Carta Aos Hebreus e Catolicas 5
Carta Aos Hebreus e Catolicas 5
Carta Aos Hebreus e Catolicas 5
Cartas de João e
Carta de Judas
5
1. OBJETIVOS
• Apresentar as últimas cartas do conjunto das Cartas Ca-
tólicas.
• Introduzir as três Cartas de João e a Carta de Judas em sua
história, literatura e teologia.
• Conduzir à leitura das três Cartas de João e da Carta de
Judas.
2. CONTEÚDOS
• A Primeira Carta de João.
• Data, lugar da composição e autoria da carta.
• Teologia da Primeira Carta de João.
• A Segunda e a Terceira Carta de João.
• Data, lugar da composição e autoria das cartas.
154 © Cartas aos Hebreus e Católicas
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Os textos em questão são os últimos do grupo chamado de
Cartas Católicas. Embora colocados juntos nesta apresentação e
em outros lugares onde são analisados, eles não apresentam mui-
tas semelhanças entre si. São também os últimos escritos do Novo
Testamento em ordem canônica, se excetuarmos o Livro do Apo-
calipse.
A Primeira Carta de João é um escrito muito interessante. Re-
toma, aparentemente, alguns pontos do Evangelho segundo João,
apesar de os especialistas não aceitarem que ela seja do mesmo
autor. Essa Primeira Carta de João é quase sempre analisada em
separado das outras.
Semelhanças e diferenças
Uma questão importante da 1 João é sua semelhança ou não
com o Evangelho de João. Muitos já afirmaram que existe um pa-
rentesco imediato entre os dois escritos. Alguns até afirmam que a
1 João é uma espécie de apresentação ou conclusão do Evangelho
segundo João.
Essas semelhanças não são claras quando se analisa uma tra-
dução do texto. O que aqui se anota pode ser observado com o
texto grego. Pode-se encontrar:
1) Semelhanças gramaticais: disposição das partes da ora-
ção; uso raro de pronome relativo; alguns detalhes gra-
maticais como uso de determinadas partículas (preposi-
ções, conjunções etc.).
2) Estilo da escrita: algumas construções fraseológicas são
semelhantes às do quarto Evangelho, como paralelis-
mos, inclusões, palavras chaves, ritmo da escrita etc.
3) Índole semítica do texto: embora os termos semitas e o
pensamento dessa ordem não esteja tão claro, à primei-
ra vista, sob uma análise mais detalhada, encontram-se
elementos que levam a supor uma origem ou ao menos
um modo de pensar semita.
4) Analogia de conteúdo: os temas presentes no Evangelho
de João e na 1 João são semelhantes.
Destinatários
Diversamente das outras duas cartas ditas de João, essa
primeira carta não foi escrita a uma pessoa em particular. O que
parece é que foi escrita para um conjunto grande de Igrejas que,
provavelmente, viviam em uma mesma região geográfica ou sob
problemas e desafios comuns.
158 © Cartas aos Hebreus e Católicas
O texto da 1 João
O texto da 1 João e o das outras duas cartas ditas dele estão
presentes nos melhores códices: o Codex Vaticanus, representado
por B; o Codex Sinaiticus, representado por S; o Codex Ephremi,
representado por C; o Codex Alexandrinus, representado por A. Há
representantes do texto antigo em forma de textos unciais ou com
letras maiúsculas e existem, também, representantes de texto mi-
núsculo, com letras minúsculas.
Os testemunhos antigos do texto são muitos e, em geral, em
harmonia. As variantes de um texto antigo para outro são poucas.
Uma exceção digna de nota é o chamado "comma iohanneum”.
Trata-se de uma inserção no texto que, vista sob o ponto de
vista de estilo e de doutrina, aparece, claramente, como um acrés-
cimo posterior. Esse acréscimo acontece entre os versículos séti-
mo e oitavo do quinto capítulo. Aqui está o texto com o acréscimo,
no destaque, entre aspas:
7
São, assim, três os que dão testemunho: "no céu: o Pai, o Verbo e
o Espírito Santo, e esses três são um só; e há três que testemunham
na terra:” 8 o Espírito, a água e o sangue; estes três dão o mesmo
testemunho. 9 Aceitamos o testemunho dos homens. Ora, maior é
o testemunho de Deus, porque se trata do próprio testemunho de
Deus, aquele que ele deu do seu próprio Filho.
Prólogo: 1,1-4
Os primeiros versículos da 1 João lembram muito o Prólogo
do Evangelho segundo João. Em uma estrutura que concentra os
elementos, esses versículos, também aqui chamados de "prólogo",
destacam a afirmação do ver e do testemunho.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
1
O que era desde o princípio, o que temos ouvido,
o que temos visto com os nossos olhos, o que temos contemplado
Experiência direta A
e as nossas mãos têm apalpado
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
no tocante ao Verbo da vida —
Deus que se revela B
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
2
porque a vida se manifestou, e nós a temos visto;
Testemunho C
damos testemunho e vos anunciamos a vida eterna,
Fundamental
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
que estava no Pai e que se nos manifestou —,
Deus que se revela B’
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
3
o que vimos e ouvimos nós vos anunciamos,
Experiência direta A'
para que também vós tenhais comunhão conosco.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo.
Primeira conclusão D
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
4
Escrevemo-vos estas coisas para que a vossa alegria seja completa. Segun-
da conclusão E
Esta estrutura, como foi dito atrás, demonstra-se concêntrica:
A
B
C
B’
A’
D
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Inicialmente, anuncia-se uma experiência direta (A). Essa ex-
periência direta se equipara com a sua reafirmação (A’). O Verbo
da vida (B) é recordado, não com essa expressão, mas com a ideia
de sua manifestação (B’). Isso tudo se concentra no principal: “por-
que a vida se manifestou, e nós a temos visto, damos testemunho
e vos anunciamos a vida eterna” Tem-se, então: (a) vida que se
manifesta; (b) visão que dela se tem; (c) testemunho de quem viu;
(d) anúncio da vida eterna.
O prólogo da 1 João evidencia a experiência direta de quem
fala, talvez atribuída também a quem ouve, experiência direta com
Jesus, apresentado como o Verbo da vida. O resultado é a alegria
do fiel que deve ser, por isso mesmo, completa.
Filiação divina:––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
É interessante que o texto fale, frequentemente, da filiação divina. Parece que o
autor da 1João insiste em declarar que os fiéis, os que aceitam amar, motivados
pela adesão a Jesus Cristo, assumem a condição de filhos. Talvez isto não tenha
muita repercussão na atualidade, quando tal anúncio não causa tanto impacto.
Mas em uma sociedade violenta, marcada pelo ateísmo e pelo domínio político
militar, como era a sociedade no mundo romano na bacia do Mediterrâneo, essas
afirmações têm grande efeito. Mais ainda pelo fato de valorizar, intensamente,
o amor fraterno, coisa não muito destacada naqueles tempos; aliás, até negada
pela sociedade do poder e da opressão. Nesse sentido, o conteúdo da 1 João é
forte e provocativo.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
5,5-13: A fonte da Fé
A perícope anterior fechava o assunto do amor e, ao mesmo
tempo, abre agora o tema da fé e de suas consequências. Na par-
te da questão do chamado "comma iohanneum”, que já foi vista
anteriormente, é fundamental destacar a insistência na realidade
do Espírito, citado, muitas vezes, nessa perícope. É uma perícope
cristológica, mas que tem o Espírito como motivação.
Partindo de uma pergunta retórica (vers. 5), o autor decla-
ra que o vencedor do mundo é Jesus Cristo. Ele veio pela água e
pelo sangue (vers. 6), o que parece citar o episódio da Paixão no
Evangelho segundo João, quando do lado aberto de Cristo jorrou
sangue e água (1Jo 19,34).
Então, nos versículos 7 e 8, o autor raciocina com a imagem
do Espírito, da água e do sangue, como fontes do testemunho. Cla-
ramente, o que se vê é a menção da tradição literária da paixão de
Jesus e do símbolo usado para apresentá-la.
172 © Cartas aos Hebreus e Católicas
5,18-21: Epílogo
Finalmente, a Primeira Carta de João chega ao seu fim. Mas
não tem roupagem de fim, parecendo mais uma interrupção do
discurso. Algumas traduções bíblicas identificam essa perícope
como um resumo da carta.
Quem nasce de Deus não pode pecar, pois o Gerado por
Deus, que é Jesus Cristo, guarda o fiel, ao qual o maligno não pode
atingir (vers. 18). O autor da carta e seus ouvintes e leitores sabem
que são nascidos de Deus e que estão em um mundo corrompido
(vers. 19). Isto impõe sobre eles a adesão ao Filho de Deus como
caminho da Verdade (v. 20).
O último versículo da carta parece ser uma interrupção do
discurso. Volta a expressão "filhinhos”, seguida da exortação a se
guardar dos ídolos, que não foram citados no corpo da carta. Talvez
esse versículo iniciasse outro argumento e a carta fosse mais longa
em sua origem, ou esses ídolos estão no posto do maligno, fazen-
do uma ponte com o paganismo. Difícil saber o que pode ser.
A Primeira Carta de João é um longo discurso de confiança e
apresentação dos motivos de adesão à mensagem cristã. Mais do
que uma carta, ela é um estímulo no estilo dos primeiros discípu-
los frente aos valores do mundo de sua época.
Canonicidade
Não há unanimidade nos testemunhos da tradição a respei-
to dessas duas cartas. Santo Ireneu de Lião cita a 1 João e a 2 João,
não a 3 João. Clemente de Alexandria (†211) cita a 1 João como
"carta de João mais longa", o que sugere uma carta curta. O Cânon
de Muratori fala de "epístolas" de João, portanto, mais de uma,
sem esclarecer que sejam duas ou três. Orígenes (†245) e Eusébio
de Cesaréia (†339/340) expressam incertezas quanto à inspiração
da segunda e da terceira cartas. São Jerônimo († 420) indica, tam-
bém, que havia incertezas a respeito dessas cartas.
Contudo, partindo de Eusébio de Cesaréia, no Oriente, e de
Jerônimo, no Ocidente, as duas cartas atribuídas a João passam
a ser reconhecidas como parte do cânon do Novo Testamento. O
que é certo é que a segunda carta foi unanimemente aceita desde
fins do século 3º, e a terceira carta, desde fins do século 4º.
Autoria e destinatários
Nas duas cartas, o autor identifica-se como "presbítero", pa-
lavra que significa "ancião". Não se trata, necessariamente, de um
ancião em termos de idade, de anos vividos. Pode ser ancião no
sentido de experiência acumulada, portanto, de vivência. Assim,
o ancião pode não ser, forçosamente, um idoso, mas, sim, uma
pessoa experiente, provada pelas circunstâncias.
Eusébio de Cesaréia, citando Pápias, bispo de Hierápolis,
apresenta uma informação que fez muita influência na interpreta-
ção da autoria dessas cartas. Segundo ele, citando o antigo Bispo,
o autor dessas cartas seria um tal "João presbítero", distinto do
João, apóstolo do Senhor.
A tradição católica, seguida pela tradição bíblica das Igrejas
da Reforma, identifica o autor dessas duas cartas com o discípulo
João, apóstolo, filho de Zebedeu. A afirmação de sua ancianidade
expressa bem uma provável situação do apóstolo João, que, se-
gundo a tradição da Igreja antiga, morreu centenário.
O autor dessas duas cartas é uma personalidade segura
de seu testemunho (3Jo 12), consciente de sua autoridade (2Jo
8.9.10.12), autoconsiderado pai dos membros das comunidades,
aos quais chama “filhos” (3Jo 4), e preocupa-se com a ortodoxia e
a fé (3Jo 2s.12; 2Jo 1-4).
Isso tudo posto, é ainda necessário considerar que não há
segurança a respeito da autoria dessas duas cartas. Elas compõem
com a 1 João e o Apocalipse, o que se convencionou chamar “escri-
tos joaninos” mesmo que possam ser de autoria diversa.
O destinatário da 2 João é uma certa "senhora eleita", ex-
pressão que deve identificar uma comunidade cristã conhecida do
autor. Tal destinação dá a essa carta uma conotação eclesiológica
notável.
Já o destinatário da 3 João é um certo Gaio, membro de uma
comunidade. A ele, o autor da 3 João pede a assistência aos prega-
176 © Cartas aos Hebreus e Católicas
O texto da 2 João
A 2 João pode ser dividida em quatro partes bem distintas e
bem articuladas. A seguir, apresenta-se uma proposta de divisão.
Divisão da 2 João
1-3: Saudação e introdução
4-6: A necessidade do amor
7-11: Os anticristos
12-13: Epílogo ou conclusão
7-11: Os anticristos
O tema do anticristo é apresentado. Ele é identificado como
os que não confessam Jesus Cristo e são chamados também de
"Sedutor". Não estar na doutrina de Jesus Cristo é não possuir a
Deus. Os fiéis devem evitar o convívio com estes que negam a Je-
sus, pois participar de suas obras é assemelhar-se com eles.
O texto da 3 João
A Terceira Carta de João tem, como a Segunda Carta de João,
uma estrutura simples. Pode-se chamá-la “bilhete”, mais do que
carta, embora tenha uma estrutura bem clara de carta.
Divisão da 3 João
1-2 Saudação
3-8 Gaio e o testemunho
9-11 Diótrefes e o mal exemplo
12 Demétrio é elogiado
13-15 Epílogo
1-2: Saudação
Assim como na 2 João, quem escreve é o Ancião ou Presbíte-
ro. Ele se dirige a um tal de Gaio − certamente um discípulo seu.
13-15: Epílogo
Após isso tudo, o autor declara que tem, ainda, muitos as-
suntos a tratar, mas o fará pessoalmente. Deseja a Gaio a paz e
transmite a mensagem dos amigos. No final, pede que Gaio saúde
a cada irmão pelo próprio nome, o que pode indicar uma intimida-
de notável entre o autor e os membros desta Igreja.
7. CARTA DE JUDAS
A Carta de Judas é deuterocanônica, isto é, aceita pelas Igre-
jas como parte do cânon apenas em um segundo momento.
Clemente de Roma provavelmente cita Judas (25) em sua
Primeira Carta aos Coríntios e no escrito chamado “Martírio de
Policarpo”. O Cânon de Muratori insere a carta entre os escritos
canônicos. Já Tertuliano cita Judas, contudo, para defender uma
suposta inspiração do Livro de Henoc. São Jerônimo apresenta a
questão de modo claro: algumas Igrejas e alguns personagens im-
portantes rejeitam a carta justamente pelo apoio que ela dá ao
texto apócrifo Livro de Henoc; outros a aceitam por uma suposta
antiguidade. Orígenes e Clemente de Alexandria citam a Carta de
Judas várias vezes.
Trata-se de um escrito pouco visitado pelos leitores do Novo
Testamento. Não apresenta o prestígio de um escrito paulino ou
de algum outro escrito com elementos doutrinais significativos.
180 © Cartas aos Hebreus e Católicas
3-4: O combate da fé
O autor faz referência a um momento de sua atividade epis-
tolar: quando escrevia, esta ou outra carta, não é possível saber.
Nessa ocasião, ele foi levado a exortar seus leitores contra os des-
vios da fé. Alguns homens ímpios teriam entrando na comunidade,
confundindo seus membros. Eles negam Jesus Cristo e propõem
atos licenciosos (vers. 4). A situação deveria ser de confusão entre
os membros da Igreja.
8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
As questões autoavaliativas são propostas para que você
tenha a possibilidade de pensar sobre os conceitos expostos nas
unidades. Elas o conduzem, mais uma vez, ao texto da unidade ou
do livro bíblico em questão. Com o ato de respondê-las, seu apren-
dizado fica mais fixado.
O necessário é compreender os princípios e relacioná-los
entre si. Dessa forma, formam-se quadros de compreensão que
podem se desenvolver com leituras posteriores.
Assim, convidamos você a responder a essas questões auto-
avaliativas. Se for possível, partilhe com os colegas do EAD as res-
postas e as possibilidades que as questões levantadas propõem.
Bom estudo e reflexão.
184 © Cartas aos Hebreus e Católicas
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
KÜMMEL, W. G. Introdução ao Novo Testamento. Tradução de Isabel Fontes Leal Ferreira
e João Paixão Neto. São Paulo: Paulinas, 1982. (Nova Coleção Bíblica)
SCHLOSSER, J. A epístola de Judas. In: MARGUERAT, D. (Org.). Novo Testamento: história,
escritura e teologia. Tradução de Margarida Oliva. São Paulo: Loyola, 2009, p. 559-567.
TUÑI, J. O. As cartas de João. In: TUÑI, J. O.; ALEGRE, X. Escritos Joaninos e cartas
católicas. Tradução de Alceu Luis Orso. São Paulo: Ave Maria, 1999, p. 153-189. (Coleção:
Introdução ao Estudo da Bíblia, 8)
ZUMSTEIN, J. As epístolas de João. In: MARGUERAT, D. (Org.). Novo Testamento: história,
escritura e teologia. Tradução de Margarida Oliva. São Paulo: Loyola, 2009, p.471-492.