2015, Rocha
2015, Rocha
2015, Rocha
INSTITUTO DE FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE FÍSICA
DOUTORADO EM ENSINO DE FÍSICA
TESE DE DOUTORADO
PORTO ALEGRE
2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE FÍSICA
DOUTORADO EM ENSINO DE FÍSICA
PORTO ALEGRE
2015
Carlos Raphael Rocha
Banca Examinadora
__________________________________________
Dr. (Pres.) Marco Antonio Moreira (UFRGS)
__________________________________________
Dr. Nelson Studart Filho (UFABC)
__________________________________________
Dr. Guilherme Frederico Marranghello (UNIPAMPA)
__________________________________________
Dr. Magno Valério Trindade Machado (UFRGS)
__________________________________________
Dra. Rejane Maria Ribeiro Teixeira (UFRGS)
ii
Aos meus pais Beto e Rosane, por terem
me ensinado o valor da educação e pelo
apoio durante toda minha vida.
iii
AGRADECIMENTOS
À Elza, minha esposa, que me apoiou nos momentos mais conturbados e mais tensos
do doutorado.
Ao professor e amigo Antônio João Fidélis por sua imensa colaboração na aplicação
deste projeto, na discussão das atividades propostas e pelos momentos de descontração.
Aos alunos, tanto das turmas pesquisadas como das universidades em que trabalhei,
por terem me instigado e criticado este trabalho de forma construtiva durante sua execução.
iv
“Só nos entregamos a problemas que
julgamos poder resolver com os recursos
de que dispomos.”
Rubem Alves
v
ÍNDICE
LISTA DE FIGURAS................................................................................................................. ix
LISTA DE TABELAS................................................................................................................ xi
LISTA DE ABREVIATURAS....................................................................................................... xii
RESUMO............................................................................................................................... xiii
ABSTRACT............................................................................................................................ xiv
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO.................................................................................................... 1
1. A atualização curricular no Ensino Médio brasileiro................................................. 1
2. O ensino de Mecânica Quântica.................................................................................. 2
3. Por que ensinar Mecânica Quântica no Ensino Médio?............................................ 3
vi
3.4. Campos conceituais..................................................................................................... 55
4. Implicações para o ensino........................................................................................... 56
vii
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................. 149
APÊNDICES........................................................................................................................... 158
APÊNDICE I – TEXTO DE APOIO.............................................................................................. 159
APÊNDICE II – QUESTIONÁRIO DE CONHECIMENTOS PRÉVIOS................................................... 180
APÊNDICE III – AVALIAÇÕES ESCRITAS................................................................................... 181
APÊNDICE IV – QUESTIONÁRIO DE OPINIÕES........................................................................... 184
APÊNDICE V – TESTES RÁPIDOS............................................................................................. 185
APÊNDICE VI – M APAS MENTAIS INICIAIS................................................................................ 186
APÊNDICE VII – M APAS MENTAIS FINAIS................................................................................. 192
APÊNDICE VIII – ALGUNS CONCEITOS ATRIBUÍDOS ÀS QUESTÕES DAS AVALIAÇÕES ESCRITAS E
DOS TESTES RÁPIDOS............................................................................................................ 198
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Esquema de um experimento de dupla fenda com fonte, anteparo com duas
fendas e anteparo de registro........................................................................................... 33
Figura 2. Padrão de interferência obtido no experimento de dupla fenda com ondas
eletromagnéticas.............................................................................................................. 34
Figura 3. Experimento de dupla fenda com partículas clássicas...................................... 34
Figura 4. Experimento de dupla fenda com partículas quânticas..................................... 35
Figura 5. Esquema do experimento de Stern-Gerlach..................................................... 36
Figura 6. (a) Polarizador na direção (b) Polarizador na direção ................................. 37
Figura 7. Representação das bases adotadas por Alice e Bob para a transmissão de
fótons................................................................................................................................ 40
Figura 8. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10206-10232; (b) 10207-10233; (c) 10316-10319.............................. 74
Figura 9. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10305-10309; (b) 10308-10324........................................................... 74
Figura 10. Respostas à quarta questão da primeira avaliação pelos alunos 10225-
10229 da primeira etapa................................................................................................... 76
Figura 11. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10104-10113; (b) 10214-10222; (c) 10216-10227; (d) 10305-10309;
(e) 10314-10320............................................................................................................... 76
Figura 12. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10216-10227; (b) 10230-10234; (c) 10303-10325............................................ 77
Figura 13. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na
primeira etapa da pesquisa.............................................................................................. 79
Figura 14. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10118; (b) 10124; (c) 10205; (d) 10212; (e) 10316............................. 80
Figura 15. Respostas à segunda questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10106; (b) 10118; (c) 10129; (d) 10210.............................................. 81
Figura 16. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10101; (b) 10133; (c) 10202; (d) 10218; (e) 10320............................. 83
Figura 17. Respostas à quarta questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10207; (b) 10305; (c) 10316; (d) 10319.............................................. 83
Figura 18. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10225; (b) 10316............................................................................................... 84
Figura 19. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10105; (b) 10119; (c) 10310.............................................................................. 85
Figura 20. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10119; (b) 10303; (c) 10312................................................................ 85
Figura 21. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10122; (b) 10124; (c) 10320................................................................ 88
Figura 22. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10202; (b) 10223; (c) 10230; (d) 10324.............................................. 89
Figura 23. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10111; (b) 10113; (c) 10215................................................................ 89
Figura 24. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10105; (b) 10112; (c) 10119; (d) 10316............................................................ 90
Figura 25. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10113; (b) 10119; (c) 10210; (d) 10320............................................................ 91
Figura 26. Resposta à sexta questão da terceira avaliação pelo aluno da primeira
etapa 10133...................................................................................................................... 91
Figura 27. Mapas mentais iniciais dos alunos (a) 20316 e (b) 20417.............................. 97
ix
Figura 28. Respostas ao primeiro teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20133; (c)
20226; (d) 20234; (e) 20301; (f) 20321; (g) 20406; (h) 20514.......................................... 105
Figura 29. Respostas ao segundo teste rápido pelos alunos (a) 20102; (b) 20111; (c)
20211; (d) 20214; (e) 20329; (f) 20336; (g) 20413; (h) 20507.......................................... 106
Figura 30. Respostas ao terceiro teste rápido pelos alunos (a) 20116; (b) 20125; (c)
20215; (d) 20231; (e) 20316; (f) 20331; (g) 20416; h) 20517........................................... 107
Figura 31. Respostas ao quarto teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20125; (c)
20202; (d) 20229; (e) 20308; (f) 20315; (g) 20418; (h) 20521.......................................... 108
Figura 32. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20122; (b) 20207; (c) 20231; (d) 20321.............................................. 110
Figura 33. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20122; (b) 20128; (c) 20209; (d) 20418; (e) 20512............................ 111
Figura 34. Respostas à terceira questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20215; (b) 20219; (c) 20220; (d) 20335.............................................. 112
Figura 35. Respostas à quarta questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20117; (b) 20125; (c) 20223............................................................... 113
Figura 36. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20111; (b) 20120; (c) 20122; (d) 20220; (e) 20224; (f) 20308; (g) 20316; (h)
20505; (i) 20513................................................................................................................ 114
Figura 37. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20116; (b) 20118; (c) 20122; (d) 20212; (e) 20219; (f) 20233; (g) 20316; (h)
20321; (i) 20414................................................................................................................ 115
Figura 38. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na
segunda etapa da pesquisa.............................................................................................. 117
Figura 39. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20107; (b) 20115; (c) 20232............................................................... 118
Figura 40. Resposta à segunda questão da segunda avaliação da segunda etapa pelo
aluno 20403...................................................................................................................... 118
Figura 41. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20107; (b) 20202; (c) 20205; (d) 20418.............................................. 119
Figura 42. Respostas à quarta questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20231; (b) 20333................................................................................ 120
Figura 43. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20121; (b) 20202; (c) 20203; (d) 20211; (e) 20305............................ 120
Figura 44. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20106; (b) 20109; (c) 20120; (d) 20231; (e) 20411........................................... 121
Figura 45. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20115; (b) 20125; (c) 20231; (d) 20515.............................................. 122
Figura 46. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20125; (b) 20219; (c) 20521............................................................... 124
Figura 47. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20111; (b) 20215; (c) 20224; (d) 20236; (e) 20327............................ 125
Figura 48. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20116; (b) 20310................................................................................ 125
Figura 49. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20119; (b) 20202; (c) 20209; (d) 20312; (e) 20511........................................... 126
Figura 50. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20203; (b) 20224; (c) 20231; (d) 20316............................................................ 126
Figura 51. Respostas à sexta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20101; (b) 20122; (c) 20202; (d) 20316............................................................ 127
x
LISTA DE TABELAS
xi
LISTA DE ABREVIATURAS
CQ Criptografia Quântica
CV Coeficiente de Variação
EM Ensino Médio
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
EQ Emaranhamento Quântico
ET Ensino Técnico
FC Física Clássica
FMC Física Moderna e Contemporânea
MC Mecânica Clássica
MQ Mecânica Quântica
PCNEM Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PNLEM Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Médio
TAS Teoria da Aprendizagem Significativa
TCC Teoria dos Campos Conceituais
xii
RESUMO
xiii
ABSTRACT
This thesis presents the results of research on the understanding of some concepts and
principles of quantum mechanics by students of secondary school from two public schools on a
course of approximately 25 hours over about three months. The application of the course was
accomplished in two stages with the participation of 240 students, 137 of the first grade and 103
of the third grade. The students from the first stage were evaluated with a questionnaire to
assess their previous knowledge, three written evaluations, a survey of opinions and an
interview with each class. In the second stage, in addition to the aforementioned instruments, a
mind map, four rapid tests and the interview with three students in each class, randomly
chosen, were inserted into the research. The theory of meaningful learning of David Ausubel
and the theory of conceptual fields of Gerard Vergnaud were adopted as a theoretical
background for the study development and data analysis. Linear superposition was considered
a subsumer necessary to understand the concepts of state of a physical system and linear
superposition of states. The comprehension of the concepts was investigated using the
following problem situations: double-slit experiment, Stern-Gerlach experiment, polarization of
light, quantum entanglement and quantum cryptography, as well as other examples. With linear
superposition of waves and of vectors considered as a subsumer to the concepts of quantum
mechanics, the use of a pseudo advance-organizer seemed to improve the learning of these
topics, as we see in the assessments. The situations appear to enhance the understanding of
the concepts and the learning seemed to be closer to a meaningful learning. Computer
simulations, a written text and slides presentations were used and an environment was provided
where students felt comfortable to express their knowledge in such a way that scientifically
accepted knowledge was promoted. Only a few students had a negative attitude towards the
content presented and the acceptance of the majority showed that contents of Modern and
Contemporary Physics seem to stimulate them for learning and to promote the update of the
Physics curricula at secondary school. Also, the contents of the course were well understood
both by third grade and first grade students, showing that the Modern and Contemporary
Physics can be approached at any moment in this level of education.
xiv
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO
Este trabalho versa sobre uma pesquisa em Ensino realizada junto a alunos de Ensino
Médio (EM) de duas escolas públicas, relativa à introdução de alguns dos conceitos e
princípios mais fundamentais da Mecânica Quântica (MQ). Foram ministrados dois cursos, em
épocas distintas, um em cada escola, voltados tanto para alunos de primeira como de terceira
série.
1
Ainda assim, apesar dos avanços gerados por tais pesquisas em Ciências no país e no ensino
decorrente, e pelo incentivo político através das mudanças nas matrizes curriculares das
disciplinas de EM, a alteração dos currículos nas escolas brasileiras ainda não é satisfatória.
Além disto, ainda são poucas as pesquisas que se envolvem com a investigação dos fatores
que determinam a aprendizagem dos conceitos básicos de FMC pelo aluno de EM (Lino e
Fusinato, 2011, p. 75).
Esta preocupação com a atualização curricular já foi manifestada por Ostermann e
Moreira (2001) e Lobato et al. (2005). A inserção de tópicos de Física Moderna nos currículos,
embora tida como necessária, vem ocorrendo de forma muito lenta e sem que haja uma
dedicação maior aos principais conceitos da teoria. Em geral, as inclusões existentes atêm-se
a alguns tópicos que acabam mais por limitar a área do que por defini-la. Aspectos da
relatividade especial e a dualidade onda-partícula, por exemplo, são frequentemente inseridos
nos currículos do EM em virtude da sua cobrança em processos seletivos (ENEM, vestibulares)
para o ensino superior.
Além de atualizar o ensino, acredita-se que a introdução de tópicos de FMC permite
que o professor consiga manter o interesse pelas Ciências que os alunos trazem inicialmente
para a sala de aula (Aubrecht, 1989) ou até mesmo o faça surgir. Torna-se, então,
imprescindível promover uma revisão ou reformulação dos currículos de Física do EM para
tentar sanar algumas das dificuldades que o ensino desta Ciência enfrenta nos últimos anos.
Não existe uma alternativa única para isto, mas mudanças devem ocorrer e a inserção de
tópicos de FMC é, sem dúvida, uma das contribuições mais promissoras para tal ensino na
atualidade.
1
2. O ensino de Mecânica Quântica
1
Em geral, nos referiremos à MQ não-relativística no contexto do ensino, embora em algumas instâncias esteja
implícito incluir-se a situação relativística também.
2
Moderna, mas podem ser considerados como decorrentes de postulados com consequências
mais abrangentes, nos quais a MQ se apoia (Rocha et al., 2011). Hobson (2007, p. 96) também
se mostra preocupado com os cursos introdutórios de Física Quântica, pois a maior parte deles
dedica muito tempo para a apresentação da aparente contradição entre as naturezas
ondulatória e corpuscular de fótons e de partículas materiais, uma abordagem às vezes
confusa e desnecessária.
Estudos como o de Greca e Herscovitz (2002) e o de Greca e Freire Jr. (2003)
mostram que há interesse dos alunos de cursos de graduação em elementos da MQ e que,
após terem sido trabalhados em cursos introdutórios da área de Ciências Exatas, evidenciaram
uma compreensão razoável dos conceitos discutidos.
Em trabalhos anteriores (Rocha, 2008; Rocha et al., 2010), foi possível averiguar que
tópicos de MQ não comumente apresentados em disciplinas introdutórias de cursos de
licenciatura, tais como Emaranhamento Quântico e Criptografia Quântica, estimulam os alunos
para o aprendizado dos primeiros princípios desta teoria. Estes trabalhos também sugerem
que, além dos acima citados, exemplos como o do experimento de dupla fenda, o do
experimento de Stern-Gerlach e o da polarização da luz são ótimas situações-problema de
aplicação dos conceitos apresentados nas disciplinas.
Muitos professores do EM ainda não se sentem confiantes para trabalhar tópicos de
MQ, limitando-se a apresentar alguns aspectos de sistemas quânticos que conflitam fortemente
com expectativas clássicas. Existem, contudo, trabalhos, como, por exemplo, o de Rocha
(2008) e o de Pantoja (2011), que buscam proporcionar parte do conhecimento necessário
para discutir vários tópicos junto a seus alunos. Considerando os motivos apresentados pelos
professores julga-se, então, necessária a realização de pesquisas que efetivamente promovam
a inserção de tópicos de MQ no EM.
3
ocorre tradicionalmente (op. cit., p. 40). É interessante salientar também que o aprendizado de
tópicos da Física Moderna no EM não apresenta dificuldades tão diversas daquelas existentes
no aprendizado dos conceitos clássicos (Carvalho Neto et al., 1999, p. 56), não havendo pois
impedimentos a priori para a abordagem da MQ no EM.
Encontram-se trabalhos sobre o ensino de MQ a partir da década de 1970 e desde
então se afirma que, em geral, os estudantes apresentam grandes dificuldades conceituais no
estudo introdutório desta disciplina (Rüdinger, 1976, p. 144; Frederick, 1978, p. 242). A
existência de tais dificuldades indica que não se deve medir esforços a fim de buscar a
introdução adequada de tais tópicos em todos os níveis de ensino para que se consiga atingir
um nível satisfatório de aprendizado.
Trabalhos como os de Chiarelli (2006) e Soares (2010), entre outros, corroboram a
ideia de que é possível inserir temas de FMC no EM, em que especificamente se introduzam
algumas noções de MQ.
Deve-se salientar também que a aplicação descontextualizada de conceitos, contudo,
pode não apenas desauxiliar na percepção correta dos fenômenos quânticos, mas até provocar
um obstáculo epistemológico para o aprendizado do campo de conhecimentos adequado. Com
a ampla ocorrência de palestras, cursos, e até congressos e outros eventos maiores que se
utilizam de fenômenos do mundo microscópico de forma inadequada, contextualizando-os em
situações não descritas pela MQ, agravada pela divulgação dos mesmos na variada mídia
disponível na atualidade, é preciso cada vez mais promover uma contrapartida da Ciência. É
necessário, então, um grande esforço da comunidade científica para que o contato com a MQ
ocorra cedo, no caso no EM, para evitar que os estudantes se apropriem de uma "versão
deturpada" da MQ e para propiciar que possam absorver uma versão cientificamente
adequada, ainda que introdutória, desta teoria.
Podem ser encontradas outras afirmações que reiteram a posição de que é possível
trabalhar tópicos de MQ no EM, como a seguinte citação de Pinto e Zanetic após ministrarem
um curso enfocando o comportamento dual da luz:
“Acreditamos que a maioria dos alunos aprendeu pouca Física
Quântica, mas eles não terminaram o século sem terem pelo menos
sido apresentados à Física nele desenvolvida. Aliás, quantos alunos
que passam por um curso de Mecânica Clássica entendem realmente
as leis de Newton? Nossa experiência mostrou que temos ainda muitas
questões a responder, mas agora acreditamos ainda mais que é
possível levar a Física Quântica para o ensino médio.” (Pinto e
Zanetic, 1999, p. 21, grifo nosso).
4
memória (de detalhes) não significa uma perda total, pois com o que resta (o princípio geral) é
possível reconstruir pormenores, quando necessário (Bruner, 1978, p. 22).
Sabe-se que a construção de conceitos pelo ser humano se inicia quando este começa
a conviver com o mundo externo, ou seja, desde que nasce. Logo, a formação de conceitos,
através da construção de esquemas em interação com as situações com que o indivíduo tem
contato, promove a conceitualização e, consequentemente, o desenvolvimento cognitivo
(Vergnaud, 1996b, p. 113).
As colocações apresentadas nos conduziram a avaliar o processo de aprendizagem de
alguns dos mais importantes princípios da MQ no EM. Com esta perspectiva em mente,
buscamos, então, neste estudo, propiciar que tópicos fundamentais de MQ sejam trabalhados
no EM para que os alunos consigam perceber de forma crítica o papel da teoria e as
decorrências da mesma.
No capítulo II é apresentada uma revisão da literatura no período de 2010 a meados de
2015 com os principais artigos encontrados em revistas e periódicos da área e que tratam da
inserção de conceitos de MQ no EM.
Os capítulos III e IV incluem os referenciais teóricos utilizados na tese. Optou-se por
separar a fundamentação em dois referenciais distintos: um de conteúdo relacionado à MQ e
outro de caráter teórico-metodológico ligado à Teoria da Aprendizagem Significativa (TAS) de
David Ausubel e à Teoria dos Campos Conceituais (TCC) de Gérard Vergnaud. Estes
referenciais são utilizados no trabalho para delinear tanto a metodologia da pesquisa como a
análise dos dados coletados.
O capítulo V apresenta a metodologia de desenvolvimento das duas etapas da
pesquisa, bem como os procedimentos adotados durante as fases de coleta e de análise de
dados.
A análise e a discussão dos dados coletados nas duas etapas da pesquisa constam do
capítulo VI e, no capítulo VII, encontram-se as conclusões e as sugestões para trabalhos
futuros.
Após a apresentação dos resultados e das conclusões, constam a bibliografia utilizada
e os apêndices com os materiais que dão suporte à pesquisa desenvolvida.
5
CAPÍTULO II
REVISÃO DA LITERATURA
1. Introdução
Este capítulo tem como objetivo proporcionar uma revisão da literatura acerca das
publicações envolvendo o ensino e a aprendizagem de conceitos de Mecânica Quântica (MQ)
no Ensino Médio (EM). São considerados dois grupos de trabalhos relativos ao tema: trabalhos
constantes de artigos de revisão já publicados e trabalhos de uma revisão adicional sobre o
assunto, ora apresentada. Apesar de o foco desta Tese ser a MQ no EM, são também
abordados trabalhos que incluem a Física Moderna e Contemporânea (FMC) no EM e uma
extensão conceitual da MQ no ensino superior.
O primeiro grupo analisado inclui trabalhos sobre FMC e MQ apresentados aos níveis
médio e superior até 2009 e o segundo grupo abarca trabalhos publicados de 2010 até meados
de 2015.
6
trabalho, de Stefanel (1998), apresenta resultados relacionados à incorporação do princípio da
superposição linear pelos alunos.
Os autores desta revisão consideram que o pequeno número de artigos relacionados a
estudos sobre concepções alternativas e a propostas testadas em sala de aula deve incentivar
a pesquisa nessa área. Mesmo salientando que este é um grande desafio, outro ainda é
proposto: o de analisar quais tópicos sobre FMC devam ser ensinados nas escolas.
Em uma revisão específica sobre o ensino de MQ, Greca e Moreira (2001) apresentam
mais de 40 artigos atingindo cursos introdutórios (em nível médio e superior) publicados de
1970 a 2000. Os artigos foram classificados em três grandes grupos: artigos sobre concepções
dos estudantes a respeito de conteúdos de MQ; trabalhos com críticas aos cursos introdutórios
de MQ; estudos contendo propostas de novas estratégias didáticas. Os autores observam que
são poucos os artigos encontrados no primeiro grupo e que poucas propostas do terceiro grupo
foram efetivamente implementadas, além de constatarem, também, um aumento no interesse
por este tipo de pesquisa nos últimos anos do período analisado.
Quanto aos trabalhos que tratam da análise das concepções prévias dos estudantes
sobre conteúdos de MQ, os autores salientam que tópicos importantes como a superposição
de estados e o problema da medida não estão no foco de estudo de qualquer das publicações.
Os principais tópicos de estudo foram: a estabilidade do átomo; o comprimento de onda de De
Broglie; a Dualidade Onda-Partícula; Princípio da Incerteza; quantização; fótons e elétrons.
Uma das críticas encontradas nos trabalhos relacionados pelos autores (Rüdinger,
1976) diz respeito à tentativa de amarrar os conceitos quânticos aos conceitos clássicos que os
estudantes já conhecem, como no caso da introdução da equação de Schrödinger em analogia
com as ondas mecânicas em cordas vibrantes, o que dificultaria a compreensão da
superposição de estados. A utilização exclusiva de características ondulatórias para descrever
as características dos sistemas quânticos é também criticada por García-Castañeda (1985),
pois isso pode passar a falsa ideia de que basta estender um pouco as ideias sobre ondas
clássicas para compreender os princípios quânticos (Nussenzveig, 1996).
As propostas de novas estratégias para o EM apresentadas nesta revisão foram
categorizadas em quatro abordagens: histórico-filosófica; estabelecimento de elos com a Física
Clássica (FC); apresentação da MQ sem elos com os conceitos clássicos; abordagem
experimental. Somente em uma das propostas de aprendizagem da MQ sem ligação com os
conceitos clássicos (Niedderer e Deylitz, 1999) é utilizado o conceito de estado (entre outros)
para o ensino de tópicos introdutórios de MQ, e apenas com o intuito de descrever um modelo
para o átomo.
Alguns livros-texto também são apresentados como propostas de mudança na
orientação dos cursos introdutórios de MQ, todos eles, contudo, voltados para a educação em
nível superior. O terceiro volume de “The Feynman Lectures on Physics” (Feynman et al., 1963)
7
apresenta o experimento de dupla fenda como fundamental para a compreensão dos
fenômenos quânticos, por conter a essência da MQ. O quarto volume de “Curso de Física
Básica” (Nussenzveig, 1996) discute largamente os princípios quânticos a partir do conceito de
estados de polarização dos fótons.
Em suas considerações finais, Greca e Moreira (2001) observam que os autores dos
trabalhos relacionados indicam que os estudantes não compreendem satisfatoriamente os
conceitos da MQ, mesmo que muitas das pesquisas realizadas não sejam conclusivas a
respeito. Além disto, segundo os autores, as abordagens tradicionais da MQ têm sido
severamente criticadas sob vários ângulos, recomendando-se enfatizar os aspectos
conceituais desta teoria em cursos introdutórios.
8
de estudos relativos à formação inicial e continuada de professores dado que, de todos os
trabalhos analisados, somente quatro eram concernentes a este tema. A sugestão final é de
que é necessário investigar os processos conduzidos em sala de aula, que estruturam e
condicionam a aprendizagem, mesmo sabendo da importância no rigor e na ênfase que devem
ser dados aos conceitos-chave.
Pantoja et al. (2011) apresentam uma revisão sobre trabalhos de pesquisa em ensino
de MQ no período de 1999 a 2009. Cinco grupos foram utilizados em sua classificação:
propostas didáticas; implementação de propostas didáticas; estudos de concepções; análise
curricular e críticas aos cursos introdutórios; análise teórica/epistemológica.
Onze artigos foram classificados na primeira categoria e nove propostas foram
relacionadas com sugestões didáticas específicas para o EM, sendo três destes escritos
elaborados pelos mesmos autores. As propostas de Michelini et al. (2000), Goff (2006) e
Fanaro et al. (2007; 2009) incluem conceitos básicos de MQ. É interessante destacar que
somente três trabalhos abordaram a chamada Velha Teoria Quântica, o que sugere que tais
tópicos estejam sendo esgotados como fonte de estudos. Os autores, além disto, acreditam
que o pequeno número de novas propostas pode significar que as anteriores estejam sendo
testadas.
Efetivamente, na segunda categoria foram encontrados 25 trabalhos, a maioria (21)
tratando de estudos no Ensino Superior. Somente quatro artigos abordam o ensino de MQ no
EM e nenhum deles abarca conceitos fundamentais como o de estado de um sistema físico e o
de superposição linear de estados. Os trabalhos de Greca et al. (2001) e Singh (2008b)
envolvem a aquisição de tais conceitos, mas ambos apresentam uma abordagem para o
Ensino Superior. Como a combinação de laboratório virtual e aulas expositivas é a metodologia
mais utilizada nas propostas, esta conjugação se revela como um fértil campo de pesquisa.
Um dado interessante na terceira categoria é o de que o número de artigos enfatizando
as concepções da Velha Teoria Quântica (quatro) é quase o mesmo dos que abordam a (Nova)
Teoria Quântica (cinco). Nos trabalhos deste grupo, o maior objetivo dos autores era
apresentar um questionário para detecção de concepções, narrando o processo de validação,
bem como a apresentação de possíveis concepções dos alunos. Em particular, Singh (2008a)
elaborou e aplicou um teste a cerca de 200 estudantes de Física de início de curso, de sete
universidades diferentes, sobre conceitos e princípios fundamentais da MQ, detectando
dificuldades de entendimento comuns a todos.
Três dos quatro trabalhos apresentados na quarta categoria atacam problemas
relativos ao EM, seja enfocando os currículos europeus e de alguns outros países (Lobato e
Greca, 2005) ou questionando a estrutura de livros didáticos e de divulgação científica (Niaz e
Fernández, 2008; Velentzas et al., 2007). Os autores acreditam que a escassez de trabalhos
9
nessa área pode estar relacionada, em grande parte, à exigência maior de domínio de
conteúdo para efetuar esta análise.
Mesmo com o pequeno número de artigos encontrados na quinta categoria, os autores
consideram de grande valia a reflexão sobre a organização do conteúdo tanto no que tange ao
uso de teorias de aprendizagem quanto de epistemologia. Há uma indicação de que os
trabalhos apresentados possuem uma nova linha de pensamento para o Ensino de Física, seja
para justificar a proposta de um dado viés para a construção de unidades didáticas em MQ,
como para fundamentar epistemologicamente um texto didático a ser utilizado no EM
(Brockington e Pietrocola, 2005).
Ao final desta revisão é apresentada uma análise da quantidade de publicações na
área. O crescimento da pesquisa neste caso é nítido, principalmente ao se considerar que, dos
60 artigos encontrados, 27 foram publicados nos dois últimos anos da revisão. O destaque final
fica para o aumento da quantidade de artigos publicados na categoria de implementação de
propostas didáticas (cinco e oito trabalhos, respectivamente, nos dois últimos anos da revisão).
Silva e Almeida (2011) apresentam uma revisão da literatura sobre ensino de tópicos
de MQ especificamente para o EM, entre os anos de 1997 e 2010. Os trabalhos encontrados
foram separados em cinco categorias: revisão da literatura sobre o ensino de MQ/FMC; análise
curricular; análise dos conteúdos em livros que abordam MQ/FMC; elaboração e/ou aplicação
de propostas de ensino; concepções de professores sobre o ensino de MQ/FMC no EM.
Por se tratar de revisão que abarca um período comum ao de algumas já
apresentadas, vários trabalhos já foram elencados em categorias das outras revisões. Assim,
apresentamos apenas um resumo da motivação desta revisão. Os trabalhos sobre revisão da
literatura, análise curricular e análise de conteúdos em livros que abordam MQ/FMC constam
todos das demais revisões apresentadas neste capítulo e não serão novamente citados.
Nas propostas de ensino, tanto as elaboradas como as aplicadas, foi encontrada
somente uma matéria relacionada à superposição de estados (na forma de um contraexemplo)
e outra ao conceito de estado de um sistema físico.
Johansson e Milstead (2008), ali arrolados, sugerem a utilização do Princípio de
Incerteza de Heisenberg para promover a compreensão de fenômenos como o da
radioatividade e também as forças de troca. Estes autores consideram que seja feita apenas
uma referência a e como limites impostos pela natureza ao nosso conhecimento de tais
grandezas, não sendo necessário introduzir quer a expressão formal do Princípio, quer o
conceito de função de onda de uma partícula e nem discutir a superposição de estados.
Carvalho Neto et al. (2009) apresentam os resultados da aplicação de uma proposta
didática, relativos ao ensino de aspectos da MQ em seu caráter preditivo probabilístico,
baseando-se na interpretação da complementaridade de Niels Bohr. Após realizar pré-testes,
entrevistas prévias, minicurso e entrevistas finais, os autores concluem que houve
10
aprendizagem significativa acerca das previsões essencialmente probabilísticas da MQ. Isto
porque os estudantes reconheceram que o ato de preparar e observar um dado sistema físico,
em certo instante de tempo, define o fenômeno como ondulatório ou corpuscular, de acordo
com a interpretação da complementaridade. Conforme os autores, os estudantes também
perceberam que o elétron não é nem onda e nem partícula clássica e que há diferença entre
estado quântico físico (descrito pela função de onda) e estado clássico (definido por posição e
velocidade). Adicionalmente, os autores consideram que o conceito de “previsão” deve ser
exigido como subsunçor para a aprendizagem significativa do aspecto preditivo das teorias
físicas.
Ao final da revisão, os autores apontam que a pertinência de se ensinar MQ no EM é
cada vez mais consensual entre os pesquisadores da área. Especificamente, o consenso é
maior na posição de que só faz sentido ensinar MQ no EM se for privilegiado o caráter
qualitativo, conceitual, filosófico, cultural, em detrimento de um enfoque matemático. A
constatação de inúmeras sugestões de formas de abordagem da MQ evidencia que não existe
definição no que tange aos conteúdos a serem ministrados no EM. Há trabalhos que usam o
Princípio de Incerteza de Heisenberg, a interpretação probabilística da MQ, o conceito de spin
e a dualidade onda-partícula, sem se limitar ao efeito fotoelétrico, ao raio-X ou à quantização
da energia. É ressaltada no trabalho, também, a necessidade de realização de mais pesquisas
sobre o ensino de MQ no EM, para ampliar o conhecimento sobre o assunto e possibilitar que
professores trabalhem tais tópicos em sala de aula.
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Foram selecionados 39 trabalhos, assim agrupados: propostas pedagógicas; propostas
didáticas implementadas; estudos sobre concepções de estudantes ou professores acerca de
tópicos fundamentais de MQ; análise de material didático; estudos sobre formação continuada.
O primeiro conjunto trata de referências apresentadas como material de consulta
direcionado a professores de Física, em nível médio ou superior, enquanto a segunda
categoria inclui propostas pedagógicas testadas em sala de aula ou em fase de
implementação. O terceiro grupo abarca trabalhos em que foram averiguadas concepções,
atitudes e ideias prévias de alunos e professores sobre tópicos de MQ. A quarta categoria se
refere à análise de materiais didáticos para o ensino de FMC no EM e a quinta categoria,
finalmente, apresenta estudos sobre a formação continuada de docentes para análise e
promoção da atualização curricular no EM.
Alguns dos trabalhos encontrados se enquadram em mais de uma categoria; optou-se,
então, por situá-los naquela considerada mais próxima de seu propósito, lembrando que a
classificação ora utilizada é apenas uma de muitas possíveis. Apesar de o foco desta Tese ser
o ensino de MQ no EM, são incluidos também artigos voltados para o Ensino Superior, pois
algumas propostas voltadas a alunos de graduação podem ser úteis para alunos de EM.
Em dois trabalhos diferentes, Gordon e Gordon (2010, 2012) apresentam dois jogos,
baseados nos clássicos “campo minado” e “raposa e cães de caça” (fox and hounds), como
recursos para o ensino de conceitos de MQ de maneira divertida. O primeiro jogo introduz o
“campo minado quântico”, que trabalha com os conceitos de superposição de estados,
emaranhamento e não-localidade, e o segundo apresenta o “gato de Schrödinger e matilha”,
que pode ser utilizado para abordar conceitos como os de superposição de estados,
interferência construtiva e destrutiva, medições e emaranhamento. Neste último, é possível
também tratar os conceitos de dualidade onda-partícula e descoerência, utilizando-o como um
modelo. Este segundo jogo foi apresentado, de modo preliminar, para 95 estudantes de ensino
secundário em uma aula de uma hora e meia e acompanhado de um questionário de múltipla
escolha, aplicado antes e depois da instrução, abordando superposição de estados,
interferência, medição e emaranhamento. A compreensão dos estudantes acerca dos
conceitos é apresentada em gráficos que mostram que a maior parte dos alunos respondeu o
pós-questionário de modo correto. Além disto, muitos estudantes consideraram a atividade
interessante e não muito longa e se mostraram interessados em outros materiais de
aprendizagem envolvendo jogos, além de considerarem que este recurso auxiliou na
compreensão de conceitos de MQ. Tais jogos, assim como outros propostos pelos mesmos
autores, são considerados bons auxiliares para a compreensão do significado da superposição
de estados e do emaranhamento.
Kuttner e Rosenblum (2010) apresentam quatro variações de um experimento
imaginado (gedankenexperiment), com foco no teorema de Bell e no emaranhamento,
12
experimento este que pode ser trabalhado em cursos de física em qualquer nível de ensino.
Como o fenômeno do emaranhamento quântico é usado atualmente em indústrias e discutido
correntemente na literatura popular, faz-se necessário abordá-lo em sala de aula visto que
divulgações pseudocientíficas utilizam este conceito de forma equivocada. Os autores
consideram também que o contato com uma área tão próxima da fronteira da Física pode
estimular o aluno para o aprendizado.
Dada a dificuldade experimental em realizar trabalhos com a câmara de bolhas,
Gagnon (2011) apresenta software computacional capaz de realizar a simulação do
experimento em um nível muito próximo do real. Dados preliminares apontam para um sucesso
na utilização desta simulação em aulas de mecânica, eletromagnetismo e física moderna. A
simulação permite ilustrar o efeito de um campo magnético em partículas eletricamente
carregadas, exemplificar a mecânica relativística e discutir conservação de energia, momento
linear e números quânticos em colisões entre partículas, além de proporcionar exemplos para
que os estudantes possam exercitar a habilidade de identificar partículas.
Dando sequência a um trabalho de 2007, Hobson (2011, 2012) apresenta duas
abordagens diferentes para introduzir a MQ. No trabalho de 2011, o foco é o ensino do
conceito de incerteza. O autor utiliza pacotes de onda para explicar os resultados do
experimento de dupla fenda e mostra também que, apesar da aleatoriedade existente nos
eventos quânticos individuais, a estatística para grandes números destes eventos é previsível,
indicando que uma visão meramente probabilística da MQ é incorreta. O autor também
argumenta que a incerteza pode ser desprezada no mundo macroscópico, fazendo recair
assim na Mecânica Clássica (MC). No segundo trabalho, o experimento de Rarity-Tapster-
Mandel (Rarity e Tapster, 1990) é utilizado para ilustrar e auxiliar na compreensão do conceito
de não-localidade e da desigualdade de Bell.
Considerando a linguagem como fundamental para a compreensão da Ciência e a
construção de conceitos científicos, Paulo e Moreira (2011) discutem a relevância da
linguagem e da captação de significados da MQ para a inserção de seus conceitos
fundamentais no EM. O problema da relação entre as linguagens clássica e quântica é
levantado e os autores apresentam a opção da utilização da linguagem clássica para tratar os
fenômenos quânticos, desde que a lógica seja modificada e torne-se condizente com a MQ.
Assim, de acordo com os autores, a lógica científica subjacente à FC deve ser abandonada. A
modificação na lógica presume a distinção entre diversos níveis de linguagem, em que o
primeiro se refere a objetos (átomos, elétrons, etc), o segundo, a enunciados sobre objetos, o
terceiro, a enunciados acerca dos enunciados sobre objetos e assim sucessivamente.
Uma seleção de mais de quarenta animações interativas e visualizações gratuitas a
serem utilizadas em diversos níveis de cursos de graduação para o ensino de MQ se encontra
em Kohnle et al. (2012). As animações abordam diversos tópicos, tais como o modelo atômico
de Bohr para o átomo de hidrogênio, a análise probabilística de sistemas clássicos, pacotes de
ondas, efeito fotoelétrico, Princípio de Incerteza de Heisenberg, poço finito, expansão em
autoestados, medida e colapso da função de onda e informação quântica. Cada animação
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inclui um roteiro passo-a-passo salientando os pontos-chave. Em um diagnóstico realizado com
estudantes que utilizaram individualmente as animações, os autores relatam a ocorrência de
ganhos substanciais na aprendizagem daqueles que trabalharam com as animações.
Recorrendo a uma abordagem fenomenológica e conceitual, Pereira et al. (2012)
apresentam e discutem os postulados da MQ com auxílio de um interferômetro virtual de Mach-
Zehnder. O conceito de estado do sistema é considerado como central na MQ porque expressa
um conjunto de informações sobre o sistema físico. Os autores então delineiam uma
abordagem operacional para o ensino de MQ, com a intenção de contornar as dificuldades
decorrentes do formalismo matemático que surgem no ensino desta teoria. Tal transposição
didática pode contribuir para o primeiro contato de alunos de EM com a MQ e fazer com que
conceitos como os de estado, autoestados, observáveis, superposição de estados, projeção e
probabilidade façam mais sentido do que uma abordagem tradicional acerca do efeito
fotoelétrico, radiação de corpo negro ou modelos atômicos semiclássicos.
Rau (2012) apresenta dois exemplos de tópicos de MQ com origem na Astronomia,
com vistas a alunos de cursos de graduação: átomos sob a ação de fortes campos magnéticos;
íon negativo do hidrogênio. Tais exemplos são considerados pelo autor como problemas
fundamentais da MQ por tratarem de princípios e técnicas básicos, apresentar interesse prático
e possuir importância histórica. O autor não informa se tais tópicos foram trabalhados em sala
de aula.
Um conjunto de exemplos históricos e fenomenológicos, constituindo uma contribuição
didática para a divulgação e compreensão da dualidade onda-partícula em um curso
introdutório de MQ, é apresentado por Segura et al. (2012). Como recurso para cursos
introdutórios de MQ, sugerem a utilização do aporte histórico, desde as primeiras discussões
sobre a natureza da luz no século XVII, o experimento de dupla fenda, as confirmações dos
experimentos de Fresnel e Maxwell acerca da natureza ondulatória da luz e as ondas de
matéria de De Broglie. Com esta apresentação, pretendem os autores introduzir quatro noções
cruciais para a compreensão da MQ e que estruturam o fenômeno da dualidade onda-partícula:
fusão, unificação, compatibilidade e percepção como um todo. Estas noções são consideradas
fundamentais por propiciarem que problemas como o da superposição de estados e o da
medição sejam abordados e tornem o mundo quântico mais compreensível.
14
graduação e os resultados indicaram uma melhora na compreensão de tópicos abordados na
disciplina regular de MQ pelos estudantes que realizaram esta atividade. Relatórios dos
experimentos e questionários ao final do curso também ajudaram a constatar a boa
compreensão de tais tópicos. O autor acredita que o formalismo matricial auxiliou na explicação
dos experimentos com fótons correlacionados, conforme a linguagem utilizada na disciplina, e
serviu também para introduzir alguns aspectos do emergente campo da informação quântica.
Kiouranis et al. (2010) apresentam a análise da implementação de uma sequência
didática sobre o comportamento de objetos (partículas e ondas) no experimento de dupla fenda
dirigida a estudantes de química quântica de um curso de Bacharelado em Química. A análise
é fundamentada na teoria da transposição didática de Yves Chevallard, que possibilita a
reflexão sobre o saber científico reelaborado para ser utilizado em situações de ensino,
preocupando-se assim em tornar os conceitos mais compreensíveis para os alunos. Durante a
verificação do saber ensinado, os autores comentam que os alunos expressaram suas ideias
com interrupções, lacunas e linguagens coloquiais, influenciadas por diversos fatores, tais
como o livro didático, a fala do professor e materiais de divulgação científica. Necessidades e
possibilidades de aprendizagem foram identificadas e uma reorientação da prática do professor
da disciplina foi promovida através de um processo dinâmico de ação e reflexão.
A viabilidade de uma proposta pedagógica de curta duração para o ensino de MQ a
alunos de graduação é analisada por Rocha et al. (2010). Um minicurso visando estabelecer
situações propícias para o ensino de conceitos de MQ foi elaborado e aplicado em três
ocasiões para professores em formação ou em exercício. A receptividade dos tópicos
abordados (experimento de dupla fenda, superposição de ondas e de vetores do plano,
emaranhamento quântico e criptografia quântica) e comentários decorrentes, sugere que a
ausência de discussões relativas aos conceitos fundamentais da MQ em cursos de graduação
é sentida pelos alunos. Os conceitos de estado e de superposição linear de estados não foram
considerados de difícil compreensão pelos alunos, face às situações apresentadas. Os autores
sugerem que o ensino introdutório de MQ seja feito sem o uso de conceitos da MC e com
auxílio de inúmeras situações-problema nas quais os conceitos fundamentais da MQ são
utilizados.
Deslauriers e Wieman (2011) mediram a aprendizagem e a retenção de conceitos da
MQ por estudantes de engenharia da Universidade de British Columbia. Dois grupos, um com
57 e outro com 63 estudantes, tiveram abordagens diferentes de ensino e um questionário
previamente validado foi utilizado em ambos. Para o primeiro grupo foi oferecida uma
abordagem tradicional de ensino, enquanto o segundo recebeu um curso diferenciado com
leituras pré-classe, aulas interativas, questões rápidas para discussão entre os alunos e
simulações computacionais, além de artigos sobre como pessoas aprendem e retêm o
conhecimento. O primeiro grupo teve um desempenho 19% menor do que o segundo; a
retenção de conceitos nos dois grupos, contudo, foi alta, como mostraram testes aplicados seis
e dezoito meses após o término do curso. A alta retenção verificada contrasta com a
15
aprendizagem obtida em cursos usuais de graduação e sinaliza para a importância de uma
aprendizagem conceitual de MQ.
Kapon et al. (2011) descrevem uma proposta didática delineada para examinar a
aprendizagem de 14 estudantes que concluíram a escola secundária e que foram
apresentados a palestras online proferidas por cientistas, sobre ideias avançadas de FMC (por
exemplo, o efeito Aharonov-Bohm). Os alunos foram divididos em dois grupos, cada um
recebendo instruções sobre MQ e Astrofísica de forma alternada. Uma atividade em grupo foi
realizada logo após as palestras para que se pudesse categorizar a aprendizagem dos
estudantes. Mesmo que as palestras fossem muito além de sua capacidade de compreensão,
a análise das discussões indicou que os estudantes conseguiam inferir e progredir no domínio
dos conceitos abordados nas palestras. Os grupos também foram submetidos a cinco testes
(antes da primeira palestra, após a primeira palestra, após a atividade em grupo, após a
segunda palestra e um teste de retenção um ano após as palestras). Os resultados indicam
que a apresentação de tópicos de FMC deste modo, somada à instrução formal, pode auxiliar
na incorporação desta área ao currículo e introduzir a Física de uma maneira mais relevante e
útil para os alunos.
No decorrer de aulas sobre processos de transferência de calor para quinze alunos da
segunda série de uma escola particular de EM, Lino e Fusinato (2011) abordaram o problema
da radiação de corpo negro, inserindo conceitos de MQ, como o da quantização da energia. O
curso teve a duração de oito horas-aula e mapas conceituais foram utilizados como
instrumentos de avaliação. Além disto, os alunos responderam um questionário com quatro
questões, cujo objetivo era verificar as noções reveladas acerca da constituição da energia
radiante de corpos aquecidos. As respostas foram separadas em duas categorias: respostas
que apresentam bases conceituais apenas com conceitos clássicos; respostas que apresentam
bases conceituais quânticas. A análise dos questionários indicou que ocorreu alteração no
conceito subsunçor de energia, havendo incorporação da ideia de quantização neste conceito,
o que pode ser considerado como um primeiro indício de ocorrência de aprendizagem
significativa. De acordo com os autores, a estrutura hierárquica de conceitos e as conexões
presentes nos mapas conceituais também fornecem indício de ocorrência desta aprendizagem.
Pereira et al. (2011) apresentam um estudo acerca da fala privada em uma atividade
realizada por um grupo de alunos de curso de Licenciatura em Física, recorrendo a um
interferômetro virtual de Mach-Zehnder. O objetivo era verificar a ocorrência de fala privada em
adultos e analisar como esse processo de mediação é utilizado em uma situação de resolução
de problemas envolvendo conceitos de MQ. Foi constatada a ocorrência de fala privada,
atribuindo-se isto às duas ferramentas culturais fornecidas pelo cenário sociocultural: roteiro e
software. Os resultados encontrados destacam a importância das atividades colaborativas no
âmbito da pesquisa em Educação em Ciências.
Um relato de experiência acerca da difusão do conteúdo de FMC para alunos e
professores de escolas públicas de EM é apresentado por Vicentini et al. (2011). O projeto foi
desenvolvido em uma disciplina de curso de graduação e, com apoio de políticas universitárias
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e governamentais, os alunos fizeram apresentações em oito colégios, atingindo 850 alunos de
EM, além de cursos para professores da rede pública de uma cidade paranaense. Os temas
abordados foram: Corpo Negro, Efeito Fotoelétrico, Constante de Planck, Dualidade Onda-
Partícula, Origem do Universo, Evidências do Big Bang, Átomo de Bohr, Polaroides e Cristais
Líquidos, Fissão e Fusão Nuclear, Física das Radiações, Laser, Raios X, Relatividade,
Condutores e Isolantes, Semicondutores, Fibras Ópticas, Computação Quântica e Câmaras de
Ionização. Para cada tema, uma série de recursos didáticos foi elaborada: seminários de trinta
minutos, oficina para professores e alunos, experimentos de baixo custo e pôster ilustrativo. Os
resultados satisfatórios mostraram que o projeto contribuiu na complementação da formação
escolar, na divulgação científica e no despertar do interesse dos estudantes pela área de
exatas e tecnologia. Quanto aos professores, especificamente, o projeto foi bastante profícuo,
em boa parte porque muitos dos que lecionavam Física no EM eram formados em Matemática
e tinham dificuldades em trabalhar tópicos de FMC.
Em um estudo com 121 alunos de escola secundária da Nigéria, Adegoke (2012)
examina em que grau uma abordagem de engajamento interativo (evitando a competição em
sala de aula e encorajando a discussão e cooperação) pode reduzir o hiato de gênero nos
resultados de aprendizagem em Física Quântica. Dois grupos foram analisados: um deles
recebeu uma abordagem tradicional de ensino enquanto o outro recebeu a abordagem com
engajamento interativo. Foi preparado um guia instrucional para cada grupo, e aplicado um
teste escrito de desempenho ao final da instrução. Os resultados encontrados permitiram
considerar que o engajamento interativo efetivamente reduziu as diferenças de aprendizagem
entre os estudantes.
Através da aplicação de uma proposta didática de doze horas-aula, Pantoja et al.
(2012) analisaram a aquisição de conceitos como o de sistema físico, variáveis dinâmicas,
estado de um sistema físico e evolução temporal por seis estudantes de um curso de mestrado
profissional. A proposta foi baseada nas teorias de aprendizagem de Ausubel e de Vergnaud e
três situações-problema foram utilizadas: experimento de Stern-Gerlach, átomo de hidrogênio e
molécula de amônia. Problemas de lápis e papel, mapas conceituais, entrevistas
semiestruturadas e anotações de campo fizeram parte dos dados coletados. Considerou-se
que foram obtidas evidências de aprendizagem significativa, tanto na forma predicativa como
na operativa, porém algumas limitações na assimilação dos conceitos são mencionadas pelos
autores. Dificuldades na compreensão dos conceitos de sistema físico, variáveis dinâmicas e,
principalmente, de estado de um sistema físico são relatadas e para tais conceitos foi
necessário ter seus significados reafirmados em diversas oportunidades. Mesmo assim, foi
considerado ter ocorrido aprendizagem significativa em quatro dos seis estudantes que
participaram da instrução.
Com a análise de uma atividade didática centrada no interferômetro virtual de Mach-
Zehnder, Pereira, Ostermann e Cavalcanti (2012) apresentam dois exemplos de um estudo em
que alunos de graduação em Física utilizam o discurso para promover a apropriação de um
conceito. Na atividade, a construção de significados surgiu por meio de um processo de
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interanimação de vozes, ou seja, diversas vozes se colocam em contato dentro de um mesmo
enunciado, em que não é assinalado individualmente quem resolveu o problema. Isto indicou
que foi o grupo, enquanto “sistema”, que desempenhou tal função no plano intermental e não
apenas uma pessoa. A importância das atividades em grupo desenvolvidas em aulas de
Ciências fica assim destacada, sobretudo porque em muitas ocasiões se esperaria que nem
mesmo o mais capaz dos membros do grupo conseguisse resolver o problema isoladamente.
A. F. G. Silva et al. (2012) analisaram o aprendizado de alunos de terceira série do EM
de escolas públicas e privadas em uma cidade cearense. Um curso de Física Moderna de
quarenta horas-aula foi ministrado para duas turmas de trinta alunos voluntários cada (uma
com alunos de escola pública e uma com alunos de escola privada). O conteúdo abordado no
curso compreendia: o átomo e o quantum; o núcleo atômico e a radioatividade; fissão e fusão
nucleares; teoria especial da relatividade; teoria geral da relatividade. Foram utilizados
experimentos, vídeos e simulações computacionais ao longo do curso. Na comparação entre
as duas turmas, através de um pré e um pós-teste, constatou-se que o desempenho ao final do
curso foi muito semelhante, mesmo com os alunos da escola privada apresentando uma base
conceitual melhor no pré-teste. Os autores indicam, também, que o conteúdo de FMC pode ser
abordado tanto em escolas públicas como privadas, principalmente se utilizados experimentos,
vídeos e simulações, pois em ambos os casos os alunos conseguiram acompanhar o conteúdo
apresentado e entender a parte conceitual, inclusive com referências ao cotidiano.
Pantoja et al. (2014) estudaram a aquisição e retenção do conhecimento explícito e as
operações de pensamento implícitas na MQ que foram feitas por cinco estudantes de
graduação em Física, matriculados pela primeira vez em uma disciplina de MQ. Uma proposta
didática de doze horas de duração, baseada nas teorias da aprendizagem de Ausubel e de
Vergnaud, foi implementada visando a abordagem dos conceitos de sistema físico, variáveis
dinâmicas, estado de um sistema físico e evolução temporal. Os autores consideram que a
proposta encontrou evidências de: mudança considerável de variáveis da estrutura cognitiva;
semelhanças (para os conceitos de sistema físico e de variáveis dinâmicas) e diferenças (para
os conceitos de estado e de evolução temporal) na aquisição dos conceitos por parte dos
estudantes; que quatro dos cinco estudantes adotaram processos mais próximos do polo
significativo do que do polo mecânico da aprendizagem; inadequação do significado atribuído
pelos estudantes ao conceito de probabilidade, antes, durante e depois da instrução, o que
mostra uma tendência a ser um obstáculo epistemológico natural que deve ser abordado com a
apresentação de situações-problema associadas à MQ; que o conhecimento prévio tem um
papel crucial na aquisição, na retenção e na resolução de problemas, se levado em conta.
18
numérica de conceitos. Os testes foram aplicados a 236 estudantes de EM de todas as séries,
na região de Porto Alegre. Os resultados sugerem que conceitos de MQ são apresentados aos
alunos principalmente através da mídia, visto que este é um assunto não abordado
tradicionalmente em salas de aula. Entrando em contato com essa MQ alternativa, os
estudantes constroem ou começam a construir representações sociais da MQ. Os autores
consideram que compreender as representações sociais pode auxiliar na aprendizagem
significativa da MQ, bem como avaliar a influência dos meios de divulgação sobre as ideias dos
indivíduos a respeito deste tema.
Akarsu (2010) apresenta um estudo com a intenção de esclarecer alguns dos
problemas mais comuns no ensino de tópicos de MQ, a saber: dificuldades de aprendizado,
estratégias de ensino insuficientes, problemas conceituais e de instrução. O estudo foi
realizado em cinco universidades dos Estados Unidos e o autor utilizou um questionário com
29 questões que foi respondido por 86 estudantes de cursos de ciência e de engenharia, entre
19 e 21 anos, que participavam de cursos de MQ. Cinco professores de MQ dos
departamentos de Física também foram entrevistados. Além de questionários e entrevistas,
outras fontes de dados são citadas como, por exemplo, tarefas de casa, provas finais, livros-
texto e atividades de laboratório. Nas entrevistas, os professores revelaram que os estudantes
costumam se esforçar para compreender a base abstrata, a formulação matemática e os
diversos níveis de instrução. Os questionários apontaram que 69% dos estudantes adquiriram
um nível adequado de compreensão da MQ, fração considerada baixa pelo autor. Uma das
sugestões apresentadas é não apresentar o modelo atômico de Bohr para que os estudantes
não criem uma noção incorreta acerca das órbitas de elétrons. Com o amparo das Guidelines
for College Physics Program, o autor sugere utilizar diferentes abordagens, como a utilização
de laboratório aberto e troca de instrutores no decorrer do curso, para possibilitar uma melhor
compreensão de conceitos da MQ. A oferta de cursos extracurriculares de física-matemática
antes dos cursos de MQ também é apontada como algo que deve ser considerado.
McKagan et al. (2010) desenvolveram e validaram um questionário com doze questões
para analisar a compreensão de aspectos conceituais da MQ utilizado para avaliar a eficácia
de diferentes métodos de ensino desta teoria.
Para analisar dificuldades conceituais e matemáticas de quinze estudantes de
graduação em Física na Turquia, Özcan (2010) aplicou um questionário com duas questões
abertas, envolvendo propriedades básicas de MC e MQ. Os estudantes, com idades entre 21 e
23 anos, já haviam realizado um curso de MQ e levaram cerca de vinte minutos para responder
o questionário. Foi possível categorizar as respostas dos alunos em três grupos para a MC (a
MC apresenta um ponto de vista holístico; as predições da MC são deterministas; a estrutura
matemática da MC é diferente da utilizada na MQ) e quatro para a MQ (sistemas subatômicos
são descritos pela MQ; o movimento do sistema é descrito pela equação de Schrödinger; as
previsões da MQ são baseadas em probabilidades; a estrutura matemática da MQ é diferente
daquela para a MC). Nove subgrupos de análise são apresentados para a MC e outros nove
para a MQ. O estudo indica que os estudantes possuem dificuldades para identificar diferenças
19
entre MC e MQ e que as descrições apresentadas para os prováveis caminhos de
aprendizagem devem servir para melhorar o currículo e desenvolver novas estratégias de
ensino.
Destacando o Princípio de Incerteza e a Dualidade Onda-Partícula como fundamentais
para a compreensão da MQ, Ayene et al. (2011) apresentam um trabalho que enfatiza as
descrições de estudantes sobre estes conceitos. Um estudo fenomenográfico, com uma
entrevista semiestruturada, foi realizado com 25 estudantes de curso de graduação em uma
universidade etíope. A descrição dos estudantes sobre dualidade onda-partícula foi mapeada
em três categorias: clássica, mista e semiquântica. A descrição do conceito de incerteza foi
separada em quatro grupos: incerteza como propriedade extrínseca do processo de medição,
princípio de incerteza como erro ou incerteza de medição, incerteza como distúrbio da medição
e incerteza como o princípio de incerteza da MQ. De modo geral, os estudantes tiveram a
tendência de mostrar uma visão mais clássica na interpretação da MQ; entretanto, uns poucos
estudantes utilizaram fenômenos tipicamente ondulatórios como interferência e difração em
sua descrição das propriedades ondulatórias de entidades quânticas. Este resultado, ainda
assim, é extremamente consistente com o que havia sido encontrado em estudos anteriores
pelos autores.
Considerado como elemento importante no ensino do formalismo da MQ, o
experimento de Stern-Gerlach é utilizado por Zhu e Singh (2011) para a compreensão de
alguns conceitos como o da preparação de um específico estado quântico a partir de um
estado arbitrário, a evolução temporal da função de onda e a medição em MQ. A análise foi
realizada através de entrevistas individuais com mais de duzentos estudantes de Física de
várias universidades em cursos de pós-graduação e de graduação e que cursavam disciplinas
de MQ. Os estudantes apresentaram dificuldades na distinção entre o espaço físico (em que o
experimento é realizado) e o espaço de Hilbert (em que se situa o estado do sistema) e na
preparação de um estado quântico específico em um espaço de Hilbert bidimensional. As
dificuldades encontradas foram usadas como guia para a elaboração de um tutorial para
auxiliar os estudantes no aprendizado de princípios fundamentais da MQ utilizando o
experimento de Stern-Gerlach. Em análises preliminares, o tutorial pareceu realmente melhorar
a compreensão de conceitos da MQ no contexto deste experimento.
Pereira e Ostermann (2012) analisaram o modo como recursos textuais disponíveis
moldam as explicações dos futuros professores de Física sobre MQ. O estudo foi desenvolvido
em uma disciplina introdutória de MQ de um curso de licenciatura, sendo este o primeiro
contato formal dos estudantes com esta matéria. Os estudantes foram submetidos a um teste
do tipo lápis e papel com uma questão conceitual sobre o formalismo da MQ e uma aplicação
da equação de Schrödinger independente do tempo para um elétron preso em um potencial
quadrado infinito. Este teste foi realizado em pequenos grupos (dois ou três alunos) e constituiu
uma das avaliações do curso, podendo ser consultado o material de apoio da disciplina e
acessar a internet. Microfones e gravadores de som foram instalados para registro do áudio
das conversas dos alunos. A análise dos discursos mostrou que as primeiras explicações dos
20
alunos se basearam na dicotomia “determinismo-probabilismo”, ora em combinação com a
explicação geral do Princípio de Incerteza, ora com o postulado de Born, que afirma que o
quadrado do módulo da função de onda representa a densidade de probabilidade de se
encontrar o objeto quântico em uma determinada região do espaço. A introdução de textos
explicativos na resolução da questão permitiu que os estudantes subvertessem suas respostas,
inserindo novos conceitos, e que ficassem mais próximos de uma explicação completa e
adequada ao problema proposto.
Para investigar as dificuldades que estudantes possuem a respeito da MQ não-
relativística de uma partícula em uma dimensão espacial, Zhu e Singh (2012) desenvolveram e
aplicaram um questionário a mais de duzentos estudantes de graduação e pós-graduação de
dez universidades. O questionário apresentava perguntas relacionadas a possíveis funções de
onda, estados ligados e de espalhamento, processos de medição, valores esperados, papel do
Hamiltoniano e dependência temporal da função de onda e de seus valores esperados. Os
resultados apontam muita dificuldade dos estudantes na compreensão destes conceitos e que
tutoriais e métodos de peer-instruction podem ajudar a reduzir significativamente tais
dificuldades. Os autores também observam que cursos de graduação de MQ não têm sido
efetivos em ajudar na compreensão destes tópicos, principalmente porque, em geral, o foco é
mantido em avaliações quantitativas.
Hilger e Moreira (2013) apresentam alguns resultados preliminares de uma
investigação sobre eventuais representações sociais da teoria quântica, possivelmente
compartilhadas entre 238 estudantes do EM, todos da mesma cidade. O objetivo do trabalho
era o de identificar e caracterizar possíveis representações sociais utilizando testes de
associação numérica e escrita de conceitos, além de técnicas de análise multidimensional para
o estudo dos dados obtidos. Segundo os autores, a compreensão dessas representações pode
fornecer indícios acerca da influência dos meios de divulgação sobre as ideias dos indivíduos a
respeito de conceitos científicos. Estas representações integram o conhecimento prévio do
aluno e terão papel fundamental para a ocorrência de aprendizagem significativa da Física
Quântica, caso possam ser caracterizadas como subsunçores. Os resultados apontam que as
representações sociais dos conceitos quânticos são desenvolvidas de forma a que podem se
tornar grandes obstáculos epistemológicos para a compreensão dos conceitos cientificamente
aceitos.
Sinarcas e Solbes (2013) analisam o processo de ensino-aprendizagem em estudantes
de segunda série do EM da Espanha e mostram as principais dificuldades enfrentadas por
eles, principalmente as de cunho ontológico e epistemológico. Após a aplicação de um
questionário a 78 estudantes e a análise de 10 livros didáticos, os autores consideram que os
alunos possuem grandes dificuldades de compreensão da MQ, especialmente sobre o espectro
descontínuo do átomo de Bohr, a diferença entre estado clássico e estado quântico de um
sistema e a implicação tecnológica da MQ, e que os livros não conduzem à aprendizagem
significativa dos conteúdos abordados, pois não introduzem os conceitos de forma crítica. O
trabalho apresenta uma crítica razoável à prática tradicional para o ensino de MQ, visto que os
21
estudantes não compreendem efetivamente o papel da teoria quântica, e aponta uma nova
abordagem para seu ensino. Os autores defendem que o ensino de MQ deve ser desenvolvido
levando em conta o currículo oficial, os resultados da pesquisa educacional e o
desenvolvimento histórico da MQ, incluindo conceitos e conteúdos procedimentais e tópicos da
Natureza da Ciência e das relações Ciência-Tecnologia-Sociedade. Uma unidade de ensino
obedecendo estes pontos foi desenvolvida e está sendo utilizada com alunos de EM para
verificar se há superação das dificuldades e êxito nos objetivos propostos.
Didiş et al. (2014) apresentam a primeira parte de um estudo visando examinar os
modelos mentais de 31 estudantes acerca da quantização de observáveis físicos, tais como
luz, energia e momento angular, em um curso de Física Moderna. Os estudantes eram
provenientes de curso de graduação em física ou em ensino de física. A análise qualitativa,
segundo diversas entrevistas realizadas com os estudantes, revelou seis variações dos
modelos mentais sobre a quantização dos observáveis físicos: modelo científico, modelo
científico primitivo, modelo de retalhamento, modelo alternado, modelo integrado e modelo
evolutivo. Os modelos dos estudantes foram determinados conforme o contexto e, além disso,
alguns estudantes apresentavam um modelo misto, com a utilização de múltiplos modelos
mentais, para explicar um fenômeno e os usavam de forma inconsistente.
22
profundo conhecimento sobre o tema, para poder trabalhar os conceitos de forma clara e
motivadora sem envolver cálculos matemáticos sofisticados.
23
condicionam a aprendizagem, mesmo sabendo da importância no rigor e na ênfase que devem
ser dados aos conceitos-chave. O quarto trabalho, de Pantoja et al. (2011), destaca o aumento
da quantidade de artigos publicados na categoria de implementação de propostas didáticas
(cinco e oito trabalhos, respectivamente, nos dois últimos anos da revisão) e tais
implementações ocorrem, em sua maioria, no Ensino Superior (21 dos 25 trabalhos
encontrados). Para a aplicação destas propostas, os autores apontam que as metodologias
mais utilizadas são a aula expositiva, a instrução via laboratórios virtuais ou uma combinação
destas duas. O quinto trabalho, de Silva e Almeida (2011), é específico para artigos
relacionados com o EM e indica que a pertinência de se ensinar MQ no EM é cada vez mais
consensual entre os pesquisadores da área, além de destacar que a existência de inúmeras
sugestões de formas de abordagem da MQ evidencia a falta de definição no que tange aos
conteúdos a serem ministrados no EM. Os autores ressaltam, também, a necessidade de
realização de mais pesquisas sobre o ensino de MQ no EM, visando ampliar o conhecimento
sobre o assunto e possibilitar que professores trabalhem tais tópicos em sala de aula.
Em seus trabalhos, Ostermann e Moreira (2000) e Greca e Moreira (2001) não indicam
o número de artigos analisados em suas revisões, mas se estima que sejam mais de 50
trabalhos na primeira revisão e mais de 40 trabalhos na segunda revisão. Pereira e Ostermann
(2009) apontam 102 artigos encontrados com a temática de estudo em seu trabalho, enquanto
Pantoja et al. (2011) encontraram 60 trabalhos e Silva e Almeida (2011) relacionaram 23
trabalhos. Isto indica que, desde a década de 1970, cerca de 270 artigos foram analisados
nestas revisões. Este número pode ser ligeiramente menor, visto que alguns artigos aparecem
em mais de uma revisão.
A nova revisão, por nós organizada, relativa ao período de 2010 a 2015, encontrou 39
trabalhos relacionados ao tema de FMC, particularmente sobre tópicos de MQ, sendo
dezesseis trabalhos relacionados com o EM ou com implicações para ele (sete em propostas
pedagógicas, cinco em propostas didáticas implementadas, três em estudos sobre concepções
e um em cada uma das demais). No período em análise, a revisão inclui o conteúdo e os temas
mais atuais de MQ apresentados no Ensino de Física, segundo os periódicos analisados. As
cinco revisões anteriores apontaram escassez ora na aplicação de propostas didáticas, ora nos
estudos de levantamento de concepções, enquanto a presente revisão constata que os
trabalhos estão bem divididos nas três primeiras categorias (onze na primeira, quatorze na
segunda e onze na terceira), indicando que os estudos sobre a inserção de tópicos de MQ
estão sendo realizados em diferentes abordagens de pesquisa. Alguns trabalhos encontrados
no levantamento desta revisão mostram, inclusive, que algumas abordagens compreendem o
ensino dos conceitos e princípios da MQ em níveis mais aprofundados, tais como em cursos de
bacharelado ou de pós-graduação.
O presente trabalho visa a implementação de uma proposta didática com conceitos e
princípios fundamentais da MQ para alunos de EM, algo não encontrado nos trabalhos
analisados.
24
O desafio inerente à pesquisa neste campo de conhecimento fica explícito em
praticamente todos os trabalhos encontrados, seja os relativos ao EM, ao ensino superior ou na
formação continuada de professores. Isto, no entanto, não deve causar impedimentos para o
desenvolvimento da pesquisa em Ensino de Física, mas sim promover uma busca por
diferentes formas de apresentação da MQ, visando a atualização curricular e o interesse dos
alunos nos conteúdos de Física e na carreira científica.
25
CAPÍTULO III
1. Introdução
26
interesse de áreas de conhecimento dantes não relacionadas à MQ, em número cada vez mais
crescente.
A estudantes e profissionais de áreas não diretamente relacionadas à Física
interessam mais os aspectos conceituais da Teoria Quântica e menos a resolução de
problemas específicos, como os de equações de autovalores de energia de sistemas
complexos, investigados pela Física Atômica, pela Física Molecular e pela Física Nuclear.
Neste contexto, são apresentados a seguir, então, alguns dos conceitos e princípios da
MQ, que embasam o projeto de ensino assunto deste trabalho. O curso não utiliza a
formulação dos mesmos, mas apresenta situações-problema que conduzem o aluno a
compreender o que vários dos postulados estabelecem.
27
com vetores e operadores. Efetivamente, espaços lineares complexos são definidos sobre o
campo dos escalares complexos, e incluem vetores e operadores; os vetores podem se
superpor linearmente gerando novos vetores e são transformados pela ação de operadores
sobre eles.
O princípio da superposição linear estabelece que, dados dois (ou mais) vetores de um
espaço linear, qualquer combinação linear destes vetores também é um vetor deste espaço
linear.
28
Assim, o estado de um sistema quântico, quando conhecido completamente, contém as
informações sobre valores de todos os observáveis compatíveis de um dado conjunto, em
determinado instante de tempo. Isto implica em que deve ser possível acessar (medindo) estas
informações e a isto se referem os quatro postulados seguintes.
Pelo primeiro postulado, então, os estados de sistemas quânticos podem ser descritos
como vetores pertencentes a espaços lineares e sobre tais vetores podem ser executadas
operações que, em geral, caracterizam modificações dos estados.
O princípio da superposição linear, nesta teoria, estabelece que, dados dois (ou mais)
estados distintos admissíveis para um determinado sistema ou objeto quântico, então qualquer
combinação linear destes dois (ou mais) estados também é um estado admissível para o
sistema. Esta é uma decorrência simples do primeiro postulado que implica, no entanto, em
consequências sobre situações físicas importantíssimas não previstas em Física Clássica, mas
observadas em sistemas quânticos.
O princípio da superposição linear, consequência do primeiro postulado, é apresentado
antes de outros postulados porque nele reside grande diferença de comportamento entre os
sistemas clássicos e os sistemas quânticos, distinção básica entre a teoria clássica e a teoria
quântica.
É importante salientar que este postulado não impõe a superposição linear aos objetos
quânticos, mas sim aos estados dos objetos quânticos. Como exemplo, pode-se analisar a
situação de um elétron submetido ao experimento de dupla fenda.
Para este elétron, consideram-se duas possibilidades (fendas) de passagem, ou seja,
dois estados caracterizados classicamente por “estado de passagem pela fenda 1, ”, e
“estado de passagem pela fenda 2, ”. Logo, um estado possível para este elétron, pelo
princípio em questão, pode ser a superposição linear , que seria lida como
via de regra, modifica o estado do sistema em análise. Assim, diferentemente da FC, o estado
3
Por observáveis compatíveis entendem-se aqueles tais que, a medida dos valores de um deles, pode não alterar os
valores da medida do outro. Em MQ a incompatibilidade de observáveis ocorre, por exemplo, entre os observáveis
posição e momento linear (numa dada direção). Esta incompatibilidade entre posição e momento linear é comumente
apresentada como o Princípio de Incerteza de Heisenberg. Pressupõe-se que os valores das medidas possam ser
obtidos em um grande conjunto de sistemas, todos inicialmente nas mesmas condições.
4
Operador linear hermitiano (Â) é aquele que satisfaz, no produto escalar em que se encontra intercalado entre vetores
e , a relação . Tal operador possui somente autovalores reais e autovetores ortogonais
para autovalores distintos.
29
de um sistema quântico não inclui informações sobre os valores de todas as grandezas físicas
associadas ao sistema em um dado instante de tempo. Somente valores de observáveis
compatíveis podem caracterizar um mesmo estado do objeto quântico, no mesmo instante de
tempo. Como as grandezas físicas são passíveis de serem medidas, a cada grandeza física
deverá corresponder uma operação de medida adequada e, portanto, um operador adequado.
Como exemplos, tem-se que ao observável físico posição corresponde um operador
posição, ao observável energia corresponde um operador hamiltoniano em determinadas
condições, ao observável projeção de spin em uma dada direção corresponde o operador de
projeção de spin naquela direção, etc.
De acordo com o segundo postulado, então, medidas em MQ estão relacionadas a
ações de operadores sobre estados dos sistemas.
30
Observe-se que alguns observáveis, inclusive posição e momento, possuem
autovalores contínuos, embora outros apresentem autovalores discretos em número infinito ou
até mesmo em número limitado (por exemplo, projeção de spin do elétron em uma dada
direção).
O que ocorre com o estado do sistema quântico após ter sido feita a medida de alguma
grandeza física? Em geral, o sistema não mais se encontra no estado anterior à medida,
estado este que se constitui em uma superposição de autoestados do observável em análise.
5
Nesta tese não serão consideradas situações de casos degenerados, discretos ou contínuos, por questão de
simplicidade.
31
Por efeito da medida, o estado “colapsa” para o autoestado referente ao autovalor obtido e,
6
imediatamente após, uma segunda medida confirma o valor da primeira.
Com este postulado, simplifica-se o tratamento do processo de medida. A redução do
estado, ao realizar-se uma medida de uma grandeza física, presente no quinto postulado, pode
ser enunciada da forma seguinte. “Se a medida de um observável A sobre o sistema físico que
se encontra no estado resulta no autovalor do operador Â
correspondente (caso discreto e não degenerado), imediatamente após a medida o estado do
sistema é o autoestado ”.
O estado citado como exemplo na seção 2.4, após uma medida da projeção de
Para repetir o mesmo resultado de certa medida, em MQ, foi mencionado que se deve
efetuar a segunda medida imediatamente após a primeira. Isto porque o sistema quântico pode
evoluir e se modificar com o transcorrer do tempo. Em MQ, apesar de não haver um
determinismo como o da FC para a obtenção de resultados nas medidas de valores de
observáveis físicos, existe uma lei (causal) que rege a evolução temporal dos estados de
sistemas quânticos.
O sexto postulado introduz a equação de Schrödinger dependente do tempo como tal
lei causal para os estados de sistemas quânticos. “A evolução temporal do estado de um
6
Imediatamente, aqui, significa que o intervalo de tempo transcorrido entre o instante da primeira medida e o instante
de uma nova observação é suficientemente pequeno para que o estado do sistema não se modifique expressivamente
no tempo, ou seja, a única modificação significativa do estado seja a provocada pelo ato de medida.
7
Para que o operador hamiltoniano represente a energia total do sistema, é necessário que seja independente do
tempo.
32
3. Situações de aplicação dos postulados
Figura 1. Esquema de um experimento de dupla fenda com fonte, anteparo dotado de duas
fendas e anteparo de registro.
Três casos são comumente analisados neste tipo de experimento: experimento com
ondas eletromagnéticas, experimento com partículas clássicas e experimento com partículas
quânticas. O primeiro recai no conhecido experimento de Young, descrito pela Mecânica
Ondulatória, como também o experimento do tanque de ondas realizado, em geral, em água.
Quando de sua elaboração, o experimento de Young auxiliou no estabelecimento do caráter
ondulatório da luz, reforçando o encerramento de um debate que se arrastava desde a época
de Newton a respeito da dualidade da natureza da luz, como onda ou como partícula. Contudo,
8
Por simplicidade, consideram-se duas fendas de mesmas dimensões e dispostas simetricamente em relação à fonte.
33
arranjos mais modernos deste experimento possibilitaram a verificação de que, mesmo objetos
tradicionalmente descritos como partículas, manifestam propriedades de caráter ondulatório. A
explicação ondulatória usual do experimento de Young se refere à chegada de uma mesma
frente de onda em cada uma das fendas, com ocorrência de difração e geração de duas novas
ondas. Estas duas ondas interferem de forma construtiva e destrutiva, gerando um padrão de
interferência (vide figura 2).
9
Se o experimento for realizado com partículas clássicas , o padrão visualizado é
completamente diferente do ondulatório. Neste caso, observa-se que as partículas passam ou
pela fenda 1 ou pela fenda 2, pois somente aparecerá uma franja na região atrás de cada
fenda no anteparo de registro, conforme apresentado na figura 3. O estado do objeto não será
descrito como uma superposição de estados de passagem pelas fendas 1 e 2. A ausência de
superposição linear classifica este sistema como clássico.
9
Evita-se a utilização do termo “macroscópico”, pois já são observados comportamentos ondulatórios de objetos
considerados “grandes” como, por exemplo, o fulereno (Arndt et al., 1999). Aspelmeyer e Zeilinger (2008) salientam
que tais situações são tipicamente quânticas.
34
conforme esquematizado na figura 4. A explicação para este resultado utiliza o princípio da
superposição linear. Quando o experimento é realizado com as duas fendas abertas e sem
qualquer dispositivo de medição capaz de interferir com o registro no anteparo final, são
consideradas duas possibilidades básicas para o estado de cada partícula: o estado de
passagem pela fenda 1 e o estado de passagem pela fenda 2. No entanto, o princípio de
superposição linear afirma que, se temos dois estados possíveis para um sistema físico
(estado pela fenda 1 e estado pela fenda 2), qualquer combinação linear desses dois estados
também é um estado possível para o sistema. Observe-se que o “padrão de interferência”
registrado no segundo anteparo se refere à detecção de número de partículas nas regiões
indicadas e que não ocorre contagem de fração de partícula.
10
O padrão de interferência, em ambos os casos, só é obtido após a emissão de um grande número de partículas.
35
3.2. Experimento de Stern-Gerlach
Na experiência realizada, a escolha do elemento químico prata (Ag) não foi arbitrária. O
elemento contém 47 elétrons e a estrutura eletrônica da prata indica que, no estado
fundamental, apenas um elétron (o de menor energia de ligação) sofre influência do campo
magnético inhomogêneo, ou seja, o campo exerce força magnética praticamente neste único
elétron. Este elétron, contudo, apresenta momento angular orbital zero, o que faria com que o
resultado esperado fosse o de uma franja estreita única no anteparo, na região central entre as
duas faixas indicadas na figura 5. O campo magnético inhomogêneo que atua sobre o 47º
elétron do átomo de prata, exerce uma força , em que V é o potencial
36
estados possíveis de projeção do spin na direção do campo os estados e – , tendo-se uma
superposição linear dos mesmos: para o feixe primitivo.
a) b)
Figura 6. (a) Polarizador na direção (b) Polarizador na direção .
37
3.4. Emaranhamento Quântico
estiver no estado de projeção de “spin para cima”, então o pósitron estará no estado de
projeção de “spin para baixo” (denominações simplificadas para projeções de spin) e vice-
versa. Embora a MQ não seja capaz de dizer em qual combinação o sistema composto pelo
elétron e pelo pósitron se encontra, ainda assim se pode verificar que as projeções de spin das
duas partículas estão fortemente correlacionadas e, após várias medições, encontrar-se-á, na
situação deste exemplo, uma probabilidade igual de se ter cada um dos autovalores possíveis.
Supondo que o elétron e o pósitron viajaram dez metros (ou dez anos-luz) cada um e que na
medida da projeção de spin de uma das partículas foi encontrado, por exemplo, o valor “spin
para cima”, imediatamente se saberá que a outra partícula, situada a vinte metros (ou vinte
anos-luz) da primeira, estará com “spin para baixo”.
Apesar deste fato, em princípio, não parecer tão surpreendente, ele se mostra contrário
à visão realista da teoria quântica, defendida no artigo EPR. A medida da projeção de spin de
uma das partículas causa um colapso instantâneo no estado do sistema e “produz” o valor da
projeção de spin da outra partícula. Esta consequência dos postulados da MQ foi duramente
criticada por Einstein e seus colaboradores; para eles, o elétron e o pósitron deveriam ter
projeções de spin bem definidas ao longo de todo o processo, mesmo que a MQ não consiga
fornecer esta informação.
11
Enquanto David Bohm argumenta com uma partícula genérica, Griffiths utiliza o méson π.
38
O EQ conduz a um conceito extremamente importante para a MQ: a não-localidade.
Este conceito é considerado como um dos pilares da teoria quântica (Zeilinger, 1999). Apesar
do que alguns estudiosos acreditavam inicialmente, a MQ é uma ciência em que a não-
localidade, não só é permitida, como é fundamental para a explicação e o desenvolvimento de
inúmeras técnicas experimentais. Vários trabalhos foram realizados utilizando o EQ como
pressuposto teórico, inclusive com o prêmio Nobel sendo atribuído a alguns deles, como o
recente prêmio a David Wineland e Serge Haroche em 2012. Suas descobertas permitiram
pesquisas com computação quântica, relógios atômicos altamente precisos e outros (Itano et
al.,1994; Haroche, 1998; Raimond et al., 2001).
Outra consequência do EQ é a existência de uma inseparabilidade quântica
fundamental. As propriedades de uma partícula em um estado emaranhado dependem do que
ocorre com qualquer uma das outras partículas que compõem o estado ao qual ela pertence,
mesmo quando através de uma ação à distância, ocorrendo uma perda parcial da
individualidade da mesma.
Alguns autores consideram o EQ tão fundamental quanto o Princípio da Incerteza, mas
ainda assim esse é um tópico raramente abordado em cursos de Física, como ressalta também
Hobson (2012, p. 270).
Por ser uma consequência do princípio da superposição linear e por conduzir a uma
gama de situações instigantes e muito novas, o EQ é candidato a ser discutido em diversos
níveis de ensino, conforme constatado por Rocha (2008) e reiterado por Kuttner e Rosenblum
(2010, p. 124), além de auxiliar na introdução da MQ no EM.
A criptografia quântica (CQ) é uma área recente de aplicação dos conceitos mais
fundamentais da MQ, de extrema importância não apenas do ponto de vista científico, mas
também para transações comerciais, financeiras e militares. Conceitos como o da superposição
linear e o do EQ servem de ancoradouro para a CQ e mostram como a MQ pode ter
implicações no mundo atual.
A segurança de um processo criptográfico consiste na codificação de mensagens,
tornando-as inacessíveis ou ininteligíveis para qualquer pessoa que as intercepte e não saiba
como decodificá-las. Registros de antigos processos criptográficos datam do tempo do Império
Romano, mais especificamente da utilização dos mesmos pelo Imperador Julio Cesar para se
comunicar com seus generais. Os processos clássicos de criptografia mais utilizados possuem
segurança baseada na fatoração de números primos muito grandes (Oliveira e Vieira, 2009, p.
144), mas com o advento da computação quântica, códigos que poderiam levar dias (ou até
milhares de anos) para serem descobertos com um computador clássico, podem ser revelados
em tempos da ordem de poucas horas. Assim, faz-se necessária a introdução de um novo tipo
de criptografia, imune à incrível velocidade da computação quântica: a criptografia quântica.
Nesta forma de codificação, a segurança não está vinculada à rapidez de processamento do
39
computador, mas sim à capacidade de se perceber que alguém esteja tentando interceptar o
código.
Em um trabalho para introduzir a CQ de forma mais acessível ao público leigo, Rigolin
e Rieznik (2005) apresentaram quatro dos principais protocolos quânticos: BB84, E91, BBM92
e B92, sendo os dois últimos simplificações dos dois primeiros. Não cabe aqui uma descrição
detalhada de cada um destes protocolos, mas é conveniente uma breve apresentação com o
destaque do ponto mais importante de cada um. A segurança desses protocolos é baseada
apenas em uma longa sequência de números aleatórios trocada entre o emissor e o receptor
da mensagem (chamados usualmente na literatura de Alice e Bob, respectivamente) e que
deve ser compartilhada em segredo. Essa sequência de números aleatórios é conhecida como
chave criptográfica. A distribuição de chaves quânticas é uma tecnologia baseada nas leis da
MQ para gerar e distribuir chaves de criptografia comprovadamente seguras em canais tidos
como inseguros.
O protocolo BB84 foi o primeiro introduzido, sendo considerado até hoje o mais simples
protocolo de distribuição de chaves quânticas; este protocolo foi proposto, em 1984, por
Charles Bennett e Gilles Bassard no trabalho “Quantum cryptography: public key distribution
and coin tossing”. O protocolo transmite fótons polarizados por um canal quântico e utiliza
também um canal clássico de comunicação (por exemplo, Internet ou telefone). O canal
clássico não afeta a segurança do processo porque é usado para conferência de alguns dados
a serem descartados posteriormente.
Usando o exemplo tradicional, são consideradas duas pessoas bastante afastadas
(Alice e Bob, no caso) desejando se comunicar. Supõe-se que Alice envie fótons e Bob os
receba. Antes de iniciar o processo, Alice e Bob escolhem as bases (compostas por dois
estados ortogonais de polarização) a usar na transmissão e recepção dos fótons, por exemplo,
as constantes da figura 7, apresentadas por Bennett e Brassard (1984).
Base A Base B
Figura 7. Representação das bases adotadas por Alice e Bob para a transmissão de fótons.
A base A mede com certeza a polarização dos fótons que apresentam polarização
horizontal ou vertical, enquanto a base B mede com certeza a polarização dos fótons que
apresentam polarizações diagonais, a 45° em relação à base A.
Alice e Bob combinam previamente, também, qual polarização representará os bits 0 e
1 (que são as menores unidades de informação) em cada base, o que pode ser feito através de
um canal clássico de comunicação. Supondo que o bit 0 corresponda à polarização horizontal
na base A e à polarização diagonal direita na base B ( e ), então a polarização vertical
na base A e a polarização diagonal esquerda na base B serão associadas ao bit 1 ( e ).
Classicamente, seriam esperados estados de polarização ou |0> ou |1>. Contudo, pelo
princípio da superposição linear, podem existir estados de polarização que sejam combinações
40
dos estados |0> e |1>. Em particular, podemos representar estados de polarização de uma das
bases em função dos da outra, resultando, por exemplo, e
estados emaranhados.
Bennett, Brassard e Mermin (1992) simplificaram o protocolo E91, criando o protocolo
BBM92, mostrando de um modo mais simples que não é possível que outra pessoa conheça
as chaves sem que Alice e Bob o percebam.
Bennett (1992) criou o protocolo B92, em que dois estados não-ortogonais de
polarização de fótons são utilizados na transmissão das chaves criptográficas.
41
ocorrido. O estado que descreve o sistema pode ser expresso como
uma superposição de gato vivo e gato morto em partes iguais:
.”
É fácil verificar que, quando no estado acima, não se pode afirmar que o gato
esteja vivo ou morto, pois as duas possibilidades coexistem e não podem ser descartadas,
criando-se assim o paradoxo. Apesar de que, em um primeiro momento, este exemplo possa
ser considerado como exclusivamente ilustrativo em MQ, inúmeros trabalhos mostram que é
possível criar “estados de gatos de Schrödinger” com átomos e que são fundamentais para a
Computação e Comunicação Quântica (Colavita e Hacyan, 2003; Leibfried et al., 2003;
Leibfried et al., 2005).
Outro exemplo interessante de aplicação dos conceitos de MQ é a holografia quântica.
Ela é considerada como uma técnica inovadora para a reconstrução da superposição linear de
estados (ou pacotes de ondas). Fazendo-se uma analogia com a holografia óptica, permite-se
que o estado de um objeto a ser caracterizado interfira com um conhecido estado de referência
(Leichtle et al., 1998). Para criar o holograma, pulsos de dois lasers com defasagem temporal
entre si são utilizados para excitar os objetos de análise e os resultados mostram que os dados
contêm informação suficiente para se obter todo o estado quântico do sistema. Esta aplicação
é de grande interesse para estudos de MQ em diversos níveis de ensino, pois o termo
“holograma quântico” vem sendo utilizado de forma totalmente equivocada como justificativa
dos efeitos medicinais de itens em circulação no mercado nacional. Alguns fabricantes,
inclusive, já foram obrigados a publicar notas de esclarecimento sobre ineficácia de seus
12
produtos .
A teleportação quântica é um fenômeno de transmissão de informação (Bennett et al.,
1993) que permite transportar o estado de um objeto quântico a outro objeto quântico (sem
acompanhamento de matéria), desde que não se procure obter informações sobre tal estado
durante o processo de transmissão. A teleportação utiliza o EQ para o envio de informação e
necessita de três participantes em seu processo, tais como fótons com polarizações horizontal
e vertical. Como o EQ já é realizável a grandes distâncias (Schmitt-Manderbach et al., 2007;
Ursin et al., 2007), teoricamente é possível transferir informações via teleportação quântica em
distâncias desta ordem (cerca de 150 quilômetros).
É possível verificar facilmente que, em todos os exemplos apresentados, tanto o estado
de um sistema físico como a superposição linear são conceitos fundamentais no trato da MQ,
sendo esta uma das razões pelas quais esta tese os coloca em um papel central para uma
abordagem introdutória à teoria quântica no EM.
12
Em janeiro de 2011, um fabricante de pulseiras com supostos hologramas quânticos foi obrigado a publicar a
seguinte nota: “Em nossas propagandas, afirmamos que os braceletes Power Balance melhoram seu vigor, equilíbrio e
flexibilidade. Admitimos que não há provas científicas confiáveis que sustentem nossas afirmações e, portanto, que
assumimos uma conduta enganosa, em violação da s52 do Trade Practices Act 1974. Se você acredita ter sido lesado
por nossa propaganda, pedimos desculpas e oferecemos reembolso integral.” Notícia divulgada em
http://gizmodo.uol.com.br/pulseiras-dapowerbalance-nao-funcionam-admite-empresa/. Acesso em 24 de fevereiro de
2015.
42
4. Implicações para o ensino
43
CAPÍTULO IV
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: TEORIAS DE APRENDIZAGEM
1. Introdução
13
Versão em português para Ausubel (2000).
44
um mecanismo de aprendizagem significativa, ou seja, uma disposição para relacionar
o novo material a ser apreendido, de forma não arbitrária e não literal, à própria
estrutura de conhecimentos;
um material potencialmente significativo, ou seja, deve ter estrutura lógica e
relacionável com aspectos relevantes da estrutura cognitiva do aprendiz, de forma não
arbitrária e não literal.
O mecanismo de aprendizagem serve para relacionar aspectos não literais de novos
conceitos, proposições, informações ou situações a componentes relevantes da estrutura
cognitiva existente, de forma não arbitrária. Conforme a natureza da tarefa de aprendizagem, o
mecanismo pode ser descobrir ou simplesmente apreender (compreender) e incorporar as
relações na estrutura cognitiva.
O material é dito potencialmente significativo porque o significado não está nele, mas
sim na relação entre ele e o conhecimento prévio relevante existente na estrutura cognitiva do
aluno. Se o material fosse significativo, o objetivo da aprendizagem significativa já estaria
completado antes de sequer ter-se tentado ou ocorrer qualquer aprendizagem.
A presença de ideias ancoradas claras, estáveis, discrimináveis e relevantes na
estrutura cognitiva é o principal fator de facilitação da aprendizagem significativa, enquanto a
ausência de tais ideias constitui a principal influência limitadora ou negativa sobre uma nova
aprendizagem significativa. Ausubel (1968, p. IV) afirma que:
“[...] o conhecimento prévio (a estrutura cognitiva do aprendiz) é a
variável crucial para a aprendizagem significativa.”
Ausubel denomina este conhecimento prévio do aprendiz de conceito subsunçor, ou
simplesmente subsunçor (Moreira, 1999a, p. 11); portanto a aprendizagem significativa decorre
da interação entre os subsunçores e o novo conhecimento.
A aprendizagem significativa não implica em as novas informações formarem um tipo
de ligação simples com os elementos pré-existentes na estrutura cognitiva do aprendiz. A
ligação de forma simples, arbitrária e não integradora somente ocorre na aprendizagem
mecânica. Na aprendizagem significativa, o processo de aquisição de informações resulta em
uma alteração tanto das novas informações, que ganham significados, como do aspecto
especificamente relevante da estrutura cognitiva do aprendiz, que pode ficar mais estável, mais
rico em significados.
45
se associar com aspectos relevantes da estrutura cognitiva, mas sem significado, não de forma
substantiva (não literal) e não arbitrária, que permitiria a incorporação significativa na estrutura
cognitiva. A aprendizagem significativa, no entanto, apresenta inúmeras vantagens em relação
à aprendizagem mecânica, tais como economia do esforço de aprendizagem, retenção mais
estável e maior capacidade de transferência.
Por não estarem devidamente ancorados à estrutura cognitiva do aprendiz, materiais
apreendidos mecanicamente são mais vulneráveis a interferências e, assim, ao esquecimento,
possuindo uma capacidade de retenção muito inferior.
No entanto, a relação entre a aprendizagem significativa e a aprendizagem mecânica
não é dicotômica. Em muitas situações de aprendizagem prática, pode-se colocá-las facilmente
em um contínuo entre memorização e significado.
46
resumos costumam apresentar o mesmo nível de abstração, generalidade e inclusividade que
o próprio material, salientando alguns pontos em troca da omissão de informações menos
importantes e, portanto, apesar de ser um material introdutório, o organizador prévio não deve
ser visto como um resumo.
A utilização dos organizadores prévios, de acordo com Ausubel, é baseada
principalmente em três pontos:
1) a importância de ter ideias especificamente relevantes e apropriadamente
estabelecidas na estrutura cognitiva, para tornar as novas ideias, potencial e
logicamente significativas, de fato em significativas;
2) as vantagens em utilizar ideias mais gerais e inclusivas de uma determinada
disciplina, convenientemente modificadas para proporcionar maior relevância ao
novo material;
3) identificar ideias já existentes e relevantes da estrutura cognitiva, bem como indicar
explicitamente a relevância destas ideias para os organizadores prévios e para o
novo material.
Os organizadores prévios são, também, dispositivos pedagógicos capazes de ajudar a
implementar a diferenciação progressiva e a reconciliação integradora de novos
conhecimentos.
a+A a’A’ a’ + A’ A’
47
passando a e A para a’ e A’, respectivamente. Esta é a fase de assimilação do novo
conhecimento. A fase seguinte é denominada fase de retenção do conhecimento, que acontece
quando os dois conhecimentos se dissociam e resultam em a’ + A’. Por fim, sobrará somente
um resíduo A’, resultante do subsunçor A com as alterações sofridas por ter sido “exposto” à
nova informação. A fase de retenção mais formação do resíduo é conhecida como assimilação
obliteradora. Nesta assimilação é natural ocorrer um esquecimento do que se aprende, pois
frequentemente não aparece, explicitamente no final do processo de assimilação, alguma
informação sobre o recente corpo de conhecimentos apresentado ao aprendiz. Isto não
significa que o aluno esqueça totalmente o que aprendeu, como fica denotado no resíduo A’.
Apesar do esquecimento, o resíduo indica que se pode aprender novamente o conteúdo de
forma mais fácil, dinâmica e sistemática do que na aprendizagem inicial. O papel do resíduo A’
é facilitar o reacesso à informação, a reaprendizagem.
A assimilação não se completa após ocorrer a aprendizagem significativa, mas
continua durante certo tempo, podendo envolver novas aprendizagens e/ou retenções ou graus
variáveis de retenção ou armazenamento intactos, ou ainda uma perda final da capacidade de
recuperação das ideias subordinadas assimiladas. É um processo dinâmico.
Portanto, a assimilação explica também o fenômeno do esquecimento (ou perda de
capacidade de recuperação em relação ao significado recentemente aprendido), colocando a
hipótese de que a particularidade e especificidade únicas do último significado são afastadas
(obliteradas), em vários graus, pela generalidade da(s) ideia(s) ancorada(s).
48
da matéria de ensino: diferenciação progressiva e reconciliação integradora (Moreira, 1999a, p.
160).
De fato, a diferenciação progressiva pressupõe que o conhecimento seja organizado
em uma estrutura de tópicos, sendo possível partir de ideias gerais e chegar a aspectos mais
específicos. Pretende-se, assim, que os alunos consigam compreender os pormenores de
determinado conteúdo partindo de um todo mais inclusivo.
Em alguns casos, o tema precisa partir de pontos específicos de determinado campo
de conhecimento para somente depois chegar a um todo mais inclusivo; necessita-se, então,
utilizar a reconciliação integradora. Esta estratégia propõe que a instrução explore relações
entre ideias, aponte similaridades e diferenças importantes e reconcilie discrepâncias reais ou
aparentes (op. cit., p. 161). Dificilmente se encontra esta estratégia em livros-texto que, em sua
maioria, seguem uma sequência linear na qual os conceitos e proposições mais importantes,
mais gerais e mais inclusivos ficam para o fim. Ausubel reconhece que utilizar a reconciliação
integradora não é tarefa fácil e sugere organizar o ensino “descendo e subindo” nas estruturas
conceituais hierárquicas à medida que a nova informação vai sendo apresentada ao aluno
(Moreira, 1999b, p. 51-52).
Estes dois princípios podem ser implementados através do uso de organizadores
prévios (Ausubel, 2002, p. 151) ou, ainda, com a utilização de determinados recursos
instrucionais, como os mapas conceituais (Moreira, 1999a, p. 161).
49
grau de aprendizagem. Com satisfação inicial de certa aprendizagem, os estudantes
inicialmente desmotivados podem desenvolver, de forma retroativa, alguma motivação para
aprender mais. Por conseguinte, em algumas circunstâncias, a forma mais apropriada de se
estimular a motivação para a aprendizagem é através da concentração nos aspectos cognitivos
da aprendizagem, em vez daqueles de motivação, e basear-se na motivação que se
desenvolve, de forma retroativa, a partir do desempenho educacional bem sucedido, para
estimular mais aprendizagem.
Grande parte do efeito de facilitação da motivação é, aparentemente, mediada por um
aumento da atenção. Ao direcionar a atenção dos estudantes para determinados aspectos de
um conteúdo, independente da forma como se procede para isto, promove-se a aprendizagem.
A atenção pode ser considerada como uma condição cognitiva geral essencial para a
ocorrência de aprendizagem significativa.
Apesar de intimamente relacionados à filosofia comportamentalista, os conceitos de
recompensa e punição também são citados na TAS como auxiliares para a promoção da
aprendizagem significativa. A recompensa influencia a aprendizagem de três formas: servindo
como incentivo para a aprendizagem; aumentando, em longo prazo, a motivação para a
aprendizagem; aumentando a probabilidade de recorrência de respostas. A punição (ou não-
recompensa) funciona como o inverso da recompensa, também de três formas: ajudando a
estruturar um problema, fornecendo uma direção para a realização da atividade;
enfraquecendo, em longo prazo, as motivações que estimulam o comportamento que se pune;
diminuindo a probabilidade de recorrência de respostas que levem à não-recompensa.
Estas são colocações de Ausubel, mas é preciso não confundir motivação e
intencionalidade ou recompensa com condicionamento. Mesmo sem motivação, o aprendiz tem
que necessariamente ter a intenção de captar os significados que estão sendo trabalhados no
processo instrucional. Sem essa intencionalidade, a aprendizagem não será significativa.
Quanto à recompensa ou à não-recompensa, é claro que podem ajudar nesse processo, mas
devem ser usadas na progressividade da aprendizagem significativa. Não tem sentido usar
recompensas quando não há evidências de que aprendizagem significativa está ocorrendo,
que a captação de significados está acontecendo.
Além disto, a recompensa e a punição possuem efeitos facilitadores indiretos. Do ponto
de vista da motivação, a conscientização de uma aprendizagem bem sucedida estimula
esforços subsequentes de aprendizagem, ao melhorar a autoconfiança dos aprendizes, ao
encorajá-los a ser perseverantes e ao aumentar a atração subjetiva da tarefa de aprendizagem.
Da mesma forma, motiva os indivíduos para praticar, ensaiar e desempenhar aquilo que já
aprenderam.
A Teoria dos Campos Conceituais (TCC), proposta por Gérard Vergnaud (1990; 1993),
foi elaborada inicialmente para o campo da matemática visando explicar o processo de
50
conceitualização progressiva das estruturas aditivas, das estruturas multiplicativas, das
relações número-espaço e da álgebra. Vergnaud (1996b) enfatiza, no entanto, que a TCC não
é exclusiva do campo da matemática, podendo assim ser aplicada em outras áreas. Vergnaud
foi discípulo de Piaget e utiliza, em sua teoria, diversos termos piagetianos, tais como
esquema, adaptação, assimilação e acomodação.
A TCC tem o objetivo de descrever o processo de desenvolvimento cognitivo. Segundo
Vergnaud, para se entender o conhecimento, é útil e necessário estudar seu desenvolvimento
no sujeito. Mesmo não sendo voltada diretamente para a sala de aula como a de Ausubel, esta
teoria apresenta implicações imediatas às atividades de ensino e de aprendizagem.
A principal finalidade da TCC é fornecer uma estrutura que permita compreender as
filiações e rupturas entre conhecimentos em crianças e adolescentes, a forma de
aprendizagem dos mesmos, entendendo-se por conhecimento tanto habilidades como
informações expressas (Vergnaud, 1990).
Baseada em um princípio de elaboração pragmática de conceitos, a TCC considera
que não se pode teorizar sobre a aprendizagem apenas a partir do simbolismo ou das
situações. Tais elementos devem ser considerados, mas o ponto crucial fica a cargo da ação
do sujeito em situação e da organização do seu conhecimento (Vergnaud, 1993).
Esta abordagem é o segundo referencial teórico usado nesta tese, apresentando-se a
seguir os conceitos centrais deste referencial.
3.1. Conceitualização
3.2. Esquema
51
são eles utilizados para organizar o conhecimento de uma pessoa e prover o arcabouço teórico
para o aprendizado subsequente.
Este conceito é herança de Piaget, sendo adaptado por Vergnaud em sua teoria.
Enquanto Piaget propõe que é a partir da interação sujeito-objeto que ocorre o
desenvolvimento cognitivo, Vergnaud afirma que o mais importante é uma interação dita
esquema-situação e, assim, analisa o processo de desenvolvimento cognitivo a partir do
“sujeito-em-situação”. Deve-se, então, segundo ele, considerar a situação-problema ao
trabalhar com os esquemas porque é com ela que estes lidam, não somente com objetos.
Vergnaud também sofreu uma grande influência de Vygotsky ao considerar como
pontos cruciais a linguagem e os símbolos, praticamente negligenciados por Piaget. A
mediação através da linguagem é um processo essencial no ensino de ciências, sendo assim
um ensino insubstituível; isto, no entanto, não significa que o papel do ensino seja somente o
de colocar palavras no conteúdo conceitual dos conhecimentos (Vergnaud, 2007). Outra
influência da obra de Vygotsky ao trabalho de Vergnaud, que é uma consequência direta da
teoria sociointeracionista daquele (também negligenciada por Piaget), é a de possibilitar uma
orientação dos estudantes mediante uma escolha, a mais adequada possível, das situações
apresentadas aos alunos (Vergnaud, 1996a).
O conceito de esquema é o mais importante na psicologia cognitiva se a psicologia
está interessada em estudar comportamentos e atividades (Vergnaud, 1998). É nos esquemas
que se deve buscar os elementos cognitivos que fazem com que a ação do sujeito seja
operatória (Vergnaud, 1993) e tais elementos são denominados conhecimentos-em-ação.
Esquemas são formados pelos seguintes componentes (Vergnaud, 1990; 1996b; 2012):
metas e antecipações – que são os objetivos do esquema;
regras de ação e controle – regras do tipo “se...então”, que servem para
generalizar e regular comportamentos;
invariantes operatórios – que são conceitos e conhecimentos contidos nos
esquemas e que servem para categorizar a informação e inferir, a partir desta,
metas e comportamentos relevantes;
possibilidades de inferência – que auxiliam na construção de antecipações e regras
para situações.
Saliente-se que um esquema não deve ser interpretado como um estereótipo,
justamente porque este construto está apoiado nos invariantes operatórios que dão sentido e
pertinência a uma variedade de situações. A definição de esquema pode ser considerada muito
próxima da de algoritmo, entretanto um algoritmo é um esquema, mas nem todo esquema é
um algoritmo. Algoritmo são efetivos, enquanto esquemas são frequentemente eficazes, mas
não efetivos (Figueroa e Otero, 2011). Observe-se que um aprendiz tende a modificar seu
esquema, caso não tenha dado conta de uma situação particular, ou seja, a sua organização
da atividade é invariante, mas não a atividade.
A importância dos esquemas fica mais evidente ao lembrar que os alunos estão
constantemente expostos a novas situações e que devem conseguir lidar com elas. Para isso
52
os estudantes recorrem aos esquemas que já construíram, combinando-os de forma que lhes
permitam lidar com as situações e, consequentemente, conduzir à adaptação. Este processo
pode não ser realizado em uma primeira tentativa e, portanto, os alunos devem continuar
buscando a construção de novos esquemas, com ou sem o auxílio do professor ou de outros
estudantes (Vergnaud, 1998).
Assim como Ausubel, Vergnaud (1996a) considera que a repetição significativa executa
um papel importante na formação dos esquemas. A familiaridade com as situações-problema
apresentadas é capaz de contribuir com mais segurança para esta formação. A repetição, no
entanto, pode apresentar riscos caso não seja compensada com variações de situações-
problema, porque o esquema será tanto mais flexível quanto mais variadas forem as situações-
problema em que ele se desenvolve.
Os esquemas são de extrema importância na TCC assim como o são na teoria de
Piaget, podendo-se dizer que estão no centro dos processos de adaptação das estruturas
cognitivas, a saber, assimilação e acomodação. Assim, a educação formal deve contribuir para
a construção de um repertório diversificado de esquemas, sem que estes se convertam em
estereótipos (Vergnaud, 1996a).
3.3. Conceitos
53
situação e os esquemas e, consequentemente, está na relação do sujeito com situações e
significantes (Vergnaud, 1990).
A descrição dos vários elementos de uma situação deve ser feita essencialmente em
termos de propriedades e funções (Barais e Vergnaud, 1990). Assim, situações didáticas são
consideradas ocorrências interessantes e ricas (Vergnaud, 1993, p. 17). A organização de uma
situação didática supõe a análise simultânea das funções epistemológicas de um conceito, da
significação social das áreas de experiência a que ele se refere, do desempenho dos atores da
situação didática, dos resultados desse desempenho, do contrato e da transposição.
Vergnaud inclui nos invariantes operatórios teoremas-em-ação e conceitos-em-ação.
Um teorema-em-ação é uma proposição tida como verdadeira sobre o real e um conceito-em-
ação é uma categoria de pensamento tida como pertinente ou, relevante (Vergnaud, 1998).
Existe uma relação dialética entre os conceitos-em-ação e os teoremas-em-ação, pois os
conceitos são ingredientes dos teoremas e os teoremas são propriedades que dão aos
conceitos seus conteúdos. Os conceitos-em-ação estão no coração da organização dos
esquemas e os teoremas-em-ação são o meio de inferência (geralmente de modo implícito), os
objetivos e as regras de interesse (Vergnaud, 2007). Um conceito-em-ação não é um conceito,
assim como um teorema-em-ação não é um teorema. Na Ciência, conceitos e teoremas são
explícitos e pode-se discutir acerca de sua pertinência e veracidade. Este não é
necessariamente o caso dos invariantes operatórios. Utilizando a metáfora de Vergnaud
(1990), os teoremas e conceitos explícitos se constituem em uma pequena parte visível do
iceberg da conceitualização; sem a parte oculta formada pelos invariantes operatórios, a parte
visível não faz qualquer sentido.
Para o estudo de inúmeros campos de conhecimento, representações simbólicas,
como quadros, tabelas, gráficos e fórmulas, são uma ajuda preciosa, visto que a formulação de
relações e suas representações enriquecem a conceitualização (Vergnaud, 2007). Como um
conceito não é somente “o significado das palavras”, a expressão deste conceito em termos de
palavras e símbolos tem papel decisivo nos processos de conceitualização. É importante, no
entanto, salientar que fórmulas não são o ponto final da conceitualização, pois é necessário
que se faça uma leitura adequada das mesmas, o que envolve várias operações de
pensamento.
A transformação de invariantes operatórios em textos e palavras não é simples e direta
(Vergnaud, 1998). Ela requer, inicialmente, o aprendizado e a prática da linguagem natural e de
diversos outros meios semióticos, tais como, por exemplo, signos e representações. Além
disso, os sistemas linguísticos e semióticos não são direcionados para expressar exatamente o
que cada indivíduo tem em mente quando é colocado diante de uma situação, selecionando
informações e processando-as, porque existe muita diferença entre o que é representado na
mente de cada um e o significado usual das palavras. Ainda assim, em Física, a verificação do
significado de representações simbólicas não depende somente de uma habilidade potencial
de representar concretamente as entidades e relações expressas, mas também em levar em
54
conta os elementos conceituais, tais como sistema, estado, conservação, interação, etc.
(Barais e Vergnaud, 1990).
Não se deve restringir a ideia de linguagem somente à linguagem falada, visto que a
mediação ocorre com ou sem a linguagem falada; existe muita informação para o estudante
nas expressões faciais, gestos e entonação de voz do professor (Vergnaud, 1998).
Vergnaud (1993) considera, também, importante tomar como objetos de pesquisa
conjuntos relativamente amplos de situações e conceitos, classificando os tipos de relações,
classes de problemas, esquemas de tratamento, representações linguísticas e simbólicas e os
conceitos matemáticos que organizam este conjunto.
Segundo a TCC, o professor deve ser considerado como um importante mediador no
processo de domínio de um campo conceitual pelo aluno (Moreira, 2002). Sua primeira ação
como mediador é a escolha de situações e fórmulas que serão utilizadas, visto que uma
fórmula não pode ser descoberta por um aluno, salvo em raríssimas exceções. Pode-se afirmar
então que, segundo a teoria de Vergnaud, o principal papel do professor é selecionar e utilizar
as situações-problema (em quantidade e nível de dificuldade adequados) de modo a dar
sentido aos conceitos em uma relação dialética. Tais situações devem conduzir o aluno a um
aprendizado paulatino dos conceitos envolvidos, ou seja, devem ocorrer dentro da zona de
desenvolvimento proximal do aluno, conforme apontado por Vygotsky (1991). Caso situações
mais complexas sejam apresentadas no início do estudo, podem acarretar um desestímulo
para o aprendizado subsequente.
Considerando que novos esquemas não podem ser desenvolvidos sem novos
invariantes operatórios, o professor deve auxiliar os estudantes nesse processo de construção
de esquemas e representações (Vergnaud, 1998). Com isso, os alunos se tornam capazes de
enfrentar situações novas e mais complexas.
Para Vergnaud, o estudo do desenvolvimento e do funcionamento de um conceito, ao
longo de sua aprendizagem ou utilização, deve considerar os três conjuntos (referente,
significado e significante) ao mesmo tempo; não se pode reduzir o significado ao significante e
nem às situações (Vergnaud, 1990, p. 146).
55
a construção e a apropriação das propriedades de um conceito ou dos aspectos de
uma situação é um processo de muito fôlego que se estende ao longo dos anos.
O conhecimento está, pois, organizado em campos conceituais que o aprendiz domina
ao longo de um expressivo período de tempo, através da maturidade, experiência e
aprendizagem (Vergnaud, 1982). Não será, em geral, em apenas algumas aulas que um aluno
conseguirá captar todo o conhecimento presente em determinado conteúdo. Acreditamos,
então, que um contato cedo do aluno de EM com tópicos de MQ tende a propiciar uma melhor
compreensão deste campo conceitual para incursões posteriores.
Considerar a MQ não-relativística como um campo conceitual é dar a ela sua devida
importância. Na estruturação deste campo aparecem ramificações que podem, de fato,
transcender a teoria-base. É o caso, por exemplo, da segunda quantização, em que é
abandonada a restrição não relativística e a consequente imposição de conservação de
probabilidade (do número de partículas envolvidas nos processos). Por exemplo, a
Eletrodinâmica Quântica, que descreve a interação entre partículas carregadas com a
mediação de fótons e a Cromodinâmica Quântica, em que são estudadas as interações fortes,
são teorias desenvolvidas após a compreensão da estrutura da MQ.
Simplificadamente, o campo conceitual é visto como um conjunto de situações que
requerem o domínio de vários conceitos, procedimentos e representações de naturezas
distintas. Desta forma, a Física se constitui em um imenso campo conceitual que pode ser
fragmentado em inúmeros outros como, por exemplo, a Mecânica Clássica, a Termodinâmica,
o Eletromagnetismo, a Mecânica Quântica, etc. O ensino dos campos conceituais não pode ser
visto como o ensino de conceitos isolados nem como o de sistema de conceitos. Afinal, campo
conceitual é um conjunto muito grande de situações-problema com diferentes níveis de
complexidade.
56
Nem sempre é fácil mostrar a ocorrência de aprendizagem significativa. Ao tentar
verificar a compreensão genuína de conhecimentos, solicitando aos alunos que indiquem os
atributos de critérios ou de elementos essenciais de um princípio, podem ocorrer apenas
verbalizações resultantes de uma aprendizagem mecânica.
Quanto à verificação da compreensão verdadeira e significativa das ideias
apresentadas ao aprendiz, Ausubel considera a resolução de problemas como um método
prático e válido. Quando bem sucedida, a resolução de problemas exige muitas capacidades e
habilidades, tais como raciocínio, perseverança, flexibilidade, improviso, ousadia, sensibilidade
aos problemas e astúcia tática, além da compreensão dos princípios subjacentes.
Outra forma de verificar a ocorrência de aprendizagem significativa é através da
apresentação, ao aprendiz, de um novo conhecimento sequencialmente dependente do
anterior que não pode ser dominado sem a compreensão genuína do conhecimento anterior.
Apesar de recorrer-se a várias formas de verificação da aprendizagem significativa,
sempre se deve ter em conta a possibilidade da ocorrência de uma aprendizagem mecânica.
As concepções prévias dos alunos contêm teoremas-em-ação e conceitos-em-ação
que podem não ser teoremas e conceitos científicos, mas que podem (e devem) evoluir para
eles. Há muito de implícito nos esquemas (Vergnaud, 1990) e é papel do professor tornar
explícito o conhecimento implícito do aluno para que possa se aproximar do conhecimento
compartilhado pela comunidade científica. Uma proposição explícita pode ser debatida, o que é
impossível para uma proposição totalmente implícita (Vergnaud, 1996a). Isto corrobora a ideia
de que o conhecimento pode ser modificável se for comunicável, debatido e compartilhado.
A transformação do conhecimento implícito em explícito deve ser feita sem nunca
subestimar aquilo que o aluno já sabe (Moreira, 2002).
Nota-se que, segundo a TCC, para aprender é necessário que haja mediação, quer
com o professor quer com os outros alunos ou sua família (Vergnaud, 1996b). Por mais que a
evolução dos conhecimentos do aluno proceda, em grande parte, de sua própria ação, de sua
experiência e de sua reflexão pessoal, Vergnaud considera que esta evolução não se realizaria
adequadamente sem ajuda do professor.
Em particular, no caso do ensino de MQ, deve-se também utilizar um grande número
de situações nas quais os principais conceitos são aplicados para que os alunos possam
compreendê-los. Os experimentos de dupla fenda e de Stern-Gerlach, o emaranhamento
quântico e a criptografia quântica são situações que utilizamos para auxiliar o aluno a
compreender conceitos inerentes a estados de objetos quânticos, como o da superposição e o
da incompatibilidade de alguns observáveis. Situações mais comuns à FC, tais como a
superposição de ondas e de vetores geométricos, servem para a formação do conceito de
superposição linear a ser utilizado posteriormente na MQ. No estudo realizado, foi utilizada
uma estrutura clássica para auxiliar a conceitualização de determinados conceitos da MQ, e
não para explicar fenômenos quânticos utilizando conceitos e leis cronologicamente,
apresentados na FC.
57
A MQ possui conceitos e princípios bem definidos e específicos, que são
extremamente importantes, mas se vale também de princípios adotados em FC, como os de
conservação de momento e de energia. No entanto, alguns conceitos clássicos podem se
constituir em obstáculos epistemológicos se aparecerem no decorrer do ensino de MQ. O
conceito de orbital, por exemplo, pode ser materializado pelos alunos como conceito de órbita
de modo a simplificar o conteúdo, apesar de não serem análogos. Consequentemente,
conceitos quânticos devem ser devidamente trabalhados de forma a não propiciar o
aparecimento de aproximações simplistas. Isto significa que, mesmo que haja elos importantes
entre a MC e a MQ, para que ocorra o aprendizado desta se faz necessário alguma ruptura
com a MC (Moreira, 2002).
Em MQ, assim como, aliás, em toda a Física, a linguagem e a simbologia adotadas
tornam-se instrumentos para o domínio das situações-problema e construção de esquemas
adequados. O domínio de representações como, por exemplo, a notação de Dirac deve ser
analisado para verificar se o aluno possui uma relativa compreensão do campo conceitual da
MQ.
Além dos argumentos já citados, preocupamo-nos também com a preservação do
conhecimento construído através de anos de desenvolvimento da MQ não-relativística.
Fazendo com que alunos do EM entrem em contato com esta teoria através de materiais
didáticos adequados, discutindo e analisando o seu conteúdo em nível introdutório, pretende-
se que estes estudantes possam captar significados aceitos no contexto desta teoria, sem
distorcê-los.
58
CAPÍTULO V
1. Introdução
2. Questões de pesquisa
59
3. Metodologia de ensino
60
Tabela 1. Número de alunos matriculados nas turmas da primeira etapa de ensino.
Turma Número de alunos
101 33
102 34
103 26
Em cada escola, o professor que lecionava a disciplina de Física nos cedeu suas
turmas para a realização do ensino e da pesquisa, possibilitando que fosse apresentado o
conteúdo de MQ aos alunos e que seu desenvolvimento fosse analisado no decorrer do
processo de aprendizagem. Nas duas etapas, o professor acompanhava a aplicação do projeto
em sala de aula junto aos alunos.
Os alunos da primeira etapa foram acompanhados durante quatro meses e os da
14
segunda etapa durante três meses , possibilitando, com a coleta de dados, o recolhimento de
informações visando analisar o aprendizado e responder as questões de pesquisa propostas.
O projetor multimídia foi utilizado em todas as aulas, facilitando a apresentação do
15
conteúdo programado e otimizando, assim, a dinâmica de sala de aula . Os alunos foram
estimulados continuamente a participar das atividades de sala de aula e todo comentário feito
por eles, pertinente ou não, era escutado e analisado, propiciando que os estudantes não se
intimidassem ante o professor ou com o novo conteúdo. Para promover discussões e criar a
pré-disposição para a aprendizagem, perguntas foram inseridas ao longo do texto de apoio
utilizado no decorrer do curso (vide Apêndice I). Simulações em computador também foram
14
O período de tempo maior no acompanhamento, pelo pesquisador, das turmas da primeira etapa ocorreu devido a
uma interrupção das aulas na escola durante o semestre. O número de horas de aula foi o mesmo nas duas fases de
ensino.
15
Os arquivos com os slides apresentados em sala de aula foram disponibilizados aos alunos como material de
consulta. Este material foi elaborado utilizando um texto de apoio por nós produzido como base.
61
utilizadas para viabilizar a compreensão dos conceitos e princípios estudados nas situações-
problemas propostas. Os endereços com as simulações podem ser encontrados no texto de
apoio. Testes rápidos (apresentados na seção 4.1.2. deste capítulo e constantes do Apêndice
V) também foram utilizados na segunda etapa da pesquisa com o intuito de criar uma prontidão
para a aprendizagem, algo também necessário para a ocorrência da aprendizagem
significativa. Os instrumentos de coleta de dados utilizados nas duas etapas da pesquisa
serviram como avaliação da aprendizagem e foram adotados pelo professor regular da
disciplina no cálculo da média para a aprovação dos alunos, conforme previsto pelo regimento
de cada instituição ou legislação em vigor.
Buscou-se evitar referências a conceitos clássicos para interpretação dos fenômenos
quânticos, tendência também de alguns outros pesquisadores (vide, por exemplo, Pospiech
(1999), Greca et al. (2001) e Carvalho Neto et al. (2009)). Pospiech (1999) e Greca et al.
(2001), aliás, usam o termo “objeto quântico” em vez de partícula. O conhecimento-em-ação
dos alunos também foi analisado, caso estes explicitassem sua compreensão em cada
situação, nos exercícios e atividades propostos no decorrer das aulas.
Na nossa perspectiva, buscamos, então, propiciar que os estudantes viessem a
construir, por um processo de formação de conceitos, alguns subsunçores adequados para
prosseguimento no estudo sobre MQ. O conceito de superposição linear foi considerado como
importante subsunçor para promover a aprendizagem significativa de outros conceitos.
Estruturas utilizadas em FC como a da superposição de ondas e a da superposição de vetores
geométricos foram pensadas como ancoradouros para o desenvolvimento da ideia de
superposição linear de estados quânticos, na expectativa de que esta propicie um bom
aproveitamento no aprendizado de tópicos da MQ. Em nenhuma instância do curso foi
proposta a interpretação dos fenômenos apresentados com conceitos clássicos como os de
trajetória, velocidade, etc.
62
desenvolvimento da MQ. Além disso, o conteúdo inicia com uma introdução sobre a MQ,
16
seguida de um “pseudo-organizador prévio ”, com a superposição de ondas e de vetores.
Posteriormente, são introduzidos conceitos e exemplos de estados de sistemas físicos
(clássicos e quânticos) e alguns dos principais postulados da MQ, junto a situações-problema
específicas. Cada aluno recebeu cópia do Texto de Apoio, entregue aos poucos, antes da aula
17
sobre o respectivo conteúdo . Além disso, foram enviados aos alunos, por correio eletrônico,
os slides e os endereços das simulações utilizados em algumas das aulas. O Texto de Apoio,
cujo conteúdo é listado no quadro 1, consta do Apêndice I. Os endereços eletrônicos das
simulações utilizadas também constam do Texto de Apoio e os slides foram construídos com
base no mesmo material entregue aos alunos.
As situações-problema de aplicações dos conceitos de MQ elencadas no Texto de
Apoio são: experimento de dupla fenda, experimento de Stern-Gerlach, polarização da luz,
emaranhamento quântico e criptografia quântica, os dois últimos, temas atualmente muito
trabalhados em pesquisa em Física. O conceito de estado de um sistema físico e os princípios
de superposição linear, incompatibilidade de observáveis, possíveis valores de medidas, entre
outros, foram abordados nas situações-problema.
Foi, em geral, uma preocupação na redação do Texto de Apoio, introduzir o que o
aluno precisaria saber para aprender de forma significativa conceitos e princípios quânticos e
inserir tais conteúdos de modo a motivá-lo para o aprendizado, conforme recomendado pelos
referenciais teóricos utilizados nesta pesquisa. Estes são os aspectos básicos que nortearam o
desenvolvimento de um material, em princípio, potencialmente significativo e em condições de
criar a situação de pré-disposição necessária para a ocorrência da aprendizagem significativa.
Os resultados a obter na pesquisa podem sinalizar o alcance dos objetivos, total ou parcial,
deste material.
Com o intuito de promover avaliações pontuais durante o processo de ensino-
aprendizagem do curso, algumas questões foram inseridas ao longo do Texto de Apoio,
visando discutir os princípios e as situações-problemas apresentados. As questões do tipo
“exercício” poderiam tanto ser resolvidas pelos alunos com auxílio do pesquisador ou serem
designadas como atividades extraclasse. A intenção das atividades do tipo “reflita” era
promover uma situação de desconforto nos alunos para que entendessem a situação
apresentada como sendo efetivamente um problema e, assim, buscar uma solução. Em ambos
os tipos de questões, visou-se a externalização dos conhecimentos recém-incorporados à
estrutura cognitiva dos alunos e que servissem, também, como um instrumento para a
avaliação da aprendizagem.
16
Organizadores prévios são estruturas que se destinam a facilitar a aprendizagem de um tópico específico, enquanto
pseudo-organizadores prévios se destinam a facilitar a aprendizagem de uma unidade (vários tópicos) (Souza e
Moreira, 1981, p. 304).
17
Caso o aluno não estivesse presente na aula, o material lhe era entregue na próxima aula a que comparecesse.
63
Quadro 1. Relação dos conteúdos do Texto de Apoio.
Fundamentos de Mecânica Quântica
1. Introdução
2. Somando Ondas, Vetores e Estados
Somando Ondas
Somando Vetores do Plano Real
Os Experimentos de Dupla Fenda – As Primeiras Estranhezas
Espaços Vetoriais
Descrevendo Sistemas Físicos
Sistemas Binários
Bits Quânticos
Spin e Experimento de Stern-Gerlach
Sistemas Não Binários
3. Quais os Principais Fundamentos da Teoria que Explica com Sucesso os
Fenômenos Quânticos?
Somar Estados é uma Consequência da MQ?
O que entendemos por estado de um objeto físico?
Objetos quânticos
Medições em MQ
Quais problemas podemos enfrentar ao medir grandezas físicas?
Limitando os Valores de Medidas
Superposição Linear de Estados e Emaranhamento Quântico
Segurança na Transmissão de Informação: a Criptografia Quântica
4. Metodologia da pesquisa
Esta seção descreve a metodologia utilizada ao longo das etapas da pesquisa, visando
responder as questões da pesquisa da segunda seção. São apresentados os instrumentos de
coleta de dados e os procedimentos adotados para a análise.
Para avaliar a compreensão dos alunos sobre o conteúdo apresentado, lançou-se mão
18
de diversas formas de coleta de dados . Foram utilizados como instrumentos: questionário de
conhecimentos prévios; três avaliações escritas; questionário de opiniões ao final do curso;
diário de bordo com registro de manifestações dos alunos no decorrer das aulas (e até mesmo
fora delas) ante os assuntos desenvolvidos. Ocorreram algumas alterações nas estratégias de
avaliação, ao passar-se da primeira para a segunda etapa da pesquisa, visando a melhoria do
processo. Assim, adicionalmente, na segunda etapa foram incluídos mapas mentais (aplicados
18
Os instrumentos de coleta de dados e o Texto de Apoio foram avaliados e tiveram validade de conteúdo apontada
por doutores na área, conforme recomendado por diversos pesquisadores como, por exemplo, Silveira (1993, p. 67).
64
no início e no fim do curso) e testes rápidos utilizados em seu decorrer. A forma de utilização
de cada instrumento de coleta de dados e outros detalhes a respeito é descrita a seguir.
Para facilitar a análise e preservar a identidade dos envolvidos na pesquisa, os alunos
foram rotulados por um número de cinco dígitos, o primeiro relativo à etapa da pesquisa, os
dois seguintes referentes à turma do aluno e os dois últimos ao próprio aluno. Assim, o aluno
20122, por exemplo, é o aluno 22 da primeira turma da segunda etapa. As turmas 01 e 02 na
primeira e na segunda etapa são turmas de primeira série e as demais são turmas de terceira
série.
Na primeira aula e antes do início da apresentação dos tópicos de MQ, foi proposto aos
alunos um questionário com dez questões com a intenção de, a partir das respostas
apresentadas, avaliar o conhecimento sobre alguns conceitos prévios à MQ e obter
informações sobre eventual contato anterior do aluno com esta teoria. Os conceitos prévios
investigados foram os de partícula, estado de um objeto e onda, além de questões sobre
personagens de destaque em Física e equipamentos, experimentos, artefatos, etc. Cópia deste
questionário consta do Apêndice II.
Com o intuito de verificar a aprendizagem dos alunos, foram aplicadas três avaliações
escritas durante o desenvolvimento da proposta, todas elas sem consulta ao Texto de Apoio ou
19
a outros meios. A primeira avaliação foi realizada em duplas, enquanto as demais foram
individuais. O momento de aplicação de cada avaliação é apresentado no próximo capítulo e,
em todas as avaliações, o período disponibilizado para sua resolução foi de cinquenta minutos,
mas os alunos acabavam por realizá-las em menos tempo do que o ofertado, conforme
apresentado no próximo capítulo. Cópias das avaliações encontram-se no Apêndice III.
A primeira avaliação, relativa à superposição linear de ondas e de vetores, buscou
verificar também o interesse do aluno pelo aprendizado em MQ. Esta avaliação constou de seis
questões, sendo cinco dissertativas e uma de múltipla escolha, e o foco estava na
compreensão dos conceitos e princípios aplicados nas situações-problema estudadas.
Na segunda avaliação, foram contemplados conteúdos sobre os principais conceitos e
postulados da MQ, a saber, os relativos a sistemas físicos, estados de sistemas físicos,
superposição linear de estados quânticos, resultados de medidas e probabilidades associadas,
observáveis e incompatibilidade de observáveis. Esta avaliação constou de sete questões,
sendo seis dissertativas e uma de múltipla escolha, e as situações-problema utilizadas foram o
átomo de hidrogênio, o experimento de dupla fenda e o experimento de Stern-Gerlach.
A terceira avaliação versou sobre a aplicação dos postulados às situações-problema
de Emaranhamento Quântico e Criptografia Quântica, além de outras como a polarização da
19
Nas turmas da primeira fase da pesquisa, a primeira avaliação foi realizada em duplas. Esta estratégia foi retirada na
segunda fase proporcionando verificar-se a aprendizagem de cada aluno separadamente. As demais avaliações foram
realizadas de forma individual (e sem consulta ao Texto de Apoio).
65
luz, por exemplo. Esta avaliação constou de seis questões, sendo cinco dissertativas e uma de
múltipla escolha.
Ao final desta etapa foi aplicado um questionário de opiniões (vide Apêndice IV) com a
intenção de verificar o acolhimento dos alunos aos temas apresentados e sobre o propósito de
um estudo introdutório de MQ no EM. O questionário constou de dez questões e os alunos
foram incentivados a apresentar respostas que representassem suas opiniões verdadeiras,
sem risco de comprometer os resultados (ainda não divulgados) das avaliações (já corrigidas).
Adicionalmente, no mesmo dia, logo após o término do tempo de respostas concedido ao
questionário de opiniões, os alunos foram reunidos para que expusessem as opiniões que,
eventualmente, não conseguiram colocar no papel.
Como mencionado, elaboramos um diário de bordo com registros sobre reações e
questionamentos dos alunos ante os assuntos desenvolvidos. Em particular, as manifestações
apresentadas na reunião mantida com os alunos após o questionário de opiniões, foram
registradas no diário de bordo. O diário foi utilizado para complementar a análise dos dados
coletados na pesquisa.
Nesta fase do projeto, os alunos foram inicialmente levados a elaborar um mapa mental
associando a expressão “Mecânica Quântica” a menções de temas que lhes viessem à mente.
Cada aluno recebeu, para tal, uma folha com a citação “Mecânica Quântica” no centro,
solicitando-se silêncio para que a atividade fosse desenvolvida individualmente e sem
interferências dos colegas. A denominação “mapa mental” do instrumento não foi apresentada
aos alunos, não sendo o intuito do curso que os alunos se apropriassem desta nomenclatura
(pelo menos não naquele momento).
Finalizada a atividade do mapa mental, foi proposto, na mesma aula, o questionário de
conhecimentos prévios utilizado na primeira etapa da pesquisa.
Como forma de diagnosticar o aprendizado no decorrer do curso, lançou-se mão de
quatro testes rápidos, com respostas por escrito, além das mesmas três avaliações aplicadas
na primeira fase do projeto. Os testes rápidos compreenderam uma ou duas perguntas com
expectativa de resposta rápida e foram realizados ao final de algumas das aulas. Os alunos
tinham de cinco a dez minutos para resolver estes testes e, em geral, este tempo foi
considerado suficiente. Os testes foram aplicados ao final do terceiro, sexto, sétimo e décimo
encontros, respectivamente. Para as respostas aos testes, o aluno recebeu uma folha em
branco somente com o número da questão, sendo esta apresentada através do projetor
multimídia. A intenção de tal estratégia era a de induzir os alunos a responder rapidamente
(tipicamente, em menos de três minutos) para, se possível, apresentar e discutir as respostas
logo em seguida. Os quatro testes utilizados constam do Apêndice V.
As avaliações escritas foram aplicadas nos mesmos momentos do desenvolvimento do
conteúdo da primeira fase.
66
A reapresentação do mapa mental do início do primeiro encontro, ao final do curso,
visou analisar, através das diferenças entre os dois mapas, alguns aspectos da aprendizagem
ocorrida. Na mesma aula, foi aplicado o questionário de opiniões introduzido na primeira etapa,
com os mesmos objetivos anteriores.
Três alunos de cada turma foram escolhidos aleatoriamente para uma rápida entrevista
sobre o curso apresentado. Estas entrevistas foram gravadas, sendo os alunos informados da
preservação de suas identidades e da não influência das mesmas nos resultados das suas
avaliações.
Assim como na etapa anterior, foi elaborado um diário de bordo, utilizado para
complementar a análise dos demais dados coletados.
67
Com base na análise exploratória de Kendall (1977) proposta por Barbancho (1992),
20
que calcula o coeficiente de variação (CV) ou grau de dispersão dos dados, procurou-se
verificar se as respostas fornecidas refletiam o nível de conhecimento da turma sobre cada um
dos assuntos das avaliações e dos testes rápidos. O valor do CV maior que 0,30 implica em
uma grande dispersão, indicando que o valor da média da turma não reflete necessariamente a
realidade conceitual do grupo; trata-se, então, de uma turma não homogênea, a compreensão
dos conceitos apresentados não tendo ocorrido de modo uniforme em toda a turma.
21
Realizou-se, igualmente, uma análise de variância utilizando o teste t de Student , com
um nível de significância a 95%, para verificar se havia diferença estatisticamente significativa
entre as amostras nos seguintes casos: (1) entre as diferentes séries de uma mesma etapa da
pesquisa; (2) entre as mesmas séries das duas diferentes etapas da pesquisa. As respostas
deixadas em branco pelos alunos foram contabilizadas e consideradas na análise do CV e do
teste t, mesmo que não haja consenso entre pesquisadores em Ensino sobre o significado de
uma resposta em branco (Hora et al., 2010, p. 97).
Após a conclusão das etapas da pesquisa, foi realizada uma comparação entre os
desempenhos dos alunos de primeira e terceira séries de cada etapa, visando a análise da
existência de uma possível influência do aprendizado de conceitos apresentados anteriormente
em FC nas terceiras séries para a aprendizagem de conceitos fundamentais da MQ. Fez-se,
também, uma comparação dos resultados entre as mesmas séries das duas apresentações do
curso, com o intuito de analisar se havia alguma diferença estatisticamente significativa entre
elas.
As entrevistas da segunda etapa foram analisadas qualitativamente após sua
transcrição, buscando elementos nas falas dos alunos que pudessem revelar indícios de
ocorrência de aprendizagem significativa e os conhecimentos-em-ação utilizados.
Com tais dados assim analisados, consideramos possível responder as questões de
pesquisa propostas.
No próximo capítulo, são apresentadas a análise e a discussão dos dados coletados.
20
O coeficiente de variação é uma medida da dispersão relativa e é dado pela expressão: , em que é o desvio
série.
68
CAPÍTULO VI
1. Introdução
A primeira etapa da pesquisa teve como foco o desenrolar da primeira fase de ensino,
realizada em 2010, e envolveu a análise de respostas dos alunos a questionário de conhecimentos
prévios e a análise de resultados de três avaliações escritas, além do exame do questionário de
opiniões e das entrevistas realizadas.
22
Na apresentação dos dados, erros gramaticais e ortográficos cometidos por alguns alunos foram corrigidos nas transcrições,
exceto quando a resposta do aluno foi escaneada.
23
Uma análise preliminar dos questionários respondidos pelos alunos da primeira fase da pesquisa foi apresentada no XIX
Simpósio Nacional de Ensino de Física em Manaus, AM (2011), com o trabalho “Inserindo conceitos de mecânica quântica no
ensino médio: superposição linear” na forma de comunicação oral.
69
ginástica, música, terapia). Os alunos, dentre estes, que justificaram suas escolhas, citaram os
seguintes motivos: “já ouvi falar” e “acho que é isso”.
Quanto à terceira questão, treze alunos da primeira série e sete da terceira não sabem ou
não souberam apresentar um conceito de partícula. As respostas e exemplos que mais apareceram
no grupo dos alunos da primeira série dizem respeito a “parte ou pedaço de uma coisa/matéria”,
“coisas pequenas”, “pedaços vistos no microscópio”, “átomos”, “célula” e até “pedaço de unha”. Além
de repetirem algumas dessas afirmações, os alunos da terceira série citaram que partículas são
“pedaços de pedaços”, “menor parte de um átomo ou corpo”, “grão”, entre outros. A palavra elétron
foi citada como exemplo de partícula na terceira série.
No que concerne à quarta questão, para os alunos de ambas as séries o termo estado esteve
muito relacionado com os estados de agregação da matéria (sólido, líquido, gasoso). Não ocorreram
grandes diferenças nas respostas apresentadas pelos alunos das duas séries; muitos relacionaram o
estado de um sistema com “a posição em que um objeto ou pessoa está, suas condições
(preservado, movimento, temperatura), como foi feito e de onde veio”. Quinze alunos da primeira
série e quatro da terceira não responderam ou não souberam responder esta questão. Nenhum aluno
mencionou que o estado poderia alterar-se no tempo.
Na quinta questão poucos alunos explicaram, mesmo a seu modo, o que é uma onda, mas a
maioria apresentou exemplos, sendo as ondas do mar o mais citado. Alguns alunos da primeira série
afirmaram que uma onda é um “impulso temporário/magnético” ou uma “oscilação”. Ondas sonoras,
ondas eletromagnéticas (TV, rádio, micro-ondas) e ondas geradas por pedra jogada no meio de um
lago, foram também citadas como exemplos.
A sexta questão foi a que menos respostas afirmativas apresentou. Um aluno registrou que
acreditava que o experimento de dupla fenda era um experimento com “dois buracos”. Alguns
relacionaram a palavra “fenda” com uma ferramenta e outros julgaram ser o experimento, um de
dupla face ou duplo acontecimento, sem explicar o que queriam dizer com isso. Talvez se a pergunta
se referisse à experiência de interferência de Young, algumas respostas poderiam ter sido mais
relacionadas ao assunto. Isto sinaliza para o fato de que, apesar da importância do experimento de
dupla fenda para a observação de um fenômeno não clássico (com elétrons, por exemplo), este
tópico não foi sequer mencionado nas disciplinas de Física e Química dos alunos do EM envolvidos
no curso.
Quase todos os alunos das duas séries afirmaram ter interesse, em resposta à questão
número sete, em conhecer a teoria base dos equipamentos apresentados na pergunta, seja por
curiosidade, desejo de aquisição de conhecimento ou para simplesmente saber como funcionam.
Cinco alunos declararam não importar saber o que os aparelhos têm em seu interior, pois isto não os
ajudaria em nada e acrescentaram que nunca iriam “usar isso”.
Sete alunos da primeira série afirmaram já ter ouvido falar da MQ (oitava pergunta), porém
não sabiam informar a respeito de quais assuntos, sendo apenas familiar o nome; os demais
declararam não ter ouvido a respeito e alguns destes manifestaram interesse em estudar esta teoria.
Quanto aos alunos da terceira série, quase metade dos mesmos mencionou já ter ouvido algo a
respeito da MQ, sendo os assuntos citados “onda”, “propagação de onda”, “ciência” e “tecnologia”.
70
Um aluno registrou já ter ouvido falar da MQ, a respeito de um objeto poder estar em dois lugares ao
mesmo tempo.
Albert Einstein foi o nome mais lembrado pelos alunos na nona questão. Os estudantes
comentaram já ter visto sua foto em capas de revistas, em notícias na Internet relacionadas à sua
genialidade, a respeito da bomba atômica e da teoria da relatividade. Um aluno mencionou ter ouvido
falar de Werner Heisenberg e outro de Max Planck, porém não souberam dizer em relação a quais
assuntos. De modo equivocado, uns poucos alunos das duas séries acreditavam que Einstein teria
sido o inventor da lâmpada elétrica e da eletricidade. Treze alunos da primeira série e três da terceira
afirmaram não conhecer qualquer dos cientistas citados.
Relativamente à décima e última pergunta do questionário, 43 alunos (30 da primeira série e
13 da terceira) informaram já ter lido sobre Aceleradores de Partículas, Bomba Atômica, Chip,
Nanotecnologia, Radiação Eletromagnética, Teletransporte ou Tunelamento em livros e na Internet,
ou ter ouvido falar a respeito na própria Escola. A Bomba Atômica foi citada pelo seu poder de
destruição e utilização em guerras; um aluno da terceira série afirmou que ela “possui átomos
concentrados que liberam energia quando se separam”. Segundo os alunos, os Chips são
“componentes eletrônicos utilizados em aparelhos celulares e para guardar informação”. Um aluno
crê que o Acelerador de Partículas é utilizado para “visualizar partículas invisíveis ao microscópio”. A
Nanotecnologia foi considerada por um aluno como uma “tecnologia microscópica” e o Teletransporte
como algo que “permite a troca da posição de uma pessoa em instantes”, por outro aluno. Um
estudante associou a palavra “tecnologia” aos termos apresentados. Trinta alunos da primeira série e
treze da terceira afirmaram não ter ouvido falar a respeito dos itens apresentados ou não
responderam a pergunta.
As respostas ao questionário sugerem que os alunos da primeira série tiveram pouco (ou
nenhum) contato com a MQ e que alguns dos alunos da terceira série tiveram algum contato com
esta teoria, em parte talvez na Internet ou pela televisão. Pode-se dizer, no entanto, que
provavelmente este contato não foi através da educação formal em Física, visto que o currículo da
Educação Básica não contempla a MQ ou alguns de seus elementos nesta disciplina. Contudo, na
disciplina de Química isto pode ter ocorrido, pois o conteúdo de Atomística contempla alguns tópicos
de MQ. Saliente-se, então, que o conhecimento apresentado pelos alunos de terceira série não
advém de uma formação, mas sim de uma informação que foi obtida provavelmente pela educação
em espaços não-formais e informais de ensino.
A falta de conhecimentos dos alunos de ambas as séries acerca da física quântica revelada
pelo experimento de dupla fenda também nos induz a acreditar que seja possível abordar a MQ do
mesmo modo para estas séries. Esta situação também ocorreu nas duas últimas questões do
questionário, mostrando que os alunos das duas séries possuem informação semelhante acerca de
alguns cientistas importantes no trato da MQ e também de alguns termos importantes da área.
Na análise das respostas às questões também foi possível verificar que os alunos possuem
grande dificuldade em escrever o que pensam a respeito de determinado conteúdo. Alguns alunos,
inclusive, salientaram em suas respostas que já tinham ouvido falar sobre o tema, mas não
conseguiam apresentar explicações ou dar exemplos. No processo ensino-aprendizagem de qualquer
71
disciplina, torna-se extremamente complicado tentar fazer o aluno se apropriar de um campo de
conhecimento sem que ele consiga externalizar o que pensa. Segundo a Teoria dos Campos
Conceituais, é através desta externalização que o professor pode encontrar guarida para verificar o
aprendizado dos alunos. Uma solução parcial para esta dificuldade pode ser a averiguação de
algumas das concepções dos estudantes na forma oral, através de uma conversa informal ou
discussão em sala de aula. Lamentavelmente, nem todos os alunos participam dessas sessões
ativamente, realizando as atividades de forma rápida e sem interesse, o que pode prejudicar uma
avaliação mais detalhada do aprendizado de cada aluno e dos conceitos que traz consigo para a sala
de aula.
Três avaliações escritas foram realizadas para verificação de aprendizagem dos alunos e,
com isso, possibilitar uma análise da qualidade das situações-problema utilizadas ao longo do curso
(e da qualidade do próprio curso). As questões de cada uma das avaliações estão apresentadas no
Apêndice III.
As turmas tiveram cinquenta minutos para a resolução de cada uma das avaliações, mas
algumas delas utilizaram menos tempo.
A primeira avaliação, constando de seis questões, foi aplicada após a realização de aulas em
que foi trabalhada uma introdução da MQ com seus aspectos não intuitivos, algumas de suas
aplicações e uma rápida apresentação do momento histórico que conduziu à sua elaboração, além de
24
conceituação e exemplos de superposição de ondas e superposição de vetores . Os tópicos
abordados, conforme apresentado no Texto de Apoio, foram a Introdução, Somando Ondas, Vetores
e Estados (Somando Ondas e Somando Vetores do Plano Real).
Esta avaliação foi realizada por 71 alunos, sendo 49 da primeira série e 22 da terceira série,
e foi realizada em duplas nesta etapa da pesquisa, mas com alguns alunos optando por resolvê-la
individualmente.
24
Apesar deste tópico ser tradicionalmente abordado no primeiro ano, optou-se por trabalhá-lo igualmente nas duas séries,
visto que havia uma expectativa, mas não confirmação, de que seu conteúdo tivesse sido trabalhado anteriormente pela
terceira série e com aprendizagem significativa.
72
conteúdos apresentados. Pode-se perceber também que os índices de respostas em branco são
maiores nas turmas de primeira série do que na de terceira.
Tabela 3. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da primeira avaliação na
primeira etapa da pesquisa.
Em
Série Questão 0 1 2 3
branco
1 2 0 25 20 2
2 11 4 17 8 9
3 3 6 0 40 0
1ª
4 9 3 23 8 6
5 10 12 5 14 8
6 4 8 12 8 17
1 0 0 8 14 0
2 2 2 9 8 1
3 2 2 0 18 0
3ª
4 0 0 11 11 0
5 2 7 8 4 1
6 8 6 5 2 1
TOTAL 53 50 123 155 51
A análise destes dados permite chegar aos valores da tabela 4 para a média e o desvio
padrão de cada série.
Tabela 4. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a primeira avaliação.
1ª série 3ª série
Média 1,67 2,05
Desvio Padrão 0,64 0,54
Com estes valores de média e desvio padrão, chega-se aos valores 0,38 e 0,27 para o
coeficiente de variação (CV) da primeira e da terceira série, respectivamente. Estes valores para o
CV indicam que o valor da média pode refletir a realidade conceitual somente da terceira série,
sinalizando que há uma compreensão homogênea dos tópicos apresentados somente nesta série.
Em um nível de confiança a 95%, obtém-se t = 2,50 para o valor do teste t de Student na
comparação entre as séries nesta etapa. Este resultado indica que há diferença estatisticamente
significativa entre as respostas das duas séries na primeira avaliação da primeira escola da pesquisa.
Em uma análise feita questão a questão, pode-se encontrar outros indícios de alguma
aprendizagem pelos alunos.
A figura 8 apresenta algumas das respostas dos alunos da primeira etapa à primeira questão
da primeira avaliação, que foi enunciada da seguinte forma:
Explique, com suas palavras, qual o resultado da soma de duas ondas e apresente um
exemplo.
As respostas incluídas nesta figura foram apresentadas também por outros alunos, sua
repetição sendo omitida para evitar redundância de informação. Como a avaliação foi realizada em
duplas nesta etapa, aparecem dois números de alunos. É interessante destacar que as situações-
problema adotadas no trato da superposição de ondas foram utilizadas por alguns alunos em seus
73
exemplos, como o da soma de ondas em água, provocadas por goteiras (alunos 10207-10233) e o da
soma de ondas sonoras (alunos 10316-10319). Isto pode ser considerado como uma apropriação do
campo de conhecimento apresentado e, neste ponto, deve ser tido como um conhecimento prévio
relevante para o aprendizado da superposição linear de estados estudada na sequência do conteúdo.
(a)
(b)
(c)
Figura 8. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10206-10232; (b) 10207-10233; (c) 10316-10319.
Algumas das respostas apresentadas pelos alunos a esta questão aparecem na figura 9. As
respostas levam a crer que a sistemática utilizada para criação de novos vetores a partir de outros foi
incorporada pelos alunos. Um destaque pode ser dado à resposta dos alunos 10305-10309 que
consideraram que a formação de um vetor do plano real pela multiplicação de um vetor do plano por
um número real é idêntica àquela utilizada no caso das ondas. Isto sugere que este conteúdo não é
considerado difícil pelos alunos e pode ser devidamente trabalhado no Ensino Médio (EM).
(a)
(b)
Figura 9. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10305-10309; (b) 10308-10324.
74
Analise as ondas representadas na primeira coluna, efetue a superposição das
mesmas e relacione corretamente com as da segunda coluna.
(
( )
a)
(
( )
b)
(
( )
c)
Por ser uma questão em que os alunos deveriam relacionar duas colunas, analisa-se a
terceira questão da primeira avaliação quanto ao seu índice de acertos. Dos 71 alunos que realizaram
esta avaliação, nenhum deixou a resposta à questão em branco e 58 alunos (80,6%) relacionaram
corretamente as colunas, o que sugere que a forma procedimental de superposição de ondas foi bem
compreendida.
A quarta questão objetivava verificar a sistemática da construção e representação de vetores
no plano pelos alunos e é enunciada a seguir:
a) b) c)
Como a maioria dos alunos havia mostrado conhecimento correto sobre o resultado do
produto de um vetor do plano real por um número real e da soma de duas ondas, esperava-se
um bom índice de respostas corretas. Efetivamente, 73,6% dos estudantes tiveram respostas
avaliadas como corretas ou parcialmente corretas, a maior parte (34), no entanto, avaliada
apenas como parcialmente correta, visto que ou um dos três itens propostos não foi respondido
corretamente ou alguns dos vetores foram representados incorretamente. Ainda assim, o erro
apresentado pode estar em parte associado a algum momento de falta de atenção na
resolução da questão (e não tanto a uma falta de aprendizado sobre a superposição de vetores
e sua representação). A figura 10 apresenta a resposta (considerada correta) dos alunos
10225-10229 a esta questão.
75
Figura 10. Respostas à quarta questão da primeira avaliação
pelos alunos da primeira etapa 10225-10229.
Que razões você citaria para justificar a introdução de uma teoria diferente da
Mecânica Clássica, como é a chamada Mecânica Quântica?
Cabe destacar que a postura de alguns dos alunos perante o conteúdo apresentado foi
negativa, o que se refletiu nas respostas apresentadas, conforme exposto na figura 11
(especialmente em 11b, 11c e 11e). Saliente-se que em momento algum se tentou passar uma
imagem depreciativa tanto da MC como da MQ aos alunos e estas manifestações foram
espontaneamente apresentadas pelos alunos. A postura relativa à MQ mencionada pode se
constituir em um fator impeditivo para a ocorrência da aprendizagem significativa nestes
alunos, visto que esta não é uma situação de pré-disposição para a aprendizagem. Ainda que
haja exemplos de postura inadequada acerca do conteúdo apresentado, estes alunos
representam apenas uma ínfima parte do público estudado; são casos particulares e seu
desempenho pode mostrar se esta atitude comprometerá o aprendizado dos tópicos
subsequentes. Dez alunos não responderam esta questão.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Figura 11. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10104-10113; (b) 10214-10222; (c) 10216-10227; (d) 10305-10309; (e) 10314-10320.
76
A sexta questão tinha por objetivo verificar se os alunos percebiam algumas das
situações de aplicação de conceitos da MQ, seja em implicações tecnológicas, seja no campo
de pesquisa, tal como enunciado a seguir:
Ao todo, 19 alunos deixaram esta questão em branco (ver tabela 4) e algumas das
respostas podem ser vistas na figura 12. A avaliação dos alunos 10216 e 10227 novamente
apresenta uma resposta que pode sugerir falta de comprometimento e postura negativa
perante o conteúdo ministrado.
(a)
(b)
(c)
Figura 12. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10216-10227; (b) 10230-10234; (c) 10303-10325.
A segunda avaliação contém sete questões e foi realizada após as aulas em que os
conceitos de estados de sistemas físicos, superposição linear de estados e incompatibilidade
de observáveis foram trabalhados, incorporando-se como situações-problema os experimentos
de dupla fenda, o experimento de Stern-Gerlach e características do átomo de hidrogênio.
77
Nesta etapa da pesquisa, 79 alunos, desta vez individualmente, realizaram a avaliação
(57 da primeira série e 22 da terceira).
A análise destes dados permite chegar à tabela 6 para a média e o desvio padrão de
cada uma das séries.
Tabela 6. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a segunda
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 1,38 1,53
Desvio Padrão 0,53 0,61
Decorrem destes valores de média e desvio padrão, os valores 0,39 e 0,40 para o
coeficiente de variação (CV) da primeira e da terceira série, respectivamente. Tais números
indicam que o valor da média para as turmas de terceira série nesta etapa pode não refletir a
78
realidade conceitual das turmas na segunda avaliação. Há muita heterogeneidade na
compreensão e o conteúdo não foi bem compreendido por todos os alunos, tendo-se alguns
alunos com boa compreensão e outros com não bom entendimento sobre os tópicos
estudados.
Em um nível de confiança a 95%, o valor do t de Student resultou em 0,61 na
comparação entre as duas séries. Este valor indica que não há diferença estatisticamente
significativa entre as duas séries nesta etapa.
Mesmo sendo uma questão de cunho clássico, é importante lembrar que o conceito de
estado nem sempre é salientado em MC e que é praticamente o mesmo para sistemas
clássicos e quânticos. A figura 13 apresenta o sistema físico investigado pelos estudantes na
segunda avaliação. Um fato interessante sobre esta questão é o de que muitos alunos se
aproximaram do objeto (exposto na mesa do professor) para coletar mais informações e assim
promover uma descrição mais completa de seu estado, conforme recomendado ao longo das
aulas.
Figura 13. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na
primeira etapa da pesquisa.
79
conceito, acredita-se que, ao utilizá-la, os alunos estejam revelando alguma compreensão
sobre o conceito de estado de um sistema físico, sob a perspectiva da MQ. Verifica-se também
que a noção de alteração do estado no tempo (um passo para a evolução temporal) está
presente em algumas das descrições, como no caso das respostas dos alunos 10118, 10205, e
10212. O alto número de respostas consideradas corretas a esta questão leva a crer que
ocorreu aprendizado acerca do papel do conceito de estado de um sistema físico pelos alunos
e que a representação (via notação de Dirac) está sendo incorporada às suas estruturas
cognitivas.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Figura 14. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10118; (b) 10124; (c) 10205; (d) 10212; (e) 10316.
Algumas respostas dos alunos a esta questão constam da figura 15. As respostas
apresentadas sugerem que é possível haver compreensão da superposição linear de estados
pelos alunos com o recurso desta situação-problema, mas a elevada proporção de alunos
80
(27,8%) que deixaram de responder a questão também permite considerar que se trata de um
conhecimento um tanto abstrato para os alunos e que sua abordagem no EM deva ser feita
com mais tempo para discussão. Conceitos (relativos ao átomo de hidrogênio) trabalhados
nesta questão são usualmente abordados na disciplina de Química durante a primeira série do
EM (Atomística). É possível que os alunos estejam tendo uma aprendizagem mecânica dos
conceitos em Química e que não ocorra uma recuperação quando da abordagem dos mesmos
em Física, tanto na primeira como na terceira série. Faz-se, assim, necessário que a forma com
que este conteúdo é trabalhado seja discutida para realmente promover uma aprendizagem
significativa ou, até mesmo, verificar se esta situação-problema é adequada para a
compreensão dos conceitos envolvidos nesta análise.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 15. Respostas à segunda questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10106; (b) 10118; (c) 10129; (d) 10210.
81
Considere o experimento de dupla fenda com elétrons.
a. Estando fechada uma das fendas, o que você espera encontrar
registrado no segundo anteparo, quando realizar a experiência com
muitos elétrons? O que você pode dizer sobre o estado do elétron
submetido a este experimento?
b. Estando abertas as duas fendas, o que você espera encontrar
registrado no segundo anteparo, quando realizar a experiência com
muitos elétrons? O que você pode dizer sobre o estado do elétron
submetido a este experimento?
Algumas das respostas encontradas a esta questão são apresentadas na figura 16.
Foram identificadas várias respostas que podem ser consideradas adequadas ao propósito da
questão. Alguns alunos expressaram o estado associado a cada um dos dois itens utilizando a
notação de Dirac (por exemplo, alunos 10101,10133, 10218, e 10320) e outros descreveram o
estado sem a utilização da notação (por exemplo, aluno 10202), mas aparentando uma
compreensão sobre o papel da superposição linear no experimento. Face às respostas
encontradas, pode-se considerar que o experimento de dupla fenda é uma situação-problema
adequada para o aprendizado de conceitos de MQ e de fácil compreensão por parte dos
estudantes, visto que os estados foram bem elaborados pelos alunos e a superposição linear
estava presente. Pelas respostas a esta questão, é possível inferir que há um bom aprendizado
dos dois conceitos-chave da MQ mais abordados nesta tese, principalmente nesta específica
situação-problema.
A quarta questão foi proposta aos alunos com a seguinte redação:
Poucos alunos forneceram uma resposta satisfatória a esta questão; 48,1% deles
deixaram de responder. Acredita-se que isto possa ter ocorrido pelos mesmos motivos
enfrentados na segunda questão. Algumas das poucas respostas aceitas como satisfatórias
são apresentadas na figura 17. Todas elas são de alunos que propuseram estados de ligação
para o par de átomos de hidrogênio. Contudo, em nenhuma destas respostas é possível
verificar a aplicação do conceito de superposição linear. Isto pode decorrer de dificuldades
relacionadas ao manejo de situações envolvendo o átomo de hidrogênio e indica que o
conceito de superposição linear (como outros) é mais claramente percebido em algumas
situações-problema do que em outras.
82
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Figura 16. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10101; (b) 10133; (c) 10202; (d) 10218; (e) 10320.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 17. Respostas à quarta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10207; (b) 10305; (c) 10316; (d) 10319.
83
Em Mecânica Quântica existem algumas grandezas físicas (observáveis) que
são ditas incompatíveis, ou seja, não podem caracterizar o mesmo estado do
objeto. Assim, responda os itens a seguir.
a. É possível caracterizar o estado de um elétron pela posição no espaço
(coordenadas x, y e z, por exemplo)?
b. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua posição e sua
energia?
c. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua projeção de spin
em uma direção e sua posição?
(a)
(b)
Figura 18. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10225; (b) 10316.
Assim como nas questões 2 e 4, muitos alunos deixaram a sexta questão sem resposta
(27,8%). A figura 19 apresenta algumas respostas dos alunos a esta questão.
É possível notar que, mesmo com muitas respostas em branco (27,8% dos alunos),
ainda assim tanto alunos de primeira quanto de terceira série forneceram respostas aceitas
como satisfatórias (apesar da imprecisão da linguagem) para esta questão (32,9% dos alunos),
84
indicando alguma compreensão da presença da superposição linear na descrição de estados
em MQ. Assim, por mais que os alunos tenham tido dificuldades em expor seus conhecimentos
nesta questão, pode-se ainda inferir que há alguma internalização do conceito de superposição
linear até aquele momento do curso. Com essa internalização, o campo de conhecimentos
apresentado aos alunos está conduzindo à produção de um esquema para interpretação
destes fenômenos novos e, dadas as respostas fornecidas, parece que se começa a atingir
uma equilibração majorante, visto que os novos esquemas estão dando conta das situações-
problema.
(a)
(b)
(c)
Figura 19. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10105; (b) 10119; (c) 10310.
Qual dos estados a seguir pode ser atribuído a elétrons que, submetidos ao
experimento de Stern-Gerlach, apresentam resultados como os indicados na
figura abaixo? Justifique sua escolha.
a) c)
b) d)
(a)
(b)
(c)
Figura 20. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10119; (b) 10303; (c) 10312.
85
respostas corretas (mais da metade dos estudantes) parece indicar o experimento de Stern-
Gerlach como uma situação-problema favorável a fácil assimilação de conceitos de MQ e que
pode ser utilizada com relativo êxito na abordagem de tópicos de MQ no EM.
Antes do início do curso, os alunos, em sua ampla maioria, não tinham conhecimento
sobre o Princípio de Superposição Linear de Estados em MQ e também sobre as diferenças
estruturais existentes entre a MQ e a MC, conforme revelado na análise das respostas ao
questionário proposto.
Com os resultados da segunda avaliação, é possível perceber que já existe um
razoável domínio pelos alunos, sobre o campo conceitual da MQ. Isso sugere que este primeiro
contato com a teoria vem cumprindo seu papel para uma adequada alfabetização científica
acerca de parte dos conceitos de MQ, frequentemente divulgados em diversos canais de
informação acessíveis ao público em geral (muitas vezes sem qualquer endosso científico) e
que podem conduzir a interpretações errôneas, das quais dificilmente se liberam os alunos.
Em um aspecto mais geral, as situações-problema utilizadas foram importantes para a
compreensão do que é o estado de um sistema quântico e da superposição linear de tais
estados. Os experimentos de dupla fenda e de Stern-Gerlach, em especial, foram os de mais
fácil assimilação pelos alunos e podem ser considerados conceitualmente simples, para a
aplicação dos primeiros princípios da MQ. As questões que utilizaram o átomo de hidrogênio
como situação-problema tiveram pouco êxito na avaliação da aprendizagem dos alunos, o
número de alunos que responderam tais questões tendo sido muito menor que o daqueles que
o fizeram em questões relacionadas com as outras situações-problema. Deste modo, uma
abordagem para o ensino de MQ que utilize situação envolvendo o átomo de hidrogênio
deveria dar um enfoque muito mais aprofundado ao assunto, pois foi considerada de difícil
compreensão pelos alunos.
A terceira avaliação continha seis questões e foi realizada após as aulas em que o
emaranhamento quântico e a criptografia quântica foram apresentados, com o decorrente
reforço dos postulados da MQ.
Nesta fase da pesquisa, 69 alunos realizaram a avaliação (48 da primeira série e 21 da
terceira série).
86
2.2.3.1. Análise quantitativa
A partir dos dados da terceira avaliação é possível chegar à tabela 8 para a média e
desvio padrão de cada uma das séries.
Tabela 8. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a terceira
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 1,57 1,43
Desvio Padrão 0,69 0,68
Com tais valores de média e desvio padrão, resultam os valores 0,44 e 0,48 para o
coeficiente de variação (CV) da primeira e da terceira série, respectivamente, que refletem falta
de homogeneidade na compreensão pelas séries. Os valores de CV apresentados indicam a
ocorrência de algumas dificuldades conceituais que devem ser analisadas e sanadas com uma
abordagem diferenciada na segunda etapa da pesquisa. A próxima etapa deverá estar mais
voltada às questões em que os alunos tiveram um problema maior na resolução.
Em um nível de confiança a 95%, foi obtido o valor 0,79 para o teste t de Student na
comparação entre as duas séries. Isto indica que não há diferença estatisticamente significativa
para os resultados da terceira avaliação entre as séries nesta etapa da pesquisa, mesmo que a
compreensão não tenha sido homogênea em cada série, conforme apontado pelo coeficiente
de variação.
87
2.2.3.2. Análise qualitativa
Apresenta-se agora uma análise de algumas das respostas fornecidas pelos alunos da
primeira etapa às questões da terceira avaliação.
Com a apresentação de um estado de determinado sistema físico, a primeira questão
tinha por objetivo verificar se os alunos conseguiam identificar as informações (ou a maior parte
delas) contidas neste estado, conforme o seguinte enunciado:
(a)
(b)
(c)
Figura 21. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10122; (b) 10124; (c) 10320.
A figura 22 mostra algumas das respostas fornecidas pelos alunos à segunda questão.
Como na sétima questão da segunda avaliação, muitos alunos simplesmente assinalaram as
alternativas que julgaram adequadas sem apresentar justificativa, algo que prejudica a análise
sobre a aprendizagem destes alunos acerca dos conceitos abordados nesta questão.
Apesar da dificuldade que muitos alunos apresentam na redação de suas respostas, é
possível perceber alguns indícios de que sabem identificar a “separabilidade” dos estados
(alunos 10230 e 10324) e a imediata informação do estado da segunda partícula obtido com a
medida do estado da primeira partícula (aluno 10223). Deste modo, apesar de não ser uma
questão trivial para a maior parte dos alunos, acredita-se que proporcionou uma situação-
88
problema adequada para verificação de aprendizagem de conceitos extremamente novos (e
motivadores) para os alunos e que sinaliza ser de algum razoável domínio neste primeiro
contato.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 22. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10202; (b) 10223; (c) 10230; (d) 10324.
(a)
(b)
(c)
Figura 23. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10111; (b) 10113; (c) 10215.
89
A quarta questão, enunciada a seguir, abordava a configuração de um estado e o
processo de medida da polarização de um fóton, relacionado aos processos de criptografia
quântica.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 24. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10105; (b) 10112; (c) 10119; (d) 10316.
Por que o emaranhamento quântico pode ser considerado como uma aplicação
simples da superposição linear?
A figura 25 apresenta algumas das respostas dos alunos a esta questão. Pode-se notar
que muitos alunos percebem que o emaranhamento quântico é uma simples decorrência (do
ponto de vista conceitual) do princípio de superposição linear. Pelo número de acertos e erros
nesta questão, vê-se que um número razoável de alunos (37,7%) teve respostas consideradas
corretas ou parcialmente corretas. Mesmo com a grande dificuldade dos estudantes em
expressar-se e com o fato de o emaranhamento quântico ser algo novo e contraintuitivo, ainda
assim se pode considerar que as respostas obtidas foram satisfatórias e que estão dentro do
esperado em um primeiro contato com a MQ.
90
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 25. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10113; (b) 10119; (c) 10210; (d) 10320.
Figura 26. Resposta à sexta questão da terceira avaliação pelo aluno da primeira etapa 10133.
25
A palavra medicina foi considerada inadequada, quando não justificada, porque pode estar vinculada a terapias
alternativas, em desacordo com a abordagem utilizada ao longo do curso.
92
por 26 alunos (49,1%) para as alternativas assinaladas, indicavam que os tópicos haviam sido
trabalhados, mencionados ou comentados em sala de aula ao longo do curso. Isto mostra a
importância que a atualização do currículo do EM tem sobre o cotidiano dos alunos. É
reprovável que a formação básica dos alunos do EM ocorra sem que tenham qualquer contato
com a FMC ou talvez com uma abordagem excessivamente matemática da Física. Dezesseis
alunos (30,2%) afirmaram acreditar que as palavras assinaladas tinham relação com a palavra
quântica. Algumas das outras justificativas apresentadas foram: “foi o que me veio em mente”,
“não existe cura, ginástica, medicina, música ou terapia quântica”, “MQ não se aplica a
questões corporais ou mentais”. Nove alunos não justificaram as alternativas assinaladas e
dois alunos justificaram as suas opções com “tudo é estranho e anormal” e “MQ não existe e é
coisa louca”.
Os alunos que marcaram alguma alternativa considerada inadequada, afirmaram ter
ouvido falar nestas opções durante o curso ou, ainda, que acreditam que estas palavras devem
ter alguma relação com quântica. É importante destacar que, mesmo que não seja uma
aprendizagem significativa neste momento, este primeiro contato dos alunos com a MQ cria
uma postura pertinente acerca dos conteúdos abordados. Além disto, as respostas da maioria
dos alunos mostram que eles parecem estar mais predispostos ao aprendizado do que com um
conteúdo tradicionalmente abordado nos currículos de física do EM. Assim, vale a pena que
tais conteúdos sejam trabalhados em sala de aula no EM para, adicionalmente, favorecer a
condição de pré-disposição para a aprendizagem, visando a aprendizagem significativa.
Os tópicos mais citados pelos alunos como os mais importantes foram criptografia
quântica (25,4%), emaranhamento quântico (20,3%) e superposição linear (20,3%). O
experimento de dupla fenda (6,8%), a superposição de ondas (5,1%) e de vetores (3,4%), a
computação quântica (3,4%) e o estado de um sistema físico (1,7%) também foram lembrados
por alguns alunos, enquanto outros (13,6%) afirmaram que todos os tópicos são importantes e
três alunos consideraram que nenhum tópico tem importância.
Dentre os conteúdos que os alunos consideraram mais fáceis, os mais citados foram a
criptografia quântica (37,3%), o emaranhamento quântico (16,9%) e a soma de vetores
(15,6%). A soma de ondas (13,6%), superposição linear (13,6%) e estado (10,2%) também
foram apontados. Dois alunos citaram o experimento de dupla fenda e outros dois apontaram a
computação quântica como sendo de fácil compreensão. Sete alunos (da primeira série)
afirmaram que todos os assuntos são difíceis. É interessante notar que tópicos mais atuais e
que não costumam fazer parte do currículo do EM como a criptografia quântica e o
emaranhamento quântico são apontados como sendo de fácil compreensão pelos estudantes e
isto mostra que aspectos básicos referentes a tais tópicos podem realmente ser aprendidos de
forma significativa, visto ser algo que aparentemente interessa aos alunos. Estes tópicos ainda
são colocados pelos alunos ao lado de outros mais tradicionais do ensino de Física, como a
superposição de ondas e a de vetores.
93
Uma questão que pode ser levantada é: por que não abordar o conteúdo de Física do
EM mesclando tópicos atuais com os mais tradicionais e tentar, desta forma, cativar o aluno
para o aprendizado?
Ao mesmo tempo em que foram apontados como tópicos mais fáceis por vários alunos,
o emaranhamento quântico (42,4%) e a criptografia quântica (10,2%), o experimento de dupla
fenda (5,1%) e a superposição linear (8,5%) também foram citados por outros como tópicos
mais difíceis. Sete alunos responderam que não consideraram difícil tópico algum e, em
contraponto, outros sete consideraram que todos eram difíceis, embora alguns tenham
afirmado que, ainda assim, gostaram de estudá-los. O experimento de Stern-Gerlach, a soma
de ondas e a de vetores e o conceito de spin também foram citados como tópicos difíceis por
alguns poucos alunos (duas menções, no máximo).
A maior proporção de alunos (47,4%) considerou que não é difícil compreender o
conceito de estado de um sistema físico, enquanto outra expressiva parte (35,6%) considerou
difícil. Outros estudantes (11,9%) consideraram que o conceito é um pouco difícil de
compreender.
Quanto ao conceito de superposição linear, os alunos estiveram divididos entre os que
consideraram o conceito de fácil compreensão e de acreditar (35,6%) e outros (32,2%) que
consideravam somente ser de difícil compreensão ou somente de se acreditar. Houve ainda
outros alunos (11,9%) que afirmaram acreditar no conceito e alguns (6,8%) que o consideraram
de difícil compreensão.
Boa parte dos alunos (45,8%) considerou que a MQ consegue descrever “elementos de
realidade”, enquanto outros (28,3%) afirmaram que a MQ é pura ficção científica, com as
respostas igualmente divididas entre os alunos da primeira e da terceira série.
A visão que os alunos possuem acerca da MQ ficou dividida entre opiniões negativas
(30,5%) e positivas (20,3%). Quatro alunos veem a MQ como uma teoria ainda inacabada,
como uma ciência do futuro ou com implicações futuras. Os posicionamentos positivos
envolveram afirmações do tipo “parece difícil, mas tem seus encantos”, “poderia ter este
assunto com mais frequência, pois nos deixa curiosos”, “assunto interessante de se aprender”,
“superior à Mecânica Clássica”, “agora consigo entender um pouco mais sobre o assunto” e
“um alerta para as pessoas devido à utilização enganosa de empresas”. As opiniões negativas
trouxeram respostas como “algo difícil de se aprender”, “estranho e muito chato”, “algo que
nunca vou usar em minha vida”, “algo que não gostei e não consegui entender”, “pouco usada
em nosso dia-a-dia”, “uma coisa irreal, ficção científica” e “teoria no papel”.
As opiniões finais trouxeram afirmações que sugerem que a proposta de ensino é
válida e atinge certos objetivos. Um bom número de alunos (37,3%) afirmou que a proposta foi
boa/interessante/legal e que gostaram de como o curso foi ministrado. Alguns alunos (8,5%)
acharam o curso difícil e que poderia ter sido abordado de alguma forma mais fácil. Outras
opiniões emitidas por um ou dois alunos sobre o curso foram: “assunto chato”, “deveria haver
mais interação com os alunos” e “deveria haver mais exercícios”.
94
2.4. Entrevistas com as turmas
A análise dos instrumentos utilizados na primeira etapa da pesquisa sugere que houve
boa compreensão dos conteúdos trabalhados por razoável parcela dos alunos, mesmo que
com alguma resistência de alguns deles. As dificuldades enfrentadas fazem com que se
recorra a uma abordagem diferenciada e com mais ênfase em alguns tópicos na segunda
etapa, como no caso da situação-problema do átomo de hidrogênio.
Saliente-se que, ainda assim, a receptividade dos alunos aos conteúdos apresentados
foi relativamente positiva e que poucos alunos tiveram uma postura negativa em relação à MQ,
conforme resultados das avaliações e dos questionários de opiniões.
A experiência da primeira etapa recomenda a inserção de novos instrumentos de coleta
de dados na segunda etapa para averiguar melhor o aprendizado dos alunos ao longo do
95
processo de apropriação do campo conceitual da MQ. Acredita-se que mapas mentais e testes
rápidos possam ser utilizados para este intuito.
96
Outros termos bastante registrados nos mapas das cinco turmas foram: difícil, cálculos,
números, matemática, equações, tecnologia, força, movimento e energia.
A palavra “Mecânica” fez com que muitos alunos associassem termos relacionados à
mecânica automotiva, tais como: carro, motor, oficina, conserto e peças. Visto que a mecânica
automotiva é algo próximo ao cotidiano dos alunos, pode-se considerar que tais respostas
poderiam ser esperadas nos mapas mentais, mesmo que não tenham relação com a MQ.
A proximidade fonética fez com que palavras como quantidade, mecanismos e aquática
também estivessem presentes em alguns mapas mentais, tanto por alunos de primeira como
de terceira série. Para cada uma dessas palavras, foram respectivamente 41, 14 e 2 menções.
Alguns dos mapas construídos pelos alunos, com grifos destacando as palavras que
estão mais relacionadas com a MQ, podem ser encontrados no Apêndice VI. Tais mapas
apresentam termos com algum grau de proximidade com a MQ e com um conteúdo
relativamente diferente dos citados anteriormente. Em especial, os mapas dos alunos 20316 e
20417, apresentados na figura 27, são dignos de nota, pois indicam que estes alunos já
tiveram um contato maior com a MQ e incorporaram alguns conceitos em seu vocabulário e,
possivelmente, em sua estrutura cognitiva. O conhecimento prévio de alguns conceitos de MQ
por estes dois alunos pode ser considerado como um fator auxiliar na ocorrência de
aprendizagem significativa, acreditando-se também que não deva provocar prejuízo no
processo de ensino e aprendizagem.
(a)
(b)
Figura 27. Mapas mentais iniciais dos alunos (a) 20316 e (b) 20417.
97
É necessário destacar que alguns alunos utilizaram palavras de desânimo e, até
mesmo, de desgosto no mapa. Expressões como “assunto chato e difícil”, “coisa chata”,
“alguém gosta disso?”, “dor de cabeça”, “não é assunto de ensino médio”, “nota baixa”,
palavras como loucura, preguiça e até palavras de baixo calão foram registradas nos mapas de
três alunos da primeira série. Foram, ao todo, 32 menções de palavras ou expressões deste
tipo, sendo que 23 foram registradas na primeira série. Saliente-se que, por vezes, mesmo
utilizando tais palavras, ainda assim os alunos mencionavam outras expressões semelhantes
às apresentadas anteriormente.
Acredita-se que os alunos que utilizaram estas expressões não dispõem, neste
momento, da condição de pré-disposição para a aprendizagem, necessária para a ocorrência
da aprendizagem significativa. Buscou-se assim, no início do curso, apresentar a MQ como
algo ao alcance do aluno e com implicações em seu cotidiano, na tentativa de fazer com que
crie a condição de pré-disposição para a aprendizagem e possa vir a aprender de forma
significativa.
Logo após a elaboração do mapa mental, foi entregue aos alunos o questionário de
conhecimentos prévios, o mesmo utilizado na primeira etapa da pesquisa. Também nesta
atividade não houve pressão para finalização da tarefa e propiciou-se que as respostas
coletadas fossem espontâneas e individuais, solicitando aos alunos que não trocassem
informações sobre o conteúdo a ser escrito. Nesta segunda etapa da pesquisa, 67 alunos da
primeira série e 70 alunos da terceira série responderam ao questionário.
Como na primeira etapa, a primeira e a segunda perguntas foram analisadas em
conjunto, com 50 alunos da primeira série e 52 da terceira assinalando somente respostas que
se relacionam com a MQ. As palavras mais marcadas pelos alunos foram mecânica, física e
partícula. A marcação destas palavras se deve, muito provavelmente, a uma conduta
conservadora dos alunos, visível em suas justificativas: “partícula é estudada na física”, “é a
matéria que estamos estudando”, “física é a matéria que estuda a mecânica quântica” e “as
opções marcadas estão diretamente ou indiretamente ligadas”. Os outros alunos apresentaram
como justificativas as expressões “já ouvi algo relacionado a estes termos”, “chutei”, “primeiras
coisas que vieram em mente”, “são palavras que me dão ideia de dificuldade”, “não sei
justificar, mas imagino que tenha a ver”, “os nomes ficam legais juntos”, “é o que faz mais
sentido”, “quântica lembra quantidade e leva a partículas”.
A palavra computação foi assinalada por 46 alunos e as palavras emaranhamento e
criptografia foram assinaladas por, respectivamente, onze e dez alunos. Uma das justificativas
apresentadas para a marcação das palavras computação e criptografia foi: “parece algo de
computador e computador criptografa as coisas”. As justificativas para a marcação da palavra
emaranhamento foram: “emaranhamento lembra partícula (força forte, força fraca)”, “li sobre
emaranhamento em um artigo”, “porque quântica parece ser difícil de estudar e partícula e
98
emaranhamento não é muito fácil”. Quanto ao aluno que afirmou que já leu sobre
emaranhamento em um artigo, acredita-se que possa já dispor da condição de pré-disposição
para a aprendizagem, visto que parece existir nele um interesse pelo aprendizado de assuntos
relacionados a esta temática.
35 alunos, 17 das primeiras séries e 18 das terceiras, assinalaram alguma palavra que
não diz respeito à MQ. Nas turmas de primeira série, a palavra consciência foi marcada quatro
vezes, cura foi assinalada uma vez, ginástica duas vezes e medicina onze vezes. Nenhum
aluno das primeiras séries assinalou música ou terapia. Nas turmas de terceira série, a palavra
consciência foi marcada três vezes, cura quatro vezes, ginástica três vezes, medicina oito
vezes, música sete vezes e terapia três vezes. As justificativas apresentadas pelos alunos
foram: “nanorobôs e aparelhos em medicina”, “já ouvi falar em cura por energia dos
medicamentos”, além de outras justificativas já apresentadas (“foi o que me veio em mente”,
etc.). Somente dois alunos não justificaram suas respostas.
Sete alunos fizeram referência ao mapa mental como motivador para a marcação da
palavra “mecânica” no questionário ou, ainda, dizendo respeito ao próprio questionário, o de
este incentivar o aluno nas respostas, visto que possui expressões inerentes à MQ.
As respostas apresentadas pelos alunos das cinco turmas à terceira pergunta foram
semelhantes àquelas dadas pelos alunos da primeira fase da pesquisa. As respostas mais
comuns foram: “algo pequeno”, “pequeno pedaço”, “pequeno pedaço de átomo ou matéria”,
“menor unidade da matéria”, “uma parte”, “porção da matéria que se pode modificar”, “pequeno
pedaço ou parte de algo”, “menor parte da matéria”, “partes do átomo”, “algo minúsculo que
precisa de microscópio”. Os exemplos mais citados foram: partículas de água, partículas de
poeira, átomo, elétron, próton, nêutron, molécula e grão de areia. Além destes, alguns
exemplos relacionados à Física de Partículas também foram apresentados pelos alunos, tais
como partícula alfa, bóson, quark e bóson de Higgs. Apenas oito alunos das cinco turmas não
responderam esta pergunta.
Destacam-se aqui duas respostas fornecidas para esta questão: “algo que deforma o
plano do espaço”, “é uma ‘perturbação’ no espaço-tempo”. Estas duas respostas estão
próximas da definição de massa utilizada na teoria da relatividade geral e, caso se fosse traçar
um perfil epistemológico (Bachelard, 1984) destes alunos, a parte relacionada ao racionalismo
completo apareceria com certo destaque nestes perfis, diferentemente do que ocorreria com
outros alunos. O objetivo deste questionário não era o de construir o perfil epistemológico dos
alunos, mas as respostas apresentadas puderam trazer este fato à tona.
Como na primeira fase da pesquisa, grande parte dos alunos relacionou o conceito de
estado com os estados de agregação de matéria na quarta questão, sendo o principal exemplo
citado os estados sólido, líquido e gasoso de algum material. Outras respostas apresentadas
foram: “a forma e o jeito em que um objeto é encontrado”, “estado emocional”, “é como você
está no momento”, “comportamento”, “estado de espírito”, “modo que ele está no ambiente”,
“ação e interação com os planos dimensionais”, “uma propriedade física do objeto”, “modo de
estar”, “aparência do objeto”, “estado de agitação molecular” e “classificação da aparência”.
99
Exemplos indicados foram: sólido, líquido, gasoso, plasma, quente, frio, parado, em
movimento, inércia, sentado, estado de paralisia, objeto em mau estado (mal cuidado), macio,
duro, feliz, triste, seco, molhado, sujo, bom, ruim, uma roupa em mau estado, “estou acordado
agora”. Somente cinco alunos não responderam esta questão.
É interessante destacar que mesmo que a maioria dos alunos nunca tenha tido contato
formal com a definição de estado físico de um objeto, os exemplos arrolados revelam que o
conhecimento prévio apresentado por eles é muito próximo daquele que será estudado ao
longo do curso. Até mesmo a questão da variação temporal dos estados de sistemas físicos
pode ser percebida em alguns dos exemplos. Assim, esta estrutura conceitual pode servir
como ancoradouro para uma definição mais formal sobre o conceito de estado de um sistema
físico a ser apresentado no curso.
Os alunos desta etapa da pesquisa tiveram menos dificuldade em explicitar sua
compreensão sobre o conceito de onda do que os da fase anterior, visto que somente nove
alunos (oito da primeira série e um da terceira) não responderam a quinta questão. Isto não
significa que todos tenham uma compreensão adequada a respeito. Algumas das respostas
apresentadas foram: “algo que se propaga”, “algo com curvas, não é uma linha reta”, “é uma
frequência”, “uma vibração”, “tipo de frequência usado para se comunicar”, “perturbação
(normalmente periódica) de algo”, “reflexo e movimento feito pela luz e pelo som”, “estado onde
não tem massa”, “algo que não seja reto, que tenha ondulações”, “um emaranhado de
partículas”, “movimentos que nos fazem ouvir rádio, TV”, “uma pulsação eletromagnética como
as micro-ondas”, “uma ondulação”, “oscilação de energia”, “algo que transmite energia”,
“vibrações transmitidas por meio de encontros entre duas coisas”, “variação da eletricidade ou
magnetismo”, “variação de uma frequência”, “transmissão de energia que movimenta partículas
de maneira frequente”, “tipos de propagação”, “algo que sofre oscilações”, “movimento de
energia sem movimento de massa”, “algo curvado”, “forma de transmissão podendo ser
magnética e até radioativa”, “aquilo que se propaga no espaço ou na água sem movimentar
nenhum objeto”, “junção de força e movimento”, “transmissão de alguma coisa”. A palavra
frequência também foi utilizada por alguns alunos em suas respostas. Os exemplos mais
citados foram ondas no mar, som ou ondas sonoras, ondas eletromagnéticas, ondas de rádio,
micro-ondas e movimento de uma corda.
A variedade de explicações e de exemplos mostra que os alunos possuem certo
domínio do conceito de onda. Mesmo que a verbalização do conceito não seja correta, os
exemplos dados indicam que os alunos possam ter conhecimento do que vem a ser uma onda.
Frente a esta questão, acredita-se que os alunos devam utilizar seus esquemas para
respondê-la e, consequentemente, explicitar seus conhecimentos-em-ação. Neste caso, o
conhecimento-em-ação utilizado aparenta estar correto e no caminho ideal para a
compreensão dos conteúdos abordados no restante da disciplina. Vale lembrar que o conceito
é um conjunto formado por situações, invariantes operatórios (internalizados na estrutura
cognitiva de cada aluno) e representações e, desta forma, as respostas apresentadas sugerem
que este conceito é conhecido dos alunos.
100
Quanto à sexta pergunta, 121 alunos (88,3%) afirmaram não conhecer o experimento
de dupla fenda. Um aluno da primeira série escreveu que se “trata de um experimento com
duas fendas”. Três alunos da terceira série apresentaram respostas próximas do que vem a ser
o experimento: “ao se arremessar elétrons através de duas fendas, estes se interferem entre si
formando vários pontos de luz, como se fossem ondas”, “vi em um vídeo algo que envolvia
feixes de luz e ondas na água que, após passarem por duas placas formavam algo em um
quadro”. Outro aluno afirmou tratar-se de “experimento para definir a natureza da luz (onda ou
partícula), mas o experimento é inconclusivo, pois ela se comporta como ambos”. Alguns
alunos relacionaram a palavra fenda com uma ferramenta ou com alguma espécie de
experimento com duas formas de terminar, duas teorias ou dois modos de ocorrência, assim
como na primeira fase da pesquisa. Um aluno questionou se isto não teria a ver com duas
dimensões e outro perguntou se teria alguma relação com o DNA, por causa da dupla hélice.
Um aluno afirmou que já ouviu falar no experimento, mas não soube explicar o que seria. Fato
interessante ocorreu nas turmas do curso Técnico em Agropecuária, pois a dupla fenda foi
apontada como um método de enxertia para propagação assexuada em plantas, o que
realmente é verdadeiro. Os alunos, neste caso, trouxeram conhecimento de outra área para a
sala de aula e isto evidenciou um problema possível de ocorrer ao se utilizar termos de uma
área em outra.
Na sétima questão, 113 alunos (82,5%) responderam que consideram importante
conhecer uma teoria com tantas implicações como é a MQ. As justificativas apresentadas
foram: “porque é interessante”, “precisamos conhecer a tecnologia”, “são objetos usados no dia
a dia”, “para entender como funcionam as coisas”, “é sempre bom aprender”, “para saber se
isso é (ou não) um mal para a saúde humana”, “posso precisar desse conhecimento um dia”,
“para exercitar o pensamento”, “porque me interesso pelo assunto”, “parece ser interessante”,
“só pela curiosidade”, “devemos ter mente aberta para novos conhecimentos”. Seis alunos que
consideraram importante conhecer a teoria colocaram ressalvas: um afirmou que “mesmo
sendo importante ter esse contato, ainda assim o assunto é chato” e outro que “só se deve
conhecer o básico da teoria, pois muitos nunca mais a utilizarão em suas vidas”. Quatorze
alunos não consideram importante aprender MQ e apresentaram as seguintes justificativas:
“não é importante”, “não é interessante”, “o importante é saber mexer com a tecnologia e não
como ela funciona”, “não se interessam pelo assunto”, “não quero lembrar de física ao usar
esses aparelhos”, “não trabalho com isso”, “é muito complexo para mim”, “deve ser deixado
para quem trabalha com isso” e “não tenho necessidade de saber isso”. Seis alunos deixaram
a questão em branco.
Levando em conta uma das condições necessárias para a ocorrência de aprendizagem
significativa, pode-se considerar que os alunos que acreditam ser importante aprender MQ têm
a pré-disposição para aprendizagem. Este fator pode auxiliá-los na compreensão dos tópicos a
abordar ao longo do curso, dada sua postura perante este novo conhecimento. É importante
verificar também como será o aprendizado dos quatorze alunos que não mostraram interesse
pelo aprendizado, pois a pré-disposição para a aprendizagem pode mudar. O conhecimento
101
prévio relevante presente na estrutura cognitiva do aluno e o material de apoio potencialmente
significativo podem ser analisados conforme o aprendizado destes alunos.
Mesmo com interesse pelo aprendizado da teoria, 63 alunos (46%) afirmaram na oitava
questão nunca ter ouvido falar em MQ até então. A maior parte dos alunos que afirmaram já ter
ouvido falar sobre a MQ, disseram que não lembram onde, quais os assuntos e nem do que ela
trata. Outras justificativas apresentadas foram: “para construção de robôs”, “estudo dos
átomos”, “algo relacionado à nanotecnologia e aos processadores quânticos”, “computação
quântica com computadores ultrapotentes”, “vi em um filme, mas não lembro o assunto”, “tenho
vaga noção”, “deve ser uma ciência que cuida de microtecnologias”, “energia e comprimento de
onda de Planck e seu prêmio Nobel”, “força forte, força fraca, partícula de Deus”, “princípio de
incerteza, antipartículas, dualidade onda-partícula, teoria de cordas”, “li sobre emaranhamento
em um artigo”, “acelerador de partículas”, “robótica, computação, mecânica, eletromecânica”,
“as contas, partículas e só porque a mecânica quântica me confunde demais”. Dez alunos não
responderam esta pergunta.
Pelas respostas induz-se que alguns alunos devem ter tido contato com algum material
mais aprofundado sobre a MQ, além daqueles que a divulgam com uma interpretação
incorreta. A menção de assuntos como a computação quântica, emaranhamento quântico e
acelerador de partículas pode se dever ao momento de aplicação do questionário. A esta
época, fervilhavam notícias sobre a descoberta do bóson de Higgs no LHC, na Suíça, e muitas
palavras inerentes à MQ acabaram adentrando ao vocabulário dos alunos, que as utilizaram
em suas respostas, mesmo que não tivessem qualquer domínio do conteúdo. Neste caso, fica
explícito o papel da educação científica que é o de promover a aprendizagem de concepções
científicas atualizadas do mundo físico e natural e o desenvolvimento de estratégias de
trabalho centradas na solução de problemas, conforme apontado nos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio.
Conforme esperado, o nome mais lembrado na nona questão foi o de Albert Einstein,
citado por 63 alunos. Os alunos mencionaram que Einstein era um físico alemão muito
inteligente, um famoso cientista, detentor de um QI elevado e que desenvolveu a teoria da
relatividade, a equação E=mc² e a teoria das cordas, além de citar sua famosa foto. Planck foi
citado por dois alunos, por seus trabalhos na física quântica, com a constante de Planck e
“pelas descobertas de inúmeras fórmulas para desvendar contas antes intermináveis”. Quatro
alunos afirmaram conhecer o nome de Werner Heisenberg, mas apenas um deles relacionou
seu nome ao Princípio de Incerteza. Cesar Lattes foi lembrado por três alunos, por ter seu
nome ligado ao Currículo Lattes, pela descoberta do méson , fótons, áreas teóricas sobre
energias e forças primordiais como a gravidade. Muitos alunos não citaram explicitamente o
nome de algum cientista, mas afirmaram já ter ouvido falar deles. As justificativas foram:
“grandes físicos ou matemáticos”, “exemplos de pessoas inteligentes”, “importantes para o
desenvolvimento da tecnologia”, “compreensão do universo, velocidade da luz”, “invenções que
auxiliaram no desenvolvimento da ciência”, “bombas atômicas, velocidade da luz”, “em
documentários de ciência”, “células, moléculas, átomos, partículas”, “nas matérias do colégio”,
102
“gênios da física”, “algo sobre nuclear e sobre computadores”. Quatro já ouviram falar de
alguns deles, mas não lembravam onde ou sobre quais assuntos. Apenas dois nunca ouviram
falar sobre qualquer um dos cientistas listados e somente um deixou a questão em branco.
Por estar em voga à época, o acelerador de partículas foi lembrado na décima questão
por alguns como sendo uma máquina que “acelera partículas e colide-as”, “foi criada para
26
simular o Big Bang” e “para encontrar o bóson de Higgs”, além de citarem o CERN e o LHC
como exemplos. Dos itens apresentados nesta questão, a bomba atômica foi o mais lembrado.
Os alunos mencionaram já ter ouvido falar sobre ela em “estudos sobre 2ª guerra mundial“, que
“é feita de plutônio e urânio enriquecidos e que 10 kg destes materiais equivale a uma tonelada
de TNT” e que “é uma bomba produzida por átomos, quebra o núcleo de um átomo,
explodindo-o”. O chip foi considerado por alguns dos alunos como um dispositivo que
“armazena informações ou dados”, “uma unidade de processamento”, “um rastreador”, um tipo
de “circuito elétrico” e “um processador”. A nanotecnologia foi tida como provedora de
“recursos tecnológicos para aparelhos menores”, uma eventual “utilização na área robótica” e
também no “desenvolvimento de minipartículas para ajudar contra doenças”. Alguns alunos
consideraram a radiação eletromagnética como uma “radiação através dos elétrons”, podendo
vir “quando há espalhamento de radiação devido a algum acidente” e alguns citaram o
ultravioleta e o infravermelho como exemplos. O teletransporte foi apontado como já visto em
filmes e desenhos animados e que consiste em “desaparecer e aparecer em outro lugar” ou
“transportar coisas para outra dimensão”. Um dos alunos afirmou já ter ouvido falar que é
possível teletransportar um fóton. Somente dois alunos da terceira série afirmaram já ter ouvido
falar em tunelamento. Os assuntos apontados foram o estudo de “worm holes” e a “criação de
túneis”. Ainda 51 alunos citaram já ter ouvido falar de algum dos itens apresentados, mas não
souberam explicar seu significado e nem onde ouviram tais termos. Doze alunos não souberam
responder ou disseram não ter ouvido falar de qualquer dos itens listados.
O conhecimento apresentado sobre alguns cientistas na nona questão e os termos da
décima questão parecem indicar que estes assuntos fazem parte do cotidiano de alguns alunos
e é papel da educação formal apresentar as teorias ou os conceitos de forma correta para que
os alunos compreendam os fenômenos envolvidos e estejam devidamente alfabetizados
cientificamente. Diferentemente dos alunos da primeira etapa da pesquisa, os da segunda fase
apresentam menos dificuldade em expressar (externalizar) suas ideias, o que proporcionou
uma maior quantidade e qualidade dos dados coletados, podendo-se inferir as observações
apresentadas.
As pequenas diferenças entre as respostas assinaladas pela maioria dos alunos leva a
crer que todos estão, praticamente, em um mesmo patamar de conhecimentos acerca da MQ:
superficial e repleto de associações espontâneas oriundas do contato com abordagens
provavelmente incorretas de interpretações dos fenômenos da MQ. Este nível de conhecimento
da MQ pelos alunos leva a crer que a abordagem utilizada para construir o curso seja
26
CERN é a sigla para o Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire, localizado em Genebra, na Suíça, e LHC para
o Large Hadron Collider, o experimento situado no CERN e considerado como o maior já construído pelo ser humano.
103
adequada para as duas séries, mesmo havendo uma pequena diferença na média de idade
entre elas e estando a terceira série mais exposta ao ensino formal.
Os testes rápidos foram, como indica o nome, rápidas avaliações para diagnosticar
uma aprendizagem imediata relacionada ao conteúdo de determinada aula e que, em geral,
foram respondidas em menos de três minutos pelos alunos. Os testes foram aplicados,
respectivamente, no terceiro, sexto, sétimo e nono encontro. Os quatro testes (vide Apêndice
V) foram utilizados somente na segunda etapa da pesquisa e os seguintes conteúdos foram
abordados:
Teste rápido 1: Superposição de ondas e de vetores
Teste rápido 2: Estado de um sistema quântico e projeção do vetor de estado
Teste rápido 3: Incompatibilidade de observáveis
Teste rápido 4: Emaranhamento quântico e probabilidades de ocorrência dos
valores de medida
A análise do coeficiente de variação (CV) e o teste t de Student mostram dois lados
diferentes e interessantes acerca do conhecimento dos alunos sobre os tópicos dos testes
aplicados ao final das aulas. (Pode-se observar, porém, que o número de alunos envolvidos
não é grande.) Os valores do CV de cada um dos testes para cada série constam da tabela 10.
Tabela 10. Coeficiente de variação de cada série nos testes rápidos.
Teste rápido 1 Teste rápido 2 Teste rápido 3 Teste rápido 4
1ª série 0,22 0,38 0,60 0,22
3ª série 0,17 0,49 0,70 0,23
104
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
Figura 28. Respostas ao primeiro teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20133; (c) 20226;
(d) 20234; (e) 20301; (f) 20321; (g) 20406; (h) 20514.
105
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
Figura 29. Respostas ao segundo teste rápido pelos alunos (a) 20102; (b) 20111; (c) 20211;
(d) 20214; (e) 20329; (f) 20336; (g) 20413; (h) 20507.
106
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
Figura 30. Respostas ao terceiro teste rápido pelos alunos (a) 20116; (b) 20125; (c) 20215;
(d) 20231; (e) 20316; (f) 20331; (g) 20416; h) 20517.
Os valores para o CV no quarto teste rápido foram muito próximos e indicam que há
homogeneidade na compreensão dos conceitos envolvidos nas questões por parte dos alunos
das duas séries. Comparando as duas séries em um nível de significância a 95%, encontra-se
um valor de 0,06 para o teste t de Student, sinalizando que não há diferença estatisticamente
significativa entre as séries. Assim, no quarto teste, além de não diferirem dentro de suas
séries, os alunos também não revelam compreensão diferente na comparação entre as duas
séries. Neste quarto teste rápido, nenhum aluno deixou questões em branco. Algumas das
respostas fornecidas pelos alunos constam da figura 31.
Assim como na primeira etapa de ensino, três avaliações escritas foram realizadas
para verificação de evidências de aprendizagem dos alunos e, com isso, possibilitar uma
análise da qualidade das situações-problema utilizadas ao longo do curso.
Cada turma teve, pelo menos, cinquenta minutos para a realização de cada uma das
avaliações, sendo que algumas utilizaram menos tempo. Em particular nesta etapa duas
turmas de terceira série, na segunda e na terceira avaliações, usaram pouquíssimo tempo
(menos de vinte minutos) para rapidamente sair de sala de aula. Isto, no entanto, não
prejudicou a avaliação, conforme será mostrado a seguir.
107
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
Figura 31. Respostas ao quarto teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20125; (c) 20202;
(d) 20229; (e) 20308; (f) 20315; (g) 20418; (h) 20521.
A análise destes dados permite chegar à tabela 12 para a média e o desvio padrão de
cada uma das turmas.
Tabela 12. Média e desvio padrão das séries na segunda
etapa da pesquisa para a primeira avaliação.
1ª série 3ª série
Média 2,51 2,54
Desvio Padrão 0,38 0,36
Com estes valores de média e desvio padrão, os valores obtidos para o CV foram 0,15
e 0,14 para a primeira e para a terceira série, respectivamente. Estes números indicam que o
valor da média pode refletir a realidade conceitual das turmas, tratando-se, assim, de turmas
homogêneas. Saliente-se o fato de que as turmas da primeira etapa possuem um valor mais
alto para o CV, em relação ao desta etapa, mas que ainda pode ser caracterizado como
homogêneo.
Em um nível de confiança a 95%, na comparação entre as duas séries desta etapa, o
valor de t foi de 0,83, indicando que não houve diferença estatisticamente significativa entre as
séries analisadas.
109
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 32. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20122; (b) 20207; (c) 20231; (d) 20321.
110
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Figura 33. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20122; (b) 20128; (c) 20209; (d) 20418; (e) 20512.
Dos 144 alunos que realizaram esta avaliação, nenhum deixou a terceira questão em
branco e 129 (89,6%) relacionaram corretamente as colunas apresentadas, o que indica que a
forma procedimental de superposição de ondas foi bem compreendida. Apesar de alguns
alunos somente terem relacionado as colunas sem apresentar como chegaram a certa
conclusão, outros explicitaram seus invariantes operatórios (conhecimentos-em-ação) para
inferir e resolver a questão. Algumas destas respostas são encontradas na figura 34.
111
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 34. Respostas à terceira questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20215; (b) 20219; (c) 20220; (d) 20335.
Na quarta questão, 81,5% dos alunos tiveram as respostas avaliadas como corretas ou
parcialmente corretas. A figura 35 apresenta as respostas de alguns dos alunos a esta
questão. Este alto índice de acertos leva a crer que parte essencial do conceito de
superposição linear de vetores, a representação, está devidamente compreendida pelos alunos
e, assim como a superposição linear de ondas, pode servir de subsunçor para a compreensão
do conceito de superposição linear de estados.
112
(a)
(b)
(c)
Figura 35. Respostas à quarta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20117; (b) 20125; (c) 20223.
113
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
(i)
Figura 36. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20111; (b) 20120; (c) 20122; (d) 20220; (e) 20224; (f) 20308; (g) 20316; (h) 20505;
(i) 20513.
114
alternativa for aprendida significativamente, ela se constituirá em um grande obstáculo
epistemológico no futuro.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(f)
(g)
(h)
(i)
Figura 37. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20116; (b) 20118; (c) 20122; (d) 20212; (e) 20219; (f) 20233; (g) 20316; (h) 20321;
(i) 20414.
115
apresentar pré-disposição para o aprendizado do conteúdo de MQ e aparentam possuir a
superposição linear como um subsunçor para o aprendizado dos novos conceitos. A ausência
de respostas em tom jocoso na avaliação desta etapa corrobora essa visão, visto que
respostas deste tipo apareceram somente em algumas avaliações na primeira etapa.
A média de cada uma das duas séries nesta avaliação foi muito próxima e,
considerando ainda o desvio padrão e o coeficiente de variação obtidos, podemos dizer que a
compreensão desses alunos parece ter sido satisfatória e sugere que os subsunçores foram
devidamente incorporados às suas estruturas cognitivas e que há uma boa indicação de que o
aprendizado dos próximos tópicos possa ir na direção de uma aprendizagem significativa.
Com base na tabela 13, pode-se verificar que foi grande o número de alunos (72,1%)
com alto número de acertos (valores 2 e 3 na escala), mesmo que menor se comparado ao da
primeira avaliação. A maioria dos alunos respondeu corretamente a maior parte das questões e
isto aponta indícios de alguma aprendizagem dos conteúdos apresentados. O elevado número
116
de respostas em branco em algumas questões desta avaliação na primeira etapa da pesquisa
fez com que ocorresse um enfoque maior dos tópicos relacionados a estes conteúdos na
segunda etapa de ensino. Com isto, o número de respostas em branco teve uma queda
apreciável nesta etapa, embora a sexta questão ainda domine neste aspecto e a quarta
questão no desempenho negativo.
A análise destes dados permite chegar à tabela 14 para a média e o desvio padrão de
cada uma das turmas.
Tabela 14. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a segunda
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 2,10 2,19
Desvio Padrão 0,44 0,42
Com estes valores de média e desvio padrão, tem-se o valor de 0,21 e 0,19 para o CV
da primeira e da terceira série, respectivamente. Estes números indicam que o valor da média
das séries estudadas nesta etapa pode refletir a realidade conceitual das turmas nesta
segunda avaliação; trata-se, assim, de turmas homogêneas.
Em um nível de confiança a 95%, na comparação entre as duas séries, o valor de t foi
1,37 para o teste t de Student, indicando que não há diferença estatisticamente significativa
entre as séries na segunda avaliação.
Figura 38. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na segunda
etapa da pesquisa.
117
como no caso das respostas dos alunos 20107, 20115 e 20232. O alto número de respostas
consideradas corretas para esta questão (ver tabela 11) corrobora a ideia de que há alguma
internalização do conceito de estado de um sistema físico pelos alunos em sua estrutura
cognitiva, com a representação (notação de Dirac) sendo devidamente incorporada.
(a)
(b)
(c)
Figura 39. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20107; (b) 20115; (c) 20232.
Algumas das respostas à terceira questão são apresentadas na figura 41. A notação de
Dirac foi utilizada por alguns estudantes (alunos 20202 e 20418) para descrever o estado
associado a cada um dos dois itens, enquanto outros descreveram o estado sem a notação
(alunos 20107 e 20205), mas ainda assim aparentando uma compreensão sobre o papel da
superposição linear no experimento. As respostas encontradas nesta etapa reafirmam a
suposição de que o experimento de dupla fenda é uma situação-problema adequada para o
aprendizado de conceitos de MQ e de fácil compreensão pelos estudantes, pois os estados
118
foram bem elaborados pelos alunos e a superposição linear estava ali presente. Assim, esta
questão aparenta ser uma via eficaz de verificação da aprendizagem acerca dos dois principais
conceitos abordados nesta pesquisa.
(a)
(b)
(c)
(d)
119
(a)
(b)
Boa parte dos alunos, como na primeira etapa, simplesmente respondeu “sim” ou “não”
na quinta questão, sem apresentar justificativa, mas foi possível verificar que os alunos da
segunda etapa tiveram mais dedicação para a resolução desta questão, visto que foi possível
encontrar facilmente mais justificativas nesta etapa. Algumas das respostas a esta questão
constam da figura 43 e sugerem haver alguma compreensão da noção de incompatibilidade de
observáveis, principalmente as respostas dos alunos 20203, 20211 e 20305. Outras respostas,
como a do aluno 20121, mostram alguma compreensão sobre a perda de informação
ocasionada por consecutivas medidas de diferentes grandezas, decorrente da
incompatibilidade de observáveis.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
120
Como nas segunda e quarta questões, houve diminuição do número de alunos que
deixou a sexta questão sem resposta frente à primeira etapa da pesquisa (de 27,8% para
10,2%). A figura 44 apresenta algumas respostas dos alunos a esta questão.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Nota-se que tanto alunos de primeira quanto de terceira séries forneceram boas
respostas para esta questão, indicando compreensão do papel da superposição linear na
descrição de estados em MQ em ambas as séries. Mesmo com dificuldades dos estudantes
para expor seu conhecimento, ainda assim se pode inferir alguma internalização dos conceitos
apresentados. Essa internalização leva a acreditar que o campo de conhecimentos
apresentado aos alunos está promovendo a construção de um esquema para interpretação dos
novos fenômenos e as respostas fornecidas sugerem a ocorrência de uma equilibração
majorante, com os novos esquemas dando conta das situações-problema.
Nas respostas à última questão apresentadas na figura 45, ocorrem expressões que
possibilitam identificar a compreensão da superposição linear, como nas respostas dos alunos
20115, 20125 e 20515.
121
(a)
(b)
(c)
(d)
Viu-se nos questionários e mapas mentais iniciais que, antes do curso, os alunos não
tinham conhecimento sobre o princípio de superposição linear (embora talvez alguns
soubessem somar vetores geométricos) e também não sobre as diferenças existentes entre a
MQ e a MC.
Os resultados desta avaliação mostram que há um razoável domínio por parte dos
alunos das situações-problema abordadas e, consequentemente, do campo conceitual da MQ.
Em um aspecto mais geral, as situações-problema utilizadas foram importantes para a
compreensão do que é o estado de um sistema quântico e da superposição linear de estados.
Os experimentos de dupla fenda e de Stern-Gerlach, em especial, foram os de mais fácil
assimilação pelos alunos e podem ser considerados como situações-problema simples para
aplicação dos primeiros princípios da MQ, conforme mostrado também em Rocha et al. (2014).
Mesmo que ainda apresentando alguns problemas quanto a sua plena compreensão,
as questões que abordaram o átomo de hidrogênio como situação-problema tiveram mais êxito
na avaliação da aprendizagem dos alunos nesta etapa do que na anterior, provavelmente
devido à ênfase dada neste momento em decorrência das constatações da etapa anterior.
Assim, a abordagem ao ensino de MQ que utilize esta situação-problema deve ser feita de
modo mais aprofundado, pois ainda aparenta ser de difícil compreensão pelos alunos.
122
3.4.3. Terceira avaliação
Com base na tabela 15, pode-se verificar que foi grande o número de alunos (82,0%)
com alto número de acertos (valores 2 e 3 na escala), mais alto que na segunda avaliação e
menor que na primeira. Os alunos, em sua maioria, responderam corretamente a maior parte
das questões e isto leva a crer que há algum indício de aprendizagem dos conteúdos
apresentados, inclusive porque repete o padrão positivo de acertos das avaliações anteriores.
Percebe-se também que os índices de acertos são maiores nas turmas da segunda etapa do
que nas da primeira etapa da pesquisa, o que indica uma melhor compreensão dos tópicos
apresentados pelas turmas da segunda etapa da pesquisa.
A partir dos dados da terceira avaliação é possível obter a tabela 16 para a média e o
desvio padrão de cada uma das turmas.
Tabela 16. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a terceira
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 2,22 2,35
Desvio Padrão 0,42 0,45
Com estes valores de média e desvio padrão, têm-se os valores 0,19 e 0,19 para o CV
para a primeira e para a terceira séries, respectivamente. Estes números indicam que o valor
123
da média pode refletir a realidade conceitual das turmas analisadas nesta etapa da pesquisa;
tratando-se, assim, de turmas homogêneas. Algumas das dificuldades conceituais encontradas
na primeira etapa parecem ter sido sanadas (ou ao menos minoradas) com uma abordagem
diferenciada na segunda etapa de ensino, voltando-se mais aos conteúdos das questões em
que os alunos apresentaram um problema maior de resolução na etapa inicial.
Em um nível de confiança a 95%, o resultado do teste t de Student apresenta um valor
t = 1,10, indicando que não há diferença entre as séries nesta etapa da pesquisa.
(a)
(b)
(c)
Figura 46. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20125; (b) 20219; (c) 20521.
A figura 47 mostra algumas das respostas fornecidas pelos alunos para a segunda
questão. Alguns alunos simplesmente assinalaram as alternativas que julgaram adequadas
sem apresentar qualquer justificativa, dificultando uma análise mais aprofundada sobre a
aprendizagem acerca dos conceitos abordados nesta questão.
É possível encontrar indícios nesta questão de que os alunos sabem identificar a
superposição linear por meio do emaranhamento quântico (alunos 20224 e 20327). A questão
da imediata informação sobre o estado da segunda partícula obtida com a medida do estado
da primeira também foi apresentada pelos alunos (e.g., aluno 20215). Apesar de o
124
emaranhamento quântico não ser trivial para a maior parte dos alunos, acredita-se que esta
situação-problema possa ser adequada para verificação de aprendizagem dos novos
conceitos, inclusive mostrando razoável domínio neste primeiro contato.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Figura 47. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20111; (b) 20215; (c) 20224; (d) 20236; (e) 20327.
As respostas à terceira questão (vide figura 48) evidenciam novamente algum domínio
da notação de Dirac pelos alunos no processo de construção de estados emaranhados, como
foi visto na primeira etapa da pesquisa. O domínio desta representação é importante para a
compreensão do conceito de estado de um sistema quântico e as respostas fornecidas pelos
alunos permitem inferir que o aprendizado deste conceito está sendo adequado.
(a)
(b)
Figura 48. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20116; (b) 20310.
Conforme ilustrado na figura 49, ocorre novamente na quarta questão a utilização (pelo
aluno 20511) da notação de Dirac, o que indica que esta representação está sendo
incorporada à estrutura cognitiva e que, consequentemente, há aprendizagem acerca da
125
representação do conceito de estado. A superposição linear fica visível nos exemplos
apresentados pelos alunos 20202, 20209 e 20511. A incerteza na medição decorrente da
probabilidade de obtenção dos valores de medida também aparece nas respostas dos alunos.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
Figura 49. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20119; (b) 20202; (c) 20209; (d) 20312; (e) 20511.
A figura 50 apresenta algumas respostas à quinta questão. Apesar de esta ter sido a
questão com maior número de respostas em branco na terceira avaliação (6,3%), ainda assim
muitos alunos associaram o emaranhamento quântico a uma simples decorrência do princípio
de superposição linear. Analisando o número de acertos nesta questão, vê-se que pouco mais
da metade dos alunos (58,5%) obtiveram conceitos considerados parcialmente corretos ou
corretos, ocorrendo então uma melhora apreciável em relação aos alunos da primeira etapa.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 50. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20203; (b) 20224; (c) 20231; (d) 20316.
Assim como na primeira etapa, a criatividade dos alunos na sexta questão para a
construção de chaves foi interessante, conforme mostrado na figura 51; este tópico parece
mesmo estimular para o aprendizado da MQ. Destaque-se aqui a resposta do aluno 20202,
126
que afirmou estar lendo um dos livros mencionados pelo pesquisador informalmente no
decorrer de uma das aulas e que aborda a criptografia quântica.
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 51. Respostas à sexta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20101; (b) 20122; (c) 20202; (d) 20316.
Como nenhum aluno desta etapa deixou a questão em branco e 96,5% das respostas
foram avaliadas como corretas, sugere-se que este tema é efetivamente capaz de despertar o
interesse do aluno pelo aprendizado, promovendo pré-disposição para a aprendizagem,
condição necessária para a ocorrência da aprendizagem significativa.
127
a possuíam anteriormente e que a aprendizagem dos novos conceitos deu indícios de ocorrer
de maneira significativa.
Assim como nas duas avaliações anteriores, as médias das duas séries tiveram valores
bem próximos e, com o valor do desvio padrão obtido, podemos verificar que há uma
compreensão semelhante dos conteúdos apresentados nestas séries. Isso corrobora a visão
apresentada no início da tese de que conteúdos de Mecânica Quântica e de Física Moderna e
Contemporânea podem ser apresentados de uma forma intelectualmente honesta aos alunos
de Ensino Médio, levando em conta os subsunçores necessários para a compreensão dos
conceitos trabalhados.
128
partícula, polarização, spin, superposição, teletransporte, tunelamento e vetores, pelos alunos
de terceira série.
É interessante destacar que, mesmo que pareçam sem justificativa, algumas das
expressões apresentadas pelos alunos têm algum fundamento. É o caso das expressões
“creme dental”, “estratégia de marketing”, “não é colchão”, “colchões” e “vestibular”. Um caso
contado em sala de aula por um aluno no decorrer do curso foi o de uma periodontista que
havia recomendado o uso de certo creme dental para tratamento de problemas gengivais. Tal
produto era descrito pelo fabricante como um “modulador frequencial do peróxido de
hidrogênio”, utilizando algo chamado de Oxigenoterapia como fundamentação científica para
seu funcionamento. Assim, o comentário deste episódio em sala de aula foi o que
provavelmente fez com que o aluno escrevesse esta expressão em seu mapa mental. A
expressão “estratégia de marketing” pode ter sido mencionada porque foi levantado ao longo
do curso que muitos fabricantes se apropriam da palavra “quântica” por ser uma palavra da
moda e a utilizam de forma inconsequente, sem a preocupação de significado técnico ou
científico. A presença das expressões “não é colchão” e “colchões” pode ser atribuída à
existência de um estabelecimento na cidade de Joinville que comercializa “colchões
bioquânticos”. A página da internet do fabricante dos colchões contendo uma suposta
explicação para o funcionamento do princípio bioquântico do colchão está em manutenção
desde 2008. Já a expressão “vestibular” pode ter sido mencionada por um aluno porque houve
uma questão sobre o experimento de dupla fenda em um concurso vestibular prestado por ele.
Este fato, aliás, fez com que vários alunos perguntassem, na ocasião, se o pesquisador era o
responsável pela elaboração da questão, algo prontamente negado.
27
As expressões mais mencionadas pelos alunos nos mapas mentais finais foram dupla
fenda (30 e 38), emaranhamento (59 e 58), criptografia (57 e 51), estado (39 e 38),
superposição (42 e 42), elétron (41 e 36), ondas (38 e 47), vetores (41 e 43) e spin (45 e 42).
Estes números indicam que mais de 50% dos respondentes mencionaram tais termos em seus
mapas. Especificamente no caso das palavras emaranhamento e criptografia, ocorreram mais
de 80% de aparições nos mapas, o que indica que tais temas foram de interesse dos alunos,
podendo ter ocorrido alguma internalização inicial destes termos. O mesmo pode ser dito das
palavras estado e superposição, mencionadas nos mapas de mais de 60% dos alunos. Isto é
digno de nota, visto que nesta resposta espontânea dos alunos se pode verificar a presença
dos principais conceitos da MQ, conforme abordado neste trabalho.
Apesar de se poder considerar, também, que os alunos tenham apresentado os termos
criptografia e emaranhamento porque ‘estavam mais frescos em sua memória’, pois foram os
últimos assuntos trabalhados, a presença dos termos vetores e ondas em mais de 60% dos
mapas mentais induz a invalidar esta hipótese. As aulas sobre superposição de ondas e de
vetores ocorreram no início do curso, aproximadamente três meses antes da confecção dos
mapas, e ainda assim vetores e ondas tiveram uma massiva presença nas respostas dos
alunos. A hipótese a ser levantada neste caso é a de que a aprendizagem dos conteúdos
27
Os números entre parênteses indicam o número de aparições das expressões nos mapas nas turmas de primeira
série e de terceira série, respectivamente.
129
relativos à superposição tanto de ondas como de vetores pelos alunos ocorreu de forma
significativa e com boa retenção, com base nestes dados.
Outra palavra bastante presente nos mapas mentais finais foi spin. O mais interessante
da presença desta expressão é que era praticamente desconhecida dos alunos no começo do
curso, pois os professores de Química deixaram de trabalhar este conceito no EM por conta de
28
dificuldades de compreensão e aprendizagem e de sua alta abstração . Ainda assim, mesmo
com estas supostas dificuldades apontadas por professores de Física e de Química e com uma
possível dificuldade natural devido à abstração do conceito, mais de 60% dos alunos
mencionaram a palavra, mostrando que muitos a incorporaram em sua estrutura cognitiva,
mecânica ou significativamente, e que ela pode vir a se tornar efetivamente significativa em um
futuro curso em que os conceitos de MQ sejam trabalhados. Acredita-se, com isto, que o
aprendizado e retenção deste conceito até o presente momento pode ser considerado
satisfatório.
Outras palavras e expressões importantes foram apresentadas pelos alunos nos
mapas. Estas palavras e o número de vezes em que foram mencionadas em cada série
constam da tabela 17.
Tabela 17. Palavras presentes nos mapas mentais finais
dos alunos da segunda etapa da pesquisa.
1ª série 3ª série 1ª série 3ª série
Alice, Bob e Eva 18 7 Partícula 19 14
átomo 7 11 Polarização 10 16
experimento de Stern-
3 20 posição 7 5
Gerlach
física 17 6 probabilidade 11 5
(in)compatibilidade 5 4 tunelamento 4 16
Além das palavras e expressões já citadas, outras foram mencionadas pelos alunos em
seus mapas mentais, porém em menor número, e só serão apontadas a título de curiosidade:
anteparo, bits, ciência, colapso, difração, ket, mundo subatômico, objeto quântico, observáveis,
PhET, q-bits, teleporte. Mesmo que em menor número, estas expressões ainda mostram
aspectos importantes abordados no decorrer do curso e que foram marcantes para alguns dos
alunos, causando possivelmente uma pré-disposição para a aprendizagem.
Em dois mapas de uma das turmas de primeira série os alunos escreveram
comentários elogiosos acerca da proposta aplicada e da metodologia utilizada no curso,
agradecendo o ambiente amigável de sala de aula e a postura do professor permitindo
inúmeras possibilidades de intervenção (perguntas, comentários, etc.) dos alunos durante as
aulas.
O Apêndice VII apresenta os mapas mentais dos mesmos alunos apresentados no
Apêndice VI, excetuando os que não estiveram presentes no dia de realização desta atividade.
28
Em uma busca por artigos sobre o ensino do conceito de spin em aulas de Química no EM nos mesmos periódicos
da revisão da literatura e em outras revistas de Ensino de Química, nenhum trabalho foi encontrado. Esta afirmação é
proveniente de conversas realizadas com professores de Química das instituições em que o curso foi ministrado e da
vivência do pesquisador no meio educacional. Segundo Gomes e Pietrocola (2011), o conceito de spin aparece no
universo escolar na disciplina de química no EM, quando do estudo da distribuição eletrônica nos átomos, mas
somente no ensino superior ele é estudado de modo um pouco mais aprofundado.
130
O mapa do aluno 20316, destacado neste capítulo, também é apresentado no Apêndice VII. Já
o mapa do aluno 20417 não é apresentado, pois não esteve presente em aula no dia da
atividade.
Os mapas mentais finais mostraram uma clara evolução dos alunos acerca dos
conceitos de MQ após o curso ter sido ministrado. Nitidamente, alguns alunos tiveram um
desempenho melhor nas avaliações, assim como alguns conseguiram expressar melhor nos
mapas mentais os conceitos que se relacionam com a MQ. Isto revela a importância de
promover a avaliação como um processo que lança mão de vários meios de verificação e que é
possível verificar diferentes formas de aprendizagem conforme o meio de avaliação utilizado.
Nesta etapa, o questionário de opiniões foi respondido por 133 alunos (69 da primeira
série e 64 da terceira série) após terem confeccionado o mapa mental final.
A tabela 18 apresenta o número de vezes que cada palavra foi assinalada na primeira
questão do questionário de opiniões por série na segunda etapa da pesquisa. A palavra
medicina somente foi considerada adequada se devidamente justificada pelos alunos, pois
pode se referir às aplicações da MQ na medicina. Apenas um aluno de uma das primeiras
séries marcou todas as opções e, assim como na primeira etapa, optou-se por desconsiderar
suas respostas nesta questão.
Tabela 18. Número de vezes em que cada palavra foi assinalada na primeira questão do
questionário de opiniões por série na segunda etapa da pesquisa.
Palavra 1ª série 3ª série
Computação 65 62
Consciência 1 0
Criptografia 66 63
Cura 1 2
Emaranhamento 67 63
Física 66 62
Ginástica 0 1
Mecânica 62 59
Medicina 3 13
Música 6 2
Partícula 66 62
Terapia 0 7
131
apresentadas foram: “foi o que me veio em mente”, “não existe cura, ginástica, medicina,
música ou terapia quântica”, “MQ não se aplica a questões corporais ou mentais”. Somente
dois alunos não se manifestaram sobre as alternativas assinaladas.
Entre os alunos que marcaram alguma alternativa considerada inadequada conforme a
apresentação do curso, quinze afirmaram ter ouvido falar nestas opções durante o curso e
onze justificaram que acreditam que estas palavras devem ter alguma relação com quântica.
Um destaque interessante é o de uma das turmas de terceira série em que um grande número
de alunos (doze) assinalou a opção medicina. A justificativa de oito deles foi o assunto ter sido
visto ao longo do curso. Um aluno da primeira série assinalou a opção música e justificou
afirmando que as ondas sonoras estavam relacionadas com a soma de ondas analisada no
começo do curso. A melhora significativa nas respostas dos questionários em relação às da
primeira etapa leva a crer que, mesmo que não seja uma aprendizagem significativa neste
momento, este contato com a MQ promoveu uma postura pertinente acerca dos conteúdos
abordados nos alunos e eles pareceram estar mais predispostos ao aprendizado do que com
um conteúdo tradicional. Assim, a necessidade de se abordar tais conteúdos no EM é citada
novamente, para que realmente se busque a condição de pré-disposição para a aprendizagem,
com vistas à aprendizagem significativa.
Os tópicos mais citados pelos alunos como mais importantes foram criptografia
quântica (54,9%), emaranhamento quântico (33,9%) e superposição linear (21,8%).
Superposição de ondas (17,3%) e de vetores (14,3%), experimento de dupla fenda (8,8%),
estado de um sistema físico (8,8%) e computação quântica (7,5%) também foram lembrados
por alguns alunos, enquanto outros quatro afirmaram que todos os tópicos são importantes e
um aluno considerou que nenhum tópico tem importância.
Dentre os conteúdos considerados mais fáceis, os mais citados foram a criptografia
quântica (53,4%), o emaranhamento quântico (40,6%) e a soma de ondas (28,6%). A soma de
vetores (18,8%), superposição linear (18,0%) e estado (12,0%) também foram apontados em
menor número. Doze alunos citaram o experimento de dupla fenda e outros quatro apontaram
a computação quântica como sendo de fácil compreensão. Dois alunos consideraram todos os
assuntos fáceis e outros dois afirmaram que todos os assuntos são difíceis. Nota-se, assim
como na primeira etapa, que tópicos mais atuais e que não costumam fazer parte do currículo
do EM como a criptografia quântica e o emaranhamento quântico são apontados como sendo
de fácil compreensão pelos estudantes, podendo realmente ser aprendidos de forma
significativa, por serem aparentemente interessantes para os alunos. Tais tópicos são
colocados pelos alunos no mesmo patamar de dificuldade de outros mais tradicionais no
ensino de Física, como a soma de ondas e de vetores.
Ao mesmo tempo em que foram apontados como tópicos mais fáceis por cerca da
metade dos alunos, os conceitos de emaranhamento quântico (21,8%) e a criptografia quântica
(18,1%), o experimento de dupla fenda (18,8%) e a soma de ondas (15,8%) também foram
citados como tópicos mais difíceis, juntamente com a superposição linear (14,3%) e a soma de
vetores (9,0%). Um razoável número de alunos (12,8%) respondeu que não considerava
132
qualquer tópico difícil e nenhum aluno nesta etapa considerou que todos eram difíceis. O
experimento de Stern-Gerlach, o conceito de spin e o de estado também foram citados como
tópicos difíceis por alguns alunos.
É interessante notar que os mesmos tópicos foram considerados de fácil compreensão
(ou de difícil compreensão) nas duas etapas da pesquisa. Isto leva a crer que os tópicos foram
abordados em um mesmo grau de dificuldade para os estudantes das duas etapas e as
diferenças presentes nas respostas apresentadas se devem mais à estrutura cognitiva dos
alunos do que ao método de instrução utilizado. Possivelmente, conseguiu-se criar, no início de
ambos os cursos, a condição de pré-disposição para a aprendizagem, que conduziu ao bom
aprendizado apresentado nas duas etapas.
A ampla maioria dos alunos (82,7%) considerou que não é difícil compreender o
conceito de estado de um sistema físico, enquanto apenas cinco alunos consideraram isto
difícil. Dezessete alunos (12,8%) declararam que o conceito é um pouco difícil de
compreender.
Quanto ao conceito de superposição linear, 41,4% dos alunos afirmaram ser fácil de
compreender, 30,0% que era de se acreditar e 20,3% que era de difícil compreensão e de se
acreditar, além de outros 8,3% que só o consideraram de difícil compreensão.
A maioria dos alunos (61,7%) afirmou que a MQ consegue descrever “elementos de
realidade”, enquanto 27,1% se mostraram divididos em considerá-la como “ficção científica” ou
“elementos de realidade” e outros 9,8% afirmaram que a MQ é pura ficção científica. Dentre os
alunos que se mostraram divididos, 75% eram de uma mesma turma de terceira série,
sugerindo que a MQ pode não ter sido bem interpretada por estes estudantes, mesmo que
estivessem interessados e tivessem respondido corretamente as perguntas propostas nas
avaliações e testes rápidos. Ainda assim, a proporção de alunos que tiveram uma percepção
da MQ como sendo algo irreal sofreu uma grande redução da primeira para a segunda etapa
da pesquisa (respectivamente, 38,6% e 9,8% dos respondentes em cada etapa).
A visão que os alunos possuem acerca da MQ se concentrou nas opiniões positivas
(72,9%), enquanto 8,3% deles apresentaram opiniões negativas. Sete alunos (5,3%) percebem
a MQ como uma teoria ainda inacabada, como uma ciência do futuro ou com implicações
futuras. Quatro alunos a visualizam como uma teoria que descreve um mundo diferente do
mundo em que eles vivem e um aluno afirmou que não tem opinião formada ainda sobre a MQ.
Os posicionamentos positivos envolveram afirmações do tipo “matéria importante que deveria
ser ensinada antes”, “parece difícil, mas tem seus encantos”, “mais legal do que a Física
Clássica”, “parte mais fácil da Física”, “poderia ter este assunto com mais frequência, pois nos
deixa curiosos”, “assunto interessante de se aprender”, “usamos no dia-a-dia sem nem
percebermos”, “algo que faz parte de nossa realidade e que deve ser estudado no EM”, “mais
fácil e mais lógica do que a Física Clássica”. As opiniões negativas trouxeram respostas como
“loucura”, “difícil”, “sem muita aplicação prática”, “mais doido do que via antes”, “algo distante
da realidade”. Destaque-se aqui a redução, da primeira para a segunda etapa, no número de
alunos com opiniões negativas em relação à MQ (de 30,0% para 8,3%) e também o grande
133
aumento no número de opiniões positivas (de 20,0% para 72,9%). Isto reforça a ideia de que
os alunos da segunda etapa estavam mais pré-dispostos para a aprendizagem dos conteúdos
de MQ e se reflete nos melhores resultados de seus testes rápidos e de suas avaliações.
As opiniões finais corroboram as afirmações anteriores e indicam que a proposta de
ensino atingiu seus objetivos. Boa parte dos alunos (61,6%) afirmou que a proposta foi
boa/interessante/legal e que gostaram de como o curso foi ministrado e apenas sete alunos
acharam que o curso foi difícil. Nove alunos de uma mesma turma de terceira série pediram
que as aulas não utilizassem tanto o projetor multimídia, pois, segundo eles, isto deixava as
aulas monótonas. Sete alunos solicitaram que houvesse aulas práticas em laboratório e seis de
uma mesma turma reclamaram do horário do curso, ministrado logo após seu horário de
almoço. Cinco alunos consideraram o tempo do curso curto, quatro pediram mais exercícios e
outros quatro mais exemplos de aplicações dos conceitos de MQ abordados. Outras opiniões
emitidas por um ou dois alunos sobre o curso foram: “mais pessoas deveriam conhecer a
teoria”, “deveria ter o curso mais vezes”, “deveria ter mais aulas sobre criptografia”, “perdemos
muita matéria dos outros conteúdos de Física”, “melhor conteúdo que já aprendi em Física”,
“todas as turmas deveriam ter este curso”, “assunto pode ser trabalhado no Ensino Médio com
certeza”, “a Física Clássica deveria ser ministrada antes do curso para se ter uma base”, “os
testes rápidos poderiam ser excluídos do curso” e “há um bom nível das provas escritas”.
Muitas destas respostas mostram que a abordagem de um conteúdo novo e diferente pode
promover a atualização curricular e ainda despertar o interesse dos alunos para o aprendizado
em Física.
134
Foi diferente. Uma coisa que a gente não tem muita noção... ninguém toca
muito nesse assunto. Foi um jeito diferente de aprender Física. A gente não
tá acostumado a fazer as coisas assim... e a gente tá acostumado que tudo
tem que ter uma explicação correta... [20204]
Na verdade a gente não tava nem acostumado com Física... eu sempre me
dei mal. Aí eu consegui melhorar a nota. Foi bem interessante. [20233]
Eu gostei das aulas, mas eu fiquei com sono algumas vezes. Mas eu
aprendi bastante com relação às coisas de MQ porque eu só ficava ouvindo
esse nome “quântico, quântico, quântico”, mas nunca sabia a que se referia
e que tinha tantas aplicações inclusive no nosso curso: criptografia e outras
coisas. [20301]
Acho interessante porque são coisas que a gente não aprende no EM e que
podem muito bem ser ensinadas. Não são tão difíceis, apesar de um pouco
estranhas, mas bem aplicáveis ao EM e muito interessante para que os
alunos porque caso a pessoa queira seguir nessa área, ela já terá uma base
bem legal. [20315]
Achei bem legal, porque é um assunto que eu tinha bastante curiosidade.
Eu sabia que Planck tinha começado com a Física Quântica (foi o que eu
soube), aí eu sempre tive curiosidade em saber o que era. Já tinha ouvido
falar em emaranhamento e coisas assim, só que não tinha a menor ideia de
como funcionava e achei bem interessante, bem legal. [20329]
Útil pra aprender outras coisas da Física, não só a Física Clássica. Antes as
pessoas falavam e a gente nem sabia o que era. A gente comprava “coisas
quânticas” porque era leigo no assunto. [20410]
Legal que vai dar pra usar no futuro, que nem os métodos de segurança
que o professor falou ali (criptografia). [20415]
Eu nem tinha ideia do que era antes... [20416]
Uma coisa nova, né? [20506]
Muito interessante porque contribuiu... além do conteúdo normal do terceiro
ano, a gente teve um extra que foi muito importante para o vestibular ou
concurso. [20519]
Seis alunos, três de uma das turmas de primeira série e três de uma das turmas de
terceira série, afirmaram que não se sentiram estimulados ou pré-dispostos para o aprendizado
dos conceitos de MQ abordados no curso. Os demais afirmaram que acharam o conteúdo do
curso interessante e se sentiram pré-dispostos para aprender MQ. A seguir alguns dos
comentários feitos pelos alunos:
No começo não, mas com as aulas do professor foi mais motivado. Acho
que se fosse outra pessoa não seria igual. [20108]
Olha, eu não sou muito chegada em Física em geral, mas só que eu achei
bem interessante, como eu já falei. Então algumas coisas e pegava e ia... a
parte de emaranhamento e tudo que eu comecei a... o que eu começava a
entender mais, eu ficava mais motivada... queria saber mais. A parte da
criptografia também, que é algo que se aplica ao nosso curso. Achei umas
coisas que eu não entendia então me cansava um pouco. E também a parte
das simulações foi bem interessante pra poder visualizar o que estava se
passando [20301]
Concordo com ela um pouco, porque eu não gosto muito de Física, mas
algumas coisas surpreenderam porque foram legais e foram bem
interessantes. [20315]
Eu gosto muito de Física e o curso me fez gostar mais ainda. Eu realmente
quero fazer um curso de Física […]. Eu gostei bastante e me senti muito
motivada. As dormidas em aula que foram só uma, foi pelo cansaço físico e
por ser logo depois do almoço e não pela aula. Acho que foi o mais legal
porque a gente percebia a aplicação. Se não tivesse simulação, ficaria até
complicada de entender aquela parte do elétron que se comporta como
onda e como partícula... ficaria bem complicado. [20329]
135
Eu não vi muito sentido nas coisas apresentadas, nenhuma aplicação. Por
isso eu tive um pouco de dificuldade. [20410]
É como foi dito, MQ o cara não entende: um elétron passar por dois lugares
ao mesmo tempo... não entra muito na cabeça isso! Não se consegue
acreditar. [20415]
Me senti mais motivado do que para a física normal. [20520]
Somente cinco alunos, todos de duas turmas de terceira série (204 e 205), disseram
que não estudaram fora de sala de aula em momento algum. Todos os demais afirmaram que
leram o texto de apoio ou os slides apresentados nas aulas, alguns em casa e outros na
própria escola.
Quando perguntados sobre o que poderia ter sido diferente no curso, oito alunos
afirmaram que consideraram bom o curso e que não fariam qualquer mudança. Algumas das
afirmações dos alunos neste questionamento são apresentadas a seguir:
136
A MQ é importante porque explica muitas coisas que a física clássica não
consegue explicar. [20520]
4. Diário de bordo
137
Os alunos de terceira série tiveram mais facilidade em compreender a soma de vetores
do que os de primeira série, possivelmente por este ser um conteúdo tradicionalmente
abordado na primeira série do EM. Assim, o ensino deste conteúdo acabou por fazer ressurgir
na estrutura cognitiva dos alunos um conhecimento que já havia sido internalizado, aprendido
de forma significativa e possivelmente passado pelo estágio da assimilação obliteradora. Esta
diferença de aprendizado, entretanto, não foi tão grande a ponto de se poder concluir que os
alunos de terceira série tiveram melhor desempenho que os alunos de primeira série.
Pela reação inicial dos alunos, o experimento de Stern-Gerlach foi tido como de difícil
compreensão em todas as séries. Os alunos de primeira série apresentaram dificuldades em
usar o conceito de spin, pois a maior parte deles não estudara este conteúdo ainda na
disciplina de Química. Nas turmas de terceira série, os alunos relataram que não lembravam de
ter tido esse conteúdo na primeira série, o que pode indicar uma aprendizagem mecânica, no
caso de o assunto realmente ter sido ministrado.
Alguns alunos apresentaram dificuldades de compreensão do conceito de
incompatibilidade de observáveis, tema que foge da intuição clássica usada em seu cotidiano.
O conceito de estado de um sistema físico foi um dos conteúdos que os alunos tiveram
maior facilidade para compreender. A questão da variação temporal do estado de um sistema
físico, mesmo não sendo o foco deste estudo, também pareceu compreendida pelos alunos.
Foi fácil perceber situações em que alunos ofereciam exemplos da modificação do estado com
a alteração temporal. Em um dos exemplos, um aluno descreveu o estado de uma de suas
canetas e constatou que a mesma não estava funcionando. Passado algum tempo, o mesmo
aluno interrompeu a aula para informar uma modificação no estado de sua caneta, que havia
voltado a escrever. Este tipo de exemplo se repetiu em praticamente todas as turmas.
As perguntas apresentadas ao longo das aulas mostram que muitos alunos têm
interesse neste conteúdo e que se faz necessária a inclusão destes tópicos no ensino de Física
no EM. Como ilustração, algumas das perguntas que os alunos fizeram ao longo do curso
foram: “fotoelétrico é a mesma coisa que fotovoltaico?”, “mas por que o elétron se comporta
assim no experimento de dupla fenda?”, “por que a figura no experimento de Stern-Gerlach é
essa?”, “por que o computador quântico é mais rápido?”, “o que são bits quânticos?”, “por que
a superposição é importante?”, “qual a diferença entre e ?”, “computação
quântica não pode quebrar a criptografia quântica?”, “qual a diferença entre monitoramento
passivo e monitoramento ativo?”, “pode haver superposição de mais de uma grandeza física?”.
Destaque-se que, mesmo que alguns conceitos tenham sido considerados de difícil
compreensão ao longo do processo de ensino-aprendizagem, isto não significa que não foram
devidamente compreendidos pelos alunos. Sempre que as dificuldades eram levantadas pelos
alunos, o professor buscava retornar ao conceito e abordá-lo novamente utilizando a mesma
ou outras técnicas até que houvesse uma melhor compreensão.
De forma mais geral, os alunos da primeira etapa da pesquisa pareceram estar menos
envolvidos com o curso do que os da segunda etapa. Isto talvez se deva ao fato de que muitos
138
alunos sabem que, independente do resultado da avaliação escrita, eles serão aprovados ao
29
final do ano letivo, pois esta é a conduta adotada na educação no país neste momento .
Outro fato importante a ser citado é o de que o professor da instituição em que a
segunda etapa da pesquisa foi realizada e que cedeu as aulas para execução da pesquisa
incorporou o assunto ao seu conteúdo anual e incluiu perguntas sobre MQ no exame final dos
alunos. Portanto este tema foi adotado pelo professor e não foi somente algo trabalhado
durante a pesquisa e esquecido logo após o término do curso.
139
segunda e na terceira avaliação. Isto porque o número de acertos dos alunos na primeira
avaliação foi maior do que nas demais, fato este que pode estar relacionado aos aspectos
clássicos de algumas questões da primeira avaliação e que já haviam sido aprendidos de
forma significativa anteriormente.
A segunda avaliação mostrou que situações-problema conceitualmente simples em
MQ, como o experimento de dupla fenda e o de Stern-Gerlach, não apresentam grande
dificuldade de compreensão pelos alunos. Assim, estes experimentos podem (e devem) ser
utilizados como recursos auxiliares para promoção da atualização curricular no ensino de
Física no EM e como tópicos que permitam a criação de uma “nova” consciência capaz de
interpretar fenômenos quânticos, estranhos ao mundo cotidiano do aluno.
O emaranhamento quântico também se apresentou como uma situação-problema
adequada para o ensino de tópicos de MQ, visto que os alunos pareceram ter compreendido os
conceitos de estado de um sistema quântico e de superposição linear de estados nas
avaliações propostas.
De mesma forma, uma situação-problema mais usual como o átomo de hidrogênio não
foi de fácil assimilação pelos alunos, quando abordado da ótica da MQ, mesmo que este
exemplo esteja normalmente presente nos cursos de Química do EM. A utilização desta
situação-problema, (e de qualquer outra), não deve ser descartada somente por conta de um
resultado negativo, mas certamente sua abordagem deve ser revista para que os conceitos
sejam devidamente compreendidos pelos alunos. Uma revisão acerca da apresentação na
primeira etapa, aliada à pré-disposição para a aprendizagem verificada nos alunos da segunda
etapa, fez com que essa situação-problema produzisse um resultado melhor. A efetiva
compreensão do campo conceitual da MQ, no entanto, só será atingida quando ocorrer o
domínio desta situação, entre outras não abordadas neste trabalho.
O curto período do curso, conforme inclusive apontado por alguns alunos, impede uma
conclusão definitiva sobre a aprendizagem dos alunos acerca dos conteúdos abordados,
embora os indícios sejam animadores e nos tentem a fazer alguma afirmação maior. Isto,
porém, estaria indo contra o referencial teórico utilizado nesta pesquisa. Efetivamente, segundo
a teoria dos campos conceituais de Vergnaud, o domínio de um campo conceitual, a MQ neste
caso, ocorre ao longo de um expressivo período de tempo (Vergnaud, 1982, p. 40). Espera-se,
contudo, que este primeiro contato dos alunos com a MQ tenha servido para a criação de
subsunçores que auxiliem no aprendizado de novas situações-problema em MQ, para os
alunos que venham a realizar cursos que necessitem de tais conhecimentos e, também, não
menos importante, que este conhecimento sirva como uma alfabetização científica, necessária
para criar uma criticidade quando os alunos forem apresentados a algo que desconheçam e
que possa ser utilizado para propagar ideias sem um embasamento adequado.
Nem todas as respostas dos alunos aos mapas, testes, avaliações e questionários
puderam ser aqui transcritas, dado o volume de dados coletados. Para que a análise não
ficasse muito densa e redundante, apenas algumas respostas foram incluídas no texto, visto
que outros alunos tiveram respostas semelhantes àquelas apresentadas. Ainda assim, espera-
140
se que as informações apresentadas tenham sido suficientes para elucidar e ilustrar o ponto de
vista defendido na pesquisa. Declara-se que as informações não apresentadas em nada
prejudicam as conclusões ora apresentadas.
As conclusões sobre os resultados aqui apresentados, bem como as respostas às
perguntas de pesquisa lançadas no capítulo V encontram-se a seguir.
141
CAPÍTULO VII
CONCLUSÕES
142
problema, podendo assim ser utilizado tal conceito com frequência para interpretação dos
fenômenos estudados na MQ. De fato, os alunos terminaram por incorporar propriedades de
espaços lineares sem que houvesse necessidade de que isto fosse explicitado. Pode-se
considerar que esta abordagem teve um resultado adequado no aprendizado dos alunos, visto
que em nenhuma ocasião utilizaram conceitos da Mecânica Clássica para interpretar os
fenômenos apresentados. As respostas dos alunos foram apresentadas, mesmo que algumas
incorretamente, utilizando a linguagem inerente à MQ. A importância que deve ser dada à
linguagem e à simbolização no progressivo domínio de um campo conceitual pelos alunos na
Teoria dos Campos Conceituais (Moreira, 2002, p. 8) faz com que se acredite que os
resultados encontrados sinalizam que o aprendizado dos alunos nas duas etapas do curso
seguiu o caminho desejado para a ocorrência de uma aprendizagem significativa, caso não
tenha ocorrido efetivamente.
Os experimentos de dupla fenda podem ser considerados como novidade para
praticamente todos os alunos e o fato de algumas de suas configurações fugirem totalmente da
intuição clássica também conseguiu instigá-los para o aprendizado dos conceitos abordados.
De início, como esperado, houve um estranhamento com os resultados obtidos no experimento
com elétrons e os alunos fizeram uma série de perguntas para tentar compreendê-los, mas as
explicações apresentadas e a forma como a MQ lida com este experimento pareceu plausível
para os alunos. Por mais que alguns alunos insistissem que os resultados pareciam malucos
ou irreais, esta opinião acabou mudando para a maioria, e a teoria aparentou ter sido
devidamente compreendida por eles.
As respostas dos alunos às questões sobre o experimento de Stern-Gerlach, na
avaliação e no teste rápido, mostraram boa aprendizagem dos conceitos trabalhados com esta
situação-problema, sugerindo que ela é adequada para uma abordagem no EM, mesmo que
atualmente o conceito de spin esteja sendo deixado de lado por boa parte dos professores de
Química e Física. A abstração de vários conceitos, somada à desmotivação de alguns
professores pode culminar na supressão de conteúdos tidos como mais difíceis de trabalhar e
parece ser este um caminho seguido no EM, visto que praticamente todos os alunos
afirmaram, no decorrer das aulas, que não tinham ouvido falar ou não se lembravam de ter
estudado algo sobre o conceito de spin. Se ocorreu algum estudo deste conceito, um eventual
aprendizado, deve ter sido de forma mecânica. Por ser algo complexo para alunos de EM,
certamente não se espera uma compreensão correta deste conceito, mas o primeiro contato
oferecido no curso proposto para o EM pode fazer com que uma aprendizagem subsequente
ocorra de um modo mais fácil e de forma significativa. É extremamente importante que alunos
de EM tenham contato com conteúdos de FMC, pois, dependendo da escolha futura de cada
um, esta pode ser a última vez em que o aluno estudará Física em sua vida (Oliveira et al.,
2007, p. 448).
A aceitação dos alunos aos tópicos sobre o emaranhamento quântico e a criptografia
quântica mostra que temas recentes estimulam o aluno para o aprendizado de FMC e podem
ser usados no ensino de Física como elementos capazes de criar a condição de pré-disposição
143
para o aprendizado. É interessante lembrar que, sob uma visão epistemológica
contemporânea, a Ciência está em constante construção (Forato et al., 2011, p. 30) e, deste
modo, sempre surgirá algum assunto que pode ser incorporado no ensino de Física. Isso
significa que não somente a Ciência está em constante construção, mas que o ensino de Física
precisa ser repensado frequentemente para acompanhar as mudanças que a Ciência promove.
Apesar de serem tópicos não usuais no ensino de Física, o emaranhamento quântico é um
fenômeno examinado por Einstein et al. (1935) na década de 30 do século passado e a
criptografia quântica teve seus desenvolvimentos tecnológicos a partir da década de 80 do
mesmo século.
Mesmo sem serem situações-problema centrais neste estudo, alguns comentários
podem ser tecidos acerca da computação quântica e do átomo de hidrogênio. A computação
quântica pareceu interessar aos estudantes, principalmente se discutida com a criptografia
quântica. A rapidíssima velocidade de processamento em que um computador quântico é
capaz de operar (teoricamente) faz com que os alunos queiram saber detalhes das dificuldades
no processo de construção deste equipamento. Com tal interesse, é possível tratar temas que
não são tradicionalmente abordados em cursos de MQ, como a descoerência e o próprio
emaranhamento quântico. A abstração do modelo do átomo de hidrogênio, aliada a grandezas
físicas não tão usuais aos alunos, como spin, momento linear e até mesmo energia, fez com
que esta situação-problema não fosse tão proveitosa quanto as demais. Os alunos da primeira
etapa da pesquisa não tiveram bom desempenho nas duas questões da segunda avaliação
que trabalharam com esta situação-problema. Estas questões, inclusive, foram as principais
responsáveis por baixar a média em quase todas as séries. O impacto negativo desta situação-
problema foi menor nas turmas da segunda etapa porque se atentou a este aspecto na análise
de dados da primeira etapa e buscou-se dar mais atenção ao átomo de hidrogênio na segunda
etapa para uma melhor compreensão. A recomendação, neste momento, é que seja dado um
enfoque central a esta situação-problema no caso de pretender utilizá-la para o aprendizado de
conceitos de MQ.
No caso dos quatorze alunos da segunda etapa que apresentaram uma postura de
negação no questionário de conhecimentos prévios frente ao conteúdo a ser apresentado,
podemos verificar que o desempenho destes alunos foi muito próximo do dos demais, ainda
que inferior, mas ainda assim com uma diferença muita pequena. A média desses alunos foi
2,4%, 0,9% e 5,7% abaixo da dos demais alunos na primeira, segunda e terceira avaliação,
respectivamente. Isso sugere que a diferença de aprendizagem destes alunos em relação aos
demais é pequena, que a abordagem utilizada em sala de aula pareceu estimulá-los em parte
para a aprendizagem e que o conteúdo apresentado é capaz de promover interesse pela FMC,
bem como promover a atualização dos currículos do EM.
Acredita-se que, com os dados coletados e a análise feita no capítulo anterior, possa
se considerar que a aprendizagem dos alunos foi satisfatória e está no caminho certo para
promover a aprendizagem significativa, caso os alunos continuem seus estudos nesta área. O
incentivo dado aos alunos, desde o começo do curso, também auxiliou no processo de
144
apropriação dos conceitos trabalhados. Este estímulo pode ter sido fundamental para a criação
de uma autoeficácia do estudante acerca do estudo da MQ o que, por muitas vezes, não se vê
em sala de aula. Além disto, criou-se nos alunos a percepção de que existe um respaldo
científico para a descrição de fenômenos quânticos (e fora da FC). Ainda assim, seria muita
pretensão afirmar, neste momento, que ocorreu aprendizagem significativa em todos os alunos
em um curso de curta duração como este (aproximadamente 25 horas-aula). Os referenciais
utilizados, a Teoria da Aprendizagem Significativa e a Teoria dos Campos Conceituais, podem
ser considerados adequados para este estudo porque possibilitaram a elaboração de uma
proposta de ensino preocupada com a maneira com que os alunos deveriam aprender o
conteúdo e em como lidar com problemas de compreensão de certos conceitos e princípios
enfrentados no decorrer do curso. Ainda de acordo com as teorias utilizadas, a aprendizagem
significativa do campo conceitual da MQ só será efetivada no caso da exposição do aluno a
este campo por um expressivo período de tempo, através da maturidade, experiência e
aprendizagem (Vergnaud, 1982, p. 40), aliada à frequência (repetição e prática) de
apresentação do material instrucional ao aluno, de forma invariável e inequívoca (Ausubel,
2002, p. 185). Mesmo com todo o empenho e dedicação para que houvesse uma
aprendizagem adequada dos conceitos e princípios da MQ, ainda assim foi possível verificar
que as visões de alguns (não muitos) alunos não se modificam por conta de uma insistência
em resistir à apresentação de um novo conteúdo e de interpretá-lo de forma correta, já que
cada indivíduo possui uma forma idiossincrática de explicação dos fenômenos. Barais e
Vergnaud (1990, p. 74) afirmavam que isto poderia acontecer ao considerar que concepções
intuitivas tendem a persistir, mesmo após a apresentação de um novo conceito aos alunos.
Em todos os aspectos considerados, os resultados apresentados sugerem estar de
acordo com o exposto no primeiro capítulo desta tese, a saber, que é possível ensinar MQ no
EM. Apesar de parecer redundante, esta afirmação ainda é constantemente posta em
discussão, devido aos inúmeros problemas que o ensino de FMC enfrenta neste nível de
formação, seja pela falta de preparo dos professores, pela falta de material didático disponível,
pela carga horária insuficiente para a inserção de mais conteúdo, pela necessidade de
conhecimento prévio ou pela dificuldade matemática (Morais e Guerra, 2013).
Os problemas apontados por Terrazan (1992) há mais de vinte anos são totalmente
atuais frente ao vigente currículo de Física no EM e uma de suas frases soa como uma espécie
de profecia concretizada (op. cit., p. 211):
145
escolas envolvidas neste desafio. Os livros didáticos evoluíram desde a publicação do trabalho
de Terrazan, mas muitos professores ainda insistem em trabalhar os “temas clássicos”,
seguindo uma lógica de ensinar somente o que lhes foi ensinado, sem qualquer mudança nos
conteúdos, nas metodologias de aplicação e de avaliação e no currículo.
O que se defende nesta tese é que é possível fazer divulgação científica de qualidade
no EM e com razoável compreensão dos estudantes. A apresentação da MQ foi capaz de
levantar uma série de discussões dos alunos e instigá-los para a aprendizagem. Isto,
principalmente, porque ao trabalhar uma teoria como esta, ocorre a abordagem de princípios
totalmente incomuns ao cotidiano da grande maioria e uma nova teoria, como é o caso da MQ,
nasce de novos princípios.
Outro ponto de questionamento é apontado por Monteiro et al. (2009, p. 157):
146
pela Internet. Os estudantes sofrem um bombardeio de informações em todos os ambientes e,
na maioria das vezes, não possuem uma bagagem conceitual adequada para analisar de forma
crítica o que lhes chega. É neste momento que a educação formal deve entrar em cena. Alguns
desses conhecimentos prévios, no entanto, podem ser considerados como subsunçores e ser
usados pelo professor para conduzir uma aprendizagem correta dos conceitos cientificamente
aceitos. Enquanto o EM tiver um currículo “engessado” e professores não aceitarem as
sugestões de conteúdo oriundas dos questionamentos dos alunos, dificilmente haverá alguma
mudança relevante na forma como o ensino de Física é visto pela sociedade. Há uma
necessidade imediata de mudança de postura nos cursos de Física do EM (Oliveira et al.,
2007), sempre lembrando que jamais se deve subestimar ou desvalorizar aquilo que o aluno já
sabe (Moreira, 2002, p. 21).
Outro ponto relevante percebido na pesquisa é que os alunos já estão condicionados
nas aulas de Física a memorizar fórmulas para usá-las ao resolver os exercícios e não há
qualquer tipo de questionamento conceitual ou, até mesmo, matemático para interpretação dos
fenômenos de interesse. Há certa matematização descontextualizada nas aulas de Física,
fazendo com que os alunos sejam pouco incentivados a escrever. Não se defende que a
matemática seja retirada das aulas de Física de EM, pois ela é a linguagem que permite ao
cientista estruturar seu pensamento para apreender o mundo, mas o ensino da ciência deve
propiciar meios para que os estudantes adquiram esta habilidade (Pietrocola, 2002, p. 105). O
que deve ser discutido é a atual ênfase na matematização, de modo a que se evolua para uma
relação dialógica entre discussões conceituais e exercícios matemáticos.
O material de apoio produzido neste trabalho, bem como as avaliações, testes rápidos,
questionários e mapas mentais, podem ser considerados adequados e foram bem aproveitados
pelos alunos no curso, podendo ter contribuído para a ocorrência de aprendizagem
significativa. A utilização destes materiais, no entanto, não tem o poder de promover a
aprendizagem significativa por si só, visto que eles são somente potencialmente significativos.
Há, ainda, a necessidade de se buscar outras condições para ocorrência de aprendizagem
significativa. Além disto, nos ambientes formais de ensino, a criação de um ambiente propício
para que os alunos se sintam confortáveis para questionar e levantar discussões sobre o
conteúdo apresentado é fundamental para sucesso em qualquer disciplina de EM. Sem esse
retorno dos alunos, o professor fica refém de sua confiança no aprendizado dos alunos e isto
pode nem sempre ocorrer. O professor, então, tem o papel de avaliar o aprendizado dos alunos
ao longo do processo educacional e deve lançar mão de diversas formas de avaliação para
que possa realmente verificar se os alunos estão compreendendo o conteúdo e de que forma
ocorre esta compreensão.
Há uma necessidade real, também, de se ter uma compreensão empática do professor
em relação aos alunos. Esta é uma característica que não se encontra na maioria das salas de
aula e é apresentada por Rogers (1977) como algo inerente ao facilitador da aprendizagem,
termo que ele utiliza para definir o professor. É importante que o professor assuma a condição
147
de se colocar no lugar do aprendiz, reconhecendo suas inseguranças e medos. Quando isto
acontece, o professor consegue ver meios de atingir a aprendizagem significante.
Em todas as etapas da pesquisa, tentou-se utilizar a compreensão empática e isto
pode ter auxiliado os alunos a aprender alguns dos conceitos apresentados, bem como a se
sentirem confortáveis ao externalizar o conteúdo e serem avaliados.
As soluções para o ensino de FMC no EM estão longe de ter uma proposta comum e
definitiva e os desafios parecem ser cada vez maiores, devido à quantidade de descobertas
científicas e de conceitos a que os alunos estão sendo expostos constantemente. É preciso,
para isso, que primeiramente se reconheça o problema. A MQ é uma teoria recente, mas que
foi construída e fundamentada há quase cem anos, não cabendo mais evitá-la no Ensino.
Outras teorias e outros conceitos como, por exemplo, os relacionados ao Big Bang e ao bóson
de Higgs, são temas presentes na atualidade e é preciso buscar essa contextualização para
que a Física não seja relegada a um segundo plano como disciplina no EM. Os alunos,
certamente, possuem curiosidade sobre estes assuntos, mesmo que de forma velada. Cabe à
comunidade científica e aos professores de Ciências trabalharem de forma a que se desperte a
curiosidade dos alunos desde as primeiras séries (Hamburger, 2007, p. 104) seguindo as
recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Resumindo, para que dificuldades de aprendizagem possam ser minimizadas em uma
proposta de ensino, faz-se necessário a consideração de pelo menos três fatores
preponderantes: a compreensão empática, o interesse dos alunos pelo conteúdo ministrado e a
diversidade de instrumentos de avaliação. Esses fatores não levam a uma solução infalível,
mas conduzem a resultados interessantes e que promovem uma alfabetização científica
satisfatória.
148
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158
APÊNDICES
158
APÊNDICE I
TEXTO DE APOIO
1. Introdução
Uma nova Física, um novo mundo, fenômenos nunca antes observados, os fenômenos
quânticos, começaram a surgir aos nossos olhos no início do século XX. Primeiro foi a noção de
pacotes de energia (Max Planck, 1900), que resultaram no que hoje é chamado de fótons, dando à
luz um caráter corpuscular (Albert Einstein, 1905). Depois, foi a conscientização de que as ondas
eletromagnéticas em geral (não só a luz) apresentavam aspectos tanto corpusculares como
ondulatórios e a sugestão de que também a matéria, elétrons por exemplo (Louis De Broglie,
1924), apresentasse as duas características, o chamado caráter dual da matéria. Para explicar
estes e outros aspectos estranhos que objetos de pequenas dimensões apresentavam, como é o
caso de níveis de energia discretos dos átomos, foi necessário estabelecer-se uma nova Teoria
(Werner Heisenberg, Erwin Schrödinger, 1925), porque a Física Clássica com suas leis, até então
consideradas de validade ampla e (quase) irrestrita, mostrou-se incapaz de fazê-lo. A Teoria que
vem explicando com sucesso os fenômenos do mundo microscópico e que vem, até, predizendo
consequências surpreendentes comprovadas por experimentos, é a Mecânica Quântica (MQ) (no
caso, não relativística).
Imagine, então, um mundo onde os objetos apresentam uma probabilidade de estar em
mais de um lugar ao mesmo tempo, mesmo encontrando obstáculos energéticos para atravessar,
como se fantasmas fossem, onde dois objetos podem estar fortemente correlacionados, mesmo
se um deles estiver aqui e o outro em outra galáxia, entre outros aspectos fantásticos. Estes
fenômenos poderiam ser considerados como absolutamente absurdos, pelo que observamos no
nosso cotidiano, mas não o são se incorporarmos a este o mundo dos átomos, elétrons e de
muitas outras partículas pequeníssimas, enfim, o mundo das partículas quânticas, regido pela MQ.
Inúmeros fenômenos que jamais imaginaríamos ocorrer, constituem-se em previsões da
MQ, teoria que se desenvolveu na primeira metade do século XX e que ainda hoje conduz a
importantes implicações tecnológicas, tais como a Criptografia, a Computação e o
Emaranhamento Quânticos, além de possibilitar, por exemplo, a construção de dispositivos de
pequenas dimensões capazes de armazenar muita informação.
Pela falta de familiaridade com os eventos que a MQ descreve, torna-se muito importante
analisar os seus primeiros princípios e obter uma boa compreensão do significado de seus
conceitos fundamentais, para que não sejam interpretados e utilizados erroneamente.
A dimensão da importância da MQ supera o que normalmente se esperaria de uma Teoria
Física, pois abre caminhos verdadeiramente revolucionários para o conhecimento científico e
modifica a nossa visão sobre o mundo e o universo em geral.
Alguns dos assuntos aqui abordados serão apresentados com auxílio de simulações, que
se encontram disponíveis para acesso via computadores conectados à Internet.
Somando Ondas
Em Física, ondas são perturbações que se propagam em geral em meios (água, sólidos) e
até no vácuo e que são de naturezas variadas.
Ao somar ondas, resultam fenômenos de interferência, podendo esta ser construtiva ou
destrutiva. Quando duas ou mais ondas se somam o resultado é, também, uma onda, que é uma
superposição linear das ondas iniciais.
159
Em Matemática, temos duas funções que são utilizadas com bastante frequência e que se
apresentam como representação gráfica de uma onda: a função seno e a função cosseno. A figura
1 mostra o gráfico das funções sen(x) e cos(x), com x variável real.
(a) (b)
Figura 1. (a) sen(x); (b) cos(x).
Em geral, ondas são representadas por certas funções. As funções seno e cosseno, assim
como as que representam outras ondas, podem ser somadas gerando novas funções (ondas) ou,
em certos casos, até anulando-se completamente. Desta forma, podemos construir determinadas
ondas convenientemente, através de superposição linear (soma) de outras. Alguns exemplos são
ondas triangulares, ondas quadradas e ondas dente-de-serra, muito utilizadas em Eletrônica e
mostradas na figura 2. Estas ondas são construídas a partir de somas específicas de outras
ondas.
Figura 2. (a) onda triangular; (b) onda quadrada; (c) onda dente-de-serra.
1,5
0,5
0
0 2 4 6 8 10 12 14
-0,5
-1
-1,5
Exercício: Procure reproduzir alguns dos pontos mais significativos da figura acima.
Outro exemplo de soma de ondas bastante observado é o das ondas do mar. Por
inúmeras vezes, as ondas do mar se superpõem formando ondas maiores ou, dependendo da
situação, até anulando-se.
160
Para “manipular” a superposição de ondas podemos, por exemplo, trabalhar com uma
*
simulação em computador do “Física 2000”, denominada “Somando Ondas” .
1, se 0 x 1, 2 x 3, 4 x 5
Exercício: Faça um gráfico da função f ( x ) .
0, se 1 x 2, 3 x 4, 5 x 6
Reflita: A função f(x) acima pode ser encarada como uma superposição linear de ondas?
Da mesma maneira podemos pensar que funções (ondas) mais simples podem resultar da
decomposição de funções mais complicadas (ondas mais distorcidas).
Verificamos, assim, que as ondas (funções) consideradas são dotadas de uma operação
de soma – tal que a soma de duas ondas (funções) é uma onda (função)– e de uma operação de
multiplicação por número – tal que a multiplicação de uma onda (função) por um número é uma
onda (função).
(a)
(b)
(c)
Figura 4. Intensidade das funções (a) sen(x); (b) cos(x); e (c) sen(x) + cos(x).
Nas ondas da figura 1 podemos destacar o comprimento de onda () e a amplitude (A). As
intensidades destas ondas ( Is senx e Ic cosx ) estão representadas nas figuras 4a e 4b,
2 2
respectivamente, e a intensidade da soma das duas ondas ( I senx cos(x) ) na figura 4c.
2
*
Física 2000: http://www.maloka.org/fisica2000/
161
U
v1
V
v2
Exercício: Considerando os vetores v 1 e v 2 abaixo
v1 (2,0) v 2 (2,3) ,
represente no gráfico ao lado :
a) v 1 + v 2 b) 2 v 1 +3 v 2 c) – v 1 + v 2 .
1
A soma de dois vetores segue uma regra bem definida, a saber, a regra do paralelogramo.
162
Young –, obtém-se um padrão com franjas de interferência, como o da figura 6. Similares são os
*
padrões encontrados com ondas de água e de som. (Ver simulações em PhET .) As manchas
escuras no segundo anteparo se referem às regiões em que ocorre interferência construtiva (onde
a intensidade da onda resultante é grande) e as manchas claras às regiões de interferência
destrutiva (onde a intensidade da onda resultante é pequena ou nula). (Ver simulação em “Física
2000”.)
*
Physics Education Technology: http://phet.colorado.edu/new/simulations/
163
Para entender este fenômeno, que a Física Clássica não explica, foi necessário
desenvolver uma nova teoria: a MQ. A explicação do experimento exige alguns conceitos (e
termos) não comuns a partículas clássicas, como superposição linear de estados, amplitude de
probabilidade e função de onda. O padrão da figura 8 é, em geral, obtido com uma fonte de alta
intensidade que emite muitas partículas de uma só vez. (Ver simulações em “Física 2000” e em
“PhET”.)
Reflita 1: O que significa a faixa central ser mais densa que as laterais, no segundo anteparo?
Reflita 2: O que são os pontos escuros no segundo anteparo?
Reflita 3: O que você esperaria obter no segundo anteparo depois de a fonte enviar dez elétrons?
Contudo, imagine agora que a fonte está emitindo um único elétron a cada vez, ou seja,
um novo elétron só é emitido após o registro da contagem do elétron anterior no segundo
anteparo. Que padrão de contagens aparece, após um tempo muito longo? O da figura 7 ou o da
figura 8? Por estranho que possa parecer, a resposta é: ainda o da figura 8. O fenômeno quântico
desafia novamente nossa expectativa! Como é possível gerar padrão de interferência sem ocorrer
interação entre os elétrons?
Para responder a estas (e outras) perguntas sobre o comportamento de objetos quânticos,
a MQ nos apresenta um conjunto de princípios diferentes dos da Física Clássica.
Aliás, não apenas elétrons, mas também prótons, nêutrons, átomos e mesmo moléculas
de grande porte (como o fulereno, que é composto por 60 átomos de carbono) mostram este
comportamento.
Reflita: Como você justificaria os padrões de interferência no experimento de dupla fenda com
objetos microscópicos?
Espaços Vetoriais
Qual a diferença entre um projétil quando está em repouso dentro de uma caixa e quando
é atirado por uma metralhadora? E qual a diferença entre uma criança com 36,5°C de temperatura
e a mesma criança com 40°C? Que consequências podem estas diferenças trazer?
164
Podemos simplesmente dizer que nos dois exemplos temos estados diferentes de um
mesmo objeto, corpo, sistema. Contudo, como percebemos, as consequências das diferenças de
estado podem ser bastante diversas. É importante, então, conhecer o estado dos sistemas físicos.
Assim como para objetos clássicos, é importante conhecer os estados dos objetos
quânticos.
3
Figura 9. Gráficos de intensidade para experimentos de fendas simples e dupla para elétrons.
Reflita: Por que podemos dizer que quando as duas fendas estão abertas temos uma soma dos
estados dos casos de uma fenda?
Sistemas quânticos são aqueles que satisfazem as leis da MQ, que são diferentes das da
Mecânica Clássica. Já o conceito de estado quântico, tido como fundamental na nova Mecânica –
e apesar do termo estado possuir diferentes concepções – é, em princípio, basicamente o mesmo
que na Física Clássica, embora apresente características peculiares.
Assim, por exemplo, um elétron pode estar ligado a um átomo ou estar livre. Temos aí
dois estados diferentes possíveis para o elétron. Para conhecer o estado de um sistema quântico,
devemos conhecer o valor das grandezas físicas associadas a ele. Ainda no exemplo do elétron,
se ele estiver livre, pode ter uma energia pequena ou muito alta (aceleradores de partículas).
Neste caso, o estado do elétron deve estar caracterizado pelo menos pela grandeza física energia.
Então, existem ou não diferenças entre as caracterizações de estados de objetos
clássicos e estados de objetos quânticos (além do objeto ser diferente)? Sim, como detalharemos
2
Falstad: http://www.falstad.com/mathphysics.html
3
Greca, I. M., Herscovitz, V. E. Introdução à Mecânica Quântica. Notas de Curso. Texto de apoio, v. 13.
165
depois, existem. Os estados dos objetos clássicos são caracterizados, em princípio, pelos valores
de todas as grandezas físicas relacionadas aos objetos. Já para caracterizar os estados dos
objetos quânticos podemos relacionar apenas os valores de certas grandezas físicas
(observáveis), aquelas que são ditas compatíveis.
O observável é a grandeza física cujos valores são passíveis de determinação (energia,
posição, momento linear, spin, etc.). Quando dois observáveis são compatíveis, é possível obter
informação sobre valores de um deles sem alterar a determinação de valores do outro. O estado
de um sistema quântico pode, então, ser caracterizado pelos valores de ambos.
Uma maneira de simbolizar o estado de um objeto quântico é a que recorre à notação de
*
Dirac. Nesta notação, o estado é usualmente simbolizado por (ket) , acrescido de uma
característica interna (por exemplo, Energia ).
Tal notação pode também ser usada para descrever estados de objetos clássicos,
embora ali seja menos útil. Um exemplo pode ser o de um paciente internado em um hospital.
Suponhamos que em seu primeiro boletim médico, quando foi internado, conste que sua
temperatura é 38ºC e seja constatado um estado gripal. O segundo boletim médico, um dia
depois, informa que sua temperatura é de 39°C e foi diagnosticada gripe A. No décimo dia (após o
tratamento), o paciente está com 36,5ºC e obtém alta hospitalar. Utilizando a notação de Dirac,
podemos descrever os estados do paciente conforme cada boletim médico. O primeiro estado
informa paciente, 1º dia 38º C, gripe , o segundo diz paciente, 2º dia 39º C, gripe A e o
terceiro, paciente, 10º dia 36,5º C, recuperado . (Contudo observe-se que não ocorre (não
existe) neste caso um estado ( ..., Gripe A ..., recuperado ) do paciente, em um dado instante de
tempo.
Tal notação pode ser usada para denotar estados de outros sistemas. Assim, para os
vetores do plano apresentados na figura 5 teremos, além de estados v1 , v 2 , inúmeras
combinações lineares U c 1 v 1 c 2 v 2 . Também para ondas, os estados sen x e cosx
geram inúmeros estados possíveis de ondas ( a senx b cosx ).
Analogamente, se estivermos tratando de sistemas quânticos, podemos introduzir as
características de cada estado do sistema no vetor de estado (ket) correspondente. Assim,
F1 Possível passagem pela fenda 1 e F2 Possível passagem pela fenda 2 podem
gerar, no caso dos experimentos de dupla fenda, estados F F1 F2 , para elétrons registrados
no segundo anteparo.
Sistemas Binários
Bits Quânticos
*
A denominação “ket” e a notação decorrem de “partir ao meio” o símbolo de produto escalar entre dois vetores,
(bracket em inglês).
166
superposições lineares desses abrindo, assim, para uma unidade de informação simultaneamente
dois canais de processamento, uma vez que o bit quântico (qubit) pode estar também em estados
2
c1 0 c 2 1 , com 0 c1 1 , 0 c 2 1 e c1 c 2
2
1.
Outro importante exemplo de um sistema binário pode ser fornecido pelo spin do elétron.
O spin é uma propriedade dos sistemas físicos (uma grandeza física), cuja existência e
importância foram reveladas em análises de sistemas quânticos. Seus efeitos, contudo, aparecem
também em sistemas macroscópicos como, por exemplo, nos materiais ferromagnéticos.
Uma das experiências mais importantes relativas a este observável, que possibilita a
observação de consequências dos diversos postulados da MQ, é o experimento cujo esboço é
apresentado na figura 10.
O arranjo do experimento de Stern-Gerlach (Otto Stern e Walther Gerlach, 1921),
conforme esquematizado na figura 10, inclui um forno em que se aquece e vaporiza o material a
estudar, um colimador por onde passa o material vaporizado e um campo magnético fortemente
inhomogêneo em uma dada direção, ao qual é submetido o material que é, finalmente, registrado
em um anteparo. Stern e Gerlach recorreram ao metal prata, verificando que os átomos se situam
em dois grupos distintos no anteparo, como mostrado (de forma ampliada) na figura. O efeito pode
ser entendido, ao menos qualitativamente, se o sistema possuir momento angular. Como de fato
no átomo de prata somente um elétron contribui para tal, e este elétron tem momentum angular
orbital nulo, foi necessário pensar-se na existência de momento angular de outra natureza, isto é,
não orbital.
Surgiu, então, um observável novo na teoria quântica, o momento angular intrínseco (do
elétron) ou, simplesmente, spin (do elétron).
O resultado do experimento de Stern-Gerlach mostra que existem somente dois estados
possíveis na direção do campo magnético (que chamaremos de direção z, por ora) para a
projeção do spin do elétron. Podemos associar, então, a cada projeção do spin do elétron, um
estado correspondente. Cálculos do momento magnético gerado pelo momento angular intrínseco
( s ) do elétron mostram que o spin só tem duas projeções possíveis na direção do campo
magnético ( e ) que denominamos simplesmente de “spin-para-cima” e “spin-para-
2 2
baixo”. Diz-se, então, que o spin do elétron é ½. Os estados associados às mencionadas
projeções do spin podem ser representados por e .
167
Existem sistemas quânticos de grande interesse que não são binários. Assim, quando
estudamos os valores das energias emitidas por átomos que foram aquecidos ou sofreram
colisões, verificamos a existência de espectros discretos de energia. A figura 11 apresenta as
linhas do espectro de emissão do átomo de hidrogênio na parte do visível. Este é o átomo mais
simples existente, que é constituído por um elétron e um próton.
Toda teoria física possui um conjunto de postulados, isto é, afirmações sem demonstração
que são supostas verdadeiras, de que decorrem consequências que devem estar de acordo com
fenômenos naturais observados e com resultados experimentais determinados. Para a MQ não
relativística não é diferente podendo-se dizer, no mínimo, em favor desta teoria, que ela apresenta
um pequeno número de suposições e conduz, com enorme sucesso, a resultados observados – a
maioria dos quais surpreendentes – para sistemas microscópicos (e alguns nem tanto). É,
portanto, uma excelente teoria física no seu domínio de validade.
Podemos verificar (como no caso do experimento de dupla fenda com elétrons) que a
superposição de estados quânticos resulta em um novo estado quântico, mas esta verificação não
constitui uma prova de tal propriedade. Por isto, na origem da MQ se encontra (sem
demonstração) a afirmação: os estados de um sistema quântico satisfazem o princípio da
superposição linear. É importante salientar que esta propriedade permite a construção de
inúmeros estados para o mesmo sistema ou objeto, a partir da existência de apenas alguns. Na
prática esta propriedade gera várias situações físicas interessantíssimas e, ao mesmo tempo,
intrigantes. Como exemplo, temos o efeito não-local do Emaranhamento Quântico, que pode
conectar sistemas separados por distâncias muito grandes.
No experimento de dupla fenda, como vimos, o estado F F1 F2 é o responsável
pelo padrão de interferência no segundo anteparo da figura 8. Observemos que tanto F1 como 2
F1 ou c F1 (c, um número qualquer real ou complexo), descrevem o mesmo estado do elétron,
qual seja o da localização no segundo anteparo, do objeto caracterizado pela passagem pela
fenda superior. Por isto, em MQ é usual denotar os estados por vetores unitários, isto é, vetores
de módulo (ou comprimento) igual a 1 (um). Neste caso, se F1 e F2 são vetores unitários, F
não é unitário e por isto costumamos representar a superposição da situação da experiência de
dupla fenda para objetos quânticos, quando a fonte está disposta simetricamente em relação às
fendas, por
1
F1 F2 . Na superposição de estados, cada conjunto de coeficientes
2
(chamados amplitudes de probabilidade) gera um estado particular.
168
e . Um tal elétron deste experimento pode estar, por exemplo, no estado
1
.
2
Exercício 1: Agora que entendemos o que significa “estado de um objeto ou sistema”, apresente
dois exemplos de sua livre escolha de objeto (ou sistema) e de três estados diferentes de cada
um.
Exercício 2: Examine uma caneta que você possui. Descreva um estado desta caneta, da
maneira mais completa que conseguir. Escreva e traga a descrição e a caneta para a aula. Vamos
fotografar a caneta e verificar quão cuidadoso (minucioso) você foi ao descrever o estado da
caneta.
169
Objetos quânticos
Medições em MQ
Como se pode, então, conhecer o estado de um sistema quântico? Tanto para objetos
clássicos, como para quânticos, conhecer o seu estado implica em medir as grandezas físicas que
caracterizam o objeto em uma dada instância. A medida inclui a observação feita ou simplesmente
por uma pessoa ou com o auxílio de algum equipamento. Ocorre, porém, aí, uma grande diferença
entre a consideração de estados de sistemas clássicos e estados de sistemas quânticos.
Enquanto para sistemas clássicos, medidas das grandezas físicas realizadas com instrumentos e
de modo adequados não mudam o estado do sistema, no caso quântico isto não ocorre na maioria
das vezes e não por defeitos de projeto ou uso inadequado de medidores.
De fato, as medidas de grandezas físicas que caracterizam o estado de um objeto, em
geral modificam o estado do objeto quântico.
Veja-se, por exemplo, o que ocorre na experiência de dupla fenda para elétrons, em que
se tem um padrão de contagens no segundo anteparo muito parecido ao padrão de interferência
do experimento com ondas. A figura de interferência é obtida ao se manter as duas fendas do
primeiro anteparo abertas simultaneamente; se nos perguntarem por qual fenda os elétrons
passaram não saberemos responder, pois se fechada alternadamente cada uma das fendas, o
padrão de interferência não ocorre.
Quem sabe, então, se mantendo as duas fendas abertas, mas observando a região entre
os dois anteparos (ou seja, a região atrás do primeiro anteparo), seria possível verificar por qual
das duas fendas o elétron passou? Poderíamos, por exemplo, usar uma fonte luminosa para isto?
Essa ideia foi usada, mas novamente a figura de interferência não se formou (figura 12). É como
se o elétron soubesse que estava sendo observado e, por isso, resolveu comportar-se de forma
diferente.
Figura 12. Padrão de contagens no experimento de dupla fenda para elétrons com fonte de luz.
Na verdade, isto não tem qualquer relação com uma possível capacidade racional do
elétron de perceber que o observam. O mais correto é considerar que a medida é uma operação
170
que, quase sempre, muda o estado do objeto quântico. No exemplo acima, o clarão indica que o
elétron colidiu com um fóton do feixe luminoso, sofrendo espalhamento, ou seja, mudando seu
estado. (Ver simulação em “PhET”.)
Reflita: Por que a presença da fonte luminosa atrás das fendas provocou um resultado diferente
no segundo anteparo?
Exercício: Procure algum (outro) exemplo de medida de uma propriedade de sistemas quânticos
que modifique o estado do sistema.
Algumas medidas, contudo, podem não mudar o estado do sistema quântico. Retomando
o experimento de Stern-Gerlach sabe-se que (após passar pelo campo magnético inhomogêneo)
ao serem registrados no anteparo, os átomos de prata estarão ou no estado de “spin-para-cima”
ou no estado de “spin-para-baixo”. Se submetermos logo após a primeira medida o feixe
caracterizado pelo estado de “spin-para-cima” a um segundo campo magnético, idêntico ao
primeiro, apontando na mesma direção, todos os átomos do feixe permanecerão no estado de
“spin-para-cima”. Neste caso, a medida não modificou o estado do sistema. Ou seja, após passar
pelo primeiro campo magnético inhomogêneo, os átomos daquele feixe estarão no estado de
“spin-para-cima” e uma segunda medida (imediatamente após a primeira) não alterará tal estado,
repetindo simplesmente o resultado da primeira.
Como trabalhar todos estes aspectos das operações sobre os objetos quânticos?
Examinemos uma situação clássica de operações sobre vetores do plano. Uma rotação de
90°, no sentido anti-horário, de v 2 da figura 5, por exemplo, transforma-o em v 1 . A operação
de rotação realizada pode ser simbolizada por um operador de rotação. Outro exemplo de
operação de interesse é aquele em que se projeta V sobre o eixo horizontal, transformando-o
em v 2 .
Exercício 1: Em Computação, conhece-se uma chave denominada NOT que transforma um dos
bits no outro. Represente isto por meio de operadores e vetores (kets).
Exercício 2: O que significa, em Computação Quântica, Â 0 0 1 ?
171
Sendo a operação de medida das grandezas físicas uma operação simbolizada por
operadores, estabelece-se uma correspondência entre grandezas físicas e operadores. Como
exemplos de grandezas físicas frequentemente determinadas para uma partícula quântica,
podemos citar a posição, o momento linear, a energia, o momento angular orbital e o momento
angular intrínseco (spin). Assim, a cada grandeza física corresponde um operador. Teremos,
então, operadores posição, energia, etc..
Na MQ, a operação de medição dos valores de uma grandeza física de um objeto é
representada com a atuação de um operador sobre o vetor de estado do objeto. Os operadores
em questão não são quaisquer; eles satisfazem a certas condições.
É importante saber que cada um dos operadores que representam grandezas físicas
satisfaz alguma equação do tipo B̂ b , com b real (ou seja, que existem vetores que
satisfazem a equação de autovalores) e que podemos, em princípio, determinar os diversos
valores (reais) de b e os vetores correspondentes.
Reflita 1: Como você obtém uma informação a respeito de um estado de um objeto quântico?
Reflita 2: Considerando o que foi exposto sobre a caracterização do estado de um objeto
quântico, parece-lhe aceitável salientar que o estado é o depositário dos valores das grandezas
físicas inerentes ao sistema?
Reflita: O que significa “valores contínuos” de uma grandeza física? E “valores discretos”?
Exercício 1: Apresente um exemplo de observável físico cujos autovalores são contínuos.
Exercício 2: Apresente um exemplo de observável físico cujos autovalores são discretos.
Sabemos como “manipular” estados, somando-os para obter outros estados, ou operando
sobre eles, estas ações resultando, em geral, em novos estados; ou, ainda, submetendo-os a
ações que não os modificam.
Exercício 1: Que informações você consegue obter dos estados de spin de um elétron que é
submetido a um experimento de Stern-Gerlach?
Exercício 2: Apresente dois estados de spin de um elétron diferentes, em que o primeiro estado
representa predominância de situações de spin-para-cima e o segundo, de situações de spin-para-
baixo.
Há, contudo, outros fatos surpreendentes, ainda não mencionados, que os sistemas
microscópicos revelam e que são incorporados aos postulados da MQ. Tomemos como exemplo o
espectro de energia do átomo de hidrogênio, que em uma primeira aproximação pode ser obtido
pelo modelo de Bohr. As linhas espectrais determinadas evidenciam a existência de vários
estados de energia possíveis para o elétron do átomo, quando ele está “ligado” ao núcleo.
A descrição quântica dessa diversidade espectroscópica, mesmo em um modelo bastante
simples, é surpreendentemente satisfatória e constitui-se em um dos grandes sucessos da MQ,
desde seus primórdios. Esta descrição, basicamente, consiste em estabelecer as soluções e os
172
autovalores de uma equação de autovalores de um operador ( Ĥ ) associado à energia total do
elétron do átomo. Ĥ , neste modelo simples, nada mais é do que a soma de um operador
associado à energia cinética do elétron e de um operador associado à energia potencial do
elétron, supondo o núcleo praticamente inerte, o que é aceitável face à grande razão entre a
3
ordem de grandeza da massa do núcleo e a da massa do elétron (~10 ).
Este modelo, embora muito simples, reproduz com concordância mais do que razoável
vários dos valores obtidos experimentalmente e que evidenciaram:
i) a existência de valores discretos de energia para o elétron do átomo (e portanto, para
alguns sistemas quânticos);
ii) o fato, surpreendente, de os resultados de medida sempre resultarem em algum dos
autovalores do operador correspondente.
Este último aspecto, que é verificado não apenas para resultados de medidas da energia
do átomo de hidrogênio, mas para medidas das mais diversas grandezas físicas conhecidas,
qualquer que seja o estado em que se encontrem, conduz a um dos principais postulados da MQ,
como veremos adiante e não encontra paralelo no trato dos sistemas clássicos, até porque se
torna trivial para valores contínuos dos observáveis. O que se depreende de tais resultados é que
os únicos valores possíveis resultantes da medida de alguma grandeza física são os
autovalores do operador que corresponde à referida grandeza.
Vamos considerar agora estados de um objeto quântico que são caracterizados por
valores de duas grandezas físicas. Isto significa que a equação de autovalores deve ser satisfeita
com os dois operadores correspondentes às grandezas, ou seja B̂ b , mas também
C c . Então o estado é autoestado dos dois operadores e as grandezas físicas
correspondentes serão ditas compatíveis.
A compatibilidade de dois observáveis nos leva a dizer que algumas informações relativas
ao estado do sistema podem ser fornecidas “simultaneamente”. Isto significa que o estado do
objeto pode ser caracterizado por valores das duas grandezas físicas, por exemplo, a energia
cinética e a projeção de spin de um elétron. Quando dois observáveis são incompatíveis, a medida
dos valores de um deles em geral afeta a determinação dos valores do outro. Logo, não existe
estado que possa ser caracterizado pelos valores das duas grandezas. (Não existe estado que
seja autoestado comum aos dois operadores que representam tais grandezas físicas.) Por
exemplo, posição e momento linear na mesma direção.
Quando utilizamos a notação de Dirac indicamos, em geral, no ket, os valores de todas as
grandezas físicas compatíveis de um dado conjunto. Assim, o estado do elétron do átomo de
hidrogênio que tem a maior energia de ligação e cuja projeção de spin na direção de um campo
magnético inhomogêneo (direção z ) é máxima, é caracterizado por E1 13,6 eV, s z .
2
Contudo, se nos perguntarmos a que distancia do núcleo está o elétron, veremos que o ket em
questão não apresenta esta informação. A razão para isto não é medição incompleta das
propriedades físicas do elétron, ou seja, não é que simplesmente tenhamos deixado de medir a
posição do elétron. Esta “ausência de informação” deriva do fato de a energia e a posição do
elétron do átomo de hidrogênio serem observáveis incompatíveis. Isto implica em que, medir
primeiro a posição do elétron e depois sua energia de ligação, não resulta em geral nos mesmos
valores obtidos quando se mede primeiro a energia de ligação e depois a posição do elétron.
Costumamos, neste caso, dizer que há uma relação de incerteza entre tais observáveis (Princípio
de Incerteza de Heisenberg).
Em resumo, pode-se dizer que o estado de um sistema quântico é o conjunto das
informações sobre os valores das grandezas físicas compatíveis (em um determinado instante de
tempo, segundo Schrödinger). O estado será completamente conhecido em determinado instante
de tempo, se todos os observáveis compatíveis (independentes) do sistema forem arrolados e
seus valores no dado instante de tempo forem determinados.
173
Já vimos como são diferentes do que esperaríamos alguns dos comportamentos dos
objetos quânticos, como os átomos, os elétrons e os fótons. Vimos também que, pela combinação
linear de estados de tais objetos, podemos formar novos estados destes objetos. Esta não é uma
propriedade incorporada à Física Clássica e, a partir dela, muitos resultados não considerados
classicamente começam a surgir. Uma das consequências mais surpreendentes da propriedade
de superposição de estados em Mecânica Quântica é a da possibilidade de existirem Estados
Emaranhados, possibilidade esta comprovada já experimentalmente.
O que são, então, estes Estados Emaranhados? Estados emaranhados são estados de
dois ou mais objetos (quânticos), que implicam em uma relação muito significativa entre os
estados individuais dos objetos, de tal modo que não conseguimos separar uns dos outros.
Vamos apresentar um exemplo para que fique bem claro o que são tais estados.
Se tivermos dois átomos em posições conhecidas, A e B, podemos ter o átomo 1 na
posição A e o átomo 2 na posição B ( estado A 1 B 2 ) , mas podemos também ter o átomo 1 na
posição B e o átomo 2 na posição A (estado B 1
A 2
). Logo, pela propriedade de combinação
linear é possível encontrar os átomos no estado A 1B 2
B 1
A 2
, ou no estado
A 1
B 2
B 1
A 2
, entre muitas outras possibilidades.
Repare que, para estes estados combinados, não podemos mais dizer que o átomo 1 está
no estado A e o átomo 2 está no estado B (ou vice-versa). Há uma possibilidade finita (de
cinqüenta por cento nos exemplos dados) de o átomo 1 estar no estado A e também de estar no
estado B. Mas se medirmos a posição do átomo 1 e o encontrarmos em A, saberemos que o
átomo 2 estará em B mesmo sem medirmos a posição do átomo 2. Os estados dos átomos 1 e 2
estão então relacionados, emaranhados. Determinar o estado de um deles (na medida) nos
informa sobre o estado do outro, sem necessidade de medição sobre este último.
Repare que o estado do conjunto dos dois átomos foi expresso como soma de estados em
que os átomos estão separados (um deles em A e o outro em B), mas o estado do conjunto não é
separável (tanto o átomo 1 como o átomo 2 podem estar em A e em B). O estado do conjunto não
é separável, é emaranhado.
Exercício: Quais dos estados a seguir estão emaranhados? Justifique suas respostas.
a) 1 A 1 A 2 B 1 A 2
b) B 1 B 2
A 1
A 2
c) B 1 B 2
B 1
A 2
d) B 1
A 2
A 1
B 2
Esta propriedade parece interessante, mas o exemplo dado ainda não trouxe grande
surpresa para vocês, na verdade, porque já se acostumaram com objetos quânticos que podem
estar tanto na posição A como na B. Vejamos então um exemplo mais dramático.
Consideremos agora dois elétrons. Sabemos que os elétrons têm spin ½ e que a projeção
do spin em uma dada direção apresenta dois valores que podem ser usados para caracterizar os
estados como e .
Parecido ao exemplo dos átomos acima, podemos pensar que o sistema dos dois elétrons
pode estar no estado 1 2 , ou no estado 1 2 , ou ainda no estado 1 2 ou até no
estado 1
2
. Todos estes estados são separáveis.
Mas não paramos por aí. Podemos ter várias combinações dos estados acima, como é o
caso da combinação C 1 2 1 2 . Agora, pensemos que, além da projeção de spin,
possamos informar que o elétron 1 está na posição A e o elétron 2 na posição B. Teremos, então,
um estado possível D A 1 B 2 A 1 B 2 .
Se os elétrons estiverem próximos um do outro, este estado talvez não nos cause
surpresa, mas se os elétrons estiverem muito afastados (por exemplo, a 300 quilômetros de
distância um do outro) quando medirmos a projeção de spin do elétron que está em A e
obtivermos “+”, saberemos que o elétron que está a 300 km dali, em B, tem projeção de spin “–”,
sem ter medido esta projeção!
Mesmo separados por uma distância tão grande os elétrons continuam correlacionados.
174
Um grupo liderado pelo físico austríaco Anton Zeilinger realizou um experimento que
mostrou que isto é possível. Eles trabalharam com pares de fótons emaranhados. Vários outros
grupos têm realizado com sucesso experimentos com estados emaranhados de dois objetos
quânticos.
Conforme o experimento do grupo de Zeilinger mostra, os estados emaranhados também
podem ser realizados com fótons polarizados. Imagine a situação em que um par de fótons possui
polarização emaranhada tal que sempre que um deles apresentar polarização vertical, o outro
apresentará polarização horizontal. O estado de polarização do sistema quântico pode ser, por
exemplo, , onde H e V denotam, respectivamente, as polarizações
HA V B V A HB
horizontal e vertical dos fótons e A e B denotam cada um dos fótons. Agora imagine que
tenhamos dois observadores, Alice e Bob, cada um observando um dos fótons. Há uma
probabilidade de 50% de Alice obter uma ou a outra das polarizações, assim como Bob. Porém,
quando Alice efetuar a medida da polarização de um dos fótons, qualquer que seja o valor
encontrado na medida, o fóton que está aos cuidados de Bob apresentará a polarização contrária.
Como o estado do sistema é composto pela superposição linear de estados de dois fótons, cada
qual com probabilidade finita de “existir”, ou seja, como o estado do sistema abrange as duas
possibilidades, a medida da polarização retilínea dos fótons resultará obrigatoriamente em um dos
autoestados de polarização retilínea que compõem o estado do sistema. Isso ajuda a evidenciar
que a informação não viajou mais rápido do que a luz, porque os estados já estavam “pré-
definidos”.
Pense: Por que o emaranhamento pode ser considerado uma simples aplicação do princípio de
superposição linear?
Exercício 1: Crie um estado emaranhado com estados de projeção de spin para elétrons.
Exercício 2: Crie um estado emaranhado com estados de polarização retilínea para fótons.
175
Segurança na Transmissão de Informação: a Criptografia Quântica
4
Extraído de Vieira, C. L.; Oliveira, I. S. A revolução dos q-bits. Jorge Zahar, 2009.
5
Monitoramento passivo é aquele em que alguém não pretende ser descoberto ao tentar interceptar a
mensagem.
176
Tamanho do número Tempo de fatoração Tempo de fatoração
(em bits) (computador clássico) (computador quântico)
512 4 dias 34 segundos
1024 10 mil anos 4,5 minutos
2048 10 mil bilhões de anos 36 minutos
26
4096 10 anos 4,8 horas
Tabela 1: Previsão para o tempo de fatoração de números por
computadores clássicos e por computadores quânticos.
Reflita: Por que a criptografia quântica possui segurança incondicional contra ataques de
monitoramento passivo?
Exercício: Tente descobrir qual a mensagem escondida nas sentenças criptografadas abaixo.
a) Bubdbsfnpt bp bnboifdfs. b) moB aid, slunoa ed QM. c) 01-20-01-03-01-18.
O Protocolo BB84
Dos protocolos citados, o mais simples é o protocolo BB84, proposto por C. H. Bennett e
G. Brassard, o primeiro dos protocolos quânticos a ser implementado.
O protocolo transmite fótons polarizados por um canal quântico e utiliza também um canal
clássico de comunicação (por exemplo, Internet ou telefone). O canal clássico não afeta a
segurança incondicional do processo porque é usado para conferência de alguns dados a serem
descartados posteriormente.
Suponhamos que Alice envie os fótons e Bob os receba. Antes de iniciar o processo, Alice
e Bob escolhem as bases (compostas por dois estados ortogonais de polarização) a usar na
transmissão e recepção dos fótons, p. ex., as da figura 15, apresentadas por Bennett e Brassard.
A base A (retilínea) mede com certeza a polarização dos fótons que apresentam
polarização horizontal ou vertical, enquanto a base B mede com certeza a polarização dos fótons
que apresentam polarizações diagonais, a 45° em relação à base A.
Base A Base B
Figura 15. Representação das bases adotadas por Alice e Bob para a transmissão dos fótons.
177
também aleatoriamente as bases para a leitura das polarizações. Bob só pode executar a medida
uma vez para cada fóton, tendo em vista o colapso do estado e a impossibilidade de clonar um
fóton isolado.
Eva sabe, inicialmente, que os fótons estão sendo enviados com polarização dada pelas
bases A ou B. Assim como Bob, ela escolhe aleatoriamente seus polarizadores ao interceptar os
fótons. Estatisticamente, há uma probabilidade de Eva acertar, no máximo, 75% dos bits enviados.
Os fótons interceptados devem ser reenviados e no reenvio há a probabilidade mínima de 25%
dos fótons estarem com a polarização errada devido à sua medição. Assim, Bob receberá uma
chave em que os dados diferem pelo menos em 25% dos da chave original enviada por Alice,
embora ele não saiba isso ainda. Contudo, ao conferir seus dados com os de Alice, ele percebe
que, devido a uma alta taxa de erros, alguém está tentando espionar os dados transmitidos. Em
geral, os erros de transmissão são baixos (inferiores a 3%) e são devidos a ruídos no canal
quântico ou a desalinhamento dos polarizadores. Por que Eva não consegue interceptar o envio
de Alice e reenviá-lo corretamente para Bob, sem que percebam sua interferência no processo?
Como não é possível clonar um quantum individual, Eva não pode duplicar o estado quântico do
fóton recebido, medir sobre um dos fótons e reenviar o outro para Bob.
Reflita 1: Por que tal processo de criptografia só é seguro contra ataques de monitoramento
passivo?
Reflita 2: Por que só é possível enviar um bit por fóton?
178
A empresa QinetiQ consegue transferir chaves quânticas pelo ar por 23 km em topos de
montanhas, regiões de baixa turbulência atmosférica. A Agência Espacial Europeia está investindo
para criar um satélite de baixa órbita que possibilite a comunicação por 1.000 km. Os EUA
financiam um projeto de US$ 4 milhões para interligar as Universidades de Harvard e Boston e a
BBN Technologies, em Massachusetts.
Estima-se que em breve seja possível utilizar tais protocolos em escala industrial.
Reflita: Você considera possível utilizar átomos ao invés de fótons em Criptografia Quântica? Que
aplicações isso poderia trazer?
179
APÊNDICE II
6) Em vários campos da Física fala-se em um Experimento de Dupla Fenda. Será que você já
ouviu falar alguma coisa a respeito? Se já ouviu, conte o que sabe sobre isto.
7) Você considera importante conhecer uma teoria que possui inúmeras implicações
tecnológicas, algumas delas em equipamentos e aparelhos muito em voga, tais como células
fotoelétricas, mp3 player, cartões de memória, entre outros? Por quê?
8) Se você já ouviu falar em Mecânica Quântica, quais assuntos dela você citaria?
9) Você já ouviu falar em (Albert) Einstein, (Max) Planck, (Werner) Heisenberg ou (César)
Lattes? A respeito de quais assuntos?
10) Você já ouviu falar em Acelerador de Partículas, Bomba Atômica, Chip, Nanotecnologia,
Radiação Eletromagnética, Teletransporte ou Tunelamento? Sabe informar o que significam estas
denominações?
180
APÊNDICE III
Avaliações escritas
Primeira avaliação
1) Explique, com suas palavras, qual o resultado da soma de duas ondas e apresente um
exemplo.
2) Explique, com suas palavras, qual o resultado da multiplicação de um vetor do espaço real
por um número real e apresente um exemplo.
3) Analise as ondas representadas na primeira coluna, efetue a superposição das mesmas e
relacione corretamente com as da segunda coluna.
(a) ( )
(b) ( )
(c) ( )
a) v + w b) 2 v + w c) – v + 2 w
5) Que razões você citaria para justificar a introdução de uma teoria diferente da Mecânica
Clássica, como é a chamada Mecânica Quântica?
6) Cite duas ou mais aplicações da Mecânica Quântica, sobre as quais tenha escutado falar ou
lido algo.
181
Segunda avaliação
1) Analise o objeto tradicionalmente descrito pela Física Clássica proposto pelo professor e
caracterize o mesmo. A seguir, descreva um estado possível deste objeto.
5) Em Mecânica Quântica, existem algumas grandezas físicas (observáveis) que são ditas
incompatíveis, ou seja, não podem caracterizar o mesmo estado do objeto. Assim, responda os itens
a seguir.
a. É possível caracterizar o estado de um elétron pela posição no espaço (coordenadas x, y e z, por
exemplo)?
b. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua posição e sua energia?
c. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua projeção de spin em uma direção e sua
posição?
7) Qual dos estados a seguir pode ser atribuído a elétrons que, submetidos ao experimento de
Stern-Gerlach, apresentam resultados como os indicados na figura abaixo? Justifique sua escolha.
a) c)
b) d)
182
Terceira avaliação
2) Quais dos estados a seguir são exemplos de estados emaranhados de sistemas quânticos?
Justifique. As letras H e V lembram observáveis de algum objeto quântico a você?
a) 1 H 1 H 2 V 1 V 2 c) 3 V 1 H 2 H 1 V 2 e) 5 H 1 V 2
b) 2 H 1 H 2
H 2
H1 d) 4 V 1
V 2
H1V 2
f) 6 H 1 V 2
3) Escreva dois estados distintos de um par de elétrons emaranhados com projeções de spin e
.
5) Por que o emaranhamento quântico pode ser considerado como uma aplicação simples da
superposição linear?
6) Codifique a mensagem “superposição linear” e explique que chave criptográfica você utilizou em
tal processo.
183
APÊNDICE IV
Questionário de opiniões
4) Que tópicos do curso você considerou mais fáceis? De quais mais gostou?
5) Que tópicos do curso você considerou mais difíceis? De quais menos gostou?
8) Você considera a Mecânica Quântica uma teoria tipo “ficção cientifica”, “nada a ver com a
realidade física”, ou considera que ela consegue descrever “elementos de realidade” que a Física
Clássica não consegue?
184
APÊNDICE V
Testes rápidos
2) Mil fótons polarizados na horizontal ( ) são submetidos a um polarizador a 45° em relação a sua
orientação. Qual o resultado da passagem desses fótons pelo polarizador?
185
APÊNDICE VI
20112
20119
20122
20128
20132
20211
186
20214
20223
20237
187
Turmas de terceira série
Aluno Mapa
20301
20302
20305
20312
20314
188
20315
20319
20321
20322
20324
189
20332
20404
20415
20416
20511
20516
190
20517
191
APÊNDICE VII
20112
20119
20122
20128
192
20132
20211
20214
20223
20237
193
Turmas de terceira série
Aluno Mapa
20301
20302
20312
20314
20315
194
20316
20319
20321
20322
195
20324
20332
20404
20415
196
20416
20511
20516
20517
197
APÊNDICE VIII
Alguns conceitos atribuídos às questões das avaliações escritas e dos testes rápidos
1ª avaliação escrita
Questão
Aluno 1 2 3 4 5 6
10104 2 3 3 2 3 2
10206 3 3 3 2 1 1
10303 3 2 3 3 2 3
20125 3 2 3 3 3 2
20209 3 3 3 2 3 3
20335 3 2 3 3 2 2
2ª avaliação escrita
Questão
Aluno 1 2 3 4 5 6 7
10118 3 3 3 2 3 3 3
10305 2 1 3 3 3 3 3
10316 3 2 3 3 3 3 0
20121 3 1 3 0 2 1 1
20211 3 1 2 3 3 3 3
20403 0 3 2 3 3 3 2
3ª avaliação escrita
Questão
Aluno 1 2 3 4 5 6
10133 0 1 3 1 1 3
10202 1 3 3 1 3 3
10316 3 2 3 3 1 3
20116 1 2 3 3 0 3
20209 2 3 3 3 2 3
20316 3 2 2 2 3 3
Testes rápidos
Teste 1 Teste 2 Teste 3 Teste 4
Aluno 1 2 1 2 1 1 2
20125 1 3 3 3 3 3 3
20226 3 3 0 3 3 3 3
20329 3 3 3 3 3 3 1
198
199