Carne de Coelho: Do Abate Ao Processamento: Priscila de Oliveira Moraes

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CARNE DE COELHO: DO ABATE AO


PROCESSAMENTO

Priscila de Oliveira Moraes


Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Heloisa Lara Silva


Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Meire Luiza Wirth


Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Sebastião Ferreira Magagnin


Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

'10.37885/230813985
RESUMO

Alguns fatores limitam o aumento do consumo da carne de coelho. A falta de hábito dos
consumidores somado ao alto preço da carne são fatores que desestimulam a compra no
mercado. O objetivo desta revisão foi estudar os principais fatores envolvidos com a qualidade
da carne de coelho no mercado, bem como apresentar como é realizada a classificação e
tipificação de carcaça de coelhos em outros países, apresentando ao final a possibilidade de
processamento como uma alternativa para aumentar a comercialização de produtos cuníco-
las. Para isso, esta revisão foi dividida em 5 tópicos, nos quais são estudados os fatores em
torno do consumo da carne de coelho etapas dentro do abatedouro, principais fatores que
afetam a qualidade da carne, tipificação da carcaça e o processamento da carne de coelho.

Palavras-chave: Insensibilização, Qualidade de Carne, Tipificação de Carcaça.


CONSUMO DE CARNE CUNÍCOLA

A carne de coelho não faz parte da rotina de consumo dos brasileiros, embora seja uma
carne saudável, de um animal extremamente versátil e de fácil produção, sua expressão
ainda é pequena no agronegócio quando comparada a outras carnes. Dados pré-históricos
revelam que o coelho já servia de fonte de alimento para humanos do período Paleolítico,
mas ofereciam as buscas menos recompensantes, pois escapavam com facilidade de fle-
chas e armadilhas, rendiam pouca carne que era, ainda, muito magra (Smil, 2013). Foi na
Península Ibérica, há cerca de 500 mil anos, que o coelho europeu foi domesticado e passou
a ser disseminado para o restante do mundo. Historicamente, na Europa, são comuns os
pratos à base de coelho, porém, devido ao seu pequeno tamanho, sua carcaça é incluída
inteira nos pratos mais tradicionais. Por este motivo são encontrados poucos métodos de
preservação e de processamento ​​da carne.
No ano de 2018, o continente asiático, representado principalmente pela China e a
República Popular Democrática da Coreia contribuíram com 73,3% do volume global de carne
de coelho. A Europa com 20%, com os dois principais países produtores sendo França e
Espanha, o continente africano representa 6% e o americano 1% da produção. Cabe ressal-
tar que diferentes métodos de coleta e fornecimento de dados são utilizados nos diferentes
países e isto pode subestimar o número total da produção. No Brasil, poucas são as informa-
ções e estimativas disponibilizadas, ainda aquelas que existem são pouco confiáveis, pouco
detalhadas e ultrapassadas. Levando em consideração esta informação, os pesquisadores
da Associação Científica Brasileira de Cunicultura, estimaram que a produção de coelhos
fica em torno de 149.150 coelhos mantidos em granjas comerciais, aproximando-se dos
valores daquele estimado pela FAO e pelo IBGE (Machado et al., 2021).
Alguns fatores limitam o aumento do consumo da carne de coelho. Um dos principais
fatores é o alto preço da carne. No Brasil, são poucos os abatedouros de coelhos, fazendo
com que a logística de distribuição da carne torne-se um gargalo, aumentando os valores nas
gôndolas do mercado. Além disso, o coelho também é visto como um animal de companhia.
Com isso, há um interesse crescente em alojamentos de animais visando o bem-estar. É um
grande desafio ao produtor mudar os sistemas de instalação sem interferir na produtividade
e qualidade da carne. A criação em grupos em um sistema a pasto, vem ganhando espaço
no debate do bem-estar animal em substituição às gaiolas convencionais para coelhos,
levando a um alto custo de produção, além de uma alteração no rendimento de carcaça e
qualidade de carne.

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ABATE DE COELHOS

A cadeia de carne cunícola envolve uma série de etapas complexas e inter-relaciona-


das, norteadas pelos princípios do bem-estar animal, que devem ser respeitados em todas
as suas etapas e durante todas as atividades tecnológicas realizadas com os animais.
O manejo pré-abate é considerado crucial para uma produção de carne de coelho de alta
qualidade. Fatores como jejum, carregamento para transporte, transporte de longa distância
em condições ambientais inadequadas, repouso durante o transporte, armazenamento e
métodos de atordoamento podem afetar de forma negativa a qualidade da carne de coelho.
No Brasil, a portaria nº365 de 16 de julho de 2021 apresenta o Regulamento Técnico
de Manejo Pré-abate e Abate Humanitário e os métodos de insensibilização autorizados pelo
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, para os animais de açougue, incluindo
os lagomorfos (MAPA, 2021).

Jejum

A ração do coelho é removida para a evacuação do conteúdo intestinal, reduzindo a


incidência de contaminação fecal que pode ocorrer durante o processamento, o que pode
comprometer a segurança da carne (deterioração e bactérias patogênicas). O tempo de je-
jum é importante, pois pode afetar a qualidade (pH muscular final), rendimento de carcaça
(perda de peso vivo), a segurança da carne (e o bem-estar animal). O tempo total do jejum
engloba a retirada da ração na granja, o transporte e a área de espera no frigorífico. A lite-
ratura descreve que o jejum não deve exceder 9 horas, após esse período, as reservas de
energia se esgotam. Durante as primeiras 12 horas de jejum, os coelhos perdem de 3 a 6%
de seu peso corporal, aumentando para 8–12% em 36–48 horas (Cavani e Petracci; 2006).

Carregamento

O carregamento dos coelhos é, geralmente, feito em caixas projetadas originalmente


para transporte de frangos. O manuseio dos animais pelas pernas ou orelhas é inadequado
e pode causar dor, medo e angústia. Os coelhos devem ser retirados das gaiolas ou do local
onde estão individualmente segurando e levantando pela pele do pescoço (nuca) com uma
mão, com ou sem apoio do corpo com a outra mão. Uma vez fora da gaiola ou recipientes,
seu corpo deve ser apoiado com a outra mão. A região torácica, as pernas e o lombo interno
são, infelizmente, as áreas mais frequentes de se encontrar lesões visíveis apenas após
a remoção da pele. Um levantamento feito por Build et a. (2004) em criadores espanhóis
demonstrou que, em média, os cunicultores levavam 90min para fazer o carregamento e a
mão de obra, em sua maioria, era do próprio abatedouro.

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Transporte

O transporte, incluindo a duração e a densidade de alojamento durante o percurso da


granja para o abatedouro são cruciais para o bem-estar e qualidade da carne. Mudanças
fisiológicas e bioquímicas que ocorrem pelo estresse, provocam a liberação de catecolaminas
musculares, contrações e aumento da temperatura corporal (Cavani e Petraci, 2006). Um dos
problemas durante o transporte é a grande variação de idade e densidade de animais por
caixa. Há caixas pequenas com 3500cm², até 5000cm² e grandes acima de 5000cm², a média
recomendada de animais para caixa é respectivamente 11, 13 e 14, com uma densidade
média de 349cm²/coelho.
Outra preocupação recorrente por afetar negativamente os coelhos, é o contato dos
animais com as fezes e a urina durante o percurso, principalmente, quando as gaiolas são
carregadas em vários andares.
A mortalidade de coelhos antes de chegar ao abate representa uma perda econômi-
ca. No entanto, são poucos os dados experimentais. Segundo Voslarova et al. (2018), a
menor mortalidade foi encontrada em coelhos transportados por até 100 km (0,05%). A maior
mortalidade foi registrada para distâncias superiores a 400 km (0,29%).
O tempo de viagem está relacionado com as reservas de glicogênio, que podem ser
esgotadas pela retirada prolongada da alimentação e estresse durante o transporte. O consu-
mo de reservas de glicogênio pode determinar um aumento no pH final do músculo levando
a um menor grau de desnaturação proteica com maior capacidade de retenção de água e
cor mais escura. Um aumento no tempo de transporte de 1h para 7 h aumenta os níveis
sanguíneos de corticosterona e creatina quinase (Liste et al., 2008).
Em frangos de corte, foi relatado que a coloração mais escura e valores de pH mais
altos do peito podem levar a uma deterioração microbiológica mais rápida do que a carne
mais clara e com pH mais baixo (Allen et al., 1998).
Manter os animais antes do abate na planta de processamento, entre 3-6h de es-
pera, pode contribuir para amenizar o efeito do transporte devido à restauração dos esto-
ques de glicogênio durante o tempo de espera, proporcionando menor pH muscular final
(Verga et al. 2009).

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Tabela 1. Efeito do pré-abate e abate na qualidade da carne.

Etapa Problema Efeito Autor


não esvaziamento do trato gastrointestinal = risco de
Jejum Abaixo de 6h
contaminação Dalla Zotte (2002)
(6h - 9h)
Acima de 9h menor rendimento de carcaça, alteração no pH da carne
Hemorragia, hematomas, ossos quebrados. Regiões mais
Carregamento Apanha de forma errada Vergara et al. (2009)
afetadas: pernas, músculos torácicos e lombar
Alta densidade Estresse, aumento da mortalidade. Maior cuidado com
Buil et al. (2004)
(média de 349cm²/coelho) o escoamento das fezes e urina
Transporte Desidratação, perda de peso (rendimento de carcaça), Dal Bosco et al. (1997)
Tempo de viagem
aumento do pH da carne, carne escura, maior morta- Trocino et al. (2003)
(acima de 4h)
lidade) Voslarova et al. (2018)

Insensibilização e sangria

É um dos procedimentos mais importantes na produção de carne. O objetivo do ator-


doamento é deixar o coelho inconsciente para o abate humanitário. Os abatedouros de coe-
lhos europeus utilizam o método de atordoamento elétrico. Os valores de tensão e potência
usados com
​​ mais frequência são 49 V e 250 Hz. Os coelhos recebem um eletrochoque com
duração inferior a 2 segundos, no seio frontal (Fossa temporalis) com um eletrodo de metal
em forma de “V” (López et al., 2008).
Para monitorizar a eficácia da insensibilização, sugere-se a utilização de indicadores
para o estado de consciência, selecionados com base na sua sensibilidade, especificidade
e facilidade de utilização. Da mesma forma, sugere-se indicadores para confirmar que os
animais estão mortos antes de se retirar a pele.
Após a insensibilização, os coelhos são pendurados pelas patas traseiras na linha de
processamento e é realizado um corte na veia jugular e artéria carótida em um ou ambos
os lados do pescoço, ocorrendo a sangria por 2-3 minutos. Durante este período, o coelho
perde a maior parte de seu sangue, o que eventualmente causa insuficiência cerebral e
morte. A perda insuficiente de sangue devido a um corte ruim no pescoço pode causar vasos
sanguíneos de ingurgitamento residual e ausência de contração muscular. Isso pode produzir
carcaças com veias ingurgitadas visíveis e carne escura (Cavani et al., 2004).

Esfola e Evisceração

A remoção da pele é realizada manualmente, embora haja processos automatizados,


o manual é o mais comum. Nesta fase é preciso muito cuidado, pois pode ocorrer contami-
nação bacteriana cruzada de carcaças, proveniente do contato da pele com as ferramentas
ou máquinas utilizadas para esfolação.
Para a evisceração a cavidade corporal é aberta por meio de uma incisão na parte in-
ferior do abdômen perto do ânus até o ponto médio da costela inferior; as vísceras, incluindo

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o trato gastrointestinal e órgãos associados (estômago, ceco e conteúdo intestinal) e o trato
urogenital, com a bexiga urinária vazia, são retirados (Cavani et al. 2004).
O vazamento do conteúdo do trato intestinal e contaminação da carcaça por rupturas
durante a evisceração deve ser evitada, pois é considerada a via primária para a contami-
nação por patógenos de carcaças, podendo ser usado como um indicador de controle do
processo durante o abate. No momento da evisceração, a inspeção veterinária é realizada
na carcaça de cada coelho para avaliar se partes da carcaça ou órgãos estão adequados
para consumo humano ou devem ser condenados.

Resfriamento da carcaça

Após a evisceração, as carcaças dos coelhos são submetidas à refrigeração, reduzindo


a temperatura interna da carcaça para próximo de 0ºC. O objetivo é maximizar a segurança
alimentar, reduzindo o crescimento bacteriano. O método mais utilizado é a refrigeração
por via aérea. Na qual, envolve a passagem das carcaças penduradas na linha de pro-
cessamento em salas de circulação de ar frio. Nesta etapa há uma leve perda de peso da
carcaça resfriada.

QUALIDADE DA CARNE

Dentro da família Leporidae existem diferentes gêneros. No entanto, acredita-se que


todos os coelhos domésticos descendem de uma única espécie conhecida como coelho
europeu (Oryctolagus cuniculus) (Hardy et al., 1994)
A domesticação dos coelhos resultou em várias raças distintas. Na américa do norte
a American Rabbit Breeders Association (ARBA) define os padrões oficiais para raças re-
conhecidas de coelhos, atualmente são reconhecidas mais de 50 raças. Os padrões são
publicados em um guia. Há diferentes formas de classificar as raças de coelhos, podendo
ser caracterizado pela cor, pelo tamanho da pelagem, peso corporal e aptidão. De acordo
com a aptidão ele pode ser classificado para produção de carne, pele ou lã ou para animal
de estimação. Para ter uma boa aptidão para carne, o coelho precisa ter um bom rendimento
de carcaça, com ênfase na conformação corporal e na musculatura.
Outra forma de classificar os coelhos é pelo formato do corpo. Os coelhos podem ter
diferentes formatos de corpo, que podem ser determinados pela silhueta do coelho quando
vista de lado, como apresentada na Figura 1.

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Figura 1. Classificação pelo formato do corpo dos coelhos.

Fonte: Adaptado de Columbia (2009).

Relação entre as raças e a qualidade da carne

Quando produzida em larga escala, a produção cunícola tem sua base em linhagens
sintéticas, geradas a partir do cruzamento de raças e linhagens para obtenção de alta ferti-
lidade e alta taxa de crescimento, visando um coelho de porte médio para ser abatido entre
9-13 semanas de idade com peso final entre 2 – 2,6kg (Dalle Zotte et al., 2014).
Programas de melhoramento que buscam taxas de crescimento mais rápidas têm
como foco a alta eficiência alimentar e um menor tempo de alojamento. Os coelhos sele-
cionados para taxa de crescimento são abatidos com o mesmo peso comercial dos coelhos

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não selecionados, no entanto, eles são abatidos em idades anteriores e são mais jovens do
que os coelhos que não foram selecionados. O abate de animais mais jovens implica um
pior rendimento de carcaça, uma proporção de ossos ligeiramente maior e uma proporção
ligeiramente diferente de cortes no varejo e com menor quantidade de lipídios. A seleção
para um rápido crescimento favorece o aumento da atividade glicolítica muscular, reduzin-
do a maciez devido à menor retenção de água, aumentando o pH da carne, reduzindo a
suculência e o sabor da carne, devido a menor concentração de lipídios (Pilles et al. 2000).
Diferenças entre linhagens ou cruzamentos foram encontradas para várias caracterís-
ticas da carne em diferentes trabalhos. Essas diferenças podem ser devido a diferenças na
composição genética das linhagens comparadas. No entanto, em estudos de qualidade da
carne, o tamanho da amostra é pequeno porque as características são difíceis e algumas
com alto custo para registrar, o que muitas vezes leva a diferenças não significativas que
podem ser relevantes (Blasco et al., 2018).
No Brasil não há empresas especializadas na produção de genética específica para a
produção de carne de coelhos. No entanto, algumas raças são amplamente utilizadas como
Nova Zelândia Branca, Califórnia, Chinchila e Gigante de Flandres. É importante destacar
que há uma grande variabilidade de características físicas entre as raças, um Gigante de
Flandres é duas vezes mais pesado que um Nova Zelândia e até 4 vezes mais pesado que
um coelho anão, como o coelho Netherland Dwarf.
Ao avaliar raças de coelhos Nova Zelândia Branca, Gigante de Flandres e Fulvo
Borgonha e seus cruzamentos, Derewicka et al. (2021) observaram que o cruzamento de
fêmeas de Fulvo Borgonha ou Nova Zelândia Branca com machos Gigante de Flandres resul-
tou em alto peso corporal final e um alto rendimento de carcaça; podendo ser uma alternativa
para melhorar as características de coelhos para abate, como apresentado na tabela 2.

Tabela 2. Pesos da carcaça e dos cortes das raças puras e seus cruzamentos.
Nova Zelândia branco Fulvo Borgonha Gigante de Flandres
Variáveis (g) NZb X FB FB X GF NZb x GF
(NZb) (FB) (GF)
Peso abate 2520 3193 2571 2739 2540 2801
Carcaça quente 1214 1566 1326 1365 1295 1435
Carcaça resfriada 1176 1520 1285 120 1253 1377
Parte dianteira 466 652 480 519 486 541
Lombo 263 295 316 302 291 323
Parte traseira 447 572 488 499 476 512
Fonte: adaptado de Derewicka et al (2021).

De forma semelhante, Denardin et al. (2015) avaliaram filhos de matrizes cruzadas


de Nova Zelândia branco (NZb) com Chinchila (CH) e de NZb com Califórnia (CF). Todas
as matrizes foram acasaladas com machos híbridos (Gigante de Flândres x Prateado de

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Champagne) e observaram que animais com 25% da raça Califórnia têm melhor rendimento
de carcaça do que animais com 25% da raça Chinchila, quando usados em mestiçagem.
A linhagem Botucatu é descendente de coelhos híbridos Norfolk 2000 originados de
duas gerações de cruzamentos nos quais, fêmeas mestiças, Nova Zelândia x Califórnia
foram cruzadas com machos Gigante de Bouscat. A linhagem foi melhorada geneticamen-
te na UNESP de Botucatu, pela pesquisadora a Profa. Ana Silvia Alves Meira Tavares
Moura. Os animais foram selecionados para tamanho de ninhada e taxa de crescimen-
to. A linhagem Botucatu é considerada de dupla aptidão com peso vivo adulto de 5,0 kg e
selecionada para maior tamanho de ninhada e ganho de peso diário durante a engorda,
podendo chegar ao peso de abate entre 70-80 dias.
Animais oriundos do cruzamento White German Giant × Botucatu, apresentaram maior
peso corporal e produziram melhor rendimento de carcaça, sem diferenças na conversão
alimentar, quando comparados aos Botucatu puros, sem diferença no peso dos cortes nobres,
fato que é uma vantagem para a produção de cortes (Bianospino et al., 2006).

Relação entre idade e peso

É fato que o peso do animal aumenta com a idade. No entanto, para coelhos, realizar
essa associação com base na literatura é um pouco complexo. Isto porque as comparações
entre grupos de coelhos (ex. raças diferentes, ambiência) são frequentemente realizadas
com o mesmo peso comercial com o objetivo de encontrar o “tratamento” economicamente
mais lucrativo.
Quando se usa diferentes linhagens, raças ou cruzamentos em comparação com o
mesmo peso comercial e idades diferentes pressupõem-se que os grupos estão em um es-
tágio diferente de maturidade. Isso significa que a proporção corporal do peso adulto será
diferente. Durante o crescimento, os diferentes componentes do corpo se desenvolvem em
diferentes taxas, a alometria de crescimento. Essa diferença irá refletir no peso relativo da
carcaça e de seus cortes nobres (filé de lombo e coxa, por exemplo), que é o que determina
o valor da carcaça para os abatedouros.
Em coelhos adultos de 4,5kg, os coeficientes alométricos, com exceção do tecido
adiposo e da pele, costumam diminuir com o crescimento. Fato que explica o porquê há um
maior rendimento de carcaça conforme aumenta a idade e ao mesmo tempo há um aumento
no custo da alimentação (Zotte, 2002)
O rendimento de carcaça aumenta até 91 dias. Quando os coelhos são abatidos antes
há um melhor aproveitamento da potencialidade de crescimento, porém terá menor teor de
gordura na carcaça e uma piora na conversão alimentar. Por outro lado, a redução no re-
torno econômico é um obstáculo para o abate com idade superior a determinada. Szendrõ

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et al. (2012) avaliaram economicamente o efeito do abate de coelhos com idades de 74, 84
e 94 dias com peso corporal médio de 2,53, 2,84 e 3,15 kg, respectivamente. Os autores
concluíram que aos 74 dias os coelhos não estão maduros o suficiente, enquanto 84 dias
os coelhos são considerados favoráveis ​​para abate. Esta idade de abate é considerada um
compromisso razoável do ponto de vista do abatedouro ou do criador.

Ambiência e a qualidade da carne

Os efeitos ambientais envolvem principalmente a temperatura e estação do ano, nas


quais a temperatura desempenha um papel importante no desempenho produtivo e de
abate. O aumento da temperatura ambiente acima do valor de termoneutralidade reduz o
consumo de ração e, consequentemente, a taxa de crescimento resultando em menor peso
corporal na idade de abate comercial, mas às vezes, com um melhor rendimento de abate
devido à menor proporção de pele, intestino vazio e vísceras. Da mesma forma, a tempe-
ratura abaixo da termoneutralidade afeta a taxa de crescimento por causa do mecanismo
termostático existente de regulação da ingestão e a maior necessidade de energia para ter-
morregulação. Causando um menor desempenho produtivo, com maior custo para o produtor.
Embora haja uma literatura restrita, coelhos criados em alta temperatura, se compara-
dos aos criados em condições termoneutras, apresentam carne mais pálida e seus lipídios
apresentam maior proporção de ácidos graxos saturados. O que pode ser vantajoso, pois
estes ácidos graxos são menos oxidados, proporcionando uma maior estabilidade lipídica
e vida útil da carne (Andrade et al., 2018).
O tipo de instalação também influencia nas características de carcaça e na qualidade
da carne de coelho. Os coelhos também podem ser utilizados como animais de estimação, o
que torna o olhar da sociedade mais crítico em relação ao seu bem-estar na produção. Nem
sempre, os ideais humanos são correlacionados com uma instalação ideal para atender as
demandas coelhos. No entanto, os consumidores desejam consumir uma carne saudável
que tenha como origem um animal criado em uma “instalação feliz”. Neste sentido, as últimas
pesquisas com instalação para coelhos têm como foco o bem-estar, dentre elas instalações
que permitam o acesso do animal à pastagem vêm ganhando espaço.
Em relação ao rendimento de carcaça e peso ao abate, instalações convencionais, em
gaiolas possuem um melhor rendimento de carcaça e peso de abate quando comparados
com animais em um sistema com acesso ao pasto (Figura 2) . Em sistema de produção
onde o coelho tem acesso ao pasto, ele terá maior possibilidade de locomoção, com maior
rendimento dos membros traseiros. Além disso, é esperado um menor percentual de gordura
na carcaça e uma diminuição na relação carne/osso, isto porque ele gasta muita energia em
movimento, salto e corrida (Hernandez e Pilar, 2006; Pinheiro et al., 2011)

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Figura 2. Sistemas de gaiola ao ar livre. A) Gaiolas móveis B) Piquetes.

Fotos: (Martin et al., 2016).

As características sensoriais da carne tendem a mudar, pois as instalações com acesso


ao pasto tendem a mudar o perfil da fibra muscular. As fibras musculares, podem ser do tipo
αR = vermelho e rapidamente contrátil; αW= branca e rapidamente contrátil ou βR = vermelho
e lentamente contrátil. A área da fibra está relacionada com o número de fibras musculares
por 1mm². Quanto maior o trabalho muscular maior será o número de fibras vermelhas e
rapidamente contrátil (αR), conforme o número de mitocôndrias aumenta. Assim, quanto
maior a locomoção dos coelhos, como no caso dos animais criados com acesso ao pasto
maior o percentual de fibras vermelhas e lentamente contrátil e rapidamente contrátil (βR
e αR), e menor percentual de brancas e rapidamente contrátil (αW). A locomoção também
está ligada com o maior percentual de conteúdo mineral dos ossos, aumentando a sua te-
nacidade à fratura (Volek et al., 2018; Dalle Zotte et al., 2009)

TIPIFICAÇÃO DE CARCAÇA DE COELHOS

Importância do estudo e tipificação da carcaça cunícola

Nos últimos anos, o aumento do interesse do consumidor em adquirir produtos de


qualidade certificada e de origem rastreável conduziu o mercado a se adequar quanto aos
parâmetros que regulamentam a produção, abate e comercialização da carne de coelho.
Dentre as ferramentas que auxiliam na condução de um mercado organizado e que permi-
te avaliar a qualidade do produto final de um sistema de produção é o estudo da carcaça,
onde os aspectos quantitativos e qualitativos se relacionam direta ou indiretamente com a
qualidade da carcaça.
Os sistemas de classificação e tipificação de carcaça existentes em alguns países do
globo tem o intuito de organizar e facilitar a comercialização da carne, além de agregar valor
ao produto. Conseguinte, o uso de um sistema com critérios próprios de avaliação, auxilia
os cunicultores inseridos na cadeia produtiva a ter conhecimento do nicho específico de
mercado que está sendo atendido por seu produto e do valor que pode ser agregado a este,

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permitindo incentivar a produção de lotes de animais mais homogêneos e de boa qualidade
de carcaça, além de auxiliar no direcionamento quanto aos nichos de mercado.
Desta forma, os sistemas de tipificação que causam influência sobre a padronização
do produto final impõem (mesmo que indiretamente), diretrizes de qualidade de carne e abre
possibilidade para a conquista de novos mercados e exportação de produtos que atendam
também às exigências do mercado externo. Cada país possui seus sistemas próprios de
tipificação, sendo que alguns países possuem até dois sistemas, um no sentido de atender
as preferências do mercado consumidor e outro mais simples, porém não menos importante,
a fim de organizar a cadeia produtiva.

Diretrizes sobre qualidade e tipificação de carcaças cunícolas na França

O sistema de tipificação de carcaças da França segue a regulamentação e os parâ-


metros dispostos por lei, cuja finalidade descreve especificações para a criação, abate e
processamento de coelhos visando a aplicação de boas práticas em todas as etapas do
processo. O documento lançado em 2004 e atualizado em 2011 pela Associação Francesa
de Normatização (AFNOR) descreve critérios sobre a genética dos animais adquiridos pelos
criadores, que deve ser de fornecedores que também seguem regulamentação sobre insta-
lações, gaiolas, qualidade de água, área de carga e descarga de animais, gestão sanitária e
certificação de origem de cada lote, como também as diretrizes para criadores que trabalham
com a engorda dos animais, como a prática de inseminação artificial, alimentação, controles
profiláticos e gestão do rebanho (AFNOR, NF V47-001, 2011).
O documento direciona sobre um ponto essencial para a qualidade das carcaças, que
é o manejo do apanho dos coelhos e transporte até os frigoríficos. O cuidado com os ani-
mais nesse processo se torna imprescindível, de forma que deva ser realizado a modo de
evitar estressores e lesões indesejáveis que, além de comprometer a qualidade e o valor
agregado da carcaça, provoca sofrimento aos animais. Para que esse ponto crítico seja bem
conduzido, parâmetros como forma de captura, tipo de veículo transportador e densidade
máxima de carga devem ser respeitados.
Visando ainda qualidade de carcaça, a idade mínima para envio ao abate é regula-
mentada em 65 dias de idade a fim de otimizar os critérios qualitativos como rendimento
do abate, razão muscular/óssea, adiposidade, retenção de água, resistência ao cozimento,
propriedades organolépticas e qualidade nutricional.
As especificações para abate e pós abate definem tempo e temperatura de resfriamento
da carcaça para que o processo de transformação de músculos em carne seja eficaz. O tem-
po de pendura pelas patas traseiras não pode ser inferior a 2 horas e as carcaças devem

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esfriar em posição suspensa em câmaras de resfriamento, a fim de obter uma temperatura
no interior do músculo entre 0 ºC e 4 ºC.
Quanto à classificação das carcaças inteiras, uma escala fotográfica de referência pode
ser utilizada para avaliar a adiposidade perirrenal das carcaças refrigeradas. Esta escala
permite uma classificação de 1 a 5 a quantidade de gordura perirrenal: a nota 1 corresponde
a rins não cobertos com gordura e classificação 5 para rins completamente recobertos de
gordura (AFNOR, NF V47-001, 2004).

Figura 3. Classificação das carcaças de coelhos de acordo com a sua adiposidade perirrenal.

Fonte: adaptado de Tarik et al. (2021).

O corte e a desossa podem ser realizados em comum acordo entre os contratantes ou


qualquer corte original elaborado pelo processador. Nesta etapa, para garantir a preservação
ideal da carne, deve-se reduzir o máximo possível o número de manuseios das carcaças e
o tempo para a realização das operações. Os cortes mais comuns da indústria são coelho
inteiro, coelho inteiro cortado, meio coelho, corte traseiro, corte dianteiro, costelas, ombro
com costelas, garupa inteira, garupa cortada, filé e costeleta.

Diretrizes sobre qualidade e tipificação de carcaças cunícolas nos Estados Unidos

O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), seguindo o ideal por


padrões de qualidade de carne e respeitando a busca dos consumidores por rótulos que a
certificam, publicou um guia de classificação de alimentos em 1985-87, escrito por membros
do 4-H Rabbit Developmental Committee. Foi revisado posteriormente no ano de 2017 por
pesquisadores da Universidade de Michigan. Este guia auxilia os consumidores na orien-
tação quanto a compra dos produtos cunícolas e também na avaliação e precificação das
carcaças e seus variados cortes.
De acordo com o guia, a classificação das carcaças configura-se conforme a idade
e peso de abate em três categorias principais: “fryers”, “roasters” ou “stewers”. A cate-
goria “fryers” engloba animais com menos de 10 semanas de idade, pesando 1,58 kg a
2,5 kg e a carcaça deve ter mais da metade de seu peso vivo, incluindo rins, coração e

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fígado. Os classificados como “roasters” têm de 10 semanas a 6 meses de idade, com peso
vivo entre 2,5 kg a 4,08 kg, sua carne é mais firme e escura comparada a categoria anterior.
Por último, os animais “stewers” possuem mais de 6 meses de idade, peso vivo acima de
3,63 kg e sua carne é mais firme e com maior deposição de gordura.
Além das classificações quanto à idade e peso, as carcaças são divididas ainda em
tipo “A”, “B” e “C”. A carcaça qualidade “A” deve ser livre de coágulos sanguíneos devido a
sangramento incompleto, não ter nenhum sinal de pele avermelhada causada pelo acúmulo
de fluido nos tecidos conjuntivos, ser livre de pelos, sujeira, ossos quebrados, hematomas,
defeitos e deformidades. Sua carcaça é curta, espessa, arredondada, tem costas e quadris
largos, ombros largos e bem preenchidos e textura muscular firme. Possui ainda uma boa
quantidade de gordura interna na virilha, sobre as paredes internas da cavidade corporal
e moderadamente nos rins. A pequena diferença que separa as carcaças tipo “A” e “B” é a
presença de coágulos ocasionais em veias, não derivados de sangramento incompleto no
momento do abate e a quantidade de gordura abdominal e supra renal que são menores.
A classificação “C” de qualidade indica que a carne pode apresentar vermelhidão
causada pela coagulação do sangue nos tecidos conjuntivos, defeitos e deformidades mo-
deradas devido a remoção de hematomas graves. Pode apresentar descoloração por causa
de hematomas, mas deve estar livre de coágulos. Sua conformação pode ser longa, esguia
(magra) ou bastante carnuda. Pode ter costas e quadris finos e estreitos. A textura do mús-
culo pode ser macia e flácida e apresentar pouca gordura externa.

Diretrizes sobre qualidade e tipificação de carcaças cunícolas no México

O México está entre os países que possui legislação que estabelece diretrizes de
classificação e características das carcaças de coelho comercializadas em seu território,
cujo objetivo principal é garantir aos consumidores um produto de qualidade, que cumpra
as disposições sanitárias e zoosanitárias, dentro da classificação de carne fresca, refrige-
rada ou congelada.
As normas contidas no documento (NMX_FF_105_SCFI,2005) estabelecem sobre
todas as etapas do processo de obtenção da carne, sendo elas: manejo pré-abate, planta
baixa do abatedouro, os cortes da carcaça, embalagem, refrigeração, etiquetagem e selo
de certificação de qualidade.
Para um coelho estar dentro dos parâmetros exigidos para abate, deve ter idade entre
9 e 14 semanas com peso de 1,8 kg a 2,4 kg. No pré-abate, os animais devem descansar
um mínimo de 2 horas, com água à vontade. Sob refrigeração pós abate, a carcaça deve
ser mantida a uma temperatura de 0º C a 4º C e para congelamento deve permanecer em
um sistema de preservação física a uma temperatura de -12 ºC a -18 ºC.

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Com relação a características da carne, a norma dispõe ainda sobre a coloração das
fibras, que deve estar entre tons de rosa pré-estabelecidos pelo “Sistema Pantone” do país.
Não deve apresentar odores não característicos da carne, ter firmeza consistente e que se
correlaciona com a proporção e a natureza do tecido conjuntivo e estrutura da fibra muscular.
Sua textura deve ser avaliada de acordo com a idade do animal. Portanto, a carne de coelho
que é classificada em suas diferentes categorias e deve ser firme, fresca e estar livre de
cabelos, tumores, hematomas, hemorragias, manchas derivadas do processo de eviscera-
ção, livre de abscessos e manchas brancas no fígado. A gordura superficial e interna deve
ser branco perolado. Além disso, qualquer carcaça deve vir apenas de animais abatidos em
plantas com rastreios registrados e autorizados.
As categorias em que as carcaças podem ser classificadas são “México Extra”, que
deve ter entre 1 - 1,5 kg e idade até 77 dias, a categoria “México 1”, pesando 0,9 - 1,8 kg
e até 100 dias de idade e, por fim, a categoria “México 2”, com peso menor que 0,9 kg ou
maior que 1,8 kg e qualquer idade. Nesta última classificação, as carcaças podem apresentar
defeitos como gordura líquida, musculatura pálida, mole e exsudativa (PSE) ou dura, seca e
escura (DFD). Com relação à sua apresentação para venda, podem ainda ser inteiras com
ou sem cabeça, ou cortadas, com e sem cabeça.

Adoção de um sistema de tipificação no Brasil

Atualmente o Brasil não possui um sistema de classificação e tipificação de carcaças


cunícolas. Isso se dá em parte devido ao costume cultural brasileiro de baixa procura pelo
produto no mercado ou baixo estímulo na hora da compra, como apresentação da carne nas
gôndolas do mercado, praticidade de preparo ou preços abusivos que fogem da realidade
econômica de muitos brasileiros. Todavia, os estabelecimentos de abate seguem rigorosa
inspeção dos órgãos governamentais responsáveis por garantir a inocuidade e segurança
alimentar da população.
Para estimular o crescimento do setor no país, dentre outros aspectos, é necessário
a adoção de um sistema que considere a qualidade final da carne, para tornar o mercado
mais competitivo e lucrativo. Desta forma, os produtos saem diferenciados e com maior valor
agregado, estimulando ainda mais a melhoria da cadeia produtiva e o uso de tecnologias de
controle (principalmente relacionadas a índices zootécnicos) pelos produtores para padroni-
zação dos animais (forma de estimular o profissionalismo agropecuário), além de impulsionar
o melhoramento genético dos rebanhos cunículas brasileiros e competitividade internacional.
É notável a necessidade de investimentos no setor, seja ele privado ou por meio de
políticas públicas de incentivo ao produtor rural. Devido à competitividade do mercado e da
necessidade em se produzir carne de qualidade e de preço acessível, o uso de tecnologias

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para intensificar o sistema de produção torna-se fundamental, pois permitem maior controle
da produção, tanto no sentido econômico, como de índices produtivos, aspectos qualitativos
da carcaça e atender questões ambientais. Olhando por esse viés, o apoio aos produtores
por meio de políticas públicas de incentivo estimulariam a resiliência da atividade e o cres-
cimento do setor.
Além disso, às exigências do mercado quanto a produtos especializados, derivados
de sistemas orgânicos de produção, voltados principalmente ao bem-estar animal, têm au-
mentado em todas as partes do mundo. Estudos desenvolvidos para avaliar a interrelação
dos sistemas de criação com a qualidade da carne final mostram que eles têm sim impacto
no peso corporal, as características da carcaça e a qualidade da carne. Desta forma, con-
sumidores, cientistas e a indústria de alimentos precisam de informações concretas sobre
os efeitos dos sistemas de criação no bem-estar animal, bem como na qualidade da carne
e na saúde animal.

PROCESSAMENTO DA CARNE CUNÍCOLA

Devido ao pequeno tamanho do animal, a carne de um coelho era normalmente comida


em uma única refeição, sendo assim, pouco foi pesquisado e desenvolvido no campo de
preservação e processamento dessa carne quando comparado a animais maiores, como
gado ou suínos. Pesquisas relacionadas ao processamento e industrialização de produtos
cárneos cunícolas são recentes, visando produtos para o consumidor que prioriza alimentos
com pouco tempo necessário de preparo e visualmente mais atraentes do que a carcaça
inteira congelada, a forma mais comum de comercialização da carne de coelho, que pode
ser intimidadora para os consumidores devido à sua apresentação que remete o animal de
origem da carne e exige tempo, conhecimento e esforço de preparo.
A carcaça pode ser segmentada em diversas porções e cortes diferentes dividindo em
coxas, lombo, costeletas e perna. Além disso, a embalagem e a forma de apresentação do
produto por ser um grande atrativo para o consumidor (Figura 4).

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Figura 4. Cortes selecionados de carne de coelho de marca comercial espanhola.

Fonte: Hermibérico Produtos.

No processamento da carne de coelho há obstáculos específicos visto que a produ-


ção desta ainda é pequena e pouco automatizada, a manipulação da carne ainda é muito
dependente de manejo manual. Há riscos de contaminação cruzada na fase pré-abate, nos
processos de transporte e armazenamento dos animais, e na fase do processamento, ge-
ralmente feito manualmente. Tanto no esfolamento quanto na evisceração a contaminação
pode ocorrer no contato da pele e das ferramentas utilizadas na carcaça, e na evisceração.
Ainda na evisceração pode ocorrer o contato de matéria fecal com a carcaça, em possíveis
rupturas do trato gastrointestinal.
Ao ser processada mecanicamente, porém, encontram-se fragmentos ósseos na carne,
devido à tendência dos ossos de coelho de partir com maior facilidade em comparação com
outras espécies, e ao pouco desenvolvimento de tecnologias específicas para o processa-
mento cunícola. Além disso, a carne de coelho também possui baixa suculência, relaciona-
da ao nível reduzido de gordura (5.16%); um sabor considerado “selvagem”, relacionado à
dieta com alto nível de fibra do coelho; fibrosidade acentuada e aparência pálida devido ao
baixo conteúdo de pigmentos heme (mioglobina e hemoglobina), fatores estes que podem
ser desagradáveis para o consumidor final e trazem obstáculos no desenvolvimento de
produtos processados.
O processamento da carne (Figura 5) entra como uma forma de driblar essas caracterís-
ticas inerentes à carne de coelho e estender o tempo de prateleira dos produtos, garantindo
segurança e qualidade; mascarando o sabor típico e a textura fibrosa e apresentando opções
mais apelativas para o consumidor, tanto visualmente quanto em se tratando de tempo e
facilidade de preparo do alimento. Algumas das alternativas são: marinadas, hambúrgueres,

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linguiças e salsichas. Na China, outros produtos cunícolas, como carne seca, carne defu-
mada, enlatados e cozidos a vapor, estão sendo pesquisados.
As marinadas podem modificar os parâmetros sensoriais da carne de coelho, au-
mentando a suculência, sabor e maciez da carne, em comparação às formas usuais de
preparação, esses produtos são comercializados de forma pré-marinada, pronto para pre-
paro ou congelados.
A carne desossada mecanicamente pode otimizar o rendimento da carcaça e a diver-
sificação de produtos no mercado ao ser utilizada no preparo de hambúrgueres, linguiças
e salsichas. A tecnologia de alimentos permite que a formulação destes alimentos garanta
um alimento mais saboroso e suculento, com baixa demanda de tempo de preparo.

Figura 5. Fluxograma do processamento que pode ser aplicado em carne cunicola adaptado de Petracci e Cavani (2013).

Da Espanha, o presunto ibérico, ou pata negra, é conhecido mundialmente pelo seu


sabor peculiar, que provém, principalmente, da pureza da raça dos animais (suínos pretos
ibéricos), da sua forma de criação e do processo de cura. Como uma forma de atrair consumi-
dores a marca Moncada segui o exemplo e criou uma linha com o “Coelho Iberico Moncada”,
que ganhou as prateleiras dos mercados com cortes de coelhos e seus subprodutos, como
hambúrgueres e linguiças (Figura 5).

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Figura 5. Exemplo da marca de carne e produtos cárneos na Espanha.

Fonte: google imagens.

Outro mercado que vem consumindo e utilizando a carne do coelho é o mercado da


alimentação Pet, no exterior diversas alimentações secas para cães fazem utilização da
carne de coelho como fonte de proteína pelo seu teor aminoacídico, tamanho da proteína
(média de 34 a 55 kDa) e como proteína alternativa para cães com alergias alimentares,
onde se procura oferecer uma fonte de proteína à qual o animal nunca tenha sido expos-
to. As orelhas dos coelhos desidratadas (Figura 6) também são um petisco interessante para
cães, durante a mastigação ocorre um efeito abrasivo que remove placa dental e material
orgânico acumulado e são hipoalergênicas, mesmo que a alergia à proteína cunícola possa
ocorrer os casos são raros.

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Figura 6. Petiscos para cães feitos de orelhas de coelho.

Fonte: JR. Pet Products.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim como em outros animais, são diversos os fatores intrínsecos e extrínsecos que
podem afetar a qualidade da carne. Novas estratégias são necessárias para encorajar os
consumidores a consumir a carne de coelho como mais uma alterativa proteica de origem
animal como a carne suína, bovina e avícola. Adotar um sistema de classificação e tipificação
de carcaça cunícola por ser grande avanço para melhorar visibilidade da carne no mercado
brasileiro, assim como já ocorre em outros países. Além disso, o processamento da carne
adaptando-se a um cotidiano mais tecnológico e prático que se vive atualmente pode ser um
caminho para dar a cunicultura um lugar significativo nos mercados de alimentos do futuro.

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