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Copyright ©by Ana Luiza Ruschel Nunes & Editors UEPG "Nenhuma pare deste livre. sem autorizagto prévia por escrito ‘da Editora, poderd ser reproduzida ou transmitida, seam quais forem os melos ‘empregados:eletronicos, mecinicos,fotograficos,gravaco ou quaisquer outros Equipe editorial Coordenasto editorial Beatriz Gomes Nadal Supervisto editorial Marcia Smaniotto Preparasto de origina cha catalogrfica: Cristina Mara Botelho FRevisto: Marlon Magno Superisiode provas. Marcia Smanioto Frojetogrifcoe diagramagso: Rubia Carla Dropa Witton Paz (On dados da Obra da Capa sto: ‘Série? Vietades (Obra Temperanca ‘Autor: Wilton Paz Media: 100% 80 cm ‘Teenie: Aches sobre Fela ‘Ano: 2009 Direitos do uso de imagem de obea de ane doados ‘organzadora do Livro pelo Artista, Ficha Catalograica ees ina ars de gue sca A786 ‘por Ana Luiza Ruschel Nunes. pre ona les UEC. 202 352p. ISBN -978-85-7798.151.9 ‘Artes vieuais 2 Escola Nunes, Ana Luiza Ruschel, org LT. ‘Depésito legal na Biblioteca Nacional Eaitora filiads & ABEU Associagto Brasileira das Btoras Universitaias Editora UEPG (Campus Central - Praca Santos Andrade, n.1 ‘4010-919 ~ Ponta Grossa - Parand Fone: (42) 3220-3305 email editoraBuepg brARTE, IMAGEM E MEDIAGAO CULTURAL ‘Teresinha Sueli Franz Introducio ‘A designagio mediagdo cultural é utlizada em diferentes contextos. No presente texto, porém, nos limitamos ao sentido que essa designacao possa ter dentro de um conjunto de acdes educativas que visam promover uma educaglo para a compreensdo critica das artes visuais, ages desenvolvidas entre educadores diferentes piiblicos. Com mais frequéncia, refere-se ao trabalho do monitor (ou guia) em museus e/ou institui- ‘bes culturais, mas se estende ao trabalho dos professores em salas de aula. © termo mediagdo, como aco educativa, também é mencionado entre nés para designar 0 trabalho do ‘educador progressista, em oposicio as préticas ligadas as tendéncias pedag6gicas da escola tradicional, tecni- cista e escolanovista. Essa discussio surge, principalmente, com o trabalho desenvolvido por Paulo Freire a partir dos anos 60 do século XX, que € voltado para o didlogo educador-educando, visando o desenvolvimento da consciéncia critica, da autonomia e da cidadania. Ele também influenciou, principalmente, 0s movimentos populares e a educacio nao formal. Constantemente reinventada, continua sendo a vertente vinculada aos Aiscursos crticos da educagao, Insplrados nos ideais de Paulo Freire, alguns arte-educadores passaram a rever ‘suas préticas, apostando no papel da escola e da educaco como agentes de transformacao sociocultural, onde © papel do educador muda de mero transmissor de informagées para o de mediador de complexos processos educativos. Essa corrente pedag6gica esté também implicita na Proposta Triangular’, a partir da qual, segundo "1 _Vertente do ensino das Artes Vsuaissstematizada no Museu de Arte Cortemporinea de Sdo Paulo (Brasil), sob a coordenaglo de Ana Mae Barbosa, os dimos anos da década de 80 do séulo XX. Coloca x obra de ates visuals (ou a imagem dela 0 centro do process de esudos. Sugere que ocenhecimentoaristico se consi na elacSo entre odesenvalvimento de préticas artistics, letra da obrade arte (ou esta) ¢o esto da histéria da at (inter elacionados). -235-[ARTES VISUAIS, LEITURA DE IMAGENS E ESCOLA ‘Ana Mae Barbosa (1991), passamos a entender o conceito de arte-educacao como epistemologia da arte. E uma proposta de arte-educaco que nasceu a partir das pesquisas de mediacao entre arte e puiblico no privilegiado contexto de pesquisa, ensino e extensio da Universidade de Sdo Paulo, dentro do Departamento de Educacéo do Museu de Arte Contempordnea. Em nossos dias, parece no haver dividas de que, para fazermos frente as miiltiplas realidades que formam a sociedade contemporiinea, nés, educadores em artes visuais, somos levados a mergulhar também na grande onda critica sobre tudo o que representa (ou representou) o pensamento e o modo de vida moderno, Estamos imersos “em uma imensa desconstrucdo das esperangas que a modernidade edificou sobre a racionali- dade, a objetividade, o progresso e tudo o mais” (GERGEN, 2006, p. 31). Essa busca jé leva alguns anos, entre diversas correntes do pensamento, como, por exempio, a do construcionismo social, que nos convida a tirar partido dessa vertente critica para promover a abertura de novos padrdes de pensamento ea adocao de praticas mais inclusivas e criticas no ensino das artes visuais. Podemos comesar questionando (sabendo que nao somos os primeiros) as nossas velhas e persistentes crengas na existéncia de princfpios universais no ambito da historia das artes visuais. Ainda que pareca jé ndio haver dividas de que 0 saber (e, portanto, a arte) tem uma origem social ¢ que sua compreens3o demanda a desconstrugdo de problemas epistemol6gicos locais (culturais), resultado de formas de vida singulares e es- pecificas, no é certo que tenhamos dominio sobre as consequéncias que tais questdes trazem para as praticas de mediacao cultural. Sabemos, afinal, por que é importante gerar novos discursos, novos relatos, novas me- todologias de ensino, novas estratégias diditicas, enfim, novas politicas educativas sobre mediacao cultural? ‘A mediagao cultural como um ato politico Para comecar, espero nao haver mais diividas de que a finalidade da mediago cultural hoje va além do desenvolvimento da sersibilidade, da criatividade, da percepcdo estética (universal), da criatividade, da fruigdo, da contemplagdo e da leitura formal de imagens ¢ da obra de artes visuais. Espero que finalmente tenhamos entendido que, nas tendéncias pedag6gicas contempordneas em arte-educacéo, as finalidades do - 236 -"5 ARTE, IMAGEM E MEDIAGAO CULTURAL ensino tornam-se mais amplas e complexas. E que somente uma competente mediaco cultural pode ajudar 108 estudantes, ¢ 0 piiblico em geral, a superar as compreensBes ingénuas da arte e das imagens em geral, as interpretacoes de senso comum, espontdneas ¢ intuitivas e, ndo raramente, preconceituosas, a fim de alcangar ‘© dominio do que chamo de compreensio critica da arte. Arte-educadores contemporneos defendem também a ideia de que a educacio artistica é um poderoso instrumento para resgatar a autoestima e fortalecer a identi- dade, a0 mesmo tempo em que pode contribuir para propiciar a inclusio social e a educaco para a cidadania ‘ea democracia, o que inclul a preparacdo dos estudantes para as profissbes relacionadas com as visualidades. Frente 3s mudancas em relagio as finalidades da educacdo artistica, o trabalho de mediaco cultural exige dos educadores um conjunto de novas competéncias, que vao desde o dominio das linguagens ¢ dos pro- cedimentos artisticos até o aprofundamento de conceitos relacionados & formaco de valores como a ética, a solidariedade e a educagao para a transformacao social. As novas tecnologias da comunicagao também trazem novos desafios. Aproximar arte e tecnologia, educar para os meios de comunicacio e aprender a lidar com as diferengas, em um mundo cada vez mais globalizado, séo competéncias a serem adquiridas e ensinadas em contextos de ensino de artes visuais. Em meio as continues mudangas da sociedade contemporanea, & possivel ignorar as questdes urgentes, que desafiam todos os ambitos sociais, como as relacionadas ao meio ambiente € 8 educacdo para uma cultura da paz? No imbito da preservagio e da divulgacio do patriménio, ¢ urgente rever o histérico desprezo pela cultura material das minorias, colocando-es lado a lado com a cultura erudita, como fonte de estudos, levando fem conta no apenas sua aparéncia formal, mas seus significados culturais. Para que isso ocorra, é preciso enfrentar os preconceitos em torno das desigualdades socioculturais, ajudando o piblico a encontrar seu lugar ‘em um mundo plural. Como? Fomentando atitudes ¢ condutas positivas para com todos 0s grupos sociais e censinando a identificar e a questionar certos valores culturais, como a auséncia da arte de determinados grupos sociais nas galerias e museus de artes visuais. Hoje, jd nio 6 vidvel pensar em qualquer exposico de arte sem um cuidadoso projeto.diditico com formagio de mediadores, preparaco de materiais e, geralmente, com amplo apoio a formagao de professores do ensino regular. Nao se trata mais de fazer os costumeiros passeios pelas exposicdes, mas do planejamento - 237‘ARTES VISUAIS, LEITURA DE IMAGENS E ESCOLA ‘cuidadoso de complexos processes de estudo e pesquisa em tomo das manifestacbes atisticas, que pode envol- ‘ver paiblicos de todas as idades, mediadores, artistas e outros especialistas da érea das artes visuais, Os estudos em tomo da compreensao critica da arte e das imagens da cultura popular comesam a ‘ganhar espaco no ensino de artes visuais. A cigncia critica da educacio pretende estimular os professores a Pensar sobre a docéncia baseada no senso comum (CARR, 1996), Esse autor sugere o emprego do método da Critica para levar as profissionais 2 refletirem sobre suas préticas. A partir dessa perspectiva, a educacio ndo se {interpreta como um fenémeno natural, mas como uma prética politica e social situada na histéria e imersa em lama cultura vulnerivel 8s deformagées ideol6gicas, és pressbes institucionais e as demais formas de presses indo educativas. Assim, 0 uso da critica pode permitir aos profissionais de educagSo reconstnuir sua pritica de forma racionale reflexiva. Configuragio de preconceitos no campo das artes visuais, Diante de uma sociedade pluricultural e dos discursos sobre a inclusio social, é ingénuo defender a ‘deia de que os museus de arte que conhecemos sejam um lugar de salvaguarda da heranga cultural da huma- nidade. Antes, cabe perguntar: a quem nossos acervos antisticos representam e a quem excluem? Onde e como estio representadas as mulheres? Onde esti a arte dos pobres, dos negros, dos indlos e de outras populacées consideradas periféricas & cultura hegeménica? Por que a arte de certos segmentos da populag3o se encontra separada e isolada em museus de antropologia? Ou ainda, exposta em felras de artesanato como curiosidades Para vender aos turistas (por qualquer preco), enquanto a arte erudita, oficial, académica, contempornes e ‘modema ocupa os museus de arte e outros espacos puilicos privilegiados? Talver o problema seja a necessidade de entendermos a origem das concepsées que fundamentam ‘nossas préticas. Pode ser itil lembrar que a hist6ria da arte, dominada em meio ao século XX pelo formalismo € pelo esteticismo, que ignorou a arte das minorias ¢ exclu tradig@es artisticas consideradas retrigradas,te- nha recobradb, jé hé algum tempo, o interesse pelo estudo dos contextos sociais e politicos, como bem ensina Shiner (2004). Arte, estética,histéria da arte e critica de arte so invengSes do século XVII, época em que a -238 -‘ARTE, IMAGEM E MEDIACAO CULTURAL, antiga idela funcional de are se descompés nas categotias belas-artes¢ artesanato, Somente no século XVIII surgem espacos como museus de arte e salas de concertos, quando tanto a misica instrumental quanto a pintura passam a ser vistas como objetos de experiéncia e andlise independente de suas fungdes sociais tradicionais. Nese momento, também foi criada a categoria das belas-artes, e com ela promoveu-se a separacao entre os prazeres ditos educados/refinados ¢ os ditos vulgares, destinados is feiras e avs botecas. E nesse contexto que nés, mediadores culturais, podemos encontrar a origem de tantos preconceitos ‘que reforgamos com determinadas acies educativas. Arte, entendida de maneira geral, é uma invencio europeia que tem somente duzentos anos. No ‘encanto, é comum vermos professores de arte ou educadores de museus (em situacdes de ensino) observando imagens ou obras da histéria da arte do passado distante, & maneira moderna, ou seja, como se ela fosse feita para ser contemplada, frufda ou lida formalmente. No entanto, esses artefatos foram feitos por outros motivos, seja para decorar as paredes de um castelo ou o interior de uma igreja, ou ainda para celebrar e homenagear algum personagem ou evento importante (real ou imaginério) de determinada comunidade. Assim também acontece com o discurso dominante sobre a educacéo escolar, construido, segundo Herninde2 (2005), ha 150 ‘anos, para umna sociedade vinculada ao sistema de produgio derivado da revolucéo industrial, mas que conti- nua vinculado as atuais priticas de ensino, Diante dessas questdes, cabe vasculhar os velhos projetos socias, vinculados a esses concepsdes, antes de fundamentar praticas de mediaco cultural para responder is demandas e necessidades da sociedade atual (complexa, globalizada, hibrida e mutante). Tais questbes levam a crer que a busca por respostas sobre o tema DProposto requer a introduglo de debates que problematizem os referentes que usamos como cones, tanto nas instituigées formativas quanto nas encarregadas de expor e divulgar as obras de artes visuals. ‘Uma mediagio cultural critica com estudantes ¢ o piiblico em geral pode ajudar a desvendar a ori- ‘gem de tantos preconceitos que até hoje repercutem no campo da educagio aristica. Devemos lembrar que ‘expresso publico das belas-artes referia-se, no passado, a quem era considerado @ parte mais valiosa da sociedade. Para eles (¢ nao ao piblico em geral) era reservado o deleite das artes ditas “cultivadas”. No final do século XVII, e a0 longo do século XIX, havia um amplo consenso de que os setores ditos populares eram[ARTES VISUAIS, LETTURA DE INAGENS E ESCOLA incapazes de aprecié-las. Assim, as novas instituigbes artsticas contribuiram para criare reforcar preconcettos socials que até hoje repercutem no ensino de artes visuals. Podemos comevar questionando até que ponto nossos discursos e praticas em artes visuals perpewuam antigas crengas sobre a exclusdo de certos segmentos da sociedade do nosso campo. No mesmo contexto de corigem da categoria ane ¢ estética nasceu também a crenga de excluir do contato com a arte os “pobres igno- rantes”, os “selvagens de pele escura”, as “frivolas mulheres", os “bobos da classe média", 0s “ricos dados ao luxo”, como vemos em Shiner (2004). Ele também conta que a0 menos dois dos autores mais importantes do século XVIII em questbes de estética defendiam a ideta de que as pessoas de cor eram, por natureza, incapazes de ter 0 “gosto refinado” pelas artes. Igualmente se suspeitava que as mulheres faltasse o poder intelectual requerido para controlar sua sensibilidade. A elas, recomendava-se que se ocupassem das artes ditas menores (bordados, croché, tricd, etc). O termo belas-artes era traduzido como “artes bem educadas”, com fortes co- notagées classistas, signo de refinamento social das socledades europela e norte-americana. ‘A.adogéo de um marco te6rico adequado as novas demandas socials exige também mudangas no uso da linguagem, o que leva educadores criticos a examinar os supostos ideol6gicos incrustados em sua propria lnguagem. Uma teoria educativa critica, que pretende ser democritica e libertadora, hé de gerar um discurso ‘que possa ir além da linguagem fixada pelas velhas concepgbes de ensino (FREIRE, 1987; GIROUX, 1996), de are, de saciedade e de educacao. Para atingir essas metas, podemos nos apolar em outras manelras de abordar a educagao em artes, visuals. Nao se trata de novos mé‘odos de leitura de obras de arte, mas de novas concepgces de ensino, nas ‘quals, segundo Heméndez (2003), € possivel compreender que nas obras de arte, assim como nas imagens €€ nos atefatos visuals em geral, hé mals do que vemos. Essa compreensdo pode ser facilitada a partir do estabelecimento de relagies entre os artefatos visuals e/ou as manifestacdes artisticas e seus contextos de roducdo, bem como a partir dos seus efeitos nas construgdes das identidades dos diferentes piiblicos, o que ‘esté amplamente exemplificado em Franz (2003). = 240P ARTE, IMAGEM E MEDIACAO CULTURAL A educacao para a compreensio critica da arte ‘Aarte é um campo nao estruturado e complexo, O dominio dessa drea exige uma competente parceria, entre 0 trabalho escolar e a instinuigbes culturais, como museus e outros espacas expositivos. Na promocao de ‘uma educacio inclusiva e coerente com os problemas da sociedade contempordnea, espera-se que os mediado- res culturais saibam que nio serd apenas pelo contato espontineo com a arte ou pela contemplagio desinteres- sada que atingiremos nossas metas. £ mais provivel que, através da pesquisa e da problematizago, possamos ajudar 0s estudantes a compreender os modos como as instituigBes culturais (universidades, escolas, museus € ‘sistema de arte em geral) os representam e/ou excluem, assim como compreender como tais insttuigdes 0s afetam e influem sobre o que pensam de sie dos outros. ‘Como identificar os conhecimentos ¢ as habilidades necessérios para compreender manifestagbes ar- tisticas de maneira critica? Uma vez sabendo que na compreensio da arte ha diferentes niveis e que a experi- ncia estética nio é inata, mas adquirida, podemos levar os estudantes e/ou 0 piblico a alcangar niveis mais, ‘complexos de compreensio. & também importante sabermos que as respostas estéticas se relacionam com as competéncias e as capacidades dos individuos e que a intensidade da experiéncia estética é diretamente pro- porcional ao niimero de ambitos nivels de interpretagdo por onde possa circular o espectador. A compreensio da arte implica em diferentes nivels de complexidade, que vo desde as ideias ingénvas, implicitas e intuitives, imparciais e equivocadas, até as mais complexas, elaboradas, coerentes e criticas dos especialistas. ‘A-educagio para a compreensio critica coloca a arte (assim como qualquer imagem em estudo) em ‘seu contexto, para que as pessoas possam entendé-la melhor. Levando em conta que os artistas s¥o individuos ‘que tém (ou tiveram) uma situaco concreta na histria e na cultura, a arte também passa a ser fruto de certas tradigdes culturais. Os estudantes necessitam saber a origem das ideias que legitimaram o campo arte en- tender o papel da arte, dos artistas e do pablico em cada tempo e lugar. E necessério desconstruir o problema epistemolégico ~ examinar os modes de vida que Ihe deram forma, como diz Gergen (2008). [Na educagiio para a compreensio critica da arte, vemos que as obras de arte sio representacOes socioculturais, tudo o que esti na mente dos artistas é reflexo da esfera social circundante. Nao existem pro- ccessos de pensamento (nem obras de arte) totalmente independentes dos contextos de origem. Nesse sentido, -241-[ARTES VISUASS, LEITURA DE IMAGENS E ESCOLA ‘@ antropologia cultural também pode nos ajudar a examinaras formas ¢ as emogdes proprias de determinadas ‘sociedades humanas ~ vascular ¢ estudar nfo apenas a forma do artefato visual, mas tentar compreendé-lo ‘como evidéncia material da meméria comunitéria ou da meméria coletiva (GERGEN, 2006), que pode ser afetiva ou nao. Consideragées finais ‘Nas abordagens socioculturais de ensino da arte, o sentido da medio cultural também se amplia. Se ha bem pouco tempo atrés 0 papel ea fungo do ensino da arte era desenvolver a sensibilidade, a criatividade e ‘0 senso estético, hoje a funcio € ajuda os estudantes eo piblico em geral a compreender 0 mundo sociale cul- tural (péprio eds outros). Esses mundos poem ser arm revelads nas representagescriada parr das ‘qualidades estéticas dos meios artisticos, Nessa busca, porém, nosso olhar hi de ser critico, porque a histéria ‘sempre foi um lugar de dispatae, escrevé-la, uma questo de dominio de uns sobre outros. Sabemos que, a me- ida que os grupos de poder mudam, também mudam as maneiras de contar a hist6ria, e ue o conhecimento (€ portanto, a arte) é construido socialmente, formado por interesses de poder. Compreendida como pritica so- iocultural, a obra de arte traz consigo também as contradigbes inerentes& sociedade e a cultura (CARY, 1998). ‘Mais do que ensinar a fruit, areciar, contemplar, perceber ou ver, uma boa mediacao ensina a com= preender criticamente: problematizar, contextualizar,relacionar, comparar, relacionar, explicar aplicar os significados da arte & sua propria vida e ao seu tempo. A intensidade da experiéncia estética & diretamente proporcional ao nimero de ambitos € niveis de compreensdofinterpretacio por onde possa circular o especta~ dor. Por outro lado, “os educadores pés-modemos se esforgam para anular a dicotomia entre arte erudita¢ arte Popular e repudiam o eltismo” (EFLAND, FREEDAMN; STHUR, 2003, p. 77). 'No lugar dos velhos métodos de ensino da histiria da arte linear e evolutiva, & possfvel que nosso papel de mediadores em artes visuais, hoje, seja levar nossos estudantes a desenvolver pesquisas em torno da histévia da construgio das ideias que formam o sistema da arte (antigo ¢ modemo). Apoiados, por exemplo, ‘no construcionismo social, na historia cultural, nos estudos culruras e na pedagogia critica, podemos buscar =242-‘com nossos estudantes e pblicos a compreenséo historica do significedo dos termos artista, arte, artesanato, Imaginasdo, criatividade, etc. No & possivel continuar tratando esses referentes como algo natural ¢ imutivel, ‘Tentar compreender como surgiram as divisdes entre essas categorias pode desvelar velhos preconceitos que ‘nao combinam com as finalidades da educa¢ao contemporanea, que ha de ser, segundo Moacir Gadout (2002), Inclusiva, multicultural e critica. £ necessério um esforco continuo para desvelar as razées do desprezo que a histéria da arte tradicional criou sobre as evidéncias materiais (e imateriais) de certas culturas, buscando, junto com os estudantes, pis- tas de compreensdo sobre 0 momento histérico em que aquilo que denominamos arte rompe a relagdo com a vida e passa a servir a um projeto social especifico. Ao colocar essas questdes em relagio aos seus contextos de origem, outros relatos podem ser construidos, o que poders nos ajudar a ver as coisas de outro modo: pro- blematizando a ideia de arte que ronda objetos culturas (africanos. indfgenas, arte ocidental do passado, etc.) feitos com propésitos definidos em comunidades onde a categoria arte sequer existe (ou exist). Transferidos a contextos como museus ou outras megaexposigdes, esses objetos culturais sdo simplesmente af expostos para ser contemplados, a0 gozo ou & experiéncia estética (que se supZe ser universal), sem qualquer conexio com (8 propésitos de vida que representam. Essa tarefa ndo ¢ facil, porque delega aos educadores em artes visuals o papel de desestabllizar slidos poderes estabelecidos, levando em conta que esse trabalho € feito em lugares normalmente fragilizados pela descrenga: 0 da escola e 0 da educagio. Mais que estudar nomes, biografias de artistas, estilos, talvez seja na desconstrucdo do projeto ilumi- nista e nas suas apostas por verdades universals que possamos encontrar as razOes da suposta universalidade ¢ ‘superioridade da idela europeia de arte nascida no século XVIII ¢ incristada nas salas de aula do século XI. ‘Certamente nos dari muito trabalho ajudar nossos estudantes a ver que a arte do passado, hoje pendurada em ‘museus ou ilustrando livros de histéria da arte e de estética, foi criada com propésitos que em nada lembram ‘essas categorias. m ‘Sem uma competente mediagio, toma-se dificil fazer entender que muito do que a histéria moderna da arte convencionou como sendo a arte no foi produzido como obra de arte autdinoma dedicada i contemplacdo = 243 - é ARTE, MAGEM E MEDIACAO CULTURALARTES VISUAIS, LETTURA DE IMAGENS E ESCOLA : estética ou mera fruigdo artistica. Construgdo histérica recente, requer que busquemos na historia das ideias a origem dessa concepgao, sabendo que essa palavra pode dizer coisas diferentes dependendo da época e do lugar. As ideias e as priticas artisticas somente fazem sentido se colocadas em relago ao sistema de arte que a legtimou como tal. Por isso, as pedagogias crticas adotam a arte de acordo com a perspectiva multicultural, Esse enfoque consiste em algo além do que apenas incluir unidades ¢ lige sobre outras culturas no curiculo ‘escolar, implica em centrar nosso imteresse nos grandes temas e fungbes da arte, que slo interculturais e ans- cculturais. Implica também em nio deixar passar a oportunidade de incluir exemplos de arte de culturas locais, relacionados com temas mais concretos e préximos da vida dos estudantes, como aprendemos de Chalmers (2003). Na educagio pars a compreensio critica de obras de arte ¢ de imagens em geral, estas devem ser Compreendidas como representacées socioculturais (¢ ndo puramente estéticas). Nesse caso, é necessirio de- senvolver estudos que exigem o dominio de diferentes ambitos do conhecimento humano. Esses conhecimen- tos, segundo Franz (2003), podem ser de diversos campos interdisciplinares e transdisciplinares, a partir de abordagens socioculturais e contextualistas, com base nas teorias criticas da arte e da cultura, através de uma edagogia problematizadora e dial6gica, como ensinou Paulo Freire (1987). Nas abordagens pés-modemas de censino de artes visuais, é valorizada também a relagdo que 0s individuos estabelecem entre a arte e sua vida pessoal e social. Por esse motivo, valorizo também, como vemos em Franz (2003 e 2001), 05 émbitos biogré- fico e critico social. Dessa maneira, a aprendizagem faz sentido para os estudantes. Para finalizar, relembro 0 mesire Paulo Freire, para quem nenhuma prética educativa pode ser con- siderada neutra. Por isso, € fundamental refletic sobre as politicas que nortelam a mediac¥o cultural, porque, decididamente, sio elas que vio definir 0 sentido de nossas ages. Referéncias BARBOSA, A. M. A imagem no ensino da arte. Sao Paulo: Perspectiva, 1991. CARR, W. Una teoria para la educacién: hacia una investigacién educativa critica. Madrid: Morata, 1996,[ SZ ARTE, IMAGEM E MEDIAGAO CULTURAL } CARY, R. Critical art pedagogy: foundations for postmodem art education. New York; London: Garland, | 1998, CHALMERS, G. Arte, educacién y diversidad cultural. Barcelona: Paidés, 2003. | _ EFLAND, A. D; FREEDMAN, Kerry; STUHR, Patricia. La educacién en el arte posmoderno. Barcelona: | Paidés, 2003. | FRANZ, T. S. Educago para a compreensio da arte: Museu Victor Meirelles. Florianépolis: Insular, 2001. __—. Fducago para uma compreensao critica da arte. Florian6polis: Letras Contemporaneas, 2003. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. GADOTTI, M. Histéria das ideias pedagégicas. Sao Paulo: Atica, 2002. GERGEN, K. J. Construir la realidad: el futuro de la psicoterapia. Barcelona: Paidés, 2006. GIROUX, H. Los profesores como intelectuales: hacia una pedagogia critica del aprendizaje. Barcelona: Paidés, 1996. HERNANDEZ, F. Ir além da visio e da satisfaco: a educaco para a compreensdo critica da cultura visual. In: FRANZ, Teresinha Sueli. Educagdo para uma compreensio critica da arte. Florianépolis: Letras Contempordneas. 2003. - Aconstrucio da subjetividade docente como base para uma proposta de formacao inicial de professores de artes visuais. In: HERNANDEZ, F;; OLIVEIRA, M. A formagio do professor e oensino das artes visuais. Sania Maria: UFSM, 2005. SHINER, L. La invencién del arte: una historia cultural. Barcelona: Paidés, 2004. =245-
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