Apostila - Modelo Vivo

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Modelo Vivo

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MODELO VIVO

O homem sempre desenhou o homem. Observe as diversas notações gráficas que o


homem fez de si mesmo ao longo dos tempos, é um requisito básico para quem quer aprender a
desenhar a figura humana. A história da arte neste caso cumpre uma função pedagógica importante,
pois oferece um farto material didático. Ao empenhar-se nesse estudo histórico da representação
gráfica da figura humana, o aluno estará observando a maneira peculiar com que foi representada
artisticamente cada forma humana em diferentes civilizações e épocas da humanidade, com seus
códigos e convenções culturais, suas regras de proporções, suas leis de anatomia, simetria e
simbologia.
Algumas das convenções usadas para desenhar a figura humana na antiguidade, ainda
hoje é empregada por alguns artistas, como o quadriculamento – vinte e três quadradinhos
subdivididos – estabelecido no antigo Egito para desenhar a figura humana em obediência às normas
religiosas. Uma outra convenção muito comum ainda hoje. Foi estabelecida pelo escultor grego
Policleto, no século V a. C. Ele usou o tamanho da cabeça humana para determinar a altura de uma
pessoa, isto é, segundo ele, a representação da figura humana, seja na escultura ou desenho,
deveria ter a medida de oito cabeças. Será, contudo, bom, ter em mente este padrão de proporção se
altera por fatores tais, como a raça, sexo, idade e diferenças físicas peculiares ao individuo. Alguns
artistas preferem hoje em dia a medida de sete cabeças e meia, tanto para homens como para
mulheres, o que não é relevante para o resultado final das obras.
No Renascimento Leonardo da Vinci, procurando expressar a concepção humanista da
época, que tinha o homem como a “medida de todas as coisas”, elabora a clássica figura de um
homem nu inscrito nas duas das principais formas geométricas – quadrado e circulo – passando-nos
a idéia de que existe uma relação fixa entre as proporções de nosso corpo e a ordem universal.
Estudar, pois, os ideais estéticos dos povos em suas diferentes gerações, para
compreender melhor a expressão artística do ser humano é o primeiro passo para quem quer
aprender a desenhar a figura humana.
O segundo pré-requisito seria estudar com detalhe as proporções da figura humana, ou
seja, as relações de tamanho de uma determinada parte do corpo com outra. Por exemplo, como já
foi mencionado anteriormente, usa-se a medida de oito cabeças para encontrar a altura de uma
pessoa. A cabeça também serve para calcular a distância que vai do ombro até o pescoço, da axila
até o cotovelo, entre outras partes. Essas aferições podem ser feitas de uma forma muito simples,
basta estender um dos braços, fechar um dos olhos e com o auxilio de um lápis, deve-se ir
comparando o tamanho dos membros em relação a outros. Muitos alunos, por desconhecerem as
proporções não conseguem inserir adequadamente uma figura no papel, acabam cortando as figuras
ou forçando o desenho para que ele caiba dentro do suporte escolhido para desenhá-la, seja em
papel ou tela. A solução é marcar o centro do papel com retas perpendiculares e diagonais, e
relacionar este centro ao centro do corpo que vai ser desenhado e em seguida marcar as
extremidades da cabeça e pés. A partir deste ponto marcar a altura da cabeça e dos pés.
O terceiro pré-requisito é conhecer os efeitos de luz e sombra. Este processo deve ser feito,
tomando como referência volumes geométricos como o cilindro, o cone e a esfera. Depois de
dominada a técnica de sombreamento destes objetos passa-se a outra fase que é a representação da
figura humana a partir de bonecos móveis de madeira, que representa de forma simplificada, as
quatro principais articulações do corpo humano, como a da cabeça, a do tronco, a dos braços e a das
pernas. Desta forma ao se deparar com o modelo vivo, o aluno não terá problema em representar um
corpo simulando movimentos.
O quarto pré-requisito para um bom desenho da figura humana é conhecer o processo de
comparação de ângulos e pontos através de eixos horizontais e verticais, ou seja, uma “perspectiva
visual” na qual as informações óticas são diretamente percebidas pelo olho e desenhadas sem uso de
réguas ou compasso. O principio é o mesmo de comparação de proporções, com o uso de um lápis,
tendo um dos braços estendidos, o aluno vai traçando linhas verticais e horizontais imaginarias. Com

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isso ele vai identificando que ângulo uma determinada parte da cor apresenta em relação à outra, em
que pontos determina partes do corpo coincide em relação à outra.
O quinto pré-requisito é saber identificar as áreas vazias que se apresentam em volta e
entre os membros do corpo, que seriam as áreas cheias. Essas áreas são chamadas de espaço
positivo e espaço negativo e é importantíssimo para quem deseja representar a figura humana de
uma forma mais natural. Esse processo deve ser feito primeiramente com imagens de revistas e
posteriormente com modelo vivo.
Quanto ao desenho do modelo vivo, é importante que o artista considere algumas
observações preliminares a respeito desta prática. Um dos grandes críticos de arte e filósofo do
século XVII, Denis Diderot, comenta em um de seus livros “Ensaios Sobre a Pintura”, que o desenho
da figura humana a partir de um modelo vivo é uma etapa importante dentro do processo de
aprendizagem, pois muitos artistas acabam estereotipando movimentos peculiares de algumas ações
humanas. Segundo Diderot, as posições que um modelo desempenha são falsas, frias e ridículas,
uma coisa é uma atitude outra é uma ação. Para ele a atitude de uma pessoa puxando água é
totalmente diferente da ação verdadeira, e que isso pode ser notado pela expressão do rosto e nas
tensões musculares do corpo. Diderot propõe como última etapa e que deve ser constantemente
praticada no aprendizado do desenho da figura humana, é a representação de pessoas de diferentes
condições sociais, idade, sexo e estados emocionais em atividades habituais, seja nas ruas, praças,
clubes, no lar, etc.
Há pessoas que preferem uma especialidade de desenho da figura humana, com o rosto,
pés, mãos, corpo, etc. e não se dedicam ao desenho integral da figura. Outros se dedicam ao estudo
dos movimentos e posições do corpo como um todo e só depois ir se dedicando as particularidades
de cada membro, como as mãos, pés e rosto. Este é o processo mais recomendado.
Para estudo do corpo humano, deve-se levar em conta que ele é uma estrutura, isto é, um
conjunto de elementos com diferentes funções. Estes elementos estão organizados de tal modo que o
deslocamento de um, em um determinado movimento implica no movimento de outros. Para que se
possa compreender melhor estes movimentos, deve-se observar e estudar as articulações ósseas, a
partir dos principais ossos. Para isto o aluno pode criar um esqueleto simplificado à sua maneira e
fazer esboços de pessoas nas mais diferentes situações. Podem ser usadas revistas, esculturas,
boneco de madeira e modelo vivo. Após exercitar bem esta parte, o aluno deve ir acrescentando
volume muscular de forma simplificada aos ossos e exercitar o sombreamento de cada parte.
Um outro aspecto importante do rosto humano é que as partes estão tão integradas entre si,
que se modificarmos alguma delas, conseqüentemente, estaríamos afetando todas as estruturas,
tornando a pessoa desenhada, totalmente despersonalizada. Deve-se, pois, caso o desenho pretenda
ser realista e não uma caricatura ou outra forma de expressão artística, ser o mais fiel possível à
pessoa retratada.
Um dos membros humanos que merece toda uma dedicação especial é as mãos, primeiro
por ser muito expressivo e segundo por ser a parte mais difícil de desenhar do corpo humano. Muitos
artistas por não saberem representá-la ou acharem demorado a sua criação a omitem ou camuflam
de seus personagens, tanto em desenhos, pinturas e até esculturas, o próprio Rodin deixava as mãos
de suas esculturas para serem feitas por sua assistente Camille Claudel.
Mas esse não deve ser um obstáculo para quem quer realmente aprender a desenhar a
figura humana, pois hoje o desenho, a pintura e a escultura não são vistas como um espelho, que
devolve ao homem sua própria imagem. Isto se deve e muito ao surgimento da fotografia no século
XIX. O artista desde então, adquiriu a liberdade de retratar a figura humana à sua maneira.
O modo mais fácil de imaginar a cabeça é imaginá-la de uma forma oval e traçar linhas
verticais e horizontais para demarcar a posição dos olhos, boca, nariz e orelhas. Esta medida tem
como objetivo, familiarizar-se com as posições de cada uma das partes do rosto do humano, e não
serem tidas como absolutas, pois nem toda pessoa tem, por exemplo, tem a medida de um olho entre
um olho e outro, e também nenhum lado do rosto é igual ao outro. Após definir posições das partes
do rosto, deve-se estudar cada parte exaustivamente, buscando exemplos de pessoas de diferentes
raças, sexo e idade.
Um problema muito comum entre aqueles que começam.
Por fim, ao retratar a figura humana o aluno deverá sempre ter um olho crítico, pois estará
observando uma obra de arte perfeita, em formas, expressões e movimentos. E por mais que ele a
estude e a retrate ele nunca irá chegar a perfeição do artista maior que é Deus.

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A FIGURA HUMANA
A Figura Humana tem sido objeto de
representação desde que o homem descobriu a
possibilidade de registrar imagens por meio de desenhos,
pinturas ou esculturas. Contudo o modo de ver e
representar esse tema tem se modificado ao longo do
tempo, como conseqüência da visão de mundo de cada
época e do desenvolvimento da ciência e das técnicas.
Estes diferentes modos de representação da figura
humana foram se desenvolvendo, enriquecendo-se,
proporcionando assim inúmeras possibilidades de
expressão.

Na Pré-História, já encontramos figuras humanas


esquemáticas, representando caçadores e esculturas
femininas modeladas em argila. Os gregos foram
excelentes escultores e são famosos seus trabalhos em
mármore, como a Vênus de Milo e figura do Discóbolo,
que foi utilizada como referência para a vinheta das Olimpíadas de Atlanta. Um arquiteto e
escritor romano do século I, chamado Marcus Vitruvius Follio, observou que a altura de
homem é aproximadamente igual ao alcance de seus braços abertos. Leonardo da Vinci
ilustrou essas medidas com um desenho muito conhecido em que ele inscreve a figura de
um homem em um quadrado e em um círculo.

A representação da figura humana tem como


referência as formas básicas, desde os tempos mais
remotos. Pode ser esquemática como os tradicionais
bonecos com a cabeça em forma de círculo e os membros
representados por linhas, ou complementada com
detalhes, tornando-se mais complexa como as figuras
clássicas em perspectiva ou a multiplicidade de pontos de
vista do Cubismo.

A análise da figura humana gerou a criação de


diversos cânones. A palavra cânon ou cânone é de origem
grega e significa regra, padrão, modelo, norma. Neste caso
especifico, cânones são um conjunto de padrões de
medidas que serve de modelo para desenhar ou modelar
uma figura humana. O cânone clássico, de origem grega,
toma a cabeça como unidade de medida, estabelecendo
uma relação de proporcionalidade entre as várias partes do
corpo humano, totalizando 8 ou 7 ½ cabeças de altura.
João Medeiros, em seu livro “Técnica da Pintura” explica a
importância deste conhecimento para o artista:

Qualquer desenhista, ou pintor, sabe de cor as principais proporções


anatômicas da figura humana. Procure também conhecer e estudar
as proporções da figura humana. Não é tão difícil como parece.
Depois que você decorar as proporções, e os detalhes, enfim, notará
que a execução do desenho se torna bem mais simples. Os tratados
de anatomia facultam naturalmente ao aluno a assimilação dos

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cânones do corpo humano. Contudo, para perfeita compreensão,
devem os estudos ser feitos diretamente do modelo-vivo, ao natural.
Geralmente, serve a cabeça de modulo para medir mais ou menos a
altura do individuo. A medida da altura corresponde a 7 cabeças e
meia. Isto é, a altura do individuo compreende a altura da cabeça 7½
vezes. O tronco abrange três alturas da cabeça. Os membros
inferiores, quatro alturas. Mas como se superpõem, tronco e
membros de uma altura de meia cabeça, segue-se que a altura total,
excluída a própria cabeça, é de 6 ½ alturas de cabeça. Em síntese:
com a soma da altura da própria cabeça, temos o total, geralmente
admitido, de 7 ½ cabeças (MEDEIROS, 1966, p. 47-49).

Os cânones de medida da figura humana que são utilizados com padrão, com
podemos perceber o texto do autor, não devem ser tomados como regras absolutas, ou
como as “medidas corretas”, ou como ideal de beleza. Por um lado, as pessoas são muito
diferentes umas das outras. Algumas são magras, outras são gordas, algumas baixas,
outras altas. Além dessas variações, os padrões de beleza mudam de uma época para
outra: atualmente as mulheres consideradas bonitas são altas e magras, mas no século XIX
elas deveriam ser mais cheias e como as banhistas pintadas por Renoir. Por outro lado, as
medidas utilizadas também dependem do estilo do artista, da imagem e do significado que
ele quer dar à sua obra.
Outro aspecto que
precisamos observar é que as
medidas variam de acordo com a
idade da pessoa. O cânone descrito
é apropriado para uma pessoa
adulta. As medidas de altura em
crianças e jovens, em geral, variam
pouco entre aqueles que têm a
mesma idade. Uma criança de 1
ano tem 4 cabeças de altura, de 3 a
4 anos tem 5 cabeças, de 5 a 8
anos tem 6 cabeças, mais ou
menos.
Além dos cânones de
medidas, também foram realizados
estudos sobre a perspectiva aplicada à figura humana. Segundo Parramón, “este
conhecimento pode resumir-se em quatro fatores:

A) A forma cilíndrica do corpo humano: a cabeça, o torso, os braços,


as coxas, as pernas, todo o corpo é um conjunto de cilindros
combinados, afetados pela perspectiva, mais ou menos, segundo
a distância em relação à linha do horizonte.
B) A linha do horizonte determinante da altura da figura: Uma figura
situada em primeiro plano, em segundo plano ou em último, mais
perto ou mais longe, será mais alta ou mais baixa. [...]
C) A forma anatômica do corpo e a perspectiva: vendo uma figura
em escorço, se produz um efeito de perspectiva que pode afetar o
alinhamento dos ombros, do peito, dos cotovelos, dos quadris,
dos joelhos, dos pés, etc.
A representação de várias figuras, situadas a distâncias
diferentes: rege-se por uma série de normas que permite
desenhá-las com a exatidão matemática. (PARRAMÓN, 1993, p.
96-97).

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ARTICULAÇÕES
O corpo humano é uma estrutura, Isto é, um sistema de elementos com várias
funções.
Nossos ossos são cerca de duzentos, mas consideremos a pessoa como tendo só
seis partes rígidas, unidas por articulações. Essas seis partes são:

1) A cabeça, que é articulada com o


pescoço.
2) O tronco, que se movimenta por
meio da coluna vertebral, entre o
tórax e o quadril.
3) Os dois braços, articulados nos
ombros. Os antebraços são
articulados nos cotovelos. Os
antebraços e as mãos são
articulados nos pulsos.
4) As duas pernas. As coxas e o
quadril são articulados na virilha. As
coxas e as pernas são articuladas
nos joelhos. As pernas e os pés são
articulados nos tornozelos.

Cada uma dessas partes tem ossos e articulações proporcionais entre si.

O esqueleto é uma complexa construção óssea na qual


os ossos estão articulados para que possamos realizar
os diferentes movimentos, ajudados por músculos e
tendões:

1) Articulação da cabeça.
2) Articulação dos ombros.
3) Articulação da bacia.
4) Articulação do cotovelo e do joelho.
5) Articulação das mãos e dos pés.

Essa estrutura (esqueleto) é recoberta por um sistema


de músculos, nervos e tendões que têm por função
mantê-la compacta e, ao mesmo tempo, movimentá-la.
Lembre-se de que existem diferentes tipos físicos
(longilíneos, brevilíneos, obesos, magros, etc). Quando
estiver desenhando, modelando um corpo, não o
considere um modelo único. De limite a base e o
vértice do desenho, evitando erros muito comuns aos
principiantes.

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NORMAS PARA DESENHAR
COM MODELOS VIVOS OU DE CÓPIAS

1 – Marcar o centro do papel traçando retas de canto a canto,


para ajudar a centrar o estudo.

2 – Medir a olho, ou com


lápis, o objeto do desenho,
para determinar-lhe o centro,
e traçar ai uma linha, em
relação com o centro do
papel.
Traçar uma linha na cabeça e
outra nos pés.
Por meio de linhas traçadas
livremente, procurar conseguir o aspecto geral da figura,
ajudando assim a visualizá-la e colocá-la no papel, no
tamanho desejado. Deve-se desenhar muito levemente
a fim de não obliterar a impressão mental da figura com
a um desenho pesado, e facilitar as correções.

3 – Decidir onde colocar o ponto inferior do pescoço e traçar


uma reta deste ponto até os pés (se o desenho é de frente).
Se é de costas, traçar uma reta da sétima vértebra cervical até
os pés.
Marcar a linha dos ombros com uma curva, sob o ângulo
apropriado.
Sendo uma figura ereta, desenhar primeiro a perna em que
repousa mais peso, para conseguir o equilíbrio apropriado da
figura.

4 – Traçar a linha que mostra


o ângulo da posição da
pélvis, uma linha que passe
pelas rótulas. Desenhar o tronco indicando seu volume,
marcando a largura dos ombros, quadris e cabeça.

Enquadrar com linhas retas que passem externamente às


saliências da figura para obter melhor idéia das direções
das linhas e evitar a sensação de desenho “retorcido”.

5 – Esboçar dentro das


linhas um esqueleto
simplificado, que esteja de
acordo quanto à posição
das articulações e com o
volume do tórax.
Tomar cuidado para que a parte superior do pescoço, o
púbis, o umbigo, a pélvis, as rótulas e as partes internas dos
tornozelos, fiquem na devida relação entre si.
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Comparar as proporções relativas da cabeça com o volume do tronco, das mãos com as
faces, dos pés com as mãos, dos braços com as pernas, e a espessura do pescoço com a
cabeça, e a da perna com o braço.

6 – Trabalhar os contornos, aperfeiçoando;


procurando melhor caracterização e
linhas mais graciosas.

7 – Indicar os limites dos planos e


das sombras principais.

8 – Encher os planos nas


superfícies externas e ligar as
sombras à medida do
possível.

9 – Sem perder a noção do conjunto, modelar os planos,


tendo em mente a direção da luz.
Ao desenhar a cabeça, decidir do
volume e desenhar os planos da face,
depois os olhos, a boca e por fim o nariz.
É mais fácil ajustar uma cabeça
numa figura que uma figura numa cabeça.

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Lápis é um instrumento utilizado para escrita, desenho e pintura. É composto por um
bastão fino de grafite inserido num cilindro de madeira.

Lista dos tipos de lápis (Classificação por nível de dureza):

Duros Médio
• Lápis 8H - usado para litografia. • Lápis HB
• Lápis 7H
• Lápis 6H
• Lápis 5H
• Lápis 4H
• Lápis 3H
• Lápis 2H

• Lápis H

Macios
• Lápis 1B ou B
• Lápis 2B - é um tipo de lápis semi-macio usado para desenho.
• Lápis 3B - usado para definição de meio tom. Ideal para representação da textura da pele
• Lápis 4B
• Lápis 5B
• Lápis 6B - é um tipo de lápis (ou grafite) com ponta macia adequado para desenho. Ele tem
ponta mais macia que o 5B, que o 4B e assim por diante. É muito usado para taquigrafia.
• Lápis 7B
• Lápis 8B
• Lápis 9B

Legenda
• Por "H" entende-se "Hard" - uma mina dura.
• Por "B" entende-se "Brand" ou "Black" - uma mina macia ou preta.
• Por "HB" entende-se "Hard/Brand"- uma mina de dureza média.

9H USADO PARA LITOGRAFIA


8H USADO PARA LITOGRAFIA
7H USADO PARA LITOGRAFIA
6H USADO PARA LITOGRAFIA
5H USADO PARA LITOGRAFIA
4H USADO PARA LITOGRAFIA
3H USADO PARA DESENHO TÉCNICO
2H USADO PARA DESENHO TÉCNICO
H USADO PARA DESENHO TÉCNICO
HB USADO PARA DESENHO TÉCNICO
B USADO PARA ESBOÇOS
2B USADO PARA ESBOÇOS
3B USADO PARA DEFINIÇÃO DE MEIO TON
(ideal para a representação da textura da pele)
4B USADO PARA DEFINIÇÃO DO MEIO TON
(ideal para a representação de pelos, penas, cabelos, etc.
5B USADO PARA SOMBRAS
6B USADO PARA SOMBRAS ABSOLUTAMENTE ESCURAS,
NEGRO ABSOLUTO
7B USADO PARA SOMBRAS ABSOLUTAMENTE ESCURAS
8B USADO PARA SOMBRAS ABSOLUTAMENTE ESCURAS
9B USADO PARA SOMBRAS ABSOLUTAMENTE ESCURAS

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Um breve percurso pela história do Modelo Vivo no Século XIX
(Princípios do método, a importância de Viollet Le Duc e o uso da fotografia)

Ao longo de sua trajetória no século XIX, o modelo vivo. Há a curiosa anedota do jornal
curso de modelo vivo adquiriu valores carioca que relata que os alunos de Romano
elevados e diferenciados nas principais trocavam o magro modelo em pose por uma
academias européias. Na academia francesa, figura idealizada no papel. Partindo do
notamos que o estudo do nu a partir do princípio de que a nota é verdadeira, nota-se,
modelo, inteiramente baseado nos princípios em primeiro lugar, a ineficácia do modelo e,
da Antigüidade Clássica, mantém, em termos conseqüentemente, a ausência de modelos
gerais, uma consolidada doutrina desde sua adequados que possam realizar o exercício.
implantação, ainda nos tempos de Colbert, até Tentativas foram feitas até mesmo no sentido
a primeira metade do século XIX. Estes de empregar escravos negros ou libertos, em
princípios da academia francesa, entre os quais razão de suas “formas artísticas”:
a imitação e estudo das anatomias perfeitas, o
aperfeiçoamento do desenho e a recuperação O senhor director recommendou novamente
das poses anteriormente provenientes das aos senhores professores não se descuidassem
estátuas, serão repassados às academias de procurar algum homem que queira servir
européias e adaptados às academias como modelo vivo, ainda que fosse hum preto,
americanas, seguidoras, por sua vez, do visto haver entre estes, individuos dotados de
modelo francês de ensino. formas artísticas. (Ata de 1/3/1837)

No Brasil, veremos que a prática do modelo Tratou-se novamente da necessidade de abrir


vivo será igualmente um elemento essencial ao quanto antes a classe de modelo vivo; e não
aprendizado artístico, à imitação da natureza, a há nisto pouca difficuldade: pois hum preto
exemplo da academia francesa. Sua que já estava ajustado deixa actualmente de
implantação, contudo, será realizada com comparecer. (Ata de 6/3/1837)
grandes dificuldades. Félix-Émile Taunay,
diretor da Academia Imperial de Belas Artes Nenhum escravo negro, no entanto, apareceu
entre 1834 e 1851, iniciará o penoso processo para a sessão providenciada por Taunay. Ainda
de aperfeiçoamento do curso de modelo vivo. que aparecessem para ocupar o cargo,
Aprovada ainda em outubro de 1833, Taunay certamente Taunay se depararia com a
empregará os primeiros modelos, de fato, inexperiência na composição das poses
alguns anos depois da aprovação, a partir de clássicas, fundamentais ao aprendizado. Era,
um esquema didático baseado nos princípios em vão, a busca por um escravo negro, ainda
clássicos e adaptados, de certo modo, às que suas belas formas artísticas o autorizassem
dificuldades encontradas no Brasil. a tal exercício. Ao mesmo tempo, supondo que
fosse contratados, a sociedade certamente seria
Em primeiro lugar, há a ausência da profissão contrária à atitude de Taunay, gerando uma
propriamente dita. Estamos no Brasil da crise de cunho moralista contra o estudo do nu
década de 1830 e não há profissionais de a partir de um homem negro.
modelo vivo no Rio Janeiro. Isso se deve, em
princípio, pela inexistência de escolas de arte Félix-Émile tentou, desde a aprovação da
nem de academias na cidade. Sabemos medida, empregar modelos adequados.
somente da Aula Régia de Desenho e Figura Passava-se, durante anos, do modelo “magro”,
do Rio de Janeiro, criada em 1800 e dirigida “estragado”, “idoso” ou de “formas moles”,
por Manuel Dias de Oliveira, o Brasiliense ou para um professor de ginástica, um arqueiro do
Romano, onde, segundo a historiografia e Paço, o jovem de “belo desenvolvimento de
algumas criticas do período, empregava-se o
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músculos” ou finalmente, uma nova procura modo, dos obstáculos morais comuns à
por um modelo adequado, visto que os profissão. A ele, dentro desta condição,
mesmos, quando eficientes, não permaneciam também era permitido o porte da espada.
muito tempo no cargo. Estamos já em 1843 e
continuava-se a procura por modelos que O curso de modelo vivo, normalmente vinculo
correspondessem ao clássico exercício, que à école du modèle dentro da Academia, vai
tinha, convém dizer, reduzidos incentivos do ganhando, no entanto, uma certa autonomia,
governo imperial. Ao final dos dezessete anos fazendo também parte dos exercícios
de sua trajetória, alguns modelos passaram cotidianos no ateliê do próprio artista. No
pela Academia, dentro destas características século XVIII, sabemos, por exemplo, que
acima descritas. Félix-Émile Taunay colocará Joseph Marie-Vien, mestre de Jacques-Louis
o curso em prática, mesmo que longe do ideal David, alugava os serviços do modelo em seu
de beleza e perfeição pretendidas. Sabemos, ateliê, incentivando a prática que, segundo ele,
contudo, que a profissão no Brasil se era mais proveitosa que dentro da própria
desenvolverá, ainda que tardiamente, na escola, em razão da liberdade do pintor na
segunda metade do século XIX, em franco composição das poses necessárias e muitas
atraso, portanto, com a matriz européia. De vezes devido à disposição da luz e do lugar
qualquer modo, vale a pena retomarmos aqui dentro do ateliê.
uma parcela desta história passada nas
academias da Europa, concentrando-nos mais A partir da direção tomada por Vien, das
demoradamente na academia francesa, berço descobertas arqueológicas e da formação de
para as demais. O desenvolvimento do curso uma teoria voltada à imitação do mundo
modelo vivo, ao longo do século XIX, também antigo, principalmente através dos estudos de
foi feito de altos e baixos no ambiente europeu, Winckelmann, será na pintura, com Jacques-
como bem nos revelam seus principais fatos, Louis David, que se levará a efeito esta nova
dos quais tentamos, timidamente, nos estética fundada na beleza ideal e na perfeição
aproximar. da natureza a partir do modelo grego. O estudo
do nu, questão central ao debate estilístico do
Este artigo recupera, ainda que de forma breve, período, constitui elemento fiel e indissociável
o curso de modelo vivo na França e sua do estudo do antigo. Noção central do
difusão nas academias européias, apresentando neoclassicismo, encontrará em David seu
os “princípios do método”, passando depois às principal articulador que defenderá, além do
transformações impetradas seja por Viollet-le- estudo do modelo na fase preparatório e do
Duc ou pela apropriação de suas idéias e, desenho, igualmente na fase intermediária e
finalmente, uma curta aproximação ao uso da final, já na pintura.
fotografia como recurso ao estudo do nu.
A Academia francesa manterá, ao menos até a
O modelo vivo na Academia francesa e sua primeira metade do século XIX, os princípios
difusão tradicionais no curso de modelo vivo, isto é,
suas poses cotidianas em horários restritos, e
O curso de modelo vivo inicia-se na academia notadamente, o uso do modelo nu masculino.
francesa nos tempos de sua fundação, já em Ao lado do modelo vivo, a cópia da estatuária
1648. Em termos gerais, podemos dizer que antiga, modelo perfeito para a representação do
este era o principal diferencial da antiga corpo humano, será igualmente defendida
Maîtrise, legitimando o surgimento da pelos acadêmicos franceses durante boa parte
academia na França. A école du modèle, como daquele século.
era chamada na Académie Royale de Peinture
et Sculpture, apresentava exercícios diárias. A Será a partir do Salão de 1824, no entanto, que
pose era definida pelo professor que, a cada aparecem os primeiros indícios das futuras
intervalo, verificava os desenhos realizados e mudanças no sistema artístico baseado no
fazia suas considerações. Ao modelo eram estudo do nu a partir dos princípios clássicos,
oferecidas algumas condições especiais, por marcando, sobretudo, a valorização da cor
exemplo sua nomeação como petit pelas obras de Eugène Delacroix e de John
fonctionnaire do governo, o qual lhe rendia Constable. Inicia-se um certo questionamento à
alguns privilégios e tentava livrá-lo, de certo perfeição do método baseado no estudo do
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corpo humano a partir do modelo da estatuária Espanha parece ter sido a única a temer o
antiga e do modelo vivo posado à sua maneira. pecado implicado pela nudez ao ponto de
Será sintomática, nesse sentido, a crítica de excluir estes modelos de seu ensino.
Stendhal neste mesmo Salão de 1824, onde
relata o cansaço do público em relação ao Segundo Pevsner, o modelo vivo, nu e
gênero acadêmico e às cópias de estátuas, masculino, que só fora aprovado como método
público este que preferia apreciar os cadáveres de aprendizado na academia espanhola trinta
inacabados do Massacre de Scios de anos depois de sua fundação, seguia seu difícil
Delacroix. A crítica de Stendhal revela o caminho, embora na mesma trajetória da
caráter urgencial de mudanças no processo de academia francesa. A academia de Córdoba, na
aprendizado da academia francesa, fortemente Argentina, fundada a partir do modelo europeu
voltado à questão da Antigüidade Clássica. um século mais tarde, também sofre algumas
restrições ao aprendizado do modelo vivo, a
Uma série de mudanças começa a ser exemplo de academia espanhola. Como bem
reivindicada pelos alunos da academia destaca Tomas Bondone, o estudo do nu em
francesa, como uma certa independência do Córdoba, já no século XX, sofrera proibições
estudo do antigo. Com a proposta de um novo por parte das esferas religiosa, política e social,
rumo para as artes através dos pincéis tornando-se um desafio ao artista cordobês,
coloridos de Delacroix, vinha também a sobretudo ao diretor Gomez Clara, que
necessidade de mudança dos parâmetros finalmente vence o moralismo e instala as
neoclássicos da École des Beaux-Arts. Embora aulas do nu em 1922.
tenha havido uma comissão encarregada da
análise das mudanças necessárias para a Na Itália, o classicismo da Accademia di San
reforma da École, autorizada pelo Ministro do Luca seguia o mesmo ritmo das outras
Interior, o Conde Montalivet, o relatório academias no século XIX, isto é, o estudo das
entregue em 1832 não apontava mudanças proporções, a cópia da estatuária antiga,
necessárias e nada se alterava na estrutura da destacando-se sempre as estátuas de Antinous,
instituição. As mudanças em torno da base da do Discóbolo e do Laocoonte, além dos gessos
école, isto é, o desenho a partir da estatuária contemporâneos inspirados nos modelos
antiga e das gravuras, além do modelo vivo nu gregos dos professores Antonio Canova e
e masculino, só viria encontrar algum efeito a Thorvaldsen, que passavam a fazer parte do
partir da década de 1860, pelas mãos de Viollet estudo dos alunos. Havia, no entanto, algumas
le Duc. inovações.

Se a base acadêmica francesa não se Nas aulas de anatomia da academia italiana,


modificava na década de 1830, com exceção havia, no entanto, uma certa modificação. Os
de algumas mudanças administrativas em sua trabalhos do médico cirurgião Giuseppe Del
estrutura e da implantação de outras tendências Médico associavam o estudo do cadáver, ossos
classicizantes, as outras academias européias e músculos, ao modelo vivo mostrado em aula,
seguiam quase o mesmo ritmo. Na Espanha, a identificando todos os estudos do corpo ao
Academia de Bellas Artes de San Fernando, movimento:
criada em 1752 a partir do modelo francês,
passara, em 1820 e 1823, por novos planos de Devendo o artista representar a figura viva, em
estudos. Estes indicavam apenas pequenas movimento, com características particulares, o
modificações no sistema administrativo e estudo teórico não seria completo, se não lhes
didático, como o estudo do colorido e a adoção mostrasse qual é o estado dos músculos,
de alguns tratados anatômicos sem, contudo, se quando estão em repouso, quando agem, e em
desvencilhar dos modelos clássicos, caros a segundo lugar, no momento de força que
qualquer instituição acadêmica de artes, com exercitam; por isso, depois de ter feito
uma certa ressalva. A esse respeito, destaca conhecer a situação, os ataques, e os usos dos
Pevsner: músculos, de uma parte da figura, o Professor
manda vir o modelo da Academia, e demonstra
Em todos os países, o recurso aos modelos a verdade na teoria estabelecida.
masculinos parecia indispensável a uma
formação completa e a Academia Real da

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Del Médico, que se tornava titular da recém- ao aluno um leque restrito de possibilidades.
criada cátedra de anatomia da Accademia di Segundo Vitet, o aluno fixava aquela pose na
San Luca em 1812, por influência da academia memória e tratava de repeti-la, com alguma
francesa em Roma, publica no ano anterior sua variação, nos seus personagens, tratando o
Anatomia per uso dei pittori e scultori, obra modelo vivo como uma espécie de “manequim
dedicada à academia italiana que trazia em seu de carne humana”, vestido diferentemente a
conteúdo os modelos da Antigüidade e a teoria cada cena representada.
de Winckelmann. Também utilizava o tratado
anatômico do francês Lavater, Élements O modelo vivo masculino constituía, desde a
anatomiques d’osteologie et de myologie à época da Academia real, a base do ensino na
l’usage des peintres et sculpteurs, de 1797, instituição e nos ateliês privados e,
embora o tratado de Del Medico fosse o mais principalmente, dos concursos trimestrais,
estudado junto a seu mestre, autor da obra, que semestrais e anuais. O modelo nu feminino
também criava o prêmio de encorajamento aos passará a ser admitido nos ateliês da escola na
alunos da classe da anatomia nos anos de 1813 década de 1880 e só será admitido nos
e 1814, incentivando o estudo do corpo concursos anuais a partir de 1939. Neste
humano. período, diante do modelo nu masculino, havia
aulas separadas entre artistas homens e artistas
Juntamente aos estudos anatômicos, a classe de mulheres. Para as aulas de modelo nu
modelo vivo, chamada Scuola Del Nudo, feminino, consideravam que homens e
aparecia na academia italiana, a exemplo da mulheres poderiam freqüentar conjuntamente.
academia francesa, com grande valor, mas Vejamos como se deram os passos para as
numa ordem um pouco diversa. Tommaso modificações destas aulas.
Minardi, professor de desenho da Accademia
di San Luca em 1823 e futuro professor de Viollet-le-Duc e a Reforma do Ensino
Vitor Meirelles em Roma, evoca não somente
a recuperação das esculturas do Quattrocento, Viollet-le-Duc apresentava, em 1863, um
mas igualmente, em razão da importância do plano de reforma contra a teoria do desenho
estudo do nu, a extensão dos estudos do natural segundo a tradição clássica, vale dizer as
em detrimento da idealização proposta pelo cópias realizadas a partir do antigo e classe
antigo, que ainda neste período era colocado sistematizada do modelo vivo. Seu plano
em primeiro grau na academia francesa. atacava diretamente esta prática, as ditas
Lorenzo Bartolini, professor de escultura na academias, onde os modelos pagos por hora
Accademia di Firenze em 1839, que a exemplo posavam em salas fechadas, cansados e
de Minardi pregava o uso dos gessos do repetitivos. Os alunos passavam desta prática
Quattrocento italiano, também evocava a às cópias das telas no Museu do Louvre, dando
importância do estudo do natural apresentando, continuidade à metodologia de ensino. Viollet
em 1840, um modelo deformado aos alunos, le Duc defendia a livre observação da natureza
criando grande polêmica no meio acadêmico, e o desenho de memória como o melhor
em contraposição às belas estátuas do Colosso aprendizado do verdadeiro. Retoma, desta
di Montecavallo ou de Laocoonte, maneira, a idéia de Lecoq de Boisbaudran, que
normalmente utilizadas nas classes. defendia o aprendizado do aluno através de
escolhas feitas diretamente na natureza. Lecoq
Embora a academia italiana tenha implantado de Boisbaudran, professor de desenho da École
algumas mudanças em relação ao sólido Imperial et Spéciale du Dessin, dita Pétite
método difundido pela academia francesa, École, desde 1841, ensinava a disciplina
veremos que na França, berço do sistema, as através do método de “gradação das
transformações concretas em relação à didática dificuldades nos exercícios”, isto é, por meio
acadêmica só começaram a acontecer, do desenho de memória, colocando o modelo
efetivamente, após as reformas iniciadas por em movimento. Seu método ficou conhecido
Viollet-le-Duc, na década de 1860. Já em em Paris principalmente através da publicação
1861, Ludovic Vitet, que naquele ano de sua obra, Éducation de la mémoire
publicava sua obra sobre a Académie Royale pittoresque, editada em 1862, onde discute seu
de Peinture et Sculpture, relatava que o curso método inovador:
de modelo vivo era um mau serviço, pois dava

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Quelques modèles étant été engagés pour não deixando de revelar, contudo, e cada vez
l’expédition; ils devaient marcher, s’asseoir, mais, o lado já saturado da profissão e as
ocurrir, se livrer enfin librement et constantes humilhações sofridas pelos
spontanément à divers mouvements; tantôt nus modelos. As modificações surgem
comme des faunes antiques, tantôt vêtus de principalmente na década de 1880, com a
draperies de différents styles et de diverses inclusão do modelo feminino. No entanto,
couleurs...Nos pauvres mercenaires de la junto às mudanças surgem outras questões.
pose, livrés à eux-mêmes dans ce milieu
vivifiant et splendide, semblaient vraiment se Em 1867, Jules e Edmond de Goncourt,
transfigurer. conhecidos como os Irmãos Goncourt,
publicam o romance Manette Salomon,
O desenho, para Lecoq de Boisbaudran, seria a relatando a vida dos artistas na École des
tradução do pensamento a partir da observação Beaux-arts, dando especial ênfase à questão do
direta do natural, rompendo com o nu modelo vivo, suas atribuições e seu tratamento.
acadêmico estático de um modelo pago por Revela uma vida repleta de maus tratos,
hora, na fechada sala mal iluminada do atelier, humilhações, julgamentos físicos e raciais,
livrando os alunos do método mecânico e encarados cotidianamente com naturalidade.
levando-os ao método intelectual. Apresenta o Na década de 1880, a mesma cena era repetida
método aos professores da École des Beaux- todas as segundas-feiras na porta da École des
Arts, mas não consegue modificá-lo Beaux-Arts na busca do emprego de modelo
diretamente. Contudo, influencia Viollet le para aquela semana: “poucos parisienses,
Duc em sua proposta de reforma de Ensino. muitos italianos, alguns negros”. As mulheres,
Assim como Lecoq de Boisbaudran, Viollet que passavam a ser aceitas nos ateliês
alertava ainda para a cópia de modelos no presentes dentro da école no início da década
Louvre. O aluno não deveria aprender a ver a de 1880, eram de belos tipos, louras
natureza a partir do olhar dos mestres. Só o parisienses, jovens moças de Nápoles.
exercício do natural libertaria o aluno “das Segundo o jornal Le Figaro, em seção de 28 de
paredes da Escola ou do ateliê”: agosto de 1889, no relato sobre aqueles que
buscavam a profissão, há a informação de que
Le véritable dessinateur n’est pas un os italianos chegavam quase sempre em
photographe reproduisant un modèle posant família, os franceses chegavam sozinhos,
devant lui, mais un observateur étudiant ce “como se estivessem ali por acidente”. Todos
modèle, de façon à en connaître si bien la eram colocados nus e escolhidos. Os que
forme, la raison d’être, de se mouvoir, les tinham sorte, ganhavam por quatro jornadas
diverses apparences suivant les circonstances das 8 ao meio dia, com alguns intervalos.
extérieures, qu’il pourra en fermant les yeux, Normalmente eram escolhidos os profissionais,
se le représenter sous un aspect quelconque, pois os amadores acabavam por revelar a
non vaguement, mais nettement, avec ses ignorância das poses e a semelhança aos
plans, le jeu des ombres, les effets de la manequins, embora sempre com grandes
coloration, le mouvement que lui imprime un críticas. Os mais experientes, como o grande
sentiment, un besoin ou une passion. modelo Gélon, dito Aquiles, ou Charles
Dubosc, profissional de modelo vivo dos 7 aos
Entrava com todo o vigor na polêmica em 62 anos, que acumulou fortuna na profissão,
torno da metodologia que ganhava força nos mostravam o conhecimento histórico na
domínios do ensino artístico desde os anos de correta definição das poses, além do
1840. Entretanto, suas propostas só começam a conhecimento das poses da estatuária antiga
se concretizar em 1871, em alguns aspectos. para sua maior perfeição. Ao mesmo tempo,
Não se modificam ainda no que se refere ao alguns modelos apresentavam alguma
modelo vivo e muito menos à proposta baseada inquietação quanto à forma representada e a
na experiência de Lecoq de Boisbaudran, mas atitude do artista. Em Manette Salomon, e
são efetivamente criados, segundo sua mesmo em L’Oeuvre, de Émile Zola, ao
proposta, os ateliês internos à École, antes abordarem esta profissão, tema constante da
privados, e o exercício de desenho cotidiano é literatura do século XIX, há passagens em que
suprimido. Quando ao modelo vivo, o curso o modelo vivo sente ciúmes da própria imagem
seguia o rumo que fora tomado séculos antes, representada na tela, amada pelo artista, que vê

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o modelo com indiferença ao lado do resultado Em seu Journal, Delacroix declara o uso e a
final. A anedota parece, assim, perfeitamente admiração pela fotografia como recurso ao
verossímil ao final do século XIX. A fotografia artista. Em comparação às gravuras das
aparecerá, no entanto, como um aliado e um estátuas antigas, também extremamente
vilão nessa história, como notaremos adiante. utilizadas como método, a fotografia do
modelo, a partir da apropriação de luz e
O Estudo do Nu e a Fotografia sombras perfeitas, acaba revelando as
imperfeições dos cânones clássicos, admirados
A reivindicação de Viollet le Duc em torno do por Delacroix. No caso de Delacroix, o
modelo, com a busca pela permissão do nu daguerreótipo era comumente usado pelo
feminino, a mudança das poses, o movimento, artista, então em grande moda entre 1850 a
a substituição do modelo pago por hora de 1860. Jules Ziegles e Eugène Durieu eram os
trabalho, cansado das poses cotidianas, fotógrafos que vendiam a ele os
encontrava um outro recurso em meados do daguerreótipos, em sua maioria, de modelos
século XIX, embora com algumas restrições. nus femininos. Ao contrário das poses
Inicia-se o uso da fotografia do modelo. As masculinas realizadas na Academia, os nus
coleções presentes na Bibliothèque Nationale representados nos daguerreótipos eram
de France, no Musée d’Orsay e na École normalmente femininos, bem apresentados,
Nationale des Beaux-Arts, entre outros, compostos na cena fotográfica de maneira
oferece-nos instrumentos interessantes para o semelhante ao quadro terminado, com
entendimento desta questão. Ali, foram panejamento e acortinado adequados à cena.
expostas diversas fotografias e discutidas Os nus femininos dos daguerreótipos, no
algumas das novas noções que adentravam o entanto, vão adquirindo conotações eróticas,
mundo acadêmico e renovavam, de certo sofrendo proibições e provocando até mesmo a
modo, o clássico curso do modelo vivo. prisão de modelos e fotógrafos em 1851. Vale
ressaltar que artistas como Ingres, totalmente
O novo recurso indicava não só a mudança em oposto à pintura e às técnicas utilizadas por
relação ao próprio método, mas igualmente da Delacroix em 1862, também se coloca contra o
representação da imagem, gerando polêmicas uso da fotografia nas artes, assim como seus
diversas. Se, por um lado, ampliava o recurso alunos.
do artista e evitava as poses longas do modelo,
não resolviam a questão proposta por Viollet le Embora rejeitada por alguns artistas, veremos
Duc já levada adiante por Lecoq de que até o final do século XIX e início do
Boisbaudran, isto é, a questão do movimento. século XX, a fotografia do modelo nu se
Ao contrário, a fotografia viria mostrar a pose desenvolve cada vez mais. Revistas
duradoura e eternizada do modelo, agora especializadas de fotografias dos modelos
também representado em meio ao processo de surgem nesse período, como se fossem
produção do artista. Ao mesmo tempo, era catálogos de estudos de nus, com poses
questionado em seus próprios termos - modelo diversas, masculino e feminino, gordos e
vivo -, ao ser trocado pela impressão magros, à escolha do artista. Entre 1901 e
fotográfica depois de sua primeira pose. 1907, destacam-se três revistas que vão
Poderia causar, conseqüentemente, o declínio cumprir suas exigências. Le Nu Académique
de sua profissão. Charles Blanc, em sua apresenta edições entre 1905 e 1906. Surge por
Grammaire des arts du Dessin, publicada em uso exclusivo dos artistas, mas seus modelos
1867, questiona o uso da fotografia no estudo aparecem sempre escondendo o sexo ou
do desenho. Para ele, ela transmite o real e não cobrindo-o com uma folha de parreira. Mesmo
o verdadeiro, pois há a ausência de expressão e sendo uma revista voltada inteiramente aos
de “alma”, levantando toda uma polêmica que artistas, é, desta forma, a menos artística das
conduzirá o mundo da fotografia e das artes revistas que surgem nesse período, colocando
nos séculos XIX e XX. Mas os pintores ainda os modelos nus femininos cobertos com
avançam cada vez mais e continuam a acessórios. Ao contrário, a revista Le Nu
manipulá-la enquanto método para o estudo do Esthétique, editada entre 1902 e 1907, é uma
nu. das poucas a apresentar nus femininos
inteiramente despidos. Émile Bayard, seu
editor, apresenta nus fragmentados e inteiros

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de homens, mulheres e crianças, assim como levar adiante o estudo do natural,
modelos com poses de estátuas antigas, à reestruturando o modelo vivo. Utiliza, para
maneira clássica do profissional de modelo tanto, o modelo em movimento,
vivo nas academias de arte, fotografias de desvencilhando-se do aprendizado clássico,
modelos com poses diversas refletidas em associado ao recurso fotográfico, inovação
espelho e ainda modelos fotografados daquele século.
propositadamente com as marcas do espartilho,
algo incomum na profissão que será Analisamos, ainda que brevemente, como o
imensamente explorado por pintores realistas estudo a partir do modelo vivo se desenvolve,
como Courbet que, de resto, também usará o sobretudo, no século XIX francês. A clássica
recurso fotográfico para a realização de suas metodologia acadêmica, embora extremamente
obras. Também a revista Mes Modèles forte e valorizada em alguns momentos da
apresentava nus masculinos e femininos aos história, sofre suas alterações na segunda
pintores e escultores, mas igualmente modelos metade daquele século. Incorporará métodos
vestidos, semivestidos, com grande variedade diversos e, sobretudo, vinculados a uma certa
de poses e explicações sobre as vestimentas, modernidade, como o uso da fotografia. Do
incluindo aí também as descrições físicas. Uma modelo clássico à sua modernização, o
inovação oferecida pela revista é a aprendizado através do modelo vivo foi e
possibilidade de compra da fotografia isolada continuará sendo, porém e indiscutivelmente, o
pelo artista, funcionando como uma espécie de tradicional estudo de nu...
catálogo de venda de poses, sempre de acordo
com a vontade do artista. Fonte: DIAS, Elaine. “Um breve percurso pela
história do Modelo Vivo no Século XIX -
A fotografia do modelo nu constituir-se-á Princípios do método, a importância de Viollet
ainda um recurso fortemente utilizado pelos Le Duc e o uso da fotografia”. In: 19&20 - A
médicos anatomistas que trabalhavam como revista eletrônica de DezenoveVinte. Volume
professores nas escolas de arte ao final do II, n. 4, outubro de 2007. Texto publicado no
século XIX, como Mathias Duval e Paul site: http://www.dezenovevinte.net/19e20
Richer. Do cânone idealizado e antigo,
passava-se à simples observação do natural,
ajudada pelo recurso fotográfico. Paul Richer,
por exemplo, torna-se, ele próprio, fotógrafo.
Cria uma espécie de catálogo anatômico com
modelos nus e fichas descritivas, apresentando
informações sobre o sexo, idade, medidas do
corpo e suas proporções, criando tipologias.
Publica em 1921 a obra Nouvelle Anatomie
Artistique e prepara ainda a obra Atlas
Physiologique, trabalho composto por três
volumes (movimento, locomoção e exercícios
variados), que resta inédito. Professor da École
des Beaux-Arts desde 1903, Paul Richer
preferia ensinar anatomia com o modelo vivo,
assim como Giuseppe del Medico, além do
cadáver e do estudo isolado dos ossos e
músculos, embora usasse com grande
eficiência as suas próprias fotografias
anotadas, abrindo, desta maneira, o caminho
para a morfologia em razão de seus estudos
sobre os corpos vivos e não mortos: “Le nu n
´est dès lors plus simplement le modèle vivant
de l’atelier, mais bien l’incarnation d’une
vérité naturaliste”. Nesse sentido, vemos ainda
o quanto Paul Richer se aproxima de Lecoq de
Boisbaudran e Viollet le Duc, na tentativa de

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