Derrida - A Lei Do Gênero - Anotações Aula Junho de 2024

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DERRIDA, Jacques. A lei do gênero.

Tradução de Nicole Alvarenga Marcello; Carla


Rodrigues. Revista TEL. Programa de Pós-graduação em História
UNICENTRO - Campus de Irati.

Não vou me dedicar a demonstrar, considerando que seja


sempre possível, o porquê de vocês não poderem decidir de
imediato se as frases com as quais abri essa fala e marquei esse
contexto eram ou não repetições de tipo citacional; nem se elas
eram ou não de tipo performativo; tampouco se elas eram todas
duas, juntas, e sempre juntas, uma coisa ou outra. Pois talvez
não tenha escapado à atenção de todos que, de uma repetição à
outra, a relação entre os dois enunciados iniciais sem dúvida
mudou. A pontuação foi ligeiramente modificada, do mesmo
modo que o conteúdo da segunda proposição independente. Esse
deslizamento quase imperceptível podia tornar, a princípio,
independentes entre si as opções interpretativas que poderiam
tê-los feito escolher uma ou outra, ou uma e a outra dessas duas
frases. Seguir-se-ia uma combinação de possibilidades muito
rica que, para não extrapolar meu tempo de fala e para respeitar
a lei do gênero e do colóquio, me abstenho de esmiuçar.
(Derrida, 255)

Essa questão voltava em todas as questões.


Blanchot
https://joaocamillopenna.files.wordpress.com/2017/08/blanchot-a-loucura-
do-dia.pdf

Deviar-se de um logos verdadeiro; atentar para efeitos [em


disputa, jogos] do texto; reconhecer relações dissimétricas (não
considerar “origem”, “verdade”); “espero também que uma certa
dessemelhança, uma heterogeneidade do outro reconfigure isso
que você acabou de chamar de meu retrato” (Derrida, A verdade
ofensiva...);

1. questão fundamental dos limites / problemas de borda, de linha de demarcação e


de transbordamento x oposição simples: conceito tradicional de gênero – puro,
traço de reconhecimento é indiviso, reenvia a uma mesma origem simples;
citação e uma não-citação; uma narrativa e uma não-narrativa; autor e analista;
leitor crítico e leitor autocrítico; crítico e não-crítico; ficção e não-ficção; modo
(narrativa) e gênero (romance / conto de fadas); masculino e feminino; “eu” e
“nós”; mundo sensível e mundo das ideias; natureza e história; forma e
conteúdo; dentro e fora; discurso filosófico e mítico; próprio e estrangeiro [Tese:
Derrida / Élida – hos(ti)(pita)lidade];
2. Questão dos limites e da “origem”: Não misturar os gêneros – interpretação
constativa e performativa; dever de não permitir a mistura – télos do conceito/da
teoria de gênero; Derrida lendo Blanchot – limites da ontoteologia são
rasurados; não nos tranquilizaremos quanto à identidade;
3. desloca-se o olhar: um traço identificatório permite o reconhecimento da
participação; participação sem pertencimento / lei do transbordamento – “o
traço que marca o pertencimento aí se divide, sem falta, a borda do conjunto
acaba formando, por invaginação, um compartimento interno maior que o todo,
as consequências dessa divisão e desse transbordamento restando tão singulares
quanto inimitáveis”; [Evando Nascimento, p. 332]: “todo texto participa de um
ou mais gêneros sem pertencer inteiramente a nenhum”;
4. Movimento de invaginação: dobra; oposições são embaralhadas; relação dos
gêneros [com o modo] é complexa; “invaginação” perturba a Lei, a ordem, a
crono-lógica do gênero (narrativa, conto, relato, romance, novela) – genealogia
“monstruosa” [Nietzsche, Bataille, Blanchot, Freud – esse estranho familiar];
Ficção Americana – estranha metonímia se forma no bolso do texto, aberto, no
entanto para o exterior. Verdadeira des-construção em abismo da “negritude”
[parafraseando / roubando Evando Nascimento, 335]; estranha metonímia (vale
pelo todo);

Monk é um escritor negro brilhante, mas seus livros não são


populares já que ele se recusa a retratar negros de forma
estereotipada em seu trabalho. Ele é pressionado por seu editor a
criar uma obra comercial e escreve uma história carregada de
preconceitos como piada. Só que o livro se torna um best-seller
da noite para o dia. Com o dinheiro caindo em sua conta, mas
com a consciência pesada, Monk é obrigado a encarnar um
personagem do gueto para manter a farsa.
Sinopse, Ficção Americana, PrimeVídeo

Jeffrey Wright, Divulgação – Amazon (Prêmio melhor roteiro adaptado, 2024)

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marilene-felinto/2022/12/literatura-
consiste-em-inventar-um-povo-que-falta.shtml
Fato é que o professor, diante da "falta de sintonia" dos alunos
com o texto rosiano –e diante da acomodação da academia a seu
cânone seleto –, optou por livro de um escritor jovem, com
presença e divulgação na mídia, um desses supervalorizados,
mas que são apenas medianos.
Para mim, literatura surge e se constitui de atmosferas, não é
narração enfadonha de fatos, sem personalidade, sem alma.
Escrever, afinal, e como afirmou Deleuze em "A Literatura e a
Vida", "não é contar as próprias lembranças, suas viagens, seus
amores e lutos (...). É um caso de devir, sempre inacabado,
sempre em via de fazer-se, e que extravasa qualquer matéria
vivível ou vivida".
O tal escritor contemporâneo e que, conforme o professor,
respondia de imediato à demanda do alunado, é daqueles que
peca pelo excesso de realidade ou de imaginação (o que é a
mesma coisa, segundo Deleuze), e cujo texto li aos bocejos.

5. questão dos limites: [Paul Preciado]: invenção do corpo patológico e normal;


[Butler]: sexo e gênero; [Homi Bhabha]: hibridismo da autoridade colonial e
mito originário do poder colonialista; - mito originário do poder colonialista:
realidade colonial resulta de narrativa e história imperialista; discurso não-
dialógico; enunciação unitária; não há “diferença”; sujeitos “fixados” em
determinados papéis; [Malévola]: animais e humanos; paz e guerra; Moors e
humanos; mães e mães; Malévola e Malebelévola; Corvo Diaval x humano;
Corvo x Urso x Cavalo X Humano; personagem da atriz Jenn Murray, toca
órgão numa igreja para a morte de habitantes de Moors; [Derrida]: eu/nós –
presença absoluta; questão do ser; metafísica da presença – manter a
ambiguidade;

Eduardo Portela, Identidade em questão: vias e desvios da


identidade literária (palestra na ABL)
https://www.youtube.com/watch?v=5zfdbNAaRlQ&t=2340s
O historicismo e o sociologismo dominantes não dispuseram de
condições de dar conta da pluridimensionalidade do literário.
(...) Mais recentemente, importante crítico literário paulista, viu
no Bruxo do Cosme Velho, provavelmente inspirado pelo
fantasma sempre presente da luta de classes, um mestre na
periferia do capitalismo. Machado, no entanto, não tem
domicílio fixo, não é do centro nem da margem, nem do mais
acima nem do mais embaixo. As análises de conteúdo não
entendem a complexidade, a ambiguidade estrutural que se
ocultam nas palavras e nos silêncios poéticos. Então, essas
disciplinas que privilegiam a análise de conteúdo, não dão conta
da trama da linguagem, que é o que decide a sorte de um
discurso literário. (...) A apropriação psicológica reforçada pela
voracidade psicanalítica não vacila em colocar o autor ou o
personagem no divã: complexo de Édipo ou de Electra, traumas
da primeira infância, sentimentos recalcados ou transferidos,
transtornos de todo tipo proliferam desinibidamente. Mais uma
vez, Machado de Assis tem sido vítima de diagnósticos
precipitados ou exteriorizantes: Capitu traiu ou não traiu?
Machado se omitiu? Machado preferiu guardar a distância
regulamentar face à pretensa culpa e dar vazão a um dos mais
vigorosos recursos da construção literária que é a ambiguidade.

6. Derrida lê Maurice Blanchot / a impossibilidade de separação dos gêneros


[literários]: (Maurice Blanchot): extrema direita; esquerda; elitista e
tradicionalista; denuncia fascismo e a ilusão de um “mito”; amigo íntimo de
Levinas, escreveu crônicas em jornal favorável à Hitler – como definir
Blanchot?; Blanchot e Derrida; Blanchot e Levinas; Blanchot e Bataille [pensar
juntos, co-implicação, pertencer sem pertencimento]; Blanchot: “que é a
literatura” / “como a literatura é possível?” – Giorgio Agambem;
7. por que “desconstruir” limites?: permitir jogo polissêmico e disseminal [que
leva ao abismo]; rasurar centro [ser, Família, Deus, Pátria, phoné, verdade;
identidade, gênero]; tudo vira “discurso” [sistema no qual, o significado central,
originário ou transcendental, nunca está absolutamente presente fora de um
sistema de diferenças]; deslimitar o “jogo”: movimento do jogo é o movimento
da suplementariedade; jogo / afirmação nietzschiana [ sim, sim ]: afirmação
alegre do jogo do mundo e da inocência do devir, a afirmação de um mundo de
signos sem erro, sem verdade, sem origem, oferecido a uma interpretação ativa;
8. questão dos limites do gênero “contos de fadas”: “Os contos de fadas
são narrativas onde aparecem seres encantados e elementos mágicos
pertencentes a um mundo imaginário, maravilhoso. Estes contos têm quase
sempre uma estrutura simples e fixa. Tem uma característica bem marcante
como na sua fórmula inicial: ‘Era uma vez...’ e final: ‘... foram felizes para
sempre”. (http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/
producoes_pde/2013/2013_uenp_port_pdp_angela_scheffer_portela.pdf) – Malévola 2 –
“dobra” a aposta - experimentos genéticos nazifascistas; o mal, a guerra e
animalidade circula; desejos de extermínio; câmara de gás nazista na igreja –
solução final nazista; misoginia; patriarcado; mulheres histéricas, violentas,
ingênuas; estupro, violação e trauma; trama de Édipo; expulsão territorial;
migração forçada;

Duende, Lickspittle, o nobre, servo da rainha

https://www.youtube.com/watch?v=qavgfqu-lz4
Angelina Jolie (Malévola)
Todos conhecemos a história da Bela Adormecida. Então,
conhecemos a Malévola, sabemos o que aconteceu no batizado.
Mas não sabíamos o que havia acontecido antes. Nós
respeitamos o clássico. Tentamos trazer o que você ama dessa
história. Também queremos trazer um mundo que você nunca
viu antes.

Ellen Faning (Princesa Aurora)


É a história clássica da Bela Adormecida e muito mais. Quando
eu assisti ao desenho animado, sempre senti que não tinha muito
medo da Malévola. Ela sempre me intrigou.

Eu assisti ao filme e tive algumas ideias que revelaram mais


sobre o personagem. Criaram um passado sobre ela, que levaram
ao momento em que ela amaldiçoa Aurora, e depois nos leva
além desse momento do ponto de vista da Malévola. É uma
reinvenção, não só uma releitura da mesma história.
Linda Woolverton (Roteirista)

Era uma vez ou talvez duas vezes, pois devem se lembrar desta
história... havia um poderoso ser chamado Malévola. Por
alguma razão, a dona do mal e protetora dos Moors ainda era
odiada depois de todo esse tempo. Sim, ela havia amaldiçoado a
princesa Aurora, mas isso foi antes de descobrir a luz no coração
de uma criança humana e de criar a menina como filha. Afinal,
foi o amor de Malévola que quebrou a mesma maldição. Mas, de
alguma forma, esse detalhe foi misteriosamente esquecido. Pois,
conforme a história era contada e repetida várias vezes pelo
reino, Malévola tornou-se a vilã mais uma vez. (Malévola: a
dona do Mal, 4min20s)
Maleficent: Mistress of Evil

porque talvez se lembre da história


havia uma criatura poderosa chamada Malévola
aquele mesmo feitiço
Malévola tornou-se mais uma vez a vilã

9. tensão teórica que borra fronteiras: do binário ao paradoxo da dissimetria: “um


par irregular do um sem o outro, no qual ambos se intimam regularmente,
comparando-se a partir da figura do outro, dizendo simultaneamente e
indiscernivelmente “eu” e “nós” [Derrida, A lei do gênero]; não conjunção;
posicionar o “outro” em um lugar que já não seja oponível; nem separável nem
inseparável [espectro, fantasma]; “verdade” ofensiva – verdade que está sempre
em outro lugar; corpo-a-corpo das línguas, dos gêneros]; impossibilidade de
separação dos gêneros literários; ficção e não ficção; diferença sexual; ética
como abertura à alteridade, à literatura e à psicanálise; [Homi Bhabha / Frantz
Fanon, O local da cultura, p. 168]: borra fronteira entre colono e nativo;
[Derrida, p. 275]: “Os gêneros passam uns pelos outros”; [Blanchot]: “A
verdade é que nós não podemos mais nos separar. Eu o seguirei por toda parte,
viveremos sob seu teto. Teremos o mesmo sono”; - borra fronteiras: há algo de
incesto aí... [Hélene Cixous]: Jacques Derrida – “masculinidade capaz de
feminilidade”; Clarice Lispector “feminilidade capaz de masculinidade";
[Marilene Felinto]: surto lésbico-literário:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs05099912.htm
10. receptáculos narrativos x gênero: “cada conteúdo narrativo — fabuloso, fictício,
legendário ou mítico, pouco importa no momento — torna-se, por sua vez, o
recipiente de uma outra narrativa. Cada narrativa é, então, o receptáculo de uma
outra. Somente há receptáculos de receptáculos narrativos” (Derrida, Khôra, p.
55);

Chamada para a revista Lingu@ Nostr@


Em prefácio à tradução brasileira do seminal Luto e melancolia,
de Sigmund Freud, Maria Rita Kehl (2013) lembra que a longa
tradição ocidental, que associava ao “gênio” poético o humor
oscilante do melancólico – entre o extremo da sua condição e o
“polo antípoda” da mania –, não havia, certamente, sido
ignorada pelo criador da psicanálise na escolha desse
significante para “desafiar a psiquiatria de sua época” (p. 23).
Três anos após a publicação desse ensaio de 1917, em Além do
princípio de prazer, Freud (2019) encontra, na epopeia
romântica de Torquato Tasso, Jerusalém libertada, “a figuração
poética mais comovente de semelhante traço fatídico” (Freud,
2019, p. 71) com a compulsão à repetição do trauma nos atos
inconscientes do sobrevivente.

Aurora espeta o dedo na roca de fiar

As moiras (em grego: Μοῖραι), na mitologia grega, eram as três


irmãs que determinavam o destino, tanto dos deuses, quanto dos
seres humanos. Eram três mulheres lúgubres, responsáveis por
fabricar, tecer e cortar aquilo que seria o fio da vida de todos os
indivíduos.
Wikipedia

(Remedios Vario, Premonições)


Fiar, tecer, narrar

Elle Fanning, Aurora no reino dos Moors

inventar uma pele, a noite


Mônica de Aquino
Linha, labirinto
Teço uma ideia de Troia
você está na sobreposição de três fios
teço a guerra na mortalha
posso inventar outra moira
matar uma cidade ou ilha
ninguém conhece os motivos
que as mãos, agora, inventam.

O que fazem tuas mãos, Odisseu


neste duelo de formas
fantasmas sobre as minhas
incapazes de duelar com agulhas
e linhas
desafiam que labirinto as escolhas:
ganha a minha mão o homem capaz
de tecer.

Cem homens dentro do átrio


no lugar do arco, sentar-se,
em silêncio
não o movimento do braço
mas dedos, inventar uma pele
Troia é a noite
ganha a minha mão quem descobre
outra Ítaca.

Sim, ele tece uma casa


sobre a memória
infiel à volta à guerra
açula a lembrança, a espera
aproxime-se, homem que desconheço:
ganha a minha mão quem desperta
a raiva do cão.

As mãos sobre as minhas abertas


a tecer outras linhas: a moira sorri
corta um fio, amarra, ignora o tempo.
Sente-se aqui, tecelão.
John William Waterhouse: Penélope e os pretendentes

Chacina dos pretendentes de Penélope

11. différance: diferença derridiana / iterabilidade: “différance” nos informa que não
há a coisa enquanto tal, mas sim o rastro; iterabilidade nos informa que, desde o
início, o que se dá não é a coisa, qualquer que seja ela, em sua presença, mas sim
a referência a ela, ou, poderíamos dizer, a sua re-tomada; iterabilidade: o que
é primeiro nunca é a coisa, mas sim a sua repetição; desde o primeiro momento,
o que se dá é a repetição de uma referência à coisa e não a coisa mesma
[ESTRADA, Paulo Cesar Duque. Jamais se renuncia ao Arquivo Notas sobre
'Mal de Arquivo' de Jacques Derrida. Nat. hum., São Paulo , v. 12, n. 2, p. 1-
16, 2010];
12. repetição / performatividade [Butler, 2019, p. 16]: prática reiterativa e citacional
por meio da qual o discurso produz os efeitos daquilo que nomeia; poder
reiterativo do discurso para produzir os fenômenos que regula e que impõe;
materialidade é efeito produtivo do poder; reiterações nunca são simplesmente
réplicas do mesmo; todo “ato” é repetição; ato performativo repete uma
enunciação “codificada” e reiterável; reiteração é citação, recitação;

Se uma expressão performativa é provisoriamente bem-sucedida


(e eu sugeriria que seu “êxito” é sempre e apenas provisório),
não é porque uma intenção tenha êxito em governar a ação do
discurso, mas apenas porque essa ação ecoa ações anteriores, e
acumula a força da autoridade com a repetição ou a citação de
um conjunto prévio de práticas autorizantes. Isso significa,
então, que uma expressão performativa “obtém êxito” na medida
em que ela conte com o apoio e encubra as convenções
constitutivas pela qual é mobilizada. Nesse sentido, nenhum
termo ou declaração pode funcionar performativamente sem a
historicidade acumulada e dissimulada de sua força (Butler,
2019, p. 375).

13. Lei da heterossexualidade [Butler, p. 18]: “imperativo heterossexual permite


certas identificações sexuadas e forclui ou nega outras identificações”; matriz de
poder excludente – “requer a produção simultânea de um domínio de seres
abjetos, aqueles que ainda não são sujeitos, mas que formam o exterior
constitutivo do domínio do sujeito; Sistema heterossexual [Paul Preciado: O que
é contrassexualidade? Em: Manifesto contrassexual (pg. 21 a 33).
https://joaocamillopenna.files.wordpress.com/2017/08/preciado-paul-b-manifesto-
contrassexual.pdf] dispositivo social de produção de feminilidade e
masculinidade; opera por divisão e fragmentação do corpo; recorta órgãos e gera
zonas de alta intensidade sensitiva e motriz (visual, tátil, olfativa) que depois
identifica como centros naturais e anatômicos da diferença sexual; sistema
arbitrário e metonímico – extrai determinadas partes da totalidade do corpo e faz
delas significantes sexuais; sistema que assegura exploração material de um sexo
sobre outro; heterossexualidade é tecnologia social;
14. Resultado [P.Preciado]: Homens e mulheres como construções metonímicas do
sistema heterossexual; redução do erótico; exploração estrutural das mulheres;
privilégio do pênis; corpos-homem / corpos-mulher são produzidos por
tecnologia social heteronormativa; a arquitetura do corpo é política; instituições,
linguagens, medicina, relações sociais e domésticas;
15. [Para além] Invocações performativas: “é um menino” / performativos do
gênero: fragmentos de linguagem carregados historicamente do poder de investir
um corpo como masculino como feminino; sanciona corpos que ameaçam a
coerência do sistema/gênero até o ponto de submetê-los a processos cirúrgicos
de “cosméticas sexual” (diminuição do tamanho do clitóris, aumenta o tamanho
do pênis, fabricação de seios de silicone, ação hormonal do rosto e etc); Em
Malévola: esconder os chifres, os dentes afiados;
16. Identidade sexual: efeito de reinscrição das práticas de gênero no corpo; [Daí
que] Gênero: não é simplesmente performativo (efeito das práticas culturais
linguístico-discursivas / Butler); gênero é prostético, não se dá senão na
materialidade dos corpos; Maquinaria sexo-prostética: contemporânea da
máquina capitalista e da produção industrial;
17. no princípio, a diferença [Desconstrução]; diferença imprime a marca da cisão,
da separação, da heterogeneidade, no corpo pretensamente uno, homogêneo,
delimitável e auto-idêntico; nenhuma identidade é auto-idêntica; toda identidade
implica uma diferença, uma heterogeneidade;
18. no princípio, o dildo: [PRECIADO, Paul?? Beatriz. A lógica do dildo ou as
tesouras de Derrida. Em: PRECIADO, Beatriz. Manifesto contrassexual. São
Paulo: n-1 edições, 2014] – sexo: sistema complexo de estruturas reguladoras
que controlam a relação entre os corpos, os instrumentos, as máquinas, os usos e
os usuários; heterossexualidade – falo; contrassexualidade – lógica do dildo; fim
do pênis como “origem” da diferença sexual; falsa impostura de uma lógica de
dominação; heterossexualidade não é origem, mas paródia; heterossexualidade
é/se sustenta em sistema arbitrário de significação (masculino/feminino;
ativo/passivo); Filosofia a golpes de dildos: [abrir] dos tímpanos ao ânus;

O dildo, como Preciado mostra no capítulo intitulado “A lógica


do dildo ou as tesouras de Derrida”, ultrapassa o pênis como
algo da ordem da natureza e da propriedade, porque todo
mundo, desde então, pode ter seu próprio pênis, aliás, quantos
quiser – o que mostra a precariedade do pênis, que passa a ser
visto, não como algo da ordem do poder e da virilidade, como
acreditam tanto os machistas como as lésbicas radicais, como
algo a ser exaltado ou combatido, mas, diferente disso, a
dildologia mostra que o pênis nada mais é que um brinquedo
como outro qualquer, que todo mundo pode comprar e que ter
ou não um órgão reprodutivo masculino não é ter um órgão
sexual ontologicamente maravilhoso [Rafael Haddock-Lobo,
Preciado e o pensamento da contrassexualidade (Uma prótese de
introdução), p.87]

https://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%A9rula_papal
Férula papal (do latim Ferula pontificalis: bastão pontifical) é
uma insígnia papal, em forma de bastão alto encimado pela cruz.
Rower[quem?] (1947) define como um bastão, à guisa de cetro,
que desde a Idade Média era colocado na mão do papa depois de
sua eleição para significar o seu poder espiritual e temporal.
(...) sob a lógica do enxerto e vendo na figura da filósofa Paul
Preciado, aquela que penetra com seu dildo a desconstrução de
Jacques Derrida; aquele que promove enxertos clitorianos na
genealogia de Michel Foucault; aquela que faz fist-fucking no
corpo sem órgãos de Deleuze e Guatarri; aquele que injeta
líquidos tóxicos e deforma o pênis e os testículos do corpo
lésbico de Monique Wittig; aquela que raspa a cabeça e,
masturbando-a, faz gozar o ciborgue de Donna Haraway; aquele
que reencena a performance de Judith Butler, mostrando o cu
auto-penetrado do travesti por seus sapatos de saltos-dildo. Esse
poderia ser um começo dildotectônico, ou seja, de fato
filosófico, de se começar, pois toda a filosofia poderia ser,
então, lida sob a dildológica. Isso também me interessaria
bastante já que, como antecipei, em meus termos a metafísica
deve ser compreendida como um “cis-logismo”. [Rafael
Haddock-Lobo, Preciado e o pensamento da contrassexualidade
(Uma prótese de introdução)]

19. violência da lei: não permite a conjunção; princípio de seletividade: constrói-se


por meio de apagamento, exclusão; [todavia] ao se colocar produz a sua própria
transgressão [A alteridade no pensamento de Jacques Derrida: escritura, meio-luto, aporia /
Ana Maria Amado Continentino https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/colecao.php?
strSecao=resultado&nrSeq=9591@1
20. Lei: interdição / transgressão: [nota de rodapé / Continentino]: “(...) Derrida nos
dá um bom exemplo de como a lei exige para se cumprir sua própria
transgressão, através da citação de um grafite onde se lê a ordem: “Não me
leia””; Lei: inibidora e estimulante; silenciadora e provocante; Narradores de
Javé: “Proibida a entrada de analfabetos”; [Malévola]: “Não sorria” – Corvo;
21. contradição interna do conceito: de cortesia: injunção agir além da regra, da
norma, do rito; todo conceito normativo implica a regra [que se conheça a regra]
e a invenção sem regra [sem nunca se ater a ela]; “É falta de cortesia ser apenas
cortês, ser cortês por cortesia” (Derrida, Paixões, p. 15);
22. Lei / regras, normas, axiomas: conjunto de traços identificáveis e codificáveis
para decidir que isso ou aquilo, que tal coisa ou tal acontecimento pertencem a
tal conjunto ou a tal classe; [todavia, por um lado] um texto não pertenceria a
gênero algum; [Evando Nascimento, p. 333]: há tão somente regras genéricas ou
específicas mais ou menos formalizáveis; [por outro lado]: um traço
identificatório permite o reconhecimento da participação; participação sem
pertencimento;
23. [Butler / Corpos que importam]: “restrição constitutiva” – “tais restrições
produzem o domínio de corpos inteligíveis, mas também introduzem um
domínio de corpos impensáveis, abjetos, inabitáveis? (...) o domínio escolhido e
ilegível que assombra o domínio antecedente como o espectro de sua própria
impossibilidade, o próprio limite para a inteligibilidade, seu exterior
constitutivo” (2019, p. 12); fantasma “retorna” – forclusões e supressões
retornam;

Portanto, não é suficiente afirmar que os seres humanos são


construções, pois a construção do humano também é uma
operação diferencial que produz o mais ou menos “humano”, o
inumano, o humanamente inconcebível. Esses locais excluídos
ao se transformar em seu exterior constitutivo, chegam a limitar
o “humano” e assombrar tais limites, por representar a
possibilidade persistente de sua irrupção e de sua rearticulação.
(Butler, 2019, p. 27)

24. Relações: não de extensão; de indivíduo exemplar à espécie; de espécie à


gênero; de gênero de gênero ao gênero em geral [buscando a verdade, a ordem,
decifrar o enigma – discurso, narrativa]; poética sobre a teoria dos gêneros;
história da teoria dos gêneros; história crítica do conceito de gênero desde Platão
até nossos dias; RELAÇÕES totalmente diferentes [nem construtivismo, nem
determinismo, nem essencialismo, nem humanismo]: não dominar a proliferação
de estudos sobre o tema; permitir-se à multidão de...; ao porvir, à
degenerescência; à transexualidade monstruosa e criativa: “A transexualidade
me permite, de forma mais do que metafórica e transferencial, criar” [Derrida];
Evando Nascimento: “Derrida chama transexual esse movimento de passagem
de um gênero através do outro. Esse é o valor (de)generativo de todo hymen, a
partir do qual se fia um texto, pertença ele ao gênero do relato, da narrativa, do
romance, do ensaio ou da tese” (p. 339); [Blanchot]: Sim, falei demais com
pessoas, isso me aflige; cada pessoa foi um povo para mim. Esse imenso outro
rendeu-me bem mais do que eu poderia ter querido”;
25. exaurir os gêneros x naturalização dos gêneros: “sem jamais deixá-los saturar
por um catálogo dos gêneros”; despir as bordas [onde se começa a amarrar e a se
fechar; problematizar pressuposições que naturalizam ideias] que separam “A” e
“B”, transbordar e dividir os limites “entre”; irrupção do fora no dentro; borda –
o que prende uma coisa à outra; aqui a lei é “louca” – não segue a normalidade;
Clarice Lispector ‘e Hélene Cixous: escrita poética, poema em prosa, “borram as
fronteiras entre gêneros, não se deixam limitar por apenas um. Afinal, poderia a
escrita feminina, em toda sua potência, caber nos limites de um gênero
fechado?” (Luciana Benigno, SOBRE O EU EM PSICANÁLISE: a tecedura de
uma ficção).

Uma escrita, com as mãos cintilantes na escuridão, quando eu


não ousava mais me ajudar, minha escrita tão distante na solidão
pura, tão perto do riacho ressecado de Querite, nem chuva, nem
orvalho, veio incessantemente me pedir perdão, eu a perdoava,
eu pedia perdão, nem alimento, nem corvos. Eu não falava mais,
eu temia minha voz, eu temia a voz dos pássaros, e todos os
chamados que olham de fora, e não há fora, mas apenas o nada,
e se apaga – uma escrita me encontrou quando eu não conseguia
me encontrar. Hélene Cixous sobre seu encontro com a escrita de Clarice
Lispector. https://lucianabenigno.com.br/cixous-clarice-e-a-laranja/

26. romper com naturalização / lógica naturalizante / desnaturalizar oposições:


naturalização é deturpação da “realidade”; aquilo que se nos parece natural
ocorre dentro de um espaço normatizado; atentar para os efeitos da natureza:
desnaturalização ou naturalização; naturalização dos gêneros: fundada em
oposições; ficcional; esquemas que enformam e deformam a realidade;
construção artificial; simetria factícia; rasurar lógica historicizante: teleológica
da história; verdade da produção histórica, história como verdade;
27. enunciados à própria sorte [processos de interpretação, transbordamento,
disseminação, uma perturbação – divisão interna do traço, impureza, corrupção,
contaminação, decomposição, perversão, deformação, cancerização, proliferação
generosa, degenerescência]: “Não misturar os gêneros” (Derrida); “Casamento é
homem e mulher, o resto é par” (Silas Malafaia, https://guiame.com.br/gospel/mundo-
cristao/casamento-e-homem-e-mulher-o-resto-e-par-silas-malafaia )
28. limite se delineia: norma, interdito, ordem x riscos / assombração constitutiva:
impureza; anomalia; monstruosidade, caos;
29. lei do nome / denominação: “ao mesmo tempo um modo de configurar um limite
e também de inculcar repetidamente uma norma” [Butler, 2019, p. 25];
30. lei do gênero / qual? gênero descritivo, constativo, neutro – em que atos de
linguagem;
31. “não misturarei os gêneros” [que se ouve?]: voto de obediência; descrição
constativa;
32. “E se fosse impossível não misturar os gêneros?” ameaça de uma lei de
impureza [anomalia] ou um princípio de contaminação; condição de
possibilidade da lei: uma contra-lei [constitui] por repetição (citação, narrativa –
relato, história);
33. o que se encaixaria num gênero neutro?: neutralidade negativa (nem …
nem), dialética (síntese, antítese, tese); duplamente afirmativa (sim, sim):
Corvo Diaval, corvo e humano; Rainha transformada em cabra / Rainha e
cabra; Duende – “Você é um duende”. “Como ousa me chamar disso? Sou
Lickspittle, o nobre, um servo da rainha” – Duende e servo da Rainha;
Malévola, Rainha, Rainha é Malévola, Malévola é Rainha; “dupla negação
[nem nem] abre passagem a uma dupla afirmação [nietzschiana] (sim, sim);
[Maurice Blanchot, A loucura do dia]: “experimento no viver um prazer sem
limites e terei em morrer uma satisfação sem limites”
34. gênero neutro: se deixa atrair pela lei, se sujeita e foge dela, de quem ela
foge e ama;
35. evita[r] “que se trate o feminino como uma potência geral e genérica, ele tem
sua participação no acontecimento, na performance, no aleatório, no
encontro”;

Rainha de Ulstead, Ingrith (Michelle Pfeiffer)


Sabe o que caracteriza o grande líder, Aurora? A habilidade de
provocar medo nos súditos e depois usar esse medo contra os
inimigos. Então, eu espalhei a história da bruxa má e da princesa
que ela amaldiçoou. Não interessava quem acordou A Bela
Adormecida. Todos ficaram aterrorizados. E a história se tornou
lenda. Sei que acha que sou um monstro. Mas o que eu fiz com
o rei, com Malévola, com o meu filho, eu fiz por Ulstead.

36. Perguntas possíveis para uma pesquisa: Levando-se em consideração que a


identidade de um gênero sempre depende da do outro – que sequer se pode
falar de identidade como algo fixo senão como “participação no
acontecimento, na performance, no aleatório, no encontro”; questiono como
o mal – outro nome possível para o sadismo, como um constituinte do
“eu”/“nós” – circula entre essas personagens, especialmente numa
perspectiva nem negativa (nem … nem) nem dialética, mas afirmativa, e
duplamente afirmativa (sim, sim)? Que tipo de “aliança”, dobra [produtiva –
Foucault / Butler] ou “hymem” as espelha e (de)limita?

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