2015, Rocha

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

INSTITUTO DE FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE FÍSICA
DOUTORADO EM ENSINO DE FÍSICA

INSERINDO CONCEITOS E PRINCÍPIOS DE MECÂNICA QUÂNTICA NO ENSINO MÉDIO:


ESTADOS QUÂNTICOS E SUPERPOSIÇÃO LINEAR DE ESTADOS

TESE DE DOUTORADO

CARLOS RAPHAEL ROCHA

PORTO ALEGRE
2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE FÍSICA
DOUTORADO EM ENSINO DE FÍSICA

INSERINDO CONCEITOS E PRINCÍPIOS DE MECÂNICA QUÂNTICA NO ENSINO MÉDIO:


ESTADOS QUÂNTICOS E SUPERPOSIÇÃO LINEAR DE ESTADOS

CARLOS RAPHAEL ROCHA

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Ensino de Física do Instituto
de Física da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, sob orientação do Prof. Dr.
Marco Antonio Moreira e co-orientação da Profa.
Dra. Victoria Elnecave Herscovitz, como requisito
parcial à obtenção do título de Doutor em Ensino
de Física.

PORTO ALEGRE
2015
Carlos Raphael Rocha

INSERINDO CONCEITOS E PRINCÍPIOS DE MECÂNICA QUÂNTICA NO ENSINO MÉDIO:


ESTADOS QUÂNTICOS E SUPERPOSIÇÃO LINEAR DE ESTADOS

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Ensino de Física do Instituto
de Física da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, sob orientação do Prof. Dr.
Marco Antonio Moreira e co-orientação da Profa.
Dra. Victoria Elnecave Herscovitz, como requisito
parcial à obtenção do título de Doutor em Ensino
de Física.

Aprovado em 16 de novembro de 2015.

Banca Examinadora

__________________________________________
Dr. (Pres.) Marco Antonio Moreira (UFRGS)

__________________________________________
Dr. Nelson Studart Filho (UFABC)

__________________________________________
Dr. Guilherme Frederico Marranghello (UNIPAMPA)

__________________________________________
Dr. Magno Valério Trindade Machado (UFRGS)

__________________________________________
Dra. Rejane Maria Ribeiro Teixeira (UFRGS)

ii
Aos meus pais Beto e Rosane, por terem
me ensinado o valor da educação e pelo
apoio durante toda minha vida.

iii
AGRADECIMENTOS

À Elza, minha esposa, que me apoiou nos momentos mais conturbados e mais tensos
do doutorado.

Ao professor Marco Antonio Moreira, meu orientador, que me ajudou a trilhar os


devidos caminhos em todas as etapas da pesquisa.

À professora Victoria Elnecave Herscovitz, minha co-orientadora, por todos os


ensinamentos e por sua imensa paciência no meu aprendizado.

Ao professor e amigo Antônio João Fidélis por sua imensa colaboração na aplicação
deste projeto, na discussão das atividades propostas e pelos momentos de descontração.

A todos os meus amigos da pós-graduação, em especial ao Paulo e ao Alex, pelas


frutíferas discussões e pela grande contribuição neste trabalho.

Em especial, ao meu irmão Ramon, que me apoiou (e cobrou) em todos os momentos.


Por este mesmo motivo, agradeço aos amigos Alexandre, Gordo, Guilherme, Isabele, Luiz e
Maicon.

Aos amigos e professores do IFSC de Jaraguá do Sul e do Departamento de Física da


UDESC, em especial a Catia, Clodoaldo, Juliano, Julio, Valmor e Viviane do IFSC e Alex,
Fragalli e Zanon da UDESC, por terem me apoiado direta e indiretamente na execução deste
trabalho e ajudado na realização deste passo da formação acadêmica.

Aos servidores, diretores e professores da Escola de Educação Básica Senador


Rodrigo Lobo, de Joinville, e do Instituto Federal Catarinense, de Araquari, por terem cedido o
espaço para a realização desta pesquisa.

Aos alunos, tanto das turmas pesquisadas como das universidades em que trabalhei,
por terem me instigado e criticado este trabalho de forma construtiva durante sua execução.

iv
“Só nos entregamos a problemas que
julgamos poder resolver com os recursos
de que dispomos.”

Rubem Alves

v
ÍNDICE

LISTA DE FIGURAS................................................................................................................. ix
LISTA DE TABELAS................................................................................................................ xi
LISTA DE ABREVIATURAS....................................................................................................... xii
RESUMO............................................................................................................................... xiii
ABSTRACT............................................................................................................................ xiv

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO.................................................................................................... 1
1. A atualização curricular no Ensino Médio brasileiro................................................. 1
2. O ensino de Mecânica Quântica.................................................................................. 2
3. Por que ensinar Mecânica Quântica no Ensino Médio?............................................ 3

CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA................................................................................. 6


1. Introdução...................................................................................................................... 6
2. Trabalhos anteriores de revisão da literatura............................................................ 6
2.1. Revisão de Ostermann e Moreira sobre tópicos de FMC............................................ 6
2.2. Revisão de Greca e Moreira sobre o ensino de MQ.................................................... 7
2.3. Revisão de Pereira e Ostermann sobre tópicos de FMC............................................. 8
2.4. Revisão de Pantoja, Moreira e Herscovitz sobre pesquisa em ensino de MQ............ 9
2.5. Revisão de Silva e Almeida sobre o ensino de MQ no EM.......................................... 10
3. Uma nova revisão.......................................................................................................... 11
3.1. Propostas didáticas...................................................................................................... 12
3.2. Propostas didáticas implementadas............................................................................. 14
3.3. Estudos sobre concepções.......................................................................................... 18
3.4. Análise de material didático......................................................................................... 22
3.5. Estudos de formação continuada................................................................................. 23
4. Considerações acerca da revisão da literatura.......................................................... 23

CAPÍTULO III – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: MECÂNICA QUÂNTICA.......................................... 26


1. Introdução...................................................................................................................... 26
2. Postulados da Mecânica Quântica.............................................................................. 27
2.1. Primeiro Postulado: Estado de um Sistema Quântico................................................. 28
2.2. Segundo Postulado: Grandeza Física e Operador...................................................... 29
2.3. Terceiro Postulado: Valores de Medidas..................................................................... 30
2.4. Quarto Postulado: Probabilidade de Ocorrência dos Valores de Medida.................... 31
2.5. Quinto Postulado: Colapso do Estado......................................................................... 31
2.6. Sexto Postulado: Evolução Temporal dos Estados Quânticos.................................... 32
3. Situações de aplicação dos postulados..................................................................... 33
3.1. Experimentos de Dupla Fenda..................................................................................... 33
3.2. Experimento de Stern-Gerlach..................................................................................... 36
3.3. Polarização da Luz....................................................................................................... 37
3.4. Emaranhamento Quântico........................................................................................... 38
3.5. Criptografia Quântica................................................................................................... 39
3.6. Outros exemplos de aplicação..................................................................................... 41
4. Implicações para o ensino........................................................................................... 43

CAPÍTULO IV – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA.................................................. 44


1. Introdução...................................................................................................................... 44
2. A teoria da aprendizagem significativa de David Ausubel........................................ 44
2.1. Aprendizagem significativa........................................................................................... 44
2.2. Aprendizagem mecânica.............................................................................................. 45
2.3. Organizadores prévios................................................................................................. 46
2.4. O processo de assimilação.......................................................................................... 47
2.5. Reconciliação integradora e diferenciação progressiva............................................... 48
2.6. Recursos para promoção da aprendizagem significativa............................................. 49
3. A teoria dos campos conceituais de Gérard Vergnaud............................................. 50
3.1. Conceitualização.......................................................................................................... 51
3.2. Esquema...................................................................................................................... 51
3.3. Conceitos..................................................................................................................... 53

vi
3.4. Campos conceituais..................................................................................................... 55
4. Implicações para o ensino........................................................................................... 56

CAPÍTULO V – METODOLOGIA DO ENSINO E DA PESQUISA....................................................... 59


1. Introdução...................................................................................................................... 59
2. Questões de pesquisa.................................................................................................. 59
3. Metodologia de ensino................................................................................................. 60
3.1. Público-alvo e descrição das aulas.............................................................................. 60
3.2. Texto de apoio.............................................................................................................. 62
4. Metodologia da pesquisa............................................................................................. 64
4.1. Instrumentos de coleta de dados................................................................................. 64
4.1.1. Primeira etapa da pesquisa....................................................................................... 65
4.1.2. Segunda etapa da pesquisa...................................................................................... 66
5. Análise dos dados......................................................................................................... 67

CAPÍTULO VI – ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.................................... 69


1. Introdução...................................................................................................................... 69
2. Primeira etapa da pesquisa.......................................................................................... 69
2.1. Questionário de conhecimentos prévios...................................................................... 69
2.2. Avaliações escritas....................................................................................................... 72
2.2.1. Primeira avaliação..................................................................................................... 72
2.2.1.1. Análise quantitativa................................................................................................ 72
2.2.1.2. Análise qualitativa.................................................................................................. 73
2.2.1.3. Considerações sobre a primeira avaliação............................................................ 77
2.2.2. Segunda avaliação.................................................................................................... 77
2.2.2.1. Análise quantitativa................................................................................................ 78
2.2.2.2. Análise qualitativa.................................................................................................. 79
2.2.2.3. Considerações sobre a segunda avaliação........................................................... 86
2.2.3. Terceira avaliação..................................................................................................... 86
2.2.3.1. Análise quantitativa................................................................................................ 87
2.2.3.2. Análise qualitativa.................................................................................................. 88
2.2.3.3. Considerações sobre a terceira avaliação............................................................. 91
2.3. Questionário de opiniões.............................................................................................. 92
2.4. Entrevistas com as turmas........................................................................................... 95
2.5. Síntese da aplicação na primeira etapa....................................................................... 95
3. Segunda etapa da pesquisa......................................................................................... 96
3.1. Mapas mentais iniciais................................................................................................. 96
3.2. Questionário de conhecimentos prévios...................................................................... 98
3.3. Testes rápidos.............................................................................................................. 104
3.4. Avaliações escritas....................................................................................................... 107
3.4.1. Primeira avaliação..................................................................................................... 108
3.4.1.1. Análise quantitativa................................................................................................ 108
3.4.1.2. Análise qualitativa.................................................................................................. 109
3.4.1.3. Considerações sobre a aplicação da primeira avaliação....................................... 115
3.4.2. Segunda avaliação.................................................................................................... 116
3.4.2.1. Análise quantitativa................................................................................................ 116
3.4.2.2. Análise qualitativa.................................................................................................. 117
3.4.2.3. Considerações sobre a aplicação da segunda avaliação...................................... 122
3.4.3. Terceira avaliação..................................................................................................... 123
3.4.3.1. Análise quantitativa................................................................................................ 123
3.4.3.2. Análise qualitativa.................................................................................................. 124
3.4.3.3. Considerações sobre a aplicação da terceira avaliação........................................ 127
3.5. Mapas mentais finais.................................................................................................... 128
3.6. Questionário de opiniões.............................................................................................. 131
3.7. Entrevistas com alunos................................................................................................ 134
3.8. Síntese da aplicação na segunda etapa...................................................................... 137
4. Diário de bordo.............................................................................................................. 137
5. Discussão acerca da aplicação do curso nas duas etapas da pesquisa................ 139

CAPÍTULO VII – CONCLUSÕES................................................................................................ 142

vii
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................. 149

APÊNDICES........................................................................................................................... 158
APÊNDICE I – TEXTO DE APOIO.............................................................................................. 159
APÊNDICE II – QUESTIONÁRIO DE CONHECIMENTOS PRÉVIOS................................................... 180
APÊNDICE III – AVALIAÇÕES ESCRITAS................................................................................... 181
APÊNDICE IV – QUESTIONÁRIO DE OPINIÕES........................................................................... 184
APÊNDICE V – TESTES RÁPIDOS............................................................................................. 185
APÊNDICE VI – M APAS MENTAIS INICIAIS................................................................................ 186
APÊNDICE VII – M APAS MENTAIS FINAIS................................................................................. 192
APÊNDICE VIII – ALGUNS CONCEITOS ATRIBUÍDOS ÀS QUESTÕES DAS AVALIAÇÕES ESCRITAS E
DOS TESTES RÁPIDOS............................................................................................................ 198

viii
LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Esquema de um experimento de dupla fenda com fonte, anteparo com duas
fendas e anteparo de registro........................................................................................... 33
Figura 2. Padrão de interferência obtido no experimento de dupla fenda com ondas
eletromagnéticas.............................................................................................................. 34
Figura 3. Experimento de dupla fenda com partículas clássicas...................................... 34
Figura 4. Experimento de dupla fenda com partículas quânticas..................................... 35
Figura 5. Esquema do experimento de Stern-Gerlach..................................................... 36
Figura 6. (a) Polarizador na direção (b) Polarizador na direção ................................. 37
Figura 7. Representação das bases adotadas por Alice e Bob para a transmissão de
fótons................................................................................................................................ 40
Figura 8. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10206-10232; (b) 10207-10233; (c) 10316-10319.............................. 74
Figura 9. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10305-10309; (b) 10308-10324........................................................... 74
Figura 10. Respostas à quarta questão da primeira avaliação pelos alunos 10225-
10229 da primeira etapa................................................................................................... 76
Figura 11. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10104-10113; (b) 10214-10222; (c) 10216-10227; (d) 10305-10309;
(e) 10314-10320............................................................................................................... 76
Figura 12. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10216-10227; (b) 10230-10234; (c) 10303-10325............................................ 77
Figura 13. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na
primeira etapa da pesquisa.............................................................................................. 79
Figura 14. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10118; (b) 10124; (c) 10205; (d) 10212; (e) 10316............................. 80
Figura 15. Respostas à segunda questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10106; (b) 10118; (c) 10129; (d) 10210.............................................. 81
Figura 16. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10101; (b) 10133; (c) 10202; (d) 10218; (e) 10320............................. 83
Figura 17. Respostas à quarta questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10207; (b) 10305; (c) 10316; (d) 10319.............................................. 83
Figura 18. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10225; (b) 10316............................................................................................... 84
Figura 19. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10105; (b) 10119; (c) 10310.............................................................................. 85
Figura 20. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10119; (b) 10303; (c) 10312................................................................ 85
Figura 21. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10122; (b) 10124; (c) 10320................................................................ 88
Figura 22. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10202; (b) 10223; (c) 10230; (d) 10324.............................................. 89
Figura 23. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da
primeira etapa (a) 10111; (b) 10113; (c) 10215................................................................ 89
Figura 24. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10105; (b) 10112; (c) 10119; (d) 10316............................................................ 90
Figura 25. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira
etapa (a) 10113; (b) 10119; (c) 10210; (d) 10320............................................................ 91
Figura 26. Resposta à sexta questão da terceira avaliação pelo aluno da primeira
etapa 10133...................................................................................................................... 91
Figura 27. Mapas mentais iniciais dos alunos (a) 20316 e (b) 20417.............................. 97

ix
Figura 28. Respostas ao primeiro teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20133; (c)
20226; (d) 20234; (e) 20301; (f) 20321; (g) 20406; (h) 20514.......................................... 105
Figura 29. Respostas ao segundo teste rápido pelos alunos (a) 20102; (b) 20111; (c)
20211; (d) 20214; (e) 20329; (f) 20336; (g) 20413; (h) 20507.......................................... 106
Figura 30. Respostas ao terceiro teste rápido pelos alunos (a) 20116; (b) 20125; (c)
20215; (d) 20231; (e) 20316; (f) 20331; (g) 20416; h) 20517........................................... 107
Figura 31. Respostas ao quarto teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20125; (c)
20202; (d) 20229; (e) 20308; (f) 20315; (g) 20418; (h) 20521.......................................... 108
Figura 32. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20122; (b) 20207; (c) 20231; (d) 20321.............................................. 110
Figura 33. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20122; (b) 20128; (c) 20209; (d) 20418; (e) 20512............................ 111
Figura 34. Respostas à terceira questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20215; (b) 20219; (c) 20220; (d) 20335.............................................. 112
Figura 35. Respostas à quarta questão da primeira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20117; (b) 20125; (c) 20223............................................................... 113
Figura 36. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20111; (b) 20120; (c) 20122; (d) 20220; (e) 20224; (f) 20308; (g) 20316; (h)
20505; (i) 20513................................................................................................................ 114
Figura 37. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20116; (b) 20118; (c) 20122; (d) 20212; (e) 20219; (f) 20233; (g) 20316; (h)
20321; (i) 20414................................................................................................................ 115
Figura 38. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na
segunda etapa da pesquisa.............................................................................................. 117
Figura 39. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20107; (b) 20115; (c) 20232............................................................... 118
Figura 40. Resposta à segunda questão da segunda avaliação da segunda etapa pelo
aluno 20403...................................................................................................................... 118
Figura 41. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20107; (b) 20202; (c) 20205; (d) 20418.............................................. 119
Figura 42. Respostas à quarta questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20231; (b) 20333................................................................................ 120
Figura 43. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20121; (b) 20202; (c) 20203; (d) 20211; (e) 20305............................ 120
Figura 44. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20106; (b) 20109; (c) 20120; (d) 20231; (e) 20411........................................... 121
Figura 45. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20115; (b) 20125; (c) 20231; (d) 20515.............................................. 122
Figura 46. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20125; (b) 20219; (c) 20521............................................................... 124
Figura 47. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20111; (b) 20215; (c) 20224; (d) 20236; (e) 20327............................ 125
Figura 48. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da
segunda etapa (a) 20116; (b) 20310................................................................................ 125
Figura 49. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20119; (b) 20202; (c) 20209; (d) 20312; (e) 20511........................................... 126
Figura 50. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20203; (b) 20224; (c) 20231; (d) 20316............................................................ 126
Figura 51. Respostas à sexta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda
etapa (a) 20101; (b) 20122; (c) 20202; (d) 20316............................................................ 127

x
LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Número de alunos nas turmas da primeira etapa da pesquisa........................ 61


Tabela 2. Número de alunos nas turmas da segunda etapa da pesquisa....................... 61
Tabela 3. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da primeira
avaliação na primeira etapa da pesquisa......................................................................... 73
Tabela 4. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a
primeira avaliação............................................................................................................. 73
Tabela 5. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da segunda
avaliação na primeira etapa da pesquisa......................................................................... 78
Tabela 6. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a
segunda avaliação............................................................................................................ 78
Tabela 7. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da terceira
avaliação na primeira etapa da pesquisa......................................................................... 87
Tabela 8. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a
terceira avaliação.............................................................................................................. 87
Tabela 9. Número de vezes em que cada palavra foi assinalada na primeira questão
do questionário de opiniões por série na primeira etapa da pesquisa............................. 92
Tabela 10. Coeficiente de variação de cada série nos testes rápidos............................. 104
Tabela 11. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da primeira
avaliação na segunda etapa da pesquisa........................................................................ 109
Tabela 12. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a
primeira avaliação............................................................................................................. 109
Tabela 13. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da segunda
avaliação na segunda etapa da pesquisa........................................................................ 116
Tabela 14. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a
segunda avaliação............................................................................................................ 117
Tabela 15. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da terceira
avaliação na segunda etapa da pesquisa........................................................................ 123
Tabela 16. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a
terceira avaliação.............................................................................................................. 123
Tabela 17. Palavras presentes nos mapas mentais finais dos alunos da segunda
etapa da pesquisa............................................................................................................ 130
Tabela 18. Número de vezes em que cada palavra foi assinalada na primeira questão
do questionário de opiniões por série na segunda etapa da pesquisa............................. 131

xi
LISTA DE ABREVIATURAS

CQ Criptografia Quântica
CV Coeficiente de Variação
EM Ensino Médio
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
EQ Emaranhamento Quântico
ET Ensino Técnico
FC Física Clássica
FMC Física Moderna e Contemporânea
MC Mecânica Clássica
MQ Mecânica Quântica
PCNEM Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PNLEM Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Médio
TAS Teoria da Aprendizagem Significativa
TCC Teoria dos Campos Conceituais

xii
RESUMO

Apresenta-se, nesta tese, os resultados da investigação da compreensão de alguns conceitos


e princípios de Mecânica Quântica por alunos de Ensino Médio de duas escolas públicas em
um curso de, aproximadamente, 25 horas-aula, ao longo de cerca de três meses. A aplicação
do curso foi realizada em duas etapas com a participação, ao todo, de 240 alunos, sendo 137
da primeira série e 103 da terceira. Aos alunos da primeira etapa foram propostos um
questionário de conhecimentos prévios, três avaliações escritas, um questionário de opiniões e
uma entrevista com cada uma das turmas analisadas. Na segunda etapa, além dos
instrumentos mencionados, foram inseridos um mapa mental no início do curso e um mapa
mental ao final do curso, quatro testes rápidos, sendo a entrevista realizada com três alunos de
cada turma, escolhidos aleatoriamente. Adotou-se, como referencial teórico para o
desenvolvimento metodológico desta pesquisa e para a análise dos dados coletados, a teoria
da aprendizagem significativa de David Ausubel e a teoria dos campos conceituais de Gérard
Vergnaud. A superposição linear foi considerada como um subsunçor necessário para a
compreensão dos conceitos de estado de um sistema físico e de superposição linear de
estados. A compreensão dos conceitos foi verificada utilizando como situações-problema
experimento de dupla fenda, experimento de Stern-Gerlach, polarização da luz,
emaranhamento quântico e criptografia quântica, além de outras abordadas de forma menos
destacada. A utilização de um pseudo-organizador prévio, com a superposição linear de ondas
e de vetores sendo considerada como subsunçor para os conceitos de Mecânica Quântica
apresentados, pareceu auxiliar a aprendizagem destes tópicos, visto que boa parte dos alunos
se desempenhou bem nas avaliações sobre estes tópicos. As situações utilizadas pareceram
ter auxiliado na compreensão dos conceitos abordados e a aprendizagem dos alunos pareceu
ter sido na direção de uma aprendizagem significativa. O curso lançou mão da utilização de
simulações computacionais, de um texto de apoio e de apresentação de slides, além de buscar
a criação de um ambiente em que os alunos se sentissem confortáveis para externalizar seus
conhecimentos colaborando para a condução a um conhecimento cientificamente aceito.
Alguns poucos alunos tiveram uma postura negativa perante o conteúdo apresentado e a
aceitação da maioria mostrou que conteúdos de Física Moderna e Contemporânea parecem
estimular os estudantes para a aprendizagem e auxiliar na promoção da atualização dos
currículos de Física de Ensino Médio. Verificou-se, também, que os conteúdos trabalhados no
curso foram satisfatoriamente compreendidos tanto por alunos de terceira série quanto de
primeira série do Ensino Médio, mostrando assim que a Física Moderna e Contemporânea
pode ser abordada em qualquer momento neste nível de ensino.

xiii
ABSTRACT

This thesis presents the results of research on the understanding of some concepts and
principles of quantum mechanics by students of secondary school from two public schools on a
course of approximately 25 hours over about three months. The application of the course was
accomplished in two stages with the participation of 240 students, 137 of the first grade and 103
of the third grade. The students from the first stage were evaluated with a questionnaire to
assess their previous knowledge, three written evaluations, a survey of opinions and an
interview with each class. In the second stage, in addition to the aforementioned instruments, a
mind map, four rapid tests and the interview with three students in each class, randomly
chosen, were inserted into the research. The theory of meaningful learning of David Ausubel
and the theory of conceptual fields of Gerard Vergnaud were adopted as a theoretical
background for the study development and data analysis. Linear superposition was considered
a subsumer necessary to understand the concepts of state of a physical system and linear
superposition of states. The comprehension of the concepts was investigated using the
following problem situations: double-slit experiment, Stern-Gerlach experiment, polarization of
light, quantum entanglement and quantum cryptography, as well as other examples. With linear
superposition of waves and of vectors considered as a subsumer to the concepts of quantum
mechanics, the use of a pseudo advance-organizer seemed to improve the learning of these
topics, as we see in the assessments. The situations appear to enhance the understanding of
the concepts and the learning seemed to be closer to a meaningful learning. Computer
simulations, a written text and slides presentations were used and an environment was provided
where students felt comfortable to express their knowledge in such a way that scientifically
accepted knowledge was promoted. Only a few students had a negative attitude towards the
content presented and the acceptance of the majority showed that contents of Modern and
Contemporary Physics seem to stimulate them for learning and to promote the update of the
Physics curricula at secondary school. Also, the contents of the course were well understood
both by third grade and first grade students, showing that the Modern and Contemporary
Physics can be approached at any moment in this level of education.

xiv
CAPÍTULO I

INTRODUÇÃO

Este trabalho versa sobre uma pesquisa em Ensino realizada junto a alunos de Ensino
Médio (EM) de duas escolas públicas, relativa à introdução de alguns dos conceitos e
princípios mais fundamentais da Mecânica Quântica (MQ). Foram ministrados dois cursos, em
épocas distintas, um em cada escola, voltados tanto para alunos de primeira como de terceira
série.

1. A atualização curricular no Ensino Médio brasileiro

Até a década de 90 do século passado, pouco se ouvia falar na inserção de tópicos de


Física Moderna e Contemporânea (FMC) no EM no país. Isto porque mesmo os livros utilizados
neste nível de ensino não incluíam tais tópicos e muitos professores não se sentiam
confortáveis em trabalhar assuntos diferentes daqueles tradicionalmente ensinados. Neste
panorama, o ensino de Física era usualmente desdobrado em Mecânica, Termodinâmica,
Ondas, Óptica e Eletromagnetismo, sendo esta uma das muitas possíveis divisões, conforme a
apresentação dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM). Ao
analisar a função social e formadora da escola atual observa-se que, na maioria dos casos,
não são abordados de forma adequada os conhecimentos científicos e tecnológicos, pois os
conteúdos e metodologias adotados não têm atendido as necessidades dos indivíduos, quais
sejam as de capacitá-los para uma intervenção efetiva e ativa na sociedade contemporânea
(Rezende Jr. e Cruz, 2009, p. 306). Para que o aluno seja um cidadão esclarecido e
compreenda o mundo contemporâneo altamente tecnológico que o cerca, recai sobre a escola
a responsabilidade de incluir em seu currículo assuntos relevantes para a formação do
estudante.
Quinze anos após a publicação de trabalho de Terrazan (1992) sobre a inserção de
Física Moderna e Contemporânea no EM, Oliveira et al. (2007) insistem que o ensino de Física
não tem acompanhado os avanços tecnológicos ocorridos nas últimas décadas e que o
currículo se apresenta desatualizado e descontextualizado, representando um problema tanto
para os professores quanto para os estudantes. Desatualização curricular, abordagem
essencialmente formalista, ênfase no ensino de cinemática, formação insuficiente dos
professores e ausência de FMC nos currículos escolares são apontados como os maiores
problemas para a qualidade do ensino de Física nas escolas (Ostermann e Cavalcanti, 2001, p.
13).
Nota-se, no entanto, um interesse crescente em promover a atualização curricular em
disciplinas científicas do EM, pois esta é, na atualidade, uma linha de pesquisa bastante
comum em programas de pós-graduação em Ensino de Ciências em todo o país, tendo a
quantidade de trabalhos publicados nesta área um aumento substancial nos últimos anos.

1
Ainda assim, apesar dos avanços gerados por tais pesquisas em Ciências no país e no ensino
decorrente, e pelo incentivo político através das mudanças nas matrizes curriculares das
disciplinas de EM, a alteração dos currículos nas escolas brasileiras ainda não é satisfatória.
Além disto, ainda são poucas as pesquisas que se envolvem com a investigação dos fatores
que determinam a aprendizagem dos conceitos básicos de FMC pelo aluno de EM (Lino e
Fusinato, 2011, p. 75).
Esta preocupação com a atualização curricular já foi manifestada por Ostermann e
Moreira (2001) e Lobato et al. (2005). A inserção de tópicos de Física Moderna nos currículos,
embora tida como necessária, vem ocorrendo de forma muito lenta e sem que haja uma
dedicação maior aos principais conceitos da teoria. Em geral, as inclusões existentes atêm-se
a alguns tópicos que acabam mais por limitar a área do que por defini-la. Aspectos da
relatividade especial e a dualidade onda-partícula, por exemplo, são frequentemente inseridos
nos currículos do EM em virtude da sua cobrança em processos seletivos (ENEM, vestibulares)
para o ensino superior.
Além de atualizar o ensino, acredita-se que a introdução de tópicos de FMC permite
que o professor consiga manter o interesse pelas Ciências que os alunos trazem inicialmente
para a sala de aula (Aubrecht, 1989) ou até mesmo o faça surgir. Torna-se, então,
imprescindível promover uma revisão ou reformulação dos currículos de Física do EM para
tentar sanar algumas das dificuldades que o ensino desta Ciência enfrenta nos últimos anos.
Não existe uma alternativa única para isto, mas mudanças devem ocorrer e a inserção de
tópicos de FMC é, sem dúvida, uma das contribuições mais promissoras para tal ensino na
atualidade.

1
2. O ensino de Mecânica Quântica

Considerando a revolução na Física causada pela MQ e suas aplicações, resulta ser


importante abordar esta teoria no EM. Embora a MQ tenha se desenvolvido praticamente no
primeiro quarto do século passado, o quadro em que o Ensino de Física no Brasil se encontra
faz com que a inserção de tópicos desta teoria ainda deva ser objeto de estudo, dado o número
relativamente pequeno (embora crescente) de publicações a respeito. A MQ traz uma nova
visão de mundo, que lida com fenômenos que a Física Clássica (FC) não explica e que é
responsável pelo atendimento de novas necessidades que surgem a cada dia (Pinto e Zanetic,
1999, p. 7), além de servir de base para múltiplos avanços tecnológicos, tanto em projetos
como na fabricação de inúmeros dispositivos e em impressionantes desenvolvimentos nas
áreas da Saúde, da Comunicação e da Informação Quântica (Piazza et al., 2015).
Analisando as pesquisas atuais sobre o ensino de Física Moderna para o EM percebe-
se que princípios que decorrem dos conceitos fundamentais da MQ, tais como o Princípio da
Incerteza de Heisenberg e a Dualidade Onda-Partícula, são apresentados aos estudantes
como sendo o cerne desta teoria. Tais conceitos são muito importantes no contexto da Física

1
Em geral, nos referiremos à MQ não-relativística no contexto do ensino, embora em algumas instâncias esteja
implícito incluir-se a situação relativística também.

2
Moderna, mas podem ser considerados como decorrentes de postulados com consequências
mais abrangentes, nos quais a MQ se apoia (Rocha et al., 2011). Hobson (2007, p. 96) também
se mostra preocupado com os cursos introdutórios de Física Quântica, pois a maior parte deles
dedica muito tempo para a apresentação da aparente contradição entre as naturezas
ondulatória e corpuscular de fótons e de partículas materiais, uma abordagem às vezes
confusa e desnecessária.
Estudos como o de Greca e Herscovitz (2002) e o de Greca e Freire Jr. (2003)
mostram que há interesse dos alunos de cursos de graduação em elementos da MQ e que,
após terem sido trabalhados em cursos introdutórios da área de Ciências Exatas, evidenciaram
uma compreensão razoável dos conceitos discutidos.
Em trabalhos anteriores (Rocha, 2008; Rocha et al., 2010), foi possível averiguar que
tópicos de MQ não comumente apresentados em disciplinas introdutórias de cursos de
licenciatura, tais como Emaranhamento Quântico e Criptografia Quântica, estimulam os alunos
para o aprendizado dos primeiros princípios desta teoria. Estes trabalhos também sugerem
que, além dos acima citados, exemplos como o do experimento de dupla fenda, o do
experimento de Stern-Gerlach e o da polarização da luz são ótimas situações-problema de
aplicação dos conceitos apresentados nas disciplinas.
Muitos professores do EM ainda não se sentem confiantes para trabalhar tópicos de
MQ, limitando-se a apresentar alguns aspectos de sistemas quânticos que conflitam fortemente
com expectativas clássicas. Existem, contudo, trabalhos, como, por exemplo, o de Rocha
(2008) e o de Pantoja (2011), que buscam proporcionar parte do conhecimento necessário
para discutir vários tópicos junto a seus alunos. Considerando os motivos apresentados pelos
professores julga-se, então, necessária a realização de pesquisas que efetivamente promovam
a inserção de tópicos de MQ no EM.

3. Por que ensinar Mecânica Quântica no Ensino Médio?

Tendo em vista a preocupação com o EM, cabe a pergunta: tópicos abordados em


cursos introdutórios de MQ no ensino superior também podem ser abordados no EM e auxiliar
na promoção da atualização curricular? Lembrando que a MQ é uma produção humana, a
educação formal deve viabilizar situações para que ela possa ser estudada em diversos níveis.
Apesar de certa dificuldade existente em relação à MQ, propõe-se trabalhar seus conceitos e
princípios mais primitivos de uma forma acessível aos estudantes de EM. Considerando a ideia
de currículo em espiral, pode-se considerar que "qualquer assunto pode ser ensinado com
eficiência, de alguma forma intelectualmente honesta, a qualquer indivíduo, em qualquer
estágio de desenvolvimento” (Bruner, 1978, p. 31). Assim, os tópicos selecionados devem ser
apresentados com uma linguagem acessível para que os alunos possam dominar certo campo
de conhecimento, mas esta linguagem não deve reduzir a teoria nem distorcê-la e sim,
introduzi-la. Com base neste ponto de vista, entende-se que muitos aspectos de uma teoria
podem ser ensinados com proveito, em nível indutivo ou intuitivo, muito mais cedo do que

3
ocorre tradicionalmente (op. cit., p. 40). É interessante salientar também que o aprendizado de
tópicos da Física Moderna no EM não apresenta dificuldades tão diversas daquelas existentes
no aprendizado dos conceitos clássicos (Carvalho Neto et al., 1999, p. 56), não havendo pois
impedimentos a priori para a abordagem da MQ no EM.
Encontram-se trabalhos sobre o ensino de MQ a partir da década de 1970 e desde
então se afirma que, em geral, os estudantes apresentam grandes dificuldades conceituais no
estudo introdutório desta disciplina (Rüdinger, 1976, p. 144; Frederick, 1978, p. 242). A
existência de tais dificuldades indica que não se deve medir esforços a fim de buscar a
introdução adequada de tais tópicos em todos os níveis de ensino para que se consiga atingir
um nível satisfatório de aprendizado.
Trabalhos como os de Chiarelli (2006) e Soares (2010), entre outros, corroboram a
ideia de que é possível inserir temas de FMC no EM, em que especificamente se introduzam
algumas noções de MQ.
Deve-se salientar também que a aplicação descontextualizada de conceitos, contudo,
pode não apenas desauxiliar na percepção correta dos fenômenos quânticos, mas até provocar
um obstáculo epistemológico para o aprendizado do campo de conhecimentos adequado. Com
a ampla ocorrência de palestras, cursos, e até congressos e outros eventos maiores que se
utilizam de fenômenos do mundo microscópico de forma inadequada, contextualizando-os em
situações não descritas pela MQ, agravada pela divulgação dos mesmos na variada mídia
disponível na atualidade, é preciso cada vez mais promover uma contrapartida da Ciência. É
necessário, então, um grande esforço da comunidade científica para que o contato com a MQ
ocorra cedo, no caso no EM, para evitar que os estudantes se apropriem de uma "versão
deturpada" da MQ e para propiciar que possam absorver uma versão cientificamente
adequada, ainda que introdutória, desta teoria.
Podem ser encontradas outras afirmações que reiteram a posição de que é possível
trabalhar tópicos de MQ no EM, como a seguinte citação de Pinto e Zanetic após ministrarem
um curso enfocando o comportamento dual da luz:
“Acreditamos que a maioria dos alunos aprendeu pouca Física
Quântica, mas eles não terminaram o século sem terem pelo menos
sido apresentados à Física nele desenvolvida. Aliás, quantos alunos
que passam por um curso de Mecânica Clássica entendem realmente
as leis de Newton? Nossa experiência mostrou que temos ainda muitas
questões a responder, mas agora acreditamos ainda mais que é
possível levar a Física Quântica para o ensino médio.” (Pinto e
Zanetic, 1999, p. 21, grifo nosso).

Assim, partindo do pressuposto de que é possível ensinar MQ no EM, o foco do


presente estudo é o de discutir algumas das premissas desta teoria em tal nível de ensino. A
compreensão dos aspectos gerais ou fundamentais da teoria assegura que uma perda de

4
memória (de detalhes) não significa uma perda total, pois com o que resta (o princípio geral) é
possível reconstruir pormenores, quando necessário (Bruner, 1978, p. 22).
Sabe-se que a construção de conceitos pelo ser humano se inicia quando este começa
a conviver com o mundo externo, ou seja, desde que nasce. Logo, a formação de conceitos,
através da construção de esquemas em interação com as situações com que o indivíduo tem
contato, promove a conceitualização e, consequentemente, o desenvolvimento cognitivo
(Vergnaud, 1996b, p. 113).
As colocações apresentadas nos conduziram a avaliar o processo de aprendizagem de
alguns dos mais importantes princípios da MQ no EM. Com esta perspectiva em mente,
buscamos, então, neste estudo, propiciar que tópicos fundamentais de MQ sejam trabalhados
no EM para que os alunos consigam perceber de forma crítica o papel da teoria e as
decorrências da mesma.
No capítulo II é apresentada uma revisão da literatura no período de 2010 a meados de
2015 com os principais artigos encontrados em revistas e periódicos da área e que tratam da
inserção de conceitos de MQ no EM.
Os capítulos III e IV incluem os referenciais teóricos utilizados na tese. Optou-se por
separar a fundamentação em dois referenciais distintos: um de conteúdo relacionado à MQ e
outro de caráter teórico-metodológico ligado à Teoria da Aprendizagem Significativa (TAS) de
David Ausubel e à Teoria dos Campos Conceituais (TCC) de Gérard Vergnaud. Estes
referenciais são utilizados no trabalho para delinear tanto a metodologia da pesquisa como a
análise dos dados coletados.
O capítulo V apresenta a metodologia de desenvolvimento das duas etapas da
pesquisa, bem como os procedimentos adotados durante as fases de coleta e de análise de
dados.
A análise e a discussão dos dados coletados nas duas etapas da pesquisa constam do
capítulo VI e, no capítulo VII, encontram-se as conclusões e as sugestões para trabalhos
futuros.
Após a apresentação dos resultados e das conclusões, constam a bibliografia utilizada
e os apêndices com os materiais que dão suporte à pesquisa desenvolvida.

5
CAPÍTULO II

REVISÃO DA LITERATURA

1. Introdução

Este capítulo tem como objetivo proporcionar uma revisão da literatura acerca das
publicações envolvendo o ensino e a aprendizagem de conceitos de Mecânica Quântica (MQ)
no Ensino Médio (EM). São considerados dois grupos de trabalhos relativos ao tema: trabalhos
constantes de artigos de revisão já publicados e trabalhos de uma revisão adicional sobre o
assunto, ora apresentada. Apesar de o foco desta Tese ser a MQ no EM, são também
abordados trabalhos que incluem a Física Moderna e Contemporânea (FMC) no EM e uma
extensão conceitual da MQ no ensino superior.
O primeiro grupo analisado inclui trabalhos sobre FMC e MQ apresentados aos níveis
médio e superior até 2009 e o segundo grupo abarca trabalhos publicados de 2010 até meados
de 2015.

2. Trabalhos anteriores de revisão da literatura

Destacamos, na literatura, cinco trabalhos de revisão já publicados, relacionados ao


ensino de conceitos de FMC, seja de MQ ou de outros temas, com análise de artigos
publicados de 1970 a 2009.

2.1. Revisão de Ostermann e Moreira sobre tópicos de FMC

Ostermann e Moreira (2000) apresentam uma revisão de mais de 50 artigos sobre a


introdução de FMC no EM desde 1970 até o final do século passado. Os trabalhos foram
classificados em seis grandes grupos, a saber: justificativas para a inserção de FMC no EM;
questões metodológicas, epistemológicas e históricas referentes ao ensino de FMC;
estratégias de ensino e currículos; concepções alternativas dos estudantes acerca de tópicos
de FMC; temas de FMC apresentados como divulgação ou como bibliografia de consulta para
professores do EM; propostas testadas em sala de aula com apresentação de resultados de
aprendizagem; livros didáticos de nível médio que inserem temas de FMC. Os autores afirmam
ter constatado uma maior concentração de publicações na forma de divulgação e de
bibliografia de consulta para professores. Além disto dizem, também, que poucos trabalhos se
referiam a pesquisas sobre concepções alternativas dos estudantes acerca de tópicos de FMC
e a resultados de propostas aplicadas em sala de aula.
Nove trabalhos relativos ao ensino de MQ são citados por eles com aplicação em sala
de aula e com resultados de aprendizagem, a maioria tratando de temas introduzidos junto a
Velha Teoria Quântica, como o efeito fotoelétrico e a natureza quântica da luz. Somente um

6
trabalho, de Stefanel (1998), apresenta resultados relacionados à incorporação do princípio da
superposição linear pelos alunos.
Os autores desta revisão consideram que o pequeno número de artigos relacionados a
estudos sobre concepções alternativas e a propostas testadas em sala de aula deve incentivar
a pesquisa nessa área. Mesmo salientando que este é um grande desafio, outro ainda é
proposto: o de analisar quais tópicos sobre FMC devam ser ensinados nas escolas.

2.2. Revisão de Greca e Moreira sobre o ensino de MQ

Em uma revisão específica sobre o ensino de MQ, Greca e Moreira (2001) apresentam
mais de 40 artigos atingindo cursos introdutórios (em nível médio e superior) publicados de
1970 a 2000. Os artigos foram classificados em três grandes grupos: artigos sobre concepções
dos estudantes a respeito de conteúdos de MQ; trabalhos com críticas aos cursos introdutórios
de MQ; estudos contendo propostas de novas estratégias didáticas. Os autores observam que
são poucos os artigos encontrados no primeiro grupo e que poucas propostas do terceiro grupo
foram efetivamente implementadas, além de constatarem, também, um aumento no interesse
por este tipo de pesquisa nos últimos anos do período analisado.
Quanto aos trabalhos que tratam da análise das concepções prévias dos estudantes
sobre conteúdos de MQ, os autores salientam que tópicos importantes como a superposição
de estados e o problema da medida não estão no foco de estudo de qualquer das publicações.
Os principais tópicos de estudo foram: a estabilidade do átomo; o comprimento de onda de De
Broglie; a Dualidade Onda-Partícula; Princípio da Incerteza; quantização; fótons e elétrons.
Uma das críticas encontradas nos trabalhos relacionados pelos autores (Rüdinger,
1976) diz respeito à tentativa de amarrar os conceitos quânticos aos conceitos clássicos que os
estudantes já conhecem, como no caso da introdução da equação de Schrödinger em analogia
com as ondas mecânicas em cordas vibrantes, o que dificultaria a compreensão da
superposição de estados. A utilização exclusiva de características ondulatórias para descrever
as características dos sistemas quânticos é também criticada por García-Castañeda (1985),
pois isso pode passar a falsa ideia de que basta estender um pouco as ideias sobre ondas
clássicas para compreender os princípios quânticos (Nussenzveig, 1996).
As propostas de novas estratégias para o EM apresentadas nesta revisão foram
categorizadas em quatro abordagens: histórico-filosófica; estabelecimento de elos com a Física
Clássica (FC); apresentação da MQ sem elos com os conceitos clássicos; abordagem
experimental. Somente em uma das propostas de aprendizagem da MQ sem ligação com os
conceitos clássicos (Niedderer e Deylitz, 1999) é utilizado o conceito de estado (entre outros)
para o ensino de tópicos introdutórios de MQ, e apenas com o intuito de descrever um modelo
para o átomo.
Alguns livros-texto também são apresentados como propostas de mudança na
orientação dos cursos introdutórios de MQ, todos eles, contudo, voltados para a educação em
nível superior. O terceiro volume de “The Feynman Lectures on Physics” (Feynman et al., 1963)

7
apresenta o experimento de dupla fenda como fundamental para a compreensão dos
fenômenos quânticos, por conter a essência da MQ. O quarto volume de “Curso de Física
Básica” (Nussenzveig, 1996) discute largamente os princípios quânticos a partir do conceito de
estados de polarização dos fótons.
Em suas considerações finais, Greca e Moreira (2001) observam que os autores dos
trabalhos relacionados indicam que os estudantes não compreendem satisfatoriamente os
conceitos da MQ, mesmo que muitas das pesquisas realizadas não sejam conclusivas a
respeito. Além disto, segundo os autores, as abordagens tradicionais da MQ têm sido
severamente criticadas sob vários ângulos, recomendando-se enfatizar os aspectos
conceituais desta teoria em cursos introdutórios.

2.3. Revisão de Pereira e Ostermann sobre tópicos de FMC

Complementando o trabalho de Ostermann e Moreira (2000), Pereira e Ostermann


(2009) revisam mais de cem artigos sobre o ensino de FMC publicados nas mais importantes
revistas de ensino de ciências do país e do exterior, segundo o Qualis da CAPES, no período
de 2001 a 2006. Os autores classificam os artigos em quatro grupos: propostas testadas em
sala de aula que apresentam resultados de aprendizagem; levantamento de concepções
acerca de tópicos de FMC; bibliografia de consulta para professores; análises de publicações
relacionadas ao ensino de FMC. Mais da metade dos artigos analisados pelos autores está
inserida no último grupo.
No que diz respeito a estudos sobre o ensino de conceitos da MQ realizados no EM, os
autores apresentam quatro trabalhos relevantes para a análise. Destes, dois deles (Silva e
Kawamura, 2001; Budde et al., 2002) tratam de temas da Velha Teoria Quântica (modelos
atômicos e dualidade onda-partícula, respectivamente). Kalkanis et al. (2003) elaboraram e
avaliaram uma estratégia educacional que permitiu a formação de estruturas conceituais
independentes para a FC e a MQ, com resultados considerados satisfatórios. Paulo e Moreira
(2004), após a apresentação de uma unidade didática envolvendo o experimento imaginário do
gato de Schrödinger, obtiveram resultados indicativos de não haver diferença de aprendizagem
dos conceitos quânticos entre alunos de primeiro e de segundo anos do EM maior do que as
inerentes à FC. Estes últimos autores comentam, também, que o conhecimento prévio sobre
física ondulatória clássica não parece influenciar criticamente os resultados da aprendizagem.
Pereira e Ostermann apresentam ainda três trabalhos que tratam do ensino de MQ,
com foco na análise de currículos e de livros didáticos, dois deles para o EM.
Os autores concluem que 26 dos artigos encontrados dizem respeito ao ensino de MQ,
tendo a Velha Teoria Quântica como tônica, e que 22 tratam da inserção de tópicos de FMC no
EM.
Apesar do aumento, em comparação ao trabalho de Ostermann e Moreira (2000), na
quantidade de publicações nesta área, os autores salientam que a maioria dos artigos ainda se
refere a bibliografias de consulta para professores. Comentam eles também sobre a escassez

8
de estudos relativos à formação inicial e continuada de professores dado que, de todos os
trabalhos analisados, somente quatro eram concernentes a este tema. A sugestão final é de
que é necessário investigar os processos conduzidos em sala de aula, que estruturam e
condicionam a aprendizagem, mesmo sabendo da importância no rigor e na ênfase que devem
ser dados aos conceitos-chave.

2.4. Revisão de Pantoja, Moreira e Herscovitz sobre pesquisa em ensino de MQ

Pantoja et al. (2011) apresentam uma revisão sobre trabalhos de pesquisa em ensino
de MQ no período de 1999 a 2009. Cinco grupos foram utilizados em sua classificação:
propostas didáticas; implementação de propostas didáticas; estudos de concepções; análise
curricular e críticas aos cursos introdutórios; análise teórica/epistemológica.
Onze artigos foram classificados na primeira categoria e nove propostas foram
relacionadas com sugestões didáticas específicas para o EM, sendo três destes escritos
elaborados pelos mesmos autores. As propostas de Michelini et al. (2000), Goff (2006) e
Fanaro et al. (2007; 2009) incluem conceitos básicos de MQ. É interessante destacar que
somente três trabalhos abordaram a chamada Velha Teoria Quântica, o que sugere que tais
tópicos estejam sendo esgotados como fonte de estudos. Os autores, além disto, acreditam
que o pequeno número de novas propostas pode significar que as anteriores estejam sendo
testadas.
Efetivamente, na segunda categoria foram encontrados 25 trabalhos, a maioria (21)
tratando de estudos no Ensino Superior. Somente quatro artigos abordam o ensino de MQ no
EM e nenhum deles abarca conceitos fundamentais como o de estado de um sistema físico e o
de superposição linear de estados. Os trabalhos de Greca et al. (2001) e Singh (2008b)
envolvem a aquisição de tais conceitos, mas ambos apresentam uma abordagem para o
Ensino Superior. Como a combinação de laboratório virtual e aulas expositivas é a metodologia
mais utilizada nas propostas, esta conjugação se revela como um fértil campo de pesquisa.
Um dado interessante na terceira categoria é o de que o número de artigos enfatizando
as concepções da Velha Teoria Quântica (quatro) é quase o mesmo dos que abordam a (Nova)
Teoria Quântica (cinco). Nos trabalhos deste grupo, o maior objetivo dos autores era
apresentar um questionário para detecção de concepções, narrando o processo de validação,
bem como a apresentação de possíveis concepções dos alunos. Em particular, Singh (2008a)
elaborou e aplicou um teste a cerca de 200 estudantes de Física de início de curso, de sete
universidades diferentes, sobre conceitos e princípios fundamentais da MQ, detectando
dificuldades de entendimento comuns a todos.
Três dos quatro trabalhos apresentados na quarta categoria atacam problemas
relativos ao EM, seja enfocando os currículos europeus e de alguns outros países (Lobato e
Greca, 2005) ou questionando a estrutura de livros didáticos e de divulgação científica (Niaz e
Fernández, 2008; Velentzas et al., 2007). Os autores acreditam que a escassez de trabalhos

9
nessa área pode estar relacionada, em grande parte, à exigência maior de domínio de
conteúdo para efetuar esta análise.
Mesmo com o pequeno número de artigos encontrados na quinta categoria, os autores
consideram de grande valia a reflexão sobre a organização do conteúdo tanto no que tange ao
uso de teorias de aprendizagem quanto de epistemologia. Há uma indicação de que os
trabalhos apresentados possuem uma nova linha de pensamento para o Ensino de Física, seja
para justificar a proposta de um dado viés para a construção de unidades didáticas em MQ,
como para fundamentar epistemologicamente um texto didático a ser utilizado no EM
(Brockington e Pietrocola, 2005).
Ao final desta revisão é apresentada uma análise da quantidade de publicações na
área. O crescimento da pesquisa neste caso é nítido, principalmente ao se considerar que, dos
60 artigos encontrados, 27 foram publicados nos dois últimos anos da revisão. O destaque final
fica para o aumento da quantidade de artigos publicados na categoria de implementação de
propostas didáticas (cinco e oito trabalhos, respectivamente, nos dois últimos anos da revisão).

2.5. Revisão de Silva e Almeida sobre o ensino de MQ no EM

Silva e Almeida (2011) apresentam uma revisão da literatura sobre ensino de tópicos
de MQ especificamente para o EM, entre os anos de 1997 e 2010. Os trabalhos encontrados
foram separados em cinco categorias: revisão da literatura sobre o ensino de MQ/FMC; análise
curricular; análise dos conteúdos em livros que abordam MQ/FMC; elaboração e/ou aplicação
de propostas de ensino; concepções de professores sobre o ensino de MQ/FMC no EM.
Por se tratar de revisão que abarca um período comum ao de algumas já
apresentadas, vários trabalhos já foram elencados em categorias das outras revisões. Assim,
apresentamos apenas um resumo da motivação desta revisão. Os trabalhos sobre revisão da
literatura, análise curricular e análise de conteúdos em livros que abordam MQ/FMC constam
todos das demais revisões apresentadas neste capítulo e não serão novamente citados.
Nas propostas de ensino, tanto as elaboradas como as aplicadas, foi encontrada
somente uma matéria relacionada à superposição de estados (na forma de um contraexemplo)
e outra ao conceito de estado de um sistema físico.
Johansson e Milstead (2008), ali arrolados, sugerem a utilização do Princípio de
Incerteza de Heisenberg para promover a compreensão de fenômenos como o da
radioatividade e também as forças de troca. Estes autores consideram que seja feita apenas
uma referência a e como limites impostos pela natureza ao nosso conhecimento de tais
grandezas, não sendo necessário introduzir quer a expressão formal do Princípio, quer o
conceito de função de onda de uma partícula e nem discutir a superposição de estados.
Carvalho Neto et al. (2009) apresentam os resultados da aplicação de uma proposta
didática, relativos ao ensino de aspectos da MQ em seu caráter preditivo probabilístico,
baseando-se na interpretação da complementaridade de Niels Bohr. Após realizar pré-testes,
entrevistas prévias, minicurso e entrevistas finais, os autores concluem que houve

10
aprendizagem significativa acerca das previsões essencialmente probabilísticas da MQ. Isto
porque os estudantes reconheceram que o ato de preparar e observar um dado sistema físico,
em certo instante de tempo, define o fenômeno como ondulatório ou corpuscular, de acordo
com a interpretação da complementaridade. Conforme os autores, os estudantes também
perceberam que o elétron não é nem onda e nem partícula clássica e que há diferença entre
estado quântico físico (descrito pela função de onda) e estado clássico (definido por posição e
velocidade). Adicionalmente, os autores consideram que o conceito de “previsão” deve ser
exigido como subsunçor para a aprendizagem significativa do aspecto preditivo das teorias
físicas.
Ao final da revisão, os autores apontam que a pertinência de se ensinar MQ no EM é
cada vez mais consensual entre os pesquisadores da área. Especificamente, o consenso é
maior na posição de que só faz sentido ensinar MQ no EM se for privilegiado o caráter
qualitativo, conceitual, filosófico, cultural, em detrimento de um enfoque matemático. A
constatação de inúmeras sugestões de formas de abordagem da MQ evidencia que não existe
definição no que tange aos conteúdos a serem ministrados no EM. Há trabalhos que usam o
Princípio de Incerteza de Heisenberg, a interpretação probabilística da MQ, o conceito de spin
e a dualidade onda-partícula, sem se limitar ao efeito fotoelétrico, ao raio-X ou à quantização
da energia. É ressaltada no trabalho, também, a necessidade de realização de mais pesquisas
sobre o ensino de MQ no EM, para ampliar o conhecimento sobre o assunto e possibilitar que
professores trabalhem tais tópicos em sala de aula.

3. Uma nova revisão

Após a análise das revisões da literatura e comentários constantes da seção anterior, é


apresentada uma revisão complementar com artigos publicados de 2010 até meados de 2015,
de modo a atualizar as revisões na área. Um artigo de 2009, não contemplado pelas revisões
anteriores, também foi considerado.
Foram arrolados artigos relacionados com o ensino de MQ e publicados principalmente
em periódicos avaliados com conceitos A1, A2, B1 e B2, segundo o Qualis da CAPES. Ao todo
foram examinadas oito revistas nacionais (Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Ciência &
Educação, Ensaio – Pesquisa em Educação em Ciências, Experiências em Ensino de
Ciências, Investigações em Ensino de Ciências, Revista Brasileira de Ensino de Ciência e
Tecnologia, Revista Brasileira de Ensino de Física, Revista Brasileira de Pesquisa em
Educação em Ciências) e onze estrangeiras (American Journal of Physics, Enseñanza de las
Ciencias, International Journal of Science Education, Journal of Research on Science
Teaching, Latin American Journal of Physics Education, Physical Review Special Topics –
Physics Education Research, Physics Education, Revista Electrónica de Enseñanza de las
Ciências, Science Education, Science & Education e The Physics Teacher).

11
Foram selecionados 39 trabalhos, assim agrupados: propostas pedagógicas; propostas
didáticas implementadas; estudos sobre concepções de estudantes ou professores acerca de
tópicos fundamentais de MQ; análise de material didático; estudos sobre formação continuada.
O primeiro conjunto trata de referências apresentadas como material de consulta
direcionado a professores de Física, em nível médio ou superior, enquanto a segunda
categoria inclui propostas pedagógicas testadas em sala de aula ou em fase de
implementação. O terceiro grupo abarca trabalhos em que foram averiguadas concepções,
atitudes e ideias prévias de alunos e professores sobre tópicos de MQ. A quarta categoria se
refere à análise de materiais didáticos para o ensino de FMC no EM e a quinta categoria,
finalmente, apresenta estudos sobre a formação continuada de docentes para análise e
promoção da atualização curricular no EM.
Alguns dos trabalhos encontrados se enquadram em mais de uma categoria; optou-se,
então, por situá-los naquela considerada mais próxima de seu propósito, lembrando que a
classificação ora utilizada é apenas uma de muitas possíveis. Apesar de o foco desta Tese ser
o ensino de MQ no EM, são incluidos também artigos voltados para o Ensino Superior, pois
algumas propostas voltadas a alunos de graduação podem ser úteis para alunos de EM.

3.1. Propostas pedagógicas

Em dois trabalhos diferentes, Gordon e Gordon (2010, 2012) apresentam dois jogos,
baseados nos clássicos “campo minado” e “raposa e cães de caça” (fox and hounds), como
recursos para o ensino de conceitos de MQ de maneira divertida. O primeiro jogo introduz o
“campo minado quântico”, que trabalha com os conceitos de superposição de estados,
emaranhamento e não-localidade, e o segundo apresenta o “gato de Schrödinger e matilha”,
que pode ser utilizado para abordar conceitos como os de superposição de estados,
interferência construtiva e destrutiva, medições e emaranhamento. Neste último, é possível
também tratar os conceitos de dualidade onda-partícula e descoerência, utilizando-o como um
modelo. Este segundo jogo foi apresentado, de modo preliminar, para 95 estudantes de ensino
secundário em uma aula de uma hora e meia e acompanhado de um questionário de múltipla
escolha, aplicado antes e depois da instrução, abordando superposição de estados,
interferência, medição e emaranhamento. A compreensão dos estudantes acerca dos
conceitos é apresentada em gráficos que mostram que a maior parte dos alunos respondeu o
pós-questionário de modo correto. Além disto, muitos estudantes consideraram a atividade
interessante e não muito longa e se mostraram interessados em outros materiais de
aprendizagem envolvendo jogos, além de considerarem que este recurso auxiliou na
compreensão de conceitos de MQ. Tais jogos, assim como outros propostos pelos mesmos
autores, são considerados bons auxiliares para a compreensão do significado da superposição
de estados e do emaranhamento.
Kuttner e Rosenblum (2010) apresentam quatro variações de um experimento
imaginado (gedankenexperiment), com foco no teorema de Bell e no emaranhamento,

12
experimento este que pode ser trabalhado em cursos de física em qualquer nível de ensino.
Como o fenômeno do emaranhamento quântico é usado atualmente em indústrias e discutido
correntemente na literatura popular, faz-se necessário abordá-lo em sala de aula visto que
divulgações pseudocientíficas utilizam este conceito de forma equivocada. Os autores
consideram também que o contato com uma área tão próxima da fronteira da Física pode
estimular o aluno para o aprendizado.
Dada a dificuldade experimental em realizar trabalhos com a câmara de bolhas,
Gagnon (2011) apresenta software computacional capaz de realizar a simulação do
experimento em um nível muito próximo do real. Dados preliminares apontam para um sucesso
na utilização desta simulação em aulas de mecânica, eletromagnetismo e física moderna. A
simulação permite ilustrar o efeito de um campo magnético em partículas eletricamente
carregadas, exemplificar a mecânica relativística e discutir conservação de energia, momento
linear e números quânticos em colisões entre partículas, além de proporcionar exemplos para
que os estudantes possam exercitar a habilidade de identificar partículas.
Dando sequência a um trabalho de 2007, Hobson (2011, 2012) apresenta duas
abordagens diferentes para introduzir a MQ. No trabalho de 2011, o foco é o ensino do
conceito de incerteza. O autor utiliza pacotes de onda para explicar os resultados do
experimento de dupla fenda e mostra também que, apesar da aleatoriedade existente nos
eventos quânticos individuais, a estatística para grandes números destes eventos é previsível,
indicando que uma visão meramente probabilística da MQ é incorreta. O autor também
argumenta que a incerteza pode ser desprezada no mundo macroscópico, fazendo recair
assim na Mecânica Clássica (MC). No segundo trabalho, o experimento de Rarity-Tapster-
Mandel (Rarity e Tapster, 1990) é utilizado para ilustrar e auxiliar na compreensão do conceito
de não-localidade e da desigualdade de Bell.
Considerando a linguagem como fundamental para a compreensão da Ciência e a
construção de conceitos científicos, Paulo e Moreira (2011) discutem a relevância da
linguagem e da captação de significados da MQ para a inserção de seus conceitos
fundamentais no EM. O problema da relação entre as linguagens clássica e quântica é
levantado e os autores apresentam a opção da utilização da linguagem clássica para tratar os
fenômenos quânticos, desde que a lógica seja modificada e torne-se condizente com a MQ.
Assim, de acordo com os autores, a lógica científica subjacente à FC deve ser abandonada. A
modificação na lógica presume a distinção entre diversos níveis de linguagem, em que o
primeiro se refere a objetos (átomos, elétrons, etc), o segundo, a enunciados sobre objetos, o
terceiro, a enunciados acerca dos enunciados sobre objetos e assim sucessivamente.
Uma seleção de mais de quarenta animações interativas e visualizações gratuitas a
serem utilizadas em diversos níveis de cursos de graduação para o ensino de MQ se encontra
em Kohnle et al. (2012). As animações abordam diversos tópicos, tais como o modelo atômico
de Bohr para o átomo de hidrogênio, a análise probabilística de sistemas clássicos, pacotes de
ondas, efeito fotoelétrico, Princípio de Incerteza de Heisenberg, poço finito, expansão em
autoestados, medida e colapso da função de onda e informação quântica. Cada animação

13
inclui um roteiro passo-a-passo salientando os pontos-chave. Em um diagnóstico realizado com
estudantes que utilizaram individualmente as animações, os autores relatam a ocorrência de
ganhos substanciais na aprendizagem daqueles que trabalharam com as animações.
Recorrendo a uma abordagem fenomenológica e conceitual, Pereira et al. (2012)
apresentam e discutem os postulados da MQ com auxílio de um interferômetro virtual de Mach-
Zehnder. O conceito de estado do sistema é considerado como central na MQ porque expressa
um conjunto de informações sobre o sistema físico. Os autores então delineiam uma
abordagem operacional para o ensino de MQ, com a intenção de contornar as dificuldades
decorrentes do formalismo matemático que surgem no ensino desta teoria. Tal transposição
didática pode contribuir para o primeiro contato de alunos de EM com a MQ e fazer com que
conceitos como os de estado, autoestados, observáveis, superposição de estados, projeção e
probabilidade façam mais sentido do que uma abordagem tradicional acerca do efeito
fotoelétrico, radiação de corpo negro ou modelos atômicos semiclássicos.
Rau (2012) apresenta dois exemplos de tópicos de MQ com origem na Astronomia,
com vistas a alunos de cursos de graduação: átomos sob a ação de fortes campos magnéticos;
íon negativo do hidrogênio. Tais exemplos são considerados pelo autor como problemas
fundamentais da MQ por tratarem de princípios e técnicas básicos, apresentar interesse prático
e possuir importância histórica. O autor não informa se tais tópicos foram trabalhados em sala
de aula.
Um conjunto de exemplos históricos e fenomenológicos, constituindo uma contribuição
didática para a divulgação e compreensão da dualidade onda-partícula em um curso
introdutório de MQ, é apresentado por Segura et al. (2012). Como recurso para cursos
introdutórios de MQ, sugerem a utilização do aporte histórico, desde as primeiras discussões
sobre a natureza da luz no século XVII, o experimento de dupla fenda, as confirmações dos
experimentos de Fresnel e Maxwell acerca da natureza ondulatória da luz e as ondas de
matéria de De Broglie. Com esta apresentação, pretendem os autores introduzir quatro noções
cruciais para a compreensão da MQ e que estruturam o fenômeno da dualidade onda-partícula:
fusão, unificação, compatibilidade e percepção como um todo. Estas noções são consideradas
fundamentais por propiciarem que problemas como o da superposição de estados e o da
medição sejam abordados e tornem o mundo quântico mais compreensível.

3.2. Propostas didáticas implementadas

Baily e Finkelstein (2010) relatam variações nas estratégias de ensino a respeito da


interpretação da MQ em dois cursos similares de Física Moderna da Universidade de Colorado.
Foram encontrados estudantes com tendência a adotar uma visão realista (ou seja,
determinista e local) quando o professor abordava as ontologias dos alunos de forma branda.
Galvez (2010) apresenta um formalismo matricial para explicar experimentos com
fótons correlacionados em cursos de MQ na graduação, com inúmeras variações de alguns
experimentos. Uma atividade opcional de laboratório foi desenvolvida em um curso de

14
graduação e os resultados indicaram uma melhora na compreensão de tópicos abordados na
disciplina regular de MQ pelos estudantes que realizaram esta atividade. Relatórios dos
experimentos e questionários ao final do curso também ajudaram a constatar a boa
compreensão de tais tópicos. O autor acredita que o formalismo matricial auxiliou na explicação
dos experimentos com fótons correlacionados, conforme a linguagem utilizada na disciplina, e
serviu também para introduzir alguns aspectos do emergente campo da informação quântica.
Kiouranis et al. (2010) apresentam a análise da implementação de uma sequência
didática sobre o comportamento de objetos (partículas e ondas) no experimento de dupla fenda
dirigida a estudantes de química quântica de um curso de Bacharelado em Química. A análise
é fundamentada na teoria da transposição didática de Yves Chevallard, que possibilita a
reflexão sobre o saber científico reelaborado para ser utilizado em situações de ensino,
preocupando-se assim em tornar os conceitos mais compreensíveis para os alunos. Durante a
verificação do saber ensinado, os autores comentam que os alunos expressaram suas ideias
com interrupções, lacunas e linguagens coloquiais, influenciadas por diversos fatores, tais
como o livro didático, a fala do professor e materiais de divulgação científica. Necessidades e
possibilidades de aprendizagem foram identificadas e uma reorientação da prática do professor
da disciplina foi promovida através de um processo dinâmico de ação e reflexão.
A viabilidade de uma proposta pedagógica de curta duração para o ensino de MQ a
alunos de graduação é analisada por Rocha et al. (2010). Um minicurso visando estabelecer
situações propícias para o ensino de conceitos de MQ foi elaborado e aplicado em três
ocasiões para professores em formação ou em exercício. A receptividade dos tópicos
abordados (experimento de dupla fenda, superposição de ondas e de vetores do plano,
emaranhamento quântico e criptografia quântica) e comentários decorrentes, sugere que a
ausência de discussões relativas aos conceitos fundamentais da MQ em cursos de graduação
é sentida pelos alunos. Os conceitos de estado e de superposição linear de estados não foram
considerados de difícil compreensão pelos alunos, face às situações apresentadas. Os autores
sugerem que o ensino introdutório de MQ seja feito sem o uso de conceitos da MC e com
auxílio de inúmeras situações-problema nas quais os conceitos fundamentais da MQ são
utilizados.
Deslauriers e Wieman (2011) mediram a aprendizagem e a retenção de conceitos da
MQ por estudantes de engenharia da Universidade de British Columbia. Dois grupos, um com
57 e outro com 63 estudantes, tiveram abordagens diferentes de ensino e um questionário
previamente validado foi utilizado em ambos. Para o primeiro grupo foi oferecida uma
abordagem tradicional de ensino, enquanto o segundo recebeu um curso diferenciado com
leituras pré-classe, aulas interativas, questões rápidas para discussão entre os alunos e
simulações computacionais, além de artigos sobre como pessoas aprendem e retêm o
conhecimento. O primeiro grupo teve um desempenho 19% menor do que o segundo; a
retenção de conceitos nos dois grupos, contudo, foi alta, como mostraram testes aplicados seis
e dezoito meses após o término do curso. A alta retenção verificada contrasta com a

15
aprendizagem obtida em cursos usuais de graduação e sinaliza para a importância de uma
aprendizagem conceitual de MQ.
Kapon et al. (2011) descrevem uma proposta didática delineada para examinar a
aprendizagem de 14 estudantes que concluíram a escola secundária e que foram
apresentados a palestras online proferidas por cientistas, sobre ideias avançadas de FMC (por
exemplo, o efeito Aharonov-Bohm). Os alunos foram divididos em dois grupos, cada um
recebendo instruções sobre MQ e Astrofísica de forma alternada. Uma atividade em grupo foi
realizada logo após as palestras para que se pudesse categorizar a aprendizagem dos
estudantes. Mesmo que as palestras fossem muito além de sua capacidade de compreensão,
a análise das discussões indicou que os estudantes conseguiam inferir e progredir no domínio
dos conceitos abordados nas palestras. Os grupos também foram submetidos a cinco testes
(antes da primeira palestra, após a primeira palestra, após a atividade em grupo, após a
segunda palestra e um teste de retenção um ano após as palestras). Os resultados indicam
que a apresentação de tópicos de FMC deste modo, somada à instrução formal, pode auxiliar
na incorporação desta área ao currículo e introduzir a Física de uma maneira mais relevante e
útil para os alunos.
No decorrer de aulas sobre processos de transferência de calor para quinze alunos da
segunda série de uma escola particular de EM, Lino e Fusinato (2011) abordaram o problema
da radiação de corpo negro, inserindo conceitos de MQ, como o da quantização da energia. O
curso teve a duração de oito horas-aula e mapas conceituais foram utilizados como
instrumentos de avaliação. Além disto, os alunos responderam um questionário com quatro
questões, cujo objetivo era verificar as noções reveladas acerca da constituição da energia
radiante de corpos aquecidos. As respostas foram separadas em duas categorias: respostas
que apresentam bases conceituais apenas com conceitos clássicos; respostas que apresentam
bases conceituais quânticas. A análise dos questionários indicou que ocorreu alteração no
conceito subsunçor de energia, havendo incorporação da ideia de quantização neste conceito,
o que pode ser considerado como um primeiro indício de ocorrência de aprendizagem
significativa. De acordo com os autores, a estrutura hierárquica de conceitos e as conexões
presentes nos mapas conceituais também fornecem indício de ocorrência desta aprendizagem.
Pereira et al. (2011) apresentam um estudo acerca da fala privada em uma atividade
realizada por um grupo de alunos de curso de Licenciatura em Física, recorrendo a um
interferômetro virtual de Mach-Zehnder. O objetivo era verificar a ocorrência de fala privada em
adultos e analisar como esse processo de mediação é utilizado em uma situação de resolução
de problemas envolvendo conceitos de MQ. Foi constatada a ocorrência de fala privada,
atribuindo-se isto às duas ferramentas culturais fornecidas pelo cenário sociocultural: roteiro e
software. Os resultados encontrados destacam a importância das atividades colaborativas no
âmbito da pesquisa em Educação em Ciências.
Um relato de experiência acerca da difusão do conteúdo de FMC para alunos e
professores de escolas públicas de EM é apresentado por Vicentini et al. (2011). O projeto foi
desenvolvido em uma disciplina de curso de graduação e, com apoio de políticas universitárias

16
e governamentais, os alunos fizeram apresentações em oito colégios, atingindo 850 alunos de
EM, além de cursos para professores da rede pública de uma cidade paranaense. Os temas
abordados foram: Corpo Negro, Efeito Fotoelétrico, Constante de Planck, Dualidade Onda-
Partícula, Origem do Universo, Evidências do Big Bang, Átomo de Bohr, Polaroides e Cristais
Líquidos, Fissão e Fusão Nuclear, Física das Radiações, Laser, Raios X, Relatividade,
Condutores e Isolantes, Semicondutores, Fibras Ópticas, Computação Quântica e Câmaras de
Ionização. Para cada tema, uma série de recursos didáticos foi elaborada: seminários de trinta
minutos, oficina para professores e alunos, experimentos de baixo custo e pôster ilustrativo. Os
resultados satisfatórios mostraram que o projeto contribuiu na complementação da formação
escolar, na divulgação científica e no despertar do interesse dos estudantes pela área de
exatas e tecnologia. Quanto aos professores, especificamente, o projeto foi bastante profícuo,
em boa parte porque muitos dos que lecionavam Física no EM eram formados em Matemática
e tinham dificuldades em trabalhar tópicos de FMC.
Em um estudo com 121 alunos de escola secundária da Nigéria, Adegoke (2012)
examina em que grau uma abordagem de engajamento interativo (evitando a competição em
sala de aula e encorajando a discussão e cooperação) pode reduzir o hiato de gênero nos
resultados de aprendizagem em Física Quântica. Dois grupos foram analisados: um deles
recebeu uma abordagem tradicional de ensino enquanto o outro recebeu a abordagem com
engajamento interativo. Foi preparado um guia instrucional para cada grupo, e aplicado um
teste escrito de desempenho ao final da instrução. Os resultados encontrados permitiram
considerar que o engajamento interativo efetivamente reduziu as diferenças de aprendizagem
entre os estudantes.
Através da aplicação de uma proposta didática de doze horas-aula, Pantoja et al.
(2012) analisaram a aquisição de conceitos como o de sistema físico, variáveis dinâmicas,
estado de um sistema físico e evolução temporal por seis estudantes de um curso de mestrado
profissional. A proposta foi baseada nas teorias de aprendizagem de Ausubel e de Vergnaud e
três situações-problema foram utilizadas: experimento de Stern-Gerlach, átomo de hidrogênio e
molécula de amônia. Problemas de lápis e papel, mapas conceituais, entrevistas
semiestruturadas e anotações de campo fizeram parte dos dados coletados. Considerou-se
que foram obtidas evidências de aprendizagem significativa, tanto na forma predicativa como
na operativa, porém algumas limitações na assimilação dos conceitos são mencionadas pelos
autores. Dificuldades na compreensão dos conceitos de sistema físico, variáveis dinâmicas e,
principalmente, de estado de um sistema físico são relatadas e para tais conceitos foi
necessário ter seus significados reafirmados em diversas oportunidades. Mesmo assim, foi
considerado ter ocorrido aprendizagem significativa em quatro dos seis estudantes que
participaram da instrução.
Com a análise de uma atividade didática centrada no interferômetro virtual de Mach-
Zehnder, Pereira, Ostermann e Cavalcanti (2012) apresentam dois exemplos de um estudo em
que alunos de graduação em Física utilizam o discurso para promover a apropriação de um
conceito. Na atividade, a construção de significados surgiu por meio de um processo de

17
interanimação de vozes, ou seja, diversas vozes se colocam em contato dentro de um mesmo
enunciado, em que não é assinalado individualmente quem resolveu o problema. Isto indicou
que foi o grupo, enquanto “sistema”, que desempenhou tal função no plano intermental e não
apenas uma pessoa. A importância das atividades em grupo desenvolvidas em aulas de
Ciências fica assim destacada, sobretudo porque em muitas ocasiões se esperaria que nem
mesmo o mais capaz dos membros do grupo conseguisse resolver o problema isoladamente.
A. F. G. Silva et al. (2012) analisaram o aprendizado de alunos de terceira série do EM
de escolas públicas e privadas em uma cidade cearense. Um curso de Física Moderna de
quarenta horas-aula foi ministrado para duas turmas de trinta alunos voluntários cada (uma
com alunos de escola pública e uma com alunos de escola privada). O conteúdo abordado no
curso compreendia: o átomo e o quantum; o núcleo atômico e a radioatividade; fissão e fusão
nucleares; teoria especial da relatividade; teoria geral da relatividade. Foram utilizados
experimentos, vídeos e simulações computacionais ao longo do curso. Na comparação entre
as duas turmas, através de um pré e um pós-teste, constatou-se que o desempenho ao final do
curso foi muito semelhante, mesmo com os alunos da escola privada apresentando uma base
conceitual melhor no pré-teste. Os autores indicam, também, que o conteúdo de FMC pode ser
abordado tanto em escolas públicas como privadas, principalmente se utilizados experimentos,
vídeos e simulações, pois em ambos os casos os alunos conseguiram acompanhar o conteúdo
apresentado e entender a parte conceitual, inclusive com referências ao cotidiano.
Pantoja et al. (2014) estudaram a aquisição e retenção do conhecimento explícito e as
operações de pensamento implícitas na MQ que foram feitas por cinco estudantes de
graduação em Física, matriculados pela primeira vez em uma disciplina de MQ. Uma proposta
didática de doze horas de duração, baseada nas teorias da aprendizagem de Ausubel e de
Vergnaud, foi implementada visando a abordagem dos conceitos de sistema físico, variáveis
dinâmicas, estado de um sistema físico e evolução temporal. Os autores consideram que a
proposta encontrou evidências de: mudança considerável de variáveis da estrutura cognitiva;
semelhanças (para os conceitos de sistema físico e de variáveis dinâmicas) e diferenças (para
os conceitos de estado e de evolução temporal) na aquisição dos conceitos por parte dos
estudantes; que quatro dos cinco estudantes adotaram processos mais próximos do polo
significativo do que do polo mecânico da aprendizagem; inadequação do significado atribuído
pelos estudantes ao conceito de probabilidade, antes, durante e depois da instrução, o que
mostra uma tendência a ser um obstáculo epistemológico natural que deve ser abordado com a
apresentação de situações-problema associadas à MQ; que o conhecimento prévio tem um
papel crucial na aquisição, na retenção e na resolução de problemas, se levado em conta.

3.3. Estudos sobre concepções

Hilger et al. (2009) apresentam resultados preliminares de uma investigação com o


objetivo de identificar e caracterizar possíveis representações sociais compartilhadas por um
grupo de estudantes, a partir de dados obtidos com o uso de testes de associação escrita e

18
numérica de conceitos. Os testes foram aplicados a 236 estudantes de EM de todas as séries,
na região de Porto Alegre. Os resultados sugerem que conceitos de MQ são apresentados aos
alunos principalmente através da mídia, visto que este é um assunto não abordado
tradicionalmente em salas de aula. Entrando em contato com essa MQ alternativa, os
estudantes constroem ou começam a construir representações sociais da MQ. Os autores
consideram que compreender as representações sociais pode auxiliar na aprendizagem
significativa da MQ, bem como avaliar a influência dos meios de divulgação sobre as ideias dos
indivíduos a respeito deste tema.
Akarsu (2010) apresenta um estudo com a intenção de esclarecer alguns dos
problemas mais comuns no ensino de tópicos de MQ, a saber: dificuldades de aprendizado,
estratégias de ensino insuficientes, problemas conceituais e de instrução. O estudo foi
realizado em cinco universidades dos Estados Unidos e o autor utilizou um questionário com
29 questões que foi respondido por 86 estudantes de cursos de ciência e de engenharia, entre
19 e 21 anos, que participavam de cursos de MQ. Cinco professores de MQ dos
departamentos de Física também foram entrevistados. Além de questionários e entrevistas,
outras fontes de dados são citadas como, por exemplo, tarefas de casa, provas finais, livros-
texto e atividades de laboratório. Nas entrevistas, os professores revelaram que os estudantes
costumam se esforçar para compreender a base abstrata, a formulação matemática e os
diversos níveis de instrução. Os questionários apontaram que 69% dos estudantes adquiriram
um nível adequado de compreensão da MQ, fração considerada baixa pelo autor. Uma das
sugestões apresentadas é não apresentar o modelo atômico de Bohr para que os estudantes
não criem uma noção incorreta acerca das órbitas de elétrons. Com o amparo das Guidelines
for College Physics Program, o autor sugere utilizar diferentes abordagens, como a utilização
de laboratório aberto e troca de instrutores no decorrer do curso, para possibilitar uma melhor
compreensão de conceitos da MQ. A oferta de cursos extracurriculares de física-matemática
antes dos cursos de MQ também é apontada como algo que deve ser considerado.
McKagan et al. (2010) desenvolveram e validaram um questionário com doze questões
para analisar a compreensão de aspectos conceituais da MQ utilizado para avaliar a eficácia
de diferentes métodos de ensino desta teoria.
Para analisar dificuldades conceituais e matemáticas de quinze estudantes de
graduação em Física na Turquia, Özcan (2010) aplicou um questionário com duas questões
abertas, envolvendo propriedades básicas de MC e MQ. Os estudantes, com idades entre 21 e
23 anos, já haviam realizado um curso de MQ e levaram cerca de vinte minutos para responder
o questionário. Foi possível categorizar as respostas dos alunos em três grupos para a MC (a
MC apresenta um ponto de vista holístico; as predições da MC são deterministas; a estrutura
matemática da MC é diferente da utilizada na MQ) e quatro para a MQ (sistemas subatômicos
são descritos pela MQ; o movimento do sistema é descrito pela equação de Schrödinger; as
previsões da MQ são baseadas em probabilidades; a estrutura matemática da MQ é diferente
daquela para a MC). Nove subgrupos de análise são apresentados para a MC e outros nove
para a MQ. O estudo indica que os estudantes possuem dificuldades para identificar diferenças

19
entre MC e MQ e que as descrições apresentadas para os prováveis caminhos de
aprendizagem devem servir para melhorar o currículo e desenvolver novas estratégias de
ensino.
Destacando o Princípio de Incerteza e a Dualidade Onda-Partícula como fundamentais
para a compreensão da MQ, Ayene et al. (2011) apresentam um trabalho que enfatiza as
descrições de estudantes sobre estes conceitos. Um estudo fenomenográfico, com uma
entrevista semiestruturada, foi realizado com 25 estudantes de curso de graduação em uma
universidade etíope. A descrição dos estudantes sobre dualidade onda-partícula foi mapeada
em três categorias: clássica, mista e semiquântica. A descrição do conceito de incerteza foi
separada em quatro grupos: incerteza como propriedade extrínseca do processo de medição,
princípio de incerteza como erro ou incerteza de medição, incerteza como distúrbio da medição
e incerteza como o princípio de incerteza da MQ. De modo geral, os estudantes tiveram a
tendência de mostrar uma visão mais clássica na interpretação da MQ; entretanto, uns poucos
estudantes utilizaram fenômenos tipicamente ondulatórios como interferência e difração em
sua descrição das propriedades ondulatórias de entidades quânticas. Este resultado, ainda
assim, é extremamente consistente com o que havia sido encontrado em estudos anteriores
pelos autores.
Considerado como elemento importante no ensino do formalismo da MQ, o
experimento de Stern-Gerlach é utilizado por Zhu e Singh (2011) para a compreensão de
alguns conceitos como o da preparação de um específico estado quântico a partir de um
estado arbitrário, a evolução temporal da função de onda e a medição em MQ. A análise foi
realizada através de entrevistas individuais com mais de duzentos estudantes de Física de
várias universidades em cursos de pós-graduação e de graduação e que cursavam disciplinas
de MQ. Os estudantes apresentaram dificuldades na distinção entre o espaço físico (em que o
experimento é realizado) e o espaço de Hilbert (em que se situa o estado do sistema) e na
preparação de um estado quântico específico em um espaço de Hilbert bidimensional. As
dificuldades encontradas foram usadas como guia para a elaboração de um tutorial para
auxiliar os estudantes no aprendizado de princípios fundamentais da MQ utilizando o
experimento de Stern-Gerlach. Em análises preliminares, o tutorial pareceu realmente melhorar
a compreensão de conceitos da MQ no contexto deste experimento.
Pereira e Ostermann (2012) analisaram o modo como recursos textuais disponíveis
moldam as explicações dos futuros professores de Física sobre MQ. O estudo foi desenvolvido
em uma disciplina introdutória de MQ de um curso de licenciatura, sendo este o primeiro
contato formal dos estudantes com esta matéria. Os estudantes foram submetidos a um teste
do tipo lápis e papel com uma questão conceitual sobre o formalismo da MQ e uma aplicação
da equação de Schrödinger independente do tempo para um elétron preso em um potencial
quadrado infinito. Este teste foi realizado em pequenos grupos (dois ou três alunos) e constituiu
uma das avaliações do curso, podendo ser consultado o material de apoio da disciplina e
acessar a internet. Microfones e gravadores de som foram instalados para registro do áudio
das conversas dos alunos. A análise dos discursos mostrou que as primeiras explicações dos

20
alunos se basearam na dicotomia “determinismo-probabilismo”, ora em combinação com a
explicação geral do Princípio de Incerteza, ora com o postulado de Born, que afirma que o
quadrado do módulo da função de onda representa a densidade de probabilidade de se
encontrar o objeto quântico em uma determinada região do espaço. A introdução de textos
explicativos na resolução da questão permitiu que os estudantes subvertessem suas respostas,
inserindo novos conceitos, e que ficassem mais próximos de uma explicação completa e
adequada ao problema proposto.
Para investigar as dificuldades que estudantes possuem a respeito da MQ não-
relativística de uma partícula em uma dimensão espacial, Zhu e Singh (2012) desenvolveram e
aplicaram um questionário a mais de duzentos estudantes de graduação e pós-graduação de
dez universidades. O questionário apresentava perguntas relacionadas a possíveis funções de
onda, estados ligados e de espalhamento, processos de medição, valores esperados, papel do
Hamiltoniano e dependência temporal da função de onda e de seus valores esperados. Os
resultados apontam muita dificuldade dos estudantes na compreensão destes conceitos e que
tutoriais e métodos de peer-instruction podem ajudar a reduzir significativamente tais
dificuldades. Os autores também observam que cursos de graduação de MQ não têm sido
efetivos em ajudar na compreensão destes tópicos, principalmente porque, em geral, o foco é
mantido em avaliações quantitativas.
Hilger e Moreira (2013) apresentam alguns resultados preliminares de uma
investigação sobre eventuais representações sociais da teoria quântica, possivelmente
compartilhadas entre 238 estudantes do EM, todos da mesma cidade. O objetivo do trabalho
era o de identificar e caracterizar possíveis representações sociais utilizando testes de
associação numérica e escrita de conceitos, além de técnicas de análise multidimensional para
o estudo dos dados obtidos. Segundo os autores, a compreensão dessas representações pode
fornecer indícios acerca da influência dos meios de divulgação sobre as ideias dos indivíduos a
respeito de conceitos científicos. Estas representações integram o conhecimento prévio do
aluno e terão papel fundamental para a ocorrência de aprendizagem significativa da Física
Quântica, caso possam ser caracterizadas como subsunçores. Os resultados apontam que as
representações sociais dos conceitos quânticos são desenvolvidas de forma a que podem se
tornar grandes obstáculos epistemológicos para a compreensão dos conceitos cientificamente
aceitos.
Sinarcas e Solbes (2013) analisam o processo de ensino-aprendizagem em estudantes
de segunda série do EM da Espanha e mostram as principais dificuldades enfrentadas por
eles, principalmente as de cunho ontológico e epistemológico. Após a aplicação de um
questionário a 78 estudantes e a análise de 10 livros didáticos, os autores consideram que os
alunos possuem grandes dificuldades de compreensão da MQ, especialmente sobre o espectro
descontínuo do átomo de Bohr, a diferença entre estado clássico e estado quântico de um
sistema e a implicação tecnológica da MQ, e que os livros não conduzem à aprendizagem
significativa dos conteúdos abordados, pois não introduzem os conceitos de forma crítica. O
trabalho apresenta uma crítica razoável à prática tradicional para o ensino de MQ, visto que os

21
estudantes não compreendem efetivamente o papel da teoria quântica, e aponta uma nova
abordagem para seu ensino. Os autores defendem que o ensino de MQ deve ser desenvolvido
levando em conta o currículo oficial, os resultados da pesquisa educacional e o
desenvolvimento histórico da MQ, incluindo conceitos e conteúdos procedimentais e tópicos da
Natureza da Ciência e das relações Ciência-Tecnologia-Sociedade. Uma unidade de ensino
obedecendo estes pontos foi desenvolvida e está sendo utilizada com alunos de EM para
verificar se há superação das dificuldades e êxito nos objetivos propostos.
Didiş et al. (2014) apresentam a primeira parte de um estudo visando examinar os
modelos mentais de 31 estudantes acerca da quantização de observáveis físicos, tais como
luz, energia e momento angular, em um curso de Física Moderna. Os estudantes eram
provenientes de curso de graduação em física ou em ensino de física. A análise qualitativa,
segundo diversas entrevistas realizadas com os estudantes, revelou seis variações dos
modelos mentais sobre a quantização dos observáveis físicos: modelo científico, modelo
científico primitivo, modelo de retalhamento, modelo alternado, modelo integrado e modelo
evolutivo. Os modelos dos estudantes foram determinados conforme o contexto e, além disso,
alguns estudantes apresentavam um modelo misto, com a utilização de múltiplos modelos
mentais, para explicar um fenômeno e os usavam de forma inconsistente.

3.4. Análise de material didático

Fazendo uma análise da presença de tópicos de FMC em livros didáticos de EM


disponibilizados pelo Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Médio (PNLEM),
Dominguini (2012) apresenta a opinião dos autores acerca da inserção destes temas no EM.
Cinco livros foram analisados, todos contendo tópicos de FMC, seja em forma de capítulo,
unidade ou em textos dispersos ao longo da obra. Os autores de dois livros consideram que a
FMC não é um conteúdo específico de EM e deve ficar como um suplemento informativo
dentro de outros capítulos, e ministrado somente se houver tempo e disponibilidade no
currículo; os outros três autores defendem a inserção de FMC como essencial no EM, a
ausência de tais temas sendo absurda e insustentável.
Simon et al. (2014) analisam um conjunto de livros de divulgação científica que
abordam a MQ, visando sua utilização em cursos de nível superior. Dez livros foram
selecionados segundo alguns critérios estabelecidos pelos autores: grau de adequação ao
público-alvo, conceitos abordados, adoção de formulações matemáticas ou não e menção a
experimentos ou não. Os autores consideram que os livros de divulgação científica, ao
apresentarem os conceitos de forma rigorosa, podem se tornar uma opção plausível para
discussões em disciplinas de mecânica quântica no ensino superior, sendo que nove dos dez
livros analisados se mostraram adequados para o uso nas condições apresentadas. Salientam
também que, apesar disso, a mera utilização dos livros analisados em sala de aula não fará
com que o tema seja abordado de forma mais conceitual, mas pode ser um suporte para o
professor. Ademais, é necessário que a didática do professor seja revista e que ele tenha um

22
profundo conhecimento sobre o tema, para poder trabalhar os conceitos de forma clara e
motivadora sem envolver cálculos matemáticos sofisticados.

3.5. Estudos de formação continuada

Considerando que a inserção de tópicos de FMC no EM é algo consensual entre


pesquisadores na área de ensino de física, J. R. N. Silva et al. (2012) elaboraram um trabalho
visando proporcionar a atualização das práticas de professores das redes de ensino público e
privado em assuntos relacionados a conteúdos específicos de FMC. Um grupo de
estudo/discussão foi formado e buscou-se investigar a presença de Necessidades Formativas
para os professores de ciências, concluindo que a participação num grupo de estudo/discussão
de tópicos de FMC pode suscitar nos participantes o desenvolvimento dessas características,
principalmente no que se refere à possibilidade de explicarem fenômenos antes
desconhecidos. As Necessidades Formativas são características consideradas necessárias
para a formação de um bom professor, tais como: ruptura da visão simplista do ensino de
ciências; conhecer a matéria a ser ensinada; questionar as ideias docentes do senso comum;
adquirir conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem das ciências; saber preparar atividades
capazes de gerar uma aprendizagem efetiva; saber avaliar. Com base na análise individual dos
professores do grupo, acreditam os autores que a metodologia de trabalho deste grupo pode
servir como um modelo para grupos de formação continuada de professores de ciências.

4. Considerações acerca da revisão da literatura

Apresentamos neste capítulo uma síntese de cinco artigos de revisão publicados em


anos anteriores, bem como uma nova revisão até meados de 2015, em que o foco são
trabalhos relacionados ao ensino de MQ. O tema inclui, pela correlação, também artigos sobre
ensino de FMC.
Das cinco revisões mencionadas, três apresentam trabalhos compreendendo
exclusivamente tópicos de MQ (Greca e Moreira (2001), Pantoja et al. (2011) e Silva e Almeida
(2011)), enquanto as demais abordam trabalhos sobre tópicos de FMC (Ostermann e Moreira
(2000) e Pereira e Ostermann (2009)). O primeiro trabalho de revisão apresentado, de
Ostermann e Moreira (2000), considera que o pequeno número de artigos relacionados a
estudos sobre concepções alternativas e a propostas testadas em sala de aula deve incentivar
a pesquisa nessa área. O segundo artigo, de Greca e Moreira (2001), observa que os trabalhos
listados indicam que os estudantes não compreendem satisfatoriamente os conceitos da MQ,
mesmo que muitas das pesquisas realizadas não sejam conclusivas a respeito. Além disto, os
autores criticam as abordagens tradicionais da MQ e recomendam uma ênfase nos aspectos
conceituais desta teoria em cursos introdutórios. No terceiro trabalho, Pereira e Ostermann
(2009) comentam que há uma escassez de estudos relativos à formação inicial e continuada de
professores e sugerem investigar os processos conduzidos em sala de aula, que estruturam e

23
condicionam a aprendizagem, mesmo sabendo da importância no rigor e na ênfase que devem
ser dados aos conceitos-chave. O quarto trabalho, de Pantoja et al. (2011), destaca o aumento
da quantidade de artigos publicados na categoria de implementação de propostas didáticas
(cinco e oito trabalhos, respectivamente, nos dois últimos anos da revisão) e tais
implementações ocorrem, em sua maioria, no Ensino Superior (21 dos 25 trabalhos
encontrados). Para a aplicação destas propostas, os autores apontam que as metodologias
mais utilizadas são a aula expositiva, a instrução via laboratórios virtuais ou uma combinação
destas duas. O quinto trabalho, de Silva e Almeida (2011), é específico para artigos
relacionados com o EM e indica que a pertinência de se ensinar MQ no EM é cada vez mais
consensual entre os pesquisadores da área, além de destacar que a existência de inúmeras
sugestões de formas de abordagem da MQ evidencia a falta de definição no que tange aos
conteúdos a serem ministrados no EM. Os autores ressaltam, também, a necessidade de
realização de mais pesquisas sobre o ensino de MQ no EM, visando ampliar o conhecimento
sobre o assunto e possibilitar que professores trabalhem tais tópicos em sala de aula.
Em seus trabalhos, Ostermann e Moreira (2000) e Greca e Moreira (2001) não indicam
o número de artigos analisados em suas revisões, mas se estima que sejam mais de 50
trabalhos na primeira revisão e mais de 40 trabalhos na segunda revisão. Pereira e Ostermann
(2009) apontam 102 artigos encontrados com a temática de estudo em seu trabalho, enquanto
Pantoja et al. (2011) encontraram 60 trabalhos e Silva e Almeida (2011) relacionaram 23
trabalhos. Isto indica que, desde a década de 1970, cerca de 270 artigos foram analisados
nestas revisões. Este número pode ser ligeiramente menor, visto que alguns artigos aparecem
em mais de uma revisão.
A nova revisão, por nós organizada, relativa ao período de 2010 a 2015, encontrou 39
trabalhos relacionados ao tema de FMC, particularmente sobre tópicos de MQ, sendo
dezesseis trabalhos relacionados com o EM ou com implicações para ele (sete em propostas
pedagógicas, cinco em propostas didáticas implementadas, três em estudos sobre concepções
e um em cada uma das demais). No período em análise, a revisão inclui o conteúdo e os temas
mais atuais de MQ apresentados no Ensino de Física, segundo os periódicos analisados. As
cinco revisões anteriores apontaram escassez ora na aplicação de propostas didáticas, ora nos
estudos de levantamento de concepções, enquanto a presente revisão constata que os
trabalhos estão bem divididos nas três primeiras categorias (onze na primeira, quatorze na
segunda e onze na terceira), indicando que os estudos sobre a inserção de tópicos de MQ
estão sendo realizados em diferentes abordagens de pesquisa. Alguns trabalhos encontrados
no levantamento desta revisão mostram, inclusive, que algumas abordagens compreendem o
ensino dos conceitos e princípios da MQ em níveis mais aprofundados, tais como em cursos de
bacharelado ou de pós-graduação.
O presente trabalho visa a implementação de uma proposta didática com conceitos e
princípios fundamentais da MQ para alunos de EM, algo não encontrado nos trabalhos
analisados.

24
O desafio inerente à pesquisa neste campo de conhecimento fica explícito em
praticamente todos os trabalhos encontrados, seja os relativos ao EM, ao ensino superior ou na
formação continuada de professores. Isto, no entanto, não deve causar impedimentos para o
desenvolvimento da pesquisa em Ensino de Física, mas sim promover uma busca por
diferentes formas de apresentação da MQ, visando a atualização curricular e o interesse dos
alunos nos conteúdos de Física e na carreira científica.

25
CAPÍTULO III

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: MECÂNICA QUÂNTICA

Este trabalho, como mencionado anteriormente, envolve uma atividade de ensino


introdutório de Mecânica Quântica (MQ) para o Ensino Médio (EM), aplicada em sala de aula.
Distinguindo-se da maioria das escolhas de temas ofertados ao EM, encontradas na literatura,
a presente proposta enfoca alguns dos primeiros conceitos e princípios da Teoria Quântica não
relativística.
Considera-se oportuno, então, incluir neste texto algum detalhamento sobre o conteúdo
quântico que embasa o curso. Os postulados abordados são encontrados na obra pioneira de
Dirac (1930) ou ainda, por exemplo, em Messiah (1959) e em Cohen-Tannoudji, Diu & Laloë
(1973) (e edições posteriores), entre outros autores.

1. Introdução

A MQ e a Teoria da Relatividade mudaram a maneira de ver e compreender o mundo


físico, causando uma revolução e um avanço no conhecimento sobre a Natureza sem
precedentes, no século XX.
A teoria quântica fornece um excelente modelo para a abordagem do mundo
microscópico do átomo (Dicke e Wittke, 1973, p. V), bem como para a compreensão de vários
fenômenos revelados por sistemas de maiores dimensões e como base para aplicações
tecnológicas de grande impacto nas áreas mais diversas, algumas próximas à Física e outras
bastante distantes dela. Áreas como as das Comunicações, da Saúde e da Informação se
amparam fortemente na MQ e aparelhos como os de tomografias, ressonância magnética e
PET Scan, além de lasers, semicondutores e supercondutores, são apenas alguns exemplos
utilizados rotineiramente na atualidade.
No livro "O que é Vida?", publicado em 1944, Schrödinger (1997) afirma que “a MQ é o
primeiro aspecto teórico que dá conta, a partir de princípios básicos, de todos os agregados de
átomos presentes na Natureza”.
Classificada como uma teoria, pois possui um número relativamente pequeno de
premissas, das quais decorre toda uma gama de fenômenos observados, que a Física Clássica
não descreve, a MQ nos surpreende ainda hoje com consequências novas e intrigantes. Os
postulados constituem o cerne da teoria, mas são, via de regra, pouco abordados nas
modalidades de ensino introdutório da MQ.
A justificativa de selecionar para cursos iniciais e de curta duração os primeiríssimos
conceitos e princípios da MQ reside, para nós, em pelo menos um quarteto de considerações:
explicitação das diferenças entre as premissas da FC e da MQ; baixa oferta destes tópicos em
cursos introdutórios; avanço tecnológico propiciado pela pesquisa fundamentada nesta teoria;

26
interesse de áreas de conhecimento dantes não relacionadas à MQ, em número cada vez mais
crescente.
A estudantes e profissionais de áreas não diretamente relacionadas à Física
interessam mais os aspectos conceituais da Teoria Quântica e menos a resolução de
problemas específicos, como os de equações de autovalores de energia de sistemas
complexos, investigados pela Física Atômica, pela Física Molecular e pela Física Nuclear.
Neste contexto, são apresentados a seguir, então, alguns dos conceitos e princípios da
MQ, que embasam o projeto de ensino assunto deste trabalho. O curso não utiliza a
formulação dos mesmos, mas apresenta situações-problema que conduzem o aluno a
compreender o que vários dos postulados estabelecem.

2. Postulados da Mecânica Quântica

A MQ não-relativística, enquanto teoria, se desenvolveu tanto a partir da Mecânica


Ondulatória como a partir da Mecânica Matricial e, a seguir, através da Formulação Abstrata,
sintetizada por Dirac (1930; d’Espagnat, 1976, p. 6). Quanto à evolução temporal em Física
Quântica, uma apresentação tradicional da mesma (aqui priorizada) recorre à descrição de
Schrödinger, que atribui aos estados dos sistemas quânticos a responsabilidade de evoluir no
tempo, enquanto a descrição de Heisenberg, atribui aos operadores tal função.
Utiliza-se, ademais, a notação de Dirac, tal qual apresentada em Dirac (1930) e em
Messiah (1959), em que o estado quântico é simbolizado por um vetor ( ; ket), acrescido de
uma característica interna, por exemplo, ou .
Os princípios (ou postulados) referem-se a conceitos introduzidos, via de regra, com o
recurso da linguagem tradicional, usada também em FC. Os primeiros conceitos introduzidos
são o de sistema físico e o de grandeza física (ou observável), o sistema podendo ser
elementar ou complexo, dependendo do interesse que se tenha em examinar suas
propriedades.
Além disto, em algumas instâncias, são introduzidas correspondências entre elementos
físicos e matemáticos, o que é explicitado em cada princípio.
Na introdução gradual dos postulados da MQ, batizamos de “postulado zero” uma
correspondência entre um sistema físico e uma estrutura matemática, a saber, a assertiva: “A
2
todo o sistema físico corresponde um espaço linear complexo ”. Tal afirmação pode ser
também absorvida como: “Em MQ, vale o princípio da superposição linear”.
Como se poderá observar, este princípio vale para vetores geométricos em um espaço
linear, bem como para ondas.
Então, não sendo novidade, o que há de especial nesta afirmação? De fato, trata-se
aqui de um postulado de correspondência entre a Física de um sistema quântico e os
construtos implícitos em um espaço vetorial. É nesta álgebra que a fenomenologia da MQ
encontra guarida e, consequentemente, também nas propriedades associadas às operações
2
O espaço linear complexo mencionado é, de fato, um espaço de Hilbert, mas, para cursos introdutórios, evita-se esta
especificação que impõe a introdução de conceitos matemáticos mais elaborados.

27
com vetores e operadores. Efetivamente, espaços lineares complexos são definidos sobre o
campo dos escalares complexos, e incluem vetores e operadores; os vetores podem se
superpor linearmente gerando novos vetores e são transformados pela ação de operadores
sobre eles.
O princípio da superposição linear estabelece que, dados dois (ou mais) vetores de um
espaço linear, qualquer combinação linear destes vetores também é um vetor deste espaço
linear.

2.1. Primeiro Postulado: Estado de um Sistema Quântico

O primeiro postulado se refere à entidade fundamental da MQ, o estado físico quântico,


e pode ser enunciado como: “A todo estado de um sistema quântico, em dado instante de
tempo, corresponde um vetor no espaço linear”.
O conceito de estado de um sistema quântico é basicamente o mesmo que o de estado
de um sistema clássico (embora seja muito menos citado em Física Clássica) e pode ser
apresentado como um conjunto de valores de grandezas físicas (compatíveis), em um
determinado instante de tempo. O estado pode ser pensado, então, como um conjunto de
valores de tudo a respeito de que se pode ter conhecimento concomitante sobre o sistema, em
um dado instante de tempo. No caso clássico, em geral, as grandezas físicas são compatíveis,
o que torna a concepção de estado quase trivial.
Por exemplo, quando se extravia um objeto e se pede ajuda a outras pessoas para
encontrá-lo, é necessário informar sobre as características do objeto para obter sucesso na
busca do mesmo. Não basta caracterizá-lo tal qual um fabricante detalha as informações
técnicas de seu produto; é importante apresentar, também, especificações que tornem este
objeto singular e pertencente a quem o procura. Muitas destas características não variam com
o tempo, enquanto outras, sim. No exemplo citado, é sempre útil declarar qual a localização do
objeto no momento em que foi perdido embora, em geral, o objeto, se reencontrado, estará em
outro local. A relação das informações acerca do objeto constitui o estado do mesmo naquele
instante de tempo.
Assim, alternativamente, pode-se enunciar o primeiro postulado da Mecânica Quântica
como: “Tudo o que se pode saber sobre o sistema físico em um dado instante de tempo t está
expresso em seu estado, caracterizado pelo vetor de um espaço linear ”. A
correspondência entre estado e vetor está contida neste enunciado, atribuindo ao estado do
sistema quântico o papel de ente fundamental da MQ, papel este que, em espaços lineares,
recai sobre o vetor.
A diferença entre o estado de um sistema elementar clássico e o de um sistema
elementar quântico é, pois, que, em princípio, em FC o estado quando conhecido
completamente reúne valores de todas as grandezas físicas associadas ao sistema, enquanto
em Física Quântica isto ocorre apenas para os observáveis ditos compatíveis, como se verá na
próxima seção.

28
Assim, o estado de um sistema quântico, quando conhecido completamente, contém as
informações sobre valores de todos os observáveis compatíveis de um dado conjunto, em
determinado instante de tempo. Isto implica em que deve ser possível acessar (medindo) estas
informações e a isto se referem os quatro postulados seguintes.
Pelo primeiro postulado, então, os estados de sistemas quânticos podem ser descritos
como vetores pertencentes a espaços lineares e sobre tais vetores podem ser executadas
operações que, em geral, caracterizam modificações dos estados.
O princípio da superposição linear, nesta teoria, estabelece que, dados dois (ou mais)
estados distintos admissíveis para um determinado sistema ou objeto quântico, então qualquer
combinação linear destes dois (ou mais) estados também é um estado admissível para o
sistema. Esta é uma decorrência simples do primeiro postulado que implica, no entanto, em
consequências sobre situações físicas importantíssimas não previstas em Física Clássica, mas
observadas em sistemas quânticos.
O princípio da superposição linear, consequência do primeiro postulado, é apresentado
antes de outros postulados porque nele reside grande diferença de comportamento entre os
sistemas clássicos e os sistemas quânticos, distinção básica entre a teoria clássica e a teoria
quântica.
É importante salientar que este postulado não impõe a superposição linear aos objetos
quânticos, mas sim aos estados dos objetos quânticos. Como exemplo, pode-se analisar a
situação de um elétron submetido ao experimento de dupla fenda.
Para este elétron, consideram-se duas possibilidades (fendas) de passagem, ou seja,
dois estados caracterizados classicamente por “estado de passagem pela fenda 1, ”, e
“estado de passagem pela fenda 2, ”. Logo, um estado possível para este elétron, pelo

princípio em questão, pode ser a superposição linear , que seria lida como

“estado de passagem pelas fendas 1 e 2”. Nada trivial!

2.2. Segundo Postulado: Grandezas Físicas e Operadores

Para conhecer completamente o estado de um sistema, em MQ, é necessário medir


3
todas as grandezas físicas compatíveis de um conjunto, associadas a este sistema. Medir uma
dada grandeza física implica em uma operação de medida sobre o sistema. Tal operação é
simbolizada no formalismo por um operador. Assim, o segundo postulado da teoria pode ser
enunciado da seguinte maneira: “A cada grandeza física em MQ corresponde um operador
linear hermitiano , pertencente a um espaço linear ”. Em MQ, a medição é um processo que,
4

via de regra, modifica o estado do sistema em análise. Assim, diferentemente da FC, o estado

3
Por observáveis compatíveis entendem-se aqueles tais que, a medida dos valores de um deles, pode não alterar os
valores da medida do outro. Em MQ a incompatibilidade de observáveis ocorre, por exemplo, entre os observáveis
posição e momento linear (numa dada direção). Esta incompatibilidade entre posição e momento linear é comumente
apresentada como o Princípio de Incerteza de Heisenberg. Pressupõe-se que os valores das medidas possam ser
obtidos em um grande conjunto de sistemas, todos inicialmente nas mesmas condições.
4
Operador linear hermitiano (Â) é aquele que satisfaz, no produto escalar em que se encontra intercalado entre vetores
e , a relação . Tal operador possui somente autovalores reais e autovetores ortogonais
para autovalores distintos.

29
de um sistema quântico não inclui informações sobre os valores de todas as grandezas físicas
associadas ao sistema em um dado instante de tempo. Somente valores de observáveis
compatíveis podem caracterizar um mesmo estado do objeto quântico, no mesmo instante de
tempo. Como as grandezas físicas são passíveis de serem medidas, a cada grandeza física
deverá corresponder uma operação de medida adequada e, portanto, um operador adequado.
Como exemplos, tem-se que ao observável físico posição corresponde um operador
posição, ao observável energia corresponde um operador hamiltoniano em determinadas
condições, ao observável projeção de spin em uma dada direção corresponde o operador de
projeção de spin naquela direção, etc.
De acordo com o segundo postulado, então, medidas em MQ estão relacionadas a
ações de operadores sobre estados dos sistemas.

2.3. Terceiro Postulado: Valores de Medidas

Enquanto os postulados anteriores podem ser considerados como postulados de


correspondência entre o papel de vetores e operadores em espaços lineares e o de estados de
sistemas físicos e de operações físicas – de medida ou não – sobre os estados, os demais
postulados introduzem novas imposições. Apesar de relacionar grandezas físicas com
operadores, o segundo postulado nada afirma sobre quais são os possíveis valores das
medidas.
Em FC, o espectro de valores possíveis para as medidas de grande número de
grandezas físicas está no contínuo, mas em MQ, dependendo da situação em análise, isto
pode não ocorrer. Pode-se citar, como exemplo, os valores de energia (de ligação) do elétron
do átomo de hidrogênio, os estados associados denominados autoestados e os valores
obtidos, autovalores. Classicamente, esperar-se-ia que tais valores de energia estivessem em
um continuo, o que não ocorre. Os valores de energia de tal elétron podem ser obtidos, em
MQ, a partir de uma equação (dita de autovalores) relativa ao operador hamiltoniano
correspondente, concordando extremamente bem com os resultados experimentais. (Em um
modelo bastante simplificado, obtêm-se autovalores , , e assim por

diante, ou seja, o espectro de energias em questão é discreto.)


O que se observa, em geral, na MQ é que os resultados experimentais estão de acordo
com aqueles decorrentes de cálculos de autovalores de operadores adequados, o que reforça
a motivação para o segundo postulado, relativo à sua correspondência aos observáveis físicos.
O terceiro postulado está, então, estritamente relacionado aos possíveis valores de medida de
um observável e pode ser enunciado da seguinte forma: “Os únicos resultados possíveis da
medida de uma grandeza física são os autovalores do operador associado ao observável”. Este
postulado pode parecer estranho porque não menciona o estado do sistema, ou seja, os
resultados (possíveis) de medidas parecem independer dos estados do sistema e se
vincularem apenas ao operador associado à grandeza física.

30
Observe-se que alguns observáveis, inclusive posição e momento, possuem
autovalores contínuos, embora outros apresentem autovalores discretos em número infinito ou
até mesmo em número limitado (por exemplo, projeção de spin do elétron em uma dada
direção).

2.4. Quarto Postulado: Probabilidade de Ocorrência dos Valores de Medida

Apesar de o terceiro postulado informar sobre os possíveis valores de medida de uma


grandeza física, ele não estabelece qual a obtenção, em medidas, de algum valor em
particular. Pelo princípio de superposição linear, estados de sistemas quânticos podem ser
expressos como (decompostos em) combinações de outros estados, em particular no conjunto
de autoestados de um operador que corresponde a um observável físico. Um estado, quando
decomposto em autoestados de certo operador que corresponde a um
observável físico, apresenta, em situações de medida dos autovalores do referido operador,
probabilidades distintas de ocorrência de cada autovalor.
O quarto postulado se refere a estas probabilidades e pode ser enunciado como segue,
na situação simples de um observável que possui um conjunto de autovalores discretos e não
degenerados: “Na medida da grandeza física A sobre um sistema quântico que se encontra no
estado , de norma 1, com decomposição espectral em autoestados do operador Â
5
que corresponde à grandeza A (caso discreto e não degenerado ), a probabilidade de se obter
o autovalor de Â é ”.
Por exemplo, um dado estado de projeção de spin de um elétron (supostos de norma
1), com decomposição espectral em autoestados de projeção de spin em uma dada direção ( ),

pode ser expresso como . Neste caso, há uma probabilidade de

⅓ de se obter o autovalor e uma probabilidade de ⅔ de se obter o autovalor , para


a projeção de spin na direção .
Este postulado, cuja comprovação se dá realizando um grande número de medidas
sobre sistemas, todos no mesmo estado, assegura também que quando o objeto físico se
encontra em um autoestado do operador que corresponde à grandeza física medida, a
probabilidade de se obter o autovalor correspondente é 1 e a de se obter qualquer outro
autovalor é 0.

2.5. Quinto Postulado: Colapso do Estado

O que ocorre com o estado do sistema quântico após ter sido feita a medida de alguma
grandeza física? Em geral, o sistema não mais se encontra no estado anterior à medida,
estado este que se constitui em uma superposição de autoestados do observável em análise.

5
Nesta tese não serão consideradas situações de casos degenerados, discretos ou contínuos, por questão de
simplicidade.

31
Por efeito da medida, o estado “colapsa” para o autoestado referente ao autovalor obtido e,
6
imediatamente após, uma segunda medida confirma o valor da primeira.
Com este postulado, simplifica-se o tratamento do processo de medida. A redução do
estado, ao realizar-se uma medida de uma grandeza física, presente no quinto postulado, pode
ser enunciada da forma seguinte. “Se a medida de um observável A sobre o sistema físico que
se encontra no estado resulta no autovalor do operador Â
correspondente (caso discreto e não degenerado), imediatamente após a medida o estado do
sistema é o autoestado ”.
O estado citado como exemplo na seção 2.4, após uma medida da projeção de

spin na direção com autovalor , passa a se encontrar no estado . Uma segunda

medida em um instante posterior imediato fornecerá, com probabilidade igual a 1, o valor .


Um tratamento mais elaborado sobre a transformação que afeta o estado no ato da medida é
feita por vários autores, mas resulta bastante complexa para o nível de ensino pretendido com
este trabalho (vide, por exemplo, Gottfried (2003)).

2.6. Sexto Postulado: Evolução Temporal dos Estados Quânticos

Para repetir o mesmo resultado de certa medida, em MQ, foi mencionado que se deve
efetuar a segunda medida imediatamente após a primeira. Isto porque o sistema quântico pode
evoluir e se modificar com o transcorrer do tempo. Em MQ, apesar de não haver um
determinismo como o da FC para a obtenção de resultados nas medidas de valores de
observáveis físicos, existe uma lei (causal) que rege a evolução temporal dos estados de
sistemas quânticos.
O sexto postulado introduz a equação de Schrödinger dependente do tempo como tal
lei causal para os estados de sistemas quânticos. “A evolução temporal do estado de um

sistema quântico é governada pela equação de Schrödinger , em que


7
é o operador hamiltoniano associado à interação que sofre o sistema ”.
A superposição linear de estados provoca, muitas vezes, interessantes efeitos na
evolução temporal dos estados de sistemas quânticos. No caso de uma partícula confinada a
uma região de potencial do tipo oscilador harmônico duplo (a uma dimensão espacial, por
exemplo), em uma superposição dos dois primeiros autoestados de energia, a partícula oscila,
com o passar do tempo, entre as duas regiões do potencial, ocorrendo, em alguns momentos,
maior probabilidade de ser encontrada de um lado do potencial e, em outros momentos, do
outro lado. Tal efeito serve de base para a construção de relógios atômicos, por exemplo como
na caso da molécula de amônia.

6
Imediatamente, aqui, significa que o intervalo de tempo transcorrido entre o instante da primeira medida e o instante
de uma nova observação é suficientemente pequeno para que o estado do sistema não se modifique expressivamente
no tempo, ou seja, a única modificação significativa do estado seja a provocada pelo ato de medida.
7
Para que o operador hamiltoniano represente a energia total do sistema, é necessário que seja independente do
tempo.

32
3. Situações de aplicação dos postulados

Considerando apenas os seis postulados apresentados, na realização de um curso


para alunos de EM pretende-se analisar, sobretudo, as dificuldades enfrentadas na
compreensão dos conceitos de estado e de superposição linear de estados pelos estudantes.
Tais conceitos permeiam algumas situações incluídas no curso cabendo aqui, então, uma
breve apresentação das mesmas. Na análise e discussão de resultados, a compreensão dos
alunos é averiguada com base nestas aplicações.
São apresentados experimentos de dupla fenda, o experimento de Stern-Gerlach, uma
análise da polarização da luz, o emaranhamento quântico, a criptografia quântica e três outras
situações de forma abreviada.

3.1. Experimentos de Dupla Fenda

O aparato necessário para a execução de um experimento dito de dupla fenda consta


8
basicamente de uma fonte que emitirá o objeto de análise, um anteparo com duas fendas e
um segundo anteparo para efeitos de registro. A figura 1 ilustra simplificadamente o esquema
deste experimento.

Figura 1. Esquema de um experimento de dupla fenda com fonte, anteparo dotado de duas
fendas e anteparo de registro.

Três casos são comumente analisados neste tipo de experimento: experimento com
ondas eletromagnéticas, experimento com partículas clássicas e experimento com partículas
quânticas. O primeiro recai no conhecido experimento de Young, descrito pela Mecânica
Ondulatória, como também o experimento do tanque de ondas realizado, em geral, em água.
Quando de sua elaboração, o experimento de Young auxiliou no estabelecimento do caráter
ondulatório da luz, reforçando o encerramento de um debate que se arrastava desde a época
de Newton a respeito da dualidade da natureza da luz, como onda ou como partícula. Contudo,

8
Por simplicidade, consideram-se duas fendas de mesmas dimensões e dispostas simetricamente em relação à fonte.

33
arranjos mais modernos deste experimento possibilitaram a verificação de que, mesmo objetos
tradicionalmente descritos como partículas, manifestam propriedades de caráter ondulatório. A
explicação ondulatória usual do experimento de Young se refere à chegada de uma mesma
frente de onda em cada uma das fendas, com ocorrência de difração e geração de duas novas
ondas. Estas duas ondas interferem de forma construtiva e destrutiva, gerando um padrão de
interferência (vide figura 2).

Figura 2. Padrão de interferência obtido no experimento de dupla fenda com ondas


eletromagnéticas.

9
Se o experimento for realizado com partículas clássicas , o padrão visualizado é
completamente diferente do ondulatório. Neste caso, observa-se que as partículas passam ou
pela fenda 1 ou pela fenda 2, pois somente aparecerá uma franja na região atrás de cada
fenda no anteparo de registro, conforme apresentado na figura 3. O estado do objeto não será
descrito como uma superposição de estados de passagem pelas fendas 1 e 2. A ausência de
superposição linear classifica este sistema como clássico.

Figura 3. Experimento de dupla fenda com partículas clássicas.

Os resultados do experimento de dupla fenda com partículas quânticas, como elétrons,


nêutrons ou prótons, intrigaram a comunidade científica. Poder-se-ia pensar inicialmente que
seria visualizado um padrão semelhante ao das partículas clássicas, por se tratar de porções
de matéria, mas o que se observa é um padrão próximo ao do experimento com ondas,

9
Evita-se a utilização do termo “macroscópico”, pois já são observados comportamentos ondulatórios de objetos
considerados “grandes” como, por exemplo, o fulereno (Arndt et al., 1999). Aspelmeyer e Zeilinger (2008) salientam
que tais situações são tipicamente quânticas.

34
conforme esquematizado na figura 4. A explicação para este resultado utiliza o princípio da
superposição linear. Quando o experimento é realizado com as duas fendas abertas e sem
qualquer dispositivo de medição capaz de interferir com o registro no anteparo final, são
consideradas duas possibilidades básicas para o estado de cada partícula: o estado de
passagem pela fenda 1 e o estado de passagem pela fenda 2. No entanto, o princípio de
superposição linear afirma que, se temos dois estados possíveis para um sistema físico
(estado pela fenda 1 e estado pela fenda 2), qualquer combinação linear desses dois estados
também é um estado possível para o sistema. Observe-se que o “padrão de interferência”
registrado no segundo anteparo se refere à detecção de número de partículas nas regiões
indicadas e que não ocorre contagem de fração de partícula.

Figura 4. Experimento de dupla fenda com partículas quânticas.

Uma das variações importantes do experimento de dupla fenda com partículas


quânticas é o caso de emissão de partícula por partícula pela fonte. Nos primórdios da teoria
quântica, cogitou-se que o padrão de interferência observado para partículas no experimento
ocorria devido à possível interação entre as partículas (de um feixe) na trajetória entre os dois
anteparos. Contudo, fazendo-se com que uma segunda partícula seja emitida somente após a
detecção da primeira no segundo anteparo, observa-se também padrão de interferência e
evita-se que tal hipótese possa ser considerada. Este caso revela mais claramente que o
estado citado anteriormente é uma superposição dos estados associados à passagem da
10
partícula pela fenda 1 e pela fenda 2 .
A simplicidade conceitual destes experimentos sugere que a introdução e a motivação
para o aprendizado de fenômenos quânticos possam ser feitas com o auxílio dos mesmos.
Como ocorrem duas possibilidades em cada experimento (fenda 1 e fenda 2), o sistema pode
ser pensado, de modo simplificado, como binário e se referir, então, a um espaço bastante
simples para a análise dos resultados. Sistemas de superposição simples (binária) são
importantes em MQ, a apresentação de alguns deles ocorrendo nas próximas seções.

10
O padrão de interferência, em ambos os casos, só é obtido após a emissão de um grande número de partículas.

35
3.2. Experimento de Stern-Gerlach

Um exemplo de sistema binário ocorre com o experimento proposto por Gerlach e


Stern (1922), conduzindo à introdução do conceito de spin para o elétron por Uhlenbeck e
Goudsmit (1925; 1926). O arranjo experimental tradicional inclui um forno em que se aquece e
vaporiza o sistema a estudar, um colimador por onde passa o material vaporizado e um campo
magnético fortemente inhomogêneo em uma dada direção, ao qual é submetido o material que
é, finalmente, registrado em um anteparo. Originalmente foi utilizado o metal prata no
experimento, verificando-se que seus átomos se situavam em dois grupos distintos no
anteparo, como representado (de forma ampliada) na figura 5.
A explicação do fenômeno advém do fato de cargas em movimento gerarem campos
magnéticos (vide, por exemplo, Caruso e Oguri (2006) e Walker (2009)), conduzindo a relações
entre momentos angulares de sistemas carregados e momentos magnéticos. Tais momentos
magnéticos, por sua vez, interagem com campos magnéticos inhomogêneos a que
eventualmente as cargas sejam submetidas. Como os átomos são sistemas de partículas
carregadas, pode-se esperar a observação de efeitos desta interação.

Figura 5. Esquema do experimento de Stern-Gerlach.

Na experiência realizada, a escolha do elemento químico prata (Ag) não foi arbitrária. O
elemento contém 47 elétrons e a estrutura eletrônica da prata indica que, no estado
fundamental, apenas um elétron (o de menor energia de ligação) sofre influência do campo
magnético inhomogêneo, ou seja, o campo exerce força magnética praticamente neste único
elétron. Este elétron, contudo, apresenta momento angular orbital zero, o que faria com que o
resultado esperado fosse o de uma franja estreita única no anteparo, na região central entre as
duas faixas indicadas na figura 5. O campo magnético inhomogêneo que atua sobre o 47º
elétron do átomo de prata, exerce uma força , em que V é o potencial

escalar, é o momento magnético devido ao spin do elétron e é o campo magnético


inhomogêneo que atua sobre o elétron. Não existindo momento angular orbital, foi introduzida a
hipótese da existência de um momento angular intrínseco do elétron (spin) que geraria o
momento magnético . Como ocorre um desdobramento do feixe em dois, indicam-se como

36
estados possíveis de projeção do spin na direção do campo os estados e – , tendo-se uma
superposição linear dos mesmos: para o feixe primitivo.

3.3. Polarização da Luz

Outro exemplo binário de grande interesse em Física Quântica é o de estados de


polarização da luz. Considere-se luz plano-polarizada com direção de polarização arbitrária
no plano xz, que se propaga na direção e que incide sobre um polarizador que só permite a
passagem de luz polarizada na direção , conforme esquematizado na figura 6(a).

a) b)
Figura 6. (a) Polarizador na direção (b) Polarizador na direção .

Em uma descrição clássica o campo elétrico correspondente, que aponta na direção ,


é . A intensidade I do campo transforma-se, após a passagem pelo
polarizador , em , com o ângulo entre os eixos e . A concepção quântica a
respeito do feixe é a de que ele é constituído de fótons e que a intensidade do feixe é
proporcional ao número de fótons ali existentes.
Se a fonte de luz for de intensidade muito baixa (ou seja, se a estimativa clássica não
for mais adequada), de modo que se possa até pensar em um fóton a cada vez sendo
registrado em um dispositivo colocado um pouco atrás do polarizador, ter-se-á que ou um fóton
é registrado ou nenhum, ou seja, não ocorre registro de “fração de fóton”. Contudo, se muitos
fótons forem enviados um a um, durante um intervalo de tempo convenientemente longo, ao
final terá sido registrado no dispositivo um número de fótons , ou seja, reproduz-
se em número de contagens a lei que caracteriza a intensidade revelada classicamente.
Utilizando-se um segundo grupo de fótons, com a mesma polarização na direção e,
se ao invés de um polarizador que permite apenas a passagem de luz polarizada na direção ,
for colocado um polarizador que permite apenas a passagem de luz polarizada na direção ,
novamente não serão registradas “frações de fótons” no dispositivo obtendo-se, ao final do
processo com N fótons, um número de fótons . Observe-se que , ou
seja, passa pelos polarizadores a totalidade dos fótons, se somadas as passagens por e .
Um feixe que se apresente polarizado na direção passará todo por e um feixe polarizado
na direção , passará todo por .

37
3.4. Emaranhamento Quântico

O Emaranhamento Quântico (EQ), criticado no famoso artigo publicado por Albert


Einstein, Boris Podolski e Nathan Rosen em 1935 (Einstein et al., 1935), é conhecido como
paradoxo EPR. No referido trabalho, a descrição acerca da realidade física proporcionada pela
MQ é colocada em discussão. A grande crítica apontada pelos autores é que, se a MQ estiver
completa, ela não deve permitir situações extremamente absurdas como uma “ação
fantasmagórica à distância”, aparentemente revelada no EQ. Schrödinger (apud Pinto Neto,
2010, p. 40) considera o EQ como o traço característico da MQ, aquele que impõe um total
abandono das linhas clássicas de pensamento.
O argumento do famoso trabalho sobre EPR parte de duas premissas.
1) Uma teoria só é completa se todo elemento de realidade física tiver uma
contrapartida na teoria física.
2) Se, sem perturbar o sistema de forma alguma, for possível predizer com certeza o
valor de uma quantidade física, então existe um elemento de realidade física
correspondendo a esta quantidade física.
Griffiths (2005) apresenta uma versão simplificada do paradoxo EPR, introduzida por
David Bohm (1979) . Considere o decaimento de um méson  neutro em um elétron e um
11

pósitron: . Supondo o píon em repouso, o elétron e o pósitron viajariam em


sentidos opostos (conservação de momento linear). Como o píon possui spin zero, por
conservação de momento angular, o sistema elétron-pósitron se encontra em um estado de
spin com a seguinte configuração: . Isto é, se o elétron

estiver no estado de projeção de “spin para cima”, então o pósitron estará no estado de
projeção de “spin para baixo” (denominações simplificadas para projeções de spin) e vice-
versa. Embora a MQ não seja capaz de dizer em qual combinação o sistema composto pelo
elétron e pelo pósitron se encontra, ainda assim se pode verificar que as projeções de spin das
duas partículas estão fortemente correlacionadas e, após várias medições, encontrar-se-á, na
situação deste exemplo, uma probabilidade igual de se ter cada um dos autovalores possíveis.
Supondo que o elétron e o pósitron viajaram dez metros (ou dez anos-luz) cada um e que na
medida da projeção de spin de uma das partículas foi encontrado, por exemplo, o valor “spin
para cima”, imediatamente se saberá que a outra partícula, situada a vinte metros (ou vinte
anos-luz) da primeira, estará com “spin para baixo”.
Apesar deste fato, em princípio, não parecer tão surpreendente, ele se mostra contrário
à visão realista da teoria quântica, defendida no artigo EPR. A medida da projeção de spin de
uma das partículas causa um colapso instantâneo no estado do sistema e “produz” o valor da
projeção de spin da outra partícula. Esta consequência dos postulados da MQ foi duramente
criticada por Einstein e seus colaboradores; para eles, o elétron e o pósitron deveriam ter
projeções de spin bem definidas ao longo de todo o processo, mesmo que a MQ não consiga
fornecer esta informação.

11
Enquanto David Bohm argumenta com uma partícula genérica, Griffiths utiliza o méson π.

38
O EQ conduz a um conceito extremamente importante para a MQ: a não-localidade.
Este conceito é considerado como um dos pilares da teoria quântica (Zeilinger, 1999). Apesar
do que alguns estudiosos acreditavam inicialmente, a MQ é uma ciência em que a não-
localidade, não só é permitida, como é fundamental para a explicação e o desenvolvimento de
inúmeras técnicas experimentais. Vários trabalhos foram realizados utilizando o EQ como
pressuposto teórico, inclusive com o prêmio Nobel sendo atribuído a alguns deles, como o
recente prêmio a David Wineland e Serge Haroche em 2012. Suas descobertas permitiram
pesquisas com computação quântica, relógios atômicos altamente precisos e outros (Itano et
al.,1994; Haroche, 1998; Raimond et al., 2001).
Outra consequência do EQ é a existência de uma inseparabilidade quântica
fundamental. As propriedades de uma partícula em um estado emaranhado dependem do que
ocorre com qualquer uma das outras partículas que compõem o estado ao qual ela pertence,
mesmo quando através de uma ação à distância, ocorrendo uma perda parcial da
individualidade da mesma.
Alguns autores consideram o EQ tão fundamental quanto o Princípio da Incerteza, mas
ainda assim esse é um tópico raramente abordado em cursos de Física, como ressalta também
Hobson (2012, p. 270).
Por ser uma consequência do princípio da superposição linear e por conduzir a uma
gama de situações instigantes e muito novas, o EQ é candidato a ser discutido em diversos
níveis de ensino, conforme constatado por Rocha (2008) e reiterado por Kuttner e Rosenblum
(2010, p. 124), além de auxiliar na introdução da MQ no EM.

3.5. Criptografia Quântica

A criptografia quântica (CQ) é uma área recente de aplicação dos conceitos mais
fundamentais da MQ, de extrema importância não apenas do ponto de vista científico, mas
também para transações comerciais, financeiras e militares. Conceitos como o da superposição
linear e o do EQ servem de ancoradouro para a CQ e mostram como a MQ pode ter
implicações no mundo atual.
A segurança de um processo criptográfico consiste na codificação de mensagens,
tornando-as inacessíveis ou ininteligíveis para qualquer pessoa que as intercepte e não saiba
como decodificá-las. Registros de antigos processos criptográficos datam do tempo do Império
Romano, mais especificamente da utilização dos mesmos pelo Imperador Julio Cesar para se
comunicar com seus generais. Os processos clássicos de criptografia mais utilizados possuem
segurança baseada na fatoração de números primos muito grandes (Oliveira e Vieira, 2009, p.
144), mas com o advento da computação quântica, códigos que poderiam levar dias (ou até
milhares de anos) para serem descobertos com um computador clássico, podem ser revelados
em tempos da ordem de poucas horas. Assim, faz-se necessária a introdução de um novo tipo
de criptografia, imune à incrível velocidade da computação quântica: a criptografia quântica.
Nesta forma de codificação, a segurança não está vinculada à rapidez de processamento do

39
computador, mas sim à capacidade de se perceber que alguém esteja tentando interceptar o
código.
Em um trabalho para introduzir a CQ de forma mais acessível ao público leigo, Rigolin
e Rieznik (2005) apresentaram quatro dos principais protocolos quânticos: BB84, E91, BBM92
e B92, sendo os dois últimos simplificações dos dois primeiros. Não cabe aqui uma descrição
detalhada de cada um destes protocolos, mas é conveniente uma breve apresentação com o
destaque do ponto mais importante de cada um. A segurança desses protocolos é baseada
apenas em uma longa sequência de números aleatórios trocada entre o emissor e o receptor
da mensagem (chamados usualmente na literatura de Alice e Bob, respectivamente) e que
deve ser compartilhada em segredo. Essa sequência de números aleatórios é conhecida como
chave criptográfica. A distribuição de chaves quânticas é uma tecnologia baseada nas leis da
MQ para gerar e distribuir chaves de criptografia comprovadamente seguras em canais tidos
como inseguros.
O protocolo BB84 foi o primeiro introduzido, sendo considerado até hoje o mais simples
protocolo de distribuição de chaves quânticas; este protocolo foi proposto, em 1984, por
Charles Bennett e Gilles Bassard no trabalho “Quantum cryptography: public key distribution
and coin tossing”. O protocolo transmite fótons polarizados por um canal quântico e utiliza
também um canal clássico de comunicação (por exemplo, Internet ou telefone). O canal
clássico não afeta a segurança do processo porque é usado para conferência de alguns dados
a serem descartados posteriormente.
Usando o exemplo tradicional, são consideradas duas pessoas bastante afastadas
(Alice e Bob, no caso) desejando se comunicar. Supõe-se que Alice envie fótons e Bob os
receba. Antes de iniciar o processo, Alice e Bob escolhem as bases (compostas por dois
estados ortogonais de polarização) a usar na transmissão e recepção dos fótons, por exemplo,
as constantes da figura 7, apresentadas por Bennett e Brassard (1984).

Base A Base B
Figura 7. Representação das bases adotadas por Alice e Bob para a transmissão de fótons.

A base A mede com certeza a polarização dos fótons que apresentam polarização
horizontal ou vertical, enquanto a base B mede com certeza a polarização dos fótons que
apresentam polarizações diagonais, a 45° em relação à base A.
Alice e Bob combinam previamente, também, qual polarização representará os bits 0 e
1 (que são as menores unidades de informação) em cada base, o que pode ser feito através de
um canal clássico de comunicação. Supondo que o bit 0 corresponda à polarização horizontal
na base A e à polarização diagonal direita na base B ( e ), então a polarização vertical
na base A e a polarização diagonal esquerda na base B serão associadas ao bit 1 ( e ).
Classicamente, seriam esperados estados de polarização ou |0> ou |1>. Contudo, pelo
princípio da superposição linear, podem existir estados de polarização que sejam combinações

40
dos estados |0> e |1>. Em particular, podemos representar estados de polarização de uma das
bases em função dos da outra, resultando, por exemplo, e

Todos os protocolos mencionados embasam sua segurança no fato de que a


observação dos estados utilizados para transmissão das chaves quânticas por outras pessoas
promoverá o colapso do estado, o que será percebido por Alice e Bob.
O protocolo E91, proposto por Artur K. Ekert (1991), utiliza Estados de Bell (por
exemplo, ) para transmitir chaves quânticas, ou seja, trabalha com

estados emaranhados.
Bennett, Brassard e Mermin (1992) simplificaram o protocolo E91, criando o protocolo
BBM92, mostrando de um modo mais simples que não é possível que outra pessoa conheça
as chaves sem que Alice e Bob o percebam.
Bennett (1992) criou o protocolo B92, em que dois estados não-ortogonais de
polarização de fótons são utilizados na transmissão das chaves criptográficas.

3.6. Outros exemplos de aplicação

Além das situações-problema acima, apresentamos, de forma sucinta, outros exemplos


de aplicações dos conceitos de MQ, que podem ser considerados de igual importância, mas
que não foram utilizados como objetos de ensino no decorrer da pesquisa. Outras situações
podem ser encontradas, por exemplo, em Oliveira (2005).
A computação quântica, mencionada na seção anterior, utiliza o q-bit (ou qubit) como
unidade fundamental de processamento. Um computador (clássico) trabalha com bits 0 ou 1.
Já, um q-bit, pode se apresentar em superposições de estados do tipo ,
possibilitando a abertura de muitos canais de processamento, fazendo com que um
computador quântico efetue cálculos muito mais rapidamente que um computador clássico.
Uma situação de aplicação dos principais conceitos da MQ, conhecida como o
paradoxo do gato de Schrödinger, é apresentada com a configuração abaixo (Schrödinger,
1935, p. 812).

“Um gato é colocado em uma câmara de aço, juntamente com o


seguinte mecanismo diabólico (inacessível ao gato): dentro de um
contador Geiger há uma pequena quantidade de um material
radioativo, tão pequena que no decorrer de uma hora talvez um único
átomo decaia, mas com igual probabilidade de não decair. Se o
decaimento ocorrer, o contador Geiger ativará um martelo, por meio de
um relé, que quebrará um frasco contendo cianureto. Deixando o
sistema isolado por uma hora, pode-se afirmar que o gato estará vivo
caso o átomo não tenha decaído ou morto se o decaimento tiver

41
ocorrido. O estado que descreve o sistema pode ser expresso como
uma superposição de gato vivo e gato morto em partes iguais:
.”

É fácil verificar que, quando no estado acima, não se pode afirmar que o gato
esteja vivo ou morto, pois as duas possibilidades coexistem e não podem ser descartadas,
criando-se assim o paradoxo. Apesar de que, em um primeiro momento, este exemplo possa
ser considerado como exclusivamente ilustrativo em MQ, inúmeros trabalhos mostram que é
possível criar “estados de gatos de Schrödinger” com átomos e que são fundamentais para a
Computação e Comunicação Quântica (Colavita e Hacyan, 2003; Leibfried et al., 2003;
Leibfried et al., 2005).
Outro exemplo interessante de aplicação dos conceitos de MQ é a holografia quântica.
Ela é considerada como uma técnica inovadora para a reconstrução da superposição linear de
estados (ou pacotes de ondas). Fazendo-se uma analogia com a holografia óptica, permite-se
que o estado de um objeto a ser caracterizado interfira com um conhecido estado de referência
(Leichtle et al., 1998). Para criar o holograma, pulsos de dois lasers com defasagem temporal
entre si são utilizados para excitar os objetos de análise e os resultados mostram que os dados
contêm informação suficiente para se obter todo o estado quântico do sistema. Esta aplicação
é de grande interesse para estudos de MQ em diversos níveis de ensino, pois o termo
“holograma quântico” vem sendo utilizado de forma totalmente equivocada como justificativa
dos efeitos medicinais de itens em circulação no mercado nacional. Alguns fabricantes,
inclusive, já foram obrigados a publicar notas de esclarecimento sobre ineficácia de seus
12
produtos .
A teleportação quântica é um fenômeno de transmissão de informação (Bennett et al.,
1993) que permite transportar o estado de um objeto quântico a outro objeto quântico (sem
acompanhamento de matéria), desde que não se procure obter informações sobre tal estado
durante o processo de transmissão. A teleportação utiliza o EQ para o envio de informação e
necessita de três participantes em seu processo, tais como fótons com polarizações horizontal
e vertical. Como o EQ já é realizável a grandes distâncias (Schmitt-Manderbach et al., 2007;
Ursin et al., 2007), teoricamente é possível transferir informações via teleportação quântica em
distâncias desta ordem (cerca de 150 quilômetros).
É possível verificar facilmente que, em todos os exemplos apresentados, tanto o estado
de um sistema físico como a superposição linear são conceitos fundamentais no trato da MQ,
sendo esta uma das razões pelas quais esta tese os coloca em um papel central para uma
abordagem introdutória à teoria quântica no EM.

12
Em janeiro de 2011, um fabricante de pulseiras com supostos hologramas quânticos foi obrigado a publicar a
seguinte nota: “Em nossas propagandas, afirmamos que os braceletes Power Balance melhoram seu vigor, equilíbrio e
flexibilidade. Admitimos que não há provas científicas confiáveis que sustentem nossas afirmações e, portanto, que
assumimos uma conduta enganosa, em violação da s52 do Trade Practices Act 1974. Se você acredita ter sido lesado
por nossa propaganda, pedimos desculpas e oferecemos reembolso integral.” Notícia divulgada em
http://gizmodo.uol.com.br/pulseiras-dapowerbalance-nao-funcionam-admite-empresa/. Acesso em 24 de fevereiro de
2015.

42
4. Implicações para o ensino

Este capítulo teve como objetivo a apresentação dos aspectos da MQ utilizados ao


longo dos cursos oferecidos aos alunos do EM. Foram introduzidos os postulados da MQ e
situações de aplicação consideradas simples para o estudo de seus principais conceitos e
premissas.
Além de enfatizar os conceitos de estado e de superposição linear de estados, os
postulados relacionados (à exceção do sexto) foram frequentemente abordados nas aulas e a
compreensão dos mesmos foi testada em exercícios e nas avaliações.
As situações de aplicação listadas não contemplam todo o arcabouço considerado de
interesse para o trato da MQ, mas serviram como um ponto de partida para a elaboração do
texto de apoio que será comentado no capítulo V. As principais situações de aplicação
utilizadas ao longo do trabalho foram o experimento de dupla fenda, o experimento de Stern-
Gerlach, a polarização da luz, o emaranhamento quântico e a criptografia quântica. Além
destes, outras situações de aplicação também foram utilizadas sempre que servissem para
esclarecer algum conceito em estudo e aumentar a gama de situações que os alunos poderiam
dominar durante a instrução.
Poder-se-ia comentar também sobre a filosofia subjacente à análise da teoria quântica,
mas não se pretende isto neste trabalho, pois o foco está no estudo da compreensão dos
alunos acerca da operacionalidade dos princípios da MQ em determinados fenômenos
quânticos. Debates de cunho filosófico são considerados importantes, mas não são temas
desta tese. Aos interessados por esta questão, sugere-se a leitura de Schreiber (1994), Laloë
(2001), Pessoa Jr. (2003) e Pinto Neto (2010), entre outros.

43
CAPÍTULO IV
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: TEORIAS DE APRENDIZAGEM

1. Introdução

Para nortear o desenvolvimento da pesquisa, tanto no aspecto metodológico quanto no


tocante ao ensino ali desenvolvido, bem como a interpretação dos dados coletados, são
apresentados neste capítulo os dois referenciais teóricos adotados no trabalho, a saber, a
Teoria da Aprendizagem Significativa (TAS) de David Ausubel e a Teoria dos Campos
Conceituais (TCC) de Gérard Vergnaud.
Os dois autores consideram a cognição com um papel importante na aprendizagem e,
consequentemente, no desenvolvimento do indivíduo. Segundo Martinez (2010), cognição é o
conjunto de todas as habilidades mentais e dos processos relacionados ao conhecimento, tais
como percepção, atenção, associação, memória, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e
linguagem. Desta forma, os processos cognitivos utilizam o conhecimento existente e geram o
novo conhecimento.
Apresenta-se, a seguir, a teoria de Ausubel e, na sequência, a teoria de Vergnaud.

2. A Teoria da Aprendizagem Significativa de David Ausubel

A teoria da aprendizagem significativa (TAS) de Ausubel é uma teoria cognitivista


construtivista e voltada para a aprendizagem de corpos organizados de conhecimento, tal
como ocorre na sala de aula, no cotidiano da grande maioria das escolas. Na apresentação da
teoria de Ausubel nos referimos basicamente a considerações deste psicólogo encontradas no
13
livro Aquisição e Retenção do Conhecimento: uma perspectiva cognitiva (2002).
Os primeiros trabalhos de Ausubel sobre a aprendizagem significativa foram publicados
no início da década de 1960 e a teoria se desenvolveu ao longo das duas décadas seguintes.
Os principais conceitos desta teoria são o de aprendizagem significativa, aprendizagem
mecânica, subsunçor, organizadores prévios, assimilação, reconciliação integradora e
diferenciação progressiva.

2.1. Aprendizagem significativa

A aprendizagem significativa é um processo que envolve a aquisição de novos


conhecimentos (com significados) a partir de algum material de aprendizagem apresentado que
se relaciona com um aspecto relevante da estrutura cognitiva do indivíduo (Moreira e Masini,
2001, p. 17). Desta forma, a aprendizagem significativa exige como condições para que os
aprendizes possam aprender significativamente determinados corpos de conhecimento:

13
Versão em português para Ausubel (2000).

44
 um mecanismo de aprendizagem significativa, ou seja, uma disposição para relacionar
o novo material a ser apreendido, de forma não arbitrária e não literal, à própria
estrutura de conhecimentos;
 um material potencialmente significativo, ou seja, deve ter estrutura lógica e
relacionável com aspectos relevantes da estrutura cognitiva do aprendiz, de forma não
arbitrária e não literal.
O mecanismo de aprendizagem serve para relacionar aspectos não literais de novos
conceitos, proposições, informações ou situações a componentes relevantes da estrutura
cognitiva existente, de forma não arbitrária. Conforme a natureza da tarefa de aprendizagem, o
mecanismo pode ser descobrir ou simplesmente apreender (compreender) e incorporar as
relações na estrutura cognitiva.
O material é dito potencialmente significativo porque o significado não está nele, mas
sim na relação entre ele e o conhecimento prévio relevante existente na estrutura cognitiva do
aluno. Se o material fosse significativo, o objetivo da aprendizagem significativa já estaria
completado antes de sequer ter-se tentado ou ocorrer qualquer aprendizagem.
A presença de ideias ancoradas claras, estáveis, discrimináveis e relevantes na
estrutura cognitiva é o principal fator de facilitação da aprendizagem significativa, enquanto a
ausência de tais ideias constitui a principal influência limitadora ou negativa sobre uma nova
aprendizagem significativa. Ausubel (1968, p. IV) afirma que:
“[...] o conhecimento prévio (a estrutura cognitiva do aprendiz) é a
variável crucial para a aprendizagem significativa.”
Ausubel denomina este conhecimento prévio do aprendiz de conceito subsunçor, ou
simplesmente subsunçor (Moreira, 1999a, p. 11); portanto a aprendizagem significativa decorre
da interação entre os subsunçores e o novo conhecimento.
A aprendizagem significativa não implica em as novas informações formarem um tipo
de ligação simples com os elementos pré-existentes na estrutura cognitiva do aprendiz. A
ligação de forma simples, arbitrária e não integradora somente ocorre na aprendizagem
mecânica. Na aprendizagem significativa, o processo de aquisição de informações resulta em
uma alteração tanto das novas informações, que ganham significados, como do aspecto
especificamente relevante da estrutura cognitiva do aprendiz, que pode ficar mais estável, mais
rico em significados.

2.2. Aprendizagem mecânica

Em contraposição à aprendizagem significativa, Ausubel (Moreira, 1999a, p. 11)


apresenta o conceito de aprendizagem mecânica. A aprendizagem mecânica é aquela em que
novas informações são apreendidas praticamente sem interagir com conhecimentos
especificamente relevantes existentes na estrutura cognitiva. A nova informação é armazenada
de maneira literal e arbitrária e, assim, o aprendiz não dá significados ao que aprende.
Contudo, tal aprendizagem não ocorre, como é óbvio, em um vácuo cognitivo. O material pode

45
se associar com aspectos relevantes da estrutura cognitiva, mas sem significado, não de forma
substantiva (não literal) e não arbitrária, que permitiria a incorporação significativa na estrutura
cognitiva. A aprendizagem significativa, no entanto, apresenta inúmeras vantagens em relação
à aprendizagem mecânica, tais como economia do esforço de aprendizagem, retenção mais
estável e maior capacidade de transferência.
Por não estarem devidamente ancorados à estrutura cognitiva do aprendiz, materiais
apreendidos mecanicamente são mais vulneráveis a interferências e, assim, ao esquecimento,
possuindo uma capacidade de retenção muito inferior.
No entanto, a relação entre a aprendizagem significativa e a aprendizagem mecânica
não é dicotômica. Em muitas situações de aprendizagem prática, pode-se colocá-las facilmente
em um contínuo entre memorização e significado.

2.3. Organizadores prévios

Se os subsunçores relevantes adequados, próximos e especificamente relevantes, não


estiverem presentes na estrutura cognitiva, o aprendiz tende a utilizar os mais relevantes e
próximos disponíveis.
Visto nem sempre se poder depender da disponibilidade espontânea de conceitos
subsunçores relevantes e próximos de modo adequado, uma forma de facilitar a aprendizagem
significativa e a retenção é introduzir subsunçores adequados e torná-los parte da estrutura
cognitiva existente antes da apresentação real da tarefa de aprendizagem.
A situação comum que causa dificuldades à aprendizagem e à retenção significativas
de ideias novas e estranhas (mas potencialmente significativas) é que os subsunçores da
estrutura cognitiva do aprendiz não possuem o grau necessário e desejável de relevância e de
especificidade, para agirem como ideias ancoradas eficazes.
Nestas situações em que não existem subsunçores relevantes ou adequadamente
próximos para a compreensão da nova informação, Ausubel sugere a utilização de
organizadores prévios, para somente depois apresentar-se a nova informação ao aluno. Um
organizador prévio é um recurso pedagógico que ajuda a suprir a deficiência de subsunçores
necessários para que ocorra aprendizagem significativa, ou seja, o organizador serve de ponte
entre aquilo que o aluno já sabe e aquilo que deveria saber para aprender de forma
significativa. No caso da MQ, é útil, por exemplo, que os alunos tenham conhecimentos sobre
vetores e ondas, bem como a respeito de suas superposições para facilitar a aprendizagem da
superposição de estados dos sistemas. Tais situações podem ser facilmente conduzidas à
generalização dos espaços vetoriais. Como a aprendizagem significativa decorre da interação
do novo conhecimento com os aspectos especificamente relevantes da estrutura cognitiva, se
não existirem estes aspectos (subsunçores), faltarão condições para a ocorrência de
aprendizagem significativa.
Os organizadores prévios devem ser apresentados em um nível de abstração,
generalidade e inclusividade mais alto que o novo material a ser aprendido. Observe-se que

46
resumos costumam apresentar o mesmo nível de abstração, generalidade e inclusividade que
o próprio material, salientando alguns pontos em troca da omissão de informações menos
importantes e, portanto, apesar de ser um material introdutório, o organizador prévio não deve
ser visto como um resumo.
A utilização dos organizadores prévios, de acordo com Ausubel, é baseada
principalmente em três pontos:
1) a importância de ter ideias especificamente relevantes e apropriadamente
estabelecidas na estrutura cognitiva, para tornar as novas ideias, potencial e
logicamente significativas, de fato em significativas;
2) as vantagens em utilizar ideias mais gerais e inclusivas de uma determinada
disciplina, convenientemente modificadas para proporcionar maior relevância ao
novo material;
3) identificar ideias já existentes e relevantes da estrutura cognitiva, bem como indicar
explicitamente a relevância destas ideias para os organizadores prévios e para o
novo material.
Os organizadores prévios são, também, dispositivos pedagógicos capazes de ajudar a
implementar a diferenciação progressiva e a reconciliação integradora de novos
conhecimentos.

2.4. O processo de assimilação

Aprender significativamente não implica em uma ligação duradoura entre o novo


conhecimento e a estrutura cognitiva do aprendiz. Na aprendizagem significativa, o processo
de aquisição de conhecimento pelo aprendiz resulta em modificação tanto do conhecimento
apresentado como dos aspectos relevantes existentes em sua estrutura cognitiva. Este
processo é descrito pela teoria da assimilação (ou de ancoragem). O termo ancoragem é uma
metáfora utilizada para designar a interação seletiva entre o novo material e as ideias
existentes na estrutura cognitiva.
No âmago da teoria da assimilação está a suposição de que novos significados são
adquiridos através da interação de novas ideias (conhecimentos) potencialmente significativas
com proposições e conceitos anteriormente apreendidos. Não é apenas o novo conhecimento
que sofre modificações ao ser incorporado à estrutura cognitiva, mas também os aspectos
relevantes. O esquema seguinte exemplifica de modo simples o processo de assimilação de
conhecimento.

a+A  a’A’  a’ + A’  A’

No processo de assimilação, um novo conhecimento a interage com o subsunçor


adequado A e resulta num conhecimento formado pela interação das duas informações,
denotado por a’A’. Note-se que, nesta interação, os dois conhecimentos sofrem alteração,

47
passando a e A para a’ e A’, respectivamente. Esta é a fase de assimilação do novo
conhecimento. A fase seguinte é denominada fase de retenção do conhecimento, que acontece
quando os dois conhecimentos se dissociam e resultam em a’ + A’. Por fim, sobrará somente
um resíduo A’, resultante do subsunçor A com as alterações sofridas por ter sido “exposto” à
nova informação. A fase de retenção mais formação do resíduo é conhecida como assimilação
obliteradora. Nesta assimilação é natural ocorrer um esquecimento do que se aprende, pois
frequentemente não aparece, explicitamente no final do processo de assimilação, alguma
informação sobre o recente corpo de conhecimentos apresentado ao aprendiz. Isto não
significa que o aluno esqueça totalmente o que aprendeu, como fica denotado no resíduo A’.
Apesar do esquecimento, o resíduo indica que se pode aprender novamente o conteúdo de
forma mais fácil, dinâmica e sistemática do que na aprendizagem inicial. O papel do resíduo A’
é facilitar o reacesso à informação, a reaprendizagem.
A assimilação não se completa após ocorrer a aprendizagem significativa, mas
continua durante certo tempo, podendo envolver novas aprendizagens e/ou retenções ou graus
variáveis de retenção ou armazenamento intactos, ou ainda uma perda final da capacidade de
recuperação das ideias subordinadas assimiladas. É um processo dinâmico.
Portanto, a assimilação explica também o fenômeno do esquecimento (ou perda de
capacidade de recuperação em relação ao significado recentemente aprendido), colocando a
hipótese de que a particularidade e especificidade únicas do último significado são afastadas
(obliteradas), em vários graus, pela generalidade da(s) ideia(s) ancorada(s).

2.5. Reconciliação integradora e diferenciação progressiva

O processo de assimilação sequencial de novos significados, a partir de sucessivas


exposições a novos materiais potencialmente significativos, em diferentes níveis de
generalidade e complexidade, resulta na diferenciação progressiva de conceitos ou
proposições, no consequente aperfeiçoamento dos significados e em uma melhora na
ancoragem para aprendizagens significativas posteriores. Este princípio reconhece que a maior
parte da aprendizagem e toda a retenção e organização das matérias é hierárquica por
natureza, procedendo de cima para baixo em termos de abstração, generalidade e inclusão.
Não se trata, portanto, de um processo dedutivo.
Quando conceitos ou proposições são apreendidos através de novos processos de
aprendizagem, talvez se desenvolvam significados novos e diferenciados, possibilitando
resolver os significados conflituosos através de um processo de reconciliação integradora. A
reconciliação integradora tem a tarefa facilitada no ensino expositivo, se o professor e/ou os
materiais de instrução anteciparem e destacarem, explicitamente, as semelhanças e diferenças
confusas entre novas ideias e ideias relevantes existentes e já estabelecidas nas estruturas
cognitivas dos aprendizes.
Do ponto de vista instrucional, o processo de facilitação da aprendizagem significativa
pode lançar mão desses dois princípios da estrutura cognitiva como princípios programáticos

48
da matéria de ensino: diferenciação progressiva e reconciliação integradora (Moreira, 1999a, p.
160).
De fato, a diferenciação progressiva pressupõe que o conhecimento seja organizado
em uma estrutura de tópicos, sendo possível partir de ideias gerais e chegar a aspectos mais
específicos. Pretende-se, assim, que os alunos consigam compreender os pormenores de
determinado conteúdo partindo de um todo mais inclusivo.
Em alguns casos, o tema precisa partir de pontos específicos de determinado campo
de conhecimento para somente depois chegar a um todo mais inclusivo; necessita-se, então,
utilizar a reconciliação integradora. Esta estratégia propõe que a instrução explore relações
entre ideias, aponte similaridades e diferenças importantes e reconcilie discrepâncias reais ou
aparentes (op. cit., p. 161). Dificilmente se encontra esta estratégia em livros-texto que, em sua
maioria, seguem uma sequência linear na qual os conceitos e proposições mais importantes,
mais gerais e mais inclusivos ficam para o fim. Ausubel reconhece que utilizar a reconciliação
integradora não é tarefa fácil e sugere organizar o ensino “descendo e subindo” nas estruturas
conceituais hierárquicas à medida que a nova informação vai sendo apresentada ao aluno
(Moreira, 1999b, p. 51-52).
Estes dois princípios podem ser implementados através do uso de organizadores
prévios (Ausubel, 2002, p. 151) ou, ainda, com a utilização de determinados recursos
instrucionais, como os mapas conceituais (Moreira, 1999a, p. 161).

2.6. Recursos para promoção da aprendizagem significativa

A frequência (repetição potencialmente significativa e prática) de apresentação do


material instrucional ao aluno facilita fortemente a aprendizagem e retenção significativa. A
repetição facilita a disponibilidade, a estabilidade, a clareza e a capacidade de discriminação
dos conteúdos apresentados anteriormente, servindo após como subsunçores ou outras
variáveis da estrutura cognitiva ao longo do processo de aprendizagem. No entanto, a
frequência em si não é condição necessária e nem suficiente para promoção da aprendizagem
significativa. Ausubel comenta que é possível apreender logo o conteúdo de grande parte de
um material relativamente fácil e potencialmente significativo, mas em geral são necessárias
várias leituras para uma aprendizagem, com boa retenção, de materiais mais difíceis.
Embora a motivação seja um fator extremamente importante e facilite muito a
aprendizagem significativa, ela não é uma condição indispensável, principalmente para uma
aprendizagem limitada e de curto prazo. A motivação será essencial se o tipo de aprendizagem
for constante e de longo prazo, pois envolve o domínio de determinada disciplina ou currículo.
Ao afirmar que a aprendizagem significativa possa ocorrer na ausência de motivação,
certamente não se nega que a motivação pode facilitar (e em muito) a aprendizagem.
Frequentemente, a melhor forma de ensinar estudantes desmotivados é ignorar a falta
de motivação inicial dos mesmos e concentrar-se em ensiná-los tão eficazmente quanto
possível em termos cognitivos; estejam os alunos motivados ou não, deve-se almejar algum

49
grau de aprendizagem. Com satisfação inicial de certa aprendizagem, os estudantes
inicialmente desmotivados podem desenvolver, de forma retroativa, alguma motivação para
aprender mais. Por conseguinte, em algumas circunstâncias, a forma mais apropriada de se
estimular a motivação para a aprendizagem é através da concentração nos aspectos cognitivos
da aprendizagem, em vez daqueles de motivação, e basear-se na motivação que se
desenvolve, de forma retroativa, a partir do desempenho educacional bem sucedido, para
estimular mais aprendizagem.
Grande parte do efeito de facilitação da motivação é, aparentemente, mediada por um
aumento da atenção. Ao direcionar a atenção dos estudantes para determinados aspectos de
um conteúdo, independente da forma como se procede para isto, promove-se a aprendizagem.
A atenção pode ser considerada como uma condição cognitiva geral essencial para a
ocorrência de aprendizagem significativa.
Apesar de intimamente relacionados à filosofia comportamentalista, os conceitos de
recompensa e punição também são citados na TAS como auxiliares para a promoção da
aprendizagem significativa. A recompensa influencia a aprendizagem de três formas: servindo
como incentivo para a aprendizagem; aumentando, em longo prazo, a motivação para a
aprendizagem; aumentando a probabilidade de recorrência de respostas. A punição (ou não-
recompensa) funciona como o inverso da recompensa, também de três formas: ajudando a
estruturar um problema, fornecendo uma direção para a realização da atividade;
enfraquecendo, em longo prazo, as motivações que estimulam o comportamento que se pune;
diminuindo a probabilidade de recorrência de respostas que levem à não-recompensa.
Estas são colocações de Ausubel, mas é preciso não confundir motivação e
intencionalidade ou recompensa com condicionamento. Mesmo sem motivação, o aprendiz tem
que necessariamente ter a intenção de captar os significados que estão sendo trabalhados no
processo instrucional. Sem essa intencionalidade, a aprendizagem não será significativa.
Quanto à recompensa ou à não-recompensa, é claro que podem ajudar nesse processo, mas
devem ser usadas na progressividade da aprendizagem significativa. Não tem sentido usar
recompensas quando não há evidências de que aprendizagem significativa está ocorrendo,
que a captação de significados está acontecendo.
Além disto, a recompensa e a punição possuem efeitos facilitadores indiretos. Do ponto
de vista da motivação, a conscientização de uma aprendizagem bem sucedida estimula
esforços subsequentes de aprendizagem, ao melhorar a autoconfiança dos aprendizes, ao
encorajá-los a ser perseverantes e ao aumentar a atração subjetiva da tarefa de aprendizagem.
Da mesma forma, motiva os indivíduos para praticar, ensaiar e desempenhar aquilo que já
aprenderam.

3. A Teoria dos Campos Conceituais de Gérard Vergnaud

A Teoria dos Campos Conceituais (TCC), proposta por Gérard Vergnaud (1990; 1993),
foi elaborada inicialmente para o campo da matemática visando explicar o processo de

50
conceitualização progressiva das estruturas aditivas, das estruturas multiplicativas, das
relações número-espaço e da álgebra. Vergnaud (1996b) enfatiza, no entanto, que a TCC não
é exclusiva do campo da matemática, podendo assim ser aplicada em outras áreas. Vergnaud
foi discípulo de Piaget e utiliza, em sua teoria, diversos termos piagetianos, tais como
esquema, adaptação, assimilação e acomodação.
A TCC tem o objetivo de descrever o processo de desenvolvimento cognitivo. Segundo
Vergnaud, para se entender o conhecimento, é útil e necessário estudar seu desenvolvimento
no sujeito. Mesmo não sendo voltada diretamente para a sala de aula como a de Ausubel, esta
teoria apresenta implicações imediatas às atividades de ensino e de aprendizagem.
A principal finalidade da TCC é fornecer uma estrutura que permita compreender as
filiações e rupturas entre conhecimentos em crianças e adolescentes, a forma de
aprendizagem dos mesmos, entendendo-se por conhecimento tanto habilidades como
informações expressas (Vergnaud, 1990).
Baseada em um princípio de elaboração pragmática de conceitos, a TCC considera
que não se pode teorizar sobre a aprendizagem apenas a partir do simbolismo ou das
situações. Tais elementos devem ser considerados, mas o ponto crucial fica a cargo da ação
do sujeito em situação e da organização do seu conhecimento (Vergnaud, 1993).
Esta abordagem é o segundo referencial teórico usado nesta tese, apresentando-se a
seguir os conceitos centrais deste referencial.

3.1. Conceitualização

A teoria de Vergnaud é uma teoria psicológica de conceitos que supõe a


conceitualização como o núcleo do desenvolvimento cognitivo (Vergnaud, 1996b, p. 118), ou
seja, um indivíduo se desenvolve cognitivamente na medida em que atribui significados aos
conceitos, em que vai conceitualizando.
Segundo Vergnaud (2007), a conceitualização pode ser entendida como a identificação
dos objetos do mundo, de suas propriedades, relações e transformações. Esta identificação
pode ser direta ou semidireta, ou ainda resultante de um processo de construção de
conhecimentos.

3.2. Esquema

Para analisar a cognição, Vergnaud considera fundamental trabalhar com o conceito de


esquema. Esquema é a organização invariante do comportamento para uma determinada
classe de situações (Vergnaud, 1993). Note-se que não é o comportamento que é invariante,
mas sua organização (Greca e Moreira, 2002). Segundo Vergnaud (1990), a automatização é
uma das manifestações mais evidentes do caráter invariante da organização do
comportamento. Os esquemas devem sempre ser pensados como esquemas de ação, pois,

51
são eles utilizados para organizar o conhecimento de uma pessoa e prover o arcabouço teórico
para o aprendizado subsequente.
Este conceito é herança de Piaget, sendo adaptado por Vergnaud em sua teoria.
Enquanto Piaget propõe que é a partir da interação sujeito-objeto que ocorre o
desenvolvimento cognitivo, Vergnaud afirma que o mais importante é uma interação dita
esquema-situação e, assim, analisa o processo de desenvolvimento cognitivo a partir do
“sujeito-em-situação”. Deve-se, então, segundo ele, considerar a situação-problema ao
trabalhar com os esquemas porque é com ela que estes lidam, não somente com objetos.
Vergnaud também sofreu uma grande influência de Vygotsky ao considerar como
pontos cruciais a linguagem e os símbolos, praticamente negligenciados por Piaget. A
mediação através da linguagem é um processo essencial no ensino de ciências, sendo assim
um ensino insubstituível; isto, no entanto, não significa que o papel do ensino seja somente o
de colocar palavras no conteúdo conceitual dos conhecimentos (Vergnaud, 2007). Outra
influência da obra de Vygotsky ao trabalho de Vergnaud, que é uma consequência direta da
teoria sociointeracionista daquele (também negligenciada por Piaget), é a de possibilitar uma
orientação dos estudantes mediante uma escolha, a mais adequada possível, das situações
apresentadas aos alunos (Vergnaud, 1996a).
O conceito de esquema é o mais importante na psicologia cognitiva se a psicologia
está interessada em estudar comportamentos e atividades (Vergnaud, 1998). É nos esquemas
que se deve buscar os elementos cognitivos que fazem com que a ação do sujeito seja
operatória (Vergnaud, 1993) e tais elementos são denominados conhecimentos-em-ação.
Esquemas são formados pelos seguintes componentes (Vergnaud, 1990; 1996b; 2012):
 metas e antecipações – que são os objetivos do esquema;
 regras de ação e controle – regras do tipo “se...então”, que servem para
generalizar e regular comportamentos;
 invariantes operatórios – que são conceitos e conhecimentos contidos nos
esquemas e que servem para categorizar a informação e inferir, a partir desta,
metas e comportamentos relevantes;
 possibilidades de inferência – que auxiliam na construção de antecipações e regras
para situações.
Saliente-se que um esquema não deve ser interpretado como um estereótipo,
justamente porque este construto está apoiado nos invariantes operatórios que dão sentido e
pertinência a uma variedade de situações. A definição de esquema pode ser considerada muito
próxima da de algoritmo, entretanto um algoritmo é um esquema, mas nem todo esquema é
um algoritmo. Algoritmo são efetivos, enquanto esquemas são frequentemente eficazes, mas
não efetivos (Figueroa e Otero, 2011). Observe-se que um aprendiz tende a modificar seu
esquema, caso não tenha dado conta de uma situação particular, ou seja, a sua organização
da atividade é invariante, mas não a atividade.
A importância dos esquemas fica mais evidente ao lembrar que os alunos estão
constantemente expostos a novas situações e que devem conseguir lidar com elas. Para isso

52
os estudantes recorrem aos esquemas que já construíram, combinando-os de forma que lhes
permitam lidar com as situações e, consequentemente, conduzir à adaptação. Este processo
pode não ser realizado em uma primeira tentativa e, portanto, os alunos devem continuar
buscando a construção de novos esquemas, com ou sem o auxílio do professor ou de outros
estudantes (Vergnaud, 1998).
Assim como Ausubel, Vergnaud (1996a) considera que a repetição significativa executa
um papel importante na formação dos esquemas. A familiaridade com as situações-problema
apresentadas é capaz de contribuir com mais segurança para esta formação. A repetição, no
entanto, pode apresentar riscos caso não seja compensada com variações de situações-
problema, porque o esquema será tanto mais flexível quanto mais variadas forem as situações-
problema em que ele se desenvolve.
Os esquemas são de extrema importância na TCC assim como o são na teoria de
Piaget, podendo-se dizer que estão no centro dos processos de adaptação das estruturas
cognitivas, a saber, assimilação e acomodação. Assim, a educação formal deve contribuir para
a construção de um repertório diversificado de esquemas, sem que estes se convertam em
estereótipos (Vergnaud, 1996a).

3.3. Conceitos

Um conceito não pode ser reduzido à sua definição, principalmente se o interesse é no


ensino e na aprendizagem do mesmo (Vergnaud, 1990; 1993). Para analisar um conceito,
deve-se levar em conta sua constituição (Vergnaud, 1998). Segundo Vergnaud, um conceito
pode ser definido como um tripé de conjuntos, C = (S, I, R), em que:
 S representa o conjunto de situações que dão sentido ao conceito (o referente);
 I representa o conjunto de invariantes operatórios associados ao conceito (o
significado);
 R representa o conjunto de representações simbólicas usadas para indicar e
representar os invariantes e, consequentemente, as situações e os procedimentos para
lidar com elas (o significante).
O primeiro conjunto se refere à realidade, enquanto os outros dois a representam
(Moreira, 2002).
É através de situações e de problemas a resolver que um conceito adquire significado
(Vergnaud, 1990). Situação deve ser entendida como uma tarefa ou uma combinação delas, a
ser desempenhada pelo estudante, devendo a tarefa a se realizar ser considerada como um
problema pelo estudante. Caso o estudante não considere a tarefa como um problema, a
situação não será frutífera para o aprendizado dos conceitos trabalhados. Ao tratar o processo
de conceitualização como a pedra angular da cognição, Vergnaud considera que a análise de
tal processo passa pelo par esquema-situação. Além disto, este par possui uma relação
dialética. Um conceito se torna significativo através de uma variedade de situações, mas o
sentido não está na situação em si (Vergnaud, 1990; 1993). O sentido é uma relação entre a

53
situação e os esquemas e, consequentemente, está na relação do sujeito com situações e
significantes (Vergnaud, 1990).
A descrição dos vários elementos de uma situação deve ser feita essencialmente em
termos de propriedades e funções (Barais e Vergnaud, 1990). Assim, situações didáticas são
consideradas ocorrências interessantes e ricas (Vergnaud, 1993, p. 17). A organização de uma
situação didática supõe a análise simultânea das funções epistemológicas de um conceito, da
significação social das áreas de experiência a que ele se refere, do desempenho dos atores da
situação didática, dos resultados desse desempenho, do contrato e da transposição.
Vergnaud inclui nos invariantes operatórios teoremas-em-ação e conceitos-em-ação.
Um teorema-em-ação é uma proposição tida como verdadeira sobre o real e um conceito-em-
ação é uma categoria de pensamento tida como pertinente ou, relevante (Vergnaud, 1998).
Existe uma relação dialética entre os conceitos-em-ação e os teoremas-em-ação, pois os
conceitos são ingredientes dos teoremas e os teoremas são propriedades que dão aos
conceitos seus conteúdos. Os conceitos-em-ação estão no coração da organização dos
esquemas e os teoremas-em-ação são o meio de inferência (geralmente de modo implícito), os
objetivos e as regras de interesse (Vergnaud, 2007). Um conceito-em-ação não é um conceito,
assim como um teorema-em-ação não é um teorema. Na Ciência, conceitos e teoremas são
explícitos e pode-se discutir acerca de sua pertinência e veracidade. Este não é
necessariamente o caso dos invariantes operatórios. Utilizando a metáfora de Vergnaud
(1990), os teoremas e conceitos explícitos se constituem em uma pequena parte visível do
iceberg da conceitualização; sem a parte oculta formada pelos invariantes operatórios, a parte
visível não faz qualquer sentido.
Para o estudo de inúmeros campos de conhecimento, representações simbólicas,
como quadros, tabelas, gráficos e fórmulas, são uma ajuda preciosa, visto que a formulação de
relações e suas representações enriquecem a conceitualização (Vergnaud, 2007). Como um
conceito não é somente “o significado das palavras”, a expressão deste conceito em termos de
palavras e símbolos tem papel decisivo nos processos de conceitualização. É importante, no
entanto, salientar que fórmulas não são o ponto final da conceitualização, pois é necessário
que se faça uma leitura adequada das mesmas, o que envolve várias operações de
pensamento.
A transformação de invariantes operatórios em textos e palavras não é simples e direta
(Vergnaud, 1998). Ela requer, inicialmente, o aprendizado e a prática da linguagem natural e de
diversos outros meios semióticos, tais como, por exemplo, signos e representações. Além
disso, os sistemas linguísticos e semióticos não são direcionados para expressar exatamente o
que cada indivíduo tem em mente quando é colocado diante de uma situação, selecionando
informações e processando-as, porque existe muita diferença entre o que é representado na
mente de cada um e o significado usual das palavras. Ainda assim, em Física, a verificação do
significado de representações simbólicas não depende somente de uma habilidade potencial
de representar concretamente as entidades e relações expressas, mas também em levar em

54
conta os elementos conceituais, tais como sistema, estado, conservação, interação, etc.
(Barais e Vergnaud, 1990).
Não se deve restringir a ideia de linguagem somente à linguagem falada, visto que a
mediação ocorre com ou sem a linguagem falada; existe muita informação para o estudante
nas expressões faciais, gestos e entonação de voz do professor (Vergnaud, 1998).
Vergnaud (1993) considera, também, importante tomar como objetos de pesquisa
conjuntos relativamente amplos de situações e conceitos, classificando os tipos de relações,
classes de problemas, esquemas de tratamento, representações linguísticas e simbólicas e os
conceitos matemáticos que organizam este conjunto.
Segundo a TCC, o professor deve ser considerado como um importante mediador no
processo de domínio de um campo conceitual pelo aluno (Moreira, 2002). Sua primeira ação
como mediador é a escolha de situações e fórmulas que serão utilizadas, visto que uma
fórmula não pode ser descoberta por um aluno, salvo em raríssimas exceções. Pode-se afirmar
então que, segundo a teoria de Vergnaud, o principal papel do professor é selecionar e utilizar
as situações-problema (em quantidade e nível de dificuldade adequados) de modo a dar
sentido aos conceitos em uma relação dialética. Tais situações devem conduzir o aluno a um
aprendizado paulatino dos conceitos envolvidos, ou seja, devem ocorrer dentro da zona de
desenvolvimento proximal do aluno, conforme apontado por Vygotsky (1991). Caso situações
mais complexas sejam apresentadas no início do estudo, podem acarretar um desestímulo
para o aprendizado subsequente.
Considerando que novos esquemas não podem ser desenvolvidos sem novos
invariantes operatórios, o professor deve auxiliar os estudantes nesse processo de construção
de esquemas e representações (Vergnaud, 1998). Com isso, os alunos se tornam capazes de
enfrentar situações novas e mais complexas.
Para Vergnaud, o estudo do desenvolvimento e do funcionamento de um conceito, ao
longo de sua aprendizagem ou utilização, deve considerar os três conjuntos (referente,
significado e significante) ao mesmo tempo; não se pode reduzir o significado ao significante e
nem às situações (Vergnaud, 1990, p. 146).

3.4. Campos conceituais

Um campo conceitual pode ser definido como um grande conjunto, informal e


heterogêneo, de situações e problemas cuja análise e tratamento requerem diversas classes
de conceitos, procedimentos e representações simbólicas que se conectam umas com outras e
que, provavelmente, estão entrelaçadas durante todo o processo de aquisição (Moreira, 2002).
Vergnaud apresenta três argumentos para a introdução do conceito de campo
conceitual:
 um conceito não é formado dentro de um só tipo de situação;
 uma situação não é analisada com um só conceito;

55
 a construção e a apropriação das propriedades de um conceito ou dos aspectos de
uma situação é um processo de muito fôlego que se estende ao longo dos anos.
O conhecimento está, pois, organizado em campos conceituais que o aprendiz domina
ao longo de um expressivo período de tempo, através da maturidade, experiência e
aprendizagem (Vergnaud, 1982). Não será, em geral, em apenas algumas aulas que um aluno
conseguirá captar todo o conhecimento presente em determinado conteúdo. Acreditamos,
então, que um contato cedo do aluno de EM com tópicos de MQ tende a propiciar uma melhor
compreensão deste campo conceitual para incursões posteriores.
Considerar a MQ não-relativística como um campo conceitual é dar a ela sua devida
importância. Na estruturação deste campo aparecem ramificações que podem, de fato,
transcender a teoria-base. É o caso, por exemplo, da segunda quantização, em que é
abandonada a restrição não relativística e a consequente imposição de conservação de
probabilidade (do número de partículas envolvidas nos processos). Por exemplo, a
Eletrodinâmica Quântica, que descreve a interação entre partículas carregadas com a
mediação de fótons e a Cromodinâmica Quântica, em que são estudadas as interações fortes,
são teorias desenvolvidas após a compreensão da estrutura da MQ.
Simplificadamente, o campo conceitual é visto como um conjunto de situações que
requerem o domínio de vários conceitos, procedimentos e representações de naturezas
distintas. Desta forma, a Física se constitui em um imenso campo conceitual que pode ser
fragmentado em inúmeros outros como, por exemplo, a Mecânica Clássica, a Termodinâmica,
o Eletromagnetismo, a Mecânica Quântica, etc. O ensino dos campos conceituais não pode ser
visto como o ensino de conceitos isolados nem como o de sistema de conceitos. Afinal, campo
conceitual é um conjunto muito grande de situações-problema com diferentes níveis de
complexidade.

4. Implicações para o ensino

É possível perceber, com o aqui descrito, que o processo de aprendizagem significativa


é necessariamente complexo e exige, via de regra, extenso período de tempo para ser
concluído. Ainda assim, a aprendizagem significativa é extremamente importante no processo
de educação porque é o mecanismo humano por excelência para aquisição e armazenamento
da vasta quantidade de ideias e de informações existentes em qualquer área de conhecimento.
A eficácia da aprendizagem significativa é atribuída, em grande parte, à não-arbitrariedade e ao
caráter não-literal da capacidade de relação da tarefa de aprendizagem com a estrutura
cognitiva.
A natureza e as condições da aprendizagem por recepção significativa ativa exigem um
tipo de ensino que reconheça os princípios da diferenciação progressiva e da reconciliação
integradora nos materiais de instrução e que também caracterize a aprendizagem, a retenção e
a organização do conteúdo das matérias na estrutura cognitiva do aprendiz.

56
Nem sempre é fácil mostrar a ocorrência de aprendizagem significativa. Ao tentar
verificar a compreensão genuína de conhecimentos, solicitando aos alunos que indiquem os
atributos de critérios ou de elementos essenciais de um princípio, podem ocorrer apenas
verbalizações resultantes de uma aprendizagem mecânica.
Quanto à verificação da compreensão verdadeira e significativa das ideias
apresentadas ao aprendiz, Ausubel considera a resolução de problemas como um método
prático e válido. Quando bem sucedida, a resolução de problemas exige muitas capacidades e
habilidades, tais como raciocínio, perseverança, flexibilidade, improviso, ousadia, sensibilidade
aos problemas e astúcia tática, além da compreensão dos princípios subjacentes.
Outra forma de verificar a ocorrência de aprendizagem significativa é através da
apresentação, ao aprendiz, de um novo conhecimento sequencialmente dependente do
anterior que não pode ser dominado sem a compreensão genuína do conhecimento anterior.
Apesar de recorrer-se a várias formas de verificação da aprendizagem significativa,
sempre se deve ter em conta a possibilidade da ocorrência de uma aprendizagem mecânica.
As concepções prévias dos alunos contêm teoremas-em-ação e conceitos-em-ação
que podem não ser teoremas e conceitos científicos, mas que podem (e devem) evoluir para
eles. Há muito de implícito nos esquemas (Vergnaud, 1990) e é papel do professor tornar
explícito o conhecimento implícito do aluno para que possa se aproximar do conhecimento
compartilhado pela comunidade científica. Uma proposição explícita pode ser debatida, o que é
impossível para uma proposição totalmente implícita (Vergnaud, 1996a). Isto corrobora a ideia
de que o conhecimento pode ser modificável se for comunicável, debatido e compartilhado.
A transformação do conhecimento implícito em explícito deve ser feita sem nunca
subestimar aquilo que o aluno já sabe (Moreira, 2002).
Nota-se que, segundo a TCC, para aprender é necessário que haja mediação, quer
com o professor quer com os outros alunos ou sua família (Vergnaud, 1996b). Por mais que a
evolução dos conhecimentos do aluno proceda, em grande parte, de sua própria ação, de sua
experiência e de sua reflexão pessoal, Vergnaud considera que esta evolução não se realizaria
adequadamente sem ajuda do professor.
Em particular, no caso do ensino de MQ, deve-se também utilizar um grande número
de situações nas quais os principais conceitos são aplicados para que os alunos possam
compreendê-los. Os experimentos de dupla fenda e de Stern-Gerlach, o emaranhamento
quântico e a criptografia quântica são situações que utilizamos para auxiliar o aluno a
compreender conceitos inerentes a estados de objetos quânticos, como o da superposição e o
da incompatibilidade de alguns observáveis. Situações mais comuns à FC, tais como a
superposição de ondas e de vetores geométricos, servem para a formação do conceito de
superposição linear a ser utilizado posteriormente na MQ. No estudo realizado, foi utilizada
uma estrutura clássica para auxiliar a conceitualização de determinados conceitos da MQ, e
não para explicar fenômenos quânticos utilizando conceitos e leis cronologicamente,
apresentados na FC.

57
A MQ possui conceitos e princípios bem definidos e específicos, que são
extremamente importantes, mas se vale também de princípios adotados em FC, como os de
conservação de momento e de energia. No entanto, alguns conceitos clássicos podem se
constituir em obstáculos epistemológicos se aparecerem no decorrer do ensino de MQ. O
conceito de orbital, por exemplo, pode ser materializado pelos alunos como conceito de órbita
de modo a simplificar o conteúdo, apesar de não serem análogos. Consequentemente,
conceitos quânticos devem ser devidamente trabalhados de forma a não propiciar o
aparecimento de aproximações simplistas. Isto significa que, mesmo que haja elos importantes
entre a MC e a MQ, para que ocorra o aprendizado desta se faz necessário alguma ruptura
com a MC (Moreira, 2002).
Em MQ, assim como, aliás, em toda a Física, a linguagem e a simbologia adotadas
tornam-se instrumentos para o domínio das situações-problema e construção de esquemas
adequados. O domínio de representações como, por exemplo, a notação de Dirac deve ser
analisado para verificar se o aluno possui uma relativa compreensão do campo conceitual da
MQ.
Além dos argumentos já citados, preocupamo-nos também com a preservação do
conhecimento construído através de anos de desenvolvimento da MQ não-relativística.
Fazendo com que alunos do EM entrem em contato com esta teoria através de materiais
didáticos adequados, discutindo e analisando o seu conteúdo em nível introdutório, pretende-
se que estes estudantes possam captar significados aceitos no contexto desta teoria, sem
distorcê-los.

58
CAPÍTULO V

METODOLOGIA DO ENSINO E DA PESQUISA

1. Introdução

Conforme mencionado no primeiro capítulo, foi oferecido um curso de


aproximadamente 25 horas para alunos de primeira e terceira séries de Ensino Médio (EM)
sobre a fundamentação quântica que alicerça a Física Moderna e Contemporânea (FMC). A
expectativa é de que o conteúdo selecionado e as estratégias de ensino adotadas
proporcionem condições de aprendizagem aos estudantes.
Com este trabalho pretende-se analisar os resultados da proposta desenvolvida,
investigando a ocorrência de aprendizado de alguns dos primeiros conceitos e princípios da
Mecânica Quântica (MQ) no EM, as principais dificuldades reveladas e o efeito das estratégias
(situações-problema) utilizadas no aprendizado.
A pesquisa levada a cabo seguiu alguns procedimentos metodológicos para a
realização de suas diversas etapas, procedimentos estes apresentados neste capítulo,
juntamente com a metodologia de ensino adotada. Aspectos éticos não foram feridos nas
etapas da pesquisa, visto que alunos, corpo docente e direção de cada escola foram
informados sobre a pesquisa a desenvolver e que não haveria identificação dos sujeitos
envolvidos.

2. Questões de pesquisa

A FMC é um tema atual e pertinente para o ensino de Física no EM e,


consequentemente, uma de suas fundamentações, a MQ, também. Assim, com os referenciais
teóricos apresentados, este estudo tem por objetivo responder as duas questões abaixo.
 Como ocorre o aprendizado de alguns dos primeiros conceitos e princípios da
MQ no EM?
 Quais as principais dificuldades encontradas e quais estratégias (situações-
problema), dentre as oferecidas, surtem melhores efeitos neste aprendizado?
Estas perguntas têm o intuito de nortear a pesquisa sobre a compreensão dos
primeiros conceitos e princípios da MQ, inseridos em um contexto de ensino adequado.
Realizada a intervenção em turmas de EM, são analisadas as principais dificuldades
observadas na compreensão dos tópicos apresentados, bem como identificados quais tópicos
mais motivaram os alunos, segundo os registros obtidos com os instrumentos adotados.

59
3. Metodologia de ensino

A metodologia de ensino utilizada no decorrer deste trabalho contempla o público-alvo,


os procedimentos em sala de aula e os materiais utilizados ao longo do curso. Os referenciais
teóricos apresentados no capítulo IV foram utilizados para a elaboração dos instrumentos de
coleta de dados, para as técnicas de ensino utilizadas no curso, para a confecção dos
materiais distribuídos aos alunos e para a análise dos dados obtidos.

3.1. Público-alvo e descrição das aulas

Com o recurso de uma metodologia qualitativa (participação ativa e período


relativamente longo de imersão no fenômeno estudado), a mesma disciplina foi oferecida em
duas etapas, a grupos distintos, em épocas distintas. O público-alvo foi constituído, em ambas
as etapas, por alunos de turmas de primeira e de terceira série do EM de escolas da rede
pública de ensino do estado de Santa Catarina. Optou-se por trabalhar com estas duas séries,
quer porque atualmente já é considerado adequado abordar conceitos de FMC ao final da
terceira série do EM, quer porque existem recomendações para que tais conceitos sejam
inseridos no início do EM (vide, por exemplo, Rezende Jr. e Cruz, 2009). Além disto, esta
opção possibilita comparações nas relações ensino-aprendizagem entre alunos de inicio e de
final do EM. A escolha de escolas públicas se deve tanto ao fato de que tais instituições
possuem certa liberdade curricular, bem como por permitirem maior autonomia dos professores
para desenvolver os conteúdos das disciplinas (Oliveira et al., 2007).
Na primeira fase do ensino foram envolvidos os alunos de duas turmas de primeira
série e de uma turma de terceira série em disciplinas regulares de Física do EM, de uma escola
da rede pública estadual de ensino da cidade de Joinville, SC, no primeiro semestre de 2010.
As aulas de uma das turmas de primeira série (turma 101) eram oferecidas no período da
manhã e as da outra turma de primeira série (turma 102), bem como as da turma de terceira
série (turma 103), no período noturno. O número de alunos matriculados em cada turma é
apresentado na tabela 1.
As aulas do turno matutino tinham a duração de 45 minutos cada, ocorrendo sempre
duas em sequência, perfazendo 90 minutos; as aulas das turmas noturnas tinham a duração de
40 minutos cada, ocorrendo também duas em sequência, perfazendo 80 minutos de aula. Em
geral, as turmas possuíam alunos da mesma faixa etária (15-18 anos), exceto pela inclusão de
dois alunos com mais de 30 anos, na primeira série do noturno. O número de alunos presentes
em cada aula e participantes dos instrumentos de coleta de dados não se manteve fixo, tendo
ocorrido novas entradas de estudantes no decorrer do semestre letivo e também trocas de
turno por alguns alunos. O número de alunos em cada atividade é apresentado na análise dos
questionários e avaliações, no próximo capítulo. É importante salientar que muitos alunos do
turno noturno trabalhavam durante o dia, estando cansados e até mesmo desmotivados em
várias das aulas, problema frequente em cursos noturnos.

60
Tabela 1. Número de alunos matriculados nas turmas da primeira etapa de ensino.
Turma Número de alunos
101 33
102 34
103 26

Na segunda etapa de ensino foram incluídos os alunos de duas turmas de primeira


série e os alunos de três turmas de terceira série de disciplinas de Física do EM/Ensino
Técnico (ET) de um Instituto Federal de Ensino, de Araquari, SC, no segundo semestre de
2012. Todas as turmas funcionavam no período diurno, com algumas aulas sendo ministradas
no período da manhã e outras no da tarde. As turmas de primeira série (turmas 201 e 202) e
uma de terceira série (turma 203) cursavam o EM/ET em Informática e as outras duas turmas
de terceira série (turmas 204 e 205) cursavam o EM/ET em Agropecuária. As aulas tinham a
duração de 45 minutos, ocorrendo sempre duas em sequência, totalizando 90 minutos. As
turmas possuíam alunos na mesma faixa etária (15-18 anos), faixa etária comum e adequada
para este nível de ensino, segundo o Ministério da Educação. O número de alunos
matriculados em cada turma é apresentado na tabela 2.
Tabela 2. Número de alunos matriculados nas turmas da segunda etapa de ensino.
Turma Número de alunos
201 35
202 35
203 36
204 20
205 21

Em cada escola, o professor que lecionava a disciplina de Física nos cedeu suas
turmas para a realização do ensino e da pesquisa, possibilitando que fosse apresentado o
conteúdo de MQ aos alunos e que seu desenvolvimento fosse analisado no decorrer do
processo de aprendizagem. Nas duas etapas, o professor acompanhava a aplicação do projeto
em sala de aula junto aos alunos.
Os alunos da primeira etapa foram acompanhados durante quatro meses e os da
14
segunda etapa durante três meses , possibilitando, com a coleta de dados, o recolhimento de
informações visando analisar o aprendizado e responder as questões de pesquisa propostas.
O projetor multimídia foi utilizado em todas as aulas, facilitando a apresentação do
15
conteúdo programado e otimizando, assim, a dinâmica de sala de aula . Os alunos foram
estimulados continuamente a participar das atividades de sala de aula e todo comentário feito
por eles, pertinente ou não, era escutado e analisado, propiciando que os estudantes não se
intimidassem ante o professor ou com o novo conteúdo. Para promover discussões e criar a
pré-disposição para a aprendizagem, perguntas foram inseridas ao longo do texto de apoio
utilizado no decorrer do curso (vide Apêndice I). Simulações em computador também foram

14
O período de tempo maior no acompanhamento, pelo pesquisador, das turmas da primeira etapa ocorreu devido a
uma interrupção das aulas na escola durante o semestre. O número de horas de aula foi o mesmo nas duas fases de
ensino.
15
Os arquivos com os slides apresentados em sala de aula foram disponibilizados aos alunos como material de
consulta. Este material foi elaborado utilizando um texto de apoio por nós produzido como base.

61
utilizadas para viabilizar a compreensão dos conceitos e princípios estudados nas situações-
problemas propostas. Os endereços com as simulações podem ser encontrados no texto de
apoio. Testes rápidos (apresentados na seção 4.1.2. deste capítulo e constantes do Apêndice
V) também foram utilizados na segunda etapa da pesquisa com o intuito de criar uma prontidão
para a aprendizagem, algo também necessário para a ocorrência da aprendizagem
significativa. Os instrumentos de coleta de dados utilizados nas duas etapas da pesquisa
serviram como avaliação da aprendizagem e foram adotados pelo professor regular da
disciplina no cálculo da média para a aprovação dos alunos, conforme previsto pelo regimento
de cada instituição ou legislação em vigor.
Buscou-se evitar referências a conceitos clássicos para interpretação dos fenômenos
quânticos, tendência também de alguns outros pesquisadores (vide, por exemplo, Pospiech
(1999), Greca et al. (2001) e Carvalho Neto et al. (2009)). Pospiech (1999) e Greca et al.
(2001), aliás, usam o termo “objeto quântico” em vez de partícula. O conhecimento-em-ação
dos alunos também foi analisado, caso estes explicitassem sua compreensão em cada
situação, nos exercícios e atividades propostos no decorrer das aulas.
Na nossa perspectiva, buscamos, então, propiciar que os estudantes viessem a
construir, por um processo de formação de conceitos, alguns subsunçores adequados para
prosseguimento no estudo sobre MQ. O conceito de superposição linear foi considerado como
importante subsunçor para promover a aprendizagem significativa de outros conceitos.
Estruturas utilizadas em FC como a da superposição de ondas e a da superposição de vetores
geométricos foram pensadas como ancoradouros para o desenvolvimento da ideia de
superposição linear de estados quânticos, na expectativa de que esta propicie um bom
aproveitamento no aprendizado de tópicos da MQ. Em nenhuma instância do curso foi
proposta a interpretação dos fenômenos apresentados com conceitos clássicos como os de
trajetória, velocidade, etc.

3.2. Texto de apoio

Antes de iniciar a atividade de ensino da primeira fase, e visando a pesquisa a ser


realizada, foi redigido um Texto de Apoio envolvendo os principais conceitos inerentes à
superposição linear de estados quânticos e aos princípios fundamentais da MQ a serem
abordados. Parte da base deste material foi utilizada na apresentação de curso de extensão na
Universidade do Vale do Rio dos Sinos e em disciplina do curso de Licenciatura da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Rocha, 2008).
Este material foi escrito visando possibilitar uma aprendizagem significativa dos
conceitos propostos, contemplando assim uma espécie de organizador prévio, bem como de
situações-problema com aplicações dos conceitos abordados e verificações recorrentes da
aprendizagem com auxílio de perguntas propostas ao longo do texto. Já na introdução do
material se buscou criar uma condição de pré-disposição para a aprendizagem mostrando
algumas das estranhezas do mundo quântico e implicações tecnológicas decorrentes do

62
desenvolvimento da MQ. Além disso, o conteúdo inicia com uma introdução sobre a MQ,
16
seguida de um “pseudo-organizador prévio ”, com a superposição de ondas e de vetores.
Posteriormente, são introduzidos conceitos e exemplos de estados de sistemas físicos
(clássicos e quânticos) e alguns dos principais postulados da MQ, junto a situações-problema
específicas. Cada aluno recebeu cópia do Texto de Apoio, entregue aos poucos, antes da aula
17
sobre o respectivo conteúdo . Além disso, foram enviados aos alunos, por correio eletrônico,
os slides e os endereços das simulações utilizados em algumas das aulas. O Texto de Apoio,
cujo conteúdo é listado no quadro 1, consta do Apêndice I. Os endereços eletrônicos das
simulações utilizadas também constam do Texto de Apoio e os slides foram construídos com
base no mesmo material entregue aos alunos.
As situações-problema de aplicações dos conceitos de MQ elencadas no Texto de
Apoio são: experimento de dupla fenda, experimento de Stern-Gerlach, polarização da luz,
emaranhamento quântico e criptografia quântica, os dois últimos, temas atualmente muito
trabalhados em pesquisa em Física. O conceito de estado de um sistema físico e os princípios
de superposição linear, incompatibilidade de observáveis, possíveis valores de medidas, entre
outros, foram abordados nas situações-problema.
Foi, em geral, uma preocupação na redação do Texto de Apoio, introduzir o que o
aluno precisaria saber para aprender de forma significativa conceitos e princípios quânticos e
inserir tais conteúdos de modo a motivá-lo para o aprendizado, conforme recomendado pelos
referenciais teóricos utilizados nesta pesquisa. Estes são os aspectos básicos que nortearam o
desenvolvimento de um material, em princípio, potencialmente significativo e em condições de
criar a situação de pré-disposição necessária para a ocorrência da aprendizagem significativa.
Os resultados a obter na pesquisa podem sinalizar o alcance dos objetivos, total ou parcial,
deste material.
Com o intuito de promover avaliações pontuais durante o processo de ensino-
aprendizagem do curso, algumas questões foram inseridas ao longo do Texto de Apoio,
visando discutir os princípios e as situações-problemas apresentados. As questões do tipo
“exercício” poderiam tanto ser resolvidas pelos alunos com auxílio do pesquisador ou serem
designadas como atividades extraclasse. A intenção das atividades do tipo “reflita” era
promover uma situação de desconforto nos alunos para que entendessem a situação
apresentada como sendo efetivamente um problema e, assim, buscar uma solução. Em ambos
os tipos de questões, visou-se a externalização dos conhecimentos recém-incorporados à
estrutura cognitiva dos alunos e que servissem, também, como um instrumento para a
avaliação da aprendizagem.

16
Organizadores prévios são estruturas que se destinam a facilitar a aprendizagem de um tópico específico, enquanto
pseudo-organizadores prévios se destinam a facilitar a aprendizagem de uma unidade (vários tópicos) (Souza e
Moreira, 1981, p. 304).
17
Caso o aluno não estivesse presente na aula, o material lhe era entregue na próxima aula a que comparecesse.

63
Quadro 1. Relação dos conteúdos do Texto de Apoio.
Fundamentos de Mecânica Quântica
1. Introdução
2. Somando Ondas, Vetores e Estados
Somando Ondas
Somando Vetores do Plano Real
Os Experimentos de Dupla Fenda – As Primeiras Estranhezas
Espaços Vetoriais
Descrevendo Sistemas Físicos
Sistemas Binários
Bits Quânticos
Spin e Experimento de Stern-Gerlach
Sistemas Não Binários
3. Quais os Principais Fundamentos da Teoria que Explica com Sucesso os
Fenômenos Quânticos?
Somar Estados é uma Consequência da MQ?
O que entendemos por estado de um objeto físico?
Objetos quânticos
Medições em MQ
Quais problemas podemos enfrentar ao medir grandezas físicas?
Limitando os Valores de Medidas
Superposição Linear de Estados e Emaranhamento Quântico
Segurança na Transmissão de Informação: a Criptografia Quântica

4. Metodologia da pesquisa

Esta seção descreve a metodologia utilizada ao longo das etapas da pesquisa, visando
responder as questões da pesquisa da segunda seção. São apresentados os instrumentos de
coleta de dados e os procedimentos adotados para a análise.

4.1. Instrumentos de coleta de dados

Para avaliar a compreensão dos alunos sobre o conteúdo apresentado, lançou-se mão
18
de diversas formas de coleta de dados . Foram utilizados como instrumentos: questionário de
conhecimentos prévios; três avaliações escritas; questionário de opiniões ao final do curso;
diário de bordo com registro de manifestações dos alunos no decorrer das aulas (e até mesmo
fora delas) ante os assuntos desenvolvidos. Ocorreram algumas alterações nas estratégias de
avaliação, ao passar-se da primeira para a segunda etapa da pesquisa, visando a melhoria do
processo. Assim, adicionalmente, na segunda etapa foram incluídos mapas mentais (aplicados

18
Os instrumentos de coleta de dados e o Texto de Apoio foram avaliados e tiveram validade de conteúdo apontada
por doutores na área, conforme recomendado por diversos pesquisadores como, por exemplo, Silveira (1993, p. 67).

64
no início e no fim do curso) e testes rápidos utilizados em seu decorrer. A forma de utilização
de cada instrumento de coleta de dados e outros detalhes a respeito é descrita a seguir.
Para facilitar a análise e preservar a identidade dos envolvidos na pesquisa, os alunos
foram rotulados por um número de cinco dígitos, o primeiro relativo à etapa da pesquisa, os
dois seguintes referentes à turma do aluno e os dois últimos ao próprio aluno. Assim, o aluno
20122, por exemplo, é o aluno 22 da primeira turma da segunda etapa. As turmas 01 e 02 na
primeira e na segunda etapa são turmas de primeira série e as demais são turmas de terceira
série.

4.1.1. Primeira etapa da pesquisa

Na primeira aula e antes do início da apresentação dos tópicos de MQ, foi proposto aos
alunos um questionário com dez questões com a intenção de, a partir das respostas
apresentadas, avaliar o conhecimento sobre alguns conceitos prévios à MQ e obter
informações sobre eventual contato anterior do aluno com esta teoria. Os conceitos prévios
investigados foram os de partícula, estado de um objeto e onda, além de questões sobre
personagens de destaque em Física e equipamentos, experimentos, artefatos, etc. Cópia deste
questionário consta do Apêndice II.
Com o intuito de verificar a aprendizagem dos alunos, foram aplicadas três avaliações
escritas durante o desenvolvimento da proposta, todas elas sem consulta ao Texto de Apoio ou
19
a outros meios. A primeira avaliação foi realizada em duplas, enquanto as demais foram
individuais. O momento de aplicação de cada avaliação é apresentado no próximo capítulo e,
em todas as avaliações, o período disponibilizado para sua resolução foi de cinquenta minutos,
mas os alunos acabavam por realizá-las em menos tempo do que o ofertado, conforme
apresentado no próximo capítulo. Cópias das avaliações encontram-se no Apêndice III.
A primeira avaliação, relativa à superposição linear de ondas e de vetores, buscou
verificar também o interesse do aluno pelo aprendizado em MQ. Esta avaliação constou de seis
questões, sendo cinco dissertativas e uma de múltipla escolha, e o foco estava na
compreensão dos conceitos e princípios aplicados nas situações-problema estudadas.
Na segunda avaliação, foram contemplados conteúdos sobre os principais conceitos e
postulados da MQ, a saber, os relativos a sistemas físicos, estados de sistemas físicos,
superposição linear de estados quânticos, resultados de medidas e probabilidades associadas,
observáveis e incompatibilidade de observáveis. Esta avaliação constou de sete questões,
sendo seis dissertativas e uma de múltipla escolha, e as situações-problema utilizadas foram o
átomo de hidrogênio, o experimento de dupla fenda e o experimento de Stern-Gerlach.
A terceira avaliação versou sobre a aplicação dos postulados às situações-problema
de Emaranhamento Quântico e Criptografia Quântica, além de outras como a polarização da

19
Nas turmas da primeira fase da pesquisa, a primeira avaliação foi realizada em duplas. Esta estratégia foi retirada na
segunda fase proporcionando verificar-se a aprendizagem de cada aluno separadamente. As demais avaliações foram
realizadas de forma individual (e sem consulta ao Texto de Apoio).

65
luz, por exemplo. Esta avaliação constou de seis questões, sendo cinco dissertativas e uma de
múltipla escolha.
Ao final desta etapa foi aplicado um questionário de opiniões (vide Apêndice IV) com a
intenção de verificar o acolhimento dos alunos aos temas apresentados e sobre o propósito de
um estudo introdutório de MQ no EM. O questionário constou de dez questões e os alunos
foram incentivados a apresentar respostas que representassem suas opiniões verdadeiras,
sem risco de comprometer os resultados (ainda não divulgados) das avaliações (já corrigidas).
Adicionalmente, no mesmo dia, logo após o término do tempo de respostas concedido ao
questionário de opiniões, os alunos foram reunidos para que expusessem as opiniões que,
eventualmente, não conseguiram colocar no papel.
Como mencionado, elaboramos um diário de bordo com registros sobre reações e
questionamentos dos alunos ante os assuntos desenvolvidos. Em particular, as manifestações
apresentadas na reunião mantida com os alunos após o questionário de opiniões, foram
registradas no diário de bordo. O diário foi utilizado para complementar a análise dos dados
coletados na pesquisa.

4.1.2. Segunda etapa da pesquisa

Nesta fase do projeto, os alunos foram inicialmente levados a elaborar um mapa mental
associando a expressão “Mecânica Quântica” a menções de temas que lhes viessem à mente.
Cada aluno recebeu, para tal, uma folha com a citação “Mecânica Quântica” no centro,
solicitando-se silêncio para que a atividade fosse desenvolvida individualmente e sem
interferências dos colegas. A denominação “mapa mental” do instrumento não foi apresentada
aos alunos, não sendo o intuito do curso que os alunos se apropriassem desta nomenclatura
(pelo menos não naquele momento).
Finalizada a atividade do mapa mental, foi proposto, na mesma aula, o questionário de
conhecimentos prévios utilizado na primeira etapa da pesquisa.
Como forma de diagnosticar o aprendizado no decorrer do curso, lançou-se mão de
quatro testes rápidos, com respostas por escrito, além das mesmas três avaliações aplicadas
na primeira fase do projeto. Os testes rápidos compreenderam uma ou duas perguntas com
expectativa de resposta rápida e foram realizados ao final de algumas das aulas. Os alunos
tinham de cinco a dez minutos para resolver estes testes e, em geral, este tempo foi
considerado suficiente. Os testes foram aplicados ao final do terceiro, sexto, sétimo e décimo
encontros, respectivamente. Para as respostas aos testes, o aluno recebeu uma folha em
branco somente com o número da questão, sendo esta apresentada através do projetor
multimídia. A intenção de tal estratégia era a de induzir os alunos a responder rapidamente
(tipicamente, em menos de três minutos) para, se possível, apresentar e discutir as respostas
logo em seguida. Os quatro testes utilizados constam do Apêndice V.
As avaliações escritas foram aplicadas nos mesmos momentos do desenvolvimento do
conteúdo da primeira fase.

66
A reapresentação do mapa mental do início do primeiro encontro, ao final do curso,
visou analisar, através das diferenças entre os dois mapas, alguns aspectos da aprendizagem
ocorrida. Na mesma aula, foi aplicado o questionário de opiniões introduzido na primeira etapa,
com os mesmos objetivos anteriores.
Três alunos de cada turma foram escolhidos aleatoriamente para uma rápida entrevista
sobre o curso apresentado. Estas entrevistas foram gravadas, sendo os alunos informados da
preservação de suas identidades e da não influência das mesmas nos resultados das suas
avaliações.
Assim como na etapa anterior, foi elaborado um diário de bordo, utilizado para
complementar a análise dos demais dados coletados.

5. Análise dos dados

Foram analisadas, de forma qualitativa, as respostas de cada aluno ao questionário de


conhecimentos prévios, para verificar tipos de conhecimentos-em-ação sobre MQ que cada
aluno, eventualmente, já trazia consigo para a sala de aula. Esta informação (pesquisa
estimulada) permitiria uma comparação entre os pré-conhecimentos dos alunos das primeiras e
terceiras séries, bem como nortearia condutas futuras no ensino planejado. As respostas mais
comuns foram contabilizadas e o número de repetições em cada série permitiu essa
comparação.
Os mapas mentais apresentados no inicio da segunda etapa e aplicados
cronologicamente antes dos questionários, também analisados de forma qualitativa, visavam
verificar (de modo não estimulado) que conceitos de MQ apresentavam os alunos que, via de
regra, não haviam tido um contato formal com a teoria. Os mesmos mapas mentais, solicitados
ao final do projeto, visavam uma comparação com aqueles montados no inicio do curso. Este
tipo de comparação pode indicar de que forma se dá a apropriação deste campo conceitual por
parte dos alunos.
Os resultados das três avaliações e dos quatro testes rápidos foram analisados de
forma tanto qualitativa, como quantitativa. Com a análise qualitativa das avaliações, procurou-
se estudar o teor da resposta, para verificar indícios de aprendizagem significativa dos tópicos
apresentados. Na análise quantitativa foram atribuídos valores às respostas a cada questão,
segundo critério de quão próximas do correto estavam. Em cada questão, os valores atribuídos
variaram de 0 até 3 (inteiros), desde resposta considerada totalmente incorreta ou em branco a
resposta totalmente correta. As respostas fornecidas pelos alunos possibilitaram também
verificar quais das situações-problema utilizadas surtiram mais efeito positivo na compreensão
dos conceitos e princípios de MQ. Alguns dos conceitos atribuídos às respostas dos alunos nas
avaliações escritas e nos testes rápidos são apresentados no Apêndice VIII.
Após a atribuição de valores a cada questão respondida pelos alunos, calculou-se a
média aritmética simples e o desvio padrão dos resultados de cada avaliação e teste rápido em
cada uma das séries.

67
Com base na análise exploratória de Kendall (1977) proposta por Barbancho (1992),
20
que calcula o coeficiente de variação (CV) ou grau de dispersão dos dados, procurou-se
verificar se as respostas fornecidas refletiam o nível de conhecimento da turma sobre cada um
dos assuntos das avaliações e dos testes rápidos. O valor do CV maior que 0,30 implica em
uma grande dispersão, indicando que o valor da média da turma não reflete necessariamente a
realidade conceitual do grupo; trata-se, então, de uma turma não homogênea, a compreensão
dos conceitos apresentados não tendo ocorrido de modo uniforme em toda a turma.
21
Realizou-se, igualmente, uma análise de variância utilizando o teste t de Student , com
um nível de significância a 95%, para verificar se havia diferença estatisticamente significativa
entre as amostras nos seguintes casos: (1) entre as diferentes séries de uma mesma etapa da
pesquisa; (2) entre as mesmas séries das duas diferentes etapas da pesquisa. As respostas
deixadas em branco pelos alunos foram contabilizadas e consideradas na análise do CV e do
teste t, mesmo que não haja consenso entre pesquisadores em Ensino sobre o significado de
uma resposta em branco (Hora et al., 2010, p. 97).
Após a conclusão das etapas da pesquisa, foi realizada uma comparação entre os
desempenhos dos alunos de primeira e terceira séries de cada etapa, visando a análise da
existência de uma possível influência do aprendizado de conceitos apresentados anteriormente
em FC nas terceiras séries para a aprendizagem de conceitos fundamentais da MQ. Fez-se,
também, uma comparação dos resultados entre as mesmas séries das duas apresentações do
curso, com o intuito de analisar se havia alguma diferença estatisticamente significativa entre
elas.
As entrevistas da segunda etapa foram analisadas qualitativamente após sua
transcrição, buscando elementos nas falas dos alunos que pudessem revelar indícios de
ocorrência de aprendizagem significativa e os conhecimentos-em-ação utilizados.
Com tais dados assim analisados, consideramos possível responder as questões de
pesquisa propostas.
No próximo capítulo, são apresentadas a análise e a discussão dos dados coletados.

20
O coeficiente de variação é uma medida da dispersão relativa e é dado pela expressão: , em que é o desvio

padrão e é a média da amostra.


21
Foi possível analisar os dados obtidos com o teste t de Student por se apresentarem segundo uma distribuição
normal (Winter, 2013), ou seja, pelo menos 95% dos valores obtidos estão compreendidos na faixa de , em que
é a média e é o desvio padrão da série. O cálculo do valor de t, para amostras com tamanhos e variâncias
diferentes, é dado por , em que é a média, o desvio padrão e é o número de indivíduos da n-ésima

série.

68
CAPÍTULO VI

ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

1. Introdução

Lembrando o mencionado anteriormente, a disciplina de Física oferecida aos alunos de


primeira e terceira séries do Ensino Médio (EM) foi apresentada em dois momentos distintos,
caracterizados como etapas (ou fases) do ensino e da pesquisa. O desenrolar da primeira fase
conduziu à introdução de alguns elementos de avaliação adicionais na segunda fase. Este capítulo
22
apresenta a análise dos dados coletados na pesquisa, com os diversos instrumentos utilizados, bem
como a discussão dos resultados encontrados, segundo os referenciais teóricos adotados.

2. Primeira etapa da pesquisa

A primeira etapa da pesquisa teve como foco o desenrolar da primeira fase de ensino,
realizada em 2010, e envolveu a análise de respostas dos alunos a questionário de conhecimentos
prévios e a análise de resultados de três avaliações escritas, além do exame do questionário de
opiniões e das entrevistas realizadas.

2.1. Questionário de conhecimentos prévios

O questionário de conhecimentos prévios, constando de dez questões, foi proposto aos


23
alunos (vide Apêndice IV) e por eles respondido (por escrito) como primeira atividade do curso .
Não houve pressão sobre os alunos quanto ao período de tempo para finalização da tarefa,
procurando-se propiciar que as respostas coletadas fossem espontâneas e individuais. Solicitou-se
aos estudantes, também, que não trocassem ideias sobre o conteúdo de suas respostas. Nesta etapa
do processo, 58 alunos da primeira série e 26 alunos da terceira série responderam o questionário.
As respostas à primeira e segunda perguntas são analisadas em conjunto, por serem
complementares. 45 alunos da primeira série e 23 da terceira assinalaram somente respostas que se
relacionam diretamente com a MQ: computação, criptografia, emaranhamento, física, mecânica,
partícula. Dentre as justificativas mais utilizadas estão: “acho que deve ser isso”, “se é da aula de
Física, deve ter a ver com Física”, “o professor falou algo relacionado”, “relacionei com as outras
questões”, “já ouvi falar”, “já vi na internet e em alguns livros” e até mesmo “nunca ouvi falar”. Quinze
alunos da primeira série e dois da terceira deixaram as justificativas em branco. Quanto aos demais
alunos, treze da primeira série e três da terceira assinalaram alguma alternativa muitas vezes
divulgada na mídia sem qualquer endosso científico, como relacionada à MQ (consciência, cura,

22
Na apresentação dos dados, erros gramaticais e ortográficos cometidos por alguns alunos foram corrigidos nas transcrições,
exceto quando a resposta do aluno foi escaneada.
23
Uma análise preliminar dos questionários respondidos pelos alunos da primeira fase da pesquisa foi apresentada no XIX
Simpósio Nacional de Ensino de Física em Manaus, AM (2011), com o trabalho “Inserindo conceitos de mecânica quântica no
ensino médio: superposição linear” na forma de comunicação oral.

69
ginástica, música, terapia). Os alunos, dentre estes, que justificaram suas escolhas, citaram os
seguintes motivos: “já ouvi falar” e “acho que é isso”.
Quanto à terceira questão, treze alunos da primeira série e sete da terceira não sabem ou
não souberam apresentar um conceito de partícula. As respostas e exemplos que mais apareceram
no grupo dos alunos da primeira série dizem respeito a “parte ou pedaço de uma coisa/matéria”,
“coisas pequenas”, “pedaços vistos no microscópio”, “átomos”, “célula” e até “pedaço de unha”. Além
de repetirem algumas dessas afirmações, os alunos da terceira série citaram que partículas são
“pedaços de pedaços”, “menor parte de um átomo ou corpo”, “grão”, entre outros. A palavra elétron
foi citada como exemplo de partícula na terceira série.
No que concerne à quarta questão, para os alunos de ambas as séries o termo estado esteve
muito relacionado com os estados de agregação da matéria (sólido, líquido, gasoso). Não ocorreram
grandes diferenças nas respostas apresentadas pelos alunos das duas séries; muitos relacionaram o
estado de um sistema com “a posição em que um objeto ou pessoa está, suas condições
(preservado, movimento, temperatura), como foi feito e de onde veio”. Quinze alunos da primeira
série e quatro da terceira não responderam ou não souberam responder esta questão. Nenhum aluno
mencionou que o estado poderia alterar-se no tempo.
Na quinta questão poucos alunos explicaram, mesmo a seu modo, o que é uma onda, mas a
maioria apresentou exemplos, sendo as ondas do mar o mais citado. Alguns alunos da primeira série
afirmaram que uma onda é um “impulso temporário/magnético” ou uma “oscilação”. Ondas sonoras,
ondas eletromagnéticas (TV, rádio, micro-ondas) e ondas geradas por pedra jogada no meio de um
lago, foram também citadas como exemplos.
A sexta questão foi a que menos respostas afirmativas apresentou. Um aluno registrou que
acreditava que o experimento de dupla fenda era um experimento com “dois buracos”. Alguns
relacionaram a palavra “fenda” com uma ferramenta e outros julgaram ser o experimento, um de
dupla face ou duplo acontecimento, sem explicar o que queriam dizer com isso. Talvez se a pergunta
se referisse à experiência de interferência de Young, algumas respostas poderiam ter sido mais
relacionadas ao assunto. Isto sinaliza para o fato de que, apesar da importância do experimento de
dupla fenda para a observação de um fenômeno não clássico (com elétrons, por exemplo), este
tópico não foi sequer mencionado nas disciplinas de Física e Química dos alunos do EM envolvidos
no curso.
Quase todos os alunos das duas séries afirmaram ter interesse, em resposta à questão
número sete, em conhecer a teoria base dos equipamentos apresentados na pergunta, seja por
curiosidade, desejo de aquisição de conhecimento ou para simplesmente saber como funcionam.
Cinco alunos declararam não importar saber o que os aparelhos têm em seu interior, pois isto não os
ajudaria em nada e acrescentaram que nunca iriam “usar isso”.
Sete alunos da primeira série afirmaram já ter ouvido falar da MQ (oitava pergunta), porém
não sabiam informar a respeito de quais assuntos, sendo apenas familiar o nome; os demais
declararam não ter ouvido a respeito e alguns destes manifestaram interesse em estudar esta teoria.
Quanto aos alunos da terceira série, quase metade dos mesmos mencionou já ter ouvido algo a
respeito da MQ, sendo os assuntos citados “onda”, “propagação de onda”, “ciência” e “tecnologia”.

70
Um aluno registrou já ter ouvido falar da MQ, a respeito de um objeto poder estar em dois lugares ao
mesmo tempo.
Albert Einstein foi o nome mais lembrado pelos alunos na nona questão. Os estudantes
comentaram já ter visto sua foto em capas de revistas, em notícias na Internet relacionadas à sua
genialidade, a respeito da bomba atômica e da teoria da relatividade. Um aluno mencionou ter ouvido
falar de Werner Heisenberg e outro de Max Planck, porém não souberam dizer em relação a quais
assuntos. De modo equivocado, uns poucos alunos das duas séries acreditavam que Einstein teria
sido o inventor da lâmpada elétrica e da eletricidade. Treze alunos da primeira série e três da terceira
afirmaram não conhecer qualquer dos cientistas citados.
Relativamente à décima e última pergunta do questionário, 43 alunos (30 da primeira série e
13 da terceira) informaram já ter lido sobre Aceleradores de Partículas, Bomba Atômica, Chip,
Nanotecnologia, Radiação Eletromagnética, Teletransporte ou Tunelamento em livros e na Internet,
ou ter ouvido falar a respeito na própria Escola. A Bomba Atômica foi citada pelo seu poder de
destruição e utilização em guerras; um aluno da terceira série afirmou que ela “possui átomos
concentrados que liberam energia quando se separam”. Segundo os alunos, os Chips são
“componentes eletrônicos utilizados em aparelhos celulares e para guardar informação”. Um aluno
crê que o Acelerador de Partículas é utilizado para “visualizar partículas invisíveis ao microscópio”. A
Nanotecnologia foi considerada por um aluno como uma “tecnologia microscópica” e o Teletransporte
como algo que “permite a troca da posição de uma pessoa em instantes”, por outro aluno. Um
estudante associou a palavra “tecnologia” aos termos apresentados. Trinta alunos da primeira série e
treze da terceira afirmaram não ter ouvido falar a respeito dos itens apresentados ou não
responderam a pergunta.
As respostas ao questionário sugerem que os alunos da primeira série tiveram pouco (ou
nenhum) contato com a MQ e que alguns dos alunos da terceira série tiveram algum contato com
esta teoria, em parte talvez na Internet ou pela televisão. Pode-se dizer, no entanto, que
provavelmente este contato não foi através da educação formal em Física, visto que o currículo da
Educação Básica não contempla a MQ ou alguns de seus elementos nesta disciplina. Contudo, na
disciplina de Química isto pode ter ocorrido, pois o conteúdo de Atomística contempla alguns tópicos
de MQ. Saliente-se, então, que o conhecimento apresentado pelos alunos de terceira série não
advém de uma formação, mas sim de uma informação que foi obtida provavelmente pela educação
em espaços não-formais e informais de ensino.
A falta de conhecimentos dos alunos de ambas as séries acerca da física quântica revelada
pelo experimento de dupla fenda também nos induz a acreditar que seja possível abordar a MQ do
mesmo modo para estas séries. Esta situação também ocorreu nas duas últimas questões do
questionário, mostrando que os alunos das duas séries possuem informação semelhante acerca de
alguns cientistas importantes no trato da MQ e também de alguns termos importantes da área.
Na análise das respostas às questões também foi possível verificar que os alunos possuem
grande dificuldade em escrever o que pensam a respeito de determinado conteúdo. Alguns alunos,
inclusive, salientaram em suas respostas que já tinham ouvido falar sobre o tema, mas não
conseguiam apresentar explicações ou dar exemplos. No processo ensino-aprendizagem de qualquer

71
disciplina, torna-se extremamente complicado tentar fazer o aluno se apropriar de um campo de
conhecimento sem que ele consiga externalizar o que pensa. Segundo a Teoria dos Campos
Conceituais, é através desta externalização que o professor pode encontrar guarida para verificar o
aprendizado dos alunos. Uma solução parcial para esta dificuldade pode ser a averiguação de
algumas das concepções dos estudantes na forma oral, através de uma conversa informal ou
discussão em sala de aula. Lamentavelmente, nem todos os alunos participam dessas sessões
ativamente, realizando as atividades de forma rápida e sem interesse, o que pode prejudicar uma
avaliação mais detalhada do aprendizado de cada aluno e dos conceitos que traz consigo para a sala
de aula.

2.2. Avaliações escritas

Três avaliações escritas foram realizadas para verificação de aprendizagem dos alunos e,
com isso, possibilitar uma análise da qualidade das situações-problema utilizadas ao longo do curso
(e da qualidade do próprio curso). As questões de cada uma das avaliações estão apresentadas no
Apêndice III.
As turmas tiveram cinquenta minutos para a resolução de cada uma das avaliações, mas
algumas delas utilizaram menos tempo.

2.2.1. Primeira avaliação

A primeira avaliação, constando de seis questões, foi aplicada após a realização de aulas em
que foi trabalhada uma introdução da MQ com seus aspectos não intuitivos, algumas de suas
aplicações e uma rápida apresentação do momento histórico que conduziu à sua elaboração, além de
24
conceituação e exemplos de superposição de ondas e superposição de vetores . Os tópicos
abordados, conforme apresentado no Texto de Apoio, foram a Introdução, Somando Ondas, Vetores
e Estados (Somando Ondas e Somando Vetores do Plano Real).
Esta avaliação foi realizada por 71 alunos, sendo 49 da primeira série e 22 da terceira série,
e foi realizada em duplas nesta etapa da pesquisa, mas com alguns alunos optando por resolvê-la
individualmente.

2.2.1.1. Análise quantitativa

A tabela 3 apresenta a quantidade de valores atribuídos por série em cada questão da


primeira avaliação, conforme a escala de valoração apresentada no capítulo anterior.
Com base na tabela, pode-se verificar que foi grande o número de alunos (64,4%) com alto
número de acertos (valores 2 e 3 na escala). Assim, como os alunos, em sua maioria, responderam
satisfatoriamente a maior parte das questões, infere-se que há indícios de alguma aprendizagem dos

24
Apesar deste tópico ser tradicionalmente abordado no primeiro ano, optou-se por trabalhá-lo igualmente nas duas séries,
visto que havia uma expectativa, mas não confirmação, de que seu conteúdo tivesse sido trabalhado anteriormente pela
terceira série e com aprendizagem significativa.

72
conteúdos apresentados. Pode-se perceber também que os índices de respostas em branco são
maiores nas turmas de primeira série do que na de terceira.
Tabela 3. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da primeira avaliação na
primeira etapa da pesquisa.
Em
Série Questão 0 1 2 3
branco
1 2 0 25 20 2
2 11 4 17 8 9
3 3 6 0 40 0

4 9 3 23 8 6
5 10 12 5 14 8
6 4 8 12 8 17
1 0 0 8 14 0
2 2 2 9 8 1
3 2 2 0 18 0

4 0 0 11 11 0
5 2 7 8 4 1
6 8 6 5 2 1
TOTAL 53 50 123 155 51

A análise destes dados permite chegar aos valores da tabela 4 para a média e o desvio
padrão de cada série.
Tabela 4. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a primeira avaliação.
1ª série 3ª série
Média 1,67 2,05
Desvio Padrão 0,64 0,54

Com estes valores de média e desvio padrão, chega-se aos valores 0,38 e 0,27 para o
coeficiente de variação (CV) da primeira e da terceira série, respectivamente. Estes valores para o
CV indicam que o valor da média pode refletir a realidade conceitual somente da terceira série,
sinalizando que há uma compreensão homogênea dos tópicos apresentados somente nesta série.
Em um nível de confiança a 95%, obtém-se t = 2,50 para o valor do teste t de Student na
comparação entre as séries nesta etapa. Este resultado indica que há diferença estatisticamente
significativa entre as respostas das duas séries na primeira avaliação da primeira escola da pesquisa.

2.2.1.2. Análise qualitativa

Em uma análise feita questão a questão, pode-se encontrar outros indícios de alguma
aprendizagem pelos alunos.
A figura 8 apresenta algumas das respostas dos alunos da primeira etapa à primeira questão
da primeira avaliação, que foi enunciada da seguinte forma:

Explique, com suas palavras, qual o resultado da soma de duas ondas e apresente um
exemplo.

As respostas incluídas nesta figura foram apresentadas também por outros alunos, sua
repetição sendo omitida para evitar redundância de informação. Como a avaliação foi realizada em
duplas nesta etapa, aparecem dois números de alunos. É interessante destacar que as situações-
problema adotadas no trato da superposição de ondas foram utilizadas por alguns alunos em seus

73
exemplos, como o da soma de ondas em água, provocadas por goteiras (alunos 10207-10233) e o da
soma de ondas sonoras (alunos 10316-10319). Isto pode ser considerado como uma apropriação do
campo de conhecimento apresentado e, neste ponto, deve ser tido como um conhecimento prévio
relevante para o aprendizado da superposição linear de estados estudada na sequência do conteúdo.

(a)

(b)

(c)

Figura 8. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10206-10232; (b) 10207-10233; (c) 10316-10319.

A segunda questão foi enunciada da seguinte forma:

Explique, com suas palavras, qual o resultado da multiplicação de um vetor do espaço


real por um número real e apresente um exemplo.

Algumas das respostas apresentadas pelos alunos a esta questão aparecem na figura 9. As
respostas levam a crer que a sistemática utilizada para criação de novos vetores a partir de outros foi
incorporada pelos alunos. Um destaque pode ser dado à resposta dos alunos 10305-10309 que
consideraram que a formação de um vetor do plano real pela multiplicação de um vetor do plano por
um número real é idêntica àquela utilizada no caso das ondas. Isto sugere que este conteúdo não é
considerado difícil pelos alunos e pode ser devidamente trabalhado no Ensino Médio (EM).

(a)

(b)

Figura 9. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10305-10309; (b) 10308-10324.

A terceira questão foi apresentada aos alunos com a seguinte redação:

74
Analise as ondas representadas na primeira coluna, efetue a superposição das
mesmas e relacione corretamente com as da segunda coluna.

(
( )
a)

(
( )
b)

(
( )
c)

Por ser uma questão em que os alunos deveriam relacionar duas colunas, analisa-se a
terceira questão da primeira avaliação quanto ao seu índice de acertos. Dos 71 alunos que realizaram
esta avaliação, nenhum deixou a resposta à questão em branco e 58 alunos (80,6%) relacionaram
corretamente as colunas, o que sugere que a forma procedimental de superposição de ondas foi bem
compreendida.
A quarta questão objetivava verificar a sistemática da construção e representação de vetores
no plano pelos alunos e é enunciada a seguir:

Efetue e represente, no plano cartesiano, as operações indicadas a seguir, para os


vetores do plano e .

a) b) c)

Como a maioria dos alunos havia mostrado conhecimento correto sobre o resultado do
produto de um vetor do plano real por um número real e da soma de duas ondas, esperava-se
um bom índice de respostas corretas. Efetivamente, 73,6% dos estudantes tiveram respostas
avaliadas como corretas ou parcialmente corretas, a maior parte (34), no entanto, avaliada
apenas como parcialmente correta, visto que ou um dos três itens propostos não foi respondido
corretamente ou alguns dos vetores foram representados incorretamente. Ainda assim, o erro
apresentado pode estar em parte associado a algum momento de falta de atenção na
resolução da questão (e não tanto a uma falta de aprendizado sobre a superposição de vetores
e sua representação). A figura 10 apresenta a resposta (considerada correta) dos alunos
10225-10229 a esta questão.

75
Figura 10. Respostas à quarta questão da primeira avaliação
pelos alunos da primeira etapa 10225-10229.

A quinta questão da primeira avaliação visava verificar se os alunos haviam


compreendido alguns dos motivos que levaram à criação da Mecânica Quântica e se
conseguiam perceber algumas diferenças entre ela e a Mecânica Clássica, sendo enunciada
da seguinte forma:

Que razões você citaria para justificar a introdução de uma teoria diferente da
Mecânica Clássica, como é a chamada Mecânica Quântica?

Cabe destacar que a postura de alguns dos alunos perante o conteúdo apresentado foi
negativa, o que se refletiu nas respostas apresentadas, conforme exposto na figura 11
(especialmente em 11b, 11c e 11e). Saliente-se que em momento algum se tentou passar uma
imagem depreciativa tanto da MC como da MQ aos alunos e estas manifestações foram
espontaneamente apresentadas pelos alunos. A postura relativa à MQ mencionada pode se
constituir em um fator impeditivo para a ocorrência da aprendizagem significativa nestes
alunos, visto que esta não é uma situação de pré-disposição para a aprendizagem. Ainda que
haja exemplos de postura inadequada acerca do conteúdo apresentado, estes alunos
representam apenas uma ínfima parte do público estudado; são casos particulares e seu
desempenho pode mostrar se esta atitude comprometerá o aprendizado dos tópicos
subsequentes. Dez alunos não responderam esta questão.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 11. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10104-10113; (b) 10214-10222; (c) 10216-10227; (d) 10305-10309; (e) 10314-10320.

76
A sexta questão tinha por objetivo verificar se os alunos percebiam algumas das
situações de aplicação de conceitos da MQ, seja em implicações tecnológicas, seja no campo
de pesquisa, tal como enunciado a seguir:

Cite duas ou mais aplicações da Mecânica Quântica, sobre as quais tenha


escutado falar ou lido algo.

Ao todo, 19 alunos deixaram esta questão em branco (ver tabela 4) e algumas das
respostas podem ser vistas na figura 12. A avaliação dos alunos 10216 e 10227 novamente
apresenta uma resposta que pode sugerir falta de comprometimento e postura negativa
perante o conteúdo ministrado.

(a)

(b)

(c)

Figura 12. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10216-10227; (b) 10230-10234; (c) 10303-10325.

2.2.1.3. Considerações sobre a primeira avaliação

Os resultados obtidos nesta primeira avaliação (tanto os da análise quantitativa como


os da análise qualitativa) levam a crer que houve compreensão por parte dos alunos acerca da
superposição linear de ondas e de vetores e mesmo, em parte, de algumas implicações da
MQ, apesar de certas respostas que sugerem falta de comprometimento de alguns alunos. Há,
pois, uma expectativa de se atingir uma boa compreensão dos conceitos de MQ a serem
apresentados, pois a superposição linear é considerada como um subsunçor importante para o
aprendizado de tais conceitos.

2.2.2. Segunda avaliação

A segunda avaliação contém sete questões e foi realizada após as aulas em que os
conceitos de estados de sistemas físicos, superposição linear de estados e incompatibilidade
de observáveis foram trabalhados, incorporando-se como situações-problema os experimentos
de dupla fenda, o experimento de Stern-Gerlach e características do átomo de hidrogênio.

77
Nesta etapa da pesquisa, 79 alunos, desta vez individualmente, realizaram a avaliação
(57 da primeira série e 22 da terceira).

2.2.2.1. Análise quantitativa

A tabela 5 apresenta a quantidade de valores atribuídos por série em cada questão da


segunda avaliação na primeira etapa da pesquisa, conforme a escala de valoração de
questões já apresentada.
Com base nesta tabela, pode-se também verificar que é relativamente grande o
número de alunos (52,4%) com alto número de acertos (valores 2 e 3 na escala), mesmo que
menor se comparado ao da primeira avaliação. Como na avaliação anterior, a maioria dos
alunos respondeu corretamente a maior parte das questões e isto dá indícios de alguma
aprendizagem dos conteúdos apresentados. Uma informação importante, contudo, diz respeito
à quantidade de alunos que deixaram de responder alguma questão desta avaliação na
primeira etapa da pesquisa. As questões dois, quatro (sobretudo) e seis, em especial, foram as
que os alunos mais deixaram de responder e isso fez com que se proporcionasse um enfoque
maior dos tópicos relacionados a elas na segunda etapa da pesquisa.
Tabela 5. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da segunda avaliação
na primeira etapa da pesquisa.
Em
Série Questão 0 1 2 3
branco
1 1 1 22 32 1
2 13 18 9 3 14
3 3 8 14 24 8
1ª 4 19 9 3 0 26
5 1 5 4 44 3
6 11 13 10 6 17
7 14 2 19 10 12
1 0 0 17 5 0
2 2 7 5 0 8
3 0 4 6 10 2
3ª 4 4 1 1 4 12
5 1 1 2 15 3
6 4 3 6 4 5
7 4 0 10 5 3
TOTAL 77 72 128 162 114

A análise destes dados permite chegar à tabela 6 para a média e o desvio padrão de
cada uma das séries.
Tabela 6. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a segunda
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 1,38 1,53
Desvio Padrão 0,53 0,61

Decorrem destes valores de média e desvio padrão, os valores 0,39 e 0,40 para o
coeficiente de variação (CV) da primeira e da terceira série, respectivamente. Tais números
indicam que o valor da média para as turmas de terceira série nesta etapa pode não refletir a

78
realidade conceitual das turmas na segunda avaliação. Há muita heterogeneidade na
compreensão e o conteúdo não foi bem compreendido por todos os alunos, tendo-se alguns
alunos com boa compreensão e outros com não bom entendimento sobre os tópicos
estudados.
Em um nível de confiança a 95%, o valor do t de Student resultou em 0,61 na
comparação entre as duas séries. Este valor indica que não há diferença estatisticamente
significativa entre as duas séries nesta etapa.

2.2.2.2. Análise qualitativa

Analisando as respostas dadas pelos alunos em cada questão, verifica-se existirem


indícios de aprendizagem e é possível avaliar a qualidade de algumas situações-problema
utilizadas.
A primeira questão da segunda avaliação visava verificar se os alunos entendiam o
papel do estado de um sistema físico na descrição das características deste sistema e se
sabiam utilizar a notação de Dirac para representar o estado, além de incluir informações sobre
uma possível evolução temporal do estado. A questão foi apresentada aos alunos da seguinte
forma:

Analise o objeto tradicionalmente descrito pela Física Clássica proposto


pelo professor e caracterize o mesmo. A seguir, descreva um estado
possível deste objeto.

Mesmo sendo uma questão de cunho clássico, é importante lembrar que o conceito de
estado nem sempre é salientado em MC e que é praticamente o mesmo para sistemas
clássicos e quânticos. A figura 13 apresenta o sistema físico investigado pelos estudantes na
segunda avaliação. Um fato interessante sobre esta questão é o de que muitos alunos se
aproximaram do objeto (exposto na mesa do professor) para coletar mais informações e assim
promover uma descrição mais completa de seu estado, conforme recomendado ao longo das
aulas.

Figura 13. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na
primeira etapa da pesquisa.

A figura 14 apresenta algumas das respostas fornecidas pelos alunos à primeira


questão da segunda avaliação. É possível verificar que o uso da representação pela notação
de Dirac foi adotada pelos alunos. Como a representação faz parte da compreensão do

79
conceito, acredita-se que, ao utilizá-la, os alunos estejam revelando alguma compreensão
sobre o conceito de estado de um sistema físico, sob a perspectiva da MQ. Verifica-se também
que a noção de alteração do estado no tempo (um passo para a evolução temporal) está
presente em algumas das descrições, como no caso das respostas dos alunos 10118, 10205, e
10212. O alto número de respostas consideradas corretas a esta questão leva a crer que
ocorreu aprendizado acerca do papel do conceito de estado de um sistema físico pelos alunos
e que a representação (via notação de Dirac) está sendo incorporada às suas estruturas
cognitivas.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 14. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10118; (b) 10124; (c) 10205; (d) 10212; (e) 10316.

A segunda questão da segunda avaliação foi enunciada da seguinte forma:

Considere um átomo de hidrogênio (objeto tipicamente descrito pela


Física Quântica). Descreva o átomo, ou seja, o nome e número de seus
elementos (elétrons, prótons, nêutrons...) e, a seguir, caracterize dois
estados possíveis do mesmo.

Algumas respostas dos alunos a esta questão constam da figura 15. As respostas
apresentadas sugerem que é possível haver compreensão da superposição linear de estados
pelos alunos com o recurso desta situação-problema, mas a elevada proporção de alunos

80
(27,8%) que deixaram de responder a questão também permite considerar que se trata de um
conhecimento um tanto abstrato para os alunos e que sua abordagem no EM deva ser feita
com mais tempo para discussão. Conceitos (relativos ao átomo de hidrogênio) trabalhados
nesta questão são usualmente abordados na disciplina de Química durante a primeira série do
EM (Atomística). É possível que os alunos estejam tendo uma aprendizagem mecânica dos
conceitos em Química e que não ocorra uma recuperação quando da abordagem dos mesmos
em Física, tanto na primeira como na terceira série. Faz-se, assim, necessário que a forma com
que este conteúdo é trabalhado seja discutida para realmente promover uma aprendizagem
significativa ou, até mesmo, verificar se esta situação-problema é adequada para a
compreensão dos conceitos envolvidos nesta análise.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 15. Respostas à segunda questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10106; (b) 10118; (c) 10129; (d) 10210.

O experimento de dupla fenda foi a situação-problema utilizada na terceira questão


desta avaliação, para verificar a aprendizagem acerca dos conceitos de estado de um sistema
físico e de superposição linear de estados, conforme apresentado aos alunos no enunciado a
seguir:

81
Considere o experimento de dupla fenda com elétrons.
a. Estando fechada uma das fendas, o que você espera encontrar
registrado no segundo anteparo, quando realizar a experiência com
muitos elétrons? O que você pode dizer sobre o estado do elétron
submetido a este experimento?
b. Estando abertas as duas fendas, o que você espera encontrar
registrado no segundo anteparo, quando realizar a experiência com
muitos elétrons? O que você pode dizer sobre o estado do elétron
submetido a este experimento?

Algumas das respostas encontradas a esta questão são apresentadas na figura 16.
Foram identificadas várias respostas que podem ser consideradas adequadas ao propósito da
questão. Alguns alunos expressaram o estado associado a cada um dos dois itens utilizando a
notação de Dirac (por exemplo, alunos 10101,10133, 10218, e 10320) e outros descreveram o
estado sem a utilização da notação (por exemplo, aluno 10202), mas aparentando uma
compreensão sobre o papel da superposição linear no experimento. Face às respostas
encontradas, pode-se considerar que o experimento de dupla fenda é uma situação-problema
adequada para o aprendizado de conceitos de MQ e de fácil compreensão por parte dos
estudantes, visto que os estados foram bem elaborados pelos alunos e a superposição linear
estava presente. Pelas respostas a esta questão, é possível inferir que há um bom aprendizado
dos dois conceitos-chave da MQ mais abordados nesta tese, principalmente nesta específica
situação-problema.
A quarta questão foi proposta aos alunos com a seguinte redação:

Considere um par de átomos de hidrogênio. Caracterize dois estados


possíveis do conjunto destes dois átomos.

Poucos alunos forneceram uma resposta satisfatória a esta questão; 48,1% deles
deixaram de responder. Acredita-se que isto possa ter ocorrido pelos mesmos motivos
enfrentados na segunda questão. Algumas das poucas respostas aceitas como satisfatórias
são apresentadas na figura 17. Todas elas são de alunos que propuseram estados de ligação
para o par de átomos de hidrogênio. Contudo, em nenhuma destas respostas é possível
verificar a aplicação do conceito de superposição linear. Isto pode decorrer de dificuldades
relacionadas ao manejo de situações envolvendo o átomo de hidrogênio e indica que o
conceito de superposição linear (como outros) é mais claramente percebido em algumas
situações-problema do que em outras.

82
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 16. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10101; (b) 10133; (c) 10202; (d) 10218; (e) 10320.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 17. Respostas à quarta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10207; (b) 10305; (c) 10316; (d) 10319.

O foco da quinta questão era verificar se alguma noção acerca da incompatibilidade de


observáveis na descrição de estados físicos em MQ fora incorporada à estrutura cognitiva dos
estudantes e teve o seguinte enunciado:

83
Em Mecânica Quântica existem algumas grandezas físicas (observáveis) que
são ditas incompatíveis, ou seja, não podem caracterizar o mesmo estado do
objeto. Assim, responda os itens a seguir.
a. É possível caracterizar o estado de um elétron pela posição no espaço
(coordenadas x, y e z, por exemplo)?
b. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua posição e sua
energia?
c. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua projeção de spin
em uma direção e sua posição?

Como são convenientes conhecimentos mais avançados em matemática para se tenha


uma devida compreensão deste tópico, a ideia aqui era introduzir inicialmente este conceito
para mostrar uma diferença crucial na descrição de estados de sistemas clássicos e de
sistemas quânticos. Buscou-se nesta questão, então, verificar se os alunos utilizam o
argumento da incompatibilidade para justificar uma falta de possibilidade de descrever um
estado por duas grandezas físicas dadas. A maior parte dos alunos simplesmente respondeu
“sim” ou “não” nesta questão sem apresentar justificativa (intencionalmente não solicitada na
questão). Duas das respostas apresentadas constam da figura 18 e indicam que alguma noção
de incompatibilidade de observáveis foi adquirida pelos alunos, observada principalmente em
respostas como a do aluno 10225. Outras respostas mostram alguma compreensão sobre a
perda de informação ocasionada por consecutivas medidas de diferentes grandezas (aluno
10316), intimamente relacionada com o Princípio de Incerteza de Heisenberg e que decorre da
incompatibilidade de observáveis.

(a)

(b)

Figura 18. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10225; (b) 10316.

A compreensão da superposição linear na descrição de estados em MQ era o objeto de


análise da sexta questão, conforme proposto no seguinte enunciado:

Em que a superposição linear diferencia sistemas quânticos dos sistemas


clássicos? Dê exemplos.

Assim como nas questões 2 e 4, muitos alunos deixaram a sexta questão sem resposta
(27,8%). A figura 19 apresenta algumas respostas dos alunos a esta questão.
É possível notar que, mesmo com muitas respostas em branco (27,8% dos alunos),
ainda assim tanto alunos de primeira quanto de terceira série forneceram respostas aceitas
como satisfatórias (apesar da imprecisão da linguagem) para esta questão (32,9% dos alunos),

84
indicando alguma compreensão da presença da superposição linear na descrição de estados
em MQ. Assim, por mais que os alunos tenham tido dificuldades em expor seus conhecimentos
nesta questão, pode-se ainda inferir que há alguma internalização do conceito de superposição
linear até aquele momento do curso. Com essa internalização, o campo de conhecimentos
apresentado aos alunos está conduzindo à produção de um esquema para interpretação
destes fenômenos novos e, dadas as respostas fornecidas, parece que se começa a atingir
uma equilibração majorante, visto que os novos esquemas estão dando conta das situações-
problema.

(a)

(b)

(c)

Figura 19. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10105; (b) 10119; (c) 10310.

A última questão da segunda avaliação visava avaliar a compreensão de vários


conceitos de MQ pelos alunos, usando o experimento de Stern-Gerlach como situação-
problema. Seu enunciado foi o seguinte:

Qual dos estados a seguir pode ser atribuído a elétrons que, submetidos ao
experimento de Stern-Gerlach, apresentam resultados como os indicados na
figura abaixo? Justifique sua escolha.

a) c)
b) d)

Nas respostas apresentadas na figura 20, é possível identificar a presença de


elementos que denotam a compreensão da superposição linear.

(a)

(b)

(c)

Figura 20. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10119; (b) 10303; (c) 10312.

Nesta questão, 15 alunos (19,0%) apresentaram respostas consideradas totalmente


corretas e 29 (36,7%), respostas consideradas parcialmente corretas. Este número elevado de

85
respostas corretas (mais da metade dos estudantes) parece indicar o experimento de Stern-
Gerlach como uma situação-problema favorável a fácil assimilação de conceitos de MQ e que
pode ser utilizada com relativo êxito na abordagem de tópicos de MQ no EM.

2.2.2.3. Considerações sobre a segunda avaliação

Antes do início do curso, os alunos, em sua ampla maioria, não tinham conhecimento
sobre o Princípio de Superposição Linear de Estados em MQ e também sobre as diferenças
estruturais existentes entre a MQ e a MC, conforme revelado na análise das respostas ao
questionário proposto.
Com os resultados da segunda avaliação, é possível perceber que já existe um
razoável domínio pelos alunos, sobre o campo conceitual da MQ. Isso sugere que este primeiro
contato com a teoria vem cumprindo seu papel para uma adequada alfabetização científica
acerca de parte dos conceitos de MQ, frequentemente divulgados em diversos canais de
informação acessíveis ao público em geral (muitas vezes sem qualquer endosso científico) e
que podem conduzir a interpretações errôneas, das quais dificilmente se liberam os alunos.
Em um aspecto mais geral, as situações-problema utilizadas foram importantes para a
compreensão do que é o estado de um sistema quântico e da superposição linear de tais
estados. Os experimentos de dupla fenda e de Stern-Gerlach, em especial, foram os de mais
fácil assimilação pelos alunos e podem ser considerados conceitualmente simples, para a
aplicação dos primeiros princípios da MQ. As questões que utilizaram o átomo de hidrogênio
como situação-problema tiveram pouco êxito na avaliação da aprendizagem dos alunos, o
número de alunos que responderam tais questões tendo sido muito menor que o daqueles que
o fizeram em questões relacionadas com as outras situações-problema. Deste modo, uma
abordagem para o ensino de MQ que utilize situação envolvendo o átomo de hidrogênio
deveria dar um enfoque muito mais aprofundado ao assunto, pois foi considerada de difícil
compreensão pelos alunos.

2.2.3. Terceira avaliação

A terceira avaliação continha seis questões e foi realizada após as aulas em que o
emaranhamento quântico e a criptografia quântica foram apresentados, com o decorrente
reforço dos postulados da MQ.
Nesta fase da pesquisa, 69 alunos realizaram a avaliação (48 da primeira série e 21 da
terceira série).

86
2.2.3.1. Análise quantitativa

A tabela 7 apresenta a quantidade de valores atribuídos por série em cada questão da


terceira avaliação na primeira etapa da pesquisa, conforme a escala de valoração já
apresentada.
Tabela 7. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da terceira avaliação na
primeira etapa da pesquisa.
Em
Série Questão 0 1 2 3
branco
1 7 13 15 5 8
2 2 23 14 8 1
3 5 12 12 17 2

4 11 18 7 3 9
5 11 10 7 15 5
6 3 2 0 40 3
1 0 5 9 3 4
2 0 8 8 5 0
3 6 6 4 4 1

4 3 3 6 2 7
5 0 10 3 1 7
6 1 1 0 14 5
TOTAL 49 111 85 117 52

A partir dos dados da terceira avaliação é possível chegar à tabela 8 para a média e
desvio padrão de cada uma das séries.
Tabela 8. Média e desvio padrão das séries na primeira etapa da pesquisa para a terceira
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 1,57 1,43
Desvio Padrão 0,69 0,68
Com tais valores de média e desvio padrão, resultam os valores 0,44 e 0,48 para o
coeficiente de variação (CV) da primeira e da terceira série, respectivamente, que refletem falta
de homogeneidade na compreensão pelas séries. Os valores de CV apresentados indicam a
ocorrência de algumas dificuldades conceituais que devem ser analisadas e sanadas com uma
abordagem diferenciada na segunda etapa da pesquisa. A próxima etapa deverá estar mais
voltada às questões em que os alunos tiveram um problema maior na resolução.
Em um nível de confiança a 95%, foi obtido o valor 0,79 para o teste t de Student na
comparação entre as duas séries. Isto indica que não há diferença estatisticamente significativa
para os resultados da terceira avaliação entre as séries nesta etapa da pesquisa, mesmo que a
compreensão não tenha sido homogênea em cada série, conforme apontado pelo coeficiente
de variação.

87
2.2.3.2. Análise qualitativa

Apresenta-se agora uma análise de algumas das respostas fornecidas pelos alunos da
primeira etapa às questões da terceira avaliação.
Com a apresentação de um estado de determinado sistema físico, a primeira questão
tinha por objetivo verificar se os alunos conseguiam identificar as informações (ou a maior parte
delas) contidas neste estado, conforme o seguinte enunciado:

Que informações podemos obter de um par de elétrons que estejam no estado


, sendo “A e B” valores de posição dos
elétrons e “+ e –” projeções de spin dos elétrons, denominadas “spin para
cima” e “spin para baixo”, em uma mesma direção?

A figura 21 apresenta algumas das respostas a esta questão, de alunos que


conseguiram identificar informações sobre emaranhamento e estados de projeção de spins
presentes no estado fornecido. Isto parece sugerir certo domínio dos alunos sobre alguns dos
conceitos e princípios abordados no curso como os de superposição linear de estados, spin,
emaranhamento e probabilidades.
A segunda questão da terceira avaliação visava verificar se os alunos sabiam identificar
um estado emaranhado e as grandezas físicas envolvidas, segundo o seguinte enunciado:

Quais dos estados a seguir são exemplos de estados emaranhados de


sistemas quânticos? Justifique. As letras H e V lembram observáveis de algum
objeto quântico a você?
a) c) e)
b) d) f)

(a)

(b)

(c)

Figura 21. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10122; (b) 10124; (c) 10320.

A figura 22 mostra algumas das respostas fornecidas pelos alunos à segunda questão.
Como na sétima questão da segunda avaliação, muitos alunos simplesmente assinalaram as
alternativas que julgaram adequadas sem apresentar justificativa, algo que prejudica a análise
sobre a aprendizagem destes alunos acerca dos conceitos abordados nesta questão.
Apesar da dificuldade que muitos alunos apresentam na redação de suas respostas, é
possível perceber alguns indícios de que sabem identificar a “separabilidade” dos estados
(alunos 10230 e 10324) e a imediata informação do estado da segunda partícula obtido com a
medida do estado da primeira partícula (aluno 10223). Deste modo, apesar de não ser uma
questão trivial para a maior parte dos alunos, acredita-se que proporcionou uma situação-

88
problema adequada para verificação de aprendizagem de conceitos extremamente novos (e
motivadores) para os alunos e que sinaliza ser de algum razoável domínio neste primeiro
contato.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 22. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10202; (b) 10223; (c) 10230; (d) 10324.

A terceira questão solicitava que os alunos construíssem estados emaranhados de


autoestados de projeção de spin para duas partículas, segundo o enunciado a seguir:

Escreva dois estados distintos de um par de elétrons emaranhados com


projeções de spin e .

Algumas das respostas, conforme apresentado na figura 23, mostram domínio da


notação de Dirac pelos alunos e, parcialmente, também no processo de construção de alguns
estados emaranhados. Considerando que o domínio da representação reflete a compreensão
do conceito de estado de um sistema quântico, as respostas fornecidas pelos alunos sugerem
que o aprendizado deste conceito está adequado até o momento.

(a)

(b)

(c)

Figura 23. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10111; (b) 10113; (c) 10215.

89
A quarta questão, enunciada a seguir, abordava a configuração de um estado e o
processo de medida da polarização de um fóton, relacionado aos processos de criptografia
quântica.

Em um processo de transmissão de chave criptográfica, suponhamos que Alice


envie um fóton polarizado na vertical para Bob e este utilize uma base inclinada
a 45° em relação à horizontal para medir a polarização deste fóton. Você pode
dizer qual será a medida realizada por Bob? Pode dizer qual o estado do fóton
enviado por Alice?

Apesar de parecer simples em um primeiro momento, esta questão possuía grau de


dificuldade relativamente alto, pois permitia diferentes respostas às suas duas perguntas. Os
alunos poderiam responder, na primeira pergunta, que o fóton poderia passar ou não pelo
polarizador ou que não havia como saber o resultado da medida e, na segunda pergunta, que o
fóton enviado por Alice estaria em um autoestado de polarização na vertical ou, também, para
Bob, que seria um estado de superposição dos autoestados “passar” e “não-passar”. Caso o
aluno tenha fornecido qualquer destas respostas, ela foi considerada adequada.
É possível perceber novamente, nesta quarta questão, conforme ilustrado na figura 24,
a utilização da notação de Dirac por alguns estudantes (10105 e 10112), indicando que esta
representação está sendo incorporada à sua estrutura cognitiva e, consequentemente, que há
aprendizagem acerca da representação do conceito de estado.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 24. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10105; (b) 10112; (c) 10119; (d) 10316.

A quinta questão visava verificar de modo mais direto a compreensão do papel da


superposição linear no emaranhamento quântico pelos alunos, conforme o enunciado a seguir:

Por que o emaranhamento quântico pode ser considerado como uma aplicação
simples da superposição linear?

A figura 25 apresenta algumas das respostas dos alunos a esta questão. Pode-se notar
que muitos alunos percebem que o emaranhamento quântico é uma simples decorrência (do
ponto de vista conceitual) do princípio de superposição linear. Pelo número de acertos e erros
nesta questão, vê-se que um número razoável de alunos (37,7%) teve respostas consideradas
corretas ou parcialmente corretas. Mesmo com a grande dificuldade dos estudantes em
expressar-se e com o fato de o emaranhamento quântico ser algo novo e contraintuitivo, ainda
assim se pode considerar que as respostas obtidas foram satisfatórias e que estão dentro do
esperado em um primeiro contato com a MQ.
90
(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 25. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da primeira etapa
(a) 10113; (b) 10119; (c) 10210; (d) 10320.

A sexta questão da terceira avaliação buscava verificar se os alunos compreendiam o


processo de criação de uma chave criptográfica, conforme o seguinte enunciado:

Codifique a mensagem “superposição linear” e explique que chave criptográfica


você utilizou em tal processo.

A criatividade dos alunos na construção das chaves foi interessante, conforme se


observa na figura 26 e este tema parece realmente estimulá-los para o aprendizado.

Figura 26. Resposta à sexta questão da terceira avaliação pelo aluno da primeira etapa 10133.

Esta questão não tem o intuito de avaliar conhecimento sobre tópicos de MQ ou


mesmo sobre criptografia (embora introduza o conceito), mas sim de verificar se tal tema é de
interesse dos alunos. Como somente oito alunos (3,8%) deixaram a questão em branco e
78,2% dos alunos que responderam esta questão foram avaliados com conceito 2 ou 3, é difícil
não acreditar que este tema levante o interesse do aluno pelo aprendizado, servindo assim
como uma espécie de catalisador para a promoção da condição de pré-disposição para a
aprendizagem, necessária para a ocorrência da aprendizagem significativa.

2.2.3.3. Considerações sobre a terceira avaliação

Foi possível verificar que as situações-problema utilizadas na terceira avaliação foram


bastante úteis para promoção da condição de pré-disposição de aprendizagem e de uma
consequente aprendizagem pelos alunos. A CQ, especificamente, pareceu muito estimulá-los
para o aprendizado e o EQ, considerado contraintuitivo por muitos autores que abordam a MQ
(por exemplo, Plenio e Vedral (1998) e Zeilinger (1998)), mostrou ser bem compreendido pelos
alunos. Em especial, infere-se que os alunos conseguiram compreender o papel do estado de
um sistema quântico, bem como o da superposição linear de estados de um sistema quântico,
relacionando-os principalmente com o conceito de EQ. A ausência de intuição para
91
interpretação de fenômenos quânticos foi praticamente menosprezada, pois desde o princípio
se buscou que os alunos construíssem os novos conceitos sem a utilização de conceitos
próximos da MC. Assim, a construção dos novos conceitos deve fazer parte de uma
aprendizagem significativa ou, pelo menos, estar muito próxima disto. Naturalmente, é preciso
ter em conta que a aprendizagem significativa é progressiva e que os alunos estão dando os
primeiros passos no campo conceitual da MQ cujo domínio é lento, progressivo, com rupturas e
continuidades (Vergnaud, 1983).

2.3. Questionário de opiniões

O questionário de opiniões foi aplicado ao final do curso, sendo especificamente


respondido pelos alunos no último encontro, na aula seguinte à da aplicação da terceira
avaliação. Ao todo, 59 alunos estiveram presentes e participaram da atividade (46 alunos da
primeira série e 13 alunos da terceira série). O questionário de opiniões, constante do Apêndice
IV, indaga os alunos a respeito dos tópicos apresentados, bem como solicita sugestões e
comentários sobre o curso. Um aluno deixou todas as questões em branco e seu questionário
não foi computado nas respostas analisadas a seguir.
A tabela 9 apresenta o número de vezes em que cada palavra foi assinalada na
primeira questão do questionário, por série, na primeira etapa da pesquisa. As palavras
computação, criptografia, emaranhamento, física, mecânica e partícula foram consideradas
adequadas para relacionar com a palavra quântica. A palavra medicina, no entanto, foi
considerada adequada quando devidamente justificada pelos alunos, pois pode se referir a
25
aplicações da MQ, como no caso de radiografias, radioterapia, tomografia, etc. Cinco alunos
marcaram todas as opções e optou-se por desconsiderar as respostas destes alunos nesta
questão. Assim sendo, foram computadas ao todo as respostas de 53 alunos nesta questão.
Tabela 9. Número de vezes em que cada palavra foi assinalada na primeira questão do
questionário de opiniões por série na primeira etapa da pesquisa.
Palavra 1ª série 3ª série
Computação 33 6
Consciência 6 0
Criptografia 33 11
Cura 3 0
Emaranhamento 39 12
Física 37 10
Ginástica 0 1
Mecânica 40 9
Medicina 6 1
Música 5 2
Partícula 35 10
Terapia 2 1

Trinta e nove alunos (73,6%) assinalaram somente palavras consideradas adequadas,


na ótica do que foi apresentado ao longo do curso. As justificativas mais comuns, apresentadas

25
A palavra medicina foi considerada inadequada, quando não justificada, porque pode estar vinculada a terapias
alternativas, em desacordo com a abordagem utilizada ao longo do curso.

92
por 26 alunos (49,1%) para as alternativas assinaladas, indicavam que os tópicos haviam sido
trabalhados, mencionados ou comentados em sala de aula ao longo do curso. Isto mostra a
importância que a atualização do currículo do EM tem sobre o cotidiano dos alunos. É
reprovável que a formação básica dos alunos do EM ocorra sem que tenham qualquer contato
com a FMC ou talvez com uma abordagem excessivamente matemática da Física. Dezesseis
alunos (30,2%) afirmaram acreditar que as palavras assinaladas tinham relação com a palavra
quântica. Algumas das outras justificativas apresentadas foram: “foi o que me veio em mente”,
“não existe cura, ginástica, medicina, música ou terapia quântica”, “MQ não se aplica a
questões corporais ou mentais”. Nove alunos não justificaram as alternativas assinaladas e
dois alunos justificaram as suas opções com “tudo é estranho e anormal” e “MQ não existe e é
coisa louca”.
Os alunos que marcaram alguma alternativa considerada inadequada, afirmaram ter
ouvido falar nestas opções durante o curso ou, ainda, que acreditam que estas palavras devem
ter alguma relação com quântica. É importante destacar que, mesmo que não seja uma
aprendizagem significativa neste momento, este primeiro contato dos alunos com a MQ cria
uma postura pertinente acerca dos conteúdos abordados. Além disto, as respostas da maioria
dos alunos mostram que eles parecem estar mais predispostos ao aprendizado do que com um
conteúdo tradicionalmente abordado nos currículos de física do EM. Assim, vale a pena que
tais conteúdos sejam trabalhados em sala de aula no EM para, adicionalmente, favorecer a
condição de pré-disposição para a aprendizagem, visando a aprendizagem significativa.
Os tópicos mais citados pelos alunos como os mais importantes foram criptografia
quântica (25,4%), emaranhamento quântico (20,3%) e superposição linear (20,3%). O
experimento de dupla fenda (6,8%), a superposição de ondas (5,1%) e de vetores (3,4%), a
computação quântica (3,4%) e o estado de um sistema físico (1,7%) também foram lembrados
por alguns alunos, enquanto outros (13,6%) afirmaram que todos os tópicos são importantes e
três alunos consideraram que nenhum tópico tem importância.
Dentre os conteúdos que os alunos consideraram mais fáceis, os mais citados foram a
criptografia quântica (37,3%), o emaranhamento quântico (16,9%) e a soma de vetores
(15,6%). A soma de ondas (13,6%), superposição linear (13,6%) e estado (10,2%) também
foram apontados. Dois alunos citaram o experimento de dupla fenda e outros dois apontaram a
computação quântica como sendo de fácil compreensão. Sete alunos (da primeira série)
afirmaram que todos os assuntos são difíceis. É interessante notar que tópicos mais atuais e
que não costumam fazer parte do currículo do EM como a criptografia quântica e o
emaranhamento quântico são apontados como sendo de fácil compreensão pelos estudantes e
isto mostra que aspectos básicos referentes a tais tópicos podem realmente ser aprendidos de
forma significativa, visto ser algo que aparentemente interessa aos alunos. Estes tópicos ainda
são colocados pelos alunos ao lado de outros mais tradicionais do ensino de Física, como a
superposição de ondas e a de vetores.

93
Uma questão que pode ser levantada é: por que não abordar o conteúdo de Física do
EM mesclando tópicos atuais com os mais tradicionais e tentar, desta forma, cativar o aluno
para o aprendizado?
Ao mesmo tempo em que foram apontados como tópicos mais fáceis por vários alunos,
o emaranhamento quântico (42,4%) e a criptografia quântica (10,2%), o experimento de dupla
fenda (5,1%) e a superposição linear (8,5%) também foram citados por outros como tópicos
mais difíceis. Sete alunos responderam que não consideraram difícil tópico algum e, em
contraponto, outros sete consideraram que todos eram difíceis, embora alguns tenham
afirmado que, ainda assim, gostaram de estudá-los. O experimento de Stern-Gerlach, a soma
de ondas e a de vetores e o conceito de spin também foram citados como tópicos difíceis por
alguns poucos alunos (duas menções, no máximo).
A maior proporção de alunos (47,4%) considerou que não é difícil compreender o
conceito de estado de um sistema físico, enquanto outra expressiva parte (35,6%) considerou
difícil. Outros estudantes (11,9%) consideraram que o conceito é um pouco difícil de
compreender.
Quanto ao conceito de superposição linear, os alunos estiveram divididos entre os que
consideraram o conceito de fácil compreensão e de acreditar (35,6%) e outros (32,2%) que
consideravam somente ser de difícil compreensão ou somente de se acreditar. Houve ainda
outros alunos (11,9%) que afirmaram acreditar no conceito e alguns (6,8%) que o consideraram
de difícil compreensão.
Boa parte dos alunos (45,8%) considerou que a MQ consegue descrever “elementos de
realidade”, enquanto outros (28,3%) afirmaram que a MQ é pura ficção científica, com as
respostas igualmente divididas entre os alunos da primeira e da terceira série.
A visão que os alunos possuem acerca da MQ ficou dividida entre opiniões negativas
(30,5%) e positivas (20,3%). Quatro alunos veem a MQ como uma teoria ainda inacabada,
como uma ciência do futuro ou com implicações futuras. Os posicionamentos positivos
envolveram afirmações do tipo “parece difícil, mas tem seus encantos”, “poderia ter este
assunto com mais frequência, pois nos deixa curiosos”, “assunto interessante de se aprender”,
“superior à Mecânica Clássica”, “agora consigo entender um pouco mais sobre o assunto” e
“um alerta para as pessoas devido à utilização enganosa de empresas”. As opiniões negativas
trouxeram respostas como “algo difícil de se aprender”, “estranho e muito chato”, “algo que
nunca vou usar em minha vida”, “algo que não gostei e não consegui entender”, “pouco usada
em nosso dia-a-dia”, “uma coisa irreal, ficção científica” e “teoria no papel”.
As opiniões finais trouxeram afirmações que sugerem que a proposta de ensino é
válida e atinge certos objetivos. Um bom número de alunos (37,3%) afirmou que a proposta foi
boa/interessante/legal e que gostaram de como o curso foi ministrado. Alguns alunos (8,5%)
acharam o curso difícil e que poderia ter sido abordado de alguma forma mais fácil. Outras
opiniões emitidas por um ou dois alunos sobre o curso foram: “assunto chato”, “deveria haver
mais interação com os alunos” e “deveria haver mais exercícios”.

94
2.4. Entrevistas com as turmas

As entrevistas com as turmas nesta etapa da pesquisa foram realizadas após a


aplicação do questionário de opiniões e visaram colher dados que os alunos não tivessem
devidamente expressado em seus questionários e que pudessem contribuir para uma melhor
compreensão acerca de seu aprendizado.
Ao serem indagados sobre a dificuldade do curso, os alunos das duas turmas de
primeira série se apresentaram divididos entre os que gostaram da proposta e os que acharam
a proposta difícil de compreender. Mesmo os alunos que consideraram difícil o curso afirmaram
que o assunto abordado era “legal” e interessante. Quanto aos alunos da terceira série, a
maioria afirmou ter gostado de trabalhar com a MQ e não a achou difícil, mas sim complexa,
exigindo mais atenção do que a usualmente dispensada a outros conteúdos e outras
disciplinas.
Quando perguntados se perceberam a importância de se estudar a MQ, os alunos de
uma das primeiras séries afirmaram não perceber a necessidade de conhecer esta teoria,
enquanto os alunos das outras turmas consideraram importante compreender como funcionam
os dispositivos que utilizam em seu cotidiano e que têm a MQ como base para sua concepção.
A alfabetização científica de forma correta também fez com que alguns alunos afirmassem que
agora sabem como é a MQ e que, por isso "não comprariam produtos como colchões
quânticos".
Na turma cujos alunos disseram não compreender o papel da MQ no cotidiano, ainda
assim houve um comentário que mostrou boa receptividade do aluno ao curso apresentado.
Este aluno comentou que estudar a MQ “é legal e que o professor pode voltar com mais
conteúdos como este”. Isto mostra que, mesmo com as dificuldades que alguns alunos
afirmaram ter, ainda assim o conteúdo pareceu ter estimulado os estudantes a se interessarem
pela disciplina de Física e, em especial, pela MQ.

2.5. Síntese da aplicação na primeira etapa

A análise dos instrumentos utilizados na primeira etapa da pesquisa sugere que houve
boa compreensão dos conteúdos trabalhados por razoável parcela dos alunos, mesmo que
com alguma resistência de alguns deles. As dificuldades enfrentadas fazem com que se
recorra a uma abordagem diferenciada e com mais ênfase em alguns tópicos na segunda
etapa, como no caso da situação-problema do átomo de hidrogênio.
Saliente-se que, ainda assim, a receptividade dos alunos aos conteúdos apresentados
foi relativamente positiva e que poucos alunos tiveram uma postura negativa em relação à MQ,
conforme resultados das avaliações e dos questionários de opiniões.
A experiência da primeira etapa recomenda a inserção de novos instrumentos de coleta
de dados na segunda etapa para averiguar melhor o aprendizado dos alunos ao longo do

95
processo de apropriação do campo conceitual da MQ. Acredita-se que mapas mentais e testes
rápidos possam ser utilizados para este intuito.

3. Segunda etapa da pesquisa

A segunda etapa da pesquisa enfocou o desenrolar da segunda fase de ensino,


realizada em 2012 e envolveu a análise de respostas dos alunos a mapas mentais iniciais,
questionário de conhecimentos prévios, testes rápidos e a análise de resultados de três
avaliações escritas, além da análise de mapas mentais reaplicados, questionário de opiniões,
entrevistas com os alunos e registros de diário de bordo.
Os novos instrumentos de avaliação introduzidos decorreram de considerações sobre
os resultados obtidos na primeira etapa da pesquisa e se ajustam a algumas alterações
efetuadas na segunda fase de ensino. Cinco turmas de alunos, das quais três de primeira série
e duas de terceira série estiveram envolvidas nesta etapa.

3.1. Mapas mentais iniciais

Os mapas mentais, não utilizados na primeira etapa da pesquisa, foram


confeccionados pelos alunos das cinco turmas da segunda fase no primeiro encontro do curso
“Fundamentos da Mecânica Quântica”. A atividade não foi apresentada aos alunos como
“mapa mental” para evitar a introdução de denominações novas, visto que isto não era um
ponto central da avaliação. Instruiu-se apenas os alunos para que escrevessem todas as
palavras, expressões e ideias que lhes viessem à mente ao ler a expressão “Mecânica
Quântica” destacada no centro da folha entregue. Não houve pressão sobre os alunos durante
a realização da atividade, dando-lhes liberdade de tempo para preencherem seus mapas.
Solicitou-se, também, aos alunos que não se comunicassem a respeito do conteúdo a ser
registrado no mapa.
Os alunos apresentaram inúmeros questionamentos e fizeram afirmações durante a
realização da atividade, sobre o próprio mapa e até sobre assuntos mais específicos do curso,
tais como: “não sei o que responder”, “não me vem nada na cabeça”, “esta atividade vale
nota?”, “tem tempo para responder?”, “acelerador de partículas é o LHC?”, “LHC pode criar
antimatéria?”, “como é feito o enriquecimento do combustível da bomba atômica?”, “o que é o
gato de Schrödinger?”, “o que é o bóson de Higgs?”. Procurou-se deixá-los livres para
efetuarem estes questionamentos, porém os mesmos só foram discutidos após a conclusão
das atividades do mapa mental e do questionário de conhecimentos prévios.
Ao todo, 138 mapas foram elaborados pelos alunos, sendo 68 nas turmas de primeira
série e 70 nas turmas de terceira série. A palavra que mais constou dos mapas foi “física” (59
vezes), provavelmente devido à denominação “física quântica” já fazer parte do vocabulário de
alguns alunos e por ser Física a disciplina em estudo no momento de confecção do mapa.

96
Outros termos bastante registrados nos mapas das cinco turmas foram: difícil, cálculos,
números, matemática, equações, tecnologia, força, movimento e energia.
A palavra “Mecânica” fez com que muitos alunos associassem termos relacionados à
mecânica automotiva, tais como: carro, motor, oficina, conserto e peças. Visto que a mecânica
automotiva é algo próximo ao cotidiano dos alunos, pode-se considerar que tais respostas
poderiam ser esperadas nos mapas mentais, mesmo que não tenham relação com a MQ.
A proximidade fonética fez com que palavras como quantidade, mecanismos e aquática
também estivessem presentes em alguns mapas mentais, tanto por alunos de primeira como
de terceira série. Para cada uma dessas palavras, foram respectivamente 41, 14 e 2 menções.
Alguns dos mapas construídos pelos alunos, com grifos destacando as palavras que
estão mais relacionadas com a MQ, podem ser encontrados no Apêndice VI. Tais mapas
apresentam termos com algum grau de proximidade com a MQ e com um conteúdo
relativamente diferente dos citados anteriormente. Em especial, os mapas dos alunos 20316 e
20417, apresentados na figura 27, são dignos de nota, pois indicam que estes alunos já
tiveram um contato maior com a MQ e incorporaram alguns conceitos em seu vocabulário e,
possivelmente, em sua estrutura cognitiva. O conhecimento prévio de alguns conceitos de MQ
por estes dois alunos pode ser considerado como um fator auxiliar na ocorrência de
aprendizagem significativa, acreditando-se também que não deva provocar prejuízo no
processo de ensino e aprendizagem.

(a)

(b)

Figura 27. Mapas mentais iniciais dos alunos (a) 20316 e (b) 20417.

97
É necessário destacar que alguns alunos utilizaram palavras de desânimo e, até
mesmo, de desgosto no mapa. Expressões como “assunto chato e difícil”, “coisa chata”,
“alguém gosta disso?”, “dor de cabeça”, “não é assunto de ensino médio”, “nota baixa”,
palavras como loucura, preguiça e até palavras de baixo calão foram registradas nos mapas de
três alunos da primeira série. Foram, ao todo, 32 menções de palavras ou expressões deste
tipo, sendo que 23 foram registradas na primeira série. Saliente-se que, por vezes, mesmo
utilizando tais palavras, ainda assim os alunos mencionavam outras expressões semelhantes
às apresentadas anteriormente.
Acredita-se que os alunos que utilizaram estas expressões não dispõem, neste
momento, da condição de pré-disposição para a aprendizagem, necessária para a ocorrência
da aprendizagem significativa. Buscou-se assim, no início do curso, apresentar a MQ como
algo ao alcance do aluno e com implicações em seu cotidiano, na tentativa de fazer com que
crie a condição de pré-disposição para a aprendizagem e possa vir a aprender de forma
significativa.

3.2. Questionário de conhecimentos prévios

Logo após a elaboração do mapa mental, foi entregue aos alunos o questionário de
conhecimentos prévios, o mesmo utilizado na primeira etapa da pesquisa. Também nesta
atividade não houve pressão para finalização da tarefa e propiciou-se que as respostas
coletadas fossem espontâneas e individuais, solicitando aos alunos que não trocassem
informações sobre o conteúdo a ser escrito. Nesta segunda etapa da pesquisa, 67 alunos da
primeira série e 70 alunos da terceira série responderam ao questionário.
Como na primeira etapa, a primeira e a segunda perguntas foram analisadas em
conjunto, com 50 alunos da primeira série e 52 da terceira assinalando somente respostas que
se relacionam com a MQ. As palavras mais marcadas pelos alunos foram mecânica, física e
partícula. A marcação destas palavras se deve, muito provavelmente, a uma conduta
conservadora dos alunos, visível em suas justificativas: “partícula é estudada na física”, “é a
matéria que estamos estudando”, “física é a matéria que estuda a mecânica quântica” e “as
opções marcadas estão diretamente ou indiretamente ligadas”. Os outros alunos apresentaram
como justificativas as expressões “já ouvi algo relacionado a estes termos”, “chutei”, “primeiras
coisas que vieram em mente”, “são palavras que me dão ideia de dificuldade”, “não sei
justificar, mas imagino que tenha a ver”, “os nomes ficam legais juntos”, “é o que faz mais
sentido”, “quântica lembra quantidade e leva a partículas”.
A palavra computação foi assinalada por 46 alunos e as palavras emaranhamento e
criptografia foram assinaladas por, respectivamente, onze e dez alunos. Uma das justificativas
apresentadas para a marcação das palavras computação e criptografia foi: “parece algo de
computador e computador criptografa as coisas”. As justificativas para a marcação da palavra
emaranhamento foram: “emaranhamento lembra partícula (força forte, força fraca)”, “li sobre
emaranhamento em um artigo”, “porque quântica parece ser difícil de estudar e partícula e

98
emaranhamento não é muito fácil”. Quanto ao aluno que afirmou que já leu sobre
emaranhamento em um artigo, acredita-se que possa já dispor da condição de pré-disposição
para a aprendizagem, visto que parece existir nele um interesse pelo aprendizado de assuntos
relacionados a esta temática.
35 alunos, 17 das primeiras séries e 18 das terceiras, assinalaram alguma palavra que
não diz respeito à MQ. Nas turmas de primeira série, a palavra consciência foi marcada quatro
vezes, cura foi assinalada uma vez, ginástica duas vezes e medicina onze vezes. Nenhum
aluno das primeiras séries assinalou música ou terapia. Nas turmas de terceira série, a palavra
consciência foi marcada três vezes, cura quatro vezes, ginástica três vezes, medicina oito
vezes, música sete vezes e terapia três vezes. As justificativas apresentadas pelos alunos
foram: “nanorobôs e aparelhos em medicina”, “já ouvi falar em cura por energia dos
medicamentos”, além de outras justificativas já apresentadas (“foi o que me veio em mente”,
etc.). Somente dois alunos não justificaram suas respostas.
Sete alunos fizeram referência ao mapa mental como motivador para a marcação da
palavra “mecânica” no questionário ou, ainda, dizendo respeito ao próprio questionário, o de
este incentivar o aluno nas respostas, visto que possui expressões inerentes à MQ.
As respostas apresentadas pelos alunos das cinco turmas à terceira pergunta foram
semelhantes àquelas dadas pelos alunos da primeira fase da pesquisa. As respostas mais
comuns foram: “algo pequeno”, “pequeno pedaço”, “pequeno pedaço de átomo ou matéria”,
“menor unidade da matéria”, “uma parte”, “porção da matéria que se pode modificar”, “pequeno
pedaço ou parte de algo”, “menor parte da matéria”, “partes do átomo”, “algo minúsculo que
precisa de microscópio”. Os exemplos mais citados foram: partículas de água, partículas de
poeira, átomo, elétron, próton, nêutron, molécula e grão de areia. Além destes, alguns
exemplos relacionados à Física de Partículas também foram apresentados pelos alunos, tais
como partícula alfa, bóson, quark e bóson de Higgs. Apenas oito alunos das cinco turmas não
responderam esta pergunta.
Destacam-se aqui duas respostas fornecidas para esta questão: “algo que deforma o
plano do espaço”, “é uma ‘perturbação’ no espaço-tempo”. Estas duas respostas estão
próximas da definição de massa utilizada na teoria da relatividade geral e, caso se fosse traçar
um perfil epistemológico (Bachelard, 1984) destes alunos, a parte relacionada ao racionalismo
completo apareceria com certo destaque nestes perfis, diferentemente do que ocorreria com
outros alunos. O objetivo deste questionário não era o de construir o perfil epistemológico dos
alunos, mas as respostas apresentadas puderam trazer este fato à tona.
Como na primeira fase da pesquisa, grande parte dos alunos relacionou o conceito de
estado com os estados de agregação de matéria na quarta questão, sendo o principal exemplo
citado os estados sólido, líquido e gasoso de algum material. Outras respostas apresentadas
foram: “a forma e o jeito em que um objeto é encontrado”, “estado emocional”, “é como você
está no momento”, “comportamento”, “estado de espírito”, “modo que ele está no ambiente”,
“ação e interação com os planos dimensionais”, “uma propriedade física do objeto”, “modo de
estar”, “aparência do objeto”, “estado de agitação molecular” e “classificação da aparência”.

99
Exemplos indicados foram: sólido, líquido, gasoso, plasma, quente, frio, parado, em
movimento, inércia, sentado, estado de paralisia, objeto em mau estado (mal cuidado), macio,
duro, feliz, triste, seco, molhado, sujo, bom, ruim, uma roupa em mau estado, “estou acordado
agora”. Somente cinco alunos não responderam esta questão.
É interessante destacar que mesmo que a maioria dos alunos nunca tenha tido contato
formal com a definição de estado físico de um objeto, os exemplos arrolados revelam que o
conhecimento prévio apresentado por eles é muito próximo daquele que será estudado ao
longo do curso. Até mesmo a questão da variação temporal dos estados de sistemas físicos
pode ser percebida em alguns dos exemplos. Assim, esta estrutura conceitual pode servir
como ancoradouro para uma definição mais formal sobre o conceito de estado de um sistema
físico a ser apresentado no curso.
Os alunos desta etapa da pesquisa tiveram menos dificuldade em explicitar sua
compreensão sobre o conceito de onda do que os da fase anterior, visto que somente nove
alunos (oito da primeira série e um da terceira) não responderam a quinta questão. Isto não
significa que todos tenham uma compreensão adequada a respeito. Algumas das respostas
apresentadas foram: “algo que se propaga”, “algo com curvas, não é uma linha reta”, “é uma
frequência”, “uma vibração”, “tipo de frequência usado para se comunicar”, “perturbação
(normalmente periódica) de algo”, “reflexo e movimento feito pela luz e pelo som”, “estado onde
não tem massa”, “algo que não seja reto, que tenha ondulações”, “um emaranhado de
partículas”, “movimentos que nos fazem ouvir rádio, TV”, “uma pulsação eletromagnética como
as micro-ondas”, “uma ondulação”, “oscilação de energia”, “algo que transmite energia”,
“vibrações transmitidas por meio de encontros entre duas coisas”, “variação da eletricidade ou
magnetismo”, “variação de uma frequência”, “transmissão de energia que movimenta partículas
de maneira frequente”, “tipos de propagação”, “algo que sofre oscilações”, “movimento de
energia sem movimento de massa”, “algo curvado”, “forma de transmissão podendo ser
magnética e até radioativa”, “aquilo que se propaga no espaço ou na água sem movimentar
nenhum objeto”, “junção de força e movimento”, “transmissão de alguma coisa”. A palavra
frequência também foi utilizada por alguns alunos em suas respostas. Os exemplos mais
citados foram ondas no mar, som ou ondas sonoras, ondas eletromagnéticas, ondas de rádio,
micro-ondas e movimento de uma corda.
A variedade de explicações e de exemplos mostra que os alunos possuem certo
domínio do conceito de onda. Mesmo que a verbalização do conceito não seja correta, os
exemplos dados indicam que os alunos possam ter conhecimento do que vem a ser uma onda.
Frente a esta questão, acredita-se que os alunos devam utilizar seus esquemas para
respondê-la e, consequentemente, explicitar seus conhecimentos-em-ação. Neste caso, o
conhecimento-em-ação utilizado aparenta estar correto e no caminho ideal para a
compreensão dos conteúdos abordados no restante da disciplina. Vale lembrar que o conceito
é um conjunto formado por situações, invariantes operatórios (internalizados na estrutura
cognitiva de cada aluno) e representações e, desta forma, as respostas apresentadas sugerem
que este conceito é conhecido dos alunos.

100
Quanto à sexta pergunta, 121 alunos (88,3%) afirmaram não conhecer o experimento
de dupla fenda. Um aluno da primeira série escreveu que se “trata de um experimento com
duas fendas”. Três alunos da terceira série apresentaram respostas próximas do que vem a ser
o experimento: “ao se arremessar elétrons através de duas fendas, estes se interferem entre si
formando vários pontos de luz, como se fossem ondas”, “vi em um vídeo algo que envolvia
feixes de luz e ondas na água que, após passarem por duas placas formavam algo em um
quadro”. Outro aluno afirmou tratar-se de “experimento para definir a natureza da luz (onda ou
partícula), mas o experimento é inconclusivo, pois ela se comporta como ambos”. Alguns
alunos relacionaram a palavra fenda com uma ferramenta ou com alguma espécie de
experimento com duas formas de terminar, duas teorias ou dois modos de ocorrência, assim
como na primeira fase da pesquisa. Um aluno questionou se isto não teria a ver com duas
dimensões e outro perguntou se teria alguma relação com o DNA, por causa da dupla hélice.
Um aluno afirmou que já ouviu falar no experimento, mas não soube explicar o que seria. Fato
interessante ocorreu nas turmas do curso Técnico em Agropecuária, pois a dupla fenda foi
apontada como um método de enxertia para propagação assexuada em plantas, o que
realmente é verdadeiro. Os alunos, neste caso, trouxeram conhecimento de outra área para a
sala de aula e isto evidenciou um problema possível de ocorrer ao se utilizar termos de uma
área em outra.
Na sétima questão, 113 alunos (82,5%) responderam que consideram importante
conhecer uma teoria com tantas implicações como é a MQ. As justificativas apresentadas
foram: “porque é interessante”, “precisamos conhecer a tecnologia”, “são objetos usados no dia
a dia”, “para entender como funcionam as coisas”, “é sempre bom aprender”, “para saber se
isso é (ou não) um mal para a saúde humana”, “posso precisar desse conhecimento um dia”,
“para exercitar o pensamento”, “porque me interesso pelo assunto”, “parece ser interessante”,
“só pela curiosidade”, “devemos ter mente aberta para novos conhecimentos”. Seis alunos que
consideraram importante conhecer a teoria colocaram ressalvas: um afirmou que “mesmo
sendo importante ter esse contato, ainda assim o assunto é chato” e outro que “só se deve
conhecer o básico da teoria, pois muitos nunca mais a utilizarão em suas vidas”. Quatorze
alunos não consideram importante aprender MQ e apresentaram as seguintes justificativas:
“não é importante”, “não é interessante”, “o importante é saber mexer com a tecnologia e não
como ela funciona”, “não se interessam pelo assunto”, “não quero lembrar de física ao usar
esses aparelhos”, “não trabalho com isso”, “é muito complexo para mim”, “deve ser deixado
para quem trabalha com isso” e “não tenho necessidade de saber isso”. Seis alunos deixaram
a questão em branco.
Levando em conta uma das condições necessárias para a ocorrência de aprendizagem
significativa, pode-se considerar que os alunos que acreditam ser importante aprender MQ têm
a pré-disposição para aprendizagem. Este fator pode auxiliá-los na compreensão dos tópicos a
abordar ao longo do curso, dada sua postura perante este novo conhecimento. É importante
verificar também como será o aprendizado dos quatorze alunos que não mostraram interesse
pelo aprendizado, pois a pré-disposição para a aprendizagem pode mudar. O conhecimento

101
prévio relevante presente na estrutura cognitiva do aluno e o material de apoio potencialmente
significativo podem ser analisados conforme o aprendizado destes alunos.
Mesmo com interesse pelo aprendizado da teoria, 63 alunos (46%) afirmaram na oitava
questão nunca ter ouvido falar em MQ até então. A maior parte dos alunos que afirmaram já ter
ouvido falar sobre a MQ, disseram que não lembram onde, quais os assuntos e nem do que ela
trata. Outras justificativas apresentadas foram: “para construção de robôs”, “estudo dos
átomos”, “algo relacionado à nanotecnologia e aos processadores quânticos”, “computação
quântica com computadores ultrapotentes”, “vi em um filme, mas não lembro o assunto”, “tenho
vaga noção”, “deve ser uma ciência que cuida de microtecnologias”, “energia e comprimento de
onda de Planck e seu prêmio Nobel”, “força forte, força fraca, partícula de Deus”, “princípio de
incerteza, antipartículas, dualidade onda-partícula, teoria de cordas”, “li sobre emaranhamento
em um artigo”, “acelerador de partículas”, “robótica, computação, mecânica, eletromecânica”,
“as contas, partículas e só porque a mecânica quântica me confunde demais”. Dez alunos não
responderam esta pergunta.
Pelas respostas induz-se que alguns alunos devem ter tido contato com algum material
mais aprofundado sobre a MQ, além daqueles que a divulgam com uma interpretação
incorreta. A menção de assuntos como a computação quântica, emaranhamento quântico e
acelerador de partículas pode se dever ao momento de aplicação do questionário. A esta
época, fervilhavam notícias sobre a descoberta do bóson de Higgs no LHC, na Suíça, e muitas
palavras inerentes à MQ acabaram adentrando ao vocabulário dos alunos, que as utilizaram
em suas respostas, mesmo que não tivessem qualquer domínio do conteúdo. Neste caso, fica
explícito o papel da educação científica que é o de promover a aprendizagem de concepções
científicas atualizadas do mundo físico e natural e o desenvolvimento de estratégias de
trabalho centradas na solução de problemas, conforme apontado nos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio.
Conforme esperado, o nome mais lembrado na nona questão foi o de Albert Einstein,
citado por 63 alunos. Os alunos mencionaram que Einstein era um físico alemão muito
inteligente, um famoso cientista, detentor de um QI elevado e que desenvolveu a teoria da
relatividade, a equação E=mc² e a teoria das cordas, além de citar sua famosa foto. Planck foi
citado por dois alunos, por seus trabalhos na física quântica, com a constante de Planck e
“pelas descobertas de inúmeras fórmulas para desvendar contas antes intermináveis”. Quatro
alunos afirmaram conhecer o nome de Werner Heisenberg, mas apenas um deles relacionou
seu nome ao Princípio de Incerteza. Cesar Lattes foi lembrado por três alunos, por ter seu
nome ligado ao Currículo Lattes, pela descoberta do méson , fótons, áreas teóricas sobre
energias e forças primordiais como a gravidade. Muitos alunos não citaram explicitamente o
nome de algum cientista, mas afirmaram já ter ouvido falar deles. As justificativas foram:
“grandes físicos ou matemáticos”, “exemplos de pessoas inteligentes”, “importantes para o
desenvolvimento da tecnologia”, “compreensão do universo, velocidade da luz”, “invenções que
auxiliaram no desenvolvimento da ciência”, “bombas atômicas, velocidade da luz”, “em
documentários de ciência”, “células, moléculas, átomos, partículas”, “nas matérias do colégio”,

102
“gênios da física”, “algo sobre nuclear e sobre computadores”. Quatro já ouviram falar de
alguns deles, mas não lembravam onde ou sobre quais assuntos. Apenas dois nunca ouviram
falar sobre qualquer um dos cientistas listados e somente um deixou a questão em branco.
Por estar em voga à época, o acelerador de partículas foi lembrado na décima questão
por alguns como sendo uma máquina que “acelera partículas e colide-as”, “foi criada para
26
simular o Big Bang” e “para encontrar o bóson de Higgs”, além de citarem o CERN e o LHC
como exemplos. Dos itens apresentados nesta questão, a bomba atômica foi o mais lembrado.
Os alunos mencionaram já ter ouvido falar sobre ela em “estudos sobre 2ª guerra mundial“, que
“é feita de plutônio e urânio enriquecidos e que 10 kg destes materiais equivale a uma tonelada
de TNT” e que “é uma bomba produzida por átomos, quebra o núcleo de um átomo,
explodindo-o”. O chip foi considerado por alguns dos alunos como um dispositivo que
“armazena informações ou dados”, “uma unidade de processamento”, “um rastreador”, um tipo
de “circuito elétrico” e “um processador”. A nanotecnologia foi tida como provedora de
“recursos tecnológicos para aparelhos menores”, uma eventual “utilização na área robótica” e
também no “desenvolvimento de minipartículas para ajudar contra doenças”. Alguns alunos
consideraram a radiação eletromagnética como uma “radiação através dos elétrons”, podendo
vir “quando há espalhamento de radiação devido a algum acidente” e alguns citaram o
ultravioleta e o infravermelho como exemplos. O teletransporte foi apontado como já visto em
filmes e desenhos animados e que consiste em “desaparecer e aparecer em outro lugar” ou
“transportar coisas para outra dimensão”. Um dos alunos afirmou já ter ouvido falar que é
possível teletransportar um fóton. Somente dois alunos da terceira série afirmaram já ter ouvido
falar em tunelamento. Os assuntos apontados foram o estudo de “worm holes” e a “criação de
túneis”. Ainda 51 alunos citaram já ter ouvido falar de algum dos itens apresentados, mas não
souberam explicar seu significado e nem onde ouviram tais termos. Doze alunos não souberam
responder ou disseram não ter ouvido falar de qualquer dos itens listados.
O conhecimento apresentado sobre alguns cientistas na nona questão e os termos da
décima questão parecem indicar que estes assuntos fazem parte do cotidiano de alguns alunos
e é papel da educação formal apresentar as teorias ou os conceitos de forma correta para que
os alunos compreendam os fenômenos envolvidos e estejam devidamente alfabetizados
cientificamente. Diferentemente dos alunos da primeira etapa da pesquisa, os da segunda fase
apresentam menos dificuldade em expressar (externalizar) suas ideias, o que proporcionou
uma maior quantidade e qualidade dos dados coletados, podendo-se inferir as observações
apresentadas.
As pequenas diferenças entre as respostas assinaladas pela maioria dos alunos leva a
crer que todos estão, praticamente, em um mesmo patamar de conhecimentos acerca da MQ:
superficial e repleto de associações espontâneas oriundas do contato com abordagens
provavelmente incorretas de interpretações dos fenômenos da MQ. Este nível de conhecimento
da MQ pelos alunos leva a crer que a abordagem utilizada para construir o curso seja

26
CERN é a sigla para o Conseil Européen pour la Recherche Nucléaire, localizado em Genebra, na Suíça, e LHC para
o Large Hadron Collider, o experimento situado no CERN e considerado como o maior já construído pelo ser humano.

103
adequada para as duas séries, mesmo havendo uma pequena diferença na média de idade
entre elas e estando a terceira série mais exposta ao ensino formal.

3.3. Testes rápidos

Os testes rápidos foram, como indica o nome, rápidas avaliações para diagnosticar
uma aprendizagem imediata relacionada ao conteúdo de determinada aula e que, em geral,
foram respondidas em menos de três minutos pelos alunos. Os testes foram aplicados,
respectivamente, no terceiro, sexto, sétimo e nono encontro. Os quatro testes (vide Apêndice
V) foram utilizados somente na segunda etapa da pesquisa e os seguintes conteúdos foram
abordados:
 Teste rápido 1: Superposição de ondas e de vetores
 Teste rápido 2: Estado de um sistema quântico e projeção do vetor de estado
 Teste rápido 3: Incompatibilidade de observáveis
 Teste rápido 4: Emaranhamento quântico e probabilidades de ocorrência dos
valores de medida
A análise do coeficiente de variação (CV) e o teste t de Student mostram dois lados
diferentes e interessantes acerca do conhecimento dos alunos sobre os tópicos dos testes
aplicados ao final das aulas. (Pode-se observar, porém, que o número de alunos envolvidos
não é grande.) Os valores do CV de cada um dos testes para cada série constam da tabela 10.
Tabela 10. Coeficiente de variação de cada série nos testes rápidos.
Teste rápido 1 Teste rápido 2 Teste rápido 3 Teste rápido 4
1ª série 0,22 0,38 0,60 0,22
3ª série 0,17 0,49 0,70 0,23

Os valores para o CV, no primeiro teste rápido, indicam que há homogeneidade na


compreensão dos conceitos envolvidos no teste nas duas séries. Comparando, contudo, as
duas séries em um nível de significância a 95%, encontra-se o valor de 3,14 para o teste t de
Student, indicando que as duas séries possuem diferença estatisticamente significativa. Neste
teste rápido, apenas um aluno da primeira série deixou a primeira questão em branco. A figura
28 apresenta algumas respostas dos alunos às duas questões do primeiro teste rápido.

104
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f)

(g)

(h)

Figura 28. Respostas ao primeiro teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20133; (c) 20226;
(d) 20234; (e) 20301; (f) 20321; (g) 20406; (h) 20514.

No segundo teste rápido, não há homogeneidade na compreensão dos conceitos


envolvidos nas questões, dados os valores obtidos para o CV em cada série. Na comparação
entre as duas séries em um nível de significância a 95%, encontra-se o valor de 1,56 para o
teste t de Student, indicando que as duas séries não possuem diferença estatisticamente
significativa, mesmo não sendo homogêneas internamente. Neste segundo teste, dois alunos
das primeiras séries deixaram a primeira questão em branco e dois da primeira série e dois da
terceira deixaram a segunda questão em branco. Algumas das respostas fornecidas pelos
alunos constam da figura 29.

105
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f)

(g)

(h)

Figura 29. Respostas ao segundo teste rápido pelos alunos (a) 20102; (b) 20111; (c) 20211;
(d) 20214; (e) 20329; (f) 20336; (g) 20413; (h) 20507.

Os valores de CV para o terceiro teste rápido também indicam que não há


homogeneidade na compreensão dos conceitos envolvidos nas questões pelos alunos das
duas séries. Ainda assim, comparando as duas séries em um nível de significância a 95%,
encontra-se o valor de 1,59 para o teste t de Student, sinalizando que as duas séries não
possuem diferença estatisticamente significativa. Nenhum aluno deixou a questão deste teste
em branco.
Alguns alunos da turma 205 reclamaram da redação da questão deste teste por não
conseguirem entender o que estava sendo perguntado. Algumas das respostas dos alunos são
apresentadas na figura 30.

106
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f)

(g)

(h)

Figura 30. Respostas ao terceiro teste rápido pelos alunos (a) 20116; (b) 20125; (c) 20215;
(d) 20231; (e) 20316; (f) 20331; (g) 20416; h) 20517.

Os valores para o CV no quarto teste rápido foram muito próximos e indicam que há
homogeneidade na compreensão dos conceitos envolvidos nas questões por parte dos alunos
das duas séries. Comparando as duas séries em um nível de significância a 95%, encontra-se
um valor de 0,06 para o teste t de Student, sinalizando que não há diferença estatisticamente
significativa entre as séries. Assim, no quarto teste, além de não diferirem dentro de suas
séries, os alunos também não revelam compreensão diferente na comparação entre as duas
séries. Neste quarto teste rápido, nenhum aluno deixou questões em branco. Algumas das
respostas fornecidas pelos alunos constam da figura 31.

3.4. Avaliações escritas

Assim como na primeira etapa de ensino, três avaliações escritas foram realizadas
para verificação de evidências de aprendizagem dos alunos e, com isso, possibilitar uma
análise da qualidade das situações-problema utilizadas ao longo do curso.
Cada turma teve, pelo menos, cinquenta minutos para a realização de cada uma das
avaliações, sendo que algumas utilizaram menos tempo. Em particular nesta etapa duas
turmas de terceira série, na segunda e na terceira avaliações, usaram pouquíssimo tempo
(menos de vinte minutos) para rapidamente sair de sala de aula. Isto, no entanto, não
prejudicou a avaliação, conforme será mostrado a seguir.

107
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f)

(g)

(h)

Figura 31. Respostas ao quarto teste rápido pelos alunos (a) 20101; (b) 20125; (c) 20202;
(d) 20229; (e) 20308; (f) 20315; (g) 20418; (h) 20521.

3.4.1. Primeira avaliação

A primeira avaliação é a mesma da primeira etapa da pesquisa e foi aplicada nas


mesmas condições, tendo sido realizada por 144 alunos (68 da primeira série e 76 da terceira
série).

3.4.1.1. Análise quantitativa

A tabela 11 apresenta a quantidade de valores atribuídos por série em cada questão da


primeira avaliação na segunda etapa da pesquisa.
Com base nesta tabela, pode-se verificar que foi grande o número de alunos (89,7%)
com alto número de acertos (valores 2 e 3 na escala). Assim, como os alunos, em sua grande
maioria, responderam corretamente a maior parte das questões, infere-se que há indícios de
108
alguma aprendizagem dos conteúdos apresentados. Pode-se perceber também que os índices
de acertos são maiores nas turmas da segunda etapa do que nas da primeira etapa da
pesquisa.
Tabela 11. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da primeira avaliação
na segunda etapa da pesquisa.
Série Questão 0 1 2 3 Branco
1 0 0 25 43 0
2 0 1 29 35 3
3 1 0 8 59 0

4 0 10 39 19 0
5 1 4 2 58 3
6 5 8 6 48 1
1 0 2 8 66 0
2 3 3 16 51 3
3 3 0 3 70 0

4 0 11 43 22 0
5 2 8 7 54 5
6 1 8 7 57 3
TOTAL 16 55 193 582 18

A análise destes dados permite chegar à tabela 12 para a média e o desvio padrão de
cada uma das turmas.
Tabela 12. Média e desvio padrão das séries na segunda
etapa da pesquisa para a primeira avaliação.
1ª série 3ª série
Média 2,51 2,54
Desvio Padrão 0,38 0,36

Com estes valores de média e desvio padrão, os valores obtidos para o CV foram 0,15
e 0,14 para a primeira e para a terceira série, respectivamente. Estes números indicam que o
valor da média pode refletir a realidade conceitual das turmas, tratando-se, assim, de turmas
homogêneas. Saliente-se o fato de que as turmas da primeira etapa possuem um valor mais
alto para o CV, em relação ao desta etapa, mas que ainda pode ser caracterizado como
homogêneo.
Em um nível de confiança a 95%, na comparação entre as duas séries desta etapa, o
valor de t foi de 0,83, indicando que não houve diferença estatisticamente significativa entre as
séries analisadas.

3.4.1.2. Análise qualitativa

A figura 32 apresenta algumas das respostas dos alunos à primeira questão da


primeira avaliação. É possível verificar a utilização da soma de ondas em água provocadas por
goteiras ou no mar (como o aluno 20207) e ondas triangulares, quadradas e dentes-de-serra
(aluno 20231). Assim como na primeira etapa, ocorre uma aparente apropriação da noção de
superposição linear de ondas e este campo de conhecimento pode ser considerado como
conhecimento prévio relevante (subsunçor) para o aprendizado da superposição linear de
estados, estudada na sequência do conteúdo.

109
(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 32. Respostas à primeira questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20122; (b) 20207; (c) 20231; (d) 20321.

Algumas das respostas apresentadas pelos alunos à segunda questão aparecem na


figura 33. Estas respostas, bem como na etapa anterior, sugerem que a sistemática utilizada
para criação de novos vetores foi devidamente compreendida pelos alunos. Assim como na
primeira etapa, um aluno (20122) considerou a atividade como algo “simples” de se fazer,
mostrando que este conteúdo não é tido como difícil e que pode ser devidamente trabalhado
no EM.

110
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 33. Respostas à segunda questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20122; (b) 20128; (c) 20209; (d) 20418; (e) 20512.

Dos 144 alunos que realizaram esta avaliação, nenhum deixou a terceira questão em
branco e 129 (89,6%) relacionaram corretamente as colunas apresentadas, o que indica que a
forma procedimental de superposição de ondas foi bem compreendida. Apesar de alguns
alunos somente terem relacionado as colunas sem apresentar como chegaram a certa
conclusão, outros explicitaram seus invariantes operatórios (conhecimentos-em-ação) para
inferir e resolver a questão. Algumas destas respostas são encontradas na figura 34.

111
(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 34. Respostas à terceira questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20215; (b) 20219; (c) 20220; (d) 20335.

Na quarta questão, 81,5% dos alunos tiveram as respostas avaliadas como corretas ou
parcialmente corretas. A figura 35 apresenta as respostas de alguns dos alunos a esta
questão. Este alto índice de acertos leva a crer que parte essencial do conceito de
superposição linear de vetores, a representação, está devidamente compreendida pelos alunos
e, assim como a superposição linear de ondas, pode servir de subsunçor para a compreensão
do conceito de superposição linear de estados.

112
(a)

(b)

(c)

Figura 35. Respostas à quarta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20117; (b) 20125; (c) 20223.

Respostas à quinta questão da primeira avaliação constam da figura 36 e somente oito


alunos não a responderam. É possível verificar que algumas respostas, como a do aluno 20111
e a do aluno 20308, são sucintas, mas ainda assim estão de acordo com o propósito da
questão. Outras respostas como as dos alunos 20316 e 20505 apresentam os motivos que
levaram à criação da MQ e respostas como a do aluno 20224 citam o momento histórico em
que a MQ está inserida. Uma resposta com uma visão peculiar é a do aluno 20220 que afirma
que as duas teorias não são tão diferentes e que coloca a MQ como “auxiliar” à Mecânica
Clássica. Saliente-se, no entanto, que a maioria das respostas foi considerada boa, conforme
apresentado na tabela 11.
A figura 37 inclui algumas das respostas dos alunos à sexta questão da primeira
avaliação. Apenas quatro alunos deixaram esta questão em branco, conforme se vê na tabela
11.

113
(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f)

(g)

(h)

(i)

Figura 36. Respostas à quinta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20111; (b) 20120; (c) 20122; (d) 20220; (e) 20224; (f) 20308; (g) 20316; (h) 20505;
(i) 20513.

A variedade de situações listadas pelos alunos leva a crer que as situações de


aplicação apresentadas aos alunos no início do curso podem fazer parte do seu cotidiano e
que os mesmos são capazes de reconhecê-las como objeto de estudo. Mesmo em respostas
consideradas fracas, como a do aluno 20212, se pode identificar a utilização de uma palavra
não comum que está relacionada aos princípios da MQ. É interessante destacar a resposta do
aluno 20414 que diz ter lido algo sobre a MQ em revistas dedicadas ao público leigo. Isto
enfatiza o que foi dito anteriormente sobre tais conteúdos atuais serem apresentados em
diversas mídias aos estudantes e a necessidade de se oferecer uma contrapartida do sistema
educacional para que estes conceitos sejam trabalhados corretamente em sala de aula,
evitando assim a ocorrência de uma compreensão incorreta, pois se uma concepção

114
alternativa for aprendida significativamente, ela se constituirá em um grande obstáculo
epistemológico no futuro.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

(f)

(g)

(h)

(i)

Figura 37. Respostas à sexta questão da primeira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20116; (b) 20118; (c) 20122; (d) 20212; (e) 20219; (f) 20233; (g) 20316; (h) 20321;
(i) 20414.

3.4.1.3. Considerações sobre a aplicação da primeira avaliação

Acompanhando a primeira etapa da pesquisa, os resultados obtidos na primeira


avaliação da segunda etapa levam a crer que houve boa compreensão por parte dos alunos
acerca da superposição linear de ondas e de vetores, bem como de algumas implicações da
MQ e de sua origem, além de verificar-se um comprometimento maior destes alunos do que
dos da primeira etapa. Estes resultados levam a acreditar que pode haver uma melhor
compreensão dos conceitos de MQ a serem apresentados, visto que estes alunos parecem

115
apresentar pré-disposição para o aprendizado do conteúdo de MQ e aparentam possuir a
superposição linear como um subsunçor para o aprendizado dos novos conceitos. A ausência
de respostas em tom jocoso na avaliação desta etapa corrobora essa visão, visto que
respostas deste tipo apareceram somente em algumas avaliações na primeira etapa.
A média de cada uma das duas séries nesta avaliação foi muito próxima e,
considerando ainda o desvio padrão e o coeficiente de variação obtidos, podemos dizer que a
compreensão desses alunos parece ter sido satisfatória e sugere que os subsunçores foram
devidamente incorporados às suas estruturas cognitivas e que há uma boa indicação de que o
aprendizado dos próximos tópicos possa ir na direção de uma aprendizagem significativa.

3.4.2. Segunda avaliação

A segunda avaliação é a mesma da primeira etapa da pesquisa e foi aplicada nas


mesmas condições, ou seja, após as aulas em que os conceitos de superposição linear de
estados, estados de sistemas físicos e incompatibilidade de observáveis foram trabalhados,
incorporando-se como situações-problema os experimentos de dupla fenda, o experimento de
Stern-Gerlach e características do átomo de hidrogênio. Esta avaliação foi realizada por 147
alunos (70 da primeira série e 77 da terceira série).

3.4.2.1. Análise quantitativa

A tabela 13 apresenta a quantidade de valores atribuídos por série em cada questão da


segunda avaliação.
Tabela 13. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da segunda avaliação
na segunda etapa da pesquisa.
Série Questão 0 1 2 3 Branco
1 0 0 1 69 0
2 2 43 8 16 1
3 2 7 24 36 1
1ª 4 27 11 7 21 4
5 0 16 5 49 0
6 9 17 7 29 8
7 5 0 33 32 0
1 1 0 2 74 0
2 3 26 23 21 4
3 1 12 39 23 2
3ª 4 12 24 18 20 3
5 0 4 7 66 0
6 7 20 11 32 7
7 8 0 32 37 0
TOTAL 77 180 217 525 30

Com base na tabela 13, pode-se verificar que foi grande o número de alunos (72,1%)
com alto número de acertos (valores 2 e 3 na escala), mesmo que menor se comparado ao da
primeira avaliação. A maioria dos alunos respondeu corretamente a maior parte das questões e
isto aponta indícios de alguma aprendizagem dos conteúdos apresentados. O elevado número

116
de respostas em branco em algumas questões desta avaliação na primeira etapa da pesquisa
fez com que ocorresse um enfoque maior dos tópicos relacionados a estes conteúdos na
segunda etapa de ensino. Com isto, o número de respostas em branco teve uma queda
apreciável nesta etapa, embora a sexta questão ainda domine neste aspecto e a quarta
questão no desempenho negativo.
A análise destes dados permite chegar à tabela 14 para a média e o desvio padrão de
cada uma das turmas.
Tabela 14. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a segunda
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 2,10 2,19
Desvio Padrão 0,44 0,42

Com estes valores de média e desvio padrão, tem-se o valor de 0,21 e 0,19 para o CV
da primeira e da terceira série, respectivamente. Estes números indicam que o valor da média
das séries estudadas nesta etapa pode refletir a realidade conceitual das turmas nesta
segunda avaliação; trata-se, assim, de turmas homogêneas.
Em um nível de confiança a 95%, na comparação entre as duas séries, o valor de t foi
1,37 para o teste t de Student, indicando que não há diferença estatisticamente significativa
entre as séries na segunda avaliação.

3.4.2.2. Análise qualitativa

A figura 38 apresenta o sistema físico descrito pelos estudantes na primeira questão da


segunda avaliação. Assim como na primeira etapa da pesquisa, muitos alunos se aproximaram
do objeto para coletar mais informações visando uma descrição mais completa de seu estado.

Figura 38. Objeto descrito pelos alunos na primeira questão da segunda avaliação na segunda
etapa da pesquisa.

A figura 39 apresenta algumas das respostas fornecidas pelos alunos à primeira


questão da segunda avaliação. É possível verificar a utilização da representação pela notação
de Dirac por alguns dos alunos. A utilização desta representação sugere que os alunos estejam
atingindo alguma compreensão sobre o conceito de estado de um sistema físico, visto que a
representação é um dos conjuntos a serem dominados na compreensão de um conceito. Ideias
relacionadas à variação temporal também estão presentes em alguns dos estados descritos,

117
como no caso das respostas dos alunos 20107, 20115 e 20232. O alto número de respostas
consideradas corretas para esta questão (ver tabela 11) corrobora a ideia de que há alguma
internalização do conceito de estado de um sistema físico pelos alunos em sua estrutura
cognitiva, com a representação (notação de Dirac) sendo devidamente incorporada.

(a)

(b)

(c)

Figura 39. Respostas à primeira questão da segunda avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20107; (b) 20115; (c) 20232.

A resposta do aluno 20403 à segunda questão da segunda avaliação consta da figura


40. Respostas como a deste aluno mostram que é possível revelar compreensão da
superposição linear pelos alunos recorrendo a esta situação-problema (átomo de hidrogênio) e
que a ênfase dada a ela na segunda etapa de ensino fez com que a quantidade de alunos que
deixaram de responder esta questão fosse bastante reduzida de uma etapa para outra (de
27,8% para 3,4% dos alunos).

Figura 40. Resposta à segunda questão da segunda


avaliação da segunda etapa pelo aluno 20403.

Algumas das respostas à terceira questão são apresentadas na figura 41. A notação de
Dirac foi utilizada por alguns estudantes (alunos 20202 e 20418) para descrever o estado
associado a cada um dos dois itens, enquanto outros descreveram o estado sem a notação
(alunos 20107 e 20205), mas ainda assim aparentando uma compreensão sobre o papel da
superposição linear no experimento. As respostas encontradas nesta etapa reafirmam a
suposição de que o experimento de dupla fenda é uma situação-problema adequada para o
aprendizado de conceitos de MQ e de fácil compreensão pelos estudantes, pois os estados

118
foram bem elaborados pelos alunos e a superposição linear estava ali presente. Assim, esta
questão aparenta ser uma via eficaz de verificação da aprendizagem acerca dos dois principais
conceitos abordados nesta pesquisa.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 41. Respostas à terceira questão da segunda avaliação pelos alunos


da segunda etapa (a) 20107; (b) 20202; (c) 20205; (d) 20418.

Como na segunda questão, também foram enfatizados os tópicos relacionados à


quarta questão, verificando-se uma grande redução na ausência de respostas (de 48,1% para
4,8%) dos alunos. Apesar da melhora ocorrida entre as duas etapas da pesquisa devido à
ênfase maior dada a esta situação-problema na etapa de ensino, ainda assim a situação
utilizada (par de átomos de hidrogênio) não aparenta ser uma boa situação para verificação de
aprendizagem dos conceitos de MQ neste caso. Duas das respostas dos alunos constam da
figura 42. Em particular, o aluno 20333 teve uma das melhores respostas ao colocar o par de
átomos de hidrogênio em duas distintas combinações moleculares (H2 e H2O). O aluno 20231
atribuiu estados de agregação da matéria para supostos conjuntos de pares de átomos de
hidrogênio, o que não está incorreto. Contudo, em nenhuma destas respostas é possível
verificar-se a aplicação do conceito de superposição linear, indicando que não se revelou (ou
houve pouca) aprendizagem deste conceito nesta situação-problema.

119
(a)

(b)

Figura 42. Respostas à quarta questão da segunda avaliação


pelos alunos da segunda etapa (a) 20231; (b) 20333.

Boa parte dos alunos, como na primeira etapa, simplesmente respondeu “sim” ou “não”
na quinta questão, sem apresentar justificativa, mas foi possível verificar que os alunos da
segunda etapa tiveram mais dedicação para a resolução desta questão, visto que foi possível
encontrar facilmente mais justificativas nesta etapa. Algumas das respostas a esta questão
constam da figura 43 e sugerem haver alguma compreensão da noção de incompatibilidade de
observáveis, principalmente as respostas dos alunos 20203, 20211 e 20305. Outras respostas,
como a do aluno 20121, mostram alguma compreensão sobre a perda de informação
ocasionada por consecutivas medidas de diferentes grandezas, decorrente da
incompatibilidade de observáveis.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 43. Respostas à quinta questão da segunda avaliação pelos alunos da


segunda etapa (a) 20121; (b) 20202; (c) 20203; (d) 20211; (e) 20305.

120
Como nas segunda e quarta questões, houve diminuição do número de alunos que
deixou a sexta questão sem resposta frente à primeira etapa da pesquisa (de 27,8% para
10,2%). A figura 44 apresenta algumas respostas dos alunos a esta questão.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 44. Respostas à sexta questão da segunda avaliação pelos alunos da


segunda etapa (a) 20106; (b) 20109; (c) 20120; (d) 20231; (e) 20411.

Nota-se que tanto alunos de primeira quanto de terceira séries forneceram boas
respostas para esta questão, indicando compreensão do papel da superposição linear na
descrição de estados em MQ em ambas as séries. Mesmo com dificuldades dos estudantes
para expor seu conhecimento, ainda assim se pode inferir alguma internalização dos conceitos
apresentados. Essa internalização leva a acreditar que o campo de conhecimentos
apresentado aos alunos está promovendo a construção de um esquema para interpretação dos
novos fenômenos e as respostas fornecidas sugerem a ocorrência de uma equilibração
majorante, com os novos esquemas dando conta das situações-problema.
Nas respostas à última questão apresentadas na figura 45, ocorrem expressões que
possibilitam identificar a compreensão da superposição linear, como nas respostas dos alunos
20115, 20125 e 20515.

121
(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 45. Respostas à sétima questão da segunda avaliação pelos alunos


da segunda etapa (a) 20115; (b) 20125; (c) 20231; (d) 20515.

Nesta questão, 69 alunos (46,9%) tiveram respostas consideradas totalmente corretas


e 67 (44,2%) respostas consideradas parcialmente corretas. Este número elevado de respostas
corretas e parcialmente corretas (91,1%) indica que o experimento de Stern-Gerlach é uma
situação-problema de fácil assimilação dos conceitos de MQ e que pode ser utilizada com êxito
na abordagem de tópicos de MQ no EM, além de ter sido muito bem compreendida pelos
alunos da segunda etapa.

3.4.2.3. Considerações sobre a aplicação da segunda avaliação

Viu-se nos questionários e mapas mentais iniciais que, antes do curso, os alunos não
tinham conhecimento sobre o princípio de superposição linear (embora talvez alguns
soubessem somar vetores geométricos) e também não sobre as diferenças existentes entre a
MQ e a MC.
Os resultados desta avaliação mostram que há um razoável domínio por parte dos
alunos das situações-problema abordadas e, consequentemente, do campo conceitual da MQ.
Em um aspecto mais geral, as situações-problema utilizadas foram importantes para a
compreensão do que é o estado de um sistema quântico e da superposição linear de estados.
Os experimentos de dupla fenda e de Stern-Gerlach, em especial, foram os de mais fácil
assimilação pelos alunos e podem ser considerados como situações-problema simples para
aplicação dos primeiros princípios da MQ, conforme mostrado também em Rocha et al. (2014).
Mesmo que ainda apresentando alguns problemas quanto a sua plena compreensão,
as questões que abordaram o átomo de hidrogênio como situação-problema tiveram mais êxito
na avaliação da aprendizagem dos alunos nesta etapa do que na anterior, provavelmente
devido à ênfase dada neste momento em decorrência das constatações da etapa anterior.
Assim, a abordagem ao ensino de MQ que utilize esta situação-problema deve ser feita de
modo mais aprofundado, pois ainda aparenta ser de difícil compreensão pelos alunos.

122
3.4.3. Terceira avaliação

A terceira avaliação é a mesma da primeira etapa da pesquisa e foi aplicada nas


mesmas condições, ou seja, após as aulas em que o emaranhamento quântico e a criptografia
quântica foram apresentados. Esta avaliação foi realizada por 142 alunos (70 da primeira série
e 72 da terceira série).

3.4.3.1. Análise quantitativa

A tabela 15 apresenta a quantidade de valores atribuídos por série em cada questão da


terceira avaliação.
Tabela 15. Quantidade de valores outorgados às respostas às questões da terceira avaliação
na segunda etapa da pesquisa.
Série Questão 0 1 2 3 Branco
1 2 14 18 36 0
2 0 12 34 24 0
3 2 1 9 58 0

4 4 10 33 22 1
5 15 11 21 14 9
6 0 3 1 66 0
1 5 9 26 32 0
2 0 12 28 32 0
3 4 4 15 49 0

4 3 7 28 33 1
5 7 14 23 25 3
6 0 0 1 71 0
TOTAL 42 97 237 462 14

Com base na tabela 15, pode-se verificar que foi grande o número de alunos (82,0%)
com alto número de acertos (valores 2 e 3 na escala), mais alto que na segunda avaliação e
menor que na primeira. Os alunos, em sua maioria, responderam corretamente a maior parte
das questões e isto leva a crer que há algum indício de aprendizagem dos conteúdos
apresentados, inclusive porque repete o padrão positivo de acertos das avaliações anteriores.
Percebe-se também que os índices de acertos são maiores nas turmas da segunda etapa do
que nas da primeira etapa da pesquisa, o que indica uma melhor compreensão dos tópicos
apresentados pelas turmas da segunda etapa da pesquisa.
A partir dos dados da terceira avaliação é possível obter a tabela 16 para a média e o
desvio padrão de cada uma das turmas.
Tabela 16. Média e desvio padrão das séries na segunda etapa da pesquisa para a terceira
avaliação.
1ª série 3ª série
Média 2,22 2,35
Desvio Padrão 0,42 0,45

Com estes valores de média e desvio padrão, têm-se os valores 0,19 e 0,19 para o CV
para a primeira e para a terceira séries, respectivamente. Estes números indicam que o valor
123
da média pode refletir a realidade conceitual das turmas analisadas nesta etapa da pesquisa;
tratando-se, assim, de turmas homogêneas. Algumas das dificuldades conceituais encontradas
na primeira etapa parecem ter sido sanadas (ou ao menos minoradas) com uma abordagem
diferenciada na segunda etapa de ensino, voltando-se mais aos conteúdos das questões em
que os alunos apresentaram um problema maior de resolução na etapa inicial.
Em um nível de confiança a 95%, o resultado do teste t de Student apresenta um valor
t = 1,10, indicando que não há diferença entre as séries nesta etapa da pesquisa.

3.4.3.2. Análise qualitativa

A figura 46 apresenta algumas das respostas fornecidas pelos alunos à primeira


questão. Verifica-se que eles conseguiram identificar um grande número de informações
presentes no estado fornecido, o que sugere algum domínio acerca dos conceitos abordados,
tais como superposição linear, spin, emaranhamento quântico e probabilidades de obtenção
dos valores de medida.

(a)

(b)

(c)

Figura 46. Respostas à primeira questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20125; (b) 20219; (c) 20521.

A figura 47 mostra algumas das respostas fornecidas pelos alunos para a segunda
questão. Alguns alunos simplesmente assinalaram as alternativas que julgaram adequadas
sem apresentar qualquer justificativa, dificultando uma análise mais aprofundada sobre a
aprendizagem acerca dos conceitos abordados nesta questão.
É possível encontrar indícios nesta questão de que os alunos sabem identificar a
superposição linear por meio do emaranhamento quântico (alunos 20224 e 20327). A questão
da imediata informação sobre o estado da segunda partícula obtida com a medida do estado
da primeira também foi apresentada pelos alunos (e.g., aluno 20215). Apesar de o

124
emaranhamento quântico não ser trivial para a maior parte dos alunos, acredita-se que esta
situação-problema possa ser adequada para verificação de aprendizagem dos novos
conceitos, inclusive mostrando razoável domínio neste primeiro contato.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 47. Respostas à segunda questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20111; (b) 20215; (c) 20224; (d) 20236; (e) 20327.

As respostas à terceira questão (vide figura 48) evidenciam novamente algum domínio
da notação de Dirac pelos alunos no processo de construção de estados emaranhados, como
foi visto na primeira etapa da pesquisa. O domínio desta representação é importante para a
compreensão do conceito de estado de um sistema quântico e as respostas fornecidas pelos
alunos permitem inferir que o aprendizado deste conceito está sendo adequado.

(a)

(b)

Figura 48. Respostas à terceira questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20116; (b) 20310.

Conforme ilustrado na figura 49, ocorre novamente na quarta questão a utilização (pelo
aluno 20511) da notação de Dirac, o que indica que esta representação está sendo
incorporada à estrutura cognitiva e que, consequentemente, há aprendizagem acerca da
125
representação do conceito de estado. A superposição linear fica visível nos exemplos
apresentados pelos alunos 20202, 20209 e 20511. A incerteza na medição decorrente da
probabilidade de obtenção dos valores de medida também aparece nas respostas dos alunos.

(a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 49. Respostas à quarta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20119; (b) 20202; (c) 20209; (d) 20312; (e) 20511.

A figura 50 apresenta algumas respostas à quinta questão. Apesar de esta ter sido a
questão com maior número de respostas em branco na terceira avaliação (6,3%), ainda assim
muitos alunos associaram o emaranhamento quântico a uma simples decorrência do princípio
de superposição linear. Analisando o número de acertos nesta questão, vê-se que pouco mais
da metade dos alunos (58,5%) obtiveram conceitos considerados parcialmente corretos ou
corretos, ocorrendo então uma melhora apreciável em relação aos alunos da primeira etapa.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 50. Respostas à quinta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20203; (b) 20224; (c) 20231; (d) 20316.

Assim como na primeira etapa, a criatividade dos alunos na sexta questão para a
construção de chaves foi interessante, conforme mostrado na figura 51; este tópico parece
mesmo estimular para o aprendizado da MQ. Destaque-se aqui a resposta do aluno 20202,

126
que afirmou estar lendo um dos livros mencionados pelo pesquisador informalmente no
decorrer de uma das aulas e que aborda a criptografia quântica.

(a)

(b)

(c)

(d)

Figura 51. Respostas à sexta questão da terceira avaliação pelos alunos da segunda etapa
(a) 20101; (b) 20122; (c) 20202; (d) 20316.

Como nenhum aluno desta etapa deixou a questão em branco e 96,5% das respostas
foram avaliadas como corretas, sugere-se que este tema é efetivamente capaz de despertar o
interesse do aluno pelo aprendizado, promovendo pré-disposição para a aprendizagem,
condição necessária para a ocorrência da aprendizagem significativa.

3.4.3.3. Considerações sobre a aplicação da terceira avaliação

As situações-problema utilizadas nesta avaliação efetivamente serviram para criar a


condição de pré-disposição de aprendizagem, além de promover uma aprendizagem nos
alunos. Os alunos desta etapa tiveram um desempenho muito melhor (média subiu de 1,53
para 2,28) nesta avaliação do que os da primeira etapa, tendo sido dada certa ênfase nos
pontos deficitários da primeira aplicação do curso. Novamente a criptografia quântica e o
emaranhamento quântico pareceram estimular os alunos para o aprendizado, além de serem
bem compreendidos. O estado de um sistema quântico e a superposição linear de estados
pareceram também ser bem compreendidos pelos alunos, visto que conseguiram relacioná-los
com o emaranhamento quântico e a criptografia quântica. A intuição para interpretação de
fenômenos quânticos parece ter sido criada ao longo curso, observando-se que os alunos não

127
a possuíam anteriormente e que a aprendizagem dos novos conceitos deu indícios de ocorrer
de maneira significativa.
Assim como nas duas avaliações anteriores, as médias das duas séries tiveram valores
bem próximos e, com o valor do desvio padrão obtido, podemos verificar que há uma
compreensão semelhante dos conteúdos apresentados nestas séries. Isso corrobora a visão
apresentada no início da tese de que conteúdos de Mecânica Quântica e de Física Moderna e
Contemporânea podem ser apresentados de uma forma intelectualmente honesta aos alunos
de Ensino Médio, levando em conta os subsunçores necessários para a compreensão dos
conceitos trabalhados.

3.5. Mapas mentais finais

Os mapas mentais finais foram confeccionados, de forma individual, pelos alunos da


segunda etapa da pesquisa no último encontro do curso, na aula seguinte à da aplicação da
terceira avaliação. No total, 134 alunos realizaram esta atividade (69 alunos da primeira série e
65 da terceira). Assim como na aplicação do mapa no início do curso, os alunos tiveram total
liberdade para escrever quaisquer palavras que desejassem relacionar com a expressão
central “Mecânica Quântica”. Esta liberdade objetivava que a externalização dos
conhecimentos presentes na estrutura cognitiva dos estudantes pudesse ser mais espontânea
e com potencial de traduzir melhor o conhecimento dos alunos.
Em alguns poucos casos (11 nas turmas de primeira série e 13 nas de terceira série),
no entanto, ainda ocorreu uma associação de palavras consideradas sem qualquer conexão
com o conteúdo apresentado, podendo estar relacionada com a liberdade de resposta dos
alunos, com o caráter não avaliativo da tarefa e até com um descaso dos alunos em relação à
atividade. Nas turmas de primeira série, as expressões “loucura”, “creme dental”, “chato”, “o
impossível se tornando possível”, “anormal”, “de volta para o futuro”, “coisas estranhas”, “outro
mundo”, “nonsense”, “LOL”, “mind explosion”, “Fernandona”, “Claudia Raia”, “Claudia Ohanna”,
“pokémon”, “Dercy”, “nota baixa”, “coisas absurdas”, “complicado” foram relacionadas. Os
alunos das terceiras séries incluíram as expressões “estratégia de marketing”, “não é colchão”,
“prêmio”, “carrasco bonito”, “uma parada muito louca”, “quantidade”, “Alf, o ETeimoso”,
“colchões”, “Aquaman”, “doidera”, “vestibular”, “pouco desenvolvida”, “foge da clássica”,
“respostas: não sei”, “futuro”, “complexidade” “coisas absurdas”, “surreais na física comum”,
“paranormal”, “incrível”, “o desconhecido”, “teorias impossíveis possíveis”, “pesquisa futurística
improvável”, “loucura kkk”. É importante salientar que, mesmo apresentando tais expressões,
todos os alunos ainda escreveram outras que, aí sim, condiziam com os tópicos apresentados
ao longo do curso como: criptografia, computação quântica, elétrons, emaranhamento, estado,
experimento de dupla fenda, fótons, objeto quântico, ondas, partículas, prótons, spin,
superposição e tunelamento, pelos alunos de primeira série; átomos, compatibilidade,
computador quântico, criptografia, elétron, emaranhamento, estado, experimento de dupla
fenda, experimento de Stern-Gerlach, fóton, nanotecnologia, objetos quânticos, ondas,

128
partícula, polarização, spin, superposição, teletransporte, tunelamento e vetores, pelos alunos
de terceira série.
É interessante destacar que, mesmo que pareçam sem justificativa, algumas das
expressões apresentadas pelos alunos têm algum fundamento. É o caso das expressões
“creme dental”, “estratégia de marketing”, “não é colchão”, “colchões” e “vestibular”. Um caso
contado em sala de aula por um aluno no decorrer do curso foi o de uma periodontista que
havia recomendado o uso de certo creme dental para tratamento de problemas gengivais. Tal
produto era descrito pelo fabricante como um “modulador frequencial do peróxido de
hidrogênio”, utilizando algo chamado de Oxigenoterapia como fundamentação científica para
seu funcionamento. Assim, o comentário deste episódio em sala de aula foi o que
provavelmente fez com que o aluno escrevesse esta expressão em seu mapa mental. A
expressão “estratégia de marketing” pode ter sido mencionada porque foi levantado ao longo
do curso que muitos fabricantes se apropriam da palavra “quântica” por ser uma palavra da
moda e a utilizam de forma inconsequente, sem a preocupação de significado técnico ou
científico. A presença das expressões “não é colchão” e “colchões” pode ser atribuída à
existência de um estabelecimento na cidade de Joinville que comercializa “colchões
bioquânticos”. A página da internet do fabricante dos colchões contendo uma suposta
explicação para o funcionamento do princípio bioquântico do colchão está em manutenção
desde 2008. Já a expressão “vestibular” pode ter sido mencionada por um aluno porque houve
uma questão sobre o experimento de dupla fenda em um concurso vestibular prestado por ele.
Este fato, aliás, fez com que vários alunos perguntassem, na ocasião, se o pesquisador era o
responsável pela elaboração da questão, algo prontamente negado.
27
As expressões mais mencionadas pelos alunos nos mapas mentais finais foram dupla
fenda (30 e 38), emaranhamento (59 e 58), criptografia (57 e 51), estado (39 e 38),
superposição (42 e 42), elétron (41 e 36), ondas (38 e 47), vetores (41 e 43) e spin (45 e 42).
Estes números indicam que mais de 50% dos respondentes mencionaram tais termos em seus
mapas. Especificamente no caso das palavras emaranhamento e criptografia, ocorreram mais
de 80% de aparições nos mapas, o que indica que tais temas foram de interesse dos alunos,
podendo ter ocorrido alguma internalização inicial destes termos. O mesmo pode ser dito das
palavras estado e superposição, mencionadas nos mapas de mais de 60% dos alunos. Isto é
digno de nota, visto que nesta resposta espontânea dos alunos se pode verificar a presença
dos principais conceitos da MQ, conforme abordado neste trabalho.
Apesar de se poder considerar, também, que os alunos tenham apresentado os termos
criptografia e emaranhamento porque ‘estavam mais frescos em sua memória’, pois foram os
últimos assuntos trabalhados, a presença dos termos vetores e ondas em mais de 60% dos
mapas mentais induz a invalidar esta hipótese. As aulas sobre superposição de ondas e de
vetores ocorreram no início do curso, aproximadamente três meses antes da confecção dos
mapas, e ainda assim vetores e ondas tiveram uma massiva presença nas respostas dos
alunos. A hipótese a ser levantada neste caso é a de que a aprendizagem dos conteúdos

27
Os números entre parênteses indicam o número de aparições das expressões nos mapas nas turmas de primeira
série e de terceira série, respectivamente.

129
relativos à superposição tanto de ondas como de vetores pelos alunos ocorreu de forma
significativa e com boa retenção, com base nestes dados.
Outra palavra bastante presente nos mapas mentais finais foi spin. O mais interessante
da presença desta expressão é que era praticamente desconhecida dos alunos no começo do
curso, pois os professores de Química deixaram de trabalhar este conceito no EM por conta de
28
dificuldades de compreensão e aprendizagem e de sua alta abstração . Ainda assim, mesmo
com estas supostas dificuldades apontadas por professores de Física e de Química e com uma
possível dificuldade natural devido à abstração do conceito, mais de 60% dos alunos
mencionaram a palavra, mostrando que muitos a incorporaram em sua estrutura cognitiva,
mecânica ou significativamente, e que ela pode vir a se tornar efetivamente significativa em um
futuro curso em que os conceitos de MQ sejam trabalhados. Acredita-se, com isto, que o
aprendizado e retenção deste conceito até o presente momento pode ser considerado
satisfatório.
Outras palavras e expressões importantes foram apresentadas pelos alunos nos
mapas. Estas palavras e o número de vezes em que foram mencionadas em cada série
constam da tabela 17.
Tabela 17. Palavras presentes nos mapas mentais finais
dos alunos da segunda etapa da pesquisa.
1ª série 3ª série 1ª série 3ª série
Alice, Bob e Eva 18 7 Partícula 19 14
átomo 7 11 Polarização 10 16
experimento de Stern-
3 20 posição 7 5
Gerlach
física 17 6 probabilidade 11 5
(in)compatibilidade 5 4 tunelamento 4 16

Além das palavras e expressões já citadas, outras foram mencionadas pelos alunos em
seus mapas mentais, porém em menor número, e só serão apontadas a título de curiosidade:
anteparo, bits, ciência, colapso, difração, ket, mundo subatômico, objeto quântico, observáveis,
PhET, q-bits, teleporte. Mesmo que em menor número, estas expressões ainda mostram
aspectos importantes abordados no decorrer do curso e que foram marcantes para alguns dos
alunos, causando possivelmente uma pré-disposição para a aprendizagem.
Em dois mapas de uma das turmas de primeira série os alunos escreveram
comentários elogiosos acerca da proposta aplicada e da metodologia utilizada no curso,
agradecendo o ambiente amigável de sala de aula e a postura do professor permitindo
inúmeras possibilidades de intervenção (perguntas, comentários, etc.) dos alunos durante as
aulas.
O Apêndice VII apresenta os mapas mentais dos mesmos alunos apresentados no
Apêndice VI, excetuando os que não estiveram presentes no dia de realização desta atividade.

28
Em uma busca por artigos sobre o ensino do conceito de spin em aulas de Química no EM nos mesmos periódicos
da revisão da literatura e em outras revistas de Ensino de Química, nenhum trabalho foi encontrado. Esta afirmação é
proveniente de conversas realizadas com professores de Química das instituições em que o curso foi ministrado e da
vivência do pesquisador no meio educacional. Segundo Gomes e Pietrocola (2011), o conceito de spin aparece no
universo escolar na disciplina de química no EM, quando do estudo da distribuição eletrônica nos átomos, mas
somente no ensino superior ele é estudado de modo um pouco mais aprofundado.

130
O mapa do aluno 20316, destacado neste capítulo, também é apresentado no Apêndice VII. Já
o mapa do aluno 20417 não é apresentado, pois não esteve presente em aula no dia da
atividade.
Os mapas mentais finais mostraram uma clara evolução dos alunos acerca dos
conceitos de MQ após o curso ter sido ministrado. Nitidamente, alguns alunos tiveram um
desempenho melhor nas avaliações, assim como alguns conseguiram expressar melhor nos
mapas mentais os conceitos que se relacionam com a MQ. Isto revela a importância de
promover a avaliação como um processo que lança mão de vários meios de verificação e que é
possível verificar diferentes formas de aprendizagem conforme o meio de avaliação utilizado.

3.6. Questionário de opiniões

Nesta etapa, o questionário de opiniões foi respondido por 133 alunos (69 da primeira
série e 64 da terceira série) após terem confeccionado o mapa mental final.
A tabela 18 apresenta o número de vezes que cada palavra foi assinalada na primeira
questão do questionário de opiniões por série na segunda etapa da pesquisa. A palavra
medicina somente foi considerada adequada se devidamente justificada pelos alunos, pois
pode se referir às aplicações da MQ na medicina. Apenas um aluno de uma das primeiras
séries marcou todas as opções e, assim como na primeira etapa, optou-se por desconsiderar
suas respostas nesta questão.
Tabela 18. Número de vezes em que cada palavra foi assinalada na primeira questão do
questionário de opiniões por série na segunda etapa da pesquisa.
Palavra 1ª série 3ª série
Computação 65 62
Consciência 1 0
Criptografia 66 63
Cura 1 2
Emaranhamento 67 63
Física 66 62
Ginástica 0 1
Mecânica 62 59
Medicina 3 13
Música 6 2
Partícula 66 62
Terapia 0 7

As palavras consideradas adequadas, sem quaisquer questionamentos, foram


marcadas por mais de 85% dos alunos. Ao todo, 105 alunos (78,9%) assinalaram somente
palavras consideradas adequadas, conforme a apresentação no curso. As justificativas mais
comuns para as alternativas assinaladas citavam que os tópicos haviam sido trabalhados,
mencionados ou comentados em sala de aula e foram apresentadas por 55 alunos (41,4%).
Isto mostra novamente a importância que a atualização do currículo do EM tem sobre o
cotidiano dos alunos, sendo assim esperado que os alunos tenham contato com conteúdos
atuais da FMC no ensino formal. Houve, ainda, 21 alunos (20,2%) que afirmaram acreditar que
as palavras assinaladas tinham relação com a palavra quântica. Outras justificativas

131
apresentadas foram: “foi o que me veio em mente”, “não existe cura, ginástica, medicina,
música ou terapia quântica”, “MQ não se aplica a questões corporais ou mentais”. Somente
dois alunos não se manifestaram sobre as alternativas assinaladas.
Entre os alunos que marcaram alguma alternativa considerada inadequada conforme a
apresentação do curso, quinze afirmaram ter ouvido falar nestas opções durante o curso e
onze justificaram que acreditam que estas palavras devem ter alguma relação com quântica.
Um destaque interessante é o de uma das turmas de terceira série em que um grande número
de alunos (doze) assinalou a opção medicina. A justificativa de oito deles foi o assunto ter sido
visto ao longo do curso. Um aluno da primeira série assinalou a opção música e justificou
afirmando que as ondas sonoras estavam relacionadas com a soma de ondas analisada no
começo do curso. A melhora significativa nas respostas dos questionários em relação às da
primeira etapa leva a crer que, mesmo que não seja uma aprendizagem significativa neste
momento, este contato com a MQ promoveu uma postura pertinente acerca dos conteúdos
abordados nos alunos e eles pareceram estar mais predispostos ao aprendizado do que com
um conteúdo tradicional. Assim, a necessidade de se abordar tais conteúdos no EM é citada
novamente, para que realmente se busque a condição de pré-disposição para a aprendizagem,
com vistas à aprendizagem significativa.
Os tópicos mais citados pelos alunos como mais importantes foram criptografia
quântica (54,9%), emaranhamento quântico (33,9%) e superposição linear (21,8%).
Superposição de ondas (17,3%) e de vetores (14,3%), experimento de dupla fenda (8,8%),
estado de um sistema físico (8,8%) e computação quântica (7,5%) também foram lembrados
por alguns alunos, enquanto outros quatro afirmaram que todos os tópicos são importantes e
um aluno considerou que nenhum tópico tem importância.
Dentre os conteúdos considerados mais fáceis, os mais citados foram a criptografia
quântica (53,4%), o emaranhamento quântico (40,6%) e a soma de ondas (28,6%). A soma de
vetores (18,8%), superposição linear (18,0%) e estado (12,0%) também foram apontados em
menor número. Doze alunos citaram o experimento de dupla fenda e outros quatro apontaram
a computação quântica como sendo de fácil compreensão. Dois alunos consideraram todos os
assuntos fáceis e outros dois afirmaram que todos os assuntos são difíceis. Nota-se, assim
como na primeira etapa, que tópicos mais atuais e que não costumam fazer parte do currículo
do EM como a criptografia quântica e o emaranhamento quântico são apontados como sendo
de fácil compreensão pelos estudantes, podendo realmente ser aprendidos de forma
significativa, por serem aparentemente interessantes para os alunos. Tais tópicos são
colocados pelos alunos no mesmo patamar de dificuldade de outros mais tradicionais no
ensino de Física, como a soma de ondas e de vetores.
Ao mesmo tempo em que foram apontados como tópicos mais fáceis por cerca da
metade dos alunos, os conceitos de emaranhamento quântico (21,8%) e a criptografia quântica
(18,1%), o experimento de dupla fenda (18,8%) e a soma de ondas (15,8%) também foram
citados como tópicos mais difíceis, juntamente com a superposição linear (14,3%) e a soma de
vetores (9,0%). Um razoável número de alunos (12,8%) respondeu que não considerava

132
qualquer tópico difícil e nenhum aluno nesta etapa considerou que todos eram difíceis. O
experimento de Stern-Gerlach, o conceito de spin e o de estado também foram citados como
tópicos difíceis por alguns alunos.
É interessante notar que os mesmos tópicos foram considerados de fácil compreensão
(ou de difícil compreensão) nas duas etapas da pesquisa. Isto leva a crer que os tópicos foram
abordados em um mesmo grau de dificuldade para os estudantes das duas etapas e as
diferenças presentes nas respostas apresentadas se devem mais à estrutura cognitiva dos
alunos do que ao método de instrução utilizado. Possivelmente, conseguiu-se criar, no início de
ambos os cursos, a condição de pré-disposição para a aprendizagem, que conduziu ao bom
aprendizado apresentado nas duas etapas.
A ampla maioria dos alunos (82,7%) considerou que não é difícil compreender o
conceito de estado de um sistema físico, enquanto apenas cinco alunos consideraram isto
difícil. Dezessete alunos (12,8%) declararam que o conceito é um pouco difícil de
compreender.
Quanto ao conceito de superposição linear, 41,4% dos alunos afirmaram ser fácil de
compreender, 30,0% que era de se acreditar e 20,3% que era de difícil compreensão e de se
acreditar, além de outros 8,3% que só o consideraram de difícil compreensão.
A maioria dos alunos (61,7%) afirmou que a MQ consegue descrever “elementos de
realidade”, enquanto 27,1% se mostraram divididos em considerá-la como “ficção científica” ou
“elementos de realidade” e outros 9,8% afirmaram que a MQ é pura ficção científica. Dentre os
alunos que se mostraram divididos, 75% eram de uma mesma turma de terceira série,
sugerindo que a MQ pode não ter sido bem interpretada por estes estudantes, mesmo que
estivessem interessados e tivessem respondido corretamente as perguntas propostas nas
avaliações e testes rápidos. Ainda assim, a proporção de alunos que tiveram uma percepção
da MQ como sendo algo irreal sofreu uma grande redução da primeira para a segunda etapa
da pesquisa (respectivamente, 38,6% e 9,8% dos respondentes em cada etapa).
A visão que os alunos possuem acerca da MQ se concentrou nas opiniões positivas
(72,9%), enquanto 8,3% deles apresentaram opiniões negativas. Sete alunos (5,3%) percebem
a MQ como uma teoria ainda inacabada, como uma ciência do futuro ou com implicações
futuras. Quatro alunos a visualizam como uma teoria que descreve um mundo diferente do
mundo em que eles vivem e um aluno afirmou que não tem opinião formada ainda sobre a MQ.
Os posicionamentos positivos envolveram afirmações do tipo “matéria importante que deveria
ser ensinada antes”, “parece difícil, mas tem seus encantos”, “mais legal do que a Física
Clássica”, “parte mais fácil da Física”, “poderia ter este assunto com mais frequência, pois nos
deixa curiosos”, “assunto interessante de se aprender”, “usamos no dia-a-dia sem nem
percebermos”, “algo que faz parte de nossa realidade e que deve ser estudado no EM”, “mais
fácil e mais lógica do que a Física Clássica”. As opiniões negativas trouxeram respostas como
“loucura”, “difícil”, “sem muita aplicação prática”, “mais doido do que via antes”, “algo distante
da realidade”. Destaque-se aqui a redução, da primeira para a segunda etapa, no número de
alunos com opiniões negativas em relação à MQ (de 30,0% para 8,3%) e também o grande

133
aumento no número de opiniões positivas (de 20,0% para 72,9%). Isto reforça a ideia de que
os alunos da segunda etapa estavam mais pré-dispostos para a aprendizagem dos conteúdos
de MQ e se reflete nos melhores resultados de seus testes rápidos e de suas avaliações.
As opiniões finais corroboram as afirmações anteriores e indicam que a proposta de
ensino atingiu seus objetivos. Boa parte dos alunos (61,6%) afirmou que a proposta foi
boa/interessante/legal e que gostaram de como o curso foi ministrado e apenas sete alunos
acharam que o curso foi difícil. Nove alunos de uma mesma turma de terceira série pediram
que as aulas não utilizassem tanto o projetor multimídia, pois, segundo eles, isto deixava as
aulas monótonas. Sete alunos solicitaram que houvesse aulas práticas em laboratório e seis de
uma mesma turma reclamaram do horário do curso, ministrado logo após seu horário de
almoço. Cinco alunos consideraram o tempo do curso curto, quatro pediram mais exercícios e
outros quatro mais exemplos de aplicações dos conceitos de MQ abordados. Outras opiniões
emitidas por um ou dois alunos sobre o curso foram: “mais pessoas deveriam conhecer a
teoria”, “deveria ter o curso mais vezes”, “deveria ter mais aulas sobre criptografia”, “perdemos
muita matéria dos outros conteúdos de Física”, “melhor conteúdo que já aprendi em Física”,
“todas as turmas deveriam ter este curso”, “assunto pode ser trabalhado no Ensino Médio com
certeza”, “a Física Clássica deveria ser ministrada antes do curso para se ter uma base”, “os
testes rápidos poderiam ser excluídos do curso” e “há um bom nível das provas escritas”.
Muitas destas respostas mostram que a abordagem de um conteúdo novo e diferente pode
promover a atualização curricular e ainda despertar o interesse dos alunos para o aprendizado
em Física.

3.7. Entrevistas com alunos

As entrevistas foram realizadas na segunda etapa da pesquisa logo após o término do


curso e três alunos de cada turma foram escolhidos aleatoriamente para manifestar-se sobre
alguns pontos que complementassem as informações fornecidas no questionário de opiniões.
Buscou-se perguntar aos alunos o que acharam do curso, se se sentiram motivados ou
pré-dispostos para aprender MQ com a introdução apresentada, se estudaram para o curso
fora do ambiente de sala de aula, se tentaram resolver os exercícios propostos no texto de
apoio, o que poderia ter sido diferente no curso, se já tinham ouvido falar de MQ antes do curso
e o que levavam de conhecimentos de MQ após o curso.
Sobre sua opinião a respeito do curso, os alunos responderam que acharam o curso
interessante e teceram os seguintes comentários:
Achei legal. Tava preocupado no começo com relação à Física tradicional
do primeiro ano que a gente não ia ter... e apesar de não gostar de Física.
[20108]
Eu gostei também e... tava com medo... achei que ia atrapalhar, mas acho
que vai adiantar bastante no terceiro ano. [20109]
Legal. É meio surreal... coisa que a gente nunca viu... a gente só vê mesmo
o clássico da Física... e quando começa a estudar uma coisa que nem pode
existir neste mundo, o negócio fica meio... [20203]

134
Foi diferente. Uma coisa que a gente não tem muita noção... ninguém toca
muito nesse assunto. Foi um jeito diferente de aprender Física. A gente não
tá acostumado a fazer as coisas assim... e a gente tá acostumado que tudo
tem que ter uma explicação correta... [20204]
Na verdade a gente não tava nem acostumado com Física... eu sempre me
dei mal. Aí eu consegui melhorar a nota. Foi bem interessante. [20233]
Eu gostei das aulas, mas eu fiquei com sono algumas vezes. Mas eu
aprendi bastante com relação às coisas de MQ porque eu só ficava ouvindo
esse nome “quântico, quântico, quântico”, mas nunca sabia a que se referia
e que tinha tantas aplicações inclusive no nosso curso: criptografia e outras
coisas. [20301]
Acho interessante porque são coisas que a gente não aprende no EM e que
podem muito bem ser ensinadas. Não são tão difíceis, apesar de um pouco
estranhas, mas bem aplicáveis ao EM e muito interessante para que os
alunos porque caso a pessoa queira seguir nessa área, ela já terá uma base
bem legal. [20315]
Achei bem legal, porque é um assunto que eu tinha bastante curiosidade.
Eu sabia que Planck tinha começado com a Física Quântica (foi o que eu
soube), aí eu sempre tive curiosidade em saber o que era. Já tinha ouvido
falar em emaranhamento e coisas assim, só que não tinha a menor ideia de
como funcionava e achei bem interessante, bem legal. [20329]
Útil pra aprender outras coisas da Física, não só a Física Clássica. Antes as
pessoas falavam e a gente nem sabia o que era. A gente comprava “coisas
quânticas” porque era leigo no assunto. [20410]
Legal que vai dar pra usar no futuro, que nem os métodos de segurança
que o professor falou ali (criptografia). [20415]
Eu nem tinha ideia do que era antes... [20416]
Uma coisa nova, né? [20506]
Muito interessante porque contribuiu... além do conteúdo normal do terceiro
ano, a gente teve um extra que foi muito importante para o vestibular ou
concurso. [20519]

Seis alunos, três de uma das turmas de primeira série e três de uma das turmas de
terceira série, afirmaram que não se sentiram estimulados ou pré-dispostos para o aprendizado
dos conceitos de MQ abordados no curso. Os demais afirmaram que acharam o conteúdo do
curso interessante e se sentiram pré-dispostos para aprender MQ. A seguir alguns dos
comentários feitos pelos alunos:
No começo não, mas com as aulas do professor foi mais motivado. Acho
que se fosse outra pessoa não seria igual. [20108]
Olha, eu não sou muito chegada em Física em geral, mas só que eu achei
bem interessante, como eu já falei. Então algumas coisas e pegava e ia... a
parte de emaranhamento e tudo que eu comecei a... o que eu começava a
entender mais, eu ficava mais motivada... queria saber mais. A parte da
criptografia também, que é algo que se aplica ao nosso curso. Achei umas
coisas que eu não entendia então me cansava um pouco. E também a parte
das simulações foi bem interessante pra poder visualizar o que estava se
passando [20301]
Concordo com ela um pouco, porque eu não gosto muito de Física, mas
algumas coisas surpreenderam porque foram legais e foram bem
interessantes. [20315]
Eu gosto muito de Física e o curso me fez gostar mais ainda. Eu realmente
quero fazer um curso de Física […]. Eu gostei bastante e me senti muito
motivada. As dormidas em aula que foram só uma, foi pelo cansaço físico e
por ser logo depois do almoço e não pela aula. Acho que foi o mais legal
porque a gente percebia a aplicação. Se não tivesse simulação, ficaria até
complicada de entender aquela parte do elétron que se comporta como
onda e como partícula... ficaria bem complicado. [20329]

135
Eu não vi muito sentido nas coisas apresentadas, nenhuma aplicação. Por
isso eu tive um pouco de dificuldade. [20410]
É como foi dito, MQ o cara não entende: um elétron passar por dois lugares
ao mesmo tempo... não entra muito na cabeça isso! Não se consegue
acreditar. [20415]
Me senti mais motivado do que para a física normal. [20520]

Somente cinco alunos, todos de duas turmas de terceira série (204 e 205), disseram
que não estudaram fora de sala de aula em momento algum. Todos os demais afirmaram que
leram o texto de apoio ou os slides apresentados nas aulas, alguns em casa e outros na
própria escola.
Quando perguntados sobre o que poderia ter sido diferente no curso, oito alunos
afirmaram que consideraram bom o curso e que não fariam qualquer mudança. Algumas das
afirmações dos alunos neste questionamento são apresentadas a seguir:

O curso poderia ter sido desde o começo do ano. [20204]


Poderia ter mais tempo, pois ficou muito apertado pra explicar as coisas.
[20233]
Em qualquer escola deveria ter mais aula prática de Física. Porque eu acho
que o aluno grava as coisas mais mexendo do que só ouvindo. [20315]
Talvez se, no caso daquelas simulações, a gente pudesse mexer com eles,
porque como a gente tem laboratório aqui... de repente pode ser uma
ideia... a gente poder regular lá, interagir com a simulação... e se a aula não
fosse depois do almoço também. [20329]
Acho que não mudaria nada. Aqueles testes feitos no final da aula faziam,
pelo menos comigo, eu ter que prestar atenção durante a aula porque eu
sabia que podia ter um teste depois. Então eu me sentia motivada a prestar
atenção. [20410]
Tá legal assim. A gente se empolgou bastante. Bom material. [20415]

Quando perguntados se já tinham ouvido falar em MQ antes do curso, onze alunos


disseram nunca ter tido contato com a teoria, enquanto quatro, os alunos 20301, 20315, 20329
e 20415 afirmaram já ter ouvido falar a respeito em alguns produtos, filmes e reportagens, mas
nunca souberam o que significava.
À pergunta sobre que conhecimentos de MQ os alunos levam após o curso, todos
responderam que jamais comprariam algum produto anunciado como colchão ou pulseira
quântica face às explicações dadas em sala de aula. Algumas das respostas dos alunos são
apresentadas a seguir.

Um pouco menos estranho e desconhecido. Assim, a gente aprendeu que


tem muitas aplicações, muitas coisas que usam MQ. [20301]
Pra mim, vai ser menos desconhecido, mas vai continuar sendo um pouco
estranho e vai continuar sendo importante como eu sempre pensei que
fosse a coisa. Aprendemos também a não ser enganados pelas empresas e
pelo capitalismo. [20315]
A MQ deixou de ser só o nome pra alguma aplicação. É bom saber que nós
fazemos coisas que envolve MQ, quer dizer... não nós, mas nós utilizamos
coisas que tem MQ. Saímos da ignorância e a gente agora não vai ficar
acreditando que existem colchões quânticos, lojas quânticas, pulseiras
quânticas. [20329]
Se alguém falar, aí a gente já tem uma ideia do que é. Não vai acontecer de
não saber nada. [20416]

136
A MQ é importante porque explica muitas coisas que a física clássica não
consegue explicar. [20520]

Verifica-se que as manifestações dos alunos nesta entrevista são complementares e


corroboram as informações retiradas dos questionários de opiniões. De forma geral, os alunos
aparentam ter adquirido algum conhecimento de MQ, o que parece ter ocorrido de forma crítica
e significativa.

3.8. Síntese da aplicação na segunda etapa

Assim como na primeira etapa da pesquisa, os resultados da aplicação nesta etapa


podem ser considerados satisfatórios, inclusive com um grau maior de aprendizagem dos
alunos, observado nos mapas mentais, testes rápidos, avaliações e questionários de opinião.
As dificuldades encontradas na primeira etapa em relação ao trato do átomo de hidrogênio
como uma situação-problema para a aprendizagem dos conceitos de estado e de superposição
linear de estados foram reduzidas na segunda aplicação e muitos dos problemas iniciais não
surgiram novamente.
A receptividade dos alunos aos conteúdos apresentados, nesta etapa, aparentou ser
mais alta que a da etapa anterior e pouquíssimos alunos tiveram uma postura de
enfrentamento em relação aos tópicos trabalhados.
Pode-se afirmar também que a inserção dos novos instrumentos de coleta de dados
para averiguar o aprendizado dos alunos ao longo do processo de apropriação do campo
conceitual da MQ possibilitou uma melhor análise do aprendizado dos alunos, o que virá a
corroborar as conclusões a serem apresentadas no próximo capítulo.

4. Diário de bordo

O diário de bordo é um registro dos acontecimentos da disciplina, sobretudo em sala de


aula. Os comentários a respeito atingirão as duas etapas da investigação.
No diário de bordo constam informações sobre o comportamento das turmas nas duas
etapas de ensino, que podem auxiliar na compreensão de alguns dos resultados apresentados
anteriormente.
Uma das reclamações mais repetidas nas duas etapas foi quanto à dificuldade dos
alunos em efetuar a soma de duas ondas, tanto em turmas de primeira como de terceira série.
A ausência de conhecimentos sobre funções trigonométricas pelos alunos de primeira série
mostra que este é, possivelmente, um subsunçor que deva ser considerado em uma
abordagem mais aprofundada de conceitos de MQ. Esta ausência não se caracterizou,
contudo, como grande entrave para o aprendizado de conceitos de MQ porque os alunos
possuíam conhecimentos espontâneos e corretos sobre a soma de ondas, advindos de seu
cotidiano e que puderam ser usados ao longo do curso. Isto fica mais evidente ao se analisar
as boas notas obtidas pelos alunos na primeira avaliação em ambas as etapas da pesquisa.

137
Os alunos de terceira série tiveram mais facilidade em compreender a soma de vetores
do que os de primeira série, possivelmente por este ser um conteúdo tradicionalmente
abordado na primeira série do EM. Assim, o ensino deste conteúdo acabou por fazer ressurgir
na estrutura cognitiva dos alunos um conhecimento que já havia sido internalizado, aprendido
de forma significativa e possivelmente passado pelo estágio da assimilação obliteradora. Esta
diferença de aprendizado, entretanto, não foi tão grande a ponto de se poder concluir que os
alunos de terceira série tiveram melhor desempenho que os alunos de primeira série.
Pela reação inicial dos alunos, o experimento de Stern-Gerlach foi tido como de difícil
compreensão em todas as séries. Os alunos de primeira série apresentaram dificuldades em
usar o conceito de spin, pois a maior parte deles não estudara este conteúdo ainda na
disciplina de Química. Nas turmas de terceira série, os alunos relataram que não lembravam de
ter tido esse conteúdo na primeira série, o que pode indicar uma aprendizagem mecânica, no
caso de o assunto realmente ter sido ministrado.
Alguns alunos apresentaram dificuldades de compreensão do conceito de
incompatibilidade de observáveis, tema que foge da intuição clássica usada em seu cotidiano.
O conceito de estado de um sistema físico foi um dos conteúdos que os alunos tiveram
maior facilidade para compreender. A questão da variação temporal do estado de um sistema
físico, mesmo não sendo o foco deste estudo, também pareceu compreendida pelos alunos.
Foi fácil perceber situações em que alunos ofereciam exemplos da modificação do estado com
a alteração temporal. Em um dos exemplos, um aluno descreveu o estado de uma de suas
canetas e constatou que a mesma não estava funcionando. Passado algum tempo, o mesmo
aluno interrompeu a aula para informar uma modificação no estado de sua caneta, que havia
voltado a escrever. Este tipo de exemplo se repetiu em praticamente todas as turmas.
As perguntas apresentadas ao longo das aulas mostram que muitos alunos têm
interesse neste conteúdo e que se faz necessária a inclusão destes tópicos no ensino de Física
no EM. Como ilustração, algumas das perguntas que os alunos fizeram ao longo do curso
foram: “fotoelétrico é a mesma coisa que fotovoltaico?”, “mas por que o elétron se comporta
assim no experimento de dupla fenda?”, “por que a figura no experimento de Stern-Gerlach é
essa?”, “por que o computador quântico é mais rápido?”, “o que são bits quânticos?”, “por que
a superposição é importante?”, “qual a diferença entre e ?”, “computação
quântica não pode quebrar a criptografia quântica?”, “qual a diferença entre monitoramento
passivo e monitoramento ativo?”, “pode haver superposição de mais de uma grandeza física?”.
Destaque-se que, mesmo que alguns conceitos tenham sido considerados de difícil
compreensão ao longo do processo de ensino-aprendizagem, isto não significa que não foram
devidamente compreendidos pelos alunos. Sempre que as dificuldades eram levantadas pelos
alunos, o professor buscava retornar ao conceito e abordá-lo novamente utilizando a mesma
ou outras técnicas até que houvesse uma melhor compreensão.
De forma mais geral, os alunos da primeira etapa da pesquisa pareceram estar menos
envolvidos com o curso do que os da segunda etapa. Isto talvez se deva ao fato de que muitos

138
alunos sabem que, independente do resultado da avaliação escrita, eles serão aprovados ao
29
final do ano letivo, pois esta é a conduta adotada na educação no país neste momento .
Outro fato importante a ser citado é o de que o professor da instituição em que a
segunda etapa da pesquisa foi realizada e que cedeu as aulas para execução da pesquisa
incorporou o assunto ao seu conteúdo anual e incluiu perguntas sobre MQ no exame final dos
alunos. Portanto este tema foi adotado pelo professor e não foi somente algo trabalhado
durante a pesquisa e esquecido logo após o término do curso.

5. Discussão acerca da aplicação do curso nas duas etapas da pesquisa

Com relação ao questionário de conhecimentos prévios proposto nas duas fases da


pesquisa, não há diferenças quanto ao contato anterior dos alunos com a Física Moderna e,
em especial, com a MQ. Alguma diferença existente entre a primeira e a terceira séries residiu
no fato de que muitos alunos da terceira série afirmaram já ter ouvido falar da MQ, por mais
que não soubessem do que ela trata. Mesmo assim, esta ligeira diferença não pareceu ser
considerável para caracterizar os alunos da primeira série como tendo menor capacidade de
aprendizado para os conceitos de MQ.
Considerando, então, as respostas apresentadas para o questionário inferiu-se que
seria possível trabalhar a MQ em nível similar acessível para alunos de Ensino Médio de todas
as séries, de forma que houvesse interesse e compreensão sobre os princípios fundamentais
da teoria. Considerou-se, também, que a apresentação de alguns tópicos de MQ para estes
alunos é de grande importância para a promoção da atualização curricular da disciplina de
Física do Ensino Médio e para uma adequada alfabetização científica. Não foi objetivo da
proposta, no entanto, instrumentar os alunos para trabalhar tópicos em MQ, mas sim
proporcionar um ambiente em que os estudantes tenham contato com a teoria de modo que
quando, e se, vierem a se defrontar com ela novamente, dentro ou fora da sala de aula, saibam
a que a mesma se propõe e do que trata.
Quanto às avaliações escritas, é importante destacar, de início, que se considera que
não são o único (e nem isoladamente o melhor) método para verificação da aprendizagem dos
alunos, devendo-se assim mesclar esta forma de avaliação com outros métodos. Portanto,
apesar de ter um peso grande na análise desta tese, as avaliações escritas foram
complementadas com as análises de questionários, mapas mentais, testes rápidos e
entrevistas para, enfim, se ter um panorama sobre a real aprendizagem dos alunos acerca dos
tópicos de MQ.
Em um primeiro momento, é possível perceber que os estudantes tiveram boa
compreensão da superposição linear de ondas e de vetores do plano, possibilitando a
construção deste subsunçor para uma melhor aprendizagem dos conceitos de MQ utilizados na
29
Atualmente, o sistema educacional das escolas públicas, principalmente, faz com que o professor precise provar que
o aluno merece ser reprovado e não que o aluno mostre que merece ser aprovado. Como muitos professores estão
sobrecarregados e não querem mais um fator de estresse, acabam aprovando a maioria dos alunos, mesmo aqueles
que apresentam um conhecimento muito abaixo do que deveria ser recomendado para aprovação. Em último caso, a
situação do aluno pode ser decidida pelo conselho de classe no final do ano e o aluno pode ser aprovado, mesmo que
o professor diga que ele merece ser reprovado. A decisão do conselho é superior ao “desejo” do professor.

139
segunda e na terceira avaliação. Isto porque o número de acertos dos alunos na primeira
avaliação foi maior do que nas demais, fato este que pode estar relacionado aos aspectos
clássicos de algumas questões da primeira avaliação e que já haviam sido aprendidos de
forma significativa anteriormente.
A segunda avaliação mostrou que situações-problema conceitualmente simples em
MQ, como o experimento de dupla fenda e o de Stern-Gerlach, não apresentam grande
dificuldade de compreensão pelos alunos. Assim, estes experimentos podem (e devem) ser
utilizados como recursos auxiliares para promoção da atualização curricular no ensino de
Física no EM e como tópicos que permitam a criação de uma “nova” consciência capaz de
interpretar fenômenos quânticos, estranhos ao mundo cotidiano do aluno.
O emaranhamento quântico também se apresentou como uma situação-problema
adequada para o ensino de tópicos de MQ, visto que os alunos pareceram ter compreendido os
conceitos de estado de um sistema quântico e de superposição linear de estados nas
avaliações propostas.
De mesma forma, uma situação-problema mais usual como o átomo de hidrogênio não
foi de fácil assimilação pelos alunos, quando abordado da ótica da MQ, mesmo que este
exemplo esteja normalmente presente nos cursos de Química do EM. A utilização desta
situação-problema, (e de qualquer outra), não deve ser descartada somente por conta de um
resultado negativo, mas certamente sua abordagem deve ser revista para que os conceitos
sejam devidamente compreendidos pelos alunos. Uma revisão acerca da apresentação na
primeira etapa, aliada à pré-disposição para a aprendizagem verificada nos alunos da segunda
etapa, fez com que essa situação-problema produzisse um resultado melhor. A efetiva
compreensão do campo conceitual da MQ, no entanto, só será atingida quando ocorrer o
domínio desta situação, entre outras não abordadas neste trabalho.
O curto período do curso, conforme inclusive apontado por alguns alunos, impede uma
conclusão definitiva sobre a aprendizagem dos alunos acerca dos conteúdos abordados,
embora os indícios sejam animadores e nos tentem a fazer alguma afirmação maior. Isto,
porém, estaria indo contra o referencial teórico utilizado nesta pesquisa. Efetivamente, segundo
a teoria dos campos conceituais de Vergnaud, o domínio de um campo conceitual, a MQ neste
caso, ocorre ao longo de um expressivo período de tempo (Vergnaud, 1982, p. 40). Espera-se,
contudo, que este primeiro contato dos alunos com a MQ tenha servido para a criação de
subsunçores que auxiliem no aprendizado de novas situações-problema em MQ, para os
alunos que venham a realizar cursos que necessitem de tais conhecimentos e, também, não
menos importante, que este conhecimento sirva como uma alfabetização científica, necessária
para criar uma criticidade quando os alunos forem apresentados a algo que desconheçam e
que possa ser utilizado para propagar ideias sem um embasamento adequado.
Nem todas as respostas dos alunos aos mapas, testes, avaliações e questionários
puderam ser aqui transcritas, dado o volume de dados coletados. Para que a análise não
ficasse muito densa e redundante, apenas algumas respostas foram incluídas no texto, visto
que outros alunos tiveram respostas semelhantes àquelas apresentadas. Ainda assim, espera-

140
se que as informações apresentadas tenham sido suficientes para elucidar e ilustrar o ponto de
vista defendido na pesquisa. Declara-se que as informações não apresentadas em nada
prejudicam as conclusões ora apresentadas.
As conclusões sobre os resultados aqui apresentados, bem como as respostas às
perguntas de pesquisa lançadas no capítulo V encontram-se a seguir.

141
CAPÍTULO VII

CONCLUSÕES

Com os resultados apresentados no capítulo anterior, é oportuno voltar-se agora às


duas perguntas apresentadas no quinto capítulo e ao referencial teórico utilizado, para buscar
uma resposta adequada ao contexto da pesquisa. As duas perguntas serão respondidas em
conjunto, pois suas respostas são complementares. Identificando as estratégias e as
dificuldades presentes no processo de ensino-aprendizagem dos conceitos de MQ, acredita-se
que também será possível verificar como ocorre o aprendizado dos principais conceitos pelos
alunos. As perguntas centrais desta tese, que se referem ao projeto específico desenvolvido,
são apresentadas novamente a seguir:
 Como ocorre o aprendizado de alguns dos primeiros princípios da MQ no EM?
 Quais as principais dificuldades e que estratégias (situações-problema) surtem
o melhor efeito neste aprendizado?
Buscou-se, nesta pesquisa, centrar-se na compreensão pelos alunos dos conceitos de
estado de um sistema físico e de superposição linear de estados, sem, contudo, deixar de
introduzir e aplicar os princípios da Mecânica Quântica apresentados no capítulo III. Além dos
dois conceitos priorizados, conforme estes tópicos foram sendo abordados no curso
implementado com alunos do EM, outros conceitos e os postulados relacionados foram
naturalmente discutidos como, por exemplo, a (in)compatibilidade de observáveis, o colapso do
vetor de estado, os autovalores como possíveis valores de medida e a probabilidade de
obtenção dos valores de medida. As situações-problema utilizadas serviram para tentar criar
uma gama de opções que propiciasse uma melhor compreensão destes conceitos pelos
alunos. As seguintes situações, principalmente, foram utilizadas: experimentos de dupla fenda,
experimento de Stern-Gerlach, polarização da luz, emaranhamento quântico e criptografia
quântica. Com menor ênfase, a computação quântica e o átomo de hidrogênio também foram
utilizados para apresentar algumas aplicações dos principais conceitos da MQ.
A utilização da superposição de ondas e de vetores antes da apresentação dos
conceitos de MQ fez com que este pseudo-organizador prévio conseguisse criar, na maior
parte dos alunos, o conceito de superposição linear e auxiliasse na compreensão da
superposição linear de estados e demais conceitos. Nesta ótica, o conceito de superposição
linear é considerado como o subsunçor que se buscou criar com este pseudo-organizador
prévio e que serviu para utilização no restante do curso. A noção intuitiva de onda e de soma
de ondas que os alunos utilizam em seus cotidianos foi suficiente para suprir a falta de
conhecimentos acerca de funções trigonométricas apresentadas por algumas turmas,
especialmente as de primeira série. Os resultados da primeira avaliação (e do primeiro teste
rápido, na segunda etapa da pesquisa) e a facilidade de interpretação das somas de ondas e
de vetores que os alunos apresentaram no decorrer das aulas, mostram que a inserção do
conceito de superposição linear foi relativamente bem compreendida nestas situações-

142
problema, podendo assim ser utilizado tal conceito com frequência para interpretação dos
fenômenos estudados na MQ. De fato, os alunos terminaram por incorporar propriedades de
espaços lineares sem que houvesse necessidade de que isto fosse explicitado. Pode-se
considerar que esta abordagem teve um resultado adequado no aprendizado dos alunos, visto
que em nenhuma ocasião utilizaram conceitos da Mecânica Clássica para interpretar os
fenômenos apresentados. As respostas dos alunos foram apresentadas, mesmo que algumas
incorretamente, utilizando a linguagem inerente à MQ. A importância que deve ser dada à
linguagem e à simbolização no progressivo domínio de um campo conceitual pelos alunos na
Teoria dos Campos Conceituais (Moreira, 2002, p. 8) faz com que se acredite que os
resultados encontrados sinalizam que o aprendizado dos alunos nas duas etapas do curso
seguiu o caminho desejado para a ocorrência de uma aprendizagem significativa, caso não
tenha ocorrido efetivamente.
Os experimentos de dupla fenda podem ser considerados como novidade para
praticamente todos os alunos e o fato de algumas de suas configurações fugirem totalmente da
intuição clássica também conseguiu instigá-los para o aprendizado dos conceitos abordados.
De início, como esperado, houve um estranhamento com os resultados obtidos no experimento
com elétrons e os alunos fizeram uma série de perguntas para tentar compreendê-los, mas as
explicações apresentadas e a forma como a MQ lida com este experimento pareceu plausível
para os alunos. Por mais que alguns alunos insistissem que os resultados pareciam malucos
ou irreais, esta opinião acabou mudando para a maioria, e a teoria aparentou ter sido
devidamente compreendida por eles.
As respostas dos alunos às questões sobre o experimento de Stern-Gerlach, na
avaliação e no teste rápido, mostraram boa aprendizagem dos conceitos trabalhados com esta
situação-problema, sugerindo que ela é adequada para uma abordagem no EM, mesmo que
atualmente o conceito de spin esteja sendo deixado de lado por boa parte dos professores de
Química e Física. A abstração de vários conceitos, somada à desmotivação de alguns
professores pode culminar na supressão de conteúdos tidos como mais difíceis de trabalhar e
parece ser este um caminho seguido no EM, visto que praticamente todos os alunos
afirmaram, no decorrer das aulas, que não tinham ouvido falar ou não se lembravam de ter
estudado algo sobre o conceito de spin. Se ocorreu algum estudo deste conceito, um eventual
aprendizado, deve ter sido de forma mecânica. Por ser algo complexo para alunos de EM,
certamente não se espera uma compreensão correta deste conceito, mas o primeiro contato
oferecido no curso proposto para o EM pode fazer com que uma aprendizagem subsequente
ocorra de um modo mais fácil e de forma significativa. É extremamente importante que alunos
de EM tenham contato com conteúdos de FMC, pois, dependendo da escolha futura de cada
um, esta pode ser a última vez em que o aluno estudará Física em sua vida (Oliveira et al.,
2007, p. 448).
A aceitação dos alunos aos tópicos sobre o emaranhamento quântico e a criptografia
quântica mostra que temas recentes estimulam o aluno para o aprendizado de FMC e podem
ser usados no ensino de Física como elementos capazes de criar a condição de pré-disposição

143
para o aprendizado. É interessante lembrar que, sob uma visão epistemológica
contemporânea, a Ciência está em constante construção (Forato et al., 2011, p. 30) e, deste
modo, sempre surgirá algum assunto que pode ser incorporado no ensino de Física. Isso
significa que não somente a Ciência está em constante construção, mas que o ensino de Física
precisa ser repensado frequentemente para acompanhar as mudanças que a Ciência promove.
Apesar de serem tópicos não usuais no ensino de Física, o emaranhamento quântico é um
fenômeno examinado por Einstein et al. (1935) na década de 30 do século passado e a
criptografia quântica teve seus desenvolvimentos tecnológicos a partir da década de 80 do
mesmo século.
Mesmo sem serem situações-problema centrais neste estudo, alguns comentários
podem ser tecidos acerca da computação quântica e do átomo de hidrogênio. A computação
quântica pareceu interessar aos estudantes, principalmente se discutida com a criptografia
quântica. A rapidíssima velocidade de processamento em que um computador quântico é
capaz de operar (teoricamente) faz com que os alunos queiram saber detalhes das dificuldades
no processo de construção deste equipamento. Com tal interesse, é possível tratar temas que
não são tradicionalmente abordados em cursos de MQ, como a descoerência e o próprio
emaranhamento quântico. A abstração do modelo do átomo de hidrogênio, aliada a grandezas
físicas não tão usuais aos alunos, como spin, momento linear e até mesmo energia, fez com
que esta situação-problema não fosse tão proveitosa quanto as demais. Os alunos da primeira
etapa da pesquisa não tiveram bom desempenho nas duas questões da segunda avaliação
que trabalharam com esta situação-problema. Estas questões, inclusive, foram as principais
responsáveis por baixar a média em quase todas as séries. O impacto negativo desta situação-
problema foi menor nas turmas da segunda etapa porque se atentou a este aspecto na análise
de dados da primeira etapa e buscou-se dar mais atenção ao átomo de hidrogênio na segunda
etapa para uma melhor compreensão. A recomendação, neste momento, é que seja dado um
enfoque central a esta situação-problema no caso de pretender utilizá-la para o aprendizado de
conceitos de MQ.
No caso dos quatorze alunos da segunda etapa que apresentaram uma postura de
negação no questionário de conhecimentos prévios frente ao conteúdo a ser apresentado,
podemos verificar que o desempenho destes alunos foi muito próximo do dos demais, ainda
que inferior, mas ainda assim com uma diferença muita pequena. A média desses alunos foi
2,4%, 0,9% e 5,7% abaixo da dos demais alunos na primeira, segunda e terceira avaliação,
respectivamente. Isso sugere que a diferença de aprendizagem destes alunos em relação aos
demais é pequena, que a abordagem utilizada em sala de aula pareceu estimulá-los em parte
para a aprendizagem e que o conteúdo apresentado é capaz de promover interesse pela FMC,
bem como promover a atualização dos currículos do EM.
Acredita-se que, com os dados coletados e a análise feita no capítulo anterior, possa
se considerar que a aprendizagem dos alunos foi satisfatória e está no caminho certo para
promover a aprendizagem significativa, caso os alunos continuem seus estudos nesta área. O
incentivo dado aos alunos, desde o começo do curso, também auxiliou no processo de

144
apropriação dos conceitos trabalhados. Este estímulo pode ter sido fundamental para a criação
de uma autoeficácia do estudante acerca do estudo da MQ o que, por muitas vezes, não se vê
em sala de aula. Além disto, criou-se nos alunos a percepção de que existe um respaldo
científico para a descrição de fenômenos quânticos (e fora da FC). Ainda assim, seria muita
pretensão afirmar, neste momento, que ocorreu aprendizagem significativa em todos os alunos
em um curso de curta duração como este (aproximadamente 25 horas-aula). Os referenciais
utilizados, a Teoria da Aprendizagem Significativa e a Teoria dos Campos Conceituais, podem
ser considerados adequados para este estudo porque possibilitaram a elaboração de uma
proposta de ensino preocupada com a maneira com que os alunos deveriam aprender o
conteúdo e em como lidar com problemas de compreensão de certos conceitos e princípios
enfrentados no decorrer do curso. Ainda de acordo com as teorias utilizadas, a aprendizagem
significativa do campo conceitual da MQ só será efetivada no caso da exposição do aluno a
este campo por um expressivo período de tempo, através da maturidade, experiência e
aprendizagem (Vergnaud, 1982, p. 40), aliada à frequência (repetição e prática) de
apresentação do material instrucional ao aluno, de forma invariável e inequívoca (Ausubel,
2002, p. 185). Mesmo com todo o empenho e dedicação para que houvesse uma
aprendizagem adequada dos conceitos e princípios da MQ, ainda assim foi possível verificar
que as visões de alguns (não muitos) alunos não se modificam por conta de uma insistência
em resistir à apresentação de um novo conteúdo e de interpretá-lo de forma correta, já que
cada indivíduo possui uma forma idiossincrática de explicação dos fenômenos. Barais e
Vergnaud (1990, p. 74) afirmavam que isto poderia acontecer ao considerar que concepções
intuitivas tendem a persistir, mesmo após a apresentação de um novo conceito aos alunos.
Em todos os aspectos considerados, os resultados apresentados sugerem estar de
acordo com o exposto no primeiro capítulo desta tese, a saber, que é possível ensinar MQ no
EM. Apesar de parecer redundante, esta afirmação ainda é constantemente posta em
discussão, devido aos inúmeros problemas que o ensino de FMC enfrenta neste nível de
formação, seja pela falta de preparo dos professores, pela falta de material didático disponível,
pela carga horária insuficiente para a inserção de mais conteúdo, pela necessidade de
conhecimento prévio ou pela dificuldade matemática (Morais e Guerra, 2013).
Os problemas apontados por Terrazan (1992) há mais de vinte anos são totalmente
atuais frente ao vigente currículo de Física no EM e uma de suas frases soa como uma espécie
de profecia concretizada (op. cit., p. 211):

“O que não podemos é esperar a entrada do século XXI para iniciarmos a


discussão nas escolas da Física do século XX. Utilizando uma frase de um
colega pesquisador em ensino de física, Prof. João Zanetic da USP, é
fundamental que ‘ensinemos a física do século XX antes que ele acabe’".

A única forma de promover a inserção da FMC nos currículos do EM parece ser


através de tentativas devidamente fundamentadas e com muita coragem do corpo docente das

145
escolas envolvidas neste desafio. Os livros didáticos evoluíram desde a publicação do trabalho
de Terrazan, mas muitos professores ainda insistem em trabalhar os “temas clássicos”,
seguindo uma lógica de ensinar somente o que lhes foi ensinado, sem qualquer mudança nos
conteúdos, nas metodologias de aplicação e de avaliação e no currículo.
O que se defende nesta tese é que é possível fazer divulgação científica de qualidade
no EM e com razoável compreensão dos estudantes. A apresentação da MQ foi capaz de
levantar uma série de discussões dos alunos e instigá-los para a aprendizagem. Isto,
principalmente, porque ao trabalhar uma teoria como esta, ocorre a abordagem de princípios
totalmente incomuns ao cotidiano da grande maioria e uma nova teoria, como é o caso da MQ,
nasce de novos princípios.
Outro ponto de questionamento é apontado por Monteiro et al. (2009, p. 157):

“[…] questionamos até que ponto os demais cursos de formação de


professores de Física estão trabalhando a FMC em uma perspectiva que
possibilite ao futuro professor introduzir aquela na educação básica, em
uma perspectiva crítica em relação à ciência, à tecnologia, bem como quais
as consequências sociais delas. Até que ponto as universidades, enquanto
espaços de formação e difusão do saber, estão possibilitando que os
professores de Física em exercício reelaborem seus saberes acerca do
ensino da FMC e conduzam suas práticas em uma perspectiva dialógica?”

Assim, a discussão sobre a inserção da FMC no EM deve partir dos cursos de


formação de professores e este debate deve estimular o professor a lecionar e discutir tais
tópicos de forma clara e concisa para os alunos. Não se deve menosprezar a capacidade dos
alunos em compreender conteúdos de FMC. A grande questão aqui é a forma de abordagem
dos tópicos selecionados, em sala de aula (Ostermann e Moreira, 2001, p. 11). Não há uma
solução única para esta situação e a forma de tentar mudar é ir para a sala de aula e
experimentar diferentes técnicas para motivar os alunos e fazer com que se interessem pelo
aprendizado dos tópicos. Acredita-se que este debate deve estar presente nas disciplinas de
FMC em cursos de formação de professores, pois este é, possivelmente, o momento em que o
futuro professor irá refletir sobre a forma de trabalhar tais conteúdos no EM. A forma
expressivamente matemática e a abordagem conceitual quase inexistente com que este
conteúdo é seguidamente trabalhado em cursos de graduação impede uma formação mais
crítica deste profissional e pode torná-lo temeroso ou até incapaz para lecionar a FMC no EM.
Um professor deve idealmente estar apto a abordar conteúdos trazidos pelo aluno à sala de
aula e qualquer demonstração de interesse do aluno pela disciplina deve ser percebida como
uma situação de pré-disposição para aprendizagem, para que se busque a aprendizagem
significativa.
Foi possível perceber neste estudo que os alunos têm interesse em aprender tópicos
de FMC e trazem inúmeras perguntas e informações que escutam na televisão ou recebem

146
pela Internet. Os estudantes sofrem um bombardeio de informações em todos os ambientes e,
na maioria das vezes, não possuem uma bagagem conceitual adequada para analisar de forma
crítica o que lhes chega. É neste momento que a educação formal deve entrar em cena. Alguns
desses conhecimentos prévios, no entanto, podem ser considerados como subsunçores e ser
usados pelo professor para conduzir uma aprendizagem correta dos conceitos cientificamente
aceitos. Enquanto o EM tiver um currículo “engessado” e professores não aceitarem as
sugestões de conteúdo oriundas dos questionamentos dos alunos, dificilmente haverá alguma
mudança relevante na forma como o ensino de Física é visto pela sociedade. Há uma
necessidade imediata de mudança de postura nos cursos de Física do EM (Oliveira et al.,
2007), sempre lembrando que jamais se deve subestimar ou desvalorizar aquilo que o aluno já
sabe (Moreira, 2002, p. 21).
Outro ponto relevante percebido na pesquisa é que os alunos já estão condicionados
nas aulas de Física a memorizar fórmulas para usá-las ao resolver os exercícios e não há
qualquer tipo de questionamento conceitual ou, até mesmo, matemático para interpretação dos
fenômenos de interesse. Há certa matematização descontextualizada nas aulas de Física,
fazendo com que os alunos sejam pouco incentivados a escrever. Não se defende que a
matemática seja retirada das aulas de Física de EM, pois ela é a linguagem que permite ao
cientista estruturar seu pensamento para apreender o mundo, mas o ensino da ciência deve
propiciar meios para que os estudantes adquiram esta habilidade (Pietrocola, 2002, p. 105). O
que deve ser discutido é a atual ênfase na matematização, de modo a que se evolua para uma
relação dialógica entre discussões conceituais e exercícios matemáticos.
O material de apoio produzido neste trabalho, bem como as avaliações, testes rápidos,
questionários e mapas mentais, podem ser considerados adequados e foram bem aproveitados
pelos alunos no curso, podendo ter contribuído para a ocorrência de aprendizagem
significativa. A utilização destes materiais, no entanto, não tem o poder de promover a
aprendizagem significativa por si só, visto que eles são somente potencialmente significativos.
Há, ainda, a necessidade de se buscar outras condições para ocorrência de aprendizagem
significativa. Além disto, nos ambientes formais de ensino, a criação de um ambiente propício
para que os alunos se sintam confortáveis para questionar e levantar discussões sobre o
conteúdo apresentado é fundamental para sucesso em qualquer disciplina de EM. Sem esse
retorno dos alunos, o professor fica refém de sua confiança no aprendizado dos alunos e isto
pode nem sempre ocorrer. O professor, então, tem o papel de avaliar o aprendizado dos alunos
ao longo do processo educacional e deve lançar mão de diversas formas de avaliação para
que possa realmente verificar se os alunos estão compreendendo o conteúdo e de que forma
ocorre esta compreensão.
Há uma necessidade real, também, de se ter uma compreensão empática do professor
em relação aos alunos. Esta é uma característica que não se encontra na maioria das salas de
aula e é apresentada por Rogers (1977) como algo inerente ao facilitador da aprendizagem,
termo que ele utiliza para definir o professor. É importante que o professor assuma a condição

147
de se colocar no lugar do aprendiz, reconhecendo suas inseguranças e medos. Quando isto
acontece, o professor consegue ver meios de atingir a aprendizagem significante.
Em todas as etapas da pesquisa, tentou-se utilizar a compreensão empática e isto
pode ter auxiliado os alunos a aprender alguns dos conceitos apresentados, bem como a se
sentirem confortáveis ao externalizar o conteúdo e serem avaliados.
As soluções para o ensino de FMC no EM estão longe de ter uma proposta comum e
definitiva e os desafios parecem ser cada vez maiores, devido à quantidade de descobertas
científicas e de conceitos a que os alunos estão sendo expostos constantemente. É preciso,
para isso, que primeiramente se reconheça o problema. A MQ é uma teoria recente, mas que
foi construída e fundamentada há quase cem anos, não cabendo mais evitá-la no Ensino.
Outras teorias e outros conceitos como, por exemplo, os relacionados ao Big Bang e ao bóson
de Higgs, são temas presentes na atualidade e é preciso buscar essa contextualização para
que a Física não seja relegada a um segundo plano como disciplina no EM. Os alunos,
certamente, possuem curiosidade sobre estes assuntos, mesmo que de forma velada. Cabe à
comunidade científica e aos professores de Ciências trabalharem de forma a que se desperte a
curiosidade dos alunos desde as primeiras séries (Hamburger, 2007, p. 104) seguindo as
recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Resumindo, para que dificuldades de aprendizagem possam ser minimizadas em uma
proposta de ensino, faz-se necessário a consideração de pelo menos três fatores
preponderantes: a compreensão empática, o interesse dos alunos pelo conteúdo ministrado e a
diversidade de instrumentos de avaliação. Esses fatores não levam a uma solução infalível,
mas conduzem a resultados interessantes e que promovem uma alfabetização científica
satisfatória.

148
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Zhu, G.; Singh, C. (2011). Improving students’ understanding of quantum mechanics via the
Stern–Gerlach experiment. American Journal of Physics, 79(5): 499-507.

Zhu, G.; Singh, C. (2012). Surveying students’ understanding of quantum mechanics in one
spatial dimension. American Journal of Physics, 80(3): 252-259.

158
APÊNDICES

158
APÊNDICE I

TEXTO DE APOIO

Fundamentos de Mecânica Quântica

1. Introdução

Uma nova Física, um novo mundo, fenômenos nunca antes observados, os fenômenos
quânticos, começaram a surgir aos nossos olhos no início do século XX. Primeiro foi a noção de
pacotes de energia (Max Planck, 1900), que resultaram no que hoje é chamado de fótons, dando à
luz um caráter corpuscular (Albert Einstein, 1905). Depois, foi a conscientização de que as ondas
eletromagnéticas em geral (não só a luz) apresentavam aspectos tanto corpusculares como
ondulatórios e a sugestão de que também a matéria, elétrons por exemplo (Louis De Broglie,
1924), apresentasse as duas características, o chamado caráter dual da matéria. Para explicar
estes e outros aspectos estranhos que objetos de pequenas dimensões apresentavam, como é o
caso de níveis de energia discretos dos átomos, foi necessário estabelecer-se uma nova Teoria
(Werner Heisenberg, Erwin Schrödinger, 1925), porque a Física Clássica com suas leis, até então
consideradas de validade ampla e (quase) irrestrita, mostrou-se incapaz de fazê-lo. A Teoria que
vem explicando com sucesso os fenômenos do mundo microscópico e que vem, até, predizendo
consequências surpreendentes comprovadas por experimentos, é a Mecânica Quântica (MQ) (no
caso, não relativística).
Imagine, então, um mundo onde os objetos apresentam uma probabilidade de estar em
mais de um lugar ao mesmo tempo, mesmo encontrando obstáculos energéticos para atravessar,
como se fantasmas fossem, onde dois objetos podem estar fortemente correlacionados, mesmo
se um deles estiver aqui e o outro em outra galáxia, entre outros aspectos fantásticos. Estes
fenômenos poderiam ser considerados como absolutamente absurdos, pelo que observamos no
nosso cotidiano, mas não o são se incorporarmos a este o mundo dos átomos, elétrons e de
muitas outras partículas pequeníssimas, enfim, o mundo das partículas quânticas, regido pela MQ.
Inúmeros fenômenos que jamais imaginaríamos ocorrer, constituem-se em previsões da
MQ, teoria que se desenvolveu na primeira metade do século XX e que ainda hoje conduz a
importantes implicações tecnológicas, tais como a Criptografia, a Computação e o
Emaranhamento Quânticos, além de possibilitar, por exemplo, a construção de dispositivos de
pequenas dimensões capazes de armazenar muita informação.
Pela falta de familiaridade com os eventos que a MQ descreve, torna-se muito importante
analisar os seus primeiros princípios e obter uma boa compreensão do significado de seus
conceitos fundamentais, para que não sejam interpretados e utilizados erroneamente.
A dimensão da importância da MQ supera o que normalmente se esperaria de uma Teoria
Física, pois abre caminhos verdadeiramente revolucionários para o conhecimento científico e
modifica a nossa visão sobre o mundo e o universo em geral.
Alguns dos assuntos aqui abordados serão apresentados com auxílio de simulações, que
se encontram disponíveis para acesso via computadores conectados à Internet.

2. Somando Ondas, Vetores e Estados

Antes de penetrar no mundo da MQ, vamos nos ater à discussão de algumas


propriedades de sistemas a serem utilizadas para um proveitoso aprendizado dos conteúdos
apresentados. Assim, para a discussão dos experimentos de dupla fenda, que muito revelam
sobre o comportamento das partículas quânticas, é importante analisar alguns aspectos
relacionados a ondas e a vetores geométricos.

Somando Ondas

Em Física, ondas são perturbações que se propagam em geral em meios (água, sólidos) e
até no vácuo e que são de naturezas variadas.
Ao somar ondas, resultam fenômenos de interferência, podendo esta ser construtiva ou
destrutiva. Quando duas ou mais ondas se somam o resultado é, também, uma onda, que é uma
superposição linear das ondas iniciais.

159
Em Matemática, temos duas funções que são utilizadas com bastante frequência e que se
apresentam como representação gráfica de uma onda: a função seno e a função cosseno. A figura
1 mostra o gráfico das funções sen(x) e cos(x), com x variável real.

(a) (b)
Figura 1. (a) sen(x); (b) cos(x).

Em geral, ondas são representadas por certas funções. As funções seno e cosseno, assim
como as que representam outras ondas, podem ser somadas gerando novas funções (ondas) ou,
em certos casos, até anulando-se completamente. Desta forma, podemos construir determinadas
ondas convenientemente, através de superposição linear (soma) de outras. Alguns exemplos são
ondas triangulares, ondas quadradas e ondas dente-de-serra, muito utilizadas em Eletrônica e
mostradas na figura 2. Estas ondas são construídas a partir de somas específicas de outras
ondas.

Figura 2. (a) onda triangular; (b) onda quadrada; (c) onda dente-de-serra.

As ondas dente-de-serra, por exemplo, são obtidas de:


sen kx 

f x   
2
.
 k 1
k
Se somarmos apenas os primeiros cinco termos da função f(x) considerada poderemos
perceber a tendência da figura em se aproximar da onda dente-de-serra (figura 3).

1,5

0,5

0
0 2 4 6 8 10 12 14

-0,5

-1

-1,5

Figura 3. Representação gráfica dos cinco primeiros termos da onda dente-de-serra

Exercício: Procure reproduzir alguns dos pontos mais significativos da figura acima.

Exercício: Trace os gráficos das funções ondulatórias


i) sen(x), ii) cos(x), iii) sen(x+), iv) cos(x+),
no intervalo e construa as superposições
a)i + ii, b)i + iii, c)i + iv, d)ii + iii, e)iii + iv.

Outro exemplo de soma de ondas bastante observado é o das ondas do mar. Por
inúmeras vezes, as ondas do mar se superpõem formando ondas maiores ou, dependendo da
situação, até anulando-se.

160
Para “manipular” a superposição de ondas podemos, por exemplo, trabalhar com uma
*
simulação em computador do “Física 2000”, denominada “Somando Ondas” .

1, se 0  x  1, 2  x  3, 4  x  5
Exercício: Faça um gráfico da função f ( x )   .
0, se 1  x  2, 3  x  4, 5  x  6

Reflita: A função f(x) acima pode ser encarada como uma superposição linear de ondas?

Da mesma maneira podemos pensar que funções (ondas) mais simples podem resultar da
decomposição de funções mais complicadas (ondas mais distorcidas).
Verificamos, assim, que as ondas (funções) consideradas são dotadas de uma operação
de soma – tal que a soma de duas ondas (funções) é uma onda (função)– e de uma operação de
multiplicação por número – tal que a multiplicação de uma onda (função) por um número é uma
onda (função).

(a)

(b)

(c)

Figura 4. Intensidade das funções (a) sen(x); (b) cos(x); e (c) sen(x) + cos(x).

Nas ondas da figura 1 podemos destacar o comprimento de onda () e a amplitude (A). As
intensidades destas ondas ( Is  senx  e Ic  cosx  ) estão representadas nas figuras 4a e 4b,
2 2

respectivamente, e a intensidade da soma das duas ondas ( I  senx   cos(x) ) na figura 4c.
2

Reflita: Por que o valor máximo da intensidade na figura 4c é igual a 2?


Reflita: Qual a relação da intensidade da soma das funções seno e cosseno (I) com a soma das
intensidades das funções seno e cosseno?

Exercício: Determine um valor de x para o qual a intensidade da figura 4c se anula e um valor de


x em que seja máxima.

Somando Vetores do Plano Real

Outro exemplo de superposição linear muito encontrado, tanto em Matemática, como em


Física, refere-se a conjuntos de grandezas vetoriais. Assim, em Física, podemos citar velocidades,
acelerações e forças, entre tantas outras grandezas vetoriais conhecidas.
Para exemplificar algumas propriedades importantes destes conjuntos, podemos recorrer
2
a vetores do plano real (R ) – vetores expressos em duas dimensões, sendo módulo
(comprimento), direção e sentido, informações a respeito dos mesmos.

*
Física 2000: http://www.maloka.org/fisica2000/

161

U


v1 
V

v2

Figura 5. Representação de vetores do plano.


 1
A figura 5 mostra que podemos expressar um vetor V como soma de dois outros,
   
V  v 1  v 2 e também um vetor U como combinação linear mais geral dos vetores,
  
U  c 1v 1  c 2 v 2 , em que c1 e c2 são números reais.
Verificamos, assim, que os vetores representados possuem uma operação de soma – tal
que a soma de dois vetores do plano é um vetor do plano – e uma operação de multiplicação por
número – tal que a multiplicação de um vetor do plano por um número é um vetor do plano.
Além destas propriedades (necessárias), verificamos que os vetores satisfazem também
as seguintes propriedades.
   
1. v 1  v 2  v 2  v 1 (comutativa);
     
2. v 1  (v 2  v 3 )  (v 1  v 2 )  v 3 (associativa);
   
3. c(v 1  v 2 )  cv 1  cv 2 (distributiva), sendo c um escalar;
  
4. (c1  c 2 )v  c1v  c 2 v (distributiva);
 
5. (c 1c 2 )v  c 1(c 2 v ) (associativa);
     
6. Existe e é único o vetor nulo v 0 , que satisfaz v 0  v  v  v 0  v ;
 
7. 1 v  v ;
 
8. 0  v  v 0 .
Estas propriedades são também satisfeitas pelas ondas que se superpõem linearmente,
embora vetores do plano e ondas sejam entidades muito diferentes.

Reflita: O que há de comum entre ondas e vetores do plano?

 
Exercício: Considerando os vetores v 1 e v 2 abaixo
 
v1  (2,0) v 2  (2,3) ,
represente no gráfico ao lado :
     
a) v 1 + v 2 b) 2 v 1 +3 v 2 c) – v 1 + v 2 .

Os Experimentos de Dupla Fenda – As Primeiras Estranhezas

Nossa viagem pelo mundo quântico começa com os experimentos


de dupla fenda.
Estes experimentos estão entre os exemplos mais claros e simples de visualização de
fenômenos quânticos. Utiliza-se para fazê-los, em geral, uma fonte de ondas ou partículas, um
anteparo com duas fendas e um segundo anteparo para efeitos de registro. Quando o experimento
é realizado com uma fonte que emite ondas eletromagnéticas (luz, por exemplo) – Experimento de

1
A soma de dois vetores segue uma regra bem definida, a saber, a regra do paralelogramo.

162
Young –, obtém-se um padrão com franjas de interferência, como o da figura 6. Similares são os
*
padrões encontrados com ondas de água e de som. (Ver simulações em PhET .) As manchas
escuras no segundo anteparo se referem às regiões em que ocorre interferência construtiva (onde
a intensidade da onda resultante é grande) e as manchas claras às regiões de interferência
destrutiva (onde a intensidade da onda resultante é pequena ou nula). (Ver simulação em “Física
2000”.)

Figura 6. Padrão de interferência obtido no experimento de dupla fenda com luz.

Reflita 1: Qual a ligação entre a superposição de ondas e o resultado do experimento de dupla


fenda com ondas eletromagnéticas?
Reflita 2: O que se origina na superposição de cristas de ondas? E na de vales de ondas? E na
de crista e vale?

Se a fonte do experimento emitir partículas macroscópicas (como projéteis atirados por


uma metralhadora, por exemplo), observaremos um padrão bem diferente do das ondas. Veremos
duas franjas bem destacadas no segundo anteparo, conforme apresentado na figura 7. Os pontos
escuros se referem às regiões atingidas pelos projéteis.

Figura 7. Experimento de dupla fenda com partículas macroscópicas.

Reflita 1: O que são os pontos escuros no segundo anteparo?


Reflita 2: Os resultados apresentados na figura 6 lhe parecem razoáveis? Por quê?

Os experimentos acima utilizam ondas e partículas clássicas. O que acontece, porém, se


usarmos no experimento uma fonte de elétrons, por exemplo? Intuitivamente, poderíamos crer na
ocorrência de um padrão como o da figura 6. Afinal os elétrons são porções de matéria assim
como as balas da metralhadora. Mas os elétrons são muito menores que as balas de
metralhadora. De fato, são objetos quânticos e, por isso, não é seguro confiar em nossa “intuição
clássica” para predizer os resultados. A figura 8 mostra o padrão de contagens obtido neste caso.
Vê-se que ele é muito parecido com o padrão de interferência das ondas, embora represente o
número de elétrons que chegam ao segundo anteparo. Mas se os elétrons são partículas, como
isso é possível? Estará ocorrendo interferência de uns com outros, a exemplo do que ocorre com
ondas?

*
Physics Education Technology: http://phet.colorado.edu/new/simulations/

163
Para entender este fenômeno, que a Física Clássica não explica, foi necessário
desenvolver uma nova teoria: a MQ. A explicação do experimento exige alguns conceitos (e
termos) não comuns a partículas clássicas, como superposição linear de estados, amplitude de
probabilidade e função de onda. O padrão da figura 8 é, em geral, obtido com uma fonte de alta
intensidade que emite muitas partículas de uma só vez. (Ver simulações em “Física 2000” e em
“PhET”.)

Figura 8. Experimento de dupla fenda com partículas quânticas.

Reflita 1: O que significa a faixa central ser mais densa que as laterais, no segundo anteparo?
Reflita 2: O que são os pontos escuros no segundo anteparo?
Reflita 3: O que você esperaria obter no segundo anteparo depois de a fonte enviar dez elétrons?

Contudo, imagine agora que a fonte está emitindo um único elétron a cada vez, ou seja,
um novo elétron só é emitido após o registro da contagem do elétron anterior no segundo
anteparo. Que padrão de contagens aparece, após um tempo muito longo? O da figura 7 ou o da
figura 8? Por estranho que possa parecer, a resposta é: ainda o da figura 8. O fenômeno quântico
desafia novamente nossa expectativa! Como é possível gerar padrão de interferência sem ocorrer
interação entre os elétrons?
Para responder a estas (e outras) perguntas sobre o comportamento de objetos quânticos,
a MQ nos apresenta um conjunto de princípios diferentes dos da Física Clássica.
Aliás, não apenas elétrons, mas também prótons, nêutrons, átomos e mesmo moléculas
de grande porte (como o fulereno, que é composto por 60 átomos de carbono) mostram este
comportamento.

Reflita: Como você justificaria os padrões de interferência no experimento de dupla fenda com
objetos microscópicos?

Espaços Vetoriais

Os conjuntos de ondas e também os conjuntos de vetores apresentados, que se


superpõem linearmente, formam o que chamamos de espaços vetoriais.
Como o experimento de dupla fenda (entre outros) nos mostra, também para sistemas
quânticos temos consequências explicadas pelas regras de soma e de multiplicação por número.
Considera-se, então, que valem aí propriedades de espaços vetoriais.
Isto conduz, então, a que conceitos típicos de espaços vetoriais, como os de vetores,
operadores, autovetores e autovalores, estejam na base do formalismo da MQ. Não se assuste,
tais conceitos serão abordados adiante.

Descrevendo Sistemas Físicos

Qual a diferença entre um projétil quando está em repouso dentro de uma caixa e quando
é atirado por uma metralhadora? E qual a diferença entre uma criança com 36,5°C de temperatura
e a mesma criança com 40°C? Que consequências podem estas diferenças trazer?

164
Podemos simplesmente dizer que nos dois exemplos temos estados diferentes de um
mesmo objeto, corpo, sistema. Contudo, como percebemos, as consequências das diferenças de
estado podem ser bastante diversas. É importante, então, conhecer o estado dos sistemas físicos.

Reflita: Como descrever o estado de um objeto clássico?

Exercício: Escolha um objeto clássico e caracterize um estado possível do mesmo.

Assim como para objetos clássicos, é importante conhecer os estados dos objetos
quânticos.

Exercício: Caracterize dois estados possíveis de um elétron.

Podemos entender o estado de um sistema físico como o conjunto de (informações sobre


os) valores das grandezas físicas associadas ao sistema.
Analisemos a experiência de dupla fenda para elétrons quando a modificamos fechando
alternadamente uma ou a outra das fendas e comparemos seus resultados com os da situação em
2
que as duas fendas estão abertas. (Ver simulações em Falstad ). Observamos que a soma das
intensidades dos dois primeiros casos não é igual à intensidade da soma das duas situações de
uma fenda cada. Ver figura 9.
A experiência de dupla fenda para elétrons indica que estados dos elétrons (sistemas
quânticos) se superpõem linearmente (como ondas e vetores geométricos, lembram?). Este é um
dos principais pilares da MQ. (Muitos autores, inclusive, denominam os estados de vetores de
estado.)
A teoria quântica afirma que, se temos dois estados possíveis para um sistema quântico,
uma soma dos dois estados é também um possível estado do sistema. Essa soma é a chamada
superposição linear de estados.

3
Figura 9. Gráficos de intensidade para experimentos de fendas simples e dupla para elétrons.

Reflita: Por que podemos dizer que quando as duas fendas estão abertas temos uma soma dos
estados dos casos de uma fenda?

Sistemas quânticos são aqueles que satisfazem as leis da MQ, que são diferentes das da
Mecânica Clássica. Já o conceito de estado quântico, tido como fundamental na nova Mecânica –
e apesar do termo estado possuir diferentes concepções – é, em princípio, basicamente o mesmo
que na Física Clássica, embora apresente características peculiares.
Assim, por exemplo, um elétron pode estar ligado a um átomo ou estar livre. Temos aí
dois estados diferentes possíveis para o elétron. Para conhecer o estado de um sistema quântico,
devemos conhecer o valor das grandezas físicas associadas a ele. Ainda no exemplo do elétron,
se ele estiver livre, pode ter uma energia pequena ou muito alta (aceleradores de partículas).
Neste caso, o estado do elétron deve estar caracterizado pelo menos pela grandeza física energia.
Então, existem ou não diferenças entre as caracterizações de estados de objetos
clássicos e estados de objetos quânticos (além do objeto ser diferente)? Sim, como detalharemos

2
Falstad: http://www.falstad.com/mathphysics.html
3
Greca, I. M., Herscovitz, V. E. Introdução à Mecânica Quântica. Notas de Curso. Texto de apoio, v. 13.

165
depois, existem. Os estados dos objetos clássicos são caracterizados, em princípio, pelos valores
de todas as grandezas físicas relacionadas aos objetos. Já para caracterizar os estados dos
objetos quânticos podemos relacionar apenas os valores de certas grandezas físicas
(observáveis), aquelas que são ditas compatíveis.
O observável é a grandeza física cujos valores são passíveis de determinação (energia,
posição, momento linear, spin, etc.). Quando dois observáveis são compatíveis, é possível obter
informação sobre valores de um deles sem alterar a determinação de valores do outro. O estado
de um sistema quântico pode, então, ser caracterizado pelos valores de ambos.
Uma maneira de simbolizar o estado de um objeto quântico é a que recorre à notação de
*
Dirac. Nesta notação, o estado é usualmente simbolizado por (ket) , acrescido de uma
característica interna (por exemplo, Energia ).
Tal notação pode também ser usada para descrever estados de objetos clássicos,
embora ali seja menos útil. Um exemplo pode ser o de um paciente internado em um hospital.
Suponhamos que em seu primeiro boletim médico, quando foi internado, conste que sua
temperatura é 38ºC e seja constatado um estado gripal. O segundo boletim médico, um dia
depois, informa que sua temperatura é de 39°C e foi diagnosticada gripe A. No décimo dia (após o
tratamento), o paciente está com 36,5ºC e obtém alta hospitalar. Utilizando a notação de Dirac,
podemos descrever os estados do paciente conforme cada boletim médico. O primeiro estado
informa paciente, 1º dia  38º C, gripe , o segundo diz paciente, 2º dia  39º C, gripe A e o
terceiro, paciente, 10º dia  36,5º C, recuperado . (Contudo observe-se que não ocorre (não
existe) neste caso um estado ( ..., Gripe A  ..., recuperado ) do paciente, em um dado instante de
tempo.
Tal notação pode ser usada para denotar estados de outros sistemas. Assim, para os
vetores do plano apresentados na figura 5 teremos, além de estados v1 , v 2 , inúmeras
combinações lineares U  c 1 v 1  c 2 v 2 . Também para ondas, os estados sen x  e cosx 
geram inúmeros estados possíveis de ondas ( a senx   b cosx  ).
Analogamente, se estivermos tratando de sistemas quânticos, podemos introduzir as
características de cada estado do sistema no vetor de estado (ket) correspondente. Assim,
F1  Possível passagem pela fenda 1 e F2  Possível passagem pela fenda 2 podem
gerar, no caso dos experimentos de dupla fenda, estados F  F1  F2 , para elétrons registrados
no segundo anteparo.

Sistemas Binários

A dupla fenda do experimento com elétrons exemplifica de forma simples, um sistema


binário.
Sistemas binários podem ser descritos em espaços (complexos) de dimensão dois, em
que são necessários (e suficientes) dois estados (vetores) linearmente independentes (não
proporcionais um ao outro) para construir qualquer estado.
Outros sistemas de mesma dimensão, frequentemente considerados em física quântica e
de grande importância devido às suas aplicações, são encontrados em Computação Quântica
(para os bits quânticos) e no estudo e descrição do spin do elétron (e do próton e do nêutron, entre
outros sistemas).

Bits Quânticos

Em um computador clássico, por exemplo, a informação é processada em um sistema


binário, representando-se seus elementos por 0 e 1. Em tal computador o bit clássico, que é a
menor unidade de informação, se apresenta ou no estado 0 ou no estado 1 . Já em um
computador quântico, em princípio, além dos estados 0 e 1 , existem estados que são

*
A denominação “ket” e a notação decorrem de “partir ao meio” o símbolo de produto escalar entre dois vetores,

  (bracket em inglês).

166
superposições lineares desses abrindo, assim, para uma unidade de informação simultaneamente
dois canais de processamento, uma vez que o bit quântico (qubit) pode estar também em estados
  2
  c1 0  c 2 1 , com 0  c1  1 , 0  c 2  1 e c1  c 2
2
 1.

Exercício: O que significa  


1
0 
 1 para bits quânticos?
2

Spin e Experimento de Stern-Gerlach

Outro importante exemplo de um sistema binário pode ser fornecido pelo spin do elétron.
O spin é uma propriedade dos sistemas físicos (uma grandeza física), cuja existência e
importância foram reveladas em análises de sistemas quânticos. Seus efeitos, contudo, aparecem
também em sistemas macroscópicos como, por exemplo, nos materiais ferromagnéticos.
Uma das experiências mais importantes relativas a este observável, que possibilita a
observação de consequências dos diversos postulados da MQ, é o experimento cujo esboço é
apresentado na figura 10.
O arranjo do experimento de Stern-Gerlach (Otto Stern e Walther Gerlach, 1921),
conforme esquematizado na figura 10, inclui um forno em que se aquece e vaporiza o material a
estudar, um colimador por onde passa o material vaporizado e um campo magnético fortemente
inhomogêneo em uma dada direção, ao qual é submetido o material que é, finalmente, registrado
em um anteparo. Stern e Gerlach recorreram ao metal prata, verificando que os átomos se situam
em dois grupos distintos no anteparo, como mostrado (de forma ampliada) na figura. O efeito pode
ser entendido, ao menos qualitativamente, se o sistema possuir momento angular. Como de fato
no átomo de prata somente um elétron contribui para tal, e este elétron tem momentum angular
orbital nulo, foi necessário pensar-se na existência de momento angular de outra natureza, isto é,
não orbital.

Figura 10. Experimento de Stern-Gerlach.

Surgiu, então, um observável novo na teoria quântica, o momento angular intrínseco (do
elétron) ou, simplesmente, spin (do elétron).
O resultado do experimento de Stern-Gerlach mostra que existem somente dois estados
possíveis na direção do campo magnético (que chamaremos de direção z, por ora) para a
projeção do spin do elétron. Podemos associar, então, a cada projeção do spin do elétron, um
estado correspondente. Cálculos do momento magnético gerado pelo momento angular intrínseco

( s ) do elétron mostram que o spin só tem duas projeções possíveis na direção do campo
magnético (   e   ) que denominamos simplesmente de “spin-para-cima” e “spin-para-
2 2
baixo”. Diz-se, então, que o spin do elétron é ½. Os estados associados às mencionadas
projeções do spin podem ser representados por  e  .

Sistemas Não Binários

167
Existem sistemas quânticos de grande interesse que não são binários. Assim, quando
estudamos os valores das energias emitidas por átomos que foram aquecidos ou sofreram
colisões, verificamos a existência de espectros discretos de energia. A figura 11 apresenta as
linhas do espectro de emissão do átomo de hidrogênio na parte do visível. Este é o átomo mais
simples existente, que é constituído por um elétron e um próton.

Figura 11. Parte visível do espectro de emissão do átomo de hidrogênio.

3. Quais os Principais Fundamentos da Teoria que Explica com Sucesso os Fenômenos


Quânticos?

Toda teoria física possui um conjunto de postulados, isto é, afirmações sem demonstração
que são supostas verdadeiras, de que decorrem consequências que devem estar de acordo com
fenômenos naturais observados e com resultados experimentais determinados. Para a MQ não
relativística não é diferente podendo-se dizer, no mínimo, em favor desta teoria, que ela apresenta
um pequeno número de suposições e conduz, com enorme sucesso, a resultados observados – a
maioria dos quais surpreendentes – para sistemas microscópicos (e alguns nem tanto). É,
portanto, uma excelente teoria física no seu domínio de validade.

Somar Estados é uma Consequência da MQ?

Podemos verificar (como no caso do experimento de dupla fenda com elétrons) que a
superposição de estados quânticos resulta em um novo estado quântico, mas esta verificação não
constitui uma prova de tal propriedade. Por isto, na origem da MQ se encontra (sem
demonstração) a afirmação: os estados de um sistema quântico satisfazem o princípio da
superposição linear. É importante salientar que esta propriedade permite a construção de
inúmeros estados para o mesmo sistema ou objeto, a partir da existência de apenas alguns. Na
prática esta propriedade gera várias situações físicas interessantíssimas e, ao mesmo tempo,
intrigantes. Como exemplo, temos o efeito não-local do Emaranhamento Quântico, que pode
conectar sistemas separados por distâncias muito grandes.
No experimento de dupla fenda, como vimos, o estado F  F1  F2 é o responsável
pelo padrão de interferência no segundo anteparo da figura 8. Observemos que tanto F1 como 2
F1 ou c F1 (c, um número qualquer real ou complexo), descrevem o mesmo estado do elétron,
qual seja o da localização no segundo anteparo, do objeto caracterizado pela passagem pela
fenda superior. Por isto, em MQ é usual denotar os estados por vetores unitários, isto é, vetores
de módulo (ou comprimento) igual a 1 (um). Neste caso, se F1 e F2 são vetores unitários, F
não é unitário e por isto costumamos representar a superposição da situação da experiência de
dupla fenda para objetos quânticos, quando a fonte está disposta simetricamente em relação às
fendas, por  
1
 
F1  F2 . Na superposição de estados, cada conjunto de coeficientes
2
(chamados amplitudes de probabilidade) gera um estado particular.

Reflita 1: Por que 2 F1 descreve o mesmo estado que F1 ?


Reflita 2: A superposição de estados é uma consequência ou uma imposição na Teoria Quântica?

No caso do experimento de Stern-Gerlach descrito anteriormente, todos os átomos de


prata são preparados do mesmo modo mas, ainda assim, após passar pelo campo magnético
inhomogêneo, os átomos se agrupam em duas faixas. Como o estado inicial resultou em estados
associados às duas faixas, (  e  ), a consequência lógica é que o estado inicial do elétron
visado dos átomos de prata usados no experimento é, na verdade, uma superposição dos estados

168
 e  . Um tal elétron deste experimento pode estar, por exemplo, no estado

 
1
 
  .
2

O que entendemos por estado de um objeto físico?

Consideremos um cubo de gelo do congelador do refrigerador. Ele é, em geral, um objeto


de forma quase regular, semitransparente, de temperatura abaixo de zero centígrado e sólido. Se
a temperatura do congelador for mantida constante, o cubo será um objeto razoavelmente estável.
Se, contudo, o cubo for retirado do congelador e colocado em um copo à temperatura ambiente,
digamos 22°C, ele "derreterá" tornando-se, após algum tempo, um objeto com características
diferentes. O objeto agora será líquido, quase transparente, com temperatura próxima à do meio
em que se encontra e tomando a forma do recipiente em que se encontra. O objeto é o mesmo,
mas seu estado de agregação mudou. Se o líquido, agora denominado água e não mais gelo, for
aquecido convenientemente, o objeto passará a outro estado de agregação, o estado gasoso.
Teremos o chamado vapor d’água, estado que, por um abaixamento da temperatura se
transformará em estado líquido.
As características destes três conjuntos são diferentes, embora se trate basicamente do
mesmo objeto; a diferença está no estado de agregação (devido à temperatura) do objeto. O que
têm em comum o gelo, a água e o vapor d’água? Todos são conjuntos de moléculas de H 2O.
Então o objeto é um conjunto de moléculas do mesmo tipo, mas em três estados diferentes,
porque se agregam diferentemente, em função da temperatura. E estas moléculas, quase
desagregadas no estado de vapor podem, por sua vez, ser estados de algum conjunto de objetos
mais elementares? A resposta é sim. Estas moléculas são conjuntos de dois átomos de hidrogênio
16
(H) com um átomo de oxigênio (O ), em um estado em que os átomos se encontram juntos, como
um pacote. Existem meios para separar estes átomos e quando estão separados ter-se-á um
outro estado do que antes era a molécula H2O. Podemos seguir adiante com este raciocínio e
separar por processos adequados os átomos de hidrogênio em elétrons e prótons, e os átomos de
oxigênio dezesseis, em elétrons, prótons e nêutrons, (oito elétrons, oito prótons e oito nêutrons
cada átomo). Este conjunto agora não é mais um átomo. O conjunto está em outro estado.
O conceito de estado não é usado apenas para caracterizar distintos estados de
agregação da matéria. De fato, usamos tal conceito em situações bastante distintas desta. Por
exemplo, quando uma mãe diz ao filho que saiu de casa limpinho, bem penteado, com roupa
impecável e que voltou sujo de barro, com a roupa amassada e talvez até rasgada e despenteado:
“Que horror, olha só em que estado te encontras!”
De fato o "objeto" é o garoto, mas as características do mesmo mudaram.
O que podemos então entender por estado de um objeto, em Física (e no nosso senso
comum)? Talvez se possa dizer que o estado de um objeto (ou de um sistema ou um conjunto de
objetos) é um particular conjunto de valores de propriedades que podem ser determinadas,
associadas ao objeto.
Em nosso cotidiano, podemos observar diretamente a maioria destes valores. Podemos
ver que o menino que usava uma camiseta limpa está depois com a camiseta suja, que estava
inicialmente penteado e agora está com o cabelo desarranjado, ou seja, muitas vezes não
determinamos quantitativamente a diferença entre os estados do mesmo objeto, mas
qualitativamente. Em outras ocasiões, utilizamos instrumentos para verificar se houve ou não
mudança nos valores das grandezas físicas. Assim, para saber se a temperatura de uma pessoa
doente está alterada, recorremos a um termômetro para medir o valor desta característica. Há
também observações mais difíceis de fazer, que exigem equipamentos mais sofisticados (e caros).
Para determinar se uma pessoa está com alterações no estado de um dos pulmões, pode-se
recorrer a exame radiográfico, ou tomografia, ou punção, ou até cirurgia.

Exercício 1: Agora que entendemos o que significa “estado de um objeto ou sistema”, apresente
dois exemplos de sua livre escolha de objeto (ou sistema) e de três estados diferentes de cada
um.
Exercício 2: Examine uma caneta que você possui. Descreva um estado desta caneta, da
maneira mais completa que conseguir. Escreva e traga a descrição e a caneta para a aula. Vamos
fotografar a caneta e verificar quão cuidadoso (minucioso) você foi ao descrever o estado da
caneta.

169
Objetos quânticos

Nos exemplos citados, consideramos objetos grandes – macroscópicos - (caneta,


camiseta, menino) e pequenos – microscópicos - (moléculas, átomos, elétrons). Em geral os
objetos grandes satisfazem as leis da física clássica enquanto os pequenos, não satisfazem tais
leis, mas seguem as leis da física quântica. O tamanho do sistema não é um indicativo absoluto de
quais leis eles seguem, mas em um primeiro momento serve como guia, para colocarmos o objeto
ou no cesto da Mecânica Clássica ou no cesto da MQ.
A MQ estuda os estados dos sistemas quânticos (em geral muito pequenos, muito
menores do que um grão de areia, por exemplo). Então em MQ se quer conhecer o estado de um
sistema quântico e a partir daí responder a várias perguntas sobre o sistema. Pelo menos esta é a
pretensão desta teoria.
Do que vimos acima é válido concluir que em MQ podemos impor que: a cada estado de
um sistema quântico corresponde um vetor de estado.

Medições em MQ

Como se pode, então, conhecer o estado de um sistema quântico? Tanto para objetos
clássicos, como para quânticos, conhecer o seu estado implica em medir as grandezas físicas que
caracterizam o objeto em uma dada instância. A medida inclui a observação feita ou simplesmente
por uma pessoa ou com o auxílio de algum equipamento. Ocorre, porém, aí, uma grande diferença
entre a consideração de estados de sistemas clássicos e estados de sistemas quânticos.
Enquanto para sistemas clássicos, medidas das grandezas físicas realizadas com instrumentos e
de modo adequados não mudam o estado do sistema, no caso quântico isto não ocorre na maioria
das vezes e não por defeitos de projeto ou uso inadequado de medidores.
De fato, as medidas de grandezas físicas que caracterizam o estado de um objeto, em
geral modificam o estado do objeto quântico.
Veja-se, por exemplo, o que ocorre na experiência de dupla fenda para elétrons, em que
se tem um padrão de contagens no segundo anteparo muito parecido ao padrão de interferência
do experimento com ondas. A figura de interferência é obtida ao se manter as duas fendas do
primeiro anteparo abertas simultaneamente; se nos perguntarem por qual fenda os elétrons
passaram não saberemos responder, pois se fechada alternadamente cada uma das fendas, o
padrão de interferência não ocorre.
Quem sabe, então, se mantendo as duas fendas abertas, mas observando a região entre
os dois anteparos (ou seja, a região atrás do primeiro anteparo), seria possível verificar por qual
das duas fendas o elétron passou? Poderíamos, por exemplo, usar uma fonte luminosa para isto?
Essa ideia foi usada, mas novamente a figura de interferência não se formou (figura 12). É como
se o elétron soubesse que estava sendo observado e, por isso, resolveu comportar-se de forma
diferente.

Figura 12. Padrão de contagens no experimento de dupla fenda para elétrons com fonte de luz.

Na verdade, isto não tem qualquer relação com uma possível capacidade racional do
elétron de perceber que o observam. O mais correto é considerar que a medida é uma operação

170
que, quase sempre, muda o estado do objeto quântico. No exemplo acima, o clarão indica que o
elétron colidiu com um fóton do feixe luminoso, sofrendo espalhamento, ou seja, mudando seu
estado. (Ver simulação em “PhET”.)

Reflita: Por que a presença da fonte luminosa atrás das fendas provocou um resultado diferente
no segundo anteparo?

Exercício: Procure algum (outro) exemplo de medida de uma propriedade de sistemas quânticos
que modifique o estado do sistema.

Algumas medidas, contudo, podem não mudar o estado do sistema quântico. Retomando
o experimento de Stern-Gerlach sabe-se que (após passar pelo campo magnético inhomogêneo)
ao serem registrados no anteparo, os átomos de prata estarão ou no estado de “spin-para-cima”
ou no estado de “spin-para-baixo”. Se submetermos logo após a primeira medida o feixe
caracterizado pelo estado de “spin-para-cima” a um segundo campo magnético, idêntico ao
primeiro, apontando na mesma direção, todos os átomos do feixe permanecerão no estado de
“spin-para-cima”. Neste caso, a medida não modificou o estado do sistema. Ou seja, após passar
pelo primeiro campo magnético inhomogêneo, os átomos daquele feixe estarão no estado de
“spin-para-cima” e uma segunda medida (imediatamente após a primeira) não alterará tal estado,
repetindo simplesmente o resultado da primeira.
Como trabalhar todos estes aspectos das operações sobre os objetos quânticos?
Examinemos uma situação clássica de operações sobre vetores do plano. Uma rotação de
90°, no sentido anti-horário, de v 2 da figura 5, por exemplo, transforma-o em v 1 . A operação
de rotação realizada pode ser simbolizada por um operador de rotação. Outro exemplo de
operação de interesse é aquele em que se projeta V sobre o eixo horizontal, transformando-o
em v 2 .

Exercício: Descreva uma operação que transforme v 1 em  v 2 .

As operações acima modificam os vetores sobre os quais atuam. Note-se que as


operações (e, portanto, os operadores) só adquirem significado se agindo sobre os vetores.
Também para os estados dos sistemas quânticos, operações como as de rotação do
sistema transformam tais estados em outros. Isto ocorre, além disto, na maioria dos casos de
estados de sistemas quânticos, para as operações de medida de valores de grandezas físicas.
Algumas operações, entretanto, não modificam estados particulares do sistema, como
vimos. No caso dos vetores da figura 5, a operação de projeção sobre o eixo horizontal não
modifica o vetor v 2 (já situado sobre o eixo).
Da mesma maneira, existem operações (de medida de grandezas físicas, entre outras)
sobre um sistema quântico que não transformam o estado do sistema.
Como citado, então, existem operações que transformam os estados de sistemas
quânticos e operações que não transformam algum estado. Podemos simbolizar estas duas
situações (matematicamente) por:
    e B̂   b  ,
ou seja, no primeiro caso o operador  transforma o vetor  no vetor  (a operação
representada por  transforma o estado  do sistema quântico no estado  ), enquanto no
segundo caso (equação de autovalores) o operador B̂ não modifica o vetor  (autovetor) e ao
ser aplicado gera o número b (a operação representada por B̂ não modifica o estado do sistema
quântico e registra o valor b, denominado autovalor).

Exercício 1: Em Computação, conhece-se uma chave denominada NOT que transforma um dos
bits no outro. Represente isto por meio de operadores e vetores (kets).
Exercício 2: O que significa, em Computação Quântica, Â 0  0  1 ?

171
Sendo a operação de medida das grandezas físicas uma operação simbolizada por
operadores, estabelece-se uma correspondência entre grandezas físicas e operadores. Como
exemplos de grandezas físicas frequentemente determinadas para uma partícula quântica,
podemos citar a posição, o momento linear, a energia, o momento angular orbital e o momento
angular intrínseco (spin). Assim, a cada grandeza física corresponde um operador. Teremos,
então, operadores posição, energia, etc..
Na MQ, a operação de medição dos valores de uma grandeza física de um objeto é
representada com a atuação de um operador sobre o vetor de estado do objeto. Os operadores
em questão não são quaisquer; eles satisfazem a certas condições.
É importante saber que cada um dos operadores que representam grandezas físicas
satisfaz alguma equação do tipo B̂   b  , com b real (ou seja, que existem vetores que
satisfazem a equação de autovalores) e que podemos, em princípio, determinar os diversos
valores (reais) de b e os vetores  correspondentes.

Reflita 1: Como você obtém uma informação a respeito de um estado de um objeto quântico?
Reflita 2: Considerando o que foi exposto sobre a caracterização do estado de um objeto
quântico, parece-lhe aceitável salientar que o estado é o depositário dos valores das grandezas
físicas inerentes ao sistema?
Reflita: O que significa “valores contínuos” de uma grandeza física? E “valores discretos”?
Exercício 1: Apresente um exemplo de observável físico cujos autovalores são contínuos.
Exercício 2: Apresente um exemplo de observável físico cujos autovalores são discretos.

Sabemos como “manipular” estados, somando-os para obter outros estados, ou operando
sobre eles, estas ações resultando, em geral, em novos estados; ou, ainda, submetendo-os a
ações que não os modificam.

Exercício 1: Que informações você consegue obter dos estados de spin de um elétron que é
submetido a um experimento de Stern-Gerlach?
Exercício 2: Apresente dois estados de spin de um elétron diferentes, em que o primeiro estado
representa predominância de situações de spin-para-cima e o segundo, de situações de spin-para-
baixo.

Simbolicamente, sendo B̂ o operador que corresponde ao observável físico, devem existir


estados  para os quais B̂   b  . O vetor de estado  , então, não é modificado pela
medida da grandeza física correspondente. Além disto, b simboliza o valor obtido na medida da
grandeza. Temos aí a equação de autovalores, sendo  o autoestado ou autovetor do operador
B̂ e b o autovalor associado. Leia-se ainda: a operação representada por B̂ (medida do valor da
grandeza física em estudo), realizada sobre o sistema quântico quando este se encontra no
estado  , dá como resultado o número b e não altera o estado do sistema, ou seja, reproduz o
sistema no mesmo estado anterior à medida. Como uma mesma grandeza física pode ter vários
(mesmo infinitos, em número) valores diferentes, podemos indexar os autovalores e autovetores
B̂   b  , com  simbolizando a variedade de autovetores possíveis. Os autovalores
podem ser discretos e/ou contínuos.
Passa a ter sentido, então, dizer que b é o valor da grandeza física para aquele estado do
sistema.
Por exemplo: –13,6 eV é (aproximadamente) o valor da energia do elétron do átomo de
hidrogênio no estado fundamental.

Há, contudo, outros fatos surpreendentes, ainda não mencionados, que os sistemas
microscópicos revelam e que são incorporados aos postulados da MQ. Tomemos como exemplo o
espectro de energia do átomo de hidrogênio, que em uma primeira aproximação pode ser obtido
pelo modelo de Bohr. As linhas espectrais determinadas evidenciam a existência de vários
estados de energia possíveis para o elétron do átomo, quando ele está “ligado” ao núcleo.
A descrição quântica dessa diversidade espectroscópica, mesmo em um modelo bastante
simples, é surpreendentemente satisfatória e constitui-se em um dos grandes sucessos da MQ,
desde seus primórdios. Esta descrição, basicamente, consiste em estabelecer as soluções e os

172
autovalores de uma equação de autovalores de um operador ( Ĥ ) associado à energia total do
elétron do átomo. Ĥ , neste modelo simples, nada mais é do que a soma de um operador
associado à energia cinética do elétron e de um operador associado à energia potencial do
elétron, supondo o núcleo praticamente inerte, o que é aceitável face à grande razão entre a
3
ordem de grandeza da massa do núcleo e a da massa do elétron (~10 ).
Este modelo, embora muito simples, reproduz com concordância mais do que razoável
vários dos valores obtidos experimentalmente e que evidenciaram:
i) a existência de valores discretos de energia para o elétron do átomo (e portanto, para
alguns sistemas quânticos);
ii) o fato, surpreendente, de os resultados de medida sempre resultarem em algum dos
autovalores do operador correspondente.

Este último aspecto, que é verificado não apenas para resultados de medidas da energia
do átomo de hidrogênio, mas para medidas das mais diversas grandezas físicas conhecidas,
qualquer que seja o estado em que se encontrem, conduz a um dos principais postulados da MQ,
como veremos adiante e não encontra paralelo no trato dos sistemas clássicos, até porque se
torna trivial para valores contínuos dos observáveis. O que se depreende de tais resultados é que
os únicos valores possíveis resultantes da medida de alguma grandeza física são os
autovalores do operador que corresponde à referida grandeza.

Quais problemas podemos enfrentar ao medir grandezas físicas?

Vamos considerar agora estados de um objeto quântico que são caracterizados por
valores de duas grandezas físicas. Isto significa que a equação de autovalores deve ser satisfeita
com os dois operadores correspondentes às grandezas, ou seja B̂   b  , mas também
C   c  . Então o estado é autoestado dos dois operadores e as grandezas físicas
correspondentes serão ditas compatíveis.
A compatibilidade de dois observáveis nos leva a dizer que algumas informações relativas
ao estado do sistema podem ser fornecidas “simultaneamente”. Isto significa que o estado do
objeto pode ser caracterizado por valores das duas grandezas físicas, por exemplo, a energia
cinética e a projeção de spin de um elétron. Quando dois observáveis são incompatíveis, a medida
dos valores de um deles em geral afeta a determinação dos valores do outro. Logo, não existe
estado que possa ser caracterizado pelos valores das duas grandezas. (Não existe estado que
seja autoestado comum aos dois operadores que representam tais grandezas físicas.) Por
exemplo, posição e momento linear na mesma direção.
Quando utilizamos a notação de Dirac indicamos, em geral, no ket, os valores de todas as
grandezas físicas compatíveis de um dado conjunto. Assim, o estado do elétron do átomo de
hidrogênio que tem a maior energia de ligação e cuja projeção de spin na direção de um campo

magnético inhomogêneo (direção z ) é máxima, é caracterizado por E1  13,6 eV, s z    .
2
Contudo, se nos perguntarmos a que distancia do núcleo está o elétron, veremos que o ket em
questão não apresenta esta informação. A razão para isto não é medição incompleta das
propriedades físicas do elétron, ou seja, não é que simplesmente tenhamos deixado de medir a
posição do elétron. Esta “ausência de informação” deriva do fato de a energia e a posição do
elétron do átomo de hidrogênio serem observáveis incompatíveis. Isto implica em que, medir
primeiro a posição do elétron e depois sua energia de ligação, não resulta em geral nos mesmos
valores obtidos quando se mede primeiro a energia de ligação e depois a posição do elétron.
Costumamos, neste caso, dizer que há uma relação de incerteza entre tais observáveis (Princípio
de Incerteza de Heisenberg).
Em resumo, pode-se dizer que o estado de um sistema quântico é o conjunto das
informações sobre os valores das grandezas físicas compatíveis (em um determinado instante de
tempo, segundo Schrödinger). O estado será completamente conhecido em determinado instante
de tempo, se todos os observáveis compatíveis (independentes) do sistema forem arrolados e
seus valores no dado instante de tempo forem determinados.

Superposição Linear de Estados e Emaranhamento Quântico

173
Já vimos como são diferentes do que esperaríamos alguns dos comportamentos dos
objetos quânticos, como os átomos, os elétrons e os fótons. Vimos também que, pela combinação
linear de estados de tais objetos, podemos formar novos estados destes objetos. Esta não é uma
propriedade incorporada à Física Clássica e, a partir dela, muitos resultados não considerados
classicamente começam a surgir. Uma das consequências mais surpreendentes da propriedade
de superposição de estados em Mecânica Quântica é a da possibilidade de existirem Estados
Emaranhados, possibilidade esta comprovada já experimentalmente.
O que são, então, estes Estados Emaranhados? Estados emaranhados são estados de
dois ou mais objetos (quânticos), que implicam em uma relação muito significativa entre os
estados individuais dos objetos, de tal modo que não conseguimos separar uns dos outros.
Vamos apresentar um exemplo para que fique bem claro o que são tais estados.
Se tivermos dois átomos em posições conhecidas, A e B, podemos ter o átomo 1 na
posição A e o átomo 2 na posição B ( estado A 1 B 2 ) , mas podemos também ter o átomo 1 na
posição B e o átomo 2 na posição A (estado B 1
A 2
). Logo, pela propriedade de combinação
linear é possível encontrar os átomos no estado   A 1B 2
 B 1
A 2
, ou no estado
  A 1
B 2
B 1
A 2
, entre muitas outras possibilidades.
Repare que, para estes estados combinados, não podemos mais dizer que o átomo 1 está
no estado A e o átomo 2 está no estado B (ou vice-versa). Há uma possibilidade finita (de
cinqüenta por cento nos exemplos dados) de o átomo 1 estar no estado A e também de estar no
estado B. Mas se medirmos a posição do átomo 1 e o encontrarmos em A, saberemos que o
átomo 2 estará em B mesmo sem medirmos a posição do átomo 2. Os estados dos átomos 1 e 2
estão então relacionados, emaranhados. Determinar o estado de um deles (na medida) nos
informa sobre o estado do outro, sem necessidade de medição sobre este último.
Repare que o estado do conjunto dos dois átomos foi expresso como soma de estados em
que os átomos estão separados (um deles em A e o outro em B), mas o estado do conjunto não é
separável (tanto o átomo 1 como o átomo 2 podem estar em A e em B). O estado do conjunto não
é separável, é emaranhado.

Exercício: Quais dos estados a seguir estão emaranhados? Justifique suas respostas.
a) 1  A 1 A 2  B 1 A 2
b)   B 1 B 2
 A 1
A 2
c)   B 1 B 2
B 1
A 2
d)   B 1
A 2
 A 1
B 2

Esta propriedade parece interessante, mas o exemplo dado ainda não trouxe grande
surpresa para vocês, na verdade, porque já se acostumaram com objetos quânticos que podem
estar tanto na posição A como na B. Vejamos então um exemplo mais dramático.
Consideremos agora dois elétrons. Sabemos que os elétrons têm spin ½ e que a projeção
do spin em uma dada direção apresenta dois valores que podem ser usados para caracterizar os
estados como  e  .
Parecido ao exemplo dos átomos acima, podemos pensar que o sistema dos dois elétrons
pode estar no estado  1  2 , ou no estado  1  2 , ou ainda no estado  1  2 ou até no
estado  1
 2
. Todos estes estados são separáveis.
Mas não paramos por aí. Podemos ter várias combinações dos estados acima, como é o
caso da combinação C   1  2   1  2 . Agora, pensemos que, além da projeção de spin,
possamos informar que o elétron 1 está na posição A e o elétron 2 na posição B. Teremos, então,
um estado possível D  A  1 B  2  A  1 B  2 .
Se os elétrons estiverem próximos um do outro, este estado talvez não nos cause
surpresa, mas se os elétrons estiverem muito afastados (por exemplo, a 300 quilômetros de
distância um do outro) quando medirmos a projeção de spin do elétron que está em A e
obtivermos “+”, saberemos que o elétron que está a 300 km dali, em B, tem projeção de spin “–”,
sem ter medido esta projeção!
Mesmo separados por uma distância tão grande os elétrons continuam correlacionados.

174
Um grupo liderado pelo físico austríaco Anton Zeilinger realizou um experimento que
mostrou que isto é possível. Eles trabalharam com pares de fótons emaranhados. Vários outros
grupos têm realizado com sucesso experimentos com estados emaranhados de dois objetos
quânticos.
Conforme o experimento do grupo de Zeilinger mostra, os estados emaranhados também
podem ser realizados com fótons polarizados. Imagine a situação em que um par de fótons possui
polarização emaranhada tal que sempre que um deles apresentar polarização vertical, o outro
apresentará polarização horizontal. O estado de polarização do sistema quântico pode ser, por
exemplo, , onde H e V denotam, respectivamente, as polarizações
  HA V B V A HB
horizontal e vertical dos fótons e A e B denotam cada um dos fótons. Agora imagine que
tenhamos dois observadores, Alice e Bob, cada um observando um dos fótons. Há uma
probabilidade de 50% de Alice obter uma ou a outra das polarizações, assim como Bob. Porém,
quando Alice efetuar a medida da polarização de um dos fótons, qualquer que seja o valor
encontrado na medida, o fóton que está aos cuidados de Bob apresentará a polarização contrária.
Como o estado do sistema é composto pela superposição linear de estados de dois fótons, cada
qual com probabilidade finita de “existir”, ou seja, como o estado do sistema abrange as duas
possibilidades, a medida da polarização retilínea dos fótons resultará obrigatoriamente em um dos
autoestados de polarização retilínea que compõem o estado do sistema. Isso ajuda a evidenciar
que a informação não viajou mais rápido do que a luz, porque os estados já estavam “pré-
definidos”.

Exercício: Que informações podemos obter de um estado de um sistema quântico considerado


emaranhado?

Na década atual, vários experimentos relacionados a estados emaranhados foram


produzidos. Fótons e elétrons foram utilizados em projetos em que o emaranhamento de estados
de polarizações ou estados de projeções de spin ou estados de momento linear foi testado a
grandes distâncias.
Como se pode observar, uma utilização simples e sutil do princípio de superposição linear
de estados conduz a estados emaranhados. Tais estados são de extrema importância nos
processos de comunicação atualmente utilizados e em desenvolvimento, e isso faz com que os
profissionais de áreas muito mais amplas da ciência (tais como engenharia, informática e
telecomunicação) necessitem ser informados sobre os primeiros princípios da MQ.

Pense: Por que o emaranhamento pode ser considerado uma simples aplicação do princípio de
superposição linear?

Exercício 1: Crie um estado emaranhado com estados de projeção de spin para elétrons.
Exercício 2: Crie um estado emaranhado com estados de polarização retilínea para fótons.

O emaranhamento quântico é um fenômeno que não possui análogo na Física Clássica e


que decorre do princípio da superposição linear de estados, um dos primeiros fundamentos da
Mecânica Quântica. Como podemos perceber, apesar de simples consequência da superposição
de estados, o emaranhamento conduz a novas e surpreendentes perspectivas de
desenvolvimento de tecnologias, interessando inclusive a Agências Espaciais, para o
estabelecimento de estados vinculando objetos quânticos locados na Terra com objetos situados
em satélites.
A superposição de estados é uma propriedade já realizada para objetos quânticos e que
tem consequências importantes para a criptografia quântica, a computação quântica e a
teleportação, entre outras aplicações.
A previsão teórica da correlação do emaranhamento quântico gerou grandes discussões
na segunda metade do século passado, por levar alguns cientistas a pensar que uma informação
pudesse ser transmitida em velocidade maior do que a da luz, violando a teoria da relatividade.
Albert Einstein e outros dois colaboradores, inclusive, foram alguns dos maiores críticos desse
princípio que, em sua opinião, evidenciava possíveis falhas da teoria quântica. Einstein chamava o
emaranhamento quântico de ação fantasmagórica à distância.

Pense: Por que Einstein considerou estranho o efeito do emaranhamento quântico?

175
Segurança na Transmissão de Informação: a Criptografia Quântica

Outro importante exemplo de aplicação de alguns princípios da MQ, desenvolvido e


utilizado a partir da década de 70, é a Criptografia Quântica. A área da Criptografia abrange os
processos de proteção da transmissão de informação, buscando restringir o acesso ao conteúdo
transmitido apenas para aqueles que de direito. A criptografia consiste, via de regra, na
codificação de uma mensagem com o auxílio de uma chave (secreta ou pública) e o destinatário
somente conseguirá decodificar e ler a mensagem, se possuir a chave ou se souber como a
construir. O objetivo do processo é a segurança da informação, de tal modo que, se e quando a
mensagem for interceptada, não seja possível acessar e identificar seu conteúdo original de forma
inteligível.
Conforme a figura 14, por exemplo, temos uma mensagem a ser enviada: “Mecânica
Quântica”. Após passar por um processo de criptografia, seu conteúdo fica alterado e somente
quem possuir a chave de decodificação correta poderá acessar seu real conteúdo.

Figura 14. Apresentação simplificada de um processo criptográfico.

Com o avanço da tecnologia os mecanismos de transmissão de informação progrediram


de forma espetacular, sendo a Internet a principal responsável pelo vertiginoso aumento de
comunicação escrita entre dois ou mais sistemas ou entes. Aumentando o número de usuários
destes meios e melhorando a qualidade e rapidez da transmissão, tornou-se também
absolutamente necessário melhorar os sistemas de proteção associados ao processo de
transmissão.
Os algoritmos de criptografia usados atualmente para preservação do sigilo na
transmissão de mensagens via computadores utilizam sequências aleatórias dos dígitos 0 e 1,
como chaves, cujo conteúdo pretende ser de conhecimento exclusivo do emissor (Alice) e do
receptor (Bob). As chaves são veiculadas pelos canais clássicos de comunicação, sendo passíveis
de quebra de sigilo.
As chaves usuais dividem-se em chaves privadas e chaves públicas. Chaves privadas são
aquelas partilhadas por Alice e Bob e estabelecidas previamente ao envio de mensagens.
Evidentemente este tipo de chave não se adapta a comunicações entre empresas e
(individualmente) seus clientes. Além disto, para que a chave seja segura, deve usar um grande
conjunto de dígitos, mas em geral o tamanho do conjunto que caracteriza a mensagem é muito
maior, o que significa que parte da mensagem é enviada sem criptografia, favorecendo a violação
de sigilo, sem que Alice e Bob a percebam de imediato.
Empresas e seus clientes recorrem a algoritmos de chave pública, em que a chave usada
para codificar a mensagem é diferente da usada para decifrá-la. Neste caso, o uso de fatoração de
números muito grandes é frequente.
Nos dois casos citados, a segurança do processo está relacionada à complexidade da
sequência de números usada e o consequente intervalo de tempo necessário para a descoberta
da mesma. Contudo tais códigos podem ser desvendados em intervalos de tempo viáveis, se a
velocidade de processamento da informação aumentar. No caso de um computador quântico, por
exemplo, que utiliza princípios como o da superposição linear de estados, poder-se-ia reduzir um
intervalo de tempo de bilhões de anos para fatorar certo número em um computador comum, a um
período de tempo de alguns minutos. Na tabela a seguir podemos comparar algumas previsões
para o tempo de fatoração de números em computadores clássicos e em computadores
4
quânticos .
Há, porém, uma nova possibilidade de evitar-se a quebra de sigilo do algoritmo
criptográfico, que surge da utilização dos primeiros princípios da MQ. Este novo método de
criptografia é denominado de Criptografia Quântica. Os processos de criptografia quântica são
5
incondicionalmente seguros contra ataques de monitoramento passivo , porque sua segurança
está baseada nas distribuições probabilísticas de resultados de medidas e no colapso do vetor de
estado pelo ato de medida.

4
Extraído de Vieira, C. L.; Oliveira, I. S. A revolução dos q-bits. Jorge Zahar, 2009.
5
Monitoramento passivo é aquele em que alguém não pretende ser descoberto ao tentar interceptar a
mensagem.

176
Tamanho do número Tempo de fatoração Tempo de fatoração
(em bits) (computador clássico) (computador quântico)
512 4 dias 34 segundos
1024 10 mil anos 4,5 minutos
2048 10 mil bilhões de anos 36 minutos
26
4096 10 anos 4,8 horas
Tabela 1: Previsão para o tempo de fatoração de números por
computadores clássicos e por computadores quânticos.

Os protocolos de criptografia quântica recorrem, principalmente, a fótons polarizados.


Mesmo com computadores poderosíssimos, fica impossível a decodificação total dos dados. As
tentativas de interceptação da mensagem são detectadas, não existindo previamente (antes da
medida) um dado resultado.
Existem diversas propostas de protocolos de criptografia quântica. É comum adotar as
iniciais do(s) nome(s) do(s) autor(es) e o ano em que foram propostos, para a nomenclatura dos
protocolos. Dentre os protocolos encontrados na literatura, podemos citar o BB84, o E91, o
BBM92 e o B92.

Reflita: Por que a criptografia quântica possui segurança incondicional contra ataques de
monitoramento passivo?

Exercício: Tente descobrir qual a mensagem escondida nas sentenças criptografadas abaixo.
a) Bubdbsfnpt bp bnboifdfs. b) moB aid, slunoa ed QM. c) 01-20-01-03-01-18.

O Protocolo BB84

Dos protocolos citados, o mais simples é o protocolo BB84, proposto por C. H. Bennett e
G. Brassard, o primeiro dos protocolos quânticos a ser implementado.
O protocolo transmite fótons polarizados por um canal quântico e utiliza também um canal
clássico de comunicação (por exemplo, Internet ou telefone). O canal clássico não afeta a
segurança incondicional do processo porque é usado para conferência de alguns dados a serem
descartados posteriormente.
Suponhamos que Alice envie os fótons e Bob os receba. Antes de iniciar o processo, Alice
e Bob escolhem as bases (compostas por dois estados ortogonais de polarização) a usar na
transmissão e recepção dos fótons, p. ex., as da figura 15, apresentadas por Bennett e Brassard.
A base A (retilínea) mede com certeza a polarização dos fótons que apresentam
polarização horizontal ou vertical, enquanto a base B mede com certeza a polarização dos fótons
que apresentam polarizações diagonais, a 45° em relação à base A.

Base A Base B
Figura 15. Representação das bases adotadas por Alice e Bob para a transmissão dos fótons.

Alice e Bob combinam previamente, também, qual polarização representará os bits 0 e 1


em cada base, o que pode ser feito através de um canal clássico de comunicação. Supomos que o
bit 0 corresponde à polarização horizontal na base A e à polarização diagonal direita na base B (
0 A e 0 B ). Assim, a polarização vertical na base A e a diagonal esquerda na base B são

associadas ao bit 1 ( 1 A e 1 B ). Observe-se que, pelo princípio da superposição linear, podemos


representar estados de polarização de uma das bases em função dos da outra, resultando, por
exemplo, 0 B  0 A  1 A e 1 B  0 A  1 A .
Combinadas as bases e a representação dos bits em cada base, Alice pode enviar os
fótons para Bob. Supomos que Alice decida enviar os bits 011010100111 para Bob. Decididos os
bits, Alice escolhe aleatoriamente as bases em que vai enviar cada bit para Bob, que escolhe

177
também aleatoriamente as bases para a leitura das polarizações. Bob só pode executar a medida
uma vez para cada fóton, tendo em vista o colapso do estado e a impossibilidade de clonar um
fóton isolado.

Sequência de bits enviada por Alice. 0 1 1 0 1 0 1 0 0 1 1 1


Bases escolhidas por Alice para enviar cada fóton. A B B B A A B A B A B B
Bases escolhidas por Bob para medir a polarização
A B A B B A B B A A B A
dos fótons.
Medição da polarização por Bob. 0 0 0 0 0 1 1 1 1
FIM DA TRANSMISSÃO PELO CANAL QUÂNTICO
Bob informa as bases utilizadas para detectar os
A A B B A B B B A
fótons.
Alice informa as bases corretas. OK OK OK OK OK
Relação (secreta) dos bits de bases coincidentes. 0 0 0 1 1
Bob revela alguns bits da chave. 0 1
Alice confirma os bits de Bob. OK OK
Bits corretos restantes compõem a chave. 0 0 1
Tabela 2. Transmissão de bits de Alice para Bob utilizando fótons polarizados.

A tabela 2 exemplifica o processo de transmissão de uma chave criptográfica entre Alice e


Bob. Nas quatro primeiras linhas estão registradas as etapas relativas à transmissão dos fótons
polarizados, enquanto nas demais ocorre a discussão pública entre Alice e Bob, finalizando com a
seleção (implícita) da chave a ser compartilhada. Se Bob escolher a base errada para medir a
polarização, obterá resultado aleatório. Em algumas ocasiões, Bob utiliza a mesma base que
Alice, mas não consegue medir a polarização dos fótons, o que ocorre em situações reais por
perda de fótons dentro do canal quântico de comunicação.
Para analisar a segurança do processo, vejamos agora o que acontece quando outra
pessoa (Eva) decide espionar (e consequentemente interceptar) os fótons enviados por Alice a
Bob.

Reflita: Por que Eva tem que interceptar estes fótons?

Eva sabe, inicialmente, que os fótons estão sendo enviados com polarização dada pelas
bases A ou B. Assim como Bob, ela escolhe aleatoriamente seus polarizadores ao interceptar os
fótons. Estatisticamente, há uma probabilidade de Eva acertar, no máximo, 75% dos bits enviados.
Os fótons interceptados devem ser reenviados e no reenvio há a probabilidade mínima de 25%
dos fótons estarem com a polarização errada devido à sua medição. Assim, Bob receberá uma
chave em que os dados diferem pelo menos em 25% dos da chave original enviada por Alice,
embora ele não saiba isso ainda. Contudo, ao conferir seus dados com os de Alice, ele percebe
que, devido a uma alta taxa de erros, alguém está tentando espionar os dados transmitidos. Em
geral, os erros de transmissão são baixos (inferiores a 3%) e são devidos a ruídos no canal
quântico ou a desalinhamento dos polarizadores. Por que Eva não consegue interceptar o envio
de Alice e reenviá-lo corretamente para Bob, sem que percebam sua interferência no processo?
Como não é possível clonar um quantum individual, Eva não pode duplicar o estado quântico do
fóton recebido, medir sobre um dos fótons e reenviar o outro para Bob.

Reflita 1: Por que tal processo de criptografia só é seguro contra ataques de monitoramento
passivo?
Reflita 2: Por que só é possível enviar um bit por fóton?

A Utilização da Criptografia Quântica

Embora seja recente, a criptografia quântica já mostrou sua viabilidade.


Inicialmente, nos laboratórios da IBM, as chaves eram transmitidas a pequenas distâncias
(aprox. 30 cm), mas atualmente a empresa NEC realiza a transmissão de chaves criptográficas
quânticas a distâncias de 150 km. Uma equipe da IBM já utiliza a criptografia quântica a distâncias
de 60 km usando fibra ótica de alta pureza (material de custo ainda muito elevado). Em distâncias
maiores, as perdas são muito grandes, devido a impurezas da fibra, inviabilizando o sistema.
A empresa MagiQ Technologies comercializa sistemas que transferem chaves por até 100
km e que custam cerca de cem mil dólares. A empresa id Quantique também comercializa
produtos que transferem chaves quanticamente codificadas.

178
A empresa QinetiQ consegue transferir chaves quânticas pelo ar por 23 km em topos de
montanhas, regiões de baixa turbulência atmosférica. A Agência Espacial Europeia está investindo
para criar um satélite de baixa órbita que possibilite a comunicação por 1.000 km. Os EUA
financiam um projeto de US$ 4 milhões para interligar as Universidades de Harvard e Boston e a
BBN Technologies, em Massachusetts.
Estima-se que em breve seja possível utilizar tais protocolos em escala industrial.

Reflita: Você considera possível utilizar átomos ao invés de fótons em Criptografia Quântica? Que
aplicações isso poderia trazer?

179
APÊNDICE II

Questionário de conhecimentos prévios

1) Com qual(is) da(s) palavra(s) abaixo você ligaria a palavra quântica?


( ) Computação ( ) Emaranhamento ( ) Medicina
( ) Consciência ( ) Física ( ) Música
( ) Criptografia ( ) Ginástica ( ) Partícula
( ) Cura ( ) Mecânica ( ) Terapia

2) Explique (justifique) suas escolhas na questão acima.

3) O que é uma partícula, no seu entender? Dê um exemplo.

4) O que você entende por estado de um objeto (de um ser)? Dê um exemplo.

5) O que é uma onda, no seu entender? Dê um exemplo.

6) Em vários campos da Física fala-se em um Experimento de Dupla Fenda. Será que você já
ouviu falar alguma coisa a respeito? Se já ouviu, conte o que sabe sobre isto.

7) Você considera importante conhecer uma teoria que possui inúmeras implicações
tecnológicas, algumas delas em equipamentos e aparelhos muito em voga, tais como células
fotoelétricas, mp3 player, cartões de memória, entre outros? Por quê?

8) Se você já ouviu falar em Mecânica Quântica, quais assuntos dela você citaria?

9) Você já ouviu falar em (Albert) Einstein, (Max) Planck, (Werner) Heisenberg ou (César)
Lattes? A respeito de quais assuntos?

10) Você já ouviu falar em Acelerador de Partículas, Bomba Atômica, Chip, Nanotecnologia,
Radiação Eletromagnética, Teletransporte ou Tunelamento? Sabe informar o que significam estas
denominações?

180
APÊNDICE III

Avaliações escritas

Primeira avaliação

1) Explique, com suas palavras, qual o resultado da soma de duas ondas e apresente um
exemplo.
2) Explique, com suas palavras, qual o resultado da multiplicação de um vetor do espaço real
por um número real e apresente um exemplo.
3) Analise as ondas representadas na primeira coluna, efetue a superposição das mesmas e
relacione corretamente com as da segunda coluna.

(a) ( )

(b) ( )

(c) ( )

4) Efetue e represente, no plano cartesiano, as operações indicadas a seguir, para os vetores do


 
plano v e w .
 
v  (2,1) w  (1,2)

     
a) v + w b) 2 v + w c) – v + 2 w

5) Que razões você citaria para justificar a introdução de uma teoria diferente da Mecânica
Clássica, como é a chamada Mecânica Quântica?
6) Cite duas ou mais aplicações da Mecânica Quântica, sobre as quais tenha escutado falar ou
lido algo.

181
Segunda avaliação

1) Analise o objeto tradicionalmente descrito pela Física Clássica proposto pelo professor e
caracterize o mesmo. A seguir, descreva um estado possível deste objeto.

2) Considere um átomo de hidrogênio (objeto tipicamente descrito pela Física Quântica).


Descreva o átomo, ou seja, o nome e número de seus elementos (elétrons, prótons, nêutrons...) e, a
seguir, caracterize dois estados possíveis do mesmo.

3) Considere o experimento de dupla fenda com elétrons.


a. Estando fechada uma das fendas, o que você espera encontrar registrado no segundo anteparo,
quando realizar a experiência com muitos elétrons? O que você pode dizer sobre o estado do
elétron submetido a este experimento?
b. Estando abertas as duas fendas, o que você espera encontrar registrado no segundo anteparo,
quando realizar a experiência com muitos elétrons? O que você pode dizer sobre o estado do
elétron submetido a este experimento?

4) Considere um par de átomos de hidrogênio. Caracterize dois estados possíveis do conjunto


destes dois átomos.

5) Em Mecânica Quântica, existem algumas grandezas físicas (observáveis) que são ditas
incompatíveis, ou seja, não podem caracterizar o mesmo estado do objeto. Assim, responda os itens
a seguir.
a. É possível caracterizar o estado de um elétron pela posição no espaço (coordenadas x, y e z, por
exemplo)?
b. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua posição e sua energia?
c. É possível caracterizar o estado de um elétron pela sua projeção de spin em uma direção e sua
posição?

6) Em que a superposição linear diferencia sistemas quânticos dos sistemas clássicos? Dê


exemplos.

7) Qual dos estados a seguir pode ser atribuído a elétrons que, submetidos ao experimento de
Stern-Gerlach, apresentam resultados como os indicados na figura abaixo? Justifique sua escolha.

a)    c)     
b)    d)     

182
Terceira avaliação

1) Que informações podemos obter de um par de elétrons que estejam no estado


  A 1B 2
 B 1
A 2
, sendo “A e B” valores de posição dos elétrons e “+ e –”
projeções de spin dos elétrons, denominadas “spin para cima” e “spin para baixo”, em uma
mesma direção?

2) Quais dos estados a seguir são exemplos de estados emaranhados de sistemas quânticos?
Justifique. As letras H e V lembram observáveis de algum objeto quântico a você?
a) 1  H 1 H 2  V 1 V 2 c) 3  V 1 H 2  H 1 V 2 e) 5  H 1 V 2

b) 2  H 1 H 2
 H 2
H1 d) 4  V 1
V 2
 H1V 2
f) 6  H 1  V 2

3) Escreva dois estados distintos de um par de elétrons emaranhados com projeções de spin  e
 .

4) Em um processo de transmissão de chave criptográfica, suponhamos que Alice envie um fóton


polarizado na vertical para Bob e este utilize uma base inclinada a 45° em relação à horizontal
para medir a polarização deste fóton. Você pode dizer qual será a medida realizada por Bob?
Pode dizer qual o estado do fóton enviado por Alice?

5) Por que o emaranhamento quântico pode ser considerado como uma aplicação simples da
superposição linear?

6) Codifique a mensagem “superposição linear” e explique que chave criptográfica você utilizou em
tal processo.

183
APÊNDICE IV

Questionário de opiniões

1) Com qual(is) da(s) palavra(s) abaixo você ligaria a palavra quântica?


( ) Computação ( ) Emaranhamento ( ) Medicina
( ) Consciência ( ) Física ( ) Música
( ) Criptografia ( ) Ginástica ( ) Partícula
( ) Cura ( ) Mecânica ( ) Terapia

2) Explique (justifique) suas escolhas na questão acima.

3) Quais conceitos dentre os trabalhados no curso você considera mais importantes?

4) Que tópicos do curso você considerou mais fáceis? De quais mais gostou?

5) Que tópicos do curso você considerou mais difíceis? De quais menos gostou?

6) Você considera o conceito de estado de um sistema físico difícil de compreender?

7) Você considera a superposição linear de estados difícil de compreender? De acreditar?

8) Você considera a Mecânica Quântica uma teoria tipo “ficção cientifica”, “nada a ver com a
realidade física”, ou considera que ela consegue descrever “elementos de realidade” que a Física
Clássica não consegue?

9) Como você enxerga a Mecânica Quântica neste momento?

10) Apresente suas opiniões, sugestões e críticas sobre o curso apresentado.

184
APÊNDICE V

Testes rápidos

Primeiro teste rápido


1) O que resulta da soma dos vetores = (2,0) e = (0,3)? E da soma de 3 com 2 ?
2) A soma das ondas representadas pelas funções cos(x) e sen(x) é também uma onda? Seu
valor máximo é igual a 1?

Segundo teste rápido


1) Que informações podemos obter a respeito da energia de um elétron do átomo de hidrogênio
que está no estado ?
2) Um elétron que foi sujeito ao experimento de Stern-Gerlach (campo na direção vertical) é
registrado no grupo que está na parte de cima do anteparo. Em que estado podemos dizer que
se encontra este elétron?

Terceiro teste rápido


1) É possível caracterizar o estado de um sistema quântico por qualquer conjunto de grandezas
físicas conhecidas? Por quê?

Quarto teste rápido


1) Qual dos estados a seguir é um estado emaranhado para pares de fótons?
a) c)
b) d)

2) Mil fótons polarizados na horizontal ( ) são submetidos a um polarizador a 45° em relação a sua
orientação. Qual o resultado da passagem desses fótons pelo polarizador?

185
APÊNDICE VI

Mapas mentais iniciais

Turmas de primeira série


Aluno Mapa

20112

20119

20122

20128

20132

20211

186
20214

20223

20237

187
Turmas de terceira série
Aluno Mapa

20301

20302

20305

20312

20314

188
20315

20319

20321

20322

20324

189
20332

20404

20415

20416

20511

20516

190
20517

191
APÊNDICE VII

Mapas mentais finais

Turmas de primeira série


Aluno Mapa

20112

20119

20122

20128

192
20132

20211

20214

20223

20237

193
Turmas de terceira série
Aluno Mapa

20301

20302

20312

20314

20315

194
20316

20319

20321

20322

195
20324

20332

20404

20415

196
20416

20511

20516

20517

197
APÊNDICE VIII

Alguns conceitos atribuídos às questões das avaliações escritas e dos testes rápidos

1ª avaliação escrita
Questão
Aluno 1 2 3 4 5 6
10104 2 3 3 2 3 2
10206 3 3 3 2 1 1
10303 3 2 3 3 2 3

20125 3 2 3 3 3 2
20209 3 3 3 2 3 3
20335 3 2 3 3 2 2

2ª avaliação escrita
Questão
Aluno 1 2 3 4 5 6 7
10118 3 3 3 2 3 3 3
10305 2 1 3 3 3 3 3
10316 3 2 3 3 3 3 0

20121 3 1 3 0 2 1 1
20211 3 1 2 3 3 3 3
20403 0 3 2 3 3 3 2

3ª avaliação escrita
Questão
Aluno 1 2 3 4 5 6
10133 0 1 3 1 1 3
10202 1 3 3 1 3 3
10316 3 2 3 3 1 3

20116 1 2 3 3 0 3
20209 2 3 3 3 2 3
20316 3 2 2 2 3 3

Testes rápidos
Teste 1 Teste 2 Teste 3 Teste 4
Aluno 1 2 1 2 1 1 2
20125 1 3 3 3 3 3 3
20226 3 3 0 3 3 3 3
20329 3 3 3 3 3 3 1

198
199

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