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Obra originalmente publicada sob o título:

La práctica educativa: cómo enseñar


© Editorial Graó, de Serveis Pedagògics, 1995
ISBN 84-7827-125-2

Capa:
Mário Röhnelt

Preparação do original:
Alda Rejane Barcelos

Supervisão editorial:
Letícia Bispo de Lima

Editoração eletrônica:
Formato Artes Gráficas

Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à


ARTMED® EDITORA S.A.
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90040-340 Porto Alegre RS
Fone (51) 3027-7000 Fax (51) 3027-7070

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5
A organização
social da classe

O PAPEL DOS AGRUPAMENTOS

Historicamente, a forma mais habitual de preparar as pessoas


mais jovens de qualquer grupo social para sua integração na cole-
tividade tem sido através de processos geralmente individuais,
seja em casa ou no campo por parte dos pais, seja nas oficinas por
parte de mestres artesãos. As classes mais privilegiadas tinham
acesso a outros tipos de aprendizagens, como a leitura, a escrita ou
outros saberes, mas sempre se tratava de uma formação individua-
lizada. A maioria das aprendizagens era o resultado de atividades
cotidianas. Quando chega o momento em que se considera necessário
generalizar o ensino da leitura, da escrita e da denominada “cultura
geral” para outras camadas sociais, é que se coloca a necessidade de
resolver o problema de como ensinar ao mesmo tempo a um número
máximo de alunos.
É assim que nascem as primeiras formas de agrupamento. Em fins
do século XVI, se define uma das formas para organizar os alunos, que se
tornará habitual praticamente até nossos dias: grupos de cinqüenta a
sessenta alunos do mesmo sexo e da mesma idade situados numa mesma
aula e dependentes de um professor/tutor ou de diversos professores.
Toda escola, e mais quanto mais pretensões de “qualidade” tenha, dará
ênfase em destacar a estrutura organizativa em grupos homogêneos e
graduados. Nos núcleos de população com um número reduzido de
alunos se aceitam, embora como algo negativo, outras formas organi-
zativas diferentes, sempre dentro do grande grupo, neste caso hete-
rogêneo. As relações e a organização social neste modelo são bastante
simples. O grande grupo atua como um todo, como soma de pessoas
selecionadas previamente segundo certos critérios uniformizadores:
sexo, nível, capacidades... O grande grupo e a estrutura social têm a
112 / ANTONI ZABALA

função de solucionar fundamentalmente os problemas de ordem e


disciplina. As relações no grupo se articulam como uma fórmula para
favorecer a comparação e a competição “estimuladora” (divisão em
“romanos” e “cartagineses”, êmulos, atos públicos de distribuição de
notas, quadros de honra, etc.).
Em fins do século XIX e no começo do XX, começam a surgir
de forma apreciável outras formas de organização da escola e
das aulas que rompem com este modelo único. Estruturação das aulas
em grupos fixos e móveis, equipes de trabalho, grupos homogêneos e
heterogêneos, oficinas, “cantos”, estudos individualizados, etc. O
surgimento de diferentes modelos organizativos é a resposta às novas
inquietações no ensino, às diferentes concepções educativas e aos
conhecimentos psicopedagógicos. Defende-se o trabalho em equipe
como meio para promover a socialização e a cooperação, para poder
atender aos diferentes níveis e ritmos de aprendizagem, para resolver
problemas de dinâmica grupal, para tornar possível a aprendizagem
entre iguais, etc.
Neste capítulo descreveremos as formas mais genéricas de organi-
zação social nas escolas a partir de referenciais de análise que nos
permitam reconhecer as possibilidades de cada uma das opções. Desta
maneira poderemos dispor de critérios para selecionar, em cada momen-
to, a forma de agrupamento mais adequada a nossas intenções educacio-
nais. Analisaremos os motivos que as justificam e os critérios para avaliá-
las e a seguir trataremos, com estas mesmas proposições, as variáveis
metodológicas do tempo e do espaço.

FORMAS DE AGRUPAMENTO

Uma revisão das formas de organização grupal nos permite fazer


uma classificação mais ou menos esquemática das diferentes maneiras de
agrupar os meninos e meninas em classe.
Nesta classificação podemos observar que as diferenças mais
características das diversas formas de agrupamentos estão determinadas
por seu âmbito de intervenção: grupo/escola e grupo/classe; e em cada
uma delas conforme o trabalho seja realizado com todo o grupo ou com
grupos ou equipes fixos ou móveis. E também deve se precisar, nos dois
âmbitos, se os critérios que se utilizaram para estabelecer estes agrupa-
mentos foram a homogeneidade ou a heterogeneidade dos mesmos em
relação a considerações de sexo, nível de desenvolvimento, conhe-
cimentos, etc. (Quadro 5.1.)
A PRÁTICA EDUCATIVA / 113

Quadro 5.1
Agrupamento homogêneos heterogêneos
grande grupo x
grupos/classe fixos x x
Escola grupos/classe móveis x x
como grande grupo x x
grupo equipes fixas x x
equipes móveis x x
individual

Em primeiro lugar temos o grupo/escola como primeira configuração


grupal da escola, grupo que em toda escola tem uma forma e estrutura
social determinada. Neste primeiro âmbito encontramos atividades que
se realizam em diferentes tipos de agrupamento: o grande grupo em
atividades globais da escola, assembléias, atividades esportivas ou cul-
turais, etc.; o grupo/classe, que geralmente implica grupos fixos de idade,
embora em alguns casos sejam móveis e, portanto, os componentes
variam conforme a atividade a ser desenvolvida, a área ou a matéria:
oficinas, atividades facultativas, níveis, etc.
No âmbito do grupo/classe encontramos atividades de grande grupo:
exposições, assembléias, debates, etc.; atividades organizadas em equipes
fixas: organizativas, de convivência, de trabalho, etc.; atividades em equi-
pes móveis de dois ou mais alunos: investigações, diálogos, trabalhos ex-
perimentais, observações, elaboração de dossiês, “cantos”, etc.; ativida-
des individuais de exercitação, aplicação, estudo, avaliação, etc.

DESCRIÇÃO E AVALIAÇÃO DAS DIFERENTES


FORMAS DE AGRUPAMENTO

Como qualquer uma das outras variáveis metodológicas, as dife-


rentes tendências de organização social das instituições educacionais e da
classe têm sido determinadas mais pelo costume e pela história do que
por uma reflexão fundamentada das opções escolhidas em cada mo-
mento. Assim, encontramos escolas e professores que mantiveram a todo
custo os modelos herdados, e outros que foram mudando, quase de
forma compulsiva, conforme as tendências do momento. E em ambos os
casos se fazem desqualificações globais das opções contrárias. Em nossas
escolas, infelizmente, não tem sido freqüente dispor de espaço e tempo
para a reflexão serena, fato que não contribui para a análise constante,
profunda e desapaixonada que uma tomada de decisão tão complexa
merece. Como veremos, e esta pode ser a conclusão fundamental, cada
114 / ANTONI ZABALA

uma das opções organizativas comporta determinadas vantagens e


determinados inconvenientes, certas possibilidades e certas potencial-
idades educativas diferentes. De algum modo, nós, educadores, temos
em mãos alguns instrumentos educativos que não são nem bons nem
maus em si mesmos, mas que são basicamente ferramentas que podem
ser adequadas para satisfazer determinadas necessidades educativas.
Nossa tarefa consiste em conhecer estas potencialidades didáticas, sem
renunciar, por princípio, a nenhuma delas, e utilizá-las
convenientemente quando for necessário.

A escola como grande grupo


As características da organização grupal neste âmbito estão deter-
minadas, em primeiro lugar, pela organização e pela estrutura de gestão
da escola e, em segundo lugar, pelas atividades que toda a escola realiza
de forma coletiva, as quais, apesar de serem bastante limitadas, são
cruciais para o sentimento de identificação pessoal com a escola, tanto
por parte dos alunos como dos professores.
Portanto, são instrumentos ou ferramentas formativas de todo o
grupo/escola as atividades vinculadas à gestão da escola, que confi-
guram determinadas relações interpessoais, uma distribuição de papéis e
responsabilidades e um diferente grau de participação na gestão. E
também o são as atividades gerais da escola, de caráter cultural, social e
esportivo, de natureza interna e de difusão exterior, quer dizer, dirigidas
aos familiares dos alunos ou abertas a setores mais amplos da comuni-
dade, do bairro ou cidade. Assim, pois, é preciso distinguir entre as
atividades com participação de toda a escola e as que são conseqüência
da maneira de gerir esta escola.

Atividades gerais da escola


Durante o ano, a maioria das escolas organiza uma série de ativi-
dades que em geral são de caráter social, cultural, lúdico ou esportivo. As
principais diferenças entre as escolas estão associadas à abrangência e à
finalidade destas atividades. Portanto, há algumas que são do grupo e
para o grupo, quer dizer, de caráter interno, e outras que estão abertas a
outras coletividades. Em relação à função ou finalidade, encontraremos
atividades para o prazer, a motivação, a promoção externa, a demons-
tração e o compromisso.
Todas as atividades de grupo/escola, se são satisfatórias, potenciali-
zam o sentimento de pertinência e de identificação com o grupo, a auto-
estima coletiva. Portanto, promovem atitudes de compromisso e respon-
sabilidade para com os demais e também reforçam o estímulo e a
motivação em relação aos projetos da escola, entre eles os que estão
A PRÁTICA EDUCATIVA / 115

relacionados com a formação e o estudo. Esta identificação também


envolve a adoção ou a rejeição dos valores do grupo, constituindo então
um dos meios mais valiosos para promover a aprendizagem de
conteúdos de caráter atitudinal.
Esta potencialidade obriga a avaliar com muita atenção as carac-
terísticas das atividades que se propõem. Em muitos escolas existe uma
contradição paradoxal: algumas, por exemplo, apesar de terem uma
declaração de intenções não-consumistas, promovem festas, represen-
tações ou comemorações, em que é imprescindível a compra de fantasias
ou vestidos caros e inúteis para outras atividades; outras fazem manifes-
tações cooperativas e anticompetitivas e, em troca, seguido organizam
concursos, competições e jogos com prêmios; há as que, apesar de se
definirem como não-sexistas, não levam em conta este aspecto ao atribuir
papéis de ambos os sexos nas representações, nas atuações ou nos
brinquedos e também há as que fazem declarações de “humildade” e
organizam grandes atos que basicamente são manifestações publicitárias.
Também encontraremos escolas em que muitas destas atividades
gerais ocorrem no exterior ou estão dirigidas para o exterior: atividades
de participação em festas ou atividades culturais de bairro, visitas a
campos de trabalho, atividades de pesquisa social, serviços para a
comunidade (coleta e reciclagem de papel, oferecimento das instalações
escolares, etc.). Trata-se de atividades que demonstram o compromisso
social da escola e que constituem a forma mais coerente, e portanto mais
formativa, de responder a certas finalidades educacionais vinculadas a
valores como a solidariedade, o respeito, o compromisso, etc.
Que critérios utilizaremos para avaliar estas atividades? Como em
todas as experiências que os alunos vivem, deveremos nos perguntar que
aprendizagens promovem. Temos que nos perguntar que conteúdos
conceituais, procedimentais e sobretudo atitudinais são trabalhados em
cada uma das atividades e relacioná-los com as finalidades educacionais
que promovem. Uma vez mais, a análise dos conteúdos da
aprendizagem deve nos permitir chegar a conclusões sobre a função
social do ensino que a escola tem e sobre a capacidade de incidência
formativa que estas atividades têm.

Tipo de gestão da escola


A estrutura e a organização da escola como grupo se define pelo tipo
de organograma da escola e, portanto, pelo grau de envolvimento e
atribuição de responsabilidades dos professores e dos próprios alunos. O
funcionamento está determinado pelo regimento da escola, que define os
papéis dos diferentes segmentos que compõem a comunidade escolar.
A distribuição de papéis e de responsabilidade que ocorre na escola
pode ser resultado de uma análise exclusivamente pragmática, efetuada
116 / ANTONI ZABALA

unicamente com critérios relativos às necessidades de dinamização,


organização e desenvolvimento das diferentes tarefas de uma instituição
com funções complexas. Ou, pelo contrário, pode responder a uma
concepção que tem presente que a própria estrutura organizativa e as
relações que define se convertem em instrumentos educativos de
primeira ordem ao oferecer imagens, e sobretudo vivências, que marcam
a maneira de entender o que são ou o que têm que ser as organizações
sociais e a forma como se distribuem os deveres e os direitos de cada um
de seus membros. Este funcionamento também define determinadas
relações interpessoais, uma maneira de conceber as relações de trabalho,
que podem ser de ajuda, de colaboração, de confiança ou exatamente o
contrário. Uma gestão mais ou menos colegiada ou compartilhada,
monitorias coordenadas ou não, certas decisões em equipe ou
individuais, etc., vão incidindo de maneira imperceptível, mas profunda,
no pensamento e nos valores dos alunos.

O diferente grau de participação na gestão


Se a estrutura organizativa é central no oferecimento de pautas e
modelos de gestão e atribuição de responsabilidades, o grau e a maneira
em que os diferentes segmentos da comunidade escolar participam nas
decisões da escola são igualmente básicos na formação dos alunos. É
especialmente importante o papel que os meninos e meninas devem
desempenhar na definição das normas ou regras de convivência da
escola.
Toda escola é regida por determinadas normas que permitem o
funcionamento da coletividade. A disciplina necessária, o respeito mútuo
e as relações de convivência devem ser garantidas por normas que
regulem as atuações de todos os membros. As diferenças entre escolas
não apenas afetam os diversos tipos de normas, como também afetam
quem as promove ou estabelece, quem vela por seu cumprimento e quem
julga a validade de sua aplicação. Assim, de certo modo, aplicando a
distribuição de poderes de Montesquieu, poderíamos nos perguntar:
quem ostenta o poder legislativo, o executivo e o judiciário na escola?
Certamente encontraremos diferentes graus de participação dos alunos
nestes “poderes”, mas, dada a tradição escolar, é lógico que na maioria
dos casos serão os professores ou a equipe diretiva que utilizarão a
capacidade de legislar, executar e julgar na escola.
Chegando a este ponto, podemos fazer uma avaliação educativa das
normas que regulam o funcionamento cotidiano da escola e de como são
postas em prática. Em muitas escolas já é habitual encontrar declarações
de princípios que consideram como função básica a formação de cida-
dãos democráticos capazes de atuar com autonomia e responsabilidade.
Portanto, se trata de escolas que têm considerado como conteúdos de
A PRÁTICA EDUCATIVA / 117

aprendizagem os valores e as atitudes democráticas, o espírito crítico, a


responsabilidade pessoal, a aceitação das opiniões dos demais, a
autonomia de pensamento e outros conteúdos de caráter atitudinal.
Como já vimos no segundo capítulo, a forma de aprender estes
conteúdos comporta um trabalho na escola que consiste funda-
mentalmente na realização de experiências que nunca são pontuais e
episódicas, mas atividades continuadas, centradas em modelos em que se
vivem estes valores e estas atitudes. Nestes casos, as recomendações ou
imposições praticamente são inúteis. Por outro lado, é necessário que os
meninos e meninas convivam num ambiente em que aqueles valores
impregnem todas as atuações. Dificilmente um aluno ou uma aluna pode
ser responsável e aceitar as idéias dos outros se não se exercitou em
modelos que lhe obriguem a atuar sob estes princípios. Para ser coerente
com objetivos desta magnitude é necessário que as decisões que são
tomadas na escola, as normas de convivência que a regem e, sobretudo, a
maneira de estabelecê-las e administrá-las estejam em consonância com
as finalidades educacionais a que se propõem. Não há duvida de que são
o instrumento mais poderoso que temos em nossas mãos para formar os
meninos e meninas nestes valores. Se a opção da escola é a formação
integral da pessoa e um dos objetivos é a educação nestes valores
democráticos, haverá que incluir instâncias e processos que permitam
que o aluno conheça progressivamente as regras do jogo de uma
sociedade democrática e, especialmente, que saiba atuar e defendê-la. O
julgamento e a revisão das normas da escola, as eleições de represen-
tantes, as assembléias de alunos ou da escola, se convém, e, finalmente,
todas aquelas formas que permitem que os meninos e meninas aprendam
a participar responsavelmente numa coletividade são os meios educati-
vos que possibilitam a formação nesta faceta capital da personalidade.
Longe de se configurar como um elemento estritamente estrutural, o
âmbito escola ou grupo/escola, sua gestão e a possibilidade que oferece a
seus membros de participar responsavelmente surgem como o marco
formativo que irá concretizar-se depois no âmbito mais restrito do
grupo/classe, que será objeto de nossa atenção a seguir.

Distribuição da escola em grupos/classe fixos


Esta é a maneira convencional de organizar os grupos de alunos nas
escolas. Trata-se de agrupamentos de 20 a 40 (ou inclusive mais) meninos
e meninas de idade similar, que durante um ou mais anos trabalham as
mesmas áreas ou matérias e terão os mesmos professores.
O fato de que seja a fórmula mais corrente para agrupar os alunos
criou uma tradição, um conhecimento e certas habilidades que dificultam
a aceitação de fórmulas de organização radicalmente diferentes. No
118 / ANTONI ZABALA

entanto, é preciso analisar as vantagens e os inconvenientes para poder


aproveitar os pontos positivos e resolver as deficiências que apresenta.
Antes de mais nada, gostaria de considerar a opção de homogeneidade
ou não destes grupos.
Nas escolas que têm que formar mais de um grupo/classe por série,
devido ao elevado número de alunos, uma das dúvidas mais freqüentes
que se coloca é a conveniência ou não de agrupá-los conforme os níveis
de desenvolvimento ou de conhecimentos, ou fazê-lo heterogeneamente.
Se nossa finalidade se limita à realização de determinadas capacidades
de caráter cognitivo e se consideramos que a função do ensino é seletiva,
a distribuição por grupos/classe homogêneos favorecerá a tarefa do
ensino, posto que não haverá tantas diferenças entre os alunos. Agora,
inclusive neste caso, o conhecimento que temos dos processos de ensino/
aprendizagem nos obriga a avaliar uma série de condições que não se
dão da mesma maneira nos grupos homogêneos, por exemplo, a apren-
dizagem entre iguais, o contraste entre modelos diferentes de pensar e
atuar e o surgimento de conflitos cognitivos, a possibilidade de receber
ajuda de colegas que sabem mais, etc. Todos estes fatores nos levam a
considerar a conveniência de que os grupos/classe fixos tenham que ser
heterogêneos.
No caso de que a opção escolhida seja a formação integral e que se
centre tanto nas capacidades cognitivas como nas capacidades de
equilíbrio pessoal, de relação interpessoal e de inserção social, as formas
de agrupamento que não se baseiam na diversidade são improcedentes.
Embora os conflitos aumentem devido à existência de níveis, culturas e
interesses diferentes, sabemos que as aprendizagens são possíveis
precisamente graças a estes conflitos. Para que os meninos e meninas
possam reconhecer suas possibilidades e limitações, saibam aceitar-se,
possam entender e respeitar a diferença, possam satisfazer as diferentes
necessidades pessoais, sejam capazes de relacionar-se com os demais e
ajudá-los, etc., deverão ter vivido situações, problemas e conflitos que
tenham podido aprender a resolver com ajuda da professora ou do
professor e dos outros companheiros e companheiras.
Aceitando a conveniência da heterogeneidade do grupo/classe fixo,
revisaremos a seguir as vantagens e os inconvenientes que oferece.
Independentemente das razões de facilidade organizativa, o motivo
primordial que o justifica é o fato de oferecer aos meninos e meninas um
grupo de colegas estável, favorecedor das relações interpessoais e da
segurança afetiva. As outras vantagens estão relacionadas com o fato de
que é a forma em que usualmente se têm organizado as escolas, de tal
maneira que o maior número de propostas, materiais e recursos
didáticos, assim como de estudos realizados, parte do pressuposto do
grupo/classe fixo. Ao mesmo tempo, é uma organização adequada à
estrutura espacial das escolas, entendida pelas famílias e pelo resto da
A PRÁTICA EDUCATIVA / 119

coletividade, e baseada em certas tradições consolidadas de gestão da


distribuição do trabalho docente.
Os inconvenientes dos grupos/classe fixos estão condicionados pela
rigidez que lhes é atribuída, já que correm o risco de fechar-se em si
mesmos. Por outro lado, embora se tenha buscado a heterogeneidade, se
os alunos têm a mesma idade ainda são muito iguais e isso envolve o
perigo de que os processos sejam analisados em relação a um grupo
típico (3º do ensino fundamental, 2º do médio...) e no referencial
temporal de uma série. Estes perigos e riscos podem ser neutralizados, ao
menos em parte, com uma organização por ciclos de mais de uma série.
Isto permite criar equipes de professores de ciclo com proposições mais
amplas e globais do desenvolvimento dos alunos, ao mesmo tempo que
se facilita a realização de atividades que rompam a rigidez do grupo/
classe/série.

Distribuição da escola em grupos/classe móveis ou flexíveis


Entendemos por grupo/classe móvel o agrupamento em que os
componentes do grupo/classe são diferentes conforme as atividades,
áreas ou matérias e que pode chegar a ter professores diferentes para
cada aluno.
Esta configuração é bastante habitual em escolas que trabalham
mediante créditos com conteúdos ou matérias opcionais. Segundo este
sistema, cada aluno pertence a tantos grupos quantas matérias ou
atividades diferentes configurem seu percurso ou itinerário escolar.
Também é habitual nas escolas que trabalham com oficinas abertas a
todo um ciclo ou uma etapa, embora neste caso a estrutura básica
continue sendo o grupo/classe e, em alguns momentos determinados, os
meninos e meninas vão a oficinas diferentes. Portanto, trata-se de
oficinas em que encontramos alunos de diferentes idades e que
pertencem a diversos grupos/classe.
A razão fundamental que deu origem a esta forma organizativa foi a
preocupação em atender aos diferentes interesses e capacidades dos me-
ninos e meninas. E atendê-los fundamentalmente por dois motivos: num
caso, quando favorece que cada aluno possa construir um itinerário esco-
lar o mais personalizado possível, ao poder optar por matérias diferentes
conforme seus interesses; e em outro, quando a distribuição é dada pelo
grau de conhecimentos, de tal modo que, diante de um mesmo itinerário
para todos, a designação para um grupo ou para outro é conseqüência do
nível de competência pessoal. Assim, um aluno pode estar no grupo 6 de
matemática, no 8 de língua e no 3 de ciências, enquanto que outro assiste
ao grupo 7 de matemática, 6 de língua e 8 de ciências. Evidentemente,
também pode se dar a combinação de ambos os casos.
120 / ANTONI ZABALA

Assim, pois, podemos observar que as vantagens manifestas são,


por um lado, esta capacidade de ampliar a resposta à diversidade de
interesses e competências dos alunos e, por outro, que em cada grupo
existe uma homogeneidade que favorece a tarefa dos professores devido
ao fato de poder garantir determinados níveis e determinados interesses
similares. Quando os alunos podem participar na construção de seu
percurso escolar, além de garantir uma melhor predisposição para a
aprendizagem, se dá chance para que eles assumam um conhecimento
mais profundo de seu processo educacional e um maior grau de
responsabilização. Em ambos os casos, a flexibilidade na constituição dos
grupos faz com que dificilmente se produza um desfecho negativo.
Uma distribuição grupal deste tipo comporta uma primeira dificul-
dade, determinada pela complexidade organizativa, mas que deve ser
superada se nos detemos nas vantagens que supõe. Também há dois
inconvenientes que é preciso solucionar. Um deles é a necessidade de
garantir que cada aluno tenha acesso a um grupo de convivência estável.
O outro, conseqüência dos agrupamentos por níveis de competência, é o
perigo que já destacamos ao falar dos grupos homogêneos.
Até agora falamos das características dos diferentes agrupamentos
no âmbito da escola. Mas avançar na compreensão da organização social
da aula requer falar das diferentes formas de organizar as atividades na
aula. Isto é o que faremos a seguir.

Organização da classe em grande grupo


Historicamente, esta é a forma mais habitual de organizar as ativi-
dades de aula. Nestas atividades todo o grupo faz o mesmo ao mesmo
tempo, seja escutar, tomar nota, realizar provas, fazer exercícios, debates,
etc. Os professores ou os alunos se dirigem ao grupo em geral, através de
exposições, demonstrações, modelos, etc., introduzindo, evidentemente,
ações de atendimento a meninos e meninas individualmente.
Esta fórmula é a mais simples e, como já apontamos, a que goza de
mais tradição. Questionada pelas concepções progressistas por ter sido a
forma exclusiva de agrupamentos de aula, num modelo de escola que
considera todos os alunos como iguais e, em todo caso, no qual “sobram”
as diferenças. Modelo que corresponde a um ensino de conteúdos
fundamentalmente conceituais e ensinados como se se aceitasse que são
aprendidos através da memorização mecânica. Esta herança tem feito
com que, seguidamente, as desqualificações sejam genéricas, como se
fosse uma forma de organização negativa em si mesma.
O problema surge quando se considera que é a única organização
possível, de maneira que, independentemente do conteúdo a ser
trabalhado, a forma de agrupamento dos alunos sempre é a mesma.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 121

Vejamos a utilidade desta forma de agrupamento. Faremos uma análise


segundo os diferentes tipos de conteúdo a serem ensinados e levaremos
em conta, em todo momento, os condicionantes determinados pela
necessidade de atender à diversidade dos alunos.
Quando é preciso ensinar conteúdos factuais a exposição deve ser
clara, o número de alunos e a forma de organizá-los pode ser bastante
simples: desde que o número de alunos não seja excessivo para permitir
que o professor ou a professora mantenha o atendimento aos alunos, o
grande grupo será a forma mais apropriada para desenvolver esta
atividade. Se for conveniente, as recomendações sugeridas a cada aluno
quanto ao trabalho individual poderiam ser feitas de forma pessoal.
Portanto, o grande grupo é uma forma de organização apropriada
quando os conteúdos a serem ensinados são factuais, sempre que a idade
do aluno lhe permita seguir um plano de memorização de forma
autônoma.
Começamos a detectar as limitações da organização em grande
grupo quando os conteúdos a serem ensinados são conceituais. Em
primeiro lugar, devido ao número de alunos, já que se o grupo é muito
numeroso dificilmente poderemos estabelecer as inter-relações necessá-
rias para conhecer o processo de aprendizagem que cada aluno segue.
Em segundo lugar, realmente teremos poucas oportunidades de
conhecer o processo de elaboração e compreensão de cada aluno se todo
o grupo tem que estar sujeito aos diálogos individuais entre professor e
aluno. Certamente este trabalho será mais fácil se dividimos o grande
grupo em pequenos grupos, cada um deles com trabalhos específicos,
para que seja possível circular pelos diferentes núcleos e oferecer a ajuda
necessária a cada menino ou menina.
Assim, pois, podemos chegar à conclusão de que uma organização
em grande grupo coloca muitos problemas para o ensino dos conceitos se
não se introduzem medidas que permitam conhecer o grau e o tipo de
processo que está seguindo cada aluno na construção do significado, a
fim de que se possa prestar a ajuda que cada aluno precisa. Quanto mais
complexo for o conteúdo a ser aprendido e mais jovens forem os alunos,
mais dificuldades teremos para atender à diversidade numa estrutura de
grande grupo.
Quanto aos conteúdos procedimentais, a estrutura de grande grupo
servirá para dar a conhecer a utilidade do procedimento, técnica ou
estratégia. Também poderão se explicar e mostrar as diferentes fases ou
os passos que o compõem. E tudo isto com certas garantias de que
estamos conseguindo dar conta das diversas formas de aprender dos
alunos. Por outro lado, será muito difícil poder propor as atividades de
aplicação e exercitação suficientes e necessárias para cada aluno, que
representem um desafio pessoal e nas quais se possa prestar a ajuda de
que cada um necessita.
122 / ANTONI ZABALA

Pudemos observar que os conteúdos atitudinais têm a dificuldade


de que sua aprendizagem não pode se realizar com poucas atividades. O
componente cognitivo destes conteúdos exige um trabalho de compre-
ensão do que representam. Portanto, as atividades que este processo
envolve podem ser feitas em grande grupo. Mas os componentes afetivos
e comportamentais dos conteúdos atitudinais exigem atividades que
impliquem colocar os alunos diante de conflitos ou situações proble-
máticas que terão que resolver. Situações que dificilmente podem se
realizar em grande grupo, excetuando a assembléia.
A assembléia de alunos atua como instrumento de gestão e admi-
nistração das regras de jogo do grupo, através dos debates, das propostas
ou exposições, das revisões das normas de atuação e comportamento;
como regulador das relações pessoais e como meio para manter a convi-
vência. É o instrumento mais valioso de que dispomos para promover e
potencializar muitos dos valores e das atitudes que consideramos
conteúdos de aprendizagem. As normas que forem estabelecidas e os
meios que forem utilizados para assegurar seu cumprimento, assim
como a maneira de desenvolver a assembléia, o papel que se outorgue
aos alunos, seu grau de responsabilidade e a distribuição de cargos darão
a base para a reflexão sobre os atos e os comportamentos dos alunos e
sobre os valores que os presidem. Mas se, ao mesmo tempo, não se criam
situações que possibilitem a atuação mais ou menos desinibida dos
alunos, dificilmente poderão apresentar-se as condições para que se
vejam obrigados a escolher entre diferentes formas de comportamento.
Os tipos de atividades que podem ser realizados em grande grupo e
que são fatores de conflito, sem deixarem de ser suficientemente con-
troláveis pelo professor, são limitados. Este inconveniente faz com que
muitos dos desejos de formação fiquem relegados a um segundo plano,
ou esquecidos, se não se dispõe de outras formas organizativas, já que a
necessidade de manter a ordem num grupo obriga a tomar medidas de
controle que seguidamente entram em choque com as finalidades educa-
cionais estabelecidas. O controle da organização de um grupo sem a
existência de outras formas de organização, como as equipes fixas, obriga
a que as relações sejam mais rígidas e muitas vezes autoritárias. Deste
modo, se potencializam determinadas atitudes. Se são as atitudes deseja-
das, perfeito: a forma de agrupamento é a correta. Mas não poderemos
dizer o mesmo se nossas intenções educacionais são outras.
De acordo com a revisão que realizamos do grande grupo, a respeito
dos diferentes tipos de conteúdo, podemos concluir que se trata de uma
forma organizativa apropriada para o ensino de fatos, que no caso dos
conceitos e princípios aparecem muitos problemas para que se possa
conhecer o verdadeiro grau de compreensão de cada menino e menina,
que nos conteúdos procedimentais é impossível atender à diversidade no
ritmo de aprendizagem e estabelecer as ajudas pertinentes e que no caso
A PRÁTICA EDUCATIVA / 123

dos conteúdos atitudinais o grande grupo é especialmente adequado


para a assembléia, mas é insuficiente.

Organização da classe em equipes fixas


A forma habitual de organização da classe em equipes fixas consiste
em distribuir os meninos e meninas em grupos de 5 a 8 alunos, durante
um período de tempo que oscila entre um trimestre e todo um ano, e nos
quais cada um dos componentes desempenha determinados cargos e
determinadas funções. As diferenças no número de componentes, a
duração e o tipo de cargos e funções estão determinadas pela idade dos
alunos. Assim, as equipes são mais reduzidas e sua duração é mais curta
na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental do que
no ensino médio, e os cargos e as funções estão relacionados com a
capacidade de atuação autônoma dos meninos e meninas.
As funções fundamentais das equipes fixas são duas. A primeira é
organizativa e deve favorecer as funções de controle e gestão da classe. A
segunda é de convivência, já que proporciona aos alunos um grupo
afetivamente mais acessível.
A função organizativa se resolve atribuindo a cada equipe, e dentro
desta a cada aluno, certas tarefas determinadas, que vão desde a distri-
buição do espaço e da administração dos recursos da aula até a responsa-
bilidade pelo controle e pelo acompanhamento do trabalho de cada um
dos membros da equipe em cada uma das áreas. Assim, em cada um dos
grupos podemos encontrar uma distribuição de cargos: coordenador da
equipe, secretário, responsável pela manutenção, etc., e, por outro lado,
as responsabilidades de cada um deles relacionadas com o processo mais
acadêmico: responsável pela matemática, língua, etc., com funções de
acompanhamento e auto-avaliação do grupo. Deste modo, cada um dos
membros da equipe pode ter um cargo organizativo (secretário, coorde-
nador...) e outro de responsável por uma área. Tal como apontamos
anteriormente, as funções dos cargos e dos responsáveis estão determi-
nadas pela idade dos alunos.
A outra razão que justifica os grupos fixos é que oferecem aos alunos
um grupo que, por suas dimensões, permite as relações pessoais e a
integração de todos os meninos e meninas. O objetivo consiste em formar
grupos em que possam se estabelecer relações de amizade e colaboração,
assim como de aceitação das diferenças. Com esta intenção, a consti-
tuição dos grupos leva em conta a diversidade de seus membros. Para
alcançar estes objetivos se propõem atividades que não se reduzem às
estritamente disciplinares, como por exemplo, saídas, passeios, etc.
A análise desta forma de agrupamento está relacionada com as duas
funções expostas. A mais clara é a organizativa. A organização da classe
124 / ANTONI ZABALA

em equipes fixas resolve muitos dos problemas de gestão e controle da


classe. Ter uma estrutura socialmente complexa permite a co-respon-
sabilização dos grupos em muitas das tarefas de organização da classe,
liberando os professores, em grande parte, de um trabalho que consome
muito tempo e costuma ser pouco “produtivo”. Ocorre o paradoxo de
que é fácil encontrar esta forma organizativa em aulas de educação
infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, onde não há
excessivos problemas de disciplina, enquanto que naqueles níveis em
que as características da pré-adolescência com freqüência ocasionam
problemas de convivência, os professores se encontram seguidamente
órfãos de instrumentos que lhes ajudem a resolvê-los.
Mas ao mesmo tempo, uma organização deste tipo oferece uma
grande quantidade de oportunidades para que os meninos e meninas
assumam cada vez mais responsabilidades para com os outros, apren-
dam a se comprometer, a avaliar seu trabalho e o dos demais, a oferecer
ajudas… É aqui também que há relação com a função de convivência, já
que dá chance para que se estabeleçam vínculos afetivos, de ajuda, de
companheirismo e de aceitação dos outros e de suas diferenças.
Portanto, independentemente de sua capacidade organizativa, as
equipes fixas só têm sentido se a escola traçou como objetivos prioritários
o desenvolvimento das capacidades de equilíbrio e autonomia pessoal,
de relação interpessoal e de inserção social e, portanto, os conteúdos
atitudinais que decorrem disso. Se estes são os objetivos, dificilmente
serão alcançados se a escola não se dotar de instrumentos organizativos
que, como as equipes fixas, os tornam possíveis.
Estes mesmos argumentos podem nos servir para julgar a conve-
niência de que os grupos fixos sejam homogêneos ou heterogêneos. A
resposta está condicionada pelos objetivos educacionais estabelecidos. A
homogeneidade de sexo, atitudes, capacidades ou interesses aparente-
mente favorece a gestão dos grupos, já que reduz os problemas de
convivência. Problemas e conflitos que, como já sabemos, são as oportu-
nidades formativas de que dispomos para conseguir a aprendizagem de
determinados conteúdos atitudinais. Desde uma perspectiva que promo-
va a colaboração e o respeito pela diferença, os grupos fixos sempre
deverão ser heterogêneos.
Por outro lado, é bastante freqüente encontrar opiniões contrárias às
equipes fixas, justificadas pela possibilidade de que os grupos se fechem,
que surjam lideranças fortes ou despóticas, que apareça uma rejeição a
um determinado menino ou menina, sem levar em conta que precisa-
mente estas situações são as que permitem a intervenção educacional.
Prescindir deste instrumento educativo pode ser uma forma de esconder
a realidade da aula e desperdiçar a possibilidade de fazer intervenções
que ajudem os grupos fechados a se abrirem, a reconduzir as atitudes
despóticas dos líderes, a integrar os que foram rejeitados.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 125

Em resumo, as equipes fixas oferecem numerosas oportunidades para


trabalhar importantes conteúdos atitudinais. Sua estrutura também é
apropriada para a criação de situações que promovam o debate e os
correspondentes conflitos cognitivos e pela possibilidade de receber e dar
ajuda, o que facilita a compreensão dos conceitos e procedimentos
complexos. Comprometem os alunos na gestão e no controle da aula e
constituem um bom instrumento para promover a cooperação e a
solidariedade, valores que, embora sempre tenham sido fundamentais para
a formação das pessoas, agora, numa escola cada vez mais aberta à
diversidade (de culturas, de competências…), se erigem em instrumentos
básicos de convivência e progresso.

Organização da classe em equipes móveis ou flexíveis


O termo equipe móvel ou grupo flexível implica o conjunto de dois
ou mais alunos com a finalidade de desenvolver uma tarefa determinada.
A duração destes agrupamentos se limita ao período de tempo de realização
da tarefa em questão. Podem ser alguns breves momentos ou todo um
trimestre. Sua vida se limita à tarefa e, portanto, numa organização de
conteúdos por áreas ou matérias, não existe continuidade das equipes. A
estrutura interna destas equipes está condicionada pelo trabalho a ser
realizado e pela necessidade de formarem determinadas atitudes. As
diferenças fundamentais com as equipes fixas são a variabilidade no
número de integrantes e a permanência ou vida do grupo para além da
atividade concreta.
Os motivos que justificam os grupos móveis são diversos, embora o
principal seja a necessidade de atender às características diferenciais da
aprendizagem dos meninos e meninas. Posto que esta estrutura permite
distribuir trabalhos em pequenos grupos, é possível que os professores
atendam àqueles grupos ou alunos que mais o necessitem, que distingam
as tarefas a serem realizadas conforme possibilidades ou interesses, ou
que exijam diferentes níveis de elaboração. Trabalhos que sempre devem
estar bem definidos, para que os grupos possam trabalhar autonomamente
e seja possível favorecer a atenção personalizada por parte dos professores.
É o caso dos “cantos” na educação infantil ou das oficinas ou dos trabalhos
de pesquisa em níveis superiores, em que os passos a serem seguidos e as
técnicas a serem aplicadas são bastante conhecidos pelos alunos e, portanto,
a intervenção dos professores está mais em oportunizar desafios e ajudas
a cada aluno em particular, sem interromper o trabalho do resto do grupo.
Há outras razões comuns às equipes móveis e aos grupos fixos, que
decorrem das possibilidades que a aprendizagem entre iguais oferece.
Numa estrutura de tais características surgem muitas situações em que é
possível que os próprios meninos e meninas se ajudem entre si. Ensinar
126 / ANTONI ZABALA

modelos, novas explicações, ou interpretações mais próximas dos pontos


de vista dos alunos faz com que nesta estrutura possam se beneficiar
tanto da comparação entre perspectivas diferentes como da possibilidade
de dar e receber ajuda entre colegas.
Outro dos motivos é determinado pelos próprios objetivos edu-
cacionais, quando se considera conteúdo de aprendizagem saber
trabalhar em equipe e tudo o que isso envolve, tanto nos aspectos
operativos de distribuição de trabalho como nos mais atitudinais
de relação colaboração entre colegas; ou no caso da aprendizagem
das línguas, concretamente da conversação e do diálogo; ou quando a
autonomia e a co-responsabilidade são consideradas conteúdos de
aprendizagem; etc.
Quanto à homogeneidade ou não das equipes móveis, é preciso
realizar as mesmas considerações que se mencionaram até agora em
relação ao grupo/classe ou às equipes fixas. No entanto, neste caso,
devemos levar em conta que, posto que são agrupamentos limita-
dos a algumas atividades concretas e a um período de tempo curto, e
portanto não são estáveis, os inconvenientes das equipes homogêneas,
numa opção educativa de formação integral, podem ser relativizados.
Caso se tenha a precaução de variar a configuração e o grau de ho-
mogeneidade dos grupos, conseguiremos, por um lado, aproveitar
as vantagens que oferece o fato de poder trabalhar em alguns momen-
tos com grupos de alunos de características similares – sexo, nível,
interesses, etc. – e as vantagens educativas da diversidade. Deste
modo, as equipes móveis algumas vezes poderão ser homogêneas e
outras heterogêneas, segundo as intenções educacionais ou a situação
do grupo e seus interesses.
Levando em conta as características e o funcionamento das equipes
móveis, podemos observar que são especialmente adequadas, quando
não imprescindíveis, para o trabalho de conteúdos procedimentais –
portanto, nas áreas em que os componentes procedimentais são básicos,
como as de língua, matemática, artes, etc. –, dada a necessidade de se
adaptar às diferentes capacidades, ritmos, estilos e interesses de cada
aluno. Para a aprendizagem dos conteúdos procedimentais é imprescin-
dível realizar múltiplas atividades de aplicação e exercitação, conve-
nientemente seqüenciadas e progressivas. Neste caso, uma estrutura
de classe limitada ao grande grupo obrigará a estabelecer uma
seqüência idêntica para todos, com as dificuldades para atender aos
diferentes estilos e ritmos de aprendizagem que isso supõe. De outro
modo, uma distribuição em equipes favorece a definição de propostas
educativas que levam em conta a diversidade dos alunos. Também
será extremamente apropriada para o trabalho dos conteúdos
atitudinais no âmbito das relações interpessoais.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 127

Trabalho individual
Consiste nas atividades que cada menino ou menina realiza por si só
e é a forma de trabalho que a maioria de seqüências de ensino/apren-
dizagem propõe num ou noutro momento. Seja qual for a corrente peda-
gógica, nas propostas educativas sempre esteve presente o trabalho indi-
vidual. E é lógico que seja assim, porque a aprendizagem, por mais que
se apóie num processo interpessoal e compartilhado, é sempre, em últi-
ma instância, uma apropriação pessoal, uma questão individual. As dife-
renças são encontradas no papel que se atribui a este trabalho, no mo-
mento em que ele é realizado, nos tipos de conteúdos que se trabalham e
em seu grau de adaptação às características pessoais de cada aluno.
É impossível fazer uma análise isolada do trabalho individual, já que
seu valor varia enormemente conforme seja realizado. Se não fosse assim,
poderíamos dizer que é imprescindível, e pouco mais. Vejamos em que
condições se aplica esta forma de trabalho e que conteúdos são
trabalhados para fazer uma avaliação.
Começaremos com um modelo expositivo e posteriormente introdu-
ziremos diferentes atividades conforme os conteúdos que forem
trabalhados. Numa seqüência de ensino/aprendizagem tópica, de
exposição-memorização-exame, o trabalho individual é realizado na fase
de memorização e exame. Nesta seqüência, evidentemente esquemática,
a fase expositiva ocorre em grande grupo; a memorização é uma tarefa
individual que cada menino ou menina realiza em aula, ou em casa, nas
séries mais avançadas e, finalmente, o exame é um trabalho individual
que se realiza em grande grupo. Neste modelo, é um tipo de trabalho que
não permite a interação professor/aluno, além da devolução do exame
com a nota correspondente. Se analisamos este processo desde a
perspectiva dos tipos de conteúdos que podem ser trabalhados, obser-
varemos que quando os conteúdos são de caráter factual, as atividades
de aprendizagem que consistem em exercícios que ajudam a memorizar
– fundamentalmente atividades de repetição verbal – são bastante
simples e cada aluno as pode realizar sem mais ajuda do que a motivação
para fazê-las. Posto que as diferenças de aprendizagem entre os alunos se
centram, a grosso modo, no tempo que cada um tem que dedicar ao
estudo, e posto que é um fator que só depende dos próprios alunos,
podem fazê-lo sozinhos com bastante chance de êxito. Um resultado
negativo na prova não implicará repetir todo o processo de ensino/
aprendizagem, mas unicamente exigirá que o aluno por si só lhe dedique
o tempo de que realmente necessite.
Por outro lado, não podemos dizer o mesmo no caso dos conceitos e
dos princípios. Para poder adaptar o processo de ensino às características
singulares da aprendizagem de cada um dos meninos e meninas, será
necessário introduzir mudanças qualitativas na forma de realizar este
128 / ANTONI ZABALA

trabalho individual. Neste caso, não podemos deixar o aluno sozinho na


fase de estudo, já que se não entendeu o conceito – durante a exposição,
com os diálogos e as perguntas que se introduziram, nos debates ou nos
trabalhos em grupos reduzidos –, dificilmente poderá resolver as difi-
culdades de compreensão por si só. De outro modo, o trabalho
individual será eficaz quando, uma vez compreendido o conceito, realize
as atividades e exercícios que lhe permitirão ampliar, detalhar, recordar e
eventualmente reforçar o que já tinha compreendido. As diferenças entre
os alunos serão solucionadas com o tempo que cada um deles terá que
dedicar a cada uma destas finalidades.
Quando os conteúdos a serem aprendidos forem de caráter
procedimental, a necessidade de oferecer atividades de aplicação e
exercitação para cada aluno, adaptadas a seu nível de domínio e dentro
de um conjunto progressivo, obriga a introduzir em todas as unidades
didáticas momentos em que se levam a cabo estas tarefas de exercitação
personalizada. A dificuldade consistirá em oferecer os desafios e ajudas
adequados às características de cada um dos alunos, mas na maioria dos
casos o trabalho será individual. O problema a ser resolvido se encontra
nos meios para poder orientar o processo de cada menino e menina no
domínio progressivo da técnica, do procedimento ou da estratégia.
Quanto à aprendizagem dos conteúdos atitudinais, a necessidade de
propor atividades vivenciais que impliquem a resolução de conflitos de
atuação e tomada de posições faz com que o trabalho individual só seja
adequado na análise e na avaliação de casos, nos aspectos mais
conceituais dos valores e, sem dúvida, em todos aqueles relacionados
com o estudo individual: dedicação, autonomia, interesses, responsa-
bilidade, atenção, etc.
Assim, pois, vemos que o trabalho individual é especialmente útil
para a memorização de fatos, para o aprofundamento e a memorização
posterior de conceitos e, especialmente, para a maioria dos conteúdos
procedimentais em que se deve adaptar o ritmo e a proposição das
atividades às características de cada menino ou menina. Ao mesmo
tempo, podemos comprovar a complexidade da tarefa educacional pelo
fato de ter que acompanhar as diferentes trajetórias neste trabalho
individual. Como podem se propor a cada aluno atividades de apren-
dizagem específicas, quando há mais de trinta alunos numa classe? Os
diferentes métodos de ensino foram buscar fórmulas que favorecessem o
andamento de todos os alunos. Fórmulas, técnicas e instrumentos que em
muitos casos se converteram no “método” que serve para qualquer coisa.
Por tudo quando vimos até agora, a atenção à diversidade envolve
formas de ensinar notavelmente complexas porque têm que responder a
muitas variáveis que estão estreitamente inter-relacionadas. Tudo isso
leva a que nos demos conta, cada vez mais, da necessidade de utilizar
formas de intervenção extremamente flexíveis, que integrem todos
A PRÁTICA EDUCATIVA / 129

aqueles meios que potencialmente ajudam a aprender. Um destes meios,


especialmente útil no andamento do trabalho individual, é o denomi-
nado por Freinet de “contrato de trabalho”. Dado o interesse que tem,
vamos descrevê-lo rapidamente.

Os contratos de trabalho
A função básica dos contratos de trabalho consiste em facilitar a
tarefa dos professores ao propor a cada aluno as atividades de
aprendizagem apropriadas a suas possibilidades e a seus interesses.
Recebe o nome de contrato porque cada aluno estabelece um acordo com
o professor sobre as atividades que deve realizar durante um período de
tempo determinado, geralmente uma ou duas semanas. Para poder levar
a cabo o controle destes acordos e de seu cumprimento, cada menino e
menina dispõe de uma agenda – em educação infantil costuma ser um
mural – onde constam os compromissos assumidos para o espaço de
tempo em questão. A cada semana, ou a cada quinze dias, ocorre uma
reunião entre o professor e o aluno, com uma dupla função: revisar o
trabalho feito e combinar a nova tarefa para o período seguinte. Dada a
dificuldade que representa fazer uma proposta específica para cada
aluno, é imprescindível contar com materiais preparados previamente
que contemplem atividades claramente seqüenciadas e progressivas,
como por exemplo as fichas de trabalho de Freinet, as fichas ordenadas
de leituras, os cadernos de cálculo ou ortografia, as fichas de
interpretação e confecção de planos e mapas, as atividades de pesquisa,
de elaboração tecnológica, de práticas de laboratório, etc., sempre que,
como já apontamos, estejam convenientemente ordenadas. Assim, pois, o
trabalho do professor está centrado em determinar quantas atividades
devem se fazer em cada uma das seqüências ou o grau de aprofun-
damento que deve se conseguir num determinado período.
Se uma das tarefas mais pesadas dos professores é a correção
das produções dos alunos quando estas são iguais para todos,
num modelo de contratos o será mais ainda. Para solucionar este
inconveniente é interessante, sempre que seja possível, que as ati-
vidades sejam autocorretivas ou que se introduzam fórmulas de
correção compartilhada.
Voltando às idéias expostas anteriormente, cabe dizer que esta
forma de dar resposta ao andamento do trabalho individual é
interessante só para aqueles conteúdos que permitem estabelecer uma
seqüência mais ou menos ordenada. Como vimos, trata-se dos conteúdos
adequados para o trabalho individual, quer dizer, de alguns conteúdos
factuais e principalmente muitos conteúdos procedimentais. Conteúdos
que representam porcentagens muito elevadas do trabalho cotidiano,
especialmente em algumas áreas.
130 / ANTONI ZABALA

Com os contratos de trabalho, ao mesmo tempo que se contribui


para o desenvolvimento destes conteúdos, se promove a aprendizagem
de conteúdos atitudinais como a autonomia, o compromisso ou a
responsabilidade. E, sobretudo, se faz o aluno participar nos objetivos
educacionais que são propostos, porque ele se vê obrigado a ter uma
visão global, não apenas dos conteúdos a serem trabalhados, como
também de seu próprio processo de aprendizagem.
Sem um meio como o contrato de trabalho e sem materiais com
propostas de atividades seqüenciadas de forma progressiva, dificilmente
pode ser solucionado o problema que envolve o atendimento aos
diferentes processos de aprendizagem que segue cada um dos meninos e
meninas em determinados conteúdos.

DISTRIBUIÇÃO DO TEMPO E DO ESPAÇO

As formas de utilizar o espaço e o tempo são duas variáveis que, ape-


sar de não serem as mais destacadas, têm uma influência crucial na
determinação das diferentes formas de intervenção pedagógica. As carac-
terísticas físicas da escola, das aulas, a distribuição dos alunos na classe e o
uso flexível ou rígido dos horários são fatores que não apenas configuram
e condicionam o ensino, como ao mesmo tempo transmitem e veiculam
sensações de segurança e ordem, assim como manifestações marcadas por
determinados valores: estéticos, de saúde, de gênero, etc. São muitas as
horas que os alunos passam num espaço concreto e com um ritmo tem-
poral que pode ser mais ou menos favorável para sua formação.

O papel do espaço
Como nas outras variáveis, a estrutura física das escolas, os espaços
de que dispõem e como são utilizados correspondem a uma idéia muito
clara do que deve ser o ensino. Logicamente, posto que os aspectos físicos
são os que mais perduram no tempo, não são tanto uma conseqüência do
que tem que ser ou é hoje em dia o ensino, mas o papel que se atribuiu a
ele num momento determinado.
Se a utilização do espaço tem sido o resultado de uma maneira de
entender o ensino, tanto em relação à função social como à compreensão
dos processos de aprendizagem, certamente uma mudança nestes
elementos levaria a uma reconsideração das características que deveriam
ter de acordo com outras concepções do ensino.
A todos nós parece lógica a distribuição atual das escolas. Conside-
ramos que uma escola tem que ser um conjunto de unidades espaciais, as
aulas, situadas uma junto à outra e unidas mediante corredores. Este
A PRÁTICA EDUCATIVA / 131

conjunto pode variar desde uma ou duas aulas nas escolas unidocentes
até escolas que têm dezenas. Também o interior destas unidades espa-
ciais apresenta uma distribuição bastante similar: um conjunto de cadei-
ras e mesas colocadas de duas em duas ou individualmente e alinhadas
de frente para o quadro-negro e para a mesa do professor ou professora.
A pergunta que devemos nos fazer é se realmente esta é a fórmula
mais adequada, a melhor, a única. E, sobretudo, temos que nos perguntar
que critérios nos permitem justificá-la.
Se iniciamos de novo uma revisão histórica, veremos que esta
configuração não é gratuita. Como pudemos observar, nossa tradição é
herdada de um ensino centrado nos conteúdos factuais e conceituais, que
tem girado em torno de modelos de comportamento inspirados em
fórmulas disciplinares rígidas e uniformizadoras. O ensino dos conteú-
dos conceituais e factuais através de estratégias de reprodução com-
portava o uso de exposições gerais para todo um grupo de alunos que,
em função das finalidades da educação, podia ser bastante numeroso,
colocado de forma que os alunos pudessem receber facilmente as
exposições e instruções do ensino. Ao mesmo tempo, esta disposição
contribuía para manter a ordem. Trata-se de uma disposição espacial
criada em função do protagonista da educação, o professorado, em que
os meninos e meninas, como se estivessem num cinema ou num teatro, se
situam de forma que possam ver e escutar quem representa uma fonte
básica do saber. A opção propedêutica, mas basicamente a concepção
transmissora e uniformizadora do ensino, comportava determinadas
formas bem definidas e bastante eficazes se levamos em conta o que se
pretendia.
Se nos perguntam qual é o número máximo de alunos que pode
haver numa classe onde se tenham que explicar, por exemplo, os nomes
dos rios da Europa, os códigos da língua, matemática, física ou química,
as obras mais importantes do romantismo, etc., certamente responde-
remos que é limitado, sempre e quando se possa manter a ordem. E
também diremos que a melhor maneira de situar estes alunos será a que
lhes permita ver e escutar melhor o professor. Assim, pois, o espaço físico
adequado será o que permita acomodar o número máximo de alunos que
se estabeleceu, e a distribuição da aula mais apropriada será a que
favoreça o controle dos professores. Para garantir que esta função de
transmissão e controle seja mais eficaz só será necessário situar o
professor num nível superior ao dos alunos mediante um tablado.
As razões de ordem, controle e eficácia, segundo uma concepção do
ensino e da aprendizagem, determinaram os usos do espaço e, portanto,
as características físicas da maioria das escolas.
A utilização do espaço começa a ser um tema problemático quando
o protagonismo do ensino se desloca do professor para o aluno. O centro
de atenção já não é o que há no quadro-negro, mas o que está acon-
132 / ANTONI ZABALA

tecendo no campo dos alunos. Este simples deslocamento põe em dúvida


muitas das formas habituais de se relacionar em classe, mas questiona
consideravelmente o cenário. O que interessa não é o que mostra o
quadro, mas o que acontece no terreno das cadeiras e, mais concre-
tamente, em cada uma das cadeiras.
Este deslocamento faz com que muitos dos elementos que
configuram o meio físico do aluno adquiram uma grande importância. A
necessidade de que o aluno viva num ambiente favorável para seu
crescimento também inclui, e de maneira preferencial, o ambiente em
que deve se desenvolver. O estado de ânimo, o interesse e a motivação
receberão a influência do meio físico da escola. Criar um clima e um
ambiente de convivência e estéticos, que favoreçam as aprendizagens, se
converte numa necessidade da aprendizagem e, ao mesmo tempo, num
objetivo do ensino. Ao mesmo tempo, as características dos conteúdos a
serem trabalhados determinarão as necessidades espaciais.
A necessidade de elaboração pessoal do conhecimento acarreta, so-
bretudo para os alunos mais jovens, a necessidade de favorecer a ativi-
dade mental do aluno através de ações que não se limitem a escutar as
exposições do professor ou da professora. A observação, o diálogo ou o
debate, a manipulação e a experimentação são atividades imprescindí-
veis para favorecer os processos construtivos dos alunos, e para realizar
estas atividades é preciso dispor de espaços que as facilitem. Neste mo-
mento nos vemos obrigados a reconsiderar a adaptação da distribuição
convencional do espaço. Em atividades com estas características, o centro
de atenção já não pode ser somente o que diz o professor, mas tem que se
deslocar para o que os alunos fazem e, portanto, para as necessidades
que estas tarefas comportam. Se as atividades selecionadas são debates,
diálogos ou discussões em grupos reduzidos, bastará que a disposição da
classe possa variar conforme as características da tarefa: distribuição em
círculo ou semicírculo, por pequenos grupos ou por duplas. Por outro
lado, se as atividades a serem realizadas se concretizam na manipulação,
na experimentação, na observação ou na pesquisa bibliográfica, será
necessário que a configuração da classe permita estas tarefas ou será
imprescindível contar com outros espaços adequados fora da aula.
Quando nossa atenção se concentra no ensino dos conteúdos proce-
dimentais, a necessidade de revisar o tratamento do espaço se multiplica,
já que, como vimos, é necessária uma atenção às diferenças no tipo de
ajuda e em relação à realização das diferentes atividades, estabelecendo
desafios e apoios adequados às características diferenciais de cada
menino ou menina. Isto implica a organização de agrupamentos de
diferente natureza e, portanto, dispor de espaços que possibilitem o
trabalho de cada um dos diferentes grupos. Pode se tratar de espaços
fixos em classe, onde se encontrem os elementos e materiais que
permitam realizar o trabalho correspondente (“cantos” e pequenas
A PRÁTICA EDUCATIVA / 133

oficinas, bibliotecas da classe...), ou outros espaços adequados fora da


aula e concebidos para realizar trabalhos deste tipo (auditórios,
laboratório, biblioteca, horta escolar…). Conforme as etapas ou níveis,
será necessário avaliar a possibilidade de que haja aulas de grupo/classe
que convivam com aulas especializadas. Por outro lado, é preciso levar
em conta as possibilidades de ampliar o espaço físico da escola,
introduzindo como concepção espacial geral a utilização dos serviços
que a comunidade oferece: biblioteca pública, serviços municipais,
associações, museus, etc. Quanto aos conteúdos atitudinais, excetuando-
se o papel da assembléia e das necessidades de espaço desta atividade,
sua relação com a variável espaço está associada à série de manifestações
que indiretamente constituem a maneira de entender os valores por parte
da escola sobre determinados campos. Referimo-nos, por exemplo, aos
espaços que são de todos ou os que estão destinados a coletivos deter-
minados, e dentro deste último grupo aos que são de uso exclusivo dos
professores; às diferenças de mobiliário dos setores e das salas de pro-
fessores e de alunos; às características físicas e aos objetos diferenciados
nos refeitórios ou nos banheiros; às diferenças relacionadas ao gênero
nos banheiros e vestiários e ao uso do pátio. Trata-se de manifestações do
sentido que têm para a escola as relações de hierarquia e poder e as
funções e papéis que se atribuem às pessoas, conforme o status social ou
de gênero. São manifestações aparentemente sem importância, mas que
formam de modo decisivo valores e atitudes determinadas.
É conveniente dedicar especial atenção às dimensões das escolas. As
necessidades de uma escola seletiva e uniformizadora não têm nada que
ver com as de outra cujo objetivo seja a formação integral das pessoas. Os
prédios grandes, com centenas de alunos e dezenas de professores, são
radicalmente contrários a propostas educativas encaminhadas para o
desenvolvimento não apenas cognitivo dos meninos e meninas. É
impossível promover determinadas atitudes ou estabelecer um bom
clima afetivo se os meninos e meninas não podem se sentir membros,
com personalidade própria, de uma comunidade, onde todos se
conhecem, professores e alunos, com nomes e sobrenomes. Dificilmente
podem se sentir seguros no anonimato que envolve conviver com
centenas de desconhecidos. Daí que é muito difícil manter marcos
coerentes de maneiras de viver, conforme os valores e as atitudes que se
pretende promover, numa perspectiva personalizada e global. Dado que
as construções já estão feitas, e evidentemente segundo outros modelos
educativos, em muitos casos será necessário criar divisões e espaços que
rompam com a grandiosidade dos prédios e viabilizem, ao máximo,
formas de relações personalizadas. E, logicamente, será necessário
ampliar este requisito às dimensões das equipes docentes. Será
conveniente que ao estruturar e organizar as equipes docentes se leve em
conta a necessidade de que os meninos e meninas possam conhecer todos
134 / ANTONI ZABALA

os professores. A tradição seletiva e propedêutica, especialmente nas


escolas do ensino médio, não tem que impedir a adaptação das estruturas
físicas e organizativas às novas necessidades educativas postas por uma
proposta integral.
Por outro lado, se a participação, a democratização, o serviço à
comunidade, entre outros, são os valores que se querem promover entre
os alunos, será necessário considerar que possibilidades existem de que
outros grupos do bairro ou da cidade possam utilizar as instalações da
escola. Independente dos motivos de racionalização e utilização das
instalações escolares, determinados valores de inserção e atuação social
só podem ser defendidos se se convertem em modelos de participação e
compromisso real. A biblioteca, o auditório, o ginásio, os pátios e as
aulas, em coerência com estes princípios, devem estar a serviço da
comunidade a que pertencem, aceitando como fatores educativos todos
os inconvenientes e conflitos que supõe uma proposta deste tipo.

A distribuição do tempo não é o menos importante


Numa perspectiva racional, a variável temporal seria resultado e
conseqüência das decisões tomadas em relação às outras variáveis: a
seqüência didática, o tipo de atividade, a organização de conteúdos, etc. –
para além da necessidade, sobretudo com os menores, de orientação no
tempo e de segurança pessoal. O tempo teve, e ainda tem, um papel
decisivo na configuração das propostas metodológicas.
Em geral o tempo parece ser um fator intocável, já que os períodos
de uma hora determinam o que é que se tem que fazer e não o contrário.
Apesar de que não exista nenhum estudo científico que conclua que a
hora é o melhor tempo para aprender, a distribuição horária em frações
homogêneas exerce uma forte pressão sobre as possibilidades de atuação
na aula. Muitas das boas intenções podem fracassar se o tempo não for
considerado como uma autêntica variável nas mãos dos professores, para
utilizá-la conforme as necessidades educacionais que se apresentem em
cada momento.
Quando a tarefa educativa se limita à exposição, ao estudo ou à
realização de exercícios individuais padronizados, o fator tempo importa
pouco. Em todo caso, é suficiente que exista uma certa variedade de
conteúdos durante o dia. A estruturação horária em períodos rígidos,
sejam de uma hora ou de quarenta e cinco minutos, é o resultado lógico
de uma escola fundamentalmente transmissora. A ampliação dos
conteúdos educativos e, sobretudo, uma atuação conseqüente com a
maneira como se produzem as aprendizagens, nos leva a reconsiderar
estes modelos inflexíveis.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 135

Já comentamos a grande importância que têm os debates, os traba-


lhos em grupo, as atividades de motivação, a continuidade e o encadea-
mento de muitas atividades nas seqüências didáticas, as necessidades de
estabelecer o máximo de relações entre umas atividades e outras e como
condicionam o interesse e a atenção dos alunos. O que acontece quando o
ritmo se rompe justamente quando havíamos conseguido uma boa
participação? E se isto acontece no momento mais interessante de um
debate, de uma experiência ou de uma observação? Conseguir captar o
interesse dos alunos é suficientemente difícil para condicioná-lo à arbi-
trariedade de um horário que não se adapta às necessidades educa-
cionais. Existem certas tarefas que podem ser executadas em quinze
minutos ou conteúdos que podem ser maçantes se os trabalhamos du-
rante um espaço de tempo mais prolongado. Pelo contrário, há ativi-
dades e conteúdos que merecem uma dedicação muito mais prolongada.
No entanto, é evidente que o ritmo da escola, de toda uma coletividade,
não pode se deixar levar pela aparente improvisação, principalmente
quando existe mais de um professor encarregado de um grupo. No
entanto, o planejamento necessário não impede que, apesar das dificul-
dades, se estabeleça um horário que pode variar conforme as atividades
previstas no transcurso de uma semana.

Conclusões

A revisão que fizemos neste capítulo torna manifesto que as diversas


formas de agrupamento dos alunos são úteis para diversos objetivos e
para o trabalho de diferentes conteúdos. Assim, pois, uma primeira
conclusão é que antes de defender fervorosamente um modelo e rejeitar
outro de maneira irrevogável, é preciso saber encontrar a utilidade de
cada um e transpô-lo para a prática, quando a situação o exija.
É esclarecedor analisar as formas de agrupamento em relação aos
diferentes conteúdos. Quando ensinamos, os conceitos, os procedi-
mentos, as atitudes e os fatos seguidamente formam um conjunto que
seria artificial dividir estritamente. Assim, pois, uma segunda conclusão
nos leva a afirmar que não devemos nos mostrar inflexíveis. Numa
mesma unidade didática, e também numa mesma sessão, teremos que
recorrer a formas diversas e sucessivas de agrupamento dos alunos e de
organização das atividades que serão mais adequadas do que outras para
os objetivos que queremos alcançar.
Como pudemos ver, a forma de agrupar os alunos não é uma
decisão técnica prévia ou independente do que queremos ensinar e do
aluno que queremos formar. A terceira conclusão deste capítulo indica
que, assim como se aprende a nadar nadando, se aprende a participar, a
gestionar, debater, comprometer-se, responsabilizar-se, etc., quando há
136 / ANTONI ZABALA

possibilidade de fazê-lo. É evidente que algumas formas de agrupar os


alunos oferecem mais oportunidades do que outras para realizar estas
aprendizagens. Portanto, é necessário potencializá-las se não queremos
que nosso discurso teórico e nossa prática pedagógica pertençam a
universos diferentes.
Outra conclusão é a seguinte: o trabalho em grupo, as equipes, o
grande grupo não excluem o trabalho e o esforço individuais. Pelo
contrário, promover um trabalho pessoal que tenha sentido, que seja
adequado a cada aluno, que permita o acompanhamento por parte do
professor e a direção e o controle por parte do estudante, é um desafio ao
qual não podemos renunciar em benefício de um trabalho rotineiro,
mecânico e sem atrativo. Neste sentido, os contratos de trabalho podem
constituir um instrumento eficaz para articular um trabalho persona-
lizado interessante e pelo qual o aluno se sinta responsável.
Por último, não esqueçamos o papel formativo do grupo/escola ou,
se preferem, da estrutura, o funcionamento e a cultura da própria
instituição, de seus costumes internos e de suas manifestações públicas
ou externas. Em grande parte, condicionam o que pode se fazer nos
diferentes níveis da escola, educativamente falando, ao mesmo tempo
que constituem um bom indicador da coerência entre as intenções
formativas e os meios de que dispomos para alcançá-las.

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6
A organização dos conteúdos

PROPOSTAS DISCIPLINARES, MÉTODOS


GLOBALIZADOS E ENFOQUE GLOBALIZADOR:
DIFERENTES FORMAS DE ORGANIZAR OS CONTEÚDOS

Nas atividades e nas tarefas que configuram as diferentes unidades


de intervenção que definem a prática na aula, trabalham-se conteúdos de
aprendizagem distintos e, habitualmente, mais de um conteúdo. Quando
examinamos uma unidade de intervenção mais ampla, as unidades didá-
ticas, observamos que nunca se reduzem ao trabalho de um único con-
teúdo. Geralmente, o número de conteúdos configura estas unidades. A
forma de apresentação e a relação que existe entre eles nunca são
arbitrárias; ao contrário, obedecem a certos critérios que fazem com que a
seleção dos conteúdos de cada unidade e o tipo de relações que entre eles
se estabelecem sejam de uma maneira e não de outra. Isto supõe que
estas unidades girem em torno de temas, perguntas, tópicos, lições, etc.,
que articulam e relacionam os diferentes conteúdos de uma maneira
determinada. Ao mesmo tempo, as diferentes unidades estabelecem
certas relações entre elas que justificam os conteúdos que as compõem.
As relações e a forma de vincular os diferentes conteúdos de aprendi-
zagem que formam as unidades didáticas é o que denominamos
organização de conteúdos.
Sabemos que os conteúdos, apesar de que seguidamente se apre-
sentem em classe de modo separado, têm mais potencialidade de uso e
de compreensão quanto mais relacionados estejam entre si. Muitos dos
esforços dos professores estão voltados para oferecer modelos interpre-
tativos que integrem conteúdos teoricamente isolados ou específicos
para incrementar seu valor formativo. Assim, pois, o algoritmo soma,
sem a compreensão do que significa somar e o conhecimento de cálculo
mental, nunca possibilitará que os meninos e meninas sejam competen-
140 / ANTONI ZABALA

tes na resolução de situações simples que impliquem somar; o conheci-


mento da toponímia de um país, sem a interpretação de mapas, nunca
lhes permitirá compreender problemas de caráter geográfico, etc.
No entanto, quais são os critérios que se utilizam para organizar os
conteúdos em cada unidade didática? Que motivos justificam uma
seleção e uma distribuição determinada de temas?
Até agora, ao falar de conteúdos tratamo-los de forma diferenciada
conforme fossem conceituais, procedimentais ou atitudinais, uma das
classificações menos freqüente no ensino hoje em dia. Tradicionalmente,
os conteúdos foram classificados conforme um critério de pertencimento
a uma disciplina, cadeira ou matéria. Geralmente foram apresentados
agrupados conforme fossem de matemática, química, língua, música, etc.
Portanto, as unidades didáticas foram organizadas conforme determina-
dos critérios pelas matérias ou disciplinas. A distribuição habitual dos
planos de ensino, programas, currículo, etc., e das áreas específicas na
formação dos professores também obedeceram a esta lógica. As matérias
ou disciplinas selecionadas, como provedoras daquilo que deve se apren-
der na escola, deram lugar a determinadas cadeiras, conforme uma con-
figuração que coincide com a organização clássica do saber acadêmico.
Por motivos históricos, esta relação com os saberes universitários fez com
que tenham predominado as ciências ou saberes com mais anos de
vigência, herdeiras do trívio e do quadrívio medievais. Posto que a fun-
ção do ensino consistia em promover a obtenção destes conhecimentos,
as disciplinas ou cadeiras escolares, e nelas a forma de selecionar, dis-
tribuir e organizar os conteúdos de aprendizagem, tiveram uma depen-
dência clara da lógica formal de cada uma delas. Por isso, as disciplinas,
sua estruturação interna em diferentes temas ou tópicos (a matemática
em geometria, estatística, etc.; a língua em gramática, léxico, etc.; a física
em estática, dinâmica, cinemática, etc.) se transformaram no sistema
tradicional de organizar os conteúdos de aprendizagem no ensino.
Mas esta organização compartimentada de conteúdos, segundo sua
dependência disciplinar, nem sempre se encontra na escola de forma
pura. Ao longo deste século, e cada vez mais, podemos encontrar propos-
tas e experiências que rompem com esta organização por unidades
centradas exclusivamente numa cadeira ou disciplina, de maneira que
aparecem unidades ou temas que tentam estabelecer relações entre
conteúdos de diversas matérias. Relações entre a matemática e a física,
entre a história da arte e a da literatura, entre a língua e as ciências
sociais, entre a biologia e a química, etc. Numa fase mais avançada destes
vínculos entre diferentes disciplinas, aparecem, sob as denominações de
sincretismo e globalização, propostas de organização de conteúdos que,
aparentemente, prescindem da compartimentação disciplinar, desenvol-
vendo, inclusive, métodos extremamente elaborados em que os critérios
de organização dos conteúdos não estão condicionados por sua natureza
A PRÁTICA EDUCATIVA / 141

disciplinar. Os “centros de interesse”, o trabalho por temas ou tópicos, os


“complexos russos” ou os “projetos”, entre outros, são métodos deno-
minados globalizadores, porque seu ponto de partida não decorre da
lógica das disciplinas. Nestes sistemas, os conteúdos de aprendizagem e
sua organização em unidades didáticas só são relevantes em função de
sua capacidade para compreender numa “realidade” que sempre se
manifesta “globalmente”.
Neste capítulo, depois de efetuar uma revisão terminológica dos
conceitos que se referem às diferentes formas de relacionar as disciplinas:
multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, co-
mentaremos diversas propostas metodológicas globalizadoras, analisando as
razões que as justificam, e para concluir faremos uma proposta do que
podemos denominar enfoque globalizador.

COMO PODEM SER ORGANIZADOS OS CONTEÚDOS?


QUE REFERENCIAL PODE SER UTILIZADO?

Existem duas proposições acerca das diversas formas de organizar


os conteúdos que, apesar de pontos coincidentes, partem de suposições e
referenciais diferentes. Assim, certas formas de organizar os conteúdos
tomam como ponto de partida e referencial básico as disciplinas ou
matérias; neste caso, os conteúdos podem ser classificados conforme sua
natureza em multidisciplinares, interdisciplinares, pluridisciplinares,
metadisciplinares, etc. Nestas propostas, as disciplinas justificam os
conteúdos próprios de aprendizagem e, portanto, nunca perdem sua
identidade como matéria diferenciada. As características de cada uma
das modalidades organizativas estão determinadas pelo tipo de relações
que se estabelecem e o número de disciplinas que intervêm nestas
relações, mas em nenhum caso a lógica interna de cada uma das
disciplinas deixa de ser o referencial básico para a seleção e articulação
dos conteúdos das diferentes unidades de intervenção. Deste modo,
encontraremos organizações centradas numa disciplina apenas, forma
tradicional de organização dos conteúdos, e outras que estabelecem
relações entre duas ou mais disciplinas.
No outro lado está o modelo de organização de conteúdos que nos
oferecem os métodos globalizados, os quais nunca tomam as disciplinas
como ponto de partida. Nestes métodos, as unidades didáticas dificil-
mente são classificáveis se tomamos como critério o fato de que corres-
pondam a uma disciplina ou matéria determinada. Os conteúdos das
atividades das unidades didáticas passam de uma matéria para outra
sem perder a continuidade: a uma atividade que aparentemente é de
matemática segue outra que diríamos que é de ciências naturais, e a
seguir uma que poderíamos classificar como de estudos sociais ou de
142 / ANTONI ZABALA

educação artística. A diferença básica entre os modelos organizativos


disciplinares e os métodos globalizados está em que nestes últimos as
disciplinas como tais nunca são a finalidade básica do ensino, senão que
têm a função de proporcionar os meios ou instrumentos que devem
favorecer a realização dos objetivos educacionais. Nestas propostas, o
valor dos diferentes conteúdos disciplinares está condicionado sempre
pelos objetivos que se pretendem. O alvo e o referencial organizador
fundamental é o aluno e suas necessidades educativas. As disciplinas
têm um valor subsidiário, a relevância dos conteúdos de aprendizagem
está em função da potencialidade formativa e não apenas da importância
disciplinar.
Se levamos ao extremo as diferenças entre ambas as propostas, diría-
mos que a distinção se deve à concepção que cada um tem do papel do
ensino, o que implica que as prioridades não sejam as mesmas. No caso
dos modelos disciplinares, a prioridade básica são as matérias e sua
aprendizagem, enquanto que os métodos globalizados situam no centro
da atenção o aluno e suas necessidades educacionais gerais. Também é
evidente que entre um extremo e o outro existem numerosas possibi-
lidades. Uma educação centrada no aluno nunca é uma posição contra-
posta ou excludente, mas somatória. Uma educação centrada exclusiva-
mente na lógica disciplinar pode não observar as necessidades formati-
vas gerais do aluno, mas, no caso contrário, uma educação centrada no
aluno não pode prescindir do ensino dos conteúdos disciplinares.
O diferente grau de importância que se atribui ao fato disciplinar
nas atividades didáticas implica que seguidamente seja difícil estabelecer
uma linha divisória entre os modos de organização de conteúdos no
contexto de métodos globalizados e aqueles que envolvem relações entre
muitas disciplinas. No entanto, convém levar em conta que estamos
falando de perspectivas diferentes de aproximação ao problema da
organização de conteúdos. Nos métodos globalizados, a aproximação ao
fato educativo se realiza a partir da perspectiva de como os alunos
aprendem e, secundariamente, do papel que devem desempenhar as
disciplinas em sua formação. Nas propostas interdisciplinares, o alvo são
as disciplinas e a maneira como os alunos podem aprendê-las melhor.
Como dizíamos anteriormente, trata-se de perspectivas totalmente
diferentes, mas estreitamente vinculadas, já que nem num caso se
prescinde das disciplinas nem no outro se esquece dos alunos.

As disciplinas como organizadoras dos


conteúdos: diferentes graus de relação

Ao longo dos anos, a ciência, em seu empenho em compreender a


realidade, fragmentou o saber até diversificar o conhecimento numa
A PRÁTICA EDUCATIVA / 143

multiplicidade de disciplinas, e cada uma delas, em sua especialização,


criou um corpo diferenciado, determinado por um campo ou objeto
material de referência (por exemplo, o espaço para a geografia, os
animais para a zoologia, as rochas para a geologia, etc.); um campo de
estudo próprio ou objeto formal da disciplina (por exemplo, as formas no
espaço para a geometria, o comportamento para a psicologia, os planos e
os mapas para a cartografia, etc.); certas metodologias próprias para a
observação ou a pesquisa (por exemplo, a experimentação em biologia, o
trabalho de campo na sociologia); certos instrumentos de análise (por
exemplo, a estatística e as simulações); certas aplicações práticas e uma
história diferenciada.
A organização dos conteúdos na escola deu lugar a diversas formas
de relação e colaboração entre as diferentes disciplinas que foram consi-
deradas matérias de estudo. Segundo o grau e as características destas
relações, diversos autores (Boisot, Piaget, Hechausen, Scurati e Damiano)
definiram várias formas de classificação sem que exista um consenso
geral sobre os critérios utilizados, já que em alguns casos levaram em
conta as necessidades escolares e em outros apenas prestaram atenção
aos aspectos epistemológicos.
Se fazemos uma síntese integradora e ao mesmo tempo esquemática,
numa perspectiva educacional podemos estabelecer três graus de
relações disciplinares: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdis-
ciplinaridade:
• A multidisciplinaridade é a organização de conteúdos mais tradi-
cional. Os conteúdos escolares são apresentados por matérias in-
dependentes umas das outras. O conjunto de matérias ou discipli-
nas é proposto simultaneamente, sem que apareçam explicitamente
as relações que podem existir entre elas. Trata-se de uma organi-
zação somativa. Esta concepção é a adotada no bachillerato* atual.
• A interdisciplinaridade é a interação entre duas ou mais disciplinas,
que pode ir desde a simples comunicação de idéias até a inte-
gração recíproca dos conceitos fundamentais e da teoria do conhe-
cimento, da metodologia e dos dados da pesquisa. Estas intera-
ções podem implicar transferências de leis de uma disciplina para
outra e, inclusive, em alguns casos dão lugar a um novo corpo
disciplinar, como a bioquímica ou a psicolingüística. Podemos
encontrar esta concepção na configuração das áreas de Ciências
Sociais e Ciências Experimentais no ensino médio e da área de
Conhecimento do meio no ensino fundamental.

* N. de R.T. No sistema educacional espanhol, o bachillerato é um dos ramos da etapa do


ensino, o que se situa entre a educação secundária obrigatória e o ensino superior - o
bachillerato atende a uma formação propedêutica à universidade em contraposição à
formação mais específica da educação técnico-profissional.
144 / ANTONI ZABALA

• A transdisciplinaridade é o grau máximo de relações entre as disci-


plinas, daí que supõe uma integração global dentro de um sistema
totalizador. Este sistema favorece uma unidade interpretativa,
com o objetivo de constituir uma ciência que explique a realidade
sem parcelamento. Atualmente, constitui mais um desejo do que
uma realidade. De certa maneira seria o objetivo da Filosofia.
Nesta concepção, e vencendo as distâncias lógicas, poderíamos
situar o papel das áreas na educação infantil e nas séries iniciais
do ensino fundamental, onde uma aproximação global de caráter
psicopedagógico determina certas relações de conteúdos com
pretensões integradoras.
Como podemos ver, estas classificações partem das disciplinas, e as
diferenças entre elas provêm do grau e do tipo de relações que se
estabelecem, o que pode dar lugar a formas de organizar os conteúdos,
conforme o critério, que correspondam a uma só disciplina – no caso da
multidisciplinaridade – ou a duas ou mais – no caso da interdiscipli-
naridade.

MÉTODOS GLOBALIZADOS

Se efetuamos uma leitura dos métodos globalizados sem abandonar


a perspectiva disciplinar, poderíamos considerar que organizam os
conteúdos de forma transdisciplinar. Certamente se trata de uma
afirmação atrevida, já que nenhum destes métodos pretende transfor-
mar-se numa disciplina totalizadora. Sua perspectiva se centra exclusi-
vamente no aluno e em suas necessidades educacionais. Assim, pois,
estas necessidades educacionais serão as que obrigarão a utilizar
conteúdos disciplinares e não o contrário.
Se damos outra olhada superficial na maneira de organizar os
conteúdos nos métodos globalizados, poderemos observar que os
conteúdos que são trabalhados procedem de diferentes disciplinas,
apesar de que o nexo que há entre elas não segue nenhuma lógica
disciplinar. Os critérios estruturadores das atividades e articuladores dos
conteúdos de aprendizagem procedem de necessidades alheias às
disciplinas que se utilizam, por exemplo, a necessidade de realizar um
projeto, a de fazer uma pesquisa ou a de tratar ou conhecer um tema de
interesse próximo à realidade do aluno.
Historicamente os métodos globalizados nascem quando o aluno se
transforma no protagonista do ensino; quer dizer, quando se produz um
deslocamento do fio condutor da educação das matérias ou disciplinas
como articuladoras do ensino para o aluno e, portanto, para suas
capacidades, interesses e motivações. Esta mudança de ponto de vista
implica a relativização do valor educativo das disciplinas em relação a
A PRÁTICA EDUCATIVA / 145

sua capacidade para contribuir para o desenvolvimento dos meninos e


meninas. O movimento a que me refiro coincide com o surgimento, no
começo deste século, de uma nova interpretação dos mecanismos através
dos quais nós, as pessoas, adquirimos o conhecimento. Primeiro, com o
termo sincretismo introduzido por Claparède e, posteriormente, Decroly
com o termo globalismo, se postula que se adquire o conhecimento por
percepções que, inicialmente, sempre são globais, de maneira que o
objetivo da educação é favorecer a passagem destas visões globais, e
geralmente superficiais, para uma compreensão mais profunda da
realidade através da análise. Esta concepção fundamentalmente psicoló-
gica da percepção humana e da necessidade de suscitar o interesse dos
alunos é o primeiro desencadeante dos métodos globalizadores. Mas a
estas necessidades, centradas no começo em critérios psicológicos, irão se
acrescentando outras, sob argumentos sociológicos ou epistemológicos,
associados à finalidade última do ensino e à necessidade de oferecer
modelos que permitam interpretar a realidade em sua totalidade.

Quadro 6.1
CENTROS PROJETOS INVESTIGAÇÃO PROJETOS
DE INTERESSE DO MEIO DE TRABALHO
PONTO Situação Situação Situação real Situação real
DE real real Perguntas ou Elaboração
PARTIDA Tema a ser Projeto a ser questões dossiê
INTENÇÃO conhecido realizado

FASES – Observação – Intenção – Motivação – Escolha do


– Associação – Preparação – Perguntas tema
• espaço – Execução – Suposições – Planejamento
• tempo – Avaliação ou hipóteses – Busca de
• tecnologia – Medidas de informação
• causalidade informação – Sistematização
– Expressão – Coleta de da informação
dados – Desenvolvimen-
– Seleção e to do índice
classificação – Avaliação
– Conclusões – Novas
– Expressão e perspectivas
comunicação

Existem diversos métodos que podem ser considerados globaliza-


dores: os centros de interesse de Decroly, o sistema de complexos da
escola de trabalho soviética, os complexos de interesse de Freinet, o sis-
tema de projeto de Kilpatrick, o estudo do meio do MCE, o currículo
experimental de Taba, o trabalho por tópicos, os projetos de trabalho, etc.
146 / ANTONI ZABALA

Por razões históricas, e por sua vigência atual, iremos nos deter em
quatro dos métodos citados:
• Os centros de interesse de Decroly, os quais, partindo de um núcleo
temático motivador para o aluno e seguindo o processo de ob-
servação, associação e expressão, integram diferentes áreas do
conhecimento.
• O método de projetos de Kilpatrick, que basicamente consiste na
elaboração e produção de algum objeto ou montagem (uma má-
quina, um audiovisual, um viveiro, uma horta escolar, um jor-
nal, etc.).
• O estudo do meio do MCE (Movimento de Cooperazione Educativa de
Italia), que busca que meninos e meninas construam o conhe-
cimento através da seqüência do método científico (problema,
hipótese, experimentação).
• Os projetos de trabalho globais, em que, com o fim de conhecer um
tema, tem que se elaborar um dossiê como resultado de uma
pesquisa pessoal ou em equipe.
Todos os sistemas apresentados no Quadro 6.1 partem de uma
situação “real”: conhecer um tema, realizar um projeto, resolver certas
interrogações ou elaborar um dossiê. A diferença fundamental entre eles
está na intenção do trabalho a ser realizado e nas fases que devem ser
seguidas.
Dado que estes métodos não apenas respondem ao problema da or-
ganização dos conteúdos, faremos uma descrição de cada um deles, pres-
tando atenção a todos os aspectos que incluem e às razões que oferecem
seus autores para justificá-los. No tópico seguinte trataremos de analisá-
los desde uma perspectiva concreta da organização de conteúdos.

Os centros de interesse de Decroly


Diversos educadores propuseram métodos que partem de uma
situação ou tema que podem ser motivadores, mas Ovide Decroly (1871-
1932), em sua escola L’Ermitage e com o tema “para a vida mediante a
vida”, aplica um método baseado na comprovação do fato de que às
pessoas interessa sobretudo satisfazer as próprias necessidades naturais.
Estas necessidades implicarão um conhecimento do meio e das formas
de reagir nele. O meio estará constituído por diversos elementos: o
menino ou a menina e a família, a escola, a sociedade, os animais, as
plantas, a terra com seus elementos e os astros. Para satisfazer certas
necessidades naturais, o programa escolar deverá ensinar como se
satisfazem hoje em dia, no país em que se vive e nos demais países
(geografia); como as satisfizeram nossos antepassados (história); o que
nos ajuda a satisfazê-las no mundo animal (ciências naturais); que
A PRÁTICA EDUCATIVA / 147

repercussões têm sobre a organização social. Para cada centro de inte-


resse se seguirão três etapas: observação pessoal e direta através das
ciências; associação no espaço e no tempo e expressão através da língua, o
desenho, o corpo…
A partir destes princípios, este método foi evoluindo e se ampliou o
tipo de centros de interesse. Hoje em dia, se define, com este termo, o traba-
lho de conhecimento sobre um tema que é atrativo e que envolve o uso de
diferentes recursos disciplinares no processo que leva a conhecê-lo.

Seqüência de ensino/aprendizagem
• Observação: Define-se como o conjunto de atividades que tem por
finalidade pôr os alunos em contato direto com as coisas, os seres,
os fatos e os acontecimentos. Este objetivo é alcançado através da
realização de exercícios de comparação, cálculo, experimentação,
expressão oral e escrita, desenho, etc.
• Associação: Através dos exercícios de associação, os meninos e me-
ninas relacionam o que observaram com outras idéias ou realidades
não-suscetíveis de contato e observação direta. É o caso das ativi-
dades de associação no espaço e no tempo, relacionadas com as áreas
de geografia e história; as associações tecnológicas e de adaptação às
necessidades da sociedade e as associações de causa-efeito.
• Expressão: Uma vez adquiridos os dados empirícos mediante a ob-
servação e a medida e uma vez estabelecidas as comparações en-
tre diversos objetos associados no espaço e no tempo, o conheci-
mento é verificado e corrigido com a expressão. A expressão pode
ser concreta, quando utiliza os trabalhos manuais, a modelagem, o
desenho, a música, etc., ou abstrata, quando traduz o pensamento
com ajuda de símbolos convencionais e se identifica com a
linguagem, os signos matemáticos ou musicais, etc.

Justificativa
Decroly utiliza diferentes argumentos, baseados em sua experiência
como homem eminentemente pragmático e sensível aos problemas da
sociedade:
• A criança é o ponto de partida do método. Partir de uma base bio-
psicológica e da observação sistemática envolve se dar conta de
que as diferenças individuais são muito grandes, tanto em relação
às aptidões como ao tempo de maturidade, e que a origem destas
diversidades está tanto no próprio indivíduo como no ambiente.
“A criança não é o queremos que seja, mas o que pode ser.”
• O respeito à personalidade do aluno. “A educação tem que ser
para a vida e baseada na vida. A resposta à imobilidade que con-
148 / ANTONI ZABALA

dena a uma escola passiva é o ensino ativo que permite que o


aluno atue como o inventor ou o artista, quer dizer, realizando
tentativas – fazendo provas e cometendo erros.”
• A alavanca eficaz de toda aprendizagem é o interesse. Mas não
qualquer interesse, porém o profundo, nascido das necessidades
primárias e que é manifestação dos instintos.
• A vida como educadora. A eficácia do meio é decisiva. O fato de
levar em conta as aquisições que a criança fez antes de ir para a
escola leva Decroly a pensar que a maioria das aprendizagens é
feita espontaneamente, por contato com o meio imediato.
• Os meninos e as meninas são seres sociais. Assim, pois, a escola deve
ser concebida de maneira que potencialize o surgimento e o desen-
volvimento das tendências sociais latentes na pessoa. É preciso bus-
car mostrar ao vivo as formas elementares da vida social e praticá-
las, introduzindo em sala de aula encargos e responsabilidades.
• A atividade mental está presidida, em muitos aspectos, pela fun-
ção globalizadora e é influenciada pelas tendências preponde-
rantes no sujeito. Daqui se desprendem os diversos significados
que adquirem os objetos, os acontecimentos, etc., para cada indiví-
duo e em cada momento de sua vida.

O método de projetos de Kilpatrick


Embora a estruturação e difusão do método de projetos tenham sido
obra de Kilpatrick, Dewey realizou as primeiras provas em 1896, na
escola experimental da Universidade de Chicago. Trata-se de um sistema
baseado no funcionalismo e que recebe influências do evolucionismo de
Stanley Hall, das teorias condutistas de Thorndike sobre a aprendizagem
e, evidentemente, das socialistas de Dewey.
Dewey decidiu romper com o intelectualismo que imperava no
ensino e se propôs a incorporar à educação a experiência do aluno, seus
interesses pessoais e os impulsos para a ação. Sua visão sublinha as
diferenças individuais, as atitudes sociais dos alunos no ambiente escolar
e seu desejo de participar na proposição e direção da própria aprendi-
zagem. Concede uma grande importância ao trabalho, à iniciativa
individual, ao fato de se aprender fazendo e à formação democrática.
Kilpatrick foi o realizador prático e divulgador das idéias de seu
mestre Dewey. Suas propostas pedagógicas são as mais características do
pragmatismo americano e da educação democrática. Para ele, o objetivo
da educação consiste em aperfeiçoar a vida em todos seus aspectos, sem
outras finalidades transcendentes. A finalidade da escola deve ser ensi-
nar a pensar e a atuar de maneira inteligente e livre. Por isso, os pro-
gramas têm que ser abertos, críticos e não-dogmáticos, baseados na expe-
A PRÁTICA EDUCATIVA / 149

riência social e na vida individual. Kilpatrick entende o método como


uma adaptação da escola a uma civilização que muda constantemente.
O ponto de partida do método de projetos é o interesse e o esforço. O
professor terá que aproveitar as energias individuais, naturalmente
dispersas, canalizá-las e integrá-las para um objetivo concreto. Um bom
ensino será dado quando os meninos e as meninas possam se mover de
acordo com suas intenções e aglutinem seus esforços e desejos para
objetivos claramente definidos segundo certos ideais e valores.
Para Kilpatrick o projeto é uma “atividade previamente determina-
da”, a intenção predominante desta atividade é uma finalidade real que
orienta os procedimentos e lhes confere uma motivação, um ato proble-
mático, levado completamente a seu ambiente natural”.
O método de projetos designa a atividade espontânea e coordenada
de um grupo de alunos que se dedicam metodicamente à execução de
um trabalho globalizado e escolhido livremente por eles mesmos. Deste
modo, têm a possibilidade de elaborar um projeto em comum e de
executá-lo, sentindo-se protagonistas em todo o processo e estimulando a
iniciativa responsável de cada um no seio do grupo.

Seqüência de ensino/aprendizagem
O projeto compreende quatro fases:
• Intenção: Nesta primeira fase, os meninos e meninas, coordenados
e dirigidos pelo professor, debatem sobre os diferentes projetos
propostos, escolhem o objeto ou montagem que querem realizar e
a maneira de se organizar (grupo/classe, grupos reduzidos, indi-
vidualmente). Definem e esclarecem as características gerais do
que querem fazer, assim como os objetivos que pretendem
alcançar.
• Preparação: A segunda fase consiste em fazer o projeto do objeto
ou montagem. É o momento de definir com a máxima precisão o
projeto que se quer realizar. Para completar esta fase serão
exigidos o planejamento e a programação dos diferentes meios
que serão utilizados, os materiais e as informações indispensáveis
para a realização e as etapas e tempo previstos.
• Execução: Uma vez definido o projeto, os meios e o processo a ser
seguido, o trabalho será iniciado segundo um plano estabelecido.
As técnicas e estratégias das diferentes áreas de aprendizagem
(escrever, contar, medir, desenhar, montar, etc.) serão utilizadas
em função das necessidades de elaboração do projeto.
• Avaliação: Uma vez concluído o objeto ou montagem, será o mo-
mento de comprovar a eficácia e a validade do produto realizado.
Ao mesmo tempo, será analisado o processo seguido e a participa-
ção dos meninos e meninas.
150 / ANTONI ZABALA

Justificativa

Resumidamente, as razões esgrimidas para se trabalhar a partir do


método de projetos são as seguintes:
• Possibilita a atividade coletiva com um propósito real e dentro de
um ambiente natural. Portanto, o projeto deve incluir atividades
em comum, em equipe e o trabalho em comunidade. Pretende
fomentar o espírito de iniciativa ao mesmo tempo que a cola-
boração num projeto coletivo.
• Vincula as atividades escolares à vida real, buscando que se pa-
reçam ao máximo. Dá-se importância aos impulsos das ações,
das intenções, propósitos ou finalidades da ação. No projeto,
intervém todo tipo de atividades manuais, intelectuais, estéti-
cas, sociais, etc.
• Torna o trabalho escolar algo autenticamente educativo, já que os
próprios alunos o elaboram. Potencializa a capacidade de inicia-
tiva do aluno e o respeito à personalidade dos meninos e meninas.
Permite a adequação do trabalho aos níveis de desenvolvimen-
to individual.
• Favorece a concepção da realidade como fato problemático, que é
preciso resolver, e responde ao princípio de integração e de
totalidade, o que dá lugar ao ensino globalizado, quer dizer, não
existem matérias isoladas, senão que os projetos incluem todos os
aspectos da aprendizagem: leitura, escrita, cálculo, expressão
artística, etc.

O método do estudo do meio


Diversos pedagogos se perguntam por que a pesquisa não pode ser
também um bom método de aprendizagem, já que é a forma utilizada
para chegar ao conhecimento. Freinet é quem estrutura, a partir de 1924,
sua teoria pedagógica no princípio do tâtonnement e baseia as técnicas
didáticas no tateio experimental que a criança realiza constantemente.
Herdeiro desta tradição, o Movimento de Cooperazione Educativa (MCE) da
Itália busca organizar e sistematizar o tateio experimental, assim como
esclarecer os fundamentos psicopedagógicos da investigação da criança
como processo natural de aprendizagem, e busca tansformar a escola
numa instituição em que o aluno ponha toda sua bagagem cultural ao
alcance dos demais para que se chegue, de modo conjunto, a conhecer o
mundo cientificamente. Parte-se da idéia de que os meninos e meninas
sabem e trazem para a escola uma grande quantidade de conhecimen-
tos aprendidos de forma natural através de seu próprio tateio experimen-
tal. A criança sempre experimenta quando se “encontra diante de um
A PRÁTICA EDUCATIVA / 151

problema que tenha que solucionar, e o método da investigação imporá


sua solução, através da utilização dos conhecimentos anteriores de uma
forma nova, criativa” (F. Tonucci, 1979).
Para o MCE, pesquisar na escola significa escolher, ordenar, relacio-
nar os elementos descobertos e analisar problemas precedentes. A
pesquisa será o processo natural de aprendizagem na medida em que
está relacionada com o ambiente ou interesse da criança; um ambiente
que lhe é familiar e do qual tem uma experiência imediata.
Deste contato com o meio, de seu interesse, surgirá a motivação pelo
estudo dos múltiplos problemas que se apresentam na realidade. Resol-
ver estes problemas envolverá a proposição de hipóteses de trabalho que
deverão ser verificadas com dados e informações previamente coletados.
Tudo isto permitirá solucionar, total ou parcialmente, o problema que
havia surgido e pode ser o ponto de partida da proposição de novas
questões. Mas o conhecimento obtido é suficientemente importante para
que as conclusões sejam comunicadas aos outros, dentro e fora da escola,
utilizando diversos meios de comunicação (murais, montagens, jornais,
dossiês, reportagens, etc.). Em 1970, este processo de sistematização deu
lugar a uma definição da metodologia de “Estudo do Meio” numa série
de etapas ou fases.

Seqüência de ensino/aprendizagem
• Motivação: Nesta fase inicial se pretende colocar os meninos e
meninas diante de situações próximas de suas experiências vitais,
que lhes provoquem e lhes incentivem, a fim de despertar seus
interesses e suas motivações pelas questões que esta situação
coloca. O debate na sala de aula permitirá definir os aspectos do
tema motivo de estudo.
• Explicitação das perguntas ou problemas: No debate deverão aparecer
opiniões diversas e, sobretudo, numerosas perguntas e problemas
que terão de ser resolvidos. Em grupos reduzidos ou coletiva-
mente – conforme a idade dos alunos – serão definidas e
classificadas as perguntas ou os problemas objeto de pesquisa.
• Respostas intuitivas ou hipóteses: Para muitas das perguntas feitas,
os meninos e meninas já têm suposições ou respostas mais ou
menos intuitivas como resultado de informações ou experiências
anteriores. Mas geralmente se trata de um conhecimento confuso,
quando não errôneo. Nesta fase se pretende que, ao mesmo tempo
que aflorem suas concepções prévias, os alunos possam prever as
formas, meios ou instrumentos que têm que utilizar.
• Determinação dos instrumentos para a busca de informação: Em função
dos conteúdos do tema, do tipo de perguntas, das idades ou das
disponibilidades e disposições da escola, estes instrumentos
152 / ANTONI ZABALA

estarão relacionados com a experiência direta (visitas, entrevistas,


experimentações…), com fontes de informação indireta (artigos,
livros, dados estatísticos, jornais…), ou inclusive com a informa-
ção proporcionada pelos professores.
• Esboço das fontes de informação e planejamento da investigação: Para
poder formular conclusões que realmente sejam verdadeiras é
necessário utilizar os meios adequados e fazê-lo de forma ri-
gorosa. Por este motivo, nesta fase as atividades de busca de infor-
mação e os diferentes instrumentos a serem utilizados (questio-
nários, referências de observação, experimentos de campo ou de
laboratório, etc.) têm que estar claramente definidos, com esboços
previamente trabalhados e um planejamento ajustado.
• Coleta de dados: Nesta fase, os meninos e meninas, através dos
diferentes meios e fontes de informação, coletarão todos aqueles
dados úteis para responder às perguntas e questões colocadas.
• Seleção e classificação dos dados: A informação obtida será múltipla e
diversa, em alguns casos excessiva, noutros contraditória. Será
necessário fazer uma seleção dos dados mais relevantes para
responder às questões. Uma vez selecionadas e classificadas, os
alunos já se encontram prontos para chegar a conclusões.
• Conclusões: Com os dados obtidos, os meninos e meninas poderão
confirmar ou não a validade das suposições e de suas idéias pré-
vias e ampliar seu campo de conhecimento. Também estarão
prontos a generalizar o que foi um estudo restrito a um campo
concreto e a um problema pontual.
• Generalização: Nesta fase se realizará um trabalho de descontex-
tualização e aplicação das conclusões a outras situações para que
não se convertam numa aprendizagem episódica.
• Expressão e comunicação: Através de diferentes técnicas expressivas
e de comunicação serão expostos os resultados da pesquisa aos co-
legas de classe ou da escola, ou inclusive à comunidade. Estes re-
sultados da pesquisa também serão incluídos nos cadernos ou
dossiês individuais que, além de registro do trabalho realizado,
serão o suporte básico de estudo e o meio para sistematizar a
lembrança.

Justificativa
Conforme esta metodologia, a tomada de posição frente a um
problema supõe uma ação sobre o mesmo, uma comunicação dos
resultados obtidos e uma atuação conseqüente. Para o MCE, a pesquisa
sempre envolve uma ação que implica a modificação do meio, contrária
ao “ativismo ingênuo”, que imita a realidade sem intenção de modificá-
la. Portanto, o problema do uso de um esquema de pesquisa não se deve
A PRÁTICA EDUCATIVA / 153

apenas a uma coerência com os processos de aprendizagem, senão que o


essencial é que a aprendizagem científica da realidade sempre parta da
experiência. Esta experiência desenvolverá na criança um “espírito
científico que foi definido como um costume geral de considerar cada
aspecto da realidade física, natural, econômica e social, segundo o
método do exame dos fatos, da verificação experimental, da razão
crítica” (Ciari, 1980). Para o MCE, este espírito científico é essencial no
desenvolvimento do “hábito democrático”. Numa sociedade democrá-
tica, o espírito científico formará cidadãos com capacidade de observar,
de avaliar, de escolher e de criticar , já que este espírito científico significa
capacidade e aptidão para observar as coisas, mas, sobretudo, para
interpretar suas relações. “A capacidade de propor hipóteses, de progra-
mar uma experiência, de tirar conclusões ensina a criança a pensar, a ra-
ciocinar, a comprovar se uma coisa é verdadeira ou falsa; ensina a dis-
tinguir, a escolher; sem ela não existe hábito democrático. Uma mente
passiva, inerte, conformista, não pode constituir uma personalidade de-
mocrática” (Ciari, 1961). A metodologia do MCE terá como objetivo pri-
mordial ensinar a formular “projetos” de experiências e sistematizá-los,
discutir, estabelecer relações, realizar experimentos, tirar conclusões, etc.,
como meio de contribuir para formar cidadãos e cidadãs críticos, respon-
sáveis e com instrumentos para intervir na realidade que os rodeia.

Os projetos de trabalho globais


Esta forma de intervenção nasce de uma evolução dos Project Works
de língua e é uma resposta à necessidade de organizar os conteúdos
escolares desde a perspectiva da globalização, criando situações de
trabalho nas quais as meninas e os meninos se iniciem na aprendizagem
de certos procedimentos que os ajudem a organizar, compreender
e assimilar uma informação. Nesta forma de entender o método, o pro-
duto final do projeto se concretizou na realização de um dossiê ou
monografia. Na elaboração do dossiê se utilizará uma série de ha-
bilidades, estratégias e conhecimentos procedentes de diferentes dis-
ciplinas, áreas ou matérias.

Seqüência de ensino/aprendizagem
Na realização do projeto podem se destacar as seguintes fases:
• Escolha do tema: Parte-se da idéia de que os meninos e meninas
sabem que devem trabalhar sobre alguma coisa e também que
devem fazê-lo de uma determinada maneira.
Como resultado de experiências anteriores, de algum fato de
atualidade ou de um acontecimento, propõem-se temas para trabalhar. O
154 / ANTONI ZABALA

grupo, juntamente com o professor, decide qual será o tema do novo


projeto.
• Planejamento do desenvolvimento do tema: Depois da escolha do
tema, cada menino e menina, ou coletivamente, realiza uma
proposta de índice dos diferentes tópicos do dossiê. Também se
estabelecem as previsões sobre a distribuição do tempo e as
tarefas a serem realizadas para a busca da informação que tem
que dar resposta aos tópicos do índice.
A seguir, o professor ou a professora especificará os objetivos de
aprendizagem e selecionará os conteúdos que tem intenção de trabalhar.
• Busca de informação: A exposição em comum das diferentes
propostas de índice configurará o roteiro de trabalho. Uma vez
escolhidas as formas e os meios mais apropriados e acessíveis
para coletar a informação, os meninos e meninas, distribuídos em
pequenos grupos ou individualmente, buscarão os dados neces-
sários.
• Tratamento da informação: Esta é uma das partes mais significativas
do método, já que nesta fase o aluno tem que poder selecionar e
reconhecer o que é essencial do que é episódico; distinguir entre
hipóteses, teorias, opiniões e pontos de vista; adquirir as habilida-
des para trabalhar com meios e recursos diferentes; classificar e
ordenar a informação; chegar a conclusões e estabelecer processos
de descontextualização para poder generalizar e, finalmente,
propor novas perguntas.
• Desenvolvimento dos diferentes tópicos do índice: A partir da infor-
mação coletada e selecionada, se elaboram os conteúdos dos
diferentes capítulos que compõem o índice.
• Elaboração do dossiê de síntese: Nesta fase se concretiza o que para os
alunos é o produto do projeto e que conduziu e justificou todo o
trabalho anterior.
Realiza-se a síntese dos aspectos tratados e dos que ficam abertos a
futuras aproximações por parte de toda a classe e de cada aluno.
• Avaliação: A seguir, se avalia todo o processo em dois níveis: um
de caráter interno, que cada menino e menina realiza e no qual
recapitula o que fez e o que aprendeu, e outro de caráter externo,
no qual, com ajuda do professor ou professora, os alunos têm que
se aprofundar no processo de descontextualização, aplicando a
situações diferentes a informação trabalhada e as conclusões
obtidas, estabelecendo relações e comparações que permitam a
generalização e a conceitualização.
• Novas perspectivas: Finalmente, abrem-se novas perspectivas de
continuidade para o projeto seguinte, a fim de que se mantenha
um maior grau de inter-relação e significado no processo de
aprendizagem.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 155

Justificativa

Esta forma de intervenção é justificada por diversos argumentos.


Como poderemos observar, a maioria deles está relacionada com a
importância que se dá ao aprender a aprender e ao envolvimento do
aluno em sua aprendizagem. Em resumo, esta maneira de intervir:
• Permite uma abordagem dos conteúdos de aprendizagem defini-
dos pela escola a partir do diálogo que se estabelece entre os
objetivos explicitados pelos alunos e a mediação e intervenção do
professor, que assegura sua correta seqüenciação.
• Promove contextos de trabalho em que os alunos podem, a partir
de uma proposição inicial (relacionada com seus conhecimentos
prévios), buscar informação, selecioná-la, compreendê-la e rela-
cioná-la através de diferentes situações para convertê-la em co-
nhecimento.
• Contribui com um sentido da globalização, segundo o qual as
relações entre as fontes de informação e os procedimentos para
compreendê-la e utilizá-la têm que ser estabelecidas pelos alunos
e não pelos professores, como acontece nos enfoques interdis-
ciplinares.
• Dá prioridade a uma perspectiva procedimental no processo de
ensino e aprendizagem. A ênfase na relação entre ensino e
aprendizagem é sobretudo de caráter procedimental e gira em
torno do tratamento da informação, portanto potencializa a
aprendizagem de estratégias e procedimentos instrumentais e
cognitivos acima dos conteúdos conceituais.
• Promove um elevado nível de envolvimento do grupo/classe, na
medida em que todos estão aprendendo e compartilhando o que
aprendem. Neste sentido, o docente ou a equipe de educadores não
são os únicos responsáveis pela atividade que se realiza em aula.
• Contribui para levar em conta as diferentes possibilidades e
interesses dos alunos na aula, a fim de que ninguém permaneça
desconectado e de que cada um encontre um lugar para participar
na aprendizagem.

ANÁLISE DAS DIFERENTES FORMAS


DE ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS

Este exame de quatro modelos de intervenção globalizados nos


permitiu ver que não só dão uma determinada resposta à maneira de
organizar os conteúdos, como que cada um propõe formas diferenciadas,
tanto em relação às seqüências de ensino/aprendizagem como em
relação ao papel dos grupos, o uso de materiais e a função da avaliação.
156 / ANTONI ZABALA

Portanto, as razões que se esgrimem em cada caso se referem a aspectos


gerais e a outros vinculados à globalização e sua fundamentação. Se nos
detemos na maneira de resolver a organização dos conteúdos e a
comparamos com as proposições estritamente disciplinares, veremos que
a importância que se dá ao aluno e a como aprende e a finalidade que se atribui
ao ensino são as chaves que motivam a opção globalizadora.
Nos modelos disciplinares, a concepção de como se aprende, no que
se refere à organização dos conteúdos, tem uma importância relativa,
pelo menos no ponto de partida. A disciplina é o objeto de aprendi-
zagem, e este fato é indiscutível. É preciso dominar o corpo conceitual da
disciplina e seus métodos e técnicas específicos. O conhecimento sobre a
aprendizagem em geral não tem que servir para questionar a disciplina,
mas, sim para estabelecer as propostas didáticas mais apropriadas para
sua aprendizagem. Uma vez aceita a disciplina como objeto do ensino,
será aplicado o conhecimento do como se aprende para determinar a
metodologia adequada. Assim, pois, o fator fundamental numa tomada
de posição exclusivamente disciplinar não está determinado tanto por
razões psicopedagógicas, mas pelo papel que se atribui ao ensino, quer
dizer, a sua função social. A pergunta-chave volta a ser a que questiona
qual tem que ser o papel do ensino e, portanto, que tipo de cidadão e
cidadã se propõe e, portanto, que capacidades é preciso desenvolver. As
disciplinas e sua formalização promovem o desenvolvimento de
capacidades cognitivas – nem todas – e, em menor grau, das outras
capacidades humanas. Segundo a resposta que se dê ao que se considera
que os meninos e meninas têm que “saber “, “saber fazer” ou “ser” ao
concluir seu percurso educacional, será determinada a importância dos
diferentes conteúdos disciplinares e a forma mais apropriada de organizá-
los. Por este motivo, tem certa lógica que no Bachillerato* se configure uma
organização de conteúdos em que as disciplinas sejam as estruturadoras do
currículo, já que são o objeto de estudo prioritário, dado que a função
fundamental do bachillerato é claramente propedêutica e se entende que seu
objetivo prioritário é o desenvolvimento das capacidades cognitivas relacio-
nadas com conteúdos de caráter disciplinar. No entanto, esta clara definição
disciplinar vai perdendo importância quando nos referimos ao ensino
obrigatório**, porque o objeto de estudo, se levamos em conta a função
social do ensino nesta etapa, não pode ser exclusivamente disciplinar, dado
que as finalidades educacionais têm um caráter eminentemente formativo
de todas as capacidades da pessoa.

** N. de R.T. Ver a 2a nota da p. 31.


** N. de R.T. No sistema educacional espanhol, o ensino obrigatório - educação básica
obrigatória - compõe-se da educação primária, com seis anos de duração, e da educação
secundária obrigatória, com quatro anos.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 157

Neste ponto adquirem grande importância as propostas globaliza-


das, posto que buscam situar o objeto do ensino num campo em que as
disciplinas não são tudo. A alternativa não é uma negação das discipli-
nas, mas uma posição diferente de seu papel e, como observaremos, não
tem a mesma importância em cada um dos métodos globalizados ante-
riormente descritos.

A intervenção na realidade:
objetivos dos métodos globalizados
Em primeiro lugar, utilizaremos o referencial “função social do
ensino” – e como se concretiza no trabalho sobre determinados conteú-
dos de aprendizagem – para analisar as diferentes formas de intervenção
pedagógicas que descrevemos em torno dos centros de interesse, o
método de projetos, o estudo do meio e os projetos de trabalho.
• Os centros de interesse, numa primeira aproximação, consistem na
busca da informação para conseguir a melhora no conhecimento
de um tema que é interessante para o aluno. Portanto, os con-
teúdos de aprendizagem são basicamente conceituais. Mas pode-
mos nos dar conta de que a forma de adquirir estes conceitos tem
um interesse crucial, daí que os conteúdos procedimentais
relativos à investigação autônoma e à observação direta são essen-
ciais. Ao mesmo tempo, os conteúdos atitudinais vinculados à
socialização, à cooperação e à inserção no meio são os estrutura-
dores da maioria das atividades que configuram o método.
• No método de projetos de Kilpatrick, os conteúdos básicos de apren-
dizagem são de caráter procedimental e atitudinal. O que interes-
sa não é tanto o tema de trabalho, o objeto que se constrói ou a
montagem que se realiza, mas todas as habilidades individuais e
grupais que têm que se promover para conseguir o objetivo esta-
belecido. De certo modo, os conteúdos conceituais estão em fun-
ção da capacidade de planejamento e realização. As habilidades
vinculadas ao “saber fazer” e ao “saber resolver” são o fio condu-
tor do método. Da mesma maneira, a capacidade de participação e
trabalho associada a necessidades colocadas na vida real é a
orientadora dos conteúdos atitudinais.
• Neste sentido, o estudo do meio é o método mais completo, já que os
conteúdos procedimentais estão presentes em todas as fases e
etapas – atribuindo uma importância especial não apenas àqueles
relacionados com a busca de informação, como também aos mais
complexos de caráter estratégico cognitivo. Além do mais, os
conteúdos conceituais, vinculados a problemas e conflitos da vida
real, são básicos como instrumentos para compreender esta
158 / ANTONI ZABALA

realidade social. Os conteúdos atitudinais também são os


orientadores e estruturadores de toda a metodologia. Os valores e
atitudes relacionados com o fomento de uma cidadania
comprometida, ao mesmo tempo que é capaz de pôr em dúvida e
fundamentar suas opiniões não apenas intuitivamente, como
também com argumentos contrastados pelas diferentes fontes de
informação, é chave na definição das razões que justificam o
método.
• No método de projetos de trabalhos globais, os conteúdos que cen-
tram o trabalho são de caráter conceitual e estão relacionados com
o conhecimento de um tema ligado à realidade, geralmente do
mundo sócio-natural (o que é, como funciona, como se desenvol-
ve, quando aconteceu, por que motivo, etc.). O que o torna mais
relevante é o trabalho sistemático de alguns conteúdos proce-
dimentais relacionados com a busca de informação e de trabalho
em grupo, assim como a utilização constante de determinadas
estratégias cognitivas associadas ao “aprender a aprender”. Por
outro lado, o interesse pelo trabalho dos conteúdos atitudinais é
mais fraco, já que, apesar de estarem presentes (cooperação no
trabalho em equipe, rigor na proposição das atividades de busca
de informação, etc.), não são os motores do método.
De forma esquemática, poderíamos afirmar, apesar de correr o risco
de um reducionismo evidente, que cada uma destas propostas dá
prioridade a uma determinada função social do ensino. Assim, nos
centros de interesse a função social do ensino consiste em formar cida-
dãos preparados para conhecer e interagir com o meio; o método de
projetos de Kilpatrick considera que sua finalidade é a preparação para a
vida de pessoas solidárias que “sabem fazer”; o método de estudo do
meio submete a ação educativa à formação de cidadãos democráticos e
com “espírito científico” e, finalmente, os projetos de trabalho globais
entendem que o objetivo é a formação de cidadãos e cidadãs capazes de
“aprender a aprender”.
Como podemos observar, apesar das diferenças, o objetivo básico des-
tes métodos consiste em conhecer a realidade e saber se desenvolver nela. O papel
que se atribui ao ensino é o denominador comum que justifica o caráter
globalizador. Se as finalidades do ensino estão voltadas para o conhe-
cimento e à atuação para a vida, então parece lógico que o objeto de estudo
deve ser o eixo estruturador das aprendizagens, seja a própria realidade. Por
isso, o ensino de todos aqueles conhecimentos, estratégias, técnicas, valores,
normas e atitudes que permitem conhecer, interpretar e agir nesta realidade
deveria partir de problemas concretos, situações verossímeis, questões
específicas de uma realidade global mais ou menos próxima dos interesses e
das necessidades dos futuros cidadãos adultos, membros ativos de uma
sociedade que nunca colocará problemas disciplinares específicos.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 159

O meio social a que pertencem sempre é muito mais complexo do que


os enunciados definidos pelas disciplinas ou matérias. É imprescindível não
cometer o erro simplista de acreditar que o conhecimento isolado de
técnicas e saberes é suficiente para dar resposta aos problemas da vida social
e profissional futura. Se não se realiza o difícil exercício de integrar e relacio-
nar estes saberes, será impossível que os conhecimentos possam se trans-
formar num instrumento para a compreensão e a atuação na sociedade.
Com este objetivo de estabelecer vínculos com o mundo real e partindo de
problemas tirados da realidade, os métodos globalizados tentam propor-
cionar aos meninos e meninas meios e instrumentos para que num
determinado momento possam realizar a difícil tarefa de aplicá-los às
complexas situações que lhes serão colocadas pela vida em sociedade.

Significância, funcionalidade e atitude


favorável nos métodos globalizados

Se a realidade, como objeto de estudo, é o nexo comum dos métodos


globalizadores, também o é a necessidade de criar as condições que
permitam que o aluno esteja motivado para a aprendizagem e que seja
capaz de compreender e aplicar os conhecimentos adquiridos. Uma
análise atualizada nos permite concretizar este interesse a partir da
atenção aos princípios psicopedagógicos da aprendizagem significativa,
baseados na necessidade de estabelecer o maior número de vínculos
substantivos e não-arbitrários entre os conhecimentos prévios e a poten-
cialização da atitude favorável.
Realmente, nos métodos globalizados os diversos conteúdos de
aprendizagem sempre são justificados pela necessidade de realizar um
projeto concreto, de conhecer um tema de interesse, ou como meio para
resolver alguns problemas ou questões que os alunos colocam. O
conhecimento de um conceito gramatical, a utilização da medida própria
da matemática, ou conhecimento do conceito de erosão ou do ciclo da
água nunca são o resultado de um trabalho em si mesmo, mas de uma
necessidade sentida. Num modelo globalizador, os alunos sempre
conhecem o sentido da tarefa que realizam. As estratégias globalizadoras
pretendem que aquilo que se aprende parta de uma necessidade sentida
e não de conhecimentos impostos a priori. Os meninos e meninas se
fazem perguntas acerca de fenômenos para os quais não têm explicação,
e através de diversas atividades, de experimentação, de leitura e de
comparação entre diferentes opiniões, podem chegar a compreender a
formulação de princípios ou conceitualizações complexas. Atividades
cujos novos conteúdos sempre são funcionais e significativos pelo fato de
não estarem estabelecidos por necessidades alheias à própria realização
do projeto ou da busca de informação.
160 / ANTONI ZABALA

Posto que se parte de uma situação real, e portanto complexa, o


número de relações que pode se estabelecer entre as experiências
anteriores e os novos conteúdos pode ser maior, já que ao incrementar o
número de vínculos, a significância da aprendizagem aumentará e terá
mais possibilidades de aplicação em situações diferentes. Esta é uma das
razões que, em sua época, Claparède e sobretudo Decroly esgrimiram, a
partir de outras concepções psicopedadógicas, para fundamentar suas
propostas. Esta razão corresponde à necessidade de responder, na vida
real, a situações que nunca estão segmentadas, senão que se apresentam
sob uma grande complexidade de variáveis que atuam simultaneamente.
Quanto mais relações possam ser estabelecidas entre os novos conteúdos
e os esquemas de conhecimento já existentes, mais possibilidades terá a
pessoa de dar resposta a situações ou problemas complexos.
Junto a esta necessidade de dotar as aprendizagens de significância, o
fato de partir de situações próximas também constitui o meio para criar as
condições que favorecem o trabalho, já que fomenta a atitude favorável para
a aprendizagem ou, se se prefere, para a motivação intrínseca. Os métodos
expostos sempre partem do interesse dos alunos e em seu desenvol-
vimento buscam que não decaia a atenção, a fim de garantir que as ati-
vidades contribuam para a assimilação dos conteúdos trabalhados.
O fato de que os conteúdos trabalhados (leitura, cálculo, expressão
oral, respeito ao meio ambiente) não sejam uma imposição externa, mas se
apresentem como o que é preciso conhecer para responder a interrogações
pessoais, realizar atividades que se considerem interessantes e tomar
decisões sobre a forma de estudar, supõe um incentivo para o aluno, o qual
dá valor positivo ao trabalho sobre conteúdos que lhe são úteis.

O ENFOQUE GLOBALIZADOR, UMA


RESPOSTA A NECESSIDADES VARIADAS
E INCLUSIVE CONTRAPOSTAS

Do exame que realizamos até agora se conclui que os métodos


globalizados dão resposta à necessidade de que as aprendizagens sejam o
mais significativas possível e, ao mesmo tempo, conseqüentes com certas
finalidades que apontam para a formação de cidadãos e cidadãs que
compreendam e participem numa realidade complexa. Portanto,
poderíamos dizer que quando se participa destas finalidades, a forma
mais adequada de organizar os conteúdos tem que ser a dos métodos
globalizados. Mas esta aparente conclusão não é de todo certa. Neste
marco, os referenciais a serem levados em conta – o construtivismo e o
conhecimento da realidade – nos propõem que as aprendizagens sejam o
mais significativas possível e que permitam resolver os problemas de
A PRÁTICA EDUCATIVA / 161

compreensão e participação num mundo complexo. É evidente que os


métodos globalizados atendem a estes requisitos, mas não são a única
forma possível de atendê-los.
Respeitar a concepção construtivista e que o objeto de estudo sejam
os problemas de compreensão e atuação no mundo real implica que toda
a intervenção pedagógica parta sempre de questões e problemas da
realidade, do meio do aluno (entendido no sentido amplo: não apenas o
que o rodeia, como tudo quanto influi nele e o afeta). Para responder a
estas questões ou problemas será necessário utilizar instrumentos concei-
tuais e técnicos, que sem dúvida nenhuma, procedem das disciplinas;
instrumentos que será necessário aprender a manejar rigorosamente, e
em profundidade, se queremos que cumpram sua função. Rigor que
obviamente só pode se produzir desde o marco de cada uma das
disciplinas. E aqui é onde surge o conflito: como podemos partir de
problemas que nos proponham as situações reais e ao mesmo tempo
respeitar a estrutura e a organização lógicas das disciplinas?
Não podemos alterar os diferentes saberes ou matérias sem correr o
risco de provocar erros conceituais ou procedimentais em sua apren-
dizagem. É imprescindível que os conteúdos disciplinares sejam
apresentados e trabalhados atendendo à lógica definida pela matéria.
Portanto, o planejamento prévio dos conteúdos de aprendizagem, sua
seleção e sua seqüenciação terão que corresponder, num grau muito
elevado, – os demais estarão determinados pelo nível de desenvolvi-
mento e conhecimentos prévios dos alunos – à própria forma em que se
estrutura cientificamente a disciplina. Isto quer dizer que devemos levar
em conta, ao longo do ensino, uma série de conteúdos de aprendizagem
procedentes de diferentes matérias, selecionadas e seqüenciadas de acor-
do com sua lógica. Mas esta finalidade não tem por que ser contraditória
numa proposta que parta de situações tão reais quanto seja possível.
Trata-se de um problema de ponto de partida e de atitude na
proposição das atividades de ensino/aprendizagem. A solução se acha
no que podemos denominar enfoque globalizador, segundo o qual toda
unidade de intervenção deveria partir, como dizíamos, de uma situação
próxima à realidade do aluno, que seja interessante para ele e lhe proponha
questões às quais precisa dar resposta. Se isto é assim, é possível organizar os
conteúdos por disciplinas, nas quais os conteúdos de aprendizagem se
entrecruzem conforme a lógica das matérias, mas que, por outro lado, em
sua apresentação aos alunos, nas atividades iniciais, a justificativa dos
conteúdos disciplinares não seja unicamente uma conseqüência da lógica
disciplinar, mas o resultado de ter que dar resposta a questões ou
problemas que surgem de uma situação que o aluno pode considerar
próxima. Assim, pois, neste enfoque, e desde uma organização por
disciplinas fechadas, na aula de matemática se partiria de uma situação
da realidade cuja solução exigisse o uso de recursos matemáticos; na aula
162 / ANTONI ZABALA

de língua, de uma situação comunicativa próxima que é preciso melhorar


com instrumentos lingüísticos; na aula de ciências experimentais, de um
problema de compreensão de um fenômeno mais ou menos cotidiano; na
aula de ciências sociais, dos problemas interpretativos que decorrem de
um conflito social; etc.
No esquema do Quadro 6.2, podemos ver que em cada área a
seqüência didática começa com a descrição de uma situação da realidade
que coloca diferentes questões; questões e problemas que podem ser
abordados com diferentes pontos de vista. Numa escola organizada de
forma que cada disciplina ou matéria é lecionada por um professor ou
professora diferente, partir-se-á, neste esquema de situações diferentes.
A professora de matemática, por exemplo, definirá a situação da
realidade nos problemas que deve resolver um grupo de rock que
procura alugar um lugar para ensaiar. Os problemas que se deduzem
desta situação são múltiplos, mas como nos encontramos numa aula de
matemática só nos deteremos naqueles aspectos ou problemas que são
matematizáveis: espaço, investimento, custos fixos e variáveis, consumo,
financiamento, rentabilidade, etc. Na aula de língua, o professor propõe
um debate sobre uma situação que surgiu na escola e que provocou mal-
estar entre professores, pais e alunos. Após o debate é feito um acordo de
participar na solução eleborando um documento que ajude a com-
preender as posições das partes envolvidas. O professor utiliza esta
situação para realizar uma série de atividades relacionadas com as
competências lingüísticas dos meninos e meninas e com alguns aspectos
morfossintáticos. Cada um dos professores e professoras seguirá o
mesmo esquema na área que lhe corresponde: situação da realidade,
proposição de questões, utilização de instrumentos e recursos
disciplinares, formalização conforme os critérios científicos da disciplina
e aplicação a outras situações para favorecer a generalização e o domínio
dos conceitos e das habilidades aprendidos.

Quadro 6.2

Situação realidade A → problemas → recursos matemáticos → formalização


(matemática) → aplicação a outras situações
Situação realidade B → dilemas comunicativos → instrumentos lingüísticos
→ formalização (língua) → aplicação a outras situações
Situação realidade C → questões → meios “científicos” → formalização (ciên-
cias experimentais) → aplicação a outras situações
Situação realidade D → conflitos → recursos “sociais” → formalização (ciências
sociais) → aplicação a outras situações
Situação realidade E → comparações → instrumentos expressivos → formali-
zação (educação artística) → aplicação a outras situações
A PRÁTICA EDUCATIVA / 163

Seguindo este esquema conseguiremos que o aluno entenda o


porquê da aprendizagem dos diferentes instrumentos conceituais, das
técnicas e dos recursos das diversas disciplinas. Desta forma, o aluno
melhora o significado das aprendizagens, ao mesmo tempo que mostra
um grau de interesse e uma motivação mais elevados, já que se dá conta
de que na escola não apenas faz “o que tem de fazer”, nem o que faz é
para prever necessidades futuras, geralmente incompreensíveis do ponto
de vista de uma criança ou um adolescente (para quando for adulto, para
seguir curso superior ou para exercer uma profissão).
Dado que na perspectiva comentada não se estabelecem as relações
entre as diferentes variáveis que intervêm em toda situação, poderemos
aperfeiçoar este esquema de intervenção se acrescentamos uma atividade
em que os meninos e meninas, voltando à situação de partida, relacionem
os problemas que abordaram desde uma única perspectiva disciplinar
com outros que se dão naquela mesma situação e que foram deixados de
lado (veja-se esquema adjunto).

Situação realidade → proposição questões → instrumentos disciplinares → forma-


lização → aplicação a outras situações → revisão integradora

O exemplo que descrevemos pode corresponder a uma escola que


tem professores diferentes para cada área, mas que conta com as
circunstâncias favoráveis para que os especialistas que intervêm num
mesmo grupo/classe trabalhem em equipe. No caso de que todas as
áreas sejam lecionadas pelo mesmo professor ou professora, não será
difícil, e ao mesmo tempo representará uma grande economia de tempo,
conceber uma situação inicial que proponha problemas ou questões que
possam ser solucionados através de recursos disciplinares a partir de
cada uma das matérias, em vez de buscar uma situação motivadora para
cada disciplina (Quadro 6.3). Assim, pois, podemos observar que,
partindo de uma organização de conteúdos disciplinares mas proposta
desde um enfoque globalizador, caso se dêem as condições favoráveis, é
possível chegar a um modelo assimilável às propostas dos métodos
globalizados.
O inconveniente representado por uma organização fundamen-
talmente disciplinar, apesar de que se tente partir de um enfoque
globalizador, é o perigo de não introduzir o máximo de relações, de se
limitar ao marco de cada disciplina e à situação real de partida, de
maneira que se deixem de lado as relações e os vínculos entre os
conteúdos das diferentes disciplinas – os quais permitem que cada vez
mais os meninos e meninas enriqueçam suas estruturas de conhecimento
com esquemas interpretativos suficientemente complexos para respon-
der aos problemas e às situações que deverão resolver no mundo real. O
outro inconveniente de uma abordagem exclusivamente disciplinar afeta
164 / ANTONI ZABALA

os conteúdos de caráter atitudinal que não estão relacionados de forma


direta com nenhuma disciplina e que, por outro lado, são básicos, e
inclusive prioritários, numa determinada concepção do ensino. Numa
organização disciplinar, de quem dependem os conteúdos como o res-
peito, a solidariedade, a cooperação, os valores não-sexistas, etc.? Quem
se sentirá responsável pela realização dos objetivos educacionais
relacionados com estes conteúdos? Quem introduzirá em suas unidades
didáticas situações conflitantes que provoquem a intervenção do
professor ou da professora para ajudar os alunos em seu progresso?
Quando se fala de enfoque globalizador não só se propõe uma
forma de entender a organização dos conteúdos, como também uma
maneira de conceber o ensino, em que, como nos métodos globalizados, o
protagonista é o aluno e as disciplinas são um dos meios que temos para
favorecer seu desenvolvimento pessoal.

Quadro 6.3

→ problemas → recursos matemáticos → for-


malização (matemática) → aplicação a outras si-
tuações
→ dilemas comunicativos → instrumentos lin-
güísticos → formalização (língua) → aplicação a
outras situações
→ questões → meios “científicos” → forma-
Situação lização (ciências experimentais) → aplicação a Integração
realidade A outras situações
→ conflitos → recursos “sociais” → formali-
zação (ciências sociais) → aplicação a outras
situações
→ comparações → instrumentos expressivos
→ formalização (educação artística) → aplica-
ção a outras situações

Conclusões

Como pudemos observar, a organização dos conteúdos não é um


tema menor, uma decisão secundária ou um problema de escolha
estritamente técnico. Ao contrário, responde à própria essência do que se
pretende alcançar com a educação obrigatória, ao protagonismo que se
atribui ao aluno como sujeito ativo na construção do conhecimento, à
análise que se realize dos fatores e das variáveis que intervêm,
favorecendo ou obstaculizando esta construção.
A PRÁTICA EDUCATIVA / 165

Também fica claro que se inclinar por um enfoque globalizador


como instrumento de ajuda para a aprendizagem e o desenvolvimento
dos alunos numa perspectiva global, que não deixa de lado nenhuma das
capacidades que a educação deve atender, em nenhum caso supõe a
rejeição das disciplinas e dos conteúdos escolares. Pelo contrário, segun-
do nossa opinião, implica atribuir-lhes seu verdadeiro e fundamental
lugar no ensino, que tem que ir além dos limites estreitos do conhe-
cimento enciclopédico, para alcançar sua característica de instrumento de
análise, compreensão e participação social. Esta característica é a que os
torna suscetíveis de contribuir de forma valiosa para o crescimento pes-
soal, já que fazem parte da bagagem que determina o que somos, o que
sabemos e o que sabemos fazer.
De tudo quanto vimos até agora, podemos deduzir que o mais
importante não é levar a cabo uma organização de conteúdos conforme
um ou outro modelo. O debate não consiste em seguir ao pé da letra um
método globalizado ou se inclinar por um modelo disciplinar. Um ou
outro serão mais ou menos apropriados conforme a coerência dos con-
teúdos trabalhados em relação aos projetos previstos e a adequação das
atividades ao conhecimento que temos sobre os processos de aprendi-
zagem. Se isto é realmente assim, a resposta será a opção de organizar os
conteúdos a fim de nos assegurar ao máximo, através de um enfoque
globalizador, de que as aprendizagens sejam o mais significativas
possível para que o que os meninos e meninas aprendam lhes ajude a se
formar como cidadãos competentes para compreender a sociedade em
que vivem e participar nela construtivamente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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cepción constructivista del aprendizaje escolar y de la enseñanza” em: C. COLL, J.
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ciplinas?” em: Infancia y aprendizaje, 56, pp. 7-18.
FREINET. C. (1980): Técnicas Freinet de la escuela moderna. Madri. Siglo XXI.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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