44 - Filosofia Cristã - IETB
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a. O valor da filosofia
Qual é, pois, o valor da filosofia? Parece ser tríplice. No nível mais baixo, a filosofia é uma forma de
exercício intelectual. Ajuda a afrouxar a mente. Em si mesma, não é coisa má. Alguns estudantes queixam-se
de que a filosofia não leva ninguém a lugar algum. A acusação não está inteiramente sem justificativa. Um
número muito grande dos movimentos importantes na filosofia acabou em becos sem saída. Mas pelo menos
o estudo deles revela onde estão os becos sem saída e, no decurso dos estudos, qualquer pessoa que procurou
segui-los forçosamente adquiriu maior agilidade mental. Terá chegado a ter mais consciência daquilo que
conta como um argumento válido, e daquilo que não conta. O estudo da forma de certos argumentos e a
aquisição da capacidade de segui-los e avaliá-los é uma atividade que realmente vale a pena. Mas assim como
há pessoas que dedicam sua vida inteira aos exercícios esportistas, assim também há filósofos cujas mentes
dão a impressão de nunca subir acima dos exercícios da lógica. Para a maioria das pessoas, o exercício nunca
poderá tornar-se uma finalidade em si mesmo, mas é muito útil como meio para atingir maior capacidade nisto
ou naquilo. O mesmo ocorre com a filosofia.
Mas o valor da filosofia não termina aí. O estudo da história da filosofia é como um exercício de
navegação. Ajuda a pessoa a ver onde está. Ao estudar os vários movimentos na filosofia e compará-los com
a fé cristã podemos apontar nossa posição no mapa intelectual. Naturalmente, isto não se aplica somente ao
cristão, mas também a qualquer outra pessoa. Se sabemos algo da história das ideias e dos numerosos debates
que as cercam, temos condições muito melhores para apreciar e avaliar as ideias e os movimentos dos nossos
próprios dias.
Um conhecimento da história das ideias frequentemente nos ajudará, pois nos mostrará para onde elas
levam. Éo que vemos, por exemplo, no caso da teoria de percepção de Locke. Aquilo que de início parecia ser
um corretivo contra os conceitos do racionalismo da Europa continental foi levado por Hume à sua conclusão
lógica e estéril. O existencialismo individualista de Kierkegaard originalmente visava salvar o cristianismo
das incursões danosas do idealismo. Mas também levou a um empobrecimento da fé. Assim, muitos outros
exemplos poderiam ser citados.
Para o cristão, porém, talvez o maior valor de um estudo da história da filosofia é a maneira em que
deve ajudá-lo a ver o cristianismo em perspectiva, A fé cristã não é uma forma religiosa do platonismo,
aristotelianismo, idealismo, existencialismo, ou qualquer outro ismo. E, como consequência, nem deve ser
defendido nem atacado como tal. Em última análise, sua validade depende da validade da crença cristã em
Cristo, da revelação bíblica e tudo quanto acarretam.
b. A tarefa da filosofia da religião
A FILOSOFIA MEDIEVAL
A filosofia não começou na Idade Média, mas a Idade Média é um bom ponto onde começar um relato
da filosofia e da fé cristã. Entre outras coisas, uma e outra começaram a se levar a sério como nunca antes!
Nos primeiros séculos da igreja, os pensadores individuais tinham alternadamente flertado com a filosofia, ou
a tinham denunciado. Na Idade Média, dificilmente havia qualquer pensador importante que não levasse a
sério a filosofia. Para o bem ou para o mal (e, por vezes demais, era o último) as ideias filosóficas entraram
no fluxo sanguíneo da teologia medieval e esta, por sua vez, afetou a vida e o pensamento do cristianismo em
eras posteriores.
Muitas das perguntas formuladas e respondidas pelos pensadores medievais haveriam de determinar o
percurso do pensamento europeu durante os séculos vindouros. Algumas delas ainda estão conosco hoje. Deus
existe? Como sabemos? Qual prova temos? Olharemos algumas das várias respostas que foram dadas a estas
perguntas na Idade Média. Mas, em primeiro lugar, procuraremos obter uma vista geral do período como um
todo e examinaremos algumas das suas personalidades destacadas.
A METAFÍSICA
As generalizações são, notoriamente, enganadoras. Mas se uma delas puder ser permitida a esta altura,
é que o pensamento da Idade Média posterior se caracterizava pelo interesse pela metafísica ao invés de pela
física. De modo geral, as grandes mentes da Idade Média não se interessavam pelo universo físico por amor a
ele mesmo: estavam interessadas pela realidade que, segundo acreditavam, subjazia a ele. Não se preocupavam
demasiadamente com as questões científicas a respeito dos fenômenos naturais. O que atraía seu interesse era
o relacionamento entre o natural e o sobrenatural.
TOMÁS DE AQUINO
As obras de Anselmo foram relativamente poucas em número e de reduzido volume. O caso de Tomás
de Aquino é diferente. Tudo que dizia respeito a ele era grande. Nos seus dias de estudante, seu corpo
avantajado mereceu-lhe a alcunha de “boi mudo”. Nos anos posteriores, seus escritos volumosos, maciços no
escopo bem como no peso, ganharam para ele o título de Doutor Angélico. Sua influência foi tão profunda
que, em tempos mais recentes, tem sido chamado o Doutor Geral da Igreja Católica.
Como Anselmo, Aquino era um italiano. Viveu, porém, uns bons cem anos mais tarde. Nasceu em
1225, e morreu em 1274. A despeito dos esforços da família para dissuadi-lo — esforços estes que chegaram
ao ponto de aprisioná-lo no castelo da família —Tomás entrou na ordem dominicana. Estudou teologia e
filosofia com Alberto Magno e ensinou por certo tempo juntamente com ele em Colônia. O restante da sua
vida foi dedicado ao estudo, escrever, e a ensinar em vários centros de erudição na Europa. Era uma vida
dedicada à defesa e propagação intelectuais da fé, conforme ele a entedia.
Suas duas obras principais são duas enormes Sumas, ou compêndios de teologia e filosofia. A Suma
contra os Gentios foi projetada para ser manual para os missionários. A Suma Teológica (cuja mais recente
edição crítica alcança sessenta volumes) tem sido descrita como “a realização máxima da sistematização
teológica medieval e a base aceita da teologia católica romana moderna”. Outro escritor a chamou de lago para
onde fluíram muitas correntes, e do qual foram tiradas muitas correntes, mas que não é uma nascente.
Estes vereditos são justos. A Suma Teológica dificilmente tem rival quanto ao tamanho, eficiência e
apresentação sistemática.
Seu pensamento é uma liga formada pelo ensino da Bíblia, as tradições da igreja e a filosofia,
especialmente a de Aristóteles, que tinha sido recentemente redescoberta.
Assim como ocorre com a maioria dos pensadores que examinaremos, muitos volumes foram escritos
acerca do homem e de aspectos diferentes do seu pensamento. Para nossos propósitos do momento, porém,
teremos que ficar satisfeitos em apenas selecionar dois itens do seu ensino que têm aplicação às discussões da
atualidade. Um deles diz respeito às suas provas da existência de Deus. O outro é a sua doutrina da analogia.
O primeiro é interessante não somente por si mesmo, mas também porque tipifica uma abordagem básica da
teologia católica. O segundo é interessante por causa da sua relevância aos debates contemporâneos acerca da
posição e do significado da linguagem religiosa. Embora o primeiro pareça (pelo menos a este autor) um passo
falso, o segundo é sugestivo e importante.
As Cinco Vias
As provas de Aquino quanto à existência de Deus são conhecidas como as Cinco Vias. Incluem os
argumentos que mais tarde vieram a ser conhecidos como o Argumento Cosmológico e o Argumento
Teleológico (aquele procura uma causa última do cosmos, e este um projetista último). Muitas vezes tem sido
A Filosofia e os Reformadores
O último sermão de Lutero em Wittenberg passou para a história como uma investida clássica contra
a razão, “a Meretriz do Diabo”. Mas não é, de modo algum, um ataque isolado contra a filosofia. Aqueles que
se deram ao trabalho de examinar alguns dos índices das obras completas de Lutero tiveram pouca dificuldade
em achar referências a Aristóteles como “destruidor da sã doutrina”, um “mero sofista”, um “inventor de
fábulas”, “o filósofo fedorento”, um “bode” e um “pagão cego”. A lista poderia facilmente ser estendida. Este
tipo de coisa fez com que Lutero tivesse a reputação de ser irracionalista irresponsável. Contribuiu, também,
à impressão generalizada que a filosofia e a teologia bíblica pouco têm a ver uma com a outra.
Esta, porém, é apenas metade do quadro. Num momento menos excitado, Lutero refletiu: “Quando eu
era monge, desprezavam a Bíblia. Ninguém entendia o Saltério. Acreditavam que a Epístola aos Romanos
continha algumas controvérsias acerca de assuntos dos dias de Paulo e que não tinha utilidade para a nossa
era. Eram Scotus, Tomás e Aristóteles que deviam ser lidos.” As circunstâncias alteraram-se, e o mundo
acadêmico tem suas modas como qualquer outra pessoa. A situação que Lutero descreve não está
completamente removida daquela das universidades ocidentais hoje. A filosofia fez com que a Bíblia fosse
irrelevante, e a razão tomou para si o lugar da revelação.
Para um homem do temperamento de Lutero, vivendo naquela época e debaixo de tais pressões, não é
surpreendente que se expressasse daquela maneira. Mas, conforme tem demonstrado a pesquisa moderna,
Lutero não estava condenando a razão como tal. Ele mesmo a empregava com efeito poderoso. O verdadeiro
alvo dos seus ataques era o abuso da razão, situações em que a filosofia tem negado a verdade da fé cristã. A
razão tinha seu legitimo lugar na ciência e nas questões de todos os dias. Tinha sua função verdadeira em
entender e avaliar aquilo que era colocado diante dela. Mas não era o único critério da verdade.
Para Lutero, havia três luzes que iluminavam a existência humana. Havia a luz da natureza, em que a
razão e o bom-senso bastavam para solucionar muitas das questões da vida de todos os dias. Havia a luz da
graça mediante a qual a revelação na Escritura dava ao homem um conhecimento de Deus que, doutra forma,
O RACIONALISMO
Na linguagem de todos os dias, o “racionalismo” veio a significar a tentativa de julgar tudo à luz da
razão. Vinculada com ela, há a suposição de que, quando isto é feito, a razão terá completamente liquidado o
sobrenatural, e que não sobra mais nada além da natureza e dos fatos crus. Mas no sentido mais técnico e
filosófico do termo, o racionalismo denota uma abordagem mais específica e certamente menos ateia. Os
racionalistas dos séculos XVII e XVIII eram muito diferentes entre si quanto ao modo de desenvolver seus
diferentes sistemas. Havia, porém, em comum entre eles uma crença na racionalidade do universo e o poder
da razão para entendê-la. Por detrás de toda a maquinária complexa da natureza havia uma mente racional, e
esta podia ser conhecida mediante o emprego certo da razão. Tendo os dados certos, era possível desenhar um
mapa da realidade, na condição de se fazer as deduções lógicas corretas.
Os reformadores do século XVI eram dominados por uma preocupação com Deus. Tomaram por ponto
de partida a ação de Deus em Cristo, conforme é testificada pelas Escrituras. A partir dali, passaram a pensar
acerca do mundo. Os racionalistas do século XVII ficaram entusiasmados, não tanto com Deus, mas com o
mundo. Muitos deles eram cientistas que tinham feito contribuições à matemática, especialmente à geometria.
O ponto de partida deles era a lógica, e suas técnicas eram derivadas da matemática. Não eram homens sem
religião. De qualquer forma, a noção de Deus ocupava um lugar mais ou menos importante no seu pensamento.
Mas para eles o problema não era de seu relacionamento pessoal com Aquele a Quem todos os homens têm
de prestar contas. Pelo contrário, sua curiosidade era provocada pela estrutura racional do universo. E o ponto
de vista que adotaram quanto a esta decidia o papel que atribuíam a Deus no esquema deles.
Descartes
O primeiro dos grandes filósofos racionalistas foi o francês René Descartes (1596-1650). Descartes
recebeu sua educação, não numa universidade, mas sim, num colégio jesuíta. Procurando uma vida de lazer,
Descartes embarcou numa carreira militar. Serviu em vários exércitos europeus, sempre tomando o cuidado
de transferir-se para outro lugar quando surgiam hostilidades.
Era diletante em várias ciências inclusive a medicina. Suas contribuições principais, porém, foram
feitas nos campos da geometria e da filosofia. Naquela, inventou a geometria coordenada. Nesta, foi o pioneiro
O EMPIRISMO
O racionalismo era, em grande medida, um movimento da Europa continental. Na Grã- Bretanha, o
movimento que os filósofos hoje consideram a mais relevante entre as tendências filosóficas daquela era foi o
empirismo. Em especial, os empiristas do século XVIII preocupavam-se principalmente com os problemas do
conhecimento. Em contraste com os racionalistas que procuravam erigir sistemas filosóficos por meio de
raciocinar com base em verdades alegadamente evidentes em si mesmas, os empiristas ressaltavam o papel
que a experiência desempenhava no conhecimento. Argumentavam que não temos ideia alguma senão aquelas
que derivam da experiência que vem a nós através dos sentidos. Declarações somente podem ser conhecidas
como sendo verdadeiras ou falsas por meio de testá-las na experiência.
Não seria bem verdadeira a definição do empirismo como movimento inglês. Os três representantes
principais no século XVIII eram, na realidade, um inglês, um irlandês e um escocês. Locke, Berkeley e Hume.
Nem seria correto estigmatizar o movimento como sendo inflexivelmente agnóstico. Embora Hume fosse um
cético, os escritos teológicos de Locke mostram que era um homem de fé cristã sincera, e Berkeley era um
bispo anglicano. Mesmo assim, pensa-se geralmente que o movimento fez uma contribuição considerável ao
avanço geral do agnosticismo moderno. Quando, pois, Hume levou as técnicas empiristas até suas conclusões
lógicas, não deixou alternativa alguma ao ceticismo.
Locke
John Locke (1632-1704). Hoje, Locke é principalmente lembrado por ser o pioneiro da abordagem
empirista ao conhecimento. Em Oxford, ficou impressionado com a leitura de Descartes, mas sua própria
abordagem foi seguindo uma direção bem diferente. Rejeitou a ideia racionalista de que a mente tinha
carimbadas sobre ela, desde o nascimento, certas noções primárias, evidentes por si mesmas. Pelo contrário,
retratava a mente como sendo uma peça em branco que recebia de fora as suas impressões. '”Suponhamos,
Empregava a razão até aos limites para demonstrar as limitações da razão. Levou adiante a teoria
representativa do conhecimento até às últimas consequências. Para ele, isto significava que você nem poderia
comprovar a existência das coisas fora de si mesmo, nem sequer dentro de si mesmo. Para ele, a “ideia de uma
substância não é nada senão uma coletânea de ideias simples, que são unidas pela imaginação, e que têm um
nome específico atribuído a elas, mediante o qual podemos relembrar, ou a nós mesmos ou a outros, aquela
coletânea. Percebemos os dados dos nossos sentidos, mas não podemos saber que há qualquer coisa além.” A
ideia do próprio-eu humano era especialmente elusiva. “Da minha parte, quando entro mais intimamente
naquilo que chamo de “eu mesmo”, sempre tropeço numa ou outra percepção específica, do calor ou do frio,
da luz ou da sombra, do amor ou do ódio, da dor ou do prazer. Nunca posso em qualquer tempo apanhar a
mim mesmo em flagrante sem uma percepção, e nunca posso observar qualquer coisa senão a percepção.”
Hume também era cético no que dizia respeito aos milagres. Poderíamos ter pensado que a pessoa que
negava a racionalidade da causalidade e, desta forma, subvertia a base da lei científica, dificilmente tivesse a
presunção de invocar a lei científica como aliada. Argumentava que os milagres contradiziam as leis da
natureza, sendo, portanto, improváveis. A crença deve ser proporcionada pela evidência. Concluiu: “O milagre
é uma violação das leis da natureza e, já que a experiência firme e inalterável estabeleceu estas leis, a prova
contra o milagre, pela própria natureza dos fatos, é tão integral quanto qualquer argumento tirado da
experiência que é possível de imaginar.”
Voltando-se às evidências em prol dos milagres, Hume as pronunciou fracas. “Havia uma falta geral
de testemunhas discernentes e competentes com bom-senso suficiente para não serem logradas pela fraude.
Além disto, devemos levar em conta a notória propensidade da natureza humana para exagerar, a qual
forçosamente abala nossa confiança em muitas das histórias. Devemos perguntar, também, por que os milagres
não acontecem em nossos próprios dias. Finalmente, devemos lembrar-nos de que todas as religiões alegam
milagres, mas nem todos eles podem ser verdadeiros. Destarte, nunca se pode apelar a milagres como o
fundamento de uma religião. Nunca podem ser usados para estabelecer a fé. Somente aqueles que já têm fé
suficiente podem aceitá-los sem suspeitas.”
Hume ainda não tinha acabado seu ataque contra a religião. Em The Natural History of Religion voltou
a pegar em armas para atacar o ponto de vista de que a religião original da humanidade era um monoteísmo
racional e moral. Hume não tinha mais conhecimento da antropologia do que seus oponentes. O que fez foi
sugerir um tipo de hipótese evolucionária. Por meio de fazer uso do seu conhecimento dos clássicos,
argumentava que os deuses e deusas do politeísmo (que eram simplesmente seres humanos aumentados) eram
progressivamente creditados com diferentes atributos até que finalmente fossem ajuntados num só, e
creditados com a infinidade. Lado a lado com este processo havia um aumento de fanatismo. Quanto mais
Na Europa continental o racionalismo era a nova filosofia do século XVII e a filosofia ortodoxa do
século XVIII. Mas mesmo então, mentes pesquisadoras estavam questionando seus métodos e resultados e
procurando conceitos da realidade que fossem diferentes, embora não menos racionais. Nesta seção,
mencionaremos quatro: Rousseau, Voltaire, Lessing e Kant. Os dois primeiros eram franceses, os dois
últimos, alemães. A seus próprios modos, todos os quatro estavam procurando conceitos iluminados do
conhecimento, conduta e religião humanos. Todos os quatro rejeitaram a religião tradicional. Todos os quatro
avançaram firmemente ao longo do itinerário traçado pelos deístas ingleses.
Rousseau
Jean-Jacques Rousseau (1712-78) era homem de muitas capacidades. Foi, sucessivamente, um
protestante, um católico e um deísta. No decurso da sua vida inquieta, elaborou um novo sistema de notação
musical, escreveu uma ópera que foi encenada diante de Luís XV e experimentou sua capacidade como
educador, teorista político, novelista e homem de letras. Fez e rompeu numerosas amizades com pessoas
famosas e com as não-tão-famosas. Para muitos, era um enigma, e continua sendo. Era um dos expositores
mais eloquentes da dignidade do homem, mas seus relacionamentos pessoais eram pateticamente sórdidos.
Suas teorias educacionais receberam bastante aplausos em anos recentes e, mesmo assim, Rousseau deixou
seus próprios cinco filhos ilegítimos num hospital para enjeitados.
Na imaginação popular, a Era Vitoriana foi um período em que todos, sem exceção, se conformavam
ao mesmo código moral rígido e que praticavam a mesma religião inflexível e sem alegria. Na realidade, o
século XIX foi um período de fé e um período de descrença. Foi testemunha da expansão missionária sem
paralelo, e viu avivamentos religiosos em todos os cantos do globo. Os bancos das igrejas do mundo ocidental
ainda estavam repletos de devotos. Fora da igreja, porém, não havia falta de vozes estridentes que insistiam
com os fiéis que estes estavam se iludindo. E até mesmo dentro das igrejas podiam ser ouvidos os tons cultos
daqueles que tinham chegado à conclusão de que o cristianismo já não podia ser crido novamente da mesma
maneira.
O século XIX já passou pelos portais da história para o âmbito dos currículos para provas e da pesquisa
acadêmica. No presente momento, a igreja do século XIX está passando por extensa reavaliação.
Alguns dos nomes que consideraremos já eram figuras de fama mundial. Outros eram pouco
conhecidos fora do seu próprio país e seu círculo imediato. Alguns fundaram escolas de pensamento; outros
foram grandes individualistas. Se tiveram qualquer coisa em comum, não é aquilo acerca do que concordavam.
É seu mútuo desejo de reinterpretar o cristianismo à luz daquilo que consideraram ser o conhecimento moderno
e das suas próprias filosofias específicas.
SCHLEIERMACHER
Poucas pessoas na Inglaterra tinham consciência da relevância de Schleiermacher no século XIX. Por
muitos anos, foi conhecido somente por causa de um ensaio, pouco notável, acerca de Lucas, e quase um
século passou-se depois da sua morte antes de sua obra mais importante, The Christian Faith, ser traduzida
para o Inglês. Na Europa ocidental a situação era bem diferente, no entanto. É com justiça que Karl Barth
aplicou a Schleiermacher algumas palavras que este último aplicou primeiramente a Frederico Magno: “Não
fundou uma escola, mas, sim, uma era.” Somente agora é que nós, estamos começando a apreciar a verdadeira
relevância de Schleiermacher, para o bem ou para o mal.
Vida e obras
Friedrich Daniel Ernst Schleiermacher (1768-1834) foi filho de um capelão do exército na Silésia
Superior. Seus dois avós eram pastores e seu pai, que tinha fortes tendências pietistas, mandou-o para o
seminário moraviano em Barby, na esperança de que estas tendências fossem acalentadas no seu filho. É
bastante curioso que certa vez o aconselhasse a ler Kant como antídoto ao liberalismo moderno. O jovem
Schleiermacher leu Kant, mas reagiu de modo diferente. Reagiu, também, contra sua criação pietísta. Até esta
HEGEL E O IDEALISMO
O idealismo
O termo “idealismo” é elástico, no seu sentido mais amplo denota o ponto de vista de que a mente e os
valores espirituais são mais fundamentais do que os materiais. Como tal, opõe-se ao naturalismo, que explica
a mente e os valores espirituais em termos de objetos e processos materiais. O termo foi aplicado pela primeira
vez como termo técnico da filosofia no século XVIII. E dentro em breve ficou sendo usado para descrever o
ensino de Berkeley, de que não se podia saber que qualquer coisa existia, e nada existia mesmo, a não ser
ideias na mente da pessoa que percebe. O próprio Berkeley preferia chamar sua filosofia de imaterialismo. O
termo idealismo, no entanto, pegou e dentro em breve era aplicado a outras filosofias. Kant o adotou, e
distinguia cuidadosamente seu próprio ensino, que chamava de “Idealismo Transcendental” daquele de
Descartes e de Berkeley, que chamava de idealismo problemático e dogmático. Conforme já vimos, Kant
sustentava que era impossível obter conhecimento do mundo mediante o pensamento racional exclusivamente.
O progresso do Idealismo
Hegel logo achou discípulos póstumos entre as fileiras dos teólogos alemães que fizeram do
hegelianismo a base filosófica dos seus ensinos. Na segunda metade do século o idealismo conseguiu uma
base firme nas universidades britânicas, especialmente em Oxford. Na Grã-Bretanha de antes de 1914, o
idealismo parecia tão firme e duradouro quanto o Império Britânico.
Parte da razão destes fatos é que esta era a doutrina (num ou outro formato) ensinada por todos estes
luminários maiores no firmamento filosófico. Mas se sondarmos mais profundamente, e perguntarmos por que
deveria ser assim, então certo número de razões se sugerem. Uma delas é que a educação britânica naqueles
KIERKEGAARD
Vida e obras
Para alguns leitores, a análise excruciante que Kierkegaard fez das reações humanas lança luz brilhante
sobre o comportamento pessoal, para outros, é um falastrão enfadonho. Na mente dalguns, o existencialismo
de Kierkegaard ocupa a vaga deixada pelo idealismo como base filosófica do cristianismo. Para outros,
Kierkegaard representa a falência da filosofia ocidental.
De seu próprio modo, os escritos de Kierkegaard não são menos difíceis de serem seguidos do que os
de Hegel, mas por uma razão diferente. Hegel simplesmente não se deu o trabalho de expressar-se com clareza.
O ATEÍSMO E O AGNOSTICISMO
Ateísmo significa descrença na existência de Deus, ou a negação dela. É um termo que tem estado em
uso desde os fins do século XVI. A palavra “agnosticismo” foi cunhada muito mais recentemente. É
geralmente atribuída a T.H. Huxley, o cientista vitoriano e amigo de Charles Darwin, que a elaborou para
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