Modernização Na Administração Pública

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As Trajetórias Modernizadoras da Administração

Pública: Brasil e Espanha


Maria Angeles Abellán Lopez, Thiago Ferreira Dias, Carmen Pineda Nebot

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Maria Angeles Abellán Lopez, Thiago Ferreira Dias, Carmen Pineda Nebot. As Trajetórias Mod-
ernizadoras da Administração Pública: Brasil e Espanha. Revista Brasileira de Políticas Públicas e
Internacionais , 2020, 5 (3), pp.251-27. �10.22478/ufpb.2525-5584.2020v5n3.54673�. �hal-03148039�

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As Trajetórias Modernizadoras da
Administração Pública: Brasil e Espanha
Las Trayectorias Modernizadoras de la Administración Pública: Brasil y España

The Modernizing Trajectories of the Public Administration: Brazil and Spain

Maria Angeles Abellán-López1


Thiago Ferreira Dias2
Carmen Pineda Nebot3

DOI: 10.22478/ufpb.2525-5584.2020v5n3.54673

Recebido em: 20/08/2020


Aprovado em: 04/10/2020

Resumo: O objetivo deste trabalho é a análise comparativa das linhas de reformas na


administração pública do Brasil e da Espanha durante o último terço do século XX até o
presente. As principais tendências de modernização estudadas nesta pesquisa são Nova
Gestão Pública, governança e administração eletrônica. A metodologia combina a análise
histórica, o método comparativo e a coleta documental e empírica dos dados extraídos de
ambas as administrações. Entre as conclusões estão as semelhanças e singularidades de
cada caso. Nos dois países, a modernização começou como uma resposta adaptativa às
mudanças e reformas sociais focadas na concessão, privatização e terceirização de
contratos com organizações privadas como prestadoras de serviços públicos. Entre as
diferenças, identifica-se que no Brasil as reformas se concentraram em um período muito
curto, enquanto na Espanha se desenvolveram gradualmente e em sintonia com a União
Europeia.

Palavras chave: Reforma administrativa; Burocracia; Nova Gestão Pública;


Governança; E-administração.

Resumen: El objetivo de este trabajo es el análisis comparado de las líneas de reformas


en la administración pública de Brasil y España durante el último tercio del siglo XX
hasta la actualidad. Las principales tendencias de la modernización estudiadas en esta
investigación son la New Public Management, la gobernanza y la e-administración. La
1
Universitat de València – E-mail: [email protected].
2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DAPGS/UFRN) – E-mail: [email protected].
3
Grupo de Trabalho: Espaços Deliberativos e Governança Pública (GEGOP/CLACSO).
E-mail: [email protected].
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metodología combina el análisis histórico, el método comparado y el acopio documental


y empírico de los datos extraídos de ambas administraciones. Entre las conclusiones se
destacan semejanzas y singularidades de cada caso. En ambos países, la modernización
se inició como respuesta adaptativa a los cambios sociales y las reformas se centraron en
la concesión, privatización y externalización de contratos con organizaciones privadas
como prestatarias de los servicios públicos. Entre las diferencias se identifican que en
Brasil las reformas se concentraron en un período muy breve mientras que en España
fueron graduales y en sintonía con la Unión Europea.

Palabras clave: Reforma administrativa; Burocracia; New Public Management,


Gobernanza, E-administración.

Abstract: The objective of this work is the comparative analysis of public administration
reforms in Brazil and Spain during the last third of the twentieth century to the present.
The main trends of modernization studied in this research are New Public Management,
governance and e-administration. The methodology combines the historical analysis, the
comparative method and the documentary and empirical collection of the data extracted
from both administrations. Among the conclusions are similarities and singularities of
each case. In both countries, modernization began as an adaptive response to social
changes and reforms focused on the granting, privatization and outsourcing of contracts
with private organizations as providers of public services. Among the differences are
identified that in Brazil the reforms were concentrated in a very short period while in
Spain they were gradual and in tune with the European Union.

Keywords: Administrative Reform; Bureaucracy; New Public Management;


Governance; E-Administration.

1. Introdução
A ação política precisa de um instrumento eficaz para se conectar com a
sociedade, e esse instrumento é o que conhecemos como Administração Pública, que
garante a estabilidade do sistema político, o bem-estar coletivo e a coesão social. Dessa
forma, a atividade administrativa não pode ser tratada separadamente dos objetivos
políticos que a sustentam.
Atualmente, enfrentamos um cenário político-administrativo global muito
complexo e, nas últimas décadas, houve profundas transformações que afetaram a
organização, o funcionamento e a igualdade de legitimidade das Administrações Públicas.
Toda transformação da sociedade se reflete nas administrações públicas a ponto de se
dizer que são as instituições das democracias que mais mudanças experimentaram nas
últimas décadas.
As mudanças sociais, econômicas e culturais das últimas décadas do século XX
conduziram a um processo de modernização das funções e estruturas de nossas

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organizações públicas sem precedentes. Neste ponto é essencial distinguir a


modernização da reforma administrativa. Quando falamos em modernização, nos
referimos a um processo de melhoria da atividade pública em termos de eficiência,
eficiência e efetividade, a fim de melhorar a burocracia, os canais de comunicação, a
participação e a informação cidadã e aumentar a transparência institucional. A
modernização das Administrações Públicas tem como principal objetivo o cumprimento
dos propósitos confiados ao aparato estatal para atender à sociedade e prestar melhores
serviços públicos. O fundamento final é a convicção de que não pode haver uma boa
sociedade sustentável sem uma boa administração. Portanto, a modernização
administrativa engloba um processo complexo e demorado no qual as Administrações
Públicas devem se adaptar ao entorno e reagir a profundas mudanças econômicas, sociais,
tecnológicas e culturais que impactam o sistema político (Dahrendorf, 1990; García
Pelayo, 1991; Moore, 1998; Giddens, 1999; Barzelay, 2002; Stiglitz, 2003; Aguilar
Villanueva, 2008). Por outro lado, a reforma administrativa refere-se a uma mudança no
desenho institucional das Administrações Públicas com mudanças normativas,
procedimentais e orçamentárias em diferente grau.
O Estado contemporâneo é o arquiteto da ação estruturadora da sociedade e, ao
mesmo tempo, seu regulador constante em um ambiente extremamente complexo e
interdependente. Essa complexidade não só afeta a sociedade, mas também a mesma
arquitetura estatal com aumento de suas estruturas, funções, órgãos, agentes e processos.
Todos os elementos do sistema político administrativo estão constantemente em
transformação e com eles se transforma a sociedade (Abellán-Lopez, 2019).
O modelo contemporâneo da Administração Pública foi inspirado em quatro
fontes doutrinárias: a) o clássico modelo burocrático weberiano; b) o modelo
neoburocrático que utiliza processos de tomada de decisão racionais; c) o modelo
institucional que destaca a importância do behaviorismo; e, d) o modelo de escolha
pública utilizado pela economia política (Denhardt, 2003).
No último terço do século XX, várias reformas foram realizadas na
Administração Pública nos países ibero-americanos e na Espanha, com a necessária
correlação da modernização política interconectada aos processos de mudança global. Os
Estados enfrentam problemas financeiros significativos que têm impacto no
questionamento da gestão pública. Em meio a esse debate, surgiram diferentes linhas de
pensamento político administrativo que defendem um enfoque menos burocrático. Em

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consequência, a gestão pública começa a se vincular a fenômenos como redução do déficit


fiscal, qualidade dos serviços públicos, descentralização funcional, orientação cidadão-
cliente, redesenhos de processos, o gerencialismo, a supressão do formalismo e a
terceirização de serviços. De tudo isso, surge uma onda reformista na teoria e na prática
real da Administração Pública (Pollit, Van Thiel e Homburg, 2007).
Modernizar a gestão pública está vinculada à eliminar a burocracia, dando
flexibilidade, calculando os custos econômicos reais das transações públicas e
aumentando a receptividade aos cidadãos (OCDE, 1987; Osborne e Gaebler, 1994). O
paradigma pós-burocrático administrativo emerge em torno do processo modernizador,
como uma superação do modelo weberiano de pensar e agir nas questões públicas.
Este trabalho abordará as quatro correntas administrativas que produziram mais
impacto na modernização das Administrações Públicas brasileira e espanhola: a nova
gestão pública (NPM en inglés), agovernança, a e-administração (também conhecida
como administração 2.0) e o novo serviço público.
O objetivo deste trabalho é uma análise comparativa e sistematizada das
principais linhas de modernização implementadas na Administração Pública do Brasil e
da Espanha. Os processos democratizadores de ambos os países, coincidindo com a
terceira onda de democratização (Huntington, 1991), envolveram uma profunda
modernização política administrativa para adaptar suas estruturas às instituições
democráticas constitucionais. Ou seja, a modernização administrativa começou em
ambos os sistemas políticos com a adaptação de suas estruturas ao novo regime
democrático e uma redefinição do papel estatal. Dessa forma, esta pesquisa percorre as
trajetórias modernizadoras das Administrações Públicas do Brasil e da Espanha, o que
contribui para ampliar o conhecimento administrativo comparativo dos casos
selecionados.
Este trabalho está organizado da seguinte forma. Após essa introdução e
metodologia, é oferecido o arcabouço do contexto histórico político do Brasil e da
Espanha, o que permitirá captar mais de forma mais refinada a influencia da
modernização administrativa. Em seguida, o estudo analisa o processo de modernização
administrativa no Brasil e na Espanha, a burocratização das estruturas públicas e as
reformas do NPM. Em continuidade são identificadas as principais inovações e reformas
que acompanharam a transformação digital nas Administrações Públicas contemporâneas

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são identificadas abaixo. Por fim, são formulados alguns desafios para as Administrações
Públicas do Brasil e da Espanha no atual contexto global e digital.

2. Metodologia
Esta pesquisa utiliza o método histórico para fazer um percurso ao presente e ao
método comparativo aplicado ao Brasil e à Espanha. A estratégia de pesquisa que foi
seguida é a comparação binária que se refere a dois casos: Espanha e Brasil, que destacam
as principais semelhanças e diferenças (Morlino, 2010).
A metodologia baseia-se na revisão bibliográfica sistemática, na sistematização
das experiências reformistas, no estudo das instituições formais e em suas performances
regulatórias e procedimentais, bem como a análise documental e empírica das
administrações brasileira e espanhola (Corbetta, 2010; Marconi e Lakatos, 2010). Foram
estudadas legislações, relatórios, bancos de dados, planos de modernização sobre gestão
pública, boletins oficiais, diversos manuais, regulamentos de fiscalização e agendas
digitais de diversas instituições nacionais e internacionais. A pesquisa documental facilita
o estudo e fornece informações relevantes sobre acontecimentos do passado e permite o
monitoramento e o sequenciamento cronológico até a atualidade. Quanto à literatura
sobre reforma e modernização das administrações públicas, políticas públicas, nova
gestão pública, governança e e-administração. Este estudo comparativo do Brasil e da
Espanha oferece grande valor interpretativo e contribui para um maior conhecimento de
suas trajetórias modernizadoras.

3. Contextualização política administrativa da Espanha e do Brasil


Antes de introduzirmos plenamente nas principais trajetórias de modernização
política administrativa, parece necessário realizar uma contextualização.
A singularidade e relevância dos casos comparativos do Brasil e da Espanha
residem na coincidência do início de seus processos de modernização com mudanças
políticas decorrentes da passagem do autoritarismo para a democracia. Os processos
transitórios buscaram democratizar as estruturas administrativas para acomodar o novo
sistema político e alcançar a necessária legitimidade.
Em seguida, é oferecida uma visão histórica sumária da Espanha e do Brasil para
captar a recepção das reformas que foram implementadas em ambos os sistemas políticos.

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No caso espanhol, cabe destacar que se passaram mais de quarenta anos desde o
início da transição democrática e do processo de descentralização política administrativa.
Parece apropriado assinalar que este trânsito não foi uma crise de regime, mas uma
mudança integral do sistema político, social e econômico. A crise de legitimidade do
franquismo foi acompanhada por um desmantelamento total de suas instituições
envolvendo um setor da classe política do mesmo franquismo (Linz, 1992; Tezanos,
Cotarelo e De Blas, 1993).
O crescimento econômico do falecido Franquismo (1962-1975) derivado do
Plano de Estabilização de 1959, produziu desenvolvimentismo tecnocrático e expansão
econômica sem precedentes. Assim, na última década de franquista foram implementadas
reformas no serviço público e na liberalização econômica; e foram criadas grandes
estruturas como a Previdência Social ou o Instituto Nacional da Indústria. Este
crescimento do público e as mudanças sociais condicionaram os processos políticos
subsequentes que contribuíram para a transição democrática.
O primeiro passo consistiu em se legitimar tanto na origem como do exercício.
A legitimidade da origem veio através de um consenso político que garantiu uma saída
democrática e levou à Constituição espanhola de 1978. A legitimidade do exercício fez
com que as instituições do Estado orientassem sua atividade administrativa aos propósitos
constitucionais do Estado social e democrático de direito.
Nesta primeira fase de modernização, os esforços se concentraram na
democratização do aparato público, na descentralização política administrativa e na
construção do Estado de bem-estar.
Em resumo, as reformas administrativas durante o asno oitenta e início dos anos
noventa foram pouco ambiciosos e com uma clara vocação para resolver aspectos
concretos ou pontuais. A dimensão do setor público e sua racionalização burocrático-
administrativa tornaram-se os andaimes estruturais que permitiram a transição para a
democracia mudando estruturas e instituições, mas sem romper a legalidade formal.
Em relação ao Brasil, parece apropriado voltar um pouco mais ao tempo para
avaliar mais refinadamente o papel da reforma administrativa. De fato, a modernização
administrativa começa com a expansão e consolidação do modelo burocrático no governo
federal, em 1936, com a intenção de diminuir ou neutralizar o patrimonialismo herdado
da monarquia absolutista brasileira (Paludo, 2013). A mudança liderada por Getúlio
Vargas (chamada revolução de 1930) colocou em marcha uma transformação que, em

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termos de mudança administrativa, foi o início de um processo de padronização da


Administração Pública em aspectos fundamentais da gestão de pessoas, materiais e
financeiras (Lima Junior, 1998). Alguns dos principais aspectos desta época que merecem
ser destacados são: a) a intenção de implementar estruturas gerenciais e de coordenação;
b) a aspiração de implementar um processo de racionalização na administração; c) o
surgimento das primeiras carreiras burocráticas; d) o propósito de adotar o concurso como
forma de acesso ao serviço público; e) as mudanças na forma como são gerenciados os
recursos humanos e orçamentários; f) a implementação de mecanismos de controle na
burocracia para romper com o clientelismo e o patrimonialismo.
Em 1937, com a criação do Departamento de Administração do Serviço Público
(DASP), previsto na Constituição de 1937, pôs em curso um dos elementos fundamentais
da modernização administrativa brasileira. O DASP será o responsável pela
implementação burocrática do país, cuja principal missão era definir e executar a política
responsável pela gestão de pessoal que incluísse concursos públicos e a capacitação
técnica necessária para o uso de métodos de racionalização no serviço público e o
desenvolvimento de orçamentos (Lustosa, 2008).
Assim, realizou o primeiro esforço institucional para combater o
patrimonialismo e aplicar os princípios de eficiência e efetividade na Administração
Pública. No entanto, enquanto iniciativas de reforma administrativa foram promovidas, a
verdade é que elas tiveram um caráter inacabado. As posteriores mudanças políticas, que
combinam ciclos democráticos e autocráticos (ditadura militar de 1964 a 1985), não
permitiram a realização de muitas mudanças (Rezende, 2004). Embora nesses anos, mais
especificamente em 1967, algumas reformas de descentralização foram realizadas: dentro
dos quadros da administração federal; da administração governamental para órbita
privada; e da União para os governos locais. Além da descentralização da gestão de
recursos (pessoal, material, finanças).
Recentemente, já na década de 1990, o Brasil retomou com a volta da
democracia sua agenda de reformas administrativas.
Após essa contextualização histórica sumária, podemos concordar que o
processo de modernização espanhola e brasileira começou com a democratização de todas
as suas estruturas político-administrativas e a subsequente redistribuição do poder. No
caso da Espanha, um processo de descentralização política foi acompanhado pela criação
de comunidades autônomas e a institucionalização de um Estado de bem-estar garantidor.

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No caso do Brasil, foi a primeira tentativa de implementar e consolidar o modelo


burocrático na Administração Pública Federal.
Nos próximos item, aprofundaremos sobre as mudanças modernizadoras
experimentadas em ambas as administrações públicas.

4. As trajetórias de modernização e reforma das administrações públicas como


resposta adaptativa
4.1. Mudanças estruturais iniciais
Nesta primeira etapa, os esforços políticos de Espanha se dirigem a adaptar
mudanças nas estruturas administrativas que no caso espanhol consistiram em ajustes
institucionais para o advento de um novo regime democrático e a descentralização política
que se inicia em 1978. A prioridade se centrava em dar soluções rápidas aos problemas
políticos da Espanha e nem tanto a busca de efetividade administrativa. Estes processos
reformistas implicam numa redefinição do papel do Estado, uma nova realocação
organizativa com três níveis territoriais diferenciados: o central, o autonômico e o local.
As reformas administrativas durante estes anos foram pouco ambiciosas e com uma clara
vocação de solucionar aspectos concretos ou pontuais porque o principal problema era a
mudança política. A reforma da função pública foi um passo essencial porque até 1984
não se elaborou legislação constitucional nesta matéria. A Lei 30/1984, de 2 de agosto,
de Medidas para a Reforma da Função Pública foi um avanço fundamental porque
incorporou instrumentos de gestão para melhorar a eficácia e a transparência da
ordenação dos empregos públicos. Esta lei conseguiu reduzir o número de carreiras,
aumentar a mobilidade horizontal, introduzir o posto de trabalho como elementos de
planejamento e racionalização das estruturas administrativas e mudar o sistema
remunerativo vinculando-o ao posto desempenhado e a produtividade. Até a chegada da
democracia, as carreiras superiores tinham predomínio no conjunto do Estado e na
repartição de poder. O pluralismo político, os partidos políticos, os sindicatos e o auge da
sociedade civil diminuíram em certa forma o poder da alta função pública.
Em relação ao Brasil, a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 200, em 1967,
promoveu um amplo programa de mudanças organizacionais com o objetivo de
consolidar o modelo de Administração Pública Desenvolvimentista. Esse modelo
introduziu uma combinação do modelo burocrático weberiano com ideias de
racionalização baseadas em Taylor e Fayol, adaptadas às condições políticas brasileiras

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em pleno regime ditatorial (Lustosa, 2008). Além das mudanças organizacionais é


possível identificar cinco princípios que articulam a reforma proposta no Decreto-Lei nº
200: a) planejamento, descentralização, delegação de autoridade, coordenação e controle;
b) expansão de empresas estatais, órgãos independentes (fundações) e empresas semi-
independentes (municípios); c) fortalecimento e ampliação do sistema de mérito; d)
desenvolvimento de diretrizes gerais para um novo plano de classificação de postos de
trabalho; e) reagrupamento de departamentos, divisões e serviços em 16 ministérios
(Warlich, 2013).
A reforma de 1967 fez progressos significativos, embora não tenha eliminado a
distância entre Administração Direta e Indireta. Em resumo, estamos em uma etapa de
busca de legitimidade e institucionalização das estruturas políticas administrativas. A
necessidade de dar à sua administração pública flexibilidade e eficiência é a razão pela
qual o Brasil inicia um processo reformista profundo.

4.2. A ascensão da nova gestão pública na era da globalização


Como mencionado acima, a gestão pública foi criticada por sua natureza formal
burocrática, iniciando um debate global que possibilitou a superação do paradigma
clássico weberiano. O novo paradigma pós-burocrático, conhecido como nova gestão
púbica, defende flexibilidade, eficiência, orientação cidadã como consumidor de serviços
públicos (OCDE, 1999, 2003, 2014; Kooiman, 1993, 2003; Metcalfe & Richards, 1993;
Al Gore, 1994; Osborne e Gaebler, 1994; Barzelay, 2001; Bouckaert, 2003).
Seu ponto de partida é a existência do homo economicus, indivíduos racionais,
informados e calculistas, que tentam maximizar a utilidade de suas escolhas, de acordo
com a análise custo-benefício (Buchanan e Tullock, 2014).
O paradigma burocrático e pós-burocrático enfrenta duas visões: a primeira,
mais jurídica e garantista é próprio do Direito Público e a segunda, orientada para os
resultados e a eficiência, que aposta num modelo neoempresário. A partir do cruzamento
dessas duas visões de compreensão da Administração Pública surgem as seguintes
trajetórias modernizadoras para os casos da Espanha e do Brasil.
Na abordagem das trajetórias se estabeleceram as principais linhas de
reformistas das estruturas administrativas que não constituem um catálogo fechado, mas
uma ferramenta que facilita seu tratamento analítico. No caso espanhol, o início das

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reformas coincide com a transição para a democracia em 1978. Para o Brasil, o


desenvolvimento das reformas começou na década de 1960 durante a ditadura.
Se, na primeira etapa, era democratizar as estruturas políticas administrativas, a
segunda etapa buscava reformá-las para melhorar sua eficiência e resultados. A NPM se
dividiu fortemente na maioria das democracias ocidentais, graças à disseminação de obras
como A Reinvenção do Governo (Osborne e Gaebler, 1994), Criar uma Administração
Pública que funcione melhor e custe menos (Al Gore, 1994) e os conhecidos documentos
da OCDE A Transformação da Gestão Pública (1999). Tanto na Espanha quanto no
Brasil, os processos de reforma inspirados no NPM tiveram um espetacular
desenvolvimento. No caso da Espanha, um grande evento foi a sua entrada na
Comunidade Europeia, atual União Europeia (UE), que tem sido decisiva para a
europeização e modernização das estruturas públicas espanholas.
Na Espanha o impulso político permitiu a adoção de um conjunto de medidas
baseadas no documento Reflexões para a modernização do Estado que foi elaborado pelo
Ministério de Administrações Públicas em 1990. Além disso, a necessidade de cumprir
os requisitos de Maastrichtt, a insatisfação dos cidadãos com os serviços públicos, as
experiências de modernização que tinham lugar em países do nosso entorno e a
incorporação de novas tecnologias da informação impulsionaram as diferentes iniciativas
reformistas. Trata-se de uma década de reformas administrativas que consistem no
redesenho de processos e a redução de circuitos administrativos, a implementação de
planos estratégicos e de qualidade (ISO 9000, modelo EFQM, TQM), a modernização da
função pública (quadro de controle de comando, RPT), reforma do plano de contabilidade
e a gestão orçamentária para todas as Administrações Públicas espanholas,
benchmarking, auditorias da gestão pública, desregulamentação e a introdução de
elementos quase competitivos como a contratação externa ou terceirização, as concessões
de infraestrutura e o surgimento das privatizações.
Esse período recorda a entrada em vigor de uma importante lei que alterou
substancialmente a administração espanhola e os direitos administrativos da cidadania: a
Lei nº 30/1992, de 26 de novembro, sobre o Regime Jurídico das Administrações Públicas
e o Processo Administrativo Comum (LRJPAC). Sua principal tarefa foi simplificar as
estruturas administrativas, reforçar as garantias dos cidadãos e reconhecer o
procedimento administrativo como parte básica no processo de modernização da
sociedade e de sua administração. Alguns anos antes, a Lei nº 30/1984, de 2 de agosto,

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sobre Medidas para a reforma da Função Pública que introduziu uma reordenação dos
recursos humanos que, embora não alterasse seu desenho burocrático, si quer iniciou uma
reflexão sobre as características do serviço público que levaram ao mal funcionamento
da Administração.
Em relação ao Brasil, a década de 1990 traz ventos democráticos que favorecem
algumas medidas. Assistiu-se um contexto de estabilidade na economia, com o sucesso
da implementação do Plano Real, que promoveu uma nova política monetária e fiscal
acompanhada de um controle da inflação nacional. A convocatória eleitoral de 1994 teve
a liderança de Fernando Henrique Cardoso e do Plano Real em cuja agenda
governamental estava a Reforma Administrativa. O arquiteto do desenvolvimento desta
iniciativa foi o professor Luis Carlos Bresser Pereira, como Ministro da Administração e
Reforma do Estado de 1995 a 1998.
Ele foi responsável pelo desenvolvimento do Plano Diretor de Reforma da
Previdência Estadual (PDRAE, 1995) que apresentava um diagnóstico da situação e
assinalava objetivos, ações e metas para a mudança da Administração Pública em termos
de efetividade, eficiência e efetividade. Esse marco reformista foi a base para a
formulação e aprovação de leis que mudariam as práticas na Administração Pública, como
a Emenda Constitucional nº 19/1998. Bresser-Pereira (1996) inspirou-se tanto pelas
reformas implementadas no Reino Unido e Estados Unidos, bem como a recepção de
alguma influência europeia. Esse movimento de reforma estatal ficou conhecido no Brasil
como Reforma Gerencial. Seu primeiro diagnóstico foi apontar a existência de quatro
estruturas dentro do Estado: a) o núcleo estratégico do Estado; b) as atividades exclusivas
do Estado; c) serviços não exclusivos ou competitivos; d) a produção de bens e serviços
para o mercado (Bresser-Pereira, 1996; Brasil, 1995).
O núcleo estratégico é composto, no âmbito federal, do Presidente da República,
dos Ministros de Estado e da cúpula dos ministérios, responsável pela definição de
políticas públicas; O Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado), responsável
pela formulação das leis; e os tribunais nacionais e o ministério público, responsáveis
pelo cumprimento da lei.
As atividades exclusivas estatais são aquelas que só podem ser realizadas por
representantes e/ou funcionários do Estado, ou seja, não podem ser delegadas. Inclui
policiais, forças armadas, órgãos de fiscalização e regulação, e órgãos responsáveis pelas

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transferências de recursos, como o Sistema Único de Saúde, o sistema de assistência ao


desemprego, etc.
Os serviços não exclusivos ou competitivos de Estado são aqueles que, embora
envolvam propriedade estatal, a gestão do serviço pode ser realizada por terceiros
(terceirização). Recordemos que a incorporação de mecanismos flexíveis para a
aquisição e terceirização de serviços públicos foi um compromisso do NPM. Por essa
razão, foi fomentada uma visão sociocêntrica de maior descentralização da ação estatal,
onde as organizações privadas poderiam realizar serviços de interesse público e, assim,
foi estabelecida nas Leis nº. 8.637/1998 e nº 9.790/1999, que criaram a possibilidade de
qualificação de pessoas jurídicas em direito privado e sem fins lucrativos, como
Organizações Sociais (OS) e Organizações de Interesse Público da Sociedade Civil
(OSCIP) e Decreto nº 3.100, de 30 de junho de 1999, que regulamenta a Lei nº
9.790/1999.
Por fim, a produção de bens e serviços para o mercado é realizada pelo Estado,
por meio de empresas de economia mista, atuando em setores de serviços públicos e/ou
setores considerados estratégicos. Em sua maioria, tais empreendimentos foram
privatizados ou operados sob concessão para serem operados no mercado por meio de um
Plano de Desestatização. Um apoio a essas medidas foi a iniciativa de criação de
"organismos autônomos", cunhados sob o nome de agências reguladoras que seriam
reguladores das atividades privatizadas.
Segundo o principal formulador, Bresser-Pereira (1996), a Reforma Gerencial
foi a promoção de mudanças em busca da eficácia, eficiência e a efetividade dos serviços
públicos a sociedade. Do exposto até o momento, podemos afirmar que houve luzes e
sombras, êxitos e fracassos nestas ambiciosas reformas. Segundo Ramos (1989) e Salm e
Menegasso (2009), o principal problema do modelo da NPM é a usurpação da esfera
privada, já que é o mercado y não a sociedade politicamente articulada a principal
referência para a Administração Pública.
Outras limitações assinaladas por Paes de Paula (2005) são: a) a constituição de
uma nova elite burocrática; a centralização do poder nos poderes executivos; inadequação
da aplicação de técnicas e práticas do setor privado no setor público; dificuldade em lidar
com a complexidade dos sistemas administrativos e a dimensão sociopolítica da gestão e;
incompatibilidade entre a lógica da gestão e o interesse público. Tais limitações

Revista Brasileira de Políticas Públicas e Internacionais, v. 5, n. 3, dez./2020, pp. 247-268.

262
Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

alimentaram críticas crescentes ao modelo, abrindo caminho para novas propostas para a
produção de serviços públicos.
As expectativas depositadas na NPM não só não foram cumpridas como
decepcionadas, produzindo questionamento de seus postulados. Dessa forma, surgiram
duas correntes críticas complementares. A primeira é denominada de novo serviço
público (NSP) e a segunda é conhecida como neoweberianismo. O NSP critica a
assimilação dos cidadãos como cliente-consumidor e defende a cidadania democrática
como um valor mais elevado sobre uma visão puramente empresarial. Sua principal
contribuição é a defesa de uma nova abordagem para a gestão pública, aberta aos valores
democráticos, de interesse geral e a incorporação dos cidadãos na deliberação e
participação em todas as etapas das políticas públicas, mas sem renunciar a ideia de criar
uma administração eficiente (Denhardt e Denhardt, 2001, 2003; 2007). Por sua vez, a
abordagem neoweberiana reafirma o valor do serviço público como valor per si para
evitar a demolição de estruturas públicas, salvaguardar a segurança jurídica, reafirmar o
público frente ao mercado e fortalecer o status de cidadania (Pollit & Bouckaert, 2004;
Pollitt, van Thiel & Homburg, 2007; Aguilar Villanueva, 2006, 2013).

4.3. E-administração, participação cidadã e neoweberianismo


Na primeira década do século XXI, as duas maiores preocupações são adaptar a
Administração a novas tecnologias de informação e comunicação (TIC) e focar na
satisfação dos cidadãos.
A adesão da Espanha à União Europeia favorece a implementação da e-
Administração, de mãos dadas com a Internet e a telefonia móvel. A UE propunha a
promover o desenvolvimento e a disseminação das TIC’s entre todos os cidadãos dos
Estados-Membros.
Para isso, as instituições comunitárias estabeleceram um objetivo estratégico de
preparar a mudança para uma economia e sociedade do conhecimento, baseadas na
sociedade da informação e de P&D, acelerando a competitividade e a inovação, com
vistas a alcançar o pleno emprego e fortalecer a coesão na UE. Tais iniciativas seriam
refletidas no Plano de Ação da e-Europe (Conselho Europeu de Lisboa, 23 e 24 de Março
de 2000).
Pensemos que a Comissão Europeia sustentou que as TIC eram a essência de
toda a administração moderna. No desenvolvimento desse cenário digital, as

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263
Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

administrações espanholas promoveram a administração eletrônica por meio de diferentes


diretrizes europeias. O White Paper para o Aperfeiçoamento dos Serviços Públicos (2000)
foi levantado como uma reflexão sobre os requisitos de adaptação da Administração e do
Plano de Qualidade para a Administração Geral do Estado, que enquadra iniciativas como
cartas de serviço, avaliação, qualidade nos serviços públicos, capacitação de funcionários
e gestores públicos, receptividade, a flexibilidade das formas de gestão e racionalização
administrativa.
Este período é muito produtivo posto que coincidindo com a vitória eleitoral dos
socialistas em 2004, num contexto de bonança e prosperidade, as tendências anteriores
vão se consolidando. A implementação das novas tecnologias cresce exponencialmente,
se generaliza a assinatura digital, os trâmites eletrônicos e a expansão dos escritórios
virtuais. A administração eletrônica ou e-Administração pode ser definida como a
“utilização de tecnologias de informação e comunicação e, em particular a internet, com
o objetivo de melhorar a gestão dos assuntos públicos" (OCDE, 2003). As referências
usadas para se referir a administração eletrônica admitem vários rótulos como e-
Administração, e-Governo, Democracia 2.0, Governo Aberto e Dado Aberto. Estas duas
últimas denominações alcançaram notável sucesso na literatura político administrativa4.
Neste período, o governo da Espanha articulou diferentes planos reformistas que
visavam implementar a e-administração como o Plano Avança, que permitiu gerenciar a
e-administração entre 2005 e 2012. O objetivo era a transição de um modelo "Ilhas" para
um modelo baseado na interoperabilidade e colaboração entre administrações multinível.
A partir de 2013, foi implementada a conhecida Agenda Digital convertida na atualidade
em Agenda Espanha Digital 2025, cujos objetivos são a implantação do 5G, a
Cibersegurança, a Inteligência Artificial e os direitos digitais dos cidadãos.
À medida que se implementava a e-administração, o contexto social demandava
cada vez mais medidas de governança, transparência e bom governo. Como
consequência, as exigências de transparência da informação, de reaproveitamento dos
dados públicos e as políticas públicas participativas contribuíram para a generalização da
administração digital.

4
O Governo Aberto é baseado na transparência, participação e colaboração em governança (Lathrop &
Ruma, 2010). O grande objetivo do Governo Aberto é uma mudança cultural e de valores no público. Uma
das iniciativas pioneiras do Governo Aberto foi a promovida pelo presidente americano Barack Obama.
Por sua vez, o conceito de Dados Abertos refere-se à abertura de dados em formatos abertos e à interconexão
entre as administrações públicas.

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Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

No caso do Brasil, foi a criação do Comitê Executivo de Governança Eletrônica


(Grupo de Trabalho Interministerial), que se constituiu para propor políticas, diretrizes e
normas relacionadas às novas formas eletrônicas de interação no Estado (Dias, Sano e
Medeiros, 2019). Assim, no ano de 2001, foi lançada a Política de Governo Eletrônico no
Brasil para desenvolver a política digital brasileira e com o Decreto nº 5.234, de 7 de
julho de 2004, criou o Departamento de Governo Eletrônico. Essa estrutura se
encarregaria da articulação e coordenação das ações governamentais eletrônicas, como a
prestação de serviços públicos no ambiente eletrônico e a padronização das ações e a
disseminação de informações governamentais eletrônicas na Administração Pública
Federal.
O compromisso do Brasil com a e-administração chegou a tal ponto que a ONU,
em 2001, considerou as boas práticas de governo eletrônico brasileiro entre as vinte
melhores do mundo. No entanto, sete anos depois, passou do 18º para o 45º (Prado, 2009)
no ranking de boas práticas.
Ainda assim, pode destacar práticas exitosas implementadas como: declaração
anual de Imposto de Renda, o Sistema Eletrônico de Compras Públicas, os Sistemas
Eleitorais Eletrônicos que utilizam as urnas eletrônicas e o lançamento do Portal de
Convênios em 2008 e aprovação da Estratégia Geral de Tecnologia da Informação dos
órgãos do Sistema de Administração de Recursos Tecnológicos da Informação (SISP)
(Dias, Sano e Medeiros, 2019).
É importante ressaltar que durante esse período as reformas administrativas
idealizadas no PDRAE (Brasil, 1995) foram realizadas pela Administração Pública
Federal e exerceram uma grande influência na implementação da administração
eletrônica, mudanças legais e de gestão de pessoas para promover economia e a melhoria
a carteira de serviços públicos aos cidadãos.
Em continuidade, o Quadro 1 sintetiza as trajetórias reformistas do Brasil e da
Espanha.

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Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

Quadro 1: Principais trajetórias reformistas do Brasil e da Espanha


Correntes Melhores resultados
políticas
administrativas Espanha Brasil
Democratização de estruturas Criação da Secretaria de
políticas administrativas Administração de Serviços Públicos
Descentralização e (DASP), que promoveu os principais
Burocracia
desconcentração alicerces da modernização
weberiana
Busca de legitimidade e administrativa burocrática brasileira.
Institucionalismo
pluralismo
Segurança jurídica
Plano Diretor de Reforma do
Europeização Aparato Estadual (PDRAE, 1995)
Qualidade (ISO 9000; EFQM) como motorista de mudanças
Cartas de serviço institucionais (estrutura e lei),
Redesenho de processos culturais e gerenciais (instrumentos
Gestão de RH administrativos de organizações
Nova Gestão Privatização de serviços públicos privadas)
Pública (NPM) Diferenciação entre propriedade e - Redesenho das estruturas de
gestão. fornecimento de políticas
públicas;
- Adoção de processos e
instrumentos da gestão privada;
- Privatização e concessões
públicas
Digitalização integral Política de Governo Eletrônico no
Interoperabilidade Brasil em 2001.
e-Administração
Enfoque na igualdade e gênero na Decreto nº 5.234, de 7 de julho de
Governança
política pública 2004, que cria o Departamento de
Novo serviço
Governança territorial multinível Governo Eletrônico
público
(reformas do Estatuto do CCAA,
implementação de conferências
setoriais)
Governo Aberto (Membro Fundador
da Parceria para o Governo Aberto
Estabilidade orçamentária
Neoweberianismo nº 12.527/2011, conhecida como Lei
Transparência e boa governança
e-Administração de Acesso à Informação)
Governo aberto
Estabilidade nos limites de gasto do
Agenda digital
orçamento público (Emenda
Constitucional nº 95)
Fonte: Elaboração própria.

5. Os novos caminhos e os desafios para a Administração Pública: uma discussão


A NPM foi um paradigma inspirado nas empresas que introduziu inúmeras
mudanças no setor público. Suas reformas que se apresentavam ambiciosas foram
insuficientes para responder às mudanças globais que exigiam inovações mais profundas
na gestão pública. No entanto, deve-se notar que foi uma das trajetórias modernizadoras
com grande impacto tanto no Brasil quanto na Espanha. Em ambos os países, os principais
pontos convergem na implementação de ações para simplificar a estrutura administrativa,

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Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

a racionalização das políticas públicas e a simplificação da burocracia. Além disso, em


ambos os casos foi operado com uma visão focada na concessão, privatização e
terceirização de contratos com organizações privadas como prestadores de serviços
públicos.
Uma das inovações mais significativas foi o avanço do governo eletrônico, e-
administração, que acelerou os tempos e encargos burocráticos (eliminando uma parte da
"papelada") e simplificando os trâmites, graças à as TIC’s e a internet (internet das
coisas).
Segundo Osborne (2006), a nova gestão pública foi uma fase de transição para a
nova governança pública. Nela amplia o marco de intervenção estatal e fortalece a
interação com a sociedade. Essa nova trajetória modernizadora incorpora avanços
significativos das instituições participativas adotando diferentes configurações como
conferências, conselhos, etc., que têm em comum a promoção de espaços para incluir o
processo deliberativo, criando mediações entre Estado e sociedade (Avritzer, 2011). Entre
os principais desafios estão aspectos relacionados à estabilidade econômica, o
desenvolvimento sustentável (Agenda 2030 do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável
da ONU) e transformação digital no serviço público com a superação qualitativa e
quantitativa do gap digital.
Abaixo estão algumas das medidas legislativas mais significativas da última
década no Qaudro 2. Este período (2009-2019) descreve uma das maiores crises
econômicas do mundo, das quais seus efeitos ainda persistem em muitos países e setores
de atividade. Os pacotes legislativos favoreceram a redução dos gastos públicos, da dívida
pública e da consolidação fiscal.
Assim, é possível detectar que as mudanças da modernização administrativa no
Brasil e na Espanha reguardam certo paralelismo. Os dois países foram influenciados
pelas correntes modernizadoras que se estendiam a nível mundial. No entanto, no Brasil,
as mudanças ocorreram em um curto espaço de tempo e a Governança Pública não está
presente de maneira tão relevante quanto na Espanha.
As reformas influenciadas pelo NPM impactaram o Brasil e a Espanha através
do redesenho da oferta de serviços públicos (privatizações e concessões de serviços).
Embora o Brasil tenha sido afetado pela estabilidade econômica, a Espanha (prejudicada
pela crise da dívida pública) se beneficiou da governança por causa de sua adesão à UE.

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Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

Quadro 2: Principais ações reformistas na última década no Brasil e Espanha


Espanha Brasil
A Lei 2/2011, de 4 de março, da Economia Decreto nº 7.746/2012 que estabelece critérios
Sustentável e práticas para promover o desenvolvimento
nacional sustentável nos contratos realizados
Lei 27/2013, de 27 de dezembro, da pela administração pública federal direta, local
racionalização e sustentabilidade da e fundações e pelas empresas estatais.
Administração Local. Instrução Normativa nº 10 que estabelece as
regras para a preparação dos Planos Logísticos
Sustentáveis na Administração Pública Federal.

Modificação do art. 135 da CE para consagrar a Emenda Constitucional nº 95, que impõe
Estabilidade Orçamentária. limites ao gasto público na Administração
Pública Federal.
Lei Orgânica 2/2012, de 27 de abril, de
Estabilidade Orçamentária e Sustentabilidade
Financeira, estabelece objetivos concretos de
gasto e endividamento para todas as AAPP, e
os obriga a cumprir com os objetivos de déficit.

Em 26 de outubro de 2012 o Conselho de Lei nº 12.618/2012, que muda o Sistema de


Ministros aprova um Acordo que por ele cria Previdência Social dos servidores públicos com
uma Comissão para a reforma das criação da Previdência Complementar.
Administrações Públicas (CORA). Lei nº 13.019/2014, Marco Regulamentar das
Organizações da Sociedade Civil que inclui os
Lei 15/2014, de 16 de setembro, de procedimentos que devem observa nas fases de
racionalização do Setor Público e outras procedimentos entre a Administração Pública e
medidas de reforma administrativa. as organizações da sociedade civil.

Informe da OCDE sobre Governança Pública


na Espanha: a reforma administrativa a reforma
contínua.
Lei 19/2013, de 9 de dezembro, de Instrução Normativa n° 04 da Secretaria de
transparência, acesso à informação pública e Logística e Tecnologias da Informação (SLTI)
bom governo. em 2010 e o Plano Nacional de Banda Larga,
Lei nº 7.175/2010, em que as tecnologias de
Lei 25/2013, de 27 de dezembro, incentivo a inovação, comunicação y informação da
fatura eletrônica e criação do registro contábil Administração Pública se ocupam da aquisição
de faturas no Setor Público. de soluções de TI; em 2011 a criação do
Sistema Unificado de Registro de Fornecedores
A Agenda Digital para Espanha. (Sicaf) e o Guia de Gestão de Processos
Governamentais, integrando iniciativas de e-
PING e Gespública do Governo (métodos de
melhorias de práticas em governos);
Lei nº 12.527/2011, conhecida como a Lei de
Acesso a Informação (LAI) que regula a
disponibilidade de dados para a sociedade.
Fonte: Elaboração própria.

Revista Brasileira de Políticas Públicas e Internacionais, v. 5, n. 3, dez./2020, pp. 247-268.

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Abellán-López, Dias & Nebot. As Trajetórias Modernizadoras da Administração Pública

6. Conclusões
Chegado a este ponto, cabe pensar que os desafios das Administrações Públicas
estudadas são numerosos e há um longo caminho a percorrer. Ao longo do artigo,
verificou-se que Brasil e Espanha aderiram aos princípios da nova gestão pública, mas
com um balanço desigual. Embora o caso brasileiro e espanhol tenha se somado à onda
global modernizadora da nova gestão pública, as mudanças no Brasil ocorreram em um
período muito curto de tempo, enquanto na Espanha teve um prazo maior e também se
beneficiou de sua adesão à União Europeia. Por outro lado, a governança, tanto na
Espanha quanto na União Europeia, tem tido um forte impacto e sendo mais suave no
Brasil.
Pensamos que as chaves para o futuro passam pela busca por mais eficiência na
prestação de serviços públicos, a redução do gap digital para que todos os cidadãos
possam acessar a carteira de serviços sem discriminação (que, como se revelou na crise
de saúde do Covid-19), abordar uma análise dos agentes beneficiados em termos
econômicos das concessões e privatizações que eram monopólio ou oligopólio natural
(telecomunicações, eletricidade, indústrias setoriais, sistema bancário) e a implementação
de mais controles e avaliações operacionais. Tudo isso deve ser enquadrado em um
contexto de crescimento das desigualdades sociais que não podem ser negligenciadas.
Entre as futuras linhas de investigação deve considerar: quem têm sido o
beneficiário da modernização administrativa, cidadania, governantes ou atores
econômicos privados?

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