2 - Portugal Medieval (Séculos Xii-Xv)

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2 – PORTUGAL MEDIEVAL (SÉCULOS XII-XV)

Política e Guerra

D. Afonso I (1139-1185)
Quando o conde D. Henrique faleceu, em 1112, o governo do condado Portucalense foi
entregue à viúva, D. Teresa. D. Afonso Henriques passaria a exercer o poder apenas em
1127, quando atingiu a maioridade. Nesse mesmo ano, com o apoio dos nobres
portucalenses, D. Afonso derrotou a mãe e os seus apoiantes galegos na batalha de S.
Mamede, junto a Guimarães. A partir de então, tornou-se livre para governar sem
interferências.
Partindo do Minho, e de forma a afastar-se das influências dos nobres de Portucale, D.
Afonso Henriques avançou para sul e instalou-se em Coimbra, para, a partir dessa
cidade, dilatar as fronteiras do condado. Foi assim que, em 1139, venceu a batalha de
Ourique. Pouco se sabe sobre esta batalha (nem sequer é certo que tenha ocorrido junto
a Ourique, no Alentejo), mas não restam dúvidas de que foi importante, pois foi a partir
daquela vitória que D. Afonso Henriques passou a intitular-se rei.
Nos anos que se seguiram à vitória na batalha de Ourique, D. Afonso Henriques
conduziu novas campanhas militares: para sul, contra os Mouros, e mesmo para norte e
oeste, contra a Galiza e o reino de Leão. Foi numa destas campanhas, ocorrida em 1147,
que o rei conquistou Santarém e Lisboa aos Mouros. Para a conquista de Lisboa teve
mesmo a ajuda de uma armada de cruzados oriundos do norte da europa.
D. Afonso Henriques continuou a expandir o reino até 1169, ano em que foi derrotado
quando tentava conquistar Badajoz. Foi mesmo ferido numa perna durante os combates
e acabou por ficar incapaz de montar a cavalo para o resto da vida.
Em 1179, Portugal foi reconhecido pelo Papa como um reino in- dependente, através do
lançamento da bula Manifestis Probatum. Já em 1143, em Zamora, o rei de Leão e
Castela tinha reconhecido D. Afonso Henriques como rei, embora não lhe garantisse
ainda a independência, que acabou por ser assegurada através do posterior
reconhecimento papal.

D. Sancho I (1185-1211)
Em 1185, D. Sancho i sucedeu no trono ao pai, D. Afonso Henriques. Ainda enquanto
infante, D. Sancho tinha demonstrado qualidades governativas e militares. Por um lado,
começou a auxiliar o pai no governo do reino desde que o progenitor fora ferido na
perna, em 1169. Por outro, deu continuidade à guerra contra os Mouros, defendendo,
em 1184, Santarém de um duro cerco.
Ao longo do seu reinado, procurou dar continuidade à Reconquista, expandindo o reino
em direção a sul. Foi assim que, em 1189, conquistou Silves e Alvor, novamente com a
ajuda de uma armada de cruzados. Ambas as vilas foram perdidas pouco depois, uma
vez que se encontravam isoladas em território inimigo, já que toda a área entre Silves e
Évora era ainda controlada pelos Mouros. A ofensiva muçulmana de 1190-1191,
comandada pela dinastia dos Almóadas marroquinos, conquistou todas as terras a sul do
Tejo, com exceção de Évora.
De forma a estabilizar e fortificar a fronteira, D. Sancho i concedeu cartas de foral a
várias vilas, como Almada (o Tejo era então a fronteira entre o reino de Portugal e os
Mouros). Além disso, concedeu castelos às Ordens Militares, para que aquelas
vigiassem as zonas de fronteira. O pai, D. Afonso Henriques, tinha tido uma política
semelhante.

D. Afonso II (1211-1223)
D. Afonso II sucedeu ao pai, D. Sancho i, em 1211. Ao longo do seu reinado, manteve
uma política de fortalecimento e centralização do poder régio. Através da introdução de
leis escritas, apoiadas no direito Romano, conseguiu afirmar a superioridade do poder
do rei face à nobreza e ao clero. Contudo, tal política levou a que existissem graves
problemas de relacionamento entre o monarca e vários membros da nobreza e do clero.
As inquirições Gerais, lançadas pelo rei, consistiam em inquéritos feitos no terreno
pelos oficiais da coroa e tinham como objetivo limitar as usurpações de terras levadas a
cabo pela nobreza e pelo clero. Uma outra lei, a das confirmações, garantia que o rei
tinha o direito de decidir se os nobres podiam manter as terras que tinham recebido da
coroa. Este processo de centralização e aumento do poder da coroa foi prosseguido, de
forma mais ou menos contínua, pelos reis que se seguiram ao longo dos séculos
subsequentes.
D. Afonso II foi um rei doente – crê-se que sofria de lepra – e, portanto, incapaz de
comandar exércitos em batalha. Mas mesmo sem poder ser um conquistador, como o
pai ou o avô, no reinado de D. Afonso II a Reconquista continuou. Foi levada a cabo
sobre- tudo pelas Ordens Militares e o feito mais significativo foi a conquista de Alcácer
do Sal, ocorrida em 1217. Já antes, em 1212, forças portuguesas tinham participado na
batalha de navas de Tolosa, lado a lado com castelhanos e aragoneses. Esta importante
vitória cristã assinalou o declínio do poderio militar Almóada na Península ibérica e, em
1223, os muçulmanos voltariam a dividir-se em pequenos reinos taifa, permitindo novos
avanços na Reconquista.

D. Sancho II (1223-1248)
Com a morte de D. Afonso II, ocorrida em 1223, subiu ao trono D. Sancho II. O novo
rei começou por pôr fim à disputa que as tias tinham mantido com o seu pai. Cancelou
também algumas das leis de fortalecimento do poder da coroa passadas por D. Afonso
II, de forma a agradar ao clero e à nobreza. Contudo, o rei revelou-se incapaz de
governar de forma capaz e de manter a ordem. Bandos de cavaleiros andavam pelo
reino a saquear igrejas e mosteiros, e o rei, que tinha por obrigação garantir a justiça,
nada fazia.
A Reconquista, entretanto, foi seguindo o seu rumo. Nas décadas de 1220, 1230 e 1240,
o avanço português fez-se pelo Alentejo e Algarve, tendo sido conquistadas vilas como
Elvas, Serpa e Tavira. As Ordens Militares de Santiago e do Hospital foram decisivas
no avanço das conquistas, já que o rei enfrentava problemas em mobilizar o apoio da
nobreza.
Os problemas sociais e políticos no reino acabaram por ser superiores aos sucessos
militares e D. Sancho II foi deposto. Os bispos portugueses, descontentes com a atuação
do rei perante a igreja, apelaram ao Papa que, em março de 1245, depôs D. Sancho II
através da emissão de uma bula papal. Uma nova bula, emitida em julho do mesmo ano,
ordenava ao clero, nobreza e concelhos de Portugal que obedecessem ao infante D.
Afonso, irmão do rei, pois daí em diante seria ele a governar.
O infante D. Afonso era, à época, conde de Bolonha, vila do norte de França, por ter
casado com a condessa Matilde. Em 1245, em Paris, perante bispos portugueses e
emissários do Papa, jurou respeitar a igreja e todos os seus privilégios. Assim, após a
deposição do rei, irmão do infante, o Papa concedeu-lhe o governo de Portugal.
Quando, no verão desse ano, aportou em Lisboa, encontrou o reino dividido entre os
seus partidários e os apoiantes de D. Sancho II. A guerra entre os dois irmãos durou até
1248, altura em que D. Sancho II faleceu, pouco depois de ter partido para o exílio em
Castela.

D. Afonso III (1248-1279)


D. Afonso III, que apenas se intitulou rei após a morte do irmão, passou rapidamente à
ação. Em 1249-1250 concluiu a Reconquista portuguesa, ao ocupar o que faltava do
Algarve, desde logo a cidade principal, Faro. Pouco depois, em 1250-1251, viu-se
obrigado a combater contra Castela, para manter a posse da nova conquista. A questão
só ficou definitivamente resolvida em 1267, passando o Guadiana a marcar a fronteira
sudeste entre os dois reinos.
Enquanto rei, D. Afonso III continuou a política de fortalecimento e centralização do
poder da coroa, seguindo assim os passos do pai, D. Afonso II. Chegou mesmo a lançar
as inquirições Gerais, em 1258, para combater os abusos da nobreza e do clero. Criou os
cargos de meirinho-mor, mordomo-mor e chanceler-mor e entregou-os a nobres da sua
confiança. Com o apoio destes homens, conseguiu expandir o poder da coroa pelo reino.
Ao mesmo tempo, criou uma nova nobreza: a nobreza de serviço, que era subserviente
ao rei e tornava-se rica e poderosa pelo serviço ao monarca, e não pelo combate contra
os Mouros.
Apoiado pelos concelhos do sul do reino durante a guerra civil,
D. Afonso III não tardou a recompensá-los. Concedeu novas cartas de foral e cartas de
feira aos concelhos e criou, em 1253, uma lei de tabelamento de preços e salários. Foi
também o primeiro rei a dar assento em reunião de cortes aos delegados concelhios.
Ao contrário do que seria expectável de um homem que foi elevado ao trono pelo Papa,
D. Afonso III não tardou até começar a limitar os privilégios da igreja em prol do seu
próprio poder. O conflito entre o rei e os bispos portugueses foi intenso ao longo de
todo o reinado e foi por pouco que o monarca não morreu excomungado pelo Papa.
Conseguiu o perdão em janeiro de 1279, um mês antes de falecer.

D. Dinis (1279-1325)
Alçado ao trono em 1279, D. Dinis procurou, desde cedo, deixar uma marca pessoal no
reino, reorganizando-o por completo em praticamente todas as áreas. Em 1289, com a
assinatura da concordata dos Quarenta Artigos, D. Dinis pôs fim ao conflito que opunha
Portugal ao Papado. Embora tenham existido fricções com o clero português, D. Dinis
conseguiu várias decisões favoráveis por parte do Papa. Exemplo disso foi a permissão,
concedida em 1319, para a transferência dos bens da extinta Ordem do Templo para a
recém-criada, e exclusivamente portuguesa, Ordem de cristo.
D. Dinis preocupou-se em consolidar e defender as fronteiras do rei- no, uma vez que
não as podia alargar. A sul nada mais havia a conquistar, a leste, Castela era um vizinho
demasiado poderoso. Em 1297, após um curta guerra contra Castela, foi assinado o
Tratado de Alcanizes, que garantiu a estabilização de toda a fronteira leste do reino.
Em todo o caso, e de forma a garantir a defesa do reino, D. Dinis mandou construir ou
reparar centenas de castelos por todo o território, em particular nas regiões de fronteira.
Tomou ainda outras decisões de cariz militar, como a criação dos besteiros do conto,
uma milícia de homens dos concelhos armados com bestas. Ou ainda a criação de uma
marinha de guerra, para proteger a costa e o comércio marítimo dos ataques dos piratas
muçulmanos do norte de África e do reino de Granada.
D. Dinis também se preocupou em reforçar e centralizar o poder da coroa. Por isso, para
combater os abusos da nobreza e do clero, lançou várias inquirições Gerais, entre 1283 e
1307. Também se preocupou, desde o início do reinado, em acabar com o poder de D.
Afonso, seu irmão, que tinha construído um poderoso senhorio no Alto Alentejo.
Assim, o rei atacou o infante em 1281, 1287 e 1299, acabando por o vencer e obrigar a
exilar-se em Castela.
A política seguida pelo rei gerou um grande descontentamento entre várias partes da
nobreza, o que acabou por conduzir a uma guerra civil. Esta durou entre 1319 e 1324, e
opôs o rei às forças da nobreza comandadas pelo seu filho mais velho, o infante D.
Afonso. A guerra correu mal a D. Dinis, que foi obrigado a admitir a der- rota e a fazer
várias concessões. Morreu praticamente isolado, em janeiro de 1325.

D. Afonso IV (1325-1357)
Ao contrário do que seria esperado de um infante que se revoltou contra um rei
centralizador, D. Afonso IV seguiu de perto os passos do pai. Cedo começou a limitar
os poderes senhoriais da nobreza que antes tinha ajudado a defender. Atacou e derrotou
os irmãos bastardos que se lhe tinham oposto durante a guerra civil, demonstrando,
assim, que não queria ter rivais no reino.
Criou novos tipos de funcionários régios para poder exercer um maior controlo sobre os
concelhos: os juízes de fora, representantes da justiça do rei com mais autoridade do que
os juízes locais; e os vereadores, que intervinham em assuntos económicos em nome do
rei. Regulou ainda a ação dos corregedores, funcionários que circulavam pelo reino
corrigindo – daí o nome – os erros da justiça local. O controlo sobre o reino ia
crescendo e, em 1334, D. Afonso IV chegou ao ponto de ordenar que todos os
detentores de terras no reino se apre- sentassem na corte. O rei queria, desta forma,
confirmar a legitimidade das jurisdições detidas pela nobreza, clero e Ordens Militares.
Ao mesmo tempo que o rei aumentava o seu poder, começavam a surgir numerosos
sinais de crise económica e social. Os motivos da crise foram, desde o reinado de D.
Dinis, os maus anos agrícolas e, mais tarde, a Peste negra (1348-1352).
Em 1340, D. Afonso IV comandou o exército português que, ao lado dos exércitos
castelhanos e aragonês, derrotou um numeroso exército muçulmano na batalha do
Salado, no sul da Andaluzia. A aliança entre os reinos cristãos foi patrocinada pelo
Papa, e acabou por resultar na derrota da última invasão islâmica da Península ibérica.
D. Afonso IV não hesitou mesmo em aliar-se ao rei de Castela, seu genro, com quem
tinha estado em guerra entre 1336 e 1339.
Foi também durante o reinado de D. Afonso IV que se deram os primeiros passos, ainda
hesitantes, na expansão portuguesa. O rei enviou, nas décadas de 1330 e 1340, várias
armadas às ilhas Canárias. O Papa, no entanto, não reconheceu a D. Afonso IV a posse
das ilhas. Apesar destes primeiros passos, a expansão além-mar só começaria no reinado
de D. João i, com a conquista de Ceuta, em 1415. No final do seu reinado, D. Afonso IV
debateu-se com uma questão que colocava o reino em risco: a relação entre o infante
D. Pedro e D. Inês de castro. A família dos Castro, que tantos problemas políticos dava
ao rei de Castela, tentava, assim, alcançar uma posição favorável junto do futuro rei de
Portugal. Percebendo a ameaça, e apoiado pela nobreza, que temia, num futuro
próximo, perder os cargos em favor dos Castro, D. Afonso IV mandou matar D. Inês de
castro, em 1355. Seguiu-se a revolta de D. Pedro que culminou numa guerra civil contra
o pai.

D. Pedro I (1357-1367)
Assim que subiu ao trono, D. Pedro i procurou de imediato vingar-se dos assassinos de
D. Inês de castro, tendo conseguido matar dois dos três responsáveis. A morte de D.
Inês tinha, no entanto, impedido os Castro de influenciarem a política portuguesa. Ao
que tudo indica, o casal nunca chegou a casar, pelo que os filhos eram todos ilegítimos.
Este pormenor será importante no final do reinado de D. Fernando.
Em 10 anos de reinado, D. Pedro i percorreu todo o reino e preocupou-se sobremaneira
com a justiça e a forma como era aplicada no território. Contudo, não parece ter tido o
mesmo desejo de alguns dos reis que o antecederam, desde logo o pai e o avô, de refrear
os com- portamentos da nobreza, pelo que não lançou quaisquer inquirições.
Ainda assim, a alta nobreza temia-o – mais não fosse pela vingança sangrenta que
exerceu contra os assassinos de D. Inês de castro – e o reino, no geral, respeitava-o
enquanto rei. No entanto, a crise social que teve origem nas dificuldades económicas e
na Peste negra ainda se fazia sentir com intensidade no reino.
Enquanto rei, D. Pedro I soube manter a neutralidade portuguesa face aos conflitos
internos castelhanos, embora, por várias vezes, tenha sido chamado a intervir. Do seu
casamento com D. Constança Manoel – ocorrido anos antes do romance com D. Inês de
Castro – nasceu o único filho legítimo e herdeiro, D. Fernando. Entre os vários filhos
ilegítimos contava-se D. João, feito Mestre da Ordem de Avis logo aos 7 anos de idade.
Era o futuro D. João i.

D. Fernando (1367-1383)
D. Fernando beneficiou, logo no início do reinado, da boa administração dos bens da
coroa operada pelos antecessores, em particular D. Afonso IV (1325-1357) e D. Pedro I
(1357-1367), que tinham deixado os cofres régios cheios de metais preciosos. No
entanto, quando faleceu, em 1383, D. Fernando deixou o reino mergulhado numa forte
crise económica, social e político-militar.
As três guerras que mantiveram contra Castela (1369-1371, 1372-1373 e 1381-1382),
conhecidas como Guerras Fernandinas, deram origem a uma grande devastação um
pouco por todo o reino, já que este foi várias vezes atacado e invadido. Lisboa chegou
mesmo a ser alvo de um apertado cerco em 1373.
Após o fim da última das guerras, foi assinado, em 1383, o Tratado de Salvaterra de
Magos, que estabelecia a paz entre Portugal e Castela, ao casar a filha de D. Fernando,
D. Beatriz, com o rei de Castela, D. Juan I. Este tratado colocava o reino em perigo de
perder a independência, pois D. Fernando não tinha um filho homem que lhe pudesse
suceder no trono.
Pouco depois, em outubro de 1383, D. Fernando faleceu, e o rei- no passou a ser
governado pela viúva, D. Leonor Teles. A rainha era uma mulher impopular e não
tardou até que se revoltassem contra ela. Anos antes, quando casou com D. Fernando, já
tinham acontecido revoltas populares semelhantes. A revolta mais importante ocorreu
em Lisboa em 1383, e obrigou mesmo a rainha a fugir para Santarém, de onde pediu
ajuda ao genro, o rei Juan i de Castela.

D. João I (1385-1433)
Em Lisboa, o líder da revolta popular cedo se revelou ser D. João, Mestre da Ordem
Militar de Avis e filho bastardo do rei D. Pedro I. Ao assassinar o conde Andeiro, um
dos maiores apoiantes de D. Leonor Teles e seu suposto amante, o Mestre obrigou a
rainha a fugir. Tomou então o controlo da cidade e preparou-a para o combate. Durante
todo o ano de 1384 aguentou um duro cerco imposto pelo rei de Castela.
Nuno Álvares Pereira foi, ainda antes do cerco de Lisboa, envia- do para sul, para
defender a fronteira alentejana. Era já então um dos mais importantes apoiantes de D.
João. Foi junto à vila de Fronteira que, em abril de 1384, venceu a batalha dos Atoleiros
contra um exército castelhano.
O cerco de Lisboa acabou por correr mal ao rei de Castela, que se viu obrigado a retirar
depois de o seu exército ter sido atacado pela peste. A partir de então, D. João e D. nuno
Álvares Pereira iniciaram uma campanha para subjugar as vilas e castelos que apoiavam
o rei castelhano, como era o caso de Torres Vedras.
No início de 1385, tiveram lugar cortes em Coimbra. Foi a primeira vez que numa
reunião do género foi eleito um rei de Portugal. O Mestre foi escolhido como rei, e
passou a ser D. João i. A sua causa deveu muito ao apoio armado de D. nuno Álvares
Pereira e aos argumentos legais do doutor João das Regras.
Nesse mesmo ano de 1385, o rei de Castela comandou nova in- vasão contra Portugal,
tendo entrado no reino a partir da Beira. Parte do seu exército foi derrotado em
Trancoso pelos fidalgos beirões, mas a maior parte continuou a seguir para sul, rumo a
Lisboa. O novo rei, D. João i, e o seu novo condestável, D. nuno Álvares Pereira,
decidiram sair-lhe ao caminho nas proximidades de Leiria. Deu-se então, a 14 de agosto
de 1385, a batalha de Aljubarrota.
Após a vitória, D. João i passou à ofensiva, atacando o reino de Castela para obrigar D.
Juan i a assinar a paz. Foi aí que, junto a Badajoz, em outubro de 1385, D. nuno Álvares
Pereira venceu a batalha de Valverde.
A aliança entre Portugal e a Inglaterra foi estabelecida pelo Tratado de Windsor, em
1386. No ano seguinte, D. João i casou com D. Filipa de Lencastre, prima do rei inglês.
A partir de então, D. João i pôde contar com um apoio inglês mais forte quando tinha de
enfrentar Castela.
A paz definitiva entre Portugal e Castela só foi alcançada com a assinatura do Tratado
de Medina del Campo, em 1431. No entanto, depois da chamada Paz de Ayllon, de
1411, não houve mais com- bates entre os dois reinos. Foi este tratado de 1411 que
permitiu a
D. João i atacar e conquistar Ceuta, dando assim o primeiro passo da expansão
portuguesa. Quando faleceu, em 1433, D. João I deixou um reino muito diferente
daquele que tinha recebido.

D. Duarte (1433-1438)
D. Duarte seguiu, em boa medida, o trabalho iniciado pelo pai.
D. João i tinha sido obrigado, no início do reinado, a dar muitas das terras da coroa à
nobreza, em troca de apoio militar. Com a guerra a chegar ao fim, o rei passou a tentar
comprar de volta essas terras, embora a nobreza não o quisesse aceitar. D. Duarte deu
continuidade a esse processo, de forma a fortalecer, uma vez mais, o seu próprio
património. Para tal, instaurou a Lei Mental, uma lei que regia a forma como as terras
que a nobreza detinha em nome do rei podiam ser herdadas.
Ainda enquanto infante, D. Duarte tinha começado a auxiliar o pai nas tarefas de
governo do reino. D. João i, nos seus derradeiros anos de vida, preferia caçar a assinar
documentos. Por isso, quando chegou ao trono, D. Duarte era já um homem maduro e
experimentado. Embora só tenha reinado durante cinco anos, foi ele quem governou
Portugal praticamente sozinho entre 1411 e 1433.
D. Duarte foi ainda responsável pela criação de uma série de outras leis, apelidadas de
Ordenações de D. Duarte, que facilitavam a aplicação da justiça e controlavam a ação
dos funcionários régios. Essas leis seriam, mais tarde, ampliadas pelo filho, D. Afonso
V, com a publicação das Ordenações Afonsinas.
O principal acontecimento do reinado de D. Duarte foi a expedição fracassada contra
Tânger, ocorrida em 1437, que iremos abordar no capítulo seguinte. Diga-se, no
entanto, que quando D. Duarte morreu, em 1438, vítima de peste, muitos dos problemas
causadas pela expedição ficaram por resolver.

D. Afonso V (1438-1481)
D. Afonso V subiu ao trono após a morte inesperada do pai, o rei D. Duarte. Tiveram
então início lutas pelo governo do rei- no, já que o pequeno rei tinha apenas 5 anos de
idade. A mãe,
D. Leonor de Aragão, e o tio paterno, o infante D. Pedro, lutaram pelo poder entre 1438
e 1440. D. Pedro acabou por vencer, e D. Leonor exilou-se em Castela. D. Pedro
governou o reino em nome do sobrinho até 1448, altura em que o rei, maior de idade
desde 1446, afastou o infante da corte. O exílio deveu-se às in- trigas urdidas pelos
rivais de D. Pedro.
O infante era acusado de ser demasiado ambicioso. Como prova, era apresentado o facto
de ter casado a filha, D. isabel, com o jovem rei. D. Pedro acabou por morrer na batalha
de Alfarrobeira, em 1449. Combateu contra as forças do rei, que então era apoiado pelos
rivais do infante, como D. Afonso, filho bastardo de D. João i e primeiro duque de
Bragança.
Durante os primeiros anos do seu reinado autónomo, a partir de 1449, D. Afonso V
perseguiu os apoiantes do tio e sogro, D. Pedro iria perdoá-los anos mais tarde, mas até
esse momento tirou-lhes os bens e deu-os a antigos apoiantes da sua mãe, D. Leonor,
que, entretanto, tinha falecido no exílio, em Castela. O rei recusou-se, no entanto, a
afastar a rainha, o que era pedido por antigos rivais de D. Pedro. D. Isabel acabaria por
falecer em 1455, após dar à luz o príncipe D. João, futuro D. João II.
D. Afonso V foi um rei que teve interesse nos descobrimentos. Apoiou sempre as
atividades do infante D. Henrique e, quando este morreu, em 1460, assumiu o controlo
da navegação na costa ocidental africana. Também teve interesse na luta contra os
muçulmanos em Marrocos. Por isso, em 1458 conquistou Alcácer Ceguer e, em 1471,
Arzila e Tânger. Pelo meio ficava uma campanha fracassada contra Tânger, em 1463-
1464.
Na década de 1450, D. Afonso V começou a ganhar interesse no trono de Castela.
Assim, ao longo dos anos seguintes, foi angariando apoios para se poder tornar rei de
Castela e Portugal em simultâneo. Em 1475, casou com D. Joana, filha do falecido rei
Henrique IV de Castela, e reclamou para si a coroa daquele reino. Entrou em guerra
contra D. isabel de Castela, meia-irmã do falecido rei, e o seu marido, D. Fernando de
Aragão. A guerra não correu bem e, em 1479, no Tratado das Alcáçovas-Toledo, D.
Afonso V desistiu do trono castelhano. Faleceu em 1481, desapontado pelo insucesso.

Economia e Sociedade

A Igreja Medieval
Ainda antes da queda do império Romano do Ocidente, ocorrida em 476, tinham-se
estabelecido vários reinos germânicos pagãos na europa Ocidental. Na Hispânia
estabeleceram-se, como vimos no capítulo anterior, os reinos dos Suevos e dos
Visigodos.
A igreja, com o Papa à cabeça, conseguiu sobreviver à queda do império Romano do
Ocidente. Foi mesmo a única instituição que, ao sobreviver, conseguiu preservar
elementos da cultura romana, como o Latim ou o direito Romano. Foi a igreja que
começou a cristianizar os novos reinos germânicos. Como vimos antes, o rei visigodo,
Recaredo, converteu-se, em 589, ao cristianismo.
Durante séculos, os clérigos desempenharam um duplo papel. Por um lado, só eles
podiam garantir ao Ser Humano a salvação da alma num período em que a morte estava
muito mais presente do que hoje. Podia ocorrer a qualquer momento e acontecer a qual-
quer um, particularmente às crianças.
Por outro lado, os clérigos eram os únicos que sabiam ler e escrever, e, portanto,
tornavam-se muito úteis para os reis, que precisavam de governar reinos cada vez
maiores e mais complexos. Reis como D. Afonso II (1211-1223) nunca poderiam ter
lançado as inquirições Gerais se não tivessem funcionários que lessem, escrevessem e
conhecessem a lei, ou seja, o direito Romano.
O poder do Papa e da igreja foi muito importante ao longo da idade Média, e ajudou a
moldar a vida dos europeus. Como vimos antes, o poder do Papa era tal que podia depor
reis que ofendiam os bens da igreja. Foi o que aconteceu a D. Sancho II (1223-1248).

Uma sociedade de ordens


A sociedade medieval europeia era uma sociedade de Ordens, ou seja, cada indivíduo
era colocado num grupo social com funções e estatutos diferentes. Ao todo, existiam
três Ordens que se organizavam em forma de pirâmide:
No topo ficavam os oradores, ou seja, o clero, cuja função era rezar para garantir a
proteção divina para todos. No meio, os guerreiros, portanto, a nobreza, que devia
defender os clérigos e os trabalhadores. Na base, os trabalhadores, comummente
apelidados de povo, que deviam alimentar e sustentar os clérigos e os nobres com o seu
trabalho.
Este era o modelo teórico que deveria guiar toda a sociedade medieval e, como se pode
perceber, era um modelo idealizado que nunca correspondeu totalmente à realidade. Em
Portugal, o rei D. Duarte (1433-1438) escreveu sobre este assunto, aumentando o
número de ordens para integrar os grupos que ficavam de fora, como os mercadores, e
que eram tão importantes para o funciona- mento da sociedade.
Ainda que desajustado da realidade, o modelo das três Ordens durou muito tempo,
mesmo para além da idade Média, só sendo definitivamente posto de parte após a
Revolução Francesa. No vértice da pirâmide encontrava-se o rei, ele mesmo originário
da no- breza, cujos principais deveres eram garantir a defesa dos súbditos e administrar
a justiça, de forma a manter a paz social no reino.
A ascensão social existia, mas não era muito comum. Um camponês rico podia ser
armado cavaleiro se servisse o rei na guerra com homens ou lhe emprestasse dinheiro.
Mas não poderia subir muito mais. Por outro lado, por muito pobre que um fidalgo
fosse, nunca deixaria de ser fidalgo, pois assim tinha nascido e assim morreria.

Fome, peste e guerra – o século XIV


Os séculos XI a XIII foram um período em que a população europeia cresceu
consideravelmente, fruto do aumento da produção agrícola. Costuma-se chamar a este
período o renascimento das cidades, pois os centros urbanos tornaram-se mais
populosos, ricos e, consequentemente, mais importantes.
Face a estes séculos de crescimento, o século XIV aparece como um período de graves
crises, por ter sido assolado por fomes, guerras e pestes. A má imagem que hoje em dia
impera sobre os 1000 anos de idade Média (c. 500-c. 1500) deve-se, em grande parte, ao
século XIV.
Logo nas primeiras décadas deste século, as alterações climáticas, em particular o
arrefecimento das temperaturas, provocaram uma série de maus anos agrícolas um
pouco por toda a europa. O pão era, então, a base da alimentação, e uma escassez de
cereais conduzia, inevitavelmente, à fome.
Nesse mesmo período, vários reinos europeus envolveram-se em sangrentos conflitos
militares. Inglaterra e França deram início à Guerra dos 100 Anos (1337-1453) e, mais
tarde, arrastariam Portugal e Castela para o conflito. Na Península ibérica, Portugal
enfrentou não só guerras civis (em 1319-1324 e 1355), como também se envolveu em
conflitos contra Castela (1336-1339; 1369-1371; 1372-1373; 1381-1382 e 1383-1431).
A guerra provocava, natural- mente, grande destruição: morriam homens – e, em muitos
casos, também mulheres e crianças –, arruinavam-se campos cultivados e roubavam-se
bens.
A Peste negra assolou a europa entre 1347 e 1352. Chegou a Portugal em 1348 e, tal
como no restante continente europeu, apanhou os habitantes enfraquecidos pela fome e
pela guerra. A Peste negra foi vista desde o início como um castigo divino, pois não
havia forma de a combater.
Por toda a europa terão morrido milhões de pessoas, embora seja impossível saber
números certos. Sabe-se, no entanto, que só no início do século XVI a população
portuguesa alcançou os valores que tinha antes da chegada da Peste negra, em meados
do século XIV.

O crescimento urbano – lisboa


Em 1147, quando D. Afonso Henriques conquistou Lisboa, a cidade era já um
importante centro urbano. Até ao início do século XIII, a cidade não terá contado com
mais do que 10 mil habitantes. No entanto, no final do século XIV, na altura em que
elevou D. João, Mestre de Avis, a regedor e defensor do reino, contaria já com cerca de
35 mil, sendo, sem dúvida alguma, a cidade mais importante. Estes números são
particularmente significativos quando comparados com a população do Porto, que, em
torno do ano 1400, não passaria os 4 mil habitantes. Lisboa foi, portanto, um exemplo
claro do renascimento das cidades que antes referimos.
Durante a idade Média, a corte era itinerante, ou seja, o rei per- corria o reino com a
família e o seu séquito de cavaleiros e servi- dores. Isto significava algo que, para nós, é
estranho: uma capital móvel. A capital é onde o rei está, seja em Lisboa, seja numa
pequeníssima aldeia perdida nos montes.
Ainda assim, os reis tiveram sempre algumas cidades onde passavam mais tempo, como
Lisboa, Santarém e Évora. A itinerância da corte devia-se, em grande parte, às
dificuldades de abastecer com alimentos um grande número de pessoas. Ou seja, era
muito difícil, numa sociedade com uma agricultura pouco produtiva, ali- mentar um
grande número de pessoas numa só região. Também por isso os reis começaram a
preferir Lisboa que, por estar junto ao Tejo, era mais fácil de abastecer por via marítima.
Também o comércio internacional ajudou Lisboa a crescer. As ligações entre o
Mediterrâneo e o norte da europa, feitas por mar, tinham um porto de escala obrigatório
em Lisboa. Isto tornava a cidade um importante polo para mercadores e banqueiros,
sobretudo italianos. Mais tarde, já durante a idade Moderna, Lisboa viria a ser uma das
maiores e mais importantes cidades do mundo, mantendo contactos por via marítima
com a europa, África, Ásia e Américas.

Cultura e Artes

Castelos e igrejas – do românico ao Gótico


O Românico foi um estilo artístico que se espalhou pela europa nos séculos Xi a XIII. A
Sé de Lisboa foi, na sua origem, uma construção românica, tendo, no entanto, sido
sujeita a intervenções posteriores. O Românico foi um estilo caracterizado por
construções de dimensões modestas e poucos complexas, sobretudo quando comparadas
com edificações de períodos posteriores.
Os primeiros castelos de pedra começaram a surgir por volta do século XII, portanto,
em pleno período de arte românica. Eram construções de pedra simples, com muralhas
grossas e altas, e um pequeno número de torres. A torre de menagem – a mais alta e
forte – era o ponto mais importante do castelo, por aí habitar o seu senhor ou alcaide.
O Gótico, estilo artístico oriundo do norte da europa, chegou a Portugal algures em
meados do século XIII. A utilização do Gótico marcou a construção dos edifícios,
essencialmente, até ao final do século XV, altura em que foi introduzido o estilo Gótico
Tardio, comummente apelidado de Manuelino, que abordaremos mais adiante.
Ainda hoje existem, espalhados por todo o País, castelos e igrejas de estilo Gótico. Os
claustros e as naves de grandes dimensões, bem como os arcobotantes (suportes para
aguentar paredes muito altas), são alguns dos elementos mais visíveis deste estilo
arquitetónico. Os dois monumentos mais imponentes do Gótico em Portugal são os
mosteiros de Alcobaça e da Batalha.
A introdução do Gótico em Portugal também operou evoluções nos castelos, sobretudo
no reinado de D. Dinis (este rei mandou renovar 57 castelos!). O número de torres ao
longo das muralhas aumentou, e foram mesmo colocados torreões em zonas mais
frágeis, como junto às portas (conforme se pode ver no castelo de Guimarães).

O português como língua escrita


A língua foi-se desenvolvendo a par do reino, tornando-se o Português um elemento
importante para a criação de uma identidade nacional, num processo que teve início na
idade Média, mas que durou vários séculos até se consolidar.
O Galaico-Português foi a primeira forma dessa língua. De bases latinas, teve origem no
noroeste da Península ibérica, na região que engloba a Galiza e o norte de Portugal, mas
desde cedo adquiriu e adaptou palavras de origem árabe. O mais antigo documento não-
literário escrito em Galaico-Português que chegou até ao presente foi o testamento de D.
Afonso ii, datado de 1214. Já era, no entanto, uma língua falada e mesmo utilizada no
contexto da composição literária desde finais do século XII, sendo disso exemplo as
cantigas de amigo e de amor ou as cantigas de escárnio e maldizer.
Com D. Dinis (1279-1325), o Português tornou-se a língua “oficial” dos documentos
escritos e expedidos a partir da chancelaria régia, substituindo o Latim. A chancelaria
régia era o organismo que acompanhava em permanência o rei e que passava a escrito
todo o género diplomas e leis. Se o rei fizesse a doação de uma terra a um nobre, essa
doação era feita por escrito, redigindo-se um documento que o comprovava. O
documento era feito em duplicado, sendo uma cópia enviada ao nobre e ficando outra
para o rei, para que este pudesse sempre saber a quem tinha dado o quê. Também a
criação da primeira forma de universidade em Portugal, o estudo Geral, foi,
simultaneamente, causa e consequência do aumento da importância da língua
portuguesa.
Ao longo do século XIV surgiram novas formas de utilização da língua portuguesa,
desde logo na escrita de livros de linhagens, como o célebre Livro de Linhagens do
Conde D. Pedro. Um livro de linhagens é um documento onde se incluem pequenas
histórias sobre a origem e desenvolvimento das várias famílias nobres do reino. Podem
ser histórias verídicas ou lendas puramente ficcionadas, mas o propósito é o mesmo:
dignificar e demonstrar a importância da nobreza para a construção do reino, sobretudo
no que diz respeito à guerra contra os Mouros que, como vimos, era a principal
atribuição da nobreza.

As crónicas de reis e os romances de cavalaria


As crónicas dos reis surgiram como uma ferramenta para criar uma imagem quase
perfeita dos reis. Tinham, portanto, uma função semelhante à dos livros de linhagens da
nobreza. As crónicas deviam ser registos dos acontecimentos ocorridos durante um de-
terminado espaço de tempo, geralmente o reinado de um rei específico. Isto é o que
sucede, por exemplo, com a Crónica de D. João I, de Fernão Lopes. Ainda que as
crónicas fossem, em muitos casos, idealizadas, são, por vezes, a única fonte para o
estudo de certas épocas.
O século XV constituiu o auge da crónica régia portuguesa, em- bora já no século XIV
tivessem sido escritas crónicas, como a Cró- nica Geral de Espanha de 1344 (neste
período, Espanha referia-se a todo o espaço geográfico da Península ibérica, e não ao
reino de Espanha que, na altura, ainda não existia). Foi no século XV que se criou um
novo tipo de funcionário régio: o cronista-mor do reino, que tinha por função a escrita
das crónicas de reis.
As crónicas foram, desde o início, utilizadas para educar a nobreza. Isto porque se
esperava que ao lerem ou ouvirem ler os exemplos dos heróis do passado, os jovens
nobres sentissem vontade de os imitar e, assim, serem mais leais ao rei ou mais
corajosos em batalha. A leitura era ainda uma atividade coletiva: na corte, ao serão,
alguém lia enquanto dezenas de pessoas ouviam.
Também os romances de cavalaria, como as obras sobre o rei Artur e a Távola Redonda,
estiveram em voga entre a nobreza nos séculos XIV e XV. O jovem D. nuno Álvares
Pereira leu esses romances e ambicionou mesmo ser um herói casto, como fora, na
lenda, Galahad, um dos cavaleiros da Távola Redonda.

A cultura dos príncipes de Avis


Como vimos, a dinastia de Avis começou com D. João i (1385-1433), um rei que, ao
longo da vida, demonstrou ser culto (foi educado pela Ordem de Avis) e inteligente,
tendo chegado a compor um livro sobre caça, o Livro da Montaria.
O seu sucessor, o rei D. Duarte (1433-1438), teve ainda mais interesse pela cultura.
Tinha uma biblioteca pessoal com mais de 80 livros (um número muito elevado para
uma época em que os livros eram muitos caros e raros). D. Duarte escreveu dois livros,
algo muito pouco comum para um rei.
No Leal Conselheiro, o rei D. Duarte ensinava os homens da corte a serem virtuosos e
cuidados. Escreveu o livro a pedido da rainha, sua esposa, tendo-lhe dedicado a obra,
utilizando vários elementos que recolheu num livro de apontamentos que transportava
sempre consigo. Já no Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela, D. Duarte
propôs-se a ensinar à nobreza os melhores truques para montar e andar a cavalo, bem
como a combater com armas em torneios e justas. A morte levou-o antes de terminar
este último livro.
Outros filhos de D. João i e D. Filipa de Lencastre também demonstraram qualidades
literárias. O infante D. Pedro, duque de Coimbra e regente do rei D. Afonso V, escreveu
um livro sobre virtudes, o Tratado da Virtuosa Benfeitoria, além de ter traduzido
algumas obras do Latim.
Já D. João e D. isabel demonstraram bastante erudição em algumas das suas cartas
pessoais. Os menos brilhantes a este nível terão sido os infantes D. Henrique e D.
Fernando, que não deixaram escrito algo que possa ser considerado inovador ou sequer
erudito.
D. Henrique demonstraria qualidades noutras áreas, como veremos no próximo capítulo,
e D. Fernando acabaria por falecer prematuramente no cativeiro.

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