Todas As Estrelas
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Todas As Estrelas
Todas as Estrelas
1ª Edição
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra poderá ser reproduzida ou transmitida
por qualquer forma, meios eletrônicos ou mecânico sem consentimento e autorização por escrito
do autor/editor.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos
de imaginação da autora. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. Nenhuma
parte desse livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes - tangíveis ou
intangíveis - sem prévia autorização da autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei n° 9.610/98, punido pelo artigo 184 do código penal.
Essa obra é recomendada para maiores de 18 anos.
Sinopse
Ilustração
Nota da autora
Decicatória
Playlist
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Epílogo
Agradecimentos
Sobre a autora
Redes sociais
O que fazer quando o amor da sua vida está bem diante dos seus olhos?
Melanie Hansen é uma médica que tem a chance de recomeçar seus planos após um
relacionamento abusivo que quase custou a sua vida.
Sozinha em uma nova cidade, com um novo emprego e novos amigos, seria a melhor
chance que poderia ter para começar do zero.
O que ela não imaginava é que surgiria seu vizinho Tyler Smith, um CEO irritante e
extremamente atraente, com seus próprios traumas do passado, que irá bagunçar a sua rotina e
mostrar que a vida pode ser bela com uma boa dose de diversão.
O acordo foi: sem sentimentos.
Mas nós sabemos que isso nunca funciona.
Seja muito bem-vindo (a)!
Importante informar que esse romance aborda gatilhos sobre relacionamento abusivo,
agressão física e psicológica, palavras de baixo calão, consumo de álcool, drogas e cenas de sexo
explícito. Algumas cenas que envolvem os gatilhos são descritivas, então caso se sinta
desconfortável em algum momento da leitura, peço que não continue. Seus limites devem
sempre ser respeitados.
Ressalto que não corroboro com nenhum dos pré-citados acima e, portanto, não concordo
com nenhuma atitude tomada pelos personagens que possam envolver tais temáticas.
Lembrando que a história da protagonista é um exemplo de realidade que muitas
mulheres, infelizmente, ainda passam diariamente.
Se esse livro chegou até você, por favor, não permaneça em um relacionamento abusivo,
não se cale, não tenha vergonha, não deixe que apaguem seu brilho. Peça ajuda!
Você é incrível, capaz e merece mais do que imagina. Você é importante para o mundo!
Agora sim, preparado (a) para iniciar?
Boa leitura!
Com amor, Gabi.
Para os amantes de clichês, intensos e divertidos.
Aos que adoram mergulhar em risos, lágrimas, e principalmente:
Que amam ler a última página e sentir o coração quentinho.
Esse livro é para você!
Acesse a playlist do livro no Spotify
por meio do código QR abaixo ou clicando aqui.
“Eu não me identifico com você, não.
Porque eu nunca me trataria tão mal assim.
Você me fez odiar esta cidade.”
Happier Than Ever – Billie Eilish
Há poucas pessoas aqui, e mesmo assim fico atenta a cada uma que passa pela porta
grande de metal escuro.
Sozinha, com medo e frio dentro desse ônibus, observo as gotas de chuva rolarem pela
janela e penso nos últimos 4 anos da minha vida e no que tenho feito dela.
Como eu pude ser tão inocente? Acredito que seja a pergunta que todos se fazem ao
perceberem que ignoraram todos os sinais.
Tinha todo o meu futuro planejado em São Francisco, minha cidade natal, e aqui vejo
tudo ir embora, assim como a água que rola pelo asfalto, o famoso “por água abaixo”.
Como não percebi e não agi antes?
É difícil de explicar, somente aconteceu. Estava tudo bem e de repente não estava mais,
até ficar bem novamente, assim como um ciclo vicioso que nunca acaba.
Tive que aprender muito cedo que na vida nem tudo são flores, mas quando se tem foco,
conseguimos lidar com os espinhos que ela nos traz, assim como a mamãe me ensinou antes de
partir quando eu tinha 11 anos.
Morei com os meus tios no restante da minha infância e adolescência, após uma longa
briga pela minha guarda na justiça contra a minha família paterna. Elizabeth e John não podiam
ter filhos, então quando cheguei na vida deles, parecia ser o destino certo... e de certa maneira
foi.
Os dois me ensinaram o que era amor e me mostraram como é ser amada, em um lar.
Nunca quiseram tomar o lugar de meus pais, mesmo assim eu os considerava e os enxergava
como os meus heróis. Desses, que não usam capas, mas fazem um delicioso bolo de chocolate e
que consertam qualquer tipo de coisa.
Mamãe ficaria muito orgulhosa e feliz pela forma como eu fui criada.
Os estudos eram importantes e o incentivo sempre esteve presente. Queria ser médica,
pelo desejo em meu coração de ajudar as pessoas, e nada me fazia mudar de ideia a não ser a
questão financeira de meus tios que não eram das melhores, e eu não tinha nenhuma herança
para ajudar.
Estudei muito para conseguir alcançar meu objetivo. Perdi toda a minha juventude
mergulhada em livros velhos de biblioteca pública. Evitava festas, reuniões sociais, tudo que
pudesse desviar o meu foco. Consegui passar na faculdade de Stanford, porém não era apenas
“estar dentro”. Estudei mais e batalhei como uma obsessiva da medicina, só para estar onde
estou hoje e olhando adiante, ainda falta muito.
Naquele primeiro ano de residência, trabalhar no hospital virou o meu combustível para
viver e também o motivo da minha ansiedade. “O que quero fazer realmente?” era a minha
pergunta, pois ainda não me sentia totalmente completa.
Até que, em um caótico dia, ajudei a salvar uma garotinha de 7 anos em um dos meus
plantões. Ela era tão pequena e frágil, e quando não havia mais esperança, a trouxemos de volta.
Seu nome era Júpiter, e ela era linda e graciosa como um planeta gigante e forte na galáxia
camuflado entre as estrelas...
“As estrelas guiam destinos certos”. Lembrei-me vagamente de mamãe me dizendo essa
frase, momentos antes de dizer boa noite.
Entendi como um sinal... Pediatria! Essa seria a minha especialização.
E foi no Hospital Central de São Francisco, durante meu segundo ano de residência que eu
conheci o homem que me faria perder a fé em tudo que eu acreditava, principalmente no amor.
Naquela noite, ele havia dado entrada como paciente no hospital após um pequeno
acidente de trabalho e por algum motivo eu estava ajudando um colega fora do meu setor. Seu
rosto marcante e sorriso cativante foi o que me chamou mais a atenção. Possuía cabelo dourado
como o sol e pele clara. Galanteador, me fez rir muito enquanto limpava o ferimento no seu
braço. Anthony Scottish sabia muito bem usar as palavras ao seu favor e há muito tempo eu não
me sentia desejada ou me sentia mulher, já que estava ocupada demais para isso.
Bem, quero dizer, eu achei que sabia reconhecer um babaca a quilômetros de distância.
Eu estava equivocada, e muito deslumbrada.
Namoramos alguns meses e decidimos morar juntos. “Mas isso é loucura Melanie!” É,
eu sei, mas no início me pareceu uma boa ideia, já que ele morava muito próximo ao hospital,
então seria algo mais confortável para mim, pois poderia descansar mais. Sabe aqueles 5 minutos
de sono que fazem a diferença? Para uma residente que não tem descanso, isso soa como 8 horas
de sono ininterruptos.
O que poderia dar errado? Éramos jovens e estávamos muito felizes e apaixonados.
Tudo parecia estar extremamente certo se não fosse o fato de que eu não poderia ter
amigos homens, e nem usar roupas justas e curtas porque era provocativo e vulgar para uma
mulher comprometida. Minhas amigas eram más influências, meus colegas de trabalho tinham
segundas intenções, e meus tios tomavam muito o meu tempo. Eu tinha que me dedicar ao nosso
relacionamento e aproveitar o tempo que não estava trabalhando, apenas com ele.
Eu estava iludida demais para enxergar os primeiros sinais de homem possessivo e
doente que nele habitava.
Além de seu ciúme, quando era contrariado, ele me humilhava com palavras e dizia que
ninguém nunca amaria uma mulher patética como eu.
Me vi entrando em um buraco fundo e escuro, ao qual eu não sabia se era possível sair
algum dia, pois toda vez eu voltava ali, no mesmo lugar. Eu tive medo, vergonha e não
enxergava como sair dessa situação.
O amor se transformou em temor e meu único refúgio era o meu trabalho. Peguei ainda
mais turnos, tudo para fugir de casa.
Entre meus intervalos das dezesseis horas, Tia Beth conseguiu me encontrar no hospital.
Seus olhos denunciavam as lágrimas que escorreram minutos antes em que se preparava para
dizer que, meu tio e ela, não aguentavam mais me ver nessa situação.
O medo de me perder falou mais alto, então ela e John tinham juntado as suas economias
de anos e comprado um pequeno apartamento para mim, bem longe daqui. Suas palavras eram
que eu poderia recomeçar do zero. Pela primeira vez na vida, em anos, senti esperança. Abracei
ela o mais forte que podia e choramos muito, como um pequeno “até logo”.
Senti naquele momento que eu não estava sozinha, então falei imediatamente com o
chefe do hospital quando Tia Beth partiu, e verifiquei se era possível fazer uma transferência. As
estrelas pareciam ter sorrido para mim outra vez, e como meu chefe, sempre gostou do meu
trabalho, disse que seria uma pena me perder, mas que entendia a situação e era preciso fazer só
algumas ligações que estava feito.
“Você tem um grande futuro, Doutora Hansen.”
Foi o que Doutor Benjamin disse antes que eu fechasse a porta atrás de mim. Era algo
bom de se ouvir de alguém tão experiente com a sua carreira de 28 anos na medicina.
Senti conforto no meu coração machucado, mas ainda faltava a pior parte: conseguir fugir
do monstro.
Durante a noite eu estava tomando banho, tentando relaxar do dia longo e cansativo
dentro da banheira na suíte do nosso quarto. Anthony nunca estava em casa nesse horário, pois
sempre saia com seus amigos após o trabalho. Seria meu último banho nessa casa, prepararia
minhas coisas e partiria pela manhã em segredo, pois ele realmente é muito influente na cidade,
as pessoas poderiam me ver e ligar para ele.
Eram muitas informações novas na minha cabeça e eu estava fazendo mil planos.
Recomeçar.
Essa palavra ficava ressurgindo a todo momento na minha mente. Senti algumas lágrimas
escorrerem pelo meu rosto, se fundindo a água morna que me banhava.
Me assustei quando ouvi a porta de entrada bater forte contra o batente. O homem que me
assombrava chegou do bar mais cedo dessa vez, entrou no banheiro e se sentou ao meu lado no
chão úmido, conversando e fazendo promessas falsas com seu mau hálito de álcool e cigarro
barato.
Ele parecia se sentir culpado por tudo, dava para ver em seus olhos azuis o remorso de ter
me roubado tanto e de não ter cuidado de mim como deveria, ou poderia ser apenas alucinação
da minha cabeça me pregando peças como das outras vezes em que decidi ficar.
A balança invisível da minha consciência dizia: foram 1461 dias ao lado dessa pessoa, e
não 1.
O que ele não sabia é que dessa vez seria diferente. Eu estava exausta de viver daquela
maneira e tinha o plano B. Eu disse a ele que iria embora, não aguentava mais e estava infeliz.
Não sei o porquê, mas desabafei.
Péssima hora, Melanie. Péssima hora para dizer tudo que segurou durante 4 anos.
Como era de se esperar, ele surtou ao me ouvir dizer que o deixaria. Começou a gritar e
me insultar, antes de afundar a minha cabeça no fundo da banheira que ainda estava cheia.
Engoli muita água, senti ela entrando pelo meu nariz e boca enquanto tentava inutilmente
gritar e escapar de suas mãos grandes e fortes que já me acariciaram e foram meu abrigo tantas
vezes.
Sem ar. Sem conseguir respirar. Desespero. Senti a dor do líquido invadindo meus
pulmões.
Por alguns segundos, vi toda minha a vida passar em um flash diante dos meus olhos. Vi
a imagem de minha mãe ao meu lado segurando minha mão como se dissesse para eu não
desistir. Ela não queria que eu morresse naquele momento, não era a minha hora e eu não iria
aceitar.
Ele podia ser mais forte fisicamente, mas minha vontade de viver era muito maior.
Alcancei a garrafa de vinho que eu tomava ao lado e a quebrei com toda a minha força na
sua cabeça, o que fez ele me soltar e cair, desacordado, no chão.
Foi o primeiro dia que agradeci aos céus por ele estar tão bêbado, porque naquela
situação, depois do impacto na sua cabeça, ele não conseguiria se levantar sozinho.
Juntei todas as minhas roupas e pertences mais especiais o mais rápido que pude em uma
mala pequena. Antes de sair, dei uma última olhada no Anthony. Ele estava com um grande
estrago na testa e o sangue fresco escorria por seu rosto jovem e bonito.
Respirei fundo. Naquele momento eu não tinha mais lágrimas para chorar. Sem olhar
para trás, fui embora daquele lugar que foi minha tortura psicológica e meu próprio inferno
pessoal.
Depois de chegar na rodoviária e comprar minha passagem, me acomodei no ônibus e
esperei, até ele ser finalmente ligado para dar início a viagem. Pego de dentro da minha mochila
de couro preta as chaves do meu novo apartamento, que já tirei diversas vezes da bolsa para
admirar.
Não sei o que me espera a partir de agora, mas de uma coisa eu tenho certeza: eu nunca
mais quero voltar aqui.
“Algo sobre a glória sempre pareceu me entediar.
Porque só aqueles que realmente amo, me conhecerão de verdade.”
7 years - Lukas Graham
A ressaca eminente fazia minha cabeça latejar, com pontadas me lembrando da bebedeira
de ontem, automaticamente sinto meu estômago embrulhar e prometo a mim mesmo, pela
milésima vez, que nunca mais vou beber.Me viro na cama e me deparo com um cabelo cacheado
e preto ao meu lado. Geralmente não deixo as mulheres passarem a noite no meu apartamento
porque eu não tenho intenções para um segundo encontro, mas, ao que tudo indica, eu não estava
em condições de mandá-la embora.
— Bom dia, bonitão — A morena se espreguiça do meu lado, levando seus braços finos
para cima.
Ela tem cílios longos, dando uma aparência feminina e atraente aos seus olhos castanhos
e rosto arredondado.
A desconhecida se levanta ainda nua e consigo visualizar melhor seu corpo com belas
curvas e quadris largos.
Tenho uma regra que não estou disposto a quebrar: sexo sempre deverá ser casual.
O amor não é algo de que eu tenha interesse e decidi que seria melhor assim há alguns
anos.
Eu definitivamente não tenho cabeça no momento para lidar com a pressão que um
relacionamento exige em ter que tentar, a cada segundo, não perder alguém.
Perder pessoas, isso não deveria ser algo normal da vida.
Meu velho ainda está na linha de frente, talvez tenha medo de me deixar sozinho e eu não
conseguir dar conta. Ele diz sempre que essa vida agitada que eu levo uma hora vai acabar
comigo e que devo ser responsável.
Robert pode até dizer isso para o meu bem, mas também sei que é pela “Imagem de um
futuro CEO bem-sucedido, intocável e sério...” que ele tenta me empurrar incansavelmente. Ele
também preferia que eu fosse virgem quando me casasse e tivesse em torno de 5 ou 7 herdeiros,
só para garantir um futuro de gerações para sua empresa. Uma imagem ótima, para nossos sócios
e investidores. Mas não, eu não sou esse homem, e provavelmente nunca serei.
– Oi? Planeta terra chamando — A morena de quem eu não me lembro o nome,
estala seus dedos longos ao ar para chamar a minha atenção. — Quer tomar café da manhã
comigo?
Por que não me lembro do nome dela?
— Linda, hoje não. Tenho uma reunião importante marcada, talvez na próxima. – Sorrio
para ela.
Então ela pega o seu jeans do chão e se contorce para entrar dentro dele com um pouco
de dificuldade por ser tão apertado. Ainda não entendo como que as mulheres conseguem vestir
isso o dia todo, mas devo admitir: fica extremamente tentador.
– Okay... então é isso. A noite foi incrível, obrigada – A desconhecida me diz e se
aproxima colando sua boca na minha por alguns segundos em um beijo suave. Em seguida se
afasta deixando o gostinho de uva e lembranças do seu gloss pegajoso, pega sua bolsa no chão
antes de sair.
Assim que escuto a porta da frente bater levanto da cama e vou até a minha suíte. Tomo
um banho longo, escovo os dentes, e aproveito para dar uma aparada na barba que já não vê uma
lâmina há 2 semanas.
Vesti meu terno preto de gente séria e que sabe o que está fazendo. A ironia é que eu
nunca sei o que estou fazendo, porém sou muito bom em fingir.
Ligo a cafeteira e vejo que a mulher, que acabo de descobrir se chamar Lisa deixou um
post-it amarelo grudado nela com seu telefone e nome marcado nele. Tem até uma marca de
beijo de batom no papel.
Tomo meu café, forte e sem açúcar.
Você é capaz de fazer tudo após uma boa dose de café, ou de um bom whisky.
Demoro um pouco para encontrar a chave do meu carro que com sorte acho jogada no
sofá, deve ter caído do bolso do blazer quando a Lisa me atacou e tirou minha roupa. Ok, talvez
tenha sido o contrário.
Fecho meu apartamento e observo o meu andar por um instante enquanto caminho. Os
apartamentos são pequenos, mas é bom para quem mora sozinho. Não é nada luxuoso, a
decoração nos corredores e encanamentos são antigos, porém eu não tenho vizinhos há um bom
tempo e a privacidade é ótima para alguém como eu. Eu definitivamente não gostaria de ser meu
próprio vizinho, como todos os últimos que reclamaram e se mudaram.
Meu pai até insistiu para que eu fosse morar em um dos apartamentos luxuosos
espalhados pela cidade da nossa família, mas eu sei que seria observado a todo momento, então
resolvi vir para cá. Gosto daqui e já me adaptei, foi a melhor forma que encontrei de estar mais
“isolado” de alguma forma e ter paz para fazer o que eu quiser.
Estou tão distraído que acabo esbarrando em algumas caixas no meio do corredor. São
caixas vazias, então deduzo que alguém tenha se mudado no meio da noite e ficou cansado
demais para levar todas elas lá para baixo. O cheiro de café recém coado invade minhas narinas e
escuto uma música em volume alto vindo de dentro do apartamento.
Pelo visto não serei mais o único morador desse andar, com um prazo de validade de
talvez, o quê? Umas 2 semanas?
Chuto a caixa para perto da parede, e pego meu celular do bolso vendo que há 6
chamadas perdidas do meu pai, acabei me esquecendo de tirar do modo silencioso quando
acordei.
Estou atrasado e já começo a ensaiar qual será a minha desculpa da vez.
Assim que eu piso os pés no prédio todos sabem que o chefe chegou. Então
automaticamente todos tomam seus lugares.
A Investimentos Smith foi fundada pelo meu pai há anos e auxilia grandes clientes
jurídicos a lidarem com suas aplicações no mercado financeiro.
– Bom dia, Senhor Smith! – Diz o porteiro de forma calorosa abrindo a grande porta para
mim.
– Um belo dia! Não é mesmo, Frank?
Vou pelas escadas. Uma jovem que começou a trabalhar essa semana e eu ainda não tive
a oportunidade de conhecer me recebe com um grande sorriso assim que chego no nono andar.
– Tenha um excelente dia, Senhor Smith... – A recepcionista me deseja, e percebo ela me
avaliar da cabeça aos pés e aproveito para ler o nome em seu crachá.
– Você está muito bonita hoje, senhorita Anna. – Lhe dou uma piscada e ela retribui
sorrindo timidamente.
Penso se talvez ela queira tomar alguma bebida na saída do trabalho, mas me recordo
imediatamente que meu pai foi bem claro: Se quer espalhar seu esperma por aí, espalhe por
onde quiser! Menos no escritório nas minhas funcionárias!
Bem, já dizia um velho sábio: “O que os olhos não veem, o coração não sente”. Robert
não precisa saber sobre tudo que já foi feito, e nem sobre os meus planos mais tarde com a
senhorita Anna da recepção.
Entro no escritório do meu pai e ele já está encerrando uma ligação. Parecia ser
importante pela sua expressão. Tiro o meu paletó o pendurando na cadeira e dobro as mangas da
minha camisa branca, pronto para iniciar o dia de trabalho.
– Por Deus Tyler, quando vai aprender a chegar no horário certo? Que jeito que passará
seriedade assim? Eu dependo de você! – Meu pai se vira ainda sentado na sua cadeira giratória
para me encarar com a decepção aparente em seus olhos castanhos.
Meu pai já tem 62 anos e sua idade já está cada vez mais visível, devido às rugas em sua
pele e seu cabelo cada dia mais grisalho
– Bom dia para o senhor também. – Ironizo
Recebo sua respiração profunda em resposta.
– Tudo bem, vou me controlar com os horários e tentar chegar na hora certa a partir de
amanhã. Eu só tive uma noite longa...
– Eu percebi, você cheira a álcool. Tyler, você está prestes a completar 30 anos, a mesma
idade que eu tinha quando resolvi abrir essa empresa. Eu preciso de você aqui nos horários certos
e que se comprometa, está me entendendo?
Balanço a cabeça em afirmação e me arrependo por ter saído de casa sem tomar uma
aspirina para dor de cabeça.
Robert se levanta para me mostrar suas anotações:
– Olha esse cliente da Coréia do Sul…
Ele continua dizendo algo, mas não consigo compreender pois olho para um arranha céu
através da janela do escritório. Eu lembro que ao lado daquele prédio, tem uma boate que eu
parei de frequentar há um bom tempo, o que me desperta saudades de um whisky diferente que
havia lá.
Eu sei, eu sei. Nunca mais ia beber… mas hoje ainda é quarta-feira.
Só preciso que o expediente acabe logo.
“Péssimo mentiroso.
Agora que você sabe, você está livre para ir”
Bad Liar – Imagine Dragons
Estou parada em frente ao prédio que será a minha nova casa. Foram mais de 8 horas de
viagem de São Francisco para Los Angeles. Até tentei dormir dentro do ônibus, mas
simplesmente não consegui desligar a minha mente depois de tudo que aconteceu e espero nunca
mais na minha vida ter que encontrar o Anthony.
Seguro firme o papel que Tia Beth me entregou, aqui tem todas as informações como
senhas da portaria, endereço do trabalho novo e um breve texto intitulado como “Guia de
Sobrevivência da Abelhinha”. Sorrio sozinha, pois meus tios cuidaram de cada detalhe.
É um pequeno bairro afastado do letreiro famoso de Hollywood, um contraste gritante
entre o luxo e o modesto.
O rico e o pobre separados na maternidade.
As poucas árvores nas calçadas estão com cores vibrantes devido ao clima quente de Los
Angeles, típico da estação. Os anjos dizem Amém para a minha nova vida, onde tem mais cor e
um novo sentido.
O apartamento fica no quarto andar do pequeno prédio e preciso usar um elevador velho
e duvidoso. Ao chegar, vejo que o número do meu apartamento é B27. Pego a chave que está
debaixo do tapete e entro. Acendo as poucas luzes e eu consigo visualizar um pouco melhor o
ambiente. É pequeno, possui sala e cozinha conjugadas, um quarto e um banheiro ao fundo.
Somente o necessário para alguém que mora sozinho. As paredes estão pintadas em tom de
branco, o que me traz um clima de paz apesar do mofo evidente próximo ao sofá velho com o
estofado em xadrez vermelho.
Começo a desempacotar imediatamente as caixas que já estão aqui que meus tios
enviaram antes, e aproveito para colocar o chip novo no celular usado que comprei em umas das
paradas da viagem. Sem redes sociais, sem wifi e sem chance de ser rastreado, eu espero.
Vou até o quarto e me deito na minha nova cama. Ela é macia e espaçosa, e mesmo que
eu esteja sentindo muita fome, o cansaço é tão grande que meus olhos pesam e sem perceber,
caio em um sono profundo enquanto abracei um travesseiro.
– Mais força!
Levo um susto e me sento na cama tentando raciocinar de onde está vindo a voz grave,
mas respiro aliviada quando me dou conta de que não vem de dentro do meu apartamento. Olho
para o meu celular na cabeceira da cama e o relógio marca quatro horas da manhã.
– Isso, continua, bem aí... Oh meu...
Que droga! É isso mesmo que estou pensando? Encosto o meu ouvido esquerdo contra a
parede por curiosidade e tento pensar em algo a se fazer, até que sinto a vibração como se algo
batesse nela. Me dou conta de que o quarto do meu vizinho ou vizinha, está exatamente ao lado
do meu.
Minha consciência diz que é muito errado ouvir, mas permaneço ali, até que escuto
estalos de palmadas e em seguida a mulher ordenar:
– Isso, mais, isso!
Tudo bem, estou indo longe demais.
Pego o meu travesseiro, incomodada com os sons que escuto, e fecho a porta do meu
quarto indo para o sofá velho dormir, tentando ignorar tudo que acabei de ouvir.
Acordo mais algumas vezes no meio da noite e dessa vez tenho flashes de memórias da
noite passada. Água, sangue, minha incapacidade de respirar. Não consigo mais dormir ao ver
que já são 6 da manhã.
Me levanto e faço uma faxina completa ao som de Imagine Dragons, para tirar a poeira
acumulada pelo tempo que o apartamento ficou fechado. Tomo meu café calmamente, como se
eu estivesse apreciando cada pequena gotinha da liberdade.
Aos poucos, o apartamento já está ficando a minha cara. Dentro das caixas tinham
cortinas e manta colorida para o sofá. Alguns pôsteres, plantas artificiais e porta-retratos com
fotos minhas e dos meus tios.
Mando uma mensagem de texto para minha tia, com o meu número novo.
Após um banho curto, estou encarando o pequeno espelho que há no cômodo. Bem, eu
precisava me arrumar para ir até o hospital para a entrevista. Há muito tempo, eu não usava um
batom colorido ou passava lápis para contornar meus olhos. Fiz uma maquiagem simples e,
apesar de ainda estar insegura com minha aparência, me sinto incrível. Escolho vestir meu suéter
rosa, jeans e calço meu tênis branco. Ao sair, tranco o apartamento, e já aproveito para pegar
algumas das caixas que estavam no corredor para jogar na lata de lixo.
Chego ao Aiden Strickland, hospital central de Los Angeles após alguns minutos de
ônibus e me sinto extasiada com a dimensão que tem o local. Toda a mobília e pintura parece ser
nova e bem limpa. Seguro em mãos a minha carta de recomendação que meu ex chefe fez para
que eu consiga a vaga que tinham aqui disponível.
Aguardo na recepção ansiosamente.
– Doutora Hansen! Pode me acompanhar, por gentileza? – Diz uma enfermeira um pouco
mais baixa do que eu, que veste um pijama cirúrgico azul, me recebendo com um caloroso
sorriso.
O corredor é longo, e o silêncio para mim sempre foi algo constrangedor.
– Ei, como é o seu nome? – Pergunto para a enfermeira que continua andando com
passos rápidos, com uma prancheta presa debaixo do seu braço.
Sua pele é iluminada e negra, tem lindas sobrancelhas pretas desenhadas por lápis de
contorno. Seus olhos castanho-escuros são grandes demais para o seu rosto arredondado e
pequeno. Observo escapando por debaixo da sua toca hospitalar, pequenas mechas cor-de-rosa
do seu cabelo.
– Sou a Amanda Wilson, muito prazer! – Sua voz é aveludada. – Fiquei sabendo que é
pediatra, Doutora Hansen.
– Sim! Sinto que já me conhece. – Brinco.
– Sabe como é, as notícias correm rápido por aqui. E se quiser saber de qualquer coisa, é
só falar comigo – Ela sorri, dando uma piscada. – Eu auxilio na ala de pediatria, então se precisar
de qualquer coisa estarei lá.
– Bem, nesse caso, já vi que vamos ser ótimas amigas! – Digo a ela que responde com
um olhar carinhoso.
– Bem, chegamos. O Doutor Patterson já irá receber você – Ela para, e abre uma porta
grande e branca. – Depois volto para te buscar!
Amanda se retira sem despedidas me deixando sozinha no escritório que noto ser
espaçoso e exageradamente branco e limpo.
Estou muito nervosa agora, porque tenho que mostrar o meu trabalho e esforço
novamente. Será que vão gostar de mim?
Meus pensamentos invasivos se perdem quando avisto um homem de costas ao meu lado
direito, que está avaliando um raio-x de um fêmur fraturado. Seu cabelo é castanho e curto,
possui um corte estilo militar bem baixo. Através do jaleco é possível visualizar bem os seus
ombros largos o que acho sem dúvidas atraente, e imagino por um breve momento como deve
ser seu rosto.
O homem se vira e me surpreendo ao notar o quão jovem ele é, aparenta ter a faixa de 30
anos. Dentes grandes e perfeitos são expostos através de um sorriso bonito e simétrico.
A voz límpida preenche o silêncio que há entre nós.
– Você deve ser a Doutora Hansen, de São Francisco – Ele se senta e me convida a fazer
o mesmo, apontando para a cadeira a sua frente. – Meu nome é Liam, mais conhecido como
Doutor Patterson.
– Muito prazer Doutor Patterson, estou muito animada por estar aqui.
– Fico feliz em saber disso, mas quem vai falar com você será meu pai, desculpe pela
confusão... Eu apenas sou chefe da cirurgia no Strickland. – Sorri sem graça dessa vez.
– Apenas? Isso é apenas incrível. – Brinco.
Liam me encara com os seus olhos azuis da cor do céu ensolarado em contraste com a
sua pele que, pelo contrário, parece não ver um sol há meses, em seguida nossa atenção é voltada
para a porta por onde entra outro homem com aparência muito semelhante a sua, porém com
mais idade e cabelo grisalho.
– Desculpe meu atraso, eu sou o Doutor Arnold Patterson, diretor desse hospital. Espero
que meu filho não a tenha espantado. – Sua expressão ainda é neutra.
– De forma alguma. – Respondo.
– Bem, melhor eu ir trabalhar. – Liam diz e se levanta para que o pai tome seu lugar, em
seguida se retira da sala.
Entrego minha carta de recomendação nas mãos de Arnold, e aguardo até que o diretor
leia linha por linha enquanto bato ansiosa meus pés no chão, contando os segundos aguardando
sua resposta.
Após longos minutos de espera, finalmente diz algo:
– Doutor Benjamim deixou uma ótima recomendação, já nos antecipamos antes e nos
falamos por telefone antes de você chegar, ele me contou que a senhorita foi uma das melhores
residentes dele, posso confiar nisso?
– Posso garantir que você não vai se arrepender. – Digo confiante.
Meu coração bate rápido em meu peito, é como se cada centímetro do meu corpo
pulsasse por essa oportunidade.
Essa é a minha grande chance de recomeçar.
– A vaga é sua Doutora, na verdade já era antes de você chegar. Tudo isso é formalidade,
me desculpa.
Finalmente solto o ar que estava preso em meus pulmões e consigo aliviar meus ombros.
– Prefere que te chamem de Melanie ou Hansen? Será para colocar no seu cadastro e a
forma que as pessoas irão se referir a você – Ele ainda segura minha ficha, aguardando a minha
resposta, .
– Pode ser Doutora Melanie. Acredito que dá mais intimidade aos meus pacientes e sinto
que eles ficam mais confortáveis comigo. – Respondo formalmente.
Ele sorri satisfeito e assente, preenchendo os papéis.
– Doutora Melanie, aqui funciona da seguinte forma... – Arnold fica sério para me
explicar os protocolos. – Temos todo o suporte que você irá precisar, contamos com plano de
saúde e programas educacionais. Na pediatria atendemos muitas crianças, então você terá que ter
energia para acompanhar todas elas. Terá a enfermeira Amanda Wilson à sua disposição para te
ajudar, e quem te instruirá será a chefe da pediatria, Doutora Hailey Johnson. Alguma dúvida?
– Bem, a minha dúvida é quando posso começar? – Pergunto não conseguindo esconder
meu êxtase.
– Gostei do seu entusiasmo – Ele diz sorrindo, aprovando a minha atitude. – Hoje você
fará uma visita para sua ambientação e pode começar amanhã.
Ele se levanta e aperta as minhas mãos me encarando por um momento como se pudesse
enxergar a minha alma através dos meus olhos até dizer:
– Seja bem-vinda e fico a sua disposição se precisar de alguma coisa.
Agradeço e saio da sala, encontro Amanda me esperando do lado de fora como
prometido.
– Você se encontrou com o filho do diretor? – Seu sorriso é empolgante.
– Sim e eu pensei que ele fosse o diretor...
– Futuro diretor sim, também é solteiro para a sua informação.
Sinto meu rosto esquentar de vergonha.
– O assunto foi somente profissional.
Se ela soubesse de tudo que eu passei…
– Sei, suas bochechas coradas nesse momento te entregam, Doutora!
Ela me avalia e ri como se me conhecesse há anos.
– Doutora Hansen, vamos até um paraíso que eu chamo de pediatria! – Ela anuncia
seguindo em frente, me mostrando o caminho.
São longos corredores que se cruzam como se fossem um labirinto, as paredes são
tingidas em um tom de cinza e o teto é branco, com uma bela fila de leds que iluminam cada
passo que damos acionadas por sensor de movimento.
A enfermeira continua caminhando enquanto cantarola uma melodia baixa, porém
tranquila. Por algum motivo sinto que eu posso confiar nela, porém não tenho amigos há um bom
tempo, não sei mais qual é a sensação de ter com quem contar.
– Amanda… pode me chamar de Mel – Digo para ela. – Me tira uma dúvida, por que o
cabelo cor-de-rosa?
A curiosidade é mais forte do que eu, então espero que ela não leve a mal.
– Bem, Mel – Ela sorri ao dizer meu nome. – Número 1, é porque eu gosto e 2, as
crianças gostam, principalmente as meninas. Contei a elas que sou uma fada madrinha disfarçada
de um reino muito distante e que minha missão é cuidar delas. Torna tudo mais leve,
principalmente quando tenho que furar seus bracinhos frágeis e pequenos... São seres inocentes
demais para lidarem com a realidade e a carga pesada de um hospital.
Sinto uma enorme admiração pela Amanda nesse momento, ela com toda certeza é
alguém que ama a profissão e está no lugar certo.
– Isso é incrível – É a única coisa que consigo responder, então seguro a sua mão direita
delicadamente.
– É só o meu trabalho, e você pode me chamar de Mandy. Agora venha comigo – Ela me
puxa enquanto eu ainda seguro a sua mão e seguimos até o último bloco.
– Aqui é a ala da pediatria. Agora vamos ver uma paciente que chegou pela manhã. Ela
teve um pequeno acidente doméstico, caiu de cima de uma árvore no jardim da sua casa e bateu a
cabeça – Mandy diz, já abrindo a porta do quarto.
Entramos, e vejo uma garotinha muito bonita. Ela tem o cabelo longo preto e seus olhos
parecem duas bolinhas de vidro escuras. Tem um curativo na testa, que imagino que tenha
cortado quando aconteceu a queda. Dou uma olhadinha na ficha antes de iniciar o atendimento.
“Emily Smith - 7 anos e 6 meses.”
– Olá mocinha, como você está?
– Estou bem. Como você é linda! Você é uma princesa? – Ela pergunta entusiasmada.
Olho para Mandy, pedindo socorro.
– Sim Emily, ela é a princesa Ariel. Está vendo o cabelo laranja dela? Veio lá do fundo
do mar, e está aqui para te ajudar a se recuperar e ficar boa logo – Mandy responde por mim,
sorrindo e acenando a cabeça para eu continuar.
Emily abre a boca, surpresa, e consigo ver seu sorriso se formar com uma janelinha bem
no meio.
– E onde está a sua calda de peixe, Ariel? – Ela pergunta curiosa. Se senta e cruza as
pernas pequenas na cama.
Pensa rápido Mel, não posso destruir os sonhos da garotinha.
– Minha fada madrinha – Respondo e aponto para Mandy. – Ela me concedeu pernas para
vir a superfície e passar um bom tempo por aqui. Aí, sempre que eu quiser voltar a ser sereia, eu
vou pra água, faço um encanto e minha calda volta num passe de mágica. – Falo baixinho, como
se fosse um segredo superimportante.
– Nossa! – Diz Emily de boca aberta de surpresa.
Os olhinhos da criança estão brilhando e Mandy sorri satisfeita ao meu lado com a minha
resposta. Checo o laudo e vejo o que a queda causou: um pequeno corte na testa e um braço
esquerdo fraturado.
Somos interrompidas com uma batida na porta. Doutor Patterson entra junto com uma
mulher que deduzo que seja a mãe de Emily, pela semelhança no rosto. Ela é alta e muito bonita,
seus olhos são verdes e tem o cabelo escuro e ondulado na altura do seu ombro, dando um ar
elegante e jovem.
– Oi Emily, como você está se sentindo hoje? – Doutor Patterson pergunta a menina ao
chegar bem próximo de nós.
– Estou bem, Doutor Liam. A Ariel está cuidando de mim – Ela responde com olhar de
satisfação e com toda a certeza do mundo.
– Hum, Ariel – Ele diz me avaliando dando um sorriso de canto, depois se volta para a
pequena. – Bem Emily, já falei com a sua mamãe e com sorte a queda da árvore não foi tão feia e
não fraturou nenhum osso, mas você vai ficar em observação por hoje para termos certeza de que
está bem, ok?
A mulher que o acompanhava se aproxima de mim. Seu perfume cítrico e doce invade as
minhas narinas como algo marcante e delicado ao mesmo tempo.
– Muito obrigada – Ela diz baixinho enquanto o Doutor Liam avalia a paciente mais fofa
do mundo. – Meu nome é Kate, sou mãe da Emily – Diz estendendo a mão para me
cumprimentar.
– Muito prazer, Doutora Melanie Hansen.
– Tenho certeza de que a Emily gostou muito de você. Aliás, a Ariel é a princesa favorita
dela. – Ela estreita os olhos com seus longos cílios e avalia o meu crachá.
– Que isso! É só o meu trabalho. E ela é adorável, olha só para esses olhinhos – Digo
como uma manteiga derretida.
Já que Liam chegou para cuidar da paciente, Mandy e eu nos despedimos e saímos do
quarto para ela terminar de me mostrar o restante do andar.
– Vem comigo, princesa – Ela faz uma reverência engraçada e em seguida me puxa pelo
meu braço direito. – Vamos começar pelas regras: nunca, em hipótese alguma, entre nessa sala
nos horários das 16:30h às 17h.
– Por qual motivo, Mandy?
– É o horário em que Anton, da Ala C, vem se encontrar com a Penélope da Emergência.
Acredite em mim, não vai querer assistir a cena. E nem queira se encontrar com o Doutor Flinn
nos corredores, que ele vai querer te contar toda a história magnífica os 54 anos de carreira dele
e, acredite, isso toma muito tempo. Ah, e nós também temos reunião de condomínio todos os
dias às 15h e você está convidada. Se considere uma sortuda – Mandy sorri mostrando todos os
seus dentes mostrando empolgação.
– O que? Reunião de Condomínio?
– Sim! Esse é o momento do dia em que reuno os melhores enfermeiros e médicos desse
lugar e nos encontramos no refeitório para conversar e tomar um café!
– Se tem café eu gostei.
– Se você esbarrar com aquelas duas ali durante os turnos – Aponta de forma sutil para as
duas mulheres de jaleco Rosa que passam por nós. – Corre que é cilada! Diz que tem uma
emergência e fuja. Vão querer saber de tudo da sua vida e sugar sua juventude.
– Ok!
– Lá vem ela, Doutora Johnson. – Mandy anuncia.
Uma mulher alta e imponente se aproxima de nós, seus olhos são de um verde que eu
nunca vi na minha vida e seu rosto fino possui uma aparência elegante combinado com belos
cachos castanhos na altura dos ombros. Repenso por duas vezes os sapatos que escolhi para o
meu primeiro dia, pois ela olha para os meus pés subindo o seu olhar pouco a pouco, como se
avaliasse uma rival a sua frente.
Decido me apresentar formalmente e me manter firme em minha postura.
– É um prazer estar aqui, Doutora Johnson! Eu sou...
– Doutora Hansen, eu sei, e espero que esteja disposta a trabalhar duro por esse hospital.
– Hailey fala de forma ríspida e se vira, nos deixando sozinhas.
Fico apenas parada no mesmo lugar, tentando assimilar o que acabou de acontecer aqui.
– Péssima primeira impressão. – Amanda diz balançando a sua cabeça em negação. –
Mas não se preocupe, essa mulher só deve amar seu próprio cachorro, que faleceu há 2 anos.
– Mas o que eu fiz de errado?
– Nada, na verdade ela apenas odeia residentes de forma gratuita, você se acostuma.
– Que sorte a minha. – Brinco com a situação, mas não deixo de me sentir mal com isso.
– Enfermeiro Brandon – Amanda aponta com o queixo para o rapaz moreno que passa do
nosso lado e nos cumprimenta. – Beija muito bem, mas é ruim de papo. Não queira ir à capela
sozinha, dizem que é mal-assombrada. Eu nunca vi nada, mas também não quero pagar para ver,
sou muito jovem para morrer. Se você precisa de um tempo para respirar, o melhor lugar é a ala
A, lá tem um cantinho sem câmeras que usamos para matar serviço. Mais uma coisa, se você me
der qualquer coisa comestível e doce me ganha na hora! – Ela diz balançando a cabeça com
expressão séria.
Começo a rir, é muita informação.
– Toma, esse é seu guia de sobrevivência ao manicómio. Aqui vai ter tudo o que eu te
disse e tudo que vai precisar saber – Ela me entrega a folha que estava presa em sua prancheta
até então.
– Você está falando sério?
– Claro que não, Mel! Estou tirando uma com a sua cara – Ela ri e pega o caderno de
volta. – Mais uma coisa sobre mim, quase nunca falo sério.
– E só agora você me avisa? – Lamento.
A gargalhada de Mandy dá para ser ouvida a quilômetros de distância.
Após sair do hospital, antes de voltar para casa, decido ir para o centro, para conhecer
melhor a cidade. Vou até uma loja de rua que vende bijuterias e encontro brincos e presilhas em
forma de estrela do mar e conchas bem chamativas. As crianças vão amar isso já que a Amanda
me apresentou como princesa Ariel para todos os pacientes que conhecemos hoje, o que achei
muito carinhoso da parte dela.
Já passa das 21h, a cidade está toda iluminada. Los Angeles com certeza é um dos lugares
mais bonitos que eu já vi. O clima é agradável, as ruas são limpas. Há grandes prédios,
coqueiros, e é possível ver de longe o letreiro Hollywood. Até penso se posso encontrar algum
famoso por aqui, tia Beth endoidaria se eu encontrasse George Clooney por um acaso em algum
restaurante ou na calçada da fama. Passo pela frente da praia e sinto a brisa fresca do mar vindo
até mim. O cheiro, as cores, tudo faz com que eu me sinta viva novamente.
Paro mais a frente para ver um artista de rua cantar uma canção de blues a capela.
É estranho, mas, acabei de chegar nesse lugar e já sinto que deveria ter morado aqui a
vida toda.
“Eu passei os últimos oito meses.
Pensando que tudo o que o amor faz.
É quebrar, queimar e acabar”
Begin Again – Taylor Swift
2 semanas depois
– Impossível! Você não tem nada saudável aqui para comer Ty, como que você ainda
mantém esse corpo sarado? Eu vou ter que malhar três dias na academia só de respirar aqui. –
Minha irmã diz de forma revoltada, enquanto revira cada canto do armário da cozinha.
Ela é dois anos mais nova e mesmo assim se sente na obrigação de cuidar de mim até
hoje, ainda mais depois que a nossa mãe se foi. Kate sempre foi a mais responsável de nós dois.
Casou-se, e logo teve Emily para completar sua família. Não deveria ser o contrário? Eu sou o
mais velho!
– Desisto! Não tem nada para cozinhar. – Ela continua o assunto.
– Existe uma coisa que se chama Delivery, e pasme: é possível pedir através de um
aplicativo no celular. – Respondo com ironia, enquanto ela revira os olhos claros com a minha
resposta.
– Ou você poderia aprender a cozinhar para surpreender uma mulher.
– Não tenho interesse em culinária, e nem em conquistar uma namorada.
– Você nunca mais vai ter um relacionamento sério mesmo, Tyler? E aquela advogada,
Cindy… Mindy, ou sei lá o nome dela.
– Minha vida está muito boa assim, maninha. E não pretendo mudar tão cedo, não adianta
tentar me convencer.
Abro uma garrafa de vinho branco e sirvo em duas taças para nós. Ela se senta no sofá
depois de tirar um sutiã preto rendado com as pontas dos dedos e jogar para o outro lado do
cômodo, fazendo uma careta.
– Tyler, eu não vou estar aqui para sempre, não quero que fique sozinho – Ela acaricia
minha mão direita que está sobre o sofá de couro.
– Não Kate, e chega desse assunto – Esbravejo.
– Você realmente não tem nenhum sonho na sua vida? – Minha irmã insiste.
– Talvez eu tenha um...
Noto o olhar esperançoso em seu rosto.
– Viver em uma ilha no Havaí, bronzeado, solteiro e com muito dinheiro. Espera... eu já
estou vivendo meu sonho, só falta a ilha.
Kate revira os olhos.
– Tudo bem, você venceu… Como estão os assuntos na empresa? – Ela pergunta,
tomando um grande gole do vinho.
– Até que estão indo bem. Nosso pai quer que eu seja como ele, mas não sou. Seria muito
mais fácil se você estivesse lá comigo. Você é a mais inteligente da família, não eu.
– Sinto muito Ty, com a empresa do James ampliando da forma que está, decidimos que
vou ficar em casa e cuidar do crescimento da Emily. Já passei muito tempo longe dela por causa
da empresa da nossa família – Kate diz, lamentando sobre o tempo perdido.
– Admiro seu marido por isso. – Ofereço minha taça em um brinde.
Ao invés de trabalhar conosco, James quis começar do zero. E Kate realmente se dedicou
muito nos últimos anos, então ela merece esse tempo.
O que acontece é que os problemas voltam para mim. Sei que é egoísta da minha parte,
mas era muito mais fácil quando eu não precisava tomar decisões e só assinava alguns papéis
com o meu sobrenome. Não precisava ter o olhar de reprovação de Robert sobre mim. Com a
saída de Kate, tive que assumir o lugar dela e sei que ela é a favorita do meu pai.
Nossos olhos se voltam para a mesma direção, com alguém dando socos na minha porta
de entrada.
– Não está esperando nenhuma mulher né, Tyler? Você prometeu que daria um tempo
para mim – Minha irmã me repreende.
– Claro que não, Kate. Mas se for gostosa vou ter que te dispensar. – Me levanto para ir
atender.
– Cachorro! – Ela arremessa um travesseiro na minha direção.
Abro a porta e me surpreendo muito com o que vejo.
Cabelo ruivo e longo, pele aveludada e clara como a neve. Ela está vestindo um pijama
preto clássico do Star Wars e por cima um robe de cetim da mesma cor, que está bem justo ao
seu corpo. Por sorte, a camiseta do Darth Vader tem um decote em V que a deixa sexy, mesmo
com o grande vilão me encarando.
A mulher que deve medir 1,60 centímetros, franze as sobrancelhas finas, furiosa, e me
fuzila com os olhos cor de avelã. Mas ainda sim percebo que ela está me avaliando, enquanto
sobe o olhar até o meu rosto.
– Boa noite, Ruiva bonita – Digo para quebrar o gelo.
– Sou sua nova vizinha e estou tentando dormir. Será que poderia diminuir um pouco o
volume? – Mesmo com tom de raiva, sua voz é doce e calma.
Admiro sua beleza por alguns segundos, sendo mais forte do que eu.
– Mas que porra! É possível parar de me encarar?
– Que boca suja… não é uma boa primeira impressão para a vizinhança.
Ela revira os olhos, fazendo eu me sentir ainda mais desafiado.
– Desculpa, eu vou diminuir o volume ok?
– Obrigada.
– Qual é o seu nome?
– Você não precisa saber. – Responde rápida e afiada.
– “Você não precisa saber”? Que nome esquisito. – Ironizo.
Acho que minha irmã não vai se importar de dividir um pouco a atenção, e talvez já
esteja na hora de ela ir embora.
– Quer entrar, vizinha?
– Eu jamais entraria! – Responde de forma ríspida como se eu tivesse a insultado.
Até onde isso vai?
– Azar o seu, porque você parece um pouco nervosa, seria bom para você relaxar –
Encosto no batente da porta, cruzando os braços e esperando a resposta da esquentadinha.
Sua respiração é profunda até que seus olhos seguem para dentro do meu apartamento.
– Kate?
– Melanie! – minha irmã surge, cortando a minha diversão.
Droga Kate.
Espera, elas se conhecem?
– Olá Kate, me desculpe pelo incômodo. Só preciso que diminuam um pouquinho o
volume. Boa noite para vocês!
A ruiva muda o tom ao falar com a minha irmã, ficando sem graça. Vira as costas e vai
embora sem se despedir.
Kate volta para a sala rindo muito sem parar.
– É impressão minha ou você levou o seu primeiro fora da vida, Tyler Smith? – Ela
gargalha, voltando para o sofá.
– Não levei um fora. Ela já estava na minha, você que chegou e estragou tudo – Digo
para ela como se não importasse.
Está bem, levei um fora sim.
– Sim, eu vi. Você estava mandando muito bem mesmo. Achei que ela se jogaria nos
seus braços ali mesmo – Kate responde com ironia.
– Cala a boca, Kate!
Resmungo como um mimado.
– Tyler, sinto em te dizer, mas você está encrencado. Mulheres como essa fazem você se
apaixonar – Kate bate no meu ombro como se fosse um consolo.
– O quê? Eu nem a conheço – Digo como uma criança que não ganhou o doce. – E de
onde você a conhece?
– Ela é Doutora da Emy, e sua sobrinha gostou muito dela. Não parava de dizer em como
a Ariel é bonita. – Minha irmã serve mais vinho nas taças.
– Ela está mais para Úrsula. – Respondo sorrindo.
– Pois eu adorei ela – Kate retruca e se aproxima.
Mesmo assim fico pensando na ruiva que surgiu no meio da noite. Um pouco de diversão
não faz mal a ninguém. Por que ela negou tão rápido?
– Você deveria se desculpar – Minha irmã diz, erguendo as sobrancelhas.
– Por qual motivo exatamente?
– Bem, ela parecia muito irritada com você... Deveria ir ao hospital amanhã no meu
lugar. Ainda falta assinar alguns papéis para as doações, já que a ideia foi sua. – Ela sugere.
– Não vou.
Kate não sabe, mas não piso em nenhum hospital desde o acidente com nossa mãe.
– Por que não? Está com medo da sua vizinha? Covarde – Sussurra, provocativa.
– Eu não sou um covarde, estarei lá. – Respondo prontamente para evitar mais perguntas.
Tento levar minha mente para outra coisa que não seja aquele hospital e então penso mais
sobre ela. Talvez eu queira saber um pouco mais sobre a minha nova vizinha e me divertir um
pouco com isso.
Doutora Melanie, você ainda não sabe mas, acabou de me desafiar.
“Eu tinha medo de dentistas e do escuro,
eu tinha medo de garotas bonitas e de começar conversas.”
Riptide - Vance Joy
Eu jurei.
Há muito tempo eu não piso os meus pés em um hospital, lembro de prometer a mim
mesmo desde o acidente, que nunca mais entraria em um. Ironias do destino, cá estou eu, na
recepção do mesmo hospital que estive entre a vida e a morte, e com um adesivo colado no peito
para visitantes.
Dito meu nome na recepção e a jovem que aparenta ter uns 20 anos com trança no cabelo
castanho, diz que é só eu ir até a direita no final do corredor, pegar o elevador e seguir as setas.
– Desculpa, para que lado ficam as escadas? – Pergunto.
– Para o mesmo lado, Senhor Smith. – Ela aponta para a direita novamente.
– Obrigado.
Estou indo na direção que a jovem me falou quando vejo de longe uma mulher de costas
com o cabelo ruivo solto no ar. Sei que tenho uma reunião com o médico chefe a respeito da
doação que estamos fazendo ao hospital, mas mesmo assim acelero o meu passo para alcançá-la.
Um pouco de diversão para alegrar o meu dia não faz mal algum antes da burocracia que vou
enfrentar, e eu não sou um covarde segundo a Kate.
– Melanie?
Consigo chamar sua atenção. Seus olhos encontram os meus, mas no mesmo momento
ela vira as costas me deixando sozinho.
– Melanie, espera!
Ela se vira bruscamente como um esquilo raivoso.
– Aqui, para você, é Doutora Melanie Hansen! – Ela diz com ênfase em “doutora”.
– Está bem Doutora… vejo que começamos com o pé esquerdo ontem à noite. Prazer, eu
sou o Tyler, seu vizinho – Estendo minha mão a ela para cumprimentar de forma amigável.
Depois de analisar mentalmente a situação, ela cede. Sua mão é pequena e macia, mas
mesmo assim aperta a minha com força.
Deve ser muita raiva contida.
Sorrio para ela que se mantém séria. Pego um lenço branco de dentro do meu blazer e
balanço em forma de iniciar a paz. Consigo arrancar um breve sorriso dela e noto as marquinhas
nas nas suas bochechas, mas logo ela muda o humor.
– O que você está fazendo aqui, Tyler? Já não basta me perturbar com barulhos toda
noite? Vamos combinar uma coisa? Espaço! Cada um para o seu lado – Ela diz séria.
Ela realmente está brava comigo, minha irmã não erra uma.
– Hum – Murmuro exagerado. – Então você ficou escutando os barulhos, Doutora
Melanie?
Eu não consigo perder a chance de provocá-la, isso pode ser mais divertido que assistir a
uma partida de Basquete na TV.
– Podemos ser apenas vizinhos e não trocar uma palavra? – Ela revira os olhos.
– Desculpa, estou sendo um babaca – Mudo de assunto antes que ela perca ainda mais a
paciência. – Preciso ir até a diretoria, sabe me dizer onde fica Doutora?
– Não sei – Ela cogita em me deixar sozinho, mas volta atrás. – Quer dizer, vem comigo
estou indo para o mesmo andar agora mesmo. – Ela diz se virando novamente. Ela é pequena,
mas ainda assim anda muito rápido.
Fico observando ela de costas. Até que ela fica atraente com esse jaleco, posso imaginá-la
se estivesse sem roupa nenhuma por debaixo dele.
Para com esses pensamentos pervertidos, Tyler! Me repreendo mentalmente.
– Não que seja da minha conta, mas o que te traz até aqui? – Ela pergunta com desdém.
Sei que é sem interesse e é só para quebrar o gelo.
– Apenas negócios.
Eu poderia falar sobre a doação que minha família está fazendo, mas não quero parecer
um idiota que fica se expondo pelo dinheiro que tem.
– Você cuidou muito bem da minha sobrinha, inclusive devo agradecer em nome da
família. Emily Smith, deve se lembrar dela…
Melanie para no mesmo instante quando escuta o nome da Emy, se vira para mim e me
olha com curiosidade.
– Sabe? A garotinha bonita como eu, esperta e parece um gnomo – Continuo tentando
fazê-la se lembrar.
– Sei, ela é a minha paciente – Ela diz como se algo tivesse feito sentido na sua cabeça.
Se eu não estiver louco, poderia até falar que seu rosto ficou corado.
Imagino que ela achou que Kate não era minha irmã e foi lá reclamar.
Ora, ora, se não é o Tyler Smith marcando uma cesta.
– Acho que é daqui que você conhece a minha irmã, que você viu no apartamento ontem
à noite – Digo orgulhoso porque dessa vez eu estou à sua frente.
Ela só acena com a cabeça e quando me dou conta estamos na frente do elevador.
Minhas mãos começam a tremer diante da grande porta de metal e traiçoeira que estamos
esperando para ser aberta. O portal para o Inferno. E agora, o que eu faço?
Se eu me negar a entrar ela vai me achar patético.
A porta se abre e entro atrás dela que nem se atreve a olhar para mim. Vejo ela apertando
o botão de número 16. Merda, é no último andar mesmo? Está de sacanagem.
Fecho os meus olhos tentando pensar que não estou ali dentro, tento visualizar uma
quadra e estou arremessando uma bola de basquete na cesta. Ok, não está funcionando… sinto
que meu coração está acelerado. Por que eu entrei aqui? Abro os olhos novamente e vejo
Melanie me observando com curiosidade, com as sobrancelhas franzidas
– Você está bem, Tyler? – Ela pergunta.
Só balanço a cabeça para cima e para baixo porque sou incapaz de responder. Ela é
médica, o que estou fazendo? Ela vai perceber o meu ataque de pânico.
– Você tem medo de elevador, Senhor Smith? – Ela pergunta já sabendo a resposta. –
Fiquei sabendo que semana passada houve uma queda de energia e as pessoas ficaram presas
aqui dentro por cerca de 3 horas, foi estressante. Outro dia mesmo o elevador despencou e 2
homens ficaram feridos. Mas fica tranquilo, hoje é seu dia de sorte, nada vai acontecer.
Sim, pelo seu sorriso de canto, percebo que está se vingando. Melanie não é a sereia e
sim aquele polvo que quer o lugar da doce sereia.
É hoje que a terra perde um homem. Se não for com a queda do elevador, vai ser de
ataque cardíaco.
– Porra Melanie, esse negócio pode despencar! – Lamento com a voz trêmula de
nervosismo.
– Relaxa Tyler, você não é a única pessoa que tem medo de elevadores no mundo. Isso é
normal, você tem que enfrentar os seus medos e vai ficar tudo bem. – Ela para na minha frente e
segura minhas mãos que estão suadas.
Me sinto estranho com alguém segurando minhas mãos, não sou muito de demonstrar
carinho físico. Me concentro só nos olhos dela, que notei que são avelãs puxados para o tom de
verde. Fico hipnotizado por um momento e aos poucos meu coração vai desacelerando e as
minhas mãos vão parando de tremer. Ela respira fundo junto comigo, me mostrando como se faz,
soltando o ar devagar. Vejo seu peito subir e descer lentamente, faço o mesmo até escutarmos o
bip contínuo do elevador avisando que chegamos ao andar desejado. Saio antes mesmo das
portas terminarem de se abrir totalmente.
Assim que saímos do elevador Melanie tira do bolso do seu jaleco branco e coloca nas
orelhas um par de brincos ridículos de estrela do mar azul, e prende uma mecha do seu cabelo
ruivo com uma presilha em forma de concha do mar dourada. Não sei por qual motivo acho acho
engraçado vê-la colocar aqueles acessórios infantis, então começo a rir antes de dizer algo.
– Não diga nada, Tyler! – Ela aponta uma caneta em ameaça e em seguida me dá um
soco fraco no peito, me indicando a direção.
– Essa doeu Doutora, tem mais de onde veio esse? – Digo em tom provocativo.
– Você tem quantos anos mesmo? – Ela resmunga alto e sai na frente.
Até que eu me esqueci da vergonha que passei agora a pouco no elevador. Melanie é uma
boa distração para os meus medos. Continuo seguindo ela, mantendo uma distância segura de
suas faíscas.
– Bem, você fica aqui e eu vou para o último bloco – Melanie me aponta a porta da
diretoria.
A porta é aberta no mesmo instante como se fosse telepatia.
– Senhor Smith, bem na hora! – O homem de jaleco azul marinho ergue a mão direita
para me cumprimentar. Ainda não tínhamos nos conhecido pessoalmente, mas de certa forma ele
já sabe quem eu sou.
Quem é o cara mais pontual do universo agora, pai?
– Doutora Melanie – Ele sorri para ela, me deixando para escanteio. – Depois que
terminarmos, se puder vir até a minha sala, quero apresentar uma ideia para você.
– Claro Doutor Patterson, estarei aqui. Com licença, agora tenho que ir atender meu
paciente. – Ela responde brevemente e se vira sem nem se despedir.
O infeliz continua a olhando até que vire no próximo corredor à esquerda.
– Bem, pode entrar... Meu pai já está aguardando – Ele diz abrindo o caminho após nos
encararmos por um instante.
Entro com a maior certeza de que eu não gostei desse Doutor Engomadinho.
“Caindo rápido demais para conseguir me preparar para isso.
Tropeçar no mundo pode ser algo perigoso.”
Whatever it takes – Imagine Dragons
Não sei que peça é essa que as estrelas querem me pregar, mas é muita coincidência que
meu vizinho seja tio da minha primeira paciente. Se eu não acreditasse em coisas do destino eu
diria que isso seria loucura.
Estou pensando nessas coincidências da vida quando encontro Mandy, que está
segurando dois copos da Starbucks.
Café, era disso que eu precisava!
– Obrigada, você é um anjo na terra.
Pego meu copo e dou uma golada da bebida quente com chantilly de baunilha, em
seguida meus ombros relaxam com a sensação familiar.
– Oi Mel – ela diz com um sorriso maquiavélico e eu já posso esperar a pergunta que vem
por aí. – As más línguas desse hospital já me informaram que você esteve com um homem essa
manhã…
Por algum motivo deixo escapar uma risada de nervosismo.
– Você realmente não perde tempo… Fique sabendo que não era ninguém importante.
Lembra do meu vizinho barulhento que comentei? É o Tyler. Ele é tio da Emily Smith. Não é
muita ironia?
– Não, não, não! Minha amiga Melanie, ele não é apenas seu vizinho. Ele é o Tyler
Smith, simplesmente um dos herdeiros mais ricos de Los Angeles. Gata, você ganhou na loteria
– Mandy diz empolgada.
– Não pode ser – Respondo com desinteresse. – Ele mora no mesmo andar que eu,
impossível uma pessoa ter tanto dinheiro dessa forma e morar lá.
– Pode ser algum experimento social ou estão gravando um reality show? As pessoas
dessa cidade respiram fama – Ela me dá uma cotovelada de leve. – e me falaram bem da forma
que ele te olhou.
– Eu sei, como um pedaço de carne no açougue... Ele é insuportável, acredite. Só deve
pensar com a cabeça do pau dele!
– Bem, se essa cabeça for gostosa vale a pena conferir, não acha? – Mandy diz séria,
fazendo um gesto medindo com as mãos o possível tamanho do documento do Tyler.
Mas no mesmo instante nós duas começamos a rir daquela bobagem.
– Mandy acredite, não estou aberta para nenhum tipo de relacionamento agora.
Penso em falar sobre o Anthony, mas não me sinto confortável em dizer nem o nome dele
em voz alta agora. É como se o nome dele fosse uma maldição que ainda me acompanha a cada
passo.
– Não sei o que o idiota anterior fez com você garota, mas o que eu sei é que você vai dar
a volta por cima e cair direto em um pau muito habilidoso, rigoroso e…
– Mandy, não!
– Tudo bem, estou brincando. Eu entendo, acredite. Não sei o que aconteceu, mas quando
quiser conversar estou aqui para o que precisar, pode confiar em mim! Não gosto de muitas
pessoas, mas as que eu gosto são para sempre e as protejo com todas as minhas forças.
– Muito obrigada Mandy, de verdade!
Eu não pretendo falar tão cedo sobre meu relacionamento com Anthony, mas não a culpo
por tentar fazer eu me sentir melhor.
– Aliás, hoje é sexta, isso quer dizer que é dia de happy hour – Mandy faz uma dança
engraçada mexendo os quadris em comemoração.
– Mandy! Não vou, nem adianta tentar me convencer. Eu preciso estudar para a prova do
conselho.
– Mel, é tradição! E você acabou de chegar, o pessoal quer te conhecer e você já negou
na semana passada. Não aceito não como resposta dessa vez. Então às oito da noite eu te pego na
sua casa, ok? Se não gostar, prometo te pagar o café por uma semana.
Sei que não vou ter escapatória. E a oferta do café foi boa, tenho que admitir.
– E o Doutor Patterson também vai, com certeza vai querer uma reunião com você até na
balada – Diz Mandy com ironia. – Está bem, desculpa, parei.
Não estou cega e sei que ele está muito atencioso comigo, mas não muda o fato de que eu
sou nova aqui no trabalho. Ele é filho do meu chefe e realmente não preciso de mais problemas
com homens.
– Não vou conseguir fazer você parar de falar sobre isso né, Mandy?
– Não – Ela responde satisfeita e com um sorriso triunfante nos lábios.
– E o que tenho que vestir hoje à noite?
– É assim que se fala garota! Vamos à boate, vista sua roupa mais provocante. – Mandy
pisca e entra em outra sala enquanto sigo para a direção contrária.
Percebo meu beep ser acionado no bolso do jaleco então corro até a pediatria onde
encontro Doutora Hailey aguardando na entrada.
Os socorristas entram com um garotinho deitado sobre a maca, me aproximo e verifico
suas pupilas, há muito sangue em seu corpo.
– Trauma 2! – Doutora Hailey anuncia.
– Quem é ele, o que houve? – Pergunto ao paramédico que fez os primeiros socorros.
– Acidente de carro, os pais já estão no centro cirúrgico. – Ele responde.
– Vamos monitorizar. – Anuncio.
Caminho rapidamente ao lado da maca até chegarmos a sala de pronto atendimento
enquanto a equipe se reune para fazer o trabalho.
– Onde está sangrando? – Doutor Liam chega e veste suas luvas, em seguida começa a
verificar.
– Estou procurando... – Hailey responde enquanto procura por cada espaço de pele do
paciente. – O sangramento vem apenas do abdômen.
Verifico o monitor cardíaco enquanto seguro seu pulso colocando meu dedo indicador e
médio dando a palpada.
– Frequência cardíaca 130, Pressão pelo menos 90 com pulso radial. – Aviso.
– Tudo bem, quero 2 acessos – Doutor Patterson solicita. – Quero resultados da
gasometria, tipagem e prova cruzada também.
Percebo o garoto abrindo os olhos claros.
– Você está me ouvindo? – Pergunto. – Vai ficar tudo bem, ok?
– Quero sangue O negativo, tem que estar morno. Nível 1, 2 bolsas. – Liam ordena e sai
em seguida para se preparar.
– Sim doutor – Doutora Johnson responde e ordena aos enfermeiros que estão em volta. –
Fazer exames e encaminhar para o centro cirúrgico, agora!
Levam o pequeno garoto rapidamente até o elevador de emergência. Fico sozinha e
torcendo pelo melhor... Nunca é fácil ver uma criança machucada e só espero que seus pais
fiquem bem para cuidar dele.
Confesso que pensei em desistir umas cinquenta vezes até finalmente chegar na boate, e
está muito mais lotado do que eu esperava. A música eletrônica está no volume máximo e as
pessoas dançam no meio da pista. Na verdade, nem sei muito bem como me comportar em um
lugar desse já que eu não ia em muitas festas.
Vejo meu reflexo em um espelho quando passamos pelo bar. Estou usando um vestido
simples que comprei depois que sai do trabalho. Ele é um tule preto com alças finas, modelo
ajustado na minha silhueta. Minhas coxas estão expostas e começo a me arrepender por ter
comprado algo tão justo e pequeno fazendo eu me sentir mal. Poderia ter vindo com uns dos
meus suéteres e calça jeans.
Mandy usa um vestido branco com apliques em renda, sua pele brilha, seu cabelo rosa
está totalmente solto e moldado por cachos.
– Olha, o pessoal está ali – Ela diz apontando para uma mesa lotada no canto do Bar.
O ambiente está escuro, iluminado apenas pelas luzes de LED coloridas de alguns pontos
estratégicos para deixar o ambiente aconchegante e livre para as pessoas se beijarem. Tenho que
tomar cuidado para não pisar no pé de ninguém. Será que estou precisando de óculos ou eu que
não suporto mais lugares lotados?
Liam é o primeiro a se levantar para me cumprimentar. Ele está perfumado, um cheiro
gostoso e doce. É diferente ver ele fora do hospital sem o uniforme, mesmo de social ainda está
com um visual mais despojado com uma camisa clara e tênis brancos.
– Mel, você está deslumbrante! – Ele diz assim que seus olhos se focam em mim.
– Obrigada – Como ele não está sendo formal comigo aqui, resolvo ser mais leve – Você
também está bonito, sem o jaleco – Respondo para quebrar o gelo e os olhos dele brilham diante
das luzes.
– Mel, esses são o enfermeiro Neve e o paramédico Garret, e Doutora Natália que está de
folga essa noite.
– Bem, nos conhecemos hoje mais cedo. – O sorriso largo do homem na ponta da mesa
me chama a atenção e então me lembro sobre a ocorrência mais cedo, ele era um dos
paramédicos.
Todos me recebem de forma calorosa e erguem suas bebidas como se fosse um brinde a
minha presença.
– Você ainda vai ter chances de conhecer o restante do pessoal porque o hospital é muito
grande, mas acredite, os melhores estão aqui nessa mesa – Mandy cochicha no meu ouvido e dá
uma piscadinha.
– O que você quer tomar, Melanie? Deixe que eu pago uma bebida de boas-vindas para
você – Liam se oferece.
– Hoje só uma água com gás! É bom que ninguém se assuste comigo essa noite.
Arranco alguns sorrisos.
– Então na próxima você vai beber comigo e vamos passar vergonha juntos. Vai ficar me
devendo – Ele avisa antes de se levantar e ir em direção ao bar.
– Então Melanie, você é de onde?
Ouço uma voz masculina e grave me perguntar.
– Você é o Neve, acertei?
O jovem moreno de olhos castanhos e barba volumosa acena que sim com a cabeça.
– De São Francisco.
Liam volta com as bebidas.
– Nossa, veio de longe. Tem parentes aqui?
– Na verdade não tenho ninguém, só queria começar minha carreira em um lugar novo.
Inclusive estou gostando muito daqui, o hospital é maravilhoso – Mudo de assunto.
– Pare de encher a Mel de perguntas, Neve! Esse trabalho é meu – Mandy se intromete.
Neve faz uma careta feia para ela que logo revida mostrando o dedo do meio.
As horas passam sem eu notar, porque eles são engraçados, e é bom fazer amigos novos,
consigo ficar à vontade perto deles mais rápido do que imaginei. Contam suas experiências
hospitalares mais loucas e é possível perceber que já são amigos há muito tempo.
– Para tudo! Essa é a minha música – Mandy anuncia quando começa a tocar Summer do
Calvin Harris na pista. – Mel e Nati, venham comigo!
Natália é loira natural dos olhos azuis e deve medir quase 1.80 de altura. Até pensei que
seria uma modelo quando cheguei, tenho certeza de que chama atenção por onde passa. Ela é
bem divertida, assim como Mandy.
Vamos até o centro da pista e Natália e Mandy começam a dançar como se não houvesse
o amanhã. Decido me soltar também, balanço as mãos e a cintura. Não sei dançar, mas as duas
como boas amigas me acompanham. Sei que deve estar a coisa mais engraçada do mundo, mas
não me importo.
Estou distraída quando alguém segura firme na minha cintura por trás. Me assusto com o
toque, sinto um arrepio como se mil lembranças ruins viessem a minha mente.
Me viro e dou de cara com o Liam que me encara com seus olhos azuis. Ele me segura
mais firme e me conduz para dançar.
Penso em sair correndo, mas me lembro que não é o Anthony.
Respiro fundo e solto o ar dos meus pulmões lentamente.
Por favor, seja normal Mel, essa é uma nova vida. Não há o que temer.
– Você dança bem – Ele diz me tirando do transe, sei que ele está sendo irônico.
– Sim, foram anos de Ballet Clássico, eu tenho um dom na verdade – Sem querer piso no
pé dele, nós dois rimos até pararmos de dançar.
Ele me olha de um jeito diferente, é possível notar. Já vi esse olhar antes, é olhar de
desejo.
– O que foi? – Pergunto e penso em sair correndo.
Meus olhos vão em direção ao banheiro feminino, posso inventar uma desculpa.
– Estou pensando seriamente em te beijar. – Liam diz olhando para os meus lábios.
“Tudo que eu sou é um homem,
eu quero o mundo em minhas mãos.”
Sweater Weather - The Neighbourhood
Estou no meu apartamento e estou preocupada com a noite de hoje, porque não sei para
onde Tyler irá me levar. Troco de roupa umas mil vezes e por fim decido colocar um vestido de
linho azul marinho, com meias finas que cobrem minhas pernas e um sapato baixo.
Cafeína é minha válvula de escape para praticamente tudo, inclusive minha ansiedade,
então vou até a cozinha e ligo a cafeteira para passar um café fresco.
Tudo está tão silencioso que sinto falta de São Francisco e dos meus tios, a única família
que eu tenho.
Pego meu celular que está em cima da bancada para enviar uma mensagem.
Termino de lavar as mãos e saio do banheiro quando Kate surge do além. A casa é grande
e mesmo assim ela consegue me achar onde quer que seja, como um animal asqueroso caçando
a presa simpática através do seu cheiro.
– Ty, o que houve com você? – Ela pergunta, já colocando a mão no meu rosto,
analisando cada centímetro da minha pele e ultrapassando qualquer limite de privacidade.
– Nada! Foi só uma briga. – Dou de ombros e respondo o mínimo, geralmente funciona.
– E será que essa briga envolve uma certa ruiva que está na nossa mesa de jantar? – A
intrometida tira suas próprias conclusões.
Levanto as mãos tentando me justificar.
– Kate, vai se acalmando. Só vim porque não tinha outra coisa para fazer. E você sempre
diz para eu vir visitar vocês, fiz a gentileza de trazer ela até aqui já que você e a Emy gostaram
tanto da doutora.
– Ty, acho ótimo você estar aqui – Ela diz sorridente.
Reviro os olhos.
– Vocês transaram? – Minha irmã pergunta sem rodeios.
– O quê? Claro que não Kate! Não vou transar com ela.
– Ai cassetada! Isso é pior do que eu pensei. Você realmente está muito e extremamente
ferrado. – Ela diz balançando a cabeça em negação.
– O que você quer dizer com isso?
– Nada, só quero desejar parabéns.
– Não estou te entendendo, Bruxa.
– Você acabou de conhecer a sua futura esposa. – Ela dá uma risada e um tapa no meu
ombro de consolo, antes de sair correndo como se fosse uma criança de 10 anos.
Filha da...
Vou atrás dela até o deck do quintal pensando se realmente foi uma boa ideia vir até aqui.
É incrível a forma que os anos passam e nada muda nessa casa. A mesma cadeira de quando eu
tinha 7 anos está bem ali, talvez até exista o chiclete que eu colei embaixo dela ou da mesa.
Não falo com o meu pai desde ontem, então evito o contato visual com ele me sentando
do outro lado da mesa. James, meu cunhado, está na churrasqueira velha, e Melanie se sentou na
minha frente.
– Não esperava pela sua presença filho, estou realmente feliz de estar aqui. – Robert tenta
puxar assunto comigo.
Abaixo minha cabeça olhando para minhas próprias mãos, me arrependendo outra vez
por estar aqui e por envolver minha vizinha nisso.
– Finalmente uma garota para te colocar no eixo. – Meu pai continua se direcionando a
Melanie.
Melanie, que está tomando refrigerante na hora que meu pai fala isso, não se aguenta e,
como espontânea que é, ri e cospe toda a bebida na minha camisa Prada.
Todo mundo começa a rir, claro.
– Tyler, me desculpa, me desculpa mesmo. – Diz envergonhada.
– Melanie, se queria me ver sem camisa era só ter me falado que nós já poderíamos ter
resolvido isso lá no apartamento mais cedo. – Pisco e cochicho para ela que fica vermelha e joga
duas batatinhas fritas no meu peito.
– Não se preocupa, Mel. Querida, pegue uma camiseta lá no guarda-roupa do papai para
o seu tio, por favor. – Kate pede a Emy que, sem reclamar, levanta-se e vai correndo para dentro
de casa.
– Claro que você não é forte como eu, Tyler, então Melanie vai ficar meio decepcionada
em ver você com a minha camisa – Meu cunhado brinca.
– James, sua linguiça está assando! Por que você não cuida dela?
– Eu sei, como você gosta da minha linguiça? Grande, mal passada? Bem rosa? Porque é
o que eu tenho para você hoje. – Ele revida.
– Meu Deus, a minha filha é mais madura que vocês dois juntos. – Minha irmã corta a
onda.
– Nos formamos na mesma faculdade que você, Kate. – Argumento.
Melanie não liga, está se acabando de rir. Olho para o meu cunhado e rimos juntos.
– É verdade, deixem a garota se assustar no próximo jantar… – Meu pai interrompe –
Kate me disse que você é uma excelente pediatra, se formou em qual faculdade?
– Stanford, senhor Smith. Estou finalizando a minha residência no hospital e ainda
preciso fazer o exame de medicina, mas estou bem confiante. Obrigada pelo elogio!
Admiro o amor que Melanie fala sobre sua profissão, não é algo normal hoje em dia onde
todos almejam apenas sucesso e dinheiro.
– Você é inteligente, gostei de você! O que acha de jogar boliche conosco semana que
vem? O Tyler fica bem irritado quando perde. É divertido de ver. – Meu pai me provoca.
Não dê mais asa a cobra, por favor. Uma vez vindo aqui, já está ótimo.
– Bem, posso pensar, mas já vou adiantando que sou péssima no boliche. – Ela responde
gentilmente.
– Fica tranquila, todos somos – Minha irmã responde.
– Vocês são uma família linda e eu agradeço muito por me receberem aqui hoje. –
Melanie diz.
– Obrigada Mel e por favor, já se sinta da família. – Kate responde. – Meu irmão é
teimoso e as vezes insuportável, mas ele tem um coração bom, acredite em mim.
– Apesar da arrogância, gosto da sinceridade dele. – Melanie sorri.
– Eu ainda estou aqui, vocês duas sabem?
Kate pisca para mim e se levanta, indo para dentro da cozinha. Ela é extremamente
semelhante à minha mãe, não gosto de vir aqui porque me lembro muito dela.
Hoje seria seu aniversário. Todos os anos, desde a morte dela, meu pai e minha irmã se
reúnem nesse dia. Não importa o que estiverem fazendo, ou se o mundo estiver acabando ao
redor de todos, eles passam esse dia juntos.
A saudade me bate da maneira mais cruel e inesperada possível. Estar aqui nessa casa que
me traz tantas memórias, talvez seja o motivo da minha ansiedade e necessidade de chorar.
Me levanto da mesa sem dizer nada e caminho pelo gramado até chegar a um lugar que
seja possível respirar sozinho e um pouco afastado da casa. Visualizo Los Angeles do topo e
imagino como seria se ela ainda estivesse aqui. Tudo seria mais fácil. Ainda estaria adivinhando
figuras e contando estrelas com ela enquanto estivéssemos deitados em uma coberta estendida na
grama, conversando sobre a vida.
– Também sinto saudades dela. – A voz do meu pai preenche meu espaço.
– Pai, agora não!
– Não filho, eu realmente estou muito feliz por você estar aqui. Me desculpa por ontem e
pela forma que falei, sei que as vezes posso ser muito duro com você.
– Não precisa fazer isso.
– Fazer o quê? Eu amo você, Tyler. E sei que estar aqui hoje é um grande avanço para
você, então obrigado por fazer isso pela nossa família.
Apenas aceno com a cabeça, tentando me manter forte e estável.
– Melhor voltarmos. – Aviso meu pai e caminho na frente para evitar falar sobre qualquer
coisa sem que eu desabe.
Eu tenho que ser forte.
Uma risada nada sutil me toma por completo, me trazendo uma tranquilidade
inquestionável. Melanie ri de alguma piada sem graça do James e isso me faz sorrir também.
Kate retornou com um pequeno bolo coberto com glacê e velinhas cor de rosa. A dor em
meu peito é inquestionável.
– Bem, esse é mais um ano sem minha amada esposa, mas sou grato por ter cada um de
vocês aqui e gostaria de desejar essa noite, os parabéns para a mãe e mulher mais incrível de
nossas vidas. – Meu pai faz um breve discurso antes de pedir para que minha sobrinha apague as
velinhas.
Um nó se instala em minha garganta, ficando impossível de conter minhas lágrimas e me
odeio por isso. Me sinto impotente e vazio, até que alguém acomoda seu corpo em meu peito.
Olho para baixo, mesmo sabendo que é Melanie quem me abraça. Seu cabelo ruivo cheira a
essência de baunilha. Fico intacto e não sei o que fazer, então apenas retribuo o seu abraço, a
encaixando em meus braços.
Não era para eu estar aqui hoje e apesar da briga que há dentro de mim, tudo parece mais
leve.
Eu não me sentia à vontade de vir.
Até hoje.
“Se eu apenas deitasse aqui.
Você deitaria comigo e simplesmente esqueceria o mundo?”
Chasing Cars - Snow Patrol
Fiquei pensando na noite de ontem, Kate me contou sobre a perca precoce da mãe há
alguns anos, foi um acidente, e quem dirigia o carro era Tyler. Mal consigo imaginar o tamanho
de sua dor nessas circunstâncias.
Ele voltou para casa em um completo silêncio. Eu odeio silêncios, mas naquela ocasião,
apenas dirigi de volta e respeitei.
Eu acredito em destino, acredito que uma força maior move o universo.
Pela primeira vez me identifico com Tyler: Meu vizinho e eu somos duas pessoas
quebradas pela vida, que precisam colocar um pouco de óleo nas engrenagens para tudo voltar a
funcionar novamente.
Subo as escadas do nosso prédio enquanto minha cabeça não descansa, olho para a porta
do seu apartamento antes de entrar no meu, pensando se devo ir até lá e desisto. Deixo meu tênis
na entrada e sigo descalça até o banheiro para tirar o uniforme do meu trabalho e para tomar uma
ducha. Curvo minhas costas, e deixo que a água quente percorra por ela para espantar a dor na
coluna após horas em pé, e muitos pacientes felizmente, atendidos.
Tento pensar em outras coisas enquanto eu saio do box e pego a toalha branca para tirar o
excesso de água do meu cabelo, mas, é impossível desligar minha mente.
Há 4 anos atrás Tyler perdia, talvez, a pessoa mais importante na sua vida, e eu estava
entrando no meu inferno pessoal, perdendo a minha identidade.
De um lado são 4 anos de luto, do outro são 4 anos de sobrevivência.
Se ele quer uma amiga, estarei aqui.
Me visto rapidamente com a primeira roupa que encontro em minha gaveta, em seguida
vou até o apartamento do meu vizinho.
Bato algumas vezes na porta, até que ele abre e meus ombros se relaxam ao vê-lo. Seu
rosto e cabelo estão amassados, devia estar deitado, ou nem mesmo foi trabalhar hoje.
– Vista uma roupa, Tyler – Ordeno, empurrando-o para dentro e invadindo o seu
apartamento assim como ele invadiu o meu ontem.
Entrando no cômodo e visualizando bem, consigo entender como alguém com tanto
dinheiro consegue sobreviver aqui, tudo passou por uma bela reforma. Laminados brancos no
chão, paredes em tom de grafite e eletrodomésticos de primeira linha.
– O que você quer, Melanie? Quero ficar sozinho – Ele interrompe meus pensamentos.
– Não! – Eu cruzo os meus braços para encará-lo.
– Não o quê? – Seus olhos verdes estampam a confusão.
– Não vou deixar você sozinho! Vamos, temos que sair daqui – Digo a ele como se fosse
uma ordem.
– Você não precisa fazer isso por mim. Pena é o que eu menos preciso, Melanie – Ele
responde rapidamente.
– E quem disse que é por você? Eu quero sair para me divertir essa noite, por mim! Você
não quer mesmo? Tudo bem, vou ligar para o meu amigo Liam – Digo, pegando meu celular do
bolso de trás do meu jeans.
Tyler me observa da cabeça aos pés lentamente, assim como ele fez no primeiro dia que
nos conhecemos, e não sei por que o fato de ele fazer isso de forma tão intensa, me faz sentir
viva e confiante.
– Está bem, vou com você.
Ele está sem camisa, exibindo seu abdómen e peitos definidos que prendem meu olhar
por um momento, em seguida cruza os braços e meus olhos descem como um imã até a sua
bermuda de moletom escuro.
– Mas tem que prometer que não vai abusar do meu corpinho gostoso, Doutora Melanie –
Ele debocha porque me pega no flagra, olhando. – Nada de brincar de médica, sou um homem
difícil.
Aponto para o seu quarto ao ver a cama com lençóis escuros de onde estou e ordeno:
– Vai se vestir!
Enquanto sai com um sorriso largo, noto uma parede na sala repleta de molduras, me
aproximo e há muitas fotos: Kate com a filha se lambuzando de sorvete, Emily fazendo careta,
Tyler posando em frente a sua Mercedes preta... Subo meus olhos e encontro Robert e uma
mulher, linda como a irmã de Tyler. Em questão de minutos, meu vizinho surge na sala vestindo
uma camisa azul marinho e calça de alfaiataria preta, depois ameaça pegar as chaves do carro no
balcão de mármore.
– Carro hoje não, amigão! Acho que vamos precisar de um Uber – Digo a ele que me
encara sem entender nada. – Porque vamos encher a cara!
Eu faço a minha dança de comemoração e ele sorri, balançando a cabeça.
– Que rebelde... Achei sexy. É agora que você vai conhecer a minha cama? – Ele me
pergunta com um sorriso de canto.
– Só nos seus sonhos – Saio à frente cantarolando. – Você não é o homem extremamente
difícil?
– Digamos que você seja o meu ponto fraco, Melanie.
Estou chegando ao meu apartamento e a porta está arrombada. Como filmes de terror
não ensinam nada, entro no apartamento como a tola sou, mesmo que minha consciência me
dissesse para não entrar. Vejo um homem alto de costas, cabelo loiro ondulado. Sinto minhas
mãos tremerem e meu coração gelar no mesmo momento. O homem se vira e é ele, Anthony, que
está com o sangue escorrendo na testa pela pancada que eu dei nele naquela noite. Seu rosto
está com expressão de raiva. Ele vem correndo em minha direção e eu grito o mais forte que
meus pulmões aguentam, mas a minha voz não sai, o esforço para escapar das mãos dele é em
vão.
– Melanie! Acorda, você está gritando – Escuto a voz do Tyler me chamando, sinto suas
mãos firmes segurarem meus ombros.
Acordo em um susto e me levanto da cama o mais rápido que eu posso, apavorada e
sufocada por medo. Está difícil de respirar, então vou até a janela correndo e abro ela para
respirar ar puro. Olho para todos os lados e para a rua desconfiada, era como se Anthony
realmente estivesse aqui.
E se ele me encontrar, o que ele pode fazer?
– Está tudo bem? – Tyler pergunta vindo até mim. – Teve um pesadelo? Quer conversar
sobre isso?
Balanço a cabeça negativamente.
– Está tudo bem, pequena – Ele diz me olhando nos olhos, me passando a confiança que
preciso para me acalmar. – Agora vem para cama, são mais de quatro da manhã e você me
acordou.
Tyler segura a minha mão que está trêmula e me leva calmamente até a minha cama,
porém ele se deita ao meu lado desta vez.
Ele estava no sofá, conforme tínhamos combinado antes de irmos dormir. Não deixo de
sentir desconfiança.
– O que está fazendo?
– De forma alguma eu vou deixar você dormir sozinha. Vem aqui – Ele me puxa como
uma pena por cima da cama, me aconchegando em seu peito e colocando o braço debaixo de
mim fazendo com que fiquemos em posição de conchinha. – Sei que sou irresistível e você vai
ter que ser forte para não me agarrar aqui mesmo, nessa madrugada, mas é só fechar os olhos e
fingir que não estou aqui.
Viro minha cabeça somente o suficiente para ver seu rosto. Seus olhos estão fechados,
destacando seus cílios longos.
Fico hesitante porque ele veste uma cueca boxer da Calvin Klein preta e camiseta escura,
e eu estaria mentindo se eu dissesse que não me sinto atraída por ele. Então me viro para o outro
lado, tentando manter uma distância segura. Tyler não perde tempo e se encaixa atrás de mim
novamente, fazendo sua barba encostar levemente no meu ombro, me causando um tremor no
meu corpo.
Ele passa as pontas dos dedos pelo comprimento da minha mão direita até meu ombro.
Merda, Tyler!
– Tyler, o que estamos fazendo? – Pergunto, pegando um travesseiro e colocando no
meio de nós dois, erguendo uma muralha que talvez só irá funcionar na minha cabeça.
– O quê? Eu não tenho culpa. Você está com esse pijama e eu confesso que tenho um
tesão pelo Darth Vader – Ele ironiza. – Agora cala a boca e dorme, porque não vou sair daqui até
amanhecer.
Estou sorrindo feito uma boba com a reação dele.
– “Luke, eu sou seu pai.” – Ele imita a frase icônica do vilão de Guerra nas Estrelas. –
Sério, o cara é incrível, estou dizendo.
Começamos a rir, entro em uma crise de riso como há muito tempo não tenho. Minhas
bochechas e barriga doem… consigo me acalmar aos poucos e, sem perceber, caio no sono e sem
pesadelos.
Abro meus olhos e pisco algumas vezes, sabendo que já é de manhã. O cheiro de café
fresco invade minhas narinas, mas sinto algumas pontadas fortes na cabeça pelo resultado da
tequila de ontem.
Tyler e eu dormimos na mesma cama essa noite. Ele me respeitou, mas estou com medo
de encarar seu rosto. Ele me pegou em uma noite vulnerável e eu costumo ser forte. Tive o pior
dos pesadelos que ando tendo, porque Anthony estava aqui, invadindo o meu lar.
Tomo um banho gelado, ainda aflita sobre meu ex, visto meu pijama cirúrgico azul
marinho de trabalho e tranço o meu cabelo.
Flagro Tyler na cozinha, que está com duas xícaras me esperando, com um sorriso
radiante.
– Bom dia, Ruiva Perigosa! Como você está?
Ótimo, ele está normal. Nada constrangedor entre nós dois.
– Estou muito bem, obrigada por ontem à noite.
– Não foi nada, você me ajudou a sair da ressaca moral que eu estava, então é o mínimo
que eu poderia fazer. Aliás, você bêbada é a melhor pessoa do mundo, até me elogiou, eu poderia
ter gravado aquilo. Sem falar que implorou para eu dormir no seu apartamento. Depois de muito
pedir, eu aceitei. – Ele diz orgulhoso, tomando um gole da sua bebida quente.
– Não implorei, não! E você que queria transar com um hambúrguer? Eu que deveria ter
gravado!
– Não só com o Hambúrguer, acredite. – Ele diz isso só para me ver ficar vermelha.
Jogo o guardanapo que está em cima da bancada no rosto dele e meu telefone toca em
seguida. Procuro o aparelho onde quer que esteja, até que o encontro jogado atrás do sofá.
Aparece o nome do Liam na tela. Atendo a ligação e Tyler fica me observando, curioso de onde
está na bancada.
– Oi, Liam! Bom dia!
"Oi, Mel, você está bem?"
– Estou bem, obrigada por perguntar.
"Eu queria falar com você e como estou aqui por perto pensei se gostaria de uma carona
para o trabalho."
– Eu aceito, pode vir, te aguardo.
Desligo o telefone e Tyler está me encarando com aquela expressão irônica
– O que foi isso?
– Não estou te entendendo, Tyler!
Então ele começa a me rodear no meio da cozinha e a balançar a bunda de forma
exagerada, e sim, ele está me imitando.
– Oi Doutor Engomadinho, quer vir aqui? Claro, pode vir bebê, sem problemas. – Ele faz
uma voz fina.
– Doutor Engomadinho? Vai embora, acho que já deu da nossa intimidade por hoje,
certo? – Aponto para a porta.
Ele sai rindo do apartamento. Impossível, não existe ninguém como ele.
Assim que ele sai, resolvo dar uma geral no apartamento e dar uma conferida na minha
aparência que, pelo sono bom dessa noite, está ótima. Não demora muito e alguém toca o
interfone. Atendo o Liam e o peço para subir. Ele veio mais rápido do que eu esperava.
– Oi Mel, bom dia! Vi isso e trouxe para você. – Ele me entrega um buquê pequeno com
rosas brancas.
Eu poderia ficar mais feliz se essa simples rosa não me trouxesse tantas lembranças ruins.
– Que gentil. Obrigada, Liam! – Agradeço a ele.
Pego as flores e coloco em cima da minha bancada.
– Aceita café?
– Não, obrigado, eu não tomo café. Mas aceito água.
Liam devolve um sorriso envergonhado, então sigo até a geladeira e pego uma garrafa de
água e sirvo em um copo, levo até ele:
– E o que você queria, Doutor Patterson?
Volto a manter minha formalidade assim que me dou conta, porém me vem na cabeça o
meu vizinho chamando-o de Doutor Engomadinho, quase que solto uma gargalhada, mas me
seguro. Merda Tyler.
– Como estava por perto aproveitei para ver se gostaria de uma carona até o trabalho,
também queria te convidar para ir a um evento de medicina comigo hoje.
Fico pensativa com a atitude de Liam que me pega de surpresa.
– Não é um encontro, fica tranquila. É apenas um passeio entre amigos de trabalho. – Ele
diz com um sorriso, enquanto ergue as duas mãos tentando se explicar.
Isso pode ser bom para o meu currículo.
– Ok. Qual vai ser a abordagem do evento? – Pergunto.
Nossos olhos vão em direção a porta de entrada com alguém batendo nela. Talvez Liam
tenha notado minha expressão de dúvida ao levantar-me e ir abrir a porta.
Não! Ele não está fazendo isso.
Tyler invade o meu apartamento com duas sacolas de papelão, e o cheiro de canela e
chocolate predomina o ambiente.
Meu vizinho coloca as sacolas na bancada da cozinha e olha para o Liam, surpreso. Belo
ator, ele definitivamente mora na cidade certa.
– Doutor Patterson! Que surpresa, você por aqui. Eu não sabia da sua presença, me
desculpe, eu jamais interromperia.
Liam é educado, então se levanta para apertar as mãos de Tyler que está com um sorriso
confiante no rosto, curvando levemente seu pescoço, deixando ainda mais aparente a diferença
de altura dos dois.
– O que está fazendo aqui, Tyler? – Pergunto.
– Trouxe café da manhã, Melanie. Imaginei que depois da noite que tivemos ontem, você
estaria com fome. – Ele diz orgulhoso.
Tyler eu te mato, e vai ser hoje.
Olho furiosa para ele, tentando manter a postura. Depois olho para o Liam, que está ali
parado nos olhando sem entender nada.
– Tudo bem, obrigada pela gentileza. Agora pode ir embora – Digo ao meu vizinho,
tentando ser o mais calma possível.
– O quê? Mas tem tanta comida. Dá para nós três, não acha, Liam? – O safado se dirige
ao meu chefe.
– Claro!
Os dois se sentam na mesa de jantar de frente para o outro, e eu vou pegar os pratos e
guardanapos no armário.
– Então… – Liam limpa a garganta tossindo. – Aonde foram ontem?
– Fomos na boate, nada demais. Diversão entre amigos – Digo tentando disfarçar e olho
para o Tyler, que me encara com diversão.
– Nós podíamos combinar de irmos todos juntos um dia. Se o Tyler é seu amigo, então
ele é bem vindo a turma. – Liam diz calmo e pega um dos pãezinhos com ervas.
Ele é confiante, seu sorriso e postura não me deixa negar.
– Claro Doutor, vai ser divertido, mal posso esperar – Tyler diz e fica o encarando do
outro lado da mesa enquanto enfia um pretzel açucarado quase inteiro na boca.
– Bem, odeio ter que me despedir, tudo está maravilhoso, mas se não irmos agora
estaremos atrasados. – Liam diz, se levantando.
Meu vizinho limpa a boca com um guardanapo de papel e fica esperando minha resposta.
– Claro, Liam. Pode me esperar lá embaixo só para eu pegar minhas coisas e já podemos
ir. – Digo, me levantando para acompanhá-lo.
– Ótimo, até logo Tyler!
Quando ele finalmente vai embora, volto para a sala para ver o homem que me encara
com diversão.
– Muito engraçado, agora levanta a bunda da cadeira que eu tenho que ir trabalhar porque
ao contrário de você eu não sou herdeira! – Digo ao Tyler.
– Ruiva perigosa, assim me magoa..., mas tudo bem, eu vou em paz! – Ele diz saindo
pela porta e sei que está sorrindo.
“Como você pode sentir falta de alguém que nunca conheceu?”
IDK You yet - Alexander 23
– Não, você não vai sair assim! – Anthony resmunga, sentado no sofá da nossa sala de
estar.
Olho para a roupa que estou usando. É um dos meus vestidos favoritos, verde militar com
decote em V e mangas compridas em seda.
– Mas não tem nada de errado com o meu vestido…
Cruzo os meus braços, o encarando.
Anthony levanta e se aproxima de mim, segurando a minha cintura enquanto beija o meu
pescoço em diversos pontos, me fazendo sorrir pelo carinho inesperado.
— Meus amigos estão lá, não quero que ninguém mais olhe para você e veja o que é meu.
– Segura a minha bochecha para que eu olhe em seus olhos. – Vista uma calça amor, vai fazer
frio essa noite.
Hoje
Estamos no quarto do Jensen, garoto franzino de 9 anos. Muito esperto, porém teve
alguns desmaios incomuns nos últimos dias e está aqui para vermos o que está acontecendo.
– Isso vai doer, Ariel?
– É só uma furadinha e vamos levar um pouco do seu sangue e descobrir o que está
acontecendo com você, tudo bem? – Peço permissão e Jensen fecha seus olhinhos aguardando
que a agulha perfure seu braço.
Termino e entrego a seringa para Mandy, higienizo o braço dele e colo um adesivo Band-
aid do superman.
– Agora posso provar a gelatina de uva? – Ele pergunta.
– Você foi muito corajoso e terá toda gelatina que você quiser, Jensen.
O garoto sorri, então lhe mando uma piscada antes de sair e ir para o próximo paciente.
Ainda no corredor enquanto caminhamos, minha fofoqueira favorita começa a me
atualizar das fofocas que eu perdi ontem.
– Mel, você acredita que o irmão do Garret pegou a esposa com o primo da amiga dela na
cama? Foi a maior confusão. O vizinho teve que ajudar a segurar a briga até chegar a polícia.
Queria ter presenciado isso… – Ela diz pensativa.
Sorte que eu tenho ela que além de ser uma excelente profissional, é minha melhor amiga
e me distrai o dia todo.
Antes que eu comente algo, ela muda de assunto.
– Já sabe onde o Doutor vai te levar, Mel? – Mandy pergunta animada. – Ele tem perfil
de levar a mulher no primeiro encontro no melhor e mais caro restaurante da cidade.
– Não Mandy, será apenas algo profissional. Nós vamos jantar e vamos a um evento
sobre tumor cerebral depois.
Suspiro fundo apreensiva.
– Só queria, sei lá, me sentir mais à vontade com isso.
Na real, eu não gosto de restaurantes chiques. Gosto de comida de fast food e de me
sentar no chão para comer, bem no pé da escada.
Ok, talvez isso tenha sido muito específico.
– Ele não vai te forçar a fazer nada que não queira. Ele é um cara legal, se dê uma chance
para se divertir sem ter que pensar demais. – Ela diz.
– Eu sei, ele é legal e é filho do meu chefe.
Ela me olha com expressão de dúvida.
– Só tenho medo de tudo virar uma merda. – Tento me explicar.
O problema é que eu não sei mais de quem estou falando.
– Mel, olha para mim – Mandy segura delicadamente meu rosto fazendo eu encarar seus
olhos. – Só relaxa, você não tem que ter controle de tudo. Se virar uma merda, ok, virou uma
merda. Mas pelo menos você não vai ficar arrependida de nada que não tenha feito.
– Nossa, você me ajudou muito Mandy… – Sorrio como uma forma de encerrar o
assunto.
– Eu sei, sou a melhor – em seguida ela arregala os olhos assim que olha atrás de mim. –
Enfermeira Wilson preciso de você aqui, agora! – Percebo ser a voz da Doutora Johnson.
– Enfermeira Wilson, blá, blá, blá... – Amanda imita ela de uma forma engraçada e diz
em seguida. – Melhor eu ir!
Já é noite novamente e termino meu turno. Vou até o vestiário tomar um banho rápido e
me vestir. Liam e eu combinamos de ir direto do hospital para que desse tempo de jantar e não
perder o início da palestra.
– Oi, Melanie. – Ele diz assim que me vê, sorrindo e com os olhos brilhando.
– Oi, Liam. Será que é muito simples? – Pergunto, insegura sobre o jeans que escolhi.
– Não, de forma alguma, você está linda. Vamos? – Ele pergunta e encosta sua mão nas
minhas costas, me mostrando a direção.
Não estou certa sobre isso, por mais que sejamos amigos, fico com a má impressão de
que isso ainda parece um encontro.
– Será que podemos ir apenas à palestra? Estou realmente um pouco indisposta. – Meu
estômago para nas minhas costas.
– Mel, imagina! Podemos ir a essa palestra em outra ocasião. Não vão faltar convenções
de medicina por aqui. – Ele responde sendo cavalheiro, mas vejo o ressentimento nos seus
olhos.
Deve ter planejado uma noite toda e me sinto culpada por isso.
Minha mente me repreende, me trazendo de volta à realidade para me lembrar do motivo
de eu ter vindo parar em Los Angeles.
Não cometa os mesmos erros. Não faça as coisas para agradar ninguém, faça o que tem
vontade.
Liam olha para o seu relógio de pulso.
– Eu te levo para casa, posso? – Ele pergunta e aceito a gentileza.
Então é essa a sensação de dizer não? Ao mesmo tempo que me sinto realizada, parece
que estou cometendo uma injustiça com uma pessoa legal. Olho para as flores que ele me trouxe
mais cedo em cima da bancada, já murchas pelo calor do apartamento que ficou fechado o
restante do dia. Não sou ingênua, ele está tentando me conquistar.
Anthony sempre me dava rosas brancas como pedidos de desculpas por ser um babaca, e
era um manipulador e abusivo.
Abro o armário da cozinha em busca de uma aspirina para espantar a dor de cabeça
latejante que surgiu com as lembranças que invadem a minha mente. Pego as rosas de cima da
bancada e as jogo no lixo, tirando elas da minha visão.
De repente, me sinto melancólica e sozinha, talvez eu devesse ter ido ao evento.
Vou até meu quarto e escuto uma risada feminina vindo do apartamento do Tyler, o que
não escuto há alguns dias.
Meu vizinho pode transar com qualquer mulher em qualquer dia, mas que de preferência
que me avise para eu trocar meu turno, mas hoje, definitivamente, não quero passar o resto da
minha noite ouvindo nada.
Vou até a porta do apartamento de Tyler e bato algumas vezes tendo um Déjà Vu. Ao
menos hoje estou vestida apropriadamente.
– Melanie? – Tyler diz assim que abre a porta, parecendo surpreso.
Graças aos céus, ainda está vestido.
– Oi Tyler, vim saber se o remédio para a sua verruga genital está funcionando. Eu sei
que deveria ter aguardado seu retorno no consultório, mas como vizinha e sua médica, estou
preocupada com você… – Falo em um tom que, quem quer que esteja lá dentro, consiga ouvir.
Uma mulher de cabelos longos castanhos, parecida com uma modelo da Victória Secrets,
surge atrás dele pegando sua bolsinha minúscula de cima da mesa de centro.
– Me perdoa, eu não sabia que estava com visita… – Digo com pesar exagerado.
Prove do seu veneno.
Tyler apenas sorri, deixando a mulher passar por nós sem dizer nada enquanto mexe
rapidamente no seu celular após tirar do seu bolso.
Ficamos nos encarando enquanto escutamos juntos o barulho dos saltos terminando de
chegar ao fim do corredor.
– Verruga genital? Sério? – Ele ri e me puxa pelo braço para dentro do apartamento.
– Desculpa, foi a única coisa que eu pensei. Pensando agora, foi bem infantil fazer isso da
minha parte… me arrependo? Não! Só desejo uma ótima e bela noite de sono.
– Ótima noite de sono interrompida, porque acabei de enviar uma mensagem para a Kate
e agora nós vamos jogar boliche em família.
– O quê? Hoje não, Tyler!
– Você está me devendo, além de que você não pode negar isso para a Emy que, com
certeza, já está vestindo sua roupinha coberta de glitter dourado e com um desenho brega da
Pequena Sereia. – Tyler sorri triunfante. – Certo, Ariel?
Entramos no local e agora entendo do porquê a garotinha gosta tanto desse lugar. Ele é
todo colorido e cheio de luzes. A decoração é vintage, como se estivéssemos nos anos 80. Tyler e
eu vamos pegar nossos sapatos de boliche e em seguida encontramos todos em uma mesa grande
com bastante comida não saudável.
É disso que eu estou falando.
Kate e James se levantam e me abraçam. Senhor Smith abre um enorme sorriso ao me ver
e então dou um abraço nele também, que com certeza não esperava, julgando pela sua reação.
Emily vem correndo até mim e quase me derruba ao subir no meu colo com um pulo,
sorte que Tyler estava atrás de mim e me segurou firme pela cintura.
– Meninas contra meninos! – Ela grita e ergue as mãos, vibrando por todo mundo estar
aqui.
Montamos nossas equipes, Kate e eu. Tyler e James. Emy e o pai de Tyler ficaram na
torcida, se enchendo de batata frita.
– Vamos apostar uma coisa Melanie? – Tyler chega perto de mim e diz baixo no meu
ouvido.
– Eu gosto de apostas, manda ver. – Estou com medo do que possa ser a aposta, mas sou
competitiva.
– Se vencer, você escolhe o que quiser. Se eu vencer, eu durmo no seu apartamento hoje
de novo. – Ele sugere de forma maliciosa.
Gosto dele porque desde o primeiro dia que nos conhecemos ele deixou bem claro o que
queria: Sexo! Sem rodeios, sem esconder nada, sem tentar me conquistar com promessas baratas.
Apenas a verdade.
– Negócio fechado. – Digo, apertando sua mão como um pacto de confiança.
Tyler e James são os primeiros. Diferente dos ternos de sempre, hoje Tyler veste um
jeans justo e uma camiseta polo preta comum como se fosse um milionário da tecnologia.
Ele derruba 8 pinos em sua jogada. É a vez de James, que derruba 7.
Kate se levanta e começa a se alongar antes de jogar, como se fosse correr uma maratona.
Mas acerta apenas 5 pinos.
É a minha vez. Mal sabem eles que o meu tio John é fã de boliche e participamos até de
campeonatos em São Francisco. Eu menti aquele dia na casa de Kate só para ver a cara
impagável do Tyler agora.
– Cuidado para não escorregar, Melanie. Está liso aí, bem no meio, aí mesmo onde você
está pisando… – Meu vizinho diz, tentando me distrair.
Respiro fundo e pego a bola pesada como a jogadora profissional que eu sou. Todo
mundo está aguardando ansiosamente a minha jogada. Me preparo, respiro fundo. Jogo. Strike.
Boa, não estou enferrujada.
– Isso! – Escuto Kate gritar animada.
– Puta merda, ela joga. – Escuto Tyler xingar baixinho.
E a plateia vibra, James e Senhor Smith estão rindo feito loucos. Emily está em cima da
cadeira, pulando e batendo palmas. Tyler ainda está olhando de boca aberta.
– Limpa a baba! – Digo a ele.
– Não sabia jogar é, Melanie? Sua mentirosa! Por algum momento eu achei que você
fosse o cordeirinho e não o lobo. – Ele diz irritado e estou adorando isso.
– Não vai chorar né? – Faço biquinho para ele.
– Eu estou torcendo para a Mel. – Robert Smith diz confiante.
– Traidor. – Tyler acusa o pai.
Kate e eu ensaiamos uma dança de comemoração caso vencêssemos, enquanto Tyler e
James se preparam para a próxima rodada. Acertam, novamente, a mesma quantidade de pinos
cada. Tyler se senta como uma criança emburrada na cadeira.
Kate acerta oito pinos dessa vez e eu mais um Strike.
– Mel, Mel, Mel! – Todos batem palmas e gritam meu nome só para irritar ainda mais o
Tyler, que revira os olhos.
A família dele é incrível, cada um do seu jeitinho.
Kate e eu vencemos de lavada, e fizemos a dança da vitória mais ridícula do mundo,
mexendo o quadril e as mãos como se fosse um episódio de Um maluco no pedaço.
– Tyler é um perdedor, e está irritado pois não sabe perder… – Cantarolo com diversão.
Ele deixa escapar uma risada.
– Vamos pequena, vou te levar para casa. – Ele diz, pegando as chaves do carro de cima
da mesa e minha mão em seguida.
Me despeço de todos e agradeço pela noite.
– E aí Melanie, qual vai ser o pedido da vencedora?
– Quero café grátis por 1 mês, detalhe: do Starbucks, ou daqueles importados que vi em
cima da sua bancada. Todos os dias!
Bato as palmas, empolgada.
– Nossa, eu nem podia imaginar qual seria o seu pedido. – Ele responde com ironia.
– Eu sei, acho que na minha outra vida eu fui um café. Seria possível? – Pergunto.
Ele sorri enquanto dirige, minha tensão desapareceu completamente graças a ele.
– Sabe Tyler, ser uma vencedora cansa. Você já poderia me pagar um café hoje, não
acha? Só para eu esfregar minha vitória na sua cara mais um pouco. – Proponho.
Fico observando sua mão esquerda sob o volante e a outra apoiada na própria perna. Ele
me olha de canto de olho e analisa, franzindo as sobrancelhas grossas.
– Melanie Hansen, está querendo prolongar nossa noite? – Ele pergunta.
– Cala a boca! – Respondo. – Está sentindo?
– O quê?
– Cheiro de campeã! – Respondo satisfeita.
Chegamos e subimos até o apartamento de Tyler. Estamos na sua sala, ele me entrega o
prêmio da noite em uma xícara preta de porcelana, amargo e sem açúcar do jeito que eu gosto.
– Melanie?
– Oi.
– Sobre ontem, foi um pesadelo que você teve? Eu também fico daquela forma quando
tenho um sonho ruim. Quer conversar sobre isso? – Ele pergunta com o tom de voz baixo.
Sinto que meu coração vai sair pela boca. Por que é tão difícil falar sobre isso?
– Tyler, juro que quero te contar mais sobre isso. Mas não estou preparada.
Ele me observa por um momento como se avaliasse a situação.
– Ok, te respeito. Mas não vai escapar de mim. – Ele diz sério.
Aceno que sim com a cabeça e levanto-me para respirar, me aproximando da bancada de
mármore duas vezes maior que a da minha cozinha.
– Tenho mais uma pergunta… – Ele diz e me avalia de longe com seus olhos verdes.
– Vai, mais uma e chega de perguntas.
– Por que você se faz de difícil para mim? – Seu semblante está curioso.
Dou uma risada alta, talvez de nervosismo.
– Não me faço de difícil...
Tyler me avalia da cabeça aos pés e as borboletas em meu estômago começam a bater as
asas, prontas para literalmente voar por todos os cantos possíveis do meu corpo.
Eu nunca fui uma pessoa que agisse por impulso, e por um milésimo de besteira de
segundos eu solto a seguinte frase em voz alta:
– É sexo que você quer? Então ok, tudo bem. Estou dando o sinal verde!
Assim que eu digo isso ele se levanta e começa a caminhar até mim, bem silencioso e
devagar. Um passo por vez, e a cada passo que ele se aproxima é como se meu corpo tremesse,
querendo o seu.
É só sexo, não é nada demais! Pode me ajudar a aliviar toda minha tensão...
Afirmo para mim mesma, porém minhas pernas bambas denunciam todo meu
nervosismo.
– O que você está fazendo, Tyler?
– Estou me aproximando lentamente Melanie, para ver se eu ouvi bem o que você acabou
de dizer. – Ele responde e seus olhos refletem desejo, fazendo eu não acreditar que tudo isso seja
para mim de fato.
Ele está parado na minha frente, perto demais, quase como se eu pudesse ouvir seu
coração batendo no seu peito.
Passo as pontas dos meus dedos em seu rosto em um impulso fazendo uma carícia na
pequena cicatriz que tem na sobrancelha. Suspiramos juntos com o toque e então ele encaixa a
sua mão direita na minha nuca, passeando com as pontas dos seus dedos até a minha orelha
esquerda, então brinca com meu lóbulo enquanto aproxima ainda mais a sua boca da minha.
O maldito sorri e, sem dizer nada, simplesmente afunda a sua boca na minha. Sua língua
quente e saborosa toma conta da minha em movimento lento. Nos encaixando até tudo se tornar
bruto, desesperados um pelo outro. Solto um gemido fraco quando suas mãos começam a
percorrer pelo meu corpo vulnerável, me entrego a ele sem renúncias enquanto seus dedos
descem pela minha coluna e seguram em minha cintura, firme, me grudando ainda mais a ele,
depois sobem pela minha barriga e seguram os meus seios, enquanto a sua boca sai por um
momento da minha e brinca com o meu pescoço. Cada centímetro da minha pele se arrepia e em
resposta, cravo minhas unhas nas suas costas. Começo a abrir os botões da sua camisa e a tiro
caminhando com meus dedos pelo seu abdômen duro assim como imaginei que fosse, Tyler sorri
e em seguida seus braços longos me envolvem e me levantam em seu colo com facilidade,
abraço seu quadril com as minhas pernas e nossas bocas não se afastam, sua língua avança
ferozmente na minha. Ele apoia meu corpo sobre a bancada da cozinha e me inclino sob o
mármore frio apenas para que ele se afaste o suficiente para desabotoar meu jeans e tirar a minha
calça a jogando no chão, sem tirar os olhos do meu corpo. Tira a minha blusa com facilidade, e
então beija meu pescoço descendo e trilhando um caminho de pequenos chupões e mordiscadas
até chegar nas minhas coxas. Minhas pernas como uma ótima vilã se abrem como um ato rebelde
contra a minha mente, cedendo ainda mais espaço para ele enquanto beija por cima da minha
calcinha molhada, recebo um aperto forte em meu quadril e gemo de necessidade quando Tyler
puxa com os dentes a lateral da renda escura.
– Meu Deus…
Não tenho certeza se saiu algum som da minha boca.
– Está tudo bem? – Meu vizinho para imediatamente.
Minha razão se faz presente ao menos uma vez na noite.
– Sim, mas isso entre nós não pode acontecer.
– Tudo bem… – Responde e suas mãos ameaçam se afastar do meu corpo.
– Espera! – Seguro sua mão a mantendo na minha perna.
Quer saber? Foda-se a razão.
– Continua, eu quero!
– Tem certeza?
– Claro, agora continua antes que eu me arrependa disso!
Seus olhos brilham e ele passa a língua umedecendo seus lábios e então segura em meu
quadril novamente e me ergue em seu colo enquanto me beija com intensidade. Quando
finalmente percebo já estamos em seu quarto, e Tyler me coloca na cama ainda sem afastar seu
corpo do meu. Em seguida, volta a fazer o mesmo caminho que fez anteriormente e dessa vez
com mais força, deixando possíveis marcas de chupões em minha pele, seus dedos puxam minha
calcinha pela lateral e é nesse momento que eu fico completamente exposta. Sua boca não para,
beija a parte interna da minha coxa até trilhar o caminho certo e começar a brincar com a sua
língua dentro de mim. Minhas costas se arqueiam sobre os lençóis brancos e gemo o seu nome
alto, o que é apenas um incentivo para me sugar com força e introduzir um dos seus dedos dentro
de mim. Levanto minha cabeça para ter a visão de seu cabelo sobre a testa e minhas pernas
envolta dos seus ombros largos, seguro o tecido atrás de mim e gemo mais uma vez, pequenos
choques percorrem por minhas pernas e minha respiração fica ainda mais acelerada
Tyler se afasta apenas para esticar a mão e pegar um preservativo dentro do seu criado
mudo.
– Se quiser que eu pare é só dizer, ok? – Ele diz enquanto tira o restante da sua roupa e
estica o preservativo sobre a sua ereção.
– Puta merda… – Não consigo desviar os meus olhos do seu corpo.
– Sabia que eu ia gostar da sua boca suja.
Tyler se deita sobre mim e uma onda de calor percorre meu corpo quando passeia com
sua barba em meu pescoço e me arrepia inteira. Me beija novamente, dessa vez mais paciente e
lento, até se encaixar melhor e me penetrar com facilidade. Seus olhos me fitam e fica impossível
de não o encarar de volta, em seguida me beija, dessa vez ferozmente puxando meus lábios
inferiores entre os dentes, deixamos escapar gemidos em meio ao nosso beijo enquanto ele entra
e sai com agilidade devido a minha umidade após as preliminares, inclino minha cabeça para trás
e meu tronco se eleva enquanto Tyler apoia as mãos ao lado da minha cabeça fazendo com que
seu corpo trabalhe com a velocidade certa. Me contraio e ele geme ainda permanecendo firme
enquanto meus batimentos cardíacos aumentam ainda mais.
Gememos em sincronia quando percebo os lençóis abaixo de mim se encharcarem, e cada
pedaço do meu corpo pulsa, então solto meus braços descansando acima da minha cabeça,
quando Tyler percebe, também chega ao seu ápice, e cai ao meu lado na cama.
Após longos minutos de silêncio enquanto ainda tentamos nos recuperar finalmente tenho
forças para dizer algo.
– Isso foi…
– Muito bom! – Tyler completa a minha frase. – Melanie…
O interrompo antes que diga algo:
– Shiiiu, deixa eu aproveitar esse momento porque ele não vai se repetir.
Me sento na cama me cobrindo com o lençol para olhar em seus olhos e sua expressão é
de confusão.
– O que?
Aponto para mim e para ele.
– Tyler não podemos, somos amigos. Você queria o sexo e eu também precisava, mas,
nós dois, isso não pode acontecer de novo…
Tyler balança a cabeça em afirmação por algumas vezes.
– Podemos fingir que isso nunca aconteceu? – Tento me manter fria.
Em seguida Tyler pergunta com ironia.
– Então é assim? Vai usar o meu corpo e ir embora?
Tento sorrir, antes de responder:
– Sim e foi muito bom, acredite – Faço uma pausa, tentando colocar meus pensamentos
no lugar. – Agora vou para meu apartamento, e nada vai ficar estranho entre nós, obrigada pela
noite!
Tyler assente com a cabeça e estica os braços longos e definidos acima da sua cabeça,
fechando seus olhos por um momento relaxando sobre a cama ainda sem roupa.
Aproveito e me levanto rápido para pegar minhas roupas no chão, quando percebo que
ele está me fitando, no mesmo momento, uma onda quente percorre meu corpo antes de eu quase
gritar:
– Hey, privacidade!
Meu vizinho dá uma gargalhada alta, me contaminando, fazendo com que eu sorria
também.
Minha razão brinca no meu subconsciente dizendo: “Eu avisei para não ultrapassar os
limites”.
“Em minha defesa eu não tenho uma.
Por nunca deixar as coisas do jeito que estão.”
The 1 - Taylor Swift
Estou na capela do hospital. Precisei parar um pouco o meu turno, pois precisava vir para
algum lugar que não tivesse ninguém.
Tyler vem a minha mente, forte e perfeito a todo momento. Penso em como fui fraca
ontem em ceder, e me lembro de todas as minhas inseguranças que, por algum motivo, deixei
serem ultrapassadas.
Era só atração física? Tensão sexual? Eu precisava disso?
O medo me atinge.
Tyler me faz esquecer completamente daquele que não sai da minha mente, e quando
estou longe quero estar perto da segurança que me transmite.
Penso que talvez o problema esteja em mim, em sempre querer alguém por perto. Eu não
posso me deixar levar novamente, não da mesma forma.
Estou aqui sozinha com os olhos fechados. Respiro fundo e solto o ar, preciso voltar ao
trabalho.
Me assusto quando escuto um grito estridente vindo do fundo da capela.
– Puta merda! – Dou um grito e pulo do banco assustada, até notar que é a Amanda. –
Você quer me matar? – Pergunto com a respiração ainda acelerada.
Meus olhos se voltam para a cruz na parede.
– Perdão! Eu não queria dizer palavrão aqui dentro, do fundo do meu coração.
Que Ele perdoe também os pensamentos que eu estava tendo agora a pouco.
– Você fala como se Ele não te visse xingando o dia todo, Madre Teresa. – Mandy está
gargalhando com o susto que me deu.
– Sim, e me sinto muito envergonhada agora. – Tento fazer uma cara angelical para
Mandy, que a essa altura já está chorando de rir. – Já imaginei que você era a assombração da
capela ou algo do tipo.
– Mas essa capela realmente é assombrada – Mandy começa a dizer com a expressão
séria. – Há vários relatos das enfermeiras de que há muito tempo morreu uma freira aqui
mesmo, bem no banco que você está sentada, se duvidar você está sentada em cima dela, que
falta de educação da sua parte Melanie…
– Chega Mandy! Já estou bem assustada. – Digo me levantando e sentando-me no banco
de trás, em respeito a freira.
Sou dessas que não acredita, mas também não duvida.
– Ah meu Deus, eu vou fazer xixi na calça de tanto rir. – Mandy gargalha e limpa os
olhos que estão cheio de lágrimas, em seguida ela se senta ao meu lado, respirando fundo para ao
menos tentar dizer alguma coisa até que fica intacta no mesmo lugar. Me encara por um
momento, parando de rir e respirando fundo.
Seu rosto muda imediatamente para a expressão de dúvida.
– Melanie Hansen! O que significa esse roxo do tamanho de um pêssego no seu pescoço?
– Ela pergunta espantada, tocando o meu pescoço.
Merda, a base não cobriu totalmente.
– Foi meu cachorro!
Saiu muito rápida minha resposta, não acredito que eu disse isso.
– Você não tem cachorro, Mel. Espera… – Ela pensa na ideia mirabolante dentro da sua
cabecinha. – Você saiu com o Doutor Patterson ontem... Sua safada! Onde vocês dois foram?
– Não Mandy, eu não sai com o Liam. – Minha voz entrega meu nervosismo. – Quer
dizer, a princípio ele me levou para casa, mas acabei na cama de outro.
Respiro fundo e me envergonho por dizer isso em voz alta.
– Eu estou sem palavras! Espera, foi o vizinho, vulgo Titio Gostoso, não foi? – Ela
pergunta, mas já sabe a minha resposta.
Balanço a cabeça apenas para confirmar minha ruína.
– Eu sabia! Eu sabia! Eu sabia! – Ela repete várias vezes empolgada. – Porra Mel,
espera... perdão Senhor! – Ela diz olhando para o teto da capela fazendo o sinal da cruz. – Poxa
Mel, você é sortuda! Vocês foram para o “vamos ver”? Foram só preliminares? Preciso de
detalhes!
– Só preliminares. – Ela sabe que eu estou mentindo pelo "uhum" que solta enquanto me
escuta. – Está bem, nós transamos! Está feliz? Acho que a gente não deveria estar falando desse
assunto aqui dentro, não acha?
– Deixa o Papai do Céu ouvir a fofoca! Amiga, estou orgulhosa! Pegou o gato, e ele
pegou você de jeito, pelo o que estou vendo… Como você está se sentindo?
– Estou ótima, mas disse a ele que não vai acontecer de novo, eu não quero perder a
amizade dele.
– Já falou com ele depois de ontem? – ela pergunta.
– Não.
– Então é isso! Não se desespera, lembra que eu te disse para deixar acontecer? Se algo
ficar estranho, finge normalidade. E se quiser replay não seja boba em recusar, sempre alivia o
estresse – ela diz tranquila – Ele é bom de cama?
Tento olhar para minhas próprias cutículas que estão sem fazer em uma maneira de
disfarçar.
– Hum, por essa marca em seu pescoço ele é sim.
Dou risada e isso alivia minha tensão, por mais estranho que pareça, as coisas absurdas
que ela diz me tranquilizam.
Encontro Liam parado na porta de entrada do Hospital, durante meu intervalo.
– Boa tarde, Doutor Patterson! – Quebro o silêncio e chamo sua atenção para mim.
Não tem como eu fugir, preciso falar com ele.
– Boa tarde, Doutora Melanie… Você está se sentindo melhor?
Faço o máximo de esforço para sorrir.
– Sim, bem melhor.
– Eu estava indo à cafeteria, quer ir comigo? – Ele pergunta apontando para o outro lado
da rua.
– Está perguntando a um macaco se quer banana? Lógico!
Vamos até a Starbucks da próxima esquina, me sento em uma mesa no canto e o estofado
em couro preto me acomoda perfeitamente. Aguardo sozinha até Liam ir fazer o pedido e
retornar.
– Ariel! – a atendente chama do balcão.
Olho para o Liam que está sorrindo, se divertindo com a minha expressão e faz um sinal
para eu ir buscar o pedido. Pego meu café filtrado com o atendente e retorno rapidamente.
– Desculpe, não resisti. Acho legal as crianças te chamarem de Ariel no hospital.
– Culpa da Mandy! – Me defendo. – Mas eu também gosto.
– Como você está? Tem falado com a sua família, Mel?
– Sim, mando mensagem para a minha tia todos os dias. Sinto muita falta deles aqui
comigo, sabe? Mas disseram que logo virão me visitar.
– Eles parecem ser pessoas muito legais. Isso explica a mulher espetacular que você é!
– Imagina! Eu sou a mais chata, acredite. Não queira me ver brigar por um copo como
esse aqui – Balanço meu copo de café ao ar para ele, que ri com a minha atitude.
– Mas e você, Liam? Qual é a sua história? Como se tornou chefe da cirurgia tão rápido?
– Bem, nada emocionante, apenas estudei muito. Sou privilegiado e sou muito grato por
isso, sabe? Consegui estudar em uma universidade boa e me formei mais cedo que o normal.
Esse sempre foi meu sonho, então me dediquei ao máximo. Perdi muitos momentos de lazer, mas
valeu a pena. – Liam sorri.
– Entendo bem como é isso, também abri mão de muitas coisas.
– Sobre a chefia, foi muito trabalho, e não vou ser hipócrita, claro que o fato de eu ser
filho do diretor também contribuiu muito para isso. A cobrança é muito maior, acredite, porém
aprendi a lidar com tudo. – Ele diz, dando um gole na sua bebida.
– Sua mãe também é médica?
– Cardiologista aposentada, mas foram muitos anos de dedicação para a sociedade.
– Deve ser incrível ter os seus pais como exemplo.
Aceno com a cabeça, e sorrio feliz pelas suas oportunidades.
– E seus pais, Melanie?
– Bem, minha mãe faleceu quando eu ainda era criança. Meus tios me criaram, não tenho
muita história.
– Eu sinto muito pela sua perca! – Liam diz com pesar.
Recebo um olhar de conforto e o silêncio se instaura entre nós.
– Eu não acredito! – Eu digo.
– Não acredita no que, Mel? – Ele me pergunta curioso.
– Que você não gosta de café! Cara, você tomou direito? Olha para esse capuccino se
não é a oitava maravilha do mundo!
– Mel você é médica, sabe o tanto que isso faz mal? – Ele pergunta, rindo da minha
reação.
– É um risco que eu quero correr! Digo séria e semicerro os olhos para ele como um
desafio.
Minha atenção é voltada para a notificação que recebo no meu celular que está apoiado
na mesa, então pego para averiguar.
Por que eu ainda fico surpresa em ser ele? Parece até que o Tyler tem um radar chamado
"Alerta de Liam".
Decido que não vou responder. Coloco o celular na mesa.
– Então... – Sou interrompida com o celular vibrando novamente.
Merda Tyler.
Agora sinto que meu coração vai sair pela boca, ainda não encontrei o Tyler desde ontem.
– Está tudo bem, Mel? – Liam está me encarando.
– Sim, tudo ótimo!
“Não se aproxime muito, é escuro aqui dentro.
É onde meus demônios se escondem.”
Demons - Imagine Dragons
De longe consigo ver o Nick vindo até minha direção e Charlotte está com ele de mãos
dadas. Merda, a minha consulta seria somente com ele. Mas talvez possa ser bom ter o ponto de
vista feminino, não?
Charlotte, possui um cabelo escuro, longo e liso. Ela está bem vestida como a boa
estilista que é, já Nick está com o cabelo loiro todo desalinhado e usa uma camiseta simples da
Calvin Klein e calça jeans desbotada. Totalmente opostos. A sua noiva é daquele tipo de mulher
que daria medo em qualquer homem, menos no Nickolas.
– Oi Charlotte! Já desistiu de se casar com o idiota do Nick? – Pergunto sendo irônico
assim que chegam perto.
– Olha Smith, confesso que ele não sendo um babaca igual a você eu fico aliviada! – Ela
responde sorrindo e pisca.
– Essa doeu! – Seguro o meu próprio coração no peito. – Também senti saudades Char!
– Eu não senti nem um pingo de saudade sua. – Ela responde se sentando.
– Parem de se provocar! – Nick interrompe. – Tyler, o que era tão importante?
O Barman se aproxima de nós. Pego o meu copo de Whisky e quase tomo por completo,
deixando o líquido queimar minha garganta, afundando toda minha confusão.
– Ei amigo, ainda não são três da tarde, isso é grave... o que houve?
– Operação Ruiva Atômica foi um desastre – eu começo a desabafar – Eu estou fodido,
Nick! Sabe o que é estar fodido? Ah, você sabe, você tem a Charlotte.
Charlotte quase se engasga com a água que estava tomando e começa a rir.
Nick balança a cabeça negativamente e pergunta:
– Operação Ruiva Atômica? Que merda é essa?
– Meu objetivo era transar com a minha vizinha e nós transamos ontem.
– Eu ainda não estou entendendo qual o problema, se era isso que você queria desde o
princípio… – Meu amigo diz como se fosse a coisa mais normal do mundo.
Então friso apenas um detalhe:
– Nick, eu sou homem para segunda vez?
Ele continua me encarando, concordando com a cabeça para eu prosseguir com a história.
– Ela simplesmente olhou para mim como quem não se surpreende com nada e disse que
não ia transar comigo de novo.
– Eu amei essa mulher! – Charlotte responde primeiro. – Você está tomando do próprio
veneno, Smith! Eu vivi para ver isso! Me pague uma bebida que eu vou comemorar. – Ela diz,
erguendo a mão pequena para o barman.
Nickolas sorri.
– Tenho que confessar que ela mandou bem.
– Com amigos como vocês dois quem precisa de inimigo?
– Desculpa Tyler, mas isso é inédito – Ele responde. – E o que pensa em fazer agora?
– Não sei, chamei você para isso, idiota! Preciso de dicas, ideias. Você é o apaixonado
aqui!
– E parece que não sou o único – Meu amigo diz e continua. – Você gosta dela realmente
ou isso só está ferindo o seu ego?
A pergunta me atinge como um soco em meu estômago.
– Talvez eu deva me afastar ou sei lá. – Termino de virar o meu copo de Whisky, já
esperando por outro.
– Tyler, não dá para transar com alguém que você gosta e não dar a mínima no outro dia,
aliás, isso você não deveria fazer com nenhuma mulher, o que é fato. – Charlotte interrompe. –
Mulheres gostam de atenção, carinho, saber que são especiais. O que ela gosta? Você sabe?
Uma música me refresca a memória de quando eu escutei no seu apartamento.
– Imagine Dragons, ela ama.
– Segundo o Google, essa noite está tendo um show deles na região. São um pouco mais
de 30 minutos daqui. E se você sair rápido, ainda vai dar tempo de levar ela. – A noiva do meu
amigo diz olhando para o celular.
– Charlotte, sua gênia do mal.
Sorrio, pegando o meu celular, e mando uma mensagem de texto para Melanie.
– Operação Ruiva Atômica subiu de nível, meus amigos… – Digo ao casal e me levanto.
– Vai lá, gatão! – Nick grita.
– Você consegue! – Charlotte conclui.
Nick e Charlotte vibram me vendo correr de lá.
Chego ao topo da escada e já consigo ver a ruiva que está me deixando louco, me
esperando. Ela está sentada no chão e encostada na minha porta, vestindo jeans e tênis branco.
Está com o cabelo ruivo trançado e com aquela cara que ela faz quando está brava, arqueando as
sobrancelhas.
Ao me aproximar, algo estranho percorre por todo o meu corpo e minhas mãos suam de
ansiedade.
– Oi Melanie!
Sua expressão está séria.
– Oi Tyler, você está atrasado!
Sinto seu perfume doce e a noite passada vem como uma memória fresca na minha
mente.
– Dormiu bem essa noite, pequena? – Pergunto a provocando.
– Como um urso, e não me chama assim! – Ela responde, sorrindo. – Sei o que você está
fazendo Tyler, e não vai funcionar…
Me aproximo a pressionando entre mim e a porta. Ela não recua, o que me dá a liberdade
de apoiar minhas mãos ao seu lado.
– Provocar? Bem, eu não estava pensando somente nisso. Estou pensando que eu posso
abrir essa porta agora mesmo e te carregar para dentro do apartamento, e sabe o que eu vou fazer
com você? Vou beijar cada pedacinho do seu corpo e fazer você gemer meu nome assim como
você fez ontem à noite! – Digo baixo em seu ouvido e sua respiração acelerada entrega o calor
que há entre nós dois.
Melanie olha no fundo dos meus olhos e se aproxima ainda mais em desafio, quase
encostando seus lábios nos meus, até dizer com a voz baixa e provocante:
– Pena que isso não vai acontecer porque somos amigos, Smith.
Com as mãos empurra meu peito, se esquivando da barreira que a coloquei.
– E não podemos ser amigos com alguns benefícios?
– Você sabe que isso não funciona. Você não assiste filmes? Não vai dar certo! – Ela
responde já se virando para entrar no seu apartamento.
Hora do plano B.
– Tenho uma coisa para te contar – Digo antes que ela entre e feche a porta. – Você foi
convocada a participar de uma linda e entediante cerimônia de casamento neste sábado.
– O quê? Como assim casamento?
– É o casamento do Nickolas e da Charlotte, meus amigos, e preciso de uma
acompanhante. Seu nome já está na lista, então não é possível cancelar. – Respondo cruzando os
braços.
Inclusive tenho que agradecer a Kate por isso.
– Você é inacreditável! Isso vai triplicar a sua dívida. – Ela responde menos brava do que
eu imaginava.
Parece que está fugindo e tentando se esquivar de mim. Isso é por causa da noite de
ontem?
– Que pena que você está tão ocupada, iria te convidar para ir a um show comigo… uma
tal banda chamada Imagine Dragons. É, acho que era isso mesmo.
Melanie paralisa por um momento.
– Como assim? Onde? – ela diz com um sorriso enorme no rosto exibindo suas covinhas
fundas nas bochechas.
– Uma cidade vizinha. Estão fazendo um show essa noite e eu estarei lá… – Respondo
me virando em direção as escadas enquanto assobio.
Escuto sua porta ser fechada.
– Espera Tyler! Você não acha mesmo que vai a esse show sem mim, né? E você já está
me devendo pelo casamento, então vai ter que me levar.
– Negócio fechado – digo satisfeito.
Como previsto, levamos mais de meia hora para chegar e a Melanie colocou músicas
diferentes durante todo o caminho para se preparar. Ela não conseguia esconder a empolgação e
devo admitir que é muito bom ver ela dessa forma.
Todo plano estava dando muito certo, até o momento que me lembrei que para entrar em
um show privado você precisa ter as entradas.
– Desculpe Senhor, mas os ingressos estão esgotados! – O atendente rabugento diz.
– É impossível! São só mais duas pessoas, qual vai ser a diferença? Eu pago 5 vezes
mais, o que você quiser para entrar! – Respondo revoltado.
– Sem ingressos, sem entrada, senhor! – Ele diz enquanto masca seu chiclete de forma
exagerada e olha para o casal que está atrás de nós. – Próximo!
Saímos pela lateral para não atrapalhar a fila. Vejo que Melanie está triste, mesmo que
tente dizer o contrário.
– Está tudo bem, Tyler, sério!
– Não! – Começo dizendo. – Não é hoje que seus sonhos serão destruídos, Melanie. Eu
sou Bond, Tyler Bond! – Digo a ela, tentando fazê-la sorrir e está dando certo.
Tenho até uma missão com nome maneiro, me respeita.
– Vem comigo! – Seguro sua mão, que olha para a minha cara tentando entender o que
está acontecendo.
Damos a volta até chegarmos no muro dos fundos. Por sorte, não é muito alto devido ao
pouco investimento do prefeito da pequena cidade. Então tomo impulso e subo, me sentando em
cima do muro para auxiliar e subir a Melanie.
Dou uma olhada para o outro lado e não vejo nenhum segurança. Devem estar focados na
aglomeração dentro do local.
– Merda, Tyler! Você está maluco? – ela pergunta rindo, olhando para os lados para ter
certeza de que ninguém está vendo.
– Quer assistir o melhor show da sua vida ou não quer? – Pergunto estendendo minha
mão.
– Eu juro que se eu for presa por sua causa eu te mato dentro da viatura! – Ela diz
pegando impulso e segurando minha mão para subir.
– Nossa, foi tão difícil de te convencer, Melanie! Se não der nada certo na medicina, você
pode entrar para o crime.
Desço e fico esperando ela pular no meu colo. Cheiro seu pescoço só para irritá-la e ela
se debate para descer do meu colo, me xingando.
– Vamos, estamos perdendo o show! – Ela diz irritada, me puxando pela mão.
Chegamos, mas não conseguimos um lugar muito privilegiado na plateia. Está lotado. Por
sorte, o show está acabando de começar. A multidão grita quando o vocalista surge no centro do
palco com flash de luzes voltados ao redor dele. Olho para Melanie que nem pisca, e está com o
sorriso largo de orelha a orelha. Isso não tem preço! Ele começa a cantar em solo, e o teclado vai
acompanhando. Já ouvi essa música antes e também conheço. O vocalista faz um solo impecável
de Demons. A guitarra surge no meio e sinto minha pele arrepiar. É ainda melhor ao vivo.
Quando o refrão chega, todos começam a cantar juntos e erguem as mãos.
Fico observando minha vizinha que está com os braços para cima, cantando cada palavra
da música com os olhos fechados enquanto escorrem lágrimas no seu rosto. A ruiva baixinha que
está ao meu lado é a coisa mais linda que já vi na minha vida. Eu a abraço e ela se aconchega no
meu peito, cantando. Quando acaba a música, nós dois gritamos junto com a plateia. A coloco no
meu ombro para ela enxergar melhor. Ela grita e vibra a cada música, a cada palavra profunda
que contém nas letras. Faz carinho no meu cabelo em algumas ocasiões, depois volta a cantar
com toda alma como se o universo todo pudesse te ouvir.
O show termina e confesso que foi um dos melhores que eu já fui.
– Isso foi insano! – Melanie diz empolgada.
Estamos indo a saída e o atendente da portaria está com os seguranças apontando para
nós dois.
Com certeza ele iria reconhecer esse rostinho bonito.
– Melanie, não se apavora agora. Mas na hora que eu falar para você correr, você corre! –
Digo baixo no ouvido dela.
Ela me devolve um olhar assustado. Olho novamente para os seguranças e eles começam
a vir em nossa direção, então estendo minha mão esquerda para a Melanie que logo me estende
de volta a mão pequena e aperta firme.
– Agora corre!
Nós corremos juntos, sem olhar para trás, até chegarmos no estacionamento. Estamos
rindo, em êxtase, nos encarando assim como nos encaramos noite passada.
Então é assim que se sente um tolo?
Que os céus me ajudem!
“No verão antes de você, pensava que o amor era Shakespeariano.
Mais ou menos como uma experiência dolorosa.”
Little Did I Know - Julia Michaels
Que noite insana! O show não poderia ter sido mais perfeito. Cada centímetro da minha
pele arrepiava quando eu cantava as músicas junto com a multidão de vozes.
Nós dois estamos dentro do carro. Meu coração bate acelerado no meu peito, e ainda
estou sem fôlego por ter corrido dos seguranças. Tivemos que estacionar longe dos outros carros
porque quando chegamos já não tinham muitas vagas. Está escuro aqui devido as árvores altas ao
redor e a noite está fresca.
O que a Melanie do passado diria se me visse hoje? Talvez diria que não me conhecesse
mais. Ou talvez a Melanie do presente sempre estivesse ali escondida, atrás de outras pessoas,
sendo uma marionete.
Sinto que vou explodir com tanta adrenalina, então olho para o Tyler que está da mesma
forma. Ofegante e com um sorriso bobo no rosto, exatamente igual o meu, que com certeza estou
estampando.
Ele me encara com seus olhos verdes que estão mais escuros hoje, e ergue as
sobrancelhas grossas tentando adivinhar o que eu estou pensando, juntando os lábios em um
pequeno sorriso de canto.
Tyler, você me ajudaria muito se não fosse tão atraente. Por que você tem que ser tão
bonito?
– Está quieta, Esquilinha... – Ele diz, ameaçando apertar o botão para ligar a sua
Mercedes.
A Melanie de antigamente com certeza não teria a coragem que eu tenho hoje.
– O que está fazendo? – Ele pergunta olhando para minhas mãos que estão no botão,
subindo os vidros do carro.
Respiro fundo. Assim que os vidros se fecham, sem pensar, eu seguro a nuca do Tyler
com a mão esquerda e beijo seus lábios sentindo o gosto de bala de menta tão presente e gostoso.
Puta merda, que gosto é esse? Ele não hesita em nenhum momento, como se já estivesse
esperando por isso.
Tyler me pega pela cintura e me puxa para perto. Me encaixo no seu colo e tiro sua
camisa, e começo a beijar seu pescoço, descendo minhas unhas pelo seu abdômen trincado. Ele
aperta forte minha bunda e depois minha coxa e cintura. Puxo seu cabelo preto expeço fazendo
com que ele morda meu queixo e desça até o meu pescoço, dando beijos e chupadas. Tyler puxa
meu cabelo e dá uma pequena mordida na orelha. Me inclino para trás para ele tirar minha
camiseta e sem querer encosto na buzina do carro, fazendo com que levemos um susto com o
barulho. Começamos a rir, enquanto tiro minha camiseta desesperada, que era a ideia principal,
sem tirar os olhos do dele que automaticamente me observa e passa a língua na boca para
umedecer ainda mais seus lábios. Estou com sutiã preto de renda, ele para por um momento
como se estivesse gravando na cabeça aquela cena, então sobe suas mãos e acaricia meu rosto
delicadamente.
Seus olhos se direcionam para uma cicatriz que tenho no meu ombro esquerdo, seus
dedos descem por ali e a acariciam como se não fosse nada. Um frio percorre minha espinha
como se me fosse jogado um balde de água fria ao me lembrar o motivo de eu ter ela, como uma
ferida aberta que nunca se fecha na minha cabeça. Minha respiração fica ainda mais acelerada
quando meu nervosismo cessa ao perceber que Tyler está beijando o local do meu ombro que é
marcado por ela.
Logo sua mão grande envolve minha nuca novamente e ele me puxa para si com
intensidade, beijando e mordendo meu lábio inferior. Revido fazendo a mesma coisa e ele dá um
tapa na minha bunda me fazendo gritar seu nome como ele prometeu mais cedo. Começo a
desabotoar sua calça sem tirar minha boca da sua e sinto que estou latejando, implorando pelo
seu corpo. Cada toque seu em minha pele causa um arrepio viciante e eletrizante.
Tyler passeia sua mão pelas minhas costas. Desabotoa meu sutiã com facilidade e brinca
com meus mamilos, segurando firme e brincando com a língua neles. É o suficiente para eu
gemer alto dentro do carro, que por ser um conversível, ficamos ainda mais próximos dentro
dele. Os vidros já estão embaçados. Saio do colo dele por um momento para tirar minha calça,
enquanto ele consegue descer a dele até o joelho junto com a cueca e pega uma camisinha dentro
do porta-luvas. Ele sorri e olha para mim enquanto coloca a camisinha. Ele me puxa novamente
para seu colo e já sento procurando o encaixe que me traz a sensação de prazer. Perfeito. Subo e
desço, sentando lentamente para provocar, fazendo com que ele morda meu ombro, gemendo de
prazer. Enquanto subo e desço, Tyler segura com a mão esquerda meu cabelo e puxa, enquanto
sua mão direita aperta minha cintura. Eu continuo e eu grito apoiando as mãos no vidro, tentando
segurar tudo que está em volta de mim. É um misto de sensações e o meu corpo enrijece e depois
estremece. É o suficiente para eu ficar encharcada em cima dele, que sorri satisfeito, sustentando
meu corpo.
Ele então me segura firme na cintura com a mão esquerda e apoia a mão direita no banco,
dessa vez dando estocadas dentro de mim com a própria força. Puta que pariu. Sinto minhas
pernas tremerem por vontade própria. Ele goza, e ficamos ali abraçados em silêncio, esperando
tudo que estamos sentindo passar.
Depois de alguns minutos, eu saio do colo dele e começo a me vestir.
– Isso... – Tento dizer algo, ainda ofegante.
– É o que deveríamos fazer todos os dias. – Tyler responde sorrindo.
Eu começo a rir também, sem constrangimentos.
– Que fique bem claro que você me quis hoje. – Ele me diz como se fosse inocente,
levantando as mãos.
– É porque você não queria, certo, Tyler? – Respondo com ironia.
– Então é isso? Atração física? – Ele pergunta.
– Atração Física. – Reafirmo para mim mesma.
– Sem esperar uma ligação amanhã ou flores?
– Não! – Dou uma risada alta.
Ele ri e olha para mim. Ainda está com os lábios inchados, cabelo desalinhado e rosto
marcado. Vejo as marcas das minhas unhas no seu peito enquanto ele veste a camisa branca.
O carro cheira a sexo agora.
– Te falei que poderíamos ter alguns benefícios. – Ele diz, interrompendo o silêncio.
Isso é estúpido.
A quem eu quero enganar? Eu também quero continuar.
– Continuamos com uma condição, Tyler… – Digo a ele, erguendo o dedo indicador. –
Sem rolar sentimentos.
Ele pensa por um momento, coçando a barba por fazer e fica me encarando. Até penso
que vai falar alguma coisa, mas por alguma razão desiste e olha para o volante.
– Ótimo, sem rolar sentimentos. É um prazer fazer negócios com você. – Responde
apertando a minha mão.
– Obrigada pela noite, de verdade, eu precisava. Foi um dos melhores dias da minha vida.
– Admito.
– Sabe que estamos juntos para o que der e vier. Certo, Melanie? Juntos! – Tyler diz.
– Juntos, gostei disso. – Respondo abrindo um sorriso espontâneo.
Só espero que eu não esteja me arriscando muito.
“Você realmente me conhece.
A futura e velha eu.”
Easy - Camila Cabello
Melhor esconder da minha tia a parte de que estou transando com o meu vizinho, tio da
minha paciente e meu amigo?
Sim, ela não precisa saber disso.
Meu beep apita de dentro do bolso do meu jaleco, então devo ir atender.
Estou com o Google aberto no meu celular. É... aqui não fala nada sobre querer fazer
sexo com a amiga, merda.
– Tyler, presta atenção! Me ajuda a abotoar as mangas. – Nick interrompe meus
pensamentos.
Estou ajudando ele a se preparar para o seu casamento, como o ótimo padrinho que sou.
Ainda não acredito que o meu melhor amigo vai se casar.
– Como você está, Nick? Ainda dá tempo de desistir, irmão. Juro que te mando o mais
longe daqui e a maluca da Charlotte nunca poderá te rastrear. Eu te cubro! – Digo olhando nos
seus olhos.
– E você não iria junto? - Ele pergunta.
– Não! Um homem bonito como eu seria difícil de esconder, mas você não chama tanta
atenção assim. – Termino de fechar as mangas e coloco a abotoadura de águia dourada.
Vai ser o casamento do ano. Os noivos alugaram a cobertura e o salão de festa do hotel
mais alto e luxuoso de Los Angeles e estamos em um dos quartos que foram reservados. Na
verdade, foram reservados quartos para todos os convidados, o que é notável que não mediram
esforços para fazer uma festa cara. A família da Charlotte é um forte exportadora de
equipamentos eletrônicos de Singapura, sua cidade natal e Nickolas é diretor comercial da
Investimentos Smith de Nova York.
– Cala a boca! – Ele diz sério e noto suas mãos tremerem de nervosismo.
– Calma, irmão! O máximo que pode acontecer é a noiva não aparecer. Mas não se
preocupa – seguro no ombro dele. – Se isso acontecer, eu me caso com você!
– Sai fora! – Nick empurra meu ombro.
– Vou subir até o local do seu assassinato, me liga se mudar de ideia, ainda dá tempo de
comprar as passagens, já sei... Se no altar você se sentir inseguro ou confrontado, pisque 4 vezes
e eu te envio para Bahamas.
– Vai a merda, Tyler! – Meu amigo joga uma das almofadas em mim.
Saio do quarto rindo e vou até as escadas, e quando chego no próximo andar pego meu
celular do bolso do meu blazer e envio uma mensagem de texto para Melanie.
Dou risada, Melanie sempre tem a resposta rápida e afiada, por algum motivo fico
ansioso em encontrá-la e guardo meu celular novamente no bolso. A aguardo na entrada do salão
no corredor e passo a palma da minha mão na minha própria calça, não pararam de transpirar
desde o momento em que sai do quarto. Há um grande pôster com a foto do casal de noivos e
leio a frase que está logo abaixo, com umas letras bonitas: Nickolas e Charlotte para sempre...
Sou distraído por um vulto que vejo de canto de olho.
O quê?
Minhas mãos voltam a suar quando vejo Melanie andando pelo corredor. Parece que tudo
em volta fica em câmera lenta e que só existe ela nesse prédio. Melanie vem caminhando, usando
um vestido longo que cai perfeitamente sobre seu corpo. Enquanto desfila, sua perna fica a
mostra com a grande fenda que se abre e revela a pele branca e macia de sua coxa. Seu cabelo
ruivo está solto e ondulado, emoldurando seus ombros finos, destacando ainda mais seus seios no
decote. Na boca? Ah, aquele batom vermelho que eu gosto.
– Fecha a boca Tyler, se não a baba cai. – Ela chega perto de mim e coloca a mão no meu
queixo, fechando minha boca que eu nem notei que estava aberta.
– Não mande eu fechar a boca quando você está gostosa pra caralho, Melanie.
– Cala a boca – Ela sorri sem jeito. – Não está demais? Fiquei com medo por ser um
casamento. – Ela cochicha perto de mim com expressão preocupada.
Sinto o seu cheiro doce e logo me lembro do seu gosto de cereja ao olhar para sua boca.
– Melanie, eu juro para você que se eu não tivesse que casar o meu melhor amigo – Olho
para o meu relógio só para conferir se tenho tempo. – Nesse momento, eu te empurraria para o
quarto mais próximo e te foderia até você pedir para parar. – Digo na naturalidade, encarando-a
para que ela acredite em mim.
– Tyler... – Ela diz ficando mais corada que a maquiagem nas maçãs do seu rosto.
– Melanie, olha isso? O que mais essas pessoas gostam é de chamar a atenção. Não se
preocupe, você está e é mais linda do que pode imaginar.
Então ela respira fundo e parece absorver a alta dose de confiança que lhe passei. Coloco
minha mão esquerda levemente na sua cintura e vejo que ela dá um suspiro forte antes de erguer
os olhos e me encarar.
– Você também está bonito, Smith... – Seus olhos me avaliam da cabeça aos pés. - E
deixa eu te contar um segredo?
Sua boca se aproxima do meu pescoço.
– Quem teria que pedir para parar seria você se estivéssemos no quarto.
É guerra?
– Não me provoca Melanie, ou realmente vou perder o casamento do meu melhor amigo.
– Vamos entrar! – Ela ri da minha cara e toca em meu peito com sua bolsinha de festa
minúscula.
Entramos e procuro minha família que está sentada na primeira fileira. Deixo Melanie
com eles e vou até o meu lugar de "Padrinho de Honra" no altar. Seria trágico se não fosse
cômico.
Sou eu e os dois tios de Nick de um lado, e do outro são três madrinhas que deduzo serem
amigas de Charlotte, que não param de me avaliar.
Volto meus olhos para uma certa moça de vestido vermelho escuro provocante que não
para de sorrir com a minha irmã e meu cunhado.
A cerimônia começa ao som de piano e violinos, e Nick surge no final do corredor de
mãos dadas com a sua mãe. Eu amo esse idiota com todo o meu coração.
Ele chega ao altar e dá um abraço nos tios e depois me abraça forte, já consigo ver seus
olhos azuis brilharem.
– Só 4 piscadas e eu te tiro daqui. – Digo no ouvido dele, que bate nas minhas costas e ri,
talvez de nervoso.
Toca outra música e Emy entra jogando pétalas de rosas brancas no corredor. A pestinha
é a coisa mais fofa e todo mundo se derrete pela baixinha que sorri mostrando as janelinhas.
Ela termina e já se senta ao lado da Melanie, que a recebe com um grande sorriso. Seu
cabelo ruivo cai sobre o rosto e meus olhos percorrem sua perna exposta pela fenda.
Foco, Tyler. Casamento.
O som de violino invade o lugar e a cantora começa a cantar Paradise do Coldplay.
Charlotte surge, vindo lentamente pelo corredor. Está parecendo uma princesa com seu
vestido branco que brilha mais que o salão todo. Assim que os dois se olham, ambos choram de
emoção.
Merda, o que estou fazendo? Não chora Tyler, não chora Tyler.
E acabo chorando.
Olho para Melanie que está ali, flagrando cada cena, enquanto seus olhos avelãs brilham.
E quando eu a encaro de onde estou, ela abre um enorme sorriso e presto atenção em cada
detalhe para gravar essa cena na minha cabeça: uma ruiva, de batom e vestido vermelho que sorri
para mim do banco de uma cerimônia de casamento. Deus, eu poderia me casar com essa
mulher!
A cerimônia é leve e descontraída e a hora passa rápido. A família de Nick gosta de festa
e tem uma grandiosa esperando no terraço e todos vão para lá assim que a cerimônia acabar.
Vou até Melanie que está me aguardando em uma janela do canto, observando a cidade
do alto. Ela me olha e sorri assim que me aproximo.
– Você chorou Tyler, eu deveria ter gravado isso.
– Eu não chorei, foi o produto do cabelo da Charlotte, o cheiro estava muito forte.
– Sim, o laquê. – Ela responde irônica e observa o céu noturno.
Fico ao seu lado, apenas curtindo a sensação de bem estar.
– Tudo isso é loucura, olha para essa cidade! Eu nunca imaginei que pudesse estar aqui
hoje. Está vendo esse céu estrelado, Tyler? – Ela me pergunta apontando para o mesmo. – Gosto
de acreditar que elas comandam nosso destino. Estou feliz por estar aqui.
– Sou grato às estrelas por terem trazido você para mim. – Respondo com sinceridade.
– As estrelas guiam destinos certos.
Seus olhos brilham.
– Eu gosto de como essa frase soa. – Afirmo.
Uma lágrima escorre pelo seu rosto, e então a recolho delicadamente acariciando sua
bochecha e Melanie fecha seus olhos e sorri da maneira mais arrebatadora que eu poderia
aguentar.
– O que você me disse mesmo, naquela noite que você invadiu meu apartamento? –
Pergunto.
– Aquela noite? Deixa eu pensar – Ela fecha os olhos, tentando lembrar. – Já sei! Hoje
vamos encher a cara! – Ela grita erguendo as mãos para cima.
– Só se for agora!
Subimos até o terraço que está exageradamente decorado com rosas brancas para todos os
lados e vamos até a mesa que está com os nossos nomes, junto com a minha família, em seguida
Melanie pede licença a todos e vai ao toalete.
Kate, como o projeto de furacão atentado que é, se senta do meu lado.
– Vocês transaram, né? Como não me contou? – Ela pergunta cochichando no meu
ouvido e me dando um tapa no braço.
– Quem te contou, Bruxa? Já sei foi o Nick? – Pergunto a ela passando a mão no meu
braço para amenizar a dor.
– Ninguém me contou, você que acabou de me confirmar. – Ela sorri satisfeita.
A manipulação é de família, infelizmente.
– Vai à merda, Kate.
Nick e Charlotte chegam na hora certa para o show começar.
– E aí, quando é o casamento com a Ruiva Atômica? – Meu amigo pergunta, apertando
meus ombros. Charlotte está do seu lado, rindo como uma inimiga.
– Dia 15 de fevereiro! – Kate grita animada.
– Por que dia 15 de fevereiro? – James pergunta.
– Uma data aleatória. – Minha irmã dá de ombros.
– Um brinde a essa data! – Charotte ri.
– Porra, seus traidores!
– Titio Ty, não fala palavrão! – Emy me repreende.
– Desculpa, docinho! Quer ir brincar? Porque a conversa vai ficar feia aqui. – Aponto
para todos e minha sobrinha assente e vai em direção à mesa de docinhos.
– Ruiva Atômica? Que merda é essa? – James pergunta, rindo.
– Eu disse a mesma coisa, James. Que merda é essa? – Nick responde com ironia olhando
para mim.
– Já prevejo a cor da coleira. – Charlotte diz irônica.
– Ninguém pediu sua opinião. – Reviro os olhos.
– A coleira vai ser verde com certeza, combina com os olhos dele. – Robert interrompe,
rindo.
Todos caem na gargalhada.
– E o show? Funcionou? Deu certo? – Charlotte pergunta.
– Por que eu estou sendo a última pessoa a saber das coisas? Que show foi esse, alguém
pode me dizer? – Kate pergunta balançando sua taça de vinho no alto e me fuzilando com os
olhos.
– Fazia parte da missão do agente especial Tyler Bond de conquistar a garota. – Nick diz.
Lembrete: não contar mais esse tipo de coisa para o idiota do meu melhor amigo.
– Oh, meu Deus! – Kate chora de tanto rir.
– Tyler, quando a sua irmã me contou, não achei que estaria nessa situação. Meus
sentimentos, cara. – James diz em condolências.
– James, ainda dá tempo de te deserdar da família?
Sinto que estou no circo porque todo mundo está rindo de mim nesse momento.
– Atenção, gente! Ninguém olha! A Mel está voltando, todo mundo finge cara de
paisagem. – Charlotte alerta.
Os bons atores entram no papel.
Olho para Kate e James com cara feia e os dois safados estão com os lábios grudados, se
segurando para não rir, Charlotte está segurando a costela do Nick e meu pai sabe ser falso, então
está tranquilo.
Melanie vem até nós. Atrai alguns olhares enquanto passa pelas mesas. Realmente, esse
vestido...
– Uau, você é linda! Dá para entender o encanto do Smith agora. – Charlotte abre a boca
grande e abraça Melanie.
– Obrigada! É Charlotte, certo? Você é a noiva mais linda que eu já vi em toda a minha
vida, eu juro. – Melanie diz.
– Está vendo, Tyler? Ela diz que eu sou linda e você não! Adorei você, Mel. – Charlotte a
abraça de novo.
– Você deve ser o famoso Nick. – Melanie olha para o meu melhor amigo.
– O próprio. Ouvi falar muito bem de você, Mel.
Minha dignidade está indo pelo ralo. Adeus, foi bom enquanto durou.
Melanie se senta do meu lado.
– Fiquei sabendo que foram a um show essa semana. Como foi? – Kate pergunta.
Essa safada! Sei bem o que ela está querendo.
– Sim, o Tyler me levou. Imagine Dragons é minha banda favorita e foi o máximo.
Quase fomos presos por pular o muro. – Melanie responde e ri ao se lembrar.
– Pular muro, Tyler? É mesmo? Eu queria estar presente para ver isso, com certeza. –
Kate junta seus lábios.
Emy volta para a mesa e dá um grande abraço na Melanie. Sua boca está suja de doce,
andou roubando alguns da mesa e nem disfarça.
– Oi, Tia Ariel! – Emily a chama de tia e é a minha deixa.
– Melanie, vamos ao bar comigo pegar bebidas?
– Claro. – Ela diz, se levantando.
Vamos até o bar e peço um whisky para mim e o quinto drink contendo a mistura de
saquê e limão para Melanie por recomendação da Charlotte. Os noivos estão no centro da pista
de dança se divertindo como nunca.
Melanie me puxa pela mão até o centro da pista com Charlotte e Nick, que não recusam
uma boa dança. Nós quatro dançamos com nossas bebidas erguidas para o alto e cantamos
fingindo saber saber a letra da música.
A noite passa como um estalo. Já bebemos bastante. Somos bons em promessas de encher
a cara. Até o momento, Melanie já fez amizade com os garçons, convidados, pais dos noivos, e
todo mundo que seja possível.
Ela está na pista de dança com os recém casados, enquanto eu estou aqui no bar, sentado
e rindo da sua dança de robô que ela insiste em fazer e acha que é legal. Ela percebe que estou
olhando e vem até mim.
– Tyler, chama um Uber para mim que eu já estou sem condições. – Ela afirma e segura
minhas mãos.
– Você não vai para a casa hoje, tem um quarto aqui para você. – Digo e ela sorri.
Na verdade, ela não tem um quarto. Mas acho que ela não vai se importar de dormir
comigo essa noite.
Nos despedimos de quem ainda restava na pista de dança do salão e seguimos em direção
aos corredores.
Estamos bêbados, e estou tentando achar o cartão da porta do quarto para abrir.
– Tyler, não acredito que você perdeu a chave de novo! - Ela diz e tomba a cabeça para o
lado, escorando na parede e esperando a minha resposta.
Meu olhar vai para o seu decote e depois para os seus lábios que estão com um pequeno
sorriso.
– Deixa eu te contar um segredo? – Cochicho para Melanie que arregala os olhos e vem
até perto de mim, querendo saber. – Eu não perdi as chaves aquele dia.
– Seu mentiroso, você não vai para o céu, Tyler! – Ela cruza os braços, mas por alguma
razão acha engraçado e ri.
Acho o cartão e abro a porta. Gesticulo como um cavalheiro para que ela entre na minha
frente e porra essa bunda nesse vestido está me deixando louco.
Ela para na porta e me avalia assim como fez mais cedo: dos pés à cabeça.
– Tyler, eu te quero agora. – Ela diz. – Só preciso ir ao banheiro antes.
Sorrio com sua espontaneidade, enquanto Melanie corre para dentro do cômodo.
Onde essa mulher estava esse tempo todo?
Fecho a porta e vou até o quarto, onde percebo que a luz do seu celular velho pisca por
várias vezes de dentro da sua bolsa dourada que está em cima da cama king size. Me aproximo e
percebo sua bolsinha semiaberta. Sei que é errado bisbilhotar, mas me sinto tentado em olhar
mesmo assim. Pego o Nokia e Tem várias chamadas perdidas de um número desconhecido. Ok,
isso é muito errado, decido guardar o celular no mesmo lugar quando chega outra notificação,
dessa vez é uma mensagem e fico um pouco abismado com o que vejo.
Hoje
Estamos deitados na cama depois da noitada, apenas cobertos pelo lençol de seda caro do
quarto do hotel.
Tyler ainda está dormindo com o braço embaixo de mim, seu cabelo escuro está caído
sobre a testa e eu passeio meus dedos pelo seu abdômen malhado e apoio minha cabeça no seu
peito, ouvindo seus batimentos cardíacos.
– Bom dia Ruiva Perigosa. – Ele diz com a voz sonolenta e abre os olhos.
– Não era atômica? – Pergunto.
Ele sorri e me segura firme, subindo em cima mim, e começa a beijar meu pescoço
enquanto sua barba passeia pelo meu ombro.
– Te chamo da forma que você quiser, Melanie. – Ele diz com a voz rouca e morde meu
lábio inferior.
Amo quando ele me chama e que meu nome soa sexy na sua voz.
O encanto se quebra quando olho para o relógio no criado mudo.
– Tyler, tenho que ir trabalhar, estou muito atrasada! – É irresistível a oferta, mas
empurro ele de cima de mim, que rola para o lado, e me apresso em procurar o meu vestido.
Onde está? Onde está? Onde? Aqui.
– Sexo matinal ajuda a diminuir o estresse, dizem os estudos. – Ele diz, apoiando as
mãos na cabeceira estofada.
– Comprovamos isso outro dia. Agora se veste, porque você vai me dar uma carona. –
Pego a roupa dele que está no banheiro e jogo na cama.
– Outro dia? Só uma rapidinha. Já está atrasada mesmo, não vai mudar nada. – Tyler me
despe com os olhos enquanto coloco meu vestido.
– Nem adianta me olhar com essa cara de cachorro que se perdeu na mudança, não vai
funcionar.
– Está bem, General Estraga Prazeres. – Ele revira os olhos e se levanta para vestir a
calça.
Rio alto.
– Seu telefone estava tocando ontem à noite, Melanie. –Tyler me trás o celular para
guardar na bolsa.
– Deve ser a tia Beth, depois eu retorno para ela. – Digo, já pegando o aparelho e
guardando na minha clutch com pressa.
Pegamos nossas coisas e descemos para fazer o checkout.
Estou no hospital tomando um café da cafeteira velha que conseguimos, e com a cabeça
latejando em razão do álcool da noite passada.
– Oi, Mel. – Liam se aproxima de mim e sorri. – Como foi o casamento?
– Quem te contou, a Mandy?
Ele concorda que sim com a cabeça e ri.
– Foi ótimo, pessoas legais, comida boa! Mas sei que preciso do dobro de café hoje. Dou
uma grande golada na bebiba quente e amarga.
– Ressaca das bravas? – Ele pergunta, já sabendo da resposta.
Concordo com a cabeça e ele ri.
– Tem lugar para passar o Dia de Ação de Graças, Mel? – Ele pergunta.
– Bem, provavelmente os meus tios vem para cá passar o feriado comigo.
Nem acredito que vou encontrar eles, estou morrendo de saudades.
– Que notícia boa! Se quiserem passar o feriado com a minha família, as portas estarão
abertas para vocês. – Ele oferece.
– Eu agradeço muito, pela gentileza.
Amanda abre a porta com brutalidade e começa a falar antes mesmo de perceber que
estou acompanhada.
– Amiga, desculpa pelo atraso, estava na reunião de condomínio hoje... Ah, olá Doutor
Patterson!
Liam se despede e Amanda o avalia até ele se retirar da sala.
– Que pedaço de mal caminho.
– Amanda!
– É a verdade, não tenho culpa se você só tem olhos para seu vizinho.
– Somos amigos.
– Será que o doutor Liam toparia os mesmos benefícios?
– Isso é muito errado.
– Eu sei, por isso é tão tentador. – Mandy ri alto.
Alerto minha amiga assim que ela se recompõe.
– Melhor voltarmos ao trabalho, antes que Doutora Hailey venha atrás de nós.
Já passam das nove da noite e estou me preparando para ir embora, quando o meu celular
vibra de dentro da bolsa que estava no armário do vestiário. Costumo deixar ali para não ter
distrações durante o dia.
Me assusto com o que vejo na tela. São 19 chamadas perdidas de um número que eu
conheço bem. Meu coração gela e me falta força nas pernas. Minhas mãos tremem. Com muito
esforço, abro a mensagem que acabou de chegar e percebo muitos SMS que eu não tinha visto
ainda.
Perco meu chão, meu pior pesadelo se tornou realidade. É difícil para sair do hospital e
está chovendo muito. Olho para todos os lados como uma paranoica, como se a qualquer
momento Anthony fosse aparecer. Estou desnorteada quando vejo um homem alto de cabelo
loiro e não sei o que fazer. Penso ser ele, mas assim que se vira, vejo que não é. Para mim, todo
mundo tem cara de Anthony agora, e as gotas da chuva se fundem com as minhas lágrimas.
Volto para a cobertura do hospital, correndo. Pego meu telefone e disco o número da
pessoa que eu mais preciso ver agora.
– Oi, Melanie! Já deu saudades?
– Tyler?
– O que aconteceu, Melanie? Que voz é essa? Está chorando?
– Por favor, vem me buscar no hospital. Preciso de você.
– Estou indo, pequena.
“Mas se você nunca tentar, você nunca saberá.
O quanto você vale.”
Fix you - Coldplay
Melanie está sentada no chão, abraçando suas pernas e na mesma hora eu sei que alguma
merda aconteceu.
Desço do carro e não importo se vou me molhar com os pingos da chuva ou não, só quero
que a sua dor passe para mim.
Eu aguento qualquer tipo de pancada.
– Melanie! – Grito e ela levanta a cabeça
Nossos olhos se encontram, mas ela não está com aquele sorriso no rosto que eu tanto
gosto. Pálida e sem hesitar, ela corre em minha direção e me abraça forte. A tiro do chão por um
momento e a seguro firme no meu peito.
Sua pele está gelada e tremendo como se estivesse em transe, não conseguindo nem falar.
Não sou médico como ela, mas entendo o que é uma crise de ansiedade, e seja o que for que
tenha acontecido, ela precisa de um tempo para respirar e me dizer como eu posso ajudá-la.
– Você veio. – Ela chora e me abraça mais forte, não querendo soltar.
– Vai ficar tudo bem, Melanie. Eu prometo. – Com muito custo consigo soltar sua mão
do meu pescoço e a puxo em direção ao carro.
Preciso tirar ela daqui. Ela fica em silêncio, apenas tentando respirar. Dirijo segurando
sua mão até chegarmos a um parque afastado da cidade, onde possivelmente não haverá muitas
pessoas.
Aqui é um lugar para ficar sozinho, pensando, e traz um ponto de paz junto ao contraste
de luzes da cidade e do céu. Ela gosta de estrelas e mesmo que esteja nublado, isso talvez isso
possa funcionar para acalmá-la. Nos sentamos no gramado, e coloco meu blazer seco em volta
dos seus ombros.
– Obrigada. – Ela me encara com os olhos vermelhos e inchados.
– A hora que estiver pronta, ok? Pode me contar o que quiser. – Digo para quebrar o
silêncio.
– Eu me sinto um pouco envergonhada com isso. Não é uma coisa que eu me orgulhe. –
Ela diz relutante.
– Melanie... – Seguro seu queixo para que me olhe nos olhos. – Você está falando
comigo, é o Tyler. Sem julgamentos. Apenas seu amigo aqui para te ouvir.
– Certo. – Ela respira fundo.
Ficamos ali um do lado do outro, apenas olhando para o céu nublado.
– Há 4 anos atrás, conheci um cara no hospital de São Francisco. O nome dele é Anthony.
– Ela começa.
Será que ela é casada? Tenho que me preparar para o pior.
– Nosso relacionamento era muito bom. Ele sempre foi atencioso, carinhoso, fazia o que
me deixava feliz. – Ela continua e para por um momento.
– Você está indo bem. – Tento fazê-la prosseguir.
– Os sinais sempre estiveram ali, desde o começo e eu somente os ignorei. Eu gostava
demais dele. Anthony começou a cuidar do jeito que eu me vestia, dos meus horários, dos meus
amigos, até da minha própria família. E eu não tinha visto perigo nenhum, achava que ele me
amava e estava apenas cuidando de mim.
Concordo com a cabeça e estou com medo do que eu vou ouvir.
– Foi quando começaram as agressões verbais. Ele me xingava, me diminuía e depois,
pedia perdão e prometia ao mundo que ia mudar. Depois eram empurrões e mais pedidos de
desculpa. E eu aceitava, não tem explicação do porquê, mas eu aceitei todas as vezes e só foi
piorando. Estava tudo bem no nosso relacionamento e de repente, não estava. – Melanie olha
para as próprias mãos.
Fico em silêncio, absorvendo suas palavras.
– Foi quando meus tios decidiram dar um basta. Eles sabiam que eu tinha medo de
denunciar as agressões porque o Anthony tem muitos amigos na polícia de São Francisco e
sabiam que logo ele estaria solto. Eles juntaram dinheiro e compraram o apartamento que vivo
hoje, para eu recomeçar em outro lugar. – Ela sorri quando se lembra dos tios.
Fecho minhas mãos, tentando conter a raiva que sinto nesse momento ao notar a angústia
em seu rosto.
– No dia em que resolvi ir embora, ele chegou em casa bêbado. Tentei conversar, juro
que tentei. – Ela começa a chorar novamente, se lembrando do ocorrido. – Disse a ele que não
aguentava mais e que iria embora. Foi quando... Bem, eu estava na banheira tomando banho, ele
me afundou na água e tentou me afogar. Lutei com todas as minhas forças, e minha mãe estava
lá, eu sei que estava. Eu a vi, e eu soube que ia morrer. Foi quando consegui agarrar a primeira
coisa que consegui e quebrei uma garrafa na cabeça dele e fugi.
Juro que vou matar esse desgraçado.
– Foi ele quem te mandou mensagem ontem à noite? – Pergunto, já sabendo da resposta.
Minha voz está trêmula, e ela me olha espantada.
– Foi. Você viu? Me desculpe por você ter visto isso, não pense nada, por favor.
– Calma pequena! Nada disso é sua culpa e não pense nem por um minuto que tenha
sido.
Me levanto e pego a mão dela, a ajudando a se levantar.
– Agora grita o mais alto que você conseguir. – Peço.
Ela me olha sem entender nada. Seco as lágrimas que estão escorrendo na sua bochecha.
– Vai, você consegue. – Peço novamente.
Então sua voz sai, Melanie grita por quatro vezes seguidas, e depois sorri pra mim,
liberando a raiva que precisava.
– Olha para mim agora... – Seu rosto está voltando ao normal. É a Melanie que eu
conheço. – Eu juro que se esse filho da puta aparecer aqui, eu vou caçar ele até o inferno se for
preciso! Ele não vai te fazer mal e isso é uma promessa. Confia em mim?
Ela balança a cabeça em afirmação e mais algumas lágrimas escorrem, mas seu sorriso
não desaparece.
– Vamos trocar seu número, e você vai dormir no meu apartamento por alguns dias até
você ficar mais tranquila, ok?
– Muito obrigada.
A abraço forte e beijo o topo da sua cabeça.
– Por que você é assim, Tyler? Seria mais fácil se você fosse uma pessoa chata e sem
emoções. – Ela balança a cabeça negativamente enquanto se afasta.
– É para isso que servem os amigos, não?
– Sim, e você é um ótimo melhor amigo, subiu de nível. – Ela sorri.
Consegui o que eu queria, sua crise passou. A única coisa que não passou foi o ódio que
cresceu no meu peito agora. Anthony, vou gravar bem esse nome.
– O que está pensando? – Melanie me pergunta.
– Não sei, talvez em mil e uma maneiras de assassinar o seu ex doente. – Digo em tom de
brincadeira, mas tem um fundo de verdade.
Melanie me abraça e eu seguro sua cintura enquanto voltamos para o carro.
– Obrigada mesmo, Tyler. Eu estava desesperada.
– Fiquei feliz por ter me ligado.
– Agora estou morrendo de frio, vamos para casa? Quero X-Burguer, Batatinha e Café.
Muito café. Café extra. Café em dobro.
– Claro, vou providenciar todo o café disponível em Los Angeles. Melanie, já pensou em
se inscrever nos Dependentes de Cafeína Anônimos?
– Olha quem fala. – Ela diz revoltada com a minha observação.
Damos risada, o clima já está leve de novo. Melanie está com a maquiagem borrada, suas
roupas e seu cabelo estão molhados, e ainda sim é a mulher mais linda do mundo. Eu só queria
pegar essa dor que ela sente e transferir toda para mim. Sei que isso só o tempo e carinho pode
curar. Entendo seus medos, mesmo assim ela é mais forte do que eu imaginava.
Sei disfarçar bem minha inquietação e ódio pelo desgraçado, só para ela ficar bem. Mas
realmente estou pensando em assassinato.
“Tentei manter você perto de mim,
mas a vida se intrometeu.”
Hold Back The River - James Bay
E mais uma vez, uma mulher passou a noite no meu apartamento, e eu não me incomodei
ou fiquei torcendo para que partisse.
Ela apenas está ali, onde deveria estar vestida com o uniforme do hospital central de Los
Angeles e com o seu cabelo preso em um coque alto.
– Melanie, tenho uma péssima notícia. – Mostro a embalagem vazia. – Tomamos o
restinho do café.
– Não pode ser! – Ela diz de forma exagerada e desliza sobre o sofá até cair no chão,
esparramada no laminado.
Vou até ela e a levanto. Abraço a baixinha, beijando a sua testa.
– Está tudo bem? Como se sente hoje? – Pergunto preocupado.
– Me sinto incrível, mas não fique convencido. – Ela diz, piscando para mim.
Dou uma olhada no meu celular e meu pai não parou de ligar desde cedo. Ainda tenho
que resolver a bagunça que provoquei por ter saído ontem.
– Vamos, passamos na cafeteria e te deixo no hospital. – Convido a Melanie porque,
afinal, o que é mais um pouco de atraso para quem já está fodido?
Ela se levanta do chão e me segue, sem nem precisar pedir duas vezes.
Passamos na Starbucks mais próxima que fica a um pouco mais de 5 minutos de onde
moramos, por ser manhã o ambiente está cheio mas não precisamos esperar muito para que o
atendente chame nossos nomes para pegar nosso pedido.
– Então Tyler, o que era aquele lugar que me levou ontem? – Ela pergunta, me encarando
com seus olhos cor de avelã enquanto dá um gole no seu café expresso.
Meu pai liga de novo, e eu viro o celular na mesa.
– É um lugar onde vou para respirar.
Saboreio um delicioso e generoso Croissant de manteiga.
– É lá que você leva as mulheres que quer conquistar? – Ela pergunta semicerrando os
olhos como se já soubesse a resposta.
– Eu as levo para um hotel. – Respondo rapidamente. – Para lá eu levo quem me conhece
de verdade.
Um sorriso instantâneo e satisfeito surge no seu rosto.
Assim que deixo Melanie no hospital, vou direto para a empresa.
– Senhor Smith está irritado, já vou avisando. – Cindy me alerta assim que eu chego no
escritório.
– Obrigado Cindy, se eu demorar para sair liga para a minha irmã. Foi bom viver
enquanto durou.
– Ela também está aí, Senhor. – Ela diz preocupada.
– Então pode encomendar o caixão, Cindy!
Meu pai deve estar muito bravo para também ter chamado a Kate.
– O filho mais bonito chegou! – Abro a porta de madeira maciça e brinco para tentar
quebrar o gelo e ignorar o olhar mortal que ele me lança de longe.
Ele sabe ser rígido quando quer.
Robert coloca a mão na cabeça como se estivesse com dor e Kate está segurando com
firmeza os lábios para não rir, me fazendo um sinal com as mãos de que eu me ferrei.
Xingo ela sem emitir som.
– Tyler, precisamos conversar. – Ele diz sério.
– Pai, me desculpa por sair ontem sem dizer nada, é que tive uma emergência e não podia
deixar de resolver.
– O problema não é esse. Preciso de alguém que esteja aqui cem por cento. Não posso
confiar a empresa a você se não posso nem contar com sua presença em uma reunião importante.
– Ele coça a cabeça. – Eu entendo Tyler, você tem problemas, mas não é mais uma criança para
agir como tal. Você tem se esforçado, não faça esse tipo de coisa para você não perder tudo pelo
que lutou.
Essa doeu.
– Pai, não fala isso. – Minha irmã interrompe.
– Está tudo bem, Kate. – Tento tranquilizar minha irmã.
Odeio decepcionar o meu pai e ele tem razão nesse caso, ele também precisava de mim.
Minha prioridade foi a Melanie e eu não faria diferente. Mas tenho que aceitar e ouvir porque o
deixei na mão.
– Kate, pode deixar o Tyler e eu a sós, querida? – Ele pede e ela se retira dando um
aperto em meu ombro antes de sair da sala.
Meu pai se senta e aponta para que eu me sente ao seu lado.
– Tyler, naquele dia você me perguntou o porquê essa empresa é tão importante para
mim, filho. A verdade é que eu trabalhei tanto por isso, e foi somente o que me restou. Eu tenho
uma carreira, filhos, uma neta..., mas o amor da minha vida não está mais aqui comigo, estou
sozinho. Não quero que todos os meus anos trabalhados, longe de vocês e longe dela sejam em
vão. Por isso eu preciso de você. Estou velho Tyler, olha para mim... Você me compreende?
Ele nunca tinha falado sobre minha mãe abertamente e isso abre um buraco no meu peito.
Meu pai aqui na minha frente, sem armaduras. Como eu desejei ter visto esse pai antes.
– O que eu tenho que fazer para resolver isso?
– Não sei se você pode, Tyler. – Ele diz.
– Eu te prometo, eu vou mudar.
Robert balança a cabeça negativamente antes de me olhar nos olhos.
– Ok. – Ele respira fundo. – Como você sabe, inauguramos a um tempo uma sede em
Nova York. Quero te colocar como CEO, você estará a frente da empresa e de tudo que tiver de
ser feito. Essa é uma grande oportunidade para você conseguir experiência e de fato me ajudar
por lá, já que não estou conseguindo ir com frequência fazer visitas.
Me afundo na cadeira, coçando minha barba.
Tudo que eu sempre sonhei que meu pai fizesse, mesmo que eu não assumisse, era
finalmente me dar um voto de confiança. Ele precisa de mim e eu não posso decepcionar. Não de
novo.
“Os dias passam e meus olhos secam,
e eu penso que estou bem.”
Wrecked - Imagine Dragons
Guardo meu telefone e estou na farmácia do hospital conferindo algumas medicações que
foi recomendada a uma das pacientes da pediatria. Mandy estava ocupada, então resolvi vir
sozinha para adiantar o procedimento.
Consigo encontrar os remédios, separo os comprimidos e estou me preparando para sair
quando escuto alguns barulhos vindo da entrada e coisas caindo no chão. Escuto a tranca da
porta se fechar. Levo um susto e me escondo atrás de uma prateleira grande de remédios para ver
quem é, antes de sair. Ainda estou assustada com essa história do Anthony me encontrar, não
posso negar. Todo cuidado é pouco.
Reconheço as vozes abafadas, é o Anton da ala C e a Penélope da Emergência. Cara...
eles realmente vêm se pegar aqui? Não estou acreditando. Pensei que só fossem boatos. Olho
para o meu relógio e cassete são quatro e meia e eu nem vi a hora passar. A Mandy me alertou
sobre entrar nesse horário aqui.
Me sento no chão e dou uma olhada escondida, tentando não fazer barulho, e vejo que os
dois estão se beijando. Na verdade, quase engolindo um ao outro. Anton é bem maior que a
Penélope, deve ter em torno de um e noventa de altura. Vejo ele apertando a bunda dela e sobe a
mão para os seus seios.
Fico constrangida de interromper, então fico ali sentada no chão atrás da prateleira,
esperando os dois terminarem. Não pode ser que vão fazer alguma coisa aqui dentro, e eu não
sou empata foda.
– Tira, tira, tira... – Escuto Anton cochichar para Penélope e ela dá um gritinho de
empolgação.
Meu Deus, não é possível. Eles vão fazer isso. O que eu faço?
– Você é tão imenso... – Penélope diz, tentando fazer uma voz sexy.
Coloco minha mão na boca tentando abafar o riso porque a voz que ela faz é engraçada.
– Gosta do que vê, Penélope Charmosa? Vem que eu vou ser o seu King Kong. – Ele
começa a imitar o barulho de um macaco guinchando.
Nesse momento já estou mordendo meus dedos tentando segurar a gargalhada.
– Esse King Kong tem um bananão delicioso. – Ela diz e ouço ela se engasgar com o
bananão, digo, o pau do cara.
Meus olhos lacrimejam de tanto que seguro para não rir. Meu Deus! Dou uma espiada e
ele está de costas para mim, e Penélope de joelhos na sua frente. Por favor King Kong vai rápido,
só peço isso.
Eles começam a emitir alguns sons estranhos, acho que eles gostam dessa parada de
animais. Eu estou passando mal de tanto segurar para não rir alto. Eles levam apenas cinco
minutos para explodirem em gemidos, então se vestem rapidamente e saem da sala.
Espero estar tudo em silêncio para conseguir respirar. Preciso me acalmar antes de sair,
porque estou chorando de rir e minha barriga dói. A porta abre de novo e me levanto para ver
quem é.
– Te encontrei, o que aconteceu Mel? – Mandy pergunta.
– Eu estava aqui... e o Anton e a Penélope entraram, ah meu Deus! Eu não acredito até
agora.
– Não! Eu te avisei sobre entrar aqui nesse horário, Mel. – Ela me encara e já começa a
rir também.
– Mandy, eu estou traumatizada! – Digo me lembrando do gorila.
– Poupe-me dos detalhes. – Ela diz. – Mentira, quero saber tudo!
– Só digo uma coisa, eles gostam de zoológico. – Digo e minhas bochechas doem de
tanto rir.
– Tipo? – Ela pede para eu ser mais específica.
– King Kong e bananão. – Digo quase não saindo minha voz.
– Porra... E eu achando que eu era esquisita. – Ela diz, rindo junto.
Contei para ela com detalhes sobre minha experiência em presenciar o encontro do ano
no hospital, pensando que não vejo a hora de contar para o Tyler. Ele vai pirar.
Saímos e fomos até a pediatria.
– Onde vai passar o feriado de ação de graças, Mel?
– Kate me enviou mensagem mais cedo, convidando eu e os meus tios para passar com
eles. Acho que vou ir.
– As coisas estão ficando sérias entre você e o Titio Gostoso hein. – Ela me diz, sorrindo.
– Na verdade, não sei. Mas sim, estou bem próxima dele agora. Estou curtindo essa fase
de não ter compromisso, Mandy.
– Eu fico feliz por você, de verdade.
– Mas e você, Mandy? Não tem ninguém? Onde vai passar o feriado?
– Bem, na verdade estou conhecendo melhor o Garret, nada sério. – Ela diz, satisfeita.
Garret é um cara engraçado e é bem bonito. Mandy é maravilhosa e merece alguém legal
como ela.
Ela então sugere:
– Podemos até marcar um encontro de casal qualquer dia.
– Acho que não vai rolar Mandy, eu e o Tyler não somos um casal.
– Não? E por que você tocou no nome dele se eu não citei nomes? – Ela arqueia as
sobrancelhas.
– Espertinha! Estou te entendendo...
Travo quando vejo o King Kong, digo, Anton vindo até nós.
– Me tira daqui, não vou ser capaz de encarar ele.
– Oi Enfermeira Mandy e Doutora Melanie. – Ele sorri, exibindo seus dentes
exageradamente perfeitos e brancos.
Mandy segura minha mão, mas evito olhar de volta.
– Oi, desculpe Anton, temos que ir. Temos uma emergência agora para atender. Nati, já
estamos indo! – Avistamos Natalia passando pelo corredor.
Ela nos olha sem entender nada. Mandy puxa minha mão.
– Já podem me dizer por que as duas estão rindo? – Jess pergunta assim que nos
aproximamos.
Mandy e eu finalmente nos encaramos e caímos na gargalhada.
Cheguei mais cedo hoje, tomei banho e fui até o apartamento do Tyler. Decido fazer um
jantar como forma de agradecimento, tento fazer um projeto de peixe assado, comprei até um
vinho para acompanhar. Não é um dos caros que ele está acostumado, mas era o que cabia em
meu orçamento.
Ele chega e está vestindo seu terno caro de 3 peças escuro, perfeitamente ajustado ao seu
corpo alto e definido, e já vai soltando o nó da gravata e tirando o blazer, jogando em cima do
sofá. É incrível como ele é atraente sem nem fazer esforço.
Assim que me vê parada na cozinha, ele sorri.
– Oi, que surpresa boa. Chegou mais cedo. – Ele diz com um sorriso nos lábios e se
aproxima.
Sirvo vinho branco em duas taças e passo uma para ele, que apoia a taça na bancada e me
abraça, me erguendo sobre ela. Minhas pernas abraçam seu quadril e ele beija todo o meu
pescoço, subindo a minha blusa para tocar e acariciar as minhas costas. Ele fica abraçado comigo
ali por um momento, cheirando meu cabelo em silêncio.
– Tyler, está tudo bem? – Pergunto.
Seus olhos verdes me encontram.
– Na verdade, ver você aqui no meu apartamento, me vem uma memória muito fresca de
você em cima dessa bancada. – Ele diz baixo, beijando o meu pescoço.
Sua voz rouca envia uma onda eletrizante pelo meu corpo, fazendo minha pele arrepiar.
– E fazendo comida, Melanie? Não estamos comendo nada de fast food? Isso que é
surpresa. – Ele ri.
Bato nele com o guardanapo.
– Ei, não duvide dos meus dotes culinários. – Franzo minhas sobrancelhas para ele.
Ok, eu estou com medo. Não cozinho bem.
– Diga isso para o jantar que está queimando no forno. – Ele aponta e só então sinto o
cheiro ruim de fumaça.
Desço da bancada correndo para ver meu peixe que vai por água abaixo.
– Você me distraiu!
Tyler está rindo, então me viro para ele com a mão na cintura.
– E por este motivo, eu escolhi a medicina. – Suspiro alto e começo a rir. – Era para ser
uma janta diferente, então e aí, comida japonesa ou indiana?
– Indiana. – Ele escolhe e pega sua taça, se sentando no sofá. – Mas o que vale é a
intenção, não se preocupa.
Percebo que Tyler está mais sério que o normal hoje.
– Como foi seu dia, Tyler?
Ele pensa por um momento.
– Bem, nada de interessante. E o seu? – Ele pergunta com divertimento.
Pego minha taça e me junto a ele para contar da minha experiência traumática.
“E se o mundo não te aquecer,
há um cobertor de estrelas acima de você.”
London’s Song - Matt Hartke
Se tem uma pessoa que leva o feriado de ação de graças a sério, é a Kate. Ela já está a
todo vapor na cozinha, preparando o banquete para nos receber ainda mais porque está animada
pela Melanie e seus tios que estarem presentes esse ano. Ela lembra muito minha mãe, gosta de
colocar a mão na massa e assar vários tipos de carne.
Ainda não consegui contar a Melanie que vou para Nova York na próxima segunda.
Meu pai já está velho e cansado, Kate tem sua família e eu tenho que fazer isso por eles.
Não sei quanto tempo vai levar, justo agora que estávamos indo bem... Não vou mentir
que não gostei de ter minha vizinha por perto. Estou mais tranquilo, meus pesadelos pararam e
ela me traz um certo tipo de paz.
– Titio Ty, pode abrir os olhos... – Emy diz balançando no ar um pincel grande de
maquiagem. – Você está linda! – Ela continua dizendo com sua voz meiga.
Estou no chão, de pernas cruzadas, sentado de frente para ela.
Emy ergue seu espelhinho rosa da Disney para eu me ver, colocando a língua de fora.
Essa é a cara que ela faz quando está aprontando, igualzinha a que Kate fazia quando era
pequena.
Ela pintou meus olhos com sombra azul chegando até a sobrancelha e passou glitter prata
nas minhas bochechas. Também tem uma presilha de borboleta bem na frente do meu cabelo,
segurando uma mecha para trás. A mini gênia me manipulou a deixar ela me pintar, caso
contrário, iria contar a Kate que passei o dedo no bolo dela dentro da geladeira, e ela fica uma
fera quando eu faço isso.
– Meu Deus, Emily Smith! Estou fabulosa, sou a própria Britney Spears. – Eu digo a ela
com exagero, que me mostra seu sorriso com janelas divertido.
– Quer tomar um chá, senhora? – Emily me serve uma xícara de chá imaginário na
pequena pecinha de plástico rosa.
– Delicioso. – Finjo tomar o ar.
Agora tenho que tirar tudo isso antes que a Melanie e seus tios cheguem.
– Tia Ariel! – Ela grita e vai correndo em direção a porta que estou de costas.
Assim que eu me viro, lá está ela. Com um vestido branco e com o cabelo trançado, ela
sorri divertida com a criança no colo.
A expressão de Melanie é de diversão.
– Você merecia seu nome na calçada da fama, uma verdadeira diva do pop. Gostei da
purpurina, deu um toque de feminilidade no seu estilo. – Ela diz franzindo o cenho, e junta os
lábios tentando não gargalhar.
– Muito engraçado! – Sou irônico e me levanto puxando a presilha do meu cabelo. –
Como eu tiro isso, Emy?
– Eu não sei Titio Ty. – Ela responde, já se debatendo do colo da Melanie e escorrega
caindo no chão e correndo como uma criança encrencada.
– Talvez seja permanente. – Melanie diz para me assustar.
– E você não vai ajudar sua traidora? – aponto para Melanie.
– Não mesmo... Acho que deveria ficar assim o dia todo... – Ela responde erguendo o seu
celular e batendo uma foto.
– Apaga isso. – Peço e me aproximo dela.
– Não dá mais, enviei nesse momento para a Kate!
A abraço e seguro firme enquanto ela tenta escapar, gritando, enquanto faço cócegas com
meus dedos na sua costela e me aproximo ainda mais esfregando todo meu glitter nela que se
contorce de tanto rir.
– Chega, chega, chega por favor! – Ela pede sem fôlego.
A puxo para o banheiro do andar de cima para nos limparmos antes de descer.
– Quer tomar um banho? – Pergunto enquanto ela tenta tirar o glitter do rosto na torneira
da pia.
– Tyler, é a casa da sua irmã! – Ela diz incrédula.
– Melanie, fico assustado com os seus pensamentos perversos. – Digo a ela com um
sorriso malicioso.
– Você é inacreditável.
Chego perto dela e ela pega a toalha úmida que estava usando e começa a tirar a
maquiagem dos meus olhos com delicadeza. Apoio minhas mãos em sua cintura enquanto ela faz
isso.
– Tem muita maquiagem... – Ela ri e olha meu rosto.
– Você está gostosa com esse vestido. – Digo, passeando meus dedos pelos botões que
fecham ele.
– Tira a mão dos botões. – Ela ordena.
A seguro firme e ela solta um gritinho de susto quando a levanto no mármore da pia
gelado e me encosto nela.
– Tyler... – Ela me alerta e olha para os lados, como se alguém estivesse nos vendo.
– Você disse para eu tirar a mão dos botões, e eu tirei. – Digo, beijando seu ombro e
sentindo seu cheiro de baunilha, suave e doce.
– Alguém pode entrar a qualquer momento... – Ela aponta para a porta.
– Existem fechaduras para isso. – Falo baixo em sua orelha, desço minhas mãos e aperto
sua coxa, indo lentamente embaixo do seu vestido, a tocando por cima da sua calcinha de renda.
Ela se contorce em cima da pia e fecha os olhos, tentando evitar o inevitável. – Só não faça
barulho...
Avanço em sua boca, puxo seus lábios e nossas línguas se encontram. Ela deixa escapar
um gemido baixo enquanto a acaricio lentamente, então eu tampo sua boca com a outra mão.
– Caladinha. – Solto minha mão lentamente, e a beijo novamente quando volto os
movimentos.
Paramos imediatamente quando ouvimos alguém nos chamando.
– Tia Ariel, tio Ty! – Emy grita no corredor, não demora muito para vermos a tranca da
porta tentar ser aberta.
– Empata Foda. – Xingo baixinho e olho para Melanie, que está corada e tentando
retomar o fôlego.
– Só um minutinho pestinha, estamos só limpando a maquiagem. – Grito para Emy do
outro lado da porta.
É egoísmo querer ficar a sós nesse cômodo com ela? E não me importa se é a porra de
um banheiro.
Nós rimos e ajudo Melanie a descer no chão. Em seguida terminamos de nos limpar e
descemos junto com a Emy e vamos até o quintal. Meu pai, James e Kate estão todos de um lado
da mesa e do outro vejo o casal que imagino serem os tios da Melanie.
– Tia e tio, esse é o Tyler, meu vizinho e meu amigo. – Melanie aponta para mim
– Muito prazer filho, sou o John. – O homem que aparenta ter uns cinquenta anos, de
cabelo e barba grisalho, sorri e se levanta, apertando minhas mãos de forma firme.
– Finalmente estou te conhecendo, ouvi falar muito de você. Sou a Beth!
Percebo que a genética que a Melanie puxou vem dela. É uma senhora muito bonita, de
estatura baixa como a sobrinha, cabelo alaranjado longo e olhos castanhos. Ela me abraça forte e
sinto um conforto em seus braços.
– O prazer é todo meu. – Respondo.
– Obrigada por cuidar da nossa abelhinha – Beth diz sorrindo. – Aliás, vocês todos,
estamos muito felizes por ela ter vocês aqui em Los Angeles.
– Abelhinha, é mesmo? Isso quer dizer que eu sou o Zangão? – Falo baixo, provocando
Melanie.
Ela aperta minha costela em resposta.
– Imagina Senhor e Senhora Hansen, para nós é um prazer ter ela conosco. – Kate diz e
sei que ela é sincera.
– Eles estavam presos no banheiro, mamãe. – Emily diz espontânea.
Melanie arregala os olhos e quase se engasga com o vinho que estava tomando, ao menos
dessa vez não me deu um banho.
– É mesmo, filha? – Kate diz nos encarando.
A família civilizada e normal que eu gosto.
– Nós estávamos retirando a maquiagem que a Emy passou no Tyler, muito glitter. –
Melanie se explica com vergonha aos tios como se fosse uma adolescente em apuros.
– E porque você está com glitter também? – Ela pergunta.
– Eu definitivamente não sei responder essa pergunta. – Melanie se dá por vencida
tomando um generoso gole do seu vinho.
– Vou te mostrar como, pestinha! – Levanto e pego a garotinha no colo a girando de
ponta cabeça, ela gargalha pedindo por socorro.
– Bem, vou servir o jantar, porque essa conversa fica cada vez mais estranha. – Kate se
levanta e dá um tapa na minha bunda para descer minha sobrinha no chão. – Desce a heroína do
dia no chão, Ty.
Melanie e James vão junto com ela para ajudar a trazer a comida na mesa.
– Então você joga boliche, John? Sua sobrinha deu um show de habilidades conosco. –
Meu pai puxa assunto.
– Deixe-me adivinhar, ela disse que não sabia jogar... – John a conhece bem.
– Sim, e deu uma baita surra em mim e no bonitão. – James diz, apontando para mim.
– Não foi bem assim. – digo emburrado.
Meu pai e James se divertem.
– Então Melanie fala muito sobre mim, Senhora Hansen? – Pergunto a ela, aproveitando
a deixa e garantindo grandes provas para usar contra a sobrinha dela.
– Todos os dias, ela te adora.
Como suspeitei, minha irmã fez um banquete e a mesa está farta. A decoração branca em
cima da mesa está impecável. Ela termina de arrumar cada detalhe, orgulhosa, finalizando com
os talheres antigos de prata
– Então vamos começar dizendo pelo que somos gratos esse ano, eu começo em nome da
minha família – ela fica de pé e respira fundo, sorrindo. – Eu sou grata pela minha filha Emily.
Sou grata por ter um marido companheiro, pelo meu pai. Sou grata pelo meu irmão que é a
pessoa mais irritante do mundo. E sou grata por ter a Melanie e seus tios conosco hoje. Estou
muito feliz que você chegou para completar nossas vidas. – Seus olhos se enchem de lágrimas e
os de Mel também. – Agora chega ou vou chorar.
– Bem, acho que vou falar por nós dois – John diz, Beth sorri para ele e se levantam
ficando abraçados – Somos gratos a vida por nos ter dado de presente nossa abelhinha. Você é
nossa filha, e temos muito orgulho da mulher que se tornou. Somos gratos por estar aqui hoje
junto com essa família e esperamos ser muito próximos de vocês.
Melanie já está chorando, merda.
– Uau, nem sei por onde começar – ela diz secando uma lágrima. – Sou grata hoje pelos
meus pais Tio John e Tia Beth. Obrigada por acreditarem em mim e me amarem – ela sorri para
eles. – Também sou grata a essa família, me sinto em casa com vocês e isso não tem preço.
Melanie segura minha mão.
– E sou grata ao Tyler. Que é meu melhor amigo e a pessoa que está comigo em todos os
momentos desde que cheguei aqui, obrigada por ser minha âncora. – Ela diz e sorri para mim da
forma mais doce possível.
– Bem, não sou muito de me expressar dessa forma, mas quero dizer que sou grato pela
minha família. Pai, maninha, James talvez eu não goste muito de você. – Digo a ele e todos riem
– Mentira, eu gosto sim. Minha irmã não poderia ter alguém melhor ao seu lado. Sou grato pela
pestinha da minha sobrinha Emy, saiba que eu faria tudo por você. Sou grato a Beth e ao John,
por não terem medido esforços e criado essa mulher maravilhosa e irritante aqui do meu lado –
Olho para Melanie que está sorrindo. – Sou grato as estrelas, Melanie, por terem me trazido você
e por você me aceitar do jeito que eu sou. Sou grato pela sua amizade e sua companhia. – Sorrio
para ela e sinto meus olhos lacrimejarem com as verdades que acabaram de sair da minha boca
de forma espontânea.
Tento me recompor, isso foi intenso.
– Bem, minha vez – meu pai começa. – Sou grato pela minha família. Também não sou
muito bom com palavras, acho que o Tyler puxou isso de mim – ele brinca e todos riem. – Sou
grato a minha esposa por ter me dado os melhores presentes, Kate e Tyler. Saibam que tudo que
eu faço é por vocês. Sou grato a Kate por ter me dado a Emily e o James. Sou grato ao Tyler por
ter trazido a Mel. Sou grato a Melanie por ter me dado John e Beth – Ele respira fundo. – Sou
grato pela nossa vida e sou grato por estarmos tendo essa oportunidade em Nova York, muito
obrigado filho por estar indo até lá e fazer isso acontecer, sei que se mudar vai ser um desafio
para você e estou muito orgulhoso. – Ele ergue a taça de vinho em forma de brinde.
E a merda definitivamente foi para o ventilador.
Todos erguem as bebidas para o brinde. Melanie solta minha mão e me encara.
– Precisamos conversar. – Digo finalmente.
“Então me diga para ir, vou empacotar minhas malas, pegar a estrada.
Encontre alguém que te ame melhor do que eu.”
July - Noah Cyrus (Micky)
Vou seguindo as placas indicadoras de voo para Nova York, até que o encontro, é difícil
de não ver aquele homem alto e bem-vestido. Junto com ele estão Nick e Charlotte, o que me
deixa aliviada por estarem voltando para Nova York junto com ele, porque estar dentro de um
avião deve ser no mínimo aterrorizante, para alguém que tem claustrofobia.
– Mel! Que bom te ver! – Charlotte grita assim que me vê, me abraçando forte.
Nick me puxa e me abraça da mesma forma.
Encaro Tyler, que sorri por cima dos ombros de Nick.
– É que eu queria que nossa despedida fosse dramática, já viu nos filmes? A pessoa
nunca chega na hora marcada. – Digo ainda ofegante por correr pelo aeroporto todo.
Noto o olhar intenso e devastador de Tyler sobre mim.
"Voo 457 para Nova York, atenção, últimas chamadas."
– Bem, vamos indo para deixar vocês se despedirem – Nick diz. – Até breve, Ruiva
Atômica.
Os dois saem de mãos dadas e sobem a escada rolante que vai dar acesso a entrada do
avião.
– Quero meu melhor amigo de volta. – É a primeira coisa que consigo dizer de forma
clara e sincera.
– Vem aqui, pequena. – Tyler me puxa contra seu peito e me abraça forte, beijando o
topo da minha cabeça.
– Me desculpa.
– Não tem com o que se desculpar. – Sua voz é baixa, me trazendo conforto.
– Então... É isso?
– É... Melanie, obrigado por ter vindo – ele diz e tira as chaves do seu apartamento e
carro do seu bolso, colocando na minha mão. – Aqui, você pode usar quando quiser e usa com
responsabilidade, pequena.
Sorrio para ele e o abraço firme.
– Odeio despedidas. – Digo como uma criança mimada, afundando minha cabeça no seu
peito e sentindo mais uma vez o seu cheiro de perfume amadeirado.
– Eu também vou sentir sua falta. – Ele encosta os lábios na minha testa e logo após
dispara beijos por todo o meu rosto. – Vamos comigo?
– Não me peça isso por favor... Não posso, Tyler.
– Sabe que financeiramente você não precisa se preocupar. – Ele tenta me convencer.
– Tyler, meu trabalho é o meu sonho, eu não posso deixar isso de lado. Entende?
– Eu entendo e você está certa, mas estou preocupado em deixar você sozinha.
– Vou passar alguns dias na casa da Mandy, não precisa se preocupar.
Tyler se afasta de mim segurando minha mão, apenas me encarando.
"Voo 457 para Nova York, atenção, última chamada."
– Ok, só mais um abraço. – Me agarra novamente e nós rimos nos apertando.
– Vai Tyler! Quero você me ligando todos os dias, quero saber de tudo. Você vai ser um
ótimo chefe, eu acredito em você. – Digo, fazendo força para não gritar o tanto que eu gostaria
que ele ficasse em Los Angeles comigo.
– Até logo, pequena. Se cuida, por favor! – Ele diz se afastando.
Tyler pega sua mala e vai até a escada rolante, o que parece ser uma eternidade.
Não olha para trás Tyler, não olha para trás, não olha para trás.
Isso é muito brega e clichê para eu aguentar.
Quando chega ao topo, ele dá uma última olhada para trás.
Já não aguento mais e começo a chorar, acenando com a mão. Ele me lança uma
saudação militar, sorrindo, e se vira sumindo na multidão.
Boa sorte, Tyler.
“E você jamais estará sozinha,
espere por mim para voltar para casa.”
Photograph - Ed Sheeran
Quatro dias passaram voando, nem vi passar para ser clara. Depois que deixei Tyler no
aeroporto, chorei tudo o que eu tinha para chorar. Especialmente porque meus tios tiveram que
voltar para São Francisco hoje. Confesso que estou com medo de ficar sozinha nesse
apartamento, as únicas horas boas são quando Tyler me liga para jogar conversa fora. Ele
também está com dificuldades de adaptação por lá, então tento dar o máximo de apoio sem
demonstrar que estou pirando sem ele.
Mandy e eu estamos no meu apartamento pegando algumas coisas para eu passar alguns
dias na casa dela.
– Espero não te incomodar Mandy, serão só por alguns dias. – Digo, fechando minha
mala pequena colocando o Star em cima para não esquecer.
Claro que aonde eu for, ele vai comigo. Ele é minha melhor lembrança da minha melhor
companhia.
– Mas com toda certeza do mundo eu não te deixaria sozinha com um ex psicopata na sua
cola. – Mandy resmunga me avaliando, apoiada na bancada da cozinha. – Vamos ser colegas de
casa, estou empolgada.
Sorrio para ela que está com dois coques presos na cabeça, um de cada lado e algumas
mechas rosa que caem sobre seu rosto pequeno. Depois de me ajudar a conferir se eu não tinha
esquecido de nada da lista, ela pega a minha mala enquanto eu tranco a porta.
– Tenho que pegar uma coisa antes de irmos. – Aviso ela e sigo até o apartamento do
Tyler.
Mandy vem atrás como um cão de guarda.
Assim que abro a porta vem muitas lembranças frescas na memória.
– Com todo meu respeito... até o apartamento dele cheira a homem gostoso. – Mandy diz
entrando e aspirando exageradamente com o nariz pelo ambiente.
Ela se senta no sofá, se esparramando sobre ele enquanto olha para todos os cantos.
– Esse apartamento é maravilhoso, finíssimo, com um toque de elegância, esses quadros
devem ser caros. – Ela aponta para as molduras na parede.
De fato, o apartamento do Tyler surpreende quem entra ali pela primeira vez, já que é
bem decorado. Móveis caros e planejados em cada canto, cozinha toda em mármore preto, e
iluminação automatizada em led e lustres.
– Sim, ele tem bom gosto. – Afirmo.
Minha amiga se afunda ainda mais no sofá da sala e vira o pescoço, para cheirar e sentir o
couro.
– Mandy, se eu fosse você não colocaria o nariz ou a boca nesse sofá. – A aviso.
– Vocês transaram aqui? – Ela grita e se levanta imediatamente. – Por que não me avisou
antes de eu esfregar meu rosto todo aqui, Mel?
Ela se afasta do sofá e se apoia na bancada me observando com cautela e, pela minha
expressão, se esquiva rapidamente.
– Aqui também? – Ela pergunta, já sabendo a resposta.
Apenas concordo com a cabeça e começo a rir da careta de repulsa que ela faz.
– Mel, você é nojenta! Porém não te julgo, faria o mesmo, transaria com ele aqui e ali e
aqui também. – Ela diz, apontando para os lugares do ambiente.
Balanço a cabeça em negação, me viro e pego quatro pacotes no armário.
– Você está roubando o que eu acho que está? – Ela me pergunta.
– É Café Premium selecionado, caríssimo. É um pecado ficar aqui estragando. E não é
roubo, é um empréstimo. – Bufo.
– Está perdoada, mais alguma coisa que queira "emprestar"? – Mandy pergunta fazendo
aspas com as mãos.
Só aceno que não e dou uma última olhada, inalando o cheiro dele antes de fechar a
porta.
Descemos para o estacionamento e vou até a vaga do Tyler. Entro na sua Mercedes preta
e chamo Amanda para entrar também. Já que ele deixou as chaves comigo, creio que eu tenha o
passe livre.
– Esse é o carro dele? – Mandy pergunta, já abrindo a porta e se sentando, dando
gritinhos de empolgação. – Jeffrey, trás o meu espumante com cerejas, por gentileza? – Ela
estrala os dedos para um mordomo imaginário.
Dou risada e ligo o motor, ela vibra ao ouvir.
– Por favor, me diga que transaram nesse carro! – Ela grita e eu dou risada balançando a
cabeça que sim. – Olha isso Mel, eu estou toda arrepiada. – Ela me diz mostrando os pelos do
seu braço.
Chegamos até um condomínio pequeno com as casas todas iguais, a moradia da Mandy
fica no final da rua.
– Chegamos, é aqui Mel. Seja bem-vinda e sinta-se em casa! – Ela cantarola assim que
abre a porta de entrada.
A casa é simples e aconchegante como o meu apartamento, mas ainda assim é maior. Há
cortinas e decorações coloridas por todo canto, além de uma bandeira grande do México na
parede da sala e miniaturas de caveiras mexicanas em cima da pequena lareira. Mandy nunca me
falou sobre sua família ou sua descendência, também não pude reparar já que seu sotaque
americano é perfeito e eu jamais poderia imaginar.
– Mamã! Chegamos. – Mandy diz alto.
Olho para Mandy que sorri de volta para mim, ela sabe que estou surpresa. Sinto o cheiro
gostoso de comida caseira. Casa de mãe tem dessas coisas.
– Me voy hija. – Escuto uma voz bonita vindo de dentro da cozinha.
Um garoto franzino surge de dentro do corredor. Ele aparenta ter uns 10 anos e é uma
miniatura de Mandy com grandes olhos e cabelos castanhos. Ele parece envergonhado assim que
me vê.
– Gael, essa é a Melanie. Lembra da Doutora que eu falei? Aquela que não bate bem com
os parafusos? – Ela pergunta, fazendo uma careta e ele acena que sim com a cabeça, sorrindo –
Ela vai ficar conosco por alguns dias.
– Hermosa. – Ele diz com a voz fina.
Se foi um elogio, não sei.
– Muito prazer, Gael. – Digo e vejo um pequeno sorriso surgir.
– Hola querida, seja bem-vinda a nossa humilde casa – Uma mulher muito bonita que
deduzo ser a mãe da Mandy pela semelhança vem até mim e me dá um grande abraço. – Sou a
Rosa.
– Sou a Mel, muito obrigada por me receber.
Ela tem os cabelos lisos longos até o quadril, pretos como o céu sem estrelas.
– Aguardo vocês na cozinha, Gael vá lavar as mãos!
Mandy me leva até o quarto de hóspedes. Tem uma pequena cama de solteiro
devidamente arrumada para uma visita, coberta por uma linda manta amarela e bordada com
flores coloridas. Está ótimo para mim e realmente me sinto a vontade.
Percebo nesse momento que eu não sabia quase nada sobre a Mandy, e me sinto culpada
por isso.
– Sei que está com mil perguntas na cabeça, pode ficar tranquila que eu te explico tudo,
Mel! Toma um banho e desce, conversamos na mesa. – Ela diz, me mandando um beijo
enquanto fecha a porta para minha privacidade.
Verifico meu celular e tem uma chamada perdida de Tyler, que deve ter me ligado
quando estava dirigindo. Ligo de volta. Chama 3 vezes e na quarta vez ele atende.
– Você está ligando para o Disk Sexo NY: Se você quer nudes, digite 1. Se você quer
ouvir coisas obscenas, digite 2. Se você quer uma viagem a ilha do prazer, digite 3. Se quer
todas as opções, digite 4. Ou aperte 5 para ouvir as opções novamente.
Ele faz uma voz engraçada de locutor de rádio, percebo que está na viva-voz pelo eco,
então deve estar dirigindo.
– Você é inacreditável, Tyler.
– Desculpe, não foi possível entender sua escolha. Se você quer nudes, digite...
– Que merda, Tyler.
Começamos a rir.
– Já estou com saudades, pequena.
– Eu também estou!
– Onde você está agora, Melanie?
– Já estou na casa da Mandy... Agora percebo que vai ser até bom para eu a conhecer
melhor, sabe? E eu acho que vou aprender a falar espanhol.
– Muy Bueno... se você está bem, estou feliz.
– Hoje é seu primeiro dia como Chefe Oficial, como se sente?
Apesar de já estar em Nova York há uns dias, ele teve que ir atrás de algumas coisas
antes de iniciar os trabalhos.
Eu definitivamente não entendo nada de burocracia de empresas.
– Estou nervoso Melanie...pirando para ser mais exato.
– Vai dar tudo certo, Tyler. Você é o Bond, Tyler Bond!
Escuto sua risada gostosa e a ligação começa a falhar, deve estar passando dentro de
algum túnel.
A ligação cai.
Agora nossas conversas são assim.
– Bem, parece que somos eu e você, Star. – Olho para o macaco felpudo, que está deitado
na cama.
“Adoraria acordar ao seu lado.
Adoraria te abraçar perto de mim, essa noite e sempre.”
Pillowtalk - Zayn
Marquei uma reunião com todos os funcionários para iniciar o primeiro dia. Tem sido
dias longos e cansativos por mexer com tanta burocracia e papeladas, mas ainda sim meu pai e
Kate tem ajudado de longe. Nick já atuava como gerente comercial nessa sede quando se mudou
com sua esposa para Nova York, e ter ele aqui com sua vasta experiência tem me ajudado muito.
Meu pai não economizou em fazer um ambiente bonito e luxuoso para esse
empreendimento. Todos os móveis são novos, pretos com detalhes em madeira rústica. A logo
nova e moderna da Investimentos Smith estampa a parede da área da entrada.
Olho para a janela grande no centro da sala, e vejo a neve caindo do lado de fora, a
Melanie com certeza amaria isso. Depois volto meu olhar para vários rostos que eu ainda não
conheço e estão todos voltados para mim, aguardando minha posição.
– Bom dia pessoal. Para quem não me conhece, eu sou o Tyler Smith, e estou aqui para
iniciar como novo Diretor Executivo em Manhattan. Os supervisores de cada setor estarão
passando o plano de trabalho que criei. Se tiverem sugestões, estou aberto para ouvi-los, e como
meu pai, serei feliz em recompensá-los pelo trabalho árduo. Qualquer dúvida que tiverem eu fico
à disposição.
Libero todo mundo para iniciar os trabalhos e Nick e eu vamos até meu escritório.
Através das paredes de vidro, tenho a visão de todos trabalhando pelo lado de dentro. Pego o
jornal que está em cima da minha mesa e tem uma grande foto minha estampada bem na primeira
página.
– Herdeiro da Investimentos Smith chama a atenção ao assumir sede em Manhattan. Ele
é Tyler Smith, bonito, rico, jovem e solteiro. Saiba tudo sobre ele. – Leio em voz alta e começo a
rir.
– Nova York gosta de solteirões ricos. Com certeza você já está na lista dos mais
cobiçados, se prepara para ficar nos holofotes. – Nick diz dando risada e cruzando as pernas
longas.
– 29 anos, 1.90 de altura, sedutor e seu esporte preferido é basquete... Cara, isso é
insano. Sabem até a minha altura, será que sabem que cor de cueca estou usando também? E de
onde tiraram que basquete é meu esporte favorito? Eles não podem colocar isso no jornal, se eu
não falei nada. – Comento, revoltado.
– Mas basquete não é seu esporte favorito, Tyler? – Nick me olha, confuso. – E qual é,
então?
– Basquete. – Digo simplesmente.
– Inacreditável. – Ele balança a cabeça, rindo. – Só esqueceram de mencionar que o
solteiro cobiçado é apaixonado por uma tal Ruiva Atômica que espera ele em Los Angeles.
Amasso o jornal e jogo na cabeça do Nick que reclama e me mostra o dedo do meio.
– Com licença, Senhor Smith. – Uma jovem bate na porta e entra na sala. – Sou Emma
Miller, serei sua secretária. É uma honra estar aqui tendo essa oportunidade. – Diz e tenta sorrir
para parecer confiante.
Percebo que suas mãos estão trêmulas e suando quando aperta minha mão.
– Qual a sua experiência, Senhorita Miller? – Pergunto para quebrar o gelo e tentar
tranquilizar seu nervosismo.
Ela veste um terninho preto justo ao corpo esguio, possui um volumoso e lindo cabelo
com cachos que moldam seu rosto, um batom vermelho escuro desenha seus lábios contrastando
com sua pele negra.
– Me formei ano passado em Harvard, gestão financeira. Na verdade, aqui será minha
primeira experiência profissional desde que sai da sala de aula, então quero dar o meu melhor
para tudo dar certo! – Ela responde atropelando as palavras, mas percebo que está sendo sincera.
Afirmo satisfeito com a cabeça.
É bom ter mentes jovens e criativas por aqui.
– Seja bem-vinda! – Digo sorrindo – Tem alguma coisa para mim?
– Sim Senhor Smith, o The New York Times está ligando para agendar uma entrevista.
Qual o melhor horário? – Ela pergunta, levantando seu bloquinho de anotações com a caneta.
– Pode agendar as dezesseis horas, Senhorita Miller. Obrigado!
Ela acena que sim com a cabeça e se retira da sala.
Aluguei o apartamento que vou ficar no mesmo prédio de Nick e Charlotte, fica numa
área luxuosa da Upper East Side perto de vários pontos turísticos importantes. Já estou muito
longe de casa, então devo me permitir ao menos o luxo de estar longe.
Nick e eu estamos na quadra do condomínio jogando um mano a mano de basquete.
Jogávamos muito na época da faculdade e estava com saudades disso.
A neve que cai está suave e eu precisava liberar a adrenalina do dia.
– Obrigado pela ajuda de hoje na empresa Nick. – Arremesso a bola na cesta e bate na
trave, quicando para fora. – Acho que estou enferrujado.
– Tyler você me ameaçou, literalmente não tive escolha. – Ele ri e toma a bola do chão,
batendo algumas vezes antes de fazer a jogada.
– Não ameacei não... Está bem, talvez eu tenha ameaçado, mas foi por uma boa causa. –
Eu respondo tomando a bola dele e dessa vez consigo fazer uma cesta.
Olho para a aliança na mão esquerda do Nick.
Talvez eu esteja mais pensativo do que o normal hoje.
– Nick... Você e Charlotte, como você soube que era ela? – Pergunto. – Como você soube
que é a pessoa certa?
Meu amigo sorri com a minha pergunta.
– Nunca sabemos irmão, mas quando ela te escolhe, aí você percebe que é. Entendeu?
Bem, pela sua cara acho que entendeu. – Ele diz tirando sarro.
Balanço com a cabeça negativamente e nós rimos.
Nick toma a bola de mim no meu momento de distração e acerta a bola na cesta, se
pendurando no quadro. Assim que desce, ele para por um momento e me encara com seus olhos
azuis, Nickolas me conhece bem e sabe que estou a um turbilhão aqui dentro.
– Abre seu coração para o seu melhor psicólogo. – Meu amigo diz – E vamos subindo ou
a Charlotte vai nos decepar por deixar esfriar o jantar.
Sigo atrás dele.
– Me sinto injusto por estar segurando a Melanie a mim. Ela disse o que sente e eu não
soube retribuir. Não sei quanto tempo vou ficar aqui, tenho medo de machucar ela. – Digo
pensativo.
– Tyler, independente da distância ou do tempo, quando o destino une duas pessoas, ele
não separa, vocês têm um propósito. – Ele diz.
“As estrelas guiam destinos certos.”
A frase de Melanie ecoa na minha mente.
Assim que abrimos a porta o cachorro deles, pula em mim. Eles têm um Golden Retriever
caramelo de 5 anos, manco da pata esquerda, sequela de um atropelamento. O dono não o quis
mais e o abandonou. Claro que Nick e Charlotte tinham que adotar ele, são tão perfeitos que
chega a dar enjoo.
– Capitão, sentado! – Nick ordena.
O pulguento obedece, se sentando na mesma hora.
– Capitão? – Pergunto.
– Jack Sparrow. – Nick diz rindo. – Como o pirata, porque ele manca. Jack Sparrow.
Esquece, Charlotte gosta dos nomes que eu invento.
Fico encarando-o com ironia.
Mas o Jack Sparrow não é manco... Tudo bem, deixa para lá.
– Eu amo o nome dele, Nick – Charlotte grita da cozinha.
– Ao menos é melhor que o seu. – Digo só para irritá-la.
– Acho bom você parar ou eu deixo você passar fome sozinho e não vou voltar atrás até
que você beije os meus pés. – Ela retruca.
Vou até a cozinha e ligo a cafeteira.
Se é a casa do Nick e da Charlotte também é minha casa.
O cachorro chamado Jack segue meu rastro.
– Alguém quer café? – Pergunto.
– Você é esquisito. Quem toma café antes da janta? – Nick pergunta.
Penso por um momento.
– Dãa? Eu... e a Melanie. – Respondo. – Quem que não toma café antes da janta?
– Almas gêmeas, eu disse! – Charlotte diz para o Nick.
“Mas se você me amava
Por que me deixou?”
All I Want - Kodaline
A comida está bem apimentada, talvez eu deva tomar o dobro de água hoje, porém está
deliciosa, posso me acostumar com isso facilmente.
– Você é de Los Angeles Melanie? – Rosa me pergunta chamando minha atenção, com
seu sotaque diferente.
– Não, senhora. Na verdade...
– Não precisa me chamar de senhora, mi hija. Me chame de Rosa ou de Mamá, é bom
que assim você se acostuma com o espanhol. – Ela sorri e seus olhos castanhos parecem sorrir
junto.
– Mamá? É assim que se pronuncia? – Pergunto a Mandy que afirma que sim com a
cabeça. – E Rosa é um lindo nome. Minha tia Beth ama flores, principalmente rosas. – Digo
enchendo minha boca de tacos. – Mas voltando ao assunto... Na verdade, sou nascida e criada em
São Francisco. Faz pouco tempo que estou aqui.
– Amanda habla mucho, perdon... É... Amanda Fala muito bem de você. Se é amiga da
minha filha então também será a minha chica. – ela pisca.
– Chica? – pergunto.
– Minha menina. – Mandy diz, sorrindo. – Desculpe Mel... Mamá e Gael tem um pouco
de dificuldade com a língua americana, tudo que eles sabem estou ensinando a eles, e a partir de
agora você vai me ajudar.
Rosa se levanta e junta os pratos que sujamos, se negando a ter ajuda para limpar.
– Hijo de puta! – Gael grita para o vídeo game plugado na televisão.
– Cállate Gael, respeto. – Mandy o repreende dando um puxão de orelha no menino que
faz careta.
Vamos até o quarto da Amanda que também não é muito grande, mas tem uma cama de
casal bem confortável. Nos deitamos, nos espreguiçando e esticando nossa coluna até ouvirmos o
estralo.
– Pode começar a me contar toda a sua história, Mandy, estou curiosa. – Já pergunto, me
virando de barriga para baixo e apoiando as mãos no queixo para olhar para ela.
Ela sorri.
– Sabia, eu te conheço sua fofoqueira. – Ela responde sorrindo, seu cabelo rosa agora está
solto, caindo sobre os ombros.
Encaro ela e balanço a cabeça, incentivando a continuar.
– Certo, vamos lá, você merece saber... Eu tinha 17 anos quando vim morar nessa cidade,
falando no máximo 20 palavras em inglês, na esperança de realizar os meus sonhos e
proporcionar uma vida melhor a minha família. No início foi bem difícil, trabalhava para ter
moradia e o que comer como garçonete o dia todo. A menina do México em Los Angeles tentando
conquistar o seu espaço. Deixei tudo para trás para limpar chão e servir bebidas para bêbados
mal-educados. – Ela fica pensativa ao se lembrar da época.
– 17 anos, sozinha. – Fico pensando na minha amiga indefesa e sozinha aqui e sinto meu
coração apertar.
– Foi quando que em uma magnífica noite, um dos bêbados passou a mão no meu corpo
dentro do bar sem minha permissão, dei um chute bem dado nas bolas dele e a mulher que o
acompanhava bateu com uma garrafa na minha cabeça sem eu ter culpa. Me levaram para o
hospital com um belo corte, e por mais que teriam que raspar meu cabelo para dar os pontos,
aquilo de alguma forma foi mágico para mim, vendo todas aquelas pessoas em pró da minha
saúde. Os via como heróis com seus uniformes e jalecos correndo de um lado para o outro
comigo – ela diz sorrindo. – Foi aí que eu decidi o que eu queria fazer da minha vida.
– Mandy... – Tento dizer algo, mas as palavras não saem e ela sorri de volta.
Isso faz eu perceber que todos temos nossos demônios internos, a diferença é como cada
um reage com isso.
– Trabalhei mais e estudei para conseguir uma bolsa de estudos. Na época tinha uma
instituição que ajudava imigrantes. Fui falar com eles e pedi uma chance. Apareceram anjos na
minha vida que me ajudaram a arrumar diárias de faxineira, outros me ensinaram inglês, outros
me forneciam comida e abrigo. – Ela sorri – Consegui me formar e estou aqui.
– Você é uma das pessoas mais incríveis que eu conheço, Mandy! Queria ter estado aqui
para te colocar numa caixinha e cuidar de você. – Eu digo e a abraço firme. – E sua mãe e seu
irmão? Estão há pouco tempo aqui?
– Sim, há pouco mais de um ano, guardei minhas reservas mesmo ganhando pouco e
trouxe minha mãe junto com o Gael, ainda falta meu pai e meus dois irmãos mais velhos.
Estamos cuidando da documentação e é bem caro – ela diz com os olhos cheios de lágrimas. –
E... É isso, essa é minha história, você é a primeira pessoa que eu me abro sobre isso e trago na
minha casa.
– Me sinto lisonjeada. Obrigada por confiar em mim e no que eu puder ajudar estarei aqui
– digo e sorrimos uma para a outra.
Acabo dormindo junto com a Mandy depois de conversarmos sobre a vida até cair no
sono ate chegar o horário de ir para o trabalho.
– Acho que ainda não tinha pegado um plantão como esse, hoje o hospital está lotado,
isso está uma loucura. – Digo após curvar meu pescoço de um lado para o outro, tomando meu
copo de café em um único gole.
– 16 longas horas, minhas costas estão me matando. – Mandy diz, se espreguiçando e
esticando a coluna ao meu lado com a ajuda de Natalia.
– Falta muito para a gente ir embora? – Nati pergunta.
Ouvimos a sirene de emergência.
– Bem, teve sua resposta! – Digo deixando o copo e corremos até o quarto que foi tocado
o sinal.
Percebo que a sirene não é do meu setor, mas por estarmos mais próximas meu instinto
pede para eu ir até lá.
Demoramos cerca de dois minutos para chegarmos ao quarto e sou a primeira médica
disponível. Vejo na ficha e o responsável pela paciente é a Doutora Hailey.
Há uma adolescente na maca, ela está tendo uma convulsão e Neve e Garret estão
segurando-a para não se machucar.
Estou acostumada a atender pacientes, mas cada situação é sempre uma situação nova
para mim.
E essa paciente não é minha, não conheço o histórico.
– É uma crise convulsiva, Doutora Hansen – Garret, que chegou antes, começa a me
passar o que está acontecendo – Ela está com convulsões recorrentes, como quer proceder
Doutora?
– Chama a Doutora Hailey, rápido! – Peço a Nati que acena com a cabeça e sai correndo
da sala.
Me aproximo da maca para avaliar.
– Ela já tomou duas miligramas de Diazepam, vou dar agora a segunda dose. – Garret
afirma, já aplicando.
– Alguma alergia? – Pergunto rapidamente.
– Nenhuma no prontuário.
A convulsão permanece e a paciente revira os olhos se debatendo com força sobre a
maca.
– Pode aplicar Fenobarbital. – Peço a Mandy.
– Já está no soro, Doutora. – Ela afirma colocando a dosagem.
Vai, reage garota.
Ela para imediatamente de se debater e vai fechando os olhos lentamente.
– Doutora, a pressão está caindo. – Mandy avisa.
Escutamos o sinal contínuo e o monitor cardíaco acusa o coração parando de bater.
Verifico e a garota está sem pulso.
– Parada cardíaca! Doutora Hansen, o que quer fazer? – Neve me pergunta.
Mandy tira o cronômetro do bolso e começa a contagem do tempo que seu coração está
parado.
– Carrega o desfibrilador em 200 e se afastem! – Peço ao Neve, que acata minha ordem.
Apoio na região do coração da garota para liberar o choque elétrico e o impacto é forte.
– Ainda sem pulsação, 38 segundos. – Mandy checa.
– Carrega em 300. – Ordeno ao Neve que acata novamente minha instrução.
Apoio novamente no peito dela, seu corpo franzino pula da maca.
– Ainda sem pulso Doutora, 49 segundos. – Mandy afirma.
Não posso perder você, vamos, reage!
– Carrega! Carrega de novo. – Peço ao Neve que obedece prontamente.
Reage por favor.
Apoio e descarrego o choque elétrico novamente, fecho meus olhos quando faço isso
mais uma vez.
– Tem ritmo cardíaco e a pressão voltou a subir... – Mandy diz e respira fundo.
Olho para o monitor cardíaco que mostra o seu coração voltando a bater.
Doutora Hailey finalmente chega ao quarto junto de Natalia.
– Mandou bem, Doutora Hansen. – Garret diz sorrindo orgulhoso.
– Obrigada pessoal. – Respondo quase sem fôlego.
– Obrigada Doutora Melanie, salvou a vida da minha paciente. – Hailey me surpreende.
Pela primeira vez desde que estou aqui consigo olhar em seus olhos castanhos, ela apenas
acena em afirmação como forma de respeito e então aceno de volta, talvez declarando o fim de
uma competição injusta.
Me retiro do quarto e do meu plantão.
Vou até o carro de Tyler no estacionamento e respiro por um momento dentro dele.
Recebo um SMS no meu telefone na hora certa, é do meu melhor amigo.
Não imaginei que eu sentiria tanta falta dele, principalmente em dias ruins como esse.
Olho para o céu de dentro do carro tentando enxergar alguma figura, mas não consigo
raciocinar direito.
Melanie: É grave!
Sorrio sozinha.
– Boa noite, Senhorita Hansen. Seja bem-vinda ao nosso Hotel. – O recepcionista careca
com um bigode engraçado me cumprimenta, avaliando meu documento de identificação.
Ainda não sei o porquê estou fazendo isso, mas estou aqui.
– O quarto da cobertura já está preparado para você, por gentileza me acompanhe. – Ele
diz me entregando a chave e o cartão, e me indicando a passagem até o elevador – Último andar,
quarto 146. O Hotel West espera que você tenha uma experiência inesquecível – ele diz, fazendo
uma reverência.
Não sei como agir, então também faço uma reverência em resposta. Vejo ele sorrir com a
minha atitude e a porta se fecha. Claro que não era para eu fazer isso, começo a rir sozinha
dentro do elevador. Mandei mensagem para a Mandy para avisar que eu dormiria fora.
Chego ao último andar, a porta se abre e sinto um frio na barriga de ansiedade quando
adentro o corredor luxuoso e pouco iluminado. É um hotel cinco estrelas e, para ser sincera, eu
nunca me atrevi a me hospedar em um, não teria grana para isso. Tento relaxar meus ombros
enquanto caminho pelo corredor longo, procurando o número do quarto.
Chego finalmente e tenho um pouco de dificuldade para abrir a porta com o cartão, até
que consigo. Coloco o cartão no dispositivo da entrada para acender as luzes.
Cacete... esse quarto é maior que o meu apartamento, cheira a riqueza. Tem um grande
hall de entrada com móveis e cortinas pretas. Já vou tirando meu all star branco para pisar
descalça, em seguida ajusto o termostato que tem regulagem de temperatura no ambiente e no
piso.
Pareço uma criança em um parque de diversões. De repente, até esqueço do meu cansaço
do plantão. Exploro cada lugar do ambiente. Chego ao banheiro todo revestido em mármore
preto e tiro minha roupa para tomar um banho relaxante, a água quente da ducha potente vai
tirando toda a minha tensão, termino e visto minha lingerie que, por sorte, estou com uma bonita
hoje e um roupão por cima. Estou nervosa agora. Ligo o som para espairecer, e toca uma música
lenta. Vai ser boa para entrar no clima, começo a mexer o quadril e a cantar.
Vou até o quarto e tem um buquê com rosas vermelhas apoiado na cama King, junto com
um balde com gelo, champanhe e uma taça. Merda Tyler. Ele é inacreditável. Sorrio com isso,
não perco tempo e já pego a champanhe, me servindo de uma taça cheia. Tomo um gole...
deliciosa.
Meus olhos se voltam para outro pacote em cima da cabeceira com um grande laço
vermelho, vou até lá empolgada e abro o embrulho o mais rápido que eu posso até perceber ser
um Iphone novinho de última geração. Há um recado dentro da caixa que mesmo que eu saiba
que não é a letra do Tyler, percebo que ele mandou escrever.
10 dias em NY
Se tem uma coisa que estou custando a me adaptar aqui é com essa neve toda, em Los
Angeles faz sol todos os dias e peço perdão a Deus se algum dia eu reclamei disso.
Encaro o meu copo de café e depois a extensa planilha na tela do meu notebook. Tem
sido dias de trabalho árduo para conquistar meu espaço aqui. Já passou das dezoito horas, e a
verdade é que ando saindo tarde todos os dias.
O que a Melanie deve estar fazendo agora? Será que está em um plantão louco salvando
vidas, ou está sentada de pernas cruzadas e com um coque despenteado no cabelo em frente a
televisão, segurando uma xícara gigante de café, enquanto chora assistindo o filme do Will. Sim,
aquele filme que o casal não fica junto no final porque o caralho do homem resolve que quer
morrer. Inspirador…
Fica cada dia mais difícil de conversarmos com frequência. Ultimamente ela está tendo
turnos de trabalho loucos e está se preparando para o exame do Conselho de Medicina. Sei que
ela vai conseguir porque ela é incrível no que faz, mas eu queria que tivéssemos mais tempo
juntos.
– Eu tenho certeza de que no seu atestado de óbito vai constar overdose de cafeína,
imagina que morte horrorosa. – Nick chama minha atenção entrando na minha sala, rindo.
– Vai a merda, Nick – xingo e sorrio, tentando olhar para a planilha mais uma vez.
Estou cansado fisicamente e mentalmente.
– Tem mais alguma coisa que queira do seu humilde escravo? – Meu amigo pergunta e
faz uma reverência.
– Não princesa! Pode ir, vou terminar isso aqui e já vou para a casa.
– Te vejo mais tarde, e por favor Tyler, não se cobra tanto – ele diz me mandando um
beijo com as mãos antes de ir.
Dou risada. É bom ter esse idiota aqui.
Termino de revisar tudo para amanhã. Olho o relógio e já são oito e meia da noite. Estou
saindo da sala e vejo a Emma, minha secretária ainda no seu computador com seus óculos de
grau. Essa garota sai no mesmo horário que eu todos os dias e desde então temos nos aproximado
bastante. Ela falou sério quando disse que trabalharia muito para merecer o cargo...
Ela come batatinhas de fast food, enfiando cinco de uma vez dentro da boca e me vem
uma lembrança boa com uma ruiva aos pés de uma escada.
– Miller! – Grito seu nome e ela se assusta, derrubando o refrigerante no teclado do
computador.
– Me desculpa Sr. Smith. Porra, que bagunça. Quer dizer, desculpa pelo palavrão. Eu não
quis dizer isso. – Ela diz, passando o papel toalha para tentar limpar. – Aqui, terminei de revisar
esses projetos.
Ela me passa a pasta grossa com papéis, avalio os cálculos e tabelas montadas por ela,
minuciosa aos detalhes.
– Isso está muito bom, parabéns Miller. Você sabe que não precisa ficar aqui no
escritório todos os dias depois do horário junto comigo , certo? – Pergunto.
Ela acena em afirmação com a cabeça.
– Vem comigo! Vou te pagar uma bebida porque trabalhamos demais essa semana. –
Emma me olha com dúvida e curva as sobrancelhas, mas pega sua bolsinha rosa e vem atrás de
mim como se atendesse uma ordem.
Vamos até o bar da frente do escritório e nos sentamos próximos ao balcão. Emma pede
uma taça de vinho e eu pego um whisky. Não tinha vindo aqui ainda, mesmo sendo em frente ao
escritório, e só assim para me dou conta do quanto eu estou trabalhando pesado. O ambiente é
tranquilo, não há muitas pessoas e tem algumas mesas de sinuca no meio do bar. Meu celular
vibra no bolso e pego para abrir a mensagem.
Sorrio para a tela como se estivesse esperando uma mensagem dela o dia todo, bem, na
verdade eu estava esperando sim.
Estou em frente ao Staples Center, é uma arena localizada no centro de Los Angeles. O
sol está se pondo, e as luzes do lado de fora se acendem. Estou com essa mania de reparar em
todos os detalhes depois daquela noite que eu e Tyler fomos no show do Imagine Dragons.
Está lotado, as pessoas andam para todos os lados com suas camisas da equipe de
basquete, riem e conversam alto. Compro um boné para entrar no clima e pipoca com manteiga
porque é importante. Nunca assisti qualquer jogo dentro de um estádio ao vivo, então acho que
pode ser interessante.
Fico por um tempo procurando na multidão, até que Liam finalmente aparece vestindo
uma camisa amarela e roxa do time de basquete.
Eu tinha dois ingressos porque queria que a Mandy viesse comigo ao jogo. Claro, vou ter
o Tyler no telefone, mas achei que poderia ser legal ter a minha amiga comigo. Acontece que no
último momento ela teve que estender o plantão e não conseguiria vir. Liam ouviu nossa
conversa e se ofereceu para vir comigo porque, segundo ele, também é fã dos Lakers. Não
poderia dizer não e eu perderia 100 dólares, paguei muito caro para ficar na primeira fila.
– Boa noite, Doutor Patterson!
Ele sorri para mim e me encara com seus olhos azuis. Noto que ele fez a barba para vir.
Entramos e encontramos nossos lugares, nos camuflando no mar intenso de roxo que
preenche os bancos por todo o estádio, torcendo pela mesma equipe hoje. Pego meu telefone e
coloco o fone na orelha direita, já que Liam está na minha esquerda, e disco para fazer uma
chamada de vídeo.
– Para quem está ligando, Mel? – Ele pergunta curioso.
– Tyler. – respondo.
– Ah, não sabia que ele estaria junto. – Liam responde meio decepcionado.
Começo a pensar agora que talvez não tenha sido uma boa ideia aceitar a ajuda de Liam,
não quero que ele entenda errado as coisas. Tento ignorar a situação e disco o número de novo,
porque na primeira vez a ligação chamou até cair.
– Melanie, já começou? Eu estava no banho!
Tyler atende a ligação e vejo que ele está sem camisa e tirando o excesso de água do
cabelo espesso.
– Espera, isso é um boné dos Lakers? Gostei, Esquilinha!
– Sim, é para entrar no clima! – Ajusto meu boné e sorrio para ele. – Vai Lakers!
– A Mandy está aí?
– Bem, na verdade, o Liam está aqui comigo... – Assim que falo o nome do doutor ele se
aproxima do meu ombro para olhar a tela, dando um aceno para o Tyler através da câmera que
faz uma expressão nada amigável.
– Doutor Engomadinho? Porra Melanie!
– O Tyler mandou oi, Liam! – Digo, tentando sorrir para o meu amigo ao lado.
A noite vai ser longa...
– Mel, vou ao banheiro antes de começar o jogo. Quer uma bebida? – Ele pergunta antes
de sair e eu balanço a cabeça em afirmação.
Assim que Liam sai, Tyler pergunta:
– Por que você chamou ele para o nosso encontro, Melanie?
– Ele se ofereceu para vir comigo já que a Mandy não poderia. E deixa eu te contar uma
coisa: encontros são para pessoas que querem namorar! – Respondo.
– Então nesse caso, serei seu namorado!
Meu amigo diz na maior naturalidade e faz aquela expressão de satisfação, juntando seus
lábios em um pequeno sorriso, me encarando enquanto cruza seus braços.
Ele acha que me encurralou.
– Você só está falando isso porque está com ciúmes do Doutor Engomadinho... quer
dizer... do Liam. Merda Tyler, olha o que você faz comigo! – Digo e me afundo na cadeira,
bufando.
Ele me encara e quando vai dizer alguma coisa, o Liam chega se sentando ao meu lado e
me entrega um copo descartável grande. Sugo a bebida pelo canudo de uma vez pela sede da
discussão e só ai me dou conta de que é um chá gelado. Eca, faço uma careta no mesmo
momento, mas Liam não nota.
– Está bom, Mel? Não sabia que o que você queria beber. Não tinha café, então trouxe o
mesmo que o meu. – Liam me diz, tomando uma golada da sua bebida, igual a um psicopata que
não se abala com o gosto ruim.
Não vou dizer que está horrível e que odeio chá, é falta de educação.
– Está gostoso Melanie?
Tyler pergunta, se divertindo, e eu balanço a cabeça em negação.
– O segredo quando está ruim é tomar tudo de uma vez, vai, eu te ajudo.
Tiro a tampa do copo para virar de uma vez sem o canudo, e já sinto o gosto amargo do
mate.
– Faz de conta que isso é uma coca-cola, isso! Bem geladinha, com bastante gelo até o
topo do copo e com três rodelas grandes de limão. Está tão gostoso que você não quer parar de
tomar.
Dou o último gole e sinto meu estômago embrulhar.
– Nossa, estava com sede Mel! Vou buscar mais um para você… – Liam ameaça levantar
e eu seguro o seu punho.
– Não Liam, não precisa se preocupar, o jogo já vai começar – digo, e ele assente com a
cabeça e se senta de novo. Ufa.
Como um punhado de pipoca amanteigada para tirar o gosto de chá da boca.
O jogo se inicia e a plateia vai a loucura. Não entendo muito de jogos, mas confesso que
é muito emocionante, e é bem melhor ao vivo. Os jogadores são muito altos, e fazem a bola de
basquete se mover como mágica sobre suas mãos e pela quadra.
Tyler acompanha o jogo pela televisão e pelas minhas reações na ligação. É engraçada as
coisas que me leva a fazer, se não fosse por ele eu não estaria aqui, vivendo essa experiência.
O jogo é acelerado, e a outra equipe também é muito boa. O placar das duas é
aproximado em pontuações. Nossa equipe faz uma jogada perfeita e encaixa uma cesta. Todos
gritam. Depois acontece o que eu entendo que seja uma falta contra nosso jogador no meio da
quadra, porque a torcida começa a vaiar. Eu, como já estou no espírito de Lakers, começo a fazer
a mesma coisa.
– Qual é juiz? Merda, isso foi falta! – Eu grito do meu lugar. – Hijo de Puta, se vai
marcar marca para os dois lados!
E eu nem estou entendendo nada.
Olho para o Liam que está me encarando e rindo da minha reação. Ele é mais recatado,
noto que fica apreensivo, mas não se expressa muito.
– Xingamento em espanhol é novo para mim! – Tyler está chorando de rir do outro lado
da linha.
– Culpa do Gael! – Dou de ombros e rio junto, me lembrando dos palavrões em espanhol
que o menino anda me ensinando.
"Defesa! Defesa! Defesa..."
A multidão grita e bate palmas.
Fico de pé para fazer o mesmo e puxo o braço de Liam que está sentado e aos poucos se
solta.
Cesta. Todos gritam. A vitória é dos Lakers. É uma loucura. Fico arrepiada com a
comoção geral.
– Quer jantar comigo, Mel? – Liam pergunta em meio a gritaria. – Antes que você diga
não, está me devendo, lembra? Pela noite do boliche.
– Tudo bem, eu te devo. Vamos!
Liam sorri com a minha resposta.
– Te encontro na sétima avenida, Mel. Tem um restaurante italiano maravilhoso. Você
vai gostar! – Liam diz partindo.
Vou me despedir de Tyler e vejo que ele desligou a ligação, então eu envio uma
mensagem de texto.
18 dias em NY
Estou no caminho certo, confiro os gráficos na tela grande da Investimentos Smith e vejo
que só cresce. Me acomodo na minha cadeira grande preta de couro, pensando que talvez eu não
seja mais o mesmo Tyler de alguns meses atrás. Me sinto mais adulto e responsável, isso é
inquestionável. Claro que o descanso é muito pouco, mas sei que valerá a pena cada minuto.
Meu celular vibra no bolso desviando minha atenção, então pego para atender.
– Já falou com a Mel? – Kate pergunta.
– Oi Kate, eu estou ótimo. Obrigado por perguntar. – Respondo ironicamente.
– Você está bem, Ty? Desculpa, estou ansiosa. – Ela ri e grita ao mesmo tempo.
– Estou muito bem, segue o plano... Já está tudo certo por aí? As documentações? –
Pergunto.
– Tudo conforme planejado. Eles já estão embarcando no aeroporto. Nossos advogados já
cuidaram de tudo. Do México para Los Angeles, Muchacho! – Kate diz dando um gritinho de
empolgação.
– Parece que alguém andou te ensinando espanhol também? – Pergunto rindo.
– Sim, e estou adorando isso! – Kate diz.
– Como será que se diz bruxa em espanhol? – Pergunto a Kate que me xinga na linha.
Melanie me contou a história da Mandy, então liguei para minha irmã logo depois,
pedindo sua ajuda. Não é questão de fazer uma boa ação ou não. Uma família não deve ser
separada nunca e que bom que somos privilegiados e eu tenho condições de ajudar.
– Ótimo, Kate. Manda um beijo para a pestinha da Emy. Diz que estou com saudades, só
dela, não de você!
– Câmbio, desligo otário! – Kate responde.
Antes de guardar o celular dou uma olhada na foto da Melanie que coloquei de proteção
de tela após nossa conversa aquela noite. Seja lá o que for que nós temos, estamos dispostos a
tentar descobrir.
Volto a me acomodar na cadeira. Olho mais adiante e vejo uma loira caminhando rápido
pelo corredor com um vestido vermelho colado ao corpo, exaltando seu quadril largo. Seus seios
saltam por cima devido ao decote, com um grande colar de pedra verde caindo no meio deles.
Merda, Lisa Stuart. Estou fugindo dessa mulher igual diabo foge da cruz.
Escorrego para debaixo da mesa, tentando fazer com que ela não me veja. O ramal toca e
ergo apenas a mão, tocando por cima da mesa, tentando encontrar o maldito telefone.
– Senhor Smith, você sabe que sua sala é de vidro e dá para ver metade de você debaixo
da mesa, certo? – Emma diz, rindo.
– Ok, me sinto ridículo agora Miller. – Não vou ter escapatória.
Bufo e finjo pegar uma caneta debaixo da mesa e me sento na poltrona novamente. O
inimigo é astuto e usa Louis Vuitton, louco para me fazer perder o controle. Ela sorri assim que
me vê e entra na sala com a liberação de Emma.
– Bom dia, Sr. Smith! – Ela se senta na minha frente, cruzando as pernas torneadas.
Desvio o olhar.
– Você não atendeu minhas ligações...
– Sou muito ocupado, Senhorita Stuart.
Ela se levanta e vai até a janela tentando fazer meu olhar ser desviado.
– Estou com saudades de você Smith, você nunca me ligou de volta.
– Peço desculpas por isso, Lisa.
– Sou bem madura para isso, não pense que eu fiquei chorando por você. – Ela sorri
mordendo os lábios carnudos.
Volto o olhar para meu notebook.
– Agradeço por acreditar em investir conosco, eu realmente não esperava.
– Bem, quando soube da notícia que estava vindo para cá como diretor executivo fiquei
feliz, sempre confiei que você assumiria a empresa algum dia.
Subo meu olhar apenas para encarar seus olhos castanhos, devo agradecer por isso?
– Obrigado.
– Quer tomar uma bebida comigo como nos velhos tempos?
– Desculpe, Lisa. Mas vou recusar a proposta.
Ela ri.
– Eu entendo essa nova fase, mas, você é o chefe, creio que não tenha problemas de sair a
hora que você quiser.
– Não é só isso, tenho uma pessoa agora.
Lisa ri alto antes de dizer de forma debochada:
– Smith comprometido e fiel?
– As pessoas podem mudar, Lisa. – Afirmo.
Um sorriso satisfeito surge em seus lábios avermelhados.
– Realmente, é inacreditável o que acabei de ouvir.
Nos olhamos por um momento, até ela finalmente dizer:
– Por mais que eu queria que você tivesse mudado na época comigo, ela deve realmente
valer a pena. Estou realmente feliz por você, Smith.
“Então abra os olhos e veja,
o modo como nossos horizontes se encontram.”
All of the stars – Ed Sheeran
Já estamos em clima festivo e definitivamente essa é minha época favorita do ano porque
todo mundo fica mais feliz e mais bondoso. O hospital já está decorado. Arrumei até uns broches
legais de Papai Noel, meus pacientes adoraram e o Tyler também, mesmo ele não gostando
muito de Natal.
Guardo meu celular no bolso do jaleco e volto a tomar meu café, encarando a parede de
tijolos brancos depois de um dos meus pacientes de cinco anos passar mal e vomitar em mim. As
maravilhas que a medicina me proporciona, mas não me incomodo nenhum pouco. Me limpo e
já estou pronta novamente para ver aqueles anjinhos do bem.
Estou em um quarto na ala D do hospital, onde guardam as macas novas. Descobri que é
um bom ponto de descanso e bom para pensar sozinha. O problema é que meus amigos me
seguiram, então descobriram meu esconderijo secreto. Péssimos. Todos eles, péssimos!
Ao meu lado estão sentados Neve e Garret, e na maca da frente está Nati, esparramada
como se estivesse em sua cama. Ross e Collin chegam depois e se deitam do lado para tirar um
cochilo, eles são mais quietos, mas mesmo assim estão sempre presentes nas reuniões de
condomínio. Me lembro da noite da boate, Mandy dizendo que os melhores estariam naquela
mesa. E não é que ela estava certa?
Por falar nela, cadê a Mandy?
– Meu Deus que dor de cabeça. – Garret reclama do meu lado.
– Cuidado pode ser tumor, ou aneurisma, Garret. – Eu digo com ironia.
– Muito engraçado, Hansen! – ele revira os olhos.
– Seu senso de humor é questionável. – Neve diz para mim e bate na minha mão
estendida.
– Esse hospital ainda vai nos matar de exaustão – Nati reclama, olhando para o teto. –
Qualquer dia eu desmaio no meio do corredor, eu juro!
– Não mata não, Doutor Flinn está aqui desde a inauguração do hospital em 1975 e
detalhe, ele já tinha cinquenta anos de carreira nessa época. Isso é tipo o Jurassic Park para ele –
Neve responde, fazendo todo mundo rir.
– Bem pessoal, são quatro e meia, King Kong já deve estar descascando seu bananão. –
Garret lembra, olhando para seu relógio de pulso.
– Garret, você é péssimo!
E eu não consegui esquecer do bananão e nem da Penélope Charmosa, claro que Mandy
contou para todo mundo sobre o ocorrido.
A porta é escancarada de repente e todo mundo se assusta.
– Cheguei, seus putos! – Mandy grita, fazendo o maior barulho.
– Mandy, eu sou cardíaco, pelo amor de Deus. – Neve reclama com a mão sobre o
coração enquanto todo mundo ri.
– Do que estão falando? – ela pergunta, já se sentando em uma cadeira de rodas vaga.
– Sobre como nossas vidas são tristes e solitárias. – Nati fala.
– Natalia, sua vida não é triste, você precisa é transar! – Mandy diz. – Quem se habilita?
Neve e Garret que não são bobos erguem a mão instantaneamente.
– Não vou transar com nenhum de vocês – Ela revira os olhos.
– Mesmo assim eu fico a disposição. – Garret diz e lança uma piscadinha para Nati. –
Sou muito bom de cama, é o que elas dizem.
– Eu já estou em outra não adianta me olhar com esse olhar não. – Minha amiga revida
quando Garret a encara.
– Só um remember. – Ele diz fazendo beicinho a ela que ri alto.
– Vai ficar querendo.
Olho para Mandy, tentando entender. Os dois estavam juntos até esses dias... Queria que
minha vida se resolvesse rápido igual os seus romances.
– Onde você estava, Mandy? – Pergunto, olhando para ela.
– Fiquei presa no elevador. – Ela diz e fica vermelha, tentando disfarçar.
– Sozinha? – pergunto.
– O quê? Sim, sozinha! – Ela responde.
Sei que está mentindo.
– Ok, eu não digo mais nada. Bom, preciso de mais café. – Afirmo e me levanto.
Mandy e eu saímos do hospital e somos pegas de surpresa com a Kate nos esperando do
lado de fora com os braços cruzados, encostada na sua BMW preta. Ela veste um vestido branco
estampado de flores amarelas e salto alto fino de verniz.
– Pela sua cara de surpresa, o meu irmão não falou com você. – Ela diz e me abraça forte,
me esmagando em seu peito.
Devolvo o abraço apertado. Nós conversamos quase todos esses dias por ligações, não
conseguimos nos encontrar devido a minha rotina. Senti saudades de ver ela pessoalmente.
– Você deve ser a Mandy, muito prazer! Sou a Kate Smith! – Ela se afasta de mim e
abraça a minha amiga da mesma forma que me abraçou.
– Você é a mulher mais cheirosa e mais bonita que eu já vi na minha vida! – Ela diz
impressionada, admirando a Kate assim que se afasta.
Começo a rir, nem eu sei de onde ela tira essas coisas.
– Você é linda, e amei seu cabelo rosa. – Kate responde e abre um grande sorriso – Bem,
estou amando os elogios e queria gravar para o Tyler ouvir, mas tenho que sequestrar vocês duas
agora – ela diz, abrindo a porta e nos empurrando para dentro do carro.
Kate só para de dirigir quando chegamos em frente ao aeroporto. Mandy me olha sem
entender nada quando descemos do carro e entramos aguardando na área de desembarque
enquanto as pessoas vêm e vão. Kate me olha de vez em quando e sorri entusiasmada.
– Kate o que está acontecendo? – pergunto baixinho.
– Eu não acredito! – Mandy quase grita se vira para mim com os olhos cheios de
lágrimas.
Não entendo o que está acontecendo. Só me dou conta quando Mandy sai correndo em
direção a um homem muito familiar e o abraça forte. Ele é alto e a tira do chão, a girando no ar.
Outros dois jovens se juntam e os abraçam. Seu pai e seus irmãos. Olho para Kate que me abraça
de lado.
– Não agradeça a mim Mel, agradeça ao Ty. A ideia foi dele. – Ela diz, secando as
lágrimas com um lenço de papel.
Ele não me contou que faria isso. Isso é... incrível.
Volto meu olhar para Amanda e sua família, fico arrepiada e emocionada.
No fim das contas o destino é uma coisa engraçada, hoje aproximou pessoas para unir
outras.
O destino age quando você não está realmente esperando por ele, e é aí que você percebe
que as pessoas vão surpreender você de todas as formas possíveis. De vez em quando as pessoas
vão se superar, fazendo você acreditar que realmente o bem existe nesse mundo tão caótico.
Eu conheci o mal e estou conhecendo o bem de perto.
E Tyler, é a razão para eu perder o meu fôlego.
“Nada me preparou para
o que o privilégio de ser seu faria.”
Turning Page- Sleeping At Last
Feriado de 4 de Julho. Estou no volante do meu carro... Toca Vienna na rádio, e uma
mão com aliança dourada e aparador de diamante branco aumenta o volume. Olho para o meu
lado, e minha mãe dança ao som de Billy Joel. Ela ama essa música porque se lembra da sua
adolescência rebelde, ela canta os versos enquanto dou risada. "Canta comigo Ty!", permaneço
em silêncio até ela me cutucar incansavelmente, fazendo com que eu ceda e cante cada palavra.
Ela veste um suéter vermelho de lã e aparenta ser muito mais jovem do que realmente é.
Seu cabelo preto encaracolado está solto hoje o que não é normal, ela sempre o prende em um
rabo de cabelo alto para domar os fios. Assobiamos junto com a música. Tem chovido a semana
toda, mas hoje de longe é o pior dia, não é possível ter muita visão da estrada então estou indo
devagar.
Fomos até a empresa fazer uma surpresa para o meu pai, mas nos desencontramos:
quando chegamos, ele tinha acabado de sair... "O pai trabalha demais, mais um feriado sem
estar com a gente." Resmungo. "Tenha paciência com ele filho, isso é o sonho e a vida dele. Nós
como família temos que apoiar." Ela diz calma. Minha mãe nunca reclamava, mas eu sei que
sentia falta dele em casa. "Eu paro de reclamar só se você disser que sou seu filho favorito”. Eu
digo. "Você é incrível Ty, mas sabe que eu não posso escolher. Você e a Kate são os grandes
amores da minha vida, não me arrependo de nada." Dou uma olhada de lado e vejo que ela que
está sorrindo. Nosso dia foi perfeito, nada estragaria isso.
Volto minha atenção para a pista, focando na próxima curva, "Mãe eu te am..." Minha
fala é interrompida quando o pneu traseiro estoura e escutamos um enorme barulho. Sentimos o
impacto. Meu primeiro impulso é tentar usar o freio. Tudo é muito rápido, não dá para
raciocinar. Perco o controle do volante que gira na minha mão e não vejo mais nada. Minha
vida passa diante dos meus olhos em questão de segundos, enquanto o carro capota sabe sei lá
quantas vezes, até que para de ponta cabeça. Só escuto o silêncio. É uma estrada afastada e vejo
as árvores de perto quando olho para frente. Devemos ter caído do viaduto. Desmaio e acordo
algumas vezes, sentindo o sangue escorrer da minha testa e pingar no teto do carro. “Mãe, você
está bem? Mãe!". Não consigo vê-la e ela não me responde. Tento sair com a força que consigo
fazer e sei que minha perna está presa entre as ferragens porque não consigo mover um músculo
sequer. Escuto uma voz conhecida me chamar "Tyler! Me ajuda, por favor." Olho pelo espelho
retrovisor e Melanie me olha apavorada do banco de trás. Começo a gritar, desesperado...
Acordo com o meu próprio grito abafado. Estou suado e ofegante com o coração
disparado enquanto tento retomar minha própria consciência.
Melanie!
Pego meu celular na cabeceira e minha mão treme ao procurar seu nome nas últimas
chamadas. Vejo que são mais de quatro horas. O telefone chama, ela não atende. Puta Merda,
atende essa ligação. Tento de novo, estou acelerado. Vou até a cozinha e dou um soco na
bancada de mármore em frustração.
Os pesadelos tinham parado... por que essa merda foi voltar? Por que eu não conseguia
ver minha mãe como as outras vezes? Visualizo as imagens desse dia toda vez que fecho os
meus olhos pensando no porquê saímos aquele dia, porque não ficamos com a Kate em casa,
porque não usei outra rota. Não consegui nem ao menos terminar de dizer que amava ela.
– Alô?
Melanie finalmente atende, com a voz embargada de sono.
– Me diz que você está bem.
Sinto meu coração palpitar e minha visão fica turva.
– Eu estou bem. Calma, você está bem? O que aconteceu?
Com certeza nota o meu desespero.
– Você estava no meu pesadelo daquele dia e... Por favor, me diz que você está bem! Me
perdoa por te deixar sozinha...
Começo a chorar em um ataque de ansiedade e fica quase impossível de conseguir
respirar sozinho, enquanto minhas mãos soam.
– Tyler, calma e respira.
Me sinto incapaz de responder.
–Tyler!
Melanie grita meu nome me tirando do transe.
– Nada vai acontecer comigo e você não me deixou! Entenda isso, você precisava estar
aí.
– Mas e se eu não for o que você precisa? Eu não posso te perder como eu perdi minha
mãe, Melanie. Eu não sei se sou capaz de te provar isso ou dizer o que você precisa ouvir... –
Estou em choque.
De todas as minhas crises, talvez essa seja uma das piores. Me deito no sofá e as lágrimas
descem sobre meu rosto por vontade própria entre os meus soluços.
– Tyler, me escuta?
Aceno com a cabeça como se ela estivesse me vendo e digo que sim, mas minha voz não
sai. Respiro fundo e foco na sua voz doce que sai através do telefone como um calmante.
– Eu sei que se eu precisasse você viria imediatamente.
Respiro fundo.
– Eu te ouvi em dezenas e dezenas de músicas e eu finalmente te achei. Eu te amo e você
não precisa dizer o mesmo para mim, se é isso que está te deixando mal... porque eu sei o que
você faz por mim. E isso me basta. Você me basta.
– Você é a melhor coisa que aconteceu na minha vida, Melanie.
Sei que ela está sorrindo do outro lado da linha porque o som é abafado.
As vezes é necessário passar por algumas situações difíceis na vida, e as vezes a dor vem
para descobrirmos quem realmente somos, ou para nos fazer perceber das perdas que temos tido
ao nos dedicarmos demais ao que não tem importância. A vida tem um jeito surpreendente de
nos ensinar, e uma maneira inteligente de nos fazer entender que as oportunidades são únicas, o
tempo é ligeiro, e que as pessoas que amamos não são eternas.
Já estou vestido com meu terno e confiro no meu Rolex que já passam das 7 da manhã.
Subo até o apartamento de Nick e Charlotte, sabendo que eles já devem estar acordados e
tomando café da manhã a essa hora e sem bater a porta eu entro empolgado com mais uma
missão na minha cabeça.
– Bom dia, meus animais favoritos! – Digo alto, e indo até a cozinha onde eu deduzo que
eles estejam.
– Por que você não entra, Tyler? Fique à vontade. Sente-se a mesa conosco para tomar do
nosso café! – Charlotte ironiza.
Ela ainda está de pijama e com o rosto amassado de sono e Nick sempre pontual já está
de terno como eu para mais um dia de trabalho.
– Pois eu achei que não iam convidar. Muito obrigado pela gentileza. – Sorrio e me sento
junto com eles.
Jack Sparrow se levanta e vem até mim se deitando embaixo da minha cadeira como de
costume. Passo geleia de morango em uma torrada e desço a mão estrategicamente na boca dele
para ele pegar. Esse cachorro gosta de mim, eu sei disso.
– Tyler, já falei que não é para dar comida ao Jack. – Charlotte avisa.
– Eu não estou dando nada a ele... – Respondo tomando um gole de café puro fingindo
inocência. – E tenho uma coisa para dizer a vocês.
– Sabe amor. – Nick se direciona a Charlotte – Talvez eu devesse mudar minha carreira
para psicologia.
– Primeiro, não porque eu preciso de você exclusivamente Nickolas, ninguém mais
precisa e segundo, eu preciso ir para casa.
– O quê? Você Tyler? – Charlotte pergunta.
– Não, Kim Kardashian precisa ir. Claro que sou eu!
– Ainda não sei como eu não matei você, Tyler..., mas planejo todo santo dia seu
assassinato. – Ela diz, pegando a faca e passando a geleia no pão, me fuzilando com os olhos
puxados.
– Nick, você vai ser meu advogado? – Olho para o ele e depois para a Char que ainda está
de cara feia. – E testemunha também!
– Vocês dois que se matem, eu não tenho nada a ver com isso. – Ele diz dando de ombros
e rindo. – Mas o que pretende fazer? Ainda tem muita coisa a ser feita na empresa, Ty.
– Eu sei, Nick! Por isso preciso de você... O ponta pé inicial já dei, só preciso de alguém
de confiança para colocar na linha de frente. – Digo cruzando os braços e encostando na cadeira.
Nick coça sua barba loira enquanto analisa o que acabei de dizer.
– Certo, e depois disso?
Então completo meu raciocínio:
– Com esse alguém para gerenciar, consigo acompanhar tudo de forma online e
instantânea, e visito uma vez por mês ou mais se for necessário. Ainda vou estar na frente. O
plano é brilhante!
– E temos quanto tempo para encontrar esse alguém para a direção? – Ele pergunta.
– Esse alguém é você Nick, você assume em minha ausência.
Os olhos de Nick brilham na mesma intensidade da que quando assistimos os Lakers
jogar uma final.
– Eu nem sei o que dizer...
– Nickolas, você como ninguém merece isso. Você trabalha há anos na empresa do meu
pai e não há outra pessoa melhor para trabalhar nisso comigo.
– Obrigado, Tyler!
–Durante as festas, nós iremos para Los Angeles meus amigos!
– Você disse “nós”? – Nick pergunta, sorrindo.
– Sim, vocês vão comigo para me dar apoio, depois vocês voltam para o ninho de vocês.
Charlotte interrompe, erguendo a mão direita para o alto em batendo palmas, em seguida
diz:
– Eu sabia, você não ia aguentar ficar longe dela. Se é para o amor, eu apoio!
– Eu também. Está apoiado, Tyler – Nick diz e ri.
– Eu só sei que as revistas vão ter que mudar sua manchete agora: Solteiro cobiçado
Tyler Smith se casa em Los Angeles. E estilista famosa, esplêndida e magnífica Charlotte Evans
desenha o vestido da noiva. – Charlotte dá gritinhos de empolgação. – Olha, me arrepiei Nick...
Ela grita, apontando para o braço e meu amigo se levanta para fazer uma dança mexendo
os quadris.
Céus! Por que tenho amigos assim?
Capitão Jack se levanta e começa a uivar com a bagunça que os dois fazem.
– Até você, pulguento? – pergunto olhando para ele que abana o rabo sem se importar.
“Se o mundo me levar para onde eu deveria ir,
Será, então, que eu saberei que consegui?”
The good Part - AJR
Estou tomando café da manhã com a família da minha amiga. Ela dormiu fora de casa,
então lhe mandei uma mensagem, preocupada. Mandy não respondeu com nada além de um
emoji sorridente.
Tudo está uma alegria desde que a família ficou completa. Eles falam pouca coisa em
inglês e nossa comunicação é cada vez mais engraçada já que Mandy e Gael tem que traduzir
tudo para mim.
O pai dela se chama Martin, tem o seu irmão de dezesseis anos chamado Juan e o outro
de vinte e dois chamado Javier. Rosa não parou de sorrir desde que chegaram, e isso não tem
dinheiro que pague no mundo. Eles iam sair hoje para procurar emprego já que a documentação
está toda correta graças ao Tyler.
– Por que você toma tanto café, Mel? – Gael me pergunta com seus olhinhos curiosos
enquanto estou na segunda xícara.
– Como não tomar? Isso deixa meu corpo feliz e quentinho... – Eu respondo. – Mas você
não pode tomar tanto café assim na sua idade, conselho de médica. – Pisco para ele e bagunço
seu cabelo preto com a mão.
Famoso faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. Pois é...
Peço licença e vou até o meu quarto, me deitando na cama para esticar as costas. Hoje é
dia do exame do Conselho de Medicina. Star está em cima da cadeira da escrivaninha, foi ele
quem eu abracei todas essas noites para dormir.
– Somos só eu e você, Star, e vamos estudar mais um pouco porque eu preciso passar
nessa prova hoje.
Pirada? Talvez eu seja. Virei a noite passada de olhos abertos, estudando. Meu celular
vibra sobre a cama.
Graças a Deus aparece o nome e a foto de Mandy na tela.
– Oi Mel, não precisa chamar o FBI nem me ameaçar. Desculpa pela demora em
responder!
Ela se explica antes mesmo de eu cobrar.
– Você sabe que isso é abandono de incapaz, certo? E que eu estava preocupada? Mas te
perdoo se começar me contando onde você está porque eu preciso de uma distração. – Digo
rindo e já me sento cruzando as pernas na cama para ouvir a história.
Ela respira fundo na linha.
– Na verdade, eu estou no apartamento do Liam... Não me pergunta como cheguei até
aqui, saímos do hospital, fomos ao bar, conversamos e acidentalmente acordei aqui hoje de
manhã.
Ela diz como se fosse um pecado capital, então começo a rir.
– Acidentalmente, Mandy? Você não tem vergonha na sua cara?
Depois do ocorrido na noite do jogo dos Lakers ele soube me respeitar e desde então
estamos nos dando bem como bons amigos.
– Acidentalmente... Ele é meu chefe, e olha onde eu estou. Não que eu seja a melhor
pessoa do mundo para pensar no que estou fazendo.
– É, geralmente não.
– Outro porém são os 20 centímetros Mel, meu Deus! A forma que ele me pegou ontem?
Achei que eu não ia conseguir andar hoje...
– Não me diz mais nada! – Grito para ela parar de contar os detalhes.
Ela se diverte na linha enquanto tento tirar a imagem da minha mente.
– Mandy... esses são tipos de coisas que não tem como se controlar se vocês estão em
sintonia, aproveite. Acredite, eu como ninguém sei disso. E onde ele está agora? Estou curiosa.
– Ele saiu para comprar algo para o café.
Escuto um barulho no fundo como se algo tivesse caído no chão.
– Amanda! Você está vasculhando as coisas dele?
– O quê? Preciso ver se ele não é um psicopata, stalker ou algo do tipo... Vai que ele é
casado e nunca contou? Preciso investigar isso.
– Tudo bem, procure uma foto ou uma aliança escondida. Já olhou o sótão? Pode ser que
o corpo da esposa dele esteja lá dentro. – Digo com ironia.
– Hilário!
– O quê? Você seria uma heroína. – Tento convencer ela.
Há uma pausa na ligação.
– Meu Deus, Mel!
Afasto o celular do meu ouvido com o seu grito.
– Mandy, o que aconteceu? – Pergunto assustada me levantando de imediato.
– Os livros dele estão todos separados por cores na estante e acabei de ver as cuecas
dele na gaveta separadas da mesma forma. Ele tem a temporada toda de Greys Anatomy em
DVD! Quem usa DVD hoje em dia?
Ela está incrédula e eu começo a rir.
– Não ri, Mel! Ele é estranho e eu estou com medo. Mudei de ideia, pode chamar o FBI!
– Ele não é estranho, Mandy, só é uma pessoa organizada. – Digo, pensando na
explicação mais fácil. – Você está arrumando defeitos, está com medo de sentir algo. Assume!
– O quê? Não consegui entender... Shiiiiiii...
Ela está imitando um chiado de telefone?
– Mandy.
– A ligação falhou na última parte Mel, que pena! Escutei a porta, ele está chegando,
tenho que ir. Boa sorte na prova! Se eu não der notícias em duas horas, me procure!
E ela desliga na minha cara, sem tempo para despedida.
Sozinha novamente com o meu macaco que me julga com o olhar.
Após longas horas de espera, eu finalmente tenho o resultado do meu exame em mãos.
Seguro firme e é engraçado perceber que o meu futuro depende do que está escrito aqui dentro
desse envelope.
Deixo para abrir quando saio do andar caso eu queira gritar, ou por medo de abrir
sozinha. Fico surpresa quando vejo minha equipe esperando do lado de fora. Mandy, Nati, Garret
e Neve me olham ansiosos assim que eu saio. Sorrio ao ver a cena, em São Francisco eu não
tinha amigos próximos por culpa do Anthony, então tudo é muito novo para mim.
– Qual o resultado? – Mandy pergunta ansiosa.
Abro lentamente o envelope e retiro de dentro o papel. Leio apenas a última linha.
"Melanie Hansen está aprovada."
– Passei! – Grito, erguendo o papel para cima.
Todo mundo começa a gritar e pular em comemoração. As pessoas que passam pelo
corredor nos olham como se não entendessem nada.
– Eu sabia! Essa é minha garota! Da licença pessoal que a minha doutora quer passar! –
Mandy grita e uiva para o alto como uma loba.
Passo no meio deles, na brincadeira, e todos batem palmas como se fosse uma passarela.
Um por um me abraça, parabenizando.
– Isso merece uma comemoração! – Nati diz.
Deixo o pessoal ir andando na frente e pego meu telefone para para fazer uma chamada
de vídeo com Tyler, que atende no segundo toque.
– Oi, pequena! E aí, como foi?
Ele diz sorrindo e passando a mão no cabelo castanho que cai sobre a testa.
– Só queria dizer que eu estou aprovada! – Eu grito com empolgação, dançando sozinha
enquanto ele também vibra.
– Eu sabia que você iria conseguir...
Tyler me observa por um momento e depois sorri.
– Vai passar o Natal lá na casa da Kate?
A irmã dele insistiu para que eu e meus tios fossemos passar o Natal com eles. Ela
convidou a família de Mandy também, então esse ano a festa vai ser incrível. Tirando o detalhe
de que o Tyler não estará aqui.
– Sim, já está tudo certo. Eu queria que você estivesse aqui.
– Eu também, pequena!
– Mas você vai comemorar, certo? Você não pode odiar o Natal para sempre! – Pergunto,
sei que ele não gosta dessa época.
– Talvez eu não odeie mais tanto assim... Na verdade, eu não queria comemorar, mas a
Charlotte e o Nick já decoraram o apartamento todo. E acredite, tem um presente com o meu
nome embaixo da árvore. Isso é assustador!
– Eu queria um presente com meu nome. Isso é legal!
– Se eu bem conheço a Kate, você vai ganhar vários presentes com o seu nome, confia
em mim. Ela é louca!
O sinal contínuo e ensudercedor de emergência do hospital é acionado. Liam surge
correndo pelo corredor.
– Achei vocês! Vamos pessoal, preciso de todos na ala B, agora! – Liam ordena e
seguimos atrás dele.
Me despeço de Tyler rapidamente, parece que a comemoração vai ficar para depois.
“De pé no corredor da fama,
E o mundo conhecerá o seu nome.”
Hall of fame – The script
23 dias em NY
Minha cabeça está cheia e não consigo focar na planilha de investidores. Algo me
incomoda. Me levanto e vou até a cozinha do escritório. Kate sempre diz: "Se está cansado, pare
por um momento. Levante, respire, veja outras coisas e depois volte ao trabalho."
Me deparo com Miller em frente ao bebedouro olhando para o nada como um robô, sua
expressão não está nada legal.
– Está tudo bem? – Chego perto dela que me olha assim que eu chamo, saindo do transe.
– Oi, Sr. Smith! – Ela responde sem muito entusiasmo.
Percebo que ela andou chorando, seus olhos estão vermelhos e inchados.
– Miller, vamos fazer diferente? – proponho a ela que me olha com curiosidade. –
Quando ninguém estiver olhando, você me chama de Tyler e eu te chamo de Emma. Pode ser?
Ela balança a cabeça em afirmação.
– O que está fazendo aqui sozinha, Emma? – Pergunto frisando o nome dela que sorri em
seguida.
– Eu falei com a Alisson ontem à noite sobre meus sentimentos.
– Corajosa... e como foi? – Pergunto, mesmo sabendo que pelo sua expressão não deve
ter ido muito bem.
– Foi péssimo como eu esperava, ela disse que me ama, mas não dessa forma..., mas me
prometeu que isso não estragaria nossa amizade. – Ela abaixa a cabeça. – Acho que não foi uma
boa ideia, como que vai continuar sendo a mesma coisa?
– Emma, você não fez nada de errado e estou muito orgulhoso de você. Eu não teria essa
coragem, se ela for mesmo sua amiga, ela não vai deixar isso abalar vocês. E posso te contar um
segredo? Você vai encontrar outra Alisson e o sentimento será recíproco. Agora você é livre para
amar qualquer pessoa. – Digo, tentando empolgá-la.
Miller cutuca as próprias unhas pintadas de esmalte vermelho.
– E o seu pai? Contou a ele?
– Não, não posso. Já te expliquei minha situação. Estou sem opções, se eu não quiser
morar embaixo da ponte, melhor que ele continue não sabendo.
– Tudo bem, mas uma hora você vai ter que contar.
– Ok... – Ela diz sorrindo e respira fundo absorvendo minhas palavras. – Agora preciso
voltar ao trabalho, Sr. Smith... quer dizer, Tyler... Está bem, isso é estranho. – Ela ri e se retira.
Com toda certeza, ela é a mais trabalha duro dentro dessa empresa, de longe. Sempre
chega até mim com ideias novas, é organizada, disciplinada. Conversei com o Nick sobre Emma,
ela é de confiança e eu sinto isso.
Miller é esforçada o suficiente, só fico preocupado com o fato de ela ser tão jovem.
Estou voltando para o meu escritório quando passo ao lado de um grupo de funcionários
distraídos em fofoca.
– Com certeza ela está transando com o chefe. – Uma das mulheres diz.
– Disso não há dúvidas, Miller consegue os melhores lugares das reuniões, ele acata as
ideias dela e ela praticamente saiu da faculdade agora, quem consegue isso? – O outro responde
convicto.
– Esperta é ela, porque eu ficaria com aquele homem e ainda seria privilegiada por isso. –
A outra diz, rindo. – Ouvi dizer que foram vistos conversando sozinhos no Flows.
Eles finalmente percebem que eu estou ouvindo e arregalam os olhos quando dou uma
tossida exagerada. Dou uma olhada firme enquanto cada um finalmente olha para o próprio
computador e em seguida vou até a minha sala.
– Miller, convoque uma reunião com todos para daqui 15 minutos. – Peço antes de virar
as costas e entrar.
Estou puto.
Vejo de dentro da minha sal todos os funcionários se reunindo ao centro da sala central,
em seguida saio da sala para encontrá-los, Nick está ao meu lado direito e sorri, com certeza meu
amigo já deve imaginar o que eu estou fazendo. Todos me encaram sem entender o motivo da
reunião surpresa, alguns cochicham e outros me olham com respeito.
Respiro mais uma vez, para controlar minha respiração.
– Bom dia a todos! Tenho alguns motivos para ter reunido vocês aqui hoje. Primeiro,
como todos sabem, estamos em épocas festivas e nós iremos fechar a empresa por esse período
para aproveitarem com a família de vocês. Eu, como ninguém, sei como família é algo
importante, então meu conselho é que aproveitem cada minuto ao lado deles.
Vejo os rostos a minha frente sorrirem com a notícia.
– Segundo, me desculpem pelo que eu vou dizer agora, mas é inadmissível que em pleno
século 21, as conquistas e trabalho árduo das mulheres sejam diminuídos pela aculsação de
dormir com o chefe, como eu acabei de ouvir. Que fique bem claro que se eu ficar sabendo de
mais alguém que fala esse tipo de absurdo, a porta de saída será o destino de vocês e sem
passagem de volta. Evans estará aqui para cuidar que esse tipo de fofoca não aconteça. – Digo,
olhando sério para as pessoas que falaram aquilo da Emma. Elas abaixam a cabeça na mesma
hora.
Nick balança a cabeça em afirmação e cruza os braços, olhando friamente para todos.
– Terceiro, convoquei vocês aqui porque pretendo voltar para Los Angeles ainda essa
semana e estive pensando no melhor para essa empresa desde que eu cheguei. A partir de hoje
quem assume em minha ausência será o Sr. Evans, lembrando que ainda visitarei a sede
semanalmente se for preciso e ainda estarei presente de forma online.
O silêncio prevalece.
– Por favor, venha ao meu lado agora, Miller!
Emma arregala os olhos assim que ouve seu nome ser chamado, com relutância ela vem e
se posiciona ao meu lado esquerdo.
– Senhorita Miller juntamente ao Sr. Evans serão meu braço direito e meus olhos nessa
empresa assim que iniciarmos o novo ano.
Ela está com um sorriso de orelha a orelha com a confiança que lhe passei. Levanto
minha mão direita para apertar a dela, que me devolve o cumprimento de forma firme.
– Será um prazer trabalharmos juntos! – Nick também a cumprimenta.
Ela terá eu e o Nick como apoio para ensiná-la. Eu confio nela e estou com aquele
sentimento de que eu fiz a coisa certa. Com o aumento de salário que pretendo dar, ela poderá se
sustentar sozinha, e agora ela está livre e sair de casa, se quiser, e eu estou em paz por poder ir
para casa tranquilo.
Charlotte e Nick estão patinando no gelo, então me restou ficar com o Jack sentado num
banco, observando os dois.
De grande chefe executivo, respeitado e admirado, para babá do pulguento.
Há dias que Charlotte estava querendo vir ao Wollman Rink, é uma pista de gelo pública
no Central Park. Fica a cinco quarteirões do nosso prédio.
A neve cobre todo canto, algumas árvores são decoradas por luzes de Natal coloridas
misturadas com o branco de neve nos galhos. Manhattan inteira está decorada com gorros e
sinos.
Canções natalinas são repetidas por horas como se fossem um disco arranhado com uma
só missão: uma tortura psicológica nos forçando a decorar cada palavra e cantar sem querer no
nosso subconsciente.
Melanie, por outro lado, deve estar toda empolgada. Já imagino ela vestindo um suéter de
lã vermelho e verde com uma rena fofinha bordada igual ao dos tios para combinar. Sorrio ao
pensar na cena, ela com certeza me faria usar um também.
Nick e Charlotte estão entretidos tentando patinar no gelo, Charlotte parece uma criança
maratonista em patinação e Nick... bem, ele é o Nick. Ele não sabe patinar, depois de cinco
tombos ele se levanta e consegue ficar de pé por dois segundos até cair de novo.
– Você como patinador é ótimo como homem de negócios! – Eu grito só para irritá-lo.
Eu podia ficar vendo ele cair o dia todo e me divertiria muito com isso.
– Tyler, o Central Park é grande, vai passear! – Nick grita.
– É mais divertido ver você cair... Mas tudo bem, eu vou porque o Jack está entediado. E
eu não gosto de ficar vendo um homem ser torturado pela própria esposa. – Eu digo, me
levantando para esticar as pernas.
– Cuidado Jack, você pode pegar raiva se ficar muito tempo perto do cachorro… –
Charlotte revida meu insulto.
As pessoas em volta olham para nós, um bando de malucos gritando um com o outro.
Charlotte me encara do outro lado da pista de gelo, mexe no bolso da blusa com a mão
direita e tira em seguida, levantando o dedo do meio e passando ele nos lábios como se fosse um
batom. Tampa com a tampa imaginária e guarda no bolso novamente.
Um bom lutador sabe quando é a hora de abandonar a briga. Me viro, rindo, e parto para
o mais longe dali.
Jack é um bom companheiro silencioso, tenho que ir devagar por causa da sua pata
manca. Paro na barraquinha de cachorro-quente e peço dois ao atendente que capricha nos
molhos. Como um e passo o outro para o Jack que devora de uma vez só.
– Não conta para a chata da Charlotte que eu te dei comida, certo? Vai ser nosso segredo.
– Peço ao Jack fazendo sinal de silêncio com o dedo na boca
O falso está abanando o rabo, com certeza por achar que vem mais comida.
Mando uma foto nossa para a Melanie que responde a mensagem de imediato.
Melanie: Fofo...
Hoje é véspera de Natal e eu não poderia estar mais empolgada com isso. Meus tios iam
direto para a casa de Kate mais tarde. Vou terminar meu plantão e ir para lá, só quero passar no
meu apartamento antes para pegar meu suéter de lã. Já é tradição eu ficar combinando de suéter
com os meus tios. É estranho, eu sei, mas é coisa de família e eu amo isso.
Tudo fica com o clima mais leve nessa época, até mesmo no hospital. Damos alta para
quem já está pronto para eles poderem ir para casa e comemorar. Para quem fica, os enfermeiros
noturnos preparam uma apresentação com canções para os pacientes. Todos amam isso.
– Ei Neve, como está o processo de aquecimento? – Pergunto ao meu amigo que decora
uma canção natalina de um pedaço de papel.
Estamos andando pelo corredor, indo em direção ao elevador.
Ele sorri olhando para o papel e depois me fita com seus olhos castanhos profundos.
– Claro, se não fosse enfermeiro eu seria cantor, com certeza. – Ele ri e começa a cantar
para me mostrar, mas é péssimo como eu sou em dançar.
– Ainda bem que você é enfermeiro meu amigo... ainda bem. – Digo com ironia.
– Ainda bem que a Nati canta e atua melhor, mesmo sendo rabugenta. – Ele ri.
Pelo que eu soube, a Natalia também tinha pego esse plantão noturno, já que sua família
toda é da Rússia, e esse ano ela não vai viajar até lá para comemorar.
– O que as duas marias fofoqueiras estão fofocando aí sem mim? – Mandy surge,
Já estamos nos acostumando com as suas aparições repentinas dela.
– Falando sobre a falida carreira de cantor do Neve – eu respondo rindo.
– Ouvi dizer que é trágico! – Garret também chega se intrometendo na conversa, e
acompanha nossos passos.
– Não é possível mais conversar com privacidade nesse hospital, não? – pergunto a todos
que balançam a cabeça, rindo e me acompanhando até o elevador.
– Privacidade? O que é isso – Nati chega segurando a porta nas laterais antes de fechar.
Não é possível, Liam entra logo atrás aproveitando a porta aberta.
– E lá se vai o King Kong… – Mandy aponta para o bananão que passa com pressa pelo
corredor antes da porta do elevador se fechar.
Olho para o relógio no meu pulso, e são quatro e meia, o que significa que está mais
pontual do que nunca. Começamos a rir, descontrolados.
– A vida sexual nesse hospital é ativa, todo mundo transa aqui! – Nati diz com uma
pontinha de inveja olhando para frente.
– Já falei que estou disponível, e faço seu estresse passar rápido, prometo. – Garret diz
mandando um beijinho e uma piscadinha para ela que revira os olhos.
– Nunca Garret! Prefiro sair com o Neve do que com você – ela diz, semicerrando os
olhos para ele.
– Vai que é tua, Neve! – Mandy cochicha, cutucando o ombro dele.
– Vocês são as pessoas mais malucas que eu conheço, sério! – Liam diz rindo balançando
a cabeça.
– E você está junto, não se exclua da maluquice. Com todo respeito, chefe! – Garret
responde.
– Tudo bem! – Liam responde.
Percebo uma troca de olhares entre ele e a Mandy.
A porta finalmente se abre e me despeço deles.
– Pessoal amo vocês, mas ainda tenho que passar no meu apartamento para pegar meu
suéter de rena. Mandy, encontro você mais tarde?
Decido fazer mais uma pergunta para provocá-la.
– Vai levar acompanhante?
– Vou, e vai ser você! Toma cuidado essa noite, já aviso que tenho uma queda por ruivas!
– Ela grita.
Faz tantos dias que não venho aqui, que parecem ter sido anos.
Assim que piso no pé da escada as memórias com o Tyler vêm como um banho de água
fresca na minha mente. Nós dois sentados no primeiro degrau, comendo e falando besteira um
para o outro.
Subo me sentindo um pouco ansiosa, pensando que talvez eu dê uma passada no
apartamento dele também e mate a saudade do seu perfume, cheirando suas roupas que ficaram
no closet, como uma maluca.
É... talvez eu faça isso.
Coloco a chave na minha porta e ela não gira para abrir. Estranho, eu pensei que eu tinha
trancado quando sai com a Mandy aquele dia.
Seguro a maçaneta de forma firme e abro. A luz solar ainda entra pelas janelas e me
parece que está da mesma forma que eu deixei. Entro e vou até a cozinha encher a jarra de água
para preparar um café, talvez seja bom eu ficar um tempinho aqui antes de eu ir.
– Amor... finalmente veio para casa – Escuto uma voz familiar, vindo de trás da sala.
Meu coração gela no mesmo instante, como se uma corrente elétrica passasse pelo meu
corpo, derrubo a jarra de vidro que está em minhas mãos com água fazendo uma bagunça no
chão da cozinha.
Demoro um tempo para me virar e olhar quem está a minha frente. Não pode ser... Seus
olhos azuis me encaram destacados por profundas olheiras de quem parece que não dorme há
dias, seu cabelo ondulado loiro está um pouco maior que da última vez que o vi.
Anthony, meu pior pesadelo se tornou real.
– O que... O que você está fazendo aqui? – Pergunto com a voz embargada pelo medo.
O desgraçado invadiu meu apartamento, ele está aqui.
– Amor... não está feliz por me ver? – Ele pergunta, sorrindo. – Fiquei te esperando por
dias aqui e você não aparecia. Onde você estava?
Doente psicopata. Ele estampa um sorriso no rosto que me causa um calafrio na espinha.
– Como você me achou, Anthony? – Pergunto friamente e ele percebe que eu não queria
ser encontrada.
– Agora é Anthony? Não é mais amor? – Ele ri histericamente. – Você sabe que eu tenho
amigos na polícia de São Francisco. Eu iria descobrir onde você estava mais cedo ou mais tarde,
você sabe disso, não se faça de desentendida.
Olho para a distância da porta e depois para ele de novo. Não vejo escapatória, se eu
correr agora ele vai conseguir me pegar no corredor e me trazer de volta à força.
Não faça besteira, Mel. Respiro fundo.
– O que você quer aqui? – Pergunto, voltando meu olhar para ele que me encara com um
sorriso de confiante.
– Vim te buscar para irmos pra casa, amor. Eu vou mudar, eu prometo, eu te amo tanto.
Nós podemos resolver isso como nas outras vezes, eu te perdoo por tudo! – Ele se aproxima e eu
dou um passo para trás, como reflexo. – Podemos resolver isso, eu sei que podemos.
– Não. – Falo baixo, tentando manter a calma.
Noto a cicatriz na sua testa, é da pancada que eu dei nele aquele dia.
– Não? Por que não? É por causa do cara que está te comendo? Qual é? Eu sei sobre ele.
Eu sei sobre a vida dele. É Tyler, não é?
– Meu Deus Anthony...
– Como você é patética. Ele não te quer como eu quero, ele não pode te amar como eu te
amo. Na primeira oportunidade ele vai te deixar igual seu pai!
– Você não me ama, o que você sente é doentio. – Eu digo balançando a cabeça – Olha o
que você está fazendo... À espreita, me esperando na minha própria casa.
Ele começa a ficar nervoso. Puxa os próprios cabelos, xingando e andando de um lado
para o outro da sala. Que merda. Abro a gaveta de talheres de forma delicada para que ele não
perceba, tentando caçar algo para me defender.
Ele para e me olha furioso, percebendo minha movimentação.
– Que porra você está fazendo? – Ele olha para a minha mão segurando a faca. – Está tão
cega por ele assim? Você não vê que é comigo que você tem que ficar.
– Não! Vai embora, por favor! – Tento pedir novamente.
Ele está descontrolado e minha respiração está forte e acelerada.
– Tudo bem… – Ele balança a cabeça em afirmação diversas vezes, então coloca a mão
direita para trás.
Anthony saca uma arma. Nesse momento sinto que meu chão cai sobre meus pés. Fico ali
como uma estátua, sem fazer movimentos bruscos enquanto ele anda de um lado ao outro pela
sala.
– Tudo bem meu amor, se você não vai embora comigo, não vai ficar com ninguém! Eu
não aguento isso, eu não aguento viver sem você! – Ele diz, levantando e apontando a arma para
mim.
Meu primeiro impulso nesse momento é gritar, mas não posso fazer nada que vá irritar
ainda mais ele e incentivar a atirar. Respiro fundo, tentando manter o controle.
– Tudo bem meu amor… – Reúno todas as forças possíveis, confesso que sinto vontade
de vomitar quando digo isso. – Está tudo bem... Me desculpa. Eu vou para casa com você meu
bem, calma... Você disse que vamos resolver isso, e vamos. Eu e você. Abaixa essa arma. – Digo
colocando a faca sobre a bancada e tentando me aproximar lentamente.
Ele está chorando, mas não abaixa a arma.
– É mentira! – Ele diz entre os soluços.
– Não é, eu prometo. – Tento olhar nos seus olhos, já estou perto o suficiente. – Abaixa
essa arma.
Deslizo minha mão pelo seu braço lentamente chegando até o objeto gelado em suas
mãos.
– Dê essa arma para mim, vamos esquecer que isso aconteceu e vamos para casa, ok?
Encosto minha testa em seu peito, ele beija o topo da minha cabeça e seu peito sobe e
desce acelerado.
Devagarinho, ele solta a arma sobre a minha mão. Me afasto lentamente, pegando uma
distância segura sem que ele perceba. Ainda estou tremendo, mas agora estou no controle.
– Vamos para casa, amor? – Ele pergunta tentando encontrar meu olhar.
Seguro a arma firme e aponto para ele.
– Vai embora agora da minha casa! – Anuncio com firmeza e ele me olha assustado. –
Saia daqui e nunca mais volte, seu desgraçado.
– Atira! – Ele abre os braços.
As lágrimas escorrem dos meus olhos por conta própria.
– Você é covarde, não vai atirar.
Recebo uma risada irônica.
– Eu sempre soube a pessoa podre que você é Melanie!
Tento colocar a mente no lugar enquanto ainda permaneço na mesma posição.
– Atira! – Anthony grita e caminha em minha direção.
Fecho meus olhos por um instante e aperto o gatilho sem ver nada, torcendo para que eu
tenha conseguido acabar com tudo isso.
Abro os meus olhos e percebo que Anthony ainda está de pé olhando para mim, enquanto
minha parede tem um belo buraco de bala.
– Você iria me matar mesmo? – Ele pergunta e percebo o rancor em sua voz.
Minha atenção é voltada para a porta que é bruscamente aberta. Tudo é muito rápido,
Tyler está em cima do meu ex disparando socos em seu rosto, o rosto de Anthony fica coberto
por sangue assim como ficou no dia em que quebrei uma garrafa na sua cabeça.
A polícia chega, os vizinhos do andar de cima devem ter chamado após terem ouvido o
disparo alto da arma. Tyler se afasta após muita insistência de um dos policiais, enquanto outro
prende as mãos de Anthony nas algemas. Outro policial vem até mim e então eu entrego a arma
em suas mãos e passo meu depoimento.
– Seu desgraçado, se cruzar o caminho da Melanie de novo eu juro que te mato. Te caço
até o inferno se for preciso! – Escuto Tyler o ameaçar.
– Eu não vou ficar preso. – Ele responde.
– Em Los Angeles você vai. – Tyler diz rígido.
A polícia finalmente sai com Anthony algemado.
Olho para Tyler sem entender como tudo isso acabou de acontecer, ainda estou em
choque.
– Surpresa! – Ele diz em tom de brincadeira.
Corro até ele pendurando-me em seu pescoço enquanto ele me abraça o mais forte que
consegue. Tyler dispara beijos por todo meu rosto, pescoço e cabeça.
– Você está bem? Que saudades que eu senti desse cheiro, dessa pele macia, que
saudades que eu senti desse abraço.
– Você voltou para mim? – É o que eu consigo dizer.
– Sim, minha pequena, e não irei mais embora.
Acho que nem eu e nem ele sabíamos como reagir ao nosso reencontro.
– Meu Deus, suas mãos!
Me lembro de Anthony ao ver o sangue nas mãos do Tyler, não acredito que ele
realmente esteve aqui.
Vamos até o banheiro, Primeiro deixamos a água correr para limpar o sangue, depois o
encosto na bancada e pego toalhas limpas no armário.
Tyler começa a rir.
– Juro que havia sonhado com nosso reencontro o mais romântico possível, mas lá estava
você, minha Ruiva Perigosa com a arma apontada para um cara duas vezes maior.
Começo a rir ao pensar nisso.
Ergo seu braço e dobro as mangas da sua camisa social preta, sorrio para ele e molho a
toalha, passando delicadamente pelos seus dedos que devem arder com o contato.
– Isso me lembra de uma certa noite... você cuidando do meu nariz, Doutora Hansen.
– Me pergunto até hoje o que você disse para aquele cara te bater tão forte.
– Na verdade, eu levei um soco por você. – Paro apenas para admirar a verdade em seus
olhos verdes.
Viro seu antebraço e está escrito a caneta “Melanie” em sua pele.
– O que é isso?
– Um presente com o seu nome, você disse que seria legal. – Ele diz.
Olho em seus lábios e então o beijo. Como é bom sentir seu gosto. A saudade é imensa,
puxo seus lábios com o dente e depois ataco sua boca novamente até nossas línguas se
encontrarem de forma sincronizada e desesperada.
Esperei muito por isso e ele também esperou.
– Eu te amo. – Digo baixo entre nosso beijo.
– Eu poderia ouvir essa frase o resto da minha vida. Fala de novo?
– Eu te amo!
Tyler me pega no colo e corre até o quarto enquanto me faz rir de cócegas em minhas
costelas.
“Quando você vai perceber?
Viena espera por você.”
Viena – Billy Joel
Melanie dirige o meu carro, batucando ao som da música no volante enquanto canta a
milésima canção da sua banda favorita.
Passamos na Starbucks antes para pegar café e croassaint de manteiga.
– Por que gosta tanto deles, Melanie? – Pergunto a ela que sabe as músicas até de trás
para a frente, provavelmente.
Admiro o jeito de ela ser tão intensa com pequenas coisas.
– Não sei explicar, é uma sensação boa quando coloco meus fones e me desligo do
mundo para ouvir, justamente, as músicas deles. Sou só eu e a melodia, as letras são tão
profundas. Como se cada pedacinho do meu corpo reagisse com uma sensação diferente. Acho
que é o mesmo efeito que o café causa em mim, sabe? – Ela responde, tomando uma grande
golada da sua bebida.
– Sei.
– Sabe?
– Sei, porque é o efeito Melanie sobre mim.
Ela sorri e apoia a sua mão na janela enquanto faz ondas imaginárias no vento com os
dedos.
Procuro no aplicativo a música Viena, de Billy Joel.
– Quero que você escute uma música…
– Gosto da melodia… – Melanie cantarola o início.
– Essa era a música favorita da minha mãe, e agora é a minha.
As lágrimas se acumulam em meus olhos, mas não estou triste. Estou feliz por estar
conseguindo ouvir ela novamente.
– Agora é a minha música favorita também, divide comigo?
Algumas mechas ruivas caem sobre seu rosto. Ela está tão feliz. Desde que saímos do
nosso apartamento não tirei os meus olhos dela. Meu coração chega a partir em pensar que se eu
demorasse mais alguns minutos aquele desgraçado poderia ter feito algo grave.
Encaro o céu noturno da janela e agradeço as estrelas, por me fazer chegar antes.
– Você está bem, Melanie?
– Um pouco abalada, vou confessar. Porém, aliviada por tudo ter finalmente terminado.
Ele vai ficar preso mesmo?
Seguro sua mão que está descansando em sua coxa enquanto dirige antes de dizer:
– Eu prometo para você que aquele desgraçado nunca mais vai cruzar o seu caminho.
Melanie sorri, e uma lágrima escorre dos seus olhos.
Não posso imaginar o quão difícil deve ser você se relacionar com uma pessoa por anos,
e essa pessoa te machucar dia após dia da maneira mais cruel.
Ninguém merecia passar por isso.
Enquanto estou em meus pensamentos, Melanie já estacionou o carro na frente da casa da
minha irmã, em seguida descemos e vamos até a entrada, abro a porta.
– Você realmente não gosta de bater na porta das pessoas né? – Ela diz e ergue a mão
fingindo bater.
– Não! – Digo sorrindo e estendo a mão para ela entrar na minha frente, enquanto ela
balança a cabeça.
Dou uma olhada na sua bunda que está linda em um jeans claro, olho para os lados e a
puxo de volta pela cintura, 9a encostando com força sobre a parede de entrada, dando beijos em
seu pescoço no ponto que eu sei que gosta.
– Tyler… – Sua voz sai quase como um sussurro.
– Melanie, eu juro que eu poderia ter ficado fodendo com você a noite toda e eu não me
importaria de perder o natal. – Eu digo a ela apoiando minhas mãos sobre a parede e beijando o
seu queixo até chegar a sua boca entreaberta. – Que saudade...
Me afasto só o suficiente para encarar seus olhos que deve estar pensando na
possibilidade de voltarmos para o carro assim como eu.
Sorriamos um para o outro.
– Poderíamos ir... mas... eu te recompenso mais tarde. Vou te chupar todinho… – Ela
cochicha bem próximo a minha orelha, me provocando, e lambe a minha boca.
Ela sai debaixo dos meus braços que estavam a prendendo sobre a parede. Melanie ri,
sabendo que consegue me manipular facilmente.
Vamos até a sala principal que deduzimos ser onde todos estão. Seguimos o barulho e a
voz de Kate se destaca.
– Ah, Meu Deus! Ty! Não acredito! – Kate é a primeira a me ver e se levanta
imediatamente.
Ela corre em minha direção e se pendura em meu pescoço me abraçando forte, sendo
difícil de soltá-la. Logo depois ela bate no meu ombro, com certeza brava por eu não ter contado
que viria.
– Titio Ty! – Minha sobrinha corre em seguida e levanto a pestinha do chão a segurando
no meu colo.
Também abraço meu pai e James.
Kate dá uma olhada nas minhas mãos dilaceradas e franze a sobrancelha, mas entende
pelo meu olhar que não é o momento de falar sobre isso agora.
Melanie segura minha mão e me direciona até onde a amiga está no canto da sala. Ela
segura uma taça de frisante, seu cabelo cor-de-rosa se destaca sobre o vestido preto e justo.
– Você deve ser a Mandy. Obrigado por cuidar da Melanie todo esse tempo! – Digo a ela
com um sorriso e a abraço.
Ela fica surpresa com o meu gesto, mas me abraça de volta.
– É um prazer, e ainda bem que você voltou! Achei que ia ter que internar ela na
psiquiatria por conversar tanto com aquele macaco de pelúcia. – Ela diz, caçoando da amiga.
– Obrigada Mandy, obrigada mesmo. – Melanie ironiza.
– Eu sei, ela é maluca! – Digo baixo. – Ela conversa e leva ele para todo lado. Se duvidar
tem vários deles no quarto dela escondidos, é sinistro.
Levo um tapa da Melanie no ombro:
– Desculpa, mas fui eu quem briguei com uma velha por ele?
– Sim! – Respondo ironicamente.
Recebo um belo tapa no ombro em resposta.
Os pais da Mandy são tão apaixonados, é possível ver a todo momento a troca de olhares
entre eles daqui onde estou.
Gael e Emy brincam com o Jack, fazendo uma espécie de cabo de guerra com um
brinquedo que a qualquer momento irá arrebentar.
Juan e Javier conversam algo sobre futebol, estou ficando realmente boa no espanhol
porque eu entendi quase tudo do que eles falaram.
James conversa com o senhor Robert Smith que de vez em quando olha para mim e sorri
com gentileza. É possível ver a felicidade nos seus olhos por ter a família unida de volta.
Tia Beth segura minha mão em cima da mesa. Desde que contei a ela e ao Tio John que o
Anthony apareceu, ficaram bem preocupados. Até agora não estou acreditando que tive tanta
coragem. Talvez eu tenha me subestimado muito.
Mas no final da noite, a minha maior surpresa realmente foi o Tyler ter voltado. Ele nem
me avisou, só voltou para mim. Como eu esperei por esse momento...
– Oi, Ruiva Perigosa. – Ele me abraça por trás assim que chega na sala – Preciso falar
com você, lá fora. – Diz, beijando o topo da minha cabeça.
– É mesmo? E o que seria? – Pergunto, me virando para encarar seus olhos verdes.
– Quero te mostrar uma coisa. – Responde sorrindo e segura minha mão, me puxando da
cadeira - Eu já devolvo ela, Tia Beth.
– Demorem o tempo que precisarem. – Ela responde e sorri ao Tio John.
Tyler me leva até os fundos, porém é num ponto mais afastado da casa, que eu não havia
explorado ainda e nem reparado quando vim.
É uma pequena estufa repleta de flores.
Entramos e é possível ver várias plantas de cores variadas. Do lado esquerdo há algumas
rosas azuis começando a desabrochar, o telhado todo é de vidro, sendo possível ver todo o céu
estrelado de onde estamos. O ambiente é cheiroso e trás uma memória olfativa muito boa, como
se algo fosse familiar...
– Nossa, Tyler... esse lugar... é incrível!
– Já te falei que essa era a casa onde Kate e eu crescemos? Nós costumávamos nos
esconder aqui. – Ele sorri com a lembrança. – Eu fiquei nervoso no início quando a minha irmã
não quis vender essa casa, mas sabe... Hoje eu sou grato. As lembranças daqui são a última coisa
que nos restou da nossa mãe.
– Está tudo bem, Tyler? – Pergunto ao perceber que ele ficou emocionado.
– Sim, é a primeira vez que eu entro aqui após a morte dela. – Ele olha para cima,
tentando impedir que as lágrimas rolem pelo seu rosto. Depois se aproxima de mim, tocando
minha bochecha com delicadeza. – Eu queria te mostrar essa parte da minha infância, isso é
importante para mim.
– Eu fico feliz por ter me mostrado.
Tyler se afasta novamente e começa a andar passando a mão pela bancada da estufa. Ele
veste um jeans justo e um suéter verde militar bem diferente dos seus habituais ternos bem
ajustados. Mesmo assim está bonito, de tirar o fôlego para ser exata. Seu cabelo escuro brilha
sobre a fraca luz do luar que entra pelas brechas. Seu maxilar ainda está livre da barba que
costumava usar.
– Preciso te dizer algo…
– Beleza... é agora que você me olha e diz que foi tudo um engano terrível. – Tento
brincar para quebrar o gelo.
Ele ri e balança a cabeça negativamente.
– Você nunca foi um engano para mim, Melanie! – Ele diz, sério.
Ainda estou parada no mesmo lugar e um nó se instala em minha garganta até finalmente
escutar a sua voz novamente.
– Eu ensaiei milhões de vezes o que iria te dizer na viagem de volta para cá, e a primeira
coisa que devo fazer é te pedir desculpas, Melanie: Por ser ter medo dos meus próprios
sentimentos, por não conseguir dizer o que você precisava naquela noite em que você abriu seu
coração para mim. A verdade é que eu não quero mais passar o resto da minha vida com medo
disso, do amor e das percas, e que aceitei que devo deixar meus fantasmas e dores no passado e
não deixar que eles me afetem.
As mesmas borboletas de quando encontrei Tyler pela primeira vez ainda permanecem
aqui em meu corpo, então apenas escuto o que tem a dizer sem a capacidade de reagir.
– Eu quero te amar com intensidade, brincar de descobrir desenhos em estrelas com
você. Quero contar sobre meus pesadelos ou sobre as coisas mais fúteis que eu penso. Eu quero
você com suas manias, sua risada escandalosa, seu vício por Imagine Dragons e por café, suas
expressões engraçadas e nada sutis, sua forma intensa e livre de viver, eu quero você chorando
pelo filme do Will pela milésima vez ou por qualquer filme bobo de romance. Eu quero tudo em
você. Eu te quero por completo! Talvez realmente estivesse escrito nas Estrelas que eu iria te
conhecer, e que você seria a melhor coisa que poderia ter acontecido na minha vida. E se isso
não é amor, o que mais pode ser?
Nesse momento é impossível conter minhas lágrimas, então Tyler se aproxima segurando
meu rosto enquanto encara meus olhos.
– A verdade é que eu sou loucamente e perdidamente apaixonado pela minha melhor
amiga, desde o momento em que pus meus olhos nela.
Dessa vez ele não consegue conter as lágrimas, como se estivesse falando tudo do que o
seu coração estava transbordando. Eu passo a mão pelo seu rosto, passando meus dedos na sua
cicatriz da sobrancelha, depois desço, o acariciando no queixo.
– Você é a única para mim, e não há mais ninguém!
Tyler tira do bolsa uma pequena caixinha de veludo azul marinho, quando a abre é
possível ver o belo anel dourado com um diamante na parte superior.
– Eu quero que você guarde isso com você, é o anel da minha mãe.
Eu estou sem palavras, apenas tentando assimilar tudo que ele me disse até agora.
– Tyler eu não posso aceitar.
Ele sorri de lado, então tira o anel com cuidado e então coloca em meu dedo anelar
direito.
– Sem rótulos ou pressão, apenas cuide, e quando você estiver pronta podemos falar
sobre isso.
O anel cabe perfeitamente e em seguida levanto minha mão a luz para olhar, é estranho, é
como se aquele pequeno anel dourado preenchesse um espaço e fosse destinado a estar ali.
Quando finalmente encaro Tyler o abraço forte e afundo minha cabeça em seu peito, seu
coração está acelerado. Em seguida me afasto o suficiente para tocar meus lábios nos seus que,
de imediato, ele me devolve um beijo carinhoso enquanto segura minha nuca.
– Eu te amo! – Ele diz baixo entre nosso beijo, e logo parou para pensar por um momento
no que acabou de dizer.
Espera... ele disse isso mesmo?
Nós sorrimos um para o outro antes de eu responder.
– Eu te amo, Tyler Smith..
Tenho certeza, é ao seu lado que eu quero estar o resto da minha vida.
“Tudo que eu sei é a forma que me sinto.
E tudo que eu desejo, é o que é real.”
All my life – Wild
Estamos indo para Malibu curtir a virada do novo ano e já vamos passar alguns dias de de
folga na casa de praia da família do Tyler, que fica a mais ou menos uma hora de Los Angeles.
No rádio do carro toca Yellow, do Coldplay.
Tyler estica a mão no botão de volume e aumenta o som, apertando para reprisar a
música.
– O quê? Eu gostei dessa música, Melanie. – Ele diz, sorrindo.
Balanço com a cabeça positivamente e sorrio de volta.
Chegamos e observo a cidade que é tão linda quanto onde moramos. Tyler segura minha
mão em cima da coxa, enquanto a outra apoia no volante da Mercedes, exibindo seu belo relógio.
Ele usa óculos escuros da Ray-Ban, jeans escuro e camisa branca.
Desse ângulo que o vejo, ele parece um Bad Boy Sexy.
Para com esses pensamentos pervertidos, Melanie.
Tyler mudou tanto desde a vez que o vi pela primeira vez. Ele sempre teve uma alta dose
de confiança, mas essa que ele sente hoje é, de alguma forma, aparenta ser diferente.
A semana foi cheia para ele. Sei que é difícil de resolver as coisas da empresa de longe,
sorte que tem a Emma. Conversei bastante com ela pelas chamadas de vídeo, e ela é
simplesmente maravilhosa.
– Chegamos, pequena.
Tyler com certeza foi modesto quando disse "casa de praia", isso é uma baita de uma
mansão de frente para o mar. Eu posso ver tudo de mais luxuoso pelo resto da vida e ainda ainda
não vou estar acostumada.
Pegamos nossas malas e entramos no grande hall de entrada com móveis brancos e
decoração nas paredes que com certeza valem mais que meu apartamento.
Kate logo chega para nos receber, como sempre nos dá aquele abraço de mãe e nos aperta
até perdemos o ar.
O quarto de hóspedes fica no segundo andar e é bem espaçoso, tem uma cama King com
lençóis brancos e banheiro privado. Vou até a porta da sacada que dá de frente para o mar e a
abro para sentir a brisa. Fico encarando por um momento e Tyler por trás, me abraçando e
beijando enquanto cheira o meu pescoço.
– Encare essa semana que vamos ficar aqui como uma pré lua de mel, o que acha? – ele
pergunta, me virando enquanto segura minha cintura e encosta os seus lábios nos meus com o
seu gosto de menta tão presente.
– Uma lua de mel antes de casar? Gostei, nada convencional.
– Só não pode fazer barulho enquanto todo mundo estiver aqui. – Ele cochicha entre
nosso beijo, me deixando arrepiada.
– Seu pervertido!
– Eu sei que você gosta de uma aventura, Melanie! – Ele diz e puxa o meu lábio inferior
com os dentes.
Escutamos uma música vindo do andar de baixo, não é possível definir, mas é animada.
Com a mão esquerda apoiada em minha cintura, ele ergue a direita segurando minha mão.
– Se apoie nos meus pés. – Ele diz, olhando para mim – Você tem que aprender a dançar
até o nosso casamento! .
– Okay – Respondo de forma exagerada – Ninguém entende meu dom de mexer o corpo.
Me apoio nos seus pés e ele me segura firme enquanto dançamos pelo quarto uma espécie
de valsa lenta. Me aconchego em seu peito, exalando seu cheiro até que ele nos derruba sobre a
cama.
Penso por um momento que quando fui embora de São Francisco eu não larguei tudo,
pelo contrário, eu conquistei tudo.
Deixei tudo que era de ruim para finalmente viver.
30 minutos depois...
Abro meus olhos e vejo o sol entrar pela janela grande e bater diretamente em mim,
parece que brilha ainda mais forte. É incrível... Espera… O brilho está na minha pele. O brilho
está na minha pele! Eu brilho!
– Nossa, o dela bateu forte. – Escuto Charlotte dizer ao fundo e rir.
Fico curtindo a sensação, que é estranha. Me sinto bem, porém um pouco lenta e as
palavras saem um pouco enroladas. Estou com muita fome agora.
– Meu Deus, mas eu amo tanto, tanto, tanto vocês. – Eu digo. – Mas eu preciso comer!
– Está bem, já entendemos o quanto… – Tia Beth diz.
Mais risadas. Todas estamos alteradas.
Alguém liga o som da coxinha, opa cozinha. Cara... Preciso comer.
Kate dança com Charlotte no meio de nós. Nati e Mandy se juntam. Tia Beth acabou
dormindo em cima da bancada.
Preciso de um doce, doce, doce, encontro uma lata na geladeira.
– Meninas! – Nick entra apavorado na cozinha e olha para mim enquanto estou
despejando chantili dentro da minha própria boca.
Cai um pouco para os lados e eu passo as costas da mão para limpar.
– É o Tyler, não quero assustar vocês, mas... ele meio que… machucou o dedo. – Ele diz,
coçando a nuca.
– Ai meu Deus! – Kate grita. – Quem substituiu o Nemo?
– Sabia! A Dory sempre quis ser ele. – Charlotte diz chateada.
– Que porra está acontecendo aqui? – Nick começa a rir. – Espera! Foco galera! O Tyler,
cabum – ele faz o gesto de explosão. – Se machucou. – Seu tom fica sério.
Não sei se rio ou se me preocupo com Tyler.
Todas se apavoram e me encaram esperando minha reação. Demoro um tempo para
calcular o porque estão me esperando.
– Calma, eu sou médica… a médica chegou pessoal! Calma! – Eu falo mais alto que o
normal.
Foco, Mel!
– Nick, pega um saco vazio e enche de gelo. – Ele atende meu pedido e vai até o
congelador.
– Kate, pega algumas toalhas limpas, Charlotte ajuda ela. – Peço a elas que correm ao
banheiro de visita para pegar.
– Nati e Mandy pega o kit de primeiros socorros na minha mala e venham. – Peço a elas.
– Sim, Capitã! – Elas respondem juntas.
Tia Beth ainda dorme na bancada.
Nós corremos até a praia.
Liam está agachado ao lado do Tyler que está com o rosto pálido e sentado na areia com
a camisa suja de sangue, pego a toalha limpa e enrolo na mão dele.
– Uh, isso deve estar doendo, mas vai doer só mais um pouquinho. – Digo apertando e ele
geme de dor.
– Ai meu Deus, eu não posso ver sangue. – Charlotte diz passando mal ao ver a camiseta
do Tyler.
Por algum motivo, começo a rir. Que onda que é essa?
– Você está chapada, Melanie? – Tyler pergunta.
– Não! – Tento segurar, mas é em vão, deixo escapar uma gargalhada. – Desculpa por rir.
– Inacreditável, nem me chamou sua safadinha… – Ele ri, depois geme de dor ao lembrar
do machucado em sua mão esquerda.
Pego outra toalha limpa que a Kate trouxe e faço a troca. Dou uma avaliada na mão de
Tyler, por sorte parece que o osso não estilhaçou, nos levantamos e seguimos até o carro.
– Minha mão está em suas mãos, Melanie, e é bem aquela que você gosta, cuidado. – Ele
ainda consegue fazer piada.
– Você não vai perder nenhum dedo. – Respondo e ele ri.
– Você vai ficar bem irmão, força. – Nick diz em consolo.
– Eu sou o único que não bebi, eu levo vocês ao hospital. – James diz.
– Ah, eu também vou e trago um lanchinho para o pessoal. – Kate diz, entrando no carro.
– Fala para o papai ficar de olho na Emy… – Ela pede a Charlotte.
Chegamos no hospital de Malibu rapidamente, e desço com o Tyler. Kate e James ficam
de nos buscar depois já que o paciente só pode ficar com um acompanhante.
Já estamos no quarto para alguns exames e para o raio-x.
Ele vai ficar bem, como imaginei.
– Não acredito que vamos passar a virada de ano novo no hospital e com você chapada de
maconha. – Tyler ri.
Subo na maca e me deito no peito dele. Sei que não se pode fazer isso. Mas essa noite eu
não sou a médica responsável.
– Nós somos estranhos...
– Sim, somos estranhos. – Ele concorda, rindo.
Sinto sua respiração forte.
– Dia 15 de Fevereiro. – Tyler diz.
– O quê? O que tem dia 15 de fevereiro? – Pergunto, levantando meu rosto para encarar
seus olhos.
– É o dia que vamos nos casar. Não quero esperar mais. Quero você como minha esposa.
– O quê? Agora? Tipo, daqui 2 meses? Não podemos fazer isso agora, Tyler. Você sabe
que nem me pediu em namoro ainda? É rápido. Muito rápido… – Eu digo.
Meu coração está quase saindo do peito.
– Olha, eu até apontaria os motivos, mas isso é meio que impossível agora. – Ele
responde fazendo piada.
Nós gargalhamos.
Ele me encara e sorri antes de fazer uma única e arrebatadora pergunta:
– E então, você quer casar comigo, ser minha namorada e minha melhor amiga pelo resto
da sua vida?
“Olhe para as estrelas.
Olhe como elas brilham para você.”
Yellow - Coldplay
Dia 15 de Fevereiro
Puta merda.
Me encaro diante do grande espelho, tentando vestir minha camisa. Ainda estou de cueca.
Nunca demorei tanto para me vestir assim, estou nervoso.
– Tyler! Não se vestiu ainda, cara? – Nick diz, entrando no quarto para me ajudar com a
abotoadura da camisa.
– Acho que posso desmaiar a qualquer momento – digo com sinceridade.
Respiro fundo..
– Relaxa cara, se a Ruiva Atômica fugir, eu me caso com você – Meu amigo diz com
ironia a mesma coisa que eu disse a ele no dia do seu casamento.
– Ela não vai fugir, certo? Não me leva a mal princesa, mas não gosto muito de loiro
barbudo – digo ao Nick, que ri.
– Muito engraçado – Revira os olhos.
– Qual é? Teríamos que ter um homem na relação que com lógica seria eu nesse caso.
Então você tira a barba – Eu digo para provocá-lo.
– Vai a merda, Tyler.
– Achei vocês! – Miller entra no quarto de repente.
– Finalmente. – Nick comemora.
– Vôo longo, quase que eu perco o evento do ano – ela diz a ele e dá um soquinho em seu
ombro.
Por reflexo e por ela ser mulher, eu cubro rapidamente as minhas partes de baixo.
– Relaxa, Tyler. Com todo respeito, não tem nada que me interesse aí para eu olhar. – Ela
ri, balançando a cabeça, em seguida pula na cama, ficando de barriga pra baixo e nos encarando
com a mão no queixo.
– Não precisa ofender Emma. – Ironizo.
Emma me manda uma piscada e pergunta:
– Sobre o que estão conversando?
– Estamos calculando as opções caso a noiva fuja. – Nickolas responde.
Mostro o dedo do meio para ele que se diverte com a minha irritação.
Emma veste um vestido de tule e está com a maquiagem bem-marcada. Ela veio passar os
dias aqui devido a festa, mas na segunda já volta ao trabalho que, por sinal, tem feito com
excelência.
– Meninos eu queria contar isso pessoalmente para vocês, já que eu viria para Los
Angeles... – Miller suspira, prendendo a respiração por alguns segundos. – Eu contei ao meu pai
que gosto de mulheres na semana passada.
– Puta Merda, e como foi? O que ele disse? – eu pergunto, ansioso.
– Ele disse um monte de coisas ruins e me expulsou de casa como eu tinha previsto – ela
responde e abaixa a cabeça.
– Que merda, Emma – Nick diz, chateado.
– Tudo bem gente, é sério! A parte ruim é que ele nunca mais quer olhar para a minha
cara... A parte boa é que arrumei um apartamento maneiro perto do trabalho com o salário que eu
tenho agora, que no caso vocês que pagam. – Ela ri – Eu estou bem!
– Emma, dê um tempo a ele, tenho certeza que ele ama você. Ele só precisa de um tempo
para assimilar tudo. Se não aceitar também, paciência. Nós somos seus amigos e te apoiamos,
somos sua família também. É da sua vida, que estamos falando, tudo bem? Você é uma das
pessoas mais incríveis que eu já conheci e tenho um orgulho muito grande de você – eu digo.
Ultimamente tenho falado tudo o que penso sem medo de esconder meus sentimentos.
Miller se tornou mais que uma funcionária, é uma irmã para mim e para o Nick.
Vejo os olhos de Emma brilharem, ela se levanta imediatamente e corre até mim, me
abraçando forte. Ela é magrinha e baixinha, quase que some quando se aconchega no meu peito.
– Você sabe que é estranho você me abraçar quando estou só de cueca né, Emma? – Eu
digo para encher o saco dela.
– Foda-se! – Ela diz, me abraçando ainda mais forte.
Olho para o Nick, que está sorrindo.
– Porra, que orgulho que eu tenho de vocês – Ele diz se aproximando e apertando nós
dois, em um abraço fazendo um sanduíche da Emma, que xinga baixo nós dois.
Kate entra de repente no quarto e flagra a cena.
– O que está acontecendo aqui – Kate grita – Como assim me deixaram de fora?
Kate se enfia da forma que consegue no nosso abraço coletivo. Todos rimos.
– Porque você ainda não está vestido, Tyler? Temos dez minutos, vamos! – A Bruxa já
voltou ao normal.
Nick e Emma se sentam na cama e ficam observando, enquanto Kate me ajuda com a
camisa branca e faz o nó da gravata borboleta. Visto a calça bem ajustada e o blazer sob medida
preto, combinando com os sapatos. Deixei a minha barba bem aparada. Arrumo meu cabelo com
as mãos mesmo e passo perfume e loção pós-barba.
– Perfeito – Kate diz sorrindo, olhando para mim e me avaliando da cabeça aos pés.
Ela veste um vestido nude bem bonito que foi o tom escolhido das madrinhas de honra.
– Vocês estão atrasados. – Charlotte abre a porta, espionando, depois abre totalmente
para nos ver – Tyler, minha cruz, preciso dizer que eu arrasei no vestido dela, está perfeito!
Espetacular para ser exata, você vai passar mal quando ver. – Ela diz empolgada e batendo
palmas.
– Com certeza, deve ter ficado bom mesmo por causa da modelo. – Eu digo para
provocar ela.
– Só não vou te xingar porque hoje é seu casamento, idiota! Ops, escapou... Atchim,
babaca. Esse escapou também, desculpa otário, vai a merda...Atchim! – ela diz, se divertindo,
fingindo os espirros – Crise de espirros doida, eu hein. – Ela diz com um sorriso de canto.
Mostro o dedo do meio para ela também, só para não perder o costume.
Descemos as escadas, está tudo decorado com as rosas brancas da nossa própria estufa.
Melanie e eu escolhemos a casa de Kate para fazermos nosso casamento, querendo ou não, essa
casa foi onde cresci.
De alguma maneira, eu queria ter a minha mãe presente, dessa forma sinto que ela está
aqui. Espero que ela tenha orgulho de mim lá de cima.
Vamos até o lado de fora do gramado, próximo as árvores. Há bancos de madeira dos
dois lados, já com todos os convidados presentes, que não são poucos. Até os parentes distantes
vieram, parceiros de negócio, conhecidos, amigos como a família de Mandy. Nick e Emma vão a
frente, como se fosse um aviso de que chegamos.
Todos se levantam dos bancos de madeira, ficando de pé para nos receber.
Minhas mãos tremem muito mais agora. Olho para a Kate e ela sabe que estou nervoso,
então ela sorri, me estendendo a mão.
Tem uma curva antes de chegarmos ao corredor principal que foi montado como uma
passarela. As rosas brancas também estão presentes do lado de fora, por todo lado. Escuto a
música ser tocada: Yellow, do Coldplay, versão acústica
“Olhe para as estrelas, olhe como elas brilham para você...”
Melanie quem escolheu as músicas, e eu saberia essa letra e toque mesmo que morresse e
nascesse de novo.
Quando chegamos e olho finalmente para o altar, meu coração para por alguns segundos
e fico sem fôlego com o que eu vejo.
Melanie já me espera lá na frente, ela parece um anjo. É possível ver ela sorrir e vejo suas
covinhas aparecerem de onde estou. Ela está toda de branco, o vestido é justo ao corpo exibindo
suas belas curvas, juntamente com um véu longo. Seu cabelo ruivo está preso em um coque,
exibindo ainda mais seu sorriso perfeito.
Essa mulher é linda, e eu vou me casar com ela hoje.
– Só não desmaia agora, está bem? – Kate pede rindo, mas ela já está chorando.
Sinto as lágrimas rolarem pelo meu rosto por vontade própria e sinto um frio no
estômago.
Ela me esperando no altar primeiro não é nada normal, mas somos eu e ela, então para
nós tudo que é estranho é bom.
Caminhamos até a metade, Kate me abraça e beija o meu rosto e depois me solta,
seguindo até o altar. Melanie vem me buscar, ela também chora, mas não parece nem se importar
se vai manchar a maquiagem ou não.
– Eu te amo tanto, pequena... – falo baixinho em seu ouvido enquanto ela me abraça
forte.
Ela sorri e me encara com seus olhos avelãs e segura minha mão para nos colocarmos
diante do altar que foi montado, simples e bonito.
Olho para o meu lado esquerdo e vejo Nick, que faz um sinal de positivo com as mãos.
Charlotte que, por incrível que pareça, está chorando, me flagra a observando e cochicha "não
estou chorando". Nós rimos. Kate já não tem nem lágrimas mais, James sorri satisfeito. Meu pai
encara com orgulho.
Olho para o lado direito e estão Mandy e Nati, também com seus vestidos de damas de
honra. Neve, Garret e Emma. Tio John e Tia beth sorriem para nós.
O pastor convidado se coloca na nossa frente.
– Tyler e Melanie, estamos aqui presentes hoje para celebrar essa união. Todos que os
amam estão aqui, para testemunhar o amor de vocês. O princípio do amor é nunca deixar o outro
fraquejar. Vocês sabem bem o que é isso, diante de tantos fantasmas do passado em que lutaram,
sem nunca abandonar um ao outro. Por esse motivo, quando penso em vocês, me lembro do
versículo que diz assim "O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não
se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se irá facilmente, não guarda rancor. O
amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo
espera, tudo suporta."
E eu que disse que não ia chorar...
Já estamos na festa, tudo iluminado por luzes como se fossem pequenas estrelas no
quintal.
Melanie e eu estamos no centro, dançando nossa música lenta enquanto todos observam.
A banda contratada toca, Walking The Wire, em um palco improvisado. Claro que tinha que ter
Imagine Dragons se não, não seria o nosso casamento. Ela já soltou o cabelo ruivo que estava
preso e não parou de sorrir nenhum minuto.
Ensaiamos como loucos para ela não pisar no meu pé no meio da dança, eu dou risada ao
me lembrar disso. Ela com certeza sabe no que estou pensando e dá um tapinha no meu ombro.
Escutamos o barulho de garfo batendo na taça e olhamos para o palco onde está Kate com
o microfone na mão.
– Atenção, atenção, atenção de todos. – Ela se concentra, tentando fazer com que a voz
não saia muito alta. Emy, com seu vestido bufante, segura sua mão – Quero dizer que estou
muito feliz essa noite, porque eu estava certa.
Os assobios ecoam pelo local combinado com barulho de risadas.
– Brincadeira pessoal, como madrinha de honra fiquei encarregada de fazer o discurso. E
não teria outra forma que não fosse dizendo sobre amor.
Kate respira fundo tentando conter suas lágrimas.
– Mel, desde a primeira vez que te vi, já senti que você seria da nossa família. Ty, eu te
amo maninho, mesmo com a sua chatice diária, mesmo que você tenha matado meu coelho...
Com toda certeza nesse mundo, a mamãe está muito orgulhosa de você de onde quer que ela
esteja. – Minha irmã me manda um beijo com as mãos.
Finjo pegar no ar com a mão direita e coloco no meu peito.
– Você é o meu tio favorito, mesmo sendo o único. – Emy diz sorrindo no microfone,
fazendo todos rirem – E Titia Ariel, você é a princesa mais linda de todas.
Pestinha que eu amo. Sorrio para Melanie, que está fazendo um coração com as mãos
para ela.
Melanie se afasta e segue em direção ao palco.
– Bem... Nossa é bastante gente vendo aqui de cima. – Ela diz meio sem jeito – Vamos
lá, não sou muito boa para falar em público, mesmo tendo que falar em público algumas vezes.
Só estou nervosa, espero que a platéia não seja difícil. – Ela ri e respira fundo.
– Vai, Mel! Arrasa! – Mandy grita para incentivar.
– Você é a Ruiva Atômica, você consegue! – Nick grita.
Todos riem.
Melanie fecha os olhos e os abre novamente, olhando diretamente para mim. Como se
girasse um botãozinho e desligasse tudo que está em volta, sobrando apenas nós dois.
– Tyler, eu me lembro quanto te conheci... Me lembro de quando você me beijou pela
primeira vez e desde aquele momento, eu já soube que você me tinha.
Sorrio ao lembrar.
– Você me trouxe de volta a vida mesmo existindo mil motivos para desistir e assim
como me prometeu, eu prometo que mesmo quando você estiver caindo, mesmo quando a chuva
engrossar ou quando você estiver cansado, eu sempre estarei ao seu lado.
Digo "Eu te amo”, mas não sai som, estou emocionado demais.
– Eu prometo cuidar de você e te amar sem exigências, amar cada qualidade e cada
defeito assim como você aceita cada parte de mim. Prometo dar o meu melhor todos os dias,
assim como prometo ser sua melhor amiga o resto da minha vida. E eu só preciso afirmar uma
coisa, Tyler...
Balanço a cabeça em afirmação, a incentivando a continuar, e então Melanie me atinge
com uma pergunta:
– Você promete nos amar?
Espera... Nos amar? Como assim?
– Porque dentro de mim existem dois corações que batem loucos por você, Tyler!
Escuto a Kate e Charlotte gritarem ao fundo e várias pessoas comemorando no salão.
Parece que todo mundo já entendeu o que ela quis dizer e eu ainda não.
É preciso alguns segundos para minha ficha finalmente cair: Eu vou ser pai? A mulher da
minha vida vai ter um filho meu?
Ela desce do palco e vem até mim com um sorriso meio nervoso.
– É isso mesmo? Nós, eu e você, vamos ter um bebê? – Eu pergunto ainda sem acreditar.
– Sim – Ela diz rindo.
– Você é a melhor coisa que me aconteceu, pequena. – Eu digo, segurando seu rosto e
dou um beijo em seus lábios.
Todos presentes na festa batem palmas e gritam.
Viro para os nossos amigos que nos encaram chorando, eu ergo a mão da Melanie em
comemoração.
– Eu vou ser pai! – Eu grito e todos os malucos que eu amo gritam comemorando com a
mesma loucura, vindo nos abraçar.
Hoje eu venci, e essa é a nossa história.
O que fazer quando o amor da sua vida está bem diante dos seus olhos? A resposta é
fácil, o agarre e não o solte nunca.
Não importa o quanto você tente se negar, não há nenhuma forma de fugir de uma alma
que se encontrou na sua.
“Prometo a você aqui de cima.
Que vamos enfrentar o que vier, amor.”
Walking The Wire – Imagine Dragons
Acordo assustada com um trovão alto que parece ecoar dentro do quarto. A chuva está
forte lá fora e foi assim a semana toda.
Sinto o cansaço da noite anterior, Liam me promoveu a chefe da pediatria, tenho
trabalhado duro para isso. Mas amo o que faço, realizei o meu sonho profissional.
Apalpo o lado direito, caçando alguém. Ainda estou de olhos fechados e a cama está
vazia, mas não demora muito para eu sentir alguns movimentos no colchão de alguém pequeno
subindo.
– Mamãe, mamãe! Acorde mamãe! – Escuto a voz doce me chamar.
A pequena mão segura meu braço e me balança para eu acordar.
– Mais cinco minutinhos, filho. – Eu peço, o agarrando e nos virando de lado. O abraço
forte, e faço um carinho no seu cabelo que é preto e espesso como o do pai.
Ele se remexe para se livrar do meu abraço de urso, se virando para mim e tocando em
meu rosto com a mão quentinha.
Abro os olhos e encaro meu baixinho que já completou três anos. Kalel, minha pequena
estrela.
Meu Deus… O tempo passou tão rápido.
Quem escolheu o nome foi o Tyler, assim que leu o significado soube na hora que seria o
nome que chamaríamos nosso filho. A gravidez do meu pequeno foi bem tranquila, por mais que
ele seja elétrico e engraçado como o pai.
O dia do seu nascimento foi aquela loucura, Tyler desmaiou no hospital quando viu ele
nascer. Foi necessário mais um médico para socorrer ele no chão. Foi cômico, tenho tudo
gravado graças a Mandy, desde então, Kate e eu colocamos o desmaio dele para assistir em todas
as festas de família só para encher o saco dele.
Nos apaixonamos à primeira vista quando pegamos em nossos braços aquele bebê
gordinho de três quilos e duzentos. Não acreditamos por dias que ele realmente era nosso, fruto
do nosso amor. Nosso milagre.
– Papai mandou te chamar, mamãe. Vamos abrir os presentes? – Ele me encara com os
olhos verdes faceiros e com marca de covinhas na bochecha como as minhas.
Olho para o relógio e são mais de duas da manhã. Fecho meus olhos novamente, ainda
sonolenta.
– Papai disse que é hora de dormir, Kalel – Digo.
– Papai fez café – Abro meus olhos e o encaro sorrindo com seus dentinhos.
Não foi só a aparência que ele puxou de Tyler, a personalidade de persuasão também.
– Beleza, me convenceu. Vamos! – Eu digo, rindo, e ele se levanta para pular na cama de
felicidade.
Ainda moramos no mesmo apartamento e só fizemos uma reforma para unir o meu e o
dele. Quebramos algumas paredes, erguemos outras. Ficou espaçoso e não queríamos sair daqui.
Foi onde nossa história começou.
Kalel me abraça e ando devagar com ele no meu colo.
Chegamos na sala e eu me encosto na parede, flagrando a cena que faz eu perder o fôlego
toda vez que vejo.
Tyler está de pijama diante da árvore de Natal iluminada pelo pisca-pisca com nossa filha
de cinco meses em seu colo. Ele está sorrindo, olhando para ela.
– “Brilha, brilha, minha menina, nunca cresça minha gordinha… vai ser freira como a
prima... Se não papai vai ter problema… esse é o nosso esquema…” – Ele está cantarolando
com uma voz engraçada para ela dormir.
Mas não funciona, só faz ela dar gargalhadas no colo dele.
Quando descobrimos a gravidez da nossa menina, ficamos eufóricos. Tyler comemorou
por dias, e desde o início ele soube que seria uma menina.
Nossa pequena Lina Smith.
Sim, ele também escolheu o nome que significa “da lagoa” ou “linho, corda, corda de
instrumento musical”.
Graças ao Tyler, nossos filhos nunca poderão reclamar de não ter nomes originais.
Ele me flagra observando e sorri para mim. Os anos passam e cada vez que eu vejo esse
homem meu coração fica mais apaixonado. É possível sentir tanto amor por alguém assim?
– Tem café fresco, Ruiva Perigosa – ele diz.
– Ruiva Perigosa? Qual perigo eu represento hoje, Tyler Bond? – pergunto a ele,
descendo nosso filho do meu colo e indo até a cozinha para pegar café.
Volto com duas xícaras cheias e Tyler está colocando Lina no colo de Kalel, no chão, se
sentando ao lado para ajudar a segurar.
Me sento junto com eles em volta da árvore grande que está recheada de presentes.
Olho para o Tyler que não mudou quase nada, só aprendeu a pentear o cabelo. Sorrio com
isso. Ele tem trabalhado dobrado após a sede de Manhattan crescer tanto, o obrigando a expandir
para outras cidades de Nova York.
– Ela é bonita papai, igual a mamãe – Kalel diz olhando para a Lina.
Lina é ruiva como eu, é possível notar no pouco cabelo que tem. Não creio que irá mudar
a cor.
– Ela é mesmo, pequeno. Linda como a mamãe – Tyler responde.
Tyler sorri para as crianças, olhando como o pai babão que é.
– O perigo que você me apresenta é que talvez eu esteja pensando seriamente em ter mais
cinco filhos com você... – Tyler diz, me encarando e voltando a minha pergunta anterior.
Quase engasgo com a bebida.
– Tyler eu te amo... mas vamos focar na nossa estrelinha e nessa nota musical por
enquanto – digo rindo, apontando para as crianças e tomando um pouco do meu café.
Tyler também ri, e pelo fato do Kalel imitar tudo que o pai faz, ele solta uma gargalhada.
Depois dá um beijinho na testa da irmã.
– Obrigada Tyler, por me dar os melhores presentes que eu poderia ter... isso inclui você
também – eu digo.
Ele me encara e sorri de volta.
Se há alguns anos atrás alguém chegasse em mim e me dissesse que eu teria tudo o que
tenho hoje, eu não mudaria nada. Nadinha. Esse é meu lar, eles são meu lar e meu ponto de paz.
Mais tarde, quando as crianças já estão dormindo em seus quartos e depois que o Kalel
abriu todos os presentes, estamos na nossa cama.
Encaro meu anel de noivado que não tirei do dedo um dia sequer. Tyler me abraça e
passa a mão pelo meu cabelo, fazendo carinho. Nos viramos um para o outro para nos encarar.
Ele sorri e sobe em cima de mim, fazendo uma trilha de beijos em meu pescoço.
Eu já deveria ter superado todas as borboletas no meu estômago... mas ainda sou caidinha
por ele.
Ele me flagra sorrindo sozinha e franze a testa.
– Eu acho que podemos começar a praticar os nossos próximos filhos. – Ele diz com
segundas intenções.
– Ok! Já temos um mini Tyler manipulador, irônico e bonito como você e uma doce mini
ruiva atômica como eu – eu digo sorrindo – Qual vai ser o próximo?
– Uma mistura dos dois, talvez, ou totalmente o inverso, minha pequena. – Ele propõe,
sorrindo.
Não vou mentir, adoraria ver muitas cópias de nós correndo pela casa. Mas por enquanto,
dois estão ótimos.
– Eu amo o nosso lar, nossa família, eu amo você, Melanie.
Tyler passa a mão pelo meu rosto e depois envolve minha nuca, puxando meus lábios até
os seus.
Não importa quanto tempo passe, eu nunca me cansarei de sentir o seu toque.
– Meu lar é você! – Eu respondo em meio ao nosso beijo – Eu te amo, Tyler Smith.
A Gabrielly de 15 anos com certeza estaria surtando com o que está acontecendo hoje.
Sim, esse livro não é apenas a realização de um sonho, mas um grande marco na minha vida.
Pode ser que não seja o livro mais elaborado ou mais bem escrito, mas para mim, ele é o melhor
do mundo porque tem muito de mim aqui.
Eu me lembro exatamente em agosto de 2019, quando a ideia ressurgiu em meu coração e
Tyler me questionava constantemente por que eu apenas não escrevia sobre ele e Melanie
(Acredite, há milhões de vozes, situações e conflitos na minha mente). Escrevi, obedeci a todas
as vozes, me entreguei até se tornar um arquivo em meu HD.
Em 2021 eu conheci pessoas incríveis e não tão incríveis no mundo literário
(Infelizmente a vida é assim), parei de repente de ler ou pensar em qualquer coisa que fosse
relacionada a livros.
Um dia, em uma conversa com minha amiga Nilciara, contei sobre o arquivo e ela apenas
me disse: “Por que não posta no Wattpad?”
Eu fiz isso, e tinham apenas minhas amigas votando em cada capítulo e comentando
muito para me incentivar, então Nil, Livia Caroline, Rita, Letícia e Josi, eu serei eternamente
grata por todo apoio que me deram e nunca me esquecerei disso.
Em pouco tempo, TAE atingiu mais de 640 mil leituras (O que para mim foi algo surreal
e inesperado, aliás eu tinha apenas um rascunho guardado há anos e chorei igual criança, não vou
negar, e tenho muito orgulho dessa conquista), então também agradeço, do fundo do meu
coração, os meus queridos leitores do Wattpad.
Agradeço a minha família que aceitaram meu livro mesmo sem ler, aceitaram a novidade
de ter uma escritora na família e não pouparam esforços para esse livro ser publicado e realizar o
meu sonho, vocês são e sempre serão meu combustível.
Para todos que de alguma forma chegaram até aqui, meu muito obrigada por dar a chance
de me conhecer e conhecer meus personagens.
Vou me despedindo antes que isso aqui vire outro livro (risos).
Espero que tenham se divertido e quero muito ver todos em breve.
Com amor, Gabi.
Gabrielly Arislian é nascida e criada no interior do Paraná, na cidade de Arapongas. Teve
seu primeiro contato com a escrita aos 15 anos, mas somente 9 anos mais tarde teve a coragem
de escrever o seu primeiro romance intitulado, desde então, de “Todas as Estrelas”. Já possui
outras obras escritas e muitas ideias e personagens para criar histórias. É casada e tem um filho
que ama muito. Sim, ama café e Imagine Dragons (o que não é nenhuma surpresa).
Me siga e acompanhe as próximas novidades.
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