The Fear of The Dark (Blood and Moon 1)
The Fear of The Dark (Blood and Moon 1)
The Fear of The Dark (Blood and Moon 1)
PARTE I
AVISO DE CONTEÚDO
A Kussy e Lance, por me darem força e coragem para transformar meus escritos no
Para os criativos queer que achavam que nunca teriam voz, mas gritavam a plenos
NIKOLA
Um vampiro está caçando dentro do meu bar favorito. Tanto para uma
noite de folga.
Nikola Kingston engoliu o resto de sua vodca, empurrando o copo sobre
o balcã o ú mido com o pagamento da conta preso embaixo. Ele olhou em
volta instintivamente, as pontas dos dedos batendo no topo do bar com
energia reprimida. Havia uma razã o para ele assombrar locais populares
para beber – eles eram locais de mel para vampiros de todas as classes
sociais. Isso incluía intrusos do outro lado da fronteira.
E Nikola, com seus sentidos afinados por séculos de vida, e ainda mais
aguçados vivendo sob o comando de Lady Morrigan nas ú ltimas décadas,
identificou facilmente o cheiro de cobre e pinho do clã de Lorde Malkolm.
Ele se recostou e examinou o espaço animado. A noite ainda era uma
criança, chegando perto das dez. A maioria dos lugares com uma base de
clientes humanos nã o ficava aberta depois da meia-noite, dado o fato de
que os cidadã os mortais da cidade de Grander sabiam que nã o deviam
ande pelas ruas tarde demais depois de escurecer. Mas era fim de
semana e os humanos nã o eram exatamente conhecidos por seus
instintos de sobrevivência. Entã o, o lugar estava lotado.
Mesmo assim, o invasor que Nikola avistou se destacou. Ele permaneceu
na varanda interna, examinando a multidã o dançante e bebendo abaixo
com olhos vermelhos que o marcavam como um Seguidor de Sangue.
Será que a criatura notou Nikola ou simplesmente descartou Nikola
como apenas mais um Filho da Lua? Baseando sua observaçã o na
contraçã o faminta dos lá bios do invasor e na suavidade leitosa de suas
bochechas, Nikola acreditou que ele fosse um vampiro recentemente
Transformado – jovem demais para saber melhor. Ou muito arrogante.
Nikola decidiu nã o agir ainda. Mantendo o monstro noturno na sua visã o
periférica, ele avaliou suas opçõ es. Ao contrá rio do outro vampiro, ele
nã o era um vampiro que caçava para devorar e matar.
Ele era um Filho da Lua, marcado por olhos prateados, e nã o extraía
poder nem prazer do assassinato. A perfuraçã o dos dentes de Nikola no
pescoço de um humano era semelhante ao beijo de um amante. O ato de
se alimentar, pelo menos de acordo com sua pró pria filosofia, era algo
em que um humano participava – e nã o era vítima.
Porém, verdade seja dita, se o demô nio de olhos vermelhos fosse um
membro do clã de Morrigan, Nikola nã o teria pestanejado. Você é a
companhia que mantém , sua consciência o repreendeu. Ele descartou o
pensamento, lembrando a si mesmo que devia sua vida ao seu criador, e
parte desse contrato ordenava que ele defendesse as fronteiras
estabelecidas entre Lady Morrigan e Lorde Malkolm.
O clube estava a todo vapor naquela noite fria de outubro. Homens sem
camisa e com a temperatura corporal elevada pelo á lcool tropeçavam em
torno dos outros clientes em danças de acasalamento quebradas e
suadas. O baixo eletrô nico da mú sica techno pulsava no alto-falante
montado no alto, e o chã o estava cheio de corpos balançando e bebidas
derramadas. Torcendo, rindo, cantando e o soluços ocasionais teriam
sido um zumbido sem sentido para os ouvidos humanos, mas Nikola foi
capaz de distinguir as notas individuais.
Entrelaçando-se entre os sons da vida estava o colorido das emoçõ es que
irradiavam de cada ser humano como calor. O caleidoscó pio de
sentimentos variava da excitaçã o ao desgosto e ao tédio, ameaçando
dominar Nikola se ele baixasse a guarda. Mas um Filho da Lua nã o
chegou à idade de Nikola sem aprender a filtrar até mesmo os
pensamentos mais barulhentos.
Um sorriso tocou seus lá bios. Quando jovem, o mundo de hoje era algo
que ele simplesmente nã o poderia ter imaginado. Tecnologia, política,
guerra – embora estas coisas confundissem a velha mente com a
velocidade com que progrediram – nã o podiam ser comparadas aos
círculos sociais do ser humano moderno. Nikola preferia este clube
principalmente porque era um símbolo literal de amor, sexo e interaçõ es
que antes eram um crime indescritível.
Antes que pudesse se perder na retrospectiva, como costumava fazer, ele
se concentrou respirando fundo. O intruso havia se deslocado para o lado
norte de sua sacada e Nikola nã o queria correr o risco de perdê-lo no
meio da multidã o.
Nikola seguiu a linha de visã o escarlate.
No bar do térreo, um jovem bebia uma cerveja clara. As pontas do anel
preto do septo tocavam a borda da caneca a cada aumento. Ele tinha
cabelos desgrenhados e olhos cansados. Com sua pele bronzeada e traços
faciais marcantes, ele tinha o físico perfeito para ser um banhista, mas se
vestia mais pró ximo de uma groupie de banda de rock, com a camisa
preta rasgada nas mangas e jeans skinny rasgados. Ele prestava muito
mais atençã o ao telefone do que a qualquer outra pessoa ao seu redor.
Nikola se perguntou se ele veio sozinho. O jovem parecia claramente
infeliz com sua situaçã o atual. Talvez ele tenha recebido má s notícias.
Talvez seus companheiros o tivessem abandonado onde ele estava.
Independentemente do que aconteceu, a decepçã o pairava sobre ele
como um miasma.
Não viaje pelas ruas de Grander sozinho à noite. Essa era uma regra que
Nikola ouvia sussurrar entre os humanos com frequência.
Nikola recostou-se e esperou, observando tanto o humano quanto o
vampiro mortal. Outros participantes da festa circulavam ao redor de
Nikola, alguns parando para se dirigir a ele, muitas vezes numa tentativa
bêbada de fazer algum movimento. Nikola podia admitir que se
considerava uma criatura visualmente agradá vel. Pele lisa, um rabo de
cavalo loiro prateado que chegava até o meio das costas, olhos prateados.
Suas roupas eram simples, mas elegantes, compostas por uma camisa de
botã o bem ajustada e calças sociais casuais, destacando sua constituiçã o
alta e musculosa. Ele descobriu que quanto menos se vestisse, mais fá cil
seria acompanhar as tendências modernas.
Seus admiradores consideraram sua quietude e silêncio sobrenaturais
como rejeiçã o. Se algum deles respondeu com raiva, ele nã o se importou
o suficiente para perceber.
O outro vampiro desceu as escadas em direçã o ao andar térreo. Se
houvesse algum sangue nas veias famintas de Nikola para alimentá -lo,
seu coraçã o estaria disparado de excitaçã o. O outro vampiro nã o
reconheceu sua presença, entã o talvez ele nã o visse Nikola como uma
ameaça.
Um erro comum.
O Seguidor de Sangue atravessou a multidã o na pista de dança. A criatura
evitou os clientes com tanta graça que era como se estivesse realmente
participando da celebraçã o da vida noturna. Alguns homens até tentaram
agarrar o homem esguio, mas ele escapou de suas mã os como se fossem
tã o fracos quanto a carícia de uma neblina.
O vampiro predador colocou a mã o no ombro do humano, fazendo-o se
assustar. O vampiro sorriu desculpando-se, sentando-se ao lado de sua
presa. Sangue carmesim corou nas bochechas do homem por cima da
lisonja vazia que o vampiro fez sobre seu penteado. Nikola notou a forma
como as pupilas do Seguidor de Sangue explodiram com uma fome
acentuada.
O humano fez movimentos circulares em direçã o aos seus pró prios
olhos, indicando o brilho vermelho anormal dos olhos do vampiro.
Nikola franziu a testa, suspeitando que o humano pudesse nã o ser daqui.
Havia lendas urbanas em torno dos olhos vermelhos entre os civis de
Grander – embora a maioria dos que estavam perto o suficiente para
contemplar as piscinas escarlates nã o vivessem para contar a histó ria.
O vampiro riu, dizendo em voz alta: — Lentes? Você gosta deles? — O
humano tropeçou em um elogio nervoso. O vampiro interrompeu a
tentativa desajeitada atraindo-o para um beijo intenso.
A criatura, abrindo os olhos, encontrou o olhar furioso de Nikola
enquanto o humano se afogava em flagrante. Exultando com sua vitó ria.
Ah, então ele me considera um Filho da Lua qualquer.
Se ao menos isso fosse verdade.
O vampiro predador inclinou a cabeça e murmurou seu convite ao
humano. Nikola podia sentir os tremores de seus encantos sedutores
percorrendo a sala. Nenhum humano tinha chance contra a hipnose de
um vampiro, seja da Lua ou do Sangue. Os ombros tensos do humano
murcharam e um sorriso apaixonado tocou seu belo rosto. Vampiro e
presa se levantaram, e o vampiro depositou dinheiro na conta do
humano.
Nikola permitiu que eles atravessassem a multidã o antes de decidir
segui-los. Se ele fosse muito ó bvio, o Seguidor de Sangue poderia tentar
fazer uma cena no espaço pú blico, e se era uma coisa que qualquer um
dos líderes vampíricos punia mais, eram os espetá culos pú blicos.
Ele manteve essa distâ ncia enquanto seguia a dupla na noite fria. Lua
nova, o tipo de noite em que a maioria dos Seguidores de Sangue eram
mais ativos. Ele manteve os olhos fixos na nuca do vampiro enquanto
eles manobravam pelo animado bairro festivo, os letreiros de néon e as
lâ mpadas da rua refletindo nas calçadas brancas em um vertiginoso
turbilhã o de luzes e cores. A festa O distrito era um dos poucos lugares
seguros na cidade de Grander, mas estava longe de ser hermético.
Era simples manter o controle do vampiro e de sua presa, mesmo em
meio à multidã o cambaleante e bêbada. Nikola só precisava ouvir o
silêncio de um coraçã o tranquilo.
Nikola perseguiu os dois por mais alguns quarteirõ es, misturando-se à s
sombras. Certamente o vampiro Malkolm havia percebido seu
perseguidor, mas ele parecia nã o se preocupar. Ele realmente nã o via
Nikola como a ameaça legítima que era.
Os sons do baixo e da confraternizaçã o entre bêbados desapareceram
enquanto eles caminhavam por avenidas mais silenciosas e escuras. Os
apartamentos e empresas ao redor estavam tã o mortos quanto o céu
noturno. Aqueles que moravam por aqui eram espertos o suficiente para
ficar dentro de casa depois do pô r do sol, acomodados com relativa
segurança em suas camas.
— Onde foi que você disse que morava? — a voz do humano ecoou.
O vampiro nã o respondeu e em vez disso colocou a mã o no ombro do
homem. Mesmo à distâ ncia, Nikola podia sentir a emoçã o humana
percorrendo as ruas vazias. Uma emoçã o aguda que se transformou em
medo quando os olhos do vampiro brilharam escarlates, como cerejas de
cigarro queimando no escuro.
A mã o do vampiro bateu na boca do humano, abafando seu grito que se
aproximava. A dupla se moveu como um borrã o enquanto o vampiro
puxava sua presa para mais fundo em um beco apertado. Havia um
ditado por aqui que dizia algo como: Grander é um labirinto para se
perder, então vá direto para casa e ignore os gritos na rua.
Nikola entrou em açã o, seus passos mal tocando o chã o enquanto ele
dobrava a esquina correndo. Esse humano não é seu para se alimentar, foi
o primeiro pensamento de Nikola, um fio de seu senso de dever para com
Lady Morrigan. E ele se odiava por isso, por suas açõ es nã o terem
nenhuma motivaçã o heró ica real.
Ele silenciosamente enviou uma oração de perdão à Deusa da Lua. Ela não
me abandonou depois de todos esses anos, então não a abandonarei.
O vampiro tinha o humano preso contra uma parede, com a boca
fechada. Unhas pretas enroladas em garras, cravando-se nas bochechas
macias do humano. Um sorriso alegre expô s presas animalescas
enquanto o humano se debatia em vã o. Esse sorriso vacilou quando o
Seguidor de Sangue olhou para cima e avistou Nikola atacando-o.
Utilizando toda a escala de sua constituiçã o gigantesca, Nikola bateu com
o ombro no vampiro. O humano se libertou, gritando, e caiu no chã o
fugindo. Bom, Nikola pensou. Não preciso dizer a ele para fugir.
O vampiro Malkolm caiu no asfalto, com um rosnado nos lá bios. Ele
tentou se levantar, mas Nikola deu um chute em seu rosto. Ele sentiu o
barulho de ossos quebrando sob o couro do sapato. Como a criatura nã o
tinha se alimentado recentemente, nã o havia sangue para derramar.
Nikola se ajoelhou e agarrou o intruso pelo colarinho, forçando-o a olhar
em seus olhos prateados. Os olhos vermelhos brilhando com veemência
raivosa. — Quem diabos é você, Filho da Lua? — o Seguidor de Sangue
rosnou.
— Nikola Kingston de Lady Morrigan, — ele respondeu calmamente, com
uma nota de tristeza em sua voz inglesa. — Talvez você já tenha ouvido
falar de mim.
O reconhecimento e o medo pulsaram no intruso. Antes que ele pudesse
reagir, Nikola deu um soco em sua mandíbula, deslocando-a e
nocauteando-o.
Nikola arrastou o invasor até a Dust Street, que ficava ao longo da borda
oeste da fronteira entre os territó rios de Malkolm e Morrigan. Estava
começando a chuviscar, formando poças na calçada decrépita. As
unidades habitacionais iminentes estavam totalmente silenciosas a esta
hora.
Ele rolou o vampiro sobre a linha invisível do territó rio com a ponta do
sapato. O invasor viveria esta noite, viveria para contar a histó ria.
Apenas mais uma gota no oceano que foi a histó ria de Nikola Kingston.
Ele enfiou as mã os nos bolsos e soltou um suspiro. Não estive em
patrulha, mas mesmo assim me foi negada uma bebida. Ele precisaria
caçar amanhã enquanto explorava com quem quer que fosse designado –
um infeliz acaso. Nikola detestava alimentar-se perto da presença dos
Seguidores de Sangue de Lady Morrigan, que frequentemente zombavam
dele por “deixar sua presa escapar”. Esse foi o preço de ser o ú nico Filho
da Lua no clã de Morrigan. O ú nico Filho da Lua entre todos os clã s de
Sangue, até onde ele sabia.
— Você é a companhia que mantém, — disse Nikola para si mesmo. Ele
começou a se virar, mas um movimento chamou sua atençã o.
O invasor desapareceu de onde Nikola o deixou. Um grunhido ecoou pela
noite, mais profundo dentro do territó rio de Malkolm, seguido por
soluços grosseiros. Entã o, uma segunda voz, tensa e cortante de raiva.
— Que porra você pensa que está fazendo? Você está tentando começar
uma merda que nã o tem como terminar?
— Senhor, sinto muito.— Nikola reconheceu a sú plica do invasor.
— Idiota! — Houve o som á spero de metal colidindo com osso. Entã o um
grito. Alguém, provavelmente um superior, estava disciplinando aquele
vampiro por cruzar os limites – pelo menos isso significava que foi um
incidente isolado e nã o um movimento por parte de Malkolm.
Mesmo assim, vou relatar.
Nikola continuou se movendo, deixando para trá s os sons da surra
implacá vel.
CAPÍTULO DOIS
ASHER
Asher Black ficou meio aliviado por esse idiota ter aparecido na praia
naquele momento. Ele tinha muita energia para desabafar desde que o
chefe decidiu que todos deveriam ficar quietos e observar seus inimigos.
Observar. Tch. Onde está a diversão nisso? Asher acertou um golpe final
nas costelas do idiota, aproveitando o golpe satisfatório, e jogou o pé-de-
cabra de lado. Ele bateu contra a lixeira antes de cair no concreto cheio
de lixo.
Asher olhou por cima do nariz para o idiota chorã o, afastando seus
cachos escuros e pegajosos dos olhos. Cristo, qual era mesmo o nome
desse cara? O Rei Supremo deu permissã o a Malkolm para aumentar seus
nú meros, entã o Asher estava tendo dificuldades para acompanhar
nomes e rostos de novatos.
— Mestre, por favor.— Asher revirou os olhos e o chutou na lateral para
garantir. Ele sentiu um osso quebrado sob a ponta de aço da bota. O
vampiro se agitou, estremecendo e tossindo – ele estaria engasgando
com sangue se conseguisse se alimentar.
— Eu nã o vou matar você, — disse Asher, parecendo desanimado.
Malkolm nã o gostaria que Asher eliminasse os novos nú meros para os
quais vinha pedindo luz verde nas ú ltimas duas décadas. — Mas só
porque você idiota nã o conseguiu pegar um humano em territó rio
inimigo. O que diabos você estava fazendo lá , hein?
— Meu... meu bar favorito... estou com saudades...
Asher se agachou e agarrou um punhado de cabelo do idiota, puxando
sua cabeça para trá s, entã o ele foi forçado a olhar no rosto de Asher.
Como todo mundo, o novato ficou boquiaberto com a cicatriz de uma
polegada de largura que corria diagonalmente da sobrancelha esquerda
de Asher até o canto direito da boca. Asher resistiu à vontade de bater o
crâ nio do idiota no asfalto.
— Você nã o é mais um humano,— Asher disse, sua voz uniforme e baixa,
uma alteraçã o séria de seu maníaco estridente momentos atrá s. O
vampiro tremeu. — Isso significa que você tem novas regras a seguir. Se
você sente muita falta da sua antiga vida, posso acabar com seu
sofrimento.
— N-nã o! — o vampiro gritou. Asher ficou quase desapontado. — Eu
quero viver!
— Entã o é melhor você começar a viver para Lorde Malkolm. — Asher se
levantou e verificou a hora em seu celular. Faltavam mais algumas horas
para o nascer do sol. Talvez o novato se recuperasse o suficiente para se
abrigar em algum lugar antes disso. Ah bem. Não é problema meu.
Mas antes que pudesse deixar o idiota entre os escombros, ele precisava
perguntar algo. — Estou surpreso que quem bateu na sua bunda te
deixou sem te matar. Quem você encontrou?
O vampiro ofegou entre os ossos quebrados.
— Ele... Nikola Kingston.
Asher inclinou a cabeça. Esse era um nome que ele sempre ouviu. O
mú sculo do clã de Lady Morrigan, o ú nico seguidor da Deusa da Lua que
corria entre os lobos.
— Nikola. Nikola Kingston.— Asher virou o rosto para a chuva e soltou
uma gargalhada. — Oh, o que eu faria para enfrentar você, aquele que
não mata.
Alguns disseram que Nikola era um covarde, mas Asher achou que era
preciso muita coragem para deixar seus inimigos viverem, tudo em nome
de sua Deusa da Lua.
E em nome do meu Deus do Sangue, espero que nos encontremos em breve,
Nikki.
NIKOLA
Nikola morava em um subú rbio rico fora dos limites da cidade. Oakwood,
lar de mansõ es barrocas e de aposentados que raramente se
aventuravam em Grander. As casas do bairro eram espaçadas
esporadicamente, permitindo a cada morador seu amplo quintal. Muitos
foram cercados, outros pontilhados por viveiros de peixes.
As á rvores floresciam entre as propriedades, uma lufada de ar fresco
natural depois de serem cercadas pelo horizonte da cidade e zonas de
construçã o. Estradas de cascalho serpenteavam pelo cená rio, um desses
caminhos subia até uma pequena mansã o no topo de uma colina.
Era descaradamente gó tico. Telhados pontiagudos e á guas-furtadas
íngremes tornavam o projeto assimétrico, mas permaneciam graciosos
com suas janelas salientes e acabamentos brancos salpicando a madeira
marrom. O alpendre, com gradeamento decorado com arcos agudos,
envolve o primeiro andar, forrado de sebes. Trepadeiras subiam pela
parede norte, como se a natureza estivesse tentando arrastar a escura
casa de bonecas para a floresta circundante.
Sempre teatral, foi Veronica quem escolheu a casa, e quem eram Nikola
ou Francis para negar à jovem donzela seus desejos excêntricos?
Nikola estacionou o Lexus compartilhado, de propriedade de Veronica
sob seu pseudô nimo humano, na garagem. O espaço estava lotado com
uma coleçã o de instrumentos musicais e materiais de arte de Veronica,
seu meio em constante evoluçã o. Nikola afastou a insegurança de que ele
realmente nã o acrescentava nada ao conjunto da vida, sempre servindo
sob o comando de Corvellious, o vampiro que o gerou.
Com um suspiro, ele entrou em sua casa, permitindo-se uma sensaçã o de
conforto. Atravessando a cozinha de azulejos pretos e brancos que
continha apenas copos e uma geladeira cheia até a borda de uísque e
vinho, ele foi até a sala de estar. Três sofá s vermelhos circulavam em
frente a uma lareira fria. Uma mesa de centro de mogno ficava no centro,
repleta de esboços inacabados e poemas incompletos. Um lustre brilhava
no alto, aquecendo o local com seu brilho suave.
Tapetes gastos subiam pelas amplas escadas que levavam ao resto dos
corredores da casa, cada centímetro das paredes decoradas com algum
tipo de pintura, madeira queimada, tapeçaria ou fotografia.
Uma pintura da Deusa da Lua acima do manto da lareira deu as boas-
vindas a Nikola em casa. Ele parou diante dela, examinando suas
pró prias pinceladas. A obra de arte já tinha uma década e retratava a
mã e de todas as Crianças da Lua ajoelhada nas á guas de uma salina. Sua
pele era negra como a noite, pontilhada pelas luzes de estrelas distantes.
Seu cabelo, pairando sobre os ombros delicados, brilhava branco com a
luz refletida da lua cheia. Seus olhos estavam fechados - uma decisã o
artística porque Nikola nã o achava que conseguiria capturar totalmente
o brilho surreal que fazia suas pró prias íris parecerem ferro barato em
comparaçã o.
Ele nã o ouvia a voz dela há três décadas, desde que serviu no clã de
Morrigan. Pela vida dele, ele nã o poderia suportar olhar na cara dela. Eu
poderia ser melhor para você. Mas como sem virar as costas ao Mestre
Corvellious? Depois de tudo que seu pai vampiro fez por ele?
Corvellious era dono de si, podia escolher seu pró prio caminho... e Nikola
devia a ele sua segunda vida.
Nikola pode passar o resto de seus dias tentando diminuir a distâ ncia
entre eles. Era possível que Corvellious tivesse seu pró prio sentimento
de traiçã o.
Nikola preferiu nã o insistir nessas coisas.
— Jesus, cara! — Nikola ficou surpreso, assustado com o ú nico que
poderia se aproximar dele. — Quando foi a ú ltima vez que você se
alimentou?
Nikola se recompô s e encarou o membro do seu clã , uma impressionante
mulher de ascendência africana. Embora a maior parte da companhia de
Sangue que ele mantinha o considerasse extraoficialmente parte do clã
de Morrigan, a verdade é que ele ainda era um Filho da Lua. E ao
contrá rio da hierarquia de luta pelo poder entre os Seguidores de
Sangue, os clã s da Lua eram tipicamente menores e mais íntimos. Os
covens lunares eram famílias escolhidas, e nã o fileiras que se esperava
que se alinhassem.
Veronica, tã o parecida com uma irmã mais nova de Nikola, jogou os
braços em volta dos ombros dele. Um instante se passou antes que ele
retribuísse o abraço – os Seguidores de Sangue nã o estavam
familiarizados com o toque casual. A floresta de seus cachos crespos
derramou-se em seu rosto, fazendo có cegas em seu nariz. Ela cheirava a
perfume caro e irradiava uma alegria desenfreada.
— Como foi Nova York? — Nikola perguntou, nã o querendo continuar o
assunto sobre sua alimentaçã o negligente. Ele tinha se visto no espelho
retrovisor mais cedo, entã o já estava ciente dos fios grisalhos crescendo
na linha do cabelo e nas sobrancelhas. Uma das diferenças notá veis entre
as Crianças da Lua e os Seguidores de Sangue era como seus corpos
reagiam à falta de nutriçã o: as Crianças da Lua começaram a envelhecer,
o que era uma troca melhor para a decomposiçã o lenta, o destino dos
Seguidores de Sangue famintos.
Seus dentes afiados e olhos prateados brilhavam enquanto ela sorria. Seu
vestido fofo, feito de babados vermelhos e um espartilho preto rendado,
zombava da corte vitoriana. Embora ela pró pria tenha nascido no início
dos anos 90, Veronica era conhecida por se vestir de todas as outras
épocas além da sua - embora suas tatuagens de espinhos de hera
envolvessem seu braço esquerdo e a imagem de uma mariposa com uma
caveira olhando maliciosamente por entre as asas no a direita
normalmente prejudicava o efeito.
— Foi maravilhoso. Nã o acredito que fiquei tanto tempo sem visitar a
cidade.
— Espere até ver o resto do mundo, — disse Nikola, sorrindo
suavemente.
Veronica bateu palmas, seu vestido esvoaçante farfalhando enquanto ela
pulava animadamente de um pé para o outro.
— Esse é o plano!
Nikola ouviu movimento na esquina, as chaves do carro tilintando.
— Se ao menos ela pudesse parar de se envolver em brigas de rua,—
Francis disse, seu rosto moreno sério, mas seu tom leve. Ele estava
vestido com um terno risca de giz e gravata impecá vel, combinando com
a paleta de cores vermelha e preta de sua esposa. Ele era mais alto que
Nikola, mas nã o tã o volumoso, com dreadlocks orgulhosos caindo sobre
seus ombros largos.
— Saudaçõ es, irmã o,— disse Nikola, quase formalmente, baixando a
cabeça. Alguns hábitos nunca morrerão completamente. — O que você
quer dizer com brigas de rua? É por isso que você chegou em casa mais
cedo?
Veronica pisou forte, cruzando os braços, e imediatamente saltou em sua
pró pria defesa.
— Ele teve o que mereceu! O bastardo... espere. — Ela parou no meio da
frase, estreitando os olhos. — Você tem regado minhas plantas?
— Uh... principalmente, — Nikola murmurou, lançando um olhar de
pâ nico para Francis, que permaneceu impassível. Veronica gritou e
desapareceu escada acima, seus passos de repente bastante altos para
um vampiro.
— Tivemos que sair um dia mais cedo porque ela atraiu a atençã o de um
recém-nascido Seguidor de Sangue. Eu consegui convence-lo a sair, mas
ela insistiu em persegui-lo e praticamente deu de cara com seu pai.
Francis fez uma pausa. — À s vezes me pergunto se a Deusa realmente a
reivindicou ou se é o Chifrudo disfarçado.
Nikola riu.
— Na semana da lua nova, nunca deixa de fazer o mundo ficar infestado
de vermes. Além disso, como foi sua visita a Nova York?
— Lotado, desagradá vel, fedorento como sempre, mas meu amor teve
uma primeira vez deliciosa na cidade, entã o suponho que nã o posso
reclamar. — Francis lançou um olhar para cima, seu olhar endurecido
suavizando-se com afeto. Nikola fez o possível para ignorar a pontada de
solidã o. Nã o era como se Nikola estivesse em condiçõ es de adquirir uma
companheira. A maioria das outras Crianças da Lua nã o podiam confiar
nele, por razõ es pelas quais ele nã o podia culpá -las.
Ele ficou aliviado por Francis e Veronica estarem em casa novamente. Os
três, seu passado e seu presente, estavam muito intrinsecamente ligados
à s disputas territoriais dos Sangue para que encontrassem algo além de
parentesco um no outro.
— Você está exausto, — Francis sentiu, franzindo a testa para seu velho
amigo. Nikola se virou, olhando para a pintura sem realmente vê-la. —
Ouvi rumores sobre a tensã o entre Morrigan e Malkolm aumentando.
Nã o é tarde demais para você sair.
Você sabe que não é tão simples. O que isso faria de Nikola, fugindo de seu
pai vampiro novamente, especialmente durante um momento de crise?
Ele nã o conseguiu formular as palavras certas, entã o sorriu
educadamente. Ele deu um aperto amigá vel nos ombros de Francis e
roçou-o, num pedido tá cito para ir para a cama.
A vida de Nikola era uma teia de aranha de lealdade complicada, e
quanto mais ele lutava, mais enredado ficava.
ASHER
Ele poderia dizer que Nikola nã o estava com o coraçã o em sua pequena
briga lá atrá s – mas ele ainda foi capaz de sentir a força bruta do Filho da
Lua. O que eu preciso fazer para realmente te animar, Nikki ? As chances
eram de que ele teria que convencer Nikola de que estava lutando por
sua vida, mas Asher nã o achava que deveria ir tã o longe na primeira
noite.
O jovem vampiro chupou os dentes da frente. Malkolm disse para trazê-
lo ao Deus do Sangue, não transformá -lo em algum tipo de brinquedo.
Asher entendeu que se ele pressionasse demais, isso provavelmente
afastaria o Filho da Lua, e isso nã o funcionaria.
Acho que vou tornar divertido me odiar. Asher zombou de um bocejo e
entrelaçou os dedos atrá s da cabeça, cantarolando enquanto caminhava.
Ele saltou ao ritmo de sua mú sica inventada, feliz por nã o estar lidando
com recém-nascidos ansiosos demais.
Asher nã o era estú pido – ele estava ciente da capacidade do Filho da Lua
de ler emoçõ es. Mas Asher nã o se importou o suficiente para se
preocupar em esconder a sua. Ele sabia que Nikola havia sentido o peso
de sua excitaçã o antes.
O cara não poderia pensar que fez um bom trabalho fingindo que não
estava se divertindo também. Asher riu para si mesmo.
Nikola lançou um olhar e disse: — Perdi alguma coisa?
Ah, emocionante – a maioria dos outros estava com muito medo de Asher
para questioná -lo daquele jeito. Cada vez que Nikki falava, Asher queria
rir de seu sotaque britâ nico abafado.
— Ah, nada importante,— ele respondeu com indiferença e continuou
seu pequeno passeio vertiginoso. Ele gostou da maneira como Nikola
olhou para ele, com as sobrancelhas franzidas em perplexidade.
E ele era um cara tã o grande também, corpulento e mal-humorado. Asher
o imaginou como um Seguidor de Sangue, normalmente mais forte que
os Filhos da Lua. Por um instante, ele começou a se preocupar com a
possibilidade de um monstro como Nikola Kingston superá -lo, mas
imediatamente descartou.
Não há um maldito vampiro nesta cidade que lute como eu.
Ele nã o percebeu que tinha parado de cantarolar até que Nikola lhe
lançou um olhar penetrante e desconfiado. Asher apenas sorriu.
— Aqui estamos! — ele anunciou, saltando na frente de Nikola,
gesticulando com grandes arcos diante do portã o da mansã o de Malkolm.
— Lar Doce Lar!
Asher nã o tinha a capacidade do Filho da Lua de ler emoçõ es, mas até ele
podia ver a apreensã o dançando nos olhos metá licos de Nikola.
O refeitó rio era, ironicamente, o cô modo mais sombrio da mansã o. Bem...
talvez a ironia dependesse de você ser humano ou nã o. As paredes eram
pretas, as pinturas do Deus do Sangue o retratavam em vá rias poses,
geralmente envolvendo um cadá ver ou alguns.
Os pisos de madeira estavam profundamente manchados. Jarras cheias
de sangue e á lcool cobriam a mesa de mogno com travessas ocasionais
de carne cozida.
Alguns Seguidores de Sangue optaram por consumir carne humana, o
ú nico tipo de alimento que conseguiam digerir. Asher achou o ato de
comer uma reminiscência da mortalidade. Havia algo enganosamente
gracioso no ato de beber sangue e apenas sangue. Eu não sou nenhum
maldito zumbi.
Em homenagem ao convidado, guardas encapuzados ficavam nos cantos.
Asher admirou a maneira como Nikola, com o rosto uma má scara estoica,
examinou cada fenda da sala.
Lorde Malkolm levantou-se. Asher fez uma reverência. Para sua total
surpresa, Nikola fez o mesmo. Riccardo já estava presente, sentado à
esquerda de Malkolm.
— Nikola Kingston, bem-vindo, — disse Lord Malkolm em seu tom mais
complacente. Ele até vestiu um terno índigo para a ocasiã o. Asher
reprimiu uma risada. — Por favor junte-se a nó s.
Asher tomou seu lugar à direita de Malkolm. Nikola parou, olhando entre
os outros doze assentos até que um dos garçons de smoking puxou uma
cadeira bem na frente de Malkolm. A extremidade oposta da mesa.
Nikola baixou a cabeça para o Seguidor de Sangue e sentou-se.
Asher inclinou a cabeça para trá s e cruzou os braços, já começando a
ficar entediado. Ele fechou os olhos por um momento.
— Bem, Nikola de Lady Morrigan, você deve ter perguntas, — começou
Malkolm.
— Sim, seu senhor,— Nikki retumbou. Seu senhor. Nã o meu senhor.
Asher sorriu.
— Admito, suspeito que compartilho muitos deles,— prosseguiu
Malkolm. — Mas o Rei Supremo pode ficar... hm, distraído, por assim
dizer. Tenho certeza de que você entende a ansiedade de incontá veis
séculos, de perder anos quando parecia que apenas algumas estaçõ es se
passaram. O Rei Supremo recentemente perguntou sobre você – e ele
nã o está satisfeito com o tratamento que você está tendo como um
Seguidor de Sangue.
Asher ouviu o clique de Nikola engolindo.
— Você sabia,— continuou Malkolm, — que foram os Filhos da Lua que
lideraram as expediçõ es vampíricas da Europa ao Novo Mundo durante a
Terceira Purificaçã o de nossa espécie coletiva? As dezoito centenas, se
bem me lembro. O Rei Supremo foi um dos primeiros e tem
supervisionado o crescimento de Grander desde entã o – ele nã o
esqueceu as dívidas que o Chifrudo tem para com os Filhos da Lua.
— Sim, eu me lembro, — disse Nikola. — Moro na América desde a sua
fundaçã o, mas só me mudei para Grander em meados do século passado.
Lorde Malkolm fez uma pausa por uma fraçã o de segundo. Asher se
perguntou o que Nikki estava descobrindo sobre ele.
— Ah, interessante. Suponho que seja fá cil esquecer que Grander nã o é o
centro do universo vampírico. Diga-me, onde mais na América você ficou
à espreita?
Nikola nã o disse nada. Asher abriu um olho para vê-lo carrancudo. Se
olhares pudessem matar... Malkolm, que normalmente decapitaria
qualquer outra pessoa tã o abertamente hostil, apenas riu.
— Me perdoe. Nó s, homens de antigamente, tendemos a manter nosso
passado perto de nossos coraçõ es.
— Posso perguntar qual é exatamente o objetivo desta... desta reunião?
Nikola perguntou, em tom cortado.
O canto do lá bio de Malkolm se contraiu. Asher e Riccardo trocaram
olhares. Seu senhor entrelaçou os dedos diante de seu sorriso de lá bios
apertados.
— O Rei Supremo me pediu para convidá -lo civilmente para atravessar a
fronteira. Qual a melhor maneira de enviar a mensagem a todas as
minhas fileiras do que anunciar publicamente que você está livres para
explorar pacificamente meu territó rio?
— Por que o Rei Supremo contou a você e nã o disse uma palavra à minha
senhora? — Nikola perguntou.
Os olhos de Malkolm brilharam. Asher realmente esperava nã o ter que
matar Nikki tã o cedo. — Essa informaçã o, — o senhor falou claramente,
— está bem acima da sua posiçã o.
Nikola hesitou, estreitando os olhos. Ele cedeu com uma profunda
reverência do queixo.
— Eu nã o quis desrespeitar, seu senhor.
Malkolm ignorou isso com um movimento do pulso.
— Nã o importa. Tenho certeza de que as coisas funcionam de maneira
diferente com Morrigan. — Nikola franziu a boca, resistindo ao impulso
de defender sua senhora desafiando o senhor diante dele. — Agora, meu
Deus, este é um jantar para honrar um tratado! Vamos jantar.— Malkolm
bateu palmas, colocando os servidores em açã o.
Eles avançaram, erguendo as garrafas individuais para despejar o sangue
vermelho brilhante e os tô nicos de vinho nos copos. Asher estava
hesitante em acenar, nã o tendo atualmente o desejo por sangue que nã o
fosse diretamente da fonte. Mas isso corria o risco de ofender Lorde
Malkolm. No mínimo, era universalmente conhecido que Asher nã o
comia carne pessoalmente. Ele nem tinha um prato na frente dele.
As feiçõ es de Nikola se contorceram de desgosto. Asher fingiu tomar um
gole de vinho, confuso.
— Aconteceu alguma coisa, Nikola Kingston?
Todo o respeito que Nikola estava fingindo saiu do prédio. Cheio de
sarcasmo e nojo, ele brincou secamente: — É seguro presumir que
aqueles que forneceram esta refeiçã o nã o andam mais entre nó s.
Malkolm deu uma risada á spera.
— Você está se perguntando se o sangue e a carne humana diante de
você sã o de origem ética? — O homem às vezes faz piadas. Asher nã o
pô de deixar de rir. — Será que importa tanto de onde vem o sangue para
a Deusa, desde que você mesmo nã o tenha cometido o assassinato?
— Considere isso uma moral pessoal,— sibilou Nikola. Há aquele ódio de
novo, fervendo, sexy. Asher bebeu.
— Nã o posso enganar um homem quanto ao seu có digo de conduta. Mas
nã o posso deixar de notar o paradoxo do seu có digo e da empresa que
você mantém.
Nikola congelou com as palavras, sem dizer nada. Malkolm continuou.
— Devo perguntar, Nikola. Por que você mesmo nã o se submete ao Deus
do Sangue? Imagine o poder que você poderia exercer!
A preocupaçã o de Asher de antes voltou.
Nikola respondeu calmamente: — Ah, mas se eu fizesse isso, perderia o
acesso a metade inteira do Grander. — O Filho da Lua, sem ser
dispensado, levantou-se, causando uma vibraçã o de movimento. Asher e
Riccardo saltaram, os guardas ao redor deles se aproximaram. Malkolm
ergueu a mã o, impedindo que todos atacassem o Filho da Lua.
Nikola curvou-se pela cintura, sem se incomodar com o quã o perto
esteve de ser atacado.
— Agradeço por esta noite, Lorde Malkolm, e acredito que cumpriu o
propó sito de honrar os desejos do Rei Supremo. Entendo que, embora
tenha permissã o para entrar em seu territó rio, ainda sou considerado
um dos filhos de Morrigan — e um Filho da Lua. Que muitos dos Sangue
consideram presas. Só porque posso cruzar a fronteira nã o me torna
invencível. — Os olhos prateados de Nikola se ergueram, ousando
encontrar os de Malkolm. — E é meu direito me defender
independentemente da disputa entre a senhora e o senhor.
O sorriso de Malkolm era só dentes. Ele gesticulou em direçã o a Riccardo
e ordenou: — Por favor, leve nosso convidado para fora... com segurança.
Ele nã o deve ser prejudicado nas dependências da mansã o. O resto de
vocês está dispensado. Mestre Asher, você fica.
Asher concedeu com um ú nico aceno de cabeça. Ele observou todos
saírem, a maior parte de sua atençã o voltada para Nikola. O Filho da Lua
olhou para trá s e Asher deu um extravagante aceno de despedida com os
dedos.
Um pouco depois, Asher e Malkolm estavam sozinhos.
Malkolm estava em Asher antes do pró ximo. Asher recuou
instintivamente, mas a mã o de Malkolm agarrou sua nuca, mantendo-o
no lugar. Os dentes de Malkolm roçaram a pele abaixo da orelha de
Asher, provocando um turbilhã o de memó rias e sensaçõ es confusas.
— Você é meu, você me entende? — Malkolm sibilou.
— Sim, meu senhor, — Asher respirou. Ele nã o tinha permissã o para
dizer mais nada.
Malkolm afundou suas presas na artéria que pulsava na garganta de
Asher. A dor explodiu em todo o sistema nervoso de Asher, trazendo
consigo uma pontada de prazer aguçado. Ele sentiu cada gota de sangue
enquanto Malkolm bebia dele.
As pá lpebras de Asher tremeram, nã o vendo mais o espaço entre os
instantâ neos de memó rias.
Asher, acorrentado à parede, ouvindo os uivos do Deus do Sangue em
seu crâ nio. Asher, de joelhos diante do chicote de Malkolm, sempre ali
com garras e dentes. Aquela cela gelada e perpetuamente ú mida, sua
casa durante as primeiras semanas como recém-nascido.
O corte de uma adaga dentada quando ele nã o conseguiu matar aquela
primeira oferenda humana...
— Você é meu,— cantava Malkolm. — Se você nã o pode ser minha arma
mais mortal, vou me livrar de você.
— Sim, meu senhor, — Asher repetiu, tanto na memó ria quanto no
presente.
A mã o de Malkolm deslizou por baixo das calças de Asher, pegando o
membro rígido de Asher. Foi a voz do Deus do Sangue que guiou Asher a
traduzir a dor em prazer... e foi Malkolm quem testou os limites desse
mesmo mecanismo de enfrentamento sempre que treinou Asher
cruelmente e o torturou por todo e qualquer motivo. Falhas.
A queimadura dos dentes de Malkolm e o golpe de suas mã os começaram
a dominar Asher. Ele nã o recebeu permissã o para gozar. A permissã o era
obrigató ria . Ele agarrou a borda da mesa para se apoiar.
— Meu senhor,— Asher choramingou em advertência.
Malkolm se afastou, deixando Asher meio drenado, a maior parte do
sangue restante latejando em seu pênis insatisfeito. Asher sabia que nã o
deveria implorar por mais.
O senhor usou um lenço para limpar o vermelho que pintava seu queixo.
Sua expressã o era neutra e indiferente quando ele ordenou: — Vá .
Acompanhe Nikola Kingston. Provavelmente, ele examinará nosso
territó rio. Lembre-o de seu lugar.
Asher fez uma reverência e saiu do refeitó rio, agindo como se nada
tivesse acontecido, se convencendo do mesmo.
CAPÍTULO CINCO
NIKOLA
ASHER
— Como você chama esse jogo, Mestre Asher? — Nikola interrogou com
uma voz frustrantemente calma. Ele os levou até a rua vizinha ao Club
Frost, repleta de mercados e cafés de esquina. Asher nã o pô de deixar de
notar como Nikola era lindo. Ele obviamente se alimentou nas ú ltimas
horas, Asher estava vendo pelo rubor em suas bochechas, a luz renovada
em seus olhos.
O ar fresco das ruas abertas fez maravilhas para acalmar o cérebro
embriagado de Asher – e acender fogo em seus vasos sanguíneos.
— Você também está jogando, hein, Nikki?
Nikola manteve suas feiçõ es suaves. Ele era bom nisso. Asher quase
invejou a cara de pô quer.
— Eu estaria mais inclinado a concordar se soubesse o que você está
fazendo, Mestre Asher.
— O nome do jogo, Nikki, é você e eu.
Os olhos de Nikola se arregalaram, as perguntas dançando claramente
através deles. Asher entrou correndo. Seja para beijar ou para morder,
ele nã o tinha certeza – ele descobriria quando chegasse lá . Mas Nikola
parou o ataque ambíguo, pegando Asher pelos braços e torcendo-os nas
costas.
Asher gritou, meio de dor, meio exuberâ ncia, e chutou para cima, virando
para frente e por cima do ombro de Nikola. Nikola, sem esperar, o soltou.
Asher pousou atrá s de Nikola. O vampiro mais velho se virou, apenas
para acertar o joelho de Asher em seu estô mago.
A violência cantava nas veias vazias de Asher, trazendo-o à vida. Este foi
o hino dos homens, da longevidade. A luta. A luta pelo poder. E ele
sempre sairia por cima.
Os dois vampiros encontraram olhos brilhantes, e Asher ficou
emocionado ao ver que Nikola correspondia à paixã o de Asher.
— Já está se divertindo, Nikki? — Ele pulou para trá s, deixando Nikola se
recuperar do golpe.
— O que diabos você está fazendo? — Nikola rosnou. Asher sentiu-se
atraído pela raiva do homem. Isso mesmo, Nikki. Pegue a isca.
Asher queria segurar essa raiva em suas mã os, moldá -la no guerreiro
enterrado sob olhos prateados e moral equivocada.
Asher riu. Para sua alegria, Nikola avançou, rosnando, com os punhos
voando. Asher jogou na ofensiva, deslizando e esquivando-se habilmente.
As feiçõ es de Nikola se distorceram. Asher riu enquanto dançava ao
redor do Filho da Lua.
— Este é o lendá rio Nikola Kingston? — Asher zombou, saltando para
trá s no momento em que um golpe roçou o ar ao longo de sua bochecha.
Os olhos de Nikola estavam selvagens. Uma bela aparência nele. — Cara,
você nã o é...
A provocaçã o de Asher falhou quando Nikola pegou a frente de sua
jaqueta de couro e o acertou na porta de um caminhã o estacionado.
Asher sentiu o metal deformar-se sob a fissura de sua coluna, sua visã o
turvando.
As mã os de Nikola estavam pressionadas contra o peito de Asher,
fechadas. Asher ouviu suas respiraçõ es irregulares – respiraçã o e vida,
sinais de que estavam bem alimentados. Ele podia sentir o cheiro de cada
aspecto da alma de Nikola naquele mesmo segundo – sua raiva, sua
adrenalina. Asher estava sedento por isso.
Provavelmente não deveria drenar o próximo brinquedo de Malkolm.
Asher piscou até que sua visã o se acalmou, um sorriso estú pido no rosto.
Os dedos de Nikki se curvaram com mais força na frente de sua camisa.
— O que é tã o engraçado? — o Filho da Lua rosnou.
Asher bufou, aproximando seu rosto do de Nikola.
— Nã o é sempre que um homem me pega desprevenido, Nikki.
— Qual é o seu plano aqui? O que você quer?
Merda, isso foi um interrogató rio? Isso não é divertido. Mas seria menos
divertido contar toda a verdade a Nikki. Nã o, isso teve que esperar. Nã o
até que nã o houvesse como voltar atrá s. Asher zombou.
— Meu motivo aqui, Nikki, é me divertir com você. Fazer de você o
melhor vampiro que você pode ser. Me deixa mais forte também,
entendeu?
Nikola piscou, um pouco da tensã o deixando seus ombros. Ele recuou...
não era a reação que eu queria.
— Eu sou seu inimigo. Eu nã o entendo.
— Ah, Nikki. Poderíamos ser amigos, certo? Eu odeio matar esse
potencial desperdiçado.— Asher se inclinou mais perto, seus lá bios
quase tocando a orelha de Nikola. O cheiro de cobre pulsante sob a pele
quente fez o Seguidor de Sangue balançar no local. O Filho da Lua
estremeceu – excitado ou muito consciente de quã o perto as presas
famintas de Asher estavam de seu pescoço? — Imagine sua força se você
se dedicar ao Deus do Sangue.
Asher queria uma reaçã o, mas nã o esperava ser levantado pelos ombros
e jogado no concreto. Estrelas dançavam atrá s de seus olhos, mas ele nã o
era o segundo em comando de um clã inteiro à toa. Ele girou no chã o,
equilibrando-se no có ccix, usando as pernas para afastar os tornozelos
de Nikola.
Asher rolou para trá s e Nikola se segurou antes que pudesse cair. Os dois
se enfrentaram agachados. Como uma arma disparando, eles se
empurraram um contra o outro, colidindo com as mã os, empurrando um
contra o outro em uma partida de força. Asher cravou os calcanhares e se
viu grunhindo.
— Onde diabos estava esse fogo antes?
Nikola mostrou os dentes, rosnando: — Você me pegou logo depois de
uma alimentaçã o.
Asher o imaginou curvado sobre sua presa, o sangue escorrendo pelo
queixo. Momento ruim porque as imagens causaram êxtase e uma sede
dolorosa que enfraqueceu seus joelhos, dando a Nikola a vantagem.
Ele deu um chute no peito de Asher, nã o o suficiente para esmagar os
ossos, mas o suficiente para empurrá -lo para trá s. Ofegante, Asher
devolveu o golpe com os nó s dos dedos na mandíbula de Nikola. Quase
parecia errado, ele pensou, acertar um rosto tão bonito.
— Mestre!
O que?
Nikola caiu para trá s, respirando pesadamente. Ele e Asher se viraram
para outro vampiro, um recruta mais jovem ajoelhado na beira do
telhado acima.
Não se atreva.
Asher sibilou um aviso, mas o idiota nã o deu atençã o. Ele se jogou em
Nikola, com as presas abertas, suas feiçõ es torcidas em um grito
selvagem – o grito para matar. Nikola se preparou, mas Asher estava
mais perto. Ele se observou se mover sem realmente pensar nisso.
Asher abordou o recém-nascido irado, agarrando-o no concreto. Ele
reconheceu vagamente o cabelo loiro platinado do recruta – ele havia
sido Transformado recentemente, algumas semanas atrá s.
— Você nã o toca nele! — Asher rosnou, pegando-o pelos fios brilhantes e
batendo repetidamente o nariz no asfalto.
O recém-nascido deve ter se alimentado recentemente; uma fraca poça
de sangue começou a espirrar onde Asher estava quebrando o nariz. O
cheiro de metal, os soluços suplicantes, alimentaram Asher.
— Existem ordens: ninguém mata Nikola, — Asher ferveu, batendo com
mais força.
Se for para matar, serei eu.
— Mestre Asher de Lord Malkolm,— Nikola disse formalmente,
colocando a mã o nos ombros de Asher. Asher congelou, um gato
frenético pronto para atacar. — É o bastante.
Certo, talvez matar um cara na frente do Filho da Lua nã o ajudasse a
ganhar seu favor. Só para garantir, Asher quebrou o rosto do recém-
nascido pela ú ltima vez.
Asher estava perto do vampiro. O garoto estava tremendo, cruzando os
braços sobre a cabeça. Asher sentiu as pontas dos dedos tremendo com
agressividade mal contida e apertou-as para esconder isso. Estava
começando a ficar um pouco difícil nã o pegar o Seguidor de Sangue e
bebê-lo até deixá -lo seco.
Preciso me alimentar antes de perdê-lo.
— Mestre Asher,— Nikola disse, interpretando mal os punhos cerrados.
Ele falou... suavemente. A ideia do cara tentando confortar Asher era
hilá ria o suficiente para reprimir um pouco de sua raiva. — Acredito que
você tenha defendido seu ponto de vista.
— O que eu disse sobre essa merda formal, cara? — Asher se virou, já
esquecendo o vampiro insolente. O garoto sabia o suficiente para pelo
menos ficar abaixado – ou talvez estivesse fodido demais para se
levantar.
Asher estremeceu quando o aroma deliciosamente sedutor que irradiava
da pele de Nikki o atingiu. Ele inclinou o rosto para o céu, aproveitando a
brisa fresca. O inverno está chegando... nada como sentir a neve cair na
pele e nã o sentir frio. O frio escaldante chegou cedo por aqui e as
nevascas caíram com força. Ele estava ansioso por isso e pelos invernos
infinitos que viriam.
— O que você acha da imortalidade, Nikki?
Nikola nã o respondeu imediatamente.
— Está vamos apenas brigando e agora você quer bater um papo? — Ele
olhou incisivamente para o vampiro caído.
— Bem, claro. Se conversá ssemos a noite toda, nã o teríamos tido chance
de jogar.
— Receio nã o conseguir entendê-lo, Mestre Asher.— É assim que eu
gosto. Entã o, Nikola disse: — É uma maldiçã o.
Asher queria lhe pedir que explicasse, mas o vermelho estava começando
a turvar sua visã o. Uma maldição, assim como esta sede inabalável. Ele
estava pensando em arrastar o vampiro mais jovem para fora de vista,
mas sabia que era melhor nã o abater inutilmente os recrutas de
Malkolm.
E se eu atacasse Nikola para me alimentar? Seria esse o empurrão que
Nikola precisa para matar?
Muito tentador. Asher balançou a cabeça e olhou para Nikola, toda
brincadeira abandonando seu comportamento. Ele nã o perdeu o modo
como Nikola enrijeceu, constantemente pronto para outro ataque. O
Filho da Lua encontrou o olhar de aço de Asher, sem se deixar intimidar
pelo peso do poder por trá s dele. Na verdade, Asher sentiu a pressã o dos
anos do outro vampiro, a confiança de um velho homem de fé. Ele nã o
pô de evitar um sorriso teimoso. Quem é você, Filho da Lua entre a maré
de Sangue?
Ele sabia que Nikola podia sentir a fome arranhando o estô mago de
Asher, arranhando o interior de sua garganta como uma lixa. Asher
suspirou melancolicamente e desceu a rua. Seu olhar percorreu o toldo
listrado de um café da manhã . Às vezes sinto falta de panquecas... Ele só
pensava em suas comidas favoritas do passado em momentos de sede de
sangue.
— Bem, isso foi divertido, Nikki, — disse Asher. Antes que Nikola
pudesse responder, Asher saltou, subindo no toldo frá gil. Ele olhou para
Nikola, que parecia adoravelmente confuso. Ele gritou: — Acho que nã o
preciso realmente me preocupar com a possibilidade de você morrer,
mas saiba que as patrulhas de Malkolm matam primeiro e fazem
perguntas depois. — Asher inclinou a cabeça com um sorriso, de modo
que as luzes da rua iluminaram seus dentes no â ngulo certo. — Eu sou os
olhos e os ouvidos deste lado da cidade, Nikki. Nã o se esqueça disso.
Asher escalou a parede até os telhados, deixando Nikola para trá s.
NIKOLA
ASHER
NIKOLA
Está tudo bem? Você deveria parar e dizer oi (ou seja, tirar
Nikola decidiu que deveria perguntar a Katsuki qualquer coisa que eles
pudessem ter notado sobre os Seguidores de Sangue locais. Eles
certamente já estavam em Grander há tempo suficiente. Tempo
suficiente para que a maioria dos Seguidores de Sangue entendesse
deixar Katsuki em paz. Mas será que a imunidade deles sobreviveria se
Malkolm descobrisse que Katsuki estava fornecendo informaçõ es a
Nikola?
Estava ficando muito perigoso para seu clã e amigos se afiliarem a ele?
Ele estremeceu diante da solidã o iminente. Já sobrevivi a isso antes,
poderia novamente. Mas o pensamento lhe causou uma forte sensaçã o de
cansaço. Poderia Aguento mais uma rodada de isolamento?
— Deusa me ajude, — ele respirou em direçã o ao céu nublado. As
nuvens, pesadas pela chuva fria, nã o responderam.
Nikola imaginou que Katsuki iria adivinhar por que ele estava visitando o
estú dio e, se eles decidissem que nã o queriam participar dos jogos entre
senhor e senhora, o rejeitaria. Mesmo assim, ele nã o conseguiu se livrar
totalmente do desconforto ao pedir o endereço.
Só espero poder evitar Asher Black desta vez.
Nikola ponderou sobre isso. Por alguma razã o distorcida, ele queria
contar a Asher amanhã . Como se ele estivesse muito entusiasmado com a
perspectiva e mal pudesse esperar. Descartando essa ideia ridícula, ele
imaginou que reservar algum tempo seria do seu interesse — tempo
para reportar aos seus superiores, tempo para se preparar para
quaisquer possíveis mudanças nos planos.
Asher: É um encontro. ;)
ASHER
Dias de hoje
Asher, perdido em suas memó rias, virou a cabeça em direçã o à s mesmas
correntes empilhadas no canto, esquecido.
Não me arrependo da minha decisão de não ter matado o humano que ele
estava me oferecendo. Mas valeria a pena desobedecê-lo quando se
tratasse de Nikola Kingston?
O sono pesava sobre seus olhos. Deve ser o nascer do sol. Faltam mais
dois.
CAPÍTULO ONZE
NIKOLA
Dias de hoje
Nikola acordou assustado, com um suspiro nos lá bios e um arranhã o na
porta. Ele ficou lá por alguns segundos, o braço jogado sobre os olhos
enquanto recuperava o fô lego. Ele desprezava um aspecto da mente do
vampiro da Lua, e essa era a natureza do sonho – era um rolo das
memó rias mais nítidas. Nikola favorecia a natureza absurda dos sonhos
humanos.
Ele se perguntou o que os Seguidores de Sangue sonhavam e bufou com a
ideia de perguntar a Corvellious. Ele decidiu que seria melhor nã o saber
o que se passava na mente de seu criador.
Nikola pegou o celular na mesa com abajur, acendendo a luz para afastar
a escuridã o total de seu quarto minimalista. Tudo o que realmente
definia o espaço eram cadernos amarelados e tomos empoeirados – um
tema comum de muitos vampiros idosos em geral.
Antes que ele pudesse acordar completamente e parar, Nikola observou
seus polegares digitarem uma mensagem para enviar a Asher:
ASHER
NIKOLA
— Você nã o viu nem ouviu nada de Asher Black nas ú ltimas duas noites?
Lady Morrigan perguntou. Ela chamou Corvellious e Nikola para a
mesma sala de conferências de antes.
Nikola confirmou com um movimento do queixo.
— Sim minha senhora. — Embora nã o sem esforço, ele admitiu para si
mesmo. Ele havia passado as ú ltimas noites memorizando o layout do
territó rio de Malkolm – isto é, mentalmente, sem câ mera nem caneta a
tiracolo. Ele tinha sido capaz de sentir as patrulhas de Malkolm
espreitando e vigiando. Eles certamente atacariam se o vissem fazendo
mais do que um passeio.
Cada momento que Nikola passava em territó rio inimigo ele estaria de
olho no segundo em comando de Malkolm. Mas Asher aparentemente
desapareceu da face da Terra, nã o deixando nenhuma pista ou sinal de
que ele estava por perto.
E ele não respondeu.
Certamente nada poderia ter superado Asher Black. Isso seria um fim
anticlimá tico para o que representava uma fascinante rivalidade. Céus,
estou começando a soar como ele. Nikola baniu o rastro do pensamento,
prestando mais atençã o à sua senhora e criadora.
— Você nã o deve estar procurando o suficiente,— Corvellious começou a
rosnar.
Morrigan o silenciou com a mã o levantada.
— Das informaçõ es limitadas que tenho sobre o segundo em comando de
Malkolm, Asher nã o é do tipo que... fica quieto. Se ele nã o está nas ruas,
deve ser porque Malkolm o mantém cativo em algum lugar, ou de outra
forma contido. Mas por que? — Nikola sentiu uma pontada de pena de
Asher, pensando naquela cicatriz cruel. Embora seus companheiros de
Sangue considerassem isso uma fraqueza, ele nã o rejeitou a simpatia –
parecia uma â ncora de sua pró pria humanidade.
Morrigan suspirou, a frustraçã o endurecendo sua voz.
— Malkolm calcula cada movimento seu, jogando a cidade como se fosse
um jogo de xadrez em que só ele tem acesso a metade do tabuleiro. Algo
mais deve estar acontecendo aqui.
Quando ela nã o disse mais nada, imersa em contemplaçã o, Corvellious
falou com Nikola.
— Grandes mudanças estã o se espalhando pelas entranhas de Grander,
aproximando-se cada vez mais a cada noite. Se Asher se provar inú til
para nó s, entã o ele será apenas uma ameaça que é melhor eliminar mais
cedo ou mais tarde. — Corvellious recostou-se, olhando maliciosamente
para seu filho vampiro. Nikola nã o pô de deixar de compará -lo com o
Filho da Lua da floresta dos seus sonhos de memó ria.
O conheço melhor do que ninguém, Mestre Corvellious. No entanto, você
continua sendo um estranho para mim.
— Espera-se que você atenda ao chamado para matar Asher Black e
outros subordinados a Malkolm. Precisaremos da sua força guiada pela
brutalidade do Chifrudo.
O rosto de Nikola permaneceu impassível, sem revelar nada. Ele, embora
extremamente leal, manteve uma aparência de rebeliã o reservada quase
exclusivamente em homenagem à sua Deusa. Farei tudo ao meu alcance
para servir Corvellous sem tomar um vida. A dú vida brilhou na resoluçã o
como as sombras escuras de uma fogueira. Que mudanças seus
superiores esperavam se esperassem que ele se juntasse a eles sob o
comando do Deus do Sangue, sacrificando assim sua imunidade
provisó ria? O chã o balançou sob seus pés. Eles estavam planejando uma
invasã o, um assassinato? Devo avisar meus companheiros Filhos da Lua
para escaparem?
Se eu não agir a tempo, precisarei matar para salvar suas vidas? Eu
abandonaria a Deusa da Lua se isso significasse proteger Corvellious? Ou
meu clã?
— A discussã o sobre se Nikola se juntará à s minhas fileiras apenas para
outro dia. — Morrigan levantou os olhos, olhando para sua alma. —
Tente descobrir o paradeiro de Asher, Nikola. Mesmo que você nã o o
encontre novamente, ainda desejo saber o que ele tem feito. Vocês,
Crianças da Lua, adoram fofocar, entã o certamente há pelo menos um
boato. Ficamos inquietos quando o inimigo desaparece de vista.
ASHER
NIKOLA
ASHER
NIKOLA
Nikola relatou ao Mestre Corvellious em seu escritó rio. Ele tinha acabado
de explicar seu recente fogo cruzado com Asher Black, omitindo alguns...
detalhes desnecessá rios. Ele ainda podia praticamente sentir o
desconforto de seu orgasmo sendo arrancado dele. Eu realmente fodi o
rosto de Asher? Nas ú ltimas horas, Nikola esteve em constante batalha
consigo mesmo, enfrentando fantasias e desejos proibidos. Não posso
deixar isso ir tão longe de novo.
Mas se eu deixasse isso florescer, isso abriria Asher Black para mim?
Nikola se sentiu mal só de pensar em usar a atraçã o de Asher por ele
dessa maneira.
E o que dizer do meu próprio coração?
— Entã o, Riccardo convidou você para a corte de Malkolm,— Corvellious
pensou em voz alta. Seus olhos se iluminaram, um sorriso raro tocando
seus lá bios. — Nikola, meu filho, você entende o que isso significa?
Oh não.
— Você deseja que eu finja interesse,— deduziu Nikola, sua alma
esfriando. — Um agente duplo.
— Precisamente. — Corvelious levantou-se. — Vá . Morrigan
normalmente nã o desculpa ser interrompida, mas ela ficaria ainda mais
irritada se nã o lhe contá ssemos esse novo acontecimento
imediatamente.
Nikola nã o estava em posiçã o de discutir, seguindo Corvellious e
tentando nã o pensar nos dias em que ele era considerado o príncipe de
seu criador.
Nikola pensou em ligar para ele e avisá -lo sobre a suposta espionagem
de Riccardo, mas nã o sabia o suficiente sobre tecnologia para ter certeza
de que as chamadas telefô nicas também nã o seriam grampeadas.
Certamente nã o, talvez apenas o histó rico de chamadas, mas Nikola nã o
queria arriscar. Ele concordava com Morrigan sobre ousadia e exércitos,
embora nã o se considerasse um soldado.
Embora eu suponha que dançar com o inimigo como se fôssemos amigos
seja muito ousado.
O pênis de Nikola se contraiu e suas presas latejaram em antecipaçã o. Ele
temia estar começando a perder de vista o que diabos deveria estar
fazendo em primeiro lugar.
CAPÍTULO DEZOITO
ASHER
Eu estarei lá.
NIKOLA
ASHER
Riccardo foi convocado para mostrar o territó rio a Brie e treiná -la com
os outros recrutas em torno de sua idade vampírica. Por mais que Asher
quisesse ficar por perto como uma mosca na parede para ter certeza de
que Brie nã o diria merda nenhuma, ele nã o tinha uma desculpa boa o
suficiente para fazê-lo. Embora ele odiasse admitir, a situaçã o estava fora
de seu controle. Ele descobriria rapidamente se Brie, por qualquer
motivo, decidisse gritar.
Já era hora de tomar aquele banho. Ele tinha seu pró prio banheiro, mas
queria sair da mansã o e ficar longe de olhares indiscretos, entã o
atravessou a cidade até a parada de caminhõ es local perto da rodovia.
O frentista mal o reconheceu quando Asher apareceu com algum
dinheiro e o pedido da chave. Mas quando ela deslizou a chave, ela
finalmente olhou para cima e engasgou. A princípio, ele pensou que ela
havia sido pega de surpresa pela cicatriz.
— Jesus! Sã o lentes de contatos?
— Uh, sim,— Asher disse secamente. Seu olhar penetrante percorreu
seus dentes, e ele estava pensando em mordê-los para assustá -la um
pouco. Em vez disso, ele foi embora. Em sua visã o periférica, ele a
observou tirar uma foto dele com o telefone, franzindo as sobrancelhas
quando viu que nã o conseguiu capturar a imagem dele.
Ela nã o era de meia-idade, talvez tivesse vinte e tantos anos, no má ximo.
Foi a geraçã o de Asher e abaixo que percebeu as travessuras vampíricas
mais rá pido do que seus pais e avó s. Afinal de contas, Grander era uma
anomalia, e os humanos nã o gostavam de admitir que havia perigo em
andamento. Era mais fá cil acreditar que os vampiros eram tã o raros
como sempre foram desde a ú ltima Purificaçã o, praticamente à beira da
extinçã o. O resto do mundo. A América especialmente nã o queria aceitar
que abrigasse mortos-vivos. Mas as geraçõ es mais jovens poderiam
agora partilhar histó rias online, comparar coisas que testemunharam,
ouviram falar ou viram nas notícias. Foi assim que Asher soube que ele
poderia cometer suicídio por vampiro andando na parte certa/errada da
cidade.
Nem mesmo Morrigan ou Malkolm conseguiram acompanhar a era do
computador, por mais que tentassem. Quem diabos sabia o que
pressagiava o futuro de Grander e as unidades de emergência valeram a
pena para ignorar os assassinatos vampíricos?
Sob o fluxo pressurizado de á gua escaldante, Asher considerou a relaçã o
entre as populaçõ es humanas e vampíricas de Grander. De vez em
quando, ele pegava um jornal e lia os artigos detalhando os casos de
corpos drenados, como eles vinham acontecendo com mais frequência
ultimamente. Isso aumentou, é claro, considerando o aumento de
recrutas de Malkolm. Inferno, recentemente, ele tinha visto uma
manchete em um painel de debate de notícias perguntando CORPOS SEM
SANGUE – CRISE DE VAMPIROS OU SUPOSTOS COPIADORES DE
ASSASSINOS EM SÉRIE? Alguns Filhos da Lua estavam preocupados com
uma Purificaçã o iminente, a primeira da América do Norte já registrada,
mas nã o era funçã o de Asher se preocupar com assuntos humanos, entã o
ele geralmente nã o prestava atençã o.
Refrescado e com cheiro de sabonete genérico, Asher jogou as chaves no
balcã o. A atendente se encostou nos cigarros e nos bilhetes de loteria,
observando Asher como se ele fosse um cachorro raivoso. Se ele
estivesse com um humor melhor, ele iria sibilar para ela, mas apenas
revirou os olhos e saiu do posto de gasolina. Observe o senhor e a senhora
tentando nos fazer começar a usar óculos escuros ou algo assim.
Ele nã o foi direto para o shopping abandonado. Ele se certificou de que
ninguém o estava seguindo, rosnando para qualquer Seguidor de Sangue
aleató rio que encontrasse até que eles corressem na outra direçã o. Ele
até fez questã o de parar no canteiro de obras de uma futura Target, a
poucos quarteirõ es da mansã o de Malkolm.
Ele se agachou na beira de um arranha-céu, observando a reuniã o de
recrutas em treinamento brigando sob o olhar atento de Riccardo. Ele
avistou Brie por perto, que ficou paralisado pela intensidade dos cortes,
mordidas e chutes. Jovens vampiros perdendo um braço ou cabeça sob o
regime de vitó ria sobre a honra de Malkolm nã o eram inéditos, embora
Asher tentasse contornar os danos causados aos futuros soldados.
Satisfeito por nã o haver ninguém para persegui-lo esta noite, ele foi
embora. O que ele tinha em mente, tanto para sua pró pria satisfaçã o
quanto para se aproximar de Nikola, ele nã o queria que ninguém
estivesse por perto para testemunhar e relatar.
CAPÍTULO VINTE E UM
NIKOLA
ASHER
mim?
NIKOLA
ASHER
NIKOLA
— Nã o posso acreditar que você achou que Van Helsing era uma escolha
apropriada,— Nikola lamentou pela décima vez. Ele estava sentado no
banco de trá s do Lexus de Veronica, Francis aceitando seu destino
silenciosamente no banco do passageiro.
— Você prometeu,— Veronica melodizou, batendo os polegares no
volante no ritmo da mú sica eletrô nica que saía do aparelho de som. Ela
era uma bomba-reló gio de energia, pronta para explodir no auge da festa
desta noite. A coceira era contagiosa, Nikola podia admitir.
Ele bufou, sem se preocupar em discutir. Ele se examinou mais uma vez,
incapaz de aceitar o quã o ridículo parecia. Veronica o vestiu com uma
jaqueta de couro marrom que ia até os joelhos, calças escuras e um colete
de couro com botõ es prateados combinando. Ela até comprou para ele
um par de botas de caça, perfeitamente ajustadas. Ele já havia dado a ela
o tamanho do seu sapato antes?
Ele convenientemente esqueceria a besta de plá stico no carro e largaria o
chapéu de cowboy de abas largas em algum lugar, uma vez lá dentro.
Pelo menos não preciso sofrer com pelos faciais falsos. Cada vez que
Francis coçava o lá bio superior, Nikola reprimia uma risadinha.
A sorte de rodar com um dos anfitriõ es é que eles chegaram cedo o
suficiente para evitar serem recebidos por qualquer tipo de multidã o.
Como o estú dio estava trancado durante a noite, eles passaram pela
porta da frente do apartamento para um refú gio para o Halloween.
A TV de tela plana da sala foi conectada a vá rios consoles de videogame
ao longo das décadas e, ao lado dela, uma má quina de fliperama
apitando. Balõ es laranja e pretos agrupados no alto, teias de aranha
falsas se estendendo de canto a canto. Havia lençó is brancos espalhados
pelo trio de sofá s, salpicados de tinta vermelha para imitar sangue.
A cozinha estava limpa e arrumada, com caveiras e cabeças do monstro
de Frankenstein penduradas no teto. A peça central da mesa de jantar
era uma tigela de doces cheia de atiradores. Vá rias garrafas de bebidas
alcoó licas lotavam a ilha. Luzes elétricas piscavam em todas as
superfícies e pequenos adesivos de Halloween, nomeadamente gatos
pretos e fantasmas, estavam colados nas paredes.
Já havia alguns vampiros presentes, a maioria do clã de Katsuki – Diesel,
ostentando uma aparência zumbificada, os gêmeos ruivos vestidos como
fadas rosa, e outro casal com vestes de bruxa e bruxo clá ssicos, nenhum
dos quais Nikola reconheceu. Diesel vestiu roupas esfarrapadas
manchadas de vermelho e sua maquiagem de palco criou feridas
purulentas realistas em seu corpo.
— Olha quem está aqui! A Família Addams! E seja lá o que diabos Nick
deveria ser. Indiana Jones?
— Van Helsing, — Nikola respondeu secamente.
Diesel gargalhou, batendo no joelho.
— Caramba, como isso é adequado! Ideia da Veronica, certo? O caçador
dos ratos da peste de Malkolm.
Nikola fingiu nã o notar a forma como as outros Filhos da Lua o olhavam
de soslaio, desconfiança e cautela pinicando em sua pele como rebentos
de cactos. Ele tinha certeza de que estava revestido pelo cheiro de
Sangue. Nikola se concentrou em admirar o quã o bem a tatuagem
exposta do cérebro de Diesel combinava com seu traje.
— Amigos. Bem-vindo! — Katsuki apareceu de outra sala. Eles flutuaram
em direçã o a Nikola e seu clã de braços abertos. O antigo vampiro usava
um colete prateado sem mangas com botõ es em forma de meia-lua, seus
jeans skinny com brilho metá lico. A cauda de uma raposa branca estava
presa na alça de um cinto, sua voz abafada por trá s de uma má scara de
raposa pá lida com marcas vermelhas ornamentadas. Uma kitsune, Nikola
identificou.
Katsuki abraçou Francis em um abraço. Embora a má scara escondesse o
sorriso, nã o havia como esconder o riso brilhando em seus olhos.
— Francis, faça-me a gentileza, quem você é?
Veronica gritou de prazer.
— Ele nã o é o Gomez mais bonito de todos os tempos? — Francis gemeu
fingindo dor, e a risada de Katsuki era como sinos de vento captados em
uma suave noite de primavera. Talvez esta noite não seja tão ruim.
ASHER
Mudança de planos.
NIKOLA
CONTINUA EM...