Ficha 4 - Textos Modernistas

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FICHA DE EXERCÍCIOS 4 – 2º BIMESTRE – LÍNGUA PORTUGUESA – PROFESSORA GIULIA QUEIROZ

MODERNISMO BRASILEIRO

Moça Linda Bem Tratada – Mário de Andrade Erro de português – Oswald de Andrade (1927)
(1922) Quando o português chegou
Moça linda bem tratada, Debaixo de uma bruta chuva
Três séculos de família, Vestiu o índio
Burra como uma porta: Que pena!
Um amor. Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
Grã-fino do despudor, O português.
Esporte, ignorância e sexo,
Burro como uma porta: Pronominais – Oswald de Andrade (1925)
Um coió. Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Mulher gordaça, filó, Do professor e do aluno
De ouro por todos os poros E do mulato sabido
Burra como uma porta: Mas o bom negro e o bom branco
Paciência... Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Plutocrata sem consciência, Deixa disso camarada
Nada porta, terremoto Me dá um cigarro.
Que a porta de pobre arromba: ___________________________________________
Uma bomba.
___________________________________________ Mãos Dadas – Carlos Drummond de Andrade
(1940)
Poética – Manuel Bandeira (1922) Não serei o poeta de um mundo caduco.
Estou farto do lirismo comedido Também não cantarei o mundo futuro.
Do lirismo bem comportado Estou preso à vida e olho meus companheiros
Do lirismo funcionário público com livro de ponto Estão taciturnos, mas nutrem grandes esperanças.
espediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. Entre eles, considere a enorme realidade.
diretor. O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo. não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na
janela.
Abaixo os puristas. não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Todas as palavras sobretudo os barbarismos não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
universais O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os
Todas as construções sobretudo as sintaxes de homens presentes,
exceção a vida presente.
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
________________________________________________
Estou farto do lirismo namorador
Político Canto de regresso à pátria – Oswald de Andrade (1925)
Minha terra tem palmares
Raquítico Onde gorjeia o mar
Sifilítico Os passarinhos daqui
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora Não cantam como os de lá
de si mesmo. Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
De resto não é lirismo Minha terra tem mais ouro
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do Minha terra tem mais terra
amante exemplar com cem modelos de cartas e as Ouro terra amor e rosas
diferentes maneiras de agradar & agraves mulheres, Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
etc. Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Quero antes o lirismo dos loucos Sem que volte pra São Paulo
O lirismo dos bêbados Sem que veja a Rua 15
O lirismo difícil e pungente dos bêbados E o progresso de São Paulo.
O lirismo dos clowns de Shakespeare.

- Não quero saber do lirismo que não é libertação.


No Meio do Caminho – Carlos Drummond de Andrade Manifesto futurista – Filippo Marinetti (1909)
(1928)
No meio do caminho tinha uma pedra 1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia
tinha uma pedra no meio do caminho e da temeridade.
tinha uma pedra 2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos
no meio do caminho tinha uma pedra. essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o
Nunca me esquecerei desse acontecimento extase, o sono. Nós queremos exaltar o
na vida de minhas retinas tão fatigadas. movimento agressivo, a insônia febril, o passo de corrida, o
Nunca me esquecerei que no meio do caminho salto mortal, o bofetão e o soco.
tinha uma pedra 4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-
tinha uma pedra no meio do caminho se de uma beleza nova: a beleza da
no meio do caminho tinha uma pedra. velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado
com tubos grossos, semelhantes a
________________________________________________ serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que
correr sobre a metralha, é mais bonito
Solidariedade – Murilo Mendes (1941) que a Vitória de Samotrácia.
Sou ligado pela herança do espírito e do sangue 5. Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o
Ao mártir, ao assassino, ao anarquista. volante, cuja haste ideal atravessa a Terra,
Sou ligado lançada também numa corrida sobre o circuito da sua órbita.
Aos casais na terra e no ar, 6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, fausto e
Ao vendeiro da esquina, munificiência, para aumentar o entusiástico
Ao padre, ao mendigo, à mulher da vida, fervor dos elementos primordiais.
Ao mecânico, ao poeta, ao soldado, 7. Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que
Ao santo e ao demônio, não tenha um caráter agressivo pode ser
Construídos à minha imagem e semelhança. uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um
violento assalto contra as forças
________________________________________________ desconhecidas, para obrigá-las a prostar-se diante do
homem.
Motivo – Cecília Meireles (1963) 8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!... Por
Eu canto porque o instante existe que haveríamos de olhar para trás, se
e a minha vida está completa. queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O
Não sou alegre nem sou triste: Tempo e o Espaço morreram ontem.
sou poeta. Nós já estamos vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna
velocidade onipresente.
Irmão das coisas fugidias, 9. Nós queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo
não sinto gozo nem tormento. - o militarismo, o patriotismo, o gesto
Atravesso noites e dias destruidor dos libertários, as belas idéias pelas quais se morre
no vento. e o desprezo pela mulher.
10. Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as
Se desmorono ou se edifico, academia de toda natureza, e combater o
se permaneço ou me desfaço, moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.
— não sei, não sei. Não sei se fico 11. Nós cantaremos as grandes multidões agitadas pelo
ou passo. trabalho, pelo prazer ou pela sublevação;
cantaremos as marés multicores e polifônicas das revoluções
Sei que canto. E a canção é tudo. nas capitais modernas; cantaremos o
Tem sangue eterno a asa ritmada. vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros
E um dia sei que estarei mudo: incendiados por violentas luas elétricas; as
— mais nada. estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam;
as oficinas penduradas às nuvens pelos
________________________________________________ fios contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a
ginastas gigantes que cavalgam os rios,
A Rua – Cassiano Ricardo (1947) faiscantes ao sol com um luzir de facas; os piróscafos
Bem sei que, muitas vezes, aventurosos que farejam o horizonte, as
o único remédio locomotivas de largo peito, que pateiam sobre os trilhos,
é adiar tudo. É adiar a sede, a fome, a viagem, como enormes cavalos de aço enleados de
a dívida, o divertimento, carros; e o voo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento,
o pedido de emprego, ou a própria alegria. como uma bandeira, e parece
A esperança é também uma forma aplaudir como uma multidão entusiasta.
de contínuo adiamento. É da Itália, que nós lançamos pelo mundo este nosso
Sei que é preciso prestigiar a esperança, manifesto de violência arrebatadora e
numa sala de espera. incendiária, com o qual fundamos hoje o "Futurismo", porque
Mas sei também que espera significa luta e não, queremos libertar este país de sua
[apenas, fétida gangrena de professores, de arqueólogos, de cicerones
esperança sentada. e de antiquários.
Não abdicação diante da vida. Já é tempo de a Itália deixar de ser um mercado de
belchiores. Nós queremos libertá-la dos
A esperança inúmeros museus que a cobrem toda de inúmeros cemitérios.
nunca é a forma burguesa, sentada e tranquila da Museus: cemitérios!... Idênticos, na verdade, pela sinistra
[espera. promiscuidade de tantos corpos que não
se conhecem. Museus: dormitórios públicos em que se
Nunca é a figura de mulher descansa para sempre junto a seres odiados
do quadro antigo. ou desconhecidos! Museus: absurdos matadouros de
Sentada, dando milho aos pombos. pintores e escultores, que se vão trucidando
ferozmente a golpes de cores e linhas, ao longo das paredes Tinha havido a inversão de tudo, a invasão de tudo: o teatro
disputadas! de base e a luta no palco entre morais e imorais. A
Que se vá lá em peregrinação, uma vez por ano, como se vai tese deve ser decidida em guerra de sociólogos, de homens
ao Cemitério no dia de finados... de lei, gordos e dourados como Corpus Juris.
Passe. Que uma vez por ano se deponha uma homenagem Ágil o teatro, filho do saltimbanco. Ágil e ilógico. Ágil o
de flores diante da Gioconda, concedo... romance, nascido da invenção. Ágil a poesia.
Mas não admito que se levem passear, diariamente pelos A poesia Pau-Brasil, ágil e cândida. Como uma criança.
museus, nossas tristezas, nossa frágil Uma sugestão de Blaise Cendrars: - Tendes as locomotivas
coragem, nossa inquietude doentia, mórbida. Para que se cheias, ides partir. Um negro gira a manivela do desvio
envenenar? Para que apodrecer? rotativo em que estais. O menor descuido vos fará partir na
E o que mais se pode ver, num velho quadro, senão a direção oposta ao vosso destino.
fatigante contorção do artista que se esforçou Contra o gabinetismo, a prática culta da vida. Engenheiros em
para infrigir as insuperáveis barreiras opostas ao desejo de vez de jurisconsultos, perdidos como chineses na
exprimir inteiramente seu sonho?... genealogia das idéias.
Admirar um quadro antigo equivale a despejar nossa A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica.
sensibilidade numa urna funerária, no lugar de A contribuição milionária de todos os erros. Como
projetá-la longe, em violentos jatos de criação e de ação. falamos. Como somos.
Vocês querem, pois, desperdiçar todas as suas melhores Não há luta na terra de vocações acadêmicas. Há só fardas.
forças nesta eterna e inútil admiração do Os futuristas e os outros.
passado, da qual vocês só podem sair fatalmente exaustos, Uma única luta - a luta pelo caminho. Dividamos: poesia de
diminuídos e pisados? importação. E a Poesia Pau-Brasil, de exportação.
Em verdade eu lhes declaro que a frequência diária aos Houve um fenômeno de democratização estética nas cinco
museus, às bibliotecas e às academias partes sábias do mundo. Instituíra-se o naturalismo.
(cemitérios de esforços vãos, calvários de sonhos Copiar. Quadro de carneiros que não fosse lã mesmo, não
crucificados, registro de arremessos truncados!...) prestava. A interpretação no dicionário oral das Escolas de
é para os artistas tão prejudicial, quanto a tutela prolongada Belas Artes queria dizer reproduzir igualzinho...Veio a
dos pais para certos jovens ébrios de pirogravura. As meninas de todos os lares ficaram artistas.
engenho e de vontade ambiciosa. Para os moribundos, para Apareceu a máquina fotográfica. E com todas as
os enfermos, para os prisioneiros, vá lá:- prerrogativas do cabelo grande, da caspa e da misteriosa
o admirável passado é, quiçá, um bálsamo para seus males, genialidade
visto que para eles o porvir está de olho virado - o artista fotográfico.
trancado... Mas nós não queremos nada com o passado, nós, Na música, o piano invadiu as saletas nuas, de folhinha na
jovens e fortes futuristas! parede. Todas as meninas ficaram pianistas. Surgiu
E venham, pois, os alegres incendiários de dedos o piano de manivela, o piano de patas. A pleyela. E a ironia
carbonizados! Ei-los! Ei-los!... Vamos! Ateiem eslava compôs para a pleyela. Straviski.
fogo às estantes das bibliotecas!... Desviem o curso dos A estatuária andou atrás. As procissões saíram novinhas das
canais, para inundar os museus!... Oh! a fábricas.
alegria de ver boiar à deriva, laceradas e desbotadas sobre Só não se inventou uma máquina de fazer versos - a havia o
aquelas águas, as velhas telas gloriosas!... poeta parnasiano.
Empunhem as picaretas, os machados, os martelos e Ora, a revolução indicou apenas que a arte voltava para as
destruam sem piedade as cidades veneradas! elites. E as elites começaram desmanchando. Duas
________________________________________________ fases: 1a) a deformação através do impressionismo, a
fragmentação, o caos voluntário. De Cézanne e Malarrmé,
MANIFESTO DA POESIA PAU–BRASIL – Oswald de Rodin
Andrade (1924) e Debussy até agora. 2a) o lirismo, a apresentação no templo,
os materiais, a inocência construtiva.
A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre O Brasil profiteur. O Brasil doutor. E a coincidência da primeira
nos verdes da Favela, sob o azul cabralino, são construção brasileira no movimento de
fatos estéticos. reconstrução geral. Poesia Pau-Brasil.
O Carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raça. Pau- Como a época é miraculosa, as leis nasceram do próprio
Brasil. Wagner submerge ante os cordões de rotamento dinâmico dos fatores destrutivos.
Botafogo. Bárbaro e nosso. A formação étnica rica. Riqueza A síntese
vegetal. O minério. A cozinha. O vatapá, o ouro e a dança. O equilíbrio
Toda a história bandeirante e a história comercial do Brasil. O O acabamento de carrosserie
lado doutor, o lado citações, o lado autores conhecidos. A invenção
Comovente. Rui Barbosa: uma cartola na Senegâmbia. Tudo A surpresa
revertendo em riqueza. A riqueza dos bailes e das frases Uma nova perspectiva
feitas. Negras de jockey. Odaliscas no Catumbi. Falar difícil. Uma nova escala
O lado doutor. Fatalidade do primeiro branco aportado e Qualquer esforço natural nesse sentido será bom. Poesia
dominando politicamente as selvas selvagens. O Pau-Brasil.
bacharel. Não podemos deixar de ser doutos. Doutores. País O trabalho contra o detalhe naturalista - pela síntese; contra
de dores anônimas, de doutores anônimos. O Império foi a morbidez romântica - pelo equilíbrio geômetra e
assim. Eruditamos tudo. Esquecemos o gavião de penacho. pelo acabamento técnico; contra a cópia, pela invenção e pela
A nunca exportação de poesia. A poesia anda oculta nos cipós surpresa.
maliciosos da sabedoria. Nas lianas da saudade Uma nova perspectiva.
universitária. A nova, a de Paolo Ucello criou o naturalismo de apogeu. Era
Mas houve um estouro nos aprendimentos. Os homens que uma ilusão de ótica. Os objetos distantes não
sabiam tudo se deformaram como borrachas diminuíam. Era uma lei de aparência. Ora, o momento é de
sopradas. Rebentaram. reação à aparência. Reação à cópia. Substituir a
A volta à especialização. Filósofos fazendo filosofia, críticos, perspectiva visual e naturalista por uma perspectiva de outra
crítica, donas de casa tratando de cozinha. ordem: sentimental, intelectual,
A Poesia para os poetas. Alegria dos que não sabem e irônica, ingênua.
descobrem. Uma nova escala:
A outra, a de um mundo proporcionado e catalogado com Filhos do sol, mãe dos viventes. Encontrados e amados
letras nos livros, crianças nos colos. O reclame ferozmente, com toda a hipocrisia da saudade, pelos
produzindo letras maiores que torres. E as novas formas da imigrados, pelos traficados e pelos touristes. No país da cobra
indústria, da viação, da aviação. Postes. Gasômetros Rails. grande.
Laboratórios e oficinas técnicas. Vozes e tics de fios e ondas Foi porque nunca tivemos gramáticas, nem coleções de
e fulgurações. Estrelas familiarizadas com negativos velhos vegetais. E nunca soubemos o que era urbano,
fotográficos. O correspondente da surpresa física em arte. suburbano, fronteiriço e continental. Preguiçosos no mapa-
A reação contra o assunto invasor, diverso da finalidade. A múndi do Brasil.
peça de tese era um arranjo monstruoso. O romance Uma consciência participante, uma rítmica religiosa.
de idéias, uma mistura. O quadro histórico, uma aberração. A Contra todos os importadores de consciência enlatada. A
escultura eloqüente, um pavor sem sentido. existência palpável da vida. E a mentalidade pré-lógica
Nossa época anuncia a volta ao sentido puro. para o Sr. Lévy-Bruhl estudar.
Um quadro são linhas e cores. A estatuária são volumes sob Queremos a Revolução Caraíba
a luz. Maior que a revolução Francesa. A unificação de todas as
A Poesia Pau-Brasil é uma sala de jantar das gaiolas, um revoltas eficazes na direção do homem. Sem nós a Europa
sujeito magro compondo uma valsa para flauta e a não teria sequer a sua pobre declaração dos direitos do
Maricota lendo o jornal. No jornal anda todo o presente. homem.
Nenhuma fórmula para a contemporânea expressão do A idade de ouro anunciada pela América. A idade de ouro. E
mundo. Ver com olhos livres. todas as girls.
Temos a base dupla e presente - a floresta e a escola. A raça Filiação. O contato com o Brasil Caraíba. Ori Villegaignon
crédula e dualista e a geometria, a álgebra e a print terre. Montaigne. O homem natural. Rosseau. Da
química logo depois da mamadeira e do chá de erva-doce. Revolução Francesa ao Romantismo, à Revolução
Um misto de "dorme nenê que o bicho vem pegá" e de Bolchevista, à revolução Surrealista e ao bárbaro tecnizado
equações. de Keyserling. Caminhamos.
Uma visão que bata nos cilindros dos moinhos, nas turbinas Nunca fomos catequizados. Vivemos através de um direito
elétricas, nas usinas produtoras, nas questões sonâmbulo. Fizemos Cristo nascer na Bahia. Ou em
cambiais, sem perder de vista o Museu Nacional. Pau-Brasil. Belém do Pará.
Obuses de elevadores, cubos de arranha-céus e a sábia Mas nunca admitimos o nascimento da lógica entre nós.
preguiça solar. A reza. O Carnaval. A energia íntima. O Contra o Padre Vieira.
sabiá. A hospitalidade um pouco sensual, amorosa. A Autor do nosso primeiro empréstimo, para ganhar comissão.
saudade dos pajés e os campos de aviação militar. Pau- O rei-analfabeto disseralhe: ponha isso no papel mas sem
Brasil. muita lábia. Fez-se o empréstimo. Gravou-se o açúcar
O trabalho da geração futurista foi ciclópico. Acertar o relógio brasileiro. Vieira deixou o dinheiro em Portugal e nos trouxe a
império da literatura nacional. lábia.
Realizada essa etapa, o problema é outro. Ser regional e puro O espírito recusa-se a conceber o espírito sem o corpo. O
em sua época. antropomorfismo. Necessidade da vacina antropofágica. Para
O estado de inocência substituindo o estado de graça que o equilíbrio contra as religiões de meridiano. E as inquisições
pode ser uma atitude do espírito. exteriores.
O contrapeso da originalidade nativa para inutilizar a adesão Só podemos atender ao mundo orecular.
acadêmica. Tínhamos a justiça codificação da vingança. A ciência
A reação contra todas as indigestões de sabedoria. O melhor codificação da Magia. Antropofagia. A transformação
de nossa tradição lírica. O melhor de nossa permanente do Tabu em totem.
demonstração moderna. Contra o mundo reversível e as idéias objetivadas.
Apenas brasileiros de nossa época. O necessário de química, Cadaverizadas. O stop do pensamento que é dinâmico. O
de mecânica, de economia e de balística. Tudo indivíduo vítima do sistema. Fonte das injustiças clássicas.
digerido. Sem meeting cultural. Práticos. Experimentais. Das injustiças românticas. E o esquecimento das conquistas
Poetas. Sem reminiscências livrescas. Sem comparações de interiores.
apoio. Sem pesquisa etimológica. Sem ontologia. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros.
Bárbaros, crédulos, pitorescos e meigos. Leitores de jornais. Roteiros.
Pau-Brasil. A floresta e a escola. O Museu O instinto Caraíba.
Nacional. A cozinha, o minério e a dança. A vegetação. Pau- Morte e vida das hipóteses. Da equação eu parte do Cosmos
Brasil. ao axioma Cosmos parte do eu. Subsistência.
Conhecimento. Antropofagia.
________________________________________________ Contra as elites vegetais.
Em comunicação com o solo.
Manifesto Antropófago – Oswald de Andrade (1928) Nunca fomos catequizados. Fizemos foi o Carnaval. O índio
vestido de senador do Império. Fingindo de Pitt. Ou
Só a ANTROPOFAGIA nos une. Socialmente. figurando nas óperas de Alencar cheio de bons sentimentos
Economicamente. Filosoficamente. portugueses.
Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os Já tínhamos o comunismo. Já tínhamos a língua surrealista.
individualismos, de todos os coletivismos. De todas as A idade de ouro.
religiões. De todos os tratados de paz. Catiti Catiti
Tupi, or not tupi that is the question. Imara Notiá
Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos. Notiá Imara
Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do Ipeju
antropófago. A magia e a vida. Tínhamos a relação e a distribuição dos
Estamos fatigados de todos os maridos católicos suspeitos bens físicos, dos bens morais, dos bens dignários. E
postos em sabíamos transpor o mistério e a morte com o auxílio de
drama. Freud acabou com o enigma mulher e com os sustos algumas formas gramaticais.
da psicologia impressa. Perguntei a um homem o que era o Direito. Ele me respondeu
O que atropelava a verdade era a roupa, o impermeável entre que era a garantia do exercício da possibilidade.
o mundo interior e o mundo exterior. A reação Esse homem chama-se Galli Mathias. Comi-o.
contra o homem vestido. O cinema americano informará. Só não há determinismo onde há o mistério. Mas que temos
nós com isso?
Contra as histórias do homem que começam no Cabo
Finisterra.
O mundo não datado. Não rubricado.
Sem Napoleão. Sem César.
A fixação do progresso por meio de catálogos e aparelhos de
televisão. Só a maquinaria. E os transfusores de sangue.
Contra as sublimações antagônicas. Trazidas nas caravelas.
Contra a verdade dos povos missionários, definida pela
sagacidade de um antropófago, o Visconde de Cairu: - É
mentira muitas vezes repetida.
Mas não foram cruzados que vieram. Foram fugitivos de uma
civilização que estamos comendo, porque somos
fortes e vingativos como o Jabuti.
Se Deus é a consciência do universo Incriado, guaraci é a
mãe dos viventes. Jaci é a mãe dos vegetais.
Não tivemos especulação. Mas tínhamos adivinhação.
Tínhamos Política que é a ciência da distribuição. E um
sistema social-planetário.
As migrações. A fuga dos estados tediosos. Contra as
escleroses urbanas. Contra os Conservatórios e o tédio
especulativo.
De William James e Voronoff. A transfiguração do Tabu em
totem. Antropofagia.
O pater famílias e a criação da Moral da Cegonha: Ignorância
real das coisas + fala (sic.) de imaginação + sentimento de
autoridade ante a prole curiosa.
É preciso partir de um profundo ateísmo para se chegar à
idéia de Deus. Mas a caraíba não precisava. Porque tinha
Guaraci.
O objetivo criado reage como os Anjos da Queda. Depois
Moisés divaga. Que temos nós com isso?
Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha
descoberto a felicidade.
Contra o índio de tocheiro. O índio filho de Maria, afilhado de
Catarina de Médicis e genro de D. Antônio de Mariz.
A alegria é a prova dos nove.
No matriarcado de Pindorama.
Contra a Memória fonte do costume. A experiência pessoal
renovada.
Somos concretistas. As idéias tomam conta, reagem,
queimam gente nas praças públicas. Suprimamos as
idéias e as outras paralisias. Pelos roteiros. Acreditar nos
sinais, acreditar nos instrumentos e nas estrelas.
Contra Goethe, a mãe dos Gracos, e a Corte de D. João VI.
A alegria é a prova dos nove.
A luta entre o que se chamaria Incriado e a Criatura - ilustrada
pela contradição permanente do homem e o seu
Tabu. O amor cotidiano e o modusvivendi capitalista.
Antropofagia. Absorção do inimigo sacro. Para transformá-lo
em totem. A humana aventura. A terrena finalidade. Porém, só
as puras elites conseguiram realizar a antropofagia carnal,
que traz em si o mais alto sentido da vida e evita todos os
males identificados por Freud, males catequistas. O que se
dá não é uma sublimação do instinto sexual. É a escala
termométrica do instinto antropofágico. De carnal, ele se torna
eletivo e cria a amizade. Afetivo, o amor. Especulativo, a
ciência. Desvia-se e transfere-se. Chegamos ao aviltamento.
A baixa antropofagia aglomerada nos pecados de catecismo
- a inveja, a usura, a calúnia, o assassinato. Peste dos
chamados povos cultos e cristianizados, é contra ela que
estamos agindo. Antropófagos. Contra Anchieta cantando as
onze mil virgens do céu, na terra de Iracema, - o patriarca
João Ramalho fundador de São Paulo.
A nossa independência ainda não foi proclamada. Frase típica
de D. João VI: - Meu filho, põe essa coroa na tua
cabeça, antes que algum aventureiro o faça! Expulsamos a
dinastia. É preciso expulsar o espírito bragantino, as
ordenações e o rapé de Maria da Fonte.
Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por
Freud - a realidade sem complexos, sem loucura,
sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de
Pindorama.

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