Batismo Infantil

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Batismo Infantil

Autor: Edward W. A. Koehler


Tradução: Moises Estacheski

Desde os dias dos anabatistas, no início do século XVI, o batismo infantil tem sido
uma questão controversa na Igreja. Também em nossos dias há aqueles que rejeitam
o pedobatismo, porque não há nenhum texto na Bíblia que ordene explicitamente que
também os bebês sejam batizados, como foi ordenado que fossem circuncidados no
Antigo Testamento.
As palavras de nosso Salvador "Ide, portanto, e ensinai todas as nações, batizando-
as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo", embora breves e concisas, são
suficientemente claras e claras para cobrir esse ponto. Ainda assim, talvez valha a
pena estudar o contexto histórico e o pano de fundo dessas palavras para determinar
sua implicação, e também a consequente prática da Igreja, para saber em que sentido
as pessoas mais próximas da época de Cristo entendiam essas palavras; em outras
palavras, se havia algo nos usos predominantes da época em que essas palavras
foram ditas e nas práticas posteriores da Igreja que lançaria alguma luz sobre a ques-
tão de se as crianças devem ou não ser batizadas.
Quando Jesus ordenou que batizassem as nações, Ele não introduziu um rito do qual
nunca se ouvira falar antes e cujo escopo os discípulos podem ter tido uma dúvida
razoável se deveria ou não ser aplicado também às crianças. Não somente João ba-
tizou no deserto, mas até mesmo entre os judeus havia muito tempo que era costume
batizar pessoas. Pois quando os sacerdotes e levitas perguntaram a João quem ele
era, não acharam nada estranho e novo no rito do batismo em si, mas questionaram
sua autoridade para batizar. "Por que, pois, batizas tu, se não és o Cristo, nem Elias,
nem o profeta?" João 1: 25. Em Hebreus 9:10, aprendemos que os judeus tinham
"vários batismos", prescritos pela Lei Levítica, Núm. 19. Eram batismos para a impu-
reza e eram repetidos conforme a ocasião exigia. No entanto, os sacerdotes e levitas
não tinham esses batismos em mente quando entrevistaram João.
Seu batismo era diferente, um batismo para o discipulado. Se ele tivesse batizado
gentios para torná-los prosélitos, eles poderiam ter deixado passar; mas João estava
batizando judeus, os filhos de Abraão, os discípulos de Moisés, e para tal batismo,
assim acreditavam, ele não tinha autoridade a menos que fosse "aquele Cristo, ou
Elias, ou o profeta".
Todos os judeus, homens, mulheres e crianças, consideravam-se como tendo sido
batizados em Moisés, 1 Cor. 10: 1, 2. Os escritores judeus falam de seu batismo como
tendo ocorrido no deserto. Maimônides1 diz: "Por três coisas Israel entrou na aliança:

1
Maimônides (Moisés ibne Maimom; N. 30 de março de 1138 – M. 13 de dezembro de 1204). Filósofo e Talmu-
lid (estudioso) do Talmude. Foi o grande intérprete judeu da Torá na era medieval e considerado a Segunda
pela circuncisão, pelo batismo e pelo sacrifício. A circuncisão foi no Egito, como está
escrito: 'Nenhum incircunciso comerá dela'. O batismo foi no deserto, pouco antes da
promulgação da Lei, como está escrito: 'Santificai-os hoje e amanhã, e lavem as suas
vestes [a lavagem das vestes era entendida como a lavagem de todo o corpo]. E sa-
crifício, como está escrito em Êxodo 24:5". É irrelevante para nosso propósito atual
mostrar se esse batismo era ou não uma instituição divina; basta dizer que os judeus
acreditavam que, no deserto, todas as pessoas, inclusive as crianças, eram batizadas.
Além disso, eles sustentavam que esse batismo valia para todos os seus descenden-
tes; filius baptizati habetur pro baptizato2. Portanto, o judeu natural não acreditava que
ele próprio ou seus filhos precisassem ser batizados, o que pode explicar um pouco a
atitude dos fariseus e dos doutores da lei em relação ao batismo de João, Lucas 7:30.
No entanto, o caso era bem diferente com os prosélitos, cujos antepassados não ha-
viam sido batizados até Moisés. Maimônides escreve: "E assim, em todas as épocas,
quando um étnico está disposto a entrar na aliança e se reunir sob as asas da majes-
tade de Deus e tomar sobre si o jugo da Lei, ele deve ser circuncidado, batizado e
trazer um sacrifício; ou, se for uma mulher, deve ser batizada e trazer um sacrifício.
Como está escrito: 'Como tu és, assim será o estrangeiro', Núm. 15:15. Como você
está? Pela circuncisão, pelo batismo e pela oferta de um sacrifício. Assim também o
estrangeiro, de geração em geração, pela circuncisão, e pelo batismo, e pela oferta
de sacrifício... O estrangeiro que for circuncidado e não for batizado, ou batizado e
não for circuncidado, não será prosélito até que seja circuncidado e batizado. E ele
deve ser batizado na presença de três". O Talmude Babilônico diz o seguinte: "Quando
um prosélito é recebido, ele deve ser circuncidado; e quando ele é curado [da ferida
da circuncisão], eles o batizam na presença de dois homens sábios, dizendo: 'Eis que
ele é um israelita em todas as coisas'". É evidente, portanto, que o costume dos judeus
antes da época de nosso Salvador e, segundo eles mesmos afirmam, desde o início
de sua Lei, era batizar, além de circuncidar, qualquer prosélito que chegasse a eles
vindo das nações.
Assim como no deserto os judeus eram batizados e também seus filhos, o batismo
para proselitismo não se limitava a pessoas adultas, mas incluía também crianças
pequenas. A Gemara Babilônia diz o seguinte: "Se, com um prosélito, seus filhos e
suas filhas se tornarem prosélitos, o que é feito por seu pai reverte para o bem deles."
"Eles costumam batizar tal prosélito na infância, mediante a profissão da Casa do
Julgamento." A Mishna, tanto do Talmude da Babilônia quanto do Talmude de Jeru-
salém, fala de crianças com mais ou menos de três anos de idade sendo tornadas
prosélitas pelo batismo. Não é nosso propósito examinar a instituição, a validade e a
eficácia desse batismo para o proselitismo, apenas desejamos estabelecer o fato de
que, de acordo com os escritores judeus, era uma prática comum entre os judeus
batizar prosélitos e que era igualmente comum batizar os filhos dos prosélitos, e que

Autoridade na Torá. Tinha grande respeito e admiração não só pelos seus, mas grandes mestres muçulmanos
da época. (Nota do tradutor)

2
Do latim: Filhos de um batizado, é considerado um batizado. (N.T)
essa prática remonta à criação da Lei e deve ter estado em voga na época de nosso
Salvador.
Agora, é verdade, a questão se o batismo que Cristo instituiu deve ou não ser admi-
nistrado a crianças não pode ser determinada pelo que os judeus faziam com os filhos
de prosélitos, mas deve ser respondida com base nas palavras da instituição. No en-
tanto, se Cristo tivesse a intenção de limitar Seu Batismo somente a pessoas adultas,
excluindo as crianças, então deveríamos esperar que, diante do costume judaico pre-
dominante de batizar também crianças, Ele deveria ter avisado Seus discípulos, di-
zendo-lhes muito claramente que deveriam discipular ou prosélitos para Ele somente
pessoas adultas. Sempre que um costume é mantido, nada precisa ser dito; mas se
uma mudança radical é feita, então aqueles que cresceram sob o antigo costume de-
vem ser informados. Portanto, não é um ponto contra o batismo infantil o fato de que
na ordem de Cristo os bebês não são expressamente mencionados; não era neces-
sário fazer isso. Somente no caso de elas serem excluídas do batismo é que seria
necessária uma menção especial a elas. Os discípulos sabiam que, de acordo com o
costume judaico, as crianças gentias eram batizadas para se tornarem discípulos, ou
prosélitos, de Moisés; se o Salvador não quisesse que as crianças se tornassem Seus
discípulos pelo batismo, Ele certamente teria informado isso aos discípulos.
Mas o que encontramos? Assim como os judeus faziam prosélitos dos gentios, inclu-
indo seus filhos, Cristo diz a Seus discípulos para ensinar todas as nações, batizando-
as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Tendo em vista o costume predomi-
nante dos judeus, não podemos deixar de pensar que, nada sendo dito em contrário,
o batismo de Cristo nesse ponto continuou a prática comum e foi destinado tanto a
adultos quanto a crianças. Há, de fato, uma grande diferença entre o batismo judaico
para o proselitismo e o batismo de Cristo para o discipulado, como pode ser visto pelo
que a Bíblia ensina sobre o benefício e o poder do batismo cristão. Mas nesse ponto,
quanto a quem deve ser batizado, não há indicação de que qualquer mudança tenha
sido planejada. "Cristo tomou em Suas mãos o batismo como o encontrou, acrescen-
tando apenas isto, que Ele o exaltou a um propósito mais nobre e a um uso maior."
(Lightfoot.)3
Agora, o que aprendemos sobre o batismo infantil no Novo Testamento? Sobre o ba-
tismo de João, lemos em Mt. 3: 5-6: "Então, saíram a ter com ele Jerusalém, toda a
Judéia e toda a região circunvizinha do Jordão, e foram batizados por ele no Jordão,
confessando os seus pecados". As crianças não são expressamente mencionadas,
mas tendo em vista que era comum as pessoas que vinham para ser batizadas traze-
rem seus filhos com elas, assim como trouxeram crianças pequenas a Jesus para que
Ele as tocasse, Marcos 10:13, é muito provável que também crianças tenham sido
batizadas por João.
Em João 3:3 lemos: "Se o homem não nascer de novo, não poderá ver o reino de
Deus." Alguns questionaram se Cristo realmente tinha o batismo em mente quando

3
Citação do Livro Harmonia Quatuor Evangelistarum, de autoria do Reverendo John Lightfoot (1602-1675) clé-
rigo inglês, estudioso rabínico e um dos participantes da Assembléia de Westminster.
disse essas palavras. Mas nosso Salvador usa aqui uma expressão que era corrente
em Sua época e que todos os judeus entendiam como se referindo ao batismo. Os
judeus chamavam o batismo de um gentio de seu novo nascimento, sua regeneração,
nascer de novo. Na Gemara, lemos: "Se alguém se torna prosélito, é como uma cri-
ança recém-nascida". E em Maimônides: "O gentio que se torna prosélito, e o escravo
que se torna livre, eis que ele é como uma criança recém-nascida." Na mente judaica,
a ideia de um novo nascimento estava associada ao batismo. Cristo usa esse termo
e, no versículo 5, acrescenta as palavras "da água e do Espírito", indicando clara-
mente que Ele estava falando do batismo. Sem dúvida, o novo nascimento que Cristo
tinha em mente e o novo nascimento do batismo judaico não eram, de forma alguma,
os mesmos; mas as palavras "nascer de novo da água e do Espírito" não poderiam
ser entendidas por Nicodemos de outra forma que não se referisse ao batismo.
Entretanto, Cristo disse algo que contrariava a opinião judaica. Os judeus não exclu-
íam os filhos dos gentios do batismo; no entanto, isentavam a si mesmos e a seus
filhos, acreditando que eles deveriam ser considerados batizados por causa do ba-
tismo de seus pais no deserto e, portanto, também renascidos. E agora Jesus diz a
esse mestre em Israel que todo aquele que quiser entrar no reino de Deus precisa
nascer de novo, não apenas os gentios, mas também os judeus, e também Nicode-
mos. Cristo não mencionou expressamente as crianças, mas elas certamente estão
incluídas na palavra "τίς" qualquer pessoa. E para que ninguém pense que uma cri-
ança está no reino de Deus em virtude do batismo e do novo nascimento de seus pais,
Ele acrescenta: "O que é nascido da carne é carne", v. 6. O que Cristo deseja impres-
sionar Nicodemos é que todos os homens, judeus e gentios, homens e mulheres,
adultos e crianças, são, em virtude de seu nascimento natural, carne nascida da carne
e que não podem entrar no reino de Deus a menos que nasçam de novo da água e
do Espírito. Cristo não poderia ter falado como falou se as crianças não fossem admi-
tidas ao batismo ou se "o bebê do crente obtém a graça regeneradora em virtude de
seu nascimento e descendência de um crente em aliança com Deus" (Shedd, de
acordo com Pop. Sym., § 261).
As palavras de nosso Salvador, Mateus 28:19, são igualmente claras. "Portanto, ide
e fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do
Espírito Santo." Por nenhum artifício de interpretação podemos excluir as crianças e
os bebês do conceito "nações, ἔθνη, povos". Falando do povo americano, ou nação,
nenhuma pessoa sã jamais pensaria em excluir nossas crianças. Que direito, então,
alguém tem de excluí-las das nações que, pelo batismo, devem ser feitas discípulas
de Cristo?
A prática judaica lança alguma luz sobre essas palavras. Os gentios eram iniciados
na religião judaica por meio da circuncisão, do batismo e do sacrifício e, no caso das
mulheres, por meio do batismo e do sacrifício. Mas esse batismo não era de forma
alguma negado aos bebês. "Um israelita que pega uma criancinha pagã ou encontra
um bebê pagão e o batiza como prosélito, eis que ele se torna um prosélito" (Maimô-
nides). Portanto, era comum tornar os gentios e seus filhos discípulos de Moisés por
meio do batismo. Se Cristo tivesse feito uma mudança para excluir as criancinhas,
teria sido necessária uma declaração definitiva nesse sentido para a orientação de
Seus discípulos. Mas Ele abre o mundo para eles, e a comissão deles é fazer prosé-
litos, discipular todas as nações.
Mas pelo fato de que repetidamente é apresentado o argumento contra o batismo
infantil de que, antes de uma pessoa ser batizada, ela deve, de acordo com as pala-
vras de Cristo, ser ensinada, e que, como as crianças não podem ser ensinadas, seu
batismo deve, portanto, ser adiado até que tal instrução seja possível, dificilmente pa-
receria necessário responder a isso. Pois Cristo não diz que devemos primeiro ensi-
nar, depois batizar, e depois ensinar novamente, mas Ele diz: Mαθητεύσατε πάντα τὰ
ἔθνη discipulai todas as nações, e então, usando particípios, Ele nos diz como isso
deve ser feito, a saber, por: batizando e ensinando-os. A palavra Mαθητεύσατε nos
mostra o que deve ser realizado pelo batismo e pelo ensino: todas as nações devem
se tornar prosélitos, discípulos de Cristo; devem se tornar cristãos. Essas palavras de
nosso Salvador contêm não apenas o mandamento de batizar as nações, mas tam-
bém mostram as bênçãos do batismo, a comunhão com o Deus Triúno, Pai, Filho e
Espírito Santo, e o poder do batismo para nos tornar discípulos de Cristo, para operar
a fé.
Vejamos também Col. 2:11-12: "No qual também fostes circuncidados com a circun-
cisão não feita por mãos, despojando-vos do corpo do pecado pela circuncisão de
Cristo; sepultados com ele no batismo, no qual também fostes ressuscitados pela fé
na operação de Deus, que o ressuscitou dentre os mortos." Paulo está se dirigindo
aos cristãos e lhes diz que eles também foram circuncidados, não, de fato, com a
circuncisão feita por mãos, como os judeus eram circuncidados na carne, mas com a
circuncisão de Cristo, que consistia em despir o corpo dos pecados da carne. E essa
circuncisão interior, essa circuncisão espiritual, ocorreu quando eles foram sepultados
com Cristo no batismo. Paulo não quer dizer que o rito externo do batismo tomou o
lugar do rito externo da circuncisão. No entanto, há uma certa semelhança entre a
circuncisão carnal dos judeus e a circuncisão espiritual dos cristãos no batismo. Por-
tanto, não é uma violência ao sentido do texto dizer que, assim como a circuncisão da
carne, que simbolizava a circuncisão do coração (Nm 10:16), era realizada em bebês,
o batismo, que também significa uma circuncisão interior, deveria ser administrado às
crianças.
Qual era a prática dos apóstolos? É verdade que nenhuma menção expressa é feita
às crianças que eram batizadas. Isso é compreensível, pois os apóstolos não podiam
alcançar as crianças a não ser por meio dos pais, que tinham autoridade sobre elas.
Mas, depois de terem conquistado os pais, é muito provável que eles seguissem o
costume judaico estabelecido de batizar os filhos dos prosélitos a pedido de seus pais
ou mães e, portanto, trouxessem também seus filhos para serem feitos discípulos de
Cristo pelo batismo. Assim, lemos sobre o carcereiro de Filipos que ele e todos os
seus foram batizados (Atos 16:33), e sobre Lídia lemos que ela foi batizada e sua
família (versículo 15). Não há registro de nenhum caso em que o batismo de uma
criança tenha sido adiado só porque ela ainda era uma criança. Se a prática cristã a
esse respeito fosse diferente da prática judaica predominante, deveríamos esperar
alguma menção a esse fato. Na questão da circuncisão, havia uma diferença. Quando
os cristãos judaizantes insistiram que os gentios precisavam ser circuncidados, os
apóstolos tomaram uma posição definitiva contra isso. Se a Igreja não tivesse batizado
os filhos dos gentios que foram recebidos em sua comunhão, os mesmos judeus não
teriam apontado para o costume da Igreja judaica, que batizava os filhos dos proséli-
tos, e insistido que os filhos dos gentios também deveriam ser batizados? Mas não há
nenhuma indicação de que tal questão tenha sido enfrentada pela Igreja; portanto,
sua prática deve ter se conformado à prática judaica nesse aspecto. Os irmãos judai-
zantes levantaram uma questão sobre praticamente todos os pontos em que havia um
afastamento da Igreja Cristã de seus costumes anteriores, mas nenhuma questão foi
levantada sobre o batismo infantil. Portanto, devemos concluir que a prática dos ju-
deus, que batizavam os filhos dos prosélitos, foi continuada pelos cristãos e que eles
batizavam também crianças para o discipulado de Cristo. "Se o batismo e o batismo
de crianças tivessem sido uma coisa nova e desconhecida até a vinda de João Batista,
como a circuncisão foi até que Deus a designou a Abraão, teria havido, sem dúvida,
uma ordem expressa para o batismo de crianças, como houve para a circuncisão. Mas
quando o batismo de crianças era uma coisa comumente conhecida e usada, como
aparece por evidências incontestáveis de seus escritores (judeus), não havia neces-
sidade de uma afirmação expressa de que tais e tais pessoas deveriam ser o objeto
do batismo, quando era bem conhecido, antes do início do Evangelho, que homens,
mulheres e crianças eram batizados". (Lightfoot.)
Um dos mais antigos testemunhos pós-postólicos do batismo infantil encontra-se na
Apologia de Justino Mártir. Falando sobre a maneira pela qual os homens foram re-
novados por Cristo e se dedicaram a Deus, ele diz sobre aqueles que foram persua-
didos e acreditaram nas coisas ensinadas entre eles: "Então eles são conduzidos por
nós para onde há água, e de acordo com a regeneração segundo a qual nós mesmos
fomos regenerados, eles são regenerados." De acordo com o uso da época, as pala-
vras "regeneração" e "regenerado" significam "batismo" e "batizado" (ver Tito 3:5),
assim como os judeus chamavam seu batismo de regeneração. Em outro lugar, ele
diz: "Várias pessoas, homens e mulheres, de sessenta e setenta anos, que foram
feitos discípulos de Cristo em sua infância (οἱ ἐκ παίδων ἐμαθητεύθησαν τῷ Χριστῷ)
continuam incorruptos." Aqui Justino Mártir nos diz que havia entre eles alguns ho-
mens e mulheres que em sua infância ἐμαθητεύθησαν foram feitos discípulos de
Cristo. Notemos que ele usa a mesma palavra, ἐμαθητεύθησαν, que encontramos em
Mateus 28:19, Mαθητεύσατε, e nos mostra que essas pessoas foram em sua infância
feitas discípulos, regeneradas, batizadas. Ora, presume-se que Justino Mártir escre-
veu cerca de noventa anos depois de Mateus, que escreveu várias décadas após a
ascensão de Cristo. Portanto, as pessoas que, na época da escrita de Justino Mártir,
tinham cerca de setenta anos de idade, devem ter sido feitas discípulos de Cristo cerca
de trinta ou trinta e cinco anos após a ascensão, ou seja, no meio dos tempos apos-
tólicos, dentro de uma geração após a escrita de Mateus.
Outra testemunha é Irineu, o mais eminente professor da Igreja na segunda metade
do segundo século. Ele também usa o termo '.'regeneração" para significar "batismo".
Em seu livro Adversus Haereses, ele escreve: "E novamente, quando Ele deu a Seus
discípulos a incumbência de regenerar para Deus, Ele lhes disse: 'Ide e ensinai a
todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo'". Aqui,
o encargo de regenerar significa simplesmente o encargo de batizar. Em outro lugar,
Irineu diz: "Pois Ele veio para salvar todas as pessoas por Si mesmo; todos, quero
dizer, que por Ele são regenerados para Deus - bebês e pequeninos e crianças e
jovens e idosos. Portanto, Ele passou pelas várias idades, para os bebês, sendo feito
um bebê, santificando os bebês; para os pequeninos, Ele foi feito um pequenino, san-
tificando os dessa idade e também dando-lhes um exemplo de piedade, justiça e obe-
diência; para os jovens, Ele foi um jovem", etc. Quando Irineu fala de bebês regene-
rados, é bastante claro que eles não são capazes de regeneração em nenhum outro
sentido da palavra, a não ser no sentido em que ela é realizada pelo batismo, ou seja,
o ato externo do batismo acompanhado da graça de Deus pela qual Ele regenera seus
corações.
Orígenes, 185-254, em seus Comentários sobre Romanos, traduzidos para o latim por
Rufino, diz o seguinte: "Por isso também a Igreja tinha, desde os apóstolos, a tradição
de dar o batismo até mesmo às crianças. Pois aqueles a quem os mistérios divinos
foram confiados sabiam que há em todas as pessoas uma poluição natural do pecado,
que deve ser eliminada pela água e pelo Espírito, em razão da qual o próprio corpo
também é chamado de corpo do pecado."
Nos escritos de Agostinho, 354-430, encontramos muitas referências ao batismo in-
fantil. Em uma carta a Bonifácio, ele escreve: "Não o perturbe o fato de algumas pes-
soas não levarem seus filhos ao batismo com a fé [propósito] de que eles possam,
pela graça espiritual, ser regenerados para a vida eterna, mas porque pensam que
conseguem ou preservam sua saúde corporal por meio desse remédio. Portanto, as
crianças não deixam de ser regeneradas porque não são trazidas por outros com essa
intenção."
Muitos outros autores poderiam ser citados, todos mostrando que o batismo infantil
era uma prática universal na Igreja desde os dias dos apóstolos até o surgimento dos
anabatistas no século XVI.4
Atualmente, o batismo infantil é praticado de forma consistente nas igrejas luteranas
e católicas. Em alguns grupos reformados, ele foi totalmente descartado e, onde ainda
é observado, não é considerado necessário. De modo geral, as objeções ao batismo
infantil são de dois tipos: uma diz respeito à criança, a outra ao próprio batismo.
Uma objeção ao batismo infantil baseia-se na aparente incapacidade da criança de
entender e apreciar o que está sendo feito com ela. Por essa razão, afirma-se que o
batismo é absolutamente inútil para a criança. É verdade que, ao olharmos para os

4
Para um tratamento abrangente da história do batismo infantil, recomendamos o History of Infant Baptism
(História do Batismo Infantil), do Dr. W. Wall, Vigário de Shoreham, em Kent, de 1675 a 1728, de cujo livro fo-
ram retiradas muitas das informações apresentadas neste artigo. (Nota do autor)
bebês que batizamos, observamos que às vezes eles dormem, às vezes choram ou
parecem totalmente despreocupados com o que está sendo dito e feito. E é muito
natural que pensemos: Como esse batismo pode ser benéfico para o bebê e qual é a
utilidade de batizá-lo? Essas considerações racionalistas talvez sejam a principal ra-
zão pela qual alguns adiam o batismo de seus filhos até que eles atinjam a idade de
assentimento.
Entretanto, a mesma linha de raciocínio poderia ter sido apresentada contra a circun-
cisão. Ainda assim, foi definitivamente ordenado que uma criança de oito dias de idade
fosse circuncidada, Gênesis 17:12. Além disso, os pais não seguem essa regra com
seus filhos em assuntos temporais. Eles farão por seus filhos o que acreditam ser bom
para eles, mesmo que eles não concordem ou se oponham veementemente a isso.
Quando há uma dúvida se uma coisa é benéfica ou não, as preocupações da criança
não devem ser descartadas levianamente por outra pessoa; mas no batismo o bene-
fício é evidente e inquestionável: a criança entra em comunhão com Deus e se torna
receptora de Sua graça. Em todos os casos, é para o bem da criança ser batizada;
portanto, as crianças devem ser levadas ao batismo, mesmo que, ao que nos parece,
elas não concordem conscientemente. Pode-se privilegiar uma pessoa, embora ela
seja incapaz de saber disso. O argumento de que, por meio do batismo infantil, pre-
determinamos a religião da criança tem tão pouca força quanto o argumento de que,
por meio da escolaridade e da educação que damos a uma criança, predeterminamos
sua carreira na vida. Fazemos uma coisa; por que não a outra?
No batismo, grandes benefícios e privilégios são concedidos à criança. É um meio de
graça, por meio do qual a graça e o perdão de Deus não são apenas oferecidos, mas
também o Espírito Santo é dado, que opera de tal forma no coração da criança que,
pela fé, ela aceita os dons oferecidos. Como isso é feito é um profundo mistério para
nós. Mas para o fato de que isso é feito, temos a autoridade de Deus, que nos diz que
pela água e pelo Espírito nascemos de novo (João 3:5) e que chama o batismo de
lavagem da regeneração e renovação do Espírito Santo (Tito 3:5). As crianças, que
por seu nascimento natural são carne nascida de carne, renascem para Deus pelo
batismo e se tornam participantes de todas as Suas bênçãos em Cristo.
Esse benefício e poder do batismo é negado por muitos. E essa é a outra razão pela
qual eles se opõem ao batismo infantil. A teologia reformada sustenta que a Palavra
e os Sacramentos não são meios pelos quais Deus transmite Seu Espírito e Sua
graça. Com relação ao batismo, as confissões reformadas afirmam que ele mera-
mente simboliza a regeneração e o perdão dos pecados e é um símbolo e selo externo
de que a regeneração e a purificação foram efetuadas pelo Espírito Santo. "O batismo
não é um meio de regeneração... Ele não confere o Espírito Santo como um Espírito
regenerador, mas é o sinal autêntico de que o Espírito Santo foi ou será conferido, de
que a regeneração foi ou será efetuada." (Pop. Sym., §§ 260,261.) De acordo com
essa ideia, não é o Espírito Santo que age e opera através do Batismo, mas é o ho-
mem que faz algo; a saber, ao submeter-se ao batismo ele mostra que de alguma
outra forma misteriosa o Espírito Santo o regenerou, ou ainda o regenerará.
No batismo, grandes benefícios e privilégios são concedidos à criança. É um meio de
graça, por meio do qual a graça e o perdão de Deus não são apenas oferecidos, mas
também o Espírito Santo é dado, que opera de tal forma no coração da criança que,
pela fé, ela aceita os dons oferecidos. Como isso é feito é um profundo mistério para
nós. Mas para o fato de que isso é feito, temos a autoridade de Deus, que nos diz que
pela água e pelo Espírito nascemos de novo (João 3:5) e que chama o batismo de
lavagem da regeneração e renovação do Espírito Santo (Tito 3:5). As crianças, que
por seu nascimento natural são carne nascida de carne, renascem para Deus pelo
batismo e se tornam participantes de todas as Suas bênçãos em Cristo.
Esse benefício e poder do batismo é negado por muitos. E essa é a outra razão pela
qual eles se opõem ao batismo infantil. A teologia reformada sustenta que a Palavra
e os Sacramentos não são meios pelos quais Deus transmite Seu Espírito e Sua
graça. Com relação ao batismo, as confissões reformadas afirmam que ele mera-
mente simboliza a regeneração e o perdão dos pecados e é um símbolo e selo externo
de que a regeneração e a purificação foram efetuadas pelo Espírito Santo. "O batismo
não é um meio de regeneração... Ele não confere o Espírito Santo como um Espírito
regenerador, mas é o sinal autêntico de que o Espírito Santo foi ou será conferido, de
que a regeneração foi ou será efetuada." (Pop. Sym., §§ 260,261.) De acordo com
essa ideia, não é o Espírito Santo que age e opera através do Batismo, mas é o ho-
mem que faz algo; a saber, ao submeter-se ao batismo ele mostra que de alguma
outra forma misteriosa o Espírito Santo o regenerou, ou ainda o regenerará.
Se fosse assim, certamente não haveria razão para que as crianças fossem batizadas,
porque não há nenhuma maneira que conhecemos pela qual Deus poderia ter trans-
mitido Seu Espírito e graça a criancinhas para sua regeneração e, portanto, seu ba-
tismo não poderia simbolizar essa regeneração, a menos que se assume, e é assu-
mido, que "o bebê do crente obtém a graça regeneradora em virtude de seu nasci-
mento e descendência de um crente em aliança com Deus" (Pop. Sym., § 261). Essa
ideia remete à antiga opinião judaica de que a filiação ao convênio de Deus é trans-
mitida por nascimento natural de um pai crente e contradiz totalmente a declaração
de Cristo: "O que é nascido da carne é carne", João 3:6. Se o batismo não é um meio
pelo qual o Espírito Santo efetua a regeneração, mas apenas um sinal de que, de
alguma outra forma, ela foi efetuada, então podemos entender que ele deve ser adi-
ado até o momento em que a pessoa possa confessar de forma articulada a regene-
ração que foi efetuada nela.
A indiferença e a negligência em relação ao batismo infantil que encontramos em mui-
tas igrejas de nossos dias têm sua raiz na negação de que o batismo é de fato um
meio de graça, por meio do qual o Espírito de Deus é derramado sobre nós abundan-
temente para nos conceder graça e perdão e para operar na alma a fé pela qual acei-
tamos esses dons e, assim, somos regenerados. Para convencê-los de seu erro, de-
vemos apontar para o mandamento de Cristo que nos diz para discipular todas as
nações, o que certamente inclui bebês e crianças. Devemos mostrar que todas as
crianças são carne nascida da carne e não herdam de seus pais a participação no
convênio da graça, mas devem nascer de novo da água e do Espírito se quiserem
entrar no reino de Deus. Finalmente, eles devem aprender com a Bíblia que o batismo
é o meio pelo qual Deus concede graça e opera a regeneração no coração. Quem
quer que compreenda o ensino bíblico da depravação natural das crianças e do be-
nefício e poder do batismo não hesitará em batizar seus filhos.

KOEHLER, E. W. A. Batismo infantil. Tradução de Moises Estacheski. Revista Teoló-


gica mensal do Seminário Concórdia St. Louis. Concordia Publishing House. Missouri:
St. Louis. 1939. Págs. 481-491.

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