Volume 5 Com ISBN
Volume 5 Com ISBN
Volume 5 Com ISBN
Fevereiro de 2024
Autor: MELO, Rav Maorel
Revisão,
projeto gráfico,
editoração eletrônica
e capa, imagem de
capa: Rav Maorel Melo
Impressão
e acabamento: Uiclap
ISBN: 978-65-00-57367-1
E
m um grupo de WhatsApp criado para promover a
interação à distância dos Judeus de Caruaru, numa
mensagem do dia 29/12/2019, o Rav Maorel Melo
disse:
- Shalom Chaverim Yekarim! Boker Tov L'Kulam!
Encontrei esta postagem em minha linha do tempo, no
Facebook, e como o conteúdo dela me lembrou muito os
efeitos do Mafteach Einêi-Shelomó, resolvi compartilhar com
vocês. Como a pessoa que postou não pôs a fonte de onde tirou
a informação não sei lhes dizer com certeza quem é o autor,
mas de qualquer forma, o texto é muito inspirador, vale à pena
ler e refletir sobre ele.
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Os olhos de Enoque encontraram um único sulco
dentro da casca e traçara seu caminho, seguindo-o enquanto
vagava pelas ondas e redemoinhos de um galho enorme. Ele
mergulhou e dançou ao longo da superfície da Árvore,
deliberadamente em seu movimento. Lembranças da vida de
Enoque pairavam em sua mente. Ele as sobrepôs contra as
formas da casca, procurando-as como num mapa. Em algum
lugar, parecia que, na superfície desse ser infinito, suas
próprias experiências de vida foram escritas. As possibilidades
do poder da Árvore o aproximaram. Se ele pudesse encontrar
o caminho de sua própria vida, ele poderia traçar suas curvas
para ver o destino da esposa e do filho que ele havia deixado
para trás. A linha seguia em direção às estrelas acima dele,
vagando como o caminho de um rio quando se reunia com o
oceano.
Esta árvore era o coração deste lugar, um microcosmo
do Reino Maior que a cercava.
A clareza da visão de Enoque não durou muito.
Encontrar uma única pessoa, enterrada em meio ao caos da
criação, era impossível. Vendo a enormidade do ser infinito,
revelou a insignificância de sua própria vida em comparação.
Uma única mancha escura perdida no céu noturno. Ele estava
sozinho. Ele nunca viu seu filho crescer. Nunca mais acordou
sua esposa com um beijo. Seu futuro foi limpo. O pouco valor
que ele tinha agora foi apagado. A realização dessa perda
agarrou o coração de Enoque e arrancou lágrimas dele.
Um anjo pairava alto sobre o homem que chorava.
Usava um traje arrebatador de tecido cinza. Emergindo de suas
costas em dois grandes arcos, uma malha de folhas de papel
dobradas subia em forma de asas.
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- Você não está perdido e nem eles. - Disse o anjo,
surpreendendo Enoque. Em seu rosto ausente, uma cúpula
branca imaculada brilhava com clareza cristalina.
- Você pode falar?! O que você sabe da minha família?
- A vergonha pela exibição aberta de tristeza de Enoque
rapidamente se transformou em frustração. Primeiro consigo
mesmo, mas depois com o anjo.
- Eu sei todas as coisas. - O anjo virou sua máscara
inexpressiva em direção a Enoque. - Eu sou Raziel.
Enoque olhou para Raziel, buscando informações de
sua memória, ele esperava alguma lembrança perdida que
poderia dar contexto a esse ser estranho. O nome era familiar,
mas ele não conseguiu identificá-lo. Tantas perguntas, mas ele
não sabia o que perguntar. Enoque desejou que seu irmão
tivesse sido trazido para cá. Israel havia estudado as Escrituras.
Ele já sabia o nome desses anjos. A forma deste lugar. Ele
poderia fazer as perguntas que teriam imposto significado a
essa missão.
- O que devo fazer agora? - A mente de Enoque estava
muito ocupada percorrendo uma lista de arrependimentos para
reconhecer completamente a situação como estava. Raziel
permaneceu imóvel e depois centrou seu olhar cego em direção
à Árvore como se estivesse considerando uma resposta, mas
finalmente escolheu não falar.
- Eu não escolhi vir aqui. Não queria isso. - Ao longo
de sua vida, Enoque tinha sido um homem fiel. Ele sempre
tentou ser gentil com as pessoas ao seu redor, mas nunca
buscou um propósito mais elevado. Se ele tivesse tido a chance
de testemunhar o berço da existência, teria recusado; ver as
estrelas de baixo era suficiente.
- Eu sei -, respondeu Raziel.
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Enoque assentiu, se acalmando. - Eu estou morto? Eu
vaguei pela terra como um fantasma sem comida ou água.
Fiquei acordado por noites que passam em um instante e dias
que parecem durar para sempre. Quanto mais experimento,
menos entendo.
- Você não está morto -, disse Raziel, endireitando as
roupas.
- Então, que lugar é esse? -, Perguntou Enoque,
apoiando-se em uma das raízes gigantescas. - Chega a mim
com lições que não tenho capacidade de aprender. O
conhecimento do Infinito está aqui bem na minha frente e tudo
o que vejo são mistérios. Minha presença neste mundo não
significa nada e, no entanto, me mantém aqui.
Raziel caminhou até Enoque e colocou as mãos nos
ombros caídos do homem. - É como você diz. Você está
vivendo um tempo que não entende, uma verdade que deve
adotar se quiser encontrar significado em sua existência aqui.
- O anjo estendeu a mão para fora, em direção ao nascer do sol
brilhante. - Não deixe sua falta de compreensão diminuir o
valor que você extrai dela. Se você olha para o céu sem limites
ou para um único grão de areia, está vendo isso
completamente. Não existe uma palavra que não a descreva e
nenhum silêncio que a trai. É tudo e nada em um.
A orientação do anjo era uma porta escura que Enoque
lutou para encontrar a vontade de atravessar. - Eu vejo! – disse
Enoque.
- Não, ainda não. Mas você vai. - Raziel respondeu
bruscamente. - Não procure entender. Simplesmente
testemunhe.
Enoque estendeu a mão em direção ao tronco da
Árvore, apoiou o peso no corpo enquanto se virava para
encará-lo. Tudo parecia real. Talvez a coisa mais real que ele
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já havia tocado. A presença da Árvore o inundou, lavando o
medo que havia crescido em seu coração.
- O que tem dentro?
- "Áaaarvoreeee" -, disse Raziel musicalmente. - Além
disso, nada. Todas as coisas. O que você está vendo é
realmente a totalidade do que é. - Raziel estendeu a mão e
tocou a Árvore também e falou seu nome. - Ein Sof.
Enoque olhou para o rosto vazio do anjo. O dele havia
se suavizado em uma resolução calma. - Você pode me ensinar
mais?
Raziel se afastou, suas asas queimando para fora. Ele
enfiou a mão nas roupas, pegando um livro considerável antes
de oferecê-lo a Enoque. Enoque recebeu o tomo com cuidado,
puxando seu peso em direção ao corpo. Abrindo-o com
reverência, ele ficou surpreso ao descobrir que as páginas
estavam em branco. Enoque se afastou, percebendo que sua
observação era óbvia demais. Enoque ergueu os olhos e a
infinita paisagem de nuvens deu lugar a um pequeno bosque.
Seus pés foram plantados em terreno firme no topo de uma
colina desconhecida. O som das vozes das mulheres chegou ao
ouvido dele entre as folhas farfalhantes. Cheiro de terra tomou
conta dele quando ele se levantou, atordoado. Segurando o
livro em branco e olhando para esta cena simples, a mensagem
era clara. Ele seguiu as vozes em busca de algo com o qual
escrever.
No grupo de WhatsApp, após ler o relato acima o
Moshé disse: “É ... este com certeza tomou o Chá”.
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12
Sumário
Interlúdio..................................................................... 7
Apresentação ............................................................. 17
Para o Chassid........................................................... 48
13
Recorte segundo – O Dízimo Espiritual ................... 83
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Sobre Rabi Yeshua HaNotzeri ................................ 156
................................................................................ 228
15
A Muralha de Melo ................................................. 316
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Apresentação
A
pós entrar em contato com o conteúdo do Sefer
HaMaftechot, o Mateus, um associado do Centro de
Cultura Judaica de Caruaru (agora um judeu de
Caruaru) e assíduo estudante da Torá compartilhou
sua impressão sobre a obra nos seguintes termos:
A leitura do livro é como acessar uma receita cujos
ingredientes, com preparos diferentes, podem tornarem-se
substâncias diferentes. Isso torna o livro o melhor dos
remédios e o pior dos venenos. E como pode ser isso? É como
diz o Zohar sobre a Etz HaDaat, "De toda a árvore comereis",
não apenas dessa, mas de toda. Se qualquer pessoa aceitar o
conteúdo da obra em parte e rejeitar em parte, pode acabar se
atrapalhando.
Sem falar que ela está imbuída de uma energia
espiritual muito forte, é como que, ao ler, a pessoa estivesse
"descondensando" a gama de entidades que estão unidas ao
livro.
Após ler as considerações do Mateus sobre o conteúdo
da obra eu fiquei positivamente surpreso e resolvi anexá-la
aqui para a apreciação do leitor.
Seja bem-vindo ao quinto volume do Sefer
HaMaftechot, O Livro das Chaves.
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É com muita gratidão a Deus e aos Judeus de Caruaru
e aos demais colaboradores que escrevo estas palavras e
avanço na realização desta memorável obra. B’Shem Yeshua
HaMashiach. Amén.
No volume dois nós tivemos mais viagens do que
apresentação de conceitos quando o comparamos com o
volume um, os quais chamei de “chaves” ou de “reinos”. No
volume dois exploramos os conceitos do Reino das Árvores e
a Chave dos Mortos apenas, enquanto tivemos os relatos das
fantásticas viagens do Barukh e da Arielá, da Hosheaná, da
Débora, dentre outras experiências místicas.
Neste volume três (depois de repaginado o projeto ele
tornou-se o volume 5, como será explicado adiante) eu resolvi
meio que reiniciar a obra como um todo, pois, apesar da versão
da Fonte Editorial, Judaísmo e a Cabalá Volume 1, e a versão
da Editora Atlântico, Judaísmo e a Cabalá Volume 2, terem
ficado legais, todavia, por conta do marketing eles acabaram
por não representar bem na capa a proposta real da obra, meio
que dando a entender uma coisa quando a obra se trata doutra
coisa, por conta disso eu resolvi refazer o projeto e publicá-lo
pela UICLAP, os três volumes novamente. Obviamente que os
volumes 1 e 2 serão uma reedição dos volumes originais, e a
penas o volume 3 é que conterá informações inéditas.
As referências e citações dos volumes 1 e 2 neste
volume 3 serão extraídas do Judaísmo e a Cabalá 1 e 2, desta
forma, acredito eu, embananará menos as coisas por aqui.
Um complemento à explicação acima: Quando resolvi
publicar a obra pela UICLAP me dei conta de que na
formatação original os volumes ficariam calibrosos e o custo
relativamente alto, a fim de amenizar estes contratempos
resolvi repaginar toda a obra que no projeto original seria
composto de três volumes, mas que, por conta desta
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repaginação, ela será composta mais ou menos de seis
volumes, e este que originalmente seria o volume 3, passou a
ser denominado como: Sefer HaMaftechot, O Livro das
Chaves, Volume 5.
Que o Eterno, bendito seja o Seu Nome, lhe abençoe
com muitos insights que lhe confiram elevação intelectual e
espiritual neste Mundo e no Outro. B’Shem Yeshua
HaMashiach. Amén.
Boa leitura e, Mazal Tov!
O autor.
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20
A Sétima viagem do Rav
A
minha sétima viagem mística com o Mafteach
Einêi-Shelomó se deu no início do mês de agosto
de 2020. Obviamente que entre a quinta e a sétima
viagem houve a sexta, mas tanto eu quanto a
Rabanit Miriam Melo fomos orientados pela Voz
para que não registrássemos esta sexta viagem, por isso que a
“pulei” para registrar o relato completo da sétima, restando ao
conteúdo da sexta viagem apenas citações esporádicas na
medida em que houver a necessidade de cruzar informações a
fim de embasar e ou estabelecer um conceito.
Como de costume, tomei o Chá à noite. Em média o
processo ativo do chá durou três horas e o processo passivo
duas horas mais ou menos, todas as informações obtidas do
Outro Lado durante este período são tantas e tão magníficas
que um instante naquele estado de consciência parece ser
muito tempo, se me fosse permitido separar com clareza e
harmonia as informações obtidas certamente eu teria que
escrever um livro de algumas centenas de páginas sem os
comentários, mas, como isso não me é possível e como muitas
informações que foram prestadas lá não devem ser
compartilhadas em público, e foi essa a orientação que recebi,
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restou-me, portanto, trechos que posso compartilhar em grupo
e trechos que compartilharei de maneira individual para com
as pessoas citadas por nome, para os quais tais mensagens
foram dirigidas e foi o que me propus a fazer. A soma de todos
os relatos possíveis de serem compartilhados resolvi registrar
aqui para apreciação e estudo do leitor e das próximas gerações
dos Judeus de Caruaru. Ki Yehi Ratzon.
Eu tinha planejado tomar o Chá no término do Tzum
de Tisha BeAv, para mim este seria o momento ideal, afinal de
contas teria acabado de realizar uma nobilíssima Mitzivá por
todo Am Israel e me conectaria com os Céus em seguida, qual
momento seria mais perfeito do que este? Mas, quando se
aproximava o fim do Tzum de Tishá BeAv eu me senti tão
desconectado com a ideia do Chá que me bateu uma irritação
sobrenatural, pois, não havia causa que justificasse tal
desconexão, e a minha perturbação de espírito foi tanta que eu
pensei, como diria o Nachmad: "Tem uma mensagem aí". E
resolvi, portanto, não tomar o Chá naquela noite.
Mas, o compromisso e a aparente necessidade de tomar
o Chá não se esvanecera, e de um dia para o outro o desejo
aumentou muito! E foi quando o pessoal veio para o Peshat
(estudo das Escrituras Sagradas) do Moshé e da Sará que me
senti conectado com o Espírito do Chá novamente e era como
se ele quisesse me comunicar coisas importantes, e então,
seguimos para a sala de estudos e realizamos o Peshat
normalmente. Não comuniquei a ninguém que iria tomar o Chá
pelo receio de desistir novamente como foi da vez anterior e
ter que de novo dizer que ficaria para outro dia frustrando a
expectativa dos interessados na narrativa da viagem.
Foi quando o pessoal foi em bora, depois do Peshat
onde estiveram presentes: O Moshé, a Sará, o Nachmad e o
Elihud, depois de despedi-los, eu fui para perto da Rabanit
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Miriam Melo e disse para ela: "Eu vou tomar o Chá hoje, sinto
como se ele desejasse me comunicar algo importante". A
Rabanit Miriam Melo então me fez um pedido: "Se você ouvir
um grito me fala?" Eu achei estranho o seu pedido, mas em se
tratando de Miriam Melo nada é fantástico demais que não seja
possível, e naturalmente me comprometi em informá-la caso
eu ouvisse algum grito.
Em seguida fui preparar a sala de estudos rumo à minha
sétima experiência com o Mafteach Einêi-Shelomó, levei
comigo lá para cima: O Chá, vela e fósforos, e já havia quase
uma semana que eu estava comendo exclusivamente peixe,
pois, eu e a Rabanit Miriam Melo consideramos o que recebeu
Gamliel e compartilhou conosco de que consumir peixe
durante alguns dias potencializa a qualidade de uma
experiência mística, e assim eu e ela nos dedicamos a esse
regime, também durante dias eu reduzi minhas refeições, e nos
últimos dois dias após o Tzum de Tisha BeAv eu me esforcei
para apenas tomar água e evitar comida sólida, ora ou outra
comi algumas fatias de abacaxi e com o passar das horas um
pouco de leite condessado e tomei tanta água quanto possível.
Pois bem, me sentia, portanto, preparado para esta viagem,
mesmo antes de me posicionar devotamente na mesa, um frio
me percorreu a espinha, um temor e tremor percorreu o meu
corpo, o aviso era claro: "Se não se sentir seguro recue!" Mas
eu me mantive firme e segui adiante. Posicionei a vela no
castiçal que consagrei para isso, depois segui as instruções do
Zohar que nos ensina a quando estivermos próximos da
Presença Divina devemos pedir perdão pelos nossos pecados e
depois pedir perdão por todos aqueles que nos vierem à mente,
e somente depois disso é que os Portões da Misericórdia se
abrirão para o místico, e assim fiz, depois fiz uma prece
espontânea, e este foi o teor de minha prece:
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"Senhor do Universo, Meu Deus, eu não sou ninguém
para me dirigir a Ti, mas em mérito de Rabi Yeshua HaNotzeri
Binekha, em seu mérito eu ouso me dirigir a Ti e te fazer
pedidos, conceda-me segundo a Tua Misericórdia o adentrar
nos Mistérios Sagrados e dê-me capacidade mental para
suportar as informações reveladas, que todos os ensinamentos
me sejam para o bem, e que o Senhor me dê forças para de
bom grado e voluntariamente aceitar os Tikunim que me forem
propostos e ou os castigos merecidos para as expiações de
meus pecados. Todavia, meu Senhor, que seja feita a Tua
Vontade e não a minha, pois Tua Vontade é perfeita e quem é
capaz de questioná-la?” - Me esforcei para fazer a prece em
hebraico e por fim finalizei: “Ani Mevakesh Kol Elé B'Shem
Yeshua HaMashiach. Amén”.
Acendi a vela, peguei a dose do Chá, recitei o
SheHaKol e o tomei, apaguei a luz, e para esperar o efeito do
Chá resolvi ouvir Loreena Mcknetty, tratou-se do concerto:
Nights From Alhambra, em vídeo no Youtube:
Sentei-me confortavelmente em
uma de nossas cadeiras de plástico em
frente ao computador e relaxei ao som
da música que tocava.
Algumas dezenas de minutos se
passaram e foi quando eu percebi que a
legenda do vídeo começou a se mostrar
em 3D, o som da música começou a distorcer em meus ouvidos
e a letra das canções começaram a falar em minha alma, era os
efeitos do Chá sem dúvida, ao perceber que os efeitos se
agravavam resolvi me esforçar por prestar atenção na música
e na letra da canção para depois comparar a diferença da
canção ouvida sob o efeito do Chá e a mesma canção ouvida
sem efeito o efeito do Chá, então, depois de alguns minutos,
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quando percebi que estes fenômenos só se agravavam a cada
segundo, resolvi desligar o celular e o computador e me dirigi
a outra cadeira encostada na parede próximo à janela que
ficava na cabeceira da mesa de estudos, sentei-me lá e percebi
que meus movimentos já estavam bem comprometidos, caso
me demorasse mais para me locomover de uma cadeira para a
outra provavelmente não iria conseguir fazê-lo e teria que
viver toda a viagem em frente ao computador mesmo.
Sentado na cadeira, com a cabeça encostada na parede,
relaxei meu corpo tanto quanto possível, pois, o medo que
surgira antes de tomar o Chá persistiu e se tornou mais
evidente, fechei os olhos e lá estavam as mandalas. Porém,
desta vez, havia algo diferente nelas, elas pareciam comunicar
algo inteligível, e a minha própria voz se manifestou para mim
conversando comigo sobre o fenômeno que eu estava
testemunhando, e foi quando eu pensei: "Não seria isso
invenção da minha cabeça?" A Voz que sempre fala comigo
disse: "Não duvide Ben HaAdam, creia meu filho! Quantas
vezes teremos que passar pelo mesmo processo até que você
possa crer na veracidade destes fenômenos?" O tom da Voz
era calmo, mas havia um "que" de incômodo e repreensão,
também havia paciência e um "que" de compreensão em
relação à minha teimosia e ceticidade, e foi quando a Voz
disse: "Ben HaAdam, hoje Eu te darei muitos presentes porque
você ajudará muita gente, caso queira se submeter
voluntariamente e passivamente ao processo proposto aqui,
você aceita se submeter?" E eu respondi: "Sim meu Senhor,
aceito me submeter passivamente a todo o processo". E a Voz
me disse: "Pois bem..." e eu senti que meu corpo estava repleto
de muriçocas (chamadas de pernilongos em São Paulo) que me
incomodavam, suas picadas coçavam e doíam e o barulho que
elas faziam ao pé do ouvido era muito irritante e eu
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impulsivamente senti um desejo quase irresistível de passar a
mão pelo meu corpo para espantar as muriçocas, e foi quando
a Voz disse: "Lembre-se que você prometeu se submeter
voluntariamente e passivamente a todo o processo". Então, eu
desisti de passar as mãos pelo corpo e aceitei o incômodo que
as muriçocas me causavam passivamente, e a Voz me disse:
"Tudo isso é seu, e quando você aceitar verdadeiramente isso
passará", e realmente, quando resolvi profundamente não lutar
contra as muriçocas as suas picadas se transformaram em
carícias e a coceira se transformaram em sensações de prazer,
as muriçocas mudaram suas formas e se transformaram em
criaturas de formas variadas, eram ainda muriçocas em suas
essências, mas já não eram mais em suas aparências, umas
eram flores, outras eram polens, outras ainda pequenos
pássaros e ainda outras belos insetos de muitas e belas cores.
E foi quando a Voz se apresentou e me chamando a atenção
para a ferida do meu pé direito e disse: "Seu castigo terminou,
sua ferida vai sarar".
Então, meu corpo foi tomado de muito frio, e enquanto
isso, muitos fachos de luzes de muitas e belas cores foram
derramadas como água em cima de mim, e a Voz me disse:
"Vê, Ben HaAdam, Eu estou te dando cura, estou te dando
vida, Eu estou te dando muitos presentes hoje, porque você
fará muito benefício a muita gente, e o seu trabalho tem
beneficiado a muitos, não pare de fazer o que você faz,
continue do seu jeito, mas continue de qualquer forma". E foi
quando eu disse: "Mas, meu Senhor, quem sou eu para merecer
tais presentes? Veja como eu me comporto de forma estranha
às vezes?" A Voz então me disse: "Essa é sua natureza Ben
HaAdam, Eu te fiz assim, Eu sei quem você é, você se encontra
quando se perde, mas é quando pensa estar no controle que
acaba se perdendo de fato. Miriam Melo tem razão em zelar
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por você, infelizmente você acredita demais nas pessoas, mas
não pare de acreditar, Miriam Melo é um grande presente que
te dei para te livrar do mal". A isso Miriam Melo me apareceu
espiritualmente e confirmou todas aquelas palavras, e sua
aparência era dupla, e era que quando ela olhava para as
pessoas que olhavam para mim que a sua aparência era como
a de um animal forte e feroz, algo como uma leoa, mas quando
olhava para mim era como uma pomba e nesse momento
conversamos sobre coisas íntimas que não convém
compartilhar.
E quando Miriam Melo se afastou, eis que as cores das
mandalas tomaram um tom marrom acinzentado e era como se
formassem duas "tábuas" gigantescas como tampos de mesa
um em cima do outro, e havia um espaço da altura de um
homem entre os tampos e o vão que entre eles se formou ia
longe a perder de vista, ao fundo tudo era trevas e muitas
entidades se moviam lá, eu senti como se elas desejassem se
aproximar de mim para pedir ajuda, mas as necessidades delas
eram tantas e tão graves que eu seria consumido em um
instante se o Eterno, bendito seja o Seu Nome, não as tivesse
mantido distantes o suficiente de mim, senti pena delas e senti
muito não poder ajudá-las, e foi quando uma mulher gritou
desesperadamente, e seguiu-se após seu grito outros gritos
menores em intensidade, eram gritos de várias mulheres que
seguiam o primeiro grito.
Então, eu senti um frio mais intenso e pude ver a sua
cor, era branco como o gelo e resplandecente como uma luz
neon, ele se instalou em minha coluna e depois o percebi
simultaneamente atuando em outras áreas do meu corpo, e o
meu corpo começou a tremer violentamente de frio ao ponto
de debater-se, e enquanto eu pensava sobre o significado deste
fenômeno, eis que minha mãe surgiu, ela me falou de meu
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passado, de suas frustrações e de muitas coisas particulares
pertinentes a mim e a ela apenas. A Voz então, paralelo ao meu
diálogo com minha mãe me disse: "Você está curando a sua
mãe Ben HaAdam! Deseje o bem para sua mãe! Deseje a cura
para a sua mãe! Você pode Ben HaAdam! Não duvide em seu
coração! Creia apenas, creia plenamente, ela está aqui diante
de você e você está com ela lá (em São Paulo)". E então,
emocionado eu disse: "Ani Maamin BeEmuná Shelamá!" (“eu
creio com fé perfeita”) e em seguida disse: "Eu lhe curo minha
mãe, eu expio em mim as suas dores". O meu corpo
convulsionou bastante na cadeira, não o bastante para que eu
caísse dela, mas o bastante para assustar a qualquer um que
estivesse testemunhando a minha viagem. Após algum tempo
neste estado o meu corpo foi se acalmando, os músculos foram
relaxando e a minha mente e espírito foram ficando serenos.
E foi quando eu senti como se estivesse voando as
alturas em direção ao céu infinito, e foi quando a Voz me disse:
"Para cada pessoa que você ajudar Eu te darei um presente". E
olhei à minha volta, e me senti numa espécie de berço de luz,
muito confortável, e acima de mim pairavam todos os objetos,
pessoas e experiências que gostaria que estivessem perto de
mim eternamente, algumas daquelas coisas eu já havia
conquistado no Mundo de cá, porém, foi no Mundo de lá
durante este momento que pude ter uma percepção mais clara
do valor delas, outras estavam muito distantes de minha
realidade ao ponto de eu perguntar para a Voz: "Mas Senhor,
como isso pode ser possível? Como alguém em minhas
condições poderá adquirir tanta coisa à essa altura da vida?" E
a Voz me respondeu: "Ben HaAdam, tudo isso já é seu, você
só precisa aprender como se apossar delas! Ben HaAdam, veja,
este é o presente que te dou agora, a capacidade de não querer
o que profundamente você quer, e enquanto continua a querer
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deve não lutar por isso sem, no entanto, mover-se nem para se
aproximar e nem para se afastar, e veja o que acontecerá..." à
isso percebi que as coisas que desejava que estavam muito fora
do meu alcance no berço e por mais que eu esticasse as minhas
mãos para pegá-las não as alcançava, quando desejei não
querer o que profundamente queria todas estas coisas se
aproximaram de mim tão rápido que eu não soube a qual delas
tomar posse primeiro e me maravilhei em apenas tê-las do meu
lado sem ter contudo, controle algum de nada.
E após este momento, depois de ter revelado o que
precisava revelar, eis que muitas outras coisas me foram
reveladas na sequência, e eu me conectei com muitas pessoas;
pessoas que vieram me ajudar, pessoas que vieram para que eu
ajudasse. As pessoas que vieram para me ajudar foram
presentes Divinos dados a mim pelos Céus, enquanto as
pessoas que vieram para que eu as ajudasse foram presentes
que cada um mereceram receber de Deus, a saber, terem parte
de suas faltas expiadas em mim e ter suas dores diminuídas a
quase nada por meu intermédio.
E foram estas as pessoas com as quais me conectei:
Adam, Noach, Avraham Avinu, Rabi Yeshua HaNotzeri, Ben
Zoma, Rabino Arieh Kaplan, o Espírito do Sefer HaZohar,
Kolot Rabot, o Espírito do Chá, Raul Seixas, o Espírito da
Cidade de Caruaru, o Espírito da Cidade de Jerusalém, a
Shekhiná dos Judeus de Caruaru, Gamliel, Moshé, Diná, Yael,
Akiva, Shealtiel, Makhnissel, Chassid, minha vó, minha
sobrinha, dois irmãos meus, meu avô, meu pai, Bibiu, o
Presidente Bolsonaro, além é claro de Miriam Melo, minha
esposa, e de minha mãe, mencionadas acima, e a mãe de
Miriam Melo.
Com cada um destes personagens eu tive uma conversa
incrível! E compartilharei, dentro do possível, trechos
29
relevantes de vários destes diálogos. Houveram algumas
pessoas que após se manifestarem e tendo, cada qual a seu
tempo, conversado comigo, me pediram que compartilhasse a
conversa que tivemos com suas contrapartes no nosso mundo
natural, dizendo: "Por favor Rav, escreva-me estas palavras,
eu preciso muito delas!" E sobre alguns outros as Vozes
disseram: "Diga, conte para eles, eles precisam saber disso!" E
assim, atendendo a estas solicitações procedi, me dirigi a cada
um em particular e reportei-lhes a nossa conversa, e a reação
de cada um deles foi surpreendente! Eles testemunharam que
se estivessem tratando comigo sobre o assunto tratado através
de suas contrapartes espirituais durante a viagem mística
usariam basicamente as mesmas palavras evocando os
mesmos conceitos da maneira como se deu durante a viagem.
Também me conectei com Hosheaná, uma judia de
Caruaru. A Voz me pediu para lhe dizer na frente de todos que
ela é muito importante para todos nós, eu particularmente sou
muito grato por todo o bem que recebi de suas mãos, e com
certeza ela será muito bem recompensada pelo Outro Mundo
por todo o bem que tem praticado para comigo e para com
todos os Judeus de Caruaru. Todá Rabá Yedidá Chaverá! Ao
que Hosheaná respondeu: “Ai que emoção! E o quanto eu sou
grata ao senhor, Rav Maorel, e à Rabanit Míriam Melo.
Obrigada por tudo. Amén”.
30
variadas, e apesar de eu não ser capaz agora de descrevê-las a
minha sensação interna era de que eu sabia do que se tratava
cada uma delas, e mesmo sendo obscuro à minha mente o seu
significado, todavia, para a minha alma o seu significado me
pareceu tão claro quanto água cristalina. E eu subia e subia e
estava maravilhado com o que via e sentia e foi quando me
percebi numa espécie de jardim, era uma mistura de jardim
com floresta, mas era tudo muito organizado, cada planta no
seu lugar, tudo era muito harmonioso e sereno, até que olhei e
vi a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, era uma
árvore de aspecto medonho, terrivelmente bela e atraente, sua
presença era como a de uma entidade feroz, ávida por
desencaminhar a qualquer que ela pudesse se apossar, o mal
era tão patente que se manifestou dentro dela como uma
serpente deformada fisicamente, e mesmo a serpente era
escrava dos desejos da Árvore, e foi quando eu me perguntei:
"Qualquer um de mentalidade simples, por mais simples que
seja, não iria se deixar enganar por uma armadilha tão óbvia
quanto essa. Por que Adam, tão Sábio e Perfeito em todos os
sentidos, se deixaria desviar-se de seu caminho por algo tão
bobo assim?" E foi quando Adam apareceu para mim e me
disse: "Meu filho! Meu filho! Se você tivesse sequer
vislumbrado um pouco do resplendor que vi diretamente com
os meus próprios olhos você teria feito a mesma coisa! Ela era
linda meu filho!" E foi quando eu percebi que Adam se referia
a Chava, e então eu me esforcei para tentar imaginar a beleza
de seu rosto e a beleza de seu corpo para poder entender o que
levou alguém tão perfeitamente Sábio se entregar por sua conta
a cair em uma armadilha tão flagrantemente exposta, e
enquanto eu me esforçava para perceber estas coisas Adam
gargalhou de mim e disse: "Meu filho! Ela era maravilhosa!
Ela era linda e perfeita! Mas, não me refiro à beleza de seu
31
corpo, mas à beleza e grandeza de seu ser, pois, a atração pelo
corpo é algo de crianças, comparado com o que vi quando olhei
para ela com desejo, cobiçar o seu corpo era insignificante, eu
cobicei perdidamente a sua alma!" E foi quando me dei por
mim e estava extasiado com a profunda emoção e verdade
daquelas palavras que reverberavam em meu ser como se os
sentimentos dele agora também fossem meus, eu os senti em
meus ossos, tal a intensidade da interação e do fenômeno, e me
convenci de que se estivesse no lugar de Adam teria me
perdido mais cedo do que ele, sem dúvida! Me convenci disso
pelas suas palavras mesmo não tendo visto nada sobre Chava
Imenu durante a visão. E foi quando Adam gargalhou
novamente e com intensa alegria, dor e vergonha misturados e
me confessou: "Meu filho, sem ela eu era um eterno nada, mas
quando olhei para o seu ventre e vi toda a humanidade que de
nós nasceriam e foi quando fui tomado da concreta certeza de
que com ela eu seria simplesmente um Deus, quem não
perderia o juízo com um vislumbre desses meu filho! Você
seria capaz de não cair voluntariamente por conta de uma
promessa tão grande quanto essa?! Eu sem ela era nada meu
filho, mas com ela, eu era o Todo!" E a estas palavras as
lágrimas correram livremente pelos meus olhos e eu
compreendi que não haveria quem pudesse se livrar daquela
queda sofrida por ele.
E enquanto eu ainda estava muito emocionado, Adam
se retirou, e eu me questionei: "Seria Chava tão
escandalosamente bela assim?!" E a Voz me disse: "Meu filho!
Eu mesmo a fiz com Minhas próprias Mãos! Como ela poderia
ser menos do que isso?! Eu a fiz para escândalo dos homens,
para que eles zombassem de suas próprias limitações, diante
dela não havia homem que se sentisse alguma coisa, pois,
todas as emoções masculinas invadiam a todos que a
32
vislumbrasse sequer por um instante, e as emoções que os
invadiam, como inundações que devastam regiões inteiras,
eram tão violentas e desconcertantes que muitos deles
preferiram a morte ao invés de continuarem a experiênciar tão
fantástico e exótico prazer em apenas contemplá-la! Creia Ben
HaAdam, e não duvide. Se você crer, se você aceitar os
presentes que tenho para te dar hoje, você receberá todos eles".
E eu disse: "Ken Adoni! Ani Maamin BeEmuná Shelemá! Ani
Mekabel Alai Kol HaMatanot LeMaalá e Kol HaMatanot
Lamata! Ani MeKabel Kol Elê!" (“Sim meu Senhor! Eu
acredito com fé perfeita! Eu recebo sobre mim todos os
presentes do Alto e todos os presentes de Baixo! Eu recebo
todos eles!”) e foi que frente a energia destas minhas palavras
eu vi as profundezas do Abismo se escancararem e de lá saíram
muitas entidades de todos os níveis e espécies enquanto que
dos Céus desceram muitos mensageiros e todos juntos
formaram em torno de mim uma grande esfera e eu estava
dentro, e a proporção da grandeza do que eu estava
experienciando com que se pode comparar? era semelhante a
uma grande melancia com uma pequena ervilha bem no meio
dela, em seu interior.
33
disse: "São as luzes de sempre meu Senhor!" E a Voz me disse:
"Sim, são as luzes de sempre, mas percebeu que agora elas
fazem algum sentido para você? Percebe que agora elas se
comunicam de alguma maneira com você?" E eu disse: "Sim,
percebo. Mas não compreendo a linguagem delas". A Voz
então me disse: "Não se preocupe com isso agora, em breve
você compreenderá. Você pediu por mistérios e eu vou te
revelar mistérios. Você pode acreditar nisso Ben HaAdam?" E
eu respondi reverentemente: "Sim, eu acredito. Ani Maanim
BeEmuná Shelemá BeKol Levavi!" (“eu creio com fé perfeita
de todo o meu coração!”) e foi que as luzes que se expressavam
ao meu redor tomaram a forma de uma floresta e eu me percebi
olhando para um lugar elevado e eis que a Arca de Noé estava
lá, sua porta principal aberta, Noach (nome hebreu de Noé)
estava em pé com suas mãos estendidas à maneira dos
sacerdotes hebreus e de suas mãos emanavam energias
invisíveis que se conectavam com todas as criaturas vivas, e
fisgadas por este encanto irresistivel elas rumavam em direção
a Arca a fim de nela entrar. Enquanto eu olhava e via tudo isso,
a Voz me disse: "Ben HaAdam, a sua conexão com Noach não
foi por acaso (a Voz estava se referindo à minha conexão
emocional com o parecer do Mekubal Friedrich Weinreb, autor
da obra: Kabala - El Libro de Jonas), Eu os fiz com a mesma
natureza, ambos amam a todas as coisas vivas, ambos desejam
o bem desmedidamente para todos e ambos buscam ordenar as
coisas à sua própria maneira, mesma natureza, porém, poderes
distintos. Noach, Eu o escolhi dentre todas as famílias da terra
para que ele fosse o grande Rei do Novo Mundo..." e enquanto
a Voz me dizia isso um resumo do Dilúvio passou em
segundos diante dos meus olhos e foi quando as águas secaram
de sobre a terra e o Novo Mundo passou a ser povoado
novamente pelos tripulantes da Arca de Noé, foi que a minha
34
mente adquiriu um "quê" de serenidade, e a Voz continuou:
"...o Meu filho o pus como Rei sobre outro Novo Mundo
segundo o modelo de Noach. Todos perecerão, menos a Casa
de Meu filho e todos aqueles que ele desejar livrar do mal". E
foi quando me veio à mente a passagem das Escrituras
Sagradas que dizem: "E, como foi nos dias de Noé, assim será
também a vinda do Filho do homem" (Mateus 24:37). E esta
passagem aprofundou-se no meu ser, encarnou-se em mim
com mais força do que já o fizera antes. E a Voz me disse:
"Ben HaAdam, você acertou quando fez um trocadilho entre
"Tevá" - ( תֵּ בָ הArca) e "Teva" - ( טֶ בַ עNetureza), pois de fato é
isso. Veja você mesmo..." e eu olhei e vi a Grande Arca e todos
os animais entrando nela, e ela agora me pareceu como um
Grande Ventre e era como um pai e uma mãe simultaneamente
a cuidar de todos em seu interior, seu interior era perfeito, era
um mundo mágico, era enorme e tinha de tudo para a
manutenção de todos havia fartamente, e então a Voz me disse
que o Espírito da Tevá (Arca) foi posto no mundo na forma do
Espírito da Teva (Netureza), e dentro de suas possibilidades
ela cuida de toda a vida no mundo existente com o mesmo zelo
e devoção de antes. E foi enquanto eu contemplava tudo isso
que a Arca, que era um Grande Ventre, me pareceu muito
familiar, e era na verdade o meu ventre, e todos os animais
estavam dentro de mim, e eles se juntavam todos e, como
pequenas peças a montarem uma peça maior (como peças de
lego), tomavam ora a forma de um leão, ora a forma de um
macaco, ora a forma de ave-de-rapina e ora a forma de uma
serpente, porém, cada um destes gigantescos animais eram
formados, cada qual a seu turno, da soma e aglutinação de
todos os animais da Arca, e espantado com tudo o que estava
vendo e sem saber o significado de tudo aquilo, perguntei:
"Meu Senhor, por favor, diga-me, qual o significado de todas
35
estas coisas? Seriam todos estes animais reencarnações de
minhas vidas passadas?" E a Voz me disse: "Não Ben
HaAdam, cada energia dessa, de cada animal que você vê, foi
a matéria prima com a qual forjei sua natureza. Você é como
um prato feito por uma cozinheira talentosa que vai à natureza
e de lá traz os mais elaborados temperos, e aos olhos dos
simples estas coisas, plantas de várias espécies, sabores e
cheiros de toda a sorte, muitos ingredientes, uns sobre os
outros, não fazem sentido algum, mas quando trabalhados por
mãos habilidosas o resultado final é um prato de constituição
Divina, perfeito em todo aspecto, que sacia a fome e arrebata
a alma, que cura o corpo e purifica o espírito daquele que dele
saboreou. Este é você Ben HaAdam, é assim que os espíritos,
encarnados e desencarnados se realizam em você, e é por isso
que você receberá muitos presentes hoje. Você pode crer nisso
Ben HaAdam?" E eu respondi temendo e embriagado de
prazer e realização, cheio de gratidão e vergonha por não ter
as palavras adequadas para agradecer tudo aquilo que estava
recebendo: "Ken Adoni. Ani Maamin BeEmuná Shelemá
BeKhol Levavi".
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momento em que Adam Avinu conversava comigo me pareceu
que pude em um relance muito rápido "enxergar" o ventre de
Chava, e era como a Arca de Noé, porém, cheio de gente de
todos os rostos, de todos os tempos, de todas as aparências, uns
lembravam anjos, outros lembravam homens e outros ainda
lembravam animais, e foi enquanto contemplava toda a
humanidade em potência em seu interior que percebi que as
presenças masculinas foram se desvanecendo e as presenças
femininas foram crescendo e amadurecendo, e enquanto elas
se desenvolviam eu me conectava emocionalmente com todas
elas e ao mesmo tempo com cada uma individualmente, e
quando chegaram na adolescência meu sentimento por elas foi
se transformando e o desejo de tê-las todas como esposas foi
surgindo, e quanto mais elas amadureciam mais o meu amor e
desejo por todas elas aumentava e eu senti vergonha do que
sentia apesar de não ter forças para brecar o que estava
sentindo, e então, no auge de minha confusão de rosto eu disse:
"Ai Senhor meu, eis que me encontro fora de controle, me
ajude pois não desejo ofender ninguém!" E foi quando surgiu
o Avraham Avinu, e ele me disse com tom de riso na voz: "Não
se turbe o vosso coração meu filho, na verdade você está
experienciando a minha natureza, este sou eu e não você,
todavia, aprouve ao Eterno, bendito seja o Seu Nome, nos
conectar neste aspecto. Saiba que desejei ter todas as mulheres
do mundo, e só possui como minhas àquelas que, todavia, o
meu Senhor entregou em minhas mãos, e lutei contra o meu
desejo de querer sempre mais e fui muito bem-aventurado
nisso. Por amor a Deus, por amor à Sará, por amor a toda a
minha família eu refreei o meu desejo por mulheres, crente que
o meu Senhor realizaria, à maneira Dele, todos os meus
desejos, não porque eu merecia tal dádiva, mas porque Ele me
prometeu que assim seria e eu sei que Ele não volta atrás com
37
a Palavra dada ao Seu servo. Saiba que minha natureza neste
aspecto afetou muito a David meu filho, e em seu filho
Shelomó eu me realizei e vivi a fartar todos os desejos e sonhos
de meu coração e de minha alma no tocantes às mulheres.
Bendito seja o Eterno que opera maravilhas em todos os
mundos! Não tenha vergonha e não se culpe por suas
particularidades, pois, estas coisas sou em você para o bem e
não para o mal". E a Voz me disse: "Este é outro presente que
te dou hoje, o revelar destes mistérios". E extasiado com tudo
o que via e ouvia tanto do Avaraham Avinu quanto da Voz que
comigo falava, eu disse sem pensar por um instante: "Ani
Mekabel Kol HaMatanot LeMaalá VeKol HaMatanot LeMata!
Ani Maamin BeKol Elê BeKhol HaLevavi!"
As cores em forma de peças de quebra-cabeça que
rodopiavam à minha volta se aglomeraram juntando-se uma à
outra formando uma espécie de prancha. E em cima desta
prancha se projetavam muitas imagens, passagens de minha
história, objetos, rostos e tantas outras coisas, e eu olhava tudo
aquilo e percebi que as imagens eram plenamente captadas
pela minha mente, mas eram invisíveis aos meus olhos, e foi
quando eu perguntei: "Meu Senhor, por que as imagens que se
projetam em cima desta prancha são compreendidas pela
minha mente mas são invisíveis aos meus olhos?" E a Voz me
respondeu: "A prancha que você está vendo Ben HaAdam, na
verdade é um mármore, este todavia, não é um mármore
qualquer, mas uma superfície que consagrei para permitir aos
filhos dos homens estas visões e experiências que Estou te
apresentando desde o início de sua viagem, todas as
experiências vividas por você até aqui são fruto das atividades
das energias que se manifestam em cima deste mármore.
Quando você leu sobre Rabi Akiva e os seus três companheiros
que se aventuraram a viverem experiências semelhantes a esta
38
sua, antes de embarcarem cada qual em sua viagem, o Rabi
Akiva alertou-lhes sobre o perigo de quando avistassem este
mármore dizerem: "Água, água!" pelo fato de que para a mente
humana é impossível que uma superfície sólida, cujo contato
só é possível se dar na superfície venha a imprimir em seus
espíritos a sensação de profundidade como se eles estivessem
mergulhando em um oceano profundo. Quando os
companheiros de Akiva chegaram a este lugar, cada qual por
motivos particulares rejeitaram a explicação e instrução de
Akiva e disseram: "Água, água". Isso aconteceu porque para
dois deles, que se equivocaram, ao invés de perceberem que
tinham se deparado com o um mármore, pensaram eles: “O que
aconteceu foi que Akiva não foi merecedor de conhecer os
mistérios abaixo e percebendo a superfície dura ignorou o fato
de ser água e a chamou de mármore”, eles acusaram Akiva de
ter negado a verdade, e a partir de então eles se convenceram
de que se fizessem ao contrário da instrução de Akiva, não
negando a verdade, seriam merecedores de perceber a
superfície da água mole e poderiam livremente mergulhar em
suas profundezas e conhecer os mistérios que segundo eles
para Akiva foi negado. Lembre-se Ben HaAdam de como você
viu as águas que derramei no ventre de Miriam Melo para
purificação de muitos, não foram elas parecidas com esta
superfície que você contempla? E não foi o relato da Rut
semelhante quando descreveu a Abertura do Mar Vermelho
onde as águas eram coloridas e sua substância era composta de
muitas entidades semelhante a este mármore aqui? Pois bem,
a suspeita deles não foi sem fundamento, a ilusão é muito
convincente e sedutora, dentre os quatro só a dois deles Eu
revelei este mistério".
39
A interação com Ben Zoma
40
mim palavras adequadas para agradecer plenamente: "Todá
LaEl, Todá Rabá!" seriam suficientes e a Kavaná (intensão)
com a qual eu as pronunciaria as tornariam plenas do sentido
desejado nos Céus e na Terra e assim tenho feito até os dias de
hoje sempre que uma coisa realmente boa e ou fantástica me
acontece. E foi quando a Voz disse: "Sua natureza é como a de
Ben Zoma, seu amor pelo saber e a necessidade de saber
profundamente te inflama a mergulhar arriscando-se e
perdendo-se voluntariamente, e mergulhando e retornando à
superfície e eis que você se torna a cada esforço mais pleno de
si e de tudo à sua volta".
41
impossível nos separar sem danos para ambos, e enquanto eu
fluía de forma involuntária e loucamente perdido, me esforcei
por raciocinar tentando compreender o significado daquilo
tudo, e com muito esforço eu perguntei: "Meu Senhor, quem é
esta?" E a mulher me respondeu: "Eu sou a Torá, a sua amada
e desejada. Eu sou em sua cidade o que você quiser que eu seja,
eu sou o que você propaga sobre mim, em sua cidade as
pessoas me conhecem segundo o que sai de sua boca, eu sou
sua Torá, só sua e de mais ninguém, e você é meu..." e antes
que ela terminasse de falar eis que me vi sendo seu marido, seu
irmão, seu filho e seu amigo, seu guardião e seu servo. E a Voz
disse: "Você e a Torá são Um, assim determinei".
Depois destas coisas, eis que as luzes coloridas
tomaram formas de estrelas de Davi, elas me pareceram
entidades vivas e a minha sensação era de que elas tinham
personalidade. Elas flutuavam no ar, porém, não de forma
aleatória, era como se respeitassem alguma lei que as obrigava
a orbitar em torno de eixos invisíveis que as ordenava em
forma de globos, um dentro do outro, um maior do que o outro,
um globo de estrelas tinha muitos globos menores também
formados por estrelas dentro, e assim eu observava esse
repentino fenômeno, até então inédito em minhas experiências
com o Mafteach Einêi-Shelomó. Os espaços vazios deixados
pelas distâncias entre um globo e outro compunha um
ambiente sem fronteiras que parecia infinito de cor cinza
esverdeado e os globos formados por estrelas de Davi
pareciam dançar sincronizadamente diante de meus olhos.
42
Enquanto me esforçava para não tentar entender o
significado daquilo, pois, em minha quinta viagem foi-me
aconselhado que eu adotasse uma postura mental passiva para
que segredos pudessem serem-me revelados com mais
facilidade e clareza, foi enquanto eu observava passivamente
que uma atmosfera híbrida de Ciência e Religião permeou o
ar, e uma presença familiar se fez presente, as estrelas de Davi
desfizeram os globos e passaram a se moverem de forma
espiral, semelhante àqueles desenhos esquemáticos de DNA, e
o fundo cinza esverdeado inflamou-se adquirindo um tom de
laranja, amarelo, branco gelo reluzente e azul claro... e
enquanto eu percebia toda esta mudança a voz do Rabino
Arieh Kaplan se revelou e disse: "Eu trabalhei muito, trabalhei
muito. Escrevi muitos livros, e há lugares onde meu nome não
é mencionado mesmo quando estudam as minhas obras, mas
você tem feito o meu nome ser mencionado em sua cidade e
eu lhe sou grato por isso". A isso a Voz se manifestou e disse
para ele: "Eu sei que você trabalhou muito, e muito
valorosamente, suas obras iluminam o mundo e glorificam
adequadamente o Meu Nome, por isso pus homens como ele
para acender a sua chama e aquecer a sua alma com os louvores
dos homens mortais". Então, percebi a alma do Rabino Arieh
Kaplan e ele se sentia satisfeito com o presente Divino que
recebera, e voltando-se para mim disse: "Vê o bem que você
me fez? Por isso eu pedi permissão para o Eterno, bendito seja
o Seu Nome, para sintonizar a sua vibração à minha, para que
os seus pensamentos captem os meus". E eu perguntei para a
Voz: "O que é isso meu Senhor?!" E a Voz me disse: "Este é
outro presente que te dou hoje".
43
Para o Gamliel
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quando ele insistia nisso que a Shekhiná dos Judeus de Caruaru
apareceu, era uma mulher cuja beleza não podia ser vista pelos
olhos e sua voz tinha algo de cristal, como se fosse possível
sentir a textura do som que emitia quando falava, e ela se
dirigiu ao Gamliel e disse: “Eu sou a Shekhiná dos Judeus de
Caruaru, não duvide do que o seu Rav está afirmando sobre
você e não rejeite o que lhe é de direito, você realmente é muito
grande e eu mesma evolui muito com sua chegada, e sua
humildade é verdadeira e muito valiosa para este Mundo de cá
e por isso os segredos não te são ocultos, antes te são revelados
ao mesmo tempo que, tais segredos, são ocultados a outros de
aparência maior do que a sua”. E foi, por fim, emocionado o
Gamliel aceita os elogios que fiz enquanto ao mesmo tempo
ficou meneando a cabeça como se tivesse pedindo desculpas
por talvez ter sido de alguma forma insolente e ou
desrespeitoso, eu lhe indico por sinais de que está tudo bem e
a Voz se manifesta e lhe diz: “Você é humilde, mas às vezes
em seu interior você se convence desmedidamente, e por isso
Eu te ensino por medidas, mas chegará o dia em que você
crescerá e Eu poderei te falar mais abertamente”. E então, o
meu corpo se acalmou, e a presença do Gamliel foi se
desvanecendo, desvanecendo, até que foi embora.
Quando o Gamliel tomou ciência deste relato,
impressionado compartilhou-o com a Shoshaná, sua noiva, e
ela após ler todas estas palavras lhe disse: “Impressionante!
Parece até que era tu em pessoa, que estava lá conversando
com ele normalmente!” E o Gamliel lhe respondeu: “De fato,
não sei como uma coisa dessas é possível!”
E para mim o Gamliel disse: “Não há limites para o
Mundo Espiritual sem dúvidas! Muito obrigado por
compartilhar, Rav”.
45
Para o Moshé
46
trabalho místico foi feito utilizando-se alcatrão para prejudica-
lo e o seu desejo de tomá-lo estaria atrelado à vontade da
entidade enviada de se satisfazer nele, todavia, o mal que vi
neste processo foi expiado em mim, e se a Voz do Chá estiver
certa sobre isso também (e geralmente está), como diriam os
evangélicos: "Agora você está liberto", eu comuniquei para o
Moshé.
E foi quando o alcatrão saiu pela minha boca e se
dissipou no ar como fumaça foi que eu senti a presença do
Moshé, o seu espectro foi se materializando, se materializando
e o meu corpo agora era o Moshé e eu estava fora do meu corpo
em pé observando-o. Sentado na cadeira o Moshé me disse:
"Rav, eu lhe respeito muito e confio na sua palavra, e os meus
estudos não tem por objetivo lhe desmerecer, na verdade, o
objetivo é tentar me equilibrar, pois, temo me desequilibrar por
acreditar demais, desmedidamente nas suas palavras, por
favor, me perdoe por minha falta de equilíbrio. Saiba que o
senhor é meu amigo e eu confio muito no senhor". A isso eu
respondi: "Eu sei querido Moshé, eu sei. Não foi à toa que te
designei para ser um dos juízes dos Judeus de Caruaru, você é
o meu ponto de equilíbrio naquilo em que as minhas emoções
me cegam, sua postura e suas palavras prestam um importante
serviço para todos nós, não há o que perdoar. Todavia, eu que
lhe peço perdão por não conseguir expressar adequadamente o
quão valoroso você é para todos nós". Como ele insistia em se
desculpar pela sua falta de equilíbrio no tocante ao exagerado
apego aos meus ensinamentos e a insistência em buscar
conhecimentos outros para equilibrar este apego, foi-nos
permitido surgir o espectro do Makhnissel, ele se pôs ao meu
lado e disse para o Moshé: "Chaver, saiba que você não é o
único, eu também gosto dele demais, e me esforço para não
decepcioná-lo, e faço isso Chaver porque sei que o Adoni é
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sincero e verdadeiro conosco e entende as nossas limitações".
E foi após as palavras do Makhnissel que o Moshé se sentiu
menos desconfortável. E assim, satisfeito, sua presença foi se
dissipando, dissipando, até que por fim, foi embora de fato.
Moshé disse: Eita! Parece que realmente era eu lá.
Agora, em relação ao conhaque, chega me deu vontade de
tomar uma dose igual àquela, mas a partir de hoje me
esforçarei para não mais tomar.
Para o Chassid
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antigos, e o rosto do Chassid estava entre os que se
encontravam mais próximos de mim.
E foi quando comecei a identificar a aparência dos
rostos que a presença do Chassid se tornou mais forte e
concreta a cada instante que se seguia, e logo, o Chassid era o
meu corpo e eu estava fora de mim olhando para ele. Nesse
momento, a Voz me pediu que lhe dissesse algumas coisas que
ditou para mim e eu lhe disse em seguida, que foi como segue:
"O nome "Melo" é muito importante e poderoso para o Mundo
de cá, é um nome querido e muitos concorrem por obtê-lo, se
esforçam muito, pagam caro e nem sempre conseguem, é
através do nome "Melo" que as bênçãos desse Mundo chegam
até você, e você se safa das consequências ruins de suas
práticas reprováveis, não é por sua esperteza que você escapa,
mas porque o nome "Melo" está sobre você e Eu zelo por todo
o Melo do seu Mundo. Você está envergonhando e manchando
a reputação dos Melos..." e nesse momento surgem diante de
mim a minha face, a face da Flávia, a face do Kefa I, meu
primo, as faces de meus irmãos por parte de pai, e uma
infinidade de Melos conhecidos e desconhecidos se mostram
ao longe, alguns como que tomando o Chassid como exemplo
e outros o censurando. E a Voz que falava comigo continuou e
pediu que lhe repassasse: "...confie mais em Mim e menos em
você. Não está em suas mãos o seu sucesso, e não há liberdade
para você manter-se desviando-se do Bom Caminho para
sempre. O nome "Melo" te protege e te guarda, mas fará isso
por tanto tempo quanto Eu queira, pois, a Minha Vontade é
que você voluntariamente refine-se e evolua ao ponto de se
tornar digno do nome que carrega e que há anos afronta
despudoradamente". Ao ouvir estas palavras o semblante do
Chassid era de vergonha e de gratidão, de vergonha porque não
tinha como me ocultar nada, pois, já que ele era meu corpo não
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havia sentimento seu que me era oculto, gratidão por ter sido
merecedor de uma mensagem dessa natureza. Ele fez menção
com a cabeça indicando que compreendeu, depois baixou os
olhos passivamente e se desvaneceu como uma névoa, e o meu
sentimento foi como se eu soubesse que há nele
comprometimento verdadeiro com as instruções dadas e que
logo, logo, eu ouviria boas notícias a seu respeito, e assim sua
presença se foi de minha viagem.
Chassid disse: Shalom Rav!
Por coincidência, eu estava indo levar a minha esposa
no trabalho dela, e no caminho nós dois sentimos uma
sensação incômoda, como se algo ruim estivesse nos
acompanhando. Sim, todas estas palavras são muito
condizentes, eu tenho me sentido muito só Rav, tenho me
sentido agraciado e desprotegido ao mesmo tempo.
Para o Akiva
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sobre o que eu queria ter e não consegui, de maneira nenhuma
quis lhe tirar o que era seu, minha inveja me provocava na
verdade a ser como o senhor, a atingir o coração das pessoas e
elas sentirem por mim o que sentem pelo senhor, porém, eu
não soube como buscar o meu bem e acabei lhe fazendo mal.
Mas saiba que gosto muito do senhor, lhe admiro muito, o
senhor é sem dúvida uma boa referência para mim, só lhe peço
do fundo do coração: me perdoe?" enquanto ele me dizia estas
coisas eu senti suas emoções, pois, o seu corpo era o meu corpo
e não havia sentimento oculto para mim, seu pedido era sincero
e ele realmente estava com vergonha e sofria por conta do
ocorrido. Então, eu lhe disse: "Ó querido Chaver, eu já te
perdoei há muito tempo, eu já te perdoei desde a sua saída dos
Judeus de Caruaru. Saiba que sempre tive simpatia por você e
que sempre percebi o seu potencial para a grandeza, mas ao
invés de buscar crescer, o seu esforço foi para me diminuir
frente às pessoas que me consideravam, todavia, também sei
que você não fez estas coisas por puro mal, eu não entendi
exatamente o motivo pelo qual você estava fazendo aquelas
coisas, mas percebi que o seu objetivo era outro, apenas não
estava sabendo como persegui-lo adequadamente. Veja
Chaver; quando eu disse que você cresceu e se tornou capaz
de liderar eu não menti não, essa é realmente a minha
impressão sobre você, o problema é que em "cada terreiro
apenas um galo canta" e quando você se sentiu com alguma
força foi no meu "terreiro" que você resolveu "cantar", e
infelizmente nos Judeus de Caruaru não caberia mais os dois
juntos, ou eu ou você teria fatalmente que sair, e foi o que de
fato aconteceu. Mas veja; você tem potencial, você tem
condições de formar o seu próprio grupo, liderar a sua própria
comunidade se você for sincero consigo mesmo e com as
outras pessoas de todo o seu coração, pois, no Mundo
51
Espiritual isso está previsto, é algo potencialmente possível, só
dependendo de você para se materializar. A cidade é grande
Chaver, e os Judeus de Caruaru são limitados, esforce-se e
encarne a estatura que atingiu com os seus estudos e com a
Bênção Divina, faça valer apena toda a sua caminhada. Deixe-
me dizer-lhe: se você realmente se esforçar e organizadamente
conseguir montar sua comunidade, saiba que eu mesmo terei o
maior prazer em divulgá-la para o meu público, será um
imenso prazer vê-lo prosperar nos estudos e ensino da Torá
Yedid Chaver!" E foi ao ouvir minhas palavras que suas
lágrimas correram de seus olhos mais fartamente, porém, sua
feição era de alívio e de gratidão, e quando suas emoções se
abrandaram um pouco ele me disse: "Por favor Rav, quando
terminar a sua viagem, escreva estas palavras para mim. Eu
realmente preciso lê-las!" E eu, de minha parte garanti com
minha palavra dada que o faria. E foi quando eu lhe assegurei
que reportaria o diálogo que tivemos do Outro Lado que ele
adquiriu uma feição alegre e sua presença foi desvanecendo-
se, desvanecendo-se, até transformar-se em uma névoa e ir
embora.
Após reportar-lhe o relato acima, eu lhe disse: Shalom
Chaver! Esta é a parte da minha viagem onde você aparece, se
o conteúdo destas palavras faz algum sentido para você ou não,
eu não sei, mas por via das dúvidas resolvi cumprir com minha
palavra dada. Caso algo nas minhas palavras acima faça algum
sentido, por favor, me diga, isso me ajudará a perceber
aspectos mais profundos destas experiências místicas
promovidas pelo Mafteach Einêi-Shelomó, e se as palavras
não fizerem sentido algum, me diga também, pois, para mim
terão o mesmo valor de análise.
O Akiva então me respondeu: Shalom! Depois de ler e
reler, acho incrível um acontecimento como este! O fato maior
52
do ponto de vista sobre tudo o que ocorreu entre nós é que eu
cometi erros vergonhosos dos quais me arrependo
profundamente, e isso é verdadeiro quando até mesmo durante
uma experiência como está eu volte a te falar do quanto sinto
muito pelo que ocorreu e que me dói muito, toda a perca e o
tempo que eu permaneça afastado de você e de todos do grupo,
por imaturidade e resquícios da minha antiga mente cristã
(protestante) me fizeram ver e apontar erros que julguei como
se fosse um procedimento de comportamento de pastores, dos
quais não compete a um judeu, enfim, foi muito doloroso, mas
que à época e de acordo com as circunstâncias eu julguei tudo
do meu modo e tinha tudo por certo. Porém as proporções que
tomaram os fatos, eu não esperava, eles se agravaram muito, a
ótica sob as quais minhas palavras foram levadas e a maneira
como tudo isso chegou ao conhecimento, do qual não quero
mais contestação para que isso fique de vez no passado, o
Yechezkel cometeu alguns erros que cabe a ele consertar, por
isso também não o julgo nem quero, pois nesse ponto onde me
encontro hoje julgo que toda a culpa de fato foi minha por
pensar demasiadamente na capacidade de raciocínio dos
outros. O ponto aqui é entre você e eu, e, é nesse ponto que
quero focar.
Sinto muito por ter decepcionado muito você. Quanto
a mim, nunca foi mesmo a intenção de lhe enfraquecer ou
desqualificar e ou prejudicar todo esforço que o Sr. fez desde
que descobriu em si o que o Eterno, bendito seja, pôs no seu
coração. Essa centelha Divina que existe dentro do Sr. é linda,
forte e tem uma chama que é capaz de, pela luz da Torah,
iluminar muitas vidas que se aproximarem do Sr. e posso te
afirmar isso com convicção pois ela acendeu a minha vida que
hoje creio que havia apenas um pavio quase que apagado, o Sr.
me apresentou o verdadeiro Deus e me fez ver a beleza que
53
existe nos estudos das Escrituras, me ajudou a me descobri
como raiz de Israel e me deu um nome judeu que permanecerá
para sempre, e se ainda não o fosse suficiente se tornou para
mim um pai neste Mundo e no Outro. Posso lhe assegurar
firmemente que jamais quis assumir seu lugar, ou sua posição,
quando evangélico nunca aceitei cargos de liderança de
coordenação ou do que quer que fosse, nunca quis de alguma
maneira ter que comandar as ações de outras pessoas, digo isso
porque tenho temperamento forte e dificuldade de dizer aos
outros o que fazer ou não, e isso sempre foi um ponto tenso
para mim, então toda a parte de tristeza e arrependimento que
houve no diálogo é de fato o que sinto. Porém, a parte que
mencionou sobre querer usurpar sua posição, não, jamais quis
e acredito que jamais teria a capacidade de ocupar este lugar
que, para mim é tão alto, não conheci até hoje alguém que
tivesse tal dom de aprender e absorver, e esmiuçar tantos
pontos de estudos como o Sr., que é para mim a luz da Torah.
Nunca passou pela minha cabeça criar, fundar ou
administra uma igreja evangélica se quer, por exemplo na
igreja que fiz parte por mais de 6 anos nem presbitério eu quis
que me nomeassem, quanto mais diácono. Auxiliar uma
instituição sempre que possível o fiz de diversas maneiras,
inclusive no ministério de louvores. Mais, de liderar sempre
fugi! Quando no pouco tempo que estivemos nos reunindo na
casa do Nachmad, nunca me comportei como líder, sempre
levei o estudo da Parashá, pois sempre fui o que mais vezes fiz
os estudos diários, como os faço até hoje, e sempre tinha algo
assim no Shabat para compartilhar com os demais, além dos
familiares deles que também participavam convosco. Mas
jamais impus qualquer ponto ou situação que os demais se
ofendessem, isso o Sr. mesmo pode comprovar com cada um
deles.
54
Obtive durante esse tempo que estou ausente, de outros
rabinos que conheci, conhecimento diversificado sobre temas
que inclusive estudamos juntos, acredite! Muitos pontos
diferentes, como o Sr. mesmo sabe, a grande maioria, pra não
dizer 100% deles, eu ri comigo mesmo, lembrando dos seus
ensinamentos corretos e da máxima que sempre dizia:
"Procuro sempre ficar com o que mais faz sentido e se
aproxima da Torah". E assim, segui adiante. Por fim, meu
amigo, não sei se o Sr. se lembra, mas uma vez te pedi
permissão para que a todos que me perguntassem quem é meu
Rabino, que a minha resposta fosse sempre: O Rav Maorel!
Eu, quando estive aí na oportunidade do livro (do
lançamento d’As Muitas Vozes), aliás estou indo bem na
leitura, mais uma vez obrigado, não procurei tentar oficializar
o meu retorno de imediato, pois percebi que ainda não era o
momento. Não sei, HaShem sabe, pode ser impressão minha,
mas ainda havia um peso no ar dentro do coração da Sra.
Miriam, e com razão. Eu nunca, repito, nunca quis seu mal ou
do grupo e nem seu lugar, nem desmerece-lo, nem lhe
envergonhar, se o fiz, o fiz sem perversidade, Yeshua é minha
testemunha, pois sabe o que se passa no mais íntimo de cada
um de nós. Só te peço encarecidamente que tire do seu coração
a ideia de que nós dois não poderíamos fazer parte da mesma
mesa, compartilhar do mesmo pão e vinho, estudando na
mesma Torah, pois isso me deixaria muito triste. Eu sempre os
amei muito e jamais quis me separar de todos vocês.
Para o Shealtiel
55
estranho da viagem envolvendo o Moshé e uma garrafa de
conhaque de alcatrão, eu teria me conectado tanto com a
pessoa quanto com o espírito da bebida e ambos estavam
conectados por algum trabalho místico feito no passado para
atrapalhar a vida da pessoa mencionada.
Mal tinha terminado este processo, eu ouvi uma música
de reggae, uma imagem se plasmou devagar, era um boné de
reggae e o espírito da maconha veio surgindo como que
dançando no passo da música, e surgindo, se tornando a cada
instante mais presente e claro, e eu me perguntei: "Meu
Senhor, o que significa isso?" e o meu sentimento era de
escândalo, pois, que associação tinha eu com esta erva? E a
Voz me disse: "Ben HaAdam, a maconha é um mensageiro
Meu como qualquer outro, todavia, há nele suas
particularidades, ele não é de natureza má, mas se diverte em
ver os homens tropeçarem, e logo que consegue fazer alguém
tropeçar sente pena dele e o agracia com um presente tirado
dos tesouros que lhe concedi que possuísse". E eu pude sentir
o espírito da maconha como se fosse realmente uma pessoa, e
ele deu de ombros como querendo dizer: "É minha natureza,
eu sou assim, fazer o que? Mas gosto das pessoas e me divirto
com elas e elas comigo, se faço algum mal não o faço só, e se
faço algum mal não é por mal que faço, os homens também me
fazem tropeçar".
E enquanto eu me maravilhava com estas informações
e sensações e tudo o mais que só a experiência do Mafteach
Einêi-Shelomó é capaz de proporcionar, ainda o espírito da
maconha não tinha ido embora totalmente, eu me conectei com
o espectro do Shealtiel, sua presença foi se tornando mais forte
e perceptível e logo o meu corpo era ele e eu estava fora do
meu corpo em pé enquanto o observava sentado. Naturalmente
que fiquei muito surpreso com a visão, e me esforcei muito
56
para não querer entender a lógica daquilo naquele momento,
temendo atrapalhar o fluxo natural do fenômeno com minhas
questões. E então, o Shealtiel olhou para mim com reverência
e disse: "Rav, eu o tenho em grande consideração". E eu lhe
respondi: "Eu também lhe tenho em consideração Chaver". A
isso, a Voz me falou algumas coisas e me pediu que as falasse
para ele tanto durante a viagem quanto depois dela, e eu lhe
disse o que a Voz me ordenou que lhe dissesse, e foi o seguinte:
"Você Chaver, tem muito potencial, as pessoas prestam
atenção em você e isso é dom dos Céus, porém, você não o tem
utilizado adequadamente, você mente para você mesmo e
mente para as pessoas à sua volta. Há guardado para você um
amanhã glorioso, mas as suas mentiras não te deixam tomar
posse delas. Eu tenho orgulho e prazer quando te vejo no
amanhã, a luz e o brilho que você emanará aos corações e todas
bênçãos que advirão para você e para todos à sua volta por
conta disso são enormes. Mas, Eu preciso que você evolua e
cresça adequadamente, Eu não te dei presentes celestiais para
você enganar e usurpar lugares alheios abusando da boa-fé das
pessoas que te têm em consideração, na verdade, todos os
presentes que te dei foi para aliviar as dores dos corações, as
suas dores e as dores dos outros. Você é importante para Mim
Meu filho, e Eu espero pacientemente que você perceba isso
de forma adequada". Com lágrimas nos olhos ele me
agradeceu profundamente por todas as palavras, e me disse
novamente que tinha muito respeito e consideração por mim,
em seguida se comprometeu em evoluir e finalmente sua
presença se foi.
Após relatar-lhe o ocorrido, eu lhe disse: Esta foi a
parte da viagem que lhe correspondeu Yedid Chaver. Saiba
que não tenho nada nem contra e nem a favor da sua vida
particular, saiba que realmente o tenho em certa consideração,
57
e se não fosse por Força Maior eu não te comunicaria nada
destas coisas. Se estas palavras fizerem para você algum
sentido, por favor, me comunique, pois, estou estudando as
possibilidades das experiências com o Chá e sua opinião sobre
o que te escrevi servirá de valioso material de pesquisa. Até
agora, das quatro pessoas que me deram retorno sobre o que
leram ficaram impressionadas com a similaridade entre a
minha descrição deles e as suas personalidades reais. E se não
fizer sentido algum, por favor, diga-me também, suas palavras
terão o mesmo valor.
O Shealtiel me respondeu e disse: Rav! Tudo que lhe
foi revelado é pura realidade. Eu passei muito tempo mentindo
pra mim mesmo. Hoje eu me sinto perdido. Me encontro em
cima do muro; uma hora me volto à Presença do Divino, outra
hora me sinto um ímpio, vem muitos desejos no meu coração
e apesar de ser um cidadão de bem e temente a Deus, sinto uma
vontade enorme de me conectar com a maconha. Como sei que
entristecerei minha família, reprimo a vontade e me amparo no
álcool as vezes. Tenho tentado vender uma imagem de uma
pessoa de Deus, uma pessoa honrada, uma pessoa que é um
canal de Deus, mas nos bastidores me sinto acabado, devido
alguns erros que cometi lá atrás, alguns erros que me
atormentam, hoje tenho muita ansiedade e já pensei várias
vezes em tirar minha própria vida, esse é o sentimento que sou
levado às vezes a mergulhar. Sou muito grato a Deus, mas na
minha vida as coisas sempre foram bem complicadas devido
minhas escolhas, e nos meus momentos de solidão eu me
amparei na maconha sem ninguém saber, longe de tudo e
todos, só os Olhos do Divino me viam. Pensei várias vezes
tentar encontrar respostas para minha vida, o porquê de
cometer erros que refletem em outras pessoas, já desejei várias
vezes encontrar o sentido da minha missão, todas as vezes que
58
estou bem, focado, eu acabo deslizando em algumas áreas da
vida e fica como o senhor me viu, no chão, se lamentando,
depressivo. Pensei por diversas vezes, procurar respostas nas
igrejas, e até mesmo pensei em me comunicar com os mortos
através da magia, porém, sempre me veio o medo e o temor a
Lei do meu Deus. Vivi várias coisas esses últimos anos, meses
e dias. Irei me programar pra ir aí esses dias, gostaria de ter
uma prosa com o senhor. Bem, esse é meu relato, a única
pessoa que sabe de tudo isso é o senhor, percebi que O Eterno
me chama pra algo novo. Ontem Ele falou comigo aqui em
casa, me falou que quando Yossef foi vendido no meio de uma
nação, Ele mesmo encontrou Yossef, e Ele me disse ontem:
"Eu te encontrei". No mesmo dia em que O Eterno falou
comigo o senhor me mandou a mensagem que gostaria de
partilhar esta experiência comigo. Que HaShem te abençoe
meu mestre, obrigado por ser um arauto do Divino na minha
vida!
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60
Estudando o Conteúdo da Sétima viagem do Rav
E
sta minha sétima viagem foi distinta de todas as
anteriores sob vários aspectos: espectros de pessoas
vivas e mortas, bem como entidades impessoais se
revezaram para me pedir auxílio, me comunicar
coisas, me auxiliar em muitas questões tanto
pessoais quanto para benefício de outras pessoas, além ter sido
me pedido que ao retornar da viagem eu comunicasse para
cada pessoa correspondente ao seu espectro o que
conversamos durante o trecho da viagem onde eu e a pessoa
interagimos.
A Voz também me disse que a cada pessoa que eu
ajudasse eu ganharia presentes tanto materiais quanto
espirituais. Neste aspecto, não foi a primeira vez em que a Voz
me informa destas possibilidades e me faz tais ofertas, na
verdade, eu percebi ainda que indiretamente, este padrão surgir
em minha sexta viagem (que a Voz solicitou para mim e para
a Miriam Melo que não a registrasse, nem a minha e nem a
dela, que foi a sua segunda viagem com o Mafteach Einêi-
Shelomó), explicitamente este padrão me foi revelado nesta
minha sétima viagem e se repetiu na oitava, se mostrando de
maneira mais tímida em minha nona.
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Dentre as pessoas que me pareceram que auxiliei de
alguma maneira pouco tempo depois desta minha sétima
viagem, foi uma que me procurou (eu tive a impressão que a
Providência Divina a trouxe até mim) e que eu a conhecia
apenas superficialmente, e como essa pessoa não apareceu
durante a viagem com o Mafteach Einêi-Shelomó, mas
apareceu dentro do contexto revelado de “para cada pessoa que
você ajudar Eu lhe darei um presente”, e foi justamente isso
que aconteceu, então, aproveitarei este espaço para registrar
esta curiosa interação que resultou numa forte amizade e em
benefícios para ambos os lados, sendo, todavia, interrompida
de maneira trágica, uma fatalidade terrível dado o fato dele não
ter conseguido manter a frequência de seus pequenos ritos
diários que me foram revelados como Tikun para libertá-lo das
forças densas que o atormentava. Eu me refiro ao Dr. José
Carlos Rodrigues de Figueiredo, um advogado caruaruense,
filho do dono da Casa das Rendas que fica situada no centro
da cidade de Caruaru, próxima a Igreja Nossa Senhora da
Conceição, na mesma rua onde por muitos anos funcionou a
magnífica e famosa Feira de Caruaru, cuja famosa canção
interpretada por Luiz Gonzaga afirma que “de tudo o que há
no mundo tem na Feira de Caruaru”, restando apenas hoje em
dia um arremedo de outrora situado noutro lugar da cidade.
Haviam se passados alguns dias quando percebo
alguém tentando se comunicar comigo via WhatsApp, tentei
identificar quem era, dei uma olhada na foto do perfil e com
dificuldade pude me lembrar que já tinha tido contato com
aquele senhor no dia do casamento da Chulda, uma judia de
Caruaru, como o Felipe, ele foi um dos padrinhos deles, na
ocasião ele tinha “forçado” uma conversa sobre religiões, tinha
afirmado que era católico e médium, além de ser um judeu
genuíno, no decorrer da conversa ficou claro para mim que ele
62
era verdadeiramente católico, e o mais era fruto de sua
confusão interna promovida por questões que surgiram-lhe
devido aos fenômenos sobrenaturais que experimentara há
alguns anos para os quais ninguém lhe ofereceu uma
compreensão mais clara e coerente, restando-lhe nomear as
coisas do jeito que lhe veio à mente.
Na mensagem de WhatsApp ele me pediu ajuda, disse
que precisava conversar comigo pessoalmente, surpreso com
o contato inesperado lhe disse que; mesmo não sabendo em
que poderia ajuda-lo, todavia, não me importava de nos
encontrarmos para conversarmos pessoalmente sobre suas
questões. Combinamos de nos encontrar na minha casa. No dia
e horário combinado ele apareceu, convidei-o a entrar e nos
dirigimos para a sala de estudos. Lá, nos acomodamos, ele me
contextualizou sobre as impressões que teve de minha pessoa
após nossa conversa por ocasião do casamento da Chulda, e
por fim, me falou sobre os seus tormentos espirituais, enquanto
ele me falava sobre seus problemas e assombros, um fenômeno
inédito me acometeu: minha testa começou a manifestar um
incômodo, seguiu-se à isso uma sensação de molhado na testa,
entre os olhos, o molhado se transformou num cristal e o cristal
pareceu dividir-se ao meio, o lado esquerdo esquentou bastante
e o lado direito esfriou bastante, e um lado se contrapunha ao
outro. Ele continuou falando como se não tivesse percebido
nada de diferente em minha postura, e eu, de minha parte, me
esforcei por não manifestar nada estranho em meu
comportamento, e foi quando olhei para ele e o que vi foi: o
seu lado esquerdo ficou negro-avermelhado, enquanto o seu
lado direito ficou branco, quase reluzente.
Após ele terminar sua narrativa e exposição de sua
situação, que, por conta dos fenômenos que estavam me
acomentendo pouca coisa compreendi, ele finalmente pediu
63
minha opinião. Sem saber o que lhe dizer, resolvi ir direto ao
ponto: “Veja Sr. Carlos, eu não sei até que ponto o Sr. Poderá
crer no que vou lhe dizer, e já adianto que não precisa crer em
absolutamente nada do que pretendo lhe relatar, pois, na
verdade, mesmo eu não estou muito certo do quanto tais
informações são confiáveis, mas se o Sr. quiser, compartilharei
com o Sr. Mesmo assim” ao que ele ansioso me disse: “Claro
Rabino! Por favor, pode me contar, já vi muita coisa estranha
e, acredito, que pouco ou nada pode me assustar”, então
processegui: “Bom...” relatei para ele os fenômenos que me
ocorreram, e ele quis saber o que aquilo poderia significar,
após ponderar por um breve momento, resolvi compartilhar
com ele o meu parecer sobre os possíveis significados: “O Sr.
tem bom coração, é caridoso e se comove com o sofrimento
alheio, tem uma inclinação religiosa e uma certa sensibilidade
espiritual. Por outro lado, o Sr. tem uma vida desregrada, uma
conduta um tanto promíscua, um ínpeto violento, é ambicioso,
vaidoso e inconformado com sua realidade de vida atual”.
Espantado, ele me disse que eu tinha descrevido-o como se nos
conhecemos há muito tempo, e me perguntou como eu
consegui fazer aquilo, ao que eu me desculpei pelos
inconvenientes de minha fala e lhe confessei em seguida que
não fazia a menor ideia de como aquilo pôde ter sido possível,
restando apenas a crença nos Céus e numa Providência Divina
tomada no Mundo Espiritual visando o bem-estar dele.
Chegeui à conclusão também de que; por necessidade
de prosperar financeiramente a todo o custo, ele teria se
envolvido com pessoas erradas e por conexão emocional
acabou recebendo destas pessoas influências malignas,
entidades passaram a residir em torno dele, assombrando-o e,
vez por outra, roubando-lhe a consciência, o que levava-o a se
comportar de maneira violenta e vergonhosa, causando-lhe
64
muito sofrimento, constrangimento e dor, para e ele e para as
pessoas ao seu redor. Emocionado, ele me perguntou o que
poderia fazer para resolver o seu problema espiritual, eu nunca
tinha me deparado com algo assim, não sabia o que dizer, e foi
quando me esforçava por dizer algo que o ajudasse que me
veio como uma imagem de retroprojetor que saindo de minha
testa me mostrava coisas que ele deveria fazer e por conexão
emocional me instruía a instruí-lo, e assim o fiz, mesmo não
tendo controle algum de qualquer parte daquele inédito
fenômeno, eu lhe disse: “Veja; é esquisito, portanto, o Sr. Faz
se o Sr. quiser, mas caso queira, isso lhe será para o bem. Todas
as noites, antes de dormir, o Sr. deve pegar uma vela, encostar
no meio de sua testa, entre os olhos, e imaginar estas entidades
que lhe atormentam sendo presas dentro da vela, após alguns
minutos dessa forma, o Sr. deve preparar um lugar onde
acenderá a vela de modo que ela possa queimar por completo,
assim, as energias negativas que lhe atormentam evoluirão e
lhe deixarão em paz. Também deve pegar pequenos potes,
dentro deles colocar sal-grosso e um pedaço de canela em pau,
e dispor estes potes nos cantos de sua casa, trocando o
conteúdo por conteúdo novo uma vez por mês, queimando de
maneira respeitosa o conteúdo antigo e descartando-o
adequadamente. Em seguida lhe informei que ele deveria se
esforçar por melhorar a sua rede de contatos, evitar a
companhia de gente de vibração muito baixa, se afastar de
pessoas de conduta suspeita e se esforçar por levar uma vida
tão simples quanto possível, isso por sete meses, no final dos
quais ele estaria livre dos tormentos mentais que lhe tiravam o
gosto de viver, uma vez que, segundo ele, a fim de se livrar de
seus tormentos já tinha tentado se matar algumas vezes, graças
a Deus, sem sucesso.
65
Assim ele se comprometeu, e durante todo o tempo que
se esforçou por realizar os ritos prescritos de seu Tikun (termo
hebraico para “conserto” da alma), a sua qualidade de vida
aumentou muito, ele disse que estava dormindo como há muito
tempo não dormia, suas ideias estavam fluindo e sua percepção
da realidade nunca tinha sido tão positiva, é como se a vida
tivesse adquirido um colorido sobrenatural, os problemas não
pareciam tão sérios quanto outrora e as soluções para os
mesmos milagrosamente estavam surgindo, uma a uma,
soluções para problemas até então aparentemente insolúveis.
E quais foram os presentes que a Voz me prometeu que
eu ganharia após ajudar alguém? Bom, além de um grande e
eterno amigo, também ganhei terrenos para a construção da
Sinagoga dos Judeus de Caruaru, um projeto em 3D da
Sinagoga além de um projeto em planta impressa feito pelo
irmão do Dr. Carlos, Sr. Emanuel (se não me engano) que é
engenheiro civil. Os benefícios percebidos por ele quanto por
mim, fruto deste milagroso encontro promovido pelos Céus,
estavam surgindo e em curso, mas as seduções do mundo
natural são poderosas e o Dr. Carlos não pôde resistir
plenamente a todas, vindo a reincidir em alguns
comportamentos que tinha votado não mais praticar, e num
fatídico dia (18 de agosto de 2021) ele foi assassinado. Há
várias explicações que alegam hipoteticamente ter sido o
motivo daquela tragédia, mas, na minha opinião, como
acredito em Deus, nas Escrituras Sagradas e nas instruções
místicas dos Mekubalim, acredito que tal tragédia só se abateu
sobre ele pelo fato dele ter, por um motivo ou outro,
abandonado a proteção do voto que voluntariamente fizera
antes do prazo formalmente estabelecido, cumprindo nele
infelizmente a versículo que reza: “Quando fizeres algum voto
ao Senhor teu Deus, não tardarás em cumpri-lo; porque o
66
Senhor teu Deus certamente o requererá de ti, e em ti haverá
pecado” (Deuteronômio 23:21).
Nossas interações duraram pouco tempo desde o dia
em que ele me procurou para se consultar até o dia de sua
morte trágica, mas foi o bastante para vivermos bons e
memoráveis momentos, entre nós, os Judeus de Caruaru, o Dr.
Carlos ficou conhecido como o eterno Etz HaSadé (Árovre do
Campo), e pelas poucas vezes que o vimos em nossas viagens
místicas, foi justamente assim que o vislumbramos: como uma
frondosa árvore espiritual que situada em alguma esfera
celestial abriga alguns de nós ao partir deste Mundo para o
Outro, pelo menos foi o que percebemos ter acontecido com o
Betzalel e a Shelomit, que a paz esteja com eles.
Ainda à título de registro, durante o tempo em que ele
cumpriu rigorosamente o seu Tikun, alguns fenômenos
interessantes me acometeram. O primeiro deles se deu na
manhã do dia 11 de setembro de 2020, eu tive um nítido e
estranho sonho e em seguida, após acordar, tive uma visão.
Tentando encontrar respostas ou algum sentido que me
permitisse compreender alguma possível razão para aqueles
fenômenos, compartilhei o ocorrido com a Rabanit Miriam
Melo e depois com o Dr. Gamliel, e após ter percebido como
que chegado a algum lugar, compartilhei também com os
Judeus de Caruaru, dizendo:
Shalom Chaverim Yekarim!
Hoje de manhã, mais ou menos depois das seis horas,
tive um sonho pra lá de esquisito seguido de uma visão,
enquanto tomávamos o café da manhã, eu e Miriam Melo
ficamos conjecturando sobre os possíveis significados
daquelas informações, mas sem chegar efetivamente a lugar
nenhum. Foi quando eu me lembrei do Gamliel e resolvi pedir
que ele lesse os relatos dos fenômenos e, se possível,
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compartilhasse comigo as suas interpretações, e ele o fez, e foi
tão brilhante que resolvi compartilhar com todos por aqui.
O fenômeno se deu assim: Eu me percebi nem
dormindo e nem acordado, e a sensação foi como se estivesse
sonhando, porém, a percepção sensorial era muito nítida e
assemelhou-se muito às experiências do Mafteach Einêi-
Shelomó. Estávamos todos nós em Jerusalém, na parte nova
da cidade, e tínhamos chegado lá junto com uma caravana de
evangélicos, era como se uma grande instituição evangélica
tivesse bancado todas as nossas despesas e nós estávamos
acompanhando eles, havia uma rua enladeirada, estávamos
descendo dos carros que há pouco haviam estacionado, eram
bastante, e as bagagens da viagem estavam sendo retiradas dos
carros para serem colocadas dentro de uma casa, de frente a
ela havia um salão do tipo que os evangélicos gostam de fazer
os seus cultos. Eu percebi que os evangélicos queriam nos
colocar para trabalhar carregando as suas bagagens como que
nos forçando a compensá-los por termos as nossas despesas
pagas por eles, e eu olhei para vocês e resolvi carregar as
bagagens sozinho para não expor vocês a nenhum tipo de
humilhação e a viagem perder a graça por causa disso.
Por conta de eu estar carregando as bagagens sozinho
demorei muito tempo fazendo isso, e foi quando percebi que o
dia já declinava e todos se preparavam para irem passear
dentro da Jerusalém Antiga, a distância entre nós e a cidade era
grande de forma que todos resolveram ir de carro, e eu
continuei carregando as bagagens para dentro de casa, e foi que
eu me vi com o Chassid apenas, que no sonho foi identificado
como Del, foi quem ficou do meu lado até o fim, quando
terminei o céu já estava rubro e nós então fomos a pé em
direção ao restante do pessoal, em direção à Jerusalém Antiga.
No caminho passamos por uma feira de artesanato, e o Chassid
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me pediu para pararmos um pouco porque a irmã dele pedira
que ele comprasse nesta barraca específica alguns cordões de
colocar no pescoço para ela poder revender em Caruaru, e eu
concordei, a barraca era de madeira, bem simples com tábuas
gastadas pelo tempo, muito se assemelhava às barracas daqui
da Feira de Caruaru na parte das frutas e verduras, o dono da
barraca era um homem negro com tranças rastafári, para
vender realmente haviam muitos cordões artesanais de se
colocar no pescoço, mas o tipo que o Chassid pediu não tinha
mais, salvo um ou dois o que não servia porque ele precisava
comprar em grosso para revender.
Foi então que o vendedor disse para ele: "Veja; tem um
modelo aqui que talvez interesse, o pessoal tem comprado
bastante dele..." e se abaixando pegou de seu estoque debaixo
do banco de feira um pacote plástico transparente, dentro
haviam cordões artesanais pretos cujos ornamentos eram
compostos de sementes, conchas e pipoca de milho-alho, o
Chassid então disse quando viu os cordões: "Vixi!" e eu olhei
para ele meio constrangido porque ele pareceu desrespeitoso
com a crença alheia e lhe perguntei: “Qual o problema? Essa é
a viagem dele?” a isso o Chassid foi e comprou um pacote
daqueles cordões e nós seguimos adiante em direção à
Jerusalém Antiga.
Após caminharmos por um bom tempo chegamos
quando já era noite em um trecho do caminho que era
composto de ruínas, grandes pedras revolvidas, algumas casas
de gente pobre construídas em cima dos escombros e parte da
rua improvisada parecia um beco largo com bancos de praça
espalhados intercaladamente a fim de proporcionar descanso
para os fatigados que por ali passavam, ao perceber isso fui
comentar com o Chassid, quando olhei para trás ele não estava
mais ao alcance de minha vista, então pensei: "Será que ele
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andou muito rápido e chegou primeiro do que eu? Ou eu andei
muito rápido e o deixei para trás?" e fiquei na dúvida se
acelerava o passo para frente ou se percorria uma parte do
caminho para trás na ânsia de reencontrá-lo. Na dúvida, resolvi
me sentar em um dos bancos de praça, e enquanto me
encontrava sentado olhei para os muros da Antiga Jerusalém e
algo me dizia que eu deveria me hospedar em um hotel que se
encontrava justamente aos pés do muro da Cidade Velha, e
enquanto percebia estas coisas uma Voz do Alto me veio e me
disse: "Não entre em Jerusalém, permaneça longe dela.
Todavia, ore pela sua Paz". E assim o sonho acabou.
Despertei com minha esposa vindo deitar a cabeça no
meu ombro, e ao abrir os meus olhos senti vontade de lhe
contar o sonho, e foi o que eu fiz, e enquanto lhe contava outro
fenômeno se deu: De olhos, ora abertos e ora fechados, mas
acordado, me percebi dentro de um quarto branco sem mobília
alguma, salvo uma cadeira num canto da parede e sentado nela
um homem que aparentava ter uns sessenta e poucos anos, e
era essa a sua aparência; ele parecia um andrógeno, estava nu,
porém, com as pernas cruzadas de forma que não era possível
ver a sua genitália, as suas mãos estavam postas cruzadas em
cima dos seus joelhos, suas sobrancelhas eram grossas e em
baixo de seus olhos parecia que a maquiagem própria das
mulheres tinha-se borrado levemente, como se ele tivesse
chorado, sua pele era clara, seu cabelo estava cortado baixo,
seu cabelo era, como se diz aqui em Caruaru “cabelo ruim”,
porém, tinha sido cortado de maneira estilizado formando
sobre sua cabeça três triângulos e os espaços entre eles tinham
sido raspados, ao que me pareceu, na máquina zero.
Impressionado com o fenômeno me veio à mente o
Testamento de Salomão que você (eu disse para o Gamliel) me
passou em PDF, e resolvi experimentá-lo, então, procedi
70
segundo a minha lembrança da leitura do dito livro, e olhando
para a entidade perguntei-lhe: "Qual o seu nome? Qual o seu
ofício? E qual o poder que lhe sujeita?" a entidade olhou para
mim com um olhar que me transmitiu um misto de sentimentos
vindos dela; medo, tristeza, cansaço e ameaça, como se fosse
um bicho acoado. E pouco depois a entidade me disse sem
abrir a boca, como se sua voz se transmitisse pela testa: "Me
chamo Maracabeus, estou cansado de perambular pelo mundo
e busco um lugar para descansar as plantas dos meus pés".
Então, curioso com aquela interação resolvi me aproximar da
entidade, ao dar um ou dois passos em sua direção ela fez uma
ar de riso e me olhou nos olhos e me pediu: "Por favor, não se
aproxime, não quero lhe fazer mal", à isso então, não avancei
mais, e ela continuou a se apresentar, porém, não mais com
palavras mas agora com imagens e símbolos que de uma forma
que não sei explicar emanavam dela e eram parte dela, todavia
pairavam no ar de forma que eu podia ver claramente os seus
pensamentos como se estivessem fora dela diante dos meus
olhos.
E foi isso que ele, o Maracabeus, me mostrou: O seu
ofício era arruinar a vida dos evangélicos, pois, a conduta
hipócrita dos evangélicos muito o irritava e ele ficava à
espreita esperando o primeiro deslize para se apossar deles e
arruinar as suas vidas diante da sociedade, e a força que o
subjugava era o que a entidade em símbolos chamou de São
Arcanjo Miguel, e enquanto eu prestava atenção em suas
informações contava para minha esposa o que estava
acontecendo.
Enquanto a entidade se revelava para mim, me veio um
sentimento de curiosidade para saber como ela arruinava a vida
dos evangélicos, e foi como que a entidade pôde ler os meus
pensamentos e fez menção com a feição de que me revelaria
71
como isso se dava, e eu fiquei surpreso e prestei atenção
dobrada nos movimentos da entidade, e foi quando ela olhou
para o teto do quarto e lentamente começou a abrir a sua boca,
e sua boca se escancarou tanto que o seu queixo topava em seu
peito e o resto de sua cabeça encostava em suas costas, de sua
boca começou a sair muitas cobras, porém, elas não saiam de
tudo, antes pareciam ser parte de seu interior e foi-me
semelhante o comportamento das cobras saindo da boca da
entidade ao comportamento das cobras na cabeça da Medusa
como retratada no filme Fúria de Titãs o mais recente, e eu
fiquei realmente impressionado e resolvi olhar mais
detalhadamente as cabeças das cobras e umas tinham por
cabeças bocas sensuais de mulheres, com batom e tudo, e os
dentes eram brancos e bonitos e a impressão que passavam
eram que o seu hálito era bom, e as bocas se mexiam
freneticamente como que falando sem parar mas sem
compromisso com as palavras que proferiam, e eram sedutoras
e repulsivas ao mesmo tempo, e foi quando percebi que outras
cobras tinham como cabeças as cabeças completas de
mulheres, com cabelos e com feições bem definidas, também
falavam freneticamente e meneavam a cabeça e discutiam
entre elas e suas feições eram um misto de agradável,
desagradável, confusão, ira, ciúmes e toda uma convulsão de
emoções misturadas umas com as outras.
E essa era a forma que essa entidade que se apresentou
para mim chamada de Maracabeus adotou para se revelar. Ela
me disse que teria sido expulsa do Dr. Carlos por causa do
Tikun que lhe receitei, e que por conta disso ela era agora
minha responsabilidade. E então, ela me deu mais duas
instruções: Se eu quisesse retê-la comigo, deveria pegar um
paletó e pendurá-lo em uma parede onde ninguém fosse lá
mexer, acima do paletó eu deveria escrever o nome da
72
entidade, e quando fosse buscar os seus favores bastava que
em frente ao paletó colocasse uma mesinha e em cima dela
algum objeto pessoal da pessoa que eu desejasse que ela
atormentasse e acendesse uma vela com esta intenção, assim
ela faria o que pedi e depois voltaria a descansar no paletó. A
outra instrução foi: caso eu não a quisesse por aqui, eu deveria
segurar uma vela próximo à minha testa e mentalizar a
entidade "encarnando" na vela, depois acendê-la fora de casa
de forma que fosse permitido à vela queimar até o final, e
assim a entidade evoluiria e seguiria seu caminho em paz. E
assim, acabou o fenômeno.
Enquanto eu repassava tudo isso para Miriam Melo
enquanto tomávamos café, me lembrei de um sonho seu (do
Gamliel) que você nos contou há algum tempo atrás, que em
minha lembrança foi mais ou menos assim: Você sonhou que
aqui na Sinagoga era um dia de festa, a casa era a mesma,
porém, era bem maior, e havia muita gente, tanto do grupo
quanto de convidados, e no fim todos estavam se organizando
para dormirem por aqui, e foi quando alguém resolveu entrar
em um determinado quarto e eu, antes das pessoas abrirem a
porta, teria alertado dizendo: "Não abram a porta deste quarto,
pois, ai reside uma entidade que só respeita a mim, qualquer
um que entrar ai que não seja eu terá problemas". Acredito que
foi mais ou menos isso que você relatou, e se não me engano,
você disse que a entidade se revelou como Kolot Rabot. Você
lembra disso?
Ao que o Dr. Gamliel me respondeu dizendo:
Shalom Rav!
Bom, ao que me parece o “sonho” que o senhor teve é
um feedback do outro mundo sobre o efeito que sua obra, As
Muitas Vozes, tem tido neste mundo e consequentemente
refletido nas dimensões espirituais. Saiba que quem mais tem
73
comprado sua obra são de fato os evangélicos e o senhor os viu
no sonho viajando a Jerusalém. Isto porque o estudo do seu
livro tem feito com que eles saiam de sua zona de conforto em
muitos temas tidos por eles como intocáveis, estão pensativos
e possuem a mente entrando em outro grau de contemplação
das Escrituras, um grau mais elevado, por isso o senhor os viu
subindo até Jerusalém, elevando assim sua santidade pouco a
pouco. Nós, os judeus de Caruaru, fomos vistos junto com o
senhor como sendo patrocinados por eles pelo motivo de que
nosso nome está sendo propagado por todas estas pessoas
estranhas a nós. E, junto com eles também estamos ascendendo
a algo mais sagrado pelo simples fato de que existem muitas
pessoas estudando esta obra e isso é exemplificado pelo fato
de que viajamos de graça, às custas dos evangélicos, enquanto
estes pagaram não somente suas próprias passagens como
também a nossa. O senhor carregando as malas enquanto eles
fazem a viagem sozinhos possui o significado de que eles estão
prestando atenção à obra, mas não a seu criador. Eles não te
deram ainda o respeito devido, nem ao senhor e nem a nós, por
isso foram indiferentes quanto à nossa comodidade. O senhor
é visto trabalhando porque de fato o livro é resultado do seu
esforço e a maior indignação não é que eles não prestem
atenção em nós, os rebentos, mas no senhor o líder.
O senhor então é visto com o Chassid indo em direção
à cidade. Saiba que o Chassid e o senhor são uma coisa só, a
diferença é que o Chassid representa puramente seu senso
crítico que racionaliza tudo enquanto o senhor mesmo
representa puramente seu carisma e respeito pelo outro. O que
o senhor vê durante o momento da compra dos enfeites é um
conselho do seu eu amoroso e piedoso para o seu eu racional e
crítico, ríspido. E perceba que o produto é algo que não serve
nem a uma parte do senhor e nem a outra, é algo adquirido para
74
terceiros. Pois estas são as conclusões tiradas do estudo do
livro, daqueles que estão longe de nós. E ora as conclusões são
belas e têm sentido e ora são besteiras inúteis, mas mesmo
sendo besteiras inúteis devem ser respeitadas como algo
inerente ao processo. Como aquele que enquanto aprende a
andar de bicicleta inevitavelmente cai, seu esforço é louvável
mesmo que nem sempre acerte. Quando o senhor olha para trás
e se vê sem o Chassid, significa que neste momento a lição já
foi aprendida e agora as duas partes de sua mente tornaram-se
uma só.
Sentado no banco aos pés das sagradas muralhas, o
senhor recebe a mensagem divina de que deve acampar fora e
não deve lá entrar. Saiba que Jerusalém, como eu já disse
anteriormente, é o símbolo da elevação mental daqueles que
estudam sua obra. E o senhor é advertido a não interferir no
processo nem se preocupar de adentrar lá para guiar ninguém,
apenas a lembrar deles com amor e rezar por eles, para que
assim como Rabi Akiva entrou e saiu em paz eles assim
também o façam.
A entidade que lhe apareceu na visão, é para confirmar
ao senhor esta minha interpretação. Pois ela representa a
totalidade de entidades (perceba pelas muitas cobras) de
mesma classe que atormentavam as pessoas evangélicas que,
saindo da mediocridade pelo estudo de sua obra foram libertas
de seus demônios. Elas vieram até o senhor porque foram suas
palavras que as desterraram tirando-lhe suas moradas. Como
está escrito: E andará por lugares áridos, etc. (Mateus 12:43).
E, como foram com Rabi Yeshua a legião nos porcos assim te
pedem permissão para habitarem em determinado canto (que
muito lembra o quarto onde o evangélico pendura seu terno,
esta entidade lá morava na casa deles), assim como o inquilino
aparece para o agente que o deposita para fora de sua morada.
75
O nome com o qual ela se apresenta é um eufemismo de um
livro “apócrifo” que os evangélicos desconhecem a
importância que este possui para eles mesmos. Vivendo como
se este livro não existisse, mas não deixando de ser
influenciado por suas palavras em diversos meios diferentes.
Assim como esta entidade o era.
Admirado com a riqueza e profundidade das palavras
do Dr. Gamliel, eu disse: Puxa vida! Kol HaKavod! Como
você conseguiu chegar a estas interpretações?!
O Dr. Gamliel Oliveira me disse: Veja, as vezes alguém
me pergunta algo e depois ao ver a resposta eu mesmo me
admiro, como se isso não fosse de fato algo concebido por mim
e sim por algo muito superior. Este foi um dos casos onde senti
claramente isso, saiba que não pensei mais que alguns minutos
para escrever estás palavras. E eu nunca disse isso a ninguém,
é só uma impressão que tenho, sabe?
A isso, eu lhe disse: Impressionante! Que o Eterno,
bendito seja o Seu Nome, te conceda dar muitos frutos querido
Gamliel. B'Shem Yeshua HaMashiach. Amén.
E o Dr. Gamliel Oliveira agradeceu dizendo: Amén,
agradeço muito Rav! Mas estou besta com tudo isso que lhe
foi mostrado. O senhor é quase um profeta! Ver tudo isso de
forma tão clara?!
Aproveitei o momento e, como querendo explorar um
pouco mais de seu conhecimento místico, lhe perguntei: Se
estiver ao seu alcance Chaver, por favor, me fale um pouco de
sua percepção em relação às duas receitas que a entidade me
passou sobre como alguém deve mantê-la ou dispensá-la? Ou
seja; por que receitas aparentemente tão precisas? Seria por
ventura apenas ilustração sem maior relevância ou reside aí
alguma coisa a mais?
76
E o Dr. Gamliel Oliveira disse: Acredito piamente que
reside sim. Que ela não mentiu e neste momento está por aí
vendo que decisão o senhor tomará. Como a casa é muito
frequentada eu acho difícil que o senhor consiga criar ela aí,
então acharia mais sábio se o Sr. a dispensasse para que
ninguém se prejudicasse desavisadamente. Se possível antes
do Shabat, por causa do fogo. Ou o senhor arruma um jeito de
mantê-la em outro canto.
Por fim, eu lhe disse: Eu imaginei que você iria dizer
que estas informações não tinham relevância alguma, e temi
por isso, pois, para mim a entidade me pareceu bem real e suas
informações verdadeiras, porém, como ao contrário do que
pensei que você faria, você afirmou que, também de acordo
com a sua ótica, a entidade existe, seguirei então o rito para
dispensá-la como me foi revelado e de acordo com o seu
conselho.
E foi o que fiz. No dia 13 de setembro de 2020 procedi
de acordo com as instruções recebidas rogando aos Céus que
com misericórdia, paz e luz Maracabeus pudesse evoluir e
ascender aos lugares celestiais. Depois, comuniquei aos
Judeus de Caruaru o que fiz nos seguintes termos:
Shalom Chaverim Yekarim!
Aqui no Nordeste é parte da crendice popular e eu
aprendi isso de minha vó que consiste no seguinte, de acordo
com suas palavras: "Quando se acende uma vela para uma
aima penada e ela não aceita a vela, então, a vela começa a
chorar e no final fica toda a cera derretida feito um montinho
no lugar. Mas, quando se acende uma vela para uma aima
penada e ela aceita, a vela queima toda e é como se tivesse
sumido dali". Busquei retratar do mesmo jeito que minha vó
falava, e apesar do jeito simples e informal das palavras,
acredito que todos entenderam a explicação. Pois bem,
77
registrei o resultado final da vela que acendi de acordo com o
que foi-me revelado durante a visão e conversa com a entidade
Maracabeus. De acordo com a minha vó, pelo menos, a vela
foi plenamente aceita, Maracabeus evoluiu e subiu para planos
mais elevados do que aquele no qual se encontrava.
Passadas estas coisas, semanas depois, eu resolvi viver
a minha oitava experiência mística com o Mafteach Einêi-
Shelomó. A certa altura da viagem o Dr. Carlos me apareceu,
ele estava muito feliz e mergulhava em uma espécie de piscina
cheia de moedas de ouro, pedras preciosas e utensílios de ouro
cravejados de diamantes e ornamentados com tudo o que há de
mais belo e caro no mundo, era como se esta piscina fosse o
fundo de um gigantesco baú de madeira, as tábuas eram
negras, a tampa do baú estava entreaberta e a luz natural
penetrava timidamente dentro do baú o bastante para fazer com
que todo aquele tesouro brilhasse tanto que mais parecia um
céu dourado, o Dr. Carlos mergulhava no tesouro, enchia as
suas mãos de moedas de ouro e as jogava para cima e me dizia:
“Veja Rabino! É muita coisa! E eu vou repartir isso com o
senhor também!” e rindo mergulhava no tesouro repetidas
vezes. Para minha infeliz surpresa e confusão de rosto, pouco
tempo depois disso o Dr. Carlos foi assassinado. Refletindo
posteriormente sobre isso, me lembrei da passagem da Bessorá
HaKedoshá que nos ensina dizendo: “Se queres ser perfeito,
vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um
tesouro no Céu; e vem, e segue-me” (Mateus 19:21). O Dr.
Carlos era relioso, ainda que à sua maneira, e era também
muito caridoso, e foi quando me ocorreu que o que a Voz me
mostrou foi a sua recompensa no Outro Mundo por todo o bem
que ele fez para as outras pessoas neste mundo de cá.
78
Recorte primeiro – O Sacrifício Voluntário
79
preparar-se adequadamente para conversar com o Deus de
Israel, isso equivale a uma Terumá, uma oferta para a
promoção do diálogo entre Deus e o homem.
O termo “Oração” em hebraico é “Tefilá” está
aparentado com o conceito de refletir. Durante uma Tefilá o
indivíduo reflete mentalmente uma imagem de si mesmo no
Mundo Espiritual, e esta imagem vai se completando à medida
que ele vai tecendo sua oração palavra por palavra, e isso é
uma espécie de meditação, e quando uma Tefilá é realizada
com sentimento genuíno e profundo, pode atingir um grau de
complexidade e profundidade tal que pode promover uma
visão e ou uma profecia. Portanto, o ato de orar ou rezar,
quando feito adequadamente, é um meio de promover uma
viagem mística que permite vislumbrar os segredos do Mundo
Espiritual.
Sabemos que o corpo humano pode ser preparado para
ser utilizado pela Presença Divina como se fosse o Templo
Sagrado, todavia, vale salientar que esta possibilidade não
acontece de forma automática, requer do místico um esforço
consciente neste sentido, e todo este esforço do místico em
consagrar seu próprio corpo para ser utilizado por Deus como
um Templo é considerado no Mundo Espiritual como se o
místico estivesse oferecendo uma Terumá, que traduz-se aqui
em ofertar a si mesmo para o estabelecimento da Shekhiná
durante o tempo em que durar a viagem mística, e esta entrega
assemelha-se, em termos espirituais, às Terumot trazidas pelos
filhos de Israel a Moisés para a construção do Mishkan, a
Tenda da Reunião, o Tabernáculo.
Isso porque a Espiritualidade busca um “recipiente”
que possa tanto dar quanto receber. Para o homem receber a
Luz de Deus ele deve primeiro assemelhar-se a Deus e ser um
doador. Isto é realizado através do cumprimento dos
80
Mandamentos de Deus, o que provê alimento espiritual para
os universos espirituais. Este esforço em assemelhar-se a
Deus, no que diz respeito a uma viagem mística que é o tema
central desta obra, tornando-se assim primeiro um doador, é o
que os cabalistas chamam de “dar força a Deus”, como está
escrito: “Dar força a Deus é o dever de Israel Seu orgulho”
(Salmos 68:35 – texto hebreu).
Podemos concluir que tornar-se um recipiente
doador/receptor parece ser um conceito da Espiritualidade em
geral, pois, não há religião que não exija do fiel alguma forma
de sacrifício para estabelecer e manter a conexão entre o fiel e
a Divindade cultuada. Desta forma, neste ponto, o que é
verdadeiro para o Judaísmo, é verdadeiro para todas as
religiões que envolvem em suas expressões algo de místico.
E nas Escrituras Sagradas encontramos bases para
sustentar este conceito-chave nas seguintes passagens: Quando
Yitzichak Avinu plantou grãos em tempo de seca, enquanto
todos minguavam, ele, por conta de sua fé na Providência
Divina colheu cem vezes mais (Gêneses 26:1-12), quando o
Eliahu HaNavi instruiu a viúva, que não tinha mais nada para
comer senão apenas um pouco de farinha para uma única
refeição em um tempo de estrema miséria, ao consagrar a Deus
o pouco que tinha, o resultado desta Terumá (oferta) foi a
multiplicação milagrosa do alimento em sua casa que os
sustentou fartamente por três anos (1 Reis 17:9-16), coisa
semelhante aconteceu quando Elishá HaNavi também instruiu
outra viúva em uma situação parecida e o milagre se deu da
mesma forma (2 Reis 4:1-7). O Santo, bendito seja o Seu
Nome, garante que milagres semelhantes ocorrerão na vida de
todos aqueles que forem fiéis na prática do MeAssará
(Dízimo), acusando de “roubadores de Deus” todos aqueles
que negligenciam esta importante Mitzivá (Malaquias 3:8-12),
81
e na prática de Tzedaká. Este é o mesmo espírito da passagem
que registra o milagre obrado por Rabi Yeshua HaNotzeri
sobre a multiplicação dos pães e peixes (João 6:1-13).
Todas estas passagens têm em comum o fato de que
alguém alcançou dos Céus algo mais daquilo que já tinha,
mesmo que o que tinha era em pouquíssima quantidade,
todavia, precisou utilizar o que tinha, seja alguma capacidade
intelectual ou física, seja algo de seu mantimento e ou bens,
direcionando-os ao Serviço Sagrado, consagrando-os a Deus,
e somente após isso, após tornarem-se de alguma maneira
doadores foi que foram agraciados com bençãos, dons e
dádivas dos Céus, convertendo-se de doadores para receptores.
Rabi Yeshua HaNotzeri sintetizam este conceito da seguinte
maneira: “Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em
abundância; mas ao que não tiver até o que tem ser-lhe-á
tirado” (Mateus 25:29). E, consonante a isso, está escrito:
Também quando se recita o agradecimento a mesa não
deve estar vazia, dado que “nenhuma benção pode
repousar sobre uma mesa vazia”, como se ensina com
frequência nas palavras, “Diz-me, o que tens em casa?”
(2 Reis 4:2); em uma palavra, as bençãos celestiais só
pousam sobre um lugar que é completo.
Esotericamente isto se expressa nas palavras: “Eu ei
posto Sabedoria no coração de todos os que são de
coração sábio” (Êxodo 21:6), quer dizer “ao que tem
lhe será dado”, e também nas palavras: “Ele dá
sabedoria aos sábios” (Daniel 2:21). O símbolo de tudo
isto é a mesa do “Pão da proposição” (Êxodo 25:30),
porque está escrito: “E sobre a mesa porás o pão da
proposição perante a Minha Face perpetuamente”
(Zohar, Parashá Terumá, V.4, p. 759).
“O Santo, bendito seja Ele, só dá Sabedoria para quem
tem sabedoria, pois está dito: “Ele outorga Sabedoria ao
82
sábio e conhecimento aos entendidos” (Talmud da Babilônia,
Tratado Berakhot 55a).
“Abri vossos ouvidos e Eu falarei convosco. Dai-Me
vossas almas para que Eu também possa dar Minha Alma a
vós” (Odes de Salomão 9:1).
83
tomar o Yud, que é o décimo, como uma oferenda
elevada para torna-la sagrada. Como sabemos que o
décimo é sagrado? Porque está escrito: “O décimo será
sagrado para Deus” (Levítico 27:32). O que é sagrado?
Aquilo a respeito do qual está escrito: “E as primícias
de todos os primeiros frutos de tudo, e toda a oblação
de tudo, de todas as vossas oblações, serão dos
sacerdotes; também as primeiras das vossas massas
dareis ao sacerdote, para que faça repousar a bênção
sobre a tua casa” (Ezequiel 44:30). Além disso, está
escrito: “O princípio da sabedoria é o temor a Deus”
(Salmos 111:10). Não leia “é o temor”, porém, “e o
temor”. O versículo, então, dirá: “O princípio é a
Sabedoria e o temor a Deus” (Bahir 103).
A letra Yud está gravada no início do mais importante
Nome Divino, que é composto de quatro letras. Também é a
primeira letra no Nome Divino contraído (Salmos 68:4 /
Tehilim 68:5), que por revelação recebeu David HaMelekh a
fim de poder pronunciá-lo sem incorrer na quebra da Mitzivá
de não pronunciar o Nome de Deus em vão (Êxodo 20:7).
Dessa maneira a letra Yud participa da energia criativa do
Divino, pois, é através deste Nome Divino específico que o
Mundo é sustentado. A letra Yud é, portanto, a letra da Vida
mesma! Ela pode ser vista impressa no interior das sementes,
no formato dos espermatozoides dos humanos e dos animais,
testemunhando que toda a vida brota de uma mesma fonte, por
isso os germes de suas sementes têm um mesmo formato,
diversificando sua matéria e forma apenas na medida que
forem baixando e se materializando neste Mundo Físico (As
Muitas Vozes, 2020, pp. 93-94).
Quando alguém se entrega em uma viagem mística,
esta entrega caracteriza uma Terumá, e esta Terumá é
comutada pela Espiritualidade como um Korban, e este
84
Korban é composto do Dízimo Espiritual, MeAssará em
hebraico, que significa o “Yud” entregue pelo viajante aos
Mundo Superiores, e este “Yud” nada mais é do que o décimo
da força vital do viajante, a mesma força vital que lhe permite
viver, procriar, realizar suas tarefas neste nosso Mundo Físico,
um décimo desta força vital é requerido pela Espiritualidade
para regar com ela as entidades que dela necessitam e anseiam.
Sobre isso é dito que o místico está transmitindo luz e sustento
para outros universos (Meditação e Cabalá, 2005, p. 218). Esta
é a origem do cansaço e enfado do viajante durante ou após a
sua viagem mística.
Rabi Yeshua HaNotzeri ensinou:
“Os anjos, assim como os profetas, virão junto de vós
e vos darão o que vos pertence. E vós, também, deveis dar-lhes
o que tendes nas mãos e perguntai a vós mesmos: Quando virá
o dia em que receberão o que é deles?” (Tomé, Logion 88).
É consenso entre os Judeus de Caruaru que toda viagem
mística (independente da chave de acesso) começa “por
baixo”, quer dizer; equivale a um homem que se esforça por
jogar uma pedra para longe, primeiro ele baixa a mão
bruscamente procurando impulso, depois lança a pedra adiante
com toda a sua força, da mesma maneira, quando o espírito do
místico adentra às esferas espirituais o que primeiro lhe ocorre
é uma sensação de ser sugado para baixo, para os mundos
inferiores para depois ser lançado em direção aos mundos mais
elevados. E é durante esta permanência nos mundos inferiores
que o místico terá contato com entidades baixas, necessitadas
de todo o tipo de ajuda e recurso e elas tomarão a sua parte
durante a viagem do místico de um jeito ou de outro.
Quando alguém desavisado adentra em uma esfera
assim tenderá a se assustar e sua vibração desarmonizada
causará desconforto tanto para ele quanto para as entidades que
85
se aproximarem, e é em momentos assim que o risco da
fragmentação da mente do viajante aumenta, o que poderá se
traduzir no nosso mundo como sintomas de loucura,
esquizofrenia e coisas do tipo. Isso porque este processo
equivale a uma espécie de cirurgia delicada, porém, com o
paciente desperto, caso ele não relaxe sujeitando-se
passivamente ao processo o seu espernear poderá provocar que
o médico corte ou perfure algum órgão ou parte delicada do
corpo, o que resultaria, de acordo com esta hipótese,
obviamente numa lesão cujas consequências poderiam ser
graves.
Este MeAssará espiritual que o viajante deve entregar
à Espiritualidade não é apenas para benefício de entidades
baixas, mas para o seu próprio benefício, pois, equivale a peles
mortas do corpo que os peixes beliscam enquanto alguém toma
um banho seja de mar, seja de rio. Trata-se de matéria
excessiva como as unhas ou cabelos por cortar, em certa
medida se assemelha também ao doar sangue, estes são
expedientes que, apesar dos incômodos, é sabido os seus
benefícios para a saúde do doador além da promoção de um
bem maior através da doação realizada. Nesta condição o
viajante está fazendo as vezes de um Tzadik (um justo) que
une todos os mundos no mistério de Kabetzel ()קבצאל, que
significa “Reunião de Deus” (2 Samuel 23:20).
Na maioria dos casos, uma vez imerso em uma viagem
mística, doar este MeAssará espiritual não é uma opção, ele
lhe será tirado por bem ou por mal, aconselha-se, portanto, que
o viajante tenha plena consciência do que está fazendo e pelo
que está passando e doe o seu MeAssará voluntariamente e sua
boa vontade será recompensada com presentes espirituais
extra. Há casos, porém, que a Espiritualidade leva o pedido do
viajante em consideração no sentido de não querer
86
experineciar esta parte baixa da viagem, mas o preço a se pagar
por isso é o comprometimento da própria viajem, uma vez que
equivale a se jogar uma pedra sem tomar impulso para baixo
antes de lança-la longe.
Na quarta viagem do Chassid Melo (se não me
engano), ele conversou comigo antes de tomar o Chá sobre esta
possibilidade, me perguntando: “Rav, eu quero viver a viagem,
mas não gostaria de passar pelas zonas espirituais baixas.
Existe algum meio de se evitar isso?” ao que lhe respondi:
“Veja Chaver, como bem sabemos, toda viagem começa por
baixo, e me parece que viver esta parte da viagem é inevitável,
mas também percebi que a Voz considera nosso desejo até
certo ponto, talvez seja possível, caso você deseje de todo o
coração, alcançar a dádiva de viver uma viagem sem ter que ir
para as zonas espirituais baixas”. Então, ele resolveu tomar o
Chá, mas antes pediu a Deus, em uma prece espontânea com
muita Kavaná, a dádiva de não visitar as zonas espirituais
baixas, após isso fez a Brakhá SheHaKol e tomou o Chá.
Minutos depois os efeitos da viajem se fizeram visíveis, eu que
estava velando por ele fiquei ansioso para saber o que ele já
poderia compartilhar comigo, e foi quando prestei atenção em
sua feição que percebi um quê de espanto e frustração, e ao
indaga-lo sobre isso ele me disse: “Rav, uma Voz feminina
surgiu e me disse que; como eu me recusei ir para baixo,
deixando o equivalente a um estádio de futebol cheio de gente
me esperando, eu não seria digno de ver nada, toda a minha
viajem se resumirá em ouvir e sentir algumas poucas
sensações”.
Desta forma, comparando uma coisa com a outra, seja
pelo bom e pelo mal exemplo, percebi como verdadeiras as
palavras de São Francisco de Assis quando disse:
87
“Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa Paz.
Onde houver Ódio, que eu leve o Amor, onde houver Ofensa,
que eu leve o Perdão. Onde houver Discórdia, que eu leve a
União. Onde houver Dúvida, que eu leve a Fé. Onde houver
Erro, que eu leve a Verdade. Onde houver Desespero, que eu
leve a Esperança. Onde houver Tristeza, que eu leve a Alegria.
Onde houver Trevas, que eu leve a Luz! ... Pois é dando, que
se recebe. Perdoando, que se é perdoado e é morrendo, que se
vive para a vida eterna!”
Entregar o MeAssará espiritual voluntariamente é uma
oferenda de paz, pois, une todos os mundos e todas as
entidades que habitam neles em torno de um só altar, a saber;
o corpo do místico. Esta reza de São Francisco de Assis
coaduna muito bem com o que afirmam os nossos Sábios,
quando dizem que Deus ama as oferendas de paz mais do que
as outras (Sefer HaZohar, Parashá VaYikrá, V. 4, p. 924).
88
tamanho de uma moeda de um real, a mancha estava mais
funda do que a pele em volta, sua aparência era lustrosa e
úmida. Temendo ir para o médico tentei resolver o problema
em casa mesmo, usei pomadas, cremes, compressas, tomei
comprimidos antinflamatório e nada, tudo se mantinha da
mesma maneira incômoda.
Semanas se passaram e o quadro parecia cada vez mais
preocupante, até que a Rabanit Miriam Melo vendo que não
conseguia me convencer de ir a um médico, resolveu suplicar
aos Céus por ajuda e buscar de Deus uma solução para aquele
problema, e dia a dia ela rogou a Deus por ajuda, por cura.
Passaram-se dias desde que ela resolveu suplicar a Deus em
meu favor, e numa noite ela sonhou, e em seu sonho um
Maleakh (um anjo) se dirigiu a ela dizendo: “Recorte numa fita
azul uma letra Shin e a cole em uma fita vermelha, depois
amarre na perna direita dele, mantenha-a lá até que ela ou caia
por conta própria ou vocês a tirem em Yom Kipur, e o pé dele
sarará de seu mal”. Na manhã que se seguiu à noite do sonho,
enquanto tomávamos o nosso café da manhã, ela me contou o
ocorrido e nós concordamos em atender às orientações do
mensageiro celestial o quanto antes, e assim o fizemos. Dias
depois eu resolvi viver minha sétima experiência com o
Mafteach Einêi-Shelomó, e foi quando a Voz me falou sobre a
cura plena de meu pé, e após a viagem mística, alguns dias
depois o pé amanhceu plenamente curado; a mancha tinha
perdido o seu brilho, ela se encontrava na mesma altura que a
o restante de minha pele, não coçava mais e a fita vermelha
com a letra Shin azul nela tinha misteriosamente saído de
minha perna completamente, se encontrando em cima da cama
um pouco distante do meu corpo, e foi assim que fui curado do
mal que me acometeia. Hoje em dia, nem mesmo a mancha no
89
pé, como sinal de que houve um problema alí, não se encontra
mais. Todá LaEl! Todá Rabá!
90
Sobre Adam
91
Na mentalidade popular, o erro de Adão e Eva, o seu terrível e
mortal pecado, não teve a ver com o comer do Fruto Proibido
– geralmente imaginado como sendo uma maçã – mas, teve a
ver na verdade com a desobediência, ou seja; esse caso se
assemelhou a um pai que querendo educar o seu filho disse
para ele: “Brinque com todos os seus brinquedos, menos com
aquele carrinho ali, nele nem sequer toque”, não havia
problema algum em tocar no carrinho ou brincar com ele, o
menino não iria se machucar, mas o pai precisou ensinar-lhe a
respeitar suas ordens, mas como a criança não conseguiu num
primeiro momento compreender os fundamentos daquela
importante lição, o pai ao perceber a criança brincando com o
carrinho disse-lhe: “Quem te disse que você poderia brincar
com este carrinho?” Em seguida deu-lhe uma boa surra e tirou-
lhe todos os outros brinquedos que até então lhe era permitido,
mantendo-o de castigo dalí pra frente por tempo
indeterminado.
É lógico que a dramática História da Humanidade não
poderia começar de maneira tão infantil e boba!
Para a alegria e satisfação dos amantes das Escrituras
Sagradas que se esforçam por enxergar as coisas para além de
suas aparências exteriores, a história é bem outra.
“Quando vejo os Teus Céus, obra dos Teus dedos, a
lua e as estrelas que preparaste; que é o homem mortal para
que te lembres dele? e o filho do homem, para que o visites?
Pois pouco menor o fizeste do que os anjos, e de glória e de
honra o coroaste. Fazes com que ele tenha domínio sobre as
obras das Tuas mãos; tudo puseste debaixo de seus pés”
(Salmos 8:3-6).
A história original do Homem está entrelaçada com a
história original dos próprios anjos, pois, antes que o homem
fosse formado do pó da terra ele era feito de uma substância
92
intermediária que nem é matéria e nem é espírito, é algo entre
uma coisa e outra. Os nossos Sábios discorreram sobre esta
substância da seguinte maneira:
Foi por isso que Ele criou uma combinação metafísica
universal e abrangente, não exatamente física, embora
no limiar do físico, mas também não espiritual. Dessa
substância se desenvolveram todas as numerosas
criaturas físicas dos mundos inferiores e outro
composto espiritual, a partir do qual se desenvolveram
os seres espirituais dos mundos superiores (Abarbanel,
V. 1, p. 6).
Nachmânides explica que Shamáim, ao ser mencionado
no primeiro versículo da Torá, refere-se ao espiritual,
àquilo que está acima dos corpos celestes, ainda mais
elevado do que a Mercavá. É o nível indicado nas
palavras do versículo: “Acima das cabeças da Chaiá
havia a semelhança de uma expansão, como a cor do
gelo terrível espalhado de cima sobre as suas cabeças”
(Ezequiel 1:22). É esse também o sentido do dito: “Ele
cavalga pelo céu em tua ajuda etc” (Deuteronômio
33:26).
...
Sua interpretação, portanto, é bastante óbvia – que a
palavra Shamáim, conforme mencionada aqui no
primeiro versículo da Torá, não se refere à atmosfera
superior nem aos corpos celestes que orbitam nas suas
órbitas prescritas e estabelecidas por Deus, mas aos
intelectos espirituais (anjos) que circundam o Trono
Divino da Glória. Há, certamente, muitos níveis
diferentes para esses intelectos espirituais, categoria
após categoria. A categoria mais alta de lacaios é
representada pela palavra Shamáim. ...Temos então que
Shamáim se refere tanto aos corpos celestes em órbita
quanto aos intelectos puramente espirituais que são
93
comumente chamados de anjos. A Torá, então, fala no
primeiro versículo sobre as criações cósmicas
superiores, tanto físicas quanto espirituais... por que
Shamáim é usado tanto para seres físicos quanto seres
espirituais? ...é que os intelectos espirituais realmente
servem como força motriz e alma dos corpos celestes.
Isso, de acordo com o filósofo grego Aristóteles. Sendo
assim, podemos agora dizer que tanto Maimônides
quanto Nachmânides estão corretos nas suas
interpretações de Shamáim, se as combinarmos. Os
nossos Sábios também parecem apontar para isso em
um dito do Midrash: “O Rav diz que Shamáim é um
acrônimo para Esh e Maim (fogo e água); o Rabi Aba
Bar Cahana diz, em nome do Rav, que o Santo Deus
misturou fogo e água e dessa combinação formou o
Shamáim” (Bereshit Rabá). ...O que ele quis dizer foi
que o conceito de Shamáim é uma combinação do
espiritual com o material. A natureza física dos corpos
celestes o Rav chamou de “água” e a inteligência
espiritual ele chamou de “fogo”. Podemos citar várias
fontes bíblicas onde os anjos são chamados de
entidades de fogo, a exemplo do Salmos 104:4.
O Rabi Aba Bar Cahana foi um passo além ao dizer que
o Santo Deus mesclou-os até formarem uma mistura
única – os corpos celestes físicos somados à
inteligência espiritual que os dirigem e os mantêm nas
suas órbitas -, e foi esse composto único que a Torá
chamou de Shamáim. É interessante notar como no
Talmud os nossos Sábios relacionaram os anjos com
Shamáim: “O Rabi Shemuel Bar Nachmani disse que
cada palavra que emanou da boca do Santo Deus um
anjo foi criado, conforme está escrito (Talmud da
Babilônia, Tratado Chaguigá 14a / Samos 33:6): ‘Pela
Palavra do Senhor o Shamáim foi feito etc’”
(Abarbanel, V. 1, pp. 32-34).
94
Agora com esta informação em mãos devemos ler o
relato da Criação do Homem com atenção em seus detalhes, e
ao fazer isso seremos obrigados a concluir que o Adam do
capítulo um, não pode ser considerado como um homem no
sentido que o concebemos hoje em dia, isso porque o Adam do
Gênesis 1:27 era um ser sem corpo de carne e osso, ele era
mais como um espírito, semelhante a Deus. Apenas no capítulo
2 é que o texto informa: "E formou o Senhor Deus o homem
do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o
homem foi feito alma vivente" (Gênesis 2:7). Perceba que;
enquanto no capítulo 1 é dito que Deus criou o homem, no
capítulo 2 Deus lhe dá forma. E é somente a partir do capítulo
2 que podemos imaginar Adam como comumente ele é
imaginado, antes não.
Nas palavras do Rabino Abarbanel, que a paz esteja
com ele:
Da mesma forma, não vemos nenhum problema
quando, na criação do homem, a Torá emprega a
expressão “e criou” (Gêneses 1:27), pois lá ela
descreve a criação da alma no seu nível mais alto, que
é o poder de inteligência que foi criado do nada por
Deus. Ela não se refere ao corpo, que foi criado Yesh
MiYesh da terra. Para a criação do corpo, a Torá usa
uma expressão diferente – “e formou” (Gêneses 2:7) -,
indicando que Deus formou o homem do pó do chão
(Abarbanel, V. 1, p. 12).
No mesmo trecho de Gêneses 1:27 que alguns pensam
se tratar do que parece ser a primeira mulher de Adão, o texto
hebreu não traz "homem e mulher os criou" como infelizmente
está traduzido na maioria das Bíblias cristãs, mas antes está
escrito assim: "macho e fêmea os criou" - ָזכָר ּונְ קֵּ בָ ה בָ ָרא אֹ תָ ם
- percebeu? "Macho e Fêmea" e não "Homem e Mulher", isso
95
porque o conceito de homem e mulher como se conhece
comumente só surge no capítulo 2 do Gênesis.
Existe uma obra judaica chamada: O Alef-Bet de Ben
Sira, é um livro que foi escrito por Yeshua Ben Sira, o filho do
Profeta Jeremias. Neste livro ele conta sobre a origem de Lilit,
cujo o nome explícito é citado nas Escrituras Sagradas apenas
uma única vez (Isaías 34:14 – texto hebreu), em seus
pormenores. Segue abaixo parte deste relato:
Quando o Santo Abençoado criou o primeiro Adão
sozinho, eles disseram (Os anjos designados para a
cura: Sanoy, Sansanoy, Semangalof): (Gênesis 2:18)
“Não é bom para este Adão ficar sozinho” Eles criaram
para ele uma companheira fora da Terra, como ele
havia sido, e a chamaram de Lilith. Imediatamente eles
começaram a desafiar um ao outro. Ela disse: 'Não vou
me deitar embaixo', e ele disse: 'Não vou me deitar
embaixo de você, mas apenas no topo. Pois você só está
apta para estar na posição inferior, enquanto eu devo
ser o superior' Lilith respondeu: 'Somos iguais um ao
outro na medida em que fomos ambos criados a partir
da Terra!' (de acordo com o segredo de Merachefet
(Gêneses 1:2) e do “vapor que subia” (Gêneses 2:6))
Mas eles não quiseram ouvir um ao outro. Quando
Lilith viu isso, ela pronunciou o Nome Inefável e voou
para longe no ar do mundo. Adão ficou em oração
diante de seu Criador e disse: 'Soberano do universo! A
companheira que me destes fugiu para longe de mim.'
Imediatamente, o Santo Abençoado enviou estes três
anjos (Sanoy, Sansanoy, Semangalof) para trazê-la de
volta. O Santo Abençoado disse a Adão, 'Se ela
concordar em voltar, está bom. Se não, ela deve
permitir que cem de seus filhos morram todos os dias.'
Eles partiram e a perseguiram, e a alcançaram no meio
do mar, nas águas poderosas onde os egípcios
96
acabariam por se afogar. Eles lhe disseram a palavra de
Deus, mas ela não quis retornar. Os anjos disseram:
'Nós te afogaremos no mar.' Ela lhes disse: 'Deixem-me
em paz. Fui criada apenas para causar doenças aos
bebês. Tenho domínio sobre eles por oito dias após o
nascimento, se forem homens, e, se forem mulheres,
por vinte dias após o nascimento.' Quando os anjos
ouviram as palavras de Lilith, eles insistiram em levá-
la, mas ela lhes jurou pelo nome do Deus Vivo e
Eterno: 'Sempre que eu ver vocês, ou seus nomes, ou
suas formas em um amuleto, não terei poder sobre os
bebês.' Ela também concordou que cem de seus filhos
morressem todos os dias (Otzar Midrashim, O Alef-Bet
de Ben Sira 34).
Este Midrash nos ensina que Adam era um vento a
soprar no mundo, como Deus no Universo (pois Adam foi
criado “a Imagem de Deus”, e Deus é como um espírito, como
o vento – João 4:24). Quando por ordem Divina Adam teve
que baixar sobre os animais, como Deus ordenara, a fim de
subjugá-los e governá-los, ele bifurcou seu espírito em uma
contraparte feminina. Isto porque Adam precisava dominar de
dentro para fora as criaturas do mundo, assim, como macho ele
dominava os machos e em sua contraparte feminina ele
dominava as fêmeas. Naquela época, o cio dos animais ocorria
à noite, então Adam incorporava nos animais e promovia entre
eles o desejo da cópula, a fim de assim promover a reprodução
das espécies. Pelo fato de o cio dos animais sempre ocorrer a
noite, a contraparte feminina de Adam foi chamada de Lilit,
que consiste da contração da palavra Lailá ( )לילה- noite em
hebraico - e ela adquiria sempre uma consciência autônoma à
parte de Adam todas as vezes em que este fenômeno ocorria.
Certa vez (de acordo com outra opinião), Lilit, enquanto os
animais copulavam, questionou Adam, dizendo: "Porque você
97
tem sempre que ficar por cima e eu por baixo, visto que somos
feitos da mesma essência?" Adam não prestou a devida
atenção, e nem percebeu o quão importante era para ela esta
questão e simplesmente respondeu: "Porque fomos criados
assim, eu para estar por cima e você para estar por baixo."
Diante desta resposta, Lilit se enfureceu, invocou o Nome
Divino e abandonou o mundo da matéria, desequilibrando
assim toda a criação que tem por base de sua existência um
conceito dual macho e fêmea. Então, o Eterno, bendito seja, a
condenou a vagar para sempre sem materializar-se e ainda a
condenou a perder cem filhos todos os dias, de forma que,
quando Adam adquiriu seu corpo físico, Lilit o visitava em
sonhos e o provocava sexualmente a fim de extrair dele a sua
semente e gerar filhos com ela. Dali pra frente, Lilit se tornou
responsável pela promiscuidade do mundo, e é por este motivo
que entre os judeus a masturbação é proibida, pois, a cada
semente dos homens que é desperdiçada, Lilit as toma e delas
gera filhos para atormentar a humanidade.
O Zohar, comentando a Parashá Bereshit, nos informa
que Lilit vaga pelo mundo afora, e que na antiguidade ela
gerou de Adam a muitos espíritos acusadores, como está
escrito: “Em um livro antigo encontrei observado que a palavra
“uma” significa aqui “uma companheira”, quer dizer, a Lilit
original, que esteve com ele e concebeu dele. Porém, ela não
foi uma ajuda para ele, como está escrito: “mas para o homem
não se achava ajudadora idônea” (Zohar, Parashá Bereshit,
comentando Gêneses 2:20 – página 107, Editora Sigal).
Parte do processo da Criação teve haver com descenso
da Luz Sagrada para os níveis inferiores, e esse descenso da
Luz Sagrada causou o surgimento dos mundos e das criaturas
espirituais e dos mundos e das criaturas materiais a partir de
uma substância superior cuja essência é composta de matéria
98
e espírito, na linguagem dos Sábios “fogo e água”, como vimos
acima, esta substância é chamada genericamente de Shamaim
“Céus”. O Adam de Gêneses 1:27 é o Homem Celestial por
excelência. Muito distinto do Adam descrito no capítulo dois,
como veremos a seguir.
Os Sábios nos ensinam que todos os mundos e todos os
seres foram criados a partir de uma partícula de matéria em
torno do qual tudo começou a orbitar. Esta partícula de matéria
primordial é chamada de Even Shetiá (Pedra do Fundamento)
ou Even Piná (Pedra do Ângulo), e ela funciona como o
“umbigo do mundo”. Ao criar o Mundo Espiritual, um mundo
perfeito e cheio de seres perfeitos, o Eterno, bendito seja,
precisou dar a este Mundo e aos seus seres um propósito, pois,
como tratava-se de algo perfeito não havia nada a ser realizado
por lá, foi então que surgiu a necessidade da criação de um
Mundo Material. Este mundo da matéria surgiu a partir da
criação de uma minúscula partícula de matéria em torno da
qual todos os seres celestiais orbitaram e deram, cada qual, a
sua contribuição, realizando o propósito no Mundo da Matéria
para o qual foram criados, coisa impossível para eles no
Mundo Espiritual, e desta maneira estes seres celestiais que
são a personificação dos Pensamentos Divinos, popularmente
chamados de “anjos”, trouxeram à existência toda a
diversidade de seres e formas de nosso mundo. A dinâmica da
Criação se deu da seguinte maneira: Deus pensou, Seu
Pensamento deu à luz um anjo, e este anjo expressou-se dando
forma à matéria, logo, tudo o que vemos à nossa volta é, em
certa medida, a expressão exterior dos anjos, algo como “suas
roupas” ou suas “máscaras”. Como reza o Talmud sobre a
“vontade dos anjos”: “Todas as obras da Criação foram criadas
completamente crescidas, elas foram criadas conforme as suas
vontades” (Talmud da Babilônia, Tratado Rosh HaShaná 11a).
99
Como os anjos nascem já plenamente desenvolvidos, da
mesma maneira, os primeiros seres criados no nosso mundo da
matéria surgiram à maneira dos anjos; plenamente
desenvolvidos também. Em relação à Even Shetiá, os Sábios
nos ensinam que:
E “Lekh Lekha” (Gêneses 12:1 - literalmente, vá até
você) para a terra de Moriyah: Mencionou, “vá até
você” – ou seja, para sua essência. Pois a origem do
físico vem daí. Como foi retirado do local sobre o qual
foi declarado: “Um altar de terra farás para Mim”
(Êxodo 20:21), como foi explicado na Parashat Lech
Lecha (Kli Yakar em Gênesis 12:1). E na palavra
Moriyah, “Yah (Deus)”, parece supérfluo. Pois eis que
está declarado: “Irei ao monte da mirra (Monte Mor)”
(Cântico dos Cânticos 4:6). Pelo contrário, é porque o
lugar da Pedra Fundamental – a partir da qual foram
estabelecidos dois mundos, que foram criados com o
nome Yah ( – )יהestá lá. Como a Porta do Céu está ali;
e a união entre o Santo, bendito seja Ele, e Israel é
completada ali - como o apego de um homem à sua
esposa, entre quem o nome Yah ( )יהé o mediador. E
Seu companheiro (David) dizia quinze (o valor
numérico de Yah) [canções de] subida, [que eram
paralelas aos quinze degraus] que subiam do Pátio das
Mulheres - como o número do nome, Yah ()יה. Foi
também um sinal de que o Templo seria construído ali
após as quinze gerações de Avraham a Shelomó (Kli
Yakar em Gênesis 22:2).
Os nossos Sábios afirmam que o Nome Yah ( )יהé
mediador entre o homem e sua mulher por conta de um dado da
Tradição que reza: Ao criar o homem – “Ish” ( – )אישe a mulher –
“Ishá” ( – )אשהo Santo, bendito seja o disse: “Se eles guardarem os
Meus Mandamentos e os Meus Estatutos, Eu porei Meu Nome no
100
meio deles e eles serão fecundos, crescerão e se multiplicarão, mas
se eles não andarem nos Meus Caminhos, abandonando os Meus
Mandamentos e Estatutos, Eu retirarei Meu Nome do meio deles e
eles serão como um fogo devorador e consumirão um ao outro”.
Curiosamente, ao retirarmos a letra Yud ( )יde “Ish” ( )אישe a letra
Hê ( )הde “Ishá” ( )אשהrestará para ambos apenas “Esh” ()אש, que
significa “Fogo”. Ainda sobre a Even Shetiá, encontramos noutro
lugar:
Outra explicação disto (Eclesiastes 1:10), é como está
escrito: “O Senhor pela Sabedoria fundou a terra”
(Provérbios 3:19) e também: “Eu o enchi do espírito de
Sabedoria” (Êxodo 31:3). Isto nos ensina que o
Tabernáculo era igual a todo o Mundo e a um embrião
humano, que é um mundo em miniatura. Como é isso?
Quando o Santo, bendito seja Ele, criou Seu Mundo,
Ele o fez exatamente como uma criança nasce de uma
mulher. Uma criança começa a crescer no umbigo e
depois se desenvolve em todas as direções, e o Santo,
bendito seja Ele, começou a criação do Seu mundo na
Pedra Fundamental e construiu o Mundo sobre ela. Por
que foi chamada de Pedra Fundamental? Porque o
Santo, bendito seja Ele, começou a criação do Seu
Mundo sobre ela. Então Ele criou o Templo celestial,
como está escrito: O lugar, ó Senhor, que fizeste para
habitar (Êxodo 15:13). Não leia a palavra como makom
(“fundação”), mas como mekuvan (“exatamente
oposto”). Sua morada acima está diretamente oposta à
Sua morada abaixo. A formação do embrião é como a
formação do Mundo, pois assim como o embrião é
formado no ventre de sua mãe, também o Mundo foi
formado na Pedra Fundamental (Midrash Tanchuma,
Pekudei 3).
No Livro do Profeta Ezequiel encontramos que a
aparência dos anjos era da seguinte forma: “E a semelhança
101
dos seus rostos era como o rosto de homem; e do lado direito
todos os quatro tinham rosto de leão, e do lado esquerdo todos
os quatro tinham rosto de boi; e também tinham rosto de águia
todos os quatro” (Ezequiel 1:10). Estes anjos são as poderosas
Chaiot, animais celestiais, isso vem nos ensinar que como um
carimbo na cera assim foram as atuações dos anjos na matéria,
logo, cada expressão da natureza são na verdade produto e
resultado das atividades destes seres celestiais.
Quando Deus criou o homem a Sua Imagem e
Semelhança, Ele, o Santo bendito seja, o criou Só, sem a ajuda
de anjo algum, após criado o homem, Ele o conectou com a
natureza dos seres celestiais para que o homem pudesse
governar toda a Criação, produto da atividade dos anjos, desta
forma, tudo o que há no mundo de forma macro há no homem
de forma micro, por conta disso, o homem apenas refletindo
sobre sua própria natureza e essência é capaz de compreender
todo o Universo, pois, ele não apenas possui dentro de si um
reflexo de todo o mundo, como igualmente os dispositivos que
tornam possíveis as conexões com os seres espirituais de todos
os mundo inferiores e superiores.
Enquanto o Adam do capítulo um de Gênses foi criado
por Deus, o Adam do capítulo dois não, ele foi formado do pó,
e não conforme a Imagem e Semelhança de Deus. Trata-se de
uma evolução e involução simultânea de uma mesma entidade.
Evolução porque o propósito da Criação é materializar o
Mundo Espiritual, involução pelo fato da percepção de quando
algo se espiritualiza evolui, mas quando se materializa involui,
haja vista que uma reencarnação é, em certo sentido, uma
punição. A principal chave para se perceber a distinção entre
os processos da criação do homem nos dois capítulos são os
102
dois termos “Yivrá” (Gêneses 1:27 - “ )יבראcriou” e “Yitzer”
(Gêneses 2:7 - “ )ייצרformou”.
Ao lermos o relato da Criação, poderemos perceber que
a Torá descreve o surgimento da vida em sua forma mais
elementar (Gêneses 1:2) e segue manifestando o surgimento
dos seres mais complexos (Gêneses 1:20-25), um após o outro,
de forma que a última criatura criada é a criatura mais
complexa e, portanto, mais elevada a surgir (Gêneses 2:7). O
homem, enquanto ser espiritual, é semelhante aos anjos, mas
enquanto ser material ele é comparado a um animal, mas que
animal?
Antes do homem ser formado do pó o animal mais
complexo e evoluído era a Nachash ()נחש, como reza a Torá:
“Ora, a Serpente era mais astuta que todas as alimárias do
campo que o Senhor Deus tinha feito” (Gênesis 3:1). O termo
“Nachash”, comumente traduzido como “serpente” imprimiu
em nosso imaginário a figura de uma cobra falante, mas na
verdade, Nachash era um homem e a única distinção entre
Nachash e Adam foi o fato de Deus ter soprado o Sopro Divino
em Adam e em Nachash não, no mais poder-se-ia se dizer que
em termos gerais Nachash era também um ser humano tal
como Adam o era. Aliás, o Nachash de Gêneses 3 é apenas um
exemplar dentre milheres deles, pois, tudo o que Deus criou o
criou em pares e quando Adam e Chava chegaram ao mundo
de tudo o que Deus havia criado já havia se multiplicado em
milhares de milhares, esta é a explicação para a existência da
“Terra de Node” e da mulher de Caim (Gêneses 4:16-17), por
exemplo.
Se por um lado Nachash era a criatura física mais
evoluída que Deus criara, por outro lado, não era ela a entidade
mais influente no mundo antes do surgimento de Adam, na
103
verdade, a entidade mais influente no mundo antes de Adam
era o Samokhel ()סמכאל.
Samokhel foi uma entidade celestial criada por Deus
para receber as súplicas das criaturas de nosso mundo e
distribuir para elas as dádivas enviadas por Deus dos Céus.
Tudo estava seguindo harmonicamente bem para Samokhel,
até que o Santo, bendito seja Ele, resolveu criar Adam. Quando
os seres celestiais perceberam que Deus estava prestes a criar
Adam eles, instigados por Samokhel, O questionaram, como
está escrito:
Quando o Santo, bendito seja Ele, quis criar o primeiro
homem, Ele consultou os anjos ministradores. Ele lhes
disse (em Gênesis 1:26): “Façamos o homem à Nossa
imagem”. Eles lhe disseram: “Que é o homem, para que
dele Te lembres?” (Salmo 8:4). Ele lhes disse: “Este
homem que Eu quero criar terá sabedoria maior que a
de vocês.” O que Ele fez? Ele reuniu todo o gado,
animais selvagens e aves para passar diante deles. Ele
lhes disse: “Quais são os nomes destes seres?” Eles,
porém, não sabiam. Quando Ele criou Adão, Ele os fez
passar diante dele. Ele lhe disse: “Quais são os nomes
destes seres?” Ele disse: “É apropriado chamar este de
boi, este de leão, este de cavalo, ...” e assim por diante
para todos eles. É assim afirmado na Torá: “E Adão
nomeou todos os seres” (Gênesis 2:19-20). Ele lhe
disse: “E você, qual é o seu nome?” Adão disse-Lhe:
“Adam ()אדם, porque fui criado da terra – Adamá
(”)אדמה. O Santo, bendito seja Ele, disse-lhe: “Eu, qual
é o Meu Nome?” Ele lhe disse: “O Senhor – Adonai
()יהוה, porque Tu és o Senhor de todas as criaturas”, ou
seja, como está escrito: “Eu sou o Senhor, esse é o Meu
Nome” (em Is 42:8), que o primeiro Adão Me deu. É
aquele com o qual concordei para uso entre Mim e Mim
104
mesmo; é aquele com o qual concordei para uso entre
Mim e Minhas criaturas” (Bereshit Rabá 17:4 /
Bamidbar Rabá 19:3).
Noutra versão, Samokhel é quem toma a dianteira e
representa os anjos que viram na criação do homem um
problema. Após ter criado o homem, o Eterno, bendito seja o
Seu Nome, ordenou que os anjos celestiais se encurvassem
perante ele e o servissem, todos obedeceram com prazer,
menos Samokhel e os anjos que lhe eram subordinados, o
Santo, bendito seja, lhe perguntou: “Por que você não se curva
perante o homem que criei?” Ao que Samokhel respondeu:
“Eu sou feito do fogo das orlas de Tuas vestes, por que me
encurvaria perante uma criatura feita do barro?” E Deus lhe
perguntou: “Em que te achas superior ao homem que criei?”
Ao que Samokhel respondeu: “Em sabedoria! Eu sou
infinitamente mais antigo do que ele, e este acabou de nascer,
o que poderia saber?” Ao que o Santo Deus, bendito seja,
propôs: “Farei passar diante de ti todas as criaturas que criei, e
tu darás nomes a elas, e depois farei passar todas as criaturas
que criei diante do homem, e ele dará nomes a elas. Aquele
que conseguir nomear todas as criaturas este será diante de
Mim o mais sábio”. E assim foi, todas as criaturas começaram
a desfilar diante de Samokhel, e ele começou por dar-lhes
nomes, mas a certa altura ele não conseguiu mais nomeá-las,
nome novo algum lhe vinha à mente, e então, ele desistiu.
Depois, o Santo, bendito seja, fez as criaturas desfilarem diante
de Adam, como está escrito: “E Adão pôs os nomes a todo o
gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo” (Gênesis
2:20). E assim, Deus decretou que Adam era superior em
sabedoria em comparação com Samokhel.
Samokhel, todavia, não se deu por satisfeito, ele
percebera que perdeu a disputa por pouco, e imaginou que se
105
tivesse apenas mais uma chance certamente ganharia desta
vez, e foi o que ele fez; ele solicitou do Eterno, bendito seja o
Seu Nome, mais uma chance para disputar com Adam, e
conseguiu, Deus quebrou de seu nome a letra Kaf ()כ, e de
Samokhel ( )סמכאלque significa “o administrador Divino”, ele
passou a ser chamado de Samael ( )סמאלque significa “o
Veneno de Deus”, e assim ele foi lançado na terra para obter
sua segunda chance, e ganhou desta vez, como está escrito:
“Dar-te-ei a ti todo este poder e a sua glória; porque a mim me
foi entregue, e dou-o a quem quero” (Lucas 4:6). E quando foi
dado todo o poder e glória deste nosso mundo a Samael?
Quando ele conseguiu induzir Adam à queda. E noutro lugar
encontramos: “Sabemos que somos de Deus, e que todo o
mundo está no maligno” (1 João 5:19). Em corroboração a
isso, os nosso Sábios ensinam que:
A eficácia de Samael em nosso mundo se dá através de
sua nação que domina Israel no exílio devido aos seus
pecados. Ele é, portanto, capaz de causar um פגם
(Pegam), uma falha, na harmonia do mundo “superior”.
Expliquei em Parashat Chaiê Sará - פרשת חיי שרה- que
Samael tem raízes nas emanações superiores. Expliquei
ali a natureza dual de Samael e como ela se reflete na
palavra “Pilagsham” - פלגשם, as concubinas de Abraão.
Samael é ao mesmo tempo um anjo, algo sagrado, e
também a fonte da morte, do mal (Shenei Luchot
HaBerit, Torah Shebikhtav, Vayishlach, Torah Ohr
13).
Voltando um pouco no assunto para tratarmos das
incríveis características físicas do Adam formado do pó e antes
de sua fatídica queda, encontramos nos livros antigos que
Adam tinha uma estatura gigantesca (Talmud da Babilônia,
Tratado Chaguigá 12a:2), sua pele brilhava como o sol, pois,
106
ele era coberto de escamas reluzentes, sua sabedoria era plena
e seu conhecimento sobre os segredos dos mundos espirituais
era extremamente profundo, o que ele desconhecia era a
sedução da matéria, a sedução de nosso mundo, produto da
mistura entre o bem e o mal que ocorreu apenas depois de sua
queda, apesar de ter sido formado do pó da terra, todavia, pelo
fato de ter sido moldado pelas Mãos de Deus, seu corpo jamais
conheceria a morte caso ele não tivesse transgredido a Mitzivá
do Fruto Proibido, ele nasceu já adulto, sua aparência era de
um jovem entre 18 a 22 anos, todos os seus membros eram
perfeitos e plenamente desenvolvidos, sua força vital era a
mesma da dos seres celestiais.
Quando Adam foi formado do pó, ao vê-lo, os próprios
anjos foram fortemente atraídos pelo seu esplendor e o
adoraram pensando estarem diante de Deus (Bereshit Rabá
8:11). Aprendi de uma chave mística chamada: Bassar
HaAretz ()בשר הארץ, que significa “Carne da Terra”, que o
“encurvar dos anjos” em torno de Adam significou a maneira
pela qual os Céus o vestiu, cada anjo serviu-lhe como uma bela
e reluzente escama que cobriu o seu corpo como uma
vestimenta, por isso é dito que Adam estava vestido de Luz
Celestial antes de sua fatídica queda, e de cada uma delas uma
cor, um poder e uma luz distinta emanavam. É disso que trata
o versículo que reza: “Tu eras o querubim, ungido para cobrir,
e te estabeleci; no Monte Santo de Deus estavas, no meio das
pedras afogueadas andavas” (Ezequiel 28:14 / Bereshit
Rabbah 9:5), as “pedras afogueadas” eram os anjos de Deus
que o serviam, estes mesmos anjos são também chamados de
“pedras preciosas”, como está escrito: “Estiveste no Éden,
jardim de Deus; de toda a pedra preciosa era a tua cobertura”
(Ezequiel 28:13 / Bereshit Rabbah 18:1). Todas as criaturas da
Natureza lhe prestavam homenagem e lhe obedeciam, ele sabia
107
falar a língua dos pássaros e entendia a linguagem dos demais
seres do campo inclusive das árvores. Os próprios anjos lhe
serviam comida e bebida produzidas nos Céus, como
encontramos escrito:
A Gemara levanta uma objeção de um baraita à
afirmação de que comer carne era proibido para Adão:
Rabino Yehuda Ben Teima diria: Adão, o primeiro
homem, jantaria no Jardim do Éden, e os anjos
ministradores assariam carne para ele e coavam o vinho
para ele. A Serpente olhou para ele e viu sua glória, e
ficou com ciúmes dele, e por isso a Serpente o incitou
ao pecado e causou seu banimento do Jardim. De
acordo com isto, evidentemente Adão comeria carne. A
Gemara responde: Aí a referência é à carne que desceu
do Céu, que foi criada por um milagre e não era de
forma alguma carne de animais. (Talmud da Babilônia,
Tratado Sanhedrin 58b:22).
Sua beleza era mítica, sem par, não havia nada na face
de toda a terra que pudesse igualar-se a ele em beleza e em
toda a história da humanidade poucas foram as pessoas em
nosso mundo que puderam alcançar parcamente aproximar-se
em semelhança à irradiação de sua bela e celestial feição
(Talmud da Babilônia, Tratado Baba Metzia 48a:8). A luz dos
seus olhos podia fazê-lo enxergar muito longe, para além do
tempo e do espaço, ele pôde ver o surgimento de todas as
pessoas de todas as gerações futuras até o fim dos tempos, só
não conseguia entender plenamente o que via, uma vez que
toda revelação espiritual se manifesta em forma de enigma.
Como está escrito:
É o que Reish Lakish diz: Qual é o significado daquilo
que está escrito: “Este é o livro das gerações de Adão”
(Gênesis 5:1)? Este versículo ensina que o Santo,
bendito seja Ele, mostrou a Adão cada geração e seus
108
intérpretes da Torá, cada geração e seus sábios (Talmud
da Babilônia, Tratado Sanhedrin 38b:10).
Adam era como o Santuário de Deus na terra, aliás, foi
ele mesmo, Adam, o modelo pelo qual o Tabernáculo e mais
tarde a Beit Kadish – o Templo foram inspirados, ele foi
realmente a medida de todas as coisas. Como encontramos
escrito:
Daqui vemos que tanto o ser humano como o Santuário,
quando foram criados, foram criados pelas duas mãos
de Deus. De onde aprendemos que o ser humano foi
criado pelas duas mãos de Deus? Como se diz: “Suas
Mãos me fizeram e me moldaram” (Salmos 119:73).
De onde aprendemos que o Santuário foi criado pelas
duas mãos de Deus? Como se diz: “No santuário, Deus,
que as Tuas Mãos estabeleceram” (Êxodo 15:17). E
ainda se diz: “Ele os levou até a fronteira do Seu
Santuário, a montanha que Sua Mão Direita havia
adquirido” (Salmos 78:54). E, por fim, se diz (Êxodo
15:18): “O Eterno reinará para todo o sempre” (Avot
D'Rabbi Natan 1:8).
Adam era o que dava propósito e sentido à vida de
todas as criaturas de nosso mundo e dos mundos espirituais,
ele tornou-se o canal pelo qual as criaturas naturais e
sobrenaturais podiam se comunicar umas com as outras e todas
com Deus, Adam tinha no mundo a mesma função dos
Querubins sobre o tampo da Arca Sagrada através dos quais a
Presença Divina se manifestava e trazia as revelações dos
segredos do Mundo Espiritual (Bereshit Rabbah 9:5 / Êxodo
25:22 / Ezequiel 28:14), mas do ponto de vista de Adam havia
um vazio que o incomodava, ele não sabia o que era, mas sentia
que algo lhe faltava, e foi quando começou a buscar respostas
para uma pergunta que ele não soube formular que a Torá nos
109
conta que Deus disse dele: “Não é bom que o homem esteja
só” (Gêneses 2:18).
Quando Adam dominava as criaturas de dentro para
fora, antes de receber o seu corpo do pó da terra, não havia
questões em sua mente, pois ele percebia a existência tal qual
os anjos a percebem, mas quando foi revestido pelo corpo feito
do barro, do pó da terra, ele percebeu a existência como os
animais a percebem, mas ao contrário dos animais que tinha
pares, Adam se percebeu só e sua solidão o provocou a
procurar um par que lhe correspondesse e a única maneira que
Adam conhecia de conexão com a vida era introduzir-se dentro
das criaturas como fez enquanto dominava o mundo e o regia
antes de obter o seu corpo animal, então, observando os
animais ele buscou uma maneira de, nessa nova forma, refazer
a conexão com eles como anteriormente, e foi neste processo
de tentativa e erro que nasceu o processo de domesticação, o
que foi um grande acerto e, paralelo à isso, o que hoje se chama
de zoofilia, o que foi um grande erro, como encontramos
escrito:
E Rabi Elazar disse: Qual é o significado daquilo que
está escrito: “Isto agora é osso dos meus ossos e carne
da minha carne” (Gênesis 2:23)? Isso ensina que Adão
teve relações sexuais com cada animal e fera em sua
busca por sua companheira, e sua mente não estava
tranquila, de acordo com o versículo: “E para Adão não
se achou companheira para ele” (Gênesis 2: 20), até que
teve relações sexuais com Eva (Talmud da Babilônia,
Tratado Yebamot 63a:5).
Porém, como o Santo, bendito seja o Seu Nome, ainda
não havia revelado lei alguma para que o homem se balizasse
por ela, este ato de Adam não foi computado como um pecado,
como está escrito: “Porque onde não há lei também não há
transgressão” (Romanos 4:15). E este foi outro aspecto do
110
motivo pelo qual a Torá afirma: “Não é bom que o homem
esteja só” (Gêneses 2:18), e como afirmam os nosso Sábios:
“Naquele mesmo dia ele nomeou todos os animais” (Avot
D'Rabbi Natan 1:8 / Gêneses 2:19-20). E é daqui que nasce o
arquétipo da Torá de que “Conhecer”– LaDaat ()לדעת,
equivale a ter relações sexuais.
Os esforços de Adam de encontrar para si uma parceira
que lhe correspondesse provocou sua imaginação, e ele passou
a idealizar como ela poderia ser, com que ela poderia parecer.
Para nós hoje em dia este tipo de reflexão mental não seria um
grande esforço já que temos praticamente tudo disposto à
nossa volta, sabemos como uma mulher se parece, temos
espelho para contemplarmos nossa própria imagem restando-
nos, portanto, apenas imaginar detalhes tais como: cor dos
olhos, cor dos cabelos, altura, cor da pele e coisas do tipo,
traços de caráter e assim por diante. Para Adam tudo isso lhe
era desconhecido, ele simplesmente não tinha referência
nenhuma ao seu dispor, nem sequer um espelho para
contemplar a própria face, logo, o seu arquétipo imaginário do
que poderia vir a ser uma mulher foi construído à partir do
desejo mais profundo de sua alma, e este esforço foi tal que
Adam passou a sonhar enquanto dormia interagindo com sua
parceira de forma tão nítida como se ele estivesse acordado, tal
a força de espírito empregada neste processo (Bereshit Rabá
18:4). E foi então que o Santo, bendito seja, resolveu criar
Chava.
Quando observamos o processo da Criação do Mundo
e dos seres que habitam nele como proposto pela Torá,
poderemos perceber que o processo se inicia (como tudo neste
mundo) a partir de uma expressão de vida simples, como vida
em potencial a se desenvolver na água (Gêneses 1:2) e
veremos que na medida que o processo avança formas de vida
111
mais complexas passam a se desenvolver ainda na água
(Gêneses 1:20-21) para em seguida se tornarem capazes de se
moverem sobre a terra seca (Gêneses 1:24), culminando com
a criação do Homem, o ser pleno, a coroa da própria Criação
(Gêneses 1:26-27). Podemos concluir, portanto, que a lógica
proposta pela Torá em relação à sequência dos seres criados
que os seres mais elementais, mais simples em suas
constituições, foram criados primeiro, e os seres mais
complexos depois, restando ao Homem ser criado por último.
Sendo assim, todas as prerrogativas válidas para o Homem
também eram válidas para a Mulher. Enquanto o Homem foi
criado do barro, a Mulher foi criada a partir da carne do
Homem (Gêneses 2:22 / 1 Coríntios 11:9), material
obviamente mais nobre, e neste sentido, na constituição física
da Mulher haviam algumas vantagens em relação à do
Homem.
“Então o Senhor Deus fez cair um sono pesado sobre
Adão, e este adormeceu; e tomou uma das suas
costelas, e cerrou a carne em seu lugar” (Gênesis 2:21)
- disse Rabi Eliezer em nome do Rabi Yossi Ben Zimra:
a mulher era dotada de mais compreensão do que o
homem. Como é ensinado: aos onze anos e um dia, seus
votos permanecem; aos doze anos e um dia seus votos
se aplicam; e todas as crianças de doze anos são
examinadas. Mas para os homens, apenas a partir dos
doze anos e um dia seus votos permanecem; aos treze
anos eles se inscrevem como responsáveis
religiosamente, e é a partir daí que são examinados.
...Rabi Aybu disse, e alguns atribuem isso ao nome de
Rabi Benaya, e também é ensinado em nome de Rabi
Shimon Ben Yochai: Deus adornou a Chava como uma
noiva, e depois a trouxe para Adam. Em alguns lugares
eles chamam de 'Kil'ata' [tranças] de 'Bin'yata' [redes].
112
Rabi Hamma Bar Chanina disse: você acha que ela foi
trazida a ele sob uma alfarrobeira ou sicômoro? Em vez
disso ela foi adornada com vinte e quatro tipos de
enfeites, e então trazida a ele, como diz: "No Éden, o
jardim de Deus tu eras, e todas as pedras preciosas eram
a tua cobertura: a cornalina, o topázio...” (Ezequiel
28:13). ...O Rabi Hamma Bar Chanina e o Rabi Shimon
Ben Lakish disseram: uma regra geral seguida por uma
específica; siga a regra geral adicionando o específico,
e tudo estará na regra geral - "cada pedra preciosa é a
sua cobertura" é uma regra geral (Bereshit Rabbah
18:1).
O surgimento de Chava pôs Adam em outro patamar
evolutivo. Tal foi a sua evolução que, de acordo com os nossos
Sábios, foi apenas a partir do surgimento de Chava que Adam
mereceu ser chamado de Homem de fato:
Rabi Simlai disse-lhes: No passado, Adão foi criado a
partir da Adamah e Chava foi criada a partir de Adam.
Daqui em diante, “à nossa imagem e à nossa
semelhança” – não há homem sem mulher e não mulher
sem homem, e nem ambos sem Shekhinah (Bereshit
Rabá 8:9).
“Não é bom que o homem esteja só” (Gênesis 2:18).
Ensinou Rabi Yaakov: Qualquer homem que não tenha
uma mulher vive sem um verdadeiro bem. Rabi
Shimon em nome de Rabi Yehoshua Ben Levi disse:
Vive mesmo sem paz. Rabi Yehoshua de Sakhnin em
nome de Rabi Levi disse: Vive mesmo sem viver
verdadeiramente. Rabi Chiya Bar Gomdi disse: Ele
nem mesmo é um humano completo (Adam Shalem),
pois se diz (Gênesis 5:2): “Homem e mulher os criou;
e os abençoou e chamou o seu nome Adam, no dia em
que foram criados” (Bereshit Rabá 17:2).
113
Em Bereshit Rabá 8:9 encontramos uma menção
velada à Escritura que reza:
“Melhor é serem dois do que um, porque têm melhor
paga do seu trabalho. Porque se um cair, o outro levanta o
seu companheiro; mas ai do que estiver só; pois, caindo, não
haverá outro que o levante. Também, se dois dormirem
juntos, eles se aquentarão; mas um só, como se aquentará?
E, se alguém prevalecer contra um, os dois lhe resistirão; e o
cordão de três dobras não se quebra tão depressa”
(Eclesiastes 4:9-12).
Na Bessorá encontramos registrado exatamente o
mesmo, como está escrito: “Todavia, nem o homem é sem a
mulher, nem a mulher sem o homem, no Senhor” (1 Coríntios
11:11). Como Chava foi criada por último, todas as qualidades
e virtudes que haviam em Adam sobejavam em Chava, e
contrário à regra geral imposta na criação de todos os animais
onde os machos são mais belos do que as fêmeas, em relação
à Adam e Chava se deu ao contrário: Chava era muito mais
bela do que Adam. Mas, a maior virtude de Chava não era a
sua estonteante beleza, mas sua mente, seus pensamentos, seu
apego e devoção a Deus. Como encontramos escrito:
Rabi Shimon Ben Menasya interpretou
homileticamente: Qual é o significado daquilo que está
escrito: “E da Tzela... o Senhor Deus ...formou uma
mulher” (Gênesis 2:22)? Este versículo ensina que o
Santo, bendito seja, trançou o cabelo de Chava e depois
a trouxe para Adam, como se diz nas cidades costeiras,
onde eles chamam o ato de trançar o cabelo de Tzela
(Berakhot 61a:17).
O termo “Tzela” ( )צלעque aparece no texto hebreu
referindo-se à costela de Adam, num sentido mais profundo,
de acordo com os nossos Sábios, se refere às tranças que Deus
114
fez nos cabelos de Chava antes de apresenta-la ao seu marido.
Este ato Divino de “trançar os cabelos de Chava” se refere a
educa-la e ensiná-la as virtudes de ser uma boa esposa a fim de
que ela se torne uma verdadeira mulher virtuosa (Provérbios
31:10-31). Daqui aprendemos que uma mulher é o produto
final de uma boa educação, pois, a fêmea da raça humana só
se tornou uma mulher após Deus trançar (educar) seus
pensamentos. Curiosamente, nesta perspectiva: os cabelos de
Chava, os pensamentos de Chava e o Jardim do Edem estão
interconectados e na Torá há um belo paralelo entre plantas
brotando na terra em comparação com pensamentos brotando
da cabeça de alguém, como está escrito:
ַויֵּצֵּ א יִ צְ חָ ק לָשּוחַ בַ שָ דֶ ה לִ פְ נֹות ע ֶָרב וַיִ שָ א עֵּינָיו ַוי ְַרא וְ הִ ּנֵּה גְ מַ לִ ים
בָ ִאים ׃
“E Isaque saíra a orar (Suach - ׂשּוח ַ ) no campo, à tarde; e
levantou os seus olhos, e olhou, e eis que os camelos vinham”
(Gênesis 24:63).
115
que ela trouxe à memória, houve um em que ela descreve que
se percebeu fora e dentro do mundo, no céu e na terra ao
mesmo tempo. E enquanto se percebia assim, como um
espírito onipresente, a Voz lhe instruía sobre como o Eterno,
bendito seja, ouve as preces dos seres humanos, e enquanto a
Voz lhe explicava isso, ela olhou e viu muitas pessoas, de
todos os lugares do mundo, de todas as religiões, fazendo suas
preces, e era como que enquanto oravam de cada uma delas
subia uma sutil fumaça, como de incenso, que se elevava de
cor cinza e que se esforçava para clarear para branco, muitas
delas ao subir não conseguia clarear e sua elevação entortava
para a direita e ou para a esquerda e sua cor escurecia, haviam,
porém, algumas que conseguiam se elevar retas em direção aos
Céus, enquanto subiam clareavam e mudavam de uma cor
cinza suave para branco, depois mais branco, depois reluzente
ao ponto de não se poder mais olhar diretamente para elas,
pois, ofuscavam os olhos. Estas orações, explicou a Voz, eram
as orações dos santos, dos justos, estas transpunham todas as
barreiras e chegavam a Deus que as recebia como um cheiro
suave. Para minha alegria, ela disse que dentre aquelas preces
que sempre subiam, as minhas poucas e curtas preces estavam
dentre estas. E a Voz direcionou o olhar de Miriam Melo para
um aspecto espiritual do mundo, e quando ela olhou, viu que
as preces brotavam no Mundo Espiritual como arbustos,
folhas, galhos, como plantas em geral no Mundo Físico (este é
o arquétipo do Gan Eden e sua vegetação). Desta maneira, as
orações no Mundo Físico são percebidas como vegetação que
brota no Mundo Espiritual. E enquanto ela me falava isso, me
veio à mente estes dois trechos da Torá: Gênesis 2:5 que utiliza
o termo “Siach” ( )שיחque foi traduzido por “Planta” e Gênesis
24:63 que utiliza um termo de mesma raiz “Suach” ()שוח
traduzido como “Oração”. Compreendendo que uma oração é
116
a verbalização dos pensamentos da cabeça do devoto, logo,
“Pensamento” entendido aqui como “cabelos espirituais” têm
sua expressão na oração que é a sua forma exterior e aparente,
assim como as plantas no Mundo Físico parecem com cabelos
numa cabeça quando olhadas de cima, pela janela de um avião,
por exemplo.
Este trecho da viagem dela me trouxe à memória um
trecho de minha segunda viagem, quando eu me percebi como
um espírito sobrevoando uma densa floresta cuja terra era
negra e coberta de altas árvores e demais vegetações de cor
dourada e todas reluzentes, e a entidade que me acompanhava
me perguntou se eu reconhecia aquele lugar, como que
respondi que não, ela desceu comigo, passamos pelo meio das
árvores douradas e reluzentes, abrimos o solo como quem
corta uma pele com um bisturi e entramos passando por
camadas de membranas e osso até chegar em cima de um
gigantesco cérebro. Estávamos em pé em cima do meu próprio
cérebro. Como diria a Filósofa Lúcia Helena Galvão, em sua
palestra intitulada Como viver o Mito (2014): cabelos em
linguagem arquetípica correspondem aos pensamentos.
Na manhã de sábado do dia 14 de outrubro de 2023,
estávamos conversando: eu, o Elihud e o Tzuriel, e em meio a
tudo o que conversávamos o assunto deste recorte veio à tona,
e após cada qual dar a sua contribuição a fim de aprofundar o
tema, o parecer do Tzuriel tornou-se digno de nota, pois, de
acordo com ele o ato de Deus trançar os cabelos de Chava
esteve relacionado ao concatenamento de seus muitos
pensamentos em relação ao propósito maior da vida, ou seja;
Deus. Isso significa que Chava após o trançar de seus cabelos
obteve uma percepção profunda da personalidade Divina,
intuitivamente ela passa a entende-Lo suficientemente, e o seu
esforço seria intensificar o sentir Deus sem a necessidade de
117
entendê-Lo racionalmente, senti-Lo cuidando dela, senti-Lo
permeando os seus pensamentos, direcionando suas ideias, ao
contrário do Adam que nasce com um profundo sentimento de
conexão com Deus, mas a compreensão de Sua personalide e
a natureza desta conexão lhe são desconhecidas e alcançar esta
compreensão de maneira intelectual, racional, tem sido o
drama de Adam desde o seu surgimento enquanto ser humano
de carne e osso.
A que isso se pode assemelhar?
Conta-se que quando era um estudante universitário,
Mahatma Gandhi por ter se descatado muito acima da média
em sua turma acabou por atrair alguns desafetos, dentre eles
estava um dos seus professores que numa determinada aula
propôs uma reflexão a fim de embaraçar Gandhi. O professor
disse:
- Me respondam: Se andando na rua vocês
encontrassem uma carteira perdida e dentro dela houvesse
dinheiro e sabedoria, e por algum motivo desconhecido vocês
só pudessem levar ou um ou outro, quais dos dois vocês
levariam: o dinheiro ou a sabedoria?
- O dinheiro – disse Gandhi após levantar rapidamente
a sua mão. O professor olhou para ele com desdém, Gandhi
teria caído em sua armadilha. Com um ar sarcástico o professor
olhou para toda a sala e depois rindo de maneira zombeteira
olhou para Gandhi e disse:
- Me admira que alguém que tenha se mostrado tão
inteligente possa ter feito uma escolha tão burra. – a isso
Gandhi respondeu:
- É que cada um de nós pegará aquilo que lhe falta
professor.
Salvo as devidas proporções, foi mais ou menos isso
que ocorreu no Eden; cada qual buscava o que lhe faltava em
118
meio às circunstâncias que se lhe apresentaram. No entanto,
em relação a Adam e Chava, havia uma diferença sutil nas
respectivas naturezas dos desejos deles, em resumo: Adam
queria ter enquanto que Chava queria ser. E foi percebendo
esta sutil diferença que a Nachash resolveu iniciar sua
abordagem por Chava.
“Ora, a serpente era mais astuta que todas as
alimárias do campo que o Senhor Deus tinha feito”
(Gênesis 3:1).
Os nossos Sábios nos ensinam que, na verdade, o
próprio Adam nomeou aquela criatura de “Nachash” ()נחש,
significando um trapaceiro, que é Menachesh ()מנחש, um
adivinho (Levítico 19:26 / 2 Reis 21:6), sedutor e hipócrita,
alguém que engana outro fazendo-o pensar que algo vem de
Deus quando na verdade trata-se de um embuste. Como Adam
deu à Nachash seu próprio nome e, portanto, conhecia sua
verdadeira natureza, ele deveria ter aumentado sua vigilância
quando sentiu que algo estava errado (Mei HaShiloach,
Volume I, Gênesis, Bereshit 11).
Como a Torá claramente afirma, Nachash era apenas
um animal, mas estava em termos de perfeição muito acima de
todos os demais animais do mundo por conta do seu intelecto,
em resumo, fisicamente falando não havia distinção alguma
entre entre os aspectos físicos de Adam e de Nachash, em
suma, Nachash era um homem em todos os sentidos, menos no
tocante ao Sopro Divino, pois este foi soprado apenas em
Adam, e como esta característica distintiva era algo muito sutil
e invisível aos olhos, Nachash não conseguia compreender
porque a vida parecia tão fácil e prazerosa para este ser recém
chegado enquanto para ele, Nachash, a sua sorte era a mesma
sorte dos animais comuns. Chava era linda de estontear, mas
119
Adam parecia vê-la como alguém de beleza comum, Nachash,
por outro lado, a via como uma manifestação física do próprio
esplendor celestial, e ao vê-la foi tomado de feroz paixão e
desejo de possuí-la, não apenas isso, mas o próprio Samael
aproveitou-se do desejo de Nachash por Chava e o influenciou
pondo nele uma terrível inveja e ciúmes de Adam, como
afirmam os nosso Sábios:
Rabino Yehudah ben Beteira disse: Adão estava
sentado no Jardim do Éden, e os anjos que servem a
Deus estavam lá no Jardim cuidando dele. Eles
grelharam carne para ele e deram-lhe vinho gelado para
ele. Nachash veio e viu tudo isso, e tomou isso como
uma afronta à sua própria honra, e ficou com ciúmes
(Avot D'Rabbi Natan 1:8).
Nachash nunca tinha pensado nestas coisas, até que
Samael veio e o despertou maliciosamente para isso. A inveja
e o ciúme, originalmente eram de Samael que buscou em
Nachash a sua expressão física, um representante seu, como
Adam era um representante físico de Deus.
Está escrito na Torá: “...macho e fêmea os criou”
(Gênesis 1:27). Tudo o que Deus criou, desde os menores seres
da água até os maiores mamíferos da terra, incluindo o homem,
macho e fêmea os criou, e com Nachash não foi diferente, a
criatura que figura no Eden é um exemplar de sua espécie.
Sabemos que quando Adam surgiu no mundo de tudo o que
Deus tinha criado havia milhares e milhares, e com a espécie
de Nachash não foi diferente, quando Adam e Chava viveram
no mundo haviam milhares de Nechashim povoando a terra,
inclusive, de acordo com os nossos Sábios, esta espécie não
apenas falava, mas discutia religião, criaram leis, fundaram
uma civilização, e encontramos na Torá uma evidência disso
quando lemos que Kain, após fugir para longe do local que
120
tinha assassinado o seu irmão chegou numa terra cujo
governador era Nod (Gêneses 4:16), no tempo em que além de
Adam, Chava e Kain não havia hipoteticamente mais nenhum
ser humano sobre a terra. Os Nechashim (plural de “Nachash”)
são um povo antigo, sua existência data de mais ou menos
cinco mil anos de idade, e na minha humilde e particular
opinião, nos nossos dias os representantes mais próximos dos
antigos Nechashim são os chineses (Judaísmo e a Cabalá, V.
2, 2022, pp. 188-189).
Curiosamente os chineses ficaram conhecidos na
américa, durante a construção da ferrovia Transcontinental dos
EUA, como trabalhadores submissos, esforçados,
disciplinados e baratos, prova disso é que a construção desta
ferrovia teve início em 1862 e, em apenas sete anos, foi
concluída em tempo récorde. Dizem que os chineses
trabalharam horas e horas a fio, com descanso mínimo e com
salário muito baixo, quase não reclamavam mesmo exauridos
de cançasso e não poupavam esforços para realizarem suas
tarefas, mesmo que isso pusesse a saúde ou a vida deles em
risco. A gigantesca e famosa Grande Muralha da China, que é
a única obra humana que pode ser vista do espaço a olho nu, é
um flagrante testemunho do empenho, talento e dedicação dos
chineses aos trabalhos braçais. Foi, provavelmente, sobre os
ancestrais dos chineses que o Rabi Shimon Ben Menassia
disse: “É uma pena o mundo ter perdido um grande serviçal,
pois se a espécie de Nachash não tivesse sido amaldiçoada,
cada um de Israel obteria duas Nechasim boas; ...para que lhe
trouxessem pedras preciosas” (Talmud da Babilônia, Tratado
Sanhedrin, 59b).
E aqui há uma chave: Servir as criaturas de Deus era a
função original de Samael, até que ele recusou-se servir a
Adam, perdendo assim o seu posto e tornando-se obcecado
121
pelo status do homem diante de Deus, da mesma maneira a
Nachash, por conta de sua capacidade intelectual, deveria
auxiliar ao homem, mas por desenvolver inveja e ciúme, se
tornou egocêntrico e passou a pensar apenas em si mesmo, por
isso se tornou maldito, e não apenas isso, mas a fonte física de
onde emanam todos os males e perversidades de nosso mundo
(como o Pandemia do Covid-19, por exemplo). O mesmo,
infelizmente aconteceu com o homem, que foi posto
originalmente no Eden para zelar por ele, o que equivale dizer;
cuidar e servir as criaturas de Deus, como está escrito: “E
tomou o Senhor Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden
para o lavrar e o guardar” (Gênesis 2:15). Quanto a Lilit e a
Chava, suas respectivas quedas dos níveis espirituais
superiores para os inferiores se deu da mesma forma: por
egoísmo e inveja. Desta maneira, a nossa redenção virá quando
conseguirmos realizar o propósito de nossa existência, a saber;
fazer o que Adam negligenciou quando voltou a sua atenção
para dentro de si mesmo ao invés de voltar a sua atenção e
capacidade em benefício do todo ao seu redor, como está
escrito noutro lugar:
Porque para mim tenho por certo que as aflições deste
tempo presente não são para comparar com a glória que
em nós há de ser revelada. Porque a ardente expectação
da criatura espera a manifestação dos filhos de Deus.
Porque a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua
vontade, mas por causa do que a sujeitou, na esperança
de que também a mesma criatura será libertada da
servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos
filhos de Deus (Romanos 8:18-21).
Assim aprendemos que dedicar a vida em prol de si
mesmo é dedicar-se à servidão da corrupção, é tornar-se inútil
para o propósito maior de toda a Criação, é tornar-se, portanto,
maldito, como Nachash e Samael (que são considerados como
122
sendo um) se tornaram, e o homem comum depois deles. Pode-
se dizer que estes três personagens são os arquétipos por detrás
do provérbio popular que reza: “As três serpentes mais
perigosas são: a inveja, a ingratidão e a traição. Elas se
escondem em qualquer lugar, até mesmo em abraços e
sorrisos”.
De tudo o que foi exposto acima, conclui-se que, em
suas versões caídas, Adam e Nachash são como alguém que
contempla o próprio reflexo num espelho e que sente repulsa
do que vê.
123
Sobre Noach
124
regência do novo Rei, dando origem a outro mundo, a outro
Olam, de forma que o tempo não era contado da maneira linear
como estamos acostumados hoje em dia, mas era contado de
forma circular, ou seja; o nascimento, vida e morte de um Rei
fechava um círculo temporal geralmente chamado de era. E
“Olam” ( )עולםé o termo hebreu para “era” num sentido de
círculo temporal, de período de domínio de um Rei.
Este dado é muito importante, pois nos permite
compreender que Noach não foi apenas o salvador de sua
família, mas o Salvador e Rei supremo de um novo mundo.
Também nos permite compreender a era em que estamos
vivendo, que é a Era do Mashiach HaMelekh – a era do Rei
Messias. Um período de regência que já dura dois mil anos. Os
nossos Sábios nos ensinam que o mundo como o conhecemos
tem durado por seis mil anos, sendo que os primeiros dois mil
anos foram vazios, isto é, o povo decidia como viver, sem
nenhuma autoridade sobre eles, uma espécie de democracia.
Os segundos dois mil anos foram regidos pela Torá, ou seja; a
humanidade recebeu uma diretriz celestial pela qual devem
orientar as suas vidas e, por fim, os últimos dois mil anos têm
sido regidos pelo Mashiach (Talmud da Babilônia, Tratado
Sanhedrin 97a).
O Mashiach tem regido o seu mundo como Deus tem
regido toda a criação, a sua regência se dá através do seu Olam
()עולם, de maneira oculta, como se fosse um mundo dentro de
outro mundo, tal qual uma semente dentro de um fruto
preparando-se para dar à luz uma nova árvore.
O Mashiach rege o seu mundo, enquanto que outras
forças regem o restante da criação. Isso também inclui as
pessoas; existem aqueles que participam do Mundo do
Mashiach e aqueles que não participam, e mesmo que os
125
nossos sentidos não possam perceber as fronteiras entre um
mundo e outro, e nem distinguir quem pertence ao Reino do
Mashiach ou não, todavia, isso está sendo regido desta
maneira. Curiosamente, o Judaísmo é a única religião
monoteísta que compreende que o mundo inteiro nunca se
converterá à Religião Judaica (ao contrário do Cristianismo e
do Islamismo que sonham converter o mundo inteiro, cada
qual à sua maneira), mas apenas aqueles que possuem dentro
de si uma Nefesh Yehudi – uma alma judaica, estes sim virão
de todos os povos línguas e nações para se juntarem ao povo
de Israel no Reino do Messias (Êxodo 12:38 / Zacarias 8:23 /
Apocalipse 5:9-10). E naquele dia o Reino do Mashiach
subjugará os demais reinos da terra (Daniel 7:27), mas haverá
sempre uma distinção entre o Reino do Mashiach e os reinos
das nações. Na Bessorá HaKedoshá o Mashiach mesmo
evidencia como se deu o estabelecimento de seu Reino e como
está ocorrendo a sua expansão, como está escrito: “E eu,
quando for levantado da terra, todos atrairei a mim” (João
12:32). E noutro lugar encontramos: “Todo o que o Pai me dá
virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei
fora. Porque eu desci dos Céus, não para fazer a minha
vontade, mas a Vontade Daquele que me enviou. E a Vontade
do Pai que me enviou é esta: Que nenhum de todos aqueles
que me deu se perca, mas que o ressuscite no último dia” (João
6:37-39). Consonante a isso, os nosso Sábios ensinam que:
O Rabi Yehoshua Ben Levi encontrou o Profeta Eliahu
quando se encontrava na entrada da caverna do Rabi
Shimon Bar Yochai... O Rabi Yeshoshua perguntou-
lhe: “Quando Mashiach chegará?” Eliahu respondeu-
lhe: “Vá e pergunte ao próprio Mashiach!” O Rabi
Yehoshua Ben Levi perguntou-lhe: “E onde ele pode
126
ser encontrado?” Eliahu respondeu-lhe: “No portão da
cidade de Roma”.
... O Rabi Yehoshua foi até ele, o Mashiach, e disse-
lhe: “Que a paz esteja sobre você, meu Rabi e Moré!”
O Mashiach respondeu-lhe: “Que a paz esteja sobre
você, filho de Levi!” O Rabi Yehoshua Ben Levi
perguntou-lhe: “Quando o mestre chegará?” O
Mashiach respondeu-lhe: “Hoje!”
O Rabi Yehoshua Ben Levi voltou para Eliahu. Eliahu
perguntou-lhe: “O que ele falou para você?” ...O Rabi
Yehoshua respondeu-lhe: “Ele mentiu para mim, pois
disse-me que chegaria hoje – e não chegou!” Eliahu
disse-lhe: “O que ele quis dizer foi o seguinte: Ele virá
hoje se escutares a sua Voz” (Talmud da Babilônia,
Tratado Sanhedrin 98a).
O espírito desta passagem talmúdica é o mesmo das
Escrituras que rezam: “Eis que estou à porta, e bato; se alguém
ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com
ele cearei, e ele comigo” (Apocalipse 3:20). A Voz do
Mashiach é propagada através das vozes de seus mensageiros
(Isaías 52:7 / Mateus 28:19 / João 17). De forma que o Mundo
do Mashiach é análogo à Arca de Noé, é uma proteção para a
destruição que abaterá o mundo natural, como bem comparou
o Mashiach, quando disse: “E, como foi nos dias de Noé, assim
será também a vinda do Filho do homem” (Mateus 24:37). Nos
dias de Noé eles viviam numa democracia, como vivemos
hoje, e eles corromperam o mundo com violência e
promiscuidade, como fazemos igualmente. A mesma fórmula,
por que daria num resultado diferente?
Noé era o Rei daquele mundo, como o Mashiach é o
Rei deste nosso mundo, mas tanto lá quanto aqui não houve o
devido reconhecimento e sujeição das pessoas em geral à sua
autoridade, o que culminou com uma completa destruição.
127
Está escrito na Torá:
“Estas são as gerações de Noé. Noé era homem justo
e perfeito em suas gerações; Noé andava com Deus”
(Gênesis 6:9).
Os Sábios discutem em que contexto que Noach era
justo, um Tzadik, pois, sendo filho de sua geração, a geração
que corrompeu o mundo ao ponto de leva-lo à destruição
completa, seria difícil imaginar que Noach fosse um Tzadik
sem mácula alguma, um Tzadik Shalem, por conta desta
percepção eles discutiram e o resultado foi uma divisão de
opiniões. Rashi expõe esta divisão de opinões da seguinte
maneira:
Alguns de nossos rabinos explicam isso (esta palavra)
para seu crédito: ele era justo mesmo em sua geração;
segue-se que se ele tivesse vivido em uma geração de
pessoas justas, ele teria sido ainda mais justo devido à
força do bom exemplo. Outros, porém, explicam isso
para seu descrédito: em comparação com sua própria
geração, ele foi considerado justo, mas se tivesse vivido
na geração de Abraão, teria sido considerado sem
importância (cf. Sinédrio 108a). (Rashi em Gênesis
6:9).
O que os Sábios quiseram nos ensinar com esta
discussão foi que um Tzadik é um Tzadik, ou seja; Deus
mesmo é quem o justifica, como não há outra autoridade acima
de Deus um Tzadik não pode ser descredibilizado. A outra
lição foi: ainda que alguém observe o Tzadik e encontre falhas
em seu comportamento, não cabe ao indivíduo julga-lo
desfavoravelmente, pois, pode estar ofendendo um Santo
verdadeiro e não ficará sem punição por suas ofensas, como
ocorreu no caso de Elishá HaNavi, que foi ofendido por jovens
e por conta da ofensa dirigida a um Tzadik ursos vieram e
devoram eles (2 Reis 2:23-24). Também nos é ensinado que
128
não devemos nos considerar nem santos e nem profanos, pois,
o julgamento pleno sobre nossos atos cabe a Deus que tem
plena ciência de todas as coisas, logo, eu não tenho como aferir
com precisão o quanto estou acertando e quanto estou errando,
qual a grandeza de meus acertos e qual a gravidade dos meus
erros, só Deus sabe, e mais ninguém, e ainda que as pessoas
possam me julgar, como julgaram a Noach, eu devo seguir em
frente no caminho da Torá na certeza que no dia de acerto de
contas eu receberei o que me for justo; em recompensas ou
castigos. Mas, a despeito da opinião desfavorável em relação
à Noach, a maioria dos Sábios o consideram um Tzadik
Shalem – um justo pleno, e por conta disso a Torá o retrata não
apenas como o Salvador e Consolador, como o Rei do novo
mundo pós-diluviano. A grandeza e santidade de Noach é
ilustrada tanto nas Escrituras Sagradas quanto na Tradição
Judaica quando ambas as fontes o iguala a Yov e a Daniel,
homens muito amados por Deus:
“Faça para você uma arca de madeira de gofer”
(Gêneses 6:14). Para compreender este versículo
completamente, devemos nos referir a Ezequiel 14:14,
onde o Profeta fala de três homens, ou seja, Noé, Daniel
e Jó, que conseguiram salvar suas próprias vidas devido
à sua piedade pessoal. O Profeta afirma que Deus lhe
disse que mesmo que todos esses três homens piedosos
estivessem vivos em Jerusalém naquela época, eles não
poderiam salvar a cidade do desastre, embora
pessoalmente fossem salvos. A razão pela qual todos
esses três homens piedosos são mencionados é para nos
ensinar que mesmo dois deles juntos não seriam
suficientes para se salvarem naquele momento em
Jerusalém. Alguns dos comentaristas anteriores se
perguntaram que, em vista das muitas pessoas piedosas
que pereceram durante a destruição do Templo
129
(compare Salmos 79:2 "eles deixaram os cadáveres dos
Teus servos etc."), como é que três pessoas piedosas
puderiam salvarem-se enquanto que um número muito
maior de pessoas piedosas morreram durante a
destruição da cidade? Uma das respostas dadas é que
cada pessoa piedosa pode ter sido espalhada entre
muitos pecadores, ao passo que se três pessoas piedosas
tivessem ficado juntas certamente teriam sido salvas
pelos seus méritos. Esta pode ter sido a razão pela qual
Noé só pôde ser salvo depois de construir a Arca, ou
seja, proporcionando um ambiente separado para si
mesmo. Enquanto ele estivesse cercado por seus
compatriotas sem uma “Mechitza” ()מחיצה, muro
divisório, ele teria sido arrastado junto com eles. Se
Noach tivesse tido mais algumas pessoas piedosas com
ele, ele e eles teriam sido salvos sem a necessidade de
construir seu próprio ambiente. Sob tais circunstâncias,
o versículo em Salmos 94:15, que nos informa que sob
certas circunstâncias a justiça poderia ter revertido o
julgamento, teria sido preferivelmente aplicável. Pelo
fato de Noé ter sido obrigado a construir uma Arca,
aprendemos que seus filhos não se igualavam a ele em
piedade. Se tivessem feito isso, Noach não teria
precisado construir a Arca, mas teria sido salvo em seu
próprio habitat. Precisamos conciliar isso com as
palavras dos nossos sábios que citei anteriormente, e
segundo as quais Abraão aprendeu com Noach que era
inútil orar para que uma cidade com menos de dez
pessoas justas fosse salva. Se Noé fosse o único homem
justo em sua geração, o que Abraão poderia ter
aprendido com isso? Devemos, portanto, assumir que
embora os filhos de Noé fossem justos, eles não eram
pessoas perfeitamente justas como o seu pai. Quando
Abraão orou sobre pessoas justas serem capazes de
salvar uma cidade, ele se referia a pessoas
130
perfeitamente justas, não àquelas cujas boas ações mal
superavam seus pecados. Esta é a razão pela qual
Ezequiel listou os nomes de homens notavelmente
justos, como Noé, Daniel e Jó. Ele não se referiu a três
tipos médios de Tzadikim (Or HaChaim em Gênesis
6:14).
Estes três Tzadikim são equivalentes, e são arquétipos
de níveis espirituais tal qual os Patriarcas: Abrão, Isaac e Jacó
na Árvore da Vida das Sefirot, onde Abraão representa a
Coluna de Chessed, que fica à direita da Árvore, Isaac a
Coluna de Guevurá, à esquerda da Árvore e Jacó
representando a Coluna de Tifeeret, a Coluna do meio. Está
escrito na Torá com relação ao versículo: “Com os andares
inferior, segundo e terceiro o farás” (Gênesis 6:16), foi
ensinado em uma Beraita: “O andar de baixo era para esterco,
o andar do meio era para animais, e o andar de cima era para
pessoas” (Talmud da Babilônia, Sanhedrin 108b:11). Em certa
medida, portanto, os andares da Arca de Noé são análogos às
três colunas da Árvore da Vida, onde o andar de baixo
representa a severidade de Guevurá que é correspondente a
Issac e a Jó, o andar do meio representa a beleza da natureza
em toda a sua complexidade e, desta forma, a coluna de
Tifeeret que é correspondente a Jacó e a Daniel, e o andar de
cima representa a coluna de Chassed que é correspondente a
Abraão e a Noach, uma vez que tendo sido justamente o
homem culpado pela destruição do mundo, merecendo por
conta disso severo castigo, todavia, aprouve ao Santo agraciar
uma família livrando-a do trágico destino de todas as pessoas
daquela geração, e por extensão livrando assim o mundo
inteiro da total aniquilação, e aqui, neste contexto, a Torá
estabeleceu um conceito de que para certos males o veneno
que o provocou é também o remédio para tal problema, pois o
131
mundo foi destruído pelo homem, porém, igualmente pelo
homem o mundo foi reconstruído, tal qual o veneno da
serpente que traz a morte tem seu antídoto extraído do mesmo
veneno promovendo a vida.
Os três andares no interior da Arca evocam a estrutura
tripla do atributo Divino de Emesh (como fartamente
trabalhado no Sefer HaMaftechot volume 1, A Chave de
Emesh), atributo este concebido pelo Santo, bendito seja,
como ponte intermediária entre a luz e as trevas. Em termos de
expressão da natureza, Emesh equivale ao entardecer e ao
amanhecer, fenômenos naturais que se revelam como não
sendo nem dia e nem noite, mas uma interseção entre ambos.
Emesh ( )אמשé o atributo Divino formado pelas chamadas
Três Mães, as letras: Alef, Mem e Shin.
A Arca de Noé, após construída e pronta para abrigar
aos tripulantes, manifestou o atributo Divino de Emesh na
medida em que a atmosfera espiritual que se plasmou em torno
da Arca tornou manifestos os três níveis de ascenção para o
interior da Arca: o lado de fora, correspondente às trevas, o
lado de dentro, correspondente à luz, e a rampa, correspondete
ao estado intermediário que se manifesta tanto no amanhecer
quanto no anoitecer. De forma que aqueles que não quiseram
render-se à mensagem de Noach tornaram-se habitantes das
trevas, aqueles que adentraram na Arca tornaram-se habitantes
da luz, enquanto que os animais que subiam a rampa
representaram aquelas pessoas que estavam num estado de
transição de sua condição animalesca e irracional, vivendo
apenas para saciar os seus apeites instintivos para uma
condição verdadeiramente humana que aponta para um nível
de transcendência superior, aproximando a natureza humana
da natureza Divina, e é por isso que encontramos na Torá a
informação de que alguns casais de animais ao subirem na
132
rampa da Arca foram chamados de “o homem e sua mulher”
(Gêneses 7:2 – texto hebreu) e não como esperaríamos que
fossem chamados, comumente de “macho e fêmea”.
Ainda sobre o Atributo Divino de Emesh, sua essência
muito se parece com o conceito cristão da Santíssima
Trindade, e esta semelhança é mantida mesmo quando este
Atributo é tratado pelos Sábios na Tradição Judaica, como está
escrito: Rabi Yosse disse: “Ouve Israel, o Senhor é nosso
Deus, o Senhor é Um!” (Deuteronômio 6:4) ... o mistério
contido nas palavras “O Senhor é nosso Deus, o Senhor”, é o
mistério da unidade em três aspectos...” (Zohar, Terumá, V.4,
pp. 760-761). E noutro lugar também foi nos ensinado pelo
Rabino Shimeon Bar Yochai: “Assim como há três cabeças
juntas em Atika Kadisha, ... tudo acontece por meio de três
cabeças como eu disse” (Zohar, HaAzinu, V.22, pg. 417). O
“Atika Kadisha” é o mesmo “Atik Yomin”, o “Ancião de dias”
de Daniel 7:22.
Ou seja; no “Universo do Caos” que é o universo das
coisas intermediárias, o Nome Divino é Emesh ()אמש, o único
atributo Divino escrito com as Três Mães. A fonte de origem
das Três Mães se encontra no Sefer Yetzirá, O Livro da
Formação:
עשר ספירות בלי מה ועשרים ושתים אותיות יסד
שלוש אמות ושבע כפולות ושתים עשרה פשוטות
“Dez Sefirot do nada e 22 letras fundação: Três Mães,
Sete Duplas e Doze Elementares” (Sefer Yetzirá 1:2).
O Rabino Ariel Bension (2010, p. 90) citando o Zohar,
nos ensinou que o Ancião dos Dias é conhecido como a Face
Grande, que é composta de três naturezas ou princípios
superpostos: macho, fêmea e filho.
133
O “Macho” equivale a Alef, a “Fêmea” equivale a
“Shin” e o “Filho” equivale a Mem. O Ancião de Dias, o Trono
de Deus e a Janela entre os mundos é Emesh, e tudo o que
envolve estes conceitos é Seu Domínio.
Os Sábios do Zohar, em suas visões místicas, ao
visualizarem os domínios de Emesh os descreveram nos
seguintes termos: “Três figuras são vistas no Trono Supremo:
uma é o Pássaro e uma é a figura do Messias, pois todos se
elevaram ao mais alto. E o Santíssimo conjura os dois a
disseminar todo o Bem no mundo” (BENSION, Ariel, 2010,
pp. 200-201).
Em outras palavras: uma comunidade religiosa,
considerada como a família espiritual, protege aqueles que
dela participa das mazelas morais e espirituais do mundo tal
qual a Arca de Noé protegeu a ele, a sua família e a todos os
demais tripulantes. Por isso a Torá disse: “E abençoarei os que
te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em
ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gênesis 12:3),
preste atenção, a Torá diz: “todas as famílias da terra” e não
“todo o indivíduo da terra”, esta é a fórmula para se livrar dos
males destrutivos do mundo: viver em família, e mais
particularmente, em uma família construída e regida pela
Vontade de Deus, pela Torá, como bem nos ensinou o
Mashiach, como está escrito:
“E disse-lhe alguém: Eis que estão ali fora tua mãe e
teus irmãos, que querem falar-te. Ele, porém, respondendo,
disse ao que lhe falara: Quem é minha mãe? E quem são
meus irmãos? E, estendendo a sua mão para os seus
discípulos, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; porque,
qualquer que fizer a Vontade de meu Pai que está nos Céus,
este é meu irmão, e irmã e mãe” (Mateus 12:47-50).
134
A Família Espiritual não é um conceito estritamente
religioso, ele também foi percebido e validado pelos filósofos
antigos:
Podemos comparar os cidadãos aos marinheiros:
ambos são membros de uma comunidade. Ora, embora
os marinheiros tenham funções muito diferentes, um
empurrando o remo, outro segurando o leme, um
terceiro vigiando a proa ou desempenhando alguma
outra função que também tem seu nome, é claro que as
tarefas de cada um têm sua virtude própria, mas sempre
há uma que é comum a todos, dado que todos têm por
objetivo a segurança da navegação, à qual aspiram e
concorrem, cada um à sua maneira. De igual modo,
embora as funções dos cidadãos sejam semelhantes,
todos trabalham para a conservação de sua
comunidade, é a este interesse comum que deve
relacionar-se a virtude de cada cidadão
(ARISTÓTELES. Política – Professor Clovis de Barros
Filho, 2012, p. 33).
Consonante a isso os nossos Sábios ensinaram que nos
últimos dias as pessoas honestas terão que viver em
comunidade e se afastarem da sociedade em geral (Talmud da
Babilônia, Tratado Sanhedrin 97a). Pois, “Como foi nos dias
de Noé assim será na Vinda do Filho do Homem" (Mateus
12:50).
135
Sobre o Pai Abraão
136
menino que se negaria, no futuro, a reconhecer Nimrod como
uma autoridade divina, e que inclusive o derrotaria (BEKER,
Menachem, 2011). Para se resguardar, Nimrod ordenou
confinar todas as mulheres grávidas a fim de assassinar a todos
os bebês masculinos que nascessem deste dia até que passasse
o perigo.
Terach, cuja esposa, Amathlai Bat Karnebo (EPSTEIN,
Rabino Isidore, Talmud da Babilônia – Tratado Baba Bathra
91a), que já estava grávida de Avraham, era ministro do Rei e
um dos homens mais confiáveis da corte real, e como tal restou
excluído da obrigação de entregar a sua esposa, assim como os
demais nobres da corte que gozavam da confiança do Rei.
Contudo, o estranho astro prenunciava o nascimento do
milagroso menino mesmo assim. Nimrod, então, temendo pelo
seu futuro, pediu um cálculo desde o aparecimento do estranho
astro até o presente momento para saber se a criança já tivesse
nascido quantos anos teria, os astrólogos lhe informaram que
a criança teria em torno de dois anos de idade se tivesse
nascido no tempo do aparecimento do estranho astro. Então,
Nimrod mandou matar todas as crianças de dois anos para
baixo, a fim de que dessa forma, matasse junto com as crianças
o menino vaticinado pela leitura da estrela.
Após algum tempo apresentaram-se novamente os
astrólogos ante Nimrod informando-lhe acerca do
aparecimento da dita estrela sobre a casa de Terach, o estranho
astro havia feito desaparecer quatro estrelas dos quatro pontos
cardeais, como se fosse um buraco negro no espaço. Isso
indicava que o bebê de Terach seria aquele que venceria o
poderoso Nimrod, e sua glória se expandiria para o norte e o
sul, para leste e o oeste.
Nimrod ordenou a Terach que entregasse o seu bebê – o
pequeno Avraham -, porém, ele entregou o filho de uma
137
escrava no lugar de Avraham, e ordenou que sua esposa,
Amathlai, a mãe do menino, o escondesse em uma caverna
durante treze anos, até que – percebendo que o vaticínio de
seus astrólogos não se cumpria – Nimrod revogou o decreto e
Avraham pôde regressar livremente para sua casa, junto ao
convívio familiar.
Avraham cresceu, e se tornou um fervoroso monoteísta,
e constantemente desafiava os delírios de divindade de
Nimrod, que farto das provocações dele, ordenou que se
preparasse um forno para arrojar ali a Avraham. Por fim, os
servos de Nimrod, em público perguntaram a Avraham: “Com
quem estais; com Nimrod ou com tuas ideias monoteístas?”
Ao que Avraham respondeu: “Estou com o Eterno.” Então, o
jogaram no forno.
Mas, para surpresa de todos, o fogo que deveria devorar
a Avraham Avinu, ao invés disso, se transformou em uma
frondosa trepadeira que, saindo de dentro do forno, se espalhou
para todos os lados, cheia de folhas e flores que, de tão belas e
cheirosas, encantou a todos, e Avraham, pela providência
Divina, saiu de dentro do forno ileso.
Haran, o irmão de Avraham, ficou tão impressionado
com o que viu que resolveu igualmente desafiar a Nimrod, e
disse: “Também sou monoteísta! Também creio no Eterno!”
Declarando publicamente que também partilhava da mesma fé
de seu irmão, porém, por fazer isso apenas para se exibir, não
por uma fé genuína, não por causa de uma fé enraizada em seu
interior, não logrou o mesmo resultado. Também o arrojaram
em um forno e o fogo o devorou. É esta a razão da Torá
declarar a morte de Haran ainda jovem, porém, sem um motivo
aparente (Gênesis 11:28).
O Midrash questiona o porquê de o fogo não ter
devorado a Avraham e o porquê de ter devorado a Haran:
138
Por que? Qual é a diferença entre Avraham e Haran? O
fogo pode consumir a matéria, porém, não ao ser que a
transcende. Haran atuou motivado por princípios
lógicos, nunca logrou sair da prisão que impõe os
parâmetros do arrazoamento humano. Avraham, por
outro lado, atuou motivado pela fé da transcendência.
Avraham cria apesar de não ter nenhum indício lógico
que sustentasse a sua postura, Avraham cria apesar do
que o que se manifestava como normal era justamente
o contrário de sua fé. Quando alguém planeja a sua vida
transcendendo a lógica que a existência pretende
impor, os resultados que obterá também transcenderão
a relação natural de causa-efeito. E nessas condições, o
fogo não necessariamente queima. Avraham foi um ser
transcendente: o fogo físico não chega até aí (BEKER,
Menachem Beker. 2011, p. 70).
O episódio da Fornalha Ardente em relação à Avraham
imediatamente nos remete a outro episódio futuro bem
semelhante registrado nas Escrituras Sagradas, o episódio dos
três judeus jogados na fornalha ardente de acordo com a ordem
do Nevuhadenetzar HaMelekh, o Rei nabucodozor, e de
acordo com os nossos Sábios tanto um episódio quanto o outro,
quando lidos juntos, remete ao conceito de: Maassê Avot
Siman LeBanim (os feitos dos pais são sinais para os filhos).
Como está escrito:
Rav Naḥman bar Yitzḥak disse: Outra razão pela qual
alguém recita o hallel dos Salmos 113-118 é porque ele
contém uma referência à libertação das almas dos
justos da Gehenna, como está declarado: “Eu te
imploro, Senhor, livra minha alma ” (Salmos 116:4).
Ḥizkiya disse: Outra razão é porque contém a história
da descida dos justos Hananias, Misael e Azarias à
fornalha ardente e sua ascensão milagrosa dela.
139
Ḥizkiya esclarece sua declaração anterior: A
descendência deles é mencionada neste hallel, como
está escrito: “Não para nós, Deus, não para nós”, um
versículo que Hananias recitou. Mishael recitou: “Mas
ao Teu Nome dá glória.” Azarias recitou: “Pela Tua
misericórdia e por amor da Tua Verdade.” Todos
recitaram juntos: “Por que deveriam as nações dizer:
Onde está agora o seu Deus?” Este hallel também alude
à subida de Hananias, Misael e Azarias da fornalha
ardente, como está escrito: “Louvai ao Senhor, todas as
nações, louvai-O todos os povos. Porque a Sua
misericórdia é grande para conosco, e a verdade do
Senhor dura para sempre, aleluia ” (Salmos 117).
Hananias recitou: “Louvai ao Senhor, todas as nações”,
pelo milagre evidente realizado por eles diante das
nações. Mishael recitou: “Elogiem-no todos os povos.”
Azarias recitou: “Pois a sua misericórdia é grande para
conosco”. Todos recitaram juntos: “E a verdade do
Senhor dura para sempre, aleluia ”. E alguns dizem que
o anjo Gabriel recitou: “E a verdade do Senhor dura
para sempre”. Esta Gemara elabora: Quando o maligno
Nimrod jogou nosso pai, Abraão, na fornalha ardente,
Gabriel disse diante do Santo: Bendito seja Ele: Mestre
do Universo, descerei e esfriarei a fornalha, e assim
salvarei os justos. Abraão da fornalha ardente. O Santo,
bendito seja, disse-lhe: Eu sou único no meu mundo e
Abraão ainda é único no seu mundo. É apropriado que
o único salve o único. Portanto, o próprio Deus desceu
e o salvou. E como o Santo, bendito seja, não nega
recompensa a nenhuma criatura que procure realizar
uma boa ação, Ele disse a Gabriel: Você merecerá o
resgate de três de seus descendentes em circunstâncias
semelhantes. Rabi Shimon HaShiloni ensinou: Quando
o malvado Nabucodonosor jogou Hananias, Misael e
Azarias na fornalha ardente, Yurkamo, o anjo
140
ministrador do granizo, ficou diante do Santo, bendito
seja, e disse diante Dele: Mestre do Universo, eu
descerei e esfriarei a fornalha ardente, e salvarei estes
justos da fornalha ardente. Gabriel lhe disse: A força do
Santo, bendito seja, não ficará evidente desta maneira,
pois você é o ministro do granizo, e todos sabem que a
água apaga o fogo. Sua ação não seria considerada um
grande milagre. Em vez disso, eu, o anjo ministrador
do fogo, descerei e esfriarei a fornalha por dentro, e
queimá-lo-ei por fora, para consumir aqueles que
lançaram os três justos na fornalha; e assim realizarei
um milagre dentro de um milagre. O Santo, bendito
seja, disse-lhe: Desce. Naquela época Gabriel começou
a louvar a Deus e recitou: "E a Verdade do Senhor dura
para sempre" (Salmos 117:2), pois Deus cumpriu Sua
promessa a ele de mais de mil anos antes (Pesachim
118a:17 - 118b:1).
Avraham: O Hebreu
141
Criação do Universo. O que não ocorreu com as demais
nações” (HALEVI, Rabi Yehudá. 2012, parágrafo 49).
Outros Sábios também deram suas explicações do
porquê Avraham Avinu ter sido chamado pela Torá de
“Hebreu”:
O que significa o adjetivo “hebreu” com o qual o
versículo qualifica a Avraham? “Hebreu” significa “do
outro lado”. Disse Rabi Yehudá: “Todo o mundo está
de um lado, e ele – Avraham – está do lado oposto (todo
o mundo está imerso em atividades materiais para
engrandecer a si mesmos, Avraham Avinu está imerso
em atividades espirituais neste mundo para
engrandecer e elevar toda a criação espiritualmente
diante de Deus).
Ensina Rabi Nechemia: “Avraham era hebreu porque
descendia de Eber (Gênesis 10:21). De modo que
“hebreu” vem a ser um adjetivo patronímico.
E nossos Sábios dizem: “Era hebreu por haver nascido
do outro lado do Eufrates, quer dizer, do Eufrates até o
Leste, na Mesopotâmia; falava a língua hebraica. Neste
caso, “Hebreu” seria adjetivo gentílico (BEKER,
Menachem Beker. 2011, p. 82).
142
Porém, depois que se estabeleceu na Terra Prometida, e
depois de haver se submetido a duras provas, nasceram seus
filhos Ishmael e Yitzichak. É importante observar que
Avraham tinha 86 anos quando nasceu Ishmael, e 100 anos
quando nasceu Yitzichak. E o fenômeno da procriação em
idade avançada também ocorreu com Yitzichak e Yaacov:
Yitzichak tinha 60 anos quando nasceram seus filhos gêmeos
(Gênesis 25:26); e Yaacov começou a procriar sua frondosa
descendência aos 80 anos de idade (Rashi – Parashá Toldot).
Vários dos Sábios de Israel se assombraram do feito de
que os três Patriarcas tiveram seus filhos quando já eram
anciãos. Rabi Avraham Shemuel Biniamin Sofer, autor do
Ketav Sofer, explicou que:
Os Patriarcas tinham a importantíssima missão de
transmitir à humanidade os Valores Divinos. Se
houvessem tido filhos durante a sua juventude, não
haveriam podido consagrar-se à nobre missão de
inculcar estes valores a terceiros. Por isso, o
Eterno, induziu que eles tivessem seus filhos em
idade avançada, de modo que pudessem
livremente aplicar-se à educação de suas crianças
depois de haver formado numerosos discípulos
durante a juventude (BEKER, Menachem Beker.
2011, pp. 72-73).
143
mostrar ao mundo o grau de abnegação do grande Patriarca de
Israel mediante a ordem Divina:
1. Avraham foi ocultado de Nimrod durante treze anos,
para evitar que o matassem.
2. Nimrod arrojou a Avraham em uma fornalha acesa.
3. O Eterno ordenou a Avraham abandonar sua pátria e
dirigir-se a uma Terra que lhe mostraria.
4. Avraham precisou sair de Kenaan por causa de uma
severa fome.
5. Sará, esposa de Avraham, foi conduzida ao palácio,
para ser tomada por mulher pelo Faraó.
6. Ló, sobrinho de Avraham, foi tomado como
prisioneiro. E Avraham precisou lutar em uma guerra
para resgatá-lo.
7. O Eterno informou a Avraham, no Pacto entre as
Partes, que o Povo de Israel sofreria quatro exílios.
8. À idade de noventa e nove anos, o Eterno lhe ordenou
circuncidar-se.
9. O Eterno lhe ordenou despedir de sua casa a sua esposa
Hagar e a seu filho Ishmael.
10. O Eterno lhe ordenou atar o seu filho Yitzichak sobre
o Altar como oferenda.
A Religião de Avraham
144
É sabido que o Patriarca Avraham se educou na religião
e crença dos Sabeus, de que não há outra divindade
além das estrelas, das obras dos tais (Sabeus) só
existem agora em traduções árabes, e também em suas
antigas crônicas. Dizem claramente que o sol governa
o mundo, tanto o mundo superior como o inferior
(MAIMON, Rabi Moshé Ben. 1947, capítulo 29).
145
O historiador grego Estrabão, em sua obra Geografia,
acrescenta informações curiosas sobre os Sabeus, baseando-se
nas informações de Eratóstenes (século III a.C.). Eles viviam
num território situado entre o Reino Mineano e o Reino
Qatabano. A capital do reino, Marib, estava situada no topo de
uma colina arborizada. O país, como seus vizinhos, constituía-
se numa florescente monarquia ostentando belos templos,
palácios e casas que lembravam as dos egípcios. A forma de
sucessão ao trono era peculiar: o herdeiro manifesto não era o
filho do rei, mas o primeiro filho nascido numa família nobre
após a coroação do soberano. O rei era também o juiz, mas não
podia deixar o palácio, sob pena de ser apedrejado até a morte.
A religião dos Sabeus, embora admitisse uma
multiplicidade de deuses, parecia estar centralizada em torno
de uma divindade suprema denominada Almaqah. Os
símbolos de uma cabeça de touro e vinhas que aparecem
associadas a ele, indicam que tratava-se de um deus solar.
O sabeu era uma língua do ramo semítico. Possuía um
alfabeto elegante composto por 29 caracteres, os quais foram
posteriormente adaptados para a criação do “Giiz”, uma
espécie de latim da Etiópia (o "Giiz" não é mais uma
língua viva desde aproximadamente o século X d.C., todavia
ainda é usado como língua litúrgica pela Igreja Ortodoxa
Etíope).
Da mesma forma que o árabe e o hebreu, o alfabeto
sabeu incluía somente consoantes (sílabas, na verdade), e
diferentemente destes, não possuía nenhuma indicação de
vogais. Na maioria das inscrições, é escrito da direita para a
esquerda (embora algumas outras também apresentem o estilo
"boustrophedon", ou seja, da direita para a esquerda e da
esquerda para a direita, como quem ara um campo).
146
Nestes livros e crônicas se nos refere a história do
Patriarca Avraham da seguinte maneira: Avraham foi criado
em Kuza; quando discrepou do parecer dos religiosos
declarando que há um artífice do sol, opuseram-lhe certos
argumentos que evidenciam e manifestam a ação que o sol
exerce sobre o universo. “Tens razão” disse Avraham; “o sol
atua como um machado na mão do lenhador”. Em suma, o rei
dos Sabeus o reduziu a prisão, onde continuou por muitos dias
discutindo com eles. Por fim, temeu o rei que Avraham lhe
corrompesse com sua ideia e a todo o reino, distanciando o
povo de sua antiga religião, decidiu expulsá-lo e desterra-lo
para a Síria, logo de o haver privado de seus bens e
propriedades. Tal é o relato que aparece em um livro chamado
“A Agricultura Nabateana”.
Entre os turcos ao Norte e os indianos no Sul restam
ainda alguns dos Sabeus, que um dia povoaram a terra, e entre
os deles que foram hábeis para pensar, e entre os filósofos
daqueles tempos, só se concebia a ideia de que Deus era o
espírito das esferas celestes, que eram o seu corpo. Abu-Becr
Al-Zaig menciona isso em seu “Comentário ao Livro da
Física”.
Quando apareceu Avraham, “Coluna do Mundo”, não
tardou em convencer-se de que há um Ser Divino e espiritual,
que não é nem corpo, nem força residente em um corpo, autor
dos planetas e das estrelas; e compreendeu o absurdo das
lendas em que havia sido educado. Começou, por isso, a
combater a crença dos Sabeus e a declarar a falsidade de suas
opiniões, e a proclamar publicamente contra eles “o Nome de
Deus, Senhor do Universo” (Gênesis 21:33), cuja proclamação
encerrava ao mesmo tempo as ideias da existência de Deus e a
Criação do Mundo (Ibidem).
147
Como Avraham “criou” a Deus
148
olhada. Sem virar a cabeça, o que você vê detrás da sua
cabeça? Nada.
Agora que já sabemos como é o “nada”, podemos
perguntar-nos outra coisa: O “nada” existe? Existe de
verdade uma coisa que não é nada? Se não, se “nada”
não é uma coisa, então não podemos dizer realmente
que ele existe, pelo menos não como geralmente
concebemos a existência.
Mas o nada existe? O senso comum nos diz que sim.
Afinal, antes de haver qualquer coisa, havia o nada.
Antes de Deus ter criado o Universo, não havia nada –
nada, salvo Deus.
É muito difícil imaginar o nada. Mas Deus é ainda mais
difícil de imaginar, até mais impossível de visualizar.
Na obra clássica da Kabalá, o Tikiney Zohar, o Profeta
Elias é citado dizendo a Deus: “Nenhum pensamento
pode compreender-te, em absoluto”. O grande líder
Chassídico, Rabi Shneur Zalman de Liade, explica esta
ideia. Ele escreve que a mente humana não foi
construída nem equipada para compreender a Deus.
Exatamente como você não pode conter um
pensamento na sua mão física, você não pode captar a
Deus com a mente. Exatamente como nenhuma mão,
não importa a sua força ou o seu tamanho, pode
apreender nenhum pensamento, por mais simples que
este seja, nenhuma mente, nenhum pensamento pode
compreender a Deus.
Então, o que fazer com um conceito que você não pode
compreender? O que você faz com algo tão
transcendental, tão remoto da nossa imaginação, que a
mente não pode sequer concebê-lo? Em primeiro lugar,
você lhe dá um nome. Você tenta imaginar como Ele
pode afetar você. Você tenta estabelecer algum
relacionamento com Ele. Foi isso que fez o homem
149
(Avraham) com Deus. E foi assim que o homem
“criou” a Deus (KAPLAN, Aryeh. 2012, pp. 45-46).
Eis aí o que nos apresenta o Rabino Aryeh Kaplan sobre
a estrutura mental de um monoteísta. O Pai Abraão foi
precursor deste tipo de raciocínio, não é à toa que Monoteísmo
e Avraham se tornaram sinônimos no decorrer das eras. Não é
à toa que Avraham Avinu é chamado de; o Pai da Fé, não é à
toa que o Eterno quando deseja referir-se a Si mesmo diz com
frequência: “Eu sou o Deus de Abraão...” (Gênesis 26:24). E
não foi à toa que Yochanan HaShaliach fez questão de registrar
em sua Bessorá que Rabi Yeshua HaNotzeri seguiu
estritamente e inflexivelmente o padrão de Fé Monoteísta
fundado por Avraham seu Pai, como está escrito: “E a Vida
Eterna é esta: que Te conheçam, a Ti só, por Único Deus
verdadeiro...” (João 17:3).
Toda a Tradição sobre Avraham consumiria muitas
páginas sem esgotar o assunto, ele é sem dúvida uma das
personalidades mais influentes do mundo, de todas as
gerações, neste mundo e no outro. Acredito que por tudo acima
exposto sobre Avraham Avinu já é possível ter um olhar mais
acurado sobre como o Judaísmo retrata a Avraham, o Pai da
Fé Monoteísta, o Pai do Povo Judeu. Bom, tendo em vista a
impossibilidade de escrever aqui nesta obra tudo o que há para
se escrever sobre Abraão, me limitarei em concluir esta breve
biografia com algumas citações do Midrash sobre os seus
últimos dias sobre esta terra, sua preocupação com a sua
descendência futura e uma breve reflexão sobre o mérito que
ele adquiriu junto a Deus.
150
Ensina Rabi Berekhia: “Sabes com o que se assemelhava
Avraham? A um cântaro de azeite aromático, hermeticamente
fechado, localizado em um lugar distante, onde sua fragrância
não podia ser apreciada. Até que foi tirado de seu lugar. E só
então, sua fragrância pôde ser valorizada. Assim disse o Eterno
a Avraham: “Avraham, tens tantos méritos, tantas Mitzivot!
Vai de lugar em lugar para que se engrandeça o teu nome pelo
mundo!”, como indica o versículo: “Sai-te da tua terra... E far-
te-ei uma grande nação...” (Gêneses 12:1-2) (BEKER,
Menachem Beker. 2011, p. 80).
A importância da Circuncisão
151
O Gaon Rabi Itzchak Zeev Soloveichik de Brisk nos dá
esta explicação: “Em todas as Mitzivot da Torá, Avraham
atuou com suma diligência, conforme a norma: “Os diligentes
se antecipam na observância das Mitzivot” (Pessachim 4a e
outras fontes). E por isso mesmo cumpriu as Mitzivot antes de
se lhe mandar que se fizesse. Contudo, a Mitzivá da
Circuncisão se denomina Berit Milá (O Pácto da Circuncisão).
E a norma estabelece que em todo o pacto devem ser no
mínimo duas pessoas, as partes envolvidas. Por isso, não pôde
circuncidar-se antes do Eterno lhe ordenar, pois do contrário
haveria uma parte somente envolvida no pacto. E a
Circuncisão deve constituir-se como um Pacto entre duas
pessoas, entre o Mandante e o mandatário, porque se não fosse
desta forma careceria do caráter de Mitzivá - Mandamento”
(BEKER, Menachem Beker. 2011, p 79).
Foi por isso que mesmo Paulo, opositor à prática da
Circuncisão para os membros de sua congregação, disse:
“Qual é logo a vantagem do judeu? Ou qual a utilidade da
circuncisão? Muita, em toda a maneira” (Romanos 3:1-2).
152
Questiona o Admur Rabi Itzchak Meir de Gur, autor do
Chidushei Harim: “De onde deriva Rashi que finalmente
Terach se reencaminhou na senda do Eterno? Na verdade, foi
graças ao mérito de seu filho Avraham que Terach teve o
privilégio de repousar junto a ele na vida transcendental!
Como nos ensinam os Sábios: “Os méritos do filho virtuoso
exonerou ao seu pai pecador” (Sanhedrin 104a). E uma vez
exonerado, o pai pecador resta habilitado para morar junto a
seu filho virtuoso no Paraíso das Almas.
Continua o autor do Chidushei HaRim: “Na paráfrase do
versículo acharás a resposta a um segredo: O versículo não
disse: “Te unirás a teu pai”, senão “Te unirás a teus pais”, no
plural. Ou seja, a Avraham se está prometendo não só se unir
ao seu pai, senão inclusive ao seu avô (também idólatra)”
(BEKER, Menachem Beker. 2011, pp. 81-82).
153
A respeito disso, afirmam os Sábios no Talmud
Yerushalmi: “Israel é comparável com o pó e as estrelas:
Quando descem (de nível espiritual), descem até o pó. Porém,
quando sobem (de nível espiritual), sobem até a altura dos
Céus” (Ibidem).
154
pé. Porém, e quando o Templo não estiver mais de pé?
O que será deles? Como poderão expiar as suas
transgressões?” (BEKER, Menachem Beker. 2011, pp.
84-85).
A Tradição Judaica propõe uma resposta a esta pergunta
de Avraham, eu, porém, prefiro registrar a Resposta Divina
sugerida no Novo Testamento, como está escrito: “Porque
Deus amou o mundo de tal maneira que deu o Seu Filho
unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas
tenha a Vida Eterna” (João 3:16). Assim expiarão as suas
faltas quando o Templo de Jerusalém já não estiver mais em
pé, como já há dois mil anos se pode ver.
155
Sobre Rabi Yeshua HaNotzeri
O que se pode dizer sobre ele que já não tenha sido dito
de milhões de maneiras diferentes?
Na impossibilidade de neste curto espaço escrever algo
inédito sobre o homem mais importante que pisou na terra, me
resta contribuir apenas com a resposta a uma incômoda
pergunta moderna erguida pelos opositores à veracidade
histórica do Novo Testamento.
A pergunta é: Jesus Cristo realmente existiu?
Esta não é apenas uma pergunta incômoda, para os
crentes nele esta pergunta é por demais absurda! Mas, por
conta dos seus opositores, esta questão se tornou impossível de
ignorar nos restando apenas responde-la tão plena e claramente
quanto possível.
Aqueles que questionam se Jesus existiu ou não, hoje em
dia, são muitos: a maioria dos judeus, a maioria dos ateus,
alguns esotéricos, e um número de pessoas cada vez maior que
se decepcionaram com as igrejas por onde andaram e se
sentiram enganadas. Minha resposta, no entanto, visa
responder à questão judaica contemporânea. Minha resposta,
tenho certeza, será muito útil para pessoas sinceras e
verdadeiras para com Deus e para com os homens, pessoas que
pela sua ingenuidade se deixam enganar por aqueles que as
Escrituras Sagradas chamam de “mercenários” (João 10:12-
13), me refiro a indivíduos conhecidos por muitos nas redes
sociais, pessoas que por um lado afirma que o Judaísmo não
tem fronteiras, mas que por outro lado afirmam ser válido
156
apenas o Judaísmo ensinado por eles e por mais ninguém,
impondo contraditoriamente uma fronteira que há pouco
afirmou não existir, estes são mais desonestos e perversos do
que aqueles que eles insistem em denunciar. Cada qual
receberá o seu devido castigo no Dia do Acerto de Contas. Ki
Yehi Ratzon.
Aqueles que afirmam que Jesus não existiu argumentam
que o Novo Testamento é uma invenção romana, e que
nenhum judeu sério daria algum valor a qualquer registro
romano, pois tal registro seria um produto de gentios e uma
obra idólatra. Se Jesus realmente tivesse existido, certamente
encontraríamos fontes judaicas atestando isso. Portanto, Jesus
não existiu. É o que eles afirmam. Mas, mesmo entre os
maledicentes, não há um consenso sobre isso, pois, há outra
ala que afirma que Jesus existiu, é que ele não foi o Cristo, o
Messias, ele foi um agitador, um feiticeiro, e há quem dentre
eles afirme que Jesus foi um sábio, mas não o Cristo. Porém,
por agora, esta ala judaica que acredita que Jesus existiu não é
alvo do meu interesse, por isso a deixarei de lado em minha
argumentação.
Existe uma obra produzida por uma instituição
intitulada: Jews for Judaism, que se dedica exclusivamente a
explorar as “contradições” do Novo Testamento visando com
isso “vacinar” os judeus da sedução dos missionários,
geralmente judeus-messiânicos, que busca convencê-los de
que Yeshua é o Mashiach.
Eles já produziram muito material neste sentido e
praticamente tudo o que produziram está disponível
gratuitamente na internet. Dentre estas obras, uma me chamou
atenção por conta do autor do conteúdo, que é ninguém menos
do que o famoso e prestigiado Rabino Aryeh Kaplan, que a paz
esteja com ele, me chegou às mãos a versão em espanhol da
157
obra cujo título é: El Verdadero Mesías, uma respuesta judía
a los misioneros. A existência desta obra por si só já responde
de pronto a questão se Jesus existiu ou não, pois, um Rabino
do calibre do Rabi Aryeh Kaplan não iria ocupar o seu precioso
tempo produzindo uma obra que efetivamente não está
aclarando nada para ninguém, pois, a questão erguida nesta
obra não é sobre a existência de Jesus, mas quem ele foi. A
questão está voltada ao fato de se ele é o Messias ou não.
Obviamente que toda a argumentação do Rabi Aryeh
Kaplan é para fundamentar a percepção de que não, Rabi
Yeshua HaNotzeri não é o Mashiach, e para os cabeças desta
instituição, Jews for Judaism, certamente ter um argumento
escrito pelo próprio Aryeh Kaplan seria suficiente para que de
uma vez por todas ficasse mais do que provado que Jesus não
é o Messias não apenas pelas provas apresentadas, mas pelo
fato do ilibado Rabino Kaplan, famoso pela sua agudeza de
espírito, amante da Verdade, extremamente inteligente e
íntegro afirmar isso. A questão é que está escrito:
“Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e
perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por
minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso
galardão nos Céus; porque assim perseguiram os profetas
que foram antes de vós” (Mateus 5:11-12).
E como as Escrituras não podem ser anuladas (João
10:35), nem mesmo o grande Aryeh Kaplan ficou imune à
sedução da Serpente que o induziu a torcer a Verdade e o
Sagrado para afagar o ego dos profanos.
A organização Jews for Judaism nasceu como um
contraponto a outra organização religiosa chamada Judeus por
Jesus, que faz parte de um fenômeno maior, o chamado
Judaísmo-messiânico, movimento este criado no século XIX
pelo Rabino Joseph Rabiowitz de Kishnev, capital da
158
Moldávia, um país situado no Leste Europeu. E na mesma
proporção que o Judaísmo-messiânico se ramificou, nasceram
os movimentos anti-missionários contrários a estas
ramificações.
O maior problema dos movimentos anti-missionários se
encontra no fato de que aos ouvidos atentos eles soam
mentirosos e fraudulentos, por insistirem em dizer coisas
diferentes sobre o mesmo assunto quando questionados por
pessoas diferentes, como por exemplo ao responderem à
questão: Jesus existiu ou não? Em um primeiro momento dirão
categoricamente: “Não existiu” e noutro momento, revisando
a resposta, dirão: “Existiu, mas...” e desta forma seguem
perdendo credibilidade. Outro problema é que no afã de
combater a figura de Jesus eles misturam Cristianismo com os
textos do Novo Testamento e ainda validam, quando lhes
convém às suas argumentações, as palavras de cristãos que,
emocionados e desesperados por defender o seu sagrado,
acabam falando coisas sugeridas pela própria imaginação sem
respaldo bíblico e nem tão pouco teológico, o que fornece
material para os anti-missionários “coloca-los no bolso”
dando-lhes a impressão de que ganharam o debate e deixando-
os satisfeitos o bastante para não investigar a questão
seriamente, de maneira profunda e honesta, e assim, seguem
enganados e perversamente enganando.
159
fácil para um judeu desfazer o argumento de um cristão
quando este mistura em sua argumentação o Cristianismo e o
Novo Testamento, no trecho a seguir o Rabino Aryeh Kaplan
irá desmantelar a crença no Mediador entre Deus e os homens
(1 Timóteo 2:5) e ainda categorizar tal crença como idólatra:
Os Dez Mandamentos começam com as palavras, “Eu
Sou o Eterno, teu Deus, que te tirou da terra do Egito,
da casa da servidão. Não terás outros deuses diante de
Mim” (Êxodo 20:2-3). Quando Deus disse: “Diante de
Mim”, está sublinhado que não se deve crer em outra
divindade, nem sequer se tal divindade suponha crer
Nele.
Aquele que põe um mediador entre Deus e o homem é
culpado por transgredir este mandamento (Yad,
Avodas Kojavim 1).
Para um homem que crê em Deus, que necessidade há
de outra divindade? Porém, uma pessoa poderia pensar
que Deus está muito elevado e que por isso é
inalcançável sem um mediador. A abertura dos Dez
Mandamentos nos ensina que também isso é idolatria.
Deus é infinito e onisciente. Dizer que Ele necessita de
um mediador para escutar nossas orações é negar Sua
infinita Sabedoria.
Se Jesus realmente fez as declarações registradas nos
Evangelhos, então se evocou nelas idolatria, pondo-se
como divindade. É de surpreender-se que os judeus
jamais o aceitaram como profeta, rabino ou mestre?
(KAPLAN, Rabino Aryeh, Jews for Judaism, 2007, p.
12).
Nesta declaração o Rabino Aryeh Kaplan faz uma
ressalva importante: “Se Jesus realmente fez as declarações
registradas nos Evangelhos”. O Rabino Aryeh Kaplan é
respeitado por judeus e não judeus não apenas pelo seu
brilhantismo literário mas, sobretudo, pela sua honestidade
160
intelectual e zêlo pela verdade, isso nos indica que em sua
ressalva ele pressupôs que foram verdadeiras as palavras dos
Evangelhos que lhe contaram, como ele mesmo não os leu,
então, para não ser taxado de mentiroso, fez a ressalva, e a
partir do que lhe contaram ele concluiu que tais registros
afirmam que um “mediador entre Deus e os homens” (1
Timóteo 2:5) precisa obrigatoriamente ser um “Deus
encaranado”, como se ambos fossem sinônimos. Isso porque
os cristãos acreditam assim e os judeus não se importam em
orientá-los adequadamente sobre isso, como querem apenas
ganhar o debate, logo, quanto mais confusos os cristãos
restem, melhor.
O conceito do “mediador entre Deus e os homens” é um
conceito instituído na Torá e fartamente exemplificado em
todas as Escrituras Sagradas. Abraão foi um mediador entre
Deus e os homens, como está escrito:
“E chegou-se Abraão, dizendo: Destruirás também o
justo com o ímpio? Se porventura houver cinqüenta justos na
cidade, destruirás também, e não pouparás o lugar por causa
dos cinqüenta justos que estão dentro dela? Longe de ti que
faças tal coisa, que mates o justo com o ímpio; que o justo
seja como o ímpio, longe de ti. Não faria justiça o Juiz de
toda a terra? .... Disse mais: Ora, não se ire o Senhor, que
ainda só mais esta vez falo: Se porventura se acharem ali
dez? E disse: Não a destruirei por amor dos dez”
(Gênesis 18:23-32).
E noutro lugar encontramos: “E aconteceu que,
destruindo Deus as cidades da campina, lembrou-se Deus de
Abraão, e tirou a Ló do meio da destruição, derrubando
aquelas cidades em que Ló habitara” (Gênesis 19:29). Na
verdade, os três Patriarcas: Abraão, Isaac e Jacó foram (e são)
mediadores entre Deus e os homens, como está escrito: “E
161
ouviu Deus o seu gemido, e lembrou-se Deus da Sua Aliança
com Abraão, com Isaque, e com Jacó” (Êxodo 2:24). José foi
um mediador entre Deus e os homens:
“Depois vieram também seus irmãos, e prostraram-se
diante dele, e disseram: Eis-nos aqui por teus servos. E José
lhes disse: Não temais; porventura estou eu em lugar de
Deus? Vós bem intentastes mal contra mim; porém Deus o
intentou para bem, para fazer como se vê neste dia, para
conservar muita gente com vida. Agora, pois, não temais; eu
vos sustentarei a vós e a vossos filhos. Assim os consolou, e
falou segundo o coração deles” (Gênesis 50:18-21).
Moisés foi um mediador entre Deus e os homens, pois,
num lugar encontramos escrito: “Agora, pois, perdoa o seu
pecado; se não, risca-me, peço-te, do Teu Livro, que tens
escrito” (Êxodo 32:32). E noutro lugar encontramos: “E
disseram a Moisés: Fala tu conosco, e ouviremos: e não fale
Deus conosco, para que não morramos” (Êxodo 20:19).
O conceito do “mediador entre Deus e os homens” não é
apenas um conceito da Torá, mas algo que o Eterno, bendito
seja o Seu Nome, busca ardentemente na humanidade, como
está escrito: “E busquei dentre eles um homem que estivesse
tapando o muro, e estivesse na brecha perante Mim por esta
terra, para que eu não a destruísse; porém a ninguém achei”
(Ezequiel 22:30). E dentre os mediadores entre Deus e os
homens, obviamente o Mashiach é o maior de todos eles.
Nenhum destes mediadores foi considerado um “Deus
encarnado” e nem tão pouco o ato de intermediar a mensagem
divina para as pessoas foi compreendido na Torá ou nas
Escrituras Sagradas como um ato idólatra, nem o ato e nem o
posto.
Uma artimanha semelhante a esta utilizada pelo Rabino
Aryeh Kaplan para confundir os cristãos pode ser percebida
162
nos diálogos que se sucederam durante a famosa Disputa de
Barcelona (de 20 de julho a 8 de agosto de 1263), onde
disputaram diante do Rei espanhol Jaime I de Aragão, o
famoso Rabino Moshé Ben Nachman, o Nachmânides, e o ex-
Rabino convertido ao Cristianismo, o Frei Pablo Cristiane:
Então ele disse:
- Existe um Salmo que diz: Um Salmo de Davi. O
Senhor disse ao meu Senhor: Senta-te à Minha Direita
até que eu coloque os teus inimigos como escabelos de
seus pés (Salmos 110:1). Quem é este a quem o Rei
Davi chama “meu Senhor” senão o próprio Deus? E
como tu explicaria que esse “Senhor” se assentaria ao
lado Direito de Deus?
O Rei disse:
- Perguntaste bem, pois se o Messias tivesse sido
completamente humano, descendente do Rei Davi, ele
não o teria chamado “meu senhor”. Se eu, o Rei, tivesse
um filho ou um neto, ainda que governasse o mundo
inteiro, eu nunca o chamaria de “meu senhor”. Pelo
contrário, eu gostaria que ele me chamasse de “meu
senhor” e também que beijasse minha mão [como sinal
de respeito].
Voltei-me para Frei Pablo e disse:
- Será por acaso tu, judeu, o sábio que achaste essa
novidade e rejeitou o Judaísmo por causa dessa razão?
Foste tu quem disseste ao Rei para reunir sábios judeus
para discutir com eles sobre as novidades que
encontrastes? Será que nenhum Padre ou uma criança
que não tenha feito essa pergunta aos judeus? Essa
questão é muito antiquada.
Disse o Rei para mim:
- Mesmo assim, respondei-o!
Então eu disse:
163
- Escutai-me, então, senhores. O Rei David era um
poeta que compunha salmos por inspiração divina: ele
os compôs para recitá-los diante do altar de Deus,
porém, ele mesmo não os recitava. Deveis saber que ele
não tinha permissão para cantar, posto que era proibido
para ele. No entanto, ele compôs salmos para os levitas
recitarem, como está escrito no livro das Crônicas (1
Crônicas 16:3-7). E, por esse motivo, ele compôs os
salmos para que fossem apropriados ao levita que iria
recitá-los; pois se o levita dissesse: “Disse o Senhor a
mim...”, o levita estaria dizendo uma mentira. Portanto,
era apropriado que o levita dissesse no Templo: “O
Senhor disse ao meu senhor...”, ou seja, referindo-se a
David para se “sentar” à Sua Direita e que Deus iria
protege-lo e salvá-lo, subjugando seus inimigos. E
assim sucedeu, pois em uma ocasião David empunhou
sua lança contra 800 homens matando-os todos de uma
vez (2 Samuel 23:8). Por acaso, existe entre os
cavaleiros do Rei aqui presentes alguém que poderia
realizar tal façanha? Esse é o significado da expressão
a mão direita de Deus. E, do mesmo modo, David
escreveu: “Sua Mão Direita me protege...” (Salmos
18:36). E também: “A Mão Direita de Deus faz
proezas, a Mão Direita se eleva...” (Salmos 118:15-
16), e assim por diante.
E sobre Moisés, nosso mestre, que a paz esteja com ele,
está escrito: “aquele que enviou Seu Braço glorioso
para estar à direita de Moisés...” (Isaías 63:12). E ele
mesmo diz quando Faraó foi derrotado: “A Tua Destra,
ó Senhor, despedaça o inimigo” (Êxodo 15:16 – o
versículo foi citado incorretamente). Além disso, é
comum por parte da Escritura fazer os versos falarem
de forma impessoal [em terceira pessoa]. Isso ocorre
por exemplo com o verso: “e enviou a Jerubaal, a
Baraque e Yiftach, e Samuel” (1 Samuel 12:11), ao
164
invés de “e me enviou”, e também: “me escutai,
mulheres de Lameque” (Gêneses 4:38), ao invés de
“minhas mulheres”. E assim são todas as palavras de
Moisés, nosso mestre, na nossa Torá.
De qualquer forma, ele [David] foi obrigado a compor
dessa maneira, como eu disse. E saibam que os salmos
foram escritos por inspiração divina e estes se aplicam
tanto a David quanto ao seu filho que ocupará seu
trono, ou seja, o Messias. Assim como tudo relacionado
a Era messiânica foi concretizado em David, em certo
aspecto, da mesma forma acontecerá com o Messias,
mas de forma completa. Pois da mesma forma que a
Mão Direita de Deus protegeu David até que ele
triunfasse sobre os inimigos ao seu redor, então ele
protegerá o Messias até fazer das nações o escabelo de
seus pés, pois todas as nações são seus inimigos, já que
eles subjugaram seu povo, negaram seu advento e seu
reinado; e alguns deles fizeram de outro, o seu
“Messias”. Portanto, o que é dito neste salmo era
apropriado para aquele que recitasse o salmo no
Templo, seja nos dias de David ou nos dias do Messias,
seu filho, já que tal salmo se refere ao trono de David e
seu reinado.
Frei Pablo respondeu:
- Como podeis dizer algo assim? Seus próprios sábios
declaram que este salmo se refere ao Messias e que a
explicação literal do versículo é que ele se sentará à
Direita de Deus.
Então, ele trouxe uma Hagadá dos sábios que dizia:
“No Mundo Vindouro, o Santo, bendito seja, fará o
Messias sentar à Sua Direita e Abraão à Sua
Esquerda” (Yalkut, Salmos, 869).
Sobre isso eu respondi:
165
- Mas isso também concorda com a minha opinião. Eu
já disse que essas interpretações se referem em parte a
David e fundamentalmente ao Messias.
Então lhe pedi o livro e ele o entregou a mim. Eu
respondi:
- Vejam como ele interpreta mal as suas palavras! Esta
Hagadá afirma:
“No Mundo Vindouro, o Santo, bendito seja, fará o
Messias sentar à Sua Direita e Abraão à Sua Esquerda.
Então o rosto de Abraão empalidecerá e dirá: o filho
de meu filho se senta à Mão Direita e eu à Esquerda?
Mas então o Santo, bendito seja, o tranquilizará...”
A partir disso, concluímos que o Messias não é Deus e
que Jesus não é o Messias, pois se tivesse sido [o
próprio] Deus, Abraão não teria se envergonhado de
seu descendente receber maior honraria que ele, nem
seu rosto empalideceria. Da mesma forma, a Hagadá
diz “filho de meu filho” e não “filho de minha filha”,
porque Jesus, de acordo com o que sustentais, não era
filho do filho de Abraão (A Disputa de Barcelona,
2019, pp. 113-118).
O leitor atento perceberá que ambos os debatedores
concordam, mesmo que a contragosto, em praticamente tudo o
que ambos disseram um para o outro, os únicos pontos de
discordância são: se Jesus é o Messias e se o Messias é Deus
encarnado. Obviamente que para o Judaísmo o Messias não é
Deus encarnado, porém, em relação a negação de que Jesus
não é o Messias, este é um posicionamento despeitoso por
parte do Rabino Nachman, uma vez que até os dias de hoje esta
discussão de quem é o Messias não está fechada, e o Rabino
só pareceu ganhar a disputa por conta da confusão estabelecida
pela Teologia Cristã de que o Messias obrigatoriamente tem
que ser Deus encarnado. Mas, imagina que o Frei Pablo
Cristiane dissesse: “Tudo bem, eu concordo que o Messias não
166
é Deus encarnado, mas sustento que Jesus é o Messias”, aí, a
partir deste momento o Rabino teria muitas dificuldades em
rebater o Frei Pablo que, como possuía igualmente formação
rabínica em tal grau que foi o único a ser capaz de debater com
o Rabino Nachman, certamente teria sempre um contraponto
da Tradição Judaica para cada esquiva do Rabino. Aliás,
mesmo sem ter negado a divindade de Cristo, o Frei Pablo
durante todo o debate deixou o Rabino em aperto e se não
tivesse contado com a confusão natural da Teologia Cristã para
se safar, certamente teria perdido o debate.
Para o leitor cristão a confusão se estabelece na
percepção de que ambos falaram a verdade, o que de fato
aconteceu, porém, ambos também cometeram equívocos, e a
maneira como o Rabino denunciou os equívocos do Frei Pablo
foi que lhe deu vantagens, pois, o Frei Pablo não teve
capacidade de fazer o mesmo ao revés.
A verdade, todavia, por trás deste debate pode ser
plenamente evidenciada ao salientar os acertos da fala de
ambos os debatentes, coisa impossível na época (e até certo
ponto também hoje em dia) dadas as despeitas religiosas, a
desonestidade intelectual de ambos os lados e a necessidade
mútua de um prevalecer absoluto sobre o outro. Mas,
imaginando que tal debate estivesse direcionado pura e
simplesmente para se constatar se Jesus é o Messias ou não,
levando em consideração que tanto o Judaísmo como o
Cristianismo respondem as questões implícitas no Texto
Sagrado através de dados extraídos das literaturas que
compõem a Tradição de ambos os lados, bastaríamos constatar
que: O Mashiach existe mesmo antes da criação do mundo
(João 17:5 / Talmud da Babilônia, Massekhet Pessachim 54a e
Massechet Nedarim 39b/ Zohah, Parashá Tzav, p. 1582 /
Pesikta Rabbati, Piska 36), que ele foi designado nos Céus pelo
167
próprio Deus para ser Rei sobre toda a humanidade (João 1:49
e 18:37 / Apocalipse 5:9-10 / Talmud da Babilônia, Massekhet
Sanhedrin 98b / Sefer HaZohar, Parashá VaYehi, p. 478), que
ele teria que nascer de maneira milagrosa como nasceram os
demais patriarcas do povo de Israel (Isaías 7:14), que ele
expiaria com sua morte os pecados do povo de Israel (Isaías 53
/ Talmud da Babilônia, Massechet Sanhedrin 98a / Midrash
Rut Rabbah, comentando Rute 2:14) e ressuscitaria para
reordenar o mundo de acordo com a sua vontade (Isaías 53:10
/ Mateus 28:18). É sabido que no mundo judaico há centenas
de candidatos a messias que surgiram no decorrer da história
do povo de Israel, Rabi Yeshua HaNotzeri é o primeiro deles,
o Rabino Menachem Mendel Schneerson (18 de abril de 1902
- 12 de junho de 1994) foi o último. E dentre todos eles, apenas
Rabi Yeshua HaNotzeri ressuscitou e vive já por mais de dois
mil anos. Nenhum outro alcançou este feito, levando esta
informação em conta, o cálculo fica fácil de se fazer, a resposta
se torna óbvia!
E é aqui onde a desonestidade intelectual precisa reinar,
pois, não dá para vencer um debate contrário a uma figura de
tamanho vulto histórico e espiritual, o que resta fazer é tornar
questionáveis os registros sobre esta figura. E é justamente isso
que os maledicentes fazem, para a sua própria perdição, pois
torcem o seu próprio conceito de Sagrado, mentem e
blasfemam contra aquilo mesmo que afirmam firmemente
acreditar, apenas para prevalecer num debate contra o outro. A
verdade não é o foco, o monopólio da fé é que é o foco. E este
terrível pecado tanto os judeus quanto os cristãos, cada qual à
sua maneira, cometem e não se envergonham disso.
Em relação a alegação cristã de que Jesus é filho de
Maria e não filho de José, e por isso ele não é herdeiro do
Trodo de Davi, pois, este direito teria José e seus filhos, há
168
alguns dados da Tradição tanto judaica quanto cristã que nos
ajudam a resolver este problema.
Sobre as Genealogias
169
natural de pais e filhos, e os outros, ainda que gerados
por uns, recebiam o home de outros, de ambos os
grupos se registra a memória: dos que foram gerados e
dos que passaram por sê-lo.
Deste modo, nenhum dos evangelhos engana:
enumeram segundo a natureza e segundo a Lei. De fato,
suas famílias, que descendiam de Salomão e de Natã
respectivamente, estavam mutuamente entrelaçadas ...
de forma que é justo considerar os mesmos indivíduos
em diferentes ocasiões filhos de diferentes pais... e
também que ambas genealogias são estritamente
verdadeiras e chegam até José por caminhos
complicados, mas exatos.
Mas para que fique claro o que foi dito, vou explicar a
transposição das linhagens. Quem vai enumerando as
gerações a partir de Davi e através de Salomão encontra
que o terceiro antes do final é Matã, o qual gerou a Jacó,
pai de José (Mateus 1:15-16). Mas, partindo de Natã,
filho de Davi, segundo Lucas, também o terceiro para
o final é Melqui (Lucas 3:23-24), pois José era filho de
Heli, filho de Melqui (que de acordo com a Tradição,
seu nome completo era: “Matã Ben Melqui”, como será
explicado mais adiante).
Portanto, sendo José nosso ponto de anteção, deve-se
demonstrar como é que nos é apresentado como seu pai
um ou outro: Jacó, que traz sua linhagem de Salomão,
e Heli, que descende de Natã; e de outro modo,
primeiramente os dois, Jacó e Heli, são irmãos; e ainda
antes, como é que os pais destes, Matã e Melqui, sendo
de linhagens diferentes, aparecem como avós de José.
Assim é que Matã e Melqui se casaram sucessivamente
com a mesma mulher e tiveram filhos, filhos de uma
mesma mãe, pois a Lei não impedia que uma mulher
sem marido – porque este a houvesse repudiado ou
porque houvesse morrido – se casasse com outro.
170
Pois bem, de Esta (pela Tradição era assim que se
chamava a mulher), Matã, o descendente de Salomão,
foi o primeiro, gerando a Jacó; tendo morrido Matã,
casou-se a viúva com Melqui, cuja ascendência
remonta a Natã e que, sendo, como dissemos antes, da
mesma tribo, era de outra família. Este teve um filho:
Heli.
E assim encontramos que, sendo de duas linhagens
diferentes, Jacó e Heli são irmãos por parte de mãe.
Morrendo Heli sem filhos, seu irmão Jacó casou-se
com sua mulher, e dela teve um terceiro filho, José, o
qual, segundo a natureza, era seu, mas segundo a Lei,
era filho de Heli, já que Jacó, sendo seu irmão,
suscitou-lhe descendência...
Em realidade, uns poucos mais cuidadosos, que tinham
para si registros privados ou que se lembravam dos
nomes ou haviam-nos copiado, se ufanavam de ter a
salvo a memória de sua nobreza. Ocorreu que entre
estes estavam aqueles de que falamos antes, chamados
desposinói por causa de seu parentesco com a família
do Salvador e que, desde as aldeias judias de Nazaré e
Cocaba, visitaram o resto do país e explicaram a
referida genealogia, começando pelo Livro dos Dias,
até onde alcançaram (História Eclesiástica, 2005,
Capítulo 7:1-17).
Bom, quando comparamos os registros das palavras de
Africanus por Eusébio acerca da Genealogia de Rabi Yeshua
HaNotzeri com o relato de Lucas 3:23 em diante, percebemos
que o terceiro para o final não é Melqui, como afirma
Africanus, mas também se chama Matã, acontece que é
comum no mundo judaico que um filho queira homenagear o
seu pai pondo o nome dele em seu filho, neto de seu pai, e foi
justamente o que aconteceu no caso de Matã; ele era filho de
Levi, que era filho de Melqui. Levi, querendo homenagear o
171
seu pai pois o nome de seu pai como sobrenome em seu filho,
de maneira que o nome completo de Matã era: Matan Ben
Melqui, e como era de costume na época, uma pessoa com dois
nomes ora era chamada por uns por um nome e ora por outros
pelo outro nome, como no caso de Matã (como no registro de
Lucas) que ora era também chamado de Melqui (como no
registro de Africanus). Na Bessorá temos outro caso
semelhante cujos dois nomes estão registrados referindo-se ao
mesmo personagem, me refiro ao Apóstolo Mateus, cujo nome
completo era: Mateus Levi (Matai Ben Levi), ora ele é referido
no texto como Mateus (Mateus 9:9) e ora como Levi (Marcos
2:14 / Lucas 5:27).
Há, porém, um dado no registro de Eusébio que
aparentemente conflita com o Talmud, “Morrendo Heli sem
filhos, seu irmão Jacó casou-se com sua mulher, e dela teve
um terceiro filho, José, o qual, segundo a natureza, era seu,
mas segundo a Lei, era filho de Heli”: se Heli morreu sem
filhos, como pode o Talmud afirmar que Miriam HaNotzerit
era sua filha (Talmud de Jerusalém, Massekhet Chaguigá 2a)?
Acontece que no Judaísmo a poligamia sempre foi
prática permitida pela Torá, e era muito comum nos tempos
bíblicos os homens possuírem mais de uma esposa
(Deuteronômio 21:15 / 1 Samuel 1:2 / 1 Crônicas 14:3 dentre
outras referências), logo, este foi o caso de Heli: ele teve mais
de uma esposa e delas não teve filhos, mas teve uma filha, a
qual chamou Miriam. Em relação a qual tribo israelita
pertenciam, devemos estar cientes de que ao retornar do Exílio
na Babilônia, judeus, benjamitas e metade da tribo de Levi
passaram a conviver num mesmo território, e mesmo antes
disso, durante o próprio exílio, sem Templo e nem
demarcações geográficas das posses de cada tribo, todos se
misturaram entre si, de forma que mesmo aqueles que
172
preservaram os registros de suas árvores genealógicas não
puderam, entretanto, impedir que famílias de uma tribo se
misturassem com famílias de outra tribo, de sorte que ao
retornarem para Eretz Israel os judeus, os levitas e os
benjamitas tinham se misturado quase que completamente, e
dentre os muitos casos ocorridos desta natureza, a família de
Heli é uma delas, pois sua família era meio judia e meio levita.
Sendo, portanto, Miriam HaNotzerit, meio judia e meio levita
(Lucas 1:5-37), filha biológica de Heli, e sendo obrigada a
casar-se de acordo com a Torá apenas com homens de sua
própria linhagem coube-lhe por sorte casar-se com Yossef.
Yossef HaNotzeri, que era judeu da Casa de Davi, e como
afirmou Africanus; segundo a natureza filho de Yaakov, mas
segundo a Torá filho de Heli, que era meio judeu e meio levita,
tornando, portanto, Yossef HaNotzeri e Miriam HaNotzerit
irmãos, não foram, todavia, irmãos biológicos, biologicamente
ambos eram filhos de pais e mães distintos, mas sendo Yossef
filho por força da Torá de Heli, enquanto que Miriam era filha
biológica de Heli, por força da Torá eles eram considerados
como meio-irmãos, mas em termos biológicos, eram na
verdade primos, já que Yossef era filho biológico de Yaakov,
o irmão de Heli, pai de Miriam e, de acordo com a Torá, a
união matrimonial deles era completamente lícita e preferível,
como está escrito:
“Então Moisés deu ordem aos filhos de Israel, segundo
o mandado do Senhor, dizendo: A tribo dos filhos de José fala
o que é justo. Isto é o que o Senhor mandou acerca das filhas
de Zelofeade, dizendo: Sejam por mulheres a quem bem
parecer aos seus olhos, contanto que se casem na família da
tribo de seu pai. Assim a herança dos filhos de Israel não
passará de tribo em tribo; pois os filhos de Israel se chegarão
cada um à herança da tribo de seus pais. E qualquer filha que
173
herdar alguma herança das tribos dos filhos de Israel se
casará com alguém da família da tribo de seu pai; para que
os filhos de Israel possuam cada um a herança de seus pais.
Assim a herança não passará de uma tribo a outra; pois as
tribos dos filhos de Israel se chegarão cada uma à sua
herança” (Números 36:5-9).
O Dr. Antônio Sérgio Valente parece indicar em seus
estudos mais ou menos a mesma coisa em relação a Yossef e
Miriam serem irmãos por força da Torá. Em sua obra ele
afirma: “A idade elevada de Maria de Cleófas, esta
compreendida como mulher de Cleófas (irmão de José e, por
extensão, irmão em sentido ampliado, de Maria)...” (A
Misteriosa Família de Jesus, 2017, p.71). Por fim, de acordo
com todas as informações acima, podemos concluir como
esclarecidos os caminhos que fazem com que as genealogias
registradas por Mateus e Lucas resultem em basicamente duas
genealogias: uma traçada a partir da linha patrilinear e a outra
a partir da linha matrilinear, como também restou esclarecidos
os fatos de José ser citado em embas tornando-o irmão de
Maria e mesmo assim o casamento entre ambos ter sido
legalmente aceito e, por fim, e não menos importante, como
uma genealogia chega até o Rei Salomão, filho de Davi,
enquanto que a outra chega até Natã, o Príncipe, filho de Davi.
A Tradição Judaica, sobre a genealogia pela linha
matrilinear como registrada em Lucas 3, ainda nos oferece
outro dado curioso além do já citado no Talmud sobre Heli ser
o pai de Miriam HaNotzerit, como encontramos escrito:
“Nunca mais te chamarão: Desamparada, nem a tua
terra se denominará jamais: Assolada; mas chamar-te-ão: O
Meu prazer está nela - “Chefitzi-Bá” (בָ ּה- )חֶ פְ צִ י-, e à tua
terra: A casada; porque o Senhor se agrada de ti, e a tua terra
se casará” (Isaías 62:4).
174
O Sefer HaZohar comentando este versículo afirma:
“Você que leva as Boas-Novas a Tzion” é Chefitzi-Bá, a
esposa de Natan, filho de David, que é mãe do Mashiach,
Menachem filho de Amiel, que era seu descendente. Ela deve
sair e trazer as notícias sobre a Redenção e ela é parte do
significado geral: “Você que leva as Boas-Novas a Tzion”
(Zohar III: 173b, Parashat Shelakh Lekha 45: 298).
No Sefer Zerubavel encontramos outro comentário
curioso: “Este é o Mashiach do Senhor, que está escondido
aqui até o Tempo do Fim, e seu nome é Menachem filho de
Amiel, e ele nasceu nos dias de David, Rei de Israel, e o
espírito levou-o e escondeu-o aqui até o Tempo do Fim, e eu
perguntei a Metatron e ele disse-me: “O Santo, bendito seja,
vai dar a Salvação por meio de Chefitzi-Bá, a mãe de
Menachem, e uma estrela brilhará diante dela...” (Sefer
Zerubavel, Rafael Patai, Wayne State University Press, pg
125).
O texto descreve o papel que Chefitzi-Bá irá realizar no
Fim dos Tempos. O nome de “Menachem Ben Amiel” para o
Mashiach é interessante. Menachem significa “Consolador”
em Hebraico, e é com base neste versículo abaixo que surge
este nome para Mashiach:
“Por estas coisas eu ando chorando; os meus olhos, os
meus olhos se desfazem em águas; porque se afastou de mim
o Consolador - "Menachem" ( ) ְמנחֵ ם- que devia restaurar a
minha alma; os meus filhos estão assolados, porque
prevaleceu o inimigo” (Lamentações 1:16).
É notável que o Zohar, dos dez Filhos de David,
concentre-se em Natan, assim como Lucas fez (Lucas 3:31). O
Rabi Reuven Margolies comenta sobre esta passagem difícil
no Zohar da seguinte maneira: “O Zohar tem o cuidado de
descrever o Mashiach como sendo um descendente da esposa
175
de Natan, ao invés de Natan mesmo. Natan faleceu sem filhos,
e Salomão, seu irmão casou com sua viúva, de acordo com as
leis de Yibum (Deuteronômio 25:5-6) a lei do casamento por
levirato, o primeiro filho da viúva que por Lei tem que se casar
com o seu cunhado, terá o nome do marido falecido e é
considerado este como sendo descendente do falecido.
Portanto, Mashiach é referido aqui como descendente de
Natan, ainda que ele seja de fato descendente de Salomão”
(Chabad.org: É o Messias descendente de Salomão – Yehudá
Shurpin). Daqui então, está aclarado como pode Rabi Yeshua
descender de Salomão e de Natan ao mesmo tempo.
Os motivos pelos quais Mateus registrou a genealogia de
Rabi Yeshua HaNotzeri pela linha patrilinear enquanto que
Lucas a registrou pela linha matrilinear, tem a ver com o
público alvo de sua obra: Mateus escreveu para judeus,
estando ele habitando na Terra Santa, em Eretz Israel,
enquanto que Lucas escreveu para estudantes da Torá que
viviam na diáspora, fora da Terra de Israel, como bem
podemos constatar na introdução mesmo do seu evangelho
(Lucas 1:3). E esta é a lei sobre a genealogia em Israel: aquele
que habita na Terra Santa sua genealogia é contada pelo pai,
mas para aqueles que estão fora da Terra Santa a genealogia
válida é a que se conta a partir da mãe, como consta na Halakhá
que reza: “Este é o princípio geral: Quando um filho nasce a
um servo, um estrangeiro, uma serva, ou uma estrangeira, ele
é como a mãe. Não nos ocupamos do pai” (Mishnê Torá –
Sefer Kedushá – Hilkhot Issurê Biá 15:4). Esta é a fonte na
Halakhá do que comumente afirmam hoje em dia: “Judeu é
todo aquele nascido de mãe judia”.
Na genealogia como registrada por Mateus
especificamente, há ainda outros questionamentos que
merecem nossa atenção, pois, a certa altura encontramos
176
registrado que: “E Josias gerou a Jeconias e a seus irmãos na
deportação para babilônia” (Mateus 1:11). O Rei Jeconias foi
amaldiçoado por Deus, sua maldição foi não ter filhos que lhe
sucedesse ao trono (Jeremias 22:30), a questão erguida aqui é:
se o Rei Jeconias foi amaldiçoado com a ausência de filhos,
como pode ele constar na genealogia do Mashiach? A resposta
a esta importante questão se encontra nas palavras de nossos
Sábios, que rezam:
O Rabi Yochanan disse: O exílio expia por tudo, pois
está dito: “Assim diz o Senhor: Escrevei que este
homem está privado de filhos, homem que não
prosperará nos seus dias; porque nenhum da sua
geração prosperará, para se assentar no trono de
Davi, e reinar ainda em Judá” (Jeremias 22:30). Mas
depois que ele foi exilado consta: “E os filhos de
Jeconias: Assir, e seu filho Sealtiel” (1 Crônicas 3:17).
Cujo filho, Zerubavel, governou os exilados que
voltaram da Babilônia para construir o Segundo
Templo Sagrado. Assim, o exílio de Yechoniá expiou
pelo seu pecado e reverteu a sentença que lhe fora
decretada, de não ter filhos e de perder o trono (Talmud
da Babilônia, Massekhet Sanhedrin 37b).
E foi justamente após os pecados do Rei Jeconias terem
sido completamente expiados no exílio babilônico que ele não
apenas mereceu ter filhos, como também mereceu que um
sucessor seu voltasse a sentar-se no trono da Davi, seu pai,
como está escrito: “Fala agora a Zorobabel, filho de Sealtiel,
governador de Judá” (Ageu 2:2). E é por isso que na sequência
da genealogia encontramos: “E, depois da deportação para a
babilônia, Jeconias gerou a Salatiel; e Salatiel gerou a
Zorobabel” (Mateus 1:12).
Uma vez resolvida esta questão, outra nos salta os olhos:
um leitor atento perceberá que, quando comparamos a
177
genealogia como registrada em Mateus 1 com a genealogia
como registrada em 1 Crônicas 3, há alguns nomes faltando na
lista de Mateus, o que levou alguns críticos do Novo
Testamento a descredibilizá-lo como Palavra de Deus, dado
este suposto equívoco de Mateus.
Pois bem, o problema é que o leitor atento perceberá que
Ezra HaKohen - Esdras o Sacerdote (Esdras 10:10) - fez a
mesma coisa, e também perceberá que ninguém ousa acusar
Ezra de ter errado e ou descredibilizar o seu livro como não
sendo digno de constar entre as obras que compõem a Sagrada
Palavra de Deus, e nem podem! Como alguém poderia ter mais
conhecimento sobre genealogia judaica do que um Sacerdote?
Um Sacerdote é por natureza um guardião mesmo dos
Tesouros do Templo e os registros genealógicos eram parte
importante destes tesouros, logo Ezra, responsável em seu
tempo de mantê-lo e aumentá-lo não seria ele justamente o
responsável a cometer um erro tão crasso como o que buscam
imputar a Mateus. Pois é, mas ele o fez.
Quando comparamos a genealogia de Ezra, sua própria
genealogia (Esdras 7:1-6) com 1 Crônicas 6:1-14, Ezra omitiu
sete nomes. Como podem ainda considerar os seus registros
como Palavra de Deus? O que os Sábios antigos e os rabinos
modernos têm a dizer sobre isso?!
Bom, a primeira explicação para esta embaraçosa
situação se encontra no conceito da Torá, que afirma: “E a Sem
nasceram filhos, e ele é o pai de todos os filhos de Éber...”
(Gênesis 10:21).
É deste versículo que surge o conceito do Patriarca. Já
que Eber era o pai dos seus próprios filhos o que a Torá quer
dizer quando afirma que na verdade o pai dos filhos de Eber
era Sem? No Talmud os rabinos registraram, portanto, que um
professor está em importância acima de um pai, e que se o
178
professor for avô, bisavô ou alguém da família que os instruiu
na Torá, logo, o título de "Pai" deve ser dado a ele em
detrimento do mesmo título em relação ao pai biológico
(Talmud da Babilônia, Massekhet Baba Metzia 33a / Eruvin
capítulo 54a).
Outra explicação rabínica se encontra na obra clássica,
O Cuzari, como está escrito:
Em relação às gerações de Adam a Avraham, mesmo
aqueles que não se uniram ao Fluxo Divino, ao menos
viviam num estado elevado por terem sido gerados por
eleitos, e eram dotados de potencial para gerarem, eles
mesmos, pessoas virtuosas. Se fossem afastados, sua
descendência também o seria – e Deus preserva o
perverso em função dos bons frutos de sua ramificação
genealógica. Às vezes, passam-se algumas gerações até
que a semente se refine, remanescendo a virtude, sem
casca. Este fenômeno se deu com Térach: ele não
mereceu o Fluxo Divino, mas sua raiz continha o
potencial para conceber um filho pródigo, potencial
este que não existia em Kham e Yafet. Este fenômeno
ocorre nas leis de genética: há pessoas que mais se
parecem com o avô do que com o pai, mas está claro
que sua natureza e seus traços se encontravam
preservados no pai, embora imperceptivelmente. Isto
aconteceu com Éber, cujo caráter especial estava oculto
nos seus filhos, até se revelar em Avraham (O Cuzari –
A Grandeza de Israel, parágrafo 95, p. 67).
Em resumo: o Ezra HaKohen, portanto era da Tribo de
Levi, buscou registrar sua própria genealogia a fim de ser
eternamente lembrado como descendente de personagens
importantes nas Escrituras Sagradas dessa Tribo específica, e
por conta disso chamou de "Pai" aos avós, chamou de "Pai"
aos mestres e ignorou os personagens de sua árvore
179
genealógica que deporia contra a nobreza e grandeza
pretendida em seu registro. Sabendo que algumas pessoas más
são protegidas por Deus da morte prematura pelo potencial de
gerar um descendente ilustre que trará futuramente a este
mundo, Ezra HaKohen percebeu que a recompensa destas
pessoas foi as suas vidas mesmo, não merecendo nada mais do
que isso, enquanto aos justos dentre os seus ancestrais
mereceram eternizarem-se em seus registros como pessoas
santas que o geraram por fim.
O nome de Matai é: Matai HaLevi Bar Chalfai (Mateus
9:9 / Marcos 2:13-14 / Lucas 5:27-28), portanto, era da Tribo
de Levi (de acordo com a maneira da Tradição Judaica de
identificar um levita), semelhante em origem e instrução ao
Ezra HaKohen, logo, não é difícil perceber em Matai
HaShaliach o seu interesse no mesmo gênero literário bem
como sua forma e técnica de registro semelhante, e tais
semelhanças nem são acidentais e nem deveriam ser um
espanto, pois, trata-se de dois indivíduos de mesma Tribo e,
portanto, de visões de mundo semelhantes, é natural que
ambos os registros se assemelhem em muitos aspectos.
Portanto, se Ezra HaKohen está certo em seu registro
genealógico, Matai HaLevi também está, e ambos os registros
são equivalentes em importância e aptos a serem considerados
como Palavra de Deus, pois, os argumentos rabínicos que
justificam a um, naturalmente também justificam o outro.
Resta-nos agora aclarar a questão do nascimento
virginal, uma questão que se ramifica em duas, a saber: a) se
José não é o pai biológico de Jesus, como Jesus pode ser
herdeiro do trono de Davi? b) Por que Deus, bendito seja,
concebeu toda a humanidade de uma mesma maneira, ou seja;
através de relações sexuais, e apenas no caso de Jesus Ele
determinaria que seria diferente?
180
A rimeira parte desta questão pode ser formulada de
maneira mais simples e objetiva: É José o pai biológico de
Jesus ou não? O texto de Mateus 1, de acordo com a crença
cristã, parece afirmar que não, que na melhor das hipóses; José
é pai adotivo de Jesus. O problema, é que se isso fosse
realmente assim, Jesus estaria desqualificado como herdeiro
do Trono de Davi, pois, este tipo de herança só pode ser
passada para um descendente biológico. Portanto, só nos resta
afirmar que sim; José é o pai biológico de Jesus. Mas, como?
Afinal de contas o texto afirma que Maria engravidou sem ter
sido tocada por José, e os cristãos afirmam que o pai de Jesus
é o Espírito Santo!
181
interpretá-la, resultando no famoso “Espírito Santo” tão
popular nos discursos religiosos de hoje em dia.
A Ruach HaKodesh - esta Força Divina feminina - surge
desde o início da Criação do Mundo gerando vida, como está
escrito na Torá: “e o Espírito de Deus se movia sobre a face
das águas” (Gênesis 1:2), isto é: gerando a vida nas águas. E
dali para frente, sempre que foi necessário que a vida se
manifestasse no mundo, principalmente entre os Patriarcas e
Matriarcas do Povo Judeu, de forma milagrosa, o Ruach
HaKodesh realizou o que é próprio de sua natureza: gerou a
vida. Contudo, por ser uma entidade feminina, não pode criar
a vida do nada, mas antes, semelhante às mulheres, ela apenas
gera a vida a partir de alguma coisa, a semente da vida, todavia,
vem de outro lugar.
Não é a primeira vez nas Escrituras Sagradas que uma
mãe tem um filho por obra da Ruach HaKodesh, os exemplos
de nascimentos de natureza milagrosa são tantos e tão
popularmente conhecidos de todos, que acredito não ser
necessário enumera-los aqui. O caso de Maria, parece ser um
caso à parte, pelo fato extraordinário dela ser uma virgem e
não ter sido tocada por ninguém quando concebeu. Para os
cristãos isso é um sinal claro de que José não é o pai de Jesus,
senão o pai adotivo. Para os judeus, por outro lado, àqueles que
vêm neste relato o Sagrado, a Tradição Judaica nos traz outra
perspectiva.
O Rabino Aryeh Kaplan, no prefácio do livro Sefer
Yetzirá, comentado por ele, nos informa que Ben Sira, o Filho
do Profeta Jeremias, nasceu de sua mãe e de seu pai, sem,
contudo, o Profeta ter sequer estado perto da futura mãe do
menino quando ela engravidou, e seu vínculo paternal com o
menino em questão só forçosamente se estabeleceu apenas
depois deste constatado fato. O mesmo Rabino nos transporta
182
para o Talmud (E outros livros que comentam esta estranha
passagem talmúdica) e nos informa que o Rav Zeira e o Rav
Papa nasceram da mesma forma que o Ben Sira, o filho do
Profeta Jeremias, ou seja; suas mães engravidaram de seus pais
sem, contudo, terem sido tocadas por eles. Assim, Maria não
teria sido a primeira e nem a última a passar por esse
fenômeno, agora ela se encontra entre quatro virgens judias
que sofreram o mesmo fenômeno, o status espiritual de seus
filhos é que difere, mas a forma como foram concebidos pela
Ruach HaKodesh através da semente dos pais milagrosamente
transportada para as mães foi a mesma.
Evoco agora o Talmud da Babilônia no Tratado Sotá
12a, na passagem em que informa que a Yocheved, já mãe de
duas crianças, Miriam e Aharon, teve a sua virgindade
milagrosamente restaurada e só depois foi que engravidou de
Moshé, seu filho caçula, filho de Amram, seu pai.
Isso me parece uma obra muito mais fantástica do que o
ocorrido com Miriam HaNotzerit! Pois, se para alguns é
impossível que tal nascimento virginal tenha ocorrido, o que
se dirá de uma senhora, mãe de dois filhos, voltar a ter o sinal
de sua virgindade, engravidar sem ser tocada pelo seu marido,
e dar à luz virgem!
Agora, Maria já não é apenas uma, mas está entre as
cinco mulheres judias que passaram pelo mesmo fenômeno.
Contudo, há um Midrash que afirma, que o milagre
maior ocorreu com Yocheved, que teve sua virgindade de
volta, sendo ela já mãe de dois filhos, e dando à luz virgem de
seu menino caçula, porém, um milagre menor ainda que mais
abrangente ocorreu a todas as virgens judias comprometidas
do Egito: Todas elas engravidaram virgens sem terem sido
tocadas por homem algum!
183
Agora já não são mais cinco mulheres judias a
engravidarem virgens, mas milhares!
Como nestes milhares de casos relatados na Tradição
Judaica, todas estas virgens engravidaram de seus maridos sem
terem sido tocadas por eles, e mesmo os meninos tendo sido
concebidos de forma milagrosa, mesmo assim todos eles
tiveram um pai e uma mãe biológicos. Concluo, portanto, que;
com Miriam HaNotzerit, esposa de Yossef HaTzadik
HaNotzeri, ocorreu o mesmo. Sim, José é o pai biológico de
Jesus, o Messias.
Resta-nos agora aclarar a segunda parte da questão. Em
termos, a resposta à primeira parte já respondeu muito da
segunda parte, porém, insiste aqui a incômoda questão acerca
de Isaías 7:14, é esta a verdadeira questão velada por trás da
questão aparente. Pois, no Evangelho de Mateus está escrito:
“Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho, E chamá-
lo-ão pelo nome de Emanuel, que traduzido é: Deus conosco”
(Mateus 1:23). Mas, lá na fonte citada por Mateus, o versículo
se encontra ligeiramente diferente: “Portanto o mesmo Senhor
vos dará um sinal: Eis que a jovem - עלמה- conceberá, e dará
à luz um filho, e chamará o seu nome Emanuel” (Isaías 7:14 –
texto hebreu), enquanto que “virgem” em hebraico é “Betulá”
( בתולה- Deuteronômio 22:23), por que Mateus registrou
“virgem” enquanto citou Isaías 7:14 quando lá está “jovem”?
Na verdade, não foi Mateus quem fez isso primeiro, os
72 Sábios rabinos que traduziram as Escrituras Sagradas do
hebraico para o grego foram quem, compreendendo que uma
moça jovem é igual a uma moça virgem, traduziram assim, o
que Mateus fez é o que todos os Sábios judeus fazem; passam
adiante o que compreenderam dos Sábios anteriores.
184
Trecho de Isaías 7:14 em grego, onde aparecem: “Partenos”
(virgem) e “Emanuel”.
Tendo respondido e aclarado as importantes questões em
torno das genealogias como registradas por Mateus e por
Lucas de Rabi Yeshua HaNotzeri, que pelos crentes é
considerado como o Mashiach Tzidikenu, por tudo acima
exposto, pelos descrentes, se souberem do que estão falando e
não forem desonestos intelectualmente, ele será tratado como
pelo menos um forte candidato a Messias. Resta calar os
detratrores em apenas mais uma afirmação perniciosa,
afirmam eles: “O Novo Testamento é uma obra romana, foi
uma criação da Igreja Católica para enganar as massas!”
Sabemos que a Igreja Católica Apostólica Romana
surgiu formalmente no século IV d.C. e que os estudiosos
afirmam que os textos que compõem o Novo Testamento
datam, o mais tardio, do ano 90 d.C., mas estes fatos não
convencem os maledicentes, pois, não buscam a verdade,
buscam apenas se imporem como representantes de uma
verdade que eles mesmos invetaram. Portanto, os dados que
compartilho aqui não visam “abrir-lhes os olhos” para a
Verdade, pois, eles sabem a verdade, apenas a negam
mentindo e enganando gente simples, e é para estes simples
que ainda não foram corrompidos por estes detratores que
minhas palavras são direcionadas.
Em sua maioria, os detratores são: judeus que não
acreditam no Novo Testamento como parte integrante da
Palavra de Deus, como parte integrante da Bíblia, são os B’nei-
185
Noach, cegos e guias de cegos, são os atuais desigrejados,
protestantes às avessas e outros tipos sem noção que acreditam
que há mais inteligência na negação da crença (seja essa qual
for) do que nos fatos históricos, todos estes são rebeldes sem
causa.
Vamos nos concentrar, todavia, na questão pelo viés
judaico, o que o Talmud, obra que goza de imensa
credibilidade entre os judeus de verdade, tem a dizer sobre o
Novo Testamento?
186
HaNotzeri, por conta das profecias, foi chamado de Bessorá
()בשורה, enquanto o anunciador de boas-novas foi chamado
de Mevasser ()מבשר, e por conta destes, os seus discípulos, os
Mevasserim (plural de Mevasser), a obra que escreveram
passou a se chamar de Bessorá HaKedoshá ()בשורה הקדושה
“As Santas Boas-Novas”, que em grego se chama
“Euanguélio” - Ευαγγέλιο. E é como “Euanguélion”
(Evangelho) que o Talmud se refere a esta obra, como está
escrito:
Yossef Bar Chanin levantou um dilema diante do
Rabino Abahu: Com relação a esses livros da casa de
Abidan () ֲא ִבידָ ן, alguém os resgata do fogo ou não os
resgata? Naquela casa havia textos sagrados judaicos,
que eram usados em debates e discussões sobre
questões de fé. Rabi Abbahu não lhe deu uma resposta
clara, mas disse sim e não, e o assunto era incerto para
ele. Rav não iria à casa de Abidan para conversar, e
ainda mais ele não iria à casa de Nitzrefei, o templo do
fogo persa. Shemuel, para a casa de Nitzrefei ele não
foi, mas para a casa de Abidan ele foi. Os estudiosos
gentios disseram a Rava: Por que você não veio à casa
de Abidan? Ele evitou a pergunta deles com uma
desculpa e disse-lhes: Há uma certa palmeira na
estrada, e isso torna o caminho difícil para mim.
Disseram-lhe: Vamos arrancá-la. Ele disse a eles: No
entanto, o poço resultante em seu lugar será difícil para
mim. Mar Bar Yossef disse: Eu sou um deles, somos
amigos e não os temo. Ainda assim, uma vez ele
discutiu com eles e eles tentaram colocar sua vida em
perigo. O Rabi Meir chamaria a escrita Notzeri, o
Evangelion, o perverso fólio [Aven Guilyon - אָ וֶון
;]גִ לְ יֹוןO Rabi Yocḥanan o chamou de fólio pecaminoso
187
[Avon Guilyon - ( ]עֲוֹון גִ לְ יֹוןTalmud da Babilônia,
Tratado Shabat 116a:10).
Este excerto é encantadoramente surpreendente! Neste
trecho do Talmud os rabinos estão discutindo o que se deve
fazer com os textos do Evangelho, do Novo Testamento; caso
fossem encontrados pegando fogo, deveriam resgatá-los ou
deixa-los queimar? A dúvida se encontra no fato de que, para
os rabinos fariseus os textos do Evangelho são heréticos, por
isso deveriam deixar queimar, porém, contém passagens da
Torá e dos Profetas, por isso deveriam resgatá-los.
Mas, o que vem a ser uma “Heresia” de fato?
O termo “Heresia” é para o grego o que o termo “Seita”
é para o latim.
A palavra “heresia” é um termo muito usado, mas o seu
significado não é tão conhecido pela maioria das pessoas. Essa
palavra tem origem grega (haíresis) e significa “opção”,
“escolha”. No latim, o seu equivalente (seita) significa
“opinião”, “sistema”, “doutrina”. Na literatura grega tardia, o
termo significa “a escolha de um sistema” ou “escola de
filósofos”. Na Teologia, a palavra heresia é, geralmente,
definida como uma doutrina contrária aos dogmas de uma
igreja ou de uma religião. A palavra é ainda utilizada, em
sentido figurado, como opinião ou doutrina diferente às ideias
recebidas e, popularmente, pode ser usada para significar
disparate, absurdo, contrassenso.
Em relação mais especificamente ao termo “seita”,
apesar de ser um sinônimo de “heresia”, todavia, os estudiosos
atribuem a ele algumas características ligeiramente distintas
em seu significado. O termo “seita” é usado amplamente e é
aplicado a grupos que seguem um líder vivo que promove
doutrinas e práticas novas e não-ortodoxas. Segundo Peter L.
Berger, seita seria a organização de um grupo contra um meio
188
que consideram hostil ou descrente. O grupo então se fecha em
um corpo de doutrinas e vê o restante da sociedade como
inerentemente má ou pecadora, passível da ira divina, que
inevitavelmente sobrevirá sobre eles.
Em outras palavras: um “herege” ou um “seitário”,
enquanto indivíduo, não existe, enquanto grupo só é possível
existir quando se organizam e confrontam o grupo maior de
onde nasceram, portanto, os grupos heréticos ou as ceitas, por
força de definição; só existem dentro do fenômeno maior de
sua própria religião. Por exemplo, não é possível que um
budista seja considerado um herege por um cristão, que um
muçulmano seja considerado herege ou seitário por um
hinduísta, ou que um umbandista seja considerado herege ou
seitário por um judeu. Mas, os muçulmanos xiitas podem
considerar os muçulmanos sunitas como hereges ou seitários
(e vice-versa), os católicos podem considerar como heregeses
os protestantes, os judeus-sefaraditas podem considerar como
hereges os judeus-ashkenazitas, os candomblecistas podem
considerar como hereges os umbandistas, e assim por diante.
No que diz respeito aos Notzerim (judeus-nazarenos),
eles enquanto eram considerados como hereges pelos
Perushim (judeus-feriseus) e pelos Tzadukim (judeus-
saduceus), da mesma forma os consideravam a ambos como
hereges, como está escrito: “E, levantando-se o sumo
sacerdote, e todos os que estavam com ele (e eram eles da seita
dos saduceus), encheram-se de inveja” (Atos 5:17), e noutro
lugar encontramos “Alguns, porém, da seita dos fariseus, que
tinham crido, se levantaram, dizendo que era mister
circuncidá-los e mandar-lhes que guardassem a Lei de
Moisés” (Atos 15:5).
Esta passagem do Talmud (Tratado Shabat 116a:10), por
si só testemunha de que o Novo Testamento é uma obra judaica
189
(doutro modo não estariam discutindo sobre sua sacralidade),
que contém verdades da Torá, que é capaz de instruir e que sua
instrução é profunda, difícil de superar, como claramente
confessa o Rava, quando foi interpelado pelos seus discípulos
gentios sobre o motivo dele não ter ido à “casa de Abdan” e,
não sabendo o que responder, respondeu-os por eufemismo,
dizendo: “Há uma certa palmeira na estrada, e isso torna o
caminho difícil para mim. Disseram-lhe: Vamos arrancá-la.
Ele disse a eles: No entanto, o poço resultante em seu lugar
será difícil para mim”. A ida à casa de Abdan tem a ver com
disputas teológicas, e alguns rabinos fariseus iam lá para
debater com os rabinos que eram adeptos daquele movimento,
como eles estavam perdendo as disputas com uma certa
frequência começaram a evitar os embates e passaram a
discutir não apenas uma proibição de se frequentar aquele
lugar como também, ainda que de maneira indireta, incendiá-
lo, tal o ódio que passaram a nutrir pela casa de Abdan. A
“palmeira” mencionada pelo Rava em suas desculpas, refere-
se ao Rabino chefe da Sinagoga, o termo “palmeira” em
hebraico é “Tamar” ( )תמרcujas letras que compõem a palavra
são um acrônimo para a frase “Terumat Maim Rabim” ( תרומת
)מים רביםque significa: “Encontro de muitas águas”, fazendo
referência ao fato de que no deserto sempre que alguém avista
uma palmeira, provavelmente em torno dela há água, as
“muitas águas” são as pessoas que acorrem ao Rabino para
consultar-lhe e estudar com ele. Quando os seus alunos
sugeriram “arrancar a palmeira” queriam dizer que o Rabino
deles, o Rava, era capaz de ganhar a disputa com o Rabino da
casa de Abdan, mas o Rava indicou que perderia quando disse:
“No entanto, o poço resultante em seu lugar será difícil para
mim”. O termo “poço” neste contexto, significa conhecimento
190
e sabedoria, Rava teria informado que a profundidade do
conhecimento e da sabedoria dele era inferior aos do Rabino
da casa de Abdan.
Mas, o que vem a ser “casa de Abdan”?
O termo “Abdan” ( )אֲבִ ידָ ןé um termo hebreu que
significa “destruição”, este termo aparece no Apocalipse, por
exemplo, como está escrito: “E tinham sobre si rei, o anjo do
abismo; em hebreu era o seu nome Abadom ()אבדון, e em
grego Apoliom” (Apocalipse 9:11). As sinagogas dos
Notzerim, dos judeus-nazarenos, passaram a serem chamadas
de “casa de Abdan” por conta das frequentes derrotas que
estavam infringindo aos judeus-fariseus, que por isso,
passaram a temer os embates e passaram a temer ainda mais a
possível erosão do farisaísmo na época, onde muitos judeus
fariseus importantes deixaram o farisaísmo e se tornaram
nazarenos, como bem informa a passagem que reza: “Apesar
de tudo, até muitos dos principais creram nele; mas não o
confessavam por causa dos fariseus, para não serem expulsos
da Sinagoga” (João 12:42). A partir destes contratempos, as
singagoas dos Notzerim passaram a serem chamadas de “casa
de Abdan” enquanto que os seus escritos passaram a serem
chamados por três nomes: “Evangelion” para que não fosse
associado ao Judaísmo, “Aven Guilion” para que ficasse claro
que aquele que entrasse em contato com esta obra certamente
se perderia, e “Avon Guilion” dando a entender que a obra foi
maliciosamente confeccionada para perverter as mentes. Ou
seja; não puderam vencê-los no discurso, passaram a difamá-
los, como está escrito: “E não podiam resistir à sabedoria, e
ao Espírito com que falava. Então subornaram uns homens,
para que dissessem: Ouvimos-lhe proferir palavras blasfemas
contra Moisés e contra Deus” (Atos 6:10-11). Mas, a conduta
191
dos Notzerim sempre deixou os Sábios judeus em dúvida:
“Afinal de contas, Deus está com eles ou não?”, como bem
aconselhou o Rabi Gamliel dizendo: “E agora digo-vos: Dai
de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho
ou esta obra é de homens, se desfará, mas, se é de Deus, não
podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes também
achados combatendo contra Deus” (Atos 5:38-39).
A Gemara relata: Imma Shalom, esposa do Rabi
Eliezer, era irmã do Rabi Gamliel. Havia um filósofo
Notzeri em sua vizinhança que disseminou sobre si a
fama de não aceitar propina. Eles queriam zombar dele
e revelar sua verdadeira natureza. Ela deu a ele em
particular uma lâmpada de ouro, e ela e seu irmão
vieram diante dele, aproximando-se dele como se
estivessem buscando julgamento. Ela disse ao filósofo:
quero compartilhar da herança dos bens de meu pai. Ele
lhes disse: Dividam. Raban Gamliel disse a ele: Está
escrito em nossa Torá: Em uma situação onde há um
filho, a filha não herda. O filósofo disse a ele: Desde o
dia em que você foi exilado de sua terra, a Torá de
Moisés foi retirada e o Avon Guilyon ( )עֲוֹון גִ לְ יֹוןfoi
dado em seu lugar. Está escrito no Avon Gilyon: Um
filho e uma filha herdarão igualmente.
No dia seguinte, Raban Gamliel trouxe ao filósofo um
burro líbio. Posteriormente, Raban Gamliel e sua irmã
compareceram perante o filósofo para um julgamento.
Ele disse a eles: Eu procedi (estudei) até o fim do Avon
Gilyon, e está escrito: Eu, Avon Guilyon (um
eufemismo para se referir a Rabi Yeshua HaNotzeri),
não vim para subtrair da Torá de Moisés, e não vim
para adicionar à Torá de Moisés (Mateus 5:17-20). E
está escrito lá: Na situação em que há filho, a filha não
herda. Ela disse-lhe: Que a tua luz brilhe como uma
lâmpada (Mateus 5:16), aludindo à lâmpada que ela lhe
192
dera. Raban Gamliel disse a ele: O burro veio e chutou
a lâmpada, revelando assim todo o episódio (Talmud
da Babilônia, Massekhet Shabat 116a:11-116b:2).
Nesta passagem talmúdica (Shabat 116a-116b),
encontramos um debate entre o Rabi Gamliel, uma figura
bíblica, com um filósofo que teria se tornado Notzer, e era
assim que eram chamados os gentios que se convertiam ao
movimento dos Notzerim, dos Nazarenos, como propagado
por Paulo (Atos 24:5 / Atos 11:1 / Romanos 11:13 / 2 Timóteo
1:11-2:7), aos olhos dos Sábios eles eram equivalentes aos
judeus-helenistas, pois como aqueles, eles não se
circuncidavam e afirmavam que a Torá já havia perdido a sua
validade. Nesta passagem dois trechos do Evangelho de
Mateus são citados praticamente palavra por palavra (Mateus
5:16 e Mateus 5:17-20), e ambos os trechos foram recitados
pelo Rabi Gamliel e sua irmã, a esposa do Rabi Eliezer, e antes
disso o Rabi Gamliel teria afirmado: “Eu estudei o Evangelho
até o fim”, em seguida faz um trocadilho com o nome do livro
sagrado chamando-o de Avon Guilion e cita as palavras de
Rabi Yeshua HaNotzeri como se ele e o Evangelho fossem
uma e a mesma coisa, o Rabi Gamliel demonstrou que o
filósofo estava equivocado em relação à Torá e em relação às
palavras de Rabi Yeshua HaNotzeri registradas no Evangelho,
e é neste ponto da disputa que três coisas interessantes são
demonstradas: a) que os cristão, na época chamados de
“nazarenos-filósofos”, acreditavam mais nos discursos que
lhes eram pregados por seus líderes do que nos textos sagrados
que tinham em mãos, pois foi isso que fez o filósofo Notzer
citado nesta passagem (Shabat 116a-116b), b) que os judeus
são mais apegados aos textos sagrados do que aos discursos
que lhes pregam os seus líderes, e c) que o Novo Testamento
cita a Torá corretamente, e apesar de ter sido considerado
193
como uma obra perigosa e corruptora pelos judeus-fariseus, no
tocante a Torá o Evangelho igualmente foi considerado como
uma obra verdadeira cuja reprodução da Torá nele foi tida por
fiel e digna de todo o crédito, uma vez que não houve por parte
do Rabi Gamliel a necessidade de retificar as palavras do
Evangelho com citações diretas da Torá.
No Talmud também encontramos escrito:
A propósito da discussão acima, a Gemara relata
incidentes envolvendo Sábios que foram sentenciados
pelas autoridades governantes. Os Sábios ensinaram:
Quando Rabi Eliezer foi preso e acusado de heresia
pelas autoridades, elas o levaram a um tribunal para ser
julgado. Um certo oficial de justiça disse a ele: Por que
um ancião como você deveria se envolver nessas
questões frívolas de heresia? O Rabi Eliezer disse a ele:
O juiz é confiável para mim para governar
corretamente. Aquele oficial pensou que Rabi Eliezer
estava falando sobre ele; mas, na verdade, ele disse isso
apenas em referência a seu Pai Celestial. O Rabi Eliezer
quis dizer que aceitou o julgamento de Deus, ou seja,
se ele foi acusado, deve ter pecado contra Deus de
alguma maneira. O oficial disse-lhe: Já que confiaste
em mim, estás absolvido; você está isento.
Quando o Rabi Eliezer voltou para casa, seus alunos
entraram para consolá-lo por ser acusado de heresia,
que ele interpretou como um sinal de pecado, e ele não
aceitou suas palavras de consolo. Rabi Akiva disse a
ele: Meu professor, permita-me dizer um assunto de
tudo o que você me ensinou. Rabi Eliezer disse a ele:
Fale. Rabi Akiva disse a ele: Meu professor, talvez
alguma declaração de heresia tenha vindo ante você e
você obteve prazer com isso, e por isso você foi
considerado responsável pelo Céu. O Rabi Eliezer disse
a ele: Akiva, você está certo, pois me lembrou que uma
194
vez eu estava caminhando no mercado superior de
Tzippori e encontrei um homem que era um dos alunos
de Yeshua HaNotzeri (Jesus, o Nazareno), e seu nome
era Yaakov (Tiago) de Kefar Sekhanya. Ele me disse:
Está escrito na tua Torá: “Não trarás o pagamento a
uma prostituta, nem o preço de um cão, à casa do
Senhor teu Deus” (Deuteronômio 23:19). Qual é a
Halakha: É permitido fazer do pagamento a uma
prostituta pelos serviços prestados um banheiro para
um Sumo Sacerdote no Templo? E eu não disse nada a
ele em resposta.
Ele me disse: Rabi Yeshua HaNotzeri, ensinou-me o
seguinte: É permitido, conforme derivado do versículo:
“Por causa do pagamento a uma prostituta ela os
ajuntou, e ao pagamento a uma prostituta eles
retornarão” (Miquéias 1 :7). Já que as moedas vieram
de um lugar imundo, deixe-as ir para um lugar imundo
e serem usadas para construir um banheiro.
E tive prazer com a declaração, e devido a isso, fui
preso por heresia pelas autoridades, porque transgredi
o que está escrito na Torá: “Afaste-se dela, e não se
aproxime da entrada de sua casa” (Provérbios 5:8).
“Afaste-se dela”, esta é uma referência à heresia; “e não
se aproxime da entrada de sua casa”, esta é uma
referência à autoridade governante. A Gemara observa:
E há quem diga uma interpretação diferente: “Afaste-
se dela”, esta é uma referência à heresia e à autoridade
governante; “e não te aproximes da entrada da casa
dela”, esta é uma referência a uma prostituta. E quanta
distância se deve manter de uma prostituta? Rav Ḥisda
disse: Quatro côvados.
Com relação à derivação do verso de Yeshua
HaNotzeri, a Gemara pergunta: E o que os Sábios
derivam desta frase: “Pagamento a uma prostituta”? A
Gemara responde: Eles explicam isso de acordo com a
195
opinião de Rav Ḥisda, como Rav Ḥisda diz: Qualquer
prostituta que se aluga para outros por dinheiro ficará
tão apegada a esta prática que, finalmente, quando
outros não desejam mais contratá-la, ela contratará
outros para ter relações sexuais com ela. Como é
afirmado (Ezequiel 16:34): “Assim que contigo sucede
o contrário das outras mulheres nas tuas prostituições,
pois ninguém te procura para prostituição; porque,
dando tu a paga, e a ti não sendo dada a paga, fazes o
contrário” (Talmud da Babilônia, Tratado Avodá Zará
16b:17-18a:1-4).
A passagem talmúdica a seguir reforçará as provas da
narrativa pretendida no início deste assunto:
A Beraita relata um incidente que ilustra este ponto.
Houve um incidente envolvendo Ben Dama, filho da
irmã do Rabi Yishmael, no qual uma cobra o picou. E
após o ataque, Ya'akov (Tiago discípulo de Jesus) da
aldeia de Sekhanya, que era um herege, um discípulo
de Yeshua HaNotzeri, veio tratá-lo, mas Rabi Yishmael
não o deixou fazer isso. E Ben Dama disse a ele: Rabi
Yishmael, meu irmão, deixe-o me tratar, e eu serei
curado por ele. E vou citar um versículo da Torá para
provar que aceitar tratamento médico de um herege é
permitido nessa situação. Mas Ben Dama não
conseguiu completar a declaração antes que sua alma
partisse de seu corpo e ele morresse.
O Rabi Yishmael recitou a respeito dele: Afortunado é
você, Ben Dama, pois seu corpo é puro e sua alma
partiu em pureza, e você não transgrediu a declaração
de seus colegas, que declarariam o verso: “E quem
rompe uma cerca, uma cobra o morderá” (Eclesiastes
10:8), ou seja, alguém é punido por ignorar uma
ordenança dos Sábios. Este incidente indica que não é
permitido aceitar tratamento médico de um herege,
196
mesmo que seja claro que sem ele ele viverá apenas um
pouco.
A Gemara explica: A heresia é diferente, pois é
sedutora. Em outras palavras, é proibido aceitar
tratamento médico de um herege, pois alguém pode vir
a ser atraído por sua heresia. Em contraste, receber
atendimento médico de um gentio é permitido se
houver certeza de que alguém morrerá se não for
tratado.
O Rabi disse acima: Você não transgrediu a declaração
de seus colegas, que diriam o versículo: “E quem
arrebenta uma cerca, uma cobra o morderá”. A Gemara
pergunta: Mas Ben Dama também foi mordido por uma
cobra, mesmo antes desta declaração do Rabi
Yishmael, então como ele pode ser considerado
afortunado? A Gemara explica: A cobra mencionada na
maldição dos Sábios é diferente, pois não tem remédio
algum. Embora Ben Dama tenha sido mordido por uma
cobra, ele poderia ter sido curado.
A Gemara pergunta: E o que Ben Dama teria dito? Que
versículo ele pretendia citar como prova de que lhe era
permitido ser curado por um herege? O versículo:
“Portanto, guardareis os Meus estatutos e as Minhas
ordenanças; se o homem os cumprir, por eles viverá”
(Levítico 18:5). Isso ensina que se deve viver pelas
Mitzivot de Deus, e não que se deve morrer por elas.
Este verso serve como fonte para a Halakha de que
alguém pode violar uma proibição para salvar uma
vida.
E por que Rabi Yishmael discorda de Ben Dama? Ele
sustenta que este assunto se aplica apenas em privado,
mas em público não se pode transgredir uma proibição
nem mesmo para salvar uma vida. Como é ensinado em
um Beraita que Rabi Yishmael diria: De onde se deriva
que se os opressores dizem a uma pessoa: Adore um
197
ídolo e você não será morto, esse alguém deve adorar o
ídolo e não ser morto? O versículo afirma: “Ele viverá
por eles”, e não que ele deva morrer por eles. Alguém
poderia pensar que isso se aplica mesmo em público.
Portanto, o versículo declara (Levítico 22:32): “E não
profanareis o Meu santo Nome” (Talmud da Babilônia,
Tratado Avodá Zará 27b:6-11).
A conclusão, portanto, é; para aqueles que consideram o
Talmud uma fonte de autoridade rabínica válida, ficou claro
que para os Sábios do Talmud:
1 – Compreendem que Rabi Yeshua HaNotzeri existiu.
2 – Que seu conhecimento é equiparával ao dos demais
Sábios, digno de debate sério e comprometido tomando suas
palavras como base para Halakhá.
3 – Que os Sábios reconhecem a força, profundidade e
sedução do Judaísmo-Notzeri, e por isso se esforçaram por
impedir seus discípulos de sequer se aproximar de seus agentes
propagadores, de suas sinagogas e de sua Tradição, a Bessorá,
tratada no Talmud sob alcunha de “Evangélio” ou “Avon
Guilion”.
4 – Que a Bessorá, os escritos dos evangelhos, são obras
judaicas direcionadas para judeus e escritas séculos antes do
surgimento da Igreja Católica e tempos antes do surgimento,
mesmo informal, do Cristianismo.
198
Sobre Ben Zoma
199
era um tanto excêntrica por causa de muita ponderação. Os
estudiosos frequentemente recorriam a ele em busca de
conselhos e sua opinião era considerada a de uma autoridade.
Quando a questão das ofertas que deveriam ser trazidas por um
nazireu estava sendo debatida, Ben Zoma divergiu de seu
professor, Rabi Yehoshua, e sua opinião foi estabelecida como
lei.
A máxima favorita de Ben Zoma afirmava: “Quem é
sábio? Aquele que aprende de qualquer um, como se diz: “De
todos os que me ensinaram obtive entendimento” (Salmos
119:99 – texto hebreu). Quem é poderoso? Aquele que subjuga
sua má inclinação, como foi dito: “Aquele que é tardio em irar-
se é melhor do que o poderoso; e aquele que governa o seu
espírito do que aquele que toma uma cidade” (Provérbios
16:32). Quem é rico? Aquele que se alegra com sua sorte,
como é dito: “Você desfrutará do fruto do seu trabalho, será
feliz e prosperará” (Salmos 128:2) “Você será feliz” neste
mundo, “e você prosperará” no mundo vindouro. Quem é
aquele que é honrado? Aquele que honra seus semelhantes
como está dito (I Samuel 2:30): “Porque eu honro aqueles que
Me honram, mas aqueles que Me desprezam serão
desonrados” (Pirkê-Avot 4:1).
Outra vez, Ben Zoma viu uma grande multidão de
pessoas no Monte do Templo e disse: “Louvado seja Deus que
sonda todos os mistérios e que criou tantas pessoas, nenhuma
das quais tem rostos nem opiniões semelhantes e, no entanto,
Ele sabe o que acontece no coração de cada um deles; e tudo
isso Ele criou para me servir” (Talmud da Babilônia, Tratado
Berakhot 58a).
De acordo com o Arizal, Ben Zoma neste episódio ao
contemplar essa multidão alcançou também uma visão
espiritual, ele viu 600.000 almas cujas centelhas habitavam
200
nele para evoluírem, e que em troca elas compartilhavam com
ele os méritos que cada uma destas almas alcançou em suas
vidas passadas, e também o auxiliavam no cumprimento de
Mitzivot durante toda a sua vida, portanto, por conta das
bênçãos dos Céus e do auxílio constante destas 600.000 almas,
os caminhos percorridos por Rabi Shimeon Ben Zoma foram
caminhos perfeitos (Portal das Reencarnações, 2016, p. 268).
Ben Zoma também ficou maravilhado com o progresso
humano e disse: “Consideremos quanto esforço Adão teve de
fazer antes de poder comer um pedaço de pão. Ele tinha que
arar o campo e semear a semente e colher o grão depois
amarrar e debulhar e joeirar e selecionar os grãos, depois disso
ele moía o trigo e peneirava a farinha e amassava a massa e
assava e só então ele poderia comer pão; mas levanto-me pela
manhã e encontro tudo preparado e pronto para meu uso”
(Tosefta Berakhot 6:5).
Falando no mesmo sentido, ele disse também:
“Consideremos os esforços de Adão antes de ele ter uma roupa
para vestir. Ele tinha que tosquiar a lã ou colher o linho depois
tinha que pentear a lã ou bater o linho e depois tinha que fiar e
tecer e só então poderia usar uma roupa; mas levanto-me pela
manhã e o encontro pronto para meu uso. Todos os artesãos do
mundo trabalham diligentemente para preparar tudo isso para
minha satisfação” (Ibidem).
Outra vez ele disse: “Quando uma pessoa respeitável vai
visitá-la, o que ela diz? Louvado seja o nome do meu anfitrião
pelo esforço que exerceu em meu favor. Quantos vinhos e
bolos e outras coisas boas ele preparou por minha causa. Mas
quando um homem ingrato vai visitá-lo, o que ele diz? O que
quer que o anfitrião tenha feito, ele fez por sua própria esposa
e filhos. O quanto eu consumi? Apenas uma fatia de pão e um
201
pedaço de bolo e uma taça de vinho” (Talmud da Babilônia,
Tratado Berakhot 58a:5).
Alguns comentaristas explicam esta frase de Ben Zoma
como uma ilustração das atitudes de vários tipos de pessoas
para com Deus que preparou tudo para o benefício da
humanidade. Alguns estão dispostos a agradecê-Lo, enquanto
outros dizem que não há necessidade de agradecer porque
Deus queria ter pessoas na terra e, portanto, Ele teve que suprir
todas as suas necessidades, assim como Ele provê todas as
outras criaturas.
É relatado que certa vez o Rabi Yehoshua Ben Chananiá
caminhou pela estrada e percebeu Ben Zoma, que estava tão
preocupado com seus pensamentos que nem percebeu seu
professor e nem o cumprimentou. O Rabi Yehoshua parou Ben
Zoma e perguntou-lhe: “De onde você vem e para onde vai,
Ben Zoma?” E ele respondeu: “Eu estava contemplando as
águas superiores e inferiores e descobri que o espaço entre elas
não ultrapassa a largura de três dedos”. Quando o Rabi
Yehoshua ouviu suas palavras, ele comentou com seus alunos:
“Vejam, Ben Zoma ainda está do lado de fora”. Pouco tempo
depois, Ben Zoma morreu (The Jewish Spiritual Heroes,
Volume I; The Creators of the Mishna, Simeon ben Azai and
Simeon ben Zoma 2-22).
A minha sétima viagem mística com o Mafteach Einêi-
Shelomó se deu no início do mês de agosto de 2020. Naquele
tempo, além da ciência de que houveram quatro rabinos que
adentraram ao PARDES e qual o resultado do retorno de cada
um deles, eu não sabia de mais nada.
Foi enquanto eu pesquisava por estes dias (dezembro de
2023) no site do Sefaria.com informações sobre a vida e obra
do Rabino Ben Zoma que me deparei com estas informações
biográficas acima bem como me dei conta de um detalhe na
202
narrativa da Voz durante a minha viagem mística enquanto se
apresentava para mim o espectro do Rabino Ben Zoma que eu
não tinha atentado antes; nem quando vivi a experiência e nem
quando a registrei nestas páginas, o fato de que
tradicionalmente dos quatro rabinos que foram para o
PARDES, o que não voltou, pois, morreu, não foi o Rabino
Ben Zoma, mas o Rabino Ben Azai! Quando me dei conta
disso passei a me perguntar: “A Voz se eganou, trocando os
nomes dos personagens ou minha imaginação me traiu
promovendo esta troca enquanto o espectro se apresentava?”
Em vista disso empreendi uma pesquisa mais profunda para
ver se conseguia alguma resposta coerente à estas questões e
me surpreendi com o que encontrei.
Eis a versão mais popular do relato dos quatro Sábios
que adentraram o PARDES:
Os Sábios ensinaram: Quatro entraram no pomar
[PARDES], isto é, trataram dos segredos mais elevados
da Torá, e são os seguintes: Ben Azai; e Ben Zoma;
Acher, o outro, um nome para Elisha ben Avuya; e
Rabino Akiva. Rabi Akiva, o mais velho entre eles,
disse-lhes: Quando, ao chegarem aos mundos
superiores, vocês alcançarem pedras de mármore puro,
não digam: Água, água, embora pareçam ser água,
porque está afirmado: “O que fala mentiras não será
estabelecido diante dos Meus Olhos” (Salmos 101:7).
A Gemara passa a relatar o que aconteceu com cada um
deles: Ben Azai vislumbrou a Presença Divina e
morreu. E com relação a ele o versículo afirma:
“Preciosa aos olhos do Senhor é a morte dos Seus
piedosos” (Salmos 116:15). Ben Zoma vislumbrou a
Presença Divina e foi ferido, ou seja, perdeu o juízo. E
a respeito dele o versículo diz: “Achaste mel? come só
o que te basta; para que porventura não te fartes dele,
203
e o venhas a vomitar” (Provérbios 25:16). Acher cortou
os brotos das mudas. Em outras palavras, ele se tornou
um herege (em relação ao Rabi Elishá Ben Avuya, ele
consta na lista dos Sábios do Talmud que se tornaram
Notzeri junto com: Rabi Gamliel, Rabi Nikadmon e o
Rabi Eliezer). Rabi Akiva saiu em segurança (Talmud
da Babilônia, Tratado Chaguigá 14b).
Nesta versão, de fato, quem é percebido como morto
pelos demais Sábios foi o Rabi Ben Azai, enquanto que Ben
Zoma enlouqueceu. Mas há outro relato, menos popular, que
nos comunica o mesmo ocorrido de forma ligeiramente
diferente:
Quatro entraram no Jardim, um espiou e ficou ferido;
um espiou e morreu; um espiava e cortava mudas, outro
entrava em paz e saía em paz. Ben Azai espiou e ficou
ferido; sobre ele o versículo diz: “Achaste mel? come
só o que te basta; para que porventura não te fartes
dele, e o venhas a vomitar” (Provérbios 25:16). Ben
Zoma espiou e morreu, sobre ele o versículo diz:
“Preciosa aos olhos do Senhor é a morte dos Seus
piedosos” (Salmos 116:15). Acḥer espiou e cortou
mudas. Quem é Aher? Elisha ben Abuya, que matou os
filhos da Torá... Rabi Akiva entrou em paz e saiu em
paz; sobre ele o versículo diz (Cânticos 1:4): “Leva-me
tu; correremos após ti” (Talmud de Jerusalém, Tratado
Chaguigá 2:1:9 - Heinrich W. Guggenheimer, 1999-
2015).
Quão surpreso não fiquei ao descobrir que a confusão em
relação ao Sábio cujo espectro se manifestou em minha sétima
viagem mística não foi um equívoco de minha memória ou
uma peça pregada pela minha imaginação, mas uma confusão
estabelecida pelos próprios Sábios há quase dois milênios
atrás, como bem pudemos conferir nas duas versões acima do
mesmo relato. No Talmud da Babilônia (Chaguigá 14b), quem
morreu foi o Rabi Ben Azai e quem enlouqueceu foi o Rabi
204
Bez Zoma, enquanto que no Talmud de Jerusalém Ben Azai
foi quem enlouqueceu e Ben Zoma foi quem morreu
(Chaguigá 2:1:9).
Os destinos destes dois Sábios se misturaram de tal
maneira que ambos se tornaram como um na história judaica e
no imaginário dos dos demais Sábios talmúdicos a tal ponto
que é impossível desassociá-los e igualmente impossível
discernir com certeza quem viveu o que e quem disse o que,
como nos revela os demais registros da Tradição sobre estas
duas enigmáticas personalidades:
Rav Yehuda, filho de Rav Shemuel Bar Sheilat, disse
em nome de Rav: Os Sábios procuraram suprimir o
livro de Eclesiastes e declará-lo apócrifo porque suas
declarações se contradizem e podem confundir seus
leitores. E por que eles não o suprimiram? Porque o seu
início consiste em assuntos da Torá e o seu fim consiste
em assuntos da Torá. Os detalhes ostensivamente
contraditórios são secundários em relação à essência do
livro, que é a Torá. A Gemara elabora: Seu início
consiste em assuntos da Torá, como está escrito: “Que
proveito tem o homem de todo o seu trabalho que ele
trabalha sob o sol?” (Eclesiastes 1:3), e os Sábios da
escola do Rabi Yanai disseram: Por inferência:
Debaixo do sol é onde o homem não lucra com seu
trabalho; entretanto, antes do sol, isto é, quando
engajado no estudo da Torá, que precedeu o sol, ele
obtém lucro. Seu final consiste em assuntos da Torá,
como está escrito: “De tudo o que se tem ouvido, o fim
é: Teme a Deus, e guarda os Seus mandamentos;
porque isto é todo o homem” (Eclesiastes 12:13 – texto
hebreu). Com relação a este versículo, a Gemara
pergunta: Qual é o significado da frase: “porque isto é
todo o homem”? Rabi Eliezer disse: O mundo inteiro
foi criado apenas para esta pessoa. Rabi Aba Bar
Kahana disse: Esta pessoa é equivalente ao mundo
inteiro. Shimon Ben Azai disse e alguns dizem que
Shimon Ben Zoma foi que disse: O mundo inteiro só
205
foi criado para ser companheiro deste homem, para que
ele não fique sozinho (Talmud da Babilônia, Tratado
Shabat 30b:3).
Preste atenção: “Shimon Ben Azai disse e alguns dizem que
Shimon Ben Zoma foi que disse...”. Os Sábios buscaram uma razão
para esta eterna confusão entre os nomes e os feitos destes dois
Sábios, como podemos perceber no parecer seguinte:
Ele é chamado de Ben Zoma, já que disseram no final
do primeiro de Sanhedrin 17b: “Aqueles que
deliberaram diante dos Sábios é uma referência a
Shimon Ben Azai e Shimon Ben Zoma, que se sentaria
na frente dos sábios e os desafiaria com perguntas”. E
isso estava com eles em sua juventude, antes de
atingirem o reino da maturidade - ainda assim, seus
nomes eram conhecidos por sua sabedoria. E é por isso
que foram chamados pelos nomes de seus pais, pois não
tiveram nomes próprios [estabelecidos] em sua
juventude. Então, mesmo depois de amadurecerem,
esse nome - que eram chamados de Ben Zoma e Ben
Azai - ficou com eles. E embora também haja outros
que foram apontados como tendo sentado diante dos
sábios, eles foram os mais perspicazes e analíticos. E é
por isso que eles [em particular] foram chamados por
esses nomes. E Rashi, que sua memória seja
abençoada, explicou (Rashi em Avot 4:1) que eles não
chegaram ao reino da maturidade (eles morreram
jovens), e é por isso que foram chamados pelos nomes
de seus pais. Mas pelo que parece, não há necessidade
[de dizer isso]. Pois foi porque seus nomes foram
notados em sua juventude que eles foram chamados
pelos nomes de seus pais, e esses nomes permaneceram
com eles. Assim parece (Derekh Chayim 4:1:2).
E ais aqui outro dado curioso sobre eles, apesar de não
serem irmãos, todavia, tiveram destinos semelhantes, ambos
foram chamados pelos nomes de seus respectivos pais. De
acordo com a versão mais popular do PARDES, o fim do Rabi
Ben Zoma se deu da seguinte maneira, poucos dias depois da
experiência mística vivida pelos quatro Sábios, Rabi Shimeon
206
Ben Zoma foi observado pelos seus pares se comportando de
forma estranha, ele tinha se afixionado em uma passagem da
Torá e nela penhorou toda a sua razão e existência, como
consta:
Com relação ao destino de Ben Zoma, os Sábios
ensinaram: Houve uma vez um incidente com relação
ao Rabino Yehoshua Ben Ḥananya, que estava em um
degrau no Monte do Templo, e Ben Zoma o viu e não
ficou diante dele para homenageá-lo. Pois ele estava
imerso em pensamentos. O Rabi Yehoshua lhe disse:
De onde você vem e para onde vai, Ben Zoma? (ou seja,
o que está em sua mente?) Ele lhe disse: Em meus
pensamentos eu estava olhando para o ato da Criação,
para a lacuna entre as águas superiores e as águas
inferiores, pois há apenas a largura de apenas três dedos
entre elas, como está afirmado: “E o Espírito de Deus
pairava sobre a face das águas” (Gênesis 1:2), como
uma pomba pairando sobre seus filhotes sem tocá-los.
O Rabino Yehoshua disse aos seus alunos que ouviram
esta conversa: Ben Zoma ainda está lá fora; ele ainda
não alcançou a plena compreensão desses assuntos
(Talmud da Babilônia, Tratado Chaguigá 15a:3).
Dias depois, ocorreu outro episódio semelhante:
Aconteceu uma vez que Rabi Shimon Ben Zoma estava
sentado, absorto em pensamentos. Rabi Yehoshua
passou e cumprimentou-o uma, duas vezes, mas ele não
respondeu. Na terceira vez, ele respondeu assustado.
Ele lhe disse: 'Ben Zoma, onde estavam seus
pensamentos?' Ele lhe disse: 'Estive pensando.' Ele lhe
disse: 'Como os céus e a terra são minhas testemunhas,
não sairei daqui até que você me informe onde estavam
seus pensamentos.' Ele lhe disse: 'Eu estava observando
o ato da Criação e percebi que entre as águas superiores
e as águas inferiores havia apenas dois ou três dedos de
distância. “O espírito do Senhor soprava” não está
escrito, mas sim, “estava pairando” (Gêneses 1:2) –
como um pássaro que bate as asas, eles tocam no ninho,
mas não tocam exatamente.' Rabi Yehoshua virou-se e
disse aos seus discípulos: Ben Zoma se foi. Nem
207
mesmo alguns dias se passaram sem que Ben Zoma
ainda estivesse no mundo (Bereshit Rabá 2:4).
Bom, agora que compreendemos que confundir Ben
Zoma com Ben Azai, e vice-versa, é um problema antigo,
acredito que cabe agora sabermos um pouco mais sobre o Rabi
Ben Azai.
208
Elisha Ben Avuya “cortou as plantas”, acreditando que Deus
abandonou os judeus, ele disse: “De que serve a Torá e por que
deveríamos sofrer para observá-la?” Ele então abandonou a fé
e tornou-se “Acher”, um estranho, um inimigo aberto da Torá
e daqueles que se apegavam a ela. Apenas o Rabi Akiva não
sofreu nenhum dano e saiu inalterado desta aventura.
Shimeon Ben Azai, que morreu após ponderar os
mistérios, e Shimeon Ben Zoma, que perdeu a razão, eram
membros da academia do Rabi Akiva e eram reconhecidos
como discípulos proeminentes cujas opiniões eram
frequentemente procuradas. Eles foram considerados capazes
de dirigir academias separadas, embora não tenham sido
confirmados e uma honra especial tenha sido concedida a Ben
Azai. Embora não ordenado, ele às vezes era chamado de
Rabino e quando divergia do Rabi Akiva, sua opinião é
mencionada primeiro pelo menos em uma ocasião. Outras
vezes, o Rabi Akiva retratou suas opiniões em favor das de
Ben Azai e uma vez Ben Azai derrotou o Rabi Akiva em um
debate para completa satisfação dos outros estudiosos.
No início Ben Azai estudou com o Rabi Tarfon, depois
com o Rabi Yehoshua Ben Hananiá, onde conheceu o Rabi
Shimeon Ben Zoma, e mais tarde tornou-se discípulo e amigo
do Rabi Akiva, migrando ele e Ben Zoma para a escola deste.
Ele então teve muitas oportunidades de informar o Rabi Akiva
sobre as opiniões jurídicas do Rabi Yehoshua, mas sua
veneração pelo Rabi Akiva era tão grande que ele disse uma
vez que aos seus olhos “todos os estudiosos juntos não valem
mais do que uma casca de alho, exceto o Rabi Akiva”, a quem
ele se referiu como “o homem careca” (Bechorot 58a).
De acordo com o Arizal, Rabi Yitzichak Lúria, não
temos que entender estas palavras de Ben Azai como prova do
orgulho que ele sentia de si mesmo em relação a todos os
209
Sábios de Israel. E o mesmo no caso do Rabi Akiva, quando
ele o chama de careca. Mas, o segredo por trás das palavras é
que todos os Sábios, ou a grande maioria, criam Nefashot
(almas) para os prosélitos por meio de sua ocupação com a
Torá. No entanto, existe uma diferença entre eles, pois há os
Sábios que só conseguem trazer Nefashot para os prosélitos,
mas que ainda ficam naquela Klipá chamada Noga de que
falamos. Enquanto, o Rabi Akiva e o Ben Azai, depois que
traziam estas Nefashot dali, colocavam-nas dentro da
Santidade, onde elas se corrigiam. Depois eles as extraíam dali
e as davam para os prosélitos. Então, no que se refere a este
nível, o Rabi Akiva e Ben Azai eram superiores a todos os
Sábios de sua geração, por isso Ben Azai disse que todos os
Sábios de Israel, perante ele, se pareciam com a casca do alho
[alusão à Klipat Noga], com exceção do careca (Portal das
Reencarnações, 2016, p. 232).
Ben Azai realizou seu trabalho escolar em Tiberíades.
Ele era famoso por sua diligência incomum e após sua morte
foi dito que toda diligência desapareceu (Talmud da Babilônia,
Tratado Sotá 49a). Sua grande devoção ao aprendizado o levou
a se afastar de sua esposa, filha do Rabi Akiva. Quando Ben
Azai declarou certa vez que “aquele que não se esforça para
trazer crianças ao mundo pode ser comparado a um assassino”,
o povo disse-lhe: “Você prega bem, mas não pratica os seus
próprios princípios”. Ben Azai então respondeu: “Não posso
evitar. Meu coração anseia pela Torá e o mundo terá que se
recriar sem mim”.
É sabido que de acordo com a Halaká corrente hoje em
dia, certamente Ben Azai, e mesmo o Rabi Akiva, estariam
desqualificados para ocuparem os postos elevadíssimos que
ocuparam diante dos Sábios e de todo o povo de Israel, pois,
de acordo com as convenções rabínicas atuais não se pode
210
chamar de Rabino aquele que, mesmo sendo um Sábio não
tenha se casado, e também é dito que aquele que é casado e
não tem relações conjugais com sua esposa comete grave
pecado. Todavia, mesmo assim, nem Rabi Akiva dava prazer
sexual para a sua esposa e, mesmo tido contraído um noivado
com a filha do Rabi Akiva, Ben Azai acabou por não concluir
as formalidades de seu casamento por conta do seu extremo
apego a Torá, o que fez com que ambos ficassem eternamente
numa fronteira indefinida: nem casados e nem solteiros, e ao
mesmo tempo casados e solteiros simultaneamente.
Mas, de acordo com o Arizal, havia uma diferença sutil
entre a situação social e espiritual de ambos os Sábios: “O que
acontece é que no assunto da criação das Nefashot dos
prosélitos, a altura de Ben Azai era superior à do Rabi Akiva,
já que Ben Azai não tinha casado” (Portal das Reencarnações,
2016, p. 234). Na verdade, não há um consenso entre os Sábios
se formalmente Ben Azai se casou ou não, mas afirma-se com
segurança que:
E por causa desta proximidade Ben Azai tomou a filha
do Rabi Akiva como esposa, como é sabido (Talmud
da Babilônia, Tratado Ketuvot 63a). E mesmo que eles
não tenham tido nenhum tipo de relacionamento, tendo
ele mandado ela retornar para a casa do pai dela, como
é sabido, já nos foi explicado em Mitsvat Kedushin [o
preceito do matrimônio], que por meio da cerimônia do
casamento o marido dá para sua mulher o aspecto da
Luz Circundante que vem do próprio Ruach do homem.
Sendo assim, Ben Azai, quando casou com a filha do
Rabi Akiva, passou parte de seu Ruach para ela, pelo
segredo da Luz Circundante, ficando, assim, sempre
com ela (Portal das Reencarnações, 2016, p. 232).
Esta situação matrimonial do Rabi Ben Azai é tão
desconcertante que os Sábios do Talmud tiveram, por mais de
211
uma vez, que fazer “malabarismos” halákhicos para poder
justifica-lo:
As notas da Gemara: Rav Yitzcḥak Bar Rav Yossef
disse que Rabi Yocḥanan disse: Cada um desses Sábios
apresentou uma opinião a respeito do tempo necessário
para o estágio inicial da relação sexual estimado com
base em si mesmo, ou seja, com base em sua própria
experiência. A Gemara pergunta: Mas, e quanto a Ben
Azai, que não se casou, então como ele poderia fazer
uma estimativa com base em sua própria experiência?
A Gemara responde: Se quiser, diga que ele era casado
e separado da esposa. E se quiser, diga que ele ouviu
falar do seu Moré. E se desejar, diga que seu
conhecimento pode ser entendido com base no
versículo: “O conselho do Senhor é para os que O
temem” (Salmos 25:14), ensinando que aqueles que
temem a Deus estão a par de um conhecimento além de
sua experiência pessoal (Talmud da Babilônia, Tratado
Sotá 4b).
No momento da sua morte, Ben Azai ainda era jovem.
Pelas descrições de sua vida que possuímos, fica evidente que
sua diligência, sua renúncia às alegrias da vida e sua piedade
contribuíram para sua morte precoce. Sua piedade era
amplamente conhecida e as pessoas acreditavam que “aquele
que vê Ben Azai em seu sonho pode esperar tornar-se piedoso”
(Talmud da Babilônia, Tratado Sotá 49a).
As opiniões jurídicas de Ben Azai são frequentemente
citadas na Mishná como no caso da sua crença de que o
Cântico dos Cânticos e o Eclesiastes são sagrados. Neste caso
específico, a discussão termina com as seguintes palavras:
“Eles concordaram e decidiram de acordo com as palavras de
Ben Azai”. Na questão da conveniência de ensinar as filhas,
Ben Azai era da opinião de que todo pai deveria ensinar a Torá
212
à sua filha. Ele também expressou uma opinião a respeito do
momento da oferta do dízimo do gado.
A filosofia de vida de Ben Azai é expressa em alguns dos
seus ensinamentos que podem ser classificados entre os
preceitos éticos mais civilizados. “Todo homem cuja
compreensão está obscurecida por seu conhecimento”, disse
ele, “deveria ser aprovado; mas é um mau sinal para um
homem se o seu conhecimento for obscurecido pela sua
compreensão”.
Sua máxima favorita dizia: “Seja rápido em cumprir um
mandamento menor, assim como faria com um mandamento
importante, e fuja de toda transgressão. Pois a recompensa de
um mandamento é um mandamento e a recompensa da
transgressão é a transgressão (Pirkê-Avot 4:2). Uma versão
mais ampla desta máxima é dada em Avoth d’Rabbi Nathan:
“Se você cumpriu um mandamento sem arrependimento, será
levado a cumprir outros mandamentos; mas se você cometeu
uma transgressão sem se arrepender, será levado a cometer
outras transgressões”.
Ele também disse: “Quando Deus mostra aos homens
justos a recompensa que Ele preparou para eles? Quando eles
estão perto da morte.
Outra vez ele aconselhou o seguinte: “Quando você
procurar um lugar para sentar, escolha um que esteja alguns
degraus abaixo do que você acha que merece. Pois é melhor
que lhe digam para subir do que para descer”. O elemento mais
importante da fé judaica é a Torá. Sobre isto Ben Azai disse:
“Quem se permitir ser humilhado pela honra da Torá, será
honrado no final, e aquele que se degradar por causa das
palavras da Torá será elevado no final”.
Ben Azai expressou inúmeras opiniões interessantes
sobre vários presságios que acompanham a morte, segundo os
213
quais era possível julgar a vida do paciente. É um bom
presságio para um homem morrer com a consciência tranquila
e sem se arrepender da vida. Outros bons sinais são se os sábios
ficam satisfeitos com ele; quando o paciente morre com o rosto
voltado para cima e olhando para as pessoas ao seu redor e
quando seu rosto fica colorido.
Certa vez, o povo pediu a Ben Azai que explicasse as
Lamentações. Ele então disse: “As Lamentações começam
com a palavra ‘Eikha’ ( )איכהe devem ser explicadas de acordo
com suas letras. O Alef ( )אindica que os judeus foram exilados
quando negaram o seu único Deus; o Yud ( )יmostra que eles
abandonaram os dez mandamentos; o Khaf ( )כprova que eles
não cumpriram o mandamento da circuncisão que foi dado
vinte gerações após a criação do mundo; o Hê ( )הmostra que
eles negaram os cinco livros da Torá” (Aqui é feito uso da
substituição de letras hebraicas por números: Alef, 1; Khaf, 20;
Yud, 10; Hê, 5).
A Tradição relata que quando Ben Azai estava expondo
ensinamentos da Torá, ele foi cercado por línguas de fogo. As
pessoas pensaram que ele estava explicando os mistérios da
“Carruagem Divina” (Merkabá), mas era apenas uma
exposição comum da Torá. Ele então explicou que as línguas
de fogo foram causadas pela alegria da Torá, que permanece
nova como no dia em que foi dada no Monte Sinai. Como a
Torá foi transmitida pelo fogo, ela é sempre acompanhada de
fogo.
Além de subestimar os colegas, Ben Azai desprezava os
estudiosos que não estavam interessados em aprender, mas
apenas desejavam testar os seus professores. Sobre essas
pessoas ele disse: “É mais fácil conquistar o mundo inteiro do
que sentar-se diante de pessoas que se enrolam em xales e
cujos rostos não se podem ver”.
214
Em seu método de exposição, Ben Azai seguiu os passos
do Rabi Akiva. Às vezes ele ampliou as palavras do Rabi
Akiva com sua própria interpretação. Assim, Rabi Akiva disse
que foi por causa do mérito dos judeus que Deus falou com
Moisés. Ben Azai expandiu esta declaração para indicar que
não só a Moisés, mas a todos os outros profetas, Deus falou
por causa do mérito dos judeus. Outra vez, ele modificou a
explicação do Rabi Akiva sobre o dever de servir a Deus com
toda a alma, de uma maneira que provaria que o homem deve
estar pronto para dar a sua alma pelo privilégio de observar os
mandamentos de Deus.
Ben Azai acreditava na moralização das pessoas com o
objetivo de melhorá-las. Quando lhe perguntaram: “Até onde
se deve ir na sua moralização, seja até que a pessoa a quem se
prega esteja pronta para lutar ou para amaldiçoar? ele
respondeu que bastava que tal pessoa começasse a repreender
(The Jewish Spiritual Heroes, Volume I; The Creators of the
Mishna, Simeon ben Azai and Simeon ben Zoma 2-22).
Apesar de até aqui boa parte do mistério que envolve a
confusão entre os nomes dos dois rabinos e a autoria de seus
feitos e palavras já ter sido esclarecido, no entanto, uma
pergunta implícita se impõe: e no Mundo Espiritual, será que
há alguma implicação que atrele um personagem ao outro a tal
ponto deles se tornarem como um na história e no coração dos
Sábios de Israel? De acordo com o Rabino Isaac Lúria há sim.
Como se sabe, o Arizal se tornou mestre por excelência
em vários aspectos do Judaísmo, mas o seu nome tem maior
proeminência quando o assunto é sobre o Guilgul
(Reencarnção da maneira como compreendida no Judaísmo),
nesta matéria ningué pôde superá-lo até os dias de hoje. Pois
bem, tendo dito isso, de acordo com o Arizal, o Rabi Yitzichak
Lúria, chamado pelos seus discípulos de o “Santo Leão”, as
215
almas antigas encarnam e reencarnam em nosso mundo
retificando os traços de sua personalidade de acordo com a
Ratzon, a Vontade Divina, e hora uma alma se fragmenta e
habita vários corpos simultaneamente, ora várias almas
passam a habitar um mesmo corpo, seja pelo segredo do
Guilgul propriamente dito ou pelo segredo de Ibur ou Dibuk.
E dentre muitas almas cujas sucessivas reencarnações
estão registradas na obra do Arizal, duas destas almas antigas
nos interessam agora, a saber: Kain e Hevel, os filhos de Adam
e Chavá. Por caminhos complicados de explicar agora (pois
não é este o objetivo deste tema) as almas de Kain e Hevel
encarnaram e reencarnaram e no decorrer das eras ambas
acabaram reencarnando ao mesmo tempo em um Rabino
chamado: Rav Mesharshia ()משרשיא.
216
17b) e Rabi Yitzichak (Talmud da Babilônia, Tratado Avodá
Zará 8b).
Conta-se que quando ele morreu, as palmeiras ficaram
cheias de espinhos no lugar de tâmaras, em sinal de luto (Moed
Kattan 25b). Eis alguns dos ensinamentos do Rav Mesharshia:
Rav Mesharshia disse: Qual é o versículo do qual é
derivado (que alguém recebe no Outro Mundo; ou
dupla bênção ou dupla maldição)? Com relação aos
justos, é afirmado: “Portanto, na sua terra possuirão o
dobro” (Isaías 61:7); enquanto que com relação aos
ímpios, é afirmado: “E destrói-os com dupla
destruição” (Jeremias 17:18); portanto, cada um recebe
uma porção dobrada (Talmud da Babilônia, Tratado
Chagigá 15a:10).
217
“...quem cria plantas perfumadas”. Mar Zutra disse:
Quem cheira uma cidra [etrog] ou um marmelo recita:
“Abençoado…que deu fragrância agradável às frutas”
(Talmud da Babilônia, Tratado Berakhot 43b:2).
Sobre a Merkabá
219
the Bible nas páginas 35 atá a página 57. Este texto foi
reproduzido na íntegra na obra Judaísmo e a Cabalá volume 2,
nas páginas da 236 a 248, uma tradução livre para a língua
portuguesa realizada pelo Dr. Gamliel Oliveira, um Judeu de
Caruaru.
O conceito da Merkabá ou Merkavá tem sua base nas
Escrituras Sagradas a partir de alguns versículos chaves que
seprados não parecem comunicar muita coisa, mas juntos
formam o quadro completo, como está escrito:
וארא החיות והנה אופן אחד בארץ אצל החיות לארבעת פניו
“E vi os seres viventes (Chaiot - ;)חיותe eis que havia uma
roda sobre a terra junto aos seres viventes, uma para cada
um dos quatro rostos” (Ezequiel 1:15).
220
ולמזבח הקטרת זהב מזקק במשקל ולתבנית המרכבה הכרבים
זהב לפרשים וסככים על־ארון ברית־יהוה
“E para o altar do incenso, ouro purificado, por seu peso;
como também o ouro para o modelo do carro (Mekabá -
)מרכבה, a saber, dos querubins, que haviam de estender as
asas, e cobrir a Arca da Aliança do Senhor”
(1 Crônicas 28:18).
222
Zoma lhe serve como mediador, intermediário, exercendo de
fato o papel de um Profeta. Por fim, cumpriu-se ao pé da letra
no Rabi Ben Zoma o provérbio cristão tão popular hoje em dia,
que reza: Deus escolheu os loucos para confundir os Sábios (1
Coríntios 1:27).
223
Sobre o Rabino Aryeh Kaplan
224
movimento Chassídico chamado Klausenburg. Em seu
primeiro dia no Minian, Henoch Rosenberg, um Chassid-
klausenburger de 14 anos, percebeu que Len estava deslocado
– ele não estava usando Tefilin nem abrindo um Sidur – e fez
amizade com ele. Henoch Rosenberg e seus irmãos ensinaram
hebraico a Kaplan e em poucos dias Kaplan estava aprendendo
o Chumash.
Klausenburg, é uma “dinastia” chassídica que se
originou na cidade da Transilvânia de Clujnapoca, hoje na
Romênia. O nome do movimento foi extraído do apelido do
Rabino Yekusiel Yehudah Halberstam, todos o chamavam de
Rebe Klausenburg, e ele governou a comunidade de 1927 a
1994, o movimento foi dividido em dois movimentos
separados após sua morte, liderados por seus dois filhos.
Quando completou 15 anos, Kaplan matriculou-se na
Yeshivá Torá Vodaas, e aos 18 anos (de janeiro de 1953 a
junho de 1953) ele esteve entre um pequeno, mas importante,
grupo de Talmidim selecionado para ajudar o Rabino Simcha
Wasserman a abrir a Yeshivá Or Elchonon, uma nova Yeshivá
em Los Angeles. Depois de sua estada em Los Angeles,
Kaplan teve alguns pequenos empregos, incluindo lecionar em
uma Escola Hebraica no Bronx e na Beit Torá em Richmond,
na Virgínia (fevereiro de 1955).
Em janeiro de 1956, Kaplan foi a Israel para estudar na
Mir em Jerusalém. Naquele ano, ele recebeu a sua Semikhá
(ordenação rabínica) de alguns dos Possekim mais importantes
de Israel, incluindo o Rabi Yitzichak HaLevi Herzog e o Rabi
Eliezer Yehudá Fihkel. Ao retornar de Israel em agosto de
1956, Kaplan tornou-se professor de hebraico na Academia
Eliahu em Lousiville, Kentucku. E começando no semestre de
outono de 1957 estudou na Universidade de Lousville. Onde
ingressou na Sigma Pi Sigma, na Woodcock Society e na Phi
225
Kappa Phi, completando seu bacharelado em física em 11 de
junho de 1961. Enquanto estava em Lousville, conheceu Tobie
Goldstein, com quem se casou em 13 de junho de 1961 e com
quem teve nove filhos.
Após sua formação acadêmica, ele se mudou no mesmo
ano para a Universidade de Maryland com o intuito de dar
continuidade em seus estudos de física e para pleitear uma
posição profissional como cientista e pesquisador na Divisão
de Mecânica dos Fluidos do National Bureau of Standards,
onde foi responsável pela pesquisa em magnetohidrodinâmica.
Kaplan obteve seu mestrado em física pela Universidade de
Maryland em 1963. Depois de se formar, ele permaneceu na
Universidade de Maryland como bolsista na National Science
Foundation durante o semestre de outono de 1964.
Em 1965, Kaplan mudou de carreira e começou a exercer
a profissão de Rabino. Em Encountres (uma espécie de
periódico), Kaplan escreveu que quando questionado sobre o
motivo de ter mudado de carreira científica para exercer o
rabinato, ele disse “Deus tinha uma missão para mim”. Sua
carreira como Rabino se dividiu basicamente entre funções de
púlpito e outras funções paralelas às de líder congregacional.
Ele também dava palestras em sua casa em Kensington,
às quais muitos moradores locais compareciam regularmente.
Kaplan também atuou como consultor rabínico para a
peça “Yentl” – uma peça teatral de Leah Napolin e Isaac
Bashevis Singer, que conta a estória de uma jovem que desafia
a tradição ao discutir os papéis da mulher no Judaísmo do seu
pai que era Rabino. Após o falecimento do seu pai, ela corta o
cabelo e passa a se vestir de homem, e se matricula em uma
Yeshivá onde passa a estudar sob o pseudônimo Anshel. Na
Yeshivá ela se apaixona por outro estudante que descobre que
ela é uma mulher e todo um drama se estabelece em torno da
226
possibilidade de continuar os estudos ou abandonar tudo para
se tornar uma mãe de família – depois que o diretor conheceu
o Rabi Aryeh Kaplan na Balsa de Staten Island (uma rota de
passageiros gratuita operada pelo Departamento de
Transportes da Cidade de Nova York que opera 24 horas por
dia e permite apresentações artísticas para entreter os
passageiros), ele o questionou sobre sua associação com uma
peça contendo nudez e uma mulher vestida de homem, Kaplan
simplesmente lhe respondeu: “É uma abominação, mas e daí?”
Em 1971, o Rabino Aryeh Kaplan se mudou para o
Brooklyn, Nova York, onde viveu até o fim da vida. Lá não
ocupou nenhum cargo como Rabino de púlpito, mas teve
muitas outras funções que envolviam, principalmente,
escrever e editar publicações religiosas.
O Rabino Aryeh Kaplan morreu em sua casa de ataque
cardíaco em 28 de janeiro de 1983, aos 48 de idade. Ele foi
sepultado no Cemitério Judaico do Monte das Oliveiras, em
Jerusalém, Israel.
227
Raul Seixas
228
edificações que são erguidas nelas são os resultados das
influências exteriores que sofremos da realidade em que
vivemos e das pessoas com as quais interagimos, seja
pessoalmente, seja através do trabalho ou obra de alguém vivo
ou morto. Como na minha adolescência eu me inspirei bastante
no Raul Siexas, através das letras de suas músicas,
provavelmente por isso o seu espectro se plasmou nesta minha
viagem a fim de me inspirar mais uma vez.
Raul Santos Seixas (Salvador, 28 de junho de
1945 — São Paulo, 21 de agosto de 1989) foi um cantor,
compositor, produtor e multi-instrumentalista, frequentemente
considerado um dos pioneiros do Rock Braisleiro. Raul Seixas
é chamado de Pai do Rock Brasileiro e Maluco Beleza. Sua
obra musical é composta por dezessete discos lançados
durante 26 anos de carreira. Seu estilo musical é
tradicionalmente classificado como rock e baião, e de fato
conseguiu unir ambos os gêneros de forma harmônica e até
hoje sem igual. Raul Seixas tinha um estilo musical que era
chamado de "contestador e místico".
E acredito que foi por causa dessa faceta mística da arte
de Raul Seixas que, em certa medida, suas músicas cabaram
me guiando em termos religiosos e filosóficos, fermentando a
minha imaginação, me permitindo identificar as coisas à minha
volta por um ângulo que a maioria das pessoas ao meu redor
não faziam a menor ideia que existia. Mas, se isso me parece
ser influência das letras das músicas do Raul Seixas,
curiosamente, eu não era o único a ouví-las, mas praticamente
todos os demais com os quais tentei conversar sobre estas
minhas percepções em relação às particularidades das letras
das músicas do Raul me olharam de maneira estranha enquanto
fumavam maconha e se rebelavam contra os pais em casa e os
professores na escola, me provocando a seguinte questão:
229
quem era o verdadeiro esquisito, eu ou eles? Hoje, depois de
tantos anos, percebo, portanto, que na verdade a
Espiritualidade se apropriou das letras das músicas do Raul
Seixas para me ensinar conceitos que doutro modo; ou eu não
acharia quem me ensinasse ou não iria conseguir aprender de
outra forma. Eu aprendi mais sobre filosofia, por exemplo, nas
músicas do Raul Seixas do que o que me foi passado em todo
o meu período escolar, dada a precariedade da educação em
nosso país, sobretudo no Nordeste, onde há muitas décadas
reina o voto de cabestro e, por isso, não é interessante para
político de Esquerda nenhum que os nordestinos
compreendam as coisas como realmente são, mas que se
mantenham sempre acreditando que as coisas são como eles
dizem que são.
A música do Raul Seixas que ouvi enquanto ele ainda
vivia foi a que apresentaram num programa infantil chamado
Balão Mágico (de 1983 a 1986), a música se chamava O
Carimbador Maluco, na verdade tratou-se de um clipe onde o
Raul apareceu com um chapéu que tinha uma pequena hélice
em cima e estava impedindo uma nave espacial de seguir
viagem, mas no final do processo o Carimbador Maluco libera
a nave, deseja aos tripulantes boa sorte e afirma que o seu
verdadeiro desejo era seguir viagem com eles. Confesso que
só muito tempo depois foi que eu descobri que o Carimbador
Maluco era o grande Raul Seixas, para mim, quando assisti ao
clipe, tratava-se apenas de um doido engraçado.
Os evangélicos na época o chamava de ateu e adorador
do Diabo, isso por causa de algumas músicas realmente
estranhas como: Cowboy fora da lei, onde ele critica a
crucificação, Rock do Diabo, onde ele afirma que o Diabo era
quem lhe inspirava, dentre outras como a canção Eu nasci há
dez mil anos atrás. Bom, que ele parecia um adorador do
230
Diabo com estas músicas realmente parecia, mas não é
possível ser adorador do Diabo e ateu ao mesmo tempo, ou
uma coisa ou outra, e se alguém quiser insistir em afirmar que
um ateu serve ao Diabo de qualquer forma, todavia, preciso
dizer que se serve não serve de maneira consciente.
Para mim, Raul Seixas não parecia ser um ateu, ele
compôs canções que louvam a Deus e O engrandece de
maneira mais poética, profunda e filósofica do que a maioria
dos cantores gospels, padres e pastores poderiam fazê-lo,
como por exemplo a canção Tente outra vez, onde ele
aconselha que devemos ter fé em Deus e fé na vida e seguir em
frente, como também a canção Água viva, onde ele afirma que
conhece bem a Fonte que desce do monte que rega céus,
infernos, rega gente, é sobre Deus e Sua misericórdia que ele
está falando, o que dizer da canção Ê, meu pai, onde ele suplica
a Deus por ajuda sempre que porventura ele cair, fracassar, ter
medo demais e, por fim, porém, não menos importante, a
lindíssima canção Gita. Eu aprendi sobre Deus, Sua grandeza,
magnitude e profundidade ouvindo e refletindo na letra da
canção Gita mais do que em muitos dos meus estudos
religiosos em livros durante o início de minha jornada em
direção ao Sagrado, ao desvendar os segrados espirituais que
Deus dispôs aos homens. Para mim, Gita é em música o que o
livro O Alquimista, de Paulo Coelho, é em texto, ambos se
complementam em meu imaginário, e não seria exagero dizer
que estas obras contribuíram de maneira significativa para que
eu pudesse encontrar a Torá, estudar e ensinar Judaísmo. Aliás,
atrelado às minhas lembranças durante o meu processo de
formação religiosa que envolve o nome do Raul Seixas se
encontra o meu período de estudos das Escrituras Sagradas
com o Sr. Oriceu.
231
Sr. Oriceu é um homem negro, bem afeiçoado,
descendente de jamaicanos cuja família tinha um objeto
místico que utilizavam para resolver problemas espirituais e
naturais das pessoas que os procuravam, este objeto era um
pião de quatro lados feito de cipós cuja utilização se dava da
seguinte maneira: aquele que fora consagrado para herdar o
pião, ao sentir alguma impressão mística sobre qualquer
assunto, se sentava no chão, pernas abertas em arco, com o
pião posto no chão no espaço criado entre as pernas, o místico
estendia suas mãos sobre o pião sem tocá-lo e o pião
misteriosamente se punha de pé a girar, enquanto girava o
místico obtinha visões do que precisava fazer ou das pessoas
que vinham lhe consultar mas que ainda não tinha chegado à
sua casa. Depois da morte do seu pai, o Sr. Oriceu é que foi
consagrado como herdeiro do místico pião, porém, sua mãe,
que àquela altura da vida já tinha sido influenciada pelas
pregações evangélicas, se esforçou por convencer o Sr. Oriceu
de que aquele objeto era maligno, e assim o jogaram fora. O
Sr. Oriceu se tornou Pastor de um ministério chamado A Voz
do Sétimo Anjo, casou-se e teve filhos, eu o conheci em algum
momento depois dos anos dois mil e ele foi meu mestre nas
Esctituras Sagradas por mais ou menos três anos. Nosso
convívio se dissipou quando eu resolvi me circuncidar, apesar
dele ter me ensinado sobre Judaísmo como poucos poderia tê-
lo feito, no entanto, ele era extremamente contrário à
circuncisão, mas como a ideia tinha se enraizado em mim de
maneira profunda, não pude atender aos seus rogos e tive que
seguir em frente. Lamento que as coisas tenham terminado
assim, mas sou-lhe extremamente grato por todo o bem que ele
me fez.
Talvez, a pergunta que urge agora é: e o que é que Raul
Seixas tem a ver com isso? É que em 1982, ele fez um show e
232
se apresentou bêbado em Caieiras, São Paulo, e foi quase
linchado pela platéia que não acreditava que Raul era o
próprio, mas um impostor, e o Sr. Oriceu estava presente neste
show. Provavelmente eu e o Sr. Oriceu nos demos bem
justamente por compartilharmos de uma visão de mundo
semelhante, não apenas gosto musical semelhante, trata-se de
algo mais além. Percebi no Sr. Oriceu um espírito rebelde,
ainda que espirituoso, filosófico e religioso, características
hoje que percebo em mim e que percebi nas canções do Raul
Seixas. Na congregação guiada pelo Sr. Oriceu haviam jovens
e pessoas de meia idade em diante, e eu era o único a chama-
lo de Sr. Oriceu, ao contrário dos demais que o chamava de
Pastor Oriceu, ele não parecia se incomodar com isso, e para
mim, realmente ele me parecia ser alguém muito maior do que
um Pastor e eu o via como uma autoridade, na verdade gostaria
de ter podido chama-lo de pai sem causar constrangimento
nem para mim e nem para ele, mas como não me foi possível,
preferi shamá-lo de meu senhor.
Raul Seixas se interessava por filosofia, psicologia,
história, literatura e latim. Algumas ideias dessas correntes
foram muito aproveitadas em sua obra, que possuía uma
recepção boa ou de curiosidade por conta disso. Ele nasceu às
8 horas da manhã em 28 de junho de 1945 numa família de
classe média baiana, a qual vivia na Avenida Sete de
Setembro, Salvador. Seu pai, Raul Varella Seixas, era
engenheiro da estrada de ferro e sua mãe, Maria Eugênia
Santos Seixas, se dedicava às atividades domésticas. Em julho
de 1945, foi registrado no Cartório de Registro Civil de
Salvador com o nome do pai e do avô paterno. Em 16 de
setembro, batizaram-no na Igreja Matriz da Boa Viagem. Sua
formação religiosa era católica, mas como na Bahia o
sincretismo religioso entre Catolicismo, Candomblecismo e
233
Umbanda é muito forte, Raul não ficou imune a estas
influências e sem pudor deixou-as transparecer em suas
canções, mais particularmente na canção Ave Maria da rua, a
letra fala que “seu nome é Iemanjá que é Virgem Maria”, e
nesta frase ele não apenas entrega a influência das religiões
afro-brasileiras em seu imaginário, mas que, ao contrário do
que afirmam os umbandistas e candomblecistas, para Raul
Seixas não é a Vigem Maria que é Iemanjá, mas Iemanjá que
é Virgem Maria, ou seja; Iemanjá foi a forma com a qual a
Virgem Maria teria se revelado aos negros baianos. Essa
percepção é importante porque daqui podemos extrair uma
chave que destrancará as portas da obscuridade da crença ou
descrença de Raul Seixas em Jesus Cristo. Ora, se ele
acreditava na Virgem Maria, logo, é impossível que não
acreditasse em Jesus, mas se ele acreditava em Jesus, por que
o maltratou tanto em suas canções?
A questão acima me remete, em minhas lembranças, ao
momento em que me percebo apegado conscientemente à
crença em Deus e na Bíblia. Meu avô e minha vó, que a paz
esteja com eles, foram os responsáveis pela minha formação
religiosa, eles eram católicos praticantes, meu avô me contava
histórias bíblicas e me ensinava virtudes morais através destas
histórias, minha vó me ensinou a rezar, me levava para os
terços e para as missas que frequentava, infelizmente não me
tornei tão religioso quanto ela gostaria, mas aprendi o amor,
temor e respeito ao Sagrado graças à devoção dela. Num dia
qualquer resolvi ler a Bíblia sozinho e nela descobri um Jesus
um pouco diferente do Jesus ensinado por meu avô e pela
minha vó, eu não sabia explicar em que consistia a diferença,
mas havia algo de diferente entre os “dois Jesuses”, sem
dúvida. Quando se aproximou o tempo de meu Serviço Militar
Obrigatório, me deparei com a versão evangélica de Jesus, e
234
então, acabei restando-me confuso com “três Jesuses” e a
necessidade de escolher um deles como verdadeiro renegando
os outros dois como falsos, mas qual eu deveria escolher?
Anos mais tarde optei pelo Jesus do texto bíblico, que muito
se aparenta com o Jesus histórico, renegando assim o Jesus
católico e o Jesus evangélico. Acredito que com Raul Seixas
deva ter acontecido coisa semelhante: ele também teria
renegado o Jesus católico e o Jesus evangélico, optando,
todavia, por crer num Jesus alternativo que, ao que tudo indica,
era tão estranho às pessoas comuns que ele resolveu não
divulgar, mantendo sua crença de maneira privada.
Certamente nunca saberemos quais as características
religiosas, filosóficas e culturais com as quais revestiu Raul
Seixas o seu Jesus particular, mas acredito ser possível, ainda
que hipoteticamente, se aproximar de sua mente e vislumbrar
ainda que indiretamente o que ele escondeu “às setes chaves”.
Como vimos, sua formação religiosa foi católica, e ele era
muito espirituoso desde a mais tenra idade, como pode-se
conferir em suas próprias palavras: “Quando eu era guri, lá na
Bahia, música para mim era uma coisa secundária. O que me
preocupava mesmo eram os problemas da vida e da morte, o
problema do homem, de onde vim, para onde vou (...)” estes
não eram pensamentos de uma criança comum.
Como ele gazeava (matava) as aulas para ir ouvir e
discutir rock, a família resolveu matricular Raul num colégio
de padres, o Colégio Interno Marista, onde chegou à 3.ª série
em 1960, mas acabou repetindo o estágio em 1961. Nessa
época, Raul começou a se interessar pela leitura, pois seu pai,
que amava livros, possuía uma vasta biblioteca em casa. Tão
logo decifrou o mistério das letras, o garoto pôs-se a ler os
volumes que encontrava na biblioteca do pai e assim, as
histórias que lia na biblioteca fermentavam sua imaginação e,
235
com os cadernos do colégio, fazia desenhos, criava
personagens, enredos, para depois vender ao irmão 4 anos mais
novo, que acabava ficando interessado e comprava os
esboços. Segundo Raul, um dos personagens principais dessas
histórias era um cientista maluco chamado “Melô” (algo como
"amalucado", curiosamente muito parecido com “Melo”), que
viajava para diversos lugares imaginários como o "Nada", o
"Tudo", "Vírgula", "Xis ao Cubo" e "Oceanos de
Cores". Segundo Raul, "Melô" era sua "outra parte, a que
buscava as respostas, o eu fantástico, viajando fora da lógica
em uma maquinazinha em que só cabia um só passageiro...
Melô-eu”. Mais tarde, já maduro, Raul Seixas diria: "Eu era
um fracasso na escola. A escola não me dizia nada do que eu
queria saber. Tudo o que aprendia era nos livros, em casa ou
na rua. Repeti cinco vezes a segunda série do ginásio. Nunca
aprendi nada na escola. Minto. Aprendi a odiá-la". Raul
Seixas amava a leitura, os estudos dos assuntos que lhe
interessavam, mas odiava a escola, enfim, odiava a ordem
social de seu tempo.
Em 1967, Raul Seixas começa um relacionamento com
Edith Wisner, filha de um pastor protestante americano. O pai
de Edith não aceita o namoro da filha. Em 6 meses, Raul
completa o segundo grau, faz cursinho pré-vestibular e passa
em Direito, Psicologia e Filosofia. Com isso, casa-se com
Edith. Fez isso para agradar o pai dela, ainda que de fachada,
demonstrou ser um exímio acadêmico apenas para se casar
com Edith, mas ele sabia que não importaria o que fizesse
nunca teria a aprovação plena do pai dela, por isso, assim que
alcançou o seu intento retornou à sua maneira de sempre de
viver. Logo em seguida, abandona os estudos, volta a reunir os
Panteras e aceita o convite de Jerry Adriani para ir para o Rio
de Janeiro. Este período de desvio de forma comum de viver a
236
vida lhe conferiu não apenas o ingresso na academia de ensino
superior e uma certidão de casamento, mas também lhe
conferiu repulsa pela Igreja Protestante, dada a sua hipocrisia.
E aqui encontramos outro elemento relevante que irá nos
nortear em direção ao Jesus de Raul Seixas: ele era um crente
em Deus, na Bíblia, porque amava livros e a Bíblia é o maior
dos livros, era um crente na Virgem Maria e obviamente no
Cristo, porém, por causa da repulsa que adquire das
instituições religiosas ele definitivamente não era cristão.
Mas, se ele não era cristão, o que ele era então?
Pelas suas canções e pelos dados biográficos que foram
publicados e a maioria deles é hoje de domínio público assim
como suas músicas, percebe-se que ele, à sua maneira, buscou
sicenramente e de maneira profunda se encontrar
espiritualmente, saber quem é e o que veio fazer aqui: qual o
seu papel no mundo? A quem deveria seguir e a quem deveria
orientar? Provavelmente, nesta fase de sua vida, a canção
Metamorfose Ambulante represente bem o seu espírito de
jornada espiritual em busca de uma definição do seu eu para si
mesmo e para os outros, em certa medida Metamorfose
Ambulante representa uma versão “profana” do que disse o
Apóstolo Paulo de si mesmo:
“Porque, sendo livre para com todos, fiz-me servo de
todos para ganhar ainda mais. E fiz-me como judeu para os
judeus, para ganhar os judeus; para os que estão debaixo da
lei, como se estivesse debaixo da lei, para ganhar os que
estão debaixo da lei. Para os que estão sem lei, como se
estivesse sem lei (não estando sem lei para com Deus, mas
debaixo da lei de Cristo), para ganhar os que estão sem lei.
Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos.
Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a
237
salvar alguns. E eu faço isto por causa do evangelho, para
ser também participante dele” (1 Coríntios 9:19-23).
Assim como Paulo, o genial Apóstolo, Raul Seixas
também foi um revolucionário, também se percebeu com uma
missão especial. Enquanto Paulo se esforçou por libertar as
pessoas da idolatria, Raul Seixas se esforçou por libertar as
pessoas das leis morais e civis que as tolhiam, é claro e, graças
a Deus, que Raul Seixas não alcançou plenamente o que
buscava, ao contrário de Paulo que o alcançou, mas do ponto
de vista particular do Raul, ele estava fazendo a coisa certa e
sua certeza alcançou à plenitude de sua razão quando ele
experienciou um fenômeno místico que lhe daria o certificado
de que sim; ele era alguém espiritualmente especial e um
mensageiro da Nova Era. Em suas palavras ele nos conta que:
“Precisamente a 7 de janeiro deste ano (1973), às 16
horas, quando houve um eclipse parcial, estava eu na Barra
da Tijuca, perto do Recreio dos Bandeirantes, e avistei um
disco cujos lados havia [sic] uma auréola cor de fogo em
propulsão. Quando surgiu e consegui visualizá-lo, uma coisa
estranha me tocou e só então percebi que era um predestinado
e as coisas começaram a clarear para mim, sedimentando-me
este conceito. Simbolicamente, pareceu-me viajar no tal disco-
voador e consegui ver a Terra com toda sua problemática. Ao
retornar da viagem espacial, não sei explicar o personagem
que encarnei por alguns minutos, mas pareceu-me um
jacobino, dentro daquela Revolução Francesa. Refeito, voltei
à casa e passei a interessar-me pelo cósmico. Dois meses
depois, acordei bem cedo, com vontade de escrever. Era uma
espécie de ânsia. Telefonei a um amigo e ele me aconselhou a
voltar ao local do disco-voador. Voltei e, lá chegando, tive um
sentido amplo do que era a terra, o fogo, a água, e o ar, esses
quatro elementos que compõem um todo a ser vivido por mim,
238
mas por etapas” (Raul Seixas sobre a inspiração para compor
"Ouro de Tolo", em entrevista publicada na Revista Amiga em
julho de 1973).
No ano de 1974, Raul Seixas e Paulo Coelho criam a
Sociedade Alternativa, uma sociedade baseada nos preceitos
do bruxo inglês Aleister Cronley, praticamente repetindo o
chamado Livro da Lei. O cantor foi levado pelo escritor a
conhecer uma ordem filosófica baseada na Lei de Thelema,
desenvolvida por Crowley. A Sociedade Alternativa, com sede
alugada, papel timbrado e relatórios mensais, chegou a
anunciar a aquisição de um terreno em Minas Gerais, para a
construção da Cidade das Estrelas, uma comunidade onde a
única lei era: “Faz o que tu queres, há de ser tudo da lei.” Em
todos os seus shows, Raul divulgava a Sociedade Alternativa
com a música de mesmo nome.
Nesta fase de suas descobertas espirituais e filosóficas,
Raul estava bem perto de concluir a face de sua versão
particular do seu Cristo: ele já tinha concebido um cristo
distinto e contrário ao Cristianismo, ele já tinha se percebido
como uma espécie de “apóstolo” do seu cristo particular, e o
encontro com Paulo Coelho iria lhe permitir encontrar a lei
deste seu cristo, o deus do qual o seu cristo derivava, bem
como o seu “profeta” que anunciaria ao mundo a vinda dos
mensageiros de tal cristo pelo mundo afora. Também Paulo
Coelho se sentia, em certa medida, um representante desta
coisa maior, porém, com menos devaneios e com um pouco
mais de sobriedade - Paulo Coelho buscava através de seus
livros místicos de contos com forte tempero árabe na
composição da cultura e dos diálogos de seus personagens,
cuja obra O Alquimista se tornou, neste sentido, sua obra
prima - e seu encontro e associação com o Raul Seixas
contribuiu com este “tempero árabe-muçulmano” na formação
239
da cosmovisão mística ideológica que estava em fases de
cristalização no imaginário do Raul e, provavelmente foi essa
contribuição do Paulo Coelho que depois tornaria ambos
estranhos um ao outro, ou seja; a contribuição do Paulo Coelho
se revelaria contraproducente no final das contas, porque
mesmo que seu cristo tenha sido concebido de maneira
profanamente contrário à maneira como os baianos, e os
brasileiros em geral, compreendiam o Cristo bíblico, no
entanto, o cristo do Raul se manteve cristão demais para o
gosto de Paulo Coelho que aspirava algo mais subversivo.
Raul era cristão demais para Paulo, enquanto Paulo era
muçulmano demais para Raul e o que os unia era apenas a
influência das palavras do Aleister Cronley apresentado a Raul
Seixas pelo Paulo Coelho, mas que Raul, como em qualquer
outro assunto, criou em seu imaginário uma versão distinta de
Aleister Cronley da que concebeu Paulo Coelho em seu
imaginário, eles falavam sobre o mesmo personagem, mas
acreditavam em aspectos diferentes e irreconciliáveis do
mesmo, era como se Paulo Coelho era o “lado esquerdo” de
Aleister Cronley, enquanto que Raul Seixas se tornou o seu
“lado direito” aqui no Brasil. Mas, quem foi Aleister Cronley
e o que ele concebeu? Qual o seu legado?
Aleister Crowley (nascido Edward Alexander
Crowley; Royal Leamington Spa, 12 de outubro de 1875 –
Hastings, 1 de dezembro de 1947), foi um membro da Ordem
Hermética da Aurora Dourada e influente ocultista britânico,
responsável pela fundação de uma doutrina (ou filosofia,
dependendo do ponto de vista) que batizou de Thelema.
Atualmente, é mais conhecido como autor de obras sobre
magia e misticismo, dentre eles o Livro da Lei, que tornou-se
a escritura sagrada principal dos thelemitas, e doutros tratados
sobre diversos assuntos esotéricos. Em muitas de suas
240
façanhas, buscava "ir contra os valores morais e religiosos do
seu tempo", defendendo a liberdade individual e espiritual
baseada no principal lema thelêmico: "Faze o que tu queres,
há de ser tudo da Lei". Por isso, ganhou imensa notoriedade
em vida, e foi tachado pela imprensa britânica como "The
wickedest man in the world" (algo como "O homem mais ímpio
do mundo").
Edward Alexander Crowley nasceu na Rua Clarendon
Square, n. 30, em Royal Leamington Spa, no condado de
Warwickshire, Inglaterra, entre as 11h00 da noite e meia-noite
do dia 12 de outubro de 1875. Seu pai, Edward Crowley, era
engenheiro de formação, mas, segundo Crowley, nunca
trabalhou como um, pois era um abastado dono de uma
cervejaria, que o permitiu se aposentar antes mesmo que
Crowley nascesse. A mãe de Crowley, Emily Bertha Bishop,
vinha de uma família com raízes em Devon e
Somerset. Ambos pais de Crowley pertenciam a uma
comunidade cristã fundamentalista conhecida como Irmãos de
Plymouth, na qual seu pai costumava ser missionário. Deste
modo, desde tenra idade o jovem Crowley foi criado para ser
um Irmão de Plymouth, e obrigado todo dia a ler um capítulo
da Bíblia.
Em 29 de Fevereiro de 1880, Grace Mary Elizabeth,
uma irmã de Crowley, nasceu, mas sobreviveu apenas cinco
horas. No velório, ao ver o corpo da pequenina irmã, Crowley,
detalhando-se a si mesmo na terceira pessoa em sua
autobiografia As Confissões de Aleister Crowley, descreve-nos
a cena da seguinte forma:
“O incidente criou nele uma curiosa impressão. Ele
não entendia o porque de estar tão inutilmente perturbado. Ele
não poderia fazer nada; a menina estava morta; aquilo não
era de sua conta. Essa atitude persistiu nele com o passar da
241
vida. Nunca mais compareceu a outro velório, salvo o do
próprio pai, que ele não se importou em comparecer porque
sentiu que o pai era, em verdade, o centro de seu interesse”.
Em 5 de Março de 1887, quando Crowley tinha apenas
onze anos, seu pai morreu de câncer de língua. Crowley mais
tarde descreveria esse evento como decisivo em sua
vida, sendo neste o ponto em que passa a descrever-se em
primeira pessoa nas Confissões. Tendo herdado as riquezas do
pai, mais tarde foi matriculado numa escola particular da
Irmandade de Plymouth, mas foi expulso por "tentar
corromper outro aluno". Depois, tentou a Escola de Tonbridge
e o Colégio de Malvern, ambos os quais desprezava. Na
adolescência, gradativamente se desiludia e tornava-se cético
quanto ao Cristianismo, e cada vez mais atentava contra a
moralidade cristã que lhe fora forçada quando criança. Em
1895, Crowley entrou num curso de três anos do Trinity
Colege, Cambridge, para estudar filosofia. Porém, com
permissão do tutor, trocou o curso para literatura inglesa, que
até então não era parte do currículo oferecido. Foi aqui que
passou a ter uma visão mais severa contra o Cristianismo.
Conforme confessou:
“A Igreja Anglicana […] me parecia com uma estreita
tirania, tão detestável quanto a dos Irmãos de Plymouth;
ainda menos lógica e mais hipócrita… Quando descobri que
comparecer à capela era obrigatório, imediatamente recusei.
O vice-reitor me repreendeu por não estar comparecendo à
capela, e não estava mesmo, pois tinha que acordar cedo para
isso. Dei a desculpa de que tinha sido criado entre os Irmãos
de Plymouth. O reitor pediu para que eu viesse vê-lo de vez em
quando para contar mais do assunto, ao que tive a
surpreendente ousadia de escrever-lhe: "A semente plantada
pelo meu pai, regada com as lágrimas de minha mãe,
242
arraigaram-se demais para serem arrancadas, até mesmo por
alguém de sua eloquência e erudição”.
O ano de 1904 foi divisor de águas para Crowley, o
ano em que o mistério que viria perseguí-lo por toda a vida
estava por se revelar, como bênção e maldição. À época,
Crowley já era um magista competente, e um iniciado veterano
na Aurora Dourada, uma das mais importantes ordens mágicas
de todos os tempos.
Naquele tempo, Crowley estava viajando o mundo. Em
março e abril de 1904, estava no Cairo, Egito, em lua-de-
mel com a esposa, Rose Kelly. Mesmo entre as alegrias da
viagem de núpcias, Crowley e Kelly não largavam os afazeres
esotéricos. Durante um trabalho de invocação de elementais do
ar para a esposa, Kelly começa a canalizar e a balbuciar que o
deus egípcio Hórus falava através dela. O deus prescreve então
uma série de detalhes para um ritual de invocação, e o
resultado deste ritual se dá nos dias 8, 9 e 10 de abril, nos quais
Crowley recebe o Liber Al vel Legis (Livro da Lei), que para
ele tratava-se de uma escritura sagrada contendo a lei e as
liturgias mágicas do "Novo Aeon" (a Era de Aquário).
Crowley ficou perplexo com o conteúdo, que deixou para ele
fora de dúvida a veracidade, beleza e poder do Livro da Lei.
O Livro foi todo ditado por uma entidade de nome
Aiwass, que mais tarde Crowley reconheceu que era o seu "Eu
superior" ou Santo Anjo da Guarda, na magia cerimonial. A
Lei da Nova Era é sintetizada na frase “Faze o que tu queres
há de ser o todo da Lei”, e tem como contraponto e
complemento “Amor é a Lei, amor sob Vontade”. Essa
vontade seria a Verdadeira Vontade, ou Thelema (do grego-
coiné θέλημα, "vontade, arbítrio"), em que o indivíduo possui
absoluto discernimento das forças que movimenta e o
movimentam. Nas próprias palavras de Crowley: “O tolo bebe,
243
e se embebeda: o covarde deixa de beber. O homem sábio,
valente e livre, bebe, e glorifica ao Deus Altíssimo”. "Os
Livros Sagrados de Thelema" são uma compilação dos mais
importantes livros escritos por Aleister Crowley entre 1907 e
1911, que resultaram na fundação de uma nova religião, ou
filosofia, em nova esfera, distante do eixo principal em torno
do qual revolve-se a vida espiritual judaico-cristã. Nesse
sentido, Thelema pode ser caracterizada não apenas como uma
religião secular, mas também como uma ética filosófica. A
obra se subdivide em 14 livros sagrados. Os textos Classe A,
segundo Crowley, não são de sua autoria, pois foram apenas
redigidos através dele em hierofanias ou epifanias.
Em resumo: Crowley era, por conta de sua rebeldia
fruto dos estremos cuidados de seus pais, um protestante às
avessas. Curiosamente, esta mesma característica pode ser
identificada em Coelho e no Seixas, o que os une de certa
forma num mesmo espírito revolucionário espiritualista e
filosófico, distinguindo-se, no entanto, nas bases da formação
religiosa de cada um segundo a imposição da Lei Sagrada que
reza: “Educa a criança no caminho em que deve andar; e até
quando envelhecer não se desviará dele” (Provérbios 22:6).
Após apostatarem de suas crenças familiares; Aleister
Crowley passa a protestar contra o Protestantismo, Paulo
Coelho contra o Catolicismo e Raul Seixas contra ambas as
formas de Cristianismo, eles acabam, por fim da força, a
encarnarem um princípio vicioso percebido na conduta de
qualquer satanista, por mais esperto que se apresente, que
consiste em imaginar a sua crença às avessas num esforço de
produzir uma versão negativa da fé positiva que antes
professavam, assim acreditam que estão dando à luz a algo
contrário a Deus, dificultando-Lhe o caminho de
evangelização e santificação do mundo, em outras palavras: o
244
Satanismo nada mais é do que um Cristianismo às avessas, não
há nada de original e nem tão pouco de Satanás de fato em tais
crenças ou expressões religiosas que realmente deveria
preocupar gente séria, uma vez que tais crenças são pura
invenção sem base genuína alguma, é o tipo de revelação que
qualquer maconheiro consegue alcançar mas que logo perderá
o sentido quando os efeitos da maconha passar, o que forçará
o crente em tais coisas se manter drogando-se com certa
regularidade para que seus devaneios e aspirações
“messiânicas-demoníacas” não se embotem por força da razão
natural humana.
De qualquer forma; temos aqui as peças restantes do
nosso “quebra-cabeça”. A experiência de Aleister Crowley no
Egito o fez crer que ele era um mensageiro do deus Hórus,
enquanto o “anjo” que lhe anunciou tais “verdades” tinha por
nome Aiwass, que ele, após refletir, percebeu que tratava-se na
verdade do seu “Eu maior”, o “Livro da Lei” nada mais foi do
que uma sacralização revelada do “Sagrado” concebido pelo
próprio Crowley, e aqui sua experiência permite-nos
identificar um padrão já fartamente trabalhado no livro
Judaísmo e a Cabalá, Volume 1, de que o místico ao adentrar,
seja lá de que maneira for, ao Mundo Espiritual, sua viagem
mística se dará pelos mundo inferiores, e o que ele verá e
ouvirá nada mais será do que o seu sagrado particular
traduzido em sons e imagens, e tais informações são
compartilhadas em via de regra justamente pelo espectro do
místico, uma representação espiritual da própria pessoa que
viaja. No final das contas, a pessoa terá a impressão de ter
encontrado a verdade última das coisas por conta da
familiaridade com tais mistérios que julgava desconhecer, mas
que estranhamente lhe aprece agora tão próximos e claros
como se sempre acreditasse nas coisas dessa forma, mesmo
245
sem saber explicar como passou a crer assim, e isso é assim
porque o que ocorre é semelhante a alguém que se vê em um
espelho, e neste espelho místico se esforçará para ver a melhor
versão de si mesmo em todos os aspectos e desta forma não se
convencerá de verdades novas, mas aprofundará sua
compreensão em verdades já estabelecidas e familiares,
porém, sob uma ótica até então não explorada o que lhe fará
parecer uma verdade inédita.
Pois bem, o que Aleister Crowley chamou de Aiwass,
Paulo Coelho em sua obra O diário de Um Mago chamou de
Mensageiro familiar e Raul Seixas chamou de Melô, termos
distintos para identificar, cada qual, o que entre os católicos se
chamaria de “anjo da guarda” e entre os ocultistas se chamaria
de “Eu maior”. Assim, Hórus fez as vezes de deus, o Livro de
Thelema, sua “Bíblia” revelada, Aleister Crowley fez as vezes
de Moisés, Paulo Coelho fez as vezes do Apóstolo Pedro
equanto que Raul Seixas teria feito as vezes do Apóstolo
Paulo. Inclusive, na canção Meu amigo Pedro, constante no
álbum Há dez mil anos atrás, a letra entrega uma disparidade
de pensamento sobre as coisas corriqueiras da vida onde dois
amigos que outrora andavam juntos, hoje são quase que
inimigos, e Raul chama o outro de Pedro, uma possível alusão
ao Paulo Coelho num esforço de lhe dizer o que não foi
possível na ocasião em que se sepraram, tal qual os apóstolos
Pedro e Paulo, ora se ajudando (Atos 15) e ora contrários um
ao outro (Gálatas 1-2). A rivalidade, ao que me parece, se
estabeleceu em torno da disputa de quem seria o “Apóstolo” a
representar fielmente o “evangelho” do Aleister Crowley aqui
no Brasil, Paulo Coelho achava que era ele e exigia a
submissão do Raul, Raul Seixas, por outro lado, achava que
era ele e igualmente exigia a submissão do Paulo Coelho.
246
A pretensão de Raul Seixas como o genuíno
representante das verdades do Livro de Thelema pode ser
conferida, além de em suas músicas e dados biográficos, numa
foto sua que ilustra a capa de um dos seus discos chamado
Krig-ha-bandolo onde ele aparece com ares místicos de um
profeta e com uma chave egípcia (Ankh – a “chave da vida”)
desenhada em sua mão direita. Ao que me parece, Raul Seixas
se percebeu como uma encarnação do deus Hórus, e assim
como no Cristianismo Jesus Cristo é a encarnação de Deus, da
mesma forma Raul concebera uma versão profana desta
mesma crença e, portanto, ele se tornara o seu próprio cristo
enquanto o lema “Faze o que tu queres há de ser o todo da
Lei” era a sua versão pervertida do Evangelho.
Sim, eu sei; é muita loucura. Mas, afinal de contas,
estamos conversando sobre o Maluco Beleza, como pode-se
discorrer honestamente e livremente sobre ele sem vez por
outra perder a proporção das coisas e a sobriedade da
realidade? E este seria o motivo do antagonismo de Raul
contra o Cristo bíblico em suas canções, pois, se percebendo
como o único verdadeiro, não toleraria a presença de um
“falso” atrapalhando o seu caminho rumo a autolibertação e a
libertação de seu próprio povo do Egito cultural-religioso
implantado pelo Catolicismo/Protestantismo e suas vertentes,
dentre as quais, ainda que não admitisse claramente, no fundo
ele sabia que sua concepção religiosa-filosófica, era parte
constituinte.
Depois de sua morte, Raul permaneceu entre as paradas
de sucesso. E mesmo muitos anos depois de sua morte, Raul
Seixas continua fazendo sucesso entre novas gerações até os
dias de hoje, como bem se pode ver.
247
Vivi Melo, a Encantada
248
da casa onde morava na Rua do Imperador, no bairro
Vassoural.
Ela cometeu o suicídio por meio de enforcamento e
para isso usou uma corda e se pendurou no telhado e foi
descoberta por uma criança.
Os pais da jovem são evangélicos, porém ela acabou o
namoro há uma semana, que estranhamente vivia desenhando
cenários de morte e alguns amigos disseram que ela
participava do tal jogo da baleia azul, mas isso não foi
confirmado pelos familiares.
O corpo da menor foi encaminhado para o IML da
cidade” (Página do Facebook: Caruaru Hoje - matéria do dia
06 de Março de 2018).
O texto não era apenas mal elaborado e despudorado,
era também malicioso e tendencioso, seu objetivo visava algo
mais do que informar à população de uma tragédia, tinha a
necessidade explícita de likes e o “certificado de notícia de
primeira mão”. De acordo com o Lucivaldo Melo, pai da Vivi,
ela não jogava Baleia Azul, mas os desenhos na parede
realmente eram macabros, apesar de terem sido bem
desenhados, ela tinha talento pra desenhar, tal qual seu pai e
eu. Sobre o término com o seu namorado, há algumas nuvens
cinzentas sobre esta parte da história que dão margem a
especulações. Eu estive na casa de meu irmão pouco tempo
depois do ocorrido, e o ex-namorado dela apareceu, ele entrou,
mal cumprimentou o dono da casa e seguiu depressa para o
corredor que dava na cozinha, ele foi em direção à mãe de Vivi,
que infelizmente já havia alguns anos que tinha adquirido uma
reputação ruim em termos morais e religiosos.
A matéria procurou induzir o leitor crer que o motivo
pelo qual a Vivi teria se suicidado foi devido à depressão
causada pelo término do namoro, deixando implícito que teria
249
sido o rapaz a terminar a relação, enquanto ao mesmo tempo o
leitor é induzido a imaginar que ela foi, após a suposta
depressão, possessa por demônios por jogar o jogo Baleia
Azul, evocando como “prova” desta hipótese os desenhos
macabros na parede de seu quarto.
Eu nunca saberei o que levou ela a se suicidar, mas
como todo mundo que soube da história, baseado no que
conheço da família, também deduzi algumas hipóteses as quais
aludirei aqui de maneira discreta: Ela era muito apegada ao seu
pai, logo o sofrimento do seu pai infrigido por sua mãe lhe era
muito penoso, muito difícil de suportar. Meu irmão tem uma
natureza muito branda, se esforça de toda a maneira possível
para evitar atritos familiares, raras foram as vezes em que ele
teria se posicionado de maneira enérgica seja para com a
esposa, seja para com os três filhos, mas Vivi, que tinha sangue
mais quente, não suportava vê-lo padecer passivamente. Seu
namorado me pareceu ser um pouco mais velho do que ela, seu
pai conservador regrava seu relacionamento com ele, logo, o
jovem necessitado de interações mais íntimas, não
encontrando espaço para suas realizações no namoro com a
filha, buscou espaço e contexto com outra pessoa, porém, da
mesma convivência familiar. Ela teria descoberto, brigou com
a mãe várias vezes por conta disso, e o resultado foi que; nem
resolveu o seu problema e nem o de seu pai, e ainda piorou
mais a sua situação, pois, a partir de então, a mãe passou a
trata-la com maior severidade e rispidez.
Vivi era uma moça muito bela, ao completar quinze
anos tinha um porte e aparência de uma verdadeira princesa.
Como seus traços indígenas, herdados de seu pai, herança esta
que veio de nossa tataravó que, segundo relato de minha vó,
que a paz esteja com ela, foi pega de cachorro no mato
(Judaísmo e a Cabalá, V. 2, 2022, pp. 88-89) eram bem
250
acentuados na cor dos seus olhos, nos seus cabelos negros,
longos e lisos, na cor de sua pele e em alguns traços de sua
feição, estas características emolduravam uma moça alta e
esbelta, nariz afilado, queixo fino e postura elegante. Ela era
uma moça bonita de feição e bonita de porte, sua voz era
agradável, salvo quando ria, pois, sua risada espontânea era um
tanto estridente, mas isso não lhe conferia defeito, isso apenas
a tornava humana, doutro modo seria perfeita demais, e como
me ensinou vovó: “Perfeito só Deus”.
Sua mãe, que era dona de uma loja de confecções cujo
nome era algo como “Elenvy Fashion”, passou a explorar
exageradamente a beleza de sua filha, seus conselhos eram
extremamente opostos à moral da religião que dizia praticar,
como Vivi era muito apegada ao seu pai, e ele era um estudioso
da Bíblia sob a ótica evangélica, Vivi se refugiava em seus
conselhos e, por conta disso, sua mãe passou a se esforçar por
distancia-la de seu pai. O relacionamento deles, de meu irmão
e sua esposa, estava ruindo a passos largos, e ninguém sairia
ileso deste processo.
A mãe de Vivi desenvolveu uma natureza narcisista e
se esforçava a todo custo para que a filha desenvolvesse essa
natureza também, e de tanto tentar, por fim, conseguiu, mas
não da maneira que esperava, pois, o narcisismo desenvolvido
em Vivi seguiu, ao meu ver, basicamente os mesmos moldes
do mito. O reproduzirei aqui à minha maneira:
Conta-se que na antiga Grécia, em cima de uma colina
morava um casal de idosos cujo maior sonho era ter um filho,
mas por mais que tentassem nunca tinham sido agraciados
pelos deuses. Até que num dia qualquer, três senhoras lhe
bateram à porta, a dona da casa atendeu, elas lhe pediram pão
para comer e água para beber, a senhora as pôs para dentro de
sua casa e lhes ofereceu um banquete.
251
As três senhoras eram três sacerdotisas de Hécate, e
gratas pelo inesperado banquete, chamaram o casal e lhes
disseram: “Há muitos anos que vocês pedem um filho aos
deuses, mas eles nunca ouviram e nem atenderam aos seus
clamores, mas hoje eles houviram, e daqui a um ano vocês
segurarão um filho em seus braços, ele será perfeito, lindo e
maravilhoso em todos os sentidos, ele será chamado de filhos
dos deuses dada a sua perfeição e beleza. Mas, advirtu-vos;
não deixem que ele veja a própria aparência, pois, no dia em
que ele contemplar a própria face, ele morrerá”. As
sacerdotisas deixaram a casa e seguiram o seu caminho, e um
ano depois assim como elas predisseram nasceu um menino e
puseram o seu nome Narciso.
Narciso era perfeito e extremamente belo, pessoas e
animais eram atraídos à casa por conta da presença de Narciso,
todos concorriam para vê-lo, e assim o casal prosperou, pois,
os visitantes traziam de terras distantes todas as delícias do
mundo apenas para terem uma chance de contemplar o filho
dos deuses. Quanto mais Narciso crescia mais belo ficava,
quando se tornou adolescente as mulheres pisoteavam-se aos
montes ao se esforçarem-se para chegar na casa onde Narciso
morava, e os homens se matavam de inveja. Seus pais,
lembrados da recomendação das sacerdotisas, substituíram
todos os utensílios da casa que poderiam de alguma forma
refletir a sua imagem por utensílio de madeira e de barro,
naquela casa não se utilizavam espelhos e Narciso só tomava
a água que era dada pelos seus pais, pois temiam que ao ir
beber no pote poderia acidentalmente ver o próprio rosto e
morrer por conta disso.
Narciso vivia rodeado de pessoas o admirando,
paparicando-o e mimando-o, mas havia algo que incomodava
Narciso que as pessoas não percebiam, elas vinham para
252
admirar a divina beleza de Narciso, era isso que elas queriam,
mas nenhuma delas estava preocupada com o que Narciso
queria. Mesmo constantemente rodeado de pessoas, Narciso se
sentia extremamente só.
Numa manhã cedo, antes do tumulto diário iniciar-se
com a visita da multidão que acorriam todos os dias à casa de
Narciso, ele se levantou de sua cama, e antes mesmo que seus
pais se dessem conta, Narciso fugiu de casa. Ele correu
apressadamente floresta adentro, correu e correu tão depressa
quanto pôde, seu intuito era fugir da aglomeração em sua casa,
era ter paz, mas também ele corria ao encontro de algo que
sabia que precisava encontrar, mas não sabia o que era, mas,
mesmo assim ele correu e correu. De tanto correr sentiu sede e
procurando encontrou um belo lago de água doce e cristalina,
sedento, ele se debruça à margem do lago para sorver a água e
ao aproximar sua face da água do lago ele vê algo que nunca
imaginaria que poderia existir, era o ser mais belo de todo o
mundo, nem mesmo em seus mais profundos sonhos ele pôde
vislumbrar tamanha beleza, graça e sedução, o vazio na alma
de Narciso foi preenchido, sua solidão e angústia perderam o
motivo de ser, sua vida passou a ter significado e propósito,
Narciso estava intensamente apaixonado. A beleza da criatura
no lago fez ele esquecer-se de sua sede e cansaço, feliz com
sua descoberta ele volta extasiado para a sua casa, seus pais
não deram por sua falta e ele guardou o segredo apenas para si
mesmo.
Dalí em diante, todos os dias de manhã cedo, Narciso
saía de sua casa e ia para o lago para contemplar a face da
criatura do lago que cativou seu coração e alma. Dias se
passaram desta maneira, até que em uma destas visitas,
enquanto Narciso contemplava a face da bela criatura no lago,
Narciso foi tomado de um poderoso desejo de beijar a criatura,
253
mas tinha medo de assustá-la e por isso se esforçou por resistir
aos seus desejos, porém, em um movimento involuntário seu
corpo inclinou-se bruscamente para a direção da margem do
lago e antes que Narciso pudesse se recompor e recuar
percebeu que a criatura do lago fez também um movimento
involuntário em sua direção, o desejo era recíproco, então,
Narciso ciente de que a criatura desejava o mesmo que ele
entregou-se aos seus desejos, inclinou-se livremente em
direção das águas do lago, mas escorregou da margem por
causa dos musgos e da humidade do solo, caiu dentro da água
e por não saber nadar, morreu afogado.
As oréades, ninfas que habitavam e protegiam as
florestas, montanhas e os campos, tinham ouvido falar da
profecia do nascimento de Narciso, e há muito que procuravam
vê-lo, porém, sem sucesso. Até que os animais da floresta lhes
contaram que havia um determinado lago onde Narciso ia
todos os dias contemplar a própria face em suas margens, as
oréades procuraram encontrar o lago e acabaram por acha-lo,
ao chegar no lago, as oréades perceberam que o lago, que era
de água doce, tinha se transformado num lago de água salgada,
e então, perguntaram para ele: “Ó lago, por que choras?” e o
lago lhes respondeu: “Choro por Narciso”, e elas
compreensivamente observaram: “De fato, quem mais poderia
sentir falta de Narciso senão tu, uma vez que Narciso vinha
sempre contemplar sua beleza em suas margens” à isso, o lago
se pegou pensativo, e depois de alguns instantes de reflexão
disse por fim: “Eu choro por Narciso, mas não sabia que
Narciso era belo. Eu choro por Narciso porque todas as vezes
que Narciso vinha contemplar sua beleza em minhas margens
eu contemplava minha beleza nos olhos dele”.
Nossa querida Vivi estava sempre rodeada de gente,
porém, se sentia só, todos olhavam para ela, para sua beleza,
254
mas ninguém se importava com ela de verdade, e ao mergulhar
dentro de si mesma, ao contemplar sua face espelhada no
Outro Mundo, tal qual Narciso entregou-se àquilo que parecia
lhe trazer paz e um sentido em sua vida, porém, por ignorar o
que havia por trás das aparências das coisas, acabou perdendo
a vida do lado de cá.
Na manhã do dia 06 de março de 2018, um pouco antes
de acordar, eu sonhei, no sonho me percebi em um campo
verdejante, uma brisa agradável soprava em meu rosto, no
horizonte pessoas plantavam e outras colhiam, todos pareciam
felizes e tranquilos. De repente me dei conta que no meu braço
esquerdo se encontrava pousada a Lailá, minha águia de
cauda-branca que havia fugido semanas atrás, surpreso eu olho
para ela; um vento suave movia suas penas dando-lhe um ar de
graça, sua feição estava serena e contemplativa, me senti
atraído pelos seus olhos e os contemplei fixamente e, como
num passe de mágica, algo se transmutou em sua natureza
revelando ser ela mais do que um simples pássaro, era uma
pessoa, apesar de sua aparência continuar de águia, ela então
pisca os olhos, tensiona o corpo e alça voo indo embora. Meu
coração ficou apertado e um sentimento de tristeza se
avolumou no meu peito de tal maneira que acordei com
lágrimas nos olhos.
Ao acordar, percebi que minha esposa ainda estava
dormindo, me levantei sorrateiramente e fui até o lugar onde
se encontrava um falcãozinho quiri-quiri que arranjei para
preencher o fazio deixado pela Lailá, eu interpretara o sonho
como um pedido da Espiritualidade solicitando a soltura do
pássaro, me dirigi ao falcão, cortei-lhe as correias e o soltei,
ele ficou sem entender o que estava acontecendo por um pouco
de tempo, mas depois foi embora livre. Mas, a tristeza, o vazio
255
e o aperto no meu peito ainda continuavam, percebi que não
tinha a ver com o falcão, era outra coisa, mas o que?
Saindo da área da piscina, onde o falcão estava, voltei
para dentro de casa, passei pela sala e segui em direção ao
quarto que ficava no fim do corredor, ao voltar do quarto
percebi que minha esposa tinha acordado e saído do nosso
quarto que ficava no início do corredor, e antes que eu dissesse
qualquer coisa, ela repentinamente me disse: “Melo! A Vivi se
suicidou!” ainda sem entender plenamente o teor da notícia fui
tomado por uma paralisia dos músculos de minhas pernas, um
frio percorreu minha espinha e uma força espiritual estranha se
apoderou de meus pés e foi subindo até a altura do meu
abodmen, meu olhos começaram a lacrimegar
involuntariamente e a senção deixou claro que a pessoa que
percebi nos olhos de Lailá no sonho era realmente Vivi que
estava me avisando de sua partida.
Tudo tinha ocorrido muito rápido, o pai dela, meu
irmão, ficou arrasado, perdido, sem saber que rumo tomar na
vida, minha esposa se aproximou deles para ajudar no que
estivesse ao alcance, e foi ela quem estava no veículo que
transportou o caixão do local do velório até o local de
sepultamento, e ela me disse que durante o trajeto, mais ou
menos à meio caminho da sepultua, ela ouviu Vivi gritar
nitidamente em seu ouvido: “Tio! Me ajuda!”, minha esposa
deu um sobressalto, o motorista percebeu e observando que ela
estava com a feição ligeiramente mudada perguntou-lhe se ela
estava bem, ela preferindo não falar sobre o fenômeno
ocorrido simplesmente disse para o motorista que sim, estava
bem.
Fisicamente Vivi está distante de nós, mas
espiritualmente, de mais de uma maneira, ainda percebemos
sua presença.
256
Meses depois de sua partida a Diná consultou a mim e
à Rabanit Miriam Melo sobre a situação da filha de uma amiga
sua. A menina nasceu com alguma limitação mental, bem sutil,
mas ainda percertível, agora moça feita demonstra um
comportamento infantil muito aquém de sua faixa etária, mas
o problema mesmo foi que desde a partida de Vivi que ela
passou a ter uns surtos violentos, chamar palavrões, desejar se
relacionar sexualmente apenas pela experiência, chamar pela
mãe como se sua mãe não estivesse presente ainda que era a
sua mãe que cuidava dela durante estes estranhos e perigosos
momentos, passou a se cortar, jogar coisas no chão, agredir e
ameaçar violentamente as demais pessoas da casa, chorar
bastante e depois insistir em querer se suicidar. Isso estava
acontecendo entre duas a três vezes por mês. A Rabanit
Miriam Melo compreendeu que seria interessante ouvir a mãe
da moça sobre isso, marcamos um dia e horário confortável
para todo mundo e na data marcada nos encontramos em nossa
sala de estudos. Estávamos lá: eu, a Rabanit Miriam Melo, a
Diná e a mãe da moça. A mãe da moça contou o que estava
acontecendo basicamente nos mesmo moldes da versão da
Diná, após terminar os relatos, que na versão dela foi
acrescentado o fato dela ter levado a moça em centros espíritas
e outros lugares que não ficou muito claro para mim, além de
em clínica psiquiátrica onde lhe foi receitada medicamentos e
tudo o mais, porém, sem sucesso. De acordo com os elementos
percebidos por Miriam Melo na narrativa da mãe da moça, a
Rabanit percebeu que a moça era atormentada por no mínimo
três espíritos, dois ela identificou: um era o pai, já falecido, e
o outro era a avó, que após as descrições da Rabanit Miriam
Melo dos tais espíritos percebidos por ela a mãe da moça
concorda plenamente com as descrições causando espanto e
admirição em todos os presentes na sala de estudos, mas o
257
terceiro permaneceu um mistério para todos. Após refletir um
pouco sobre toda a situação, me preparei para receitar-lhe um
Tikun, e quando estava repassando os ingredientes do Tikun
na minha mente, ouvi a voz de Vivi que me disse: “Não tio,
não faça assim. Faça desse jeito...” e através de imagens e de
sensações ela foi me instruindo sobre o que eu precisava
receitar para a mãe da moça. Enquanto eu prestava atenção às
instruções dela meu corpo demonstrou algumas leves
alterações; os pelos se eriçaram, meu rosto ficou rubro e
lágrimas correram dos meus olhos de maneira involuntária, e
por fim Vivi me disse: “E dessa forma eu poderei deixa-la em
paz”. Os elementos que compuseram este Tikun foram: uma
pequena taça de metal que eu tinha trazido de Jerusalém em
2014 e que tinha dado de presente para o meu irmão, o pai de
Vivi, que por ser evangélico, meses depois me devolveu e eu
a guardei comigo, esta taça deveria ser entregue para a mãe da
moça, e ela deveria reservar um lugar em sua casa onde
pudesse colocar esta taça e algum outro objeto em que pudesse
acender velas num lugar reservado que ninguém mexesse, ela
deveria acender duas velas; uma na taça e outra neste outro
objeto (ela escolheu um pires), uma vela deveria ser acesa em
nome de Vivi e outra em meu nome, e isso deveria ser feito
toda a sexta-feira à tarde, no mesmo horário do Kabalat
Shabat, deveria repetir este rito até que a moça demonstrasse
melhoras. O que de fato aconteceu, ao cabo de alguns poucos
meses a moça estava livre de seus surtos e a mãe dela entrou
em contato comigo para agradecer-nos.
Eu soube depois que a mãe da Vivi, antes de sair de
casa para as suas aventuras questionáveis, deixava os seus três
filhos na casa da mãe da moça, e foi durante estes períodos que
a filha dela e a Vivi desenvolveram um forte vínculo
emocional, o que proporcionou para a Vivi em momento
258
oportuno um canal de comunicação que, infelizmente, para as
pessoas do lado de cá, a comunicação nem foi clara e nem bem
aceita, e por conta disso o pedido de socorro foi, à princípio,
mal interpretado. Mas, como se pode perceber pela narrativa
acima, tudo deu certo no final.
Em minha quinta viagem a Vivi, Z”L, apareceu ao lado
da Yael, Z”L, para me audar a ter maior clareza em minhas
visões espirituais. Este relato está registrado noutro volume
desta obra no seu devido lugar.
Na minha sexta viagem vi muitas coisas, e dentre tudo
o que vi, houve um momento em que me percebi numa
floresta, eu era um homem negro alto e forte, de mais ou menos
uns dois metros de altura, em meus tornozelos haviam enfeites
de palha, também havia uma espécie de “coroa” de palha em
minha cabeça e eu estava vestido com um saiote de palha
também, portava uma machadinha e um pequeno arco com
flechas, e foi quando eu percebi que três caçadores passaram
por perto de onde eu estava, instintivamente eu me preparei
para atirar flechas em suas nucas, me escondi atrás de uma
árvore e os observava por detrás, me preparei, entesei o arco e
quando estava prestes a atirar a flecha um vento soprou em
volta de mim erguendo folhas, flores, cipós e poeira formando
acima da minha cabeça o rosto de uma mulher muito bela, seu
rosto era composto de todo o material que o vento ergueu do
chão, ao se formar o rosto ela olhou para mim e me disse:
“Tenha misericórdia deles como eu tenho misericórdia de
você” e estas palavras me provocaram emoções difusas e eu já
não tinha mais certeza do que desejava fazer, e quando
direcionei o meu olhar para os caçadores eles já estavam bem
distantes do meu alcance e eu resolvi deixa-los ir embora em
paz. Passado este momento, eu agora me percebo, na mesma
floresta, porém, como um espírito sem corpo que vaga livre de
259
lugar em lugar, e a Voz que sempre fala comigo me disse: “Ben
HaAdam; sua sobrinha está por aqui, você quer vê-la?” E eu
Lhe respondi: “Sim meu Senhor!” e foi quando algo passou
correndo muito rápido próximo de onde eu estava de forma
que só deu para ver o vulto e o rastro de folhas e galhos que se
ergueram do chão e agora estavam caindo por conta da
velocidade que o vulto passou. Eu o segui de acordo com o
rastro de folhas e galhos caindo no chão e de repente saiu de
detrás de uma árvore a criatura correndo tão rápido quanto
podia, mas desta vez eu estava preparado e pude de alguma
maneira desacelerar a imagem ainda que a criatura continuasse
correndo na mesma velocidade de antes, e pude ver o que era
a criatura; era Vivi, ela tinha a forma de uma pequena índia
cujos cabelos eram espetacularmente longos mas não eram
formados de fios, eram formados de finos cipós, folhas e flores
e não dormentes como são os nossos cabelos, os dela eram
vivos e sensíveis, como uma espécie de membro de seu corpo
tal qual os braços e as pernas, e eu fiquei feliz com a visão e
agradeci àquela entidade que me permitiu vê-la.
Tempos depois, vivi a minha sétima viagem com o
Mafteach Einêi-Shelomó, e nesta viagem muita gente veio
falar comigo; gente deste mundo e gente do outro mundo, e a
certa altura dos fenômenos a Vivi apareceu. Nesta viagem sua
forma era de esplendorosa luz, ela flutuava e, apesar de eu
saber de quem se tratava, todavia, não dava para ver os
detalhes do seu rosto dada a grande claridade que dele emanva,
e foi que enquanto eu a observava ela me disse: “A bênção
tio?”, e eu lhe respondi: “Deus lhe abençoe minha filha. Você
está bem?”, ela me respondeu: “Estou bem tio, mas com
dificuldades para subir para uma realidade mais evoluída...” ao
que lhe perguntei: “O que lhe impede?” e ela me mostrou: os
seus cabelos eram fios de luz muito longos, eles saiam de sua
260
cabeça e se estendiam para além, em suas pontas se
encontravam conectadas as coisas e pessoas que ela se
comprometeu emocionalmente enquanto vivia por aqui, e para
subir ela precisava desconectar-se destas coisas e pessoas, fio
a fio, e isso estava sendo uma tarefa bem difícil para ela. E
após isso, a visão se desfez. Mais tarde eu conversando com a
minha esposa, descobri que o meu irmão, o pai dela, guardava
consigo um chumaço de cabelo da Vivi e isso obviamente era
parte do problema dela. De maneira sutil e cuidadosa eu
informei o meu irmão desta questão, e ele me disse que ainda
sentia muita falta dela e não tinha condições emocionais de se
desfazer do chumaço do cabela de sua filha, mas que estaria
dalí por diante se esforçando para isso.
Mais de um ano se passaram e eu vivi minha nona
viagem com o Mafteach Einêi-Shelomó, e a Vivi apareceu
novamente à certa altura da viagem: eu olhei e vi, e era um
galho e nele um casulo de borboleta, e a Voz me disse: “Ben
HaAdam, esta é a sua sobrinha, este é o estado evolutivo em
que ela se encontra. Você quer que ela evolua?” e eu Lhe
respondi: “Claro meu Senhor!” e Ele me disse: “Então deseje
que ela evolua Ben HaAdam e ela evoluirá” Nisso eu disse:
“Evolua” e ela evoluiu de um casulo para uma bela mariposa,
e a Voz me disse: “Você está satisfeito?” e eu respondi: “Meu
senhor, apesar dela ter evoluído, ainda é uma criatura da noite”
e a Voz me disse: “Então, ordene que ela evolua mais!” e eu
disse: “Evolua mais, se torne uma borboleta” e a mariposa se
transmutou em uma linda e esplendorosa borboleta que mais
parecia uma exótica e encantadora flôr cujas asas eram suas
pétalas, e após concluir sua metamorfose, ela bateu asas e se
foi.
Meu irmão, o pai dela, após ouvir os mesu relatos sobre
o Mafteach Einêi-Shelomó desejou viver a sua primeira
261
experiência, eu lhe entreguei uma dose do místico Chá, ele
levou para casa e tomou só, pois, queria privacidade, ele não
tinha certeza do que poderia acontecer e ficou constrangido só
com a possibilidade de ocorrer alguma coisa embaraçosa. Eu
lhe dei as instruções gerais de como se preparar para toma-lo
e os cuidados e precauções que ele deveria tomar para evitar
possíveis acidentes, ele seguiu os protocolos e tomou o Chá:
ele nos contou que viu e ouviu muita coisa, e no tocante ao
caso de Vivi, ele se viu como um espírito invisível que flutuava
sobre sua própria cabeça perto da pia em sua cozinha enquanto
ele lavava os pratos justamente no dia em que Vivi se suicidou.
Ela e a mãe tinham discutido ferozmente, ele tentou apaziguar,
inclusive a discussão se inicia justamente por conta dos pratos
por lavar, e o espírito de meu irmão pôde ver quando Vivi
desceu as escadas que levavam para a área de lazer da casa e
paralelo à isso o espírito dela pairava sobre a cabeça de seu pai
como que querendo lhe chamar a atenção para o que estava
prestes a fazer, enquanto o espírito de meu irmão via tudo isso
a Voz lhe disse: “Lembra que neste momento você sentiu uma
‘pontada’ no coração?” ele disse: “Me lembro” e a Voz disse-
lhe: “Foi nesse momento que ela se foi”, e meu irmão se pôs a
chorar descontroladamente, tanto em um mundo quanto no
outro. Após algum tempo, quando suas emoções se
abrandaram, a Voz lhe disse: “Há mais que eu quero lhe revelar
sobre esta história” e então a Voz lhe levou para um cemitério,
era de madrugada, ninguém havia lá a não ser a mãe da menina
e o homem que eles compravam tecido para confeccionar as
roupas que fabricavam. E o meu irmão se esforçava para
entender o que aquilo significava, e a Voz que pôde ler os seus
pensamentos disse-lhe: “Eles se relacionam intimamente, e a
vaidade, ambição e pervercidade dela o atriu, pois, ele é um
feiticeiro e oportunista. Com a ajuda dele ela fez um pacto com
262
uma entidade sedenta de sangue, e para garantir que ela
cumpriria com sua parte no acordo ela penhrou a sua vida e a
vida de todos os seus filhos. Vivi foi a primeira vítima, ela foi
compelida a fazer o que fez, não teve escolha e nem
escapatória, o próximo seria o irmão mais velho dela, mas
como o Marquinho tomou o seu lugar, a Espiritualidade o
aceitou, a ele e ao que ele trouxe consigo, e o que deveria
acontecer com você aconteceu com ele, e o que deveria
acontecer com seu filho aconteceu com o filho dele, e mesmo
o mais novo não saiu incólume”. E foi ao ouvir estas palavras
que meu irmão se deu conta de que de fato; ela já havia
externado a necessidade de criar algum problema para pô-lo
atrás das grades, e o Marquinho foi quem acabou preso, e no
lugar do seu filho mais velho, o filho do Marquinho foi quem
morreu num acidente de moto. Meu irmão lamentou
profundamente tudo isso, mas mesmo assim agradeceu a Deus,
mesmo com a alma e o coração feridos, por tamanho
livramento, ainda que algo em seu interior o provocava a
perguntar: “Porque o livramento não veio antes?”, mas ao
pensar nisso, uma voz interior se lhe contrapunha dizendo:
“Poderia não ter vindo nunca, pois, todos nós temos limitações
e agimos mal, e isso nos tira os méritos, e sem méritos as
bênçãos se afastam e o mal se avizinha” e por isso ele sufocou
sua pergunta, arrependido de sequer ter cogitado em fazê-la.
Mas, a parte mais intrigante da viagem dele com o
Mafteach Einêi-Shelomó ocorreu quando a Voz percebeu sua
extrema tristeza e desespero pela trágica desventura de sua
filha, e então, o transportou para o futuro e lhe mostrou Vivi
como uma mulher feita, ela estava casada e tinha filhos, a cena
familiar era perfeita e todos nela pareciam felizes. Mas, como
isso poderia ser? Que futuro era aquele que lhe estava sendo
mostrado? Meu irmão, apesar de estranhamente ter se sentido
263
consolado, todavia, após passado os efeitos do místico Chá, ele
interpretou aquela visão específica como uma possibilidade,
caso a Vivi estivesse viva.
Quando meu irmão me contou isso, eu fiquei
impressionado, e mesmo que não tenha contado para ele,
registrarei aqui para memória. O que meu irmão não sabia é
que eu tive um sonho, e neste sonho eu subia a rua principal
do Vassoural, aqui em Caruaru, e passava diante de uma casa
simples, as portas eram de madeira, daquele tipo que podia-se
abrir a parte de cima e manter fechada a parte de baixo, e da
rua eu pude ver que o Marquinho estava sentado num sofá
assistindo Tv, e deitada no seu colo estava a Vivi, como se o
Marquinho fosse o seu pai, a mãe de Vivi (ex-esposa de meu
irmão e agora também ex-esposa do Marquinho) estava na
cozinha preparando algo para eles comerem, e vi também o
irmão mais velho da Vivi que transitava dentro de casa. Eu
contei este sonho para o Marquinho, ele achou estranho e
interessante ao mesmo tempo, pois, ele me confessou que sua
esposa estava grávida de uma menina. Ao nascer a menina
puseram-lhe o nome de Rubi, eu vi fotos dela, minha esposa
também viu, e ambos tivemos a nítida percepção de que ela e
Vivi se pareciam bastante.
Na minha décima primeira viagem com Mafteach
Einêi-Shelomó, a viagem na qual estávamos presentes: eu, Rav
Maorel Melo, o Chassid Melo, o Tzadok Melo e o Tzuriel
Alencar (que teve início na noite do dia 25/09/2023 pouco
antes da meia noite, e se estendeu até por volta das duas da
madrugada do dia 26/09/2023), Vivi me apareceu novamente.
Ela me surge como uma índia, linda, alta e sedutora, cabelos
longos e lisos, pele cor de bronze e presença majestosa, eu olho
em seu rosto e em seus olhos e a reconheço, mas mesmo assim
ela não se parecia com a Vivi como eu me lembro, percebendo
264
isso ela ela me disse: “Eu estou bem tio, é que eu cresci”.
Então, eu lhe disse: “Ah! Por isso está tão diferente! Deus lhe
abençoe minha filha!” Mas, uma questão me surgiu
imediatamente e eu resolvi perguntar-lhe: “Mas, você não
tinha reencarnado?” e ela me respondeu: “Sim, parte de mim
reencarnou na Rubi, mas há outra parte de mim que se mantém
no Mundo Espiritual. À propósito; eu sou a índia que já lhe
apareceu em várias ocasiões, e quando eu sussurrei em seu
ouvido “Tupã”, não estava me referindo a divindade alguma,
eu estava chamando o seu nome. O senhor é tido como Tupã
por aqui, um importante mensageiro de Deus, mas por razões
desconhecidas ainda lhe falta trovejar, relampejar, como é
próprio de Tupã, por isso tenho chamado o seu nome em seu
ouvido, na esperança que o senhor desperte e se levante”. Após
me dizer isso, fez uma vênia graciosa e foi-se embora.
Vivi estava se referindo a um sonho e semanas depois
a uma visão que tive.
Há alguns meses atrás, o Tzuriel me convidou para
assistirmos a um documentário sobre um festival religioso
africano chamado Zangbeto, tem a ver com vodu e coisas do
tipo, eu não sou de me assustar ou me impressionar facilmente,
mas confesso que este documentário me assustou e me
impressionaou muito! Após assistirmos ao documentário, o
Tzuriel seguiu para a sua casa e eu resolvi tirar um cochilo. Me
deitei e estranhamente peguei no mais profundo sono em
questão de minutos, como se tivesse trabalhado duro o dia
inteiro, e logo ao dormir sonhei, e o que vi no sonho foi: eu me
percebi agachado no canto esquerdo de um galpão, era um
galpão grande e alto, paredes brancas, me pareceu ser uma
edificação de taipa, ele estava aberto e pessoas entravam e
saiam dele, homens e mulheres negros, todos de branco com
turbantes nas cabeças, fora me pareceu que se tratava de uma
265
mistura entre África e Amazônia, o tipo de coisa que apenas
em sonhos é possível, e foi quando percebi que uma moça
jovem estava sentada no chão e olhando para mim à distância,
ao me perceber olhando para ela de volta, ela se levantou e
veio na minha direção, ao se aproximar de mim se encurvou
gentilmente e sussurrou em meu ouvido: “Tupã” e eu acordei
assutado.
A visão aconteceu semanas depois deste sonho. Por
este período eu tinha ido ao sítio com minha esposa, enquanto
caminhávamos mato adentro, eu percebi que em cima de uma
pequena elevação de terra havia uma flôr exótica e muito bela,
encantado com a beleza da flôr mostrei para a minha esposa,
que ao identifica-la prontamente me disse: “Isso é veneno!” e
eu lhe perguntei: “Como assim?” e ela continuou: “Isso é
maracujá do mato, minha mãe disse que isso é veneno.
Ninguém aqui no sítio come isso, pois, eles têm medo de
morrerem envenenados”. Eu não me convenci de que maracujá
do mato era venenoso, eu realmente desconhecia totalmente a
espécie até aquele momento, mas como podia um maracujá ser
venenoso?! Então, para “tirar os nove fora” resolvi colher
alguns maracujás e levar para casa para experimentar o seu
suco. Minha esposa ficou um pouco apreensiva com esta
minha ideia, repetiu por várias e insistentes vezes que aquilo
era veneno e que eu poderia me dar mal com isso, mas eu
estava intrigado demais com o achado e por isso disposto a
correr o risco.
Chegando em casa eu fiz um suco dos maracujás, sem
água, sem açúcar, 500ml de suco. Para minha surpresa e
encanto, o suco destes maracujás do mato era branco e muito
cheiroso, me sentei no sofá, liguei a tv e pus algo para assistir
enquanto tomava o meu exótico e, para a minha esposa,
apavorante suco. Tomei o suco devagar, gole a gole, o sabor
266
era bom, mais ácido e azedo do que o suco do maracujá do
mercado, mas encantador do mesmo jeito (pois naturalmente
eu gosto muito de qualquer tipo de maracujá). Após ter tomado
os 500ml, passados um ou dois minutos depois, eu senti uma
pancada na nuca, como se tivesse levado um tapa, me assustei
obviamente, em seguida uma repentina sonolência, a vista
começou a distorcer, comuniquei o que estava acontecendo
para a minha esposa, e ela prontamente me diss: “Eu não lhe
avisei?” Eu desliguei a tv e me dirigi ao nosso quarto, no
mesmo momento em que deitei na cama a vista escureceu
bruscamente e o meu corpo pareceu afundar no colchão tão
profundamente que tive a impressão que ia atravessá-lo e cair
no chão. Com o meu campo de visão escuro, tive a impressão
de ver vultos, me concentrei para prestar mais atenção, era uma
flôr de maracujá do mato que surgira, do meio da flôr uma
moça loira brotou, ela saia da flôr da cintura para cima e a
imagem estava girando, de modo que pude vê-la em todos os
ângulos, na sequência as pétalas da flôr se transformaram nas
mãos de um monstro com chifres e dentes afiados, ele era
gigante e segurava a moça pelo meio como se ela fosse uma
pequena boneca, ele estava se deliciando com a beleza dela, e
ela se esforçava por se soltar de suas mãos, e foi que enquanto
eu via tudo isso, as imagens se desfizeram num rodopio, como
se fossem tinta em um caldeirão que está sendo mexido com
uma colher de pal, tudo se misturou em um caldo grosso e meu
espírito caiu dentro, tudo ficou escuro novamente, e foi quando
percebi uma floresta, era à tardinha, as copas das altas árvores
se tocavam e apenas alguns fachos de luz do sol penetrava
aquele lugar, havia uma onça deitada no chão a dormir, de
repente a onça ergue a cabeça, ela tinha percebido que as folhas
secas do chão começaram a rodopiar de forma estranha e do
chão surgiu uma índia, linda e majestosa, a índia se aproximou
267
da onça que continava deitada e pôs sua mão direita sobre a
cabeça da onça, com o seu dedo médio percorreu do focinho
da onça até perto da sua nuca, se aproximou da onça ainda
mais, inclinou-se e sussurrou no ouvido dela: “Tupã” nisso a
onça abre os olhos assustada e meu espírito cai dentro dos
olhos da onça, e o que se revela é outra cena bem semelhante,
uma onça deitada no chão da floresta, porém, desta vez um
arbusto se mexe violentamente, e antes que onça consiga se
erguer, do arbusto sai um índio que rapidamente corre em
direção à onça, segura em suas orelhas e dá-lhe uma cabeçada,
e nisso acabou a visão e os efeitos do suco do maracujá do
mato.
Posteriormente, conversando com o Tzuriel sobre esta
estranha visão, ele me disse que possivelmente o seu
significado era: a moça era o espírito do maracujá-do-mato, o
monstro que a segurava representava a maneira como o
espírito do maracujá percebia as pessoas e a chave, portanto,
era que eu deveria “misturar” o maracujá-do-mato com as
pessoas, isso significava convencê-las dos benefícios naturais
do maracujá-do-mato tornando os espíritos das pessoas
agradáveis para o espírito do maracujá e vice-versa, e para
embasar sua percepção ele evocou algumas passagens bíblicas
tais quais: quando Moisés é orientado por Deus a jogar um
galho de uma determinada árvore dentro de uma água amarga
e a água se tornou doce, potável, adequada para o consumo,
quando também o Profeta Eliseu adicionou farinha a uma sopa
qua estava sendo preparada mas que perceberam que na sopa
havia um veneno mortal, e ao adicionar a farinha na sopa o que
era para a a morte converteu-se para a vida, e ainda quando
Rabi Yeshua HaNotzeri, Jesus Cristo, teria adicionado sua
saliva ao pouco de barro e com esta mistura curou um cego de
sua cegueira. Sua interpretação me pareceu brilante! E
268
levando-a em consideração, e seguindo a mesma fórmula
concebida e adotada desde que os Judeus de Caruaru
conheceram o Mafteach Einêi-Shelomó, resolvi dar um nome
hebreu ao maracujá-do-mato, e para os Judeus de Caruaru,
deste dia em diante, o maracujá-do-mato passou a ser chamado
de: Etz Yov (a Árvore de Jó) dada a sua propriedade de nos
acalmar e nos permitir passar por dificuldades com calma e
serenidade. Depois descobri que a Etz Yov é uma das
“perceiras” da Etz Chulda (a Jurema) em seu preparo do Chá
místico produzido através da casca de suas raízes (como
exausticmente tratado no Judaísmo e a Cabalá, V. 2, 2022, pp.
91-110). A parte utilizada da Etz Yov no místico Chá da Etz
Chulda são suas flores, criando uma relação semelhante a que
existe entre a Chacrona e o Mariri na composição do Mafteach
Einêi-Shelomó.
269
Sobre o meu Pai, o que posso dizer?
271
tornou pedreiro, um dos melhores de Pernambuco, seu
trabalho era perfeito, impecável. Também desenvolveu
habilidade em desenho, não chegou a desenhar
profissionalmente, mas seus poucos trabalhos chamou a
atenção de pessoas próximas, aprendeu a ser eletricista,
carpinteiro, padeiro e, como se não bastasse, ainda escreveu
alguns poemas sobre temas populares.
Mas, na minha opinião, depois de pedreiro, ele era
ainda maior enquanto galista.
Um galista é um tratador de galos de briga, sua função,
em termos gerais, é transformar um galo simples de quintal em
um atleta capaz de ganhar torneios e nocautear outros galos,
também treinados, em apenas alguns poucos minutos de luta.
Eu sei que, por conta de toda essa feminilização social
proposta pela maneira esquerdista de ser dos nossos
governantes atuais, esta não é uma atividade bem-vista, sendo
hoje em dia inclusive mais desmoralizante do que fumar
maconha ou um rapaz namorar outro rapaz. Mas, na minha
infância e adolescência, as coisas eram diferentes do que se é
hoje, tão diferente que quando comparo minhas memórias com
o que vejo a minha volta, a impressão que tenho é de ter
extraído minhas memórias de livros de contos de dois séculos
atrás, dadas a gritantes diferenças entre a maneira de se viver
em meu tempo de criança para a menira das crianças viverem
hoje em dia.
Para as pessoas alheias a este tipo de atividade lhes
parece que trata-se apenas de pura selvageria irracional e
crueldade pura contra animais inocentes. Esta percepção ganha
força por conta de suas “verdades mutiladas” e a crescente
onda de pessoas sensíveis (aqui em Caruaru chamamos de
gente cheia de frescura). Quando na verdade, tanto para o
galista quanto para o galo, a história é bem outra.
272
Os galos de briga são híbridos derivados do galo-
bankiva, uma raça originária da Índia onde ainda hoje pode-se
encontrar espécimes selvagens, soltos na natureza sem ter tido
contato algum com os humanos ou com o processo de
domesticação. Exemplares desta espécie foram trazidos para a
Europa pelos conquistadores ultramarinos, e não apenas os
animais como também a arte de brigar galo. Por conta disso é
que algumas pessoas identificam esta espécie como “galo
índio”.
Os estudiosos afirmam que o homem domesticou os
primeiros galos-bankiva na Índia a cerca de 3.200 anos a.C. e
a partir de 1.400 anos a.C. esta mesma espécie foi domesticada
na China. Por volta de 1.500 anos a. C. ela também estava
sendo domesticada no Egito e em Creta, na Grécia. Mais tarde
os romanos aprenderam a arte dos gregos e a importaram para
as regiões onde o Império Romano se estabeleceu. E a maior
atratividade destes animais era justamente a capacidade de
disputar território com um galo rival até a morte, uma
característica natural desta espécie que os homens pecerberam
e apenas conceberam regras transformando-a na base para um
jogo emocionante de apostas que já sobrevive há milênios! Ou
seja; a briga de galos sempre ocorreu na natureza, e nela a
disputa era muito mais encarniçada e mortal, pois os galos
brigavam literalmente até morrerem, e pelo fato dos golpes
serem perfurantes e profundos, não raro morria o perdedor da
batalha na hora e o ganhador semanas depois dada a gravidade
dos ferimentos. O galo-bankiva na Índia, seu lugar de origem,
nunca foi uma espécie populosa devido aos muitos predadores
e ainda por cima as mortes frequentes resultantes dos embates
mortais entre exemplares da mesma espécie, foi graças a
intervenção humana que ao perceber no comportamento
destrutivo do galo-bankiva uma atratividade que a espécie
273
pôde prosperar e se tornar uma das espécies mais bem-
sucedidas e conhecidas no mundo inteiro.
Ao contrário do que comumente se imagina, no trato
profissional dos galos de briga há veterinários, vitaminas,
comida balanceada, período de exercícios físicos, adornos de
penas, pernas, pescoço e cristas, local apropriado para banhos
de sol e interação saudável com galinhas. Do nascer do
pintinho até que o galo esteja na idade de ser preparado para
brigar leva-se seis meses, apenas após seis meses dele vivendo
tranquilamente como qualquer galinha comum é que ele
passará por exercícios físicos, provas e testes (se isso lhe
parece pouco, pare para pensar que o frango que você compra
abatido no mercado tem em média apenas 45 dias de nascido),
de dois a três meses será o tempo de seu treinamento que
inclui: exercício de pernas, exercício de pescoço, exercício de
asas e todo um preparo em sua pele para que fique forte, firme
e resistente aos golpes violentos que receberá quando chegar a
hora, e dá para perceber claramente que durante este período o
galista e o galo meio que se tornam um em espírito, sendo o
galo a extensão de seu treinador, há uma sintonia, uma magia,
algo que não dá para explicar mas é fácil de perceber: o galo
passa a distinguir a voz do seu treinador das demais vozes do
restante do pessoal com o qual interage, ele obedece certos
comandos e há casos que pode até atender ao ser chamado pelo
seu nome. Quando o galista percebe que o galo está
fisicamente pronto, então, aos treinos são adicionados os
“testes”, lutas simuladas com proteção de couro acochoado
que cobrem as esporas para não furar e uma luva de couro que
reveste o bico para não bicar, nesta altura, as simulações
seguem todas as regras das rinhas: medição e peso das aves,
tempo de água (round) e a anotação dos pontos ganhos ou
274
perdidos por ambas as aves. Após este período, agora, é só
marcar a luta.
Durante todo o tempo em que o galo é preparado e a
interação de um galista com outros tornarão as características
que chamarão a atenção no comportamento da ave conhecidas
de se ouvir falar, os boatos correm e a ave se torna o assunto
principal entre galistas, criadores e apostadores: quem será o
seu rival? Será que ele conseguirá sobreviver até o final do ano
para o torneio?
Finalmente chega o grande dia. Após meses de árduos
esforços tanto para o galo quanto para o galista, um processo
de aperfeiçoamento disciplinar para ambos, eles chegam na
rinha, geralmente uma edificação que lembra por fora uma
pousada com um galpão ao fundo do terreno onde abriga
rebolos (ringues) com relógio para marcar o tempo de luta,
com acochoados revestindo as paredes para os galos não se
machucarem, com arquibancada para o conforto da ansiosa
plateia, tem também as pias onde os galistas lavam e,
semelhante a um treinador de boxe, limpa e remedia os
ferimentos adquiridos entre uma água e outra, há a sala do
veterinário, as balanças para pesarem as aves, pois, só podem
lutar aves de mesmo peso, há telas para medir o tamanho e
porte das aves, pois, só poderão lutar se forem compatíveis, e
por fim, se verifica a idade da ave, para que não haja
disparidade absurda entre uma ave e outra. As aves mais
famosas lutam contra aves famosas, as aves estreantes lutam
com aves estreantes.
Na natureza nenhuma destas regras existem, aliás, as
esporas dos galos não nascem de forma padronizada, há galos
pequenos que tem esporas grandes, há galos grandes que tem
esporas pequenas, há esporas tortas, rombudas e até atrofiadas.
Para resolver este problema, os galistas conceberam (aqui em
275
Caruaru) próteses de esporas de chumbo, tamanho
padronizado, para utilizá-las as esporas naturais dos galos
eram serradas e as próteses eram presas por esparadrapos no
lugar por todo o tempo enquanto durasse a luta, após isso as
esporas eram retiradas e o galo iria se refazer solto no quintal
curtindo a vida ainda mais junto das galinhas que eram apenas
suas. Algo semelhante acontecia às vezes com os bicos, as
vezes a parte de cima era curta demais ou longa demais, e as
vezes a parte debaixo é que apresentava estes problemas, e eles
remediavam também com próteses temporárias de metal que
“vestidas” no bico da ave e amarrada à crista a parte de cima,
ou no “queixo” da ave, a parte de baixo. Para que os galos
pudessem dar bons golpes eles precisavam ter as penas das
asas e da cauda em perfeitas condições, mas às vezes elas eram
danificadas acidentalmente, por isso as penas naturais da ave
danificadas eram substituídas por penas de outras aves já
separadas para este propósito. A luta era composta por águas,
equivalentes a rounds, cada água tinha duração de alguns
minutos (não me recordo agora de quantos minutos) e a luta
era composta de um número determinado de águas. Quanto
melhores fossem os galos menos águas lutariam, pois, tudo era
decidido em pouco tempo, quanto piores mais águas lutariam,
pois, tinha-se dificuldade em identificar o galo vencedor. As
lutas que duravam menos águas eram aquelas em que as
apostas eram mais altas; já vi apostarem motos, carros e até
casas. E existiam aquelas lutas excepcionais que não
chegavam a completar o tempo de uma água, na verdade, a luta
era decidida em segundos. Um galo que alcançasse um feito
desses o seu valor comercial passava de R$50,00 para milhares
de reais em pouco tempo!
Eu sei que toda esta minha descrição desta atividade
não mudará a repulsa da maioria das pesssoas por brigas de
276
galo, mas oferece informações detalhadas para que pelo menos
quando forem criticar, que critiquem baseados em fatos e não
por indução emocional boba provinda de alguma mente
corruptora esquerdista.
E assim, meu pai se tornou um grande mestre nesta arte
milenar. Ele foi respeitado em todo o Estado de Pernambuco e
em alguns lugares do Sul Brasil, dada a alta taxa de sucesso
dos galos tratados por ele. Meu pai se especializou tanto nesta
arte que se tornou capaz de saber se o futuro pintinho seria
macho ou fêmea ao nascer apenas observando o formato
externo de um ovo recém-posto. Ele criou sua própria
chocadeira utilizando tábuas velhas e uma lâmpada
incandescente, aprendeu como cruzar matizes de galinhas
distintas para se obter um animal de melhor qualidade, mais
capaz para o combate, reparando assim as limitações
observadas numa ave que mesmo tendo potencial para vencer,
todavia, poderia se tornar algo maior, o que seria conseguido
através dos seus descendentes, como o ciclo de vida de um
galo é curto e sua reprodução é rápida, foi possível criar as
hipóteses, realizar as experiências e, através de tentativa e erro,
se chegar efetivamente onde ele desejou chegar, e isso lhe
conferiu sua fama.
Mas, acredito que a minha conexão emocional com
galos de briga se deu muito tempo antes de eu poder ter
qualquer consciência disso. Minha mãe me contou que pouco
tempo após meu nascimento a relação com o meu pai abalou-
se muito, o convívio de ambos tinha se tornado quase que
insuportável, e numa noite quente em todos os sentidos, eu
bêbe bem pequeno, doente e franzino, chorei muito ao ponto
de tirar o sossego deles que começaram a discutir por minha
causa, a discussão se tornou acalorada a tal ponto que sem
refletir meu pai pegou um tijolo manual e o jogou em minha
277
direção, e a Providência Divina fez com que um galo de briga,
que estava dentro de casa, de forma estranhamente inesperada
voou para cima de mim recebendo a tijolada em meu lugar. O
galo morreu instantaneamente.
Talvez, portanto, movido por um sentimento de
gratidão a Deus e às Suas criaturas é que me esforcei em
escrever estas linhas em defesa destes guerreiros emplumados
que me ensinaram que: há coisas mais importantes do que a
própria vida que devem ser defendidas a qualquer custo. Os
agora quase lendários: Galos de Briga.
Durante esta viagem com o Mafteach Einêi-Shelomó,
a Voz me pediu para ir visitar o meu pai, pois, disse: “Ele é
importante para você”. Eu confesso que não sabia que o estado
de saúde de meu pai era tão grave quanto eu vim saber depois,
e por isso acabei não indo visita-lo. Passado algum tempo, eu
vivi minha nona viagem com o Mafteach Einêi-Shelomó, e a
Voz me disse: “Você não foi visitar o seu pai”, ao que lhe
respondi: “Não meu Senhor, me perdoe”, e Ela me disse: “Mas
você pode fazer isso agora. Você deseja visita-lo?”, surpreso
eu disse: “Se isso é possível, claro! Quero sim!” e fui
transportado de minha casa para a casa de meu pai que fica
num bairro bem distante de onde moro agora, e me encontrei
em pé em sua sala, ele estava diante de mim, eu lhe disse:
“Bênção pai!” e ele me respondeu: “Deus te faça feliz” e veio
em minha direção e me abraçou forte, e quando eu estava
abraçando-o também e me preparando para dizer alguma coisa
ele mordeu-me entre o pescoço e o ombro arrancando um naco
considerável de minha carne, a mastigou e a engoliu, e quando
percebi isso me transmutei em uma árvore, meus braços se
estenderam e se transformaram em galhos com folhas e ambos
formaram minha copa e eu cresci e cresci e me tornei uma
imensa árvore e quando parei de crescer, eu olhei para ele e
278
disse: “Pode comer do meu corpo à vontade meu pai, isso não
me fará mal, e fico feliz em lhe fazer bem” ao que a Voz me
disse: “Não lhe faz mal agora, mas se ele tivesse feito isso
quando você nasceu certamente você não teria sobrevivido”.
Nisso, eu percebi que havia em meu pai uma entidade antiga e
perversa que às vezes o dominava sem que ele pudesse resistir,
e foi então que compreendi algo que não tinha me dado conta
até então, e assim pude perdoá-lo e me perdoar.
Meu irmão, o Lucivaldo, que fisicamente se parece
muito com nosso pai, vai contar que um dia desses ele foi
visita-lo, sua casa tava uma bangunça e meu irmão resolveu
ajudar limpando o que era possível limpar, pai, orgulhoso e
constrangido, disse-lhe que não tinha pedido favor algum para
ninguém e que dentre os filhos que teve apenas eu é que
parecia com ele na personalidade, pois, desde que cheguei de
São Paulo que não o havia importunado.
Finalmente, após muito relutar, resolvi ir visitar o meu
pai. O encontrei bem debilitado, cheguei perto dele e disse:
“Bênção pai!” mas ele não me respondeu, estava com um olhar
opaco e como se estivesse olhando para o nada, imaginei que
ele não tinha me respondido por causa de seu problema
auditivo, ele estava sem o seu aparelho de audição, mas ele
lentamente virou a sua face em minha direção e eu lhe
perguntei: “Senhor está me reconhecendo?” e ele meneou a
cabeça de maneira afirmativa, e com uma voz cansada e baixa
ele me disse: “Eu pensei que não iria vê-lo mais, senão depois
que eu morresse”. Esta frase pareceu-me dizer mais do que
aparentemente pretendia.
Daquele dia para cá realmente meu pai tem me
aparecido em sonhos cujos enredos e diálogos têm sido dos
mais exóticos possíveis.
279
Bibiu: a coruja irmã, a irmã coruja
280
tipo de Kipá que nossos ancestrais judeus teriam confexionado
pouco depois da chegada deles em terras brasileiras, e ao
erguer o chapéu da cabeça em cima de sua careca sempre havia
algum bichinho engraçado e interessante: ora era uma pormesa
(mais popularmente conhecida como louva-deus), ora era um
gafanhoto ou uma perereca. Aqueles foram os maiores e mais
importantes presentes que já ganhei em toda a minha vida,
pois, me serviram de diversão e aprendizado, como ainda me
servem até os dias de hoje.
Ao crescer e me tornar adolescente, me encatei com a
possibilidade de criar animais silvestres, mais particularmente
animais que eu pudesse manusear, e como aqui em Caruaru
naquele tempo havia a Feira de Passarinho e nela se traziam
dos sítios tudo o que os matutos pegavam em armadilhas para
vender e complementar a sua renda familiar, por lá aparecia de
tudo o que se pode imaginar, e eu por este tempo tive contato
direto e até fui mordido e bicado por muitos animais
fantásticos e pude inclusive levar alguns para casa, coisa
impossível de sequer se imaginar hoje em dia, animais como:
gaviões, carcarás, saguís, guaxinins, iguanas, dentre tantos
outros. Por lá tive contato com bicho-preguiça, gato maracajá,
coruja suindara, corujinha de orelha, cobra jibóia, cobra verde,
papagaio, gangarras, cágados jabutis, tejús, macaco prego,
macaco bugio e por aí vai.
Essa minha paixão por animais selvagens e exóticos
quase me trouxe problemas sérios devido a minha
imprudência. Certa vez um circo se estabeleceu aqui em
Caruaru, e eu os vi descarregarem as carretas que
transportavam animais da África e da Índia, eu fiquei tão
encantado com o que vi que a razão me faltou quase que
completamente. Quando os trabalhadores se reclusaram em
um barracão para comer eu me aproximei dos animais e tentei
281
fazer contato, consegui que um elefante indiano me
empurrasse com sua tromba que pressionou de maneira
vagarosa, mas possante, a minha barriga, e quase consegui que
um leopardo me arranhase em dos dedos de minha mão
esquerda, mas quando eu estava prestes a conseguir o feito um
dos trabalhadores viu e correu apressadamente evitando assim
o que poderia ter sido uma verdadeira tragédia, passei anos me
lamentando pelo fato de não ter conseguido, mas por fim,
compreendi que Deus me livrou de uma lesão séria, pois, o
bicho não estava para brincadeiras.
Fui para São Paulo após o Serviço Militar, e mesmo lá
não consegui ficar longe do contato com os animais silvestres,
criei algumas corujas buraqueiras, algumas cobras nativas e até
criei três caçacos (lá os chamam de saruê), e ainda consegui ter
o privilégio de ter sido mordido por um quati! Bons tempos
aqueles.
Dez anos mais tarde retornei para Caruaru, minha terra
natal, e o Santo, bendito seja o Seu Nome, foi muito generoso
comigo. Pouco tempo depois nasceram os Judeus de Caruaru
e junto com eles as oportunidades: consegui criar falcões,
tejús, codornas, jacarés papo-amarelo, e realizei o meu sonho
de criar uma jibóia, a Nina, e depois dela criei outras jiboias
mais, e foi quando as coisas milagrosamente melhoraram e eu
fui morar com minha esposa numa casa grande no Bairro
Maurício de Nassau, um bairro nobre de Caruaru, o espaço era
grande e eu podia criar bichos diversos sem estorvar muito
minha esposa que se sentia estorvada de qualquer forma. Nesta
casa pude ter uma águia-de-cauda-braca, várias corujas
suindaras, e como se tudo isso já não tivesse bom demais, um
dos Judeus de Caruaru, que era Sargento do Corpo de
Bombeiros (hoje aposentado), numa conversa
descomprometida sobre animais, se lamentou dizendo que os
282
bombeiros sempre recebem chamadas para resgatar animais
que saem do mato e invadem as casas, eles atendem aos
chamados, resgatam os animais, mas depois não sabem o que
fazer com eles e aquilo era um grande problema tanto para os
bombeiros quanto para os animais que padeciam naquele
processo chegando inclusive alguns deles a morrerem por não
terem os cuidados básicos necessários, quando ouvi isso
imediatamente lhe propus uma parceria: todos os animais que
eles resgatassem poderiam trazer para mim e eu cuidaria deles,
aqueles que estivessem aptos a retornar para a natureza eu os
soltariam quando estivessem curados de suas lesões e aqueles
que não pudessem retornar para a natureza eu arranjaria para
eles um lar, o Nachmad ficou tão feliz com a proposta que não
pensou duas vezes, fechamos o acordo e ficamos esperando as
oportunidades de pô-lo em prática, o que não demorou muito
para acontecer, poucos meses depois os bombeiros começaram
a me trazer animais diversos lá para casa, alguns eu consegui
curar e devolver para a natureza, alguns eu consegui curar mas
pela gravidade da sequela, não podendo retornar para a
natureza, eu arranjei para eles donos, e ainda outros, por conta
da gravidade dos ferimentos, infelizmente eu não consegui
fazer muita coisa e eles morreram.
A dinâmica entre eu e os bombeiro se dava da seguinte
maneira: ora eles me avisavam que estavam vindo lá para casa
para me entregar um animal e ora, por conta da
indisponibilidade de viaturas, eu precisava ir lá buscar o
animal que eles tinham resgatado. E foi que no dia 14 de março
de 2018 que eu recebi uma chamada do Nachmad, ele me disse
que os bombeiros tinham acabado de resgatar uma coruja
machucada e me perguntou se eu poderia cuidar também desta,
naturalmente eu disse que sim e lhe perguntei sobre a espécie,
ele não soube dizer, mas me enviou uma foto, ao olhar a foto
283
também não consegui identificar a espécie, nunca tinha visto
uma coruja daquelas antes: era maior do que uma suindara,
porém, toda branca com “óculos” negros em volta dos olhos,
suas asas eram pedrês, estava dentro de uma caixa de plástico
daquelas que se transporta gato. Ele me disse que não tinha
viatura disponível para leva-la para minha casa e me perguntou
se eu poderia ir busca-la, eu disse prontamente que sim, peguei
a moto e fui. Ao chegar no quartel dos bombeiros encontrei um
aglomerado de bombeiros em torno da caixa onde se
encontrava a coruja, um dos bombeiros estava dizendo para os
outros: “É uma coruja muito velha, por isso não consegue voar,
certamente vai morrer logo”, eu me aproximei da caixa e dei
uma olhada e percebi que não se tratava de uma coruja velha,
mas pelo contrário, tratava-se de um pelanco (um filhote de
ave) pois ainda estava cheia de penugem e as penas das asas
ainda tinham certas características de canhões (tubos de
sangue dos quais as penas se originam), eu tentei explicar isso
para eles, mas a versão do bombeiro que se pronunciou
primeiro prevaleceu e eu percebi que ganhar aquela discussão
não me renderia nada de proveitoso, segurei a coruja nas mãos,
analisei-a e percebi que ela não tinha ferimento algum, mas
estava muito desnutrida, em seguida, perguntei para os
bombeiros a história do resgate dela e eles me disseram que
receberam uma chamada de uma moça afirmando que um
filhote de coruja tinha caído de um pé de manga que eles
tinham no quintal, os bombeiros atenderam à chamada,
chegando na casa foram conduzidos até o quintal e lá estava a
debilitada coruja que os olhava com olhos arregalados de
medo, eles a colocaram dentro da caixa e a trouxeram para o
quartel. Após ouvir atentatmente o relato do resgate me
comprometi em cuidar dela, mas disse para eles antes de ir
embora: “Ela está muito desnutrida e pode ser que não
284
sobreviva até a samana que vem, mas vou me esforçar a fazer
tudo o que puder para salvá-la”, eles compreenderam, me
desejaram sorte e eu segui para casa de moto com a coruja.
Chegando em casa fui examiná-la com mais calma e
percebi que ela apresentava sinais de maus tratos, o dono teria
tentado alimentá-la com fiambre (carne enlatada) e que a
menteve dentro de uma caixa de papelão o que garantiu que as
pontas de suas penas ficassem envoltas no cocô da ave, à partir
disso ergui a hipótese da ave não ter caído no quintal de
ninguém, mas que ela tinha sido fruto do tráfico de animais
silvestres, o dono teria feito uma encomenda, a coruja teria
chegado, porém, por não saber como cuidar, antes que o bicho
morresse em suas mãos ele preferiu entrega-la aos bombeiros
para que ela morresse longe dele e assim ele não correria o
risco de se complicar de alguma maneira por conta disso. A
partir desta hipótese resolvi pesquisar a espécie da ave e o que
encontrei foi que aquela coruja era um filhote de murucututu,
conhecida também como corujão, coruja-de-garganta-preta,
coruja-do-mato, bate-caixão (Ceará) e mocho-mateiro. Ela
está entre as maiores corujas do Brasil, e isso explicou o
tamanho do filhote e também pareceu fundamentar minha
hipótese, pois, realmente eu nunca tinha visto uma coruja
dessas, nem em foto, senão agora.
Passou-se alguns dias, e eu percebi melhoras na saúde
da ave, suspeitei que ela iria escapar, mas como ela precisaria
crescer o bastante para poder voar e eu precisava encontrar um
lugar ideal para soltá-la (não fazendo a menor ideia de onde),
resolvi, por algum motivo idiota, chama-la de Bibiu. Para mim
tratava-se de um macho, mas dois anos depois ela vai me
contrariar pondo dois ovos.
Semanas se tornaram meses e meses se tornaram anos
e Bibiu se tornou parte integrante da família dos Judeus de
285
Caruaru. Havia algo naquele animal que transcendia a natureza
de uma simples coruja, havia algo em seus olhos que
denunciava isso, poderia ser paranoia minha? Claro que sim!
Mas, era difícil não se deixar encantar por essa possibilidade.
No dia 03 abril de 2019 eu vivi minha primeira viagem
mística através do Mafteach Einêi-Shelomó. Após uns dez
minutos de ter tomado o Chá os efeitos se fizeram perceber em
meu corpo, senti um esmorecimento, a respiração ficou pesada
e o coração batendo descompassado, pensei que ia morrer,
olhei em volta e todos pareciam bem, estávamos em cinco
naquela noite, e, portanto, compreendi que por mais estranho
que aquilo parecesse eu ficaria bem também. Realxei na
cadeira onde estava sentado e fechei meus olhos, no meu
campo de visão que à princípio estava completamente escuro
surgiu de repente uma parede de ladrilhos coloridos e eles se
moviam e me provocavam emoções, e de acordo com as
emoções que me provocavam tomavam uma forma compondo
na parede uma figura em 3D; a primeira figura foi a de um urso
de pelúcia, achei estranho aquilo e me esforcei para
desmanchar a figura, apesar de ser apenas um urso de pelúcia
aquela figura ma transmitia algo pesado, deconsfortável, um
tanto assustador (mais tarde deduzirei que tratava-se de uma
expressão no Mundo Espiritual de minha sobrinha), após eu
desmanchar o urso de pelúcia por umas três vezes os ladrilhos
se reorganizam e se transformam em Bibiu, eu fiquei muito
surpreso com a visão e a contemplei admirado, em seguida
Bibiu se transformou numa suindara, depois numa coruja
buraqueira e depois em várias outras corujas até que tudo se
desfez num redemoinho que resultou num túnel que me puxou
para dentro e a partir daí todo o resto das visões que obtive
nesta primeira viagem que já estão registradas em detalhes
noutro lugar (As Muitas Vozes, 2020, pp. 886-890).
286
Após a minha quinta viagem mística, durante a
permanência dos efeitos passivos, já eram mais de duas horas
da madrugada, eu desci da sala de estudos onde vivi a viagem
e me dirigi à cozinha, onde se encontrava a Rabanit Miriam
Melo costurando à mão algumas peças para se entreter
enquanto me esperava para irmos dormir. Desci as escadas e
me sentei perto dela, estávamos sentados próximos da porta da
cozinha que dava acesso ao quintal onde se encontrava Bibiu
pousado na porta de ferro que ficava sempre aberta, quando eu
iniciei os relatos da viagem para a Rabanit, Bibiu
repentinamente piou e grunhiu, como lhe era de costume,
todavia, naquele momento o seu piado e grunhido provocou as
minhas emoções e luzes cintilantes e coloridas invadiram o
meu campo de visão de maneira tão intensa que eu não
conseguia exergar a Rabanit Miriam Melo que estava diante
de mim, à isso eu que já estava me sentindo tonto e com
vontade de vomitar por conta do rodopiar das luzes sinalizei
para a Rabanit que não poderia conversar naquele momento,
em seguida relaxei na cadeira e contemplei as luzes, elas se
transformaram em cacos de vidros coloridos, como de vitrais
de igrejas católicas, e depois se organizaram formando a feição
de uma coruja murucututu, encantado com o que estava vendo
fixei o olhar na feição da coruja e uma conexão emocional
rapidamente se estabeleceu, nesta conexão eu soube que os
meus pensamentos podiam ser percebidos pela coruja e os
pensamentos da coruja podiam ser percebidos por mim, e foi
quando me dei conta de que aquela coruja era Bibiu, e então
exclamei: “Bibiu! É você?” a coruja fez um ar de riso e
balançou a cabeça de maneira afirmativa, à isso a Voz se
manifestou dizendo: “Cuide bem dessa ave, ela precisa muito
de você por causa do processo de evolução pelo qual ela está
passando. Ela lhe ama muito e lhe é muito grata por todo o bem
287
que você lhe tem feito, mas se ela fugir de sua casa, a intensão
dela será de retornar, porém, por ela se encantar fácil com tudo
o que vê, facilmente ela será seduzida pelas belezas do mundo
não conseguindo por conta disso voltar, e por não saber viver
na natureza certamente morrerá”. Quando o êxtase se abrandou
eu contei para a Rabanit Miriam Melo tudo o que tinha
acontecido, e nós guardamos estas informações em nossos
corações.
Na noite do dia 24 de março de 2020 o Chassid
experienciou a sua segunda viagem mística através do
Mafteach Einêi-Shelomó. Dentre tantas informações obtidas
através das visões que lhe foram reveladas, houve um trecho
cuja narrativa se deu da seguinte maneira:
A certa altura de sua viagem a sua feição ficou tensa
novamente, suas mãos se afastaram uma da outra e se
agarraram fortemente aos braços da cadeira, e com o corpo
tenso e rígido ele começou a dizer: "Venha não meu vei! Pegou
o cara errado moral! Aqui é ruim por ruim, um pelo outro meu
vei!". Aquilo me pareceu muito estranho e engraçado ao
mesmo tempo, pois, nunca vi alguém discutir com uma
entidade daquela forma. Ele manteve-se rígido por algum
tempo, e depois começou a fazer com as mãos uns sinais de
ninjutsu, coisas que se vê nos desenhos do Naruto. Bibiu, a
minha coruja mucututu, estava no banheiro da sala de estudos
da Sinagoga, e neste momento ela ficou agoniada pulando da
porta do banheiro para a barra de ferro do box e vice-versa,
então, eu achei por bem tirar Bibiu de lá e levá-la para o quintal
temendo que ela voasse na direção do Chassid e por conta dos
efeitos do Chá ele machucasse Bibiu sem querer. Peguei Bibiu
de forma mais silenciosa possível, o Chassid se encontrava
sentado na cadeira, mas estava muito tenso, a impressão era
que ele iria dar um pulo dali a qualquer momento. Desci as
288
escadas e levei Bibiu para baixo, a Rabanit Miriam Melo
estava aguardando o desfecho do processo lá na cozinha e eu
aproveitei para compartilhar com ela em que pé que estavam
as coisas até aquele momento, em seguida, subi as escadas de
volta para perto dele torcendo que não teria perdido nenhum
sinal relevante de sua parte. Quando sentei-me de volta em
meu lugar para observá-lo, ele me disse de uma forma que não
parecia ser ele, apesar de na sua voz não haver alteração
alguma: "Não deixe a ave ir embora. Não deixe a ave ir
embora... e repetiu isso por umas três ou quatro vezes. Ela
precisa ficar aqui, este é o lugar dela, ela é a sua irmã".
Quando o Chassid conclui sua viagem mística e, como
de costume, conversávamos sobre o que aconteceu, eu o
indaguei sobre a sua fala quando disse: "Não deixe a ave ir
embora. ...ela é a sua irmã" e ele me contou o que estava vendo
quando me disse aquilo: o Chassid se percebeu indo em
direção ao início da história do mundo, em direção de Adam,
porém, no meio do caminho ele se percebeu entre os judeus no
Egito e aquilo lhe chamou a atenção, e ele disse consigo
mesmo: "Irei ver isso aqui rapidinho e depois continuo a
viagem em direção de Adam". E foi e desceu, e quando desceu
ele se encontrava em meio a uma comunidade judaica no Egito
num tempo intermediário entre o tempo depois de José do
Egito e antes do tempo do surgimento de Moisés, e eu era o
seu pai, eu era um místico, um cabalista que teria hebraizado
as artes místicas egípcias, tal como faria Moshé Rabenu mais
tarde, e eu teria sido bem-sucedido, pelo menos na comunidade
da qual eu era o líder, o Chassid era meu filho, um filho
teimoso por demais e muito trabalho havia me dado por anos,
e Bibiu era uma moça, uma judia, ela era minha irmã mais
nova.
289
Enquanto minha irmã mais nova, ela era muito boba e
ingênua ao extremo e, por conta disso, trouxe para si e para a
família muitos problemas de natureza moral ao ponto das leis
universais decidirem destruí-la, e eu teria então, através de
minhas artes místicas barganhado com as forças do Universo
e teria conseguido que, ao invés dela ser destruída, que ela
reencarnasse em formas de vidas simples tais como lesmas e
outras criaturas indefesas até que refinasse a sua natureza
obtendo a forma humana novamente quando chegasse a hora.
Depois que morreu, ficando por um bom tempo como um
espírito, ela finalmente mereceu reencarnar dentro das
condições acertadas, e após mil anos depois de sua morte ela
mereceu reencarnar, e reencarnou em várias criaturas desde as
mais simples e evoluindo a cada reencarnação ressurgindo em
uma criatura mais complexa para, por fim, estar agora na
forma de uma coruja murucututu, e como coruja ela, enquanto
convive conosco, resgata a memória de sua vida passada como
um ser humano e isso é necessário para que ela finalmente
eleve-se a esta categoria novamente e, por isso, por ser minha
irmã, é que teria sido trazida para os meus cuidados, e é
também este o motivo do porque eu e Bibiu somos tão
apegados.
Quando o Chassid me contou isso, eu me emocionei
um pouco, não apenas pelo relato dele, mas sobretudo por
causa da passagem da minha quinta viagem (como relatada
acima) que eu não tinha compartilhado com ninguém a não ser
com a Rabanit Miriam Melo que estava comigo na hora em
que vivi estas impressões, muito me espantou o Chassid me
trazendo estas informações acerca de Bibiu em sua viagem.
A certa altura da minha sétima viagem, após muitas
pessoas e entidades terem se revelado e interagido comigo,
uma moça se apresenta, ela tinha pele morena, queimada do
290
sol, cabelos lisos ondulados, ela aparentava ter entre 17 a 20
anos, mais ou menos um metro e sessenta de altura, sua voz
era meiga, todavia, parecia ansiosa, ingênua e demonstrava
gratidão nos seus gestos e no modo de falar, demonstrava
também timidez, insegurança e ao mesmo tempo encanto por
tudo o que via ao seu redor. Em determinado momento de
nossa interação ela me disse que ela era a coruja que nós
chamávamos de Bibiu, me disse que sua memória era confusa,
que se sentia bem e mal ao mesmo, agradeceu-me pelos
cuidados que lhe dediquei desde que ela chegou em minha casa
até aquele momento, me disse que me percebia como se eu
fosse o seu irmão, no entanto, ao mesmo tempo, percebia em
mim a figura de um pai, e depois disso foi esmaecendo-se do
meu campo de visão até ir embora completamente.
Em meio à terceira viagem mística da Rabanit Miriam
Melo surgiu-lhe algo como penas de pavão, eram muitas,
coloridas e belas, as penas em movimento se transformaram
cada qual em aves e estas aves se juntaram e transformaram-
se numa coruja que depois tomou a feição de Bibiu,
transformando-se em seguida numa moça egípcia que se
desfez no ar.
Nós tivemos que nos mudar da casa no Maurício de
Nassau por conta dos reveses da vida, e a Rabanit resolveu
morar num apartamento situado no Bairro Agamenon
Magalhães. Como no apartamento não havia algo como um
quintal, manter Bibiu dentro de casa era muito estressante
tanto para a ave quanto para a gente, pois ela queria voar e no
apartamento não havia espaço suficiente para isso, além da
criação de ratos para a sua alimentação que no apartamento era
insustentável, daí, a Rabanit Miriam Melo me sugeriu que eu
levasse Bibiu para a nossa casa no sítio, em Taquara de São
Pedro, zona rural de Caruaru, lá Bibiu teria espaço e eu poderia
291
criar os ratos tranquilamente, eu concordei com ela e os levei
para lá.
Alguns meses se passaram e a situação ficou
insustentável dadas as despesas de ida e volta ao sítio, ração
para os ratos e o transporte de água, pois lá não tinha, então,
eu tive que pensar noutra solução. Bibiu estava conosco já há
cinco anos, era uma ave inteligente e cativante, soltá-la na
natureza não tinha como, pois, criada em cativeiro certamente
não sobreviveria, busquei contato com alguns biólogos na
esperança de que eles lhe dessem um bom destino, mas
igualmente não tive sucesso, me restou apenas uma solução.
O rapaz que eu passei a comprar os ratos para a
alimentação de Bibiu tinha contato com muitos amantes de
animais silvestres e falcoeiros, e eu compartilhei com ele este
drama em relação a Bibiu, e ele me apresentou um falcoeiro
chamado Mayson Henry, ele já criava uma suindara e tinha
encomendado num criadouro legalizado a aquisição de uma
arara, mas por uma série de motivos adversos a sua arara ainda
não tinha sequer nascido. Entrei em contato com Mayson,
conversamos pessoalmente, ele pareceu-me ser uma boa
pessoa, um pai de família responsável e demonstrou habilidade
na arte da falcoaria, então, compreendendo que Bibiu seria
melhor tratada em suas mãos do que nas minhas, doei Bibiu
para ele e ela permance em sua casa desde então. Mas, mesmo
sabendo que a situação de Bibiu melhorou bastante com esta
mudança, todavia, o sentimento que me veio por ter de me
separar dela foi forte o bastante para me abalar
emocionalmente.
Pouco tempo depois de Bibiu ter sido doada para o
falcoeiro, se aproximou a nossa Festa de Purim.
Purim tem por característica principal a Mitzivá de
beber até se embriagar e o líder da comunidade é quem deve
292
se esforçar por cumprir com esta Mitzivá, este mandamento. O
Purim deste ano (06/03/2023) foi bem divertido e reflexivo, foi
o dia em que a Flávia, esposa do Chassid, bebeu bebida
alcóolica pela primeira vez, e foi também o primeiro Purim
sem Bibiu depois de cinco anos.
Na noite de nossa comemoração, quando a maioria dos
participantes já tinham ido cada qual para as suas casas, o
Chassid e a Flávia e o Kefa, irmão do Chassid, resolveram ir
embora também, como de costume os acompanhei escada
abaixo até o pequeno portão da saída, lá chegando ficamos a
conversar um pouco, conversávamos sobre questões
religiosas, místicas e um pouco da vida no geral, e foi quando
mencionaram Bibiu, compartilhando comigo o quanto
sentiram por eu ter doado Bibiu para um desconhecido que fui
tomado por um forte e intenso sentimento de raiva, desespero
e saudade, sem compreender o que provocou aquela inundação
de fortes sentimentos tentei me libertar deles, mas meus
esforços foram em vão, os sentimentos ao invés de irem
embora se intensificaram e assomou-se a eles a vergonha.
Como eu estava embriagado, não consigo me lembrar
nem dos detalhes da conversa e nem da sequência lógica dos
assuntos, mas lembro-me da intensidade dos sentimentos e de
suas progressões ao tomarem conta de mim enquanto a razão
gradualmente se ausentara de minha consciência, eu me
segurei tanto quanto pude, mas não foi o suficiente, os três
perceberam, cada qual à sua maneira, que precisavam ir
embora e me deixar só para poder me reequilibrar
internamente, eles foram embora e eu subi as escadas
desorientado, cambaleante e chorando sem ter a menor ideia
do porquê.
Ao entrar no apartamento, percebo a Rabanit Miriam
Melo na cozinha e ela me olhava muito preocupada e começou
293
a me perguntar de maneira insistente o que teria acontecido
para ter me deixado naquele estado de nervos, além de repetir:
“Bibiu! Bibiu!” eu não conseguia dizer mais nada.
Na manhã do dia seguinte (07/03/2023), estando com
o Chassid em visita à propriedade que ele adquiriu a fim de
promover nela as suas experiências com o Mafteach Einêi-
Shelomó para as pessoas que lhe procuram para este fim, em
meio à nossa conversa tocamos no assunto do meu descontrole
emocional da noite anterior, e foi quando ele me disse: “Rav,
a impressão que eu tive é que tratou-se de outra pessoa que se
expressava através do senhor, tinha ‘um que’ de luto no
lamento e uma cobrança de algo que pareceu que o senhor
deixou de fazer”.
No dia seguinte à esta conversa (08/03/2023), enquanto
eu e a Rabanit Miriam Melo tomávamos nosso café da manhã,
me veio à mente compartilhar com ela o conteúdo de minha
conversa com o Chassid e perguntei para ela qual era a sua
percepção sobre este assunto, mas antes que eu começasse a
falar, ela me fez um sinal pedindo-me um instante, adiantou-
se e me disse: “Eu também tenho algo a lhe dizer sobre este
ocorrido”. E antes de iniciar o seu relato, ela me trouxe à
memória que na noite em que eu subo desequilibrado
emocionalmente, me dirijo à cozinha, me enconsto no balcão
de mármore e enquanto repetia o nome de Bibiu eu arranhava
a borda do balcão de maneira intensa e insistente ao ponto de
ela pensar que eu iria acabar me machucando fazendo aquilo.
Após esta breve digressão ela me disse: “Um espírito
elevado se aproximou de nós enquanto conversávamos e sua
permanência durou poucos segundos, mas o suficiente para
nos deixar algumas informações, e estas informações foram:
uma moça jovem foi sepultada ainda viva, dentro de um
caixão, ela tentou se libertar, ela bateu e arranhou o caixão com
294
toda a força que tinha, em sua mente lhe veio a imagem de
quem a teria enganado e a colocado naquela situação, neste
momento seu coração se enegreceu com raiva, rancor e dor, e
assim ela morreu. Reencarnada numa coruja ela pôde
extravasar a sua raiva em suas vítimas durante as suas
refeições, você ajudou-a a evoluir neste aspecto, pois, uma
raiva desta intensidade num ser humano seria prejudicial não
apenas para ela, mas também para muita gente. Com o passar
dos anos ela evoluiu o quanto precisava evoluir em forma de
coruja e foi embora. Agora, na coruja que você conheceu não
existe mais o espírito que você percebia, agora resta apenas
uma coruja comum mesmo.
Perplexo com estas informações conjecturei dizendo:
“Isso quer dizer que; ou Bibiu morrerá em pouco tempo, ou
Bibiu, o espírito que conhecemos, terá deixado a ave de
maneira que não a reconheceríamos mais?!” e a Rabanit disse:
“Isso mesmo”. E assim, concluímos que teria sido o espírito de
Bibiu que, ao partir, me invadira com todas aquelas emoções
em Purim para seguir o seu caminho rumo à sua próxima
reencarnação.
Como os principais eventos da vida de Bibiu ocorreram
durante o mês de março, estou inclinado a pensar que Bibiu
nasceu em Purim e morreu em Purim, bem como em Purim
reencarnou na coruja e durante Purim evoluiu desta forma e
elevando-se foi embora.
Há alguns meses atrás, por intermédio da Chulda, se
aproximou dos Judeus de Caruaru uma moça chamada
Carolina, ela desejava se tornar uma judia de nossa Kahal
Kadosh e para isso deu início aos seus estudos. Semana após
semana ela estudou tudo o que lhe passei, e me reportava as
suas impressões dos conteúdos compartilhados a fim de
compreendê-los melhor e nossa interação foi sempre
295
intercalada entre um conteúdo compartilhado e um relato de
um sonho que ela tivera e que desejava a minha interpretação
na expectativa de que os sonhos comunicassem algo de
relevante para a sua vida. E dentre tantos sonhos que ela me
relatou, houve um que se deu na madrugada do dia 17 de
setembro de 2023, que é como segue:
- Shalom Rav! Boker Tov! – Me disse a Carolina por
mensagem de WhatsApp às sete da manhã. – Eu vim lhe contar
um sonho ao senhor, quando der o senhor responde. – E
prosseguiu dizendo: Eu sonhei com um filhote de coruja, e essa
coruja tinha um olho diferente do outro, era bem bonito, era
como se tivesse estrelas no olho, (acredito que fosse cega de
um olho) porém quando eu estava acordando eu senti um
abraço de alguém. Mas não foi ninguém. Gostaria de saber se
isso tem algum significado, obrigada Rav. Shalom!
- Shalom querida Carolina! – lhe respondi. - Boker
Tov!
Me ajude com um detalhe implícito neste seu relato:
Em relação a este "abraço de alguém", a sensação que você
teve foi que você estava sendo abraçada por uma mulher ou
por um homem?
- Rav, - disse ela - eu não sei dizer, mas eu senti uma
sensação boa. Eu acordei com esse abraço.
- Compreendo. É que caso a "entidade" que lhe abraçou
fosse feminina, eu teria uma ideia vaga de quem foi que lhe
abraçou.
- O senhor pode dizer quem é? Rav eu senti paz com
esse abraço, eu gostei muito.
- Acredito que sim, mas a história é muito esquisita.
- Bom, quando o senhor poder dizer fique à vontade.
Mas eu estou muito curiosa.
296
- Vou lhe contar a história por alto, porém, os detalhes
você encontrará no Sefer HaMaftechot Volume 3 (agora
denominado Volume 5) que estou escrevendo.
- Sim, sim!
Então, eu lhe resumi a visão do Chassid em relação a
Bibiu e a nossa suposta estada no Egito em vidas passadas
omitindo os nomes dos personagens. Ao que ela me disse:
- O senhor contando e eu chorando daqui... a minha
reação é de espanto e maravilha!
- Esta é a esquisita história, e seu estiver correto, foi o
espírito da irmã deste cabalista que lhe abraçou, pois, como ela
ainda não reencarnou, sendo ela uma mulher, mas tendo vivido
por muito tempo como uma coruja, o Mundo Espiritual quando
a permite visitar o nosso mundo ela aparece com estas duas
formas simultaneamente.
- Eu tenho uma pergunta: Por que o espírito da irmã
dele me visitaria? Mas enfim, de fato é muito interessante,
gostei muito da história.
- Quando o volume 3 do Sefer HaMaftechot estiver em
suas mãos você descobrirá.
- Tudo bem Rav, mas é que há dois dias atrás eu sonhei
com o senhor. Eu sonhei que estávamos lendo a Tora e eu fazia
uma espécie de juramento, porém sobre o que não sei. Aí com
dois dias aconteceu esse fenômeno. Por um momento eu
pensei que fosse a reencarnação de uma alma judaica velha,
mas não sei. Mas a explicação do senhor foi nota 1000, melhor
impossível! Lhe sou muita grata.
- Todá Rabá!
Que o Eterno, bendito seja o Seu Nome, lhe abençoe
pela sua Tzedaká e fidelidade a este nosso sagrado projeto.
B'Shem Yeshua HaMashiach. Amén.
297
Mais tarde, no mesmo dia, ela retomou a nossa
conversa dizendo:
- Shalom Rav! Lembrei hoje no fim da tarde, e talvez
tenha conexão com o fenômeno de hoje mais cedo.
- Você poderia me explicar melhor o que você quer
dizer com isso? – eu disse-lhe.
- É sobre o juramento que eu tinha feito num sonho
anterior, como lhe mencionei mais cedo. O juramento era feito
diante da Torá, com a Torá aberta. Assim, no judaísmo se
acredita em reencarnação correto? Então eu pensei, já que eu
tenho esse pensamento judaico desde de muito tempo, então
àtoa não é, e se minha alma foi uma bússola para chegar até
aqui? Mas aí eu pensei, e se em alguma vida passada eu fui
judia? Eu espero que o senhor não me intérprete mal. Mas foi
só um pensamento que me passou. Eu confio mesmo apenas
nas palavras do senhor, que é um sábio.
O olho da coruja era assim, eu fui pesquisar então de
fato ela tinha um olho cego mesmo. Shalom. (eu tinha
esquecido de mostrar – ela me enviou uma imagem de uma
corujinha cega).
- Que o Eterno, bendito seja o Seu Nome, lhe abençoe
muito, querida Carolina, pela sua consideração e bom coração
para comigo. B'Shem Yeshua HaMashiach. Amén.
Como diria Rabi Yeshua HaNotzeri: "Se creres verás
coisas maiores do que estas". Isto significa que a entidade não
pode enxergar por si mesma, mas através do contato com você
poderá ver o que você vê, como um guia de um cego neste
mundo, assim são os olhos de alguém encarnado em benefício
de alguém desencarnado.
Lailá Tov! Shalom UL'Hitraot!!!
- Shalom! – disse ela se despedindo por fim.
298
Na virada da noite do dia 25 para o dia 26, eu, o
Chassid, o Tzuriel e o Tzadok vivemos uma viagem coletiva
com o Mafteach Einêi-Shelomó.
E o Chassid me conta que em algum momento da sua
viagem Bibiu aparece e a Voz lhe revelou o seguinte; quando
a coruja saiu de minhas mãos, um espírito cujo aspecto era de
uma matéria flúida e translúcida saiu dela, a abandonou, e ao
entrar em contato com o ar, o espírito ao respirar se torna como
um vaso de vidro, caiu no chão e se fragmentou em vários
cacos, cada caco sobe aos Céus e são espalhados por toda
parte, e a Voz lhe exlica que estes fragmentos irão ao encontro
de mulheres e se conectarão com elas, e elas de maneira
inexplicável sentirão um grande desejo de estudar a Torá e me
procurarão para isso, aVoz afirma que isso deve ser assim
porque durante todo o tempo em que Bibiu viveu comigo como
coruja se conectou espiritualmente com a Torá, mas não
podendo estuda-la naquele estado de existência rogou aos
Céus por ajuda, e os Céus lhe responderam da maneira descrita
acima, dali por diante o espírito que habitava em Bibiu
evoluirá em forma de Ibur auxiliando estas mulheres no estudo
da Torá e receberá através delas a luz necessária para que
alcance novamente a dádiva de obter de novo a forma humana
como um dia foi, há milênios atrás.
299
O Presidente Bolsonaro
300
viagem mística, mas porque igualmente apareceu na viagem
mística de milhares de pessoas.
Quão surpreso não fiquei quando li as matérias
publicadas pelos jornais a Folha.Uol, Estado de Minas Política,
dentre outros, informando em tom de escanda-lo que dirigentes
da União do Vegetal, uma instituição religiosa que faz uso do
místico Chá conhecido entre os Judeus de Caruaru por
Mafteach Einêi-Shelomó, mais popularmente conhecido por
Santo Daime ou Ayahuasca, estaria fazendo campanha para
Bolsonaro. Eu procurei me informar melhor sobre o ocorrido,
dado o fato de que a nossa imprensa é de Esquerda e, portanto,
é hipocritamente partidária e ideológica, e o que apurei de
pessoas que participam formalmente do movimento foi o
seguinte: as pessoas que frequentam estas congregações, cuja
base religiosa é cristã-kardecista, buscam lá respostas para as
aflições coletivas e soluções para os problemas sociais, tanto é
que eles atuam na sociedade em geral com feitos de caridade,
tendo como foco as pessoas mais carentes, os drogados e
pessoas doentes cujos males e dores podem ser sanados ou no
mínimo amenizados em tais reuniões. Pois bem, com a
situação política do país se agravando dada a intensificação das
operações marginais dos esquerdistas que visam quebrar nosso
país, uma grande porcentagem deste público que frequenta os
salões da União do Vegetal, por serem em sua maioria pessoas
de bem, honestas e preocupadas não apenas consigo mesmas
mas igualmente com o rumo futuro do nosso amado Brasil,
buscaram da Espiritualidade uma solução para estes males que
nos atingem em termos políticos, morais e sociais, e a
Espiritualidade revelou-lhes que a solução seria reeleger o
Presidente Bolsonaro. Essa resposta do Mundo Espiritual foi
realmente surpreendete!
301
Esta orientação da Espiritualidade em favor da
reeleição do Presidente Bolsonaro não se deu apenas entre os
adeptos do místico Chá na União do Vegetal, também se
revelou entre médius baianos e místicos de outras vertentes.
Agora, mais surpreendente foi perceber que uma
porcentagem destes “crentes” que sempre se balizaram pelas
respostas advindas destas seções na União do Vegetal e que
sempre compreenderam como verdadeiras e inquestionáveis as
respostas dadas pela Espiritualidade e pelos mestres da União
do Vegetal, compreenderem que neste caso específico do
apoio a reeleição do Presidente Bolsonaro tanto a
Espiritualidade quanto os mestres estavam manipulando,
fingindo, enganando, sendo partidários e extremistas,
antidemocráticos (como claramente afirmaram as matérias
veiculadas a torto e a direito). Ao que me parece, a maioria dos
membros da União do Vegetal são todos cidadãos de bem, pais
e mães de família, todos possuem reputação ilibada, pagam
suas contas em dia, se esforçam por não defraudarem ninguém
e por fazer o bem a qualquer um, se esforçam por educar bem
os seus filhos e a maioria das uniões familiares lá se dão por
casamento formal, sendo mal vistos aqueles que constituem
faília por outros meios questionáveis. É natural que pessoas
assim votassem em Bolsonaro! Não haveria necessidade
alguma de uma manifestação sobrenatural recomendando que
todas as pessoas de bem se inclinassem para apoiarem a Direita
Política de nosso país.
Mas, se não foi para eles a mensagem, ela foi
direcionada para quem?
Como vimos, a União do Vegetal é uma instituição
cristã-kardecista, e como toda instituição cristã tem suas portas
abertas para qualquer um, inclusive para esquerdistas, logo,
fica claro para quem foi dirigida a mensagem. Como o estatuto
302
da instituição não foi pautado em nenhum viés político,
qualquer pessoa que galgar dentro da instituição os degraus de
acenção alcançará a liderança, e pelo visto, infelizmente,
esquerdista têm alcançado este patamar, pois, apesar de serem
uma grande minoria na instituição, contudo, maliciosamente
conseguiram alcançar os postos de comando e por isso nas
matérias veiculadas sobre este caso, estes poucos falaram em
nome de muitos, falaram em nome da instituição, tornando a
maioria esmagadora de membros marginais sem voz, de
acordo com a ideologia esquerdista deles sob o disfarce de
“Democracia”.
Por fim digo que: a Espiritualidade não errou, os
bolsonaristas não erraram e a Justiça Divina se manifestará e
revelará o que realmente aconteceu, recompensando as
pessoas de bem e punindo os marginais. Ki Yehi Ratzon.
Na manhã de 11 de novembro de 2023, eu estava
tomando o café da manhã na companhia da Hosheaná, e
conversando com ela sobre este trecho do livro, ela me
comunicou que houve um trecho de sua viagem com o
Mafteach Einêi-Shelomó que ela não tinha me contado e por
isso não ficou registrado no livro Judaísmo e a Cabalá volume
2 (onde consta o relato de toda a sua viagem mística), neste
trecho omitido por acidente, ela me relatou que: a certa altura
da viagem, olhou e viu o Presidente Bolsonaro como estando
acima de todas as pessoas, como um salvador, e enquanto
contemplava isso, algo lhe puxava perversamente para baixo,
ao tentar ver que força era aquela, ela olhou para baixo e viu
uma lama negra e lustrosa que cheirava mal, e um sentimento
de podridão lhe invadiu e a mensagem que se seguiu enviada
pela Voz foi: “Este é o PT”.
303
Recorte quinto – A Origem do Sobrenome Melo
304
do sobrenome Melo, e empreendi várias pesquisas no decorrer
de alguns anos, como as pesquisas foram em fontes de domínio
público, acredito que pouca será a minha contribuição original,
no entanto, os resultados destas pesquisas me permitiram
montar um quadro que fundamentou uma hipótese mística a
qual compartilharei no final. Por hora, reproduzirei os dados
que encontrei aleatoriamente em livros e sites na internet:
Facebook, blogs, Wikipédia e canais no Youtube.
Na primeira matéria encontrei que a heráldica do
sobrenome Melo está coletada no Armorial Général de Johan
Baptiste Rietstap, esta obra é a maior obra de heráldica já
escrita, com mais de 100.000 sobrenomes de todo o mundo
(espanhol, inglês, francês, italiano, polonês, português
sobrenomes, holandês, etc.), entre os quais está o sobrenome
Melo, organizado em ordem alfabética, incluindo manual de
heráldica com desenhos, glossário completo de termos,
suplemento e apêndice. Descrição completa do brasão do
sobrenome Melo, origem do sobrenome Melo, títulos
nobiliárquicos do sobrenome Melo e datas de concessão. O
texto onde aparece o sobrenome Melo está na segunda edição,
ampliada e revisada de 1884-1887.
A obra Linhagens e Brasões da Galiza, do Padre
Crespo, onde aparece a heráldica e a história do apelido Melo,
é o mais importante tratado sobre a heráldica da Galiza, e foi
publicada trezentos anos depois do aparecimento póstumo do
"Nobiliario, Armas e triunfos da Galiza", do Padre Felipe de
la Gándara. O seu autor, Padre Crespo Pozo, teve para as suas
pesquisas vigílias e dispendiosas viagens que foram custeadas
com a gentil colaboração de Nobres como os Duques de
Medinaceli, fornecendo-lhe o arquivo da Casa do Grande
Marquês de Camarasa, dentre outros. De tudo isto resultou
uma pluralidade de fontes de referência que tornam a obra
305
erudita, de carácter enciclopédico e de âmbito ilustrativo na
heráldica galega. Esta obra recolhe, como já dissemos, a
história e a heráldica do apelido Melo, pelo que, nesta obra, os
Melo ou são galegos ou estão ligados em alguns dos seus
ramos à Galiza. O sobrenome Melo aparece coletado pelo
Cronista e Reitor Rei de Armas, Dom Vicente de Cadenas y
Vicente, em seu Repertório de Brasões da Comunidade
Hispânica, isso significa que a linhagem Melo possui armas
oficiais certificadas pelo Rei de Armas. O referido Repertório
de Brasões da Comunidade Hispânica é a maior obra da
heráldica espanhola, onde aparecem os sobrenomes com sua
heráldica, como o sobrenome Melo, organizado em ordem
alfabética, com seus brasões. Esta obra incluiu o conteúdo de
muitos manuscritos da Biblioteca Nacional de Madrid e
correspondentes às Atas dos Reis de Armas e inclui
sobrenomes que, como Melo, são espanhóis ou estão
intimamente ligados por uma razão ou outra à Espanha, então
aqueles do sobrenome Melo está nesta posição. Existem
também milhares de escudos heráldicos de diversas Seções do
Arquivo Histórico Nacional, bem como da Chancelaria Real
de Valladolid, das Salas Hijodalgos e Vizcaya, etc. Em
resumo, quem tem o sobrenome Melo realizou alguma prova
de nobreza.
Também Julio de Atienza, em sua Nobreza Espanhola,
coleta a heráldica e a história do sobrenome Melo. Esta obra é
de grande importância para a heráldica pois reune a história,
evidências de nobreza de sobrenomes e linhagens entre as
quais está o sobrenome Melo. O sobrenome Melo também
aparece no Dicionário Heráldico e Nobiliárquico dos Reinos
de Espanha de Fernando González Doria, embora apresente
menos dados sobre o sobrenome Melo do que a Nobreza
Espanhola. A história e a heráldica do apelido Melo constam
306
no Armorial Lusitano de António Sérgio, pelo que os Melo ou
são de origem portuguesa ou se estabeleceram em Portugal. Há
que ter em conta que os nobres portugueses estão ligados à
nobreza castelhano-leonesa e galega, além do fato de Portugal
ter sido outrora unido a Espanha, o que deve ser tido em conta
no estudo do apelido Melo. A história e heráldica muito
completa do sobrenome Melo aparece na grande Enciclopédia
Hispano-Americana de Heráldica, Genealogia e Onomástica
dos irmãos Arturo e Alberto García Carraffa, e continuada por
Endika de Mogrobejo. São mais de 100 volumes que esta
Enciclopédia ocupa onde podemos encontrar o sobrenome
Melo. Eles estão organizados em ordem alfabética, embora
com acréscimos no final de muitos volumes. São mais de 17
mil sobrenomes, incluindo Melo.
Por outro lado, segundo o escritor Carlos Platero
Fernández, em sua obra Los Sobrenomes nas Ilhas Canárias,
o sobrenome Melo tem filial nas Ilhas Canárias. Nesta obra,
Carlos Platero Fernández recolhe a heráldica e a história de
muitos sobrenomes que vêm de outros lugares da Espanha e da
Europa, como é certamente o caso do sobrenome Melo e que
se estabeleceu nas Ilhas Canárias. São coletadas diferentes
grafias dos sobrenomes, portanto, é possível que o sobrenome
Melo não tenha uma mesma grafia. O sobrenome Melo
aparece na obra Heráldica dos sobrenomes Canários de Lino
Chaparro D`Acosta, portanto Melo é um sobrenome que se
estabeleceu de fato nas Ilhas Canárias. A conquista do
arquipélago começou, formalmente, em 1402, com as
incursões de Jean de Bethencourt e Gadifier de la Salle, por
conta de Henrique III, em Lanzarote, Fuerteventura e El
Hierro, terras que foram facilmente anexadas a Castela. Fernán
Peraza fez o mesmo com La Gomera. Tenerife é a última ilha
a ser conquistada, já pelos Reis Católicos. Assim, sobrenomes
307
como Melo têm história e heráldica nas Ilhas Canárias. Com o
tempo, as Ilhas Canárias foram ligadas à América como
passagem obrigatória de navios para o novo continente. Os
Canários participaram ativamente, como colonos, no
nascimento de nações e cidades. Foram famílias insulares que
fundaram as cidades de Montevidéu e San Antonio do Texas -
os sobrenomes canários abundam na lista dos defensores do
Álamo; assim, muitos sobrenomes, como o sobrenome Melo,
passaram para a América. O sobrenome Melo aparece também
no Dizionario Storico-blasonico delle Famiglie Nobili e
Notablei Italiane Estinte e Fiorenti, de Gofredo di Crollalanza,
que reúne histórias e brasões de mais de 18.000 sobrenomes
italianos e outros, mas enraizados na Itália, entre deles, a
história, a heráldica e o escudo ou escudos do sobrenome
Melo. Este livro é o resultado de longas e pacientes pesquisas
de quase três décadas, o que representa quase a vida do autor;
baseia-se na ciência heráldica, genealógica, cavalheiresca e
nobre que o autor adquiriu com a fundação da Academia
Heráldica Italiana e a publicação do jornal Giornale araldico-
genealógico. Os sobrenomes, como Melo, são registrados em
ordem alfabética. A obra inclui, além das armas, a heráldica e
a história do sobrenome Melo, que inclui dados históricos
sobre a família com sua localização, seus títulos, etc (Post do
Facebook intitulado: Genealogia Familia Melo - postado em 6
de maio de 2013, em espanhol e inglês na página: Arbol
genealógico – tradução livre).
Também encontrei um fórum onde portugueses e
brasileiros discutiam sobre as possíveis origens do sobrenome
Melo e achei interessante registrar por aqui com o intuito de
deixar claro que a origem da existência do sobrenome Melo se
sustenta em tradições várias, não havendo com segurança e
sem nenhuma sombra de dúvida quem possa esclarecer de uma
308
vez por todas esta questão, mas de qualquer forma, na multidão
das palavras se encontra a verdade em meio delas escondida, e
por isso estas especulações têm o seu valor e merece nossa
atenção. As informações a seguir foram extraídas das
conversas de um fórum que discutia o sobrenome Melo que
encontrei aleatoriamente em 15 de janeiro de 2022, e o seu
conteúdo é como se segue:
Paixão Melo disse:
- É comum encontrar a informação de que o apelido
Melo provém do facto de um tal D. Soeiro Reimondes (ou
Raimundo), o "Merlo" ou "Melro", que foi chefe da linhagem
dos de "Riba de Vizela", ter vindo para o Sul e fundado na
Beira a "Vila de Melo" nas vizinhanças de Gouveia, de que
também era Senhor. D. Soeiro terá adoptado o apelido de
"Melo" e os seus descendentes encarregaram-se de o propagar.
Mas onde foi ele buscar tal apelido? Seria por alcunha
conhecido por “Melro” ou “Merlo”? Ou por outra razão mais
nobre? Este D. Soeiro viveu nos tempos de D. Afonso
Henriques que o constituiu donatário daquela povoação.
Então, foi D. Soeiro quem adoptou o apelido de Melo para si e
deu o mesmo nome à povoação e não esta que deu origem ao
apelido?! Acontece que nos meus tempos de adolescente,
costumava passar férias numa quinta de meus avós, lá na Serra
da Estrela e habituei-me a passar a pente fino, velhos
alfarrábios que por lá havia. Para além de livros de Balzac,
Victor Hugo, Dumas, Camilo, Eça, José de Alencar... havia um
grande número de Almanaques Bertrand e de Almanaques
Populares ou de Família, que faziam a minha delícia com as
anedotas contadas ou desenhadas, os provébios e um sem
número de passatempos. Pois foi num destes Almanaques
Populares ou de Família ou nome semelhante que então li um
pequeno artigo (não fixei o autor) cujo título era qualquer coisa
309
como: "A origem dos Mellos em Portugal". Dizia o dito artigo
que um velho cruzado português de nome, salvo erro,
Raimundo, fora o primeiro a saltar o "muro Mello", quando da
conquista de Jerusalém e que, apartir de então, para o
distinguir de outros Raimundos lhe começaram a chamar de
Raimundo "do Mello". Não dei grande importância ao "artigo
de almanaque", embora o guardasse na memória até porque
também tenho o apelido de Melo. Acontece que ontem mesmo
acabei de ler um livro intitulado "A Bíblia Arrancada às
Areias" de Werner Keller, onde na página 275 deparo com o
seguinte: "Não houve nada no seu palácio que Ezequias lhe
não mostrasse" (Isaias, XXXIX,2). “Na realidade armavam-se
em segredo e preparavam-se à pressa para o dia em que iria ter
lugar a grande expedição. Ezequias reparou também
esmerando-se muito, todos os muros que se achavam
desmantelados e fez em cima torres e outros muros por fora; e
redificou o forte de Mello, na cidade de David, e mandou que
se fizessem armas e escudos de todo o género” (II
Paralipómenos, XXXII; 5). Então sempre é certo que, pelo
menos, existiu em Jerusalém o tal Muro Mello de que falava o
Almanaque?! Algum confrade tem algo para acrescentar que
dê ou retire qualquer credibilidade a tal hipótese? (Postado em
27 de setembro de 2006).
Em resposta, no mesmo dia, o Pedro Mello respondeu:
- Caro confrade, o Merlo em questão é um pássaro. A
muralha era conhecida como "do Merlo" em razão de um ou
mais destes que faziam pouso lá. Ao fundar a vila, D. Soeiro
não a chamou "de Mello" mas de “Merlo” em referência ao
episódio. O povo é que, ao repetir, acabou suprimindo o “R”
e, por corruptela, virou Melo. Seu filho, Men Soares, passou a
ser conhecido como Men Soares de Mello, pela Villa de
310
Mello/Merlo, e incorporou ao apelido. Quanto ao 'Mello' da
Biblia, ignoro. Cordialmente, Pedro Mello.
Logo em seguida, veio um tal de Coelho e também deu
o seu parecer:
- Caro Paixão Melo, isso cheira-me a estórias da
carochinha. Transcrevo texto da GEPB, o qual parece basear-
se em facto históricos, e não em lendas. Cumprimentos,
Coelho.
Foi vila, na comarca da Guarda, e constituía um
priorado, da apresentação dos donativos, que eram os Melos.
D. Manuel concedeu-lhe foral, dado em Lisboa a 9-VII-1515.
É povoação muito antiga, que já existia no começo da
monarquia e tinha no séc. XIII o titulo de vila. D. Afonso III
concedeu-a, com outras, a Mem Soares, cavaleiro, que
edificou na povoação um enorme solar de que restam as ruínas,
o chamado Paço. Mem Soares tomou por apelido o nome da
terra doada. O terreno fertilíssimo deve ter contribuído para o
desenvolvimento da povoação. Uma religiosa do convento de
Chelas, D. Maria Borges Teixeira, fundou, junto à vila, um
convento, que se instalou, de início, na ermida de N. S. do
Couto, cedida pela padroeira, D. Isabel Teixeira, prima da
fundadora e viúva de Estevão Soares de Melo, senhor da vila.
D, Maria Borges alcançou licença do núncio em 22-VI -1539
e a primeira pedra da nova igreja foi lançada pelo bispo de
Coimbra, D. Jorge de Almeida, a 8-IX-1539. Em 1540 já a
obra estava em condições de receber as freiras, que logo para
ali foram. Em 1554 deixaram a regra de Santo Agostinho e
passaram para a de S. Francisco. Na povoação visitam-se ainda
o antigo edifício da Câmara, a capela de Santa Marta e o
pelourinho, todos classificados como monumentos nacionais.
Melo é ainda a terra Natal de Vergílio Ferreira. Faz parte desta
freguesia o lugar de Nabainhos (Grande Encilopédia
311
Portuguesa e Brasileira; Editorial Enciclopédia, Limitada;
Lisboa, Rio de Janeiro / postado em 28 de setembro de 2006).
Paixão Melo respondeu para o Coelho:
- Caro Coelho Também eu considero, em princípio, que
a hipotese do "muro Mello" não deve passar de uma "estória"
de almanaque. No entanto desconheço a consistência da
opinião de a origem do apelido vir de "Merlo"(pássaro) e
custa-me desprezar, sem dar-lhe qualquer atenção, e sem ter
alguma preocupação com a hipótese, que também pode ser
viável, do cruzado herói de Jerusalém. Vou tentar descobrir o
célebre Almanaque na Biblioteca Nacional, já que dou por
perdido o exemplar que tive na mão há umas boas dezenas de
anos, para ver se tem o nome do autor. Depois vou pelo menos
tentar saber da credibilidade da pessoa e assim por diante
(Postado em 29 de setembro de 2006).
Após estes trechos seguiu-se no grupo uma série
pareceres que pouco comunicaram sendo relevante para esta
conversa apenas estes recortes acima.
Melro, o Pássaro
312
pertencente ao género Turdus. Ocorre naturalmente na Europa,
Norte de África, Médio Oriente, Ásia Meridional e Ásia
Oriental. O filósofo e enciclopedista romano Varrão indica um
diminutivo de mera, "só", como explicação etimológica para o
termo merula, que significaria assim quod mera, "quase só", o
que descreve bem o carácter solitário desta ave. Este termo (e
a sua forma tardia merulu) deu ainda origem à designação
comum para esta espécie não só em português ('melro', com
síncope do 'u' e metátese do 'r'), como também noutras línguas
românicas como o castelhano ('mirlo'), o francês ('merle') e o
italiano ('merlo'). Em Portugal, é normalmente conhecido
como o melro, apesar do termo se referir de forma mais
abrangente a diversos membros da família Turdidae, como o
melro-de-peito-branco (Turdus torquatus) e o melro-das-
rochas (Monticola saxatilis).
Dada a sua proximidade ao homem e ao distinto canto
melodioso dos machos, existem numerosas referências ao
melro-preto nos ditados populares de diversas línguas,
incluindo o português, tais como: "Cada tiro, cada melro."
(quando alguém não consegue acertar em algo após sucessivas
tentativas); "Água ao melro que lhe seca o bico." (quando
alguém tem sede); "Cantam os melros, calam-se os pardais.";
"Melro que pia, o poiso denuncia."; dentre outros.
Como eu dizia: nesta cidadezinha chamada Melro no
interior de Portugal a comitiva de um príncipe parou às
margens de um rio para se refrescar. O príncipe não resistindo
às límpidas águas do rio resolveu se banhar. Entretanto, não
sabia nadar e quando deu por si estava a se afogar.
Um humilde agricultor que por ali estava a fazer as suas
semeaduras imediatamente atirou-se às águas e retirou o
príncipe, livrando-o da morte. Na sua simplicidade, em
seguida retirou-se para a sua casa para trocar as suas roupas
313
molhadas, não dando maior importância para o assunto e ao
seu ato de humanidade.
O Rei ao saber do fato pretendeu agradecer ao agricultor
e presenteá-lo. Assim foi a sua procura dirigindo-se ao local
do acidente. Lá chegando, tentou encontrar o agricultor, sem
lograr êxito, pois, sabiam que se o Rei de Portugal procurava
um Pereira, era certamente na intenção de acusá-lo de alguma
coisa relacionada à religião judaica. Recebia apenas a
informação de que se travava de um "homem que morava na
cidade de Melo" (forma popular usada pelos habitantes
daquela cidade que na sua maioria eram Anussim), ou seja, um
"Homem de Melo"!
Após haver colocado seus vassalos a procurar,
finalmente acabou o Rei por encontrar o salvador de seu filho.
Como agradecimento, deu-lhe as terras que circundavam o
local do acidente e concedeu-lhe um título honorífico, o de
Barão, encobrindo o seu passado marrano de fácil
identificação por causa do seu pseudônimo Pereira,
substituindo por Homem de Melo. Essa é a primeira menção
histórica, de acordo com esta lenda, da corruptela Melo, que
remonta à origem do sobrenome da família Melo.
Este moço, da família Pereira, apesar de muito novo, um
quase menino, munido de uma acha d'armas, lutou bravamente
contra os mouros, junto a este local denominado pelo Rei de
Portugal por Milo (como que dizendo; junto a este local e
quase só) - local cheio ou fortificação - edificado na
antiguidade pelo Rei dos Judeus - Salomão, numa das
extremidades da muralha de Jerusalém.
O Rei português ficou tão agradecido ao menino que
passou a chamá-lo de “Homem”. “Pois, como lutaste
bravamente e me salvaste dos mouros, já não és um menino,
mas um homem”. O jovem passou a ser conhecido como O
314
Homem. Quando perguntavam a que homem o Rei se referia,
este dizia: o moço dos Pereira - O Homem de Melo. “Melo”,
título que foi daí em diante, transmitido aos seus descendentes.
Obviamente que este texto carece de fontes sérias que
comprove sua veracidade, mas temo que trata-se de algo
impossível, pelo fato de estarmos lidando com uma lenda. No
fim da matéria o autor anônimo aponta como possível fonte
deste relato a obra: Baseada no Livro "Genealogia da família
Homem de Mello" –, escrito por Gastão Homem de Mello,
edição brasileira - 2ª Edição - Maio/1985.
A Ilha de Milos
315
aproximadamente 23km e, de norte a sul, 13km. A maior parte
da ilha é montanhosa, tendo como ponto culminante o Monte
Profeta Elias, com 774m, situado no oeste da ilha. De acordo
com esta hipótese, o sobrenome Melo era originalmente uma
designação genérica dos habitantes da ilha que de lá se
espalhou pela Europa até chegar nas terras do Novo Mundo.
A Muralha de Melo
316
um lanço no vale denominado Melo. O cruzado português
portou-se com tamanha valentia, praticou tais atos de bravura
que os seus camaradas maravilhados, começaram a apelida-lo
de Melo em recordação ao feito de armas. D. Soeiro fundou
em 1204 a Quinta da Serra da Estrela, que se chamou Melo.
A Mem Soares neto de Soeiro nomeou Afonso III,
Senhor de Melo.
O solar está na Vila da Beira (BARRETO, Carlos Xavier
Paes, 1960).
Melo (ou Milo) era uma estrutura na cidade israelita de
Jerusalém, mencionada pela primeria primeria vez na Bíblia
no Segundo Livro de Samuel (5:9), e em diversas passagens
subsequentes no Livro de Crônicas e no Livro dos Reis. É
mencionado como parte da cidade de Davi e parece ter sido
uma estrutura de proteção construída pelos jebusitas antes da
conquista de Jerusalém pelos israelitas. Os textos bíblicos
também descrevem uma 'Milo' que teria sido construída por
Salomão (1 Reis 9:24) e consertada por Ezequias (2 Crônicas
32:5), sem que qualquer explicação específica seja fornecida a
respeito do que ela consistia exatamente. Existe um debate
entre os estudiosos a respeito de sua natureza específica; a
teoria mais comum entre os arqueólogos e historiadores da
antiga Israel é de que Milo seria a Estrutura de Pedra em
Degraus, descoberta por Kathleen Kenyon e demonstrada por
Eilat Mazar como associada à recém-descoberta Grande
Estrutura de Pedra. Uma escavação recente feita por Mazar
diretamente acima da Estrutura de Pedra em Degraus mostra
que a estrutura está ligada e fornece suporte à Grande Estrutura
de Pedra. Mazar apresenta evidências de que a Grande
Estrutura de Pedra seria um palácio real israelita, utilizado
continuamente do século X até 586 a.C. Sua conclusão é de
que tanto esta estrutura quando a estrutura em degraus fariam
317
parte de um imenso palácio real, o que estaria de acordo com
as referências ao termo 'Milo'/'Melo' citado como "Casa de
Milo/Melo" ("Beit-Melo") no Segundo Livro de Reis (12:20),
como o local no qual o rei Joás teria sido assassinado em 799
a.C., enquanto dormia em sua cama. O termo "Milo" seria
derivado do hebraico Milui, que designaria o material usado
para preencher os espaços vazios entre pisos, paredes e muros,
visando assim fortificá-los. Toda a estrutura que sustenta os
degraus de pedra seria preenchida por este material. No Livro
de Samuel, Milo é mencionada como sendo a fronteira da
construção do rei Davi enquanto ele construía a sua cidadela,
após a conquista de Jerusalém dos jebusitas. A tradução para
o inglês da Bíblia feita pelo rei Jaime da Inglaterra traduz o
termo 'Millo' numa nota de rodapé como, literalmente, "O
Aterro", enquanto a New International Version a traduz como
"supporting terraces" ("terraços de suporte"); já as versões em
português a mencionam como "muralhas", "muros de arrimo"
e "edifícios". A reconstrução feita por Ezequias é mencionada
numa lista de uma série de reparos feitos a fortificações
militares, e diversos estudiosos acreditam que por esse motivo
ela pudesse estar associada a atividades militares, e ser uma
espécie de torre, cidadela, ou apenas parte importante de uma
muralha.
318
Melo compõe a casta de espíritos primordiais, pois ele
é a potência de todas as coisas, como está escrito:
וקרא זה אל־זה ואמר קדוש קדוש קדוש יהוה צבאות
מלא כל־הארץ כבודו
“E clamavam uns aos outros, dizendo: Santo, Santo,
Santo é o Senhor dos Exércitos; toda a terra está cheia da
Sua Glória” (Isaías 6:3).
Este versículo é, de acordo com os nossos Sábios, parte
constituinte dos louvores que os santos anjos nos Céus
proclamam diariamente diante de Deus, bendito seja o Seu
Nome (Peninei Halakhá, Oração 16:4). Melo não é a Glória,
mas o resplandecer dela, não é a expansão, mas a eficácia do
ato de expandir, não é a força, mas a energia mantenedora da
força, não é a beleza, mas a promoção da sua sedução, não é a
ruína, mas a alma de sua desolação, não é o fogo e nem a
matéria, mas o cimento unificador que promove a atração e o
apego de um ao outro para juntos rumarem em direção ao seu
estado de origem.
O termo “Melo” ()מלא, como aparece em Isaías 6:3 está,
de acordo com o Rabino Ibn Ezra, no infinitivo, como por
exemplo, de acordo com ele Melo Beito ( )מלא ביתוsignifica
“casa cheia”. Melo Khol Ha-Aretz Kevodo (Isaías 6:3) é
semelhante. Muitos erram ao pensar que o significado deste
último é que o conteúdo da terra é a glória de Deus, assim
como a terra é do Senhor, e a sua plenitude (Salmos 24:1).
Outra variante da grafia “Melo” em hebraico é “Melot”
()מלאת, que é a sua forma infinitiva e significa
simultaneamente: cumprido, realizado, plenamente feito. Sua
letra raiz final é um Alef ()א. Como no versículo:
וזאת תורת הנזיר ביום מלאת ימי נזרו יביא אתו אל־פתח אהל
מועד
319
“E esta é a lei do nazireu: no dia em que se cumprirem os
dias do seu nazireado, trá-lo-ão à porta da tenda da
congregação” (Números 6:13).
É conjugado como uma palavra que tem um Hê como
raiz final. É como a palavra Keroot (chamar - )קראתno sentido
de que (Juízes 8:1) “nos chamaste” (Ibn Ezra sobre Números
6:13:1).
Os nossos Sábios empregaram o termo “Melo” no
sentido de coletivo, como se pode ver:
ַכאֲשֶ ר יֶהְ גֶה הָ אַ ְריֵּה וְ הַ כְ פִ יר עַל טַ ְרּפֹו אֲשֶ ר יִ קָ ֵּרא ָעלָיו ְמלא
רעִ ים
“Como o leão, ou o jovem leão, rosnando sobre sua presa,
embora um bando ( ) ְמלאde pastores seja convocado contra
ele” (Sipurei Maasiyot 12:102).
O trecho da Tradição Judaica a seguir nos brindará com
outra aplicação do termo “Melo” em uma exegese bíblica no
nível Darash (alegórico) e na sequência o seu uso como parte
da nomenclatura de uma medida litúrgica de vinho a ser
consumido em um Kidush:
ויאמר־לו המלך איפה הוא ויאמר ציבא אל־המלך הנה־הוא
בית מכיר בן־עמיאל בלו דבר ׃
וישלח המלך דוד ויקחהו מבית מכיר בן־עמיאל מלו דבר
“E disse-lhe o rei: Onde está? E disse Ziba ao rei: Eis
que está em casa de Maquir, filho de Amiel, em Lo-
Debar. Então mandou o rei Davi, e o tomou da casa
de Maquir, filho de Amiel, de Lo-Debar”
(2 Samuel 9:4-5).
A Gemara agora examina o assunto em si no que diz
respeito à declaração do Rav citada no decorrer da
discussão anterior. Rav disse: David aceitou um
relatório calunioso, como está escrito em relação à
busca de David por um filho sobrevivente de Yonatan:
“E o rei disse-lhe, a Tziba, escravo de Shaul: Onde está
320
ele? E Tziba disse ao rei: Eis que ele está na casa de
Makhir, filho de Amiel, em Lo-Devar [BeLo Devar -
( ”]בלו דבר2 Samuel 9:4). Tziba indicou a David que o
filho de Yonatan era inconsequente, desprovido de
qualquer assunto [Lo Devar - ]לו דברda Torá. E está
escrito: “Então o rei Davi mandou buscá-lo da casa de
Makhir , filho de Amiel, de Lo-Devar [Milo Devar - מלו
( ”]דבר2 Samuel 9:5). Esse versículo pode ser lido que
depois de mandá-lo chamar, David o encontrou cheio
de assuntos [Melo Devar - ]מלו דברda Torá.
Para cumprir a Mitzvá do Kidush, um Melo
Lugmav ( )מלא לוגמיוde vinho deve ser bebido
pela pessoa que faz o Kidush ou por um membro
de sua audiência (conforme explicado na seção 5
deste capítulo). O resto dos ouvintes cumpre assim
a sua obrigação no Kidush, mesmo que não bebam
o vinho. Idealmente, cada ouvinte deveria beber
vinho do Kidush (SA 271:14 - Peninei Halakhá,
Shabat 6:7:2).
321
praticado o Judaísmo daquele período em detalhes que só
podem ser percebidos no versículo em Hebraico, perdendo-se
tais detalhes nas versões traduzidas. Se traduzirmos ao pé da
letra este versículo obteremos o seguinte: “Então se ajuntaram
todos os cidadãos de Siquém, e toda a Casa de Melo; e foram,
e constituíram a Abimeleque rei, junto com o Carvalho Matzav
(consagrado como altar) que está perto de Siquém” (Juízes
9:6). É estreita a relação do espírito judeu com as árvores, há
vários versículos que denunciam esta relação mística e
complexa, para o Judaísmo as árvores são como “homens que
não andam”, enquanto que os homens são como “árvores que
podem andar”. No Gan Eden, no Paraíso, de acordo com o
Zohar, as árvores eram homens. Avraham Avinu recebeu suas
revelações das Palavras de Deus quando esteve debaixo de
carvalhos e tão poderosas foram estas revelações que ele
mesmo plantou para si um bosque de carvalhos para lá poder
consultar a Deus com mais liberalidade (Gêneses 21:33). O
Santo, bendito seja o Seu Nome, quando buscou um meio de
se comunicar com Moshé Rabeinu foi através de um
espinheiro, uma acácia, a famosa sarça ardente, uma árvore
(Êxodo 3:1-6), e o Mashiach quando descreveu a si mesmo
disse: “Eu sou a videira, vós os ramos; quem está em mim, e
eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis
fazer” (João 15:5). Eu discorri fartamente sobre este assunto
no livro: Judaísmo e a Cabalá volume 2 nas páginas de 249 até
a 355.
O fato da coroação do Rei ter se dado junto ao carvalho
e a maneira como o versículo em hebraico registra isso,
denuncia que eles consultaram a Deus através do Carvalho, tal
qual Abraão teria feito várias vezes antes deles, portanto o
Carvalho tem neste processo um papel ativo e isso é
maravilhoso por demais!
322
Infelizmente, após lermos todo o capítulo
perceberemos que tratavam-se, em sua maioria, de pessoas
desonestas e ingratas, e por isso o Santo, bendito seja, os
incitou a coroar a Abimeleque como Rei para assim julgar a
um e ao outro igualmente tal qual rezou a maldição de Jotão
seu meio-irmão, filho de Gideão e herdeiro legítimo ao trono.
De qualquer forma, esta passagem reforça aquela percepção
dos Sábios de que os Céus respondem de acordo com o desejo
dos corações, mesmo que seja para a perdição, como foi o caso
em questão. E se aplicarmos as leis de Guilgul (Reencarnação)
do Arizal, que a paz esteja com ele, obteremos um norte para
compreender como a Casa de Melo na Terra de Israel há três
mil anos atrás acabou ressurgindo em Portugal no século XIV
d.C.
Percebemos que o povo coroou ao Rei tendo a Casa de
Melo fazendo as vezes de sacerdotes e juízes (Deuteronômio
17:8-13) e o Carvalho as vezes de Óraculo. Portanto, da ruína
que se seguiu a este ato a Casa de Melo teve boa parte da culpa,
porém, por ter representado a Vontade de Deus mereceram a
misericórdia Divina que se traduziu sobre eles como várias
chances de reparar suas faltas através de outras existências
consecutivas reencarnando em forças da natureza, minerais,
vegetais, animais e por fim, em pessoas novamente (Portal das
Reencarnações, 2016, p. 149), pois de acordo com as Leis de
Guilgul: Quando alguém é sentenciado a perder o seu livre
arbítrio, por conta de suas más escolhas, ela reencarna em um
ser não humano (Ibidem, pp. 145-146). Por causa do rigor
deste tipo de castigo a maioria perece no processo, mas aos da
Casa de Melo foi decretado nos Céus permaneceriam sobre a
terra e nenhum deles se perderia, mas a seu tempo cada um
deles seria redimido e retornariam à sua glória anterior dos
tempos bíblicos. E mesmo os justos podem ter decretado sobre
323
si que reencarnem em um ser não humano (Ididem, p. 148). O
destino da Casa de Melo do Livro dos Juízes, assemelha-se ao
destino de Lavan, o sogro de Yaakov Avinu, que de acordo
com o Arizal reencarnou em Bilam HaNavi, o Profeta Balaão,
que por conta de suas maldições proferidas a torto e a direito
acabou morrendo e reencarnando numa pedra, e após o seu
período de expiação de sua principal falta que era provocada
pela sua fala, por conta disso, ele reencarnou numa pedra que
não pode emitir qualquer tipo de som, e depois ele reencarnou
em Naval, o esposo de Abigail, por isso é dito dele (1 Samuel
25:37): “e se amorteceu o seu coração, e ficou ele como
pedra” fazendo alusão à sua reencarnação passada (Ibidem, p.
152). O Arizal aludiu ao tipo de castigo infligido pelos Céus
sobre a Casa de Melo, quando disse:
A encarnação em inanimados também é aludida no
versículo “Pois as pedras do muro clamarão”
(Habacuque 2:11). Há pessoas que encarnam em pedras
de um muro, que é inanimado, ou no tronco da árvore,
que é o ser vegetal, e de lá ficam clamando pelos
castigos que estão sofrendo ali (Portal das
Reencarnações, 2006, p. 152).
No caso das pessoas da família da Casa de Melo, eles
teriam encarnado como castigo no rejunte que une as pedras
do muro que leva o seu nome: a Muralha de Melo. Esta citação
do Arizal me trouxe à memória ainda outra passagem
semelhante, que é como segue:
324
disseram-lhe de entre a multidão alguns dos fariseus: Rabi,
repreende os teus discípulos. E, respondendo ele, disse-lhes:
Digo-vos que, se estes se calarem, as próprias pedras
clamarão” (Lucas 19:37-40).
325
326
Referências Bibliográficas
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Editora Lubavitch e Yeshivá Tomchei Tmimim Lubavitch,
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Lubavitch e Yeshivá Tomchei Tmimim Lubavitch, São Paulo,
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Sites consultados:
https://www.bibliaonline.com.br/
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https://www.sefaria.org/
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2023/02/religiao
-que-usa-cha-de-ayahuasca-vive-crise-apos-mestres-
cobrarem-apoio-a-bolsonaro-e-a-golpe.shtml (Acessado em:
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https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2023/02/1
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crise-ao-cobrar-apoio-a-bolsonaro-e-golpe.shtml (Acessado
em: 22/09/2023).
https://pp.nexojornal.com.br/ponto-de-
vista/2023/Ayahuasca-esp%C3%ADritos-e-extraterrestres-
bolsonarismo-e-a-evolu%C3%A7%C3%A3o-espiritual
(Acessado em: 22/09/2023).
https://www.facebook.com/ (Acessado em:
28/12/2023).
Post do Facebook intitulado: Genealogia Familia Melo
(postado em 6 de maio de 2013, em espanhol e inglês na
329
página: Arbol genealógico – tradução livre - acessado em:
18/12/2023 às 09:46 da manhã).
330
O Sefer HaMaftechot Volume 5 foi uma obra que contou,
além do auxílio dos Céus, com o apoio financeiro dos
membros do grupo online: Judaísmo Nordestino.
Eis os nomes dos principais apoiadores desta obra
através deste grupo:
331
O Chaver Tzuriel Alencar – judeu de Caruaru,
universitário (cursando Letras) – Caruaru-PE.
A Chaverá Chadassá Alencar – judia de Caruaru,
Técnica em Enfermagem – Caruaru-PE.
O Chaver Gamliel Oliveira – judeu de Caruaru, Médico
– Garanhuns-PE.
A Chaverá Shoshaná Monteiro – judia de Caruaru,
Advogada - Garanhuns-PE.
A Chaverá Hosheaná Lima – judia de Caruaru, Auxiliar
de Ensino Primário – Caruaru-PE.
O Chaver Makhnissel Pessoa – judeu de Caruaru,
Microempreendedor – Toritama-PE.
O Chaver Tzadok Melo – judeu de Caruaru,
Universitário (Biomedicina) – Caruaru-PE.
A Chaverá Chulda Santos – judia de Caruaru,
Esteticista - Bezerros-PE.
O Chaver Chassid Melo – judeu de Caruaru, Tecnólogo
– Caruaru-PE.
A Chaverá Rachel Pereira Nogueira – judia de Caruaru,
Supervisora de Cobrança – Caruaru-PE.
O Chaver Kalev Leon – judeu de Caruaru, Call center
do Grupo Provider Caruaru – Caruaru-PE.
O Chaver Yehudá Lacerda – judeu de Caruaru, Suporte
Técnico T.I - Caruaru-PE.
A Chaverá Diná Lacerda – judia de Caruaru, Social
Midia - Caruaru-PE.
O Chaver João Paulo de Lima Rocha – Atendente –
Caruaru-PE.
O Chaver Diangils Gabriel Praxedes Florênncio –
Autônomo – Caruaru-PE.
O Chaver Cícero Batista da Silva – Segurança
Particular – Caruaru-PE.
O Pastor Paulo Adriano de Araújo Curi – Palestrante –
Caruaru-PE.
332
A Chaverá Ana Carolina Ribeiro Silva – Estudante –
Caruaru-PE.
O Mevasser Yaakov Soares de Azevedo – judeu do
Recife, Produtor Musical - Recife-PE.
O Chaver Ricardo Alessandro Silva – Comerciante –
Caruaru-PE.
O Pastor Rodrigo Vital de Sá - Administrador em
segurança pública e privada – Caruaru-PE.
O Chaver Jackson Clemente de Melo – Motorista –
Canhotinho-PE.
O Pastor Iuri Barbosa de Aguiar Castro – Líder
religioso e Advogado – Fortaleza-CE.
O Chaver Silvínio Antônio Rocha Silva – Capitão
Reformado e Advogado – Timon-MA.
O Rosh Marlon Costa Degani – Empresário – Mesquita
– Rj.
O Chaver Miguel Marcello D’Avila – Advogado – Rio
de Janeiro-RJ.
O Chaver Afonso Valdevino – Vigilante – Resende-RJ.
O Pastor Fernando Souza dos Santos – Funcionário
Público - Nova Iguaçu-RJ.
O Chaver João Jorge Carvalho dos Santos –
Aposentado - Volta Redonda-RJ.
O Chaver Antonio Celso Marques Ralha – Caldeireiro
– Taubaté-SP.
O Chaver Reinaldo Bispo Correia – Lojista – Osasco-
SP.
A Chaverá Claudia Miriam Costa Bezerra - Tecnóloga
em Processos Gerências – São Paulo-SP.
O Chaver Aldair Pereira Dias - Militar do Exército em
São Paulo – São Paulo-SP.
O Pastor Fernando Lima da Cruz - Frentista de Posto –
Sorocaba-SP.
333
O Pastor Edson Waldemar Dias - Servidor Público -
Guapó-GO.
O Chaver Israel Barbosa Carrijo – Construtor -
Mineiros GO.
O Chaver Ézio Brasilino Prudêncio Da Silva –
Eletricista e Empresário - Montes Claros-MG.
O Rav Kefah Ben Yehudá - Gerente em espaço para
eventos – Brasília-DF.
O Rosh Betzalel Ben Avraham - Líder da Kahal
Maguén Avraham – Joinville-SC.
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335
Outras obras publicadas pelos Judeus de Caruaru
336