Literatura-Das-Pedras Historia Do Amapa
Literatura-Das-Pedras Historia Do Amapa
Literatura-Das-Pedras Historia Do Amapa
Fernando Canto
LITERATURA DAS PEDRAS
A Fortaleza de São José de Macapá como
locus das identidades amapaenses
Coleção
GAPUIA - SOCIOLOGIA EM PESQUISAS & TESES
Macapá-AP
2019
miolo-literaturadaspedras.indd 3
Copyright © 2019, Fernando Pimentel Canto
Conselho Editorial
Antonio Sabino da Silva Neto, Ana Flávia de Albuquerque, Ana Rita Pinheiro
Barcessat, Cláudia Maria Arantes de Assis Saar, Daize Fernanda Wagner,
Danielle Costa Guimarães, Elizabeth Machado Barbosa, Elza Caroline Alves
Muller, Janielle da Silva Melo da Cunha, João Paulo da Conceição Alves, João
Wilson Savino de Carvalho, Jose Walter Cárdenas Sotil, Norma Iracema de
Barros Ferreira, Pâmela Nunes Sá, Rodrigo Reis Lastra Cid, Romualdo Rodrigues
Palhano, Rosivaldo Gomes, Tiago Luedy Silva e Tiago Silva da Costa
ISBN: 978-85-5476-079-3
É proibida a reprodução deste livro com fins comerciais sem permissão do autor.
É permitida a reprodução parcial dos textos desta obra desde que seja citada a fonte.
As imagens, ilustrações, opiniões, idéias e textos emitidos nesta obra são de inteira e
exclusiva responsabilidade do autor do livro.
Às águas das chuvas, dos rios e dos dilúvios que permitiram o acolhi-
mento da vida por meio de Ianejar, o herói primordial, que conduziu
seu povo na mítica viagem à Mairi.
À minha família, que soube compreender sobre o tempo em que me
dediquei ao curso, nunca deixando faltar incentivo, amor e ajuda nas
horas que eu mais precisei.
À Universidade Federal do Amapá, que me possibilitou mais este
degrau acadêmico.
Aos professores da UFC, que romperam as distâncias desse país
para trazer mais luzes do conhecimento acadêmico à Amazônia, espe-
cialmente aos professores Isabelle, Alba, Cristian e George.
À minha ilustre orientadora, antropóloga Isabelle Braz, que direcio-
nava o leme da canoa na hora da tempestade.
Aos queridos colegas de turma, pela troca de informações necessá-
rias ao processo de construção da pesquisa.
Aos escritores e poetas amapaenses, que deixaram em suas obras so-
bre a Fortaleza de São José de Macapá todo um arcabouço identitário.
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INTRODUÇÃO 13
1. O ZEITGEIST AMAPAENSE 45
1.1. Os escritores 47
1.2. A herança dos migrantes 50
1.3. Os índios e a terra do “já teve” 56
1.4. O rádio, o rio e o Tumucumaque 63
1.5. A influência de Belém e a herança territorial 66
1.6. Rios de Mairi e os a-sombrados 67
1.7. A festa de São Tiago de Mazagão Velho, outras festas e tragédias 70
1.8. Amapalidade 77
1.9. Identidades em movimento e o que fica 89
1.10. O losango amapaense 93
2. OLHARES CRUZADOS DE BALAS E FLECHAS: AS CARTAS DOS CONSTRUTORES
NO CONTEXTO DA EDIFICAÇÃO (1764-1782) 97
2.1. A missão dos homens e da obra colonial 97
2.2. O olhar do outro e um cenário de tensões 104
2.3. Doenças tropicais, exílio, intrigas e mortes 110
2.4. Galúcio e o mundo amazônico: desterro e esquecimento 121
2.4.1. O gênio incompreendido 129
2.5. Construtores estrangeiros na Amazônia Colonial 133
3. O DISCURSO FUNDADOR E A CONSOLIDAÇÃO DO TERRITÓRIO FEDERAL DO AMAPÁ:
UM SONHO NA FLORESTA (1943-1956) 141
3.1. Amazônia, terra de mitos 153
3.2. Mairi, um mito Waiãpi da Fortaleza de São José de Macapá 156
3.3. O encantamento do discurso 159
3.4. A mística do Amapá: um reforço ideológico ao discurso fundador 161
3.5. O encontro com o outro: injunção e poder 166
3.6. As estratégias do Governo Territorial 168
3.7. O saneamento social urbano e a reação tímida: gentrificação e protesto 171
3.8. O Governo dominador 176
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SONETO
Se acaso aqui topares, caminhante,
Meu frio corpo já cadáver feito,
Leva piedoso com sentido aspeito
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MACAPÁ
1ª parte
Na esquerda margem selvosa
Do rio-mar, o Amazonas
Pensativa e descuidosa
Como essas gastas madonas
Das noites de bacanal
Descansa da atividade
Dos anos, da nova cidade
A minha amada cidade
Minha cidade natal
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Ao Oiapoque, o guiano
Vão seus solos marginais
Que se prolongam no plano
Das divisas boreais
Em serras em alcantil
A Oeste vastas campinas
Amplo tapiz de boninas
Com pingues raças bovinas
Riquezas e encantos mil
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3ª parte
Maldito! Maldito seja
Vezes mil um tal governo
Que insaciável deseja
Céus e terra e até o averno
Desfeito em ouro só!...
Maldito, porque os legados
De nossos antepassados
Em vez de serem zelados
São desprezados sem dó!
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2. Lembro, porém, que o texto foi publicado em 1889, ano da Proclamação da República.
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3. A revista Caras, em parceria com o banco HSBC, promoveu o concurso As Sete Maravilhas Brasilei-
ras por meio de voto virtual em 2007 e a FSJM foi uma das contempladas. Com o resultado o Parque do
Forte (Praça da parte sul da fortificação, também conhecido como “Lugar Bonito” devido a propagan-
da nos meios de comunicação local) ficou conhecido em todo o Brasil e se consolidou na paisagem ur-
bana, levantando, assim a autoestima dos amapaenses.
4. Usos e contra usos são reflexões sociológicas para o conceito de lugar, ao qual Leite entende “que é
uma determinada demarcação física e/ou simbólica no espaço, cujos usos o qualificam e lhe atribuem
sentidos diferenciados, orientando ações sociais e sendo por elas delimitados reflexivamente”. Um lu-
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gar, para Leite, “é sempre um espaço de representação, cuja singularidade é construída pela ‘territoria-
lidade subjetivada’ (Pág, 285), mediante práticas sociais e usos semelhantes”. Após buscar conceitos de
outros autores sobre o tema, ele joga sobre o leitor a perspectiva que “lugares são espaços de conver-
gências simbólicas que resultam de experiências compartilhadas mediante alguma possibilidade de
entendimento sobre o que significa um certo espaço e sobre o que representam certos conteúdos cul-
turais partilhados” (Idem).
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Reis vai mais além nessa perspectiva de ver nos artistas elementos
que têm realidades abrangentes, que quando falam de suas lembran-
ças adquirem “o direito de transitar por temas e períodos de sua pró-
pria vida e passam então a reler e valorizar a própria história” (Idem.
Pág. 219). Ela afirma que se forem confrontados os depoimentos dos
artistas com a análise das articulações das circunstâncias encontra-
das na cidade, é possível decodificar uma série de elementos que fa-
zem parte do modo de vida, dos hábitos, das estratificações sociais e
as tendências de transformações.
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5. Zeitgeist é um termo alemão cuja tradução significa espírito da época, espírito do tempo ou sinal
dos tempos. O Zeitgeist significa, em suma, o conjunto do clima intelectual e cultural do mundo, numa
certa época, ou as características genéricas de um determinado período de tempo. O conceito de espí-
rito de época remonta a Johann Gottfried Herder e outros românticos alemães, mas ficou melhor co-
nhecido pela obra de Hegel, Filosofia e História. Em1769, Herder escreveu uma crítica ao trabalho Ge-
nius seculi do filólogo Christian Adolph Klotz, introduzindo a palavra Zeitgeist como uma tradução de
genius seculi (Latim:genius - “espírito guardião” e saeculi - “do século”). Os alemães românticos, ten-
tados normalmente à redução filosófica do passado às essências, trataram de construir o “espírito da
época” como um argumento histórico de sua defesa intelectual. Hegel acreditava que a arte reflete, por
sua própria natureza, a cultura da época em que esta foi feita. Cultura e arte são conceitos inseparáveis
porque um determinado artista é um produto de sua época e, assim sendo, carrega essa cultura em
qualquer trabalho que faça. Consequentemente, ele acreditava que no mundo moderno não é possível
recriar arte clássica, que ele acreditava ser uma “cultura livre e ética”, que dependia mais da filosofia da
arte e teoria da arte, no lugar de uma reflexão da construção social, ou Zeitgeist em que este dado artis-
ta vivia. (Wikipédia, acesso em 22.06.2016)
6. 1962, na segunda vez que meus pais migraram para a capital do Território Federal do Amapá, vin-
dos de Óbidos-PA. Eles moraram em Macapá nos anos de 1950/51. Etimologicamente, Amapá signifi-
ca “o lugar da chuva” (SARNEY: 2008). A palavra Macapá vem do tupi, significando, de acordo com o
“Vocabulário Tupi-Guarani Português”, do professor Silveira Bueno. Ele diz, que “Nem sempre é fácil
desentranhar o verdadeiro significado da palavra, colhido nos elementos construtores do vocábulo. A
separação de tais elementos admite diversidades, decorrendo disso o fato muito comum de um topô-
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nimo apresentar duas ou mais interpretações”. É o caso da palavra Macapá, que segundo T. Sampaio,
significa o pomar das macabas (bacabas). De ma-caba = a coisa gorda, oleosa. Entretanto a palavra ba-
caba vem de ybá (árvore frutífera) + cabá (sebo, gordura), ambas de origem tupi. Para o padre Ângelo
Bubani, que escreveu o texto “Pistas para a História da Evangelização do Território do Amapá (inédi-
to), a palavra Macapá significa queimar, cuspir.
7. Termo usado popularmente para dizer que um ramo de uma planta pode ser plantado para que
crie suas próprias raízes e renasça, em solos diferentes ou não, desde que seja regado e cuidado.
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8. 4 A saga da emigração madeirense começa no século XV, quando suas ilhas já tinham uma den-
sidade demográfica considerável, situação que já vinha sendo dinamizada pelo duque D. Fernan-
do na segunda metade desse século. “Para que a população crescesse e não faltasse mão-de-obra
criou um imposto anual pago em trigo, para todos os homens solteiros que não têm mulheres, para
estimular a consumação de casamentos” (Fernandes dos Santos Maria Licínia in Os Madeirenses
na Colonização do Brasil. Centro de Estudos de História do Atlântico/Secretaria Regional do Tu-
rismo e Cultura. Funchal, Madeira, 1999.) Daí, com o excesso populacional das ilhas é que inicia a
diáspora madeirense, aliada a fatores de subsistência econômica visto as ilhas vulcânicas não te-
rem muito espaço para a agricultura diversificada. Além disso, a odisseia emigratória dos povos
dos dois arquipélagos constituía-se em excelente oportunidade de ascensão social dos nobres de
segunda linha que não possuíam meios materiais para permanecerem no pico da pirâmide social
(Santos. Op. Cit. Pág. 21). Mas foi só com os alistamentos a partir de 1747 que se iniciou a vinda des-
ses povos para o Brasil, principalmente para a região Meridional, quando se instalaram na Ilha do
Desterro, hoje Florianópolis, e no Rio Grande do Sul. O sucesso político-diplomático da assinatu-
ra do Tratado de Madri, de 13 de janeiro de 1750, que definia as fronteiras do Brasil, “exigia gente
para proceder à demarcação dos limites e para reforçar a defesa de toda a enorme região amazô-
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nica” (ver Silva, José Manuel Azevedo, “Açorianos e Madeirenses no Povoamento e Colonização da
Amazônia no Tempo do Marquês de Pombal” in As Ilhas e o Brasil. CEHA/SRTC. Funchal, Madei-
ra, 2000.) Foram propostos, então, três remédios: o “descimento dos índios do sertão”, a introdução
de escravos negros e o envio de povoadores, principalmente casais dos Açores e da Madeira, segun-
do autor acima citado.
9. O Zimba é um batuque que ocorre nas festividades do Divino espírito santo na localidade de Cuna-
ni, no litoral amapaense. É dançado por pescadores e lavradores do local. Muito semelhante na dança
ao Batuque, suas músicas são acompanhadas por grandes tambores denominados curimbós, confec-
cionados de troncos de árvores e couro de animais.
10. O Sairé ou Sahiré era uma manifestação religiosa que acontecia em Mazagão Velho e Carvão. Consis-
tia em uma procissão na qual era levada o sairé - uma cruz feita com três arcos de madeira enfeitada de
algodão e com músicas cantadas em nheengatu em homenagem ao Divino Espirito Santo. Sobrevive em
Santarém-PA, para onde foi levado por mazaganenses, de acordo com Nunes Pereira em seu livro O Sah-
iré e o Marabaixo (1951). A grafia usada pelos santarenos hoje obedece uma regra idiomática = Çairé. Em
Mazagão há um movimento para reincorporar essa tradição ao quadro de manifestações folclóricas locais.
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11. O Marabaixo, hoje, é a maior expressão da cultura popular do Estado do Amapá, embora também
aconteça de forma apagada na festa do Çairé de Alter do Chão (no Município de Santarém – PA) e em
Marabitanas, no Estado do Amazonas. É um ritual onde os aspectos religiosos propriamente ditos não
têm mais a ênfase que lhe era dada no passado, mas continua vivo e enraizado entre os que o praticam.
O reconhecimento como expressão cultural autêntica se deu a partir do início de um processo de valo-
rização, promovido pelos setores públicos, o que motivou a elevação de sua autoestima e a consequen-
te divulgação dentro e fora do Estado.
12. Ao Batuque estão atreladas várias manifestações de caráter religioso, ao lado de danças e cânticos
preservados até hoje por moradores do Curiaú, Mazagão Velho e Igarapé do Lago, no Estado do Ama-
pá. É uma dança de roda em que os dançarinos giram em volta dos tocadores, respondendo o estribi-
lho do “ladrão”, que é a música cantada por um solista. Porém, nos lugares aqui citados ele se realiza de
modo especial, com características próprias.
13. A Folia é de origem portuguesa. Ela encerra o ritual com antigos cantos devocionais. Antigamente
consistia num agrupamento de homens que saía a colher donativos com um porta-estandarte ou alfe-
res-da-bandeira à frente do cortejo. No Curiaú, depois que encerra a ladainha, o Mestre-sala toca uma
campa e é acompanhado nas músicas por vários instrumentos. Os Tambores são feitos de madeira leve
e cobertos com couro de animais silvestres. Há pandeiros; reco-recos feitos de taboca talhada, na qual
se esfrega um pedaço de madeira; querequexés, que são cilindros confeccionados de galhos de imbaú-
ba onde são colocados grãos de cereais ou semente de tento; violas e cavaquinho.
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14. Merengue – ritmo caribenho binário, cuja dança era muito popular nas cidades amazônicas.
15. Dados do blog do repórter policial Bolero Neto.
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16. Bessa Freire se volta para a hipótese, cada vez mais fortalecida por diferentes disciplinas, de que
a Amazônia era densamente povoada no século XVI, perguntando sobre a produção do espaço nas
sociedades indígenas, como se apropriaram dele e como o hierarquizaram, como organizaram as al-
deias, etc. Ele ainda discorre sobre os povos amazônicos, que diferentemente dos astecas e andinos
não deixaram relatos escritos contando a sua experiência de vida. Os cronistas europeus que descreve-
ram essa realidade o fizeram usando outras categorias não apropriadas. Chamaram as casas contínuas
de bairros e cidades, de fortalezas e praças, sempre cheias de gente, depois percebidas como “civiliza-
ções de palha”, no dizer de Berta Ribeiro.
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Supostamente os índios tem de caçar com arco e flecha, falar sua língua
ancestral, andar sumariamente vestidos, e assim vai. O que se oculta com
isso é toda uma história de deslocamentos forçados, de missionização, de
recrutamento laboral, de política oficial de miscigenação, de expropria-
ção de territórios. Basta lembrar que o marquês de Pombal exigiu que nos
aldeamentos se falasse português e promoveu casamentos de soldados
com mulheres indígenas. E que, antes desse período, e de serem expulsos
do Brasil, os jesuítas espalharam o nheengatu, uma língua de base tupi,
como língua franca na Amazônia. (CUNHA, 2016. Pág. 47).
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17. Sacacas e pajés são curandeiros, conhecedores de ervas mágicas e plantas que curam. Ainda hoje
são muito procurados para a cura de doenças corporais e psicológicas e quebrantos infantis, que são
resolvidos através de massagens e benzeduras.
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18. Em junho de 2007, uma expedição integrada por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe), da Agência Nacional de Águas (ANA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísti-
ca (IBGE) e do Instituto Geográfico Militar do Peru, determinou o local exato da nascente do rio Ama-
zonas, localizada no rio Apurimac, na cordilheira dos Andes, ao sul do Peru. Conforme o Atlas Geográ-
fico Mundial, o Amazonas media 6.515 quilômetros. Com a nova medição (2007), passou a ter 6 992,06,
portanto 139,91 quilômetros mais longo do que o Nilo. Em 1500, o navegador espanhol Vicente Yañez
Pinzón batizou-o de Río Santa María del Mar Dulce; 42 anos depois, o também espanhol Francisco
Orellana mudou-o para Amazonas. O colosso marrom, que no estado do Amazonas recebe o nome de
Solimões e nos estados do Pará e Amapá, de Amazonas, tem mais de mil afluentes, constituindo-se na
espinha dorsal da maior bacia hidrográfica da Terra, formada por 7 mil rios, 25 mil quilômetros nave-
gáveis. Da nascente até 1.900 quilômetros, o Amazonas desce 5.119 metros; desse ponto até o Atlânti-
co, a queda é de apenas 60 metros. Suas águas correm a uma velocidade média de 2,5 quilômetros por
hora, chegando a 8 quilômetros, em Óbidos, cidade paraense a mil quilômetros do mar e ponto da gar-
ganta mais estreita do Amazonas, com 1,8 quilômetro de largura e 50 metros de profundidade. A des-
carga média é de 180 mil metros cúbicos de água por segundo, um quinto, ou 16% da água doce despe-
jada nos oceanos do mundo. Em maio, sobe para 220 mil metros cúbicos por segundo e, em novembro,
cai para 100 mil metros cúbicos por segundo; 65% do fluxo vaza pelo Canal do Norte, que despeja até
160 mil metros cúbicos de água por segundo. A boca do rio, escancarando-se do arquipélago do Mara-
jó, no Pará, até a costa do Amapá, mede em torno de 240 quilômetros, e sua água túrgida penetra cer-
ca de 320 quilômetros no mar, atingindo o Caribe nas cheias. Se mais de um terço de todas as espé-
cies do planeta vive na Hileia, a bacia é berço de mais de 2.100 espécies de peixes, 900 a mais do que as
dos rios da Europa. Só a bacia do rio Negro, afluente da margem esquerda do Amazonas, contém mais
água doce do que a Europa. Em 2011, pesquisadores do Observatório Nacional anunciaram evidências
de um rio subterrâneo numa profundidade de 4 quilômetros abaixo do Amazonas, com 6 mil quilôme-
tros de comprimento, batizado de Hamza, em homenagem a um dos pesquisadores, o indiano Valiya
Hamza (Fonte: INPE/Blog RAY CUNHA, postado em 19.05.2015, 09h34 AM)
19. Tumuc-Humac, do caribe, “mãe de todos os rios” (Cristóvão Lins). Entre os índios Aparaí e Waia-
na significa “pedra da montanha”, e simboliza a luta entre o xamã e os espíritos. Há quem diga que tam-
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bém tem o significado mítico de “Serpente Adormecida”, e que um dia pode acordar mexendo suas es-
camas brilhantes.
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1.8. AMAPALIDADE
O termo amapalidade já vigorava no tempo do início do Território Fe-
deral do Amapá. No entanto, em 2003, o Governo Estadual voltou a
usá-lo, objetivando com isso sustentar uma condição identitária que
despertasse nos habitantes o reconhecimento formal das coisas ama-
paenses e uma espécie de agregação de valor ao sentido de perten-
cimento. O termo não pegou, mas ficou claramente instituído nas
pessoas um compromisso com a memória e com a identidade local,
espécie de reflexão tardia do valor das coisas realizadas pelos pionei-
ros do Amapá, pelos antepassados, dando a dimensão heroica que
necessitava para reconstruir e promover essa moral cívica e memorial
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20. A região norte do Amapá, a partir do Araguari até o Oiapoque sempre foi objeto de disputa en-
tre o Brasil e a França desde o tratado de Utrecht, em 1713. Era o Território contestado. Com a explora-
ção do ouro de Calçoene as tentativas de tornar a região um país independente (A República do Cuna-
ni), os ânimos foram se exaltando até um inevitável conflito armado entre o presidente do Triunvirato
do Amapá, Francisco Xavier da Veiga Cabral, o Cabralzinho, e um comandante francês que invadiu o
Amapá para prendê-lo. Dezenas de pessoas morreram no episódio sangrento. A partir daí a diploma-
cia internacional elegeu Berna, na Suíça, para julgar o caso. A 1º de dezembro de 1900 o Brasil ganhou
a causa, tendo como advogado José Maria Paranhos da Silva, o Barão do Rio Branco. O 15 de Maio, data
do combate, quando Cabralzinho matou o capitão francês e sempre foi um dia importante para os ha-
bitantes do Amapá. Era uma data comemorada por todas as escolas que reverenciavam o triúnviro
como o “Herói do Amapá”, pelo seu ato de defender a Pátria dos invasores inimigos. As especulações
que se seguiram à época do episódio deixaram a figura de Cabralzinho bastante controversa. As baixas
francesas foram seis mortos e 20 feridos enquanto 38 brasileiros, na maioria velhos, crianças e mulhe-
res perderam a vida de forma macabra e cruel. O próprio Emílio Goeldi, cientista emérito do Museu do
Pará, em relatório de novembro de 1895 ataca Veiga Cabral, embora dizendo que não quer acusá-lo di-
retamente da culpabilidade dos abusos cometidos, mas que seus companheiros são gente da pior es-
pécie, que não lhe inspiram confiança. Hoje, apesar dos monumentos construídos ao ato heroico de
Cabralzinho, inclusive no local onde teria ocorrido o episódio, a história, tão valorizada no passado pa-
rece ter caído no esquecimento, sendo muitas vezes objeto de galhofa e ironia. Sobre esses aspectos e
levando em conta que a ciência histórica hoje considera que “as atitudes mentais, a relação com o cor-
po, com o espaço, com a paisagem, a cultura política, as relações socioeconômicas, a festa, a cultura
material, etc, se constituem objetos do conhecimento em história”, (Coelho, Mauro Cezar, in Um Di-
plomata na Colônia: As Formulações de Alexandre Rodrigues Ferreira na Defesa do Cabo Norte. Brasí-
lia:2003), não seria interessante se a academia local fizesse estudos para tentar solucionar o problema,
haja vista que não é apenas o heroísmo de Cabralzinho que está em jogo, mas a própria História do Es-
tado. O professor Jonas Marçal de Queiroz, no seu estudo História, Mito e Memória: o Cunani e outras
Repúblicas, in “Nas Terras do Cabo Norte”. Belém:1999) diz que Veiga Cabral foi esquecido assim que
o litígio com a França foi resolvido. Ele questiona também a atitude de Trajano, que teria sido escravo
em Cametá e que vira o significado de liberdade na bandeira francesa. Isto posto, é inegável a necessi-
dade de surgirem novos e esclarecedores estudos na área.
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O CABÔCLO
Durante 30 anos escutei as expressões com que o tratavam: fraco, indo-
lente, preguiçoso, móle, sem vontade. Nascêra para escravo. Apontavam-
-lhe um destino: ser mandado a obedecer.
21. Caboclo, palavra oriunda do tupi-guarani que significa “aquele que vem ou que mora no mato (caá
+ oca). No tempo da construção da Fortaleza de São José de Macapá existiam os “caboqueiros”, índios
que caçavam para os contingentes militares.
22. Tradicional forma de comércio espoliador e escambo de mercadorias, feito por embarcações, an-
tigamente muito comum na Amazônia.
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“Preguiçoso? Mas qual é o único sêr que afronta de peito aberto esta nature-
za bárbara, criança ainda em plena transformação penetrando-lhe o arcanjo?
Quem é que sobe o rio remando dias seguidos, com um rancho insignifican-
te, que não alimentaria o mais sóbrio branco civilizado.? Quem fura o mato,
este cipoal de lianas povoadas de emboscadas hostis e traz de lá os frutos?
Qual é o homem que extrai as matérias primas da produção amazônica? ”
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O discurso se aprofunda.
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23. O escritor e jornalista Hélio Pennafort foi um dos poucos autores amapaenses a escrever sobre a
vida dos prisioneiros políticos da colônia de Clevelândia do Norte, no Oiapoque, que antes de se tor-
nar uma base militar, foi seguramente uma das mais ferozes e desgraçadas cadeias de presos que este
país já teve. Através dos escritos de seu pai, que ainda muito jovem foi colonizar a fronteira em 1921,
Pennafort historiza os primórdios daquela aventura patriótica, onde muitos paraenses para lá se des-
locaram após a queda do preço da borracha ocorrida no início da Primeira Guerra Mundial. E foi no
natal de 1924 que Clevelândia recebeu os primeiros prisioneiros das revoluções de 1922/24 deportados
para lá, quase todos militares da Marinha. John Dulles conta em seu livro “Anarquistas e Comunistas
no Brasil” que “O primeiro navio a conduzir prisioneiros para a Colônia Agrícola de Clevelândia alcan-
çou seu destino a 26 de dezembro de 1924. Levou cerca de 250 pessoas que o governo qualificara de ‘os
mais perigosos’ e com ‘os piores antecedentes’. Nesse grupo havia diversos operários presos no Rio de
Janeiro e que passaram o tempo picando ferrugem do casco do navio-presídio “Campos”, alguns mar-
ginais e vadios do Rio, além de conspiradores da Marinha de Guerra. Um segundo navio chegou no
dia 06 de janeiro de 1925, com 120 rebeldes da região do Amazonas. Nas margens do rio Oiapoque, no
dia 1º de maio de 1925, seis anarquistas, reuniram-se com uns poucos ‘infelizes’ e alguns colonos locais
para cantar a ‘Internacional”. O terceiro e último carregamento incluía os aproximadamente 400 sobre-
viventes defensores de Catanduva, Paraná, que vieram para Clevelândia no navio Cuiabá, após esca-
la no Rio “onde apanharam 23 conspiradores e 133 malandros, vigaristas, ladrões, vadios e mendigos”.
Segundo consta não havia um prisioneiro sequer que não tivesse ficado doente com os sintomas agu-
dos de febre, vômito, convulsões, inapetência, inchação dos membros inferiores, diarreia e prostração
generalizada. O precário hospital ali instalado já não dava conta dos casos de malária, disenteria ba-
cilar, beribéri, polinevrite e sezões. Dulles informa ainda, baseado em cartas dos prisioneiros, que de-
pois vieram a denunciar o sistema de cárcere do local, que o tratamento dessas doenças, “via de regra,
consistia em injeções e comprimidos de quinino, que pareciam causar edemas e úlceras nas partes fe-
ridas pela agulha. Para aplicar 120 injeções por dia, o hospital dispunha de apenas duas seringas e, por
mais de uma vez, com uma só agulha”. Entre os quase mil degredados de Clevelândia poucos consegui-
ram fugir daquele inferno, através de Caiena, indo para a Venezuela, ou até Belém. Contam que até 14
prisioneiros eram enterrados por dia.
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24. José Ney Picanço e Silva, o J. Ney, que há 40 anos apresenta o programa “Sua Excelência, o Domin-
go”, tendo passado por diversas rádios da capital amapaense.
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25. MEU ENDEREÇO - Música de Zé Miguel e letra de Fernando Canto - Intérprete: Zé Miguel -Meu
endereço é bem fácil / É ali no meio do mundo / Onde está meu coração, meus livros, meu violão /
Meu alimento fecundo / A casa por onde paro / Qualquer carteiro conhece / É feita de sonho e linha /
Que brilha quando anoitece / Na minha casa se tece / Mesura na luz do dia / Pra afugentar quebranto
na hora da fantasia / É fácil o meu endereço / Vá lá quando o sol se pôr / Na esquina do rio mais belo /
Com a linha do equador.
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26. Com o consentimento da gerência do Museu da Fortaleza de São José de Macapá e da Guarda Ter-
ritorial que ali se aquartelava, realizei um pernoite em suas dependências após ter sido informado que
um famoso programa de televisão teria verificado se procedia a ”existência” de fantasmas naquele es-
paço. Na noite do dia 07 de abril permaneci acordado observando e fotografando tudo o que se passa-
va nas instalações do prédio, onde duas vigilantes também faziam suas rondas e um soldado, que es-
tava destacado para me acompanhar, dormia profundamente. Segundo o programa, “São diversos os
relatos de assombrações ou visagens fantasmagóricas neste local, indo desde negros descalços que
surgem do nada na praça principal, como de soldados que vagam sem rumo pelo local. Há quem diga
que muitos escravos tentaram escapar pelo desaguadouro, o poço que fica no centro da praça de guer-
ra. E que até hoje as vozes deles podem ser ouvidas ali. Barulhos estranhos também acontecem nas ga-
lerias que, no passado, serviram de prisão. Ali, uma vigilante conta ter sido perseguida por fantasmas.
Outra assombração que testemunhas contam já ter visto na Fortaleza, é a de um padre sem cabeça que
flutua pelos baluartes do forte fumando um cigarro, na altura do que seria localizada a cabeça do mes-
mo”. (Programa Fantástico – TV Globo de 19 de agosto de 2012). A minha solicitação foi feita conside-
rando a Antropologia da Emoções, disciplina que “pretende discutir a relação entre indivíduo e so-
ciedade sob o prisma das emoções. Tomadas tanto pelo senso comum ocidental quanto por algumas
teorias clássicas como baseadas em uma ‘realidade’ psicobiológica, as emoções foram durante muito
tempo tratadas como experiências universais ou então profundamente individuais, escapando assim
ao crivo dos domínios social e cultural. Até por isso, este foi um tema pouco presente nas teorias clás-
sicas nas ciências sociais e só nas últimas décadas ganhou a atenção da antropologia principalmen-
te. Nesta disciplina se discute as questões teóricas colocadas em foco pelas análises das emoções nos
poucos autores clássicos que as abordaram – Durkheim, Mauss, Simmel e Elias – bem como em traba-
lhos mais recentes, pondo em foco a relação entre emoção, sensorialidade e corpo, assim como as ex-
periências emotivas nas sociedades ocidentais modernas”. (REZENDE:2009).
Na realidade nada vi ou ouvi de estranho, a não ser o murmúrio das águas do rio entrando com a maré
pelas galerias subterrâneas, o barulho da chuva e a forte ventania que passa pelos prédios internos as-
soviando. Entretanto, esses barulhos lembram mesmo passos e gritos de pessoas, se assemelham ao
arrastar de correntes e há constantes sombras se mexendo entre os espaços do monumento como se
fossem seres em desespero, tentando se comunicar. Fiquei lá até o amanhecer, debaixo de uma forte
chuva, duvidando, refletindo como nossos sentidos podem nos enganar e construir ilusões. Daí que
essas tensões arraigadas no imaginário popular causam, a meu ver uma espécie de auréola que dá ao
monumento uma condição anímica. Nesse processo não é de se desprezar que mesmo não se “vendo”
nada estranho, a cada som vindo como um grito lancinante do fundo da cisterna e das velhas masmor-
ras, a cada imagem projetada nos paredões e escadarias, mesmo que fossem do vento e das luzes que
dançavam intermitentemente, parecia, sim, ser projetado ali dois séculos e meio de sofrimento das al-
mas e dos corpos de centenas de trabalhadores braçais obrigados que eram a trabalhar de sol a sol em
nome da conquista lusitana.
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27. Ao decidir incluir termo tentei evitar que se confundisse com o conceito de ethos que na socio-
logia é uma espécie de síntese dos costumes de um povo. O termo indica, de maneira geral, os tra-
ços característicos de um grupo, do ponto de vista social e cultural, que o diferencia de outros. Seria
assim, um valor de identidade social. Ethos que significa o modo de ser, o caráter. Isso indica o com-
portamento do homem dando origem a palavra ética.(Wikipédia, a enciclopédia livre. Acessado em
25/08/2008. 16h31)
28. Eram também assim chamados os Índios que habitaram as terras do Amapá durante a coloniza-
ção da Amazônia
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29. Octávio Paz foi poeta e escritor mexicano. Ganhou o prêmio Nobel de Literatura em 1990.
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30. Esmeraldina dos Santos nasceu no dia 11 de janeiro de 1955 no bairro do Laguinho, em Macapá.
É filha de Maximiano Machado dos Santos (Mestre Bolão) e de Francisca Ramos dos Santos (Tia Chi-
quinha), ambos nascidos no Curiaú. Tem duas filhas e quatro netos. Estudou na Escola São Benedito
e na Paulo Freire. Em 2009 estudou na Etapa Extra da Escola Jardim Felicidade e concluiu seu ensino
médio na Escola Estadual Maria do Carmo Em 2002 publicou seu primeiro livro, intitulado Histórias
do meu Povo e em 2011 lançou o segundo livro e CD As Aventuras de Dona Florzinha. Nesse ano via-
jou pelo país no Projeto Sonora Brasil cantando Marabaixo em 56 cidades do Norte, Nordeste e Cen-
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tro-Oeste. Em 2014 percorreu no mesmo projeto por 49 cidades do Sul e do Sudeste, e no final do ano
lançou o livro O Melhor caminho é a Escola. Possui, hoje o diploma do curso de Extensão Universida-
de da Mulher, da UNIFAP.
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31. A grafia correta dos nomes que aparecem constantemente nos documentos dos códices do Ar-
quivo público do Pará é a seguinte: Fernando da Costa de Athayde Teive, Gaspar João Geraldo Gron-
felds, Domingos Sambucetti, Antonio Landi, João Ângelo Brunelli e Miguel Antonio Ciéro. Todos vie-
ram para o Brasil na Comissão Demarcadora de Limites, em 1753.
32. O capitão-engenheiro João Henrique Wilkens substituiu Galúcio como responsável pelas obras da
fortificação logo após a morte deste, enquanto esperava o engenheiro Gronfelds que iria assumir o co-
mando. Mais tarde Wilkens também assumiu os trabalhos da construção e foi para a Província do Rio
Negro (hoje Estado do Amazonas) onde escreveu o poema A Muhuraida, publicado em 1785.
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33. As cartas dos construtores são como crônicas literárias, pois não deixam de ser construções da
realidade que registram/narram acontecimentos e fatos comuns do cotidiano da ereção da obra e de
aspectos técnicos. Seus conteúdos são importantes, pois as concepções e os fatos extraídos delas lhes
dão, indubitavelmente, teor científico eivados de certa literariedade.
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34. A classificação geral dos códices do Arquivo Público do Pará foi modificada e atualizada. Utiliza-
rei, a seguir apenas os números referentes aos códices atuais e o número dos documentos.
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tive a honrra de ser mandado pelo meu natural monarca à servir a tão Au-
gusto Soberano já mais de 13 anos, para cujo fim troquei as delícias de
minha pátria com as asperezas dos mais desertos sertões do Brasil,
que corri e palmilhei. Macapá, 08 de outubro de 1763. [Grifo meu]. (Cód.
132. Doc.90).
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Esta era a ocasião, em que eu prostrado aos pés de V. Exa. devia pedir-
-lhe humilissimamente que se dignasse por os olhos de sua Piedade em
mim, mandando-me retirar daqui, porque totalmente me não entendo
com estes dois sujeitos, o Coronel Comandante, e o inspetor, parecen-
do que de algum tempo estão colliados para me amofinar, atrapalhar, e
deitar-me na ultima desesperação; o que se não deve atribuir mais que
à grande incapacidade minha para a ocupação, em que V. Exa. foi ser-
vido empregar-me, e assim, enquanto V. Exa. se compadecer ainda de
mim para me não mandar dar baixa de Real Serviço de S. Magestade era
da maior minha conveniência, que V. Exa. me fizesse mercê de tirar-me
desse insufrível martírio, livrando-me de maiores princípios; não fal-
tando nessa cidade Engenheiros de capacidade maior à minha insufi-
ciência, nos quais concorrem todas as partes necessárias para lidar, e
saber haver-me com estes dois indivíduos tão prudentes, tão desinteres-
sados, e tão zelosos do mesmo Real Serviço. Quando eu não possa ter a
habilidade para substituir a ocupação de qualquer dos ditos Engenhei-
ros, ao menos poderei ter modo de tratar de restauração da minha saú-
de sumamente arruinada com o socorro da minha família, de que vivo
ausente quase oito anos com poucos intervalos; o que não me é pos-
sível conseguir aqui. Se os rogo mais humildades, e a instâncias mais
eficazes podem impetrar da conhecida Bedignidade de V. Exa. esta tão
importante graça, humilissimamente a peço a V. Exa; e instantissima-
mente para ela suplico. São José de Macapá, 12 de abril de 1766 [grifo
meu]. (Cód. 164. Doc. 47).
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A esta hora que são quase doze do dia vinte e cinco do corrente faleceu o
Coronel Comandante desta Praça, Nuno da Cunha de Athayde Varona, e
da mesma comandância tomou entregue o Sargento Mor a da Praça Luiz
Facundes Machado e assim lho determinou o dito Comandante já defun-
to, o que participo a V. Exa (Cód. 194. Doc. 44, de 25 de maio de 1769).
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35. Os calcetas (índios, negros ou brancos degredados) eram indivíduos condenados a trabalhos for-
çados, que tinham argolas de ferro fixadas nos tornozelos e/ou nos pulsos. Os negros boçais eram os
escravos recém-chegados da África, rudes e ignorantes (para os agentes da escravidão), ainda não la-
dinos; negro-novos. Os índios guerreiros eram aqueles que, a mando dos portugueses, capturavam ou-
tros índios para o trabalho escravo; belicosos, aguerridos, enquanto os ladinos eram os escravos con-
siderados astutos, negros ou índios, que já falavam o português, tinham instrução religiosa e sabiam
fazer o serviço ordinário da casa ou dos campos (ou das obras).
36. Galúcio, cansado, olhou o Brasil da época como um homem completamente isolado. Os sertões
que palmilhou certamente não eram apenas aos da região Nordeste, que percorreu traçando mapas.
Sentia-se sozinho diante da grandeza da natureza brasileira, e dela a aspereza que influenciou sua for-
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ma de viver enquanto engenheiro militar, astrônomo, poeta, marido e intelectual incompreendido pe-
los seus pares
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Historiador vem de hístor, e hístor quer dizer “aquele que sabe”, assinalou Mi-
chel de Certeau, em Heterologías. Historiador, aquele que conta a história, é
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37. Mântua ou Mantova. Cidade italiana em que nasceram o grande poeta Virgílio, autor do poema
clássico A Eneida, guia de Dante Alighieri no Canto I do Inferno (vv. 85-87) de A Divina Comédia, e o
pintor renascentista Andrea Mantegna (1431-1506). (MARQUES, 2009. Pág. 13).
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38. De acordo com o historiador paraense J.R. Amaral Lapa, a Inquisição visitou o Pará no período de
25 de setembro de 1763 a 06 de outubro de 1769. Ele informa que, além do engenheiro Gronfelts, acusa-
do por um padre de luteranismo, “são poucos relativamente como dissemos, os estrangeiros que cir-
culando pelo Pará acabam sendo envolvidos pela Visitação. Ficamos conhecendo ainda três deles: o
engenheiro genovês Domingos Sambosete, que o bispo D. Frei João de São José encontra em suas an-
danças e que foi o responsável pela arquitetura da reconstrução da fortaleza erguida no Gurupá em
1623 e reformada em 1762. Também engenheiro era Henrique Antonio Galluzzi, que morava na pra-
ça de Macapá e fez excelente roteiro de Belém a São José do Javari, poetando nas horas vagas [grifos
meus]. Finalmente, temos o terceiro engenheiro, também ele, Antonio José Landi, que em 1761 residia
no Pará[...]”. (LAPA, 1978. Pág.35-6).
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39. Por ser o francês uma língua neolatina, assim como o italiano, creio que a posição do autor seja
mera especulação, não tendo, portanto, valor argumentativo, como motivo do recrutamento dos técni-
cos italianos em detrimento dos franceses.
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Logo que foram entregues as Cartas que V. Exa. dirigiu ao Tenente Coronel
Comandante e a mim, se despediu o segredo em Canoa ligeira em Oficial
de Pedreiro a render José Nogueira, que se achava em Mazagão, para ser
preso com João Pedro Marçal da Silva e o carpinteiro João Pereira no Cala-
bouço à ordem de V. Exa., estes dois, que já se acharam no dito calabouço,
sendo perguntados separadamente e juntos responderam o mesmo que
já tive a honrra participar a V. Exa. na carta última de 11 de Junho [ilegível]
que estando João Pedro Marçal da Silva em casa do Sargento Mor Grons-
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Silva Telles [Em seu tratado sobre a História da Engenharia no Brasil (Sé-
culos XVI a XIX):1984] afirma que o número de técnicos estrangeiros que
vieram ao Brasil, desde o governo de D. João V, é bastante elevado, no-
tando-se a atuação de 238 engenheiros até 1822, dentre os quais havia 86
portugueses, 22 brasileiros, 16 alemães, 13 italianos, 12 franceses, 2 suecos,
1 suiço e 1 holandês, não havendo registro da nacionalidade dos outros.
Essa quantidade preocupou o marquês de Pombal, que em 1770, por re-
ceio de espionagem, decretou que todos os cargos científicos no Brasil,
que outrora foram entregues a alemães e italianos, fossem remanejados
aos brasileiros ou portugueses (CAMILO. Op.Cit. Pág. 102).
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A carta que v. Exª do primeiro do presente me, de que me fez entrega o Ca-
pitão Simão Coelho Peixote, que chegou a este porto a 11, com o número
de Tropa que V. Exª me permite a honrra de participar; em informa e qua-
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O autor reforça inicialmente essa posição quando fala que “cada li-
teratura requer tratamento peculiar em virtude de seus problemas es-
pecíficos ou da relação que mantém com as outras” (Idem. Pág. 9). E
falando a respeito de forma mais generalizada do processo formativo
da literatura brasileira, diz que para compreender o sentido da pala-
vra formação é
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40. Apresentação do livro de Marijeso de Alencar Benevides, “Os Novos Territórios Federais (Amapá,
Rio Branco, Guaporé, Ponta-Porã e Iguaçu) Geografia – História – Legislação. Imprensa Nacional, Rio
de Janeiro, 1946, Pág. 31/2
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Depois de falar um cultor das coisas históricas, que direi eu sobre esse
legítimo monumento do passado que é, em todo o seu esplendor tra-
dicional, a Fortaleza de São José de Macapá? Curvo-me, em espírito,
n’uma sincera reverência à memória dos que a edificaram e deixo con-
signado nestas linhas o meu exaltado aprêço àqueles que, em tôrno do
soberbo forte, estão plasmando uma magnífica obra de brasilidade e de
progresso. (Impressões do Dr. PAULO SARAZATE, Deputado Federal pelo
Estado do Ceará – 27.07.48)
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[...]
A obra dos homens que aqui trabalham é uma continuação do esfôrço
heróico dos primeiros colonizadores, homens que eram gigantes e que
deixaram à portas do Amazonas, como símbolo de sua bravura, a For-
taleza de Macapá. [...] (Deputado SÍLVIO MEIRA, Líder da maioria da As-
sembleia Leg. Do Estado do Pará – 15.9.49).
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CONFIANÇA NO AMAPÁ
Amapaenses!
[...]
O Amapá alimentou, então, sonhos e esperanças de vir a tornar-se um
Estado rico, um São Paulo do Setentrião do País. [...]
O Amapá constituiu um exemplo autêntico da possibilidade de se
plasmar uma Civilização de alto nível sob a linha do equador.[...] (s. aut./
s.d., 1962)
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Para esse autor, o mito não pode ser interpretado por uma lógica,
mas por uma polilógica, que comporta algo de contingente e arbitrá-
rio. Seu universo mitológico aparece em um universo em que os se-
res inanimados têm as características fundamentais dos seres anima-
dos. E assim muito se pode ver na literatura sobre a FSJM, na visão de
alguns autores locais. No sentido mítico ela é polvilhada de histórias
de espíritos e fantasmas que ainda vivem em seus espaços, assombra-
dos, em sofrimento, no dizer da população.
42. Os filmes Aguirre, a cólera dos deuses (1972) e Fitzcarraldo (1982) tiveram a direção de Werner Her-
zog e foram protagonizados por Klaus Kinski.
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Por não ser algo que já se foi, o tempo mítico é um tempo de meta-
morfoses, é um discurso poético que se perde na memória e depois é
reconstruído de forma esfacelada pelos que ouviram os mitos de seus
antepassados. Preencher os espaços previstos pelo discurso do mito
significa dar a ele uma lógica, que creio, pode ser obtida através da
pesquisa histórica.
O mito de Mairi e Ianejar, o herói fundador dos waiãpi, é, na minha
opinião, a representação de um tempo poético, de um tempo cósmi-
co, de um tempo de sonho, que ultrapassa a dimensão da realidade
e que promove a utopia e tende a consolidá-la em um tempo linear.
Para Laymert Garcia dos Santos
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43. “Ladrões” são músicas do Marabaixo cujas letras, muitas vezes improvisadas no cantar, expressam
alguma história acontecida na comunidade. Ver primeiro capítulo desta tese.
44. Então foi feita uma relação de troca. Ver: LÁZARO, João. Porta-retrato: Macapá de outrora. Dispo-
nível em: < http://porta-retrato-ap.blogspot.com.br/ >. Acesso em: 10 Mai 2015.
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O que é a Mística do Amapá? A Mística do Amapá talvez não possa ser de-
finida numa frase apenas. Talvez não possa ser compreendida em cida-
des excessivamente urbanas. A Mística do Amapá é o culto do chão. Para
compreendê-la é preciso, sobretudo, sentimento glebário, espírito de grei,
de amor pelo meio, tão afastado, infelizmente, da consciência humana
nos aglomerados modernos.
A Mística do Amapá é a propagação desse sentimento telúrico e da
ideia fixa de que existe, palpitante, e viva, mais duradoura que a existên-
cia do homem, uma força una, subjetiva e sagrada, a que chamamos “o es-
pírito territorial”.
A Mística do Amapá é também a consciência de que nós, brasileiros,
somos um povo de possibilidades incomputáveis, um povo excepcional
e jovem, predestinado não apenas a ter prestígio continental, mas a ser,
com toda a certeza, e ainda neste século, “a primeira potência do mundo”.
Isso é repisado frequentemente pelo jornal, pelo rádio, pelo cinema
e, principalmente, nas escolas onde se preparam as novas gerações do
Território.
Em nosso meio não se concebe nem mesmo uma oração política, ou
de qualquer caráter, que exalte o solo e a família amapaense. O Governo
do Território, criador da Mística, tem o maior interesse na sua permanên-
cia. Graças a ela a equipe dos servidores pioneiros não trabalha somente
com a visão material do salário. Foi persuadida de que vive um sentimen-
to histórico e está lutando para que ele seja o mais glorioso possível.
Dos funcionários novos, os que não acreditam na Mística ou que não
lhe dão importância, pelo menos não se atrevem a contrariá-la. Sabem
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O autor diz que a maior parte deles era pobre e que em Belém vi-
viam em situação marginal, mas todos “Buscavam o novo campo,
atendendo os apelos do futuro e fustigados pelo anseio de uma vida
melhor” (Idem).
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45. Os intelectuais tinham um papel importante na burocracia governamental. Vindos de diversos lu-
gares do país, estiveram coesos com a política janarista e minados pelo fascínio de sua realização. Fo-
ram os principais divulgadores da “Mística” enquanto intelectuais orgânicos e intelectuais tradicionais
no serviço conectivo entre governo e povo. Álvaro da Cunha se encaixa no conceito de Gramsci, onde
o intelectual tradicional é “aquele que desenvolve funções culturais de ligação entre as administrações
políticas regionais ou nacionais com o conjunto da população ainda não incorporada às relações de
produção capitalista”. O orgânico é aquele “que age como indivíduo ou atuando no partido político que
representa seus interesses sociais, sendo o portador de um projeto de ‘hegemonias’, baseado em um
universo cultural e moral que desagrega valores anteriores e constrói novos”. Neste, não levo em con-
ta o significado cabal da teoria gramsciana (“o intelectual orgânico é o máximo grau de consciência so-
bre sua própria situação na sociedade”), mas como conceito que caracteriza o papel do modificador
da situação encontrada. [GONZALES, Horácio. O que São Intelectuais. Brasiliense, São Paulo, 1982].
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46. Não há dados quantitativos específicos sobre os negros que habitavam Macapá na época da im-
plantação do 1º Governo.
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47. Apesar de humildes, as casas e as roças das adjacências eram propriedades dos negros, doadas
por antigos senhores a seus escravos e herdadas pelos seus descendentes.
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48. Versos da música “Yra Ayê”. Pesquisa da Banda Placa, gravada no CD “Avença”, 2012.
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A literatura tem sido, cada vez mais, um meio importante para analisar as-
pectos do passado que dificilmente poderíamos encontrar em outras fon-
tes. A história, a trama contada na literatura, fornece informações sobre o
mundo dos sentimentos, relações, atitudes morais e, claro, também, so-
bre questões políticas e econômicas (D’INCAO, 1996. Pág. 13).
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Ao poeta cabia
A última palavra
O direito de lavra
Como se a carga do tear
Fosse jazida
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Tão simples
Que as pessoas suspeitavam
Em mim não o poeta
- um psicógrafo (idem)
Tão grande e séria era sua produção que pensavam ser ele um re-
ceptor de outra dimensão. Ele acreditava firmemente num futuro que
seria o redentor do Amapá em nível econômico e social. Sonhava
com hidrelétricas nos rios caudalosos do Território e com empreen-
dimentos industriais, a partir da produção do petróleo, minerais e da
agricultura.
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Certo
Todos os rios de janeiro me pertenciam
Minha é a sua estreita e rasa
Hidrografia urbana
Para os rios volumosos e crespos
Numerosos rios
Que me possuem
E marcam a identidade
Os rios que ilustram
Esta saudade
E geografam o homem (Idem)
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49. Título da matéria. FORTALEZA DE MACAPÁ – Histórico monumento a serviço do crime e destrui-
ção da liberdade – Presos comuns trancafiados dentro das paredes seculares da ex-praça de guerra.
50. Nessa época a FSJM era ocupada pelo corpo da Guarda Territorial.
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51. A única voz contrária que encontrei sobre a localização da FSJM, que é motivo de orgulho na de-
fesa da foz do rio Amazonas contra possível “invasão estrangeira” foi a do cientista paraense Ferreira
Penna, viajante e grande conhecedor da Amazônia do século XIX, que esteve em Macapá por volta de
1880. Ele afirmou o seguinte: “Ao sul da cidade está a Fortaleza de Macapá, construída no século passa-
do com todas as regras da arte militar, segundo o sistema de Vauban, sôbre um terreno alto e pedregoso,
que, todavia, tem sido muito escavado pela pancada das ondas do rio que ali vão quebrar-se”.
“Esta Fortaleza é considerada no Império na mesma ordem da de Santa Cruz; mas como praça de
guerra, sua importância vai além de constituir-se um centro de reunião de forças para distrair,
provisoriamente ou por um momento, qualquer agressão estrangeira [grifo meu]. Entre ela e a cor-
dilheira de ilhas que limitam o ramo norte do Amazonas, separando-o do ramo meridional, há um es-
paço de cerca de 6 milhas, que tanto é ali a largura do rio. Ao Sul daquelas ilhas e ao NO da ilha Marajó,
está o vasto ramo meridional do Amazonas que toma o nome de rio do Vieira, navegável para os maio-
res vapores do mundo”.
Ferreira Penna acrescenta que “o porto de Macapá é péssimo e pode-se dizer que não há um porto pro-
priamente dito senão uma costa açoitada, durante o verão, por ventos rijos e uma praia nua em gran-
de extensão, de modo que se não pode desembarcar ou embarcar livremente senão com a maré cheia”.
“O verdadeiro porto, o porto seguro, para Macapá não é junto a esta cidade, mas no grande canal entre
a ilha de Sant’Ana e o continente”.
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No período seguinte ele traça sua vidência sobre o local, que nos séculos anteriores abrigou outros for-
tes militares estrangeiros. Santana viria a se tornar a partir da década de 1950 um importante porto de
embarque de minério de manganês, ligado às minas de Serra do Navio por uma estrada de ferro. Diz
o cientista: “É ali que para o futuro hão de fundear navios que tiverem de comerciar com Macapá, bem
entendido, quando os recursos dos habitantes ou as necessidades do comércio construírem uma via fér-
rea entre a cidade e aquele canal através dos campos completamente planos, que tanta facilidade ofere-
cem para essa obra” (PENNA,1971, Pág. 15.)
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52. Jorge Hernani dos Santos, jornalista, nascido em Macapá. Foi diretor de jornalismo da TV Ama-
pá e da TV Marco Zero. Trabalhou na Assessoria de Comunicação do Governo do Estado do Amapá e
morreu em 1° de fevereiro de 2006. Nessa época estava escrevendo outro livro-reportagem sobre o se-
questro de dois vereadores por razões políticas. (Fonte: Portal da Imprensa – Jornalismo e Comunica-
ção na web – 07.02.2006).
53. Preferi transcrever a matéria in totum devido os detalhes nela colocados.
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54. A linha editorial do jornal Resistência era de esquerda, e naturalmente se opunha ao regime mili-
tar. Era editado em Belém-Pa. A reportagem intitulada “ OPERAÇÃO ‘ENGASGA’ - Tortura em Macapá:
uma época de obscurantismo político”, é de março de 1980.
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55. Jorge Hernani dos Santos, jornalista, nascido em Macapá. Foi diretor de jornalismo da TV Ama-
pá e da TV Marco Zero. Trabalhou na Assessoria de Comunicação do Governo do Estado do Amapá e
morreu em 1° de fevereiro de 2006. Nessa época estava escrevendo outro livro-reportagem sobre o se-
questro de dois vereadores por razões políticas. (Fonte: Portal da Imprensa – Jornalismo e Comunica-
ção na web – 07.02.2006).
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O INÍCIO DA FARSA
Final de abril, 1973. Macapá já registrava um ar de intranquilidade,
com aquelas nuvens carregadas de chuva, no meio da tarde quando as
duas caminhonetes da Polícia Civil entraram velozes na Avenida Pedro
Lazarino.
A garotada saiu correndo, afinal não era a primeira vez que a vizinhan-
ça reclamava dos palavrões que vinham dos bate-bolas no meio da rua.
Mas os carros passaram direto e estacionaram em frente a conhecida pa-
daria, no bairro do Beirol. Os delegados Uchôa, Queiroga e outros agen-
tes, já saíram armados e foram entrando. A meninada foi chegando per-
to, os vizinhos foram se aglomerando. Momentos de tensão e expectativa.
Minutos depois, os policiais tornaram da mesma forma como entraram,
somente com armas nas mãos. Não encontraram a pessoa que deseja-
vam prender: um velho de cabelos grisalhos, o dono da padaria conheci-
do como Jorge Padeiro, considerado comunista perigoso.
Poucos quilômetros dali dezenas de policiais estavam com as pernas
atoladas num charco, no bairro do Trem, na descida da Rua General Ron-
don, onde é a Praça Floriano Peixoto. Estavam armados com revólveres
e fuzis vasculhando a área que era um imenso matagal e alagado. Anda-
vam com dificuldade naquele lamaçal. Ninguém sabe quem avisou, como
e quando. O certo é que de repente, o aparato policial estava ali, com a
justificativa de ter recebido denúncias de que um homem que tinha es-
tuprado uma mulher, estava refugiado no meio do lago protegido pelo
matagal. A população se aglomerou em volta do local, e no meio daque-
le zum-zum-zum, chegou a se comentar que homem caçado era o famoso
monstro do Morumbi, bandido procurado pela polícia paulista, que estu-
prava as mulheres antes de matar.
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Caça às bruxas
Bastaram poucas horas desde que tudo começou para que a polícia des-
se início a uma verdadeira “operação caça às bruxas”. A repressão do Ter-
ritório já tinha a situação sob controle, ou seja, sabia dos nomes, endere-
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O Drama de Cada um
O francês Paul Lerouge era o mais idoso e debilitado dos acusados, mas
nem por isso foi poupado da violência policial. Foi um dos que mais so-
freu na fortaleza. Os outros presos não podiam olhar, foram obrigados a
ficar encostados na parede, de costas, mas, ouviam os gritos de Lerouge
que apanhava de palmatória e levava uma surra de cordas de nylon. Fo-
ram minutos de suplício num interrogatório antecipado sem registro for-
mal. Apenas puro sadismo para arrancar daquele velhinho frágil a confis-
são de que ele tinha as mãos firmes de um engasgador. Paul Lerouge não
tinha o que dizer e continuou apanhando acuado por três homens.
A idade pouco importava aos policiais violentos. Chaguinha, depois
que teve a casa revirada pela equipe do delegado Uchôa, foi levado dire-
to para a fortaleza. Começou a apanhar na rampa de subida do forte onde
já era aguardado por sete militares. Foi reconhecido por Adalberto Cou-
to, um oficial do Exército do Pará, que pediu ao seu superior para que lhe
fosse dada a permissão para conduzi-lo ao interior do forte. Foi uma pro-
teção momentânea. Dentro da fortaleza, Chaguinha começou a levar so-
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Certa vez, fez-se o sonho. Bento Maciel Parente, sonhou com uma Capi-
tania e escreveu à Coroa: “aqui se puede hacer outra Capitania. Terra de
sierras, campos alagadizoz, buena para ganados, dá bien tabaco, y coton,
y puedese estender por el rio arriba, hasta la boca del rio das amaçonas, y
Província de los Tapajós...”
Assim surgiu a Capitania do Cabo do Norte: 14 de junho de 1637.
Depois, outro sonhador propôs a criação da província de Oiapokia,
entre o Amazonas e o Nhamundá, o Atlântico e os limites do Império. Foi
Cândido Mendes, 1m 1853. Nada definido. Nada delimitado. Mas as gran-
dezas e vicissitudes do homem, num sentido cósmico, criavam o conjunto
político e o espaço econômico para o surgimento do Amapá.
Tanto isso é verdade que Ataíde Teive, dois séculos antes da Revolução
de 31 de março, lançava a pedra fundamental da Fortaleza de São José de
Macapá, para assegurar a posse da terra.
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Entre estas duas joias de arquitetura, floresceu a cidade que nasceu nas
alvissareiras manhãs equatoriais, sob a refrega rígida do homem contra o
agreste verdejante amazônico, ante a pertinácia do branco, a submissão
resignada do negro e a irrequieta participação do gentio [grifo meu],
fundiram-se e ombrearam-se na luta da construção do lugar que já na-
queles tempos recuados parecia ao promissor porvir [...].
xa em 1949. Retornando no dia 3 de abril desse mesmo ano a Macapá, ingressa no quadro de funcio-
nários do Governo do Amapá no dia 3 de maio, lotando na Divisão de Segurança e Guarda, como de-
legado de Polícia de Ferreira Gomes. Em 1951 é transferido para Macapá e em 1963 é transferido para o
município de Calçoene, assumindo o cargo de delegado de polícia.
Volta para Macapá em 1963, assumindo sempre cargos na esfera policial. Durante o golpe militar de
1964, acusado de “atividades subversivas”, é preso e recolhido à Fortaleza de São José de Macapá, por
ordem do governador Terêncio Porto. É posto em liberdade pelo próximo governador Luis Mendes da
Silva, retornando como delegado de Polícia Civil, e em seguida comandante da Guarda Territorial. Foi
ideia de Araguarino Mont’Alverne a colocação de uma estátua de Cabralzinho no município de Ama-
pá, no mesmo local onde aconteceu a invasão dos franceses. Em 1985 aposenta-se. Morre aos 91 anos.
Era escritor e membro da Academia Amapaense de Letras e da Academia Amapaense Maçônica de Le-
tras (Dados: Edgar de Paula Rodrigues).
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DOCA DA FORTALEZA
A Doca da Fortaleza, em Macapá, muito se assemelha à Doca de Belém e
a de outros portos aonde chegam e saem os pequenos barcos à vela, em
nossa costa marítima.
Há sempre o colorido das velas, a poesia dos barcos partindo e a ale-
gria dos barcos voltando, como na canção popular. A Doca da Fortaleza
tem muita coisa para se ver, comprar, admirar. É gente passando, é o gri-
to do homem que vende melado ou anuncia a farinha torrada. É o grito do
vento e o cheiro do rio, do grande rio-mar.
Também há o cheiro do peixe e da carne salgada, do assado de braza,
do barco parado com a quilha na lama, esperando a maré. E enquanto a
maré não vem os barcos, como grandes aves aquáticas, estendem suas ve-
las para o vento secar.
O caboclo uma rêde de pesca e outro passa cheio da mutamba, depois
de haver gasto o dinheiro apurado com a venda do açaí. Noutra canoa um
casal caboclo, queimado de sol, está ternurando no mormaço.
A Doca da Fortaleza tem muita coisa para ver e amar. Também pra
contar e cantar. É só olhar com olhar de poeta, do poeta das docas, do ho-
mem-menino que gosta de mar.
E quando a noite chega do outro lado da baía, surge uma lua imen-
sa e ilumina o silêncio da doca adormecida. As águas ficam prateadas e
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57. Luiz Jorge Ferreira, nascido em Belém, porém desde muito cedo levado a Macapá, onde chegou
aos dois anos. Médico, escritor, e membro fundador da Sobrames (Sociedade Brasileira de Médicos
Escritores) Secção São Paulo. Escreveu alguns livros: Berro Verde (Poemas), Tempos do Meu Tempo
(Poemas), Beco das Araras (Poemas), Cão Vadio (Poemas), Thybum (Poemas), O Avesso do Espanta-
lho (Contos), Luiz(s.) Signo do Sol - A Cinzenta Tarde Colorida). Letrou música para alguns composi-
tores de MPB e música regional de Raiz. Milton Batista, Edinaldo Lobato, Alfredo Reis, Jose Serra, Fer-
nando Canto, e Grupo Paçoca (Claudinho Reis, Gil, e Jorge Moreira). Participou do Festival da Tupi
– 1977 com o frevo Sem Jeito (Luiz Jorge&Assunção (Músico Amapaense da Banda Os Cometas e foi
premiado como o Melhor Arranjo - Maestro Nelsinho e intérprete (Trio Nagô). Foi premiado em vários
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Clarões da Alma
A Fortaleza imponente, ao lado, que bela paisagem que a história nos le-
gou e que preencheu meus sonhos por anos e anos...
Cresci íntimo com o rio e suas praias lamacentas. Pescava e perambu-
lava entre a Fortaleza e o Igarapé do Jandiá, território livre da minha se-
gunda infância, que me conservou a cultura ribeirinha do Juruá. Orgulha-
va-me do trapiche enorme avançando no mar doce, desafiando as marés,
apontando, poeticamente, para a lua cheia.
Concursos Literários de Contos e Poesia. Prêmio Canon 2009, Prêmio Bernardo de Oliveira Martins
2002-2003, Prêmio Flerts Nebó 2006-2007, International Poetry – 1983 (University of Colorado, Boul-
der). Participou da Bienal de 2010 - Convidado pela Scortecci Editora. Publicou Poema sobre o Operá-
rio Santo Dias (morto em manifestação de greve no Brasil) no Le Monde (Paris-França).
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A sordade me machuca
E me rói cá dentro do peito
Sentindo que não tem jeito
58. Os dois autores são irmãos e moraram, na infância, nas dependências da FSJM, quando seu pai
Zacarias Araújo era funcionário do Governo do Território e atuava na profissão de coureiro e sapateiro
da Guarda Territorial, segundo Obdias Araújo, seu filho, também poeta.
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[...]
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O farol da fortaleza
Guiava o navegador
Para achar o rumo certo
E navegar sem temor
Seu destino é ignorado
Com certeza foi roubado
Por algum governador
[...]
E foi assim que sumiram
Alguns dos nossos canhões
Que hoje moram no sul
E embelezam mansões
Será que eles vão voltar
Tomando o rumo do norte
Pra assumir o seu lugar
Sua missão de enfeitar
O nosso querido forte?
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Monumento histórico
Guardião impassível de uma época
Granítico símbolo de um povo
Nas noites
– longas noites –
Do gênesis da cidade
O português sonhava
Com sua amada
Além mar...
[...]
Nas prisões subterrâneas
Nas masmorras gotejantes
Fantasmas-prisioneiros de 200 anos
Retornam assombrando trevas
Nos gritos desencontrados das aves noturnas...
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59. Ray Cunha nasceu em Macapá, em 7 de agosto de 1954. Além de escritor, é jornalista, profissão que
exerce desde 1975. Trabalhou em jornais e revistas de Belém, Manaus, Rio Branco e Brasília. Graduou-
-se em jornalismo pela Universidade Federal do Pará (UFPa), em 1987, ano em que fixou residência em
Brasília. É terapeuta em Medicina Tradicional Chinesa, formado pela Escola Nacional de Acupuntu-
ra (ENAc), de Brasília. Seguem, em ordem cronológica inversa, seus livros publicados: A Confraria Ca-
banagem, Romance (Clube de Autores e Amazon.com), Hiena, Romance (Clube de Autores e Amazon.
com), A Casa Amarela, Romance (Editora Cejup, Belém, 2004), Na Boca do Jacaré-Açu – A Amazônia
como ela é, Contos (Ler Editora, Brasília, 2013), O Casulo Exposto (contos, LGE Editora, Brasília, 2008),
Trópico Úmido – Três Contos Amazônicos (edição do autor, Brasília, 2000), A Caça – Conto (Editora Ce-
jup, Belém, 1996), A Grande Farra – Contos (edição do autor, Brasília, 1992), Sob o Céu nas Nuvens –
Poesia (edição da União Brasileira de Escritores, Manaus, 1982) e Xarda Misturada – Poesia (edição dos
autores – Ray Cunha, José Edson dos Santos e José Montoril –, Macapá, 1971)
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60. Maria Ester Pena Carvalho é de formação em Ciências Sociais. Atualmente é acadêmica do cur-
so de Administração Pública (UNIFAP). Defensora da bandeira contra a corrupção e defesa do patri-
mônio público, histórico, artístico, cultural material e imaterial do Estado do Amapá. Servidora Públi-
ca Estadual; Conselheira Nacional de Políticas Culturais – Arquivos (CNPC 2015-2017; Presidente da
AARPAP (Associação dos Amigos do Arquivo Público do Estado do Amapá), associação que tem por
princípio resgatar, contar, mostrar, divulgar, ou seja, tornar conhecida a história, identidade, tradição e
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Jean Pierre olhou em volta e seus olhos se inundaram com aquela paisa-
gem maravilhosa. Tudo era diferente, era mais selvagem. Não se via mais
a fileira de canoas encostadas ao longo do canal da Fortaleza, nem o esta-
leiro e nem o imponente Hotel Macapá, do outro lado do canal (Pág. 22).
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61. Parte de uma pequena entrevista que fiz com autora sobre sua obra.
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5.1. REFERÊNCIA IMAGÉTICA
A fortificação tornou-se um ícone-referência após as facilidades da
mídia ao colocá-la com símbolo indelével da cidade, que está presen-
te em todas as representações institucionais dos governos. Bem an-
tes da transformação em estado (Na administração Annibal Barcel-
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O BRASÃO DE ARMAS
As Armas Estaduais são compostas por um escudo laureado pelas co-
res azul e vermelho, que retratam o antigo uniforme da Guarda da
Fortaleza. A feitura das Armas Estaduais deve obedecer às seguintes
disposições:
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O HINO DO ESTADO
O Hino do Estado do Amapá é composto pelo poema denominado
“Canção do Amapá”, cuja letra é de autoria o promotor de justiça Joa-
quim Gomes Diniz e a música e arranjos do maestro Oscar Santos. A
adaptação é em Fá Maior, para canto e em Si Bemol para execução, por
bandas de música. A Canção do Amapá, considerada, pela Constitui-
ção Estadual de 1991, o Hino do Amapá, foi vencedora do concurso so-
bre o Hino do Amapá em 16 de abril de 1944. Foi efetivado pela primeira
vez como hino oficial, pelo decreto nº 008, de 23 de abril de 1984, confir-
mado em 16 de junho de 1989 (Decreto nº 0018-E) e ratificado em 10 de
abril de 1991 (Decreto nº 59). [Fonte: Edgar de Paula Rodrigues].
CANÇÃO DO AMAPÁ
Letra de Joaquim Gomes Diniz
Música de Oscar Santos
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5.2. REFERÊNCIA LITERÁRIA
Deve-se rememorar que o ano de 2008 foi marcado por muitas come-
morações pelos 250 anos da fundação da vila de Macapá. Neste ano,
Escolas de samba do grupo especial da cidade, como a Associação
Universidade de Samba Boêmios do Laguinho e a Associação Recrea-
tiva Escola de Samba Piratas da Batucada fizeram seus enredos basea-
dos nesse acontecimento.
A Agremiação Carnavalesca Beija-Flor de Nilópolis apresentou e
venceu o carnaval das escolas de samba do Rio de Janeiro com o tema
“Macapaba - Equinócio Solar: viagens fantásticas ao meio do mundo”,
de autoria dos carnavalescos Laíla, Fran-Sérgio, Ubiratan Silva e Ale-
xandre Louzada, cujo samba enredo fala sobre a FSJM:
A mão de Ianejar
Na Fortaleza pela proteção da vida
Em São José de Macapá
Brilha Mairi a minha estrela preferida62
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04 de fevereiro de 1758.
Aqui a história se contorceu, houve enfrentamentos e sangue, surgi-
ram heróis e mártires. Foi o início da luta e da determinação de homens
e mulheres. Aqui o rio Amazonas, indiferente a tudo, abre sua boca num
estuário imenso. Tolda de barro as águas azuis. Serpenteia por igarapés,
invade floresta, oscila nas marés e nas estações. Na frente, só o céu e as
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63. Joãozinho Gomes. Poeta e compositor paraense - radicado no Amapá - nasceu em 20 de outubro
de 1957, na cidade de Belém do Pará. Iniciou suas atividades poética e musical na década de 1970. Em
época atual, reconhecidamente como um dos mais férteis poetas-letristas da sua geração, Joãozinho
Gomes ostenta uma obra que agrega parceiros – compositores e poetas – de várias regiões do Brasil.
A sua produção poética e musical consiste em aproximadamente mil canções e cinco livros, dos quais
cerca de duzentas canções foram gravadas por seus respectivos parceiros e, apenas um livro fora edi-
tado, “A Flecha Passa e poemas diVersos”; recentemente teve seus poemas editados pela Revista Bra-
sileira 84, da ABL- Academia Brasileira de Letras. Assim sendo, somente vinte por cento de sua exten-
sa obra está publicada.
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I
Âncoras ao rio
gente ao calabouço
grilhões cavando corpos
em busca de ossos
ainda ouço – ouço
o baque seco
do aço ao osso – o eco surdo
o gemido úmido do
índio e do caboco, o grito de
dor em quimbundo, o áfrico
choro aos abortos:
ouço a corte
assassinar os nossos
a foice trabalhar o corte
o aço ao osso
ouço a morte
o sangue gotejando
ao calabouço marca o tempo
do remorso – soluço
de um fantasma moço.
II
Aos arcos expõem o teu silêncio
um barulho de passos
ainda range aos ferros do martírio
correntes arrastando
os nossos pelos corredores
(medonho tilintar de tenebrosos guizos)
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III
O povo caminha
sobre as pedras
dentro do Ente triste.
(dentro doente o
povo) Sobre ele
um abismo de flange
aflige o amazonas
carrega em si
um afluente inteiro
para encher o pote.
Na cela; o choro
trêmulo de quem
repele a morte,
é sinal de luta na
rispidez das pedras.
São fantasmas e
crianças conjugando
a mesma “...sorte”.
IV
Farrapos após séculos!
Eis aqui a miserável obra
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O belicoso templo
de pedra e sangue
fora outro outrora,
ora abriga as artes,
enquanto
a ele o tempo ora.
Há vinte de nós
a decantar a sua história!
A frente de nós
há de cantar a sua história
legião de poetas
que carrego na memória. [grifos meus].
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AMAZÔNIA
O aeroplano ficou guardado sob os olhos dos soldados do Forte. Magní-
fica obra da engenharia lusitana. Construída pedra sobre pedra, consu-
miu décadas do tempo e muito sofrimento humano para ser erguida. Ali,
homens brancos, negros e índios, mulheres e crianças também, e velhos,
alguns muito velhos, suaram seu suor de sangue, viveram sua via-crucis,
uns com chibata nas mãos outros com arreios nos ombros. Cercados por
um dos lados pelo Dulce Mar e pelos outros a implacável muralha verde
permeada de frestas e olhos espreitando vigilantes e assombrados, e sil-
vos, muitos silvos, e sendas, poucas sendas, com pegadas e marcas, mar-
cas estranhas deixadas à noite, e silvos, muitos silvos.
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FORTALEZA CRISTÃ
El-Rei Dom José Primeiro, sem saber ao certo
O que fazer, em que lugar
Fez vir Galúcio, determinado e hábil, Vauban febril,
“Faz ser nosso sem contestação, o que é nosso é até então”
Uma a uma, pedra por pedra,
Suntuoso e monstro ergueu ali,
À sombra da expedicionária cruz,
O castelo da morte, o altar da guerra e da luz.
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Clarões da Alma
A Fortaleza imponente, ao lado, que bela paisagem que a história nos le-
gou e que preencheu meus sonhos por anos e anos...
Cresci íntimo com o rio e suas praias lamacentas. Pescava e perambu-
lava entre a Fortaleza e o Igarapé do Jandiá, território livre da minha se-
gunda infância, que me conservou a cultura ribeirinha do Juruá. Orgulha-
va-me do trapiche enorme avançando no mar doce, desafiando as marés,
apontando, poeticamente, para a lua cheia (CAPIBERIBE, 1998. Pág. 57).
64. O cronista João Alberto Capiberibe, como o dissemos antes, no capítulo anterior, foi prefeito de
Macapá, governador do Amapá e agora é senador da República. Tem 71 anos e já publicou livros de in-
teresse político. Obdias Alves de Araújo, 56 anos, publicou três livros de poesia entre eles “Praça, Pinga,
Poesia e Mágoa”, edição do Autor, Macapá - 1997.
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Tu sabias
que a Fortaleza
foi toda construída
no Curiaú?
Diz que o Sacaca
o Paulino e o Julião Ramos
vieram em cima da Fortaleza
varejando até chegar na beira do Igarapé Bacaba
onde amarraram a bichona na Pedra do Guindaste
e foram tomar uma lá
no boteco do sêo Neco.
Diz que o o Alcy escreveu uma crônica
E o Pedro Afonso da Silveira Júnior leu
Oito horas da noite
no Grande Jornal Falado E-2.
Diz que, né?
Diz que o mestre Zacarias
vinha em cima do farol
tocando um flautim feito
com as aparas da porta de ébano...
E que Dona Odália vinha fazendo
flores de raiz de Aturiá
sentada no maior de todos os canhões
brincando com a Iranilde
que acabara de nascer.
Diz que o Amazonas Tapajós vinha
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65. ARAÚJO, Obdias, O roubo do forte velho. Canto da Amazônia. 2011. Disponível em:< http://fer-
nando-canto.blogspot.com.br/2011/11/obdias-araujo-novo-poema.html. > Acesso em 09 jun.2015.
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Entre os anos de 1964 e 1982, foi construído o forte de São José de Macapá,
logo após o Tratado do Pardo ter revogado o Tratado de Madri de 1750,
reacendendo as guerras territoriais entre Espanha e Portugal.
Rogério interrompeu as meditações de Maurício.
– Aqui nós não temos um marco zero? O marco zero do Equador? Ele
não atravessa a cidade?
– Estive pensando nisso também. Mas nosso problema não é “marco
zero”, mas o “conceito zero”. Tenho procurado analisar todos os detalhes,
buscando combinações que possam ser úteis para decifrar o verdadeiro
código, do qual não temos nenhuma pista ainda. Temos de ver esse for-
te e tentar sair daqui ainda hoje. Algo me diz que as coisas estão se pre-
cipitando.
O piloto disse que até as quatro e meia podiam decolar para Belém.
Carlão preferiu ficar no aeroporto com seu colega. Tomaram um táxi e o
motorista levou-os ao forte.
Nunca havia estudado tanto a história do brasil como nos últimos me-
ses. Agora estava ali no Amapá e precisava descobrir se o forte São José de
Macapá estaria escondendo algum mistério que o general não teve tem-
po de desvendar.
“O Contestado Franco-Brasileiro teria algo a ver com isso? ” BARROS,
2008. Pág.314).
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– Será mesmo verdade que esse efeito coriolis faz as águas das pias escoa-
rem em sentido contrário, dos dois lados da linha do Equador? Aquela
moça disse que ao lado do Hemisfério Norte, a água escoa no sentido do
relógio, e, do lado do Hemisfério Sul, no sentido anti-horário. Penas que
não temos tempo para comprovar isso – disse o tenente, pesaroso.
Mas Maurício estava pensando nas hipóteses do novo código.
Nos dias 21 de março e 23 de setembro, o Sol passa sobre a linha do
Equador e então os dias e as noites duram exatamente doze horas, em
qualquer lugar do globo terrestre. Daí o nome equinócio, que vem do la-
tim aequinoctium, que significa noites iguais, e marca o início da prima-
vera, no Sul e o outono, no Norte.
“Será que esse equinoctium misturado com o efeito coriolis estaria
sendo usado? Parece tudo tão ridículo”.
Saíram do marco zero e foram direto para o aeroporto. O motorista
perguntou:
– Os senhores são da polícia? (Idem. Pág. 317).
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66. Sobre esse assunto, o ex-presidente da República e ex-senador pelo Amapá, o escritor José Sarney
traz à baila de forma intertextual, em seu livro sobre o Amapá, que os amapaenses se consideram mais
brasileiros que os outros porque se recusaram a ser franceses no episódio do Contestado (1895), desde
o confronto sangrento em que Cabralzinho lutou com os franceses defendendo o Brasil.
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67. A reflexão produzida neste item foi o resultado da sugestão da professora Alba Carvalho no exa-
me de qualificação, para que eu me colocasse frente ao tema de investigação desta tese, como litera-
to que sou.
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I
Como diariamente
As pedras dessa fortaleza silenciosa.
Bebo o rio afoito
Num apetite inútil (CANTO, 1984. Pág. 15-16).
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CÂNTICO 16º
Esvaem-se sortilégios
A cada pedra sobre pedra.
As mesmas mãos que criaram vultos
Mataram visagens de vidro.
Vão-se assombrações
Quando argamassa e barro
Unem-se/ fundem-se
Na raça que resulta em nós (CANTO, 1985. Pág. 57).
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III
O medo era um peixe engolidor
Que dissipou-se à vista da primeira paisagem
- Uma estranha construção de pedra
E um longo madeirame sobre as águas
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68. Informação verbal fornecida por Alba Carvalho. Apontamentos de sala de aula. Macapá, 2013.
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69. Informação verbal fornecida por Alba Carvalho. Apontamentos de sala de aula. Dinter, Ma-
capá. 2013
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— 296 —
ACHUGAR, Hugo. Planetas sem Boca – Escritos efêmeros sobre Arte, Cultura
e Literatura. Editora da UFMG, Belo Horizonte: 2006.
ALCANTARA, Dora Monteiro e Silva. Fortaleza de São José do Macapá, H.J.
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ALENCAR, José de. Iracema. Ática, São Paulo: 1991.
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Amapá/ SEPLAN/DETUR. Imprensa Oficial, Macapá: 1982.
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CEICT/Departamento de Turismo. Imprensa Oficial. Macapá:S. d.
AMORIM, Marília. Cronotopo e exotopia. In BRAIT, Beth (Org.). Baktin ou-
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ARANHA, Tenreiro. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em:
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ARAÚJO, Hodias. 20 centavos de poesias. Tarso, Macapá: 2006.
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Coordenadores
Prof. Dr. Cristian S. Paiva
Prof.ª Dr.ª Eliane Superti
Títulos da Coleção
Vol. 1: Participação social no desenvolvimento de políticas públicas no estado do Amapá: um olhar sobre
a elaboração e execução do plano plurianual de Macapá-AP no período de 2013 a 2016 (ISBN: 978-85-
62359-79-8)
Alexandre Gomes Galindo
Vol. 2: Literatura das pedras: a Fortaleza de São José de Macapá como locus das identidades amapaenses
(ISBN: 978-85-62359-80-4)
Fernando Canto
Vol. 3: Saber de parteira, ciência de médico? Incorporação de saberes médicos e resistência cultural na
“capacitação” de parteiras tradicionais do Amapá (ISBN: 978-85-62359-81-1)
Iraci de Carvalho Barroso
Vol. 4: Histórias vividas e narradas: as identidades amapaenses no Jornal Amapá (1945-1968) (ISBN:
978-85-62359-82-8)
Manoel Azevedo de Souza
Vol. 8: Travessias entre a sala de aula e o consultório: trajetórias docentes, narrativas e histórias de
sofrimento e adoecimento psíquico de professores no Amapá (ISBN: 978-85-62359-85-9)
Selma Gomes da Silva
Vol. 9: Ações artísticas na cidade de Macapá: conexões de mundos, trajetória e experiência na Amazônia
(ISBN: 978-85-62359-86-6)
Silvia Marques
Vol. 10: Um cais que abriga histórias de vida: sociabilidades conflituosas na gentrificação da cidade de
Macapá (1943-1970) (ISBN: 978-85-62359-87-3)
Verônica Xavier Luna
Vol. 11: A gapuia de significados: modos de vida, espaços de convivência e processos de nomeação entre
ribeirinhos da Amazônia amapaense ((ISBN: 978-85-62359-92-7)
Rosileni Pelaes de Morais