Introdução À Inspeção Escolar
Introdução À Inspeção Escolar
Introdução À Inspeção Escolar
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Sumário
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NOSSA HISTÓRIA
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INSPEÇÃO ESCOLAR: do controle à democratização do
ensino
INTRODUÇÃO
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integram, assim como, as restrições e proibições de ações, tendo em vista o
funcionamento correto e legal dos serviços.
Segundo Lawn (2001 apud Augusto), a inspeção é uma das ferramentas que
regula e controla o funcionamento das escolas.
De acordo com Senore (apud Augusto, 2010), a inspeção precisa ser vista
como um processo de mediação e suas ações devem estar fundamentadas em uma
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conduta ética, deontológica, para evitar assim, as decisões arbitrárias dos inspetores.
Esta conduta contribuiria para uma nova definição das ações do inspetor, que estaria
orientado para exercer a função de acompanhador e formador, diferente daquela de
controlador e vigilante.
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orientação educacional. De acordo com essa lei, o inspetor deve ter graduação em
pedagogia ou pós-graduação:
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pedagógica e de inspeção, tendo os do ensino primário e secundário ficado
integrados nas respectivas Direções Gerais e a fiscalização dos estabelecimentos do
ensino particular na dependência da Inspeção Geral do Ensino Particular, organismo
criado para o efeito, pelo Dec. nº 22:842 de 18 de Julho. Assim continuaram, mesmo
após a publicação da Lei nº 1:941, de 11 de Abril de 1936, que remodelou o Ministério
da Instrução Pública e criou o Ministério da Educação Nacional.
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concepção, planeamento, acompanhamento e de execução da atividade inspetava,
bem como serviços de apoio técnico e de apoio administrativo. Na atual estrutura, o
corpo incentivo distribui-se por duas grandes áreas de intervenção - a pedagógica e
a administrativa e financeira, e está afeto a 4 núcleos de inspeção e 4 divisões (SC)
e a 4 delegações regionais (DRA,DRC,DRL,DRN), chefiadas por delegados regionais
de que dependem os diretores do gabinete de apoio técnico-incentivo (GATI), sendo,
aqueles, serviços desconcentrados da IGE.
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30 de Março de 1933, à reorganização dos serviços de administração, de orientação
pedagógica, de inspeção e disciplinares do ensino primário, pretendendo, com isso,
criar uma “armadura de proteção” contra os inimigos do regime. Este decreto, que
esteve em vigor quase quatro décadas, cristalizou as ideias do Estado Novo em dotar-
se de um instrumento de inspeção adequado. As medidas então implementadas são
consideradas, pelo próprio legislador, “como um passo na sucessão lógica a que
pertencem outras medidas legislativas da Ditadura Nacional”.
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informação por vias intermédias. Visto ser a única fonte de informação sobre
colocações, legislação e didática, os professores viam-se obrigados a lê-la. Aliás, os
inspectores e diretores escolares, nas suas visitas às escolas, verificavam se havia o
último número na sala de aula.
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A Direção-geral do Ensino Primário foi extinta pelo Decreto-Lei nº 45/73, de 12
de Fevereiro, que criou a Direção-geral do Ensino Básico, constituída pelos seguintes
órgãos e serviços: Conselho Pedagógico; Serviços de Inspeção; Direção de Serviços
do Ensino Primário; Direção de Serviços do Ensino Preparatório; Divisão do Ensino
Especial; Divisão da Educação Pré-Escolar, Gabinete Técnico de Estudos e
Programação; Serviços do Ensino Básico Português no Estrangeiro; Repartição
Administrativa. Os Serviços de Inspeção do Ensino Primário e os Serviços de
Inspeção do Ensino Preparatório eram, cada um deles, dirigidos por um inspector
superior designado pelo diretor-geral.
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verificação da conformidade dos atos dos professores para com os normativos
burocráticos definidos, o que muitas vezes nem chegava a acontecer. Outra das
razões porque a ação inspetava não se ocupava mais da parte pedagógica era a
importância da função disciplinar. Esta absorvia-lhes a maior parte da atividade
quotidiana, pelas diligências inerentes aos próprios processos disciplinares.
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mera prestação do serviço público de educação” (p. 26), conviveremos com o carácter
centralista e burocrático da administração educativa.
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primeiros tempos, o inspector Joaquim Tomás, apresenta aquele que é, na sua óptica,
o equilíbrio desejável:
Ontem como hoje, foi o facto de se revestir de funções disciplinares que trouxe
para a inspeção escolar a conotação negativa que historicamente a tem
acompanhado. Mesmo que se situasse aí a sua funcionalidade política, os atores
envolvidos na instituição dificilmente o poderiam reconhecer ou mesmo assumir.
Numa interessante sequência de artigos, significativamente dedicada ao tema da
“inspeção na escola de hoje”, um professor, Virgílio Boto, fala na necessidade duma
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“inspeção no sentido moderno”, em oposição à “inspeção no sentido tradicional”, que
possa dar resposta a um contexto em que as tarefas da inspeção se complexificam,
se revestem de um carácter cada vez mais científico, obrigando a um rigoroso
planeamento; e conclui: “O autoritarismo ilógico cedeu o lugar a uma ação e
finalidade” (Boto, 1956, Outubro).
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‘Eu não quero – afirma – que o mestre seja uma biblioteca, mas sim que ele
seja um semeador da Boa Nova’. E mais adiante, a finalizar: - ‘Eu quero que a escola
seja política: uma política nobre e elevada, nacionalista e cristã – a verdadeira
política’.(Pinto, 1941, Maio)
No mesmo curso foi igualmente orador o Bispo de Vila Real, que aproveitou
para enaltecer a ação do Estado Novo, designadamente por ter reintroduzido a moral
cristã nas escolas portuguesas. A última sessão “terminou com ‘vivas’ a Carmona e
Salazar, que foram entusiasticamente correspondidos, segundo o articulista” (Pinto,
1941, Maio).
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e alunos – a chamada “revista do asseio” -, o cumprimento dos horários, o adequado
preenchimento dos “livros de escrituração”, a ordem expressa (ou não) pelo ambiente
escolar, para além da atividade letiva de alunos e professores. Tudo deveria concorrer
para que a escola cumprisse a sua dupla função de normalização dos
comportamentos e de “civilização dos costumes” dos futuros adultos, isto à luz dos
padrões morais dominantes. Na sequência de uma visita que, desse ponto de vista,
o decepcionara, em particular pela falta de cuidado pessoal da parte da professora,
afirma António Leal:
A autoridade do inspector
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comuns, alguém bateu à porta. – Quem será a esta hora?! Muito fácil a uma criança
alvoroçar-se; alvoroçaram-se todas um pouco: é que era um senhor e entrou na sala.
Pois entrou e, muito simpaticamente, mandou continuar a professora . . .
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fica, no entanto, claro que essa não é a situação habitualmente vivida no “terreno”. É
o inspector Martins quem mais demoradamente trata esta questão:
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Se esta [a lição] não satisfez totalmente, também não desagradou de modo a
ser condenada. Naturalmente alguns reparos para que, no futuro, a senhora
professora fizesse um ensino mais ativo, mais dado à observação e à experimentação,
que favorecesse o agir do raciocínio e levasse à aplicação autêntica dos
conhecimentos que iam sendo descobertos ou adquiridos. (Silva, 1968, Agosto)
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das referências à Educação Nova, ainda que numa leitura conservadora, não deixa
de nos interpelar e, em particular, de nos alertar para a complexidade dos fenómenos
históricos e para a necessidade de evitar interpretações mais ou menos redutoras,
mesmo quando sentimos postas em causa algumas das convicções associadas ao
nosso senso comum.
Não obstante o que atrás fica dito, e de forma algo paradoxal, os traços
tendentes à afirmação de uma gradual consciência profissional – e de que A. Nóvoa
(1987) fez a história –continuam a marcar presença. O corpus documental por nós
analisado dá bem conta desse facto, em articulação com a atividade da inspeção
escolar, de que é exemplo a seguinte afirmação: “[Os professores] querem o seu
aperfeiçoamento: desejam o conhecimento de novas técnicas de ensino que lhes
facilitem a sua ação” (Os novos inspectores-orientadores do ensino primário, 1971,
Maio). No rescaldo das observações feitas pelo inspetor, Rosinda de Oliveira afirma
terem sido elas “recebidas com a correspondente e humilde compreensão de quem
tem o gosto e o dever de se aperfeiçoar” (Oliveira, 1965, Março).
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reflexões e as teorizações recentes sobre o prático reflexivo não deixa de nos
interpelar de alguma forma.
Qual a imagem do “bom professor” que se expressa através dos textos por nós
analisados? A mais significativa síntese é, porventura, até pela retórica subjacente, a
que nos é proposta pelo diretor escolar Alberto Pires, inspirado no exemplo da
professora de uma das escolas visitadas:
Acrescentemos mais alguns traços aos já esboçados. Irene Lisboa apela a que
o professor “ame a sua profissão e a honre” e que cumpra “os seus deveres
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escolares”, assumindo-se assim como um “exemplo moral” para as populações
(Lisboa, 1936, Agosto). Para além das preocupações deontológicas visíveis na
autora, segundo a qual o professor deve ser zeloso, firme, inteligente, compreensivo,
generoso e tolerante, destaque-se aqui a presença do tema da exemplaridade do
mestre, uma constante no pensamento pedagógico de vários tempos e quadrantes.
Rosinda de Oliveira acrescenta outra ideia: “[É] muito fácil ensinar, quando se é capaz
de amar” (Oliveira, 1965, Março); estamos perante o reconhecimento da importância
da dimensão afetiva e sentimental no exercício da profissão, um traço também ele
típico do discurso dos professores e componente importante das suas referências
identitárias.
Uma das mais interessantes questões debatidas nesta fase é a que podemos
apresentar como se segue. Como formar um inspector? Que componentes intervêm
nessa formação? Em que contexto institucional? É de novo Joaquim Tomás quem
assume uma posição mais definida a esse respeito. Partindo do princípio de que “não
pode a função inspetava confiar-se a qualquer pessoa, por melhor intencionada que
seja”, pela responsabilidade e complexidade que lhe são inerentes, o autor defende
uma conveniente preparação dos inspectores – uma “cultura superior”, nas suas
palavras – adquirida, sobretudo, através do estudo das “ciências que se relacionam
com a educação”; e, em conformidade, conclui: “somos de opinião que os cursos para
inspectores devem ser integrados na Universidade” (Tomás, 1929, Julho).
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Outra das condições apresentadas por Joaquim Tomás é que os futuros
inspectores tenham, necessariamente, que possuir alguns anos de experiência de
ensino ao nível da instrução primária, ou seja, que sejam profissionais do ofício,
porque, justifica, “quem não é capaz de ser um bom professor, não pode ser um bom
inspector”. Essa afirmação não conduz, no entanto, à sobrevalorização da prática –
esta pode conduzir à rotina, reconhece-se noutro lado -, antes “é indispensável que
nas funções inspetavas a prática ande sempre aliada à teoria” (Tomás, 1929,
Dezembro). Para além da preocupação do autor com a valorização da função e da
figura do inspector, não nos deixa de surpreender pela sua atualidade esta visão
harmoniosa da relação entre as componentes teórica e prática da formação
profissional.
Não deixa de ser uma imagem algo paradoxal, a anteriormente traçada. Era o
inspector escolar que assumia, na vida escolar, o propósito salazarista de tudo vigiar
e de tudo controlar. Era ele, também, o braço disciplinar que atingia aqueles que, num
sentido ou noutro, se desviavam da norma instituída pelo regime autoritário. Mas o
discurso dos inspectores escolares contém, igualmente, uma ambivalência, por vezes
a contracorrente do discurso oficial, que conduz à valorização da dimensão
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pedagógica da sua atividade, ao apelo ao aperfeiçoamento profissional dos
professores, à busca da melhoria da qualidade de ensino ou à proposta de métodos
ativos e centrados no aluno. Corresponde este discurso, de alguma forma, à realidade
ou representa, antes, a idealização da atividade inspetava, produzida, a partir do
interior da mesma, pela elite dos atores nela envolvidos e como resposta ao
desconforto resultante do seu desempenho? Esta é, naturalmente, uma questão a ser
retomada, no diálogo com outras fontes e no quadro do projeto de que decorre a
presente comunicação, designadamente fontes de arquivo (como os relatórios de
inspeção) e testemunhos orais de professores e de inspectores.
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atualmente. Ele terá que saber lidar com as mudanças culturais, comportamentais,
sociais e tecnológicas que vem surgindo.
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sociedade em seu contexto. O processo democrático e participativo exige
envolvimento de todos e o estabelecimento de vínculos de liderança e tomada de
decisão compartilhada.
Para Tavares e Escott (2005), o inspetor deve ser criador de espaços que
favoreçam novas relações dentro das escolas para que os alunos, os pais,
professores e funcionários se transformem numa equipe capaz de construir uma
escola voltada para a aprendizagem do aluno e sua formação como cidadão
comprometido com o desenvolvimento da sociedade. O inspetor deve também estar
preparado para se deparar com dificuldades, ser capaz de trabalhar causas e não
efeitos, estimular pensamentos transformadores, mudar posturas, articular
informações e ações, lutar contra as condições precárias de trabalho e lidar com
incertezas e imprevistos.
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Pretendeu-se com essa pesquisa mostrar a evolução do papel do inspetor
escolar com a democratização do ensino, observando a origem da inspeção escolar
e sua importância para a qualidade da educação e discutir a atuação do inspetor no
passado e nos tempos atuais, bem como repensar o perfil necessário a esse
profissional numa sociedade que privilegia cada vez mais a democratização do
ensino.
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Referências
Afonso, N. (1998). A Inspeção-geral da Educação e as Transformações do
Sistema Educativo. InActas 1ª Conferência Nacional da Inspeção-geral da Educação
(pp. 25-34). Coimbra: SCARPA.
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Lisboa, I. (1928, Janeiro). Escola Primária, 6-7.
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Tomás, J. (1929, Dezembro). Cursos para inspectores escolares. Revista
Escolar, 10, 577-582. Tomás, J. (1932, Julho). Inspecção escolar. A Escola Primária,
7, 99-101.
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