Introdução, Características e Princípios

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1.

INTRODUÇÃO
Tutela de um sujeito especial de direitos (consumidor), como agente privado vulnerável, nas suas
relações com os fornecedores.
O Brasil adotou o foco no consumidor (enfoque subjetivo). Enquanto na França e Itália doca na
relação jurídica de consumo (enfoque objetivo).
Tem a finalidade de proteger o consumidor, reduzindo a desigualdade existente entre consumidor e
fornecedor na relação de consumo.
O Direito do consumidor é um princípio da ordem econômica previsto no Art. 170, V da CF/88, e o
Estado pode intervir na economia para assegurar a proteção dos consumidores.
A competência para editar normas sobre direito do consumidor é concorrente. A união edita normas
gerais e os Estados e o DF gozam de competência suplementar. Os Municípios detêm competência
para legislar sobre assuntos de interesse local.
O CDC se apresenta como um MICROSSITEMA JURÍDICO. Se apresenta estruturado e
principiologicamente apoiado na CF.
As normas do CDC são de ordem pública e de interesse social, são de natureza cogente
(imperativa).
 O CDC é inaplicável aos contratos celebrados anteriormente à sua vigência (STJ);

2. CARACTERÍSTICAS DO CDC
2.1 Normas principiológicas: o CDC é recheado de normas principiológicas, veiculam valores e
conceitos jurídicos indeterminados, o intérprete e o aplicador devem se debruçar sobre uma
atividade interpretativa mais densa e um ônus argumentativo maior.
2.2 Vocação de expansão: possuem característica de expansão para outros setores do ordenamento
jurídico.
2.3 Diálogo das fontes: utilização de normas variadas que dialoguem em torno de um determinado
assunto consolidando melhor resultado para o conflito.
Sempre que uma lei garantir algum direito para o consumidor, ela poderá se somar ao microssistema
do CDC, incorporando-se na tutela especial e tendo a mesma preferência no trato da relação de
consumo.
Existem 3 tipos de diálogo das fontes:
a) Diálogo sistemático de coerência → aproveitamento da base conceitual de uma lei pela
outra;
b) Diálogo sistemático de complementariedade e subsidiariedade → adoção de princípios e
normas, em caráter complementar por um dos sistemas, quando se fizer necessário para a
solução do caso concreto;
c) Diálogo de influência recíprocas → influência do sistema especial no geral e do geral no
especial.
2.4 Irrelevância dos aspectos formais: o CDC demonstra evidente preocupação com a efetividade de
suas normas, em detrimento de aspectos formais e estruturais tanto do processo, como do direito
material.

3. PRINCÍPIOS DO CDC
3.1 Vulnerabilidade do consumidor: o CDC preocupa restabelecer o equilíbrio desigual entre
fornecedor e consumidor.
O consumidor pode ser visto como hipossuficiente e vulnerável:
a) Hipossuficiente → afeta ao direito PROCESSUAL, aferido pelo juiz segundo as
circunstâncias do caso concreto, pode o magistrado proceder à inversão do ônus da prova.
b) Vulnerabilidade → é afeta ao direito MATERIAL e sua presunção em relação ao consumidor
é ABSOLUTA, não depende da condição econômica ou de qualquer outro contexto.
Nem todo consumidor é hipossuficiente, mas todo consumidor é vulnerável. A doutrina aponta 3
tipos de vulnerabilidade:
I. Vulnerabilidade técnica → desconhecimento do consumidor das características do
produto/serviço. Decorre da não participação do consumidor na cadeia do
fornecedor/vendedor, participando apenas da última etapa do processo de fornecimento
de um bem de consumo.
 A vulnerabilidade informacional pode ser considerada como espécie de vulnerabilidade
técnica, é considerada falta de informação.

II. Vulnerabilidade jurídica ou científica → desconhecimento do consumidor dos direitos e


deveres da relação jurídica de consumo. Também inclui a ausência de conhecimento de
economia ou de contabilidade.
III. Vulnerabilidade econômica ou fática → o consumidor é frágil diante do fornecedor;
IV. Vulnerabilidade organizacional → são os socialmente vulneráveis;
V. Vulnerabilidade informacional → o consumidor não detém informações suficientes para
realizar o processo decisório de aquisição ou não do produto ou serviço.
Era enquadrada como vulnerabilidade técnica.
VI. Vulnerabilidade digital → ausência e/ou precariedade do acesso às tecnologias de
informação e comunicação e aos serviços de conexão à internet (exclusão digital).
Embora a vulnerabilidade seja absoluta, é possível analisar a existência ou não dela para fins de
determinar a aplicação do CDC. Ausente essa característica, pode ser que a relação se estabeleça
nos termos empresariais, tornando inviável a aplicação do CDC.
É possível juiz extinguir o processo sem decisão de mérito quando o autor não procurou resolver o
problema administrativamente ou não utilizou a plataforma consumidor.gov? Como defensor, deve-se
combater essa tese, pois a justiça multiportas jamais pode fechar a porta do Poder Judiciário para solucionar
lesões ao direito. Cabem as partes a escolha da “porta” mais viável.
Exigir o acessa à plataforma do consumidor.gov como pré-requisito de propositura da ação, estar-se-á
estabelecendo verdadeira barreira ao acesso à justiça, haja vista a grande VULNERABILIDADE DIGITAL que
assola a parte da população.

3.2 Transparência: a PNRC busca assegurar a transparência nas relações, em prestígio à boa-fé.
Enseja o afastamento das cláusulas dúbias e contraditórias, além de impor uma interpretação mais
favorável ao consumidor.
A utilização de escore de crédito (credit scoring), método estatístico de avaliação de risco que não
constitui banco de dados, dispensa o consentimento do consumidor, que terá o direito de solicitar
esclarecimentos sobre as informações pessoais valoradas e as fontes de dados considerados no
respectivo cálculo (S. 550 STJ).
3.3 Informação: se divide em: a) prestar informação; e b) dever de informar.
O fornecedor deve sempre prestar informação correta, clara e precisa, e de maneira mais acessível,
aos consumidores. Informação falha ou defeituosa gera responsabilidade. Devem conter as
advertências necessárias para alertar o consumidor a respeito dos riscos que, eventualmente,
podem frustra a utilização do serviço contratado.
 S. 616 STJ → a indenização securitária é devida quando ausente a comunicação prévia do segurado
acerca do atraso no pagamento do prêmio por constituir requisito essencial para suspensão ou
resolução do contrato de seguro;

 O médico deverá ser condenado a pagar indenização ao paciente que teve sequelas em virtude de
complicações ocorridas durante a cirurgia caso ele não tenha explicado ao paciente os riscos do
procedimento. Deve ser prestado de forma individualizada, não se mostrando suficiente a informação
genérica (Info 632 STJ).

3.4 Segurança: os fornecedores devem assegurar a colocação no mercado de consumo de serviços


e produtos que não causem danos aos seus destinatários.
Ainda que o responsável tome as devidas providências legais do Art. 10 do CDC (recall), continua
vinculado aos danos que os consumidores venham sofrer pela utilização do produto ou serviço
inadequado/perigoso.
Tais deveres se estendem também aos serviços públicos (Art. 6, X do CDC).
3.5 Equilíbrio das prestações: o CDC reputa inválidas as cláusulas contratuais que evidenciem
desequilíbrio entre as partes, sobretudo se verificada uma desvantagem excessiva ao consumidor.
 É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado
(S. 302 do STJ).

 Não é abusiva a cláusula em contrato de plano de saúde individual que estabelece, para TRATAMENTO
EMERGENCIAL ou de URGÊNCIA, no segmento atendimento AMBULATORIAL, o limite de 12 horas (Info
637 STJ);

 Não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor para


hipótese de internação superior a 30 dias decorrentes de transtornos psiquiátricos (Info 635 STJ);

 É abusiva a cláusula contratual ou o ato da operadora de plano de saúde que limite ou interrompa o
tratamento psicoterápico oferecido ao usuário sob o argumento de que já se esgotou o número máximo de
sessões anuais asseguradas no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS. Depois que
terminarem as sessões obrigatórias, deverão continuar sendo oferecidas as sessões necessárias, no
entanto, a custa delas será dividido, em regime de coparticipação, entre o plano e o usuário (Info 612
STJ);

São direitos básicos do consumidor: V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam
prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem
excessivamente onerosas (Art. 6, V do CDC). Trata-se da chamada teoria da base objetiva do
contrato.
3.6 Reparação integral: reparação ao consumidor que sofreu qualquer tipo de dano deve ser a mais
ampla possível, abarcando todos os danos causados (Art. 6, VI do CDC).
É possível a limitação, por legislação internacional especial, do direito do passageiro à indenização
por DANOS MATERIAIS decorrentes de extravio de bagagem (Info 626 STJ).
Nas relações de consumo entre fornecedor e consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser
limitada, em situações justificáveis.
Se a vítima contribuiu para o dano que lhe foi causado, a indenização poderá ser reduzida.
Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao
CDC, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador,
integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso
tenha sido o comprador que deu causa ao desfazimento (S. 543 STJ).
3.7 Solidariedade: técnica de imputação de responsabilidade à pessoa distinta da que efetivamente
causou o dano, de modo a tornar mais eficiente o princípio da reparação integral.
A regra do CDC é a solidariedade entre todos os agentes da cadeia de consumo.
É vedada a estipulação pelo fornecedor de cláusula que exonere ou mesmo atenue a sua
responsabilidade.
Em ação de reparação de danos, a seguradora denunciada, se aceitar a denunciação ou contestar o
pedido do autor, pode ser condenada, direta e solidariamente junto com o segurado, ao pagamento
da indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice (S 537 STJ).
3.8 Interpretação mais favorável ao consumidor: as cláusulas contratuais serão interpretadas de
maneira mais favorável ao consumidor.
 É inadmissível a recusa do plano de saúde em cobrir tratamento médico voltado à cura de doença coberta
pelo contrato sob o argumento de não constar da lista de procedimento da ANS, pois este rol é
exemplificativo, impondo-se uma interpretação mais favorável ao consumidor (STJ);

São nulas as cláusulas que atenuem a responsabilidade do fornecedor ou desvirtuem direito


fundamentais inerentes à natureza do contrato. As cláusulas limitadoras de direitos do consumidor
devem ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.
3.9 Boa-fé objetiva: padrão de conduta que deve ser observado por todos os fornecedores no
mercado de consumo, com base em valores éticos, de modo a respeitar as expectativas do
consumidor naquela relação jurídica.
 A responsabilidade pela confiança é autônoma em relação à responsabilidade contratual e à extracontratual,
tendo caráter subsidiário: onde houver o dano efetivo, requisito essencial para a responsabilidade civil e não for
possível obter uma solução satisfatória pelos caminhos tradicionais da responsabilidade, a teoria da confiança
será a opção válida.” STJ, REsp 1592422.
3.10 Reparação objetiva: a responsabilidade civil por danos causados aos consumidores é objetiva,
independe da prova do elemento culpa de seu causador, bastando que a vítima comprove a
conduta, nexo causal e o dano.
As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo
e fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias (S. 479 do STJ).
O CDC adota, para os profissionais liberais, a responsabilidade subjetiva (com presunção de culpa).
3.11 Adimplemento substancial: visa impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte
do credor, preterindo desfazimentos desnecessários em prol da preservação da avença (não esta
legalmente prevista no ordenamento jurídico).
Se o adimplemento da obrigação foi muito próximo ao resultado final, a parte credora não terá direito
de pedir a resolução do contrato, sendo desproporcional e violando a boa-fé objetiva.
3.12 Venire contra factum proprium: proibição de comportamento contraditório, que configura uma
conduta desleal em prejuízo à boa-fé objetiva e aos seus deveres anexos.
Segundo a doutrina, são pressupostos para a configuração:
a) Conduta inicial;
b) legítima confiança visualizada a partir dessa conduta inicial;
c) Comportamento contraditório;
d) Dano.
3.13 Conservação do contrato: a nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o
contrato, exceto quando sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo
a qualquer das partes.
3.14 Modificações das prestações desproporcionais: modificação das cláusulas contratuais que
estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão da fatos supervenientes que as
tornam excessivamente onerosas. É um direito subjetivo do consumidor.
Não se confunde com a teoria da imprevisão do CC/02.
A teoria da base objetiva ou da base do negócio jurídico tem sua aplicação restrita às relações
jurídicas de consumo, não sendo aplicável às relações contratuais puramente civis. [...] O requisito
do fato não ser previsível nem extraordinário não é exigido para a teoria da base objetiva, mas tão
somente a modificação nas circunstâncias indispensáveis que existiam no momento da celebração
do negócio, ensejando onerosidade ou desproporção para uma das partes. STJ, REsp 1321614.
3.15 Equidade: necessidade de se estabelecer um equilíbrio material na relação jurídica.
3.16 Acesso à justiça: direito básico do consumidor, sendo a facilitação da defesa de seus direitos.

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