Artigo PRFV
Artigo PRFV
Artigo PRFV
Resumo: Os materiais compósitos podem ser definidos como a combinação de dois ou mais materiais,
sendo aplicados em diversos ramos de acordo com a necessidade de utilização devido sua alta
versatilidade. Normalmente o processo de união é feito através da combinação de uma matriz líquida com
reforços fibrados. No setor náutico, esse material é chamado de Plástico Reforçado com Fibra de Vidro
(PRFV), que é um material de boas características obtido através de um processo de laminação. A
laminação manual é amplamente utilizada por ser uma técnica com baixo custo e mais praticidade na
obtenção do material compósito. Assim, este trabalho teve como objetivo produzir um material compósito
de resina poliéster e fibra de vidro com variação na organização das camadas de mantas e tecidos da fibra
para que fosse feita a determinação das propriedades mecânicas do laminado. De cada placa resultante da
variação da organização do laminado foram obtidos cinco corpos de prova, que foram sujeitos ao ensaio
mecânico de tração, sendo possível obter os valores de tensão máxima, deformação máxima e módulo de
elasticidade. Os resultados obtidos demonstram que os tecidos possuem propriedades mecânicas mais
elevadas que as mantas devido a organização dos fios da fibra de vidro, o que os tornam relevantes no
processo de laminação. Portanto foi possível indicar qual a configuração de camadas que obteve
propriedades mecânicas mais elevadas e qual é a mais indicada para ser utilizada no setor náutico.
1. Introdução
Materiais compósitos aparecem como uma solução para diversas empresas que buscam
inovações em suas iniciativas, pois são elementos com elevadas propriedades
mecânicas, elevado desempenho e baixo custo de produção. Eles consistem na união de
dois ou mais materiais com características diferentes um do outro e que, juntos,
proporcionam um material mais leve e com propriedades mais vantajosas às dos
componentes iniciais (AGARWAL; BROUTMAN; CHANDRASHEKHARA, 1990).
Na indústria náutica, esse material compósito é conhecido por plástico reforçado por
fibra de vidro (PRFV), sendo utilizado em grande escala por apresentar características
vantajosas quando comparados com outras classes de materiais, como, por exemplo, seu
baixo custo de produção, elevado desempenho e elevada resistência à corrosão, o que o
torna atraente para ser utilizado no processo de construção de embarcações e demais
componentes (NASSEH, 2011).
De acordo com Greene (1999), o compósito incorpora reforços suportados por uma
matriz líquida, que é a resina, antes de se transformar num material sólido através de um
processo de reação química. Segundo Al-Qureshi (2010), a matriz líquida possui
características como elasticidade e resistência inferiores ao reforço. Normalmente, a
matriz utilizada é de base polimérica pelo baixo custo e elevadas propriedades.
Enquanto a fibra oferece maior resistência e rigidez ao composto, a resina proporciona a
rigidez do material ao meio (MAZUMDAR, 2002).
Outro componente que possui diversas vantagens, mas que também devem ser
consideradas suas desvantagens, é a fibra de vidro, que pode ser obtida em forma de
manta ou tecido, por exemplo. Segundo Kaw (2006), esse tipo de reforço possui
propriedades inferiores a outros tipos de reforços quando se trata da sua adesão a
resinas, resistência à abrasão, resistência à fadiga e módulo de elasticidade.
Segundo Greene (1999), o projetista tem que buscar propriedades mecânicas eficazes
nos laminados para que se obtenha um projeto de embarcação com alto nível de
desempenho. Assim, é necessário determinar as propriedades mecânicas e
comportamento do material produzido sujeitos à esforços através de ensaios mecânicos,
como o de tração, que consiste na aplicação de uma força de tração em um corpo de
prova devidamente regulamentado pela sociedade classificadora até que este sofre um
alongamento até que atinja seu ponto de ruptura (CALLISTER JÚNIOR;
O presente trabalho propõe a produção de laminados feitos com resina poliéster e fibra
de vidro utilizando a técnica de laminação manual com variação da gramatura da fibra
de vidro e organização das camadas do laminado com o intuito de obter corpos de prova
retirados de cada placa laminada para serem submetidos ao ensaio de tração seguindo as
normas da American Society for Testing and Materials (ASTM) para obter as
propriedades mecânicas do material compósito produzido (TEIXEIRA, 2021).
2. Metodologia
2.1 Materiais
Para o processo de laminação manual, foi feito o uso da fibra de vidro em manta de
300g/m², manta 450g/m² e o tecido biaxial 1808 da Central Fibras, e resina poliéster
cristal da Sulfibra. Não foi feito o uso do gel coat para ajudar na laminação, uma vez
que o bom acabamento da superfície do material produzido não é de suma importância
para a realização do ensaio mecânico de tração. O agente desmoldante utilizado foi a
cera da empresa TecGlaze-N, que é um produto que facilita a remoção do laminado que
está em contato com o molde.
Além dos itens cruciais para a produção do compósito, outros materiais e equipamentos
foram necessários para a fabricação dos laminados, como fita métrica, fita isolante,
palito de madeira, balança de precisão, tesoura, calculadora, pincel, rolete, espátula de
metal e diluente. A Figura 1 apresenta alguns dos produtos utilizados no processo.
Para dar início ao processo, foi feita a higienização do molde de vidro com o diluente
para retirar qualquer tipo de sujeira que pudesse impactar nas propriedades do material.
Em seguida, foi feita a aplicação da cera desmoldante em 3 momentos intercalados em
um intervalo de 10 minutos.
Foi realizada a laminação de nove placas, sendo uma considerada a configuração inicial
e as demais denominadas de configurações subsequentes desta base. O objetivo dessas
mudanças na organização das camadas, variando a quantidade de manta e tecido, e a
gramatura da manta, é analisar, após o ensaio mecânico de tração, qual das composições
possui melhores propriedades mecânicas. Deste modo, a Tabela 1 ilustra as variações
dos arranjos feitos.
Tabela 1 - Variações dos arranjos
Fonte: O Autor
foi utilizada uma fita métrica para dimensionar cada corpo de prova na placa laminado e
uma caneta para demarcar a linha do corte.
Seguindo a norma da ASTM D 3039, que é utilizada para que seja determinada a
resistência à tração em compósitos, foi feito o ensaio mecânico de tração na
Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Blumenau, que possui no
Laboratório de Ensaios Mecânicos uma máquina Universal de Ensaios Instron, modelo
EMIC 23-100. A temperatura média ambiente no dia foi de 18 ºC e a umidade relativa
do ar de 83%.
Fonte: O Autor
𝐹
σ= 𝐴
(1)
∆𝑙
ε= 𝑙0 (2)
σ
𝐸= ε
(3)
O valor da tensão (σ) é obtido através da Equação 1, com a razão entre a força (F) e o
valor instantâneo da área da seção transversal (A). A deformação do material é calculada
através da Equação 2, que relaciona o deslocamento (∆𝑙) e o comprimento inicial (𝑙0) do
corpo de prova. Assim, seguindo os princípios da Lei de Hooke, é possível obter o
Módulo de Elasticidade (E) através da Equação 3, que relaciona o valor de σ com ε.
Após o cálculo das propriedades das amostras de cada configuração, foi possível
calcular a média, o desvio padrão e o Intervalo de Confiança (IC) da tensão máxima, da
deformação máxima e do módulo de elasticidade de cada modelo, aplicando a
distribuição t de Student com nível de confiança 95% e Nível de Significância (NS) 5%.
De acordo com Barbetta et al. (2009), o Intervalo de Confiança pode ser calculado pela
Equação 4.
𝑠
𝐼𝐶 = 𝑥𝑚 ± 𝑡 (4)
𝑛
Deste modo, foi possível calcular a média da tensão máxima admissível, a média da
deformação máxima e a média do módulo de elasticidade de todas as configurações
produzidas. Com exceção da configuração 8, que possui apenas quatro corpos de prova,
todas as demais possuem cinco amostras para a análise.
A Tabela 3 indica os valores obtidos no cálculo da média da tensão máxima, que indica
que a configuração inicial sustenta uma maior tensão (em MPa) ao mesmo tempo que a
configuração 8, que é uma das menos espessas, se mostrou menos resistente. Na
configuração 6, que é a mais fina, foi considerado que houve incerteza nos dados
obtidos, pois houve um elevado escorregamento das amostras nas garras das células de
carga e essa imprecisão resultou em um valor elevado para a média da tensão máxima
admissível. Já a Figura 4 ilustra um gráfico comparativo da média dos valores obtidos.
Tabela 3 - Média da tensão máxima admissível
Fonte: O Autor
Como a deformação nos tecidos de fibra de vidro é maior que a deformação nas mantas
devido ao fato da organização das fibras contínuas sustentar tensões mais elevadas antes
de romper e proporcionar maior alongamento das amostras, as que tiveram elevada
deformação foram as configurações mais espessas, que possuem tecido nas camadas de
organização. A Tabela 4 apresenta a média de deformação máxima das configurações
submetidas ao ensaio de tração e a Figura 5 ilustra um gráfico comparativo desses
valores obtidos durante o ensaio.
Como o ensaio foi realizado sem um extensômetro, que tem a função de medir a
deformação mecânica das amostras submetidas ao ensaio mecânico de tração, é possível
que sua ausência tenha ocasionado essa elevada dispersão dos valores, como das
configurações 6 e 8, que tiveram elevado alongamento médio das amostras, mesmo sem
possuir camada de tecido na organização das mesmas. As bolhas geradas no material
durante o processo de laminação manual também podem ter interferido nos dados
obtidos. Além desses fatores, vale destacar que a máquina de ensaio mede o
deslocamento das garras e não a deformação real do corpo de prova, o que pode
acarretar numa interferência nos valores resultantes.
Seguindo o fato da existência da incerteza de dados, o módulo de elasticidade foi
calculado através de uma análise considerando um intervalo de tensão de 35 MPa até 50
MPa, sendo considerada a porção linear em comum da curva de tensão-deformação das
amostras. Quanto maior o módulo de elasticidade do material, menor a deformação
elástica do emprego de uma tensão e mais rígido ele será. Assim, com a obtenção do
valor do módulo de elasticidade é possível indicar a rigidez do material. Como o tecido
possui uma organização melhor dos fios da fibra de vidro, ele apresenta maior
resistência mecânica quando comparado à manta de fibra de vidro, que possui uma
descontinuidade das fibras em sua estrutura (NASSEH, 2007).
A Tabela 5 traz a média do módulo de elasticidade das configurações e a Figura 6
demonstra o gráfico comparativo dos dados.
Tabela 5 - Média do módulo de elasticidade admissível
4. Conclusões
Foi feita a caracterização das propriedades mecânicas do material compósito produzido
com base no produto utilizado no setor náutico através da comparação entre os dados
obtidos no ensaio mecânico de tração que os corpos de prova foram submetidos, sendo
Referências
AGARWAL, B. D.; BROUTMAN, L. J. Analysis and performance of fiber composites. New York:
Wiley Interscience, 1990.
AL-QURESHI, H. A. Materiais compostos: análises e fabricação. Apostila, Centro de Engenharias da
Mobilidade, Universidade Federal de Santa Catarina, Joinville, 2010. Disponível em:
http://www.bu.ufsc.br/design/Materiais_Compostos.pdf. Acesso em: 28 set. 2022.
AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. D 3039: Standard Test Method for
Tensile Properties of Polymer Matrix Composite Materials. West Conshohocken: Astm International,
2014. Disponível em: https://www.astm.org/Standards/D3039. Acesso em: 28 set. 2022.
BARBETTA, P. A.; REIS, M. M.; BORNIA, A. C. Estatística para cursos de engenharia e
informática. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
CALLISTER JÚNIOR. W. D.; RETHWISCH, D. G. Ciência e engenharia de materiais: uma
introdução. 8. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2010.
GARCIA, A.; SPIM. J. A.; SANTOS, C. A. D. Ensaios dos materiais. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2012.
GREENE, E. Marine composites. 2. ed. Annapolis: Eric Greene Associates, 1999.
KAW, A. K. Mechanics of composite materials. 2. ed. Florida: CLC Press LLC, 2006.
MARINUCCI, G. Materiais compósitos poliméricos: fundamentos e tecnologia. São Paulo: Artliber,
2011.
MAZUMDAR, S. K. Composites manufacturing: materials, product, and process engineering. Florida:
Crc Press Llc, 2002.
NASSEH, J. Barcos: métodos avançados de construção em composites. Rio de Janeiro: Jorge Nasseh,
2007.
NASSEH, J. Manual de construção de barcos. 4. ed. Rio de Janeiro: Barracuda Advanced Composites,
2011.
NASSEH, J. Técnica e prática de laminação em composites. Rio de Janeiro: Jorge Nasseh, 2008.
TEIXEIRA, L. G. M. Caracterização das propriedades mecânicas de um compósito fabricado com
resina poliéster e fibra de vidro. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Engenharia Naval) –
Centro Tecnológico de Joinville, Universidade Federal de Santa Catarina, Joinville, 2021.