Você RH #88 - Out23

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W

FUGA DE TALENTOS RAM CHARAN


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ESTRATEGISTAS
O assédio estrangeiro segue firme. O consultor mais influente do mundo fala Henry Kissinger compara os estilos
Veja como reter os melhores funcionários. sobre as novas demandas dos gestores. de grandes líderes do século 20.

AS VANTAGENS E DESAFIOS DA

DIVERSIDADE Equipes com membros de várias etnias, gêneros e orientações


sexuais tendem a ser mais inovadoras e produtivas.
Mas nem todas as empresas sabem promover a inclusão – ou
se importam de fato com ela. Entenda o que precisa melhorar.
R$ 35,00
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CARTA AO LEITOR

A faculdade sem negros


Q
uando era moleque, eu morava num bairro Recebo esse tipo de material todo santo dia, de em-
onde as classes sociais se misturavam. Na presas dos mais variados portes e setores. Mas, com
turma da rua tinha branco descendente de tanta gente abraçando a diversidade no escritório,
alemão, de italiano, ruivos (meus irmãos), como explicar esses percentuais de trabalhadores
negros e meninas de família japonesa. Uns dizendo que ela é desnecessária? Uma consultora
quase ricos, outros quase pobres. Havia al- que me atendeu na apuração da reportagem trouxe
guns bem pobres também. a seguinte hipótese: há as empresas que realmente
Frequentei escola pública, e por lá essa mistura investem em diversidade com convicção, vestem
era bem parecida. No final do Ensino Médio, porém, a camisa da causa; e existem as que o fazem por
os muito pobres não davam mais as caras. Havia ne- obrigação, para não perder clientes nem receber
gros, mas não tantos quanto no meu bairro. Aí veio multas. Essas contratam pessoas com deficiência,
a faculdade particular (cara) e meu mundo mudou. por exemplo, sem se preparar antes para acolhê-las.
Não tinha nenhum negro na minha classe. Nem na Também penso que o mundo é mais complicado do
classe ao lado. Nem no bar onde a gente matava aula. que a gente gostaria. O ser humano parece um bicho
Não me lembro de ter visto algum nos quatro anos com dificuldade de lidar com quem não se parece
em que estudei ali. com ele. Isso exige um esforço para compreender o
Na reportagem de capa desta edição, menciono outro, suas motivações, origens, problemas – e pou-
uma pesquisa com funcionários americanos em que cos parecem dispostos para valer a esse exercício
só uma minoria vê importância em ter diversidade de empatia.
no seu ambiente de trabalho. Fiquei espantado com Felizmente, seja pela dor ou pelo amor, o tema da
os números. Por exemplo, só 18% acham importante diversidade hoje é incontornável nas empresas. E
que haja pessoas com orientação sexual diferente esse movimento, como explico na reportagem, vai
da deles, e 58% dizem que isso não teria relevância melhorar índices de produtividade e de inovação
alguma. Negros no escritório? Teve mais gente achan- nas companhias – algo com o que nunca vão se de-
do bobagem do que defensores da presença dessas sacostumar. Que logo a maior parte delas se pareça
pessoas na equipe. mais com a minha turma da rua do que com as salas
Pensei como essa pesquisa americana diverge dos e corredores brancos da minha faculdade.
conteúdos que recebo diariamente, como editor da
VOCÊ RH. São sempre empresas divulgando seu
apreço pela inclusão, seu aumento de mulheres na ALEXANDRE CARVALHO
liderança, seus programas de estímulo à diversidade. EDITOR-CHEFE

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 3


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SUMÁRIO ILUSTRAÇÃO DA CAPA:


LA MINNA

OUTUBRO / NOVEMBRO 2023

Os talentos brasileiros estão


sendo atraídos para fora do
país. Diante dessa realidade,
reter funcionários é um desafio
extra para o RH. P.44

22
SEÇÕES
POR UM ESCRITÓRIO EM QUE TODOS ENTREM
A diversidade traz vantagens competitivas para a empresa.
3 | CARTA AO LEITOR Mas muitas seguem despreparadas para a inclusão de fato.

BOLETIM 36 50

8 | Notas 60 | MELHORES PRÁTICAS


ESTRATEGISTAS PIJAMA OU TERNO?
Em seu último livro, Conheça a evolução do
Ambiente tóxico: As estratégias da
Henry Kissinger, ícone dress code através dos
o principal motivo Concentrix para garantir
vivo da geopolítica, tempos: do colarinho
de demissões. remuneração igualitária
compara os estilos de branco na Revolução
entre homens e mulheres.
liderança de grandes Industrial ao casual
12 | Macro
políticos do século 20. Friday na semana toda.
Os 5 momentos-chave 62 | NA ESTANTE
para engajamento, Apps e outras tecnologias
inclusão e performance. podem funcionar como 44 56
um segundo cérebro para
16 | Desafio do RH quem tem disciplina. BYE-BYE, BRASIL RAM CHARAN!
A Kenvue já As empresas estrangeiras Entrevistamos o indiano,
nasceu gigante. 66 | NA REAL estão atrás dos guru da liderança,
A solução para desenvolver nossos profissionais, considerado “o consultor
18 | Olhar da Presidente habilidades quando principalmente na área de mais influente do mundo”
Cynthia Betti, CEO da você já está no topo? tecnologia. E agora? Como pela revista Fortune, e por
Plan International. Viagens de experiência. segurar os talentos aqui? grande parte dos CEOs.

4 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 I LU S T R AÇ ÃO : D O N T R E E _ M / I S T O C K


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BOLETIM NOTAS
REPORTAGEM: LUISA COSTA

Crescimento
foi de 50%
no primeiro
semestre deste
ano em relação
ao mesmo
período de 2022.

AUMENTA A DEMANDA POR ESPECIALISTAS


EM OTIMIZAÇÃO DE GASTOS

S
erá que a sua companhia pais contratantes no momento são estavam crescendo”, afirma Genis
está supervalorizando al- indústrias químicas e de minera- Fidelis, gerente executivo da con-
gum salário? Ou pode se ção. O salário chega a R$ 20 mil. sultoria PageGroup. Algumas com-
dar melhor ao negociar Esses funcionários analisam panhias que aumentaram de tama-
com os fornecedores de tudo relacionado ao RH que pode nho em ritmo acelerado podem ter
benefícios? Esse é o tipo impactar o resultado financeiro de ido com muita sede ao pote na hora
de pergunta que um analista ou uma empresa. E não são procura- de amealhar talentos, oferecendo
gerente de remuneração sabe res- dos, necessariamente, quando uma salários não muito sustentáveis.
ponder. Não à toa, o cargo está em companhia está no vermelho – tam- Num segundo momento, então, elas
alta no mercado. bém quando ela percebe a neces- tendem a contratar especialistas
A demanda por esses profissio- sidade de se estruturar de maneira em remuneração para arrumar
nais aumentou 50% no primeiro mais estratégica. a casa.
semestre deste ano, em relação ao “Nos últimos dois anos, atende- Só cuidado para não exagerar
mesmo período de 2022. As princi- mos muitas empresas novas que nos salários deles ;)

8 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 F O T O S : G E T T Y I M AG E S


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AMBIENTE TÓXICO: O PRINCIPAL


MOTIVO DE DEMISSÕES
Falta de reconhecimento, de um plano de carreira ou de protagonis-
mo. Todos esses problemas não superam um ambiente de trabalho
tóxico quando o assunto é o motivo para pedir demissão.
Esta é, pelo menos, a opinião de 43% dos 387 entrevistados em
uma pesquisa da The School of Life, organização especialista em
inteligência emocional, e da Robert Half, empresa global de solu-
ções em talentos.
O primeiro passo para resolver o problema é, claro, identificá-lo.
“Para isso, os departamentos de RH podem adotar algumas estraté-
gias, como a aplicação de pesquisas de clima organizacional, a ava-
liação dos índices de turnover e a implementação de uma cultura de
feedbacks anônimos”, afirma Maria Sartori, diretora da Robert Half.
Uma vez diagnosticado o problema, é hora de agir. Para melho-
rar o clima do escritório, vale treinar as lideranças, promover o
desenvolvimento de soft skills e oferecer programas de apoio à
saúde mental.
Mas não espere resultados imediatos. Sartori alerta: “É preciso
ter em mente que a mudança não ocorre da noite para o dia, e que
criar e manter ambientes saudáveis envolve um esforço coletivo”.

CLIMA ORGANIZACIONAL
DOS COLABORADORES
32% SENTEM FALTA DE RECEBER
APOIO DE SEUS GESTORES.

AFIRMAM QUE UM AMBIENTE


64% ACOLHEDOR É O MAIS
IMPORTANTE NO TRABALHO.

DIZEM QUE OS GESTORES


NÃO ESTÃO PRONTOS PARA
61% ACOLHER COLABORADORES
COM QUESTÕES DE SAÚDE MENTAL.
Solução passa por treinar
as lideranças, desenvolver
DOS 387 LÍDERES ENTREVISTADOS soft skills e programas de
51% RELATAM CASOS DE QUIET QUIT-
TING EM SUAS ORGANIZAÇÕES.
apoio à saúde mental.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 9


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BOLETIM NOTAS
REPORTAGEM: LUISA COSTA

VEJA O QUE O RH PRECISA


SABER SOBRE O NOVO PAT –
E EVITE MULTAS DE ATÉ R$ 50 MIL
Desde 2021, o Programa de Alimentação ao Trabalhador
(PAT) está passando por alterações. Mas uma pesquisa
da empresa de benefícios Flash, no primeiro semestre
deste ano, mostrou que 42% dos profissionais de RH não
tinham conhecimento sobre as novidades na legislação.
Agora, há um novo decreto: o de número 11.678, pu-
blicado em 31 de agosto. Ele regulamentou mudanças
previstas pela lei nº 14.442, de setembro de 2022.
A multa inicial pela “execução inadequada das finali-
dades do auxílio-alimentação”, tanto para empregadores
como para empresas de benefícios, vai de R$ 5 mil a R$ 50
mil. Então fique atento – e vamos às novidades.
Aqueles programas de recompensa em que o consumi-
dor recebe de volta parte do valor pago ao adquirir um
produto (ou seja, que envolvem operações de cashback)
já estavam proibidos. Agora, o decreto pôs fim a benefí-
cios indiretos, como pagamentos de planos de saúde ou
odontológico, nos contratos selados no âmbito do PAT.
As verbas e os benefícios também não podem incluir o
pagamento de notas fiscais nem faturas ou boletos por
parte das operadoras de auxílio-alimentação. Inclusive
por meio de programas de pontuação.
O decreto também assegura a portabilidade entre car-
tões alimentação ou refeição de bandeiras diferentes –
significa que o funcionário poderá escolher o fornecedor
de benefícios que irá usar, independentemente da adotada
pela empresa.
A transferência poderá ser solicitada de forma gratui-
ta pelo colaborador, para uma conta do mesmo titular,
e cancelada a qualquer momento por ele. Quem fará a
transferência do crédito integral serão as instituições
O Programa de responsáveis pelas contas de pagamento.
Alimentação
ao Trabalhador Isso quando a portabilidade for mesmo colocada em
está mudando. prática. Porque o governo e as empresas ainda devem
Mas 42% dos
profissionais de discutir os riscos e a melhor forma de implementação
RH não sabem.
dessa portabilidade. Só então o Ministério do Trabalho
vai estabelecer de uma vez as condições dessa operação.

10 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 F O T O S : G E T T Y I M AG E S


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QUEM TRABALHA EM CASA PODE


TER PEGADA DE CARBONO MENOR
Os defensores do home office já têm um argumento a mais a seu favor: o
combate ao aquecimento global. Quem permanece no modelo 100% remoto
pode ter uma pegada de carbono 54% menor em comparação àqueles que vão
ao escritório todos os dias. Já quem adota o sistema híbrido, ficando em casa
até quatro dias por semana, pode contribuir para uma redução de 11% a 29%.
A conclusão é de um estudo feito por pesquisadores da Universidade Cornell
(EUA) e da Microsoft. Eles usaram vários conjuntos de dados para analisar
como diferentes fatores determinam a pegada de carbono dos funcionários –
como o tempo em que eles usam a energia de casa para trabalhar, a distância
percorrida até o trabalho e o compartilhamento de assentos no escritórios.
O engenheiro biomolecular Fengqi You, professor da Cornell e principal
autor do estudo, ressalta que o home office não é “zero carbono” – e que “os
Redução pode
benefícios do trabalho híbrido não são perfeitamente lineares”. Os pesquisa- chegar até a 54%
dores perceberam, por exemplo, que funcionários em modelo híbrido tendem em relação a quem
adota o modelo
a morar mais longe do escritório e, portanto, percorrem trajetos maiores de presencial todos
carro. Além disso, quanto mais dias de home office, mais frequentes são os os dias.

deslocamentos não relacionados ao trabalho.

O desconto no
salário acontece de
BENEFÍCIO DE ACADEMIAS VISA A
acordo com os dias
de frequência na
malhação. ALCANÇAR PEQUENAS EMPRESAS
Há um novo personagem no mercado de benefícios que levam funcionários à
academia. Trata-se do Namu Pass, que promete conquistar negócios de peque-
no porte e, assim, oferecer uma rotina de exercícios para mais gente.
Deuk Yeo, o CEO da Namu, defende que os modelos atuais de benefícios
tendem a favorecer quem já frequenta academia e trabalha em compa-
nhias grandes, justamente porque os valores da malhação não costumam
ser acessíveis para as pequenas.
O diferencial do Namu Pass é que ele não possui segmentação por planos ou
categorias nem opera com o pagamento de mensalidades. O benefício funciona
pela contratação de diárias em academias e estúdios – de ioga, crossfit, natação
e afins. Ou seja, só há desconto no salário se o colaborador realmente usar.
A ideia é que a empresa contratante pode sair ganhando ao depender do nível
de engajamento dos colaboradores em vez de pagar uma mensalidade salgada.
As academias, por sua vez, recebem por todos os check-ins em uma unidade.
Hoje, o Namu Pass abrange 1.400 academias em 20 estados brasileiros. A
expectativa é alcançar 5 mil até o fim de 2023.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 11


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5
BOLETIM MACRO - Gartner*

MOMENTOS QUE MAIS


IMPORTAM PARA ENGAJAMENTO,
INCLUSÃO E PERFORMANCE
12 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 ILUSTRAÇÃO: MIKKELWILLIAM / GETTYIMAGES | FREEPIK | ARTEM RIASNIANSKYI / UNSPLASH
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T
Todo segundo da sua vida importa,
é claro. Mas, para estar feliz e
produtivo na empresa, há momentos
realmente transformadores, que
têm um grande impacto sobre a
carreira do colaborador.
Um estudo da Gartner mostrou
que cinco deles, especialmente,
melhoram os sentimentos de justiça
(que proporcionam engajamento e
inclusão) e alteram o cansaço e a
saúde mental da força de trabalho (o
que influencia na sua performance).
OS LÍDERES DE RH Para chegar aos cinco momentos-
DEVEM IDENTIFICAR chave, a Gartner entrevistou mais
OS PONTOS-CHAVE de 3.500 trabalhadores de diversas
DA JORNADA DOS empresas ao redor do mundo.
FUNCIONÁRIOS E Os funcionários avaliaram como
FOCAR NAS SITUAÇÕES a experiência de cada situação
EM QUE HÁ MAIS afetou sua satisfação com seus
CHANCE DE IMPACTO empregadores. Confira quais
NA SATISFAÇÃO DELES. foram os destaques.

*EMPRESA DE BENCHMARKING GLOBAL DE CAPITAL HUMANO. CONTATO: [email protected] OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 13
CLUBE DE REVISTAS
BOLETIM MACRO - Gartner*

AS (5) HORAS DA VERDADE


Estes são os momentos que fazem a diferença na jornada do funcionário.

TER CONTATO RECEBER UMA ANÁLISE


COM UM LÍDER SÊNIOR DE SUA PERFORMANCE
Avanço: promove Avanço: ajuda a calibrar
conexões de alto valor. seu desempenho.

FAZER UMA
APRESENTAÇÃO
5 1 TER UMA

4 2
CONVERSA DE
DESAFIADORA PARA ORIENTAÇÃO COM

3
A EMPRESA SEU SUPERIOR
Avanço: facilita o
Avanço: dá a rota
envolvimento em
para o crescimento
experiências fora da
na carreira.
zona de conforto.

PARTICIPAR DE UMA APRENDIZAGEM


VOLTADA A SKILLS
Avanço: desenvolvimento de habilidades.

VANTAGENS PARA O FUNCIONÁRIO


Colaboradores que se dizem mais satisfeitos com os “cinco momentos que importam” relatam:

25% 32% 21%


DE GANHO EM
PERFORMANCE.
DE AUMENTO
NA INCLUSÃO.
DE AUMENTO NO
ENGAJAMENTO.

14 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


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BENEFÍCIOS PARA A EMPRESA


Organizações com maior facilidade para identificar e administrar esses momentos
desfrutam de quatro vantagens principais.

1 Melhor entrega da proposta


de valor prometido ao
funcionário (EVP).
2 Investimentos em
RH mais embasados
e direcionados.

3 4
Melhor percepção Soluções de RH que são
e relacionamento realmente relevantes
da equipe de RH. para os colaboradores.

DIFERENÇAS NOS RESULTADOS DE


SATISFEITOS E INSATISFEITOS
Funcionários que experimentaram todos os cinco momentos, mas ficaram insatisfeitos
com eles, tiveram um índice médio de performance de 45%, enquanto a dos colaboradores
satisfeitos com esses momentos subiu para 70%.
Veja as diferenças entre os índices nos quesitos performance, engajamento e inclusão.

70% 77% 78%


45% 56% 46%

PERFORMANCE ENGAJAMENTO INCLUSÃO

*EMPRESA DE BENCHMARKING GLOBAL DE CAPITAL HUMANO. CONTATO: [email protected] OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 15
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BOLETIM DESAFIO DO RH

O COMEÇO DE QUEM
JÁ NASCE GRANDE Daniel Tucci, diretor
de RH da Renault
Brasil: seis ações
gratuitas para cada
funcionário do grupo

FOCAR NA CULTURA Gisele Jakociuk,


diretora de RH:
ORGANIZACIONAL FOI O “O objetivo é
reforçar a ideia
CAMINHO DA KENVUE PARA de time único,
ALINHAR COLABORADORES conectando todas
as áreas”.
HERDADOS DA JOHNSON &
JOHNSON COM SEUS NOVOS
CONTRATADOS.
CAROLINE MARINO

16 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


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P
ense num bebê enorme. e o atendimento ao cliente”, diz. De E também para manter todos os
Criada a partir da decisão acordo com a executiva, a gestão funcionários informados sobre as
da Johnson & Johnson de de talentos foi um desafio crítico. mudanças, a visão da empresa
separar sua unidade de “Trabalhamos na identificação e os objetivos de curto, médio
consumo, a Kenvue mal das competências essenciais para e longo prazos. “Nossa cultura
chegou ao mercado (em o sucesso da empresa e garantir é trabalhada diariamente nos
maio deste ano) e já conta com uma equipe bem capacitada.” canais internos de comunicação
mais de 2,4 mil funcionários e Essa ação teve de ser realizada e nas ações integradas. O
um faturamento em torno de US$ em paralelo com a definição de objetivo é reforçar a ideia de
15 bilhões. Para se ter uma ideia cargos e funções, remunerações e time único, conectando todas as
dessa dimensão, a empresa ocupa benefícios. Tudo ao mesmo tempo. áreas”, explica.
um terreno de mais de 1 milhão de Entre as atividades para que
metros quadrados em São José dos Propósito da nova essa conexão saísse do papel, há
Campos (São Paulo). empresa fluiu pela encontros e eventos para falar
Nada mau para uma recém- comunicação interna de resultados, propósito, valores
-nascida. Mas esse tamanho Além de treinamentos sobre e comportamentos; cafés com a
também traz complicações: se, a cultura da companhia, liderança para aproximar os times
por um lado, garante holofote Jakociuk ressalta que foi preciso da alta gestão (e dar oportunidade
e credibilidade logo de cara, implementar uma estratégia para que todos possam fazer
também traz enormes desafios de engajamento interno e perguntas, sejam pessoais ou
para estabelecer os processos de comunicação para dar vida aos relacionadas ao negócio), além
RH – como fazem os negócios mais valores e propósito da Kenvue. de abrir espaço para sugestões de
novos, só que, neste caso, para melhorias e novas ideias.
uma estrutura mastodôntica. A Kenvue também adotou
Para lidar com a gestão de tecnologias específicas de
tanta gente em tão pouco tempo, recursos humanos para gerenciar
o primeiro passo da companhia foi todas as informações referentes
focar na cultura organizacional, aos funcionários, os processos de
definindo missão e valores. Isso avaliação para fornecer feedback
porque era preciso garantir contínuo e apoiar o crescimento
que os profissionais vindos da profissional. Com o objetivo
Johnson estivessem alinhados
com a visão da nova empresa e, A ESTRATÉGIA DE de manter o time dedicado ao
cumprimento das leis trabalhistas
ao mesmo tempo, assegurar que
as contratações fossem certeiras.
ENGAJAMENTO INTERNO e regulamentações, criou uma
área de compliance.
Tudo para que a companhia E COMUNICAÇÃO MANTÉM Um último ponto importante
operasse de forma eficaz desde desse alinhamento do negócio,
o início. É o que afirma Gisele OS FUNCIONÁRIOS destaca a diretora de RH, foi a
Jakociuk, diretora de recursos
humanos no Brasil da Kenvue. INFORMADOS SOBRE A implementação de estratégias de
diversidade e inclusão, de modo
“Esse movimento permitiu
começar com uma equipe
VISÃO DA EMPRESA E OS a promover um ambiente de
trabalho acolhedor a todos. Afinal,
experiente e, ao mesmo tempo,
graças aos novos colaboradores,
OBJETIVOS DE CURTO A nada como se sentir confortável
rapidamente numa casa nova.
impulsionar a agilidade, a inovação LONGO PRAZO.” E grande.

F O T O : D I V U L G AÇ ÃO OUT/ NOV 2023 VOCÊ RH 17


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BOLETIM OLHAR DA PRESIDENTE

COM O RH
Cynthia Betti, da Plan
International: “Quando
cheguei eu tinha uma sala.
Então dispensei aquele
espaço e hoje me sento
no meio da equipe. O RH
também tem de estar mais
próximo das pessoas”.

NAS VEIAS
CEO DA ONG PLAN INTERNATIONAL, CYNTHIA BETTI CHEGOU AO TERCEIRO
SETOR APÓS OCUPAR O CARGO MAIS ALTO DE RECURSOS HUMANOS
EM UMA GRANDE COMPANHIA DE SEGUROS – ONDE FOI DE ANALISTA A
DIRETORA. ESSA TRAJETÓRIA LHE DEU UMA VISÃO DIFERENCIADA SOBRE
CAPITALISMO CONSCIENTE E AS LACUNAS DO RH.
ALEXANDRE CARVALHO

R
aros CEOs de empresas têm intervalo no setor de planejamento
uma trajetória com uma visão estratégico. Essa jornada de carreira,
tão abrangente sobre o RH diz a própria executiva, serviu como
quanto Cynthia Betti. Desde uma preparação para os desafios que
2018, ela é a número um no enfrenta hoje no terceiro setor. Foi
Brasil da Plan International, uma quando sentiu na pele a resistência
organização não governamental ao protagonismo das mulheres e teve
de 85 anos, presente em 82 países, o primeiro contato com os preceitos
que se dedica a garantir os direitos do capitalismo consciente e seu foco
e as oportunidades das crianças no propósito das organizações – algo
carentes, principalmente meninas que teve grande influência em sua
– viabilizando acesso ao estudo, transição para a ONG.
melhorando as condições de sua Nesta entrevista, Cynthia Betti
comunidade e combatendo a compartilha essa perspectiva
exploração sexual. privilegiada de CEO com visão crítica
Antes de receber o convite para do RH, apontando caminhos e os
assumir essa posição, Betti trabalhou pontos em que tanto o C-Level como
por 16 anos na Mapfre Seguros, os profissionais de recursos humanos
passando a maior parte desse tempo poderiam melhorar. Sugestões
na área de recursos humanos, onde para que o setor cumpra todo o seu
galgou todas as posições. Foi de potencial: torne-se, ao mesmo tempo,
analista a diretora de RH, com um mais estratégico e mais humanizado.

18 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 FOTOS: CELSO DON I


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OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 19


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BOLETIM OLHAR DA PRESIDENTE

Ao longo da sua trajetória no RH Luluzinha”. E eu respondia: “mas aqui Não tinha. Em 2014, implantamos
da Mapfre, houve um período a gente vive no ‘clube do Bolinha’”. um conselho de diversidade na
em que você teve um intervalo Ainda assim, criamos um programa Mapfre quando ninguém falava
na área, indo trabalhar com de mentoria para mulheres que disso. Fomos a primeira seguradora
planejamento estratégico. Como poderiam ocupar cargos maiores. a assinar o compromisso do Fórum
foi isso e sua volta ao setor? Percebi que uma mulher num das Empresas LGBT [na época, a
Eu tinha de fazer o planejamento da cargo acima precisa puxar outras. sigla se resumia a essas letras].
empresa como um todo, de todas
as áreas. E aí passei a olhar o RH Essa percepção rendeu O que, então, abriu sua cabeça de
de fora, o que foi uma experiência outras reflexões sobre o vez em relação a essas questões?
incrível. Até que veio um convite ambiente corporativo? Fui a um congresso em Chicago
para voltar para a área de recursos À época, não tantas. Eu acreditava sobre capitalismo consciente.
humanos, mas aí já como diretora. muito em meritocracia. Vim de uma Saí de lá entendendo que a gente
Só que retornei com essa visão família muito simples, frequentei precisa ter um propósito. Para uma
estratégica, de cliente do RH, às vezes escola pública, comecei a trabalhar seguradora, o propósito dela é
não tão satisfeita com o que estava com 16 anos, fui balconista de proteger as pessoas. Mas os líderes
sendo oferecido. Minha missão era doceria... e cheguei lá. Só que eu sou vão perdendo essa noção ao longo do
mesmo aproximar o RH do negócio. uma mulher branca, né? De cabelo tempo. O foco vira dinheiro para os
claro, olhos verdes. E só percebi acionistas e bônus para os
Como foi essa mudança de estilo? isso quando vim para o terceiro executivos. Então virei a xiita do
Criamos, dentro do RH, uma área setor. Conseguimos colocar muitas capitalismo consciente. Houve
de controles e indicadores, e mulheres em cargos de liderança, gestores que me apoiaram nesse
transformamos tudo em números. mas quantas delas eram negras? caminho, mas outros eram contra.
Por exemplo, promovíamos diversos
treinamentos, mas muita gente Por que você decidiu deixar
não ia. Aí, sendo uma empresa de uma posição de diretoria
seguros, nós transformamos essas numa grande empresa para se
ausências em apólices. Falávamos: tornar líder de uma ONG?
“Vamos ter de vender mil apólices A decisão de sair foi muito bem

OS PRESIDENTES
a mais porque tantas pessoas não pensada. Eu fiz um coaching de
foram ao treinamento”. Começamos carreira, refletindo o que eu queria

PRECISAM DAR
a adequar a linguagem do RH à fazer nos meus próximos setênios...
linguagem do negócio, do C-Level. E eu me lembro de dizer: “Quando

A CANETA PARA
estiver aposentada, vou trabalhar
Que desafios você encontrou no terceiro setor”. Eu já pensava no

O RH. TÊM DE
nesse período? assunto em 2014, 2015, mas só fiz a
O principal foi a falta de diversidade. transição em 2018. Minha tristeza

COLOCÁ-LO EM
Eu era a única mulher e, conversando foi deixar a equipe que eu tinha.
com outras que tinham algum cargo Porque nós fizemos muita coisa,

CONDIÇÕES
de liderança, descobri que sempre mas fazer muita coisa ali me custou
havia muito mais homens nas equipes demais. Eu não sabia o que era

EQUIVALENTES
delas. Quando organizei um grupo de mansplaining, manterrupting... e vivia
mulheres para discutir essa questão, isso o tempo todo. Tinha dificuldade

ÀS DE UM CFO.”
alguns diretores passaram a dizer de me colocar nas reuniões, de ser
que eu estava criando o “clube da ouvida, respeitada. Chegou um ponto

20 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

EU NÃO SABIA O QUE


ERA MANSPLAINING,
MANTERRUPTING...
E VIVIA ISSO O
TEMPO TODO. TINHA
DIFICULDADE DE
ME COLOCAR NAS
REUNIÕES, DE SER
OUVIDA, RESPEITADA."

em que precisava ser mais gentil E como o C-Level poderia sobre o Estatuto da Criança e do
comigo mesma e seguir os meus melhorar a atuação do RH? Adolescente, fiz um curso a respeito
propósitos sem tanta rejeição. Os presidentes precisam dar a de violência contra a criança.
caneta para o RH. Têm de colocá-lo Foi uma imersão mesmo, para
O que poderia mudar para melhor em condições equivalentes às de entender a causa. Também precisei
nos profissionais de RH? um CFO, ou essa pessoa nunca vai aceitar meus limites. Na Mapfre,
Quando cheguei para liderar a Plan ter a mesma escuta das demais. havia problemas para resolver
International, eu tinha uma sala. Não só a escuta, mas a capacidade diariamente, e eu resolvia. Aqui eu
Então dispensei aquele espaço e hoje de interagir e influenciar na não resolvo. Estamos trabalhando
me sento no meio da equipe. O RH tomada de decisões estratégicas. contra a violência infantil, a
também tem de estar mais próximo exploração sexual, mas ela ainda
das pessoas. Em vez de haver um E como foi, para você, assumir existe e vai continuar existindo. O
departamento de recursos humanos a Plan International depois Brasil é o segundo país do mundo
apartado do resto da empresa, de tantos anos no RH? em exploração sexual. Compreendi
precisa ter um profissional de RH Cheguei com grandes missões, de que estamos impactando a vida de
trabalhando dentro do marketing, arrumar os custos, a estrutura, milhares de crianças, mas nunca
outro junto à operação... Para criar processos. E com o desafio de vai ser suficiente para resolver
entender a realidade das pessoas. aprender muita coisa. Fui estudar os problemas de todas.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 21


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GESTÃO

AS VANTAGENS E
OS DESAFIOS DA

DIVERSIDADE
EQUIPES COM MEMBROS DE VÁRIAS
ETNIAS, GÊNEROS E ORIENTAÇÕES
SEXUAIS TENDEM A SER MAIS
INOVADORAS E PRODUTIVAS.
MAS NEM TODAS AS EMPRESAS SABEM
PROMOVER A INCLUSÃO – OU SE
IMPORTAM DE FATO COM ELA.
ENTENDA O QUE PRECISA MELHORAR.

ALEXANDRE CARVALHO

22 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

I LU S T R AÇ ÃO : L A M I N N A OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 23


CLUBE DE REVISTAS
GESTÃO

“S
mos anos”, conta Michele Salles,
diretora de Diversidade, Inclu-
são, Equidade e Saúde Mental
da empresa – também ela uma
mulher negra. “Reconhecemos
que havia uma longa caminha-
da pela frente quanto à te-
mática racial e assumimos
compromissos importantes,
direcionando investimentos
internacionais para promo-
Sou uma mulher negra, te- ver uma agenda de equidade.”
nho 37 anos, moro até hoje no Segundo a executiva, o Dàgbá
Parque Novo Mundo. Estudei veio conectar as ações de di-
grande parte da minha vida em versidade a um processo real
escola pública e só consegui cur- de pertencimento das pessoas
sar uma faculdade por bolsa de negras. “Estamos trabalhando
estudos. Trabalhava e estudava esse tema pela discus-
ao mesmo tempo.” Essa é a his- são e entendimento
tória de vida de Carol Garrido – tanto da questão ra-
ou pelo menos parte dela. cial quanto do am-
No ano passado, essa mu- biente corporativo.”
lher de origem humilde teve a Além de Carol Garri-
oportunidade de participar do do, outros 11 colabo-
“Dàgbá – Líderes do Futuro”, radores negros foram
um programa da Ambev volta- promovidos na primeira
do aos funcionários negros. Os edição do programa.
integrantes do projeto foram
desafiados a desenvolver pro-
postas inovadoras com foco no “A BlackRock
negócio, e a equipe de Garrido acredita que
ficou em primeiro lugar. Como conselhos diversos
prêmio, ela ganhou uma viagem permitem que as
para Nova York. Será a primeira empresas gerem
vez que essa moradora da pe- valor para o
riferia de São Paulo vai entrar
num avião rumo a outro país. E
acionista.”
Comunicado da BlackRock, a maior
não ficou nisso. Por seu desem- gestora de fundos do mundo.
penho no programa, ela foi pro-
movida a uma posição de gestão
Nos ú lti mos a nos, assi m
estratégica. Tornou-se brand
como a Ambev, muitas outras
PR manager, liderando um time
empresas, de todos os setores
responsável pela comunicação
e tamanhos, têm investido em
e reputação de todas as marcas
promover uma cultura de di-
da companhia.
versidade dentro de casa. Um
“A Ambev passou por uma
trabalho que busca acolher e
transformação radical nos últi-

24 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

HOME OFFICE FACILITA


O TRABALHO DAS MULHERES
COM DEFICIÊNCIA
O ambiente controlado da casa dá mais
segurança psicológica para essas profissionais.

Segundo o relatório “Mulheres no Trabalho 2022”,


da consultoria McKinsey, a possibilidade do trabalho
remoto e híbrido foi particularmente benéfica
para as mulheres com deficiência – uma das mais
desafiadoras entre as interseccionalidades (quando
mais de uma pessoa carrega mais de um fator que
gera preconceito). Trabalhar em casa pode ajudá-las
a serem mais saudáveis e produtivas, uma vez que
é mais fácil gerir problemas de mobilidade, dores
crônicas e questões de saúde mental quando se tem
mais controle sobre o seu ambiente de trabalho.

No home office, as PCDs também se sentem mais


respeitadas e apoiadas. Ficam menos propensas
a sofrer microagressões, como ouvir comentários
negativos sobre sua aparência ou ter colegas
questionando abertamente suas qualificações.

Em casa, aumenta também a impressão delas sobre


a confiança que recebem de seus gestores. E se veem
mais confortáveis em falar abertamente com os
colegas sobre os seus desafios – uma boa dica para
o RH conversar com as profissionais de sua empresa
que têm essas condições.

I LU S T R AÇ ÃO : L A M I N N A OUT / NOV 202 VOCÊ RH 25


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GESTÃO

COMO OS PROFISSIONAIS
dar maiores oportunidades a
mulheres, negros, LGBTQIA+,
pessoas com mais de 45 anos
ou com deficiência.
Não é que todo mundo tenha
ficado bonzinho e empático com
VEEM A IMPORTÂNCIA DA
a dificuldade do próximo da noi-
te para o dia, claro. Enquanto
há as empresas que realmente
DIVERSIDADE
se dedicam a discutir e promo- Valorizam relativamente pouco, segundo esta
ver essas pautas por convicção pesquisa do Pew Research Center. Logo, esta é
e propósito, existem também as uma questão a ser resolvida.
que entraram na onda por obri-
gação. Ou para não ficar de fora MUITO IMPORTANTE TEM ALGUMA IMPORTÂNCIA NÃO TEM IMPORTÂNCIA
de negócios milionários.
A BlackRock, maior gestora TER DIFERENTES ETNIAS NO ESCRITÓRIO
de ativos financeiros do mundo,
publicou em 2022 um documen-
to com seus novos princípios de
investimento. A empresa, que
administra US$ 10 trilhões, in-
cluiu no topo de suas exigên-
cias para investir num negócio
32% 30% 38%
tópicos como a diversidade nos
DIFERENTES IDADES
conselhos de administração.
“A BlackRock acredita que
conselhos diversos podem pro-
mover uma maior resiliência na
liderança e na força de trabalho
e, por fim, permitir que as em-
presas respondam melhor às ne-
28% 34% 37%
cessidades de seus stakeholders
e gerem valor para o acionista MESMA PROPORÇÃO DE HOMENS E MULHERES
no longo prazo”, comunicou a
gestora de fundos. Por conta
disso, ela solicita aos conselhos

26% 29% 44%


das companhias que informem
como a diversidade é considera-
da em sua composição, incluin-
do gênero, etnia e idade.
Mas as lideranças mais avan- PESSOAS DE ORIENTAÇÃO SEXUAL DIFERENTE
çadas não precisam que gesto-
ras de fundos, ou seus próprios
clientes, exijam diversidade

18% 24% 58%


dentro da empresa. Elas sabem
que equipes mais diversas ten-
dem a gerar maior produtivida-
A soma não dá 100% porque os dados da pesquisa foram divulgados em números inteiros.

26 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


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Fabiana Santana, de e lucro para seus negócios. É


da Prometeon:
“Não tínhamos o que vários estudos têm com-
mulheres nem provado recentemente.
na limpeza
terceirizada. Havia Uma pesquisa da consultoria
uma eletricista, Gartner apontou que 75% das
mas nunca era
chamada”. organizações com uma cultura
diversificada e inclusiva exce-
dem suas metas financeiras.
Outra, do Fórum Econômico
Mundial, revelou que as empre-
sas com pontuações de diver-
sidade acima da média geram
45% de sua receita proveniente
de inovação, enquanto aquelas
abaixo da média ficam em 26%.
Sim, isso significa que equi-
pes com mais diversidade são
mais inovadoras.

“Há companhias
em que não existe
nem ambiente
para conversar
sobre inclusão.”
Reinaldo Bulgarelli, consultor
especialista em diversidade.

Mais um estudo, esse da Ca-


talyst, organização global volta-
da à inclusão feminina no am-
biente corporativo, mostrou que
empresas com mais mulheres no
C-Level conseguem um aumen-
to de 34% no retorno aos acio-
nistas em relação às diretorias
nas quais a presença é quase
toda masculina.
Mas por que a diversidade traz
tantos benefícios? A resposta
mais óbvia é que a sociedade é
diversa, os clientes são diferen-
tes. Então ter pessoas de carac-
terísticas distintas tomando de-
cisões na diretoria é responder

FOTO: CELSO DON I OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 27


CLUBE DE REVISTAS
GESTÃO

ao mercado com a multiplicidade de anseios e


perspectivas que ele tem. E juntar um pessoal
de origens e histórias diversas é colocar lenha
na fogueira das novas ideias. Mais: entender
de onde vem essa vantagem traz insights re-
levantes.
Por exemplo, quais são os mecanismos que
impulsionam os resultados por causa do au-
mento de mulheres na alta gestão? Um estudo
de 2021 publicado na Harvard Business Re-
view se debruçou sobre esse tema e mostrou
que ter uma presença feminina maior na di-
retoria muda a forma como a empresa pen-
sa – e também suas estratégias em relação à
inovação.
Com base em uma análise de mais de 150
companhias, os autores descobriram que, com
mais mulheres no topo, as empresas se tor-
nam mais abertas às transformações enquan-
to, ao mesmo tempo, ficam menos dispostas
a correr riscos. E isso tem uma explicação.
Para subir na organização, muitas mulheres
buscam se destacar promovendo mudanças e
apontando novos caminhos. Isso para supe-
rar os estereótipos de timidez de um grupo
que não costuma ser ouvido nem respeitado.
Porém a pouca representatividade na alta
gestão e os preconceitos aumentam os cus-
tos profissionais de cometer erros. Por isso,
elas aprendem a avaliar cuidadosamente os
perigos escondidos em suas propostas. Essa
combinação de características faz com que as
companhias possam se beneficiar de um equi-
líbrio entre inovação e mitigação de riscos.

As pedras no caminho
Pensando em todas essas informações, a receita
do sucesso parece simples: aumente a diversidade
e os resultados virão. Só tem um problema: as or-
ganizações, assim como a sociedade em geral, não
são esse mundo idílico onde os opostos se atraem.
Estamos falando de ambientes cuja tradição é de
maioria masculina, branca e heterossexual. Abrir
espaço para negros, pessoas trans, PCDs (pessoas
com deficiência) e mesmo mulheres em certos
negócios ainda é um desafio e tanto – que exige
sensibilidade e persistência do RH.

28 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

CONSCIENTIZE
SUA EQUIPE
Veja as dicas da consultoria Gartner para a empresa
disseminar um ambiente acolhedor à diversidade.

PROMOVA OS BENEFÍCIOS DA INCLUSÃO


Vincule a diversidade aos valores essenciais
da sua empresa. Vale usar métodos de
comunicação tradicionais, como pôsteres,
folhetos, e-mails diretos e vídeos, para
transmitir a mensagem da inclusão.

COMEMORE AS AÇÕES POSITIVAS


Celebre todos os sucessos e progressos
alcançados na adoção de comportamentos
inclusivos, por menores que sejam.

CRIE UMA ATMOSFER A ABERTA


PAR A DEBATER PONTOS DE VISTA
Esse tipo de ambiente reúne diferentes
perspectivas, o que pode derrubar preconceitos
e criar discussões ricas.

DESENVOLVA MÓDULOS DE FORMAÇÃO


Incentive o treinamento sobre diversidade e
inclusão – com palestras, por exemplo.

I LU S T R AÇ ÃO : L A M I N N A OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 29


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Criada em 2017 com a VOCÊ RH, apontou que,


divisão da parte industrial entre 555 profissionais,
da Pirelli, a Prometeon fa- 85,5% acreditam que
brica pneus para a indús- muitas empresas divul-
tria, o transporte de mer- gam um posicionamento
cadorias e passageiros, e voltado para diversida-
para o agronegócio. E é de e inclusão, mas que
uma empresa com uma na verdade não estão
prevalência masculina realmente interessadas
tão marcante que as mu- em ter uma agenda efe-
lheres, quando apareciam, tiva e prioritária sobre
não eram bem recebidas. o assunto.
“Não tínhamos mulheres As respostas vão ao en-
nem na limpeza terceiriza- contro da percepção de

75%
da. Havia uma eletricista, Carolina Ignarra, con-
mas nunca era chamada. sultora e CEO da Talento
Se vinha, precisava ter um Incluir, especializada em
profissional homem junto”, encontrar oportunidades
conta Fabiana Santana, de emprego para PCDs.
diretora de RH. “Todo dia aqui eu tenho
“Há companhias em que oportunidade de vender
não existe nem ambiente pessoas com deficiência
para conversar sobre in- como se vende xampu.
das
clusão”, afirma Reinaldo Porque tem empresa que
organizações
Bulgarelli, consultor es- com uma liga pedindo 80 PCDs para
pecialista em diversidade cultura um prazo de 40 dias. Mas
e secretário executivo do diversificada não fazemos isso, mesmo
Fórum de Empresas e Di- excedem perdendo dinheiro. Se
suas metas
reitos LGBTQIA+. “Hoje, quer 80 pessoas com defi-
financeiras.
com o avanço da agenda ciência num prazo tão cur-
ESG, esses negócios estão to, é para cumprir cota,
em risco, porque precisam não tem uma preocupação
adotar uma mentalidade em se preparar para rece-
que não faz parte da sua ber quem vai chegar lá.”
cultura. Muitas vezes, têm Vale dizer, o Brasil é
de lidar com clientes im- um dos poucos países que
portantes que mandam exigem das grandes em-
exigências quanto ao nú- presas cotas de vagas para
mero de pessoas negras e profissionais com deficiên-
mulheres na organização, cia. E, se há negócios que
e eles não têm ninguém. contratam PCDs por obri-
Nem estão preparados gação, existem também os
para ter.” que o fazem por convic-
Uma pesquisa da con- ção. É o caso do Citibank.
sultoria de recrutamen- Não que o acolhimento,
to Talenses, realizada nesse caso, também não
sob encomenda para a seja um desafio.

30 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 F O T O : G I L S I LVA


CLUBE DE REVISTAS

Michele Salles,
da Ambev:
“Reconhecemos
que havia uma
longa caminhada
pela frente quanto
à temática racial”.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 31


CLUBE DE REVISTAS
GESTÃO

Faltou puxar paração com negras heterosse-


para cima xuais. E que essa probabilidade
Quando, em 2019, o banco criou é ainda maior no caso de negras
grupos de afinidades para traba- transexuais. Há três fatores de
lhar a inclusão como um todo, os rejeição aí: são mulheres, são ne-
coordenadores descobriram que gras, têm uma orientação sexual
os PCDs não eram promovidos na que sofre preconceito.
empresa. Havia muitos em cargos
de entrada, mas a ascensão na
carreira era coisa rara. “Essas
“Tem empresa que
pessoas sentiam que não eram liga pedindo 80
observadas”, diz Antonio Afonso, PCDs para chegar
head de diversidade do Citibank, em 40 dias. Nesse
ele mesmo um cadeirante. “Então prazo tão curto
tivemos a ideia de promover uma só pode ser para
mentoria específica para PCDs,
cumprir cota.”
ensinando como criar networking
Carolina Ignarra, CEO da Talento Incluir.
e como navegar melhor no sistema
interno de vagas do banco. Come-
çamos esse trabalho em 2020, e Walleria Suri Zafalon, consultora
dentro de um ano a quantidade da Talento Incluir, sofreu para
de PCDs em cargos de liderança conseguir trabalho justamente
já aumentou 50%.” pela questão da interseccionali-
Afonso faz questão de ressal- dade. Ela é uma mulher trans com
tar um ponto fundamental: o da deficiência visual. “Quando ela se
segurança psicológica. “As pes- candidatava numa empresa que
soas confundem diversidade com contratava trans, esbarrava em
inclusão. Não são a mesma coisa. rejeição porque é cega. Quando
Diversidade é trazer para dentro. ia a uma que acolhia PCD, não a
Incluir é fazer com que as pesso- chamavam porque é trans”, conta
as se sintam confortáveis em ser Carolina Ignarra.
quem elas são, dando seus pontos
de vista e agregando valor.” O preconceito
dos times
Quando há mais de um Outro desafio diz respeito à cons-
preconceito a superar cientização das equipes: grande
Interseccionalidade. Essa palavra parte das pessoas simplesmente
difícil significa a interação entre não se importa com a questão da
dois ou mais fatores sociais que diversidade em seu ambiente de
definem uma pessoa. E é um com- trabalho. Uma pesquisa do Pew
plicador quando se trata de incluir Research Center, conduzida em
indivíduos nas empresas. fevereiro e envolvendo quase 6
Uma pesquisa da Catalyst com mil trabalhadores americanos,
2.734 mulheres mostrou que ne- apontou que poucos querem ter
gras homossexuais têm uma pro- gente diferente na equipe.
babilidade maior de sofrer racismo Só três em cada dez entrevis-
no ambiente de trabalho em com- tados afirmaram ser muito im-

32 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

Negras
homossexuais
têm mais
chance de
sofrer racismo
no trabalho em
comparação
com negras
heterossexuais.

portante trabalhar num


time de diferentes etnias
ou mesmo idades. Só 26%
valorizam que o ambiente
tenha uma proporção igual
de homens e mulheres.
E a coisa piora quando
se trata de profissionais
com diferentes orienta-
ções sexuais: apenas 18%
acham relevante ter pesso-
as LGBTQIA+ trabalhando
ao lado.
A mesma pesquisa mos-
tra como a percepção da
diversidade é diferente
se você pertence a um
grupo tradicionalmente
valorizado nas empresas
ou está entre aqueles que
pedem passagem. 78%

I LU S T R AÇ ÃO : L A M I N N A OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 33


CLUBE DE REVISTAS
GESTÃO

34 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 FOTO: CELSO DON I


CLUBE DE REVISTAS

Antonio Afonso, dos profissionais negros da mulher no espaço de


do Citibank:
“Diversidade é trazer
entrevistados disseram trabalho, e outras ações
para dentro. Inclusão que é importante para a que mudaram o ambiente
é fazer com que as
pessoas se sintam empresa investir em diver- da companhia. Em 2021,
confortáveis em ser sidade e inclusão. Entre os as primeiras motoristas de
quem elas são”.
brancos, o apoio à causa foi empilhadeiras começavam
bem menor: 47%. a circular nos centros de
distribuição. Outras ocu-
É preciso ter param posições no controle
paciência. de qualidade, fazendo a
Mas insistir inspeção final nos pneus.
Apesar de tantas empresas Os próprios colegas do se-
investirem em programas xo oposto reconheceram
ligados à diversidade, o fato a capacidade maior delas

85%
é que essa preocupação para identificar ranhuras
é recente. Ou não vería- e outros defeitos nos pro-
mos uma imensa maioria dutos. “Foi uma questão
de homens brancos hete- também de encontrar as
rossexuais no C-Level das posições certas para elas
companhias. A opinião dos dentro da empresa”, diz
especialistas é que os tra- Fabiana Santana.
balhos de aprendizagem e Há de se ter persistên-
conscientização, somado cia, como no exemplo
dos
aos programas de desenvol- dessa diretora de RH. E
profissionais
vimento de líderes e inclu- ninguém melhor que os
acham que
são mesmo na base, preci- empresas negros, as mulheres e a
sam ser constantes, porque falam de comunidade LGBTQIA+
a questão não é pontual, diversidade para saber quanto tempo
e devem envolver a maior sem ter levou para que conquis-
interesse
variedade possível de gente. tassem uma série de di-
real, aponta
Dos 45+ às mulheres e ho- pesquisa da reitos de plena cidadania
mens trans, dos PCDs aos Talenses. – alguns ainda em risco
negros, e sem nunca deixar de retrocesso.
de lado a equidade de gêne- Seria muito otimismo
ro – ainda que a presença esperar que, dentro das
das mulheres em cargos de empresas, a inclusão cor-
liderança seja uma realida- resse muito mais rápido
de mais tangível. Afinal, o que no resto da socieda-
trabalho firme nessa cons- de. Mas o comportamento
cientização dá resultado. no ambiente corporativo é
Como prova a fábrica de mais regulamentado que o
pneus pesados Prometeon. do indivíduo na rua ou no
Como parte dos esfor- mosaico de vozes das redes
ços do RH em sensibilizar sociais. E ele tem todo o
as lideranças, a empresa potencial para acelerar a
investiu em palestras men- igualdade também da porta
sais sobre a importância para fora do escritório.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 35


LIDERANÇA
CLUBE DE REVISTAS

GESTÃO E
ESTR ATÉGIA
SEGUNDO

AOS 100 ANOS DE IDADE, O MAIOR ÍCONE VIVO DA DIPLOMACIA E DA GEOPOLÍTICA COMPARA, EM
SEU ÚLTIMO LIVRO, OS ESTILOS DE LIDERANÇA DE PERSONALIDADES DO SÉCULO 20. VEJA AQUI
SUAS ANÁLISES SOBRE MARGARET THATCHER, KONRAD ADENAUER E CHARLES DE GAULLE.
LUISA COSTA

36 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 I LU S T R AÇ Õ E S : H E N R I Q U E P E T R U S


CLUBE DE REVISTAS

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 37


LIDERANÇA
CLUBE DE REVISTAS

P
latão, Sun Tzu, Maquiavel: todos
foram pensadores de peso que
refletiram sobre como ser um
bom líder. Agora, mais uma figu-
ra histórica se junta a esse time.
Trata-se de Henry Kissinger, o res-
ponsável pela política externa dos EUA
nos anos 1970, e que se tornou um ícone
do século passado.
Nascido na cidade alemã de Fürth,
em 1923, de família judia, ele esca-
pou da perseguição nazista ao se
estabelecer nos EUA em 1938. Lá,
estudaria história e construiria uma
carreira acadêmica em Harvard. Em
1954, ingressou no corpo docente da
universidade, tornando-se professor
de assuntos governamentais em 1962
e diretor do Programa de Estudos de
Defesa entre 1959 e 1969.
Mas foi seu livro Nuclear Weapons
and Foreign Policy (“Armas Nuclea-
res e Política Internacional”), de 1957,
que o tornaria uma autoridade em
estratégia. Nele, Kissinger se opunha
a um ataque nuclear massivo contra a
União Soviética, preferindo uma com-
binação de armas convencionais com
armamentos nucleares táticos, menos
devastadores. Seu livro posterior, The
Necessity for Choice (“A Necessidade
de Escolha”), de 1960, ia além, advogan-
do pelo uso apenas das convencionais
(de lado a lado, claro) no caso de um
conflito entre as superpotências. Acha-
va que o desenvolvimento de tecnologia
militar não deveria ser uma corrida à
toa, mas alinhado à estratégia exigida
em cada situação.
O brilho do seu pensamento não Konrad Adenauer
passou ao largo do governo americano. confessou os
crimes alemães
Entre 1969 e 1977, ocuparia os cargos na Segunda
de conselheiro para Assuntos de Segu- Guerra e aceitou
as penalidades.
rança Nacional e de secretário de Es- Assim, conquistou
a confiança do
tado (cargo equivalente ao de ministro resto do mundo
das Relações Exteriores no Brasil, só e reconstruiu a
Alemanha.
que mais importante, dados os ten-

38 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

táculos dos EUA pelo mundo). Permaneceu na função sobre como liderar sem deixar que as intempéries do
ao longo das gestões de Richard Nixon e Gerald Ford. passado impeçam um futuro próspero. E também sobre
Sua atuação durante a Guerra do Vietnã foi contro- como encontrar saídas para crises apesar das limitações
versa. Tanto adotou uma linha dura, com papel central que inevitavelmente aparecem – seja para o chanceler
no planejamento dos bombardeios no Camboja (1969 e da Alemanha ou para você, que está na gestão de uma
1970), quanto assumiu a frente das negociações de paz equipe no escritório ou tem de lidar com líderes no dia
que levariam à retirada das forças americanas do Vietnã. a dia do RH.
Por esse feito, receberia o Prêmio Nobel da Paz em 1973.
O conhecimento adquirido na política e na experiência Konrad Adenauer:
acadêmica permitiu que Kissinger escrevesse mais de a estratégia da humildade
uma dúzia de livros sobre política externa e diploma- Com 73 anos, Konrad Adenauer foi eleito chanceler da
cia. O mais recente é o best-seller Liderança (2023). República Federal da Alemanha em 1949. Recém-der-
São 500 páginas em que compartilha bastidores da rotado na guerra, seu país estava moral e politicamente
política internacional do pós-Segunda Guerra enquanto arruinado, com a economia também em frangalhos.
analisa a trajetória e as estratégias de seis líderes que, A tarefa de Adenauer, portanto, era reerguer seu
num momento crítico de transição, teriam moldado a país e restabelecer a soberania democrática para que a
ordem mundial. Alemanha, um dia, pudesse voltar a falar de igual para
Entre eles, vamos destacar três aqui: o chanceler igual com o resto da Europa – e do mundo.
Konrad Adenauer, símbolo do que Kissinger chama de Antes de assumir o cargo, Adenauer fez um discurso
“estratégia da humildade” ao reconstruir a Alemanha; afirmando que a Alemanha só poderia encontrar o
Charles de Gaulle, que teria investido na “estratégia da caminho para um futuro melhor reconciliando-se com
vontade” ao liderar a França; e Margaret Thatcher, cuja o passado – e que deveria buscar seu futuro dentro de
trajetória Kissinger considera marcada pela “estratégia uma Europa em unificação.
da convicção”, com a qual fez valer suas ideias contra Ali ele proclamava a postura que viria a adotar
uma oposição ferrenha no Reino Unido. enquanto chanceler – a qual Kissinger chamou de
Estudar suas trajetórias é uma maneira de aprender “estratégia da humildade”. Ela consistia em aceitar

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 39


LIDERANÇA
CLUBE DE REVISTAS

as consequências da derrota, confessando os


crimes alemães e aceitando com submissão
as respectivas penalidades. Mas também em
reconquistar a confiança dos países vitoriosos
e reconstruir uma sociedade democrática.
O novo estatuto de ocupação da Alemanha
foi apresentado oficialmente a Adenauer em
setembro de 1949, na sede do Alto Comissariado
Aliado (um conselho de vitoriosos da guerra para
administrar a Alemanha Ocidental). Adenauer
afirmara que não contestaria o prejuízo da
soberania do país – “mas aproveitou a ocasião”,
escreve Kissinger, “para demonstrar que o faria
com dignidade e respeito”. Violando o protocolo
da cerimônia, ficou junto aos três altos-comissá-
rios, indicando que a nova república insistiria em
ser tratada como um parceiro igual no futuro.
Ele acreditava que mostrar resistência às
várias medidas punitivas dos Aliados era um
tiro no pé. “Creio que, em tudo que fazemos,
devemos ter clareza de que nós, enquanto re-
sultado do total colapso, estamos impotentes”,
disse Adenauer em um discurso. “Não se pode
exigir e esperar confiança logo de cara. [...] ela só
pode ser recuperada lentamente, pouco a pouco.”
E, de fato, baixando a cabeça, mas sem perder
o norte de que lidava com o renascimento de sua
nação, Adenauer alcançou o que queria. Duran-
te seu mandato, a então Alemanha Ocidental
foi admitida na OTAN (Organização do Tratado
do Atlântico Norte, a aliança militar liderada
pelos EUA) e ajudou a fundar a Comunidade
Econômica Europeia, que mais tarde daria
origem à União Europeia.
Adenauer alertou que “nunca se deve con-
fundir energia com força”. Seu sucesso em
recuperar a reputação da Alemanha não foi
à base de músculo. Foi com jeito. Líderes de
empresas podem se inspirar em seu exemplo
quando as coisas não vão bem. Consultores de
RH falam com frequência na necessidade de
o líder assumir suas vulnerabilidades (e as da
Inconformado com a rendição da organização) para exibir a transparência que
França a Hitler, Charles de Gaulle
convocou seus compatriotas colaboradores e clientes esperam dele. É essa
a resistir. Uma obstinação troca que produz confiança. Um excelente ponto
que conquistou seguidores e
contribuiria para libertar Paris de partida para companhias que precisam cor-
dos nazistas em 1944. rigir erros do passado – ou de uma nova chance.

40 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

Charles de Gaulle: a fazer cada vez mais discursos


a estratégia da vontade incentivando a resistência. E
“A chama da resistência francesa proclamou a si próprio como líder
não deve se apagar nem se apaga- da França Livre: uma espécie de
rá.” Foi com essa declaração, na governo no exílio que continuava
rádio BBC de Londres, que Charles a lutar contra o Eixo. De início,
de Gaulle começava a entrar para a não havia muitos diplomatas e
história. O ano era 1940. O político políticos que o apoiassem – além
e militar francês estava exilado na do primeiro-ministro britânico
capital britânica, e o marechal Phi- Winston Churchill, uma exceção
lippe Pétain, chefe do autoritário de peso.
e antissemita governo francês de Exilado e solitário, De Gaulle
Vichy, havia assinado o armistício acreditava que estava predestinado
com as forças nazistas. Era uma a salvar seu país. E sua vontade
rendição: a resistência oficial do prevaleceu: ele conseguiu atrair
país à ocupação alemã chegava ao seguidores aos poucos, na Ingla-
fim. Mas De Gaulle partiu para uma terra e em colônias francesas, além
estratégia autônoma. de convencer os líderes dos países
A declaração na BBC convidava Aliados de que retomar a França
os franceses a se rebelarem contra era indispensável para ganhar
os invasores. Foi, segundo Kissin- terreno na Europa.
ger, “uma declaração [no mínimo] De Gaulle adotou a cruz símbolo
extraordinária de alguém ainda da mártir Joana D’Arc – outra figu-
completamente ignorado pela es- ra de uma vontade inabalável – co-
magadora maioria do povo francês”, mo bandeira de seu movimento. E,
um ministro subalterno e general ao longo de uma série de batalhas, a
de baixa patente. resistência liderada pelo obstinado
Àquela altura era difícil conceber De Gaulle foi se estabelecendo em
que De Gaulle se tornaria um líder territórios franceses. Até final-
mítico e símbolo da própria França. mente libertar Paris da ocupação
Mas ele se tornou. O militar passou nazista, em 1944.

Tipos de ESTADISTAS
São ambiciosos, mas não revolucionários. Buscam fazer

líderes o máximo, mas sempre dentro dos limites do possível.


Exemplos: Konrad Adenauer, Margaret Thatcher, Franklin
Roosevelt (EUA), Mustafa Kemal Ataturk (Turquia) e
Segundo Kissinger, Jawaharlal Nehru (Índia).
líderes podem
ser divididos em
duas categorias PROFETAS
de acordo com São líderes visionários cujo objetivo é transcender o status
a maneira como quo e romper com o passado. Esse estilo envolve mais
atuam: estadistas desarticulação e algum sofrimento, mas pode impulsionar
e profetas. E grande progresso. Exemplos: De Gaulle, Anwar Sadat
cada uma tem (Egito), Robespierre (França), Lênin (União Soviética) e
suas vantagens. Mahatma Gandhi (Índia).

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 41


LIDERANÇA
CLUBE DE REVISTAS

De Gaulle chefiou a transição histórica da França


de um império derrotado, dividido e sobrecarregado
para uma nação próspera sob uma constituição sólida.
Pela ótica de Kissinger, ele criou uma nova realidade
política graças a uma força de vontade ímpar. “Para De
Gaulle, a política não era a arte do possível, mas a dos
determinados.” Margaret Thatcher não
O estilo de liderança do herói francês exige força se curvou à oposição
quando implementou
emocional e paixão por uma causa. Seja na geopolítica, reformas econômicas
seja nos negócios. Líderes determinados são motivadores impopulares. A vitória
na Guerra das Malvinas
natos, inspiram suas equipes pelo exemplo, conquistam ajudou-a a conservar seu
aliados na empresa para seus projetos. Gente como a poder no Reino Unido.

empresária Ruth Handler, que, diante da descrença inicial


de seus colegas, persistiu no projeto que tinha em mãos.
Transformou uma boneca com corpo de adulta (algo es-
candaloso para os anos 1950) num dos maiores sucessos
comerciais de todos os tempos: a Barbie.

Margaret Thatcher:
a estratégia da convicção
Em 1979, a Europa teve finalmente uma mulher a
servir como primeira-ministra, no Reino Unido: Mar-
garet Thatcher. A antiga potência imperial estava
em declínio, com uma economia fraca e perdendo
importância mundialmente.
Defensora do conservadorismo e do liberalismo clássi-
co, a líder britânica adotou aquilo que Kissinger chamou
de “estratégia da convicção”: diante de uma resistência
feroz, implementou uma série de reformas econômicas,
que mais tarde receberia o apelido de “thatcherismo”. Ela
privatizou estatais, eliminou subsídios dados a compa-
nhias, reduziu despesas com serviços sociais, diminuiu
o poder de sindicatos e abriu o mercado financeiro a
investidores estrangeiros.
Só que, a princípio, os resultados não foram bons. A
indústria encolheu, e as tensões sociais aumentaram.
O desemprego disparou, de 5,3% em 1979 para 10,4%
em 1981.
Por outro lado, o setor de serviços cresceu com a
abertura econômica, e o de construção civil também,
graças a um programa que incentivou a aquisição de
moradias públicas.
E a situação melhorou. Um boom econômico ajudaria
a reduzir o desemprego no fim da década. Ainda assim,
Thatcher se tornou uma figura impopular, e o próprio
Partido Conservador ficou cada vez mais cético em
relação a suas reformas. Até que chegou uma grande

42 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

5 pilares da boa liderança


Para Henry Kissinger, estes são os fatores-chave para ter influência e conduzir outros.

1 COMUNICAÇÃO
É A CHAVE 2 NÃO ESPERE
CONSENSO 3 SAIBA LIDAR
COM RISCOS
Um bom Você dificilmente verá Isso é tão importante
líder comunica todos concordando quanto a capacidade
objetivos e busca ao seu redor. Para analítica, porque
apoio – porque agir mesmo assim, é um líder se apoia
depender da preciso coragem em certezas
coerção é sintoma para escolher uma relativas do passado
de uma liderança direção e caráter e ambiguidades
inadequada. para sustentá-la. do futuro.

4 SEJA CRIATIVO
Em momentos de transição, é preciso
avaliar quais legados devem ser
5 ACREDITE NO FUTURO
Para Henry Kissinger, “nenhuma
sociedade pode permanecer grande se
preservados e quais possibilidades perder a fé em si mesma ou se impugnar
devem ser descartadas. sistematicamente sua autopercepção”.

oportunidade política – e um dos ideias é parte essencial do que todo


principais motivos para ela não ter líder deve ter para atingir o propósito
perdido a eleição de 1983: a vitória de sua organização. O bom gestor
britânica na Guerra das Malvinas. deve, sim, questionar a si próprio.
Essas ilhas ficam 480 km ao leste Mas, uma vez formada sua convicção,
da Argentina. Território oficial do precisa agarrar-se a ela para atingir
Reino Unido desde 1833, as Malvinas seus objetivos. Thatcher livrou a
foram ocupadas pelo exército argen- economia britânica da ineficiência
tino em abril de 1982. estatal e conquistou popularidade
Thatcher investiu em recuperá-las ao vencer uma guerra em menos de
de maneira obstinada, sob muitas três meses. Líderes convictos como
críticas, mas contando com o apoio ela são agentes de transformação em
da população britânica e dos EUA. A suas empresas.
vitória veio em apenas 10 semanas, Concorde ou não com os posicio-
com um grande valor simbólico. Tha- namentos das lideranças preferidas
tcher afirmou que o Reino Unido dei- de Henry Kissinger, o fato é que
xava de ser “uma nação em retirada”. eles construíram uma nova ordem
Kissinger acredita que ela lide- mundial. Nesse caminho, escolheram
rou com tenacidade. "A convicção suas estratégias e se fixaram nelas
excepcionalmente forte e o ímpeto até atingirem suas metas – por mais
competitivo foram sem dúvida parte ambiciosas que elas fossem. É assim
do sucesso de Margaret Thatcher.” que se faz boa gestão, na política e no
Acreditar firmemente nas próprias mundo corporativo.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 43


CARREIRA
CLUBE DE REVISTAS

ASSÉDIO
INTERNACIONAL
AOS TALENTOS

44 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 I LU S T R AÇ ÃO : D O N T R E E _ M / I S T O C K

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CLUBE DE REVISTAS

A
pós 17 anos de carreira na
indústria automotiva, a en-
genheira Ana Carolina Sorbo
quis ampliar os horizontes.
Com bagagem nos mercados
latino-americano, norte-
-americano e asiático, ela tinha um
alvo em mente: a Europa. Trabalhar
no continente, pensava ela, seria
uma boa estratégia de crescimento
profissional e pessoal – a qualidade
de vida do Velho Mundo, é claro,
contava pontos.
Até que o grande momento chegou:
a engenheira recebeu dois ótimos
convites para concretizar seu pla-
no. Não houve contraproposta da
montadora na qual trabalhava que
segurasse sua então head de geren-
ciamento de projetos. Em 2021, a
engenheira embarcou para Munique,
na Alemanha, onde assumiu o cargo
de head de lançamento e expansão
da Amazon. E ela não pretende voltar
ao Brasil tão cedo.
A executiva faz parte de um con-
tingente significativo de talentos
RESISTA QUEM PUDER: EMPRESAS ESTRANGEIRAS assediados por empresas estran-
ESTÃO ATRÁS DE PROFISSIONAIS BRASILEIROS, geiras. Não se trata do processo de
expatriar funcionários para outros
PRINCIPALMENTE NO SETOR DE TECNOLOGIA.
países, como as multinacionais fazem
E ISSO ACIRRA AINDA MAIS A DISPUTA POR há décadas. O fenômeno também não
COLABORADORES NUM MERCADO JÁ ESCASSO DE se refere às pessoas que emigram, na
MÃO DE OBRA. DIANTE DESSA REALIDADE, RETER cara e na coragem, em busca de uma
vida melhor. No cenário em questão,
FUNCIONÁRIOS É UM DESAFIO EXTRA PARA O RH.
são os nossos profissionais que estão
MARCELLA CENTOFANTI
recebendo propostas concretas para
atuar em companhias internacionais,
em modelo presencial ou remoto.
“O mercado de atração de talentos
está cada vez mais deixando de ser
local para se tornar global”, aponta
Lucas Toledo, diretor-executivo da
consultoria de recursos humanos
PageGroup. Embora não seja uma
invenção da atualidade, a diáspora
foi catalisada durante a pandemia

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 45

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CARREIRA
CLUBE DE REVISTAS

de Covid-19. Com todo mundo trabalhando de casa e


consumindo produtos e serviços online, a demanda por
profissionais das áreas tecnológicas e digitais explodiu.
4 PONTOS PARA A
A necessidade de mão de obra especializada nesse
campo é tão grande que despertou o desenvolvimento
de políticas públicas em alguns lugares. O governo
RETENÇÃO DE TALENTOS
Não existe bala de prata que evite a fuga de
israelense estruturou, neste ano, um programa para colaboradores para o exterior. Mas algumas
atrair pessoas com alta qualificação em tecnologia. medidas podem ajudar a mantê-los motivados.
No Canadá, uma iniciativa para a contratação de es-
trangeiros recrutou mais de 32 mil trabalhadores entre
abril de 2022 e março de 2023, sendo o Brasil uma das
1. ENGAJAMENTO
O primeiro ponto para reter trabalhadores é
principais fontes de capital humano. Na mesma linha,
vê-los sempre entusiasmados. Não que seja simples.
países escandinavos estão oferecendo pacotes de resi- Segundo um relatório da Gallup divulgado neste ano,
dência para seduzir gente para esses locais. 72% dos brasileiros não se sentem engajados em seus
postos de trabalho. “O RH não é o dono desse tema na
E o Brasil fica na seca empresa. O seu papel é ajudar os gestores e as áreas
a terem ferramentas para engajar as pessoas”, afirma
Enquanto isso, nosso país terá um déficit de 530 mil
Alexandre Benedetti, da Talenses. O tema atravessa
profissionais em tecnologia até 2025, segundo um rela- vários passos da jornada de um empregado, da
tório divulgado em maio pelo Google em parceria com contratação ao desligamento humanizado.
a Associação Brasileira de Startups (veja no quadro).
Para tentar reduzir o abismo, a Associação Brasileira
das Empresas de Software (Abes) criou, em 2022,
a plataforma RHTech, com oferta de vagas e cursos
gratuitos promovidos por Microsoft, IBM, Oracle, entre
2. CULTURA
A satisfação de um trabalhador está ligada ao
outras fontes. “A gente precisa fazer alguma coisa como ambiente em que ele atua. A organização oferece
país para melhorar a competitividade em termos de segurança psicológica? Promove ações sociais, nas
atração de mão de obra”, diz Jamile Sabatini Marques, quais os empregados podem se engajar durante o
gerente de fomento e inovação da Abes. horário de trabalho? “Tem muita gente que fica na
empresa ou que dá uma nota melhor para ela por
Se já está difícil encontrar talentos, retê-los é um
sentir que está, de alguma forma, contribuindo para
desafio ainda maior. O real desvalorizado aumenta a a sociedade”, aponta Lucas Toledo, do PageGroup.
atratividade por salários em moeda forte. As ofertas
internacionais chegam via headhunters, consultorias,
redes sociais e softwares de recrutamento. “Teve um
momento na pandemia em que as ofertas ficaram muito
agressivas, porque havia uma abundância de venture
3. FLEXIBILIDADE
Para Toledo, várias organizações estão chegando à
capital ajudando as startups a crescer. Esse movimento conclusão de que o modelo híbrido é mais indicado
diminuiu um pouco, mas ainda continua, sobretudo para o negócio. “Os profissionais querem flexibilidade
quando a gente fala de bons profissionais”, afirma Leo- para trabalhar de casa, chegar depois do rodízio e ter
licença parental estendida. Esses fatores aumentam
nardo Ferraz, diretor de pessoas da ClearSale, empresa
a atratividade da empresa no mercado.”
de tecnologia antifraude.
Em seus cálculos, dez dos 2.500 assalariados da
companhia foram assediados por organizações gringas
nos últimos anos. Pode parecer pouco, mas a perda de
posições estratégicas representa uma ameaça em um
4. TREINAMENTO
Desenvolver as habilidades pessoais das lideranças,
mercado onde os talentos são disputados a tapa. “Al- de um lado, e capacitar o time técnico, de outro, são
guns funcionários, nós conseguimos reter. Com outros, medidas que melhoram a convivência, o desempenho
fomos transparentes em explicar que não havia o que e o engajamento da equipe.

46 VOCÊ RH OUT / NOV 2023

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CLUBE DE REVISTAS

Leonardo Ferraz, da
ClearSale: “Conseguimos
reter alguns funcionários.
Com outros, fomos
transparentes em explicar
que não havia o que fazer.
Tinha gente com proposta
para ganhar o dobro”.

fazer. Tinha gente com proposta para ganhar especializada em remuneração.


o dobro”, conta Ferraz. Em 2021, quando a companhia entrou na
Num dos casos, tratava-se de um brasileiro bolsa de valores, somente 30 membros da alta
que morava no Canadá. Até aí, nenhum proble- gerência tiveram direito a cotas de ações como
ma, uma vez que a ClearSale adotou o modelo prêmio. A proposta foi ampliar o benefício para
remoto e não pretende voltar ao presencial. até 200 colaboradores, de qualquer nível hie-
Só que, passados alguns anos, o colaborador rárquico. “Se a pessoa tem um conhecimento-
preferiu mudar para um empreendimento -chave, alto potencial ou está no plano de su-
local e receber em dólares canadenses – como cessão, torna-se elegível ao programa”, explica
“Quem mais sofre
competir? Em outra situação, a companhia Ferraz. Atualmente, os papéis da ClearSale
são as empresas
tentava atrair um pesquisador para seu time de contemplam cerca de 150 funcionários. Nesse
sem um bom
desenvolvedores. Quando o universitário estava clima interno grupo seleto, a retenção é duas vezes superior
prestes a assinar contrato, recebeu um convite ou aquelas com à do resto da organização.
de um concorrente na Califórnia e titubeou. profissionais Segundo Thamiris Morais, sócia da SG Comp,
Mas decidiu ficar no Brasil por causa da cultu- desengajados.” a medida vai além da questão patrimonial. “Tem
Lucas Toledo,
ra, da perspectiva de carreira e da autonomia um aspecto cognitivo envolvido, porque o cola-
diretor-executivo
promovidas pela ClearSale. do PageGroup. borador se sente valorizado pela empresa”, diz.
Na maioria das situações, o que pesa na deci- O diretor de pessoas faz coro: “A gente trabalha
são de partir é mesmo o bolso. Segundo Ferraz: o envolvimento do líder para escolher os cola-
“As propostas, do ponto de vista de carreira, não boradores, comunicá-los e celebrar a conquista
costumam ser tão atrativas. Muitas vezes, é um com eles. Tudo isso gera mais engajamento”.
sênior assumindo a posição de um júnior em
outro lugar, mas ganhando mais por causa do Por que o brasileiro
câmbio”. Para evitar a fuga de talentos sem en- é valorizado?
trar em guerra salarial, a ClearSale desenvolveu Embora o aumento salarial quase sempre faça
um projeto junto com a SG Comp, consultoria a diferença nas ofertas de trabalho, esse não é

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CARREIRA
CLUBE DE REVISTAS

você tem um profissional engajado,


Shirley Rodrigues, ele pode até olhar o que tem lá fora,
da Brasoftware: mas dificilmente vai sair”, diz. Lucas
“Como a gente tem
um canal aberto de Toledo, do PageGroup, concorda:
comunicação, antes “Quem mais sofre são as empresas
de qualquer decisão,
as pessoas nos sem um bom clima interno ou aque-
procuram. Não foram
conversas em tom
las com profissionais desengajados,
de barganha”. independentemente de serem pe-
quenas ou grandes” (veja no quadro).
Companhias maiores têm RHs
mais estruturados, com um leque de
benefícios bem aberto para retenção
de talentos. Por outro lado, é comum
que, nas grandes, o colaborador se
torne mais um número na planilha.
Já organizações menores não cos-
tumam ter um sistema de recursos
humanos tão robusto. Só que elas
podem compensar essa desvanta-
gem pela relação estreita com cada
funcionário.

Segurança
psicológica conta
o único motivador para o êxodo. Ale- multiculturais e multifuncionais. Empresa de gestão de contratos
xandre Benedetti, managing director Também de que gostamos muito de software e serviços online, a
da Talenses, consultoria especializada de trabalhar”, aponta Benedetti. Brasoftware aposta no bom clima
em recrutamento, aponta que a mu- para reter seus talentos. Do ano
dança acontece também por fatores passado para cá, quatro dos 270
intangíveis. “As razões que levam um “Os brasileiros colaboradores receberam ofertas
profissional a fazer uma transição para têm fama de boa para emigrar – três para Portugal
o exterior são pessoais, profissionais e uma para a Suécia. Por enquanto,
adaptabilidade e de
e monetárias, além da perspectiva de ninguém saiu. “Como a gente tem
médio e longo prazo, porque nos países
bom relacionamento um canal muito aberto de comuni-
desenvolvidos há mais segurança na interpessoal com cação, antes de qualquer decisão, as
carreira”, afirma. times multiculturais.” pessoas nos procuram. Não foram
Neste ano, a Talenses está em pro- Alexandre Benedetti, diretor da Talenses. conversas em tom de barganha,
cesso de recrutar mais de 30 profissio- mas de uma troca para entender o
nais brasileiros para duas companhias momento delas na empresa”, afirma
europeias, uma alemã e uma suíça, am- Mesmo que o canto da sereia Shirley Rodrigues, gerente de RH
bas do setor automotivo. Um dos pro- seduza uma parcela dos colabo- da companhia. “Olhando para o
jetos é um hub de tecnologia sediado radores, o executivo da Talenses mercado, nós temos um ambiente
em Portugal. Além do mesmo idioma, acredita que um funcionário feliz interno muito saudável.”
nesse caso, o brasileiro é valorizado provavelmente vai ficar onde está, Dois funcionários desistiram
por outras qualificações. “Nós temos ainda mais em se tratando de um da mudança para a Península
fama de boa adaptabilidade e de bom passo tão arriscado quanto uma Ibérica quando a área jurídica da
relacionamento interpessoal com times mudança para o exterior. “Se Brasoftware apontou a burocracia

48 VOCÊ RH OUT / NOV 2023

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CLUBE DE REVISTAS

necessária para conseguir o visto de dor. Cada certificado, que custa de novo endereço.
trabalho. A firma estrangeira não US$ 150 a US$ 5 mil, é emitido no A engenheira Ana Carolina Sorbo
se responsabilizaria pela papelada. CPF do profissional, não no CNPJ concorda que nem tudo são flores.
O terceiro colaborador assediado da empresa. Ou seja, se a pessoa sai Apesar de trabalhar menos do que
pela companhia portuguesa não da Brasoftware, leva a certificação no Brasil, ela dedica três horas por
enfrentaria esse problema, por ter com ela. Trata-se de uma aposta dia na Alemanha, de segunda a
passaporte europeu. Nesse caso, de risco, como parte da estratégia sexta, ao estudo do idioma local.
a medida para evitar sua saída foi para criar vínculo com o time. Por Além disso, precisa correr atrás de
transferi-lo de uma função téc- enquanto, tem funcionado. conhecimentos numa área que ain-
nica, com salário fixo, para uma da não domina. “Às vezes, eu penso:
área de negócios, onde agora ele Should I stay estava tão bom, ganhava bem, esta-
recebe comissões. or should I go? va acomodada e, de repente, me pus
Já a funcionária tentada a traba- Morar em um país seguro e ganhar numa situação que é desconfortável
lhar na Suécia decidiu usar seu pe- em dólar ou euro é bom? Óbvio que todos os dias”, reflete. Mas ela não
ríodo de férias, durante a apuração sim. Mas também tem seu lado ne- se arrepende. “É preciso estar em
desta reportagem, para conhecer o gativo, como tudo na vida. Apesar constante desenvolvimento.”
país. Se decidir manter o emprego de os rendimentos serem maiores De fato, deixar uma situação
brasileiro, terá um acompanhamen- em nações desenvolvidas, o custo de estável para trabalhar em outro
to de carreira para se desenvolver vida, principalmente o de moradia, continente não é para qualquer um.
por aqui. também tende a ser – assim como Muito menos para quem é apegado
Além da segurança psicológica, a os impostos, dependendo do país de à zona de conforto. Mas os atrativos
Brasoftware aposta na capacitação destino. Depois que a pessoa ganha que vêm de fora parecem cada vez
dos profissionais como forma de experiência em dois ou três anos no mais irresistíveis. E essa realidade
retenção. Há seis anos, criou uma exterior, ela pode voltar ao Brasil e obriga os RHs daqui a, também eles,
área responsável pela certificação receber um salário que talvez não sair de uma situação confortável. É
dos colaboradores. A empresa banca seja exatamente igual àquele, mas hora de ir à luta – com criatividade
cursos oferecidos pela Oracle, pela que valha mais, quando se coloca e benefícios que vão além da grana
Microsoft e pela AWS, entre outros, tudo na balança. Outro ponto que – para segurar o que há de melhor
como parte da jornada do trabalha- pega é a adaptação da família ao no talento brasileiro.

FUGA DOS PROFISSIONAIS DE TECH


Levantamento do Google em parceria com a Associação Brasileira de Startups
aponta as dificuldades de perspectiva de carreira nesse segmento por aqui.

84% 73% 60% 45%


dizem que o mercado concordam que existem afirmam que a remuneração pretendem ter iniciativas
brasileiro não desenvolve condições mais atrativas do mercado nacional não é de desenvolvimento, mas
o número de profissionais no exterior, esvaziando o competitiva comparada aos não dispõem de recursos
sêniores que deveria. mercado brasileiro. internacionais. necessários para isso.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 49

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CULTURA
CLUBE DE REVISTAS

A EVOLUÇÃO DO

AS REGRAS PARA ROUPAS NO TRABALHO NASCERAM NA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL, PARA DISTINGUIR GESTORES
DE OPERÁRIOS. AGORA, COM OS COLABORADORES DEMANDANDO MAIOR FLEXIBILIDADE – E ACOSTUMADOS AOS
TRAJES INFORMAIS DO HOME OFFICE –, É UM BOM MOMENTO DE REAVALIAR AS NORMAS.
BEL DUVA

50 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 I LU S T R AÇ Õ E S : DAV I AU G U S T O


CLUBE DE REVISTAS

A
pandemia acelerou a flexibilização do dress code, mas ela já estava em andamento. Nos EUA, por exemplo,
o faturamento com as vendas de ternos masculinos caiu de US$ 2,2 bilhões em 2013 para US$ 1,9 bilhão
em 2018. E estamos falando de um negócio que, em 1948, segundo a associação americana de fabricantes
de vestuário, representava US$ 12,5 bilhões em dinheiro de hoje.
Mas foi nos últimos anos que o tema ganhou força – e vem ocupando cada vez mais espaço nos debates.
“Já antes da pandemia eu era convidada para dar palestras em empresas tradicionais para incentivar o

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 51


CULTURA
CLUBE DE REVISTAS

dress code mais casual”, afirma a consultora de mo-


da Thais Farage. “O terno tem parecido tradicional
demais. Algumas empresas querem aderir à casuali-
dade justamente para soar mais modernas. E, claro, o
período de isolamento acelerou esse processo, assim
como alterou os formatos de trabalho.”
Um fato não tão difícil de entender. De acordo
com Sergio Gomes, CEO da Headhunters Academy,
uma escola de formação em recrutamento, o avanço
da flexibilização do dress code após a pandemia já
estava dentro do esperado. “Afinal, se uma pessoa
passa quase dois anos trabalhando de casa e depois
volta ao ambiente corporativo, é compreensível que
ela tenha expectativas por mais liberdade, conforto
e bem-estar. Algo similar com o que ela vivia no
home office.”
Essa declaração está em linha com uma pesquisa
feita entre 2020 e 2022, em 30 países e com mais
de 4 mil pessoas, pelo instituto britânico Barrett
Values Center a respeito do que o mundo espera das
organizações. Entre os valores que mais subiram de
posição, quando comparados às pesquisas anteriores,
estão adaptabilidade e bem-estar.
O headhunter relaciona esse resultado à redução
da rigidez nos códigos de vestimenta. “Os colabora-
dores se sentem eles mesmos [quando vestem o que
querem], e isso traz mais engajamento. O dress code
tem a ver com a capacidade de a empresa aceitar a
diversidade e acolher melhor a identidade individual
de cada funcionário”, afirma Gomes, refletindo sobre
um conceito que segue na contramão daquilo que
um dia foi.

Diferenciando o topo
do chão de fábrica
O dress code é tão antigo quanto a humanidade. Na
Roma do século 4, o uso de vestes de seda púrpura
era restrito ao imperador e a quem ele autorizasse
pessoalmente – o aristocrata que vestisse uma sem
tal permissão seria decapitado.
Não surpreende, então, que os códigos de vesti-
menta no ambiente de trabalho tenham começado
A roupa de trabalho da
justamente com as primeiras empresas modernas, mulher logo absorveria
a influência do dress
na Revolução Industrial do século 18. code masculino. Uma
O uso da camisa branca de escritório prevaleceu tendência que se
intensificou à medida que
justamente por se tratar de uma roupa fácil de sujar. elas passaram a disputar
Só seria possível usá-la se você definitivamente não espaços de poder.

52 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

colocasse a mão na massa. Com


o tempo, o pessoal da adminis-
tração passou a ser chamado de
white-collar (colarinho branco),
em oposição aos do chão da fábrica,
os blue-collar (colarinho azul), em
referência ao macacão azul escuro.
Foi também no século 18 que
europeus mais ricos começaram
a abandonar as roupas pomposas
e opulentas – que incluíam muito
veludo, joias pesadas, adereços

O QUE DIZ A LEI na cabeça e maquiagem (muita


maquiagem) –, para dar lugar ao
terno, transformando-o na roupa
Dentro de uma organização, nem
do homem de elite e de negócios.
sempre o ponto de vista do empregador
“Quando o ato de trabalhar passou
com relação ao dress code é o mesmo
a envolver a necessidade de locomo-
do empregado. E isso requer uma
comunicação clara. Ela pode ser ção frequente e o exercício de di-
baseada no artigo 456-A da CLT, versos tipos de tarefas ao longo do
adicionado na reforma trabalhista dia, a roupa do homem – não mais
em 2017. “Ele expressamente prevê a aristocrática, mas agora burguesa
prerrogativa de o empregador definir a – também mudou”, conta a personal
vestimenta no ambiente de trabalho”, stylist Thais Farage em seu livro
afirma o advogado trabalhista Rubens Mulher, Roupa, Trabalho.
Gama. Ou seja, como o texto da lei não Nesse contexto da modernidade
determina exatamente os limites dos
europeia, o homem de classe alta
códigos de vestimenta, cabe à empresa
agora ficava a maior parte do tempo
estabelecer o que pode e o que não pode
fora de casa e adaptou sua roupa,
ser usado no escritório – e dizer isso
tornando-a mais simples e discreta
expressamente nas regras.
Mas é necessário bom senso. O – diferentemente das mulheres do
advogado diz que o padrão de roupa topo da pirâmide, que seguiam em
deve considerar os dois lados. “O casa com suas vestimentas elabo-
limite da necessidade de proteção da radas e cheias de adornos.
imagem do empregador perante seus
clientes, como um escritório que queira O dress code não evoluiu
passar um ar de sobriedade, pode pensando na mulher
exigir terno e gravata de quem está na Na formalidade da virada do século
área de atendimento, mas talvez não
19 para o 20, as poucas mulheres
seja necessário exigir o mesmo de um
que trabalhavam em escritório se
arquivista, por exemplo, que não tem
vestiam assim: vestidos ou saias lon-
contato com o público.”
gas, blusas bem fechadas e cabelos
Por outro lado, o padrão de
vestimenta não pode expor o presos, enquanto os homens usavam
empregado, constranger, causar casacos e gravatas até mesmo em
desconforto ou agredir sua identidade. climas quentes (como no Brasil).
“Exigir roupas sensuais, por exemplo, Nas décadas seguintes, os ternos
está além do direito do empregador.” masculinos foram se tornando cada

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 53


CULTURA
CLUBE DE REVISTAS

INFORMALIDADE
VEM ASSOCIADA À
PERSONALIZAÇÃO
A demanda por mais bem-estar psicológico dentro
das empresas tem crescido. Parte desse cuidado
passa por reconhecer o seguinte: os funcionários
não querem ser vistos como mais um número numa
planilha. E um dress code uniformizado transmite
justamente essa mensagem, a de que não há
preocupação com a individualidade da pessoa.
Segundo a consultoria americana de recrutamento
Vintti, flexibilizar o dress code traz inúmeros
benefícios. “As pessoas vêm de diversas origens,
com vários costumes e tradições. Permitir que se
vistam de uma forma que se alinhe com sua cultura
as ajuda a se sentirem valorizadas e respeitadas”,
aponta um comunicado da consultoria. Veja todas as
vantagens dessa flexibilização, segundo a Vintti:

vez menos formais – porém continuaram sendo o padrão. Já


RETÉM TALENTOS as mulheres passaram a ter cortes curtos de cabelo, vesti-
Oferecer um dress code mais descontraído pode ser dos com linhas retas, mais simples, e algumas começaram
um argumento de venda para muitos funcionários, a usar golas, tendo como referência a camisa masculina.
especialmente os mais jovens, que valorizam a
Durante a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, muitas
expressão individual e a liberdade de escolha.
mulheres, em caráter de emergência, ocuparam os postos
de trabalho dos homens, convocados para os campos de
MELHORA O ENGAJAMENTO batalha. A entrada massiva de trabalhadoras nas empresas
Quando os colaboradores sentem que são fortaleceu a luta pela igualdade – e reverberou nos trajes.
respeitados o suficiente para se vestirem de uma
O ápice veio com a criação do tailleur Chanel, em 1954:
forma que os deixe confortáveis, adotam uma
conjunto de saia e casaquinho que é basicamente uma
postura mais positiva em relação à empresa e se
versão feminina do terno.
tornam mais comprometidos com o trabalho.

A cultura do “colarinho solto”


AUMENTA A CRIATIVIDADE Nos anos 1970, com mulheres já subindo na hierarquia cor-
Permitir que os funcionários se vistam de uma
porativa, as cores mais ousadas começaram a surgir. Para os
maneira que lhes pareça mais autêntica pode
ajudá-los a se sentir mais confiantes nas próprias
homens, ternos e calças coloridas estavam na moda: eram
ideias, o que leva a mais inovação na empresa. roupas que podiam ser usadas tanto no escritório quanto
na happy hour, práticas e ao mesmo tempo elegantes. Foi
o que a revista Esquire chamou de “ascensão da cultura
DÁ MAIS PRODUTIVIDADE
Quando os colaboradores podem usar roupas
do colarinho solto”.
mais confortáveis, é mais provável que fiquem Com as mulheres de fato disputando espaços e cargos
relaxados e à vontade. Isto pode levar ao de poder no mercado de trabalho, na década de 1980,
aumento da produtividade, pois eles se sentem os tailleurs receberam ombreiras largas, reforçando a
menos restringidos. estética masculina.

54 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS
O dress code também
tem a ver com a empresa
aceitar a individualidade
de cada funcionário.

continuaram fora de questão, claro, mas as


camisas polo passaram a ser aceitas – e em
todos os dias da semana, não apenas às sextas.

Camisa social e cueca (em casa)


Até que chegaram a pandemia e o home
office. E trabalhar de pijama, bermuda ou
só de roupa íntima, no calor, virou o padrão.
Nas videoconferências, a opção mais formal
na parte de cima não é necessariamente
seguida na parte de baixo, a que não aparece
na tela. E mesmo o corpo visível tem refletido
a vestimenta de casa. Não é raro ver diretores
de camiseta nas reuniões à distância.
Pensando nas companhias em que é de bom
tom preservar a formalidade mesmo nos calls,
duas empresas japonesas, Aoki e Anything Inc,
criaram um terno fake, que usa o mesmo tecido
leve do pijama, mas com corte semelhante ao
do traje sério.
Agora, com a volta gradual aos escritórios,
mesmo que no modelo híbrido, as demandas
Nos anos 1990, com exceção dos setores por mais flexibilidade no ambiente corporativo
mais formais da economia, um vestuário ins- se estendem às regras de vestimenta.
pirado no esporte começou a bater ponto nos Mas a questão é menos simples do que pare-
escritórios. Jeans e até moletons passaram a ce, já que nem todo mundo se sente bem num
ser aceitos, e o conceito de casual Friday, em espaço de informalidade totalmente liberada.
que as empresas permitem que seus funcioná- “A maneira como alguém se veste faz parte
rios venham com roupas mais descontraídas de sua autoexpressão. Mas também separa o
às sextas-feiras, começou a se estender pelo público e o privado”, escreveu a Economist no
resto da semana. fim de 2021, num momento em que os escritó-
“Quando o ato
Esse caminho em direção à informalidade rios voltavam a ser ocupados. “Tirar as roupas
de trabalhar
não tinha mais volta. Nos anos 2000, o Vale passou a envolver formais e vestir algo aconchegante marca
do Silício abraçou uma cultura de quebra de a locomoção uma transição diária do trabalho para o não
regras e de criatividade em detrimento da con- frequente, a trabalho. Essa linha ficou confusa durante os
formidade. Os homens ali já iam ao escritório roupa do homem lockdowns e poderia ser mais bem pensada.”
também mudou.”
de calças cáqui. E a moda athleisure (um termo A verdade é que a opção por uma maior
Thais Farage,
que mistura “atlético” com “lazer”) invadiu informalidade não deve sofrer um retrocesso.
consultora de moda.
de vez muitos ambientes corporativos, com As empresas precisam se adaptar ao que o
seus tênis de ginástica e calças de ioga – uma momento exige – e os líderes de RH terão um
tendência que se intensificou nos anos 2010. papel essencial nessa transição. O aumento do
Até o banco J. P. Morgan, ícone do setor dress code casual no local de trabalho é apenas
financeiro, divulgou um memorando interno um exemplo dessa mudança, à medida que os
em 2016, flexibilizando seu dress code. Os 240 empregadores reconhecem a importância de
mil funcionários do banco americano podiam criar um ambiente mais acolhedor. Vai ser di-
deixar seus ternos no armário e vestir trajes ferente de trabalhar no quarto, de pijama. Mas
mais informais. Camisetas, chinelos e regatas quem não quer se sentir em casa no trabalho?

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 55


ENTREVISTA
CLUBE DE REVISTAS

O GURU
Algo mudou nas transições de
carreira desde que você lançou o
modelo de Pipeline de Liderança?
Sim. Há uma grande mudança
e também uma continuação
dos fundamentos da liderança.
A mudança é o uso de novas

DA
tecnologias. Elas estão diminuindo
O INDIANO RAM CHARAN TORNOU-SE O CONSULTOR o número de transições. As
DE EMPRESAS MAIS CÉLEBRE DO PLANETA AO tarefas que não tinham como
DELINEAR AS TRANSIÇÕES PELAS QUAIS UM LÍDER ser feitas agora serão realizadas
PASSA AO LONGO DA CARREIRA. NESTA ENTREVISTA, pelos algoritmos. Na maioria
ELE FALA SOBRE AS NOVAS DEMANDAS DOS dos casos, a supervisão pessoal
GESTORES NUM MUNDO EM EVOLUÇÃO ACELERADA. não será mais necessária, então
ALEXANDRE CARVALHO haverá um estágio de liderança

LIDERANÇA
a menos nessa jornada. E
isso vai dar mais tempo para
os líderes se dedicarem ao
coaching, ao planejamento de
carreira, à expertise... Será
um grande passo à frente.

O que está mudando na


percepção das equipes
em relação às empresas
onde trabalham?

"O
A percepção é algo muito pessoal.
consultor mais influente apresenta as transições pelas quais Ela pode ser influenciada
vivo.” Assim a revista um gestor deve passar ao longo da pela comunicação interna da
Fortune se referiu a Ram carreira, desde o primeiro cargo de empresa ou pela personalidade
Charan, indiano de 83 anos chefe até a posição de CEO. Cada do profissional. Para que essa
que vive nos EUA – isso uma com as mudanças de atitudes percepção seja positiva, a chave é
quando não está viajando que o profissional deve ter no dia a descobrir como as pessoas estão
pelo mundo para visitar empresas. dia, suas novas responsabilidades se sentindo em seus trabalhos. Há
Não é para menos. Ele é reconhecido e tarefas das quais deve desapegar aquele que pensa “eu preciso do
internacionalmente pelo seu para ser um grande líder. meu emprego só para sobreviver”.
trabalho com boards e CEOs das Chamado a compartilhar sua visão E tem o que diz “nem consigo
maiores companhias do planeta. de carreira e liderança em todos sair da cama para encarar meu
Foi inclusive conselheiro pessoal de os continentes, esse profissional expediente”. Também podem ser
Jack Welch, o lendário CEO da GE. participou em agosto do evento visões melhores, como “estou
No universo do RH, Charan se Flash Humanidades, em São Paulo, totalmente imerso no meu
tornou uma referência incontornável que premiou as empresas com RH trabalho, porque amo fazer o
no conhecimento sobre gestão mais inovador do Brasil. Foi quando que faço” ou “as pessoas ao meu
desde que lançou, em 2013, seu deu esta entrevista exclusiva redor me apreciam”. Precisamos
livro Pipeline de Liderança. A obra para a VOCÊ RH. levar em conta que estamos

56 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 F O T O S : A L E X A N D R E X AV I E R


CLUBE DE REVISTAS

A APRENDIZAGEM
CONTÍNUA É O QUE ME
MOVE PARA A FRENTE.”
OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 57
ENTREVISTA
CLUBE DE REVISTAS

numa nova era de personalização.


Cada um de nós faz compras na
internet influenciado por uma
propaganda que conhece nossos
gostos. Escolhemos nossos
canais preferidos de streaming...
As empresas também precisam
ter um olhar personalizado
para cada colaborador.

Como os gestores devem


atuar nessa nova era?
Há uma regra muito antiga: se
você não cresce individualmente,
vai ser deixado para trás. Isso se
aplica a qualquer líder. É preciso
sempre estar conectado ao que
há de novo, ao que está mudando,
a como as novas tecnologias
duplicam ou triplicam nossa
capacidade. Motivar as pessoas
é colocá-las nos cargos certos.
Deixá-las fazer o que elas amam
fazer mais do que todo mundo.

Como a velocidade das mudanças


afeta o desempenho dos líderes?
Essa velocidade aconteceu muito
por causa da tecnologia. Só que a
mente é mais rápida que qualquer
tecnologia. Então os líderes
precisam ajustar isso. Eles já têm
uma mente presenteada por Deus,
não têm de se preocupar com ela.
O que precisam é adaptar seus
hábitos a essa nova velocidade.

QUASE TODAS AS INOVAÇÕES SURGIRAM Uma pesquisa de RH da


Gartner identificou a liderança

DE GRUPOS COM DIVERSIDADE. PODE SER humanizada como a nova


evolução da gestão empresarial.
DIVERSIDADE DE PENSAMENTO, DE ETNIAS, Como você vê isso?
Não, a liderança humanizada
DE VONTADE DE ASSUMIR RISCOS.” sempre existiu. Sem ela, a
sociedade nunca teria progredido.

58 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

Há cerca de cem anos, a gestão de assumir riscos. Até vencedores Como a inteligência
empresarial foi inventada para que do Prêmio Nobel contaram artificial pode influenciar no
tivéssemos indústrias. Em algum com pessoas muito diferentes planejamento de carreira?
ponto, essa gestão prevaleceu deles em seus trabalhos. A coisa mais importante é
sobre qualquer liderança. E isso entender o que a IA pode fazer por
vai mudar porque nós precisamos Hoje ouvimos bastante sobre a você. Toda a informação disponível
das duas, em proporções necessidade de se ter uma cultura já está no Google. Então aprenda
semelhantes. Há líderes ruins de de aprendizagem nas empresas. como ela pode te ajudar no uso
gestão e existem gestores que não Como você vê essa questão? desse conhecimento, e tente se
conseguem liderar com empatia. Uma cultura que estimule o antecipar, estudando do que ela
Ambos acabam demitidos. autoaprendizado é fundamental. será capaz num futuro próximo.
Antes da internet, nos Estados Porque a sua carreira precisará
Ficou mais difícil ser um Unidos, eles pegavam um ir nesse mesmo caminho.
líder agora que há modelos livro, discutiam por duas horas
flexíveis de trabalho e e aprendiam. A maioria dos Você tem contatos com
funcionários que demandam bilionários tem essa capacidade muitos líderes de empresas
mais de suas empresas? de aprender sozinhos. Nós no Brasil. Vê diferenças de
Não. A questão é o encaixe, como construímos os primeiros estilo entre os gestores dos
no esporte. Você tem de jogar na aviões sem um manual que nos diversos países em que atua?
posição em que se sai melhor. ensinasse. Se não praticar o Eu tenho vindo ao Brasil há 25
Mas a pessoa que fazia sucesso autoaprendizado, você morre. anos. Fui apresentado a muitos
25 anos atrás nessa função pode líderes. E, como sou indiano,
achar difícil se manter nela se também conheci muitos líderes
não continuar aprendendo ao na Índia. Aliás, como vivo nos
longo da vida. Já alguém das Estados Unidos, obviamente
novas gerações tende a encontrar conheço muitos líderes
mais facilidade. O líder tem de americanos. Nos EUA, percebo
perceber isso, orientar esses que eles têm os melhores na
profissionais, e vai ter sucesso na
sua gestão, independentemente
HÁ LÍDERES área de ciência. Já no Japão, por
exemplo, você encontra líderes
dessas mudanças.
RUINS DE GESTÃO muito disciplinados. Mas aprendi
que generalizar, na maioria das
Manter um ambiente de
diversidade é um desafio
E EXISTEM vezes, não é muito proveitoso.

difícil para os líderes?


Para ser criativo, você precisa
GESTORES QUE Você tem sido um guru de
liderança há muitas décadas.
ter pessoas diferentes em
torno de si. Mas as empresas
NÃO CONSEGUEM Qual motivação o faz continuar?
Esse estímulo foi descoberto
não prestavam atenção a isso.
Agora há essa atenção. Quase
LIDERAR COM logo na minha infância, pelo
meu povo. Eu faço o que estiver
todas as inovações surgiram de EMPATIA. ao meu alcance para aprender

AMBOS ACABAM
pequenos grupos com diversidade. algo novo. A aprendizagem
Porque elas requerem diferentes contínua é o que me move

DEMITIDOS."
inputs. Pode ser diversidade de para a frente. Me faz querer
pensamento, de etnias, de vontade prolongar o meu trabalho.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 59


CLUBE DE REVISTAS
MELHORES PRÁTICAS

MESMA FUNÇÃO,
NA CONCENTRIX
NÃO TEM “GERENTE
NÍVEL 2” E “NÍVEL
3”, COM ATIVIDADES
IDÊNTICAS E
REMUNERAÇÃO
DIFERENTE. GANHA

MESMO SALÁRIO
IGUAL QUEM TEM O
MESMO TRABALHO,
SEJA HOMEM
OU MULHER.
CAROLINE MARINO

A
equiparação salarial é tema estra-
tégico na Concentrix – empresa que
atua na área de soluções para a
experiência do cliente. Ao iniciar as
atividades no Brasil em 2014, depois
da aquisição da unidade de negócios
CRM Industry da IBM, a companhia
começou seu processo de gestão de
pessoas com a pauta da igualdade de
gênero muito bem definida – e como
parte essencial de sua cultura. Por
lá, todos têm direitos iguais, o que
inclui a remuneração: profissionais
com a mesma função ganham exa-
tamente o mesmo salário, desde o
nível operacional. Não importam as
Juliana Brito, gerente de
pessoas: manter poucos níveis diferenças entre os funcionários. Se
hierárquicos facilita a equidade. estão naquele cargo é porque mere-
cem um determinado valor. Ponto.

60 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 F O T O : D I V U L G AÇ ÃO

VCRH88 Melhores Práticas.indd 60 27/09/23 23:00


CLUBE DE REVISTAS

CONCENTRIX
Esse padrão é baseado em pesqui- e o diretor são apenas cinco níveis.
sas de mercado e nos conhecimentos, Esse sistema ajuda a evitar possí-
atribuições e habilidades exigidos para veis manobras para justificar salá-
cada atividade e área. “Ao receber- rios diferentes, como a contratação
mos o direcionamento global com de uma mulher como gerente 2 com ANO DE FUNDAÇÃO:

1983
os planos de carreira, começamos uma remuneração menor do que um
a preencher as posições sem ne- gerente 3 – mesmo que executem as
nhum viés de gênero, por exemplo, mesmas funções e tenham respon-
pois o importante é a capacidade e sabilidades iguais.
a senioridade dos profissionais para “É olhar para o ser humano, inde-
CHEGADA AO BRASIL:
desempenhar suas funções”, explica pendentemente de sexo, etnia, origem
Juliana Brito, diretora de pessoas da
companhia. O trabalho começou pela
análise das descrições dos cargos e o
ou idade. Não existe uma posição que
não possa ser desempenhada por uma
mulher ou que justifique um salário
2014
que exigiam de competências e perfil. mais baixo.”
Segundo a executiva, alguns pon- O trabalho de conscientização, UNIDADES:
tos são essenciais para o esquema principalmente dos líderes, também
realmente funcionar. O primeiro entra nessa lista. “Educar as pessoas SEIS NO BRASIL,
é iniciar a equiparação a partir da
base da hierarquia. “Se a empresa
é fundamental. Isso pode ser feito por
meio de cases de sucesso, palestras SENDO UMA EM
não fizer isso, pode até ter uma eco-
nomia num primeiro momento, mas
sobre vieses e dados de mercado a
respeito do valor da diversidade. A
FORTALEZA, UMA EM
vai alimentar um sistema desigual e
será muito mais difícil equiparar os
receita é informar, treinar e depois
implementar”, afirma.
BARUERI E QUATRO
valores mais para a frente”, diz. Ela
dá um exemplo: se um homem recebe
A diretora aponta que também é
importante contar com práticas que
EM SÃO PAULO.
R$ 3.000 no nível operacional e uma fomentem um ambiente de segurança

56,5%
mulher, R$ 1.500, a porcentagem de psicológica. “Ouvimos muito as pesso-
aumento em cada promoção nunca as para entender demandas e neces-
poderá ser de 100%, e isso vai criar sidades. No caso das mulheres, temos
um desequilíbrio muito grande. um grupo de afinidade para debater
O segundo é contar com uma des- os temas que são importantes para
crição de cargo muito bem definida, elas, como gestão do tempo, síndro-
como tempo exigido de experiência e me da impostora e mães com filhos dos cargos de liderança
skills. “Dessa forma fica muito mais neurodiversos.” Entre as iniciativas são ocupados por
simples desenhar e explicar promo- que surgem dessas conversas, o RH mulheres.
ções e movimentações”, afirma Brito. passou a questionar o horário e local
em que cada uma prefere trabalhar,

62%
SEM FIRULAS PARA JUSTIFICAR para conseguir alinhar a vaga às ne-
cessidades individuais.
DIFERENÇAS SALARIAIS Acolher a diversidade, afinal, vai
Outro ponto é contar com uma estru- muito além de uma remuneração jus-
tura organizacional horizontal, com ta. O ambiente favorável é fundamen-
menos níveis hierárquicos, o que dei- tal. Mas saber que seu salário será
xa os critérios de remuneração mais idêntico ao de qualquer colega com do quadro de
transparentes e claros para todos. a mesma função, sem dúvida, ajuda funcionários é constituído
Por lá, entre o agente de atendimento muito na construção desse ambiente. por elas também.

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 61

VCRH88 Melhores Práticas.indd 61


CLUBE DE REVISTAS
NA ESTANTE

EXPANSÃO

COGNITIVA
Tiago Forte revela, em Criando um Segundo Cérebro, que digitalizar com
disciplina os dados mais relevantes pode mudar a forma como lidamos com
a informação, ampliando nossa capacidade de organizar o conhecimento e
acessá-lo rapidamente em apps ou na nuvem – uma forma de aumentar a
produtividade e nosso poder de criação.

62 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 I LU S T R AÇ ÃO : B L AC K JAC K 3 D / GE T T Y I M AGE S


CLUBE DE REVISTAS

T
udo começou com uma leve dor de garganta. Ao longo de meses, Tiago Forte (autor americano de
mãe brasileira) viu seu organismo tomado por uma doença misteriosa. Foi perdendo a capacidade
de falar, engolir e até de rir. Os médicos, cada um pedindo exames diferentes, não chegavam a um
consenso. Um dos medicamentos que Forte recebeu o fazia ter graves perdas de memória. “Eu era um
jovem de 24 anos com a mente de um idoso de 80.”
Até que teve o que chamou de uma epifania. Resolveu assumir a responsabilidade pela sua saúde
e começou a digitalizar todas as informações sobre sua condição e os tratamentos que havia recebido.
Organizou os dados e passou a estudá-los, procurando padrões. “Eu me transformei no gerente de projeto
do meu problema de saúde.” Compartilhando suas anotações em arquivos de computador com seus médicos,
acabou descobrindo que sofria de um distúrbio que afeta os músculos que agem sobre a voz – uma condição
que não seria resolvida com remédios, mas com cuidados com o corpo.
Desde então, ficou obcecado pelo potencial da tecnologia para canalizar as informações ao seu redor.
E percebeu que a rotina de anotar todo tipo de dado relevante, seja num aplicativo ou num documento na
nuvem, poderia ser uma poderosa ferramenta de trabalho. Concluiu que quem explora bem os recursos
tecnológicos de modo a estender sua capacidade de lembrar e organizar informações se torna um tipo de
mutante: ganha um cérebro a mais. E, claro, ter esse poder cognitivo ampliado é um grande diferencial – seja
para seus assuntos pessoais, seja para se destacar na carreira.
O trecho a seguir da obra de Tiago Forte, Criando Um Segundo Cérebro, revela um pouco de como esse uso
da tecnologia pode substituir antigos padrões, conectar ideias e explorar todo o seu potencial criativo.

TRECHO DO LIVRO
Uma pesquisa da Microsoft mostra balho de lembrar. nas planícies da África Oriental.
que o funcionário americano médio Precisamos reconhecer que as Toda vez que gastamos energia
gasta 76 horas por ano procurando demandas cognitivas da vida mo- nos esforçando para recordar coi-
anotações, itens ou arquivos perdi- derna aumentam a cada ano, mas sas, estamos deixando de utilizar a
dos. E um relatório da International ainda estamos usando o mesmo cé- mente para aquilo que só os huma-
Data Corporation descobriu que um rebro de 200 mil anos atrás, quando nos são capazes de fazer: inventar,
profissional do conhecimento gasta os humanos modernos surgiram elaborar histórias, reconhecer pa-
26% do dia procurando e consoli-
dando informações espalhadas por
diversos sistemas. E, por incrível
que pareça, apenas 56% das vezes É hora de aTualizar nossa memória paleolíTica.
eles conseguem encontrar as infor-
mações necessárias. de reconhecer que não podemos “usar a
É hora de atualizar nossa me-
mória paleolítica. É hora de reco- cabeça” para armazenar Tudo que precisamos
nhecer que não podemos “usar a
cabeça” para armazenar tudo que saber, e de Terceirizar para máquinas
precisamos saber, e de terceirizar
para máquinas inteligentes o tra- inTeligenTes o Trabalho de lembrar.
OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 63
CLUBE DE REVISTAS
NA ESTANTE

drões, seguir a intuição, trabalhar bert Darnton, historiador e ex-di- próprio livro, marcado com sua
em colaboração com outras pesso- retor da Biblioteca da Universidade personalidade.
as, investigar novos assuntos, fazer de Harvard, explica o papel dos li- As pessoas instruídas utilizavam
planos, testar teorias. vros de lugar-comum: os livros de lugar-comum como
Cada minuto que desperdiçamos Ao contrário dos leitores mo- uma ferramenta para interagir com
tentando mentalizar tudo que te- dernos, que seguem o fluxo de o mundo. Recorriam a eles duran-
mos a fazer é um minuto a menos uma narrativa do começo ao te as conversas e os usavam para
que temos para atividades mais im- fim, os ingleses do início da era conectar conhecimentos de dife-
portantes, como cozinhar, cuidar moderna liam de forma intermi- rentes fontes e inspirar o próprio
de nós mesmos, praticar hobbies, tente, pulando de um livro para pensamento.
descansar e passar tempo com outro. Dividiam os textos em Como sociedade, todos nós po-
quem amamos. fragmentos, que agrupavam em deríamos nos beneficiar do equi-
Só há um problema: toda mudan- novos padrões ao transcrevê-los valente moderno do livro de lugar-
ça na forma de usar a tecnologia em seções diferentes de seus ca- -comum. Atualmente, a mídia foca
também requer uma mudança na dernos. Então liam de novo o que no que é novo e público – a mais
forma de pensar. Para de fato apro- tinham copiado e recombinavam recente controvérsia política, o
veitar o poder de um Segundo Cé- os padrões à medida que acres- novo escândalo de alguma cele-
rebro, precisamos ter um novo rela- centavam mais trechos. Assim, bridade ou o meme do dia. Res-
cionamento com a informação, com ler e escrever eram atividades suscitar o livro de lugar-comum
a tecnologia e até com nós mesmos. inseparáveis. Pertenciam a um nos permite conter essa maré, al-
esforço contínuo de entender as terando nosso relacionamento com
O legado do livro coisas, pois o mundo era repleto a informação e passando a focar
de lugar-comum de sinais: era possível transitar no que é atemporal e privado.
A prática de anotar os pensamentos por ele usando a leitura e, ao re- Em vez de consumir quantida-
para entender o mundo vem de lon- gistrar o que lia, você criava seu des cada vez maiores de infor-
ga data. No decorrer dos séculos, mação, poderíamos adotar uma
artistas e intelectuais, de Leonar- abordagem mais paciente e pon-
do da Vinci a Virginia Woolf, de derada que favorecesse a releitura,
John Locke a Octavia Butler, têm
anotado as ideias que consideram
um app de calendário a reformulação e o trabalho com
as implicações das ideias ao lon-
mais interessantes nos livros de
lugar-comum.
É uma exTensão go do tempo. Isso não só poderia
levar a discussões mais civiliza-
Popularizado num período an-
terior ao da sobrecarga de infor-
do cÉrebro para das sobre os assuntos importan-
tes do dia como também poderia
mações – a Revolução Industrial
do século 18 e o início do século
regisTrar evenTos. preservar nossa saúde mental e
evitar que nossa atenção fosse
19 –, o livro de lugar-comum era
mais do que um diário ou um lugar
o celular, para se tão fragmentada.
Fazer isso não significa retor-
onde a pessoa anotava suas refle-
xões pessoais: era uma ferramenta
comunicar. a nuvem, nar ao passado. Agora nós temos a
oportunidade de trazer a tradição
de aprendizado que a classe esco-
larizada usava para entender um
um espaço dos livros de lugar-comum para
a Era Moderna. Temos a chance
mundo em rápida mudança e com-
preender qual era o seu lugar nele.
para memória. de transformar essa prática his-
tórica em algo muito mais flexí-
Em A Questão dos Livros, Ro- vel e conveniente.

64 VOCÊ RH OUT / NOV 2023


CLUBE DE REVISTAS

O livro de cunhar suas ideias e trabalhar em sociais que serão esquecidas em


lugar-comum digital colaboração com outras pessoas. minutos. Salvamos matérias para
Ao migrar para o mundo digital, Assim que você perceber que ler mais tarde, mas raramente en-
nossas anotações e observações usamos ferramentas digitais na- contramos tempo para isso. Criamos
podem ser pesquisadas, organiza- turalmente para estender nosso documentos que são usados uma
das e sincronizadas em todos os pensamento além dos limites da única vez e depois abandonados no
nossos dispositivos e armazenadas nossa cabeça, começará a enxergar abismo das nossas caixas de e-mail
em backup na nuvem para proteção. Segundos Cérebros por toda parte. ou pastas de arquivos.
Em vez de fazer anotações aleatórias Um aplicativo de calendário é Chegamos a um ponto em que a
em pedaços de papel e torcer para uma extensão da capacidade do seu tecnologia está tão avançada e ami-
encontrá-las mais tarde, podemos cérebro de lembrar eventos, garan- gável que podemos integrá-la ao nos-
desenvolver nosso próprio “cofre de tindo que você nunca esqueça um so cérebro biológico. Os computado-
conhecimento”, para que sempre sai- compromisso. Seu celular é uma res estão menores, mais poderosos
bamos exatamente onde procurar. extensão da sua capacidade de se e mais intuitivos, a ponto de serem
Certa vez o escritor e fotógrafo comunicar, permitindo que sua voz inegavelmente um componente es-
Craig Mod escreveu: “Existe uma atravesse oceanos e continentes. O sencial da forma como pensamos.
oportunidade escancarada de con- armazenamento em nuvem é uma Chegou a hora de concretizarmos
solidar nossa miríade de marginá- extensão da memória do seu cére- a visão dos pioneiros da tecnologia,
lia num livro de lugar-comum ainda bro, permitindo que você guarde de que todos deveriam ter uma men-
mais robusto. Ele seria pesquisável, milhares de gigabytes e os acesse te estendida não só para lembrar
acessível, facilmente compartilhável de qualquer lugar. mais e aumentar a produtividade,
e incorporável ao texto digital que (...) mas para viver melhor.
consumimos”. Ao longo do século 20, diversos
Esse livro de lugar-comum digital estudiosos e inovadores apresen-
é o que chamo de Segundo Cérebro. taram suas visões de como a tec-
Pense nele como a combinação de nologia poderia mudar a humani-
um caderno de estudo, um diário dade para melhor. Eles sonhavam
pessoal e um bloco de rascunho para em criar uma “mente estendida”,
novas ideias. É uma ferramenta mul- que ampliasse o intelecto humano
tiuso que pode se adaptar às suas e nos ajudasse a resolver os maiores
necessidades ao longo do tempo. Nos problemas enfrentados pela socie-
estudos (seja na faculdade, no MBA dade. A possibilidade de tamanha
ou em outro curso qualquer), pode maravilha tecnológica brilhou como
ser usado para fazer anotações. No um farol para o futuro, prometendo
trabalho, pode ser usado para or- destravar o conhecimento preso a
ganizar projetos. Em casa, pode ser livros velhos e empoeirados e torná-
usado na administração doméstica. -lo universalmente acessível e útil.
Qualquer que seja sua forma de Essas ideias inspiraram grande
usar o Segundo Cérebro, ele fun- parte da tecnologia que usamos no
cionará como uma coletânea parti- dia a dia, mas, apesar de todas as
cular de conhecimentos projetada invenções tecnológicas da Era da
CRIANDO UM SEGUNDO CÉREBRO
para servir a uma vida inteira de Informação, estamos mais longe
Autor: Tiago Forte
aprendizado e crescimento, e não do que nunca de sua visão original. Editora: Sextante
só em um único caso de uso. Um Todos os dias passamos horas in- Páginas: 240
quadro-negro onde você pode ras- teragindo com postagens de redes Preço: R$ 54,90

OUT / NOV 2023 VOCÊ RH 65


CLUBE DE REVISTAS
NA REAL POR ISIS BORGE

a solução para desenvolver


habilidades no topo? viajar!
a
o longo da carreira, as especializações por MBAs nas o objetivo de ampliar seu olhar sobre diversas questões – dos
melhores instituições de negócios são muito bem vis- indivíduos e das organizações –, enquanto têm a oportunidade
tas. Mas tenho notado que essa qualificação tem mais de desenvolver ou aprimorar relações interpessoais. Algumas
impacto só até o meio da pirâmide organizacional. Nos empresas apostam na visita de seus executivos a outras de suas
cargos mais altos, de diretores e CEOs, as empresas unidades ou a startups do Vale do Silício. Um dia desses, soube
esperam que os executivos já sejam profundos co- de uma grande multinacional do setor de energia que levou
nhecedores de suas funções e, consequentemente, muito bons seus gestores para uma semana de atividades voluntárias na
no que fazem. Nesses casos, o título de Alumni pode agregar África, em uma região sem acesso justamente… a energia. A
glamour para o currículo e fazer bem para o ego, mas não ideia era que, indiretamente, eles vissem que o propósito do
contribui por si só para mais ascensão ou estabilidade. seu trabalho também é ajudar pessoas que vivem naquele
Minha recomendação para os profissionais do topo é inves- tipo de cenário.
tir no desenvolvimento ou aprimoramento das habilidades Para melhorar o entrosamento entre seus executivos, as
comportamentais. Muitos diretores e CEOs têm gaps de soft companhias ainda estão organizando passeios esportivos em
skills sem se dar conta disso, mesmo com a evolução das or- grupo, dentro e fora do Brasil. Algumas propõem escalada em
ganizações quanto a fornecer dados objetivos sobre a melhora algum monte, outras organizam dias de mergulho. Há as que
que é esperada. Isso, em alguns casos, tem feito parte dos mesclam passeios de aventura com sessões de interação. Tudo
parâmetros de cálculo de bonificações. vai depender do perfil dos viajantes.
Às vezes, um executivo é incrível na entrega de resultados, É bem visível o benefício de apostar em viagens e atividades
mas tem sérias dificuldades em outros papéis: assumir respon- que humanizem profissionais que já são tecnicamente muito
sabilidade sobre falhas nos processos, conectar-se com o time bons. E essa parece ser uma tendência no tratamento ao alto
ou ter conversas difíceis com os colaboradores, por exemplo. A escalão. Se você está no topo da pirâmide e a sua empresa
falta dessas e de outras habilidades comportamentais tende a ainda não tem esse tipo de iniciativa, sugiro considerar esse
interferir no todo da organização. Afinal, a cadência e o sucesso investimento por conta própria. Aumentar o nosso arsenal de
dos negócios têm muito mais a ver com a forma com que os habilidades comportamentais, no fim das contas, nunca será
seus principais executivos agem no dia a dia – inclusive com algo em vão.
relação a direcionamentos e rapidez para corrigir rotas – do
que com as ações de suas equipes.
Não à toa, tenho acompanhado grandes empresas investindo
na capacitação comportamental de seus executivos por meio de
viagens de experiências. São jornadas para estimular o autoco-
nhecimento e a humanização – e que podem ser individuais ou
em grupo. O destino prioritário é aquele que tira o profissional
da zona de conforto, que o faz enxergar as próprias limitações ISIS BORGE
ou provoca alguma transformação pessoal, seja na forma de É EXECUTIVE DIRECTOR
viver, relacionar-se ou ver o mundo. TALENSES E MANAGING
Há, ainda, empresas enviando executivos de diferentes áreas PARTNER TALENSES GROUP
para participar de feiras de inovação ao redor do planeta com

66 VOCÊ RH OUT / NOV 2023 F O T O : D I V U L G AÇ ÃO


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