Curso - Etica Texto
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Curso - Etica Texto
Neste curso você obterá informações sobre a dimensão ética de sua atividade
profissional e será estimulado a uma atitude reflexiva sobre os problemas
relacionad os à essa dimensão.
MÓDULO 1
- Por que estamos discutindo ética?
- O mérito da ação: intenção e Juízo desinteressado
- Escolha e deliberação
- Virtudes e caráter
– Autono mia e responsabilidade
MÓDULO 2
- Por que falar em ética da vida pública?
- República e democracia
- Estado, cidadania e império da lei
- O cargo público
– A prestação pública de contas (Accountability )
MÓDULO 3
- Por que conduta e regras de conduta?
- Profissionalismo, decoro e civilidade
- Códigos de ética no serviço público
- Iniciativas da administração pública federal
- Conclusão
MÓDULO 1 – Conceitos Básicos
Neste módulo você terá contato com conceitos básicos de ética e com o significado
da “dimensão moral ou ética” da existência.
Do Moralismo à Ética
Há pouco tempo – durante as décadas de 1960 e 1970 – o discurso político que
punha ênfase na moralidade vinha associado a idéias conservadoras.
Essa polarização deixava pouco espaço para se pensar a ética como uma dimensão
incontorn ável da existência humana.
Isso é muito visível no que diz respeito aos costumes sexuais: o que era então
considerado abominável e excepcional tornou - se corriqueiro e quase um padrão
estético.
Por outro lado, os que se sentem comprome tidos com o discurso e a prática
contestató rios têm se dado conta da importância de resgatar esses princípios e
valores, na medida mesmo em que forças do status quo parecem desenfatizá - los
ou mesmo desprez á - los, sem dúvida porque têm atinado que a perspectiva da
mudança social e a consciência ética não são, se bem compreendida essa última,
opções conflitantes.
De todo modo, pode - se dizer que as sociedades contem por â nea, independen te das
inclinações político - ideológicas da maioria de seus cidadãos, têm demons tra d o
uma inédita abertura para refletir seriamente sobre os pressupos t os éticos de sua
existência, problematizan do desse maneira seus costumes, regras formais e
práticas informais.
O que queremos dizer quando afirma mos que a existência humana tem uma
dimensão ética ou moral?
Certas correntes da teoria moral costum a m distinguir os campos da Ética e da
Moral. Filósofos alemães, por exemplo, freqüente me nte distinguem as práticas,
regras ou costumes substantivos de uma comunidade específica (o campo da ética),
dos princípios formais, e suposta me n t e de caráter universal, implicados na
consciência do dever (o campo da moral propriame nte dito). Outras correntes são
menos propensas a essa distinção. Embora esclarecedora para certos propósitos,
essa distinção não será relevante para o nosso curso.
Etimologicamente, os dois termos têm significados semelhantes: “ética” vem do
grego ethos , e “moral” do latim mos , ambos significando “uso” ou “costume”.
Assim como os movimentos das rochas, dos mares e dos planetas, as ações
humanas modificam o mundo. Contudo, esses dois tipos de eventos são apreciados
de formas completa men te distintas.
Quando o evento é desencadea do por pessoas, a avaliação moral supõe não apenas
o aspecto exterior, visível, do evento, mas um aspecto introspectivo, que diz
respeito ao sentido interior e consciente que essas pessoas dão às suas próprias
ações. A avaliação moral implica um esforço para escrutinar as intenções do
agente.
Quando o evento é originado por uma cega força causal, essa avaliação não ocorre
exatamen te porque não há como atribuir uma intenção àquela força.
A ética envolve um processo avaliativo especial sobre o modo como os seres
humano s intervém no mundo ao seu redor, principalmente quando se relacionam
com os seus semelhantes. Esse processo avaliativo diz respeito ao mérito ou
demérito do agir humano. São as atribuições de mérito ou demérito que
impregnam esse agir com um tipo de valor: o valor moral.
O processo avaliativo do agir moral leva também a uma clivagem dos próprios
eventos de origem humana. Isso tem a ver com o sentido da intenção.
Ele foi fortemente repudiado pela opinião pública, pelo que revelou de negligência
das autoridades competentes. Contudo, a apreciação moral desse evento de “causa
humana”, porém acidental, é muito diferente – e provoca bem menos controvérsia –
do que o lançamento, cuidadosa m e nte planejado, de bombas atômicas no Japão
duran te a Segunda Guerra Mundial.
Por mais plausíveis que fossem as justificativas pragmáticas desses bombar deios
(as inevitáveis “razões de guerra”), assim mesmo nos impressiona – e nos apavora –
a simples idéia de que as bombas tivessem sido lançadas com a intenção precisa de
matar dezenas de pessoas, inclusive crianças.
Quando avaliamos o mérito da ação, nos esforçamos para ser imparciais não
levando em conta se ela nos prejudica ou nos beneficia. Procura mos desconsiderar
se aquele gesto promove ou não nosso próprio interesse.
Claro que os seres humanos são fortemente motivados por impulsos egoístas e
interessad o s; e que esses impulsos não raro nublam nossa capacidade de avaliar o
gesto alheio.
Por exemplo: é essa sensibilidade que nos faz pensar que um adversário em uma
competição é moralmente “decente”, ainda que ele venha a nos vencer (e portan to,
prejudicar) nessa competição.
Ou é isso que faz o torcedor de um time chegar à conclusão que os jogadores do
time adversário são “honestos”, ainda que venham a superar o time de seu coração.
Muitos aspectos da vida social – talvez mesmo o próprio viver comunitário – seriam
simplesmen te inimagináveis, não fosse essa capacidade de fazer juízos morais,
desinteressados, a respeito do que fazem outras pessoas ou comunidades.
O filósofo alerta também que a avaliação moral não é apenas uma questão de
sentimento.
“Dedicamos sempre uma consideração mais apaixonada a um estadista ou patriota
que serve nosso próprio país em nossa própria época do que a um outro cuja
influência benéfica operou em eras remotas ou nações distantes, nas quais o bem
resultante de sua generosa benevolência, estando menos relacionado conosco,
parece - nos mais obscuro e nos afeta com uma simpatia menos vivida. Podemo s
reconhecer que o mérito é igualmente grande em ambos os casos, embora nossos
sentimento s não se elevem à mesma altura.” (p..95)
Até aqui falamos pouco dos aspectos cognitivos da ética. Contudo, o agir moral é
um tipo de atividade inteligente, e dos mais complexos.
ESCOLHA
. O processo avaliativo da ética depende de que se façam certas coisas não tomadas
como inevitáveis. Do contrário não haveria mérito na ação.
. É a partir das comparações com o que as pessoas poderiam ter feito, mas
acabaram não fazendo, que se chega a um juízo sobre o mérito ou demérito.
DELIBERAÇÃO
A moralidade supõe uma estrut ur a do mundo em que pelo menos uma parte dos
eventos não está submetida a uma necessidade férrea, em que tudo que acontece
não poderia ser diferente, da qual nada e ninguém pode escapar. Se todos os
eventos fossem inevitáveis, a escolha não seria apenas impensável, mas inútil.
Contu d o, a escolha exige uma introspecção prévia que vai não só definir a intenção
do agir, mas desencadear um processo de amadureciment o.
O PROBLEMA DO ACASO
Para que a ética seja fato de uma dimensão significativa de nossas vidas,
precisamo s estar convictos de que a deliberação e a escolha fazem uma grande
diferença no resultado final, isto é, que o mundo seria muito distinto do que é se o
deixássemo s seguir seu curso sem a nossa interferência consciente.
MEIOS E FINS
Vejamos agora como o agir moral representa um campo privilegiado da deliberação
e da escolha.
Um fim tem que ser algo que o agente deseja, porém sempre pode haver mais de
uma opção ao agente – vejamos:
1) Posso desejar algo, mas chegar à conclusão de que os meios para alcançá - lo
estão fora de meu alcance.
2) Posso desejar algo perfeitamente alcançável, mas que eu mesmo não o considero
apropriad o do ponto de vista moral.
3) Posso desejar algo moralmente apropriado, mas pensar que certos meios
disponíveis para alcançá - los são inapropriados.
Observe...
Em (1) o fim planejado não pode estar descolado de uma avaliação da capacidade
de realizá - lo: se acho que não há meios disponíveis que me levem àquele fim, devo
reconsiderar a própria meta.
Em (2) e (3) a questão do mérito ou demérito da ação já qualifica de um modo
especial as opções. Eu tenho certas opções ao meu alcance, sei que elas poderiam
acontecer se assim o desejasse, mas a percepção de um demérito nela me leva a
cogitar uma espécie de veto interno.
Entre a deliberação e a ação subsequente no mundo há, pois, um fosso que somos
obrigados a transpor através de um salto arriscado.
Não fosse por isso, poderíamos continuar vacilando indefinidamente a respeito das
alternativas. Entretanto, isso é impossível na prática, pois...
É preciso, além da naturez a inteligente da ação moral, uma disposição para agir
confor me a direção apontada pelo intelecto. Esse ponto remete às virtudes.
Muitos obstáculos se colocam adiante do plano meditado na consciência:
O CARÁTER
Antes mesmo de chegar à idade adulta, adquirimos certos hábitos, alguns dos
quais difíceis de serem alterados depois.
Não nascemos prontos para a vida: os grupos a que pertencemos – a família, com
nossos pais, e a comunida de política, com suas autoridades – encarregam - se de
completar aquilo que a naturez a deixou em aberto.
Assim, parte não despre zível de nossa capacidade para deliberar e escolher em
sentido pleno, e que sempre acompan ha as virtudes, é fruto de uma herança que
recebemos pela educação.
Com ela se trans mite conhecimentos, mas também se forma o caráter. Isso dá à
Educação uma incontor nável dimensão ética. E se cremos, como hoje, que um de
seus institu tos mais importantes, a escola, é um dever do Estado, imediatame n te
essa dimensão transfor ma - se numa questão política da mais alta relevância.
1.5 - Autonomia e responsabilidade
AUTONOMIA
Autono mia é a condição que nos torna autores da ação. A autonomia dos atos
significa uma latitude para governar a nós mesmos, e para fixar nossas próprias
regras de vida.
. Tão logo nos reconhecemos como autores, passa mos a ver nossos atos como que
situado s fora de uma cadeia contínua de causas e efeitos que, de outro modo,
seriam simples elos dessa cadeia, apagando assim a nossa autoria.
Sim, se a entender m o s como uma vontade que não pertence a uma cadeia causal
anterior a ela.
Mas não, se a entender m os como um capricho ou uma mera preferência.
Para Kant, a vontade genuina mente livre não pode ser um capricho, mas deve
receber a forma de uma lei universal, signo da própria razão.
RESPONSABILIDADE
. Se me sinto capaz de iniciar uma ação, independe nte de outros fatores que
venham a concorrer para a sua realização no mundo, devo ser capaz também de
respo n der por pelo menos parte de suas consequências – aquelas em que for
possível identificar um vínculo especial com seu início, a minha autoria.
. Se a autonomia significa o início da obra, a responsabilidade significa a assinatu ra
dela tão logo ganhe o mundo.
2) Sobre a ética das virtudes, ver a coletânea Virtue Ethics (nova York Oxford Univ
Press, 1997), organizada por R. Crisp e M. Slote. Para uma crítica da filosofia
moderna, por suposta m en te ter colocado em segundo plano a ética das virtudes,
ver de A Macintyre. Depois da Virtude (Bauru, SP: Edusc, 2001).
Neste mód ulo serão indicadas as relações entre a ética e as instituições políticas e
apresen ta d o s termos - chave da moralidade pública.
A NATUREZA DA POLÍTICA
Sua marca também é intervir no mundo segundo uma intenção premeditada, para
conservar ou mudar um estado de coisas. Além disso, as alternativas políticas não
são neutras em relação aos valores morais, pois elas dificilmente escapam a uma
ponderação sobre o mérito ou demérito da ação: sua justiça, prudência, coragem,
magnanimidade...
A política, por ser uma ação comunitária, precisa de um ambiente para viabilizar a
concertação e a união de seus membros: a vida pública.
Esse ambiente tem em mira o convívio de todos os membros de acordo com regras
e virtudes que garantam a amizade cívica, o respeito mútuo e os modos de
resolução pacífica dos conflitos sociais.
AS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS
REPÚBLICA
Isso é verdade. Mas devemos chamar a atenção para a mudança que uma forma de
constituição provoca nas percepções sociais. Com a República, consagrou - se a
norma da separação entre o público e o privado: o poder político passou a ser
definitivamente um assunto do público, e as práticas de confusão entre os dois
campos condenada s não só pela lei, mas por uma opinião pública cada vez mais
atenta.
DEMOCRACIA
Na antiguidade Grega, Esparta era uma república, e seu governo era eleito. Porém,
apenas sua rival política e militar, Atenas, era tida como “democracia”. Veneza, no
final do período medieval, era uma república, porém recusava para si o termo
“democracia”.
Primeiro, a maioria dos postos de governo de Atenas não eram eleitos, mas
escolhidos por sorteio entre os cidadãos – em outras palavras, os cidadãos
atenienses viam- se rigorosame nte como iguais em capacidade para governar.
Mas esse não era o produt o mais importante: a diferença crucial estava na
compo sição da pólis, o grupo dos que detinham poderes reconhecidos de influencia
nas decisões comunitárias.
Portanto, uma democracia reconhece o acesso à arena das decisões das camadas
mais baixas ou pobres ou socialmente relegadas da população.
UM POUCO DE HISTÓRIA...
Seu advento pôs em questão o velho muro institucional que separava “nobres” e
“plebeus”, e que explicitamente distribuía os membros da comunida de, digamos
assim, em “vagões” de primeira e segunda classe.
A derrubad a desse muro pôs fim às desigualda des de status jurídico entre pessoas
situadas numa hierarquia de estament os, e que garantiam privilégios legais às suas
camad as superiores: acesso privilegiado a justiça, aos frutos da cooperação social,
à participação nas decisões de governo e aos próprios cargos governamentais. Ao
final dessa longa contestação, consolida - se um ideal de cidadania que deixa de
reconhecer tais diferenças,nivelando - as num único e mesmo status jurídico, e
como que transfor ma n d o a todos os membros da comunidade em simples
“plebeus”.
... Isso é o IMPÉRIO DA LEI. Sob a sua inspiração, o Estado incorpora uma série de
valores e regras substa ntivas, por final adotadas em quase todas as constituições
democráticas contempor â nea s, inclusive a brasileira.
Seguindo o ideal do Império da Lei, o Estado cria regras que procura m dar
concretu de aos valores do respeito e da dignidade intrínseca da pessoa huma na.
Art. 5º.,Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer nature za,
garantindo - se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
I- homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta
Constituição;
II- ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei;
III- ninguém será submetido a tortura nem a trata men to desuma no ou degradan te;
IV- é livre a manifestação do pensame nto, sendo vedado o anonimato;
V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização
por dano material, moral ou à imagem;
VI- é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de
culto e a suas liturgias;
VII- é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas
entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII- ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir - se de obrigação
legal a todos imposta e recusar - se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IV- é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independen te m e n te de censura ou licença;
X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação;
XI- a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consen timen to do morador,salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para
prestar socorro, ou, durante o dia, por deter minação judicial;
2.4 - O cargo público
O Estado constitui, além da ordem jurídica que engloba toda a comunidade, uma
estrutu r a administrativa permane nte.
PODER E RESPONSABILIDADE
● O aspecto público do cargo significa que ele não pertence à pessoa que
eventualmente o ocupa.
● Sua investidura não implica um título de propriedade, um direito de “uso e
abuso”, em que seu detentor pudesse herdar, doar, empresta r ou vender ao seu
bel- prazer, ou extrair rendas através de sua exploração econômica.
● A pessoa investida no cargo recebe uma missão com a expectativa de que
utilizará os meios e recursos adicionados ao cargo na proporção que a missão
exigir.
No fundo, esse servidor público faz pela comunidade aquilo que ela não poder
fazer por si mesma. Ele a representa, sabendo que não está ali para fazer o que
bem entender.
AUTORIDADES PÚBLICAS
Essas autoridades precisam responder por seus atos à opinião pública, indicand o
em que medida o exercício do cargo corresponde u à expectativa aprovada em
sufrágio.
PRESTAÇÃO DE CONTAS
4) Sobre o império da lei (rule of law ), ver o verbete correspon den te em The
Blackwell Encyclopaedia of Political Thought , organizado por D. Miller et all (Oxford:
Blackwell. 1987).
Neste m ódulo você será apresenta do a um ideal de conduta no serviço público, que
vise combinar a excelência e retidão, e obterá informações sobre as iniciativas
governamen t ais para introdu zir noções de ética na gestão pública, bem como
conhecer as vantagens de criar e observar instru men tos de orientação da conduta
na Administração Federal.
CONDUTA MORAL
Quantas vezes nossas leis são cumpridas “na letra”, mas não no seu “espírito”?
● Para ajudá - lo a alcançar o domínio dos modos de realizar ou construir algo. Esse
domínio implica a familiaridade com as regras ou procediment os que indicam o
quê e como fazer.
Vejamos...
REGRAS IMPERATIVAS
São regras que simples mente proíbem ou ordena m, pressupon d o que se saiba fazer
o que se proíbe ou ordena. Abrange a maior parte daquilo que se denomina “lei” no
sentido jurídico.
REGRAS CONSTITUTIVAS
São regras que instrue m o agente a fazer algo. Elas orientam o sujeito moral a
realizar ou constr uir o que se deseja. Como toda regra, elas limitam o leque de
coisas que poderiam ser feitas; contudo, ao contrário das regras imperativas, elas
mais possibilitam a ação do que a impede.
Quando queremos fazer algo complexo e de alta respons abilidade, como é o caso
do serviço público, vemo - nos perante uma floresta densa e escura que, se não
possuir nenhu m a trilha, oferece inúmeras possibilidades de atravessá - la e, por
isso, grandes chances de erro. Sabendo disso, ficamos inibidos de atravessá - la.
Em outras palavras: sem regras de conduta, tendemos a nos retrair perante um
empreen dime nto desafiador e arriscado.
Tendo em conta essa concepção das regras, vejamos agora alguns princípios
básicos da conduta do servidor público.
ESTADO X PATRÃO
Por outro lado, o Estado não é um “patrão” no sentido usual, que precisa explorar
severame n te o trabalho alheio para promover seus próprios interesses. Se há um
“patrão” em jogo – a própria comunidade que o Estado deve representar - ,ele não
se encaixa bem no papel de explorador do trabalho, embora até possa ser rigoroso
com os seus funcionários, no que tange ao zelo com a coisa pública.
PROFISSIONALISMO
Dos ocupan tes desses cargos não se espera um vínculo eventual ou superficial, mas
uma concentração, intelectual e emocional, na função pública específica que se
venha a escolher.
Por isso, essa função tem que estar relacionada a um talento real, desenvolvido
pela educação e pela experiência ao exercê- la.
Uma dedicação plena e por toda uma vida só pode dar certo se o candidato ao
cargo tiver, além do empenho para servir à comunida de, a competência e o gosto
para fazer o que se espera do cargo.
Do contrário, o desempen h o se tornará enfadonho em pouco tempo, com prejuízo
ao público e ao próprio servidor.
Para além do compromiss o ético com o bem comum, uma atitude profissional
exige, entre outras qualidades:
a)▪Imparcialidade
b) Objetividade
c) Excelência
a) Imparcialidade
O serviço sempre envolve relacionamen tos humanos que se chocam com nossos
gostos e preferências pessoais – políticas, ideológicas, religiosas ou o que for.
Às vezes simpatiza m os muito com certas pessoas e detesta m os outras, apoiamos
um partido ou corrente política e não outra, essa igreja e não aquela, etc.
É claro que o exercício correto de qualquer ofício não pode deixar que esses gostos
e preferências turvem a apreciação do que deve ser feito.
b) Objetividade
Objetividade significa uma abordagem razoavelmente distanciada e serena do
trabalho a fazer.
Isso não significa indiferença ou frieza: trata - se apenas de evitar que sentimento s
explosivos atrapalhe m o bom desempen ho.
Nâo é o caso de sufocar as emoções mas, ao contrário, educá - las para seguir e
adensar o fluxo racional que leva ao sucesso do trabalho.
c) Excelência
O trabalho profissional é a busca incessante da perfeição. Nunca alcançaremos a
perfeição, mas ao buscá - la, chegaremos ao melhor possível.
DECORO
Mas há outras qualidades que focam mais de perto a nature za político - moral do
serviço público.
O decoro é uma “postura” porque une a disposição interna para agir corretamen te
com a aparência desse agir.
Decoro, do latim decoru m, é “a face pública de uma estado pessoal da
honrade z” - David Burchell.
Sabedor de que sua função é alvo natural de desconfiança das partes interessad as e
de ressentimento de quem não consegue obter o benefício particular esperado, o
servidor trata de constr uir uma personalidade e uma reputação cívicas à altura de
sua autoridade formal.
Eis o valor auxiliar das normas de conduta, que se relaciona m diretamente com os
“Códigos de ética” que veremos a seguir.
O propósito desses códigos é justamen te indicar ao ocupante do cargo público
maneiras de constr uir aquela personalidade.
Essas qualidades se referem ao vínculo entre passado, presente e futuro: uma boa
reputação não se constrói do dia para a noite. Ela se faz ao longo de toda uma
carreira.
Sendo, pois, provada pelo tempo e percorrida com lisura, e vista como tal, ela dá
uma noção segura do caráter e da personalidade do servidor.
CIVILIDADE
a) “Prestação de contas”
Uma abertura para justificar publicamente decisões tomadas ou estratégicas
adotad as, e para ouvir interpelações, críticas e sugestões. Porém, fazê - los de forma
respeitosa, independe nte m en te da simpatia pessoal que se tenha pelo interlocutor.
Nessa chave, a civilidade é uma disposição necessária à prática da prestação de
contas.
b) “Espírito Cooperativo”
Uma abertura para polir e acomodar diferenças. Essa é uma qualidade essencial da
mediação. Não se trata de promover a conciliação a qualquer preço, ferindo
princípios éticos.
Mas todo conflito ou competição gera um afã para ampliar exagerada me nte o
campo de atrito das relações, e estreitar demais as possibilidades de cooperação e
acordo. O servidor público, ao contrário, deve credenciar - se como um agente
catalizado r da boa vontade e de ações coletivas constr utivas.
3.3 - Códigos de ética no serviço público
O código deve ser posto em relação, por um lado, com a lei e, por outro, com a
moralidade em sentido mais amplo.
Um código de ética não pode, obviamente, pôr - se fora ou além da lei: não pode
servir como desculpa ou meio para legitimar compor ta m en t os que a lei proíbe.
Capturar essa dimensão do bom cumprimento da lei é uma tarefa difícil, mas que
caberia perfeitamente a um código de ética.
Por outro lado, também não faria sentido ter um código de ética que apenas
repetisse o que já está plenamente determinado e assegurado na lei.
Quando se trata de uma entidade ou órgão público, quatro questões devem ser
tratadas num Código de Ética:
1) A finalidade e as características mais gerais de entidade.
2) As relações internas entre os seus servidores e outros colaboradores.
3) As relações com outras entidades, públicas ou privadas.
4) As relações com o cidadão.
Em resu mo, o Código de Ética numa entidade pública deve estabelecer um padrão
geral de conduta.
Mas, atenção...
► Aose definir o seu conteúdo, é bom lembrar que não se está agindo nem como
um legislador no Congresso Nacional nem como um reformador moral.
► Não se pode ir contra a lei, mas também não se deve simples mente repeti - la. É
preciso, capturar o aspecto do bom cumprimento da lei, identificando os casos em
que, mesmo dentro da legalidade, cometem - se atos que, intencionalmente ou não,
prejudique m alguém.
► Não deve haver nenhum a pretensão de uso universal do código: ele deve servir de
guia para a resolução dos problemas específicos do grupo de servidores
concernidos.
COMISSÃO DE ÉTICA
Como ponto alto desse processo, há que destacar a formação da Comissão de Ética
Pública, criada por Decreto Presidencial em 26 de maio de 1999, de cujas atividades
falaremos a seguir.
COMPOSIÇÃO
• Integrada por seis pessoas não vinculadas ao governo e com amplos
conhecimen tos em política, sociologia, direito e administração.
• Seus membros não recebem remuneração. Os trabalhos por eles desenvolvidos
são considerados prestação de relevante serviço público.
OBJETIVOS DA COMISSÃO
• Assegurar um padrão ético efetivo para os ocupantes dos mais altos cargos do
Executivo Federal, por meio de normas de fácil aplicação e compreensão,
suficientes para o cumprimento dos valores éticos estabelecidos pela Constituição
Federal para a Administração Pública.
• Prevenir transgressões éticas durante e depois de exercício do cargo público.
• Atuar como instância consultiva que proteja o administrador honesto.
• Fazer com que a ética seja reconhecida como instru me n t o imprescíndivel para
uma administração pública efetiva, transparente e democrática.
METODOLOGIA DE TRABALHO
A REDE DE ÉTICA
Antes da Rede de Ética, 30% dos órgãos e entidades federais levavam em conta
regras de conduta padroniza das para seus quadros. E pouco mais de 20% dos
órgãos e entidades federais cumpriam algumas das funções de gestão da ética-
divulgação, capacitação e monitoram en t o das normas.
Não obstan te, apenas 15% dos órgãos e entidades federais dispõem de mecanismo s
de reconhecimento em relação à observância das normas de conduta, o que
demon str a que o caminho a percorrer ainda é longo.
PARCEIROS
3) Sobre a civil idade, ver de J. Rawls, Liberalismo Político (São Paulo: Ática, 2000).
Ver também o artigo de G. Cohn, “Civilizacion, ciudadania y civismo: la teoria
política ante los nuevos desafios”, publicado na coletânea Filosofia Política
Contem p o r ânea, organizada por A. Boron (Buenos Aires: Clacso, 2002).
3.5 - Conclusão
Ao longo do curso, você entrou em contato com noções básicas da filosofia moral:
o problema do mérito e demérito da ação, o componente intencional da ética, o
juízo desinteressado, os conceitos de escolha e deliberação, virtudes e caráter e as
noções correlatas da autono mia e responsabilidade.
Você também viu um panora ma das questões de fronteira entre a ética, a política e
as instituições públicas, sendo apresenta do aos conceitos de república e
democracia, Estado, cidadania e império da lei.
E isso o remeteu então ao tema dos códigos de ética e às iniciativas governamen tais
no sentido de adotar padrões de comporta me n to ético no Serviço Público Federal
Brasileiro.
Como indicamos no Guia do Aluno, o intuito deste curso foi sensibilizá - lo ao tema
da ética, abrindo o caminho de uma atitude reflexiva sobre os problemas práticos
de seu ofício marcados pelo tema.
Esperamo s que tenha dado um passo importante nessa direção e que você possa, a
partir de agora, aprofundá - lo.
“Duas coisas enchem o ânimo com admiração e respeito sempre novos, tanto mais
freqüentes e detidame nte delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado sobre mim e a
lei moral em mim.”
Immanuel Kant
ESTOICISMO - Sistema filosófico fundado pelo filósofo grego Zenão de Cicio (342-
270 aC), por volta de 300 aC, cuja doutrina condenava todas as emoções e exaltava
a apatia como o ideal dos sábios. Essa doutrina aconselha a indiferença e o
despre zo pelos males físicos e morais. O conceito é apropriado para qualificar os
indivíduos austeros ou impassíveis perante as adversidades.
(Nicola Abbagnano. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Mestre Jou, 1970 – Verbete
Estoicismo)
STATUS QUO - Locução latina que significa situação inalterada. Pode ser
enten dida também como ordem estabelecida.
TRADIÇÃO - Herança cultural, isto é, a trans missão de uma geração para a outra
de crenças ou de técnicas.
(Nicola Abbagnano. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Mestre Jou, 1970 – Verbete
Tradição)