Leitura Ofidismo

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ANIMAIS SERPENTIFORMES DA FAUNA NACIONAL

&
OFÍDIOS E OFIDISMO

{ AULA PRÁTICA }

Na fauna nacional, encontram-se alguns animais ditos serpentiformes, ou seja, que


se assemelham a serpentes (ofídios, cobras) e podem ser com elas confundidos. Uns são,
pelo menos, répteis; outros, nem isso. Os principais exemplos são alistados e tratados
brevemente na seqüência.

Minhocuçus: são anelídeos oligoquetas muito grandes e longos, medindo meio metro ou
mais; habitam no geral o solo úmido, com bastante matéria orgânica. Apreciadores da pesca
tradicional os utilizam muito para a preparação de iscas. Os chamados minhocuçus
‘mineiro’e ‘paulista’ são os mais usados. A espécie Rhinodrilus fafner encontra-se sob risco
de extinção. Não oferecem riscos ao homem. Veja abaixo exemplar de Megascolides
autralis, minhocuçu comum na Austrália, com mais de 60 cm de comprimento.

Peixe-cobra ou Muçum : é o peixe Synbranchus marmoratus, chamado marbled swamp


eel em inglês. Com as nadadeiras atrofiadas e corpo muito alongado, essa espécie
assemelha-se bastante a serpentes aquáticas; apresenta fenda branquial única, ventral, em
forma de meia-lua. Bastante comum em rios brasileiros e também já relatado na Argentina.
Outros peixes com aspecto de enguia e que podem ser considerados serpentiformes, como o
muçum, seriam as moréias. Veja abaixo ilustrações pertinentes ao peixe-cobra, uma delas
em seu ambiente natural e outra mostrando boca , olhos e outros detalhes da região anterior.
Cobra-cega: trata-se, na verdade, de grupo de anfíbios ápodes encontrados tanto em meio
terrestre (subterrâneos) como aquático (lagoas). São muito confundidas com serpentes
verdadeiras quando se movimentando na superfície do solo. Escavam galerias e vivem
alimentando-se de pequenos invertebrados, em especial artrópodes. Não oferecem riscos ao
homem. Veja as ilustrações abaixo de uma espécie comum em Portugal (à esquerda) e de
Siphonops annulatus, ocorrente em solos do Brasil (à direita).

Cobra-de-duas-cabeças : conhecem-se várias espécies deste réptil ápode, que é na verdade


um lagarto. O gênero predominante no Brasil é Amphisbaena, sendo mais comuns na região
Norte, onde o povo as denomina “mães de saúva” pelo fato de serem encontradas com
freqüência no interior de sauveiros adultos. No interior destes, parecem ser toleradas pelas
formigas devido ao fato de atuarem como eficientes predadores dos besouros (no geral, da
família Staphylinidae) que muitas vezes invadem as “panelas de lixo” e dificultam as
atividades gerais da colônia. Há relatos de encontro de exemplares também em cupinzeiros.
O tamanho varia bastante entre as espécies, atingindo mais de 40 cm. Os olhos e a boca são
pouco visíveis. A cauda é curta e rombuda, o que levou à designação vulgar “cobra-de-
duas-cabeças”, já que as duas extremidades do corpo, anterior e posterior, tornam-se muito
parecidas. Não oferecem riscos ao homem.
Cobra-de-vidro : as espécies em questão, Ophiodes striatus e afins, são também répteis
pertencentes ao grupo dos lagartos. Não possuem os membros anteriores, mas apenas
rudimentos dos posteriores, parecendo serem ápodes quando vistos a alguma distância.
Movem-se com grande agilidade sobre a superfície do solo, embora sejam muitas vezes
encontrados protegido em túneis e galerias subterrâneas. Quando sob algum tipo de pressão
da parte de predadores, costumam “quebrar-se” à altura do terço final do corpo, o que
funciona bem como tática de evasão; o mesmo acontece quando mal manuseadas por
humanos, que as seguram com força excessiva nessa região. Alimentam-se de pequenos
insetos principalmente (baratas, grilos) e, em cativeiro, podem ser criadas à base de larvas
de besouros tenebrionídeos. Não oferecem riscos ao homem. Veja abaixo, O. striatus,
principal espécie ocorrente no Brasil (esq.) e O. tozetti, do norte da Argentina (dir.).

Por serem inócuos ao homem, tais animais não devem ser temidos e tampouco
tornarem-se alvos de perseguição ou caça. Alimentando-se comumente de insetos daninhos,
podem ser consideradas, por vezes, como formas úteis. Não são venenosos, nem perigosos.
Há outros animais deste tipo na fauna estrangeira (enguias de água doce, moréias etc.), mas
os aqui referidos incluem-se entre os mais destacados da fauna brasileira.
Ofídios e Ofidismo

Os répteis conhecidos vulgarmente como ‘cobras’ estão compreendidos na ordem


Squamata, subordem Serpentes (ou Ophidia). Corpo esguio, muito alongado; sem membros
locomotores, embora vestígios de pernas estejam presentes em certas espécies (jibóias);
olhos imóveis, cobertos por membrana transparente, sem pálpebras; língua no geral bem
desenvolvida, bífida e protrátil, importante na percepção de diferentes tipos de estímulos
sensoriais; narinas bem anteriores, geralmente bem visíveis; sem abertura dos ouvidos; com
muitos dentes, alguns moificados e especializados na inoculação de veneno; não possuem o
osso esterno, mas muitas costelas e vértebras; um só pulmão, o direito, sendo o esquerdo
atrofiado; pele recoberta por escamas de formato algo variável e coloração tanto opaca
quanto viva. Muitas colocam ovos, mas há formas vivíparas. Aquáticas, terrestres e
arborícolas. Muitas formas são venenosas e tidas como perigosas ao homem; outras,
embora venenosas, raramente atacam o homem; as não venenosas matam suas presas,
inclusive mamíferos relativamente grandes, por constrição, asfixiando-as.
As cobras costumam ser divididas em quatro “séries”, baseadas em características
da dentição dos espécimes: Aglifodontes (= Áglifas), Opistoglifodontes (= Opistóglifas),
Proteroglifodontes (= Proteróglifas) e Solenotodontes. Seguem breves comentários sobre
cada uma dessas séries e seus principais representantes, especialmente da fauna nacional.

Aglifodontes: desprovidas de dentes diferenciados, inoculadores de veneno (presas); boca


com muitos dentes, praticamente semelhantes entre si. Há formas não dotadas de glândula
de veneno (= não venenosas), como as jibóias (Constrictor spp.), terrestres, e as sucuris
(Eunectes spp.), geralmente aquáticas, muito comuns na região Amazônica. São serpentes
grandes e muito fortes que matam por constrição muscular, asfixiando as suas vítimas.
Outras cobras desta série ainda apresentam glândula de veneno, mas faltam-lhes o órgão
inoculador. São exemplos a ‘jararacuçu-do-brejo’ (Mastigodryas bifossatus) e a ‘boipeva’,
freqüentes nas margens de brejos e córregos, onde se alimentam de anuros (sapos, rãs) e/ou
pequenos roedores. Sendo no geral pequenas as suas vítimas, podem matá-las por
constrição ou simplesmente abocanhá-las, antes de degluti-las.

Opistoglifodontes: com glândula de veneno e dotadas de um par de presas, ou seja, de


dentes adaptados à inoculação de veneno. Tais presas são sulcadas anteriormente e
localizam-se na parte posterior da boca, fixadas no maxilar. Portanto, o veneno é expelido
da glândula produtora e escorre por esse sulco anterior do dente, penetrando nos tecidos da
vítima. Incluem-se aqui, entre muitas outras espécies, a cobra-cipó (Phyllodrias schottii),
bastante comum, a muçurana, que é ofiófaga, mostrando-se imune ao veneno das jararacas,
e as falsas corais.
Cobras aglifodontes (à esquerda, sucuri-amarela) e opistoglifodontes (à direita, muçurana)

Proteroglifodontes: com glândula de veneno e dotadas de duas presas sulcadas, localizadas


na parte mais anterior da boca. Não possuem fossetas loreais. Um dos grupos mais famosos
desta série é o das ‘najas’ (Naja spp.) ou ‘cobras-de-capelo’, nativas do Velho Mundo e não
ocorrentes no Brasil. Têm potente veneno de ação neurotóxica, são agressivas e perigosas
ao homem. Algumas espécies de Naja são “cuspideiras”, ou seja, quando incomodadas
lançam veneno na direção de seus supostos agressores. Outro grupo importante é o das
corais verdadeiras (família Elapidae), com várias espécies bem representadas no Brasil
pertencentes ao gênero Micrurus.

Corais verdadeiras : adulto de Micrurus corallinus (esq.) e filhote durante a eclosão (dir.)

As corais verdadeiras apresentam, no geral, corpo recoberto por escamas coloridas


que formam típica sucessão de anéis pretos, brancos (ou amarelados) e avermelhados (= de
tonalidade coral). Não são agressivas e têm maior atividade noturna, ficando escondidas
durante o dia no interior de tocas ou sob a vegetação. Em vista disso, causam acidentes com
humanos apenas ocasionalmente, estimados em 1% do total, e estes ocorrem quase sempre
por manuseio indevido ou descuidado da cobra. Alimentam-se de pequenos animais,
incluindo-se anfíbios anuros, lagartos ápodes e mamíferos roedores. O veneno, de ação
neurotóxica, pode causar sério desconforto às pessoas picadas e, em alguns casos, pode
ocorrer indesejável evolução dos sintomas até paralisia dos músculos respiratórios, advindo
a morte por apnéia (à semelhança do que ocorre em acidentes com Tityus serrulatus, o
escorpião-amarelo). Deve-se administrar o soro anti-elapídico.

Corais verdadeiras: exemplar de Micrurus sp. sobre o solo surpreendido em movimentação noturna
e pessoa picada sob tratamento monitorado por complicações decorrentes do envenenamento.

Solenotodontes: dotadas de um par de grandes presas canaliculadas (não sulcadas), situadas


bem anteriormente na boca. Tais dentes especiais, quando se quebram ou se perdem por
alguma razão, são substituídos por outros ‘de reserva’. Possuem um par de oríficios entre os
olhos e as narinas - as fossetas loreais (= lacrimais) - que atuam como sensores térmicos e
proporcionam às cobras ótima percepção da distância em relação às vítimas e grande
eficiência no momento do ‘bote’; por isso, o povo as chama de “cobras de quatro ventas”.
Compreende, no Brasil, as espécies dos gêneros Bothrops (jararaca, jararacuçu,
urutu, jararaca-ilhoa e várias outras afins), Lachesis (surucucus) e Crotalus (cascavéis),
todas venenosas e perigosas. Causam 99% dos acidentes com humanos no País, a maioria
devida a ataques por jararacas e afins. Surucucus não ocorrem na região Sul e em grande
parte da região Sudeste, mas são comuns nas regiões Norte e Nordeste (nesta, em especial
na Mata Atlântica). As cascavéis apresentam o guizo ou “chocalho” caudal, ausente nos
outros dois gêneros; tal estrutura vai se formando durante o crescimento do animal, pois, a
cada troca de pele por que passa, um resíduo da pele antiga permanece preso à extremidade
caudal, resultando assim uma série de anéis. Portanto, ao contrário do que se costuma dizer,
o número de anéis do guizo da cascavel indica o número de trocas de pele que sofreu e não
o número de anos de vida (= idade) que possui.
Cobras solenotodontes: (esq.) presas de uma jararacuçu; (dir.) guizo caudal de uma cascavel

Cobras solenotodontes comuns no Brasil: urutu (Bothrops alternatus; alto, à esquerda); surucucu-
pico-de-jaca (Lachesis muta; alto, à direita); cascavel (Crotalus durissus; abaixo), com o guizo
caudal bem visível. O contato e principalmente o confronto com tais ofídios deve ser evitado.
O exame da região caudal das solenotodontes, cobras com fossetas loreais, permite
a distinção entre elas: as cascavéis têm o típico guizo ou chocalho; as surucucus têm as
escamas nessa parte do corpo fortemente eriçadas, parcialmente elevadas; e as jararacas
possuem a cauda lisa, normal, afilando-se gradual ou rapidamente.
Deve-se destacar que as solenotodontes, como as demais cobras, não mastigam ou
dilaceram as suas vítimas (= alimento), mas simplesmente as engolem por inteiro, a partir
da cabeça. Em conseqüência de várias modificações adaptativas, conseguem distender
largamente a boca e engolir animais surpreendentemente grandes. Durante a deglutição, a
glote pode ser projetada para a frente de modo a permitir e/ou auxiliar a respiração.

Acidentes com jararacas e surucucus

Os venenos das jararacas (Bothrops) e surucucus (Lachesis) têm os mesmos tipos


de ação, basicamente. Os dois efeitos são: proteolítico (principal) e coagulante. No geral, as
pessoas são picadas nos braços ou pernas, observando-se dor no local, discreta ou intensa,
acompanhada de outros sintomas como inchaço, bolhas, edema, manchas avermelhadas e,
as vezes, necrose. A eventual aplicação de garrote (= torniquete) no membro atingido pode
agravar muito o quadro porque, ao restringir a circulação do sangue, leva à concentração do
veneno na área; no passado, tal procedimento, hoje condenado, muitas vezes resultou em
gangrena do membro e necessidade de sua subseqüente amputação. Isso motivou o dito
popular de que “a jararaca, quando não mata, aleija”. Secundariamente, o veneno pode
causar uma imobilização temporária das plaquetas, que se aglutinam em coágulos e ficam
retidas em capilares dos pulmões; com isso, aumenta o tempo de coagulação do sangue e,
nesse caso, a ocorrência de hemorragias (no local da picada, na boca etc.), mesmo que
pequenas, pode se tornar um problema. Tal ação é chamada coagulante. Em bovinos,
mesmo já bem erados (com 4 a 5 anos de idade e mais de 400kg de peso), quando a picada
se dá na chamada “barbela”, há considerável risco de ocorrer forte inchaço no local e o
animal acabar morrendo por asfixia, se não for tratado em tempo.
As pessoas picadas devem buscar assistência o quanto antes, se estiverem em
condições, ou serem ajudadas nesse sentido. A ocorrência de dor, por vezes persistente e
mais intensa, associada a outros sintomas no local da picada, com freqüência causa grande
ansiedade no doente e motiva a adoção de providências dentro das primeiras 3 a 6 horas do
acidente, o que é muito bom. No geral, quanto mais demorado o início do tratamento, mais
lenta e difícil a recuperação. No transporte até o local de atendimento, atentar sempre ao
fato de que o acidentado não deve realizar maiores esforços físicos. O mais importante é a
aplicação do soro; nesses casos, dispõe-se de soros específicos para acidentes com jararacas
[antibotrópico] e surucucus [antilaquético], além do soro misto antibotrópico-antilaquético.
Outras medidas, como uso de analgésicos e antialérgicos, sob a orientação médica, podem
ser bastante úteis. É sempre desejável a realização de teste prévio para verificação de
possível hipersensibilidade do paciente ao soro, prevenindo-se assim eventual choque
anafilático. Acidentes com tais cobras raramente resultam em óbitos, porém complicações
mais sérias podem decorrer do (mau) uso de torniquetes por pessoas não qualificadas.
Os acidentes com jararacas são os mais comuns e numerosos no País, ao passo que
as surucucus aparecem apenas na área de Mata Atlântica da região Nordeste e em toda a
região Norte. A surucucu pico-de-jaca (L. muta) é considerada a maior cobra venenosa e
perigosa da América do Sul.

Acidentes com jararacas e surucucus: forte ação proteolítica expressa na forma de inchaço, edema e
necroses na área em que se deu a picada (ao alto); a aplicação de torniquete agrava muito o quadro
podendo resultar em necrose generalizada ou deformação total do membro (abaixo, dir/esq)

Acidentes com cascavéis

Bem menos numerosos que os causados por jararacas, mas com o mais alto índice
de óbitos humanos. A cascavel, ao agitar o guizo caudal, muitas vezes está pretendendo
anunciar a sua presença e, com isso, evitar o confronto com algum outro animal; agindo
assim, poupa o veneno que teria de utilizar para se defender em eventual contra-ataque.
Portanto, não são agressivas e isso explica o menor número de acidentes.
Ao picar, inocula veneno que tem discreta ação proteolítica, causando dor local
temporária mas nenhum sintoma mais sério que se mostre bem visível. Em vista disso, é
comum a pessoa atingida limitar-se a uma limpeza superficial do local e aguardar certo
tempo para melhor avaliar a situação. Algumas horas depois começa então a exibir quadro
geral de sintomas faciais chamado facies neurotoxica (vulgarmente, “cara-de-bêbado”), que
é decorrente do efeito neurotóxico do veneno; expressa-se por dificuldade de o paciente em
manter os olhos bem abertos, testa enrugada, saliva escorrendo pelos cantos da boca na
forma de baba, grande ansiedade etc. Normalmente, a esta altura já deverá estar internado
em uma unidade de assistência médica e inicia-se então uma “luta” para evitar que a mais
terrível ação do veneno, a hemolítica, leve-a à morte. O veneno passa a destruir grande
número de glóbulos vermelhos do sangue, disso resultando acúmulo de resíduos destes que
necessita ser drenado pelos rins e eliminado pela urina. Se o soro antiofídico não for
ministrado em tempo, pode ocorrer que a pessoa passe a urinar cada vez menos um líquido
bem escuro (urina ‘cor de coca-cola’) e, por fim, acabe se mostrando incapaz de urinar em
virtude da paralisação total dos rins. Ocorre então a morte por insuficiência renal aguda.
Todavia, tratado devidamente e em período adequado, o paciente volta a urinar de modo
normal (volume e coloração) devido à reativação da função renal e a recuperação advém
gradualmente. O soro específico para picadas por cascavéis é o anticrotálico.

Acidentes com cascavéis: pessoa picada com “cara-de-bêbado” (esq.) e urina coletada do paciente
para monitoramento da função renal após tratamento com o soro (dir.); observa-se a recuperação
gradual da atividade dos rins pelo aumento do volume de urina e por sua coloração mais clara

Produção de Soros

Segundo dados do Instituto Vital Brazil (RJ), 40 mil acidentes por envenenamento
devido a picadas são ali registrados anualmente, dos quais 8 mil por aranhas, 10 mil por
escorpiões, 20 mil por cobras e 2 mil por outros animais.
A evolução do quadro de sintomas nos acidentes ofídicos é variável em função de
fatores como o tipo de cobra envolvido, a parte do corpo picada, a dose de veneno
inoculada, o peso da vítima etc. Independente disso, um dos aspectos fundamentais nesses
casos é a adoção das medidas corretas de atendimento ao acidentado dentro do menor
espaço de tempo possível. Acalmar a pessoa picada no primeiro momento é importante.
Nessa fase, analgésicos podem ser bastante úteis para diminuir a dor local. Não aplicar
torniquete ou garrote sob qualquer pretexto, deixando tal procedimento a cargo do médico
ou de pessoas especializadas; evitar a realização de cortes próximos ao local da picada e
mesmo o ato de tentar chupar o veneno com a boca. O ideal é transportar o acidentado até
uma unidade assistencial o quanto antes, sem permitir que ele realize esforços físicos. A
aplicação do soro antiofídico será sempre essencial a uma plena recuperação; outros
medicamentos, como antialérgicos, se for o caso, poderão ser usados a critério médico.
Entre outras instituições, o Instituto Butantan, em São Paulo, e o Instituto Vital
Brazil, no Rio de Janeiro, têm se responsabilizado pela produção de soro antiofídico no
Brasil. No Instituto Butantan, atualmente produz-se tanto soros pelo método tradicional,
empregando hiperimunização em cavalos, como os chamados soros liofilizados. O método
convencional envolve várias etapas. O veneno (= antígeno) é diluído e ministrado em
cavalos (de cerca de 500 kg de peso) em doses crescentes e aguarda-se período aproximado
de 40 dias. Nesse intervalo, deve ser muito estimulada a produção de anticorpos pelo
animal, o que é avaliado por amostragens periódicas de seu sangue. Quando o teor de
anticorpos tido como ideal é alcançado, procede-se à sangria final, retirando-se ao redor de
15 litros de sangue em duas etapas, separadas por espaço de 48 horas. Os anticorpos estão
presentes no plasma (parte líquida), que é purificado e concentrado, dando origem ao soro.
[ Para reduzir os efeitos colaterais da sangria, grande parte das hemáceas é reintroduzida
nos cavalos por uma técnica chamada plasmaferese. ] O soro passa por testes de aferição da
qualidade antes de ser liberado para uso. Cerca de 600 mil âmpolas ao ano são produzidas.

Ao encerrar, é bom lembrar que muitas crendices populares existem relativas às


cobras e ao efeito de seus venenos, bem como sobre medidas que supostamente seriam boas
no atendimento de pessoas recém-picadas. Tais lendas, mitos e superstições fazem parte do
folclore e devem ser entendidas como tal, evitando-se todavia colocá-las em prática, pois
quase sempre carecem de fundamentação ou comprovação técnico-científica. Há muitas
recomendações que claramente afrontam o bom senso, mas, acabam sendo utilizadas por
uns e outros. Coisas como tomar querosene, creolina e outras substâncias logo após a
picada para “neutralizar o veneno” são exemplares para ilustrar tal fato. A origem de vários
desses procedimentos, aparentemente injustificáveis e não raro bastante perigosos, foi
esclarecida em uma interessante e recente publicação intitulada “Serpentes: lendas, mitos,
superstições e crendices”, editada no Brasil e constante na bibliografia deste capítulo.
4
3

1. AGLIFODONTE
1 2. OPISTOGLIFODONTE
3. PROTEROGLIFODONTE
4. SOLENOTODONTE

Quatro séries de dentição observadas em ofídios: 1. Sem dentes inoculadores; 2. Presas sulcadas, na
parte posterior da boca; 3. Presas sulcadas, na parte anterior da boca; e 4. Presas canaliculadas,
muito grandes e bem anteriores na boca; também com fossetas loreais (“cobras de 4 ventas”)

Literatura consultada e indicada para leitura

Amaral, A., 1976. Serpentes do Brasil. Iconografia colorida. Melhoramentos, São Paulo, 246 p.
Borges, R.C., 1999. Serpentes peçonhentas brasileiras: manual de identificação, prevenção e
procedimentos em caso de acidentes. Atheneu, São Paulo, 148p.
Grantsau, R., 1991. Cobras venenosas do Brasil. Bandeirantes, São Paulo, 101p.
Russell, F.E., 1980. Snake venom poisoning. J.B. Lippincott Co, London, 562p.
Vizotto, L.D., 2003. Serpentes: lendas, mitos, superstições e crendices. Plêiade, São Paulo, 240p.

Sites brasileiros da Internet sugeridos para consulta

http://www.ivb.rj.gov.br
http://www.butantan.sp.gov.br

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