Fenologia e Clima

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FENOLOGIA

Fenologia da Siparuna DA Siparuna


guianensis Aublet ... guianensis Aublet EM DOIS BOSQUES 581
DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL EM CUIABÁ-MT

Carla Maria Abido Valentini1, Juliane Dias de Almeida2, Maria de Fatima Barbosa Coelho3*,
Carmem Eugênia Rodríguez-Ortíz2

*Corresponding author: [email protected]

RESUMO: A negramina (Siparuna guianensis Aublet), pertencente à família Siparunaceae, é uma espécie bastante utilizada no
Mato Grosso na forma de banho para tratamento de gripe, dor de cabeça, reumatismo e “malina”, porém pouco se conhece sobre sua
reprodução e domesticação. Com este trabalho, objetivou-se investigar o comportamento fenológico da espécie para se determinar
as intensidades de queda da folhagem na copa, brotação, floração e frutificação, visando a subsidiar a melhor época de coleta de
estacas e sementes para sua reprodução ex situ. Os aspectos fenológicos da S. guianensis foram obtidos por meio da observação
quinzenal de 40 indivíduos em duas áreas de preservação ambiental localizadas em Cuiabá-MT, entre agosto de 2007 e julho de
2009. A região apresenta uma evidente sazonalidade climática com duas estações bem definidas: uma seca (outono-inverno) e uma
chuvosa (primavera-verão), sendo que 70% da precipitação média anual de 1250 a 1500 mm ocorre entre novembro e março. Foram
analisados os índices de atividade, de intensidade e de sincronia para os eventos fenológicos em relação à sazonalidade climática.
Concluiu-se que em ambos os locais o comportamento da S. guianensis teve padrões semelhantes, sendo uma espécie perenifólia,
com maior perda de folhas no período seco, sua brotação ocorreu ao longo de todo ano, com picos de atividade e de intensidade no
final do período chuvoso, houve intensa floração na transição entre o período seco e o chuvoso, e o período de frutificação somente
aconteceu no período chuvoso. Para a fenofase de floração, houve uma alta sincronia entre os indivíduos de ambos os locais. Sugere-
se para fins de reprodução ex situ a coleta de estacas no final do período chuvoso, época de intenso crescimento vegetativo, e das
sementes durante o período chuvoso.

Palavras-chave: Brotamento, padrões fenológicos, sincronia de floração.

PHENOLOGY OF TWO Siparuna guianensis Aublet WOODS OF ENVIRONMENTAL


CONSERVATION AREAS IN CUIABÁ-MT (BRAZIL)

ABSTRACT: The negramina (Siparuna guianensis Aublet) belonging to the family Siparunaceae, is a species widely used in Mato
Grosso, Brazil, as a bath for treatment of flu, headache, rheumatism and “malina”, but little is known about their breeding and
domestication. The objective of this study was to investigate the phenology of the species to determine the intensities of the fall foliage
in the canopy, budding, flowering and fruiting in order to support the best time to collect seeds and cuttings for ex situ breeding.
The phenological aspects of S. guianensis were obtained through observation biweekly 40 individuals in two areas of environmental
conservation located in Cuiaba-MT, between August 2007 and July 2009. The region presents a clear seasonal climate with two
distinct seasons: a dry (autumn-winter) and rainy (spring-summer), and 70% of the average annual precipitation from 1250 to 1500
mm occurs between November and March. We analyzed the activity indices, intensity and synchrony to the phenological events in
relation to climatic seasonality. It was concluded that in both places the behavior of S. guianensis had similar patterns, being an
evergreen species, with greater loss of leaves during the dry season, his shooting occurred throughout the year, with peak activity
and intensity at the end of the rainy season, there was intense flowering in the transition between the dry and rainy, and the fruiting
period occurred only during the rainy season. For the flowering phenophase there was a high synchrony between individuals from
both locations. It is suggested for breeding ex situ collection of cuttings at the end of the rainy season, time of intense vegetative
growth, and the seeds during the rainy season.

Key words: Budding, phenological patterns, synchrony of flowering.

1 INTRODUÇÃO de cabeça, reumatismo e “malina” (VALENTINI et al.,


2010), e tal como outras espécies dessa fitofisionomia
Siparuna guianensis Aublet, espécie medicinal e sofre a ação do extrativismo, do fogo e da substituição por
aromática, conhecida em Mato Grosso como negramina, pastos e monoculturas e, no caso do município de Cuiabá,
é um arbusto encontrado no Cerrado que tem várias pela ocupação antrópica que tem adentrado as áreas dos
indicações terapêuticas, especialmente para gripe, dor Parque e Bosques.

1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso – Cuiabá, Mato Grosso, Brasil
2
Universidade Federal do Mato Grosso – Cuiabá, Mato Grosso, Brasil
3
Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira – Redenção, Ceará, Brasil

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Ribeiro et al. (1981), trabalhando com espécies KLINK, 2006). Tem sido encontrado que, com o aumento
nativas do Cerrado, salientaram que um dos passos iniciais da severidade da estação seca, ocorre maior proporção
para o conhecimento e utilização dessas espécies é o estudo de espécies decíduas, sendo que a queda foliar ocorre
de sua biologia e, em particular, o de sua fenologia, e Vieira durante essa estação (BATALHA; MANTOVANI, 2000;
et al. (2003) ressalvaram a importância de uma rápida ação MIRANDA, 1995; OLIVEIRA, 1998; REICH, 1995;
das instituições no sentido de resgatar, conservar “ex situ”, WILLIAMS et al., 1997) e o brotamento, florescimento
estudar e promover a domesticação dessas espécies. e frutificação podem ocorrer de maneira menos sazonal,
Fenologia é o estudo da ocorrência de eventos tanto na estação seca como na chuvosa (BATALHA;
biológicos repetitivos e das causas de sua ocorrência MANTOVANI, 2000; GOUVEIA; FELFILI, 1998).
em relação às forças seletivas bióticas e abióticas e da Porém, para a maioria das espécies, a floração ocorre na
inter-relação entre as fases caracterizadas por esses estação seca (FRANKIE et al., 1974; MIRANDA, 1995).
eventos, dentro de uma mesma ou de várias espécies Mas, mesmo perante a complexidade dos ciclos
(LIETH, 1974). Essa ciência que identifica os fenômenos fenológicos dessas plantas tropicais e das diferenças
de floração, frutificação, brotamento e queda de folhas, marcantes em nível comunitário no comportamento
objetiva o conhecimento do ciclo anual das espécies, o fenológico das espécies do cerrado, principalmente em
qual está diretamente relacionado às condições climáticas estudos de curto prazo (BENCKE; MORELLATO, 2002),
e ao caráter adaptativo de cada espécie em sua área de é possível obter de forma sistemática a fenologia dessas
dispersão (ANDREIS et al., 2005). espécies.
Uma das características marcantes do Bioma Quando a fenologia é obtida de forma sistemática,
das Savanas, do qual o Cerrado faz parte, é o aspecto reúne informações sobre o estabelecimento de espécies,
xeromórfico (COUTINHO, 1978; EITEN, 1994), o período de crescimento, reprodução, e a disponibilidade
estando comumente associado a áreas onde predomina de recursos alimentares (MORELLATO; LEITÃO-
o tipo climático Aw de Köppen, ou seja, apresentando a FILHO, 1992). Além disso, o conhecimento dos
sazonalidade na temperatura e precipitação ao longo do padrões fenológicos é considerado fundamental para a
ano, que define a existência de dois períodos climáticos compreensão da biologia reprodutiva da espécie e base
bem marcados: um quente e úmido e outro frio e seco para o desenvolvimento de programas de melhoramento
(EITEN, 1972; SARMIENTO, 1984). No período seco, genético (MAUÉS; COUTURIER, 2002), tanto para
ocorrem incêndios frequentes (MIRANDA et al., 2002) e o a indicação do período de frutificação para a coleta de
solo está sujeito a um déficit hídrico sazonal nas camadas sementes, como do período de crescimento vegetativo
mais superficiais (FRANCO, 2002). intenso, em que se têm estacas mais herbáceas e de melhor
A combinação entre essas flutuações climáticas enraizamento (FACHINELLO et al., 1994).
sazonais, as características físico-químicas dos solos e O objetivo, neste trabalho, foi investigar o
a ocorrência de queimadas determinam a distribuição, comportamento fenológico da Siparuna guianensis para
a estrutura e o funcionamento das diferentes formações determinar a época de floração, frutificação e mudança
vegetais do Cerrado (EITEN, 1972; FURLEY; RATTER, foliar, visando a subsidiar a melhor época de coleta de
1988). Também é relevante que, além do clima regional, estacas e sementes para sua reprodução ex situ.
as plantas estão sujeitas às variações ambientais locais que 2 MATERIAL E MÉTODOS
podem influenciar os padrões fenológicos (MARQUES;
OLIVEIRA, 2004), mesmo dentro de uma comunidade 2.1 Locais de estudo
vegetal local, pois a sazonalidade expõe as plantas a Este estudo foi desenvolvido no município de
mudanças periódicas na qualidade e abundância de Cuiabá-MT, em uma Unidade de Proteção Integral:
recursos como luz e água (MORELLATO et al., 1990), Parque Estadual Massairo Okamura (15°33’58,51”S e
e as espécies diferem em suas habilidades em captar e 56°03’55,06”O), e em uma área verde não protegida
armazenar esses recursos. legalmente: Bosque Paulo Siqueira ou Bosque do Ibama
Uma característica marcante da vegetação lenhosa (15°33’33,81”S e 56°03’34,30”O), a 219 e 230 metros
do Cerrado é a ocorrência de diferentes grupos fenológicos acima do nível do mar, respectivamente. Essas áreas
em relação à produção e queda de folhas (ARAUJO; estão situadas no meio urbano e distantes entre si em,
HARIDASAN, 2007; FRANCO et al., 2005; LENZA; aproximadamente, 1.000 metros (VALENTINI, 2009).

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A cobertura vegetal tanto do Parque Estadual Foram realizadas observações quinzenais das
Massairo Okamura quanto do Bosque Paulo Siqueira fenofases dos indivíduos selecionados no campo durante
é caracterizada por espécies de Cerrado (GUARIM; o período de agosto de 2007 a julho de 2009. Em alguns
VILANOVA, 2008). Apenas para o Parque Estadual casos também examinou-se a serrapilheira depositada sob a
Massairo Okamura foi realizada uma avalição biológica projeção da copa onde se observaram botões florais, frutos
preliminar da flora em trilhas secundárias, ligadas às trilhas novos abortados, frutos verdes e frutos maduros, apenas
principais do parque, perfazendo um total de 1.000 metros para confirmação da fenofase atual.
de comprimento, sendo encontrada uma frequência de Registrou-se a ocorrência percentual das seguintes
ocorrência da Siparuna guianensis de 50% (LUCENA fenofases (KOPTUR et al., 1988; MORELLATO et
et al., 2008). al., 1989): i) brotamento: período em que ocorre o
Os solos desses locais são do tipo Plintossolo aparecimento de brotos foliares até a expansão das folhas
Pétrico Concrecionário Distrófico típico e Latossolo novas; ii) queda das folhas; iii) floração: dividida em
vermelho-amarelo distrófico típico (GUARIM; VILA período com produção de botões e de flores abertas; iv)
NOVA, 2008). Amostras dos solos do Parque Massairo frutificação dividida em período com frutos imaturos e
Okamura e do Bosque Paulo Siqueira numa profundidade frutos maduros.
de 0 a 15 cm apresentaram respectivamente pH: 5 e 5,2; 2.3 Dados meteorológicos
matéria orgânica : 36% e 20%; areia: 62% e 68%; silte:
22% e 16% e argila: 16 e 16%, Empresa Mato-Grossense Os dados meteorológicos, temperatura média do ar e
de Pesquisa e Extensão Rural. precipitação, foram cedidos pelo INPE (Instituto Nacional
O clima da região é do tipo Aw, segundo a de Pesquisas Espaciais), de uma estação localizada nas
classificação de Köppen, ou seja, tropical semiúmido, com coordenadas 15º33’18,69’’S e 56º04’09,69’’O, situada
temperatura média de 24 a 26ºC, com quatro a cinco meses a 2,1 Km do Parque Massairo Okamura e a 1,4 Km do
secos e duas estações bem definidas: uma seca (outono- Bosque Paulo Siqueira.
inverno) e uma chuvosa (primavera-verão), com índice 2.4 Análise de dados
pluviométrico anual de 1250 a 1500 mm (MAITELLI,
Os dados das duas áreas foram analisados
1994).
separadamente e comparativamente, conforme os índices
2.2 Seleção dos indivíduos amostrados e dados a seguir:
fenológicos 2.4.1 Percentual de intensidade de Fournier
Foram escolhidos e georreferenciados Os valores obtidos em campo por meio de uma
aleatoriamente 20 indivíduos de Siparuna guianensis de escala intervalar semiquantitativa de cinco categorias (0
uma área de 560 m2 do setor norte do Parque Massairo a 4) e intervalo de 25% entre cada categoria, permitem
Okamura, e 20 indivíduos de uma área de 600 m2 do estimar a porcentagem de intensidade da fenofase em cada
Bosque Paulo Siqueira com boa visibilidade da copa, em indivíduo. O cálculo foi feito pela equação: [% Fournier =
idade reprodutiva, selecionados por ordem de aparição (Ʃ Fournier / 4 N) × 100], onde Ʃ Fournier = somatório das
nos bosques (FOURNIER; CHARPANTIER, 1975). categorias de Fournier para cada indivíduo e N = número
Esses indivíduos já estavam sendo observados há cerca de indivíduos da amostra (FOURNIER, 1974).
de seis meses antes de se iniciar os registros da pesquisa,
para a garantia que estavam em idade adulta. Mediu-se a 2.4.2 Índice de atividade (ou porcentagem de indivíduos)
altura e o diâmetro na altura do peito de cada indivíduo, É um método mais simples, no qual é constatada
que tiveram, respectivamente, para o Parque Massairo somente a presença ou ausência da fenofase no indivíduo,
Okamura e o Bosque Paulo Siqueira valores médios de não estimando intensidade ou quantidade. Esse método de
4,13 ± 0,98 m (Desvio-padrão) e 9,41± 2,38 cm (Desvio- análise tem caráter quantitativo em nível populacional,
padrão). Para a ratificação das observações botânicas, indicando a porcentagem de indivíduos da população
as amostras coletadas foram identificadas, registradas e que está manifestando determinado evento fenológico
arquivadas sob forma de exsicatas no Herbário Central da (BENCKE; MORELLATO, 2002). Esse método também
Universidade Federal de Mato Grosso (HUFMT), com os estima a sincronia entre os indivíduos de uma população
números 38354 e 38356. (MORELLATO et al., 1990), levando-se em conta que

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quanto maior o número de indivíduos manifestando a com tendência a declínio dos índices de precipitação nos
fenofase ao mesmo tempo, maior é a sincronia desta meses de abril e maio, onde ocorrem 10,74% das chuvas;
população. posteriormente, nos meses de junho, julho e agosto,
2.4.3 Índice de sincronia a precipitação incidida corresponde a apenas 2,58%,
caracterizando o período seco e por fim nos meses de
O índice de sincronia foi calculado de acordo setembro e outubro, ocorrem novamente as primeiras
com a equação proposta por Augspurger (1983): precipitações significativas, acumulando valores de
n
[ Xi = (1/n-1) (1/fi) j=1ej i ],em que: ej = número de 12,34%, sendo estes os meses de transição entre o período
meses que os indivíduos i e j estão na mesma fenofase; fi = seco e chuvoso (MARTINS et al., 2011).
número de meses em que o indivíduo i está na fenofase; Durante o período estudado, foi observada a
n = número de indivíduos na população. Quando X = 1, sazonalidade climática (Figura 1), abrangendo um período
ocorre a sincronia perfeita; para X = 0, não existe sincronia seco e parte de outro período seco, dois períodos chuvosos,
no evento fenológico. dois períodos de transição chuvoso-seco e um período de
2.4.4 Correlação entre as variáveis transição seco-chuvoso. Em agosto de 2007 e em julho de
2008, não houve precipitação, e o mês que mais choveu,
Para verificar a relação entre fenologia e as foi dezembro de 2008, com total acumulado de 326,1 mm.
variáveis climáticas (precipitação acumulada mensal, Segundo Pimentel et al. (1977), os números de meses
média mensal da umidade relativa do ar, e médias de secos no cerrado (precipitação inferior a 30 mm) varia de
temperaturas máxima e mínima mensal) foram utilizadas 2 a 4 meses, e essa afirmação coincidiu com os locais de
correlações de Pearson (r) ao nível de significância de 5 %. estudo, que, nesse período, em 2008, foi de 4 meses.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO As temperaturas mínimas mensais no período seco
(junho a setembro) variaram entre 16,9ºC e 20,1ºC, e as
3.1 Sazonalidade climática máximas entre 28,3ºC e 36,7ºC. No período de transição
Observa-se, na distribuição sazonal das chuvas, seco-chuvoso e chuvoso (outubro a abril), as temperaturas
quatro períodos distintos para a região em estudo, sendo mínimas mensais variaram entre 20,7ºC e 22,7ºC, e as
um período chuvoso que vai de novembro a março, máximas entre 30,3ºC e 40,5ºC. A média mensal da
concentrando os maiores índices de precipitação, que umidade relativa do ar nos períodos mais críticos dos
em média equivale a 74,34% das chuvas, seguido de meses de seca não chegou a 45%, e durante o período
um período de transição entre o período chuvoso e seco chuvoso variou entre 70% e 85%.

Umidade relativa (%) Precipitação (mm) Temperatura max (oC) Temperatura min (oC)
350 45
300 40
Umidade relativa (%)

35
Precipitação (mm) e

Temperatura (oC)

250
30
200 25
150 20
15
100
10
50 5
0 0
A S O N D J F M A M J J A S O N D J F M A M J J
2007 2008 2009
Figura 1 – Médias mensais das temperaturas máxima e mínima, média mensal da umidade relativa do ar e precipitação mensal
acumulada entre os meses de agosto de 2007 e julho de 2009 no município de Cuiabá-MT.
Figure 1 – Monthly averages of maximum and minimum temperatures, humidity, average monthly relative humidity and monthly
precipitation between the months of August 2007 and July 2009 in the city of Cuiabá-MT.

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Fenologia da Siparuna guianensis Aublet ... 585

3.2 Fenologia vegetativa (brotação e queda das folhas) Parque Massairo Okamura Bosque Paulo Siqueira
100

Queda de folhas (%)


(a)
Na Figura 2, são apresentados os índices de
atividade e intensidade das fenofases brotação e queda das 75
folhas. O percentual de queda de folhas se manteve baixo, 50
ao longo de todo o período observado, sendo que nos meses
25
de março de 2008 e 2009 registrou-se, marcadamente,
o crescimento vegetativo da espécie para os dois locais 0
observados, e o menor percentual de queda de foliar. 100
Essa característica observada confirmou a observação (b)

Brotação (%)
75
de Campos (2007), que classificou em seu estudo, a S.
guianensis como uma espécie perenifólia. 50
O período de seca foi o período de maior perda 25
de folhas pela espécie, e confirmou os levantamentos de 0
dados feitos por Rizzo et al. (1971), de que a vegetação do
100
cerrado apresenta aumento de queda de folhas em junho,

Queda de folhas (%)


(c)
atingindo o seu ponto máximo em setembro. Os eventos de
senescência e queda foliar, provavelmente, encontram-se
relacionados com o início da estação seca, quando ocorre 50
um aumento da evapotranspiração. Desse modo, a perda
de folhas no período seco constitui um fator de economia
hídrica para as plantas, e os baixos índices de umidade 0
estimulam a abscisão foliar (BORCHERT et al., 2002). 100
Sano et al. (1995) também verificaram que a (d)
cagaiteira (Eugenia dysenterica Mart.), no Cerrado de
Brotação (%)

Planaltina-DF, apresentou um comportamento perenifólio


com perda de folhas no período seco, como também foi 50
observado no estudo com a população de H. aphrodisiaca
por Coelho e Spiller (2008).
Para o Parque Massairo Okamura, o índice de 0
correlação entre a queda de folhas não foi significativo A S O N D J F M A M J J A S O N D J F M AM J J
2007 2008 2009
(p> 0,05) com nenhuma das variáveis meteorológicas
Figura 2 – Fenologia vegetativa dos indivíduos amostrados de
relacionadas neste estudo, e para o Bosque Paulo Siqueira S. guianensis nas áreas de estudo no município de Cuiabá-MT:
só foi significativo com a temperatura máxima, sendo Índice de atividade em relação à queda de folhas (a) e brotação
substancial positivo com essa variável (r= 0,51). O fato (b), e Índice de intensidade em relação à queda de folhas (c) e
de não se ter uma resposta significativa de correlação com brotação (d) dos indivíduos amostrados.
essas variáveis estudadas, não significa que a queda de Figure 2 – Vegetative phenology of individuals sampled of S.
folhas não possa ter sido influenciada por outras variáveis guianensis in the study areas in the city of Cuiabá, MT: Index of
meteorológicas não investigadas neste estudo, além de activity in relation to leaf fall (a) and budding (b), and intensity
outros fatores abióticos, como luz, gás carbônico e minerais. index in relation to leaf fall (c) and budding (d) of individuals
Além da abscisão foliar ser uma adaptação vegetativa sampled.
contra a perda de água, permitindo a sobrevivência do
indivíduo em condições desfavoráveis, há outros fatores uma correspondência entre os dois locais observados.
bióticos a serem considerados, como, por exemplo, a Isso ocorre porque um número maior de indivíduos,
própria longevidade das folhas (OOSTING, 1956). expressando a mesma fenofase, não garante a máxima
O índice de sincronia, em relação à queda foliar intensidade da mesma em cada indivíduo. As Figuras 2a
foi igual a 0,39 para o Parque Massairo Okamura, e 0,33 e 2c apresentam, respectivamente, os índices de atividade
para o Bosque Paulo Siqueira, ou seja, não muito alto entre e intensidade em relação à queda de folhas dos indivíduos
os indivíduos da mesma população, apesar de ter havido amostrados nos locais de estudo.

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A brotação, ou seja, a produção de folhas e ramos Parque Massairo Okamura Bosque Paulo Siqueira
foi observada ao longo de todo ano, contudo, os menores (a)
100
valores de atividade e de intensidade dessa fenofase
(Figuras 2b e 2d) para ambos os locais ocorreram na

Floração (%)
75
época seca do ano de 2007, que teve um longo período
de seca com as maiores variações de temperatura entre as 50
máximas e mínimas. As chuvas estimularam a brotação
e, consequentemente, as mais altas proporções relativas 25
de folhas jovens ocorreram na transição entre os períodos 0
chuvoso e seco. No final do período chuvoso, observaram-
100
se ramos mais herbáceos, em razão do crescimento (b)

Frutificação (%)
vegetativo intenso. A época do ano está estreitamente 75
relacionada com a consistência do lenho, sendo que as
estacas coletadas em um período de crescimento vegetativo 50
intenso possuem maior capacidade para enraizar 25
(FACHINELLO et al., 1994).
Tanto para o Parque Massairo Okamura, como para 0
o Bosque Paulo Siqueira a correlação para a brotadura não Flor aberta M.O. Botão floral M.O. Flor aberta P.S. Botão floral P.S.
foi significativa (p> 0,05), com nenhuma das variáveis 100
meteorológicas analisadas, o que poderia ser explicado (c)
por outras variáveis meteorológicas e fatores abióticos.
Floração (%)

Considerando a influência dos fatores bióticos nessa


fenofase, pode-se dizer que a ocorrência da brotação ainda 50
na estação seca apresenta vantagens como, escape ou
redução do ataque por insetos herbívoros (AIDE, 1988),
tendo, em vista, que grande parte desses herbívoros se 0
encontra inativa nessa época do ano (JANZEN, 1973; Frutos verdes M.O. Frutos maduros M.O. Frutos verdes P.S. Frutos maduros P.S.
WOLDA, 1978). Essa estratégia é válida, pois a herbivoria 100
mais intensa ocorre no primeiro mês de vida das folhas, (d)
Frutificação (%)

antes de elas se tornarem completamente lignificadas


ou, ainda, quando suas capacidades fotossintéticas são
50
mais altas, uma vez que estas declinam com a idade após
completarem a expansão (WRIGHT; SCHAIK, 1994). Em
relação a esse estádio fenológico, os índices de sincronia
foram 0,50 e 0,55 para o Parque Massairo Okamura e 0
A S O N D J F M A M J J A S O N D J F M AM J J
Bosque Paulo Siqueira, respectivamente. 2007 2008 2009
3.3 Fenologia reprodutiva (floração e frutificação) Figura 3 – Fenologia reprodutiva dos indivíduos amostrados
de S. guianensis nas áreas estudadas no município de Cuiabá-
Na Figura 3, são apresentados os índices de MT: Índice de atividade na floração (a); Índice de atividade na
atividade e intensidade das fenofases floração e frutificação. frutificação (b); Índice de intensidade na floração (c); Índice de
A floração (botões e flores) foi sazonal em ambos os locais, intensidade na frutificação (d).
tendo um intervalo no período chuvoso, entre os meses Figure 3 – Reproductive phenology of the individuals of S.
de dezembro de 2007 e março de 2008. Esse intervalo foi guianensis in the areas studied in the city of Cuiabá-MT: activity
mais curto em 2009, sendo de um mês para o Bosque Paulo index at flowering (a), index of activity in the fruiting (b); Index
Siqueira (mês de fevereiro), e de três meses para o Parque at flowering intensity (c), index fructification intensity (d).
Massairo Okamura (de fevereiro a abril). Um dos motivos
para essa diferença na floração entre os anos observados botões florais ocorreu no período seco, sendo que as
pode ter sido pelo fato de 2009 ter tido um menor índice flores começaram a abrir ao sinal das primeiras chuvas,
de chuva que o ano anterior, e a grande incidência de alcançando seus valores máximos em novembro de 2008.

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Fenologia da Siparuna guianensis Aublet ... 587

O padrão de floração observado, ou seja, da espécie Tanto para o Parque Massairo Okamura, quanto
possuir um período de intensa floração na transição entre para o Bosque Paulo Siqueira o índice de correlação para a
o período seco e o chuvoso, também foi descrito para frutificação só foi significativo (p<0,05), para as variáveis
outras comunidades lenhosas de cerrado (BATALHA; umidade relativa e temperatura mínima. Para o Parque
MANTOVANI, 2000; MANTOVANI; MARTINS, 1998; Massairo Okamura foi substancial moderado positivo para
OLIVEIRA; GIBBS, 2000). a umidade relativa (r= 0,54), e para a temperatura mínima
A competição entre a demanda de recursos para (r= 0,52). Para o Bosque Paulo Siqueira foi substancial
investimentos em estruturas vegetativas e reprodutivas moderado positivo para a umidade relativa (r= 0,53) e
pode influenciar o ciclo de vida das espécies de uma para a temperatura mínima (r= 0,50).
comunidade vegetal (SARMIENTO; MONASTERIO, O índice de sincronia dessa fenofase teve o mesmo
1983). O fato do período de queda foliar propiciar a valor para ambos os locais pesquisados (0,64). Nas figuras
incidência de botões florais pode se justificar pelo fato de 3c e 3d, são apresentados os índices de atividade e de
que pode disponibilizar mais nutrientes no solo, a partir intensidade da fenofase de frutificação, respectivamente.
de sua decomposição, que por sua vez favorece a floração. É importante comentar que, neste estudo, observou-
Argumenta-se, ainda, que espécies tolerantes, com maior se que a coloração dos frutos não está ligada à sua
capacidade de absorção e/ou retenção de água, não são maturação, e, sim, à incidência de luz que recebe, pois o
limitadas pela seca, sendo ainda incertas as causas da sua mesmo quando está maduro abre para expor suas sementes
periodicidade (BORCHERT, 1994; HOLBROOK et al., (deiscentes). O fruto pode estar maduro tanto na coloração
1995; SCHAIK et al., 1993). esverdeada (recebeu menor incidência de luz), quanto na
Tanto para o Parque Massairo Okamura, quanto coloração avermelhada (recebeu maior incidência de luz).
para o Bosque Paulo Siqueira para o índice de correlação
Foi possível realizar essa observação pelo fato de que
para a floração só não foi significativo (p>0,05) para a
alguns indivíduos estavam em áreas onde havia grande
temperatura máxima. Para o Parque Massairo Okamura,
incidência de luz solar, enquanto que outros estavam
foi substancial moderado negativo com a precipitação (r=
sombreados por outras espécies de maior porte no local.
-0,54) e com a umidade relativa (r= -0,64) e moderado
Ao contrário do observado por Alencar et al.
negativo com a temperatura mínima (r= -0,42). Para o
(1979), no seu estudo com Copaifera multijuga Hayne, em
Bosque Paulo Siqueira, também foi substancial moderado
que a baixa precipitação e umidade relativa favoreceram
negativo com a precipitação (r= -0,50) e com a umidade
a floração e frutificação, neste estudo com a S. guianensis
relativa (r= -0,63), e moderado negativo com a temperatura
mínima (r= -0,44). seus eventos reprodutivos ocorreram em período de alta
Em relação a essa fenofase, os índices de sincronia precipitação e umidade, ratificando o que foi observado por
foram iguais a 1 (Massairo Okamura) e 0,88 (Paulo Souza (1982 apud AGUIAR, 2001). Houve uma correlação
Siqueira), revelando no primeiro local uma sincronia positiva entre as altas temperaturas e a frutificação, o que
perfeita entre os indivíduos. Nas figuras 3a e 3c, são também foi observado por Barros e Caldas (1980).
apresentados, respectivamente, os índices de atividade e A maturação de frutos zoocóricos ao longo do
de intensidade para a fenofase de floração. período chuvoso garante que esses se mantenham atrativos
O aparecimento dos primeiros frutos nos dois anos por períodos mais prolongados, melhorando, assim,
de estudo, coincidiu com o período chuvoso no local e as chances de dispersão (BATALHA; MANTOVANI,
com o término da floração. A frutificação foi observada 2000; MANTOVANI; MARTINS, 1988). Gottsberger e
de novembro de 2007 a meados de fevereiro de 2008 e Silberbauer-Cottsberger (1983) e Oliveira e Moreira (1992)
de outubro de 2008 a abril de 2009, sendo que a maior também postularam que a estratégia de frutificação de
quantidade foi vista no primeiro ano de estudo, pois teve espécies do Cerrado estaria relacionada com mecanismos
maior índice de precipitação acumulado. Janzen (1967) de dispersão. Nesse caso, sincronismo na floração
já havia sugerido que as espécies zoocóricas, como é o e na frutificação poderia trazer a vantagem de atrair
caso da S. guianensis (RENNER; HAUSNER, 2005), polinizadores, pela maximização da polinização das
produziriam frutos na estação chuvosa. Mantovani e flores e dispersores de sementes que atendam às suas
Martins (1988) acrescentaram que na estação chuvosa os exigências quanto à germinação, ao estabelecimento e ao
frutos teriam maior duração e seriam mais atraentes aos desenvolvimento de plântulas (ANTUNES; RIBEIRO,
dispersores. 1999).

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588 Valentini, C. M. A. et al.

Além disso, a produção de frutos e sementes Ecossistema, Espírito Santo do Pinhal, v. 26, n. 1, p. 107-
abundantes, e sua maturação rápida, geralmente 112, 2001.
concentrada em uma determinada época do ano, com
pouca variação dentro do mesmo indivíduo, também foi AIDE, T. M. Herbivory as a selective agent on the timing of
observado por Piña-Rodrigues e Aguiar (1993). leaf production in a tropical understory community. Nature,
Os resultados de Campos (2007) corroboraram London, v. 336, n. 6199, p. 574-575, 1988.
com os resultados encontrados nesta pesquisa sobre a
sincronia dos indivíduos, pois observou em seu estudo ALENCAR, J. C.; ALMEIDA, R. A.; FERNANDES, N. P.
que a S. guianensis teve um comportamento sincrônico, Fenologia de espécies florestais em florestas tropicais úmidas
ou altamente-sincrônico (CAMACHO; OROZCO, 1998), de terra firme na Amazônia Central. Acta Amazônica,
de floração e frutificação intraespecífica, ou seja, com no Manaus, v. 9, n. 1, p. 163-198, mar. 1979.
mínimo 50% dos indivíduos em floração e frutificação em
ao menos um ano de observação. ANDREIS, C.; LONGHI, S. J.; BRUN, E. J. Estudo
fenológico em três fases sucessionais de uma floresta
4 CONCLUSÕES estacional decidual no municipio de Santa Tereza, RS,
A S. guianensis é uma espécie perenifólia, com Brasil. Revista Árvore, Viçosa, v. 29, n. 1, p. 55-63, jan./
maior perda de folhas no período seco, e maior intensidade fev. 2005.
de folhas no período de transição entre o período chuvoso
e o período de seca. ANTUNES, N. B.; RIBEIRO, J. F. Aspectos fenológicos de
A brotação foi observada ao longo de todo ano, seis espécies vegetais em matas de galeria do Distrito Federal.
contudo os picos de atividade e de intensidade da mesma, Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 34, n. 9, p.
para ambos os locais, ocorreram também no final do 1517-1527, set. 1999.
período chuvoso.
A sincronia, em relação ao período vegetativo, não ARAUJO, J. F.; HARIDASAN, M. Relação entre deciduidade
foi alta entre os indivíduos da mesma população, apesar e concentração foliares de nutrientes em espécies lenhosas do
de ter havido uma correspondência entre os dois locais cerrado. Revista Brasileira de Botânica, São Paulo, v. 30, n.
observados. 3, p. 533-542, 2007.
A grande incidência de botões florais ocorreu no
período seco, e intensa floração na transição entre o período AUSPURGER, C. K. Phenology, flowering synchrony, and
seco e o chuvoso, e o período de frutificação somente fruit set of six neotropical shrubs. Biotropica, Washington, v.
aconteceu no período chuvoso. 15, n. 4, p. 257-267, 1983.
O fruto pode estar maduro tanto na coloração
esverdeada (recebeu menor incidência de luz), quanto na BARROS, M. A. G.; CALDAS, L. S. Acompanhamento de
coloração avermelhada (recebeu maior incidência de luz). eventos fenológicos apresentados por cinco gêneros nativos do
Na fenofase de floração, e na fenofase de cerrado, Brasília, DF. Brasil Florestal, Rio de Janeiro, v. 10,
frutificação os índices de atividade e intensidade foram n. 42, p. 7-14, 1980.
correspondentes e proporcionais, indicando elevado
sincronismo intraespecifico, sendo que o índice de BATALHA, M. A.; MANTOVANI, W. Reproductive
sincronia revelou um sincronismo quase perfeito entre os phenological patterns of cerrado plant species at the Pé-de-
indivíduos na fenofase de frutificação. Gigante Reserve (Santa Rita do Passa Quatro, SP, Brazil):
Sugere-se, para fins de reprodução ex situ, a coleta a comparison between the herbaceous and woody floras.
de estacas no final do período chuvoso, quando há maior Revista Brasileira de Biologia, Rio de Janeiro, v. 60, p. 129-
crescimento vegetativo e das sementes, durante o período 145, 2000.
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Recebido: 22 de maio de 2011; aceito: 24 de maio de 2013.

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