Aula 1 - Bloco 1

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AULA 01

O Crime do Padre Amaro, Eça de Queirós

Sejam muito bem-vindos a mais uma aula do Clube dos Pensadores,


especificamente a nossa primeira aula sobre "o crime do Padre Amaro", de Eça
de Queirós. Essa obra é um clássico, Eça de Queirós é uma sumidade, peço só
que você preste atenção e leia com cuidado, sem pressa. Por quê? Estamos
tratando de uma obra escrita por um português, então estamos diante do
português de Portugal. Não é uma obra de difícil leitura, mas você vai perceber
ao longo dela algumas distinções de estilo, enfim, com o português com o qual
você está acostumado. Mas nada que dificulte a sua compreensão, nada disso. É
só se permitir viver essa história.

Hoje trataremos dos capítulos 1, 2 e 3. E para quem tem a mesma edição


que a minha, que é a nossa edição aqui do Clube, abra no capítulo 1, página 18.
Na segunda parte da página destaco um trecho, depois avanço para a página 19.
Diz assim:

"— Ora a minha ideia, amigo Mendes, é esta: metê-lo em casa da


Senhora Joaneira! resumiu o cónego com um grande
contentamento. É rica ideia, hem.

— Por causa da Ameliazinha é que eu não sei — considerou


timidamente o coadjutor.

— Sim, pode ser reparado. Uma rapariga nova... Diz que o senhor
pároco é ainda novo... Vossa senhoria sabe o que são as línguas do
mundo".
Aqui é o trecho em que o cônego vai decidir onde o Amaro vai morar. E
ele diz "olha, estou pensando em colocá-lo para morar ali no quarto na casa
da senhora Joaneira" e o coadjutor olha para ele e fala "ôh cônego, é o seguinte:
na casa da senhora Joaneira tem a filha dela. Lá você vai encontrar a filha
dela, a Ameliazinha. Ela é nova e o padre que está chegando é novo. E você
sabe como são as línguas deste mundo". E destaquei esse trecho para dizer a
você que é preciso evitar as línguas deste mundo, mas, principalmente, é
preciso evitar as tentações deste mundo. Quer dizer, ele é novo, ela é nova, na
mesma casa, o dia inteiro, dorme lá, enfim. Para quê isso? E você percebe que a
racionalidade ela tem que se manifestar neste momento, a prudência tem que
se manifestar neste momento. É muito mais fácil uma pessoa super prudente
dizer aqui "olha, como há uma mulher nova, e vai um padre novo, não vou
colocá-los na mesma casa, vai morar em outra casa" e isso sem traumas, sem
brigas, sem tentações, sem nada. Agora, dizer "não, mas o padre vai morar lá e
ele vai conseguir resistir à tentação", quer dizer, para quê eu vou colocar uma
pessoa em tentação? E isso vale para nós também. A prudência ela evita a
tentação. A prudência evita a chance da queda. Porque alguém diz "olha, mas a
oração é não me deixar cair em tentação", pois é.

Mas há uma outra recomendação bíblica para que oremos para que não
entremos em tentação. Então, a ideia é: naquilo que a sua sabedoria permitir,
não namore o erro. Não chegue próximo do erro. "Decidi parar de beber porque
eu me percebi alcoólatra", tudo bem. Decidi parar de beber. Na minha casa não
deve haver álcool, nenhuma bebida de nenhuma natureza. "Ah, não, mas
quando recebo visitas", as visitas devem saber que, na minha casa, não há
álcool. E se eu for servir alguma coisa, eu compro para aquele dia, para aquela
ocasião. Só e tão somente isso. O que fiz aqui? Eu me ajudei a não entrar em
tentação. Há várias atitudes nossas que nos impedem de cair. Não se apoie na
sua própria força para resistir ao mal. Mas afasta-te do mal. Afaste-se do mal.
Veja que aqui há uma oportunidade de evitar um milhão de problemas. E a
gente já começa a ver, nessa primeira parte da obra, que o padre Amaro tinha
uma questão. Ele não sabia realmente se ele queria ser padre. Ele gostava muito
de mulher e ele sofre uma tentação ao ver a Ameliazinha. Quer dizer, para quê
colocar esse padre nessa situação? Este é o nosso primeiro ponto.

Avancemos, por assim dizer. E você que está com a mesma edição que a
minha, abra na página 28. A obra, diz aqui na página 28, na primeira metade, o
seguinte:

"Falaram do seminário.

— Que será feito do Rabicho, o despenseiro? disse o cônego.

— E do Carocho, que roubava as batatas?


Riram; e bebendo, na alegria das reminiscências, recordavam as
histórias de então, o catarro do reitor, e o mestre do cantochão que
deixara um dia cair do bolso as poesias obscenas de Bocage.

— Como o tempo passa, como o tempo passa! diziam."

Destaquei esse trecho para fazer uma recomendação a você: de tempos


em tempos encontre um amigo antigo. Um amigo que você não vê há muito
tempo. Marque algo com ele, saia com ele. Sabe aquele amigo com quem você
se senta há 3, 4, às vezes 10 anos. Pense nele. Diga "olha, vamos sair para jantar,
estou na sua cidade, vamos sair para almoçar?" e aí recordem-se dos fatos de
outrora. Isso faz muito bem ao espírito. Há um saudosismo, mas é um
saudosismo solitário. Porque mostra como na sua adolescência, como na sua
infância, como no início da sua juventude você foi muito feliz. Você viveu
momentos felizes. E é muito legal percebermos isso porque, veja, eu, ontem no
avião, para escrever, com a psicóloga que palestrou em um evento que eu
estava e ela é professora de Harvard, é uma brasileira, dra Luana, acho que é
Luana Marques o sobrenome, não me recordo do sobrenome. Mas ela disse que
para controlar a ansiedade, para a gente ficar menos ansioso, a recomendação
dela é que o sujeito escreva. Mas escreva à mão. Por quê? Porque você tem que
desacelerar o pensamento, já que você não consegue escrever com aquela
velocidade com que você digita no celular ou mesmo no computador.

E ela diz "para desacelerar, escreva!" e eu no avião voltando de Belo


Horizonte, peguei um caderno meu de anotações e comecei a escrever. E então
escrevi o seguinte: coisas boas que me aconteceram hoje. E consegui elencar 10
coisas boas. Coisas pequenas como, por exemplo, tomei um café da manhã
maravilhoso. E realmente tomei. Estava no aeroporto, parei em um lugar e
acertei a mão. O café da manhã era maravilhoso. "Tomei um café da manhã
maravilhoso". Os voos não se atrasaram. E fui anotando as coisas boas que
haviam ocorrido naquele dia, quer dizer, os voos foram pontuais. E eu consegui
ver dez coisas positivas sobre um passado recentíssimo, que havia acabado de
ocorrer. Quando você sai com um amigo você tem essa opção, essa
possibilidade, se recordar das coisas boas que lhes aconteceram ali, na infância,
na adolescência, na juventude, enfim.

Na página 30, faço outro destaque. E faço um destaque no primeiro e no


segundo parágrafo da página 30. Vou lê-lo:

"— Que eu agora, dizia o padre Amaro, ando mais forte. Louvado
seja Nosso Senhor Jesus Cristo, tenho saúde, tenho!

— Ai, Nosso Senhor lha conserve, que nem sabe o bem que é!
exclamou a S. Joaneira. — Contou imediatamente a grande
desgraça que tinha em casa, uma irmã meio idiota entrevada
havia dez anos! Ia fazer sessenta anos... No Inverno viera-lhe um
catarro, e desde então, coitadinha, definhava, definhava".

Quem não tem saúde percebe a bênção que é tê-la. Agradeça a sua
saúde. Agradeça a Deus a sua saúde. Sei que a gente fala "agradeça a Deus por
sua saúde; agradeça pelo trabalho", mas segundo o português formal não seria
"pelo", "por", mas seria diretamente o artigo, "agradeça a saúde a Deus",
"agradeça o trabalho ao Senhor", então você agradece a alguém alguma coisa.
De qualquer sorte, não é o português o nosso tema aqui, é a bênção que é ter
saúde. E você percebe essa bênção muito forte quando você encontra alguém
sem saúde ou quando você se queda enfermo, fica doente. Aí você percebe a
bênção que é ter saúde. Esse já é um motivo para você escrever no seu caderno
das coisas boas que lhe acontecem hoje. Por exemplo, ter saúde. "Hoje não
estou doente, hoje estou são". Essa é uma bênção muito grande.

No capítulo 3, bem no início, na página 32, faço um destaque no início e


um pouquinho no fim da página avançando até a 33. Vou ler esse destaque e
você vai compreendê-lo. Diz assim:

"Amaro Vieira nascera em Lisboa em casa da senhora marquesa


de Alegros. Seu pai era criado do marquês; a mãe era criada de
quarto; quase uma amiga da senhora marquesa. O pai de Amaro
tinha morrido de apoplexia; e a mãe, que fora sempre tão sã,
sucumbiu, daí a um ano, a uma tísica de laringe. Amaro
completara então seis anos".

Ele perde com 5 anos o pai, ele perde com 6 anos a mãe. Órfão de pai e
mãe. Pobre, criado na casa do patrão dos pais. Deu a sorte - ou a misericórdia -
de ter uma mulher que era a patroa de sua mãe que decidiu, de certa forma, a
cuidar dele. Mas por que destaquei isso? As pessoas que você vê têm uma
história que você não vê. Não seja tão duro com elas. As pessoas que você
conhece passam por lutas que você desconhece. Seja gentil com elas. Às vezes,
uma pessoa no seu trabalho, está sentado do seu lado, o dia inteiro, e você não
sabe a amargura no coração daquela pessoa, o problema pelo qual ela tem
passado. Às vezes, é um parente doente, às vezes é um divórcio, às vezes é a
descoberta de uma traição, às vezes é uma mentira, é um aperto, é uma
pressão, é uma ameaça. Você não sabe. Às vezes é a história de vida. A pessoa
está lá e você não sabe de onde ela vem, às vezes ela perdeu o pai com 5 anos,
perdeu a mãe com 6. Às vezes ela nunca conheceu o pai. E você está ali com ela,
você diz que a conhece, mas a pessoa que você conhece tem uma história que
você desconhece. Ou a pessoa que você conhece está passando por uma
situação que você desconhece. Porque você não é Deus. E você pode me dizer
"é claro que desconheço porque não sou Deus", mas a minha recomendação
não é que você seja Deus, é que você seja filho de Deus. E, sendo filho de Deus,
ame o próximo como a si mesmo. E, sendo filho de Deus, aprendei de mim, diz
o Senhor, que sou manso e humilde de coração. Porque todo o embasamento
do cristianismo vai dizer "se alguém lhe der uma tapa na face, ofereça a outra",
"se alguém lhe tomar a túnica, dê-lhe, também, a capa", "se alguém lhe
obrigar a andar uma milha, vai com ele duas", o que significa dizer que não
preciso compreender a luta na vida do outro para ser gentil, para ser educado,
para ser cortês, para ser solidário, para ser amigo, para ser um imitador do Cristo,
para aqueles que são cristãos. Para aqueles que não são, tudo isso é aplicável,
ainda que filosoficamente. As pessoas que você conhece passam por dores, por
dificuldades que você desconhece.

Avancemos aqui para a página 35. Faço um destaque na segunda metade


da página 35. Vou lê-lo:

"Amaro foi mandado para casa do tio, para a Estrela. O merceeiro


era um homem obeso, casado com a filha dum pobre empregado
público, que o aceitara para sair da casa do pai".

Então a mulher que casou com o tio, casou com ele porque queria sair da casa
do pai.

"...onde a mesa era escassa, ela devia fazer as camas e nunca ia ao


teatro".

Olha a realidade da vida de solteira da agora esposa do tio. A mesa era


escassa, já passava fome por vezes. Ela tinha que arrumar a casa e ela nunca ia
ao teatro, não tinha atividade alguma. Basicamente o seguinte: serviços
domésticos, com fome, sem ter nenhuma atividade de lazer.

"Mas ela odiava o marido, as suas mãos cabeludas, a loja, o bairro,


e o seu apelido de Sra. Gonçalves. O marido, esse adorava-a como
a delícia da sua vida, o seu luxo; carregava-a de joias e
chamava-lhe a sua duquesa".

Destaquei esse tema para dizer a você que, às vezes, o casamento é uma
fuga. Às vezes o casamento é uma fuga. Não é por amor, nem por nada, é por
sobrevivência. O que o Eça de Queirós está nos dizendo aqui? Ele está dizendo
que essa mulher casou com esse cara, ela nem queria se casar. Ela nem gostava
dele. Ela tinha até nojo dele. Uma mão peluda, um cara meio asqueroso. E ela
topa. E ela topa para fugir da casa do pai. Porque lá a mesa era escassa, ela tinha
que arrumar a sua cama e não podia ir ao teatro. Mesa escassa, ou seja, ela
passava fome. Tinha que arrumar sua casa significa que ela tinha que fazer os
trabalhos domésticos. Passava fome, tinha que fazer os trabalhos domésticos e
não podia ir ao teatro. Ou seja, não tinha um momento de lazer, um momento
de cultura, nada. E ela se casa para fugir daquele ambiente. Casamento pode
ser uma fuga. O casamento pode ser a fuga de alguém que morava em um lar
completamente desestruturado, com violência moral, psicológica, por vezes
física. Ou em condições paupérrimas. E que encontrou no casamento um meio
de se salvar. A gente só torce para que, quando isso ocorrer, ocorra o que Mrs.
Oswald diz em "a mão e a luva", de Machado de Assis": o amor pode nascer da
convivência. Então, que o amor, para esses casos, nasça da convivência - o que
não foi o caso aqui.

Avanço para a página 36. Na página 36 faço um destaque no início e até a


metade. Diz assim:

"De resto detestavam-no; a tia chamava-lhe o cebola e o tio


chamava-lhe o burro. Pesava-lhes até o magro pedaço de vaca
que ele comia ao jantar. Amaro emagrecia, e todas as noites
chorava. E o rapaz desejava o seminário, como um libertamente".

Aqui é português de Portugal. Nós diríamos "E o rapaz desejava o


seminário, como uma libertação". Mas deixa te dizer uma coisa: quantos
traumas nossa adolescência nos trouxe para que nós enxergássemos, na vida
adulta, a libertação? Já pensou nisso? Às vezes, a pessoa passou por cada
situação dentro de casa que ela nem considerou o casamento como uma fuga,
poderia ser. Mas ela falou assim "gente, na hora em que eu ganhar o meu
dinheiro, vou sair de dentro de casa", "na hora que eu ganhar meu dinheiro,
vou morar sozinho", "não aguento isso aqui", lá na casa do tio ele era
maltratado, ele era humilhado, ele era xingado, ele passava fome, até o pedaço
de carne que davam a ele era um peso para eles. Ele emagrecia, ele chorava
todas as noites, estou diante de um sujeito deprimido. Estou diante de um
sujeito doente. E essa doença, esse momento, essa opressão, isso tudo faz com
que ele diga assim "gente, não quero viver assim. Quero ir para o seminário".
Ele viu o seminário como uma fuga. Esse não foi o homem de bem, bem
tratado, equilibrado, em uma casa harmoniosa, que disse "quero ser padre
porque entendo que essa é minha vocação". Este foi o homem sofredor,
humilhado, com fome, sem pai, sem mãe, sem dinheiro, sem história, que
pudesse lhe abrir portas e que viu no seminário a sua salvação. Às vezes, a idade
adulta é vista por nós como uma salvação.

Página 39. Destaco uma pequena frase. Diz assim:

"Invejavam todos os destinos livres, ainda os mais humildes".

Esse é sobre os adolescentes seminaristas. Quem não tem liberdade


inveja a liberdade de quem tem. Os seminaristas viam as pessoas livres fora do
seminário e eles invejavam essas pessoas. Ainda que essas pessoas fossem mais
humildes. Quando você não tem liberdade - ali está tratando de um
adolescente, que não queria estar no seminário, etc. Diferente de uma pessoa
que decide, de forma madura "quero ser seminarista, quero ser padre, quero ser
frei", etc. Aí a pessoa pode optar pelo caminho dela, está tudo certo. Mas a
pessoa quando ela se vê privada do exercício de sua liberdade, então, isso você
vai perceber não só na liberdade física, mas às vezes na liberdade de
pensamento, na liberdade de opinião. E quando você se vê cerceado disso, você
inveja quem pode falar. Pense em um casamento em que a mulher é casada
com um homem milionário que a oprime. Ela não pode sair de casa, ela não
pode fazer isso, ela não pode falar aquilo, ela não pode se vestir assim, é uma
opressão. Ela tem uma amiga que casou com um sujeito que é servidor público.
Eles saem juntos, eles viajam juntos, ela também sai sozinha, ela tem os seus
programas e eles são um casal que se dão bem. Ela tem liberdade. Essa mulher,
que é casada com um multimilionário, ela inveja a outra pela liberdade. E
suponhamos que as duas estejam fazendo tudo corretamente, não há nada de
imoral, nada de incorreto. Quem não tem liberdade, inveja a liberdade de quem
tem. Não abra mão da liberdade. Mas a liberdade é fazer o que você acha que é
o certo. Não é seguir o seu prazer não. Não confunda liberdade com
libertinagem.

Na página 43 faço um destaque, no final do parágrafo que inicia a página,


que diz assim:

"Emagrecia, tinha suores éticos: e mesmo no último ano, depois do


serviço pesado da Semana Santa, como começavam os calores,
entrou na enfermaria com uma febre nervosa".

Isso aqui é o Amaro, no fim do seminário. As pessoas que conhecemos


passam por lutas que desconhecemos. Sejamos gentis. Quando você está preso
em um lugar que você não gostaria de estar, em que você não gostaria de estar,
aquilo vai te sufocando e não se engane: a ansiedade, a depressão, a tristeza, a
angústia, ela vai se expandir para além da mente e vai se manifestar em
sintomas físicos. Que é a ideia do psicossomático, que é você manifestar, então
ele entra com febre, ele está com calor, ele está suando, ele está tremendo, ele
está com taquicardia, todos os sintomas de uma ansiedade. Então, é preciso
cuidar da mente para que esta mente não adoeça o corpo. E cuidar da mente é
respeitar o desejo do seu coração, quando ele é lícito, correto, puro e sábio. E faz
parte da sabedoria você fazer ou exercer o trabalho que lhe faz bem. Porque se
você exercer um trabalho que lhe faz mal, o trabalho pode ser bem feito, mas
você é que será mal feito. O trabalho pode ser executado, você que ficará
doente. Então, se isso está acontecendo com você, tenha um plano de
mudança. Porque a esperança de sair de onde você está vai lhe dar forças para
resistir ao mal que lhe acomete neste momento, para ser maior do que ele e,
enfim, um dia, superá-lo completamente.

Na página 49 faço um destaque que se estende até a página 50. É um


destaque um pouco longo, peço que você preste atenção. Último parágrafo. Diz
assim:
"— É verdade, disse o ministro, mas essas colocações nas boas
paróquias devem naturalmente ser recompensas dos bons
serviços. É necessário o estímulo...

— Perfeitamente, replicou o conde; mas serviços religiosos,


profissionais, serviços à Igreja, não serviços aos governos".

Quer dizer, a boa paróquia tem que ser uma retribuição ao serviço
prestado pelo pároco. E o conde vai dizer que tudo bem, mas é um serviço
prestado à igreja, um serviço profissional, um serviço religioso, não um serviço
prestado ao governo, não a uma politicagem.

"O homem das soberbas suíças negras teve um gesto de objeção.

— Não acha? perguntou-lhe o conde.

— Respeito muito a opinião de vossa excelência, mas se me


permite... Sim, digo eu, os párocos na cidade são-nos dum grande
serviço nas crises eleitorais. Dum grande serviço!

— Pois sim. Mas...

— Olhe vossa excelência, continuou ele, sôfrego da palavra. Olhe


vossa excelência em Tomar. Por que perdemos? Pela atitude dos
párocos. Nada mais".

Destaquei esse trecho para mostrar a você que desde sempre, em um


sistema, não somente democrático, mas isso fica mais evidente em um sistema
democrático, a igreja tem um papel muito forte na política. A gente discute
muito hoje sobre o papel da igreja e o papel do estado, porque, afinal de contas,
o estado é laico, e eu sou a favor do estado laico, não acho que o estado tenha
que ter uma religião oficial, nada disso, mas veja que a influência da igreja é
desde sempre. Então quando você olha para as eleições do Brasil e fala assim
"gente, está tendo uma interferência religiosa muito grande, essa interferência
religiosa é uma novidade", não. Não é novidade. Isso acontece desde sempre.
Porque quem tem o poder o utiliza. Quem tem o poder, faz dele uso. Quem
pode influenciar, influencia. De maneira que ele vai dizer "olha, a gente perdeu
em Tomar por causa dos párocos", então o pároco, se ele tem que subir dentro
da igreja por uma influência política externa, é preciso que ele tenha prestado
um bom serviço ao governo. Porque se não o governo não vai ajudá-lo. E você
começa a ver uma relação que é uma relação muito ruim porque o pároco, em
vez de subir pelos serviços religiosos, ele sobe por uma influência política. E aí
você vai ter nas melhores paróquias, digamos assim, maiores, nas que ficam nos
grandes centros, nas que tem maior influência, párocos mais políticos. E, talvez,
os melhores estejam escondidos.
Na página 59 faço o último destaque da aula. É um trecho grande que
começa, na verdade, na 58, e vamos refletir sobre ele. Na verdade, não é que é
um trecho grande, é que destaco frases avulsas ao longo da página 59. Então
preste atenção:

"— Senhor ministro, eu agradeço...

— À senhora condessa, à senhora condessa, disse o ministro


sorrindo.

Amaro daí a uma semana soube o seu despacho.

Um dia, ao amanhecer, depois de grandes abraços da tia, partiu


para Santa Apolónia".

O Amaro queria sair da paróquia que estava porque a paróquia em que


ele estava não era a paróquia em que ele gostaria de estar. Então ele vai lá, não
é uma prima, não é uma irmã, é a filha da patroa de sua mãe que havia se
casado com o conde, um homem de muita influência, e ele pede a interferência
do conde para que ele fosse transferido de paróquia, porque ele estava era
muito, muito ruim. E Amaro era um homem honesto e tal. Mas pediu que ela o
ajudasse. E, então, ela vai ajudá-lo e ele consegue, com essa ajuda, a
transferência. Destaquei esse ponto para dizer o seguinte para você: essa
transferência de Amaro para outra igreja nos mostra o poder da influência, o
poder das amizades, o poder dos contatos, mesmo para pessoas honestas.
Mesmo para pessoas honestas. O que me autoriza a dizer que você deve
procurar, esse é o ponto, você deve procurar aumentar a sua rede de contatos.
Você não precisa ser um interesseiro, você precisa ser uma pessoa interessante.
O Tiago Brunet fala isso. Você não precisa ser uma pessoa interesseira, você
precisa ser uma pessoa interessada. E uma pessoa interessada se torna uma
pessoa interessante. Você precisa fazer amizade. E você precisa fazer amizade
pensando em se doar, não em receber. Você vai receber, mas você precisa
pensar em se doar. Como fazemos isso? Como resolvemos isso? A gente resolve
isso saindo de casa. Saia de casa, faça amizades, converse com pessoas, se ligue
às pessoas, aumente a sua rede de contatos. Você é uma pessoa honesta,
continue sendo uma pessoa honesta, mas saiba: essas ligações, esses contatos e
essas amizades vão ajudá-lo ao longo da vida. De um jeito ou de outro. Faça
amigos. Isso vai fazer a sua vida muito melhor.

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