Episódios de Os Lusíadas
Episódios de Os Lusíadas
Episódios de Os Lusíadas
A morte de Inês de Castro é um dos mais belos episódios líricos presentes na epopeia e
pode-se mesmo considerar que as principais características da tragédia clássica
estão patentes:
- o desenvolvimento de uma acção, que termina com a morte da protagonista;
- observa-se a lei das três unidades (ação, tempo e espaço);
- há uma motivação para sentimentos de terror e piedade pelo uso de contrastes;
- a catástrofe é simbolizada pela morte da protagonista.
Foi no dia 8 de Julho de 1497 que a armada portuguesa, capitaneada por Vasco
da Gama, partiu em procura do desconhecido. Uma enorme multidão concentrou-se
na praia de Belém para assistir à partida dos marinheiros seus amigos ou familiares.
O tema deste excerto lírico, é emotivo do ponto de vista sentimental, pois é revelada
uma enorme saudade por aqueles que vão “navegar” e por aqueles que ficam.
É um episódio constituído por uma primeira parte, em que se descreve o local da
partida e o alvoroço geral dos últimos preparativos da viagem, estando as naus já
preparadas e os nautas na ermida de Nossa Senhora
de Belém orando.
Numa segunda parte, em que Gama e os seus marinheiros passam por entre a multidão
para chegar aos batéis, num caminho desde o “santo templo”, destacam-se as
evocações de mães e esposas acerca da partida, criando um entristecimento na emotiva
despedida do Restelo.
Finalmente, na terceira parte, é referido o embarque em que, por determinação de
Vasco da Gama, não se fazem as despedidas habituais num sentido de menor
sofrimento.
Também se pode considerar a importância desta viagem para Portugal, pois para além
dos proveitos que poderia trazer ao reino, simbolizava, acima de tudo, um perigo.
Cinco dias depois da paragem na Baía de Santa Helena, chega Vasco da Gama ao Cabo
das Tormentas e é surpreendido por uma nuvem negra “tão temerosa e carregada”que
pôs nos corações dos portugueses um grande “medo” e leva Vasco da Gama a evocar o
próprio Deus todo poderoso.
Foi o aparecimento do Gigante Adamastor, uma figura mitológica criada por
Camões para significar todos os perigos, as tempestades, os naufrágios e “perdições de
toda sorte” que os portugueses tiveram de enfrentar e transpor nas suas viagens.
Esta aparição do Gigante é caracterizada directa e fisicamente com uma adjectivação
abundante e é conotada a imponência da figura e o terror e estupefacção de Vasco da
Gama, e seus companheiros, que o leva a interrogar o Gigante quanto à sua figura,
perguntando-lhe simplesmente “Quem és tu?”.
Mas mesmo os gigantes têm os seus pontos fracos. Este que o Gama enfrenta é também
uma vítima do amor não correspondido, e a questão de Gama leva o gigante a contar a
sua história sobre o amor não correspondido.
Apaixona-se pela bela Tétis que o rejeita pela “grandeza feia do seu gesto”. Decide
então, “tomá-la por armas” e revela o seu segredo a Dóris, mãe de Tétis, que serve de
intermediária. A resposta de Tétis é ambígua, mas ele acredita na sua boa fé.
Acaba por ser enganado. Quando na noite prometida julgava apertar o seu lindo corpo e
beijar os seus “olhos belos, as faces e os cabelos”, acha-se abraçado “cum duro monte
de áspero mato e de espessura brava, junto
de um penedo, outro penedo”.
Foi rodeado pela sua amada Tétis, o mar, sem lhe poder tocar.
O discurso do Gigante, que se divide em duas partes de acordo com a intervenção de
Vasco da Gama, compreende, na primeira, um carácter profético e ameaçador num tom
de voz “horrendo e grosso” anunciando os castigos e os danos por si reservados para
aquela “gente ousada” que invadira os seus “vedados términos nunca arados de
estranho ou próprio lenho”.
A segunda parte do discurso do Adamastor representa já um caráter autobiográfico,
pois assistimos à evocação do passado amoroso e infeliz do próprio Camões.
O Gigante Adamastor diz ainda que as naus portuguesas terão sempre “inimigo a esta
paragem” através de “naufrágios, perdições de toda a sorte, que o menor mal de todos
seja a morte”, a fazer lembrar as palavras proféticas do Velho do Restelo.
Após o seu desabafo junto dos lusitanos, a nuvem negra “tão temerosa e carregada”
desaparece e Vasco da Gama pede a Deus que remova “os duros casos que Adamastor
contou futuros”.