TCC Direito Ufsc
TCC Direito Ufsc
TCC Direito Ufsc
Florianópolis
2022
ANA LAURA ARAUJO DA SILVA SOUSA
Florianópolis
2022
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
COLEGIADO DO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
TERMO DE APROVAÇÃO
Eu, Ana Laura Araujo da Silva Sousa, acima qualificado(a); venho, pelo
presente termo, assumir integral responsabilidade pela originalidade e conteúdo
ideológico apresentado no TCC de minha autoria, acima referido
A violência obstétrica tem se tornado um tema popular devido a sua forte e reiterada ocorrência,
no entanto tem havido controvérsias sobre o uso do seu termo por alguns considerarem uma
ofensa aos profissionais da saúde, especialmente obstetras e até mesmo um termo ideológico.
Observa-se que as práticas consideradas como violência obstétrica, principalmente as mais
dolorosas, são mais constantes em mulheres negras, devido a certas crenças, e, ao racismo
institucionalizado que derivam da colonialidade e está enraizada até hoje. Diante deste cenário,
e interesse pessoal da autora ao ouvir o relato de parto de mulheres de seu convívio social, o
intuito da presente pesquisa busca contextualizar inicialmente o direito das mulheres negras e
nuances sobre seus movimentos sociais de forma a compreender introdutoriamente a ligação
entre raça e gênero, ou seja, as possíveis causas que levam mulheres negras a sofrer mais
violência obstétrica que mulheres brancas. Além disso analisar a incidência da violência
obstétrica e sua caracterização, verificar os impactos das leis existentes para resguardar as
gestantes e o enfrentamento da violência no Brasil através da análise jurisprudencial sobre a
reparação de danos nos casos cabíveis, em sequência a existência de políticas públicas do
governo.
Obstetric violence has become a popular topic due to its strong and repeated occurrence,
however there has been controversy over the use of its term because some consider it an offense
to health professionals, especially obstetricians and even an ideological term. It is observed that
the practices considered as obstetric violence, especially the most painful ones, are more
constant in black women, due to certain beliefs, and, the institutionalized racism that derives
from coloniality and is rooted until today. Given this scenario, and the author's personal interest
in hearing the birth reports of women in her social environment, the purpose of this research
seeks to contextualize initially the rights of black women and nuances about their social
movements in order to understand the connection between race and gender, i.e., the possible
causes that lead black women to suffer more obstetric violence than white women. In addition,
analyze the incidence of obstetric violence and its characterization, verify the impacts of
existing laws to protect pregnant women and the confrontation of violence in Brazil through
jurisprudential analysis on the repair of damage in appropriate cases, following the existence of
public policies of the government.
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 11
2 INTRODUÇÃO AO DIREITO DA MULHER NEGRA ................................................. 13
2.1 A CONQUISTA PELOS DIREITOS DA MULHER SOB ÓTICA DO DIREITO
INTERNACIONAL.................................................................................................................. 17
2.2 CONSAGRAÇÃO DOS DIREITOS DA MULHER NO BRASIL ................................... 21
2.2.1 Da dignidade da pessoa humana .................................................................................. 23
2.2.2 Da autonomia da vontade da paciente ......................................................................... 25
3 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA ............................................................................................. 27
3.1 BREVE RELATO HISTÓRICO DO PARTO ................................................................... 30
3.2 MEDICALIZAÇÃO DO PARTO ...................................................................................... 32
3.2.1 Violência obstétrica como violência de gênero............................................................ 34
3.2.2 Práticas discriminatórias e o racismo estrutural: Mulheres negras são mais
propensas a sofrer violência obstétrica ................................................................................. 35
3.3 AS CRENÇAS LIMITANTES NA HORA DO PARTO ................................................... 39
3.3.1 Episiotomia e o “Ponto do marido do marido” ........................................................... 40
3.3.2 O hormônio artificial e amniotomia precoce .............................................................. 42
3.3.3 O “empurrãozinho” na Manobra de Kristeller .......................................................... 44
3.4 Impactos na vida da gestante ........................................................................................... 44
4 ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E POLÍTICAS PÚBLICAS 46
4.1 LEGISLAÇÕES EXISTENTES EM PAÍSES DA AMÉRICA LATINA EM
COMPARATIVO COM O BRASIL ........................................................................................ 49
4.2 REPARAÇÃO DE DANOS ............................................................................................... 55
4.3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS COMO FORMA DE ERRADICAR A VIOLÊNCIA
OBSTÉTRICA NO BRASIL.................................................................................................... 60
5 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 64
6 REFERÊNCIAS................................................................................................................... 66
11
1 INTRODUÇÃO
1
Segundo Silvio de Almeida (2019), o racismo estrutural representa um conjunto de múltiplas dinâmicas que
integram a organização econômica e política da sociedade, fornecendo “o sentido, a lógica e a tecnologia para a
reprodução das formas de desigualdade e violência que moldam a vida social contemporânea”, coaptando relações
interpessoais, dinâmica das instituições, manifestações intergeracionais das “entranhas políticas e econômicas da
sociedade” (p. 15). O trabalho não aborda direta a categoria, mas a tem como base fundante das pesquisas e das
autorias aqui utilizadas.
12
O presente capítulo visa analisar o histórico da conquista dos direitos das mulheres
negras a partir do prisma geral internacional, especialmente através da Organização das Nações
Unidas (ONU), estabelecida no período pós Segunda Guerra Mundial, visando resguardar os
direitos humanos. Por conseguinte, chegando à perspectiva do direito da mulher através da
Constituição Federal de 1988, contextualizando os direitos reprodutivos e sexuais da mulher
para enfrentamento da violência obstétrica, visto que está teve a usurpação de seus direitos e
garantias assim como indivíduo na sociedade. Deste modo, destaco dois importantes princípios
que são salutares no embasamento jurídico frente a violência obstétrica: a Dignidade da Pessoa
Humana e Autonomia.
Todavia, é necessário salientar que estudar a busca pelos direitos inerentes a mulher é
complexa, devida a existência de vários contextos em que elas estão inseridas, compreendendo
que a realidade de cada mulher é diferente, portanto, não seria adequado generalizar as mulheres
já que a perspectiva de cada uma é relativa, a conquista por direitos é diferente, a exemplo disso
sabe-se que em termos gerais as vivências de uma mulher branca pobre poderá ser
completamente diferente de uma mulher negra, ainda que a classe social seja a mesma. O fato
é que a carga histórica pesará mais para uma do que para a outra. Carneiro (2003) enfatiza a
necessidade de politizar as desigualdades de gênero, afirmando que o feminismo revela as
mulheres como sujeitos políticos que assumem diferentes olhares, estimulando a nossa
percepção através da vivência por cada grupo em particular. Desta forma, ao tratar do grupo de
mulheres indígenas e de mulheres negras, não se deve observar suas lutas apenas sob ótica do
gênero em si, mas deve ser levado em conta as especificidades que caracterizam o ser mulher
em ambos os casos.
Neste sentido, embora no próximo item intitulado “a conquista pelos direitos da mulher
sob ótica do Direito Internacional” não seja possível delimitar estritamente os direitos inerentes
a somente uma única classe de mulher, será introduzido brevemente a historicidade da relação
do feminismo com o abolicionismo para compreensão da busca por direito das mulheres negras.
Dada a complexidade atual do contexto social da violação, qualquer tentativa de trata-
la como um fenómeno isolado é um limite a naufragar. Uma efetiva estratégia contra
a violação deve ter em vista mais do que erradicar a violação – ou até o sexismo – por
si só. A luta contra o racismo deve ser um tema contínuo do movimento anti-violação,
que não deve defender apenas as mulheres de cor, mas as muitas vítimas da
manipulação racista bem como da acusação de violação. (DAVIS, p. 143, 2013)
14
Garcia (2015), elucida em seu livro “Breve história do feminismo”, que o feminismo
pode ser determinado como o momento em que a mulher recobra sua consciência como ser
humano que foi vítima, e muitas vezes ainda é, de dominação e exploração pelo homem, devido
a essência do patriarcado em seus diversos períodos históricos. Este momento vislumbrado
como feminismo visa a busca pela a independência da mulher, podendo ser visto como uma
filosofia política e movimento social que acarreta uma ética um modo de estar no mundo
próprios. Portanto, existem diversos tipos de feminismo com pensamentos e ideologias
diferentes, diferenciando-se de outras correntes políticas por ser constituído por várias mulheres
em todo o mundo.
Neste sentido, Bairros (2008) faz crítica ao feminismo frente aos movimentos de
mulheres negras.
Não há dúvidas que as mulheres do Movimento Feminista trazem uma contribuição
importantíssima do ponto de vista de uma visão do mundo, feminina, mas também
são essas mesmas mulheres formadas para desconhecer as desigualdades raciais,
formadas para pensar o Brasil como uma democracia racial e aí, contraditoriamente,
ainda que o Movimento Feminista consiga perceber em que nível a diferença de sexo
é utilizada no sentido da produção das desigualdades, ele não consegue sacar a
recriação constante dos mecanismos de discriminação racial das quais as feministas
têm sido instrumento. (BAIRROS, p.142, 2008)
mulheres e das Cidadãs” em 1791 por Olympe de Gouges, anunciando que a Revolução
Francesa negou direitos políticos a elas, diferentemente do que pregavam os revolucionários
com seus princípios de liberdade e igualdade. (GARCIA, 2015)
No século XIX surge o feminismo como movimento social na temática dos
revolucionários franceses, onde as mulheres se uniram em torne de objetivos além dos seus
específicos, envolvendo em suas temáticas a luta por liberdades de pensamento, a liberdade de
associação, abolição da escravatura, prostituição e paz. Nos Estados Unidos, as feministas
Lucretia Mott e Elizabeth Stanton se destacam, aquela como fundadora da sociedade feminina
contra a escravização e esta como sua discípula. Em 1866 a luta organizada das mulheres
sufragistas nos Estados Unidos tentavam conquistar seus direitos através de emenda
constitucional, contudo, sem sucesso pois foi concedido o direito ao voto aos escravos, libertos
e homens, reforçando a cultura de que mulheres eram inferiores. (GARCIA, 2015)
Observa-se então que nasce a relação do feminismo com as causas abolicionistas,
entretanto, diante deste histórico, é notório que as feministas brancas, de classe média,
geralmente, mesmo com todo o empenho de esforços não tinham seus direitos reconhecidos,
tampouco as mulheres negras no período escravagista, que além de objetificas, e hostilizadas,
não eram reconhecidas nem como seres humanos.
Alguns nomes são destacados por Garcia (2015) na luta pelo sufrágio, todavia com
relação a mulher negra ela sinaliza Sojourner Thuth, esta relatou a problemática e a dificuldade
das mulheres negra na busca de seus direitos por razão não só de seu gênero, mas também de
sua cor:
[...] é um grande exemplo das diversas vozes de diferentes mulheres que foram se
unindo ao sufragismo. Sojouner honrou seu nome – literalmente “verdade viajante” -
e pregou onde pôde algumas ideias que questionavam ainda mais os discursos que
justificavam a exclusão das mulheres. Ela era uma escrava liberta do estado de Nova
York. Não sabia ler nem escrever, uma vez que a alfabetização era proibida – sob pena
de morte – para os escravos, mas foi a primeira negra que conseguiu assistir à Primeira
Convenção Nacional dos Direitos das Mulheres em 1850. No ano seguinte,
pronunciou um discurso da Convenção de Akron e nele enfocou os problemas
específicos das mulheres negras, asfixiadas em truas exclusões: a raça e o gênero.
(GARCIA, p. 59, 2015)
Davis (2013) faz crítica ao movimento feminista sufragista, afirmando que estes
movimentos não estavam engajados com a causa negra, nem se quer com a causa específica das
mulheres negras que eram completamente excluídas dessas organizações, portanto não tinham
suas reivindicações observadas. Isso corroborou para uma divisão nos movimentos feministas.
16
Marry Ferreira (2020), ao relembrar a 19ª Emenda nos Estados Unidos que concedeu o
direito ao voto feminino, traz a problemática da mulher negra:
A emenda proibia os estados de negar às mulheres o direito de voto com base no sexo.
No entanto, a maioria das mulheres negras esperou quase cinco décadas mais para
realmente exercer esse direito.
Ao observarmos a história de avanços duramente conquistados em direção à igualdade
de gênero e raça nos Estados Unidos, também nos lembramos de que, no Brasil,
mulheres negras movem a democracia com seus séculos de luta organizada. No caso
dos EUA, mesmo depois da 19ª Emenda, as mulheres afro-estadunidenses
permaneceram privadas de direitos devido a outros mecanismos que limitavam o voto
de pessoas negras. (REVISTA AFIRMATIVA, 2020)
Ao entrar na perspectiva dos direitos humanos, Pires (2018) aduz que a construção
normativa teórica e jurisprudencial se dá a partir das vivências da “zona do ser”, ou seja, a
perspectiva de homens, brancos considerado cis, cristão, que tem posses e são fisicamente sem
imperfeições, portanto não é possível tornar essa realidade um padrão aplicável a todos os
processos de violência, pois ela não abrange os demais seres, sendo necessário um
reposicionamento que inclua a “zona do não ser”, ou seja, todos aqueles que não se enquadram
na “zona do ser”:
A normalização da zona do ser como representativa do pleno, autônomo e centrado
gera processos de violência que estruturam e condicionam a própria percepção sobre
o que pode ser entendido como violência. A violência como modelo normalizado de
resolução de conflitos na zona do não ser é subdimensionada em categorias como
inefetividade ou violação de direitos, que reproduzem a proteção ilusória que o
colonialismo jurídico oferece a corpos e experiências não brancas. (PIRES, p. 66,
2018)
Não é atual os estudos sobre os direitos inerentes as mulheres, sobretudo as lutas por
estas para obter reconhecimento em direitos igualitários ou equânimes aos dos homens. Dentre
essas lutas podemos destacar a participação ativa como cidadã na sociedade conquistando não
só seu direito ao voto, mas também de serem eleitas, bem como a busca por oportunidades
frente ao mercado de trabalho em atividades consideradas masculinas, a compatibilidade de
salário, direitos reprodutivos e outros.
Por muito tempo, o sexo feminino foi taxado como o sexo frágil por conta da fisiologia
da mulher. A sua qualidade estava na capacidade reprodutiva, e, portanto, esta qualidade
deveria ser preservada. Ao ter os filhos, a mãe detinha toda a responsabilidade sobre as tarefas
domésticas, o que incluía a obrigação “biológico-moral” sobre seus filhos, ou seja, a de criar e
educar. Sendo assim, a mulher só seria uma mulher honrada quando se tornara mãe.
(FOUCAULT, 1988)
Segundo Bobbio (2004), a vida do homem na sociedade foi vista como mais valorosa
do que a da mulher durante muito tempo. Essa valoração se dava geralmente pela conquista por
territórios, a defesa de novos posicionamentos políticos e da sociedade. Esses fatos estavam
quase sempre vinculados a grandes guerras, e os homens eram quem estavam na linha de frente
deste combate, ou seja, a relevância do ser humano dependia do fato histórico que se estava
vivendo.
A era do Brasil colônia, ficou marcada, as mulheres indígenas desempenhavam
diferentes papéis, como escravas de seus maridos, outras eram companheiras, e até mesmo
tinham aquelas que desempenhavam o papel de chefia. Essas mulheres quando iam parir tinham
amparo somente naquele momento, mas após o parto retornavam as suas tarefas com mais uma
responsabilidade que era exclusivamente sua, e a de cuidar dos seus filhos. Neste período, os
jesuítas chegaram com objetivo de civilizar os povos nativo através da força, desta forma
18
reforçaram ainda mais a violência, impondo ao homem indígena e negro o trabalho escravo, e
a mulher serviria como empregada doméstica ou concubina. (TELES, 1999).
Assim, os direitos humanos não existem por natureza, neste sentindo Bobbio (2004), no
seu estudo sobre “A Era dos Direitos”, compreende que os direitos, num contexto geral, não
nasceram prontos, como entendem os jusnaturalistas, ou já configurados como nós
conhecemos, mas são a edificação de vários fatos socias que ocorreram e ocorrem com o passar
do tempo e a transformação da sociedade. Sendo, portanto, a consequência do empenho
histórico.
A conquista pelos direitos especificamente da mulher não é linear, de fato a Constituição
Federal de 1988 é um marco que positivou a igualdade de gênero no Estado brasileiro, diversas
lutas foram empenhadas no decorrer da história para que chegássemos até este momento, nos
dizeres de Malard (2021, p.123):
Muito antes, vinham as mulheres brasileiras alcançando paulatinas vitórias em suas
incansáveis batalhas, não sendo demais afirmar que, se não fora a sua incansável
dedicação e luta à Constituinte de 1987, boa parte da proteção social e da valorização
da família não teriam sido constitucionalizadas.
Segundo Piovesan (2012) o marco para os direitos humanos como conhecemos hoje
ocorreu com as barbáries da Segunda Guerra Mundial, onde o valor da vida humana se perdeu
e diversas atrocidades foram cometidas. Assim, surge a necessidade de reconstruir os direitos
humanos.
Barreto (2019), aduz que diante do cenário pós guerra, a conjuntura internacional ficou
dividida entre os Estados Unidos e a União Soviética, os países concordavam em relação aos
direitos políticos e civil, chamados de primeira geração, mas discordavam dos direitos de
19
segunda geração que englobavam o direito social, cultural e econômico. Todavia, apesar deste
empasse, a Declaração proferiu tanto os direitos de primeira geração como os de segunda,
reconhecendo que ambos estão em igualdade hierárquica.
A partir da Declaração, foi firmado pela Comissão de Direito Humanos o Pacto
Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) em 19 de dezembro
de 1966. Este pacto ficou divido em cinco partes, dentre os direitos resguardados, vislumbrou
a igualdade entre homens e mulheres, e algumas garantias a proteção da família, que a época
era considerada essencial, assim, previa a proteção de mães no período pré e pós parto
garantindo-lhes licença maternidade e algumas vantagens pecuniárias. (RAMOS, 2014)
Entretanto, embora o PIDESC previsse uma certa igualdade, segundo Piovesan (2012),
este pacto não era suficiente para tratar da individualidade de cada sujeito, dependendo da sua
condição social, que é o caso da mulher. Desta necessidade surgiu a Convenção sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW) em 1979.
Portanto, “É o primeiro tratado internacional que delimita os direitos da mulher como direitos
humanos, se propondo a buscar ações afirmativas na consolidação da igualdade entre os sexos,
bem como repreender as discriminações relativas ao gênero.” (JUNQUEIRA, ANDREUCCI,
2021, p. 44)
Somente em 1981 o Brasil acatou a Convenção, fazendo algumas ressalvas a
determinados artigos, contudo, em 1994 essas ressalvas foram retiradas, promulgando
novamente a Convenção através do Decreto 4.377 de 2002. Para além da busca da igualdade, a
convenção busca prever diligências em forma de medidas afirmativas que devem ser tomadas
pelo Estado a fim de alcançar a igualdade. Essas medidas visam, de alguma forma, reparar os
diversos infortúnios históricos que acarretaram tamanha discriminação. A exemplo disso temos
a lei 9.100/95 que estipula o mínimo 20% das vagas dos partidos políticos, a serem preenchidos
por mulheres. (BARRETO, 2019, PIOVESAN 2012). A convenção ainda traz em seu texto o
significado da expressão “discriminação contra a mulher”:
Para os fins da presente Convenção, a expressão "discriminação contra a mulher"
significará toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por
objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela
mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e
da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político,
econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. (BRASIL, 2002, Art.
1)
20
Muito se fala sobre a importância da Constituição Federal de 1988 como lei primordial
no reconhecimento de direitos e garantias fundamentais, principalmente por ser a primeira lei
brasileira a reconhecer a igualdade entre homens e mulheres em seu Art. 5º inciso I, de fato
deve ser reconhecida com tal relevância, entretanto, segundo Teles (1999) foi criado em 1985
o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNMD) , um importante instrumento para
reivindicar as questões da mulher de forma que elas pudessem ficar a par do trabalho dos
constituintes na criação de leis.
De acordo com Monteiro (2018), em 1986, 166 mulheres se candidataram para a
Câmara dos Deputados, mas apenas 26 foram eleitas, aumentando a representação de mulheres
no parlamento de 1,9 5,3%. No ano seguinte a presidente do CNDM entregou a “Carta das
Mulheres Brasileiras aos Constituintes” a Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia
Nacional Constituinte. Com base neste momento alianças suprapartidárias foram criadas, e
criou-se um movimento denominado “Lobby do Batom” que visava:
Das metas propostas pelo Lobby do Batom, destacam-se a licença-maternidade de 120
dias, o direito à posse da terra ao homem e à mulher, igualdade de direitos e de salários
entre homem e mulher e formas para combate da violência doméstica. Além de
22
temáticas vinculadas diretamente ao direito das mulheres, defendia- -se também temas
da Ordem Social, [...] (BAGGENSTOSS, 2021, p. 884)
Deste modo, Rocha (2018) afirma que foi a pressão dos movimentos femininos, que
garantiu a igualdade entre homens e mulheres, especialmente no seio familiar. Em 1988 com a
Constituição Federal, apelidada popularmente de “Constituição Cidadã” é ampliado os direitos
e garantias fundamentais do cidadão, sendo promulgada no governo de José Sarney e que está
em vigor. Dentro de seu texto estabelece diversos princípios fundamentais, contudo nosso
enfoque é principalmente nos seguintes:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados
e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e
tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade
e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos
seguintes princípios:
II - prevalência dos direitos humanos; [...] (BRASIL, 1988) (grifo meu)
O título II acima mencionado que trata dos direitos e garantias fundamentais está
dividido em cinco capítulos a saber: direitos e deveres individuais e coletivos, os direitos
chamados sociais, direito relacionado a nacionalidade, os direitos políticos e os pertinentes aos
partidos políticos, e são classificados pelos doutrinadores em quatro gerações, ou seja, pela
ordem dos acontecimentos, ora conquista dos direitos. É importante frisar que os direitos
fundamentais não estão limitados a este título, mas podem ser encontrados ao longo da
constituição. (SILVA; GIMENES, 2021)
Segundo Moraes (2003), o rol de direitos sociais está previsto no Art. 6º sendo eles: a
educação, o trabalho, a alimentação, transporte, moradia, lazer, previdência social, assistência
23
aos desamparados e, finalmente, a saúde e a proteção a maternidade, com enfoque a estes dois
últimos que são imprescindíveis para a presente pesquisa. Neste sentido:
Como o direito à saúde integra o rol de direitos sociais inseridos no art. 6º, trata-se de
um direito fundamental social, definido pela organização mundial da saúde como um
estado de completo bem-estar físico, mental e social, não consistindo apenas na
ausência de doença ou de enfermidade. Note-se, portanto, que o conceito de saúde
está intimamente relacionado ao de uma vida digna, isto é, ao princípio da dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III da CF/88). Integra, destarte, o núcleo básico do
denominado mínimo existencial. (MASSON, 2016, p. 322)
No contexto da saúde, a luta era pela proteção integral à saúde da mulher durante todos
os estágios da sua vida, levantando a temática sobre a liberdade na escolha da maternidade,
garantia de pré-natal, ao parto e pós parto. Outro importante levantamento era relacionado a
preservação do aleitamento materno e a interrupção da gravidez. Essas reivindicações deveriam
ser tolhidas pelo Estado, de forma que este fornecesse métodos contraceptivos gratuitos,
viabilizasse a educação sexual, bem como proibisse instituições públicas ou privadas de
executar o controle de natalidade compulsório. Assim, mesmo que as leis dispostas sobre os
direitos reprodutivos da mulher estejam esparsas, é inegável que a Constituição de 1988 tornou
tais direitos incontestáveis. (MAIA, 2021)
tratos internacionais que precedem a Constituição Federal de 1988. Este importante princípio
pode ser encontrado também de forma expressa na Constituição da Itália de 1947; na Lei
Fundamental da Alemanha de 1949; na Constituição da República Portuguesa de 1946; na
Constituição de 1831 revisada em 199, entre outros países. (GONDINHO, 2011).
A Constituição de 1988 é a primeira a estabelecer um título específico designado aos
princípios fundamentais, podendo ser verificado, conforme visto anteriormente, logo no início
da lei, tornando-se evidente que os princípios fundamentais assim como diz o nome, são
essenciais e norteiam toda a norma jurídica. (SARLET, 2011)
Pode compreender o princípio da dignidade da pessoa humana como um componente
ético-jurídico inafastável ao qual se subordina todo o direito e é estreme de dúvida que, também
no âmbito do Direito Civil, impõe-se uma releitura dos institutos com vista a preservar e
promover a dignidade da pessoa humana. As relações entre particulares – inclusive, e sobretudo,
naquilo que se refere a exercício de atividade de natureza econômica – subordinam-se ao
pressuposto que é o respeito à pessoa de outro, tomando como sujeito concreto, dotado de
dignidade. (FACHIN; RUZYK, 2011, p. 308)
De acordo com Sarlet (2011) a dignidade da pessoa humana constitui uma qualidade
que não pode ser renunciada, visto que está é integrada é condicionada a pessoa humana,
devendo ser resguardada, admitida e sobretudo respeitada. Desta forma, embora a dignidade da
pessoa humana possa ser violada, a mesma não pode ser retirada por ser um valor intrínseco ao
ser humano. Ainda, reafirma o duplo caráter da dignidade da pessoa humana que incorpora a
autonomia da pessoa de tomar decisões sobre si mesmo. Deste modo, é salutar que o Estado
resguarde a dignidade da pessoa humana quando ausente a possibilidade de autodeterminação
do indivíduo, principalmente no âmbito da biomedicina e da bioética.
No plano jurídico-político, a dignidade consiste em um juízo axiológico inerente à
pessoa, manifestada pela autodeterminação de si, pelas condições necessárias para a
sua manifestação existencial e, também, pela pretensão de respeitabilidade por parte
das demais pessoas. Assim, configura um mínimo nuclear jurídico que o Direito
assegurar. (BAGGENSTOSS, 2018, p. 67)
A palavra autonomia deriva do grego, onde o auto significa próprio, e nomos é regra,
sendo assim a autonomia é capacidade de autodeterminação da pessoa decidir sobre si mesmo,
poder realizar suas escolhas. A autonomia esta intrinsicamente ligada a liberdade, portanto para
se garantir a autonomia é necessário que haja liberdade de pensamento, livre de ameaças. Torna-
26
se, portanto, a autonomia, uma liberdade moral que deve ser reconhecida e respeitada por todos.
É importante frisar que seu significa não é algo concreto, devido seus variados significados
entre os indivíduos. (MIGUEL; DOTTA, 2017)
Dantas (2021) explica que no Brasil, todas as instituições relacionadas a saúde e que
prestam serviços médicos estão condicionadas ao Código de Ética Médica. Neste sentido, é
indicado pelo código que sua dedicação deve ser voltada totalmente para a saúde do indivíduo,
sendo assim é o paciente que tem prioridade na relação. (COLTRI apud DANTAS, 2021). Até
mesmo a declaração Universal sobre a bioética e Direitos Humanos prevê que a dignidade da
pessoa humana e as garantias fundamentais devem ser respeitadas, contudo, predomina o
interesse do indivíduo até mesmo sobre o interesse do médico. Quatro princípios são basilares
na bioética, sendo eles: justiça, autonomia, não-maleficência e beneficência, sendo assim ética
e ciência devem andar em harmonia, pois é através da bioética que se recobra a humanidade na
saúde. (DANTAS, 2021)
Segundo Barboza (2011), boa parte da doutrina leciona que princípio da autonomia da
vontade é uma construção que deriva especialmente do contrato romano, de forma que apenas
a vontade das partes não era suficiente para criar vínculo. Afirma ele que para os
revolucionários, a pessoa livre teria autonomia para firmar contrato, no caso de transferência
da posse da propriedade bastava a possibilidade que este teria de se autodeterminar. Aduz ainda,
que embora o conceito esteja em grande parte atrelado ao negócio jurídico, a autonomia da
vontade está fortemente ligada ao conceito de liberdade, pois a partir do momento que o homem
é admitido como ser dotado de dignidade e liberdade, a concepção da autonomia é estendida
até mesmo em relação ao ser humano e seu corpo tendo duplo caráter. O primeiro envolvendo
a disposição do próprio corpo, e o segundo concernente a intervenção de uma pessoa sobre o
corpo de outrem.
Devido ao controle social é impossível dizer que exista uma autonomia pura,
desvinculada de alguma ameaça interna ou externa. A autonomia não se confunde
com individualismo, porque o indivíduo vive em sociedade e a autonomia é uma ética
humana que ajuda na harmonia dos interesses sociais e individuais. Todavia, quando
o indivíduo exerce a sua razão de forma autônoma, passa a construir diversas
personalidades. A partir disso é possível dizer que a autonomia é o fundamento da
dignidade humana, é através dela que o ser humano se torna distinto e, isso não deve
ser limitado e nem motivo para substituir a livre escolha. (SANTOS apud MIGUEL;
DOTTA, 2017, p.55)
No caso da presente pesquisa, conforme observado por Dantas (2021) quando falamos
de violência obstétrica, entende-se que o médico exerce uma importante função social, tendo
27
como dever o respeito e a autonomia do paciente diariamente. Desta forma, qualquer ato que
fortaleça e reverbere comportamentos desrespeitosos vai contra a própria missão da medicina.
Ou seja, na tomada de decisão de qualquer procedimento invasivo ou não, sendo ele necessário
ou não, o paciente deve estar ciente, e além disso deve expressar se concorda ou não. Portanto,
os princípios da autonomia e da autodeterminação prevalecem a decisão médica na maioria dos
casos.
[...] pode-se afirmar que os princípios da autonomia e da autodeterminação da paciente
são constantes no corpo de normas deontológicos que rege a Medicina no Brasil.
Assim, em respeito a esses mandamentos, as pessoas capazes para decidir devem ser
respeitadas quanto as opções relativas ao seu corpo e a sua vida. Também em
atendimento a esses mandamentos, todos e qualquer ato médico – exceto nos casos de
urgência manifesta – devem ser consentidos pela paciente. (DANTAS, p. 368, 2021)
3 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
c) perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que ocorra.
(BRASIL, 1996)
Dantas (2021), alega que a mídia tem evidenciado nos últimos anos um problema, até
então silencioso, que ocorre continuamente no mundo e no Brasil, tanto em instituições
hospitalares públicas quanto nas privadas. Este problema é denominado como Violência
Obstétrica (VO), ou seja, a violência praticada contra a parturiente, podendo ser difícil de ser
identificado pela vítima.
Os dois séculos antecessores trouxeram consigo um deslocamento do conhecimento
sobre o corpo feminino das mãos do tradicional saber popular da parteira para as mãos
de um corpo profissional médico-obstétrico, o que resultou, inevitavelmente, no
desenvolvimento de uma prática especializada e intervencionista. Esta mudança tanto
do ambiente como dos personagens do momento do nascimento transformou
drasticamente o que antes era um ritual familiar e privativo em um evento
institucional, artificial, despersonalizante, solitário e ameaçador às mulheres dos
tempos “modernos”. Para adequar-se ao novo modelo de assistência, as mulheres
despiram-se e entregaram-se ao discurso masculino da medicina hospitalar. Às
violências cometidas dentro do hospital se convencionou chamarem de violências
institucionais. (WITTE, 2019, p.292)
A pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo (2010) relatou que uma a cada
quatro mulheres sofre violência obstétrica, sendo que as violências mais comuns durante o parto
foram: gritos, procedimentos dolorosos, falta de consentimento e informação e negligência.
Um exemplo muito vivenciado da violência obstétrica é a episiotomia, entre tantos
outros corriqueiros, que chegam a ocorrer na maioria das vezes sem que a vítima nem
mesmo tome conhecimento de ter sido vítima de uma VO, como ocorre quando a
paciente é impedida de escolher a forma e o local do parto, sendo submetida
compulsoriamente a uma cesárea, por exemplo, sem motivo médico que justifique a
submissão, ou até mesmo quando é negado o direito a acompanhante no momento do
parto. (SPACOV; SILVA, p.4, 2019)
30
Segundo Brenes (1991), no Brasil, por volta do século XIX os partos eram feitos
geralmente por mulheres denominadas de aparadeiras ou parteiras leigas cuja aprendizagem foi
através da experiência, assistindo as mulheres durante todo o período gestacional. Elas também
auxiliavam muitas mulheres em relação aos cuidados com o corpo, bem como doenças e por
isso eram constantemente consultadas. Grande parte dessas mulheres eram mulatas, ou
portuguesas do setor popular. Os primeiros registros históricos sobre a temática foram feitos
por volta dos séculos XVII e XVIII na Europa, incorporando tal prática nas instituições de
medicina. Agora as antigas parteiras legais passando a se chamar de parteiro e até mesmo
médico-parteiro, introduzindo então o homem na prática obstétrica. (TOSI apud BRENES,
1991).
Com isso, os homens precisavam aprender na prática o que muitas mulheres já sabiam,
mas necessário esforço do corpo médico para que os mesmos passassem confiança a população
e a essas mulheres para se consultarem, em específico com os obstetras, ora homens. Contudo,
não obtiveram sucesso. Foi a partir desta problemática que se criou uma manipulação por parte
dos médicos, e das instituições hospitalares, na sociedade feminina, propagando discursos da
mulher como um ser frágil, hora mãe dedicada e hora mulher histérica, explorando o campo
psicológico para difundir seus discursos. Foram diversas as tentativas para atrair as mulheres
para locais onde as mesmas podiam ser internadas, devido especialmente, ao processo
menstrual que ainda era pouco estudado e compreendido na época. A última instância para
resolução do problema foi conseguir o apoio do governo, no que competia a internação e o
cadastro em clínicas que existiam na era imperial. (BRENES, 1991)
31
O interesse dos médicos pelas doenças das mulheres e pela obstetrícia não se restringia
à ética ou aos imperativos profissionais da prevenção e da cura das doenças, mas
obedecia também a uma razão política. Tanto na sociedade grega quanto na romana a
importância da mulher era medida por sua capacidade em gerar herdeiros saudáveis.
Na sociedade romana, principalmente no período imperial, o casamento e a geração
de filhos eram assuntos da política dinástica e do Estado. A participação dos médicos
foi de extrema importância e os textos que tratam das mulheres são verdadeiros
manuais de fecundação, conforme explica Rousselle (1984), para que pudessem
prevenir os problemas ou restabelecer a saúde das mulheres, ou seja, a capacidade de
procriar. (MARTINS, 2004, p. 68-69)
tratamento foi com respeito, se houve privacidade e clareza nas explicações sobre os
procedimentos além possibilidade de fazer perguntas e participação nas decisões. Observou-se
que algumas intervenções, como episiotomia e cesariana eletiva, são mais constantes nas
mulheres brancas e com nível escolar elevado, o que torna contraditório. (LEITE et al, 2022)
O Brasil ocupou, até há pouco, a nada invejável posição de campão mundial de
operações cesarianas. Se, por um lado, a cesárea realizada por razões médicas tem um
grande potencial de reduzir a morbimortalidade materna e perinatal, por outro lado, o
exagero de sua prática tem efeito oposto, inclusive por consumir recursos preciosos
do sistema de saúde. Essa profunda distorção na prática médica brasileira é
determinada por múltiplos fatores– históricos, estruturais, conjunturais mas tem, na
forma como a sociedade em geral, e a medicina em particular, encara a mulher, a
gênese dessa permissividade. Ehrenreich & English apontam para o poder da
medicina em transformar eventos fisiológicos em doenças: a medicalização do corpo
feminino – que "trata a gravidez e a menopausa como doença, transforma a
menstruação em distúrbio crônico e o parto em um evento cirúrgico" – é uma das mais
poderosas fontes da ideologia sexista da nossa cultura. (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2001, p.14)
Leite et al (2022) reitera que é desaconselhado pela OMS alguns procedimentos como:
toques vaginais excessivos e por múltiplos profissionais, a episiotomia de rotina, manobra de
kristeller, aminiotomia, uso de ocitocina, cesariana contraindicada nas clínicas e exigências da
posição do parto como obrigar a parturiente a ficar o tempo todo deitada. Entretanto, a grande
maioria dos profissionais da saúde no Brasil não veem essas práticas como abusivas, mas como
algo característico do próprio parto. Para mudar esse arquétipo, alguns cientistas consentem
sobre a necessidade de mudar o modelo de ensino e aprendizagem dos profissionais que atuaram
durante o ciclo gravídico-puerperal, dando maior ênfase as evidências científicas e respeitando
os princípios da autonomia e dignidade da mulher, que são preceitos da ética médica.
Faneli (2020) assevera que esse excesso de intervenção na hora do parto tira todo o
protagonismo feminino, sendo, portanto, uma das principais formas de violência obstétrica, e
que é caracterizado como medicalização do parto, pois deixou de ser conduzido por parteiras e
foi completamente institucionalizado pelos saberes médicos.
No Brasil, a deficiência de informação durante o pré-natal, o modelo de assistência e
a hospitalização do parto transferem para o médico o comando e o poder de decisão
sobre o processo da parturição e, simbolicamente, estabelece-se a “terceirização do
parto”, ou seja, ocorre um fenômeno cultural de transferência do comando de natureza
fisiológico exercido pela mulher grávida para um comando técnico, do médico.
(WITTE, p. 299, 2019)
Como visto, uma dessas formas de medicalização é a cesárea sem indicação, essa
intervenção cirúrgica foi desenvolvida primeiramente para partos de alto risco, portanto
utilizado em casos de emergência. Entretanto, nos dizeres de Nakatano (et al, 2017), existem
34
os “obstetras contemporâneos” dão outro sentido a cesárea, dizendo ser um parto mais
controlado, e vindo como uma medida a simplificar o parto, apurando diagnostico, prevendo o
que pode dar errado sendo então considerados por estes a resolução de todos os partos. No parto
vaginal o protagonismo é da mulher, já na cesariana o trabalho é todo do médico, ele está
controlando além da técnica, o conhecimento e o poder.
É importante salientar que dentro do processo de medicalização, a cesárea sem indicação
médica, aplicação de ocitocina e episiotomia com anestesia, que podem ser consideradas
violência obstétrica, dependendo do caso, ocorrem em maiores quantidades nas mulheres
brancas, (LEITE, et al, 2022) já as mulheres negras estão submetidas as violências mais graves
que podem levar a morte devido a negligência médica por acreditarem que mulheres negras
suportam melhor a dor. (RAMOS, 2020)
Diante deste cenário, é necessário analisar a violência obstétrica como uma questão de
gênero e também como a cor pode interferir no tratamento adequado a gestante e a parturiente
conforme será demonstrado nos itens seguintes.
3.2.1 Violência obstétrica como violência de gênero
“A violência obstétrica caracteriza-se como uma violência de gênero, por ser cometida
contra mulher em todas as etapas da gravidez e do pós-parto, incluindo os casos de
abortamento. Essa violência é considerada como parte integrante de uma sociedade
que violenta as mulheres pela sua identidade de gênero e pela sua condição feminina,
fruto da dominação masculina que origina o machismo, tanto institucional quanto
pessoal, e que recai nas diversas relações da mulher com seu corpo, sua posição na
sociedade e sua dignidade.” (MARQUES, 2020, p. 98-99)
De acordo com Marques (2020) ainda, a caracterização de gênero não está atrelada às
diferenças biológicas entre homens e mulheres na sua concepção, mas são as distinções sociais
e culturais que contribuem nas diferenças de papeis a ambos os sexos, portanto muitas vezes a
mulher encontra-se em posição de desigualdade e inferioridade em relação aos homens,
resultando nos mais diversos tipos de violências e opressões que requerem atenção,
conhecimento e políticas públicas para que sejam refutadas. Esta violência referente ao gênero
se manifesta em inúmeras formas, é uma violência presente na estrutura social, que muitas vezes
é acoberta pela sociedade, e que propaga os comportamentos dos agressores devido a
predominância do machismo.
Por gênero entendem-se todas as normas, obrigações, comportamentos, pensamentos,
capacidades e até mesmo o caráter que se exigiu que as mulheres tivessem por serem
biologicamente mulheres. Gênero não é sinônimo de sexo. Quando falamos de sexo
estamos nos referindo à biologia – as diferenças físicas entre os corpos – e ao falar de
35
Quando ser refere a violência, as mulheres negras evidenciam uma outra proporção do
problema. Reitera-se que além da violência doméstica e sexual que afetam as mulheres de todos
os grupos raciais e classes sociais, há uma forma específica de violência que constrange o direito
à imagem ou a uma representação positiva, delimita as possibilidades frente ao mercado afetivo,
coibi o ingresso em empregos, rebaixando e esmorecendo a autoestima pelo peso dos estigmas
seculares. Esses são considerados por alguns como os efeitos da supremacia dos brancos, no
imaginário e nas relações sociais concretas. Esta é uma violência invisível que arca com saldos
negativos para a subjetividade das mulheres negras. A proporção da violência racial e as
particularidades envolvidas em relação às mulheres dos grupos raciais não-hegemônicos vem
suscitando análises cautelosas e recriação de práticas que se mostram capazes de construir
outros referenciais. (CARNEIRO, 2003)
Não seria de estranhar que nessa conjuntura, de acordo com Goes (2018) que as
mulheres negras são as que mais sofrem com esse tipo de violência na jornada do início da
maternidade, especialmente no momento do parto, sendo deixadas mais tempo em filas de
hospitais para receber atendimento, e quando recebem atendimento costumam ter menos tempo
com o profissional que as atende. A submissão a aplicação de analgesia também ocorre com
maior frequência nelas, devido a isto são propensas a maior risco de óbito, sendo que 60% das
mortes ocasionadas durante o parto são de mulheres negras, do qual 90% dos casos de morte
materna são consideradas previsíveis e evitáveis caso recebessem o atendimento apropriado.
A temática racial é de suma importância que seja considerada ao se falar de violência
obstétrica, pois sua incidência é preponderante em relação às mulheres negras. Leal et al (2014),
ao analisarem os dados da pesquisa supracitada, obtiveram uma sub amostra de 6.689 mulheres,
sendo 1.840 pretas e 4.849 brancas após o pareamento pelo escore de propensão, e conforme
visto anteriormente, concluiu-se que as mulheres negras recebem menos anestesia na hora do
parto em comparação às mulheres brancas, sendo a violência por negligência muito maior em
relação às mulheres negras, que possuíram maior risco de terem um pré-natal inadequado, falta
de vinculação à maternidade, ausência de acompanhante e menos orientação na hora do parto,
ainda, tem-se a esterilização como uma das violências obstétricas que mais acometeram mulher
negras. (MARQUES, 2020).
A esterilização ocupou lugar privilegiado durante anos na agenda política das
mulheres negras que produziram campanhas contra a esterilização de mulheres em
37
função dos altos índices que esse fenômeno adquiriu no Brasil, fundamentalmente
entre mulheres de baixa renda (a maioria das mulheres que são esterilizadas o fazem
porque não encontram no sistema de saúde a oferta e diversidade dos métodos
contraceptivos reversíveis que lhes permitiriam não ter de fazer a opção radical de não
poder mais ter filhos). Esse tema foi, também, objeto de proposições legislativas,
numa parceria entre parlamentares e ativistas feministas que culminou no projeto de
Lei nº 209/91, que regulamentou o uso da esterilização. (CARNEIRO, 2003, p.122)
O chamando racismo institucional2 foi um conceito criado para entender o racismo nas
estruturas de organizações e instituições, nem sempre é manifestado de forma explícita no dia-
a-dia. Sendo o contrário de um ato individual, como por exemplo um xingamento praticado por
um funcionário de hospital contra uma pessoa, o racismo institucional entende que o espaço é
integralmente impactado e reforçado por práticas discriminatórias. Não obstante, muitas
mulheres negras vítimas de violência obstétrica não conseguem identificar tal discriminação
racial momento que está acontecendo. (TEIXEIRA, 2021). Esse racismo institucional é um
grande problema social, gerando mais desigualdades sociais e estigmas
Estudos evidenciam que as desigualdades no acesso à saúde são um problema social
que compromete a saúde da população em países como o Brasil, onde relações de
classe são racializadas e relações raciais são dependentes da classe social. Essas
desigualdades sociais são um grande problema no Brasil, e estão presentes nas
diferenças entre brancos e negros com graves consequências ao afetarem a capacidade
de inserção das pessoas na sociedade brasileira. (OLIVEIRA, 2017, p. 39-40)
Teixeira (2021) traz o estudo realizado pela pesquisadora Ellen Oliveira “Mulheres
negras vítimas de violência obstétrica”, no Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança e
da Mulher, da Fiocruz, e verificou que o racismo faz com que as vítimas reconheçam o
preconceito sofrido mas não conseguem caracterizá-lo. E que é resultado de um longo processo
histórico que ocorre desde a escravidão, onde esses grupos se mostram em desvantagem
econômica, políticas e ainda de forma jurídica até os dias de hoje. Isso pode ser verificado na
desigualdade de salário entre negros e brancos, no acesso a graduação, e na luta pela mudança
de leis que garantam a liberdade e a igualdade. Como resultado os índices desse grupo quanto
a situações de violência são maiores quando comparados a dados de outros conjuntos
populacionais.
2
De acordo com o relatório de inquérito do caso Stephen Lawrence (1999), citado e traduzido por Sampaio (2003),
racismo institucional é visto como “O fracasso coletivo de uma organização pra prover um serviço apropriado e
profissional para as pessoas por causa de sua cor, cultura ou origem étnica. Ele pode ser visto ou detectado em
processos, atitudes e comportamentos que totalizam em discriminação por preconceito involuntário, ignorância,
negligencia e estereotipação racista, que causa desvantagem a pessoas de minoria étnica.” (p.82)
38
Essa diferenciação é mencionada por Leal et (apud Hoffman et al.), no uso de analgesia.
Existem algumas percepções sociais que respaldam esse tratamento diferenciado na questão
biológica:
Esses autores entrevistaram estudantes de medicina e residentes e constataram que
eram comuns as perspectivas identificadas por esses autores como de “racismo
internalizado”, de que, ao se comparar pretos e brancos, os primeiros eram tidos como
mais resistentes à dor. O tema das percepções de profissionais de saúde acerca das
relações entre atributos raciais e resistência à dor ainda está por ser pesquisado no
Brasil. Mesmo que a temática não tenha sido sistematicamente investigada na
pesquisa nascer no Brasil, houve ocasiões, como foi o caso de serviços de obstetrícia
no Rio de Janeiro, em que profissionais de saúde mencionaram uma suposta melhor
adequação da pelve das mulheres pretas para parir, fato que justificaria a não
utilização de analgesia. (HOFFMAN et al. apud LEAL et al, 2017, p.10)
O caso de Alyne da Silva Pimentel Teixeira gerou repercussão em 2002. Alyne era
uma mulher negra de 28 anos, que estava em seu sexto mês de gestação quando precisou buscar
assistência médica devido a fortes dores abdominais, sendo apenas medicada e liberada para
voltar pra casa. Contudo ela não melhorou tendo que retornar ao hospital, verificou-se então
que o feto já estava morto, após hora de espera ela foi submetida a uma cirurgia para retirar a
placenta. Com o agravo do caso, relataram ser necessária a transferência dela para outro
hospital, ainda assim Alyne teve que aguardar por horas no corredor, vindo a falecer em
decorrência da hemorragia resultando do parto do feto. O caso foi apresentado o Cedaw que
responsabilizou o Brasil por não cumprir seu papel de prestar o atendimento médico adequado
desde o início das complicações na gravidez de Alyne. Para o órgão, a assistência à saúde
uterina e ao ciclo reprodutivo é um direito básico da mulher e a falta dessa assistência consiste
em discriminação, por tratar-se de questão exclusiva da saúde e da integridade física feminina.
(AGÊNCIA SENADO, 2013)
A decisão do Comitê CEDAW também é significativa no debate sobre violência
institucional e racismo institucional, ao reconhecer que a morte materna evitável é
uma violação do direito humano à saúde sexual e reprodutiva das mulheres e que a
violência de gênero contra Alyne Pimentel resultou da discriminação interseccional
(de raça, status, classe social e gênero) por ela sofrida, que também atinge, de forma
mais grave no Brasil, mulheres negras, pobres e periféricas. Ela contribui, portanto,
para o aprofundamento da compreensão jurídica sobre os efeitos da discriminação
racial na violência de gênero e na saúde reprodutiva de mulheres negras, pobres e
periféricas. (CATOIA, et al. 2020. p.9)
De acordo com a Rede Parto do Princípio (2012), o racismo dos profissionais de saúde
atrasa a decisão da mulher de buscar assistência, dificultando o acesso da mulher a unidade de
saúde, repercutindo no tratamento adequado que essa mulher deveria ter. Um exemplo disso é
a eclampsia, pré-eclâmpsia e os distúrbios hipertensivos afetam muito mais a população negra,
39
e é a maior causa de mortalidade materna de mulheres negras. Apesar disso, o médico não
poupa seu diagnóstico com base muitas vezes no preconceito racial, e socioeconômico.
Essa violência obstétrica contra mulheres negras, já é chamada por alguns estudiosos de
racismo obstétrico, neste sentido tem se que: “O racismo obstétrico não é algo novo, mas está
emaranhado em histórias que encobrem as expressões contemporâneas do racismo médico
exercido sobre os corpos das mulheres negras.” (DAVIS, 2021, p. 770)
As histórias das mulheres negras marcam as formas como o racismo paira sobre e
perturba seus encontros durante a gestação, o trabalho de parto, o parto e o pós-parto.
Negligência, falta de informação, indiferença, desrespeito e intervenções sem explicação
permeiam a assistência materna e se amalgamam no que pode ser denominado racismo
obstétrico.
3.3 AS CRENÇAS LIMITANTES NA HORA DO PARTO
Existe uma corrente que entende que muitas crenças limitantes sobre o parto estariam
relacionadas com a religião devido a textos bíblicos que se remetem ao pecado original, ou seja,
a Eva como tentadora de Adão. Portanto, repercutiu-se a ideia da mulher como pecadora e que
levou o homem a pecar, e, portanto, como castigo a mesma deveria sofrer as dores do parto.
Essas passagens se tornaram respaldo para que os homens colocassem as mulheres de baixo
dos seus pés, humilhando, degradando, e principalmente ocasionando-lhe dores no parto, além
das sentidas naturalmente pela mulher. Neste sentido Witte (2019) compreende que:
[...] pode nos ser útil para compreender as relações de poder existentes na nossa
cultura ocidental até os dias de hoje. Esta hierarquia mostra-se nitidamente nas
relações entre os profissionais de saúde e as usuárias do sistema de saúde,
principalmente no momento do parto, onde a parturiente apresenta pouco ou nenhum
poder de decisão sobre seu corpo em processo de parturição, e onde, muitas vezes
parece aceitar essa situação de submissão, de violência e de dor dentro das hierarquias
de gênero e de poder. (WITTE, p. 296, 2019)
Para que seja devolvido o protagonismo feminino, Faneli (2020) ressalta que é
importante abordar temáticas envolvendo o parto e que limitam a liberdade da mulher na hora
de decidir pelo parto normal ou cesárea. Ela elenca 4 principais crenças, sendo elas: as
incertezas sobre a capacidade de parir, a mulher acreditar que o parto normal não atende suas
necessidades e que as mulheres do passado estavam mais preparadas para parir pois a forma
que trabalhavam preparavam-nas fisicamente; o medo da dor, que acaba gerando ansiedade,
esse medo está relacionado as experiencias negativas relatadas por familiares justamente por
muitas vezes viverem a violência obstétrica e passar despercebido, assim, o parto vaginal acaba
40
sendo por muitas demonizado; a questão da flexibilidade íntima feminina, muitos mitos são
propagados com relação a genitália feminina após um parto natural, há uma forte repercussão
da ideia de que a vida sexual da mulher nunca mais será a mesma; e por fim de que a cesárea é
uma forma muito mais segura, moderna e sofisticada, propagando-se a ideia de que o parto
natural é algo completamente arcaico, e que não combinaria com a mulher contemporânea.
É importante ressaltar que é necessário a desmistificação sobre o parto, inclusive nas
instituições hospitalares, para que a mulher de fato possa compreender as consequências de um
parto natural e uma cesariana e opte pelo o que é melhor para ela e seu bebê, pois não cabe ao
médico pelo seu anseio de protagonismo, e sua necessidade de operar induzir a mulher a fazer
escolhas por falta de conhecimento.
Neste sentido, será analisada algumas práticas reiteradas que podem consideradas
violência obstétrica, mas que foram normalizadas pelos médicos e instituições hospitalares,
trazendo para a sociedade o entendimento de que é normal e suportável que a mulher passe por
múltiplos tipos de desrespeito e violação.
Obstétrica e Neonatal, no âmbito do Sistema Único de Saúde, que garante a atenção humanizada
e recursos somente necessários, devendo ser evitado intervenções prejudiciais a mulher no
parto. (CARNIEL; Et al, 2019)
Após a episiotomia mais um ato de desrespeito e violação do direito da mulher lhe é
acometido, o chamado “ponto do marido”. Este ponto é a sutura realizada ao corte feito no
períneo da mulher além do que deveria ser feito, o médico da pontos em excesso visando reduzir
o canal vaginal da mulher dando a impressão de que a vagina pareça “virgem”, já que é comum
o a propagação da ideia de que o nascimento de parto normal alarga o canal da mulher.
(MACEDO, 2018)
No Brasil, a episiotomia e seu "ponto do marido", assim como a cesárea e sua
"prevenção do parto", funcionam, no imaginário de profissionais, parturientes e seus
parceiros, como promotores de uma vagina "corrigida". Se as mulheres acham que
vão ficar com problemas sexuais e vagina flácida após um parto vaginal, e que a
episiotomia é a solução, elas tendem a querer uma episiotomia. Mas, quando as
mulheres têm acesso a informação e sabem que é possível ter uma vagina forte por
meio de exercícios, elas passam a compreender que a episiotomia de rotina é uma
lesão genital que deve ser prevenida e que elas podem recusá-la (DINIZ, 2012)
A enfermeira Nayara Faneli (2020) afirma que essa sutura aumenta as dores da mulher
na hora da relação sexual e pode ocasionar muitas infecções. Portanto, essa prática é totalmente
desnecessária e claramente machista que objetiva a garantia de prazer masculino, anulando o
prazer feminino, ficando manifesta mais uma vez na história a humilhação e diminuição da
mulher em detrimento do homem.
Destarte, é evidente que além da laceração sofrida pela mulher durante o parto
desnecessariamente, muitas vezes sem o consentimento da mesma, que por vezes é muito
doloroso, a propagação da cultura machista de que a mulher deve ter uma genitália perfeita que
vise dar prazer ao homem, devendo ser novamente violada com o “ponto do marido”, acarreta
em uma vida dolorosa pra mulher, física e psicologicamente.
Muitas das práticas consideradas violência obstétrica são executadas, para além de
outras motivações implícitas como visto anteriormente relacionados a crenças limitantes, com
a necessidade de acelerar o parto. A aplicação de ocitocina na mulher e o rompimento da bolsa
amniótica são exemplos disso.
43
Por sua vez, a amniotomia precoce, consiste em romper a bolsa amniótica da mulher
artificialmente durante o trabalho de parto, ou até mesmo antes de se iniciar espontaneamente,
essa prática é feita buscando intensificar as contrações e acelerar o nascimento. Contudo é
contraindicado pela OMS, pois já foi demonstrado que esse rompimento para acelerar o
nascimento pode aumentar as chances de infeção tanto para a parturiente quanto para o bebê.
(FANELI,2020). Neste sentido “A amniotomia precoce, associada ou não à ocitocina, não deve
ser realizada de rotina em mulheres em trabalho de parto que estejam progredindo bem.”
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, p. 4, 2017)
Faneli (2020) relata que nesse cenário de intervenções a que se destaca é a manobra de
Kristeller por ser uma técnica completamente desnecessária sem qualquer benefício que
justifique a sua utilização, além disso a prática é totalmente insegura e seus riscos já são
comprovados. Além de toda a dor sentida, podem ocorrer lesões maternar e neonatais, a
hemorragia, contusão, fratura em costelas, chance de laceração perineal e ruptura uterina, bem
como dor na relação sexual, e incontinência urinária. Essa prática já foi proibida em diversos
países, e é totalmente contraindicado pela OMS, entretanto a prática vem se mostrando
manifesta reiteradas vezes como forma de encurtar o tempo de nascimento do bebê.
Os impactos da gestação na vida de uma mulher são gigantescos, tanto nela como mãe,
quanto como mulher. Desde as transformações que ocorrem com seu corpo durante a gestação
até o momento do parto. Um parto natural, com um ambiente acolhedor, tolhido de humanidade,
informação, e amor é difícil e impactante, torna-se muito mais desafiador quando a parturiente
sofre violência obstétrica, onde um sonho se torna seu pior pesadelo. É fato que toda mulher
que deseja ser mãe tem expectativas e anseios em relação ao parto, muitas se informam e mesmo
assim acabando sendo negligenciadas, mas existem muitas mulheres que não tiveram acesso à
informação, e estas estão mais propensas a passar por situações depreciativas e humilhantes.
Sendo assim a violência obstétrica traz diversos danos à saúde física da mulher, mas
inevitavelmente também a saúde mental, tais como ansiedade, síndrome do pânico, depressão,
estresse pós traumático e muitos outros. Essa experiência deixa marcas que vão além das
cicatrizes físicas presentes nelas, fazendo-as relembrar desse terror vivido. (AMARAL;
KLEIN; GRUNEWALD, 2021)
Indo de encontro com os outros tipos de violência obstétrica, tem-se a mais evidente, que é a
violência verbal, está caracterizada como qualquer tipo de frase feita à gestante com o cunho
grosseiro, humilhante, falas preconceituosas, alienação ou qualquer outro tipo de conduta verbal
que desrespeite a dignidade e integridade da mulher. (MACEDO, 2018)
A pesquisa feita pela Fundação Perseu Abramo (2010) relatou que são desferidas a
parturiente frases como “na hora de fazer não gritou”, já a Rede Parto do Princípio trouxe relatos
de mulheres que foram abusadas psicologicamente com a necessidade peregrinar de hospital
em hospital para encontrar uma vaga, a omissão nas informação sobre procedimentos no parto
ou com o bebê e muitas vezes são repreendidas pelo médico ou profissional da saúde que lhe
está atendendo, além de sofrerem várias ameaças e coações como mandar ficar quieta.
Especialmente em relação ao parto normal é possível observar a predominância da
violência obstétrica, ter conhecimento é necessário para se defender de ingerências
desnecessárias realizadas no parto. Há um movimento de mulheres buscando reverter esse
quadro através do chamado “parto humanizado”. (MACEDO, 2018)
Foram destacados alguns tipos de violência obstétrica, contudo é importante frisar que
eles não param por aqui. Há uma diversidade de atos cometidos contra a gestante que podem
ser caracterizados como violência obstétrica. É o caso por exemplo de mulheres que ficam
aguardando horas por atendimento, o uso desnecessário de analgesia que pode acarretar em uma
sequência de acontecimentos, a violência sexual, impossibilitar a parturiente a ter o contato
46
imediato com o bebê, impossibilitar de amamentar, e muitos outros casos que podem ser
considerados violência. Assim, para enfrentar e erradicar a violência obstétrica é necessário
entender como a lei é aplicada, e como ela é caracterizada, além disso analisar as políticas
públicas do país para o combate contra a violência obstétrica conforme será analisado no
próximo capítulo.
a violência obstétrica como uma violência contra a mulher que é definida pela apropriação do
corpo e os processos reprodutivos das mulheres, sendo ocasionada pelos profissionais de saúde,
através do tratamento hostilizado, o abuso da medicalização e patologização dos processos
naturais, e como consequência ocasionam a perda da autonomia e capacidade de decidir
livremente sobre seus corpos e sexualidade, impactando negativamente na qualidade de vidas
das mulheres. Já o Suriname incluiu a violência obstétrica como um tipo penal.
Observa-se que embora esse tipo de violência contra a mulher seja uma discussão
recente, já é possível notar alguns avanços legislativos e sociais. Todavia, é necessário
que os países latino-americanos continuem avançando nessa agenda, visto que ainda
é uma realidade presente e que, muitas vezes, manifesta-se de uma forma quase
imperceptível, o que provoca subnotificações da incidência de tal violação. Por ainda
ser considerado um ato comum na vida das mulheres, a temática necessita de
investimento contínuo em pesquisa e conscientização dos profissionais da área da
saúde, tal qual da população comum, em especial as mulheres, as vítimas, visto que
muitas delas ainda não possuem conhecimento acerca desse tipo de violência.
(COELHO; SANTOS, 2019)
No que tange as ações positivas através de legislação acerca do tema, Macedo (2018)
entende como controverso:
Para muita gente, ainda está no poder legislativo a tarefa de encontrar soluções que
coíbam a violência antes, durante e imediatamente após o parto, reduzam os casos de
violência obstétrica e incentivem as vitimas a não se manterem caladas diante das
agressões. A força da legislação ainda é necessária para uma regulamentação formal
e jurídica do que pode ou não ser feito a uma mulher nesse momento tão especial
quanto delicado. Se não para punir, para educar. (MACEDO, 2018)
Estado de Santa Catarina.” (SANTA CATARINA, 2017). Entretanto a lei mencionada foi
revogada pela Lei nº 18.322, de 5 de janeiro de 2022 que dispõem sobre Políticas Públicas de
Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, neste sentido a violência obstétrica passou a
integrar a referida lei como capítulo V, implantando medidas informativas e protetivas para a
gestante e parturiente.
No Paraná foi sancionada a Lei 19.701 de 20 de novembro de 2018 - Dispõe sobre a
violência obstétrica, sobre direitos da gestante e da parturiente e revogando a Lei nº 19.207, de
1º de novembro de 2017, que apenas tratava da “implantação de medidas de informação e
proteção à gestante e à parturiente contra a violência obstétrica no Estado do Paraná.” Contendo
apenas três artigos genéricos conforme exposto:
Ementa: Dispõe sobre a implantação de medidas de informação e proteção à gestante
e à parturiente contra a violência obstétrica no Estado do Paraná.
A Assembleia Legislativa do Estado do Paraná decretou e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1º Dispõe sobre a implantação de medidas de informação e proteção à gestante e
à parturiente contra a violência obstétrica no Estado do Paraná.
§ 1º Constituem medidas de informação a publicidade da presente norma, informando
os órgãos e trâmites para a denúncia nos casos de violência de que trata esta Lei.
§ 2º Considera-se violência obstétrica todo ato praticado por médico, membro de
equipe médica ou profissionais de posto de saúde, de clínicas e ou de consultórios
médicos que ofendam de forma verbal, física ou psicológica as mulheres gestantes,
em trabalho de parto ou no período puerpério.
Art. 2º O Poder Executivo poderá regulamentar a presente Lei para o seu fiel
cumprimento.
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. (PARANÁ, 2017)
A lei paranaense Lei 19.701/18 que revogou a anterior, específica alguns direitos da
parturiente e gestante, bem como estabelece o pagamento de multa no descumprimento da lei:
Art. 9° O descumprimento desta Lei sujeitará:
I - os estabelecimentos ao pagamento de multa no valor de 1.000 UPF/PR (mil vezes
a Unidade Padrão Fiscal do Paraná), aplicada em dobro em caso de reincidência; e
II - os profissionais de saúde ao pagamento de multa no valor de 100 UPF/PR (cem
vezes a Unidade Padrão Fiscal do Paraná), aplicada em dobro em caso de reincidência.
(PARANÁ, 2018)
Outros estados como: Tocantins, Pernambuco, Goiás, Paraíba, Mato Grosso do Sul,
Rondônia, e Amazonas, também já publicaram leis acerca da violência obstétrica no tocante a
proteção das parturientes, sendo muito similares ou até iguais as leis anteriormente citadas. Não
obstante, grande parte dessas normas estaduais, estão limitadas apenas na definição do conceito
de tal violência, bem como caracterizar a ocorrência da mesma, de modo que somente impõe a
fiscalização aos órgãos competentes para que apliquem as sanções pertinentes através do
procedimento administrativo, assegurada ampla defesa. (FEITOSA; MOTA, 2021)
52
De acordo com o Guia dos Direitos da Gestante e do Bebê, toda gestante e parturiente é
dotada de inúmeros direitos que são garantidos por lei, e alguns deles estão relacionados a
própria violência obstétrica. A portaria MS nº 1.067/2005 cita o direito que a mulher tem de
receber um acompanhamento no seu pré-natal adequado, devendo ser atendida com dignidade
e qualidade durante a gestação, parto e puerpério; além disso garante o direito de ter um
acompanhante nas consultas de pré e pós-natal; ser auxílio no parto e ao puerpério humanizados
e segura; o acesso à maternidade; atendimento adequado e seguro nas situações em casos de
intercorrências. (CARVALHO, et al, 2019)
Além de leis que tratem especificamente de gestantes, conforme mencionado acima, no
Brasil, por esta carência de legislação federal sobre a violência obstétrica, aplica-se o Código
de Defesa do Consumidor, o Código de Ética Médica, e Código Civil e dependendo do caso,
até mesmo o Código Penal, sempre utilizando como guia a Constituição Federal.
[...] em decorrência da lacuna legal que trate especificamente o tema, o amparo ocorre
pela utilização dos direitos fundamentais constitucionais, como a dignidade da pessoa
humana, previsto no inciso III, do art. 1º, da Constituição Federal. Utiliza-se, ainda,
na esfera cível, o próprio Código Civil (CC), para eventual responsabilização civil,
como reparação por danos materiais ou morais, conforme previsto no art. 186, do CC,
que prevê que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito” e, quando aplicado concomitantemente ao art. 927, que diz que
“aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, tem
aplicabilidade ao caso da violência obstétrica. Em alguns casos, pode haver uma
violação ainda mais grave, adentrando a seara penal e, portanto, havendo aplicação de
tipos penais previstos no Código Penal (CP), como o caso de lesão corporal, previsto
no art. 129. (SPACOV; SILVA, 2019 p.12)
De acordo com Carvalho et al. (2019) a Organização Mundial da Saúde assevera que é
direito da mulher ter acesso ao mais alto padrão de saúde, portanto, tem se utilizado a aplicação
do Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90, visto que a mulher é considerada
consumidora, e o profissional de saúde e instituição hospitalar como fornecedores de serviços.
Assim, os direitos básicos garantidos pelo código estão previstos no Art. 6º como: “I - a
proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento
de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos”, e ainda “III - a informação
adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de
quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre
os riscos que apresentem”.
Em especial a temática da presente pesquisa, se faz necessário que essas leis e direitos
são sejam só uma garantia a mulheres brancas, mas também a mulheres negras, pois todos são
54
iguais perante a lei, conforme é previsto no Art. 7º da Constituição Federal de 1988, bem como
dispõe das mesmas proteções garantidas por lei. Ainda assim é necessário reforçar essa
igualdade através da Lei nº 12.288/2010 que institui o Estatuto da Igualdade Racial,
evidenciando isto no seu Art. 1o “Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a
garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos
étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de
intolerância étnica”. (BRASIL, 2010).
Portanto é notório a necessidade de garantir a defesa dos direitos a população negra, a
lei prevê que é dever do Estado garantir essa igualdade, o que deve ser feito através de: políticas
públicas; ações afirmativas; eliminação de obstáculos históricos; modificação de estruturas
institucionais e outros. (BRASIL, 2010)
No tocante a saúde, o Art. 6º e seguintes da lei dispõe o seguinte:
Art. 6o O direito à saúde da população negra será garantido pelo poder público
mediante políticas universais, sociais e econômicas destinadas à redução do risco
de doenças e de outros agravos.
§ 1o O acesso universal e igualitário ao Sistema Único de Saúde (SUS) para
promoção, proteção e recuperação da saúde da população negra será de
responsabilidade dos órgãos e instituições públicas federais, estaduais, distritais e
municipais, da administração direta e indireta.
§ 2o O poder público garantirá que o segmento da população negra vinculado aos
seguros privados de saúde seja tratado sem discriminação.
Art. 7o O conjunto de ações de saúde voltadas à população negra constitui a
Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, organizada de acordo
com as diretrizes abaixo especificadas:
I - ampliação e fortalecimento da participação de lideranças dos movimentos sociais
em defesa da saúde da população negra nas instâncias de participação e controle social
do SUS;
II - produção de conhecimento científico e tecnológico em saúde da população negra;
III - desenvolvimento de processos de informação, comunicação e educação para
contribuir com a redução das vulnerabilidades da população negra.
Art. 8o Constituem objetivos da Política Nacional de Saúde Integral da População
Negra:
I - a promoção da saúde integral da população negra, priorizando a redução das
desigualdades étnicas e o combate à discriminação nas instituições e serviços do SUS;
II - a melhoria da qualidade dos sistemas de informação do SUS no que tange à coleta,
ao processamento e à análise dos dados desagregados por cor, etnia e gênero;
III - o fomento à realização de estudos e pesquisas sobre racismo e saúde da população
negra;
IV - a inclusão do conteúdo da saúde da população negra nos processos de
formação e educação permanente dos trabalhadores da saúde;
V - a inclusão da temática saúde da população negra nos processos de formação
política das lideranças de movimentos sociais para o exercício da participação e
controle social no SUS.
Parágrafo único. Os moradores das comunidades de remanescentes de quilombos
serão beneficiários de incentivos específicos para a garantia do direito à saúde,
incluindo melhorias nas condições ambientais, no saneamento básico, na segurança
alimentar e nutricional e na atenção integral à saúde. (BRASIL, 2010) (grifo meu)
55
Diante do exposto, foi possível observar que existem algumas leis no Brasil que tratam
da violência obstétrica caracterizando-a, outras leis esparsas versando sobre os direitos da
gestante ou parturiente, e também os próprios códigos civil, penal e do consumidor que são
utilizados na falta de lei federal específica. Também se verificou a presença de lei nacional que
garante a igualdade racial, e que no tocante a saúde estabelece a necessidade a garantia do
acesso a saúde a população negra, sendo reforçado através de políticas nacionais, ações
afirmativas e outros.
Ainda assim, é necessário ter a tipificação da violência obstétrica por lei federal, para
que os direitos e garantias fundamentais das mulheres, que são por vezes estigmatizadas,
marginalizadas, e deixadas à mercê da própria sorte, sejam garantidos a fim de refrear a
violência institucionalizada cada vez mais. Daí a necessidade de compreender como a
jurisprudência, tem tratado os casos que são levados ao judiciário, e como se dá a reparação de
danos quando constatada a violência, conforme será exposto.
Trata-se de "ação de indenização por danos morais e materiais". No caso em tese ficou
constata a negligência médica pela morosidade no atendimento a parturiente na rede do SUS,
onde o nascituro apresentava batimentos cardíacos acelerados, e somente após 12h a paciente
foi submetida a cesariana, contudo a criança não resistiu e veio a falecer. Em decorrência da
intervenção cirúrgica a autora contraiu grave infecção. A ação foi julgada parcialmente
procedente para a autora, condenando o réu ao pagamento de indenização por danos morais e
materiais. Do presente acórdão retira-se ainda que, caso o réu seja ente público e comprovado
o ato ilícito, o dano e o nexo de causalidade:
2. Responsabilidade civil
Tratando-se de ação ou omissão do ente público, não há falar em elemento subjetivo
(dolo ou culpa), que, na responsabilidade civil objetiva, é de somenos importância
(art. 37, § 6º, da Constituição Federal). Basta a comprovação do ato ilícito, dano e
nexo de causalidade. (TJSC, Apelação Cível / Remessa Necessária nº. 0305946-
06.2016.8.24.0023. Relator: Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, 1ª Câmara de
Direito Público, julgado em: 08/06/2021). (grifo meu)
O termo “erro” geralmente está atrelado com à ideia de culpa. Deste modo, se o erro
médico não for comprovado juridicamente, não há como considerar alguém culpado. O erro
médico é previsto no Código de Ética Médica, capítulo III, que estabelece a responsabilidade
profissional. Segundo o Art. 1º, “É vedado ao médico causar dano ao paciente, por ação ou
omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência”. Ou seja, a conduta do
profissional deve ser atípica, irregular ou inadequada no atendimento ou prestação do serviço
57
A lei citada foi incorporada à Lei nº 8.080/90, que prevê as condições para a melhoria,
proteção e recuperação da saúde, da organização bem como o funcionamento dos serviços
correlatados e dá outras providências, assim, integrando o capítulo VII, o qual versa sobre o
subsistema de acompanhamento, é previsto:
Art. 19-J. Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde - SUS, da rede própria ou
conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um)
acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.
58
Ou seja, a paciente pode escolher quem será seu acompanhante, não devendo haver por
parte dos profissionais da saúde, ou instituição hospitalar, a objeção sobre a escolha da mulher
sobre ter um acompanhante, além disso a lei não específica quem pode acompanhá-la, ao
contrário, ela frisa que o acompanhante será indicado pela parturiente, sub entende-se que
qualquer pessoa que a faça se sentir segura pode fazer parte desse momento, não importando se
há ou não parentesco. A jurisprudência é clara ao afirmar que a presença de um acompanhante
poderia ter sido benéfica, trazendo conforto e tranquilidade a paciente que demonstrava tensão.
Segundo Dantas (2021), o Código de Ética Médica prevê no Princípio II que o
profissional da saúde tem o compromisso com a saúde do ser humano, devendo esta ser objeto
de sua atenção. Portanto, cabe a ele agir com rigoroso zelo e sempre se adequar
profissionalmente, estando atualizado com a melhor técnica que vise o bem do paciente.
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO.
ERRO MÉDICO. MANOBRA DE KRISTELLER. VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA.
ERRO MÉDICO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM
INDENIZATÓRIO. OBSERVÂNCIA AOS PARÂMETROS DA
RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. JUROS DE MORA. TERMO
INICIAL. SÚMULA 54 DO SJT. ADEQUAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA EM
PARTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A Manobra
de Kristeller é proibida pelo Ministério da Saúde, sendo sua prática considerada
violência obstétrica, principalmente pelo risco de danos neurológicos
irreversíveis no feto e danos ginecológicos na mãe; 2. Configurada a
responsabilidade civil estatal, há o dever de indenizar e o valor da indenização
por danos morais deve ser arbitrado com razoabilidade e proporcionalidade
para cumprir a dupla finalidade compensatória e pedagógica, considerando as
circunstâncias do caso concreto; 3. A indenização pelo dano moral não tem o
objetivo de reparar a dor, mas de compensá-la de alguma forma, minimizando o
sofrimento da apelada que sofre em razão do falecimento precoce de seu filho e
pela violência obstétrica sofrida quando da prática de manobra proibida; 4.
Quanto ao termo inicial dos juros de mora e da correção monetária, aplica-se,
respectivamente, as Súmulas n.º 362 e 54 do Superior Tribunal de Justiça. No caso
dos juros, a data do evento danoso é o dia do cometimento do erro médico, razão pela
qual modifico a sentença nesse ponto; 4. Recurso conhecido e parcial provimento.
(TJ/AM, Apelação Cível, n.º 0619613-73.2017.8.04.0001 Relator: Airton Luís Corrêa
Gentil, 3ª Câmara Cível, julgado em: 28/04/2022)
consequências e riscos que certamente o procedimento trará a paciente, sendo assim assume o
risco e aceita o resultado, assentindo com o dano. Portanto, é notório que o profissional age em
desacordo com o a sua responsabilidade de cuidado, atenção e de diligência a que está obrigado
legalmente para com o paciente.
A em alguns casos mais graves responsabilização pode incutir penalmente também
conforme jurisprudência retirada do sistema do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO CULPOSO. PARTO NORMAL COM
EPISIOTOMIA. ART. 121, § 3º, DO CP. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE DO § 4º
DO MESMO DISPOSITIVO LEGAL. (INOBSERVÂNCIA DE REGRA
TÉCNICA DE PROFISSÃO). PENA QUE NÃO MERECE
REDIMENSIONAMENTO. Demonstrado que o réu agiu com negligência,
imprudência e imperícia, e que dita conduta levou a paciente a óbito, pois, após
o parto com Episiotomia, deixou de realizar procedimento de revisão do reto, o que
propiciou a comunicação do conteúdo fecal com o canal vaginal, culminando com
infecção generalizada, que evoluiu com a morte da vítima, mostra-se correta a sua
condenação pela prática do delito de homicídio culposo. Aplicabilidade da causa de
aumento de pena prevista no § 4º do art. 121 do CP, por inobservância de regra técnica
de profissão. Pena definitiva de dois anos de detenção, substituída por duas restritivas
de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária,
que se mostra adequada ao caso, não ensejando redimensionamento. APELAÇÃO
DESPROVIDA. (TJRS, 2ª Câmara Criminal, Apelação Crime Nº 70053392767,
Relator: Lizete Andreis Sebben, Julgado em 14/11/2013) (grifo meu)
intervenções médicas que são considerados violência obstétrica, como por exemplo a
impossibilidade de a mulher ter o primeiro contato com o bebê logo após o parto, a cesárea
como imposição por parte dos profissionais da saúde, e até mesmo casos de esterilização não
consentida.
É possível perceber que no mundo inteiro, muitas mulheres sofrem abusos e violências
das mais diversas formas, os desrespeitos e maus-tratos durante o parto nas instituições de saúde
tanto públicas quanto privadas são numerosos, principalmente levando em conta que inúmeros
casos nem são denunciados. Esses tratamentos não violam apenas os direitos e garantias da
mulher, no entanto é possível perceber que também o direito à vida, à saúde, à integridade física
e à não-discriminação. Assim, é necessário que haja maior ação, diálogo, pesquisas e
mobilização sobre este grave tema que não somente engloba os direitos das mulheres, mas é
um problema de saúde pública e direitos humanos. (OMS, 2014)
De acordo com Diniz et al (2015 a formação dos profissionais de saúde, principalmente
a dos médicos, tem papel estruturante no formato da estruturante da saúde, e demonstra certa
resistência à mudança. As melhores evidências científicas estão sendo constantemente
atualizadas e são rapidamente propagadas em publicações eletrônicas, contudo, a maioria dos
cursos de medicina tem sua referência fundamentada em literatura desatualizadas, e são raros
os casos onde há orientações aos estudantes sobre como procurar, ponderar, e reexaminar os
ensinamentos a sua disposição em respeito a determinado tema. Portanto, significa dizer que os
graduandos estão limitando seu conhecimento sobre a prática baseada em evidência, e por vezes
tratam as melhores práticas e mais atualizadas, que tem base científica comprovada, como mera
questão de opinião, ou ideologia, mas não como uma forma de melhorar a qualidade de vida
das pessoas.
A despeito das diversas medidas de adequação estrutural e de formação profissional
adotadas no Brasil, ainda não foi atingida a mudança de paradigmas no atendimento
à mulher em estado gravídico e puerperal preconizada pela Organização Mundial de
Saúde. A não observância à perspectiva de gênero na construção das políticas públicas
voltadas à humanização do parto ensejou a insuficiente devoção do poder público ao
reequilíbrio das relações entre mulheres e profissionais no sistema de saúde. (SILVA;
AGUIAR, 2020, p. 65)
61
Alguns estados também tem feitos suas próprias diretrizes, a exemplo disso o Ministério
Público de Santa Catarina em campanhas, e a Defensoria Pública de São Paulo no Núcleo
Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres criou uma cartilha explicando
como se caracteriza a violência obstétrica, e, através da “Redes de Atendimento - Violência
Obstétrica” e disponibilizou algumas instituições e serviços onde podem ser feitas denúncias
sobre a violação, tais como: Ouvidorias de saúde, Ministério Público Federal, Ministério
Público de São Paulo, Delegacias Policiais e a Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
(DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2021)
Uma forma de dar maior autonomia a gestante, é a elaboração do plano de parto. A Lei
nº 15.759/2015 assegura este documento, que consiste na elaboração, durante a fase pré-natal,
de um plano onde é exprimida as vontades com relação ao parto, podendo até mesmo ser
informado com antecedência sobre aplicações de medicamentos, e intervenções. Este
documento deve ser seguido pelos profissionais da saúde, desde que a vida da mesma não esteja
correndo riscos. Mas alguns estudos já mostram as vantagens da utilização desse instrumento,
pois vida o protagonismo da mulher e gera de certa forma, uma maior satisfação materna,
principalmente visando um parto normal que possa acontecer com a maior naturalidade
possível. (FANELI, 2020)
Assim como disposto com Carvalho et al (2019), humanizar o parto e o nascimento não
apenas uma forma de garantir o direito da mulher ou da família sobre o fato de aquele momento
ser único e especial. Mas também, é uma forma de mobilizar, e ir contra a cultura medicalizada,
é uma maneira de enaltecer os valores éticos que são constantemente ensinados durante todo o
percurso da vida, é sobretudo, um recurso para preservar o humanismo.
“Em tempos nos quais os desejos por uma boa morte começam a ser respeitados ao
redor do mundo, não faz qualquer sentido que – dentro do possível e sempre
harmonizados com os princípios da autonomia, justiça, beneficência e não
maleficência – os desejos das mulheres, em um dos momentos mais importantes da
sua vida devam ser desconsiderados, por razões menores. (DANTAS, 2021, p. 386)”
Portanto, diante dos últimos casos que se tem noticiados no Brasil, é possível perceber
que as políticas públicas atuais não têm sido suficientes para resguardar os direitos das
gestantes, é o caso de adoção de medidas extremas, como a sanção de lei federal específica, que
além das especificações sobre como acontece a violência obstétrica, prevê sanções e penas mais
severas para aqueles que, devendo resguardar a saúde física e mental da parturiente promovendo
um ambiente salubre, igualitário, harmonioso, onde a dignidade da mulher e a autonomia sejam
respeitados, violentam em vários aspectos a mulher.
64
5 CONCLUSÃO
A partir da presente pesquisa, foi possível perceber que a violência obstétrica é uma
violência que atinge a dignidade da pessoa humana e a autonomia da mulher sobre seu corpo
durante o parto. A violência obstétrica vem sendo cada vez mais abordada devido a sua
reincidência, portanto, constatou-se que se faz necessário à sua tipificação por lei federal. Além
disso nota-se que as políticas públicas existentes não têm se mostrado tão eficiente, pois grande
parte das mulheres que sofrem com a violência obstétrica não chegam nem se quer a perceber
que os tratamentos desumanos e degradantes antes, durante e logo após o parto, bem como a
intervenções médicas desnecessárias sem o seu conhecimento e consentimento, são
caracterizados como violência obstétrica, diante disso foi possível vislumbrar que há a
possibilidade do nº de violências obstétricas ser extremamente maior do que o relatado.
Ainda, embora seja muito necessária legislação específica que caracterize a violência
obstétrica, e vise tipificação cível e penal, esta se torna uma alternativa fim, para tratar um
problema onde é necessário conhecer suas causas, e onde ele precisamente se inicia. Assim
sendo, como alternativa inicial, é primordial que as instituições de ensino tanto da área da saúde
como de ciências humanas, trabalhem mais o tema e estejam sempre em constante atualização
sobre as medidas e alternativas mais adequadas e benéficas ao paciente, como é o exemplo das
diretrizes da Organização Mundial de Saúde sobre a prevenção e eliminação de abusos durante
o parto nas instituições de saúde.
O parto foi muito medicalizado com o passar dos anos, a mulher grávida muitas vezes
foi tida como cobaia para aplicação de novas tendências, a exemplo da cesárea. Esse tipo de
procedimento seu protagonismo ao médico, que antes era totalmente da parturiente tendo
apenas o auxílio de uma parteira. Isso, combinado ao fator tempo, resultou em profissionais da
saúde que preterem um parto cirúrgico com diversas intervenções, à um parto natural. O parto
natural, por sua vez, foi horrorizado pela aplicação de manobras extremamente dolorosas que
visassem aceleração do parto, a exemplo da manobra de kristeller, episiotomia, amniotomia ou
outros, demonstrando, portanto, a impaciência dos médicos e profissionais da saúde em geral,
bem como uma desvalorização do ser, que perde totalmente sua identidade, tornando-se mera
estatística.
Relacionado a violência obstétrica, notou-se que as mulheres negras são as maiores
vitimizadas, pelo fato de serem mulheres e negras. No âmbito institucional hospitalar é notória
65
a presença da crença errônea de que a mulher negra suporta mais dor, em decorrência disso, ela
é deixada mais tempo em filas de atendimento, no atendimento, as consultas duram menos por
não ser dada a real relevância das mazelas feitas por esta, entre outros exemplos que são muito
corriqueiros. É notório, ainda, que os impactos na vida da mulher existem, o abalo emocional,
psicológico, e até mesmo física, pode leva-la a danos irreversíveis. O judiciário mostra-se pouco
solidário com relação a essas vítimas, as políticas públicas se mostram ineficiente diante das
monstruosidades que ocorrem dentro dos hospitais que aparentam ser uma “terra sem lei”, onde
médicos são deuses e a mulher sua subalterna.
Portanto, os esforços para erradicar a violência obstétrica devém ser constantes,
através de políticas públicas efetivas, legislação específica, requer-se o aprimoramento nas
instituições de ensino, principalmente no âmbito da saúde, devendo o ente público servir como
uma ponte entre os profissionais da saúde e a sociedade, sempre resguardando o direito da parte
mais fraca, ou seja, no caso presente a mulher negra.
66
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