O CRUSP Processos de Socializacao e Cons

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 140

Thais Helena Mourão Laranjo

O CRUSP: processos de socialização e consumo de


drogas

Dissertação apresentada à Escola de


Enfermagem da Universidade de São Paulo
para obtenção do título de Mestre em
Enfermagem - Área de Concentração
Enfermagem em Saúde Coletiva

Orientadora: Profa.Dra. Cássia Baldini Soares

São Paulo
2003
Laranjo, Thais Helena Mourão
O CRUSP: processos de socialização e consumo de drogas /
Thais Helena Mourão Laranjo. – São Paulo: T.H.M.Laranjo; 2003.
140 p.

Tese (Mestrado) – Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo.


Orientadora: Cássia Baldini Soares

1. Socialização 2. Juventude 3. Drogas de uso indevido I. Soares, Cássia


Baldini, orient. II. Título.

2
A vida não t em pena de ninguém
Ser á que somos r obôs pr ogr amados
para dizer amém?
(Paulinho Moska – Amém)

3
Agradecimentos

Os agradeciment os não serão f eit os por ordem de import ância, pois


est a seria uma t aref a impossível.

Gost aria de agradecer a Escola de Enf ermagem, ao Depart ament o de


Pós Graduação e especificamente as professoras do Departamento de
Enfermagem em Saúde Coletiva por terem dado a oportunidade, pela
primeira vez, para uma psicóloga realizar seu mest rado nesse depart ament o.

A minha orientadora querida, amiga e fundamental em todo o meu


processo de aprendizado nesse t rabalho aqui expresso meu reconheciment o e
gratidão.

Aos alunos moradores do CRU SP o meu reconhecimento pela acolhida


em seus apart ament os e pela disponibilidade em participar das entrevistas.
Valeu moçada!!

Ao meu chef e Dr. André M albergier o meu muit o obrigado por me


incent ivar a realizar esse t rabalho.

Aos meus pais o agradecimento pela vida e pelos valores que me


ensinaram e que me t ornaram uma pessoa persist ent e.

Ao Dani, meu Anjo e companheiro de vida o meu carinho, pois part e


desse trabalho tem a ver com o apoio que você me deu durante todo o
processo, mesmo quando eu mesma não sabia se conseguiria chegar ao f im.

Aos amigos Willian Winkler e Celi Jover pela ajuda na “ret a f inal”.

Aos meus irmãos, cunhado, sobrinhos e amigos, obrigada por me


acompanharem na minha t rajet ória de vida com paciência e carinho.

4
Resumo

O presente trabalho teve como objetivo conhecer e analisar o discurso


dos moradores sobre os processos de socialização no Conjunto Residencial da
USP – CRUSP destacando o consumo de drogas. Tomou-se a moradia como
um espaço de socialização juvenil que viabiliza a presença de estudantes
pobres na universidade e que poderia estar relacionado a um certo consumo de
drogas. Foram entrevistados 20 alunos de graduação. As entrevistas além da
caracterização sócio-econômica abordaram três aspectos: o conhecimento dos
alunos sobre a história do CRUSP, a experiência de morar no CRUSP
(aspectos positivos e negativos) e a visão dos moradores sobre o uso de
drogas. Nesta pesquisa qualitativa o procedimento metodológico que serviu de
base para a coleta e organização do material proveniente das entrevistas é
denominado “Discurso do Sujeito Coletivo” (DSC). Os resultados foram
apresentados em forma de “Discurso do Sujeito Coletivo”. Pôde-se perceber
que os alunos têm pouco conhecimento sobre a história do CRUSP, que as
alternativas para os problemas vividos pelos alunos na moradia têm sido
encontradas individualmente, o que reflete a ideologia do capitalismo neoliberal
e no que se refere ao uso de drogas, assim como na sociedade em geral, estão
presentes as duas principais concepções que contemporaneamente têm
alimentado a arena da prevenção ao consumo de drogas: guerra às drogas e
redução de danos.

DESCRITORES: socialização, juventude, drogas de uso indevido

5
ABSTRACT

The aim of this paper is to analyse and acknowledge the speech of dwellers on
their socialization processes in the University of São Paulo´s halls of residence –
CRUSP, highlighting the risks of drug intake. Such dormitories were taken as a
space for juvenile socialization which enables the attendance of needy students
quite likely to be related to abuse drugs. Twenty undergraduates were
interviewed. Interviews beyond the socioeconomic characterization comprised
three aspects: students´ awareness about CRUSP´s history, experience in living
in CRUSP (drawbacks and advantages) and their view on drug use. In this
qualitative research, all collection and compilation of information obtained in the
interview was grounded on the “Collective Subject Speech” methodological
process. All results were presented in such format. It was noticeable that
students have little knowledge about the history of CRUSP, and that alternatives
for the problems experienced by these students have been found individually,
which in its turn recalls the neo-liberal capitalism ideology. Also, as regards drug
intake, as well as society in general, this study observes the two main existing
conceptions which have been building the drug prevention arena: war on drugs
and harm reduction.

KEY-WORDS: socialization, youth, drugs

6
Sumário

1 Introdução e justificativa: o objeto e o problema de estudo.............................. 8


1.1. A história não-oficial do CRUSP .......................................................... 11
2. Considerações teóricas: ............................................................................... 19
2.1. O consumo contemporâneo de drogas................. ............................... 19
2.2. A juventude universitária e suas marcas culturais ................................21
2.3. Bases para pensar a prevenção ........................................................ 26
3 Objetivo e finalidade....................................................................................... 34
3.1Objetivo .................................................................................................. 34
3.2 Finalidade .............................................................................................. 35
4. Procedimentos metodológicos ...................................................................... 36
4.1. Coleta de dados ................................................................................... 37
4.2 Caracterização dos alunos do Conjunto Residencial da Universidade
de São Paulo - CRUSP .................................................................................... 40
5. Procedimentos para análise dos dados ....................................................... 44
6. Resultados e análise .................................................................................... 46
6.1. Quem são os moradores que constituíram os sujeitos da pesquisa .... 46
6.2. O que dizem os moradores do CRUSP sobre a história do CRUSP ... 50
6.3. Como é morar no Crusp ....................................................................... 54
6.4. A visão dos moradores sobre o consumo de drogas ........................... 89
7. Discussão e Considerações finais .............................................................. 118
8. Referência Bibliográfica .............................................................................. 128
Anexo 1 ........................................................................................................... 135
Anexo 2 ........................................................................................................... 136
Anexo 3 ........................................................................................................... 137
Anexo 4 .......................................................................................................... 139

7
1 Introdução e justificativa: o objeto e o problema de estudo

O objeto deste estudo se refere ao discurso de jovens universitários


sobre o consumo de drogas conforme mediado pelos processos de socialização
no contexto específico da moradia estudantil.
A partir da década de 80, o Brasil passou a ser o país latino americano
com mais dados sobre dependência, bem como sobre padrões de uso de álcool
e drogas em populações específicas (Kerr-Corrêa e col 1999). A revisão
bibliográfica revela um número expressivo de estudos epidemiológicos que se
referem ao conhecimento da incidência e prevalência do consumo de drogas
em populações específicas tais como: escolares (Galduróz e col 1997, Carlini-
Cotrim 1991), universitários (Andrade e col 1997a, Kerr Correa e col 1999,
Queiroz 2000), crianças em situação de rua (Noto e col 1998) e populações que
constituem demandas por serviços de tratamento (Schivoletto 1997).
Particularmente, em relação aos universitários, esses estudos vêm sendo
realizados desde a década de 70 (Zanini 1977, Magalhães e col 1989, Borini e
col 1994, Andrade e col,1997). Há uma preocupação tanto com os universitários
em geral (Andrade e col 1997, De Lucia e Planeta 1989, Magalhães e col 1991,
Boskovitz e col 1995, Bucher e Totugui 1988, Brenes e col 1986, Queiroz 2000)
como com as possíveis diferenças de consumo por área acadêmica. Nesse
caso, os mais estudados são os alunos da área de biológicas, mais
especificamente os dos cursos de medicina (Borini e col 1994, Andrade e col
1995, Andrade e col 1997, Mesquita e col, 1995, Kerr-Correa, 1999). Mas não
foram encontrados estudos que abordem os estudantes universitários na
condição específica de moradores de repúblicas estudantis ou de moradia
oferecida por uma Universidade, particularidade que corresponde à
conformação do objeto do presente trabalho.

8
Esses estudos se caracterizam pela preocupação em estabelecer quais
as drogas mais usadas, qual o padrão de uso, qual o perfil do usuário, quais as
atitudes destes sobre o consumo de drogas e quais os fatores que podem levar
ao uso ou experimentação caracterizando-se como levantamentos
epidemiológicos de natureza descritiva. Carlini e col (1994) também verificaram
essa tendência nos trabalhos científicos sobre o tema drogas em geral, pois a
partir da análise do Banco de dados do CEBRID (Centro Brasileiro de
Informações sobre Drogas) constataram que a maioria das pesquisas
registradas nesse centro consistia em levantamentos epidemiológicos,
especificamente sobre epidemiologia do uso.
Essas pesquisas têm se utilizado de questionário de auto-preenchimento,
anônimo, com perguntas fechadas de múltipla escolha. Os dados são
analisados estatisticamente e a partir daí são feitas associações entre algumas
variáveis. Em alguns trabalhos é realizada uma caracterização sócio-
demográfica dos participantes da pesquisa que inclui: idade, estado civil, ano e
tipo de curso, situação de moradia (com pais ou não), renda familiar (em alguns
casos) e escolaridade dos pais. Porém, variáveis sócio-econômicas que
indiquem a condição de classe social dos sujeitos pesquisados não são
incluídas na maioria dos estudos. Nos que levantam esses indicadores,
prevalece uma análise descritiva. Há explicitamente um recorte dos sujeitos de
pesquisa que os reduz à condição de usuários de drogas, sem remetê-los à sua
classe social ou às condições em que se instalam consumos prejudicais de
drogas.
Os levantamentos epidemiológicos estão interessados no diagnóstico
quantitativo do uso das diferentes substâncias e nos fatores que podem motivá -
lo. Embora, em alguns casos, se baseiem no conceito de que os problemas
associados ao uso de drogas se devem a três fatores - biológicos, psicológicos
e sociais - apresentam em suas conclusões apenas as motivações individuais,
ou seja, aspectos que são percebidos como de responsabilidade do indivíduo.
Os aspectos relativos à classe social e à cultura do sub-grupo estudado
(universitários, por exemplo), não são mencionados.
9
Os estudos realizados com os alunos da USP (Andrade e col 1995,
Andrade e col 1997, Barría 2000, Queiroz 2000) também se constituem em
levantamentos epidemiológicos do uso de drogas. Algumas associações sobre
uso de drogas por universitários têm levado a crer que o fato de morar longe da
família aumenta a chance do uso de drogas (Boskovitz e col 1995, Andrade e
col 1997, Queiroz 2000). No caso da USP, essa afirmação é particularmente
delicada, pois colabora para a manutenção do estigma de que morar no
CRUSP (Conjunto Residencial da USP) significa ser liberal com relação ao uso
de drogas ou mesmo usuário, o que remete ao ideário de ser problemático em
vários outros aspectos da vida1 (Velho 1999).
A associação feita nesses estudos entre as variáveis morar fora de casa
(no CRUSP) e o uso de drogas merece melhor compreensão. Esse
aprofundamento se relaciona também a uma compreensão mais ampla do
significado de morar no CRUSP, ou viver a sociabilidade juvenil sob tais
condições de moradia.
São os estudos qualitativos relativos ao tema drogas e universitários que,
embora apareçam em menor número (Magalhães e col 1989, Santos e col
2000), tratam de analisar de maneira mais aprofundada os elementos
envolvidos na problemática, dificilmente identificados pelos estudos
epidemiológicos. No estudo realizado por Magalhães e col (1989) sobre
freqüência do uso de maconha por universitários, pode-se notar que as
mudanças nos padrões de sociabilidade e de inserção social foram apontadas
pelos alunos como capazes de afetar a freqüência de uso, e que idéias pré-
concebidas a respeito do padrão de uso de maconha - droga polêmica e que
figura em primeiro lugar dentre as drogas ilícitas consumidas por jovens -
podem não se confirmar, necessitando de exploração científica. No estudo
conduzido por Santos e col (2000), com universitários da área de saúde, pode-
se constatar que para os alunos o meio universitário estimula o uso abusivo de

1
Embora não existam trabalhos sobre isso, a constatação feita é linguagem corrente na Universidade.
Durante meu trabalho no PRODUSP tenho presenciado essa fala com muita freqüência.
10
álcool, que este consumo é visto como moda e sinal de maturidade e que
atitudes contrárias ao uso levam o sujeito ao isolamento.
As críticas sobre a forma como vêm sendo conduzidos os estudos
científicos relativos ao tema drogas não devem obscurecer a importância da
realização de pesquisas epidemiológicas, pois a alternativa para que se possa
sair do patamar do senso comum, transmitido pelos meios de comunicação e
pelos projetos de prevenção, é a realização de pesquisas científicas (Carlini e
col 1994).
Não se trata, portanto, de enfatizar a importância de uma ou outra
abordagem metodológica, uma vez que objetiva-se níveis de apreensão da
realidade diferentes entre si. Deve -se estar atento, no caso das pesquisas
quantitativas, para não se restringir a realidade social ao observável, contável e
possível de apreensão empiricamente (Minayo 1999). Dessa forma, se o
pesquisador pretende alcançar um maior aprofundamento da realidade não
deve se restringir a um referencial quantitativo (Minayo 1999). Até mesmo
porque uma postura dialética impõe a qualificação de dados quantitativos para
serem compreendidos no contexto histórico em que foram coletados, referindo-
se o fenômeno observado à totalidade.
O conjunto problematizador deste estudo se refere às seguintes
indagações: como os jovens percebem os espaços e processos de socialização
da moradia estudantil? O fato de morar num conjunto residencial estudantil teria
relação com uma percepção socialmente diferenciada a respeito do consumo e
dos consumidores de drogas? E que sugestões os moradores têm sobre como
deveria ser a prevenção ao uso de drogas na moradia?

1.1 A história não-oficial do CRUSP

O resgate da história do CRUSP – Conjunto Residencial da USP - não é


tarefa simples pois, embora existam documentos de diversas ordens (artigos de

11
jornal, documentos internos da USP, livro e vídeo) que retratam essa história
sua localização não é tarefa fácil. Não menos difícil é encontrar a história do
CRUSP contada como parte integrante da história da USP. Um ex-aluno e ex-
morador do CRUSP que escreveu um livro sobre morar no CRUSP afirma no
prefácio que as histórias ali presentes se referem a sua própria experiência
como morador e a relatos orais, devido a sua dificuldade em localizar
documentos antigos (Cunha, s/d, p.2).
Assim como Cunha (s/d) verifica-se que a reconstrução da história do
CRUSP também é dificultada pela parcialidade e falta de transparência com
que são descritas as situações vividas por alunos moradores em sua relação
com a universidade e com o Estado. Foi através da leitura de artigos dos jornais
Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo e Jornal da Tarde que se pôde
perceber o quanto fatos descritos nos documentos de forma acética
apresentavam implicações políticas importantes.
Para a organização do histórico aqui apresentado foram consultados
documentos internos da COSEAS (s/d) – Coordenadoria de Assistência Social
da USP, que não estão disponíveis para o público e artigos de jornais sobre o
CRUSP e o livro O espaço da USP: presente e futuro (USP 1985).2
A análise do material revela uma história de descaso da Universidade em
relação ao CRUSP. Verifica-se que a proposta de oferecimento de uma moradia
para os estudantes como alternativa para democratizar o acesso foi
obscurecida, pois a Universidade negligenciou a administração da moradia
desde o início, posicionando-se apenas nos momentos de crise.
Para compreender a origem da idéia de se construir uma residência
estudantil dentro do campus da universidade se faz necessário recorrer ao
modelo de universidade presente no projeto da USP.
O projeto inicial da Universidade de São Paulo teve, portanto, como
modelo os projetos das universidades americanas, que propunha a moradia
para os alunos dentro do campus.

2
Pesquisa bibliográfica sobre a USP patrocinado pela Prefeitura da Cidade Universitária
“Armando de Salles Oliveira”, em 1985.
12
O projeto inicial do CRUSP foi premiado no 12o. Salão Paulista de Arte
Moderna e previa a construção de doze prédios com seis andares. A decisão de
que cada apartamento alojaria três estudantes foi do FUNDUSP (Fundo de
Obras da USP). Os motivos para tal decisão são desconhecidos.
Durante o governo de Ademar de Barros, em São Paulo, foram
construídos seis prédios do CRUSP que inicialmente abrigariam os atletas dos
jogos Pan Americanos de 1963 e posteriormente seriam destinados aos
estudantes.
Os prédios ficaram prontos, mas os jogos não se realizaram em São
Paulo devido a um surto de meningite. Os estudantes ocuparam os
apartamentos e nesse momento a USP ainda não tinha desenvolvido uma
política para as moradias estudantis.
Atualmente sabe-se que a política da Universidade para a moradia já
estava descrita naquela época em um documento intitulado ”Diretrizes e regras
adotadas em caráter experimental”. E que em 1964 o Conselho Universitário
aprovou um regimento para o CRUSP que só foi normatizado em 1966. Essa
normatização incluía o pagamento de taxas e as formas de organização e
incumbências dos representantes dos alunos. Não há informação disponível
sobre a implementação dessas regras.
Mas sabe-se que o que regulamentava a vida no CRUSP eram as
assembléias organizadas pela AURK (Associação Universitária Rafael Kaun),
entidade representativa dos moradores. Nesse período a vida política e cultural
no CRUSP era intensa e as atividades eram promovidas também pela AURK.
Em 1968 ficou pronto mais um bloco do CRUSP que passou a ser
ocupado pelo ISSU (Instituto de Saúde e Serviço Social da Universidade). Mas
devido a necessidade de vagas os estudantes acabaram por ocupá-lo. A
organização e seleção dos moradores nesse novo prédio acabou ficando a
cargo da AURK.
Neste momento o Brasil vivia sob a ditadura militar, a repressão se
intensificava, os líderes estudantis foram presos e o CRUSP era um dos únicos
lugares onde ainda os estudantes se reuniam e discutiam diferentes tendências
13
políticas, atividade proibida na época. Essa conjuntura culminou com a invasão
da polícia repressiva que espancou e expulsou os alunos, deixando os prédios
vazios. Esse foi mais um recurso utilizado pelas forças repressoras do Estado
para desmobilizar politicamente os estudantes.
O livro “O espaço da USP: presente e futuro” acima citado refere que
após a invasão e com o esvaziamento dos prédios esses acabaram por se
destinar a várias finalidades. Segundo os documentos da COSEAS dentre elas
estavam as salas de aula da Faculdade de Letras, posto do Banespa (Banco do
Estado de São Paulo), Museu de Arqueologia, alojamento para estrangeiros e
para estudantes de fora da grande São Paulo de passagem rápida pela cidade,
mas os critérios utilizados para a seleção desses alunos não eram claros. Para
servir a esses novos fins houve mudanças na estrutura inicial dos
apartamentos.
Será então a partir de 1979 sob o clima nacional de reabertura política
que os alunos retomarão o CRUSP como moradia, ocupando dois andares do
bloco A. dois anos seguintes os alunos continuaram ocupando o espaço da
moradia e a Universidade não se posicionou quanto a isso.
Em 1982, o então coordenador da COSEAS compareceu a uma
assembléia de moradores e reconheceu que o CRUSP retomou suas funções -
ser moradia para estudantes - e assumiu um compromisso verbal de que no
próximo ano iniciariam-se as reformas no CRUSP, que seria ativado um serviço
de manutenção dos prédios e teriam inicio as negociações com os moradores
para elaborar um estatuto para a moradia. No cenário político acenava-se para
as eleições estaduais.
Já em 1983, o coordenador da COSEAS anunciou que os blocos
destinados a Faculdade de Letras se transformariam em moradia novamente e
dentre as medidas propostas estava a cobrança de taxa de manutenção. Os
professores do departamento de Letras em entrevista à Folha de São Paulo
(Docentes 1983) denunciaram que embora tivesse sido anunciado que o
departamento deixaria o CRUSP, possibilitando a abertura de 300 novas vagas
na moradia, isso ainda não estava acertado. Os professores não tinham ainda
14
para onde ir e temiam que esse anúncio feito pelo coordenador da COSEAS
criasse um impasse entre eles e os alunos.
Segundo o jornal a Folha de São Paulo, (Moradores 1983) a maioria dos
alunos acreditava que esse anúncio feito pela COSEAS era uma estratégia de
divisão dos moradores em oficiais e não oficiais, criando uma rivalidade entre
eles. Além disso, repudiavam a idéia de cobrança de taxa e queriam participar
do processo seletivo para os novos moradores. Por outro lado, passados 20
anos da construção da moradia, a Divisão de Promoção Social divulgava a idéia
de que a grande novidade era que a universidade assumiria a questão da
moradia.
No mesmo período o jornal o Estado de São Paulo (CRUSP 1983)
publicava que embora tivessem se passado quatro anos desde que os blocos A
e F haviam sido tomados pelos alunos, a universidade não sabia informar quem
eram esses moradores, mas sabia que os prédios não apresentavam nem
segurança e nem infra-estrutura para que as pessoas pudessem habitá-los.
A COSEAS abriu inscrições para os novos moradores e os antigos
moradores fizeram a mesma coisa. Foi então realizada uma reunião para
discutir o impasse relacionado a criação das novas vagas com a participação de
moradores e da COSEAS na presença de jornalista da Folha de São Paulo.
Nessa reunião os alunos anunciaram que formariam uma comissão de
negociação e que forneceriam a lista de moradores. A assembléia geral do
CRUSP, realizada após essa reunião aceitou a negociação com a COSEAS e
estabeleceu que os 2o , 4o , 5o e 6o. andares do bloco B e os 2o, 3o, 4o , 5o e 6o
do bloco C seriam áreas de litígio e não poderiam ser ocupados por nenhuma
das partes até que o impasse se resolvesse, a COSEAS aceitou essas
resoluções.
O conflito entre a universidade e os alunos continuava se manifestando
de diversas formas. A próxima reunião entre moradores e COSEAS foi adiada,
pois o coordenador da COSEAS foi nomeado secretário das finanças do
município. A diretora da DPS (Divisão de Promoção Social) passou a responder
pela COSEAS, participando das negociações com os alunos. Manteve -se um
15
impasse nas negociações, os alunos solicitaram que antes de qualquer coisa
deveria ser estabelecida a gratuidade da moradia, mas a COSEAS pretendia
discutir uma política global. Diante dessa situação os alunos invadiram os
blocos B e C.
Em 1984 constituiu-se o comitê de defesa da moradia estudantil formado
por representantes de entidades estudantis, Associação dos Docentes da USP
(ADUSP), Associação dos Servidores da USP (ASUSP) e parlamentares.
Estabeleceu-se que a seleção dos moradores seria feita pela COSEAS, teria
caráter classificatório e seria baseada em critérios sócio-econômicos, o
Diretório Central dos Estudantes (DCE) seria responsável pela inscrição dos
interessados e os moradores seriam responsáveis pelo levantamento do
número de vagas. Neste mesmo ano a COSEAS finalmente solicitou à Escola
Politécnica uma reforma nos prédios do CRUSP.
O jornal o Estado de São Paulo (As obras 1984) publicou que com o
início das obras no CRUSP, a polícia pôde invadi-lo e fazer a retirada de
marginais que lá moravam. No entanto, chama a atenção que os tais marginais,
ainda segundo a reportagem, não ofereceram resistência à evacuação do
prédio “sem violência e sem a necessidade de se recorrer à tropa de choque,
está se conseguindo retirar esse pessoal” (O Estado de São Paulo, 1984, p.15).
Na mesma época a Folha de São Paulo (Degradação 1984) publicou artigo
enfatizando que “a degradação urbana e social chegou ao campus da mais
importante instituição de ensino superior do país”.
Assim vai se construindo a imagem do CRUSP como um lugar perigoso
e habitado por bandidos, marginais e delinqüentes. Nenhum dos artigos de
jornal ou documentos consultados apresentou os aspectos positivos da moradia
estudantil. O único aspecto valorizado foi o fato do projeto inicial da estrutura do
CRUSP ter sido premiado e isso na década de 60.
O ápice dos problemas no CRUSP evidenciou-se com a morte de dois
alunos, em novembro de 1984, durante uma festa na moradia. Houve uma
briga, os alunos caíram do quarto andar do bloco A e segundo artigo do Jornal
da Tarde (Briga 1984) o que teria provocado a morte dos estudantes seria a
16
fragilidade das placas e janelas do CRUSP. No entanto, a ênfase dada nos
artigos de outros jornais foi a necessidade de expulsão dos marginais, pessoas
estranhas à Universidade (Duas mortes 1984). Esse fato gerou uma série de
mudanças na moradia.
A partir daí a COSEAS assumiu o gerenciamento do CRUSP e publicou
no Diário Oficial de 23/11/84 o regimento definindo normas para ocupação e
permanência na moradia. Esse regimento previa sua reformulação com a
participação da Associação dos Moradores. Essa associação foi criada em
dezembro do mesmo ano, chamada então de AMORCRUSP (Associação de
Moradores do CRUSP) (Moradores 1984).
As negociações não avançaram, pois a COSEAS queria retirar os
moradores para realizar as reformas e esses queriam garantias de que
poderiam voltar ao CRUSP. A COSEAS e a Reitoria desmarcaram reunião e os
alunos interpretaram isso como falta de disponibilidade para negociar. Mais
uma vez essas instâncias não chegaram a um acordo. Mesmo assim as
reformas aconteceram e em 1985, foram concluídas aquelas tidas como
essenciais pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e pela Escola
Politécnica.
Em 1987 a COSEAS publicou novo regimento com o conceito de bolsa
moradia, onde os critérios mais importantes para a seleção passaram a ser o
sócio-econômico e o desempenho acadêmico. No final desse ano foi eleita nova
chapa da AMORCRUSP, que passou a discutir com a COSEAS os critérios
acadêmicos a serem incluídos no novo regimento. Através de uma consulta aos
moradores estabeleceram, em acordo com a COSEAS, que para a renovação
da bolsa-moradia o mínimo de créditos exigidos seria o necessário para que o
aluno completasse o seu curso em 1,5 vezes o tempo mínimo de duração,
definiu-se também que para resolver os casos de alunos que não cumprissem
essa regra e entrassem com recurso seria consultada uma comissão tripartite
formada pela COSEAS, DCE e AMORCRUSP.
Em 1989, a COSEAS e a AMORCRUSP se reuniram para discutir as
condições de permanência no CRUSP dos não-moradores – os hóspedes. O
17
acordo estabelecido foi que os alunos da USP poderiam ser hospedados nos
apartamentos desde que houvesse consentimento dos três moradores até a
seleção para novos moradores e isso se daria por um número indefinido de
vezes. Com isso ficou acordada a possibilidade da existência do quarto
morador.
Em 1994 mais um fato trágico levou o CRUSP às notícias de jornais, um
aluno que caiu no poço do elevador e se feriu gravemente. Posteriormente a
esse fato a Reitoria deu início às negociações com estudantes para definição
de um novo regimento e ao plano de reforma dos prédios.

18
2 Considerações teóricas:

2.1 O consumo contemporâneo de drogas

Existem registros muito antigos sobre o uso de drogas em várias


sociedades. Em momentos históricos e em culturas distintas, a compreensão
sobre o uso e os valores a ele associados são diferentes entre si e dos
encontrados atualmente nas culturas ocidentais. Essas diferenças se devem à
influência da organização política, social e econômica no modo de pensar e agir
das pessoas. A proibição e a permissão do uso de determinadas substâncias
também são fenômenos historicamente determinados e relacionados a uma
complexa trama de interesses (Escohotado 1994).
De acordo com Kaplan (1997), o processo de afirmação acentuada do
narcotráfico nas últimas décadas não se constitui em um “desequilibro do
sistema”, como poderia se interpretar numa visão funcionalista, mas em uma
resposta à globalização que vem se caracterizando pelo alto grau de
concentração de poder nos países de capitalismo central. Os países latino -
americanos sofrem poderosas restrições externas a seus interesses nacionais.
Tal interpretação está associada a uma visão histórico-crítica do narcotráfico.
Assim, do ponto de vista interno dos países, o narcotráfico partiria das
insuficiências e distorções do crescimento econômico desigual, da
desestabilização política e da constelação enorme de conflitos que daí derivam.
Há portanto nesses conflitos nutrição importante para o narcotráfico que por sua
vez retroalimenta, fortalece e amplifica o projeto de globalização. Os cinturões e
bolsões de pobreza e marginalidade são os setores privilegiados de
recrutamento de consumidores, de narcotraficantes e de outras formas de
criminalidade e violência.

19
As repercussões da crise econômica dos anos 70 e a adoção dos
padrões de acumulação neoliberais na América Latina, principalmente nos
países mais periféricos, que vivem pesadamente do setor primário da economia
são inúmeras. Os preços das matérias primas caíram durante a crise. Sem
conseguir acesso à economia os agricultores gradualmente trocaram a cultura
de algodão e outros produtos agrícolas pela narcocultura, principalmente nos
países andinos (Kaplan 1997). A narcocultura é de um lado, conhecida, pelos
hábitos culturais locais. De outro lado, foi se consolidando pela conveniência do
dinheiro “magicamente” conveniente à especulação, uma vez que pode ser
lavado e transformado em bens limpos com a facilidade que os bancos
necessitam para girar para o capital (Coggiola 2001).
Conforme Queiroz, Salum (1997), o Brasil foi o último país latino-
americano a adotar o ideário do neoliberalismo, submetendo-se ao processo de
globalização. O neoliberalismo funda-se na desigualdade, que estimulando a
“saudável” competição de mercado desresponsabiliza o Estado em prover
direitos de cidadania. O desemprego cresceu assustadoramente nas últimas
décadas com a desregulamentação das atividades econômicas e sociais pelo
Estado e a insegurança penetrou no cotidiano das pessoas, famílias e grupos
sociais pela reversão de alguns padrões de proteção social adquiridos ao longo
do processo civilizatório.
Essa análise estrutural tem poder para explicar porque a partir
principalmente da década de 70 e 80 há uma disseminação do consumo de
drogas em todo o mundo e particularmente no Brasil, uma vez que a droga
passa a uma condição clara de mercadoria cujo consumo pode “atender” a
diferentes finalidades, que vão desde o aplacamento de angústias provenientes
da vida insegura em que os mecanismos de confiança estão balançados à
reprodução de valores que contemporaneamente fornecem as bases para a
vida em sociedade - competição, individualismo e hedonismo (Soares 1997).
Para entender como, em contextos específicos, pode haver um consumo
de drogas prejudicial, no entanto, é preciso mergulhar nas condições

20
particulares ou nos contextos específicos em que esse consumo se realiza,
compreendendo quem fala, de que lugar fala e o que diz (Soares 1997).

2.2 A juventude universitária e suas marcas culturais

O presente estudo tem como foco o grupo de universitários,


especificamente na Universidade de São Paulo e no Conjunto Residencial da
USP.
A população universitária brasileira é formada primordialmente por
jovens. Os dados do perfil sócio-econômico dos moradores do CRUSP-
Graduação, São Paulo; 1999 evidenciam esse fenômeno apontando que 37%
dos moradores do CRUSP tem entre 22 e 24 anos e que 90% dos moradores
estão na faixa etária que vai dos 17 aos 28 anos. Além disso, esses alunos em
sua maioria têm como renda as chamadas “bolsas”, que são uma ajuda de
custo. Assim, o grupo estudado se caracteriza por ser jovem, de famílias
compostas por trabalhadores assalariados, em ocupações semiqualificadas ou
não-qualificadas, que recebem remunerações insuficientes para a reprodução
da vida social, mas que conseguiram manter seus filhos na escola em busca de
uma formação profissional para se inserir no mercado de trabalho.
Uma pergunta que surge dessa constatação é o que é ser jovem? Mas
para responder a essa pergunta se faz necessário percorrer o caminho histórico
que levou à formação da juventude enquanto categoria em destaque na
sociedade ocidental moderna, sendo necessário que ela seja compreendida em
sua complexidade e determinação histórica (Spósito 1992).
Um dos elementos fundamentais para essa compreensão é a
adolescência, considerada por diversas correntes da história, da sociologia e da
psicologia social, das quais nos valemos, uma primeira fase da juventude, fruto
da organização social pós revolução industrial. Assim, embora atualmente haja
uma naturalização das características da adolescência e das dificuldades

21
vividas por pais e filhos nessa etapa da vida, essas formulações não se
confirmam ao se realizar uma leitura histórica sobre esse fenômeno. Pois será
somente a partir do século XX que a adolescência começará a despontar no
cenário social, os adultos passarão a se preocupar em saber o que eles
pensam e surgirão algumas pesquisas sobre essa faixa etária (Áries 1981).
Abramo (1994) ressalta que com a industrialização aparece a necessidade
de preparar o jovem para o trabalho, ou seja, aparecem novas exigências
impostas pela nova condição de trabalho e pelo desenvolvimento tecnológico. A
escolarização deixa de ser exclusividade das camadas sociais mais abastadas.
Com isso, o tempo necessário para a entrada no mundo adulto se alarga, os
jovens têm uma maior convivência, unem-se enquanto grupo, passam a
descobrir características comuns e assim se firmam perante a sociedade.

“A adolescência na sociedade moderna é


resultado do desenvolvimento industrial que torna
essa transição para a idade adulta muito mais
complicada” (Eisenstadt apud Soares 1997 p.138).

Segundo Áries (1981) será após a primeira guerra mundial, quando os


jovens se opõem às antigas gerações, questionando as mortes ocorridas devido
à guerra e aos valores vigentes, que surgirá a consciência da juventude,
inicialmente como um sentimento de ex-combatentes.
A adolescência que não era considerada até então, passa a ser uma fase
em que todos querem chegar e dela não querem sair. A juventude se torna
depositária das expectativas de mudanças na sociedade européia. Ao mesmo
tempo em que começa a haver uma exaltação da juventude há um sentimento
inverso em relação à velhice (Áries 1981). As questões relativas à juventude
assumem na sociedade moderna uma proporção muito grande. Isso porque
esse é o tempo de ser jovem. A velhice perdeu seu status de sabedoria e
autoridade (Morin 1997).

22
Embora, atualmente, a adolescência ou a juventude sejam caracterizadas
como um período de transição da infância para a vida adulta e de mudança de
pertença de grupo as conseqüências e a intensidade dos fenômenos que
acontecem nesse período variam de acordo com a cultura e a classe social
(Lapassade 1975).
Segundo Soares (1997) embora fatores econômicos, culturais e
psicológicos possam convergir para determinar o comportamento dos
adolescentes, a condição de classe de suas famílias é preponderante. O que
leva a supor, de acordo com Novaes (2000), que não existe a juventude e sim
várias juventudes que convivem num mesmo espaço social e temporal. Dessa
forma, o termo juventude torna - se vazio de significado (Novaes 2000).

“Preferimos falar em adolescentes que se


diferenciam pela sua história de vida de acordo com
sua inserção sócio-econômica e seu
desenvolvimento psicológico particular num dado
contexto histórico e cultural” (Soares 1997 p.37).

Assim, o fenômeno universal se restringe à puberdade que se caracteriza


por mudanças que acontecem no corpo devido a um processo de
amadurecimento .
No que se refere à chamada crise da adolescência Lewin (apud
Lapassade 1975) assinala que essa decorre de uma organização social que
coloca o adolescente no lugar de marginal. Marginal compreendido como aquele
que não tem seu próprio espaço, que está numa terra de ninguém (....) “é
colocado no ponto de intersecção de dois grupos [criança e adulto]: não pode
determinar exatamente o grupo a que pertence” (p. 163). É nessa fase de
transição que para Morin (1997) se vive uma grande contradição que é a
procura ao mesmo tempo da autenticidade e da integração à sociedade.
Lapassade (1975) cita Marx para esclarecer que a entrada na vida adulta
se dá pelo trabalho e que as formas de inserção e o significado deste variam de
acordo com a classe a que pertence o jovem, existindo, portanto, uma
23
personalidade de classe. Estes autores referem ainda que deve ser dada a
devida importância para a práxis para que se possa compreender a entrada na
vida adulta.
Além disso, a escolha profissional também está vinculada e é limitada
pela classe social a que pertence o jovem. Isso no que se refere tanto às
condições econômicas quanto culturais. Os fatores culturais se apresentam
tanto na escolha da carreira como no transcorrer do curso, pois os jovens de
classe mais baixa não encontram eco nem em sua família, nem em seu grupo
de amigos para o aprendizado proporcionado em seu curso. Disso pode
decorrer um distanciamento devido às mudanças que se dão em decorrência do
aprendizado (Lapassade 1975).
No Brasil será a partir da década de 60 que os estratos médios da
sociedade terão maior acesso a Universidade (Foracchi 1972), pois até então
este era um privilégio das classes mais abastadas. Em estudo realizado por
Foracchi (1972) com estudantes da Universidade de São Paulo em 1963, pôde-
se constatar que o estudante universitário representava um encargo para a
família e que a formação universitária representaria um investimento para
alcançar uma ascensão social. Em muitos casos, nesse estudo, esses
estudantes eram a primeira geração universitária na família.
Esse fenômeno apontado por Foracchi (1972) aconteceu mundialmente
segundo Hobsbawm (1995), pois embora a corrida dos jovens para as
universidades tenha ocorrido a partir da década de cinqüenta foi somente a
partir da década de sessenta que os estudantes obtiveram expressão política e
social. Em alguns países o número de universitários quadruplicou. A razão para
tal fenômeno está no fato de que a economia moderna exigia dos profissionais
um preparo específico obtido na universidade. Os pais, em vários países do
mundo, faziam verdadeiros sacrifícios para manter seus filhos na universidade
pois isso significava a possibilidade de ascensão social na década de 70 e
nesse período o mercado podia absorver boa parte dos formados.
Segundo Abramo (1994) às modificações no mercado de trabalho nos
anos 70 e 80 acompanharam mudanças na vida dos jovens de classe média no
24
Brasil. O movimento estudantil que foi protagonista das mudanças sociais
entrou em crise nessa década e perdeu força, poder e deixou de ser símbolo da
categoria juvenil.
No período mais crítico da ditadura brasileira a universidade era um dos
únicos espaços de crítica ao regime vigente. Para se ter uma idéia eventos
culturais de diversas ordens só podiam acontecer na universidade por causa da
censura existente, sendo que os jovens universitários e os intelectuais eram os
principais responsáveis pelas produções culturais alternativas (que se opunham
a produzida ou incentivada pelo sistema) (Abramo 1994).
Será com a luta contra a ditadura e pela conquista das liberdades
democráticas que o espaço universitário se firmará como um lugar de
sociabilidade e construção de identidades positivas em torno da figura do
estudante (Abramo 1994).
Com a abertura política o cenário todo se altera e há o aparecimento de
novos espaços de atuação política e cultural. A partir de então há uma alteração
na configuração do papel social da universidade e há também um esvaziamento
dos movimentos estudantis, suas lideranças tiveram dificuldade em se adaptar
a nova conjuntura. (Abramo 1994).
Essas mudanças levaram a universidade e o movimento estudantil a
deixarem de ser um espaço de vivência social e cultural. Os jovens
universitários passaram a buscar outros espaços de atuação ligados
principalmente aos movimentos culturais (Abramo 1994).
Além disso, fazer um curso universitário vai deixando de ser um símbolo
de ascensão social e portanto garantia de bons salários e de uma melhor
capacitação profissional (Abramo 1994).
Nos últimos anos do século XX assistimos a um maior acesso das
classes mais baixas às instituições de ensino superior, mas mesmo assim essas
não perderam seu caráter elitista (Salum 2001). O acesso à universidade está
restrito a 10% da população da faixa etária apropriada (Ristoff apud Salum
2001).

25
No Brasil, nos últimos anos, verifica-se também um aumento das
instituições particulares de ensino superior com apoio governamental sendo que
a mesma regra não é seguida no que se refere às universidades públicas
(Salum 2001).

2.3 Bases para pensar a prevenção

Ao abordar o uso de drogas e as alternativas sociais propostas para


responder ao problema, encontramos o tratamento, a prevenção, a repressão
ao tráfico e as leis. O tratamento é a proposta médica clássica aos problemas
instalados. A prevenção se apresenta como uma alternativa para atuar antes
que os problemas se instalem ou se agravem e que com o passar dos anos
conquistou certa unanimidade sobre sua importância nesta área. Mas, mesmo
entre os profissionais que atuam na área de prevenção, existem muitas
divergências sobre o objetivo da prevenção, a forma de realizá-la, as idéias que
devem ser transmitidas e a quem compete a coordenação e avaliação.
O resgate da história da prevenção ao uso de drogas nos ajuda a
compreender algumas das dificuldades vividas hoje nessa área.
Inicialmente atividades preventivas consistiam em repressão e
fiscalização, com o objetivo de reduzir o consumo das drogas ilícitas e controlar
todo o processo de produção, incluídas a fonte, a comercialização e o consumo.
Mas essas medidas se mostraram ineficientes, pois não foram capazes de
cumprir seus objetivos, ao invés disso o mundo assistia a um aumento do
consumo e da produção.3
Diante dessa situação, em 1970, a UNESCO convidou profissionais de
diversos países para discutir o tema prevenção ao uso de drogas. Com a

3
O fracasso do sistema repressivo, relativo às drogas, tem sido discutido por vários autores entre eles:
Barata (1994), Karan (1997) e Sá (1993). Estes autores, ligados a área do direito, demonstram a
necessidade de ampliação da discussão sobre os efeitos negativos da criminalização das condutas
relativas ao uso de algumas drogas psicotrópicas.
26
discussão concluiu-se que a prevenção deveria ter centro na educação. Esta
conclusão foi um marco no que se refere às perspectivas de trabalho na área
(Bucher 1989).
No entanto, num primeiro momento, a educação preventiva foi
transformada em ação através da realização de campanhas veiculadas na
imprensa e pela inserção do tema no currículo escolar, com o único objetivo de
promover a abstinência. As informações disseminadas eram alarmistas e
procuravam gerar medo sobre as conseqüências maléficas do uso de qualquer
substância. Este tipo de abordagem logo caiu em descrédito, pois a
disseminação do medo extinguiu a possibilidade de diálogo entre a escola e os
alunos, a primeira passando a ser vista como repressiva e ameaçadora (Bucher
1989, Carlini-Cotrin 1992).
Avaliações fundamentadas em metodologias consagradas
cientificamente, realizadas em vários países, constataram que a educação
preventiva que dissemina informações alarmistas gera curiosidade e desejo de
experimentar alguma droga. A constatação do fracasso desse modelo reforça a
necessidade de desenvolver novas concepções para se abordar o tema sendo
estas divergentes e contraditórias (Bucher 1992).
A concepção de prevenção que se apresenta em franca oposição à
repressiva também é chamada de educação preventiva, no entanto, parte de
pressupostos completamente diferentes, tendo como preocupação principal o
investimento na auto-realização, na auto -estima e no desenvolvimento do senso
de responsabilidade em relação à própria vida. Na formação ao invés de
exclusivamente na informação.

“A educação para ter um alcance preventivo


deve situar-se num espaço mais amplo: o uso de
drogas não deve ser visto como aspecto isolado da
vida social, mas tem que ser inserido num contexto
geral da saúde, da convivência social e dos valores”
(Bucher 1989 p 20).

27
Para Bucher (1992) e Carlini-Cotrim (1992) não existe prevenção neutra,
qualquer modelo adotado está permeado por uma forma de compreender o ser
humano, sua vida em sociedade, as contradições presentes nas relações
humanas e numa significação valorativa atribuída ao uso de drogas. Para ele,
embora existam diversos modelos de prevenção, estes podem ser agrupados
em duas concepções fundamentais: uma atrelada ao modelo repressivo, mais
ou menos evidente e outra ao modelo educativo.
Na concepção repressiva dominante as drogas são percebidas como o
mal que precisa ser eliminado para que a sociedade viva em paz, os usuários
são vistos como frágeis seres que precisam ser “educados” para se adequarem
às normas sociais (Velho 1999). O tráfico e os problemas advindos do uso e da
dependência são percebidos como os maiores problemas atuais. Não se
percebe como afirma Barata, (1994) que a produção não está determinada
pelas necessidades nem do produtor nem do consumidor e sim pela lógica do
mercado cujo principal objetivo é a obtenção de lucro.
Na concepção educativa, o uso de drogas é compreendido como um
fenômeno da sociedade, uma resposta ao “mal estar” causado pelo modos
vivendi atual. Este não é o único e nem o maior problema, pois a subnutrição a
corrupção, a falta de emprego e de perspectiva de futuro aos jovens são tão
importantes quanto aqueles relacionados às drogas. O que se pode concluir é
que o uso de drogas e o tráfico são um problema sócio-político de grandes
dimensões, tanto nacional como internacionalmente, mas que culpabilizar estas
substâncias por todos os flagelos da sociedade atual colabora para que outras
discussões mais amplas não se dêem. A compreensão do significado atual do
uso de drogas só é possível a partir da discussão do contexto social, político e
econômico (Birmam 2000, Bucher 1992, Soares 1997).
Viver numa sociedade onde não existem mais utopias políticas e o ideal
de felicidade em que os homens viveriam em condições de igualdade,
independentemente de suas crenças religiosas, cor de pele e origem social
deixou de ser um ideal comum, substituído pela lógica do esforço individual e
acúmulo de dinheiro e bens, proporcionou para muitos, a busca de amparo na
28
religião e, para os incrédulos, em substâncias que proporcionam estados
nirvânicos. É neste contexto histórico que se constrói o império das drogas
(Birman 2000).
Mas, os problemas relacionados ao uso de drogas não ocorrem com
todas as pessoas, nem mesmo com todos os jovens que as experimentam. Isto
se deve ao fato de que existem especificidades individuais, psicológicas e
talvez biológicas que transformam o uso de substâncias que alteram a
consciência, as emoções e as sensações, em única alternativa de alívio ao
sofrimento e de prazer (Birmam 2000).
Essa constatação da realidade tem concordância com a concepção
teórica de que estes problemas ocorrem devido a complexa relação entre três
fatores: o indivíduo, a droga e a sociedade. Estão implicados então: um
indivíduo dotado de personalidade, crenças e valores, inserido de uma dada
forma na sociedade, o produto droga, suas características e efeitos no
organismo e o contexto sócio-cultural que cerca o momento em que se dá o
encontro do indivíduo e da droga (Soares 1997, Bucher 1989).
Portanto, para que se possa fazer um programa de prevenção se faz
necessário levar em conta todos os aspectos envolvidos, explicitando a que tipo
de concepção o programa estará atrelado. Autores como Sá (1993), Carlini
(1990) e Soares (1997) postulam que não existem programas preventivos
universais e que não se deve adaptar programas provenientes de realidades
distintas.
Recomenda-se conhecer a realidade da população com a qual se
pretende trabalhar sob vários aspectos, entre eles a forma de inserção social, a
cultura específica, os valores e as drogas mais usadas (Carlini e col 1990).
Além disso, é importante que desde o início se esclareça qual o objetivo do
trabalho, para que este possa ser avaliado e para que os participantes possam
escolher se querem ou não participar.
Um dos problemas evidentes no modelo dominante de prevenção,
segundo Soares (1997), é que este mascara as diferenças de inserção social,

29
apresenta o dependente como único responsável por sua condição e não
discute os determinantes sociais presentes na configuração desta problemática.
Para que se possa realizar um programa de prevenção comprometido
com o respeito pelas pessoas individualmente e ao grupo a que pertencem
deve-se ter, assim como assinala Soares (1997), como objetivo geral a
vinculação destas duas dimensões: a individual relacionada à formação do
cidadão crítico e a outra relacionada à organização social que deve
proporcionar os meios para que esta existência se efetive.
Um outro aspecto que nos auxilia a compreender as dificuldades
relativas a mudanças de atitudes sobre como abordar o tema drogas no cenário
atual brasileiro, se refere a como são tratadas oficialmente essas questões pela
atual Política Nacional Antidrogas (PNAD), lançada em 11 de dezembro de
2001, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.
Essa política apresenta os pressupostos teóricos, os objetivos gerais e
as diretrizes para prevenção, tratamento, recuperação e inserção social,
redução de danos sociais e de saúde, tráfico, estudos, pesquisas e avaliação
sobre drogas em território nacional.
O texto da PNAD em sua introdução descreve o problema do uso
indevido de drogas como “(...) uma ameaça à humanidade e à estabilidade das
estruturas e valores políticos, econômicos, sociais e culturais de todos os
Estados e sociedades”. Além disso, apresenta como pressuposto a construção
de uma sociedade livre do uso de drogas ilícitas e do abuso das lícitas.
Em seu aspecto geral, o texto apresenta a idéia de que o governo e a
sociedade devem travar uma luta contra as drogas, como se as substâncias
fossem um mal em si, e apresenta os problemas relacionados ao uso como
descolados da realidade social, econômica e política atual do país.
Há uma preocupação evidente com a redução da demanda, termo que
aparece em itens que versam sobre a prevenção e sobre a repressão. Pode-se
verificar neste documento alguns antagonismos, pois ao mesmo tempo em que
trata quase que exclusivamente sobre as drogas ilícitas, usa como referência os
dados do Centro Brasileiro de Estudos sobre Drogas (CEBRID) que assinalam
30
que as drogas mais usadas por estudantes são as lícitas (álcool, tabaco,
solventes e anfetaminas).
Esta política é um bom exemplo de como se reproduz a ideologia
dominante. Esta entendida como:

“(..) idéias e representações [que] serão


produzidas e difundidas pela classe dominante para
legitimar e assegurar seu poder econômico, social e
político. Por este motivo, essas idéias ou
representações tenderão a esconder dos homens o
modo real como suas relações sociais foram
produzidas e a origem das formas sociais de
exploração econômica e de dominação política. Este
ocultamento da realidade social chama-se ideologia”
(Chauí 2001 p23).

Nos auxiliam na compreensão da importância da análise deste material,


as considerações feitas por Barata (1994) para explicar a permanência da visão
criminalizadora relativa a qualquer forma de uso das drogas ilícitas. Ele nos
apresenta o teorema de Thomas, muito presente na sociologia moderna, que
postula que quando se sustenta uma determinada imagem da realidade, esta
imagem produz efeitos reais. No que se refere às drogas a reação social
criminalizadora produz por si só a realidade que a legitima.
Um outro aspecto levantado pelo autor é o fato de haver uma
homogeinização das informações transmitidas pelos meios de comunicação no
que se refere ao tema drogas. Parte -se da idéia de que a relação entre os meios
de comunicação e os expectadores é de condicionamento recíproco. Os meios
de comunicação seguem:

“Ativando e atualizando tendências que já


existem no público, e oferecendo aos indivíduos
isolados um elemento massivo de agregação e de
consenso, afetam não apenas a imagem da
realidade, mas a própria realidade”.(Barata 1994 p.
25).
31
A substituição das experiências diretas pela experiência do espetáculo
(assistido na TV) aumenta a distância da imagem diante da realidade com
relação à experiência cotidiana das pessoas. Esta estrutura comunicativa
favorece a manutenção das idéias dominantes e do “status quo” da política de
drogas.
Dessa forma evidencia-se a responsabilidade de diferentes setores da
sociedade na estigmatização dos usuários e dependentes de droga e na criação
de fenômenos que passam a ser apresentados como naturais.
Segundo Barata (1994) o problema atual das drogas está relacionado às
contradições produzidas no sistema de relações sociais e de produção, pela
distorção relativa ao desenvolvimento equilibrado das necessidades reais do
homem e da produção de recursos para satisfazê -las nas diferentes culturas.
Para compreender o que significa na cultura brasileira contemporânea,
“ser drogado”, recorremos a Velho (1999), que propõe a análise do significado
de ser “drogado” a partir do que chamou de categorias de acusação. O autor
parte da idéia de que a vida social é um processo contraditório e complexo e
que a realidade é permanentemente negociada pelos atores sociais, e que os
conflitos não tem caráter catastrófico, mas são fenômenos que precisam ser
estudados. Segundo este autor, há uma categoria abrangente a de “doente
mental” e desta deriva a de “drogado” sendo esta uma categoria totalizadora, ou
seja, contamina toda a vida do individuo acusado estigmatizando-o de forma
definitiva¸ com acusações que atacam a identidade do acusado de forma
radical. O drogado é identificado como doente, um ser fraco, sem vontade e
manipulado pelos traficantes. O rótulo de drogado serve para explicar qualquer
problema vivido pelo indivíduo e dependendo do contexto assume uma
dimensão política:

“O fato dos acusados serem moralmente


nocivos segundo o discurso oficial, pois tem hábitos
costumes desviantes, acaba por transforma-los em

32
ameaça ao “status quo”, logo em problema político”
(Velho 1999 p 60).

O autor destaca que no tipo de análise que propõe deve-se discutir o


grau de consciência dos envolvidos no processo acusatório, pois estamos
falando de emoções e não apenas de interesses.

33
3 Objetivo e finalidade

3.1 Objetivo

O presente trabalho teve como objetivo conhecer e analisar o discurso


dos moradores sobre os processos de socialização no Conjunto Residencial da
USP – CRUSP destacando o consumo de drogas.
A importância desse trabalho reside principalmente em dois fatos: em
primeiro lugar, na ausência de trabalhos científicos sobre moradia estudantil e,
em segundo lugar, na condição da moradia de se constituir como um espaço de
socialização importante, uma vez que os alunos dela se valem, em muitos
casos, durante todo o tempo que levam para concluir o curso (varia de quatro a
cinco anos) muitos só podendo visitar a família esporadicamente (devido a
problemas financeiros e distância). A moradia é composta por jovens que estão
saindo de casa pela primeira vez, são em sua maioria pobres e estão
vivenciando um “mundo” completamente novo para eles.
O pressuposto é de que essa combinação de fatores traz uma série de
dificuldades de adaptação à nova vida que aliadas ao fato da universidade
relutar em assumir a moradia como um espaço de suma importância na
democratização do acesso à universidade pode produzir sintomas de um certo
mal estar na atualidade (Birmam, 2000) como o consumo de drogas e a
depressão.
Faz se necessário elucidar e discutir os problemas para que alternativas
sejam encontradas e para que se possa aperfeiçoar os mecanismos existentes
de viabilização de uma vida estudantil plena e saudável.

34
3.2 Finalidade

Este estudo procurou reconstruir a história do CRUSP com a finalidade


de valorizar a existência da moradia e lutar, assim como no passado, para que
sejam implementadas melhorias.
Na mesma direção, o conhecimento sobre o significado de morar no
CRUSP para os alunos, que remete aos aspectos positivos e negativos da
moradia deve servir aos órgãos competentes como diretrizes para elaboração
de políticas para a moradia e aos próprios alunos como possibilidade de
conhecer os diferentes pontos de vista presentes no CRUSP.
Além disso, ao se discutir o tema do consumo de drogas com os
moradores pôde-se compreender mais amplamente como os alunos percebem
o uso e os usuários de drogas e suas sugestões para prevenção a um consumo
que pode ser prejudicial aos estudantes.

35
4 Procedimentos metodológicos

O presente trabalho utilizar-se-á da abordagem qualitativa de pesquisa


na medida em que refere-se a um objeto que, por sua natureza, é um objeto
das ciências sociais, pois trata-se de um grupo de alunos de graduação da
USP, vivendo num contexto específico – o da residência estudantil -
pertencente a uma determinada classe social, no momento histórico
contemporâneo, com uma dada vivência sobre o uso de drogas.
Trata-se de um estudo de natureza exploratória que procurará descrever
alguns aspectos de realidade específica da moradia, analisando-os e
levantando novas hipóteses a serem investigadas.
Minayo (1999) reafirma a potência da pesquisa de corte qualitativo para
dar conta do objeto das ciências sociais, elucidando a complexidade das
relações sociais que se estabelecem entre indivíduos “em determinada
condição social pertencente a determinado grupo social ou classe com suas
crenças, valores e significados” (Minayo, 1999, p.22).
Na pesquisa qualitativa existe m algumas propostas operacionais para
organização e análise do material coletado. Neste trabalho, o procedimento
metodológico que serviu de base para a coleta e organização do material
proveniente das entrevistas é denominado “Discurso do Sujeito Coletivo” (DSC).
Segundo Lefévre, a proposta é que tanto através de entrevistas, quanto
de artigos de jornal, revista, ou literatura se possa captar os diversos discursos,
ou seja, diversas formas de compreensão de uma temática presentes num
grupo específico. Nessa compreensão, os discursos são vistos como histórica e
socialmente determinados, o que condiz com as preocupações deste trabalho.
O DSC é, portanto, um conjunto de procedimentos metodológicos que
visa organizar o material verbal em forma de discursos síntese que expressam
as diferentes idéias presentes em um determinado grupo. Parte-se do

36
pressuposto de que o pensamento individual se expressa em formato de
discurso, e que por sua vez, esse discurso é compartilhado por um grupo.
Portanto, para se conhecer o que um dado grupo social pensa sobre
determinado tema faz-se necessário acessar os discursos individuais,
agrupando-os por semelhança ou complementaridade.
O início das entrevistas se deu após a aprovação do Comitê de Ética em
Pesquisa da Escola de Enfermagem da USP (anexo 1) e da autorização da
COSEAS – Coordenadoria de Assistência Social (anexo 2) que gerencia o
CRUSP.
Não foi possível discutir o projeto com a representação dos alunos
moradores do CRUSP (AMORCRUSP), embora tivesse sido procurada por
diversas vezes.

4.1 Coleta de dados

A técnica de entrevista foi escolhida devido à sua aplicabilidade nos


trabalhos científicos qualitativos, sendo uma das formas mais utilizadas para se
obter informações que permitam aprofundar as diferentes opiniões e crenças
dos entrevistados sobre um determinado assunto (Minayo 1994, Lefèvre 2000).

“A entrevista produz sempre uma


interpretação daquele que relata, trabalhando na
própria subjetividade a objetividade do real”
(Schraiber 1994 p -65)

As entrevistas foram individuais e semi-estruturadas, realizadas após


conversa com o entrevistado, na qual se apresentou o objetivo, o projeto e as
autorizações para a realização da pesquisa. As entrevistas foram gravadas e se
iniciaram somente após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e

37
Esclarecido (anexo 3). A maioria das entrevistas foi realizada no CRUSP, mas
houve casos em que ocorreu na faculdade, em uma sala específica na Escola
Politécnica liberada para esse fim e até mesmo em banco de jardim na USP.
O roteiro de perguntas foi elaborado de forma a se obter a caracterização
sócio-demográfica do aluno, seu conhecimento da história do CRUSP, seu
sentimento sobre a moradia, sua participação em atividades de lazer, sua
opinião sobre: quem usa drogas, o uso de drogas no CRUSP, a idéia presente
na USP de que o CRUSP é um ambiente livre e que propicia o uso de drogas e
quais as suas sugestões sobre o que pode ser feito – prevenção (anexo 4).
O enunciado de algumas perguntas (no 3 e 6) sofreu alterações durante o
processo de realização das entrevistas, o que condiz com uma idéia presente
na pesquisa qualitativa de que o roteiro freqüentemente será atualizado a partir
do diálogo estabelecido entre pesquisador e os pesquisados (Schraiber, 1995).
Por entender-se, em primeiro lugar, que a pesquisa qualitativa constitui
um processo de aperfeiçoamento que depende, entre outras coisas, da relação
entre entrevistador e sujeito da pesquisa, e, em segundo lugar, que o objeto
deste trabalho está centrado nas particularidades do CRUSP, não foram
realizadas entrevistas piloto, tomando-se as mudanças que por ventura se
fizessem necessárias ao roteiro, como parte do processo de aprimoramento do
estudo (Demartine, 2001).
De maneira geral, o número de pessoas a serem entrevistadas na
pesquisa qualitativa (amostra) só é definido a partir: da obtenção de dados que
de fato correspondem ao objeto empírico e do processo de reincidência das
informações que devem, por outro lado, permitir um certo grau de diversificação
presente num grupo determinado (Minayo, 1994). No caso particular do
discurso do sujeito coletivo, a técnica vem estipulando, a partir da experiência
acumulada, o número de 20, quando então a probabilidade de mudanças no
discurso é muito pequena (Lefèvre, 2000).
Assim, foram realizadas 20 entrevistas, pedindo-se sempre aos
entrevistados que indicassem pelo menos dois colegas de outros cursos,
moradores do CRUSP. Essa técnica, conhecida como snowball, tem sido
38
indicada, por possibilitar melhor recepção e disponibilidade do entrevistado em
relação a pesquisa pois permite que o pesquisador e entrevistado sejam de
alguma forma apresentados (Becker 1994, Nappo 1999).
As duas primeiras entrevistadas foram alunas da Escola de Enfermagem
com quem se mantinha algum contato. As entrevistas posteriores com os
alunos indicados foram marcadas por contato telefônico. Houve muitas
dificuldades na marcação de horários, uma vez que, na maioria das vezes, os
estudantes trabalham e estudam, ocasionando remarcações. Esse processo se
repetiu até a entrevista no. 12 e durou aproximadamente dois meses. Por causa
disso mudou-se a estratégia de contato com os alunos. A pesquisadora foi até o
CRUSP em dois finais de semana (um sábado e um domingo), realizando as
entrevistas a partir da consulta a estudantes que estavam no corredor, nos
apartamentos, indagando, e solicitando a um entrevistado que indicasse um
colega que estivesse no CRUSP naquele dia. Assim foram realizadas as 8
entrevistas que faltavam.
Durante todo esse processo houve uma preocupação em entrevistar
alunos que moram nos diferentes blocos da graduação (foram entrevistados 4
alunos por bloco), sendo metade de cada sexo, em cursos diferentes (40% dos
entrevistados estão fazendo algum curso na FFLCH (Faculdade de Filosofia
Letrtas e Ciências Humanas da USP) pois segundo o perfil dos moradores do
CRUSP elaborado pela COSEAS essa é a proporção dessa unidade no total de
moradores). Esses procedimentos se deram devido a importância de se obter
um grupo heterogêneo de entrevistados. Pois, embora o número de pessoas
entrevistadas se apresenta como uma questão fundamental para a pesquisa
qualitativa, para a construção dos Discursos do Sujeito Coletivo (DSC), que
pretende abarcar o universo de idéias, crenças, valores presentes sobre
determinado assunto, numa dada comunidade o mais importante é que a
amostra seja diversificada.
As entrevistas foram transcritas literalmente (encontram-se na íntegra no
CD rom na contra capa desse trabalho) para que após análise do material, se
obtenha os Discursos do Sujeito Coletivo. O interesse por estes discursos se
39
dá, pois parte-se do pressuposto que “o pensamento coletivo pode ser visto
como um conjunto de discursos sobre um dado tema” (Lefévre 2002 p. 11).

4.2 Caracterização dos alunos do Conjunto Residencial da Universidade


de São Paulo – CRUSP

O número total de moradores oficialmente cadastrados, atualmente, é de


1.348 (graduação 970 e pós-graduação 378). O CRUSP apresenta 7 blocos, de
A-G, com 6 andares e 11 apartamentos por andar cada apartamento foi
dimensionado para 3 estudantes. Dos 7 blocos, 5 destinam-se a alunos de
graduação e dois a alunos de pós-graduação.
A moradia é gratuita e destina-se a alunos de graduação e pós-
graduação da USP, regularmente matriculados que passam por processo
seletivo no início de cada ano. Esse processo é classificatório e baseado em
uma avaliação do nível sócio-econômico do aluno, feita pelas assistentes
sociais da Divisão de Promoção Social (DPS). No final de cada ano é feita a
reavaliação dos alunos.
Nos blocos da graduação há uma cozinha por andar, uma lavanderia por
bloco. Nos blocos existem áreas coletivas como: sala de vídeo e sala pró-aluno
com 22 computadores disponíveis para todos os moradores. Todos os blocos
possuem uma portaria que tem a função de fazer a segurança e receber as
ligações telefônicas para os moradores. A manutenção dos prédios é feita pela
Coordenadoria de Assistência Social da USP (COSEAS).
A atualização do perfil sócio econômico dos alunos de graduação,
moradores do CRUSP é elaborada pela equipe de assistentes sociais da
COSEAS.4 No documento a que tivemos acesso não constava o número bruto

4
Os dados apresentados referem -se a reavaliação de 590 alunos, em documento interno da COSEAS. -
Coordenadoria de Assistência Social - Perfil sócio-econômico dos moradores do CRUSP- Graduação. São
Paulo; 1999.
40
dos alunos para cada categoria apresentada.

Quadro 1 - Distribuição dos alunos de graduação selecionados para morar


no CRUSP, segundo a caracterização sócio-demográfica. Perfil sócio-
econômico dos moradores do CRUSP- Graduação. São Paulo; 1999

Idade
17-21 22-24 25-28 29-35 Acima de 35 Total
26% 37% 27% 8% 2% 100%

Estado civil Filhos


Solteiro Casado Separado Total Sim Não Total
96% 3% 1% 100% 5% 95% 100%

Fonte de renda*

bolsa de
estágio família Outras fontes salário Total
estudos

27% 27% 25% 13% 8% 100%

Renda ( salário mínimo)**


R$ 151,00 á R$ 302,00 à
R$151,00 R$ 453,00 Total
R$ 302,00 R$ 453,00
30% 36% 23% 11% 100%

No quadro 1 verifica-se que a maioria dos alunos moradores do CRUSP


encontra-se na faixa de 22 a 24 anos (37%). Também a maioria dos moradores
é solteira (96%) e sem filhos (95%). No que se refere a origem da renda nota-se
que a maioria tem bolsa de estudo - inclui-se aqui o estágio – (54%) e ganha
entre um e dois salários mínimos (89%).

41
Quadro 2 - Distribuição dos alunos de graduação selecionados para morar
no CRUSP, segundo a caracterização do curso. Perfil sócio-econômico
dos moradores do CRUSP- Graduação. São Paulo; 1999

Curso
FFLCH ECA EP IF IME EE FEA FCF EEFE FAU subtotal

46% 8% 5% 5% 5% 4% 4% 3% 2% 2% 84%

Curso
FE FM IAG IB IQ IGc FSP FO IP FMVZ total

2% 2% 2% 2% 2% 2% 1% 1% 1% 1% 100%

Período

Matutino Diurno Noturno Integral Vespertino Total

11% 9% 42% 28% 10% 100%

*Cursos: FFLCH – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, ECA – Escola


de Comunicação e Arte, EP – Escola Politécnica, IF – Instituto de Física, IME –
Instituto de Matemática e Estatística, EE – Escola de Enfermagem, FEA – Faculdade
de Economia, Administração e Contabilidade, FCF – Faculdade de Ciências
Farmacêuticas, EEFE – Escola de Educação Física e Esporte, FAU – Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, FE – Faculdade de Educação, FM – Faculdade de Medicina,
IAG – Instituto Astronômico e Geofísico, IB - Instituto de Biociências, IQ Instituto de
Química, IGc – Instituto de Geociências, FSP – Faculdade de Saúde Pública, FO
Faculdade de Odontologia, IP – Instituto de Psicologia, FMVZ – Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia.

No quadro 2 verifica-se que a maioria dos alunos está cursando a FFLCH


(46%), em período integral (28%) ou noturno (42%).

42
Quadro 3 - Distribuição dos alunos de graduação selecionados para morar
no CRUSP, segundo a caracterização sócio-demográfica de suas famílias.
Perfil sócio-econômico dos moradores do CRUSP - Graduação. São Paulo,
1999.

Situação ocupacional do pai Situação ocupacional da mãe


Aposentado 28% Aposentada 8%
Autônomo 27% Autônoma 12%
Empregado 18% Empregada 21%
Falecido 13% Falecida 5%
Não consta 7% Não consta 2%
Desempregado 6% Desempregada 2%
Trabalho informal 1% Trabalho Informal 2%
---- ---- Trabalho doméstico 48%
Total 100% Aposentada 100%

Grau de escolaridade
Pai Mãe
1o. grau incompleto 38% 37%
1o. grau completo 17% 17%
2o. grau incompleto 4% 5%
2o. grau completo 13% 17%
Superior incompleto 4% 3%
Superior 12% 12%
Analfabeto 3% 6%
Não consta 7% 2%
Falecido 2% 1%
Total 100% 100%

No quadro 3 nota-se que a maioria dos pais trabalha como autônomo


(27%) ou está aposentado (28%) e que as mães majoritariamente exercem o
trabalho doméstico e o cuidado da casa e da família (48%). No que se refere a
escolaridade dos pais a maioria tem apenas o primeiro grau incompleto (pais
38% e mães 37%).

43
5 Procedimentos para análise dos dados

A análise dos dados orientou-se na confluência das indicações da


proposta do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), principalmente, de Lefévre
(2002) e da análise temática de Bardin (1977). Para tanto, foram copiadas
literalmente as respostas de cada entrevistado para cada questão em um
quadro denominado Instrumento de Análise do Discurso 1 (IAD 1). Foram
agrupadas as respostas de todos os entrevistados a cada pergunta do roteiro.
Cada resposta foi analisada de forma a encontrar as figuras metodológicas
propostas por Lefévre: a primeira delas é denominada expressão-chave.
Chama-se de expressões-chave as transcrições literais dos discursos das
respostas dadas às perguntas.
Posteriormente destacou-se através do uso de elementos gráficos as
idéias centrais das expressões-chave. Entende-se por idéia central a descrição
do sentido do depoimento, que é dado pelo pesquisador, que revela o que foi
dito pelo sujeito de forma indireta e resumida e constitui a segunda figura
metodológica do método proposto.
Passou-se a agrupar as idéias centrais de mesmo sentido através do uso
de letras para facilitar o reconhecimento dos diferentes grupos, que passaram a
fazer parte de um quadro denominado Instrumento de Análise do Discurso 2
(IAD 2). Ao agrupá-las formulou-se uma idéia central síntese, expressando o
conjunto agrupado. Essa idéia central síntese é bastante semelhante ao que
Bardiin (1977 p. 105) chama de tema ou “a unidade de significação que se
liberta naturalmente de um texto analisado segundo certos critérios relativos à
teoria que serve de guia à leitura”.
Assim, essa forma de organizar o material possibilitou a identificação das
idéias previamente discutidas do ponto de vista teórico e que se encontravam
contempladas pelas perguntas do roteiro. Além disso, constatou-se uma das

44
vantagens da pesquisa qualitativa que prevê que no decorrer da entrevista, os
sujeitos retomem e aprofundem os pontos que consideram mais relevantes.
Esses aspectos foram levados em conta, ou seja, embora a organização inicial
do material tenha sido feita, por pergunta do roteiro, num segundo momento, as
respostas que representavam idéias presentes em outras perguntas foram
reagrupadas de acordo com o sentido.
No presente trabalho optou-se por não separar das idéias-centrais a
terceira figura metodológica do DSC denominada ancoragem, uma vez que as
crenças e valores cristalizados que constituem a ancoragem no discurso dos
estudantes foram incorporados às expressões que designam os diferentes
sentidos.
O DSC, a quarta e última figura metodológica do método utilizado, é
formado por operações realizadas para que o discurso apresente um sentido,
com começo meio e fim. Essas são realizadas pelo pesquisador nas
expressões-chave para que tenham um significado conjunto. O DSC é
apresentado na primeira pessoa do singular, como se o coletivo estivesse
falando.
A etapa final constituiu-se na criação do discurso do sujeito coletivo
(DSC) para cada idéia central. Essas foram agrupadas por temas ou categorias
de análise provenientes do marco teórico do estudo.

45
6 Resultados e análise

Os resultados serão apresentados relacionando-se as idéias centrais


síntese (ou temas) aos discursos dos sujeitos coletivos (DSC) correspondentes,
reunidos de acordo com três categorias amplas: o que dizem os moradores do
CRUSP sobre a história do CRUSP; como é morar no CRUSP; a visão dos
moradores sobre o uso de drogas. As expressões-chave que geraram as idéias
centrais síntese e os DSCs encontram-se no CD Rom na contra capa .
Para apoiar a compreensão dos discursos, em primeiro lugar será
apresentado, em forma de quadros, o perfil dos alunos moradores do CRUSP
que constituíram os sujeitos deste trabalho, levantados por ocasião da
entrevista.

6.1 Quem são os moradores que constituíram os sujeitos da pesquisa

Os quadros a seguir, que caracterizam o conjunto dos sujeitos da


pesquisa, mostram bastante semelhança com a população de estudantes
moradores no CRUSP, descrita na metodologia e que serviu de base para
definir os critérios para participação na pesquisa.

46
Quadro 4 - Distribuição dos participantes da pesquisa, segundo a
caracterização sócio-demográfica. CRUSP, São Paulo, 2003.

Sexo Idade
Masculino Feminino 20 -- 25 25 -- 30 30 -- 35 35 -- 40

N % N % N % N % N % N %
10 50 10 50 14 70 3 15 2 10 1 5

Estado civil Filhos


Solteiro Casado Sim Não
N % N % N % N %
20 100 0 0 0 0 20 100

Fonte de renda*

Estágio Trabalho Bolsa para auxiliar a renda Iniciação científica Família

N % N % N % N % N %

5 25 4 20 6 30 3 15 6 30

Renda ( salário mínimo)**


Até 1 1 -- 2 2 --- 4 4 --- 5
N % N % N % N %

7 35 7 35 2 10 3 15

*4 entrevistados referem duas fontes de renda. **A pergunta sobre a renda não foi feita a um dos
entrevistados.

O quadro 4 demonstra que, conforme proposto inicialmente, metade dos


entrevistados é do sexo masculino (10 alunos – 50%) e metade do sexo
feminino (10 alunos – 50%). A maioria se encontra na faixa dos 20 a 25 anos
de idade (14 alunos – 70%), sendo todos solteiros e sem filhos (20 alunos –
100%). Pode-se notar que a fonte de renda da maioria está na dependência do

47
próprio estudante - bolsa de estudos de várias naturezas ou estágio (14 alunos
– 70%) - e está na faixa de até dois salários mínimos (14 alunos – 70%).

Quadro 5 - Distribuição dos participantes da pesquisa, segundo o curso


que freqüentam e tempo de moradia no CRUSP. CRUSP, São Paulo, 2003.

Curso*
EE FFLCH FM FE FAU EP EEFE ECA

N % N % N % N % N % N % N % N %
2 10 9 45 2 10 1 5 1 5 3 15 1 5 1 5

Ano Período

1—2 2--3 3--4 Licenciatura Matutino Noturno Integral

N % N % N % N % N % N % N %

3 15 8 40 7 35 2 10 3 15 8 40 9 45

Tempo de moradia no CRUSP

8 m a 1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 a 6 anos

N % N % N % N % N %

2 10 8 40 6 30 2 10 2 10

* Cursos: EE – Escola de Enfermagem, FFLCH – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências


Humanas, FM – Faculdade de Medicina, FE – Faculdade de Educação, FAU – Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, EP – Escola Politécnica, EEFE – Escola de Educação Física e
Esporte, ECA – Escola de Comunicação e Arte.

O quadro 5 demonstra que a maioria dos entrevistados estuda na FFLCH


(9 alunos – 45%), está entre o segundo e quarto ano da faculdade (16 alunos –
80%), no período noturno (8 alunos – 40%) ou integral (9 alunos – 45%) e mora
no CRUSP de dois a três anos (14 alunos -70%).

48
Quadro 6 - Distribuição dos participantes da pesquisa, segundo a
caracterização sócio-demográfica de suas famílias. CRUSP, São Paulo,
2003.

Local de moradia dos pais*


Capital Interior/SP Outros Estados Falecidos
N % N % N % N %
3 15 12 60 4 20 2 10
Situação de inserção no trabalho dos pais**
Mãe Pai
N % N %
Ativo 4 20 10 50
Inativo 3 15 6 30
Desempregado 1 5 0 0
Trabalho doméstico 9 45 0 0
Falecido 2 10 1 5
Não há informação 1 5 3 15
Escolaridade dos pais***
Mãe Pai
N % N %
Sabe ler e escrever 1 5 0 0
Fundamental Incompleto 8 40 7 35
Fundamental Completo 1 5 2 10
Técnico Completo 3 15 2 10
Médio Completo 4 20 4 20
Superior Incompleto 2 10 2 40
Superior 1 5 2 20
Regularidade com que visita os pais****
Raramente ou
Freqüentemente Ocasionalmente
Sem família
N % N % N %
9 45 7 35 4 20
*O entrevistado no 4 refere que o pai mora no interior e a mãe na capital
** *** ****O entrevistado no 6 não tem contato com o pai e sua mãe é falecida
**A pergunta sobre a inserção dos pais no mercado de trabalho não foi feita ao entrevistado no 4
**O entrevistado no 17 refere que os pais são falecidos
O entrevistado n o 13 não tem contato com o pai
****Freqüentemente: toda semana, uma ou duas vezes ao mês; ocasionalmente: a cada mês e meio, a
cada três meses, nos feriados prolongados e semestralmente; raramente: a cada um ou dois anos

No quadro 6 verifica-se que a maioria dos pais dos alunos moradores do


CRUSP mora no interior de São Paulo (12 pais - 60%), as mães em sua maioria
cuidam da casa e da família (9 mães – 45%) e metade dos pais estão ativos
economicamente (10 pais – 50%). No que se refere a escolaridade, 35% dos

49
pais não concluíram o ensino fundamental (7) e 40% das mães (8). Os filhos
visitam seus pais, em sua maioria, freqüentemente (9 alunos – 45%), mas vale
ressaltar a expressividade daqueles que os visitam ocasionalmente (7alunos –
35%).

6.2 O que dizem os moradores do CRUSP sobre a história do CRUSP

Os moradores entrevistados mostram conhecer pouco a respeito da


história do CRUSP, limitando-se a informações esparsas, pouco adensadas,
como se pode perceber nas idéias centrais/temas e respectivos DSCs abaixo
relacionados.
O discurso predominante é o de que não têm informação ou têm
informação superficial no que se refere à origem do CRUSP.

Não há informação ou a informação é superficial


no que se refere à origem do CRUSP

O que eu sei da história do CRUSP, não sei nada.


Sinceramente não. Quando a gente veio pra cá teve uma
reunião, mas eu por estudar período integral cheguei super
atrasada, cheguei no final não fiquei sabendo nada do CRUSP,
então não sei.
Sei que já faz muito já tempo que ele está aqui e que é só
pra aluno de graduação e pós-graduação. Não sei muita coisa.
Tenho uma visão superficial, de cima, não é detalhada, mais
isso do que eu li nesse mural e eu escuto, eu já ouvi algumas
coisas assim.
Muito pouco, da história mesmo, de como começou, mas
eu ouvi falar que no começo foi um tipo de ocupação mesmo,
até professores já comentaram isso. O que eu sei também é o
discurso formalizado pelas entidades porque quando eu cheguei
aqui eu participei dos movimentos da AMORCRUSP.
Mas se você assiste ao vídeo que o COSEAS passa
quando a gente ingressa sabe um pouco disso. O vídeo fala
muito sobre isso e tem gente que se interessa um pouco pela
história do CRUSP. Eu, por exemplo, assisti aquele vídeo
“Experiência cruspiana”. Eu sei da fundação, de como foi

50
depois que foi esvaziado no período militar, essas coisas assim,
o histórico. Quando eu cheguei aqui eu tentei fazer um trabalho
de campo sobre o CRUSP, a dificuldade das pessoas que vem
de fora se adaptarem, então eu procurei algumas coisas.

Mas alguns recordam quase que de maneira lendária a informação de


que a origem da moradia estaria ligada à possível hospedagem de atletas para
jogos Panamericanos que não aconteceram devido a uma epidemia um tanto
incerta também.
O CRUSP foi construído para os Jogos Pan-
americanos

A gente sabe aquela velha história, que foi construído


para receber os atletas que vinham aqui fazer aqueles jogos,
não sei das quantas. Aqui era um alojamento e a USP ia
hospedar os atletas, que eram esses blocos aqui como
alojamento. Então eu sei que não foi construído pra ser
moradia, era pra ser utilizado nos jogos Pan Americanos, que
depois não ocorreram por causa de uma epidemia, que eu não
me lembro do que. Eu acho quando tava acabando as obras
teve um surto de malária, e aí se cancelou os jogos e ficou o
complexo esportivo e o CRUSP. E o CEPE também foi
construído meio que pra sediar os jogos que ia ser acho que no
começo da década de setenta, se eu não estou enganado, e aí
tiveram vários projetos e tal e ganhou esse projeto aqui.
Olha o que eu sei sobre a história do CRUSP é que
originalmente parece que o projeto era pra ser a vila olímpica.

Alguns estudantes marcam a história do CRUSP sob o ponto de vista de


sua estruturação enquanto moradia, assinalando a precariedade com que
iniciou, algumas melhorias que foram sendo realizadas ao longo do tempo e a
esperança que têm de que possa melhorar ainda mais.

Houve mudança na estrutura dos prédios

Primeiro [o CRUSP] foi construído de uma maneira bem


precária e depois foi feita essa coisa de moradia, foi
melhorando com o tempo, a gente sabe que teve uma época
que era tudo que meio que barracão, que os prédios não foram
todos acabados, tinham blocos que estavam só na parte
estrutural. Nessa época, a estrutura era muito precária porque
era toda de maderite, a higiene era complicada, não tinha essa
divisão de três quartos era bem diferente mesmo do que é hoje
em dia.

51
Na parte de arquitetura eu sei que foi acho que do
“Coron”, que queria fazer um jeito de morar diferente, com as
áreas coletivas, enfim essas coisas.
É foi no meio dos anos 80 e no começo dos anos 90
começou uma, uma reforma em cada bloco, começou no bloco
F e veio até esse aqui que é o último bloco que foi reformado.
Tanto que ele é um bloco novo, foi entregue em 2001
Eu vejo desde quando eu vim pra cá em 2000 algumas
coisas melhoraram. Quando eu cheguei mesmo esse corredor
hoje tem piso, era todo esburacado, era uma calçada. Isso ali
eles melhoraram, eles terminaram a reforma do bloco.
Esperamos que melhore mais ainda, pelo menos o prédio
tá tendo melhorias, tentando melhorar, isso quanto aos prédios.

Há de forma menos marcante, mas bastante curiosa uma certa


indisposição para contar a história da constituição da moradia que vem sob a
explicação de que trata -se de uma história longa ou que deve ser contada
mediante algumas condições, como se a mudez significasse um protesto .

Indisposição para contar a história

A vida do CRUSP é antiga, começa nos anos sessenta,


quando os prédios aqui da reitoria eram de fato moradia
estudantil ainda, mas aí a história é muito longa.
Quando a reitoria devolver os nossos prédios a gente fala
até dizer chega, enquanto ela não devolver a gente não vai
ficar falando não.

Muitos discursos refletem conhecimento sobre a luta do movimento


estudantil no CRUSP, relacionando-o a uma história conturbada, fruto de
reivindicação dos alunos e até mesmo de um processo de invasão, que sofre
com a presença da polícia chamada durante a ditadura militar para conter os
estudantes. Os estudantes referem perseguições e mortes nesse período de
conflitos e apontam o início de um estigma que marca a moradia.

O CRUSP tem uma história conturbada, com


embates e lutas, de destaque no período da ditadura. É
o início de um estigma.

Eu sei sobre [o CRUSP é que o] prédio onde é a reitoria


era moradia, mas também sei da época do período militar, que
52
teve invasão e tal, que os militares tomaram aqui e teve
conflitos aqui também.
As reivindicações foram reivindicações sempre com
choques entre os seguranças aqui da USP e os estudantes e
essas pessoas morreram, já teve casos de mortes.
Ele [o CRUSP] foi invadido pelos estudantes depois
várias vezes e foi interditado pela polícia. Várias coisas
ocorreram, principalmente no regime militar muita gente foi
presa e [esse espaço] ficou durante muito tempo fechado.
Depois os alunos voltaram a invadir e nessa época ele era
usado pela universidade um dos blocos era o MAE, Museu de
Arqueologia e Etnologia, eles invadiram e ainda estavam lá as
peças do museu e foi muito complicado.
Mas, quando houve a ditadura, o golpe de 64, muitos
estudantes invadiram e o CRUSP passou a ser conhecido como
reduto da clandestinidade, de pessoas que contestavam a
ditadura e que eram intensamente perseguidas.
Eu acho que esse foi o início da má imagem que o
CRUSP tem hoje na sociedade. Então é um histórico assim
bastante conturbado realmente.

A moradia foi uma reivindicação dos alunos


[O CRUSP] surgiu a partir da reivindicação dos alunos a
algumas décadas, duas ou três décadas. Com o passar do tempo,
os estudantes começaram a reivindicar a ocupação desses
apartamentos. Assim, o CRUSP foi uma reivindicação dos
alunos, como um direito. Eles começaram a usufruir do espaço.
O que eu sei é mais ou menos isso, e que dali saíram
muitas pessoas que lutavam pela universidade.

Para morar no CRUSP os alunos tiveram que


invadi-lo

Olha, eu sei que a moradia foi conseguida a custa de um


pouco de luta, que as pessoas acabaram invadindo esses
prédios, parece que foi uma luta dos alunos, uma requisição. Os
prédios estavam ociosos, aos poucos foram sendo ocupados por
estudantes que não tinham condições de pagar, sendo
regulamentado aos poucos.

Poucos alunos relacionam a história do CRUSP à da COSEAS, que


surgiu para regulamentar a moradia.

53
No passado não havia controle sobre quem
morava no CRUSP, a COSEAS foi criada para
regulamentar isso

Aí chegou uma época que morava gente que nem era da


USP, não havia o controle. Depois foi criado o COSEAS pra
regulamentar isso. Que tinha pessoas que não eram da USP e
que moravam aqui e que mais que eu posso falar assim era
uma zona aqui, tinha morte, tinha tráfico de drogas e tudo e o
COSEAS foi criado pra acabar com isso e regularizar um
pouco isso e junto também foi criado a associação de
moradores do CRUSP.

Também apareceu a idéia de que o CRUSP sempre foi uma moradia


destinada aos alunos pobres e que moram longe da universidade.

Os critérios para entrar no CRUSP sempre


foram a distância da casa e situação sócio-econômica

Eu tenho conhecimento que [o aluno] foi sempre


avaliado pela situação sócio-econômica [para entrar no
CRUSP], todos os moradores. E que quanto mais longe você
mora, mais fácil de você conseguir, eles dão prioridade para
pessoas que moram mais longe.

6.3 Como é morar no Crusp

Nesta categoria estão reunidas todas as idéias centrais síntese e os


Discursos do Sujeito Coletivo correspondentes que se referem aos benefícios,
dificuldades e formas de enfrentar as dificuldades e preconceitos vividos pelos
moradores do CRUSP.
Em primeiro lugar, o que se percebe é que os moradores explicitam o
fato de que morar no CRUSP viabiliza estar na universidade porque eles não
têm gastos com moradia, podendo inclusive comprar alguns livros; há melhora
na qualidade de vida na medida em que não se gasta tempo com trânsito,
podendo se dedicar mais aos estudos e usufruir do ambiente do campus e de
recursos como o CINUSP, por exemplo; por fim, alguns poucos apontam para a

54
tranqüilidade do ambiente, admitindo inclusive que pode ser bom ficar aos
domingos no CRUSP; e mesmo o alojamento pode ser positivo se o estudante
está interessado em ter alguma cultura geral.

Morar no CRUSP é bom porque não se tem


gastos com a moradia e isso viabiliza estar na
Universidade

Positivo eu acho que é claro, não paga nada, não paga


luz, não paga água, não paga aluguel, simplesmente mora lá.
Isso é uma coisa que pra quem realmente precisa eu acho que
ajuda demais. Eu não teria condição de pagar uma moradia tão
perto da Universidade, muita gente que mora aqui sem essa
moradia ia tornar impraticável a faculdade.
Aqui você consegue administrar muito bem o dinheiro
porque além da moradia você tem uma sustentação que é a
bolsa alimentação, a bolsa trabalho. Então você realmente é
sustentado por um aparelho que é uma rede de relações que te
sustenta aqui que dá condições pra você, mesmo que você
ganhe pouco com a bolsa você tem condições de mobilidade
maior. Uma coisa que muda [ao] morar no CRUSP também é o
seu padrão de consumo, acho que seria muito diferente se eu
morasse na minha cidade e estudasse aqui, por exemplo, eu
pensaria duas vezes em chegar numa livraria e gastar trinta
reais num livro e eu fui entrar [pela primeira vez] no cinema
aqui no CINUSP.
Um outro ponto é que o meu curso antes do CRUSP e
depois do CRUSP não tem nem comparação, também pela
pesquisa, experiência de pesquisa que eu tive dois anos de
bolsa na Pedagogia, isso me ajudou muito assim. Então tinha
aquela fonte de renda, você tava aqui, bolsa moradia, bolsa
alimentação, entendeu? Eu não tinha praticamente preocupação
nenhuma foi um período maravilhoso pra mim enquanto durou
a pesquisa.
Também acho que a gente mora num lugar é privilegiado
assim que é bastante arborizado, bem tranqüilo, tem os
pássaros, assim, pra São Paulo é um lugar legal pra se morar.

Morar no CRUSP melhora a qualidade de vida


dos alunos

De positivo a facilidade, você não perde tempo no


trânsito, você tem acesso a todas as coisas aqui dentro muito
fácil. Não tem estress pra chegar na faculdade, está perto das
bibliotecas e dos laboratórios, você consegue viver um pouco
mais intensamente a vida acadêmica claro, isso se você se
55
dispuser a tal. Você acaba ficando mais tempo aqui [na
Universidade] e aproveitando seu tempo aqui. Então tipo você
às vezes pode assistir uma matéria a tarde que você não
poderia se você tivesse que ficar se locomovendo.
A faculdade fica aqui do lado, tem várias atividades aqui
dentro, você conhece bastante gente de lugar diferente, você
vivencia a universidade de outra forma porque você não vai pra
faculdade você está dentro da faculdade.
É um lugar tranqüilo, eu nunca vi acontecer nada de mais
assim, tem uma discussão ou outra.
Morar e estudar no mesmo lugar é uma vantagem, o
verde é outra é uma área muito gostosa aqui.
Quem mora no CRUSP, trabalha na USP e estuda na
USP respira o campus 24h por dia. Então isso eu acho uma
vantagem bacana, você acaba tendo uma qualidade de vida boa
nesse sentido, principalmente pra quem estuda a noite, que
geralmente trabalha então é mais corrido.

É bom morar no CRUSP

Eu acho o lugar agradável, eu me sinto em casa como se


eu estivesse na minha própria casa, aonde eu moro ali o bloco é
muito tranqüilo. No geral eu acho bem legal, acho que é difícil
ter a oportunidade de estar em lugares assim, ter uma
universidade que ofereça moradia, eu acho até legal.

É bom ficar no CRUSP no domingo

A gente fica [no CRUSP] numa boa, um domingo é


gostoso passar aqui pra descansar, legal pegar a bicicleta sair,
passear, comprar alguma coisa no mercado e voltar, tranqüilo.

É positivo morar no alojamento para quem está


descobrindo a cultura

Quando eu cheguei eu fiquei seis, sete meses num


alojamento que chegou a ter 50 pessoas morando no quarto.
Era muito legal porque de repente a mina chegou pra mim a
gente conversando sobre literatura chegou falou assim é o
seguinte vou fazer uma lista pra você de filme você vai lá você
assiste porque ninguém pode passar sem assistir esses filmes.

Dentre os aspectos positivos identificados pelos alunos tem-se também:


para alguns a infra-estrutura oferecida é suficiente para quem quer estudar
(mas só para quem deseja estudar, porque morar no CRUSP não se constitui

56
em possibilidade de ascensão como tornar-se professor da USP por exemplo);
para outros há ênfase na possibilidade de aprender a conviver com a
diversidade e aprender com pessoas de outras áreas e até mesmo o cuidado
dispensado pelos funcionários do CRUSP (faxineiras e porteiros) aos alunos da
moradia é observado por alguns estudantes.

O CRUSP oferece a infra-estrutura necessária


para quem quer estudar

Bom, pra mim eu acho que pra estudar, pra quem tem o
propósito de estudar, como é o meu caso, eu acho um espaço
extremamente agradável, porque você tem a sua privacidade,
você tem o seu quarto, uma escrivaninha a cama o guarda -
roupa tudo que você precisa pra estar aqui estudando mesmo.
Você pode estudar tranqüilamente é silencioso é bem arejado,
claro, acho bem legal, pelo menos no bloco onde eu estou dá
pra estudar sem ser incomodado com o som alto.
Pra mim que só moro e fico aqui de dia de semana pra
estudar eu acho que são quatro anos a gente passa numa boa.
Então se você vem de muito fora de uma outra realidade que
não é a universidade é bastante positivo porque você observa e
aprende, agora se isso aqui for seu objeto de consumo, se você
de fato quiser virar professor aí é lamentável.

Morar no CRUSP ensina a conviver com a


diversidade

Ali no meu andar todas as pessoas conversam se dão


bem, respeitam, o silêncio, eu não posso reclamar de nada pelo
menos no meu bloco, a convivência ali onde eu moro é muito
boa. Então acho que isso que tem isso de positivo, assim a
gente troca, ali nos meus vizinhos, eles são de outros cursos, a
gente está sempre junto conversando acho isso legal. Assim
como tem pessoas de outros países ali no meu andar, acho que
isso tem de positivo, as diferenças, mesmo, você vê gente com
culturas completamente diferentes da sua e que de repente você
nunca tinha visto uma determinada coisa, mas a partir do
momento que você vê, você começa a aceitar melhor o outro e
as suas diferenças.
O CRUSP é uma espécie de redemoinho cultural é muito
bom para quem vem das classes mais baixas. Tipo onde gente
de tudo que é lugar, com diferentes experiências chega com a
vontade de querer trocar na verdade com a necessidade de ter
um diálogo e tal e isso foi muito bom pra mim porque até
então, por exemplo, eu fui conhecer a primeira pessoa que
57
fazia sociais aqui na faculdade. Então na verdade você sente
essa necessidade de trocar e tal aí quando você chega você fala
nossa! Que mundo é bem legal! Acho que pra mim foi positivo
não só pelo lado econômico, mas pelo lado de experiência
mesmo.

Os porteiros e faxineiras “cuidam” dos alunos

E sei lá, eu acho que existe uma atenção muito boa por
parte dos porteiros, eles anotam os recados, os telefones,
alguns sabem até o seu nome, se metem na sua vida, sua mãe
ligou duas vezes e você não estava. Isso eu acho até legal
porque, a gente ta aqui sozinho. Tipo, ninguém vê a hora que
você chega ora que você sai, acontece alguma coisa com você
ninguém dá falta. Então eu acho legal essa preocupação. Eu
gosto dos porteiros aqui do meu bloco, acho eles muito
atenciosos, a moça que limpa o corredor também.

Alguns alunos referem que participam de atividades extra-curriculares no


Centro de Práticas Esportivas da USP ou na própria faculdade, mas quase não
participam de atividades oferecidas particularmente aos moradores do CRUSP,
realizando-se a sociabilidade principalmente nas festas com os amigos. Há
quem encontre dificuldades para levar adiante os projetos nessa área liderados
pela COSEAS.

Participa de atividades extra-curriculares na


faculdade e no CEPEUSP

O que eu participo mesmo é [de atividades] mais ligadas


à faculdade [ou] alguma coisa no CEPEUSP. [As atividades]
ficaram bastante restritas à faculdade depois de um certo
tempo. Você acaba encaixando suas atividades acadêmicas
com as atividades de lazer com esse [mesmo] grupo, aí é mais
fácil concatenar

Participa de festas com amigos

Geralmente a gente faz algumas festas [ou] vai na festa


de alguém. Quando surge a gente ah! meu vamos dar uma
desencanada, vamos fazer uma festa na casa de fulano, na casa
de cicrano.
É uma coisa que vai mais de acordo com todo mundo,
tipo, tem sempre aquela mesma galerinha, que sabe mais ou
menos o quê vai fazer, então é uma coisa que prende também,
58
uma coisa que eu percebo aqui é aquela questão dos grupos,
você circula em algumas festas tal, mas tem uns grupos que
tem mais a ver com você, sua afinidade, seu estilo de vida, seu
tipo de vida.
[No meu caso eu só vou] nas minhas festas[ou dos] meus
amigos do bloco F, ali [naquele] apartamento. [Se] eu
organizar a entrada é restrita, não é pública, de jeito nenhum.
Eu abomino esse caráter público das coisas, então as coisas que
eu faço são privadas, privativas. Não, é que o pessoal é cheio
de querer entrar na festa, acha que tem direito.

Participa de atividades extra-curriculares como


coordenador

Eu sou coordenador de um coletivo militante aqui na


universidade que é o coletivo movimento popular. O coletivo
movimento popular é um coletivo afro brasileiro, que defende
a inserção dos negros na universidade, mas de uma forma
bastante criteriosa, então a gente defende as cotas, as ações
afirmativas na USP, mas sempre acompanhada da assistência
estudantil, não porque a gente quer disputar poder não, porque
se nós formos disputar poder com a reitoria ou com a
universidade, a gente tem que lembrar que isso aqui é um
espaço do Estado e disputar poder com o Estado é reconhecer
que o Estado é alguém mais forte e eu acho que os negros não
precisam disso.
Eu tenho essa bolsa do CRUSP que é da COSEAS que
chama qualidade de vida no CRUSP e a minha função é
organizar eventos esportivos, eventos assim de lazer pra
moradores do CRUSP. Eu encontro uma certa dificuldade pra
colocar isso em prática porque é preciso sempre de alguma
verba pra comprar alguma coisa e tal e eles estão em contenção
de gasto, então acaba demorando pra conseguir organizar
alguma coisa.

Participa de atividades extra-curriculares oferecidas


para os moradores

Eu entrei agora no coral do CRUSP, eu jogo bola aqui


em baixo com o pessoal que mora no CRUSP, fora isso assisto
vídeo [no] CRUSP, fui só uma vez também, quer dizer duas
vezes nesses anos todos e só.

Do lado das dificuldades os alunos apresentam motivos para não


participarem de atividades extra-curriculares: falta de tempo devido às
exigências acadêmicas ou à necessidade de trabalhar (se trabalhar fora do

59
campus terá menos oportunidade de aproveitar o que a universidade oferece),
desorganização no planejamento e divulgação das atividades e mesmo a
própria desorganização.

Não participa de atividades extra-curri culares


por falta de tempo devido às atividades acadêmicas

Eu não participo de nada, eu não tenho muito tempo por


causa da faculdade. O meu tempo é bem corrido, então às
vezes eu não consigo nem dar conta das coisas que eu tenho
que fazer mesmo de faculdade. Não participo primeiro que o
seguinte, é engraçado parece que quanto mais tempo você tem
mais coisa você tem pra fazer. Antes eu estava mais interada
das atividades da Associação de moradores, agora eu já não
estou tendo muito tempo.
Eu não sei, na verdade a gente participava bastante nos
primeiros anos aí depois você vai acumulando uma série de
coisas e compromissos e tal.

Não participa de atividades extra-curriculares no


CRUSP, pois tem que trabalhar

Quando eu entrei, ingressei no CRUSP eu pensei


seriamente em me envolver com o pessoal da AMORCRUSP
até constituir chapa pra disputar eleições, mas o fato de eu
depender, ser a única pessoa que me mantém, única pessoa
responsável por me manter [me impediu]. A preocupação
principal que passou a tomar conta de todo o meu tempo foi à
necessidade de conseguir um emprego, um estágio pra
possibilitar a minha estada aqui no CRUSP [pois] o curso é
gratuito mais na realidade tem um custo com xerox e tudo
mais. E isso dificulta sobremaneira esse envolvimento mais
político e com os próprios moradores também, mas eu no
início tinha esse desejo muito forte. Com o passar do tempo a
necessidade de se manter me obrigou a priorizar outras coisas.
Atualmente eu não tenho nenhuma atividade ligada
diretamente aos moradores.
[Além disso], as reuniões da AMORCRUSP são todas a
noite, às 8 então logo que eu comecei a trabalhar eu não pude
mais ir. Como eu preciso trabalhar então eu não crio vínculo
com essas atividades porque eu não vou ter tempo de estar
participando.
Como durante o meu curso eu tive de trabalhar o dia
todo e estudar a noite e muitas das atividades oferecidas no
CRUSP são durante o dia ou mesmo após o período de aulas
noturno, então algumas atividades dez e meia, onze horas

60
como o coral que começou a ensaiar no ano passado eu acho,
eu me sentia sobrecarregado e não tinha aquele pique pra
participar.
Existe também um outro programa que chama vídeo
CRUSP onde são oferecidas sessões de filmes atuais até todos
os fins de semana, isso eu nunca participei ou por falta de
interesse ou por não estar no campus no fim de semana, não
estar no CRUSP no fim de semana

Quem trabalha em período integral fora do campus


não pode aproveitar o que o campus oferece

Tem pessoas que trabalham o dia inteiro fora do campus,


então não conseguem aproveitar plenamente o que a
universidade oferece

Não participa de atividades extra-curriculares,


por desorganização no planejamento e divulgação das
atividades

Eu já tentei fazer alguma coisa, alguma atividade física,


pensei em fazer natação no CEPE, mas nunca condiziam os
horários, aí sozinha também eu não vou.
[Além disso], eu não tive oportunidade, não tem
ninguém que eu conheça que tenha me chamado, também eu
não me interessei. Eu sempre tinha vontade de ir assim, mas
nunca fui, eu queria ir num negócio que tem aqui de
atendimento psicológico, coral eu queria ver como que é, as
assembléias do AMORCRUSP também teria que ir , eu nunca
vou assim eu vou adiando, adiando.
[Tem o fato de que] eu já tentei participar de outras
coisas que acabaram não saindo do papel. Uma vez tentaram,
já há algum tempo tentaram alguma coisa de conscientização
de reciclagem do lixo, coleta seletiva, mas ficou muito no
papel e acabou não indo pra frente.
[As atividades] não são muito bem divulgadas, você só
vai ficar sabendo pelos murais se você não ler, você não fica
sabendo
Agora em festa eu nunca fui, eu não gosto. Mas também
aqui não tem muita festa pelo menos de dia de semana não tem
não pode ter de final de semana também eu não vejo muito
assim, eu não fico sabendo também de muita festa

61
Não consegue se organizar para fazer uma
atividade física

Eu sei que assim todo começo de ano, início de semestre


eu falo não agora eu faço tal coisa, agora eu vou fazer, por
exemplo CEPE, fazer algum esporte. [Eu] sempre me inscrevo,
mas nunca dá, então já estou no fim [do curso] e até hoje não
consegui fazer nada, que horror !.

Alguns alunos, independente de participar ou não, listam as atividades


oferecidas especificamente aos moradores do CRUSP, mostrando estar
informados sobre elas.

Conhece as atividades extra-curriculares oferecidas aos


moradores do CRUSP

[Aqui no CRUSP] tem grupo de teatro, coral, dança, tem


os filmes que passam no bloco B, que eu só fui umas vezes.
O quê que tem de lazer oferecido pelo COSEAS é o
filme no fim de semana, eu não assisto, a pró-aluno eu não
gosto de usar, que é muito cheia a noite, tem [também] o ateliê
do Moisés Voador ali, que é um lugar de confraternização de
grupos o qual eu não me enquadro neles. Eu não participo de
evento nenhum aqui no CRUSP.[Não participo das] atividades
programadas, organizadas pela COSEAS pros estudantes.
[Mas] volta e meia eles avisam [sobre] novas atividades,
como por exemplo, atividades culturais como capoeira, que eu
já vi, cheguei até a assistir. Estão constituindo agora o cursinho
do CRUSP, eu acho uma iniciativa interessante, curso de inglês
também pra comunidade mais barato, tem também esse tipo de
atividade, com certeza devem ter outras mas eu não tenho
envolvimento muito forte não, conheço alguns responsáveis
pelo AMORCRUSP, mas não tenho envolvimento forte, não,
um vínculo forte não

No que se refere às expectativas sobre a convivência no CRUSP, pode-


se encontrar tanto aqueles que se surpreenderam positivamente como aqueles
que tinham uma expectativa inicial alta e que se decepcionaram. A superação
das expectativas fica por conta de encontrar pessoas que, ao contrário do
estigma veiculado, são “normais”, conversam, arrumam a casa, fazem comida,
vivem a vida.... A decepção com a convivência fica por conta do individualismo
dos estudantes, que não têm espírito coletivo, mesmo sendo na sua maioria da
área de humanas.
62
Morar no CRUSP surpreende, supera as
expectativas do estigma atribuído aos moradores

Eu fiquei surpresa, assim positivamente, eu não reclamo


de morar aqui, eu acho que eu não tenho do que reclamar.
Olha, eu de verdade nunca tive problemas. Antes de entrar aqui
a gente tem medo, porque quando a gente comenta que está
concorrendo a vaga tal as pessoas já olham com uma cara feia,
tipo você vai ter coragem de ir morar lá? [Isso me] incomodou
no começo porque eu tinha essa idéia do CRUSP, mas depois
que eu comecei a morar aqui que eu vi que não era nada
daquilo não me incomodou mais. É muito mito, tem muita
lenda em torno de bagunça, dizem que rolam altas orgias, não
orgia, mas que é tudo muito bagunçado, mas depois que eu vim
pra cá, eu vim meio assim, sem saber mesmo o quê que eu ia
encontrar, mas eu acabei dando não sei se foi sorte, mas nunca
tive nenhum problema de verdade.
Quando eu entrei aqui as pessoas que moravam também
eram organizadas, eu entrei era tudo arrumadinho, bonitinho,
as pessoas conversavam. No final de semana a gente fazia
almoço junto, a noite pedia pizza, a casa era arrumadinha, a
gente tinha compromisso de cada um limpar uma semana e
tudo.

Há uma decepção a partir da convivência no


CRUSP

Eu me decepcionei de morar aqui, antes eu tinha uma


certa segurança porque a grande maioria dos alunos que
moram aqui faz ciências humanas. Então eu pensei assim são
pessoas razoáveis, pessoas que lutam pelo espírito coletivo,
pessoas que sabem lidar em grupo e quando eu cheguei aqui e
não era nada disso, me decepcionei muito vindo morar aqui.
Depois eu fui me decepcionando assim com as coisas, com
convivência, com uma forma um pouco egoísta de ver as
coisas e tal.

Ainda do lado das dificuldades os alunos apontam, de maneira


expressiva e ao contrário de alguns poucos que não veêm problemas na
moradia, que para que se possa morar no CRUSP é preciso minimizar
problemas, como a solidão, para tanto é preciso sair do CRUSP nos finais de
semana. Caso não saiam podem acabar isolando-se também do convívio social
mais amplo. Isso se deve, entre outros fatores, ao distanciado campus da USP,
onde se localiza o CRUSP. Como conseqüência, os alunos correm o risco de

63
passar a viver num mundo à parte o que pode gerar uma desconexão com a
realidade. Há também a possibilidade do aluno se envolver em outras
atividades e deixar o curso em segundo plano . O isolamento do campus e a
falta de infra-estrutura geram também problemas relacionados à alimentação e
ao acesso a outros bens de consumo nos finais de semana.
Claramente, os alunos apontam que os padrões de sociabilidade dos
jovens são alterados em função do isolamento a que ficam submetidos nos
finais de semana, uma vez que, como foi visto, poucos conseguem ir para casa,
sendo a solidão então apontada como conseqüência desse isolamento. Nesse
contexto sintomas depressivos podem aparecer, agravados pela falta de apoio
para trocar idéias seja com familiares, seja com amigos.

É preciso sair do CRUSP nos finais de semana


caso contrário pode -se ficar isolado do mundo,
solitário

O lado ruim que eu vejo é um pouco do isolamento,


porque na verdade assim isso aqui é uma parte totalmente
separada da cidade parece que o mundo é ali depois do rio
Pinheiros, aqui é um outro lugar.
Tem isso, no final de semana você está cansado, aí você
fica aqui. Tipo, eu estudo aqui, moro aqui e trabalho aqui, se
eu não me animar no final de semana a sair, você fica isolado
do mundo porque aqui é um mundinho a parte. Acho que isso
prejudica um pouco e prejudica um pouco também o
isolamento porque as pessoas aqui elas não se comunicam
muito.
Nos finais de semana o tempo é muito ocioso no
CRUSP, as pessoas tem pouca atividade pra fazer lá dentro,
então assim os problemas se intensificam. Você está sozinho
longe da família, se de repente você não tem um amigo ali, tem
sempre um dia que você tá mal, que você está chateado e você
não tem ninguém pra se apoiar, então eu acho que a ociosidade
no CRUSP de finais de semana principalmente é um ponto
crucial.
Outra desvantagem é a distância dos outros lugares, o
afastamento de tudo e tem também o fato de que no final de
semana a gente fica meio que ilhado aqui porque os ônibus não
podem entrar, por um la do eu entendo por questões de
segurança, mas não sei até que ponto efetivamente isso
assegura uma segurança maior.
Você tem que estudar ou ir pra sua casa no final de
semana. Se você sair com freqüência dá pra conciliar, mas
64
ficar o tempo todo aqui nesse clima, o tempo passa e como já
bateu em mim, dá uma certa angústia Tem que sair pra poder
passear, se você não sair não é muito legal, não dá pra ficar
aqui o final de semana inteiro, assim, dá pra ficar, mas você
sempre vai querer passar do portão prapoder dizer, puxa eu saí.
Outra coisa que facilita um pouco é esse negócio de estar
sempre próximo da família, mas já é uma coisa mais difícil
quando você não tem a família aqui, aí bate aquele esquema,
aqueles problemas, solidão.
Tem também o pessoal que se aliena usando muita droga
aqui na faculdade, estuda a semana inteira no final de semana
vai beber e se drogar aqui, você fica aqui alienado, porque aqui
a gente fica isolado.

Há assim um lamento de que a situação de ficar o tempo todo no


CRUSP aliena da realidade social de outros espaços, o tempo sendo todo
tomado para estudar e cuidar das tarefas cotidianas.

Morar no CRUSP gera desconexão com a


realidade

Eu acho que é muito estranho a gente acaba ficando


isolado, você acaba começando a viver num mundo a parte
porque são regras diferentes, são costumes diferentes e a gente
brinca que a gente está na bolha, na ilha, num jardim zoológico
mesmo, porque é tudo tão organizado e você sai pensando que
a sociedade é isso mesmo. É um lugar onde você pode ficar
mais a vontade é um lugar vigiado, é uma espécie de um
condomínio fechado aqui. Tem menos vantagens do que
aqueles condomínios fechados no sentido clássico, mas essa
coisa, esse desprendimento da realidade social, é o fato de
você de repente quando você sai demora um certo tempo pra
perceber que desemprego existe e que a pessoa não tem
dinheiro pra comprar tal coisa.
Mas também devido a correria dos estudos, trabalho e
tudo mais eu que não vou pra casa então eu tenho que cuidar
da minha roupa, não tenho a facilidade de levar pra casa e
lavar e da comida. Então o fim de semana seu acaba sendo
muito corrido, muitas vezes você acaba ficando muito aqui
dentro, eu trabalho aqui dentro, estudo aqui e moro aqui, então
você meio que perde a ligação direta com o mundo lá fora,
sabe?

Nesse processo, os alunos podem se perder....

65
Um dos problemas do CRUSP é que alguns
alunos deixam a faculdade em segundo plano

Um dos problemas principais que eu vejo é que a gente


está morando aqui por causa da faculdade, só que muita gente
perde essa ligação e acaba deixando a faculdade pra segundo
plano. Segundo, terceiro, quarto plano então acaba ficando
muito aqui e esquece das obrigações de ir pra faculdade e tal,
eu acho isso muito difícil. As pessoas tinham que pensar de
uma forma diferente, primeiro a faculdade eu estou morando
aqui em conseqüência da faculdade e acaba sendo o oposto, a
faculdade que está no seu quintal praticamente. É muito
complicado, essa relação é muito complicada.

Com muita ênfase apontam como agravante do isolamento problemas


de infra-estrutura como a impossibilidade de acessar alimentação, uma vez que
o restaurante central é fechado, o transporte é insuficiente e distante, a
farmácia é fechada entre outros problemas.

Dificuldade de acessar alimentação e outras


necessidades de consumo no final de semana

É isolado de tudo, no final de semana aqui


principalmente é complicadíssimo você permanecer aqui no
CRUSP, que é tudo fechado pra você fazer compras. Tem uma
série de impedimentos que dificulta a vida normal, a você viver
satisfatoriamente aqui.
Você tem que resolver problemas do tipo o quê comer e
por incrível que pareça, o restaurante central é fechado, quer
dizer que só tem moradores, pro pessoal da USP, de segunda a
sábado, no sábado até o almoço. Isso dá a entender que o
pessoal morador do CRUSP não janta no sábado e nem
almoçam e jantam no domingo, porque tá tudo fechado então
tem que sair.
Agora até que melhorou um pouco que eles abriram a
conveniência ali, uma padaria, um mercadinho tem várias
coisas, então ajuda, mas antes não tinha nada absolutamente
nada. Mas só tem essa conveniência e assim é um preço médio
não é nem barato nem caro, eles não tem uma concorrência de
outros lugares e só tem lanche não tem refeição.
Em relação a farmácia às vezes você fica doente precisa
de remédio também a daqui fica fechada aí é um saco.
Além disso, não tem mais ônibus, então você tem que
andar até a portaria um pra pegar um ônibus pra comprar
alguma coisa.

66
Os próprios alunos apontam alternativas para enfrentar o problema da
solidão e do isolamento no CRUSP: transformação do apartamento em um
espaço de convivência e organização de atividades de lazer diversificadas que
possam se constituir numa oportunidade de socialização. Além disso, referem
ser de suma importância sair do campus nos finais de semana e compreender a
transitoriedade da condição de morador, não depositando na moradia o peso de
uma situação estável quando se faz projetos de vida.

É necessário construir uma convivência no


apartamento se a meta não for viver isoladamente

Tipo, aqui nesse apartamento a condição de quando eu


entrei e quando a M entrou depois que eu, foi que a gente não
quer saber de quarto com porta fechada, pessoas que ficam o
dia inteiro em quarto, porque é um espaço onde você tem que
conviver, não é? Senão ficam três apartamentos separados,
porque cada um fica no seu quarto, isso é importante.
A gente tenta pelo menos transformar o nosso
apartamento como se fosse a casa da gente, então o que a gente
gosta de ter, como a gente gosta de organizar a casa da gente, a
gente procura fazer no nosso apartamento. Então a gente se
sente super bem, porque é como a casa da gente, se a gente não
gostar da onde a gente vive você vai pra casa e vai fazer o que,
entendeu? Só tem lá pra ficar. Então acho que é procurar ver o
lado bom mesmo.

É preciso ter atividades de lazer diversificadas

Para o pessoal que fica aqui direto, eu não sei, eu acho


que é ruim porque tem que fazer disso a sua casa, tem que
dividir esse espaço com sala com, pra receber alguém, pra ter
um pouco de lazer porque lazer aqui é difícil tem o CEPE, mas
é só esporte. Eu acho que devia ter mais lazer, mais festas às
vezes, o cinema também é legal, às vezes passa coisa que o
pessoal não gosta muito, mas também são poucos horários,
então de lazer fica meio solitário também.

As atividades podem ser uma oportunidade de


socialização

Eu acho interessante [a realização de atividades pois] é


uma opção de lazer e uma oportunidade de pessoas estarem em
contato.

67
É preciso sair do CRUSP no final de semana

Eu não gosto de ficar aqui no final de semana, ás vezes


eu vou no CEPE no sábado, tudo, ou vou andar de bicicleta se
for o caso, mas eu prefiro sair, porque eu já fico aqui a semana
inteira, eu acho importante sair.
Não é legal ficar aqui [no CRUSP] o tempo todo. Você
passou a semana inteira num lugar só, então você quer sair,
mas isso daí acontecia até [quando eu morava] em casa. Acho
que não muda muito nesse sentido. Eu acho que pode ser
entediante dependendo com quem você mora, não é o CRUSP.
O ruim de ficar aqui é que não é legal ficar parado, se você
mora aqui você não quer ficar, se você morar na sua casa, você
está a semana inteira na sua casa você quer sair um dia pra
poder passear é a mesma coisa praticamente.

O CRUSP deve ser visto como espaço provisório


de moradia

Eu tenho com quem morar, tipo, o G é meu namorado e


mora aqui só que [ele] não era meu namorado virou um ano
depois que eu morava aqui. Aí eu acho que a gente tem que
aprender a separar as coisas porque realmente você tem que ver
que isso aqui é um espaço provisório, que é pra você estudar,
ter a sua vida durante quatro, cinco anos que for o teu curso
aqui e não de repente começar a construir uma vida aqui. Eu
sei que tem gente que mora sete, oito anos [e tem] filho. [Eu]
acho que é prejudicial até pra essas pessoas, mesmo, porque
você não consegue se estabelecer na vida direito você se
encosta mesmo.

Há outras dificuldades de sociabilidade: o ambiente não propicia uma


aproximação entre os moradores e o barulho feito por alguns moradores que
não respeitam o silêncio à noite incomoda outros moradores; pode parecer à
primeira vista, segundo alguns alunos, um ambiente alegre, mas é perturbador.
Os alunos referem ainda que muitos dos seus colegas não têm noção sobre
viver em coletividade, não valorizam a moradia e isso se reflete por exemplo, na
sujeira deixada nos corredores depois de uma festa. Um outro aspecto
levantado sobre a sociabilidade é a precariedade do alojamento, onde se vive
com muitas pessoas no mesmo quarto sem nenhuma privacidade.
Assim, as formas de sociabilidade da metrópole urbana contemporânea
se refletem no comportamento fechado dos moradores que preferem a

68
segurança do apartamento à convivência com os vizinhos, estabelecendo
muitas vezes contatos superficiais e rápidos diferentes, por exemplo, das
amizades do interior.

As formas de sociabilidade no Crusp


correspondem às da cidade grande

O que eu acho estranho é que as pessoas se isolam um


pouco nos apartamentos. Logo quando eu cheguei aqui eu
achava muit o esquisito, passavam as pessoas pelo corredor
assim que eu já conhecia a algum tempo e elas não se
cumprimentam, não sei talvez também seja um costume muito
do interior, mas mesmo assim eu vejo que a maioria das
pessoas vieram de fora e de regiões pequenas, mas acho que
elas criam uma proteção assim se fecham.
Não existe aquela coisa de, também é porque eu sou do
interior, aqui em São Paulo isso não existe em lugar nenhum,
sei lá de vizinho, de combinar coisas ou se encontrar, os
meninos jogarem bola. Eu acho que os meninos até jogam bola
aí no final de semana, mas as meninas não, a gente fica em
casa assistindo televisão, vai sair pra andar de bicicleta, vai ler,
vai na praça do relógio, mas tem isso de ruim que eu acho que
é você ficar muito remetido.
As amizades não são as mesmas, naturalmente, não são
as mesmas que você tem no seu bairro, na sua família, as
amizades são muito superficiais, eu sempre percebo um certo
distanciamento, uma certa frieza nos relacionamentos e
somando isso mais o isolamento do CRUSP, eu acho que fica
uma ambiente muito desagradável pra se viver.
Tem uma coisa que eu acho um pouco pior, são os traços
de individualidade que as pessoas carregam dentro do CRUSP
porque apesar de parecer uma super comunidade, não é bem
assim entendeu? Você tem pessoas que são mais fechadas, por
mais que você tenha vários colegas, você diga oi tudo bom
nesses corredores, almoce, jante quando cada um fecha a sua
porta é ali e acabou. É claro que isso não é uma característica
generalizada, mas grande parte dos moradores tem essa postura
então é por isso que outros moradores reclamam, acontecem
brigas nos apartamentos, as pessoas se fecham realmente, o
motivo eu não sei explicar pra você o quê que é realmente
então isso é uma desvantagem muito grande que eu vejo.

Alguns moradores responsabilizam outros por problemas de convivência,


explicando que o fato do CRUSP ser uma moradia passageira pode dar aos
moradores a noção de que não devem cuidar do espaço.

69
Os moradores não têm respeito para com o
espaço coletivo

Se existe um problema é por parte dos moradores


mesmo, da falta de consciência mesmo deles e de realmente
achar que aqui é um lugar passageiro, que eles podem fazer o
que quiser com o prédio, com a cozinha, com o apartamento eu
acho que é isso.
Eu acho que as pessoas deveriam ter no mínimo senso
que se a cozinha, por exemplo, é comunitária, você vai limpar
o quê você sujou, você vai catar a cebola que você descascou,
você pegar a casca e jogar fora e não acontece. Tem dia que
você vai na cozinha, de final de semana você não tem coragem
de cozinhar porque ta sujo. E dia de semana não, ta limpinho
porque a moça que trabalha no prédio limpa todo o dia, ela
limpa o corredor, ela recolhe o lixo, mas de final de semana
não tem funcionário então, a gente deveria fazer a nossa parte
o que não acontece.
Outra dificuldade na convivência com as pessoas é o não
respeitar horário esse tipo de coisa.
São alguns poucos moradores que não cuidam do espaço
como deveriam e que é o quê também dá essa má fama ao
CRUSP de ser um lugar ruim.

O barulho incomoda não somente porque alguns aumentam o volume da


voz ou fazem festas, mas porque as paredes não têm isolamento acústico.

O barulho incomoda os moradores

De desagradável é o barulho, me desagrada muito.


Durante a noite muita gente fica gritando de um bloco pro
outro isso atrapalha essa noite mesmo de madrugada, umas
duas horas gritaram muito.
As paredes são de gesso, então a gente escuta tudo que
as outras pessoas falam, essas gritarias que eles fazem de
madrugada que não deixa ninguém dormir. Não adianta você
reclamar porque nunca fazem nada, isso é que é o ruim, pra
mim o pior é o barulho.
Lá [no [CRUSP] é uma coisa meio que egoísta, eu não
tenho horário eu faço o que eu quero. É aquela coisa como eu
não tenho aula eu não me preocupo com quem está do lado e
vai acontecendo, chama neguinho vai fazendo [uma]
comemoraçãozinha lá, uma festinha cá

70
O CRUSP parece alegre, mas é um ambiente
perturbador

Vira e mexe tem baderna lá, é gente gritando, no meio da


madrugada sai correndo, tem gente que sai correndo pelado no
meio da madrugada e [ninguém] vai fazer nada. Então, tem
gritaria, tem um lá que a gente acha engraçado porque no meio
da noite ele abre a janela e grita: “Calhorda!” e fica gritando.
Aí o povo vai abrindo a janela e: “Seu Filho da Puta”, e vai
assim, aparece o prédio inteiro. Acorda e vai gritando e a gente
lá no meio, mas se for ver bem [pra quem é] de fora é um
ambiente meio que alegre, mas não é assim é meio que
perturbador, eu não gosto muito. Eu sou meio careta para essas
coisas

É negativo o fato dos moradores não


valorizarem a moradia
Alguns moradores, eu acho, não tem consciência do que
é poder ter uma moradia assim a disposição, não valorizam
tanto.

A sujeira incomoda

Eu acho que o corredor é muito sujo, aquele lá em baixo,


aquele corredorzão, também eu não sei porque é que foram
colocar esse piso branco, porque reformaram e colocaram esse
piso branco, mas é tudo questão de estética que eu acho que
incomoda.Você morar num lugar sujo que você vê a coisa suja
incomoda e o lixo que os moradores jogam pela janela, jogam
no corredor, tem festa no outro dia você vê cheio de copinho e
papel no chão.

A moradia no alojamento é muito precária

Eu vivi no alojamento, morei no alojamento dois três


meses até sair o resultado e era um quarto com vinte pessoas,
então você não podia acender a luz depois das 11, você não
tinha espaço pra você estudar tinha que ir para uma sala de
estudos no prédio mais também difícil, a primeira cozinha
ficava no primeiro andar, ficava longe. Então, isso perde
totalmente a liberdade, não tem onde por as coisas. As minhas
coisas viviam dentro da mala porque meu guarda-roupa não
cabia tinha que dividir.
Num outro alojamento tem acho que são 10 pessoas no
quarto. E mesmo, no quinto andar tem um alojamento pequeno
pra 12 pessoas, são três quartos e ficam quatro pessoas em cada
quarto então tem espaço um pouco maior pra guardar as coisas
e são só quatro pessoas então é mais fácil de lidar do que com
71
10, 12 pessoas. Eu não gostei muito de lá pela falta de
privacidade que tinha.

Segundo os alunos, no CRUSP existem regras, mas que não precisam


ser cumpridas, eles se sentem livres da autoridade paterna e sem nada para
ser colocado no lugar. Esse excesso de liberdade acompanhado da falta de
autoridade não é visto só como algo positivo, apontando-se que a conseqüência
é o não aprendizado de respeito ao espaço público.

Viver no mundo do CRUSP é viver sem regras


institucionais estabelecidas

Eu acho que aqui no CRUSP eles dão bastante liberdade


em todos os termos, não só em termos de droga. É bem livre
mesmo, porque não tem quem controle, é um lugar livre,
[onde] as pessoas fazem o quê elas querem. Existe uma coisa
no CRUSP que é todos poderem ser o quê quiserem. Então
essa sensação de liberdade talvez incite a experimentar coisas
novas. Pessoas novas que nunca usaram devem sentir vontade
de saber como que é e acabam embarcando nesse tipo de
postura, de consumir drogas. É como se você tivesse num
mundo à parte [essa é] a impressão que a gente tem, por isso
que tem tanta gente que não consegue sair daqui
Mas é claro que assusta quando você chega aqui. Nossa
tudo é permitido. Aqui de certa forma você não tem nenhuma
autoridade, você tem iguais a você e quando a autoridade vem
você não precisa ouvir se você não quiser. Tipo se você está
dando uma festa, os caras vêm e falam pra você abaixar a
música se você não quiser você não abaixa e eles não podem
fazer nada com você porque você é universitário, você está
dentro da Universidade de São Paulo, afinal ninguém deve te
reprimir aqui dentro. É um clima propício [para] essa liberdade
que está muito firme na cabeça de todos que entram aqui.
Quando você entra aqui é isso que você sente, você fala putz
que legal eu saí da casa do meu pai ual!!
Essa [é a idéia] dos alunos que aqui chegaram junto
comigo era uma coisa meio de liberdade diante da autoridade
paterna e de desprendimento, um lugar de autonomia e pra
mim eu estou na minha aprendendo a trabalhar. Essa liberdade
eu sempre fui obrigado a ter. E de repente eu vi o pessoal
fazendo um tipo de coisa que eu falava pra mim não faz
sentido. Não é isso que vai me fazer mais livre.
[É] um problema [porque] não tem ordem estabelecida
aqui dentro, às vezes. [Há] um excesso de liberdade e as
pessoas acabam ultrapassando alguns limites assim, por
exemplo, as pessoas entram [e] elas não têm consciência de
que o espaço que elas estão usando é público e que um dia elas
72
vão embora e tem que deixar o espaço legal pra outras pessoas
virem morar.

Não há ordem estabelecida no CRUSP

A questão negativa é o foco de porcaria que tem nesse


lugar. Tem muito usuário de drogas e muita bagunça, não tem
uma ordem estabelecida aqui no CRUSP, as pessoas acham
que elas têm direito de fazer qualquer coisa, elas têm
dificuldade em definir esse caráter público do CRUSP, então
qualquer argumento é ah! isso aqui é público. Eles não têm
bem claro o que é público e o que é privado, qual a noção
definida de público. Então eu acho muito problemático morar
aqui, eu não gosto não, eu acho ruim.

Alguns alunos não identificam nenhuma especificidade no CRUSP,


referem que é como morar em qualquer prédio, outros acreditam que a
variação entre positivo e negativo se refere ao apartamento e outros aos
blocos.

Morar no CRUSP é como morar em qualquer


prédio

Aqui tem as inconveniências de morar em um prédio,


que eu acho que todo prédio tem, alguns menos outros mais vai
depender da vizinhança que você encontra. Acho que em
qualquer prédio você pode ter uma vizinhança legal ou alguns
vizinhos que fazem mais barulho

O positivo ou negativo de morar no CRUSP


varia de apartamento para apartamento

[O positivo ou negativo de morar no CRUSP] varia


muito de apartamento pra apartamento depende com quantas
pessoas você mora. Eu comecei morando[em um apartamento
desse bloco] que até que era legal o pessoal, mas que tinha
apartamento do lado assim que eu não moraria, se eu tivesse lá
eu fazia alguma coisa pra sair porque não dava.

73
Quanto mais antigos os blocos mais
problemáticos

Eu acho que o meu bloco é o mais sossegado, eu acho


que o F é o pior, porque ali é o pessoal mais antigo, você vê
assim o nível do pessoal, você dá uma olhadinha você já vê
que não é muito aquele pessoal mais sossegado. [Pela]
aparência, você percebe que o pessoal já vai mais pra esse
lado, sabe? Eu acho que esse aqui é um dos [blocos] mais
quietos. Principalmente por serem alunos mais novos na
faculdade, o bloco é novo, os moradores faz pouco tempo que
tão aqui. Então eu não sei se é o geral dos blocos do CRUSP,
mas esse bloco eu acho que é bem sossegado. Eu acho que
cada bloco tem suas peculiaridades, o bloco A, por exemplo, é
só de mães, não sei como é o uso lá, o que acontece, eu não
posso generalizar.

Os alunos se queixam de não ter a quem recorrer quando tem algum


problema na moradia. Segundo eles a COSEAS, órgão da universidade
responsável pelo gerenciamento do CRUSP, demora em resolver problemas de
diversas ordens na moradia como a falta de energia ou água, inclusive
omitindo-se em relação ao tráfico de drogas, como se ele fosse se resolver por
si mesmo. A guarda universitária também, quando chamada, não soluciona os
problemas de acordo com a expectativa dos alunos, chegando ao extremo de
recorrer à polícia. Dessa forma, sentem que a administração do CRUSP não faz
nada por eles.

A COSEAS demora em resolver problemas de


diversas ordens

A minha queixa maior é em relação a organização


mesmo, não ao CRUSP em si, nem tanto aos moradores, mas
aos órgãos que organizam e que fiscalizam o CRUSP. Esses
eu acho que deixam a desejar. Por exemplo, agora já faz tempo
que não acontece, mas às vezes acaba a energia elétrica porque
caiu um disjuntor, daí assim leva 5 horas pra alguém ir lá e
levantar o disjuntor é um botão que alguém tem mexer, mas
não tem uma mobilização da organização pra ir lá e em 5
minutos resolver o problema. Também se você precisar de
alguma coisa e você for até o COSEAS, de algum conserto,
alguma coisa, demora demais, você tem que conviver com o
problema por um tempo até eles fazerem ou você mesmo
resolve ou acaba desistindo.

74
Antes faltava água às vezes mas a muito tempo não
acontece já parece que realmente eles deram uma melhorada
nisso, mas a gente percebe ainda que tem um descuido com
essas coisas e desse lance da fiscalização.
É um apartamento ou outro por andar às vezes um ou
outro por bloco assim que tem algumas pessoas que o
COSEAS também não toma providência, que usam drogas,
depredam o lugar e não respeitam o silêncio esse tipo de coisa.

A instituição se omite para resolver problemas


na moradia principalmente os relaciona dos com as
drogas

Olha, eu acho que [o CRUSP é um ambiente] livre, não


só relacionado a drogas, mas quando acontece alguma
discussão aqui entre moradores, algum problema assim, a
maioria das vezes eles chamam a guarda universitária, mas a
guarda universitária não tem uma atuação. Eles chegam
conversam pedem pras pessoas se entenderem no diálogo em
alguns casos chega-se ao extremo de precisar chamar a PM,
daí faz Boletim de Ocorrência, vai pra delegacia, mas é difícil
isso acontecer.
[Quando] a guarda universitária passa o cara, no CRUSP
não na USP toda, [está] fumando[ou] fazendo qualquer coisa
[o guarda] não pode fazer nada [ele] não faz nada. [Portanto], é
livre o uso, de fato é livre não é uma imagem, não é uma
ilusão, de fato é livre o uso, as pessoas usam, todos sabem, as
assistentes sociais sabem quem usa, quem não usa de onde sai,
só que não acontece nada, [também] não sei se devia acontecer
[alguma coisa].
Eu acho que é verdade como eu já te disse é muito fácil a
guarda vir aqui e pressionar a gente porque a gente está
fazendo barulho numa festa quarta-feira, tudo bem a gente está
fazendo uma festa numa quarta-feira, aniversário do nosso
amigo, a gente está forçando a barra, mas é muito fácil chegar
aqui e reprimir a gente, [porque eles] sabem com [quem] eles
estão mexendo, entendeu? Mas com o traficante com aquele
cara lá mesmo pesadão, todo mundo sabe que rola ninguém vai
mexer [com ele].
E outra é claro, não estou falando que a gente está
inocente nessa história, tem o traficante aqui porque a gente
compra, mas é uma coisa pesada, a gente sente que certas
coisas complicadas acontecem aqui principalmente [por causa]
desses traficantes que a gente sabe que tem aqui, parece que é
uma coisa que fica assim meio de canto é um assunto que
ninguém fala então deixa quieto como se fosse se resolver.
[Quanto] as assistentes sociais [eu acho que] aqui tem
um problema, elas acham que se elas repreenderem de alguma
maneira vão estar exatamente prendendo, diminuindo a
75
liberdade de expressão das pessoas. Elas sabem que existe o
uso de drogas], e eu acho que se elas sabem, elas sabem quem
é e onde fica a gente sabe que o bloco F é o maior ponto, que
tem traficante lá dentro, porque não tentar falar, conversar,
tentar fazer alguma coisa lá.
O CRUSP parece livre por essas coisas, pelo lado da
administração a gente tem a impressão que [eles] não fazem
nada e pela gente [mesmo] que permite que isso aconteça.

Os alunos apontam uma série de irregularidades no ingresso no CRUSP,


no controle sobre a entrada, a permanência e a saída na moradia e na
ocupação irregular das vagas. Essa falta de controle gera entre os alunos
sentimentos de hostilidade para com moradores que vêm de outros países,
trazendo suas famílias. Assim, há um discurso pesado de crítica à forma como
as vagas são distribuídas, apontando-se desde arbitrariedades na definição do
número de pessoas por apartamento até uma certa lentidão na tomada de
decisões, prejudicando alunos que estão na fila de espera.

Há problemas na forma como são distribuídas as


vagas

Eu acho que a primeira coisa que tem de negativo é a


forma como eles criam o número de vagas por apartamento.
São três vagas, então sempre cria uma relação assimétrica de
poder, sempre são dois e um, dois e um, um e dois, quando o
apartamento tem harmonia as pessoas vivem bem, mas se tiver
qualquer desavença é sempre dois e um. Nunca eles
colocariam quatro ou dois pra morar porque tenho a impressão
que isso é uma jogada, isso atrapalha um pouco, nesse sentido,
cria uma relação de poder mesmo, de anti-democracia . Aqui a
regra do CRUSP é que duas pessoas podem tirar uma,
entendeu?
Além disso, sempre tem umas irregularidades, como eu
sou de fora, eu precisava da vaga e a gente sabe que tem muita
gente lá dentro que está lá, mas que não foi por inscrição que
simplesmente entrou e ficou. [Tem também] aquele negócio,
do pessoal [que não] mora no CRUSP [mas] que fica lá, é
hóspede irregular que a gente fala, muita gente que vai e fica
dois, três dias na casa de um, na casa de outro, tem a casa
própria dele, mas como é bem festivo o ambiente lá, aí o
pessoal vai e fica mesmo tem coisa lá que a gente [nem] sabe.
[Comigo aconteceu] mais ou menos assim eu ingressei
de transferência por isso que eu entrei o ano passado na USP,
mas já eu estou no terceiro ano porque eu peguei alguns
créditos, fazia a Federal do Pará. Aí eu vim morar aqui então
76
eu não tinha muito pra onde ir e logo no começo eu consegui
uma vaga de hóspede só que num quarto sozinho pra mim num
outro bloco. Aí eu ia ficar provisoriamente, porque o COSEAS
tinha uma data, estavam em reforma os alojamentos e tinha
uma data pra alojar os alunos e eu vim um pouco antes dessa
data.
Então, como disse, não tinha onde ficar e por sorte eu
consegui ingressar num outro bloco com dois rapazes um era
da Poli e outro fazia física. E aí foi uma moradia excelente.
Muito boa, a gente se dava muito bem, a gente fazia esquema
de limpar o apartamento, de comprar água estava tudo sempre
limpinho, arrumadinho e eu estava muito bem só que eu tava
como hóspede. Aí a assistente social me falou: ‘você está
concorrendo a vaga você pode ou não conseguir’ e aí por azar
quando veio a primeira lista, que é essa que sai em maio eu não
fui contemplado com a vaga.
Só que aí o meu nome não saiu eu fiquei bem pertinho
inclusive abriram 147 vagas e a minha classificação foi 150, eu
era o terceiro da segunda lista e depois eu soube que pessoas
desistiram já na primeira lista, mas o COSEAS não teve aquela
dinâmica de vamos colocar mais gente, eu poderia ter ficado
no lugar onde eu estava.
Foi muito engraçado porque as pessoas estavam saindo
do alojamento pra ir para as vagas e eu estava fazendo o
inverso, estava saindo de uma vaga muito boa e estava indo pro
alojamento, e lá foi meio complicado.

Ocupação irregular gera falta de vagas oficiais e


sentime nto de hostilidade

Tem muita gente que precisa morar no CRUSP e não


pode porque não consegue a vaga por causa dessas pessoas que
ocupam irregularmente e fazem mal uso do espaço.
É principalmente o pessoal de fora africanos, angolanos,
estrangeiros que vêem e conseguem não sei como, a primeira
vaga tudo bem é deles, tem direito, mas depois vem com a
família inteira e ficam morando no CRUSP. É uma coisa, eles
tiram as nossas vagas, assim como o pessoal que simplesmente
invade também tira. Acontece para todo mundo ver e ninguém
faz nada.

Para reforçar o estigma já apontado pelos entrevistados em outro


momento, os alunos referem que a sociedade tem uma visão muito distorcida
sobre o CRUSP e sobre os moradores e que eles sofrem preconceito quando
dizem que moram no CRUSP, mesmo dentro da universidade. Na opinião
deles, a existência de uma série de problemas no CRUSP não justifica a visão

77
social que se tem da moradia. Para agravar, a mídia tem tido um papel
importante na divulgação apenas de fatos negativos que acontecem no CRUSP
e mesmo na criação de fatos.
Assim o CRUSP é visto como um espaço bagunçado e perigoso, “um
espaço cumprido, cheio de beliches, como num campo nazista”. Trata-se de um
julgamento moral socialmente disseminado que imputa ao projeto de vida de
alguns estudantes, que questionam o modo de vida dominante, uma função de
“desvio”, inclusive valendo-se da idéia de que os moradores apoiam atividades
“desviantes” como é considerado o uso de drogas por exemplo. Assim, os
estudantes moradores são rotulados como miseráveis e vagabundos, há um
“preconceito de classe”.

A visão social do CRUSP desqualifica a moradia:


espaço bagunçado e perigoso

Todo mundo já tem uma idéia de república, qualquer


tipo de república já falam que é uma bagunça, que é uma
baderna, que não sei que. Mas as pessoas falam muito do que
elas não conhecem porque eu quando vim morar aqui pintavam
pra mim um lugar totalmente horrível, que eu fiquei com medo
de vir morar. Mas a partir do momento que eu vim pra cá vi
como era e desfiz totalmente essa visão. [Hoje] eu não acho
que seja uma assim coisa aberta todo mundo que entra usa
droga, não vejo nada disso. Ainda têm esse mito quando eu
falo que moro no CRUSP as pessoas falam: nossa mas deve ser
uma zona lá [ou então] já perguntam se é um bacanal, se todo
mundo usa droga, se é tudo sujo. Falam do que não sabem, não
vejo que aqui seja diferente de outros lugares. Muita gente
nunca veio aqui as pessoas acham que é um espaço cumprido,
cheio de beliches como num campo nazista.
E sei lá acho que essa idéia do CRUSP como um [lugar]
desorganizado é por ser a maioria do pessoal da FFLCH e por
a gente ter uma concepção de mundo diferente daquela que é
funcional e orgânica. O pessoal [também] acha que a gente faz
questão de não se enquadrar num mesmo estilo de vida que é o
padrão pra eles, sendo que não é verdade. A gente questiona na
busca de um aperfeiçoamento social mesmo, pra quebrar
preconceitos porque a sociedade tende que ser hipócrita. Por
isso que o uso de drogas é disseminado por aí fora, porque não
vêem isso sem preconceito, antes de saber o que se passa, qual
a razão, é como se diz, a análise é mais moral do que objetiva
aí é essa a questão. Talvez [porque] pessoal da FFLCH em

78
geral encare isso de uma forma mais objetiva então eles acham
que a gente apoia o uso de drogas e usa também quando não
tem nada a ver assim.
Eu acho que [existe] uma idéia errada até hoje sobre o
CRUSP muito errada e que tem muita gente que mora aqui e
que não sabe lidar com isso também, que não se sente bem em
falar que mora aqui. [Além disso], já saiu várias vezes na
televisão pesquisas mostrando que na USP a incidência de
usuário de drogas é muito grande. Então morar numa
república, onde tem estudante [eu] acho que [gera essa idéia].
[Mas por outro lado] apesar de haver contestações, de
dizerem não o CRUSP é um lugar super tranqüilo, onde as
coisas correm normalmente, não é verdade isso, não é
realmente. Existem blocos conturbados, existem apartamentos
muito conturbados, então o que eu acho que ocorre é uma
generalização. Por existirem grupos que se tornam conhecidos
por utilizarem ou por pessoas ouvirem histórias das pessoas
que usam e que são do CRUSP ou que moram no CRUSP e
que é uma bagunça então se tem uma idéia de que todo o
CRUSP, todos os moradores são pessoas usuárias de droga,
vivem em baderna, vivem na esbornia. [Isso] é também uma
atitude super extremista eu acho que no fim das contas acaba
sendo dividido, realmente existem esses usuários, mas o
CRUSP não é só um lugar onde se usa droga, existem pessoas
que ralam demais, trabalham o dia inteiro, se esforçam pra
manter o curso ali em dia, ajudam suas famílias, quer dizer
pessoas sérias também, não dá pra você falar assim: o CRUSP
só tem vagabundo isso não é uma idéia correta.

A visão social do CRUSP desqualifica o


morador: miserável e vagabundo

Eu acho que muita gente na não conhece na verdade o


CRUSP. Então acho que as pessoas precisam conhecer um
pouco mais o CRUSP antes de falar, conhecer as pessoas do
CRUSP, não digo que não tenha problemas lá eu não sei como
é que é nos outros, mas da minha experiência eu não posso
reclamar de nada.. Então eu acho que as pessoas imaginam,
mas elas não conhecem realmente e a gente vê que mesmo na
nossa sala, nos outros anos o pessoal que mora lá, existe até
um certo preconceito em relação ao CRUSP.
Tem gente que mora lá e não precisa realmente, então
tem isso também, mas o quê as pessoas pensam é que, ah!
aquelas pessoas que moram lá são miseráveis. Então tipo
rotulam, só usa droga, fica o dia inteiro, passa a madrugada
inteira fumando, não faz nada na vida. Está lá porque o pai
pode pagar, mas fica lá porque está abusando do governo, deve
ter gente que faz isso, a gente sabe que tem, se apóia no
governo, mas assim é esse tipo de rótulo em relação à droga e
79
em relação as condições financeiras, mesmo você sente isso. E
tem pessoas que as vezes a gente convida, porque tem estágio,
alguma coisa, é mais fácil, ali no HU, as vezes posa em casa
numa boa, mas tem gente que evita ao máximo. Está
precisando, mora muito longe, chega cansado, você convida e
você vê que a pessoa tem o pé atrás por causa do local, então
não conhece mesmo.
Eu acho assim que tem um estigma muito grande com o
CRUSP, assim com os moradores do CRUSP, a partir do
momento que você fala que mora no CRUSP as pessoas já te
olham de uma forma diferente.
Na verdade eu acho que aí há uma coisa meio de
preconceito de classe, mais ou menos isso. Na verdade eu acho
que há uma população que entra na USP e que é classe média,
média pra alta, que usa droga só que não está acostumada com
pobre a grande diferença é essa.
Na verdade pelo que eu vejo nas festas da biologia, da
medicina, da engenharia acho que não difere quanto ao uso de
drogas não difere muito daqui não. Na medicina muito pelo
contrário lá é uma coisa exagerada, lá dá medo, dá medo, mas
eu acho que, na verdade, é mais um preconceito de classe
mesmo, porque querendo ou não a maioria da FFLCH daqui é
a maioria pobre. Acho que é mais isso mesmo. O negócio está
mais aí do que o uso de droga pela USP eu acho que, pelo que
eu vi nas festas, na ECA não difere muito do CRUSP não.

A mídia reforça o preconceito, num mecanismo de: divulgação de


acontecimentos que desqualificam os moradores; de omissão da informação
que qualificaria positivamente os moradores e na generalização leviana de
acontecimentos que são específicos e particulares.

Os acontecimentos negativos viram notícia, os


positivos não

[É sempre assim] quando acontece alguma coisa muito


fora do comum, em qualquer lugar vira notícia, mas as coisas
que acontecem do bem nunca vêem. Em muitos casos você
tende a ver somente o lado negativo das coisas quer dizer é
muito mais fácil [as] coisas negativas virarem notícia do que
coisas positivas aliás a mídia faz um trabalho fabuloso nesse
sentido de notícias negativas, assuntos que são de cunho
negativo eles se tornam pauta obrigatória e as publicações já
atingem um grande número de pessoas, isso contribui
realmente para que o CRUSP tenha essa imagem [negativa].
Eu me lembro que até que saiu umas reportagens em
jornal dizendo de pessoas que usavam maconha e rasgavam a
bíblia e faziam cigarros de maconha usando a bíblia quer dizer
80
isso chocava as pessoas lendo o jornal, eu retomo a idéia que
eu falei antes você não pode generalizar.

As idéias sobre o consumo de drogas na moradia são controversas e


parecem acompanhar o conjunto de idéias preconcebidas sobre a moradia.
Muitos alunos referem que o consumo de maconha no CRUSP é freqüente e
até mesmo perceptível pelo cheiro, no entanto, no que se refere aos índices de
consumo as opiniões são bastante contrastantes pois há quem diga que o
consumo é alto, quem diga que é baixo embora traga problemas e há quem
apenas refira a existência de rumores sobre o consumo de drogas pesadas.

O uso da maconha é comum e perceptível pelo


cheiro

Maconha é absolutamente comum, não é preciso você


andar a noite pra ver, durante o dia, em qualquer lugar é no
corredor é nos apartamentos acontece muito. Eu não sei se
você teve oportunidade de ver no CRUSP aqueles corredores
imensos a gente vai passando no meio, nossa, aquele cheiro de
mato é coisa básica, vai passando assim, se for de um lado ao
outro é capaz de a gente ficar meio lesada quando chegar no
último, o pessoal fuma lá direto, é complicado.
A gente sente o cheiro, o cheiro quando a pessoa fuma
vem pela área de ventilação do prédio, pelas janelas, hoje
mesmo por exemplo, eu senti não tem como disfarçar muito. O
cheiro da maconha é muito forte e um dos pontos negativos
também é esse, de vez em quando aparece o cheiro no
banheiro que vem pelo cano central compartilhado, vem o
cheiro pelo corredor, incomoda um pouco.
Fora isso lá em baixo às vezes ficam uns grupinhos
sentados conversando ali perto do DCE ou aqui perto da
conveniência mesmo você vê, você passa perto você sente o
cheiro, sabe que eles estão fumando, mas estão na deles estão
ali.
Maconha é em tudo, por exemplo, quarta-feira teve o
eclipse da lua, foi todo mundo do CRUSP pra lá ver a lua e tal
eu cheguei assim e eu me assustei, não ta rolando nenhuma
maconhinha? Mas aí foi cinco minutos e eu já senti o cheiro da
fumacinha e tal. Aí estava um pessoal usando lá, até alguns
amigos, conhecidos aqui eles estavam usando assim aí eu
cumprimentei. oi e tal, não foi nada.

81
O CRUSP é um local onde há alto índice de uso

É aqui no CRUSP cara é complicado porque a gente


sabe que corre solto, tem traficante morando aqui. O negócio
corre assim, a gente está sentado às vezes vendo televisão
sente a maconha, o cheiro da maconha, a gente sabe que o
pessoal consome e consome coisa pesada aqui, consome muito
é um mercado interessante, tanto do pessoal daqui de dentro
como tem gente de fora que vem comprar. Então é assim meu,
a gente sabe que muita gente usa, mas é uma coisa que está aí e
é meio complicado.
E eu considero alto o uso de drogas aqui, eu acho que é
bastante pelas pessoas que estão aqui, muita gente não é daqui
e tal, mas eu acho que é um problema. O uso de drogas no
CRUSP é bastante não digo visível, mas eu sei que existe e
muito, o consumo é, na minha opinião, alto e bem freqüente

Há pouco uso

[O uso é] pouquíssimo eu só conheço esse apartamento


acho que só esse apartamento no CRUSP inteiro assim.
[Conheço em três blocos, mas um deles] é tenebroso assim.
Esse bloco é um prédio mais velho, tem um pessoal mais
antigo, então tem umas histórias lá, só que é mais bebida
[sobre] drogas eu não sei.
Tanto é que se for fazer uma pesquisa entre os
Cruspianos, os moradores do CRUSP a maioria são não
usuários é que geralmente o pessoal inverte. Só porque têm
alguns, [porque] foi achado maconha, o CRUSP é infestado de
maconheiros. Acho que não é por aí.

Há pouco uso, mas causa problemas

A maioria você sabe que não usa, só que os que usam


aqui, dentre os que usam tem um grupo que gosta de se
expressar muito com grito, se você ficar uma noite aqui e você
pegar um dia de sorte você vai ouvir a gritaria, os caras
gritando. Tinha um apartamento histórico que eu morei um
ano, o cara estava há 10 anos, agora ele saiu, nossa ele usava
muita droga, então ele quebrava tudo, as luzes do apartamento
e quando eu vim pra cá ele gritava, ficava gritando pro CRUSP
todo ouvir.

82
Há rumores sobre o uso de drogas pesadas no
CRUSP

Acontecem casos de uso de drogas pesadas tem gente


que fala que tem drogas mais pesadas [como] crack, mas eu
nunca vi ninguém fumando crack por ali

Não tenho conhecimento se há drogas mais


pesadas no CRUSP

Quanto à droga mais pesada, que chamam de mais


pesada eu num tenho conhecimento [se há no CRUSP].

Notadamente muitos alunos referem que o consumo de drogas não se


relaciona ao fato de morar no CRUSP, que não há um oferecimento.
Novamente o preconceito é apontado como mecanismo de apartação dos
moradores, uma vez que os moradores são pessoas que têm que trabalhar e
estudar para sobreviver e se esforçam muito para isso, desdobrando-se em
tarefas para manter bons padrões de estudo.

O uso de drogas não se relaciona ao fato de


morar no CRUSP

Eu acho que quem vem muito de longe, de fora, [mas]


que pode ser influenciável pode ser que ele venha a consumir
porque está aqui, mas se tivesse em outro lugar morando com
outros estudantes chegaria ao consumo da mesma maneira. A
única coisa é que as pessoas se permitem um pouco mais aqui
porque eles estão longe de casa e tudo mais, mas acho que
nada que as pessoas não fariam.
Acho que não é o ambiente que vai fazer a pessoa pode
ser que a pessoa [pense] Ah! estou entediado não sei que lá
mais. Que diferença faz entre aqui e a república é que aqui é
um espaço muito igual e a pessoa talvez se canse com isso,
tudo muito certinho, tudo muito isolado, o que cria um tédio na
pessoa, mas acho que isso não influencia tanto quanto morar
em outra república dentro de São Paulo pra poder estudar na
USP. Não tem muita diferença, não talvez só essa coisa da
pessoa estar chegando e conhecer o lugar, conhecer o espaço e
se iniciar por exemplo nas drogas, mas não é o CRUSP que
inicia a pessoa, a pessoa que em qualquer lugar faria isso.
Acho que [o CRUSP] não propicia [o uso de drogas],
acho que a pessoa, ela vem de um lugar com seus valores é ela
que vai se deixar ser conduzida ou não. É lógico que a pessoa
83
chega um pouco perdida e a gente tem que levar isso em
consideração, ninguém chega aqui espertão, ligado. É bixo,
está chegando agora, chega meio assustado, o sentido de bixo é
esse na verdade, é o sentido da pessoa que chega meio
assustada, às vezes precisa de uma força, depende de quem
apoia pode ser que ela comece a se prejudicar, mas depende
dos valores dela se ela vai ser influenciada pela ajuda dos
outros.
Eu vim lá do interior pra estudar aqui não é porque eu
recebi uma casa pra eu morar de graça que eu vá me drogar e
ficar aqui o dia inteiro me drogando. Eu acho que não é o caso,
mas eu não acho não que o lugar facilite ou inspire esse tipo de
coisa eu acho que não. Eu acho que não tem muito a ver
porque acho que as pessoas que estão aqui estão porque
precisam financeiramente e a gente não precisa só de morar e
comer a gente precisa de viver e pagar xerox, então o pessoal
trabalha e estuda [e no] final de semana o pessoal sai vai beber.
Eu não vejo muita diferença entre o CRUSP [e] os outros
condomínios, não vejo muita diferença. Tem moradores que
tem problemas tanto aqui como fora em outros condomínios às
vezes até mais, até maiores, eu não saberia destacar um fator
que confirme essa afirmação de que o CRUSP propicia o vício,
eu acho que não.
É o que eu falei, eu acho que [em] qualquer lugar a
pessoa é livre, hoje em dia [em] qualquer lugar.
Eu acho que depende muito mais das suas amizades fora
do CRUSP mesmo. Por exemplo, eu nunca usei, nunca
pretendo usar e moro aqui. Pode ser que ele encontre os amigos
aqui pra continuar, mas não que seja aqui a origem do
problema.
O fato de eu estar morando aqui com pessoas que fazem
uso, pessoas que até vendem, traficam sei lá, isso não vai
propiciar que eu use porque é uma coisa que eu não curto e não
vou fazer porque os outros fazem então é de cada um mesmo,
mas a liberdade ela existe, [mas aqui] você não vê o pessoal
oferecendo. Não é que nem no Rio de Janeiro onde o pessoal
passa vendendo na rua assim com fuzil na mão, eu nunca vi
ninguém armado aqui nem portando droga visivelmente eu
nunca vi e nunca me ofereceram, nem soube de alguém pra
quem foi oferecido droga uma vez, nunca ouvi falar. Ninguém
fica chamando o outro a ser usuário, então usa quem quer,
também ninguém fica usando em qualquer lugar.
Eu acho que se você for pegar os estudantes da USP e
colocá-los em outro conjunto residencial o índice vai ser o
mesmo. É que aqui juntou todo mundo é como se estivessem
todas as repúblicas de estudantes num espaço só e aí você
pudesse observá-las de uma só vez, aí seria fácil de você fazer
uma estatística, tipo ali todo mundo usa droga é o que
acontece. Eu vou em festa de “república” e não tem uma festa
em que eu vá e que não tem alguém fumando maconha e aqui

84
[o que] acontece é que as repúblicas estão juntas, então fica
mais fácil, mais evidente de você observar isso.

Ainda no que se refere especificamente ao consumo de drogas no


CRUSP, pode-se notar que alguns alunos, desde o ingresso na moradia,
trazem na bagagem preocupações com o consumo. Dessa forma, a atitude
deles é a de procurar um espaço livre das drogas. Já no campo das explicações
encontradas para a existência de algum consumo no CRUSP propriamente dito
há um leque que vai desde o fato de haver um livre acesso de não-moradores
ao CRUSP (as pessoas vão lá para usar), uma vez que a polícia não poder
entrar no campus, até um acesso às drogas considerado muito fácil.

Selecionou apartamentos sem usuários de drogas

Como eu fiquei pra segunda lista só tinha os lugares


bomba pra entrar. Então teve um apartamento que eu bati que
o cara abriu e estava tendo uma rodada de fumo, era uma boca
de fumo o lugar e aí o rapaz falou que na vaga já tinham
hóspedes e que o hóspede não ia sair do quarto se eu quisesse
eu podia ficar na sala, sendo que a vaga era minha por direito
era minha, aí eu falei tudo bem fica aí na boa que eu vou
procurar outra vaga.
[Em] outra [vaga] eu vi fumaça saindo da janela então eu
nem bati, aí o lugar menos pior que eu encontrei foi esse aqui.
Aí eu ingressei aqui, eu vi que era um lugar que a galera não
curtia droga me perguntaram se eu usava drogas e tudo então
eu já achei um lugar a principio legal.
Então eu moro com uma pessoa que graças a Deus é
super careta, que é uma preocupação quando a gente vai
ingressar no CRUSP [dividir o apartamento com] algum
maloqueiro, alguma pessoa bem “triste”. Eu [já me] mudei
duas vezes. [No primeiro apartamento em que morei] eles não
faziam uso de álcool e drogas, mas eram pessoas muito
difíceis, [tão] difíceis que eu resolvi [me] mudar.

Pessoas de fora não são impedidas de vir usar


droga no CRUSP

Então eu acho que de certa forma isso [o uso de drogas


ser livre no CRUSP] até é verdade porque vem muita gente
aqui pra usar drogas. Muita gente vem de outros andares pra cá
pra fumar, vem gente de fora da USP pra fumar aqui dentro.
[Tem também] a pessoa que tem medo de fumar lá em baixo,
85
de cheirar lá em baixo de alguém ver e tal, ela vem pra cozinha
cheirar porque sabe que ninguém vai impedir a entrada dela no
CRUSP, nos prédios e tal. Ninguém vai chegar lá na cozinha e
vai expulsar, sai daqui porque você ta usando drogas, isso não
acontece.
Isso é uma coisa que, eu já naturalizei mas alguém que
não mora aqui, que não fica aqui, porque eu fico aqui vinte e
quatro horas por dia, alguém tomaria um choque, mas eu não,
é liberado eu me sinto na Holanda aqui só não vende na banca.
[No entanto], eu acho isso um pouco ruim porque fica
parecendo que são os moradores, que todo mundo que mora
aqui é assim. Muita gente até, eu acredito, que vem ainda aqui
fuma maconha na cozinha, cheira essas coisas, porque acha
que todo mundo realmente usa e que é normal.

O uso de drogas acontece porque a polícia não


entra no campus

Uma coisa eu sei, acontece muito [o uso de droga no


CRUSP] porque a polícia não entra. Não adianta [o] segurança
lá não vai ser bobo de falar aqui não pode, não tem como. O
quê pode acontecer é tipo a polícia militar não entra na USP,
então o pessoal tem mais facilidade pra fumar [porque] a
polícia não vai aparecer.
Eu já conheci um povo, que eu sempre passo, a gente vê
um povo da educação física [fumando]. Por ser livre facilita
muito[para] os que usam.

O acesso às drogas é muito fácil

Eu acho que é uma questão bem complicada e é muito


fácil o acesso, a qualquer hora e qualquer dia, mas propicia
mais pra quem tem interesse também, porque tem muita gente
aqui que não usa.

Ainda sobre o consumo de drogas na moradia nota-se que há um


conjunto de idéias de senso-comum como a pressão dos colegas para a
experimentação ou a associação entre diversão e uso de drogas.

Os alunos que usam drogas pressionam os outros


para experimentar

[Tem] um povo mesmo, não sei se eles acham que é


preciso estarem assim, que a gente tem que experimentar
aquela onda hippie de todo mundo fazer isso [usar droga]
também.
86
As pessoas só se divertem se fumam e bebem e
isso incomoda

Eu vejo pessoas que só conseguem se divertir porque


fumaram, porque beberam e isso me incomoda bastante.

Há ainda visões contraditórias como a que o uso de drogas se dá nos


apartamentos e em festas ao passo que a vida no CRUSP é conservadora e
sem festas.

O uso de drogas ocorre em festas e nos


apartamentos

Eu sei que existem festas nos fins de semana, nunca fui


em uma festa, mas a minha visão é que deve ocorrer consumo
de drogas em algumas das festas ou mesmo não sendo festa em
alguns dos apartamentos também.
Eu acho [muito] complicado porque cada um quando
está dentro do apartamento, entre aspas seu você é responsável
por aquilo que você está fazendo, você não está em público,
numa via pública, no corredor, no elevador tal você está dentro
do seu apartamento dentro do seu quarto, tem como alguém
chegar e bater na porta e falar olha, por exemplo, eu senti o
cheiro e avisar o porteiro ou a guarda ou sei lá, fulano está
fumando maconha aqui, [eles] vão rir. Provavelmente, [vão]
falar deixa ele fumar.
Eu acho muito complicado porque é contraditório você
vai estar mexendo tanto com o social mas é o individual é o
subjetivo, é o direito da pessoa e ao mesmo tempo o dever
então de verdade assim eu não sei.

O estilo de vida no CRUSP não permite


extravagâncias

Em geral aqui as pessoas tem um estilo de vida assim


bastante conservador, não existe muita extravagância. Se
existissem essas extravagâncias, festas etc, talvez aconteceria
uso de droga, mas onde não tem festa não rola, o pessoal fica
na bebida no máximo.

Alguns alunos referem que não gostam nem do CRUSP nem de quem
mora lá, um outro denuncia que a vida na universidade é complicada e que as
oportunidades são menores para os alunos pobres, que constituem o universo

87
dos moradores do CRUSP e há ainda aqueles que não se sentem seguros no
CRUSP e na região em torno.

Eu não gosto de morar no CRUSP e nem das


pessoas que moram lá

Eu não gosto de morar no CRUSP, eu não gosto das


pessoas que moram no CRUSP, tirando o meu circulo de
amizades assim os amigos são poucos, conhecidos bastante
sim. O CRUSP é um lugar que não me agrada.

A vida na universidade é muito complicada

É bastante complicada a vida na universidade.

Quem é pobre não poderá ser professor

Você não pode ser professor porque você é pobre e se


quiser tem que fazer a tal da iniciação científica.

Não há segurança no CRUSP e nem na região


em torno

A nossa segurança é muito precária lá, não dentro do


CRUSP só, mas fora, ali na região é uma tristeza, dá o maior
medo de sair pra fazer alguma coisa. Agora é que tem uma
padaria perto, que antes era tudo longe, não tinha, se a gente
não conseguia jantar lá no CRUSP, o quê que vai comer, não
tem onde comprar tem que sair.
Droga rola solto, o pessoal a gente vê que às vezes rouba
as coisas, não tem como a gente falar , a gente sabe que tem
um cidadão lá que é mais possível que tenha pego, mas não
tem como provar, a gente não pode entrar e falar olha isso aqui
é meu.
Então a gente fica meio inseguro lá, pelo menos o meu
quarto está trancado. Eu só vou pra lá pra dormir, porque ficar
lá eu não fico porque eu tenho receio. Eu saio de lá vou para
faculdade fico, faço o que eu tenho que fazer, vou pra lá e
durmo é isso que acontece

Aparece também um discurso que questiona a assistência dada às


alunas que têm filhos durante o curso, como se significasse um estímulo à
maternidade.

88
Auxílio às mães dado pela COSEAS pode
estimular a gravidez

Quando eu vou no COSEAS eu falo direto com a


assistente social ou deixo alguma coisa por escrito, a respeito
da maternidade. Eu acho muito legal você ter assistência para
as mães, tipo você tem um filho vem estudar aqui, você tem
uma casa, porque você tem um quarto pra criança separado,
tem um quarto de casal, tem lavanderia tem tudo aí. Então
acho mais do que justo o direito à creche, mas o quê acontece é
que isso muitas vezes estimula, tem mães aqui que tem dois
filhos, que teve filho aqui, engravidou aqui e ficou com o filho
aqui. Eu acho que não é o caso. Eu acho que a gente tem que
aprender a separar as coisas, a gente sabe o quê é
anticoncepcional, o quê é camisinha e eu acho que o Estado
não tem o dever de arcar com isso, assim, aconteceu um
acidente tudo bem, mas eu acho que esse amparo demasiado
acaba estimulando.
Então eu até falei com a assistente social, porque eles
queriam parece mais duas maternidades, mais uma, não sei, e
eu acho legal você investir na campanha de prevenção, porque
[a gravidez] atrapalha a tua vida acadêmica eu acho isso. Aí
então eu fui até falar com a minha assistente social sobre isso.

6.4 A visão dos moradores sobre o consumo de drogas

Nos discursos dos alunos sobre o consumo de drogas nota-se a


presença das duas principais concepções que contemporaneamente têm
alimentado a arena da prevenção ao consumo de drogas: guerra às drogas e
redução de danos.
Conforme discutido no capítulo teórico, cada um desses campos é retro-
alimentado por um conjunto de teorias que vão desde a explicação para o
consumo de drogas até um conjunto de estratégias para a prevenção. A análise
foi então realizada, num primeiro momento, no sentido de compreender quais
as teorias apresentadas pelos alunos para explicar o consumo de drogas.
Na concepção de guerra às drogas situou-se a teoria explicativa que
culpabiliza o indivíduo por sua condição e mudança.

89
No que se refere às teorias explicativas que enfocam o indivíduo tem-se
a proposição de que as pessoas usam drogas porque são frágeis para enfrentar
um cotidiano de problemas, numa espécie de fuga e também uma explicação a
partir de um conjunto desqualificador dos usuários de drogas, vistos como
criaturas menos humanas.

As pessoas usam drogas porque são frágeis para


enfrentar um cotidiano problemático

Bom, eu não faço uso porque acho que isso pra mim
muitas vezes é uma fuga, tem pessoas que usam pra relaxar e
tudo, mas eu acho que isso a gente usa porque está com
problema, quer esquecer, está com a vida difícil, ah então vou
usar pra dar uma relaxada, esquecer um pouco das coisas, pra
mim muitas vezes isso é usado com uma fuga.
Na minha opinião a pessoa está passando por uma fase
difícil da vida porque ninguém usa drogas assim, porque está
totalmente estável emocionalmente. Eu acho que tem alguma
coisa que está errada pra pessoa começar a fazer isso, pra
querer uma reação tão violenta, assim no corpo e na mente, eu
acho que desequilibra totalmente.
Eu já escutei cada papo, assim, tem gente que fala, os
estudantes mesmo falam que a gente vive sobre intensa pressão
então eles recorrem a isso [uso de drogas] e como tem muita
gente que usa, muita gente vê, essas pessoas que vêem se
sentem meio assim também vão procurar.
Além disso, o fato de ter entrado na USP não é a solução
de todos os problemas, esses continuam, não alivia em nada na
verdade, surgem novos em virtude de você ter entrado na USP.
Isso eu acho também que de certa forma pode trazer um
desânimo e pra canalizar esse desânimo, continuar tocando a
vida, essa pessoa procura se refugiar num baseado.

Os usuários de drogas são pessoas


desqualificadas (criaturas menos humanas )

As pessoas que usam drogas aqui no CRUSP são meio


estranhas, são assim meio de barra pesada eu acho. Então fica
mais difícil, tem outras pessoas que eu achava super legais e
que começaram a usar drogas, aí pararam de estudar direito,
usa maconha não estuda tanto, eram super inteligentes e aí fica
só fazendo bagunça.
[Agora no geral, tem a questão] da fraqueza que vem,
quero experimentar vai lá e experimenta e não consegue sair,
nem sempre é culpa da pessoa tem alguns que a gente sabe que

90
são retardados mesmo, que vai lá porque é legal e acha que é o
topo da parada, mas tem gente que vai por pura inocência.
Acho que depende muito, mas quem não tem muita
personalidade lá [no CRUSP] acaba fugindo pro lado das
drogas mesmo. Se todo mundo que morasse lá fosse contra as
drogas, não fizesse o uso, e um que aparecesse lá a gente
chutasse essa pessoa, eu acho que não ia ter essa coisa
Eu não quero ser assim, mas eu tenho um desprezo
muito grande por usuário de drogas. Eu tenho desprezo porque
eu não respeito as pessoas que usam drogas, até amigos meus,
muitos eu parei de falar quando eu descobri que fumavam. É
difícil conversar com a pessoa que usa droga, eu prefiro
conversar com uma parede, porque a parede não fica retardada.
Eu tenho uma opinião bem negativa sobre pessoas entende a
linguagem da porrada, eu não sei se eles estão dispostos a
conversar, eles não gostam de conversar, eles não gostam de
dialogar.
[Bom, tem também] esse problema dessas pessoas que já
usam o quê que acontece pra quem trafica vai preso [porque] é
crime, [para] quem usa você pode oferecer ajuda, [mas] a
pessoa tem que aceitar se ela não aceita tem um impasse qual é
a solução desse impasse? eu acredito na força, eu acho que não
há outra solução possível infelizmente.
No entanto, eu já tentei ajudar várias pessoas, mas foi
tudo em vão, todas as pessoas que eu tentei ajudar querem me
comprovar que isso não tem efeito nenhum na vida delas. Por
exemplo, tem uma menina da minha sala que é usuária de
maconha, cocaína e sei lá mais o quê. Eu já tentei convencer
ela de várias maneiras, mas ela tenta me convencer totalmente
ao contrário, então eu não consigo nem formular uma idéia
sobre essas pessoas, eu acho que essas pessoas são tão
imaturas ainda pra saberem as coisas direito, não quererem ver.
[Tem gente que fala] ah, a pessoa está passando por
dificuldades e por isso procurou droga eu acho essa explicação
totalmente banal. Eu passei por tantas dificuldades e nunca
procurei. Porque que as pessoas vão [usar]? Porque querem
mesmo, porque gostam.

Os estudantes universitários são percebidos como um grupo que usa


drogas por escolha, uma vez que têm informação, e que acredita estar imune
aos problemas relacionados ao consumo de drogas.

O universitário usa drogas por escolha

As pessoas têm instrução, tem informação sobre isso


[drogas], você pra entrar aqui na USP eu acredito que tenha
lido jornais e revistas sobre isso. Então eu acho que é uma
escolha. Por estar em uma faculdade tão boa como essa, eu

91
acredito que a pessoa é madura o suficiente para saber o quê é
bom e ruim, é realmente uma opção muito pessoal. Eles sabem
muito bem o que está acontecendo o que eles podem fazer, o
que eles não medem são as conseqüências, então acho que não
é questão de conscientização, porque eu acho que isso eles
tem, acho que é um pouco de falta de vergonha na cara, todo
mundo ter medo de ficar usando.
Se você está a fim de levar o seu curso com seriedade
você vai levar, mas tem épocas que você descamba. Eu estou
falando isso não é que eu sou assim ah! meu maior CDF essa
daí, não cara, você apronta, tem época que você apronta pra
caramba , mas tem época que você tem que dá uma segurada.
[Eu acho que] as pessoas são livres pra decidirem que
tipo de drogas usam, eu tomo sorvete. As pessoas usam o que
elas precisam, o que elas se satisfazem, o quê satisfaz a elas.
[Pra mim], a pessoa só precisa de ajuda realmente se ela
buscar. [O uso de drogas] não me causa nenhum espanto,
nenhum assombro, não me dá vontade de ajudar a pessoa esse
tipo de coisa. Mas não acho que esse é o mesmo caso de um
adolescente por exemplo, ou de um senhor alcoólatra, de um
pai de família que se mete com bebida e tal.

Os universitários não acham que poderão ter


problemas advindos do uso de drogas

No meio universitário mesmo, aqui, eu acho que são


poucos os [usuários] que procuram ajuda, acho que são
poucos. Isso porque eles acham que é de barato, que é porque
curte, curte tudo. As pessoas geralmente não acham que isso
seja um problema, que fumar maconha não traz prejuízo
nenhum e tudo mais e no fim prejudica, eu vejo algumas
pessoas se prejudicando muito com isso. Eu realmente acho
que eles talvez não se toquem do quão grave isso é, porque o
crack por exemplo é uma droga que se você fumar em duas
vezes você fica dependente daquilo e você vai quere fumar
uma terceira. É igual a questão da aids não vai acontecer
comigo [ficar dependente]. Tem gente ainda que pensa assim.

O usuário desperta sentimento de dó

Então, às vezes eu fico com um pouco de pena de quem


usa muito, de quem usa, começa de repente a fumar maconha e
vai pra outros tipos de drogas, que acabam prejudicando muito
a vida, incluindo a vida acadêmica. A pessoa tem muita
capacidade e de repente vai por água abaixo, às vezes eu sinto
um pouco de pena.

92
Os alunos ainda contam que ver alguém usando cocaína é uma
experiência marcante e que o uso pode estar relacionado a faixa etária e a uma
fase de curiosidade.

A primeira vivência com alguém utilizando


cocaína no CRUSP foi aterrorizante

Eu fui conhecer aqui uma vez numa festa de “república”


aqui, eu nunca tinha visto ninguém cheirar cocaína e vi. Eu
fiquei horrorizada, eu acho que é feio de ver a reação da
pessoa, parece que a pessoa vai explodir, a pessoa fica com
aquele olho. Eu não gosto.

A questão da idade é determinante para o uso

Eu converso muito com os amigos e eu acho que é pela


idade mesmo [em] qualquer ambiente que você vê, nessa faixa
de idade assim está tendo droga, mesmo fora da universidade.
Eu lembro quando eu fazia cursinho sempre tem aquela turma,
o pessoal da maconha.

Existe uma fase de curiosidade

E eu nunca usei porque na fase de curiosidade eu não


tinha acesso e hoje não sei, não me chama a atenção, não me
seduz

Há um discurso que ressalta a idéia de que não é natural a pessoa


precisar de drogas para se divertir e há a idéia que as pessoas precisam ter
mais consciência sobre suas vidas e que os culpados pelo uso de drogas não
são nem o governo e nem as instituições.

Não considera normal o uso de drogas para se


obter diversão

Eu não acho que seja legal você precisar de drogas,


álcool qualquer coisa pra você se divertir, isso pra mim não é
normal, pra você ficar alegre você precisa disso, não sei não
aceito bem isso, acho esquisito. Pra mim é estranho já que não
é natural, eu acho estranho você precisar de alguma coisa.

93
As pessoas precisam ter mais consciência sobre
suas vidas

Eu acho que as campanhas elas tem sido realmente bem


pensadas, mas talvez falte alguma forma [para] chamar mais a
atenção dos moradores do CRUSP pra isso. Até porque [o] uso
de drogas não é uma coisa só no CRUSP, praticamente em
todo o lugar [vem] se tornando comum, ficando cada vez mais
próximo das pessoas todos os dias. Então são necessárias, não
digo ações educativas, mas eu acho que falta às próprias
pessoas uma consciência maior sobre suas vidas, sobre [suas]
responsabilidades

Os culpados pelo uso de drogas não são o


governo e as instituições

Eu acho que a gente vive num país que é


subdesenvolvido sim, mas em países desenvolvidos o problema
é o mesmo você tem um consumo de drogas altíssimo, uma
população bastante culta, bastante educada. Então é por isso
que eu digo não é só uma questão do governo é muito fácil
você falar é do governo falar mal ou jogar a culpa na
universidade é uma questão realmente de ser, que atinge cada
pessoa, cada usuário, cada não usuário.

Nesse contexto, ainda é possível notar que o poder que a droga em si


apresenta, é especialmente enfatizado no caso do álcool que
contraditoriamente se apresenta como a “droga das drogas” ou como “não-
droga”.

As drogas alteram o comportamento

Eu bebo cerveja, mas, eu acho o alcoolismo, você ser


dependente de álcool uma coisa muito triste e meu pai era
alcoólatra, então eu acho que é uma das drogas mais pesadas
que existe, até de você observar mesmo no comportamento da
pessoa.
Eu sou contra qualquer tipo de droga, [quer dizer], eu
não sou contra a maconha e acho cocaína, crack qualquer tipo
de droga lamentável, entendeu? Eu não gosto de conviver com
pessoas que usam porque, realmente eu acredito que esse tipo
de droga altera o comportamento, e sei lá.

94
O álcool não é uma droga

Eu uso álcool sim, mas eu não acho que é uma droga.

Entre as estratégias para a prevenção, situadas no campo da guerra às


drogas alguns alunos posicionaram-se incisivamente contra qualquer uso de
drogas enquanto apresentaram um conjunto de sugestões sobre como lidar
com os problemas relacionados ao consumo. O teor dessas sugestões é
variado: necessidade de um policiamento ostensivo e uma maior coerção por
parte da uni versidade; prevenção voltada para os dependentes de droga; e
necessidade de identificar os usuários/dependentes (está presente a idéia de
que eles incomodam).
É contra o uso de drogas

Eu bom, claro eu sou contra. Eu acho o uso da maconha


muito ruim e eu acho que a gente por ser estudante e por estar
numa universidade boa, ter um futuro, provavelmente será um
bom profissional, usar drogas? eu acho uma coisa ruim assim,
eu acho que usam a inteligência para uma coisa, mas em outras
distorce totalmente, eu não aprovo o uso de maconha, de
nenhum tipo de droga, nem cigarro na mão eu gosto, bebida
alcoólica nada, mas infelizmente quase ninguém pensa assim.
Eu sou contra o uso e eu confesso que eu não me sinto
bem em saber que pessoas usam e não me sentiria bem de
saber que um amigo meu utiliza, eu acho que eu procuraria
conversar com ele e tirar essa idéia da cabeça dele porque é
algo muito complicado realmente. Eu acho assim
extremamente negativo no sentido da saúde da pessoa é um
caminho realmente complicado pra saúde dessas pessoas
depois. É como dizem as expressões embarcar numa viagem
meio que sem volta, algumas até conseguem ter uma
recuperação, tentam voltar, se voltar pra vida, mas é uma
questão complicada.

O policiamento ostensivo deve criar ambiente de


coerção

Primeiro [deve ser feito] o que é feito na sociedade


inteira, porque a USP por mais que queiram não está fora, ela
não é uma entidade autônoma da sociedade, ela está dentro da
sociedade. Pra diminuir [os problemas] só colocando o

95
policiamento lá dentro [do CRUSP], só tirando o pessoal,
fazendo uma inspeção rígida mesmo.
Um policiamento ostensivo no combate a tráfico de
drogas tem que ter aqui dentro. Não contra o uso, o uso eu
acho que aí é um problema mais sério, mas tem que ter um
combate oficial de coerção violenta da polícia militar que é
violência querendo ou não de uma forma ou de outra.
Então eu acho que no começo uma ação forte, de
policiamento, [se] eu não posso fumar maconha na rua, não
pode aqui dentro também. Então, eu acho que devia ter uma
coerção maior de alguma entidade [como] da guarda
universitária, não quer que entre a polícia aqui não entra, mas
tem que cercear essas pessoas, como é ilegal o uso e o tráfico,
acho que tem [que ter] uma resposta legal. O encarceramento,
é uma resposta legal pra esse tipo de prática. Não sei se eles
aceitariam uma ajuda de cunho humanista, eu acho que não.
Eu conheci muita gente que é da pesada mesmo , eles não
querem ajuda. Bom é isso. É só em uma ação que eu acredito

Deve haver atividades direcionadas aos


dependentes

É, uma pessoa que quer sair desse modo de vida, se


afastar um pouco das drogas [deve] ter uma atividade pra
fazer. Eu já ouvi muitos falarem também que tem muito ataque
de depressão assim quem está fora de casa, morando aqui.
Talvez uma atividade direcionada pra essas pessoas evite um
pouco as drogas, [algo que elas] pudessem procurar assim, é
uma sugestão

Embora centrando a problemática do consumo de drogas na figura do


dependente, num campo menos categórico, há aqueles alunos que
recomendam estratégias mais próximas de uma abordagem de redução de
danos, uma vez que reconhecem a especificidade de cada caso propondo que
se pesquise a realidade do CRUSP. Consideram que a família ou os amigos
devem mobilizar-se para ajudar; nesta categoria encontram-se também aqueles
que denunciam e inexistência de política de tratamento para os dependentes e
o casuísmo das práticas de prevenção tão característico da omissão do Estado
com o problema das drogas.

96
É preciso identificar quem precisa de ajuda

Eu acho que pesquisa é uma coisa legal porque talvez


com pesquisa você possa identificar quem realmente precisa de
ajuda e quem quer essa ajuda e identificar principalmente a
quem essas pessoas estão incomodando. Eu acho que quando
começa a passar do limite dela é porque aí ela está precisando
mesmo de ajuda, pesquisa é uma coisa legal assim.
Talvez chamar os moradores, quando tem a reavaliação
lá no COSEAS e a assistente social conversar com o morador
se ele conhece alguém ou se no apartamento dele tem algum
problema, esse tipo de coisa. Eu acho que uma abordagem
assim é mais suave e indireta, do que você chegar diretamente
na pessoa que usa, isso assusta e acaba parecendo coação
assim, vem cá que nós vamos cuidar de você, eu não acho
legal.

A ajuda deve vir de alguém próximo

Então eu acho que a melhor saída vai ser a da família [ou


os] amigos, tipo você mora com mais duas pessoas no mínimo.
Por isso eu acho legal ter uma convivência realmente com
essas pessoas porque de repente ela pode perceber alguma
coisa que você não tá percebendo, te dá um toque. Você vê seu
amigo precisando vai [e] fala porque nós estamos longe da
família e de repente você é um menino de 17 anos, vem pra cá
pro CRUSP e começa a fumar maconha, depois está cheirando
cocaína e está viciado naquilo. Tua mãe não sabe porque não
te vê, teu pai não sabe porque não te vê, você não reconhece
seu problema e de repente você põe sua vida a perder por
causa de uma falta de consciência.
Aí acho que a ajuda teria que vir de alguém mais
próximo, acho que é muito difícil uma campanha atingir esse
tipo de pessoa que está muito certa do que quer, do que é e do
que está fazendo. Eu acho isso.

Não há política de tratamento para os


dependentes: as práticas são casuísticas

[O que acontece é que] você procura a COSEAS fala da


pessoa e ela fala não a gente já ofereceu ajuda. Então elas por
debaixo dos panos elas tem alguns atos de ajuda, sabe que a
pessoa tem problema então oferece ajuda profissional mesmo
assim, leva pra clínica, esse tipo de coisa, só que tem que ter a
adesão, não é forçado esse tipo de tratamento
Eu sei de vários casos de pessoas que tem problemas
com drogas que foram pra [uma] clínica de recuperação, a
fundação da USP acho até que bancou isso tudo e que voltam
97
pra cá muito bem, [mas] passa um certo período caem de novo.
Eu não sei, eu não consigo pensar numa solução, eu vejo que
as pessoas que querem ajuda de repente têm acesso a essa
ajuda, mas que acabam caindo de novo. Eu não sei se elas
perdem esse apoio de repente, se elas depois disso não tem
mais um acompanhamento e acabam voltando até por isso, eu
não conheço direito, não conheço tudo o que acontece.

Já no campo da redução de danos, elencou-se os discursos pautados


por teorias explicativas para o consumo de drogas menos reducionistas que
aquelas que culpabilizam o usuário ou somente estão atentas aos efeitos das
drogas. Assim, para os moradores do CRUSP, o consumo de drogas na
moradia está relacionado aos processos de socialização, num mecanismo de
perda de alguns laços de um lado e de esforços para reconstruí-los de outro.
Os estudantes falam então das perdas que sofrem quando chegam na
moradia, pois se de um lado parecem ganhar uma certa autonomia e liberdade
diante da perda da tutela próxima dos pais, sentem-se sem vínculo, sem saber
como prosseguir. No processo de reconstrução da sociabilidade, consumir
alguma droga – maconha notadamente – é apenas um detalhe. O rateio para
comprar comida, bebida, para sentir o conforto da proximidade e do carinho
humanos constituem os mecanismos pelos quais a sociabilidade vai passando.

O uso de drogas na moradia está relacionado aos


processos de socialização (perda/reconstrução)

Quando você vem pro CRUSP o que há na verdade é, ao


mesmo tempo que [tem] essa coisa de uma espécie de
libertação, da autonomia diante da autoridade dos pais há
também um desvinculo da sua relação social, por exemplo, da
relação com os pais, os amigos, com os familiares em geral,
com a vizinhança coisa que faz sentido pro individuo deixa de
existir onde você tem que reconstruir tudo aquilo.
Na verdade geralmente acontece um momento onde você
reconstrói aquilo e não sabe se vai sua necessidade de
afetividade de vínculo mesmo você não consegue construir
uma sociabilidade aí você, sem achar, você vai pro uso da
droga como uma forma tanto de suprir sua carência afetiva,
como uma forma de você encontrar aquela sociabilidade.
Tanto é interessante você ver a forma como, como se dá
a compra da droga, eu acho fenomenal. Tipo, na verdade é
uma reunião, se ajunta dinheiro, vamos lá, parece uma festa

98
assim sabe? Tanto é que no alojamento a gente fazia rateio pra
comprar bebida, comida e aí os caras ficavam juntando
dinheiro e 30% ia pra droga e os 70 outros ia pra [outras
coisas] E na verdade era uma reunião, e todos iam lá pras
pedras e tocavam violão e tomavam vinho e fumavam
maconha a noite toda e tal, nós que não usávamos íamos lá e
ficávamos lá porque na verdade era aquele o tipo [de] vínculo
que o pessoal estava necessitando
Fumar maconha é meio que uma socialização e tem até
uma história que eles não faziam churrasco se não tivesse
maconha, não tem festa sem a ervinha. É até interessante
porque chega um ponto que se você não tiver uma
personalidade um pouco forte você perde um pouco da
sociabilidade. Parece que a sociabilidade passa
necessariamente pelo uso de drogas, o que é uma coisa
interessante, não tem nem errado nem certo é no mínimo
interessante como a sociabilidade se dá, tem que passar
necessariamente pela droga.
[No que se refere] a universidade em si ela é muito,
muito vazia em questões de relacionamentos questões de
relacionamentos intersubjetivos, aqui no CRUSP [é assim]. A
pessoa que usa drogas tende a aprofundar isso aqui, mesmo
porque você é obrigado a estudar e se desligar às vezes parece
que você fica me io esquecido aqui. Eu acho muito
compartimentados os apartamentos é como se fosse uma cela
pra cada um, uma cela individual aí quem já vem pra cá com o
vício das drogas tem isso como incentivo pra continuar usando
ou usar mais, agora quem não usa, não sei se tende a usar por
causa disso.

Para outro grupo, na mesma direção, o consumo de drogas é a busca de


alguma resposta...

O uso de drogas é a busca de uma resposta

Do LSD a maconha ao comprimido todo mundo está


procurando resposta, eu procuro a minha resposta, insisto, no
sorvete. Eu tomo sorvete.

Assim, o efeito do produto é minimizado.

As pessoas não mudam seu comportamento


porque usam drogas
Eu acho que as pessoas que consomem as drogas têm o
comportamento de sempre, não mudam porque consomem
droga ou não.
99
Buscando ainda uma compreensão mais abrangente, o contexto também
determinará a condenação ou não do usuário.

O usuário é bandido ou herói dependendo do


contexto

No começo era muito complicado pra mim porque eu vim


de uma cidade muito pequena que as pessoas que usam drogas
são marginalizadas mesmo, que é bandido é quem não presta.
Eu antes de eu vir pra cá eu fui pra outra universidade e lá era a
mesma coisa, embora fosse uma cidade muito maior que a
minha. A minha cidade só tem 6.500 habitantes e lá [nessa
outra cidade] era a mesma coisa, a gente tinha alguns colegas
que fumavam maconha, mas era escondido porque é feio, é
errado e tudo mais.
Quando eu cheguei aqui foi complicado porque foi uma
inversão de valores por completo, porque os marginalizados
eram quem não usava, quem nunca tinha usado.

Há também um conjunto de explicações de natureza multifatorial de


senso-comum que não constrói uma explicação hierárquica sobre o consumo
de drogas, mas reúne de maneira desordenada tanto a idade, como a condição
de aproveitar a liberdade que se desfruta na moradia, como o fato de encontrar-
se desgostoso com a alguma coisa, a necessidade de ser aceita num grupo,
que envolve aspectos psicológicos e políticos e assim por diante.

O uso de drogas é multifatorial

Existem diversos motivos que podem levar uma pessoa a


usar droga, a vontade de experimentar, principalmente quando
você é muito novo aqui no CRUSP as pessoas entram numa
média de idade entre 18 a 22 anos, e essa é uma idade em que
você quer viver coisas novas assim eu acho que faz parte do
espírito humano essa sensação de aproveitar. É a influência, a
condição de vida que talvez leve. Porque a pessoa no começo
[aqui no CRUSP] realmente não sabe muito o quê fazer, é tudo
de repente. Ë tudo de uma vez, é tudo novo, o lugar é a comida
da mãe que vai deixar de comer e que faz muita falta
emocionalmente, é o lugar que você vai dormir, pessoas novas
que você vai conviver de uma hora para outra, você vai criar
uma pseudo-família [com quem vai conviver] durante um
tempo. Na faculdade as relações que você vai ter com pessoas
que são legais e com pessoas que não são legais, tudo isso é
100
muita coisa pra pessoa assimilar. Então acontece da pessoa ficar
meio perdida e de repente buscar isso [usar droga].
[Pode ser também] uma pessoa desgostosa com a vida,
pode estar usando por deboche, nos anos setenta tinha muito
disso, ou porque é legal e a galera usa. Tem pessoas que
chegam e caem nisso por inocência até, por essa coisa de estar
sozinho, longe da família, saindo de casa muito jovem acabam
começando a se prejudicar, eu acho isso bem complicado.
Eu tendo a crer que a pessoa usa em muitos casos pra ser
aceita no grupo meu colega fuma porque eu não vou fumar?
Uma outra coisa também é que em alguns cursos há uma carga
de exigência muito grande então as pessoas acabam ficando
estressadas, então elas querem ter algum tipo de válvula de
escape e algumas acabam se voltando pro o uso de drogas.
[Esse] é na verdade é um problema enorme porque você
envolve aspectos psicológicos, você envolve aspectos políticos,
então a questão é bem mais ampla do que a gente pensa. Se a
gente for pegar a educação do indivíduo, as condições sociais e
econômicas nas quais ele vive é o problema que atinge
proporções muito maiores do que a gente imagina.

Nessa abordagem multifatorial, desta vez tentando sair do senso-


comum, adota-se uma linguagem ainda muito frágil para explicar o consumo de
drogas, mas que denota preocupação em buscar elementos das disciplinas
científicas.

Discurso cientificista

É uma questão [sobre a qual] eu não consegui ainda


definir uma opinião minha. Falam [que] é uma doença, não é
qualquer um que vai se viciar, mas ao mesmo tempo [eu] acho
que se você pensar isso como doença, a gente tem que ter o
cuidado pra não reduzir a pessoa à doença. Existem vários
outros fatores que vão influenciar e interferir em ela usar ou
não. Tem os acho que os [fatores] orgânicos os fisiológicos sim,
mas também acho que tem questões de personalidade, como foi
criado, desde pequeno, não sei, se é mais influenciável ou não,
acho que são várias coisas.
[Tem também o fato de] estar em busca de alguma coisa,
tem algum tipo de pendência ou emocional ou enfim física ou
química mesmo não sei e aí busca na droga e fica ligada, fica
física química ou psíquica também.

101
O uso faz mal a saúde

[Eu acho que as pessoas] deveriam parar de usar porque faz mal
a saúde

É possível caracterizar uma série de sugestões dos alunos sobre como


proceder frente ao consumo de drogas dentro da concepção de redução de
danos: as atividades preventivas devem ser regulares, diversificadas e com
linguagem adequada ao público; deve ser oferecido mais do que informação
sobre o tema e se faz necessário conhecer a realidade dos usuários,
procurando se aproximar deles. Além disso, há referência à idéia de que não se
deve abordar somente os aspectos negativos relacionados ao consumo de
drogas e sugere-se ainda a utilização de estratégias interativas na realização de
atividades de prevenção.
Assim, a descontinuidade das atividades junta -se ao casuísmo já
denunciado pelos estudantes em outro momento. A proposta é de uma
linguagem comum ao jovem que possa atingi-lo, como a utilização de filmes e
outras atividades culturais.

A prevenção deve ter atividades regulares e


diversificadas de acordo com o público a que se
destina

Atividades [devem ser] contínuas, não isoladas, por


exemplo, em dezembro, na metade do ano, em março, uma
atividade, aí a próxima daqui a três anos, essa descontinuidade
no meu entender tem pouca eficácia, eu acredito em projeto,
em ações contínuas, duradouras, porque eu acho [que] essa
questão é uma questão que não vai se esgotar em um projeto
apenas, uso de drogas, não vai desaparecer daí a necessidade
de ter uma ações regulares [e] diversificadas. Diversificadas no
sentido de falar a mesma língua da pessoa que você quer
trabalhar, com teatro, comédias eu acho que ajuda você
ironizar, por exemplo, umas certas atitudes eu acho
interessante tirar toda todo aquele peso que a sociedade de
certa forma passa pro usuário de drogas. Eu acho que é legal,
atividades então o teatro, filmes, reuniões palestras freqüentes,
eu acho que isso ajuda, materiais, linguagem acessível para os
moradores, matérias do tipo HQ [história em quadrinhos]
podem ajudar, formato de HQ. Acho que ajuda, uma

102
linguagem mais próxima, murais, acho que ajuda, mas
freqüente, tudo isso coligado não isolados, pode fazer isso todo
o mês, usar o mural, o teatro, usar o CINUSP. Filmes com o
tema, teatro, palestras sobre o tema, pode usar até o próprio
Anfiteatro Camargo Guarnieri e discutir o tema, panfletos.
É verdade, então eu acho que [os moradores]
participariam, isso a longo prazo, eu acho que pra já, num
primeiro momento não,[mas] com continuidade, com ações
regulares[sim]. Eu acho que dessa forma ajudaria bastante a
tratar da questão drogas no CRUSP, [não] só no CRUSP, mas
nas escolas [também]. Eu acho que ajudaria bastante essas
atividades diversificadas, com várias linguagens. Eu acho que
isso ajudaria muito a atingir o usuário de drogas, sinceridade
eu acho que pensando em alternativas eu acho que contribuiria
bastante. Não fazer sempre da mesma forma sempre com a
palestra
Daí a necessidade de criar ações com linguajares, com
leituras diferentes, com abordagens diferenciadas pra atingir o
usuário de drogas, eu acho que dessa forma envolveria sim

A idéia de depositar informações não agrada aos estudantes.


Partindo-se de informações verdadeiras sobre drogas, deve-se cuidar
do espaço para interpretação dessas informações.

Para fazer prevenção é preciso mais que


informação

Eu acho que já tem grupos pra esse tipo de discussão, eu


não sei como são feitas essas discussões lá dentro, [mas sei
que] não adianta você chegar e jogar um monte de informações
pra uma pessoa porque isso não adianta de nada, a pessoa está
gostando [e] você falar também que droga é ruim, até que
ponto é ruim? A pessoa está experimentando, está gostando,
está legal como é que você fala que isso é ruim, você que
nunca provou, você que não sabe o quê é, chega aqui e fala
assim.
O caso aqui não é falta de informação, a menos que eu
esteja enganada supondo que as pessoas são mais inteligentes
do que elas realmente são, mas eu acredito que aqui o caso não
é falta de informação. Eu acho até legal o esforço do COSEAS
em distribuir panfletos dizendo que é prejudicial, que mata não
sei quantos neurônios, que acontece isso, aquilo outro, mas eu
acho que não é o caso, acho que não é falta de informação.
Quem estuda aqui já sabe as conseqüências do uso de drogas
então você ficar batendo na mesma tecla e eles rejeitando a
mesma tecla o tempo todo, então é um confronto que não vai
levar a um lugar. A maneira como as pessoas interpretam,
103
recebem e interpretam essas informações isso é um desafio
maior E eu acho que aí que reside a grande questão hoje não só
pra COSEAS, mas pros governos, pras autoridades de saúde
trabalharem isso junto a população.

A prevenção deve primar-se então por conhecer a realidade do consumo


de drogas, seguir uma filosofia práxica, ou seja, cuja reflexão seja feita a partir
da experiência com drogas.

Para fazer prevenção é preciso conhecer a


realidade dos usuários e procurar se aproximar deles

Eu acho assim, tudo que for trabalhado, mesmo com o


pessoal lá, em qualquer lugar assim de drogas, você tem que
partir do pressuposto do quê que a pessoa acha sobre a droga, o
conceito que ela tem e você trabalhar em cima do que ela tem
como conceito pra ela. Não chegar lá [e] quem chega lá
geralmente não usa e aí e fala besteira e a pessoa acaba
desencorajada a continuar no grupo. Eu acho legal um grupo
que pega a experiência do outro e trabalha em cima da
experiência do outro e não ver só um lado das drogas, está
fumando não sei quanto por dia tá cheirando não sei quanto por
dia, porque que essa pessoa está fazendo isso, tem muitas outras
coisas por traz tem que ser um grupo de amigos mesmo, de
contar experiências.
Infelizmente a maneira que é abordada o tema que são
dadas as palestras do tema droga e a postura passada, e isso a
comunicação verbal tem muito a dizer a respeito não permite
uma aproximação entre o usuário e o especialista do tema
drogas.
Com abordagens diferenciadas, com acessibilidade, a
pessoa que tiver que tratar o tema tem que se mostrar acessível,
não adianta você falar, se mostrar todo aberto sobre o tema,
compreensível [e] tudo mais se a sua postura não demonstra
isso. Eu acho que geralmente quando se trata desse tema
drogas, geralmente eu acho que o usuário acaba vendo isso a
comunicação não verbal que é passado quando é tratado do
tema.

104
Você fazendo uma palestra abordando o tema drogas
sempre da mesma forma a pedagogia oculta que é passada é
essa você está errado, toma cuidado, você vai se ferrar. Em vez
de aproximar mais o usuário pra participação dele. Quando
você não vê uma acessibilidade, uma pessoa que você pode
consultar, conversar a respeito, acho que fica difícil você ter a
aproximação, o envolvimento do usuário. Se não for feito dessa
forma eu acho que fica difícil ter resultados.

Assim,

Falar só sobre os aspectos negativos não resolve

Simplesmente falar dos males, dos malefícios da droga,


acho que não resolve.

Sugere-se então que os programas sejam dinâmicos que possam


assumir algum significado emocional para as pessoas.

A prevenção precisa de estratégias interativas

É muito complicado porque você está usando o negócio


[droga] e acha muito bom agora de repente você não sabe
quando tem um limite, o limite que a coisa começa a te
dominar e aí que é complicado e é aí que você precisa, sei lá
[de] alguma coisa pra te abrir o olho, mas eu não sei ainda o
quê. Eu posso ter alguma noção em relação ao alcoolismo,
alguma noção muito vaga. Eu acho que o caminho é meio
parecido, mas vai um pouco meio de dentro primeiro, precisa
fazer alguma coisa pra pegar de dentro. Uma coisa o visual eu
não sei se rola, como eu já vi alguns cartazinhos, alguma coisa
sobre consumo de álcool, legal você olha o desenhinho, legal
não é comigo.
Eu peguei até um texto legal uma vez dizendo assim o
que significava quando você começava a ser dependente ou
não, algumas coisas indicando, algumas perguntas se você
respondia um certo número aquilo significava que você era
dependente, ou não isso eu acho que é uma coisa mais ou
menos valida, que sinceramente cara você olha o papel você
começa a ver, você começa a se questionar. Isso aí eu acho que
é alguma coisa que tem alguma coisa de concreto sendo feito
pra mexer com esse interior. Mas eu acho que aquilo é um
pouco de coisa válida. Você jogar tipo, questionar algumas
coisas, algumas coisas básicas em relação pra pessoa tentar se
avaliar e a partir daí buscar alguma coisa, isso daí eu acho que
é uma coisa pode surtir algum efeito.

105
Coerentemente ao conjunto de explicações mais amplas que os
estudantes elaboraram e às estratégias por ele propostas para a prevenção,
são elaborados também discursos sobre a necessidade de superar o
preconceito relacionado ao usuário bem como uma atitude mais tolerante que
envolve a não punição dos usuários.

É preciso superar o preconceito relacionado ao


usuário

.Eu acho que isso ajudaria bastante a tratar do tema e


tirar esse peso e tudo isso com o intuito de tirar esse peso, de
que o usuário é um marginal, um desequilibrado, eu acho com
isso até possibilitaria com que essas pessoas sentissem
confiança em procurar mais informações

Não se deve punir os usuários

Então [a minha sugestão é] fazer alguma coisa mais no


sentido da prevenção eu acho [melhor] do que punição. Você
não vai expulsar ninguém nem condenar porque usa drogas
isso é ridículo, [pois] punição eu acho que não vai ter resultado
nenhum [porque] essas pessoas sempre ficam procurando
motivos pra se revoltar, acho que pode causar mais danos
ainda pro CRUSP, não da pra controlar essas pessoas.
Claro, se for um caso extremo como já aconteceu que eu
acompanhei de longe, que os moradores foram expulsos, acho
que foram encaminhados para tratamento clínico, mas assim
foi bem extremo, agora fora isso acho que não é tanto na
punição é mais na prevenção mesmo, dar um acolhimento pra
essas pessoas, não sei, [talvez um] serviço de psicologia, não
sei acho que é mais prevenção assim que eu penso do que
atuação.

Nesse contexto, uma sugestão interessante é a realização de um debate


social amplo sobre o tema, denunciando os lucros do narcotráfico e buscando
saídas.
Deve haver um debate social amplo sobre drogas

Eu acho precisa existir um debate maior a respeito das


individualidades, de como as pessoas percebem o uso de drogas
realmente, como isso afeta a vida delas, o consumo seja em

106
suas famílias seja a própria pessoa é aí que o trabalho deve ser
começado para que o uso se reduza, para que o narcotráfico se
enfraqueça, que na verdade se tornou um negócio altamente
lucrativo hoje em dia. Infelizmente [é] trágico demais e mais eu
acredito que exista uma saída sim, eu acho que nem tudo é a
morte, nem tudo é o caixão. É assim que eu vejo essa questão.

Os alunos apresentam sugestões e comentários específicos sobre a


prevenção ao consumo de drogas no CRUSP. Eles sugerem que sejam
desenvolvidas atividades com os alunos ingressantes (os bixos do CRUSP),
uma análise inicial e/ou acompanhamento psicológico, uma pesquisa para que
se conheça melhor os moradores e ressaltam ainda a importância da promoção
da integração entre os alunos como forma de enfrentamento da solidão e
desenvolvimento de sociabilidade.

A prevenção deve se iniciar com a recepção aos


calouros, criando clima de sociabilidade

[Eu] acho que[as atividades] podem ser feitas pra quem


chega, bixo mesmo, não pra quem já ta aqui a um ano. Mas pra
quem chega como bixo é uma orientação, mas não assim não
tome drogas, droga é um monstro, é mostrar o quanto pode ser
prejudicial no início de um curso da pessoa, ela se envolver
com drogas e não saber o que está fazendo, nesse sentido acho
que é legal ter uma orientação porque muita gente começa de
uma maneira e não sabe o que fazer e perde ano, perde
semestre, nesse sentido. Mas não [falar] a droga é um monstro,
mas mostrar o quanto a pessoa pode se prejudicar, não criando
assim um inimigo, um grande inimigo, porque é o grande
inimigo que desperta a curiosidade, nesse sentido. Não pode
ser visto como um grande inimigo, mas como uma coisa que
pode prejudicar quem não tem muito discernimento, está
chegando agora, então chega primeiro, se ambienta e o resto é
conseqüência do que você pretende
[Portanto] eu acho que uma das coisas era criar,
atividades que acolhessem os calouros e criar um ambiente de
convívio mais intenso. O pessoal chega aqui na USP com
muita vontade de querer saber sobre várias coisas, sobre
questões, atividades culturais, se abrir um concurso de
literatura a maioria vai entrar. Tipo, de forma que o discurso
antidrogas não apareça de forma moralista como fazem os pais
dos outros alunos, o COSEAS não pode trazer, por exemplo,
falando do CRUSP, o COSEAS não pode trazer pro CRUSP
um discurso paternalista contra droga. Eu acho que é muito

107
mais além, porque na verdade você não ta falando com pessoas
que [tem] o mínimo de instrução.
Atividades [podem ser] culturais e principalmente com
calouros. Tipo de tentar criar um ambiente, um estilo de
sociabilidade que não necessite, que não precise
necessariamente passar pela droga. [Para que] você não
necessite fazer [ou] elaborar uma rede social que passe pela
droga.

A USP precisa conhecer o morador do CRUSP

Então tem que saber qual é o estilo, sei lá, o perfil


psicológico dessas pessoas que entram aqui, porque a gente faz
análise sócio-econômica e acadêmica anualmente, mas
psicológica não então muita gente que entra aqui entra com
problemas e às vezes se aprofunda nas drogas porque aqui
você não encontra muita saída pra problemas assim pessoais.
[Poderia ser] feita [essa análise], não [como] uma
condição pra que a pessoa ingressasse no CRUSP, mas como
um índice pra se ter uma idéia de quais são as necessidades dos
moradores aqui, quem são essas pessoas, quais são as possíveis
carências [que] elas podem ter e que o CRUSP não supre e a
universidade não supre.
A gente que trabalha, no mercado de trabalho [sabe que]
o sindicato está gastando todo o dinheiro que tem pra falar o
quê é que está acontecendo no mercado de trabalho, o quê que
é isso aí, que empresa é aquela, [em] quê que o cara está
investindo. Então é a mesma coisa aqui enquanto não souber
quem chega, quem sai, como que chega, como que fica, como
se dá daqui a três anos, quantos usam, quantos não usam eu
acho que é um pouco caótico ainda. Acho que a instituição que
seria responsável por um tipo de política está bem longe na
verdade de fazer, de ter condições de fazer algo efetivo.
Isso, na verdade, fica em aberto se você tiver aqui uma
instituição que trabalhe com os alunos do CRUSP e que tente
entender o que se passa quando você vem pro CRUSP tanto
como você mesmo identificou não há nenhuma pesquisa sobre
os alunos do CRUSP não dá pra fazer política sem pesquisa.

Deveria ter um acompanhamento psicológico


para os alunos

Eu achava que já tinha, já tem um acompanhamento


psicológico? Um acompanhamento, continuar esse
acompanhamento, que eu acho que tem, não sei.

108
Desenvolver programas que promovam a
integração entre os moradores e diminuam a solidão

Pensando que a causa ou um dos motivos seria as


pessoas se sentirem sozinhas, se sentirem fora de um ambiente
familiar, não sei talvez se tivesse mais programas de
integração social entre os moradores, mais atividades, tornar
um lugar mais familiar, mais um ambiente de família mesmo,
de casa as pessoas se sentirem assim menos sozinhas talvez
isso, talvez eu não sei, uma idéia só.

Há também uma sugestão para que a universidade disponibilize o


acesso a tratamento e suporte para alunos dependentes que desejam ajuda.
Além disso, sugerem também a oportunidade de que os alunos possam fazer
um estágio que possibilite ampliar a visão relacionada aos problemas advindos
do uso de drogas e falam da necessidade de monitoramento da entrada de
pessoas nos prédios do CRUSP.

Deveria haver tratamento para os alunos


dependentes de drogas no HU

[Deve-se] disponibilizar um programa de tratamento, sei


lá pelo HU, eu ouvi falar dum programa porque a moça daqui
ela trabalha no CEPE e tem um horário lá que é de
funcionários do HU que tiveram proble mas, com drogas, que o
HU disponibiliza isso, sei lá podia ter uma coisa assim ter uma
linha [telefônica] pra pessoa poder procurar, a quem interessar.

Um estágio na USP muda a visão sobre os


usuários de drogas

[O uso de drogas] não me incomoda não. Bom, é


complicado tocar nesse tema se incomoda ou não, já me
incomodou, antes me incomodava bastante porque eu tinha
uma visão muito preconceituosa do tema. Eu via o usuário de
drogas como um marginal, eu não conseguia desassociar um
usuário de não ser um marginal, um usuário de um traficante,
eu tinha dificuldade de fazer essa dissociação. Depois de um
estágio intenso e do contato com a perspectiva de redução de
danos, que é a perspectiva européia, não a guerra contra as
drogas, e a proposta que esse novo olhar propõe, que é
entender o usuário, não discriminá-lo [mudei minha visão].

109
Procurar conscientizá-lo do uso, claro com o objetivo de levá-
lo a ponto de não querer usar mais, eu até cheguei a comentar,
me deixou mais a vontade em manter contato com usuários de
drogas. Porque assim não tem a preocupação de discriminá-lo,
mas sim é mais fácil, quando você passa a procurar entender o
porquê dele estar usando, dele ter esse vício, se de fato é vício,
nem todos os casos são, fica mais fácil o relacionamento a
aproximação. Você não vê o outro como inimigo, nem ele te
vê como inimigo. A aproximação fica mais fácil, acho que
possibilita muitas coisas, maiores trocas. A partir desse
estágio, [que] me ajudou bastante nesse sentido, passou a ser
indiferente uma pessoa que usa com uma que não usa, tanto
também como uma pessoa que fuma cigarro como uma que
fuma maconha, pra mim essa diferença passou a ser
insignificante, uma pessoa que usa, uma pessoa que não usa e
pronto. Pra mim não tem nenhuma diferença não, hoje não me
incomoda mais.

Faz-se necessário monitorar a entrada de pessoas


no CRUSP

Eu acho que tinha que ser feito uma fiscalização maior


nas entradas, na portaria, até porque junto com essas pessoas
que vem só pra dar um peguinha e sair vem gente que rouba
bicicleta, vem gente mexer na nossa comida que está na
cozinha. Diminuiu bastante, melhorou bastante, dizem que
antigamente a cinco, seis anos atrás era muito pior, agora está
bem melhor, [mas] ainda existe um pouco.
Quando eu estava no primeiro andar eu le mbro de gente
que morava aqui sem ter vínculo nenhum com a universidade e
essas pessoas diziam que traziam drogas pra cá, vinham da
favela no geral. Podiam controlar mais isso com segurança, um
pouquinho mais de rigidez na entrada desses moradores ou
quem vem de vez em quando eu acho que os porteiros sabem
quem não tem vínculo nenhum e está sempre vindo, podia
controlar um pouco isso. Até que não vai evitar de trazerem
droga, mas alguma violência que possa ocorrer, alguma coisa
que possa acontecer de mal aqui pode ser culpa deles.

Uma boa parte dos alunos refere conhecer o trabalho preventivo


desenvolvido pela COSEAS no CRUSP, no entanto há críticas sobre a forma
ingênua como esse trabalho é desenvolvido e sua falta de credibilidade junto
aos alunos. A sugestão é que se invista em divulgar a realidade da moradia a
partir do ponto de vista daqueles que necessitam da moradia para concretizar
seus estudos.

110
Conhecem o programa de prevenção
desenvolvido pela COSEAS

Aqui no CRUSP, por exemplo, tem muita campanha, o


COSEAS todo mês lança campanha “Boca do CRUSP” de
prevenção as drogas. [O] na Boca do CRUSP sempre está
soltando uns panfletos, tem camisinha [e] também um monte
de coisa. Eu acho uma boa iniciativa pelo menos pra orientar
as pessoas e dar a elas o poder de escolher, ela sabe das
conseqüências então ela opta se ela quer ou não.
É [também] louvável a atitude deles de procurarem
alternativas a isso, mesmo oferecendo esses programas, esses
culturais e sociais que dêem uma integração e diminuam essa
sensação de individualidade que as pessoas têm.

O trabalho de prevenção da COSEAS não atinge


os moradores

Essas atitudes da COSEAS que são tentativas de


minimizar o uso, de incentivo das pessoas terem outras
atividades, mas ao mesmo tempo isso é complicado por conta
da visão de mundo dos moradores que tem atitudes de ressalva
em relação a administração. Muito embora eles sejam
totalmente beneficiados pela universidade ou por não
concordarem com o método de administração ou porque eles
querem ter mais benefícios, não convém agora dizer porque
que eles são contra ou o quê. Então as campanhas perdem um
pouco da força na medida em que as pessoas realmente não
levam a sério.
[Mas mesmo assim] eu acho que não tem muito o quê
fazer, além do que o COSEAS tem feito porque eles fazem
campanhas, assim todo o ano eles fazem e tem até o dia de
prevenção que eles vem põe a mesinha aqui em baixo, as
assistentes sociais recebem o pessoal, conversam, tal. Eu acho
que o problema está que não vai atingir o público que o
pessoal que realmente precisa porque se eles não
reconhecerem que tem o problema não vão procurar ajuda.
[Só que eu] vejo [que o] trabalho da COSEAS não
funciona [decido] a forma como é feito não adianta é muito,
como eu posso dizer, acho às vezes que o tratamento que eles
dão é até infantil. Eles vão chamar a atenção exatamente de
quem não usa, eles fazem os painéis com o Chico Bento
desenhado se bem que eu não sei se foi do grupo da COSEAS
que fez o painel uma vez num dos blocos só. Mas eles usam
umas coisinhas que é exatamente aquilo que quem usa droga
mais critica. Eles [os usuários] dão risada ah!ah! então não
vejo que seja de uma forma boa não.

111
Essas campanhas não têm sido eficientes na medida em
que o consumo continua o mesmo, quer dizer você continua
tendo as mesmas pessoas utilizando e além do mais grande
parte dos moradores do CRUSP mantém uma atitude de
descrédito em relação a COSEAS, então isso prejudica muito o
trabalho deles de combate nesse sentido.

Deve -se divulgar uma visão de mundo de quem


tem interesse no aperfeiçoamento na moradia

Eu penso que deveria ter uma mobilização do pessoal


que organiza,: do COSEAS, da reitoria, da prefeitura, não sei
que órgão que deveria fazer isso, mas deveria ter tipo uma
publicidade mesmo, uma propaganda do que é o CRUSP,
como funciona. [Deveria] existir uma espécie de trabalho da
COSEAS meio que tentando monitorar essas coisas talvez
assim um trabalho de comunicação realizado junto aos
veículos, não digo censura é claro que isso não pode acontecer,
mas assim é preciso também que se valorize os aspectos
positivos aqui dentro da universidade. O CRUSP pode sim ser
considerado [e] ter uma boa imagem.

Ainda nesse vertente e reproduzindo as críticas feitas ao proibicionismo e


à guerra às drogas por diferentes setores de nossa formação social, os alunos
não acreditam em campanhas preventivas do uso indevido de droga e
consideram que os especialistas desconhecem a realidade dos usuários,
fazendo generalizações infundadas.

As campanhas de prevenção de drogas não


funcionam

O que eu acho que poderia ser feito, meu eu não sei se


uma campanha resolveria, entendeu, porque até hoje eu nunca
vi uma campanha que funcionasse. Então eu acho assim,
deveria ter alguma coisa, mas eu não sei o quê, alguma coisa
diferente do que existe nas campanhas contra drogas pra se
toca eles [os usuários].
A assistentes costumam fazer uma reunião, tentar trazer
as pessoas para que as pessoas falem, até fizeram uma vez a
reunião em grupo assim. Eu acho que é uma coisa chata, mas
ao mesmo tempo eu acho que é uma coisa que pode funcionar.
Fazer com que as pessoas venham e comecem a falar as coisas
porque eu não sei se você colocar alguns cartazes ou fazer
alguns vídeos algumas coisas e achar que você ta fazendo uma
campanha isso vai sensibilizar as pessoas. Eu acho, tinha que
ter alguma coisa pra mexer um pouco não [com] o lado visual,
112
assim, mexer com o interior das pessoas, porque droga mexe
com o interior.
Eu acho que quem é dependente de droga precisaria
primeiro ter consciência disso, do mal que se tem, do mal que
faz pra ele mesmo e segundo precisa de alguma coisa pra falar,
pra tentar expor. Eu acho que funcionaria um tipo de terapia
em grupo, alguma coisa nesse sentido, eu sei que é muito
difícil.

Os especialistas desconhecem a realidade do


usuário

Por mais que não queira, você acaba indo com um certo
preconceito dependendo de quem vai dar a palestra. [O
palestrante tem] um olhar diferente, um olhar de quem nunca
viu, mesmo que nunca tenha fumado de que nunca viu, de que
nunca conviveu com uma pessoa que use drogas e que é
normal como a gente. Todo mundo taxa e acha que é louco,
não é assim uma grande parte não é assim. Todo mundo pega
só a exceção eu acho que esse é um grande problema em
relação as drogas.
Muita gente vai pras drogas em relação a tudo que eu
falei pra você no CRUSP, que acontece todo mundo pega o
que é notícia, assim o que é [manchete] e é isso em todo o
lugar.

Outro ponto levantado por alunos é que a melhor alternativa ao


proibicionismo seria a liberalização do consumo de drogas, pois assim os
limites estariam mais claros. Nessa perspectiva é importante a diferenciação
feita entre usuário e traficante. Há também uma sugestão de que para trabalhar
com o dependente faz-se necessário compreender sua motivação para o
consumo de drogas.

Contra o uso, mas a favor da liberalização das


drogas

Talvez eu fosse até a favor de alguma liberalização das


drogas mesmo sendo contra, não gostando, mas eu acho que as
coisas ficariam mais claras. Só que assim aqui é proibido, o
pessoal hoje no Brasil esqueceu, mas hoje ainda é proibido no
Brasil usar droga, usar não, porque é meio complicada a
expressão do usuário e do traficante.

113
Não condena o usuário, mas condena o traficante

Não sei assim, eu acho que é um direito que a pessoa


tem [usar drogas]. Eu sou contra quem vende drogas, quem usa
não, apesar dele estar perdido na vida do traficante. Eu não
uso, mas não condeno quem usa acho aceitável, sei lá não sou
contra, mas sou contra quem discrimina, quem condena o
usuário, o traficante não.
É pra mim tem sim o traficante que é perverso. Agora
como eliminar o traficante protegendo o usuário, é uma
solução que eu não sei como, difícil, mas sei lá, acho que não
cabe punir o usuário como se ele fosse traficante, então eu
acho isso.

Para abordar o usuário deve-se entender o


motivo do uso

Eu acho que o que pode ser feito é realmente procurar


trabalhar com a pessoa porque que ela está fazendo aquilo, será
que é só pra relaxar mesmo? Até onde está o problema que a
pessoa passa pra ela usar?

Do lado mais tolerante então há uma parte considerável dos alunos que
reconhece o consumo de drogas no CRUSP, sem que isso lhes cause
problemas. Os problemas com o consumo são relativizados na admissão de
que há diferentes tipos de usuários e que nem todos têm problemas com o uso
de drogas, necessitando de tratamento, por exemplo, e que a porcentagem de
quem precisa de algum tipo de ajuda devido a problemas decorrentes do
consumo de drogas é pequena.

Há uso de drogas no CRUSP, mas isso não causa


problemas

O pessoal é gente boa, eles não quebram nada, só fumam


maconha, acho que só, e nos outros prédios também em geral
aqui no CRUSP é assim. As pessoas usam sim, principalmente
maconha, mas não criam problema nenhum, cada um na sua,
nunca deu problema nenhum em relação a isso, cada um usa
individualmente lá no seu apartamento nunca deu problema
nenhum, pelo menos ali onde eu moro.[O] tráfico, esse tipo de
coisa nunca teve e o pessoal usa numa boa, não incomoda

114
ninguém.Não sei assim, dizem que existe até traficante, mas eu
não conheço se tiver é discreto não incomoda a vizinhança.
No meu andar tem gente que usa e usa bastante, quase
todos os dias assim, mas não incomoda ninguém em nada
Vamos dizer assim conheço pessoas que dizem que usam
drogas, mas eu nunca vi, eu nunca experimentei nada, eu não
posso dizer.
Muita gente fala porque às vezes vê alguém usando
alguma coisa, mas as pessoas que usam que eu conheço são
pessoas excelentes. São pessoas ótimas que nunca
atrapalharam a vida de ninguém. [Eu] acho que muitas pessoas
falam porque tem, [mas] tem em todos os lugares. Só que ali o
pessoal não faz questão de esconder tanto. Usam e não
escondem e muita gente não entende isso e acha que é só ali e
não é só ali, está em todo o lugar. O uso de drogas está em
todo o lugar.
Eu nunca vi caso de gente drogada no corredor, de briga,
pancadaria alguma coisa assim, eu nunca vi. Você vê o pessoal
fumando na escada de incêndio, acho que quanto aos
apartamentos cada um tem a sua regra, tipo, alguns
apartamentos não permitem que fume dentro tem que ir fora,
eu não acho que é diferente, por exemplo, de [outras
universidades]. Entre os estudantes de humanas de [outras
universidades], ou estudantes assim, eu não vejo muita
diferença até mesmo na minha cidade. Tem festa o pessoal
bebe, chega tem vezes que você a vê gente bêbada, mas não
acho que seria pernicioso.
Eu vejo que tem pessoas que já vem pra cá e já tem
histórico de uso de drogas e que sabem digamos, administrar
bem isso, isso não prejudica. Eu percebo a grande maioria das
pessoas que fazem uso de droga, a grande maioria já são
adultos e usam droga, maconha principalmente, como quem
fuma cigarro, como quem toma uma cervejinha de vez em
quando. A pessoa sabe que ela não é drogada, ela não é uma
viciada que está precisando de auxílio, a pessoa vai lá de vez
em quando e dá um peguinha numa boa, não incomoda
ninguém e nem sei também o que isso traz pra vida dela
porque não parece afetar a vida social,nem estudantil, nem
nada.

Existem vários tipos de usuário: os que se


prejudicam e os que não

No começo da faculdade eu tinha amigos que fumavam


maconha direto, fumavam mesmo, uma coisa legal, estar lá
brincando, mas é aquele negócio e um tipo de vida que dá
certo porque você vem de um estilo de vida muito diferente do
meu, eu venho da periferia. [Essas são pessoas] que já tem uma
formação muito boa e que conseguem levar o curso na boa
mesmo usando a droga como essa menina que eu conheço

115
conseguiu. Gente que vem de onde eu venho acaba não
fazendo nada é uma questão de escolha que tem a ver com o
seu tipo de vida. Eu não vou falar pra você que eu acho
horrível quem usa droga, o pessoal usa droga e curte, usa droga
e leva a vida e vai continuar levando, eu não julgo [acho que
isso] tem muito a ver com eles, de onde eles vêm. [Tudo isso]
pode ser complicado ou não dependendo também do apoio que
você tem.
Eu tenho vários amigos que usam, como eu falei, que
administram isso muito bem em compensação tem outras
pessoas que não, mas eu acho que é muito complicado. Eu
nunca usei e não tenho como apontar mais afirmativamente ah
esse usou porque é maloqueiro, esse usou porque é vagabundo,
esse usou porque, às vezes você tem uma pessoa que leva uma
vida dita correta, tranqüila, vem a aprovar se torna usuário,
então é uma questão complicada.
[Eu percebo que] depende do quanto a pessoa consome a
droga no sentido do quanto ela se deixa consumir e o quanto
ela consome, tem gente que se deixa consumir e tem gente que
consome. Ë só essa noção de ser consumido pela droga ou
consumir a sua revelia de uma maneira um pouco mais real.

A porcentagem de quem precisa de ajuda é


pequena

Eu penso assim que existe muito barulho em torno das


drogas, de quem usa drogas, mas na verdade quem precisa de
ajuda mesmo é uma parcela pequena e que a maioria das vezes
essa parcela não tem condições de buscar ajuda porque ela não
quer ajuda também e são pessoas difíceis de você aproximar,
eu acho muito complicado isso.

Os alunos referem ainda que as informações sobre drogas obtidas na


família protegem do uso, que morar no CRUSP não trouxe muitas novidades
em relação a convivência com quem usa drogas e que o período de formatura,
a aproximação da saída do CRUSP geram uma série de reflexões sobre a vida.

Informações sobre drogas na família protege as


pessoas do consumo

Na educação que eu recebi, a minha mãe sempre falou


muito abertamente sobre as drogas com a gente

116
Morar no crusp não mudou sua visão sobre o
usuário de drogas

Quando eu fazia cursinho, eu já tinha amigos que


usavam [drogas] e eu nem morava no CRUSP .

A formatura provoca mudanças

Quando você está perto de formatura, perto de sair daqui


é que você fica pensando, o que você vai fazer e chega a hora
de você acordar um pouquinho parar de sonhar tanto.

Por fim, há alguns alunos que parecem estar abertos para ampliar a
compreensão do jogo complexo que está envolvido no consumo de drogas,
mas têm dificuldade em formar uma opinião, assumindo uma certa dualidade no
eixo aceitação-condenação.

Não se posiciona frente ao usuário

Eu procuro não ter um, uma idéia pré formada pensando


quem usa droga não presta mesmo é vagabundo não sei o quê,
porque muitas vezes a gente não conhece a história da pessoa e
não sabe o quê que aconteceu. [Mas], às vezes é difícil às
vezes dá raiva. Principalmente quando elas tem alguma
atitude, por exemplo, [de] atrapalhar o sono quando você quer
dormir, mas eu procuro sei lá ter uma visão mais aberta assim,
não achar ah coitadinho. Mas que é um problema é eu encaro
como um problema. Eu acho um problema sério, eu acho um
problema sério, mas não vou falar assim putz cara condeno,
não condeno, detesto, não detesto, mas é uma coisa séria.

117
7 Discussão e considerações finais

O conhecimento sobre a história do CRUSP pelos moradores em linhas


gerais pode ser considerado vago e superficial e os alunos mostram-se
algumas vezes inseguros em relação a veracidade do que relatam.
O tema mais presente é o fato do CRUSP ter sido construído inicialmente
para os jogos Pan-americanos, assim como realmente aconteceu, mas os
detalhes dessa história, sua localização no seio dos acontecimentos mais
gerais no país e suas implicações políticas não aparecem.
Pode-se dizer então que a história do CRUSP conforme contada pelos
alunos é caracterizada pela fragmentação. Há, segundo eles, pouco acesso às
informações, ou seja, essas são transmitidas no momento em que entram na
moradia e a perda dessa oportunidade significará, no melhor dos casos, acesso
casual a informações nos corredores e murais.
De fato, assim como referem alguns alunos, a história do CRUSP é
marcada por reivindicações e lutas dos estudantes. No entanto, há um
desconhecimento do papel da universidade nesse processo. Além disso, não há
referências explícitas aos aspectos positivos dessa história. Dentre os aspectos
positivos destacam-se o fato do CRUSP ter sido na década de sessenta um
lugar de vida política e cultural ativa, dos alunos terem conseguido que o
CRUSP voltasse a ser moradia de estudantes na época da abertura política e
terem mantido apesar das pressões a gratuidade.
Vale ainda ressaltar que os fatos destacados pelos alunos são aqueles
divulgados pela mídia da época (jornais), referindo-se a mortes, invasões e
expulsões.
Uma análise relevante apresentada pelos alunos fala em nome de uma
possível relação entre a história conturbada do CRUSP e a imagem negativa
atual da moradia. Aqui vale dizer que é possível que a divulgação parcial de

118
fatos da história do CRUSP, notadamente sobre os acontecimentos
conturbados, se relacione ao conjunto de idéias acerca da moradia que até hoje
circulam socialmente.
A discussão sobre a história do CRUSP é fundamental para a
valorização da moradia pelos moradores, pela universidade e por outras
instâncias que compõem a formação social.
O resgate das lutas e impasses historicamente relacionados ao conjunto
residencial pode gerar o conhecimento necessário para que se aprenda com a
experiência dos antecessores.
No que se refere a experiência de morar no CRUSP os alunos
consideram que esse cumpre, apesar do problemas, a sua função principal que
é viabilizar o curso universitário para os alunos pobres e/ou que moram longe
da universidade (em um bairro muito afastado, em outra cidade, Estado ou
país). São apontados vários problemas que dificultam a estadia no CRUSP e a
passagem pela universidade sendo boa parte deles percebidos logo após o final
da euforia de ter entrado em uma das melhores universidades do país e
conquistado uma vaga no CRUSP.
Os alunos apresentam também as alternativas encontradas por eles
próprios como forma de enfrentar esses problemas, visto que não sentem
respaldo das instâncias administrativas da universidade. Verifica-se assim, que
a solução possível tem sido buscada principalmente no plano individual.
Essa situação vivida pelos moradores do CRUSP em sua relação com a
universidade não é singular e sim um reflexo do que acontece na sociedade de
forma mais ampla.
Assim como afirma Chauí (1999) a universidade é uma instituição
intrinsecamente relacionada com a sociedade e, portanto, sofre os efeitos do
modelo político vigente - neoliberal. Nesse modelo segundo a autora as
relações sociais passam a ser mediadas pelas leis do mercado, os direitos civis
passam a ser vistos como favor, “neste país a educação passa a ser
considerada um privilégio” (Chauí 1999 p37), como algo a ser comprado e o
Estado tende a se tornar cada vez menor em importância na resolução de
119
problemas relacionados à estrutura e dinâmica social. O Estado retira-se do
âmbito das mediações entre capital e trabalho e omite-se com relação às
políticas sociais públicas e aos problemas estruturais de maior igualdade na
distribuição das riquezas que são socialmente produzidas.
Nesse sentido, a universidade oferece o mínimo necessário para que os
alunos possam ter onde morar, não se apresentando para a solução de
problemas estruturais que dificultam o acesso à moradia e ao cotidiano dos
estudantes, ou o faz de forma muito lenta, como pode-se perceber em alguns
DSCs como os seguintes: “Há problemas na forma como são distribuídas as
vagas”, “A COSEAS demora em resolver problemas de diversas ordens”, “A
instituição se omite para resolver problemas na moradia principalmente os
relacionados com as drogas” e em outros de forma subliminar
O CRUSP possibilita a democratização da universidade facilitando a vida
daqueles que contornaram o esquema capitalista neoliberal e mesmo sendo
pobres conseguiram entrar em uma universidade pública de boa qualidade
destinada aos filhos da classe rica que puderam estudar em colégios
particulares, onde o ensino é de melhor qualidade na nossa sociedade. Aos
alunos pobres o curso “natural”, ou seja, previsto é a inserção direta no
mercado de trabalho ou então o preenchimento das vagas nas universidades
particulares de qualidade duvidosa (Chauí 1999).
Segundo Foracchi (1972) os jovens que ultrapassam a barreira de
classe e chegam à universidade são muito mais impactados pela vivência de
uma nova realidade do ponto de vista cultural do que pelos conteúdos
ministrados nas salas de aula. No entanto, esse aspecto é paradoxal pois pode
levar a um deslumbramento irreal dessa nova possibilidade. Já aqueles que
vêm de classes mais abastadas tiveram a oportunidade de ir gradualmente
construindo esse repertório cultural o que torna essa vivência parte de um
processo iniciado anteriormente, não se apresentando, portanto, como uma
ruptura aos padrões conhecidos.
Esse ponto de vista é compartilhado pelos alunos do CRUSP quando no
Discurso do Sujeito Coletivo intitulado “Morar no CRUSP ensina a conviver com
120
a diversidade” essa idéia se manifesta explicitamente “O CRUSP é uma espécie
de redemoinho cultural é muito bom para quem vem das classes mais baixas.
Tipo onde gente de tudo que é lugar, com diferentes experiências chega com a
vontade de querer trocar na verdade com a necessidade de ter um diálogo e tal
e isso foi muito bom pra mim porque até então, por exemplo, eu fui conhecer a
primeira pessoa que fazia [ciências] sociais aqui na faculdade. Então na
verdade você sente essa necessidade de trocar e tal aí quando você chega
você fala nossa! Que mundo, é bem legal! Acho que pra mim foi positivo não só
pelo lado econômico, mas pelo lado de experiência mesmo”.
Toda a vivência universitária é intensificada aos moradores do CRUSP
que como eles mesmos dizem vivem a universidade 24 horas por dia. Talvez
seja também na moradia que os problemas da crise da universidade se
agudizem ou mesmo produzam tantos sintomas como o uso de drogas e
depressão.
Vários autores Chauí (1999), Menezes (1996) e Foracchi (1972) apontam
a necessidade da universidade repensar seu papel e os rumos aparentemente
naturais que esta instituição vem tomando. Segundo Chauí (1999) faz-se
necessária uma reflexão política sobre as conseqüências da ideologia
neoliberal na universidade, que propõe uma diminuição dos espaços públicos e
alargamento dos privados com aniquilamento dos direitos.
Menezes (1996) afirma que (...) “Isso tudo tem contribuído para as
universidades não atenderem a sinalização no sentido de que, mais do que alta
especialização está fazendo falta ao profissional de nível superior uma
formação geral melhor, que amplie sua visão de mundo e sua capacidade de
aprender no trabalho, além do que já apontamos a ausência da vivência, de
contato com a realidade, de capacidade e iniciativa” (p 58).
Foracchi (1971) aponta que a universidade está imersa em uma
sociedade tecnológica, com grupos cujos interesses são opostos e que não
possuem um compromisso maior com a cultura estando sim centralizados na
comercialização de seus produtos. É nesse contexto que estão imersos os
moradores do CRUSP com seus anseios e angústias.
121
Deve-se, portanto, analisar as questões trazidas pelos Discursos do
Sujeito Coletivo dos moradores sobre dois ângulos um macro estrutural, que
procuramos fazer até aqui analisando o impacto do projeto neoliberal na vida
universitária ressaltando a importância de repensá-la e também analisar
questões do micro cosmo do CRUSP que serão apresentadas a partir de agora.
Ambas estão intrinsecamente relacionadas, ficando a separação apenas a
cargo de organizar a discussão.
Algumas questões que merecem destaque nesta discussão são
levantadas pelos alunos, sendo a primeira delas o lazer que parece ser para
muitos uma atividade esporádica devido a uma série de problemas, sendo
também pouco estudado e percebido como uma questão secundária mesmo
em trabalhos acadêmicos (Abramo 1994). Mas “o lazer para os jovens, aparece
como um espaço especialmente importante para o desenvolvimento de
relações de sociabilidade, das buscas e experiências através das quais
procuram estruturar suas novas referências e identidades individuais e
coletivas” (Abramo 1994 p 62).
Outro aspecto discutido é a dificuldade dos moradores na vivência
coletiva, com predominância do individualismo. Mais uma vez estamos diante
de uma questão da sociedade capitalista pós-moderna, pois essa é a principal
forma de relacionamento das pessoas e assim se repete o padrão na
universidade. Segundo Bock (2000) o individualismo acontece entre outros
fatores porque por princípio os colegas são concorrentes, podemos acrescentar
que com a crescente violência as pessoas desconhecidas ou com as quais
temos um contato superficial são vistos como potencialmente perigosas.
Os alunos também referem sofrer preconceito pelo fato de morar no
CRUSP e mostram-se por vezes preconceituosos em relação por exemplo aos
consumidores de drogas. O preconceito é uma construção de natureza
ideológica. As generalizações provenientes da mídia, que se encarrega de
expor os acontecimentos negativos e explosivos a respeito da moradia e dos
moradores, e aquelas provenientes da chamada lei do menor esforço que

122
caracteriza o cotidiano das pessoas são mecanismos indutores do preconceito
(Konder. 2002).
No caso dos consumidores de drogas, a formação social incumbiu-se de
utilizar a categoria drogado como uma categoria de acusação que em si encerra
um conjunto tota lizador de negatividades, em que os acusados são moralmente
nocivos e podem ameaçar o status quo (Velho, 1999 p.60).
A idéia de que o CRUSP não é o responsável pelo consumo de drogas
de alguns moradores está presente na fala de muitos alunos. Os alunos
apresentam motivações variadas para o início do uso, sendo que essas não se
referem necessariamente ao CRUSP. Nota-se nos discursos dos moradores
que eles procuram desfazer a relação simplista e preconceituosa que
culpabiliza o CRUSP pelo uso de drogas e que afirma que lá o uso é maior do
que, por exempl, o em outros locais dentro da universidade.
No que se refere a moradia de forma geral uma sugestão importante
apresentada para os alunos e que se apresenta como alternativa viável para
busca de soluções para os problemas vividos pelos moradores é a realização
de pesquisas científicas que proporcionem um conhecimento mais aprofundado
da realidade dos moradores do CRUSP. É preciso conhecer a realidade para
que se possa transformá-la.
Os moradores do CRUSP consituem um grupo heterôgenio sob vários
aspectos, pois são pessoas que vêm de cidades, Estados e países diferentes,
com tradições e culturas distintas e isso se reflete na visão desses moradores
sobre o uso e o usuário de drogas e nas sugestões para amenizar os possíveis
problemas relacionados ao consumo de drogas na moradia. Além disso, são
influenciados em graus diferentes e com críticas diferenciadas, pela ideologia
dominante sobre o tema - repressiva.
Dessa forma, há discursos conservadores e repressores com propostas
de coerção da liberdade e punição severa aos usuários de drogas,
culpabilização desses pelos problemas advindos do uso de drogas e
desvalorização dos usuários proferidos em parte por alunos que se sentem de
alguma forma ameaçados ou incomodados por esses usuários.
123
Segundo Zaluar (1994) as propostas repressivas e punitivas não tem
sido eficazes no que se propõe, eliminar as drogas, mas disseminam o
preconceito contra o usuário de drogas. Dentre as propostas repressivas a mais
expressiva é a chamada guerras as drogas e os Estados Unidos é o país que
lidera essa cruzada anti-drogas com uma política repressiva e violenta
indistintamente contra o usuário, dependente, traficante e o produtor da droga.
Mas essa estratégia não tem nem mesmo diminuído as taxas de criminalidade
(Zaluar 1994).
A pergunta que se faz é porque se mantém essa política? A resposta não
é simples, pois há uma complexa trama de interesses políticos e econômicos e
não é objetivo desse trabalho explorá-la. Pode se dizer de forma resumida que
essa política tem sido uma forma de dominação Americana em relação aos
países Latino Americanos principalmente e que a guerra contra as drogas
alimenta o mercado, por exemplo, de armas (Coggiola, 2001; Kaplan 1997).
Além disso, segundo Karan (2003) “a hostilidade e o medo despertado facilitam
a intensificação do controle social, a ampliação do poder do Estado de punir e o
simultâneo enfraquecimento do Estado Democrático de Direito” (p 64).
A culpabilização do indivíduo por sua dependência, a visão
exclusivamente relacionada a aspectos negativos do usuário presentes no
discurso dos alunos assim como na sociedade de forma geral encontram
reforço na mídia. Essa tem preferido destacar as desgraças vividas por pessoas
que têm problemas sérios advindos do uso de drogas, os conflitos entre as
organizações criminosas e a polícia e as apreensões de drogas do que as
alternativas encontradas para minimizar os problemas dos dependentes de
drogas e a discussão sobre os determinantes do consumo (Bastos 2003).
Carlini-Cotrin e col (1995) afirmam que a mídia tem um papel
fundamental na fabricação de um verdadeiro estado de pânico na população
brasileira uma vez que grande parte dessa população só tem acesso a
informações veiculadas nos meios de comunicação de massa.
Os estudos sobre as informações veiculadas na mídia escrita sobre
drogas realizados por Carlini-Cotrim e col (1995) e Noto e col (2003), concluem
124
que as drogas que mais aparecem nas reportagens não são aquelas mais
usadas pela população (álcool e tabaco) de acordo com os estudos
epidemiológicos.
O esperado seria que houvesse uma distribuição mais equilibrada e
compatível com os indicadores epidemiológicos. Esta desproporção reflete-se
na percepção da população, e distorce as crenças relativas ao consumo de
drogas no Brasil.
Essa distorção sobre os diferentes aspectos que envolvem o tema
drogas está presente também nos livros didáticos usados em escolas de
primeiro e segundo graus. Em pesquisa sobre a abordagem do tema drogas em
livros didáticos verifica-se que o conteúdo apresentado está permeado pela
pedagogia do amedrontamento e pelo conceito de dependência. Não se discute
os dados sobre incidência, não se analisam as causas e não há referência
sobre a prevenção (Carlini-Cotrim 1991). Esta situação também é encontrada
nos textos oficiais (Bucher, Oliveira 1994). Assim vai se estabelecendo uma
visão acrítica e distorcida do tema.No entanto, há um contraponto a essas
idéias até aqui apresentadas, são os discursos dos alunos que reconhecem a
importância da contextualização do uso de drogas, a relativização do
julgamento do usuário de drogas (como herói ou bandido) e que fazem
propostas de prevenção interativa, a partir do conhecimento da realidade do
usuário objetivando a superação do preconceito e a promoção de um debate
social mais amplo.
Velho (1994) ressalta a importância da contextualização do uso de
drogas e afirma que as generalizações têm apenas contribuído para a
estigmatização dos usuários. O autor refere que a Antropologia tem ajudado na
compreensão de que existem diferentes maneiras de usar drogas em função de
variáveis culturais e sociológicas. Portanto, não se deve homogeneizar o
comportamento dos usuários de drogas, o estilo de vida e a condição de classe
que são determinantes na particularidade que o consumo de determinada
substância pode ter em determinado grupo em determinado momento histórico.

125
Zaluar (1994) concorda com Velho (1994) e afirma que “não se pode
concluir que todos os usuários de drogas são iguais ou até professem o mesmo
credo cultural” (p 13). Para essa autora existem diferenças no grau de
envolvimento com a droga e com o grupo, o que se reflete no lugar que a droga
ocupa na vida das pessoas.
Alguns discursos apresentam temas importantes e que fogem dos
estereótipos sociais vigentes. Um exemplo é o discurso intitulado “As pessoas
não mudam seu comportamento porque usam drogas” tema polêmico e que
está em concordância com o que afirma Bastos (2003) “nenhuma substância
determina comportamentos, mas tão somente contribui para a explicitação de
comportamentos e atitudes que já são característicos da pessoa”(p 37).
Os alunos apresentam também a idéia de que o uso de drogas no
CRUSP está relacionado aos processos de socialização. Bastos (2003) afirma
que de forma geral o primeiro contato com a droga acontece em atividades
sociais, que em termos gerais podem ser situações de festas, churrasco,
encontro de amigos. Portanto, há particularidades do CRUSP nesse processo e
semelhanças com o que acontece na sociedade de forma geral.
As propostas de prevenção ao uso indevido de drogas apresentadas
pelos moradores se coadunam com os pressupostos da redução de danos.
Nessa proposta, diferentemente da guerra às drogas e tolerância zero, postula -
se que o uso de drogas sempre existiu e que trabalhar com o propósito de
conquistar um mundo sem drogas é irreal (Marlatt 1999).
Na proposta de redução de danos procura-se desviar a atenção do uso
de drogas para se discutir as conseqüências e os efeitos do comportamento do
adicto e embora reconheça a importância da abstinência aceita e trabalha com
alternativas que reduzam os riscos relacionados ao consumo de drogas (Marlatt
1999).
Nos programas de prevenção em redução de danos a educação é o
elemento primordial, valoriza -se a informação trazida pelos participantes, o
especialista não se coloca no lugar de único detentor do saber, o formato das

126
atividades é interativo, com estímulo à discussão e com a participação de todos
(Marlatt 1999).
Outra sugestão apresentada pelos alunos é a realização de um debate
social amplo. Bastos (1994) afirma que essa é uma alternativa viável. O debate
deve reunir diferentes setores da sociedade com posições contrastantes, que
devem ser respeitadas. Assim, pode-se formular políticas públicas sintonizadas
com os pontos de vista da maioria sem excluir as minorias.
Partindo do pressuposto que a universidade pública tem o dever de
promover esse debate e outras atividades que previnam os prejuízos que
possam advir do consumo de drogas junto aos universitários (Soares, Faria
2000), concordamos com as idéias sobre prevenção trazidas pelos alunos, que
sugerem que o tema uso de drogas no CRUSP seja amplamente discutido com
essa comunidade. O objetivo desse fórum de discussão pode ser o
estabelecimento de uma política sobre o uso de drogas no CRUSP, o
esclarecimento sobre o encaminhamento para o tratamento da dependência e a
formulação de um programa de prevenção ao uso indevido de drogas que se
proponha a desenvolver atividades de lazer e promova interação entre os
moradores. O processo não é simples, mas é viável, pode-se começar com os
calouros do CRUSP, sugestão dada pelos próprios alunos.

127
8 Referências Bibliográficas

Abramo HW. Cenas juvenis: punks e darks no espetáculo urbano. São Paulo
Página Aberta; 1994.

Andrade AG, Queiroz S, VillaBoim RCM, César CLG, Alves CGP, Bassit AZ,
Gentil V, Siqueira AAF, Tolosa EMC. Uso de álcool e drogas entre alunos de
graduação da Universidade de São Paulo(1996). Rev ABP-APAL 1997; 19 (2):
53-9.

Andrade AG, Bassit AZ, Mesquita AM, Fukuhima JT, Gonçalves EL. Prevalência
do uso de drogas entre alunos da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (1991-93).Rev ABP-APAL 1995; 17 (2) 41-6.

Andrade AG, Bassit AZ, Kerr-Correa F, Tonhon AA, Boscovitz EP, Cabral M,
Rassi R et al. Fatores de risco associados ao uso de álcool e drogas na vida,
entre estudantes de medicina do Estado de São Paulo. Rev ABP-APAL 1997;
19(4) 117-26.

Ariés P. História social da criança e da família. 2a edição. Rio de Janeiro; LTC;


1981 As idades da vida; p. 29-50.

As obras no CRUSP afastam marginais. O Estado de São Paulo, São Paulo, 29


de março. 1984. p. 15.

Universidade de São Paulo. A prefeitura da cidade universitária “Armando


Salles Oliveira”. O espaço da USP: presente e futuro. São Paulo; 1985.

Barata A. Introdução a uma sociologia da droga. In: Mesquita F, Bastos IB,


organizadores. Drogas e Aids: estratégias de redução de danos. São Paulo:
Hucitec; 1994. p.21-43

Bardin L. Análise de conteúdo. Trad. de Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro.


Lisboa: Edições 70; 1977.

Barria ACR, Queiroz S, Nicastri S, Andrade AG. Comportamento do


universitário da área de biológicas da Universidade de São Paulo. Rev Psiq Clin
2000; 27 (4):215-24.

Bastos FI. Redução de danos e saúde coletiva: reflexões a propósito das


experiências internacional e brasileira. In: Sampaio CM, Campos MA,

128
organizadores. Drogas, dignidade e inclusão social: a lei prática da redução de
danos. Rio de Janeiro: Aborda; 2003. p. 15-41.

Becker HS. Métodos de pesquisa em ciências sociais. 2a ed. São Paulo:


Hucitec; 1994. Estudo de práticas de crimes e delitos. p. 153-65.

Birman J. Mal-estar na atualidade: a psicanálise e as novas formas de


subjetivação. 2 a ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2000.

Bock S. A inserção do jovem no mercado de trabalho. In: Abramo HW, Freitas


MV, Sposito MP, organizadoras. Juventude em debate. São Paulo: Cortez;
2000. p

Borini P, Oliveira CM, Martins MG, Guimarães RC. Conceitos, concepções


etiológicas e atitudes de estudantes de medicina sobre o uso e abuso de álcool.
Correlações com os padrões de uso- parte 2. J Bras Psiq 1994; 43(3) 123-31,

Boskovitz EP, Cruz ETN, Chiaravalloti Neto F, Moraes MS, Paiva Neto JV, Ávila
LA et al. Uso de drogas entre estudantes universitários em São José do Rio
Preto, São Paulo. Rev Psiq Clin 1995; 22(3): 87-93.

Brenes LFV, Hammes MF, Sole MT, Hein R, Ramil KAA. Drogas ilícitas entre
universitários. Armigs 1986; 30 (2) 140-3.

Briga e duas mortes na USP. Jornal da Tarde, São Paulo, 12 de nov. 1984. p 2.

Bucher R; Totugui ML. Conocimento y uso de drogas entre alumnos de Brasília.


Acta Psiqu.psicol, Am. Lat 1988; 34: 113-26.

Bucher R. A ética da prevenção. Psicol. Teor Pesq 1992; 8(3): 385-98.

Bucher R. A abordagem preventiva do uso indevido de drogas In: Bucher R


organizador Prevenção ao uso indevido de drogas. Universidade de Brasília,
1989, Brasília: UNB/CETAD/CORDATO; 1989.

Bucher R, Oliveira S. O discurso do “combate às drogas” e suas ideologias.


Rev. Saúde Públ. 1994: 28(2): 137-45.

Carlini EA, Carlini-Cotrim B, Silva AR. Sugestões para Programas de Prevenção


ao abuso de drogas no Brasil. São Paulo: CEBRID, 1990.

Carlini EA, D’Almeida V, Noto AR, Sá LC. Produção científica brasileira sobre
abuso de drogas: como está e para que serve.J Bras Psiq, 1994; 43(8): 423-7.

129
Carlini-Cotrim B. O consumo de substâncias psicotrópicas por estudantes
secundários: o Brasil frente à situação internacional”. Rev ABP-APAL 1991;
13(3):112-6.

Carlini-Cotrin B. A escola e as drogas: realidade brasileira e contexto


internacional. [tese] São Paulo (SP): Faculdade de Psicologia da PUC SP,
1992.

Carlini-Cotrim B, Rosemberg F. Os livros didáticos e o ensino para a saúde:


ocaso das drogas psicotrópicas. Rev Saúde Pública 1991; 25(4): 299-305.

Carlini-Cotrim B, Galduróz JCF, Noto AR, Pinsky I. A mídia na fabricação do


pânico de drogas: um estudo no Brasil. Comunicação Política 1995; 1: 217- 30.

Chauí M. O que é ideologia? 2 a ed São Paulo: Brasiliense; 2001.



Chauí M. Ideologia neoliberal e universidade. In: Oliveira F, Paoli MC,
organizadores. Os sentidos da democracia: políticas do dissenso e hegemonia
global. Rio de Janeiro: Vozes; 1999. p. 27-51.

Coggiola O. O comércio de drogas hoje. Olho da História [periódico online]


2001; (4). Disponível em: <http://www.ufba.br/ ~revistao/04coggio.html> (14 set
2001).

Coordenadoria de Assistência Social - COSEAS Perfil sócio-econômico dos


moradores do CRUSP- Graduação. São Paulo; 1999.

Coordenadoria de Assistência Social – COSEAS. Documentos internos. São


Paulo; [s.d.] (mimiografado).

CRUSP voltará a ter redsidentes em março. O Estado de São Paulo, São


Paulo, 1 o. de fev.1983. p 12.

Cunha DRR. O CRUSP visto por um mineiro. [online]. São Paulo; [s.d.].
Dsiponível em: <www.crusp.cjb.ne t> (17 ago 2003).

De Lucia R, Planeta CS. Padrões de uso de psicoestimulantes e energizantes


por universitários: análise do período 1983-1988. Rev ABP-APAl 1989; 11(3):
111-3.

Demartini ZBF. A questão da análise no processo de pesquisa. In: Lang ABSG,


organizadora. Desafios da pesquisa em Ciências Sociais. São Paulo: NAP-
CERU; 2001. p. 49-72. (textos. série 2, n 8).

Degradação no campus. Folha de São Paulo, São Paulo, 22 de março. 1984.

130
Docentes acham que haverá uma corrida ao CRUSP. Folha de São Paulo, São
Paulo, 3 de fev. 1983. p.14.

Duas mortes no CRUSP. O Estado de São Paulo, São Paulo, 25 de nov. 1984.

Escohotado, A. Las drogas. De Los orígenes a la prohibicioón. Madrid: Alianza


Editorial, 1994.

Foracchi MM. Frustrações dos jo vens e orientação do protesto estudantil. In:


Florestan F, organizador. Comunidade e sociedade no Brasil: leituras básicas
de introdução ao estudo macro-sociológico do Brasil. São Paulo: Nacional;
1972. p 559-71.

Foracchi MM. A juventude na sociedade moderna. São Paulo: Pioneira; 1972.

Galduróz JCF, Noto AR, Carlini EA. IV Levantamento sobre o uso de drogas
entre estudantes de 1o e 2o graus em dez capitais brasileiras: 1997. São Paulo:
CEBRID/UNIFESP; 1997.

Karan, ML Drogas: o processo legislativo. In: Ribeiro MM, Seibel SD


organizadores. Drogas: hegemonia do cinismo. São Paulo: Memorial; 1997.

Karan ML. Redução de danos, ética e lei: os danos da política proibicionista e


as alternativas compromissadas com a dignidade do indivíduo. In: Sampaio CM,
Campos MA, organizadores. Drogas, dignidade e inclusão social: a lei prática
da redução de danos. Rio de Janeiro: Aborda; 2003. p. 45-97.

Kerr-Corrêa F, Andrade AG, Bassit, AZ, Boccutto NMVF. Uso de drogas por
estudantes de medicina da UNESP. Rev Bras.Psiqu 1999; 21(2): 95-100.

Kaplan M. Tráfico de drogas, soberania estatal, seguridad nacional. Sistema.


1997; (136): 43-61.

Konder L. A questão da ideologia. São Paulo: Companhia das Letras; 2002.


Ideologia e cotidiano. p. 237-47.

Lapassade G. A entrada na vida. Lisboa: Edições 70, 1975.

Lefevre F, Lefevre AMC Teixeira JJV. Organizadores. O discurso do sujeito


coletivo: uma nova abordagem metodológica em pesquisa qualitativa. Caxias do
Sul: EDUCS; 2000.

Lefevre F, Lefevre AMC. A fala do social: discurso do sujeito coletivo como uma
nova ferramenta em pesquisa qualitativa. São Paulo; 2002 [Apostila do curso

131
Pesquisa qualitativa e representação social da saúde e doença: aspectos
metodológicos e instrumentais].

Magalhães MP, Barros RS, Oliveira RC.; Azevedo RB, Almeida SP, Silva MTA.
Avaliação dos efeitos da maconha por usuários de população estudantil. Ci Cult
1986; 41(7): 652-57.

Magalhães MP; Barros RS; Oliveira, RC; Azevedo RB; Almeida SP, Silva MTA.
Padrões e freqüência do uso da maconha por estudantes universitários. Rev
ABP-APAL 1989; 11(1) 34-40.

Magalhães MP, Barros RS, Silva MTA. Uso de drogas entre universitários: a
experiência da maconha como fator delimitante. Rev ABP-APAL 1991; 13:97-
104.

Marlatt GA, Baer JS, Blume AW, Daisy F, Dimeff LA, Gorman EM et al.
Redução de danos: estratégias práticas para lidar com comportamentos de alto
risco. São Paulo: Artemed; 1999. Princípios básicos e estratégias de redução
de danos; p. 46-58.

Mendes LC. Para a universidade brasileira transpor o século. Rev Serv Social
Soc 1996; 17(51): 49-60.

Mesquita AMC, Bucaretchi HA, Castel S, Andrade AG. Estudantes da


Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo: uso de substâncias
psicoativas em 1991.Rev ABP-APAL 1995; 17(2):47-54.

Minayo, MCS. O desafio do conhecimento. Pesquisa qualitativa em saúde. SP-


RJ: Hucitec-Abrasco; 1994. Fases do trabalho de campo; p 105-197.

Moradores acham que a COSEAS vai restringir CRUSP. Folha de São Paulo,
São Paulo, 2 de fev.1983. p. 15.

Moradores do CRSP criam associação e pedem garantia. Folha de São Paulo,


São Paulo, 8 de dez. 1984.

Morin E. Cultura de massas no século XX: Espírito do te mpo - I. Neurose. 9a .


ed. Forense; 1997. Juventude; p. 147-57.

Nappo SA. Análise qualitativa do uso de cacaína: um estudo em São Paulo. In:
Leite MC, Andrade AG, organizadores. Cocaína e crack: dos fundamentos ao
tratamento. São Paulo: Artemed; 1999. p.205-226.

132
Noto AR, Batista MC, Faria ST, Nappo S, Galduroz JCF, Carlini EA. Drogas na
imprensa brasileira: uma análise dos artigos publicados em jornais e revistas.
Cad Saúde Pública 2003; 19(1): 69-79.

Noto AR, Nappo S, Galduroz JCF, Mattei R, Carlini EA. IV Levantamento sobre
o uso de drogas entre crianças e adolescentes em situação de rua.São Paulo:
CEBRID/UNIFESP; 1998.

Novaes RR. Juventude e participação social: apontamentos sobre a reinvenção


da política. In: Abramo HW, Freitas MV, Sposito MP, organi zadoras. Juventude
em debate. São Paulo: Cortez; 2000. p 46-54.

Queiroz VM, Salum MJ. Globalização econômica e a apartação da saúde:


reflexão crítica para o pensar/fazer na enfermagem. In: Anais do 48o.Congresso
Brasileiro de Enfermagem; 1997. São Paulo: ABEn- São Paulo-SP;1997. p.
190-207.

Reformas e interdição do CRUSP ainda sem acordo. Folha da tarde, São Paulo,
29 de dez. 1984.

Sá, DB. Capacidade civil: um direito penal? In Bastos FI, Gonçalves OD.
Drogas: É legal? Um debate autorizado. Rio de Janeiro: Imago; 1993.

Salum MJL. Defesa da Universidade pública: a responsabilidade em construir


novas sociabilidade, educação, saúde e enfermagem. Univ Soci. São Paulo:
2001; 10(23): 173-183.

Santos LV, Silva WO, Damásio VF, Stacciarine JM, Munari DB. Percepções de
estudantes da área de saúde sobre o abuso de álcool no meio acadêmico. In:
Anais do VI Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental e V Encontro de
Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica; 2000 abril.17-20; Ribeirão Preto.
São Paulo: EERP-USP; 2000 p 199-209.

Schaiber LB. Pesquisa qualitativa em saúde. Reflexões metodológicas do relato


oral e produção de narrativas em estudo sobre profissão médica. Rev Saúde
Pública 29 (2), 1995

Schivoletto S, Henriques SG, Andrade AG. Uso de drogas por adolescentes que
buscam atendimento ambulatorial: comparação entre “crack” e outras drogas
ilícitas – um estudo piloto. Rev ABP-APAL 1997; 19(1): 7-17.
Soares CB. Adolescentes, drogas e AIDS: avaliando a prevenção e levantando
necessidades. [Tese]. São Paulo (SP): Faculdade de Educação da USP; 1997.

Soares CB, Faria LM. Prevenção de drogas no meio universitário: uma


experiência na Universidade de São Paulo. Participação 2000; 4(6):45-7.

133
Spósito MP. Jovens e educação: novas dimensões da exclusão. Rev Em
aberto. Brasília 1992; 11(56): 43-53.

Queiroz S. Fatores de risco para o uso de drogas entre alunos de graduação da


Universidade de São Paulo. [tese]. São Paulo (SP): Faculdade de Saúde
Pública da USP; 2000.

Velho G. Individualismo e cultura: notas para uma antropologia da sociedade


contemporânea Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 1999. Duas categorias de
acusação na cultura brasileira contemporânea; p 55- 64.

Velho G.A dimensão cultural e política dos mundos das drogas. In: Zaluar A.
Drogas e cidadania. São Paulo: Brasiliense; 1994. p. 23-30.

Zaluar A. Dorgas e cidadania. São Paulo: Brasiliense; 1994. p 7-22.

Zanini AC, Moraes ECF, Akerman B, Aizenstein M, Salgado LFV. Concepts and
use of psychoative drugs among university students in the São area. Drug
Forum 6 1977; 85-99.

134
Anexo 1

135
Anexo 2

136
Anexo 3

137
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE ENFERMAGEM
DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM
EM SAÚDE COLETIVA
Av. Dr. Eneas de Carvalho Aguiar, 419 - CEP 05403-000
Tel.: (011) 3066-7652 - FAX 3066-7662

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

O consumo de drogas: o que pensam os alunos moradores do Conjunto


Residencial da USP – CRUSP

Meu nome é Thais Helena Mourão Laranjo e sou aluna de Pós-


Graduação em Enfermagem, nível de Mestrado, Departamento de Enfermagem
em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo.
Estou desenvolvendo a pesquisa “Consumo de drogas: o que pensam os
alunos moradores do Conjunto Residencial da USP – CRUSP”.
O objetivo deste estudo é conhecer as opiniões dos alunos moradores do
CRUSP a respeito do uso de drogas de forma a contribuir para que as
atividades preventivas propostas estejam mais próximas da realidade deste
grupo.
Assim, solicitamos através deste documento, o seu consentimento para
participar do estudo, através de entrevista gravada, estando ciente de que essas
informações serão utilizadas para fins de pesquisa.
Não é necessário que você se identifique e será mantido o sigilo das
informações. Informamos ainda que a não participação no estudo não lhe
causará qualquer prejuízo e que você pode desistir de participar da pesquisa a
qualquer momento. No entanto, ao participar, compromete-se a fornecer
informações verídicas.
Desde já agradecemos a sua colaboração e colocamo-nos à disposição
através do telefone 3066-7652 do Departamento de Enfermagem em Saúde
Coletiva.

Profa. Dra. Cássia Baldini Soares Thais Helena Mourão Laranjo


Orientadora Mestranda
Depto Enfermagem em Saúde Coletiva Depto Enfermagem em Saúde
Coletiva

São Paulo, _______________________

_________________________________
Pesquisado

138
Anexo 4

139
ROTEIRO DAS ENTREVISTAS
Caracterização da inserção social
1. Há quanto tempo mora no CRUSP?
2. Onde mora sua família?
3. Com que regularidade você vai visitar os seus pais?
4. O que os seus pais fazem. Qual que é ocupação deles?
5. Até que série eles estudaram?
6. Qual a sua idade?
7. Você é casado?
8. Você tem filhos?
9E a sua fonte de renda, qual é?
10. Pra gente pegar em termos de salário mínimo quanto que é, um salário
mínimo, dois a grana que você vive?
11. Que curso você está fazendo?
12. Em que ano está?
13. Em que período estuda?

Perguntas específicas sobre o tema da pesquisa


1. O que você sabe sobre a história do CRUSP?
2. Eu queria que você descrevesse pra mim como é morar no CRUSP?, o quê
que tem de positivo e negativo
3. Você participa de atividades sociais, políticas, de lazer, esportivas que tem
na moradia? Tem alguma coisa desse tipo lá, específico para os moradores? E
no final de semana?
4. Em relação ao uso de drogas como você percebe o uso de drogas no
CRUSP?
5.O que você acha de quem usa drogas? Qual a tua opinião?
6. O que você acha de uma idéia que existe na universidade de que o CRUSP é
um ambiente que propicia o uso de drogas?
7. O que você acha que poderia ser feito em relação ao uso de drogas no
CRUSP?
140

Você também pode gostar