Dissertao Jaqueline Maria Da Silveira e Silva
Dissertao Jaqueline Maria Da Silveira e Silva
Dissertao Jaqueline Maria Da Silveira e Silva
BELO HORIZONTE – MG
2020
JAQUELINE MARIA DA SILVEIRA E SILVA
BELO HORIZONTE
2020
AGRADECIMENTOS
Ao CEFETMG, essa instituição Centenária, que se desvela um pouco mais a cada dia.
E ao MET, a minha gratidão por estarem presentes na junção: pioneirismo e ousadia de fazer
pessoas pensantes e, por isso, melhores.
Ao arquivo e aos que por ele passaram ou produziram, deixando suas marcas e pistas a
minha reverência. Especialmente, ao diretor Padre Lindomar da Rocha Mota e à Profa.
Fernanda da Faculdade Arquidiocesana de Curvelo, agradeço pelo segundo sim, que permitiu
a continuidade e os novos rumos da pesquisa.
A toda minha FAMÍLIA: Maria Adeide e Manoel (pais amados), irmãs e irmão
(Aparecida, Janete, Eliane e Fábio), o meu carinho e distinção pelo respeito com que trataram
esse percurso; à Dona Terezinha, Adriana e Guido, obrigada por estarem em orações e dispostos
a acolherem minha falta; à Erika e Daniel, família que o mundo me concedeu, obrigada pela
torcida. E a você, Adriano, meu amado esposo, obrigada por ser apoio, leitor e coalimentador
de sonhos.
Especialmente aos meus sobrinhos: Albert, Agno, Ítalo, Marco Túllio, Victor, Luiz
Gustavo, Lara, Maria Júlia e Yasmin, agradeço a convivência pacífica, já que a “Tia Jac” não
pode viajar, passear e nem mesmo ajudar nas tarefas do cotidiano. Quero dedicar-lhes essa
vitória. Quero que entendam que vocês também poderão conquistar o que desejarem, e de que
o NUNCA não é um lugar para quem se dedica e sonha!
Ao meu Deus Pai, Criador e que se faz presente em minha vida, o meu reconhecimento,
por fazer-me pessoa e por sempre realizar meus sonhos.
“Fiz a escalada da montanha da vida removendo
pedras e plantando flores”
“Caminhando e semeando, no fim terás o que
colher”
(Cora Coralina)
RESUMO
Esta dissertação traz uma pesquisa histórica que se encontra inserida no âmbito da
História da Educação Profissional, que é um subcampo da História da Educação. Trata-se de
um relatório de pesquisa sobre o ensino comercial, entendido como uma expressão da
modernidade, cujo foco é a história de uma instituição educativa denominada, em 1927, de
Lyceu Mineiro, tendo seu nome modificado em 1957 para Colégio Padre Curvelo. O objetivo
geral da pesquisa foi produzir a história da instituição que educa para o comércio - Lyceu
Mineiro, no período entre os anos 1927 e 1957, destacando permanências e mudanças ocorridas
ao longo de seu ciclo de vida, que caracterizaram seu desenvolvimento e sua identidade
histórica, a partir da pergunta: “por que uma escola de comércio para Curvelo, e como se
constituiu naquela localidade?” A partir dos pressupostos do conhecimento historiográfico
segundo o historiador Justino de Magalhães, buscou-se a institucionalização e
reinstitucionalização que caracterizaram o ciclo de vida e desenvolvimento da instituição,
produzindo sua identidade histórica. A pesquisa é bibliográfica e documental, e ocorre nas
fontes públicas do arquivo da escola, no museu da Faculdade Arquidiocesana de Curvelo - FAC
e nos jornais que circulavam na época e que estão no Centro de Referência do Museu da
Faculdade de Ciências Humanas de Curvelo – FACIC, além de fontes iconográficas
encontradas nesses ambientes, tendo por contorno a legislação do Ensino Comercial. O
conhecimento historiográfico da instituição educativa revelou que a associação do ato de educar
encontra-se “profundamente marcado pela sua inscrição na conjuntura histórica local”,
atrelando-se ao desenvolvimento da cidade e da formação pedagógica e política dos sujeitos
que permeiam a atividade educativa, construindo a memória e a unicidade da cultura escolar.
Afinal, cada instituição escolar ou educativa integra um todo mais amplo que é o sistema
educativo, mas constitui-se um todo em si mesma a partir da construção de uma cultura escolar
única e determinante do fazer escolar.
LISTA DE QUADROS
INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 13
ANEXOS.............................................................................................................................. 119
13
INTRODUÇÃO
1Ensino voltado a “formar profissionais aptos ao exercício de atividades específicas no comércio e, bem assim, de
funções auxiliares de caráter administrativo nos negócios públicos e privados”, Decreto Lei n. 6141 de 28 de
dezembro de 1943 – Lei Orgânica do Ensino Comercial. O ensino teve marco histórico no Brasil com a assinatura
do Alvará de 1809, pelo príncipe regente Dom João VI, em 15 de julho de 1809, proporcionando a abertura da
comercialização junto a países aliados de Portugal.
2
Modernidade como “à época da história”, em que predominam as categorias da “novidade”, da “superação” e do
“progresso” sob égide do marco da Revolução Francesa. (Faria Filho, organizador, 2012, p.19).
3
Professor, gaúcho de nascimento, que depois de ter fundado diversos estabelecimentos de ensino em várias
localidades do país, chegou a Curvelo e transferiu para a cidade, o Lyceu Mineiro, que mantinha em Belo
Horizonte. (SOARES, 1988). Apesar das inúmeras tentativas de identificar a existência da outra escola e de
remanescentes familiares do Sr. Érico de Bacellar, não foi possível obter mais informações sobre esse sujeito.
Tentamos identificar sua existência junto à Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais – SEE no setor de
Arquivos de Escolas Extintas ou Existentes, através de contato com a Metropolitana A e Metropolitana B, que são
responsáveis pela guarda dos arquivos. Tentamos em vão na cidade de Batatais, São Paulo, já que a escritura de
venda dos imóveis que possuía em Curvelo, tem como endereço a cidade da Grande São Paulo, fato também
elencado nos jornais. Para a imprensa curvelana, esse seria o destino após a saída de Curvelo e, ainda, ousou-se
localizar a origem da família no Rio Grande do Sul, que dizem ser o estado originário. Pesquisou-se também junto
ao arquivo de ex-alunos ou professores da Escola de Comércio de Juiz de Fora, tendo em vista que o professor
dava aulas de contabilidade. Buscamos também pela sua esposa Sra. Santa de Bacellar e Souza, que atuou como
professora do Lyceu Mineiro.
14
– sujeito forasteiro que embala o desejo dos filhos de curvelanos de se formarem no secundário
ou no Ensino Comercial, que até então não existia na cidade de Curvelo.
Importa afirmar que, controversamente ao progresso alavancado em poucos anos de
funcionamento, o sujeito idealizador, num dado momento, abre mão da escola e muda-se para
outra cidade. No entanto, a comunidade, segundo os relatos em jornais, não aceitou o
fechamento da instituição e se organizou em uma sociedade civil para dar continuidade à escola,
por meio da Sociedade Lyceu Mineiro Ltda., fundada por comerciantes, fazendeiros,
profissionais liberais e alguns professores da escola.
A motivação para tal intento foi porque a comunidade tinha a clareza de que a instituição
acolhia os filhos de curvelanos e de pessoas da região em regime de internato, semi-internato e
externato e, então, favorecia a formação próxima das casas, já que na redondeza não havia curso
semelhante, a não ser na Capital Belo Horizonte ou Sete Lagoas, sendo esta onde funcionou
uma escola pública, que ofertava o curso comercial, no período de 1926 a 1943.
Nesse sentido, historiar o Lyceu Mineiro, localizado na cidade de Curvelo, Minas
Gerais, é produzir uma “(re) construção das representações simbólicas das práticas educativas
e da problematização da relação das instituições educativas com o meio sociocultural
envolvente” (MAGALHÃES, 1996, p.7), atrelados à História do Ensino Comercial, dentro da
perspectiva do conhecimento historiográfico renovado da História da Educação que confere
identidade às instituições educativas, destacando-se permanências e mudanças ocorridas ao
longo de seu ciclo de vida, que caracterizam o próprio desenvolvimento e a respectiva
identidade histórica.
O recorte temporal e espacial que orientou o trabalho se deu a partir da trajetória da
instituição, que foi inaugurada em 16 de outubro de 1927. Ainda na primeira década de
existência teve a mantença alterada, devido ao retorno do primeiro proprietário para São Paulo
e, como já dito, a criação da Sociedade Lyceu Mineiro Ltda., que passou a ser a mantenedora.
Depois de 17 anos, deu-se entrada ao processo de autorização junto aos órgãos de
fiscalização, isso no ano de 1944. Já em 1957, a sociedade mantenedora e gestora resolveu doar
as ações da instituição para a Mitra Arquidiocesana de Diamantina, que assumiu a escola e as
cotas da sociedade civil. Foi nesse momento de mudança que o recorte final da pesquisa foi
estabelecido. Ficou constado na leitura das Atas da Sociedade, ocorrida numa reunião da
Congregação, naquele ano de 1957, o registro da doação das cotas para a Mitra Arquidiocesana,
começando assim um novo ciclo de funcionamento para a instituição.
Do ponto de vista metodológico, trata-se de uma investigação bibliográfica e
documental. O acesso inicial aos documentos se deu no arquivo da instituição, que fica sob a
15
4
A escola organizava os arquivos de forma administrativa – por ordem alfabética, e para separar as enturmações,
por ano, houve a necessidade de manusear as pastas e registrar separadamente todos os alunos, tendo em vista a
composição por turmas.
16
perceber que Juiz de Fora tinha alguma ligação com a cidade de Curvelo, a criação da instituição
pode ter inspiração daquela instituição de Juiz de Fora.
Destaca-se também o trabalho de dissertação de Renata Cristiane Romanini de Oliveira,
que está intitulada de “Rádio e Educação Profissional à distância: a experiência da universidade
do ar (1947 – 1961)”, do CEFET-MG, orientação do Prof. Dr. José Geraldo Pedrosa. Ela trata
da experiência de educação à distância para os comerciários do estado de São Paulo, por meio
de seu único curso, denominado Curso Comercial Radiofônico, que é também estudada pelo
seu viés de Educação à Distância, sendo uma das pioneiras nesse aspecto no país.
A dissertação traz à tona uma estrutura educacional bem próxima ao ineditismo, e é rica
em criatividade e praticidade. O trabalho é uma “abordagem situada na interseção da história
do rádio, da educação à distância e da educação profissional” (ROMANINI, 2013, p. 202),
aproximando-se do referencial teórico-metodológico da História das Instituições Educativas.
Além de descrever os aspectos da experiência de escolarização radiofônica, a autora afirmou
que há uma “simbiose entre escola e rádio”, no contexto de uma sociedade em processo de
industrialização, urbanização e massificação, com expansão do comércio e consequente
demanda pela (re)formação profissional de comerciários.
Outro trabalho de mestrado que pode ser destacado é o estudo intitulado: “A fundação
Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) e o ensino comercial em São Paulo (1902-
1931)”, de Maurício Fonseca Polato, defendida na Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo – PUC-SP. Esse estudo apresenta como objetivo, em um primeiro momento, descrever
as transformações urbanas que ocorreram na capital paulista que justificaram a criação da escola
em 1902. Posteriormente, buscou-se analisar o envolvimento das pessoas na fundação, sua rede
de relacionamentos e expectativas que tinham em relação ao ensino comercial, relacionando os
discursos desse novo grupo social com a história da escola até o advento do Decreto nº 20.158,
de 30 de junho de 1931 – norma federal que prescreveu a organização do ensino comercial e
regulamentou a profissão de contador no país.
Portanto, é importante estudar essa instituição privada no período em que praticamente
é ausente a regulamentação estatal. Por fim, demonstrou como ocorreu o desenvolvimento do
ensino comercial na cidade de São Paulo, evidenciando a FECAP como modelo. O que
entendiam como curso comercial e quais foram os cursos oferecidos no decorrer dos seus
primeiros 29 anos de existência. A pesquisa baseou-se na documentação administrativa da
FECAP, artigos e anúncios publicados em jornais e revistas especializadas da época, na
legislação federal, livros comemorativos da instituição e bibliografia acerca da história do
ensino contábil no Brasil.
19
Outro estudo paulista sobre o tema é a tese de doutorado de Fernando Antônio Peres,
defendida na Faculdade de Educação, da Universidade de São Paulo (USP), em 2010, com o
título “Revisitando a trajetória de João Penteado: O discreto transgressor de limites. São Paulo,
1890-1940”, que retrata a trajetória de João de Camargo Penteado (1877-1965). Penteado,
nascido em Jau (SP), ficou conhecido na historiografia como o diretor da Escola Moderna nº 1,
iniciativa educacional escolar dos anarquistas e seus aliados em São Paulo. Ele criou a escola
de comércio no bairro paulistano do Belenzinho, a Academia de Comércio “Saldanha
Marinho”. Neste estudo, o autor desvela outras faces desta figura da história da educação,
utilizando-se dos conceitos de sociedade de ideias e de ambiência, a partir de fontes primárias
inéditas, como os escritos de João Penteado, documentos institucionais das escolas que ele criou
e dirigiu e jornais.
Há, por fim, uma pesquisa que foi desenvolvida no sul do país, especificamente na
Pontifícia Universidade Católica/RS, por Eduardo Cristiano Hass da Silva, que dissertou sobre
“A gênese de um espaço profissional: a Escola Técnica de Comércio do Colégio Farroupilha
de Porto Alegre/RS (1950-1983)”. O seu objetivo foi investigar o processo de formação dos
técnicos contabilistas do Rio Grande do Sul, a partir do estudo da Escola Técnica de Comércio
(ETC) do Colégio Farroupilha de Porto Alegre/RS (1950-1983). Atentando-se especificamente
para a biografia coletiva dos professores que formaram as primeiras turmas de técnicos em
contabilidade da escola, bem como para os laços sociais e as carreiras destes docentes.
Dentro do cenário de formação para o Comércio, tendo por objeto a história das
instituições escolares, o estudo delineado por POLLATO (2008) é o que mais se aproxima do
Lyceu Mineiro, tanto do ponto de vista do ensino para o comércio quanto daquele que
compreende o período de instalação da instituição até as demandas impostas pela legislação
que organizou o Ensino Comercial no país. Entretanto, na periodicidade, há um distanciamento,
já que o estudo compreende apenas o período de 1902 a 1931 e, portanto, tem alvo final no
Decreto 20.158/1931, Decreto de Francisco Campos que trouxe a organização da profissão de
contador e organizou o ensino Comercial.
Outrossim, o estudo de Ferreira (1980) que trata das Leis Orgânicas do Ensino
Industrial, Comercial e Agrícola, a evolução do ensino comercial até a promulgação da Lei
Orgânica do Ensino Comercial pode ser dividida em duas fases características. A primeira fase
se inicia com a chegada do Príncipe Regente D. João ao Brasil e se prolonga até a promulgação
do primeiro texto legal de âmbito nacional sobre o ensino comercial – Decreto Legislativo de
1905. Essa fase dura aproximadamente um século podendo ser chamada de "fase embrionária".
20
A segunda fase tem início como Decreto Legislativo de 1905 e se estende até a
promulgação da Lei Orgânica do Ensino Comercial. A fase se subdivide em três momentos –
1905, 1926 e 1931, que correspondem à promulgação de atos legislativos diferentes que são
resultados da crescente conscientização, por parte do Governo Federal, da necessidade de
crescimento do ensino comercial na conjuntura do país. Essa fase pode ser rotulada de "fase de
oficialização".
Nesse cenário, o descortinamento histórico do Ensino Comercial e das escolas que se
ocuparam em formar profissionais do comércio encontra-se a ser produzido dentro do âmbito
da História da Educação Profissional, já que a maioria das pesquisas encontradas foi sobre o
campo de ensino na área contábil ou econômica. As dissertações e teses acima delineadas são
aquelas que mais se aproximaram da constituição do campo de pesquisa da História das
Instituições Educacionais. Especificamente, sobre as instituições que educam para as atividades
do comércio, constatou-se que ainda muito precisa ser feito. Por isso, o investimento desta
pesquisa, presente nesta dissertação.
Esta dissertação está organizada em três capítulos, que se propõem a conhecer um
pouco da dinâmica de estudo da instituição que educa para o comércio. São eles:
Capítulo I – “Abordagem teórico-metodológica – história da educação e a renovação
epistemológica” que, percorrendo os caminhos da pesquisa, trata da estruturação do estudo
dentro do Campo da História da Educação, História da Educação Profissional e da História das
Instituições Escolares no contexto da Escola de Annales, para trazer à tona a questão dos
documentos e da rotina escolar, suas falas ou seus silêncios. Explicita a referência teórico-
metodológica utilizada, a partir de Justino Pereira de Magalhães e de Décio Gatti.
Capítulo II – “A institucionalização da escola por meio da materialidade e dos sujeitos”
apresenta a organização e institucionalização da escola com a enumeração das fontes em tabelas
e dados que constroem e alimentam a cultura da instituição escolar, demandando conexões e
descontinuidades, com o objetivo de compreender as razões e motivos que levaram à sua
criação, a constituição da unicidade escolar na cidade e identificar as expectativas e resultados
obtidos, a partir dos sujeitos envolvidos no processo de criação e consolidação do ato de educar
e educar-se que permeia a relação pedagógica e formativa, perpassando pela organização
didática, administrativa e social da rotina escola.
Capítulo III - Da vinculação entre materialidade e a representação, tem-se a apropriação
(identidade institucional). Tomando o sentido dado por Magalhães à apropriação como as
particularidades das práticas e do que foi apropriado a partir do ato educativo transforma-se em
cultura da escola e não mais se prende ao ambiente escolar, mas soma as práticas já consolidadas
21
e promove autonomia nos sujeitos e espaços por onde exercem sua práxis diante do trabalho,
convivência social, ações concretas na família e no processo formativo e social de reconstrução
diante das necessidades, objetivos e conveniências.
Portanto, como visto é preciso desvelar a formação dos profissionais que compõem a
estrutura urbana e se ocuparam de negócios, lojas, vendas e mercados, inclusive para a venda
da produção agrícola, manufaturas, maquinários e meios para a subsistência dos moradores que
ocuparam as cidades, a presente dissertação vem de encontro aos estudos das instituições
escolares e dentre elas as instituições que formaram para o comércio. Então, no próximo
capítulo trataremos da abordagem teórica metodológica de renovação dos estudos em História
da Educação, do histórico e desenvolvimento da Educação Profissional no Brasil e do ensino
de comércio e finaliza-se com a conceituação das instituições escolares a partir do pensamento
do pesquisador Justino Pereira de Magalhães.
22
Em uma primeira análise, vale destacar que essa dissertação procura produzir uma
história dentro do campo da História da Educação, particularmente da História da Educação
Profissional. Para isso, são mobilizados referenciais que vão ao encontro da história das
instituições escolares no contexto da Escola de Annales5, e utilizando-se como referencial o
pesquisador Justino Pereira de Magalhães6. Busca-se o relacionamento entre o aspecto material
e humano e as diversas representações e papéis desempenhados pelos sujeitos, tendo em vista
o aspecto social e cultural de uma instituição educativa.
Este trabalho pretende desvelar o envolvimento e preocupação com os processos de
criação e desenvolvimento da instituição escolar, destacando-se as permanências e mudanças
ocorridas ao longo de seu ciclo de vida, verificando sua integração na sociedade em que atuou
o processo formativo a partir das fontes arquivistas e da imprensa local. Nesse sentido, é
importante ressaltar, ainda, a redefinição do conceito de documentos, entendidos aqui como
fontes da análise historiográfica.
Dessa forma, ao se deslocar o olhar da superfície dos acontecimentos em busca da
realidade, a trajetória de líderes e instituições será deixada de lado, para se debruçar sobre as
relações sociais dos diversos sujeitos que compõem o espaço da construção social. Assim, as
práticas cotidianas devem ser compreendidas “não somente nos seus aspectos marcados pela
estrutura social que uniformiza, padroniza, mas também, e, sobretudo, nos aspectos
relacionados às ações dos atores que produzem lance a lance, com conflito, mas também com
criatividade esse lugar particular” (GONÇALVES, 2004, p. 152).
5
A “escola dos Annales”, segundo Justino Magalhães, é uma lenta construção científica e social, uma
historicização total, que se desenvolveu conferindo coerência a abordagens complexas e multifacetadas: visando
ao contraponto e à superação do positivismo e da segmentação teórico-metodológica, desenvolvendo metodologias
articuladas e integrativas; justapondo uma síntese analítico-estrutural à síntese integrativa e valorativa que marca
a historiografia anglo-saxônica. (JUSTINO, 2004)
6
Historiador da Educação e Professor Catedrático do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. Os seus
interesses atuais de investigação são nas áreas de História da Educação, Cultura Escrita e Educação, História do
Livro e da Leitura em Portugal (particularmente o livro escolar) e Metodologias de Investigação em Educação. E
coordena o projeto "Atlas-Reportório dos Municípios na Educação e na Cultura em Portugal (1820-1986)".
23
ofertado para os estudantes oriundos das classes mais abastadas. Manfredi (2002) corrobora
com essa informativa:
Ainda no ano de 1946 foi promulgada a nova Constituição Federal que definiu que as
empresas industriais e comerciais deveriam ministrar, em cooperação, aprendizagem aos seus
trabalhadores menores, respeitados os direitos dos professores.
No ano de 1959, foram criadas, a partir das escolas industriais e técnicas mantidas pelo Governo
Federal, as escolas técnicas federais. Após dois anos, foi aprovada a Lei nº 4.024/61, a primeira
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A partir dos efeitos dessa lei, foi
permitido aos concluintes de cursos de educação profissional acesso ao ensino superior.
No final da década de 1960, as fazendas-modelo voltadas para a formação profissional,
que eram de responsabilidade do Ministério da Agricultura, foram incorporadas no
organograma do MEC. Com essa transferência, essas fazendas-modelos passaram a ser
denominadas escolas agrícolas. Também no findar da década de 1960, foi sancionada a Lei
Federal nº 5.540, de 28 de novembro de 1968. Essa lei permitiu a oferta de cursos superiores
destinados à formação de tecnólogos.
No início da década de 1970, foi instituída a Lei nº 5.692/71 que impeliu que o ensino
de segundo grau, hoje denominado ensino médio, deveria assegurar ao estudante, uma
habilitação profissional técnica, mesmo que fosse uma habilitação profissional básica, por meio
da conclusão do curso de auxiliar técnico. Ainda na década de 1970, foi aprovada a Lei Federal
nº 6.297, de 11 de dezembro de 1975, com propósito de assegurar formação profissional aos
trabalhadores. Essa lei definiu incentivos fiscais no imposto de renda de pessoas jurídicas
(IRPJ) para as empresas que mediassem treinamentos profissionais para os seus empregados.
No ano de 1978, foram criadas as primeiras Escolas Técnicas Federais do Brasil: Escola
Técnica Federal do Paraná, do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. Neste mesmo ano, essas
escolas foram transformadas em Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs), pela
Lei nº 6.545, de 30 de junho.
No segundo ano da década de 1980, foi sancionada a Lei Federal nº 7.044/82 que deu
nova redação à Lei Federal nº 5.692/71. Uma das implicações da Lei nº 7.044/82 foi a retirada
da obrigatoriedade da habilitação profissional no ensino de segundo grau. Na última década do
século XX, foi instituído o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), por meio da Lei
nº 8.315, de 23 de dezembro de 1991. Esse serviço foi criado em formato institucional
semelhante ao do SENAI e do SENAC.
No ano de 1994, foi instituído o Sistema Nacional de Educação Tecnológica, formado
pela Rede Federal e também pelas escolas de ensino técnico, geridos por estados e municípios.
A partir da criação dessa Rede Federal, as escolas técnicas federais e as escolas agrícolas foram
transformadas em Centros Federais de Educação Tecnológica.
27
7
José Antônio Lisboa foi quem recebeu a atribuição da cadeira de Aula Pública de Ciências Econômicas no Rio
de Janeiro. Em sua obra, publicada em 1804, intitulada Princípios da Economia Política, iniciou os estudos do
comércio e em 1809 tornou-se o primeiro a apresentar um sistema de direito comercial e a realizar os primeiros
estudos de economia política no Brasil.
8
Como eram chamados, à época, os docentes da Aula de Comércio.
9
O marco da contabilidade ocorreu quando o frade franciscano e famoso matemático Luca Paccioli escreveu o
livro intitulado “Summa de Arithmética, Geometrica, Proportioniet Proportionalita”, que foi publicado em 1494,
na Itália. “Para cada crédito corresponde um débito de igual valor.”
29
10
Francisco Baptista de Oliveira nasceu em Entre Rios, Minas Gerais, e era um homem de grande visão, rara
capacidade de trabalho e dotado de caráter puríssimo. Foi um dos maiores benfeitores de Juiz de Fora, sendo um
dos criadores dos dois estabelecimentos de crédito da cidade e também membro da Companhia Mineira de
Eletricidade. Além disso, sua casa de comércio – “A Barateza” era a principal da cidade. Investia na indústria
31
De acordo com o relato de Bastos (1982) Francisco Baptista fez visitas à Europa e
entusiasmou-se pelo ensino comercial. Com o intuito de organizar um Curso comercial entrou
em contato com diversos estabelecimentos entre os quais a “Escola dos Altos Estudos
Comerciais de Paris” e passou a “desejar ardentemente fundar um estabelecimento do gênero
em Juiz de Fora” (BASTOS, 1982, p. 21). Fez tentativas junto ao governo do Estado de Minas
Gerais – Presidente Cesário Alvim, de quem não obteve apoio e, logo depois, com Affonso
Pena11 que, em carta na Revista Industrial de Minas Gerais (1894), assim escreveu:
O iniciador da ideia e que por ela tem-se dedicado, sem medir sacrifícios, é o Sr.
Francisco Baptista de Oliveira. Se não fora a sua tenacidade e inquebrantável energia
não desanimando perante dificuldades, que pareciam invencíveis, não teríamos a
fortuna de possuir brevemente um estabelecimento de ensino comercial, moldado pelo
que há de melhor no assunto (Revista Industrial de MG, Volume I , nº 7).
mineradora e obras assistenciais junto aos Vicentinos, com os quais fundou a Associação de Caridade “Pão de
Santo Antônio”. Na área de imprensa foi fundador/proprietário do jornal “Diário de Minas”, fundou o Jornal “O
Pobre”, que tinha cunho religioso e era correspondente telegráfico com o “Jornal do Comércio” do Rio de Janeiro.
Mascarenhas (1934)
11
Afonso Augusto Moreira Pena Júnior nasceu em Santa Bárbara (MG), no dia 25 de dezembro de 1879, filho de
Afonso Augusto Moreira Pena e de Maria Guilhermina de Oliveira Pena. Seu pai foi deputado geral por Minas
Gerais (1878-1884), ministro da Guerra (1882), da Agricultura (1883-1884) e do Interior (1885), novamente
deputado geral (1886-1889), presidente de Minas Gerais (1892-1894), vice-presidente (1902-1906) e presidente
da República (1906-1909). Tendo feito os estudos secundários no Colégio Caraça, em Minas, ingressou na
Faculdade de Direito de Belo Horizonte, pela qual se bacharelou em 1902. Deputado estadual em 1902, foi reeleito
para a legislatura 1907-1910, mas renunciou ao mandato antes do fim do período.
32
As cotas também foram oferecidas através de uma reunião a cidadãos bem distintos da
sociedade da época, com anúncio em jornal local e convites aos cidadãos que compunham as
lideranças locais. Prova disso, é que havia representantes de todas as esferas formativas, assim
como no Lyceu com alguns cotistas em comum, como era o caso dos irmãos Mascarenhas.
Todas as iniciativas nesse período ficaram a cargo de instituições particulares, que
ofereciam “aulas de comércio” para atender a essa demanda de profissionais, como as do
Colégio Atheneu Paulista, o Mackenzie College e a Escola Politécnica de São Paulo. O curso
Superior do Mackenzie foi criado em 1886, sucedendo a “classe do comércio” que existia desde
1880, por Horácio Lane e “visava preparar profissionais adestrados para altos cargos do
Comércio Cafeeiro de Santos e São Paulo, notadamente nas casas comissárias” (GARCEZ,
1970, p.138). Já a Escola Politécnica de São Paulo dava o título de contador pra os alunos que
concluíssem o curso geral de um ano. Entre 1894 e 1918 formaram-se 282 contadores
(MOTOYAMA, 2004, p. 62). Tratava-se de cursos, e não de uma escola regular dedicada ao
ensino comercial propriamente dita.
Desde 1897, Horácio Berlinck12, representando o comércio, e João Pedro da Veiga Filho,
então vereador municipal, tentavam sem êxito, a criação e manutenção por parte do governo
paulista de uma instituição de ensino de natureza comercial. Somente em 1902, por meio do
apoio da Sociedade Humanitária dos Empregados do Comércio de São Paulo foi criada a
“Escola Prática do Comércio de São Paulo – FECAP”, referência no ensino comercial paulista.
No início do século XX, porém, as ofertas existentes de classes comerciais pareciam
não atender a tal demanda e “crescia a agitação em torno da ideia de organizar as atividades
comerciais paulistas” (CARVALHO, 2005, p. 80), especificamente da necessidade da criação
de uma escola de comércio, como demonstra Veiga Filho, em seu artigo de 1901:
Por estarmos plenamente convencidos dos inestimáveis proveitos que, para o Estado
de S. Paulo, podem advir da fundação de uma Escola de Comércio, nesta capital, desde
1890, em que nos confiaram a redação do Diário do Comércio, até hoje, sempre temos
propugnado pela realização de tão momentoso empreendimento (Veiga Filho, 1907,
p. 26).
12
Horácio Berlink, um dos fundadores da Escola Prática de Comércio de São Paulo, era de origem humilde, filho
de imigrantes que aprendera as noções de contabilidade ao trabalhar nos escritórios das indústrias de Álvares
Penteado.
33
de Comércio de São Paulo”, em um imóvel oferecido por Eduardo Prates, para ser a primeira
sede da escola.
Vale apontar o relacionamento existente entre essas figuras – Eduardo Prates foi o
primeiro secretário da Associação Comercial e Agrícola de São Paulo, a qual teve como
primeiro presidente Antônio da Silva Prado. Este, por sua vez, era vizinho de fazenda de
Álvares Penteado, que viria a se tornar o quarto presidente da Associação Comercial de São
Paulo (sucessora da Associação Comercial e Agrícola). O início das aulas se deu em 15 de julho
de 1902, com um grupo de 216 alunos e um corpo docente formado por aproximadamente trinta
pessoas (FAZOLI FILHO, 1992, p. 26).
Durante o período republicano, iniciou-se uma nova fase para o ensino, com grandes
mudanças e expansão do ensino comercial, entre 1889 e 1931. Para o estudo de Ferreira (1980),
que trata das Leis Orgânicas do Ensino Industrial, Comercial e Agrícola, a evolução do ensino
comercial até a promulgação da Lei Orgânica do Ensino Comercial pode ser dividida em duas
fases características. A primeira fase se inicia com a chegada do Príncipe Regente D. João ao
Brasil e se prolonga até a promulgação do primeiro texto legal de âmbito nacional sobre o
ensino comercial – Decreto Legislativo de 1905. Essa fase dura aproximadamente um século,
podendo ser chamada de "fase embrionária".
A segunda fase tem início como Decreto Legislativo de 1905 e se estende até a
promulgação da Lei Orgânica do Ensino Comercial. A fase se subdivide em três momentos –
1905, 1926 e 1931, que correspondem à promulgação de atos legislativos diferentes que são
resultados da crescente conscientização, por parte do Governo Federal, da necessidade de
crescimento do ensino comercial na conjuntura do País. Essa fase pode ser rotulada de "fase de
oficialização".
Essas mudanças foram motivadas por uma combinação de fatores: crescimento
econômico causado pelo aumento na produção e crescimento e urbanização, principalmente na
cidade de São Paulo. O Brasil com o formato agrário exportador ainda dominava a pauta das
exportações e a economia nacional e as flutuações no preço do café e os períodos de grave crise
no setor cafeeiro, ao final do século XIX e início do século XX, causados pela superprodução
e pela queda da demanda entre as grandes guerras levaram os produtores de café a investir em
outras áreas. Para Furtado (1995, p.71) nesse período cresceram os serviços públicos por meio
de órgãos administrativos e aumento burocrático, o que exigiu maior qualificação dos
funcionários para executar suas funções. Para Furtado:
13
A expressão Rede Escolar foi utilizada por Carvalho e reproduzida aqui, apesar de não ser empregado nesta época.
35
14
Getúlio Vargas nasceu em São Borja (RS), em 1882. Em 1907, concluiu o curso de Direito pela Faculdade de
Porto Alegre. Dessa data até 1930, elegeu-se pelo Partido Republicano Rio Grandense, deputado Estadual,
deputado Federal, tendo sido líder da bancada gaúcha, entre 1923 e 1929. De 1926 a 1927, foi Ministro da Fazenda
de Washington Luis e presidente do Rio Grande do Sul de 1927 a 1930. No ano de 1929, candidatou-se à
presidência da República na chapa oposicionista da Aliança Liberal. Derrotado, assumiu a liderança do movimento
revolucionário de 1930 que depôs o presidente Washington Luis. Em consequência disso, em novembro deste
mesmo ano, assume o Governo Provisório (1930-1934). A Assembleia Nacional Constituinte ao promulgar a nova
Constituição em julho de 1934, elege Getúlio Vargas presidente da República para o período 1934-1938. Em 1937,
alegando a existência de um plano comunista, conhecido como Plano Cohen, com apoio militar o Congresso
Nacional foi fechado e instalou-se o Estado Novo, e em 10 de novembro de 1937, Vargas outorga uma nova
Constituição Federal. Nos termos dessa Constituição redigida por Francisco Campos e que ficou conhecida como
Polaca, por ter se inspirado na Constituição fascista da Polônia, Getúlio passa a controlar os poderes Legislativo e
Judiciário. Durante os 15 anos que governou o Brasil (1930-1945), criou o moderno Estado Nacional, orientando-
se para uma intervenção do Estado na Economia.
36
A) Curso propedêutico:
B) Cursos técnicos:
O curso auxiliar de comércio era o que o Lyceu Mineiro oferecia, tendo em vista os
documentos analisados na pesquisa e professores existentes na escola. Além disso, o Decreto
regulamenta os laboratórios e gabinetes específicos que deveriam portar os estabelecimentos
de ensino Comercial, citação do artigo 30, conforme os cursos que mantiverem e requererem:
No Título II, foi criada a Superintendência do Ensino Comercial que ocupa o lugar da
antiga Superintendência de Fiscalização dos Estabelecimentos do Ensino Comercial- Artigo 34
40
15
Antônio Carlos Ribeiro de Andrada nasceu em Barbacena (MG) em 1870. Foi aluno da Faculdade de Direito de
São Paulo onde participou do movimento republicano antes de se formar em 1891. Iniciou a carreira política ainda
no final do século XIX, como vereador em Juiz de Fora, 1902- secretário de Finanças de Minas Gerais, 1906-
prefeito de Belo Horizonte, 1907- senador estadual e novamente vereador em Juiz de Fora e presidente da Câmara
Municipal, acumulando as funções de prefeito da cidade, 1911- deputado federal na legenda do Partido
Republicano Mineiro (PRM). Permaneceu por reeleições na Câmara dos Deputados até setembro de 1917, quando
a convite do presidente Venceslau Brás, assumiu o Ministério da Fazenda. Deixou o ministério em novembro de
1918, voltou à Câmara em maio do ano seguinte e em 1925 foi eleito senador da República. Eleito presidente de
Minas em março de 1926, tomou posse em setembro, portanto era o candidato natural à presidência da República
na sucessão de Washington Luís em 1930. No entanto, o acordo tácito que vinha garantindo a alternância de São
Paulo e Minas, no governo federal foi rompido quando Washington Luís, representante de São Paulo, preferiu
indicar outro paulista para sucessor. Preterido, Antônio Carlos passou a articular a candidatura do gaúcho Getúlio
Vargas à presidência. Tal projeto se concretizou com a formação da Aliança Liberal, coligação que reunia os
situacionismos de Minas, Rio Grande do Sul e Paraíba, e era ainda apoiada pela maioria dos "tenentes" que haviam
lutado contra o governo federal nos anos anteriores. (disponível em
https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/biografias/antonio_carlos_ribeiro_de_andrada, acesso em
25/08/2018).
41
1932. Vinte e quatro dias depois, em 30 de junho de 1932, Vargas assinaria um novo Decreto
sob o nº 20.158, organizando o ensino comercial e regulamentando a profissão de contador
(BASTOS, 1950, p. 176-178).
Pode-se afirmar que a preocupação com esta modalidade de ensino parte das
modificações sofridas pelo país como o processo de industrialização e de urbanização, mas
também como uma nova condição de exploração do capital por parte daqueles que viviam na
exportação de café e que, ao vivenciar a Crise de 1929, perderam domínio e precisavam de uma
nova estratégia de exploração mercantil.
O comércio serviu como outra fonte de renda e de exploração; uma nova opção,
diferente dos latifúndios e que precisava ser apreendida. Atrelada à visão de crescimento das
indústrias e do país, Vargas viu no cenário do Comércio uma forma de construção de novos
trabalhadores nacionais e de um novo cenário de crescimento para a República. Portanto,
investir e criar melhores meios para o ensino comercial vem ao encontro ao seu projeto
republicano e reformador da sociedade brasileira.
O Lyceu Mineiro inicia suas atividades nesse período de transição entre o Decreto n°
16.782A, de 15 de abril de 1925, para o Ensino Secundário e do Decreto nº 17.329 de 28 de
maio de 1926, para o Ensino Comercial e reestrutura-se a partir das reformas do período
varguista: Reforma Francisco Campos - Decreto 20.158, de 1931 e o Decreto Lei nº 6.141 de
1943, de Gustavo Capanema ou Lei Orgânica do Ensino Comercial.
É importante salientar que segundo os jornais, que divulgaram a chegada do professor
“Erico de Bacellar” trazendo uma nova escola para a Cidade de Curvelo, tratava-se de uma
transferência de uma escola que o mesmo detinha na Capital do Estado para Curvelo. Infere-se,
então, que o fundador já possuía experiência com as normas legais e com uma instituição
dedicada ao ensino comercial e, portanto, não desconhecia a dinâmica escolar, além de
acompanhar de perto as demandas decorrentes dessas mudanças que representaram inovações
importantes para esse tipo de ensino.
Além disso, o gestor escolar trazia consigo uma capacidade para a divulgação e
conquistas de apoios diversos no tocante ao funcionamento da instituição escolar. Além de
notícias nos jornais da época que não eram poucos, mas em torno de 05 jornais diferentes: Voz
do Povo, O Curvellano, Centro de Minas, A Mocidade, Jornal do Comércio ainda dispunha de
uma Revista Semanal chamada, Nossa Terra, que seria de organização do diretor e proprietário
do Lyceu Mineiro e da qual ele mesmo, o Sr. Bacellar, era o redator. Para além de propagandas
e sobra de elogios sobre o perfil do gestor escolar, da instituição e dos méritos para a cidade
das novas oportunidades oferecidas, no trabalho de pesquisa foram encontrados indícios de
42
acordos e garantias da administração municipal para a escola. Como por exemplo, a Lei
Publicada em 01 de outubro de 1927, que garantiria a situação financeira para a transferência e
permanência da instituição. Foi publicada em meio a outras legislações no Jornal “O Curvello,
de Outubro de 1927, a Lei de nº 329 de 01 de outubro, onde se lê:
Art. 1 - O agente do executivo, auxiliará com 500$000 (quinhentos mil reis) mensaes ao Prof.
E. de Bacellar e Souza, que se propõe a organizar nesta cidade um estabelecimento de ensino
secundário moldado no regulmento dos gymnasios officiaes.
Art. II – Esse auxilio começará a ser pago após a installação do Gymnasio. Art. III – O mesmo
professor E. de Bacellar e Souza terá o auxilio de 4000$000 (quatro contos de reis)16 pagos de
uma só vez para a mudança de seu estabelecimento de ensino de Bello Horizonte para esta
cidade.
Art. IV – Recorrer-se-á a verba Instrucção Pública.
Art. V – Revogam-se as disposições em contrario. Assinada pelo Sr. Agente do Executivo
Municipal - o Sr. Cel. José Soares dos Santos, ” (O CURVELLO, 1927).
Denota-se que em relação às outras publicações legislativas do mesmo dia, há uma Lei
promulgando e liberando o Agente do Executivo a contrair um empréstimo de R$ 80:000$000
(oitenta contos de reis) nas melhores condições encontradas (JORNAL O CURVELLO, 1927,
p.1). Ou seja, não havia disponibilidade financeira no município, mas ainda assim fechava-se o
acordo com a instituição.
Apesar de frustradas as tentativas de uma melhor identidade desse sujeito para a
construção da sua biografia, percebe-se que mesmo antes da decisão de investir na cidade com
a construção de uma instituição escolar o Sr. Érico de Bacellar já fazia parte da rotina de
“amizades” ou “políticas locais”, até pelo apoio do comandante do Executivo local à época- o
Coronel José Soares dos Santos, que era segundo Antônio Gabriel Diniz (1975, p. 127):
“comerciante e político de muito prestígio, presidente da Câmara e Agente Executivo
Municipal”. Foi um dos Chefes da Aliança Liberal em nosso município.
Após a revolução de 30, foi nomeado prefeito municipal, cargo que ocupou até o seu
falecimento. Há, na cidade, uma avenida que o homenageia – a Avenida Soares dos Santos”
(DINIZ, 1975). Posteriormente, no ano seguinte à implantação da escola, em 19 de setembro
de 1928, foi publicada uma nova Lei de nº 368, que no Art. 1º escreve: “fica autorizado o Sr.
Agente Executivo Municipal a promover os meios de officializar o Lyceu Mineiro,
transformando-o em Gymnasio Municipal” (Jornal A MOCIDADE, 1928).
16
Um conto de réis era uma quantia de grande valor intrínseco: em 1833, 2$500 era representado por uma oitava (equivalente
a aproximadamente 3,59 gramas de ouro de vinte e dois quilates), sendo que um conto de réis corresponderia a 1,4 quilogramas
do mesmo material. Quatro contos seria o equivalente a 5,6 quilogramas de ouro.
43
1.2.2 Um Decreto que tem força de Lei: Decreto Lei nº 6.141 de 28 de dezembro de 1943
– “Lei Orgânica do Ensino Comercial”
A partir do Estado Novo, que é implantado a partir de novembro de 1937, com apoio
militar, toma posse um novo Ministro da Educação, Gustavo Capanema, que inicia sua reforma
com a publicação de inúmeros decretos-leis. Nesse período, é votada a Lei Orgânica17 do ensino
Comercial sob o Decreto nº 6.141, de dezembro de 1943. Na exposição de motivos para a defesa
da Reforma ele declara que o ensino comercial não teve organização geral em nosso país,
retaliando inclusive o decreto anterior que fez parte da Reforma Francisco Campos. Ele destaca
que o Decreto 19.890 tornou o currículo mais exequível, mas como pendurava há 11 anos já
havia necessidade da reforma:
“EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
20 de dezembro de 1943.
Sr. Presidente:
[...]“até os últimos tempos da primeira República, o ensino comercial não teve
organização geral em nosso país”.
[...]“As regulamentações expedidas, omissas e raras, não buscaram estabelecer as
linhas e os processos de um sistema desse ensino, mas se limitaram a dispor sobre
determinados estabelecimentos de ensino existentes.
Somente em 1923, o Congresso Nacional tomou iniciativa de determinar que se
instituísse a fiscalização dos estabelecimentos de ensino comercial e de recomendar a
adoção de um padrão legal para os seus cursos. O decreto n. 17.329, de 29 de maio de
1926, deu execução ao preceito, e foi a partir de então que o ensino comercial teve
entre nós organização uniforme.
O sistema não podia, entretanto, perdurar. Os currículos fixados não tinham
atualidade, eram os mesmos que o decreto n. 1.339, de 9 de janeiro de 1905,
estabelecera para a Academia de Comércio do Rio de Janeiro, com a circunstância de
terem sido agravados pelo aumento de disciplinas.
A reforma, decretada em 1931 pelo Governo Provisório, deu um novo e importante
passo. Comunicou ao sistema existente o sentido das exigências modernas,
discriminando várias modalidades de cursos que pudessem atender ao
desenvolvimento do comércio e dos negócios administrativos de ordem pública e
privada em nosso país. Essa discriminação, possibilitando uma orientação profissional
mais precisa, permitiu a constituição de currículos menos pesados e, portanto mais
exequíveis.
Doze anos de experiência aconselham agora uma revisão da matéria.
Antes do mais observemos que foi acentuado o progresso que nesse período se
verificou no nosso ensino comercial. Poucos dados estatísticos bastarão para indicar
17
O primeiro resultado desse esforço saiu em 1942, com a promulgação de dois decretos-leis (autodenominados
leis, embora não tivessem sido promulgados pelo Congresso Nacional), tratando da organização do ensino
industrial (Decreto-Lei nº 4.073, de 30 de janeiro) e do ensino secundário (Decreto-Lei nº 4.244, de 9 de abril). As
“leis” orgânicas do ensino industrial e do ensino médio serviram de matriz para a elaboração de outras referentes
ao ensino comercial (Decreto-Lei nº 6.141, de 28 de dezembro de 1943), ao ensino normal (Decreto-Lei nº 8.530,
de 2 de junho de 1946), ao ensino agrícola (Decreto-Lei nº 9.613, de 22 de agosto de 1946) e ao ensino primário
(Decreto-Lei nº 8.529, de 2 de janeiro de 1946). disponível em
https://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/leis-organicas-do-ensino
44
Em seu Artigo 1º, a Lei conceitua o Ensino Comercial “entendido como um ramo de
ensino de segundo grau destinado a formar profissionais para lidarem com as atividades
específicas do comércio e de funções de caráter administrativo em negócios tanto públicos
quanto privados.” (BRASIL, 1931).
A Lei Orgânica do Ensino Comercial estabeleceu dois ciclos para o ensino comercial:
primeiro ciclo, de formação com o curso comercial básico, com duração de 04 anos e segundo
ciclo com cinco cursos de duração, denominados curso comercial técnico: “curso de comércio
e propaganda, curso de administração, curso de contabilidade, curso de estatística e curso de
secretariado”. Além disto, determina a partir dos tipos de cursos existentes como serão os
estabelecimentos de ensino comercial: Escolas comerciais – aquelas que ministravam o curso
comercial básico e Escolas Técnicas de Comércio – as que tinham um ou mais cursos técnicos.
O Lyceu Mineiro a partir de então passa a chamar-se “Escola Comercial Padre Curvelo” e a
partir de 1949, com a 1ª turma do Técnico em Contabilidade, muda a denominação para
“Escola Técnica de Comércio Padre Curvelo”.
Nessa reforma, foram atentamente discriminadas como seriam as formas de avaliação
do ensino Comercial deliberando-se no seu Artigo 15 como seriam compostos os trabalhos
escolares, além de se preocupar, também, (Artigo 53) com a formação dos professores e
orientadores que atuariam no Ensino Comercial.
Nos documentos do Lyceu Mineiro, anteriores ao ano de 1949, a Portaria de Autorização
do Ensino Comercial não consta e, inicialmente, alimentou-se a dúvida se realmente o Ensino
Comercial iniciou desde a fundação da instituição. Entretanto, um registro de Atas de Visita do
Inspetor Federal, no dia 06 de maio de 1929 (Livro de Termos de Visita do Inspetor Escolar,
em 06/05/1929), citação feita na página 73 adiante, discrimina por números os alunos do Curso
Comercial. Paira a dúvida de como era a dinâmica do curso nesse período e se realmente tratava-
se do Curso Comercial, ou apenas aulas práticas de comércio, como por exemplo datilografia,
já que aparecia nos folhetos de propaganda nos jornais nas chamadas para a matrícula. Certo
45
que após o Decreto 20.158/1931, principalmente no determina o seu artigo Art. 55, que trata
dos guarda-livros práticos, a fiscalização e necessidade da regulamentação dos cursos vem à
tona:
Os guarda-livros práticos, que já exerçam ou tenham exercido a profissão, para
gozarem das prerrogativas deste decreto, deverão requerer ao superintendente do
Ensino Comercial, dentro do prazo de um ano a contar da data da publicação deste
decreto, sejam submetidos a exames de habilitação (BRASIL, 1931).
Também porque se havia chamada nos jornais, mas não acontecia a fiscalização federal
o próprio decreto colocava em evidência a necessidade de formatação legal a partir da proibição
da veiculação de propaganda dos cursos sem a devida legalidade. Isso traz à tona que tal
situação era uma prática que acontecia, já que a legislação toma a explicação e proibição. Veja
o artigo 81 que determina inclusive o valor da multa, para tal prática:
Art. 81. Os estabelecimentos de ensino comercial que não sejam fiscalizados pelo
Governo Federal, não poderão inculcar em seus documentos, folhetos, prospectos,
anúncios, certificados ou diplomas a declaração de estabelecimentos de ensino
fiscalizados ou oficializados, sob pena de multa de cinco contos de réis (5:000$0), que
será imposta pela Superintendência do Ensino Comercial, ficando de sua cobrança
encarregado o representante da justiça federal.
Quanto ao processo legal para Verificação Prévia da Escola Técnica de Comércio Padre
Curvelo, foi encontrada uma correspondência da Diretoria do Ensino Comercial, data de
06/01/1949, designando o Inspetor Federal Messias Pereira Donato, em substituição ao inspetor
anterior, Sr. Mauro Ferreira da Silva, para proceder a verificação prévia já iniciada em 1944,
conforme citado no próprio ofício.
A história do Lyceu Mineiro e do ensino comercial perpassam essas mudanças, que
proporcionaram uma reinstitucionalização, devido às diversas vertentes políticas e sociais que
envolveram a trajetória da escola - a Era Vargas, o Estado Novo; as mudanças regimentais e
sociais, inclusive com a criação do aparato legal para os cursos comerciais e para o Curso
secundário, que também fazia parte do universo de atendimento da escola. Acrescendo a isso
ainda há a alteração da mantenedora com a mudança do primeiro proprietário para São Paulo –
Prof. Érico de Bacellar e Souza, e a organização do Liceu Mineiro Sociedade Ltda. para assumir
a escola.
Com o desenvolvimento da pesquisa documental percebe-se a falta de documentos
correspondentes à primeira década de existência da instituição - 1927 a 1937, e no museu da
Faculdade Arquidiocesana de Curvelo encontramos as plantas das edificações, as certidões de
cartório, doações de terreno e legislações municipais de amparo à escola, além de algumas fotos
que faziam parte do patrimônio histórico e escolar, donde faz-se constar alunos e suas atividades
46
buscamos no passado vestígios deixados que nos ajudem a responder as questões sugeridas pelo
mundo em que vivemos.
A história das Instituições Educacionais almeja dar conta dos vários atores envolvidos
no processo educativo, investigando aquilo que se passa no interior das escolas, gerando um
conhecimento mais aprofundado destes espaços sociais destinados aos processos de ensino e de
aprendizagem (GATTI JÚNIOR, 2002, p. 145).
Tanto autores estrangeiros quanto brasileiros têm seguido um roteiro de pesquisa
bastante similar, em que se destacam preocupações com os processos de criação e de
desenvolvimento das instituições educativas, a configuração e as mudanças ocorridas no prédio
escolar, o processo de conservação e mudança do perfil dos docentes e dos alunos, as formas
de configuração e transformação do saber veiculado nestas instituições de ensino, entre outros.
Buscam-se, assim, os elementos que conferem identidade a instituição educacional.
O primeiro passo do pesquisador em seu trabalho é a revisão bibliográfica do tema,
quando acontece o encontro de diversas obras, cabendo ao pesquisador filtrá-las, operando por
negações e associações, buscando entender o que se diz entre as palavras, pois, segundo Nunes
(1992) ler é praticar uma problemática. Ao pesquisar uma instituição educacional, deve-se fazer
um resgate da problemática da cidade, onde ela está instalada, para saber certas representações
cristalizadas da escola, da sociedade, dos educadores e da própria história da educação. Isso
decorre do próprio quadro institucional que diz respeito a cultura material e simbólica e refere-
se à representação, à apropriação das aprendizagens e à qualificação e reconhecimento da mais
valia educacional pelos grupos, indivíduos e organizações (MAGALHÃES, 2004, p. 112).
Por seu turno em cada instituição escolar, em cada tempo as interpretações serão
particulares e próximas ao ineditismo. Embora haja respeito e enquadramento na legalidade e
normatividade, as interpretações do quotidiano são próprias em consonância com as
necessidades, objetivos e conveniências. Haverá sempre resistências, emancipação e novas
configurações diante do estabelecido e socialmente imposto. E, para além dos acontecimentos
particulares e institucionais, haverá a ressignificação da influência da instituição educativa.
Porque a mesma ultrapassa seus muros e defere-se no tempo, seja pelas transformações de
caráter material, seja especificamente como representação, referência e memória dos indivíduos
e dos grupos. Magalhães (2004, p. 118) afirma que a construção da identidade história da
2ª constelação – Institucionalização/representação
3ª constelação – Instituição/apropriação
51
Logicamente não haverá fontes para delimitar todas as categorias elencadas pela
explicação da educação na sua complexidade epistemológica, como conceitua Magalhães
(2004), nem pelo menos esgotá-las, mas a própria análise propõe a discussão a partir de uma
investigação indiciária. Ginzburg (2004) compreende e explica o processo de construção e
reconstrução que precisa também ser valorizado e conhecido: “a investigação baseada em
indícios deve levar em consideração todo o universo em que está inserido seu objeto de estudo,
sendo as fontes históricas uma composição da narrativa, compondo um método que permite
apenas uma parte de processo de investigação”.
Mineiro. Ainda buscando identificar os sujeitos que faziam parte do cenário institucional, quais
as suas origens e lugares de fala, como eram as suas práticas pedagógicas e disciplinares e como
as regulamentações oficiais eram praticadas.
Nos registros dos livros de Atas de Resultado final18 onde constam as notas por conteúdo
e de onde é possível inferir as demandas de provas de 2ª chamada, provas especiais e repetência.
A partir da década de 1940, consta nos livros a cidade de origem dos alunos e a profissão do
pai, e na consulta realizada em 120 pastas de alunos, tais dados foram registrados, o que
fornecerá uma ideia do universo de origem dos alunos.
Com relação aos docentes, a partir do livro de pontos de professores, buscar-se-á
subsídios para elencar os responsáveis pelos conteúdos ano após ano e sua formação, além dos
referenciais pedagógicos para as aulas, por meio dos registros de livros utilizados e laboratórios
existentes na instituição. Acrescenta-se a esses dados os relatórios diversos das bancas de
avaliação, as publicações nos jornais dos participantes de provas e seu desempenho, além das
notícias divulgando os novos professores e adequações nos prédios. Do ponto de vista de
representatividade social, há divulgação na imprensa local desde a demanda de matrículas para
provas de admissão e exames finais, até notícias de eventos cívicos, comemorativos, culturais
e formaturas.
Além das fontes documentais do arquivo escolar e da legislação e publicações em anais
e revistas relacionadas ao Ensino Comercial e Secundário utilizou-se também jornais que
circulavam na cidade naquele período os quais foram pesquisados no Centro de Referência
“Antônia Cleuza Guimarães” do Museu de História Viva de Curvelo, que funciona na
Faculdade de Ciências Humanas de Curvelo-FACIC. A imprensa dialogava constantemente
com a instituição escolar, seja na publicidade de propagandas para a matrícula, seja na atuação
social ou nos convites para formaturas ou eventos escolares, como por exemplo resultados de
exames de admissão. Atreladas a elas utilizou-se fontes iconográficas dos jornais porque são
públicas e outras disponibilizadas pela FAC, sob o ponto de vista do “significado que portam”,
e não somente como ilustração.
Nessa direção de raciocínio, é interessante o que o sociólogo Walter Benjamin (1985)
complementa: “A fotografia é o primeiro meio de reprodução verdadeiramente revolucionário”.
Ela compõe o processo de revolução documental, alargando o conceito de documento e
alterando o panorama acadêmico a partir da década de 1990, face ao interesse que este tipo de
18
Foram encontrados 05 livros de Atas de Resultado Final, donde foram feitas as listagens de alunos e a partir
disso pode-se inferir número de aprovados, reprovados e abandonos que serão utilizados para construção de tabelas
no próximo capítulo.
53
documentação desperta, o que vem suscitando o debate e reflexão acerca do alcance, do valor
e dos limites das fontes fotográficas.
Ainda sob essa ótica, é importante relatar que as fontes iconográficas têm significado
na ampliação dos conceitos de escolha documental e Paiva (2002) fornece-nos indicações que
as mais novas gerações de historiadores brasileiros “vêm usando como fonte privilegiada a
iconografia e têm feito isso com muita destreza. (...) não tomam como simples ilustrações,
figuras, gravuras e desenhos que servem para deixar o texto mais colorido, menos pesado”,
mas “devem estabelecer um diálogo contínuo”. (PAIVA, 2002 p. 17). Além disso, tornam o
relato mais leve e interessante para leitores e pesquisadores.
Dessa forma, ficaram claros os objetivos de nossas indagações e que deveríamos adotar
procedimentos de investigação que não se circunscrevessem apenas ao levantamento e à
organização do material documental, que se tornou raro e não disponível, e iconográfico, mas
a um exercício contínuo de análise e interpretação que procurasse entender essa forma de
representação documental/visual e o seu uso nos estudos históricos, em especial, no caso, na
história da educação, que se refere à realidade do Lyceu Mineiro, localizado em Curvelo.
Nesse Capítulo serão descritos os elementos materiais que constituíram o Lyceu Mineiro
e os sujeitos que nele atuaram, para formar o trabalhador do comércio, com vistas a atender a
população da cidade de Curvelo e das regiões circunvizinhas. Ainda, levantar as razões e os
motivos que levaram à sua criação da instituição.
Na visão de Justino Magalhães, a instituição escolar caracteriza-se como epistemologia
de uma totalidade. Por isso, é preponderante que seja considerada numa dimensão mais ampla.
Nesse sentido, Magalhães afirmou que a instituição escolar deve estar integrada “de forma
interativa no quadro mais amplo do sistema educativo, nos contextos e nas circunstâncias
históricas, implicando-a na evolução de uma comunidade e de uma região, seu território, seus
públicos e zonas de influência” (MAGALHÃES, 2004, p. 133-134).
19
Ver Faria Filho (2000, p. 42) [...] “o fato de os grupos escolares ocuparem não apenas os melhores prédios, mas
também aqueles mais centrais, denota a importância atribuída aos grupos escolares na composição do desenho
urbanístico da cidade, um esforço por demonstrar a centralidade que o lugar da educação escolar deverá representar
no interior da cidade” [...]
20
Pacífico Gonçalves da Silva Mascarenhas, médico e político. Estudou no Colégio do Caraça, e depois se formou
em medicina. Iniciou-se na política por volta de 1870, ao ser eleito vereador e presidente da Câmara Municipal de
Curvelo. Em 1886 foi eleito deputado geral pela província de Minas Gerais. Reeleito para as legislaturas seguintes,
exerceu o mandato até a proclamação da República em 15 de novembro de 1889. No novo regime, foi eleito
deputado constituinte em 15 de setembro de 1890. Assumindo em 15 de novembro sua cadeira no Congresso
Nacional Constituinte, no Rio de Janeiro, agora Distrito Federal, participou dos trabalhos de elaboração da primeira
Constituição republicana do Brasil e foi um dos signatários da Emenda Lauro Müller, que propunha a demarcação
de uma zona no Planalto Central destinada à construção da futura capital federal. Depois da promulgação da nova
Carta em 24 de fevereiro de 1891 e da eleição do marechal Deodoro da Fonseca como o primeiro presidente da
República, participou da legislatura ordinária que se seguiu, entre junho de 1891 e dezembro de 1893. Disponível
em: http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-
republica/MASCARENHAS,%20Pac%C3%ADfico%20Gon%C3%A7alves%20da%20Silva.pdf
Acesso em 15/10/17.
55
série do Curso Ginasial em 1931. Neste mesmo ano o Sr. Érico de Bacellar de Souza, transfere-
se de Curvelo e uma Sociedade foi organizada – Lyceu Mineiro Sociedade Ltda.
Conforme registrado no Livro de Atas do Conselho Gestor da Escola nº 05 de 1931, a
instituição foi transferida para novas dependências, construídas à Rua João Pessoa. A
construção do novo prédio é uma afirmação da importância do Lyceu Mineiro para a Educação
Republicana. Mesmo sendo uma instituição privada, os ideais urbanísticos e arquitetônicos
coadunavam com a realidade dos grupos escolares da rede estadual, destacada nos estudos de
Faria Filho (2000, p. 42), quando ele relatou a realidade dos grupos escolares de Belo Horizonte,
que no seu início ocuparam os melhores prédios, “aqueles mais centrais”, “num esforço por
demonstrar a centralidade que o lugar da educação escolar deveria representar no interior da
cidade”.
A Rua João Pessoa era o centro comercial da cidade e, na época, chamava-se Rua Aurora
e era movimentada pelas firmas atacadistas que ali funcionavam, sendo uma delas a Atacadista
Pereira Avelar. Também se avizinhava a outros estabelecimentos comerciais e de serviços,
como o açougue de Sr. Elias Pinto e de profissionais liberais, como o médico Geraldo Valadares
e o gabinete do Sr. Vicente Boaventura e Miguel Véo, dentistas cujo consultório fazia divisa
com os muros da escola; além dos prédios do Cinema e do Fórum, que ficavam na Pça da
Bandeira, local central da cidade e utilizado para pronunciamentos e reuniões com a população.
No mesmo prédio eram oferecidos os cursos primário, secundário e comercial, no sistema
de internato para homens e externato para ambos os sexos, até o ano de 1928, precisamente dia
06 de maio, quando começou a atender o sexo feminino em regime de internato, que ocorreu
em decorrência da reforma no prédio (Jornal Voz do Povo, Anno I, nº 46). Acrescenta-se a
esses cursos as aulas preparatórias para o exame de admissão e os cursos livres de datilografia
e mecanografia e Cursos Especiais de Música (piano e violino), conforme se pode ver na figura
abaixo a propaganda do Jornal “Voz do Povo”, de 26 de junho de 1928.
56
“O inspetor faz referência ao profissional remunerado que, como previsto na reforma de 1899, era um agente
21
que o Ginásio Comercial foi determinação do Decreto e o nome “Padre Curvelo”, sugestão em
homenagem ao fundador da cidade - o Padre Antônio Corvello de Ávila.
Somente em 1945, foi que se criou formalmente o Curso Comercial Básico, por força
do Decreto-Lei 6.141, de 28 de dezembro de 1943, que habilitava o Auxiliar de escritório e, em
1949, o curso Técnico em Contabilidade. A formalidade se deve ao fato de que nessa data
houve a entrega do Relatório de Verificação Prévia para o Ministério da Educação e Saúde –
Diretoria de Ensino Comercial. Percebe-se que há um anseio da própria comunidade para a
legalização dos atos escolares, o que culminaria com a permanência e afirmação da educação
praticada desde o início da instituição.
Cabe ressaltar que em 11 de setembro de 1816, o Príncipe Regente Dom João, concedeu
a Curvelo o foro de Vila. O município foi criado por decreto da Regência Trina em 13 de
outubro de 1831. A primeira Câmara tomou posse e começou a funcionar em 30 de julho de
1832, sob a presidência do Tenente Coronel João Marciano de Lima. Em 15 de novembro de
1875, pela Lei 2.153, Curvelo é elevado à categoria de cidade e, em 13 de novembro de 1891,
a denominação da Comarca de Curvelo.
Uma resposta para a pergunta: Por que o Lyceu Mineiro veio para Curvelo? - título desta
sessão, toma a origem geográfica da cidade como resposta – devido à sua localização central,
interligando várias regiões do Estado, e outros estados. Para, além disso, e em consequência,
Curvelo era importante centro de desembarque do comércio vindo do Norte de Minas e do
sertão da Bahia. Os contatos entre áreas de mineração do centro de Minas Gerais e as fazendas
de criação do sertão de São Francisco e Bahia se faziam pelas terras de Curvelo, que funcionava
como importante “pouso de tropas” na estrada da Bahia.
Durante os séculos XVIII e XIX teve como principais atividades econômicas a criação
de gado bovino e o comércio fortalecido pelos tropeiros23. No início do século XX iniciou-se a
23
Principal grupo de agentes comerciais do mercado mineiro colonial. Ver: CHAVES, Cláudia Maria das
Graças, 1999, Perfeitos Negociantes: mercadores das minas setecentistas.
59
fase da cultura algodoeira e mais tarde a industrialização. A região de Curvelo foi pioneira da
indústria têxtil mineira, com a instalação de duas fábricas: a primeira fábrica de tecidos de
Minas foi a Cedro, instalada em 1865, em Taboleiro Grande, onde hoje é Caetanópolis, distrito
de Curvelo até 1872, quando se emancipou compondo o município de Paraopeba, na região de
Sete Lagoas (VAZ, 1990).
Em 1875, instalou-se a segunda, a Fábrica de Tecidos Cachoeira, no distrito de Ipiranga,
hoje Inimutaba, que na época também era distrito de Curvelo. Posteriormente foram fundidas
em Cedro e Cachoeira instalando-se em 1883 como a primeira sociedade anônima do Estado.
Também se destacou na indústria de óleos, da Companhia Agropecuária de Curvelo, com
fábricas de óleo de caroço de algodão e mamona.
Assim, como consequência da localização e do interposto de comércio das Minas
Setecentistas ou época da mineração, houve a instalação da linha férrea Central do Brasil até
Curvelo, em 04/08/1904 (DINIZ, 1975 p. 309), “causando admiração dos sertanejos e
população das redondezas”, o que dotou a cidade de condições para ampliar a comercialização
com grandes centros como Juiz de Fora, Rio de Janeiro e São Paulo. Antônio Gabriel Diniz
(1975, p. 310) afirma que de “toda parte vinham pessoas que pernoitavam na cidade e
movimentavam o comércio local, aumentando a população urbana”. Segundo a observação oral
feita pelo professor e ex-aluno da instituição escolar, Prof. Fausto Ferreira dos Santos, que foi
diretor no período de 1998 a 2004.
“a transferência do Sr. Érico de Bacellar e Souza para Curvelo tem forte relação com
o grande desenvolvimento que a cidade tinha nessa época, devido à movimentação
ferroviária já que Curvelo era a última estação de trem para o Norte, porque a linha
do trem não chegava a Montes Claros e nem a Pirapora, e não havia ligação nem
mesmo para Salvador.”
Dentro da rara literatura existente sobre a história de Curvelo, não foi possível encontrar
explicitamente a resposta para a indagação da escolha de Curvelo para a transferência da escola,
mas diante da situação econômica atrelada ao respaldo político da época é realmente
interessante o comentário do ex-diretor, em conformidade, logicamente, com a localização e a
organização e desenvolvimento urbano. Isso porque a afirmação da república se deu pela
educação e o desenvolvimento urbano exigia novas rotas de transporte até mesmo pelo
abastecimento interno, porque Minas Gerais tem uma significativa amplitude territorial e desde
épocas colônias os governantes sofriam com a dinamização do comércio até mesmo para a
subsistência. No Jornal do Comércio de 04 de abril de 1937 há a explicação do grande
desempenho comercial de Curvelo, em números:
60
...e o 1908 o município exportou mais de 10.000 bois gordos, consumiu uma parte e
exportou o restante de 15.000 fardos de algodão; exportou tecidos de algodão, cereais,
madeira, borracha, massa alimentícia, couros crus e preparados e muitos outros
produtos. Possuía mais de 100 casas de 1ª classe e outras tantas de 2ª classe (Jornal
do Comércio, 04/04/1937, p. 1).
Nesse cenário, importa afirmar que na época em que se instalou o Lyceu Mineiro,
Curvelo possuía um comércio alvissareiro, servindo de entreposto para as regiões
circunvizinhas e contava ainda com o serviço do transporte férreo da rede ferroviária que
facilitava o intercurso de recebimento e movimentação de matéria prima e gêneros diversos
para abastecimento do comércio local e dos arredores. Em texto publicado pelo historiador
curvelano e ex-aluno do Lyceu Mineiro, Sr. Silvio Gabriel Diniz, cujo título é “Dados para a
História de Curvelo”, o autor descreve a cidade no início do século XX:
Fonte: Livro “Dados para a História de Curvelo”, DINIZ, 1975, pag. 103 a121 autoria própria
Como pode ser percebido, a própria realidade da cidade sinalizava uma demanda de
formação para atender ao seu expansivo comércio, justificativa plausível para a instalação de
uma escola que educa para o comércio. Para além dessa questão inicial importa ainda dar
continuidade a pergunta da pesquisa que não se esgota na justificativa da instalação de uma
escola de comércio na cidade de Curvelo, mas vai além, na tentativa de responder como se
organizou a instituição e suas demandas institucionais.
62
Segundo Escolano, na Europa, “o lugar que a escola teve que ocupar na sociedade, foi
um ponto de especial preocupação para os reformadores dos fins do século XIX e início do
século XX” (FRAGO; ESCOLANO, 1998, p. 30). Da mesma forma, no Brasil, começou a
surgir, na mesma época, uma preocupação com um lugar específico para a escola funcionar, ou
seja, com a construção do prédio escolar. Souza corrobora com a afirmação que
O fato de os grupos escolares ocuparem não apenas os melhores prédios, mas também
aqueles mais centrais, denota a importância atribuída aos grupos escolares na
composição do desenho urbanístico da cidade, um esforço por demonstrar a
centralidade que o lugar da educação escolar deverá representar no interior da
cidade[...].
63
Assim, pode ser afirmado que a localização da instituição educativa foi pensada, mesmo
porque o prédio, além de destacar-se dos demais, oferecia as condições para receber alunos em
sistema de internato, que demandava um espaço ampliado e adaptado. Nesse prédio, a escola
funcionou durante 03 anos.
Com o passar do tempo, e com o crescimento da escola, mais espaços foram
demandados. Fato esse que fora percebido na leitura das Atas das reuniões da Congregação
Escolar. Ademais, as afirmações denotavam o anseio de todos pela construção de um novo
prédio, visto como um assunto premente. Vimos também nas Atas, a constante preocupação
com a instalação da escola em local apropriado, principalmente no que se refere à questão da
higiene e do ensino.
Na revista “Nossa Terra”, de junho 1928, encontra-se a seguinte referência ao prédio:
“instalado em prédio amplo e confortável, adaptado para estabelecimento de ensino, com todas
as exigências da higiene e as mais rigorosas prescrições pedagógicas” (1928, pag. 3). O prédio
referenciado é o que se encontra na Figura 4.
Figura 4 – Prédio onde funcionava o Lyceu Mineiro em 1926, a Avenida Dom Pedro II
Quando ocorreu a mudança do primeiro gestor escolar, em 1931, a escola foi transferida
para um novo prédio, conforme relatado pelo memorialista da cidade Juvenal Pereira Soares,
citando o Livro de Atas do Conselho Gestor da Escola:
Em 1931, a escola foi transferida para novas dependências construídas à Rua João
Pessoa. Isso se deveu a mudança do fundador/proprietário e diretor da escola Sr. Érico
de Barcelar e Souza para São Paulo e a organização da Sociedade Lyceu Mineiro
Sociedade Ltda., representada por cidadãos Curvelanos que “acreditavam na
Educação como força propulsora do progresso[....] que compraram a instituição
educativa, e através de empréstimos construíram o novo prédio (SOARES, 1988, p.
22).
É importante enfatizar que quando se faz referência à arquitetura ou da localização do
espaço físico de uma dada escola, o seu arranjo interno também precisa ser apresentado. Nesse
sentido, deve-se ressaltar a disposição da estrutura interna da arquitetura escolar, no que diz
respeito à disposição das salas e áreas de alimentação, lugar da aula de educação física e pátio
utilizado no recreio, das brincadeiras, das apresentações e das comemorações.
Ademais, constatou-se que os gestores da instituição, no momento da procura de um
novo prédio, levaram em consideração que o espaço físico deveria ir ao encontro dos objetivos
da instituição escolar. Essa constatação pode ser visualizada na Figura 5, que retrata a
individualização das salas de aula, sala de espera, diretoria e secretaria, localizadas logo na
entrada do prédio, demarcando o local dos gestores escolares como condutores do processo de
escolarização e também limitando a entrada, já que para adentrar a instituição dever-se-ia passar
em frente às salas da direção e da secretaria.
Quanto ao acesso dos alunos à escola, eles entravam por outro portão, localizado entre
o jardim e a diretoria, e que permanecia fechado na maior parte do tempo escolar, sendo aberto
apenas nos momentos de recebimento dos alunos externos ou da saída dos mesmos, e
acreditamos, sempre sobre a vigilância de porteiros ou disciplinários da escola, veja seta
indicativa na Figura 5. Ao fundo havia um galpão onde se encontrava um pequeno palco,
utilizado para atividades de apresentação, horas cívicas, e logo em frente a uma cantina e o local
onde eram servidas as refeições. Já o espaço dos dormitórios para os alunos internos ficava no
2º pavimento ao fundo, no lado direito, no retângulo demarcado entre as letras A/B/C/D
conforme indicado na própria planta, o que permitiria um maior controle sobre esse espaço e
consequentemente dos alunos. Ao fundo encontra-se o Campo de Futebol que complementa a
estrutura com local para recreação e participação nas aulas de Educação Física.
Faz-se oportuno informar que os registros fotográficos utilizados nessa dissertação estão
sendo considerados, de acordo com Marcus Levy Bencostta (2011, p. 400), como “objetos
culturais que guardam fortes vínculos entre a memória dos personagens da escola e a memória
da própria instituição”, visto que enquanto fontes, essas fotografias consistem em testemunho
e representação da escola em determinada época, pois revelam a um só tempo o modo de ser,
mas também o de se conceber a escola. As fotografias trazem informações sobrea cultura
material escolar, a partir dos arranjos espaciais (arquitetura) e também das memórias do que foi
vivido nos espaços.
Observa-se que nas duas fotografias (Figura 4 e Figura 6) é possível identificar o letreiro
com o nome da instituição escolar em letras garrafais, demarcando o local e o prédio. No prédio
da figura 04, “Lyceu Mineiro”, e na figura 06, “Ginásio Padre Curvelo”, talvez porque queriam
deixar evidente o nível de ensino fomentando maior procura por matrículas, ou simplesmente
fazer menção à nova dimensão social, já que a escola, desde 1931, não pertencia mais a Erico
de Bacellar e Souza, mas à Sociedade Lyceu Mineiro Ltda.
Essa ênfase dada ao nome da escola de Ginásio, pode também estar relacionada às
dificuldades com a normatização do Curso Técnico de Comércio, tendo em vista a publicação
do Decreto nº 20.158, de 30/06/1931, principalmente no que se refere ao Artigo 30, que trata
dos gabinetes e laboratórios que deveria possuir o estabelecimento para serem reconhecidos
oficialmente. Isto porque houve temporariamente a cassação do funcionamento escolar em
1932, por não atender aos requisitos do Decreto. Como se pode ver na notícia veiculada em 03
de julho de 1932, pelo Jornal Centro de Minas, na 1ª página:
Causou péssima impressão nesta Cidade o acto do Ministerio da Educação, que cassou
a inspecção preliminar do Liceu Mineiro. Esse estabelecimento modelar quanto ao
66
Após alguns dias, para alívio da comunidade escolar e da cidade, no dia 10/07/1932, o
mesmo Jornal publicou com letras garrafais, na 1ª página o seguinte:
Temos a satisfação de anunciar que o caso do Lyceu Mineiro teve solução satisfatória
para nós. Nesse sentido o Diretor do estabelecimento recebeu carta do tenente coronel
José Vargas, ilustre curvellano que perante o Ministério da Educação defendeu os
interesses do educandário que se sacrificava (JORNAL CENTRO DE MINAS, 1932,
p.1).
Seus alunos poderão fazer ali, o curso gymnasial em transição para os cursos
superiores do paiz; quer dizer, sem grandes sacrifícios e sem separarem de junto de
suas famílias, fazem todos os preparatórios antes de seguirem para qualquer curso
superior ou universidade. Ahi está o motivo dessavictória que bem representa um
marco do progresso para Curvelo. (JORNAL VOZ DO POVO, 1928, p. 1).
Na Figura 8, abaixo, observa-se a composição de alguns alunos de turmas que podem
ser de 1931 ou 1932, época na qual foram localizados os nomes dos alunos nas listas da escola.
68
No universo dos alunos organizados para a fotografia vemos que existem jovens e crianças,
público de várias idades. Encontramos alguns que são menores, que deveriam pertencer ao
curso primário; outros com idade já adiantada que deveriam compor o curso secundário e o
comercial. Além das meninas que em menor número compunham o grupo, em destaque ao
meio. Ao centro, temos os professores da escola e, dentre eles, o Monsenhor Xavier Rolim24.
24
ROLIM, Francisco Xavier de Almeida, monsenhor, político, sacerdote, jornalista e historiador, nasceu em Datas,
então Distrito de Diamantina, Província de Minas Gerais, a 3de dezembro de 1855, e faleceu em Curvelo, a 31 de
janeiro de 1943. Formando-se no curso de Humanidades e os estudos eclesiásticos no Seminário de Diamantina.
Foi Ordenado sacerdote em 1878, desempenhou a função de vigário de Datas até março de 1883. Ingressou então
na política, como Vereador à Câmara Municipal de Diamantina (1883-1886). Passando a residir em Curvelo, ali
exerceu o paroquiato por 57 anos além de fundar e dirigir o Colégio Boa Esperança e a Escola Normal,
estabelecimentos em que lecionou várias disciplinas, além de Professor no Lyceu Mineiro. Como político foi
Vereador (1892-1912). Presidente da Câmara e Agente Executivo Municipal (1895-1912). Deputado Estadual da
3ª à 6ª Legislaturas (1899-1914), ocupou a Vice-Presidência da Câmara e teve a iniciativa de leis que introduziram
ampla reforma no ensino oficial. Em seguida, elegeu-se Senador Estadual da 7a à 9a Legislaturas (1915- 1926).
Encerrou sua carreira política com atuante participação no movimento da Aliança Liberal.
25
Como já dito na introdução, conseguiu-se acesso somente aos dados das pastas de 120 alunos.
69
década de 1930 de modo geral, eram de cidades mais distantes, como Manga, Ouro Preto, Santa
Luzia, Itabirito, Entre Rios, Passa Quatro, Juiz de Fora, Tijucal.
Esses dados podem ser corroborados nos Quadros de fotografias de formandos de cada
ano, que adornaram as paredes da escola e que se encontram no museu da FAC e que estão
apostos a seguir, nas Figuras 09 e 10, dando visibilidade aos concluintes nas turmas de 1932 e
1934. Nota-se a diferença de apenas 02 anos no espaço temporal de uma turma para outra e as
vestimentas (uniforme) se alteraram. No início da instituição escolar, os jornais chamavam a
atenção para o “vanglorioso pelotão de meninos com o fardamento típico da época – quepe,
botas, talabarte, polainas de cor esverdeada” (SOARES, 1928, p. 23) fazendo referência a esse
suntuoso uniforme.
26
Pelo Decreto 16.782 A de 13 de janeiro de 1925, segundo o Art 54, parágrafo 2º : “ao estudante que fizer o
curso do 6 anno e for aprovado em todas as matérias que o constituem será conferido o grao de bacharel em
sciencias e letras” (BRASIL, 1925).
71
feita por amostragem apenas das pastas que foram pesquisadas no início dos trabalhos. Atrelado
a isso, está o fato de que somente foram pesquisadas as pastas que representavam o Ensino
Comercial, e não o Ensino Secundário.
NÚMERO DE
LOCALIDADE ALUNOS
Abaeté 1
Almas 1
Araçai 2
Bagre 9
Baldim 1
Belo Horizonte 1
Bragança 1
Buenópolis 2
Cordisburgo 2
Corinto 2
Curvelo 30
Felixlândia 9
Gouveia 1
Ipiranga 1
Montes Claros 1
Morro da Garça 4
Paraopeba 1
Pequi 1
Tomaz Gonzaga 1
Pirapama 1
Rio Vermelho 1
Santa Rita do Cedro 2
Sete Lagoas 2
TOTAL ALUNOS 77
Fonte: Elaborada pela autora, a partir do acervo escolar
Outro aspecto importante a considerar sobre a origem social dos alunos é a origem das
profissões de seus pais. Cabendo informar que nem todas as pastas consultadas continham o
dado, por isso apresentamos tão somente uma amostragem. Das consultas exitosas elenca-se
uma maioria de comerciantes, fazendeiros e industriais, respectivamente, nessa ordem em
número de amostras. Acresce-se a esses outros profissionais, em menor número, profissões de
bombeiros, pedreiros, pintor, chofer, carpinteiro, lavrador, guarda livros e funcionário da
Central. Essa origem profissional majoritariamente de profissões prestigiosas socialmente
72
permite-se inferir que possivelmente a Escola atendia em maior número a uma população com
condições de vida financeira privilegiadas (PATTO, M. 1999). Na leitura das Atas de Reuniões
da Congregação a situação econômica dos alunos vem à tona e esses dados são corroborados
com as discussões sobre a distribuição de bolsas de estudo para “alunos reconhecidamente
pobres”, deixando em evidência que os alunos não bolsistas tratavam-se daqueles alunos com
melhores situações financeiras. Confira na TABELA 2, abaixo:
Essa informação foi encontrada registrada no Livro de Termos de Visita do Inspetor Escolar,
em 06/05/1929.
O inspetor Antônio Ribeiro de Paula relatou que havia 133 alunos, sendo 85 “gynasial”
e 13 comercial, mais 1 aluno no Curso preparatório, 8 na Admissão e 19 no primário; além de
citar 17 alunos de datilografia não pertencentes ao curso comercial. Ou seja, os alunos do
Ensino Secundário ou de outras modalidades existentes na instituição experimentavam algumas
rotinas de técnico de comércio, como aulas de datilografia. Outras vezes os que frequentavam
apenas o período diurno, quando concluíam seus cursos, por não terem opções para o Curso
Superior, retomavam os estudos para fazer o Curso Técnico. Exemplo muito comum eram
alunos do curso Normal, já diplomados, optarem por fazer o Curso Técnico para complementar
os estudos. Isso foi normatizado pela Circular nº 01 de 15/02/1947, que deu às normalistas
direito de requerer matrícula nas escolas de Comércio, no Curso Comercial Básico, com
adequação apenas no conteúdo de Língua Estrangeira.
Aqueles que não estudaram tal conteúdo fariam exame de admissão, apenas desse
conteúdo, para verificar se havia conhecimento satisfatório. Isso já constava do parágrafo único,
do Artigo 21, do Decreto 6.141, que a partir de 1947, torna-se verificação habitual, como se
pode ver abaixo:
Art. 21. Além das condições referidas no artigo anterior, deverá o candidato satisfazer
o seguinte:
I. Para o curso comercial básico:
a) ter pelo menos onze anos, completos ou por completar até o dia 30 de junho;
b) ter recebido satisfatória educação primária;
c) ter revelado, em exames de admissão, aptidão intelectual para os estudos a serem
feitos.
Parágrafo único. É facultado a cada estabelecimento de ensino comercial prescrever,
no respectivo regimento, a exigência de exames de admissão para concessão da
matrícula inicial em qualquer dos cursos de que trata o n. II do presente artigo.
na escola. Abaixo, na Figura 11, uma fotografia publicada, com a identificação dos professores
e professoras.
Fonte:
Revista Nossa Terra, 1928. A fotografia faz referência ao ano letivo de 1927.
O diretor do Lyceu Mineiro, fez sciente aos snrs professores, ter recebido aviso de
São Paulo, da chegada dos cathedraticos Rodolpho Wolf, lente de grego, latim, inglês,
physica e chimica e Bento Ferreira de Carvalho, lente de escripturação mercantil e
contabilidade comercial (JORNAL VOZ DO POVO, 1928).
27
Na busca nos arquivos no início dos trabalhos foram encontradas partes de um Regimento Escolar que
acreditamos ser aquele entregue a Equipe de Inspeção Escolar juntamente com o Processo enviado em 1944 para
Autorização dos Cursos Técnicos de Comércio.
76
No que se refere às funções públicas que os professores exerciam para além da docência
na escola, a pesquisa indicou que pertenciam ou trabalhavam em entidades como a Associação
Comercial, Associação Católica de Moços, cartórios e partidos políticos, além de outras funções
como as de profissionais liberais, sendo proprietários de empresas, além do exercício das
atividades de advogados, farmacêuticos e comerciantes.
A credibilidade dos professores transcendia os muros da escola, sinalizando e
ratificando a própria imagem da instituição escolar. Com isso, eram exaltados tanto os nomes
da escola, quanto dos próprios professores. O reconhecimento dos docentes junto à
comunidade, para Magalhães (2003), está no fato de que a docência é “[...] uma profissão que
se situa entre as mais exigentes pela sua especificidade, quanto ao desempenho funcional e ao
grau de responsabilidade, bem como quanto às repercussões da ação docente nos destinos
individuais e comunitários” (MAGALHÃES, 2003, p. 74).
Como visto, a presença da imprensa na vida da cidade é bastante intensa, demarcando
inclusive, a produção identitária tanto da escola quanto dos docentes. Essa assertiva está
77
presente em Goodwin Junior (2006) quando “trata a atuação dos homens da imprensa”28. A
imprensa fica antenada a todos os fatos da cidade, não deixando de imprimir nas suas páginas
as ideias e as várias notícias acerca do cotidiano da escola, do seu ensino e de sua
funcionalidade, como segmento importante para a cidade. Ela também atuava fazendo as
propagandas para as matrículas, divulgando várias informações, que iam desde as convocações
para exames de 2º época ou de admissão, até as chamadas para as formaturas.
Para além dessa comunicação formal, sempre que era possível, a imprensa atentava-se
para os registros da presença dos professores em eventos públicos, assim como para as
participações dos alunos nos desfiles cívicos, nas datas comemorativas e formaturas, e em
outras ações ocorridas no interior da escola, promovendo-a e recomendando para aqueles que
não a conheciam ou frequentavam. Não é de se estranhar a vinculação da imprensa aos
interesses de divulgação dos docentes e da escola. Isto porque, na constituição do corpo editorial
dos jornais a Mocidade, A Voz do Povo, Revista Nossa Terra e O Curvellano, estavam presentes
os professores do Lyceu, como redatores.
Além da presença destacada na imprensa, os professores participavam da liderança das
agremiações de estudantes. É o caso da professora Araceli de Bacellar e Souza, esposa do
proprietário do Lyceu, que foi a primeira presidente do Grêmio Juvenil, conforme noticiado
pela imprensa no dia 18 de dezembro de 1927, dois meses após a inauguração da instituição
escolar (Jornal Voz do Povo, número 26, 1ª página). Posteriormente, outros professores
exerceram funções junto ao Grêmio, notadamente o os professores Cristovam Breiner e
Francisco Venâncio.
O que foi dito até agora permite aferir que, por meio das práticas escolares ou mesmo
somente com sua vinculação ao Lyceu, os professores atuaram como agentes promotores da
Escola corroborando com a sua identidade como instituição diferente das demais do mundo
social. Entretanto, não foi sem sentido essa imersão no universo da imprensa, pois era por meio
dos jornais que eles poderiam garantir a sobrevivência da Escola, conquistando a simpatia da
população e, com isso, angariando alunos que pudessem pagar as mensalidades.
Dada a importância dos professores na formação identitária da Lyceu/Escola, o
conhecimento desses sujeitos é preponderante para essa pesquisa. Por isso, na sequência iremos
nos ater ao quadro biográfico, intentando trazer dados biográficos desses sujeitos. Esse
procedimento ganha importância na História das Instituições Educativas, uma vez que para
28
O termo “homens de imprensa” é utilizado por Goodwin Junior (2006) e trata não de jornalistas profissionais,
mas de intelectuais que usavam a imprensa como um veículo de divulgação de ideias políticas as quais os mesmos
se vinculavam. (GOODWIN, 2006, p. 193)
78
29
Segundo o memorialista Padre Alberto Vieira de Araujo (1970) “Curvelo foi por quase um século um grande
centro político e denominação comum na política da Província, polarizando a região Centro Norte de
Minas”(ARAUJO, 1970, p.290). Complementa ele que “a batalha era travada entre Liberais e Conservadores,
Republicanos e Monarquistas, Vianistas versus Mascarenhistas. Sendo que dentre os Mascarenhistas os que davam
as cartas eram o Dr. Pacífico Mascarenhas e o Monsenhor Rolim” (p. 291), ambos já apresentados ao longo dessa
dissertação.
80
Veja na Tabela 3, abaixo, a dimensão de profissionais que faziam parte do grupo inicial
que compunha a sociedade, onde se destaca, mais uma vez, uma maior quantidade de
representantes dentre os fazendeiros e comerciantes. Da mesma forma que foi observada na
origem do alunado da instituição, o grupo seleto de cotistas também está atrelado a cidadãos
oriundos desse seleto grupo. Dentre os cotistas, o número de fazendeiros e comerciantes se
destacava, sendo inclusive superior ao número de professores.
proposta. Na assembleia de 17/02/1932 o diretor secretário, Sr. Antônio Lisboa de Abreu Filho,
propôs que o Lyceu Mineiro recebesse 03 alunos gratuitos, filhos de município,
“reconhecidamente pobres” e com “provas de aplicação, aproveitamento e bom proceder”, o
que foi aprovado por unanimidade. (Livro de Atas 2ª Assembleia em 17/02/1932). A expressão
do reconhecidamente pobre vem de encontro à dimensão já apresentada de que o nível social
dos alunos da escola não estava entre os pobres da cidade.
Além de cotistas da sociedade, vários membros exerciam a função de professores e/ou
exerciam cargos de direção, secretários, tesoureiros e conselheiros. Não se pode afirmar que
os professores eram impelidos à filiação voluntária ou obrigatória, mas a grande maioria assim
o fazia. Pode-se citar os senhores Antônio Teixeira Guimarães, Celso Gonzaga Pereira da
Fonseca, João Mourthé Sampaio, Cônego João Tavares de Souza, Aroldo de Oliveira, Prof.
Joao Gabriel Ribeiro, Prof. Claudovino de Carvalho, Sr. João Lima Guimaraes e Prof. José
Raimundo de Moura.Abaixo, na Figura 12, uma apólice referenciando o valor da cota de um
determinado associado.
Para fazer ver, a escola devia dar a ver. Daí os edifícios escolares majestosos,
amplos e iluminados, em que tudo se dispunha em exposição permanente.
Mobiliário, material didático, trabalhos executados, atividade discentes e docentes
– tudo devia ser dado a ver de modo que a conformação da escola aos preceitos da
pedagogia moderna evidenciasse o Progresso que a República instaurava.
Carvalho (1989, p.25)
vacinação contra varíola. O requerimento para o exame só poderia acontecer uma vez no ano,
pois não haveria dentro do mesmo ano uma nova oportunidade de reavaliação, caso não fosse
logrado o êxito no exame.
Para lograr êxito no exame de admissão a nota deveria ser igual ou superior a 5, no
conjunto das disciplinas de português, matemática, geografia e história do Brasil. Essa avalição
seria aplicada por uma banca constituída por 03 professores. No manuseio das fontes foi
percebido como era seriamente tratado o exame de admissão, tanto no que se refere à exigência
da documentação, quanto no relato que se fazia nas atas de promoção e, ainda, na comprovação
da conclusão do exame.
Os resultados dos exames de admissão circulavam nos jornais, veja Figura 14,
explicitando o bom êxito. Inferimos sobre um sentimento de angústia que deveria acompanhar
o percurso de espera pelos resultados para o candidato e seus familiares. Os candidatos que não
lograssem resultado positivo não tinham seus nomes elencados, no entanto, apesar de não haver
destaque havia a indicação de quantos eram os candidatos que não conseguiram a nota
suficiente para aprovação.
Em contrapartida aqueles que lograssem resultado com média acima de 5 pontos eram
certificados da sua aprovação, constando, inclusive, a nota por conteúdo e a média global do
exame de admissão na publicações dos jornais. Na Figura 13, vemos o resultado de um exame
de admissão para o Curso Comercial. Observa-se que o nome da escola já é Escola Comercial,
em decorrência da Lei Orgânica do Ensino Comercial, Decreto Lei 6.141 de 1943, que assim
determinava, e também porque nessa época encontrava-se em funcionamento o Curso Básico
de Comércio:
88
No tocante à realização da matrícula é importante esclarecer que ela deveria ser feita
mediante a comprovação e certificação da aprovação no exame de admissão, entregue junto aos
demais documentos. O certificado da Figura 13 refere-se a um dos documentos encontrados na
pasta da aluna Lúcia Diniz Vale por ocasião da sua matrícula na escola. Esse documento
também poderia ser utilizado para matrícula em outra escola, independentemente de ter sido
feito o exame de Admissão na Escola Comercial Padre Curvelo. Para o Curso Técnico, o aluno
deveria possuir o diploma ou o certificado de conclusão do curso comercial básico; de
conclusão do curso propedêutico, conforme Decreto 20.158, de 1931, de licença ginasial
acompanhado de aprovação na 4ª ou 5ª série do Curso Secundário fundamental; diploma de
normalista, sendo que para esses, era exigido o exame de admissão apenas em língua inglesa.
Nas publicações era aposto o nome do conteúdo e o grau obtido pelo aluno do maior
grau para o menor, seguido da palavra plenamente (notas 10 a 6) e simplesmente (nota 5). Na
publicação que se observa na Figura 14 do Jornal Voz do Povo de 1929 refere-se a notas do
primeiro exame admissão da instituição.
89
PRÁTICAS ESPORTIVAS
Pelo Quadro 6, observa-se que além das disciplinas de Cultura Geral: matemática,
português, inglês, francês, física e química e aquelas da Cultura Técnica: contabilidade,
elementos de economia e mecanografia, ainda havia as práticas educativas: educação física para
alunos até 21 anos e canto orfeônico para aqueles até 16 anos, ou seja, do Curso Comercial
Básico e instrução pré-militar para alunos do sexo masculino, sendo extinta a partir de 1947,
pelo Decreto Lei nº 9.331/46.
Com relação às disciplinas do Curso Técnico elas variavam de acordo com os cursos. O
Lyceu Mineiro ou “Escola Técnica de Comércio Padre Curvelo” oferecia o Curso Técnico em
Contabilidade a partir de 1949 e as disciplinas eram as seguintes:
30
Esta Lei publicada em 20 de novembro de 1945 alterou algumas disposições da Lei 6.141 de 1943,
principalmente no que se refere a práticas educativas, ensino de religião, critérios para admissão e apuração de
frequência e pontuação nos exames de admissão, e revisão de carga horária e exames para o Curso de Comércio.
93
Como critério de aprovação, a nota final deveria ser superior a 04 em cada disciplina da
série e a média global igual ou superior a 5 em cada grupo de disciplinas de cultura geral e
cultura técnica, separadamente. Se para participar da prova final não havia requerimento,
quando não houvesse aproveitamento dever-se-ia requerer a 2ª chamada ou nos casos em que
houvesse justificativa para não ter realizado a 1ª chamada. Ela acontecia em fevereiro do ano
seguinte, na 2ª quinzena.
Assim, tomando por referência esse apanhado do processo avaliativo, pode-se concluir que o
nível de exigência ao alunado era elevado. Os alunos tinham que lidar com uma banca de
examinadores, muitas vezes composta pelo inspetor escolar ou uma pessoa externa à rotina da
instituição, a quantidade de conteúdos que ele deveria estudar era expressiva e os critérios para
sorteio de pontos e valorização das notas era significativa. Abaixo, na Figura 15, observamos
os pontos de uma Prova Parcial de Canto Orfeônico para 4ª série.
matriculados, 37 são do 1º ano e no ano de sua formatura em 1949, perfazem apenas 15 alunos,
ou seja, 40% dos alunos terminam o ano em 1949. Já em 1947, a matrícula inicial é de 41 alunos
no 1º ano e em 1950 apenas 13 se formam, compondo o universo de 31% dos alunos que deram
entrada em 1947. Em 1948, com formatura em 1951, esse percentual aumenta um pouco
chegando a 50% de formandos, compondo 19 alunos e finalmente, a partir dos dados, dos 36
ingressantes em 1949, 33% dos alunos se formam em 1952, ou seja, apenas 12 alunos.
Sob a mesma perspectiva de análise, considerando que o curso é de 03 anos, a turma de
Curso Técnico em Contabilidade começa o ano letivo de 1949 com 39 alunos. Ao final em
1951, segundo publicação do Jornal Tribuna apenas 21 alunos concluem, num percentual de
53% dos alunos.
Da análise dos dados pode-se entender que a dinâmica escolar de acesso e repetência
eram marcadas por raras aprovações com um número bem elevado de reprovações, além do
também alto número de evasão de alunos. Entretanto mesmo assim, com um grande número
de evasão e reprovações as matrículas continuavam acontecendo e tiveram crescimento no
período analisado. Faltaram dados para uma avaliação mais profunda desses números, mas o
parâmetro vem de encontro a nossa fala de que houve a institucionalização da instituição
escolar, permitindo que a dinâmica escolar se perpetuasse, infelizmente até mesmo na
reprovação.
3.4.1 Síntese de Vida: o aluno, professor e contador municipal José Gregório Sousa Filho
Formou-se no Lyceu Mineiro no Ginasial, em 1954, com outras duas colegas e, logo
após, no Curso Técnico em Contabilidade, em 1958, onde foi a única mulher da turma. Em
1963 realizou os exames de suficiência para Professor de Geografia do 1º Ciclo no Instituto de
Educação e logrou nota 8,1 recebendo com louvor a autorização para lecionar.
Dando continuidade aos estudos licenciou-se em Geografia pela Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais - PUC Minas, e passou a atuar como professora na E. E. Bolivar de
Freitas, por volta de 1963, logrando êxito no concurso para Professor do Estado em 1969, dando
continuidade à carreira como professor efetivo. Além da rede pública atuava no Instituto Santo
Antônio, Colégio Padre Curvelo e também a partir de 01/06/1977, na Faculdade de Ciências
Humanas de Curvelo- FACIC, como professora (Documentos de nomeação na Pasta Funcional
da Servidora).
A FACIC foi inaugurada no ano de 1968, como extensão à Universidade Católica de
Minas Gerais, PUC Minas, permanecendo como extensão da PUC até 1985. Após essa data, a
Fundação Educacional de Curvelo – FEC, passa a ser mantenedora da faculdade o que perdurou
até 2009, com a Profa. Cleide Mourthé à frente como diretora da instituição no ano seguinte
1986 (Atas da Congregação da Faculdade, Livro 1, p. 40).
A faculdade ainda contava com uma área de influência significativa, abrangendo a
Microrregião do Rio das Velhas, com 16 municípios e suas respectivas comunidades. Essa
microrregião aporta cerca de 1800 mil pessoas, o que lhe impôs a obrigação de formar docentes
qualificados para atender às necessidades educacionais regionais. No campo das atividades
Educacionais, desenvolveu programas de melhoria de vida da comunidade e, em alguns
aspectos, procurando criar consciência de direitos e deveres do cidadão e do profissional.
101
Silvio Gabriel Diniz nasceu em Curvelo no dia 25 de março de 1917 e faleceu, aos
setenta anos de idade, na capital do Estado, no dia 04/06/1987. Filho do historiador curvelano
Antônio Gabriel Diniz e Babita Moreira Diniz (presente na Figura 13, como professora do
Lyceu Mineiro). Estudou as primeiras letras no Grupo Escolar de Curvelo, e em seguida no
Ginásio Padre Curvelo. Para continuar os estudos ingressou no Colégio do Caraça, e após foi
aluno da Escola Superior de Agronomia de Viçosa, onde se diplomou, em 1940, no curso de
Agronomia, profissão que levou a ocupar altos cargos: diretor da Escola Média de Agricultura
de Florestal, Secretaria de Agricultura do Governo de Minas Gerais e Companhia Agrícola de
Minas Gerais, onde se aposentou no cargo de Chefe de Gabinete da Presidência do órgão.
Segundo Geraldo de Souza (1993, p. 78), “pelo espaço de quatro anos emprestou seus
trabalhos à Fundação Nacional dos Índios, na reserva dos índios Maxacalis. Recebeu em 1979
a medalha de Honra da Inconfidência pelo Governo Mineiro. Tornou-se cidadão honorário da
Cidade de Pitangui no ano de 1965. Em 1983 recebeu a comenda da Ordem dos Bandeirantes,
por Decreto nº 151/83 e em 1982, recebeu a medalha de Mérito Agronômico, da Sociedade
Mineira de Engenheiros Agrônomos”.
102
Paulo Dayrell de Oliveira, filho de João Evangelista de Oliveira e Ana Benedita Dayrell
de Oliveira, nasceu em 22 de agosto de 1936, em Curvelo, e faleceu dia 16/12/2018. Formou-
se Contabilista pelo Colégio Padre Curvelo, presidiu o Clube Recreativo Curvelano em duas
103
gestões. Marcou época com o apito e o cartão vermelho com os quais repreendia os casais mais
fogosos na piscina do clube.
Na área da educação, presidiu o MOBRAL e a Fundação Educacional de Curvelo,
entidade mantenedora da FACIC. De espírito filantrópico, presidiu também o Rotary Club de
Curvelo. Ainda adolescente, entrou para a Sociedade de São Vicente de Paulo, na Conferência
São Tarcísio, ao mesmo tempo em que acompanhava o saudoso padre Alberto Vieira de Araújo
na associação dos Congregados Marianos.
Na imprensa, militou como colunista, articulista e editorialista de vários jornais e,
quando jovem, dirigiu “A Voz Estudantil. Amante da literatura, e ainda ajudou a fundar a
Academia Curvelana de Letras e nela ocupou a cadeira cujo patrono é o historiador Sílvio
Gabriel Diniz.”. Desportista, fundou e presidiu o hoje extinto Vasquinho Futebol Clube e
pertenceu ao Conselho Deliberativo do Curvelo Esporte Clube. Foi prefeito de 01/02/1983 a
31/12/1988 e, depois, de 01/01/1993 a 31/12/1996.
Tomando as histórias de vida acima percebe-se a influência que a formação no Lyceu
Mineiro exerceu sobre os alunos que pela instituição passaram. Dos 04 profissionais citados
todos desempenharam funções ligadas à formação de outras pessoas tanto do ponto de vista
prático, como professores, ou mesmo de forma indireta como escritos sobre a cidade ou pessoas
da cidade ou na literatura. Já foi destacado na pesquisa e nos dados apresentados que o público
alvo da instituição era de filhos de pais com origem profissional prestigiosas socialmente,
indicando que a Escola atendia em maior número uma população com condições de vida
financeira privilegiadas.
Haja vista que a grande preocupação da instituição era com publicações nos jornais para
angariar novos alunos, então subentende-se que a população que tinha acesso à cultura escrita,
a leitura e participação social no município tinha o direcionamento dos olhares dos proprietários
ou responsáveis pela instituição. Comparativamente observa-se que as outras 04 escolas
existentes na cidade, não detinham espaço nos jornais com publicações mais restritas a ocasiões
como formaturas ou datas comemorativas. Também havia o fato de que ser professor era ter
uma profissão de prestígio socialmente, destacando-se como presença nos eventos sociais e, no
caso do processo formativo, se o mesmo havia estudado na instituição educativa transformava-
se em um continuador da educação praticada. Talvez por isso o universo de professores sempre
esteve coadunado a ex-alunos.
A cultura da escola se perpetuava com o exemplo daqueles que pela instituição
passavam e nas atuações dos sujeitos historiados percebe-se os elogios como “bom cidadão,
pioneirismo, capacidade intelectual”, destaque naquilo que faziam ou simplesmente com
104
valores como, por exemplo, o fato de “serem católicos” etc. Além do mais, com o processo
formativo e a própria atuação profissional, como o caso do Sr. Jose Gregório, que exercia o
cargo de Contador Municipal junto à prefeitura, não mais a escola demandava profissionais
externos, oriundos de outras localidades e também de outras realidades formativas e sociais,
permanecendo a cultura já disseminada e incorporada ao habitus da cultura da escola.
É percebido isso também na atuação dos órgãos estudantis e das esferas de ação com
propostas que semeariam a realidade da cultura escolar e da preparação para atuação em uma
sociedade letrada, organizada, com participação dos cidadãos e que se destacava por ocupar as
funções que demandariam para o comércio, política e ou funções públicas. Como próprio dos
estudantes vê-se na atuação do Grêmio “Euclides da Cunha”, certo pioneirismo até mesmo no
nome escolhido para a agremiação, que traz à tona, um nacionalista, mas também um
temperamental. Talvez, o nome esteja atrelado ao fato de que Euclides da Cunha e tornou
internacionalmente famoso com a publicação desta obra-prima que lhe valeu vagas para a
Academia Brasileira de Letras e para o Instituo Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB).
trabalho, o aluno, sob a supervisão de seus professores, exerceria uma atividade que o prepararia
para o futuro, vivenciando situações que levassem a: “preparar o indivíduo a viver numa
democracia; tornar o indivíduo guia de si mesmo; ensinar o valor da cooperação; despertar o
interesse do educando pela escola; despertar no educando os sentimentos de ordem e de
legalidade, etc.” (CASASANTA, 1939, p. 39 e 40).
Assim, no presente estudo, constata-se que os jornais estudantis podem levantar novas
questões sobre a cultura escolar não só de uma instituição, mas também podem auxiliar no
entendimento das culturas escolares em todo o país. São saberes e fazeres que ocuparam um
dado momento histórico, mas que evidenciam que o espaço escolar não é um espaço que está
fora de embates (políticos, econômicos, sociais, educacionais e culturais).
Com relação à dinâmica implantada no jornal “A Folha” organizado pelo Grêmio
Euclides da Cunha de nº 1, produzido em 07 de junho de 1931, tendo como redatores, o Prof.
Francisco Venâncio de Mello, Pedro Veado Filho e a aluna Myrtha Galuppo, destaca-se em seu
corpo de notícias: a agenda das reuniões do mês de maio e as comemorações em que estiveram
presentes os representantes do Grêmio e as atividades que foram realizadas. As comemorações
foram: dia 15 – Comemoração da data de libertação dos escravos com discurso, poesia Navio
Negreiro e a Cruz da Estrada apresentadas na forma de declamação. Dia 24 – Discurso sobre a
batalha de Tuiuty e declamação da poesia Ingratidão de Raul de Leoni, e a leitura de um trabalho
de geografia sobre a Formação das Nações Americanas. Destaca-se que todos os trabalhos são
antes apresentados aos alunos no começo da aula de História Universal e amplamente debatidos.
Também foi destacado que os gremistas receberam novas doações de livros, sendo que
foi apresentada uma crítica literária de Katucha, a última produção de Benjamin Costallat,
salientando-se a facilidade de leitura, os trechos de comoção, a apresentação de figuras de
linguagem metáfora no livro e uma definição do enredo e da moralidade que se encontra,
delimitando-se que nesse aspecto não é indicado para todos os leitores indistintamente.
Continuando a explanação os gremistas trouxeram uma notícia sobre a narração de um
Gol, os ex-diretores do Grêmio e a chegada de um novo professor de física par a Instituição
Escolar, além da inauguração do novo pavilhão, destacando-o como moderno. Além disso,
reportaram os acontecimentos das outras escolas, como festival em benefício da Caixa escolar
pela Escola Normal, a entrega do diploma de curso primário, detalhando quais foram os alunos
que participaram com falas no evento e das apresentações com o sarau como término, do Grupo
Escolar. Com relação ao Grupo Escolar foi destacado também o aniversário da Diretora,
chamada pelos gremistas de competente, e do aplauso que o Monsenhor Rolim ofereceu a todos
as participantes durante a missa pela homenagem prestada à professora.
106
O atrazo foi causado por um piscar de olhos. Mas não importa! Muito amolado
fiquei porque tive de assistir parte da aula de pé, meio acocorado, olhando pelo
buraco da fechadura. A aula versava sobre a descoberta do Brasil. Assim
começou: Caros alunos, no ano de 1500, faltando 500 prá dois mil reis (coisa
lógica!) o almirante português Pedro Alvares Cabral descobriu o Brasil. Os
navios navegavam nas (mas! Que lógico!). Em alto mar só se viam céu e água
(logicissimo!...). Todos trajados com vestimentas próprias da época...(È claro:
com vestimentas do século XX não podia ser). Não agüentei mais ficar de pé
pois estava cansadíssimo. Como a ordem para entrar após a chamada é pagar
$500 ao porteiro, $500 ao Gremio Euclides da Cunha e $500 à caixa de
estudantes Pobres fundação do benigno Dr. C. Breiner, não pude ir me assentar
na carteira...Estava quebrado
Tecendo-se uma comparação entre os dois jornais percebe-se que o Jornal do Grêmio
Estudantil traz uma dinâmica mais madura e de escrita menos pejorativa. Ele lembra os jornais
da imprensa curvelana com suas notícias e prestação de serviço com anúncios e diálogos entre
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
partir desta pesquisa concluíram-se devido à indisponibilização dos arquivos já com a pesquisa
em andamento, mas partimos para as inferências e contextos discursivos que colocaram-nos
frente às demandas existentes. Acreditamos, que o grande desejo que permeava a educação no
Lyceu Mineiro e que sustentou todas as expectativas para o ato autorizativo e captação de novos
alunos e públicos, como por exemplo, a rotatividade de professores é a formação de lideranças
para ocupação de cargos públicos, políticos e de disseminação da cultura da escola.
Nessa direção toda a rede de legislações e mudanças implementadas com programas
específicos para as instituições escolares comerciais e a legitimação do Curso de Comércio, e
suas contradições, ambiguidades e tensões, foram fundamentais para a construção da identidade
da escola e das diversas campanhas que promoveram sua reinstitucionalização. Esses fatores
levaram um grande número de pessoas a interessar-se pela participação na sociedade, a
acompanhar os fatos ou mesmo a realizar-se politicamente a partir das demandas do Ensino
Secundário e Comercial que atendia à região e não somente a cidade.
Para além do processo educativo a instituição escolar funcionava como um reduto de
discussões políticas republicanas e nos diálogos com os professores e ideais do partido
republicano e governo local, modelavam-se novas lideranças. Isso fica evidente nas sínteses de
vida de alguns alunos da escola produzidas pelos memorialistas da cidade e segundo as
vertentes e olhares daqueles ligados diretamente à instituição, mas que denotam esse lugar que
ocupavam.
Ao iniciar este trabalho destacamos algumas questões que são consideradas desafios
encontrados pela instituição Escolar e o ensino comercial, dentre elas as permanências e
mudanças que deveriam ser destacadas. Com certeza a reinstitucionalização do Lyceu Mineiro,
que por diversas vezes muda de nome, espaço físico e mantença são critérios de mudanças e,
bastante significativos, também para permanências. Isso porque se a escola mudava e se
reorganizava devia-se aos impactos das novas exigências para autorização dos cursos,
manutenção e segurança da instituição e do interesse de gestores e professores, além das
cobranças da sociedade civil e da necessidade imposta pelo crescimento no número de alunos.
A Sociedade Lyceu Mineiro Ltda. que geriu a escola até 1957, demandava a cada dois anos a
captação de novos membros para as diretorias e gestão da sociedade e no começo contava
apenas com 06 membros, chegando a possuir 85 cotistas. Isso tem explicação porque talvez a
atuação na sociedade fornecia prestígio social e acontecia não somente porque a instituição se
consolidava, mas também devido a necessidade da integralização de capital social e cada novo
membro, aumentando o dinheiro envolvido na gestão da escola através do pagamento de cotas.
112
consigo todo um aprendizado, que longe de ser somente pedagógico, acabava por reproduzir e
incorporar aos novatos toda uma articulação para ser ela mesma novamente.
Por tudo isso, consideramos a dissertação não como um trabalho conclusivo, que encerra
uma discussão, mas sim como uma porta que se abre ao diálogo, a outras interpretações e,
acreditamos, descortina um amplo leque para novas investigações. Dentre algumas das
possibilidades, apontamos a temática relativa aos sujeitos diretores e os alunos, que apareceram
em números ou por citação, mas ainda não foi possível um aprofundamento significativo.
Muito há para se conhecer sobre os sujeitos. Enfim, os leitores perceberão que a dissertação
está aberta a novos olhares, novas leituras e a novos e muitos questionamentos, principalmente
no que diz respeito à acessibilidade de fontes e heurística de documentos, o que infelizmente
fomos impedidos de fazer.
Alia-se a isso, a escassez de informações históricas sobre a produção escrita e oral de
alunos e dos próprios professores, que se associam e são decorrentes de uma política que não
atua em esclarecer sobre a conservação, preservação e organização documental, ficando os
documentos/fontes sobre o livre arbítrio dos agentes responsáveis que não dispõem nem de
conhecimento, e por vezes, demandam pormenores como, por exemplo, espaço físico para
acomodação e disposição de arquivos.
A despeito de todas as dificuldades, foi possível produzir a história do Lyceu Mineiro
(1927) e do Colégio Padre Curvelo (1957), com as poucas fontes que foram acessadas. Em
síntese, a constatação de que a instituição pesquisada tinha uma proposta de ensino que atrelava
a formação do profissional do comércio com a formação ou conformação do sujeito social
morador da cidade de Curvelo, culminou com a ideia de Magalhães sobre as instituições
educativas e sua apropriação pelos sujeitos. Foi um ponto importante de se observar, o interesse
da escola em manter práticas que demarcavam se lugar social, com a divulgação dos rituais de
ingresso, de avaliação dos alunos, formaturas, dentre outros. Também como forma de
perpetuação da insituição exibiam em tablados com fotos, os ex-alunos e professores, que
marcaram suas passagens por aquele lugar formativo. Não ficamos sabendo ao certo se todos
os alunos eram incluídos no tablados mas foram significativos para algumas de nossas
indagações sobre as demandas de concluintes, por exemplo.
Concluindo analisamos a importância desse estudo para a História da educação e a
historiografia das instituições escolares e atentamos para o quanto o conhecimento histórico da
instituição educativa revelou que a associação do ato de educar está “profundamente marcado
pela sua inscrição na conjuntura histórica local”, atrelando-se ao desenvolvimento da cidade e
114
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119
ANEXOS
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