narrativas de caráter histórico (GONÇALVES, 2012).

A saudade também é uma forma de sentir e de reviver a memória: nossa


entrevistada pensa na EAAC com um olhar nostálgico, refletindo a vontade de
76

reviver aquela época ou de que o tempo não passe, invadida pelo sentimento de
pertencimento àquele lugar que tanto admira, um espaço de amizades sinceras e
que permeiam a memória de Maria de Lourdes Araújo (2013). Ela afirma que: “a
escola pra mim é minha casa e minha vida. Pra mim é tudo isso. Pena que eu tô
saindo o ano que vem. […] E agora eu vou sentir muita falta de lá, quando sair”
(MARIA DE LOURDES ARAÚJO, 2013).

A entrevistada lamenta sua saída da escola quando se aposentar. Esta


saudade é uma forma de pensar sobre o tempo e sobre a própria história
(ALBUQUERQUE JÚNIOR, s/d) como também marca uma ausência do que foi, mas
que ainda se faz presente nas lembranças.

O tempo de sua consciência percebe os momentos de sua passagem pela


escola, reconhece a temporalidade cronológica e a aceita, pois sabe que passou,
porém a nega quando quer e deseja a permanência. Verificamos por meio dos
conceitos apontados por Koselleck (2006) tais como “espaço de experiência” e
“horizonte de expectativa” que são “categorias do conhecimento capazes de
fundamentar a possibilidade de uma história” (KOSELLECK, 2006, p. 306) o
passado dela atualizado e seus anseios pelo futuro. Esta experiência “é o passado
atual, aquele no qual acontecimentos foram incorporados e podem ser lembrados”
(KOSELLECK, 2006, p. 309).

Podemos perceber a dificuldade da racionalização sobre o tempo, mas


observamos sua arguição e aparição através da linguagem que aponta pelos
sentidos semânticos das palavras a possibilidade de aparecimento deste. Este que
trouxe para Maria de Lourdes Araújo anos de experiências e vivências, lembranças
e bons momentos, agora se apresenta como vilão e de maneira não reversível, pois
sua aposentadoria neste espaço escolar como secretária se aproxima, profissão da
qual sente bastante orgulho.

A narrativa de Maria de Lourdes Araújo é carinhosa e desejosa de


permanência. Ela não quer que o tempo passe, não deseja sua ausência da escola.
Afirma que não se cansou de trabalhar, mesmo após 33 anos de serviços ali
prestados. Nas entrelinhas de sua narrativa, parece que o tempo marcado pelo
77

calendário, os longos 33 anos passaram sem pressa, tanto que confessa: “eu vou
sentir muita falta de lá quando sair” (MARIA DE LOURDES ARAÚJO).

No que ser refere às visões elaboradas pelo professor Joaquim Vitoriano


Pereira (2013) este demonstra, a partir de sua representação da escola, a
importância que a instituição teve em sua vida. O orgulho também permeia suas
lembranças:

E assim nós tivemos uma grande vitória que foi o colégio. Funcionou,
funciona, hoje é um centro, é um orgulho pra universidade. Os aluno
formado por lá eu encontro vez por outra, eu encontro por aí. É a
maior satisfação, valeu a pena aquele sacrifício, fazer a coisa sem ter
condições financeira pra fazer.[…] Não existe nada mais gratificante
(JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).

Através dos depoimentos dos entrevistados percebemos que a escola tinha


um perfil militar: era proibido fazer greve, pois o gestor Joaquim Vitoriano Pereira,
era exigente. Segundo Maria de Lourdes Araújo declara:

Professor Vitoriano era aquela coisa, ele vinha. Greve num era
admitida, ele não admitia greve, porque se tivesse ele voltava o
comando no meio do caminho e a gente continuava na escola,
trabalhando e estudando, num tinha isso não. Ele […] e ele era uma
pessoa muito esforçada. O professor Vitoriano era uma pessoa muito
esforçada, do regime militar também que ele vinha naquele regime
militar né? Você tinha que andar certo dentro da escola as coisa de
lá era tudo muito bem organizada […] era muito bom, era um período
bom […] Aquela escola hoje é o que é, agradeça a seu Joaquim
Vitoriano. Se hoje é um centro universitário, agradeça a Joaquim
Vitoriano ao curso técnico em Agropecuária que ele criou ali dentro.
Porque se não fosse ele! Hoje ela já taria, já seria o que? Elefante
branco? Tava pra lá e acabou! (MARIA DE LOURDES ARAÚJO,
2013).

As considerações da aluna também nos relevam aspectos da cultura escolar


da EAAC, pois

a cultura escolar inclui segundo Viñao Frago (1996) modos de pensar


e atuar dos professores que se constituem em estratégias para levar
a classe, interagir com os colegas e participar da vida cotidiana.
Estruturam-se sempre em forma de discursos e ações que junto com
a experiência e formação, fazem com que os professores consigam
realizar o trabalho (SILVA, s/d, p. 1).

O espaço de poder era exercido para além da diretoria: a pessoa de Joaquim


Vitoriano Pereira representava uma personalidade autêntica, que se impunha pela
78

própria presença diante dos alunos e de certa forma “ameaçadora” (NEUZA DOS
ANJOS, 2013), pois que intimidava os alunos ditos rebeldes, conforme declarou
Neuza dos Anjos (2013). O poder disciplinar era exercido e instrumentalizado em
nome do “bom funcionamento” de uma escola precária e sem recursos e em nome
da ordem no espaço institucional.

Neuza dos Anjos nos fala sobre esta forma de atuação e confirma este perfil
da escola em seu depoimento, afirmando que na época em que o professor Joaquim
Vitoriano Pereira era gestor “era um colégio que ainda tinha disciplina” (NEUZA DOS
ANJOS).

Do ponto de vista do professor Joaquim Vitoriano Pereira, a relação de ordem


que ele estabelecia era justificada pelos resultados visualizados no cotidiano
escolar, pois a instituição funcionava melhor e mantinha seus trabalhos regulares,
conforme ele declara:

Eu era militar recém saído da força aérea. Apenas a disciplina,


agente impôs a disciplina lá dentro, mas sem vínculo nenhum com o
quartel, apenas o meu ato de ser disciplinado. Eu acho que é por
isso que a escola funcionou bem todo tempo, é por que havia ordem.
Com ordem tudo funciona (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).

Este perfil militar da Escola Agrícola caracteriza também a constituição da


cultura escolar da instituição. Para de Julia (2001), essa cultura é composta por

um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e


condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a
transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses
comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que
podem variar segundo as épocas (finalidades religiosas,
sociopolíticas ou simplesmente de socialização). Normas e práticas
não podem ser analisadas sem se levar em conta o corpo
profissional dos agentes que são chamados a obedecer a essas
ordens e, portanto, a utilizar dispositivos pedagógicos encarregados
de facilitar sua aplicação, a saber, os professores primários e os
demais professores (JULIA, 2001, p. 10 – 11).

De todo modo, temos uma representação positiva na memória de uma ex-


professora da EAAC e de uma ex-aluna sobre o gestor Joaquim Vitoriano, O seu
perfil e sua maneira de atuar parecem justificados, pois tinha em vista o melhor para
a escola: desenvolvimento, avanços, melhorias e funcionamento regular mesmo
diante do descaso da Furne.
79

Apesar da disciplina, o professor Joaquim Vitoriano Pereira nunca foi mal


interpretado na escola. Pelo contrário, para as nossas entrevistadas, a escola só é
bem conceituada devido ao árduo esforço deste gestor, que do ponto de vista
cronológico, foi o diretor mais importante, atuando de 1970 a 1992. A ex-professora
Neuza dos Anjos (2013) complementa: “ele é um homem muito humano muito bom,
pessoa muito […] aquele homem foi quem me deu toda força para vencer na vida”.

Em relação ao corpo docente do período em que estudava na Escola


Agrícola, a aluna Maria de Lourdes Araújo (2013) também traz boas recordações.
Para ela, os profissionais eram esforçados e cumpridores dos seus deveres. De
acordo com Nora (1993) através das experiências concretas de sujeitos no tempo,
estes sintetizam significados e contemplam permanência e continuidade no que é
transcurso, para que os sentidos simbólicos e identitários lhes sejam perenes, para
que se tornem lugares ou espaços de reconhecimento (lugares de memória).

No presente estudo não enfocamos as relações de gênero na cultura escolar,


mas podemos perceber brevemente que no contexto da cultura escolar da EAAC
havia uma divisão das atividades entre sexos, sobretudo no esporte conforme afirma
Maria de Lourdes Araújo: “de esporte era o que? Futebol para os meninos, jogo de
vôley pra gente. Quem quisesse ir era só isso” (MARIA DE LOURDES ARAÚJO,
2013).

A representação social também se torna importante para nossa análise a


partir das propostas de Rangel (1999) que salienta: “é uma das perspectivas de
entendimento da elaboração e da veiculação de conceitos (afirmações, explicações)
e imagens da ‘realidade’, como os sujeitos a percebem e constroem” (RANGEL,
1999, p. 48). Na narrativa da professora, essa consideração se torna notável:

Eu nunca trabalhei pelo salário, eu trabalhei, primeiro: porque eu


precisava do salário também […]; segundo lugar: eu precisava zelar
pelo meu nome de de uma pessoa que tinha uma formação de nível
médio. Porque se você se arrasar profissionalmente nunca mais você
se apronta. Se você cair no ridículo […] profissional, e alguém achar
que você não sabe de nada, que você não faz nada, você ta perdido
pro resto da vida. Isso é o doutor, é o graduado, é o nível médio, é
qualquer um nível (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Nossa entrevistada se refere ao perfil, sempre chamando atenção para sua


ética e compromisso com a EAAC, pois sua responsabilidade e dever são
80

importantes para a manutenção de sua imagem como boa profissional. Neuza dos
Anjos nunca quis cair no ridículo e para tal, passava madrugadas lendo e
preparando aulas, pois tinha uma grande missão: ensinar o melhor para os alunos,
mesmo com um salário mísero e numa escola que não tinha recursos financeiros.
Neste sentido, os comentários de Rangel (1999) são essenciais:

As dimensões da representação social identificáveis nas “asserções”


ou “afirmações” dos sujeitos são a “atitude, a informação e o campo
de representação ou imagem”. A atitude expressa a “tomada de
posição dos sujeitos” implicando “juízo de valor” do objeto da
representação; a informação corresponde à “organização dos
conhecimentos que um grupo possui a respeito de um objeto social”;
o campo da representação “remete à idéia [sic] de imagem de
modelo social” (RANGEL, 1999, p. 50).

Essa imagem de “boa professora” sempre foi pensada e preservada com


muito zelo pela professora Neuza dos Anjos (2013) conforme percebemos em sua
narrativa:

Então: eu fui bem sucedida como ori, como professora da da da […]


do colégio agrícola. […] Eu tenho responsabilidade, eu sempre tive
responsabilidade com tudo aquilo que eu vou fazer. Então eu nunca
chegou um dia, eu via meus colega professor, as vezes os aluno ia
fazer uma pergunta eles dizia: “ah pergunta a professora Neuza”. Me
chamava na sala de aula preu responder. Eu dizia: meu amigo num
faça isso não, meu amigo você se acaba perante sua turma! Se
houver uma pergunta e você me chamar pra responder esses aluno
(NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Aqui temos a breve oportunidade de visualizar as dimensões da


representação do “bom professor” (RANGEL, 1999). Neuza era procurada para
responder as questões que outros professores não sabiam e também por isso
zelava pela consolidação e “indissociabilidade entre conceito e imagem e os seus
mecanismos” (RANGEL, 1999). Ou seja, entre a visibilidade de “boa professora”, e
também a ressonância do seu papel entre os alunos e a escola, eram os modos
como se operavam a relação de concretização desta imagem, através da prestação
de um bom serviço e de sempre procurar o saber para ensinar, sem frustrar
expectativas.

No contexto da História da Educação em Lagoa Seca, Maria de Lourdes


Araújo (2013) pensa que a EAAC trouxe grandes contribuições para a cidade e
81

ainda é bastante significativa para o agricultor em suas atividades no campo. Ela


justifica:

Eu acho ela muito importante, ela como Escola Agrícola. Como


Lagoa Seca é uma terra de agricultores, como Lagoa Seca é uma
terra que o pessoal vive de agricultura na realidade, com verduras,
são agricultores, eu acho que ela tem muita importância. Ela é muito
importante, e eu acredito que o pessoal devia dar mais importância
[…], porque […] ela tem como ajudar o agricultor em tudo o que ele
precisar em termos de conhecimento, a escola tem como fazer isso
(MARIA DE LOURDES ARAÚJO, 2013).

A representação da escola de acordo com a perspectiva da professora Neuza


dos Anjos (2013) também é valiosa, mas com restrições em relação à importância
que a sociedade concede: “no meu ponto de vista é que ela é muito importante, mas
eu não sei se o pessoal, hoje a sociedade, de Lagoa Seca até de Campina Grande
se dão valor a uma escola agrícola” (NEUZA DOS ANJOS, 2013).

Como a professora Neuza dos Anjos foi aluna da EAAC e depois docente, ela
intercala esses dois períodos quando nos fala da instituição:

A coisa mais importante que eu fiz profissionalmente formada, só


com a formação de segundo grau e ser técnica de nível médio, foi a
coisa mais importante que aconteceu na minha vida! […] Foi uma
coisa que eu jamais vou me esquecer, marcou a minha vida pra
sempre. Ainda hoje quando eu falo da escola agrícola tanto eu como
aluna como professora, eu as lágrima vem sem, sem eu sentir sabe?
[…] E foi um trabalho melhor que eu fiz no mundo (NEUZA DOS
ANJOS, 2013).

Lembrando seu papel de gestor, o professor Joaquim Vitoriano Pereira expõe


a relevância instituição para a cidade de Lagoa Seca e para a educação dos jovens,
ele declarando: “olhe, o valor que toda escola tem que é: melhorar o nível
profissional das pessoas, nível cultural, esclarecimentos. A importância é grande,
como toda esc, toda escola” (JOAQUIM VITORIANO PEREIRA, 2013).

Diante do exposto, fica evidente o papel da EAAC na memória dos


depoentes, o que ela representa para todas as pessoas que por lá passaram, quer
sejam alunos, professores, diretores ou funcionários, e também para a comunidade.
Pela sua importância histórica no município de Lagoa Seca, a instituição pode ser
vista e pensada como um “lugar de memória”. De acordo com Nora (1993) para que
82

algo seja considerado nessa condição é necessário que ele seja dotado de uma
aura simbólica.

Os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que não há


memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso
manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios
fúnebres, notariar [sic] atas, porque essas operações não são
naturais (NORA, 1993, p. 13).

Assim, os locais encarnados e simbólicos, como festas, monumentos,


símbolos, rituais, museus contam histórias de vida. No caso da EAAC, significa tudo
isso: um lugar institucional onde coexistiram vários tipos de manifestações culturais
e simbólicas, e não deixa de ser um monumento, pois é um espaço instituição criado
por homens no tempo, marcado por um caráter histórico e social.
83

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Certas palavras não podem ser ditas


em qualquer lugar e hora qualquer.
Estritamente reservadas
para companheiros de confiança,
devem ser sacralmente pronunciadas
em tom muito especial
lá onde a polícia dos adultos
não adivinha nem alcança.
Entretanto são palavras simples:
definem partes do corpo, movimentos, atos
do viver que só os grandes se permitem
e a nós é defendido por sentença dos séculos.
(Carlos Drummond de Andrade)
84

A prática do fazer historiográfico é um caminhar repleto de possibilidades, de


surpresas e inquietações, de percursos diversos e multiformes. No leque de
diretrizes oferecido por esta área de saberes, a História da Educação se apresenta
como um campo do saber historiográfico que visa, também, ressignificar práticas
educativas e memórias, que os sujeitos e atores sociais realizaram em suas
vivências cotidianas, em seus lugares de atuação. Graças a esta possibilidade, é
possível ao historiador da educação refletir e problematizar sobre a história das
instituições escolares, o lugar de excelência onde se desenvolvem sistematicamente
estas práticas educativas, pelos caminhos da memória e das representações.

Dar voz aos sujeitos que viveram, atuaram e modificaram um espaço. Dar
espaço e vida à palavra perdida, rastro que ficou para traz. Ressignificar as vozes
plurais de um passado que é outro, de um tempo que não é o seu. Possibilitar
compreensões múltiplas através de um olhar caleidoscópico e movimentar-se dentro
das possibilidades de múltiplas explicações para o universo social, pois “a
incompreensão do presente nasce da ignorância do passado” (Marc Bloch). Uma
História da Educação deve suscitar questões que busque no passado possibilidades
de melhor compreensão para o presente.

Nosso trabalho representa uma abertura de possibilidades outros trabalhos no


campo de pesquisa da História da Educação, mostrando como é possível ao
historiador da educação a (re)construção e ressignificação da história e memória de
uma instituição escolar a partir da apropriação de outros campos teóricos, no nosso
caso, da História Cultural. Verificamos como foi possível através da utilização dos
conceitos de “apropriação” e “representação” de Chartier (1991), perceber as
dimensões que a escola assumiu na vida dos entrevistados, bem como o que estes
pensam sobre a importância assumida pela mesma diante da cidade. A noção de
“cotidiano” de Certeau (2008) foi fundamental para pensarmos sobre uma história a
partir do ponto de vista do dia-dia na escola, na sala de aula, quais práticas
permeavam este espaço. A partir da reflexão sobre “memória” a partir dos estudos
de Ricoeur (2007), Le Goff (2003), Halbwachs (2006) e Pollak (1989), foi possível
pensar e ressignificar a história da escola a partir dos depoimentos orais, a partir da
própria história dos sujeitos nesta instituição.
85

Analisar as representações identitárias criadas pelos indivíduos destacou que


nossa identidade também é uma representação que elaboramos de si mesmos, com
vistas a perpetuar uma heterogeneidade peculiar do nós mesmos, e neste caso, o
contato com uma instituição possibilita o reconhecimento de uma memória e de um
passado comum vinculado a um grupo social que participa da memória coletiva.
Portanto, percebemos o caráter não fixo e relacional da identidade, pois construída a
partir do encontro com o outro, que pode ser uma pessoa e até mesmo uma
instituição.

A prática da pesquisa oral viabilizou o romper com o silêncio, busca na fala


dos depoentes e também na pesquisa documental o dizer das palavras, o falar, o
verbo, que em outros contextos, talvez soaram com simplicidade e sem grandes
repercussões, mas que entretanto ganharam força e vida neste trabalho.

Este estudo também traz uma contribuição para o ensino de história, pois
possibilita pensar a História da Educação no município de Lagoa Seca, a partir da
Escola Agrícola Assis Chateaubriand, a qual serviu de ponto de partida para as
reflexões contribuindo para a tecelagem dos fios da grande rede que é esta história
educacional desta cidade. Portanto, é possível encaminhar outras discussões que
podem girar em torno do tema das instituições escolares, pois mostramos caminhos
de possibilidades e como é viável ressignificar, a partir do viés da História da
Educação a história de uma instituição escolar.
86

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Ata de Reunião, 28 de Outubro de1964

Ata de Reunião de Julho de 1967

Ata da Sessão Ordinária da Congregação do Ginásio Agrícola ‘Assis Chateaubriand


de 15 de dezembro de 1965

Escola Integrada Da Universidade Regional Do Nordeste: Regimento – Campina


Grande, Dezembro De 1976

Plano De Aplicação De Reforma De Ensino do 1º e 2º Graus De Acordo Com a Lei


5692, DE 11 DE Agosto DE 1971. 1973
91

APÊNDICES
92

LISTA DOS ENTREVISTADOS

JOAQUIM VITORIANO PEREIRA. 86 anos.


NEUZA DOS ANJOS. 63 anos.
MARIA DE LOURDES ARAÚJO. 54 anos.
93

QUESTÕES ORIENTADORAS DAS ENTREVISTAS

Questionário para o professor Joaquim Vitoriano Pereira

Dados de identificação do Gestor:


Nome:
Idade:
Etnia: você se considera: Negro ( ) Branco ( ) Indígena ( ) Outro ( ).
Qual?________________
Profissão
Escolaridade:
1- Qual foi o período da sua gestão na Escola Agrícola Assis Chateaubriand de
Lagoa Seca?
2- Como era a EAAC antes de sua gestão e que mudanças ocorreram na sua
gestão?
3- Quais os desafios que você enfrentou na EAAC?
4- Como era a relação entre a direção da Escola e a secretaria de educação do
município de Lagoa Seca?
5- Que subsídios financeiros e de recursos didáticos a escola recebia e de
quem?
6- Como eram organizadas as reuniões entre a direção e os docentes?
7- Como eram organizadas as atas de reuniões e o que se discutia nestas
reuniões?
8- Para o Senhor na condição de gestor o que foi administrar a Escola Agrícola,
quais suas lembranças desse período?
9- O que significou para sua vida a experiência como gestor da Escola?
10- Que tipo de festividades promovia a Escola e como era organizada a
programação?
11- Como era organizada a programação da Escola pra o ano letivo e quem
organizava?
12- Para o Senhor qual importância da Escola Agrícola no Contexto da História
da educação em Lagoa Seca?
13- Na sua opinião, qual a importância e o significado desta instituição na
formação educativa de jovens para o mercado de trabalho e para a vida
educacional?
14- Como era organizado o currículo da escola com relação à organização das
disciplinas escolares, e quem fazia esta organização?
15- Na sua opinião, qual o papel que a Escola ocupou na sociedade de Lagoa
Seca tanto no sentido educacional, como no crescimento social da
localidade?
16- Quem estava na gestão do município no tempo que o Senhor atuou?
17- Que tipo de ações foram propostas na área educacional pela prefeitura que
repercutiram na Escola?
94

18- Quais foram as mudanças e reformas na educação do município no tempo


que o Senhor estava na Escola?
19- Para o Senhor, qual a contribuição da Escola Agrícola para a memória da
educação do município?
20- Na sua opinião, houve mudanças com relação ao ensino e ao funcionamento
da Escola no período militar?
21- Como era o funcionamento geral da Escola?
95

Questionário para a professora Neuza dos Anjos

Questionário

Dados de identificação da Professora/Aluna:


Nome:
Idade:
Etnia: você se considera: Negro ( ) Branco ( ) Indígena ( ) Outro.
Qual?_____________
Profissão
Escolaridade:
Questões
1- Durante quanto tempo a senhora ensinou na Escola Agrícola Assis
Chateaubriand de Lagoa Seca?
2- Como era a Escola à época em que a senhora ensinava no que se refere ao
cotidiano da sala de aula?
3- Que festividades ou programação para o ano letivo a Escola elaborava?
4- Para a senhora qual importância da Escola no contexto da educação em
Lagoa Seca?
5- Para a senhora o que foi ser professora desta Escola no período em que a
senhora atuou como docente?
6- Que mudanças ocorreram na Escola no período em que a senhora atuou
como docente?
7- Como eram as reuniões de docentes com a diretoria da Escola (gestão) no
período em que a senhora ensinou? O que se discutia nelas?
8- Como a senhora preparava e planejava as aulas?
9- Qual perfil do aluno da Escola Agrícola no período de sua atuação, no que se
refere às suas condições de vida, à aprendizagem e à participação nas
atividades?
10- Como era organizado o currículo da escola com relação à organização das
disciplinas escolares, e quem fazia esta organização?
11- Quais os desafios de ensinar na Escola no período em que a senhora atuou?
12- Quais eram os recursos disponíveis para a prática de ensino do professor no
período de sua atuação em sala de aula?
13- Para a senhora, qual o papel que a Escola ocupou e tem ocupado na
formação de um corpo de jovens para o mercado de trabalho?
14- Quem estava na gestão do município e da Escola no período em que a
Senhora atuou?
15- Quais foram as mudanças e reformas ocorridas na educação no município e
que ocorreram na Escola Agrícola?
16- Na história de sua vida enquanto docente o que representou ser professora
na Escola Agrícola Assis Chateaubriand?
17- Para a senhora, qual contribuição da Escola Agrícola para a memória da
educação no município e para a história da educação neste?
96

Questionário para a aluna Maria de Lourdes Araújo

Dados de identificação da Aluna:


Nome:
Idade:
Etnia: você se considera: Negra ( ) Branca ( ) Indígena ( ) Outro.
Qual?________________
Profissão
Escolaridade:

1. Em que período e durante quanto tempo você estudou na Escola Agrícola


Assis Chateubriand de Lagoa Seca?
2. Como era a escola no período em que você estudou?
3. Na sala de aula como eram organizadas as atividades desenvolvidas pelos
alunos?
4. Para você o que significou ser aluno desta instituição?
5. Qual a importância da escola na história de sua vida ?
6. Na sua opinião que importância tem esta escola para a educação em Lagoa
Seca?
7. Como eram as festividades promovidas pela escola e quem as organizavas e
de que modo era a participação dos alunos?
8. Como era o ensino e a relação dos professores com os alunos no período
que você estudou?
9. Que contribuição você acredita que a Escola deu e tem dado para educação
no município e para o ensino profissionalizante?
10. Que tipos de atividades de lazer, esportiva e cultural eram desenvolvidas pela
escola no período em que você foi aluno nela?
11. Que mudanças, você acredita que ocorreram na cidade de Lagoa Seca a
partir da vinda da escola para esta cidade?
12. Como era a relação entre a escola e a comunidade no período em que você
estudou?

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