Ebook Genetica Descomplicada
Ebook Genetica Descomplicada
Ebook Genetica Descomplicada
EDUARDO BRAZ
Acadêmico de medicina da UFPE
1
FRANCIELLE MARIA DE ARAÚJO BARBOSA
Formada em Biomedicina pela UFPE
Na Universidade e na Pós-graduação me
tornei mestre e atualmente sou doutoranda
em Genética e biologia molecular. Foi nesta
segunda casa que pude aprender e vivenciar a
Ciência, bem como descobrir que além das leis
da hereditariedade, a Genética tem impacto e
aplicações em diversas áreas de interesse da vida.
@arcanjo.ela
2
MARIANA DUBEUX
Acadêmica de Medicina da UFPE
3
E D I TO R E S
4
OBJETIVO DO E-BOOK
AG R A D EC I M E N TO S
D E D I C AT Ó R I A
5
“
I have always focused on
basic research, motivated
by a desire to understand
the world
Jennifer Doudna
Prêmio Nobel de Química, 2020
(ao lado de Emmanuelle Charpentier desenvolveu
um método que revolucionou a edição de genes)
6
P R E FÁ C I O
7
de não ocorrerem na estrutura do DNA. Os capítulos finais do
e-book trazem exemplos da aplicação dos conhecimentos
advindos do campo da Genética, apresentando dados científicos
gerados em diversas universidades e centros de pesquisa. Tais
conhecimentos tem auxiliado no desenvolvimento de métodos
de diagnóstico e tratamento mais eficientes, nos diferentes tipos
de doenças, fazendo parte do nosso dia a dia.
8
SUMÁRIO
4. Mutações: a chave da
36
variabilidade genética
7. Terapia Gênica 67
8. Conclusões 77
9. Referências 83
C A P Í T U LO 1
10
Timeline: Dos estudos de Mendel ao projeto Genoma Humano
Gregor Mendel estudando características de cultivos de ervilhas, descobre os princípios bá-
1866 sicos da genética: Fatores invisíveis herdáveis determinavam as características físicas das
plantas.
1869 Friedrich Miescher isolou a nucleína de leucócitos humanos. Hoje sabemos que a nucleína é
o ácido desoxirribonucleico.
1900 Carl Correns, Hugo de Vries, e Erich von Tschermak redescobrem o trabalho de Mendel e
corroboram seus achados.
Theodor Boveri e Walter Sutton postulam que as unidades de hereditariedade estão localiza-
1902 das nos cromossomos.
1909 Wilhelm Johannsen usa a palavra gene para descrever as unidades de hereditariedade.
1928 Frederick Griffith postula que um princípio transformador permite que características de um
tipo de bactéria possam ser transferidas para outra.
1929 Phoebus Levene identifica os componentes do DNA, incluindo as quatro bases adenina, cito-
sina, guanina e timina.
1944 Oswald T. Avery descobre que o princípio transformador é o DNA.
1950 Erwin Chargaff descobriu que as bases no DNA estão sempre presentes em razões fixas: o
número de adenina é o mesmo que timina e o número de citosina é o mesmo que guanosina.
1953 Rosalind Franklin e Maurice Wilkins utilizando a técnica de difração de raios X sugeriram a
natureza helicoidal e repetitiva do DNA.
1953 James Watson e Francis Crick descrevem a estrutura molecular do DNA.
1957 Francis Crick propõe o dogma central da biologia molecular.
1977 Frederick Sanger desenvolve uma técnica para sequenciamento do DNA.
1990 Tem início o projeto genoma humano com objetivo de determinar a sequência do DNA da
espécie humana.
2003 O projeto genoma humano é finalizado.
1 . 1 Os experimentos de Mendel
11
diferiam entre si em aspectos morfológicos distintos e
bem definidos, e dessa forma Mendel pode selecionar sete
características para estudo individual: textura da semente (lisa
ou rugosa), cor das sementes (amarela ou verde), cor da flor
(branca ou roxa), posição da flor (axiais ou terminais), cor da
vagem (verde ou amarela), formato da vagem (lisa ou enrugada)
e altura da planta (alta ou baixa) (3).
12
Figura 1.1: Cruzamento de unidades parentais (P), gerando geração filial
(F1) com características apenas dominantes (Superfície lisa). Em seguida,
cruzamento de unidades filiais (F1) com produção de geração filial (F2), com a
proporção de fenótipo 3:1.
13
maneiras: dois dominantes (AA), dois recessivos (aa) ou um
dominante e um recessivo na geração de híbridos (Aa) (Figura
1.2). Dessa forma, um progenitor que fosse dominante puro
(AA) produziria apenas gametas com o alelo dominante (A), e
um progenitor recessivo puro (aa) produziria apenas gametas
com o alelo recessivo (a) (Ver quadro 1 Conceitos em Genética).
Os progenitores híbridos (Aa), entretanto, produziriam dois
tipos de gametas: 50% com o alelo dominante (A) e 50% o alelo
recessivo (a). Durante a fertilização, os gametas com diferentes
alelos combinam-se aleatoriamente. Esses achados permitiram
explicar o reaparecimento da característica recessiva na prole de
híbridos F2 (4).
Figura 1.2: Explicação da ilustração de Mendel, sendo o alelo A (dominante) responsável pela
forma circular e o alelo a (recessivo) responsável pela forma amorfa. A geração P, por ser formada
por indivíduos puros, só produz combinações Aa, contudo, o cruzamento dos híbridos promove 3
pareamentos diferentes - AA, Aa e aa - explicando assim os achados iniciais.
14
1 . 3 Princípio da segregação
independente
15
não é perdido e nem modificado na geração F1, mas sim
ambos os alelos de um heterozigoto segregam-se de forma
independente e são distribuídos aleatoriamente em iguais
proporções quando da formação dos gametas (Figura 1.3). Esses
achados ficaram conhecidos como princípio da segregação
independente, ou primeira lei de Mendel (1-3).
16
(RR) e amarelas (YY) (características dominantes) e outra com
sementes rugosas (rr) e verdes (yy) (características recessivas).
O cruzamento dessas duas linhagens produziu uma linhagem F1
de sementes lisas e amarelas com genótipo híbrido Rr Yy. Uma
vez que os gametas em F1 possuem uma cópia de cada alelo
para cada gene, os seguintes genótipos em iguais proporções
foram observados: RY, Ry, rY e ry. A autofertilização da geração
F1 produziu uma geração F2 com variados fenótipos na seguinte
proporção: 9 sementes amarelas e lisas: 3 verdes e lisas: 3
amarelas e rugosas: 1 verde e rugosa (Figura 1.4). Observa-se que
dois fenótipos eram iguais aos da geração parental (sementes
amarelas e lisas e sementes verdes e rugosas), enquanto outras
duas novas variedades recombinantes surgiram (sementes
verdes e lisas e sementes amarelas e rugosas). Essas relações
numéricas, sugeriu Mendel, indicavam que os alelos de diferentes
genes segregam-se e são distribuídos independentemente
durante a formação dos gametas. Este ficou conhecido como
princípio da distribuição aleatória ou diibridismo, ou ainda
segunda lei de Mendel (1 – 3).
17
Mendel publicou seus achados em 1866 sob o título de
“Experimentos em hibridização de plantas” (Versuche über
Plflanzenhybriden), sem saber que mudaria definitivamente
os conceitos de biologia da época (3). Embora revolucionário,
o significado dos seus achados permaneceu na obscuridade
científica e incompreendido por mais de 30 anos. Foi somente
em 1900 que o alemão Carl Correns, o holandês Hugo de
Vries e o austríaco Erich von Tschermak, redescobriram
independentemente e confirmaram os achados de Mendel
(6–8). Tão logo redescoberto, o trabalho de Mendel ganhou, na
figura do biologista inglês William Bateson, seu maior defensor
(9,10).
18
C A P Í T U LO 2
19
2 . 2 Natureza química do DNA
20
desoxirribonucleico ou DNA e o ácido ribonucleico ou RNA.
Ambas consistem em longas cadeias feitas de subunidades
quimicamente semelhantes e repetidas, os nucleotídeos.
Figura 2.2: Ilustração de nucleotídeos, monômeros dos ácidos nucleicos, pareados por pontes de
hidrogênio. Em destaque, nucleotídeos do DNA, com bases nitrogenadas Adenina, Timina, Guanina e
Citosina; em detalhe, bases do RNA, Adenina, Uracila, Guanina e Citosina.
21
Em extensão ao trabalho de Levene e inspirado pelos achados
de Avery e colaboradores, o bioquímico Erwin Chargaff pôs-se
a investigar a natureza química do DNA em diferentes espécies,
chegando, entre 1949 e 1950, a duas importantes conclusões: 1.
As proporções dos quatro nucleotídeos variam entre diferentes
espécies e 2. Dentro de uma mesma espécie, as bases do DNA
estão sempre presentes em razões fixas: o número de resíduos
de A era sempre igual ao número de resíduos de T, assim como o
número de resíduos de C era igual ao de G. Além disso, os dados
ainda mostravam que a concentração de purinas era sempre
igual à concentração de pirimidinas (8,9). Esses achados ficaram
conhecidos com as regras de Chargaff e serviram de base para
desvendar a estrutura tridimensional do DNA.
22
em Londres. A técnica era laboriosa, e o material mostrava-se
difícil de fotografar. Nesta época, Rosalind Franklin, especialista
na técnica de difração de raios X, juntou-se ao laboratório de
biofísica do King’s College para estudar a estrutura do DNA.
Franklin aprimorou a técnica desenvolvida por Wilkins permitindo
a obtenção de imagens mais nítidas (12,13). Trabalhando com seu
assistente Raymond Gosling, Franklin pode obter imagens do
DNA com qualidade e clareza até então nunca vistas.
23
bases nitrogenadas dos filamentos opostos. A ligação entre
as bases é específica – adenina sempre se pareia com a timina
por meio de duas ligações de hidrogênio e citosina sempre
pareia com guanina por meio de três ligações de hidrogênio.
Dessa forma, os filamentos de DNA de uma dupla hélice são
complementares entre si (Figura 2.3). Esta característica do
modelo de Watson e Crick explica como a informação genética
pode ser copiada e transmitida. Durante a replicação do DNA,
as duas fitas se separam e ambas servem de molde, seguindo
a regra de complementaridade de bases, para a síntese de uma
nova fita (16,17).
Figura 2.3: Diagrama da estrutura da molécula de DNA. A molécula de DNA é formada por uma
dupla-fita de polinucleotídeos arranjada em hélice. As subestruturas ou nucleotídeos repetem-se ao
longo da cadeia em intervalos de 0,34 nanômetros. Cada volta da hélice possui aproximadamente 10,5
nucleotídeos (3,4 nanômetros). Em detalhe é mostrada a natureza antiparalela e a complementaridade
das cadeias. A dupla fita permanece unida por meio de ligações de hidrogênio entre as bases
nitrogenadas paralelas. Adenina (A) pareia com timina (T), por meio de duas ligações de hidrogênio e
citosina (C) pareia com guanina (G) por meio de três ligações de hidrogênio. P = um grupo fosfato.
24
Watson e Crick foram os primeiros a juntar as peças do quebra-
cabeça e descrever com precisão a estrutura do DNA. Os genes,
outrora unidades invisíveis de hereditariedade, agora possuíam
uma natureza química e estrutura física bem definidas.
25
Figura 2.4: Representação do dogma central da biologia molecular. A RNA polimerase transcreve a
parte do DNA escolhida em RNA mensageiro, o qual é traduzido por ribossomos em proteínas a partir
da correspondência de tríades de bases nitrogenadas com aminoácidos.
26
ou éxons. Grande parte é composta por regiões de DNA
intercalado entre os genes (DNA intergênico) ou dentro de
genes (íntrons) (Figura 2.5). Hoje sabe-se que fragmentos do
DNA que eram vistos como sem funcionalidade, na verdade
são bioquimicamente funcionais e estão relacionados com
mecanismos de regulação da expressão gênica e proteção
celular.
27
Fique por dentro - Conceitos básicos
Macromoléculas ácidas formadas por unidades repetidas, os nucleotíde-
os. Os ácidos nucleicos podem ser de dois tipos: o DNA (ácido desoxir-
Ácidos nucleicos ribonucleico) e o RNA (ácido ribonucleico).
Sequência específica de uma cadeia de DNA que contém as informações
Gene necessárias para a síntese de uma proteína ou de uma cadeia de RNA.
Formas alternativas de um mesmo gene geradas por mutações que ocor-
Alelo rem em regiões específicas do gene.
Representa o conjunto de genes de um indivíduo.
Genótipo
Características observáveis de um indivíduo que resultam da expressão
do genótipo combinado com a influência de fatores epigenéticos e am-
Fenótipo bientais.
Quando o indivíduo apresenta dois alelos iguais de um mesmo locus
Homozigoto gênico (AA ou aa).
Quando o indivíduo apresenta dois alelos diferentes de um mesmo locus
Heterozigoto gênico (Aa).
Quando um alelo de um gene determina um fenótipo estando em homo-
Dominante zigose ou em heterozigose (AA ou Aa).
Quando um alelo determina um fenótipo em apenas homozigose (aa).
Recessivo
Estrutura física altamente organizada e compacta, formada por uma lon-
Cromossomos ga molécula de DNA associada a proteínas.
Tipo de cromossomo que determina o sexo da maioria dos indivíduos.
Cromossomos Um par de cromossomos X e Y (XY) determina o sexo masculino en-
sexuais quanto um par de cromossomos X (XX) determina o sexo feminino.
Células que possuem apenas um conjunto cromossômico, ou seja, ape-
Células haploi- nas um par de cada cromossomo (n). Em seres humanos, as células
des haplóides ou gametas são o espermatozóide e o ovócito.
Células que possuem conjunto completo de cromossomos, ou seja, os
Células cromossomos estão dispostos aos pares (2n). Todas as células do nosso
diploides corpo, com exceção dos gametas, são diplóides.
28
C A P Í T U LO 3
3 . 1 Replicação do DNA
29
duplas idênticas à molécula original. Tal modelo de replicação
é chamado de replicação semiconservativa (Figura 3.1), pois
cada nova fita dupla contém um filamento da molécula-mãe e
uma fita de DNA recém sintetizada (4).
Figura 3.1: DNA sendo replicado pela DNA polimerase em uma replicação semiconservativa no sentido
5’3’.
3 . 2 Transcrição do mRNA
30
das células, enquanto a síntese proteica ocorre no citoplasma,
faz-se necessária a transferência de suas informações para
moléculas de RNA mensageiro (mRNA), capazes de atravessar
a membrana nuclear para coordenar a produção citoplasmática
de proteínas. Esse processo de transferência de informações é
denominado transcrição, e ocorre onde o trecho da molécula
de DNA que contém um gene a ser transcrito abre-se, iniciando
o emparelhamento de nucleotídeos por ação da enzima RNA-
polimerase (3).
31
Figura 3.2: RNA polimerase usando a fita sense como base e gerando a
molécula de RNA mensageiro.
3 . 3 Tradução do mRNA
32
Figura 3.3: Ribossomo fazendo a leitura do mRNA e coordenando a formação do polipeptídeo, etapa
final da transferência de informação do DNA para moléculas estruturais e funcionais das células.
33
3 . 4 Código Genético
34
Figura 3.4: Exemplo da degeneração do código genético, expondo os 4 códons distintos que podem
codificar o aminoácido valina.
35
C A P Í T U LO 4
36
cromossomos. Assim, as mutações são compreendidas como
“erros” na replicação do DNA que não foram identificados pelas
enzimas de reparo (3,4).
37
quando ocorre a substituição de uma purina por uma pirimidina,
ou o inverso, chamamos mutação do tipo transversão (5).
38
Do mesmo modo que ocorrem pontualmente, as modificações
no DNA podem acontecer em fragmentos cromossômicos,
denominadas mutações cromossômicas estruturais, que podem
resultar dos processos de deleção, inversão, translocação
e duplicação (Figura 4.2) (4). Um exemplo de mutação
cromossômica por deleção ocorre na síndrome de “Cri du
chat” ou “miado do gato”, distúrbio raro, causado por deleção
no braço curto do cromossomo 5 com graves repercussões no
desenvolvimento neuropsicomotor da criança (6).
39
As mutações decorrentes de duplicação ou deleção de
áreas cromossômicas inteiras relativamente grandes são
chamadas de variação do número de cópias (CNVs) e
distinguem-se de ganhos ou perdas de cromossomos inteiros
as chamadas mutações cromossômicas numéricas que
podem envolver todo o genoma (euploidia - na espécie
humana são relacionadas a abortos espontâneos) ou um ou
mais cromossomosos de um determinado par (aneuploidias,
como a conhecida trissomia do cromossomo 21 caracterizando a
síndrome de Down) (9).
nonsense mutação pontual, na qual a troca de uma base nitrogenada insere um códon
de terminalização no mRNA (UAA, UAG e UGA), finalizando precocemente a
(sem sentido) síntese protéica.
40
C A P Í T U LO 5
41
estudo da epigenética se concentra em modificações nas
bases e proteínas complexadas ao DNA, e que podem ser
clonalmente transmitidas por mitose ou meiose, explicando
alterações na expressão gênica que não envolvem mudanças
na sequência do DNA (1).
42
O ambiente externo influencia o epigenoma e cada indivíduo
modula determinada resposta para estes fatores externos.
Nesse contexto, em toda fase da vida, desde o nascimento até a
morte, somos expostos a ambientes que promovem mudanças
químicas capazes de ativar ou desativar a expressão de
genes. Estas interações podem contribuir para alterações
epigenéticas positivas (atividade física, dieta, entre outros) ou
negativas (estresse, drogas, álcool, entre outros). A epigenética
também está sendo estudada para doenças psicossociais como
a depressão e a dependência química (3).
5 . 1 Mecanismos Epigenéticos
43
em regiões especificamente associadas a metilação do DNA e
implicada em diversas patologias como o câncer (Figura 5.1) (8).
5 . 1 . 1 Metilação do DNA
44
Figura 5.2: A DNA metiltransferase 1 (DNMT1) é a responsável pela conversão do ácido nucléico citosina
em 5-metil citosina, sendo responsável pela metilação desse resíduo e consequente silenciamento dos
genes que compõem a porção do DNA metilada.
45
contêm menos nucleossomos do que outros trechos de DNA,
e estes poucos nucleossomos apresentam geralmente histonas
modificadas que aumentam a expressão gênica através de uma
maior ligação ao fator de transcrição. Desta forma, a metilação
em ilhas CpG atua silenciando genes (Figura 5.2) ao prejudicar
a ligação de ativadores transcricionais (9).
5 . 1 . 2 Acetilação de histonas
46
realizados sobre quando e como as modificações das histonas
controlam a expressão dos genes, exacerbando, acelerando ou
retardando o progresso das lesões ateroscleróticas, por exemplo
(16). Além disso, a desregulação desses processos pode alterar o
equilíbrio da expressão gênica e, portanto, são frequentemente
observados em cânceres humanos, seja por ganho ou perda
de função, superexpressão, supressão por hipermetilação
do promotor, translocação cromossômica ou mutações das
enzimas/complexos modificadores de histonas (17,18).
47
As modificações sofridas pelas histonas após a tradução (post-
transcriptional modifications - PTMs) obedecem a um padrão
que dá forma à cromatina e sua desregulação está associada
com a etiologia de diversas doenças como o câncer (19).
5 . 1 . 3 MicroRNA (miRNAs)
48
maduro à proteínas Ago 1-4 ocorre em duas fitas de miRNA,
a fita passageira que será degradada e a fita guia que
efetivamente atua como miRNA através de um complexo efetor
denominado mi-RISC (complexo de silenciamento induzido
por RNA). O mi-RISC passa a reconhecer especificamente o
RNA mensageiro (mRNA) na região 3 não traduzida (3ʹ UTR)
e regula negativamente a expressão gênica através de dois
mecanismos pós-transcricionais: a repressão traducional ou a
clivagem do mRNA (21).
Figura 5.4: Processamento do miRNA. A transcrição dos genes que codificam o microRNA é realizada
pelas enzimas RNA polimerase II e III. Em seguida, é transcrito uma sequência de microRNA primário
(Pri-miRNA) a qual será clivada pela proteína Drosha. Após isso, essa molécula que já é denominada
de Pré-miRNA é, então, exportada do núcleo para o citoplasma da célula, por meio da Exportina-5.
Nesse citoplasma a proteína Dicer cliva o Pré-miRNA em uma fita dupla de miRNA (miRNA duplex) que
vai gerar duas fitas: a passageira e a guia. A fita passageira será degradada no citoplasma e reciclada,
enquanto que a fita guia será carreada pela proteína Argonauta-2 (Ago2) que formará o complexo de
mi-RISC (Complexo de silenciamento induzido por RNA) que vai maturar o microRNA. Por fim, esse
microRNA vai poder exercer suas funções na célula que são: Clivar o mRNA e a repressão traducional.
49
5 . 2 Impacto na Saúde
50
cíclico, onde se por um lado, a expressão de certos miRNAs
é controlada pela metilação do DNA, os próprios miRNAs
são capazes de modificar os mecanismos de metilação e
a expressão de proteínas envolvidas nas modificações das
histonas e assim parecem desempenhar um papel na gênese do
câncer (23).
51
C A P Í T U LO 6
52
ou lesão do músculo cardíaco (por exemplo, creatina quinase
MB, troponina I ou T) (6). A avaliação dessas moléculas fornece
importantes ferramentas para rastrear a atividade biológica
geral.
53
6 . 1 Tipos de biomarcadores
54
pacientes e modelos animais de doença. Portanto, embora
todos os mecanismos epigenéticos estejam sendo intensamente
investigados, os miRNAs são os mais avaliados quanto ao seu uso
como biomarcadores preditivos (Figura 6.2) (9). As evidências
sugerem que eles podem desempenhar um papel essencial
como biomarcadores no câncer (10,11), em neurologia para o
diagnóstico e prognóstico da doença de Alzheimer (12), para
pacientes com epilepsia (13) ou doenças neurodegenerativas
(14). Também poderia ser usado como um meio mais rápido e
preciso de diagnóstico de doença cardiovascular aguda ou
insuficiência cardíaca (15,16) e, no caso de doenças infecciosas,
para o diagnóstico de sepse (17).
55
está associado ao fato de que biomarcadores de miRNA
frequentemente relatados são detectados em pacientes com
diferentes tipos de tumor (19). Por isso, à medida que mais
miRNAs são testados em estudos de validação em grande
escala e ensaios clínicos, nos aproximamos de biomarcadores de
miRNA clínicos eficazes, tornando-se uma realidade.
6 . 2 Biomarcadores e a medicina
personalizada
56
ritmo em avanços relevantes para a pesquisa translacional,
sendo os biomarcadores ferramentas essenciais para a sua
implementação (23).
57
e metástase celular. Quando as alterações são encontradas
na maioria dos pacientes com um tipo específico de tumor,
podem ser usados como biomarcadores para detecção e
desenvolvimento de terapias direcionadas, além de antecipar
respostas a diversos tratamentos (32,33).
58
O plasma humano detém a maior fonte de proteoma e
tecnologias que podem medir pequenas alterações de
certas proteínas são ferramentas inestimáveis para identificar
biomarcadores de proteína no sangue. A aplicação da
proteômica na descoberta de biomarcadores oncológicos pode
ser exemplificada por HER2 derivado da imunohistoquímica,
um marcador prognóstico e preditivo para a sensibilidade à
terapia com trastuzumabe (Anticorpo monoclonal IgG1 contra o
receptor HER-2) no câncer de mama (36).
59
6 . 3 Biomarcadores epigenéticos
60
ser um biomarcador promissor para a detecção de câncer
colorretal com sensibilidade e especificidade aprimoradas em
comparação com os testes de sangue oculto nas fezes (42).
Outro biomarcador de metilação do DNA para a detecção
precoce do câncer colorretal é o gene da vimentina (VIM). O
VIM foi escolhido como biomarcador porque era metilado em
cânceres colorretais, mas não na mucosa colorretal normal ou em
outros tecidos saudáveis. Foi demonstrado que era prontamente
detectável nas fezes e se tornou a base do primeiro teste
de diagnóstico baseado em metilação de DNA disponível
comercialmente (43,44).
61
a um resultado ruim sem qualquer terapia adjuvante (48), bem
como a um risco aumentado de recorrência após a cirurgia
quando tratadas com tamoxifeno (49,50).
• Acetilação
• Sequenciamento
• Microarray
62
As vantagens dos marcadores epigenéticos, como os
microRNAs, é que eles são acessíveis em fluidos corporais
(Figura 6.3), evitando, assim, a necessidade de amostras de
biópsia coletadas para o desenvolvimento e monitoramento de
biomarcadores transcricionais. Os mecanismos epigenéticos
estão geralmente envolvidos nos estágios iniciais do
desenvolvimento da doença e, portanto, são marcadores
que têm o potencial de ser mais adequados do que os
biomarcadores transcricionais para o diagnóstico precoce.
Diferentes estágios e tipos de câncer têm assinaturas de
metilação exclusivas, e tais assinaturas podem ser alvos no
desenvolvimento de biomarcadores específicos e precisos para
auxiliar na avaliação do tipo de tumor, bem como no prognóstico
e no gerenciamento da doença (53-55).
Figura 6.3 Alterações genômicas que podem ser utilizadas em biópsia líquida.
63
e tratamento personalizados. Isso abre caminho para o que
é chamado de farmacoepigenética, que prevê a resposta ao
medicamento e desenvolve uma terapia sob medida com base
nas diferenças na base epigenética de cada paciente. (56)
6 . 5 Validação de um biomarcador
64
Figura 6.4 Etapas de validação de um biomarcador. Adaptado de DAVIS, (2017) (60). A primeira
etapa denominada de fase pré-analítica, consiste na coleta, processamento e armazenamento dessas
amostras que serão avaliadas o nível de sensibilidade/especificidade, linearidade, precisão, limite de
detecção nas amostras, reprodutibilidade, repetibilidade e robustez dos ensaios realizados. A partir
da geração dessas informações esses dados serão analisados em conjunto e/ou contexto por meio
de tecnologias digitais, tais quais o Big Data. Em seguida, parâmetros clínicos deverão ser avaliados,
entre eles, a sensibilidade/especificidade clínica, valor preditivo positivo e negativo clínico, AUC/ROC
(Curva que representa o quanto a molécula interage com o receptor específico alvo), ponto de corte
(quanto esses valores podem ser considerados na prática clínica), estabelecimento e estratificação de
características individuais que vão definir se o paciente é respondedor ou não à técnica empregada,
validação externa (teste aplicado em outro laboratório/clínica e pacientes multicêntricos). Por fim,
define-se a possibilidade do uso clínico desse biomarcador, ou seja, se ele influencia o prognóstico
e o diagnóstico e, em seguida, segue para a aprovação dos agentes regulatórios do país, como por
exemplo a ANVISA no Brasil.
65
pode não se replicar em outra população que estava sujeita a
uma diferença de fator ambiental. Em contraste com a validação,
a qualificação do biomarcador se concentra na evidência que
liga um biomarcador com a biologia da doença e, conforme
apropriado, com os desfechos clínicos (61).
66
C A P Í T U LO 7
7. 1 Terapia direcionada
67
entre o receptor da proteína 1 de morte celular programada
(PD-1) e seu ligante (PD-L1) resulta na disfunção das células T,
que pode ser recuperada por certos anticorpos monoclonais
através do bloqueio do sinal PD-1 / PD-L1, o Nivolumabe. E a
quarta ocorre o acoplamento com as drogas terapêuticas:
os anticorpos monoclonais equipados com radiofármacos
ou quimioterápicos podem ajudar a entregar e liberar drogas
após a ligação às moléculas alvo (exemplos: trastuzumabe,
entansina) (3, 4). Ver tabela 7.1
68
Com isso podemos perceber que os anticorpos monoclonais
foram um avanço na genética para diversas áreas,
proporcionando qualidade de vida e esperança para algumas
patologias que antes não tinham opção de tratamento. Vários
estudos estão em andamento em diversas fases clínicas (1, 2, 3 e
4) voltados para essa linha de medicamento que vem trazendo
benefícios e com poucos efeitos colaterais (5).
7. 2 Terapia gênica
69
sendo eles: Adenovírus - material genético DNA dupla-hélice,
Retrovírus - forma de RNA, e Vírus adeno associados -
genoma de DNA de fita simples (7,8).
7. 2 . 1 Definição
70
Nesta forma há a necessidade de encaminhamento correto,
como por exemplo: se um gene é destinado a um órgão é
importante ter certeza que ele irá chegar neste órgão e não
em outro.
71
transporte de DNA, eficiência de transferência gênica in vivo
e resposta inflamatória induzida. Embora nenhum vetor seja
adequado para todas as doenças, pode-se adaptar o vetor à
doença específica de interesse (12).
72
margem de segurança significativa para este vetor.
Vetores Vaccinia
73
O CRISPR é um termo utilizado para referir a edição de
genoma, sendo considerado uma vertente da terapia gênica.
CRISPR significa repetições palindrômicas curtas agrupadas
e regularmente inter-espaçadas. Este sistema está presente
dentro das bactérias e arqueobactérias (bactérias que aguentam
temperaturas mais elevadas e pouco oxigênio). As repetições
palindrômicas são sequências de nucleotídeos simétricas,
permitindo que a mesma leitura seja realizada da direita para a
esquerda, assim como da esquerda para a direita. As sequências
espaçadoras que estão entre as regiões palindrômicas
tem origem tanto de plasmídeo quanto de vírus, como os
bacteriófagos. Estes vírus infectam apenas bactérias e, quando
não conseguem destruí-las, inserem seu material genético nas
bactérias, desta forma, torna-se parte do DNA bacteriano, que
acabam duplicando material genético do vírus junto (16).
74
combatê-los com base na sequência de DNA. Então, esse
sistema permite às bactérias se protegerem de transposons,
que são elementos móveis, se protegerem de vírus e plasmídeos
(17,18).
Figura 7.1: Adaptado de Vieira GV, Cecílio NT, Arruda LM, Sales KU. Visão geral
do mecanismo básico de ação da CAS9.
75
Vale salientar que já era possível fazer cortes no DNA com
enzimas de restrições, através de um processo complexo, com
valor elevado, e pouco preciso quando comparado ao CRISPR,
além de levar anos para alcançar o resultado esperado. Com o
CRISPR os resultados podem ser observados em semanas, o
custo mais baixo, e a possibilidade de fazer várias opções com
o genoma. Com esta técnica será possível editar células, ligar
e desligar genes, inserir genes de interesse, tratar doenças
genéticas. Apesar de todos os benefícios, é importante ter
responsabilidade ética na pesquisa e na aplicação clínica (20).
76
C A P Í T U LO 8
Conclusões
77
adenina (A), guanina (G), timina (T) e citosina (C) , e no
RNA a Uracila (U) substitui a Timina.
78
» Na tradução, temos 3 etapas: a iniciação, quando o
ribossomo se junta ao mRNA e ao primeiro tRNA para
que a tradução possa ter início, formando o complexo
de iniciação; o alongamento, quando aminoácidos são
trazidos ao ribossomo pelos tRNA e são ligados entre si
para formar uma cadeia polipeptídica; e a terminação,
quando polipeptídeo final é liberado para que possa
cumprir sua função na célula.
79
deleção, inversão, translocação ou duplicação.
80
complexidade envolvendo o microambiente celular.
81
coisa tem sido descoberta sobre as maneiras de se
realizar a transferência. Definitivamente a descoberta do
CRISPR/Cas9 foi um marco importante no isolamento de
sequências de genes de interesse de forma mais barata
e rápida, o que permitiu e viabilizou técnicas de terapia
gênica que antes eram inviáveis. Os vetores utilizados na
terapia gênica são alvo de grande interesse, sobretudo na
área da oncologia, doenças raras e congênitas nas quais
o paciente pode se beneficiar com a edição genética,
portanto, esse tipo de terapia é um campo promissor de
estudos e que deve permitir uma maior democratização
no acesso à essas terapias nos próximos anos.
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