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Modelos Farmacocineticos

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Biomatemática 29 (2019), 35–48 ISSN 1679-365X

Uma Publicação do Grupo de Biomatemática IMECC – UNICAMP

Modelo farmacocinético de compartimento único


via equações diferenciais fuzzy

Francielle Santo Pedro1,


Departamento Multidisciplinar, EPPEN–UNIFESP, 06110-295, Osasco/SP.

Laécio C. Barros2, Estevão Esmi3,


Departamento de Matemática Aplicada, IMECC–UNICAMP, 13.083-859,
Campinas/SP.

Resumo. A farmacocinética estuda o metabolismo de farmácos no orga-


nismo. Utiliza-se modelos matemáticos multicompartimentais para prever a
concentração plasmática do mesmo. Diversos parâmetros e mecanismos são
estudados neste processo, o que gera variações de indivı́duo para indivı́duo.
Pensando nisto, propõe-se uma cinética de eliminação de primeira ordem para
o antibiótico Ertapeném através das equações diferenciais fuzzy linearmente
interativas que, além de indicar a evolução do nı́vel de concentração no san-
gue, apresenta a variação da incerteza no tempo por meio de um parâmetro. O
modelo mostra-se bastante satisfatório quanto à interpretação de sua solução.

Palavras-chave: Farmacocinética; Modelo de compartimento único;


Equações diferenciais Fuzzy; Interatividade.

1. Introdução
A farmacocinética estuda o processo de metabolismo dos medicamentos
no corpo. Os modelos farmacocinéticos se utilizam das equações diferenciais
para predizer a concentração plasmática da droga em diferentes instantes (Me-
negotto, 2011). Os parâmetros farmacocinéticos (meia-vida, volume de distri-
buição, constante de eliminação, entre outros) são as medidas mais importantes
1 [email protected]
2 [email protected]
3 [email protected]
36 Santo Pedro, Barros & Esmi

para determinar a concentração plasmática. Doenças, interações medicamen-


tosas, variações fisiológicas, genéticas e, até mesmo a etnia podem influenciar
esses parâmetros, ou seja, a concentração plasmática em um determinado in-
divı́duo.
Supondo que o organismo possa ser representado por uma série de com-
partimentos interligados, a cinética do fármaco é feita através de modelos multi-
compartimentais, onde a interação entre os compartimentos modifica a concen-
tração nos mesmos. Os principais processos farmacocinéticos são a absorção, a
distribuição e a eliminação de fármacos (Menegotto, 2011).

1.1 Processos farmacocinéticos


A absorção é o processo irreversı́vel de transferência da droga do lo-
cal administrado para a circulação sistêmica. Assume-se que a velocidade de
absorção é diretamente proporcional à quantidade do fármaco que ainda não
foi absorvida, entretanto, na realidade, isso é apenas uma estimativa grosseira
(Rang et al., 2015). Por definição, medicação administrada por via intravenosa
possui absorção imediata, enquanto a administrada via extravascular precisa ser
transportada por várias barreiras até encontrar a corrente sanguı́nea. Atrasos
ou perda de fármaco durante a absorção, além de doenças e outras medicações,
podem produzir uma grande variabilidade na resposta e/ou concentração do
fármaco (Benet e Zia-Amirhosseini, 1995).
A distribuição é uma transferência reversı́vel do fármaco para o local de
ação dentro do corpo. A taxa de distribuição pode ser limitada pela permea-
bilidade ou pela perfusão do tecido (Benet e Zia-Amirhosseini, 1995).
A eliminação é uma combinação de mecanismos nos quais um farmaco
é transferido da corrente sanguı́nea para fluidos extracorpóreos, por exemplo,
bile ou urina (Benet e Zia-Amirhosseini, 1995).

1.2 Parâmetros farmacocinéticos


A meia-vida é o tempo necessário para a concentração plasmática ou a
quantidade de droga no corpo ser reduzida pela metade. Um processo é consi-
derado completo após 4 a 5 meia-vidas. A meia-vida determina a duração do
efeito do medicamento e é considerada independente da quantidade de droga
presente no corpo (Benet e Zia-Amirhosseini, 1995). Intuitivamente, quanto
mais longa é a meia-vida, maior é a permanência do fármaco no organismo
Modelo farmacocinético de compartimento único via ... 37

após a interupção de sua administração. Contudo, não intuitivamente, quanto


mais longa a meia-vida de um fármaco mais tempo é necessário para que este
atinja sua concentração de equilı́brio (Rang et al., 2015). Essa informação é
importante para que o clı́nico possa avaliar se uma dose de ataque será ne-
cessária.
O volume de distribuição relaciona a quantidade total do fármaco no
organismo à sua concentração no plasma (Rang et al., 2015). O volume de
distribuição varia com altura e peso individuais, sendo as principais causa de
variação o acúmulo de gordura ou o acúmulo de lı́quidos. Ele também varia
com a idade (Benet e Zia-Amirhosseini, 1995).
A constante de eliminação corresponde à fração de fármaco eliminada
por unidade de tempo (Rang et al., 2015).

1.3 Modelo de um único compartimento


O modelo de um único compartimento (ou modelo monocompartimental
ou cinética de eliminação de primeira ordem) é considerado um processo linear,
porque a taxa de eliminação é proporcional à concentração da droga. Em outras
palavras, quanto maior a concentração da droga, maior a taxa de eliminação.
Sendo assim, a concentração plasmática apresenta um decaı́mento exponencial
e se representado em um gráfico semilogarı́tmico apresenta um comportamento
linear (Menegotto, 2011).
A concentração plasmática da droga no instante t é dada pela equação
diferencial:

C ′ (t) = −kC(t), cuja solução é dada por C(t) = C(0)e−kt (1.1)

sendo, C a concentração do farmáco; C(0) é a concentração inicial da droga


imediatamente após a injecção intravenosa e k é a taxa de eliminação.
Na prática, um método para encontrar a taxa de eliminação constante k
consiste em traçar o logaritmo da concentração plasmática da droga em função
do tempo, o que produzirá uma reta. A inclinação dessa reta será −k. A
meia-vida pode ser obtida através da relação C(t) = 21 C(0), o que implicará
em t 21 = 0.693
k e a extrapolação para ordenada no tempo zero fornece uma
estimativa para C(0). Note que C(0) não corresponde à concentração máxima
de droga no plasma.
Noventa e cinco por cento das drogas em concentração terapêutica são
eliminadas pela cinética de primeira ordem. Nelas os processos de eliminação
38 Santo Pedro, Barros & Esmi

não estão saturados e podem se adaptar às necessidades do corpo, para reduzir
o acúmulo do medicamento (Benet e Zia-Amirhosseini, 1995).

2 Concentração plasmática do Ertapeném Só-


dico
O Ertapeném é um fármaco antibiótico de ação prolongada da classe dos
carbapenemas que foi desenvolvido para enfrentar os microorganismos gram-
negativos produtores de β-lactamase resistentes à penicilina (Rang et al., 2015).
Apesar de possuir um amplo espectro de ações antibacterianas, o Ertapeném
está licenciado para uma limitada gama de indicações (Rang et al., 2015). Ele
geralmente é administrado via intravascular e é eliminado principalmente pelos
rins (Rang et al., 2015). A cinética de eliminação deste farmáco é apresentada
por um modelo monocompartimental (Tängdén et al., 2013).
Na Tabela 1∗ temos as concentrações plasmáticas médias (mcg/mL) do
Ertapeném após infusão intravenosa de dose única de 1g com velocidade de
infusão constante durante 30 minutos dadas a adultos jovens saudáveis.

Tabela 1: Concentrações plasmáticas médias (mcg/mL) do Ertapeném após


infusão intravenosa de dose única de 1g
0.5h 1h 2 h 4 h 6 h 8 h 12 h 18 h 24 h
155 115 83 48 31 20 9 3 1

Os parâmetros farmacocinéticos foram calculados com ajuste assumindo


linearidade, isto é, linearidade no tempo de absorção e o logaritmo das con-
centrações. A meia-vida plasmática média em adultos jovens saudáveis é de
cerca de 4 horas, a constante de eliminação é 0.203 e a concentração inicial,
dada pelo intercepto da reta dos dados linearizados, é de aproximadamente 115
mcg/mL. O modelo determinı́stico é dado por

C (t) = −0.203C(t) C(0) = 115 ∈ R, (2.2)

cuja solução C(t) = 115e−0.203t é mostrada no Figura 1.


∗ Os
dados da Tabela 1 foram obtidos de http://www.anvisa.gov.br/datavisa/
fila_bula/frmVisualizarBula.asp?pNuTransacao=23904302016&pIdAnexo=3954808 em
19/07/2019.
Modelo farmacocinético de compartimento único via ... 39

160

140

120

100
C(t)

80

60

40

20

0
0 5 10 15 20 25
t

Figura 1: Concentrações plasmáticas do Ertapeném (mcg/mL) por tempo (h).


Os pontos são as medições experimentais obtidas pela Tabela 1. A concentração
inicial é C0 = 115 mcg/mL e k = 0.203.

2.1 Múltiplas doses


Os fármacos podem ser administrados em dose única, administrados con-
tinuamente como infusão IV ou em doses fixas orais sucessivas em intervalos
constantes (ver Figura 2). Alcança-se a concentração de equilı́brio quando a
velocidade de eliminação é igual a velocidade de administração, assim, a con-
centração no plasma e nos tecidos ficam relativamente constante (Rang et al.,
2015). A concentração no estado de equilı́brio é diretamente proporcional à
velocidade de infusão e inversamente proporcional à depuração do fármaco.
Quanto menor e mais frequente são as doses, mais próxima da infusão contı́nua
se parece, e menores são as suas oscilções nas concentrações (Rang et al., 2015).
Na prática, alcança-se a concentração no estado de equilı́brio após 3 a 5 meias-
vidas (Rang et al., 2015).
A equação clássica do estudo de concentração plasmática sob o regime
de doses múltiplas é obtido pelo método de sobreposição e é dado pela equação

n
X
Cdm = (C0 e−jkT )e−k(t−nT ) , para nT ≤ t < (n + 1)T.
j=0
40 Santo Pedro, Barros & Esmi

14000

12000

10000

8000
C(t)

6000

4000

2000

0
0 20 40 60 80 100 120
t

Figura 2: Concentrações plasmáticas do Ertapeném (mcg/mL) por tempo (h).


A concentração inicial é C0 = 115 mcg/mL, k = 0.203 e e as doses são admi-
nistradas a cada 16 horas.

Raramente é possı́vel determinar a concentração do fármaco diretamente


do local de ação. Veja que o valor adotado no modelo determinı́stico é o
intercepto da reta formada pelos logaritmos dos dados. No entanto, como
pode ser visto na Figura 1, há valores de concentração superior ao C0 adotado
por nós neste trabalho. Por isso amostras alternativas são utilizadas, dentre
elas destaca-se o plasma sanguı́neo (Storpirtis e Consiglieri, 1995). Entretanto,
o sangue possui muitas células de proteı́nas e estas dificultam a predição da
concentração do prı́ncipio ativo especı́fico (Tozer e Rowland, 2009). Além disso,
a concentração plasmática somente tem uma relação precisa com a concentração
de um fármaco próximo ao seu alvo (enzima, receptor, etc) se este se encontra
no sangue circulante (Rang et al., 2015). Ou seja, a situação anterior é pouco
plausı́vel para a grande parte dos fármacos.
Outro fato interessante, é que há situações onde se deseja obter dados
farmacocinéticos de uma população de pacientes, entretanto, na maioria das
vezes, os dados farmacocinéticos são obtidos através de estudos limitados e as
amostras são obtidas de forma oportunista durante o tratamento clı́nico. Isto
é, os dados coletados de cada voluntário são poucos além de serem aplicados
apenas em adultos sádios (Rang et al., 2015).
Por esses motivos, e muitos outros levantados anteriormente na Introdução
(como doenças, interações medicamentosas, variações fisiológicas ou genéticas),
Modelo farmacocinético de compartimento único via ... 41

a concentração plasmática de um fármaco pode variar de indivı́duo para in-


divı́duo, sendo assim, uma abordagem com equações diferenciais fuzzy que lida
com incerteza se apresenta como uma alternativa.
Neste trabalho trataremos a incerteza a partir das equações diferenciais
fuzzy.

3 Equações diferenciais fuzzy via derivada inte-


rativa
Um número fuzzy U é um subconjunto fuzzy de R, definido pela função
de pertinência µU : R −→ [0, 1] e dizemos que µU (t) é o grau de pertinência
de t em U . Quando U é um subconjunto clássico sua função de pertinência se
reduz a função indicadora χU : R −→ {0, 1} em que χU : R = 1 se t ∈ U e
χU : R = 0 se t ∈/ U (Barros et al., 2016).
Denotamos o conjuntos dos números fuzzy por RF . O α-nı́vel de um
número fuzzy U , é dado por [U ]α = {t ∈ R | µU (t) ≥ α}, 0 < α ≤ 1, e
[U ]0 = {t ∈ R|µU (t) > 0} = supp U.
A métrica utilizada é a de Pompieu-Hausdorff d∞ : R× R −→ R+ ∪ {0} e
é definida por d∞ (U, V ) = sup0≤α≤1 max {|u+ + − −
α − vα |, |uα − vα |}, sendo U, V ∈
+ − +
RF , [U ]α = [u−α , uα ] e [V ]α = [vα , vα ] (Gomes et al., 2015).
Uma distribuição de possibilidade conjunta J é um subconjunto de R2
com função de pertinência normal e suporte compacto. Denotamos por FJ (R2 )
a famı́lia de distribuição de possibilidade conjunta de R2 .
Sejam U1 , U2 ∈ RF e J ∈ FJ (R2 ). A distribuição J é uma distribuição
de possibilidade conjunta de U1 e U2 se

max µJ (t1 , t2 ) = µUi (ti ).


tj ∈R,j6=i

A interatividade entre números fuzzy é determinada por uma distribuição de


possibilidade conjunta (Carlsson et al., 2004).
Seja J uma distribuição de possibilidade conjunta de U1 , U2 ∈ RF e
2
f : R −→ R uma função contı́nua. A função fJ é dita ser o princı́pio de
extensão de f via J (Carlsson et al., 2004) e sua função de pertinência é dada
por
µfJ (U1 ,U2 ) (z) = sup µJ (t1 , t2 ).
z=f (t1 ,t2 )
42 Santo Pedro, Barros & Esmi

Dois números fuzzy são linearmente correlacionados (Barros e Santo Pe-


dro, 2017) se existem q, r ∈ R tais que [V ]α = q[U ]α + r.
As quatro operações aritméticas entre números fuzzy linearmente corre-
lacionados (Simões, 2017) é definida, em nı́veis, por:
• [V +L U ]α = (1 + q)[U ]α + r, ∀α ∈ [0, 1].

• [V −L U ]α = (q − 1)[U ]α + r, ∀α ∈ [0, 1].

• [V ·L U ]α = {qx21 + rx1 ∈ R|x1 ∈ [U ]α }, ∀α ∈ [0, 1].


r
• [V ÷L U ]α = {q + x1 ∈ R|x1 ∈ [U ]α }, ∀α ∈ [0, 1].
Sejam V e W números fuzzy linearmente correlacionados com U , isto
é, existem q1 , r1 e q2 , r2 tais que V = q1 U + r1 e W = q2 U + r2 . Considere
[V ]α = [vα− , vα+ ] e [W ]α = [wα− , wα+ ], ∀α ∈ [0, 1]. Temos que,

− − + +
 i. [vα + wα , vα + wα ]
 se q1 q2 ≥ 0
[V +L W ]α = − + + − (3.3)
ii. [vα + wα , vα + wα ] se q1 q2 < 0 e |q1 | ≥ |q2 |
+ +
 − −
iii. [vα + wα , vα + wα ] se q1 q2 < 0 e |q1 | < |q2 |

Proposition 1 (Simões, 2017) Sejam U ∈ RF \ R e V, W, Z ∈ RF . Se Z é


linearmente correlacionado com W , W é linearmente correlacionado com V e V
é linearmente correlacionado com U , então o operador soma +L é associativo,
isto é, (V +L +W ) +L Z = V +L +(W +L Z).

Um processo fuzzy é uma função fuzzy que associa cada número real
com um número fuzzy, isto é, F : R −→ RF . Dizemos que um processo fuzzy
é linearmente correlacionado (Simões, 2017) quando, para h suficientemente
pequeno, temos
[F (t + h)]α = q(h)[F (t)]α + r(h). (3.4)
Isto significa que o valor futuro F (t + h) está linearmente correlacionado com
o valor presente F (t), para cada h suficientemente pequeno.
Seja F : [a, b] → RF um processo fuzzy linearmente correlacionado para
todo t0 , t0 + h ∈ [a, b]. De acordo com Barros e Santo Pedro (2017), F é dita

ser L-diferenciável em t0 se existe um número fuzzy FL (t0 ) tal que o limite
F (t0 + h) −L F (t0 )
lim
h→0 h
′ ′
existe e é igual a FL (t0 ), na métrica d∞ . Ademais, FL (t0 ) é chamada de
derivada fuzzy linearmente correlacionada de F em t0 . No extremo de [a, b],
consideramos a derivada de apenas um lado.
Modelo farmacocinético de compartimento único via ... 43

Theorem 1 (Barros e Santo Pedro, 2017) Se F : [a, b] → RF L-diferenciável


em t0 e [F (t)]α = [fα− (t), fα+ (t)], para α ∈ [0, 1], então fα− e fα+ são diferenci-
aveis em t0 e para cada h com valor absoluto suficientemente pequeno, temos

 ′ ′
 i.
 [(fα− ) (t0 ), (fα+ ) (t0 )] se q(h) ≥ 1
′ ′ ′
[FL (t0 )]α = ii. [(fα+ ) (t0 ), (fα− ) (t0 )] se 0 < q(h) < 1 .
 ′
iii. {(fα ) (t0 )} se q(h) ≤ 0

A variação individual em reposta a uma dose é, na grande maioria das ve-
zes, maior que a variabilidade da concentração plasmática em relação à aquela
dose (Rang et al., 2015). assim, visando uma forma para descrever essa va-
riabilidade na concentração, vamos considerar que a concentração plasmática
do Ertapeném é um processo fuzzy linearmente interativo (ver equação (3.4)).
Dessa forma, obtemos o seguinte problema de valor inicial fuzzy:


C (t) = −kC(t) C(0) = C0 ∈ RF , (3.5)

sendo que k ∈ R e C(t) ∈ RF .

Da literatura, sabe-se que após 4 a 5 meia-vidas o processo de eliminação


do fármaco é considerado completo. Assim, optamos pelo caso (ii) do Teo-
rema 1, pois não espera-se muita incerteza ao final do processo.

Resolvendo o seguinte sistema, ∀α ∈ [0, 1],

( ′ ′
[(c+ − + −
α ) (t), (cα )(t) ] = [−kcα (t), −kcα (t)]
− + , (3.6)
[C(0)]α = [c0α , c0α ]

obtemos o processo fuzzy C(t) = C0 e−kt , sendo C0 ∈ RF (Ver Figura 3).


44 Santo Pedro, Barros & Esmi

160 c-0 (t)

c-1 (t)=c 1 (t)


+
140
c+0 (t)

120 dados experimentais

100
C(t)

80

60

40

20

0
0 5 10 15 20 25
t

Figura 3: Concentrações plasmáticas do Ertapeném (mcg/mL) por tempo (h).


Os pontos são as medições experimentais obtidas pela Tabela 1. A concentração
inicial é dada pelo número fuzzy triangular C0 = (80; 115; 170) e k = 0.203.

Na Figura 1, a curva determinı́stica não abrange todos os dados ex-


perimentais, diferentemente da a curva fuzzy obtida pela Figura 3. Neste
último caso, podemos obter os parâmetros q(h) e r(h) do processo fuzzy fa-
zendo a seguinte substituição: C(t + h) = C0 e−k(t+h) = (e−kh )C0 e−kt + 0 =
q(h)C(t) + r(h). Logo, q(h) = e−kh e r(h) = 0. Dessa forma, e−kh é a razão
com que a incerteza (ou imprecisão) decaı́.
O tratamento com o ertapeném dura, em média, 3 a 15 dias, sendo
que é recomendado a dosagem de 1g por dia. A equação via aritmética fuzzy
interativa do estudo de concentração plasmática sob o regime de doses múltiplas
é obtida pela equação

Cdm = (C0 +L C0 e−kT +L C0 e−2kT +L · · · +L C0 e−nkT )e−k(t−nT ) ,

para nT ≤ t < (n + 1)T , onde C0 ∈ RF e +L representa a soma interativa


fuzzy pela conjunta L.
Considerando que as concentrações iniciais são números fuzzy interati-
vos, obtemos na Figura 6, as concentrações obtidas durante 5 dias de trata-
mento sob regime de doses múltiplas.
Modelo farmacocinético de compartimento único via ... 45

Na Figura 4 apresentamos o regime de doses múltiplas administradas


a cada 16 horas (4 meia-vidas). Nela vemos que a concentração plásmatica
máxima e minima tende a um valor de estado de equilı́brio. Já na Figura 5
e 6 apresentamos o regime de doses múltiplas administradas a cada 08 horas
e 24 horas, respectivamente. Na primeira, vemos esse estado de equilı́brio
mais nitidamente e no segundo, devido a curta meia-vida, não acontece este
fenômeno.

180

160

140

120

100
C(t)

80

60

40

20

0
0 20 40 60 80 100 120
t

Figura 4: Concentrações plasmáticas do Ertapeném (mcg/mL) por tempo (h).


A concentração inicial é C0 = 115 mcg/mL, k = 0.203 e e as doses são admi-
nistradas a cada 16 horas.
46 Santo Pedro, Barros & Esmi

200

180

160

140

120
C(t)

100

80

60

40

20

0
0 20 40 60 80 100 120
t

Figura 5: Concentrações plasmáticas do Ertapeném (mcg/mL) por tempo (h).


A concentração inicial é C0 = 115 mcg/mL, k = 0.203 e e as doses são admi-
nistradas a cada 8 horas.

160

140

120

100
C(t)

80

60

40

20

0
0 20 40 60 80 100 120
t

Figura 6: Concentrações plasmáticas do Ertapeném (mcg/mL) por tempo (h).


A concentração inicial é C0 = 115 mcg/mL, k = 0.203 e as doses são adminis-
tradas a cada 24 horas.
Modelo farmacocinético de compartimento único via ... 47

4 Conclusão
A variação inter e intraindividual é substancial e pode ser causada por va-
riações farmacocinéticas, isto é, diferentes concentrações do fármaco nos locais
de ação ou variações farmacodinâmicas, isto é, diferentes respostas à mesma
concentração de um fármaco (Rang et al., 2015). Quando essa variabilidade
não é levada a sério, ela pode resultar em perda de eficácia e efeitos adversos
inesperados (Rang et al., 2015). Neste trabalho apresentamos um modelo de
cinética de eliminação de primeira ordem fuzzy. No texto argumentamos que
muitos fatores podem influenciar a concentração plásmatica em um indivı́duo,
assim, levando em conta essa natureza incerta (ou imprecisa), um modelo de
equações diferenciais fuzzy interativo foi proposto. Em particular, estudamos
o antibiótico do tipo carbapenéns, chamado Ertapeném. O interessante desta
nova abordagem é que modelamos um cenário de incertezas e sua evolução no
tempo através do parâmetro q(h) = e−kh , para cada h. Ademais, obtemos um
resultado satisfatório sem precisar tornar nosso modelo muito complexo.

Agradecimentos
Os autores gostariam de agradecer as agências de fomento CAPES pro-
cesso no. 88882.305833/2018-01, CNPq processo no. 306546/2017-5 e Fapesp
processo no. 2016/26040-7.

Referências
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48 Santo Pedro, Barros & Esmi

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