07 Ebook Formacao Docente e Praticas Pedagogicas
07 Ebook Formacao Docente e Praticas Pedagogicas
07 Ebook Formacao Docente e Praticas Pedagogicas
desafios e possibilidades em
múltiplos contextos
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Joelson de Sousa Morais
Cristiane Dias Martins da Costa
Lucinete Fernandes Vilanova
(Organizadores)
3
Copyright © Autoras e autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida,
transmitida ou arquivada desde que levados em conta os direitos das autoras e dos
autores.
CDD – 370
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AGRADECIMENTOS
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querido. Você arrasou, ou como você diz, achamos a capa do livro
“tendência”! (risos).
E você Antonio Gabriel, ficamos honrados
por ter aceito fazer parceria com João Daniel na
conclusão da imagem/arte da capa do livro. O
design dado, junto com a pintura e os traços que
compuseram a obra que hoje se tornou a capa
deste livro ficaram super originais e belos pela sua
participação. Muito obrigado querido por ter se
juntado a nós nessa obra, o que é de grande valia e fortalecimento do
coletivo, com sua partilha.
Diante do exposto e com reflexos potencialmente significativos
na arte da capa, vale a pena finalizamos trazendo outros olhares que
foram elogiados com base na narrativa de Diany Akiko Lee, que é
responsável pela diagramação dos livros da Pedro & João Editores, a
quem agradecemos afetuosamente seus contributos nesse processo.
Segundo ela nos respondeu via e-mail quando encaminhamos a
imagem da capa, com a seguinte narrativa: “Noossaa, fiquei encantada
com esta arte, ela é lindíssima!! Por favor, se aprovada, depois me passe
os nomes de quem fez a criação para creditarmos na ficha. A arte é muito
original, delicada e achei linda demais!! (Narrativa de Diany, 22/07/22)”
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SUMÁRIO
PREFÁCIO 15
Franciele Monique Scopetc dos Santos
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2ª PARTE: EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS E PEDAGÓGICAS NA
EDUCAÇÃO BÁSICA
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POR OUTRAS LÓGICAS FORMATIVAS DA DOCÊNCIA E
DAS VIDAS HUMANAS EM CENÁRIOS COMPLEXOS:
TECENDO UMA APRESENTAÇÃO
9
buscando envolver os/as docentes e estudantes dos cursos de
licenciaturas do campus da UFMA/Codó, do qual emergiu tal dádiva e
conquista.
Fruto de um esforço coletivo, envolvendo diferentes pessoas, de
várias áreas do conhecimento, pensamentos diversos e projetos de vida
e formação plurais e emergentes, o presente livrou nasce como uma
iniciativa dentro do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do
Maranhão (UFMA)/Campus VII – Codó (MA), iniciado no final do segundo
semestre do ano de 2021 e concluído no primeiro semestre de 2022.
Desse modo, o livro traz textos de professores/as dos três cursos
de licenciaturas que são ofertados no campus da UFMA/Codó, quais
sejam: curso de Pedagogia, Curso de Ciências Humanas: com ênfase
em História e Curso de Ciências Naturais: com ênfase em Biologia.
Professores/as, estudantes e pesquisadores/as uniram-se e
trouxeram a potência e riqueza de seus escritos, que foram se
compondo nas artes de saber fazer (CERTEAU, 2012), de cada texto que
aqui se apresenta, refletindo-se, entre outras temáticas em: práticas
da docência, currículos em emergência, formação de professores/as
em contextos universitários e no cotidiano das escolas no
desenvolvimento profissional, educação inclusiva e em cenários
interculturais, processos de alfabetização e letramento, educação
matemática, práticas metodológicas com narrativas (auto)biográficas
na formação docente, entre outras que abrilhantou o conjunto da obra
que aqui se apresenta.
Foram os/as professores/as dos cursos de licenciatura da UFMA de
Codó e os/as estudantes egressos/as do curso de Pedagogia, bem como
aqueles/as oriundos/as de cursos de especialização lato sensu e da
formação no Programa Nacional de Formação de Professores da
Educação Básica (PARFOR), que o livro foi surgindo, apresentando 09
(nove) textos com diferentes discussões que atravessou o título da obra.
O livro está dividido em três partes nos quais se compõe um
conjunto de textos em cada uma: Primeira parte: Ensino, formação
docente e conhecimentos curriculares em construção, com três textos,
a saber: Primeiro capítulo: Escritas de si e reflexividade em narrativas
(auto)biográficas como metodologias de ensino na formação de
professores, de autoria do professor Joelson de Sousa Morais; capítulo
dois: Currículo e formação docente: um estudo de sua relação com as
políticas educacionais e a importância de uma visão integradora para a
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construção do conhecimento profissional, de autoria das professoras
Francimar Oliveira Miranda de Carvalho, Lucinete Fernandes Vilanova
e Olinda Ferreira Araújo; capítulo três: “Afasta de mim esse cale-se”:
políticas curriculares pela liberdade de ensinar e por vidas vivíveis nos
currículos, de autoria dos professores Danilo Araújo de Oliveira e
Anderson Ferrari.
A segunda parte do livro é tematizada: Experiências educativas e
pedagógicas na educação básica, e congrega três textos, assim
organizados: capítulo quatro: Os contos de fadas nos anos iniciais:
estereótipos e formação das identidades das meninas codoenses, de
autorias dos/as professores/as Maria Nayara Oliveira Torres, Luís
Henrique Serra e Kelly Almeida de Oliveira; capítulo cinco: Matemática
olímpica nos anos iniciais: novas aprendizagens, de autoria dos/das
professores/as Arlane Manoel Silva Vieira, Aldineia Lima Costa e Jailly
Felix Salazar; e, capítulo seis: Práticas pedagógicas na terra de Gonçalves
Dias, de autoria das professoras Irislene Paiva Araújo Cunha e Kelly
Almeida de Oliveira.
No que se refere à terceira e última parte do livro tematizada:
Educação inclusiva e em contextos multiculturais, apresenta três textos,
a saber: o sétimo capítulo: Alfabetização e letramento a partir da
literatura afro-brasileira: uma experiência remota na Pestalozzi de Codó,
Maranhão, de autoria dos/as professores/as Cristiane Dias Martins da
Costa e José Carlos Aragão Silva; o capítulo oito: A interculturalidade na
educação escolar indígena: a perspectiva decolonial, de autoria do professor
Samuel Correa Duarte; e, o nono capítulo: Ensino de libras para crianças
surdas em tempos de pandemia no município de Codó/Ma, de autoria das
professoras Sandra Maria Ribeiro Costa e Kaciana Nascimento da
Silveira Rosa.
Em um cenário configurado cada vez mais pelas incertezas da vida
no que pese ao desenrolar de uma pandemia nesses tempos, ainda
sofremos no Brasil uma crise profunda de cunho político, pela atuação
do então presidente Jair Bolsonaro, baseado nos princípios
ultraconservadores, de direita e alicerçado pela religião protestante de
forma ortodoxa, com a disseminação de discursos e narrativas
hegemônicas, ofensivas e altamente nocivas ao povo brasileiro em
suas respectivas diversidades e singularidades. É possível destacar que
tal atuação vem ainda a todo o custo perseguindo a área de ciências
humanas e sociais, principalmente, a universidade pública, os
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profundos cortes no âmbito educacional e os avanços na ciência,
descontinuando projetos democráticos e transformadores que já
vinham há décadas acompanhando o desenvolvimento político,
educacional, cultural e científico do país.
Nesse sentido, é válido destacar a ousadia com que se tece essa
obra, por situar-se como uma resistência em tempos de incertezas que
pairam no cenário brasileiro, se tornando uma via indispensável de
construção de outros modos e possibilidades de pensar e ampliar
saberes e conhecimentos democráticos no campo da educação e da
formação humana e profissional da docência.
A presente obra, portanto, é fruto de uma criação tanto singular
como coletiva e ao mesmo tempo subjetiva, afinal de contas, cada
autor/a pensou e transformou suas experiências de mundo e
formativas em narrativas de conhecimentos que emergiram nos
textos, afinal de contas, refletindo com Paulo Freire “[...] só existe
saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente,
permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os
outros” (FREIRE, 2013, p. 81).
É válido ainda enfatizar que produzir conhecimentos diante de
toda a conjuntura a que estamos imersos é ao mesmo tempo uma
tarefa difícil, desafiante e complexa que foi nos acompanhando entre
buscas de acertos, descontinuidades diversas e conquistas que agora
se concretiza nessa obra, a qual ousamos e desejamos que circule em
diferentes espaços e contextos educacionais dentro e fora de Codó,
para além da UFMA, o estado do Maranhão, e porque não dizer da
região nordeste, ampliando-se no cenário nacional.
Como o primeiro livro que nasce no curso de Pedagogia da
UFMA/Codó, esperamos poder contribuir para a construção de
saberes e conhecimentos na formação de professores/as, tanto nos
cursos que são ofertados no respectivo campus, como para outros
contextos que apresentam etapas, níveis e modalidades de ensino, em
diferentes instituições educativas, além de agregar valor que leve a um
convite para leitura de novos/as pesquisadores/as, professores/as da
Educação Básica e Ensino Superior, e outros tantos profissionais da
educação, comprometidos e compromissados com uma educação
pública de qualidade, laica, gratuita e socialmente referenciada.
Que as cores, texturas, saberes e sabores deste livro possa ecoar nos
mais diversos e múltiplos cantos e contextos da experiência humana e
12
formativa da docência, podendo contribuir de alguma forma no processo
de construção de conhecimentos e em potentes reflexões que alie cultura
humana, científica, acadêmica, filosófica, artística e de outras tantas
dimensões da existência! Que assim seja caro/a leitor/a. Deleite-se!
Codó-MA
Princesa do Vale do Itapecuru e Cidade de Deus,
Maio de 2022.
Referências
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14
PREFÁCIO
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licenciatura em pedagogia de volta à Codó, à Região dos Cocais, que
celebra em ensino, pesquisa e extensão, transformações sociais
concretas em sua rede municipal de ensino e nos sistemas de ensino
de municípios de seu entorno como Aldeias Altas e Timbiras. A mesma
imaginação que emana dos babaçuais é aquela destacada na obra, nas
diversas políticas públicas educacionais aqui matizadas e
problematizadas ao longo de cada uma das três partes desse
livro/acontecimento.
Acontecimento histórico, pois é nesse caminhar entrelaçado de
diferenças e singularidades que vemos docentes formadoras/es,
egressas, pesquisadoras/es de diferentes regiões do país, se somando
aos esforços desse lugar de fala, o curso de pedagogia da Universidade
Federal do Maranhão (UFMA), Campus Codó.
Um lugar não somente de formação acadêmica e científica, de
pesquisa e extensão, mas também de imaginação, de inovação e,
sobretudo, de compromisso social com os direitos humanos, com a
liberdade e com a democracia. Um lugar que no cotidiano das salas de
aulas tem responsabilidade com práticas inclusivas na formação inicial
de professoras/es. Nos anseios da promoção do bem viver, nas
dimensões multiculturais e interculturais, que povoam nosso país. Foi
durante a pandemia/sindemia do vírus SARS-CoV-2, Covid-19, que
muitas das experiências educativas, que nessa obra movimentam
nosso pensamento, foram realizadas. Num misto de luto e esperança,
num jogo de dobras de sentidos, as professoras e professores que
acolheram, que ensinaram, que produziram, nesse
livro/acontecimento representam todas, todos e todes nós.
Nos representam em alegria, em determinação e competência,
nos oferecem aqui uma dimensão possível do que foi
ensinar/aprender, como medo e ousadia, com excelência e
compromisso com uma educação pública, gratuita e de qualidade. Os
próximos passos são para o futuro, um futuro em que poderemos
partilhar mais práticas educativas em consonância com nosso lugar,
que assim como é feito em Codó, possamos fazer em diversos
territórios e regiões de nosso país. Conectando saberes ancestrais e
tecnologias inovadoras, onde a formação inicial de professoras/es será
pautada nas diferenças, com respeito as diversidades étnicas, racial, de
gênero e de classe. Eis aqui, nesse livro/acontecimento, indícios do
16
projeto político pedagógico que seguimos caminhando irmanadas/os
na formação inicial de professoras e professores.
Sou eu aqui
Ocupo meu lugar
E o que eu sou
Virá
(Virá - Composição: Hermes De Castro/Marcos Lamy)
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18
1ª PARTE:
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20
ESCRITAS DE SI E REFLEXIVIDADE EM NARRATIVAS
(AUTO)BIOGRÁFICAS COMO METODOLOGIAS DE ENSINO NA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
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deixados de lado, dando a ver a emergência de significativos fatos para
impulsionar a conquista de seus sonhos, desejos e uma formação pautada
por implicações que o movem ao futuro.
Esse arsenal de acontecimentos e transformações intensivas e
potentes pelas escritas narrativas (auto)biográficas na formação de
professores se configura com um espectro de possibilidades e que
vem se tornando letra viva em minha experiência como professor nos
cursos de licenciaturas pelos quais venho atuando há nove anos em
diferentes instituições de ensino superior públicas e privadas nos
estados do Maranhão e Piauí.
Mais precisamente, o curso de Pedagogia, tem sido uma das
maiores tônicas, pelas quais tenho me interessado, estudado e
pesquisado tanto em relação às questões atinentes a formação de
pedagogos, quanto no que diz ao como pensam os estudantes deste
curso e aos professores com formação em pedagogia, em exercício
profissional da docência na Educação Básica.
Isso se dá, pela minha formação, por ser pedagogo, como
também, da riqueza que vem se revelando ao longo do tempo,
mostrando contínuas mudanças, tanto em sua matriz curricular, como
nos processos formativos e da construção de novos referenciais e
necessidades que potencializam esta área do conhecimento.
A proposta desse texto, é mais uma das experiências de tessitura
de saberes que venho narrando, pautando-se pela minha experiência
como professor do curso de Pedagogia da Universidade Federal do
Maranhão (UFMA), campus Codó, o qual se iniciou em março do ano
de 2021 naquele primeiro momento como professor substituto, e
agora, dando continuidade como professor efetivo do magistério
superior no respectivo curso1.
O que reflito nesse texto, é uma tentativa de explicitar um pouco
da minha experiência que venho desenvolvendo no curso de
Pedagogia, nas diferentes disciplinas que venho ministrando nesse
período da pandemia, mais respectivamente que se deu no ano de
2021, utilizando diferentes dispositivos metodológicos com as escritas
22
de si tecidas em narrativas (auto)biográficas dos estudantes do
referido curso.
Tais registros que tem, em sua maioria se dado pelas escritas de
si através de: fotografias, narrativas das experiências escolares,
fanzines e memoriais de formação e outros, apontam para a riqueza
da formação dos estudantes os quais são mobilizados a narrar pelos
acontecimentos do passado disparados pela evocação da memória, e
que passam a registrar por escrito as experiências que trilharam em
algum momento de sua vida pessoal, acadêmica e formativa,
impulsionados por questionamentos ou provocações que faço
durante as aulas e como dispositivo metodológico, de avaliação das
disciplinas para atribuição de notas e, principalmente, como meio de
formação, aprendizagem e construção de conhecimentos.
A questão disparadora do meu pensamento nesse texto e que se
configura como norteadora da pesquisa é: Quais contribuições
promove a escrita narrativa (auto)biográfica como processo
instituinte de formação, construção de conhecimentos e
aprendizagens com estudantes de licenciaturas na docência
universitária?
Nesse sentido, situo esse texto com o objetivo de refletir como se
tece aprendizagens e construção de conhecimentos pelas escritas de
si na tessitura de narrativas (auto)biográficas por estudantes do curso
de Pedagogia, bem como compreender as potencialidades que as
escritas narrativas (auto)biográficas propiciam na promoção de uma
reflexividade instituinte de (trans)formação do sujeito pela narração.
Trata-se, portanto, de um estudo ancorado na abordagem
qualitativa do tipo pesquisa narrativa (auto)biográfica, configurando-
se como um relato de experiência que tenho desenvolvimento como
professor do curso de Pedagogia da UFMA/Codó durante minha
atuação no período remoto no ano de 2021 na pandemia.
Os meus referenciais teóricos e epistemológicos que embasam
esse texto, são os que já vem me acompanhando a aproximadamente
quase uma década na produção do conhecimento, em leituras e
reflexões outras que trilham por estudiosos da pesquisa narrativa2, tais
23
como Marie-Christine Josso, Paul Ricoeur, Ivor Goodson, Maria da
Conceição Passeggi, Inês Bragança, Jorge Larrosa, Christine Delory-
Mombeger, Walter Benjamin e outros.
Devo ainda salientar que esse texto é produzido no âmbito de
uma pesquisa narrativa (auto)biográfica em três dimensões: como
teoria, metodologia e modo de produção de conhecimento. Tal forma
de produção de conhecimento se deu também no mesmo modo como
elaborei a minha tese de doutorado em educação (MORAIS, 2022).
Essa perspectiva vem se consolidando já um certo tempo no Grupo de
Estudos e Pesquisas em Educação Continuada (GEPEC)3 do qual faço
parte como pesquisador na Faculdade de Educação (FE) da Unicamp.
Isso implica dizer que em alguns momentos da minha escrita
nesse texto estarei narrando em primeira pessoa acerca do que penso,
vivi, pratiquei e experienciei na docência universitária utilizando os
dispositivos metodológicos das escritas narrativas (auto)biográficas
com os estudantes do curso de Pedagogia. Bem como estarei
narrando metodologicamente a partir do que fora produzido nas
disciplinas que ministrei aludindo aos componentes da aprendizagem,
construção de conhecimentos e formação que os dispositivos
metodológicos propiciaram, e a terceira dimensão, trata-se das
reflexões teóricas com base nos autores da pesquisa narrativa para
dialogar com as ideias tecidas no artigo.
de Educação da Unicamp.
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Uma das razões pelo uso de escritas narrativas tem se dado pelo
fato de que as tenho utilizado como dispositivo de minha própria
formação, como das pesquisas que venho realizando e de
(auto)formação, nas quais faço registros em meus diários nos
percursos das pesquisas científicas, como de minha prática
pedagógica na docência universitária.
Convém refletir como tem pensando alguns proeminentes
pesquisadores narrativos e com os quais venho dialogando na
produção do conhecimento científico durante minha vida acadêmica
e formativa desde que conheci essa área, me apaixonei e me senti
seduzido, completamente. Uma dessas autoras pesquisadoras,
refere-se à Conceição Passeggi, que foi minha professora no
Mestrado em Educação que cursei na UFRN, quando morei em Natal
em 2013, e que, alguns anos depois fez parte de minha banca de
doutorado em educação na Unicamp, neste ano de 2022, como
avaliadora. Segundo ela:
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[...] Nós qualificamos esse cenário como “pesquisa-formação” porque a
atividade de pesquisa contribui para a formação dos participantes no
plano das aprendizagens reflexivas e interpretativas, e situa-se em seu
percurso de vida como um momento de questionamento retroativo e
prospectivo sobre seu(s) projeto(s) de vida e sua (s) demanda (s) de
formação atual (JOSSO, 2006, p. 421)
26
Esse fazer emergir as experiências do sujeito pela narração
evocado no âmbito da memória, trata-se, assim, de uma memória
declarativa nos termos de Paul Ricoeur (2007, p. 138), que, segundo o
autor “em sua fase declarativa, a memória entre na região da
linguagem: a lembrança dita, pronunciada, já é uma espécie de
discurso que o sujeito trava consigo mesmo”.
Assim, longe de ser uma escrita meramente descritiva, em que se
insere dados, informações ou apenas o fato de mencionar
determinados acontecimentos sem um cunho crítico e reflexivo, não é
capaz de gerar processos de formação e transformação de si pelas
escritas elaboradas pelo sujeito e sim as escritas narrativas
(auto)biográficas se inscrevem como um processo de mergulho em si
que o sujeito pratica, passando a se conhecer cada vez mais, e,
consequentemente, aprender e construir conhecimentos outros ainda
não tecidos antes.
Nesse sentido, compreendo a escrita narrativa (auto)biográfica
como o registro da experiência vivida pelo sujeito ao longo dos
itinerários trilhados como um voltar para si, tecendo uma reflexividade
capaz de tomar consciência e promover estados outros de ser, pensar,
estar e fazer propiciando processos formativos, de transformação e
emancipação.
Com base nesse conceito que produzi, me leva a pensar uma
referência ímpar na pesquisa narrativa a nível mundial, a quem tive a
honra de conhece-la pessoalmente por ocasião da realização do VI
Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)Biográfica (CIPA),
realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ)/Maracanã, no ano de 2014, que foi a Christine Delory-
Momberger. Gosto muito do conceito que essa pesquisadora francesa
faz acerca da narrativa (auto)biográfica, ou melhor, do que ela designa
por biográfico, com as seguintes palavras, “somos levados a definir o
biográfico como uma categoria da experiência que permite ao
indivíduo, nas condições de sua inscrição sócio-histórica, integrar,
estruturar, interpretar as situações e os acontecimentos vividos”
(DELORY-MOMBEGER, 2008, p. 26).
27
Os dispositivos metodológicos com narrativas (auto)biográficas na
docência universitária: desvelando seus contributos e
potencialidades
28
subsidiar uma das notas referente à avaliação da aprendizagem. Tais
aulas e proposição de atividades aconteceu através de encontros e
aulas que se deram pela plataforma do Google Meet, durante as tardes,
que iam das 14:00h até às 18:00h, aproximadamente, embora,
dividindo esse horário com aulas síncronas e assíncronas.
Além dos encontros pelo Google Meet, as outras interações
diversas entre professor e estudantes se deram também pela criação
de um grupo de WhatsApp de cada turma, para o repasse de
informações, envio dos links dos encontros e textos das disciplinas,
bem como subsidiou outras situações mais imediatas que pudessem
se resolver, como também da utilização do e-mail institucional para
envio dos trabalhos das disciplinas por parte dos estudantes, e pela
devolutiva em que eu dava, individualmente, para cada um,
dependendo do tipo de trabalho que eu recebia no correio eletrônico.
Passo agora, a explicitar de uma forma mais exemplificada como se
deu os usos e contributos formativos dos dispositivos metodológicos em
minha prática pedagógica na docência universitária, os quais estão
organizados na seguinte ordem, nominados por Dispositivos
metodológicos seguido da numeração com foco nas escritas narrativas
(auto)biográficas em: 1) diários narrativos; 2) acerca das experiências
escolares; 3) com o uso de fotografias; 4) com a confecção de Fanzines; e,
5) com os memoriais de formação.
29
Para o professor, o diário pode revelar outros tantos saberes e
conhecimentos dos seus próprios estudantes que está lecionando,
mostrando facetas importantes dos modos de pensar destes sujeitos,
além das compreensões, mas também dos sonhos, desejos e reflexões
potentes que muitas vezes não são explicitadas e narradas nas
conversas orais, mas que no escrito tem uma consistência e
possibilidade de ser revelada, uma vez que os estudantes se sentem
mais a vontade para contar determinados casos e fatos por escrito que
na expressão da oralidade não conseguiriam.
De acordo com Zabalza (2004, p. 24), a importância do uso do
diário como recurso pedagógico na formação de professores no ensino
superior, “aparece como um recurso privilegiado para refletir como
cada aluno vai construindo seu conhecimento disciplinar, tanto em sua
dimensão conceitual como no que se refere à dimensão atitudinal e à
‘visão’ geral dos temas que acaba configurando em sua mente”
Metodologicamente, eu utilizava, sempre no final da aula remota,
um tempo cerca de uns 15 a 20 minutos para que cada estudante
pudesse escrever uma narrativa (auto)biográfica em seu diário, com
cerca de 01 (uma) a 02 (duas) páginas no máximo e que depois desse
momento durante a própria aula, enquanto era dada uma pausa para
que os mesmos escrevessem em seu diário, eu sorteava 02 (dois) a 03
(três) deles para que fizesse a leitura de sua narrativa na sala virtual
com câmeras abertas e áudio ligado, e depois dessa leitura era feita
uma reflexão em que eu poderia comentar o teor de sua escrita, não
avaliando ou dando juízos de valor, e sim, mostrando as características
e pontos importantes que foram possíveis de conhecer e aprender do
sujeito que narrava as suas implicações formadoras ou de possíveis
atravessamentos que traziam entraves à construção de seus saberes e
conhecimentos, algumas vezes mediatizadas por críticas
contundentes, quando os estudantes não conseguiam ser reflexivos
narrativamente, e sim apenas com o uso de uma escrita descritiva, que
fugia aos princípios outrora orientados continuamente, tanto no início,
quanto no transcurso da disciplina.
Desse processo de leitura e reflexão das narrativas, os colegas da
turma, os demais estudantes, alguns também faziam comentários
após a leitura da narrativa que o colega fez antes, e assim, a formação
acontecia em coletivo, para todos os estudantes e para o professor da
disciplina também.
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A ideia do diário foi fazer com que cada estudante pudesse se
perceber durante o curso e suas múltiplas outras experiências de vida
e formação trilhadas, passando a registrar por escrito o que mais lhe
pareceram significativos narrar (auto)biograficamente e tirar lições e
aprendizados dessa experiência.
Nesse processo, de narrar autobiograficamente no diário, os
estudantes acabam praticando uma reflexividade, passando a se ver e
perceber como era o seu estilo de escrita narrativa mediatizado pelos
meus comentários e a dos colegas de turma, afina, cada pessoa
aprende e desenvolve um modo próprio de escrever narrando, ou seja,
cada um tem um estilo narrativo, portanto, singular e irrepetível, ou
nas palavras de Bakhtin (2017, p. 43) cada sujeito acaba produzindo
uma “singularidade irrepetível da vida que se vive”, o que acredito
efetuar-se tão perspectiva pelas escritas narrativas (auto)biográficas.
31
texto que produzi em uma disciplina do doutorado em educação e que
teve uma boa receptividade e compreensão por parte deles.
A proposta é que cada estudante pudesse se lembrar de um ou
dois acontecimentos no máximo que teve, quando foi aluno da
Educação Básica, que pudesse girar em torno de algo que lhe tocou,
afetou ou trouxe profundos significados e marcas que não se
esqueceram para poder narrar. Essa implicação de deixar-se envolver,
e se lembrar de acontecimentos da vida que mexe com o sujeito e com
suas emoções para poder evocar na memória e narrar relaciona-se
inteiramente com as discussões acerca da experiência de quem
brilhantemente tem refletido Jorge Larrosa (2002). Segundo este
autor “[...] o sujeito da experiência seria algo como um território de
passagem, algo como uma superfície sensível que aquilo que acontece
afeta de algum modo, produz alguns afetos, inscreve algumas marcas,
deixa alguns vestígios, alguns efeitos” (LARROSA, 2002, p. 24).
É, portanto, esse sujeito da experiência que sente, deseja, tem
pulsações, emoções e se deleita com os prazeres e desejos da vida e
que faz toda a diferença os acontecimentos que se processam em sua
existência, pois passa a dá sentido, vigor e interesse ao que lhe toca e
faz brilhar os olhos, e sob os quais tais dimensões acabam se
reverberando em suas escritas narrativas (auto)biográficas, em que
passa a narrar não apenas o lógico, formal e concreto, mas o não
visível, o sensível e abstrato, o que lhe move e lhe forma, transforma e
provoca outros estados de espírito, de ser, pensar e fazer na vida,
formação e profissão.
Voltando ao que concerne às minhas orientações metodológicos
dessa atividade, reforço que propus para que cada estudante
elaborasse sua escrita em um total de 02 (duas) a 03 (páginas) no
máximo, uma vez que iriam fazer a leitura na sala virtual, mediatizados
por sorteios em que eu fazia antes da aula, escolhendo de três a cinco
estudantes, ao todo, para compartilharem sua escrita narrativa, seja
por meio da leitura de seu caderno escrito a punho no momento da
aula, ou através da projeção de seu texto digitado anteriormente e
compartilhado na plataforma do Google Meet.
É pertinente ressaltar que as primeiras aulas da disciplina
realizadas remotamente, foram orientados bem no início como se
poderia construir esse dispositivo metodológico da escrita narrativa
(auto)biográficas das experiências escolares, que seria também
32
enviado pelos estudantes a mim por e-mail, após a leitura para todos
durante a aula, e que depois eu iria fazer uma outra leitura sozinho em
outros momentos, quando do processo de atribuição de uma nota a
essa atividade, dentre as três notas da disciplina.
O interessante é que no processo de escruta da narrativas dos
estudantes me causavam impactos e ânimos diversos, relacionados à
uma (re)aprendizagem dos processos de narrar e da sensibilidade. O
que também se dava em outros momentos a posteriori quando da
leitura que eu fazia ao receber suas escritas no e-mail. Sobre esse
dinamismo Walter Benjamin (2012, p. 230) me faz pensar que “quem
escuta uma história está em companhia do narrador; mesmo quem lê
partilha dessa companhia”.
Suas escritas narrativas das experiências escolares se articulavam
também com os textos que já haviam sido refletidos e discutidos nas
aulas anteriores, mostrando a riqueza das narrativas (auto)biográficas
dos estudantes: na construção de outros referenciais para pensar a
educação, a formação, os modelos educacionais, os perfis de
professor, a prática pedagógica, as brincadeiras desenvolvidas no
cotidiano escolar, a relação professor-aluno e família-escola, enfim,
uma série de aspectos que se tornam um trampolim para provocar no
sujeito narrador estados de consciência e fazer descobertas de si pela
narração altamente significativas e potentes para a construção de
conhecimentos e aprendizagens.
33
capaz de propiciar e disparar. Esse movimento, é o que poderá fazer
as escolhas de qual fotografia poderia ser socializada durante os
encontros das aulas.
Mas, além de revisitar os álbuns de fotografias de família e
escolher 01 (uma) ou 02 (duas) fotografias, no máximo, o estudante
produz um texto narrativo digitado com a inserção das imagens
fotográficas no texto (no word), que varia de duas a três páginas,
contanto não somente o que viu na imagem, mas como se sentiu e
como encarou essa experiência nesse dinamismo entre ver a
fotografia, ter as sensações e sentimentos provocados e como se deu
o próprio processo de construção da narrativa, após ter feito a leitura
nos encontros virtuais, mobilizados por questionamentos que faço
neste momento e os outros colegas de turma também participando da
dinâmica de interpelação de forma aberta e livre.
O interessante dessa atividade é que são relevados outros tantos
acontecimentos e momentos que por vezes não estão expressos nas
fotografias, trazendo fatos do passado, anterior ao registro da fotografia
para que pudesse emergir aquela imagem, bem como a posteriori de ter
sido tirada, além de ser mencionadas pessoas, lugares, fatos e uma
infinidade de situações que não estão explicitadas nas fotografias.
É aí que entra a exercitação da memória, como um componente
crucial e formativo para a construção de aprendizagens mediatizadas
também pelas escritas de si, pois, um dos pré-requisitos é que nas
fotografias esteja presente o sujeito que narra, ou alguém muito próximo
de si, ou ainda registros fotográficos que tem um grande poder de
afetação e envolvimento do sujeito para poder disparar a sua narrativa.
Um brilhante texto desenvolvido por Delory-Momberger (2010) e
tematizado Álbuns de fotos de família, trabalho de memória e formação
de si, mostra a riqueza e potencialidade do uso de fotografias no
processo de formação e construção de si pela narração que o sujeito
empreende no âmbito de uma abordagem narrativa (auto)biográfica.
Texto esse que tenho trabalhado nas turmas que envolvem disciplinas
sobre conhecimentos históricos educacionais.
É extremamente válido ressaltar como tem refletido a autora
acerca dos usos das fotografias como formação de si e construção de
aprendizagens pelo sujeito. Segundo ela:
34
presente. Olhar uma fotografia é fazer um trabalho de memória no qual
lembranças reais e lembranças construídas se entrelaçam. Olhar uma
fotografia é interrogá-la, é retomá-la, atualizá-la, e estas operações
conduzem a experiências de si que são aprendizagens de si (DELORY-
MOMBERGER, 2010, p. 107).
35
conviveram ou estão ainda presentes em sua vida, e de muitos outros
fatos e acontecimentos de sua existência, potencializando o
conhecimento histórico e da disciplina como um todo.
36
variando entre dez e doze páginas. Sua tiragem era de aproximadamente
trezentos exemplares (Magalhães, 1993). (PINTO, 2020, p. 11).
Trouxe essa citação, pelo fato de que esse nome Fanzine não tem
sido muito comum utilizado na educação, muito menos os usos desse
recurso como metodologia de ensino em quaisquer que sejam os
níveis e tapas de ensino.
Assim, enfatizo que o meu primeiro contato, conhecimento e
aprendizagem que tive com esse recurso pedagógico foi durante o 5º
Encontro de Pesquisa em Educação que realizei no ano de 2009 na
Universidade Federal do Piauí (UFPI), em Teresina (PI), através de um
minicurso: Fanzinando as narrativas de formação, que realizei; momento
esse que eu ainda me encontrava como estudante do curso de Pedagogia
na época, ainda no início. Mas somente agora, mais recentemente, no ano
de 2021, foi que me lancei a propor a utilização do Fanzine como
metodologia do ensino na Educação Superior, sobretudo, nesse
momento de uma pandemia, com a ideia de tornar as aulas menos
teóricas e expositivas e dialogas, e mais práticas, mobilizando, assim,
criatividade e processos de criação pelos estudantes nos cursos de
formação de professores, em especial, na Pedagogia.
Dentre as características e formas de construção metodológica
do Fanzine, cabe salientar que:
37
pessoais que revelam-se profundamente implicados com seus saberes
e conhecimentos.
No tocante às orientações que dei na disciplina que ministrei na
Pedagogia, em termos metodológicos, primeiramente trouxe uma
aula explicitando conceitos, significados, finalidades e os propósitos
da construção do Fanzine na disciplina, inclusive, mostrando alguns
modelos destes para os estudantes perceberem o que era e como
poderia fazer.
Durante a aula de orientações de construção do Fanzine, ainda no
início, peguei uma folha chamex A4, e demonstrei como se poderia
utilizar diferentes formatos para a construção desse recurso
pedagógico, e que ficaria à critério de cada estudante o formato
escolhido de seu Fanzine.
Quanto aos temas escolhidos, os mesmos deveriam elucidar
alguns aspectos e conteúdos que se relacionassem com a disciplina
Fundamentos e Metodologia do Ensino de Artes, e que, portanto,
poderiam revelar não somente o que já tinham visto de conteúdos,
anteriormente, mas que de algum modo, pudesse se relacionar com
outros saberes, conhecimentos e conteúdos que ainda não tinham
sido vistos.
Em um segundo momento, fiz um sorteio de 04 a 05 estudantes
para apresentarem o seu Fanzine, seja mostrando pela câmera do
computador ou celular e explicando suas ideias e compreensões
expressas em sua invenção; depois, responderem um questionário
constituído de até 05 (cinco) questões abertas, para explicitarem suas
narrativas acerca do que conseguiram aprender, e como se sentiram,
perceberam e construíram saberes e conhecimentos na construção
desse dispositivo pedagógico e metodológico.
Os resultados dessa experiência metodológica com o uso dos
Fanzines foram riquíssimos, pois os estudantes mostraram-se motivados
e aprenderam com os outros colegas inúmeras outras discussões
potentes do curso e das disciplinas. O que vale ressaltar que acabaram
extrapolando a abordagem apenas de conhecimento teóricos, pois,
passaram a inventar e criar, artisticamente, uma produção que
representava o conteúdo e o sentido de sua experiência de aprendizagem
e construção de conhecimentos, revelando de si pela narração e as
motivações que fizeram suas escolhas com o Fanzine produzido.
38
As narrativas (auto)biográficas acerca dos Fanzines, permitiram
revelar as novidades, o encantamento e as descobertas de si pela
narração que foram feitas por cada estudante, evidenciando ser esse
recurso pedagógico como algo que despertou inúmeras
aprendizagens e conhecimentos, que poderiam não existir se fosse
utilizados outros dispositivos metodológicos.
39
passado, vendo-se no presente e projetando o futuro, bem o que
Ricoeur (2007), vai elucidar dos estudos realizados de Santo
Agostinho, ao dizer que experienciamos o Triplo presente e que pude
ser tecido pela narrativa, ou seja: “presente do passado ou memória,
presente do futuro ou expectativa, presente do presente ou intuição”
(RICOEUR, 2007, p. 74).
Nesse entrelaçamento, pode ser percebido como o sujeito passou
a dar sentido ao que viveu e como consegue se perceber, fazendo
(auto)críticas, tirando lições e aprendizados, e construindo
conhecimentos que se relacionam tanto à disciplina, ao curso, ao
conhecimento histórico, a sociedade, educação, tempo, vida e
formação humana e de outros tantos contextos.
Propus o memorial de formação, pela aprendizagem que tive já no
curso de Doutorado em Educação na Unicamp, no qual fui provocado
por um convite me feito por Inês Bragança, minha orientadora, no
sentido de eu perceber durante os meus itinerários trilhados ao longo
de minha vida, formação e profissão, voltando ao passado pela
memória, e poder me perceber no tempo presente. Esse memorial
seria um primeiro encontro comigo mesmo para poder eu me ver até
onde eu cheguei e o que me fez e passou a me tornar que eu sou ou
estou sendo pelas experiências formativas trilhadas no passado até o
tempo presente. Seria também um texto narrativo que iria fazer parte
como primeiro capítulo da minha tese de doutorado4 e que hoje faz
parte do meu memorial de formação no livro do Grupo Polifonia
(MORAIS, 2020).
Ou seja, alguns questionamentos podem ser fundamentais ao situar
a proposta da construção de um memorial de formação na formação de
professores, quais sejam: quem eu era e quem estou sendo? O que eu
fazia e que experiências formativas tive? O que faço hoje com as
experiências que tive no passado? Como me vejo hoje e onde quero
chegar? Enfim, é bem um voltar para si, para exercitar a memória,
exercitar a reflexividade e tomada consciência dos percursos trilhados,
40
que podem ser visibilizados esses acontecimentos e transformações pela
escrita narrativa (auto)biográfica praticada pelo sujeito.
Considerações Finais
41
corpo, alma e espírito de forma transbordante e valorosa para a minha
vida pessoal, formativa e profissional.
Como professor do Ensino Superior nos cursos de formação de
professores, tenho buscado usar metodologias de ensino que
pudessem fazer com que os estudantes encontrem sentido e
significado no que estão se apropriando, de modo a que sejam
despertados para outros estados de ser, pensar e fazer que se articule
e seja concatenada com as suas próprias experiências e saberes do
mundo com os quais possuem e trazem para a academia.
A pandemia me deslocou completamente, me fazendo buscar
outras alternativas que pudessem ser mobilizadas em minha prática
pedagógica na docência universitária, sobretudo, nesse período
remotamente, em que eu ainda não tinha tido esse tipo de experiência, e,
portanto, tal modo de conceber as aulas, me fez eu criar e recriar outras
possibilidades de aprender com os usos das tecnologias educativas e
pedagógicas para poder ensinar focando a aprendizagem, transpondo
isso para o meu fazer com os estudantes de Pedagogia e outros cursos de
licenciaturas que atuei nesse período pandêmico.
Encontrei nas escritas narrativas (auto)biográficas somando-se a
outras atividades práticas e oficinas propiciadas remotamente na
pandemia, meios privilegiados de praticar com os sujeitos uma
reflexividade instituinte de formação e (auto)formação capaz de fazer
emergir em cada um dos estudantes, descobertas outras de si, dando
sentido aos percursos trilhados e permitindo a construção com sentido
e razão acerca do que estavam fazendo, inclusive, despertando o
interesse cada vez mais pela disciplina e o curso.
Posso dizer que algumas dimensões dessa formação em
movimento com as escritas de si puderem ser significativas na
formação de professores, dentre os quais: a aprendizagem da
sensibilidade; uma formação pautada pela humanização; o
conhecimento de si e do outro mediatizadas pela narração; a
capacidade de se perceber pelo/com o outro no enriquecimento
pessoal mostrando a alteridade ter sido fundamental nesse processo;
uma maior aproximação entre os colegas de turma, inclusive,
passando a conhecer mais o outro, o que pensava e refletia, entre
outros inúmeros aspectos transformadores de cada pessoa.
Por fim, quero defender os usos das escritas narrativas
(auto)biográficas nos cursos de formação de professores, pois é uma
42
oportunidade rica de fazer os sujeitos refletirem sobre os seus
próprios percursos de vida, formação e construção de aprendizagens
e conhecimentos.
Assim, exercitar a escrita reflexiva ainda na academia pode
acompanhar os sujeitos quando estiverem atuando profissionalmente,
uma vez que narrando-se e narrando a sua prática poderão se munir
dessa ferramenta como formadora, transformando conflitos,
complexidades e problemáticas que permeiam a sua prática
pedagógica e a sua própria relação consigo, com os outros e com o
meio, em potentes dispositivos de transformação e emancipação das
consciências, contribuindo para o desenvolvimento e melhoria da
educação, da escola, de si e da sociedade.
Referências
43
438, set./dez., 2007. Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/gepiem/
files/2008/09/a_tranfor2.pdf. . Acesso em: 22 mar. 2022.
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ZABALZA, Miguel A. Diários de aula: um instrumento de pesquisa e
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Artmed, 2004.
44
CURRÍCULO E FORMAÇÃO DOCENTE:
UM ESTUDO DE SUA RELAÇÃO COM AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E
A IMPORTÂNCIA DE UMA VISÃO INTEGRADORA PARA A
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO PROFISSIONAL
Considerações iniciais
45
No primeiro momento nos propomos discutir sobre currículo desde
a sua origem até os dias atuais, navegando desde as teorias tradicionais,
que compreendiam que “teorizar” o currículo resumia-se em discutir as
melhores e mais eficientes formas de organizá-lo, passando pelas teorias
críticas que questionavam aquilo que de fato deveria ser pensado no
currículo – os interesses e as relações de poder que privilegiam
determinados conhecimentos sobre outros e chegando a teoria atual pós-
crítica que colabora no sentido de pensar o currículo enquanto conexão
entre identidade e poder, tendo em vista que forma aquilo que somos:
nossa identidade, nossa subjetividade.
No segundo momento, discorremos sobre algumas políticas
públicas brasileiras, tendo o currículo e a formação docente como foco
central.
No terceiro momento tratamos em especial do currículo integrado,
cuja discussão abarca questões diversas relacionadas à própria integração
e à concepção de disciplina e de currículo disciplinar, que têm repercussão
nos processos de organização e desenvolvimento curricular.
46
elementos da prática pedagógica, bem como a tudo o que se faz para
desenvolvê-los nas escolas e nas salas de aulas.
A importância do currículo hoje é indiscutível. Tais discussões
necessariamente abordam, com maior ou menor ênfase, os
conhecimentos escolares, os procedimentos e as relações sociais que
compreendem o cenário pedagógico, as transformações que
desejamos efetuar nos alunos, os valores que pretendemos trabalhar
e as identidades que buscamos construir.
Se buscarmos o sentido etimológico da palavra “currículo” temos
que curriculum significa “ pista de corrida”. “O currículo está
vitalmente envolvido naquilo que somos, naquilo que nos tornamos:
na nossa identidade, subjetividade” (SILVA, 1999, p. 15).
No campo do currículo, desenvolvem-se estudos e formulam-se
teorias. Silva (1999), defende que faz mais sentido, então, falar não em
teoria, mas em texto ou discurso, uma vez que, um discurso sobre o
currículo efetivamente permite a construção de uma determinada
noção de currículo. O currículo é uma questão de identidade, e é sobre
essa questão que versam as teorias do currículo.
Nessa perspectiva, nos deteremos agora, a discorrer sobre as
teorias do currículo na visão de Silva (1999), que em virtude da questão
do poder, as classifica em teorias tradicionais, críticas e pós-críticas.
a. Teorias Tradicionais
47
Numa linha mais progressista, mas também tradicional,
apresenta‐se a teoria de Dewey. Em 1902, Dewey escreveu o livro The
child and the curriculum, nele parecia mais preocupado com a
democracia do que com o funcionamento da economia (SILVA, 1999,
p. 23). Essa teoria considerava importante, também, os interesses e às
experiências das crianças e jovens. Seu ponto de vista estava mais
direcionado à prática de princípios democráticos, sendo a escola um
local para estas vivências. Em sua teoria, Dewey não demonstrava
tanta preocupação com a preparação para a vida ocupacional adulta.
O modelo de currículo de Bobbitt consolida-se a partir do livro de
Tyler de 1949 que compreende o currículo essencialmente como uma
questão técnica. A questão principal das teorias tradicionais pode ser
assim resumida: conteúdos, objetivos e ensino destes conteúdos de
forma eficaz para ter a eficiência nos resultados.
b) Teorias Críticas
48
[...] a escola não atua pela inculcação da cultura dominante às crianças e
jovens das classes dominantes, mas, ao contrário, por um mecanismo que
acaba por funcionar como mecanismo de exclusão. O currículo da escola
está baseado na cultura dominante: ele se expressa na linguagem
dominante, ele é transmitido através do código cultural dominante. As
crianças das classes dominantes podem facilmente compreender esse
código, pois durante toda sua vida elas estiveram imersas, o tempo todo,
nesse código. [...] Em contraste, para as crianças e jovens das classes
dominadas, esse código é simplesmente indecifrável (SILVA, 1999, p. 35).
49
Caberia então antes da elaboração do currículo, uma formulação do
próprio baseado nas experiências dos educandos, no universo
existencial de cada um. O papel do especialista seria então, devolver e
relacionar sistematicamente como pedagogia tais experiências. Não
deveria então haver uma distinção contornada de cultura popular e
erudita, um apagamento dessas culturas implicaria em que a chamada
“cultura popular” fosse parte legitima do currículo (SILVA, 1999, p. 67)
c) Teorias Pós-Críticas
50
identificações baseadas em características físicas, como a cor da pele,
e o termo “etnia”, para identificações baseadas em características
mais culturais, como religião, língua e etc. Aqui, observa-se que ambos
os termos, denotam uma relação de poder histórica, entre
colonizadores e colonizados, uma construção discursiva baseada nas
diferenças, em que um grupo considera-se superior aos demais.
Para Silva (1999), a cultura e a educação se modificam ao longo
da sua construção, seja de identidade, ainda que o pedagógico se
torne cultural e o cultural se torne pedagógico, currículo e cultura
devem estar interligados.
Com base nesse pensamento acreditamos que a identidade de
uma pessoa é construída a partir de seus princípios, vivências e
representação, cabendo à escola planejar um currículo que contemple
os diferente grupos sociais.
51
funções sociais e pedagógicas”. Se olharmos essa questão da
formulação das políticas educacionais no aspecto institucional, é
conhecida a desarticulação dos órgãos do governo responsáveis pela
educação, como Secretarias de Educação, o Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, Conselho
Nacional de Educação – CNE, na definição e organização institucional
e curricular do sistema de ensino.
Como artefato social fabricado no interior das relações dinâmicas
e conflituosas, disciplinas e conteúdos no contexto da
contemporaneidade devem ser contextualizados e problematizados
não deixando de dar ênfase à produção da identidade social que se faz
nas relações que o Currículo faz, voluntária ou involuntariamente.
Educação Currículo e Identidade Social estão intrinsecamente ligadas
(SILVA, 1999), uma vez que se entende que as práticas curriculares
englobam a produção de identidades, pois, os conhecimentos
reproduzidos e produzidos evidenciam o pertencimento a classes
sociais, a cultura, a etnias, a linguagem, a credos, numa profusão de
saberes que são apresentados, camuflados ou silenciados.
As atuais políticas de educação básica são frutos das reformas de
currículo dos anos 90. Delas podemos mencionar os referenciais e
parâmetros curriculares nacionais da educação infantil, ensino
fundamental e médio como ainda, das bases que os orientam. Estas se
transpõe para os livros didáticos, entre outras políticas e programas
que chegam à escola e que, ainda por falta de uma reflexão maior e
mais contundente sobre qual tipo de multiculturalismo está se
propondo, acabam por ser assimiladas pelos educadores sem o olhar
crítico necessário. Sobre isso, Lopes (2006, p. 140) acrescenta que:
52
conhecimento, e pela necessidade de contextualizá-lo pela noção de
competência e pela ênfase à diversidade”.
Ainda segundo Barretto (2006), a inserção das novas
preocupações no currículo é inegavelmente válida. Entretando, a
multiplicidade de cursos oferecidos aos docentes das redes estaduais
e municipais leva a fragmentar e dispersar os eixos de formação dos
professores. O autor continua analisando que,
53
No Brasil, a implantação do Sistema de Avaliação da Educação
Básica (Saeb) em 1988, a aplicação da Prova Brasil a partir de 2005 e,
mais recentemente, em 2007, a criação do Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica (IDEB) são ações que constituem um conjunto de
políticas de alinhamento e ajustes em relação a estas políticas globais.
Conforme Bessa (2004, p. 8), as avaliações de redes de ensino
geram “demandas para a formação de professores, de especialistas e
de pesquisadores em educação”. Por outro lado, impactam na
autonomia profissional dos docentes e no controle das ações
pedagógicas, além de interferirem, principalmente, na imagem
externa da escola.
Partindo desse ponto de vista, percebemos uma tendência atual
de responsabilização e de cobrança em relação aos/às professores/as
frente aos resultados educacionais e sociais, pressionando-os/as a
qualificar o trabalho e a profissão, através de exames e controle
profissional. Daí, segundo Barretto (2006), a necessidade de mudar a
lógica da competitiva,
54
disciplina, como matéria de ensino, não tenha adquirido este sentido antes do
início do século XX (CHERVEL, 1990).
Enquanto o currículo disciplinar é frequentemente concebido “como
consequência de princípios de organização curricular baseados na lógica das
ciências ou na natureza do conhecimento”, os currículos integrados “são
entendidos como baseados nos interesses e necessidades dos alunos e na
relevância social dos conhecimentos” (LOPES, 2001, p.148). Essa
compreensão tem possibilitado considerar a organização curricular integrada
como mais democrática porque sustentada em conhecimentos afetos à vida
cotidiana dos alunos, o que renderia maior acessibilidade àqueles
provenientes de classes subalternas.
Nessa perspectiva, a concepção e a forma como se pensa e
estrutura parte dos currículos dos cursos de formação de
professores/as dificultam o envolvimento de questões profissionais
mais próximas da realidade dos/as alunos/as. “Há também uma forte
tradição disciplinar no país que impede soluções que envolvam um
caráter mais interdisciplinar na formação, vinculado ao campo da
prática curricular da escolarização básica” (SHEIBE, 2010, p. 984).
Esta tradição de distanciamento entre formação e prática, no
entanto, vem sofrendo interferências das correntes progressistas de
educação e da mudança de concepções e de práticas pedagógicas de
muitas instituições e professores/as que, mesmo com a organização
curricular estruturada por disciplinas, procuram aproximar teoria e
prática, saberes e sujeitos no percurso de formação inicial dos/as
professores/as.
Cunha (2012) trata desta ressignificação, em relação ao currículo,
a partir da ruptura com o paradigma da modernidade, materializado
na educação através da disciplinarização, da dicotomização entre os
conhecimentos, entre corpo e mente, entre subjetividade e
objetividade e da organização linear dos conteúdos. Em relação a esta
ruptura, ela diz que “a necessidade de romper com esse paradigma
vem mobilizando as reflexões pedagógicas e indicando novas formas
de organização dos currículos, de compreensão dos espaços de
aprendizagem na sala de aula [...]” (CUNHA, 2012, p.3).
A definição de integração formativa1 utilizada aqui fundamenta-se,
contrariamente, às dicotomias que com frequência se manifestam na área
1 Uma formação voltada para além da integração teoria e prática, que pressupõe a
inclusão de uma visão mais ampliada do fazer educativo e do papel social dos
professores e da instituição, no compromisso de elevar qualitativamente a relação
55
de educação, sobretudo, na fragmentação dos conceitos e conteúdos,
corroborada por contradições e ambivalências. O rompimento da
dicotomia teoria e prática apresenta-se como possibilidade para a
integração formativa. Dessa forma, nos apoiamos à concepção de
integração formativa como resultante de várias dimensões de formação
que, articuladas, contribuem para a condição plena do sujeito,
primeiramente como humano, e depois, como profissional.
No bojo dessas discussões, trazemos a concepção de currículo
integrado a partir de Lopes (2006a). A autora propõe que nos
afastemos da análise dos processos de integração curricular a partir de
modelos de ciências e nos aproximemos da prática das escolas,
procurando entender como os currículos são organizados.
56
abertura ao meio (um currículo sem grades, aberto para as adequações
necessárias daquela realidade), visando adequar as diferentes
necessidades dos alunos, no contexto de formação de professores.
De acordo com Beane (1997 apud LOPES 2011), há necessidade de
que,
57
intersubjetivas. Nesse sentido, o papel e a postura do profissional de
ensino que procura promover qualquer tipo de intervenção junto aos
professores, tendo em vista a construção de uma didática
transformadora ou interdisciplinar, deverá promover essa
possibilidade de trocas, estimular o autoconhecimento sobre a prática
de cada um e contribuir para a ampliação da leitura de aspectos não
desvendados das práticas cotidianas.
Compreendemos a partir da autora que pensar a
interdisciplinaridade como junção de disciplinas é pensar o currículo
apenas na formação de sua grade, porém, ao se definir
interdisciplinaridade como atitude de ousadia e busca frente ao
conhecimento, cabe pensar aspectos que envolvem a cultura do lugar
onde os professores se formam.
Considerações finais
58
contexto das escolas, é uma questão sine qua non para o
desenvolvimento de um processo formativo profissional.
Isso nos remete a analisar que o professor precisa assumir-se
como intelectual, a despeito das condições adversas em que trabalha
e do desprestígio social associado ao seu exercício profissional, implica
demandar que se combinem, em sua formação e em sua prática,
dimensões de ordem política, cultural e acadêmica.
O que observamos é que o atual discurso presente nas definições
curriculares oficiais e no pensamento curricular, não implica a
superação das disciplinas escolares ou mesmo a diminuição do seu
poder na seleção e na organização do conhecimento escolar.
Para a superação dessa lógica, julgamos ser necessário considerar
o caráter multicultural da sociedade no âmbito do currículo e da
formação docente, o que implica respeitar, valorizar, incorporar e
desafiar as identidades plurais em políticas e práticas curriculares.
No âmbito das discussões sobre formação docente, percebemos
a necessidade de estudos que enfoquem a relação do professor com o
conteúdo que ensina, devido à sua complexidade e importância, pois
aspectos de diferentes ordens nela intervêm: desde questões de
natureza epistemológica, como didática e organizacional, cultural e
política, assim como aquelas relacionadas ao próprio campo do
conhecimento a que se liga determinada disciplina.
Referências
59
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um campo de pesquisa. Teoria & Educação, Porto Alegre, nº2, 1990.
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60
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SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do
currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
61
62
“AFASTA DE MIM ESSE CALE-SE”: POLÍTICAS CURRÍCULARES PELA
LIBERDADE DE ENSINAR E POR VIDAS VIVÍVEIS NOS CURRÍCULOS
Introdução
1 Essa canção de Chico Buarque e Gilberto Gil, embora escrita em 1973, só foi lançada
em 1978. Uma música repleta de metáforas, utilizadas para narrar a situação em que
vivia a sociedade durante a ditadura militar, principalmente no que se refere a
desigualdade social, de maneira que a ideia de “afastar esse cálice” diz de um desejo
de se livrar das desigualdades sociais no Brasil nesse período.
2 “Lei da Mordaça” é um termo cunhado para se referir, de forma geral, a qualquer
projeto de lei que tenta proibir que professores e professoras tratem em sala de aula
de temas como as relações de gênero e sexualidade, política e religião.
3 “Escola sem partido” é um movimento criado em 2004 no Brasil que tem como
63
estímulo ao pensamento crítico e a capacidade de reflexão, queremos
acionar essa música como um grito de alerta que se afaste de nós esse
“cale-se” e que possamos ter liberdade de ensinar e povoar o currículo
de diferenças e vidas vivíveis.
Nesse sentido, para colocar em discussão as políticas de currículo
em um contexto de avanço de economização da vida (MACEDO, 2018)
que nos afeta hoje em dia, vamos tomar como disparador das análises,
um caso ocorrido durante uma aula do curso de Licenciatura em
História de uma Universidade Pública Federal de Minas Gerais. Para
Sílvio Gallo (2019) estamos atravessando, na administração pública de
forma geral e na educação em particular, tempos difíceis, mas não
impossíveis. Essas dificuldades vêm se refletindo nas salas de aula dos
cursos de formação, aqueles/as que visam formar os/as futuros/as
professores e professoras para uma postura crítica diante da realidade
em que estamos vivendo. Talvez por isso, sejam os mais atacados.
Neste artigo, de inspiração foucaultiana, problematizamos a
maneira como reagimos as ameaças, como resistimos a tentativa de
controle do que deve estar ou não na sala de aula como conhecimento
válido. Com esse objetivo organizamos a escrita em quatro partes. Nas
duas primeiras partes nos concentramos na escrita e recuperação do
fato que será tomado como foco de análise, para construir e pensar as
condições de emergência do ocorrido em sala de aula, além de um
segundo momento da escrita em que buscamos relacionar o receio em
trazer para discussão a família homoparental como resultado do jogo
de forças da política do currículo presente na BNCC.
Nas duas últimas partes do artigo, nos dedicamos a investir num
tipo de entendimento de currículo constituído por um jogo de forças,
em tal medida que não podemos falar em vitória ou derrota de um dos
lados, mas temos que admitir que estamos nesse jogo e que temos que
jogar o jogo sabendo lidar com as forças que nos compete acionar para
tornar a escola um local possível de criação e resistência, algo que faça
a esperança vencer o medo.
64
Problematizando História e Currículo
65
Com esse entendimento de Currículo e de História como
construção, como resultado de seleção e relações de poder o
professor vem provocando os alunos e alunas dessas disciplinas a
pensarem a sala de aula como espaço de negociação e de construção
de sujeitos a partir daquilo que conhecemos (que esconde e silencia
sujeitos e fatos), das formas que conhecemos e dos efeitos que
queremos com as aulas. Entendimento de Currículo e de História que
conduz para uma concepção de Ensino de História.
Se são “invenções” situadas num tempo histórico, os currículos e
os conhecimentos de História estão sempre sujeitos a modificações, a
questionamentos, a problematizações que vão dizer das mudanças na
sociedade. Esse é o desafio e a potencialidade do Ensino de História,
ou seja, olhar o que está posto como conhecimento a ser ensinado por
um viés problematizador e potencializar outras formas de conhecer,
ser e estar no mundo, que resulte em sujeitos com um entendimento
de realidade e de mundo a partir de uma perspectiva histórica. Que
sejam capazes de compreender que isso que chamamos de realidade
é resultado de construção e que, portanto, pode ser alterada. Neste
sentido, há um investimento na sala de aula e no Ensino de História
como mecanismos de reflexão no interior de contextos escolares
diferentes. Também há um investimento e uma convocação em pensar
o que se ensina, como se ensina e para que se ensina História: o que
significa educar para a compreensão da História?
Mas Ivor Goodson (2008) não define currículo apenas como
“invenções”. Ele também associa o currículo a “tradições”, ou seja,
como um campo em que determinados conhecimentos vão se
constituindo como “tradições”. Mais do que isso, vão se constituindo
como estruturas de saber que definem posturas, escolhas,
entendimentos que naturalizam os conhecimentos. Nesse momento
em que os alunos e as alunas têm que preparar a sequência didática a
ser aplicada em 3 aulas nas escolas é muito comum a presença dessas
“tradições inventadas” quando têm que escolher a temática das aulas.
Os temas clássicos da História rapidamente são acionados como
lugares de segurança, revelando que essas tradições, muitas vezes, se
ligam ao que já está estabelecido, ao que se espera de uma aula de
História. Talvez por isso, tragam uma sensação de segurança.
Temas tradicionais sempre aparecem como reforma protestante,
independência do Brasil, Revolução Francesa, dentre outros que estão
66
nos livros didáticos, fazem parte dos grandes temas aprendidos na
Universidade, são exigidos nos processos seletivos e avaliações em larga
escala, estão presentes nos livros didáticos, enfim, vão se constituindo
como tradicionais e esperados. No entanto, a provocação é pensar as
exclusões, as possibilidades de introdução de outras questões até mesmo
nestes temas mais tradicionais, como por exemplo, a relação da reforma
protestante com a onda conservadora que estamos atravessando, a
problemática da negritude na independência do Brasil e a continuidade
do racismo na sociedade atual, a participação das mulheres na Revolução
Francesa e a pouca participação delas na política brasileira, enfim, algo
que tire os estagiários e estagiárias do conforto e os façam pensar nas
margens do currículo.
Isso tem surtido efeito e temos apresentado para as escolas
temáticas que dizem diretamente da realidade dos alunos e alunas
para se entenderem como sujeitos da história e como resultado de
processos históricos atravessados por relações de poder. O professor
vem provocando essas posturas no sentido de colocar sob suspeita
nossas formas de saber, de conhecer, de ser e de estar no mundo,
incitando os alunos e as alunas a procurarem nessas “tradições
inventadas” outras formas de conhecer, outros sujeitos apagados da
História, chamando atenção para os silêncios presentes nos currículos
de História. Isso tem causado algum efeito, sobretudo em se tratando
de um curso que vem gradativamente se modificando com a presença
de alunos e alunas negros, de classes populares e LGBTs, que vêm
olhando para o que se aprende como História a partir de uma postura
problematizadora de suas realidades. Para Michel Foucault (2006)
problematização é uma postura diante do mundo, que se relaciona
com a história do pensamento. Para o filósofo francês, a questão não
é o como o pensamento se apresenta, mas sim o que faz pensar e agir
de determinadas formas, ou seja, problematizar é tomar o
pensamento como liberdade do que se pensa.
67
O convite do professor segue essa linha de pensamento
foucaultiano ao provocar os alunos e alunas a tomar distância das
escolhas que compõem os currículos tradicionais e colocar sob
suspeita as formas de pensar e agir como professores e professoras de
História. Desta forma, diante do desafio proposto pela disciplina, de
construir uma aula de história, tomando como princípio a relação com
o presente, com a realidade dos alunos e alunas e com a
problematização disso que chamamos de realidade, que surgiu o caso
ocorrido em torno da família homoparental. Uma dupla de alunos
propôs como temática das aulas para os oitavos anos do Ensino
Fundamental as “configurações familiares ao longo da história”.
Uma temática atual, com discussões no presente que remetem a
ideia de construção de um modelo familiar vinculado a valores morais
historicamente situados. No dia da apresentação do plano de aula,
diante da turma toda, os alunos apresentaram uma aula baseada em
imagens em que eles iriam discutir os diferentes modelos de família
atravessados pela temporalidade, pelas questões de raça e classe.
Assim, selecionaram quatro imagens de constituição familiares
diferentes no tempo-espaço e nas configurações humanas. Uma
imagem clássica da família real brasileira de D. Pedro II no exílio em que
aparecem D. Pedro II em pé ao centro da fotografia, tendo de um lado
a sua filha Princesa Isabel, sua esposa Teresa Cristina e do outro lado o
Conde d’Eu e os quatro filhos homens. Uma família nobre, branca, do
século XIX em que as mulheres assumem uma postura submissa diante
das posturas altivas dos homens. Uma outra imagem que era
composta de índios brasileiros atuais em que aparecia no centro da
fotografia um índio homem numa rede cercado de duas mulheres e
muitas crianças. A terceira imagem era também uma fotografia que
retratava uma família composta por uma mulher mãe, pobre, sem a
presença de um homem e cercada de seis filhos. Uma família branca e
pobre dirigida por mulher, um dado muito presente nas atuais famílias
de periferia das grandes cidades. Por último, uma quarta fotografia de
uma família africana, identificada pelas roupas, composta de um
homem, uma mulher e duas crianças, todos negros retratando uma
comunidade africana típica.
As fotografias foram apresentadas na medida em que eram
definidos os procedimentos metodológicos das aulas, que tinha como
foco de análise a reflexão de que as famílias vão se constituindo de
68
formas distintas ao longo do tempo, variando de cultura para cultura
e dentro de uma mesma cultura. Ao final da apresentação do plano de
aula e de como pretendiam acionar didaticamente as fotografias para
a produção de conhecimento e para a compreensão da História, os
demais alunos e alunas avaliaram que a aula cumpria sua função e,
portanto, tratava-se de uma boa aula. Quando o professor da disciplina
retoma a discussão ele inicia recuperando uma exigência que diz do
Ensino de História que é a relação entre presente-passado, ou seja,
qual é a problemática do presente que está posta na aula proposta?
Porque a aula é importante? O que essa aula traz de continuidade e
descontinuidade na História, que nos permite fazer aproximações com
o hoje e com a realidade dos alunos e alunas? Essa relação presente-
passado que deve ser o fio condutor das aulas de História está
ancorada na discussão de currículo, uma vez que ela faz pensar os
saberes constituídos, ela coloca sob suspeita nossas escolhas, nos faz
enfrentar as estruturas já concebidas e fortalecidas, problematiza
nossas formas de acionar o conhecimento, usar os artefatos culturais,
enfim, ela faz questionar o porquê das nossas aulas e para quem são
as nossas aulas? Pensando nas continuidades e descontinuidades das
configurações familiares e que estão no presente, o professor fez
alguns questionamentos a turma: vocês não estão sentindo falta de um
outro tipo de família? Mesma sabendo que não damos conta da
totalidade das constituições familiares, que configuração familiar está na
pauta das discussões atualmente?
A turma parecia entender as provocações, mas permaneciam em
silêncio, até que a dupla responsável pela aula se manifestou dizendo
que sabiam que estava faltando a família homoparental.
Argumentaram que chegaram a colocar uma imagem em que
apareciam uma família de pessoas do mesmo sexo, mas que ao final,
haviam discutido e retirado por medo da reação das famílias dos
alunos e alunas da escola em que a aula seria ministrada. O medo4
parece ter sido mais forte que a necessidade de discutir com os alunos
e alunas os nossos processos formativos, as nossas relações familiares
que escapam do tradicional.
69
Como emerge o medo?
70
professores e professoras, fazendo com que lidem com o medo de
algo que sequer ocorreu.
Imbrincado com as frentes parlamentares católicas e evangélicas,
que contam com expressivo número de parlamentares e, inspirados
em movimentos internacional semelhantes, a defesa desse modelo de
família tem sido um dos principais motes de discussão que
impulsionam o ESP, dando-o visibilidade e força e garantindo vitórias
às suas demandas. No que se refere ao forte impacto do ESP na
aprovação da BNCC, podemos perceber que essa nova versão nesses
moldes se articula “em oposição à imprevisibilidade da ação docente e
em defesa do controle do currículo” (MACEDO, 2017, p. 509).
A retirada das discussões de gênero e sexualidade da BNCC de
História pode ter sido um forte motivo para que os alunos e alunas não
tenham se sentido à vontade para trazer a família homoparental para
a organização da aula, visto que a BNCC como documento oficial pode
ser acionado como argumento para definir o que deve ou não ser dado
em sala de aula, muito embora o documento deixe claro que ele não é
para ser aplicado diretamente pelos professores e professoras e nem
tampouco significa a totalidade do que deve estar presente nas salas
como conteúdo.
O medo relatado pela dupla de alunos, ao preparem a atividade
para a disciplina de Reflexões sobre a atuação do espaço escolar II –
Ensino de História, na qual estarão como professores em sala de aula
pode ser entendido como um dos efeitos dos investimentos da
ofensiva antigênero no currículo. Os alvos principais dos ataques são
os professores e as professoras das escolas públicas que são vistos
como doutrinadores com ideias esquerdistas, numa visão equivocada
de educação como algo neutro, desprovido de um caráter político.
Adeptos do ESP sob a égide de um discurso que desqualifica as
discussões de gênero e em defesa de um único modelo de família
“buscam não apenas expurgar uma visão partidária fantasiosa, mas
introduzir na rede escolar métodos de gestão que acentuam valores
privado-familiares em substituição a um ensino laico e científico”
(LINARES; BEZERRA, 2019, 130). Como consequência disso, produz-se
“um sentimento de hostilidade aos professores e indica um caminho
de criminalização da docência” (MIGUEL, 2016, p. 615). Se isso já está
afetando as escolas de forma geral, nos parece importante olhar para
as licenciaturas como espaços de formação em que essas questões
71
devem tomar lugar no sentido de preparar os futuros professores e
professoras para essas disputas no campo do currículo.
Não somente o/a docente, mas tudo aquilo ligado ao seu
exercício passa a ser alvo de ataque. Um currículo então está na mira,
a aprovação da BNCC demonstra o que é valorizado pelo movimento
ESP e todos os demais grupos ligados a ofensiva antigênero. Pretende-
se vetar as discussões críticas na escola e a liberdade do professor e da
professora em levantar questões que desorganizem as construções
tradicionais de família. Essa configuração de desconfiança e
impotência no professor e na professora “alimenta um ambiente de
hostilidade, no qual os professores se sentem acuados e os alunos são
estimulados a dotar a execração pública como modo padrão de
resolução de conflitos” (BRITTO, 2019, p. 12). É o que parece acontecer
na situação que trazemos aqui. Antes mesmo de acontecer a aula os
alunos e as alunas da disciplina de estágio se sentem censurados sobre
o que pode e o que não pode fazer em sala de aula, incorporaram a
censura e tomados por um certo receio buscaram a segurança do
conteúdo já tradicional, aquele que se espera. Esses alunos e alunas
pareciam submetidos às demandas conservadoras que mais do que
dizer o que deve estar no currículo dizem o que deve ser excluído dele.
Com isso negavam toda formação no campo da história como
construção, como um espaço do debate a partir de uma perspectiva
histórica do conhecimento, como lugar da problematização do que
estamos vivendo, enfim, o currículo “venceu” a história, o que é para
ser dado venceu a forma de olhar o mundo.
As famílias homoparentais devem ser excluídas porque elas
ameaçam um projeto de sociedade que prevê a constituição de um
sujeito homem/mulher, que corresponda às normas de gênero, seja
heterossexual, cristão e branco. Ameaçam porque o único modelo de
família que deve ser não somente viabilizado mas vivível é este
defendido pelo ESP. Assim, todos os outros modos de vida que fogem
a essa norma, devem ser excluídos e junto a isso os direitos e as
pessoas que diferem disso. Logo se entende porque as discussões de
gênero e sexualidade devem ser retiradas do currículo. Elas não
atendem a esse projeto de família, pelo contrário o questiona,
problematiza. A quem interessa que um determinado modo de
entender família seja validado no currículo, considerado como correto
e verdadeiro? Essa é uma pergunta que não é nova no campo
72
curricular, na década de 1970 (APPLE, 1993) já se perguntava pelo
interesse que determinado conhecimento e não outro fosse
considerado como válido em um currículo. Com isso queremos dizer
que existe uma política do currículo que está nos movimentos políticos
que disputam o currículo, que está na BNCC e nos seus pontos de
debate, está na aula do professor que propõem uma outra postura
diante dessas forças.
Se Ivor Goodson (2008) associou currículo a “tradições” no
sentido de que alguns temas se consolidam no currículo naturalizando
alguns conhecimentos, a aprovação da BNCC opera como um
“universalismo” (MACEDO, 2017) que de alguma forma em nosso
entendimento aciona tradições de um currículo branco, masculino,
heterossexual, branco e cristão. Esse universalismo que “precisa ser
pressuposto para sustentar uma base nacional comum para os
currículos, já escondia, sob a aparência de ‘neutralidade formal de
contexto e conteúdo’ (BROWN, 2015, p. 205), o seu caráter “particular,
sexista e racializado” (MACEDO, 2017, p. 520). De certo modo, o
universalismo proposto pela BNCC corresponde e se retroalimenta
também dos anseios de algumas famílias em ver nos currículos
escolares suas visões de mundo sendo reiteradas. Assim, essas famílias
tornam-se vigilantes aos currículos escolares, o que eles ensinam, que
tipo de sujeitos eles demandam. Os currículos correspondendo a essa
ambição perdem o aspecto de problematizador e desvinculação com
o senso comum, em detrimento da manutenção de uma norma.
Ao ser divulgado, o currículo de História presente na BNCC serve a
vários mecanismos de vigilância e controle. Serve as famílias que acionam
o que está posto para vigiar e controlar o professor e a professora no
exercício da disciplina de História, assim como serve aos alunos e alunas
para vigiar e controlar as aulas, serve aos professores e professoras na
definição do que cabe as aulas de História e na garantia de que estão
cumprindo o que lhes cabe. Mas se esses movimentos constituem
tempos difíceis, eles também se inserem no desafio de pensar que não
são tempos impossíveis (GALLO, 2019), nos convocando a buscar fugas e
resistências possíveis nesses movimentos.
Paulo Freire e Ira Shor ao discutirem sobre tradição e liberdade,
trazem algumas reflexões importantes sobre isso. Em cenários como
esse de avanços de um movimento conservador de acordo com esses
autores a cultura “socializa as pessoas para se policiarem contra sua
73
própria liberdade” (SHOR, 2013, p. 37). No âmbito da discussão aqui
proposta podemos ver isso sob dois aspectos: as famílias que
correspondem ao modelo proposto pelo ESP que assumem o papel de
vigiar os currículos e requerem apenas para si o direito de ser
visibilizados no currículo controlando o que pode e não pode ser
ensinado; os alunos da disciplina Reflexões sobre a atuação do espaço
escolar II – Ensino de História que se policiam sobre a aula que irão dar
que não pensam sobre sua liberdade a partir de muitas realidades que
povoam o currículo. Tentando propor escapes aos poderes que tentam
controlar o que pode ou não ser ensinado, Freire sugere: “Para que os
professores se transformem, precisamos, antes de mais nada, entender
o contexto social do ensino, e então perguntar como é que esse
contexto distingue a educação libertadora dos métodos tradicionais”
(FREIRE, 2013, p. 46), e ainda “que tanto os professores como os alunos
sejam agentes críticos do ato de conhecer” (FREIRE, 2013, p. 46).
Entendemos que ser agente crítico implica uma ousadia do/a
professor/a em conhecer de outra forma daquilo que está dado, buscar
abrir fissuras no currículo e encontrar saídas. “Uma das características
de uma posição séria, na educação libertadora, é, para mim, o estímulo
à crítica que ultrapassa os muros da escola” (FREIRE, 2013, p. 49)
74
famílias que fogem a norma ou poderia também se passar pelo tema
rapidamente por causa do medo. O fato é que não podemos presumir
tudo o que acontece em uma sala de aula e não podemos também
garantir que os poderes tristes sempre terão sobre sua posse todo o
território curricular. Ele é vasto, cheio de bifurcações, esconderijos,
frestas, saídas, ainda que muitas vezes se crie nele fronteiras, muros,
becos para controlar os fluxos, mas tudo pode escapar.
Um currículo não se faz sozinho também porque ele pode está
implicado com outros currículos. Como podemos compreender nesse
contexto a BNCC sem o currículo real que acontece nas escolas? Ou
ainda como podemos compreender o currículo desse curso de História
sem a BNCC e sem o currículo que acontece nas escolas? Entendemos
aqui esses currículos constituídos por relações de força e, portanto, de
resistências. O movimento que culminou na aprovação da BNCC
retirando os temas de gênero e sexualidade no currículo ainda que
gerem medo não garante que estas discussões sejam esvaziadas nas
discussões curriculares. Porque a vida e o currículo são movidos por
gênero e sexualidade e porque encontraremos de algum modo
maneiras de falar sobre isso. A imprevisibilidade pode remeter a
discussão, as resistências inventivas podem encontrar modos outros
de viver sob a égide desse regime autoritário e discutir sobre gênero e
sexualidade sem assim nomear, mas questionando seus próprios
poderes. Os corpos na escola nem sempre obedecem às normas de
gênero e sexualidade e se deseducam daquilo que a eles são ensinados
convocando que problematizações sejam levantadas, mesmo sob
risco de ataque. Assim um currículo não se faz sozinho porque a
desobediência está nele contida.
Um currículo se faz com outros currículos também. Na experiência
que aqui relatamos o professor da disciplina estranha a ausência da
família homoparental e questiona seus alunos e suas alunas sobre a
ausência desta no plano de aula. Pensamos que aqui se trata de uma
insurgência curricular nesses tempos tristes. A Universidade é um lugar de
problematização do senso comum, desses poderes autoritários de
instauração da dúvida naquilo que nos parece certo e seguro para nos
fazer pensar de outra forma daquilo que pensamos, nos pensar porque
nos constituímos sujeitos de determinados tipos. Talvez por isso ela esteja
tão fortemente sob ataque nesse governo. Ao direcionar esse
questionamento e provocar um tensionamento na preparação das aulas
75
desses alunos de estágio, a atitude diz não somente do currículo que
organiza a prática desse professor, mas da construção de outros
currículos em que esse do curso de História dessa universidade quer
constituir e mais do que isso a produção de um tipo específico de aluno
que é demandado por esse currículo.
76
(FREIRE, 2013, p. 61). Freire defende que depois da descoberta que
também é um político, o professor tem que levantar para si a seguinte
questão “que tipo de política estou fazendo?” (FREIRE, 2013, p. 61).
Que se desdobra em outras perguntas como a favor de quem o
professor/a está, contra quem está educando, a favor de quem está
ensinando, a que coisa está contra. “Essa ‘coisa’ é o projeto político, o
perfil político da sociedade, o “sonho” político. Depois desse
momento, o educador tem que fazer sua opção, aprofundar-se na
política e na pedagogia de oposição” (FREIRE, 2013, p. 61).
Quando o professor dessa disciplina de estágio levanta os
questionamentos: vocês não estão sentindo falta de um outro tipo de
família? Mesma sabendo que não damos conta da totalidade das
constituições familiares, que configuração familiar está na pauta das
discussões atualmente? certamente, ele está fazendo uma opção
política. Há aí um sonho político em funcionamento que diz também
de um currículo a favor da afirmação da vida, da diferença, do outro.
Essas problematizações acionadas pelo professor de uma pedagogia
da oposição às políticas de economização das vidas nos currículos
afirmam que as vidas que desestabilizam a norma devem ser excluídas
como conhecimento válido, como vidas que merecem ser vivíveis.
Judith Butler ao analisar as “condições concretas, sociais e
políticas de uma ‘vida vivível’” (BUTLER, 2013, p. 3), constatou que há
“vida vivível” e há vida que não é “vida vivível”. Para que uma vida seja
vivível na contemporaneidade as instituições são indispensáveis,
quando essas instituições falham, determinadas vidas “ficam
ameaçadas de ‘não ser’ ou de formas de morte social”. Ao instaurar
um modelo de família como legítimo e querer apagar as discussões de
gênero e sexualidade da BNCC o Estado revela quais vidas importam e
merecem ser vividas e, portanto, quais não são dignas de viver. Como
afirma Paraíso (2018, p. 24), “muitas vidas têm dificuldades de serem
vividas em diferentes espaços, inclusive no currículo”. Nesse sentido,
afirmar a vida no currículo é ir de encontro às políticas de
economização da vida nesse governo neoliberal responsável por
muitas mortes sociais. Levantar problematização como aquelas feitas
pelo professor da disciplina de estágio é de algum modo dizer que
essas vidas também importam no currículo do curso de História dessa
universidade e devem ser importantes em outros currículos também.
77
Considerações finais
Referências
78
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Mathieu Trachman. Investigação Filosófica, v. 5, n. 1, 2013. Disponível
em: <https://pt.scribd.com/documen-t/157976904/6-Entrevista-Com-
Judith-Butler-Uma-Analitica-Do-Poder-Cristiane-Ma-ria-Marinho>.
Acesso em: abr. 2015.
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MIGUEL, Luis Felipe. Da “doutrinação marxista” à "ideologia de
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brasileiro. Revista Direito e Práxis. Rio de Janeiro, Vol. 07, N. 15, 2016,
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no território curricular com gênero e sexualidade em tempos que
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79
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invenção política com gênero e sexualidade em tempos do slogan
“ideologia de gênero”. In: PARAÍSO, Marlucy; Caldeira, Maria Carolina
da Silva. Pesquisas sobre currículos, gêneros e sexualidades. Belo
Horizonte: Mazza. 2018
80
2ª PARTE:
EXPERIÊNCIAS
EDUCATIVAS E PEDAGÓGICAS
NA EDUCAÇÃO BÁSICA
81
82
OS CONTOS DE FADAS NOS ANOS INICIAIS: ESTEREÓTIPOS E
FORMAÇÃO DAS IDENTIDADES DAS MENINAS CODOENSES
Introdução
83
surgido sobre o seu papel na construção da identidade contemporânea e,
considerado que o limiar entre o conceito sujeito e o de identidade é
sutil”. Sendo assim, a formação da identidade é cada vez mais difícil nas
atuais circunstâncias. Tendo em vista as modificações ocorridas no Brasil
e no mundo no âmbito social, econômico e político. De maneira que em
cada período existiu um padrão, um ideal e modelo a ser seguido para a
mulher e outro para o homem.
O interesse em realizar a investigação referente aos estereótipos
femininos criados nos Contos de fadas surgiu a partir da participação
como voluntária de leitura e produção textual do Programa Novo Mais
Educação (2016-2017) na escola municipal Renê Bayma, assim como da
produção de trabalhos na linha de pesquisa sobre gênero, feminismo
e identidade da mulher negra desde o terceiro período do curso de
pedagogia. Esse texto, então foi organizado tendo o trabalho de
conclusão de curso de Pedagogia da UFMA/Campus Codó, da primeira
autora orientada pelo segundo autor e intitulado Estereótipos criados
por Contos de fadas e a formação das identidades da mulher codoense
como referência.
Com isso, investigamos a seguinte questão: como e qual a relação
de influência dos estereótipos criados nos Contos de fadas para a
formação das identidades da mulher codoense? A pesquisa objetiva
analisar como e quais são as relações entre os Contos de fadas para a
formação das identidades da menina codoense, bem como identificar
as representações das personagens femininas nos Contos de fadas
europeus; assim como compreender a relação dos Contos de fadas e o
processo de formação das identidades femininas.
Em decorrência da pandemia do covid-19 a observação foi
realizada de fevereiro a abril de 2021 mediante acompanhamento das
atividades de leitura por meio do grupo do WhatsApp da turma do 3º
ano do Ensino Fundamental da professora Elizane da Escola Municipal
Renê Bayma em Codó/MA; com questionário virtual feito com Google
forms para a professora e impresso para as estudantes; e, conversas
via aplicativo de mensagem instantânea, o WhatsApp.
Referencial teórico
84
construídas em torno de traição, mortes, canibalismos entre outros
assuntos e temas do universo adulto. Assim, os Contos de fadas infantis
constituem como adaptações de histórias contadas para adultos. Essa
mudança aconteceu em virtude do fator infância, em que “A criança
na época era concebida como um adulto em potencial, cujo acesso ao
estágio dos mais velhos só se realizaria através de um longo período
de maturação” (SILVA et. al.2012 p.05). A literatura infantil teve
contribuição da sociedade burguesa, da corte francesa do século XIV e
devido a isso houve alterações no conteúdo da história. De modo que
mais se preservou o enredo original, foram as pessoas não abastadas
(BUENO et al., 2017).
Uma vez que “A literatura passou a ser vista como um importante
instrumento para tal, e os contos coletados junto às fontes populares
são postos a serviço dessa missão” (SILVA; BARROS; NASCIMENTO.
2012 p.05). Missão essa que era transmitir os valores, princípios e
condutas morais estabelecidas para a sociedade da época para as
crianças. Com isso, podemos observar que os primeiros Contos de
fadas que se tem registro através da escrita foram realizados por
homens europeus que representam nos contos a forma como as
mulheres eram tratadas e como deveriam se portar na sociedade
europeia entre a primeira e segunda Revolução Industrial, igualmente
têm traços do período do surgimento e desenvolvimento do
protestantismo em que essas questões morais são mais valorizadas.
Reflexo disso é o fato de que todas as princesas dos Contos de fadas
são garotas virgens que nunca namoraram e o seu primeiro beijo é com
o príncipe encantado.
Os Contos de fadas como são mais conhecidos chegaram ao Brasil
no final do século XIX. No entanto, adquiriu outro termo: os Contos da
Carochinha, que relacionam os contos como “da carocha”. Nesse
sentido, se referem às histórias como sendo algo mentiroso, tendo
sido depois chamada de “Contos da Dona Carochinha”. Somente no
século XX, adotou-se o termo Contos de fadas (SCHNEIDER;
TOROSSIAN, 2009). Esses contos passaram a ter função pedagógica
quanto ao conteúdo das histórias sendo utilizados no processo de
escolarização.
As histórias são vistas como uma estratégia para auxiliar no
processo de alfabetização. Quando a corte portuguesa veio morar no
Brasil, essa questão se intensificou. No período era adotado o uso de
85
cartilhas para alfabetizar e a gramática estudada era dos dois países
europeus, Portugal e França. Diante disso, são criadas histórias para
exaltar a cultura nacional, algumas delas escritas por docentes. As
histórias foram construídas levando em consideração o
conservadorismo, intelectualidade e nacionalismo.
No que tange à caracterização dos personagens femininos nos
Contos de fadas, deve-se tratar de questões sobre gênero, palavra que
passou a ser objeto de estudo por volta de 1960 em pesquisas
relacionadas à sexualidade (BUTLER, 2016). O termo gênero surge a
partir de estudos a respeito do sexo biológico e discussão apresentada
pelo movimento feminista que debate sobre os diferentes papéis
atribuídos aos seres humanos do sexo masculino e aos do sexo
feminino. Então a palavra sexo não é suficiente para definir os
indivíduos considerando apenas os componentes biológicos. Por ser
percebido que existem outros elementos constituidores dos
indivíduos que se estendem além das questões biológicas.
Dessa forma, é possível se pensar a respeito do papel social
atribuído ao ser masculino e feminino. É nessa busca que se acentuam
as questões de dominação do homem sob a mulher, igualmente dos
instrumentos de manutenção dessa prática de subalternização. Nesse
processo destaca-se a participação do movimento de mulheres e do
feminismo que se iniciou por volta do século XIX tem proporcionado
mudanças significativas, mas é preciso muitas modificações para
alterar as bases do patriarcado. Tendo em vista que a equidade de
gênero continua a ser uma luta, assim como o voto, acesso à educação
e mercado de trabalho eram considerados utópicos. Embora em
alguns países ainda o sejam. A partir dessas manifestações e do
feminismo, foram responsáveis pela conquista de direitos como
educação e trabalho (AGUIAR e BARROS, 2015; NUNES, 2017; MORAES,
2012, CARVALHO, 2006).
A partir disso, são realizadas investigações que enfatizam as
relações estruturantes e caracterizadoras do homem e da mulher. Tão
logo a base que sustenta essa função social da mulher tem forte
relação com o sistema simbólico. De tal modo que o poder simbólico
se organiza em conformidade com uma realidade construída, com
definição de papéis a serem desempenhados pelos indivíduos tendo
como critérios os sexos. Formando assim uma estrutura ordenada.
Consequentemente aponta para a função social e o conformismo
86
lógico de Emile Durkheim. De modo igual deve ser entendido que a
relação de representação existente no sistema simbólico se manifesta
a partir da organização da comunicação e conhecimentos. É uma
ferramenta usada para definição de subalternização de uma classe sob
a dominação de outra (BOURDIEU, 2010).
Nesse sentido, teve a sua parcela de contribuição, a psicologia
especialmente apresentada por Alice Eagly ao trazer a teoria
denominada de teoria do papel social que questiona alguns aspectos
da psicologia considerada tradicional. No entanto, não alcançou as
questões estruturantes de como acontece esse processo, mas
mantém o pensamento de que é aprendido socialmente e em certa
medida como algo pertencente ao indivíduo naturalmente. Logo se
construiu um estereótipo de gênero que se tem definido o papel de
cada gênero na sociedade (SILVA,1999).
No campo de estudos da psicanálise, foram realizados estudos
sobre a representação feita através de símbolos assimilados em leitura
de contos desenvolvem nas crianças a etapa para entrada em processo
de reconhecimento de problemas e situações conflituosas vivenciadas
por heróis, mocinhas e vilões na história e relacionar com a sua
realidade. Nesse processo, acontece uma identificação da criança de
acordo com as situações e características dos personagens.
Ao longo do tempo, os contos têm sofrido modificações para o
público infantil. No entanto, preserva-se em essência o enredo
recheado de criaturas mágicas, personificação do mal na figura de
bruxas, madrastas e do bem em heróis e príncipes. Dessa forma que as
figuras femininas (com exceção das bruxas e madrastas) dita como
indivíduos do bem são retratadas com “a resignação diante de algo
que aparentemente é imutável, a autoridade e o respeito às leis
estabelecidas e impostas por uma sociedade patriarcal” (SOARES,
2015.p.02). É possível observar características de personagens
femininos como indivíduos que necessitam da proteção masculina em
obras como Branca de Neve, Bela Adormecida, Cinderela e
Chapeuzinho Vermelho. De tal modo que “A intenção é de “repasse"
de valores e padrões comportamentais, para que fossem assimilados
e resguardado por leitores e ouvintes” (PERREIRA, DINIZ, BEZZERRA
e DIAS, 2018.p.343).
Os Contos de fadas exercem influência na construção da
personalidade e percepção de si e do outro. Diante disso, Soares (2015,
87
p.04) pontua que “O sujeito é constituído no gênero não apenas em
razão do sexo a que pertence, mas principalmente, em detrimento de
códigos linguísticos e representações culturais que o matizam”. Não se
pode definir se um indivíduo que nasce biologicamente compreendido
como mulher, deve ter determinados comportamentos. Uma vez que
esses comportamentos são socialmente construídos tanto que são
diferentes os brinquedos das meninas e meninos tão logo as funções
sociais (MENESES e SILVA, 2018).
Para Bensi (2016), as produções de literatura infantil são
ferramentas para combater as atitudes discriminatórias e
desconstrução de estereótipos. Tendo em vista que estão presentes
nas histórias preconceitos, desigualdade de gênero, social e práticas
discriminatórias construídas que são reproduzidas na sociedade;
nessas produções, tem-se a oportunidade de discutir e debater a partir
dos clássicos infantis. Nessas obras, é possível apreenderem questões
para discutir sobre os padrões e estereótipos. Para isso se torna
necessário no momento da contação de história realizar intervenções
e estimular conversas a respeito da representação de personagens e
contação de histórias com outras princesas que não apresentam o
estereótipo criado nos Contos de fadas tradicionais (ZUMAÊTA, 2016).
Atualmente, tem-se visto novas produções com versões de
personagens feminino livre, independente, forte, corajosa, heroína e
não somente atrelado a personificação de seres do sexo frágil, tais
como Enrolados (2010), Valente (2012), Frozen (2013) e Moana (2016).
Nas palavras de Plácido e Silva (2018. p.09) “Essas personagens
refletem na sua identidade, a sua maneira de agir e de ser,
transgredindo formas tradicionais de identificação do feminino
exigidas pelo social”. Plácido e Silva (2018.p.09-10) afirmam que essa
mudança proporciona uma autotransformação ao longo da trajetória.
Assim como nas produções cinematográficas dos Contos de fadas
Alladin (1992), Pocahontas (1995) e Mulan (1998) realizada na década de
90 pela Walt Disney Studios “refletem essas mudanças, criando novas
representações e identidades, inclusive desvinculadas da necessidade da
figura masculina para encontrar a felicidade. [...] apresenta uma
ressignificação do papel feminino” (AGUIAR; BARROS, 2015.p.10). Logo,
essa mudança na caracterização das personagens femininas representa
uma ruptura com o padrão estabelecido para ser considerada mulher.
Dessa forma, reforça a importância e necessidades do movimento
88
feminista, igualmente de outras manifestações realizada por mulheres na
busca por equidade entre homens e mulheres e desconstrução do
modelo de mulher criado pela sociedade.
Os Contos de fadas se constituem como fatores influenciadores
no processo de formação da identidade de gênero. Assim são
realizados estudos sobre identidade no século XX para elucidar
questões pertencentes ao processo de construção da identidade de
gênero que resultou em teorias com diferentes posicionamentos. No
entanto, todos partilhavam do fato de estudarem com base na
existência natural das diferenças comportamentais entre homens e
mulheres (POMAR, 2012. p.16). Hall (2006. p.13) apresenta a concepção
de identidade como “uma “celebração móvel": formada e
transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos
representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos
rodeiam. É definida historicamente, e não biologicamente.” A questão
da identidade e do reconhecimento pessoal atravessa o debate sobre
gênero, orientação sexual, apropriação cultural e etnia (VIEIRA, 2005).
A respeito disso, Judith Butler (2003.p.17) entende que com o
feminismo surge um pensamento que a identidade das meninas já está
predeterminada, vigente por uma categorização dos indivíduos,
entretanto o sujeito não é mais entendido como algo imutável e fixo.
Hall descreve que “as velhas identidades, que por tanto tempo
estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas
identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até que visto como
um indivíduo unificado” (HALL,2006. p.07). A identidade na pós-
modernidade revela se mais difícil de ser construído isso porque “o
próprio processo de identificação, através do qual nos projetamos em
nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e
problemática” (HALL, 2006.p.12).
Atualmente as mulheres têm desempenhado mais tarefas, mas a
sua identidade de ser dona de casa, mãe e esposa se acumulou com o
ser estudante e profissional. É possível notar na mulher brasileira
contemporânea traços da identidade da mulher do século XVIII.
Obviamente que existe singularidade na identidade de cada menina,
porém se tem algo presente nas meninas de hoje em dia. Em que de
alguma forma se perpetuam de geração em geração elementos
constituidores da identidade da menina de séculos atrás. No entanto,
89
a identidade não é imutável, inflexível e fixa (CAIXETA, BARBATO,
2004; MORAES, 2012, COELHO, 2010).
Acerca da temática, Carvalho (2006.p.06) expõe um
posicionamento de que “a (trans)formação da identidade feminina a
partir da interação com a identidade masculina, pois a mulher tem
formado a sua própria subjetividade baseada em práticas sociais que
não podem desconsiderar o outro masculino". Essa afirmação tem
uma relação com o que Beauvoir (2003) declara sobre o ser mulher,
que se define tendo como fundamento o ser homem, portanto é o
oposto do masculino. Logo, os comportamentos que os homens
assumem não cabem a mulher, as posições ocupadas por homens não
podem ser ocupadas por mulheres. Segundo Pollak (1992) e Hall
(2006) o processo de formação da identidade se constitui tanto no
individual como no coletivo.
Com isso, a identidade das meninas passa a ser influenciada por
diversos aspectos trazidos com a modernidade e pós-modernidade,
entretanto conserva algumas ações machistas, patriarcal e sexista. No
entanto, por vezes o indivíduo se questiona durante esse processo por
não saber se essa é a sua verdadeira identidade ou se é a identidade
que a sociedade lhe impôs. É delicado discutir a identidade em grande
parte pelas relações sociais, econômica, cultural e histórica envolvida
na forma como a pessoa constitui a sua identidade (COELHO, 2010,
VIEIRA, 2005). Conforme, a análise sobre gênero no Brasil do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2014.p.12) apresenta
“mulheres pretas ou pardas, assim como aquelas residentes nas áreas
rurais e na Região Nordeste, apresentam historicamente indicadores
sociais mais desfavoráveis que mulheres brancas ou residentes nas
áreas urbanas ou na Região Sudeste”.
No processo de formação da identidade da mulher contemporânea
é apresentado como uma nova mulher forjada por movimentos de lutas,
resistência, conquista de direitos, pela presença da mulher em posição
de liderança, disseminação de conteúdo do feminismo na produção de
livros e mais recentemente em plataformas digitais. Todavia se faz
necessário ressaltar que as peculiaridades de cada país se revelam mais
acentuadas a distinção entre os países do Ocidente e do Oriente, assim
como em cada região, cultura e grupos de mulheres tem sua demanda
singular e passa pelo processo de formação da identidade de modo
distinto (CARVALHO, 2006; TASSO, 2012).
90
No tocante aos aspectos econômicos e educacionais como
fatores componentes da formação da identidade. Em uma pesquisa
realizada em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) a respeito das desigualdades entre mulheres e homens no Brasil
aponta que “54,5% das mulheres com 15 anos ou mais integravam a
força de trabalho no país em 2019. Entre os homens, esse percentual
foi 73,7%” e apesar de existir uma desigualdade salarial entre homens
e mulheres, elas possuem nível mais elevado de instrução escolar e 19%
das mulheres possuem ensino superior enquanto os homens 15,1%
(AGÊNCIA BRASIL, 2021). E quanto essa discussão se destaca que as
mulheres passam mais tempo nos afazeres domésticos e no cuidado
de outras pessoas em relação aos homens (IBGE, 2018).
Dessa forma, mostra como as mulheres brasileiras têm lutado
para conseguir ocupar outros espaços sociais, equidade de gênero e
enfrentam dificuldades por terem que desempenhar mais atividades
tanto tarefas do lar, profissional e educacional e essas questões são
componentes influenciadores no processo de formação das
identidades das meninas.
Rêgo e Andrade (2006) discutem sobre a identidade das mulheres
maranhenses quebradeira de coco babaçu a partir de elementos
histórico e territorial; com base nessa pesquisa é possível observar
componentes presentes no processo de formação das identidades da
mulher codoense. Barros (2010) discorre sobre os aspectos
tradicionais e culturais na formação da identidade maranhense nesta
investigação a religiosidade, o bumba meu boi, a presença dos
africanos, consequentemente a cultura africana são destacados.
Ferretti (2007.p.01) discute o protagonismo de mulheres
maranhenses em casas de culto de matriz africana do Maranhão.
Nesse sentido, existe um destaque para aspecto da religiosidade no
município com presença de religiões de matrizes africanas como
terecô, candomblé e umbanda. De acordo com o levantamento
realizado em 2014 das Comunidades Quilombolas pela Fundação
Palmares e Ministério da Cidadania revelou que no município de Codó
existem comunidades quilombolas (IBGE, 2014. p.37-38). Sousa
(2021.p.160) investiga as religiões de matrizes africanas no município
de Codó e a relação de composição da formação identitária, assim
apresenta os traços de africanidades “na religiosidade praticada pelos
sujeitos, uma vez que Codó reúne vários terreiros que misturam as
91
influências africanas, indígenas e católicas, uma demonstração (...) da
formação cultural das práticas religiosas do seu povo.” Em Codó,
apesar dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(2010) revelarem que a maioria da população são da religião Católica
apostólica romana, o município é mais conhecido por ser a cidade do
“Bita do Barão” responsável pela Tenda Espírita Rainha Iemanjá que
realiza anualmente o festejo. Ele faleceu em 2019 e em 2021, a filha
passou a liderar o festejo. Em 2020, devido a pandemia, o festejo não
pode ser realizado como ocorre tradicionalmente no mês de agosto.
Nessa direção, as meninas codoenses passam pelo mesmo
processo de formação das identidades da mulher levando em
consideração os fatos histórico, econômico, social, religiosos, étnicos,
de gênero e orientação sexual que foram apreendidos no decorrer da
sua trajetória de vida com medidas e proporções distintas. Em alguns
casos, são acrescentados com mais intensidade a questão de gênero
ao passo que se acentua as questões religiosas em outros. Como
exposto ao longo do texto, as mulheres aos poucos e com lutas têm
alcançado outras posições sociais. Por conseguinte, afeta a forma
como a mulher se identifica. Assim como é um processo constituinte
de etapas que são vivências de modo distinto, mas que não significa
dizer que seja inalterada tão pouco que não é consistente.
Metodologia
92
fadas usando em sala de aula e preferidos das estudantes da turma do
3º ano matutino da escola Renê Bayma
Assim, o período de observação foi de 27 de fevereiro de 2021 a
30 de abril de 2021 na turma do 3º ano da escola Renê Bayma sendo
acompanhamento das atividades relacionadas à disciplina de Língua
Portuguesa, no que se refere às histórias infantis usadas e a leitura dos
Contos de fadas realizado através da observação do grupo de aplicativo
de mensagem instantâneo, o WhatsApp.
Nesse sentido, da turma do 3º ano quatro meninas responderam
aos questionários impressos que foi entregue junto com as atividades
semanais e enviaram os áudios com as respostas no WhatsApp da
pesquisadora e o questionário feito no Google forms para a professora.
Resultados e discussão
93
encantados e reinos, mas que compreende que esses livros apresentam
histórias que contém estereótipos acerca do papel da mulher e do
homem na sociedade, bem como entende que essas leituras contribuem
para o processo de formação das identidades das meninas e por isso
destina um tempo para conversar sobre essas questões.
No atual Plano Nacional de Educação-PNE (2014-2024), construído
com base na “superação das desigualdades educacionais, com ênfase
na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de
discriminação” (BRASIL, 2014), no que diz respeito às metas e
estratégias não há menção especificamente quanto ao gênero, mas é
possível identificar temas como educação sexual e uma tentativa de
equidade no acesso e permanência de mulheres na educação básica,
assim como no ensino superior e pós-graduação.
Sobre isso, Abreu e Andrade (2016) discutem como é incorporado
o gênero nos Parâmetros Curriculares Nacionais, que apresentam na
orientação sexual, a definição de gênero e sexo, porém não tematizam
o processo histórico, social e político por trás dessa definição, assim
como indica que não se deve reproduzir estereótipos e ou formas
discriminatórias, mas não ampliam essa discussão para uma dimensão
que oportunize entender em profundidade essa questão tanto a nível
nacional como internacional, no contexto da escola e outros espaços
sociais. A contribuição das mulheres e do feminismo não é discutida.
As crianças devem ter contato com os livros infantis desde a
Educação Infantil. Esse contato pode ser tanto na contação de história,
assim como deixar a criança manusear os livros e, tendo em vista que
as crianças, ao adentrar no mundo da literatura infantil, contribui para
o processo de alfabetização e letramento, assim como apreensão de
valores contido nas lições de moral das histórias, até nos livros Infantis
que não têm lição de moral, mas contém algum ensinamento e
mensagem para as crianças (BRASIL, 2018).
Nesse sentido, a estudante Narizinho2 conta que as histórias
infantis nacional que mais gosta é das personagens da Iara e da
94
Narizinho da história do Sítio do Picapau Amarelo (Monteiro Lobato),
sendo para ela inspiração e dentre essas personagens a que ela se
parece é a Menina bonita do laço de fita e até as princesas soltam pum
por serem engraçadas, inteligente e bonita. Quantos aos Contos de
fadas europeus que mais gosta é a Branca de neve e sete anões, das
versões cinematográfica do Walt Disney Studios mais novas o
Enrolados (2010) ela diz que sua preferida e que se parece com ela é a
Branca de Neve pois ela é do bem, boa e ensina muitas coisas.
Para a estudante Emília as histórias infantis nacionais de sua
preferência é a personagem Emília do Sítio do Pica Pau Amarelo
(Monteiro Lobato) e dos Contos de fadas europeus gosta de ler a
história da Cinderela e as produções cinematográfica da Walt Disney
Studios do filme Moana (2016) e dentre essas personagens femininas
que gosta mais é a Emília por ser muito legal, brincalhona e por isso se
identifica com ela.
Iara relata que dos livros da literatura infantil nacional que mais
gosta é da personagem Iara do Sítio do Pica-pau Amarelo (Monteiro
Lobato) por ela viver no rio e gosta de banhar e dos Contos de fadas
europeus que mais gosta é a Pequena Sereia porque ela tem muitas
aventuras e são para ela fonte de inspiração. Na preferência de história
dos livros infantis nacional para Menina Bonita são as personagens da
Iara e Emília do Sítio do Pica-pau Amarelo (Monteiro Lobato) e a
menina bonita do laço de fita que ela mais gosta por se parecer com
ela, assim como para ela ler e ouvir a história a emociona pela trajetória
da Menina e do Coelho. Dos Contos de fada europeus que ela mais
gosta é da Pequena Sereia pela história dela.
No entendimento de Plácido e Silva (2018, p.09) a respeito da
identidade feminina que algumas personagens são construídas de
maneira a desconstruir os estereótipos femininos são vistos como uma
forma delas “resgatarem a sua representação, através da sua
vivência.” Dutra (2018) corrobora ao trazer no processo de formação
da identidade da mulher torna-se importante ter contato e referências
de mulheres que discutem sobre gênero, feminismo e que não
reproduzem os estereótipos criados para as mulheres. Com isso,
“traçando um novo caminho muito mais plural e democrático,
desconstruindo estereótipos (...)” (DUTRA, 2018.p.28).
95
Considerações finais
96
Referências
97
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99
Contos de fadas consultados
100
MATEMÁTICA OLÍMPICA NOS ANOS INICIAIS:
NOVAS APRENDIZAGENS
Introdução
101
contexto fez-se necessário desenvolver estratégias para elevar o
desempenho dos estudantes da rede municipal no que diz respeito a
aprendizagem da matemática. O Centro Timbirense de Matemática (CTM)
é o nome fantasia do projeto de extensão universitária do Centro de
Ciências de Codó - UFMA, código PJ015-2021, com o título “Matemática
Olímpica: novas aprendizagens”, desenvolvido em parceria com a
Secretaria Municipal de Educação – SEMED – de Timbiras/MA e teve como
objetivo principal preparar os alunos para participarem das avaliações
externas de modo geral, mas principalmente da OBMEP (Olimpíadas
Brasileiras de Matemáticas das Escolas Públicas), OMM (Olimpíada
Maranhense de Matemática), OBM (Olimpíada Brasileira de Matemática)
e o Concurso Canguru de Matemática.
O projeto CTM foi idealizado não só para identificar potenciais
talentos para a matemática, mas também para fazer cumprir os
objetivos da OBMEP (2022):
102
Matemática Pura e Aplicada - IMPA, com o apoio da Sociedade
Brasileira de Matemática – SBM, e promovida com recursos do
Ministério da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia,
Inovações e Comunicações – MCTIC.
No ano de 2018 houve a implementação da primeira edição da
OBMEP Nível A, voltada para estudantes do 4º e 5º ano do Ensino
Fundamental. A segunda edição ocorreu em 2019, ocasião em que os
estudantes da rede municipal de Timbiras participaram pela primeira
vez. Importa destacar que, em função das restrições impostas pela
pandemia por COVID-19, desde março de 2020, a 3ª edição da OBMEP
Nível A ocorreu apenas no ano de 2021.
No nível A, as provas são realizadas em fase única, composta por
15 questões objetivas com 5 alternativas, sendo apenas uma correta, o
conteúdo das provas segue os Parâmetros Curriculares Nacionais:
Matemática – PCNs (BRASIL, 1997), para alunos de 4º e 5º ano do
ensino fundamental. As provas são elaboradas pelo IMPA e
encaminhadas às Secretarias de Educação e representantes das
escolas federais para posterior distribuição às escolas inscritas. O
Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada - IMPA também
disponibiliza os gabaritos oficiais e as correções são de
responsabilidade das secretarias de educação ou representantes
federais, que definem individualmente as possíveis premiações.
Essa metodologia da OBMEP Nível A é distinta da OBMEP (Ensino
Fundamental - Anos Finais e Ensino Médio), e até o momento, é
desconhecida qualquer publicação científica relacionada aos impactos
educacionais desta olimpíada no Ensino Fundamental – Anos Iniciais.
Uma das razões para esta limitação pode ser a escassez de dados, visto
que apenas três edições foram implementadas até agora. Entretanto,
pelo menos do ponto de vista qualitativo, é esperado que os impactos
da OBMEP se estendam a este nível, considerando-se sua longa
tradição iniciada em 2005.
A avaliação realizada em 2010 pelo Centro de Gestão e Estudos
Estratégicos (CGEE), com a participação de dez mil pessoas, apontou
que “59% dos professores reconhecem ter alguma alteração real em
suas práticas de ensino por causa da olimpíada, como por exemplo, a
elaboração das provas, a visão da matemática, e o gosto pela
matemática” (BRASIL, 2011).
103
Almeida et al. (2018), destaca que procurar novos métodos de explorar
o conhecimento matemático é um desafio para professores de diferentes
níveis, que precisa ser superado a cada dia. No caso das olimpíadas de
matemática, as questões são interessantes e desafiadoras tanto para os
estudantes quanto para os professores, especialmente porque é necessário
desenvolver um certo grau de criatividade para a articulação de diversos
conhecimentos matemáticos e lógicos, não se tratando de mera aplicação de
fórmulas ou qualquer outro método direto.
Ainda na Avalição feita pelo CGEE apontou-se que:
104
Figura 1 – Exemplo de questões da prova da OBMEP Nível A
105
Com o sucesso da OBMEP Nível A, o IMPA informou que realizará
no ano de 2022 a 1ª edição da Olimpíada Mirim, composta de duas
fases, para alunos do 2º ao 5º ano do Ensino Fundamental (OBMEP,
2022). Neste contexto ampliado, é relevante destacar o contraste do
ensino público por região do país e, como consequência, será
necessário desenvolver novas estratégias pedagógicas no CTM que
possam ser estendidas à rede pública municipal.
O problema central é que o nível da prova em relação ao nível de
ensino e aprendizagem nas escolas públicas é de sobremaneira
superior:
106
[...] conclui-se que, de forma geral, as matrizes curriculares para a
formação do pedagogo, no Estado do Paraná, têm mostrado uma
abordagem tímida para a formação em matemática do futuro docente.
A consequência disso pode levar à precariedade da formação básica dos
alunos, pela falta de preparo do professor, o que acarretará uma
fragilidade ainda maior futuramente, pois os alunos que hoje estão
sendo formados serão os futuros docentes. (COSTA et al, 2016, p. 520)
Metodologia
107
escolas da rede municipal observando-se seu desempenho e potencial
relacionados à matemática em sala de aula.
As atividades de ensino foram desenvolvidas com dois encontros
semanais, no contraturno das aulas regulares dos estudantes. Em
virtude da ausência de material didático específico, como livros textos
ou artigos, houve a necessidade de organização de texto próprio do
projeto construído com base nas provas anteriores da OBMEP Nível A
(1ª e 2ª edição) e do concurso Canguru de Matemática dos níveis P e E.
O projeto teve início em fevereiro de 2021, durante a pandemia por
COVID-19, em que haviam decretos governamentais instituindo o
distanciamento social nas unidades escolares, e por esse motivo as
atividades com os estudantes selecionados começaram de forma remota,
por meio do aplicativo Google Meet, com apenas 13 alunos ativos.
Logo após a vigência dos decretos, retornamos de forma
presencial, respeitando todos os protocolos de distanciamento social
e as medidas de contenção da Covid-19, com 9 alunos ativos, tendo em
vista que durante a transição do ensino remoto para o ensino
presencial desistiram 4 alunos do projeto (por motivos diversos, como
viagem ou problemas de locomoção). Na ocasião, as atividades
presenciais ocorreram no Centro de Ensino Fundamental Lourdes
Coelho, da SEMED.
Resultados e discussão
108
Tabela 1 – Números de estudantes por escola (2ª edição – OBMEP Nível A).
ESCOLAS Nota 13 Nota 12 Nota 11 Nota 10
U.E Maranhão Sobrinho 3 4 1 2
U.E Faustina Araújo 0 0 0 15
C.E.F. Mundoca Alvim 0 0 0 0
C.E.F. Áurea Alvim 0 0 0 0
U.E.F. Luís Félix 0 0 0 0
U.E. Paulino dos Santos 0 0 0 2
C.E.F. Manoel Burgos da Cruz 0 0 1 3
U.E. José Sarney 0 0 0 0
U.E. Dica Pereira 0 0 0 0
U.E. José Maria Alvim 0 1 0 1
Fonte: SEMED, 2022.
Tabela 2 – Números de estudantes por escola (3ª edição – OBMEP Nível A).
ESCOLAS Nota 11 Nota 10 Nota 9 Nota 8
U.E Maranhão Sobrinho 2 1 15 20
U.E Faustina Araújo 0 3 6 10
C.E.F. Mundoca Alvim 0 0 7 6
U.E.F. Luis Felix 0 0 5 2
C.E.F. Aurea Alvim 0 0 4 2
U.E. Paulino dos Santos 0 0 1 1
U.E. José Maria Alvim 0 0 1 1
C.E.F. Manoel Burgos da Cruz 0 0 1 0
U.E. José Sarney 0 0 0 4
U.E. Dica Pereira 0 0 0 0
Fonte: SEMED, 2022.
109
Destaca-se o aumento vertiginoso de premiados com medalha de
bronze e menção honrosa. Isto pode ser explicado por dois fatores.
Um deles trata-se do tempo ampliado entre a duas edições
consideradas, e o outro fator mais importante é a divulgação dos
resultados da 2ª edição, que pode ter motivado a maior participação
de professores e alunos na edição seguinte, melhorando inclusive a
metodologia de ensino potencializando os resultados.
40 46
40
30
20 23
10
3 2 5 4 2
0
Ouro Prata Bronze Menção Honrosa
2019 2021
Fonte: Os autores.
110
Considerações finais
Referências
111
ALVES, Washington José Santos. O impacto da olimpíada de
matemática em alunos da escola pública. Dissertação (Mestrado
Profissional em Ensino de Matemática), Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.
BIONDI, Roberta Loboda; VASCONCELLOS, Lígia; FILHO, Naércio
Menezes. Avaliando o impacto da OBMEP – Olimpíada Brasileira de
Matemática da Escolas Públicas na qualidade de educação. Revista
Economia, LACEA, v.12, n. 2, p. 143-170, 2012.
BRAGANÇA, Bruno. Olimpíada de Matemática para matemática
avançar. Dissertação (Mestrado Profissional em Matemática em Rede
Nacional - PROFMAT) – Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, Minas
Gerais, 2013.
BRASIL, Avaliação do impacto da Olimpíada Brasileira de Matemática
nas Escolas Públicas – OBMEP. Brasília: Centro de Gestão e Estudos
Estratégicos, 2011.
BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Matemática - PCNs. Secretaria de Educação Fundamental: Brasília,
MEC/SEF, 1997.
BRASIL. Talentos escondidos: os beneficiários do bolsa família
medalhistas das olimpíadas de matemática. Caderno de estudos
desenvolvimento social secretaria de gestão e avaliação da
informação, 2005.
COSTA, Jaqueline de Morais; PINHEIRO, Nilcéia Aparecida Maciel,
COSTA, Hercules. A formação para matemática do professor de anos
iniciais. Ciência & Educação, Bauru, v. 22, n. 2, p. 505-522, 2016.
MOREIRA, Cristiane França Nunes. Formação de professores dos anos
iniciais do Ensino Fundamental: preparação para Olimpíadas de
Matemática. Dissertação (Mestrado Profissional em Matemática em
Rede Nacional - PROFMAT) – Universidade Federal de Alagoas,
Maceió, Alagoas, 2019.
OBMEP. Apresentação. Disponível em: http://www.obmep.org.br/
apresentacao.htm. Acesso em: 13 de mar. 2022.
POLYA, G. A arte de resolver problemas. Tradução e adaptação Heitor
Lisboa de Araújo, Rio de Janeiro: Editora Interciência, 2006.
SILVA, Werley Sales da; PAULA, Fernanda Vital de. Preparação para a
OBMEP: um relato de sucesso em duas escolas de Araguaína/TO.
REMAT: Revista Eletrônica da Matemática, Bento Gonçalves, RS, v. 7,
n. 2, p. 1-14, 15 set. 2021.
112
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA TERRA DE GONÇALVES DIAS
"Primeiros cantos”
Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Canção do Exílio, Gonçalves Dias, 1846
113
pelo distanciamento territorial de qualquer uma das duas sedes
municipais. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), o Brasil tem pelo menos 11,5 milhões de pessoas com mais de
15 anos analfabetas (7% de analfabetismo). O Maranhão, que já foi o
estado com maior taxa de analfabetismo no país, na casa dos 20%,
apresentou queda, conforme2 a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios) Contínua Educação em 2019 .
Para tentar amenizar essa situação foram desenvolvidas práticas
pedagógicas que buscaram contribuir nos aspectos sócio-afetivos
como a vivência de valores como cooperação, respeito, afeto,
aceitação, visando ainda, preservar identidades culturais. Em relação
aos aspectos pedagógicos destacamos a troca de experiências através
de aulas expositivas dialogadas, oficinas, seminários, dramatizações,
exposições, músicas, jogos, poesias, trabalhos manuais, produções
individuais e coletivas. Os materiais utilizados para a confecção dos
recursos pedagógicos foram recicláveis ou de baixo custo.
O objetivo da pesquisa é investigar o processo de alfabetização
das mulheres na comunidade Laranjeira no município de Aldeias
Altas/MA, visando não apenas a decodificação das letras, mas sua
concepção de mundo, discutindo sobre a importância da educação,
seguindo práticas pedagógicas com linguagem simples, utilizando
termos de vivências própria, oportunizando o aprendizado por meio
de conteúdos que condizem com o ambiente onde atuamos,
desenvolvendo o respeito e preservando a identidade cultural. Com a
finalidade de analisar como ocorrem essas relações foram
desenvolvidos: estudo bibliográfico, fichamentos e etapa de campo.
Entre os teóricos estão: Paulo Freire (1996) e Wallon (1968).
2 Fonte: https://www.educacao.ma.gov.br/maranhao-tem-queda-de-4-pontos-
percentuais-na-taxa-de-analfabetismo-ent . Acesso em 5 de março de 2022.
114
A pesquisa de campo foi realizada na comunidade quilombola
Laranjeira, situada no município de Aldeias- Altas à 64 km do município
de Codó, ambas cidades do Maranhão. Trata-se de um estudo
qualitativo e descritivo. A coleta de dados foi realizada no dia 29 de
maio de 2019, por meio da pesquisa de campo, com entrevistas não
diretivas, seguindo um roteiro de perguntas elaboradas previamente e
com entrevistas gravadas no celular, para depois serem transcritas.
O lócus foi a escola municipal Gonçalves Dias, inaugurada em
junho de 2017, mediante o projeto estadual "Escola Digna". A
entrevista semiestruturada foi executada pelas monitoras do projeto,
exposta por meio de texto descritivo. Para não revelar os nomes das
dez participantes, utilizamos nomes de pedras preciosas, escolhidos
por elas. Assim, temos: Coral, Esmeralda, Cristal, Turquesa, Celestina,
Jade, Cristal, Turmalina, Pérola e Topázio. As participantes da pesquisa
foram as ex-alunas do Projeto EJAI3 Mulher, uma professora da escola,
e a representante da comunidade, dentre as quais foram entrevistadas
em forma de roda de conversa das 10:00h às 14:00h, na escola.
Entrevistamos a ex-aluna do projeto Ejaí Mulher e representante
da comunidade, Jade. Ela conta que Laranjeira surgiu de uma aldeia
indígena, que após abandonarem o lugar, vieram os escravos
refugiados viver na localidade. A dona da região era filha de uma
escrava. Os pais de Jade, os avós e os bisavós, são todos de Laranjeira.
Jade se emociona ao falar do lugar onde nasceu. Laranjeira está
registrada no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
porém, a comunidade não está reconhecida pela Fundação Palmares -
órgão responsável pelo reconhecimento de comunidades quilombolas
no Brasil. No Maranhão, somam-se 700 comunidades, mas apenas 611
são reconhecidas pela Fundação.
O projeto EJAI Mulher: a ressignificação dos saberes femininos, foi
financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento
Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), entre novembro de
2017 a novembro de 2018, com carga horária total de quinhentas e
setenta e seis horas.
115
Prática pedagógica como conhecimento
Ao longo das mais diversas experiências de Paulo Freire pelo mundo, o resultado
sempre foi gratificante e muitas vezes comovente. O homem iletrado chega
humilde e culpado, mas aos poucos descobre com orgulho que também é um
"fazedor de cultura” e, mais ainda, que a condição de inferioridade não se deve
a uma incompetência sua, mas resulta de lhe ter sido roubada a humanidade
(ARANHA, 1996, p.209).
116
tanto mais o seu método é difundido e repensado. Freire elaborou uma
proposta de alfabetização, cujo princípio básico pode ser traduzido
numa frase sua que ficou conhecida: “a leitura de mundo precede a
leitura da palavra” (FREIRE, 1989, p.9). Dispensou a utilização de
cartilhas, desenvolvendo assim, um conjunto de procedimentos
pedagógicos que ficou conhecido como “método Paulo Freire”.
Na etapa preparatória do processo pedagógico freiriano, a/o
alfabetizador/a realiza uma pesquisa sobre a realidade do grupo que irá
atuar. Consequentemente, ela/e terá um levantamento do universo
vocabular, isto é, das palavras utilizadas pelo grupo para manifestar a
realidade. Após uma seleção criteriosa das palavras, pela/o alfabetizador/a,
palavras estas, que conferem sentido às situações cotidianas, são
organizados diversos padrões silábicos. Essas palavras, são as palavras
geradoras, partindo delas o estudo da escrita e leitura da realidade.
Antes de estudar as palavras geradoras, Freire (1996) propunha
ainda um momento inicial em que o conteúdo reportava-se ao
conceito sobre cultura. Com a utilização de cartazes, a discussão era
dirigida de forma que, evidenciasse o homem e a mulher como
produtores de cultura, bem como suas diferentes formas: cultura
letrada e não letrada, o trabalho, a arte, a religião etc. No
desenvolvimento das práticas pedagógicas dentro da comunidade,
uma de nossas alunas chamou atenção ao escrever o próprio nome,
percebendo por si só a importância do mesmo numa sociedade
letrada. Podemos perceber que o método pedagógico, em que a
pessoa se redescobre através da retomada reflexiva do próprio
processo, descobrindo-se, constitui por si, um método de
conscientização (FREIRE, 2013).
Assim, a metodologia de inspiração freiriana conscientiza à
medida que politiza. Não temos a pretensão de coadunar com a ideia
de que a educação sozinha, por si, definirá e mudará os rumos da
história, mas desejamos afirmar que uma educação com propósitos
éticos e de cuidado para com o outro proporcione conscientização a
respeito das contradições da humanidade.
Em Pedagogia do Oprimido, Freire (2005) não propõe repetir
palavras, simplesmente coloca a/o alfabetizanda/o na oportunidade
devida, para pode saber e dizer a palavra. Isso significa dizer que aprender
a ler e escrever vai além da alfabetização. Antes de entrar no estudo das
117
palavras ‘geradoras”, ele sugere ainda um momento inicial em que o
conteúdo do diálogo educativo envolva o conceito de cultura.
Depois de cumprida essa etapa, inicia-se o estudo das palavras
geradoras, que também podem ser apresentadas junto com cartazes,
contendo imagens referentes às situações existenciais a elas
relacionadas. Com cada gravura, desencadeia uma discussão em torno
do tema, só então a palavra escrita é analisada em suas partes
componentes: as sílabas. Por fim, é apresentado um quadro com as
famílias silábicas com as quais as/os alfabetizadoras/es podem montar
novas palavras.
Como bem nos assegura Freire (1996), pode-se dizer que a
ausência da substantividade conduz a pessoa à passividade dos
conteúdos e à privação do novo. Nesse contexto, percebemos que o
ensino pode desafiar a/o aprendiz, não apenas com palavras precisas,
mas com a inclusão de novas ideias. Não é exagero afirmar que é nessa
interação que o conhecimento prévio se modifica pela aprendizagem
de novos significados.
Com novos desafios e metodologias em mente, pensamos em
inserir histórias de mulheres que ascenderam na política, ciência e
cultura. Assim como, utilizamos músicas, pequenos textos e poesias,
de maneira que a cada aula, as palavras geradoras foram orientando
os passos seguintes da nossa "práxis", tornando as aulas
contextualizadas e significativas.
Outro fator importante na prática pedagógica é o afeto como
instrumento que pode indicar possível direção, que consideramos
essenciais para levar em conta quando se pretende que, o processo
ensino-aprendizagem seja mais produtivo e satisfatório, tanto para a/o
professor/a quanto para a/o estudante. É necessário, ainda, considerar
a/o estudante em sua totalidade e concretude. Nisso consiste o grande
desafio da docência, pois a "não satisfação das necessidades afetivas,
cognitivas e motoras, prejudica a ambos e isso afeta diretamente o
processo ensino-aprendizagem" (MAHONEY, 2005, p.11-30).
118
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.
Canção do Exílio, Gonçalves Dias, 1846
119
Parabéns! Essas são frases de grande motivação, que farão a pessoa
continuar e não parar no meio do caminho (ANDRADE, 2014 p.52).
Comprometer-se com a educação das/os estudantes é uma
atitude afetiva, assumida com liberdade e não como obrigação.
Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer tipo/forma
de discriminação. Ensinar exige bom senso, conscientização,
conhecimento, curiosidade, respeito à/ao estudante. Desse modo, o
ensino precisa ser dinâmico, associado ao conhecimento prévio das/os
estudantes com metodologias inovadoras que as/os estimulem a
continuarem seus estudos.
As primeiras palavras durante as aulas do projeto foram
desafiadoras, porque as alunas se mantiveram em silêncio.
Entendemos que ainda não era o momento de ouví-las. Foi nesse
intervalo que desenvolvemos a criticidade sobre nossa prática, com
planejamento prévio, escolhemos as atividades com critério e muito
cuidado, buscando aprimorar nossa metodologia com linguagem
simples e materiais acessíveis.
Em síntese, nossas práticas pedagógicas foram baseadas nas
metodologias freirianas, com palavras grávidas de mundo, trazidas
durante as aulas em Laranjeira. O que possibilitou uma linguagem
acessível, pois, todas as ferramentas apresentadas durante a pesquisa,
seguiam um plano elaborado semanalmente, buscando articular teoria
e prática, uma vez que, segundo Candau (2013), esta deve ser vista de
maneira unificada, caminhando lado a lado, uma sempre buscando
compreender a outra.
120
Segundo, desenvolver práticas pedagógicas com linguagem simples, para
mulheres da comunidade Laranjeira, mães solteiras, negras, donas de
casa, quebradeiras de coco e produtoras de azeite.
Nas metodologias, buscamos refletir sobre o que apresentar a
elas. Com muito cuidado, planejamento e compromisso, encontramos
maneiras de ensinar por meio de palavras descobertas por elas sobre
sua cultura e cotidiano, conduzindo a decodificação das letras, o que
Freire (1996) chama de palavras “grávidas de mundo”. Foram
necessárias várias idas e vindas que, às vezes eram cansativas,
engraçadas e aventureiras. A cada momento de receio, lembrávamos
que estávamos indo a um lugar histórico, com pessoas simples,
acolhedoras e, muito humanas, que nos ensinaram que não
precisamos de muito para sermos felizes.
No meio dessas vivências, as aulas passaram a ser práticas. Como
exemplo, citamos a extração da farinha que é um processo
colaborativo com todos da comunidade. Uma curiosidade a esse
respeito é que o dono da farinha, reparte entre os participantes a
farinha extraída. Recordamos também a extração do azeite, em que as
participantes conversam alegremente sobre seu cotidiano, cantam
músicas e entoam mantras, fortalecendo-se umas as outras em meio
às dificuldades do dia-a-dia. Além de todas essas experiências, em uma
das aulas, visitamos o memorial de Gonçalves Dias.
Momentos marcantes que fugiram das diretrizes propostas nos
planos de trabalho do projeto. Historicizamos pra reafirmar que o
caminho foi longo. Porém como fator principal, destacamos o afeto
ligado às metodologias, presente em todas as aulas, inclusive nos
contextos externos dos muros da escola. Para que tivéssemos esses
resultados, foram necessários atitudes de respeito, empatia, trabalho
em equipe, paciência, afetividade, aspectos importantíssimos unidos
às práticas pedagógicas, metodologias com linguagem simples,
acessível à todas, marcando de forma significativa o processo ensino
aprendizagem dentro da comunidade quilombola.
Aprendemos que para alfabetizar mulheres negras em uma
comunidade quilombola, devemos primeiro conhecer o outro,
respeitando-o, livrando-se de toda forma de preconceito. Em seguida,
esperar o tempo certo da fala, pelo público que se vai ensinar. Outro fator
importante é o que Freire (1996) chama de “as primeiras palavras”,
121
trabalhando conteúdos que condizem com o ambiente onde se está
atuando, desenvolvendo assim, o respeito e a identidade cultural.
Podemos perceber que a melhor forma de obter resultados
positivos é por meio de práticas metodológicas associadas à
afetividade, procurando mostrar para as/os estudantes, os equívocos
nas maneiras de pensar e agir, por meio de palavras gentis.
Constatamos que as respostas encontradas acima não foram
conseguidas meramente por meio de perguntas bem elaboradas e
previamente planejadas, mas através da confiança, segurança,
amizade e afetividade, acumulados durante meses de convívio.
Durante o período da observação, percebemos o quanto é
importante o papel da docência, principalmente quando associado à
afetividade. Os planos de aula, a reflexão sobre a prática, o respeito
pela maneira como conversavam entre si, as brincadeiras, a cultura e
principalmente, o relacionamento entre estudante e professora.
Esta pesquisa contribuiu abrindo portas para projetos num
campo riquíssimo de conhecimentos, culturas, vivências e histórias de
pessoas ancestrais que escolheram não apenas um lugar para morar,
mas que deixaram um legado de vida. Laranjeira é um lugar histórico,
campo para inúmeras pesquisas. Diante disso, podemos afirmar que a
pesquisa foi positiva, alcançamos nossos objetivos e aprendemos
novas metodologias de como ensinar e aprender dentro de uma
comunidade quilombola.
Referências
122
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários á prática
educativa. São Paulo: Paz e terra, 1996.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da solidariedade - Paulo Freire, Ana Maria
Araújo Freire, Walter Ferreira de Oliveira. 2ª Ed. São Paulo: Paz e Terra,
2016.________. Pedagogia da Esperança. 16. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2009.
FREIRE, Paulo. “Pedagogia do Oprimido - Paulo Freire. 1ª Ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2013.
_______. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2005, 42.ª edição.
MAHONEY, Abigail Alvarenga.; ALMEIDA, Laurinda Ramalho.
Afetividade e processo ensino-aprendizagem: contribuições de Henri
Wallon. Psicologia da Educação, 20, 1º sem. de 2005, pp.11-30.
WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. Lisboa: edições 70,
1968.
Sites consultados
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ma/aldeias-altas/panorama. Acesso
em 5 de março de 2022.
https://www.educacao.ma.gov.br/maranhao-tem-queda-de-4-pontos-
percentuais-na-taxa-de-analfabetismo-ent. Acesso em 5 de março de
2022.
123
124
3ª PARTE:
EDUCAÇÃO INCLUSIVA E EM
CONTEXTOS MULTICULTURAIS
125
126
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO A PARTIR DA
LITERATURA AFRO-BRASILEIRA:
UMA EXPERIÊNCIA REMOTA NA PESTALOZZI DE CODÓ, MARANHÃO
Introdução
127
entre a equipe do projeto e os alunos da Associação Pestalozzi, foram
superadas pelo uso das tecnologias e da criatividade dos bolsistas, que
focaram as atividades desse período no uso da literatura negra para
trabalhar no combate ao racismo e na valorização dos
afrodescendentes, principalmente no município de Codó onde a
maioria da população é preta e parda.
pestalozzi/
2 As informações da escola foram obtidas através do contato com a gestora da
Associação Pestalozzi.
128
No que diz respeito aos aspectos físicos da Associação Pestalozzi,
a escola possui oito turmas pela manhã (3 turmas do 2º ano, 2 turmas
do 3º ano, 1 turma do 4º e outra do 5º ano do ensino fundamental, além
de uma sala de Atendimento Educacional Especializado/AEE de braile).
No turno da tarde funcionam nove turmas (1 turma do 1º ano, 2 turmas
2º ano, 1 turma do 3º ano, do 4º e do 5º ano, mais duas salas de AEE,
uma de braile e outra de Libras). Vale ressaltar que, recentemente,
foram abertas duas turmas da Educação de Jovens Adultos e Idosos
(EJAI) no turno noturno.
A estrutura física é dotada de uma pequena quadra de esporte,
um laboratório de informática e uma sala de leitura que é utilizada
pelos professores. A acessibilidade na escola ainda se encontra em
fase de desenvolvimento, contando com rampas para o acesso dos
alunos, porém ainda não possui banheiros adaptados.
Em relação aos estudantes, observa-se que a grande maioria faz
parte da população de baixa renda que reside em bairros periféricos de
Codó e recebem ou recebiam benefícios concedido pelo governo3.
Nota-se, ainda, que o perfil desses alunos demonstra que, em sua
maioria, advém também de contextos de vulnerabilidade social, o que
requer da escola uma atuação de forma mais ampla e substancial na
vida destes sujeitos. Deve-se sublinhar que, diversas vezes, a escola e
seu corpo de professores, se desdobram para além da sala de aula, o
que exige desses profissionais uma preparação qualificada, nos
aspectos pedagógico, didático e humanizador para a convivência com
seus alunos. Nota-se, ainda, que um número significativo de discentes
da escola são criados por seus avós que têm bastante dificuldade de
acompanhar o desenvolvimento dos seus netos, fato que foi agravado
durante à Pandemia que impossibilitou o contato presencial durante o
período de março de 2020 a março de 2022.
Considerando a realidade do município, a realização das atividades
das escolas públicas durante à Pandemia foi feita através da entrega de
materiais impressos e o acompanhamento feito por grupos de
WhatsApp. Os professores também se organizaram para fazer visitas
às casas de seus discentes. Apesar dos esforços da equipe escolar,
muitas famílias atendidas pela Pestalozzi não conseguiram manter seus
filhos participando e realizando as atividades durante a pandemia por
129
vários motivos, dentre eles podemos destacar: a falta do aparelho
celular, ausência de acesso à internet em suas casas e dificuldade para
realizar as atividades destinadas aos seus filhos devido as carências
educacionais dos pais e das crianças e/ou adolescentes entre outras
razões, dentre as quais a pobreza tem um papel preponderante4.
É neste contexto de desafios, portanto, que se realiza o projeto
de extensão “Alfabetização e Letramento na Educação Especial”,
coordenado pelos autores deste capítulo que, em virtude da pandemia
de Covid-19, precisaram adaptar suas atividades a essa nova e
desafiadora realidade. Até porque, de modo presencial, as atividades
consistiam em encontros semanais na Universidade Federal do
Maranhão, Campus Codó, para planejamento das ações do projeto,
onde ocorria também as escolhas do tema, preparo dos materiais
pedagógicos que seriam utilizados e ensaios para a contação de
história que acontecia toda semana na Associação Pestalozzi. Nesses
momentos, eram realizados, ainda, a formação e a qualificação dos
bolsistas para o desenvolvimento das atividades de leitura e escrita;
além dos debates no Grupo de Pesquisa Formação Docente:
letramentos e suas mediações (FORDOC)5.
Importa sublinhar que na Associação Pestalozzi as primeiras
atividades desenvolvidas, sempre que se inicia um novo grupo de
bolsistas, é a de imersão, onde os acadêmicos observam nas primeiras
semanas as sete turmas da escola do turno matutino. Este momento
sempre possibilita conhecer ou ampliar os conhecimentos sobre os
alunos da escola e os colaboradores. Nessa oportunidade, os bolsistas
podem perceber como são realizadas diversas atividades dentro e fora
autores desse artigo em Codó. Criado desde 2014 passou por todas as esferas de
formalização na UFMA e foi registrado no CNPQ em 2016. Atualmente é composto por
pesquisadores, doutores, mestres, especialistas, graduados e graduandos que atuam
nas linhas de pesquisas “Alfabetização, letramentos e formação de leitores” e
“Educação, história, Memória e diversidade”.
130
da sala de aula. Após esse período de ambientação, inicia-se a segunda
etapa do processo que é o início das atividades de contação de
histórias, as quais são realizadas semanalmente para todos os alunos
e alunas do turno matutino. Vale sublinhar que, como já fora
mencionado, os bolsistas passam antes por um processo de formação
concomitante ao período de imersão e ambientação na escola. Na
atividade de contação de histórias, os bolsistas também incluem, em
diversos momentos, os alunos da Pestalozzi que participam das
histórias interpretando personagens da narrativa. De fato, tem-se
avaliado que essa estratégia inclusiva tem sido significativa para eles.
A etapa seguinte consiste no acompanhamento de uma turma
indicada pela escola, para desenvolvimento de atividades na
perspectiva de alfabetizar letrando (SOARES, 2021).
Entretanto, em 2020, como já mencionado, devido a Pandemia do
COVID-19 que impossibilitou as atividades presenciais, as ações do
projeto passaram a ser desenvolvidas remotamente através da
elaboração de vídeos de histórias literárias contadas pelos oitos
bolsistas do projeto, sendo dois bolsistas pela Pró-Reitoria de
Extensão e Cultura (PROEC), três bolsistas pelo Programa Foco
Acadêmico da UFMA e três voluntários.
131
reforçada com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei nº 9.394/96) que prevê “currículos, métodos e técnicas,
recursos educativos e organização específicos” para o atendimento
adequado de Necessidades Educativas Especiais (Art. 59, I), além de
“...professores de ensino regular capacitados para a integração desses
educandos nas classes comuns” (Art. 59, III).
Apesar destas leis assegurarem a presença dos deficientes no
sistema regular de ensino, ainda nos deparamos com inúmeras barreiras
que impedem que estas políticas de inclusão sejam realmente efetivadas.
Os obstáculos mais comuns são: o preconceito, a infraestrutura das
escolas, a necessidade de formação continuada para os professores, a
falta de investimentos para a compra de materiais e equipamentos
necessários para o atendimento adequado aos estudantes que
necessitam de um acompanhamento educacional especializado.
Importa mencionar que na Pestalozzi encontram-se algumas
crianças que estão também no ensino regular no contra turno de suas
atividades na instituição. Contudo, segundo a diretora da Associação,
a maioria das crianças que são encaminhadas para as chamadas
escolas regulares, terminam voltando para a Pestalozzi. Em 2019,
apenas vinte crianças foram matriculadas em escolas regulares do
município. Um dado que importa sublinhar é que muitos alunos da
Associação Pestalozzi não têm um diagnóstico da sua deficiência, o
que dificulta um trabalho individual especializado levando em
consideração a especificidade de cada estudante.
Essa carência de diagnóstico, no entanto, não impede que o
trabalho de acompanhamento dos alunos com deficiências seja feito
pelos professores da escola. Na verdade, para os futuros professores
formados pela UFMA, Campus Codó, viver essa experiência tem
possibilitado uma ampla e variada gama de papéis sociais que ajudam
esses bolsistas a lidar com o medo e o preconceito em relação ao
diferente, além de desenvolver a cooperação e a tolerância, ambos,
elementos imprescindíveis para a nossa humanização.
Tornar-se um pedagogo preparado para atuar num espaço
escolar cujo preconceito tem atrapalhado significativamente o
conhecimento e a inclusão daqueles que mais precisam, tem sido ainda
um obstáculo a ser vencido. Nesse sentido, o projeto tem ajudado
significativamente na formação dos bolsistas que participam dessa
experiência. De fato, o que se tem constatado é que os egressos têm
132
sido capazes de atuar em diversos espaços educativos, respondendo a
inúmeras demandas e exigências de uma sociedade cada vez mais
dinâmica e complexa.
Importa sublinhar, ainda, que essa experiência na Associação
Pestalozzi tem demonstrado que as atividades realizadas na escola,
através do uso da leitura literária com a contação de história,
despertaram o gosto pela leitura e o interesse em aprender a ler e
escrever nos estudantes com deficiência. Nesse sentido, o que se
constata ainda é que o desenvolvimento das potencialidades do aluno
deficiente torna-se um fator de enriquecimento para o processo
educacional de toda escola.
A alfabetização e o letramento na educação especial através da
literatura não é algo impossível. Mesmo porque, para se formar um
leitor não basta adquirir a “tecnologia” do ler e do escrever. Na
verdade, é necessário acrescentar à aprendizagem e ao domínio da
“tecnologia” o letramento que é “o resultado da ação de ensinar ou
de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um
grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado
da escrita” (SOARES, 2004, p. 18).
O conceito de letramento também pode ser pensado em relação
à literatura. Paulino (2004) define o letramento literário “como outros
tipos de letramento, [que] continua sendo uma apropriação pessoal
de práticas de leitura/escrita, que não se reduzem à escola, embora
passem por ela” (PAULINO, 1998, p. 16). Vale sublinhar que esse tipo
de letramento, de modo geral, acaba envolvendo somente o
fenômeno da leitura. As habilidades de escrita literária não costumam
ser cobradas dos indivíduos, uma vez que são concebidas como
escolhas individuais.
Conforme Paulino (2004, p. 56),
133
A formação do leitor literário se apresenta como uma das grandes
preocupações dos professores, tanto de português, quanto daqueles
que irão mediar os contatos dos alunos com os livros de literatura nos
primeiros anos de escolaridade. Soares (2000), ao discorrer sobre a
escolarização adequada da literatura, ressalta o papel da escola em
conduzir eficazmente o aluno às práticas de leitura literária que
ocorrem no contexto social. Para Soares (2000), uma escolarização
adequada da literatura conduz ao letramento literário, uma vez que
deve conduzir a uma prática de leitura literária efetiva, que ultrapasse
os muros da escola.
Contudo, Soares (2004) aponta que toda literatura na escola é
escolarizada, entretanto, é a escolarização inadequada da literatura
que vem ocorrendo na escola. Dessa forma, a escolarização acaba
adquirindo um sentido negativo. É importante enfatizar ainda que o
letramento, entendido sob o ponto de vista social revolucionário, nem
sempre terá consequências desejáveis, benéficas. Ele também pode
ser utilizado com o objetivo de manter as práticas e relações sociais
correntes e, portanto, não deve ser tratado como algo “autônomo”. É
necessário levar em conta o que está sendo lido e, principalmente, a
forma como a leitura está sendo feita.
Assim, dada a importância da mediação do professor na formação
de leitores e cidadãos, é fundamental que ele receba informação e
conhecimentos suficientes para conduzir a experiência de leitura de
seus alunos, oferecendo livros e temas variados. Dessa forma, amplia-
se o público leitor, reduzem-se os preconceitos sobre a Literatura
Infantil e impulsionam-se a criação e a publicação de textos mais
conscientes, críticos e fundadores de uma sociedade democrática,
justa e capaz de equacionar seus conflitos e suprimir as desigualdades,
as quais deixam às margens da sociedade, da leitura e da literatura, os
empobrecidos, pretos, pardos e deficientes.
Zilberman (2003) salienta que deve ser respeitada a natureza da
obra literária na sua inserção na sala de aula, sem esquecer o interesse
do aluno na escolha dos textos. Isso porque suas projeções interferem
em todo e qualquer ato de leitura. A autora ressalta, ainda, que o
processo de comunicação literária estimula o rompimento das
limitações do ensino tradicional e permite a aproximação deste com a
realidade do aluno.
134
Desse modo, os critérios que permitem o discernimento entre o
bom e o mau texto para crianças, sejam elas com ou sem deficiência,
não destoam daqueles que distinguem a qualidade de qualquer outra
modalidade de criação literária. Seu aspecto inovador merece
destaque, na medida em que é o ponto de partida para a revelação de
uma visão original da realidade, atraindo seu beneficiário para o
mundo com o qual convivia diariamente, mas que desconhecia. Nesse
sentido, o índice de renovação de uma obra ficcional está na razão
direta de sua oferta de conhecimento de uma circunstância da qual, de
algum modo, o leitor faz parte.
Conforme Soares (2004), a possibilidade de leitura e o acesso a
leitura são condições necessárias para uma plena democracia cultural.
Para a autora, essa plena democracia deve ser entendida como uma
distribuição equitativa de bens simbólicos, o que inclui a leitura
literária, como um dos mais importantes bens simbólicos para
emancipação do cidadão. Desafio a ser vencido ainda, dado o fato de
que diversas crianças brasileiras só têm, ou terão, acesso a livros de
literatura através da escola.
Sobre essa necessidade, Soares (2004), afirma que o Brasil é um
país de raras bibliotecas públicas e raras e precárias bibliotecas
escolares, onde as que existem, quase sempre, funcionam como
depósitos de livros e possuem um acervo desatualizado. Dito de outra
forma, esses espaços não funcionam como centros de informação e de
formação de leitores. Além disso, o Brasil é considerado um país com
poucas livrarias, onde os livros são caros para uma população, em sua
maioria, de baixa renda.
Lamentavelmente, essa realidade também se constata no
município de Codó em relação às bibliotecas escolares, conforme o
Censo Escolar 2018, apenas 13% das escolas de Codó possuem
biblioteca e 10% salas de leitura. Os dados analisados são referentes ao
total de 198 escolas. O que evidenciou que desse total, apenas 26
escolas possuem biblioteca e 19 salas de leitura. A situação torna-se
mais grave quando voltamos o olhar para a zona rural do município,
onde menos de 5% das escolas apresentam espaços de leitura.
Constata-se, desse modo, que os obstáculos para a democratização
da leitura são de natureza estrutural e econômica, fatores que distanciam
grande parte das crianças e dos jovens de nosso país do acesso a uma
educação de qualidade que garanta a eles o direito à literatura. Isso
135
porque, de acordo com Candido (1995), a literatura é um direito humano,
que é indispensável para nossa humanização, pois ela realiza funções
importantes no desenvolvimento dos seres humanos. Ademais, a
literatura estimula e alimenta nossa imaginação, provoca e possibilita o
exercício da alteridade, contribui para o desenvolvimento do nosso
repertório linguístico e, ainda, nos propicia de uma outra maneira
conhecer o desenvolvimento do mundo e os conhecimentos produzidos
ao longo da história.
Nesse sentido, ao garantirmos, através do projeto, o acesso a
literatura dos deficientes da Associação Pestalozzi, estamos também
garantindo a eles os seus direitos humanos a literatura que Candido
(1995) defende. Reconhecendo, na mesma medida, que o estudante
deficiente pode usar e estimular sua imaginação a partir da leitura
literária. Ademais, como afirma Guimarães Rosa, “... mire e veja que o
mais importante e bonito do mundo é isto, que as pessoas não estão
sempre iguais, não foram terminadas, mas que elas vão sempre
mudando. Afinam ou desafinam – verdade maior. É o que a vida me
ensinou. Isto me alegra, montão”.
A experiência na Associação Pestalozzi não busca atingir o nível de
“um cidadão literalmente letrado”, para nos referir aqui, sem nenhuma
conotação pejorativa, a uma expressão de Paulino (2001). Com efeito,
ficamos com a perspectiva de Soares (2004) de garantir a execução da
democracia cultural e com a assertiva de Candido (1995) da literatura
como um direito humano de todas as pessoas. Não esquecendo de
Guimarães Rosa, cujo bonito é que as pessoas não são iguais.
136
Entretanto, como já mencionado, desde o ano de 2020, devido à
Pandemia do COVID-19, os bolsistas vêm desenvolvendo atividades
remotas de intervenção junto as crianças da Associação Pestalozzi. Essas
ações se deram a partir da elaboração de vídeos de histórias literárias que
foram contadas pelos bolsistas com um toque pessoal e criativo afim de
tornar mais próximo a história da realidade do aluno da escola.
Atualmente o projeto vem trabalhando com livros literários que
contemplam a temática da questão racial e da valorização do negro. A
escolha da literatura que tratam de temas sobre o negro e negra não
foi por acaso. Ela faz do planejamento da equipe que observou essa
necessidade, assim como é sabedora de que é na infância que a leitura
pode funcionar como potencializador para o autoconhecimento e para
construção/afirmação da identidade.
Ademais, tratar desse tema que discute a representatividade e a
valorização negra na literatura é também uma forma de democratizar o
acesso das crianças da Associação Pestalozzi ao que é produzido sobre e
pelo negro na literatura brasileira. Além disso, a proposta objetiva
consolidar a autoconfiança dessas crianças negras que enfrentam no dia
a dia o duplo preconceito de serem pretas ou pardas e deficientes.
Assim, através da literatura trabalhada na escola, são mostrados
para essas crianças a relevância dos negros e negras no Brasil e no
mundo. O projeto também sublinha o protagonismo dos negros e
negras, considerando que de acordo com o censo IBGE do ano de 2010,
no Maranhão, 72,2% da população é considerada negra. Uma maioria
que se repete também em Codó, onde esse percentual chega a 85,7%
da população, quando se somam pretos e pardos. Em números, no ano
de 2010, 15.498 se autodeclararam pretos e 84.435 pardos, o que
totalizou 99.993 mil negros (ALMEIDA, 2018).
O desafio de tornar a literatura acessível aos alunos da Associação
Pestalozzi não tem sido fácil. Na verdade, essa experiência de
atividades remotas do projeto tem se apresentado como um desafio,
uma vez que toda equipe teve, e ainda está aprendendo, a utilizar as
tecnológicas para elaborar/editar os vídeos das histórias contadas.
Não obstante, consideramos que a aprendizagem que está sendo
adquirida nesse novo formato de contação de histórias tem sido
significativa e importante na constituição e na formação docente
daqueles que participam do projeto. De fato, nota-se que ao longo da
participação do projeto estamos também formando leitores
137
antenados com a tecnologia e incentivando a formação leitora dos
alunos da escola alvo das atividades, tendo a leitura literária como uma
possibilidade de formação cidadã que permite a esses leitores
refletirem, indagarem, sentirem, se emocionarem, assim como intervir
em sua realidade.
Durante essa experiência de ensino remoto foram elaborados
vários vídeos pelos bolsistas do projeto. Esses discentes têm gravado
histórias cujas cenas são construídas por cada um a partir de suas
próprias casas, tendo em vista que o acesso à universidade não estava
permitido por causa da pandemia. Em seguida um bolsista colhe as
imagens produzidas pelos colegas e edita em único vídeo. Outro
bolsista faz a narrativa das histórias infantis que tratam de contos,
lendas, mitos, entre outros, acerca da origem e história dos negros e
negras. A escolha dos temas que são tratados pelos bolsistas é feita
juntamente com a coordenadora do projeto em reuniões semanais.
Os vídeos produzidos pelos bolsistas, depois de prontos, são
assistidos por toda a equipe do projeto. Após essa análise final, se não
houver problemas a serem resolvidos, o material é encaminhado para a
gestora da Associação Pestalozzi que envia posteriormente aos
professores da escola para que eles possam reproduzir ou encaminhá-los
aos estudantes. Esse mecanismo, embora tenha desafios a serem
vencidos, como falta de acesso a internet ou mesmo de equipamentos,
ainda tem se mostrado positivo nesse projeto de contação de histórias.
Elencamos aqui para o leitor, sete histórias que foram produzidas
em vídeo pela equipe de bolsistas: “Cada um com seu jeito, cada jeito
é de um!” de Lucimar Rosa Dias, “Meninas Negras” de Madu Costa e
Rubem Filho; “Minha mãe é negra sim!” de Patrícia Santana e
Hyvanildo Leite, “O cabelo de Cora” de Ana Zargo de Câmara e Taline
Schubach; “Que cor é a minha cor” de Martha Rodrigues e desenhos
de Rubem Filho; “Meu crespo é de Rainha” de Bell Rooks e Chris
Raschka e “O amigo do rei” de Ruth Rocha. Todas tratam da
valorização da história da cultura afro-brasileira, o que interfere de
forma positiva na identificação pelas crianças negras e no
reconhecimento da sua história, sua cultura e, consequentemente, sua
importância e beleza.
138
Vale ressaltar que as histórias “Meu crespo é de Rainha” e “O
amigo do Rei” foram elaborados tendo como personagens as crianças
139
da escola. Para que isso fosse possível, as professoras encaminharam
as fotos das crianças para equipe editar junto a narrativa da história. O
resultado foi o protagonismo dos alunos da Associação Pestalozzi em
histórias contadas e assistidas por eles e seus colegas.
140
Essa perspectiva aponta para a importância de se tratar da literatura
no ambiente escolar desde muito cedo. Assim, faz-se necessário buscar as
produções antigas e mais recente de obras com personagens negras, que
valorizam a estética e a identidade negra (ARAUJO, 2017). De fato, isso
contribuirá para a composição de um repertório literário mais diverso às
crianças leitoras, em especial às crianças negras, que passam a ter maiores
possibilidades de “se verem representadas em produções literárias
nacionais em contextos bem diferentes do que foi oferecido a gerações
anteriores” (ARAUJO, 2017, p. 37).
A implementação das ações do projeto na escola tem sido
constituída a partir de pensamentos e ideias que levam à valorização e
inclusão do negro e negra em todas as esferas. Desse modo, todas as
propostas são discutidas com a escola com a qual temos construído
uma boa relação, assim como com a comunidade escolar (professores,
alunos e funcionários). Com efeito, isso tem favorecido o diálogo e a
cooperação entre as partes e fortalecido o alcance dos objetivos
propostos em cada ação realizada na escola. Sublinhamos, ainda, que
as reflexões e avaliações que realizamos se dão sobre cada ação
efetuada e permanece durante todo o andamento do projeto. Ou seja,
o projeto não é uma camisa de força. Quando é necessário,
restabelecemos os objetivos e as metas a serem alcançadas, o que
possibilita construir novas perspectivas de intervenção no trabalho
junto a Associação Pestalozzi.
Considerações finais
141
que aparecem no caminho. De fato, fazer extensão universitária em
tempos de Pandemia se tornou mais difícil ainda, tendo em vista os
limites impostos, sejam eles sanitários ou tecnológicos. Até porque,
trabalhar com a leitura e a escrita com o público da Associação
Pestalozzi já era desafiador e sempre nos trouxe indagações, dúvidas
e muita aprendizagem. Isso porque, certezas absolutas não existem no
ensino, na pesquisa e tampouco na extensão.
Assim, o que apresentamos aqui através desse texto é um
pequeno panorama do ambiente e das experiências literárias vividas
na escola em tempos de pandemia. A realidade mais ampla é
impossível de descrever nestas poucas linhas, mas o que constatamos
ao longo de mais de uma década é que através da literatura podemos
aproximar mundos que estão distantes e impedidos de se comunicar
por conta das barreiras impostas pelo preconceito da sociedade que
agravam a exclusão dos empobrecidos e deficientes, cujas condições
socioeconômicas estão beirando a pobreza extrema devido as
medidas neoliberais desse governo que não prioriza a vida, mas
valoriza demasiadamente a necropolítica, cujo objetivo é determinar
quem pode viver e quem deve morrer (MBEMBE, 2018).
A experiência com a literatura afro-brasileira tem nos permitido
refletir e provocar reflexões em toda a equipe do projeto acerca das
sequelas da escravidão para negros e negras. Na realidade, é preciso
discutir o lugar que tem sido reservado aos negros em nossa sociedade
e no município de Codó. É preciso compreender que o fim da
escravidão não significou a ruptura com um modelo de submissão e
subserviência (GOUVEIA, 2005).
Referências
142
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negras na literatura infantil brasileira: percalços e percursos. TOM
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ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola. 10 ed. São Paulo:
Global, 2003.
143
144
A INTERCULTURALIDADE NA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA:
A PERSPECTIVA DECOLONIAL
Introdução
145
saberes, que consistem em componentes essenciais da socialização e
construção identitária.
O texto está estruturado em três partes, sendo que a primeira
objetiva colocar em questão a condição da colonialidade e repensar
seus fundamentos e condições de superação; a segunda parte se
propõe a refletir sobre o multiculturalismo e suas implicações para a
prática educativa; a terceira parte procura descrever os elementos
básicos de uma educação intercultural direcionada às populações
indígenas. Concluímos com aqueles que acreditamos serem os
próximos passos no exame da temática em tela.
A colonialidade em questão
146
questão racial – a herança da escravidão é uma marca indelével do
sistema colonial que perdura na pós-modernidade; e a “colonialidade
do ser” enquanto embate pelas formas de expressão e práticas
discursivas – como os discursos são gerados para dar voz a
determinados extratos sociais e silenciar outros.
Mignolo (2008; 2014; 2017) enfatiza que a perspectiva decolonial
reivindica um ajuste nas relações de poder entre colonizados e
colonizadores, entre dominados e dominadores. A decolonialidade
opera no sentido de colocar em suspenso a produção de saberes e
modos de vida derivados da dominação de matriz eurocêntrica,
amplamente disseminados desde as grandes navegações até a
sociedade da informação em curso. Permitir aos subalternizados
tomar as rédeas de sua própria existência constitui parte do desiderato
decolonial. A decolonialidade propõe romper com os parâmetros
dominantes em matéria de produção do conhecimento, criação de
subjetividades, expressão do gênero e da sexualidade, vivências do
sagrado. Nessa perspectiva é indispensável pensar a sociedade para
além da tradição cristã-colonial, bem como desterrar o domínio do
capital – libertar corpos, almas e a terra.
A pós-modernidade evidenciou que o projeto de ocidentalização
do mundo estava fadado ao fracasso, como indica a ressurgência da
alteridade como meio de afirmação identitária. Importa agora
“desocidentalizar” a sociedade, para a construção de arranjos
institucionais nos quais a população seja de fato protagonista – o que
rompe com a visão liberal-burguesa de “democracia como meio” para
seleção de líderes, mas dialoga abertamente com a visão social-
popular desse instituto – a “democracia como fim”, no qual se planteia
a difusão da justiça social e que, portanto, deve ser um lugar no qual a
subalternidade não subsiste.
Quijano (1992; 2005) alerta que a identidade é uma categoria
relacional e intersubjetiva situada no tempo e espaço. A dominação
europeia na América Latina se deu às expensas da miríade de
identidades indígenas que habitavam o continente. No decurso do
processo de independência latino-americano, as bases do sistema
colonial não foram alteradas, mas serviram elas próprias de pedra
angular para que as classes dominantes pudessem erigir o edifício dos
novos Estados. O ponto chave é que a colonialidade articula a
diferença racial e cultural entre europeu e seus dominados indígenas
147
como uma relação de poder assimétrica. É justamente essa assimetria
que a decolonialidade coloca em questão e deseja desarticular para a
produção de uma ordem social inclusiva.
Rivera-Cusicansqui (2010) aponta para o modo como as classes
dominantes buscam manipular o passado com vistas a justificar
estruturas sociais desiguais e excludentes no presente. Raça e cultura são
mobilizadas para legitimar a imposição da cultura e poder europeu e sua
leitura intencionada da história. Sendo assim, entendemos que, contra
essa estrutura de poder, os descendentes dos povos escravizados pela
empresa colonial devem reivindicar seu lugar de fala como sujeitos do
mundo contemporâneo – o passado resiste como memória viva das
injustiças e o futuro emerge como construção coletiva. E essa perspectiva
perpassa a questão educacional entendida como projeto.
Santos, Piovezana & Narsizo (2018) lembram que a ocupação dos
territórios indígenas pela empresa colonial se deu por meio de
campanhas militares – era explícito o desígnio de dominação sobre as
populações autóctones. Aliada ao domínio das terras e corpos imposta
pelo Estado colonial, a educação praticada pelos jesuítas tinha como
objetivo a aculturação e o domínio de mentes e almas. Essa lógica de
uma educação para subjugar o elemento nativo se manteria como eixo
norteador das políticas educacionais para os povos indígenas em
território brasileiro até a assunção da Constituição Federal de 1988,
que recepcionou a demanda por maior autonomia educacional das
comunidades indígenas.
Osorio (2014) aponta a elaboração de um projeto educacional
contra hegemônico no contexto da pós-modernidade. O fundamento
dessa nova agenda para a educação residiria na constituição de uma
nova epistemologia que se propõe a desconstruir as estruturas
coloniais – nesse sentido, o pensamento decolonial se constitui numa
chave para pensar um outro mundo baseado em crenças, valores e
princípios nativos. A transformação pedagógica deve ter como
parâmetro o mundo da vida dos oprimidos com vistas a pensar as
bases para a convivência, tolerância e promoção do bem-viver. Do
ponto de vista educacional, o ponto de partida consiste no duplo
reconhecimento do fato do pluralismo cultural como estruturante das
práticas pedagógicas e, por conseguinte, da necessidade de currículos
diferenciados que atendam as diferentes matrizes culturais. Isso
implica em promover o acolhimento do outro/diferente, dos modos
148
nativos de partilha de saberes e a tomada do mundo da vida como
pressuposto para a formação educacional e anteparo essencial com
vistas ao diálogo intercultural.
149
b) a perspectiva “diferencialista” se assenta na afirmação da
diversidade e na criação de meios para que se expressem numa chave
essencialista que privilegia a composição de grupos homogêneos de
partilha e (re)produção cultural. Transposta para a educação, essa
visão implica em criar espaços de vivência pedagógica para diferentes
segmentos que compõe o mosaico social. O risco inerente é criar
“guetos” pedagógicos e reforçar a segmentação social.
2. De outro lado, a segunda abordagem, que podemos chamar de
“prescritiva”, implica em pensar o multiculturalismo como uma posição
política diante da realidade e do modo que lidamos com a diversidade e a
dinâmica social – pensar o mundo como ele “deve ser”. Aqui se advoga
um multiculturalismo (enquanto fenômeno) de matriz interativa que
reforça a interculturalidade (enquanto estratégia) como experiência
formativa do ser humano plural, o que se ajusta bem a um projeto de
sociedade democrática e inclusiva. Para tanto seria preciso
“desconstruir” os preconceitos que povoam o ambiente escolar, bem
como “desnaturalizar” hábitos e comportamentos discriminatórios
reproduzidos no cotidiano. De igual modo é essencial descolonizar os
currículos que se aplicam e os tipos de conhecimento que se ensinam nas
escolas, de modo a prover um currículo aberto aos saberes tradicionais.
Paes (2003) registra que, na atualidade, o nível de
assimilação/integração das populações originárias à cultura dominante
colonial é variável, o que tem sensíveis implicações para projetos
educacionais, visto que qualquer política educacional para públicos
específicos deve ter em conta as suas condições existenciais e a matriz
de relações com os grupos hegemônicos. Entre o índio globalizado e o
isolado existe um largo espectro no qual níveis diferentes de interação
com a cultura abrangente se desenrolam. Portanto, a escolarização de
indígenas deve ter como pressuposto o respeito à autonomia dos
povos e ser precedida do devido diagnóstico da realidade sociocultural
na qual o projeto escolar será desenvolvido.
Candau e Koff (2015) abordam os desafios que a escola
contemporânea enfrenta, destacando o papel da didática como parte
do rol de estratégias para lidar com a realidade e sala de aula. E, o que
fazer diante da fluidez de informações e identidades entre os
educandos? Podemos identificar ao menos duas linhas de ação:
150
1) a primeira consiste em gerar um choque de gestão que torne
mais eficiente os processos de avaliação e controle do processo
pedagógico numa chave produtivista; e,
2) a segunda consiste em repensar o formato escolar vigente
colocando em discussão como a escola vive o currículo na prática e
tudo que se deriva dele (a organização do tempo e espaço escolar, a
divisão de papéis e tarefas etc.).
Aqui reside a questão do projeto político educacional, que
desejamos refletir tendo em vista os objetivos estabelecidos, para o
processo formativo dos educandos e a atuação dos profissionais da
educação. O processo de ensino-aprendizagem deve se guiar pela
construção da autonomia, a busca pelo autoconhecimento, o respeito
às diferenças, o empoderamento dos elementos subalternos, a
promoção da autoestima. A prática docente, portanto, deve buscar
conciliar a busca pela igualdade de direitos com a vivência ativa das
diferenças. Nesse sentido, do ponto de vista didático, deve-se valorizar
a aula dialógica e que oportuniza ao educando expressar seu modo de
pensar/agir no mundo. O vetor multicultural se inscreve nessa quadra
do processo ensino aprendizagem.
Oliveira (2012) destaca o reconhecimento da questão da
diversidade cultural como fato incontornável por qualquer projeto
político pedagógico na atualidade. As políticas educacionais
direcionadas à população indígena expressam a percepção e intenção
do poder público para com aquele público – nesse sentido, a passagem
de um modelo assimilacionista para outro que se pretende
integracionista constitui importante mudança de paradigma. Em
termos representativos, esse processo significou o progressivo
abandono da suposta inferioridade indígena derivada da perspectiva
colonialista rumo ao reconhecimento da diversidade e do direito à
autonomia. Storch & Tamboril (2021) advertem que a educação escolar
a que os povos indígenas foram submetidos ao longo do tempo estava
impregnada de uma visão unilateral que ignorava a matriz cultural e
código comportamental nativo. Somente com a Constituição Federal
de 1988 é que a educação indígena passou a ser pensada a partir dos
interesses dos próprios indígenas.
Candau e Koff (2015) enfatizam a importância de uma agenda de
ensino-aprendizagem que valorize a autonomia do educando,
permitindo trabalhar o mundo da vida como parte integrativa de sua
151
formação, promova a cidadania ativa e as identidades culturais. A
escola deve ser vista como uma instituição intimamente vinculada com
os processos de redução das desigualdades socioeconômicas e
acolhimento das diferenças étnico-culturais. Ante o fato da
diversidade cultural na escola, haveria duas perspectivas em disputa:
1. uma abordagem gerencial com enfoque nos mecanismos de
administração educacional com vistas a organizar a instituição escolar
na lógica do controle e racionalização dos processos educativos e da
produção de resultados;
2. uma abordagem estrutural que visa analisar o formato escolar
e sua adequação às dinâmicas sociais contemporâneas, enfatizando a
necessidade de reinventar as práticas didáticas no intuito de abarcar o
fato do pluralismo cultural e as novas demandas da sociedade da
informação.
Weigel (2003) questiona os motivos que levam comunidades
indígenas a reivindicar escolas em seus territórios – dentre os
argumentos, emerge uma perspectiva pragmática, que percebe a escola
como instância de mediação entre a comunidade indígena e a sociedade
abrangente; a percepção de que o saber do colonizador constitui um
recurso de poder que pode ser utilizado também pelo indígena na defesa
de seus interesses; o domínio do capital cultural e simbólico da sociedade
não-indígena constitui em ferramenta para a comunicação e difusão da
luta indígena para além das fronteiras de seu território.
Fleuri (2003), por sua vez, descreve três propostas pedagógicas
relativas à educação indígena:
1) a proposta pedagógica multicultural que se caracteriza por um
modo de aproximar as diferenças étnico-culturais, isolando-as
reciprocamente - a convivência democrática entre todos os grupos
diferentes;
2) a proposta pedagógica intercultural que compreende o
“diferente” que caracteriza a singularidade e o caráter único de cada
sujeito humano - a ação dialógica a partir da evidência da diferença; e,
3) a proposta pedagógica transcultural - fundamenta-se como
elemento transversal já presente em diferentes culturas ou como
produto original da hibridização de elementos culturalmente
diferentes.
Paes (2003) considera a abordagem intercultural como adequada
ao trato da educação escolar indígena, com vistas a promover as trocas
152
de experiências e saberes, valorizando as línguas e práticas culturais
nativas. A demanda dos povos originários por acesso ao conhecimento
produzido pela moderna ciência configura numa perspectiva
instrumental que percebe os saberes ocidentais como meios de poder
dos quais precisam se apropriar. Vamos agora destacar a proposta
intercultural, entendida como a agenda educacional que acolhe o
diferente como parte constitutiva do processo.
153
Bergamaschi & Sousa (2015) registram que as práticas em
educação indígena têm base legal para utilizar línguas nativas e seu
referencial cultural no processo de ensino-aprendizagem. O desafio é
garantir a autonomia dos povos indígenas em promover suas escolhas
pedagógicas em diálogo com o contexto da cultura nacional
abrangente, para que cada comunidade indígena possa constituir o
projeto político-pedagógico de suas escolas com base em sua própria
tradição e epistemologia. Nesse sentido, ao Estado compete apoiar
esse processo educacional pensando a escola como interface entre a
cultura nativa e seu entorno.
Braz & Valadares (2021) observam que, ao recepcionar a demanda
por inserção da cultura indígena como parte do processo formativo
escolar, a Lei Nº 11.645, de 10 março de 2008, estabeleceu diretrizes
para sua consumação, destacando a previsão de que os modos de ser
e viver indígenas devam constar nos processos formativos para o
exercício do magistério. Os objetivos tácitos de uma educação
indígena consistem na afirmação dos direitos nativos, em particular
pela defesa da tríade língua-cultura-saberes entendidos como
componentes essenciais da socialização e construção identitária.
De acordo com Abbonizio e Ghanem (2016) as pesquisas na área
da educação escolar indígena apontam que as comunidades têm
buscado sanar a demanda por educação na interseção dos grupos
étnicos e culturais a partir de uma lógica da bricolagem, mesclando
elementos da cultura ocidental (a escolarização) e nativa (a relação
intergeracional e hábitos locais). O diagnóstico social e histórico da
educação escolar permite identificar três fragilidades:
1. a primeira é que a escola tradicional tende a confinar alunos e
atividades pedagógicas ao espaço físico escolar;
2. a segunda é que a escola tende a relegar as condições reais de
existência no tempo presente para focalizar uma projeção de vida
futura, tornando-se assim alienada e alienante;
3. terceiro a escola tende a privilegiar saberes supostamente
universais e exógenos ao modo de vida das comunidades,
desprezando assim os saberes locais.
Sendo assim, a educação escolar indígena, deve se basear em três
pilares:
1, a participação ativa da comunidade no desenvolvimento do
projeto político educacional e na seleção dos docentes;
154
2. a produção de material didático calcado na realidade social e
linguística da comunidade; e,
3. a indissociabilidade entre ensino e pesquisa como meio para
aprofundar a relação entre escola e mundo da vida.
Paula (1999) ressalta as seguintes marcas da questão da educação
indígena:
1. a existência do binômio intercultural e bilíngüe é considerado
como constitutivo da categoria “escola indígena”;
2. antes de a escola ser intercultural, as sociedades indígenas já
estão se relacionando com a sociedade não-indígena, desde o
momento do contato; e,
3. o modo como ocorrem essas relações se reflete no cotidiano
da escola.
Diante disso, a falácia da (in)capacidade indígena para o processo
escolar formal precisa ser desconstruída para se (re)pensar “que
escola indígena?” atende aos interesses e necessidades dos povos
tradicionais. O projeto político de escolas indígenas deve buscar a
formação técnica levando em conta as ocupações tradicionais da
comunidade como a produção de alimentos, manejo da terra,
artesanato e práticas culturais bem como o preparo para a inserção na
sociedade ampliada do mundo não-indígena.
Consoante à agenda da educação intercultural, de acordo com Melia
(1999) registra que a ação pedagógica dos povos tradicionais é centrada
na tríade língua, economia e parentesco. A imposição de uma língua geral
ou nacional, currículo também nacional e professores não-indígenas para
os povos indígenas gera riscos à alteridade e à diferença no processo
pedagógico – o silenciamento da identidade nativa na escola. As
vulnerabilidades estão relacionadas com o fato de que a língua com
palavras indígenas (langue) pode não ser “indígena” (parole) na sua
essência; a adaptação de currículos e conteúdos pode ficar reduzida ao
campo do folclórico e do óbvio; os professores podem ser cooptados pelo
Estado e pelas instituições. Nesse sentido, questiona-se: quais as
possibilidades de superação desses riscos e vulnerabilidades? A autora
aponta a produção de livros e cartilhas em língua indígena, a prévia
conquista da escrita de cada uma dessas línguas, o currículo adaptado à
realidade indígena, principalmente no que tange aos saberes tradicionais,
preparação, incorporação e contratação de professores indígenas por
parte do Estado e das instituições.
155
Silva (2014) destaca que a educação/socialização praticada pelo
indígena tem caráter comunitário, abarcando língua, saberes, hábitos
e rituais do grupo no qual a criança indígena está inserida. Como
métodos se destacam a observação e a imitação, processos nos quais
a criança aprende os fazeres da comunidade. Sobretudo, a criança
indígena, na relação com a natureza e com seus pares, sejam outras
crianças ou adultos, estabelecendo redes de saberes que a integram
do ponto de vista cognitivo à realidade que a cerca. A criança deve ser
vista como parte do processo de continua construção dos laços de
parentesco que formam a comunidade, fomentado, por conseguinte,
a aprendizagem do ser e fazer indígenas na prática e convivência com
os adultos. Do processo cultural de socialização da criança indígena,
alguns vetores podem ser identificados:
1. a outorga de autonomia para a criança decidir seu curso de ação
e buscar o saber; o reconhecimento das múltiplas habilidades da
criança;
2. a preocupação com o cuidado com o corpo (estética nativa) e
saúde (alimentação);
3. a percepção da criança como ponte entre o mundo físico
(material) e o metafísico (espiritual), uma vez que está em fase de
transição para o mundo humano.
Guerola (2018) toma como ponto de partida para analisar a
educação intercultural o fato da assimetria que a população indígena
está submetida no contexto nacional, levando a importantes
implicações no ambiente escolar. O poder enquanto fluxo deve
circular no interior de uma sociedade civil plural e multicultural.
Portanto, repensar a escola e a educação a que os povos indígenas têm
acesso se faz necessário, tomando como referência o marco cultural
das comunidades que reafirmam suas identidades no cotidiano e
demanda a expressão dessas também no ambiente escolar. O
exercício do poder numa sociedade aberta e plural, logo, deve prover
a liberdade na construção identitária conjugada com a produção de
signos e significados pelos diferentes sujeitos.
156
exposição refletindo sobre as propostas que se seguem. Conforme
sabemos, contraditoriamente, a ação do Estado derivado da
experiência colonial visa a submissão dos grupos subalternos
produzindo nesses um sentimento de impotência. A institucionalidade
implica numa performance de habitus com vistas à manutenção de
uma imagem e a provisão dos interesses que orientam a instituição.
Nessa perspectiva, cabe questionar se a escola indígena se coloca ao
lado da comunidade ou a serviço de um interesse de Estado: Qual a
autonomia que a escola indígena tem para prover um ensino adequado
à realidade cultural da comunidade na qual está inserida? Sendo a
oralidade uma prática central na dinâmica cultural indígena, qual o
lugar do discurso na prática pedagógica na educação a que os povos
indígenas têm acesso?
Bergamaschi (2007) destaca a observação, a oralidade e a
musicalidade como aspectos centrais nos processos educativos
nativos indígenas – ver, falar e cantar são as principais formas de
comunicação de saberes. O processo pedagógico é baseado na
partilha e na ajuda mútua entre professores e alunos com vistas à
compressão dos conteúdos e práticas. Stumpf & Bergamaschi (2016)
registram que a educação tradicional indígena não se restringe a um
local ou tempo definido, ocorrendo como ato contínuo nas interações
entre as pessoas por meio da troca de saberes, experiências e
aconselhamentos. Aspectos espirituais, emocionais e práticos são
conjugados para que a aprendizagem seja integral. Nesse sentido, a
oralidade tem função destacada na transmissão de conhecimentos
nativos, o que nos leva ao seu duplo: a memória, como elemento
constitutivo do acervo de saberes coletivos.
Santos, Piovezana & Narsizo (2018) defendem que uma agenda
de educação intercultural deve contemplar a afirmação do caráter
político do processo de troca de saberes – a prática da interatividade;
a dialogicidade para romper com a subalternização do outro – a prática
da escuta ativa; a centralidade do educando e seu mundo da vida como
bases para a construção do processo educativo – a prática da inclusão.
Pelo exposto, podemos concordar também com Delmondez e Pulino
(2014) que identificam uma agenda para a educação escolar indígena
hoje no Brasil assim organizada:
1) promover a interculturalidade, ou seja, o trânsito entre
diferenças e territórios identitários;
157
2) propiciar aos indígenas o estatuto de sujeitos de direitos de
seus próprios saberes;
3) viabilizar a transmissão de sua cultura no arcabouço
institucional do Estado democrático brasileiro; e,
4) permitir o trânsito entre identidade e diferença.
O ponto chave é que a escola indígena hoje tem como
pressuposto oferecer subsídios para que os próprios sujeitos
envolvidos no processo de ensino-aprendizagem se apropriem e
construam suas próprias metodologias.
Souza e Bruno (2017) questionam a submissão do processo
pedagógico a metas que em última instância atestam o sucesso e o
fracasso escolar. Como agravante levanta-se a questão da aplicação
dos parâmetros da cultura dominante para a formação de alunos
indígenas. A diversidade cultural precisa ser reconhecida e incluída na
agenda didática da escola – a oralidade, forma típica de transmissão
dos saberes tradicionais pode e deve ser associada com o ensino de
leitura e escrita que pautam a comunicação científica. Assim, ao tratar
da educação intercultural, podemos identificar três eixos norteadores:
1) a conexão entre diferenças culturais e a pauta dos direitos
humanos – o combate às desigualdades sociais caminha junto com a
expansão do direito de voz do subalterno;
2) a proposição de uma visão multicultural aberta que permita a
afirmação das identidades; e,
3) a busca por formatos escolares dinâmicos e capazes de propor
respostas para as questões da pós-modernidade.
Por fim, Santos, Piovezana & Narsizo (2018) identificam três
fronteiras a serem superadas para a promoção de uma educação
indígena: as fronteiras físicas, que dificultam o acesso das
comunidades indígenas a recursos materiais e imateriais, bem como
limitam as oportunidades de trocas interculturais; as fronteiras
culturais, que implicam no preconceito, intolerância e epistemicídio; as
fronteiras econômicas, que implicam nas precárias condições de
reprodução da existência material a que as populações indígenas estão
submetidas. A inclusão do outro no processo pedagógico deve se dar
a partir da sua própria perspectiva, o que torna essencial acolher as
expressões dos povos subalternizados. A promoção do bem-viver a
partir de uma educação inclusiva depende do ativo concurso de
158
educadores e comunidades indígenas - nesse sentido, a dialogicidade
será a pedra angular da escola para todas as culturas.
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159
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161
162
ENSINO DE LIBRAS PARA CRIANÇAS SURDAS EM TEMPOS DE
PANDEMIA NO MUNICÍPIO DE CODÓ/MA
Introdução
163
A Declaração de Salamanca (1994) diz que o desafio que
confronta a escola diz respeito a uma pedagogia centrada na criança
que possa ser capaz de educá-las de maneira bem-sucedida. No
entanto, não basta apenas incluir a criança no espaço da escola, mas
inseri-las efetivamente no processo de ensino aprendizagem de forma
que consiga avançar em seu aprendizado de maneira significativa.
A Declaração ressalta, ainda, que o princípio fundamental da
educação inclusiva éque todas as crianças deveriam aprender juntas,
independente de quaisquer dificuldades ou diferenças que possam ter,
e que a escola deve se adaptar ao aluno, buscando assim uma
educação para todos, uma educação verdadeiramente inclusiva
(UNESCO, 1994). Dessemodo, as crianças aprendem com seus pares,
juntas mutualmente ajudando umas as outras, tornando o
aprendizado mais prazeroso e eficaz.
Para MacCleary (2006) e Dias (2006), a superação dos entraves
que os alunos surdos enfrentam só poderá ser atingida se a escola se
reorganizar, visando promover o intercâmbio entre as duas culturas:
surda e ouvinte.
164
é denominado de “Sinal” nas línguas de sinais, ela é autônoma e
reconhecida pela linguística e compõe todos os componentes
pertinentes às línguas orais como: gramática, semântica e outros. Por
isso é considerada instrumento linguístico de poder e força.
O processo de alfabetização assimila-se com a dos ouvintes, pois
a memorização é o método mais usado e o letramento é através das
experiências e consciência de significados, usando também o método
bilíngue que propõe dar as crianças surdas as mesmas possibilidades
psicolinguísticas que tem os ouvintes; e defende o acesso das duas
línguas dentro de um contexto, a Língua Brasileira de Sinais, como
primeira língua, e a Língua Portuguesa, na modalidade escrita.
Também destacamos o processo semiótico que é um dos percursos
mais importantes na alfabetização de surdos que é o estudo de signos
e significados os quais fazem a pessoa surda comunicar e viver em
sociedade, é importante que principalmente os professores das
crianças surdas compreendam esse processo semiótico, pois são
fundamentais no processo de ensino aprendizagem, pois no contexto
escolar quando as coisas fazem sentido tudo é fácil aprender.
Assim, a Libras, no contexto de sala de aula, é fundamental para
o processo de inclusãodas crianças surdas desde a educação infantil.
Pois, segundo Jobim (2016, p.16) a criança:
165
desafios destacados vem sendo o enfrentamento dos efeitos das
transformações advindas da globalização e seus reflexos em todas as
instituições sociais (OLIVEIRA, 2011).
166
Integração da Pessoa Portadora de Deficiência); a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional n.9.394/96 e a Resolução CNE/CEB nº
2/2001, que instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial
na Educação Básica.
Tem-se, também, a Lei nº. 10.172/01- que Aprova o Plano Nacional
de Educação-27 metas para a educação das pessoas com necessidades
especiais; a Resolução do CNE/CEB nº. 02/ 2001- Diretrizes Curriculares
da Educação Especial na Educação Básica; o Decreto nº 5.626/05- que
regulamenta a Libras pela Lei de nº 10.436 de 24 de abril de 2002,
tornando-seconhecida como meio legal de comunicação e expressão.
(BRASIL, 2002, p. 758).
Durante a história da Educação Especial, várias terminologias
foram usadas para dar nomes às pessoas que nasciam com alguma
deficiência, os quais estão contidos nos registros históricos. Débil,
debiloide, idiota, cocho, manco, excepcional, deficiente, e bobo da
corte que servia de divertimentos dos demais, no entanto são muitos
os estereótipos criados e usados intencionalmente para nomeá-las e
identificá-las. São expressões que no decorrer da história marcaram (e
marcam) a imagem da pessoa com deficiência.
Com o passar dos anos, no final século XX e início o século XXI,
adotou-se o uso de termos como deficiente, educandos com
necessidades especiais, pessoas portadoras de deficiência, pessoas
com necessidades educacionais especiais, etc. (MAZZOTTA, 2010;
JANNUZI, 2004).
Algumas dessas terminologias como, por exemplo, pessoas
portadoras de deficiência, marcaram, estigmatizaram e fortaleceram o
preconceito e a discriminação, principalmente no ambiente escolar.
Foi só a partir de 2008, com a publicação do texto da Política Nacional
de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, que se
passou a usar no meio educacional e acadêmico os termos pessoa com
deficiência e aluno/estudante público alvo da educação especial.
Atualmente, ainda encontramos situações educacionais pautadas
em concepções deensino excludentes, isso porque ainda vivemos em
uma sociedade em que muitas pessoas ainda não aprenderam a
respeitar e valorizar a pessoa humana independente de suas
deficiências e limitações. Por isso, é importante manter
constantemente discussões e construções de políticas inclusivas.
167
A CORDE (Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência), surgiu em 1989, e foi um dos primeiros
segmentos que se preocupou ematualizar os termos de acordo com a
visão constituída socialmente em relação às pessoas com deficiência.
168
a comunidade surda, aceitam a condição de surdez e que, para o
estabelecimento das suas relações, utilizam a Libras para se
comunicar. Já pessoa com deficiência auditiva são aquelas que se
reconhecem como ouvintes, não usam língua de sinais e se comunicam
via oralização, mesmo com suas limitações auditivas.
Devemos reconhecer que realmente as pessoas com deficiência
são capazes e também possuem especificidades que não podem ser
ignoradas ou negligenciadas. Suas limitações e possibilidades são
próprias pela condição de deficiência, como são próprias as de cada
sujeito social.
Carvalho (2004, p. 185 -186) nos diz que:
169
o que alavancou uma série de pesquisasvoltadas à área da educação
da pessoa com deficiência, dando destaque à Educação Especial. É
importante ressaltar que a inclusão no contexto brasileiro, não se
chegou a uma situação satisfatória.
Em defesa dos direitos humanos, em prol da pessoa com
deficiência, vozes ecoavam pedindo a eliminação de práticas
discriminatórias, resultando na implementação do atendimento
educacional especializado, a partir dos movimentos internacionais
sociopolíticos.Assim, surdos lutam por seu espaço na sociedade, e a
educação das pessoas com deficiência ampliou-se, ocupando destaque
de discussão nas políticas educacionais e municipais de educação
(SANTA CATARINA, 2002; BUENO, 2008).
170
que vivem sem oportunidades e merecem vivê-las na realidade do
espaço escolar e social.
Através das ações pedagógicas, ainda mesmo na educação
infantil com crianças pequenas, os professores devem levar formas
diferenciadas para aproximar, sem distinção, osalunos do processo de
alfabetização e letramento de forma prazerosa e igualitária, e que faça
sentido para as crianças com deficiência. As crianças precisam ser
inseridas no processo educativo, despertando assim nos demais um
espírito colaborativo e solidário para comaqueles que estão excluídos
do processo de ensino e aprendizagem.
Para as crianças se sentirem parte do processo, durante o ensino
remoto, precisa-se adequar os vídeos com as aulas, no intuito de
atender as especificidades do estudante com deficiência. Sendo assim,
a criança surda tem direito de participar das atividades, de forma
diferenciada dos alunos típicos, sejam presenciais ou remotas as aulas
precisam ser de fácil compreensão. Pois as crianças típicas já sentem
dificuldades com as aulas online, durante o período de pandemia,
quanto mais as crianças atípicas, que o grau de dificuldades de
aprendizagem é maior; no entanto, também são capazes de
desenvolver habilidades e todos precisam reconhecer que elas podem
contribuir significativamente com a sociedade.
171
O ano de 2020 ficou conhecido no mundo inteiro como o ano em
que a pandemia de Covid-19 atingiu mais de 43 milhões de pessoas, e
mais de um milhão e cem mil vidas foram sanadas. No Brasil, mais de
20 milhões de pessoas contraiu o novo coronavírus e, até o momento,
já ultrapassamos 600 mil óbitos.
A sociedade obrigou-se a viver em isolamento social como
prevenção da contaminação e disseminação do vírus; comércios,
indústrias e serviços foram submetidos a mudanças de rotina, e com o
sistema de ensino não foi diferente. Em 17 de março de 2020 – início do
ano letivo – o Ministério da Educação publicou a portaria 343, em que
as aulas presenciais foram suspensas e substituídas por aulas remotas
por meio de ferramentas digitais, conforme as orientações da OMS
(Organização Mundial da Saúde).
Entre os quase 56 milhões de alunos matriculados na educação
básica e superior no Brasil, 35% (19,5 milhões) tiveram as aulas
suspensas devido a pandemia de Covid-19, enquanto que 58% (32,4
milhões) passaram a ter aulas remotas. Na rede pública, 26% dos alunos
que estão tendo aulas online não possuem acesso à internet (AGÊNCIA
SENADO, 2020).
De acordo com Vercelli (2020, p.50): “As aulas remotas ocorrem
de forma sincrônica, portanto com a presença do professor em tempo
real, sendo que as dúvidas podem ser sanadasno momento em que
surgem, por vídeo ou por chat”.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
Cultura - UNESCO,publicou em 2020, um alerta para a necessidade de
inclusão nas aulas a distância durante a pandemia e divulgou uma
lista de recomendações1 às escolas para o ensino à distância,
prevendo a inclusão de pessoas com deficiências. Entre as
recomendações estão: escolher as melhores ferramentas e
tecnologias disponíveis para o ensino remoto; assegurar programas
inclusivos, o que pode exigir instalar equipamentos dos próprios
laboratórios de escola nacasa dos estudantes, para que estes possam
de fato participar das aulas a distância; criar comunidades e aumentar
a conexão, promovendo diálogo constante entre professores da sala
de aula comum e profissionais do Atendimento Educacional
Especializado (AEE), tal como deles com estudantes e familiares,
172
favorecendo a troca de experiência e a criação de estratégias para
enfrentar dificuldades; etc.
A jornalista Mariana Rosa, autora do blog e do livro “Diário de
Alice” e ativista da inclusão comenta, em um artigo para o Portal
Lunetas2, que a adoção das vídeo aulas como única ou principal
estratégia de manutenção do vínculo entre professores e alunos,
revela uma preocupação apenas em retornar o curso do que já havia
sido planejado, sem levar em conta a diversidade de desafios que se
apresentam, nem a adaptação do currículo para a compreensão do
momento atual. Cenário o qual crianças como as que possuem
deficiências que não souberam ou não tiverem condições de
responder à proposta ficaram excluídas.
Metodologia
2Artigo intitulado “As crianças que são deixadas para trás” publicado no Portal
Lunetas e disponível em: https://lunetas.com.br/as-criancas-com-deficiencia-que-sao-
deixadas-para-tras/
173
de todas as escolas ocorreu pela ferramenta digital WhatsApp, que
também foi o principal recurso para a coleta de dados.
As participantes da pesquisa foram duas professoras e uma
professora intérprete que atendem alunos surdos. Desse modo, nossa
amostra será composta por três participantes.
As perguntas elaboradas para o questionário buscaram identificar
que ações estão sendo desenvolvidas durante o ensino remoto junto
à alunos surdos nas escolas pesquisadas localizadas na cidade de
Codó/MA.
Como já mencionado, a pesquisa foi realizada em três escolas do
município de Codó/MA: uma escola da educação infantil – que será
identificada neste trabalho como CMEI A B; uma escola do Ensino
Fundamental - que será identificada como Escola Municipal M.C; e um
Centro de Educação Especial - que será identificada como Escola E.E.
A pesquisa no CMEI A.B, situada no Bairro Codó Novo – um dos
bairros mais populosos do município e que existe um índice muito
grande de famílias em risco devulnerabilidade social, com famílias sem
estrutura financeira, e muitos índices de mães solteiras, que
matriculam seus filhos para trabalhar muitas vezes em casa de famílias
e que possuem também muitas famílias que têm uma única renda
(Bolsa Família), o que ajuda na efetivação das matrículas das crianças
para a manutenção no Programa.
A instituição de ensino tem 5 turmas, que funcionam manhã e
tarde e atendem crianças entre 3 a 5 anos. Atualmente a escola atende
uma criança com deficiência auditiva que faz tratamento em São Luís,
capital do Maranhão. A mãe está tentando conseguir um aparelho
auditivo para ela. A professora da referida aluna – identificada aqui
como M.C.R – tem 6 anos de experiência profissional. Ela nos relatou
que não tem formação na área e que, durante o ensino remoto, usa as
mesmas estratégias de ensino para todos os alunos. Ela envia atividade
uma vez por semana, com o auxílio de vídeos e áudios. As
orientações são dadas aos pais dos alunos que fazem a devolutiva por
meio da ferramenta digital WhatsApp. Sua maior dificuldade no
trabalho com essa criança é não ter contato próximo para saber de
suas reais dificuldades.
A criança não está sendo alfabetizada e letrada em sua primeira
língua (L1) – Libras - mas em Língua Portuguesa (L2), fazendo
174
atividades de coordenação motora, pois a escola não tem professores
que sabem Libras e nem instrutores de Libras.
Verificou-se que o material didático utilizado em 2020, do pré II da
educação infantil, haviam sequências didáticas em Língua de Sinais,
mas foi observado que o de 2021 não tem. Ressalta-se que o material é
da mesma editora, mas as atividades em Libras foram retiradas, oque
aponta um retrocesso pois poderia ser um começo da educação
em Libras de alunossurdos e ouvintes na educação infantil.
A professora pesquisada não considera a escola preparada para
receber alunos com deficiência auditiva ou surdez. Inclusão, para ela,
é promover a garantia de direitos iguais a todas as pessoas com
deficiência, e que a inclusão não acontece totalmente na escola, pois
não dispõe de recursos didáticos específicos para alunos que
necessitam de apoio pedagógico, como também faltam capacitação
para professores do ensino comum regular e profissionais intérpretes
e instrutores que atendam esses alunos, para que se tenha um
atendimento educacional efetivo.
A Escola Municipal M.C está situada no Bairro São Sebastião – um
bairro bem desenvolvido em saneamento básico, próximo ao centro e
já apresenta famílias de classe média. A escola atende muitos alunos
que vieram da escola particular e também de baixa renda, os quais
participam do programa social Bolsa família.
Identificaremos, neste trabalho, a professora intérprete
entrevistada de L.A.S., que atende, atualmente, duas alunas surdas,
como intérprete.
L.A.S. Informou que estuda os conteúdos antecipadamente em
Libras para que possa interpretar para as alunas. Ela assiste as aulas
que o professor da sala de aula do ensinocomum envia, e depois
pesquisa aulas em Libras. Também realiza a leitura do material e faz
um resumo explicativo usando imagens e vídeos para que as alunas
consigam acompanhar as aulas.
A professora intérprete disse que quando elas têm alguma
dificuldade, ela entra em contato com os professores do ensino
comum para que sejam pensadas estratégias de ensino para ajudar as
alunas a participarem ativamente das aulas. Porém, a professora
relata que nãoé o mesmo aproveitamento que o ensino presencial.
Nas aulas, utiliza como ferramentas tecnológicas digitais: WhatsApp,
Google Meet, Instagram, e-mail, YouTube, entre outros que auxiliam
175
para o incentivo à aprendizagem das alunas surdas durante o
momento de isolamento.
Em seu trabalho, ela tem a ajuda dos pais e sempre conversa com
eles sobre a frequência das atividades que precisam ser feitas, e os orienta
quanto as dificuldades que as estudantes possam vir a sentir em casa. L.
A. S ressalta que a maior dificuldade das alunas é estudar o conteúdo, pois
no modelo remoto é tudo bem rápido e o tempo reduzido.
A intérprete relata que é o único apoio pedagógico, até agora, e
que inclusão é dar condições necessárias para que a pessoa que possui
necessidades especiais viva com dignidade e de modo igualitário. Para
ela, falta muito para que a inclusão aconteça efetivamente. Ao
perguntar se a escola estava preparada para receber os alunos surdos,
respondeu que não sabe se a escola está preparada nem pra receber
os alunos ouvintes.
Em relação a terceira escola pesquisada, constatamos que na
Escola E.E, que está situada no Bairro São Benedito, próximo ao Centro
comercial de Codó, atende todas as turmas, pois é a única escola
com Atendimento Educacional Especializado no Município.Tem 20
alunos surdos matriculados, distribuídos do primeiro ao sétimo ano do
Ensino Fundamental e classes com crianças de 4 e 5 anos.
Atualmente, durante o ensino remoto, a professora informou que
faz o possível para osalunos aprenderem, e que aqueles que têm ajuda
dos pais estão conseguindo avançar.
Contudo, ela confessou que se antes da pandemia já era bem
difícil, durante o contexto pandêmico, os desafios aumentaram. Isso
porque a maioria das famílias dos estudantes surdossão de baixa renda
e as dificuldades financeiras acabam implicando no acesso aos
recursos tecnológicos para o acompanhamento das aulas remotas.
Considerações finais
176
providências são: fornecer acessibilidade, recursos pedagógicos e
capacitação específica dos professores para que os alunos surdos não
só sejam incluídos, mas também participem ativamente.
Durante nossa pesquisa, viu-se a realidade da escola de Educação
Infantil ao encontrarmos apenas uma criança surda de 3 anos
matriculada e sem nenhuma referência em Língua Brasileira de Sinais
– sua primeira língua. Causou-nos surpresa encontrar em pleno século
XXI, quando tanto se discute sobre inclusão, que ainda exista no
município de Codó/MA crianças excluídas das atividades de sala de
aula, mesmo com as ferramentas digitais.
De fato, o Sistema Municipal de Ensino precisa se adequar, a Lei
de Diretrizes e Base da Educação (nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996), conforme o artigo 29, nos diz que aEducação Infantil, primeira
etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físicos,
psicológico, integral e social, complementando a ação da família e da
comunidade (Redação dada pela Lei n.12.796/13, de 4 de abril de 2013).
177
Verificou-se que a inclusão exige investimentos financeiros,
formação dos profissionais e compromisso por parte do poder público.
Tem que ser garantido os direitos dessas crianças, tanto ao acesso
como na permanência nas escolas.
A escola deve ser um espaço de inclusão e socialização do saber,
em que os alunos surdos e ouvintes, os professores e comunidade
escolar estejam engajados, objetivando o aprendizado, não somente
dos conteúdos, mas também aprender a conviver, a ser e a fazer,
respeitando as diferenças. Nesse sentido, a interação com o outro é
tão importante e necessária para que seja proporcionada iguais
condições de aprendizagem tanto aos alunos surdos quanto aos
ouvintes, diminuindo qualquer forma de preconceito que priorize as
aprendizagens instituídas nas diferenças.
Referências
178
_______. LEI Nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua
Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências. . LEI Nº 12.319,
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180
SOBRE OS/AS ORGANIZADORES/AS
181
Leitores, Alfabetização e Letramento. No Maranhão, desenvolve
pesquisas que estão relacionadas a Educação, História e História da
Educação, tendo investigado em sua tese de Doutorado os Faróis da
Educação do Maranhão. Desde 2011 Coordena Projetos de Extensão e
Pesquisa no Campus de Codó. Foi Coordenadora do Projeto PIBID ?A
iniciação docente em meio a afrodescendência, à alternância e o
ensino formal na zona rural de Codó? até 2014 e Coordenadora de
Gestão do PIBID até fevereiro de 2017. Atualmente Coordena o Projeto
de Residência Pedagógica no curso de Pedagogia. Entre os anos de
2017 e inicio de 2018, desenvolveu pesquisas de Pós-doutorado na
Binghamton University, NY, como Visiting Research Associate no
Fernand Braudel Center, New York State, USA, sobre os problemas na
alfabetização na Educação Básica de Codó. Em 2019 organizou o livro
O PIBID em terras de preto: a iniciação docente em meio às
experiências de educação no campo e de educação ambiental em
Codó-MA.
E-mail: [email protected]
182
SOBRE OS/AS AUTORES/AS
Anderson Ferrari
Pós doutor em Educação e cultura visual pela Universidade de
Barcelona/Espanha. Doutor em Educação pela Unicamp. Professor na
Faculdade de Educação da UFJF. Professor permanente do PPGE/UFJF.
E-mail: [email protected]
183
Danilo Araujo de Oliveira
Professor Adjunto da Universidade Federal do Maranhão. Doutor em
Educação (UFMG). Membro e pesquisador do GECC (Grupo de Estudos e
Pesquisas sobre Currículos e Culturas) e do Observatório da Juventude.
E-mail: [email protected]
184
com objetivo de induzir o aperfeiçoamento do estágio curricular
supervisionado, promovendo a imersão do licenciado na escola de
educação básica, a partir da segunda metade do curso. Residente
atuante na Escola Rosângela Moura, num período de setembro de
2018 à Maio de 2019.
E-mail: [email protected]
185
2016 foi Diretor Geral do Campus da UFMA em Codó. Em suas
pesquisas sobre História e Educação, a partir das escolas da Educação
Básica, com foco na exclusão, pobreza e analfabetismo de famílias
afrodescendentes na periferia da cidade de Codó, Maranhão, procurou
interpretar, a partir das relações históricas, qual a interferência da
pobreza e do analfabetismo na vida das famílias da comunidade do
bairro Codó Novo. Os dados dessa investigação fizeram parte das
pesquisas de Pós-doutorado na Binghamton University, NY, como
Visiting Research Associate no Fernand Braudel Center, no período de
fevereiro 2017 a fevereiro de 2018, nos Estados Unidos da América
E-mail: [email protected]
186
Luís Henrique Serra
Licenciado em Letras pela Universidade Federal do Maranhão, mestre
e doutor em Letras pela Universidade de São Paulo. Atua na
coordenação de Letras e é professor permanente do Programa de Pós-
graduação em Letras da Universidade Federal do Maranhão, campus
Bacabal. É líder do Grupo de Investigações do Ensino de Língua
Portuguesa e coordenador do projeto Variação Linguística e sala de
aula. São temas do seu interesse: ensino de língua materna, variação
linguística na escola e gêneros textuais e formação de leitores e
escritores na escola.
E-mail: [email protected]
187
Desenvolvimento Territorial Doutorado em Sociologia pela
Universidade Estadual do Ceará, área de concentração: Mobilizações
Sociais, Campo e Cidade Principais Atividades Acadêmicas (graduação
em Ciências Sociais 1998 - 2001) Monografia de conclusão de curso de
graduação em Sociologia versando sobre o tema geral mudança social,
envolvendo os itens criminalidade e religião, com o título Vida Bandida,
desenvolvida sob orientação do Professor Dr. Paulo Henrique Ozório
Coelho. Principais Atividades Acadêmicas (mestrado em Ciência
Política 2002 - 2004) Dissertação de mestrado sobre o tema segurança
internacional, com ênfase no contexto latino americano, com o título
El Condor Pasa: a guerra na fronteira entre Peru e Equador,
desenvolvida sob orientação do Professor Dr. Marco Aurélio Chaves
Cepik. Principais Atividades Acadêmicas (mestrado em
Desenvolvimento e Planejamento Territorial 2014-2016) Dissertação de
mestrado sobre o tema política agrícola e agronegócio, no contexto
do cerrado tocantinense, com o título Avaliação do Programa de
Desenvolvimento do Sudoeste do Tocantins (PRODOESTE),
desenvolvida sob orientação da Professora Dra. Margot Riemann
Costa e Silva. Principais Atividades Acadêmicas (doutorado em
Sociologia 2017-2022) Elaboração de Tese sobre o tema Políticas
públicas e capital social: uma análise comparada da atuação de
associações de agricultores irrigantes no Brasil e Portugal,
desenvolvida sob orientação da Professora Dra. Lia Pinheiro Barbosa.
Estágio em doutorado sanduíche na Universidade do Porto-PT entre
novembro de 2018 e maio de 2019 sob supervisão da Professora Dra.
Cristina Clara Ribeiro Parente (UPORTO).
E-mail: [email protected]
188
sobre História e Educação de Mulheres(GEPHEM)UFMACodó, que tem
como Orientadora Prof.Dra Kelly Almeida, que promove pesquisa em
parceria com a instituição de ensino estimulando a práxis de análise
crítica de sociedade. Atualmente seus estudos são voltados à
Educação e Políticas Publica em interface com a Psicologia Crítica,
Histórico-Cultural , e Social. É Diretora Administrativa da Associação de
Surdos de Codó-MA; É fundadora do projeto Ateliê Pedagógico que
visa atender crianças, adolescentes e jovens em situação de
vulnerabilidade social, promovendo cursos e oficinas na área das artes
como música, dança e teatro, como também incentivo e
aprimoramento de estudos com orientação pedagógica em tempos de
pandemia, prestar assessoria pedagógica no planejamento, e recursos
pedagógicos à professores.
E-mail: [email protected]
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