TCC Larissa Maria Do Nascimento Da Silva

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL: a reiteração do racismo


estrutural na sociedade brasileira

JOÃO PESSOA PB

2020
LARISSA MARIA DO NASCIMENTO DA SILVA

DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL: a reiteração do racismo


estrutural na sociedade brasileira

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para a
obtenção do título de Bacharel em Serviço
Social pela Universidade Federal da
Paraíba.

Orientadora: Profª Drª Luciana Batista de Oliveira Cantalice

JOÃO PESSOA PB

2020
LARISSA MARIA DO NASCIMENTO DA SILVA

DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL: a reiteração do racismo


estrutural na sociedade brasileira

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para a
obtenção do título de Bacharel em Serviço
Social pela Universidade Federal da
Paraíba.

Aprovado em _____/___________/_______.

Banca Examinadora

_______________________________________________
ProfªDrª Luciana Batista de oliveira Cantalice
Universidade Federal da Paraíba - UFPB | Orientadora

________________________________________________
Mª. Terlúcia Maria da Silva
Universidade Federal da Paraíba | Examinadora Externa

________________________________________________
Esp. Kíssia Wendy Silva de Sousa
Universidade Federal da Paraíba | Examinadora Externa

JOÃO PESSOA - PB
2020
Dedico este trabalho à minha avó Marlene
(in memoriam); à minha mãe Valdete e à
minha tia Neuza. Três mulheres negras
que me ensinaram em suas vivências
diárias a lutar, reerguer-se e sempre amar.
AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus pela oportunidade de chegar a esta etapa


final da graduação. Durante os anos de estudo, passei por muitas situações adversas,
mas sei que Ele me sustentou em cada momento e me fez prosseguir até aqui.
Gratidão a esse Amor Perfeito.
Agradeço de modo muito especial à minha mãe Valdete, por nunca ter
soltado a por todo incentivo material
e emocional para que eu conseguisse concluir a graduação. O amor e apoio que
sempre recebi de você me encorajou até aqui.
Sou imensamente grata à minha querida orientadora Luciana Cantalice por
suas valiosas contribuições durante meu processo formativo, bem como na
construção deste trabalho. Seu jeito acolhedor tornou mais leve as pressões do fim
da graduação.
Mesmo não estando mais fisicamente entre nós, agradeço pelo tempo que
minha avó Marlene (in memoriam) pôde acompanhar minha graduação. A notícia de
que eu me mudaria para outra cidade a fim de cursar o nível superior foi motivo de
alegria, preocupação e muito orgulho para ela. Sou eternamente grata pelas vezes
em que se preocupava para que eu estivesse bem. Até hoje sinto falta da frase mais

Agradeço ao meu amado Heritier Kabamba pelo grande incentivo à


construção deste trabalho, pelo companheirismo e compreensão nos momentos
turbulentos da vida. Sua história de superação sempre me motivou a não desistir do
que desejo. Sua alegria ao me ver concluir esta etapa também me faz perceber que
tudo valeu a pena.
Meu coração é cheio de gratidão por minha família: meus primos, minhas
primas, tio e tia, que sempre torceram e se orgulharam por eu ser a primeira pessoa
de nossa casa a concluir o ensino superior. Mesmo morando em outra cidade, os/as
levei em meu coração, sempre, em cada momento da minha formação.
Sou grata ao meu primo César que a todo momento demonstrou tanta
preocupação e cuidado para comigo, além de todo encorajamento durante a
graduação.
Agradeço aos amigos que compartilharam comigo a alegria de ingressar
numa Universidade Pública e por todas as expressões de carinho. Cada palavra de
orgulho e incentivo tornaram minha jornada mais leve.
Por falar em afeto, jamais poderia deixar de expressar minha gratidão às
amizades que construí durante o curso. Agradeço a Itamara pelo imenso
companheirismo, pelas partilhas, pela irmandade, confiança, por ter tanta paciência
comigo e pelas tantas demonstrações de carinho. Caminhar contigo na graduação foi
incrível. Agradeço a Katyanne por tantas vezes ser luz na minha vida e pelas tantas
partilhas. Sou grata também à Gleicyene por tantas vezes trazer uma palavra amiga
e confortar meu coração ao falar sobre o Amor de Deus. Agradeço pela amizade de
Mylena que, por inúmeras vezes, tornou minhas tardes leves com seu jeito de ser,
pelos momentos simples de lazer que tivemos, mas que foram tão significativos para
mim. Meus agradecimentos também se estendem para Carol, pela sua disponibilidade
em sempre nos ajudar e pelo carinho que sempre demonstrou a mim. Conhecer vocês
foi motivo de alegria ao meu coração.
Agradeço a todos/as professores/ do curso que contribuíram no meu
processo de construção do conhecimento.
RESUMO

A presente produção constitui-se em um trabalho de conclusão de curso, cuja reflexão


inscreve-se no debate da desigualdade racial no Brasil resultante do racismo
estrutural que media a sociedade brasileira. A construção desse trabalho
compreendeu o período entre de junho 2019 a fevereiro de 2020. O objetivo geral
consiste em analisar as mediações entre o racismo estrutural no Brasil e a condição
de pobreza que atinge grande parte da população negra brasileira. Foi utilizado como
método de análise o materialismo histórico dialético por considerar que este se funda
enquanto via de análise da realidade concreta em oposição à concepções idealistas
que não condizem com o real. Considera-se a origem do racismo nas relações sociais
do país a partir do processo de colonização do Brasil pela Coroa Portuguesa, que se
vinculou às teorias raciais e justificavam o tratamento desumano direcionado aos
escravizados/as. Nestes termos, os/as apreendiam enq senhor
-los/as de sua condição humana, para destiná-los à
exploração/opressão/dominação sem limites. Nesse sentido, apreende-se o racismo
como o estabelecimento da hierarquia entre as raças/etnias que resultam em sua
materialização cotidiana. Após três séculos e meio, por interesses econômicos, o
Brasil outorgou a Lei Áurea que era formalmente intencionada a abolir à escravização.
legal do sistema escravocrata a condição socioeconômica
dos/as ex-escravizados/as foi marcada pela ausência de medidas compensatórias e
que os/as garantissem as mínimas condições de sobrevivência. Para além deste fator,
no século XIX o novo modo de produção emergente subordinou a força de trabalho
negra, visto que eram considera .
Sem acesso ao trabalho, passaram a compor a massa da superpopulação relativa.
Este contexto social culminou na eclosão do pauperismo à população negra do país,
categoria que se refere à exacerbada situação de pobreza que atinge a classe
trabalhadora, gerada pela intensificação das formas de exploração capitalista. Esta
generalização da pobreza refletiu na falta de mínimas condições de subsistência e
reprodução social da população negra. Um cotidiano marcado pela violação de
direitos. Desse modo as práticas racistas não só se limitaram a ações individuais da
relação senhor-escravo, mas ampliaram-se às dimensões das relações
socioeconômica-política-culturais que permitiram ao racismo se estruturar enquanto
mediação das relações sociais no país. Este é um traço que se reitera na sociedade
brasileira até os dias atuais. Todavia, a ideologia dominante se utiliza de mecanismos
que buscam a subtração do racismo enquanto expressão da questão social, de
modo a atribuir a responsabilidade ao indivíduo pela sua própria condição social e
econômica. Para esta pesquisa, foram utilizadas fontes secundárias que situam o
racismo enquanto particularidade da formação social do país e que apontam as
consequências de seu desenvolvimento à população negra brasileira, visto que esta
se encontra inserida em indicadores sociais que apontam sua condição subalternizada
de vida e trabalho. As fontes secundárias utilizadas nas estatísticas foram retiradas
de publicações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada e do Ministério da Justiça.

Palavras-chave: Capitalismo; Desigualdade Racial; Escravização; Racismo


Estrutural.
LISTA DE QUADROS

Quadro 01. Indicadores quantitativos da população de imigrantes europeus em São


Paulo, final do século XIX, segundo a
nacionalidade.............................................................................................................62

Quadro 02. Dados de especificação dos Estereótipos Desfavoráveis atribuídos ao/a


negro/a no Brasil, segundo a verbalização de estudantes brancos/as do ensino
secundário da cidade de Florianópolis........................................................................65
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01. Dados referentes à distribuição da ocupação de pessoas negras no Brasil


em 2003......................................................................................................................39

Gráfico 02. Dados referentes à distribuição da ocupação de pessoas brancas no Brasil


em 2003......................................................................................................................39

Gráfico 03. Taxa de alfabetização entre negros/as e brancos/as aos 16 anos no Brasil
em 1976......................................................................................................................45

Gráfico 04. Dados quantitativos sobre o percentual de pessoas ocupadas em 2018 no


Brasil com rendimento domiciliar per capta inferior a US$ 5,50 PPC por
dia...............................................................................................................................74

Gráfico 05. Dados quantitativos sobre o percentual de analfabetismo entre brancos/as


e negros/as com 15 anos de idade ou mais em
2018............................................................................................................................77
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)

Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN)

Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua)

Paridade de Poder de Compra (PPC)


SUMÁRIO

Introdução................................................................................................................ 12
Capítulo 01 Formação social do Brasil e o sistema escravocrata: o escravismo
como base estruturante das relações sociais no país...........................................19
1.1 O processo de colonização do Brasil e os traços estruturantes da economia
brasileira.....................................................................................................................20
1.2 A escravização no Brasil e o sentido da abolição
....................................................................................................................................23
1.3 O racismo estrutural como mediação das relações sociais do Brasil após a
abolição da escravatura..............................................................................................37

Capítulo 02 O trabalho livre, a questão social e a particularidade da questão


racial no Brasil..........................................................................................................50

2.1 A reiteração das características econômicas do colonialismo e as novas


necessidades do capital..............................................................................................50

2.2 A generalização do trabalho livre e a questão social: a população negra no


contexto do pauperismo..............................................................................................58

2.3 A questão racial enquanto expressão da questão social no Brasil.........................65

Capítulo 03 O traço reiterativo do racismo estrutural no Brasil frente ao mito


da democracia racial e da ...............................................................70
3.1 A reiteração do racismo estrutural na sociedade brasileira: números da
desigualdade racial frente aos mecanismos de sua
subtração .................................................................................................................70

Considerações Finais...............................................................................................84

Referências...............................................................................................................87
INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso versa sobre a desigualdade


racial no Brasil proveniente do racismo estrutural, fenômeno que historicamente insere
a população negra brasileira em precárias e subalternizadas condições materiais de
reprodução social. Parte-se do pressuposto de que o racismo estrutural enquanto
fenômeno social possui sua base no escravismo, cujo período sustentou a formação
socioeconômica do país e refletiu diretamente nas condições de vida e trabalho da
população negra brasileira, realidade que se reitera até os dias atuais. Considerando
também que a dimensão étnico-racial está interligada aos aspectos sociais,
econômicos, políticos, culturais e ideológicos.
Embora no século XVII a escravização no Brasil tenha sido legitimada, esta
se deu sob muita violência e trabalho forçado
frente a isso estava a grande concentração de terras e o poder dos
senhores de engenho que detinham os/as negros/as escravizados/as como suas
propriedades e, portanto, os/as destituíam de qualquer tratamento humanitário.
O período em questão provocou a construção de uma imagem
estigmatizada do ser negro , cuja ideia desenvolveu práticas reais de violação à
dignidade humana desses indivíduos, como as exaustivas jornadas de trabalho
forçado e os bárbaros castigos aplicados. 1 da escravatura
em 1888 como resultado de duras e longas lutas contra essa organização
econômica seus reflexos repercutiram na sociedade brasileira e até hoje se
relacionam diretamente com as condições sociais e econômicas da população negra
no país.
A vatura se deu considerando as particularidades sócio-
históricas do país e, portanto, se voltou a atender necessidades econômicas. Desse
modo não pretendeu eliminar as diversas formas de desigualdade sobretudo a racial
ao contrário, foi gerida por uma ideologia que privilegia pessoas brancas. Também
as legislações precedentes seguiram a mesma lógica Lei Eusébio de Queiroz e Lei
do Ventre Livre [...] no

Ressalta-se que atualmente a noção de abolição é questionada no Brasil, pois embora tenha sido
generalizado o trabalho livre, ainda se verifica o exercício de atividades consideradas análogas ao
trabalho escravo.
momento em que a massa de cativos/as se tornou custo e não mais lucro. (MARTA,
MEDEIROS, 2018, p. 221).
zação no Brasil que se deu por interesses
econômicos emergiu uma nova configuração das relações de trabalho: o trabalho
livre por meio do assalariamento, que exigia força de trabalho qualificada para a
indústria nascente. Nesse contexto europeus foram os mais
convocados a fazer parte da população trabalhadora. Enquanto aos/as negros/as que
haviam recebido o status
lhes foram conferidos/as nenhuma medida indenizatória nem recrutados ao mercado
de trabalho.
Com isso, lhes restaram tarefas degradantes e mal retribuídas:

Vedado o caminho da classificação econômica e social pela proletarização,


restava-lhes aceitar a incorporação gradual à escória do operariado urbano
em crescimento ou se abater penosamente, procurando no ócio dissimulado,
na vagabundagem sistemática ou na criminalidade fortuita meios para salvar
2008, p. 44).

Nessa análise, pode-se observar o quanto o quadro socioeconômico em


questão se apresentava adverso à integração social da população negra de modo que
tivessem condições dignas de vida e trabalho. Pois, além de serem constantemente
discriminados/as e recebendo tratamentos hostis, a nova organização social não os/as
possibilitou superar as suas precárias condições de vida.
É importante também refletir que após a escravização, já na generalização
do trabalho livre, ocorreu população negra
ficou designada a exercer trabalhos braçais e bastante desvalorizados socialmente.
Concomitante a isso, havia a desqualificação dos indivíduos negros, com isso
compreende-se que o capitalismo não rom o período
escravocrata, mas reconfigurou o racismo.
Por conseguinte, a conjuntura de discriminação e pauperização que os/as
ex-escravizados/as estavam inseridos/as se situa enquanto uma expressão da
questão social, pois a desigualdade racial no Brasil foi resultado das particularidades
de sua formação social e oriunda das contradições da relação capital/trabalho. Desse
modo, ainda nos dias atuais o racismo tem se reproduzido substancialmente e é
funcional ao sistema capitalista, sustentado pela desigualdade de classe social onde,
por sua vez, atinge preponderantemente os/as negros/as da sociedade brasileira
(MADEIRA, MEDEIROS, 2018).

A verdade é que o País não superou a escravidão, que se alimenta sem


sistema formal, nutrindo o racismo na estrutura social, mantenedor do modo
de produção e como prática entranhada nas relações políticas, econômicas,
jurídicas, culturais e familiares, definindo os lugares sociais como regra e não
como exceção. (ALMEIDA, 2017 apud MADEIRA, MEDEIROS, 2018, p. 217).

Nesse sentido o racismo, presente nas relações sociais do Brasil desde o


processo de escravização, se estruturou enquanto um sistema opressor que nega
direitos a população negra. Dessa forma, afirmar que o Brasil não superou este
sistema também significa que o racismo não foi eliminado das relações do país.
Referir-se ao racismo estrutural é não se limitar a manifestações de violência direta,
mas no racismo presente no funcionamento de instituições, no tratamento
diferenciado a negros/as, na diferença salarial entre pessoas negras e brancas; no
diferente acesso à educação, entre outros. Portanto, o racismo estrutural está no
âmbito conjuntural da sociedade e se constitui como padrão de normalidade . Dessa
forma, a desigualdade racial se constitui com (ALMEIDA,
2018).
Portanto, na realidade concreta, verifica-se que a população negra
brasileira se insere nas frações de classe onde inscrevem-se os altos índices de
desemprego, ocupação em cargos com baixa remuneração e prestígio social e acesso
à educação (IBGE, 2017; IBGE, 2018). Diante disso, compreende-se que a população
negra é a mais afetada pela dinâmica da produção capitalista que, aliada e apoiada
no racismo, interdita as possibilidades de superação da condição subalternizada, e ao
mesmo tempo mistificada pela ideologia dominante2, que os/as negros/as atualmente
se inserem com status de igualdade no país.
Nessa perspectiva os objetivos deste trabalho consistem em discutir o
período colonial como base da formação social do Brasil e o desenvolvimento do
racismo, também refletir sobre o modo de produção capitalista e sua contribuição para
a subalternização da população negra brasileira, além de apresentar o racismo

2 Ideologia propagada pela burguesia que detém os meios de produção numa sociedade de classes;
pois a classe dominante, além da produção material, também possui mecanismos de produção
ideológica a fim de legitimar seus interesses.
estrutural como traço reiterativo nesse país e sua 3 enquanto expressão
4
da questão social mediante o discurso da .
Para isso, foram utilizadas como questões norteadoras da pesquisa: a)
; b)
sócio históricas e ídeopolíticas existentes entre as relações sociais de produção e a
; c)
realidade para que o racismo até hoje seja desqualificado em sua concretude na
) Se é o mérito o que rege as relações sociais no país, por
que a população negra se insere na massa populacional da pobreza, analfabetismo,
.
Quanto aos procedimentos metodológicos, esta pesquisa toma por direção
o materialismo histórico dialético. Consiste em uma pesquisa exploratória e descritiva
baseada em pesquisa bibliográfica e documental com a utilização de livros, artigos
científicos, dissertações e censos demográficos sob uma leitura crítico-reflexiva
acerca do objeto de estudo. As abordagens são de caráter qualitativa e quantitativa,
onde, além dos indicadores utilizou-se a análise dos dados secundários.
A revisão bibliográfica foi planejada durante os meses de junho e julho,
como critério dessa revisão, optou-se por autores que discutem a questão racial no
Brasil numa perspectiva crítica, bem como autores marxistas que trazem em suas
produções uma análise materialista acerca das particularidades da sociedade
brasileira. Os principais autores utilizados foram ALMEIDA, 2018; COUTINHO, 2000;
FERNANDES, 2008; FURTADO, 2007; IAMAMOTO, 2001; IANNI, 1972; MAZZEO,
2015; MOURA, 1977; NETTO, 2006 e SANTOS, 2008.
As obras principais versam sobre as discussões da formação social do
Brasil, o racismo no Brasil, os/as negros/
da escravização e a questão social e capitalismo. Os dados secundários apresentados
são provenientes de pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
2018, 2019a, 2019b), Atlas da Violência (IPEA,2019) e do Ministério da Justiça

3 O termo em questão se refere à tentativa de omiti-lo enquanto expressão da questão social

engendrada no desenvolvimento do modo de produção capitalista. Dessa forma, não nega sua
existência, mas responsabiliza o próprio indivíduo por sua condição social e econômica.
4 Este termo aparece aspeado no corpo do texto, pois parte-se da análise de que esta ideologia não

corresponde à realidade concreta da sociedade brasileira, mas atua como mecanismo de manutenção
da ordem vigente mediante seu objetivo de algumas expressões da questão social presentes
em nossa sociedade.
(BRASIL, 2017). Os dados coletados estão organizados em apresentar a diferença de
renda entre pessoas negras e brancas; taxa de analfabetismo; taxas de homicídio e o
perfil da população encarcerada no Brasil.
A análise dos dados se deu a partir da aproximação sucessiva à literatura
que trata o tema. Nesse sentido, foram identificadas as categorias centrais que
estruturam a elucidação da problemática: racismo, produção e reprodução do capital,
totalidade histórica e desigualdade racial, relacionadas aos dados aferidos acerca da
realidade da população negra do Brasil.
Considerando a exposição dos resultados da pesquisa o trabalho está
estruturado em três capítulos, onde o primeiro ormação social do Brasil e
o sistema escravocrata: o escravismo como base estruturante das relações sociais no
; o segundo é O Trabalho livre, a questão social e a
particularidade da questão racial no Brasil , o terceiro e último capítulo tem como título
O traço reiterativo do racismo estrutural no Brasil frente ao mito da democracia racial
e da .
O primeiro capítulo trata do processo de colonização do Brasil por Portugal
que circunscreve a economia brasileira numa dependência ao mercado externo,
concentração de renda e terra e o processo da escravização que se constituem como
marca da nossa economia. Será enfatizado o sistema escravocrata inicialmente com
os povos originários e depois com negros/as advindos do continente africano que
originou o racismo no Brasil e os/as submeteu a condições degradantes de
sobrevivência com a finalidade de explorar intensiva e desumanamente a força de
trabalho dos/as escravizados/as.
Também será apresentado o racismo estrutural como reflexo do período
supracita atura em 1888 a imagem
negativamente estereotipada do/a negro/a permaneceu devido sua forma de inserção

população ex-escravizada mínimas condições de reprodução social, com isso,


passaram a compor as camadas mais subalternizadas da sociedade, sendo

outros.
A reiteração de características econômicas e sociais do colonialismo se deu
numa articulação entre o moderno e o arcaico o que não permitiu uma transformação
das antigas bases da economia brasileira e manteve os traços da concentração de
renda e exploração da força de trabalho. Todos esses aspectos refletiram diretamente
nas condições de vida da população negra, configurando a inserção desta população
nos mais baixos indicadores de bem-estar social.
O segundo capítulo está centrado na discussão que situa o período após a
atura, com novas relações de produção social: agora, por meio
da generalização do trabalho livre. Nesse contexto, serão abordados aspectos sociais

efetivou no aproveitamento da força de trabalho europeia e na rejeição da força de


trabalho negra. Nesse sentido, é possível verificar o reflexo do racismo, pois a

trabalho e, consequentemente, às
condições necessárias à sua reprodução social.
Essa conjuntura socioeconômico-político-cultural demarca o surgimento da
questão social no Brasil, que é produto das relações sociais capitalistas decorrente da
principal contradição desse modo de produção: produção da riqueza pela massa da
população e sua apropriação pela burguesia detentores dos meios de produção o
que produz a desigual distribuição dessa riqueza. Um dos aspectos dessa
contradição, verifica-se na desigualdade racial no país que possui traço reiterativo,
permanece até os dias atuais.
Dessa forma, a questão racial no Brasil é concebida enquanto expressão
da questão social, visto que sobretudo a população negra brasileira passa a sofrer os
efeitos que o modo de produção capitalista engendra em seu processo de
acumulação. atura não se consubstanciou na concessão
de fato da cidadania: receberam o título de homens e mulheres livres
nenhuma proteção social. Isso os/as lançou à ocupação dos lugares mais
subalternizados e marginalizados da sociedade brasileira.
Portanto, a inserção da população negra ao processo de generalização do
trabalho livre no Brasil se concretizou sob um processo de preferência pela força de
trabalho europeia em detrimento da força de trabalho dos/as ex-escravizados/as.
Fator que se configurou como a emersão de uma nova expressão da questão social,
o racismo estrutural, mediante o afastamento da população negra no novo processo
de produção, tendo rejeitado s como fonte de superação de suas
precárias condições materiais de vida e trabalho.
Por fim, o terceiro capítulo aponta a existência e a reiteração do racismo
estrutural enquanto fenômeno presente nas relações sociais do Brasil. Para isso serão
apontados dados referentes a renda, educação, violência e sistema prisional,
indicando que nessas esferas a população negra brasileira se insere em índices que

xpressão do racismo. Discute-se também que a sociedade brasileira


se inscreve numa dinâmica de concessão de privilégios às pessoas brancas e
desvantagens sociais à população negra.
Para tratar sobre a desigualdade racial, também é necessário indicar os
mecanismos utilizados pela ideologia dominante que buscam subtrair o racismo
enquanto expressão da questão social. Nessa perspectiva, elegeu-se o mito da

vez que buscam eximir o modo de produção capitalista das mazelas sociais
formuladas por sua dinâmica e disseminam a concepção de que os indivíduos são
responsáveis pela condição material de vida e trabalho que se encontram.
Enquanto o mito da democracia racial tentou incutir a ideia de que no Brasil
não existe e nunca existiu a desigualdade socioeconômica entre pessoas brancas e

sujeitos pela condição que estão inseridos/as. Contudo, busca-se, por meio dos dados
da realidade concreta, demonstrar que a desigualdade racial no Brasil não ocorre por
soa negra, mas pela forma como nossa sociedade
se estrutura: numa perspectiva de dominação branca e pela subalternização da
população negra.
Seguem ainda, como partes constitutivas do presente trabalho,
considerações finais e referências.
CAPÍTULO 01 - Formação social do Brasil e o sistema escravocrata:
o escravismo como base estruturante das relações sociais no país

O Brasil possui traços particulares em sua formação social, que se


destacam tanto no plano da economia, da política quanto das relações sociais.
Dimensões que constituem a totalidade sócio-histórica dessa formação e que não
podem ser analisadas isoladamente.
Todavia, neste capítulo, considerando a necessidade de entender a
organização econômica do país, como um complexo em si que se alia aos demais
complexos que compõem esse todo social, será abordado o processo de
desenvolvimento das relações de produção no processo da colonização do Brasil pela
Coroa Portuguesa. Observando a demarcação da submissão ao mercado externo, a
grande concentração de renda e o escravismo, como um dos traços estruturantes
dessa economia.
Além disso, será problematizado o sistema escravocrata como principal
fonte de geração de renda no século XVI, período colonial, e o reflexo de suas
mediações que ainda persistem nos dias atuais - visto que se verifica que o Brasil
ainda é permeado pela reiteração de características econômicas e sociais desse
período, posto que se firma enquanto uma economia baseada na articulação entre o
moderno e o arcaico.
Com isso, pode-se observar que o processo de escravização gerou o
racismo5 no Brasil, pela associação dos/as escravizados/as a indivíduos selvagens e
naturalmente inferiores, cujo fenômeno se estruturou na sociedade brasileira e reflete
diretamente nas condições de vida da população negra até os dias atuais. Mesmo
após a promulgação da Lei Áurea, o sistema escravocrata
mediante a
dos/as senhores/as. Visto que essa medida ocorreu sem nenhum tipo de acesso aos
meios de produção ou a proteção social à população negra, resultando em um
processo de pauperização em massa desses sujeitos.

o racismo é uma forma sistemática de discriminação que tem a raça como


fundamento, e que se manifesta por meio de práticas conscientes ou inconscientes que culminam em
desvantagens ou privilégio para indivíduos, a depender do grupo racial ao qual pertençam
2018, p. 25, grifos do autor).
Ademais, ainda pode-se verificar que, no Brasil, a população negra se
insere em índices como precarização do trabalho e baixa renda, fator que está
diretamente vinculado às condições de vida e moradia que esta população vivencia.
Ou seja, mesmo após atura, negros e negras no Brasil
continuam em situação de pobreza, além de sofrerem forte discriminação. Tal fato
retrata os resquícios das sistemáticas opressões que o sistema escravocrata impôs
aos/s negros/as escravizados/as e que, mediante a estruturação do racismo na
sociedade brasileira, se repete ao longo dos anos.

1.1 O processo de colonização do Brasil e os traços estruturantes da economia


brasileira

Tendo isso em vista, a formação social colonial se inseriu como parte


constitutiva para expansão do capitalismo, pois este foi um período caracterizado pela
transição do sistema de circulação de valores de uso para a organização comercial
com a produção de mercadorias visando sua ampliação, que culminou no sistema
capitalista de produção, cuja discussão se fará posteriormente ao do período em
questão. Isso significa dizer que o período colonial se situou na transformação do
dinheiro em capital, onde este último passou a ter o sentido do desenvolvimento das
produções (MAZZEO, 2015).

O objetivo central do colonialismo, na época do predomínio do capital


mercantil, consistia em extorquir valores de uso produzidos pelas economias
não-capitalistas dos povos colonizados, com a finalidade de transformá-los
em valores de troca no mercado internacional. (COUTINHO, 2000, p.41-42).

O trecho acima traz o sentido econômico do sistema colonial que, ao


superar a dinâmica de trocas, por meio dos valores de uso, buscou extrair ao máximo
do que se produzia com a finalidade de estabelecer relações comerciais internacionais
capazes de expandir o capital por intermédio das colônias.
Nessa perspectiva, Mazzeo (2015, p. 57) também concebe o sistema
colonial como a dinâmica de ocupação de terras para a intensa produção de
mercadorias a ser
produção colonial aos mercados europeus, articulando o desenvolvimento da
concentração a partir das múltiplas atividades que o capital cria, em seu processo de
ias possuíam um papel fundamental: eram os
núcleos produtores dessas mercadorias.
Ainda nesse sentido, faz-se importante trazer a concepção de Coutinho
(2000, p. 43) no que diz respeito ao modo de produção colonial. O autor sinaliza que
a era colonial no Brasil não se tratou de um modo de produção capitalista. Embora o
referido período tenha sido marcado pela movimentação internacional do capital,
ainda não se tinha a lei do valor-trabalho que opera nesse modo de produção, ou seja:
trabalho livre, do trabalho assalariado, que praticamente inexiste

Portanto, são esses os elementos necessários para caracterizar o


capitalismo como modo de produção econômica. Coutinho (2000), então, indica que
o período colonial se baseou num modo de produção pré-capitalista, designando-o
uma vez que o escravismo marcou a formação
econômica e social da época, como será enfatizado mais adiante. Tendo isso em vista,
será desenvolvido o processo de ocupação portuguesa no Brasil e suas ações para o
alcance de seus objetivos econômicos.
Pós século XV, a Europa vivenciou uma expansão marítima, que acabou
por originar a colonização da América em busca de maior ampliação comercial do
continente europeu, pois era necessário conquistar novos mercados para circulação
das mercadorias. Como aponta Prado Júni
unicamente terrestre, e limitado, por via marítima, a uma mesquinha navegação
costeira e de
no século XVI, chegaram à América, onde foi possível realizar o processo de
acumulação do capital.
Prado Júnior (1994) apresenta que, a priori, a intenção dos portugueses,
ao chegarem à América, não seria de povoá-la, mas ampliar seu comércio. Porém, ao
se deparar com o lugar que se tornou o Brasil, a grande extensão de terra a ser
explorada e sua imensa biodiversidade chamou atenção dos europeus, pois essas
peculiaridades se constituíam como possível fonte de crescimento econômico. O que
também gerou a necessidade de manter o controle das terras para evi
exploração por outros povos europeus. Diante disso Portugal viu-se obrigado a buscar
o povoamento do país.
Paralelo a isso, havia a necessidade de intensificar a manufatura para
atender ao crescimento do consumo, com vistas à maior acumulação econômica.
Mas, ainda seria preciso aumentar as produções para o alcance almejado. Desse
modo a inserção do trabalho forçado ocorreu diretamente atrelada ao processo de
acumulação do capital. Isto é, o trabalho escravo se incorporou como necessidade
objetiva de ampliar a produção de mercadorias (MAZZEO, 2015).
Destarte, a invasão europeia na América trouxe três eixos centrais que
auxiliam na compreensão da formação econômica brasileira: as grandes
propriedades, a monocultura e, por fim, o trabalho escravo (PRADO JUNIOR, 1994,
p. 122). Em vista disso, a formação brasileira, como colônia tropical, se baseou pela
exportação de produtos de grande importância à época.

Se vamos à essência da nossa formação, veremos que na realidade nos


constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros; mais tarde
ouro e diamantes; depois, algodão, e em seguida café, para o comércio
europeu. Nada mais que isto. É com tal objetivo, objetivo exterior, voltado
para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem o interesse
daquele comércio, que se organizarão a sociedade e a economia brasileiras.
(PRADO JUNIOR, 1994, p. 31-2).

Sendo assim, toda a organização da colônia brasileira passou a se dar no


sentido da agricultura, na ausência de consolidação do seu mercado interno e pela
subordinação econômica ao mercado externo. Tendo o branco europeu à frente desse
processo, como figura central de dominação, enquanto às populações que foram
escravizadas, coube o trabalho subordinado.

O fato de que os pressupostos da formação econômico-social brasileira


estivessem situados no exterior teve uma importante conseqüência para a
questão cultural. Isso significa que, no caso brasileiro, a penetração da cultura
europeia [...] não encontrou obstáculos prévios. (COUTINHO, 2000, p. 44).

Cabe aqui sinalizar que, conforme aponta Prado Junior (1994), o colono
europeu não diz respeito a um simples sujeito povoad
nvolvimento
da propriedade monocultural que o trabalho escravo dos povos originários e africanos
se estabeleceu no Brasil como base da economia colonial.
Como aponta Coutinho (2000), a colonização buscou extrair ao máximo do
que era produzido pelos povos que foram colonizados. No caso do Brasil, inicialmente
os povos originários e, posteriormente, negros/as do continente africano. O sistema
colonial seguia a lógica de utilizar-se da força de trabalho dos colonizados a fim de
produzir mercadorias a serem negociadas junto ao mercado externo, como forma de
ampliação econômica para a Coroa portuguesa.

1.2 A escravização no Brasil e o sentido da abolição da escravatura

Com isso, a escravização no Brasil iniciou no século XVI, a partir das


medidas da colonização e perdurou por 350 anos. Ocorreu em princípio com os povos
indígenas por meio das capitanias hereditárias com o cultivo da cana de açúcar, onde,
sucessivamente, com o desenvolvimento dos engenhos, essa força de trabalho foi
ainda mais demandada.
O número dos povos originários que aqui residiam no momento do
povoamento apresentava um vasto quantitativo, eram muitos grupos divididos em
tribos, com culturas, línguas e organizações de vida diversificadas. Como a lógica do
povoamento se voltava para a produção de mercadorias a serem vendidas para o
exterior, isso exigiu uma nova organização de trabalho aos povos originários da terra.
Condição que se mostrou como principal motivo para a resistência do povo
indígena contra as medidas do domínio português, pois houve um intenso choque
cultural no que diz respeito aos seus tipos de trabalhos realizados originariamente
frente às imposições dos colonizadores, o que não cooperou para o alcance do
objetivo primeiro da colonização no Brasil: ampliação das bases comerciais
portuguesas.
Como destaca Fausto (2006), a chegada dos estrangeiros significou uma
catástrofe ao povo indígena, pois foram obrigados a abandonar seus costumes e
adequar-se à sociedade colonial regida pelas normas europeias em busca de
exploração da força de trabalho para obtenção crescente da produção e ampliação do
sistema mercantil que divergiam totalmente de seus arranjos originais.

Incorporados não para se integrarem nela na qualidade de membros, mas


para serem desgastados até a morte, servindo como bestas de carga a quem
deles se apropriava. Assim foi ao longo dos séculos, uma vez que cada frente
de expansão que se abria sobre uma área nova, deparando lá com tribos
arredias, fazia delas imediatamente um manancial de trabalhadores cativos e
de mulheres capturadas para o trabalho agrícola, para a gestação de crianças
e para o cativeiro doméstico. (RIBEIRO, 1995, p. 100).
Ribeiro (1995) aponta que
ocorreu na perspectiva de extrair ao máximo sua força de trabalho, submetendo-os
ao exercício de exaustivas tarefas diárias, conformando-os à condição de
escravos/as.
O que ocorre é que suas primeiras formas de organização não
compreendiam rotinas de trabalho com vistas à produção de excedentes para
acumulação de riquezas, mas se fundamentava numa cultura de atividades de
subsistência, cuja finalidade era a de manter-se, sem visar a lucratividade em suas
produções.

Os índios tinham uma cultura incompatível com o trabalho intensivo e regular


e mais ainda compulsório, como pretendido pelos europeus. Não eram vadios
ou preguiçosos. Apenas faziam o necessário para garantir sua subsistência,
o que não era difícil em uma época de peixes abundantes, frutas e animais.
[...]. As noções de trabalho contínuo ou do que hoje chamaríamos de
produtividade eram totalmente estranhas a eles. (FAUSTO, 2006, p. 49).

Isso mostra que a vinda dos portugueses trouxe devastadoras e inúmeras


consequências. Para além do trabalho forçado destacaram-se as epidemias que
causaram um alto número de mortes, além das violências cultural e sexual (FAUSTO,
2006, p.40). A primeira os obrigou a apartar-se de seus próprios valores para aderir
aos costumes europeus; a segunda teve como resultante a mestiçagem do Brasil,
processo que se deu sob estupros de mulheres indígenas e que até os dias atuais são
silenciados.
As condições de trabalho que os colonizadores impuseram aos povos
originários, pelo fato de serem divergentes ao de costume, geraram muitos embates
e fugas como formas de resistências, visto que a lógica do trabalho coercitivo não lhes
era uma prática habitual. Nessa perspectiva os povos originários reagiram ao trabalho
forçado entrando em combate contra os colonizadores, muitas vezes até a morte, o
que reduziu significativamente seus números no país, pois as lutas geraram um
verdadeiro genocídio. Além dos conflitos físicos, havia as práticas de fuga. Por ter
grande conhecimento territorial, muitos conseguiam fugir e não eram capturados
novamente.
Devido à redução de seus números, decorrente das questões já colocadas,
e também frente à necessidade econômica da colônia em produzir excedentes nas
produções advindas das lavouras canavieiras, houve a substituição da exploração da
força de trabalho indígena pela de africanos/as.
No tocante à transição do predomínio do povo indígena para africanos no
trabalho escravo, Schwartz (1988, p. 68) mostra que esse processo levou quase meio
século:

A transição para uma força de trabalho africana foi efetuada nas primeiras
duas décadas do século XVII, época em que a indústria açucareira
experimentava rápida expansão e considerável desenvolvimento interno
devido aos altos preços internacionais do açúcar. [...].

Além disso, o autor aponta que as habilidades notadas nos africanos ao


trabalho manual também foi um fator que contribuiu para o aumento da compra de
negros/as para serem escraviados/as. Baseados em experiências de outros países,
os portugueses notaram que africanos conseguiam dominar melhor as técnicas para
fabricação do açúcar em comparação aos povos indígenas, em decorrência de suas
diferentes formas de organização de vida e trabalho.

Os colonizadores tinham conhecimento das habilidades dos negros,


sobretudo por sua rentável utilização na atividade açucareira das Ilhas do
Atlântico. Muitos escravos provinham de culturas em que trabalhos com ferro
e a criação de gado eram usuais. Sua capacidade produtiva era assim bem
superior à indígena. (SCHWARTZ, 1988, p. 50-1).

SCHWARTZ, 1988, p. 68); tal pensamento


contribuiu para o acirramento da busca e captura destes homens e mulheres, pois
viam nessa população a oportunidade de obter maiores lucros, por meio de sua
capacidade de produção.

índios, portugueses, ingleses ou qualquer outro povo arrancado de sua terra


natal e submetido à vontade alheia, mas as semelhanças de sua herança
cultural com as tradições europeias valorizavam-nos aos olhos dos europeus.
(SCHWARTZ, 1988, p. 70).

Vê-se, portanto, que, ao contrário dos povos originários que se


organizavam por meio da agricultura de subsistência os/as negros/as que foram
escravizados/as já possuíam mais proximidade ao trabalho, o que os tornavam mais
Essa característica, contudo, não
justifica o fato de serem escravizados e viverem em condições subumanas, como será
discutido adiante.
Mas a substituição do trabalho compulsório indígena não se deu apenas
por isso. Houve também um processo de resistência por parte das ordens religiosas
pela não escravização destes povos cuja iniciativa não provinha pelo respeito e
defesa para preservação da cultura indígena, os cristãos da época estavam mais
edominante do que ao
combate do modo de produção escravista (FAUSTO, 2006).
Somado a essa realidade, encontrava-se o índice de taxa de mortalidade
decorrente das doenças europeias que afetava em maior incidência os povos
originários, tudo isso tornava o escravo africano um investimento mais seguro. Essas
questões favoreceram o barateamento da força de trabalho dos povos indígenas,
favorecendo a procura de negros/as para serem escravizados/as
Com isso, na última década do século XVI, mediante a expansão da
economia açucareira no Nordeste, o tráfico de escravizados/as se regularizou,
possibilitando a expansão dessa população no país. Essa abertura proporcionou aos
europeus um maior interesse em explorar a força de trabalho africana, e, assim, aos
poucos, este trabalho escravo superou a escravização indígena.
Negros/as foram se constituindo como fonte de geração de riqueza, uma

no cenário da casa grande e da


senzala que o Brasil se formou socialmente. A população negra escravizada tornou-
se a principal força de trabalho nas atividades de plantações de cana de açúcar,
algodão e nos engenhos a fim de desenvolver essa produção.
Para conduzi-
navios que os/as forçavam a embarcar às colônias portuguesas. Essa migração
obrigada se tornou o tráfico negreiro, que se legitimou como meio de transporte da
população a ser escravizada. No trajeto eram submetidos a condições desumanas e
degradantes, como descreve o trecho abaixo:
Os vivos, os moribundos e os mortos amontoados em uma única massa.
Alguns desafortunados no mais lamentável estado de varíola, sofrivelmente
doentes com oftalmia, alguns completamente cegos, outros, esqueletos
vivos, arrastando-se com dificuldade para cima, incapazes de suportarem o
peso de seus corpos miseráveis. Mães com crianças pequenas penduradas
em seus peitos, incapazes de darem a elas uma gota de alimento. Como os
tinham trazido até aquele ponto parecia surpreendente: todos estavam
completamente nus. (DIÁRIO DE BORDO DA BELONAVE BRITÂNICA apud
BIBLIOTECA NACIONAL, 1988, p. 29). 6

Os/as negros/as que seriam escravizados/as eram retirados/as à força de


seu país. Capturados/as para serem comercializados/as. Dentro dos navios eram
jogados/as, acorrentados/as, para embarcar numa viagem terrível com milhares de
pessoas, presas e amontoadas no porão do navio. Muitos/as morriam no percurso e
os que resistiam, eram direcionados/as a quem os/as comprasse que passaria a ter
o t escravo , onde passariam a viver os próximos dias em
condições sub-humanas.
Embora se perceba a barbaridade que sofriam, juridicamente eram
classificados como coisas, as propriedades de seus donos. Além de serem
considerados/as naturalmente inferiores e destinados/as à subjugação, também
sofreram o processo da objetificação (FAUSTO, 2006). Essa construção ideológica
passou a constituir relações sociais de produção baseadas na propriedade do

Cientificamente, foram formuladas algumas teorias que justificavam a


inferioridade das pessoas negras. Pautavam-
diferentes etnias, onde os brancos seri Desse modo,
refletiram na sociedade brasileira, desde o escravismo até os dias atuais, pois ainda
se verifica uma concepção hierárquica entre brancos/as e negros/as no país. Todavia,
frente a essa realidade, encontra-se a tentativa de mascarar ou subtrair a existência
da desigualdade racial no Brasil.
Além disso, também se utilizou hierarquizar
intelectualmente os indivíduos. Na discussão sobre a existência de tais ideias,
de
riqueza, a ganância do ouro levou ao extremo de não ver neles homens, e sim entes

6 Diário de Bordo da belonave britânica Fawn. In: Conrad, Robert. OsTumbeiros. São Paulo,
Brasiliense, 1985. p. 55.
capital também se apropriou dos conceitos racistas para atingir seus propósitos por
meio da escravização.
Exposto isso, dá-se continuidade à dinâmica do escravismo. Considerando
os objetivos econômicos das colônias, a atividade do comércio de negros/as
africanos/as tornou-se a prática mais rentável da época para a coroa.

Portugal lucrava muito com este comércio, tributando a "mercadoria"


duplamente, tanto no momento do embarque na África, quanto no seu
desembarque em terras brasileiras. Somente a partir deste momento a mão-
de-obra utilizada no Brasil-colônia passou a ser, em maior parte, provenientes
deste comércio de africanos, trazidos para trabalhar em nossas lavouras.
(ALMEIDA, PAULA, 2006, p.264).

Aqui é notório o quanto o interesse econômico e o racismo naturalizaram


as brutalidades vivenciadas pelos povos escravizados. Neste momento não havia
nenhum reconhecimento das violências praticadas, mas justificavam-se tais práticas.
O tráfico de negros/as africanos/as se tornou um negócio muito lucrativo,
aproveitavam-se dos tributos cobrados nos embarques e desembarques,
transformando, desse modo, as crueldades em ampliação do capital.
Ao desembarcarem e serem vendidos/as como escravos/as podiam atuar
em três áreas: na agricultura, ofícios e nas atividades domésticas. A primeira esfera
era a que mais dava sentido à colonização: se direcionava ao cultivo da cana-de-
açúcar, algodão, fumo e café, para,

atividades voltadas para a carpintaria, construção, entre outros. Aos domésticos


cabiam todos os serviços da casa grande, cujas atividades demandavam grande
esforço físico (BIBLIOTECA NACIONAL, 1988).
No tocante às suas condições diárias de vida, eram submetidos/as a longas
jornadas de trabalho que chegavam a 14 ou 16 horas com péssimas condições de
vestimenta e alimentação (BIBLIOTECA NACIONAL, 1988). Eram-lhes totalmente
negadas quaisquer mínimas condições de vida, as exaustivas jornadas de trabalho
eram extremamente prejudiciais à saúde, pois as atividades desenvolvidas exigiam
grande esforço físico.
Pelas condições a que eram forçados a viver, se reduziram a coisas, lhes
sendo negados quaisquer direitos. Poderiam possuir marcas a ferro, como as
etiquetas encontradas quando se adquire um objeto qualquer. Além disso, o espaço
físico onde viviam apresentava condições deploráveis: as chamadas senzalas. Eram
vãos compartilhados por muitos/as. Um ambiente com ausência de mínimas
condições adequadas de sobrevivência e sem qualquer proteção à sua integridade.
Era-lhes negado o direito à educação; estavam constantemente expostos/as a
inúmeras doenças, sem quaisquer cuidados médicos (BIBLIOTECA NACIONAL,
1988).

Em geral amontoavam-se em senzalas impróprias para a habitação e


careciam de cuidados médicos, sendo freqüentemente vítimas de doenças
que se tomavam endêmicas, como a tuberculose, disenteria, tifo, sífilis,
verminose, malária. A média de vida útil, por isso, variava de sete a dez anos.
(BIBLIOTECA NACIONAL, 1988, p.10).

O dia a dia marcado pela alimentação insuficiente, falta de higiene


adequada e péssimas condições habitacionais os/as subjugavam a um cotidiano
totalmente insalubre, o que refletia em suas condições de saúde. Doenças por falta
de uma dieta adequada os/as acometiam, reduzindo sua média de vida. Pois,
concomitante à falta de moradia, alimentação e higiene tinham de trabalhar duramente
por longas horas diárias.
Como se não bastasse vivenciar diariamente as formas de violência já
apresentadas, ainda tinham de receber brutais
es exigiam humildade e aceitação aos
valores impostos a seus escravizados/as.

Estes castigos imobilização no tronco, açoites, marcas a ferro quente,


esmagamento de dedos, corte de orelhas costumavam ser mais violentos
na lavoura, sobretudo nos períodos em que era indispensável o trabalho
contínuo, e diante de faltas graves. (BIBLIOTECA NACIONAL, 1988, p. 11).

Os chamados castigos se configuravam como verdadeiras torturas. O


tronco, onde ficavam com as mãos amarradas enquanto sofriam fortes açoites, muitas
vezes até chegar à carne viva; a máscara composta por metal que era introduzida na
boca do/a escravo/a:

[...] instalado entre a língua e a mandíbula e fixado por detrás da cabeça por
duas cordas, uma em torno do queixo e a outra em torno do nariz e da testa.
Oficialmente, a máscara era usada pelos senhores brancos para evitar que
africanos/as escravizados/ as comessem cana-de-açúcar ou cacau enquanto
trabalhavam nas plantações, mas sua principal função era implementar um
senso de mudez e de medo [...]. (KILOMBA, 2010, p. 172).
Tudo isso compunha um conjunto de muita dor e humilhação a fim de torná-
los/as mansos e obedientes. Pois, meios cruéis de
dominação que representavam o grande desprezo dos senhores a
de Desse modo, seu cotidiano era receber dos senhores a negação da
dignidade humana, indiferença ao seu sofrimento, castigos bárbaros, exagerados e
muitas vezes injustos. Com isso, lhes restava o ódio, o desejo e a arquitetura de
vingança. Não podia ser diferente. Nestas circunstâncias não tinha como não se
rebelar, era quase impossível ser passivo nessas duras e diárias experiências.

Mas a vida dos escravos em nosso país não se resumia à mera condição de
força de trabalho, de instrumento passivo dos grupos dominantes,
supostamente os únicos agentes da história. Se deviam submeter-se às
condições impostas por uma sociedade exploradora e violenta, coube
também aos negros escravos criar uma estratégia de sobrevivência e, até
mesmo, uma nova identidade, que lhes permitisse viver o seu dia-a-dia.
(BIBLIOTECA NACIONAL, 1988, p. 11).

Durante imposição do escravismo, houve formas resistências pela


população escravizada, como por exemplo os quilombos.7 Muitos/as se organizavam
coletivamente armando emboscadas para o senhor ou feitor, realizavam combates
violentos, planejavam e concretizavam as fugas em massa, onde iam se refugiar
nos quilombos e tentar se livrar das tiranias do senhor de engenho e conquistar sua
onseguiam executar seus planos, eram
duramente reprimidos.
Ali os capitães do mato tinham um papel importante: buscar, apreender e
castigar. De acordo com o Regimento, estas figuras não seriam penalizadas se
viessem a matar algum escravo foragido durante sua tarefa de recaptura, ao menos
que o fizesse propositalmente e fosse constatado (MALHEIRO, 1976). Além disso,
estes não eram senhores de engenho, tampouco homens brancos e ricos, mas
subordinados aos senhores e, ainda assim reproduziam o pensamento dominante.
Quando os/as escravizados/as obtinham sucesso durante as fugas,
formavam os quilombos que eram os lugares onde se refugiavam, quando não eram
recapturados/as e levados/as de volta ao engenho em que trabalhavam. Moura (1986,
p. 17) aponta que os quilo

7 Esta discussão traz a formação dos quilombos de modo mais detalhado dada sua forma de
organização e desenvolvimento. Contudo, destaca-se que o quilombo não era a única prática de
resistência do povo negro escravizado.
mais complexa
se dava sua organização.

Os quilombos, por exemplo, formaram-se em praticamente todas as regiões


do Brasil. O quilombo dos Palmares, organizado na serra da Barriga, Alagoas,
em 1630, foi o mais importante de todos. Seus milhares de habitantes, os
quilombolas, sustentaram a liberdade até 20 de novembro de 1695, quando
as forças chefiadas pelo bandeirante Domingos Jorge Velho mataram Zumbi,
o último grande líder de Palmares. Em 1835, eclodiu em Salvador a revolta
dos malês, o maior e mais bem organizado levante de escravos contra a
dominação branca. (BIBLIOTECA NACIONAL, 1988, p. 11-2).

Desse modo, se constituíram como espaços de resistência onde


desenvolveram diferentes mecanismos de sobrevivência. Sua economia se baseava
na agricultura e na criação de animais, plantavam milho, feijão, mandioca, batata
doce, banana e cana de açúcar (MOURA, 1986).
Desde seu surgimento, os quilombos eram alvos de muita perseguição,
pois significavam para os senhores de engenho perda de força de trabalho e,
consequentemente, prejuízo econômico, além de ameaça de serem alvos de ataques
dos/as escravizados/as fugidos/as (SILVA G., SILVA V., 2014). O Quilombo dos
Palmares foi o maior no Brasil, tendo Zumbi dos Palmares como seu líder que
comandava as estratégias de resistência contra o sistema escravocrata.

O Quilombo de Palmares foi o maior na história do Brasil; tornou-se símbolo


de resistência, representando motivo de preocupação para as autoridades do
Brasil Colonial. Palmares passou a ocupar dentro do imaginário de muitos
escravos a esperança de se alcançar a sonhada liberdade através de fugas.
(SILVA G., SILVA V., 2014, p. 194).

Tendo em vista as revoltas orquestradas pelos/as escravizados/as e o


significado que os quilombos, principalmente Palmares, deixaram na perspectiva de
busca pela liberdade, para evitar os atos revoltosos era comum que os senhores e os
capitães do mato organizassem um rigoroso sistema de patrulhamento e penalidades
sobretudo quando recebiam novos/as negros/as a serem escravizados/as.

O medo das fugas e rebeliões dos africanos recém chegados era uma
constante. Uma grande estrutura de controle, vigilância e repressão sobre a
vida dos cativos foi criada e a própria administração colonial respaldava a
prática de castigos severos, chegando até mesmo a aplicação da pena de
morte para os escravos mais indisciplinados. (ALMEIDA, PAULA, 2006, p.
265).
Assim, organizavam um sistema de vigilância contra os/as negros/as
escravizados/as como forma de dominação e repressão. Além das estratégias de
resistência mencionadas, a literatura traz as negociações entre escravo/a e seu
senhor como outro tipo de resistência. Esta se caracterizav
ganhos e concessões de
degradantes condições a que tinham de submeter-se diariamente.
Visto o paralelo entre as condições de vida dos/as negros/as
escravizados/as e suas formas de resistências, cabe aqui sintetizar como a
escravização passou a ser gradativamente abolida formalmente no Brasil, cujo
processo foi tardio e condicionado das degradantes situações a que estes grupos
estavam submetidos, como também têm uma ligação direta nas atuais relações
sociais do país8. A busca pelo fim desse sistema, não se concretizou por uma questão
de reconhecimento à dignidade dessa população a iniciar pelo término do tráfico
negreiro mas por jogo de interesses econômicos.
Para tratar do processo que culminou na abolição da escravatura, cabe
sinalizar o movimento abolicionista. Uma organização coletiva que emergiu no século
XIX, composta por sujeitos de diferentes classes sociais e que lutaram em comum
pelo fim da escravatura no Brasil, realizando diversas campanhas nesse sentido,
como também arrecadando finanças a serem usadas para alforrias.
No início do movimento, os abolicionistas encontraram grande resistência
es ideia
da abolição realizara durante dois séculos e meio progressos extremamente
(FREITAS, 1983, p. 148). Ao mesmo tempo em que o sistema escravocrata se
enfraquecia, por questões expostas mais adiante, o movimento abolicionista avançava
gradualmente.
O objetivo principal do movimento consistia em promover a abolição
mediante indenização dos proprietários (FREITAS, 1983). A pauta abolicionista
conseguiu se inserir no âmbito da política do Brasil, sempre na perspectiva de
organização coletiva em busca do fim da escravização. Buscava-se, inclusive,

Visto que a forma de inserção social dos/as negros/as ex-escravizados/as, após a promulgação da
Lei Áurea que determinou a abolição da escravidão se deu numa perspectiva de desamparo social,
o que os/as direcionaram ao pauperismo. Com isso, passaram a ocupar posições subalternizadas na
sociedade, realidade alimentada pelo racismo e que perdura até os dias atuais.
mobilizar a população escravizada a fomentar as estratégias de fugas como forma de
pressionar o sistema escravocrata.
O referido movimento encontrou uma conjuntura social de enfraquecimento
do sistema colonial mediante o desenvolvimento da industrialização. Com o advento
da revolução industrial, em 1807 a Inglaterra extinguiu o tráfico de negros/as
africanos/as, visto que, nesse momento, a acumulação de capital passou a se
concentrar principalmente nas indústrias, o que paulatinamente passou a tornar
inviável a manutenção do sistema escravocrata necessitava-se generalizar o
trabalho livre para se garantir a realização da mais-valia.
No início do século XIX o Brasil passou a ser pressionado pela Inglaterra,
que por sua vez o fez por interesses econômicos, para extinguir as práticas do tráfico
negreiro. Gradativamente o país foi se comprometendo ao fim de tal prática, pois
necessitava, nesse momento, do reconhecimento de sua independência pela nação
inglesa, bem como pretendia vender seus produtos ao mercado externo e manter suas
taxas de lucro. Contudo, só com a Lei Eusébio de Queirós nº 581 em 1850 a proibição
de fato se efetivou. No ano de 1815 o Brasil aceitava a proibição do tráfico ao Norte
da Linha do Equador. E, finalmente em 4 de setembro de 1850 foi sancionada a lei
que impedia o tráfico de negros/as escravizados/as para o Brasil (BIBLIOTECA
NACIONAL, 1988).
A Lei Eusébio de Queirós, que recebeu esse nome pelo seu autor o
Ministro da Justiça na época foi a responsável pela abolição do referido tráfico. A
referida Lei foi resultado de um projeto que atravessou embates, pois a aceitação da
abolição desse tráfico não se deu unanimemente, muitos políticos eram contrários à
essa medida e encaravam o tráfico de negros/as como fonte de crescimento
econômico ao país.

O projeto de Eusébio de Queirós contra o comércio de escravos passou


rapidamente pela Câmara, onde os deputados que ousaram fazer uma última
defesa do comércio de escravos foram silenciados; foi aprovado em 17 de
julho. Houve alguma oposição no Senado, mas depois de uma série de
debates em sessão secreta, o projeto foi aceito em 13 de agosto. (BETHELL,
2002, p. 384).

No mês seguinte o projeto se tornou a Lei e, a partir disso, qualquer


embarcação brasileira que fosse encontrada realizando o transporte ou desembarque
de negros/as africanos/as, seriam apreendidas pelas autoridades, de acordo com o
explícito em seu primeiro artigo:

Art. 1º As embarcações brasileiras encontradas em qualquer parte, e as


estrangeiras encontradas nos portos, enseadas, ancoradouros, ou mares
territoriaes do Brasil, tendo a seu bordo escravos, cuja importação he
prohibida pela Lei de sete de Novembro de mil oitocentos trinta e hum, ou
havendo-os desembarcado, serão apprehendidas pelas Autoridades, ou
pelos Navios de guerra brasileiros, e consideradas importadoras de escravos.
(BRASIL, 1850).

Após a promulgação da Eusébio de Queirós de 1850 o preço dos/as


escravizados/as aumentou expressivamente. Além disso, por conseguinte, a restrição
de importação de novas forças de trabalho escravas gerou uma crise pela escassez
da mão de obra escravizada. Esse fator ocasionou numa maior procura de
trabalhadores livres, que, por sua vez, se recusaram ao trabalho forçado e às
condições que os/as escravizados/as tinham de submeter-se. Esses aspectos
culminaram nas práticas de tráfico interno, pela compra interna de negros/as que se
tornaram escravos/as no país (MENEZES, 2009).
Apesar da problemática apresentada, a Lei nº 581/1850 se constituiu como

Conforme enfatizado, o fim do tráfico negreiro representou um abalo ao sistema


escravocrata, entretanto a elite brasileira ainda resistia ao antiescravismo utilizando
argumentos econômicos a favor do sistema. Dessa maneira as ideias abolicionistas
no país, inicialmente, se restringiam a negros/as, mestiços/as e liberais radicais que
se opunham às práticas discriminatórias contra os/as libertos/as e ao escravismo.
Já na elite dominante, esse pensamento não era hegemônico, ao contrário,
a minoria se posicionava contra o sistema econômico em questão (BIBLIOTECA
NACIONAL, 1988). Cujo pensamento consistiu num traço conservador do
pensamento social do Brasil, que se apresentará no intermédio entre o escravismo e
a reincidência do racismo. O movimento abolicionista também alcançou ações que
foram, progressivamente, aproximando o Brasil da abolição da escravatura, como a
Lei do Ventre Livre e a Lei dos Sexagenários.
No dia 28 de setembro de 1871, depois de intensa campanha junto à opinião
pública, era aprovada, durante o gabinete presidido pelo conservador José
Maria da Silva Paranhos, a Lei Rio Branco. Conhecida como Lei do Ventre
Livre, ela libertava as crianças nascidas de mulher escrava a partir daquela
data, obrigando os seus senhores a cuidar dos ingênuos os filhos de mulher
escrava até aos oito anos de idade. Após este tempo, os senhores
poderiam libertá-las, recebendo uma indenização de 600 mil-réis, ou utilizar
os seus serviços até que completassem 21 anos de idade. (BIBLIOTECA
NACIONAL, 1988, p. 36, grifo meu).

A Lei do Ventre Livre de 1871 foi a primeira lei de caráter abolicionista no


Brasil que reconheciam livres os filhos de mulheres escravizadas que viessem a
nascer a partir da data de sua promulgação. Todavia, nesse momento, ainda não
houve a ruptura com a lógica da relação hierarquiza

Apesar dos cuidados da criança, até os oito anos de idade, ser


responsabilidade do senhor, observa-se que havia uma obrigatoriedade parcial, visto
que o Estado poderia indenizá-lo pelos custos arcados ressarcimento este que não
seria destinado aos filhos de escravas como reparo pelas barbaridades que,
historicamente, acometeram seus antecessores. Ou, ainda, poderia optar por usufruir
dos serviços da criança até que atingisse vinte e um anos de idade. Nesse sentido, a
liberdade do trabalho poderia ser alcançada somente após treze anos de prestação
de árduos serviços.
Apesar disso, dentro e fora do Parlamento houve fortes críticas à Lei de
1871, afirmando que seria um atentado à propriedade privada, com potencial para
gerar crises na agricultura. Ademais, os resultados da especificada ação não se
apresentaram de forma satisfatória aos defensores da abolição da escravatura ou em
conformidade ao preconizado, pois sua aplicação apresentou fraudes (MENEZES,
2009).

Apenas cinco anos depois da sua aprovação foram libertados os primeiros


escravos, com recurso do fundo de emancipação: 1.500 para uma população
servil superior a 1.500.000. E das 400 mil crianças registradas até 1885,
apenas 118 haviam sido confiadas ao governo e só 9 mil tinham passado à
condição de completa liberdade. As demais ficavam sujeitas, de acordo com
a lei, a um estado de escravidão de facto. (BIBLIOTECA NACIONAL, 1988,
p. 37).

Mesmo com estas contradições a luta abolicionista continuou avançando.


Políticos abolicionistas propunham leis nesse sentido e, na imprensa, a publicação de
artigos contra a escravização fomentaram as campanhas da organização
(BIBLIOTECA NACIONAL, 1988).
No início da década de 1980 o Ceará protagonizou no combate ao tráfico
interno de negros/as. Nessa década Rui Barbosa elaborava um projeto que concedia
liberdade aos/as escravizados/as sexagenários/as, por mudanças internas no
governo essa proposta se alterou e, após serem libertos/as acima dos sessenta anos,
ainda teriam de trabalhar por mais três anos até completarem sessenta e cinco anos.
Assim, em 28 de setembro de 1885 foi aprovada a Lei do Sexagenário (BIBLIOTECA
NACIONAL, 1988).
Mesmo significando um avanço na busca pelo fim da escravização, a Lei
do Sexagenário beneficiou a poucos, pois em decorrência de suas péssimas
condições de vida e trabalho, era raro que um/a negro/a escravizado/a chegasse aos
sessenta anos de idade e, quando acontecia, já não possuíam mais condições para o
trabalho.
Três anos após a aprovação das Leis anteriores, em 1888, foi assinada a
Lei Áurea que extinguiu formalmente a escravatura. A escravização aqui elencada
refere-se à prática, de ordem hierarquizada, de segregação dos sujeitos sociais,
tomando como principal preceito a cor da pele. Pois, no referido período a prática da
escravização era justificada por vários argumentos, inclusive o que considerava os/as
negros/as escravizados/as como seres naturalmente inferiores.
É necessário compreender que a conjuntura da época contribuiu para a
promulgação da Lei Áurea n°3.353, para evitar o entendimento equivocado de que
esta foi uma medida de repúdio ao escravismo. Até porque a princesa Isabel,
enquanto mulher branca e ocupando um lugar de privilégio, em nada representou a
luta negra em busca de sua plena liberdade, mas assinou o decreto por interesses
econômicos.
Além de todo o processo já discutido que levou a aprovação de leis
específicas, encontrava-se na conjuntura econômica o avanço industrial e o
surgimento de novas necessidades do capital sobretudo de capacitação para o
trabalho fabril. Demanda essa que inseriu de forma precária e pauperizada a
população de ex-escravizados/as.
Somada a essa realidade, as ideias e dogmas cristãos de supervalorização
do trabalho, ainda em meados do século XVIII, se contrapunham à escravização, o
que acabou por fortalecer os discursos já propagados pelos abolicionistas e também
por ex-escravizados/as
ainda se encontravam na condição de propriedade do senhor. No contexto
internacional a França, desde o século XVII, já tinha sancionado medidas que podiam
favorecer alforrias, e também com a Convenção Francesa em 1790, quatro anos
depois a população escravizada recebeu emancipação (MALHEIRO, 1976).
A Dinamarca aboliu o tráfico em 1792; Os Estados Unidos da Norte

des
1976, p. 110), sendo a Inglaterra uma potência mundial e de grande influência para a
economia do Brasil, pois muito se lucrava no comércio entre os países. A França e a
Europa estavam cada vez mais sensíveis às propagandas abolicionistas e
abolicionistas ingleses e franceses avançaram na difusão de suas ideias (MALHEIRO,
1976).
No mais, diante das novas necessidades do capital frente ao processo
nascente da industrialização, iniciado na segunda metade do século XIX, a
manutenção do escravismo passou a ser inviabilizada. A industrialização exigiu a
ampliação do subconsumo das massas para a obtenção da mais-valia, diante disso o
capital requisitou a generalização do trabalho livre como meio de ampliação de suas
taxas lucrativas. Daí o trabalho escravo tornou-se insuficiente para atender às novas
demandas do capital, o que favoreceu a abolição da escravatura em 1888 (IANNI,
1972).

1.3 O racismo estrutural como mediação das relações sociais do Brasil após a

Conforme já analisado, a Lei Áurea nº 3.353/1888 apresentou limites e não


merece ser reconhecida como abolidora integral da escravatura, pois os/as negros/as
que haviam sido escravizad
acesso à liberdade plena. Ficaram totalmente desprotegidos/as socialmente, sem
condições materiais de construir uma vida digna com saúde, moradia, acesso à
educação e ao trabalho remunerado assegurados. Ou seja, passaram a conviver com
a pobreza, falta de proteção social e uma estereotipagem negativa, traço que se
reitera na sociedade brasileira.
Após a a maior força de trabalho contratada foi
de imigrantes europeus. Isso também se deu porque
eram considerados/as como aqueles/as que não tinham capacitação para a nova
demanda do capital. Por consequência, suas forças de trabalho não foram recrutadas
no âmbito industrial e essa realidade resultou na inserção massiva da população
negra na linha de pobreza e exercendo as ocupações mais precarizadas no mercado
de trabalho. Esta realidade ainda é verificada no presente século, cujo aspecto permite
notar que a dinâmica social e econômica no Brasil criou bloqueios à população negra
no país para atingir mobilidade social e fez com que esse processo de precário acesso
às condições de reprodução da vida social se reiterasse.
Sendo assim, a escravização de negros/as africanos/as no Brasil se
constitui como uma das mediações que marcaram o processo da formação social do
país e que mesmo após do referido sistema, a população negra foi introduzida
numa sociedade cujo o novo modo de produção criou mecanismos para restrição
massiva dessa população ao mercado de trabalho fato que repercutiu diretamente
nas suas condições de vida e trabalho.
Nessa perspectiva, em pleno século XXI, ainda são verificados os reflexos
desse período. De acordo com o Retrato das Desigualdades Gênero e Raça (IPEA,
2003) ainda observa-se que pessoas negras, em maioria, desenvolvem no mercado
de trabalho atividades precarizadas e com menor proteção social em relação aos
trabalhos desenvolvidos por pessoas brancas.
Gráfico 01 Dados referentes à distribuição da ocupação de pessoas negras no Brasil em 2003

Fonte: Retrato das Desigualdades Gênero e Raça, IPEA, 2003.

Gráfico 02 Dados referentes à distribuição da ocupação de pessoas brancas no Brasil em 2003

Fonte: Retrato das Desigualdades Gênero e Raça, IPEA, 2003.

Diante destes dados, observa-se que já no presente século, após a


atura, ainda há desigualdades no que concerne aos postos
ocupados no mercado de trabalho entre pessoas negras e brancas. Nessa pesquisa
verifica-se que, enquanto 35% dos brancos trabalhavam com carteira assinada,
apenas 27% dos/as negros/as se encontravam na mesma situação. Ao passo que
22% de negros/as se centralizavam em atividades sem carteira assinada, somente
16% dos/as brancos/as se encontravam nessa condição.
Considerando que a inserção do indivíduo no mercado de trabalho formal
pode contribuir para uma mobilidade social a partir de um aumento da renda média,
em decorrência dos benefícios que são atrelados ao trabalho formal como férias
remuneradas, 13º salário, aposentadorias, pensões e licenças, vê-se que a população
negra ainda ocupa em maior índice atividades informais o que aponta para uma menor
expectativa de deslocamento para condições de vida relativamente melhores.
O Brasil foi o último país a eliminar no pano formal o sistema do trabalho
escravo, contudo essa medida perpassa debates atuais porque a abolição da
escravatura não eliminou todas as formas de opressão contra a população negra no
país. Negros/as no Brasil ainda vivenciam diariamente os reflexos contínuos da
sistemática precarização das condições materiais de vida e trabalho e violação de
direitos que outrora sofreram e marcou a formação social brasileira como resultado da
dinâmica capitalista.
Nesse sentido, o racismo contra os/as negros/as no Brasil permanece
vigente nas relações sociais. As marcas da exploração que perdurou por 350
(trezentos e cinquenta) anos se reeditou e passou a refletir na inserção acentuada da
população negra brasileira nos mais baixos índices de bem-estar social, cuja realidade
provém do racismo que se estruturou no país como meio de opressão à população
negra.
1888 as relações de
produção passaram por novas configurações, o que não eliminou todas as formas de
escravização. A exploração da força de trabalho saiu do modelo da servidão e passou
para as relações trabalhistas que incluiu o desenvolvimento de novas formas
degradantes de trabalho análogas ao escravo 9. Sendo assim, a Lei Áurea não se
preocupou em impedi berta fosse subalternizada e
passasse a viver em condições precárias de vida e trabalho.

9 Que ainda é uma realidade na sociedade brasileira e acomete em maior frequência trabalhadores/as
rurais que não possuem suas próprias terras.
Após a concessão dess
condição de pobreza e a intensa discriminação enfrentada. A população negra
recebeu o status de cidadania, mas sem alguma medida protetiva ou indenizatória
para viver socialmente de forma digna e inserir-se na sociedade sem sofrer algum tipo
de discriminação (IANNI, 1972). Nessa perspectiva, continuaram sem meios de
transformar sua condição de vida subalternizada e inserir-se formal e dignamente no
mercado de trabalho para obter melhores condições habitacionais, ultrapassar a
pobreza que os/as acometia, além de ter acesso à educação e erradicar o racismo,
fatores que ainda persistem até os dias atuais.
Esta realidade se constitui enquanto expressão da questão social que
deriva da contradição entre capital e trabalho na lei geral de acumulação, cuja
finalidade é o crescimento das taxas de lucratividade, desconsiderando a precarização
de vida dos sujeitos que não detém os meios de produção, mas que vendem sua força
de trabalho para garantir os meios materiais de sobrevivência.
Desse modo, vê-se que os reflexos do sistema escravocrata ainda
persistem e faz com que a população negra continue a vivenciar os duros resultados
deste período, haja vista que as bases fundamentais do sistema econômico posterior
não romperam com o racismo oriundo da escravização, mas o desdobrou. Os traços
reiterativos do período de escravização possibilitam a manutenção das diferenças
entre brancos/as e negros/as, que se repetem cotidianamente nas relações sociais.
Segundo Maringoni (
ão da população negra no
Brasil procedeu em razão da modernização conservadora que não alterou o sistema
latifundiário no país, estruturando assim o racismo como forma de discriminação: uma
mazela social que até hoje persiste. Com o avanço do sistema assalariado houve o
crescente fluxo de trabalhadores imigrantes, principalmente europeus, e passaram a
ocupar amplamente os espaços de trabalho que poderiam vir a ser dos recém

O fato é que diante da ausência de formas de integração da referida


população à sociedade mediante o acesso aos meios de produção, bem como a falta
de condição mínima de vida e habitação, a saída encontrada foi procurar moradia nas
regiões periféricas das cidades. A população negra ex-escravizada, além de sofrer
discriminação racial10, agrupou-se à população pobre do país, o que aumentou os
índices de mendicância.
Portanto, a nova dinâmica capitalista tornou quase inexistente a
possibilidade de ascensão social dos/as ex-escravizados. Seu trabalho havia se
tornado mais caro que o assalariado desde a proibição do tráfico negreiro em 1850.
Agora a nova necessidade do capital os/as levou a compor uma imensa
superpopulação relativa, jogados/as à própria sorte. Com isso, tem-se a reiteração da
ocupação por negros/as nos lugares mais subalternizados da sociedade, bem como
a persistência do seu estigma de inferioridade. Pois, ao passo que a vigente forma de
organização material se fundamenta na desigualdade, se efetuou a baixa tendência
desse grupo a alcançar mobilidade social e passar a ter condições de vida
relativamente melhores.
A multiplicação do capital apresenta uma interferência direta nas condições
materiais da classe trabalhadora, pois o modo de produção capitalista é regido pela
Lei Geral de Acumulação que, mediante a aquisição dos meios de produção e da força
de trabalho, necessita extrair a mais-valia a fim de alcançar seu objetivo: ampliar as
taxas lucrativas. A questão central é que para acumular mais capital, os salários pagos
aos/as trabalhadores/as dependem das modificações na composição do capital e todo
favorecimento destinado ao proletariado se dá pelo interesse em que possam se
reproduzir para continuar vendendo sua força de trabalho, pois toda atividade laboral
demanda esforço físico ou psicológico, e, portanto, necessitam dos mínimos meios de
reprodução (MARX, 1987).

[...] não se compra a força de trabalho para satisfazer as necessidades


pessoais do adquirente por meio dos serviços que ela presta ou do que ela
produz. O objetivo do comprador é aumentar seu capital, produzir
mercadorias que contêm mais trabalho do que ele paga e cuja venda realiza
também a parte do valor obtida gratuitamente. (MARX, 1987, p. 718-9).

Isso resulta numa polarização social: a burguesia que detém os meios de


produção, minoria na sociedade, enriquece e o proletariado que apresenta a grande
maioria da população, se insere num quadro de pauperização. Ou seja, a acumulação
capitalista engendra a contradição de produzir riqueza e pobreza simultaneamente e

10 a atribuição de tratamento diferenciado a membros de grupos racialmente identificados


(ALMEIDA, 2018, p. 25, grifos do autor).
de forma cíclica, pois o movimento de concentração do capital se realiza de forma
constante.

[...] o mecanismo do próprio processo de acumulação aumenta, juntamente

que transformam sua força de trabalho em força de valorização crescente do


capital que está sempre se expandindo. (MARX, 1987, p. 716).

De acordo com o autor, mesmo que haja trabalhadores/as inseridos/as no


mercado de trabalho, continuam sendo meio de valorização do capital. Os
pagamentos pela realização de suas atividades laborais não lhes dispõem as bases
necessárias para ascender à burguesia ou superar a situação de pobreza. Pagam-se
salários, mas mantêm-se a concentração de renda.
O capitalismo se funda na exploração do trabalho para alcançar o aumento
dos lucros com a obtenção da mais-valia. Durante a jornada de trabalho, a força de
trabalho despendida produz um valor muito superior ao necessário para a reprodução
das mercadorias, cujo excedente a mais-valia é apropriada pelo capitalista. Marx
divide o tempo de trabalho em necessário e excedente, onde o primeiro se refere à
produção que equivale ao salário recebido, já o segundo está ligado ao valor
excedente, parte importante ao capitalista (NETTO, BRAZ, 2006).
Nessa lógica de maior reprodução do capital, encontra-se uma
intensificação do ritmo de trabalho e que, consequentemente, acentua a exploração
dos/as trabalhadores/as, ou a redução do tempo de trabalho necessário frente a um
forte investimento em inovações tecnológicas como investida para otimizar a
expansão do valor excedente (NETTO, BRAZ, 2006). Contudo, é possível detectar
que em ambos os casos existe uma crescente exploração da força de trabalho com o
propósito de cada vez mais extrair lucros.
Toda essa abordagem se faz necessária para sinalizar que, sendo o modo
de produção capitalista alicerçado na desigualdade, aspectos como o étnico-racial
sofrem maior impacto dos efeitos das tendências do capitalismo. Considerando que o
racismo agrega práticas sociais de caráter discriminatório, tais práticas se estendem
à esfera o mercado de trabalho que tem repercussão direta com a renda e, por
conseguinte, reflete uma disparidade nas condições materiais de reprodução social
entre negros/as e brancos/as.
Portanto, a atura não foi suficiente para superar o
quadro social de subalternização a que negros/as foram submetidos/as, pois a base
da nova ordem emergente não permite o fim da exploração, mas se sustenta na
hierarquização social por meio da exploração da força de trabalho. Após a
promulgação da Lei Áurea em 1888 a forma da divisão de classes foi alterada, mas o
princípio da exploração se conservou, o que direcionou a população negra do Brasil à
base da pirâmide social.
O sistema econômico capitalista e sua dinâmica produtiva, pela lei geral de
acumulação, possibilitou a negação do acesso às condições mínimas de reprodução
social dos/as negros/as no Brasil. Isso significa afirmar que a estruturação do racismo
no país também é produto de ordem capitalista. Como assinala Almeida (2018), o
racismo estrutural se materializa quando a prática do racismo se torna um elemento
enraizado em determinada ordem social, ou seja, subjaz a estrutura e reproduz-se
cotidianamente por meio das relações sociais e/ou espaços institucionais mediante
violência explícita ou velada11.
Dessa forma, passa a se naturalizar em todas as esferas sejam sociais,
políticas, étnico culturais e até familiares e se forma como um processo orgânico de
político, cria as
condições sociais para que, direta ou indiretamente, grupos racialmente identificados
sejam discriminados de forma sistemática.
Ao discutir o racismo no Brasil como elemento estrutural das relações, é
imprescindível levar em consideração todo o processo histórico de negação de direitos
que a população negra, noutro tempo escravizada, foi constantemente submetida.
Pois, tratar do racismo estrutural é ir além das demonstrações individuais de racismo,
mas tratar de sua reprodução habitual na dinâmica social mediante diferenciadas
formas de acesso e ofertas de serviços ou benefícios pela população negra que
acabam por naturalizar as expressões de discriminação racial (IPEA, 2008, p. 7).
Desde o período escravocrata negros/as não
tiveram acesso a condições básicas para uma vida digna. Quando na condição de
escravos/as se constituíram como propriedade de seus senhores, sem possuir

das em ações como piadas, repetição


de estereótipos discriminatórios, gestos, entre outros. Pelo fato de não apresentar uma violência
explícita, como a física por exemplo, essas violências acabam por invisibilizar seu conteúdo agressor,
que inferioriza, discrimina e oprime os sujeitos.
qualquer tipo de direito; quando homens e mulh
trabalho, tiveram de sobreviver em meio à ausência total de ações governamentais
que lhes garantissem os mínimos de sobrevivência.

A falta de oportunidades educacionais, de políticas de proteção social e de


quase qualquer política de inclusão no mercado de trabalho formal da
população mais pobre foi tão eficaz para impedir a ascensão social da maioria
da população negra quanto a permanência do racismo. (IPEA, 2008, p. 8).

A falta de acesso à educação foi um fator predominante. No período de


escravização, a população escravizada era proibida de aprender a ler e escrever, já
na segunda metade do século XX ainda se verificava a diferença entre negros/as e
brancos que tinham tal aptidão, conforme mostra o gráfico abaixo.

Gráfico 03 Taxa de alfabetização entre negros/as e brancos/as aos 16 anos no Brasil em 1976

Fonte: IPEA, 2008, p. 9.

Diante desses números, diferença de um percentual de 14%, verifica-se


a escravatura os
reflexos desse período ainda vigoravam. Pela ausência de políticas e programas na
perspectiva de universalizar a educação, a população negra se encontrava em
desvantagem na esfera da alfabetização.
Apenas em 2006, a partir da Educação como política universal, essa
disparidade diminuiu para menos de 2% (IPEA, 2008, p. 9). Isso revela que o racismo
estrutural no Brasil implica em situar o grupo de brancos/as em situações de privilégio,
enquanto negros/as permanecem desprivilegiados/as social e economicamente, daí
se situa a importância da implementação de medidas por parte do Estado que invistam
no enfrentamento à desigualdade racial.
Além desse contexto viveram e ainda vivem sob o peso de estereótipos
negativos que se reiteraram com o passar dos anos e que também se alia a sua
condição de pobreza, decorrente do modo como foram integrados/as subalternamente
na sociedade em resposta às necessidades de reprodução do capital. Essa expressão
da questão social está envolvida nas relações sociais de produção e reprodução
social, que se inscreve nas bases econômica, ideológica e institucional. Assim, o
racismo se estruturou no Brasil e se expressa pela repetição das precárias condições
materiais de vida da maioria da população negra do país ao longo dos anos.

O escravismo não se tornou apenas um sistema econômico, mas também


existir na
sociedade por meio dos significados, símbolos e linguagens, subalternizando
até hoje os/as descendentes dos/as escravizados/as. Essa formação
econômica, social, cultural e política nunca foi desestruturada, perpetua-se
de várias maneiras, retratada pelas persistentes desigualdades sociorraciais
e por atitudes naturalizadas do racismo, estruturante da sociedade brasileira,
persistente na modernidade e obstáculo à igualdade. (MADEIRA,
MEDEIROS, 2018, p. 218)

O racismo, enquanto resultado concreto de um processo histórico e político,


também agrega a subjetividade dos indivíduos de determinada sociedade para a
manutenção da ideologia dominante, visto que é capaz de naturalizar as formas de
discriminação e violência existentes contra pessoas negras, ou seja, o racismo passa
a modelar o modo como os indivíduos encaram manifestações racistas
a vida

Também é imprescindível situar o racismo institucional que envolve a


relação entre o funcionamento de instituições e a concessão de privilégios e
desvantagens a pessoas brancas e negras, respectivamente. Nesse âmbito, o
racismo institucional também normaliza os padrões e molda os comportamentos dos
indivíduos para a manutenção da dominação branca.
Assim, a desigualdade racial é uma característica da sociedade não apenas
por causa da ação isolada de grupos ou de indivíduos racistas, mas
fundamentalmente porque as instituições são hegemonizadas por
determinados grupos raciais que utilizam mecanismos institucionais para
impor seus interesses políticos e econômicos. (ALMEIDA, 2018, p. 30)

O racismo institucional favorece o estabelecimento de parâmetros que

comportamento. Nessa perspectiva também a mídia possui um papel central no


reforço dos padrões estabelecidos, cujos indicam que a personalidade dos/as
negros/as principalmente a figura masculina condiz a pessoas violentas, enquanto
os/as brancos/as são os/as que possuem mais capacidade de liderança e
racionalidade, o que reforça a concepção marginalizada que se tem contra a pessoa
negra na perspectiva de manutenção da ideologia dominante mediante seus
mecanismos ideológicos.
Nesse contexto, o Estado se insere enquanto participante no processo de
legitimar e disseminar as normas estabelecidas, uma vez que se apresenta como
organismo reprodutor da divisão de classes, a fim de garantir os interesses da classe
dominante. Além disso, na teoria de Antônio Gramsci são descobertos
, organismos privados12 que funcionam por meio da difusão
ideológica. Seu exercício não se realiza pelo uso da repressão, e sim por participação
política mediante a propagação da ideologia dominante na perspectiva de reproduzir
as relações de produção capitalistas (COUTINHO, 1992).
o conceito
de Estado, onde
refere ao conjunto dos aparelhos repressivos e de violência que estão nas esferas
policial e militar; a segunda se constitui pelas organizações que elaboram e/ou
divulgam as ideologias, como as escolas, as Igrejas, os partidos políticos, a mídia,
entre outros (COUTINHO, 1992). Nesse sentido, os grupos reprodutores de opinião,
como os meios de comunicação de massa, podem se firmar enquanto meio
disseminador da ideologia burguesa até então predominante.

12Privados porque se inserem na perspectiva da propagação ideológica dominante de forma voluntária.


(COUTINHO, 1992, p. 76).
A mídia funciona no nível macro como um gênero discursivo capaz de
catalisar expressões políticas e institucionais sobre as relações inter-raciais,
em geral estruturadas por uma tradição intelectual elitista que, de uma
maneira ou de outra, legitima a desigualdade social pela cor da pele.
(SODRÉ, 2000, p. 243).

Nessa perspectiva, o racismo, expresso no estereótipo de inferioridade


atribuída às pessoas negras ganha, espaço na mídia brasileira. Aqui já é evidente que
as relações sociais no Brasil são perpassadas por estabelecimento de critérios étnico-
raciais, onde
midiática também reproduz essa lógica do domínio do/a branco/a e reforça o racismo
que, por vezes, se manifesta de forma velada, ou explícita e sobretudo ratifica a
desigualdade social entre negros/as e brancos/as.
Conforme demonstra Sodré (2000, p. 235):

[...] em 1986, o Centro de Pesquisa e Assistência em Reprodução Humana

pescoço, canivete na mão e uma tarja nos


que nasce para ser artista. Tem filho que nasce para ser advogado e vai ser
embaixador. Infelizmente, tem filho que já nasce marginal.

Este fato demonstra o quanto a imagem negra é desvalorizada e quase


sempre relacionada a sujeitos submissos ou violentos. Além disso, vê-se que os meios
de comunicação podem reproduzir e difundir a lógica racista, ou seja, propala a
ideologia dominante do paradigma branco. É sob esse prisma que, ainda no presente
século, se destaca o racismo quando a maioria das personagens como trabalhadores
mais precarizados, e pouco remunerados, ou sujeitos pertencentes ao mundo do
crime são interpretadas por pessoas negras nas telenovelas ou filmes brasileiros.
Com isso pode-se observar que a formação social do Brasil, alicerçada
numa economia de base escravista, contribuiu para a construção das relações sociais
do país: a existência de desigualdade entre pessoas brancas e negras, que se verifica
em suas condições de vida. O histórico de barbáries que foram efetivadas durante o
sistema escravocrata brasileiro contra a população negra, concebeu socialmente uma
atribuição ao/a negro/a como indivíduos inferiores.
Para além dessa questão que se centra no campo subjetivo e social, a
questão da desigualdade racial no Brasil também se encontra nas bases econômicas
da dinâmica capitalista no Brasil, cujo sistema, por meio de sua lei geral de
acumulação, cria mecanismos de reprodução do pensamento racista que interdita a
população negra de superar sua condição de pauperismo.
Toda essa construção se agravou a partir da necessidade de generalização
do trabalho livre, após a abolição da escravatura, pois a forma como essa população
foi inserida na sociedade industrial culminou na sua pauperização absoluta e na falta
de perspectiva de mobilidade social, cuja discussão será objeto de análise do próximo
capítulo.
CAPÍTULO 02 - O Trabalho livre, a questão social e a particularidade
da questão racial no Brasil

Tido refletido sobre o período colonial, sua organização econômica com o


predomínio do trabalho escravo, este segundo capítulo traz a discussão da dialética
entre o arcaico e o moderno que se caracteriza como traço da formação
socioeconômica brasileira, decorrente do processo de colonização realizado por
Portugal no Brasil. Pretende-se também, apontar elementos da formação capitalista
no país e, por conseguinte, como as novas necessidades do capital, agora por meio
do trabalho livre, encaminhou os/as negros/as ex-escravizados/as ao pauperismo e a
inserção massiva na superpopulação relativa, sem oferecer-lhes possibilidades de
superação dessa condição.
Além do mais, será necessário indicar o surgimento da questão social no
Brasil, produto das relações sociais capitalistas, cuja base é a contradição
fundamental entre uma produção coletiva da riqueza e sua apropriação privada pelos
detentores dos meios de produção que gera essa disparidade de condições materiais
de vida, como pode-se observar na discrepância entre as populações branca e negra
no país que vem se refazendo até os dias atuais.
Cabe ressaltar que, é nesse contexto em que se engendra a questão racial
no país como expressão da questão social, visto que estão imbricadas, pois a
população negra brasileira sofre em maior proporção as consequências sociais que o
modo de produção capitalista gera em seu processo de acumulação.

2.1 A reiteração das características econômicas do colonialismo e as novas


necessidades do capital

Dito isto, será discutido agora o caráter econômico brasileiro, determinado


pelo capitalis
sem transformações revolucionárias.
Recordemos as características centrais do fenômeno: as transformações
ocorridas em nossa história não resultaram de autênticas revoluções, de
movimentos provenientes de baixo para cima, envolvendo o conjunto da
população, mas se processaram sempre através de uma conciliação entre os
representantes dos grupos opositores economicamente dominantes,
conciliação que se expressa sob a figura política
(COUTINHO, 2000, p. 50).

Nessa discussão nota-se que a economia brasileira buscou se adequar às


necessidades do capital, subordinando-se a grupos exteriores e economicamente
dominantes, resultando em reformas horizontais que contribuíram no processo de
agudizamento da precarização das camadas sociais empobrecidas, como da
atura. O autor afirma que o contrário
disso seria uma modernização democrático-revolucionária, capaz de consolidar um
mercado interno e centrar-se nele para evitar a dependência ao exterior.
Em decorrência disso, o Brasil buscou vetar as formas de organização
coletiva em prol da consolidação de uma democracia no país, na perspectiva de
manutenção dos interesses das elites do país. Isso refletiu diretamente na forma de
construção da organização coletiva brasileira. Onde se verifica como consequência
dessa relação um enfraquecimento na organização popular e seu isolamento dos
processos políticos.
O sistema colonial contribuiu para que o Brasil se desenvolvesse
tardiamente, pois enquanto o país ainda desenvolvia a produção agrária, outros
países da Europa desenvolviam as forças produtivas capitalistas, o que gerou um
atraso da introdução capitalista no país. Isso fez com que, a partir da adesão do
pensamento liberal, ainda permanecessem as desigualdades nos processos de
produção, características do período escravocrata

econômica do Brasil (conservadora) a partir do liberalismo burguês, reprimindo e


excluindo a massa popular das decisões nos âmbitos político e econômico.

A inexistência de condições históricas que direcionassem a uma ruptura


concreta, de cunho revolucionário, com a estrutura socioeconômica colonial,
possibilita à burguesia latifundiária que assuma o processo da independência
e, posteriormente, crie um aparelho de Estado, dentro de suas diretrizes
ideológicas, com o cuidado permanente de afastar quaisquer iniciativas que
apontassem para o perigo de transformações mais radicais. (MAZZEO, 2015,
p. 83).
Isso reforça a tese do traço do desenvolvimento desigual e combinado no
tocante ao Brasil, sobremaneira, sustentado por uma cultura colonial de dominação
aliada ao progresso industrial, ou seja, o país se inseriu na expansão do modo de
produção capitalista, mas manteve as formas tradicionais de organização social pela
ausência de uma ruptura com a estrutura do colonialismo.
É justamente nessa perspectiva que o Estado passou a direcionar suas
ações: afastando qualquer possibilidade de organização coletiva que se voltasse para
uma transformação radical da sociedade, como é o caso da criminalização de
qualquer corporação reivindicatória. Por esta razão o Estado brasileiro se formou

elementos ideológicos dominantes característicos da formação social do país


(MAZZEO, 2015).
Ainda seguindo o debate sobre o caráter conservador da modernização no
Brasil, Santos (2008) aponta que a formação dos latifúndios contribuiu para a
formação das classes dominantes a partir da propriedade agrária. Contudo, a autora
afirma que mesmo com o posterior desenvolvimento do capitalismo no país, até
mesmo com a fase da industrialização pesada, isso não representou transformações
no que concerne à estrutura fundiária. Como é o caso do surgimento das

modernização do agronegócio se faz, no entanto, sob a mesma base sócio-política (a


grande propriedade territorial) e com a mesma debilidade da modernização industrial
SANTOS, 2008, p. 64).
Como visto, percebe-se que a formação do Brasil foi marcada por
continuidades. Não houve rupturas radicais, mas reformas lentas e de caráter
conservador. Nesse contexto também se insere o processo de abolição da
escravatura no país, cujo evento não eliminou as desigualdades socioeconômicas
entre brancos/as e negros/as, como também não propiciou uma transformação na
estrutura econômica pelo contrário, se manteve dependente ao comércio externo
pela agroexportação e continuou a sustentar as relações sociais entre negros/as e
branco/as na via da desigualdade ao longo doa anos, até os dias de hoje.
Isso demonstra que o desenvolvimento do capitalismo brasileiro, mesmo
inserido no capitalismo monopolista, manteve bases passadas não possibilitando ao
país uma transformação econômica capaz de manter-se independente dos países
centrais ou eliminando a lógica da grande concentração de terras. A valorização do
capital não ocorreu numa perspectiva de investimento interno, mas de dependência
ao exterior (SANTOS, 2008).
Outro aspecto trazido por Santos (2008, p. 66-7) acerca das
particularidades do capitalismo brasileiro, dependente e remoto, combina aos
interesses da burguesia dominante e sua busca pelo controle do Estado, que

classes dominantes brasileiras, no interior de suas diferentes frações, desenvolvem


intensos processos de luta e acomodação de interesses econômicos disputando

Isso repercutiu, portanto, na formação burguesa brasileira, pois, segundo


Santos (2008, p. 68):

[...] os interesses de classe que estão na origem da burguesia brasileira nada


têm a ver com os ideais revolucionários, ou mesmo reformistas, da burguesia
pensada classicamente, ou seja, dentro do padrão europeu de transição ao
capitalismo.

De acordo com a compreensão acima, nota-se que a burguesia no Brasil,


se distancia do modelo burguês europeu dotado de ideais reformadores, pois se
incorporou subalterna e tardiamente ao capitalismo industrial. Fator que corroborou
na manutenção dos componentes da anterior ordem senhorial e não permitiu uma
unificação da classe burguesa, mas se dividiu entre agrária e industrial (SANTOS,
2008).
Outro aspecto levantado pela autora em questão sobre a peculiaridade do
capitalismo tardio no Brasil diz respeito à formação do mercado de trabalho e nas
condições existentes no processo de substituição do trabalho escravo pelo
assalariado na busca pela consolidação do capitalismo monopolista. Cujo estágio
capitalista analisado por Netto (2005) se opera na manutenção das formas originais
de acumulação de capital, sem reformas estruturais, centralizando investimentos no
exterior.
Além disso, no capitalismo monopolista o Estado passou a direcionar suas
ações no sentido de preservar os superlucros dos monopó
políticas do Estado imbricam-se organicamente com as suas funções econômicas
(NETTO, 2005, p. 25, grifos do autor); ou seja, o Estado se opera voltado a atender
os objetivos econômicos da burguesia dominante e não em prol de interesses
populares. Nessa perspectiva, pode-se inferir que o capitalismo se dirige para sua
própria expansão, o que gera desigualdade.
Portanto, o Estado quando funcional ao sistema não estabelece algum
compromisso pela igualdade socioeconômica. Daí é possível entender o porquê da
ausência de proteção social à população ex-cravizada: o interesse capitalista se dá
pelo crescimento de suas produções, logo não havia o objetivo de oferecer aos/as
negros/as meios de superarem suas péssimas condições socioeconômicas.
Nesse sentido, Santos (2008) afirma que essa particularidade se justifica
na formação do liberalismo brasileiro, pois, enquanto nos países centrais este se
voltou à separação entre os interesses burgueses e o Estado, no Brasil se formou
pelos ideais senhoriais. Porém, não foi assimilado imediatamente a todo o
pensamento dominante. Além disso, não propôs transformações nas estruturas social
e econômica do país.

[...] o Estado funcional ao capitalismo monopolista é, no nível das suas


da burguesia monopolista
opera para propiciar o conjunto de condições necessárias à acumulação e à
valorização do capital monopolista. (NETTO, 2005, p. 26).

Nessa perspectiva, o Estado burguês se centra na ampliação da


reprodução do capital criando condições propícias à sua valorização. O autor ressalta
que o Estado capturado pelos ideais monopolistas pode atender demandas
socioeconômicas da população, mas que este não se verifica como uma direção
peculiar, pois as respostas sociais ocorrem quando podem atender conjuntamente, de
forma direta ou indireta, à expansão de lucros (NETTO, 2005).
Compreendido o papel legitimador do Estado brasileiro na ampliação da
reprodução do capital, faz-se necessário referenciar o processamento do trabalho livre
no Brasil, m-se
expressões da questão social mediante o desenvolvimento do pauperismo e da
superpopulação relativa no Brasil.
Conforme já mostrado, na segunda metade do século XIX, em 1888, houve
embora muitos/as ainda tenham
permanecido trabalhando nessa condição, por não receberem nenhum tipo de
proteção social após a promulgação da Lei Áurea e não terem como prover suas
necessidades objetivas. O fato é que no período citado o Brasil sofreu modificações
econômicas e sociais, já discutidas na fase inicial deste capítulo.
Durante a metade do século XIX o comércio internacional apresentou um
crescimento, o que repercutiu diretamente no Brasil, visto que isso possibilitou o
fomento das exportações nacionais. Isso significou um impulso para acelerar as
produções agrícolas. Nesse momento o café começou a emergir como a principal
fonte dessa produção, chegando a representar mais de 70% do valor das exportações,
o que significava alto lucro para o país e, portanto, um promissor investimento
(PRADO JUNIOR, 1994, p. 167).
Paralelamente à ascensão da economia cafeeira, as lavouras tradicionais
de cana-de-açúcar, algodão e tabaco do país decaíram devido à conjuntura
internacional, pois alguns países que antes eram consumidores desses produtos
passaram a ser concorrentes, principalmente com a produção do açúcar. Isso levou a
uma grande queda de exportação e consequentemente a baixa de lucros: já em
meados desse século estava colocado em quinto lugar entre os produtores mundiais
de cana-de-açúcar, com menos de 8% da produção total (PRADO JUNIOR, 1994, p.
158).
Com o declínio dessas exportações, o comércio cafeeiro foi ganhando
espaço nas produções brasileiras para o comércio internacional, principalmente nos
Estados Unidos, e passou a prosperar rapidamente. A região que protagonizou a
expansão da produção do café foi o vale do Rio Paraíba, localizado entre São Paulo
e Rio de Janeiro, devido suas características naturais propícias ao plantio do produto
(PRADO JUNIOR, 1994, p. 162).
O comércio cafeeiro vivenciou seu ápice de desenvolvimento, mas em
decorrência da alta exploração, as reservas naturais começaram a se esgotar: [...]
bastaram uns poucos decênios para se revelarem rendimentos aceleradamente
decrescentes, enfraquecimentos das plantas, aparecimento de pragas
PRADO JUNIOR (1994, p. 162,164). Mas, Campinas, localizada no oeste da província
de São Paulo, foi uma região que conseguiu reerguer a economia da produção do
café e veio a se tornar um centro produtor, amparando a riqueza do país. Desse modo,
indica Prado Junior (1994, p. 167):
A lavoura do café marca na evolução econômica do Brasil um período bem
caracterizado. Durante três quartos de século concentra-se nela quase toda
a riqueza do país; e mesmo em termos absolutos ela é notável: o Brasil é o
grande produtor mundial, com um quase monopólio, de um gênero que
tomará o primeiro lugar entre os produtos primários no comércio
internacional.

Nesse sentido, nota-se o quanto a economia cafeeira significou para o


Brasil, em termos de crescimento econômico no comércio internacional. O autor em
questão afirma que essa economia foi tão próspera, que originou a última das três
aristocracias do país, pois os fazendeiros de café formaram uma elite social brasileira.
Contudo, por questões de instabilidade econômica, no supracitado período
a economia cafeeira, até então promissora, passou a entrar em crise. Desta vez
decorrente da superprodução que passou a marcar a economia brasileira após o ciclo
de crescimento produtivo (PRADO JUNIOR, 1994). A superprodução é caracterizada
pelo período em que a produção se torna maior que a capacidade de venda, dessa
forma o produto não encontra escoamento e acaba formando muitos estoques, o que
gera queda nas taxas lucrativas (NETTO, 2005).

[...] em 1896 se observarão os primeiros sinais de desequilíbrio. Era o


resultado das grandes plantações efetuadas nos primeiros anos da
República, e que começavam agora a produzir [...]. Verificam-se então os
sintomas clássicos de superprodução: declínio de preços, formação de
estoques invendáveis. (PRADO JUNIOR, 1994, p. 228).

Portanto, o fim do século XIX, após a prosperidade da produção do café no


Brasil, demarcou o declínio da economia cafeeira, onde o país sofreu uma queda no
preço do café e teve grande dificuldade de venda. Embora houvesse o predomínio de
novas formas de produção. O referido autor afirma que já no século XX em 1925
o grande e contínuo excedente do produto obrigou sua destruição em grande escala.
Diante dos ciclos de crise no comércio cafeeiro, os fazendeiros buscaram
alternativas para retomar a alta exportação do café e restabelecer seus lucros a partir
de planos de valorização. Nessa conjuntura, grupos como os banqueiros aproveitam
a oportunidade dessas iniciativas para obter vantagens econômicas por meio de
financiamentos. O Brasil passou a se inserir no sistema especulativo com vistas a
aumentar o preço do produto, mas com a queda da Bolsa de Valores no final da
década de 1920, a economia cafeeira foi fortemente abalada e não conseguiu reverter
os danos sofridos financeiramente (PRADO JUNIOR, 1994).
Nessas crises cíclicas, o café passou a desocupar o lugar central que
possuía na economia brasileira. O país já vivenciava um progresso econômico voltado
para transição do capitalismo concorrencial à organização do capitalismo monopolista.
Ainda no período de ascensão da economia cafeeira, o Brasil recebeu grande número
de italianos, principalmente no Estado de São Paulo devido às consequências
econômicas que a unificação da Itália havia deixado que contribuíram para a
expansão da produção do café no país.
Como aponta Furtado (2007), os imigrantes europeus chegavam às
plantações de café com todos os gastos custeados e moradia garantida até a colheita,
sendo arcados pelo seu governo. Detinham condições de suprir suas necessidades e
de sua família, sua dedicação estava voltada para o trabalho que seria a oportunidade
de reconstruir suas vidas.
Enquanto isso, da escravização sofria forte
discriminação, tendo sua força de trabalho rejeitada porque havia a preferência pela
força de trabalho europeia pois eram considerados mais qualificados ao trabalho,
além de serem funcionais ao processo de branqueamento da sociedade, orientado
pela burguesia dominante. Dessa maneira, a ausência de trabalho à população negra
incidiu na precarização de suas condições de sobrevivência, sem que houvesse, na
contextualidade, nenhum tipo de proteção social que lhe assegurassem direitos.

À semelhança de uma reforma agrária, a abolição da escravatura teria de


acarretar modificações na forma de organização da produção e no grau de
utilização dos fatores. Com efeito, somente em condições muito especiais a
abolição se limitaria a uma transformação formal dos escravos em
assalariados. (FURTADO, 2007, p. 199).

Portanto, a abolição da escravatura não foi um evento linear que


subitamente transformaria o escravo em um trabalhador assalariado e regulamentado.
Para isso, seria necessária a garantia de dignas condições de vida, capaz de
ultrapassar que de fato pudesse integrá-los à
sociedade, além de garantir-lhes proteção social para que pudessem de fato atingir a
condição de cidadadãos/ãs.
2.2 A generalização do trabalho livre e a questão social: a população negra no
contexto do pauperismo

Dessa maneira, cabe ressaltar que a inserção do trabalho livre no Brasil


estabeleceu um processo de subtração da força de trabalho da população negra ex-
escravizada. Trabalhadores/as que antes contribuíram massivamente para a geração
de riqueza, agora não mais se figuravam como adequados/as à nova dialética do
trabalho. Tiveram sua força de trabalho rejeitada na nova organização de produção e
foram refutadas as con a obtenção de seu
sustento.
Desse modo, Fernandes (2008, p. 52) revela sobre o surgimento do
trabalho livre e a posição ocupada pelos/as negros/as ex-escravizados/as na nova
ordem social brasileira, firmada na compet

uição

Assim, houve o ch uiu como um


marco desse período. Esta época compreende a substituição do trabalho escravo
rabalho foi realizado
por seres coisificados, [...] seres aniquilados pela compulsão violenta da escravidão,
para os quais só resta a fuga o pelo trabalho livre
assalariado com a figura central do branco imigrante europeu, formando assim o
mercado de trabalho livre no país.

Em suma, a sociedade brasileira largou o negro ao seu próprio destino,


deitando sobre seus ombros a responsabilidade de se reeducar e de se
transformar para corresponder aos novos padrões e ideais de ser humano,
criado pelo advento do trabalho livre, do regime republicano e do capitalismo.
(FERNANDES, 2008, p. 35-6).

Os/as ex-escravizados/as, desempregados/as, chegavam quase ao dobro


do número de trabalhadores livres. Moura (1977, p. 31) apresenta dados de J. M.
Camargo Júnior (1935)13 que comprovam essa afirmação: em 1882 nas Províncias

J. M. Camargo Júnior, A Abolição e suas causas in Estudos Afrobrasileiros, Rio de Janeiro, 1935
apud Moura, 1977, p. 31.
São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Ceará e Rio de Janeiro o quantitativo
de trabalhadores livres era de 1.433.170 (um milhão, quatrocentos e trinta e três mil e
cento e setenta), ao passo que o número de desocupados correspondia a 2.822.583
(dois milhões, oitocentos e vinte e dois mil e quinhentos e oitenta e três).
O alto número de desemprego que atingia a população negra nesse
período revelava uma expressão da questão social, a qual é definida por Iamamoto
(2001,
engendradas na sociedade capitalista madura, impensáveis sem a intermediação do
Dessa forma, a generalização do trabalho livre, ligada à necessidade do
capitalismo em expandir suas produções de modo a obter lucros crescentes, criou
condições que destituíram as pessoas negras no Brasil das condições básicas para
sua reprodução social.
A predominância do imigrante como trabalhador assalariado surgiu
também como uma forma de discriminação contra a população negra cabe destacar
que os próprios italianos vinham da Itália carregando a concepção de inferioridade de
negros/as. Além disso, essa imigração era encarada como um progresso econômico
para o país, pois se apresentavam funcionais ao desenvolvimento industrial. Tudo isso
gerou uma visão de competência ao trabalho aos imigrantes e de incompetência à
população ex-escravizada, o que reforçou os preconceitos já generalizados no
período da escravização. Centralizou-se no imigrante europeu a imagem do
trabalhador ideal (SANTOS, 1997).
Isso deslocou os/as negros/as para a periferia do novo modo de produção,
marginalizando-os/as economicamente14 -se, em consequência, uma grande
massa marginalizada que, ao sair das senzalas, não tinha condições para ingressar
no processo de produç
(MOURA, 1977, p. 30), pois as atividades que antes realizavam nas lavouras não os
haviam especializado para o trabalho industrial, tampouco possuía bens que os
permitissem ser absorvidos pelo mercado da nova organização econômica.
Essa nova forma de organização, mediante a absorção da força de trabalho
imigrante em detrimento da negra se relacionou ao processo de formação,

Nessa perspectiva tornaram-se funcionais à emergente ordem econômica. Tiveram de submeter-se


aos trabalhos que lhes foram possíveis, e essa disponibilidade imediata às atividades subalternas
acabou reverberando sobre a precarização das condições de trabalho e de vida dos imigrantes, pois
estes recebiam uma baixa remuneração pelos trabalhos realizados.
denominado por Marx
processo de acumulação o capital adicional passa a recrutar cada vez menos
trabalhadores. Isso ocorre porque o capitalismo busca investir em insumos
tecnológicos a fim de diminuir os custos de trabalho e aprimorar suas técnicas, o que
reverbera na menor necessidade de trabalho vivo, ou seja, convoca menos força de
trabalho e aumenta a superpopulação relativa.
Netto e Braz (2006), na mesma perspectiva, dialogam com o que Engels

trabalhadores/as que não encontram compradores da sua força de trabalho e ficam


subjugados/a ao desemprego massivo, tal como ocorreu com a população ex-
escravizada. O exército industrial de reserva é apropriado pelo capitalismo para as
baixas do valor dos salários, visto que nesse momento há um aumento da procura por
trabalho.

com que, no desenvolvimento da produção capitalista, a demanda por máquinas,


instrumentos, instalações, matérias e insumos seja maior que a demanda da força de
NETTO, BRAZ, 2006, p. 133). Ou seja, na dinâmica capitalista há uma
desproporção entre a necessidade de venda da força de trabalho e a oferta de postos
de trabalho, gerando um excedente de trabalhadores. Não diferentemente ocorreu
durante o início da generalização do trabalho livre no Brasil, onde a população negra
não teve sua força de trabalho integrada ao novo sistema, o que acarretou na sua
inserção ao pauperismo.
Moura (1977) levanta duas perspectivas de análise acerca da não
integração social do negro após o abolicionismo. Na primeira, o autor aponta que o
sistema escravocrata inscrevia relações de produção alienantes, pois limitava
estruturalmente o interesse dos/as escravizados pelas mercadorias produzidas por
eles/elas mesmos/as.

Isto o alienava de tal forma que o impedia de ver-se e elaborar valores de


contestação globais e racionais ao sistema. [...]. Definia-se, assim, em face
da própria situação do escravo, um pensamento meramente fragmentário,
que não lhe dava condições de romper o círculo que o prendia à estrutura
[...]. (MOURA, 1977, p. 29, grifo do autor).

Dessa forma, mesmo enquanto produtores, os/as negros/as


escravizados/as se encontravam desassociados de sua potencialidade criadora, além
do que não podiam vender sua força de trabalho, pois eram eles mesmos as
mercadorias dos seus senhores. Tudo isso fazia com que seu pensamento não se
estruturasse para busca da superação dessa realidade, pelo contrário, se
fragmentava, fazendo-os permanecer nesse processo de estranhamento à sua
produção.
O segundo aspecto levantado pelo autor diz respeito à ausência de
envolvimento efetivo no novo mercado de trabalho, como trabalhadores livres. Isso
decorreria da rotina evidenciada no trabalho escravo, onde não se aproximavam de

habitualmente não os levaria a se engajar culturalmente na venda de sua força de


trabalho para conseguir seu sustento (MOURA, 1977).
Por essa razão, o autor afirma que esta realidade representou uma
pois o crescimento populacional de imigrantes para o
atendimento das novas exigências do capital não se deu por escassez da população
brasileira, mas pela falta de absorção da força de trabalho dos/as negros/as no novo
modelo econômico brasileiro.

Diante dos mecanismos de desenvolvimento que foram libertados, houve um


movimento de proteção a esses imigrantes, através de uma política dirigida e
de planos integrativos, enquanto o ex-escravo era sistematicamente repelido
daqueles setores mais dinâmicos da economia em desenvolvimento.
(MOURA, 1977, p. 32).

Assim a população negra foi se configurando na superpopulação relativa


junto aos trabalhadores nacionais que também já não tinham tanto espaço no
mercado de trabalho em decorrência da massiva presença de europeus, sobretudo
italianos sobrando-lhes o desemprego, subemprego e a forte destituição das
condições de sobrevivência.
Netto e Braz (2006, p. 134) trazem três níveis existentes na superpopulação
relativa: a) os flutuantes que ora estão inseridos no mercado de trabalho, ora se
encontram desempregados; b) os latentes, presentes na área rural, mas que precisam
migrar para as zonas industriais em busca de melhores condições de assalariamento;
c) os estagnados, que correspondem ao contingente que não consegue um emprego

miséria e no pauperismo, trabalhadores aptos, mas que há muito não encontram


emprego, [...]. .
Diante dos elementos discutidos até agora, pode-se situar os/as negros/as,
durante o processo de transição ao trabalho livre, como aqueles/as que se encontram
na base do desemprego massivo, totalmente desprovidos/as das condições mínimas
para sua sobrevivência. Inseridos/as na lógica da desigualdade do capitalismo, sob a
forma da pauperização absoluta15.
Fernandes (2008) traz números sobre a distribuição de imigrantes na
cidade de São Paulo, no fim do século XIX, que chegava a superar o número de
pessoas negras e de brasileiros/as natos/as, conforme o quadro abaixo:

Quadro 01 Indicadores quantitativos da população de imigrantes europeus em São Paulo, final do


século XIX, segundo a nacionalidade

NACIONALIDADE QUANTIDADE
Italianos 44.854

Portugueses 14.209

Espanhóis 4.727

Alemães 2.320

Franceses 1.107

Austríacos 948

Fonte: FERNANDES, 2008, p. 40.

Os números trazidos no quadro possibilitam a reflexão das desvantagens


que os/as negros/as sofreram nesse processo competitivo com a forte presença dos
imigrantes e o aproveitamento da sua força de trabalho, haja vista os elementos já
discutidos. Fernandes (2008) aponta um fato marcante nesse período: antes da
chegada massiva de europeus, os/as escravizados/as desenvolviam atividades, que,
embora fossem insuficientes para seu pleno sustento, se configuravam como uma
forma de conseguir o mínimo à sobrevivência. Todavia, ao chegarem ao Brasil, os

15 A pauperização absoluta registra-se quando as condições de vida e trabalho dos proletários


experimentam uma degradação geral: queda do salário real, aviltamento dos padrões de alimentação

p.135).
imigrantes ocuparam espaços no artesanato e comercialização de miudezas que
antes eram ocupados pela população negra que havia sido escravizada.
Fato esse que aprofundou a precarização a que estavam submetidos/as,
pois não possuíam recursos para preservar suas posições de trabalho pela ausência
de elementos materiais para uma mobilidade social. O que lhes restou foi lutar em
espaços periféricos por posições subalternas, reiterando as condições precárias de
sobrevivência (FERNANDES, 2008). Esse traço de subalternidade que atingiu
negros/as no Brasil permaneceu ao passar dos séculos. Ainda hoje se verifica a
maioria da população negra ocupando posições de pobreza, desemprego, falta de
acesso à educação e serviços básicos, conforme discussão do capítulo posterior.
Nessa perspectiva vale destacar também que as particularidades regionais
de desenvolvimento econômico no Brasil repercutiram na maneira como o/a negro/a
se inseriram socialmente. Nas regiões periféricas do país, onde havia baixos índices
de crescimento, a população negra já não era tão numerosa, pois antes da abolição
muitos/as haviam sido vendidos/as como escravos/as para senhores do Sudeste.
Diferente de regiões mais desenvolvidas, como São Paulo, em que o número era
muito superior, a economia evoluiu de forma acelerada, requisitando mais força de
trabalho, frente ao intenso fluxo de imigrantes que dispensou a população ex-
escravizada. Portanto, de acordo com a região em que viviam, o processo de
pauperização dessa população foi mais ou menos acentuado (MOURA, 1977).
Dessa forma, o processo transitório para o trabalho livre no Brasil não se
conformou por uma transformação na forma de organização social e econômica, mas
resguardou o histórico de desigualdades no país. Todo esse complexo social tendeu
a formar um processo cíclico de pauperismo decorrente dessa desigualdade
socioeconômica.
A tendência foi ter cada vez menos meios de superação da condição
subalternizada em que se encontravam, visto que não houve mecanismos que lhes
disponibilizassem as condições necessárias para sua sobrevivência e reprodução
enquanto força de trabalho. Essa massa populacional passou, mais uma vez, a viver
em condições subumanas, agregando os índices de suicídio, mendicância, alcoolismo
e criminalidade (MOURA, 1977).
Na medida em que não eram absorvidos pelo mercado de trabalho,
aumentava a condição de pobreza da população negra no país. Nessa dinâmica se
deslocaram para a condição de pauperismo, categoria que se refere à acentuação e
generalização da pobreza sem nenhuma forma de proteção social. Além disso,
sofreram e ainda sofrem fortemente o processo da criminalização por suas
condições.
Todas essas condições propiciaram o aumento da discriminação que já
sofriam. Passaram a ser estigmatizados/as como problemáticos/as, pois havia, no
pensamento geral, uma subtração da relação entre o meio social e o indivíduo. Foram
fortemente culpabilizados por suas precárias condições de vida e trabalho. Havia a
concepção de que suas realidades eram consequências da falta de interesse ao
trabalho e preferência pela vadiagem e violência. Por isso, a partir da nova
organização econômica os/as negros/as sofreram (e ainda sofrem) sistematicamente
um processo de inferiorização na estrutura social mediante suas condições precárias
e subalternizadas de vida e trabalho.
Iamamoto (2001) levanta um a

enfrentadas. Cuja análise se faz a partir de seu afastamento aos processos sociais
que incidem sobre a realidade do indivíduo.

Deriv
indivíduo isolado, perdendo-se a dimensão coletiva e isentando a sociedade
de classes da responsabilidade na produção das desigualdades sociais. Por
uma artimanha ideológica, elimina-se, no nível da análise, a dimensão
coletiva da questão social, reduzindo-a a uma dificuldade do indivíduo.
(IAMAMOTO, 2001, p. 18, grifos da autora).

Conforme explicitado pela autora, a questão social em suas expressões


está sujeita a ser encarada como uma questão individual, esvaziada de sua origem
inerente ao capitalismo, que resulta de uma estratégia ideológica para retirar desta
ordem de produção a culpabilidade pelas desigualdades existentes na sociedade de
classes. Essa análise fragmentada e equivocada se verificou na forma como os/as ex-
escravizados/as foram absorvidos/as estruturalmente na sociedade após o fim do
sistema escravocrata e adoção do trabalho livre. E também como ainda nos dias
atuais a população empobrecida sobretudo a negra, ainda é constantemente
responsabilizada por suas condições sociais e econômicas.
2.3 A questão racial enquanto expressão da questão social no Brasil

Perante esse processo e as expressões das condições de vida a que essa


população foi lançada, sua imagem passou a ser representada negativamente e
tornaram-se
que viviam e, movidos pelo desejo de superá-la, organizavam medidas de protesto,
eram considerados r e só faziam

Ianni (1972) mostra dados provenientes de um questionário aplicado a


alunos/as das escolas secundárias de Florianópolis 16, onde foi possível obter
verbalizações de estereótipos atribuídos às pessoas negras e brancas a partir de
questionamentos acerca de qualidades e defeitos desses grupos. Tais dados nos
indicam como a população negra foi negativamente estereotipada:

Quadro 02 Dados de Especificação dos Estereótipos Desfavoráveis atribuídos ao/a negro/a no


Brasil, segundo a verbalização de estudantes brancos/as do ensino secundário da cidade de
Florianópolis17

VERBALIZAÇÕES NEGRO/A MULATO/A18 BRANCO TOTAL


Brigão, desordeiro 48 34 18 100
Submisso, serviçal 68 30 02 100
Ignorante, analfabeto 59 33 08 100
Malcheiroso, sujo 73 27 - 100
Macumbeiro, supersticioso 70 30 - 100
Feio 69 31 - 100

Fonte: Elaboração própria a partir de IANNI, 1972, p. 144.

16 A pesquisa realizada obteve uma amostra de 552 questionários.


17 Os dados são referentes a percentagens.
18

esta terminologia usada para designar pessoas descendentes de brancos/as e negros/as é


interpretada, por algumas vertentes de pensamento, como pejorativa. O termo em questão advém da
animal híbrido e estéril resultante do cruzamento entre cavalo/égua com jumenta/o
o que adquire um tom depreciativo dada sua associação a um animal. Portanto, o vocábulo é encarado
como um termo racista por muitos/as.
Como se pode observar, a maioria absoluta das verbalizações de cunho
negativo foram voltadas para negros/as e mulatos/as. Nessa pesquisa os/as
negros/as estiveram mais à frente quando considerados submissos, inferiores e feios.
Enquanto as verbalizações no tocante à intelectualidade se mostraram favoráveis às
pessoas brancas. Foram consideradas as mais inteligentes e com bom
comportamento, bem como aquelas que correspondem ao ideal de beleza, ao passo
que o/a negro/a agrega a feiura, aquele/a que ninguém quer ser.
A discriminação presente nas verbalizações acima, se apresenta de forma
aberta como resultado do racismo contra negros/as. Isso diz respeito à visão
hierárquica que foi construída entre negros/as e brancos/as, onde estes últimos estão
acima intelectual e moralmente das pessoas negras. O sistema escravocrata,
apoiado principalmente em teorias racistas, emitiu que inteligência, educação e boa
conduta eram virtudes presentes nas pessoas brancas, pois negros/as se constituíam
por indivíduos violentos, que não queriam mudar de vida. Sendo, portanto, os/as
próprios/as responsáveis por sua condição social e econômica.
Diante das atrocidades já apresentadas a que eram submetidos/as
enquanto escravos/as em suas árduas rotinas de trabalho, quando rebelavam-se
contra as violências sofridas eram apontados como violentos. Essa conotação se
zação. Como é possível perceber, em maior
número, a atribuição dessa categoria se direciona vigorosamente às pessoas negras.
Outro aspecto que merece destaque diz respeito à indicação de que
negros/as são mais trabalhadores, no sentido daqueles que possuem mais eficiência
ao trabalho braçal, não propenso à intelectualidade, mas à labuta. Encontra-se aí o
quanto lhe foi (e ainda continua sendo) atribuído: o lugar social secundário, aquele
que não pode ser um modelo, pois sua imagem e seu comportamento não condizem
com o ideal branco burguês. À medida que o indivíduo branco é aquele considerado
como promissor, ao/a negro/a cabe o papel de subordinado na sociedade.
Não é difícil notar como atualmente a mídia apresenta o papel de reforçar

telenovelas e comerciais brasileiros estes/as ocupam espaços subalternos na vida e


no trabalho. Na maioria dos casos seus papeis representam a empregada doméstica,
o porteiro, o segurança violento, o traficante, fato que reitera essa estereotipagem do
indivíduo negro proveniente desde o período escravocrata.
A assimilação do/a negro/a ao mau cheiro tem relação ao cotidiano violento
a que eram submetidos/as no período escravocrata, em que passavam dias sem
tomar banho, não tinham direito à higiene adequada. Dessa forma, lhes são atribuídos
na pesquisa às pessoas brancas são
atribuídas boa higiene. Embora esses resultados tenham sido obtidos no início da
década de 1970, ainda nos dias atuais encontram-se nos noticiários situações em que
pessoas negras são atribuídas a macacos seres irracionais, destituídos de
inteligência e a seres fedidos.
Todas essas verbalizações apresentam a existência do racismo, produto
da construção cultural deixada pelo escravismo, que proporciona uma associação de
inferioridade ao/a negro/a. Como bem assinala Ortegal (2018), essas visões também
derivam das teorias científicas que tentavam comprovar cientificamente a existência
de hierarquização entre as raças que, embora tenham se enfraquecido a partir do
século XX, se reconfiguraram sociologicamente, constituindo no Brasil essa
continuidade da desigualdade entre pessoas negras e brancas.
De acordo com o que foi abordado até agora, pode-se notar que as
declarações expostas acima não partem unicamente de opiniões pessoais, mas se
caracterizam como produto da incorporação de um conjunto de ideias disseminadas
nas relações sociais do Brasil. Atribuições cultivadas pela ideologia racista desde a
prática de escravização e que não foram interrompidos com a promulgação da Lei
Áurea.
Diante disso, a mídia se configura como um dos aparelhos ideológicos do
pensamento dominante capaz de reproduzir os estereótipos de cunho subalterno
direcionados a negros/as. Isto quer dizer que esta é uma das ferramentas utilizadas
pelo sistema capitalista para incitar práticas discriminatórias contra pessoas negras.
Vê-se que a associação da pessoa negra a um indivíduo subalternizado
escravatura no Brasil. Da mesma forma
que por meio da pesquisa elucidada acima se verificou a existência da visível
discriminação contra negros/as, nos dias atuais ainda pode-se detectar esses critérios
de qualificação que acabam por criminalizar e subalternizar a imagem da pessoa
negra: expressão explícita da concretude do racismo.
A partir desta refuncionalização, negros/as não mais precisaram ser
marcados/as a ferro para serem subjugados/as e inferiorizados/as, pois a própria
dinâmica socioeconômica brasileira se encarregou e ainda se encarrega de
destituir essa população do acesso aos meios de produção necessários para sua
sobrevivência e reprodução enquanto força de trabalho.
Toda essa realidade demonstra que com o passar dos séculos o racismo
não foi rompido, mas reeditado e hoje se manifesta por meio de vários mecanismos,
o que acentua as desigualdades já existentes, pois se naturaliza em um meio social
onde possui grande parte da população negra inserida em espaços precários de
trabalho, na informalidade e na linha da pobreza e extrema pobreza.
Isso porque a promulgação da Lei Áurea com abolição do sistema
escravocrata em 1888 não significou o fim da mentalidade escravocrata, pelo
contrário, esta simbologia se incorporou à cultura dominante que permanece presente
até os dias atuais e se revela mediante o diferenciado tratamento social entre
brancos/as e negros/as e nas suas condições de vida e trabalho.
Verifica-se, pois, que o preconceito à cor negra no Brasil junto à
criminalização da questão social que atingiu a população negra após a abolição da
escravatura, é o que constituiu sua restritiva imagem como pessoas de
qualificação utilizada à época. Imagem essa
construída pelo pensamento dominante que tinha o positivismo como base ideológica,
cujo se norteia pela concepção de que a sociedade é um composto harmônico e que
embora estes
grupos servissem de manutenção da organização social de classes, havia uma forte
atribuição de subalternidade social.
Essa realidade inscreve um quadro de pauperização, criminalização,
violação do direito à vida e ao trabalho dos/as negros/as que sustenta o racismo
brasileiro. O que obrigou a população negra a uma condição de subalternização à
hegemonia branca, que ao tempo em que verbalizavam com o fim da escravização, a
ideia era de aproveitamento dessa ra vender a força de trabalho. No
entanto, sob as condições de elegibilidade determinadas pela burguesia dominante e
racista. Ou seja, a ideia de liberdade estava atribuída ao desligamento da condição
de propriedade do senhor, para submeter-se ao novo mercado de trabalho por meio
da venda da força de trabalho, sem que as condições de sua inserção nesse mercado
fossem postas.
Desse modo,
considerando que ainda há formas de trabalho análogas ao escravo apoiado na Lei
Áurea, as condições de vida da população negra não sofreram alterações no campo
socioeconômico. Pelo contrário, permaneceram incorporados/as ao quadro da
pauperização, sem acesso a nenhum tipo de amparo social por parte do Estado, ou
seja, o que ocorreu foi uma refuncionalização do racismo no Brasil e que ainda
ocorre.
Agora não mais são existiam como propriedades do senhor de engenho,
eram
que não lhes deram as condições mínimas de se encaixar imediatamente no mercado
de trabalho. Contexto que refletiu na sua precária inserção social ao longo dos anos
e que perdura até os dias atuais, com a manutenção da sua criminalização enquanto
classe pauperizada.
Mantiveram-se alvos do racismo e estigmatizados/as como pessoas
rrem da ideologia
dominante e que tornam as relações raciais no Brasil e as precárias condições de vida
da população negra em expressões da questão social. Mesmo diante dos dados reais
que revelam a sobrerrepresentação de negros/as em índices de desemprego, pobreza
e violação de direitos e sua sub-representação em posições de protagonismo
econômico na sociedade, toda essa realidade de subalternização incide numa dura
vivência que vem sendo mascarada pelo
da meritocracia que interditam o processo de reconhecimento da existência da
desigualdade racial no país e sua reiteração enquanto expressão da questão social.
CAPÍTULO 3 O traço reiterativo do racismo estrutural no Brasil
frente ao mito da democracia racial e

Após traçar as discussões a respeito do sistema escravocrata que


fundamentou a formação social do Brasil e da reflexão sobre o racismo estrutural no
país como produto desse período que se solidificou na cultura brasileira e, embora
s o mito da democracia
racial e meritocracia faz-se necessário apresentar dados concretos que mostram
o abismo social existente na sociedade brasileira entre negros/as e brancos/as,
proveniente do racismo estrutural no país.
Para esta abordagem, serão utilizadas estatísticas que atestam
desigualdade nas condições materiais de reprodução social entre pessoas negras e
brancas no Brasil advindas do racismo que se estruturou no país. Frente a essa
realidade está o mito da democracia racial e a ideologia da meritocracia que tem
contribuído na subtração do racismo enquanto expressão da questão social no país,
capaz de naturalizar a realidade de vida subalternizada e ao mesmo tempo mistificar
as reais condições de vida e de trabalho da população negra brasileira.

3.1 A reiteração do racismo estrutural na sociedade brasileira: números da


desigualdade racial frente aos mecanismos de sua subtração

Em uma sociedade onde as marcas de exploração do período escravocrata


na vida material da população negra se aliam à reconfiguração do racismo que sai
das manifestações mais explícitas e tomam uma forma velada e naturalizada é
imprescindível discutir a ideologia dominante propagada frente à realidade concreta
que nada apresenta democracia nos termos da questão étnico-racial no Brasil. Diante
das estatísticas (IPEA, 2019; IBGE, 2018; IBGE, 2019a; IBGE, 2019b; BRASIL, 2017)
é nítida a reiteração do racismo no cotidiano brasileiro que dificulta o acesso da
população negra a direitos que são básicos.
Para isso, serão apresentados indicadores sociais19 que ratificam a
subalternização da população negra na sociedade brasileira. Nesse sentido, é

19Estatísticas sobre aspectos de uma sociedade, usadas como formas de conhecer determinados
aspectos sociais.
necessário demonstrar que o mito da democracia racial e a xpressam
significados que se distanciam da realidade concreta, onde, o primeiro é reproduzido
no plano das ideias, mas sem que haja um referente correspondente ao real.
Além disso, se caracterizam como um obstáculo para o combate ao
racismo e à discriminação racial, visto que, embora negros/as ocupem as maiores
taxas em analfabetismo, desemprego, baixo salário e sejam os maiores alvos de
violência, a meritocracia atribui à população negra a responsabilidade pela realidade
que vivem e as possibilidades de alteração dela.
Nesse sentido se propaga a falsa ideia de que a mobilidade social é
resultado não
possui as condições necessárias para sua subsistência isso ocorre pela sua
insuficiente capacidade, empenho ou estratégia de prosperar independente das
relações de produção e reprodução social vigentes.
Ainda nesse sentido, o mito da democracia racial serviu para buscar
atender aos interesses sociais da classe dominante mediante a ideia que a população
negra não passava por nenhum tipo de desvantagem social e que os problemas que
os/as acometiam eram de ordem natural ou provisório e, com isso, sua integração na
sociedade dependia de seu esforço individual. Além disso ocorreu a conservação da
lógica da antiga ordem, onde brancos/as ocupavam lugar de privilégio, enquanto a
população negra se encontrava em condição socialmente inferior.
Entretanto, frente a essas falsas referências, o Brasil apresenta uma
realidade onde grande parte da sua população negra está inserida nos indicadores
vinculados à pobreza ou baixa renda. Sendo assim, a desigualdade racial no Brasil,
advinda do racismo estrutural, é ratificada por meio de pesquisas e censos existentes.
Esta se firma enquanto uma expressão da questão social, resultante do conjunto de
contradições das relações sociais capitalistas e não situação individual, fruto de uma
incompetência ou preguiça , conforme será explicitado.
Como já debatido anteriormente, o racismo se firma enquanto parte
constitutiva e constituinte das relações sociais no Brasil dada sua base escravista,
fenômeno denominado racismo estrutural. E que se manifesta por meio dos
indicadores sociais que demonstram sua reiteração sócio histórica no país, pois, o
Brasil ainda é mediado pela desigualdade nas condições de vida e trabalho entre
negros/as e brancos/as.
Mesmo o Brasil sendo um país regido pela democracia20 e que tem como
horizonte a igualdade entre os/as cidadãos/ãs, o racismo estrutural se manifesta como
expressão da desigualdade racial no país que afeta as condições objetivas de vida e
trabalho da população negra. Nessa perspectiva, a democracia constitui-se de um
sistema político que voltado para a expansão de direitos conforme a necessidade da
população de modo que se crie uma sociedade aberta às transformações
necessárias.
Todavia, Chauí (2008, p.69) aponta que nas sociedades de classe, como
no a
sociedade mediante o voto eleitoral
ideologia dominante busca a manutenção da ordem
vigente. Nesse sentido, tem-se uma sociedade hierarquizada, onde a distinção de
classe que tem recorte étnico-racial rege as relações sociais do país por meio de
privilégios às pessoas brancas e desvantagens a negros/as. Desse modo, as
desigualdades presentes no Brasil ainda o apontam como um país hierárquico e
autoritário, que contém assimetrias no que concerne às condições de reprodução
social entre pessoas negras e brancas.
A promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de
198821, após a ditadura militar, expressou um marco de redemocratização no Brasil,
pois buscou incorporar direitos sociais, políticos e culturais22 que haviam sido
duramente reprimidos no período ditatorial e que também já eram demandas
apresentadas pela população brasileira nos atos reivindicatórios. Portanto, a
elaboração da Constituição Cidadã expressou uma conquista democrática para o
país.
Contudo, no plano formal o Brasil se constitui como um país democrático,
mas sua materialização se dá de forma oblíqua. Esta assertiva se verifica na

20 Dizemos, então, que uma sociedade [...] é democrática quando, além de eleições, partidos políticos,
divisão dos três poderes da república, respeito à vontade da maioria e das minorias, institui algo mais
profundo, que é condição do próprio regime político, ou seja, quando institui direitos e que essa
instituição é uma criação social, de tal maneira que a atividade democrática social realiza-se como uma
contra-poder social que determina, dirige, controla e modifica a ação estatal e o poder dos governantes.
(CHAUÍ, 2008, p. 69).
21 Faz-se imprescindível destacar que o alcance da Constituição Federal de 1988 no Brasil se deu como

resultado de muitas lutas políticas e um amplo debate junto à população contra os abusos de poder
expresso em várias formas de violência, como a tortura cometidos durante o período do regime militar
(1964-1985).
Onde, inclusive, estabelece no Art. 215, § 1º, o reconhecimento e proteção às manifestações
populares das culturas indígenas e afro-brasileiras pelo Estado brasileiro (BRASIL, 1988).
reiteração de expressões da questão social como desigualdade, extrema pobreza,
racismo, LGTBfobia, do patriarcado, conservadorismo das elites e das opressões
realizadas pelo próprio Estado brasileiro que, ao invés de garantir a proteção social
das camadas mais vulnerabilizadas da sociedade, acaba por conservar estas
diferenças sociais para manutenção da organização econômica vigente.
Segundo o IPEA (2019), em 2017 houve 1720 denúncias pelo Disque 100
de violência contra pessoas LGBTI, dentre estas 423 se referiam à lesão corporal e
193 homicídios. Este é um dado alarmante que nos faz refletir que além das
notificações, existem os casos que não são notificados por medo, vergonha, falta de
conhecimento dos órgãos responsáveis pela denúncia e outros fatores envolvidos.
Desse modo, não se deve sobrestimar a Lei suprema, tampouco depreciá-
la, pois todas as conquistas nela expressas foram resultado de lutas árduas. Não
obstante, a partir da abertura social, política e cultural alcançadas na Constituição de
1988 sobretudo com a aprovação das eleições diretas que possibilitou maior
participação popular nas decisões políticas, avanços no campo da previdência social,
inferimos que este foi um momento onde o país expandiu a sua frágil democracia.
A Constituição Federal do Brasil declara, em seu Art. 3º, como objetivos
fundamentais:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;


II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais
e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988).

Embora haja estes princípios, a realidade concreta brasileira ainda não


apresenta igualdade social, tampouco diante do recorte racial. De acordo com a
Síntese de Indicadores Sociais (IBGE, 2019b), o gráfico abaixo indica o percentual de
pessoas ocupadas em 2018 que possuíam rendimento domiciliar per capta menor que
US$ 5,5023 em Paridade de Poder de Compra24 (PPC) por dia.

23 Valor utilizado como o limite pelo Banco Mundial para classificar as pessoas na pobreza (IBGE,
2019b)
24 A PPC é utilizada para comparar o poder de compra entre diferentes países, ou moedas, e é utilizada

como alternativa à taxa de câmbio, que, em geral varia com mudanças nos índices de preços e mesmo
a volatilidade do mercado de capitais e especulação (IBGE, 2019b, p. 57).
Gráfico 04 Dados quantitativos sobre o percentual de pessoas ocupadas em 2018 no Brasil com
rendimento domiciliar per capta inferior a US$ 5,50 PPC por dia

Fonte: IBGE, 2019b, p. 61.

Vale ressaltar que a insuficiente renda para contemplar todas as


necessidades básicas não afeta a população de maneira uniforme. Alguns
contingentes populacionais são mais vulneráveis a essa realidade. Em 2018, 32,9%
das pessoas pardas ou pretas estavam abaixo da linha considerada, enquanto as
pessoas brancas correspondiam a 15,4%. Esses dados mostram que a inserção no
mercado de trabalho não se verifica como parâmetro para superação da pobreza, pois
mesmo ocupando algum cargo de trabalho, o rendimento domiciliar pode ser
insuficiente.
Além disso, segundo o IBGE (2017) o total de pessoas desempregadas no
Brasil chegou a 13 (treze) milhões, dentre estas 8,3 eram negras, o que correspondia
a aproximadamente 64%. Também foi verificado que o mercado de trabalho formal
era ocupado em sua maioria por pessoas brancas com 68,8% desse grupo ao
passo que a população negra correspondia a 54,6%, cuja está mais vulnerável a
salários mais baixos.
Nesse aspecto vê-se o efeito da contradição capitalista, onde prevalece o
acúmulo de riqueza frente a sua desigual distribuição que resulta na concentração de
renda e, consequentemente, na desigualdade social. Pode-se notar também que
alguns grupos, como a população negra, são mais afetados na dinâmica capitalista.
Esta realidade também expressa os efeitos do racismo estrutural que naturalizou as
múltiplas e sistemáticas discrepâncias que atingiram e ainda atingem sobretudo
homens negros e mulheres negras no país; seja no início da generalização do trabalho
livre, seja na sociedade contemporânea com as formas de produção e reprodução
capitalistas desenvolvidas.
A Constituição apresenta um ideal de sociedade conforme declarado, mas
sua plena efetivação não ocorre devido as condições objetivas que são produzidas
pelas contradições das relações sociais de produção do sistema capitalista. Assim
sendo, tem-se na Lei o horizonte da sociedade almejada, todavia a realidade concreta,
mediada por contradições, apresenta obstáculos para seu verdadeiro alcance.
Como aponta Carvalho (2005, p. 207): as maiores dificuldades na área
social têm a ver com a persistência das grandes desigualdades sociais que
caracterizam o país desde a inde Nossa sociedade ainda é
perpassada pela concentração de renda, em decorrência do desigual acesso à
riqueza socialmente produzida.
Dentre tantas esferas, a desigualdade social também se manifesta no
mercado de trabalho e expressa maior incidência nos/as negros/as do país. De acordo
com a Síntese dos Indicadores Sociais (IBGE, 2019b), dentre as pessoas ocupadas,
o número de pretos e pardos equivalia a 53,7%, ao passo que pessoas brancas
correspondiam a 45,2%. Embora se verifique uma diferença de 8,5% entre estes
grupos populacionais, foi constatado que a presença de pretos e pardos era maior em
atividades no setor agropecuário, construção e serviços domésticos com 60,8%,
62,6% e 65,1%, respectivamente, cujas atividades conferem baixas remunerações. E
ainda, cargos gerenciais são ocupados por 68,6% de pessoas brancas, enquanto
apenas 29,9% são ocupados por negros/as.
Isto sinaliza o fato de que a população negra ainda é maior número em
cargos subalternizados e consequentemente recebem menos que brancos/as. Esta
realidade se configura como consequência da dinâmica da acumulação de capital que,
aliada ao racismo, vem subjugando negros/as a um quadro de subalternidade, onde
suas forças de trabalho são exploradas e seus acessos aos direitos básicos, como
educação, são dificultados a fim de manter a organização social vigente: brancos/as
como modelo de intelectualidade e ascensão econômica, enquanto ao/a negro/a cabe
ri
Conforme já apresentado, a existência das grandes propriedades e a
concentração de renda é uma realidade na formação social do Brasil. Desde o
processo de colonização buscava-se intensificar a extração do que aqui era
produzido, fizeram isso por meio da escravização e, posteriormente, pela
generalização do trabalho livre. Nessa perspectiva a economia do país nunca sofreu
uma transformação, mas manteve a lógica da concentração de renda. Desse modo,
se manteve ajustada às necessidades da reprodução capitalista e nunca rompeu com
as desigualdades existentes.
Assim losa desigualdade que concentra nas mãos de poucos a
riqueza nacional tem como
(CARVALHO, 2005, p. 208). Isso resulta num contexto social onde sobretudo pessoas
negras estão inseridas nos mais baixos índices de bem-estar social, visto que esta
parcela da população sofre mais intensamente as desigualdades provenientes do
modo de produção capitalista juntamente ao racismo presente nas relações sociais
do país.
Conforme aponta o IBGE (2019a), no que se refere à educação, a taxa de
analfabetismo é maior na população negra25, e, dentro desse contingente as pessoas
que residem na área rural são as mais afetadas por essa expressão da questão social.

25 De acordo com o IBGE a população negra compreende pretos/as e pardos/as.


Gráfico 05 Dados quantitativos sobre o percentual de analfabetismo entre brancos/as e negros/as
com 15 anos de idade ou mais em 2018

Fonte: IBGE, 2019a, Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil

De acordo com os resultados acima, embora o número de analfabetismo


na população negra em 2018 fosse 0,7% inferior ao ano de 2016, a proporção de
pessoas com idade igual ou superior a 25 anos, com pelo menos o ensino médio
completo, havia aumentado de 37,3% para 40,3%. Contudo, mesmo considerando
esse dado um avanço no campo educacional do país, ambos os indicadores
continuam a revelar a existência da desigualdade racial. Pois, como indica o gráfico
acima, o total da taxa de analfabetismo entre pessoas brancas e negras apontava
uma diferença de 5,2% (IBGE, 2019a).
Diante disso, percebe-se que os indicadores sociais e econômicos da
população negra brasileira apresentam desvantagens, cuja realidade é reflexo do
o sistema escravocrata no país. Mesmo
passados mais de 130 anos esse sistema, negros e negras ainda não
tem facilidade de alcançar boas condições de vida e trabalho. Sua reprodução social
ainda é refletida pela negação de uma digna inserção no mercado de trabalho a partir
da emersão do trabalho livre e não por ausência de empenho individual, como
p
Conforme visto, a precária e subalternizada integração social do/a negro/a
após o período de escravização, se deu numa perspectiva de total desproteção, o que
inseriu essa população na pobreza, desemprego e precário acesso à educação, fator
que se reitera na sociedade brasileira proveniente do racismo estrutural.
Na busca por uma sociedade de fato pluralista e igualitária a Constituição
Federal de 1988 definiu o racismo como crime inafiançável e imprescritível. Contudo,
fica evidente que ainda é necessário um longo percurso até o alcance da eliminação
das diversas expressões de preconceito e discriminação não só nas ações
individuais, mas na própria dinâmica social como a de cunho étnico-racial, objeto de
análise desta discussão.
Esta dificuldade ocorre pela complexidade do racismo no Brasil. As práticas
racistas não só se verificam em ações individuais, mas na própria dinâmica social o
racismo institucional que estabelece padrões discriminatórios contra negros/as.
Nesse sentido, o racismo se encontra presente nas relações sociais do país, fato que
dificulta a qualificação dos crimes de racismo como tal. Ainda existe dificuldade em
reconhecer certas ações como forma de racismo devido ao racismo velado quando
assume formas dissimuladas e acaba por se desqualificar como ato racista ser
frequente no Brasil, o que tornou-se comum desvalidá-lo como prática racista. Com
isso, se estruturou no país uma naturalização do racismo que muitas vezes não
compreende as mani .
Até alcançar a igualdade para além da formalidade, em nossa sociedade,
serão necessárias transformações na realidade concreta capazes de ultrapassar
padrões e ideias como o mito da democracia racial
tendem a mistificar a desigualdade racial no Brasil. Sobre a primeira, Fernandes
(2008, p. 309) aponta que seu nascimento surgiu gradativamente a partir do
estabelecimento de medidas que, minimamente, sugerisse uma concepção de
liberdade ou de igualdade como a Lei Áurea

Desse modo, o mito da democracia racial no Brasil, generalizou uma


distorcida compreensão da realidade brasileira, onde Fernandes (2008) elenca em
cinco pontos: a ideia de que a população negra não teria nenhum tipo de problema; a
concepção de que aqui não há distinção entre negros/as e brancos/as; a fantasia de
que tanto negros/as quanto brancos/as tiveram as mesmas oportunidades de
ascender economicamente; se propagou a ideia de que a população negra estava
confortável com suas condições de vida durante o processo de desenvolvimento e
expansão industrial no país e também a convicção de que nunca existiu ou viria a
existir a desigualdade racial no país.
Diante disso, nota-se também A partir do
momento em que se difundiu a ideia que todos/as tinham as mesmas oportunidades
e que a população negra estava satisfeita com as condições de subalternização e
pauperismo que vivenciavam, isso implica dizer que a dinâmica social não tinha
nenhuma relação à intensa exploração que assolava, principalmente, os/as negros/as.
Nesse sentido, Almeida (2018, p. 63, grifos do autor) discute a dinâmica da
iada ao racismo, concebendo a desigualdade racial como fenômeno
Assim, a soma do racismo histórico e da meritocracia
permite que a desigualdade racial vivenciada na forma de pobreza, desemprego e
privação material seja entendida como falta de mérito dos indivíduos.
Madeira e Medeiros (2018, p. 216) afirmam que

O Brasil atual prossegue com as ideais e práticas racistas, apropriadas e


funcionais à reprodução do sistema capitalista, com seus traços gritantes de
desigualdade de classes, que afetam majoritária e profundamente homens
negros e mulheres negras. Para muitos/as, o racismo aqui é leve, pois não
vigorou o apartheid.

Nesse trecho observa-se que o Brasil não eliminou as consequências


extensivas da escravização, visto que o racismo ainda é estruturalmente sustentado
pela sociedade brasileira, onde verifica-se que o lugar social da população negra é
definido a partir da condição de privilégios aos/as brancos/as ou desvantagens que a
dinâmica social institui aos/as negros/as.
Sendo assim, o racismo estrutural no Brasil está para além de práticas
individuais ou isoladas, mas se forja nas relações a partir das desigualdades entre
negros/as e brancos/as nos campos da estrutura ou superestrutura social que acabam
por se const (MADEIRA, MEDEIROS, 2018).
meritocracia mediações
centrais da reprodução do racismo,

Logo, além de medidas que coíbam individual e institucionalmente, torna-se


imperativo pensar sobre mudanças profundas nesta sociabilidade, alinhadas
à reivindicação ampla de superação do capital e de outras opressões, como
a de gênero. (MADEIRA, MEDEIROS, 2018, p. 217)
Quando se insere nas discussões o recorte de gênero, as mulheres negras
se encontram na base da pirâmide social, inclusive abaixo de homens negros. Sofrem
mais as consequências da exploração capitalista. A Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios Contínua (PNAD contínua) em 2018 apontou que as mulheres negras
possuem menos rendimentos do trabalho que homens e mulheres brancos/as e
também em comparação a homens negros (IBGE, 2018).
Além desse aspecto, a presença de mulheres em cargos de liderança
política também está muito abaixo em relação aos homens. Segundo dados do IBGE,
em 2017 o Congresso Nacional compunha apenas 11,3% de mulheres. Já no Senado
Federal, apenas 16% do senado era constituído por mulheres. E na Câmara dos
Deputados, só havia 10,5% de deputadas federais. Além disso, a pesquisa mostra
que durante o período desse levantamento, foi verificado que nos Estados da Paraíba,
Sergipe e Mato Grosso não havia nenhuma mulher exercendo o cargo de deputada
federal (IBGE, 2018).
A população negra brasileira é um grupo fortemente subalternizado e
cotidianamente vivenciam a violação de direitos. O sistema carcerário é composto em
maior número por pessoas negras que vivem em precárias condições devido à
precária infraestrutura e alto índice de violência. Aí se encontra uma consequência da
criminalização da pobreza, onde a mesma incide de forma mais contundente à
população negra, dados os aspectos já refletidos.
Em 2017, dentre os homicídios cometidos, 75,5% das vítimas foram
pessoas negras. Entre 2007 e 2017, a taxa homicídios de pessoas negras cresceu
33,1%, frente a um crescimento de 3,3% de indivíduos brancos (IPEA, 2019). Além
disso, Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (BRASIL, 2017) mostra
que o sistema penitenciário apresenta grande representatividade da população negra.
O total das pessoas que estão privadas de liberdade no Brasil em junho de 2017
correspondia a 726.354 (setecentos e vinte e seis mil e trezentos e cinquenta e quatro)
pessoas26. O INFOPEN (BRASIL, 2017) também apresenta o perfil da população
prisional do país, cujo recorte do segmento cor/etnia revela que 46,2% são de cor/etnia
parda, 35,4% de cor/etnia branca e 17,3% de cor/etnia preta.27

26Esse número advém das 1.507 unidades prisionais que são cadastradas no INFOPEN.
27Ao somar a população parda e preta que equivale à negra segundo critério utilizado pelo IBGE
tem-se 63,5% de pessoas negras inseridas no sistema penitenciário brasileiro.
Nessa discussão, faz-se necessário considerar alguns aspectos a respeito
do sistema penitenciário brasileiro. O sistema penitenciário do Brasil é norteado pela
legislação, como a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Execução Penal n°
7.210/1984, que contém deliberações como forma de preservar os Direitos Humanos.
Dentre as quais está a inclusão da população encarcerada brasileira ao acesso à
saúde. Todavia nem todas as unidades prisionais apresentam as estruturas
necessárias para realizar tal serviço, sendo necessário o deslocamento aos
equipamentos de saúde pública (BRASIL, 2017).
Além desse aspecto, são registrados casos de violência nas unidades
prisionais que podem levar muitos/as detentos/as à morte. Para cada 10 mil pessoas
privadas de liberdade no primeiro semestre de 2017, se constatou que o segundo tipo
mais frequente dos óbitos é por causas criminais, com taxa de 4,8. Enquanto a taxa
por causas naturais foi de 8,4. Com isto, percebe-se que o contexto socioeconômico
em que a maioria da população negra brasileira se encontra traduz alta
vulnerabilidade social (BRASIL, 2017).
Até aqui fica evidente o quanto homens negros e mulheres negras do país
convivem cotidianamente com o difícil acesso aos direitos básicos: alto índice de
mortalidade, baixa remuneração e precário acesso à educação; além de carregarem
numa sociedade racista e
conduzida pelo princí .
Portanto, a sociedade brasileira vive constantemente num meio social que

ndições
sociais e históricas da formação do Brasil que sistematicamente produziu
desigualdade. Concomitante a isto, na formação social brasileira também encontra-se
a desigualdade étnico-racial, onde promoveu a precária e subalterna inserção da
população negra na sociedade e que até o momento não dá bases de ruptura da
concessão de privilégios a pessoas brancas e desvantagens ao/a negro/a.
Não há credibilidade numa ideologia em que acredita que qualquer pessoa
pode chegar onde quiser mediante seu empenho individual, onde a dinâmica social e
histórica dessa sociedade agiu e age de forma discriminatória com grupos específicos,
como o caso de negros/as. Conforme os indicadores apresentados nessa discussão,
pôde-se compreender que numa estrutura social permeada pelo desigual acesso à
educação, diferenciação na ocupação de cargos que consequentemente reflete nas
condições materiais de reprodução social o esforço particular não se constitui como
forma de superação dessa condição material.
Diante disso, compreende-se que os privilégios sociais e econômicos,
historicamente, foram direcionados às pessoas brancas e servem de manutenção da
discriminação racial contra negros/as apoiados na meritocracia. O contexto das
relações raciais no Brasil perpassa as formas de discriminação contra negros/as que
servem como meios de manutenção dos privilégios da classe dominante. Dessa
maneira, o racismo estrutural no Brasil se apresenta como elemento mediador da
estrutura de produção que interdita a mobilidade social da população negra brasileira
e alimenta o ciclo da pobreza desse grupo e sua criminalização.
Para o alcance da sociedade justa e igualitária, como concebida na
legislação brasileira faz-se necessário superar a organização de produção vigente e
estruturar novas bases de sociabilidade, relações que não sejam mediadas pela
desigualdade ou que deslegitimem práticas racistas enquanto tal. Além disso, também
se apresenta como imprescindível o rompimento com a dependência econômica
exterior, cuja realidade é histórica e contribui no processo de acumulação das
economias centrais, o que gera propensão a crises e acentua as desigualdades.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento deste trabalho de conclusão de curso possibilitou uma


análise acerca do racismo no Brasil e sua forma de desenvolvimento, considera-se
que desde o período colonial o país é mediado por este fenômeno que inicialmente se
baseou em teorias raciais a partir da hipótese de hierarquização das raças e a
supremacia da raça branca em relação às demais. Conforme visto, buscou-se
justificar a máxima dominação e exploração da população negra africana, negando-
lhes qualquer tipo de direito. Além disso, pôde-se compreender que já nas relações
capitalistas, o racismo não foi eliminado das relações sociais, mas se efetivou sob
novas formas, visto que a transição do escravismo para o capitalismo se deu numa
perspectiva conciliatória, conservando traços da primeira organização econômica.
Nessa perspectiva, foi possível compreender que o racismo se
refuncionalizou, isto é, passou a se expressar sob novos aspectos: considerados/as
inseriram de forma
uniforme em relação à população branca. Passaram a ocupar espaços precarizados
de trabalho e a compor a superpopulação relativa, onde, consequentemente tiveram
precárias condições materiais de vida. Realidade que perdura até os dias atuais, pois
o racismo se estruturou no país de modo que este grupo é o mais afetado na ordem
de produção vigente.
Sendo assim, a discussão sobre o racismo estrutural na sociedade
brasileira se insere como uma das múltiplas expressões da questão social, produzidas
pelas relações de produção capitalistas. A desigualdade racial no Brasil se expressa
tanto no plano socioeconômico quanto no cultural, pois seu desenvolvimento também
se apoiou na incorporação de um conjunto de concepções disseminadas pela
ideologia dominante. A partir disso, sua manifestação se ampliou à dimensão sócio
institucional, para além de comportamentos individuais.
Portanto, dada a importância do assunto, faz-se necessário refletir as
repercussões do racismo estrutural no Brasil que demarcam a subalternização das
condições materiais de vida e trabalho da população negra brasileira. Pois, a
sociedade brasileira não rompeu com os determinantes e suas consequências no que
se refere ao período de escravização. Ainda nos dias atuais os/as negros/as do Brasil
se inserem em maior número em índices de desemprego, ocupações com baixa
remuneração, analfabetismo e prevalência na população privada de liberdade.
De acordo com os resultados obtidos nesta pesquisa, foi possível constatar
que a taxa de analfabetismo se apresenta maior à população negra, com 9,1% do
total, enquanto a população branca corresponde a 3,9% do total (IBGE, 2019a). Sendo
a educação um direito social básico, constata-se que seu acesso não ocorre de modo
uniforme entre os/as brasileiros. Os/as negros/as ainda têm dificuldade em concluir os
estudos, o que aponta para uma precária inserção no mercado de trabalho formal ou
informal futuramente que refletirá diretamente nas suas condições materiais.
Dessa forma, verificou-se que as áreas de trabalho mais ocupadas por
pessoas negras, são de menor remuneração (IBGE, 2019b), o que indica dificuldade
para a satisfação de todas as necessidades básicas. Viu-se também que o sistema
prisional brasileiro é composto em sua maioria por pessoas negras, sua distribuição
de acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias equivale a
46,2% de pardos/as, 35,4% de brancos/as e 17,3% de pretos/as28. Nessa perspectiva,
considera-se que nesse aspecto a população negra do Brasil também se insere em
desvantagem, visto que em média, as unidades prisionais do país são marcadas por
violência e a falta de estrutura adequada a oferecer dignas condições de
sobrevivência (BRASIL, 2017).
Desse modo, vê-se que brancos/as têm privilégios na sociedade brasileira.
Ao passo que as desigualdades existentes no país não são concebidas enquanto
reflexo da dinâmica da produção capitalista, busca-se justificar tal realidade por meio
se
observou, é uma ideologia funcional ao pensamento dominante que visa mistificar e
subtrair a realidade subalternizada de vida e trabalho que vive a população negra
brasileira.
Nesse sentido, verificou-se que o Brasil é mediado pelo racismo desde o
período colonial, no escravismo. C atura, o modo
de produção capitalista emergente se desenvolveu sob a inserção dos/as negros/as
ex-escravizados/as ao pauperismo, visto que este grupo compôs a massa da
superpopulação relativa. Nesse sentido suas condições precárias de vida e trabalho

28 Como já elucidado, os dados secundários utilizados na pesquisa consideram a população negra a


junção da população preta e parda.
foram reiteradas. Esta realidade demonstra a concretude do racismo no plano
sócioeconômico-cultural-político do país, a partir d
subalternizadas de vida e trabalho da população negra.
Contudo, mesmo sendo a desigualdade racial um fato concreto na
sociedade brasileira, resultante do racismo estrutural, foi possível compreender que
sua concretude é questionada a partir dos mecanismos utilizados pela ideologia
subtrair a
desigualdade entre pessoas negras e brancas do país e responsabilizar os/as
negros/as por suas condições precárias de vida e trabalho.
Além disso, verificou-
representação do real concreto. Pois, mediante o desenvolvimento desta discussão,
nota-se que as mediações da desigualdade racial no Brasil não se referem a
oportunidades ou esforço individual, mas à própria dinâmica social que
sistematicamente negou direitos básicos à população negra do país, cuja reflete em
suas condições precárias de reprodução social. Portanto, os casos de negros/as em
posição de ascensão socioeconômica se constituem como exceção e não regra.
Logo, a desigualdade racial é um fenômeno concreto no Brasil, uma vez
que historicamente a população negra esteve inserida nos mais baixos indicadores de
bem-estar social, fato que tem se reiterado até os dias atuais. Exercendo precárias e
desvalorizadas atividades, com dificuldade ao acesso de direitos básicos, além de
carregarem o estereótipo de inferioridade, produto do racismo que se estruturou
socialmente. Por esta razão, tem-se o entendimento de que esta expressão da
questão social se constitui enquanto aspecto estrutural e estruturante das relações
sociais do país.
Por fim, considera-se que a sociedade brasileira ainda experimenta as
marcas deixadas pelo sistema escravocrata, e, que, embora não mais sejam
legitimados tratamentos desumanos contra a pessoa negra e esta seja concebida
como cidadã, ainda sofrem a violação de seus direitos advindas da própria dinâmica
de produção capitalista e da reiteração do racismo. A precária inserção da população
negra brasileira ao mercado de trabalho ainda reflete nas péssimas condições
materiais de reprodução social desse grupo e faz-se necessário buscar as bases para
a superação dessa realidade.
Por isso, tratar a superação da desigualdade racial no Brasil também
significa superar a vigente dinâmica de organização social. Pois, o capitalismo não
apresenta pretensão de dispor condições iguais de vida a todos/as cidadãos/ãs
brasileiros/as, visto que sua manutenção ocorre sob a desigualdade de classe que
conforme visto, afeta mais a população negra.
Nesse sentido, vale ressaltar que as formas veladas da manifestação do

configuram como barreira para a superação dessa conjuntura. Dessa forma, é


essencial aludir que a presente pesquisa não se esgotou, nem esgotará a
possibilidade de aprofundamento dessa temática, pois tudo está em constante
movimento.
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