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Abstract judicial review: concretização de direitos e o

desafio democrático

ABSTRACT JUDICIAL REVIEW: CONCRETIZAÇÃO DE DIREITOS E O DESAFIO


DEMOCRÁTICO
Abstract judicial review: realization of rights and the democratic challenge
Revista de Direito Constitucional e Internacional | vol. 127/2021 | p. 99 - 124 | Set - Out / 2021
DTR\2021\46409

Guilherme Luis Hack Lamy


Graduando da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. [email protected]

Área do Direito: Constitucional


Resumo: Este artigo contextualiza o papel do Judiciário como guardião de direitos, questionando
tanto a legitimidade quanto o papel do Supremo Tribunal Federal. Relevante tema que advém dessa
discussão é a relação entre Judiciário e Legislativo, culminando na dicotomia “anulação de atos”-
superação legislativa”. Para além disso, este artigo versa também sobre o modo de atuação do STF,
analisando variáveis com a intenção de apurar constantes na atuação do Tribunal. Conclui-se que:
(i) o STF é legítimo para a defesa e promoção de direitos; (ii) o STF não é o “carrasco” de atos
legislativos e executivos; (iii) a probabilidade de haver a anulação de um ato é maior no início do
trâmite da ação; e (iv) que a rigidez constitucional da Carta de 1988 é meramente formal, diminuindo
o índice de nulidade da Corte.

Palavras-chave: Controle concentrado de constitucionalidade – Emendas à Constituição – Direitos


fundamentais – Jurisdição constitucional – Rigidez constitucional
Abstract: Assuming the Judiciary as a guardian of rights, both the legitimacy and the role of the
Federal Supreme Court are questioned. An important theme that arises from this debate is the
relationship between the Judiciary and the Legislative, resulting in the dichotomy “annulment of
acts”-“legislative override”. Beyond this discussion, this article also analyzes the operating mode of
the Court, seeking constants through variables. This paper concludes that: (i) the Court is legitimate
for the defense and promotion of rights; (ii) the Court is not the “executioner” of legislative and
executive acts; (iii) the likelihood of an act being annulled is greater at the beginning of the
proceedings; (iv) and that the constitutional rigidity is merely formal, reducing the Court’s nullity
index.

Keywords: Abstract judicial review – Amendments to the constitution – Fundamental rights –


Constitutional jurisdiction – Constitutional rigidity
Para citar este artigo: LAMY, Guilherme Luis Hack. Abstract judicial review: concretização de
direitos e o desafio democrático. Revista de Direito Constitucional e Internacional. vol. 127. ano 29. p.
99-124. São Paulo: Ed. RT, set./out. 2021. Disponivel em: inserir link consultado. Acesso em:
DD.MM.AAAA.
Sumário:

1. Judicial review: introdução ao estudo - 2. Democracia, direitos fundamentais e função jurisdicional


- 3. À procura de constantes: um estudo sobre a taxa de nulidade do STF - 4. Aplicação das
variáveis: submissão do estudo à prática - 5. Análise em separado: rigidez constitucional - 6.
Considerações finais - 7. Referências

1. Judicial review: introdução ao estudo

O conceito, as influências e as relações decorrentes das decisões proferidas em sede de controle


concentrado e abstrato de constitucionalidade constituem o objeto desta pesquisa. Nesse primeiro
momento, além de introduzir o tema, isto é, apresentar o abstract judicial review, é também relevante
entender o caminho histórico percorrido por seu principal protagonista: o Judiciário.

1.1. Conceito e inserção no modelo brasileiro

Nos Estados Unidos, o conceito de judicial review é restrito à possibilidade de uma corte de justiça
declarar uma lei inconstitucional. Já em países com Constituições analíticas – ambiciosas e
desconfiadas do legislador,1 como o Brasil –, a jurisdição constitucional (terminologia mais
adequada, “equivalente” ao judicial review) abrange, além da invalidação de atos legislativos (judicial
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desafio democrático

review propriamente dito), a aplicação direta da Constituição, a interpretação conforme e a criação


temporária de uma norma para suprir omissões.2

Necessário, então, apresentar breve esboço do sistema constitucional brasileiro,3 acionado em face
de eventual atentado ao princípio da supremacia da Constituição ou do menosprezo à força
normativa de preceitos constitucionais4.

Percebida a inconstitucionalidade em um caso concreto, estar-se-á diante do controle incidental


(analisado tanto pelo juiz singular – de maneira difusa – como pelo Tribunal
competente – através, por exemplo, do recurso extraordinário); enquanto a discussão abstrata
acerca da constitucionalidade – ou não – de lei ou ato normativo será diretamente analisada (no
âmbito da Constituição Federal de 1988) pelo Supremo Tribunal Federal (STF)5-6. Vale aqui uma
ressalva: a tendência de abstrativização do controle incidental e difuso.7

O estudo referente ao abstractjudicial review reside na segunda forma de controle – abstrato,


versando apenas sobre a lei ou ato normativo, e analisado diretamente pelo STF (por isso,
concentrado) –, especificamente, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Assemelha-se,
pois, ao conceito de judicial review característico do modelo norte americano. Especificamente neste
artigo, o estudo tem também como objeto a relação entre as variáveis atinentes ao Tribunal e à taxa
de decretação de nulidade (de leis e atos normativos), visando a evidenciar (ou
refutar) determinadas constantes, que serão analisadas posteriormente.

No específico caso brasileiro, é de responsabilidade do STF o processamento e julgamento das


Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI’s).8 Assim, o estudo do STF apresenta-se como
inseparável (e imprescindível) quando o assunto é o abstract judicial review, isto é, decisões
proferidas pelo Tribunal em controle abstrato.

1.2. Ascensão do Judiciário: de nulo a protagonista

A aplicação direta da Constituição para o fim de invalidar leis a ela incompatíveis era uma raridade
até o início do século XIX. A atuação jurisdicional atrelava-se estritamente às formas previstas em lei,
levando Montesquieu a concluir que o poder de julgar era um poder nulo (“en quelque façon, nulle”).9
Em 1803, com o julgamento do caso Marbury vs. Madison nos Estados Unidos, mudou-se de
paradigma: a Constituição passou a ser dotada de supremacia tal que os atos de outros poderes (a
ela incompatíveis) poderiam ser invalidados por um tribunal.10

Como consequência direta, os tribunais perderam o caráter puramente técnico, transformando-se em


verdadeiro poder. Dotados de importância na governança nacional, passaram a catalisar não apenas
temas do direito constitucional, como a interpretação constitucional, separação de poderes,
democracia, organização do Judiciário, direitos fundamentais, federalismo, mas também da ciência
política e da filosofia.11

Não mais subsiste o pretenso discurso de separação estanque entre as áreas do direito e da política,
havendo sobreposição entre elas.12 Por mais que o direito deva ter uma pretensão autônoma em
relação à política, toda a decisão proferida refletirá também fatores extrajurídicos13 – contudo, é na
aplicação do direito que o distanciamento em relação à política se impõe.14

Constituem causas diretas dessa sobreposição: (i) o reconhecimento do Judiciário para a proteção
de direitos fundamentais e do Estado de direito; (ii) a desilusão com a política majoritária; e (iii) a
preferência dos atores políticos em que seja o Judiciário a instância decisória de questões
polêmicas.15

Questões relevantes do ponto de vista político, social ou moral estão sendo decididas, em caráter
final, pelo Judiciário (fenômeno da judicialização). Há verdadeira transferência de poder para as
instituições judiciais em detrimento do Legislativo e do Executivo. O fenômeno é particularmente
intenso no Brasil, com decisões provocando reações diretas (e, às vezes, enérgicas) nos demais
poderes.16 Entretanto, não se pode imputar “aos Ministros do STF a ambição ou a pretensão [...] de
criar um modelo juriscêntrico, de hegemonia judicial”, haja vista que tal modelo decorre da disposição
constitucional.17

Isso não significa, contudo, que o controle de constitucionalidade represente a mera “submissão das
leis à guilhotina anuladora judiciária”. Com o diálogo entre Judiciário e legislador, existe a
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possibilidade – inclusive – de uma superação legislativa (legislative override), isto é, de o


legislador rediscutir decisões tomadas pela Corte e, se for o caso, superá-las.18 Entretanto, o
legislative override não implica soberania absoluta do parlamento ou do congresso, nem é instituto
presente na maioria dos ordenamentos.

Deve-se ter em mente a visão externada por John Rawls e sintetizada por Virgílio Afonso da Silva,
de que “o poder final não pode ser deixado para o Poder Legislativo, mas também não para o Poder
Judiciário. O poder final é compartilhado pelos três poderes [...]. Para tanto, é preciso haver diálogo”.
19
A Carta Magna de 1988 proporcionou ao Judiciário o papel de realização de direitos, de forma que
o princípio de separação dos poderes merece ser analisado a partir da Constituição, com a ideia de
controles recíprocos e, principalmente, de diálogo.20

Nesse contexto, merece destaque a teoria de atribuição de poderes desenvolvida por Karl
Loewenstein, posicionando as cortes constitucionais como um dos quatro detentores formais de
poder, ao lado do governo, da assembleia e dos partidos políticos.21 De qualquer sorte, é evidente o
protagonismo e a força conquistados pelo Judiciário.22

2. Democracia, direitos fundamentais e função jurisdicional

Evidentemente, nem sempre é o diálogo que prevalece quando a lei ou ato normativo são
submetidos à jurisdição constitucional. Às vezes, a relação entre os Poderes acaba não sendo
saudável, havendo a possibilidade de um deles simplesmente sobrepor uma decisão sobre a do
outro, sem adequado diálogo e argumentação adequados.

Por isso, faz-se necessário entender a relação da jurisdição constitucional com a democracia, tendo
em vista que juízes anulam atos emanados dos representantes da sociedade. Além de compreender
o ponto de vista judicial, a reação do Legislativo também deve ser objeto de análises.

2.1. O Judiciário como defensor dos direitos fundamentais

Constitui papel das cortes e tribunais constitucionais a proteção e promoção de direitos


fundamentais, assegurando o governo da maioria e resguardando as regras do jogo democrático.24
Assim, afirma Luís Roberto Barroso que “[E]eventual atuação contramajoritária do Judiciário em
defesa dos elementos essenciais da Constituição se dará a favor e não contra a democracia”.25

Referida postura é alvo de críticas, elencadas por J. Waldron em dois argumentos centrais: (i) de
que não existe qualquer razão para crer que os direitos estariam melhor protegidos pelo exercício do
judicial review do que por legislaturas democráticas; e (ii) de que, sob o ponto de vista democrático,
o Judiciário seria ilegítimo para tais decisões.26

Nas palavras do próprio autor, o controle de constitucionalidade é “inapropriado para sociedades


democráticas cujo problema principal não é a disfuncionalidade do legislativo, mas sim o fato de seus
membros discordarem sobre direitos”.27

A questão da legitimidade da jurisdição para anular atos legislativos foi também tratada por Robert
Alexy. O autor afirma três formas de contemplar a relação entre direitos fundamentais e democracia:
uma ingênua, uma idealista e outra realista.28

Na concepção ingênua, é inconcebível o conflito entre direitos fundamentais e democracia; na


idealista, pautando-se em uma sociedade ideal, a maioria parlamentar jamais defenderia posições
capazes de violar direitos fundamentais; já na realista (concepção aceita por Alexy), admite-se que
os direitos fundamentais podem ser democráticos e antidemocráticos.

Direitos fundamentais seriam antidemocráticos justamente pelo fato de terem a função de “verificar a
adequação do processo democrático ou de negar as decisões da maioria parlamentar legitimada
pelo povo”. Porém, não há simples oposição do direito fundamental à lei (elaborada
democraticamente pelos “representantes do povo”), mas sim a demonstração, “mediante adequada
argumentação”, de que a posição adotada pelo legislativo contrasta com direito fundamental. O
controle de constitucionalidade da lei justifica-se justamente em julgamentos amparados em bons
argumentos, desde que assim reconhecidos “por todas aquelas pessoas racionais que aceitam a
Constituição”.29

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Isso não significa, contudo, que o exercício do controle de constitucionalidade implica nulidade da
maioria dos atos legislativos e normativos impugnados – “a invalidação de atos emanados do
Legislativo é a exceção, e não a regra”.30 Na grande maioria dos casos:

“[...] as cortes constitucionais mantêm a legislação impugnada, julgando improcedente o pedido. Isto
se deve à primazia que a Constituição deu ao Legislativo para a tomada de decisões políticas e à
deferência que os tribunais devem aos atos dos outros ramos do governo, em nome do princípio da
separação de Poderes. Como consequência, uma quantidade relativamente pequena de leis é
declarada inconstitucional” (BARROSO, 2018, p. 2.196).

Um estudo realizado junto à Universidade Federal de Pernambuco, analisando ADIs julgadas no


período compreendido entre 1988 e 2016, chegou-se à conclusão de que apenas 21,3% delas foram
julgadas procedentes, isto é, tiveram parcial ou integral provimento.31 Além de tal dado coincidir com
a afirmação apresentada acima, deve ser levado em conta que nem toda decisão de procedência
implica a anulação do texto legal – basta voltar-se às decisões de interpretação conforme ou
declaração parcial de nulidade sem redução de texto.

Supremas cortes e tribunais constitucionais, ao interferirem em atos praticados pelo Legislativo, no


intuito de proteger direitos fundamentais, exercem os papéis contramajoritário (invalidam atos dos
poderes eleitos), representativo (atendem demandas sociais não satisfeitas pelas instâncias
políticas) e iluminista (em momentos específicos, promovem avanços civilizatórios
independentemente das maiorias políticas circunstanciais).32

O papel contramajoritário implica a possibilidade de juízes integrantes de cortes superiores


sobreporem sua respectiva interpretação da Constituição sobre a de agentes políticos
democraticamente legítimos para tanto. Apresenta-se, pois, para proteger direitos fundamentais e
regras do jogo democrático.33 O papel representativo, por sua vez, significa a tomada de decisões
amplamente apoiadas pela população – não havendo a mesma recepção na política majoritária.34

Já o papel iluminista é empregado no seguinte sentido: “o de uma razão humanista que conduz o
processo civilizatório e empurra a história na direção do progresso social e da liberação de mulheres
e homens”. Cuida-se da superação do senso comum majoritário.35

No Brasil, são várias as decisões que podem ser consideradas iluministas, destacando-se, dentre o
rol, a ADI 4.983, que declarou inconstitucional a prática da vaquejada, e a ADI 4.277, que
reconheceu as uniões entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar – mesmo com 55% da
população brasileira sendo contra referido reconhecimento. Esse fenômeno não é exclusivo do
Brasil.36

Importante frisar, nesse ponto, que a figura da judicialização não se confunde com o ativismo.37
Judicialização é um fato, decorrência direta do modelo constitucional brasileiro,38 e significa “que
algumas das grandes questões políticas, morais e sociais do nosso tempo têm algum dos seus
capítulos decisivos perante os tribunais”.39

Ativismo, por sua vez, opõe-se à autocontenção do Judiciário. O primeiro se manifesta com:
(i) aplicação da Constituição a situações não expressas em seu texto; (ii) declaração de
inconstitucionalidade de atos emanados do Legislativo com base em critérios menos rígidos; e
(iii) imposição de condutas ou abstenções ao Poder Público.

Já a autocontenção toma lugar quando o Judiciário: (i) evita aplicar a Constituição em situações não
expressas em seu texto; (ii) utiliza critérios rígidos e conservadores para declarar inconstitucionais
leis e atos normativos; e (iii) se abstém de interferir na definição de políticas públicas.40

Pode-se afirmar que o ativismo, tal como a judicialização, também tem seu lugar na pauta do Brasil,
expondo um lado positivo e um negativo. A face positiva é de que o Judiciário está atendendo a
anseios da sociedade não satisfeitos pelo Congresso Nacional; enquanto a faceta negativa expõe
“as dificuldades enfrentadas pelo Poder Legislativo”.41

Cabe uma última ponderação sobre o ativismo: ele é um remédio poderoso que, utilizado em
excesso, gera o risco de “se morrer de cura”.42

2.2. O especial caso do legislative override


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Regressando à ideia de diálogo entre poderes, em especial à “resposta” do Legislativo, merece


melhor explicação a figura do legislative override. Havendo a possibilidade de o legislativo “superar”
a decisão proferida pelo Tribunal Constitucional, a decisão por este tomada não representaria o fim
do processo político.

Apresentam-se como requisitos do override: (i) a formação de uma “supermaioria”, de


aproximadamente dois terços ou três quartos do corpo legislativo; (ii) já ter havido a declaração de
inconstitucionalidade pela corte; (iii) ser exercida apenas pela legislatura federal; (iv) fazer constar
na lei o posicionamento da corte que está sendo “deixado de lado”, por exemplo: “a despeito da
decisão tomada, o Congresso (…)”.43

Sob um sistema de legislative override, o tribunal passaria a ser mais cuidadoso na tomada de
decisões, para o fim de evitar que seus julgamentos sejam superados pelo legislativo. O tribunal
consideraria a resposta do Legislativo e da sociedade antes de anular uma lei ou ato normativo.
Passaria, pois, a se esforçar para posicionar-se do lado da maioria da população (ou, ao menos, que
a maioria do legislativo não manifestasse oposição).44 A popularidade da lei tornar-se-ia um critério
para julgamento e, já de certa forma crítica, pode-se dizer que tornar-se-iam impossíveis as decisões
ditas iluministas.

Esse sistema seria mais apropriado quando “há baixa probabilidade de a maioria [parlamentar]
deliberadamente violar direitos de minorias”,45 e “menos apropriado quando a legislatura perdeu
credibilidade devido a ações pretéritas – como abuso de direitos, corrupção, ou incompetência”.46
Outro fator propício para a implementação desse sistema seria a existência de uma Corte
Constitucional com pouca atuação histórico-política.

Fazendo menção à relação entre direitos fundamentais e democracia cunhada por Alexy, pode-se
afirmar que o legislative override assume uma concepção idealista, em que a maioria parlamentar
jamais defenderia posições capazes de violar direitos fundamentais.

É evidente a impossibilidade de uma implementação manifesta do legislative override no sistema


legal-constitucional brasileiro. O Supremo Tribunal Federal é uma instituição atuante e de extrema
relevância e visibilidade – firmada historicamente –; o Congresso Nacional é alvo de críticas
constantes (sem fazer qualquer juízo de valor, cumpre observar que a mera turbulência já seria
capaz de prejudicar o modelo).

Não é o caso de afirmar, entretanto, a inexistência do legislative override no Brasil. Existe a


superação do posicionamento firmado pelo STF através de emendas à Constituição. O mais recente
(e célebre) exemplo é o da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.983 e da Emenda Constitucional
96/2017 (LGL\2017\4583). Em um primeiro momento, a vaquejada foi declarada inconstitucional;
porém, houve reação do Congresso logo em seguida, alterando o art. 225 da CF/88 (LGL\1988\3),
instituindo que “não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que
sejam manifestações culturais”.

Por mais que o “poder final” não pertença a nenhum dos poderes, a utilização de emendas
constitucionais para “derrubar” posicionamentos do Tribunal, além de banalizar ainda mais o instituto
das emendas, acaba por retirar a autoridade do órgão jurisdicional. Não se cogita que as decisões do
Tribunal sejam intocáveis. O que se pretende é um efetivo diálogo entre os poderes, e não uma
reação imediata do Legislativo movido por fins políticos – um verdadeiro contra-ataque institucional.

Talvez seja nesse momento que a teoria do legislative override encontra um grande obstáculo: as
incertezas do fator político – aqueles fatores extrajurídicos que sondam o próprio Tribunal e, por
óbvio, são manifestos no Congresso. O diálogo institucional, que tem como objeto a efetividade dos
direitos fundamentais, é afastado e preterido pela imposição de interesses meramente políticos, em
vezes alheios aos direitos fundamentais.

É aqui que a concepção realista de Alexy toma parte: direitos fundamentais são também
antidemocráticos. As lições de Barroso convergem nesse ponto: o Tribunal exerce os papéis
contramajoritário, representativo e iluminista.

Propõe-se uma alteração meramente gramatical, não conceitual. A defesa dos direitos fundamentais
não é, em si, antidemocrática por anular atos emanados dos representantes do povo. Retorna-se à
afirmação de Luís Roberto Barroso: “[E]eventual atuação contramajoritária do Judiciário em defesa
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dos elementos essenciais da Constituição se dará a favor e não contra a democracia”.47

Os direitos fundamentais transcendem à discussão das arenas política e judicial. Os direitos


fundamentais têm ligação direta com os cidadãos, sendo os três poderes garantidores, mediadores
da proteção de direitos. Decidir, através de uma argumentação sólida, debatida em plenário, que
referido texto legal ou ato normativo é inconstitucional preza, acima de tudo, pela democracia, pelos
direitos fundamentais. “Contramajoritariedade” não é sinônimo de antidemocrático, muito pelo
contrário, adotar uma concepção contramajoritária pode significar a efetiva garantia do jogo
democrático.

Proteger valores e direitos fundamentais pode significar ir contra a vontade de quem possui mais
votos – a “democracia não se resume ao princípio democrático”. É dever do Supremo Tribunal
Federal, como intérprete final da Constituição, “velar pelas regras do jogo democrático e pelos
direitos fundamentais, funcionando como um fórum de princípios – não de política – e de razão
pública – não de doutrinas abrangentes, sejam ideologias políticas ou concepções religiosas”.48

Entretanto, conforme é reiteradamente afirmado neste artigo, não se pode “anular” o parlamento,
deve prevalecer o diálogo acima de tudo. Caso tenha o Congresso observado com rigidez os valores
e fins constitucionais, sequer há que se falar em atuação do Judiciário.49

Porém, em sendo o caso e, havendo a atuação do Judiciário através do STF, como deve proceder o
órgão do qual foi emanada a lei ou ato normativo tido como nulo?

Toma-se como analogia, nesse ponto, um conceito proveniente do Direito Processual Civil: o
overruling. O Código de Processo Civil de 2015 inaugurou um sistema de força normativa de
precedentes judiciais vinculantes, visando à proteção da igualdade (pelo processo) e da segurança
jurídica. Com referida vinculação, surgiu uma questão: como fazer com que o Tribunal que fixa uma
tese possa (ele mesmo) superá-la, sem que os respectivos recursos esbarrem no juízo de
admissibilidade?50

A proteção à igualdade e à segurança “não pode implicar o engessamento do sistema jurídico. As


relações humanas, os contextos político, econômico, ético e cultural e social, assim como os
interesses gerais da comunidade, estão em constante evolução”. Assim, é imprescindível que a
vinculação possua brechas de abertura e mobilidade para o recurso que veicule razões idôneas51
– e é nesse contexto que se insere a possibilidade de superação dos precedentes (overruling).52

Barbosa Moreira já entendia que a fixação de uma tese jurídica estava condicionada a diversas
circunstâncias, especialmente à realidade social. Afirmava ser natural a evolução da jurisprudência
com a constante revisão das teses fixadas, alterando-se o entendimento da norma, por mais que
permanecesse o teor literal da lei.53

A competência de superação é do Tribunal que fixou o precedente ou de Corte a ele superior54 e,


para que a superação seja utilizada de forma adequada, o Código previu a possibilidade de
realização de:

“[...] audiências públicas e franquear a participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam
contribuir para a rediscussão da tese (art. 927, § 2º), bem como modular os efeitos da alteração no
interesse social e no da segurança jurídica (art. 927, § 3º). Além disso, prevê que as mencionadas
Cortes, sempre que promoverem a modificação do precedente, deverão observar a necessidade de
fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da
proteção da confiança e da isonomia (art. 927, § 4º).55 ”

Assim, deve tal conceito ser transplantado para o tema analisado neste trabalho: os direitos
fundamentais. Evidente que, lançada uma decisão em sede de controle abstrato e concentrado de
constitucionalidade, ela não ficará imune a qualquer mudança. A realidade é fluida, e assim também
deve ser a jurisprudência. Não deve haver o engessamento de uma norma ou de uma interpretação
tão somente por ter havido acórdão proveniente do STF.

Por óbvio, cabe a reanálise da matéria pelo próprio STF, eis que dele emanou a decisão. Entretanto,
independentemente da provocação do Poder Judiciário, entende-se cabível a revisão da decisão
proferida pelo Legislativo. Observada uma discussão constituída por amplo debate e uma decisão
pautada em fundamentação necessária e adequada, considerando – acima de tudo – a primazia
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dos direitos fundamentais, abre-se a possibilidade de que o Legislativo supere a tese firmada por
meio do controle abstrato concentrado. Sobre o tema:

“O diálogo institucional pressupõe, portanto, que os Poderes do Estado envolvidos, de boa-fé,


busquem a decisão mais adequada e dialoguem a respeito dela, de modo que a própria revisão
judicial assuma esse caráter dialógico, sendo essa ‘parte de um ‘diálogo’ entre los jueces y las
Legislaturas’, abandonando-se a ideia de uma última palavra dada pela jurisdição, sem possibilidade
de revisões e reconhecendo a ‘falibilidade de todas as instituições políticas, ao contrário das
doutrinas da supremacia judicial e parlamentar’. É importante, entretanto, que esse diálogo seja
pautado por uma argumentação que indique o porquê da adoção dos fundamentos sustentados por
cada uma das partes, não se tornando apenas uma sobreposição de diferentes posicionamentos dos
Poderes do Estado.56 ”

Rodrigo Brandão, ao abordar “a possibilidade de o Congresso Nacional aprovar Emenda


Constitucional superadora de decisão do STF”, cita como exemplos práticos as Emendas à
Constituição 19/98, 29/2000 e 39/2002, e chega à seguinte conclusão:

“[...] se a função precípua do STF é atuar como ‘guardião da constituição’, e se compete à maioria de
três quintos das Casas Legislativas alterar formalmente a constituição, a princípio não há óbice a
que, aprovando-se emenda que altere a norma constitucional que fundamenta decisão do STF,
acabe-se por conduzir, ainda que por via reflexa, à modificação da jurisprudência constitucional da
Suprema Corte.57 ”

Afirma, ainda, que o Congresso Nacional não poderia reverter a interpretação conferida pelo STF.
Todavia, considerando a não vinculação do posicionamento do STF ao Poder Legislativo, aponta que
“não se pode afastar a possibilidade de ser aprovada emenda constitucional em sentido contrário à
interpretação conferida pelo STF”, nem de o próprio Supremo rever o posicionamento.58 Em síntese,
a atuação contramajoritária do Judiciário deixaria de criar obstáculos para que “os canais de
deliberação democrática promovam alterações substanciais no projeto de desenvolvimento social
concebido pela geração constituinte”.

Ressalta, porém, os casos em que essa emenda é (ela mesma) submetida ao controle de
constitucionalidade e, consequentemente, “derrubada”, bem como a hipótese em que Judiciário e
Legislativo não obtenham consenso “sobre os seus âmbitos de atuação”. Nessas hipóteses,
instalar-se-ia um impasse constitucional.59

Assim, independentemente do autor, é latente o ponto de convergência neste tema: a necessidade


do diálogo institucional. Não sendo justo restringir a atuação do Legislativo, também fica a ressalva
de que a própria emenda pode ser objeto de posterior controle de constitucionalidade.

3. À procura de constantes: um estudo sobre a taxa de nulidade do STF

Constatada a relevância do estudo das decisões tomadas no âmbito do controle concentrado e


abstrato, percebe-se que tal tema abrange muito mais do que uma mera análise burocrática de
decisões, remetendo também a tensões entre poderes e lutas veladas pela palavra final. No intuito
de compreender tanto as causas como os efeitos dessas decisões, faz-se necessário relacioná-las
com critérios objetivos de avaliação.

3.1. Variáveis jurídicas e políticas atinentes ao abstract judicial review

A doutrina lista hipóteses, suposições e estipula constantes a fim de relacionar a taxa de nulidade
proveniente do exercício do controle de constitucionalidade com variáveis políticas, jurídicas e
institucionais.

Tomio, Robl Filho e Kanayama60 compilam diversos estudos referentes ao abstract judicial review,
listando as seguintes hipóteses: (i) a maior rigidez constitucional elevaria a taxa de declaração de
nulidade (cf. Lipjhart); (ii) a maior politização judicial, com o consequente aumento da participação
de veto players (governo, parlamento e partidos políticos), elevaria o número de atos e leis
declarados inconstitucionais (cf. Alivizatos); (iii) uma maior estabilidade política, decorrente da
participação direta de veto players, elevaria a taxa de inconstitucionalidade (cf. Tsebelis); e (iv) de
que o controle abstrato restringe a descentralização (cf. Bzedera).

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Os mesmos autores apresentam, ainda, a ideia de que (v) o maior número de legitimados para
propor ações em controle concentrado, aliado à autonomia individual e coletiva da corte e dos juízes,
aumentaria o número de atos declarados nulos; em contrapartida, baixos índices de declaração de
nulidade caracterizariam a absorção da corte pela coalizão.

Sintetizando as variáveis, constatar-se-ia, em um primeiro momento, relação direta da taxa de


inconstitucionalidade com os seguintes itens: rigidez constitucional, politização judicial
(independência ou absorção em face do congresso ou parlamento), número de legitimados para
propor as ações e a autonomia da corte e de seus integrantes.

Contudo, conforme apresentado pelos próprios autores, apenas a rigidez constitucional guardaria
associação positiva com a taxa de declaração de nulidade de atos normativos (quando comparados
os dados de Brasil, México, Portugal e Espanha).61 Propuseram, portanto, a incorporação de
variáveis políticas na explicação das decisões: composição do parlamento ou governo, nomeações
individuais para as cortes e a relação entre o nomeado e o governo, a posição majoritária do governo
na constitucionalidade – ou não – e o tempo despendido até que fosse proferida decisão pela
corte.62

Através dos dados fornecidos pelos repositórios de Tribunais e Cortes Constitucionais do Brasil,
Espanha, Itália, México e Portugal, foram compiladas as decisões (em sede de controle concentrado
e abstrato) proferidas entre 2010 e o primeiro semestre de 2019.

Com esses dados, pretendia-se analisar as seguintes variáveis: (i) composição do parlamento ou
governo; (ii) nomeações individuais para as cortes; (iii) a relação entre o nomeado e o governo;
(iv) a posição majoritária do governo na constitucionalidade – ou não – da lei ou ato normativo;
(v) rigidez constitucional; e (vi) tempo despendido até a decisão final.

No período compreendido entre 2010 e 2019, o STF julgou, em sede de decisão final, 1.437 ADIs.
Delas, apenas 517 tiveram o julgamento procedente, declarando a inconstitucionalidade (parcial ou
total63 ) de lei ou ato normativo federal. Constatou-se, também, que o tempo médio para que seja
proferida uma decisão é de sete anos e oito meses.

A partir de uma análise puramente quantitativa, considerando as variáveis apresentadas


anteriormente, observou-se apenas uma relação inversamente proporcional entre a nulidade de atos
e leis e o tempo para a pronunciação do tribunal – isto é, quanto menor o tempo despendido até o
julgamento, maior é a taxa de nulidade. Sobre a relação com a rigidez constitucional, não foram
constatadas, a priori, relações diretas com referida taxa (uma análise mais apurada será realizada no
item 5).

Em relação às variáveis de nomeações individuais para a corte e a relação do indicado com o


governo, constatou-se uma forte influência política em todas as nomeações. Mesmo em Portugal,
país que optou pela não participação do Presidente da República na escolha dos membros de seu
Tribunal Constitucional, permanece a influência da Assembleia da República (Legislativo).64 Sendo
assim, inexistem razões para que as influências que rondam a nomeação interfiram na taxa de
nulidade, uma vez que as taxas dos países divergem (mesmo com uma constante em comum).

Há de se consignar que, ao menos no caso brasileiro, não é correto afirmar que a forma de indicação
de Ministros ao STF compromete a autonomia do Judiciário. Conforme Virgílio Afonso da Silva, um
dos motivos que garante a autonomia dos Ministros é o fato de o processo de escolha depender não
apenas da escolha do Presidente da República, mas também do Senado Federal – este,
responsável por sabatinar e aprovar (ou não) o indicado.65 Sem prejuízo, considerando que os
Ministros mantêm o cargo até serem (em regra) compulsoriamente aposentados, suas atividades no
Tribunal ultrapassam, muitas vezes, o tempo de mandato do Presidente que os indicou.66

Os critérios de composição do parlamento e seu posicionamento da constitucionalidade deixaram de


ser analisados em razão da impossibilidade de se verificar a posição do Congresso Nacional em
mais de 1.400 decisões – além de herculano, referido trabalho não apresentaria uma constante
devido à alternância de poderes no Legislativo e Executivo.

Para fins de exposição, considerando a ressalva já apresentada (de que as decisões foram
“simplificadas” em procedentes e improcedentes), apresentam-se os dados colhidos nos países,
outrora indicados, no período compreendido entre 2010 e o primeiro semestre de 2019:67
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País Decisões finais Tempo médio Taxa de nulidade


Brasil 1.437 7 anos e 8 meses 36%
Espanha 528 4 anos e 7 meses 50%
Itália 796 1 ano e 8 meses 67%
México 631 8 meses 54%
Portugal 119 9 meses 56%

Antes de prosseguir com o estudo, a quantidade de processos julgada pelo STF merece destaque.
De fato, existem ações ajuizadas há anos, entretanto, considerando o sobrecarregamento do
Tribunal, é evidente que sua taxa de eficiência é alta.68

3.2. Um problema advindo das variáveis: análise quantitativa x qualitativa

O controle abstrato/concentrado de constitucionalidade culmina não apenas em uma decisão que


declara uma lei constitucional ou inconstitucional.

Imagine-se a seguinte hipótese: uma ADI que contenha dez pedidos, todos referentes a diferentes
dispositivos de uma lei específica. O que se requer não é a inconstitucionalidade da lei, mas de
artigos, incisos ou parágrafos específicos. A decisão proferida pelo Tribunal pode declarar nove dos
dez dispositivos inconstitucionais e seria contabilizada, através do critério quantitativo adotado
apresentado anteriormente, como uma decisão que de fato declarou a inconstitucionalidade de lei ou
ato normativo.69

Porém, e se o único dispositivo que não foi tido como inconstitucional fosse a verdadeira razão do
ajuizamento da ADI? Isto é, e se o único pedido julgado improcedente fosse o que realmente
causasse impactos na sociedade? E se aquele único dispositivo fosse o que mais causasse debates
e implicações práticas nos cidadãos e no livre exercício dos direitos fundamentais?

Nessas hipóteses, por mais que 90% (noventa por cento) da ADI tenha o julgamento de
procedência – pela decretação de nulidade de lei ou ato normativo –, a análise qualitativa não
permite que tal decisão seja tida como de “procedência”. O real objetivo não foi alcançado, a
verdadeira tutela jurisdicional pretendida não foi efetivada.

Não se está desmerecendo, por óbvio, a análise quantitativa – que, inclusive, funda os dados
empíricos deste trabalho. Ela é necessária, importante e essencial para determinados fins. Contudo,
não é possível adotar um discurso cego à análise qualitativa.

Além do exemplo hipotético apresentado, uma ADI não é “binária”. Os resultados da ADI (seja a
análise qualitativa ou quantitativa) podem ser outros além da declaração de constitucionalidade ou
inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo. Pode haver interpretação conforme ou declaração
parcial de nulidade sem redução de texto, por exemplo.

Na interpretação conforme (que “não constitui método de interpretação, mas técnica de controle de
constitucionalidade”), persiste a constitucionalidade da norma mesmo quando a ADI é julgada
procedente, haja vista que apenas a “interpretação suscitada [pelo requerente] é reconhecida
incompatível com a Constituição”. Já na declaração parcial de nulidade sem redução de texto,
reconhece-se a aplicação de determinada norma em certa situação (suscitada pela parte),
“admitindo-se sua aplicabilidade em outras situações”.70

A apresentação dos diferentes pedidos formulados e resultados de uma ADI é feita justamente para
ilustrar “ponto cego” da análise quantitativa. Em uma primeira análise, pode-se cogitar que a
declaração de nulidade de um tribunal, em sede de controle abstrato/concentrado, é alta. Porém,
analisando decisão por decisão (de forma qualitativa), existe a hipótese de a maioria das decisões
que julgaram os pedidos como procedentes deixou de anular o verdadeiro dispositivo que fundou
toda a controvérsia, ou que simplesmente declarou como inconstitucional determinada interpretação
da norma – mantendo-a no ordenamento.

4. Aplicação das variáveis: submissão do estudo à prática

Neste trabalho, serão analisadas apenas duas variáveis: o tempo despendido até a decisão final e a
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rigidez constitucional. Neste item, serão expostas ações-modelo para fins de amostragem. Após,
serão os dados dessas ações submetidas à variável temporal para o fim de constatar se, quanto
maior ou menor o tempo, maior a taxa de constitucionalidade.

4.1. As Ações Diretas de Inconstitucionalidade sob análise: exposição de motivos

Foram selecionadas as seguintes ADIs para o estudo: (i) ADI 4.983, que declarou inconstitucional a
vaquejada; (ii) ADI 3.937, que declarou constitucional a proibição do amianto; (iii) ADI 4.277, que
reconheceu as uniões entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar; e (iv) ADI 5.508, que
julgou constitucional a celebração de acordos de colaboração premiada por delegados de polícia.

A ADI 4.983 foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República em 31 de maio de 2013, pretendendo
a declaração de inconstitucionalidade da Lei 15.299/2013 do Estado do Ceará – que regulamentou
a vaquejada como prática desportiva e cultural. Em 2016 (publicação em 27 de abril de 2017), o
Min. Marco Aurélio, após analisar ambos os princípios envolvendo a questão (de um lado o direito
fundamental ao meio ambiente sadio e equilibrado; de outro, direito fundamental à cultura e ao
patrimônio histórico), decidiu pela inconstitucionalidade da vaquejada.71

Em 1º de agosto de 2007, foi ajuizada a ADI 3.937. Nela, a Confederação Nacional dos
Trabalhadores da Indústria (CNTI) pretendia que a proibição do uso de amianto (da espécie
crisotila) fosse declarada inconstitucional. O julgamento se encerrou no ano de 2017 (publicação em
1º de fevereiro de 2019), tendo o Tribunal julgado improcedente a ação. No acórdão, os direitos
fundamentais à saúde e ao meio ambiente levaram à improcedência da ADI, enquanto a
argumentação da CNTI tinha como premissa o direito fundamental à livre iniciativa, da livre
concorrência e da propriedade.

No que se refere à ADI 4.277, houve a afirmação do direito fundamental à dignidade da pessoa
humana – representada, no caso, pela liberdade sexual, pelo livre desenvolvimento da
personalidade e pela busca da felicidade. O julgamento ocorreu em 2011 (publicação em 14 de
outubro de 2011). A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral da República em 05 de dezembro de
2006.

Por fim, a ADI 5.508 foi proposta também pela Procuradoria-Geral da República – em 26 de abril de
2016. A ação questionava dispositivos da Lei 12.850/13 (LGL\2013\7484) (que define organização
criminosa e trata da colaboração premiada), especificamente os §§ 4º e 6º, que permitiam ao
delegado de polícia firmar acordos de colaboração premiada. Em 20 de junho de 2018, a ação foi
julgada improcedente.

As quatro ações apresentadas versam sobre temas diversos, porém, todas têm um ponto de
convergência: abordaram temas polêmicos, dignos de manchetes e cobertura jornalística. Ato
contínuo, todas elas envolveram diretamente direitos fundamentais, sejam de primeira, segunda ou
terceira geração.

4.2. Resultados: tempo despendido até a decisão final

Compilando os dados anteriormente expostos, chega-se à seguinte tabela comparativa:

Número da ADI Tempo para decisão Ano da decisão Resultado


ADI 4.983 3 anos 2016 Procedente – pela
inconstitucionalidade
ADI 3.937 10 anos 2017 Improcedente – pela
constitucionalidade
ADI 4.277 5 anos 2011 Procedente – pela
interpretação conforme
ADI 5.508 2 anos 2018 Improcedente – pela
constitucionalidade

Tem-se, portanto, que a ação com a maior tramitação é a relativa ao amianto. Talvez pela pressão
da indústria – que, de fato, gerava empregos –, a ação tomou longo período. De outro vértice, a
ADI com resultado mais célere envolve garantias processuais penais – questão “meramente”
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jurídica, sem a necessidade de oitiva de especialistas técnicos.

Analisando todas as ações entre 2010 e 2019, o tempo médio para decisão era de sete anos e oito
meses, com taxa de nulidade média de 36%. Nas quatro ações anteriormente apresentadas, apenas
uma foi julgada procedente, pela inconstitucionalidade – representando 25%. Sem prejuízo, essa
única ADI julgou determinado ato normativo inconstitucional demorou três anos para sua conclusão.

De certo modo, pode-se dizer que a baixa taxa de nulidade do STF acabou constatada nessas
quatro ADI’s, afinal, apenas uma delas declarou nulidades. Quanto ao tempo médio de tramitação,
este foi de cinco anos nas quatro ADI’s aqui analisadas. Novamente, há certa relação com a média
geral constatada (de quase sete anos e oito meses).

Em item anterior, foi afirmado que, quanto menor o tempo despendido até o julgamento, maior é a
taxa de nulidade. Nas quatro ações analisadas, a segunda que menos demorou foi a única que
declarou nulidade de lei. A afirmativa se confirma. Veja-se que, após três anos, houve a declaração
de inconstitucionalidade. Já na ADI 3.937, que demorou dez anos até haver uma decisão final, o
resultado foi improcedente.

Embora não seja possível afirmar, categoricamente, constantes e verdades no mundo jurídico, é
possível constatar certa relação entre as constantes encontradas no estudo quantitativo com os
resultados provenientes do estudo dessas quatro ADI’s. A priori, a taxa de nulidade de atos é maior
quanto menor o tempo para decisão.

Em um âmbito global, esse resultado advém, talvez, do grande número de ações diretas distribuídas
junto ao STF. Isto é, basta que um ato gere certa comoção na sociedade que determinados partidos
políticos ingressam, em seguida, com uma ADI para “restabelecer a ordem”. Entretanto, muitas
dessas ações são desde já indeferidas, afinal, nem sempre preenchem os requisitos legais para
tanto.

5. Análise em separado: rigidez constitucional

A rigidez constitucional é uma variável que carece de análise pormenorizada. A Constituição


brasileira adota, em seu texto, uma rigidez considerada como alta, de forma que, em princípio, a
alteração ou modificação da carta constitucional deveria ser rara em nosso ordenamento. Todavia, a
realidade expõe dados completamente diversos, com mais de uma centena de emendas à
constituição em aproximadamente 30 anos de vigência do texto.

5.1. A rigidez constitucional no Brasil

A depender do grau de formalidade do procedimento necessário para a mudança da constituição, ela


poderá ser classificada como rígida ou flexível. A primeira modalidade exige “procedimento especial,
solene, dificultoso, exigente de maiorias parlamentares elevadas”, enquanto a segunda permite
alterações na carta magna através de procedimento indiferenciado do processo legislativo comum.72

A rigidez remete à supremacia da Constituição, e se expressa, dentre outros, na “instituição de um


sistema de controle de validade dos atos praticados pelos poderes constituídos, em face das normas
do Texto constitucional. A rigidez, para ser efetiva, requer um sistema de constitucionalidade das leis
e atos normativos (...)”.73 Em posicionamento semelhante, José Afonso da Silva, ao dissertar sobre a
Constituição, também ressalta que “da rigidez emana, como primordial consequência, o princípio da
supremacia da constituição”.74

Conforme dispõem os artigos 60 e seguintes da Constituição da República de 1988, podem


apresentar emendas (i) um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do
Senado Federal; (ii) o Presidente da República; e (iii) mais da metade das Assembleias Legislativas
das unidades da Federação. Ademais, dispõe o art. 60, § 2º, que o projeto de emenda à
constituição carece de aprovação de três quintos da Câmara e do Senado Federal.

Para além do rol enxuto de legitimados para propor emendas à constituição, a formação de uma
supermaioria apresenta-se como requisito para que seja a emenda aprovada. Constatados esses
fatos, fica claro que a Constituição da República de 1988 se inclui no quadro de constituições rígidas.
Como explicar, então, mais de cem emendas à constituição em pouco mais de 30 anos de vigência
da CF/88 (LGL\1988\3)?
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5.2. Ações Diretas de Constitucionalidade: em busca da rigidez

Por mais que esteja inserta no rol de constituições rígidas, pode-se afirmar – por meio de dados
empíricos – que a Constituição brasileira apresenta uma das menores taxas de rigidez (efetiva) em
toda a América Latina.75 Ou seja, a rigidez do texto constitucional acaba por residir apenas no campo
formal, sendo que a realidade expõe uma faceta muito mais “flexível”, fator esse que “explica” o
grande número de emendas à Constituição.

A contrariedade entre teoria e prática é evidente. Com “apenas” 56 emendas à Constituição, já em


2008 era constatada que os governos não vinham encontrando grandes dificuldades na alteração
formal da Constituição.76

Partindo da tabela apresentada no item 3.1., 36% das ações diretas de constitucionalidade
analisadas pelo STF entre 2010 e 2019 foram julgadas procedentes – declararam a nulidade de
dispositivos. Esse percentual é nitidamente baixo, ainda mais quando comparado com os índices de
Espanha (50%), Itália (67%), México (54%) e Portugal (56%).

Torna-se claro que a rigidez constitucional brasileira é muito mais formal do que real. Inclusive, isso
acaba por ratificar uma das conclusões de Tomio, Robl Filho e Kanayama, de que a rigidez
constitucional guarda associação positiva com a taxa de declaração de nulidade de atos normativos.
Quanto menor a rigidez, menor o índice de nulidade.77

Uma observação, porém, é necessária. A rigidez acima aludida é aquela real, verificada
fatidicamente e nos dados do respectivo Tribunal. Isso porque, considerando a rigidez estabelecida
em nossa Constituição, a conclusão seria justamente a inversa.

6. Considerações finais

O Judiciário é um Poder atuante no Estado Democrático de Direito, com participação constante em


temas sensíveis da sociedade – em especial quando estão em debate direitos fundamentais. É
mais que evidente que o Poder Judiciário, ao menos no Brasil, não é en quelque façon, nulle. Ele
está no centro de decisões políticas, econômicas e sociais – i.e., decisões de suma importância
para o desenvolvimento do país.

O papel do STF é de, acima de tudo, proteger e promover direitos fundamentais, resguardando as
regras do jogo democrático, seja com apoio ou de forma contrária ao anseio popular. Atuar de forma
contramajoritária, porém, não significa ser antidemocrático, muito pelo contrário, pode significar a
efetiva implementação de direitos.

Frisa-se que esse papel não seria necessário em uma sociedade utópica, em que jamais houvesse
proposta legislativa que implicasse afronta aos direitos fundamentais; ou em que democracia e
direitos fundamentais jamais pudessem colidir. A realidade é outra e a atuação jurisdicional deve ser
condizente.

A maioria das críticas direcionadas ao STF são referentes a eventual violação de um direito no
momento de decidir. Talvez essa seja a questão de maior relevância e elas (as críticas) sempre irão
existir. Os casos apreciados não detêm resposta simples – esses de menor complexidade,
inclusive, sequer são objeto de grande debate. Todo caso complexo pode ter mais de uma resposta,
e isso é crucial para entender a atuação da Corte.

Essa posição atuante, por certo, acaba ocupando lacunas deixadas por outros Poderes ou, em
determinados casos, terreno alheio. É nesse momento de tensão institucional que conflitos entre
Poderes aparecem, ainda mais quando os interesses tutelados afetam diretamente a própria
sociedade. Por essa razão, o diálogo institucional é medida necessária a todo momento, evitando
sobreposições e conflitos propriamente ditos.

Do mesmo modo que o Legislativo pode tomar a decisão acertada, pode tomar decisões erradas (a
depender da subjetividade do indivíduo). Porém, salvo se houver inconstitucionalidade, não pode o
STF anular questões advindas de outro Poder. O controle é legal-constitucional, não de conveniência
e oportunidade. De outro lado, caso o STF tome uma decisão devidamente fundamentada, não
parece correto a aprovação de uma emenda à constituição tão somente por haver discordância para
com a decisão tomada. O cenário ideal envolve, acima de tudo, diálogo.
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desafio democrático

Sob a ótica judicial, isto é, da atuação da Corte Suprema, este artigo se propôs a encontrar
constantes na taxa de nulidade de atos declarada pelo Tribunal. Evidentemente, não é possível
localizar constantes exatas, afinal, Direito não é um simples cálculo de soma ou subtração. Porém, a
taxa de nulidade de atos aparenta ser maior quanto menor o tempo para decisão. Além disso, ainda
que rígida no aspecto formal, a Constituição apresenta faceta mais maleável no campo prático, razão
pela qual a rigidez constitucional guarda associação positiva com a taxa de nulidade – quanto
menor a rigidez, menor o índice de nulidade.

Concluindo, tem-se uma Suprema Corte forte e atuante, responsável por resguardar direitos
fundamentais. Isso, por si só, já causa intenso desgaste – afinal, o controle de constitucionalidade
implica a escolha de um lado em casos complexos e de grande repercussão. O papel do STF,
contudo, não é “final”. É possível que eventual matéria seja revisitada pelo próprio Tribunal ou
superada pelo Legislativo – ficando aqui as críticas ao uso indevido de emendas constitucionais.

Diferentemente do que parece, porém, o STF não é um “carrasco” de atos dos demais poderes, sua
taxa de nulidade é relativamente baixa. Assim, ao mesmo tempo que expõe sua força democrática
(protetiva e promovente), nos números, respeita decisões que também possuem viés democrático
(este, representativo). Como projeto futuro, independentemente da situação atual, deve-se ter em
mente a primazia do diálogo institucional, essencial para o bom funcionamento da democracia como
um todo.

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1 .BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. [Syn]Thesis,


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2 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista: Os papéis dos tribunais


constitucionais nas democracias contemporâneas. Revista Direito e Práxis, [S.l.], v. 9, n. 4, dez.
2018. p. 2.196.

3 .O esboço apresentado refere-se tão somente ao controle de constitucionalidade exercido pelo


Judiciário de forma a posteriori, isto é, após a edição de leis e atos normativos.

4 .ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das liminares nas ações de controle concentrado de
constitucionalidade. Revista de Processo, n. 98, abr./jun. 2000. p. 275.

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desafio democrático

5 .Dar-se-á o controle abstrato concentrado através das seguintes ações: Ação Direta de
Inconstitucionalidade; Ação Direta de Constitucionalidade; Ação Direta de Inconstitucionalidade por
Omissão; Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.

6 .Ressalta-se que o modelo brasileiro é híbrido, possuindo, concomitantemente, controles


(a) difuso, (b) concentrado – realizados, respectivamente, (i) por qualquer juiz e (ii) pelo Supremo
Tribunal Federal ou Tribunais de Justiça –, (c) incidental (quando a questão constitucional advém
de um caso concreto) e (d) principal (dito abstrato, em que é discutida apenas a
constitucionalidade).

7 .Sobre o tema: CASTRO, Moisés Coelho; BORGES, Daniel Damásio. Do “concreto” ao “abstrato”:
a tendência de abstrativização do controle de constitucionalidade no Brasil. Revista da Faculdade de
Direito do Sul de Minas, v. 35, p. 211-233, 2019.

8 .Conforme enuncia o art. 102, I, a), da Constituição Federal de 1988, compete ao Supremo
Tribunal Federal o processamento e julgamento da “ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato
normativo federal ou estadual (...)”.

9 .MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de
processo civil: teoria do processo civil. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 2017. v. 1. p. 286.

10 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista..., Op. cit.,


p. 2.175-2.176.

11 .SILVA, Virgílio Afonso da. O STF e o controle de constitucionalidade: deliberação, diálogo e


razão pública. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 250, p. 197-227, jan. 2009.
p. 198.

12 .Remete-se aqui, inclusive, ao conceito de sistema elaborado por Luhmann, no sentido de que o
sistema jurídico é normativamente fechado, mas cognitivamente aberto. Ou seja, não há que se falar
em isolamento total, em “pureza”.

13 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista..., Op. cit., p. 2.194.


Ainda, conforme anota Conrado Hübner Mendes, “deve-se perceber que a corte não está fora da
política e não é o agente neutro que às vezes se supõe”. (MENDES, Conrado Hübner. Direitos
fundamentais, separação de poderes e deliberação. Dissertação (Doutorado em
Direito) – Departamento de Ciência Política, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
p. 91-92).

14 .Ibidem, p. 2.217.

15 .Ibidem, p. 2.177.

16 .Ibidem, p. 2.178-2.179. Exemplo notório é o da decisão que descriminalizou o aborto até o


terceiro mês de gestação, apontado pelo Ministro Barroso. Logo após proferida a decisão, a Câmara
dos Deputados constituiu “comissão especial para apresentar proposta de emenda à Constituição
revertendo a decisão”.

17 .BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial..., Op. cit., p. 25.


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Abstract judicial review: concretização de direitos e o
desafio democrático

18 .SILVA, Virgílio Afonso da. Op. cit., p. 212.

19 .Ibidem, p. 221.

20 .BARBOZA, Estefânia Maria de Queiroz; KOZICKI, Katya. Judicialização da política e controle


judicial de políticas públicas. Rev. direito GV, São Paulo, v. 8, n. 1, jun. 2012. p. 79.

21 .TOMIO, F.R.L.; PUGLIESE, W. Democracia constitucional contemporânea e Separação de


Poderes: uma análise com base no presidencialismo de coalizão. Pensar (UNIFOR), v. 20, 2015.
p. 364.

22 .Cf. BARBOZA, Estefânia Maria de Queiroz; KOZICKI, Katya. Op. cit., p. 64: “Esse aumento de
deferência do Legislativo para o Judiciário aconteceu em várias nações ao redor do mundo,
transformando as Supremas Cortes no mais importante corpo de tomada decisão política”.

23 .Vale ressaltar, porém, que existem casos em que o papel exercido pelos tribunais se deu “contra
os direitos das minorias”. Sobre o tema: ARAUJO, Luis Claudio Martins; MORAES, Guilherme Braga
Peña de. Contramajoritarismo, diálogo-argumentativo e legitimação das expectativas institucionais: o
papel estabilizador das Cortes nas sociedades complexas. Revista Quaestio Iuris, v. 11, n. 2, Rio de
Janeiro, 2018. p. 927-931.

24 .SILVA, Virgílio Afonso da. Op. cit., p. 221.

25 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista..., Op. cit., p. 2.186.

26 .BARBOZA, Estefânia Maria de Queiroz; KOZICKI, Katya. Op. cit., p. 64.

27 .WALDRON, J. The Core Against Judicial Review. The Yale Law Journal, v. 115, 2006. p. 1.406.
Do original: “(...) inappropriate for reasonably democratic societies whose main problem is not that
their legislative institutions are dysfunctional but that their members disagree about rights”.

28 .MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 98.

29 .Ibidem., p. 100-101. Frisa-se o trecho extraído pelos autores da obra Balancing, constitutional
review and representation.International Journal of Constitutional Law, v. 3, n. 4, p. 572-581,
out. 2005. p. 580, de Robert Alexy: “O controle judicial de constitucionalidade pode obter sucesso
somente se os argumentos apresentados pelo tribunal constitucional são consistentes e somente se
um número suficiente dos membros da comunidade está apto e desejoso de exercer suas
capacidades racionais”.

30 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista..., Op. cit., p. 2.200.

31 .FERNANDES, Antônio Alves Tôrres. Emendas constitucionais e ações diretas de


inconstitucionalidade no Brasil (1988-2016). Revista de Estudos Empíricos em Direito. v. 5, n. 3,
dez. 2018. p. 25.

32 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista…, Op. cit., p. 2.218.

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Abstract judicial review: concretização de direitos e o
desafio democrático

33 .Ibidem, p. 2.197-2.198.

34 .Ibidem, p. 2.205.

35 .Ibidem, p. 2.208-2.209.

36 .Ibidem, p. 2.215-2.216.

37 .Cabe aqui destacar a fala do ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto, em
seu artigo “Poder Judiciário: ativismo versus proatividade”: “O ativismo é proibido, a proatividade é
dever. Dever de desentranhar dos dispositivos jurídicos, isoladamente e também imersos no sistema
de que eles façam parte, todas as respectivas angulações ou propriedades normativas. Dever de não
ficar aquém do potencial normativo ali engastado. Dever, enfim, de imprimir aos enunciados jurídicos
todos os ganhos de funcionalidade sistêmica a que eles se predisponham. Inclusive e sobretudo
diante de comandos ativistas por si mesmos. Ativismo, óbvio, não como subjetiva postura do
intérprete, porém como objetivo traço de preceitos que tudo investem na sua própria força normativa.
Sem nenhuma dependência de legislação intercalar, portanto. Como faz a Constituição, por
amostragem, nos parágrafos 1.º e 2.º do seu artigo 5.º: o primeiro, a dizer que ‘as normas definidoras
dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata’# o segundo, a ordenar que ‘os direitos
e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados (...)’. Concluo, citando opinião atribuída a Michelangelo: ‘As estátuas não se fazem.
Elas já estão feitas no mármore bruto. Eu apenas removo os excessos’. Pois assim é que deve ser o
atuar do juiz: apenas desvelar (de tirar os véus) a inteira compostura das normas jurídicas. Desvelar
argumentativamente normas já abrigadas no objeto de sua interpretação. Mas fazê-lo com todo o
empenho, paciência, imparcialidade, independência, sentimento, pensamento e consciência, pois a
norma só se dá por inteiro a quem por inteiro se dá a ela”. Disponível em:
[https://ayresbritto.adv.br/poder-judiciario-ativismo-versus-proatividade-ayres-britto/].

38 .BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática, Op. cit.,
p. 25.

39 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista…, Op cit., p. 2.217.

40 .BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática, Op. cit.,
p. 26.

41 .Ibidem, p. 27.

42 .Ibidem, p. 32.

43 .STEPHANOPOULOS, Nicholas. The Case for the Legislative Override. UCLA Journal of
International Law and Foreign Affairs, v. 250, n. 10, 2005. p. 264-269.

44 .Ibidem, p. 280-281.

45 .Ibidem, p. 291. Do original: “[the legislative override system] is most apposite when there is a
relatively low probability that the majority will deliberately violate minority rights”.

46 .Idem. Do original: “[The override] is least appropriate when the legislature has been discredited
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Abstract judicial review: concretização de direitos e o
desafio democrático

due to its past actions - such as abuse of rights, corruption, or general incompetence”.

47 .BARROSO, Luís Roberto. Contramajoritário, Representativo e Iluminista…, Op. cit., p. 2.186.

48 .BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática, Op. cit.,
p. 28.

49 .Idem.

50 .LIPIANI, Júlia. Como promover a superação dos precedentes formados nos julgamentos de
recursos repetitivos por meio dos recursos especial e extraordinário? In: GALINDO, Beatriz
Magalhães; KOHLBACH, Marcela (Coords). Recursos no CPC/15 (LGL\2015\1656): perspectivas,
críticas e desafios. Salvador: Editora JusPodivm. p. 146-147.

51 .Ibidem, p. 160.

52 .Ibidem, p. 148.

53 .Idem.

54 .Ibidem, p. 152-153.

55 .Ibidem, p. 151.

56 .LEAL, Mônia Clarissa Hennig; MORAES, Maria Valentina de. “Diálogo” entre Poderes no Brasil?
Da inconstitucionalidade da regulação da vaquejada à vaquejada como patrimônio cultural imaterial
brasileiro: uma análise crítica. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, v. 5, n. 1, jan./abr.
2018. p. 76.

57 .BRANDÃO, R. Rigidez constitucional e pluralismo político. Revista Brasileira de Direitos


Fundamentais & Justiça, v. 2, n. 5, 31 dez. 2008. p. 120.

58 .Idem.

59 .Ibidem, p. 121.

60 .TOMIO, F. R. L.; ROBL FILHO, I. N.; KANAYAMA, R. L. Comparative studies of Constitutional


Courts: the role of abstract judicial review and consensualism in decisional process and in democratic
stability in Latin America (Brazil and Mexico) and in Iberian Peninsula (Spain and Portugal). In.
IPSA – RC09 (Comparative Judicial Studies). Irvine: Interim Meeting – University of California,
June, 2017. p. 168.

61 .Ou seja, quanto maior a rigidez constitucional, maior seria a taxa de nulidade da respectiva
corte/tribunal.

62 .Em relação ao fator “tempo”, vale a ressalva de que o direito à duração razoável do processo
(art. 5º, LXXVIII, CF/88 (LGL\1988\3)) não se confunde com o direito a processo rápido ou célere. A
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Abstract judicial review: concretização de direitos e o
desafio democrático

duração do processo, para ser razoável, deve ser proporcional à especificidade do direito material
tutelado em juízo. Para fins de aferição da concretização do direito à duração razoável do processo,
são aplicados os parâmetros (i) da complexidade da causa, (ii) sua importância na vida do litigante,
(iii) o comportamento das partes e (iv) o comportamento do juiz. Evidentemente, os critérios devem
ser adaptados na ação direta de inconstitucionalidade, eis que não há “partes” propriamente ditas; o
comportamento é o do Tribunal; e a importância é na vida não do requerente, mas de toda a
coletividade. Sobre o tema: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO,
Daniel. Op. cit., p. 270-273.

63 .Prudente ressaltar que foram consideradas como procedentes as decisões de parcial e de


integral provimento; enquanto foram tidas como improcedentes as decisões que não conheceram da
ação, de extinção e de improcedência propriamente dita.

64 .PEIXOTO, Leonardo Scofano Damasceno. Supremo Tribunal Federal: composição e indicação


de seus ministros. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. v. 16. (Coleção Prof. Gilmar
Mendes).p. 65-66.

65 .Todavia, Leonardo Scofano Damasceno Peixoto aponta que, caso o Senado não realize de
forma verdadeiramente efetiva a sabatina do indicado, o sistema de indicação poderá gerar uma
ligação (talvez indesejável) entre o Ministro e o Presidente que o indicou. Sobre o tema: PEIXOTO,
Leonardo Scofano Damaesceno. Op. cit., p. 60.

66 .SILVA, Virgílio Afonso da. A atual forma de indicação dos ministros do STF compromete a
autonomia do Judiciário? Não. Revista Folha de São Paulo. São Paulo, 19 jun. 2008. Disponível em:
<https://bit.ly/3585X5k>. Acesso em: 31.08.2021.

67 .Informações extraídas do banco de dados do Núcleo de Direito e Política (DIRPOL), da


Universidade Federal do Paraná (UFPR).

68 .Responsável não apenas por ADIs, mas também para ADCs, ADPFs, extradições solicitadas por
Estado estrangeiro, infrações penais comuns de detentores de determinados cargos, habeas corpus,
mandados de segurança, habeas data, mandados de injunção, recursos extraordinários etc.

69 .Novamente, destaca-se que não é toda a compilação quantitativa que chegaria a tais resultados.
Os dados coletados nesse estudo foram simplificados para fins de demonstração. Por óbvio, uma
análise criteriosa das 1.437 ADIs coletadas poderia alcançar resultados diversos, mas não muito
diferente dos encontrados.

70 .MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 76.

71 .Sobre o tema: LEAL, Mônia Clarissa Hennig; MORAES, Maria Valentina de. Op. cit.

72 .MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional.
12. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. [e-book] Capítulo 1, IV - Classificações, 3. Constituições rígidas e
flexíveis.

73 .Idem.

74 .SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30. ed. São Paulo: Malheiros
Editores Ltda., 2008. p. 41.
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desafio democrático

75 .FERNANDES, Antônio Alves Tôrres. Op. cit., p. 21. Até 2008, apenas Honduras possuía uma
taxa maior de emendas à Constituição, estando o Brasil no mesmo patamar que Colômbia e México.

76 .BRANDÃO, R. Op. cit., p. 103.

77 .TOMIO, F. R. L.; ROBL FILHO, I. N.; KANAYAMA, R. L. Comparative studies of … Op. cit.,
p. 168.

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