Jorgeadeodato, Art-5
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O VENDEDOR DE
PASSADOS: DA
CONSTRUÇÃO
IDENTITÁRIA
ANGOLANA A
UMA ADAPTAÇÃO
BRASILEIRA
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INTRODUÇÃO
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1 Nessa perspectiva, “sobrenatural” refere ao não natural, irreal. Se faz necessária a colocação da
nota, pois a maior referência que se faz, atualmente, dessa palavra é para ditar monstros em filmes
de hollywood, paradigma ainda não amplamente difundindo quando Tzvetan Todorov escreveu
sua obra.
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PERSONAGENS E NARRADOR
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Desse modo, depois que a ficção se apossa do que seria real tornando
tal elemento falso como única verdade histórica, começa-se a construção de
uma memória social a partir de uma ficcional, evidenciando a necessidade
do povo africano de se reelaborar e colocando José Buchmann como a
representação dessa nação que vive em busca de um passado mais crível
e menos cruel, tentando amortecer – mas não esquecer – o passado do
colonialismo que está impresso na imagem da África.
Ângela Lúcia é uma importante personagem – tanto para o
desenrolar da história como para Félix, uma vez que este sentia uma enorme
afeição e carinho por aquela. Fotógrafa, Ângela adorava fotografar o céu e
os diferentes tipos de luz que percebia com o passar do dia. “Seria possível
resumir toda a sua biografia, disse, em apenas cinco linhas. Nasceu em
Luanda. Cresceu em Luanda. Um dia decidiu sair do país e viajar. Viajou
muito, sempre fotografando, e finalmente regressou. Gostaria de continuar
a viajar e a fotografar. Era o que sabia fazer.” (ibid., p. 128)
Edmundo Barata dos Santos é o personagem responsável por dar
clímax à história. Perseguido por José Buchmann, Edmundo é descrito como
um homem velho, alto, com uma cabeleira bastante branca com grossas
tranças que se misturam com a barba e a mesma camisa em farrapos com a
foice e o martelo no peito. Com o decorrer da obra, Edmundo Barata revela-
se não só ex-agente do Ministério da Segurança do Estado, como também
torturador durante a revolução angolana.
[...] A revolução estava em perigo. Um bando de miúdos, uma
cambada de pequenos-burgueses irresponsáveis, tentou tomar o poder pela
força. Tivemos de ser duros. Não perdemos tempo com julgamentos, disse o
Velho no seu discurso à Nação, e não perdemos. Fizemos o que havia de fazer.
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[...]
Ela aguentou dois dias. Às tantas pariu, ali mesmo, uma menininha,
assim, deste tamanho, sangue, sangue, quando penso nisso o que
vejo é sangue.
[...]
REPRESENTAÇÕES
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torturada ainda bebê, após a morte de sua mãe. Todavia, podemos contar
do início do romance, no qual Agualusa mescla o real ao inventado, assim
como seu protagonista, ao fazer referência a uma suposta cantora brasileira
chamada Dora, a Cigarra, que canta “O passado é / um rio que dorme / e a
memória uma mentira / multiforme” (p. 4).
A partir de “O nascimento de José Buchmann”, percebemos que o
autor imprime na personagem uma nova possibilidade à representação dos
angolanos, considerando que o passado de Buchmann é menos bárbaro do
que a realidade.
Neste país não falta trabalho aos sapadores. Ainda ontem vi, na
televisão, uma reportagem sobre o processo de desminagem. [...]
Ninguém sabe, ao certo, quantas minas foram enterradas no chão
de Angola. Entre dez e vinte milhões. Provavelmente haverá mais
minas do que angolanos. (AGUALUSA, 2015, pp. 10-11)
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O LONGA-METRAGEM BRASILEIRO
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esta some de sua vida, até que, uma notícia o surpreende. Na televisão,
Vicente vê Clara em uma coletiva de imprensa falando sobre seu livro
autobiográfico e, respectivamente, sua trágica história em consequência da
ditadura argentina. Inconformado, Vicente vai falar com Clara no dia do
lançamento de sua falsa auto biografia, gerando uma pequena discussão
entre os dois protagonistas, e fazendo com que o seu próximo encontro –
o qual ocorre de forma acidental no meio da rua –, se dê de forma tensa
e conflituosa, com Clara perguntando de forma irônica: “Você acredita em
tudo que te dizem?”.
Os dias se passam, até que Vicente recebe uma visita inesperada
em seu apartamento. Clara aparece e se desculpa, arrependida, ela o convida
para ir atrás de seu passado verdadeiro e se propõe a contar a história de sua
vida, em uma viagem ao interior do Brasil. Entretanto, como bom vendedor
de histórias que é, Vicente consegue pegar o telespectador com um extremo
Plot Twist, confessando no final do filme que, seu desfecho com Clara havia
sido apenas mais uma de suas histórias inventadas, e que a última coisa dita
por Clara foi: “Você acredita em tudo que te dizem?”.
Como uma obra adaptada, o tempo, espaço, narrador e personagens
são alterados, de forma que, fique apenas a premissa básica do livro como
principal elo de convergência entre as obras. No filme de Lula Buarque
de Holanda, os personagens são colocados de forma bastante rasa, sem
que haja bastante aprofundamento a respeito do psicológico de cada um,
e fazendo com que o filme gire praticamente em torno de Vicente e sobre
seu envolvimento profissional – e, depois, uma tentativa de envolvimento
pessoal – com Clara.
Assim, os outros personagens são colocados de forma ilustrativa,
apenas a fim de passar mais características possíveis do livro para o filme,
mas sem que esses tenham total e indispensável relevância na narrativa,
como é o caso dos personagens Jairo – amigo e padrinho de Vicente –, Stela
– sua esposa –, Ernani – cliente de Vicente que quer um passado glamoroso
de um divorciado rico, e que acaba revelando parte de uma característica de
um dos personagens do livro que tem um passado conflituoso com a mãe.
Passando-se no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, tal informação
também aparece apenas de forma ilustrativa, visto que o espaço não
influencia no andamento da narrativa, ao passo que no filme, o foco principal
não é uma questão política sobre o local no qual a história é contada, mas
sim sobre a publicação de forma autobiográfica de um passado de falso.
Desse modo, pode-se observar que o filme se concentra apenas em
deixar a proposta básica de um trabalho original que consiste em vender
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A ADAPTAÇÃO
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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