Rede Frio

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Rede de frio

gestão, especificidades e atividades

Marileide do Nascimento Silva


Regina Fernandes Flauzino
(orgs.)

SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros

SILVA, M.N., and FLAUZINO, R.F., eds. Rede de frio: gestão, especificidades e atividades [online].
Rio de Janeiro: CDEAD/ENSP/EPSJV/Editora FIOCRUZ, 2017, 348 p. ISBN: 978-65-5708-096-2.
https://doi.org/10.7476/9786557080962.

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S586r Silva, Marileide do Nascimento (Org.)


Rede de frio: gestão, especificidades e atividades. / organizado por
Marileide do Nascimento Silva e Regina Fernandes Flauzino. – Rio de
Janeiro, RJ: CDEAD/ENSP/EPSJV/Editora FIOCRUZ, 2017.

348 p. ; il.

ISBN: 978-85-8432-019-6

1. Planejamento em Saúde. 2. Programas de Imunização. 3. Sistemas


de Informação. 4. Refrigeração. 5.Rede de Frio. 6. Gerenciamento de
Resíduos. 7. Saúde do Trabalhador. I.Flauzino, Regina Fernandes
(Org.).II. Título.

CDD – 22.ed. – 615.372

2017
Editora Fiocruz Coordenação de Desenvolvimento Educacional e
Educação a Distância da Escola Nacional de Saúde
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Não é suficiente você fazer o seu melhor;
primeiro você precisa saber exatamente o que fazer,
para depois dar o seu melhor.
W. Edwards Deming
Autores
Alexandre Moreno Azevedo
Economista graduado pela Universidade Estácio de Sá. Especialista em educação
profissional em saúde pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/
Fiocruz). Coordenador do Laboratório de Educação Profissional em Manutenção de
Equipamentos de Saúde (EPSJV/Fiocruz).

André Silva Cardoso


Especialista técnico em rede de frio em imunobiológicos pela Escola Politécnica de
Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Supervisor de almoxarifado do Setor
de Distribuição da Central Nacional de Armazenagem e Distribuição de
Imunobiológicos (Cenadi).

Cláudia Othero Nunes Abreu


Enfermeira referência técnica em imunização da SRS-BH da Secretaria de Estado da
Saúde de Minas Gerais.

Clayton Bernardo da Costa


Especialista técnico em rede de frio de imunibiológicos pela Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Tecnólogo em logística e responsável pelo Setor de
Distribuição de imunobiológicos da Central Nacional de Armazenagem e Distribuição
de Imunobiológicos (Cenadi).

Cristiane Pereira de Barros


Enfermeira. Especialista em saúde pública. Atualmente, é consultora técnica especialista
do Ministério da Saúde.

Evelin Plácido dos Santos


Enfermeira. Mestre em ciências da saúde da Escola de Enfermagem da Universidade de
São Paulo (USP). Especialista em saúde indígena pela Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp). Coordenadora da área de imunização do Projeto Xingu (Unifesp).

Felipe da Silva Furtado


Especialista técnico em rede de frio de imunibiológicos pela Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Tecnólogo responsável pelo Setor de Recebimento
e Armazenamento de Imunobiológicos da Central Nacional de Armazenagem e
Distribuição de Imunobiológicos (Cenadi).

Irai Borges de Freitas


Pedagogo graduado pela Faculdade São Judas Tadeu. Mestre em desenvolvimento local
pela Suam. Especialista em ergonomia pela Coppe/UFRJ e pela PUC. Especialista em
saúde do trabalhador e ecologia humana pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca (ENSP/Fiocruz). Professor pesquisador do Laboratório de Educação Profissional
em Manutenção de Equipamentos de Saúde da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio (EPSJV/Fiocruz).

João Leonel Batista Estery


Médico; farmacêutico; advogado. Especialista em saúde pública pela UFRGS.
Coordenador de logística de imunobiológicos do Ministério da Saúde (MS) e consultor
da produção do Manual de Rede de Frio, do Programa Nacional de Imunizações (MS).

Luis Cláudio Bernardo Colacio


Biólogo. Analista da qualidade em Bio-Manguinhos (Fiocruz). Atua na área de
treinamentos em BPF e desenvolve auditorias internas da qualidade e auditorias
em fornecedores.
Katia Butter Leão de Freitas
Administradora. Mestre em ciências pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca (ENSP/Fiocruz). Especialista em ergonomia pela Coppe/UFRJ e em saúde
do trabalhador e ecologia humana pela ENSP/Fiocruz. Professora pesquisadora do
Laboratório de Educação Profissional em Manutenção de Equipamentos de Saúde da
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz).

Marcello de Moura Coutinho


Bacharel e licenciado em ciências sociais pela Universidade Federal Fluminense
(UFF). Mestre em políticas públicas e saúde pela Escola Nacional de Saúde Pública
Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz). Professor pesquisador da Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio (EPSJV/ Fiocruz). Coordenador do curso técnico de nível médio em
gerência em saúde. Participa de projetos de pesquisa vinculados a políticas de saúde,
qualificação de trabalhadores técnicos de saúde no Brasil, saúde do trabalhador e
gestão em saúde.

Maria Luiza Silva Cunha


Psicóloga. Doutoranda em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca (ENSP/Fiocruz). Professora pesquisadora do Laboratório de Educação Profissional
em Gestão em Saúde, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz).
Pesquisadora dos Grupos de Pesquisa Currículo e Processos de Formação em Saúde e
Núcleo de Estudos em Democratização e Sociabilidades em Saúde.

Marileide do Nascimento Silva


Enfermeira. Mestre em ensino de biociências em saúde do Instituto Oswaldo Cruz/
Fiocruz. Especialista em educação profissional em saúde pela Escola Politécnica de
Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Auditora em serviços de saúde e professora
pesquisadora na área de vigilância em saúde e imunizações da EPSJV/Fiocruz.

Marta Casagrande Koehler


Médica graduada pela Universidade Federal do Espírito Santo. Especialista em pediatria
e pós-graduada em saúde pública pela Universidade de São Paulo (USP). Coordenadora
do Programa Estadual de Imunizações e Vigilância dos Eventos Adversos Pós-Vacinação
do estado do Espírito Santo, no período de 2001 a 2013.

Paulo Roberto de Carvalho


Químico. Doutor em ciências. Mestre em sistemas de gestão de segurança. Especialista
em gestão ambiental. Professor pesquisador em biossegurança da Escola Politécnica de
Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Professor orientador em programas de pós-
graduação em biossegurança em unidades técnico-científicas da Fiocruz.

Pedro Luiz da Silva Moura


Engenheiro eletrônico pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Técnico de gestão
e planejamento em saúde do Ministério da Saúde. Professor pesquisador da Escola
Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz).

Sarita de Oliveira Ferreira Lopes


Pedagoga graduada pela Faculdade São Judas Tadeu. Mestre em educação
profissional em saúde pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/
Fiocruz). Especialista em ergonomia pela Coppe/UFRJ e em saúde do trabalhador e
ecologia humana pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz).
Professora pesquisadora do Laboratório de Educação Profissional em Manutenção de
Equipamentos de Saúde (EPSJV/Fiocruz).

Sergio Ricardo de Oliveira


Licenciado em física. Doutor em ensino de ciências e mestre em ciências na área
de radiologia. Professor pesquisador do Laboratório de Educação Profissional em
Manutenção de Equipamento de Saúde da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Atualmente é Vice-Diretor de Pesquisa e Desenvolvimento
Tecnológico da EPSJV.
Tereza Cristina Ramos Paiva
Psicóloga. Mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca (ENSP/Fiocruz). Tecnologista em saúde do Laboratório de Educação Profissional
em Gestão em Saúde da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz).

Valéria Cristina Gomes de Castro


Graduada em serviço social pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em
ciências, na área de saúde pública, pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
(ENSP/Fiocruz). Atualmente é docente e pesquisadora na Coordenadoria de Cooperação
Social/Presidência Fiocruz. Experiência na área de saúde coletiva, com ênfase em saúde
mental, gestão do trabalho, educação popular e participação social em saúde.

Yeda Célia Silva Eugênio


Enfermeira. Especialista em enfermagem de saúde pública. Atua na Coordenação de
Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado da Saúde (SESA/ES), no Programa
Estadual de Imunizações e Doenças Imunopreveníveis.

Walkyria Hercilia Carneiro


Enfermeira. Especialista em enfermagem de saúde pública. Diretora técnica de Saúde II
da Rede de Frio da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, desde maio 2002 até a
presente data.

Walquíria Gonçalves dos Santos Teles


Enfermeira. Especialista em enfermagem de saúde pública. Técnica assessora do
Programa Nacional de Imunizações, de 1999 a 2014. Atualmente, é auditora do
Ministério da Saúde do Departamento Nacional de Auditoria do SUS.

Organizadoras
Marileide do Nascimento Silva
Regina Fernandes Flauzino
Enfermeira sanitarista. Doutora e mestre em saúde pública/epidemiologia pela Escola
Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz). Professora adjunta de
epidemiologia do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Colaboradores
Andréa Pereira Laranjeira
Biomédica. Mestre em biologia celular e molecular. Tecnologista em saúde pública do
Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz).

Daniele Bessler
Enfermeira da Maternidade Leila Diniz (RJ). Conselheira do Conselho Regional de
Enfermagem (RJ) e docente especialista em resíduos dos serviços de saúde.

Dilson dos Santos Oliveira


Especialista técnico em rede de frio de imunobiológicos pela Escola Politécnica de
Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Tecnólogo responsável pelo Setor de Kits
e Diagnóstico da Central Nacional de Armazenagem e Distribuição de
Imunobiológicos (Cenadi).
Eduardo Jorge Rabelo Netto
Biólogo. Mestre em vigilância sanitária. Coordenador dos núcleos técnicos do Instituto
Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz).

Gladys Miyashiro Miyashiro


Médica. Mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
(ENSP/Fiocruz). Especialista em educação profissional em saúde pela Escola Politécnica
de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Tecnologista em saúde pública da
EPSJV/Fiocruz.

Guaracemyr Matos
Especialista técnico em rede de frio de imunobiológicos pela Escola Politécnica
de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Tecnólogo responsável pelo Setor
de Almoxarifado da Central Nacional de Armazenagem e Distribuição de
Imunobiológicos (Cenadi).

Ieda da Costa Barbosa


Enfermeira. Mestre em políticas públicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(Uerj). Especialista em educação profissional em saúde pela Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Tecnologista em saúde pública da EPSJV/Fiocruz.

Jaline Alves Cabral da Costa


Farmacêutica industrial e bioquímica. Mestre em ciências biológicas pelo Instituto
de Microbiologia Paulo de Goés – UFRJ. Tecnologista em saúde pública do Instituto
Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz).

Márcia Danieluk
Enfermeira. Atualmente lotada na Secretaria Estadual de Saúde da Bahia.

Muriel Silva Moura


Médica graduada pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Especialista em clínica
médica (Hospital Santa Marcelina-SP), hematologia, unidade de terapia intensiva e
transplante de medula (Unicamp). Em exercício no Centro de Hematologia da Santa
Casa de Misericórdia de Maceió e no Hospital Cliom.

Nadja Greffe
Enfermeira. Especialista em saúde pública pela Universidade Federal do Estado do Rio
de Janeiro (UniRio). Coordenadora do Programa de Imunizações da Superintendência
de Vigilância em Saúde da Subsecretaria de Promoção, Atenção Primária e Vigilância
em Saúde da SMS do Rio de Janeiro.
Sumário

Prefácio ........................................................................................................................... 13

Apresentação ................................................................................................................. 15

I Imunização: especificidades e as bases para a compreensão


da rede de frio de imunobiológicos

1. Planejamento em saúde ................................................................................................................19


Maria Luiza Silva Cunha e Tereza Cristina Ramos Paiva

2. O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população .......................47


Marta Casagrande Koehler e Evelin Plácido dos Santos

3. Vigilância epidemiológica em eventos adversos pós-vacinação ........................................................79


Cláudia Othero Nunes Abreu e Marileide do Nascimento Silva

4. Avaliação da vacinação..................................................................................................................93
Cláudia Othero Nunes Abreu

5. Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) ....................................... 109


Walkyria Hercilia Carneiro e Marileide do Nascimento Silva

II A gestão da rede de frio de imunobiológicos e seu processo de trabalho

6. A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos ............................................. 127


Alexandre Moreno Azevedo, Clayton Bernardo da Costa, Luis Cláudio Bernardo Colacio,
Pedro Luiz da Silva Moura e Sergio Ricardo de Oliveira

7. Refrigeração e equipamentos da rede de frio ............................................................................... 147


Alexandre Moreno Azevedo e Pedro Luiz da Silva Moura

8. Gestão da rede de frio de imunobiológicos .................................................................................. 175


André Silva Cardoso, Clayton Bernardo da Costa, Cristiane Pereira de Barros, Felipe da Silva Furtado,
João Leonel Batista Estery, Walquíria Gonçalves dos Santos Teles e Yeda Célia Silva Eugênio

9. Gerenciamento de resíduos na rede de frio .................................................................................. 231


Cristiane Pereira de Barros e Walquiria Gonçalves dos Santos Teles

III Organização do trabalho em saúde e a rede de frio de imunobiológicos

10. Organização do trabalho ...........................................................................................................245


Marcello de Moura Coutinho e Valéria Cristina Gomes de Castro

11. Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde ......................................................... 257


Marcello de Moura Coutinho, Maria Luiza Silva Cunha

12. Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos ....................................... 275


Irai Borges de Freitas, Katia Butter Leão de Freitas, Marcello de Moura Coutinho,
Sarita de Oliveira Ferreira Lopes
13. Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho ............................................. 297
Irai Borges de Freitas, Katia Butter Leão de Freitas e Sarita de Oliveira Ferreira Lopes

14. Noções gerais sobre biossegurançae a questão do incêndio ........................................................ 327


Paulo Roberto de Carvalho, Marcello de Moura Coutinho
Prefácio

A iniciativa de publicar um livro sobre rede de frio é de alta relevância


para o Programa Nacional de Imunizações e, portanto, para a saúde da
população brasileira.

Todos conhecemos exemplos de surtos de doenças infecciosas em


que a má conservação de vacinas, especialmente as de vírus vivos, foi
identificada como fator relevante para essa ocorrência. Mesmo que a
termoestabilidade de vacinas tenha sido melhorada nos últimos anos,
e as respectivas apresentações tenham agora muito menos doses, a
manutenção adequada da rede de frio continua sendo fator essencial
para que as vacinações possam atingir seu objetivo: imunizar as pessoas
contra doenças infecciosas de grande relevância, que, por isso, deman-
dam ações específicas de prevenção.

Sabemos também, pelas experiências negativas, que a conscientiza-


ção e a preparação dos profissionais encarregados da rede de frio são
indispensáveis. Por mais simples que sejam as ações, se as pessoas não
souberem a razão que baseia a forma de organização, a logística de
distribuição, os procedimentos, bem como seu fundamento teórico
básico, a execução ficará comprometida. Os profissionais da rede de
frio devem compreender que fazem parte de um conjunto articulado,
que visa obter imunizações bem-sucedidas. Para isso, devem conservar
a vacina, um produto muito sensível e delicado, de forma correta. A
rede de frio adequada evitará perdas de vacinas e, portanto, contribuirá
para a efetiva diminuição de custos e a redução de desperdício.

A apresentação didática dos fundamentos das ações de manutenção de


rede de frio e de seu papel dentro do Sistema Único de Saúde visa mais
do que formar técnicos, é sim ter profissionais comprometidos com a
saúde da população e conscientes de que fazem parte de uma grande
equipe integrada, em que tudo e todos são importantes.
Outro aspecto essencial dentro da organização e articulação da rede de
frio é a sua gestão, qualificada e profissional, focada detalhadamente
neste livro. Bio-Manguinhos/Fiocruz tem orgulho de ter contribuído
com a organização e operação do embrião inicial da, hoje, altamente
complexa rede de frio do Programa Nacional de Imunizações.

As organizadoras, os autores e os colaboradores do livro são pessoas


com grande conhecimento e experiência na área, garantindo a qua-
lidade e pertinência da obra, que será uma fonte básica para busca de
informações, treinamento e formação de pessoal especializado.

Akira Homma
Assessor científico sênior de Bio-Manguinhos/Fiocruz; membro do Comitê Executivo da Rede de
Fabricantes de Vacinas dos Países em Desenvolvimento (DCVMM).

Reinaldo de Menezes Martins


Assessor do Comitê Técnico em Imunizações do Programa Nacional de Imunizações do Ministério
da Saúde (PNI/MS); consultor científico de Bio-Manguinhos/Fiocruz.
Apresentação

A imunização é uma das intervenções em saúde pública de maior efetivi-


dade na redução das mortes, das doenças, no Brasil e no mundo inteiro.
As vacinas, junto com a vigilância, foram responsáveis pela eliminação
de diversas doenças como, por exemplo, a varíola, obtendo, indiscutivel-
mente, o reconhecimento da população por sua efetividade e importância.

A oferta à população de imunobiológicos em condições de conferir pro-


teção é assegurada por um eficiente processo de conservação, armaze-
namento e distribuição, denominado rede de frio. Esse processo logís-
tico é complexo e exige padrões rígidos, preestabelecidos, e padrões
técnicos de utilização e gestão dos imunobiológicos, em todos os níveis
de gestão do sistema de saúde, a fim de garantir a qualidade dos imu-
nobiológicos que chegam às diversas salas de vacinas do país.

O governo brasileiro, visando manter a qualidade e segurança desses


produtos, tem investido, cada vez mais, na estruturação e/ou constru-
ção de centrais de armazenamento e distribuição de imunobiológicos
em todo país.

O Programa Nacional de Imunizações tem empenhado esforços nessa


direção, de modo a ofertar imunobiológicos de qualidade, por meio da
construção de novas centrais e, também, da compra de equipamentos
específicos, de sistema de informação próprio e de padrões de referên-
cia e rotinas que assegurem o correto funcionamento da rede de frio.

Se, por um lado, podemos comemorar as iniciativas de investimento


na construção de novas centrais de armazenamento, que ocorrem de
forma dinâmica e crescente, por outro, observamos que as capacitações
de profissionais não ocorrem na mesma proporção, visto que inexistem
ofertas para a formação específica nessa área bem como materiais didá-
ticos que abordem a temática de forma ampla, e não apenas técnica, de
modo a atender a demanda cada vez maior da imunização/rede de frio
no Sistema Único de Saúde.
É fundamental que a formação desses profissionais esteja em consonân-
cia com a proposta da vigilância em saúde, baseada na atenção básica
e na reorganização das práticas sanitárias, com ênfase na integralidade
do cuidado, sem perder o foco da importância do conhecimento téc-
nico, que deve estar associado às demais questões da saúde.

Com essa convicção é que o livro Rede de Frio: gestão, especificidades


e atividades foi concebido, organizado e produzido pela Fiocruz, por
meio da Escola Politécnica Joaquim Venâncio e da Escola Nacional de
Saúde Pública Sergio Arouca/Coordenação de Desenvolvimento Edu-
cacional e Educação a Distância, em parceria com a Editora Fiocruz. A
obra contou com a participação de especialistas das Secretarias Estadual
e Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, da Central Nacional de Arma-
zenagem e Distribuição de Imunobiológicos (Cenadi), do Ministério da
Saúde, da Universidade Federal Fluminense  (UFF) e da Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). Ele é, portanto, fruto do
compartilhamento de ideias entre parceiros com perfis diversificados e
objetivos bem definidos.

Com o propósito de colaborar para o aperfeiçoamento dos processos


formativos, o livro discorre sobre temas relacionados às atividades de
imunização que balizam a existência e compreensão da rede de frio
para a garantia dos imunobiológicos, com base no trabalho realizado
na Cenadi. Destaca a necessidade do trabalho compartilhado e do pla-
nejamento para gestão eficiente da rede; ressalta o papel estratégico
que o trabalhador da rede de frio desempenha nesse processo; debate
assuntos que vão desde o calendário vacinal até o gerenciamento dos
resíduos resultantes das atividades desenvolvidas na imunização e na
rede de frio de imunobiológicos.

Da forma como está organizado, em três partes, o livro propõe ao con-


junto de trabalhadores da área de saúde reflexões sobre o processo de
trabalho em saúde com enfoque na atenção básica e no conhecimento
dos aspectos fundamentais das estruturas de gestão da rede de frio de
imunobiológicos, nas diversas instâncias e níveis de gestão.

Essa proposta reflexiva, em que teoria e prática se articulam e se com-


plementam, torna a publicação valorosa para os profissionais de saúde,
à medida que suscita a análise de conceitos e debates à luz de suas expe-
riências, tanto nos serviços como no meio acadêmico, conferindo-lhes
o papel de atores em seus processos formativos ou de trabalho. Desse
modo, os estudos apresentados contribuem para a qualificação de profis-
sionais com uma visão ampla das questões que perpassam as atividades
da rede de frio e para uma atuação crítica e inovadora no seu cotidiano.

As Organizadoras
I Imunização: especificidades e
as bases para a compreensão
da rede de frio de
imunobiológicos
1. Planejamento em saúde
Maria Luiza Silva Cunha e Tereza Cristina Ramos Paiva

A garantia da proteção da população por meio da imunização contra as


doenças passíveis de vacinação envolve um conjunto de procedimentos
prévios que incluem, até chegar à imunização, de fato, e cumprir com
o objetivo proposto:
G planejamento do calendário de vacinação;
G organização das unidades e centrais de rede de frio com recursos
materiais e humanos, em quantitativos suficientes;
G adequação e preparação dos centros de referência para aplicação dos
imunobiológicos especiais;
G infraestrutura e equipe capacitada para manuseio, conservação,
preparo, administração, registro e descarte dos resíduos resultantes
das ações de vacinação.

Essa gama de atividades deve ser realizada com o máximo de orga-


nização para que haja o mínimo de risco e interferências possíveis.
Assim, as ações necessitam de ser pensadas, previstas, monitoradas e
avaliadas, ou seja, precisam, antes de qualquer ato, ser planejadas! O
dimensionamento do que é necessário e de como poderá ser realizado,
a partir dos objetivos traçados, somente será efetivo com um planeja-
mento cuidadoso das atividades e uma avaliação contínua e sistemática
dessas ações.

Ao longo deste capítulo, buscamos apresentar o planejamento em saúde No Capítulo 8,“Gestão da rede
como fator determinante e propulsor das atividades de imunização e de frio de imunobiológicos”,
demonstraremos a aplicação
da rede de frio de imunobiológicos. Inicialmente, destacamos algumas prática da discussão sobre
concepções que reforçam a importância de se planejar ações para obter planejamento nessa rede.
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

êxito e alcançar metas. Em seguida, propomos algumas reflexões sobre


a relação intrínseca entre o planejamento e os processos de trabalho
na rede de frio, utilizando o planejamento estratégico como referência.
Esperamos, ainda, fornecer subsídios que o ajudem a entender sobre o
planejamento e seu papel na organização das atividades de vacinação
e da rede de frio.

Conceito de planejamento
Planejar em saúde não é um modismo ou uma opção de gestão, mas
uma necessidade! Em imunização e em rede de frio, o planejamento
é elemento fundamental, especialmente porque ambas as situações
envolvem um complexo sistema logístico, executado em diversos
níveis ou instâncias, com atuação de inúmeros profissionais, de níveis
e conhecimentos diversos, todos trabalhando em comum para levar as
vacinas a cada recanto ou região deste imenso país que é o Brasil.

Como fazer para que a vacina esteja disponível e em condições de con-


ferir proteção e/ou imunizar cada uma das pessoas nas mais diversas
regiões e diferentes realidades sociopolíticas, econômicas e culturais?
Como garantir que as vacinas cheguem às unidades de saúde em tem-
peratura adequada para serem aplicadas?

Reconhecemos não ser tarefa fácil. Por isso, precisamos que as ativida-
des sejam planejadas adequadamente e acompanhadas em cada etapa,
realizando-se os ajustes necessários, as readequações e/ou reorganiza-
ções, para que se possa garantir sua realização com a máxima eficácia
e o mínimo de risco.
Figura 1 – Reunião de planejamento
O planejamento se constitui em poderosa
ferramenta para as atividades da saúde,
especialmente para a vacinação e para a
rede de frio. Para iniciarmos uma reflexão
acerca do planejamento como importante
ferramenta no processo de gestão, preci-
samos entender como ele é conceituado.

Analise a Figura 1: observe que há um


grupo de pessoas realizando um trabalho
sistemático de planejamento.

Podemos, em algumas situações, agir de


forma não planejada, realizando ou mar-
cando nossas ações pelo improviso.

20
Planejamento em saúde

O planejamento das ações passa a ser uma alternativa à não impro-


visação, usando-se métodos, pensamento sistemático e traçando-se
objetivos a fim de criar um futuro (HUERTAS, 1996).

Algumas pessoas podem ponderar, no entanto, que o futuro é com-


plexo, incerto, repleto de surpresas, não sendo possível realizar uma
predição do que ocorrerá.

Devemos, então, ficar no imobilismo e esperar para ver o que o destino


nos reserva?

A resposta é não! Porque “quem planeja influi nos resultados futuros,


ainda que não tenha total controle sobre os resultados de sua ação”,
conforme cita HUERTAS (1996, p. 15). Em outras palavras, significa
que, se não podemos predizer o que irá acontecer no futuro, podemos,
sim, prevê-lo e influenciar os fatos que se seguirão, através do planeja-
mento das ações.

Conforme essa concepção, o planejamento se opõe à visão determinís-


tica e de condução pelo destino (como na música Deixa a vida me levar,
de Serginho Meriti (PAGODINHO, 2002)), e se configura como uma
possibilidade de escolha e uma ferramenta de liberdade.

No setor de saúde, em geral, e na rede de frio de imunobiológicos, em


particular, existem importantes motivos para que tais ações baseadas
no improviso sejam evitadas. Consequências dessa ação não planejada
podem levar a problemas sérios. Um exemplo é na própria imunização
e na rede de frio, em que a falta ou a inadequação de planejamento na
aquisição e distribuição dos imunobiológicos pode acarretar desabaste-
cimento desses produtos, levando à insuficiência ou à inexistência de
vacinas para atender à população. Tal equívoco interfere no controle
epidemiológico das doenças e, consequentemente, nas mortes evitáveis
pela vacinação.

Em outras palavras, ações não planejadas podem levar ao desperdício e


ao mau uso dos recursos, além de interferirem no alcance dos objetivos.

“O planejamento então precede a ação, sendo inseparável desta como


as faces de uma mesma moeda. Podemos dizer que o planejamento e O planejamento será necessário
porque poderá nortear a
ação são indissociáveis” (MATUS, 1996). Em síntese, nas palavras de execução das ações, e essas
Carlos Matus, importante autor do planejamento em saúde na Amé- devem ser sistematicamente
monitoradas e avaliadas
rica Latina, o “planejamento é o cálculo que precede e preside a ação” durante todo o processo.
(MATUS, 1996, p. 57).

21
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Podemos então afirmar:


Planejamento é um processo que busca transformar uma situação em
outra tendo em vista uma dada finalidade. Para isso, precisaremos recorrer
ao uso de instrumentos (meios de trabalho tais como técnicas e saberes),
desenvolvendo atividades (trabalho propriamente dito), sob determinadas
relações sociais, em uma dada organização (PAIM, 2002). Essa prática
social, técnica, política, econômica e ideológica pode se apresentar de
modo estruturado, por meio de políticas, planos, programa e projetos,
No Anexo A,“Contribuições de
Carlos Matus e Mário Testa no ou não estruturado, isto é, como um cálculo (MATUS, 1996) ou um
planejamento estratégico”, deste pensamento estratégico (TESTA, 1995).
capítulo, apresentamos algumas Fonte: Paim (2006, p. 770).
informações sobre esses autores.

A partir dessas concepções, por que é importante planejar na saúde? ções

Em saúde, o uso dos recursos deve ser racionalizado, e os diferentes ato-


res envolvidos precisam ser ouvidos e contemplados de alguma forma.
Isso só é possível com planejamento constante das ações a serem rea-
lizadas. Vale destacar que o planejamento é uma ferramenta também
muito utilizada em outras áreas, mas, em saúde, é imprescindível, em
função dos fatores já mencionados e de outros, como a própria comple-
xidade do setor de saúde. Necessidades da população, perfil de adoe-
cimento, concentração de oferta de serviços, disponibilização desses
serviços, crescentes inovações tecnológicas são exemplos de questões
constantes que precisam ser superadas. Alguns desses aspectos tornam-
-se pontos de gargalo perante a escassez de recursos para resolvê-los ou
equacioná-los de forma a garantir a equidade da atenção.

Outro fator a ser considerado é o próprio processo de trabalho em saúde,


que é complexo e envolve aspectos dinâmicos e relacionais, sendo este
último um aspecto delicado, porque prevê a interação dos profissionais
da saúde com múltiplos sujeitos, entre eles, gestores, usuários, lideran-
ças comunitárias, trabalhadores de outros setores sociais, fornecedores
etc. Todos podem apresentar explicações distintas da realidade e possuir
diferentes interesses e valores, tornando o planejamento essencial e
necessário para que se possam traçar objetivos compartilhados e ações
coerentes em um processo participativo e democrático.

Para refletir
Pense, então: como se dá o planejamento em seu local de trabalho?
Existem fóruns deliberativos e de planejamento? Quem participa? Na
sua opinião, ele é considerado importante para seu trabalho e/ou de
seus colegas?

22
Planejamento em saúde

Com base no que vimos até agora, podemos afirmar que o planejamento
é uma etapa fundamental na organização de qualquer atividade, mas,
para realizá-lo e melhor compreender sua importância, precisamos
conhecer como surgiu e quais as concepções adotadas ao longo do tempo.

Planejamento em saúde: origem


e concepções
As origens do planejamento estão associadas à própria existência
humana, ao adquirir a capacidade de pensar antes de agir e de transfor-
mar a realidade a partir do processo de trabalho. Essa é uma condição
inerente à vida humana (GIOVANELLA, 1991).

A literatura faz referência ao fato de que, no início do século XX, no Os modelos de atenção foram
apresentados no Capítulo 2,
contexto de organização dos serviços previsto pelo modelo campanhista “Políticas públicas de saúde e a
de saúde pública, já se utilizavam noções, métodos e técnicas da Teoria organização do SUS”, do livro
Geral da Administração. No entanto, foi a partir da década de 1960 que Rede de Frio: fundamentos para a
compreensão do trabalho (SILVA;
emergiu na América Latina e no Brasil a reflexão teórica e metodo- FLAUZINO; GONDIM, 2016).
lógica voltada às questões específicas do setor de saúde, com o movi- Já as concepções normativa e
estratégica serão apresentadas
mento pelo Planejamento em Saúde (PAIM, 1983 apud TEIXEIRA; SÁ,
no Anexo A,“Contribuições de
1996). Naquela época, surgiram as duas concepções mais importantes Carlos Matus e Mário Testa no
de planejamento: a normativa e a estratégica. planejamento estratégico”, deste
capítulo.

Concepção normativa: uma breve síntese


Em 1961, o Conselho Interamericano Econômico e Social, em reunião
especial, formulou a Carta de Punta del Este, marco histórico na pers-
pectiva do desenvolvimento mediante a associação do econômico com
o social. Esse documento “reconhecia a saúde como componente essen-
cial do desenvolvimento, enfatizando a necessidade do planejamento,
sob a condução do Estado, para a consecução dos objetivos nacionais de
bem-estar, democracia e segurança” (LIMA, 2002, p. 82). Esse enfoque
foi dado à concepção normativa, que se relaciona com a busca pelo
desenvolvimento econômico dos países periféricos, visando alcançar os
mesmos patamares dos países centrais.

No ano de 1963, na reunião de ministros da saúde promovida pela


Opas, se estabeleceu o Plano Decenal de Saúde Pública para as Améri-
cas. A associação estabelecida com o Banco Interamericano de Desen-
volvimento permitiu o investimento em programas de saúde nos anos
de 1960 e 1970 (LIMA, 2002).

Para cumprir as exigências relativas ao recebimento dos investimen-


tos oferecidos pelos organismos internacionais, os países periféricos

23
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

deveriam realizar um plano nos moldes metodológicos desenvolvidos


pelo Centro de Estudos do Desenvolvimento da Universidade Central
da Venezuela (Cendes), a partir da solicitação da Organização Pan-
-Americana da Saúde (Opas). Esse método, conhecido como Método
Cendes-Opas, é a expressão da concepção normativa do planejamento
e caracteriza-se, entre outros aspectos:
G pela preocupação com a eficiência;
G pela centralidade da técnica;
G pelo distanciamento do planejador da realidade social planejada; e
G pelo fato de tomar essa realidade como um objeto estático e sujeita
à predição.

Fotos 1 e 2 – Planejamento distante da realidade social planejada é uma característica da


concepção normativa

Foto: Pawel Zawistowski (2007).


Foto: Rick Tolboom (2006).

A crítica ao Método Cendes-Opas foi referente à “omissão dos aspectos


políticos inerentes à problemática institucional do setor, como o finan-
ciamento, a falta de coordenação dos serviços, a baixa capacidade de
regulação do Estado, a baixa capacidade de governo, o nível de privati-
zação etc.”(RIVERA, 2009, p. 313).

Outra concepção de planejamento, a concepção estratégica, em par-


ticular a do Planejamento Estratégico Situacional (PES), tem grande
aplicação no campo da saúde.

Concepção estratégica
Surgiu a partir do fim dos anos 1970, tendo em vista a crítica ao
método normativo. A concepção estratégica propôs uma reformulação
do planejamento, incorporando o aspecto político. Um marco, nessa
perspectiva, foi a publicação, no ano de 1975, de “Formulación de
Microeconomia é o ramo da
economia que se ocupa dos Políticas de Salud”, pelo Centro Pan-Americano de Planejamento em
diferentes agentes econômicos, Saúde (CPPS-Opas). Esse documento significou um passo fundamental
entre os quais as empresas e os
consumidores (MICROECONOMIA,
na direção do deslocamento da discussão do planejamento em saúde
[200-]). do âmbito da microeconomia para o âmbito político.

24
Planejamento em saúde

O enfoque estratégico parte do pressuposto da existência de sistemas


sociais históricos, caracterizados pela complexidade e incerteza. As ver-
tentes da corrente estratégica do planejamento em saúde são: o Planeja-
mento Situacional, de Carlos Matus, o Pensamento Estratégico, de Mário
Testa, e a Escola de Medellin (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA
SAÚDE, 1995).

Antes de continuarmos, entendemos que uma situação ilustrativa pode


ajudar a compreender a diferença entre as duas concepções menciona-
das. Leia com atenção o trecho a seguir.

Diálogo entre a prática e a teoria cujo tema é o verbo planejar


A professora, Dona Prática, pede à Senhorita Teoria Normativa:
– Conjugue o verbo “planejar”.
A Senhorita Teoria Normativa obedece: – Eu planejo.
– Continue, está indo bem – diz a Dona Prática.
– Já terminei, professora – responde a Senhorita Teoria Normativa.
Perplexa, Dona Prática olha suas alunas. A Senhorita Situacional está
ansiosa para falar e conjuga o verbo antes que lhe peçam: – Eu planejo, tu
planejas, ele planeja etc.

O primeiro princípio do planejamento moderno é: “Ninguém detém o


monopólio do cálculo sistemático sobre o futuro” (MATUS, 1996, p.
52-53). Todos podemos planejar e todos fazemos algum tipo de análise
sobre o amanhã antes de, hoje, tomar uma decisão. Eu planejo, tu
planejas. Se não compreendermos pelo menos isso, não poderemos
resgatar o planejamento do mar de confusões em que navega.
Fonte: Matus (1996, p. 52-53).

25
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Com base na situação ilustrada, podemos observar que a prática (pro-


fessora Dona Prática) espera da teoria normativa (Senhorita Teoria
Normativa) respostas que esta não dá? Ficou mais nítido que existem
diferenças em tais concepções em relação a quem planeja?

Percebemos, a partir dessas concepções, que o planejamento na área da


saúde precisa ser realizado de forma mais operativa, dadas as especifi-
cidades do setor, e deve envolver todos os aspectos e atores que parti-
cipam do processo. Acredita-se, então, que a visão do planejamento na
concepção estratégica tenha maior possibilidade de lidar com a comple-
xidade do setor de saúde.

Vimos, anteriormente, que o próprio trabalho em saúde e também


na rede de frio de imunobiológicos engloba um conjunto amplo de
envolvidos, sejam trabalhadores, gestores, profissionais das centrais de
Ao considerar todos esses armazenamento e usuários. Como planejar com esse conjunto de ato-
atores participantes no
planejamento em saúde,
res é um desafio apresentado pela concepção estratégica, que, na saúde
conforme a concepção (e, consequentemente, na rede de frio e imunização), se expressa pela
estratégica, avançamos em um metodologia do Planejamento Estratégico Situacional (PES).
dos princípios organizativos
do SUS, que é a participação
social contribuindo para a
democratização da saúde.
Enfoque sobre a metodologia do Planejamento
Estratégico Situacional, de Carlos Matus
O enfoque situacional de planejamento reconhece a existência de várias
visões sobre determinada situação e, consequentemente, de conflitos na
realidade. A situação pode ser percebida ou compreendida diferente-
mente, dependendo de quem e de como ela é observada. Um exemplo é a
clássica figura a seguir (Figura 2). Este enfoque visa oferecer instrumentos
ou subsídios que possam ajudá-lo a planejar na sua realidade de trabalho.
Figura 2 – São rostos ou um cálice?
O que você vê? Dois rostos ou um cálice?
Podemos dizer que as respostas podem
ser distintas, embora a figura seja única.
Ao planejar com base no enfoque do PES,
é preciso considerar as diversas visões
sobre a realidade e debater sobre essas
opiniões com o intuito de construir con-
sensos sobre ações estratégicas que pos-
sam auxiliar na resolução ou diminuição
de problemas e, assim, propiciar mudan-
ças em determinada realidade. Planejar,
portanto, precede uma ação, exige par-
ticipação e visão dinâmica permanente
Fonte: Wikimedia Commons (user: Bryan Derksen,
durante suas fases ou momentos. 2007).

26
Planejamento em saúde

Apresentaremos quatro noções que são importantes para a aplicação da


metodologia do PES: situação, ator social, poder e problema.

Situação
É o conjunto de problemas identificados, descritos e analisados sobre
determinada realidade na qual se quer intervir. Por exemplo, quando
conversa com uma pessoa sobre as principais dificuldades encontra-
das em seu processo de trabalho, sejam elas operacionais, relacionais,
financeiras, políticas, você está apresentando a sua visão sobre a situa-
ção em questão.

Situação, portanto, é o lugar social onde estão presentes o ator e a ação.

Ator social
Pode ser uma personalidade, uma organização ou um agrupamento
humano que tenha capacidade organizativa, um projeto e controle de
variáveis para produzir fatos na situação.

Ator, portanto, pode ser você, sua equipe de trabalho, representantes


de sua instituição, desde que possuam capacidade e governabilidade
para intervir em determinado problema presente na realidade.

Poder
É uma relação social que se refere às forças sociais em conflito. É a
capacidade de fazer, de influenciar o que os outros fazem. Está relacio-
nado à governabilidade de determinado ator ao intervir numa determi-
nada ação, por exemplo, a influência que o gestor da rede de frio exerce
sobre os processos de trabalho nessa rede.

Problema
É algo considerado fora dos padrões de normalidade para os atores
sociais que estão analisando a situação. Esses padrões são definidos a
partir do conhecimento, do interesse e da capacidade de agir sobre dada
situação.

O problema é a distância entre o que é (situação atual) e o que deveria


ser (situação-objetivo) para determinado ator social. O PES é bastante potente,
principalmente diante de
problemas mal estruturados
Os problemas podem ser classificados em problemas estruturados, e quase estruturados, muito
quase ou semiestruturados e mal estruturados. frequentes no campo da saúde.

27
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Essas definições de problema bem Os problemas estruturados respondem às regras já estabelecidas, e suas
como uma introdução ao PES são
causas podem ser claramente identificadas, o que possibilita, de forma
brevemente abordadas no
Capítulo 3, “Introdução à óbvia, a sua solução. Esses problemas podem ser resolvidos de forma
vigilância em saúde: vigilância normativa, como, por exemplo, erros na estocagem de imunobiológi-
epidemiológica, vigilância
sanitária, ambiental e saúde do cos, torneira com vazamentos, ou outros que você pode conhecer.
trabalhador”, do livro Rede de Frio:
fundamentos para a compreensão Os problemas quase ou semiestruturados possuem características
do trabalho (SILVA; FLAUZINO;
Gondim, 2016). Lá, o foco está intermediárias, pressupõem certo grau de incerteza. O enfrentamento
na análise das condições de vida desse tipo de problema pode gerar dificuldades em outro problema,
e situação de saúde de uma
população; aqui, discutimos com
o que demanda forte abordagem sociopolítica. Eles dependem de um
vistas ao processo de trabalho enfoque multissetorial, do contexto em que se inserem. Não são con-
em saúde. sensuais e necessitam da atuação estratégica de vários atores para o seu
enfrentamento. A definição de como chegar a uma solução não é muito
clara, pois pode haver várias soluções com graus diferentes de eficácia.

Um exemplo: como melhorar a cobertura vacinal em menores de 1 ano


de idade, no município de Morro Alto? A solução depende não somente
dos profissionais que trabalham no setor de imunização. Para resolver o
problema, pode ser necessária a adesão de diversos outros profissionais e
setores, como agentes comunitários de saúde, equipe da saúde da criança,
até mesmo profissionais das escolas, associação de moradores.

Em contrapartida, os problemas mal estruturados estão relacionados


à situação de incerteza e só podem ser tratados por meio de modelos
probabilísticos, visto que nem todas as suas causas podem ser identifi-
cadas. Como melhorar os serviços de saúde é um exemplo de problema
mal estruturado, visto que envolve muitas variáveis (social, política,
econômica, cultural), que nem sempre são conhecidas, e está relacio-
nado a situações de incerteza, que não são facilmente controladas por
protocolos ou normas.

A metodologia do PES é aplicada para intervir sobre problemas quase


ou semiestruturados ou, principalmente, em problemas pouco estru-
turados.

A partir do entendimento sobre os três tipos de problema, como pode-


mos planejar estrategicamente as atividades, considerando o cotidiano
de trabalho em saúde, caracterizado por diversas dificuldades, e a
complexidade logística que envolve as atividades de vacinação e da
rede de frio?

Certamente, não há uma resposta pronta, mas planejar essas ações pode
auxiliar, e muito, a equacionar ou dirimir parte dos riscos e problemas

28
Planejamento em saúde

que poderiam vir a ocorrer, caso elas não fossem planejadas. Vale lem-
brar que, associados ao planejamento, o monitoramento e a avaliação
das atividades deverão ser realizados como forma de controle, acompa-
nhamento, revisão e reorganização do trabalho, das ações. Vale lembrar que, ao se
aplicar uma metodologia
com enfoque situacional,
conforme já mencionado,
Para refletir é preciso conhecer a
complexidade dos problemas,
Pense em seu local de trabalho: quais os problemas que você identifica? a governabilidade de intervir
Quais os atores sociais que poderiam planejar mudanças? Quais foram sobre determinado problema
e o nível de organização da
os critérios de sua escolha?
instituição onde se planeja.
Para atender a essas questões,
é necessário, em algumas
situações, combinar métodos
Para auxiliá-lo a resolver determinados problemas em seu local de tra- de planejamento.
balho, apresentamos no Quadro 1, de forma resumida, os principais
momentos que compõem a metodologia do PES para a elaboração de
um plano de ação.

A palavra momentos tem o objetivo de ressaltar a noção de que o pla- O momento explicativo é abordado
nejamento se constitui em um processo dinâmico, construído perma- com maior detalhamento no
Anexo B, “Dinâmica do PES e
nentemente; portanto, tem sentido distinto da palavra etapas. o momento explicativo”, deste
capítulo.
Quadro 1 – Momentos do Planejamento Estratégico Situacional
Momentos do PES O que é O que o compõe
Explicativo (o que É o momento da análise da situação • Identificação dos problemas
foi, é, tende a ser) inicial (SI), para fundamentar a ação. • Priorização
• Explicação do problema
Normativo (o que É o momento de desenhar as ações • Elaboração dos objetivos
deve ser) necessárias e suficientes para atacar as • Definição das ações do plano
causas fundamentais dos problemas
(nós críticos).
Estratégico (o que É o momento para discutir a • Análise de cenários
pode ser) viabilidade estratégica das ações do • Construção da viabilidade
plano para garantir sua realização com estratégica para se atingir a
máxima eficácia. situação-objetivo
Tático-operacional É o momento de fazer, de finalmente • Execução e avaliação do plano
(o fazer) agir sobre a realidade concreta.
Fonte: Matus (1996).

Sendo conhecedor desses momentos do PES, veja agora como opera-


cionalizá-los. Para efeito de ilustração, tomemos, como exemplo, um
dos problemas que começamos a formular anteriormente neste capí-
tulo, agora com acréscimo de alguns dados: “cobertura vacinal abaixo
da meta, em menores de 1 ano de idade, no município de Morro Alto,
no ano de 2013”.

29
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Ele poderia ser explicado na árvore de problemas da seguinte forma:

G Problema (encontra-se no tronco):


Árvore de Problemas é uma • Cobertura vacinal abaixo da meta, em menores de 1 ano de
versão simplificada do Fluxograma
Situacional. Essas ferramentas idade, no município de Morro Alto, no ano de 2013.
visam definir o conteúdo do
G Causas (representam os determinantes, a raiz do problema):
problema a partir de descritores
que possam demonstrar a
• pouca divulgação sobre a importância da vacinação;
existência do problema. São
compostas pelo conjunto de • número reduzido de profissionais para a busca ativa dos faltosos;
descritores e identificação das
causas do problema. • desconhecimento dos responsáveis.
G Consequências (encontra-se na copa):
• aumento do número de internações entre menores de 1 ano de
idade;
• ocorrência de óbitos em menores de 1 ano de idade por causas
preveníveis;
• aumento de número de faltas ao trabalho por parte dos
responsáveis pela criança;
• aumento de doenças;
• aumento de gastos com internações e tratamentos.

Figura 3 – Árvore de problemas Como já assinalado, a explicação do pro-


blema deve considerar, também, maior
conhecimento sobre ele. É importante
que o problema seja estudado, inves-
tigado, para que se possam identificar
todas as suas prováveis causas e conse-
quências.

As causas relacionam-se aos determi-


nantes do problema, que se expressam
de forma simples ou complexa, conhe-
cida ou desconhecida. Entre as causas,
existem aquelas que são denominadas
causas críticas ou nós críticos, isto é,
causas que, se trabalhadas, poderão
modificar as demais e o problema em
questão.

Em nosso exemplo, qual a causa que você definiria como nó crítico?

O nó crítico pode ter relação com várias causas. Poderia ser a pouca
divulgação sobre a importância da vacinação. Por quê? Se houver maior

30
Planejamento em saúde

divulgação acerca da importância da vacinação, os responsáveis terão


conhecimento sobre o assunto; isso poderá aumentar a procura pelo
serviço na unidade, e os profissionais não precisarão realizar a busca
ativa de tantas crianças. Assim, esta causa trabalhada poderá diminuir
as demais, além de ser algo possível de ser realizado.

A outra questão a ser vista são as consequências do problema: os con-


dicionantes do problema, os elementos que o constituem e os demais
problemas e fatores que ele desencadeia.

Identificado e priorizado o problema com suas causas e Foto 3 – A definição dos objetivos visa atacar
nós críticos, devemos passar ao momento normativo, que os nós críticos de um problema

é o momento propositivo do plano, em que são estabele-


cidos os objetivos e as ações necessárias para atacar os nós
críticos do problema, na busca de se atingir o objetivo.

Foto: Candice Courtney (s/d).


Nesse momento, são elaborados os objetivos (geral e
específicos), bem como as ações que irão compor o plano:
G o objetivo geral refere-se à proposição positiva do
problema, considera a situação-objetivo, isto é, onde se
quer chegar com o plano;
G os objetivos específicos devem estar relacionados ao(s) Fonte: Free Images.com.

nó(s) crítico(s).

A explicação do problema é a base para a construção dos objetivos.


Tanto o objetivo geral como os objetivos específicos devem expressar uma
intenção de transformação da situação-problema. O estabelecimento dos
objetivos deve considerar
cada problema ou grupo de
Voltemos ao exemplo anterior para entender como podemos construir problemas.
os objetivos de um plano:
G Problema: cobertura vacinal abaixo da meta, em menores de 1 ano
de idade, no município de Morro Alto, no ano de 2013.
G O objetivo geral deve expressar aonde se quer chegar, por exemplo: Note que o objetivo geral é o
oposto do problema apresentado.
aumentar a cobertura vacinal em menores de 1 ano de idade, no
município de Morro Alto, no ano de 2013.

O mesmo deverá acontecer com o objetivo específico, que está relacio-


nado com o nó crítico selecionado:
G Nó crítico: pouca divulgação acerca da importância da vacinação.
Vários nós críticos podem
G Objetivo específico: aumentar a divulgação acerca da importância da ser selecionados e, nesse
caso, haverá vários objetivos
vacinação em menores de 1 ano de idade, no município de Morro específicos.
Alto, no ano de 2013.

31
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Sabendo o que se quer atingir com o plano, será possível, então, discu-
tir que ações devem ser realizadas.

Para refletir
Quais as ações que você e sua equipe de trabalho descreveriam para
efetivar o objetivo específico do exemplo anterior?

Chegamos ao momento de como fazer o plano de ações: o momento


estratégico.

Ocorre quando há a análise sobre a viabilidade das ações propostas


no plano. Após escolher as ações, elas devem ser analisadas conside-
rando-se as facilidades e dificuldades para a sua execução, bem como
as estratégias de enfrentamento para superar as dificuldades. Assim, o
momento estratégico é a ocasião de se analisar a viabilidade das ações,
já que, embora possam ser muito importantes, algumas delas podem
ser inviáveis em determinado momento.

Após a análise da viabilidade, é elaborado o plano operativo com as


atividades que serão realizadas, os recursos necessários, os responsá-
veis e o tempo necessário para a execução de cada uma delas. Para
melhor entendimento e visualização, apresentamos o Plano Operativo
no Quadro 2:
Quadro 2 – Conteúdos necessários para a elaboração do plano operativo
Plano operativo
Atividades Referem-se ao detalhamento das ações.
Dizem respeito aos dispositivos necessários para a realização das
Recursos
atividades, sejam eles humanos, materiais, financeiros ou políticos.
Devem ser nomeados, isto é, não colocar o cargo, e sim os nomes
Responsáveis
daqueles que estarão à frente de cada atividade.
Devem ser expressos preferencialmente na forma DD/MM/AAAA,
Prazos
para melhor acompanhamento e avaliação do plano.

Um planejamento com base na metodologia do PES não termina aqui.


A execução, o acompanhamento e a avaliação são partes importantes
do processo e estão descritos no quarto momento, que é o momento
tático-operacional.

Esse momento corresponde à execução do plano, o agir sobre a rea-


lidade, isto é, o fazer. Para garantir a eficácia do plano, será preciso
acompanhar, avaliar e monitorar o desenvolvimento das ações propos-
tas e a situação dos problemas iniciais, seja através do desempenho das

32
Planejamento em saúde

metas propostas, seja do sistema de prestação de contas ou do conteúdo Participação democrática pode
ser entendida como a participação
da participação democrática na condução do plano.
popular nas decisões políticas do
país em referendos, plebiscitos e
Para o acompanhamento e a avaliação do plano, é preciso detalhar: projetos de iniciativa da população.

G Metas: objetivos quantitativos que se pretende atingir.


Exemplo: realizar a distribuição de imunobiológicos em 100% das
unidades de saúde, no município de Morro Alto, no ano de 2014.
Como o plano é flexível, todo
G Indicadores: medidas usadas para verificar um resultado. o processo deve ser avaliado
criticamente e, se preciso,
Exemplo: número de unidades com entrega de imunobiológicos reformulado.
em dia.

G Fontes de verificação: descrição de onde será verificado o


cumprimento de determinada ação ou objetivo.
Exemplo: sistemas de informação, planilhas, folhas de recebimento,
boletim diário, entre outros.

G Periodicidade da coleta: o tempo previsto para verificar o resultado.


Exemplo: diário, quinzenal, mensal, anual, entre outros.

G Formas de divulgação: onde serão divulgadas as informações sobre o


acompanhamento das ações do plano.
Exemplo: mural da unidade, boletim informativo, imprensa local etc.

Esses são os momentos do PES, presentes na metodologia aqui apre-


sentada.

Para encerrar a discussão sobre essa metodologia rela-


cionada ao PES, selecionamos um exemplo para que
você observe como pode ser elaborado um plano com
base nessa proposta. Para efeito didático, considera-
mos melhor apresentar esse exemplo no Anexo C,
“Construindo um plano de ação a partir de exemplo
hipotético”, deste capítulo. Nele, você encontrará tam-
bém detalhamentos sobre diversos aspectos e concei-
tos apresentados ao longo da nossa discussão, bem
como o relato de como José e sua equipe elaboraram
um plano para resolver um problema em seu processo
de trabalho.

Tente fazer o mesmo! Entendendo que o planejamento


deve ser participativo, junte seus parceiros, pensem os

33
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

seus processos de trabalho e tentem elaborar um plano para enfrentar


um dos problemas encontrados. Esse pode ser um passo importante
quando se busca melhorar as práticas cotidianas. Bom trabalho!

Considerações finais
Neste capítulo, você encontrou elementos para melhor compreender o
planejamento associado à complexidade do setor de saúde, entendendo
as diferentes concepções do planejamento em saúde que foram cons-
truídas ao longo da história.

Buscamos fornecer alguns subsídios para você lidar com essa comple-
xidade, especificamente no que se refere ao trabalho em imunização
e em rede de frio. Além desses subsídios, você precisará de outros
elementos e conhecimentos que o ajudem a refletir, organizar e pla-
nejar suas atividades, que serão abordados nos demais capítulos deste
livro. A ideia é possibilitar não somente a reflexão, mas uma atuação
baseada em conceitos sólidos e consistentes que permitam a você, tra-
balhador e leitor, entender criticamente seu trabalho, de modo a se
constituir, efetivamente, em um dos elos desta rede, que é a rede de
frio de imunobiológicos!

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nível local de saúde (uma abordagem comunicativa). 1993. Tese (Mestrado) – Escola Nacional de
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MATUS, C. Los tres cinturones del gobierno: gestión, organización e reforma. Caracas: Fundación


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PAGODINHO, Zeca. Deixa a vida me levar. Rio de Janeiro: Universal Music, 2002. 1 CD-Rom, faixa 3.

PAIM, J. S. Planejamento em saúde para não especialistas. In: CAMPOS, G.W. S. et al. Tratado de
saúde coletiva. São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2006.

RIVERA, F. J. U. Planejamento de saúde. In: PEREIRA, I. B.; LIMA, J. C. Dicionário da educação


profissional em saúde. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: EPSJV, 2009.

SÁ, M. C.; ARTMANN, E. Planejamento estratégico em saúde: desafios e perspectivas para o nível
local. In: MENDES, E. V. Planejamento e Programação Local da Vigilância da Saúde no Distrito
Sanitário. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde, 1994. p. 19-44.

SILVA, M. N.; FLAUZINO, R. F.; GONDIM, G. M. M. (Org.). Rede de frio: fundamentos para a
compreensão do trabalho. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2016.

TEIXEIRA, C. F. Enfoques teórico-metodológicos do planejamento em saúde. In: TEIXEIRA, C. F. (Org.).


Planejamento em saúde: conceitos, métodos e experiências. Salvador: EDUFBA, 2010. p. 17-31.

TEIXEIRA, C. F.; SÁ, M. C. Planejamento & gestão em saúde: situação atual e perspectivas para a
pesquisa, o ensino e a cooperação técnica na área. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 1,
n. 1, p. 82-103, 1996.

TESTA, M. Pensamento estratégico e lógica de programação: o caso da saúde. São Paulo: Hucitec;
Rio de Janeiro: Abrasco, 1995. p. 5-103.

35
Anexo A – Contribuições de Carlos
Matus e Mário Testa no planejamento
estratégico
Análise resumida das contribuições de dois importantes autores vin-
culados ao planejamento estratégico e que influenciaram fortemente o
planejamento em saúde no Brasil.

Carlos Matus
Formulou um modelo de planejamento estratégico baseado nas teorias
da situação, da produção social e da ação interativa. O seu método
para o processamento de problemas e soluções prevê quatro momen-
Assista aos vídeos em que tos: explicativo, normativo, estratégico e tático-operacional. Propõe
Carlos Matus fala sobre o elementos de cálculo de cenários e um instrumental de análise estraté-
Planejamento Estratégico
Situacional, disponíveis em:
gica. Esse autor contribuiu, ainda, com uma proposta de direção estra-
• http://www.youtube.com/
tégica para a administração pública a partir da formulação da teoria
watch?v=RjE7mDEfAW8 das macro-organizações. Esta prevê a reforma vertical da administração
• http://www.youtube.com/ com base em subsistemas de gestão, que se voltam ao “planejamento
watch?v=jWLS4IrFoGA criativo, à descentralização dos sistemas de condução e uma abordagem
de gestão por objetivos ou operações e, por fim, a alta responsabilidade
decorrente do monitoramento, da cobrança e a prestação de contas”
(MATUS, 1996, p.314).

Mário Testa
Um dos autores do Método Cendes-Opas, ele partiu da crítica a essa
metodologia para formular uma proposta de natureza estratégica de
explicação da problemática do setor de saúde, composta por diferentes
diagnósticos: administrativo, estratégico e ideológico. Adota um enfo-
que com um componente fortemente comunicacional, com base na
teoria do agir comunicativo de Rivera (2009).

Como crítico das formas institucionais autoritárias, enfatiza as ações


capazes de acentuar os traços democráticos. Desse modo, prevê um tipo
de planejamento com centralidade nas práticas dialógicas, na formação
de consensos e de compromissos. Evita um excesso de formalização
política, o que critica em Matus, levando à proposição de um método
pouco estruturado (RIVERA, 2009).

A seguir, apresentamos uma síntese dos pressupostos do planejamento


normativo e do planejamento estratégico, com base na obra de Carlos
Matus (1996).
Pressupostos Planejamento normativo Planejamento estratégico
O ator que planeja não está inserido na realidade O ator que planeja está inserido na realidade planejada
planejada. e coexiste com outros atores que também planejam.
1 O planejamento pressupõe um “sujeito” (Estado) e
um “objeto” (realidade socioeconômica), que são
independentes, e o primeiro pode controlar o segundo.
O planejamento tem início com a realização do “O diagnóstico único e verdade objetiva já não são
diagnóstico da realidade, em busca da verdade objetiva possíveis. Só é possível uma explicação situacional na
2 por parte do sujeito que planeja. Cada ator que planeja qual cada sujeito explica a realidade a partir da posição
chegará ao mesmo diagnóstico. particular que ocupa no sistema (objeto) planejado”.

“Toda a realidade social é explicável por meio da “Para compreender a realidade e tornar-se capaz de
representação como ‘modelos analíticos’ baseados nas prever sua evolução, já não é suficiente nem possível
3
relações sistêmicas de causa-efeito. Previsão e predição reduzir as ações humanas a ‘comportamentos’
são a mesma coisa”. predizíveis”.
“Se o ator que planeja não compartilha a realidade com “Se o ator que planeja compartilha a realidade
outros atores de capacidades equivalentes, então não com outros atores que também planejam, então,
há adversários, e o planejamento pode referir-se apenas necessariamente, o planejamento deve abranger o
ao socioeconômico”. Desse modo, o cálculo estratégico problema de vencer ou minar a resistência dos outros
4
não é necessário, pois “só o Estado planeja com vistas a aos planos que não sejam seus. O planejamento,
alterar os comportamentos dos agentes econômicos”. portanto, não deve ser confundido com a definição
normativa do ‘deve ser’, mas englobar o ‘pode ser’ e a
‘vontade de fazer’.”
Não se consideram as incertezas e os eventos Considera-se a existência da incerteza e dos “problemas
probabilísticos mal definidos; os “problemas quase quase estruturados”.
5 estruturados” não podem existir.
“O plano é produto de uma capacidade exclusiva do O plano não é monopólio do Estado. Qualquer força
Estado, refere-se a um conjunto de objetivos próprios e, social luta por objetivos próprios e está capacitada a
no papel, tem ‘final fechado’ porque a situação-final é fazer um cálculo que precede e preside a ação. Daí que
6
conhecida, bem como os meios para alcançá-la. [...]. A existem vários planos em competição ou em conflito, e
racionalidade técnica deve impor-se para que se chegue o fim está aberto a um número de possibilidades maior
à solução ótima dos problemas”. do que podemos imaginar.
Fonte: Matus (1996, p. 66-69).
Anexo B – Dinâmica do PES e o momento
explicativo
Figura 1 – Dinâmica do PES

Explicativo Normativo

PES
Tático
Operacional Estratégico

Fonte: Elaboração do autor.

Momento explicativo – o que foi, é, tende a ser

Esse momento refere-se ao reconhecimento da existência de problemas


mal estruturados ou semiestruturados e à análise da situação. A análise
da situação envolve o processo coletivo de identificação, priorização e
explicação de problemas.

Para a identificação, é importante reunir o maior número de infor-


mantes, tanto dos sistemas existentes como dos atores envolvidos com
a situação que se quer transformar, para que se garanta uma impor-
tante qualidade do PES, a de ser participativo.

A partir da identificação dos problemas, é necessário priorizar os que


serão enfrentados, levando-se em consideração a governabilidade para
intervir no problema, como também outros critérios, como o tamanho
do problema (sua magnitude), o valor que é dado ao problema, a tec-
nologia disponível e o custo para enfrentá-lo.
Os critérios podem ser pontuados, por exemplo, de 0 a 3, conside-
rando para cada um deles os seguintes aspectos:

Magnitude do problema: quanto maior o


problema, maior a pontuação.

Valorização do problema: quanto maior o valor


do problema para o ator que planeja, para outros
atores e para a população, maior a pontuação.

Tecnologia disponível: quanto maior a


disponibilidade de recursos materiais, humanos e
políticos, maior a pontuação.

Custo: quanto maiores os recursos financeiros


necessários para enfrentar o problema, menor a
pontuação.

Importante!
A priorização de problemas deve considerar a capacidade do ator de
intervir sobre eles. Ao olhar para sua realidade (situação), ele poderá
identificar vários problemas, mas será preciso selecionar aqueles nos quais
ele pode interferir e que são estratégicos para o alcance dos objetivos.

Após a priorização, é necessário explicar o problema. Para isso, é


necessário formulá-lo de forma clara e pesquisar sobre o tema cen-
tral deste.

Na área da saúde, os problemas, frequentemente, são de duas natu-


rezas:
G problemas referentes à saúde de determinada população;
G problemas referentes à organização dos sistemas e serviços de
saúde.

Para cada natureza do problema, a formulação deverá responder às


seguintes perguntas:
G problemas referentes à saúde de determinada população: o que é
o problema? Em quem ocorre? Onde ocorre? Quando ocorre?
G problemas referentes à organização dos sistemas e serviços de saúde:
o que é o problema? Onde ocorre? Quando ocorre?

A formulação contribui para a explicação do problema e a busca de


possíveis soluções. Vejamos, em exemplos, a diferença na formulação
de determinados problemas:
G Problema 1: distribuição de imunobiológicos
• problema formulado: atraso na distribuição de imunobiológicos
(o que é o problema) pelo órgão central (onde ocorre), no
primeiro trimestre de 2013 (quando ocorre).
G Problema 2: cobertura vacinal abaixo da meta
• problema formulado: cobertura vacinal abaixo da meta (o que é
o problema) em menores de 1 ano de idade (em quem ocorre),
no município de Morro Alto (onde ocorre), no ano de 2013
(quando ocorre).

Como já assinalado, a explicação do problema deve considerar, tam-


bém, maior conhecimento sobre ele. É importante que o problema seja
estudado, investigado, para que seja possível identificar todas as suas
prováveis causas e consequências.

As causas relacionam-se aos determinantes do problema, que se


expressam de forma simples ou complexa, conhecida ou desconhecida.
Entre as causas, existem aquelas denominadas causas críticas ou nós
críticos, que respondem afirmativamente às seguintes questões:
G Os atores que irão realizar o plano possuem governabilidade para
intervir nas causas?
G Essas causas geram ações que podem ser gerenciadas?
G As causas, se trabalhadas, podem contribuir para diminuir as
demais?

As consequências são os condicionantes do problema, os elementos


que o constituem e os demais problemas e fatores que ele desencadeia.
Existem dois instrumentos que podem ser utilizados para a explicação
da cadeia causal do problema:
G o fluxograma situacional;
G a árvore de problemas.
O fluxograma situacional é um método que exige grande rigor conceitual
ao operar as categorias explicativas. A árvore de problemas, apresentada
no Capítulo 1, é um instrumento mais simples, o qual precisa ser bem
aplicado para não se tornar pouco eficiente na explicação da cadeia
causal.
Por exigir maior rigor que a árvore de problemas, o fluxograma apresenta
uma vantagem, mas isso também é um fator que inibe o grupo e dificulta
a sua autonomia, pois, quase sempre, é necessária a presença de um
coordenador para auxiliar nesse processo.
Anexo C – Construindo um plano de ação
a partir de exemplo hipotético
A partir do exemplo adiante, você poderá entender como pode ser
construído um plano de ação baseado na metodologia do Planejamento
Estratégico Situacional e na trilogia matusiana.

Atenção!
Este é apenas um exemplo, o problema pode não existir em sua realidade.
No entanto, mesmo que haja um problema semelhante, causas diferentes
poderão ser apontadas e, com isso, outras consequências também.

Exemplo:

José trabalha no setor de imunização de uma unidade básica de saúde.


Como está sempre buscando aperfeiçoar o seu processo de trabalho e
conhecendo a metodologia do PES, resolveu reunir os demais integran-
tes da equipe e representantes da comunidade (atores sociais) para
discutir sobre o que estava dificultando o bom funcionamento do setor
(problemas) naquela realidade (situação), tendo em vista a elaboração
de um plano de intervenção.

Após vários encontros e discussões, o grupo identificou os seguintes


problemas:
G número reduzido de trabalhadores qualificados;
G pequeno espaço físico para armazenamento de insumos estratégicos;
G refrigeradores de armazenamento de insumos estratégicos
utilizados, frequentemente, para guarda de alimentos dos
funcionários;
G número reduzido de refrigeradores.

Diante desse cenário, resolveram então selecionar um problema no


qual seria possível intervir. Para isso, consideraram alguns critérios,
com pontuação de 0 a 3, e elaboraram uma planilha com o registro da
avaliação (Quadro 1).
Quadro 1 – Planilha com o registro da avaliação
Tecnologia Custo
Problema Magnitude Valorização Total
disponível estimado
Número reduzido de trabalhadores
2 1 2 0 5
qualificados.
Pequeno espaço físico para
2 1 2 1 6
armazenamento de insumos estratégicos.
Uso não exclusivo do refrigerador para
3 1 1 3 8
conservação de imunobiológicos.
Número reduzido de refrigeradores. 3 2 1 0 6

Com o problema selecionado com base na priorização, a equipe tra-


balhou na sua formulação, isto é, buscou, com palavras, tornar o
problema claro e seu enunciado passível de responder às seguintes
questões: o que ocorre, onde ocorre e quando ocorre.

O problema foi assim formulado:

“Uso não exclusivo do refrigerador para conservação de imunobiológicos


na unidade de saúde do bairro de Boa Vista, no município de Serra Velha,
no ano de 2013”.

Após analisar e pesquisar sobre o problema, a equipe utilizou o


instrumento árvore de problemas para detalhar a cadeia causal do
problema e selecionar um nó crítico, a ser trabalhado para modificar
a situação.

Veja a árvore de problemas elaborada pelo grupo:


G Causas:
• Falta de refrigerador para outros fins.
• Desconhecimento de parte dos trabalhadores sobre a utilização
correta dos refrigeradores.
• Deficiência no monitoramento e na avaliação do processo de
trabalho diário, no princípio, no meio e no fim do expediente.
• Inexistência de ações educativas sobre conservação de
imunobiológicos para os profissionais.

G Consequências:
• Comprometimento da imunogenicidade.
• Perdas desnecessárias de vacinas.
• Aumento dos custos do PNI.
• Aumento de morbimortalidade por doenças imunopreveníveis.
Como o problema selecionado foi “Uso não exclusivo do refrigerador
para conservação de imunobiológicos na unidade de saúde do bairro de
Boa Vista, no município de Serra Velha, no ano de 2013”, o objetivo
geral foi assim formulado:
G Objetivo geral: utilizar exclusivamente o refrigerador para
imunobiológicos na unidade de saúde do bairro de Boa Vista, no
município de Serra Velha.

Considerando nó crítico a “inexistência de ações educativas sobre con-


servação de imunobiológicos para os profissionais”, a formulação de
um dos objetivos específicos do plano foi:
G Objetivo específico: realizar ações educativas sobre conservação de
imunobiológicos para os profissionais da unidade de saúde do bairro
de Boa Vista, no município de Serra Velha, no ano de 2014.

Com esse objetivo definido, a equipe descreveu várias ações e realizou


a análise da viabilidade destas. No Quadro 2, apresentamos apenas a
análise de viabilidade de uma delas.
Quadro 2 – Análise de viabilidade de uma ação educativa sobre conservação de imunobiológicos
Ações Facilidades Dificuldades Estratégias (para enfrentar
as dificuldades)
Realizar rodas de conversa • Profissionais e usuários Tempo dos profissionais Aproveitar o período já existente
para discutir e informar sobre a sensibilizados para o encontro. para participar das rodas de das reuniões semanais da
importância da conservação de conversa. equipe.
• Existência de espaço físico na
imunobiológicos.
unidade de saúde.

Importante!
Não esqueça que estamos apresentando um exemplo, com apenas um
objetivo específico. Um plano pode possuir vários objetivos específicos,
e as planilhas de análise de viabilidade do plano operativo e o
acompanhamento e a avaliação devem conter e analisar todas as ações
possíveis e necessárias para o alcance de cada objetivo.

Após analisar a viabilidade e traçar estratégias para superar as dificul-


dades de execução das ações, foi então elaborado o plano operativo.
Veja como ficou estruturado o plano para uma das ações no Quadro 3.
Quadro 3 – Plano operativo

Objetivo específico Ações Atividades Recursos Responsáveis Prazos


Realizar ações Realizar rodas • Preparar um questionário para avaliar • Materiais: José, Luís, Ana 02/05/2014 a
de educação de conversa o conhecimento dos profissionais e papel, e Lia 30/05/2014
permanente sobre para discutir e usuários sobre o assunto. computador,
José e Ana 01/06/2014 a
conservação de informar sobre a impressora.
• Aplicar e analisar os questionários. 20/06/2014
imunobiológicos importância da
• Contatar o responsável técnico da
• Humanos:
Luís 10/06/2014 a
para os profissionais conservação de
equipe do setor
na unidade de saúde imunobiológicos. UBS para agendar o dia do encontro 17/06/2014
de imunização.
do bairro de Boa com os profissionais. Lia 01/07/2014
Vista, no município • Preparar material e sala no dia do
de Serra Velha. encontro.

Quadro 4 – Planilha de acompanhamento e avaliação


Objetivo Ação Meta Indicador Fonte Periodicidade Formas de
específico da coleta divulgação
Realizar ações Realizar rodas • Realizar 12 rodas • Número de • Folha de • Quinzenal • Mural da
de educação de conversa com de conversa. participantes frequência. UBS e na
• Diário
permanente sobre profissionais nas rodas. Associação de
• Quinzenalmente. • Mapa de
conservação de da unidade Moradores.
• Realizar
• Número de monitoramento
imunobiológicos para discutir e
monitoramento e
monitoramento e avaliação. • Mural da
para os informar sobre a
e avaliação UBS.
profissionais importância da avaliação diários.
diários.
na unidade de conservação de
saúde do bairro imunobiológicos.
de Boa Vista,
no município de
Serra Velha.

Mapa é uma ferramenta do planejamento que permite identificar,


acompanhar/monitorar e avaliar processos de trabalho e execução de
ações no campo da gestão em saúde.
2. O calendário de vacinação
brasileiro e as estratégias para
imunização da população
Marta Casagrande Koehler e Evelin Plácido dos Santos

Hoje, no mundo, existem dezenas de vacinas disponíveis e algumas em


desenvolvimento. São disponibilizadas nas unidades de saúde das redes
pública e privada do país e organizadas para serem administradas con-
forme grupos etários, constituindo uma importante estratégia de saúde
pública. Você já se perguntou como as vacinas são organizadas para
serem administradas nas unidades de saúde? Qual o critério de escolha
da vacina? Qual delas deve ser aplicada nessa ou naquela pessoa? Em
que faixas etárias, quantas doses são necessárias e por quê?

A escolha das vacinas, a faixa etária recomendada na organização dos


calendários de vacinação, que obedecem a critérios de sequência cro-
nológica, tipo de vacina, pessoa a ser vacinada, número de doses etc.,
bem como as diversas estratégias utilizadas pelo governo para alcançar
e vacinar a população são conhecimentos essenciais, que irão balizar a
atuação dos profissionais envolvidos nas atividades da rede de frio de
imunobiológicos e de vacinação.

Neste capítulo, serão apresentadas algumas questões referentes à vaci-


nação dos diversos grupos etários, constantes do Calendário Nacional
de Vacinação do Programa Nacional de Imunizações (PNI) brasileiro, as
principais características dos esquemas vacinais da rede pública, com
destaque para o calendário de vacinação do trabalhador de saúde, e
algumas características relacionadas ao calendário da rede privada.
Outras estratégias diferenciadas da rotina, como vacinação de bloqueio,
vacinação extramuros e as campanhas, serão, também, abordadas, assim
como ações de equidade no favorecimento do acesso à imunização de
grupos populacionais em maior situação de vulnerabilidade. A ideia
é, através da apresentação desses temas, colaborar na construção de
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

conhecimentos sobre a estratégia de vacinação adotada no país, assim


como permitir que o trabalhador da rede de frio reflita sobre a impor-
tância do seu trabalho para a garantia da qualidade e da segurança das
vacinas administradas nas diversas unidades de saúde, de toda a rede
federativa.

O Programa Nacional de Imunizações


O Programa Nacional de Imunizações (PNI) foi criado em 1973, com o
objetivo de promover o controle das principais doenças infectoconta-
giosas da época: sarampo, poliomielite, tuberculose, tétano, difteria e
coqueluche. Ao instituir o PNI, o Ministério da Saúde buscava:
a integralidade das ações de imunização realizadas no país,
que eram então fortemente marcadas pela atuação de pro-
gramas nacionais de controle de doenças específicas. Assim, o
PNI passou a coordenar as atividades de imunização desenvol-
vidas rotineiramente na rede de serviços e, para tanto, traçou
diretrizes pautadas na experiência da Fundação Serviços de
Saúde Pública (FSESP), com a prestação de serviços integrais
de saúde por intermédio de sua rede própria (FUNDAÇÃO
NACIONAL DE SAÚDE, 1998).

A avaliação das atividades de


vacinação e da cobertura vacinal é A atividade de imunização, antes da instituição do PNI, não se concretizava
discutida no Capítulo 4, “Avaliação como uma ação continuada, e as coberturas vacinais, geralmente, ficavam
da vacinação”, deste livro.
aquém do esperado. A melhoria das coberturas vacinais, ao longo dos
40 anos do PNI, tem contribuído para o declínio acelerado das doenças
imunopreveníveis.

O PNI desenvolve suas atividades mediante o estabelecimento do calen-


Para saber mais sobre o
monitoramento de coberturas
dário de vacinação, normatizado em nível federal por meio de portarias
vacinais, consulte: http://bvsms. do Ministério da Saúde. É de sua responsabilidade elaborar normas e
saude.gov.br/bvs/politicas/ procedimentos para aquisição, armazenamento e distribuição dos imu-
livro_30_anos_pni.pdf e
http://tabnet.datasus.gov.br/ nobiológicos nos níveis nacional, estadual e municipal, atuando de
cgi/pni/cpnidescr.htm acordo com o modelo descentralizado de gestão do SUS, em parceria
com os estados e municípios.

O calendário é dinâmico e alterado de acordo com a situação epide-


miológica do país e o avanço da tecnologia para a disponibilização de
vacinas. Cada vez que ele é modificado, o Ministério da Saúde o faz
através de portarias.

As ações do PNI de prevenção e controle de doenças transmissíveis têm


logrado êxito, ganhando cada vez mais a confiança da população. O PNI
tem acompanhado as transformações demográficas e epidemiológicas

48
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

registradas no país e no mundo, estabelecendo metas que contemplem


o controle, a eliminação e/ou a erradicação de doenças. O controle
da raiva humana, a eliminação do tétano neonatal e a manutenção
da erradicação da poliomielite nas Américas são exemplos do sucesso
desse programa.

As ações de vacinação desenvolvidas pelo PNI são estabelecidas com Desde a sua criação, o PNI
sempre primou pela qualidade
base em critérios para o alcance de seus objetivos, como:
dos imunobiológicos oferecidos
para uso humano. Produtos
G alcançar e manter coberturas vacinais em torno de 95% em todos os
nacionais ou importados passam
municípios brasileiros; por rigorosos controles de
qualidade. Com a criação do
G assegurar a qualidade e o quantitativo das vacinas necessários para Instituto Nacional de Controle de
o cumprimento do calendário de vacinação, garantindo a proteção Qualidade em Saúde (INCQS), em
1981, o país passou a contar com
do indivíduo por meio de controle rigoroso da qualidade dos uma infraestrutura laboratorial
imunobiológicos oferecidos. capaz de avaliar os requisitos de
qualidade dos imunobiológicos
Para alcance dos seus objetivos, o Programa Nacional de Imunizações a serem aplicados na população,
estabelece metas, sendo que a meta básica é vacinar, o mais precoce- atuando em parceria com a
Agência Nacional de Vigilância
mente possível, 100% das crianças que nascem. Todas as metas esta- Sanitária (Anvisa). O INCQS é uma
belecidas pelo programa estão relacionadas com as coberturas vacinais, das unidades técnico-científicas da
Fundação Oswaldo Cruz.
visando atingir coberturas entre 90% e 95% para todos os imunobio-
lógicos como percentual mínimo de alcance para controle, eliminação
e erradicação das doenças imunopreveníveis, meta principal do PNI.

O alcance dessas coberturas de forma homogênea em todo o país per-


mitiu e tem permitido, cada vez mais, avanços e benefícios incalculáveis
para toda a população, tais como os que podemos observar em 2015:
Todos esses avanços foram
Esquema 1 – Coberturas vacinais, avanços e benefícios para a população em 2015 obtidos com a implementação
de um eficaz calendário de
vacinação e imunobiológicos
Doenças eliminadas ou em fase de eliminação, como disponíveis na rede pública
poliomielite, sarampo, tétano neonatal e síndrome da para toda a população.
rubéola congênita.

2015 Doenças controladas (transmissão): febre amarela


silvestre, meningites/doenças meningocócicas.

Doenças em declínio ou com tendência de redução,


como doenças diarreicas causadas por rotavírus, difteria,
tétano acidental e meningites por Streptococcus
pneumoniae e por Haemophilus influenzae do tipo B.

49
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Calendários de vacinação
As estratégias de vacinação adotadas nos países como ações de saúde
pública têm, em linhas gerais, a finalidade de diminuir a carga de doen-
ças, com redução do número de hospitalizações, casos graves e óbitos,
por meio de atividades de controle, eliminação e erradicação das doen-
ças imunopreveníveis. Os calendários de vacinação são instrumentos
fundamentais para implementação dessas estratégias.

Calendário de vacinação corresponde ao conjunto de vacinas conside-


radas de interesse prioritário à saúde pública do país, recomendadas à
população desde o nascimento até a terceira idade. Tem por finalidade
obter imunização adequada da população contra doenças para as quais
existam vacinas seguras e eficazes. O calendário pode ser compreen-
dido, então, como a relação de vacinas recomendadas com a(s) idade(s)
e faixa(s) etária(s) em que devem ser aplicadas.

A escolha da faixa etária guarda relação direta com os riscos da doença, a


resposta do sistema imune a cada vacina e as possíveis complicações que
podem advir de sua administração. É fundamental que todos os grupos
previstos no calendário de vacinação sejam corretamente vacinados,
recebendo todas as doses necessárias e completando seu esquema vacinal.
Por isso, é importante que as vacinas estejam organizadas no calendário
de forma a viabilizar o menor número de idas à unidade de vacinação, o
máximo de aplicações possíveis, de acordo com o preconizado, evitando,
assim, oportunidades perdidas de vacinação e otimizando os recursos
humanos e materiais.

Embora possam existir diferenças De acordo com as recomendações da Organização Mundial da Saúde
de calendário entre os países,
todos terão em comum um
(OMS), cada país deve possuir autonomia para adotar seus próprios
elenco básico de vacinas que calendários de vacinação. Estes irão refletir, além do contexto epide-
são consideradas essenciais pela miológico local, as condições socioeconômicas, políticas e culturais
Organização Mundial da Saúde.
daquele país. As ações de imunização serão coordenadas por meio de
programas nacionais de imunizações, com metas definidas.

A OMS vem, ao longo do tempo, indicando o acréscimo de novas vaci-


nas ao calendário básico, à medida que avançam as colaborações e o
suporte financeiro de outras organizações, como as não governamen-
tais. Dependendo do contexto epidemiológico de cada país, a OMS tem
recomendado, também, a inclusão de outras vacinas, como febre ama-
rela, encefalite japonesa, febre tifoide etc.

As vacinas do calendário que serão administradas rotineiramente têm


uma sequência cronológica e uma previsão de início e término para sua

50
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

administração. À medida que cresce o número de vacinas, amplia-se o


calendário, estendendo suas faixas etárias para diferentes momentos de
vida, o que acarreta calendários específicos para determinados grupos.
Com isso, torna-se necessária a divisão do calendário de vacinação em,
no mínimo, três grupos com faixas etárias distintas do calendário infan-
til: o calendário do adolescente, do adulto e do idoso.

Outros grupos específicos são também contemplados com um calen-


dário de vacinação, como viajantes, gestantes e profissionais de saúde
etc., por causa dos riscos profissionais ou de exposição a agentes causa-
dores de doenças a que estão expostos, seja por atividades laborais ou
de lazer.

Qualquer calendário deverá estar adequado à situação do contexto local.


Entretanto, exceções e variações poderão ser necessárias na prática diária,
sendo fundamental que todos os grupos recebam todas as vacinas
recomendadas e completem o esquema básico, de forma a garantir a
imunização e proteção da saúde da coletividade. Cabe ao profissional
de saúde estimular, orientar e incentivar a vacinação por meio de
diversas estratégias disponíveis, assim como manter seu esquema vacinal
atualizado.

O calendário de vacinação brasileiro


No Brasil, a Coordenação Geral do Programa Nacional de Imunizações
do Ministério da Saúde (CGPNI/MS) é responsável pela elaboração de
normas, aquisição e distribuição dos imunobiológicos a serem utiliza-
dos pelas demais instâncias de governo. Além da responsabilidade de
elaborar normas e procedimentos, cabe também ao PNI, pela sua Coor-
denação Geral (CGPNI/MS), o estabelecimento do Calendário Nacional
de Vacinação para os diferentes ciclos de vida do indivíduo, que se con-
figura em calendários voltados para as populações infantil, adolescente,
adulta e idosa.

Normatizado em nível federal, por meio de portarias do Ministério


da Saúde, o calendário brasileiro dispõe de um elenco de vacinas que
são ofertadas, gratuitamente, na rotina das salas de vacinação da rede
pública de todo o país. Para viabilizar essa oferta, o Brasil necessita de
infraestrutura adequada para aquisição, armazenamento e distribuição
de imunobiológicos, bem como de laboratórios produtores. A autos-
suficiência desses laboratórios aumenta as possibilidades de ampliação
das vacinas do calendário brasileiro. Atualmente, o país dispõe de um
complexo nacional produtor de imunobiológicos composto por sete
laboratórios.

51
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Algumas informações sobre publicações e recomendações


relativas a calendários de vacinação
É importante que os • O primeiro calendário nacional básico, com as vacinas obrigatórias para
profissionais de saúde, menores de 1 ano de idade (tuberculose, poliomielite, sarampo, difteria,
em especial os da sala de tétano e coqueluche/DTP), foi oficializado em 1977, pela Portaria MS
vacinação e os da rede de
frio, estejam atentos às n. 452/1977. Além dessas vacinas, existia a TT (Toxoide Tetânico), indicada
novas publicações e/ou para uso em adultos, totalizando sete vacinas disponíveis no país
recomendações sobre vacinas! naquela época.

Além das vacinas incluídas no


• A Portaria GM n. 597 criou, em 12 de abril de 2004, os três calendários
calendário público, existem básicos de vacinação: da criança, do adolescente e do adulto e idoso.
outras disponíveis nos Centros de
Referência para Imunobiológicos • A Portaria n. 1.498, em vigor, em 22 de julho de 2013, revoga as
Especiais (Crie). Elas são abordadas portarias anteriores e redefine o Calendário Nacional de Vacinação e
mais adiante, neste capítulo. institui o Calendário Nacional de Vacinação dos Povos Indígenas no âmbito
do Programa Nacional de Imunizações (PNI), em todo o território nacional.
• O Calendário Nacional de Vacinação do PNI/MS e o Calendário Nacional
de Vacinação dos Povos Indígenas estão disponíveis no site
http://goo.gl/jB4FHd.
• A introdução de novas vacinas e a alteração de faixa etária geram a
publicação de novas portarias, revogando as anteriores.

Em 2015, o calendário de vacinação público e gratuito do Brasil foi


considerado o mais completo do mundo, pelo elenco de vacinas dispo-
níveis na rotina de mais de 35 mil salas de vacinação, distribuídas em
todo o território nacional.

Ao longo dos anos, outras vacinas têm sido acrescidas àquelas intro-
duzidas no calendário de vacinação brasileiro, instituído pela Portaria
MS n. 452/1977(BRASIL, 1977), o que tem permitido manter atuali-
zada a vacinação de rotina no país.

52
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

Esquema 2 – Ampliação da oferta de vacinas pelo PNI

BCG (tuberculose) 1970


Vacina oral da poliomielite (VOP)
DTP (difteria, tétano e
coqueluche)
Vacina do sarampo (administrada
aos 9 meses de vida)

Vacinas de 1970 acrescidas de:


Hep B (ampliada para pessoas entre 30 e 49 anos)
Tríplice viral (ampliada para homens e mulheres até 49 anos)
Influenza (ampliada para grupo de puérperas e pessoas com Vacinas de 2013 acrescidas de:
comorbidades e em situações especiais) Hep A
Vacina oral rotavírus humano (menores de 1 ano – duas doses) dtpa
Tetraviral (em substituição à segunda dose da tríplice viral) 2013 HPV (11 a 13 anos)
2014 Influenza sazonal

Vacinas de 2014 acrescidas de: 2015


HPV (9 a 11 anos e mulheres HIV+
na faixa etária de 9 a 25 anos)

O calendário de vacinação brasileiro dispõe, em 2015, de 15 vacinas


destinadas à população infantil, seis para adolescentes e adultos e cinco
para idosos.

Em 2016, foram redefinidos o calendário nacional de vacinação, o


calendário dos povos indígenas e as campanhas nacionais de vacina-
ções no âmbito do Programa Nacional de Imunizações (PNI), em todo
território nacional, por meio da publicação da Portaria n. 1.533, de 18 É de suma importância que
de agosto de 2016. todos os profissionais da saúde,
em especial os da imunização
e da rede de frio, conheçam
e divulguem as informações
Além do calendário público oficial, existem, também, os da rede privada, sempre atualizadas a cerca
apresentados pelas organizações/sociedades médicas e científicas do país, do calendário de vacinação
para que os benefícios da
como a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIM) e a Sociedade Brasileira
vacinação possam alcançar
de Pediatria (SBP). toda a população, já que o
PNI se tornou, há muito, um
O calendário da SBIM, em 2016, assim como o da rede pública, sofreu programa não apenas voltado
mudanças, buscando atender a diversos grupos, tais como crianças, para a população infantil, mas
prematuros, adolescentes, adultos, idosos e outros. Inclui, também, um para toda a família brasileira.
calendário de vacinação ocupacional, com indicação de vacinas de acordo
com os riscos ocupacionais específicos de cada atividade profissional.

53
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Nesses calendários constam algumas vacinas que ainda não estão


contempladas no PNI, ou que possuem esquemas vacinais diferenciados,
ficando sua utilização a critério dos usuários e do médico assistente.
Para saber mais sobre a
atuação da SBIM e da SBP, Vale ressaltar que as instituições que aplicam vacinas na rede privada
consulte: devem possuir registro no órgão regulador responsável (Anvisa), bem
http://www.sbim.org.br e como profissionais capacitados e rede de frio adequada, para a garantia
http://www.sbp.com.br/pdfs/
de qualidade dos imunobiológicos e a prática de vacinação segura.
calendario_vacinal 2014.

Cada vacina tem seu esquema vacinal específico: o volume a ser apli-
cado, o número de doses necessárias e oportunas para a efetiva pro-
teção e as idades para aplicação. O calendário nacional de vacinação
apresenta esquemas diferenciados para criança, adolescente, adulto,
idoso, gestante e populações específicas, como a dos povos indígenas.

Dos calendários mencionados, será destacado, neste capítulo, o calen-


dário ocupacional, como forma de conhecimento e incentivo à vacina-
ção dos profissionais da saúde, de modo geral.

Vacinação do profissional de saúde


Os trabalhadores da saúde se expõem constantemente a doenças conta-
giosas, muitas delas preveníveis por vacinação. De acordo com os riscos
ocupacionais, existem vacinas especialmente indicadas para eles.

Com o objetivo de proteção individual ou de pessoas no ambiente de


trabalho e no domicílio, os profissionais da saúde devem manter seu
calendário de vacinação rigorosamente em dia.

Na rede pública, integram o calendário ocupacional vacinas como hepa-


tite B, tríplice viral-SCR, dT (difteria e tétano adulto) e influenza (gripe),
entre outras. Em algumas situações, a vacina da varicela é recomen-
Em relação à vacina da varicela, dada. Além dessas, algumas poderão ser acrescentadas em decorrência
devem ser observadas as do risco ocupacional para o indivíduo, sua clientela, ou mesmo do risco
indicações dos Crie.
de disseminação de doenças na comunidade.

A vacina BCG não está indicada para os profissionais da saúde, inde-


pendentemente do resultado da prova tuberculínica. Isso porque não
existem evidências de que a revacinação com BCG traga benefícios para
o profissional de saúde no que se refere à proteção contra a tuberculose,
Se você quiser saber mais sobre
o assunto, sugerimos consultar além de dificultar, também, o monitoramento das medidas de controle
o Manual de recomendações de infecção na interpretação de novas provas tuberculínicas.
para controle da tuberculose
no Brasil, 2011, disponível no
portal www.saude.gov.br/svs.
Na rede privada, além das vacinas citadas anteriormente, o calendário
ocupacional relativo aos profissionais da saúde recomenda as vacinas

54
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

varicela, meningocócica conjugada e hepatite A. Para os cuidadores


de crianças, em especial trabalhadores de centros de neonatologia, a
vacina tríplice acelular do adulto (dTpa) está recomendada, com o obje-
tivo de interrupção da transmissão da coqueluche.

O calendário ocupacional da SBIM, de 2015, sofreu algumas altera-


ções relacionadas à área de atuação, como a de coletores de lixo, que
foram agrupados em “Profissionais que lidam com dejetos e águas con-
taminadas entre outros”. Foram introduzidas, também, novas áreas de Para obter mais informações
atuação, como: profissionais ou voluntários que trabalham em campos sobre o calendário ocupacional,
consulte: www.sbim.org.br.
de refugiados, em situações de catástrofes, em regime de confinamento
e atletas profissionais.

Para você, profissional da área de saúde e atuante na rede de frio, por


que é importante estar adequadamente vacinado?

Se você trabalha no almoxarifado ou no armazenamento e distribui-


ção, por exemplo, manipula caixas, papéis, máquinas, equipamentos
de refrigeração, veículos, entre outros, e está sujeito a acidentes que
podem expô-lo ao bacilo do tétano. Já na sala de vacina, existe a possi- Além da hepatite B, que pode
bilidade de acidente com material perfurocortante, que coloca o profis- ser prevenida pela vacinação,
o profissional está exposto
sional em risco de contrair, entre outras doenças, a hepatite B. ao risco de contrair outras
doenças, como hepatite C e
No seu dia a dia, o profissional também mantém contato com pessoas HIV, contra as quais ainda não
existem vacinas.
que podem lhe transmitir doenças respiratórias, como sarampo, gripe,
e outras, como caxumba, rubéola, varicela, coqueluche etc. Além de
ficar doente, pode transmitir a enfermidade para outras pessoas e ser
responsável por iniciar um surto em seu ambiente de trabalho, ou para
onde se deslocar.

Alguns grupos de trabalhadores necessitam de avaliação especial pelo


risco aumentado de doenças infecciosas como os trabalhadores idosos,
em função de outras patologias de base, trabalhadores que viajam ou têm
contato constante com viajantes, devido aos riscos de contagio, tra-
balhadores do sexo, pela vulnerabilidade a que são expostos e por se
constituírem potencial reservatório de agentes infecciosos, com risco
elevado de contaminação dos clientes. Em qualquer que seja a ativi-
dade laboral, o trabalhador deve conhecer os riscos relacionados à sua
atividade e as vacinas disponíveis.

Por isso, é imprescindível que o profissional cuide da sua saúde, man-


tendo a vacinação em dia, e também da saúde das pessoas de seu
convívio.

55
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Planejamento dos calendários de


vacinação
Vimos anteriormente que é imprescindível planejar na área da saúde,
em função da própria complexidade do setor; na rede de frio de imu-
nobiológicos, é um fator determinante e propulsor das atividades de
imunização e da própria rede. Vimos também que o trabalho em saúde
e na rede de frio engloba um conjunto amplo de atores e que planejar
com esse conjunto é um desafio estratégico. Para superarmos esse desa-
fio, podemos nos apoiar na metodologia de Planejamento Estratégico
Situacional (PES).

O Planejamento Estratégico Ao planejar com o enfoque do PES, é preciso considerar diversas visões
Situacional foi apresentado no sobre determinada realidade no intuito de construir consensos sobre
Capítulo 1, “Planejamento em
saúde”, deste livro. ações estratégicas que possam auxiliar na resolução ou diminuição de
problemas naquela realidade. Os problemas contribuem para eluci-
dar uma situação de saúde e as condições de vida de uma população.
Eles irão se juntar aos dados de mortalidade e morbidade e com as
necessidades de saúde para configurar um cenário (contexto local) ou
situação-problema (situação de saúde e condições de vida), para a qual
se podem desenhar várias soluções (ações intersetoriais) ou situações-
-objetivo – onde se deseja chegar. Os problemas podem conter riscos,
vulnerabilidades, doenças e mortes, elementos com capacidade para
gerar explicações e intervenções da melhor maneira possível.

É importante ressaltar que o planejamento de calendários de vacinação


é uma estratégia que envolve ações que devem ser realizadas com o
máximo de escuta dos atores envolvidos, organização, ajustes necessá-
rios, readequações e/ou reorganizações, para que se possa garantir sua
realização com a máxima eficácia e o mínimo risco. Essas ações neces-
sitam de ser pensadas, previstas, monitoradas e avaliadas. O dimensio-
namento do que é necessário e de como poderá ser realizado, a partir
dos objetivos traçados, somente será efetivo com um planejamento cui-
dadoso das atividades e por meio de avaliação contínua e sistemática
dessas ações.

Os calendários de vacinação são atualizados permanentemente, tendo


em vista o desenvolvimento de novas vacinas, o surgimento, a reemer-
gência ou a eliminação de doenças, e são sempre adaptados às necessi-
dades da população e às suas características socioeconômicas, demográ-
ficas e epidemiológicas. Por isso, podem ocorrer alterações em relação à
idade, ao número de doses, à inclusão ou à exclusão de vacinas.

56
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

Com as constantes modificações no fornecimento e produção de vaci-


nas em nível mundial, surgem, a cada ano, novas recomendações para
certos imunobiológicos, assim como se expande o uso deles para grupos
cada vez mais abrangentes, tornando o calendário vacinal ainda mais
dinâmico. É essencial que essas mudanças sejam conhecidas e acompa-
nhadas pelos profissionais de saúde para a decisão correta na hora de
vacinar.

Para tomada de decisão de alterações no calendário de vacinação, No Capítulo 4, “Conhecendo a


epidemiologia”, do livro Rede
são consideradas características como o tamanho das faixas etárias da
de Frio: fundamentos para a
população, o tipo, o local onde ocorrem as doenças, o momento em que compreensão do trabalho (SILVA;
ocorrem, os diferentes climas das regiões, entre outras. Ao serem ana- FLAUZINO; GONDIM, 2016),
são apresentados alguns dos
lisadas em conjunto, essas caraterísticas vão compor o padrão sanitário elementos necessários para
de uma população, possibilitar análises e definir ações específicas, como se analisar adequadamente a
situação de saúde de determinada
prioridades relativas ao uso de imunobiológicos.
população.

Estudos criteriosos são realizados previamente, quando se planeja a


inclusão de novas vacinas em um calendário. Esses estudos observam:
G Aspectos epidemiológicos relativos ao comportamento da doença:
baseiam-se em estudos de incidência (casos novos) ou prevalência
(casos novos e antigos) de uma doença que impacta a saúde da
população, com elevados números de casos (morbidade) ou de
mortalidade.
G Relação custo e efetividade na introdução do imunobiológico: que
compara os gastos com a aquisição ou produção da vacina com as
despesas resultantes da doença, naquele momento.
G Resultados de impacto na doença: avaliam a eficácia da vacina no
controle, na eliminação e/ou erradicação da doença e na promoção
de imunidade prolongada ou duradoura, levando em consideração
os estudos de efetividade e experiências de outros países, onde a
vacina faz parte do calendário.
G Sustentabilidade financeira: analisa o custo de produção ou de A interrupção de oferta de um
produto já implantado ocasiona
importação da vacina, caso ela não seja produzida no país. O critério
prejuízos à saúde da população,
se baseia no planejamento orçamentário para a aquisição da vacina além da quebra de credibilidade do
sem o pressuposto de qualquer interrupção por falta de recursos programa de imunizações.

financeiros após sua implantação no calendário. Um exemplo dessa situação é a


vacina varicela, que entrou no
G Disponibilidade de aquisição ou produção de vacinas: avalia a calendário do PNI somente em
capacidade e a tecnologia disponível no país para a produção da 2014, pois não havia produção
nacional nem vacinas suficientes
vacina. Caso não seja possível produzi-la, avalia a disponibilidade para serem adquiridas no mercado
no mercado internacional para importação. internacional, até então.

57
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G Novos conhecimentos técnicos e científicos: atentam para o


desenvolvimento de novos produtos, que vão sendo produzidos
a partir de recomendações baseadas em estudos científicos e pela
O critério estrutura da rede de incorporação de novas tecnologias.
frio é fundamental, pois não
adianta haver disponibilidade G Estrutura da rede de frio: considera a capacidade instalada da rede
e possibilidade de aquisição
de frio para avaliar a possibilidade e planejar a inclusão de mais
de novos imunobiológicos se
não houver estrutura, insumos imunobiológicos no calendário de imunizações.
e equipe técnica especializada
suficientes para a execução das G Transferência de tecnologia entre laboratórios produtores
atividades de armazenamento nacionais e internacionais: este último critério para incorporação
e transporte dos produtos.
de vacinas ao calendário nacional de vacinação é especialmente
relevante. Inicialmente, os imunobiológicos utilizados pelo PNI
Podemos citar, como exemplos, a
vacina oral de rotavírus humano,
eram todos importados. Há alguns anos, o Ministério da Saúde
importada em 2006 (ano da adotou a prática de firmar acordos com os laboratórios produtores
implantação) do laboratório internacionais. Estes transferem a tecnologia de produção das
Glaxo Smith Kline Biologicals
(GSK) e que, hoje, é produzida vacinas para os laboratórios nacionais, como o Instituto Butantã
pela Fiocruz/Bio-Manguinhos; e e a Fiocruz/Bio-Manguinhos. À medida que se ampliou o parque
a mais recente, a vacina hepatite
A. Para se efetivar a implantação
nacional de produção de imunobiológicos e se consolidou o processo
dessa vacina no calendário, de transferência de tecnologia de produção com laboratórios
em 2014, houve a Parceria de internacionais, o calendário público de vacinação tornou-se mais
Desenvolvimento Produtivo (PDP)
entre o Ministério da Saúde e completo, e as coberturas vacinais se elevaram e se tornaram mais
o laboratório produtor Merck homogêneas em todo o país.
Sharp & Dohme Farmacêutica,
que irá transferir, gradualmente,
para o laboratório público
Instituto Butantã, a tecnologia e
a fórmula do princípio ativo do
imunobiológico.

Foto: Peter Ilicciev (2006).

Laboratório de produção de vacinas: Bio-Manguinhos. O Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos


(Bio-Manguinhos), da Fundação Oswaldo Cruz, é uma das unidades responsáveis pela produção das
vacinas utilizadas no Programa Nacional de Imunizações.

58
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

O calendário e a caderneta de vacinação


A realização dos esquemas vacinais completos nos indivíduos deve ser
registrada em documentos conhecidos como cadernetas de vacinação.
O ideal é que uma pessoa tenha sua caderneta de vacinação para toda
a vida, pois nela estará registrado o histórico de sua imunização desde
o nascimento.

Todos devem guardar o registro de vacinação. Qualquer pessoa que


procurar a unidade vacinadora deve comprovar sua condição vacinal
com o cartão/caderneta de vacina ou o registro vacinal, seja público ou
privado. Caso contrário, será considerada não vacinada. Nesse caso,
deve recomeçar a vacinação, apesar do risco de ocorrência de eventos
adversos pós-vacinação, em consequência de vacinações sucessivas e uso
desnecessário de doses da mesma vacina.
A unidade de saúde, por sua vez, realizará o registro das doses aplicadas
no Sistema de Informações do PNI (SI-PNI). O SI-PNI está em processo de
implantação em todo o país; nele é possível o resgate dos cartões, pois a
inclusão das doses aplicadas no sistema é feita por nome do usuário.

A produção e a distribuição da Caderneta de Saúde da Criança são


responsabilidade do Programa Nacional de Saúde Materno-Infantil,
do Ministério da Saúde, sendo entregue já na maternidade. Nela são
registradas todas as vacinas administradas na população infantil.

O Quadro 1 reproduz uma das páginas em que são registradas as doses


de vacinas aplicadas.

59
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Quadro 1 – Registro das vacinas do calendário básico


Doses/vacinas BCG-ID Hepatite B Pólio Tetravalente Rotavírus Pneumocócica
Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / /
1ª dose Lote: Lote: Lote: Lote: Lote: Lote:
Unid: Unid: Unid: Unid: Unid: Unid:
Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / /
2ª dose Lote: Lote: Lote: Lote: Lote: Lote:
Unid: Unid: Unid: Unid: Unid: Unid:
Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / /
3ª dose Lote: Lote: Lote: Lote: Lote: Lote:
Unid: Unid: Unid: Unid: Unid: Unid:
Febre Amarela Reforço
Meningocócica Tríplice
Dose inicial DTP P Pneumocócica
Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / /
1ª dose ou
Lote: Lote: Lote: Lote: Lote: Lote:
reforço
Unid: Unid: Unid: Unid: Unid: Unid:
Febre Amarela dT
Meningocócica C
10/10 anos 10/10 anos
Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / / Data: / /
2ª dose Lote: Lote: Lote: Lote: Lote: Lote:
Unid: Unid: Unid: Unid: Unid: Unid:
Fonte: Programa Nacional de Saúde Materno-Infantil do MS. Quadro de Edson Alves de Moura Filho (1994).

É fundamental que o registro das doses aplicadas contenha as seguintes


informações:
G nome da vacina;
G data em que foi realizada a vacinação;
G número do lote, validade;
G laboratório produtor;
G unidade vacinadora;
G nome legível do vacinador.

Isso garante a confiabilidade das informações para consultas futuras ou


para investigação de possíveis eventos adversos pós-vacinação.

Estratégias de vacinação
Estratégia pode ser definida como o caminho escolhido para se atingir
determinada meta. É o “como fazer”. No caso da vacinação, a estratégia
é o caminho escolhido para se conseguir oferecer o imunobiológico ao
público-alvo que dele necessita, no menor prazo, alcançando a prote-
ção e, em consequência, o controle, a eliminação ou a erradicação da
doença.

60
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

Como já dissemos, o PNI tem como meta básica vacinar 100% da popu-
lação infantil, o mais precocemente possível. Diversas estratégias são
utilizadas para o alcance dessa meta, como vacinação de rotina (calen-
dário), extramuros, campanhas etc.

As estratégias de vacinação podem ser utilizadas de forma isolada ou


combinadas, já que não existe uma solução única. A escolha de uma
ou outra forma de trabalhar leva em conta as características do territó-
rio e da população, assim como a capacidade instalada e o percentual
de cobertura que vêm sendo alcançados (FUNDAÇÃO NACIONAL DE
SAÚDE, 2001).

São estratégias básicas de vacinação:


G a vacinação de rotina realizada no serviço de saúde;
G campanhas de vacinação;
G vacinação de bloqueio;
G atividades de vacinação extramuros.

Ao se propor a realização de qualquer uma dessas estratégias, é funda-


mental considerar a necessidade de capacitação dos recursos humanos
(treinamento, atualização) e de ações para mobilização e envolvimento
dos diversos segmentos da comunidade, seja para divulgar informa-
ções, seja para participar da vacinação.

Segundo o Planejamento Estratégico Situacional (PES), diversas visões


e opiniões sobre a realidade devem ser consideradas para se construir
consensos sobre ações estratégicas que possam auxiliar na resolução ou
diminuição dos chamados problemas semi ou quase estruturados, para
propiciar mudanças em determinada realidade.
A discussão da estratégia para aumentar a cobertura vacinal de determinado
território é um exemplo desse tipo de problema, e a sua solução não
depende somente dos profissionais que trabalham no setor de imunização.
Para resolvê-lo, pode ser necessária a adesão de diversos profissionais
e setores, como agentes comunitários de saúde, equipes da saúde da
família, até mesmo profissionais das escolas, associação de moradores etc.
Planejar essas ações pode auxiliar a equacionar ou dirimir parte dos riscos e
problemas que poderão ocorrer, caso elas não tenham sido planejadas.

Vacinação de rotina
A vacinação de rotina consiste no atendimento da população no dia a
dia do serviço de saúde. Essa estratégia permite o acompanhamento

61
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

contínuo e programado das metas previstas, facilitando o monitora-


mento sistemático (mensal ou trimestral), de forma a identificar, em
tempo oportuno, se as metas estão sendo alcançadas, que áreas mere-
cem atenção, ou grupos que necessitam ser priorizados.

Na rotina, é fundamental que se aproveitem todas as oportunidades


para vacinar as pessoas que pertencem aos grupos-alvo, em qualquer
situação de contato da equipe com o usuário do serviço. A articulação
e a mobilização das instituições e organizações da comunidade podem,
também, favorecer o trabalho da equipe de saúde para alcançar o
público-alvo (BAHIA, 2011).

Quando são detectadas coberturas vacinais aquém dos percentuais


estabelecidos, é necessário identificar mecanismos para sua superação.
Um desses mecanismos é a chamada “intensificação da rotina”, que
consiste em trabalhar o dia a dia de forma mais dinâmica, tornando
a vacinação mais acessível à população suscetível, o que inclui, certa-
mente, a vacinação extramuros.

Vacinação extramuros
As atividades extramuros são adotadas em função de uma necessidade
operacional ou epidemiológica que exige colocar a vacinação mais
acessível e próxima da população. Seu principal objetivo é eliminar
bolsões de suscetíveis, sobretudo na realização da prática de vacinação
nas residências e instituições em geral, como escolas, creches, empresas,
orfanatos etc. Essa atividade tem como finalidade alcançar pessoas que
não são vacinadas na rotina; população em situação de rua; acampada;
boias-frias etc. Essa prática possibilita, também, atender populações
com maior dificuldade de ser vacinadas, em especial pessoas que vivem
em áreas rurais de difícil acesso: populações indígenas, ribeirinhos, qui-
lombolas (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA; FUN-
DAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE, 2000; BAHIA, 2011).

Muitas pessoas e grupos vivem em condições de grande vulnerabilidade


social em locais insalubres e sem infraestrutura adequada, cujas formas de
viver, além de influenciar na imunidade, lhes atribui maior suscetibilidade
em adoecer.
O conhecimento do lugar onde ocorre determinada doença é muito
importante, em epidemiologia, para a caracterização do evento. A análise
dos agravos à saúde, com ênfase nas diferenças geográficas, constitui uma
preocupação fundamental para se entender o processo de manutenção da
saúde e de adoecimento das pessoas.

62
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

Distinguir onde as pessoas moram, as características geográficas do lugar,


a sua forma de ocupação, os poluentes existentes e até a existência de
alimentos contaminados ajudam a apontar os riscos a que o indivíduo está
sujeito pelo fato de viver em certas regiões ou visitá-las. Assim, conhecer
as condições de vida e a situação de saúde de territórios (determinantes,
riscos e vulnerabilidades) onde os eventos de doença ocorrem é
fundamental para a tomada de decisão e ação no sentido de proteger
pessoas e grupos e controlar a ocorrência de doenças.

As atividades extramuros podem ser realizadas tanto pelo setor público


quanto pelo privado. No caso de estabelecimentos privados, estão libe-
rados somente aqueles licenciados pela vigilância sanitária e credencia-
dos pela vigilância epidemiológica, desde que sigam rigorosamente as No Brasil, Santa Catarina é o
orientações da Portaria Conjunta Anvisa/Funasa n. 1, de 2 de agosto de único estado que regulamenta,
de forma mais detalhada,
2000, e as regulamentações locais, que podem variar em cada estado e a atividade de vacinação
município. extramuros, por meio da
Instrução Normativa Conjunta
n. 001/DIVS/DVE/2012,
O trabalho de imunização extramuros reúne uma série de peculiarida- retificada e ratificada pela
des e especificidades desafiadoras, tais como: Instrução Normativa Conjunta
n. 003/DIVS/DVE/2013 (SANTA
G falta de energia elétrica em tempo constante; CATARINA, 2013).

G manutenção dos equipamentos da rede de frio;


G grande dispersão geográfica;
G dificuldades de acesso;
G dificuldade de acompanhamento de possíveis eventos adversos Para conhecer o teor das
Instruções Normativas
relacionados à vacinação, por causa da curta permanência da Conjuntas n. 001/DIVS/
equipe de saúde local, sendo necessária, ainda, maior atenção na DVE/2012 e n. 003/DIVS/
DVE/2013, consulte:
conservação das vacinas (SANTOS, 2010);
http://www.dive.sc.gov.
G condições ambientais adversas; br/conteudos/imunizacao/
publicacoes/Instrucao_
G diversidade das características culturais, como as dos povos Normativa_Vacinacao_
indígenas, quilombolas e ribeirinhos. Extramuro.pdf

Para a conservação das vacinas nessas condições, as ações de imunização


necessitam de uma série de cuidados para manutenção de uma rede de
frio, que tem características próprias, que se diferencia da manutenção
dos imunobiológicos na rotina (geladeiras).

O custo para a realização das atividades extramuros pode ser alto,


especialmente quando envolve transporte por longas distâncias, em
áreas rurais e indígenas, por exemplo. Por isso, é importante que esses
momentos sejam aproveitados para se realizar outras ações de atenção
básica, de forma integrada com a imunização.

63
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Um planejamento cuidadoso das atividades extramuros possibilita a


realização de ações de vigilância à saúde, a atualização de cadernetas de
vacinação, de censos da população atendida, além de fortalecer o vín-
culo entre a comunidade e a equipe de saúde. Para tanto, na elabora-
ção de estratégias de imunização extramuros, devem ser consideradas a
extensão do território e as distâncias a serem percorridas, a população,
a realidade de saúde local, o perfil epidemiológico e a infraestrutura do
local, bem como as seguintes medidas:
G vacinação simultânea de toda a população suscetível, visando à
melhoria contínua dos indicadores vacinais, por meio da busca ativa
de suscetíveis;
G vigilância permanente para as doenças imunopreveníveis e
capacitação da equipe local para intervenção imediata nas formas de
bloqueio, manutenção e varredura, entre outras;
G parcerias com as diferentes instituições participantes do Programa
Nacional de Imunizações (PNI) e avaliação imediata do trabalho,
após cada ação de imunização, por todos os envolvidos, subsidiando
o planejamento das ações subsequentes;
G valorização e inserção dos agentes de saúde nas atividades de
imunização, considerando os propósitos de formação profissional e a
interação educativa com as comunidades;
G integração do trabalho de imunização com as demais atividades
multiprofissionais de assistência e vigilância à saúde;
G estabelecimento de rotinas no trabalho do programa de
imunizações, contendo regras e fluxos programáticos para as ações e
especificidades operacionais de cada local;
G elaboração de padronização de condutas e ações técnicas sobre a
prática de imunização.

A vacinação extramuros, quando bem programada em termos de recur-


sos humanos e materiais e realizada de forma sistemática, apresenta
resultados proveitosos para a cobertura vacinal dessas populações.

Vacinação de bloqueio
A vacinação de bloqueio é uma atividade executada quando há ocor-
rência de um ou mais casos de doença prevenível pela vacinação. Ela
visa interromper a cadeia de transmissão de doença mediante a vacina-
ção de todos os suscetíveis, em curto espaço de tempo.

64
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

Essa atividade pode ser limitada à moradia do doente, ao seu local de


trabalho ou de estudo; abranger as residências vizinhas, ou estender-se a
um ou mais quarteirões, ou mesmo a todo um bairro, vila ou município.

Os critérios para definição da área de cobertura de uma vacinação de


bloqueio estão definidos no Guia de vigilância epidemiológica, publicado
pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), ou por notas e informes
técnicos do Ministério da Saúde (BRASIL, 2010).

Campanhas de vacinação
As campanhas de vacinação são estratégias diferenciadas da rotina, com No Capítulo 3 do livro Rede
abrangência limitada e que visam ao controle de doenças de maneira de Frio: fundamentos para a
compreensão do trabalho, a
intensiva, com vacinação em massa da população-alvo, ou a extensão estratégia de campanha de
da cobertura vacinal, para complementação do serviço de rotina. São vacinação é exemplificada
na discussão da importância
estratégias que visam ao controle de pandemias, epidemias e surtos, das ações de saúde pautadas
ou à manutenção da eliminação/erradicação de determinada doença em base territorial. São as
imunoprevenível. informações sobre o território
que irão apontar como irá se
desenvolver a campanha: qual
Ações de intensa mobilização da comunidade, principalmente por meio o público-alvo a ser vacinado; a
dos veículos de comunicação de massa e da ampliação do número de quantidade necessária de vacinas;
os locais de vacinação; a forma de
postos, contribuem para o sucesso das campanhas, permitindo que a comunicação sobre a campanha;
população fique mais próxima da vacina, possibilitando o alcance de as formas de distribuição e
acondicionamento das vacinas
maiores contingentes e a obtenção de altos índices de cobertura. e a duração da campanha,
entre outros (SILVA; FLAUZINO;
O alto custo financeiro e a grande mobilização de recursos (humanos, GONDIM, 2016).
institucionais) e da comunidade são fatores a serem considerados, mas
que não devem impossibilitar a realização da campanha. A oportuni-
dade da campanha deve ser aproveitada para se administrarem todas as
vacinas em crianças ou em outros grupos de risco, iniciando ou com-
pletando o esquema de vacinação estabelecido.

As campanhas nacionais, a vacinação de rotina e outras estratégias têm As campanhas nacionais de


vacinação realizadas pelo PNI,
possibilitado a melhoria das coberturas vacinais ao longo dos anos de exis-
publicadas na Portaria
tência do PNI, com efetiva contribuição no declínio das doenças imuno- n. 1.489/2013, estão listadas no
preveníveis (BAHIA, 2011; FUNDAÇÃO NACIONAL DA SAÚDE, 2001). Anexo A deste capítulo.

Breve histórico das campanhas de vacinação


realizadas pelo PNI
Foram muitas as ações realizadas no país que lograram êxito no controle O Anexo A deste capítulo
apresenta as campanhas nacionais
e na eliminação de doenças como a poliomielite, o sarampo, a rubéola e
de vacinação e relaciona os
a influenza pandêmica (gripe). Algumas permanecem até hoje. Vejamos grupos-alvos.
um pouco desse histórico.

65
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Autóctone, diz-se daquilo que G 1980: foi realizada a 1ª Campanha Nacional de Vacinação contra
é natural da região onde ocorre
(DICIO, 2009).
a poliomielite, com a meta de vacinar todas as crianças menores
de 5 anos de idade em um só dia. Graças aos resultados obtidos ao
longo dos anos, em 1989 foi notificado o último caso de poliomielite
no Brasil. Em setembro de 1994, junto com os demais países das
Américas do Norte, Central e Sul, o Brasil recebeu da Comissão
Internacional para a Certificação da Ausência de Circulação
Autóctone do Poliovírus Selvagem nas Américas o certificado de que
a doença e o vírus foram eliminados do continente.
Com o objetivo de sensibilizar o público, especialmente o infantil,
para a importância da vacinação, em 1986 foi criado o personagem
Zé Gotinha, pelo artista Darlan Rosa. Utilizado pela primeira vez na
campanha contra a pólio da década de 1980, o Zé Gotinha tornou-se
uma referência e é utilizado, até hoje, em diversas campanhas de
vacinação, passando por adaptações ao longo do tempo.

G 1999: iniciou-se a campanha de vacinação contra influenza para a


população idosa, hoje ampliada para outros grupos prioritários.
G 2000: com campanhas nacionais de seguimento contra sarampo e
boas coberturas vacinais na rotina, houve a confirmação do último
caso de sarampo autóctone no país, graças a essas estratégias.
Os casos confirmados posteriormente foram importados de outros
países.
G 2008: houve grande mobilização nacional para eliminar, no país, a
rubéola e a síndrome da rubéola congênita e fortalecer a eliminação
do sarampo, com a execução da maior campanha de vacinação
realizada no mundo, em tão curto espaço de tempo. Cerca de 67
milhões de pessoas foram vacinadas entre os meses de agosto e
dezembro do referido ano (dados nacionais disponíveis no site do
DATASUS (2016)).
G 2010: a campanha contra o vírus influenza A (H1N1) foi o maior
desafio enfrentado pelo PNI até então, em virtude da vacinação de
mais de 89 milhões de brasileiros, durante a pandemia de gripe.

Outros produtos disponibilizados pelo PNI


A vacinação é a principal estratégia de imunização da população. No
entanto, em alguns casos, é necessário associá-la a outras ações. Depen-
dendo da gravidade da ocorrência de uma infecção, muitas vezes existe
a necessidade de se associar a vacinação ao uso de um soro específico,
pois, como a vacina demora de 14 a 21 dias, em média, para produzir
anticorpos protetores e o soro já possui imunoglobulinas prontas, este

66
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

irá proteger a pessoa, temporariamente, até que a ação da vacina se


inicie. É mais ou menos assim: quando a ação do soro está terminando,
começa a da vacina. Exemplos mais comuns são os casos de profilaxia
da raiva, tétano, difteria e hepatite B.

Outra situação é a imunização contra acidentes por animais peçonhen-


tos ou por botulismo, em que não existe vacina, só o soro. Nesse caso,
quando a pessoa se cura, pode ficar vulnerável, novamente, diante de
uma nova exposição ao agente. Essas condutas para proteção
da população dependem
diretamente da sua atuação,
Considerando sua atuação nas diferentes estratégias de imunização da profissional da rede de
população, além das vacinas disponíveis na rotina e nas campanhas, frio. Por meio do trabalho
cabe ainda ao PNI a aquisição e distribuição de soros heterólogos e adequado na conservação,
no armazenamento
homólogos, utilizados nas unidades hospitalares e de pronto aten- e na distribuição dos
dimento. Os soros mais comumente utilizados e que fazem parte da imunobiológicos, você
garantirá a manutenção
administração do PNI são: antitetânicos, antidiftéricos e antirrábicos. da qualidade e eficácia
do produto, conferindo
Conhecemos, anteriormente, os dois tipos de soros: os heterólogos e os imunidade às pessoas.
homólogos. Agora, iremos conhecer a diferença entre os tipos de soros.

Soros heterólogos
São soluções injetáveis de imunoglobulinas específicas, purificadas e O Anexo B deste capítulo lista os
soros heterólogos distribuídos pelo
concentradas, obtidas de soros de equinos hiperimunizados com vene-
PNI/MS.
nos de animais peçonhentos, ou produtos de microrganismos que
protegem o indivíduo mais rapidamente do que as vacinas, pois são
anticorpos já prontos. Têm durabilidade limitada, com vida média em
torno de 14 dias. São utilizados em caso de acidentes com animais peço-
nhentos, para os quais não existem vacinas, ou em risco eminente de
doenças como o tétano, a raiva e a difteria, em pessoas não imunizadas.

Os soros heterólogos podem induzir reações alérgicas, em algumas pes- Imunocomplexos são antígenos
ligados a IgG e IgM que causam
soas, ou depósitos de imunocomplexos que levam à doença do soro, em
uma reação de hipersensibilidade,
resposta a proteínas estranhas oriundas do animal. Em virtude disso, ao se depositarem na parede dos
existe a recomendação de se administrar esses soros em ambiente onde vasos, e provocam uma reação
inflamatória que lesiona o tecido
o paciente possa receber assistência imediata, caso alguma reação anor- celular, prejudicando o seu
mal ocorra (ambiente hospitalar, Unidades de Pronto Atendimento). funcionamento.

67
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 1 – Esquema de produção de soros heterólogos

Fonte: Adaptação de Sasson; Silva Junior (2011).

Soros homólogos (imunoglobulinas de


origem humana)
São soluções obtidas de doadores humanos, com altos títulos de anti-
corpos contra determinado microrganismo, obtidos tanto por infecção
natural como por vacinação anterior.

Por não conterem proteínas de origem animal em sua formulação,


apresentam menor incidência de reações alérgicas ou por depósito de
complexos imunes (doença do soro).

Em virtude das particularidades no processo de produção, os soros


homólogos, em geral, têm custo mais elevado e são utilizados em pes-
soas que já apresentaram reações adversas anteriormente, após o uso
de soros heterólogos, ou com necessidades especiais, de acordo com os
protocolos de indicação dos Crie. Atualmente, as imunoglobulinas con-
tra tétano, raiva, varicela-zóster e hepatite B estão disponíveis nos Crie.

Com base no que foi apresentado, agora você é capaz de entender por
que, em algumas situações, se utiliza a vacina, em outras, a vacina e o
soro, e em outras mais, só o soro.

68
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

Imunobiológicos especiais
Os imunobiológicos especiais (vacinas e imunoglobulinas hiperimu-
nes) são adquiridos pelo Ministério da Saúde para atender pessoas que,
por motivos biológicos, são impedidas de receber os produtos que se
encontram na rotina e disponibilizados na rede pública. Esses produtos
são administrados em locais específicos, como os Centros de Referência
para Imunobiológicos Especiais (Crie).

Sobre os Crie
Em 1993, iniciou-se no Brasil a implantação dos Crie, que são salas
públicas de vacinação, geralmente localizadas em instituições hospitalares, Para obter mais informações
onde são disponibilizados imunobiológicos não contemplados na rotina, sobre vacinas especiais e
protocolos de indicação,
chamados de imunobiológicos especiais. consulte o Manual dos Crie
Os Crie disponibilizam imunobiológicos especiais e imunoglobulinas de (MS), disponível no link

origem humana, cujos critérios de inclusão estão referidos no Manual de http://bvsms.saude.gov.br/bvs/


publicacoes/manual_centro_
referência para imunobiológicos especiais do Ministério da Saúde
referencia_imunobiologicos.pdf
(BRASIL, 2014).
Por se tratar de estrutura direcionada ao atendimento diferencial, os
Crie contam com produtos imunobiológicos de moderna tecnologia e
alto custo, com a finalidade de proporcionar melhor qualidade de vida à
população brasileira. A vacinação nos Crie se faz mediante indicação e
prescrição médica.
Para receber os imunobiológicos especiais, os indivíduos devem apresentar
uma sensibilidade aumentada às doenças, ou risco de complicações para si
ou para outros, decorrentes de:
• motivos biológicos, como imunodepressão, asplenia (falta do baço),
transplante, Aids;
• convívio com pessoas imunodeprimidas, como profissionais da área da
saúde e parentes de imunodeprimidos;
• intolerância aos imunobiológicos, em virtude de alergia ou evento
adverso grave após recebê-los;
• exposição inadvertida a agentes infecciosos por motivos profissionais ou
violência contra a pessoa. Os imunobiológicos especiais
disponibilizados pelo PNI são
Os Crie têm, ainda, a função de investigar, notificar e atender os casos de apresentados no Anexo C
Eventos Adversos Pós-Vacinação (EAPV) e representam importantes centros deste capítulo. Os EAPV serão
de informações e pesquisas. apresentados e discutidos no
próximo capítulo deste livro.

69
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Considerações finais
Neste capítulo foi possível conhecer um pouco sobre o Programa Nacio-
nal de Imunizações e as diferentes estratégias de vacinação, as quais
visam alcançar o principal objetivo do PNI, qual seja, vacinar 100% da
população brasileira.

Ao ser formulado, o PNI tinha, como missão inicial, coordenar as ações


de imunização no país, antes organizadas em programas de controle
de doenças. Sua criação possibilitou a organização e a coordenação
das ações de vacinação e um conjunto de avanços, como a erradicação
da varíola, a eliminação da poliomielite, do sarampo e da rubéola, o
processo de eliminação do tétano neonatal, a redução e o controle da
meningite por Haemophilus influenzae e meningococo C, entre outros.

Hoje o programa dispõe de um conjunto de vacinas disponíveis para


toda a população, de forma gratuita, com perspectivas de introdução
de novas vacinas e ampliação do uso de algumas já existentes. Está
prevista a ampliação da oferta da vacina hepatite B (Hep B) a toda a
população, bem como alteração do esquema vacinal de algumas vaci-
nas, como a vacina meningocócica C conjugada, entre outras, tornando
o calendário de vacinação brasileiro cada vez mais efetivo no controle
das doenças preveníveis e na proteção de toda a população.

Aliados a esses fatores, a capacidade do programa em mobilizar a popu-


lação para adesão à vacinação nas campanhas e o crescente aumento
do número das salas de vacinação de rotina tornam o PNI um exemplo
de política pública bem-sucedida, com o fortalecimento do Ministério
da Saúde.

Todas essas atividades estão fundamentadas e orientadas na discussão


permanente sobre normas, metas e resultados, o que propicia a moder-
nização de sua infraestrutura e a operacionalização entre as três esferas
de governo. As ações do PNI são desenvolvidas no Sistema Único de
Saúde (SUS), por intermédio de uma rede descentralizada, articulada,
hierarquizada e integrada.

É inegável a contribuição do PNI para a redução das desigualdades


regionais e sociais, ao viabilizar a vacinação para todos os brasileiros,
em todas as localidades de fácil ou difícil acesso. Sua forma de atuação
garante a implementação de todas as estratégias de ação, definidas
segundo os princípios do SUS: universalidade, integralidade e
participação da comunidade, estabelecidos no artigo 7o, da Lei n. 8.080,
de 19 de setembro de 1990 (BRASIL, 1990).

70
O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

O programa é protagonista de um novo momento, no qual a complexi-


dade do quadro epidemiológico e o desenvolvimento de novas vacinas
passaram a exigir adequada e inédita maneira de organização das ações
de vacinação. Sem o conhecimento e a participação efetiva do profissio-
nal de saúde, o PNI não alcançaria o êxito que hoje o coloca entre um
dos programas de maior sucesso no mundo.

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BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 1.498, de 19 de julho de 2013. Revoga as anteriores


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Doenças Transmissíveis. Manual de rede de frio do Programa Nacional de Imunizações. 4. ed.
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71
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

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O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias para imunização da população

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http://www.sbim.org.br

http://www.sbp.com.br

74
Anexo A – Campanhas nacionais
de vacinação
Campanha nacional de vacinação População-alvo
Influenza Crianças de 6 meses a menores de 2 anos de idade,
gestantes, puérperas até 45 dias após o parto, pessoas
com 60 anos de idade e mais, trabalhadores da saúde,
população privada de liberdade, povos indígenas e
indivíduos com comorbidades.
Poliomielite Crianças de 6 meses a menores de 5 anos de idade. 
Multivacinação Crianças menores de 5 anos de idade.
(todas as vacinas do calendário
básico de vacinação da criança para
atualização de esquema vacinal) 
Seguimento contra o sarampo Crianças menores de 5 anos de idade. 
(a cada cinco anos ou de acordo
com a situação epidemiológica) 
Fonte: Portaria n. 1.498, de 19 de julho de 2013 (BRASIL, 2013).
Anexo B – Soros heterólogos distribuídos
pelo PNI/MS
1. Soro anticrotálico (SACR): acidentes com serpentes do gênero
Crotalus (cascavel).
2. Soro antibotrópico (SABR): acidentes com serpentes do gênero
Bothrops (jararaca, jararacussu, urutu, cotiara e outras
3. Soro antibotrópico-crotálico (SABC): acidentes com serpentes do
gênero Crotalus e Bothrops.
4. Soro antielapídico (Sael): acidentes com serpentes do gênero
Micrurus (corais verdadeiras).
5. Soro antibotrópico-laquético (SABL): acidentes com serpentes do
gênero Bothropse lachesis (surucucus).
6. Soro antiaracnídico (Saares): acidentes com aranhas do gênero
Phoneutria (aranha armadeira) e do gênero Loxosceles (aranha
marrom). Pode ser utilizado na falta do soro antiescorpiônico,
uma vez que contém, em sua formulação, a imunoglobulina do
escorpião Tityusserrulatus (Tr).
7. Soro antiescorpiônico (Saes): tratamento dos envenenamentos
provocados por picadas de escorpião do gênero Tityus.
8. Soro antilonômico (Salo): acidentes com lagarta Lonomia obliqua
(taturana).
9. Soro antibotulínico (SAB): visa eliminar uma potente toxina
produzida pela bactéria Clostridium botulinum, que causa o
botulismo.
10. Soro antiloxoscélico (SALX): acidentes com aranhas das espécies
Loxosceles laeta, Loxosceles gaucho e Loxosceles intermedia (aranha
marrom).
11. Soro antitetânico (SAT): imunoglobulinas específicas e purificadas
obtidas de plasma de equinos hiperimunizados pela toxina do
bacilo Clostridium tetani.
12. Soro antidiftérico (SADF): imunoglobulinas específicas e
purificadas obtidas de plasma de equinos hiperimunizados pela
toxina do bacilo Corinebacterium diphtheriae.
13. Soro antirrábico (SARH): imunoglobulinas específicas obtidas do
plasma de equinos vacinados contra a raiva.
Fonte: Manual dos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (BRASIL, 2006).
Anexo C – Imunobiológicos especiais
distribuídos pelo PNI/MS
1. Vacina hepatite B (recombinante) – HB
2. Vacina poliomielite 1, 2 e 3 (inativada) – VIP
3. Vacina varicella – Varc
Para obter mais informações
4. Vacina influenza – FLU sobre as vacinas especiais e
os protocolos de indicação,
5. Vacina adsorvida meningocócica C (conjugada) – Meningo Conj C consulte o Manual dos
6. Vacina pneumocócica 10-valente (conjugada) – Pncc10V Centros de Referência para
Imunobiológicos Especiais
7. Vacina pneumocócica 23-valente (polissicarídica) – Pncc23V (Crie) do Ministério da
Saúde, disponível na parte
8. Vacina haemophilus influenzae B (conjugada) – Hib de Publicações do endereço
9. Vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis (acelular) – tríplice eletrônico:

acelular – DTPa http://bvsms.saude.gov.br/bvs/


publicacoes/manual_centro_
10. Vacina adsorvida difteria e tétano infantil – dupla infantil – DT referencia_imunobiologicos.pdf
11. Vacina adsorvida hepatite A (inativada) – HA
12. Vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis, hepatite B
(recombinante) e haemophilus influenzae B (conjugada) – Penta
(pentavalente) – DTP-HB/Hib
13. Vacina febre tifoide (polissacarídica) – FTp
14. Imunoglobulina anti-hepatite B – IGHB
15. Imunoglobulina antivaricela-zóster – IGVZ
16. Imunoglobulina antirrábica humana – IGRH
17. Imunoglobulina antitetânica – IGAT.
3. Vigilância epidemiológica em
eventos adversos pós-vacinação
Cláudia Othero Nunes Abreu e Marileide do Nascimento Silva

Com o crescente aumento do número de pessoas vacinadas, a ampliação


do calendário de vacinação introduzindo novas vacinas e, consequen-
temente, a diminuição do risco de algumas doenças que antes eram
causas de morte, é natural que, hoje, parte da preocupação dos usuá-
rios esteja mais voltada para a segurança das vacinas do que somente
para a proteção que elas possam determinar.

Apesar de, no passado, ter havido diversas ocorrências relacionadas à


aplicação de algumas vacinas, ou a alguns lotes de determinados fabri-
cantes, sabemos que, atualmente, os imunobiológicos são fabricados
com um bom perfil de tolerabilidade e segurança, e os riscos de eventos
indesejáveis pós-vacinação não devem superar os seus benefícios. Vale
ressaltar que hoje em dia testes rigorosos de segurança são exigidos
para qualquer vacina, desde seu planejamento até seu licenciamento,
independentemente do laboratório produtor. Entretanto, como qualquer
produto farmacêutico-biológico para profilaxia ou tratamento, a vacina
pode desencadear alguns eventos indesejáveis, denominados eventos
adversos pós-vacinação (EAPV). Alguns deles já são esperados e, em
sua maioria, são leves, de evolução rápida e regridem sem necessidade
de tratamento.

Este capítulo apresenta o que são eventos adversos, fatores relaciona-


dos ao seu acontecimento, sua classificação, bem como a vigilância dos
EAPV, realizada por meio de notificação e investigação.
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Eventos adversos pós-vacinação


e a atividade de vacinação
Entende-se como eventos adversos pós-vacinação (EAPV) qualquer
ocorrência ou intercorrência clínica indesejável em indivíduo que tenha
recebido um imunobiológico, independentemente de ser decorrente ou
não da vacinação, ou seja, de estar associada ou não à vacina!

É importante que os eventos adversos pós-vacinais sejam entendidos


como uma ocorrência possível, que deve ser tratada e que contribui
para o aperfeiçoamento das vacinas e para a qualidade destas, uma
vez que a maioria desses eventos significa apenas associações temporais
com a vacina (coincidências), sem confirmação de serem decorrentes
de sua aplicação.

Muitos dos EAPV que são Tais associações são inevitáveis e ocorrem em função de diversos fatores.
temporalmente associados
No entanto, até a finalização de um processo de investigação (calcado
à vacinação podem ser
consequências de doenças em avaliação clínica e laboratorial criteriosa), que discutiremos mais
intercorrentes que aparecem ou adiante, não se pode afirmar que haja relação de causa e efeito entre
se exacerbam no momento da
vacinação, ou mesmo causados por a ocorrência de um evento e a vacinação. Por isso, usa-se a expressão
fatores neurológicos prévios etc. evento adverso, e não reação, pois esta última implicaria uma relação
de causa e efeito ainda não determinada.

Em relação à frequência de ocorrência de EAPV, é importante fazermos


uma avaliação histórica. Com a evolução das pesquisas e da tecnolo-
gia, novas vacinas foram desenvolvidas e implementadas na rotina,
obtendo-se um número cada vez maior de indivíduos vacinados e,
com isso, maior número de ocorrências de eventos adversos. Embora
a maioria dos eventos pós-vacinação seja local e de leve intensidade,
eventos graves, ainda que raros, podem ocorrer, crescendo a importân-
cia de sua investigação e acompanhamento.

Eficácia é a capacidade de
alcançar o efeito esperado ou 1. O monitoramento dos eventos adversos sempre foi uma preocupação
desejado por meio da realização mundial.
de uma ação. Resulta em
atingir o objetivo proposto, em 2. Para minimizar seus riscos, o desenvolvimento de uma vacina é cercado
executar algo de acordo com o de cuidados com a segurança e qualidade, com o objetivo de obter um
determinado.
produto com maior grau de proteção/eficácia e o mais inócuo possível,
ou seja, com menor potencial de causar eventos indesejáveis.
3. Caso ocorra EAPV, sua investigação é fundamental para que o evento
não seja atribuído à vacina, sem a devida comprovação científica, e se
possa manter a confiabilidade das vacinas na proteção da população.

80
Vigilância epidemiológica em eventos adversos pós-vacinação

4. Como qualquer produto, a vacina não está livre de causar um evento


adverso. No entanto, a análise comparativa entre risco e benefício
demonstra que a probabilidade de uma vacina causar um evento
grave é muito menor do que o risco de adoecer, caso o indivíduo
não seja imunizado. Assim, é preciso muito cuidado ao tratar dessa
questão, principalmente no que diz respeito à contraindicação de uma
vacina baseada nos eventos que esta pode causar. Uma pessoa não
vacinada representa um risco de adoecimento para ela mesma e
para a população.

Fatores relacionados aos EAPV


Ainda que todos os cuidados necessários ao desenvolvimento e à ati-
vidade de vacinação sejam tomados, há possibilidade de ocorrência de
eventos associados à composição das vacinas, produtos com proprie-
dades farmacológicas específicas. Por isso, é fundamental conhecer suas
características, como:
G tipo de antígeno, se é vivo, atenuado, inativado, ou constituído de
produtos como toxoides, polissacarídeos, ou produzido por DNA
recombinante;
G aditivos utilizados na produção, como agentes de suspensão (água,
solução salina);
G presença de conservantes como o timerosal;
G uso de estabilizantes como sorbitol e gelatina hidrolisada;
G uso de adjuvante como sais de alumínio;
G outras substâncias que podem estar presentes, por exemplo,
subprodutos residuais de meio de cultivo e antibióticos (neomicina).

Alguns dos termos mencionados nos tópicos anteriores são de uso


bastante recorrente, quer na rede de frio, quer na sala de vacinação.
Por isso, sistematizamos algumas definições para ajudá-lo no dia a dia de
trabalho, caso ainda não conheça seus significados.
Vacina viva atenuada: preparação composta de microrganismos vivos
atenuados em laboratório, capazes de se multiplicar no organismo (não
causando doença) e estimular uma resposta imune. Essa resposta é
idêntica à produzida pela infecção natural.
Vacina inativada: preparação contendo microrganismos mortos ou suas
frações, possuidores de propriedades antigênicas para induzir, em um
indivíduo, a imunidade ativa e específica contra um microrganismo.

81
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Essa vacina tem a desvantagem de induzir uma baixa resposta imunitária,


o que, por vezes, requer a necessidade de se associar adjuvantes e de
administrar várias doses de reforço.
Aditivos: substâncias utilizadas como agentes de suspensão na produção
da vacina.
Conservantes: substâncias utilizadas para preservar os componentes da
vacina.
Estabilizantes: nutrientes contidos nas vacinas atenuadas para estabilizar
e prolongar a vida útil da vacina. 
Adjuvante: substância que potencializa, de forma inespecífica, a resposta
imunológica a um antígeno.

Comorbidade é um termo Em relação aos vacinados, fatores como idade, sexo, antecedentes alér-
utilizado para descrever a
gicos, comorbidade devem ser considerados em casos de EAPV. Mere-
ocorrência simultânea de dois ou
mais problemas de saúde em um cem, também, atenção especial aqueles relacionados à preparação e/
mesmo indivíduo. ou à aplicação dos imunobiológicos, como agulha e seringa utilizadas,
Eventos inusitados são aqueles contaminação no ato da preparação ou aplicação, técnica de aplicação
decorrentes de algum erro ou falha
incorreta etc. São esses procedimentos técnicos que, quando inadequa-
no preparo ou na administração da
vacina (dose, via, local etc.). dos, causam eventos inusitados, conforme apresenta o Exemplo 1, a
seguir.

Abcesso é uma coleção de pus


(secreção amarelada) que se forma Exemplo 1 – Evento adverso associado à aplicação de vacina
no local da ferida, localizada em
qualquer parte do corpo. J. C. M., com 6 meses de vida, recebeu a 3ª dose da vacina contra
hepatite B, na unidade de saúde do distrito rural de Caracóis, município
Supuração é a eliminação ou
o escorrimento de pus de um de Esmeraldas, Minas Gerais. Após 20 dias, a criança apresentou como
abcesso. manifestações no local da aplicação:
Abcesso séptico é o abcesso • dor, edema (inchaço), calor e rubor;
decorrente da contaminação
do local, no momento da • abcesso com secreção purulenta;
administração de uma injeção; no
nosso caso, de uma vacina. • supuração do abcesso.
Concluímos que, diante das manifestações apresentadas, o aparecimento
do evento adverso estava diretamente associado ao procedimento
executado no ato da vacinação, e não às características propriamente
ditas da vacina. Isso porque havia:
• abcesso quente, geralmente associado a infecção secundária e erros na
técnica de aplicação (contaminação no local de inoculação);
• tumoração no local da aplicação, com sinais inflamatórios (dor, edema,
calor e rubor), sugerindo um abcesso séptico.

82
Vigilância epidemiológica em eventos adversos pós-vacinação

Foto 1 – Abcesso com supuração por erro de aplicação


Foto: Edson Moura (2014).

Classificação dos EAPV


Um evento adverso pode ser classificado em decorrência da causa que
o originou, ou seja:
G induzido pelo imunobiológico: quando o evento não teria ocorrido,
se a vacina não tivesse sido aplicada. Pode estar relacionado à
característica intrínseca dos componentes, ou à forma de constituição
do imunobiológico, ou ainda à resposta individual do vacinado;
G potencializado pelo imunobiológico: quando o evento ocorreria de
qualquer maneira, mas foi precipitado pela vacinação (por exemplo,
primeira convulsão febril em uma criança);
G erros programáticos: quando o evento está relacionado à técnica
incorreta na preparação, aplicação e/ou no manuseio do produto;
G coincidente: associado temporalmente à vacinação, por acaso ou
pela existência de um quadro clínico subjacente, não manifesto ou
não valorizado no momento da vacinação.

Para refletir
Com base nessa classificação, que eventos adversos você relacionaria como
os mais prováveis de acontecer e que fatores estariam envolvidos para
desencadeá-los? Quais medidas poderiam ser adotadas para minimizá-los?

Há eventos adversos, em geral brandos, que ocorrem com maior fre-


quência, e, por isso, sua ocorrência é mais esperada que outros. Estes
são classificados como: Via parenteral é a via em
que substâncias são aplicadas
diretamente nos tecidos por
G locais – são os mais comuns, de início agudo, e ocorrem com a injeção, com emprego de seringas,
aplicação dos imunobiológicos por via parenteral. Manifestam-se agulhas ou cateteres.

83
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

com dor, edema, eritema (vermelhidão) na área da injeção do


produto;
G sistêmicos – manifestam-se, geralmente, com febre, mal-estar
generalizado, irritabilidade, cefaleia, náuseas, vômitos e sonolência.

De acordo com os dados sobre os eventos adversos pós-vacinação, além


dos eventos locais, os sistêmicos leves (aqueles que não necessitam de
exames complementares e tratamento médico) são os mais frequentes.
Eles evoluem e desaparecem naturalmente, como o caso apresentado no
Exemplo 1, “Evento adverso associado à aplicação de vacina”. Por isso,
as ações de vigilância estão basicamente voltadas para os eventos graves.

Os eventos graves são os que requerem hospitalização por, no mínimo,


24 horas; resultam em disfunção ou incapacidade significativa, sequelas,
anomalias, risco de morte, óbito e exigem intervenção imediata para evitar
a morte. Diante de um evento grave, a instância de sua ocorrência deverá
notificar, de imediato, a instância superior por e-mail ou telefone. Para ilus-
trar um evento adverso pós-vacinação do tipo grave, vamos ao Exemplo 2.

Exemplo 2 – EAPV grave


Criança de 2 meses de vida, trazida pelos pais de volta à unidade de
saúde, meia hora após a administração das vacinas pentavalente (DTP,
Hib e hepatite B), poliomielite inativada (VIP), pneumococo 10-valente
e rotavírus humano (VORH), com diminuição de resposta aos estímulos,
palidez e redução do tônus muscular.
Cianose é um quadro de coloração Ao ser examinada, constatou-se quadro de episódio hipotônico-
azul-violácea da pele e das hiporresponsivo (EHH), também chamado de síndrome hipotônica-
mucosas devida à oxigenação
insuficiente do sangue. hiporresponsiva, de instalação súbita, com os seguintes sintomas:
palidez seguida de cianose, diminuição do tônus muscular (hipotonia) e
diminuição de resposta a estímulos externos (hiporresponsividade).
Podemos, então, caracterizar o evento como grave, do tipo sistêmico,
decorrente de fatores relacionados ao imunobiológico. Por quê?
No exame, foi constatada reação sistêmica, inflamatória e exagerada
a componentes vacinais, em especial à endotoxina, que existe,
principalmente, na vacina celular contra coqueluche. Estudos
demonstraram que a ocorrência de EHH tem sido documentada após a
administração de vacinas contendo o componente pertussis. É observado
mais frequentemente após o uso de vacinas antipertussis de células
inteiras do que após vacinas acelulares (BRIGHTON COLLABORATION HHE
WORKING GROUP, 2004; VAERS WORKING GROUP, 2000).
Outra constatação foi o quadro clínico da criança, com limitação das
funções, que a levou à hospitalização e ao tratamento.

84
Vigilância epidemiológica em eventos adversos pós-vacinação

Na atualidade, novas classificações para evento adverso podem ser


encontradas na literatura, entretanto, adotaremos, para efeito desta
publicação, a classificação dos eventos adversos pós-vacinação apre-
sentada neste item.

Vigilância dos EAPV


Qualquer EAPV, independentemente de sua classificação e dos inúme-
ros fatores que podem tê-los provocado (aqueles referentes ao vacinado,
à vacinação, às características do imunobiológico, à técnica de preparo
e/ou de aplicação das vacinas etc.), deve ser notificado e investigado.

Para tal, é necessário um conjunto de ações que propiciem a identifi-


cação, o monitoramento e acompanhamento desses eventos, ou seja, a
vigilância dos eventos adversos pós-vacinação.

A vigilância do evento adverso faz parte da farmacovigilância dos imu- Farmacovigilância refere-se a
um conjunto de procedimentos
nobiológicos e é definida como as atividades relativas a detecção, ava-
relacionados a detecção, avaliação,
liação, compreensão e prevenção de eventos supostamente atribuíveis compreensão e prevenção de
à vacinação. Foi instituída pelo PNI, em 1993, considerando o crescente reações adversas a medicamentos
ou quaisquer outros possíveis
número de imunobiológicos disponíveis e o aumento das exigências em problemas relacionados a
relação a sua qualidade e segurança. O propósito principal é investigar fármacos.
qualquer ocorrência indesejada após a aplicação de uma vacina e/ou A farmacovigilância de vacinas
de um soro, mesmo que a manifestação clínica, local ou sistêmica, seja e outros produtos, por exemplo,
uma associação temporal, uma suspeição (suspeita). é regulamentada pela Portaria
Conjunta n. 92, de 9 de outubro
de 2008 (BRASIL, 2008), que
dispõe sobre a articulação entre
Arcabouço legal relacionado à vacinação a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa), a Secretaria de
As atividades de imunização são realizadas de acordo com um exigente Vigilância em Saúde (SVS/MS) e o
perfil de segurança e sustentadas por arcabouços legal e jurídico, que Instituto Nacional de Controle de
atendem não somente à produção de vacinas, mas também à vigilância de Qualidade (INCQS/Fiocruz/MS).

eventos adversos pós-vacinais. Essas legislações devem ser rigorosamente


seguidas, contribuindo para a notificação e o acompanhamento dos EAPV,
bem como para o aumento dos benefícios da vacinação. Para melhor
compreensão do arcabouço legal relacionado aos EAPV, recomendamos
como fonte de pesquisa e consulta algumas portarias e decretos:
• Portaria Conjunta n. 92, de 9 de outubro de 2008, que dispõe sobre
Resolução da Diretoria Colegiada – RDC n. 306, de 7 de dezembro
de 2004, e a Resolução do Conama n. 358, de 29 de abril de 2005.
Disponíveis em: http://goo.gl/zM8ljr.
• Portaria n. 1.271, de 6 de junho de 2014, que define a lista nacional de
notificação compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública
nos serviços de saúde públicos e privados, em todo o território nacional.
Disponível em: http://goo.gl/JmI60d.

85
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Além destas, recomendamos que os profissionais se atualizem


constantemente sobre as publicações de portarias e notas técnicas que
incluem vacinas no calendário básico de vacinação.

A vigilância de eventos adversos pós-vacinação está encarregada de


normatizar:
G a notificação e investigação dos eventos;
G a consolidação e análise dos casos;
G a divulgação das informações;
G as condutas e as ações a serem adotadas para controlar e prevenir
eventos adversos, objetivando, principalmente, maior conhecimento
sobre a natureza dos EAPV;
G a identificação de eventos novos ou raros;
G as possíveis falhas na cadeia de frio, no manuseio e na
administração dos imunobiológicos (erros programáticos); além
disso, possibilita a identificação de lotes com desvios de qualidade
na produção, resultando em lotes mais reatogênicos.

Dentre esses itens, a notificação e a investigação são fundamentais, pois é a


partir delas que são geradas e compartilhadas as informações sobre EAPV.
Por isso, a seguir, nos deteremos no detalhamento dessas duas ações.

Notificação dos EAPV


Após a identificação da ocorrência de um evento adverso, o passo seguinte
é assegurar, em tempo real, a notificação, ou seja, a comunicação do
evento ao serviço ou à unidade de saúde. Isso é fundamental para prover
A notificação possibilita
conhecer o perfil do regularmente informação pertinente à segurança dos imunobiológicos
imunobiológico, sua ação, disponíveis, contribuindo para a manutenção da credibilidade das ações
assim como prevenir a
ocorrência de eventos adversos
de vacinação junto à população e aos profissionais da saúde. A notifica-
evitáveis. A investigação ção deve ser realizada, preferencialmente, na unidade de saúde onde foi
permite esclarecer se a vacina administrada a vacina ou o soro, mas pode ser feita em qualquer estabe-
aplicada teria sido responsável
pela manifestação clínica lecimento de saúde em que o vacinado buscar atendimento em razão das
apresentada. Seu primeiro condições clínicas que apresenta, seja unidade básica ou hospital.
passo é a busca de notificação
de evento semelhante já feita
aos serviços de saúde.
A verificação dessa informação
Importante!
permitirá que se decida se
Todo(a) trabalhador(a) da saúde, em especial o(a) da sala de vacina, seja
há ou não a necessidade de
aprofundar a investigação do de qualquer nível de escolaridade (médio ou superior), pode e deve fazer a
evento. notificação de EAPV!

86
Vigilância epidemiológica em eventos adversos pós-vacinação

Quais eventos adversos pós-vacinação devem ser notificados?vvvvvv

Atualmente, os eventos adversos são considerados de notificação com-


pulsória, conforme Portaria SVS n. 33, de 14 de julho de 2005, inde-
pendentemente de sua classificação (BRASIL, 2005). É por meio da
notificação que se tornam possíveis o monitoramento e a vigilância de Atenção!
tais eventos. • Frequência ou intensidade
dos EAPV aumentada é sinal
de alerta para a equipe da
Devem ser notificados todos os sinais e sintomas (queixas) da pes- saúde. Essas ocorrências
soa vacinada, denominados eventos adversos temporais, com retorno devem ser investigadas.
à unidade de saúde por demanda espontânea ou não. Para garantir • Eventos adversos graves
esse retorno, é fundamental que, na triagem, o usuário da vacina ou devem ser notificados
imediatamente.
seu responsável seja esclarecido sobre os eventos possíveis e orientado
sobre como proceder em caso de:

G evento adverso comum ou esperado – retornar à sala de vacina,


caso o evento (por exemplo, uma reação local) ocorra de maneira
mais intensa, ou demore muito a passar;
G outros eventos (raros ou EAPV moderados – buscar uma unidade de EAPV moderados são eventos que
saúde de emergência, caso observe eventos deste tipo, por exemplo, necessitam apenas de avaliação
médica e exames complementares
episódio hipotônico-hiporresponsivo (EHH), convulsão etc. e/ou tratamento médico.

Recomendações ao profissional de saúde


Em qualquer evento adverso pós-vacinação, refletir sobre alguns pontos,
como os apresentados a seguir, ajuda a compreender a situação e tomar
decisões adequadas:
• Esse evento é possível?
• Foi possível neste caso?
• Repetir-se-á no próximo caso?
• A causa precede o efeito?
• A exposição ao fator de risco antecede o aparecimento dos EAPV?
• O evento é compatível com o respectivo imunobiológico?

Como notificar os eventos adversos pós-vacinação? pós-vacinaçãovv

A notificação do evento adverso pós-vacinação é feita pelo preenchi-


mento da Ficha de Notificação, disponível nas unidades de saúde. O O sistema de informação voltado
para eventos adversos pós-
formulário tende, com o tempo, a não ser mais utilizado, visto que a vacinação (SI-EAPV) será abordado
notificação deverá ser realizada por meio do SI-EAPV on-line. no próximo capítulo.

87
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Recomendações ao profissional de saúde


Na presença de quaisquer EAPV, o profissional deve, independentemente
de sua categoria profissional na equipe, realizar as seguintes condutas:
• registro do evento adverso;
• orientação ao paciente/família;
• notificação do evento adverso;
• investigação;
• fechamento do caso.

Investigação dos EAPV


É por meio da investigação que se torna possível esclarecer se há rela-
ção de causalidade ou não entre o evento observado e a vacina. O
SI-EAPV é um aliado fundamental nesse processo, visto que coleta e
sistematiza dados que permitem a identificação, a avaliação e o monito-
ramento dos EAPV. Somente conhecendo a ocorrência de um conjunto
de eventos adversos pós-vacinação é possível analisar se o evento-alvo
de investigação ocorreu dentro da frequência esperada, se tem relação
com a vacinação (componente da vacina ou técnica de aplicação), ou se
é apenas uma associação temporal.

O monitoramento dos EAPV e a adoção das medidas cabíveis somente


serão possíveis pela notificação desses eventos. Ainda que haja dúvida
se a ocorrência foi informada, deve-se fazer a notificação. Alguns even-
tos, por serem de maior gravidade, embora sejam raros, precisam, além
da notificação imediata, que se inicie rapidamente a investigação.

A investigação é o procedimento que determinará se o evento adverso


teve ou não relação com a vacina. Em geral, é realizada por médico, e/
ou enfermeiro, podendo envolver também profissionais dos Crie para
Não preencher uma informação o caso de acompanhamento e orientações em futuras vacinações. A
na Ficha de Notificação, ou investigação envolve as etapas: evolução, fechamento do caso e con-
preenchê-la de maneira errada,
pode resultar em conclusões duta a ser adotada para o cumprimento do esquema vacinal. Todas
não verdadeiras durante a essas etapas correspondem a atividades específicas, que irão requerer
investigação da causa do
evento adverso pós-vacinação.
informações clínicas e exames laboratoriais minuciosos para o fecha-
mento da investigação, podendo esta ser continuada em outros níveis
do serviço.

Os conhecimentos sobre os eventos ocorridos, sua frequência, a asso-


ciação ou não à vacina e a adoção de condutas para prevenir e monito-
rar os EAPV somente serão possíveis por meio de um eficiente Sistema

88
Vigilância epidemiológica em eventos adversos pós-vacinação

Nacional de Vigilância de Eventos Adversos, responsável pela normati-


zação das atividades de notificação e investigação, consolidação e aná-
lise dos casos e divulgação das informações.

Outra questão que deve ser considerada e que vem ganhando desta-
que na atualidade é a dor causada pela vacinação, entendida como
um evento que pode levar à recusa de vacinação. Estima-se que 10%
da população mundial tem medo de agulhas e injeções, conforme cita
Gavura (2010 apud MOREIRA; OLIVEIRA, 2015) ao estabelecer a rela-
ção entre dor e aplicação de vacinas.

Alguns trabalhos desenvolvidos no Canadá e nos Estados Unidos da


América apontam que mais de 85% dos pais acreditam que a dor cau-
sada pela vacinação é responsabilidade do profissional de saúde, que
deve administrar a vacina de forma menos dolorosa. E a preocupação
com a dor, revelada por mais de 25% dos pais, é um fator que interfere
na aceitação da vacinação. Essa recusa influi negativamente na preven-
ção das doenças evitáveis pela vacinação.

Por esse motivo, estudos vêm sendo realizados em escala mundial, e


diversos países já se preocupam com o manejo da dor no momento
da vacinação como um evento passível de ser controlado. Estratégias
como a utilização de soluções orais de glicose, a amamentação antes e
durante a vacinação têm sido recomendadas. Alguns países, embora já
adotem um conjunto de recomendações para redução da dor, não dis-
põem ainda de protocolos específicos para esses casos específicos como,
por exemplo, a Inglaterra, o Canadá e os Estados Unidos. Por isso, é
fundamental que o profissional conheça os estudos que estão sendo
desenvolvidos nessa área e as recomendações dos programas nacionais
de vacinação, para que possa adotar medidas que visem prevenir ou
minimizar quaisquer eventos que possam prejudicar ou interferir na
aceitação da vacinação.

Considerações finais
A tarefa da vigilância epidemiológica dos eventos adversos pós-vaci-
nação é realizar o monitoramento desses eventos de forma a permitir
que os benefícios alcançados com a utilização das vacinas sejam sempre
superiores a seus possíveis riscos.

Diversos países mantêm sistemas de vigilância e investigação de


eventos adversos pós-vacinação, considerando que o monitoramento
adequado e a investigação oportuna e competente são de fundamen-
tal importância para a manutenção da confiança nos programas de

89
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

imunizações. Essa confiança se pauta no cumprimento de seus objeti-


vos, que orientam a tomada de medidas que asseguram a melhor rela-
ção de risco-benefício para a população vacinada.

A vigilância dos eventos adversos mantém, desse modo, a confiabili-


dade dos imunobiológicos utilizados no PNI junto à população e aos
profissionais da saúde, procurando usar vacinas cada vez mais seguras
e menos reatogênicas.

O papel do profissional de saúde é essencial nesse processo, visto que a


identificação e o monitoramento dos eventos são atividades fundamen-
tais para o funcionamento do Sistema Nacional de Vigilância de Even-
tos Adversos Pós-Vacinais, um sistema em construção cujo aperfeiçoa-
mento ocorre dia a dia, com a contribuição dos profissionais envolvidos
com a vacinação. É por tudo isso que você, trabalhador da saúde, é tão
importante no processo!

Referências
ARAUJO, T. M. E. Análise dos eventos adversos pós-vacinais ocorridos em Teresina. Revista Brasileira
de Enfermagem, Brasília, DF, v. 60, jul./ago. 2007.

BAHIA. Secretaria da Saúde. Coordenação do Programa Estadual de Imunizações. Manual de


procedimento para vacinação. Salvador, 2011.

BALLALAI, Isabella. Manual prático de imunizações. São Paulo: Ac. Farmacêutica, 2013.

BISETTO, L. H. L. et al. A prática da enfermagem frente aos eventos adversos pós-vacinação. Revista
da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 45, n. 5, p. 1128-1134, 2011.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM n. 1.271, de 6 de junho de 2014. Diário Oficial da União,
Brasília, DF, 9 jun. 2014. Seção 1, p. 67.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Portaria n. 33, de 14 de julho de


2005. Inclui doenças à relação de notificação compulsória, define agravos de notificação imediata
e a relação dos resultados laboratoriais que devem ser notificados pelos Laboratórios de Referência
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92
4. Avaliação da vacinação
Cláudia Othero Nunes Abreu

Indiscutivelmente, hoje a vacinação constitui-se na principal estratégia


de prevenção e combate às doenças imunopreveníveis. Para que ela
aconteça, uma série de procedimentos é necessária e deve ser execu-
tada, de forma organizada e articulada, em todos os níveis ou instâncias
que envolvem esta atividade, desde a unidade básica de saúde/instância
local até as municipais, estaduais e nacional. Uma forma de assegurar
que isso ocorra é a realização de monitoramento e avaliação sistemática
dos procedimentos que envolvem as atividades de vacinação.

O monitoramento e a avaliação irão fornecer elementos sobre essas ati-


vidades, permitindo que sejam ajustadas, reorganizadas, ou até mesmo
adotados outros procedimentos/ações, de modo que a vacinação ocorra
de forma segura e eficaz e contribua, efetivamente, para a melhoria do
quadro de saúde pública brasileira. Através da avaliação será possível
verificar e acompanhar os resultados e o impacto do trabalho desenvol-
vido, de modo que sejam realizados os ajustes necessários e estabeleci-
das as estratégias para o alcance dos objetivos.

Este capítulo visa apresentar os principais aspectos relacionados ao


monitoramento e à avaliação das atividades de vacinação, os indicado-
res mais usados no PNI, sua importância para a elaboração das estraté-
gias de vacinação e forma de utilização, em cumprimento aos objetivos
e às metas propostas pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI).
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Processo de avaliação das ações de


imunização
A avaliação como uma forma de julgamento e de análise diagnóstica
para detecção de problemas é realizada nas ações de vacinação tendo
por base e diretriz os objetivos e metas do PNI, a saber:
G vacinar o maior número de pessoas com qualidade e segurança,
contribuindo para a redução da morbimortalidade; e
G vacinar 100% da população infantil o mais precocemente possível,
buscando, como objetivo geral, a proteção universal (BRASIL,
2014).

Para que esses objetivos sejam alcançados, são estabelecidas metas. Meta
é a quantificação do objetivo e deve ser perseguida em todas as etapas
e instâncias do sistema de vacinação, especialmente no que se refere ao
Como a estimativa é alcançar trabalho articulado entre os profissionais da vacinação e os da rede de
o mais alto nível de cobertura
e de forma homogênea, os
frio. Em vacinação, as metas principais são definidas em percentuais de
profissionais da saúde devem cobertura, os quais, por sua vez, são estabelecidos com base nas carac-
atentar para o fato de que terísticas epidemiológicas das doenças e nas características da vacina.
obter um percentual de 90%
a 95% não significa atender
à meta pretendida, mas sim Embora sejam produzidas com alto grau de segurança e confiabilidade,
o percentual mínimo a ser as vacinas necessitam de uma rede de procedimentos que funcione,
alcançado para controle,
erradicação ou eliminação das
em todas as suas etapas, de forma eficiente e articulada, para garantir a
doenças imunopreveníveis. proteção desejada e atingir outras metas, como redução da ocorrência
de eventos adversos pós-vacinação (EAPV), satisfação dos usuários etc.

Para se atingir as metas da vacinação, é necessário realizar o registro


dos dados e proceder ao monitoramento, por meio de métodos e da
construção e análise de indicadores. A seguir, serão apresentadas essas
etapas, de forma mais detalhada.

Registro
O registro dos dados relacionados O registro das atividades de vacinação deve ser realizado em todas as
à vacinação e aos imunobiológicos instâncias do programa de imunizações, principalmente para fornecer
é concentrado, atualmente,
no Sistema de Informações do dados que auxiliem o acompanhamento, a análise e a consequente ava-
Programa Nacional de Imunizações liação do trabalho desenvolvido e de seus resultados. É realizado por
(SI-PNI), que é abordado no
próximo capítulo.
meio de instrumentos específicos, que servem de base de dados para
alimentar o sistema de informação (SI) e podem ser de diversos tipos:
formulários, fichas, boletins, mapas, gráficos etc., dispostos em meio
físico ou on-line. Depois de consolidados pelos municípios, os dados são
encaminhados para as demais esferas de gestão, até o nível nacional.
Como exemplo, no Anexo A, temos a ficha de registro do vacinado.

94
Avaliação da vacinação

É fundamental registrar todas as atividades de vacinação, sejam elas


diárias, mensais, campanhas, busca de faltosos, monitoramento rápido
de cobertura vacinal etc. As informações e/ou relatórios gerados pelos
variados registros permitem o acompanhamento e a avaliação das ações,
com consequente definição/redefinição das estratégias de vacinação.

São os registros que fornecem dados para avaliação e subsidiam a aqui-


sição de imunobiológicos e insumos necessários para a execução ade-
quada das atividades do programa. Por isso, as consequências de um
registro mal realizado são graves.

Monitoramento e avaliação
Monitorar significa seguir, acompanhar. O monitoramento das ativida-
des de vacinação, portanto, objetiva o acompanhamento dessas ativida-
des e da cobertura vacinal, verificando:
G se as metas foram alcançadas;
G em que medida a população-alvo foi atendida;
G se o resultado está de acordo com o planejado e preconizado,
incluindo a utilização de todos os recursos: materiais e humanos.

Avaliar, por sua vez, significa fazer um julgamento, uma comparação


ou julgamento de valor (BAHIA, 2011); comparar um serviço, uma
ação/atividade/procedimento com algo considerado ideal, ou com
algum referencial. A avaliação detecta problemas que interferem na
execução das atividades e redefine novas estratégias.

A avaliação deve ser executada em todas as instâncias do Programa


Nacional de Imunizações, porque oferece subsídio para a programação
das atividades de vacinação. No processo de avaliação em saúde, con-
sidera-se, entre outros aspectos, a situação de saúde da população, as
condições socioeconômicas, o grau de organização dos serviços e sua
capacidade e resolutividade.

Para os profissionais da rede de frio, a avaliação é fundamental e deve


ser desenvolvida nas diversas etapas do seu trabalho (armazenamento,
conservação, distribuição etc.). Essas etapas se relacionam e se com-
plementam, devendo ocorrer com total precisão para que o resultado
esperado seja alcançado: a manutenção da propriedade e qualidade do
imunobiológico oferecido à população, garantindo o controle e a redu-
ção das doenças imunopreveníveis.

95
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Todas essas ações deverão ser O monitoramento e a avaliação devem ser realizados de forma contínua
registradas, conforme discutido no
item anterior.
e sistemática. Para tanto, é necessário dispor de métodos, instrumen-
tos e indicadores precisos, que expressem o conjunto das atividades da
vacinação em todas as instâncias. A partir dos resultados do monitora-
mento e da avaliação é que os profissionais irão verificar a necessidade
de elaborar e desenvolver novas estratégias, como campanhas, vacina-
ção de bloqueio, atividades extramuros, vacinação casa a casa e/ou de
grupo específicos etc.

Ilustração: Wagner Magalhães Paula


Métodos de avaliação
No processo de monitoramento e Diversos mecanismos/métodos de avaliação são utilizados nas ativida-
avaliação da vacinação, também
des de vacinação. Abordaremos alguns deles a seguir.
são utilizados indicadores, como
cobertura vacinal, homogeneidade,
taxa de abandono, registro das
doses aplicadas etc. Eles são
Supervisão
abordados mais adiante.
É um instrumento gerencial para o acompanhamento, o levantamento
dos problemas e a orientação das ações e atividades. No âmbito do PNI,
o processo de supervisão pode, também, monitorar:
G a disponibilidade de imunobiológicos – necessidades, falta dos
produtos, controle e descarte;
G as coberturas vacinais das campanhas e da vacinação de rotina,
identificando, assim, bolsões de suscetíveis;
G a adequação dos equipamentos e dos materiais para a conservação
das vacinas etc.

96
Avaliação da vacinação

O profissional da rede de frio, nas instâncias local, municipal e regional


ou estadual, frequentemente está envolvido com atividades de super-
visão. Exemplos disso são a verificação semanal, quinzenal ou mensal
do estoque e da organização dos imunobiológicos, bem como o acom-
panhamento sistemático do estado geral dos equipamentos de refrige-
ração etc. Tais ações permitem o levantamento de possíveis problemas
no estoque de imunobiológicos e nas condições dos equipamentos,
assim como a detecção precoce da necessidade de solicitar mais ou
transferir imunobiológicos, ou de realizar reparos ou trocas nos equi-
pamentos. Como consequência da supervisão, evitam-se, respectiva-
mente, perdas de vacinas e falhas na conservação da temperatura dos
imunobiológicos.

Para refletir
Como você avalia que possa contribuir para uma supervisão eficaz no
seu processo de trabalho, considerando o objetivo final de manter a
qualidade dos imunobiológicos e contribuir para uma boa cobertura
vacinal da população?

Importante!
A supervisão, como um dos métodos de avaliação, deve ser realizada
de forma cooperativa, conjunta e planejada; seus resultados devem
ser sistematizados em relatórios objetivos e sucintos, de acordo com o
propósito para a qual foi planejada.

Monitoramento rápido de cobertura (MRC)


É uma importante estratégia de vigilância das doenças imunopreve-
níveis, visto que sua metodologia permite obter dados reais sobre a
cobertura vacinal, por meio de inquérito ou levantamento de campo.
Ocorre escolhendo-se, inicialmente, por meio de sorteio aleatório, uma Ambos os métodos (MRC e
microárea de um território para ser visitada. No local, é verificada a supervisão) contribuem para a
eficiência do monitoramento
situação vacinal das crianças residentes. Caso alguma delas não esteja e da avaliação das ações de
com o cartão vacinal em dia, a administração da vacina é realizada vacinação.
naquele momento.

O MRC é de fundamental importância para as áreas de difícil acesso,


onde o registro é deficiente, a caracterização da população-alvo por
área de abrangência é inexistente, e onde haja movimentos migrató-
rios ou processos de imigração/emigração. Nesse contexto, constitui,

97
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

portanto, importante estratégia, para o gestor e a equipe, obter dados


sobre a população vacinada, bem como proceder à vacinação, garan-
tindo proteção daquele grupo/comunidade.

Para a realização do MRC, temos que observar alguns pontos como:


G determinação da composição da amostra representativa da
população a ser avaliada;
G elaboração do instrumento para a coleta das informações;
G estabelecimento das regras para aplicá-lo corretamente;
G preparação dos mapas da localidade;
G detalhamento dos quarteirões ou aglomerados rurais;
G facilidade na localização dos domicílios sorteados na amostra
(território em saúde);
G capacitação da equipe que fará as entrevistas;
G definição da equipe que analisará os dados coletados;
G estimativa da cobertura vacinal da área sorteada etc.

Como todo método, o MRC apresenta aspectos positivos e negativos.


Vantagens da sua utilização estão na ausência de sub-registro e rapidez
na obtenção dos dados. Entretanto, é de elevado custo operacional,
Outro método sensível requer pessoal especializado para formular o inquérito, coordenar a
e prático para o execução e analisar os dados.
acompanhamento contínuo
dos indicadores de cobertura
vacinal, em determinado
período, é o registro gráfico Exemplos de questões da prática respondidas pelo MRC
de cobertura vacinal. Para
conhecê-lo, acesse: http://
1. A atividade de vacinação está em conformidade com as normas e os
tabnet.datasus.gov.br/tabdata/ procedimentos recomendados?
livroidb/Com2007/Com_F13.
pdf e http://bvsms.saude.gov. 2. A equipe está utilizando todos os recursos disponíveis para superar
br/bvs/publicacoes/livro_30_ dificuldades e transpor obstáculos?
anos_pni.pdf
3. Até que ponto o trabalho de vacinação está atingindo a população-alvo?

Indicadores
A definição de indicadores é
apresentada no Capítulo 5, No contexto do PNI, utilizamos indicadores buscando analisar os resul-
“Indicadores de saúde e sistemas
tados obtidos e o impacto causado pelas ações do programa. Em vacina-
de informação em saúde:
instrumentos para analisar a ção, o principal indicador é o índice de cobertura vacinal que, associado
saúde da população”, do livro aos demais, permite o alcance do principal objetivo: aumentar a cober-
Rede de Frio: fundamentos para a
compreensão do trabalho (Silva; tura vacinal de forma homogênea e reduzir a morbimortalidade dos
Flauzino; Gondim, 2016). diversos grupos suscetíveis. A seguir detalharemos um pouco mais esse

98
Avaliação da vacinação

indicador, bem como outros também utilizados pelo PNI para monito-
rar as ações de vacinação.

Indicador de cobertura vacinal Sejam quais forem os


indicadores, é preciso
conhecê-los, compreender
É expresso pelo percentual de pessoas vacinadas (com uma vacina como são utilizados e a forma
específica), em determinado espaço geográfico e em determinado de calculá-los para que as
período. Por meio desse indicador, pode ser estimado o nível de prote- ações de vacinação possam
ser corretamente planejadas,
ção da população contra doenças evitáveis pela imunização, mediante monitoradas e avaliadas.
o cumprimento dos esquemas de vacinação específicos. Por exemplo,
para vacinas de apresentação unidose (vacinados com uma dose), con-
sidera-se o único evento de vacinação existente, enquanto, para vaci-
Esse é o caso da hepatite B, cujo
nas multidose, considera-se o quantitativo de vacinados com a última esquema completo corresponde à
dose preconizada no esquema. aplicação de três doses.

A construção do indicador de cobertura vacinal é feita por meio das


doses aplicadas e a população-alvo a vacinar.

Como fazer o cálculo da cobertura vacinal?


Após verificar, no Sistema de Informações SI-PNI, o número de doses
administradas em uma população-alvo específica (grupo/faixa etária), de
determinado local e período, e também o total da população desse mesmo
grupo, aplicar os dados na seguinte fórmula:

no de doses aplicadas em determinada


Taxa de população-alvo
cobertura = x 100
no total de indivíduos da população-alvo

Por exemplo: o número de doses da vacina tríplice viral administrada na


população de determinado município, em 2014, foi 245. Esse município
tem 246 habitantes na faixa etária de 1 ano, que é alvo de vacinação.
Nesse caso, a taxa de cobertura de vacinação é:

245
Taxa de cobertura = x 100 = 99,5%
246

Nota: o denominador para o cálculo da cobertura vacinal é diferente


quando se trata de grupo menor de 1 ano de idade. Nesse caso, devem-se
utilizar dados do sistema de informação sobre nascidos vivos (Sinasc), do
último ano disponível.

Outros métodos podem ser utilizados para avaliação da cobertura,


Titulagem de anticorpos refere-
como, por exemplo, a titulagem de anticorpos, que permite saber a se à medição de concentração
situação imunológica, e o levantamento do registro individual, reali- de anticorpos no sangue.

99
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

zado com base no arquivo das informações sobre o vacinado, existente


nas unidades de saúde.

Indicador homogeneidade
De acordo com o Manual de procedimentos para vacinação (FUNDAÇÃO
NACIONAL DA SAÚDE, 2001), “a redução da morbidade e da mortali-
dade por doenças imunopreveníveis somente será possível se os indica-
dores de cobertura forem mantidos elevados e homogêneos”.

Tal como o de cobertura vacinal, o indicador de homogeneidade desem-


penha importante papel no monitoramento e na avaliação das ações
de imunização, porque permite identificar grupos ou áreas de risco.
Convém destacar que a meta a É expresso pela proporção de unidade territorial (municípios, bairros,
ser alcançada para vacinação é territórios ou área abrangente) que atingiu a cobertura vacinal. Em
universal e deve ser de 100%,
tendo como meta mínima
outras palavras, o quanto (em percentual) determinado lugar teve de
estabelecida o percentual de cobertura vacinal. Podemos afirmar que houve homogeneidade quando
95%! 70% ou mais das unidades territoriais avaliadas alcançaram a cobertura
estabelecida para aquelas áreas.

Como fazer o cálculo do indicador de homogeneidade?

no de municípios com coberturas


para determinada vacina
Homogeneidade = x 100
no total de municípios

Fonte: Manual de normas e procedimentos para vacinação (BRASIL, 2014).

Os bolsões de não vacinados Este indicador é uma ferramenta de avaliação fundamental, pois per-
se formam pela falta de mite que equipe e gestores possam:
acesso à vacinação ou pelo
abandono dos esquemas G identificar, em caso de baixa homogeneidade, os grupos de
vacinais. É importante cobrar
dos responsáveis a garantia do suscetíveis (bolsões de não vacinados), as áreas de risco e/ou de
acesso à vacinação e investigar exclusão e as pessoas com dificuldade de acessar os serviços de
as razões do abandono da
saúde (maior concentração da população em estado de pobreza, de
vacinação, para se adotar
medidas que evitem o acúmulo migração);
de suscetíveis e a formação
desses grandes bolsões, G realizar as intervenções necessárias para redução ou eliminação
que possam comprometer o do problema por meio de várias estratégias (busca de faltosos,
controle epidemiológico da
doença. campanhas de vacinação extramuros, monitoramento
domiciliar etc.).

100
Avaliação da vacinação

Indicador de utilização das vacinas


Avaliar a utilização do imunobiológico no nível local, verificando se Aproveitar 100% das vacinas
houve desperdício/perdas pela alteração de temperatura ou procedi- recebidas é uma meta difícil
de alcançar, mas que deve ser
mento incorreto, demonstra como o trabalho vem sendo realizado na permanentemente perseguida.
rede de frio e nas salas e demais locais de vacinação, possibilitando
intervenção.

Este indicador é expresso pela seguinte fórmula matemática:

Cálculo do indicador de utilização de vacinas


no de doses administradas
Taxa de aproveitamento = x 100
no de doses distribuídas

O indicador de utilização das vacinas é importante instrumento de ava-


liação das atividades e pode sofrer interferência de alguns fatores, por
exemplo, a perda das vacinas. As perdas podem ser de dois tipos:
G técnicas, quando decorrentes da abertura de frasco de multidose,
em que vence o prazo de uso depois de aberto, como BCG,
poliomielite etc.;
G físicas, quando decorrentes de quebra de frasco, vencimento de
prazo de validade do fabricante ou por problemas na rede de frio.

Alguns cuidados para evitar perdas de vacinas


As perdas podem ser diminuídas ou eliminadas pela aplicação e zelo
de normas e padrões técnicos estabelecidos pelo PNI. Vejamos alguns Para melhor conhecer a forma
cuidados que podem ser tomados: de realizar os cálculos e as
normas e os procedimentos
• O profissional de saúde deve conhecer o prazo de validade dos técnicos para evitar perdas de
imunobiológicos, bem como as recomendações dos laboratórios vacinas, consulte o Manual
de normas e procedimentos
produtores. Deve utilizar sempre, primeiramente, os imunobiológicos com para vacinação (BRASIL, 2014),
prazos mais curtos. disponível em: http://bvsms.
saude.gov.br/bvs/publicacoes/
• No próprio frasco da vacina devem ser registrados data e horário de sua manual_procedimentos_
abertura, abrindo-o no momento de recebimento do primeiro cliente e vacinacao.pdf
sempre de acordo com a demanda.
• Quando não for possível obter dados confiáveis sobre a população
a vacinar, o quantitativo de vacinas necessário deve ser levantado
utilizando-se o cálculo de percentuais de população, conforme os
parâmetros estabelecidos pela Organização Pan-Americana da
Saúde (Opas).

101
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Taxa de abandono
Possibilita a avaliação da proporção de vacinas aplicadas que não com-
pletaram o esquema básico. É expressa pelo percentual de pessoas
que não chegaram a completar o mínimo de doses do esquema para
uma vacina específica. Seu cálculo pode ser realizado diretamente pelo
SI-PNI, com uso da seguinte fórmula:

Cálculo da taxa de abandono


no de primeiras doses – no de terceira dose
Taxa de abandono =
no de terceira dose

Para permitir o acompanhamento e a análise da taxa de abandono,


alguns parâmetros foram estabelecidos:
G taxas maiores que 10% são consideradas altas;
G de 5% a 10%, taxa média;
G menor que 5%, parâmetro aceitável.

Diversos fatores podem contribuir para que as pessoas estejam incom-


pletamente vacinadas, como desinformação, receio de ocorrência de
eventos adversos causados pelas vacinas, dificuldade de acessar a uni-
dade de saúde nos horários estabelecidos, enfim, uma gama de situações
às quais a equipe deve estar atenta. O acompanhamento por meio deste
indicador permite intervir precocemente nas causas, evitando acúmulo
de suscetíveis e formação de bolsões, os quais comprometem o controle
epidemiológico das doenças preveníveis por vacinação.

Indicadores de qualidade
Permitem avaliar vários aspectos como:
G acessibilidade: revela a quantidade dos serviços disponíveis à
população, as dificuldades financeiras e de acesso aos serviços,
as barreiras físicas e geográficas, as questões estruturais etc. que
impedem o usuário de receber a vacina; a análise desse indicador
deve ser realizada com base nas necessidades da população e nas
condições de utilização dos serviços de saúde;
G satisfação do usuário: demonstra a percepção da população sobre o
serviço prestado, no que diz respeito à relação entre o profissional
de saúde e o paciente, à infraestrutura do serviço e ao significado
de saúde e doença; para o gestor, importa conhecer o que pensa

102
Avaliação da vacinação

o usuário porque a decisão de se vacinar ou não depende de sua


vontade e interesse e, caso não esteja satisfeito com o serviço
oferecido, pode não aderir à vacinação;
G resolutividade: se expressa em duas dimensões – a quantitativa
(capacidade de resolver quantitativamente serviços requeridos
pela população) e a capacidade de solução do problema o mais
próximo de onde ele acontece. Esse indicador está diretamente
relacionado com a capacidade de gestão da rede regionalizada,
da sua organização, do funcionamento do sistema de referência e
contrarreferência etc.

Outros parâmetros podem ser utilizados na avaliação das atividades,


como o grau de eficiência e eficácia. A eficácia é verificada pelo grau
alcançado por uma ação em relação ao resultado proposto, isto é, resul-
tados X efeitos (por exemplo, eficácia da vacina). Já a eficiência refere-
-se a atingir o resultado com um mínimo de perda de recursos, isto
é, fazer o melhor uso possível do dinheiro, do tempo, de materiais e
pessoas.

Os estudos sobre custo-benefício e custo-eficácia são importantes,


porque comparam os pontos positivos e negativos das estratégias ado-
tadas. Quando se realiza a análise custo-benefício, as consequências
positivas (benefícios) são avaliadas, e seus custos são medidos em uni-
dades monetárias. Já na análise do custo-eficácia, o resultado também
é medido pelas consequências positivas, mas o custo é medido em
elementos como dias de doença evitados, anos de vida poupados, óbitos
evitados etc.

Para uma avaliação da vacinação é importante realizar a análise de


custos, por exemplo, levar em consideração o custo de implantação de
novas salas de vacinação em relação ao custo de montagem de equipes
móveis, o custo das estratégias adotadas em relação ao impacto alcan-
çado. Na análise do custo, o maior objetivo é a redução do gasto sem
perder a eficácia. A análise de custos ajuda a estabelecer a quantidade
dos recursos necessários para o alcance das metas. Em ambas, serão
avaliados os resultados alcançados, constituindo-se em um importante
instrumento de avaliação (BAHIA, 2011).

Considerações finais
A avaliação é de fundamental importância para as atividades de vaci-
nação, devendo ser realizada sistematicamente no conjunto das ações
da atenção básica.

103
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Configura-se como um poderoso instrumento no julgamento e na aná-


lise das atividades de vacinação, contribuindo para que as ações ado-
tadas sejam revisadas, bem como novas estratégias sejam implemen-
tadas. A partir dos seus resultados, todos os envolvidos e responsáveis
pelas atividades de vacinação, como profissionais, gestores etc. poderão
melhor conduzir as ações. Isso significa escolher as estratégias mais
indicadas para aquela população-alvo da área ou do território especí-
fico e adequar as ações às especificidades locais, permitindo, assim, a
manutenção de coberturas acima do mínimo preconizado.

A avaliação deve ser entendida como uma ferramenta de uso contínuo,


aplicável em todas as instâncias, a partir da premissa de que a avaliação
não deve ser realizada somente no fim das atividades, mas durante todo
o processo. Dessa forma, fornece elementos que permitem ajustes e
construção de parâmetros que balizem escolha de caminhos e diretrizes
adequadas aos objetivos da vacinação e do Programa Nacional de Imu-
nizações: imunizar toda a população, garantindo a vacinação universal,
em consonância com um dos princípios do SUS.

Para subsidiar a avaliação e fornecer as informações necessárias para a


construção e o cálculo dos indicadores, temos um importante instru-
mento: o Sistema de Informações do PNI (SI-PNI), que será apresen-
tado no capítulo seguinte.

Referências
BAHIA. Secretaria da Saúde. Coordenação do Programa Estadual de Imunizações. Manual de
procedimento para vacinação. Salvador, 2011.

BRASIL. Ministério da Saúde. Sistema de planejamento do SUS (PlanejaSUS): uma construção


coletiva: trajetória e orientações de operacionalização. Brasília, DF: Organização Pan-Americana
da Saúde, 2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/planejaSUS_livro_1a6.
pdf.> Acesso em: 9 nov. 2015.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Curso de atualização para trabalhador da sala de vacinação: manual do
aluno. 3. ed. rev. e ampl. Brasília, DF, 2013.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília, DF, 2014.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância


Epidemiológica. Manual técnico-operacional: campanha nacional de vacinação para eliminação da
rubéola, no Brasil. Brasília, DF, 2008.

FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE (Brasil). Manual de procedimentos para vacinação. 4. ed.


Brasília, DF, 2001.

104
Avaliação da vacinação

LUHM, K. R.; WALDMAN, E. A. Sistemas informatizados de registro de imunização: uma revisão


com enfoque na saúde infantil. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília, DF, v. 18, n. 1,
p. 65-78, jan./mar. 2009.

MORAES, J. C. et al. Qual é a cobertura vacinal real? Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília,
DF, v. 12, n. 3, p. 147-153, set. 2003.

MOTA, E. Inquérito domiciliar de cobertura vacinal: a perspectiva do estudo das desigualdades


sociais no acesso à imunização básica infantil. Revista Brasileira de Epidemiologia, São Paulo, v. 11,
p. 125-128, maio 2008. Suplemento 1.

SILVA, M. N.; FLAUZINO, R. F.; GONDIM, G. M. M. (Org.). Rede de frio: fundamentos para a
compreensão do trabalho. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2016.

105
Anexo A – Ficha de registro do vacinado
Motivo de indicação Continuação Motivo de indicação
1 Abuso sexual 55 Prematuridade
2 Acidente c/ mat. biológico positivo/fortemente suspeito de infecção 56 Prevenção da infecção perinatal pelo vírus HB
por VHB
57 Profilaxia após exposição de risco
3 Adultos com HIV/AIDS portadores do VHB ou VHC
58 Profissional de saúde
4 Asma grave
59 Receptores de transplante de medula óssea
5 Asma moderada
60 Risco de tétano neonatal
6 Asplenia anatômica ou funcional e doenças relacionada
61 síndrome nefrótica
7 Candidatos a transplante de órgão sólido
62 Subst. de vacinas bacterianas por DTPa+Hib
8 Cardiopatias crônicas
63 Suscetibilidade à doença e imunocompetentes em convívio
9 Cardiopatias em < 2 anos imunodeprimidos
10 Coagulopatias 64 trabalhadores de campanhas de esgoto sanitário
11 comunicantes domiciliares de imunodeprimidos 65 Transplante de medula óssea
12 comunicantes sexuais de portadores de HVB 66 Transplante de órgão sólido
13 Contato domiciliar 67 Trissomias
14 contato hospitalar 68 Uso crônico AC Acetil Salicilico
15 controle de surto de varicela em ambiente hospitalar 69 Viajante
16 convívio com portadores de VHB 70 Processo jurídico
17 Crianças <13 anos com HIV/AIDS 71 Não informado
18 Deficiência isolada de imunidade humoral e celular preservada Especialidade do Solicitante
19 Dermatopatias graves 1 Cirurgião dentista
20 Diabetes mellitus 2 Cirurgião dentista odontopediatria
21 Doadores de órgãos sólidos ou de medula óssea 3 Clinica geral
22 Doadores de sangue 4 Dermatologia
23 Doença convulsiva crônica 5 Enfermeiro
24 Doença de depósito 6 Geriatria
25 doença neurológica crônica incapacitante 7 Gerontologia
26 Encefalopatia (7 dias subsequentes à vacinação com vacina bacteriana) 8 Ginecologia
27 Evento adverso prévio 9 Hansenologia
28 Fibrose cística (mucoviscidose) 10 Hematologia
29 filho de mãe HIV+exposto 11 Infectologia
30 Fístula liquórica 12 Médico residente
31 Hemoglobinopatias 13 Nefrologia
32 Hepatopatias crônicas e portadores de Hepatite C 14 Neonatologia
33 HIV/AIDS 15 Neurocirurgia
34 Hospitalizado 16 Neurologia
35 Implante de clóquea 17 Obstetrícia
36 Himunocompetente > 1 ano contato hospitalar 18 Otorrinoralingologia
37 Imunodeficiência adquirida 19 Pneumologia
38 Imunodeficiência congênita 20 Reumatologia
39 Imunodefi ciência congênita da unidade humoral (particularmente do
complemento de lectina fixadora de mamose) 21 Saúde da família
41 Imunodeficiência devido a câncer ou imunossupressão terapêutica 22 Serviço de alergista
42 Imunodepressão terapêutica 23 Serviço de atend. ao diabético
43 Imunodepressão terapêutica ou devido a câncer 24 Serviço de atend. de hanseníase
44 Imunodeprimidos 25 Serviço de cardiologia
26 Serviço de cirurgia cabeça e pescoço
45 Infectados pelo HIV/Aids (se suscetíveis a varicela, assintomáticos ou
oligossintomáticos) 27 Serviço de cirurgia aparelho digestivo
46 Leucemia linfócita aguda e tumores sólidos 28 Serviço de cirurgia geral
47 Hão soro conversão 29 Serviço de cirurgia ginecológica
48 Hefropatias crônicas/dialisados/síndrome nefrótica 30 Serviço de cirurgia pediátrica
49 Pneumopatias crônicas 31 Serviço de endocrinologia
50 Pneumopatias crônicas em <2 anos de idade (risco de descompensação
em vigência de febre) 32 Serviço de imunologia
51 Politransfundidos 33 Serviço de pediatria
52 Portadores crônicos do VHB
53 Potenciais receptores de múltiplas transfusões de sangue
54 Pré-quimioterapia (protocolos)

Fonte: http://pni.datasus.gov.br/Download/SIPNI/ficha_registro_vacinado.pdf
5. Sistemas de Informações
do Programa Nacional de
Imunizações
Walkyria Hercilia Carneiro e Marileide do Nascimento Silva

Para que os objetivos e metas do Programa Nacional de Imunizações


sejam alcançados, as atividades de imunização devem ser planejadas
e sistematicamente monitoradas e avaliadas, sendo o registro dessas
atividades fundamental nesse processo. Tal registro é realizado em um
sistema informatizado, que facilita o acompanhamento das atividades
por todos os gestores relacionados às ações do Programa Nacional de
Imunizações.

Neste capítulo, apresentaremos o Sistema de Informações do Programa


Nacional de Imunizações (SI-PNI), sua história, funcionamento e sua
utilização em imunização. Além dele, por sua importância para o fun-
cionamento da rede de frio, também abordaremos o Sistema de Informa-
ções de Insumos Estratégicos (Sies), que fornece dados referentes a soli-
citação, distribuição e estoque dos insumos imunobiológicos e seringas.

Criação do Sistema de Informações do PNI


Desde o início das atividades do Programa Nacional de Imunizações,
detectou-se a necessidade de sistematizar as informações sobre vaci-
nação, de forma a se ter dados que possibilitassem a melhor tomada
de decisão no planejamento das ações de imunização. Em 1975, após
a criação do PNI, alguns estados iniciaram essa sistematização com
a implantação de registro de doses de vacinas aplicadas, através do
preenchimento de planilhas impressas, que eram posteriormente enca-
minhadas para a instância nacional de gestão do PNI, o PNI Nacional.

Em 1984, foi introduzido o boletim mensal impresso de doses aplica-


das, e cada estado realizava a consolidação dos dados e enviava, por
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

malote, ao PNI Nacional. Posteriormente, foi necessário fazer o mesmo


para a gestão dos produtos utilizados pelo programa, sistematizando a
movimentação de estoques dos imunobiológicos, o que possibilitou o
planejamento das necessidades e a definição de cronogramas de distri-
buição dos produtos.

As primeiras iniciativas de informatização dos registros de vacinação


datam de 1990, na Região Nordeste, apoiadas pelo Fundo das Nações
Unidas para a Infância (Unicef), que não avançaram por causa da insu-
ficiência de recursos financeiros. Entre 1993 e 1994, essas iniciativas
foram retomadas com o apoio do Departamento de Informática do Sis-
tema Único de Saúde (DATASUS), de modo que, em 1997, o registro
informatizado das informações sobre imunização estava implantado
em todas as unidades federadas.

Até 2012, o registro das informações do Programa Nacional de Imuni-


zações era realizado via subsistemas, que funcionavam isoladamente.
Eles forneciam informações sobre as principais atividades de vacinação.
Os subsistemas eram:
G SI-API: Sistema de Informações de Avaliação do Programa de
Imunizações, destinado ao registro das doses de imunobiológicos
aplicadas, possibilitando construir o indicador de coberturas
vacinais. No âmbito municipal, as informações são desagregadas
ao nível de salas de vacinas. A versão web deste sistema API-WEB
está sendo utilizada como etapa para a implementação do SI-PNI
(Sistema de Informações do PNI).
G Sies: Sistema de Informações de Insumos Estratégicos, que
substituiu o SI-EDI (Sistema de Informações de Estoque e
Distribuição de Imunobiológicos). Registra doses de imunobiológicos
distribuídas e em estoque. É o sistema utilizado na rede de frio.
G SI-AIU: Sistema de Informações de Apuração dos Imunobiológicos
Utilizados. Permite registrar a utilização e perda de imunobiológicos.
G SI-EAPV: Sistema de Informações de Eventos Adversos Pós-
Vacinação. Registra os eventos adversos notificados.
G SI-Crie: Sistema de Informações dos Centros de Referência para
Imunobiológicos Especiais, utilizado para o registro das doses
aplicadas nos usuários desses centros.
G SI-Pais: Sistema de Informações do Programa de Avaliação de
Instrumento. Registra as supervisões que são realizadas pelos
profissionais atuantes no PNI.

Apesar de todos esses sistemas possibilitarem a avaliação regular e sis-


temática dos dados das coberturas vacinais (campanha e rotina), con-

110
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

forme faixa etária, grupo-alvo e imunobiológicos específicos, não havia


dados sobre os vacinados, o que se tornou uma necessidade ao longo
dos anos do programa. Por isso, posteriormente, em 2010, foi desenvol-
vido, pelo DATASUS-RJ, um sistema com entrada individual de dados
e por procedência, o Sistema de Informações do Programa Nacional de
Imunizações, o SI-PNI.

O Sistema de Informações do PNI


O SI-PNI é um sistema que permite, através dos dados cadastrais do
vacinado, acompanhá-lo em qualquer lugar do país, além de viabilizar
uma análise mais consistente dos indicadores das áreas de imunizações
das unidades federativas. Possibilita, também, que todos os subsistemas O acompanhamento,
já mencionados possam ser consolidados em um único banco de dados. a partir do registro dos
imunobiológicos aplicados,
do quantitativo populacional
O SI-PNI tem, entre outros, o objetivo de coletar os dados referentes às vacinado e do controle
atividades de vacinação de forma a gerar informação individualizada, a do estoque, possibilita
aos gestores programar a
partir da instância local, para subsidiar as decisões/ações no âmbito da aquisição e distribuição dos
esfera de gestão. Visa, também, fornecer dados sobre a movimentação imunobiológicos e avaliar
dos imunobiológicos disponíveis na sala de vacinação, proporcionando as estratégias de vacinação,
fazendo os ajustes necessários
aos gestores uma avaliação ágil dos insumos utilizados, subsidiando o para alcance dos resultados
planejamento das ações de vacinação e a alocação de recursos geren- propostos pelo PNI.
ciais (de pessoas, financeiros, materiais). A coordenação, a supervisão
e a atualização desse sistema estão sob a responsabilidade da CGPNI.

Atualmente, os gestores podem utilizar o SI-PNI sem qualquer custo.


O sistema também pode ser instalado em diferentes sistemas opera-
cionais, por conta da tecnologia que é utilizada. Para que possa ser
usado por qualquer gestor da rede pública ou privada, é necessário
comunicar à coordenação de imunizações e elaborar e informar o fluxo
de transmissão dos dados ao PNI, uma vez que essa função está sob a
responsabilidade da coordenação municipal.

Implantação do SI-PNI
O SI-PNI foi implantado em 2010, mas somente a partir de 2012 foi Lembramos que, durante a fase
de implantação do SI-PNI, foi
possível expandir o sistema, com a disponibilização de recursos para utilizado um sistema intermediário,
compra de equipamentos de informática para as salas de vacina. Todos o Sistema de Informações de
os estados e municípios que aderiram à Portaria n. 2.363/2012 rece- Avaliação do Programa de
Imunizações (API-WEB). A compra
beram o recurso para a compra dos equipamentos, tendo, como prazo dos equipamentos necessários
final, o ano de 2014 para implantação do SI-PNI (Ofício Circular n. para a implantação do SI-PNI nas
123/2013- GAB/SVS/MS). salas de vacina foi viabilizada por
recursos alocados pela Portaria
n. 2.363/2012 (BRASIL, 2012).
A Figura 1 demonstra os subsistemas que integram o SI-PNI e as prin-
cipais informações disponibilizadas por ele.

111
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 1 – O SI-PNI

Controle de Vacinas:
Sistema • Lotes
Individualizado:
SI-PNI • Quantidade
• Dados do usuário • Frascos abertos
• Doses aplicadas

Inclui, em um único sistema, os subsistemas que funcionavam isoladamente

AIU API CRIE EAPV

on-line,
Insumos utilizados Coberturas vacinais Doses aplicadas via WEB
INDICADORES
Taxas de abandono Eventos adversos

Vantagens
• Permitir a obtenção de indicadores por município.
• Incorporar outras variáveis importantes para o PNI: estratégia de vacinação
utilizada, pertencimento a grupos populacionais específicos etc.
• Permitir informações sobre a movimentação de imunobiológicos em todos os
níveis do programa.
• Possibilitar informações sobre a mobilidade dos indivíduos, adesão e evasão ao
programa, coberturas vacinais e homogeneidade de coberturas mais reais.
• Estimular a informatização das salas de vacina e socialização das informações.

Fonte: Elaboração do autor.

O SI-PNI foi se modificando ao longo de sua existência, procurando


acompanhar o crescimento do próprio Programa Nacional de Imunizações,
o que resultou em várias versões do software.
Em 2010, o DATASUS-RJ desenvolveu o Sistema de Informações
do Programa Nacional de Imunizações, o SI-PNI, colocando-o em
funcionamento. No entanto, a expansão de utilização desse novo sistema
não pôde ser impulsionada pela falta de equipamentos de informática
em todas as salas de vacina do país.
Em outubro de 2012, com o intuito de auxiliar/subsidiar a compra de
computadores para todas as salas de vacina cadastradas no SI-API e
favorecer a implementação/utilização do SI-PNI, o Programa Nacional de
Imunizações repassou, por meio da Portaria n. 2.363/2012 e do Piso Variável

112
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

de Vigilância e Promoção da Saúde (PVVPS), o valor de R$ 1.500,00 para


as unidades de saúde da rede básica. O objetivo, além da compra de
computadores, era facilitar o entendimento e apoiar a utilização do SI-PNI.
Para auxiliar na capacitação dos profissionais na utilização do novo sistema
de informação, o PNI produziu videoaulas. As videoaulas estão disponíveis
no canal do Ministério da Saúde, no YouTube, pelo link: https://www.
youtube.com/watch?v=UnX--qKPPLk

Funcionamento do SI-PNI
O sistema utiliza dois instrumentos de coleta de dados: um para o regis-
tro de doses aplicadas na sala de vacinação (ficha do vacinado) e outro
para o registro da movimentação das doses de imunobiológicos em
todas as esferas de gestão do PNI.

O sistema permite a entrada de dados por:


G indivíduo: sua procedência, estratégia de vacinação utilizada (rotina,
intensificação, bloqueio, campanha, especial);
G grupos populacionais específicos (quilombolas, privados de
liberdade, indígenas, assentados, população geral);
G mobilidade dos indivíduos;
G adesão ao programa de imunizações e evasão, oportunidade perdida
de vacinação;
G movimentação de imunobiológicos (laboratório produtor,
fornecedor do imunobiológico);
G lotes disponíveis e utilizados;
G utilização de imunobiológicos, inclusive perdas físicas e técnicas;
G aprazamento de vacinação etc.

Além disso, o SI-PNI possibilita que, durante a entrada de dados, o


usuário identifique e corrija inconsistências antes do processamento da
informação e, com isso, permite uma análise qualitativa/quantitativa
mais consistente do programa de imunizações. Tem caráter descentrali-
zado, uma vez que não somente a coleta, mas também a digitação dos
dados, são realizadas no domínio do município.

Disponibilização para o uso do SI-PNI


Como apresentado, uma das vantagens do SI-PNI é a coleta de informa-
ções na esfera municipal pelas pessoas que estão diretamente envolvidas

113
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

com a vacinação. Para utilizar o sistema nas unidades públicas de saúde,


é necessário, apenas, obter autorização das instâncias superiores de
vacinação e dispor dos equipamentos de informática.

Figura 2 – Fluxo de informação do SI-PNI

O SI-PNI permite que qualquer


pessoa interessada nos dados
Base de dados
de imunização do país tenha
Central do SI-PNI
acesso aos relatórios emitidos. Município

Base de dados

Município Município
Central

do SI-PNI
Instrumentos

CG-PNI

Instrumentos Instrumentos
Base de dados

Município CG-
Central
Unidade PNI
Estado do SI-PNI

Regional

Regional Regional
Unidade Unidade Unidade
Instrumentos Estado

CG-
Fonte: Elaboração do autor. Unidade Unidade PNI

Instalação do SI-PNI
O processo de instalação do SI-PNI é bastante simples; é possível acessar
Unidade Regional
o pacote de instalação, esclarecer dúvidas sobre como importar dados
para outros sistemas nominais, desinstalar ou reinstalar o sistema, a Estado

A página do DATASUS partir do site do DATASUS dedicado ao sistema. Pode ser instalado em
Unidade
dedicada ao SI-PNI é http://si- rede, com vários computadores interligados, compartilhando os regis-
pni.datasus.gov.br
tros do SI-PNI.

Como é de fácil instalação, não requer equipamentos sofisticados;


entretanto, recomenda-se o uso de computadores modernos e velozes,
pelo volume de informações gerenciadas pelo sistema. A instalação do
software pode ser feita desde a sala de vacina até o nível central da
gestão do município.

114
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

Ao ser instalado o SI-PNI nas unidades de saúde, todos os sistemas antigos


não devem mais ser utilizados, pois o SI-PNI substitui os sistemas antigos
relacionados à vacinação (apresentados na Figura 1). É importante que
a substituição seja realizada de imediato, para evitar a duplicidade de
informações e o prejuízo da análise dos dados e dos resultados.

Para maior compreensão do funcionamento do sistema, é preciso conhe-


cer cada etapa de sua utilização e como é feito o registro dos dados.

Utilização do SI-PNI
A utilização do sistema e a entrada de dados são possíveis, somente, por
usuários cadastrados. Portanto, para utilizá-lo, o primeiro passo deve
ser o cadastro de todos os operadores, incluindo o usuário com perfil
de administrador, que pode cadastrar os demais operadores, conforme
o nível de habilitação (administrador, digitador, vacinador etc.). Para
cadastrar cada usuário, devem ser informados:
G dados pessoais;
G login e senha;
G tipo de habilitação;
G status (ativo ou inativo);
G nível de instância onde ocorrerá o registro.

O sistema permite a inserção do cadastro de vacinadores por estabele-


cimento, gerando uma tabela de vacinadores por sala de vacina ou ins-
tituição de saúde. O vacinador poderá ser, também, o operador (aquele
que registra no sistema), visto que o sistema identifica quem vacinou O mesmo vacinador pode ser
cadastrado em mais de um
e quem registrou. Fornece, também, a opção de pesquisar antes da
estabelecimento de saúde.
inserção dos dados do usuário, evitando cadastro em duplicidade den-
tro de um mesmo estabelecimento.

Em relação aos dados registrados, o SI-PNI dispõe de um módulo espe-


cífico que visa fornecer informações sobre o vacinado, tais como:
G dados básicos;
G histórico de vacinação com informações sobre todas as vacinas que
foram e serão aplicadas;
G qualidade do registro (se foi realizado corretamente);
G intercorrências na vacinação ou erros de imunização;
G avaliação da caderneta;

115
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G estratégias utilizadas: de acordo com a estratégia selecionada, o


sistema disponibiliza, no campo imunobiológico, uma vacina
específica. Essa inter-relação da estratégia com a vacina ocorre
porque o sistema foi criado para atender a população em geral e,
também, grupos específicos, como indígenas, quilombolas, Centros
de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie) etc.

Utilização do SI-PNI para registro de


movimentação do imunobiológico
O movimento dos imunobiológicos é observado através de um módulo
específico, que registra e disponibiliza os dados para as redes pública e
privada. Isso permite conhecer como o imunobiológico está sendo uti-
lizado nas salas de vacina, ou seja, se há perdas técnicas ou físicas, se há
controle de doses existentes e em estoque, o saldo disponível anterior
e atual, a quantidade distribuída pela rede de frio ou movimentada
na sala de vacina etc. É um módulo completo, que visa registrar toda
a movimentação do imunobiológico, subsidiando o planejamento, o
acompanhamento e a avaliação da programação do PNI, em todas as
esferas ou instâncias de gestão do programa.

A alimentação do módulo é feita pelo preenchimento de boletins de


movimentação dos imunobiológicos. Ao preenchê-los, o profissional
deve estar atento ao uso correto da terminologia:
O uso correto da terminologia G utilizado – frasco aberto para uso;
evita erros no cálculo dos
imunobiológicos disponíveis e G recebido – frasco fechado;
em estoque. Lembre-se: frasco
aberto é considerado frasco G remanejado – transferência de frascos para outro local;
utilizado!
G perda – frasco fechado que não pôde ser usado em função de
alguma ocorrência, como quebra, procedimento ou manuseio
inadequado.

Com o exposto até o momento, podemos indagar: como o profissio-


nal poderia registrar corretamente as inúmeras ocorrências na sala
de vacinas e na rede de frio considerando suas especificidades?

Inicialmente, vamos analisar algumas situações e verificar como proce-


der ao registro de forma adequada.

116
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

Exemplos de ocorrências
Em determinada unidade básica de saúde (UBS), foram recebidos da rede
de frio local, no mês de fevereiro, 1.000 frascos da vacina hepatite B, 300
doses do BCG e 1.500 frascos da poliomielite atenuada, por solicitação da
enfermeira responsável pelo setor de imunização.
No início do mês, na mesma UBS, havia 200 frascos de hepatite B, 200 de
BCG e 500 da poliomielite. E no dia do recebimento mencionado, a UBS
tinha três frascos de hepatite, um de BCG (além dos 300) e um de pólio
em uso. Destes, um frasco de hepatite foi quebrado durante o manuseio e
outro, contaminado na hora de abrir. Por necessidade, outra UBS solicitou
a essa unidade 40 frascos de pólio, que foram enviados.
No fim da tarde, durante o processo de limpeza da sala, a tomada do
refrigerador onde os imunobiológicos estavam armazenados foi desligada.
O fato foi comunicado à coordenação da instância superior, que orientou
para manter o refrigerador com as vacinas fechado, aguardando avaliação.

Com base nas ocorrências apresentadas, podemos verificar:


1. Saldo disponível de imunobiológicos da UBS: corresponde à
quantidade de frascos fechados existentes e os recebidos no início
do mês de movimentação de cada tipo de imunobiológico.
No exemplo:
BCG = 300 + 200 = 500 frascos

Importante!
No SI-PNI, o campo saldo disponível é aberto somente no primeiro
acesso, após a inclusão do primeiro mês de movimentação, tal informação
aparece automaticamente para o usuário do sistema.

2. Frascos recebidos: corresponde à quantidade de frascos recebidos


da rede de frio, do laboratório produtor e outros durante o mês a
que se refere a movimentação.
No exemplo:

BCG = 300 frascos

3. Frascos transferidos: corresponde à quantidade de frascos de cada


imunobiológico que foi remanejada para outro serviço.
No exemplo:

Poliomielite = 40 frascos

117
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Importante!
A unidade que enviou a vacina deve registrar como frasco transferido, e a
que recebeu a vacina, frasco recebido.

4. Frascos utilizados: corresponde ao número de frascos/ampolas de


cada tipo de imunobiológico aberto para uso. A retirada de, pelo
menos, uma dose já o caracteriza como frasco utilizado.
No exemplo:

Hepatite B = 3 frascos
BCG = 1 frasco
Poliomielite = 1 frasco

Se houver alguma intercorrência no processo de preparo, manuseio,


acondicionamento, ou qualquer outra irregularidade, sem que nenhuma
dose tenha sido utilizada, o frasco não pode ser registrado como
utilizado. Seu registro deve ser feito como perda. Isso se aplica às
unidades e/ou salas de vacina e às centrais de rede de frio (problemas no
acondicionamento, transporte etc.).

5. Perdas de frascos: o registro de perda de frasco deve ser feito


conforme o tipo de ocorrência – quebra de frasco, procedimento
inadequado, validade vencida, falta de energia ou falha no
equipamento.
No exemplo:
Hepatite B = 2 frascos

Importante!
• Só podem ser registrados como perda os frascos ou ampolas quebrados
antes de serem utilizados.
• O frasco aberto, com retirada de uma única dose e que veio a quebrar, é
registrado como utilizado, e não quebrado.

6. Falta de energia ou falha no equipamento: refere-se à exposição do


imunobiológico a uma temperatura inadequada, em consequência
da interrupção no fornecimento da energia elétrica ou por
ocorrência de falha mecânica no equipamento que acondiciona
os imunobiológicos (salas de vacina ou centrais de rede de frio).

118
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

Em ambos os casos, a orientação é, primeiramente, comunicar a


ocorrência à instância imediatamente superior, conforme consta no
exemplo apresentado.
Se a orientação for devolvê-lo à instância imediatamente superior,
em condição de temperatura ideal, o registro deve ser frasco rema-
nejado. Se for para desprezar o imunobiológico, o registro deve ser
perda, seja por falha no equipamento ou por falta de energia elétrica.

7. Procedimento inadequado: relacionado com a quantidade de


imunobiológicos perdida por erros nos procedimentos técnicos.
Em nosso exemplo de ocorrências, o desligamento acidental da
tomada do refrigerador é considerado perda por procedimento ina-
dequado. Outros exemplos são: acondicionamento incorreto para o
transporte, quebra do frasco por acondicionamento incorreto, imu-
nobiológico exposto ao sol durante o transporte ou a distribuição,
acondicionamento em refrigerador sem controle de temperatura.

Podem ser registrados como perda os imunobiológicos com aspecto


alterado (alteração na cor, presença de elementos ou corpos estranhos
etc.), frascos sem rótulo etc. Nesses casos, o registro no sistema deve ser
realizado no campo outros motivos.

Há outra situação importante que não foi contemplada em nosso exem-


plo de ocorrências:
8. Validade vencida: refere-se aos imunobiológicos cujo prazo de
validade expirou. Não devem ser registrados como validade vencida
os frascos que, por recomendação do laboratório produtor, têm seu
tempo de validade alterado depois de abertos!

Utilização para registro de doses aplicadas


Nos municípios em que o SI-PNI está implantado, o registro dos dados Naqueles municípios em que
o SI-PNI ainda não tenha sido
sobre as doses aplicadas é feito por usuário, na ficha de registro do
totalmente implantado, o registro
vacinado, processada na própria sala de vacinação ou na Secretaria das doses aplicadas pode ser
Municipal de Saúde. As fichas processadas são armazenadas em um realizado no API-WEB.

banco de dados, do qual é possível extrair o numerador da cobertura


A ficha de registro do vacinado
vacinal. O banco pode ser acessado no município, no estado e no Minis-
encontra-se no Anexo A do
tério da Saúde pela equipe que trabalha no Programa de Imunizações, Capítulo 4, “Avaliação da
das diferentes instâncias. vacinação”.

119
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Utilização para análise de dados


O SI-PNI permite a emissão de relatórios de imunizações com dados
sobre as pessoas que foram vacinadas e os imunobiológicos adminis-
trados. Essas informações podem ser individualizadas, por pessoa ou
imunobiológico, em período e local determinados e por instância.
Inclui-se, também, o relatório sobre os imunobiológicos especiais, com
informações sobre os motivos da indicação de tal vacina e, até mesmo,
a especialidade do solicitante. Esses relatórios são fundamentais para
planejamento, monitoramento, avaliação e adoção das estratégias de
vacinação e se constituem em poderosos instrumentos para o gestor.

Mas como são repassados os dados que subsidiam a tomada de


decisão?

O SI-PNI possui um módulo denominado utilitário, composto por duas


funções: transferência (exportação e importação dos dados) e segu-
rança (backup). Os dados (sobre os vacinados e a movimentação dos
imunobiológicos) são registrados diretamente no sistema e exportados,
de forma segura (por meio de CD, pen-drive, e-mail institucional), pela
instância ou pelo estabelecimento de saúde para a esfera ou instância
municipal, a qual, posteriormente, os envia à instância nacional.

A instituição municipal concentra os dados de todo o município e faz a


exportação por meio de um aplicativo (transmissor) disponível no site
do DATASUS, exclusivo para transmissão de dados do sistema. O acom-
panhamento da transmissão dos dados pode ser realizado pelo gestor,
por meio de relatórios emitidos pelo sistema, que permitem visualizar
as informações de todos os estabelecimentos cadastrados no SI-PNI. A
transferência é, portanto, uma etapa fundamental e deve ser feita com
todo o cuidado, pois é somente dessa forma que os dados poderão che-
gar ao Ministério da Saúde. A Coordenação Geral do Programa Nacio-
nal de Imunizações (CGPNI), da Secretaria de Vigilância em Saúde do
Ministério da Saúde (SVS/MS), depende desses dados para analisar,
elaborar e reorganizar as atividades de vacinação, objetivando alcançar
os objetivos e as metas propostas pelo programa.

O SI-PNI, como qualquer sistema, deve ser atualizado, de modo a acom-


panhar as inovações e mudanças na área de imunizações e no cotidiano
do processo de trabalho. É fundamental que os estabelecimentos de
saúde que trabalham com o SI-PNI utilizem sempre as versões mais
atualizadas do sistema e dados, como tabelas de bairro, fornecidos pelos
órgãos competentes, evitando erros de importação e exportação, com
consequente prejuízo na análise e nos resultados da vacinação.

120
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

A análise, o acompanhamento e a interpretação dos dados do sistema,


nas diferentes instâncias, servirão de parâmetro para a compreensão da
realidade de saúde e doença da população, possibilitando a intervenção
nos processos de gestão das unidades e salas de vacina e na reorganização
da cadeia de frio.

Sistema de Informações de Insumos


Estratégicos (Sies)
Outro sistema utilizado no PNI é o Sies, de grande utilidade nas centrais
e/ou coordenações de rede de frio, para solicitação e dispensação de
insumos. Esse sistema foi desenvolvido com base em outro, que o ante-
cedeu, o Sistema de Informações de Insumos Distribuídos e em Estoque
(SI-EDI), utilizado anteriormente para o registro das doses dos imuno-
biológicos distribuídos e em estoque nas centrais de armazenamento.

O Sies se encontra na versão on-line, permitindo que o PNI possa visualizar Além de atender ao PNI, esse
toda a movimentação de entrada e saída dos imunobiológicos de todas as sistema atende, também, a outras
instâncias; é empregado para o
unidades federadas, em tempo real. Tem como objetivo o gerenciamento gerenciamento de insumos não
dos imunobiológicos, no que se refere a entradas e saídas, controle de utilizados pelo PNI, tais como
medicamentos, inseticidas, kits
pedidos em tempo real, controle de estoque, emissão de relatórios etc. laboratoriais etc.

O pedido de imunobiológicos às centrais de rede de frio pelas unidades de


saúde inclui as demandas de todas as estratégias, como ações de rotina,
campanhas e vacinação extramuros (veja a tela de pedido na Figura 3).
Deve ser realizado de acordo com o cronograma preestabelecido e com a
concordância do PNI, de forma a evitar o desabastecimento de vacinas. A
instância nacional avalia os pedidos dos estados e adequa a distribuição
conforme o estoque disponível, informando e liberando a distribuição
pela Central Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobio-
lógicos (Cenadi).

A utilização desse sistema permite conhecimento específico das deman-


das e grande otimização dos recursos disponíveis, de forma a garantir
o atendimento às metas do PNI de máxima cobertura vacinal possível.

121
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 3 – Tela de solicitação de imunobiológicos do Sies

Fonte: DATASUS (acesso restrito).

Considerações finais
O conhecimento e a atualização técnica da equipe, a adequação da rede
de frio, os registros confiáveis, o sistema de informações eficiente, a dis-
ponibilidade de imunobiológicos e insumos e a participação da comuni-
dade são pontos fundamentais para o bom desenvolvimento das ações de
vacinação, em qualquer instância do Programa Nacional de Imunizações.

Para o melhor desempenho dos serviços de saúde, as ações de vacinação


exigirão planejamento, infraestrutura adequada e avaliação, visando a
um bom resultado. A utilização adequada dos sistemas que apresen-
tamos (SI-PNI e Sies) pelos profissionais da rede de frio fornecerá ao
Programa de Imunizações informações precisas para uma adequada
tomada de decisão na aquisição de imunobiológicos e demais insumos,
garantindo êxito nas atividades de vacinação.

122
Sistemas de Informações do Programa Nacional de Imunizações

É uma responsabilidade compartilhada. De um lado, gestores e o


governo devem permitir que os profissionais envolvidos nas ativida-
des, em qualquer instância do sistema, sejam capacitados e informados;
devem adotar políticas que incentivem e possibilitem a formação e a
capacitação dos profissionais, investindo e equipando os locais de tra-
balho ou as unidades de saúde. De outro, é necessário, também, que
o profissional envolvido com as atividades de rede de frio e vacinação
tenha clareza da importância da atuação qualificada e comprometida
em relação aos registros dos dados.

Referências
BRASIL. Ministério da Saúde. Manual do sistema de informação do Programa Nacional de
Imunizações. Brasília, DF, 2012.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 2.363, de 18 de outubro de 2012. Diário Oficial da União,
Brasília, DF, 19 out. 2016.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual do sistema de informação


do Programa Nacional de Imunizações: SI-PNI. Brasília, DF, fev. 2014.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual para registro de doses
aplicadas no sistema de informação on-line de avaliação do programa de imunização: APIWEB.
Brasília, DF, jul. 2013.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Ofício circular n. 123/2013


GAB/SVS/MS. Enviado aos Secretários de Estaduais de Saúde, estabelece como prazo final, para
implantação do SIPNI aos municípios e estados que aderiram à Portaria n. 2.363, o dia 31 de
dezembro de 2013. Brasília, DF, 2013.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual para registro de doses
aplicadas no sistema de informação on-line de avaliação do programa de imunização: APIWEB.
Brasília, DF, fev. 2014.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de Imunizações:


30 anos. Brasília, DF, 2003.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Curso de atualização para trabalhador da sala de vacinação: manual do
aluno. 3. ed. rev. e ampl. Brasília, DF, 2013.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância


Epidemiológica. Manual do usuário do SI-EAPV. Brasília, DF: DATASUS, 2003.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância


Epidemiológica. SI-AIU Sistema de apuração de imunobiológicos utilizados: manual do usuário.
Versão preliminar. Brasília, DF: DATASUS, 2004. Disponível em: <http://pni.datasus.gov.br/
Download/Aiu/Manual_AIU.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2015.

123
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE (Brasil). Manual de procedimentos para vacinação.


Brasília, DF, 1993.

FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE (Brasil). Manual do usuário SI-PNI/API: avaliação do Programa de


Imunizações. Brasília, DF, 2001.

Sites
http://pni.datasus.gov.br/inf_estatistica_cobertura.asp

www.datasus.saude.gov.br ∕index

http://pni.datasus.gov.br

http://sipni.datasus.gov.br

124
II A gestão da rede de frio
de imunobiológicos e seu
processo de trabalho
6. A rede de frio
e a importância da temperatura
dos imunobiológicos
Alexandre Moreno Azevedo, Clayton Bernardo da Costa, Luis Cláudio Bernardo
Colacio, Pedro Luiz da Silva Moura e Sergio Ricardo de Oliveira

O funcionamento correto da rede de frio (RF), em todas as etapas, é


essencial para que os imunobiológicos e produtos termolábeis preser-
vem suas características iniciais e princípios ativos até serem adminis-
trados – condição indispensável para garantir imunidade a todos que
os recebam.

Para assegurar a potência das vacinas, é necessária atenção cuidadosa


nas práticas de produção, conservação, armazenamento e distribuição
dos imunobiológicos, em qualquer nível ou instância no país. Essas
ações e cuidados incluem o armazenamento e transporte das vacinas
das câmaras frias, do nível nacional até o usuário final, no estabele-
cimento de saúde, incluindo os locais de atividades extramuros e as
campanhas de vacinação.

Ao percorrermos as instâncias da rede de frio, percebemos que a base


que sustenta todo o processo é a manutenção da temperatura, dentro
de parâmetros preconizados, condição essencial para se preservar a efi-
cácia dos produtos imunobiológicos.

Portanto, não podemos pensar em conservação de vacinas sem consi-


derar os conhecimentos da termologia. Devemos, também, conhecer
princípios básicos de refrigeração, transmissão de calor por condução,
por convecção e por radiação. Esses princípios fornecem subsídios para
se trabalhar com segurança no gerenciamento da rede de frio, em qual-
quer instância.

Este capítulo aborda os principais aspectos relacionados à manutenção


da temperatura dos imunobiológicos, destacando os princípios, as bases
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

e as recomendações fundamentais da termologia, de modo a contribuir


no entendimento sobre os processos físicos envolvidos na conservação
dos imunobiológicos.

A ênfase sobre a gestão das vacinas para protegê-las do calor e do frio


vem aumentando a cada dia, com a incorporação de novos instrumen-
tos e equipamentos. Certamente, muitos outros estão por vir. Por isso,
O conhecimento da não é nossa pretensão esgotar o assunto, mas fornecer subsídios para
estabilidade de uma vacina a manipulação segura dos imunobiológicos e a gestão eficiente da rede
é importante para todos
os profissionais que atuam de frio.
nessa área, principalmente
no que se refere à perda
de sua estabilidade e suas Fundamentos da termologia
características, ao ser
submetida a temperaturas A exposição das vacinas a variações de temperatura, desde calor até
fora da faixa de +2°C a
+8°C. Esse conhecimento temperaturas mais baixas que o estabelecido (ou congelamento), pode
pode auxiliar os gestores e acarretar problemas com a termoestabilidade destas. Isso pode interfe-
a equipe no planejamento
e na operacionalização
rir tanto em sua qualidade e eficácia, impedindo que o sistema imuno-
das atividades, garantindo lógico da pessoa vacinada produza anticorpos e gere imunidade, como
segurança e efetividade das também na segurança do paciente, já que podem ocorrer reações locais
vacinas utilizadas.
após administração de uma vacina incorretamente armazenada, como
já destacamos nos capítulos anteriores.

Para melhor entendermos os princípios que se aplicam à temperatura


dos imunobiológicos e sua estabilidade, vamos analisar algumas ques-
tões relativas à termologia, iniciando com as definições de calor e frio.

Calor e temperatura
Olhando à sua volta, você pode notar que há uma grande quantidade
de objetos parados ou em movimento, em relação ao solo. Escolha
um, especificamente, que esteja parado e o observe por alguns segun-
dos. O que se percebe é que ele permanece imóvel. No entanto, isso é
apenas aparente!

Os átomos são compostos, ainda, Os objetos, de uma forma geral, são compostos por pequenas porções de
por partículas menores, como matérias que chamamos de átomos. Os átomos, por sua vez, se juntam
prótons, nêutrons, elétrons etc.
e formam moléculas que, de acordo com sua organização e a energia
presente, podem constituir estruturas sólidas.

O que se sabe é que a molécula, independentemente da sua comple-


xidade, possui alguma energia que a mantém em constante agitação
(movimentação). É esse movimento interno da estrutura molecular
que constituiu a base de estudos da física sobre termologia.

128
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

Nossa vida está diretamente ligada a uma forma de energia que agita
as moléculas: a energia térmica, ou calor. Essa forma de energia está
relacionada às variações de temperatura, à mudança de estados físi-
cos das substâncias e da estrutura dos corpos. Dada a sua importância,
começaremos conhecendo os conceitos fundamentais que servirão de
base para melhor compreendermos os fenômenos que estão relaciona-
dos a esse tipo de energia. Tais conhecimentos nos permitirão entender
melhor a importância da temperatura na rede de frio.

O primeiro conceito importante para compreender o calor é o de ener- Alguns exemplos de diferentes
formas de energia são: energia
gia, algo constante na natureza, que pode se apresentar de diferentes
luminosa, que faz um corpo emitir
formas e se transferir de um corpo para outro. No caso do calor, por luz; energia cinética, relacionada
exemplo, isso implica a existência de uma fonte térmica. Trata-se de um ao movimento dos corpos;
energia elétrica, que se converte
dispositivo natural ou artificial que, por meio da utilização da queima em energia luminosa, quando
de um combustível, ou mesmo de outras formas de energia, como a acendemos uma lâmpada em casa,
por exemplo, etc.
eletricidade, produz uma quantidade esgotável de energia térmica.

Faça um teste!
Coloque água em uma panela pequena e leve-a à chama do fogão.
Com o passar do tempo, observe que a água começa a formar bolhas,
e, em seguida, tem início o processo de fervura. Note que a água se
encontra em processo de agitação constante. Esse efeito está relacionado
com o ganho de calor (energia) fornecido pela chama do fogo (fonte
térmica, nesse caso).

Com essas informações, podemos, então, construir um conceito básico


de calor:

Calor é uma forma de energia em trânsito, que passa sempre do corpo


mais quente para o corpo menos quente (HEWITT, 2011).

Essa transferência de energia aumenta o grau de agitação das molécu-


las do corpo que recebeu calor. Observa-se, também, que, enquanto a
fonte térmica permanece em contato com o corpo, transferindo calor
a ele, a temperatura deste aumenta, transmitindo ao corpo maior grau
de agitação das moléculas. Dessa forma, podemos concluir que, quanto
maior a agitação de um corpo, maior sua energia térmica.

129
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Observe o seguinte...
Ao retirarmos água da geladeira e, imediatamente, a colocarmos em um
Atenção! recipiente em banho-maria, aquecendo em fogo brando, se colocarmos a
Cuidado para não tocar a
mão na água, verificaremos que haverá alterações de temperatura. Você
panela que abriga o recipiente poderá ter as seguintes sensações:
em banho-maria. E, claro,
não permaneça com a Muito fria
mão na água, quando ela
começar a causar sensação de
Fria
desconforto térmico.
Morna
Quente – Atenção, não ultrapassar esta fase!
Muito quente – Cuidado! Não recomendamos manter a mão na água
nesta fase!

Ao se transferir calor para um corpo, percebe-se, na verdade, um


aumento da quantidade de energia nesse corpo, composto basicamente
por pequenas partículas atômicas que começam a se agitar em virtude
do ganho de energia cinética (movimento). Assim, podemos definir
outro conceito básico, isto é, o de temperatura:

Temperatura é a grandeza física que mede o grau de agitação das


moléculas (HEWITT, 2011).

Agora que já sabemos que calor e temperatura não são a mesma coisa,
é fundamental diferenciá-los da sensação térmica, que é a capacidade
que temos de observar se um corpo está quente ou frio. Essa capaci-
dade, porém, não pode servir de parâmetro, pois o que para uns seria
quente, para outros pode ser frio.

Se considerarmos, por exemplo, a temperatura da cidade do Rio de


Janeiro, que, com frequência, atinge mais de 35°C, veremos que a tem-
peratura é extremamente quente e desagradável para povos que vivem
em regiões mais frias do planeta e amena e tolerável para os que vivem
em regiões tropicais.

Outra situação que demonstra bem esse fenômeno é quando, em uma


sala com ar-condicionado ligado, algumas pessoas estão confortáveis
com a temperatura enquanto outras sentem muito frio. A sensação tér-
mica depende de quem a está sentindo. No entanto, a temperatura da
sala é a mesma para todos, por exemplo, 25°C.

Vimos, nos dois exemplos, que sempre haverá certa subjetividade nesse
tipo de análise.

130
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

A forma de medir a temperatura de um lugar ou de um corpo é por


meio de termômetros. Quando calibrados, informam com precisão as
temperaturas reais dos corpos, por intermédio de escalas termométricas
conhecidas. Por isso, é o principal instrumento para medição da tempe-
ratura. Para efetuarmos essa verificação, contudo, temos que conside-
rar um princípio fundamental denominado lei zero da termodinâmica.

A lei zero da termodinâmica estabelece que, se dois corpos estiverem


em equilíbrio com um terceiro, eles estarão em equilíbrio entre si.

Em outras palavras, a lei da termodinâmica está relacionada com um


fundamento básico físico, que é o do equilíbrio térmico. Isso significa
que, quando dois ou mais corpos, em temperaturas inicialmente dife-
rentes, são colocados em contato térmico, irão trocar calor até que, Todo e qualquer corpo,
depois de certo tempo, tenham a mesma temperatura. independente da sua
temperatura, é uma fonte
É possível observar esse efeito quando retiramos um frasco de imuno- térmica, pois transmite energia
na forma de calor para corpos
biológico da geladeira. Após algum tempo fora do refrigerador, obser- com temperaturas abaixo
vamos a formação de gotículas de água na superfície externa do frasco. da sua.
Esse efeito é provocado pela troca de calor entre o ar externo e o frasco,
que possui temperatura menor do que a do ambiente. Nessa situação,
o ar sofre redução de temperatura, condensando-se sobre a superfície Condensando refere-se à
condensação, que significa a
do frasco, o qual, ao mesmo tempo, tem a sua temperatura elevada,
passagem do estado gasoso para
comprometendo sua utilização. Esse princípio é o mesmo que nos o líquido. No exemplo, a umidade
possibilita compreender como uma vacina, em contato com materiais que está no ar e as gotículas que
se formam em volta do frasco.
congelados ou em temperatura fora dos padrões, pode vir a congelar ou
perder calor e diminuir sua temperatura. A redução da temperatura do ar
pela troca de calor com um frasco

Medição de temperatura: termômetros de imunobiológico que estava


gelado não é perceptível, pois o
frasco e o calor trocado são muito
Para medir a temperatura dos corpos, o termômetro é o instrumento pequenos em relação ao volume
mais seguro e preciso. Em geral, o fundamento do equilíbrio térmico é de ar em uma sala.

usado para medir a temperatura dos corpos por meio do termômetro.

Existem vários tipos de termômetros, que possuem características dis-


tintas quanto à funcionalidade e à precisão. Basicamente, em relação
a sua constituição, eles são do tipo analógico (que utiliza dispositivos
mecânicos) ou digital (que utiliza dispositivos elétricos) e devem ser
capazes de verificar com precisão a temperatura dos corpos.

Os termômetros analógicos são dispositivos que utilizam diversos tipos A rede de frio utiliza, com
frequência, um termômetro
de produtos para monitorar as temperaturas. Os produtos utilizados analógico, conhecido como
nesse tipo de termômetro podem ser mercúrio (metal líquido com alto capelinha ou “de máxima e
coeficiente de dilatação térmica), álcool (que tem baixo custo e menor mínima”.

131
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

risco que o mercúrio), gás (medido por pressão), ou mesmo dispositivos


mecânicos, como lâminas bimetálicas.

Figura 1 – Termômetro analógico de mercúrio do tipo capelinha

Cada Traço
Corresponde a 1°C
(Filete Azul) (Botão Central)
Marca a Temperatura Anula a Temperatura
Mínima Máxima e Mínima
(Filete Azul)
(Coluna de Álcool Marca a Temperatura
ou Mercúrio) Marca Máxima
a Temperatura do
Momento

Fonte: Elaboração de Edson Moura (2001).

Outros termômetros, como os digitais, são baseados em propriedades


elétricas e eletrônicas de alguns materiais. A medida da temperatura
é feita a partir de variações nas características elétricas do sensor de
temperatura. O dispositivo utilizado para indicar variação ou medir
a temperatura, nesses casos, é o termopar, ou simplesmente par ter-
moelétrico, que responde com uma corrente elétrica diferenciada, de
acordo com a temperatura do corpo.

A diferença básica entre os termô- Foto 1 – Termômetro digital


metros digitais e analógicos está na
precisão da medida que se quer obter.
Quando se pretende acondicionar um
produto em uma temperatura que
não pode sofrer grandes variações
(de 1ºC, por exemplo), como no caso
dos imunobiológicos, o ideal é utilizar
termômetros digitais, para garantir
que a temperatura do ambiente seja
uniforme. O termômetro analógico é
Foto: ldnxibmw (2010).

indicado para verificar a temperatura


de determinado ambiente ou local de
acondicionamento, quando pequenas
variações de temperatura não forem
relevantes. Nesse caso, deve-se alocar Fonte: Flickr.com.

132
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

o termômetro nas regiões consideradas mais críticas (de maior e menor


temperatura), aguardar o equilíbrio térmico entre o ambiente e o ins-
trumento e manter a observação constante do ambiente, de forma a
garantir sua temperatura. Se você quiser se aprofundar
mais sobre o assunto ou
obter mais dicas sobre os
Há, ainda, outro tipo de termômetro, conhecido como de radiação. termômetros, vale a pena
Utilizado para medir a distância, ou seja, sem contato com o objeto; ler o artigo de Pires, Afonso
seu princípio se baseia em captar a radiação eletromagnética da fonte e Chaves (2016) “Do
termoscópio ao termômetro
de calor. digital: quatro séculos de
termometria”, disponível em
Foto 2 – Termômetro de radiação Agora que conhecemos http://www.scielo.br/pdf/qn/
v29n6/40.pdf
mais sobre temperatura e
como devemos medi-la,
Você encontra mais detalhes sobre
a pergunta é: por que há os termômetros utilizados no PNI
mais de uma escala de no Capítulo 8, “Gestão da rede de
Foto: Larry Jacobsen (2010).

frio de imunobiológicos”, deste


medida da temperatura? livro.
Para respondê-la, apresen-
taremos um pouco da
história das escalas ter-
mométricas.
Fonte: Flickr.com.

Escalas termométricas
Desde que o homem se preocupou, realmente, em medir temperaturas,
percebeu que, para isso, deveria criar escalas numéricas e instrumentos
menos subjetivos do que seus próprios sentidos. As primeiras tentativas
remontam ao início da Era Cristã, quando alguns médicos (motivados,
talvez, pela necessidade de quantificar a febre de seus pacientes) pro-
curaram representar numericamente as diversas gradações entre frio e
quente. No entanto, foi somente a partir do século XVI que começaram a
surgir aparelhos e escalas com um mínimo de precisão e confiabilidade.
Pelo que se sabe, o primeiro desses aparelhos foi construído por Galileu
(1564-1642), em 1592. O próprio Newton (1643-1727) também criou
uma escala para medir temperaturas (MÁXIMO; ALVARENGA, 2006).

Para se ter uma ideia da “febre” que acometeu os cientistas, mesmo sem
estes terem a noção do que ocorria com os corpos quando mudavam
de temperatura, no fim do século XVIII já havia mais de 60 escalas ter-
mométricas registradas! De todas as existentes, apenas duas chegaram
até os dias de hoje: a escala Celsius, utilizada na maioria dos países, e
a Fahrenheit, ainda utilizada em países de língua inglesa (MÁXIMO;
ALVARENGA, 2006).

133
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Quando realizamos uma medida, ela deve obedecer a algum referen-


cial, critério ou padrão, ou então o valor obtido não pode ser conside-
rado válido. Para isso, utilizamos, além das escalas Celsius e Fahrenheit,
Se você quiser se aprofundar outra escala considerada absoluta e que não possui valores negativos,
mais sobre o assunto ou obter
a escala Kelvin.
informações sobre os cientistas
responsáveis pelas escalas,
visite as páginas: A escala Kelvin, por ser absoluta, tem como valor mínimo o 0 (zero),
http://www.if.ufrgs. que corresponde ao repouso (falta de movimentação) total das molécu-
br/~dschulz/web/escalas_term.
htm e http://www.if.ufrgs. las de um corpo. Além disso, a Kelvin também é utilizada em estudos
br/~dschulz/web/escalas_ científicos e em laboratórios para, principalmente, aferir e calibrar os
term_a.htm
termômetros em outras escalas.

Contudo, há uma relação direta entre as escalas, e qualquer tempe-


ratura registrada em uma delas pode ser calculada para as demais. Na
Figura 2, podemos observar a relação entre as escalas termométricas.

Figura 2 – Relação entre as escalas termométricas

TC TF – 32
= K = TC + 273
5 9

TC: Temperatura na escala Celsius; TF: temperatura na escala Fahrenheit; K: temperatura na


escala Kelvin.
Fonte: Elaboração do autor.

Eis um exemplo. Digamos que determinado produto da rede de frio


É importante conhecer a lógica
seja importado de um país de língua inglesa e apresente, no rótulo,
da conversão entre as escalas. a indicação para ser acondicionado em temperatura de –4ºF (graus
Caso necessite realizar essa Fahrenheit). Qual seria sua correspondente aqui no Brasil?
operação, consulte a internet,
onde é possível encontrar
sítios que fazem a conversão A solução é simples; basta utilizar a relação que há entre as escalas
de escalas Celsius, Fahrenheit Celsius e Fahrenheit, substituindo o valor –4ºF no lugar de TF.
e Kelvin. Um deles: http://
www.convertworld.com/pt/
temperatura/Fahrenheit.html Tc –4 – 32
=
5 9

134
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

Fazendo as contas, você conclui que o produto deve ser acondicionado


a –20ºC (graus Celsius).

Trocas de calor
Vimos, há pouco, que corpos em contato tendem a trocar calor até
atingirem o equilíbrio, ou seja, a mesma temperatura. No entanto,
alguns materiais podem ganhar ou perder calor mais rapidamente que
outros. Em outras palavras, diferentes materiais absorvem diferentes
quantidades de calor, mesmo tendo a mesma massa e independente-
mente do seu tamanho.

Por exemplo, imagine que é colocada a mesma quantidade de água, a


temperatura ambiente, em duas canecas, uma de vidro e outra de alumí-
nio. Espera-se um pouco para que as duas atinjam a mesma temperatura
e, depois disso, as canecas são colocadas no congelador de uma geladeira.
Minutos depois, retiram-se as duas canecas do congelador (de modo que
as duas porções de água não estejam totalmente congeladas). O que se
observa é que há uma pequena camada de gelo na parede da caneca de
alumínio, enquanto na parede de vidro esse efeito não é percebido.

Isso acontece porque o vidro troca calor mais rápido que o alumínio,
e o processo de congelamento passa a ser de dentro para fora, ou seja,
o congelamento no vidro é de dentro para fora. No entanto, na caneca
de alumínio o congelamento da água se dá de fora para dentro, por isso
congela a parte em contato com a caneca, antes da parte interna.

Esse experimento é bastante simples e permite visualizar a diferença


das trocas de calor de diferentes materiais (vidro e alumínio). O que
explica essa diferença é a capacidade que cada material tem de ganhar
ou perder calor com rapidez. A essa relação denominamos de calor
específico. Quanto menor o calor específico do material, mais rápida é
a troca de calor entre ele e o meio ou outro corpo.

O vidro, material sólido utilizado no envase dos imunobiológicos, possui um


calor específico muito baixo e, por isso, troca calor com muita facilidade.
Prova disso é a mudança rápida de sensação térmica quando seguramos
um frasco de vidro que está em baixa temperatura: o vidro esquenta pela
troca de calor com a mão. Por isso, é importante que, nas atividades de
vacinação extramuro ou de campanhas, os profissionais não permaneçam
com o frasco nas mãos durante todo o processo de vacinação, para que o
produto imunobiológico não sofra alteração de temperatura em contato
permanente com o calor das mãos. O vacinador deve colocar o frasco no
recipiente, isopor ou caixa térmica, a cada pessoa vacinada.

135
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

O isopor é uma espuma de Se fizermos uma analogia com uma lata de bebida, iremos reparar que,
poliestireno expandido, ou seja,
um polímero que contém inúmeras
se retirarmos a lata do sistema de refrigeração, ela rapidamente trocará
e minúsculas bolhas de ar. O ar é calor, absorvendo energia do meio ambiente. Para reduzir esse efeito,
um excelente isolante térmico, e as latas podem ser colocadas em dispositivos individuais de isopor, que
essas minúsculas bolsinhas de ar
são as responsáveis por absorver funcionam como isolante térmico. Esse tipo de material, que impede a
o calor entre as faces do isopor. troca de calor com o meio, ou mesmo com outros corpos, é utilizado
O verdadeiro isolante térmico do
isopor é o ar retido nele.
na produção de calorímetros, que nada mais são do que recipientes
com alta capacidade térmica. A capacidade térmica de um corpo está
relacionada à capacidade de receber ou ceder calor, quando o corpo
sofre uma variação de temperatura.

O calor específico é a característica da substância (água, óleo, alumínio,


vidro), não muda com a massa (por exemplo, o calor específico de um ou
dois litros de água é o mesmo). E a capacidade térmica é a característica
do corpo, isto é, muda com a massa (por exemplo, a massa de um litro de
água é diferente da de dois litros de água).

Em nosso dia a dia, utilizamos vários recipientes que não deixam a


temperatura do seu interior variar muito, ou seja, possuem grande
capacidade térmica, como garrafa térmica, caixa de isopor, a água
(banho-maria), recipiente para garrafas de cerveja etc. Esses objetos
são denominados de calorímetros. Então, as caixas térmicas, os isopo-
res usados nas atividades de imunização e de rede de frio são também
denominados de calorímetros!

Tipos de calor
Uma das preocupações com os imunobiológicos é a conservação da
A temperatura do gelo empregado sua temperatura durante o transporte. Como é possível que produtos
na conservação das vacinas é
de grande importância. Caso se
sensíveis como os imunobiológicos não sofram pequenas variações de
utilize gelo em temperaturas muito temperatura em longos períodos? Como fazer para que não percam ou
baixas (–20ºC, por exemplo) e em ganhem calor, e também não congelem?
grande quantidade (“ilhando”
as vacinas), corre-se o risco de,
em determinado momento, a A caixa de isopor (calorímetro), utilizada no transporte, é fundamental
temperatura das vacinas ficar nesse processo, pois evita bastante a troca de calor do meio interno com
próxima à temperatura do gelo.
Em consequência, as vacinas o externo. Entretanto, há outro fator que também impede o aumento
ficarão congeladas, o que inativará de temperatura no interior da caixa. Esse fator está ligado à mudança
alguns tipos específicos, como a
de estado físico dos produtos que se encontram no interior da caixa (os
DTP (FUNDAÇÃO NACIONAL DE
SAÚDE, 2001). próprios imunobiológicos ou mesmo o líquido das bobinas).

136
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

Para entender melhor o que acontece, observe que, durante a prepa-


ração das caixas de imunobiológicos, as bobinas a serem utilizadas no
interior da caixa devem estar “climatizadas” com o meio externo, ou
seja, devem estar no processo de mudança de estado físico (sólido para
líquido) com o propósito de evitar a diminuição da temperatura dos
imunobiológicos. Dessa forma, quando as bobinas forem acondiciona-
das no interior da caixa, devem estar frias o suficiente para criar uma
“atmosfera” que mantenha os imunobiológicos em temperatura cons-
tante, mas não frias demais de modo que possam provocar o congela-
mento destes. Esse efeito pode ocorrer por conta da troca de calor entre
as bobinas e os imunobiológicos, em razão da diferença de capacidade
térmica entre os objetos no interior da caixa.

Isso acontece porque, no momento de mudança de estado, o corpo não


sofre variação de temperatura; logo, a temperatura de todo o conjunto
permanece constante, e a quantidade de calor absorvido ou cedido pelo
corpo é apenas para a mudança de estado. Esse tipo de calor, que se
refere à mudança de estado, é chamado de calor latente.

Há, também, outra forma de ganho ou perda de calor, que é aquela per-
ceptível, pois ocorre variação de temperatura. A esse tipo damos o nome
de calor sensível. É importante perceber que este só ocorre enquanto o
material se encontrar em um único tipo de estado da matéria.

Para que se compreenda melhor os diversos tipos de calor, temos de


relembrar alguns conceitos básicos sobre os diferentes estados da maté-
ria. Você lembra o nome dos estados da matéria e de seus processos de
transformação?

No diagrama a seguir, representamos as diferentes mudanças de esta-


dos da matéria e seus respectivos nomes. Vale ressaltar que a maioria
das substâncias passa pelos três estados da matéria, o que caracteriza
dois calores latentes. Na sequência, podemos observar a descrição de
cada uma das mudanças de fase.

137
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Diagrama 1 – Estados da matéria

Sublimação

Fusão Vaporização

SÓLIDO LÍQUIDO GASOSO

Solidificação Liquefação ou
Condensação

Sublimação

Fonte: Adaptado de João Neto ([20--]).

Notas
• Fusão: passagem do estado sólido para o estado líquido (por exemplo,
gelo virando água, bobina de conteúdo líquido quando não mantida sob
refrigeração permanente).
• Vaporização: passagem do estado líquido para o estado gasoso. Pode
ocorrer de três maneiras:
• Calefação: passagem do estado líquido para o gasoso, de modo muito
rápido (por exemplo, gotas d’água derramadas numa chapa metálica
aquecida).
• Ebulição: passagem forçada do estado líquido para o estado gasoso
(por exemplo, água fervendo no fogo).
• Evaporação: passagem do estado líquido para o gasoso, que envolve
apenas a superfície do líquido (por exemplo, gota d’água sobre a pele
secando sozinha, poça de água evaporando).
• Liquefação ou condensação: passagem do estado gasoso para
o estado líquido, por contato do vapor com uma superfície fria (por
exemplo, os espelhos do banheiro embaçados depois de um banho
quente, nuvem que se transforma em chuva).
• Solidificação: passagem do estado líquido para o estado sólido (por
exemplo, água congelando).
• Sublimação: passagem do estado sólido para o gasoso, ou o processo
inverso, sem passar pelo estado líquido (por exemplo, a sublimação do gás
carbônico sólido, conhecido como gelo seco, usado algumas vezes pela
Central Nacional de Armazenamento no transporte de grandes volumes de
imunobiológicos, e a temperatura ambiente).

138
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

Podemos perceber, pelos exemplos descritos, os diversos estados da Mais detalhes sobre o sistema de
refrigeração podem ser obtidos
matéria, seja nas atividades domésticas ou na própria atividade da rede no Capítulo 7, “Refrigeração e
de frio. O conhecimento acerca dos estados da matéria das substâncias equipamentos da rede de frio”,
e de suas propriedades é fundamental para se entender o processo físico deste livro.

do sistema de refrigeração, sua importância e utilização em todo o pro-


cesso da rede de frio.

Propagação de calor
Agora que já sabemos que o calor é uma forma de energia em trânsito
e que os processos de trocas de calor dependem da capacidade térmica
dos produtos, é necessário saber, então, a forma como se transmite.

Para refletir
Você tem alguma ideia de como o calor pode ser transmitido entre os
corpos?

O calor pode se propagar por meio de condução, convecção e irradia-


ção. Vejamos cada uma dessas formas a seguir.

Condução térmica
É o processo de transporte de energia sem transporte de matéria que
ocorre, geralmente, em materiais sólidos. Nesse processo, a energia é
transferida de partícula a partícula, sem que nenhuma delas seja des-
locada. Um exemplo de condução térmica é o calor que sentimos ao
utilizar uma colher metálica para cozinhar um alimento. O calor que a
colher recebe, por estar em contato com o alimento quente, é condu-
zido pelas partículas que a formam até a ponta do cabo, onde estamos
segurando, e, por isso, a sentimos esquentar.

De todos os tipos de substâncias, os metais são os materiais que melhor


conduzem o calor, razão pela qual são chamados de condutores térmi-
cos. Os materiais não condutores de calor são denominados de isolantes
térmicos, como o isopor usado na conservação dos imunobiológicos, o
ar, a madeira, o plástico e o vidro. Por isso, utensílios de cozinha que
vão ao fogo, como panelas e espetos de churrasco, possuem uma base
metálica, para aquecer mais rápido, e, nos cabos, materiais isolantes,
para não queimar a mão de quem os segura.

139
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

As caixas de isopor utilizadas na conservação dos imunobiológicos devem


ter sua densidade cuidadosamente verificada, para que cumpram a função
de manutenção da temperatura de forma eficaz.
Por isso, é importantíssimo que o gestor/trabalhador, no momento da
compra desse tipo de insumo, atente para as especificações que garantam
as necessidades de manutenção da temperatura requerida pelas vacinas,
em todas as atividades de imunização e na rede de frio.

Os trabalhadores que atuam As roupas de lã ou de materiais similares também são isolantes tér-
na rede de frio utilizam roupas
confeccionadas com materiais
micos. Elas retêm o calor que o corpo emite, por causa do ar que fica
que funcionam como isolantes retido entre suas fibras. Esse ar é que dificulta a condução do calor. O
térmicos. Mais detalhes sobre esses mesmo ocorre com os pelos dos animais e a serragem, que são bons iso-
materiais são apresentados no
Capítulo 14, “Noções gerais sobre lantes porque retêm o calor, ou seja, impedem a troca de calor interno
biossegurança e a questão do com o meio externo.
incêndio”, deste livro.

É por isso que no Polo Norte, por Outro material que dificulta a condução térmica é o gelo. Um exemplo
exemplo, os esquimós constroem
simples é verificado no inverno: em localidades com frio intenso, os
suas casas (iglus) com gelo,
material que dificulta a condução lagos congelam, mas apenas em sua parte superior, onde se forma uma
térmica. camada isolante entre o frio do ar e a água do lago; abaixo do gelo, a
vida marinha continua!

Convecção térmica Figura 3 – Corrente de convecção

É o processo de transferência de calor


através do transporte de matéria, por
causa de uma diferença de densidade
e da ação da gravidade. Acontece, ape-

Ilustração: Wagner Magalhães Paula


nas, em fluidos, isto é, em líquidos ou
em gases.

Para entender esse processo, observe


o aquecimento de um líquido, a água,
por exemplo. Assim, quando o reci-
piente é aquecido, as porções inferio-
Na figura, as setas para cima
res recebem maior quantidade de calor representam o fluxo de água quente
que sobe, enquanto as setas para baixo
e aquecem primeiro. Como elas se tor- representam o de água fria, que desce
nam menos densas, sobem; enquanto para ser aquecido. Esse mesmo fluxo
é percebido no interior das caixas de
isso, as porções superiores descem, por acondicionamento dos imunobiológicos,
serem mais frias e densas, e também que, ao trocar calor, mantêm o ar mais
quente na parte superior (abaixo da
por ação da gravidade. Esse movimento tampa). Uma das formas de evitar essas
chama-se corrente de convecção. trocas de calor é manter as bobinas na
parte inferior das caixas, para conservar o
ar frio sempre no fundo da caixa.

140
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

Outro exemplo de convecção e movimento cíclico entre o ar quente,


menos denso, e o ar frio, mais denso, é o funcionamento do ar-condi-
cionado. O aparelho deve ser colocado na parte superior da habitação
para possibilitar que o ar frio, mais denso, que sai do aparelho desça e
desloque o ar quente, menos denso, que deve subir. Isso possibilita a
criação de correntes de convecção e o resfriamento do ambiente.

O mesmo acontece na geladeira, em que a refrigeração dos alimentos é


feita através da convecção. O ar em contato com os alimentos se aquece
e sobe até o congelador, onde é resfriado, e volta para os alimentos. Por
isso, o congelador fica na parte superior da geladeira.

Com esses exemplos, podemos entender, também, porque não se reco-


mendam, em imunização, refrigeradores com o congelador separado:
neles, o “ar resfriado” não descerá para o local (parte separada) onde se
encontram as vacinas.

Vejamos, agora, o processo de convecção térmica nos gases, tendo,


como exemplo, uma praia. Durante o dia, o ar próximo da superfí-
cie do continente aquece mais rápido que o ar próximo à superfície
do mar. Isso ocorre porque a água tem uma capacidade térmica maior
que a areia. Então, o ar aquecido do continente fica mais leve e sobe,
enquanto o ar mais frio do mar se desloca em direção ao continente,
formando a brisa marinha.

Figura 4 – Formação da brisa marinha

O ar quente
sobe
(convecção) Brisa
marinha

Fonte: Elaboração do autor.

Durante a noite, acontece o inverso: o ar próximo ao mar permanece


aquecido por mais tempo do que o ar próximo ao continente, então o
ar próximo ao mar sobe, e ocorre o deslocamento de ar do continente
para o mar, dando origem à brisa terrestre.

141
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 5 – Formação da brisa terrestre

Brisa O ar quente
terrestre sobe
(convecção)

Fonte: Elaboração do autor.

Você sabia?
• Quando um grupo de aves sobrevoa uma região, em círculos, está
planando em uma corrente de convecção. O ar quente sobe em um fluxo
de corrente sempre ascendente. Por exemplo: aves, como os urubus,
percebem que uma corrente de ar aquecido ascendente (de baixo para
cima) está ocorrendo em determinado ponto. As aves vão até esse ponto
e aproveitam essa propriedade para flutuar, economizando energia. As
correntes giram, por isso as aves voam em círculo. Esse mesmo princípio
é aproveitado pelos praticantes de voo livre.
• As correntes de convecção são importantes para a dispersão de
poluentes. Nas grandes cidades, a grande quantidade de poluentes
suspensos no ar dificulta a dispersão; em dias quentes, ela é mais eficiente.
Já no inverno, quando a superfície da Terra esfria muito, principalmente à
noite, ocorre o fenômeno da inversão térmica. Isso porque as camadas
de ar mais próximas da superfície da Terra ficam mais frias, e o Sol nem
sempre consegue aquecer o solo para reverter esse processo, o que
provoca interrupção das correntes de convecção e permanência dos
poluentes junto ao solo, não se dispersando na atmosfera.

Irradiação térmica
Enquanto a condução e a convecção ocorrem em meios materiais, a
irradiação pode acontecer tanto em meios materiais quanto no vácuo
(ausência de matéria). A irradiação térmica é o processo de transferên-
cia de calor por meio de ondas magnéticas. Como exemplo, podemos
citar o calor de uma fogueira, a luz do Sol etc.

As ondas são geradas pela agitação da matéria, que, por sua vez, é pro-
duzida pela quantidade de calor que contém; ou seja, as ondas depen-
dem da temperatura do corpo. O Sol, cuja temperatura em sua super-

142
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

fície é de aproximadamente 6.000K (temperatura na escala Kelvin), é


o principal irradiador de calor para a Terra. A Terra recebe o calor do
Sol diretamente no solo, que o reflete para a atmosfera e aquece nosso
planeta às temperaturas que temos.

Assim como o Sol, as lâmpadas incandescentes também emitem calor


luminoso (ondas eletromagnéticas). Dessa forma, podemos entender
por que as caixas ou os equipamentos onde estão acondicionadas as
vacinas não devem estar em locais em que incida a luz solar direta, ou
mesmo sob luz/lâmpadas incandescentes.

De um modo geral, podemos afirmar que todos os corpos emitem


uma energia radiante, uns mais e outros menos, em virtude de sua
temperatura. A maioria, no entanto, emite calor obscuro (não
acompanhado de luz), inclusive nós, seres humanos.

Agora, vamos comentar sobre algumas aplicações de formas de pro-


pagação de calor que, de algum modo, contribuem para estudos ou
manutenção da temperatura dos corpos, em especial, o efeito estufa.

Uma estufa pode ser definida, dentre outras formas, como um ambiente
fechado onde se colocam plantas que precisam de condições climáticas
especiais. O teto é feito de vidro ou outro material similar. É transpa-
rente à radiação que chega do Sol e opaco às ondas de calor emitidas Convecção térmica também
ocorre em uma estufa.
pela Terra. Desse modo, o interior da estufa se mantém com uma tem-
peratura maior do que a do exterior.

Um automóvel exposto aos raios solares, com os vidros fechados, repro- Na atmosfera terrestre também
ocorre o efeito estufa. Em virtude
duz as condições de uma estufa. Caso situação semelhante ocorra com do aumento considerável do
veículos de transporte de vacinas, os valores de temperatura indicados número de veículos (automóveis,
para manutenção da integridade dos imunobiológicos serão alterados, caminhões, ônibus), indústrias
e fontes poluidoras em geral,
provocando inadequação do produto para uso e consequente descarte. os níveis de gás carbônico
Para evitar prejuízos desse porte, somente veículos climatizados são (CO2), monóxido de carbono
(CO), dióxido de enxofre (SO2)
recomendados para o transporte de imunobiológicos. e outros gases têm aumentado
expressivamente, contribuindo
No caminho percorrido pela termologia, conhecemos diversos aspectos para o aumento da temperatura do
planeta.
que nos fizeram compreender o calor e o frio, como eles se propagam e
as diversas formas de condução. Todas essas informações são importan-
tes para vocês, profissional da saúde e trabalhadores da imunização e da
rede de frio, visto que, com base nesses princípios e nas experiências aqui
demonstradas, associadas à leitura dos próximos capítulos, será possível
compreender os processos envolvidos na rede de frio e como eles estão
convenientemente aplicados à conservação de imunobiológicos.

143
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Considerações finais
Sabemos que a rede de frio tem, como base, a manutenção da tem-
peratura dos imunobiológicos em todas as fases. Pela própria exigên-
cia dos órgãos reguladores, todos os produtores de imunobiológicos
devem realizar diversos estudos de estabilidade, visando demonstrar
que seus produtos mantêm suas características e a sua imunogenici-
dade quando expostos a condições adversas, por determinado período
de tempo (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2010).

Vimos que, além desse controle da produção, temos de estar atentos a


quaisquer mudanças ou alteração de temperatura que possam influir
na estabilidade dos produtos, tendo sido demonstrada, neste capítulo, a
base para entendermos como ocorrem as perdas e transmissão de calor
de uma matéria para outra, incluindo os princípios físicos envolvidos na
termologia. Esses princípios precisam ser conhecidos e aplicados, obri-
gatoriamente, em todas as etapas da rede de frio, porque assim estare-
mos agindo em prol da qualidade das vacinas e, consequentemente, do
controle, da eliminação ou erradicação das doenças imunopreveníveis
no país.

Equipes bem treinadas e instrumentos de medição disponíveis são


fundamentais, mas as condições em que os imunobiológicos são arma-
zenados e transportados são determinantes para garantir a qualidade
dos produtos e evitar prejuízos de consequências incalculáveis. Con-
siderando a vasta dimensão territorial do nosso país, as áreas de difícil
acesso e outras situações que os profissionais da saúde, em especial os
da rede de frio, enfrentam para que os imunobiológicos, em todas as
instâncias, sejam mantidos nas temperaturas ideais preconizadas, per-
cebemos a importância das informações aqui apresentadas e os desafios
impostos a esses profissionais na manutenção da temperatura dos pro-
dutos em todos os recantos do país.

Referências
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Resolução da Diretoria Colegiada
RDC n. 17, de 16 de abril de 2010. Dispõe sobre as boas práticas de fabricação de medicamentos.
Diário Oficial da União, Brasília, DF, 19 abr. 2010. Seção 1, p. 94.

DOCA, R. H.; BISCUOLA, G. J.; VILLAS BOAS, N. Tópicos de física. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 2.

FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. Manual de rede de frio. 3. ed. Brasília, DF, 2001.

HEWITT, P. G. Física conceitual. Porto Alegre: Bookman, 2011.

144
A rede de frio e a importância da temperatura dos imunobiológicos

JOÃO NETO, Prof. Química: estados físicos e mudanças de estado. [S.l., 20--]. Disponível em:
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PIRES, D. P. L.; AFONSO, J. C.; CHAVES, F. A. B. Do termoscópio ao termômetro digital: quatro


séculos de termometria. Química Nova, São Paulo, v. 29, n. 6, p. 1393-1400, 2006. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/qn/v29n6/40.pdf>. Acesso em: 3 ago. 2016.

RAMALHO JUNIOR, F.; FERRARO, N. G.; SOARES, P. A. T. Os fundamentos da física: 2º ano. São
Paulo: Moderna, 2006.

145
7. Refrigeração e equipamentos
da rede de frio
Alexandre Moreno Azevedo e Pedro Luiz da Silva Moura

Como vimos, os imunobiológicos têm sua potência e sua eficácia garan-


tidas pela conservação em temperaturas ideais, preestabelecidas pelos
órgãos competentes. Para a conservação desses produtos e de outros,
o gelo é o elemento de escolha, sendo amplamente utilizado desde a
Antiguidade. Em 1806, Frederick Tudor (1783-1864) iniciou o comér-
cio de blocos de gelo retirados do rio Hudson, Nova York, vendendo-os
a preços acessíveis à população, para serem utilizados na conservação
de alimentos. Eles eram armazenados nas chamadas casas de gelo, que
utilizavam a serragem como elemento térmico para a sua conservação.

O gelo era utilizado sem que se entendesse direito o porquê de ele ser
capaz de conservar os alimentos. Foi o químico francês Louis Pasteur
(1822-1895) quem demonstrou que alguns tipos de bactérias eram
responsáveis pela deterioração dos alimentos, e que sua reprodução
poderia ser impedida pela aplicação de baixa temperatura. Essa des-
coberta incentivou o desenvolvimento e a expansão da indústria de
refrigeração, porque possibilitou a conservação dos alimentos durante
um período de tempo maior. Com a descoberta de Louis Pasteur, o
homem buscou processos que permitissem a obtenção artificial de gelo.

Foi a partir de 1834, nos Estados Unidos, que se desenvolveu o primeiro O sistema mecânico por ciclo de
sistema mecânico (por ciclo de evaporação e condensação de fluidos) de evaporação e condensação de
fluidos é apresentado mais adiante,
fabricação de gelo artificial, patenteado por Jacob Perkins (1766-1894). neste capítulo.
Em 1859, o francês Ferdinand Carré (1824-1900) patenteou outro tipo
de mecanismo para a fabricação do gelo artificial, baseado no princípio
da absorção. Eram, portanto, dois processos diferentes.
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Atualmente, inúmeros equipamentos utilizados no nosso dia a dia se


beneficiam desses princípios de fabricação de gelo artificial, mantendo
os produtos de consumo doméstico sob refrigeração e/ou congelados.
No nosso cotidiano, vemos diversos equipamentos, como refrigerado-
res/câmara refrigerada, freezers, câmara frigorífica e outros. No que se
refere à rede de frio, equipamentos como câmaras refrigeradas, freezers
ou geladeiras domésticas são utilizados na conservação das vacinas,
para manter suas propriedades e características imunogênicas.

Esses equipamentos são, portanto, essenciais na rede de frio, e seu fun-


cionamento deve ser conhecido por todos os profissionais que atuam
na área. Por isso, este capítulo apresenta alguns desses equipamentos,
destacando a importância de se conhecer como funcionam, as formas
de monitorá-los, além de demonstrar as especificidades de cada um
para o seu aproveitamento máximo, com menor custo. Apresenta, tam-
bém, o papel da manutenção preventiva e corretiva no aumento da
vida útil dos equipamentos de refrigeração, de modo que tenham um
bom funcionamento e, consequentemente, garantam a conservação e
a preservação da qualidade do imunobiológico.

Princípios da gestão segura no


armazenamento de vacinas
A rede de frio utiliza diversos equipamentos de refrigeração para con-
servação dos imunobiológicos, desde caminhão frigorífico até geladeira
alimentada por energia solar. A escolha desses equipamentos é essen-
cial para o bom funcionamento da rede.

Sabemos que as tecnologias para o armazenamento de vacinas estão


evoluindo a cada dia, e a compra dos equipamentos para a rede de frio
deve ser criteriosa e cuidadosa. Recomenda-se, então, que o gestor,
antes de efetuar a compra, investigue sobre o equipamento que será
adquirido, ou forneça informações à sua chefia imediata ou demais
gestores, de modo que os produtos comprados atendam, de fato, às
necessidades das ações de imunização, evitando custos e problemas
desnecessários.

A ruptura da cadeia de frio, ou seja, quando a temperatura de arma-


zenamento das vacinas está fora da faixa recomendada (de +2ºC a
+8ºC), pode ocorrer em função de um problema no equipamento de
refrigeração. Dessa forma, além dos cuidados na escolha das câmaras
refrigeradas/refrigeradores, é necessário também adotar alguns prin-
cípios para a gestão segura no armazenamento de vacinas, que serão
apresentados a seguir:

148
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

escolher/adquirir um refrigerador adequado para a armazenagem das


vacinas;

designar um profissional habilitado/capacitado para ser responsável pela


gestão das vacinas;

adotar políticas de capacitação permanente, assegurando que todas as


pessoas envolvidas no transporte, armazenamento e na administração de
vacinas estejam capacitadas na gestão de imunobiológicos;

realizar supervisão periódica nos equipamentos, atentando para a forma de


armazenamento das vacinas;

elaborar protocolos/procedimento operacional-padrão (Pop) para


armazenamento, remanejamento ou suspensão do uso de vacinas, conforme
as recomendações do PNI;

realizar o monitoramento da temperatura dos refrigeradores de vacinas


duas vezes ao dia, assegurando que os protocolos (Pop) estejam atualizados,
especialmente nos casos de rotura da rede de frio ou de falha no
fornecimento de energia-elétrica;

informar à chefia imediata temperaturas fora da faixa de +2°C a +8°C,


adotando os procedimentos adequados conforme protocolos;

seguir as recomendações para o uso de bobinas de gelo reutilizáveis, caixas


térmicas, refrigeradores e termômetros;

realizar o monitoramento e o ajuste do equipamento e demais instrumentos


de verificação da temperatura, como data logger, termômetro,
periodicamente;

realizar as manutenções preventiva e corretiva dos equipamentos, incluindo


refrigerador e data logger, procedendo à troca das baterias do data logger e
do termômetro;

verificar a precisão dos termômetros e realizar a calibração;

realizar a limpeza periódica do refrigerador conforme as recomendações e os


protocolos da unidade e do PNI.
Para saber mais sobre limpeza
periódica de refrigeradores
A adoção dos princípios minimiza, ou mesmo impede, a ocorrência de na rede de frio, consulte o
Manual da rede de frio, do
problemas na temperatura e conservação das vacinas, evitando o risco PNI (BRASIL, 2013), disponível
de se administrar uma vacina ineficaz. A seguir, discutiremos alguns em: http://bvsms.saude.gov.br/
bvs/publicacoes/manual_rede_
desses princípios, buscando ampliar seus conhecimentos sobre equipa- frio4ed.pdf
mentos refrigeradores.

149
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Aspectos a serem considerados quando da


aquisição do refrigerador de vacinas
Ao adquirir uma câmara refrigerada/refrigerador para armazenar vaci-
nas, o profissional/gestor deve, inicialmente, refletir sobre o valor do
equipamento, relacionando custo-benefício, avaliando se o equipa-
O tamanho de um refrigerador mento atenderá suas expectativas (capacidade X número de atendi-
deve ser dimensionado mentos), verificando o tamanho da câmara refrigerada/refrigerador, a
considerando as necessidades
diárias e outras, como é o dimensão e a estrutura física da sala onde será alocado, assegurando
caso de campanhas, quando é espaço em torno deste para circulação do ar, conforme recomendações
necessário o acondicionamento
do fabricante.
de maiores volumes de
imunobiológicos.
Além desses cuidados, o gestor ou especialista em rede de frio deve
escolher uma câmara refrigerada/refrigerador que apresente algumas
características fundamentais, em virtude da especificidade do produto
a ser armazenado, tais como:
G dispositivo, monitor/termômetro ou logger embutido para
temperatura;
G sistema de alarme, que possa identificar “porta aberta” e/ou
permitir a notificação por discagem telefônica automática a alguém
sobre qualquer problema no fornecimento de energia ou falha
no equipamento, devendo ser escolhido o sistema de alarme que
melhor se adeque às suas necessidades;
G sistema de registro de temperatura embutido, que permita a leitura
fácil da temperatura (máxima e mínima). Alguns sistemas de
registro gráfico apresentam a possibilidade de serem colocados na
parte inferior do gabinete do refrigerador.

O passo seguinte é atentar para os aspectos referentes ao fabricante.


Nessa hora, algumas questões precisam ser respondidas, como:
G Por quanto tempo o refrigerador permanecerá dentro da faixa de
temperatura, no caso de falha na energia elétrica?
G Quais diferenças os refrigeradores com portas tradicionais (sólidas)
apresentam em relação às câmaras refrigeradas com portas de vidro,
no que se refere à manutenção da temperatura?
G O refrigerador terá necessidade de dispositivos que reforcem seu
funcionamento, como alarmes, recursos de monitoramento da
temperatura etc. Nesse caso, qual o custo adicional?
G O custo com a assistência técnica inclui a manutenção e os reparos
em áreas mais distantes (particularmente em áreas rurais etc.)?

150
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

G Qual a duração da garantia e suas condições?


G Qual é a eficiência energética do equipamento? Ele necessita de Suportes de “massa fria” serão
discutidos mais adiante neste
suporte de “massa fria” para ajudar na manutenção da temperatura capítulo.
interna, como garrafas com água resfriada?

O avanço da tecnologia tem permitido uma gama variada de refrigera-


dores, sejam domésticos ou câmaras refrigeradas. Existem vários tipos
de refrigeradores domésticos no mercado, dispondo, cada um, de recur-
sos que devem ser avaliados no momento de sua compra e, também,
de seu uso.

De modo geral, os refrigeradores domésticos são os equipamentos uti-


lizados nas atividades de imunização no nível local. Entretanto, não
possuem precisão no controle da temperatura e, por isso, sua utilização
tem sido paulatinamente reduzida, por orientação do PNI, em virtude Mesmo que somente
seja possível adquirir um
da existência de outros equipamentos mais apropriados ao acondiciona-
refrigerador doméstico
mento de vacinas. Considerando essa situação, tem sido recomendada para armazenagem de
a aquisição de câmaras refrigeradas, desenvolvidas especificamente imunobiológicos, as
características das câmaras
para a conservação de imunobiológicos, e esses equipamentos devem refrigeradas projetadas
ter registro na Anvisa. especificamente para
acondicionar vacinas devem ser
consideradas.
Apesar da recomendação, o refrigerador doméstico ainda é muito pre-
sente e, por esse motivo, vale ressaltar alguns cuidados para os casos
em que esse equipamento for usado para armazenagem das vacinas,
de forma a reduzir o risco de alterações drásticas na manutenção da
temperatura.
Refrigeradores projetados
Inicialmente, o gestor ou especialista em rede de frio deve seguir as para bar, suscetíveis ao
recomendações do PNI em relação à forma de acondicionamento e dis- congelamento, ou com
ciclo de degelo não devem
posição das vacinas no refrigerador e conhecer as características princi- ser utilizados para o
pais do equipamento. Algumas questões, então, devem ser levantadas, acondicionamento de vacinas.
como:
G Onde estão localizadas as áreas frias e quentes no refrigerador?
G Onde ocorre maior variação de temperatura da área de cima para
baixo e da frente para o fundo?
G Como são as oscilações da temperatura do refrigerador em clima
muito quente ou muito frio? (Alguns refrigeradores domésticos se
tornam mais quentes em clima mais quente e mais frio em climas
mais frios, podendo também ocorrer o inverso.)

É fundamental, também, seguir as recomendações preconizadas pelo


programa de imunizações para conservação e controle da temperatura
dos imunobiológicos. Convém destacar alguns cuidados:

151
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G assegurar que o refrigerador tenha um termômetro de mínima/


máxima e um mapa/livro de registro das temperaturas, e que o
bulbo do termômetro possa ser colocado corretamente no interior
do equipamento onde fica a vacina, de modo que informe a
temperatura mais próxima possível da que a vacina se encontra, e
não do recipiente de acondicionamento;
G não encostar as vacinas nas paredes do refrigerador ou próximo às
entradas de ar frio, pois há risco de congelamento;
G usar garrafas com água colorida nas portas, deixando espaço de ar
entre elas;
G colocar garrafas com água ou bobinas de gelo na parte de baixo do
refrigerador.

Contribuindo para a manutenção da temperatura do


refrigerador
O uso de garrafas com água resfriada auxilia a estabilizar a temperatura,
no interior do refrigerador, pelo aumento da “massa fria”, reduzindo os
períodos de aquecimento quando o equipamento é aberto, ou retardando
o aquecimento quando ocorre interrupção da energia elétrica ou falha no
refrigerador.
Para evitar que essa água seja consumida e, consequentemente, a massa
fria seja retirada do refrigerador, recomenda-se colocar sal ou corantes
para torná-la não potável. As garrafas devem ser rotuladas para informar
o que contêm.
Outro cuidado é em relação ao congelamento das vacinas. Não é possível
assegurar que as vacinas tenham sido congeladas usando apenas a
observação da aparência física, pois o congelamento pode ter ocorrido
mesmo que as vacinas ou garrafas com água estejam descongeladas no
momento da observação. Essa aparência de “descongelada” não indica,
necessariamente, que a temperatura do refrigerador não alcançou 0°C.

Para refletir
Que pontos positivos e negativos você identifica em relação às
condições de armazenamento e à conservação de imunobiológicos em
seu local de trabalho?

Considerando os aspectos mencionados para aquisição dos equipamen-


tos de refrigeração, é importante entendermos os princípios envolvidos
no seu funcionamento. Vamos conhecê-los?

152
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

O princípio de funcionamento e os
componentes de um refrigerador
As câmaras refrigeradas/refrigeradores são aparelhos que funcionam
continuamente, dia e noite, para manter a temperatura baixa, seguindo
a calibragem determinada (por exemplo, câmara fria de 4ºC ou de
–20ºC).

O princípio de funcionamento de uma câmara refrigerada/refrigera-


dor é muito simples: ela usa a evaporação de um líquido refrigerante
para absorver calor (calor latente). Para compreender melhor, vamos
a um exemplo mais cotidiano: ao colocar água fria em sua pele, você
normalmente sente um frescor. Isso porque a água troca calor com a
pele e “rouba” calor, que a faz evaporar; quando evapora, levando calor
consigo, cria a sensação de frio. O líquido refrigerante usado em uma
geladeira evapora a uma temperatura mais baixa do que a do ponto
de congelamento da água, que é de 0°C, nas condições normas de
temperatura e pressão ambiente; ao evaporar, ele cria temperaturas
baixas dentro da câmara refrigerada/refrigerador. Se você colocar o
fluido refrigerante (líquido refrigerante) em sua pele, ele irá congelá-la
enquanto evapora.

O sistema básico de funciona- Figura 1 – Sistema básico de uma câmara refrigerada/refrigerador


mento de uma câmara refrige-
rada/refrigerador apresentado, a
seguir, é conhecido também como
unidade selada (um sistema lacra- Evaporador
principal
do, em que somente o técnico ou
o mecânico de refrigeração po- Fluido refrigerante
na forma líquida e Placa fria ou
dem intervir, caso haja uma falha ou mesclado evaporador
no funcionamento). Recebe esse secundário

nome porque seus componentes Linha de Linha de


sucção
são ligados por tubos soldados, descarga
formando um circuito hermético Condensador
e que tem por finalidade realizar
Fluido refrigerante Fluido refrigerante
o ciclo fundamental da refrigera- na forma gasosa na forma gasosa
ção, ou seja, a retirada da energia superaquecido (baixa pressão)
(alta pressão)
térmica do interior da câmara
Filtro Tubo capilar
refrigerada/ refrigerador, trans- secador
portando-a para seu trocador de
calor externo (condensador). A Fi- Compressor

gura 1 demonstra como esse sistema


básico é composto.
Fonte: Adaptado de Embraco (2009).

153
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

A seguir, podemos ver como funciona e para que serve cada um dos
componentes do refrigerador, já que demonstramos o mecanismo geral.

Compressor
É o dispositivo responsável pela sucção e compressão do fluido refri-
gerante, fazendo com que este circule por toda a unidade selada. É
responsável, também, pelas transformações físicas (evaporação e con-
densação) para a realização da refrigeração. Os compressores, disposi-
tivos eletromecânicos responsáveis pela transformação da energia
elétrica em energia mecânica,
estão localizados, geralmente, na Foto 1 – Compressor
parte inferior traseira da câmara de
conservação, ligando-se aos outros

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e


Pedro Luiz da Silva Moura (2016).
componentes por tubos soldados.
Os compressores possuem, em seu
interior, óleo lubrificante para os
componentes mecânicos, dimi-
nuindo o desgaste por atrito entre
as partes mecânicas.

Os compressores são herméticos e constituídos por carcaça, sistema


mecânico e sistema elétrico. Do lado de fora do compressor, existem
quatro dispositivos elétricos. Abordaremos cada parte do compressor.

G Relé de partida: responsável por fornecer energia adicional ao


motor do compressor no instante da partida, visando vencer a
inércia inicial do próprio motor.

Figura 2 – Relé de partida

Ilustração: Wagner Magalhães Paula

Fonte: Adaptado de Embraco (2009).

154
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

G Protetor térmico ou de sobrecarga: sua função principal é atuar


como “anjo da guarda” do motor do compressor, evitando sua
queima caso ocorra alguma falha que o obrigue a trabalhar para
além dos limites para o qual foi projetado.

Figura 3 – Protetor térmico

Terminal
fêmea

Terminal
macho

Fonte: Embraco (2009).

G Termostato: dispositivo que regula temperatura. Ao identificar a


temperatura elevada em relação à desejada, ele aciona o relé que
liga o compressor, fazendo com que todo o sistema de refrigeração
seja acionado para que a temperatura retorne ao preestabelecido.
Quando atinge a temperatura preestabelecida, o compressor desliga,
evitando o desperdício de energia elétrica.

Figura 4 – Termostato
Fotos: Alexandre Moreno Azevedo e Pedro Luiz da Silva Moura (2016).

Impulsor Botão de
regulagem do
termostato

Parafuso de
Ilustração: Wagner Magalhães Paula (2016)

calibração
Parafuso
diferencial
Apoio da mola

Acionador
Alavanca da lâmpada
da sanfona interna
Pivô do
Pivô diferencial

Mola do
diferencial

155
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G Capacitor: tem por finalidade armazenar carga elétrica e descarregá-la


para dar partida no compressor, que necessita de força adicional para
funcionar. Esse dispositivo só é instalado em locais de baixa tensão.

Figura 5 – Capacitor

Fonte: Adaptado de Embraco (2009).

Condensador
Vale ressaltar que, na ausência Outro componente da câmara refrigerada/refrigerador é o condensa-
do condensador na parte traseira dor, localizado na parte externa traseira na maioria dos equipamentos,
do equipamento de refrigeração,
o trabalhador saberá que o conforme o representado na Figura 1. Em algumas câmaras refrige-
condensador estará entre o corpo radas/refrigeradores, dependendo do modelo, o condensador pode ser
de metal externo lateral e a placa
de isolamento térmico, não instalado, também, entre o corpo de metal externo lateral e a placa de
sendo visível. isolamento térmico. O condensador da câmara refrigerada/refrigerador
é fabricado com liga de aço cobreado, curvado em forma de serpentina,
preso por chapas de aço.
Foto 2 – Condensador
A função do condensador, independente-
mente do local da sua instalação, é sempre
a mesma. Ele realiza mudança de fase do

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e Pedro Luiz da Silva Moura (2016).


O condensador que trabalha fluido refrigerante, ou seja, faz com que
com a circulação natural do este passe de vapor para líquido, isto é,
ar possui aletas que passam
na tubulação com o fluido
perca calor latente na mudança de estado
refrigerante. Essas aletas têm para o ambiente, transformando-se em
a função de aumentar a área
líquido. Para que isso ocorra, o condensa-
de troca de calor do fluido
refrigerante com o ar ambiente. dor precisa de um meio para se resfriar, que
Por isso nunca pendure nada permita a retirada de calor. Geralmente, o
na parte traseira da câmara
refrigerada/refrigerador. meio utilizado é o ar.

É importante lembrar que a câmara refrige-


rada/refrigerador de uso industrial ou co-
mercial, por ser demasiadamente exigida e ter
seu uso prolongado, necessita de ventilação

156
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

forçada (pequenos ventiladores), que atuam para retirar calor do con-


densador mais rapidamente. O esquema a seguir apresenta o funciona-
mento do condensador.

Figura 6 – Etapas de funcionamento do condensador

2ª etapa – o evaporador libera


1ª etapa – O condensador calor, facilitando a troca entre o
recebe fluido refrigerante fluido refrigerante em seu interior
em forma gasosa, em Evaporador e o ar do ambiente. A partir dessa
alta pressão e alta principal troca ocorre a liquefação do
temperatura fluido refrigerante.
vindo do Fluido refrigerante
compressor. na forma líquida e Placa fria ou
ou mesclado evaporador
secundário

Linha de Linha de
descarga sucção

Condensador
Fluido refrigerante Fluido refrigerante
na forma gasosa na forma gasosa
superaquecido (baixa pressão)
(alta pressão)
Filtro Tubo capilar
secador

Compressor

3ª etapa – O fluido refrigerante no estado


gasoso no condensador, ao acumular-se no
último tubo do condensador, esfria mais um
pouco, segue para o filtro secador, passa
pelo tubo capilar e vai para o evaporador
(componentes que apresentaremos na
sequência do capítulo) e transforma-se em gás,
resfriando rapidamente; em seguida, é sugado
pelo compressor, que fornece energia mecânica
(pressão) e transforma-o em líquido.

Podemos observar, na Figura 7, um esquema do filtro secador. Ele é


fabricado em latão ou cobre, sua entrada é maior que a saída. É utili-
zado em câmara refrigerada/refrigerador e tem duas telas de malhas
de níquel ou bronze; entre essas telas, há um dessecante, que tem
a finalidade de remover a umidade residual da fabricação do fluido
refrigerante, evitando que essa umidade entre no tubo capilar e

157
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

ocasione entupimento. Esse dispositivo é instalado no final do con-


densador, na posição vertical, com a saída para baixo, possibilitando
melhor filtragem.

Figura 7 – Filtro secador Foto 3 – Filtro secador

Tela Tela

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e


Pedro Luiz da Silva Moura (2016).
Fonte: Portal da refrigeração (2008).

Tubo capilar
Outro componente do sistema básico de refrigeração da câmara refrige-
rada/refrigerador é o tubo capilar, feito de cobre, com diâmetro interno
muito pequeno. Localiza-se entre a saída do condensador e a entrada
do evaporador. Sua função é manter a diferença de pressão entre o lado
de alta pressão do condensador e o de baixa pressão do evaporador,
possibilitando a mudança de fase do fluido refrigerante de líquido para
gasoso, no evaporador.

Foto 4 – Tubo capilar com filtro secador

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e Pedro Luiz da Silva Moura (2016).

158
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

Evaporador
Tem a função de possibilitar a trans- Foto 5 – Evaporador
formação do fluido refrigerante do
estado líquido para o gasoso, absor-
vendo, nessa mudança de fase, a

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e


energia térmica do interior da

Pedro Luiz da Silva Moura (2016).


câmara refrigerada/refrigerador e
reduzindo a temperatura dos ma-
teriais armazenados em seu inte-
rior. No refrigerador da sua casa, é
provável que o evaporador esteja
localizado na parte de cima, onde
você congela os alimentos, tanto
nos equipamentos de uma porta como no de duas portas. No entanto,
hoje existem também refrigeradores em que o evaporador se localiza
na parte inferior do equipamento.

Descrição do processo de funcionamento


dos componentes
Agora que já conhecemos as partes vedadas do sistema, podemos des-
crevê-lo. Todo o processo ocorre da seguinte forma:
G O compressor suga do evaporador o fluido refrigerante, na forma de
vapor, em baixas pressão e temperatura.
G Em seguida, o compressor comprime o fluido refrigerante para o
condensador; nesse momento, sua pressão e temperatura se elevam,
o fluido refrigerante se condensa no condensador e troca calor com
o ambiente.
G Quando o fluido refrigerante sai do condensador, em estado líquido,
passa pelo filtro secador e entra no tubo capilar, sofre atrito, em
virtude do diâmetro reduzido do tubo capilar, e com isso sua pressão
e temperatura diminuem.
G O fluido refrigerante, ao sair do tubo capilar e ainda líquido, entra
no evaporador que está com baixa pressão. O fluido refrigerante
absorve calor, evapora e esfria (assim o evaporador realiza a sua
função de resfriamento do equipamento), voltando a ser sugado
pelo compressor, repetindo o ciclo.

Entendemos a base de funcionamento dos componentes de um refri-


gerador ou câmara refrigerada, mas um elemento muito utilizado nos
equipamentos da rede de frio, geralmente manipulado de forma inade-
quada, é o termostato.

159
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Qual é a função do termostato no sistema de refrigeração? Dtaque de

Trata-se de um dispositivo de controle automático de temperatura. Tem


sua calibragem específica em cada câmara de conservação/refrigera-
dor e pode ser instalado internamente no lado direito ou no console
externo. Conforme as variações de temperatura, o termostato detecta
se a temperatura da câmara refrigerada/refrigerador está no mínimo ou
no máximo estipulados e arma ou desarma o compressor, em resposta.
Isso permite o controle da temperatura interna no evaporador e a regu-
lagem manual da temperatura.

Para regular a temperatura, deve-se colocar Foto 6 – Botão de


regulagem do termostato
um termômetro aferido e calibrado dentro
da câmara de conservação/refrigerador, efe-
Todo sistema em que há troca tuando-se, a seguir, os ajustes do termostato,
de calor necessita de um tempo movendo-se o botão de regulagem para mais

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e


Pedro Luiz da Silva Moura (2016).
para alcançar o equilíbrio
térmico; porém, levantamentos (+) ou para menos (–), segundo a temperatura
empíricos demonstram que desejada. Esses ajustes devem ser realizados
é recomendável um tempo
mínimo de dez minutos antes de o equipamento receber as vacinas.
entre cada sessão, até que
a temperatura atinja o valor A câmara refrigerada/refrigerador possui outra
desejado. Isso é de grande
importância, pois o sistema
parte que necessita de cuidado especial: as por-
requer um período de tempo tas. Elas possuem dobradiças, nas partes supe-
para estabilizar a temperatura.
rior e inferior, que, ao longo do tempo, sofrem desgastes e necessitam
ser trocadas. Em alguns casos, a simples inversão do lado em que a
porta se abre já é o suficiente para que o equipamento volte a funcionar
Manter o compressor ligado por
mais tempo significa maior gasto
normalmente, reduzindo o custo e o tempo de manutenção.
de energia e maior desgaste para o
equipamento. As dobradiças com defeito causam um desnivelamento da porta. Esse
defeito, quando ocorre, permite a entrada de ar quente no interior da
câmara refrigerada/refrigerador, causando elevação da temperatura,
formação excessiva de gelo e gotas d’água, além de forçar o compressor
a ligar várias vezes para compensar a perda de refrigeração.
Alguns modelos de refrigerador
não permitem que seja trocada Outro componente da porta é a gaxeta, que é mais comumente conhe-
somente a gaxeta, em caso
cida como borracha da porta ou borracha de vedação. Os problemas
de defeito, sendo necessário
trocar toda a porta. Para saber causados na câmara refrigerada/refrigerador pelo desgaste da gaxeta são
se o refrigerador permite ou os mesmos provocados pelas dobradiças defeituosas; sua integridade é
não a troca da gaxeta apenas,
deve-se verificar o número do fundamental para evitar a saída de ar frio e a entrada de ar quente no
modelo e consultar o site do interior da câmara refrigerada. Essa borracha é de fácil manutenção: ao
fabricante, que fornece toda a
informação necessária.
apresentar desgaste, basta trocá-la, pois é de encaixe, em sua maioria,
permitindo a retirada e colocação de nova borracha, facilmente.

160
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

Câmara frigorífica negativa ou positiva


São ambientes construídos, na rede de frio, com a finalidade específica de
armazenar grandes quantidades de imunobiológicos nas instâncias central
e estadual, tanto em temperatura negativa como positiva.
A câmara frigorífica tem o seu princípio de funcionamento igual ao do das
câmaras refrigeradas/refrigeradores; porém, todo o seu sistema hermético
fica em local separado da câmara de armazenagem, em virtude do seu
tamanho.
Essas câmaras têm contrato de manutenção terceirizada, com controle
rígido de manutenção preventiva, além de possuírem alarmes de
identificação de falhas automáticos, que acionam o(s) responsável(eis) pela
manutenção via SMS ou outro sistema de comunicação remota. Também
possui um gerador acionado automaticamente, em caso de falta de
fornecimento de energia elétrica (BRASIL, 2013).

Todos os sistemas de refrigeração apresentados até o momento utilizam


a energia elétrica para seu funcionamento. Entretanto, em virtude das
diferenças regionais, culturais, econômicas etc. do nosso país, é impor-
tante aqui referenciar outra forma de refrigeração: a energia solar,
apresentada a seguir.

Sistema de refrigeração fotovoltaico


Nos locais em que o fornecimento de energia elétrica inexiste ou é
muito precário e irregular, caso típico de comunidades servidas por
pequenos geradores locais ou regiões remotas, recomenda-se a utili-
zação de sistemas de refrigeração autossuficiente. Na rede de frio, uti-
liza-se o sistema de refrigeração
Foto 7 – Sistema de refrigeração
fotovoltaico com energia gerada por células
fotovoltaicas.

O sistema fotovoltaico é composto


por um conjunto de células foto-
Foto: Alexandre Moreno Azevedo e
Pedro Luiz da Silva Moura (2016).

voltaicas, o qual é capaz de for-


necer energia elétrica a partir da
luz solar. Esta é transformada em
energia elétrica por painéis sola-
res (célula fotovoltaica), criados
especificamente para essa função.

161
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Células fotovoltaicas
São elementos capazes de converter energia luminosa (preferencialmente
solar) em energia elétrica. Apresentam algumas vantagens em sua
utilização, como:
• baixa necessidade de manutenção;
• ser uma fonte de energia ambientalmente limpa;
• possibilidade de utilização mesmo em localidades com precária
infraestrutura.
As células fotovoltaicas são feitas
de material semicondutor. Ao
absorver a luz, esse dispositivo
produz uma pequena corrente
elétrica, que pode ser
Foto: Patrick Moore (2008).

aproveitada. Os semicondutores
feitos de silício são os mais
usados na construção de células
fotovoltaicas, e sua eficiência em
converter luz solar (que é branca)
em eletricidade chega a 10%.
Fonte: FreeImages.com.

Funcionamento do sistema de refrigeração


alimentado por células fotovoltaicas
Corrente alternada está presente O sistema dos refrigeradores/câmaras refrigeradas “comuns” é alimen-
em nossas casas, nas tomadas
em que ligamos os nossos
tado por energia elétrica de 127v (corrente alternada); já o sistema de
eletrodomésticos. refrigeração gerado por células fotovoltaicas é alimentado por energia
Corrente contínua é aquela elétrica de 12v ou 24v (corrente contínua).
presente nas pilhas, nas baterias,
utilizadas em nossos celulares, Assim, o sistema de refrigeração fotovoltaico consiste, basicamente,
carros, rádios.
em um sistema de refrigeração convencional (visto anteriormente), no
qual o circuito elétrico de corrente alternada (rede elétrica existente
em nossas casas) é substituído por uma corrente contínua (12v a 24v),
alimentado por um sistema fotovoltaico e armazenado em baterias.

Mas, e à noite, quando não há luz solar? Dstaque de pergunta instiga

A fim de prover energia durante o período noturno, o excedente de


energia gerado pelas células fotovoltaicas, não utilizado imediatamente
pelo compressor, é armazenado em uma bateria. As baterias têm a capa-
cidade de armazenar energia elétrica, que será utilizada em períodos de

162
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

falhas no fornecimento pela concessionária, ou durante translado de


câmaras de conservação portáteis de imunobiológicos.

As baterias do sistema de refrigeração fotovoltaico são as de chumbo


ácidas, constituídas, basicamente, por placas de chumbo metálico
(ânodo polo negativo), placas de óxido de chumbo (cátodo polo posi-
tivo); ambas as placas são imersas em uma solução (líquida) de ácido
sulfúrico, ou em um gel pastoso (baterias seladas), e todo o conjunto é
acondicionado em uma embalagem plástica.

Figura 8 – Constituição das baterias

Solução
Polo negativo eletrolítica Polo positivo

Envelope
Monobloco de separador
polipropileno
Placa
positiva
Sistema de
fixação Placa
negativa
envelopada

O sistema fotovoltaico é composto basicamente por:


1. compressor com alimentação por corrente contínua;
2. bateria, cuja função é armazenar energia fornecida pela célula
fotovoltaica durante o dia para, à noite, suprir o compressor
da energia elétrica necessária para manter a temperatura dos
imunobiológicos, evitando sua deterioração;
3. circuito regulador/controlador de carga, cujo objetivo é controlar
tensões elétricas fornecidas à bateria e ao compressor;
4. célula fotovoltaica, elemento capaz de transformar energia luminosa
do Sol em energia elétrica;
5. condensador, que passa o fluido refrigerante de seu estado gasoso
para o líquido;
6. fusível, que protege o sistema contra eventuais sobrecargas;
7. painel de controle luminoso, que fornece informações visuais,
conforme o manual do operador;
8. filtro secador;
9. tubo capilar.

163
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Foto 8 – Refrigerador fotovoltaico

Foto: Alexandre Moreno Azevedo e Pedro Luiz da Silva Moura (2016).


Painel de
controle

Filtro
secador
Compressor Condensador
Fusível
Circuito regulador/
Controlador de carga
Bateria

Vimos que os refrigeradores ou os equipamentos de refrigeração são


importantes aliados na conservação dos imunobiológicos, mas outros
materiais também são utilizados com o mesmo propósito. São eles: cai-
xas térmicas e monitores de registro de temperatura.

Caixas térmicas
Embora não possuam os mesmos elementos de um sistema de refri-
geração, as caixas térmicas são bastante utilizadas nas atividades coti-
dianas de vacinação. Elas podem ser de dois tipos: de poliestireno e
poliuretano.

Por sua baixa confiabilidade, precário controle de temperatura e ausên-


cia de registros das variações internas de temperatura, tem-se reco-
mendado que as caixas de poliestireno
Figura 9 – Câmara de conservação portátil
expandido (isopor) sejam substituídas
pelas de poliuretano, já que estas são
mais duráveis, resistentes e de fácil higie-
nização (BRASIL, 2013).

As caixas térmicas têm papel importante


na manutenção da temperatura do imu-
nobiológico, seja nas atividades diárias
ou durante seu transporte. No entanto,
atualmente, já existe alternativa para

164
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

substituí-las, em virtude dos problemas que podem apresentar. Está


disponível no mercado brasileiro a câmara de conservação portátil,
com registro na Anvisa, para transporte de termolábeis. Ela é dotada
de controle e registradores adequados ao armazenamento de vacinas
e possui bateria para falta de energia ou instabilidade na rede; alguns
modelos podem ser ligados em veículos automotores com saída de 12
volts e/ou à rede elétrica convencional.

Lembre-se!
A escolha de quaisquer desses equipamentos dependerá da atividade a
ser realizada, do tempo necessário para realização, do quantitativo dos
imunobiológicos etc. Não podemos esquecer que a escolha também deve
levar em conta o tipo de material, a densidade e especificidade, conforme
já apresentado no capítulo anterior sobre termologia. Precisamos associar
aqueles conhecimentos às informações sobre refrigeração para uma
atuação consciente e calcada em bases técnicas sólidas.

Monitores de registro de temperatura


para refrigeradores de vacinas
Além dos refrigeradores e derivados, outros equipamentos são utiliza-
dos na conservação dos imunobiológicos. Como mencionado anterior-
mente, os monitores de temperatura (data loggers) e os termômetros são
importantes aliados para a manutenção, o monitoramento e o controle
da temperatura dos imunobiológicos. Precisamos, assim como fizemos
com os refrigeradores, conhecer a base de seu funcionamento e as prin-
cipais características e recomendações durante sua utilização.

Data loggers
São pequenos dispositivos eletrônicos que mensuram as temperaturas
em intervalos preestabelecidos, apresentando os resultados durante um
período de tempo. Eles podem ter forma e tamanhos variados. Cada
data logger contém uma miniatura de computador, devendo ser confi-
gurado e programado para registrar as temperaturas em intervalos de
acordo com o que se deseja.

Alguns refrigeradores específicos para vacinas têm um data logger embu-


tido, e seus registros devem ser realizados de acordo com as orientações
do fabricante. Os loggers precisam ser programados por intermédio do
computador. Uma vez programados, são desconectados do computador

165
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

e colocados no refrigerador de vacinas, onde funcionarão independen-


temente, com sua própria bateria, até que o registro seja baixado para
o computador. O objetivo dos loggers é fornecer uma série ou um mapa
das temperaturas do equipamento e das vacinas.

Avanços na tecnologia têm permitido a confecção de inúmeros tipos de


loggers. Entretanto, todos fornecem informações básicas, como:
G indicação precisa das temperaturas do refrigerador e das vacinas.
Podem ser usados para mapear “pontos frios” ou investigar
problemas, identificando as áreas seguras para o armazenamento de
vacinas;
G registro e armazenamento dos dados de temperatura para serem
consultados oportunamente;
G monitoramento da temperatura dos equipamentos e produtos;
G identificação das áreas onde as vacinas podem congelar.

Atenção!
• As temperaturas mínima/máxima devem ser registradas duas vezes ao
dia, de forma manual, independentemente do data logger, como forma
de segurança e de detecção precoce de qualquer rotura na rede de frio.
• Caso o data logger seja usado para o monitoramento rotineiro das
temperaturas, em lugar de um termômetro de mínimo-máxima, ele deve
ter um display visual de temperaturas mínimo-máxima para permitir os
registros em tempo real. Visando, também, à segurança das vacinas, os
data loggers podem ser programados para acionar o alarme quando a
temperatura estiver fora da faixa de +2°C a +8°C.

Considerações para aquisição dos data loggers


Antes de efetuar a compra de data loggers, assim como de qualquer outro
equipamento, os profissionais da saúde ou gestores devem obter todas
as informações a respeito do produto com os fabricantes. É importante
que esteja claro o tipo de uso do logger, ou seja, se será usado como
método permanente de monitoramento das temperaturas; se pode ser
configurado para registros de temperatura em intervalos, conforme
desejado; se é de fácil uso, especialmente em relação ao registro e ao
download dos dados; se a temperatura corrente é visível; se tem display
para visualização das temperaturas máxima e mínima etc.

A precisão do logger, bem como informações sobre a vida média da bate-


ria são também importantes para a aquisição do monitor, pois permite

166
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

que o gestor obtenha um equipamento adequado às necessidades do


serviço, evitando desgastes por mau uso e, consequentemente, gastos
desnecessários. Recomenda-se data logger preciso, com variação máxima
de ±0,1°C, e que sua precisão possa ser verificada pelo usuário, além do É fundamental que toda a
equipe seja capacitada para
técnico. Esses são aspectos que devem ser considerados no momento
o manuseio do data logger
da compra. e para interpretação de
seus registros, pois os dados
fornecidos auxiliarão os
Termômetros profissionais da rede de frio
ou da vacinação a conhecer
Os termômetros são, também, essenciais no monitoramento da tem- o funcionamento de seus
refrigeradores.
peratura de um refrigerador e do próprio imunobiológico. Reque-
rem verificações anuais, para assegurar precisão em sua mensuração.
Visando essa precisão, é importante verificar as baterias, evitando que
fiquem descarregadas, e proceder à troca destas, quando necessário,
ou, no mínimo, a cada 12 meses. Avaliar possíveis danos também no
cabo extensor, em caso de termômetro digital, pode contribuir para a
precisão do termômetro, uma vez que danos desse tipo podem afetar a
leitura dos valores fornecidos pelo instrumento.

A precisão dos monitores de temperatura como logger e termômetros


deve ser uma preocupação constante do especialista ou gestor da rede
de frio. Em ambos, o grau aceitável de precisão deve variar entre ±0,1°C,
devendo ser sempre verificada com o fabricante a precisão esperada
para aquele tipo de logger ou termômetro. Recomenda-se a verificação
da precisão do termômetro após a troca da bateria ou em situações de
problemas na rede de frio, conforme avaliação do gestor.

Aspectos a considerar na localização do


refrigerador de vacinas
A escolha do refrigerador e o conhecimento sobre seu funcionamento,
juntamente com uma equipe capacitada, são elos determinantes da efi-
ciência na rede de frio. Além de conhecermos a base de funcionamento
dos equipamentos, é preciso considerar as condições do ambiente em
que serão instalados, uma vez que isso influenciará seu rendimento e
funcionamento.

Vários aspectos devem ser considerados ao se instalar um refrigerador


na sala de vacinas, e alguns já são bem conhecidos dos profissionais
de saúde que atuam na imunização. O objetivo será sempre o mesmo:
permitir que o refrigerador funcione adequadamente, com o mínimo
possível de desgaste e em condições que permitam a manutenção da
temperatura interna. É sempre recomendado que o refrigerador:

167
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G seja instalado em locais fora do alcance da luz solar direta ou de


lâmpadas incandescentes e que permitam a circulação do ar;
G não fique encostado nas paredes da sala, para não estar em contato
Os refrigeradores/câmaras
refrigeradas necessitam de
direto com as mudanças de temperatura do ambiente;
espaço livre dos lados e atrás
deles para prevenir acúmulo
G esteja localizado em áreas seguras, para reduzir riscos como:
de calor. Consulte o fabricante desligamento da tomada, abertura desnecessária da porta do
para conhecer as dimensões refrigerador, locais/salas de grandes flutuações da temperatura
recomendadas.
ambiente (que podem afetar a temperatura do refrigerador) etc.

A desconexão acidental do refrigerador de sua fonte de energia pode


causar dano à vacina, se não for notada imediatamente. Uma forma
de evitar a situação é colocar um adesivo acima do interruptor e da
tomada. Outro recurso que pode ser usado é um dispositivo que pre-
vina o desligamento de refrigeradores da fonte de energia. Qualquer
que seja o recurso utilizado, o profissional deve estar atento a esses
possíveis riscos, uma vez que as grandes perdas de vacinas estão rela-
cionadas com falhas desse tipo.

Estabilização da temperatura do
refrigerador de vacinas
O profissional de saúde da rede de frio ou de imunização é elemento
essencial na manutenção da temperatura das vacinas. Sua ação é
decisiva!

Por isso, a equipe deve estar familiarizada com o refrigerador de vacinas


e registrar as temperaturas em várias seções do equipamento, como:
cada prateleira, de cima a baixo, da frente para o fundo e de lado a
lado. A estabilização do refrigerador antes da armazenagem das vacinas
minimiza a probabilidade de elas serem expostas a variações de tempe-
ratura, que afetam a sua eficácia. É importante lembrar que, em alguns
refrigeradores, a área mais fria é a prateleira de cima e, em outros, a
frente da prateleira inferior. Por isso, o profissional deve ter atenção,
pois os modelos de refrigeradores podem diferir de pontos ou áreas de
maior ou menor frio, mesmo que sejam do mesmo fabricante.

A identificação dos “pontos frios” pode ser feita pelo monitoramento


detalhado do refrigerador, por exemplo, colocando data loggers ou ter-
mômetros em todas as áreas do equipamento e observando as tempe-
raturas diferentes, antes de usar o refrigerador para armazenar vacinas.
Recomenda-se monitorar cada área por, pelo menos, 24 horas. Essa
conduta permite capturar todas as flutuações que ocorram.

168
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

Dependendo do tipo e do número de monitores que se tenha na uni-


dade, o monitoramento abrangente da temperatura pode levar algum
tempo para ser concluído. Durante a avaliação dos “pontos frios”, indi-
ca-se usar uma “massa fria”, por exemplo, garrafas com água, imitando Estoque excessivo no
um lote de vacina, uma vez que os refrigeradores se comportam dife- refrigerador/câmara refrigerada
coloca as vacinas em risco,
rentemente quando estão vazios. impede a circulação do ar e
reduz as possibilidades de se
obter temperaturas estáveis.
A verificação e o registro das temperaturas de um refrigerador de vacinas
permitem que sejam identificados problemas ou falhas no funcionamento
do equipamento e flutuações da temperatura ao longo da jornada de
trabalho, evitando perdas de vacina ou de sua potência.

Manutenção dos refrigeradores


e equipamentos de armazenagem
de vacinas
A maioria das falhas que ocorrem na câmara refrigerada/refrigerador
tem, como consequência, variação da temperatura interna para mais
ou para menos, o que alterará a conservação do que estiver em seu
interior. O controle constante da temperatura interna, por meio de um Para saber mais sobre o uso
termômetro, se faz necessário. do termômetro no controle
constante da temperatura
interna, consulte o Manual
Atualmente, recomenda-se não só o uso do termômetro, mas também o de rede de frio do Programa
de termorregistradores, que têm como principal característica registrar Nacional de Imunizações
(2013, p. 59).
as variações de temperatura ao longo do tempo. Esses equipamentos
indicam se o sistema de refrigeração apresenta alguma falha.

Ao apresentarem falhas, alguns componentes do sistema de refrigera-


ção podem levar ao desligamento total da câmara refrigerada/refrige-
rador. Quando isso ocorre, em pouco tempo a temperatura se elevará
em seu interior, inutilizando os imunobiológicos. Portanto, prevenir a
Existem falhas aleatórias,
ocorrência de falhas é o objetivo que devemos almejar. ou seja, que não há como
prever, tais como: falta de luz,
queima de fusível, entre outras.
• É importante lembrar que o gestor da rede de frio deve buscar sempre Conhecendo o funcionamento
o auxílio do técnico para a resolução do problema. Isso não impede que o dos equipamentos e as falhas
mais comuns, podemos nos
profissional usuário conheça o funcionamento dos equipamentos e de seus antecipar e intervir, evitando
elementos. problemas ou auxiliando na
identificação da causa e, se
• A manutenção adequada é outra forma de segurança do uso dos possível, contribuindo para sua
equipamentos. solução.

169
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Na rede de frio, para os equipamentos câmara refrigerada/refrigerador,


destacamos três tipos de manutenção: preventiva, corretiva e preditiva.

Para saber mais sobre 1. Manutenção preventiva: realizada em períodos predeterminados


manutenção de equipamentos, ou de acordo com o manual do fabricante, respeitando-se
consulte a NBR 5.462,
de 1994, que versa
componentes a serem substituídos ou verificados, conforme
sobre confiabilidade e utilização e frequência de uso do equipamento. Por exemplo, teste
mantenabilidade. Verifique, de efetividade de compressão do compressor.
em seu serviço, se há um
exemplar da norma. Para que possamos manter a câmara refrigerada/refrigerador em
perfeitas condições de uso, por um período prolongado de tempo,
evitando que se percam imunobiológicos, alguns cuidados devem ser
tomados periodicamente, tais como:
G verificar a borracha da porta do refrigerador/câmara refrigerada;
G verificar as dobradiças da porta do refrigerador/câmara refrigerada;
G verificar o nivelamento do refrigerador/câmara refrigerada;
G verificar se o cabo de alimentação está íntegro;
G verificar se as tomadas (parede e cabo) estão em bom estado;
G observar se há oscilação excessiva de energia elétrica no local; em
caso positivo, instalar um nobreak adequado à potência da câmara
refrigerada/refrigerador, ou solicitar verificação na instalação
elétrica;
G não utilizar a câmara refrigerada/refrigerador para outros fins;
G não instalar a câmara refrigerada/refrigerador sem pés;
G não instalar a câmara refrigerada/refrigerador em locais de piso instável;
G evitar arrastar a câmara refrigerada/refrigerador;
G instalar a câmara refrigerada/refrigerador em local abrigado do
tempo (nem muito frio, nem muito quente);
G não colocar a câmara refrigerada/refrigerador muito próximo à
parede, nem uma de costas para a outra;
G abrir a porta somente quando necessário.

2. Manutenção corretiva: realizada após a ocorrência do defeito,


restaurando suas condições originais de funcionamento. Por
exemplo, troca da borracha (gaxeta) de vedação da porta.
3. Manutenção preditiva: realizada através do acompanhamento de
indicadores previamente estabelecidos, cujos limites e tolerâncias
admissíveis não devem ser ultrapassados. Por exemplo, limites de
vibrações, desgaste de componentes, alterações na temperatura etc.

170
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

Na rede de frio, consideram-se limites e tolerâncias admissíveis para


imunobiológicos as temperaturas entre +2ºC e +8ºC.

Para refletir
Quais tipos de manutenção são realizados no seu trabalho?
Se não acontecem todos eles, você saberia o motivo? Em que você
pode contribuir para a manutenção adequada dos refrigeradores do
seu serviço?

O Quadro 1 apresenta pequenos problemas e soluções que podem


ocorrer no dia a dia com os equipamentos de refrigeração utilizados na
rede de frio.
Quadro 1 – Problemas frequentes com refrigeradores

Problema Causa Solução


Não liga. Falta de energia/voltagem da rede baixa. Verificar o fusível, a tomada, o cabo,
o disjuntor; verificar se a voltagem da
concessionária local está de acordo com o
padrão local.
Compressor que Voltagem muito alta ou muito baixa. Verificar se a voltagem da concessionária local
liga e desliga com está de acordo com o padrão local.
frequência anormal.
Compressor com Baixa voltagem. Verificar se a voltagem da concessionária local
zumbido e que não está de acordo com o padrão local; na tomada
liga. utilizada, não deve haver outros aparelhos
ligados.
Compressor ligado Frequente abertura de porta; borracha da porta danificada; Evitar abrir a porta desnecessariamente;
excessivamente. lâmpada interna acesa continuamente (a maioria das verificar interruptor da porta; não utilizar
lâmpadas usadas nos refrigeradores é incandescente, gera materiais que impeçam a circulação de
calor, o que eleva a temperatura interna do equipamento, ar na parte de trás do equipamento; não
ocasionando a armação do compressor); material impedindo colocar materiais em grande quantidade e
a circulação de ar no condensador; material quente de uma única vez no equipamento. Trocar as
colocado repentina e excessivamente na câmara refrigerada/ dobradiças.
refrigerador. Dobradiças da porta com defeito, o que
ocasiona desnivelamento da porta, permitindo entrada de ar
quente e acionando o compressor.
Ruído anormal. Desnivelado/encostado na parede. Regular os pés; afastar da parede; colocar
calço, se necessário; verificar se o piso é estável.
Interior muito quente. Temperatura ambiente muito alta; excesso de gelo no Instalar equipamento em local arejado; degelar
evaporador; material encostado no bulbo do termostato; periodicamente; afastar material do bulbo do
termostato na posição errada. termostato; colocar termostato compatível com
a temperatura externa.
Interior muito frio. Termostato na posição errada; temperatura ambiente muito Colocar termostato compatível com a
fria; material encostado no bulbo do termostato. temperatura externa; colocar equipamento em
local abrigado; desencostar material do bulbo
do termostato.

171
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Quadro 1 – Problemas frequentes com refrigeradores (cont.)

Problema Causa Solução


Vazamento de óleo. Equipamento desnivelado; tubulação partida. Nivelar equipamento; acionar assistência
técnica.
Goteiras internas. Borracha da porta danificada; porta desnivelada. Substituir borracha da porta; nivelar a porta.
Excesso de gelo Distribuição incorreta de materiais no interior do Distribuir melhor o material; trocar a borracha
no congelador/ equipamento; borracha da porta danificada. da porta.
evaporador.
Lâmpada interna não Lâmpada queimada. Trocar lâmpada.
acende.
Pouca refrigeração. Pouca circulação de ar frio; porta abrindo com muita Melhorar redistribuição dos materiais dentro
frequência; termostato desajustado. do refrigerador; abrir a porta somente quando
necessário; regular o termostato; retirar objetos
desnecessários.
Excesso de Termostato desajustado. Regular termostato.
refrigeração.
Suor na parte externa. Alta umidade do ar; vedação da porta ruim. Instalar em local ventilado; regular os pés,
deixando o refrigerador inclinado para trás.
Suor na parte interna. Porta abrindo com muita frequência; umidade interna Abrir a porta somente quando necessário;
excessiva; vedação da porta ruim; armazenamento guardar materiais embalados e frios; regular os
de materiais quentes; porta mal fechada; termostato pés, deixando o refrigerador inclinado para trás;
desajustado. remover algo que esteja atrapalhando a porta;
regular o termostato.

Considerações finais
Ao longo deste capítulo, entendemos que o controle da temperatura dos
diversos equipamentos de conservação de imunobiológicos é de funda-
mental importância para que os produtos mantenham a sua potência
em todas as etapas da rede de frio, até o seu destino final. Aprendemos
que os cuidados com esses equipamentos incluem: seguir as recomen-
dações do manual do fabricante, acompanhar o seu funcionamento e
comunicar imediatamente qualquer defeito, por mais simples que seja,
ao responsável pelo contato com a equipe técnica.

São procedimentos como esses que garantem a manutenção dos equi-


pamentos em perfeitas condições de operação. Possivelmente, você será
a primeira pessoa que identificará um indício de mau funcionamento
em uma câmara refrigerada/refrigerador; quanto mais rápida for essa
identificação e a comunicação do indício, mais rapidamente poderá ser
efetuado o conserto. A demora em informar um mau funcionamento
só agravará o problema. Portanto, você é parte fundamental de todo
esse processo! E para garantir o êxito, contamos com você na busca do
conhecimento que fundamente sua ação!

172
Refrigeração e equipamentos da rede de frio

Referências
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5.462:1994: confiabilidade e
mantenabilidade. Rio de Janeiro, 1994.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Manual de rede de frio do Programa Nacional de Imunizações. 4. ed.
Brasília, DF, 2013. Disponível em: <http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/julho/03/
manual-rede-frio.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2014.

EMBRACO. Componentes elétricos dos compressores de revenda. Joinville, 2009. Disponível em:
<http://www.embraco.com/DesktopModules/DownloadsAdmin/Arquivos/01019.pdf >. Acesso em:
3 ago. 2016.

FERRAZ, F. Refrigeração. Salvador: Centro Federal de Educação Tecnológica da Bahia, 2008.


Apostila.

LAUAND, C. A. Manual prático de geladeiras: refrigeração industrial e residencial. São Paulo:


Hemus, 2004.

MENDES, L. M. O. Refrigeração e ar-condicionado: teoria, prática, defeitos. São Paulo: Ediouro,


1994.

MENEZES, M. S. Refrigeração e ar-condicionado. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo/


Faculdade de Engenharia e Arquitetura, 2005.

PORTAL DA REFRIGERAÇÃO. Filtro secador. [S.l.], 2008. Disponível em: <http://www.refrigeracao.


net/Topicos/filtro_seca.htm>. Acesso em: 3 ago. 2016.

SENAI. Curso de refrigeração mecânica. São Paulo, 2003. Apostila.

SILVA, J. G. Introdução à tecnologia da refrigeração e da climatização. São Paulo: Artliber, 2003.

173
8. Gestão da rede de frio de
imunobiológicos
André Silva Cardoso, Clayton Bernardo da Costa, Cristiane Pereira de Barros,
Felipe da Silva Furtado, João Leonel Batista Estery, Walquíria Gonçalves dos
Santos Teles e Yeda Célia Silva Eugênio

Os imunobiológicos precisam ser mantidos em determinada tempera-


tura para lhes conferir proteção. Para tal, são conservados por meio de
um sistema que envolve diversos procedimentos, executados de forma
sincrônica e articulada, denominado cadeia ou rede de frio. Para enten- O Manual de rede de frio,
publicado pelo Ministério da
dermos esse sistema, várias informações foram apresentadas ao longo Saúde (BRASIL, 2013), faz
deste livro, de modo a favorecer a compreensão sobre a rede de frio e distinção entre os termos rede
sua importância, os fundamentos que balizam essa rede, tais como os e cadeia de frio. Neste livro,
adotamos rede de frio, termo
princípios da física relacionados à temperatura dos imunobiológicos, largamente empregado nas
o efeito da temperatura sobre esses produtos e o papel da refrigeração publicações brasileiras sobre o
assunto.
para a garantia da manutenção da temperatura apropriada e, conse-
quentemente, de sua qualidade.

O sistema, portanto, envolve um complexo logístico em que os imu-


nobiológicos, para atingirem seu destino, precisam percorrer um longo
trajeto, cercado de cuidados indispensáveis até chegarem com segu-
rança à população, conservando suas propriedades imunogênicas. O
conjunto de procedimentos que integram esse sistema inclui armaze-
namento, transporte, distribuição e manipulação das vacinas em condi-
ções adequadas de refrigeração, contando, para isso, com equipamentos
e equipe técnica especializada.

Todos esses procedimentos visam, essencialmente, garantir a manuten-


ção da temperatura dos imunobiológicos, visto que são termolábeis e/
ou fotossensíveis e, obrigatoriamente, necessitam de armazenamento
adequado para que suas características sejam mantidas.

Para que possamos conhecer e entender melhor a rede de frio de imu-


nobiológicos, abordamos, neste capítulo, a forma de sua organização
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

e estruturação, as etapas envolvidas no processo e os insumos utiliza-


dos, demonstrando a importância do planejamento e do trabalho em
equipe para a manutenção da termoestabilidade dos imunobiológicos,
que depende, em sua essência, do funcionamento eficiente de cada ele-
mento ou elo dessa complexa rede.

Definindo a rede de frio

Prosseguindo, precisamos, inicialmente, compreender o que significa


rede de frio de imunobiológicos.

Rede de frio é o processo de recebimento, armazenamento, conser-


vação, manipulação, distribuição e transporte dos imunobiológicos
(AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2007). Em outras
palavras, podemos entendê-la como um processo logístico, composto
por um conjunto de procedimentos destinados à conservação dos imu-
nobiológicos, em temperatura ideal para que possam, de fato, imunizar.

Para isso, deve funcionar de forma integrada e articulada como os elos


ou as tramas que se interligam e formam uma rede, garantindo a tem-
peratura dos imunobiológicos desde sua fabricação até a chegada ao
destino final (usuário).

Qualquer alteração ou quebra na rede ou em parte dela (como manu-


seio inadequado, equipamento com defeito, ou falta de energia elétrica)
interrompe o processo de refrigeração, comprometendo a potência dos
imunobiológicos. Essa quebra, ou rompimento, pode ocorrer em qual-
quer etapa e é denominada de rotura. Isso significa que, a qualquer
quebra na temperatura ou condição inadequada de manipulação do
imunobiológico, haverá “rotura na rede de frio”, conforme apresenta
a Figura 1, influenciando de forma decisiva a qualidade da vacina. Em

176
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

alguns países, como, por exemplo, na Austrália, a rotura é conhecida


como “rotura da cadeia de frio”.

Figura 1 – Rotura da rede de frio

Ilustração: Dilson dos Santos Oliveira (2015).

Importante!
Na ocorrência de uma rotura da rede de frio, devem-se seguir as
recomendações do Ministério da Saúde e/ou das secretarias estaduais e
municipais de saúde e/ou os protocolos estabelecidos, conforme constam
nas publicações desses órgãos.

Para que se tenha uma rede de frio confiável (portanto, sem roturas)
e se possa garantir a qualidade dos imunobiológicos, alguns elementos
são necessários, como:
Garantia de qualidade da
G equipamentos em condições de armazenar, transportar e distribuir vacina é sinônimo de controle
com segurança; rigoroso das condições de
conservação, transporte,
G trabalhadores da rede de frio devidamente capacitados, que armazenamento e distribuição.
Sendo assim, a manutenção
gerenciem o armazenamento, façam o transporte e a distribuição
das condições da rede de frio e
adequadamente; a correta avaliação dos fatores
que podem afetar a qualidade
G instalações apropriadas e adequadas ao armazenamento nos diferentes dos imunobiológicos são
níveis: nacional, estadual, regional, municipal e unidade local. fundamentais.

Além dessas questões, é preciso considerar que as vacinas, substâncias


biológicas delicadas, podem se tornar menos eficazes ou destruídas se
forem: congeladas, expostas ao calor, ou à luz solar direta ou luz UV,
incluindo a fluorescente. Quando expostas, repetidamente, a tempera- Por isso, se não protegermos
nossas vacinas, elas não
turas fora da faixa recomendada, terão perda de potência acumulativa- protegerão nossa comunidade!
mente, sem que se possa reverter esse processo.

177
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

O efeito das variações de Portanto, todas as vacinas devem ser armazenadas e transportadas
temperatura sobre as vacinas
é discutido no Capítulo 6, “A
dentro da faixa de temperatura recomendada, em todos os momentos;
rede de frio e a importância todas as pessoas responsáveis pelo seu manuseio, em qualquer fase,
da temperatura dos devem entender a importância de uma gestão eficiente dos imunobio-
imunobiológicos”, deste livro.
lógicos, perseguindo sempre os 5°C.

Por que perseguir os 5ºC?


Porque 5 graus Celsius (°C) é o ponto médio entre +2°C-+8°C, que é a
faixa de temperatura recomendada para o armazenamento de vacinas.
Muitas são danificadas ou destruídas em temperaturas fora dessa faixa,
lembrando que algumas são sensíveis ao calor, e outras não suportam o
congelamento. Mantendo-se a temperatura a 5°C, garante-se uma faixa
de segurança, evitando aquecimento (mais de 8ºC) ou congelamento
(menos de 2ºC).

Consolidados esses conceitos, vamos entender como a rede está


estruturada.

Estrutura da rede de frio de


imunobiológicos
A depender de situações Para que se possa garantir a manutenção da qualidade das vacinas,
epidemiológicas e/ou emergenciais
específicas, os fluxos podem
é necessário contar com uma rede estruturada. Com esse objetivo,
ocorrer de forma horizontalizada. a rede de frio de imunobiológicos permeia as cinco esferas adminis-
Por necessidade, um estado trativas, organizando-se em instâncias, com fluxos de distribuição e
pode realizar algumas atividades
diretamente com outro estado armazenamento basicamente verticalizados (BRASIL, 2013), mas que
ou, na mesma perspectiva, um devem trabalhar de maneira articulada. As instâncias da rede de frio de
município com outro município
(por exemplo, no caso de
imunobiológicos são as mesmas das esferas administrativas: nacional,
necessidade excepcional de envio estadual, regional, municipal e local.
de imunobiológicos de um local
para o outro). Qualquer que seja
o fluxo, este deverá ser feito Instância ou nível nacional
sob orientação geral do órgão
imediatamente superior. A instância nacional é representada pelo Ministério da Saúde, no qual
está inserido o Programa Nacional de Imunizações (PNI), que tem como
atribuição, por meio da sua Coordenação Geral (CGPNI), a definição de
normas e parâmetros técnicos para utilização e distribuição dos imuno-
biológicos.

A CGPNI está organizada por áreas técnicas, com um coordenador


geral. Cada área é responsável por atividades específicas. Em 2014,
essas áreas se organizavam da seguinte forma:
G Gerência Técnica Científica e Normatização; 

178
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

G Gerência Técnica Gestão de Insumos;


G Gerência Técnica de Apoio à Gestão;
G Gerência Técnica de Apoio Administrativo.

A área responsável por todas as ações relativas à gestão e ao funciona-


mento da rede de frio é a Gerência Técnica Gestão de Insumos. Entre
suas atribuições estão o planejamento, a aquisição e a distribuição dos
imunobiológicos para as 27 unidades federadas, bem como o acompa-
nhamento sistemático do controle de qualidade dos produtos adquiri-
dos e distribuídos.

Para a operacionalização da logística de distribuição dos imunobioló-


gicos às demais instâncias, a CGPNI conta com um complexo logístico,
que representa a instância nacional, denominado Central Nacional
de Armazenagem e Distribuição de Imunobiológicos (Cenadi). Mais
adiante, trataremos especificamente dessa instância.

Diferentes vias (terrestre, aérea etc.) são usadas para o transporte dos
imunobiológicos do laboratório produtor até a Cenadi. Em geral, a via
aérea é utilizada para o imunobiológico produzido fora do país; no caso
de laboratório nacional, são usuais tanto a via terrestre como a aérea.
Em qualquer das vias, o controle da temperatura durante todo o trajeto
é fundamental, como também a logística utilizada, os equipamentos, os
tipos de embalagens usados etc., e a cada instância compete a respon-
sabilidade pelo cumprimento e monitoramento de todos esses aspectos
e/ou condições para o transporte correto.

O caminho dos imunobiológicos se inicia na instância nacional,


representada pelo Ministério da Saúde (MS-CGPNI), que libera a
distribuição. A partir do momento que saem dos laboratórios produtores
e são armazenados na Cenadi, ela se torna responsável pela qualidade
e segurança dos imunobiológicos no que se refere a organização,
distribuição, controle de temperatura e transporte, até estes serem
entregues às centrais estaduais de imunização.

Instância ou nível estadual


Esse nível de gestão é representado pelas Secretarias Estaduais de
Saúde, por meio da Coordenação Estadual de Imunizações, responsável
pela rede de frio no nível estadual. O transporte dos imunobiológicos
da instância central até a estadual depende da disponibilidade da malha
aérea e das condições relacionadas ao percurso e ao local do destino,

179
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

que deve apresentar condições adequadas para o armazenamento dos


produtos.

Para se construir uma rede de frio nesse nível ou instância, é necessária


uma estrutura mínima em que sejam previstas áreas físicas que dispo-
nham de (BRASIL, 2013):
G espaço para armazenagem e distribuição, com câmaras frigoríficas
positivas e negativas. Dependendo da demanda, poderá ter
almoxarifado, sala de preparo, área de recebimento, inspeção e
distribuição de imunobiológicos;

Foto 1 – Cenadi

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).


Foto 2 – Acesso à câmara fria na Cenadi

Foto: Felipe da Silva Furtado (2015).

G área com previsão de espaços adequados às atividades de gestão


e administração, bem como sala para realização de reuniões,
planejamento, educação em saúde, formação e capacitação de
recursos humanos;

180
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Foto 3 – Sala de reunião da Cenadi


Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

G estrutura adequada à carga e descarga de imunobiológicos; área


para gerador, para garantia do sistema back up de geração de energia
elétrica; espaço para instalação de equipamentos condensadores,
depósito de material de limpeza e higiene; e ambiente para seleção
e guarda temporária de resíduos, além de espaços para copa,
recepção/espera e banheiros.

Foto 4 – Recebimento de carga na Cenadi Foto 5 – Sistema de gerador de energia da Cenadi


Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

Esse nível ou instância é composto de estruturas existentes nas 27


unidades federativas do país, havendo, portanto, 27 centrais estaduais
de armazenamento e distribuição de imunobiológicos, que estão geral-
mente localizadas nas capitais e sob a responsabilidade técnico-admi-
nistrativa das coordenações estaduais de imunizações das Secretarias
Estaduais de Saúde (BRASIL, 2013). A coordenação estadual é respon-
sável por distribuir os imunobiológicos para os municípios, por meio da
instância regional, quando existir.

A partir do momento em que o estado recebe os imunobiológicos


enviados pela Cenadi, ele se torna responsável por toda a logística que

181
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

os envolve, ou seja, recebimento, armazenamento, distribuição, e pela


qualidade e segurança dos produtos.

A CGPNI trabalha articulada com a instância estadual no planejamento


das atividades de vacinação, considerando o Calendário Nacional de
Vacinação e a situação epidemiológica vivenciada. Esse planejamento
visa ao abastecimento de todas as salas de vacina do estado, atendendo
às demandas específicas de cada localidade, respeitando as condições
adequadas e o processo logístico necessário para a conservação dos
imunobiológicos, seja no nível municipal ou local.

Instância ou nível regional


A instância regional é representada pelas centrais regionais de rede de
frio, subordinadas às Secretarias Estaduais de Saúde, e tem, como fun-
ção, distribuir os imunobiológicos aos municípios de sua abrangência.
Para realizar essa tarefa, de forma adequada, deve possuir estrutura com
área para armazenamento dos imunobiológicos, almoxarifado para
guarda de insumos como seringas, agulhas, caixas térmicas etc.

Deve ter, também, área de acesso para os veículos de carga, destinada


ao recebimento, à preparação e à distribuição dos imunobiológicos, e
outras que possibilitem a realização de atividades administrativas, téc-
nicas e de ensino/pesquisa, sendo o último desejável e não obrigatório.
Seu dimensionamento deve estar de acordo com as funções/atribuições
citadas, devendo dispor, ainda, de gerador, como sistema de segurança
para os casos de falta de energia elétrica, muito comum em determina-
das regiões do país.

O transporte dos imunobiológicos e todo o processo que envolve seu


recebimento e distribuição em temperatura adequada devem ser reali-
zados por técnico especializado/capacitado desde a instância estadual,
de modo a garantir que todos os procedimentos sejam realizados con-
forme o preconizado pelo PNI, no Manual de rede de frio do Programa
Nacional de Imunizações (BRASIL, 2013).

Instância ou nível municipal


A central municipal de rede de frio desse nível ou instância (CMRF)
está incluída na estrutura organizacional da Secretaria Municipal de
Saúde e tem como atribuição o planejamento integrado das ações reali-
zadas nesse nível de gestão, além do armazenamento e distribuição dos
imunobiológicos (BRASIL, 2013).

182
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Como no nível regional, a instância municipal deve dispor de estrutura


e equipamentos que comportem todos os procedimentos já menciona-
dos, especialmente aqueles destinados ao armazenamento de imuno-
biológicos que, posteriormente, serão distribuídos e utilizados na sala
de vacinação, do nível local. Por isso, o gestor da instância municipal
deve planejar as atividades zelando para que todos os insumos e imuno-
biológicos necessários estejam disponíveis, bem como dispor, também,
de um plano de contingência, com todos os fluxos e procedimentos
detalhados para o caso de qualquer problema com os equipamentos
da rede de frio. A equipe deve estar devidamente treinada e orientada
quanto cada procedimento constante desse plano de contingência.

Seja na instância regional ou municipal, os imunobiológicos deverão


ser conservados em câmaras frias, freezers (–20ºC), ou em refrigerado-
res (+2ºC a + 8ºC) específicos para vacina, conforme a temperatura
indicada para cada produto. Nessas instâncias, a instalação da câmara Por isso, enfatiza-se sempre
fria, a quantidade de freezers e refrigeradores comerciais e domésticos a necessidade de profissional
devidamente capacitado
dependem do volume a ser estocado, do tempo de armazenamento e da para as atividades de rede de
rotatividade dos produtos. Atualmente, o uso de refrigeradores domés- frio, em qualquer instância.
Somente um técnico
ticos está em desuso, sendo indicado o uso de equipamentos especí- qualificado poderá estar atento
ficos para vacina. É fundamental que todos os trabalhadores saibam às características e condições
manuseá-los, disponham de um plano de contingência para o caso de necessárias dos equipamentos
e ao acondicionamento dos
qualquer avaria nesses refrigeradores, e possam estabelecer rotinas que produtos imunobiológicos.
incluam as manutenções preventivas e corretivas desses equipamentos.

Quando o município recebe os imunobiológicos, passa a ser responsável


pela qualidade e segurança desses produtos em quaisquer dos
procedimentos, seja no transporte, na distribuição, no controle de
temperatura etc. Por isso, é fundamental que gestores e trabalhadores de
qualquer nível ou instância estejam devidamente orientados e capacitados
para atuar de forma correta em todas as etapas.
O controle de temperatura, as orientações técnicas e capacitações dos
profissionais que trabalham na rede de frio, seja em nível regional ou
municipal, estão sob a responsabilidade do nível estadual, não invalidando
a iniciativa dos municípios para elaboração de processos de capacitação de
sua equipe e de outros municípios.

Instância ou nível local


A instância local, representada pela sala de vacinação (SV), é a instância
final da rede de frio, exclusivamente responsável pelos procedimentos
ou estratégias de vacinação de rotina, campanhas, bloqueios e intensi-
ficações e vacinações extramuros (BRASIL, 2013).

183
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Em 2014, foram referenciadas pelo PNI, aproximadamente, 36 mil salas


de vacina em funcionamento à disposição da população. Todas elas
estão localizadas em unidades/serviços da rede de saúde, policlínicas e
hospitais, ocupando posição estratégica na atenção básica.

Nas instâncias local e municipal, a rede de frio deve armazenar os imu-


nobiológicos em câmeras de armazenamento específicas para vacinas,
refrigeradores do tipo doméstico (não são mais indicados) ou em caixas
térmicas (para transporte e uso diário), com temperatura na faixa de
+2°C a +8°C. O transporte dos imunobiológicos da instância municipal
para a local deve ser realizado em veículos climatizados, utilizando-se
caixas térmicas apropriadas para garantir a manutenção da tempera-
tura. No caso de transporte por longas distâncias, do município para o
nível local, o PNI recomenda que seja realizado, preferencialmente, em
veículos frigoríficos específicos (BRASIL, 2013).

O planejamento e a escolha dos equipamentos utilizados em nível local


devem levar em consideração a capacidade de armazenamento de imu-
nobiológicos em quantitativo suficiente para vacinar a população de
sua abrangência durante um mês e, também, para a programação de
abastecimento das demais salas de vacinação daquele território adstrito.

Recomenda-se o uso de freezers exclusivos para a guarda das bobinas


reutilizáveis, em número suficiente às demandas locais, assim como a
climatização da sala de vacinação por meio de aparelhos de ar-condi-
cionado. Desse modo, a temperatura ambiente ajuda a manter a dos
imunobiológicos, minimizando os riscos indesejados de alterações de
temperatura dos produtos (BRASIL, 2013).

O papel dos Crie, no caso de Fazem parte, também, da instância local os Centros de Referência para
eventos adversos pós-vacinação,
Imunobiológicos Especiais (Crie). Neles, são realizados procedimentos
foi discutido no Capítulo 3,
“Vigilância epidemiológica em de vacinação com imunobiológicos, geralmente, não disponíveis nas
eventos adversos pós-vacinação”. salas de vacinação da rede básica de saúde, os quais são destinados à
clientela específica. O funcionamento e a operacionalização desses cen-
tros devem prever facilidade de acesso da população e também garan-
tir investigação, acompanhamento e elucidação nos casos de eventos
adversos pós-vacinação (BRASIL, 2013).

Conhecido o percurso realizado pelos imunobiológicos nas diversas


instâncias, destacaremos a RF de nível central ou nacional, a Cenadi.
Isso porque, apesar desta não se caracterizar formalmente como uma
instância, como aquelas apresentadas até o momento, ela retrata bem
todos os procedimentos realizados na rede de frio, sendo expressão fiel
de todos os elos e etapas que compõem a rede.

184
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

A Central Nacional de Armazenamento e


Distribuição de Imunobiológicos (Cenadi)
A Cenadi representa o nível nacional da rede de frio e é responsável
pelo recebimento, armazenamento e pela distribuição de todos os imu-
nobiológicos disponibilizados pelo Programa Nacional de Imunizações.
Portanto, todas as vacinas liberadas e disponibilizadas pelo PNI, adqui-
ridas em laboratórios nacionais (públicos e privados) e internacionais,
são armazenadas na Cenadi, a quem compete a responsabilidade de
distribuí-las às Secretárias Estaduais de Saúde (SES), para serem utili-
zadas em todo o país.

Foto 6 – Fachada da Cenadi


Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

Para refletir
Você tem ideia da quantidade de imunobiológicos que chegam à Cenadi
para serem armazenados e distribuídos para todo o Brasil?

A Cenadi é composta por duas áreas: uma no bairro Rocha (a sede)


e outra no bairro Irajá, ambas no Rio de Janeiro. Somadas, as duas
unidades dispunham, em 2015, de sete câmaras de armazenamento,
sendo quatro com temperatura positiva e três com temperatura nega-
tiva. Juntas, essas câmaras têm ampla capacidade de armazenamento,
em torno de uma média anual de 25.324.773 doses de vacinas, possibi-
litando garantir a qualidade da imunização para milhões de brasileiros.

185
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Foto 7 – Interior da câmara

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).


Em relação à capacidade refrigerada, o complexo logístico da Cenadi
possui 19.600 m³ de área em temperatura de +2ºC a +8ºC, e 2.646 m³
de área em temperatura de –20ºC, além de 800 m² de área de tempe-
ratura controlada entre +16ºC e +17ºC. Essa última área é utilizada
para atividades de preparo, recebimento e distribuição. Dispõe, tam-
bém, de sistema de gestão e manutenção automatizado, moderno e
eficiente, com controle qualificado dos equipamentos de refrigeração e
alarmes, além de geração de energia emergencial, para casos de desa-
bastecimento da energia elétrica pela concessionária de rede elétrica,
garantindo sempre a manutenção da temperatura dos imunobiológicos
ali armazenados.

Para operacionalizar o volume de imunobiológicos, a Cenadi conta com


uma equipe capacitada e qualificada em processos sistemáticos de edu-
cação continuada e de um rigoroso planejamento de suas atividades,
etapa esta estratégica para o bom funcionamento de uma rede de frio e
para o sucesso do Programa Nacional de Imunizações.

Planejamento da rede de frio


Existem importantes motivos para que ações de vacinação não sejam
baseadas no improviso. O principal deles é que estamos lidando com
um produto que impacta diretamente a saúde e a vida das pessoas.

Uma ação não planejada pode ter diversas consequências. Para que a
logística da rede de frio seja eficiente, faz-se necessário um planeja-
mento que envolva um conjunto amplo de atores, como os profissionais
envolvidos nas diferentes instâncias da rede de frio, gestores e usuários.

186
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

A realização do planejamento na RF irá nortear o desenvolvimento


das ações, garantindo o controle e o monitoramento de todos os pro-
cedimentos, desde o início. O planejamento deve conter também um
plano de contingência. Este será de grande utilidade no caso de even- É importante lembrar que o
tuais problemas que possam ocorrer nos equipamentos e interferir na monitoramento e a avaliação
das ações de vacinação e da
manutenção da temperatura dos imunobiologicos, causando a perda rede de frio podem apontar
de vacinas, prejuízos econômicos e possíveis desabastecimentos, em a necessidade de novo
planejamento para adequação
virtude do grande volume de imunobiológicos armazenados na Central das ações e reorganização de
Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobiológicos. novas necessidades.

A seguir, apresentamos os itens que compõem o planejamento de uma


rede de frio em cada etapa do seu processo de funcionamento, desta-
cando os procedimentos realizados na Cenadi.

Aquisição dos imunobiológicos


Nesta etapa da RF, é importante, inicialmente, conhecer o quantita-
tivo de imunobiológicos necessário para o cumprimento do calendá-
rio nacional de vacinação do PNI, de modo a atender as estratégias de
rotina e outras, como as campanhas.

O planejamento da aquisição de imunobiológicos é realizado pela Coor-


denação Geral do Programa Nacional de Imunizações (CGPNI), que tem
total responsabilidade sobre o processo. Entretanto, ainda que de forma
indireta, as demais instâncias também participam desse planejamento,
em caráter complementar. Cada uma possui atribuições e competências
específicas. A seguir, no Quadro 1, apresentamos, de forma esquemá-
tica, as atividades e responsabilidades de cada nível da rede de frio na
aquisição dos imunobiológicos.

Quadro 1 – Níveis da rede de frio e suas responsabilidades/competências no


planejamento para aquisição de imunobiológicos

Níveis da rede de frio de Responsabilidades/competências


imunobiológicos
Unidades de saúde/salas de vacina Informar os estoques existentes, mensalmente, por meio de formulário próprio, às Secretárias
Municipais de Saúde ou Regionais e Distritos Sanitários, a depender da organização dos municípios.
Secretarias Municipais de Saúde Receber os formulários encaminhados pelas unidades de saúde, assim como analisar, consolidar e
elaborar a programação municipal e encaminhá-la à instância regional ou estadual.
Regionais das Secretarias Estaduais Após o recebimento da programação municipal ou regionais, analisar, consolidar e elaborar a
de Saúde programação macrorregional.
Centros de Referência para Elaborar a programação dos imunobiológicos especiais utilizados no centro e informar às
Imunobiológicos Especiais (Crie) Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde, a depender da organização do estado.
Secretarias Estaduais de Saúde Após o recebimento da programação dos municípios, regionais e Crie, analisar, consolidar e
elaborar a programação estadual.
Fonte: Elaborado por André Silva Cardoso, Clayton Bernardo da Costa, Felipe da Silva Furtado e João Leonel Batista Estery, em 2014.

187
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Todas essas informações permitirão saber o quantitativo de imunobio-


lógico a ser adquirido. Baseada nos informes repassados pelas instâncias
estadual, municipal, local e Cenadi, a Coordenação Geral do Programa
Nacional de Imunizações (CGPNI) realiza uma série de procedimentos
visando chegar ao quantitativo real de vacinas necessário naquele ano
e à normatização do seu uso. Assim, cabe à CGPNI:
G analisar e consolidar as programações a ela encaminhadas pelos
estados e pela Cenadi;
G elaborar programação nacional de aquisição, definindo quantitativos
e cronograma de recebimento;
G elaborar especificações técnicas por produto;
G emitir parecer técnico, justificando a compra;
G elaborar o Termo de Referência (TR) de aquisição, tomando por base
as necessidades programadas e os valores correspondentes à última
aquisição (salvo se houver informação mais recente);
G elaborar programação orçamentária para o próximo ano, visando à
garantia dos recursos;
G enviar para a Cenadi os imunobiológicos necessários para atender o
país.

Considerando todos esses aspectos, fica a questão: como a Cenadi se


organiza para atender a toda essa demanda?

Inicialmente, participando do processo de planejamento, prestando


informações que auxiliem na elaboração do quantitativo a ser com-
prado/adquirido, bem como do planejamento da estrutura necessária
ao armazenamento dos imunobiológicos na Cenadi. Precisará obter
informações sobre:
G volume ocupado por cada tipo de imunobiológico;
G validade dos estoques;
G quantidade e capacidade de armazenagem;
Os sistemas de informação G consumo médio mensal do ano anterior por estado e por
ligados ao Programa Nacional de imunobiológico, utilizando como base o Sistema de Informação do
Imunizações são apresentados
no Capítulo 5, “Sistemas de PNI, o Sistema de Informações de Insumos Estratégicos (Sies).
Informações do Programa Nacional
de Imunizações (SI-PNI)”, A partir das questões respondidas, a Cenadi poderá se organizar para
deste livro.
receber os imunobiológicos, e, com base nas informações fornecidas
pela Cenadi, caberá ao Departamento de Logística (DLOG) da Secreta-
ria Executiva do Ministério da Saúde efetuar a aquisição dos diversos
imunobiológicos. Para isso, precisa organizar as informações técnicas

188
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

que caracterizam cada imunobiológico a ser adquirido e realizar licita-


ções nacionais e/ou internacionais, conforme o tipo de imunobiológico.

A partir da aquisição, outros procedimentos que compõem a logística Em caso de licitação


da RF são desencadeados, como recebimento, armazenamento e dis- internacional, caberá ainda
ao DLOG, por meio do seu
tribuição dos imunobiológicos, todos comuns a qualquer rede de frio. Setor de Comércio Exterior, a
liberação dos imunobiológicos
Para ilustrar essas etapas/procedimentos, apresentamos na Figura 2 o adquiridos, de modo que
possam estar disponíveis para
fluxo do trabalho na Cenadi, desde a aquisição dos imunobiológicos até a Cenadi.
sua distribuição à instância estadual.

Figura 2 – Fluxograma da rede de frio de imunobiológicos da Cenadi

Fonte: Adaptado por Felipe da Silva Furtado, em 2014.

As etapas ou os elos/tramas da rede de frio são apresentados a seguir,


caracterizando todo o complexo logístico que a envolve através do tra-
balho realizado na Cenadi.

Procedimentos de recebimento de
imunobiológicos na Cenadi
Inicialmente, a Cenadi deve ser informada, com antecedência, sobre
a chegada dos imunobiológicos. Na chegada à central, uma comissão
ou equipe de recebimento confere se a entrega dos imunobiológicos
está em conformidade com o estabelecido no Contrato e no Termo de
Referência de Aquisição.

189
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Além desses, outros pontos devem ser observados e registrados, espe-


cialmente aqueles relacionados às condições do veículo transportador
e de acondicionamento do imunobiológico na chegada. Para efetuar o
registro, utilizam-se formulários específicos, disponíveis em cada cen-
tral. A Cenadi, por exemplo, possui o formulário Protocolo de recebi-
mento de insumos (Anexo A) e o documento formal Ata de recebi-
mento de vacina (Anexo B).

Destacamos, a seguir, alguns dados que devem ser registrados.

1. Condições do veículo de transporte do imunobiológico


G lacre do baú, para verificar o nível de segurança do baú refrigerado
a que a carga (imunobiológicos) foi submetida;
G estado de conservação e limpeza do baú do caminhão de transporte;
G temperatura exibida no painel do Foto 8 – Aferição da temperatura do
equipamento do transporte; baú do transporte

G temperatura do baú no momento;

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).


Invoice é um documento G dados dispostos na nota fiscal
administrativo semelhante à
eletrônica (NFe) ou invoice;
nota fiscal, utilizado em caso de
produtos importados. G existência e entrega dos
documentos técnicos (protocolo
de produção, protocolo de produto
acabado, controle de inspeção,
certificado de análise e liberação).

2. Condições dos imunobiológicos


Envolvem, essencialmente, a temperatura e a disposição do imunobio-
lógico no baú refrigerado. O técnico responsável pelo recebimento deve
atentar para a:
G disposição dos imunobiológicos no baú e a distância entre:
Paletes são estruturas de madeira,
ferro ou plástico. Sua função
• os paletes onde foram dispostos os imunobiológicos e o
na rede de frio é viabilizar a equipamento de refrigeração;
otimização do transporte de cargas
de imunobiológicos, através do uso • o imunobiológico e o sistema de proteção contra umidades
de paleteiras manuais ou elétricas elevadas que existe no baú refrigerado (espécie de filme);
e empilhadeiras. Os paletes de
madeira devem ser evitados pela G qualidade e disposição das embalagens, quantidade, lote, prazo de
possibilidade de desprendimento validade;
de partículas e propagação dos
microrganismos, em face da G temperatura do momento dos imunobiológicos recebidos;
dificuldade de desinfecção na
rotina do serviço. G identificação correta dos produtos imunobiológicos.

190
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Foto 10 – Aferição da temperatura quando do


Foto 9 – Paletes recebimento dos imunobiológicos
Fotomontagem: Felipe da Silva Furtado (2015).

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).


PALETE PLÁSTICO – CORRETO PALETE DE MADEIRA – INCORRETO

Após a conferência, caso os imunobiológicos cheguem com temperatura


em desacordo com as normas técnicas preconizadas pelo produtor ou
com o estabelecido no Termo de Referência, a equipe técnica de rece-
bimento, através do formulário Protocolo de recebimento de insumos
(Anexo A), faz constar essas observações na Ata de recebimento de
vacina (Anexo B), a fim de que sejam tomadas as providências neces-
sárias junto à equipe técnica do órgão requisitante (CGPNI), ou da área
administrativa de aquisição (DLOG/SE/MS).

O que fazer quando a temperatura dos imunobiológicos não


está de acordo com as normas estabelecidas pelo fabricante?
Nesse caso, todo o lote é armazenado em local predeterminado dentro das
especificações; em seguida, o fabricante é contatado e informado acerca
das variações de temperatura fora dos limites estabelecidos. O fabricante,
então, realiza uma análise da variação da temperatura do lote, baseado
no estudo de estabilidade e de acordo com as normas e os protocolos
de produção. Caso o lote não apresente nenhum problema, o fabricante
emite um laudo certificando a garantia de uso. Caso não possa mais ser
utilizado, o próprio fabricante recolhe o imunobiológico e o substitui por
outro lote com as mesmas especificações. Durante o período de espera
do recolhimento, o imunobiológico sob suspeita deve permanecer na
temperatura indicada pelo fabricante.

Se estiver tudo correto, os imunobiológicos seguem o fluxo normal,


ou seja, uma vez paletizados e devidamente identificados, são encami-
nhados para o armazenamento nas câmaras frigoríficas de acordo com
a faixa de temperatura preconizada, que pode ser de +2°C a +8°C nas
câmaras positivas ou –20°C nas negativas.
Os dados do recebimento dos imunobiológicos são encaminhados e
registrados nos sistemas de controle de estoque (Sies/EDI), por meio

191
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

do formulário Guia de entrada de imunobiológicos (GEI) (Anexo C).


Nesse formulário constam o registro do insumo recebido e as principais
informações do protocolo de recebimento; pode também ser registrado
no formulário o quantitativo de saída do produto, por ocasião do envio
para controle de qualidade no INCQS.

Registros relacionados ao recebimento


Alguns procedimentos são necessários para o registro dos imunobio-
lógicos na central de rede de frio na ocasião de seu recebimento. Em
geral, referem-se a conferência e inserção dos dados descritos na nota
de recebimento, no sistema de informação local. Como a Cenadi é uma
central nacional, existem outros cuidados que devem ser preservados,
como:
G O responsável pelo registro deve fazer uma reconferência entre
as informações constantes na guia de entrada e na nota fiscal
eletrônica, procedendo, em seguida, à alimentação das informações
nos sistemas de controle de estoque (Sies).
G Depois do registro de entrada, o profissional responsável deve imprimir
uma cópia da nota de lançamento (NL) e anexá-la à nota fiscal.
G O ateste da nota fiscal deve ser efetuado no verso da própria nota,
configurando o recebimento definitivo do imunobiológico pelo setor
responsável da Cenadi. A nota fiscal, a cópia de registro no sistema
de controle de estoque e a ata original da comissão de recebimento
devem ser encaminhadas por memorando ao DLOG/SE/MS, para
os trâmites administrativos de contabilização e pagamento do
laboratório fornecedor.
G Após esses procedimentos, os imunobiológicos têm seus lotes,
validade e quantidade conferidos e, em seguida, são armazenados
na Cenadi nas câmaras com temperaturas positivas ou negativas,
conforme estabelecido pelo produtor.

Acondicionamento dos imunobiológicos na central de


rede de frio
De acordo com o espaço físico disponível, as vacinas recebidas são orga-
nizadas nas câmaras frigoríficas. Na Cenadi, a organização obedece a
uma lógica própria: os imunobiológicos são dispostos nas câmaras frias
A Guia de entrada de
imunobiológicos (Anexo por blocos, setores e lotes. Essa organização visa facilitar a localização
C) informa a localização no momento da retirada e/ou do manuseio. Posteriormente, dados
do material no interior das
câmaras frias. sobre estoque poderão ser inseridos em planilhas eletrônicas para con-
trole dos insumos recebidos e para o serviço de transporte.

192
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Armazenagem
Foto 11 – Alocação de cargas de imunobiológicos para as câmaras frias
Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

O armazenamento é uma etapa intermediária entre a produção e a etapa


final da rede de frio, que é o transporte do imunobiológico até o seu
destino. Por isso, requer, também, tratamentos específicos para garantir
a integridade dos produtos e a eficiência da rede, exigindo movimenta-
ção ou manuseio dos mesmos por meio de práticas específicas para cada
tipo de imunobiológico. O local da armazenagem deve possuir instala-
ções de acordo com a legislação e regras dos órgãos oficiais: Ministério
da Agricultura, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) etc.

O setor de armazenagem deve dispor de câmaras frigoríficas em tem-


peraturas positivas e negativas, em número compatível com o tipo de
central e instância. Deve possuir também ferramentas de controle e
gerenciamento da movimentação dos produtos dentro das câmaras. No
caso da Cenadi, essa movimentação é realizada por meio de sistemas
de endereçamento dinâmicos. Nas centrais de RF, o uso de ferramen-
tas ou mecanismos como esses proporciona otimização do tempo das
operações e maior confiança e segurança no serviço que está sendo
executado.

O armazenamento dos imunobiológicos nas câmaras frias deve obser-


var as normas de armazenagem e as temperaturas preconizadas pelo
produtor. Nessa ação logística, a armazenagem deve, necessariamente,
obedecer aos critérios de estocagem do material, em concordância com
os lotes e validades. Esse procedimento é de fundamental importância
para a racionalização do trabalho no que tange a localização, separação
e posterior distribuição. Cada central de RF adota sistema próprio de

193
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

localização do imunobiológico; no entanto, todas devem seguir a regra


de colocar na frente os primeiros lotes a vencer e atrás os que possuem
maior período de validade.

Na Cenadi, o processo de estocagem está baseado em um tipo de estudo


logístico conhecido como sistema Peps (primeiro que entra, primeiro
que sai). É adotada uma ordem que funciona da seguinte forma: saída
sempre da esquerda para direita, de cima para baixo e de frente para
trás. A aplicação do sistema Peps em qualquer central auxilia no geren-
ciamento e na distribuição do imunobiológico, porque permite que
sejam utilizados inicialmente aqueles que foram recebidos primeiro.
Isso evita inutilização de produtos por validade vencida e contribui
para diminuição de desperdícios.

O controle de qualidade dos No setor de armazenagem, além das Foto 12 – Produtos identificados de
imunobiológicos é apresentado acordo com seu status
câmaras de refrigeração, é necessá-
mais adiante, neste capítulo.
rio que existam áreas climatizadas
com controle de temperatura, utili- Placa verde –
Liberado para uso
zadas para recebimento e expedição
dos imunobiológicos. Nas câmaras,

Fotomontagem: Felipe da Silva Furtado (2013).


os imunobiológicos são identifica-
dos por um código de cores regis- Placa amarela –
Em processo de
trado em placas de acrílico, con- análise
forme seu status ou situação:
G Vermelha: reprovado ou
vencido; Placa vermelha
– Reprovado ou
G Amarela: em processo de análise vencido
no controle de qualidade;
G Verde: liberado para uso.

Os imunobiológicos são retirados do estoque de acordo com a sinaliza-


ção das fotos. Na Cenadi, são retirados primeiro aqueles que estão na
parte de cima de cada bloco, obedecendo ao sentido vertical. Quando
todos os imunobiológicos daquele bloco são retirados, passa-se para
a coluna seguinte, observando sempre a retirada de cima para baixo,
como visualizado na Figura 3.

194
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Figura 3 – Ordem de saída das caixas do estoque


Ilustração: Felipe da Silva Furtado (2014).

A etapa seguinte é o envio de lotes de todos os imunobiológicos para o


controle de qualidade.

Envio dos imunobiológicos para o controle


de qualidade
Como mencionado anteriormente, todos os imunobiológicos disponibi-
lizados pelo PNI passam por um controle de qualidade, que se inicia no
momento pós-recebimento e armazenagem na Cenadi. A central nacio-
nal é a única responsável pelo envio de amostras ao Instituto Nacional
de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), vinculado à Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz), para testes e controle de qualidade.

O envio dos imunobiológicos para o INCQS segue a orientação do pró-


prio órgão, por amostragem aleatória de lotes de cada vacina. Em algu-
mas situações, um mesmo lote pode ser analisado duas vezes ou mais,
caso apresente qualquer alteração ou circunstância cujas condições ou
qualidade sejam colocadas sob suspeita. Nesse caso, novas amostras são
enviadas ao INCQS para análise.

Foto 13 – Fachada do INCQS no campus de Manguinhos, Fiocruz


Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

195
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Amostras de todos os lotes dos imunobiológicos adquiridos, sejam eles


nacionais ou importados, são enviadas pela Cenadi para o Instituto
Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS). Somente após a
aprovação da análise de qualidade é que a Cenadi inicia a distribuição às
instâncias estaduais.

Distribuição dos imunobiológicos


É importante ressaltar que a logística da distribuição dos imunobioló-
gicos no Brasil é bastante complexa, envolvendo uma verdadeira rede
que deve se intercomunicar para que os imunobiológicos possam che-
gar, com a qualidade necessária, até a população.

Figura 4 – Distribuição dos imunobiológicos no Brasil

Ilustração: Dilson dos Santos Oliveira (2015).

A Cenadi distribui os imunobiológicos para os estados que, por sua vez,


os redistribuem aos municípios, de onde seguem para o nível local.
A fim de manter a qualidade do produto, faz-se necessário garantir,
em toda a rede, o controle da temperatura dos imunobiológicos. Caso
ocorram falhas no sistema, estas devem ser notificadas por meio do
formulário de avaliação de imunobiológicos sob suspeita, que deve ser
encaminhado às instâncias responsáveis, junto com os dados sobre o
controle diário de temperatura.

196
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

A articulação e o compromisso dos profissionais da imunização, da rede


de frio e gestores são fundamentais para que todas as ações relacionadas
à vacinação sejam garantidas, desde a aquisição até a oferta dos
imunobiológicos nas salas de vacina, em condições e tempo hábil. Para
tanto, é um requisito haver centrais de rede de frio funcionando de forma
eficiente, nas diversas instâncias.

Para que seja viabilizada a distribuição de rotina dos imunobiológicos,


é necessário o cumprimento de um cronograma acordado entre o PNI e
os estados: estes encaminham ao PNI, por meio do Sies, os quantitativos
e a especificação dos imunobiológicos necessários para o atendimento
de sua rotina mensal. No início de cada mês, o PNI consolida as infor-
mações encaminhadas pelos estados. A partir dos quantitativos e da
especificação dos imunobiológicos, inicia a análise da pertinência das
demandas e providencia as devidas autorizações de distribuição pela
Cenadi, por meio do sistema on-line (Sies).

Após a análise do pedido, o PNI autoriza a Cenadi a distribuir para


os estados. A distribuição é realizada mensalmente, ocorre segundo
cronograma próprio da central e de acordo com a disponibilidade de
estoque. Todo processo de distribuição deve ocorrer até o último dia do Vale ressaltar novamente que,
mês, podendo haver, excepcionalmente, distribuição fora do calendário para garantir a qualidade
da vacina, a temperatura
proposto, atendendo a demandas extraordinárias ou emergenciais. durante o transporte deve ser
mantida entre +2ºC e +8ºC
Os imunobiológicos seguirão em caixas térmicas devidamente prepara- e/ou –20°C, dependendo
do tipo de vacina, seguindo
das, considerando o local e o tempo de chegada no destino. Os estados sempre as recomendações dos
devem garantir a distribuição dos imunobiológicos nas centrais regio- laboratórios produtores.
nais ou municipais.

Foto 14 – Conferência para distribuição


Foto: Felipe da Silva Furtado (2015).

197
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Os critérios utilizados pelo PNI para análise das solicitações mensais feitas
pelos estados estão baseados em:
• estoques disponíveis na Cenadi para a distribuição;
• média de distribuição mensal nacional;
• estoque estadual;
• cota mensal estadual;
• validade do imunobiológico disponível para distribuição, em consonância
com os quantitativos planejados na aquisição;
• cumprimento do cronograma de entrega pelo laboratório produtor;
• doses aplicadas.
Fonte: André Silva Cardoso, Clayton Bernardo da Costa, Felipe da Silva Furtado e João Leonel Batista Estery, em 2013.

Para que a distribuição ocorra com segurança, uma série de cuidados é


necessária para a manutenção da temperatura durante todo o processo,
assim como no recebimento e armazenamento dos imunobiológicos.

Quando há evidência de que Nesta etapa de distribuição, muitos erros podem ocorrer, interferindo
a vacina foi submetida a uma na qualidade e propriedade dos produtos. A OMS apresenta estudos
variação da temperatura diferente
da preconizada pelo produtor que apontam erros recorrentes no manuseio da vacina, que afetam
(descrita na bula), a OMS orienta substancialmente a sua potência. Em geral, são em decorrência de con-
procedimentos específicos para
análise da estabilidade das
dições insatisfatórias de acondicionamento na distribuição e no arma-
vacinas. Tais procedimentos estão zenamento. Dentre as deficiências mais comuns relatadas por diversos
disponíveis para conhecimento no países desenvolvidos, destacam-se: altas temperaturas durante a arma-
Manual de Rede de Frio (BRASIL,
2013), disponível em http://bvsms. zenagem ou o transporte; exposição da vacina a temperaturas de con-
saude.gov.br/bvs/publicacoes/ gelamento; equipamentos de refrigeração sem controle de temperatura;
manual_rede_frio4ed.pdf
falhas nas leituras e nos registros da temperatura etc.

Condições ideais na armazenagem/distribuição, como estrutura ade-


quada, são outro cuidado necessário para garantia da qualidade das
vacinas. Por exemplo, os imunobiológicos são recebidos ou distribuídos
em um setor específico, que, na Cenadi, é denominado de expedição.
Nele, os imunobiológicos são preparados para serem armazenados ou
distribuídos. Esse local deve ser climatizado, com temperatura moni-
torada constantemente; em caso de qualquer alteração que exceda o
limite tolerável, deve ser acionado um alarme, para que se realize o
ajuste necessário.

Outro cuidado é a conferência e o acondicionamento dos imunobioló-


gicos em caixas apropriadas para serem transportados com segurança.
Conferida a validade e quantidade dos lotes que serão expedidos, os

198
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

imunobiológicos devem ser inseridos, imediatamente, nas caixas isotér-


micas com núcleo (berço) para, em seguida, as bobinas de gelo serem
adicionadas (que estarão a –15ºC). O uso do berço, nesse caso, é para a
manutenção térmica dos imunobiológicos (que precisam ser mantidos
em temperatura positiva, de +2ºC a +8ºC, evitando contato direto com
a bobina congelada e, consequentemente, seu congelamento).

Os imunobiológicos que precisam ser mantidos em temperatura nega-


tiva deverão ser acondicionados em caixas isotérmicas sem o núcleo
(berço), uma vez que já se encontram em temperatura negativa, não
necessitando de proteção para isso. Para ajudar, também, na manuten-
ção da temperatura durante o transporte, poderá ser inserido gelo seco.

Cuidados para organização das caixas térmicas


na Cenadi
Como mencionado, deve-se ter precaução com os recipientes ou as
caixas nos quais os imunobiológicos serão acondicionados para o trans-
porte. As caixas utilizadas devem ser de material apropriado, como
recomendado pelo PNI, e utilizadas conforme critérios específicos,
sendo fundamental manter-se atualizado sobre as novas recomenda-
ções de caixas a serem utilizadas.

A Cenadi, conforme já referido, utiliza um recurso de proteção deno-


minado de núcleo ou berço no transporte de alguns imunobiológicos. A
finalidade do “berço” é manter a estabilidade da temperatura (entre +2ºC
e +8ºC) dos imunobiológicos por um intervalo de tempo maior e evitar o
congelamento pelo contato com bobinas em temperatura negativa.

A Cenadi passou a utilizar o berço depois de observar as condições em que


chegavam embalados/acondicionados os imunobiológicos de outros países.
Percebeu, então, que poderia desenvolver uma proteção semelhante à
dos produtos importados, que permitisse a utilização de bobinas de gelo
reutilizáveis em temperatura negativa usando um núcleo separador ou
berço, com o mesmo material da caixa de isopor onde são acondicionados
os imunobiológicos para transporte. Assim, poderia utilizar, nas caixas
térmicas, as bobinas retiradas diretamente do freezer, sem precisar de
aclimatação e sem congelar o produto imunobiológico, tornando a
logística segura e mais ágil. Após inúmeros testes e análises, a Cenadi
adotou o núcleo ou berço no processo de transporte dos imunobiológicos
armazenados em temperatura positiva.

199
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Foto 15 – Berço e caixa térmica com berço para transporte

Fotomontagem: Felipe da Silva


Furtado (2015).
Escolhida a caixa apropriada, o passo seguinte é acondicionar os imu-
nobiológicos no interior das caixas isotérmicas com “berço”.

Como se organiza esse tipo de caixa? estaque de pergunta instigadora

1. As bobinas reutilizáveis de gelo, congeladas à temperatura de até


–15°C, devem circundar as paredes internas da caixa (entre a caixa
e o berço).
Data loggers são apresentados 2. Os imunobiológicos devem ser organizados no interior da caixa
no Capítulo 7, “Refrigeração e posicionando-se o instrumento de medida de temperatura (data
equipamentos da rede de frio”,
deste livro. logger) no centro.
3. Os imunobiológicos devem ser cobertos com uma lâmina de papelão
dupla face, impermeável e coberta com bobinas reutilizáveis à
temperatura de até –15°C.
4. A caixa deve ser lacrada com fita adesiva e identificada
externamente, conforme especificação e padrão local.
5. Flocos de poliestireno podem ser colocados nas caixas térmicas
sem núcleo separador, no caso de ser necessário preencher espaços
vazios, que não tenham sido ocupados com imunobiológicos.
O objetivo dessa ação é diminuir a quantidade de ar em seu interior
e assegurar que o ambiente da caixa permaneça na temperatura
recomendada.
6. A temperatura deve ser monitorada durante o transporte.

Foto 16 – Caixa organizada com bobinas e Foto 17 – Caixa pronta, fechada, com a fita
o berço identificadora do produto
Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).
Foto: Felipe da Silva Furtado (2015).

200
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Reforçando!
• O uso de flocos de poliestireno ou de outros materiais (papelão, jornais
etc.) entre os frascos avulsos, nas caixas dos imunobiológicos, tem por
finalidade diminuir os espaços vazios, reduzir a quantidade de ar em seu
interior e evitar deslocamento dos produtos e impactos mecânicos que,
muitas vezes, levam a quebras e microfissuras dos frascos durante o
transporte.
• O ideal é utilizar caixas com capacidade adequada para cada volume a
ser transportado, para não ser necessário o uso desses artifícios.
• Conhecer os diversos tipos de embalagens dos imunobiológicos
é importante para a escolha das caixas mais adequadas ao As embalagens dos
acondicionamento das vacinas. imunobiológicos são abordadas
mais adiante, neste capítulo.

A partir do momento em que as caixas estiverem prontas, serão trans-


portadas em caminhões frigoríficos da Cenadi ao aeroporto do Rio de
Janeiro e embarcadas em aviões comerciais, até o aeroporto de des-
tino. Nos estados, seguirão transportadas em caminhão frigorífico até Para conhecer o Comprovante
as centrais estaduais de imunizações. Nas centrais, ao receber a carga, de recebimento de insumos da
Cenadi, leia o Anexo F, no fim
o profissional de rede de frio, idealmente o técnico/especialista, deve do capítulo.
conferir a temperatura interna das caixas isotérmicas, o lote, a quan-
tidade e a validade dos imunobiológicos. Em seguida, deve preencher
o documento Comprovante de recebimento de insumos (Anexo F),
assinar e enviar uma cópia à Cenadi. Caso exista alguma divergência
nas informações, a SES comunica à Cenadi para realização dos ajustes.
No caso de ausência do
especialista ou técnico em RF, a
Outros formulários são utilizados no transporte dos imunobiológicos da pessoa que receber o material
central nacional para os estados. A Nota de fornecimento de material deve chamar o responsável
(Anexo D), o formulário Detalhamento da carga (Anexo E) e o Com- da central pela realização dos
procedimentos de recebimento
provante de recebimento de insumos (Anexo F) são utilizados pela necessários.
Cenadi e acompanham a carga de imunobiológicos durante sua entrega.
O gestor deve prever, no planejamento e na organização da central, o
número de formulários suficientes para atender à demanda, bem como
um local visível para guarda dos imunobiológicos. Cada central de RF
pode dispor de impressos específicos, desde que contenham todos os
dados que atendam e detalhem o recebimento dos imunobiológicos.

Vale ressaltar que as vacinas, ao chegarem no nível local ou na sala de


vacinação, devem ser rigorosamente mantidas em temperatura entre
+2ºC e +8ºC, de preferência, entre +4ºC e +5ºC, como medida de segu-
rança, evitando mudanças bruscas de temperatura e, em consequência,
possível alteração ou perda de potência. Para tal, é necessário que a
temperatura durante o transporte das vacinas seja assegurada!

201
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Transporte dos imunobiológicos


Todas as etapas da RF são importantes. Uma delas é o transporte, durante
o qual todos os cuidados tomados para a manutenção e segurança das
vacinas, por ocasião do recebimento, armazenamento e distribuição,
poderão ser perdidos, caso ocorra qualquer procedimento incorreto no
momento em que se transportam os imunobiológicos.

Durante o deslocamento, os imunobiológicos são expostos a riscos que


podem comprometer sua qualidade. Os riscos variam desde o tipo de
transporte utilizado até o recipiente escolhido. Por isso, algumas regras
devem ser observadas na escolha do recipiente onde serão colocados os
imunobiológicos. Condições das caixas, como espessura, densidade e
qualidade, devem ser rigorosamente observadas e respeitadas durante
a sua aquisição e utilização.

Para o transporte adequado das vacinas, é necessário observar:


G tempo a ser gasto com o transporte (considerar distância, tipo
de transporte utilizado, condições do tempo, condições das
estradas etc.);
G tipos de termômetro a serem utilizados no transporte;
G quantidade e temperatura do gelo reciclável colocado dentro da
caixa;
G temperatura ambiente em torno da caixa térmica;
G colocação do termômetro na parte externa da caixa e do bulbo no
interior da caixa térmica, no centro dos recipientes das vacinas, para
garantir o monitoramento contínuo da temperatura, entre outros.

Além de adotar os cuidados fundamentais para garantir a manutenção


das temperaturas de armazenamento durante o transporte, conforme
as recomendações preconizadas em todas as instâncias, é preciso, ainda,
estar alerta em relação a vários aspectos que podem interferir decisiva-
mente na qualidade das vacinas e na manutenção de suas propriedades
imunogênicas, tais como:
G instalações adequadas;
G equipe técnica bem treinada e atualizada;
G equipamentos confiáveis;
G calendário preestabelecido de manutenção preventiva;
G garantia de manutenção corretiva, quando necessária.

202
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Foto 18 – Caixas dentro do caminhão para transporte


Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

Sabemos que o tipo e a qualidade dos insumos utilizados são elemen-


tos que impactam tanto a armazenagem quanto a distribuição ou o
transporte dos imunobiológicos na rede de frio e, consequentemente,
o planejamento da rede. Os recipientes, como as caixas térmicas; os
invólucros para acondicionar e proteger os imunobiológicos de interfe-
rências da temperatura externa (embalagens, berços etc.); os impactos
ou danos durante sua manipulação e transporte são fundamentais para
garantir eficiência no funcionamento de toda rede de frio. Por isso,
apresentamos, a seguir, algumas informações sobre os principais insu-
mos utilizados e os tipos de embalagens onde são acondicionados os
imunobiológicos, visando auxiliar o gestor ou técnico especialista da
rede de frio na aquisição e gestão apropriada dos insumos, otimizando
os recursos e evitando perdas desnecessárias.

Além dos imunobiológicos, são também considerados insumos necessários


à gestão da rede de frio os materiais de acondicionamento, como caixas
térmicas, isopores, equipamentos de proteção, manuseio e transporte
dos imunobiológicos. Por isso, é necessário planejar não somente a
aquisição das vacinas, mas também a desses materiais, a fim de evitar o
desabastecimento e a descontinuidade de uso destes.

Vejamos, a seguir, de forma breve, as embalagens e os principais insu-


mos usados na RF.

203
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Embalagens
Em todo o processo de gestão da RF, a embalagem é um dos fatores
a serem considerados para o acondicionamento adequado. As formas
de quantificação, uso e preservação dos imunobiológicos por meio de
É importante salientar que as embalagens apropriadas irão determinar a proteção desses produtos e
caixas térmicas são utilizadas a forma de organização nas caixas isotérmicas. Por isso, é importante
para acondicionamento dos
produtos imunobiológicos e, que o gestor e os demais profissionais da RF conheçam as formas e os
em geral, são consideradas tipos de embalagens que serão utilizados em todas as atividades desen-
embalagens do tipo terciária
em diante. É mais comum
volvidas na rede, uma vez que eles impactam as etapas de logística e os
serem quaternárias, destinadas planos de dimensionamento para armazenamento, distribuição, trans-
a abrigar e proteger as porte dos produtos imunobiológicos e o planejamento dos insumos a
embalagens primárias ou
secundárias. As caixas serem adquiridos. Um exemplo é o planejamento da quantidade de
isotérmicas devem ser bobinas necessárias para se colocar nas caixas térmicas. Dependendo
escolhidas conforme o tipo
de uso (vacinação, transporte
de qual seja o tipo de embalagem (primária, secundária), poderá ser
etc.), a quantidade de necessária maior ou menor quantidade de bobinas para a manutenção
imunobiológicos etc. da temperatura indicada dos imunobiológicos dentro das caixas ou da
embalagem quaternária.

Para melhor entendimento, é importante reforçar que as embalagens


que contêm ou envolvem os imunobiológicos recebem uma denomina-
ção específica. Podem ser dos tipos primária, secundária, terciária (BRA-
SIL, 2013), e assim sucessivamente. A embalagem primária é aquela
que contém o produto ou tem contato direto com ele. Por exemplo, o
frasco da vacina pentavalente ou a bisnaga da vacina poliomielite oral.

A embalagem secundária é o invólucro que envolve a primária, prote-


Para obter mais informações gendo-a. Pode ser removível ou não e conter outras embalagens primá-
sobre outras embalagens rias. A embalagem terciária é a que envolve ou protege a secundária,
usadas pelos laboratórios e
respectivas especificações, leia:
e assim, sucessivamente, todas são usadas conforme a necessidade de
• Consulta Pública n. 81, de proteção do produto.
29 de agosto de 2007, da
Anvisa, que dispõe sobre Além das embalagens, outros ma- Foto 19 – Embalagens primária, secundária e
a criação do “Vocabulário teriais, equipamentos e insumos terciária
controlado de formas
são utilizados na rede de frio
farmacêuticas e embalagens”;
Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

para conservação da tempera-


• “Vocabulário controlado
de formas farmacêuticas e
tura dos imunobiológicos e para
embalagens”, da Anvisa, aplicação nas salas de vacina.
disponível em http://www. Vejamos alguns deles que in-
anvisa.gov.br/medicamentos/
fluem no planejamento e na
seminario_III/informe_6.pdf
gestão da RF.

204
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Materiais, equipamentos e insumos utilizados


na rede de frio de imunobiológicos
A manipulação de materiais e equipamentos utilizados na RF requer
conhecimento sobre como funcionam e os cuidados específicos reco-
mendados. O planejamento para aquisição desses materiais é, tam-
bém, importante etapa na gestão e precisa ser rigorosamente pensado
pelo gestor em todo o percurso que o imunobiológico fará na rede de
frio, desde o recebimento na central até seu transporte para as demais
instâncias.

Apresentamos, a seguir, as principais informações acerca dos insumos


usados durante a conservação e o transporte dos imunobiológicos, já
que a maioria dos materiais ou equipamentos já foi explicitada em capí-
tulos anteriores.

Abordamos, de forma resumida, cuidados a serem adotados na mani-


pulação de: bobinas de gelo reutilizáveis, gelo seco, caixas térmicas,
termômetros, câmara refrigerada, refrigerador e freezer.

Bobinas de gelo reutilizáveis


As bobinas de gelo são materiais de plástico, em geral de polietileno,
que podem conter, em seu interior, água ou gel de concentração não
tóxica. Sua função é manter a estabilidade da temperatura na caixa
térmica onde estão os imunobiológicos e criar uma barreira que impeça
a troca de calor do meio ambiente com o interior da caixa e vice-versa.

A aquisição das bobinas para as atividades da RF deve considerar o


quantitativo necessário para armazenamento e distribuição aos diver-
sos estados, incluindo o envio de amostras ao INCQS e outras institui-
ções, se necessário. É importante que o gestor calcule um quantitativo
que permita também a reserva de bobinas para situações de emergência
e estoque, com finalidade de uso diário na central de RF, onde se neces-
sita de bobinas congeladas.

No mercado, há bobinas de diferentes modelos, dimensões e capacidades


(em litros), as quais devem ser selecionadas conforme as necessidades.
No caso da rede de frio, por exemplo, as dimensões das bobinas devem
ser de acordo com o tamanho das caixas térmicas (altura e largura) e
com a capacidade das caixas de receber bobinas em número suficiente
para acondicionar adequadamente o imunobiológico, mantendo-o na
temperatura recomendada.

205
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Entre os cuidados que se deve ter com as bobinas, é preciso observar


suas condições, conservá-las limpas e descartar as que se apresentam
estragadas ou danificadas. Se forem usadas bobinas danificadas, não
será possível garantir a manutenção da temperatura dos imunobioló-
gicos e, portanto, de suas propriedades e qualidade, podendo ocorrer
congelamento ou outras situações que comprometam a conservação do
imunobiológico.

Além dessas precauções, o trabalhador deve se certificar sempre que


a temperatura da bobina está correta antes de armazená-la na caixa
térmica, seja na atividade de vacinação ou no uso do transporte dos
imunobiológicos. Esse é um importante cuidado a ser tomado, já que
os diferentes conteúdos que compõem as bobinas possuem pontos de
congelamento distintos. Assim, quando a bobina que contém água
atinge 0ºC, começa, fisicamente, o processo de descongelamento, com a
presença de líquido em seu interior e ausência de “névoa” na superfície
externa. Ao contrário, a bobina com gel pode, ainda, se encontrar em
temperatura abaixo de 0ºC, estar totalmente descongelada, em estado
líquido e apresentar externamente “névoa”, dando a “falsa impressão”
de que atingiu a temperatura apropriada para acondicionamento nas
caixas térmicas. Todo o processo para que a bobina chegue a 0°C é
denominado de “aclimatação ou ambientação”. No nível local, esse
processo precisa ser realizado sempre, enquanto na Cenadi esses insu-
mos são utilizados sem aclimatação

É importante salientar que centrais de rede de frio que não disponham


de núcleo ou berço para o transporte de vacinas em temperatura positiva
devem usar bobinas aclimatadas antes de colocar na caixa térmica.
Precipitação é um fenômeno Isso porque existe o risco de congelamento e consequente
que se verifica quando um corpo comprometimento da qualidade das vacinas. Um dos problemas que pode
insolúvel se forma num líquido e
se deposita, como sedimento, no
decorrer do congelamento de uma vacina é a sua precipitação.
fundo de um recipiente. A precipitação de uma vacina ocorre em função de sua permanência em
temperatura inferior a 0°C por um período de vários dias ou acúmulo de
períodos parciais de tempo.
Todo trabalhador da sala de vacina ou rede de frio precisa se certificar
acerca da temperatura das bobinas antes de colocá-las nas caixas
térmicas, usando, além da observação, termômetro devidamente
calibrado para aferição e garantia da temperatura apropriada. Isso deve
ser feito independentemente do tipo de atividade que será realizada, seja
imunização ou na rede de frio.

Após a ambientação das bobinas, elas devem ser arrumadas no interior


da caixa, em posição vertical. A quantidade depende da atividade a ser

206
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

realizada (transporte, vacinação de rotina, extramuros etc.), da distân-


cia entre o local de saída e o local de chegada, do tempo de transporte,
entre outras situações. Por exemplo, se for um trabalho extramuro
ou em uma sala que não tenha climatização, pode ser colocada uma Todas essas informações são
encontradas, com detalhes, nos
bobina extra no assoalho da caixa (posição horizontal). Quando a tem-
manuais e outras publicações
peratura da caixa atingir o recomendado, os imunobiológicos poderão do Ministério da Saúde. Um
ser organizados no interior da caixa. Outros cuidados com as bobinas deles é o Manual de rede de
frio (BRASIL, 2013), disponível
envolvem limpeza, conservação, congelamento apropriado, verificação em http://bvsms.saude.gov.br/
do prazo de validade e da presença de resíduos ou outras substâncias bvs/publicacoes/manual_rede_
frio4ed.pdf
que possam contaminá-la.

Frascos e ampolas dos imunobiológicos não podem entrar em contato


direto com as bobinas; por isso, devem ficar acondicionados em reci-
pientes. Dentro do recipiente com vacinas, deve ser colocado o bulbo
do termômetro, e na parte externa da caixa térmica deve ficar o termô-
metro (a depender do tamanho da caixa, podem ser colocados mais de
um termômetro). Esse cuidado proporciona segurança no monitora-
mento e controle da temperatura.

Nas atividades de vacinação em


Foto 20 – Bobina de gelo reutilizável
nível local, não se devem colocar
bobinas no fundo da caixa térmica
e em contato direto com o reci-
Foto: Felipe da Silva Furtado (2015).

piente de vacinas, para evitar que


congelem. Para as atividades extra-
muros (em que a vacina estará em
trânsito por um tempo determi-
nado) ou no transporte desses pro-
dutos, recomenda-se o uso de
bobinas de gelo reutilizáveis no
fundo da caixa, em função da maior exposição da vacina à temperatura
do meio externo ou do meio ambiente.

Gelo seco
O gelo seco é utilizado na rede de frio no transporte de imunobiológicos,
com especificação de manutenção em temperatura negativa (abaixo de
0°C). A finalidade de seu uso é a manutenção dessa temperatura até o
destino final. A quantidade a ser usada será de acordo com o tempo e a
distância a ser percorrida.

O mercado dispõe de várias formas de gelo seco, em escamas, barras


ou nuggets. Apesar de auxiliar na manutenção do produto em tempe-
ratura negativa, tem sido cada vez menos utilizado na Cenadi, porque

207
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

O uso de gelo seco no transporte estudos realizados demonstram a existência de outros produtos mais
de imunobiológicos por via aérea adequados ao transporte de imunobiológicos e com capacidade similar
pode oferecer risco, porque o
gelo seco é composto de CO2 de manutenção de temperatura. Como exemplo, pode ser citado o ice
em estado sólido. Quando foam, composto por bobinas de gel em espuma que permitem manter os
este entra em contato com a
água ou umidade relativa do
imunobiológicos em temperaturas negativas por longo tempo, durante
ar, pode se expandir e provocar o transporte, sem necessidade de uso do gelo seco, principalmente no
explosões, fato possível de ocorrer transporte aéreo.
com as caixas isotérmicas que
acondicionam o imunobiológico
transportado em aeronaves. Foto 21 – Vacina para febre amarela acondicionada com gelo seco

Foto: Felipe da Silva Furtado (2013).


Atenção!
1. Não se deve confundir e substituir bobinas de gel ou água reutilizáveis
por gelo seco, pois têm aplicações diferentes. As bobinas devem ser
utilizadas para conservação dos imunobiológicos de +2°C a +8°C, e o
gelo seco, para o transporte em –20°C, como no caso das vacinas víricas,
quando são transportadas do laboratório produtor para a Cenadi e desta
para os estados.
2. Vale destacar que, atualmente, a Cenadi tem utilizado, no máximo,
5 kg de gelo seco por caixa térmica, complementando com bobinas do
tipo ice foam, para casos de transporte em temperaturas negativas. Tem
sido observado, na prática da central nacional, que somente bobinas desse
tipo (sem o gelo seco) têm mantido a temperatura dos imunobiológicos,
mas são necessários mais estudos e pesquisas para substituir
definitivamente o gelo seco pelas bobinas ice foam.
3. A utilização de gelo em barra ou escama não é recomendada
para atividades de rotina, em função do risco de congelamento dos
imunobiológicos.

208
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Caixas térmicas
Esse material é utilizado amplamente nas atividades de imunização ou Poliestireno é o que,
de RF para acondicionar os imunobiológicos, sendo elemento essen- popularmente, conhecemos como
isopor.
cial no transporte e nas atividades de vacinação. As caixas podem ser
Poliuretano refere-se a um tipo de
encontradas no comércio sob duas formas de apresentação: como caixa plástico que permite o isolamento
de isopor, composta de material isotérmico do tipo poliestireno expan- térmico.
dido, ou sob a forma de caixa feita de poliuretano.

De acordo com o tipo de atividade, uma ou outra poderá ser mais apro- Em função da facilidade de
limpeza, durabilidade e resistência,
priada. Por exemplo, a caixa de isopor, em geral, é mais utilizada no o uso das caixas de poliuretano
transporte dos imunobiológicos entre laboratórios, central nacional e está recomendado pelo PNI, nas
desta para a instância estadual, ao passo que a caixa de poliuretano é atividades de rotina.

mais usada nas atividades de vacinação de rotina.

Foto 22 – Modelos de caixa térmica de poliuretano e poliestireno expandido

Caixa poliestireno
Caixa poliestireno expandido (isopor) Caixa poliuretano 1
expandido (isopor) 50 L com berço
130 L sem berço
Fotomontagem: Felipe da Silva Furtado (2015).

Caixa poliestireno
Caixa poliestireno expandido (isopor) Caixa poliuretano 2
expandido (isopor) 50 L sem berço
130 L com berço

Seja qual for o tipo de caixa térmica escolhido, esta não pode estar
danificada ou fora dos padrões preconizados. Assim, no planejamento
da aquisição de caixas, o gestor da RF deve levar em consideração as
especificações do fabricante, a propriedade e a característica térmica
do produto, sua densidade, capacidade etc. É fundamental que o tipo
de caixa seja escolhido de acordo com o tipo de atividade ou uso a que

209
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

se destina, especialmente em relação a sua capacidade, resistência a


impactos e espessura. Caso não sejam seguidas essas recomendações,
as caixas poderão não resistir ao manuseio e às circunstâncias do dia a
dia de vacinação ou transporte, bem como não manter a temperatura
adequada, por terem estrutura e espessuras impróprias ao uso previsto.

Alguns cuidados devem ser tomados na organização das caixas térmi-


cas, além dos já mencionados, em função das diversas variáveis envol-
vidas. Tais cuidados se aplicam, especialmente, ao acondicionamento
dos imunobiológicos para o transporte. Nesse caso, é fundamental
considerar:
G a temperatura ambiente do local de origem e de destino;
G a distância até o destino, tempo em trânsito, via e condições de
transporte e o quantitativo de imunobiológicos a ser transportado;
G o isolamento da caixa térmica (deve ser preservado);
G a quantidade e o tipo de bobina reutilizável (as bobinas devem ser
verificadas e monitoradas);
G a padronização e as recomendações do PNI para a organização das
vacinas nas caixas térmicas;
G o volume da caixa a ser transportada;
G a posição dos imunobiológicos na caixa térmica (não devem ficar
soltos no interior da caixa).

Em todas as atividades, a previsão do quantitativo de caixas é indispen-


sável, devendo-se considerar sempre a relação atividade X capacidade
da caixa; quantidade de vacinas para atender a população X volume de
caixas para transporte X quantidade de bobinas necessárias etc.

Os gestores das centrais de RF e as instituições de saúde que dispõem de


salas de vacina devem planejar o orçamento considerando a aquisição do
quantitativo de caixas térmicas, bobinas e gelo necessário às atividades, de
acordo com o padrão e o preconizado pelo PNI.
Para saber mais detalhes sobre a forma e as recomendações para
organização das caixas e utilização de bobinas, consulte as publicações
referentes ao tema no site do Ministério da Saúde (www.saude.gov.br).

Termômetros
Como regra geral, os imunobiológicos devem permanecer rigorosa-
mente em temperaturas entre +2ºC e +8ºC na Central Nacional de Rede

210
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

de Frio, na central ou coordenação estadual de imunizações, nas regio-


nais de saúde, nas salas de vacinação, nos postos volantes (por ocasião
de campanhas, intensificações e bloqueios), bem como durante todo o
percurso do transporte. Excepcionalmente, e mediante estrita orienta-
ção do PNI e/ou do laboratório produtor, algumas vacinas podem ser
armazenadas em temperaturas negativas, mas apenas nas instâncias
superiores (nacional, estadual ou regional), e nunca na municipal ou
local. Isso significa dizer que a temperatura ideal de acondicionamento
das vacinas para posterior utilização será sempre de +2ºC a +8ºC.

Em qualquer das instâncias ou locais, o instrumento utilizado no moni- Termômetros são abordados nos
toramento da temperatura é o termômetro. Existe uma variedade de Capítulos 6 e 7, respectivamente,
“A rede de frio e a importância da
tipos e modelos, com diferentes princípios de funcionamento, tais como temperatura dos imunobiológicos”
termômetro de momento, máxima e mínima digital com cabo exten- e “Refrigeração e equipamentos da
rede de frio”.
sor, analógico, de radiação infravermelha visível, de registro gráfico e
termorregistradores, como já apresentado em capítulos anteriores. Pro-
curamos tratar aqui dos principais cuidados no uso desse instrumento
na rede de frio ou nas salas de vacina. Vale destacar que a instalação e
a medição dos equipamentos utilizados nas salas de vacina podem ser
encontradas, de forma vasta, na literatura sobre imunização. Por isso,
neste capítulo serão apresentados os termômetros mais utilizados na
rede de frio e os cuidados necessários para usá-los de forma segura.

Termômetro de momento, máxima e mínima digital com cabo


extensor
É utilizado em grande parte das atividades de vacinação. Atualmente,
na Cenadi, tem sido utilizado em determinadas situações, como para
medição da temperatura das caixas durante o transporte (embora deva
ser feito o uso preferencial de data loggers). Pode, também, ser utilizado
para auxiliar na medição de temperatura, quando há dúvidas na leitura
realizada por outro equipamento como o laser.

Dado seu amplo uso na sala de vacinação, a aquisição desse tipo de


insumo deve ser realizada com bastante rigor pelo gestor, devendo-se
planejar um quantitativo de reserva para estoque e recursos para veri-
ficação sistemática da calibração do equipamento, visto que sua utiliza-
ção é diária na rotina das unidades.

Para o correto uso, alguns cuidados devem ser tomados no seu manu-
seio, como:
G verificação e seguimento das recomendações do fabricante;
G data de instalação da pilha com identificação do período para troca;

211
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G adequação do termômetro na escala apropriada: verificar a presença


de botão de controle de leitura em ºF (Fahrenheit) ou ºC (Celsius),
para posicioná-lo na escala utilizada no Brasil, que é o ºC;
G calibração conforme especificações do fabricante ou normas, entre
outros.

A instalação desse tipo de termômetro no refrigerador doméstico da sala


de vacina ou nas caixas térmicas deve seguir as instruções dos manuais
do Ministério da Saúde, observando-se, principalmente, que a maioria
dos modelos digitais é importada e desenhada para o registro de tempe-
ratura ambiente dentro e fora da sala. Por isso, o visor identificado com
Out (fora) corresponde à temperatura do ambiente em que se encontra
o refrigerador ou caixa térmica, e o visor identificado com In (dentro),
à temperatura do interior do refrigerador.

Para a verificação da temperatura, deve-se pressionar o botão uma vez,


e será dada a temperatura máxima atingida, surgindo a sigla Max
(máxima); pressionando-o mais uma vez, surgirá a sigla Min (mínima);
pressionando-o pela terceira vez, a temperatura do momento. Reco-
menda-se que, após cada leitura e registro das temperaturas, seja pres-
sionado o botão Reset, para iniciar um novo ciclo de medição.

Também existe disponível um modelo que permite a leitura das tempe-


raturas de momento, máxima, mínima e do ambiente externo, com dis-
positivo de alarme, que é acionado quando a variação de temperatura
ultrapassa os limites configurados, ou seja, menor que +2ºC e maior
que +8º C (set point).

Importante!
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a utilização do
termômetro de momento, máxima e mínima digital com cabo extensor
deve restringir-se às caixas de uso diário, na instância local.
O deslocamento pode comprometer a calibração e, consequentemente,
a confiabilidade da medição.

Por ser bastante utilizado, a sua instalação e forma de leitura devem


ser conhecidas pelo profissional da saúde que trabalha com o equipa-
mento, em qualquer instância da rede de frio ou unidade de saúde.

Termômetro analógico
É indicado para refrigeradores domésticos da sala de vacina ou em
câmara frigorífica, não sendo recomendado seu uso nas caixas tér-

212
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

micas. Isso porque é um termômetro de dilatação constituído de um


reservatório, preenchido com líquido, soldado a um tubo capilar de
vidro graduado e fechado na parte superior, que precisa ser mantido na
posição vertical para que não haja fragmentação do líquido utilizado
no seu interior, o que impossibilita sua instalação no interior das caixas
térmicas.

Outro fator que contraindica seu uso nas caixas térmicas é a possibili-
dade de quebra do vidro que o reveste em situação de impacto, como
nas atividades de rotina na sala de vacina e no transporte na RF. O capí-
tulo anterior aborda com detalhes os usos e as restrições do termômetro
digital, não sendo necessários mais detalhes sobre o assunto.

Termômetro de radiação infravermelha ou pirômetro


É recomendado para medições rápidas e grandes volumes de cargas;
por isso, tem amplo uso na rede de frio e na instância estadual. É um
instrumento composto por sensores de temperatura, tem formato de
pistola, e a temperatura é verificada a partir do acionamento do gatilho
do aparelho. Possui alta tecnologia, funciona por meio de sensores que
utilizam radiação térmica. A medição da temperatura é feita por laser,
ao ser acionado o gatilho. Seu medidor possui display LCD iluminado,
com tampa protetora para o sensor, e chave de seleção °C/°F.

Foto 23 – Termômetro de radiação A distância mínima e o tempo


infravermelha visível
de pressão do gatilho para me-
dição da temperatura diária na
RF devem ser rigorosamente
seguidos pelo profissional, que
Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

deve ser capacitado ou infor-


mado sobre a forma correta de
uso do equipamento. Para que
o registro desse termômetro
seja confiável, é preciso obser-
var e seguir os procedimentos
descritos pelo fabricante do
produto.

Importante!
Por causa da emissão de raio laser, recomenda-se não utilizar esse
equipamento diretamente na pele e, em especial, em direção aos olhos.

213
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Termômetro de registro gráfico


É utilizado em câmaras e freezers, nas centrais de rede de frio, para a con-
servação de imunobiológicos. Registra temperaturas em um intervalo
de tempo, geralmente de sete dias, e os discos devem ser trocados após
esse período. O planejamento para sua aquisição deve levar em consi-
deração a necessidade de estoque de discos para registro, de forma que
a observação do comportamento da temperatura não seja interrompida
ou impedida pela falta de material. O registro gráfico das temperaturas
medidas por esse aparelho deve
Foto 24 – Termógrafo
ser avaliado diariamente para
detecção de possíveis oscilações
de temperatura.

O termômetro de registro gráfico


é utilizado pela Cenadi em situa-
Foto: Felipe da Silva Furtado (2016).

ções excepcionais, como na me-


dição da temperatura para veri-
ficar a eficiência e/ou condição
de funcionamento do sistema de
automação; serve, portanto, como
um instrumento de avaliação
periódica.

Termorregistradores: os data loggers


Eles podem ser de diversos tipos: data loggers, registrador eletrônico fri-
gorífico e indicador de congelamento. Aqui, abordamos apenas o data
logger, por sua ampla utilização na rede de frio.

Informações sobre os demais Como a descrição sobre a forma de utilização desse instrumento de
instrumentos de medição medição da temperatura já foi apresentada no capítulo anterior, vamos
de temperatura poderão ser
encontradas nas publicações do
abordar apenas as informações relativas aos cuidados com o equipa-
Programa Nacional de Imunizações, mento na central de rede de frio.
em portarias e manuais do
Ministério da Saúde.
Data loggers são pequenos registradores de temperatura utilizados nas
atividades de transporte dos imunobiológicos das centrais de RF, em
Segundo orientações da
Organização Mundial da Saúde, geral. É um importante insumo, porque permite o monitoramento da
os data loggers são indicados temperatura durante o transporte, indicando quando ela está fora da
para uso em caixas de transporte
faixa adequada, assim como o tempo em que é mantida na faixa ideal,
e câmara refrigerada para
imunobiológicos. demonstrando, também, o intervalo de tempo durante o qual o imuno-
biológico pode ter sido submetido a alterações de temperatura.

Além de seguir as especificações do fabricante, o principal cuidado a ser


tomado pelo profissional da RF é a calibração desse termômetro, que
deve ser realizada anualmente.

214
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Por serem muito utilizados, o gestor precisa planejar sua aquisição con-
siderando o uso, a capacidade instalada da rede, a movimentação e o
volume de transporte das vacinas na central de rede de frio sob sua
responsabilidade. É importante que, na capacitação da equipe da rede
de frio, sejam consultadas e informadas as orientações do fabricante em
relação ao uso e às calibrações desse registrador de temperatura.

Foto 25 – Data loggers Vale, por fim, reforçar que, indepen-


dentemente do tipo de termômetro
utilizado, o manejo, a calibração, a
fixação e o monitoramento de seus
registros são fundamentais para a
correta medição e o funcionamento
do equipamento.

Convém, ainda, reiterar outros dois


Foto: Felipe da Silva Furtado (2015).

pontos. O primeiro refere-se à exi-


gência de que todos os equipamentos
de refrigeração e de transporte utili-
zados na rede de frio tenham algum
tipo de instrumento para medir e
monitorar quantitativamente a tem-
peratura. E o segundo diz respeito
à adequação desse instrumento aos
equipamentos como câmara frigorífica, refrigerador doméstico, freezer,
caixas térmicas de uso diário ou para transporte.

Câmara refrigerada/refrigeradores
Os refrigeradores/câmaras refrigeradas e as câmaras frigoríficas (nega-
tivas ou positivas) são equipamentos destinados ao armazenamento
de imunobiológicos nas instâncias locais e nas centrais de RF, respec-
tivamente.

Nas atividades de vacinação no nível local, são comumente usados a


câmara refrigerada ou os refrigeradores domésticos. Entretanto, no
mercado, já existem tipos de câmara refrigerada/refrigeradores próprios
para armazenar imunobiológicos que poderão substituir, gradualmente,
os refrigeradores domésticos, conforme já mencionado no capítulo
anterior, em que é mostrado, com detalhes, como esses equipamentos
funcionam e os cuidados na sua instalação e aquisição.

O planejamento para aquisição desses equipamentos deve conside-


rar, principalmente, o tipo de uso, a capacidade de armazenamento, o
espaço disponível para o refrigerador, a garantia de assistência técnica

215
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Esses são cuidados que todo e o registro do produto. O gestor deve conhecer os diversos tipos dis-
gestor deve tomar na aquisição de
qualquer equipamento.
poníveis no mercado, escolher o mais apropriado às atividades a que se
destina e só então proceder a ou encaminhar o pedido de aquisição do
equipamento. Ao efetuar a compra, o gestor deve assegurar, também,
a instalação, a assistência técnica e o treinamento da equipe pelo fabri-
cante, efetuando, ainda, a capacitação da equipe de acordo com a nova
estruturação da rede de frio.

Em relação aos cuidados com os refrigeradores, para que mantenham


com qualidade e segurança os imunobiológicos armazenados, alerta-
mos, principalmente, para os seguintes procedimentos:
G fazer uso exclusivo da câmara refrigerada/refrigerador para os
imunobiológicos;
G localizar a câmara refrigerada/refrigerador a uma distância em
torno de 20 cm da parede e, se houver mais de um equipamento,
de 20 cm entre eles;
G instalar tomada a 1,30 m (um metro e trinta centímetros) do piso;
G usar tomada exclusiva para o equipamento;
G evitar a colocação de qualquer objeto sobre o equipamento;
G não colocar qualquer objeto dentro da geladeira que possa dificultar
a circulação de ar;
G realizar a verificação de rotina do fechamento das portas do
equipamento, no fim de cada dia de trabalho;
G fazer a limpeza periódica do equipamento, de preferência a cada 15
a 20 dias, antes de a camada de gelo ultrapassar 0,5 cm.

Em relação à arrumação interna da câmara refrigerada/refrigerador,


devem ser observadas algumas normas, como:
G no evaporador, devem ser colocadas as bobinas reutilizáveis
arrumadas na posição vertical; quando colocadas no evaporador,
devem estar congeladas, com uma consistência firme;
G na porta da câmara refrigerada/refrigerador, não deve ser
armazenado nenhum produto, assim como na parte inferior, local
da gaveta de frutas. A tampa deve ser retirada, e a gaveta deve
Como discutido no capítulo permanecer, por constituir uma barreira para a saída do ar frio. É o
anterior, as garrafas de água processo de convecção que rege a transferência de energia no interior
visam criar uma massa fria
dentro do equipamento. O uso
do equipamento. A colocação de garrafas de mais ou menos 1 litro,
do corante serve para alertar contendo água e um corante, também vai favorecer esse processo;
que aquela água não é própria
para consumo. G os imunobiológicos, depois de retirados das caixas, devem ser
armazenados em bandejas, tipo guarda-talheres, perfuradas ou não,

216
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

com um espaço de mais ou menos 1 cm da parede do equipamento


de refrigeração;
G o termômetro deve ficar em local central, entre a primeira e a
segunda prateleira, equidistante de todos os pontos do interior do
equipamento;
G se o termômetro utilizado no equipamento for um modelo com
o bulbo, deve-se ter o cuidado para que essa parte permaneça na
posição central. O bulbo do termômetro deve ser colocado na parte
central da prateleira do meio, onde se encontram armazenados
os frascos dos imunos; com isso, se garante a medição exata da
temperatura das vacinas por meio da medida do ar que circula em
torno desses produtos;
G após a fixação do termômetro digital na parte externa da câmara
refrigerada/refrigerador, é necessário introduzir o cabo no gabinete
interno, através do espaço entre a porta e o interior do gabinete da
câmara refrigerada/refrigerador, próximo às dobradiças.

Logo após a aquisição do equipamento, ou durante o processo de


capacitação da equipe, é fundamental identificar a localização do
evaporador ou do local de entrada do ar-refrigerado, que são diferentes
conforme o modelo do equipamento, a fim de evitar a colocação de
vacinas próximo a esses pontos, durante a arrumação dos produtos,
e resguardá-las de oscilações de temperatura que comprometam suas
propriedades e segurança.

Reiteramos, ainda, outros procedimentos tratados no capítulo anterior:


planejar e executar as manutenções preventivas, preditivas e corretivas,
dispor de um plano de contingência e equipe devidamente treinada.
O gestor e o especialista em RF devem estar atentos a esses pontos e Para conhecer outros cuidados
seguir as recomendações propostas para cada equipamento, conforme recomendados para o uso
de câmara refrigerada/
orientações do fabricante e do Programa Nacional de Imunizações. refrigerador, consulte o Manual
de rede de frio do Programa
O cumprimento das recomendações e dos cuidados aqui apresentados Nacional de Imunizações
(BRASIL, 2013), ou outras
irá garantir o perfeito funcionamento do equipamento, aumentando publicações a respeito do
sua vida útil e assegurando a qualidade e conservação dos produtos assunto, disponíveis na
imunobiológicos. internet.

Freezers
São equipamentos destinados ao armazenamento das bobinas que pre-
cisam ser congeladas para uso no transporte dos imunobiológicos entre
as instâncias e centrais de RF e na realização dos procedimentos de
vacinação nas unidades de saúde, nas ações extramuro etc.

217
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Os cuidados com esse equipamento são os mesmos aplicados aos refri-


geradores. No planejamento para aquisição do produto, o gestor da
rede de frio deve dar preferência aos freezers do tipo horizontal, com
isolamento de suas paredes, evaporador e condensador localizado em
áreas abaixo do gabinete, com selo do Inmetro e sistema de refrigera-
ção selado. Outras especificações podem ser encontradas nos modelos
disponíveis, devendo o especialista da RF ou o gestor conhecerem os
existentes para realizar a escolha apropriada, sempre considerando
a capacidade do equipamento para atender a sua demanda de arma-
zenamento, a compatibilidade com a rede elétrica local, entre outros
aspectos.

Devem ser adotados pelo profissional especialista as mesmas orien-


tações e cuidados na aquisição, instalação e manutenção dos demais
equipamentos de refrigeração.

Existem outros insumos necessários, especialmente para as atividades


de imunização, que apresentamos a seguir, de forma resumida. São
eles: seringas, agulhas e caixas coletoras de resíduos.

Seringas e agulhas
Seringas e agulhas são amplamente utilizadas nas atividades de vaci-
nação, configurando-se como o principal insumo para a administração
dos imunobiológicos.
É importante que o gestor
esteja sempre atento às O uso de seringas descartáveis trouxe grandes benefícios ao trabalho
recomendações do laboratório
produtor, bem como às
de vacinação, tanto em termos da segurança quanto da esterilização e
portarias e notas técnicas redução do risco de contaminação. A escolha do tipo de seringa e de
do Programa Nacional de calibre da agulha vai depender do tipo de imunobiológico, da via a ser
Imunizações (PNI).
utilizada para aplicação e da recomendação do laboratório produtor.

Alguns cuidados devem ser adotados pelo profissional no manuseio das


Apresentamos, no Anexo G,
“Cuidados com seringas e seringas e agulhas. Todos eles devem ser seguidos pela equipe da saúde,
agulhas”, os principais cuidados tendo sempre, como base, as recomendações do fabricante e do PNI.
para que o profissional possa
atuar de forma segura, evitando Ao gestor, cabe acompanhar as inovações do mercado, buscando, além
acidentes durante a execução dos de produtos mais seguros, observar as normas e diretrizes do Programa
procedimentos de vacinação.
Nacional de Imunizações e informar sua equipe sobre as inovações e
novas recomendações no uso e manuseio dos insumos utilizados nas
atividades de vacinação.

218
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

Caixa coletora para descarte de resíduos


perfurocortantes e infectantes
Em toda a atividade de vacinação e na rede de frio, diversos tipos de O manejo, a segregação, a coleta,
resíduos são gerados. Em relação aos resíduos cortantes ou perfurocor- o tratamento, o transporte e a
destinação final dos resíduos da
tantes, como seringas e agulhas, os cuidados básicos estão relacionados rede de frio merecem atenção
com o acondicionamento desses insumos. Eles devem ser pré-acondi- especial e serão discutidos no
capítulo seguinte.
cionados em recipiente rígido, resistente a ruptura e vazamentos, que
contenha tampa e a simbologia de material infectante, a exemplo da
caixa coletora de material perfurocortante apresentada na foto a seguir.

Foto 26 – Modelo de caixa e de suporte para Os materiais perfurocortantes


caixa coletora de material perfurocortante e devem ser especialmente:
infectante
G acondicionados
separadamente, logo após o • O maior número de
acidentes com profissionais
uso, no local de sua geração; da saúde ocorre durante
o manejo e uso de
G depositados na caixa
Foto: Alexandre Moreno (2015).

perfurocortantes.
coletora, até que esta atinja
• Caixas coletoras não
2/3 de sua capacidade. Ao devem ser esvaziadas ou
atingir esse percentual, a reaproveitadas, em nenhuma
caixa deve ser descartada, circunstância.

porque caixas cheias podem


causar acidentes.

Ciente dos cuidados, é fundamental que, no planejamento para a


aquisição desse tipo de material, o gestor considere aspectos como: o
movimento da sala de vacina e a quantidade de lixo perfurocortante
a ser descartado; o destino das caixas após sua utilização; e a capaci-
dade das caixas coletoras. Levando em consideração tais aspectos, o
planejamento garantirá a disponibilidade desse insumo, possibilitando
o acondicionamento dos perfurocortantes de forma correta, e garan-
tindo, para toda a equipe, segurança no manejo e na utilização.

Considerações finais
Entendemos que a discussão sobre gestão da rede de frio de imunobio-
lógicos envolve um conjunto de diversos procedimentos, em que cada
ator tem importância e papel de destaque. Nenhum deles é mais ou
menos importante, e todos os trabalhadores devem atuar de forma pla-
nejada, articulada e integrada, como elos de uma rede, da rede de frio!

As atividades de armazenamento, manuseio, distribuição e transporte dos


imunobiológicos são de grande importância e complexidade, exigindo

219
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

comprometimento da equipe e a presença do profissional técnico res-


ponsável, conforme legislação pertinente. Segundo o artigo 11, da
Medida Provisória n. 2.190-34, de 23 de agosto de 2001 (BRASIL,
2001), as distribuidoras de medicamentos devem manter, obrigatoria-
mente, a assistência de técnico responsável farmacêutico, devidamente
inscrito no Conselho Regional de Farmácia, durante o funcionamento
do estabelecimento (BRASIL, 1973), norma que deve ser também cum-
prida na rede de frio de imunobiológicos, pois a dispensação de imuno-
biológicos é compreendida como dispensação de medicamento.

Para mais informações sobre Além do farmacêutico, outros profissionais são importantes e fazem parte
o curso de formação de da equipe da rede de frio, como enfermeiro e auxiliar de enfermagem;
especialista em rede de frio
de imunobiológicos, oferecido auxiliar de serviços gerais; auxiliar de expedição; apoio administrativo;
pela Escola Politécnica Joaquim motorista; almoxarife; armazenista; profissionais da importação, carga
Venâncio/Fiocruz/MS, acesse http://
www.epsjv.fiocruz.br/.
e descarga; operadores de empilhadeira e, mais recentemente incorpo-
rado à equipe, o especialista de rede de frio. Trata-se de um profissional
atuante na central de RF e que, mediante uma formação específica, se
torna especialista em gestão de rede de frio de imunobiológicos, apto
para a gestão das centrais de armazenamento e distribuição dos imu-
nobiológicos. Esse profissional deve e pode auxiliar o farmacêutico na
gestão desses locais.

Seja qual for o gestor da central de rede de frio, todas as atividades


desenvolvidas irão requerer um conjunto de procedimentos técnicos e
administrativos com o objetivo de assegurar a qualidade dos insumos
(imunobiológicos), por meio de condições adequadas de recebimento,
armazenagem, manuseio, controle eficaz de estoque e transporte. Uma
forma de garantir o cumprimento dos procedimentos é o gestor, ou
especialista da rede de frio, descrever e registrar, formalmente, todas
as atribuições e responsabilidades profissionais da equipe e fazer que
sejam compreendidas por todos.

Cientes de que todos os trabalhadores exercem papel essencial no bom


funcionamento da rede de frio, é importante que os gestores identifi-
quem suas necessidades de educação permanente e promovam oportu-
nidades para sua qualificação. Para isso, o recurso orçamentário anual
deve ser planejado e aprovado em valor suficiente e, da mesma forma,
o quantitativo da equipe deve ser compatível com o bom andamento
das atividades.

Nessa perspectiva, a Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal da


Administração Pública Federal ratifica a relevância da melhoria conti-
nuada da eficiência, eficácia e qualidade dos serviços públicos prestados,
assim como o desenvolvimento permanente do pessoal, a adequação
das competências requeridas, a divulgação e o gerenciamento das ações

220
Gestão da rede de frio de imunobiológicos

de capacitação. Toda a equipe deve ser qualificada em procedimentos da


rede de frio de imunobiológicos e em boas práticas de armazenamento,
distribuição e transporte, de maneira a deter o conhecimento geral do
contexto no qual está inserida e garantir a qualidade das atividades
desenvolvidas.

Buscamos, neste capítulo, demonstrar os processos envolvidos na ges-


tão da rede de frio, a partir da experiência da Cenadi, destacando suas
etapas fundamentais, reforçando o papel do planejamento na gestão
da RF, bem como a importância da medição e do controle da tempera-
tura dos imunobiológicos, em todas as etapas e instâncias. Ressaltamos,
especialmente, a responsabilidade dos trabalhadores das centrais de
armazenamento na manutenção da temperatura e na eficiência da RF,
enfatizando a necessidade de serem implementados cursos de formação
e de educação continuada, a fim de propiciar uma atuação crítica e
eficaz dos profissionais.

Ao escolher esse tipo de abordagem, nossa intenção é, principalmente,


destacar a amplitude e complexidade do trabalho na rede de frio, para
que você, trabalhador da imunização, rede de frio, ou da saúde, em
geral, identifique sua posição nesse contexto e sua contribuição para
o sucesso das ações de imunizações, fundamentais para a garantia do
direito de todos os indivíduos receberem vacina com qualidade e capa-
cidade de conferir proteção. É essa consciência que impulsiona você,
trabalhador da rede de frio, a cumprir seus deveres profissionais e,
especialmente, de cidadão.

A gestão eficiente e qualificada e o apoio dos órgãos competentes são


instrumentos essenciais para fortalecer a perspectiva de um sistema de
saúde público, universal, que, em vez de atender ao usuário do SUS
como um “cliente” à procura de um produto ou serviço, seja humani-
zado, acolhedor para todos, sem distinção, e ciente da sua obrigação de
cumprir o preceito constitucional de que o acesso à saúde é um direito
do cidadão e dever do Estado.

Referências
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de 2007. Dispõe sobre a criação do vocabulário controlado de embalagens de medicamentos.
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realizam análises em produtos sujeitos à vigilância sanitária e dá outras providências. Diário Oficial
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221
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

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BRASIL. Lei n. 5.991, de 17 de dezembro de 1973. Dispõe sobre o Controle Sanitário do Comércio
de Drogas, Medicamentos, Insumos Farmacêuticos e Correlatos, e dá outras providências. Diário
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BRASIL. Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispõe sobre a vigilância sanitária a que ficam
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223
Anexo A – Protocolo de recebimento de
insumos
Anexo B – Ata de recebimento de
vacina
Anexo C – Guia de entrada de
imunobiológicos (GEI)
Anexo D – Nota de fornecimento de
material (NFM)
Anexo E – Detalhamento da carga
Anexo F – Comprovante de recebimento
de insumos
Anexo G – Cuidados com seringas
e agulhas
1. Guardar o material na embalagem original, em local limpo e seco.
2. Lavar as mãos com água e sabão antes do manuseio.
3. Manusear o material em campo limpo.
4. Verificar o prazo de validade e se a embalagem está íntegra.
5. Abrir a embalagem na direção do êmbolo para a agulha, evitando
contaminação.
6. Descartar as seringas e agulhas em recipientes apropriados,
resistentes e de parede rígida, sem reinserir as agulhas nos
protetores, após o uso, para evitar acidentes. Usar sempre as caixas
coletoras apropriadas.
9. Gerenciamento de resíduos na
rede de frio
Cristiane Pereira de Barros e Walquíria Gonçalves dos Santos Teles

Desde que o mundo é mundo, todos nós produzimos resíduos diaria-


mente, seja na higienização pessoal, alimentação, no trabalho, ou até
mesmo em uma simples atividade de lazer. Podemos destacar um exem-
plo: ao assistirmos a uma sessão no cinema, daquela deliciosa pipoca
será gerado um resíduo, ou seja, o saco vazio que deverá ser descartado
no lixo. Você já parou para pensar qual a importância do destino final
desse resíduo para o bem-estar da comunidade?

Existem várias definições para o termo resíduo. Considerando sua Etimologia é o estudo da origem
e evolução das palavras.
etimologia, a palavra se origina no latim  residuum,  que significa
resto, restante. Aquilo que resta. O que fica das substâncias submeti-
das à ação de vários agentes físicos ou químicos (resíduos industriais,
nucleares, sólidos urbanos, dos serviços de saúde) (RESÍDUO, 2013).

Assim como em todos os processos da atividade humana, as atividades


desenvolvidas nas diversas instâncias da rede de frio/PNI, e em todos os
processos de trabalho para a manutenção dessa rede, geram resíduos.
Podemos citar, como exemplo, o imunobiológico, cuja composição pode
conter microrganismos vivos ou atenuados; se descartado de maneira
inadequada, pode contaminar o homem e o meio ambiente. Portanto,
é importante gerenciar esse resíduo, a fim de assegurar o seu destino
final de forma correta.

Para que os resíduos sejam gerenciados de maneira adequada, contamos


com órgãos federais que regulamentam as políticas de gerenciamento
dos resíduos oriundos dos serviços de saúde, em todo o país, entre eles:
a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da
Saúde; o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), do Ministério
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

do Meio Ambiente. É importante ressaltar que estados, municípios


e Distrito Federal, com o apoio dos órgãos federais, também podem
estabelecer normas de caráter complementar, a fim de adequá-las às
especificidades locais. Neste capítulo, abordaremos os itens dessas regu-
lamentações relacionados às atividades desenvolvidas na rede de frio.

Arcabouço legal para o gerenciamento


de resíduos
O arcabouço legal para o gerenciamento de resíduos dos serviços de
saúde é constituído de normatizações atuais existentes no Brasil que
regulamentam o gerenciamento dos resíduos em saúde. Vale lembrar
que essas normas sofrem constantes atualizações, considerando os
avanços técnicos e científicos, assim como as necessidades da comuni-
dade. Como exemplo, citamos as atuais seringas utilizadas nos serviços
Descarte é a fase de manejo de saúde. Anteriormente, eram de vidro e reutilizáveis. Hoje, fabricadas
interno em que os resíduos são com plástico descartável, geram, diariamente, uma quantidade maior
desprezados em recipientes
adequados a cada grupo,
de resíduos; em consequência, o estabelecimento de normas para o
conforme sua classificação. descarte seguro se tornou essencial.

Apresentamos, a seguir, algumas referências que normatizam o geren-


ciamento de resíduos em saúde, aplicáveis ao processo de trabalho na
rede de frio.

Resolução n. 358/2005
Disposição final é uma fase do Publicada em abril de 2005, pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente
manejo externo referente ao
destino dos resíduos que não têm
(Conama), do Ministério do Meio Ambiente, a Resolução n. 358/2005
mais serventia. Normalmente, dispõe sobre o tratamento e a disposição final dos resíduos dos serviços
esse destino é o aterro sanitário de saúde (CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, 2005). Des-
ou a vala séptica, com exceção
da disposição final dos rejeitos tacamos, a seguir, trechos da resolução que se aplicam à rede de frio.
radioativos, que deve ser feita em
instalação especial denominada O inciso X do art. 2º conceitua resíduos de serviços de saúde (RSS) como
repositório.
detritos ou materiais desprezíveis, resultantes de atividades exercidas
dentro de estabelecimentos de saúde e que podem apresentar contami-
nação biológica, química ou radioativa. São todos aqueles que, por suas
características, necessitam de processos diferenciados em seu manejo,
exigindo ou não tratamento prévio à sua disposição final (CONSELHO
NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, 2005).

232
Gerenciamento de resíduos na rede de frio

Classificação dos resíduos de serviços de saúde (RSS)


Segundo o Anexo I da Resolução n. 358/2005 do Conama, os RSS são
classificados em grupos, segundo a contaminação:
1. Grupo A: formado por resíduos biológicos que, por suas características
de maior virulência, infectividade e concentração de patógenos,
apresentam risco potencial à saúde pública e ao meio ambiente.
2. Grupo B: constituído por resíduos químicos que, por sua toxicidade
(incluindo a mutagenicidade e genotoxidade), corrosividade,
inflamabilidade e reatividade, apresentam risco potencial à saúde pública
e ao meio ambiente.
3. Grupo C: incorpora rejeitos radioativos, ou seja, resíduos contaminados
com radionuclídeos ou outro elemento radioativo, em quantidades
superiores aos limites de isenção especificados na norma CNEN-NE-6.02,
referente ao licenciamento de instalações radioativas.
4. Grupo D: inclui resíduos comuns, com características semelhantes às
dos resíduos domésticos.
5. Grupo E: agrupa os materiais perfurocortantes ou escarificantes, tais
como: lâminas de barbear, agulhas, escalpes, ampolas de vidro, brocas,
limas endodônticas, pontas diamantadas, lâminas de bisturi, lancetas;
tubos capilares; micropipetas; lâminas e lamínulas; espátulas; e todos os
utensílios de vidro quebrados no laboratório (pipetas, tubos de coleta
sanguínea e placas de Petri) e similares.

Foto 1 – Exemplo de resíduo Os resíduos gerados na rede de frio estão clas-


do subgrupo A1: vacina febre
amarela
sificados nos Grupos A, subgrupo A1, Grupo
D e Grupo E, que detalharemos a seguir.

G O subgrupo A1 é composto de culturas


e estoques de microrganismos; resíduos
de fabricação de produtos biológicos,
exceto os hemoderivados; descarte
de vacinas de microrganismos vivos
ou atenuados; meios de cultura
e instrumentais utilizados para
Foto: Vinícius Marinho (2009).

transferência, inoculação ou misturas


de culturas; resíduos de laboratórios de
manipulação genética. Podemos citar,
como exemplo, o frasco da vacina febre
amarela, que, em sua composição,
Fonte: Fiocruz Imagens. contém vírus vivo atenuado, podendo,
no manejo inadequado, contaminar o

233
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

meio ambiente. Neste grupo, os resíduos gerados constituem risco


de infecção por causa da possível presença de agentes biológicos.

Para refletir
Em sua prática, como acontece o descarte de resíduos do subgrupo A1?
Você obteve orientações para realizar essa atividade?

Reciclagem é o conjunto de ações G O Grupo D incorpora resíduos que não apresentam riscos biológico,
que realiza o reprocessamento dos
resíduos e recuperação da parte
químico ou radiológico à saúde ou ao meio ambiente; podem ser
para fabricação de novos produtos, equiparados aos resíduos domiciliares. Portanto, não necessitam de
evitando que sejam lançados no tratamento prévio para o descarte. Quando não forem passíveis de
meio ambiente.
reutilização, recuperação ou reciclagem, devem ser encaminhados para
Aterro sanitário é uma obra de
engenharia destinada a receber
o aterro sanitário de resíduo sólido urbano, devidamente licenciado
os resíduos no solo, sem risco pelo órgão ambiental competente. Podemos citar como exemplo:
de contaminação das águas resíduos de varrição, os provenientes das áreas administrativas, caixas
subterrâneas. É dotado de obras de
saneamento e controle ambiental, de poliuretano e/ou poliestireno expandido (isopor), resto de fita
tais como drenos e canalizações crepe, papel usado, copos usados, resto de alimentos etc.
que permitem a captação, o desvio
e o destino adequados de gases
e percolados (também conhecido Fotos 2 e 3 – Exemplos de resíduos do Grupo D: caixas de poliuretano e copos descartáveis
como chorume: líquido produzido
pela compressão e decomposição
do lixo).
Foto: Rema Nasaradden (2002).

Foto: Lianna Henwood (2013).


Fonte: FreeImages.com. Fonte: Wikimedia Commons

Materiais perfurocortantes G O Grupo E é constituído de Foto 4 – Exemplos de resíduos do Grupo E:


são objetos pontiagudos ou que seringa e ampola
materiais perfurocortantes
apresentam fios de corte capazes
de causar perfurações. ou escarificantes, tais como:
lâminas de barbear, agulhas,
Foto: Nick Winchester (s/d).

escalpes, ampolas de vidro,


brocas, limas endodônticas,
pontas diamantadas, lâminas
de bisturi, lancetas; tubos
capilares; micropipetas;
lâminas e lamínulas; espátulas;
Fonte: FreeImages.com.
e todos os utensílios de vidro

234
Gerenciamento de resíduos na rede de frio

quebrados no laboratório (pipetas, tubos de coleta sanguínea e placas


de Petri) e similares.

Para refletir
Na sua rotina de trabalho, como acontece o descarte de resíduos do
Grupo E? Você obteve orientações para realizar essa atividade?

É importante obter orientações técnicas para proceder adequadamente


ao descarte de resíduos, evitando contaminação da natureza e de outras
pessoas, bem como possíveis acidentes e danos ao meio ambiente. Para
A Resolução n. 358/2005,
isso, recomendamos a leitura da Resolução n. 358/2005, do Conama.
do Conama, está disponível
no seguinte endereço
eletrônico: http://www.mma.
gov.br/port/conama/legiabre.
Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) cfm?codlegi=462

n. 306/2004, Resolução do Conama n. 275/2001


e Nota técnica da Anvisa n. 002/2011
Publicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a RDC
n. 306/2004 dispõe sobre o regulamento técnico para o gerenciamento
de resíduos de serviços de saúde, com o objetivo de preservar a saúde
pública e a qualidade do meio ambiente, considerando os princípios
da biossegurança, as medidas técnicas, administrativas e as normativas
para prevenir acidentes. O gerenciamento de resíduos também conta
com diretrizes na Resolução do Conama n. 275/2001 e na Nota técnica
n. 002/2011, da Anvisa. Aqui, descreveremos as etapas do gerencia-
mento de resíduos na cadeia de frio para que você possa identificar a
sua inserção no processo, como também suas responsabilidades.

Considerando que a rede de frio é um gerador de diversos resíduos em


saúde, segundo a RDC n. 306/ 2004, compete à própria rede elaborar
um plano de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde (RSS),
conhecido também como PGRSS (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂN- Você pode acessar a RDC
CIA SANITÁRIA, 2004). Esse documento deve ser compatível com a n. 306/2004 pelo endereço
eletrônico http://goo.gl/p94fVS
legislação vigente e fará parte do processo de licenciamento ambiental,
em conformidade com a Resolução Conama n. 237/1997. Importa des-
tacar que ele deve ser adequado à realidade local, atender aos critérios
técnicos e potencializar a capacidade dos recursos disponíveis.

235
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Segregação é a separação
dos resíduos, conforme sua Todos os profissionais que trabalham na cadeia de frio, mesmo os que
classificação, no momento e local atuam temporariamente ou que não estejam diretamente envolvidos nas
de geração.
atividades de gerenciamento de resíduos, devem conhecer como funciona
o sistema adotado para o gerenciamento de RSS. Por exemplo, a prática
de segregação de resíduos, os conhecimentos sobre símbolos, expressões,
padrões de cores adotados, localização dos abrigos de resíduos, entre
outros fatores, indispensáveis à completa integração ao PGRSS.

Manejo dos Resíduos dos O PGRSS deve ter como base as características dos resíduos gerados no
Serviços de Saúde (RSS) é a
ação de gerenciar os resíduos
serviço e deve estabelecer diretrizes de manejo dos Resíduos dos Serviços
em seus aspectos intra e de Saúde (RSS). O processo de manejo dos RSS ocorrerá de acordo com
extraestabelecimento, desde a sua classificação, que, no caso da rede de frio, refere-se aos Grupos A1,
geração até a disposição final.
D e E.

O manejo adequado inclui as seguintes etapas: segregação, acondicio-


namento, identificação, transporte interno, armazenamento temporá-
rio, tratamento, armazenamento externo, coleta e transporte externos.
Para acessar o Manual de rede Todas merecem especial atenção, tanto em face dos riscos sanitários
de frio do Programa Nacional envolvidos quanto das normas legais vigentes no país. A seguir, apre-
de Imunizações, visite http://
bvsms.saude.gov.br/bvs/ sentamos as etapas conforme referenciado no Manual de rede de frio do
publicacoes/manual_rede_ Programa Nacional de Imunizações (BRASIL, 2013).
frio4ed.pdf

1. Segregação: consiste na separação dos resíduos no momento e local


de sua geração, de acordo com as características físicas, químicas,
biológicas e radioativas, o estado físico e os riscos envolvidos.
2. Acondicionamento: consiste no ato de embalar os resíduos
segregados em sacos ou recipientes que evitem vazamentos
e resistam às ações de punctura e ruptura (furos e rasgos).
A capacidade dos recipientes de acondicionamento deve ser
compatível com a geração diária de cada tipo de resíduo.

No caso das bobinas reutilizáveis,


o conteúdo interno de gel celulose Especificidades da rede de frio
é uma substância atóxica; por
isso, pode ser descartado na • Os materiais perfurocortantes, como seringas agulhadas e frascos de
rede de esgoto local, antes do vacina quebrados, classificados no Grupo E, deverão ser acondicionados
acondicionamento da bobina para em recipientes resistentes (caixa coletora de perfurocortante), que
a reciclagem.
atendam aos parâmetros referenciados na NBR ABNT n. 13.853:1997
(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 1997).

236
Gerenciamento de resíduos na rede de frio

Você pode acessar a RDC n.


275/2001, do Conama, no
seguinte endereço eletrônico:
Foto: Alexandre Moreno (2015).

http://www.mma.gov.br/
port/conama/legiabre.
cfm?codlegi=273

• As campanhas de vacinação realizadas em todo país, a vacinação


extramuro ou as intensificações geram resíduos, como as seringas
utilizadas e os frascos de vacina. Esses resíduos são gerados em ambiente
fora da estrutura do serviço de saúde; portanto, quando não puderem ser
submetidos ao tratamento nos locais de geração, como a autoclavagem,
devem ser segregados, acondicionados para serem encaminhados à
unidade de tratamento de referência.

Há políticas que incentivam a reciclagem de resíduos sólidos no país.


No caso da rede de frio, resíduos recicláveis são: de poliuretano e/ou
poliestireno expandido (isopor), bobinas reutilizáveis, papéis e deri-
vados. O Conama aprovou a Resolução n. 275/2001, que define um
sistema de cores de fácil visualização, com validade em todo o território
nacional, para segregação e acondicionamento categorizado dos resí-
duos. A definição dessas cores foi inspirada em formas de codificação
adotadas internacionalmente para identificação dos recipientes e trans-
portadores usados na coleta seletiva.
Quadro 1 – Padrão de cores definido pelo Conama, Resolução n. 275/2001, para
acondicionar resíduos segregados

AZUL Papel/Papelão
VERMELHO Plástico
VERDE Vidro
AMARELO Metal
PRETO Madeira
LARANJA Resíduos perigosos
BRANCO Resíduos ambulatoriais e de serviços de saúde
ROXO Resíduos radioativos
MARROM Resíduos orgânicos
Resíduo geral não reciclável ou misturado, ou contaminado não
CINZA
passível de separação
Fonte: Elaborado de acordo com a RDC n. 275/2001 (CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, 2001).

237
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Com base na Resolução Conama RDC n. 275/2001, o acondiciona-


mento para reciclagem deve estar de acordo com as orientações dos
serviços locais de limpeza urbana (CONSELHO NACIONAL DO MEIO
AMBIENTE, 2001). São utilizados sacos impermeáveis, contidos em
recipientes, mantidos em abrigos de guarda devidamente identificados,
usando os códigos de cores, suas correspondentes nomeações e símbo-
los do tipo de material reciclável.

Não há restrição quanto ao uso 3. Identificação: consiste em um conjunto de medidas que permite
de adesivos para identificação
o reconhecimento dos resíduos contidos nos sacos ou recipientes,
dos sacos e recipientes de
acondicionamento de resíduos, fornecendo informações para seu correto manejo. Os sacos de
desde que seja garantida a sua acondicionamento, os recipientes de coleta e transporte, internos
resistência aos processos normais
de manuseio. e externos, e os locais de armazenamento devem ser identificados
de maneira a propiciar fácil visualização, de forma indelével,
utilizando-se símbolos, cores e frases, atendendo aos parâmetros
vigentes referenciados na norma da Associação Brasileira de
Normas Técnicas, NBR 12.810: 2016. Além disso, deve atender,
também, às exigências relacionadas à identificação de conteúdos e
ao risco específico de cada grupo de resíduos.

Quadro 2 – Padrão de símbolos adotados para identificar os resíduos segregados,


definidos pela ABNT

Resíduos dos grupos A e E são identificados pelo símbolo de risco


biológico, pois se trata de substância infectante. Este símbolo também
pode ser utilizado para o grupo de resíduos perfurocortantes.

Resíduos do grupo B são identificados pelos riscos que podem oferecer.


Podem ser utilizados símbolos para risco químico e/ou material
inflamável.

Imagens: Resignent (2004 e 2006).


Resíduos do grupo C são identificados pelo símbolo de radiação ionizante –
material radioativo.

Resíduos do grupo D, por não oferecerem risco, podem ser encaminhados


para a reciclagem e são identificados pelo símbolo ao lado. São utilizadas
cores para identificar o tipo de material, conforme apresentado no
Quadro 1?

Fonte das Imagens: FreeImages.com.

4. Transporte interno: consiste no translado dos resíduos dos pontos


de geração até o local destinado ao armazenamento temporário ou
ao armazenamento externo, com a finalidade de apresentação para
a coleta.

238
Gerenciamento de resíduos na rede de frio

Foto 5 – Exemplos de transporte interno dos resíduos até


o local de armazenamento temporário
Foto: Michael Zacharzewski (s/d).

Fonte: FreeImages.com.

5. Armazenamento temporário: consiste na guarda temporária


dos recipientes contendo os resíduos já acondicionados, em
local próximo aos pontos de geração. Não poderá ser feito
armazenamento temporário com disposição direta dos sacos
sobre o piso. É obrigatória a conservação dos resíduos em
recipientes de acondicionamento. Esses podem ser dispensados,
se a distância justificar. Pisos e paredes deverão ser laváveis e
resistentes ao tráfego dos recipientes coletores. Deve ter ponto de
iluminação artificial e área para armazenamento de, no mínimo,
dois recipientes coletores, para o posterior translado até a área
de armazenamento externo. Se contar com sala exclusiva, esta
deve ser identificada como sala de resíduos. No armazenamento
temporário, não é permitida a retirada dos sacos de RSS de dentro
dos recipientes ali posicionados.
6. Tratamento: consiste na aplicação de método, técnica ou processo As determinações da Nota
técnica n. 002/2011, UINFS/
que modifique as características dos riscos inerentes aos resíduos, GGTES/Anvisa, de 12 de abril
reduzindo ou eliminando o risco de contaminação, de acidentes de 2011, dizem respeito ao
ocupacionais ou de dano ao meio ambiente. cotidiano dos profissionais de
vacinação e da rede de frio,
em especial à sua segurança.
Sobre o tratamento na rede de frio, contamos com a Nota técnica n. Para conhecê-las, acesse:
002/2011, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que, http://www.saude.mt.gov.br/
de acordo com a Resolução Anvisa, RDC n. 306/2004, orienta sobre upload/controle-infeccoes/
pasta3/nota_tecnica_
o tratamento de resíduos resultantes de atividades de vacinação com uinfsggtesanvisa_n_02_2011.
microrganismos vivos ou atenuados. As orientações instruem que os pdf
seguintes resíduos devem ser submetidos a um tratamento prévio à
disposição final: frascos de vacinas com expiração do prazo de validade,
Autoclave é um equipamento
com conteúdo inutilizado, vazios ou com restos do produto. utilizado para esterilizar materiais
contaminados por meio de vapor
O processo de tratamento prévio indicado é a autoclavação por vapor de água, durante um período
determinado, com o objetivo de
saturado sob pressão. A autoclave a ser utilizada para esse procedi- destruir os agentes patogênicos
mento deve ser exclusiva, ou seja, não pode ser compartilhada com (FIOCRUZ, 2004).

239
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

A autoclavação poderá ser feita outros serviços. Essa exclusividade, na ocorrência de algum acidente e
por meio de contratação de
empresa habilitada para esse consequente contaminação do equipamento, evita que seja necessário
serviço, ou de aquisição da limpar e descontaminar a autoclave, o que acarreta custo financeiro e
autoclave para realização do
interrompe o uso do equipamento.
tratamento. Caso seja feita a
aquisição do equipamento, sua
localização poderá ser na própria
unidade de saúde, na central de Importante!
distribuição de vacinas do PNI
ou mesmo em alguns centros Os resíduos provenientes das atividades de vacinação, como frascos de
regionais do estado, para facilitar imunobiológicos, vacinas com prazo de validade expirado, materiais
a logística. perfurocortantes etc., devem ser devidamente tratados, acondicionados
e identificados para serem encaminhados ao processamento final. Todos
os profissionais da saúde precisam conhecer esse processo para garantir o
tratamento adequado dos resíduos, pois são corresponsáveis por ele.

Incineração é o tratamento com Após o tratamento prévio, os resíduos dos serviços de saúde dos Grupos A
queima de resíduos sólidos ou
e E devem ser acondicionados em saco branco leitoso. A coleta desse lixo
líquidos químicos até a redução a
cinzas, utilizando equipamentos é feita pelo município, e o transporte, em veículos (caminhões) específi-
que produzem altas temperaturas, cos e adequados para essa finalidade. O lixo é enviado diretamente para
com padrões de emissões
atmosféricas controlados. o aterro sanitário autorizado, onde passa por processo de incineração.

7. Armazenamento externo: consiste na guarda dos recipientes de


resíduos até a realização da etapa de coleta externa, em ambiente
exclusivo e com acesso facilitado aos veículos coletores, não sendo
permitida a manutenção dos sacos de RSS fora dos recipientes ali
estacionados.

Figura 1 – Exemplos de estrutura adequada para a guarda dos resíduos


acondicionados até a coleta externa

240
Gerenciamento de resíduos na rede de frio

8. Coleta e transporte externos: consistem na remoção dos RSS do As NBR n. 12.810 e 14.652 não
se encontram disponíveis para
abrigo de resíduos até a unidade de tratamento ou disposição consulta na internet. Verifique,
final, utilizando-se uma técnica que garanta a preservação das em seu serviço, se há exemplares
condições de acondicionamento e a integridade dos trabalhadores, disponíveis, caso deseje aprofundar
seus estudos.
da população e do meio ambiente, devendo estar de acordo com as
orientações dos órgãos de limpeza urbana, assim como da Resolução
Conama n. 358/2005. A coleta e o transporte externos dos resíduos
de serviços de saúde devem ser realizados de acordo com as
normas NBR n. 12.810 e NBR n. 14.652, da ABNT (ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2016, 2013).

Figura 2 – Transporte adequada para coleta de resíduos infectantes (Grupo A e E)

Considerações finais
Podemos compreender, no fim deste capítulo, que o gerenciamento de
resíduos de serviços de saúde (GRSS) é entendido como o conjunto de
ações de gestão planejadas, implantadas e implementadas com bases
técnico-científicas, normativas e legais. Tem como objetivo minimizar
a produção de resíduos gerados e proporcionar seu encaminhamento
seguro, de forma eficiente, visando à proteção dos trabalhadores, à pre-
servação da saúde pública, dos recursos naturais e do meio ambiente.

Destaque-se que são os serviços de saúde os responsáveis pelo correto


gerenciamento de todos os RSS por eles gerados, desde o momento
de sua produção até o destino final. É um processo que necessita ser
eficiente, e, para isso, os trabalhadores precisam conhecer os diversos
tipos de resíduos existentes. O manejo, a segregação, a coleta, o trata-
mento, o transporte e a destinação final desses resíduos merecem espe-

241
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

cial atenção tanto em face dos riscos sanitários envolvidos, em rela-


ção ao trabalhador da saúde e à população, quanto das normas legais
vigentes no nosso país. É por tudo isso que você, trabalhador da saúde,
é tão importante nesse processo.

Referências
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Nota técnica n. 002, de 12 de abril de
2011. Tratamento de resíduos resultantes de atividades de vacinação com microrganismos vivos
ou atenuados. Brasília, DF, 2011. Disponível em: <http://www.saude.mt.gov.br/upload/controle-
infeccoes/pasta3/nota_tecnica_uinfsggtesanvisa_n_02_2011.pdf >. Acesso em: 3 ago. 2016.

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Resolução da Diretoria Colegiada RDC


n. 306, de 7 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de
resíduos de serviços de saúde. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 dez. 2004. Seção 1, p. 49.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 12.810:2016: resíduos de serviços de


saúde: gerenciamento extraestabelecimento: requisitos. Rio de Janeiro, 2016.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13.853:1997: coletores para resíduos de


serviços de saúde perfurantes ou cortantes: requisitos e métodos de ensaio. Rio de Janeiro, 1997.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14.652:2013: implementos rodoviários:


coletor-transportador de resíduos de serviços de saúde: requisitos de construção e inspeção. Rio de
Janeiro, 2013.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Manual de rede de frio do Programa Nacional de Imunizações. 4. ed.
Brasília, DF, 2013. Disponível em: <http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/julho/03/
manual-rede-frio.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2014.

CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (Brasil). Resolução n. 358, de 29 de abril de 2005.


Dispõe sobre o tratamento e a disposição final dos resíduos dos serviços de saúde e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 4 maio 2005. Seção 1, p. 63-65.

CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (Brasil). Resolução n. 275, de 25 de abril de 2001.


Estabelece o código de cores para os diferentes tipos de resíduos, a ser adotado na identificação de
coletores e transportadores, bem como nas campanhas informativas para a coleta seletiva. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 19 jun. 2001. Seção 1, p. 80.

FIOCRUZ. Glossário em biossegurança. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio
Arouca/Fiocruz, 2004. Disponível em: <http://www.fiocruz.br/biosseguranca/Bis/StartBIS.htm>.
Acesso em: 18 set. 2016.

RESÍDUO. In: DICIONÁRIO Priberam da língua portuguesa. Porto: Priberam, 2013. Disponível em:
<https://www.priberam.pt/dlpo/resíduos>. Acesso em: 3 ago. 2016.

242
III Organização do trabalho
em saúde e a rede de frio de
imunobiológicos
10. Organização do trabalho
Marcello de Moura Coutinho e Valéria Cristina Gomes de Castro

O trabalhador da rede de frio (RF) de imunobiológicos atua, diaria-


mente, em uma série de ações e procedimentos que fazem parte do seu
processo de trabalho. No entanto, é fundamental ressaltar que o tra-
balho na RF, especificamente, e o trabalho em saúde, de maneira mais
ampla, são entendidos de forma muito mais complexa. É a compreen-
são dessa complexidade que permite uma prática não alienante e não
alienada do trabalhador, uma atuação que constrói novas realidades e
reflete sobre elas.
Não existe atividade humana da qual se possa excluir toda in- Homo faber – considera-se, do
tervenção intelectual, não se pode separar o homo faber do ponto evolutivo, a superação do
homo sapiens. Em suma, todo homem, fora de sua profissão, homo sapiens, no sentido em que
conjuga a razão e a produção de
desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou seja, é um ferramentas, ou seja, trabalho
"filósofo", um artista, um homem de gosto, participa de uma intelectual e manual. Na definição
concepção do mundo, possui uma linha consciente de condu- relativa ao verbete do Dicionário
ta moral, contribui assim, para manter ou para modificar uma de Filosofia Nicolas Abbagnano
concepção do mundo, isto é, para promover novas maneiras (2007, p. 156): “é a definição de
homem feita por Bergson, que
de pensar (GRAMSCI, 1979, p. 8). viu na inteligência, característica
fundamental do homem, a
Neste capítulo, debatemos os conceitos de trabalho e processo de tra- faculdade de fabricar instrumentos
inorganizados.”
balho, as diferentes formas que o trabalho assume na sociedade e sua
organização na atualidade, buscando relacioná-los às especificidades do
setor de saúde, em especial, da rede de frio de imunobiológicos.

Trabalho e sociedade
Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o
homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua
própria ação impulsiona, regula e controla seu intercâmbio
material com a natureza. Defronta-se com a natureza como
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais de


seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-
-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil à
vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e mo-
dificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza
(MARX, 2005).

O capitalismo superou o O trabalho humano assume diferentes formas, dependendo da orga-


feudalismo, um sistema nização societária em que se encontra. Distingue-se do trabalho reali-
socioeconômico baseado na posse
da terra, tendo o senhor feudal, os zado por outros animais, pois, através dele, o homem se transforma e
nobres e o clero como integrantes transforma a realidade, uma condição necessária em qualquer tempo
da classe social dominante e
os servos/camponeses como
histórico. O trabalho, porém, assume formas específicas em diferentes
dominados. modos de produção (primitivo, escravista, feudal e capitalista).

Com o advento do sistema capitalista, houve a ascen-


são da burguesia (patrões/empregadores) – a classe que
domina e detém os meios de produção (empresas, fábri-
cas, máquinas e infraestrutura) – e a criação do prole-
tariado (trabalhadores) – a classe que precisa vender a
sua força de trabalho para sobreviver e se reproduzir,
constituindo, portanto, a classe trabalhadora. Essas duas
classes surgidas no âmbito do capitalismo não possuem
os mesmos interesses, já que os que pertencem à burgue-
sia acumulam capital e riqueza com base na exploração
do trabalho do proletariado.

Na sociedade contemporânea, o trabalho tem sofrido


muitas transformações. Características próprias da forma
de trabalho predominante na sociedade industrial vêm
Ferro e Carvão, de William Bell Scott (1811-1890).
O capitalismo é um sistema socioeconômico surgido sendo substituídas por um tipo de trabalho em que o uso
nos séculos XV e XVI, a partir da expansão marítima da tecnologia é cada vez mais necessário. Postos de tra-
europeia (capitalismo mercantil/comercial), mas que
se consolidou com a Revolução Industrial iniciada na balho vêm sendo substituídos por tecnologias, e novas
Inglaterra, entre os séculos XVIII e XIX, substituindo, relações têm sido estabelecidas, reconfigurando a forma
mundialmente, o trabalho artesanal pelo trabalho
assalariado com o uso de máquinas. de organização predominante até então. Não se exige
Fonte: Wikimedia Commons. mais do trabalhador apenas o conhecimento do seu ofí-
cio, mas também maior flexibilidade para assumir diferentes tarefas,
a fim de suprir a demanda proveniente da diminuição de postos de
trabalho e garantir o lucro das empresas.

Para refletir
Como as mudanças tecnológicas afetam seu trabalho?

246
Organização do trabalho

Também na saúde observamos muitos avanços tecnológicos: novas


vacinas, medicamentos, recursos diagnósticos e outras mudanças que
exigem do trabalhador diferentes conhecimentos.

Os avanços do século XXI têm sido marcados por transformações sig-


nificativas no mundo do trabalho; o desemprego estrutural e o acirra-
mento da acumulação de capital, em nível mundial, se efetivam em
novas formas de organização do trabalho, com base em três grandes
eixos:
G novas tecnologias;
G novas formas de produção do trabalho;
G novas formas de gerenciamento.

Outra tendência mundial é a feminilização, ou seja, o aumento, no


mercado de trabalho, da atuação feminina, a qual representa, hoje,
mais de 40% da força de trabalho em países avançados. A classe traba-
lhadora vem se constituindo por uma grande parcela de trabalhadores
informais, com vínculos “precarizados”, subcontratados e trabalhado-
res on-line.

Para alguns autores das ciências humanas, o amadurecimento de um Acumulação pós-fordista


significa, por exemplo, redução
novo regime de acumulação pós-fordista no Brasil tem possibilitado o
de estoques, rápido descarte
surgimento de novas formas de trabalho, como os call centers (centrais programado de produtos como a
de telemarketing). Em geral, esses espaços atraem um amplo contin- televisão e o computador, assim
como a flexibilização dos direitos
gente de trabalhadores jovens, especialmente mulheres e negros, em trabalhistas.
busca de uma primeira oportunidade no mercado formal de trabalho,
constituindo-se, assim, o “precariado”. Isso porque esse setor da econo-
mia tem remunerações baixíssimas, jornadas extremamente desgastan-
tes de trabalho, não possui regulamentação e normas de salubridade,
submetendo seus trabalhadores a constante pressão, o que leva a alta
rotatividade e inúmeros problemas ligados à saúde do trabalhador, tais
como depressão, perda auditiva induzida por ruído e distúrbios osteo-
musculares relacionados ao trabalho (Dort).

247
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 1 – Novas formas de trabalho: central de telemarketing

Segundo Ricardo Antunes e Giovanni Alves (2004, p. 355),


A classe trabalhadora no século XXI, em plena era da globa-
lização, é mais fragmentada, mais heterogênea e ainda mais
diversificada. Pode-se constatar, neste processo, uma perda
significativa de direitos e de sentidos, em sintonia com o ca-
ráter destrutivo do capital vigente. O sistema de metabolis-
mo, sob controle do capital, tornou o trabalho ainda mais
precarizado, por meio das formas de subempregado, desem-
pregado, intensificando os níveis de exploração para aqueles
que trabalham.

Para refletir
Como são os contratos de trabalho no lugar em que você exerce a sua
atividade profissional? Quais são as formas de vínculo empregatício dos
trabalhadores?

O processo de trabalho é compreendido como a forma pela qual o


homem transforma os objetos, utilizando instrumentos, a fim de alcan-
çar um objetivo. São três os principais componentes do processo de
trabalho:
G a atividade adequada a um fim, isto é, o próprio trabalho;
G o objeto de trabalho, ou seja, a matéria a que se aplica o trabalho;
G os instrumentos ou meios de trabalho.

Estabelecendo uma aproximação com a organização da rede de frio


de imunobiológicos, podemos considerar que os trabalhadores atuam
a partir de uma mesma finalidade, que seria possibilitar o acesso da

248
Organização do trabalho

população a vacinas, a fim de promover o controle e a erradicação de


doenças imunopreveníveis. Para essa finalidade, utilizam diversos ins-
trumentos de trabalho, como computadores, seringas, geladeiras, cai-
xas, gelo, empilhadeiras de mão, paletes, entre outros.

Foto 1 – Trabalhador aplicando vacina que O trabalho em saúde pode ser


chegou à sala de vacina depois de passar
por todas as instâncias da rede de frio
compreendido como uma área
não produtora direta de merca-
dorias, porém inserido em um
contexto de mercado, no qual o
uso da tecnologia e o consumo de
produtos estão diretamente rela-
Foto: Peter Ilicciev ([20--]).

cionados. Refere-se a uma divi-


são técnica do trabalho, em que
atuam trabalhadores com diversas
formações profissionais e diferen-
tes concepções técnicas e éticas
Fonte: Fiocruz Imagens.
sobre o seu trabalho.

Embora, no trabalho em saúde, o resultado final a ser alcançado não


seja a produção direta de mercadoria, como em outros setores, algumas
categorias de análises do trabalho em geral são úteis para compreender-
mos a organização da atividade laborativa no setor de saúde. Diversos
autores do campo da saúde coletiva se preocuparam em conceituar o
processo de trabalho em saúde, entre eles destacamos Marina Peduzzi
e Lilia Schraiber (2009), de acordo com o trecho a seguir.
O conceito Processo de Trabalho em Saúde diz respeito à di-
mensão microscópica do cotidiano do trabalho em saúde, ou
seja, à prática dos trabalhadores/profissionais de saúde inseri-
dos no dia-a-dia da produção e consumo de serviços de saú-
de. Contudo, é necessário compreender que nesse processo de
trabalho cotidiano está reproduzida toda a dinâmica do traba-
lho humano, o que torna necessário introduzir alguns aspec-
tos centrais do trabalho que é a grande categoria de análise da
qual deriva o conceito de processo de trabalho em saúde (PE-
DUZZI; SCHRAIBER, 2009, p. 323, grifo nosso).

Podemos considerar, então, que o trabalho em saúde possui diversas


dimensões:
G na relação direta do trabalhador com seu ato produtivo;
G na integração com outros trabalhadores e usuários dos serviços; e
G nas questões relativas à vinculação do trabalho no contexto em que
este se insere, envolvendo contradições e conflitos.

249
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Com o aumento do desemprego no setor industrial a partir de 2012,


grande parte de trabalhadores, antes empregados formalmente naquele
setor, passou a compor a força de trabalho precarizada em outras áreas,
como a da saúde, que recebeu um grande contingente de trabalhadores
nas áreas técnica e administrativa, inclusive em cargos comissionados
nas administrações municipais.

O livro Trabalhadores técnicos da saúde: aspectos da qualificação profissional


no SUS (VIEIRA et al., 2013), da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Caso tenha interesse em
consultar e se aprofundar no
Venâncio, apresenta uma análise de aspectos extremamente relevantes
tema, o livro Trabalhadores sobre a qualificação dos trabalhadores técnicos da saúde no Brasil; ao
técnicos da saúde: aspectos apresentarem e analisarem os dados sobre o setor, os autores afirmam
da qualificação profissional no
SUS (VIEIRA et al., 2013) está que, a despeito das oscilações econômicas pelas quais passou o país,
disponível em: http://www. houve uma expansão nessa área, embora sem uma correlata adequação
epsjv.fiocruz.br/index.php?Area
=Material&Tipo=8&Num=231
sobre as condições de trabalho e formação profissional. Em reforço a
essa afirmativa, destacamos o trecho a seguir:
Os dados apresentados [ao longo do livro] permitem afirmar
que durante a última década, a despeito das oscilações da eco-
nomia brasileira, os postos de trabalho em saúde apresenta-
ram um movimento de expansão que consolidou um sistema
de saúde dualizado, com uma ligeira superioridade numérica
do setor público. É importante destacar que, embora cada vez
mais relevante em termos econômicos e sociais, essa expansão
vem sendo marcada tanto no âmbito público quanto no pri-
vado pela deterioração das condições de trabalho e pela dimi-
nuição da proteção jurídica do trabalho (VIEIRA et al., 2013).

Para refletir
Você está conseguindo relacionar as questões estudadas até agora com
a realidade do seu trabalho?

Fotos 2, 3 e 4 – O processo de trabalho em saúde envolve diferentes etapas e muitas tecnologias Foto: Russel Weller (2004).
Foto: Peter Ilicciev ([20--]).

Foto: Peter Ilicciev ([20--]).

Fonte: Fiocruz Imagens. Fonte: Fiocruz Imagens. Fonte: FreeImages.com.

250
Organização do trabalho

Nas imagens, é possível perceber o emprego de alta tecnologia na saúde. Os termos flexibilização e
Em consequência, principalmente, do avanço tecnológico, diversas pro- precarização têm sido utilizados
para designar o processo de
fissões foram sendo incorporadas a esse setor, gerando novas especiali- produção ao qual os trabalhadores
zações (arquitetura hospitalar, direito em saúde, mecatrônica, biome- estão submetidos no sistema
capitalista, em que há diversas
dicina, entre outras). Embora haja crescimento dos postos de trabalho formas de contratação e salários
formais, as mudanças relativas aos aspectos estruturais do trabalho, tais diferenciados para a realização
como a flexibilização e a precarização dos vínculos, passaram a com- de atividades semelhantes.
Essa multiplicidade de formas
por fortemente o processo de trabalho em saúde no Brasil nos últimos de contratação difere da
anos (esta discussão será retomada no próximo capítulo, “Organizações padronização fordista e tem
sido chamada de flexibilização.
públicas e o processo de trabalho em saúde”). E, geralmente, implica também
perdas de direitos do trabalhador,
A consolidação do SUS como um sistema que amplia direitos sociais sendo denominada, portanto, de
precarização do trabalho.
possibilitou, também, discussões relativas a vinculação e regulamen-
tação dos trabalhadores que atuam no sistema. Com a regionalização
dos serviços, ocorre menos contratação de pessoal nas esferas federal
e estadual, e há aumento do número de trabalhadores com vínculo
municipal. As mudanças ocorridas com a municipalização dos serviços
de saúde não foram acompanhadas, no entanto, por novas regulamen-
tações a respeito da administração de pessoal, forçando a convivência,
no mesmo espaço, de trabalhadores com carga horária, vínculos e salá-
rios diferenciados.

A Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUS (NOB/


RH-SUS) (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 2005) foi uma tentativa
de definir princípios e diretrizes para o setor, objetivando maior valo-
rização profissional e regularização das relações de trabalho em saúde.
No entanto, pouco se avançou nesse sentido, sendo a diversidade de
vínculos, salários e outros direitos ainda muito frequente em todo o
território nacional. Observa-se retração da tendência de regulamenta-
ção do trabalho no SUS, avançando para a precarização e terceirização
dos vínculos trabalhistas, apesar das estratégias promovidas pelo Minis-
tério da Saúde, como a criação da Secretaria da Gestão do Trabalho e
Educação, em 2003, e outras ações ao longo da última década. Muito
há ainda para ser feito no sentido de regulamentação das relações de
trabalho no SUS.

Processo de trabalho na rede de frio


de imunobiológicos
O que, comumente, é denominado apenas como “rede de frio”
compreende uma série de atividades de diferentes profissionais, que
envolve armazenamento, conservação, manuseio, distribuição e trans-
porte de imunobiológicos do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

251
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Todas essas etapas, como discutido em outros capítulos, devem garantir


as condições adequadas de refrigeração, desde o laboratório produtor
até o momento em que a vacina é administrada, se fazendo necessária,
ainda, uma articulação com outras políticas de saúde e ações interseto-
riais, além do diálogo com a sociedade. Segundo o documento come-
morativo dos 40 anos do programa, o futuro do PNI aponta para a
necessidade de se avançar sobre diferentes questões:
Ao se olhar o PNI no futuro, torna-se imprescindível vê-lo concreta-
mente a partir de um longo espectro de questões: (i) no con-
texto da atenção à saúde como uma ação da atenção básica;
(ii) no compromisso de incorporação com novas vacinas e no-
vos grupos populacionais; (iii) na clareza de que vacinação se-
gura envolve o compromisso com a eficiência e qualidade com
os diferentes componentes da atividade; (iv) no compromisso
com a investigação e análise dos eventos adversos associados à
vacinação; (v) no investimento e capacitação dos profissionais
envolvidos; (vi) na busca incessante por resultados que repre-
sentem impacto real na situação das doenças imunoprevení-
veis sob vigilância (BRASIL, 2013, p. 88).

No Brasil, o termo “rede de frio”


Na rede de serviços que envolvem o PNI, encontramos profissionais
se refere ao setor público de
saúde, embora a administração de da enfermagem, administrativos, biólogos, médicos, entre outros, que
vacinas também ocorra na rede atuam na relação direta com o usuário dos serviços, como na aplicação
privada (na qual encontramos
apenas o elo entre produtores,
de vacinas, mas também diretamente na produção e distribuição desses
distribuidores e clínicas). imunobiológicos.

Fotos 5, 6 e 7 – Processos de trabalho na rede de frio de imunobiológicos


Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).


Communication Specialist, OD (2011).
Foto: CDC/Theresa Roebuck, Health

A organização do trabalho na rede de frio de imunobiológicos é, de


fato, em rede: compreende um complexo de ligações entre instâncias
nacionais, estaduais e municipais, com centrais de abastecimento e dis-
É muito importante que tribuição nacional e regionalizadas, além das salas de vacinação, locali-
os trabalhadores que
atuam na rede de frio de
zadas nas unidades de saúde.
imunobiológicos conheçam
os aspectos dos processos de Muitas atividades desenvolvidas na rede de frio de imunobiológicos
trabalho envolvidos até as salas
de vacina, no nível local!
exigem do trabalhador conhecimentos técnicos variados, além da com-
preensão de questões éticas e culturais da sociedade. Em algumas áreas,

252
Organização do trabalho

é o trabalho administrativo que predomina e, em outras, os conheci-


mentos técnicos da enfermagem. No entanto, a formação integral desse
trabalhador é essencial, pois, na prática, todo esse conjunto de saberes
está relacionado à imunização.

A principal característica desse processo de trabalho é compor diferen-


tes profissionais para realizar a:
G gestão das vacinas, que exigem controle constante de temperatura e
tempo de armazenagem;
G atuação direta com os usuários e o conhecimento de técnicas de
aplicação de vacinas; e,
G orientação ao cuidado e o planejamento do controle vacinal.

Embora cada tipo de profissional atue em uma parte da rede, podemos


considerar que todos, de uma maneira ou outra, realizam a gestão desses
imunobiológicos. Isso não se constitui vantagem para esse trabalhador,
visto que, ao se analisar a atividade exercida, o que se observa, de modo
geral, é pouco reconhecimento e fragilidade na forma de contratação.
Essa fragilidade se expressa tanto no aspecto relativo ao vínculo empre-
gatício e à regulamentação profissional, como ao salarial e às condições
de trabalho, apesar da enorme responsabilidade que assumem em sua
prática. É o que podemos observar no texto a seguir, em que se discute
a qualificação profissional dos técnicos administrativos na saúde:
Observa-se, no exercício dessa função, uma grande varieda-
de de atividades e uma significativa instabilidade no empre-
go relacionada às mudanças políticas que se manifestam nas
modalidades e número da contratação de pessoal. Ou seja, a
cada novo mandato muda-se o contingente de trabalhadores
contratados, por se tratar, em muitos casos, de cargos comis-
sionados e de outras formas precárias de contratação de força
de trabalho (CASTRO et al., 2013, p. 154).

Como o próprio nome diz, os trabalhadores da rede de frio fazem parte


de uma grande rede. Para tanto, é fundamental compreender que cada
ponto deve estar plenamente conectado para que os princípios do SUS
sejam assegurados e o usuário possa contar com o imunobiológico de
qualidade. Nesse sentido, vale a pena conhecer a proposta do trabalho
em equipe na saúde e, em particular, na rede de frio.

O trabalho em equipe na rede de frio


Observe atentamente a Figura 2. O que lhe parece? É possível rela-
cionar o que aprendeu sobre o processo de trabalho em saúde com a
imagem?

253
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 2 – Trabalhando em equipe As formigas se comunicam, geralmente,


por uma química chamada  feromonas;
esses sinais de mensagens são mais desen-
volvidos na espécie das formigas que em
outros grupos. Como as formigas passam
a vida em contato com o solo, elas dei-
xam uma trilha de feromônio, que pode
ser seguida por outras (FORMIGA, 2013).

Nós, também, estabelecemos muitas for-


mas de comunicação. No caso do pro-
cesso de trabalho da rede de frio, a notificação de eventos adversos de
vacinas é muito importante para melhorar a qualidade dos serviços
prestados à população. Apesar da organização da rede e do enorme
número de trabalhadores da saúde e de outras áreas (como de trans-
porte de cargas, por exemplo) envolvidos na distribuição de imunobio-
O Capítulo 1 deste livro, lógicos, problemas acontecem e precisam ser comunicados, a fim de se
“Planejamento em saúde”,
abordou o planejamento contribuir para o planejamento estratégico das ações de imunização e
estratégico em saúde. integração da rede.

Considerações finais
Para finalizar este capítulo, sistematizamos alguns dos pontos com base
em nossa experiência docente e atuação no SUS, a fim de contribuir para
o debate sobre o processo de trabalho na rede de frio de imunobiológicos:
G Podemos observar que há uma prática de articulação entre os
trabalhadores dos diferentes serviços que integram essa rede, porém
essa articulação ocorre mais na resolução de problemas práticos,
sendo necessária ainda maior reflexão sobre todo mecanismo e
complexidade que compõem o sistema.
G Os trabalhadores percebem a importância do seu trabalho, sendo
que a proximidade com o usuário é um fator gerador de maior
cobrança na resolução de problemas, causando estresse, muitas
vezes. No entanto, naqueles serviços em que essa relação não
ocorre, carecem do retorno e do reconhecimento da importância
de seu trabalho por parte daqueles que o utilizam. O estresse está
relacionado, geralmente, ao processo de trabalho e execução de
prazos e normas.
G A diversidade de vínculos de trabalho (estatutários, Consolidação
das Leis Trabalhistas [CLT] e outros) pode gerar conflitos em relação
à gestão, relacionados principalmente a desigualdades salariais,
condições de trabalho e possibilidades de liberação, no horário de
trabalho, para realização de cursos de aperfeiçoamento profissional.

254
Organização do trabalho

Tal diversidade está ligada às diferenças políticas e regionais no


Brasil. As diferentes condições de trabalho e de realidades nem
sempre são modificáveis pelos esforços de manuais e protocolos
implementados pelos níveis nacional e estadual, na organização do
Programa Nacional de Imunizações.

Esperamos ter contribuído para a reflexão sobre a organização do tra-


balho em nossa sociedade e a importância daqueles que atuam na
complexa organização de distribuição de imunobiológicos no Brasil e,
também, em outros países. Atuar nessa rede exige muita responsabili-
dade e compromisso com o trabalho, a fim de fortalecer, por meio do
PNI, o reconhecimento das ações de vigilância em saúde e de todo o
SUS, como um sistema universal e equânime.

Referências
ANTUNES, R.; ALVES, G. As mutações no mundo do trabalho na era da mundialização do
capital. Educação e Sociedade, Campinas, v. 25, n. 87, p. 335-351, 2004.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. 40 anos do Programa Nacional de Imunizações. Brasília, DF, 2013.

CASTRO, V. et al. Regulamentação e história dos trabalhadores administrativos na gestão da saúde.


In: MOROSINI, M. V. G. C. et al. (Org.). Trabalhadores técnicos em saúde: aspectos da qualificação
profissional no SUS. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, 2013.

CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE (Brasil). Princípios e diretrizes para a gestão do trabalho no SUS
(NOB/RH-SUS). 3. ed. rev. atual. Brasília, DF, 2005.

DICIONÁRIO de filosofia Nicolas Abbagnano. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

FORMIGA. In: WIKIPEDIA: a enciclopédia livre. [S.l.], 2013. Disponível em: <pt.wikipedia.org/wiki/
Formiga>. Acesso em: 5 ago. 2016.

GRAMSCI, A. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.

MARX, K. Processo de trabalho e processo de produção de mais-valia. In: MARX, K. O capital. [S.l.]:
Marxists Internet Archive, 2005. v. 1, parte 3, cap. 7. Disponível em: <https://www.marxists.org/
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PEDUZZI, M.; SCHRAIBER, L. Processo de trabalho em saúde. In: PEREIRA, I. B.; LIMA, J. C. F. (Org.).
Dicionário de educação profissional em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio, 2009. p. 320-326.

VIEIRA, M. et al. Dinâmica da formação técnica e da ocupação de postos de trabalhos em saúde:


Brasil Anos 2000. In: MOROSINI, M. V. G. C. et al. (Org.). Trabalhadores técnicos em saúde:
aspectos da qualificação profissional no SUS. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio, 2013.

255
11. Organizações públicas e o
processo de trabalho em saúde
Marcello de Moura Coutinho, Maria Luiza Silva Cunha

A discussão do trabalho na saúde engloba, necessariamente, uma Eficiência trata de como fazer,
análise do contexto organizacional do trabalho e suas relações com o não do que fazer. Quando se fala
em eficiência, está se tratando de
Sistema Único de Saúde (SUS). Nos últimos anos, diferentes autores produtividade, de fazer mais com o
(AZEVEDO; BRAGA NETO; SÁ, 2002; LIMA, 1996) têm apontado para mínimo de recursos possíveis.
a crise com que nos deparamos no setor de saúde, em geral, e na gestão
das organizações públicas, em particular, que se relaciona com diferen-
tes aspectos, entre eles, governabilidade, resolutividade e eficiência.

Essa crise tem várias causas, em distintos níveis (LIMA, 1996):


G No nível estrutural, pode ser apontada, entre outras, a histórica
fragilidade da política de saúde, que se expressa, na atualidade,
pelos entraves político-institucionais observados na implementação
do SUS.
G No nível organizacional, existem diferentes elementos relacionados
à formação de profissionais e gestores, à insuficiência de
planejamento e à baixa clareza dos objetivos, à escassez de recursos
financeiros. Há, ainda, aqueles relacionados ao trabalho, como a
divisão inadequada e a insuficiência de mecanismos de coordenação
e integração, elementos estes que integram os sistemas de direção e
modelos de gestão de uma organização de saúde.
G No nível individual, estão os aspectos relacionados à qualidade do
atendimento ao usuário e às condições de trabalho.
A seguir, vamos apresentar os elementos presentes no nível organiza-
cional, com base em algumas teorias que fundamentam o trabalho na
gestão em saúde. Com esse estudo, esperamos que você aprofunde e
amplie seus conhecimentos sobre as organizações públicas de saúde,
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

suas características e determinações, bem como sobre o tema do tra-


balho em equipe e a educação em saúde, na direção da transformação
pretendida pelo fortalecimento da política de saúde prevista no SUS.

Caracterização de uma organização


pública de saúde
No dicionário, o termo organização é definido como “s.f. Ato ou efeito de
organizar (-se). / Modo por que um ser vivo é organizado. / Associação
ou instituição com objetivos definidos. / Organismo”. (FERREIRA, 1977).

Assim, organização tanto pode ser entendida como a forma pela qual
o trabalho é organizado em uma instância ou um serviço de saúde
(por exemplo, os procedimentos de solicitação, o processo de compra,
o armazenamento de imunobiológicos, como no caso da Cenadi), ou
como a própria instância ou serviço, em que o conceito de organização
se confunde com o de instituição.

Veja alguns exemplos de organizações.

Figura 1– Unidade básica de saúde (UBS) Figura 2 – Hospital

Foto 1 – Cenadi

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).

As organizações são compreendidas a partir de diferentes perspectivas


que se relacionam aos fatores que as condicionam.

258
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

Fatores inerentes à organização


• A tecnologia, compreendida como o processo de trabalho, ou seja, o
conhecimento, as técnicas, os instrumentos e as ações que são utilizadas
numa organização para transformar insumos em produtos.
• A estrutura, que representa a divisão do trabalho e a coordenação e
integração do trabalho dividido (inclui o processo de departamentalização
e a definição dos mecanismos de coordenação – a hierarquia, com a
consequente distribuição da autoridade).
• Os objetivos, entendidos como estados futuros desejados, que definem
o escopo das ações organizacionais para dentro e para fora, devendo
conter duas dimensões, uma relacionada à intenção e outra, à ação.
• O poder, compreendido como a capacidade de influenciar, que só
ocorre numa relação social.
• O ambiente, compreendido como fonte de insumo e receptor dos
produtos organizacionais, que incorpora tanto uma dimensão mais
geral – os aspectos políticos, legais, demográficos, ecológicos, sociais,
econômicos, tecnológicos, culturais etc. – quanto uma dimensão mais
específica – os fornecedores, os clientes, os concorrentes e as agências
regulamentadoras etc.
Fonte: Lima (1996).

Todos esses fatores se apresentam, de forma diferenciada, entre várias


organizações e entre momentos históricos distintos de uma mesma
organização. Eles nos ajudam a entender nosso trabalho e como ele é
produto das determinações presentes nas organizações. Por exemplo, o
organograma de uma unidade de saúde ou setor representa a estrutura
e favorece a identificação da departamentalização, da hierarquia, da
distribuição de autoridade e das relações de poder.

Para refletir
Considerando os fatores apresentados, reflita sobre a organização
na qual você se insere. Como se estrutura? Existe um organograma
da unidade de saúde ou setor em que você trabalha? Como é feita
a divisão do trabalho? Como acontece o processo decisório? Quem
participa desse processo?

As organizações foram analisadas segundo diferentes teorias e aborda-


gens. Uma delas adota um conjunto de metáforas para interpretar as
organizações com base em imagens de máquinas, organismos vivos,

259
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Morgan (1996) destaca que a culturas, sistemas políticos, prisões psíquicas, fluxos e transformações
metáfora é usada “sempre que
tentamos compreender um
e, também, como instrumentos de dominação. A utilização das diferen-
elemento da nossa experiência em tes metáforas permite, segundo o autor, a compreensão da organização
face de outro. Assim, a metáfora como fenômeno complexo, ambíguo e paradoxal (MORGAN, 1996).
prossegue por meio de afirmações
implícitas ou explícitas de que A é Vamos, a seguir, discutir um pouco sobre uma dessas metáforas, que
(ou parece) B. Quando se diz que ‘o se faz bastante presente nas organizações do ponto de vista histórico e
homem é um leão’ usa-se a imagem
do leão para chamar a atenção
ainda marca os processos de trabalho nos dias atuais.
dos aspectos do homem parecidos
com o leão. A metáfora enquadra a
nossa compreensão do homem de
A imagem das organizações como máquinas
forma específica, ainda que parcial”
(MORGAN, 1996, p. 16). Nas organizações compreendidas como máquinas, as partes possuem
um papel claramente definido no funcionamento do todo. A organi-
zação é pensada como a interligação das diferentes partes que a com-
põem, de forma mecânica.

Tal modo de funcionamento tem repercussões na vida organizacional,


caracterizada pela rotina e exigência de precisão, assim como na vida
dos trabalhadores, em que se espera que se comportem como se fossem
partes de máquinas.

Você conhece alguma organização assim? Televendas seria um exem-


plo? Ela ainda está presente nos dias atuais?

Foto 2 – Linha de montagem em uma fábrica A resposta para as duas últimas perguntas é sim. Essa
da Ford (1913) – um modo de fazer ainda
significativamente presente nos dias atuais
concepção encontra-se bastante disseminada ainda
nos dias atuais e pode ser exemplificada pelo trabalho
de produção em massa em uma fábrica, nas cadeias
de “refeições rápidas” ou mesmo em atividades como
a dos assistentes de vendas, cujos comportamento e
respostas na interação com os clientes são fortemente
padronizados e determinados previamente.

A origem dessa concepção remonta à invenção e à


proliferação das máquinas e ao seu uso, predominan-
temente na indústria, e à consequente necessidade de
adaptação das organizações às suas exigências. Essa
ampliação do uso das máquinas no processo de traba-
lho se deu em um momento histórico que envolveu
transformações sociais e econômicas significativas, a
Fonte: Wikimedia Commons.
Revolução Industrial.

No contexto da Europa e da América do Norte, a Revolução Industrial


suscitou mudanças nas organizações em direção a maior burocratiza-
ção, “rotinização” e divisão do trabalho. Esta última tornou-se cada
vez maior e intensivamente especializada, representando, por um lado,

260
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

maior controle e eficiência por parte dos fabricantes e, por outro, perda
de liberdade de ação e submissão às normas e rotinas de produção por
parte dos trabalhadores.

Os trabalhadores, assim como as peças, eram vistos como parte da engrenagem.


Essa percepção está contida na expressão “recursos humanos”.

Como foi formulada a concepção de organização ao longo do tempo?


Essa visão mecanizada se estendeu a outros processos de trabalho?

No início do século XX, uma teoria de organização e de administração Para Weber, a primeira definição
compreensível de burocracia
foi formulada considerando diferentes contribuições. A mais significa-
caracteriza-a como uma forma
tiva se referia às conclusões do sociólogo alemão Max Weber (1864- de organização que enfatiza a
1920); este afirmava que, ao “rotinizar” os processos de administração, precisão, a rapidez, a clareza, a
regularidade, a confiabilidade
as formas burocráticas exerciam, na produção, o mesmo papel que as e a eficiência, atingidas através
máquinas. da criação de divisão de tarefas
fixas, supervisão hierárquica,
regras detalhadas e regulamentos
Outra contribuição significativa foi dada por um grupo de teóricos e (MORGAN, 1996, p. 26).
profissionais em administração, da América do Norte e da Europa, que
embasou o que atualmente é conhecido como “a teoria da administra-
ção clássica” e “administração científica”. Eles defendiam fortemente
a burocratização, em oposição a Weber, influenciando, em grande
medida, o pensamento presente até os dias atuais.

Como a forma mecanicista interfere nas organizações de saúde?Dtaq

Para o setor de saúde, pensar as organizações de forma mecanicista,


produzidas unicamente a partir de processos racionais e técnicos, tem
consequências importantes. Tal perspectiva envolve a subvalorização
dos aspectos humanos e a baixa capacidade de abordar os fatores

261
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

envolvidos em sua complexidade, levando a um trabalho sem significa-


ção tanto para os trabalhadores como para os usuários. Ou seja, em
grande medida, a perspectiva mecanicista influenciou e continua
influenciando o trabalho em saúde.

Atualmente, consideram-se, entretanto, formas diferenciadas de con-


ceber o trabalho, que podem ser identificados na história e no conceito
de trabalho em equipe, que abordaremos a seguir.

O trabalho em equipe
Em nossos dias, o trabalho em equipe
é considerado como um dos elementos
centrais para a gestão dos serviços e do

Foto: Julia Freeman-Woolpert (2006).


cuidado à saúde. O trabalho em equipe
é um conceito que tem uma origem his-
tórica e que se transforma a partir da
segunda metade do século XX.

Abordaremos o desenvolvimento histó-


rico e o conceito do trabalho em equipe O trabalho em equipe, assim como
a seguir, mas, antes, propomos algumas uma travessia, pressupõe que os
envolvidos atuem em conjunto e com
questões para reflexão sobre o seu pro- objetivos comuns.
cesso de trabalho. Fonte: FreeImages.com.

Para refletir
Com quem você desenvolve o seu trabalho? Quem faz parte da sua
equipe? Como é a relação entre os integrantes da equipe? O seu
processo de trabalho considera a interação das ações entre os diferentes
participantes? Como é feita a comunicação entre os integrantes da
equipe?

Uma breve história do trabalho em equipe


Atualmente, é comum as pessoas perceberem o trabalho em saúde
como atividade de uma equipe. Mas, algumas ainda relacionam esse
trabalho fortemente à figura do médico. A seguir, vamos entender um
pouco mais sobre os motivos dessas percepções.

O trabalho em equipe surge no contexto de emergência da medicina


preventiva, nos Estados Unidos, na década de 1950. Naquela ocasião, o
papel do médico sofreu uma reformulação; ele passou a não ter mais a

262
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

responsabilidade exclusiva pelos cuidados em saúde e assumiu a função


de liderar o trabalho realizado por uma equipe multiprofissional. Bus-
cava-se uma integração entre a medicina preventiva e as demais espe-
cialidades, conforme a compreensão ampliada do conceito de saúde, que
considerava, além dos aspectos biológicos, os aspectos psíquicos e sociais.
Tais referências conceituais foram retomadas na década de 1960, pela
medicina comunitária, e serviram de base, nos anos 1970, para os progra-
mas de extensão de cobertura ocorridos em nosso país (PEDUZZI, 2009).

A compreensão da determinação social da saúde levou a uma correspon- A determinação social da saúde
e os modelos assistenciais foram
dente busca de reorientação do modelo assistencial, que passou a se voltar
abordados, respectivamente, no
para o alcance da atenção integral à saúde. Para tal, esse novo modelo pre- Capítulo 1, “Um pouco de história:
via a articulação de ações de promoção, prevenção, recuperação e reabili- evolução das concepções de saúde,
doença e cuidado”, e no Capítulo
tação da saúde, a serem realizadas por profissionais da saúde de diferentes 2, “Políticas públicas de saúde e
áreas, mediante o trabalho em equipe multiprofissional. No entanto, ainda a organização do SUS”, do livro
Rede de Frio: fundamentos para a
mantinha a centralidade do trabalho médico (PEDUZZI, 2009). compreensão do trabalho (SILVA;
FLAUZINO; GONDIM, 2016).
Outra vertente explicativa do surgimento do trabalho em equipe, na
saúde, se refere à busca pela reorganização dos processos de trabalho,
de forma a fazer frente aos crescentes custos da atenção médica. Estes
foram acarretados para o sistema pela incorporação de novas tecnolo-
gias, pelo aumento da necessidade de aquisição de produtos industria-
lizados e pela ampliação da população atendida (PEDUZZI, 2009).

O trabalho em equipe
• Parte da busca por maior eficiência da atenção médica, prevista em uma
visão economicista.
• Incorpora a concepção ampliada de saúde e um modelo baseado na
atenção integral.
Os conceitos de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade foram
importantes para a formulação da definição do trabalho em equipe,
compreendido como trabalho de um coletivo, tal como se apresenta nas
definições atuais.

Mas como foi o desenvolvimento da concepção do trabalho em


equipe ao longo do século XX?

A partir dos anos 1970, a perspectiva de organização do sistema se vol-


tou para as necessidades de saúde de populações concretas, inseridas
em espaços de vida complexos e dinâmicos, compreendidos, posterior-
mente, pelo conceito de território. As concepções de adstrição de clien-
tela, de responsabilidade sanitária, descentralização, hierarquização,

263
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

regionalização e participação comunitária desencadearam uma neces-


sidade de revisão do trabalho em saúde, visando efetivar tais princípios
organizativos pretendidos para o sistema público, que foi instituído
alguns anos depois.

Tal perspectiva levou a um processo de substituição das equipes consti-


tuídas por médicos e atendentes por uma progressiva incorporação de
profissionais de outras áreas, conformando equipes que consideravam
a atuação multiprofissional. Estas, entretanto, caracterizavam-se pelo
predomínio de profissionais de nível superior.

Considerado como um elemento estratégico voltado à superação da


fragmentação da assistência, o trabalho em equipe é enfatizado a partir
dos anos 1980. A 8a Conferência Nacional de Saúde, de 1986, incorpo-
rou, na política prevista de recursos humanos, o conceito de equipe de
saúde como unidade produtiva do trabalho em saúde (PEDUZZI, 2009).

Na década de 1990, a busca pela implementação do SUS levou ao apro-


fundamento das discussões a respeito dos seus princípios doutrinários,
entre eles o da integralidade da atenção.

Os princípios do SUS foram A integralidade pressupõe a capacidade de


abordados no Capítulo 2, “Políticas
públicas de saúde e a organização assegurar aos indivíduos o direito à atenção à saúde, dos ní-
do SUS”, do livro Rede de Frio: veis mais simples aos mais complexos, da atenção curativa à
fundamentos para a compreensão preventiva, bem como a compreensão do indivíduo em sua to-
do trabalho (SILVA; FLAUZINO; talidade e dos indivíduos/coletividades em suas singularidades
GONDIM, 2016).
(BRASIL, 1990).

A noção de integralidade expressa, em suas diferentes dimensões, o


componente reorientador do modelo de atenção à saúde, estando for-
temente relacionada às diretrizes de universalização do acesso e equi-
dade. Ela fortalece a perspectiva do trabalho em equipe no período
inicial de implantação do SUS. Outro marco do SUS foi a constituição
do Programa Saúde da Família, como estratégia governamental, e a
formação de equipes compostas por médicos, enfermeiros, técnicos de
enfermagem e agentes comunitários, em 1994.

O trabalho em equipe se inclui na perspectiva do trabalho em saúde


que reconhece a determinação social da saúde e os múltiplos aspectos
envolvidos (educacionais, econômicos, históricos, biológicos, sociais,
culturais, simbólicos, entre outros), os quais demonstram a complexidade
desse campo.

Nas concepções mais recentes, o trabalho em saúde não se refere ape-


nas a um indivíduo ou a um grupo profissional. Assim,

264
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

o “trabalho em saúde” é sempre realizado por um trabalhador


coletivo. Não há trabalhador de saúde que dê conta sozinho do
mundo das necessidades de saúde, o objeto real do “trabalho
em saúde”. Os trabalhadores universitários, técnicos e auxi-
liares são fundamentais para que o trabalho de um dê sentido
ao trabalho do outro, na direção da verdadeira finalidade do
“trabalho em saúde”: cuidar do usuário, o portador efetivo das
necessidades de saúde (MERHY; FRANCO, 2009, p. 281).

Ao longo dos anos, entretanto, a reversão do modelo biomédico não Relembrando, o modelo
biomédico é centrado na atenção
foi um processo automático. No que se refere ao trabalho em equipe,
especializada e em procedimentos
o desenho previsto na atuação multiprofissional nem sempre garantia individuais. Seu local de atenção
a pretendida integração das práticas e saberes. A atuação especializada, mais expressivo se referia aos
hospitais.
tornada hegemônica por meio da organização disciplinar do conheci-
mento, persistia no fazer cotidiano dos serviços. Frequentemente, os Hegemônica refere-se à
supremacia, à preponderância, ao
diferentes profissionais compartilhavam o mesmo local de trabalho, poder político e econômico.
mas mantinham lógicas distintas de atendimento, com pouca comuni-
cação e integração.

O conceito de trabalho em equipe


Neste capítulo, destacamos que, ao longo do tempo, o trabalho em
saúde sofreu transformações. Chamamos a sua atenção, contudo, para
o fato de que diferentes perspectivas sobre o trabalho em saúde con-
vivem, em um mesmo período, com um processo muitas vezes de dis-
puta. No que se refere à concepção de trabalho em equipe, isso não é
diferente. Assim, em nossos dias convivem concepções de trabalho em
equipe que o entendem como:
G Um fazer coletivo e articulado, ou seja, “uma modalidade de
trabalho coletivo que é construído por meio da relação recíproca,
de dupla mão, entre as múltiplas intervenções técnicas e a interação
dos profissionais de diferentes áreas, configurando, através da
comunicação, a articulação das ações e a cooperação” (PEDUZZI,
2009, p. 273).
G A mera coexistência, em um mesmo setor, serviço ou unidade, de
diferentes profissionais.

Com base nessas perspectivas, o trabalho em equipe pode ser classi-


ficado em dois tipos, que se referem a duas modalidades de equipe
(PEDUZZI, 2001), conforme a Figura 3.

265
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 3 – Tipologia do trabalho em equipe

Justaposição das ações


EQUIPE AGRUPAMENTO
Agrupamento dos agentes

Articulação das ações


EQUIPE INTEGRAÇÃO
Interação dos agentes

Fonte: Peduzzi (2001).

Para refletir
Pense, agora, no seu trabalho na rede de frio de imunobiológicos.

Quem faz parte da sua equipe? Como se dá a relação entre os integran-


tes da equipe? Você percebe que as ações realizadas pelos diferentes
trabalhadores se encontram articuladas ou justapostas? Que consequ-
ências isso tem para o funcionamento da rede? E para o SUS?

Apesar da distinção realizada em relação à equipe agrupamento e à


equipe integração, existem identidades entre as duas. Estas se referem
à existência, em ambas, das “diferenças técnicas dos trabalhos especia-
lizados e a desigualdade do valor atribuído a esses distintos trabalhos,
operando a passagem da especialidade técnica para a hierarquia de
trabalhos, o que torna a recomposição e a integração diversas do soma-
tório técnico” (PEDUZZI, 2001, p. 106). Outros aspectos em comum
consideram as tensões entre as diversas formas de conceber e exercer a
autonomia técnica e de organização dos trabalhos especializados.

Em outras palavras, o processo de trabalho em saúde envolve profis-


sionais que exercem autonomia técnica, esta concebida como a possi-
bilidade de julgamento e tomada de decisão frente às necessidades de
saúde dos usuários. O grau de autonomia, entretanto, está condicio-
nado pela maior ou menor autoridade técnica e por dimensões políticas
e ideológicas, relativas às diferentes inserções sociais dos profissionais
em questão (PEDUZZI, 2001).

266
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

Relações de trabalho: autonomia,


responsabilidade e processo gerencial
Conforme mencionado, o trabalho em saúde envolve a autonomia dos
profissionais, mas o que pensamos sobre o conceito de autonomia?

Apresentamos, a seguir, a contribuição de Campos (2002) que, ao enfo- O paradoxo existente entre
car as profissões de nível superior e a sua atuação na clínica e na saúde autonomia profissional e atribuição
institucional de responsabilidade,
coletiva, possibilita uma discussão fértil sobre tal concepção. O autor identificado nas análises acerca da
discute a questão da autonomia profissional e do paradoxo entre esta atuação de profissionais de nível
superior, diz respeito, por exemplo,
e a atribuição institucional de responsabilidade. Apresenta, ainda, uma à perspectiva médico-centrada
reflexão importante para a compreensão do tema trabalho em saúde. e ao modelo biomédico, que
Segundo esse autor, devem-se considerar os trabalhadores da saúde em entram em choque com a política
de humanização do SUS e não
uma dupla dimensão. Uma que se refere à sua capacidade de produção respeitam os direitos do paciente
do sistema, como sujeito, e a outra, pela sua condição de objeto produ- (usuário). Além disso, limitam ou
zido por fatores culturais, pelo conhecimento disciplinar, pelo mercado, até mesmo inviabilizam o trabalho
em equipe, quando os profissionais
entre outros. Significa que: de nível superior desconsideram os
saberes de outros, por exemplo, os
os trabalhadores de saúde operam com relativo grau de au-
do agente comunitário de saúde.
tonomia, apesar dos constrangimentos a que estão sempre
submetidos. Em consequência, o grau de alienação dos traba-
lhadores em relação ao objetivo (missão), objeto e meios de
trabalho dos sistemas de saúde pode variar conforme a con-
juntura e conforme a sua própria atuação como atores sociais
que são. A alienação não é um dado exclusivamente estrutural
(CAMPOS, 2002, p. 242).

A alienação dos trabalhadores em saúde pode ser verificada pelo grau Organização parcelar do trabalho
de afastamento destes do movimento de defesa da vida. Considerada refere-se a fragmentação e
especialização do trabalho, modelo
como princípio ético, a defesa da vida contrapõe-se a práticas cada vez taylorista, em que cada trabalhador
mais frequentes na atualidade, norteadas pelos interesses mercadológi- domina e realiza apenas uma parte
do trabalho.
cos, pelas normas burocráticas, pelo corporativismo e pela organização
parcelar do trabalho em saúde. Em relação ao último, Campos (2002)
estabelece que a fixação do profissional a determinada etapa de certo
projeto terapêutico produz alienação.

Como, então, podem-se superar tais práticas e o processo de alienação


do trabalhador ao realizar o trabalho em saúde? Não existem respos-
tas simples para problemas complexos, mas veremos, a seguir, que tal
condição pode e deve ser alcançada no âmbito do trabalho em saúde,
no SUS.

Vamos enfatizar aqui o tema da obra, que se refere ao reconhecimento


tanto do trabalhador da saúde quanto do usuário e da sociedade acerca
do resultado do seu trabalho. A obra é uma das condições necessárias
para a realização profissional e existencial dos profissionais da saúde.

267
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Através dela, o trabalhador, em sua condição de sujeito, não apenas


atua de forma criativa, mas se responsabiliza pela produção final da
saúde, tanto no que se refere à recuperação individual como à promo-
ção da saúde de uma coletividade (CAMPOS, 2002).

O trabalho em saúde prevê, assim, a aproximação dos trabalhadores


com o resultado do seu trabalho, levando a reconhecimento, valoriza-
ção, desalienação e, consequentemente, maior satisfação profissional.

Campos prevê maneiras de implementar a diretriz da obra, entre elas,


a criação de mecanismos que permitam o envolvimento de
todos os participantes de uma equipe com a elaboração de
novas maneiras de se fazer uma instituição funcionar. Tornar a
reinvenção uma possibilidade cotidiana e garantir a participação
da maioria nesses processos são maneiras de implicar
trabalhadores com as instituições e com os pacientes. Neste
sentido, a Gestão Colegiada de serviços de saúde pode servir
como um dispositivo desalienante. Um modo de comprometer
trabalhadores com a missão e com os projetos institucionais
(CAMPOS, 2002, p. 235).

Outro desafio apontado à gestão é lidar com a especialização do traba-


lho sem, contudo, conduzi-lo a ações fragmentadas entre os profissio-
nais da saúde. Com relação a esse ponto, o autor propõe a aplicação dos
conceitos de Campo e de Núcleo. Núcleo corresponde ao conjunto de
conhecimentos e responsabilidades referentes a uma profissão ou espe-
cialidade, o que diferenciaria os membros de uma equipe, e Campo,
os saberes e responsabilidades compartilhados. Pertencem ao Campo
os conhecimentos referentes às noções gerais da política de saúde, da
organização de modelos de atenção e do processo de trabalho, assim
como o saber básico sobre o processo saúde-doença e conhecimen-
tos relativos à epidemiologia, ao funcionamento corporal, ao vínculo
profissional-paciente e regras gerais de prevenção e promoção à saúde
(CAMPOS, 2002).

Campos (2002) afirma que No interior das equipes, a possibilidade de negociação das definições de
os médicos buscam extrema Campo e Núcleo de Competência e Responsabilidade possibilita maior
especialização, ou seja, ao se
especializarem, vão perdendo autonomia para os profissionais e equipes e a atribuição de responsa-
progressivamente a perspectiva bilidades de forma clara. A respeito desses pontos, o autor prevê uma
global da medicina. O que poderia
minimizar esse efeito seria, então,
abertura no paradoxo entre autonomia e definição de responsabilidade,
uma formação que privilegiasse a assim como entre polivalência e especialização (CAMPOS, 2002).
polivalência, para propiciar uma
visão mais holística, em cada
clínica médica.
A seguir, abordamos alguns aspectos importantes relacionados ao tra-
balho em saúde nas organizações.

268
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

Mediação de conflitos nas relações de trabalho


A adoção do trabalho em equipe não implica, necessariamente, na exis-
tência de consenso. Os diferentes participantes do trabalho em saúde
possuem pontos de vista, experiências de vida e de trabalho, valores,
interesses, controle de recursos (entre eles, financeiros, administrati-
vos, de conhecimento e de poder) e formações diferentes, que, muitas
vezes, entram em conflito. Tais divergências e a existência de conflito
não devem ser negadas ou “abafadas”, mas, sim, entendidas como ine-
rentes às relações de trabalho, como objeto da gestão em saúde e como
possibilidade de aprendizagem, crescimento e transformação.

Posicionamento ético
Os crescentes custos do setor de saúde, relacionados com o envelheci-
mento populacional, o predomínio de condições crônicas e, cada vez
mais, com intensa incorporação tecnológica, se colocam como impor-
tantes aspectos para a capacidade de manutenção de sistemas públicos
e universais de saúde, como o SUS.

A escassez de recursos coloca desafios éticos, considerando a neces-


sidade de racionamento dos serviços de saúde e o estabelecimento
de prioridade de intervenções relativas a diferentes ações e serviços
voltados aos indivíduos e coletivos. Tal perspectiva envolve a tomada
de decisão baseada no conceito de equidade. Equidade e iniquidade
envolvem juízos de valor. São “conceitos políticos que expressam um
compromisso moral com a justiça social” (ESCOREL, 2009, p. 205).

Relações de respeito e confiança


O processo de trabalho em saúde envolve o estabelecimento de rela-
ções, seja entre trabalhadores, gestores, usuários, outros atores sociais
etc. Por isso, o reconhecimento do outro e o respeito às suas diferenças
são a base para a construção da confiança e da produção do cuidado e
da saúde. Tais relações são mediadas, entretanto, pela comunicação,
conforme os quadrinhos a seguir.

269
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Para refletir
O que você refletiu a partir dos quadrinhos? Pode-se apreender que
confiança é construída na relação entre as pessoas; mas, qual é o papel
da comunicação? E como pensar essas relações de respeito e confiança
na rede de frio de imunobiológicos? Que papel você acredita que elas
têm? Seriam tão importantes quanto os insumos, os equipamentos e o
número suficiente de trabalhadores para que a rede funcione?

Educação e saúde
Em nossos dias, existem diversas expressões que relacionam educação
e saúde. Apesar de, muitas vezes, serem usadas com o mesmo signifi-
cado, essas expressões designam coisas muito diferentes e partem de
variadas concepções de saúde, educação e sociedade.

270
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

O Ministério da Saúde (BRASIL, 2009) propôs um glossário para facilitar a


identificação das diferenças contidas nas diversas perspectivas de educação:
Educação continuada, fem. Processo de aquisição sequencial e
acumulativa de informações técnico-científicas pelo trabalhador, por
meio de escolarização formal, de vivências, de experiências laborais e de
participação no âmbito institucional ou fora dele.
Educação em saúde, fem. 1 – Processo educativo de construção de
conhecimentos em saúde que visa à apropriação temática pela população,
e não à profissionalização ou à carreira na saúde. 2 – Conjunto de práticas
do setor que contribui para aumentar a autonomia das pessoas no seu
cuidado e no debate com os profissionais e os gestores a fim de alcançar
uma atenção à saúde de acordo com suas necessidades.
Notas: i) A educação em saúde potencializa o exercício do controle social sobre as políticas e
os serviços de saúde para que esses respondam às necessidades da população. ii) A educação
em saúde deve contribuir para o incentivo à gestão social da saúde. Ver Educação popular em
saúde.

Educação na saúde, fem. Produção e sistematização de conhecimentos


relativos à formação e ao desenvolvimento para a atuação em saúde,
envolvendo práticas de ensino, diretrizes didáticas e orientação curricular.
Educação permanente em saúde, fem. Ações educativas embasadas na
problematização do processo de trabalho em saúde e que tenham como
objetivo a transformação das práticas profissionais e da própria organização
do trabalho, tomando como referência as necessidades de saúde das
pessoas e das populações, a reorganização da gestão setorial e a ampliação
dos laços da formação com o exercício do controle social em saúde.
Educação popular em saúde, fem. Ações educativas que têm como objetivo
promover, na sociedade civil, a educação em saúde, mediante inclusão social
e promoção da autonomia das populações na participação em saúde.
Fonte: Brasil (2009, p. 22-23).

Para refletir
Qual perspectiva de educação, sistematizada pelo Ministério da Saúde
(BRASIL, 2009), é mais frequente em sua realidade de trabalho? Como
as perspectivas educativas (BRASIL, 2009) podem contribuir para o
trabalho em saúde, na rede de frio de imunobiológicos?

Vamos tomar um exemplo que considera a divisão social do trabalho.


Muitas vezes, as oportunidades de formação e desenvolvimento são
mais frequentes, quando não exclusivas, para os profissionais de nível
superior e consideram a lógica parcelar do trabalho e o conhecimento

271
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

especializado. Quem já ouviu falar nos famosos treinamentos para seg-


mentos profissionais específicos, como médicos, enfermeiros e farma-
cêuticos?

Com a Resolução n. 353/2003 (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE,


2003) e a Portaria MS/GM n. 198/2004 (BRASIL, 2004), uma nova
perspectiva de formação e desenvolvimento de trabalhadores foi ado-
tada pelo SUS. Trata-se da Educação Permanente em Saúde, tomada não
apenas como estratégia didática, mas como uma opção político-peda-
gógica, direcionada para equipes e voltada para o contexto de trabalho.

A educação permanente é um direito do trabalhador e contribui sen-


sivelmente para o aperfeiçoamento do SUS, em razão de ser realizada
com e para o trabalhador da saúde, a partir de experiências vivenciadas
no cotidiano do trabalho.

Concluindo...
No âmbito do SUS, as organizações de saúde devem superar a concepção
mecanicista, caracterizada pelo trabalho fragmentado e parcelar, e
considerar as múltiplas dimensões envolvidas no trabalho em saúde.
Entre elas, a dimensão relacional e ética, a busca pela defesa da vida
e efetivação da cidadania e o trabalho coletivo, o qual pressupõe forte
interação e comunicação.

Considerações finais
Em que medida seu trabalho incorpora a concepção de trabalho em
equipe, que envolve forte interação e comunicação? Que ações podem
ser pensadas para viabilizá-la em seu processo de trabalho? Que impor-
tância tem essa forma de organização quando pensamos em proces-
sos de trabalho que envolvem produção, distribuição, abastecimento
e administração de imunobiológicos e outros insumos estratégicos na
rede de frio de imunobiológicos?

Essas questões representam algumas das reflexões que buscamos trazer


para você neste capítulo. Nosso caminhar até aqui foi extenso, mas espe-
ramos que tenha contribuído para o aprofundamento dos seus saberes
e a incorporação de novos conhecimentos. Se agora você é capaz de
compreender o que são as organizações, como elas se constituíram e se
modificaram ao longo da história, como influenciaram e influenciam o
trabalho em saúde (incluindo o trabalho em equipe), teremos dado um
passo significativo na formação pretendida.

272
Organizações públicas e o processo de trabalho em saúde

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profissional em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, 2009.
Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/traequ.html>. Acesso em: 4 ago.
2016.

273
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

PEDUZZI, M.; SCHRAIBER, L. Processo de trabalho em saúde. In: In: PEREIRA, I. B.; LIMA, J. C. F.
(Org.). Dicionário de educação profissional em saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/Escola Politécnica de
Saúde Joaquim Venâncio, 2009. Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/
protrasau.html>. Acesso em: 13 dez. 2013.

SILVA, M. N.; FLAUZINO, R. F.; GONDIM, G. M. M. (Org.). Rede de frio: fundamentos para a
compreensão do trabalho. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2016.

274
12. Saúde e segurança do
trabalhador na rede de frio de
imunobiológicos
Irai Borges de Freitas, Katia Butter Leão de Freitas,
Marcello de Moura Coutinho e Sarita de Oliveira Ferreira Lopes

A atuação do trabalhador é ponto central nos processos que envolvem


o adequado funcionamento da rede de frio de imunobiológicos e, em
consequência, na manutenção da qualidade das vacinas que chegam
à população. Sua atuação depende de inúmeros fatores, tais como dos
insumos e equipamentos, de formação para desempenho das atividades,
da organização do processo de trabalho e, certamente, da sua saúde.

Neste capítulo, desejamos compartilhar ideias sobre o campo da saúde


e segurança do trabalhador. Apresentamos, brevemente, um pouco
do histórico conceitual desse campo, bem como alguns instrumentos
legais relacionados a ele, além de estratégias de análise dos ambientes
de trabalho, como o mapa de risco e sua relação com a rede de frio de
imunobiológicos.

Saúde: muito além da ausência de doença


O modelo da determinação social
O famoso modelo Dahlgren e Whitehead demonstra que o estado de da saúde, cunhado por Dahlgren
e Whitehead, foi apresentado no
saúde vai muito além da ausência de doença: ele é afetado por um con-
Capítulo 1, “Um pouco de história:
junto de fatores individuais, biológicos, ambientais, sociais, políticos, evolução das concepções de
econômicos. Esse conceito ampliado de saúde diz respeito às condições saúde, doença e cuidado”, do livro
Rede de Frio: fundamentos para a
de vida das pessoas, ou, como se diz, formalmente, são as condições de compreensão do trabalho (SILVA;
bem-estar físico, mental e social. FLAUZINO; GONDIM, 2016).

Os determinantes e condicionantes da saúde foram definidos pela Lei Lei procede do latim lex, que
significa regra, norma. Trata-se de
Orgânica da Saúde n. 8.080/90, no seu parágrafo 3, do artigo 2º: uma norma ou um conjunto de
Os níveis de saúde expressam a organização social e econô- normas concebido por um poder
soberano para regular a conduta
mica do país, tendo a saúde como determinantes e condicio- social e impor sanções a quem não
nantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento a cumpre.
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

A função das leis é controlar os básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a
comportamentos e ações dos atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e
indivíduos de acordo com os serviços essenciais (BRASIL, 1990b, grifo nosso).
princípios daquela sociedade. Em
geral, as ações puníveis por lei são
ponderadas pelos cidadãos antes A terceirização, no contexto da precarização, acompanhada da intensi-
de serem praticadas. ficação e do aumento da jornada de trabalho, com acúmulo de funções;
a maior exposição a fatores de risco para a saúde; o descumprimento de
regulamentos de proteção à saúde e segurança do trabalhador; o rebai-
xamento dos níveis salariais e o aumento da instabilidade no emprego...
Esses são alguns dos fatores que fazem parte de processos de trabalho
contemporâneos. Se considerarmos o conceito ampliado de saúde,
pode-se perceber que eles têm grande impacto sobre os trabalhado-
res, os quais, frequentemente, desenvolvem estresse, contaminação e
fadiga mental/psíquica, as chamadas “dores relacionadas ao trabalho”,
isto é, lesões por esforços repetitivos (LER) e distúrbios osteomolecula-
res relacionados ao trabalho (Dort).

Esse contexto também pode se apresentar na rede de frio, principalmente


no tocante aos trabalhadores técnicos de nível médio. Determinados
períodos como os de campanha de vacinação, possivelmente, aumentam
os níveis de estresse e fadiga, os quais constituem alguns dos fatores
desencadeadores de LER/Dort. Já o trabalho repetitivo de empilhamento
de paletes e a exposição frequente à variação extrema de temperatura
nas câmaras frias, quando não controlados corretamente, podem
gerar, por exemplo, dores musculares e doenças alérgicas respiratórias,
respectivamente.

Com base no conceito ampliado de saúde, seus determinantes e nas


questões específicas que o conceito implica na produção do trabalho e
suas implicações para o trabalhador, podemos refletir mais especifica-
mente sobre práticas de saúde e saúde do trabalhador.

Saúde do trabalhador: um pouco de sua


história
Essa história tem três grandes momentos ou visões – medicina do tra-
balho, saúde ocupacional e saúde do trabalhador.

Na medicina do trabalho, o enfoque é dado à doença, tendo surgido


Positivista refere-se a uma
como uma especialidade médica na Inglaterra, na primeira metade do
corrente de pensamento século XIX, com a Revolução Industrial. O Brasil assumiu o mesmo
sociológico e filosófico que pressuposto positivista da onipotência da medicina, ou seja, a ideia de
pressupõe uma hierarquia de
saberes, na qual a ciência está que apenas a medicina científica é adequada para compreender o pro-
acima dos demais saberes. cesso saúde-doença, desconsiderando o saber popular, por exemplo.

276
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

Cabe destacar que a medicina do trabalho estava limitada à ação médica,


devendo cuidar da adaptação física dos trabalhadores, atuando com
foco nos modelos de produção taylorista e fordista, em que o trabalha-
dor é visto como uma “máquina de produção”, mais uma engrenagem Não podemos nos esquecer
que deve ser “consertada”, sob pena de perda da margem de lucro por de que, no referido período,
o trabalho era extremamente
parte do dono da fábrica. extenuante! As jornadas de
trabalho eram de 12, 14 e
A medicina do trabalho, para Foto 1 – O trabalho na indústria até 16 horas, em condições
insalubres, aumentando
estudiosos como Mendes & Dias significativamente as
(1991, p. 342), está intimamente possibilidades de contágio
de doenças, inclusive nos
relacionada ao exercício direto do alojamentos próximos às
controle da força de trabalho. Os fábricas, onde se amontoavam
autores justificam tal afirmativa os trabalhadores.

considerando que:
G a medicina do trabalho se
constituiu, fundamentalmente,
como uma atividade médica,
sendo praticada nos locais de A medicina do trabalho era voltada para a
manutenção do trabalhador “funcionando”
trabalho (empresas, instituições em seu posto de trabalho, de forma a não
atrapalhar a produção da indústria.
públicas etc.);
Fonte: Wikimedia Commons.

G sua principal motivação era


contribuir para o estabelecimento e a manutenção do nível mais
elevado possível de bem-estar físico e mental dos trabalhadores
(perspectiva de adequação ao trabalho).

A origem da medicina do trabalho e seu desenvolvimento, portanto, Como teria dito Henry Ford:
“O corpo médico é a seção da
estão articulados à necessidade de máxima produtividade. Tanto a pers-
minha fábrica que mais dá lucro”
pectiva de adaptação ao trabalho quanto a ideia de manutenção da (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 1984,
saúde da força de trabalho refletem as influências da medicina cientí- p. 181). Não é à toa que a
medicina do trabalho continua
fica e da fisiologia, assim como das ciências da administração, quando até hoje...
nos lembramos dos princípios do taylorismo-fordismo.

Para refletir
Com base nessas ideias, você identifica alguma semelhança com seu
trabalho nos dias atuais?

Os processos de trabalho foram se transformando e se intensificando


desde a Segunda Guerra Mundial. O esforço industrial começou a exi-
gir, progressivamente, de algumas categorias profissionais, um trabalho
extremamente árduo, o que acabou gerando inúmeras doenças ou até
mesmo mortes, em decorrência de inúmeros acidentes de trabalho.

277
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Tal quadro começou a preocupar muito os empregadores, ávidos por


uma mão de obra produtiva, e também as companhias de seguro, as
quais estavam arcando com o pagamento de indenizações de altos valo-
res por incapacidades provocadas pelo trabalho. Aliada a isso, a tecno-
logia industrial avançou consideravelmente, adotando novos proces-
sos, equipamentos e a síntese de novos produtos químicos. Ao mesmo
tempo, estava havendo o rearranjo de uma nova divisão internacional
do trabalho.

Com isso, a medicina do trabalho perdeu espaço, em virtude da impo-


tência de intervir sobre os problemas de saúde causados pelos novos
processos de produção, assim como cresceram a insatisfação e o ques-
tionamento dos trabalhadores e empregadores. Os empregadores esta-
vam sendo mais onerados pelos custos diretos e indiretos dos agravos à
saúde de seus empregados. E qual foi a solução dada?

A solução foi a saúde ocupacional, na lógica da atuação médica dire-


cionada ao trabalhador, pela “intervenção sobre o ambiente” com ins-
trumental oferecido por outras disciplinas e profissões. Isso porque a
A medicina do trabalho foi saúde ocupacional manteve a centralidade do médico do trabalho na
superada historicamente pela identificação de problemas de saúde do trabalhador. Além disso, o con-
saúde ocupacional, mas, ainda
texto do seu surgimento foi o período Pós-Segunda Guerra Mundial,
assim, continua tendo seu
lugar nos processos de trabalho época de esforço para a reconstrução dos países com base na produção
contemporâneos. industrial.

Também herdeira da racionalidade científica, mas baseada em uma atu-


ação multiprofissional, e não só no profissional médico, a saúde ocupa-
cional surgiu usando a estratégia de intervir nos locais de trabalho, com
a finalidade de controlar os riscos nesses ambientes. Ela ganha impor-
tância pelo alicerce que as escolas de saúde pública e universidades dos
Estados Unidos da América (EUA) forneceram, com os estudos sobre
problemas de saúde ocupacional e enfoque ambiental, principalmente
na metade do século XX.

No Brasil, a adoção e o desenvolvimento da saúde ocupacional ocorre-


ram tardiamente, em três vertentes, as quais podem ser sintetizadas da
seguinte forma:
G Acadêmica: desenvolvimento de centros de ensino e pesquisa, com
destaque para a área de saúde ocupacional do Departamento de
Saúde Ambiental da Universidade Estadual de São Paulo (USP).
G Institucional: cuja marca mais característica foi a criação da
Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do
Trabalho (Fundacentro), versão nacional dos modelos de institutos
de saúde ocupacional que surgiram na década de 1950 pelo mundo.

278
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

G Normativa: regulamentação do Capítulo V da Consolidação das


Leis do Trabalho (CLT), principalmente nas normas relativas à
obrigatoriedade de equipes técnicas multidisciplinares nos locais
de trabalho. Sobre essa vertente, cabe destacar que a avaliação São 36 Normas
Regulamentadoras de
quantitativa de riscos ambientais pela adoção de “limites Segurança e Saúde no
de tolerância” é explicitada, principalmente, pelas Normas Trabalho, que podem ser
Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho n. 7 e n. 15. acessadas pelo link:http://
trabalho.gov.br/index.php/
seguranca-e-saude-no-
trabalho/normatizacao/normas-
A respeito da vertente normativa, é importante salientar que as chamadas regulamentadoras
Normas Regulamentadoras (NRs) foram publicadas inicialmente pelo
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), pela Portaria n. 3.214/78
(totalizando 28 NRs), estabelecendo os requisitos técnicos e legais sobre os
aspectos mínimos de segurança e saúde ocupacional (SSO).
As NRs relativas a segurança e saúde ocupacional, desde 1978, são de
observância obrigatória para qualquer empresa ou instituição que tenha
trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),
incluindo empresas privadas e públicas, órgãos públicos da administração
direta e indireta, bem como órgãos dos poderes Legislativo e Judiciário.

Mas será que cabe alguma obrigação ao trabalhador? staque de pergu

Sim, o trabalhador deve seguir os requisitos técnicos e legais, além dos


procedimentos escritos e boas práticas estabelecidas e comunicadas
pelo empregador. Vale a pena ficar atento às seguintes obrigações:
Atenção!
G cumprir as disposições legais e regulamentares sobre segurança e
Constitui ato faltoso, sujeito
saúde ocupacional, inclusive as ordens de serviço expedidas pelo à penalidade, a recusa
empregador; injustificada do empregado
ao cumprimento dos itens
G usar o equipamento de proteção individual (EPI), o equipamento relativos às obrigações dos
trabalhadores (NR 1) (BRASIL,
de proteção coletiva (EPC) e métodos de trabalho fornecidos e
2015b).
estabelecidos pelo empregador;
G submeter-se aos exames médicos estabelecidos no Programa de
Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) da empresa;
G colaborar com o local de aplicação das NRs.

No caso dos trabalhadores da rede de frio, em especial aqueles que


trabalham nas câmaras frias das centrais de distribuição, o Manual do
Programa de Imunização (BRASIL, 2013, p. 75) estabelece os seguintes
equipamentos de proteção individual (Foto 2 – EPI da rede de frio de
imunobiológicos de uso obrigatório):
G touca balaclava (touca ninja de lã);

279
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

G japona longa 7/8 com capuz Foto 2 – EPI da rede de frio de


imunobiológicos de uso obrigatório
de náilon;
G calça em lona de náilon; Touca balaclava

G meias em malha de algodão


Japona
(não alérgica); Luva

G luva de pelica; e
G calçado de segurança (bota
de cano alto para câmara
fria, forrada com lã e solado
em PVC). Calça
(macacão frio)

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015).


Vale ressaltar que o emprega-
dor também tem a responsabi-
lidade de garantir a qualidade
dos EPIs e EPCs e substituí-los
periodicamente, evitando sua Bota cano longo
com forro de lã
deterioração, o que nem sem-
pre é observado, inclusive na
rede de frio. A não observân-
cia nesse caso pode contribuir
e/ou gerar incapacidade parcial ou integral do trabalhador.

Como a saúde ocupacional perdeu seu espaço para a saúde do traba-


lhador?

Figura 14 – Vivitrum cum intius ex non hos bon nihil virtiae. Chegamos aos anos 1960, época do “é proi-
bido proibir”, momento de caminhar e cantar
Soyloco por ti, America (Gilberto Gil, Torquato
Neto e José Carlos Capinan). O chamado
“Maio francês” ocorreu em 1968, e a juven-
tude da época, em todo o mundo, passou a
questionar o sentido da vida, o uso do corpo,
os padrões comportamentais e os valores reli-
giosos e tradicionalistas. O trabalho também
Foto: Sautdutarn.

sofreu questionamentos, no que diz respeito


ao seu lado sagrado e místico, cultivado no
pensamento cristão e capitalista. E daí? Você
O ano de 1968 foi o mais intenso da década de 1960. Nele, a população perguntaria como um jovem da época.
da França se reuniu no maior protesto da história (foto); Praga se
rebelou contra os desmandos da União Soviética; Martin Luther King
e Robert Kennedy foram assassinados nos EUA; a ditadura endureceu Tentando responder, podemos afirmar que
suas ações no Brasil, acarretando maior repressão, inúmeras prisões e todo esse contexto histórico-político, esse
algumas mortes, como a do estudante Edson Luís.
Fonte: Wikimedia Commons. momento de utopias, inclusive a socialista
(uma sociedade sem propriedade privada,

280
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

onde tudo é de todos), levou à seguinte consideração: quando será a


vez de os trabalhadores participarem como protagonistas das questões
de saúde e segurança do trabalho, e não mais apenas como “máquinas
a serem consertadas”? Mais do que ninguém, são os trabalhadores que
sabem efetivamente onde o “calo aperta”.

Além das questões anteriormente citadas, havia um conjunto de fatores


que possibilitou a constatação de que a saúde ocupacional, desenvol-
vida, também, para atender à necessidade da produção, não conseguiu
atingir seus objetivos. Dentre esses fatores, destacam-se:
G a manutenção da saúde ocupacional no âmbito do trabalho,
em detrimento do setor de saúde, assim como do referencial
mecanicista da medicina do trabalho;
G a não concretização do apelo à interdisciplinaridade, ou seja, as
atividades apenas se justapuseram de modo desarticulado e foram
dificultadas pelas lutas corporativas;
G o ritmo da transformação dos processos de trabalho não ter
acompanhado a capacitação de recursos humanos, a produção de
conhecimento e de tecnologia de intervenção;
G a continuação da abordagem dos trabalhadores como “objeto”
das ações de saúde, apesar de enfocar a questão no coletivo dos
trabalhadores.

Vale afirmar, então, que a saúde do trabalhador recebeu forte influência


do pensamento que defende o conceito ampliado de saúde, superando
a saúde ocupacional. E começou a ganhar força a partir dos anos de
1960-1970, com a “teoria da determinação social do processo saúde-
-doença”, na qual as condições de trabalho têm papel importante.

A  saúde do trabalhador surge, portanto, por volta dos anos 1970,


caracterizada pela expressão das necessidades dos trabalhadores e dos
empregadores. Como campo da saúde pública, deve ter o trabalhador
como sujeito ativo nas transformações, nos processos de trabalho e na
sociedade. Considerando as experiências singulares da saúde do traba-
lhador, podemos afirmar que é de caráter conflitante e de embates.

Saúde do trabalhador no Brasil


No Brasil, a saúde do trabalhador tem como aliados os preceitos da
Reforma Sanitária, ao propor uma nova visão na saúde, na segurança e
no trabalho. Ganha força especialmente em 1986, com a realização da 8a
Conferência Nacional de Saúde e da 1a Conferência Nacional de Saúde dos
Trabalhadores, provocando mudanças na Constituição Federal de 1988.

281
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Com a regulamentação da chamada Lei Orgânica da Saúde (LOS) – Leis


Federais n. 8.080 e n. 8.142, de 1990 –, a saúde do trabalhador conquis-
tou definitivamente expressão legal nas áreas da saúde, da previdência
social e do trabalho. Vale citar o entendimento de saúde do trabalhador
presente na Lei Orgânica n. 8.080, artigo 6°, §3°, no que se refere ao
campo de atuação do SUS:
[...] um conjunto de atividades que se destina, através das
ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à pro-
moção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa
à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores sub-
metidos aos riscos e agravos advindos das condições de traba-
lho (BRASIL, 1990, p. 3).

Para compreender a saúde do trabalhador, temos que conhecer os


aspectos legais relacionados ao SUS, assim como as vigilâncias sanitá-
rias e epidemiológica, assuntos discutidos em capítulos anteriores. A
Constituição Federal Brasileira, no artigo 200, inciso II, estabelece a
competência do SUS para “executar as ações de vigilância sanitária e
epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador” (BRASIL, 1988).

A Lei n. 8.213, de 24/7/1991, Lei de Planos de Benefícios da Previdên-


cia Social, sinaliza para uma relação entre a saúde do trabalhador e a
previdência social ao demonstrar o acidente de trabalho como aspecto
A Lei n. 8.213, de 24/7/1991, determinante para a saúde do trabalhador. Define o acidente do traba-
está disponível em: lho em seu artigo 19:
http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/l8213cons.htm
Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho
a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segu-
rados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando
lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou
a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade
para o trabalho (BRASIL, 1991).

Além da definição de acidente de trabalho, a Lei Federal n. 8.213/91


determina que, sempre que houver esse tipo de ocorrência, com afas-
tamento ou não do trabalhador, as empresas serão obrigadas a emitir
a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), idealmente até o pri-
meiro dia útil após o acidente.

Emitir uma CAT nos remete à necessidade de promover a prevenção de


acidentes de trabalho por meio de: ações de capacitação e de informações
aos trabalhadores, identificação dos locais de riscos aos trabalhadores e
indicação da necessidade de medidas de correção, colaborando, desse
Legalmente, a CAT está embasada modo, para a elaboração do Mapa ou Mapeamento de Riscos, abordado
no artigo 169 da Consolidação das mais adiante.
Leis do Trabalho (CLT).

282
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

Vale lembrar que é considerado acidente de trabalho ou de trajeto


também aquele que ocorre no deslocamento residência-local de trabalho-
residência. No caso da rede de frio, os acidentes mais comuns estão
relacionados aos movimentos repetitivos na lida com computador,
empilhamento, câmaras frias e sala de vacinação.

Figura 1 – Formulário para comunicação de acidente de trabalho (CAT)

Comunicação de acidente de trabalho - CAT


1- Emitente
Empregador Sindicato Médico Segurado ou dependente Autoridade pública

2- Tipo de CAT
Inicial Reabertura Comunicação de óbito

I - EMITENTE
Empregador

3 - Razão Social / Nome

4- Tipo 5- CNAE 6 - Endereço - Rua/Av.


CGC/CNPJ CEI CPF NIT

Complemento Bairro CEP 7 - Munícipio 8 - UF 9 - Telefone


Selecione

Acidentado

10 - Nome

11 - Nome da mãe

12 - Data de Nascimento 13 - Sexo 14 - Estado Civil


Masculino Solteiro Casado Viúvo Divorciado Outro
Feminino Ignorado

15 - CTPS - Nº / Série / Data de 16 - UF 17 - Remuneração Mensal


Emissão Selecione R$

18 - Carteira de Identidade (RG) Data de Emissão Orgão Expedidor 19 - UF 20 - PIS / PASEP / NIT
Selecione

21 - Endereço - Rua / AV

Bairro CEP 22 - Munícipio 23 - UF 24 - Telefone


Selecione

25 - Nome da Ocupação 26 - CBO (consulte CBO)

27 - Filiação à Previdência Social 28 - Aposentado 29 - Áreas


Empregado Tra.Avulso Seg. especial Sim Não Urbana Rural
Médico Residente

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
quebra de página
Fonte: Ministério do Trabalho e Previdência Social (BRASIL, 2016).

283
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 1 – Formulário para comunicação de acidente de trabalho (CAT) (cont.)

Acidente ou Doença

30 - Data de 31 - Hora do Acidente 32 - Após quantas horas de 33 - Tipo 34 - Houve


Acidente trabalho? afastamento?
Típico
Doença Sim
Trajeto Não

35 - Último dia 36 - Local do 37 - Especificação do local do 38 - CGC / CNPJ 39 - UF


trabalhado acidente acidente
Selecione

40 - Munícipio do local do acidente 41 - Parte do corpo 42 - Agente causador

43 - Descrição da situação geradora do acidente ou 44 - Houve registro policial?


doença
Sim
Não

45 - Houve morte?
Sim
Não

Testemunhas
Fonte: Ministério do Trabalho e Previdência Social (BRASIL, 2016).
46 - Nome

É essencial frisar que a CAT também tem caráter legal, pois gera
47 - Endereço - Rua / Av / nº / comp.
informações para o controle estatístico  e epidemiológico junto aos
órgãos
Bairro
federais, CEP com garantia de assistência acidentária
48 - Munícipio 49 - UF
ao empregado
Telefone
Para saber mais sobre a CAT, junto ao Instituto Nacional de SeguridadeSelecione Social (INSS) ou, se
acesse: http://goo.gl/yF4uJT.
necessário,
50 - Nome uma aposentadoria por invalidez.

Segundo o /Anuário
51 - Endereço - Rua Av / nº / comp. Estatístico da Previdência Social (AEPS) de 2014,
elaborado pelo Ministério da Previdência Social (BRASIL, 2015a):
Bairro CEP 52 - Munícipio 53 - UF Telefone

G de 2009 a 2014, houve um crescimento de 15,6 milhões de


Selecione

contribuintes ao RGPS (Regime Geral de Previdência


Local e Data Assinatura e carimbo Social).
____________________________________________________________
G 704,1 mil acidentes do trabalho foram registrados no INSS em 2014.
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Em relação a 2013, houve umquebra
decréscimo
de página
de 2,9%.
G o número de acidentes registrados com CAT diminuiu em 0,82%
de 2013 para 2014. Desse total, os acidentes típicos representaram
76,55%; os de trajeto, 20,67%; e as doenças do trabalho, 2,79%.
As pessoas do sexo masculino representam 71,85% e, as do sexo
feminino, 28,14% nos acidentes típicos; 61,48% e 38,52%, nos de
trajeto; e 57,01% e 42,99%, nas doenças do trabalho.

O maior setor em número de acidentes de trabalho foi o de comér-


cio e reparação de veículos automotores (95.659 registros), seguidos
pelo setor de saúde e serviços sociais, com 66.302 acidentes. Na saúde,
o mais preocupante é que as atividades de atendimento hospitalar
(exceto pronto-socorro e unidades para atendimento a urgências) e as
de atenção ambulatorial, executadas por médicos e odontólogos, assim
como os serviços de administração de hospitais vêm apresentando,
desde 2009, um aumento de acidentes.

284
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

Saúde do trabalhador e vigilância


Neste momento de nossa análise, é oportuno relembrar que saúde
do trabalhador é, também, um campo da vigilância em saúde. Para
muitos autores, como Lacaz (2007), a saúde do trabalhador nasceu,
academicamente, da saúde coletiva com o objetivo central de conhecer
e intervir nas relações entre trabalho e saúde-doença, tendo como refe-
rência principal o surgimento de um novo ator social: a classe operária.

A perspectiva adotada foi aquela que considera o trabalho como orga-


nizador da vida social, como espaço de dominação e submissão do tra-
balhador pelo capital, mas igualmente de resistência, de constituição e
do fazer histórico-político. Podemos afirmar que, nesse contexto, surge
uma postura proativa do trabalhador, de não tutela, frente às relações
sociais de produção. No caso da rede de frio de imunobiológicos, isso
ocorre quando, por exemplo, os trabalhadores assumem protagonismo
no planejamento, na gestão e transformação dos processos de trabalho
em que estão inseridos.

A postura proativa, de protagonismo no planejamento, na gestão e


transformação dos processos de trabalho, é confirmada pela primeira
experiência bem-sucedida de que se tem notícia a respeito. Trata-se
dos denominados “Modelo Operário Italiano” ou “Mapa de Risco ou
Mapeamento de Riscos”, abordados mais adiante. Por enquanto, cabe
informar que sua origem é o Movimento Operário Italiano (MOI),
objetivando tornar possível, por parte dos trabalhadores, a identificação
dos fatores de risco (ocupacionais/ambientais) e as condições de traba-
lho. Isso ocorreu, inicialmente, nas fábricas italianas, posteriormente
estendeu-se ao redor do mundo e a quaisquer ambientes de trabalho,
inclusive aos da rede de frio de imunobiológicos. Atualmente, de forma
didática, os riscos podem ser classificados de acordo com a NR 5 – Cipa
(Quadro 1).

Quadro 1 – Classificação dos principais riscos ocupacionais em grupos, de acordo com sua natureza e padronização das cores
Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3 Grupo 4 Grupo 5
Riscos Físicos Riscos Químicos Riscos Biológicos Riscos Ergonômicos Riscos de Acidentes ou
Mecânicos
Arranjo físico
Ruídos Poeiras Vírus Esforço físico intenso
inadequado
Levantamento e Máquinas e
Vibrações Fumos Bactérias transporte manual de equipamentos sem
cargas proteção
Exigência de postura Ferramentas inadequadas
Radiações ionizantes Névoas Protozoários
inadequada ou defeituosas

285
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Quadro 1 – Classificação dos principais riscos ocupacionais em grupos, de acordo com sua natureza e padronização das cores
(cont.)
Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3 Grupo 4 Grupo 5
Riscos Físicos Riscos Químicos Riscos Biológicos Riscos Ergonômicos Riscos de Acidentes ou
Mecânicos
Controle rígido de
Radiações não ionizantes Neblinas Fungos Iluminação inadequada
produtividade
Imposição de ritmos
Frio Gases Parasitas Eletricidade
excessivos
Trabalho em turno e Probabilidade de
Calor Vapores Bacilos
noturno incêndio ou explosão
Substâncias compostas
Jornadas de trabalho Armazenamento
Pressões anormais ou produtos químicos
prolongadas inadequado
em geral

Monotonia e
Animais peçonhentos
Umidade repetitividade

Outras situações de risco


Outras situações de
que poderão contribuir
estresse físico e/ou
para a ocorrência de
psíquico
acidentes
Fonte: Adaptado de Araújo (2002, p. 150).

Aspectos relativos a ergonomia e Ao pensar nos riscos existen- Foto 3 – Trabalhador em laboratório
ambiência são tratados no próximo
tes relacionados às atividades
capítulo, trazendo exemplos
relacionados ao trabalho na rede de trabalho realizadas na rede
de frio de imunobiológicos. de frio de imunobiológicos, po-
demos citar alguns exemplos:

Foto: Vinicius Marinho (2011).


riscos físicos – as câmaras frias;
riscos químicos – as vacinas;
riscos biológicos – sangue; ris-
cos ergonô- micos – estresses
na relação com a chefia e
demais trabalhadores; utili-
O trabalho pode expor o trabalhador a riscos
zação de empilhadeiras, pale- químicos, físicos, biológicos, ergonômicos e mecânicos.
tes e mobiliários inadequa- Nesta foto, que mostra um trabalhador dentro de
um laboratório, há possibilidade de risco físico de
dos (que propiciam posturas exposição à radiação, risco químico pela manipulação
e posições incorretas); locais de reagentes, ergonômico pelo esforço repetitivo, de
pipetagem, dentre outros.
adaptados com más condi- Fonte: Fiocruz Imagens.
ções de iluminação, ventila-
ção e de conforto para os trabalhadores; riscos de acidentes ou mecâni-
cos – equipamentos e mobiliários defeituosos das unidades de saúde.

Esses fatores de risco devem ser identificados, analisados e compreendidos


sempre no contexto específico de cada processo de trabalho; não devem
ser assimilados de modo estanque e fragmentado!

286
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

Feita a observação sobre os fatores de risco, cabe destacar que a saúde


do trabalhador está devidamente regulamentada, sendo atualmente
uma realidade, uma política nacional, por meio da Portaria n. 1.823, de
23 de agosto de 2012 (BRASIL, 2012). Para saber mais sobre a
Portaria n. 1.823, de 23 de
agosto de 2012, acesse: http://
Norma Regulamentadora 32 – NR 32 goo.gl/VziOEa.

A partir do entendimento de que todo trabalhador da rede de frio


Comissão Tripartite Permanente
de imunobiológicos faz parte do setor de saúde, torna-se importante Nacional é uma comissão
conhecer a NR 32, que trata da segurança e saúde no trabalho em esta- composta por representantes
das três partes envolvidas
belecimentos de saúde. A NR 32 faz parte de um conjunto de normas – trabalhadores, governo e
brasileiras, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Portaria n. empregadores. É paritária, porque
485, de 2005, publicada no Diário Oficial da União em 16/11/2005. Foi tem número proporcional de
representantes por segmento, e é
elaborada por uma Comissão Tripartite Permanente Nacional (CTPN) e, permanente, porque não há prazo
sempre que houver necessidade, deverá ser atualizada e aperfeiçoada. para a sua extinção.

A NR 32 surgiu pela necessidade, detectada por entidades representan-


tes dos trabalhadores, de serem normatizadas questões problemáticas
que envolvam os serviços de saúde, de acordo com a atividade e os
riscos ocupacionais, tais como: uso de calçados fechados, coleta de san-
gue, uso de adornos, dentre outros.

A NR 32 não é a única legislação para proteção do profissional de saúde,


mas é a primeira norma regulamentadora federal no mundo específica
para a área de saúde. Abarca uma complexidade de pontos como questões
de segurança e saúde no trabalho, que se referem aos riscos biológicos,
químicos, radiações ionizantes, manutenção de máquinas e equipamentos,
resíduos, condições de conforto por ocasião das refeições, lavanderias e
limpeza e conservação, dentre outros.

Ao ler a NR 32 (BRASIL, 2005), observam-se três eixos norteadores:

Capacitação

NR 32 Medidas de proteção

Programas

A NR 32 favorece a interação entre os trabalhadores, reconhecendo a


necessidade de diálogo entre os profissionais e a segurança do trabalho.
Também ressalta a necessidade do uso de equipamento de proteção
individual, o chamado EPI, abordado no próximo capítulo, valoriza a
educação permanente, assim como o registro dos riscos e avaliações,
possibilitando a maior conscientização dos profissionais em relação aos
riscos relacionados ao ambiente e à atividade de trabalho.

287
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Biossegurança é o conjunto de Essa norma apresenta o conceito de serviços de saúde, no qual fica
ações voltadas para prevenção,
proteção do trabalhador,
claro que a responsabilidade é solidária entre empregadores e trabalha-
minimização de perigos inerentes dores. Trata, ainda, de temas relacionados à biossegurança, abordada
às atividades de pesquisa, no próximo capítulo, reafirmando a necessidade da abertura da CAT,
produção, ensino, desenvolvimento
tecnológico e prestação de serviços, mesmo não havendo afastamento do trabalhador, e aborda o trabalho
visando à saúde do homem, dos com perfurocortantes (a agulha de vacinação, por exemplo).
animais, à preservação do meio
ambiente e à qualidade dos
resultados. Esse foco de atenção
É extremamente importante que o trabalhador não só conheça as
retorna ao ambiente ocupacional normas, mas também esteja atento ao cumprimento destas em seu
e amplia-se para a proteção local de trabalho, sob pena de causar danos a sua saúde e a dos demais
ambiental e a qualidade.
trabalhadores.

Entretanto, é sabido que a maioria dos trabalhadores ainda possui


vínculo precário, não recebendo o EPI adequado às atividades que
desenvolvem. Desse modo, acabam expostos a inúmeros fatores de
risco, gerando insatisfações e conflitos no ambiente de trabalho. Infe-
lizmente, essa situação também ocorre na rede de frio de imunobio-
lógicos. São frequentes as reclamações quanto à baixa qualidade das
luvas, às alergias respiratórias geradas pelo entra e sai nas câmaras frias
e aos cortes provocados pelo manuseio dos imunobiológicos (frascos de
vidro), entre outros.

Desse modo, percebemos que o campo da saúde do trabalhador possui


vital importância para os trabalhadores da rede de frio de imunobiológicos,
quando pensamos em suas condições de trabalho. O conhecimento de
seu histórico, de seu marco legal e de suas ferramentas constitui uma
forma de garantir melhores condições de trabalho. Defendemos que
os trabalhadores devem tomar para si a responsabilidade não só de
conhecer todas as questões que envolvem seu trabalho, mas também
de, coletivamente, buscar intervir e transformar suas próprias condições
laborais e da sociedade.

Mapa ou mapeamento de riscos


ocupacionais/ambientais
Conforme mencionado anteriormente, o mapa ou o mapeamento de
riscos surgiu no seio do MOI, no final da década de 1960 e início da
década de 1970, mais precisamente na Federazione dei Lavoratori
Metalmeccanici (FLM), que, na época, desenvolveu um modelo próprio
de atuação na investigação, no planejamento e controle das condições
de trabalho pelos próprios trabalhadores. Essa experiência foi retratada
no livro clássico de Ivar Oddonne et al. (1986), Ambiente de trabalho: a
luta dos trabalhadores pela saúde.

288
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

O mais interessante é que o mapa de riscos (expressão que está mais


disseminada) é uma produção intelectual e política, fruto do saber dos
trabalhadores italianos organizados. Dessa forma, foram valorizados o
conhecimento e a experiência de todos os trabalhadores, sem delegação
aos “especialistas” (técnicos em segurança do trabalho, por exemplo).

O mapa de riscos se disseminou por todo o mundo, chegando ao Brasil


no início da década de 1980. Autores como Mattos e Freitas (1994)
apontam a existência de duas versões quanto à sua introdução no Bra-
sil. A primeira atribui tal feito às áreas sindical e acadêmica, por meio
de David Capistrano, Mário Gawryzewski, Hélio Baís Martins Filho e
do Departamento Intersindical de Estudos em Saúde e Ambiente de
Trabalho (Diesat). A outra versão atribui à Fundação Jorge Duprat
Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro).

Mas, o que é, de fato, o mapa de riscos, como é feito? Serve para a


rede de frio de imunobiológicos?

Podemos afirmar que é uma representação gráfica, feita a partir de um


levantamento das condições de trabalho em determinado local ou setor
de trabalho, na qual os fatores de riscos devem ser identificados pelos
próprios trabalhadores.

Figura 2 – Mapa de riscos

A elaboração dos mapas de riscos ocupacionais/ambientais é compe-


tência formal dos membros da Comissão Interna de Prevenção de Aci-
dentes (Cipa), conforme orientações contidas no anexo IV da NR-5,
Portaria n. 25, do Ministério do Trabalho e Emprego, de 29/12/1994, e
tem como objetivos:

289
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

a) reunir, no local de trabalho, as informações necessárias para


estabelecer o diagnóstico da situação de segurança e saúde no
trabalho;
b) possibilitar, durante sua elaboração, a troca e divulgação de
informações entre os trabalhadores, bem como estimular sua
participação nas atividades de prevenção.

De todo modo, cabe destacar que não são apenas os representantes


da Cipa que têm responsabilidade sobre o mapa de riscos. Todos os
trabalhadores devem atuar em sua elaboração e cobrar de sua empresa
ou instituição de trabalho as soluções para os problemas identificados,
pois está em jogo a melhoria das condições de trabalho e, em última
instância, a sua própria vida!

Como se constrói um mapa de riscos?estaque de pergunta instigadora

1º Passo: Agendar a visita com o responsável do setor, explicando o que


será feito, os objetivos, a metodologia, os trabalhadores participantes,
e marcar dia e horário para o início da elaboração do mapa de riscos.

2º Passo: Compreender o processo de trabalho do local a ser analisado:


ou seja, os setores/seções, o que são e como produzem; para quem e
quanto produzem; conhecer o quantitativo de trabalhadores, o sexo,
a idade, os treinamentos existentes relacionados a segurança e saúde,
as jornadas de trabalho desses trabalhadores; as atividades executa-
das; o ambiente; e listar todas as matérias-primas e os demais insumos
(equipamentos, tipo de alimentação das máquinas etc.) envolvidos no
processo produtivo.

3º Passo: Identificar todos os riscos existentes no local analisado com


base na tabela de classificação de riscos elaborada pela NR 5 – Comissão
Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa).

4º Passo: Identificar as medidas preventivas realizadas e sua eficácia


considerando: as medidas de proteção coletiva e individual; a organiza-
ção do trabalho; higiene e conforto.

5º Passo: Identificar os indicadores de saúde, ou seja, as queixas de


maior incidência entre os trabalhadores expostos aos mesmos riscos;
a ocorrência dos acidentes de trabalho; as doenças dos trabalhadores
diagnosticadas e as causas mais comuns do absenteísmo.

6º Passo: Conhecer os levantamentos ambientais já realizados no local.

7º Passo: Elaborar o mapa de riscos, com base no leiaute da empresa,


utilizando círculos para indicar os seguintes dados:

290
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

G O grupo a que pertence o risco, de acordo com a cor padronizada da


tabela de classificação de riscos da NR 5: Grupo 1 – Verde; Grupo 2 –
Vermelha; Grupo 3 – Marrom; Grupo 4 – Amarela e Grupo 5 – Azul.
G O número de trabalhadores que estão expostos ao risco deve ser
indicado no centro do círculo.
G A especificação do agente pode ser escrita dentro do círculo ou
descrita em legenda (por exemplo, risco químico – vacinas; risco
ergonômico – transporte de caixas).
G A intensidade do risco, ou seja, se é pequeno, médio ou grande,
representada por círculos, de acordo com a percepção dos
trabalhadores, conforme a Figura 3:

Figura 3 – Representação gráfica da intensidade dos riscos

Risco Grande Risco Médio Risco Pequeno

Após ser aprovado pela Cipa, o mapa de riscos de toda a empresa ou seto-
rial deverá ser fixado em local visível e de fácil acesso aos trabalhadores.

Concluindo, a elaboração do mapa de riscos é um trabalho de equipe,


exige diálogo entre os participantes e observação apurada para se per-
ceber, com exatidão, os riscos presentes no ambiente.

291
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Figura 4 – Mapa de riscos do térreo de um posto de saúde

4 4

Consultório A

4 4

1 1 1
Consultório B

Recepção
4 4 4

Sala de vacina

Banheiro

MAPA DE RISCOS
Risco Grande Rísco Médio Risco Pequeno

Rísco Físico: Não identificado. Legislação: NR 5 – Anexo IV,


Risco Químico: Substâncias químicas (vacinas). Portaria 25 de 29/12/1994.
Risco Biológico: Microrganismos (contato
constante com usuários/ pacientes e sangue). CIPA - 2015
Risco Ergonômico: Gerenciamento de conflitos,
condições psíquicas/ cognitiva adversas;
Movimentos repetitivos devido ao uso de
computador e atividade realizada sentada a Medidas de controle: EPI-iso
maior parte do tempo (recepção).
de luvas de procedimento e
Risco de Acidente: Manuseio de material jaleco.
perfurocortante.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Agora que você já viu o que é e como se faz, de forma geral, um mapa
ou mapeamento de riscos, que tal tentar fazê-lo em seu ambiente de
trabalho? Dissemine a ideia! Ajude a mobilizar os seus companheiros
de trabalho e mãos à obra. E não se esqueça de registrar como foi a
experiência! O registro pode ser útil para outros trabalhadores.

292
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

Para refletir
Com base nas explanações apresentadas neste capítulo e nos demais
sobre o campo da saúde do trabalhador, reflita sobre os fatores de
risco existentes nas imagens a seguir, relativas a processos de trabalho
da rede de frio de imunobiológicos, comparando-os com os do seu
ambiente de trabalho.

Foto 4 – Atividade da rede


de frio de imunobiológicos Figura 5 – Atividade da rede de frio de imunobiológicos
Foto: Peter Ilicciev (2006).

Fonte: Fiocruz Imagens.

Considerações finais
O objetivo deste capítulo foi introduzir reflexões relacionadas à saúde
do trabalhador, trazendo um pouco do seu contexto histórico-concei-
tual, partindo da medicina do trabalho, passando pela saúde ocupacio-
nal até chegar à saúde do trabalhador propriamente dita.

Retomamos o conceito ampliado de saúde e a questão dos determinan-


tes sociais da saúde, de forma a fundamentar o argumento de que a
saúde do trabalhador é algo muito mais amplo do que somente o fato
de ele estar atuando adequadamente e garantindo a produção esperada.
Há questões de saúde física e saúde mental envolvidas que implicam
um olhar mais abrangente e atento para esse trabalhador, e elas são
registradas em instrumentos legais como aqueles que apresentamos.

Conhecer esses instrumentos e desenvolver estratégias para promover


a saúde do trabalhador são ações fundamentais devidas não apenas ao
empregador, por ser seu dever legal, mas, também, ao trabalhador, que,
empoderado por esses conhecimentos, deve exigir adequação das suas
condições de trabalho aos parâmetros necessários para garantir sua saúde.

293
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADES E ATIVIDADES

Para empregadores e trabalhadores, o mapa de riscos traz uma grande


contribuição, pois proporciona um espaço de diálogo e troca de diferen-
tes visões para construção de um pacto comum de atenção às questões
de saúde e segurança de um local de trabalho.

Referências
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de Janeiro: [s.n.], 2002.

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Federal, 1988.

BRASIL. Lei n. 8.042, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na


gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos
financeiros na área da saúde e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 dez.
1990a.

BRASIL. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e
dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 set. 1990b.

BRASIL. Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência
Social e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 jul. 1991. Disponível em:
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BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 1.823, de 23 de agosto de 2012. Institui a Política Nacional
de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 ago. 2012.
Seção 1, p. 46.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Manual de rede de frio do Programa Nacional de Imunizações. 4. ed.
Brasília, DF, 2013.

BRASIL. Ministério da Previdência Social. Anuário estatístico da Previdência Social. Brasília, DF, jul.
2015a. Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/dados-abertos/aeat-2013/estatisticas-de-
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BRASIL. Ministério do Trabalho. Normas regulamentadoras. Brasília, DF, 2015b. Disponível


em: <http://trabalho.gov.br/index.php/seguranca-e-saude-no-trabalho/normatizacao/normas-
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BRASIL. Ministério do Trabalho e Previdência Social. Comunicação de acidente de trabalho, CAT.


Brasília, DF, [2016]. Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/servicos-ao-cidadao/todos-os-
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BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria n. 485, de 11 de novembro de 2005. Aprova a


Norma Regulamentadora n. 32 (Segurança e Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde).
Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 nov. 2005.

294
Saúde e segurança do trabalhador na rede de frio de imunobiológicos

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LACAZ, F. A. C. The workers’ health field: reclaiming knowledge and practices in the interface
between work and health. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 23, n. 4, p. 757-766,
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MATTOS, U. A. O.; FREITAS, N. B. B. Mapa de risco no Brasil: as limitações da aplicabilidade de um


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SILVA, M. N.; FLAUZINO, R. F.; GONDIM, G. M. M. (Org.). Rede de frio: fundamentos para a
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TEIXEIRA, S. M.; OLIVEIRA, J. A. Medicina de grupo: a medicina e a fábrica. In: GUIMARÃES, R. F. N.


(Org.). Saúde e medicina no Brasil: contribuição para um debate. 5. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1984.

295
13. Arquitetura, ambiência,
ergonomia e saúde nos locais
de trabalho
Irai Borges de Freitas, Katia Butter Leão de Freitas
e Sarita de Oliveira Ferreira Lopes

O conceito ampliado de saúde e as reflexões sobre saúde do trabalhador


reforçam nosso entendimento de que são necessárias contribuições de
diversas áreas para se promover a saúde no trabalho.

Mas quais são essas áreas? Qual a relação da arquitetura e da ambiência


com a ergonomia para a saúde dos trabalhadores da rede de frio de
imunobiológicos?

À luz de alguns conceitos utilizados pela arquitetura, como o de espaço


construído, ambiência, e dos preceitos da ergonomia, ciência que se
baseia em muitas disciplinas como a fisiologia, biomecânica, antropo-
metria, psicologia, dentre outras, vamos, juntos, ao longo deste capí-
tulo, buscar respostas para essas indagações.

Arquitetura e o desmembramento
didático do espaço construído
A arquitetura utiliza, com muita frequência, a expressão espaço cons-
truído, mas o que é isso? Para maior entendimento, apresentamos
alguns conceitos fundamentais, tais como espaço, lugar e não lugar.

Quando as quatro fachadas de um edifício constituem uma caixa, deno-


minamos de espaço (ZEVI, 1996 apud ALVES, 2007, p. 2). Esse conceito
se complementa quando o espaço se concentra na “distância entre dois
pontos, ou a área ou volume entre limites determinados” (FERREIRA,
1975, p. 562). O espaço só se torna lugar com a presença do ser humano,
e o tempo é um elemento que diferencia o espaço de lugar (ZEVI, 1996
apud ALVES, 2007).
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Como poderíamos exemplificar Então, todo espaço pode se tornar um lugar? Sim, e quanto mais tempo
o não lugar? São rodoviárias,
se habita um lugar, mais nos identificamos com ele (TUAN, 1983 apud
aeroportos, supermercados,
locais onde apenas estamos de ALVES, 2007). Já, o “não lugar” apresenta uma ideia contrária à do
passagem. lugar, ou seja, é quando não existe uma identidade, um relacionamento
ou uma história em um dado espaço (AUGÉ, 1994 apud ALVES, 2007).

Partindo do pressuposto de que os espaços devem ser organizados para


contemplar as necessidades daqueles que os utilizam, e de acordo com
as atividades que serão ali realizadas, entende-se que sua organização é
passível de projeção, construção e habitação para, assim, se tornar um
espaço construído.

E qual a finalidade do espaço construído? É proteger o ser humano


contra elementos naturais, como a chuva, o vento, o calor, o frio e
também de outros animais (AMOS RAPPORT apud CHING, 2006).

Diante dos conceitos apresentados, como você percebe a sua relação


com seu espaço de trabalho? Seria um espaço, lugar ou não lugar?
Nosso espaço de trabalho é, sem dúvida, um lugar, que pode ter nosso
porta-retratos sobre a mesa, um armário para guardar nossos pertences,
onde compartilhamos horas trabalhando em equipe. Portanto, há uma
identificação de mão dupla com o ambiente onde você trabalha, pois, ao
mesmo tempo em que você o identifica com seus pertences, o mesmo
ocorre em relação à sua equipe de trabalho, às cores etc.

Ao realizar o desmembramento do espaço construído, Freitas e Lopes


(2008) apresentam o seguinte ensaio: espaço edificado, espaço insta-
lado e espaço ocupado. Vale ressaltar que a presente abordagem não
Para saber mais sobre tem a pretensão de limitar o desmembramento do espaço construído
desmembramento do espaço
aos três momentos apresentados pelos referidos autores.
construído, leia “Constituição
da ambiência hospitalar a partir
da gestão de coletivos”, de
Silva, Freitas e Freitas (2009),
Espaço edificado
no livro Iniciação científica
na educação profissional em O espaço edificado se caracteriza pela atividade criadora, expressa
saúde: articulando trabalho, pelo processo de se projetar, considerando as etapas de trabalho que
ciência e cultura.
compreendem o programa, os estudos preliminares, o anteprojeto e o
projeto executivo (SILVA, 1983 apud CUNHA, 2006).

Atividade criadora é o momento em que a equipe multidisciplinar se


reúne para definir as tipologias, a setorização e a organização dos espaços
(leiaute), dentre outros, mediante as demandas previamente indicadas.

298
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Ao se pensar em criar um novo ambiente para atender às necessida-


des de trabalho na rede de frio de imunobiológicos, os especialistas
(arquitetos, engenheiros, ergonomistas, enfermeiros, gestores, auxilia-
res em geral, economistas e quantos mais estiverem disponíveis para
compor uma equipe multidisciplinar) devem se reunir e dialogar sobre
as características desse novo ambiente, tais como: fluxos de trabalho,
mobiliário, equipamentos, acessibilidade, local para armazenamento,
recebimento e distribuição. Enfim, tudo que diz respeito à atividade a
ser realizada naquele espaço edificado.

Portanto, é nesse momento que, de acordo com a demanda, escolhe-se


a tipologia (vertical e/ou horizontal), com algumas diferentes formas
arquitetônicas. Segundo o arquiteto Góes (2004), a tipologia vertical
se apresenta como torre simples, torre dupla, torre radial e bloco, lâmi-
nas verticais e monólito vertical; e a tipologia horizontal apresenta
pente e pavilhão, lâminas isoladas articuladas, pátio expandido, pátio
compacto e monólito horizontal.

Figura 1 – Tipologias mais usadas no projeto do edifício hospitalar

VERTICAIS
1 2 3 4 5

HORIZONTAIS
1 2 5

3 4

Tipologias verticais Tipologias horizontais


1. Torre simples 1. Pente e pavilhão
2. Torre dupla 2. Lâminas isoladas e articuladas
3. Torre radial e bloco 3. Pátio expandido
4. Lâminas verticais 4. Pátio compacto
5. Monólito vertical 5. Monólito horizontal
Fonte: Góes (2004, p. 46).

299
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Existem alguns critérios recomendados para o projeto de construção


das edificações. Podemos destacar alguns:
G custos: refere-se ao gasto econômico que representa a fabricação de
um produto ou a prestação de um serviço;
G localização: se a edificação será localizada em área apropriada para o
desenvolvimento do trabalho proposto;
G acessibilidade: se é de fácil acesso aos trabalhadores e usuários
em geral;
G tamanho do terreno: se o terreno possui área suficiente para
acomodar as instalações atuais e futuras;
G sustentabilidade: o projeto deve minimizar os impactos ambientais
e utilizar materiais ecologicamente corretos, com a finalidade de
preservar a qualidade de vida dos usuários e não comprometer a das
gerações futuras;
G conforto ambiental:
• lumínico – observar o curso aparente do Sol de forma a
aproveitar ao máximo a iluminação natural,
• térmico – explorar a ventilação natural predominante usando a
climatização artificial como complemento,
• acústico – não projetar as portas e janelas da edificação na
direção das fontes externas de ruído. Na impossibilidade, atenuar
com barreiras acústicas, que podem ser de madeira, vidro,
concreto, entre outros materiais.

Para refletir
O seu local de trabalho está em conformidade com os critérios
recomendados para espaços edificados? Se não, como amenizar os
efeitos adversos ao bem-estar dos profissionais?

Espaço instalado
O espaço instalado se caracteriza pela atividade técnica. Mas o que
compõe essa atividade?

A atividade técnica consiste em instalar fisicamente os sistemas elétrico,


hidráulico e mecânico, considerando-os funcionais, de forma a se
adequarem à atividade fim do espaço (AZEVEDO NETO, 2004).

300
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Foto 1 – Sala com alguns elementos A utilização dos componentes dos


humanizadores
sistemas funcionais possibilita que
o espaço físico seja favorecido pela
ambiência por meio dos diversos
elementos potencializadores da hu-
manização espacial, tais como luz,
cheiro, cor, paisagismo, arte, entre
outros.

Tendo em vista a humanização dos


espaços da rede de frio de imuno-
biológicos, onde não haja necessi-
dade de temperatura específica (por
exemplo, a câmara fria), devemos
Foto: Jop Quirindongo (2006).

buscar o conforto térmico através


de aparelhos infladores (pegando o
ar externo e colocando no ambiente
interno), climatizadores (condicio-
nando a temperatura do ambiente
Elementos humanizadores como luz, cheiro,
interno) e exaustores (retirando o
plantas, cores, entre outros, contribuem para ar do ambiente interno e jogando-o
criar um ambiente acolhedor e resolutivo.
Fonte: FreeImages.com.
para o ambiente externo). Esse pro-
cesso favorece a minimização e/ou a
eliminação de odores existentes nos ambientes e, também, uma tempe-
ratura confortável aos usuários do ambiente.

Espaço ocupado
O arquiteto Távora (2007) compreende que o espaço ocupado deverá ser
o resultado da inteligência artística do ser humano, que contempla uma
harmonia envolvida de sensibilidade, consciência e integração. Portanto,
entende-se que espaço ocupado caracteriza-se pela atividade humana.

Aqui consideramos a atividade humana toda ação realizada pelo e para o


ser humano, com o objetivo de capacitar, acolher e cuidar de quem cuida.
Visa três aspectos: a promoção da saúde, o atendimento ao usuário do
sistema de saúde e a saúde do trabalhador.

Quando falamos em promoção da saúde, não podemos esquecer dois


documentos importantes: a Carta de Ottawa (1986) e a Carta do Caribe
(1993). Ambas se referem à promoção da saúde, entendendo que o ser
humano deve e pode ter maior controle sobre sua saúde para melhorá-
-la. Com efeito, podemos afirmar que a promoção da saúde vai além

301
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

da assistência médica, e que o serviço de saúde deve ser um elemento


minimizador das patologias e dos agravos da saúde da população,
considerando que a saúde das pessoas deve ser um recurso para a sua
sobrevivência.

O atendimento ao usuário do sistema de saúde ocorre no espaço ocu-


pado, pois é nele que acontecem as interações entre os usuários e os pro-
fissionais da saúde. Essas interações são potencializadas pela ambiência,
que irá proporcionar tratamento ao espaço projetado, observando, com
maiores detalhes, as subjetividades de seus atores e as objetividades
das legislações, com foco na confortabilidade e na privacidade, criando
espaços identitários com aspectos relacionados às suas práticas diárias.

Por subjetividade, entendemos os desejos e as necessidades de cada


trabalhador, e por objetividade, as legislações vigentes. Portanto, o
equilíbrio entre subjetividades e objetividades é fundamental para que o
trabalhador se reconheça nesse espaço, sentindo-se acolhido, gerando um
espaço identitário sustentável, promovendo o atendimento humanizado,
acolhedor e resolutivo.

O olhar para a saúde do trabalhador considera o cuidar de quem cuida,


observando que o trabalhador participa ativamente dos problemas e
das soluções relativos aos processos de trabalho, buscando o consenso
coletivo. A questão do espaço construído também influi nesses proces-
sos de trabalho.

Mas, afinal, como a divisão didática do espaço construído pode con-


tribuir para a gestão na rede de frio de imunobiológicos?

Quando os trabalhadores conhecem as características dos espaços men-


cionados, estamos potencializando uma gestão participativa dos ser-
viços de saúde, pois eles poderão auxiliar no gerenciamento, atuando
Para saber mais sobre gestão de forma analítica, crítica e transformadora, nos possíveis problemas
participativa, indicamos: existentes no trabalho.
• Saúde paidéia, de Gastão
Wagner de Souza Campos. 3
ed. São Paulo: Hucitec, 2007.
Você sabia?
• Um método para análise
e co-gestão de coletivos, de A gestão participativa pode ser, também, denominada de cogestão,
Gastão Wagner de Souza que se utiliza do Método de Roda para as tomadas de decisão, pois
Campos. São Paulo: Hucitec,
valoriza a participação e a integração dos trabalhadores. O Método de
2000.
Roda se caracteriza como espaço democrático, que busca contemplar as
necessidades do coletivo de trabalhadores, por meio da escuta, do diálogo e
do consenso das ações propostas, para solucionar os problemas existentes.

302
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Veja um exemplo do uso da divisão didática do espaço construído na


compreensão e na solução de um problema.
G O problema: a sala de vacina de uma rede de frio de
imunobiológicos apresenta problemas para manter a temperatura do
meio ambiente externo ao freezer entre 19ºC e 21°C.
G O uso dos conceitos:
• ao se buscar as características do espaço edificado, o trabalhador
deverá conhecer o projeto que foi executado para avaliar sua
adequação, considerando o coeficiente de isolamento térmico
em relação ao dimensionamento da sala de vacina recomendado
pelas legislações pertinentes;
• no espaço instalado, o trabalhador poderá observar a existência
de sobrecarga nas máquinas e equipamentos de refrigeração
ocasionados pelo fato anterior;
• o espaço ocupado é onde iremos perceber as consequências, ou
seja, a ocorrência de constantes oscilações da temperatura no
interior da sala de vacina, que poderá comprometer a qualidade
das vacinas armazenadas, trazendo, com isso, um possível
estresse aos trabalhadores, pois vivenciarão situações de tensão.
Toda essa conjuntura poderá refletir na saúde desses profissionais
nos âmbitos físico, cognitivo e organizacional.

Ambiência
A ambiência é fundamental no espaço instalado da edificação e faz
parte da Política Nacional de Humanização do Ministério da Saúde.

A ambiência na saúde refere-se Os elementos da ambiência são


considerados fundamentais no
[...] ao tratamento dado ao espaço físico entendido como es- processo de criação de espaços
paço social, profissional e de relações interpessoais que deve identitários.
proporcionar atenção acolhedora, resolutiva e humana. [...]
Vai-se além da composição técnica, simples e formal dos am-
bientes, passando a considerar as situações que são construídas
(BRASIL, 2010, p. 5).

Importante
A ambiência deve ter origem na fase do planejamento do edifício de
saúde, ou seja, no espaço edificado.
Já a efetivação da ambiência ocorre no espaço instalado, com a utilização
dos elementos humanizadores apresentados pela cartilha Ambiência, do

303
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Ministério da Saúde (BRASIL, 2010). É no espaço ocupado que ocorrerá o


desfrute da ambiência, entendendo que os seus benefícios influenciarão
diretamente na promoção da saúde, no atendimento ao usuário do SUS e
na saúde do trabalhador.

Para compreender o que representa a ambiência na rede de frio de


imunobiológicos, é necessário conhecer os elementos humanizadores
do espaço construído, apresentados na cartilha Ambiência (BRASIL,
O material sobre ambiência, 2010). São eles: 1. Morfologia, 2. Luz, 3. Cheiro, 4. Som, 5. Sinestesia,
produzido pelo Ministério
6. Arte, 7. Cor, 8. Tratamento das áreas externas, 9. Privacidade e indi-
da Saúde, encontra-se
disponível em http://bvsms. vidualidade, 10. Confortabilidade.
saude.gov.br/bvs/publicacoes/
ambiencia_2ed.pdf
Morfologia
Como você descreve as dimensões, as formas e os volumes existen-
tes no seu espaço de trabalho? E as características desse espaço? Ele é
público ou privado? Quantas pessoas o utilizam? Quais equipamentos
são necessários e em que período do dia são utilizados?

Esses pontos deverão ser considerados para que os espaços sejam acolhe-
dores, funcionais e propícios aos processos de produzir saúde. A estética
também deverá ser considerada, favorecendo um ambiente agradável.

Para saber mais sobre o


conceito de morfologia,

Foto: Peter Ilicciev (2004).


indicamos o Dicionário visual
de arquitetura, de Francis D. K.
Ching. Tradução Julio Fischer.
4. tir. São Paulo: Martins
Fontes, 2006.

Morfologia no ambiente de trabalho. Formas, dimensões e volumes de um espaço podem


contribuir ou não para o ambiente ser percebido pelas pessoas como agradável.

Luz
Você percebe alguma influência da luz no processo saúde-doença?

Sabe-se que o seu uso adequado poderá favorecer a realização das ati-
vidades e o conforto dos usuários e que, quando utilizada inadequa-
damente, poderá contribuir para a fadiga e acuidade visual e afetar o
desempenho no trabalho, além de trazer outros desconfortos.

304
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

É fácil perceber que, cada vez mais, as edificações se utilizam de ilu-


minação artificial. Existem vários tipos de sistema tecnológico de ilumi-
nação como: geral ou de fundo, localizada ou de tarefa, combinada,
emergência, segurança e decorativa. Vejamos o que são:
G A iluminação geral ou de fundo pretende garantir um iluminamento
homogêneo no espaço. É aquela que, geralmente, se localiza no
teto das áreas, mas, dependendo do projeto, pode ser instalada
lateralmente nas paredes, desde que garanta um iluminamento bem
distribuído e sem sombras.
G A localizada ou de tarefa direciona o iluminamento para o campo do
posto de trabalho. Por exemplo, a utilização de luminária pendente
próximo ao local em que o trabalhador realiza as tarefas.
G A iluminação combinada é solicitada quando surge a necessidade de
complementação da iluminação geral com focos de luz localizada.
Uma mesa de trabalho iluminada com uma luminária e também
com a iluminação geral existente no ambiente é um exemplo.
G A de emergência deverá ser acionada em processo manual ou
automático, no caso de falta de fornecimento de energia, sempre
que ocorrer a necessidade de resoluções rápidas e de evacuação.
G A de segurança diz respeito à sinalização das saídas de emergência,
de extintores de incêndio e de outra qualquer voltada para a
segurança do prédio.
G No caso da iluminação decorativa, o objetivo é explorar as sombras
de um objeto, como um quadro de arte, por exemplo.

As fotos a seguir demonstram alguns sistemas de iluminação típicos


em áreas de trabalho. A iluminação no local de trabalho deve ser bem Foto 4 - Sistema de iluminação
localizada
planejada, considerando o plano de trabalho em que será realizada a
tarefa. Ressaltamos que a luz natural deverá ser valorizada nas edifica-
ILUMINAÇÃO
ções, face aos benefícios ao ser humano, aos custos, além de prover a LOCALIZADA
sustentabilidade.

Foto 2 – Sistema de iluminação geral Foto 3 – Sistema de iluminação combinada

ILUMINAÇÃO
GERAL ILUMINAÇÃO
COMBINADA

305
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Cheiro
Não conseguimos visualizar o cheiro, porém o sentimos, e ele exerce
Sheds são telhados ou parte influência sobre o estado de bem-estar dos usuários de um espaço.
desses em forma de “dentes de Quais são as fontes de odores nos ambientes de saúde?
serra”, com um dos planos em
vidro para favorecer a captação
da iluminação natural. Podem ser Os odores existentes nos ambientes são provenientes de diversas fon-
utilizados em fábricas, galpões e tes como: banheiros, substâncias químicas, cozinhas, entre outros. Por
hospitais.
isso, a renovação de ar deverá ser constante, e a preocupação com a
Brises-soleil é um dispositivo
arquitetônico, localizado na
qualidade do ar interior merece atenção.
fachada da edificação, para
impedir a incidência de radiação O projeto de uma edificação deverá considerar a forma arquitetônica
solar para o seu interior, porém
permitindo a entrada da ventilação
adequada para o aproveitamento dos ventos predominantes, que pode-
natural. rão influenciar diretamente na sua ventilação interior e exterior. Tam-
Cobogós são blocos decorativos bém contribuirão para a renovação do ar ambiental interno a utilização
vazados, feitos geralmente de de recursos como exaustores, sheds, chaminés, janelas, brises-soleil,
concreto ou de cerâmica, que
favorecem o aproveitamento da
cobogós, entre outros. Os ambientes ventilados são fundamentais para
iluminação e a ventilação natural. o conforto, a satisfação, a saúde e o desempenho dos trabalhadores.

Figura 2 – Traçado urbano em Marrakesh aproveitando os ventos predominantes

Para saber mais sobre


ventilação interior e exterior da
edificação, leia:
Eficiência energética na
arquitetura, de Roberto
Lamberts, Luciano Dutra,
Fernando Oscar Ruttkay
Pereira. São Paulo: PW, 1997.
Ventilação natural das
habitações, de Eustáquio
Toledo. Coord. da publicação
brasileira por Alexandre Toledo.
Maceió: Edufal, 1999.

Fonte: Adaptado de Lamberts, Dutra e Pereira (1997, p. 52).

306
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Som
Existe diferença entre som e ruído?

O som é o resultado audível de uma vibração, e o ruído é uma vibração


indesejável; ambos são subjetivos e, portanto, devem ser considerados Para saber mais sobre os níveis
nos espaços. O conhecimento das fontes de ruído é necessário ao se de ruído no ambiente de
trabalho, consulte:
buscar soluções para minimizá-lo ou, se possível, eliminá-lo, objeti-
• Norma Regulamentadora-
vando garantir a confortabilidade dos usuários do espaço. NR 15, do Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE),
disponível em: http://trabalho.
A música é uma alternativa para harmonização do ambiente; ela não deve gov.br/index.php/seguranca-
ser usada para atenuar um ruído, pois os dois se somarão, ocasionando e-saude-no-trabalho/
um ruído de maior intensidade. normatizacao/normas-
regulamentadoras
• Sistemas de controle das
Sinestesia condições ambientais de
conforto, de Tadeu Almeida
Percebemos os diferentes espaços existentes nas edificações usando de Oliveira e Otto Toledo
nossos sentidos: visão, olfato, tato, audição e sentido térmico; portanto, Ribas. Brasília, DF: Ministério
da Saúde, 1995.
destaca-se aqui a subjetividade sensorial do reconhecimento do espaço,
• Ergonomia: projeto e
através do contato com as superfícies e texturas existentes.
produção, de Itiro Iida.2. ed.
rev. e ampl. São Paulo: Edgard
Blücher, 2005.
Foto: Clesio Da Gama (2005)
Foto: Charis Tsevis (2004).

Foto: Kimberly V. (2005).

Se quiser conhecer mais sobre


diferentes espaços, superfícies
e textura, consulte a obra
de Jun Okamoto intitulada
Percepção ambiental e
comportamento: visão holística
da percepção ambiental na
Diferentes texturas. Diferentes espaços podem ser identificados pelos tipos de superfícies e texturas arquitetura e na construção.
que apresentam. São Paulo: Mackenzie, 2002.

Arte Para saber mais sobre arte e


espaços de saúde, leia Apostila
É um aspecto fundamental na inte- do Programa de Educação
de Jovens e Adultos: ensino
ração entre os espaços e os su- médio, de Márcia Cristina
Foto: Tomasz Kobosz (2015).

jeitos, pois transmite sensações e Mendes Lopes. Rio de Janeiro:


expressa a cultura local. Por isso, Fiocruz, 2002. Disciplina
de Educação Artística.
a participação dos sujeitos no pro- Laboratório de Manutenção
cesso de decoração do ambiente em Equipamentos Médico-
Hospitalares-Fiocruz.
se faz importante. O prazer do
ser humano pode ser represen-
A arte inserida no ambiente. O uso da arte como
tado por meio da arte, pois essa potencializadora nas percepções e sensações
humanas. O uso de cores e pequenos quadros na
exterioriza as emoções das expe- parede buscam despertar sensações mais leves para
riências de vida de uma pessoa. este quarto de um hospital pediátrico.

307
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Cor
A arquitetura, ao se preocuparem fazer uma edificação, se propõe, tam-
bém, a humanizá-la, trazendo os elementos da natureza (iluminação,
ventilação, cor etc.) para compor o ambiente. A ambiência, ao se pre-
ocupar em compor espaços agradáveis, recomenda a combinação de
cores harmoniosas. Seu uso deve também ser planejado, pois a prática
de uma só cor em todo o ambiente pode transmitir monotonia e/ou
melancolia. Já a utilização inadequada de diversas cores pode criar uma
atmosfera confusa no ambiente.

De acordo com a cartilha Ambiência (BRASIL, 2010, p. 9), “as cores


estimulam nossos sentidos e podem nos encorajar ao relaxamento, ao
trabalho, ao divertimento ou ao movimento”, além de proporcionarem
Para saber mais sobre cores no beleza ao ambiente.
ambiente, leia A influência da
luz e da cor em salas de espera Figura 3 – Percepção do espaço cromático
e corredores hospitalares, de
Marilice Costa Costi. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2002. Cores de tonalidades claras, como o branco,
dão a sensação de amplitude, de que o
ambiente é maior.

Já o uso de cores escuras tem o efeito


inverso: os ambientes ficam parecendo
menores do que são.

Usar cores claras no teto de um ambiente


dá a sensação de maior amplitude vertical.
Ilustração: Freitas; Freitas (2011).

Já um teto pintado com cores escuras reduz


a sensação de amplitude vertical

Tratamento das áreas externas


O tratamento das áreas externas (paisagismo vegetal, bancos, vasos com
plantas, pergolados etc.) não é apenas a construção de um jardim, mas
sim o uso estratégico de vegetação e ornamentações de forma a criar
sombras para a edificação, temperaturas e ambientes mais acolhedores.

308
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

As áreas externas têm grande im-


portância para a humanização dos
ambientes de saúde, pois podem
ser utilizadas como lugar de espe- Para saber mais sobre
ra ou de descanso dos usuários. tratamento de áreas externas,
Foto: Rin Chan ([20--]).

leia Princípios bioclimáticos


Localizam-se na entrada, na saída para o desenho urbano, de
e ao redor das edificações e podem Marta Adriana Bustos Romero.
promover uma área de convívio. São Paulo: ProEditores, 2000.

Área externa acolhedora para os usuários.


Para ampliar o conhecimento
Local com sombra e assentos para convívio e
interação.
sobre privacidade e
individualidade, leia Entre
a razão e o senso comum:
Privacidade e individualidade uma análise morfológica da
configuração do espaço na
Já parou para refletir sobre a importância da sua privacidade e indivi- arquitetura moderna, de
Sérgio Sudsilowsky. Salvador,
dualidade no trabalho? 2002. Trabalho apresentado
na sessão de Comunicações:
A privacidade abrange a intimidade do usuário, por meio da utilização Temas Livres do XXV Congresso
Brasileiro de Ciências da
de objetos que permitam a interação entre ele e o ambiente, como, Comunicação, Salvador, 2002,
por exemplo, armários para a guarda de seus pertences e divisórias de INTERCOM-Sociedade Brasileira
espaços. A individualidade compreende que cada usuário é singular, de Estudos Interdisciplinares da
Comunicação. Disponível em
oriundo de culturas diferentes. A arquitetura se propõe a criar espaços http://goo.gl/bzEUTo.
que respeitem essas diferenças.
Para saber mais sobre
confortabilidade, leia:
FREITAS, I. B.; FREITAS, K.
B. L. Fatores ergonômicos
ambientais. In: BITENCOURT,
F. (Org.). Ergonomia e
conforto humano: uma visão
Foto: Juicyrai (2007).
Foto: Vicky Johnson.

da arquitetura, engenharia e
design de interiores. Rio de
Janeiro: Rio Book’s, 2011. v. 1,
p. 65-104.

Exemplos de privacidade e individualidade. A disponibilização de armários para


os trabalhadores guardarem seus pertences e de cortinas para os atendimentos na
unidade de saúde são estratégias para resguardar, minimamente, a privacidade das
pessoas.
Fonte: FreeImages.com. | Fonte: Flickr.

Confortabilidade
Sob o ponto de vista da ambiência, é a inclusão da acessibilidade aos
usuários por meio de rampas, corrimãos, piso podotátil, entre outros.
Mas não se limita a esse entendimento. Considerando a sala de vacina,
é importante que o usuário se sinta inserido e acolhido pelo conjunto
de características do ambiente, para que ele possa se identificar cultu-
ralmente, sem perder suas referências.

309
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Foto: Nic Price (2010).


Exemplo de piso podotátil. Este tipo de piso auxilia na
orientação do caminhar de um deficiente visual.
Fonte: Flickr.

Para refletir
Vamos a um desafio? Pense no seu local de trabalho e reflita sobre os
elementos humanizadores lá presentes. Como você avalia a presença
destes na sua relação com o local de trabalho?

Ergonomia
Entendemos que a arquitetura deve buscar, na ambiência, as subjetivi-
dades dos usuários e, também, seguir a legislação vigente (normas, leis,
decretos etc.). Agora vamos compreender o que é e o que a ergonomia
tem em comum com a arquitetura e a ambiência.

A palavra ergonomia deriva dos radicais gregos ergon ou ergos, que sig-
nifica trabalho, e nomos, que significa normas, regras, leis naturais. É
uma ciência e tem a atividade de trabalho como ponto central de com-
preensão e de transformação.

A ergonomia tem um campo de aplicação muito amplo, porque abarca


conhecimentos de diversas áreas, tais como fisiologia, biomecânica,
antropometria, psicologia, arquitetura etc. De uma forma ou de outra,
Para saber mais sobre
está presente em todos os locais de trabalho e tem como objetivo prin-
ergonomia, leia “Ergonomia”, cipal adaptar o trabalho ao trabalhador. Portanto, é fundamental a sua
de Freitas; Freitas e Lopes, no existência nos diversos espaços construídos, em consonância com a
livro Biossegurança geral: para
cursos técnicos da área de ambiência e com a arquitetura, pois, como já mencionado, ambas têm
saúde. Rio de Janeiro: Publit, influência no bem-estar e na produtividade do trabalhador.
2009.
Quando a ergonomia deu os seus primeiros passos? staque de pergun

Considera-se que os ensinamentos da ergonomia estão presentes desde


a Pré-História, quando o primeiro homem escolheu uma pedra mais

310
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

adequada às mãos e aos movimentos para usá-la como uma arma, na


caça e na pesca; para sobreviver, usou seus saberes práticos a fim de
facilitar suas tarefas, criando ferramentas que contemplassem suas
necessidades. Portanto, esses atos podem ser entendidos como ações
simples do tipo ergonômico.

Pode-se afirmar que a ergonomia nasceu, “oficialmente”, em 12 de


julho de 1949, na Inglaterra, em uma reunião entre pesquisadores e
cientistas que buscavam formalizar esse novo olhar interdisciplinar da
ciência (IIDA, 2005).

Incidente é qualquer situação que


É interessante saber que... surge inesperadamente no local de
trabalho, com potencial de causar
A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) é marcada pela ergonomia, sobretudo lesão, dano ou prejuízo. Difere do
no campo da aviação, pois era necessário criar novos modos de informação por acidente, que resulta em alguém
meio de formas, cores e materiais diferentes, que possibilitassem aos pilotos ferido ou na promoção de danos
à propriedade. Por exemplo, se
manejar melhor e mais facilmente as aeronaves, além de poderem se organizar, alguém deixa vazar água no piso
evitar erros e minimizar acidentes e incidentes. de um estabelecimento mas não
prejudica ninguém e nem causa
O interesse por esse conhecimento se destacou, principalmente, na danos às instalações, isso pode ser
Inglaterra e nos Estados Unidos. Em 1949, na Inglaterra, o engenheiro e caracterizado como um incidente.
psicólogo Murrel (1908-1984) criou a primeira Associação Científica de Se alguém escorregar na poça de
água, cair e sofrer um prejuízo
Ergonomia (Ergonomics Research Society), com característica multidisciplinar. (fratura, lesão etc.), dizemos que
houve um acidente.
Tal conhecimento se espalhou pelo mundo. Nos Estados Unidos, em 1957,
foi criada a Human Factors Society, e, então, outros países, principalmente Os conceitos de acidente e
os industrializados, propagaram a ergonomia. Já em 1963, na França, foi incidente são discutidos no
criada a Société d’Ergonomie de Langue Française (Self) (LAVILLE apud capítulo seguinte deste livro,
que trata da biossegurança e da
FALZON, 2007). Em 1961, foi fundada, em Estocolmo, a Internacional prevenção de incêndios.
Ergonomics Association (Associação Internacional de Ergonomia).

No Brasil, a ergonomia se destaca a partir da década de 1970, com a influ-


ência da ergonomia da atividade, desenvolvida nos países de língua fran-
cesa e difundida pelo professor e ergonomista Alain Wisner (1923-2004).
Sua prática tem como característica uma aproximação muito íntima com
o campo de trabalho para se compreender a atividade e transformá-la.
Busca identificar as lacunas existentes entre o trabalho real (a atividade
realizada) e o trabalho prescrito (a tarefa), considerando, também, os
diversos fatores presentes nos ambientes de trabalho, como iluminação,
ventilação, acústica, organização espacial (leiaute), estresse, entre outros.

311
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Exemplo de distinção entre trabalho real e trabalho prescrito


na rede de frio de imunobiológicos
Pensemos sobre a tarefa de monitorar a temperatura dos equipamentos de
refrigeração existentes na sala de vacinação.
A prescrição determina que a leitura deve ser realizada diariamente,
no início da jornada de trabalho da manhã, da tarde e no fim do dia,
registrando-se as temperaturas em formulário próprio. Caso não exista
formulário fornecido por gráfica, mas somente na versão digital, o
trabalho real pode obrigar o trabalhador a ligar o computador, imprimir
o formulário e, se não houver tinta suficiente no cartucho de impressão,
esse mesmo trabalhador deve pedir a alguém o produto para que possa
trocá-lo e, por fim, imprimir o formulário a ser utilizado nas leituras das
temperaturas. Todas essas ações demandam tempo e somam na carga de
trabalho diária do profissional.
Nesse exemplo, é possível identificar as diferenças existentes entre
trabalho real e trabalho prescrito. Por mais que se busque padronizar os
procedimentos, ainda existirão diferenças no modo operacional de se
realizar o trabalho, pois ele sempre exigirá uma forma diferente de ser
efetuado.

Outro ponto importante a ressaltar é que a ergonomia se apresenta em


consonância com a perspectiva da saúde do trabalhador e se afasta de
uma visão restrita, simplista e seguidora de normas prescritas.

Não existe uma única definição para ergonomia. De forma mais deta-
lhada, a Associação Brasileira de Ergonomia (Abergo), em 1998, a defi-
niu como:
[...] a disciplina científica que trata da compreensão das in-
terações entre os seres humanos e outros elementos de um
sistema, e a profissão que aplica teorias, princípios, dados e
métodos, a projetos que visam otimizar o bem-estar humano
e a performance global dos sistemas. A Ergonomia visa ade-
quar sistemas de trabalho às características das pessoas que
nele operam. Nos projetos de sistemas de produção a Ergono-
mia faz convergir os aspectos de Segurança, Desempenho e de
Qualidade de Vida, através de sua metodologia específica, a
Análise Ergonômica do Trabalho (ABERGO, 1988 apud RIO;
PIRES, 2001, p. 31).

312
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Para a Associação Internacional de Ergonomia (International Ergonomics


Association-IEA),
Ergonomia (ou Fatores Humanos) é a disciplina científica
que estuda as interações entre os seres humanos e outros ele-
mentos do sistema, e a profissão que aplica teorias, princípios,
dados e métodos, a projetos que visem otimizar o bem-estar
humano e o desempenho global de sistemas (IEA, 2000 apud
IIDA, 2005, p. 2, grifos do autor).

Você sabia?
A identificação dos fatores de risco ergonômico bem como dos possíveis
danos à saúde relacionados ao processo de trabalho e à organização
do trabalho é fundamental para que se possam elaborar programas de
segurança e medidas de prevenção, além de contribuir para a redução dos
acidentes de trabalho e das doenças ocupacionais.

O desenvolvimento da ergonomia envolve, de maneira determinante,


os setores/áreas de recursos humanos, segurança do trabalho e medi-
cina do trabalho, incluindo, fundamentalmente, a direção da institui-
ção, caracterizando-se, assim, como um processo interdisciplinar. A
participação do diretor se destaca: é ela que determina a organização
do trabalho ao definir os organogramas, fluxogramas de processos,
tarefas, horários, turnos, arranjo físico, tecnologia, automação, metas
produtivas, capacidade de produção, índice de produtividade, modelo
de gestão, entre outros.

Já o envolvimento do setor de recursos humanos se destaca pela deter-


minação da política de pessoal na contratação dos funcionários: os
níveis de escolaridade e capacitação, tipos de contrato, categorias pro-
fissionais, níveis hierárquicos, qualificações, política de remuneração,
entre outros. Portanto, define o perfil dos trabalhadores.

A aplicação da Norma Regulamentadora do Trabalho 17 (NR 17-Ergo-


nomia) está diretamente relacionada à segurança no trabalho e à medi-
cina ocupacional, por meio do Serviço Especializado em Engenharia de
Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT). O serviço tem como
principal finalidade a promoção da saúde e a proteção da integridade do
trabalhador, no local em que trabalha, aplicando as legislações pertinen-
tes ao trabalho; esclarecendo os empregados acerca dos riscos existen-
tes no ambiente de trabalho; promovendo ações para neutralizá-los ou
eliminá-los; prevenindo acidentes de trabalho e doenças ocupacionais.

Os trabalhadores da rede frio de imunobiológicos estão expostos a


riscos ergonômicos ao realizar suas atividades?

313
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 1999), dentre as possíveis


doenças ocupacionais relacionadas com os riscos ergonômicos exis-
tentes no trabalho da rede de frio de imunobiológicos, podemos citar:
artroses, dorsalgias, cervicalgias, sinovites, tenossinovites, bursites.

Atualmente, percebemos que existe uma ocorrência crescente de proble-


mas ergonômicos relacionados a projetos de máquinas, equipamentos,
ferramentas, mobiliário e de postos de trabalho. Tal fato ainda é agra-
vado pelas inadequações relacionadas à organização do trabalho; por-
tanto, se faz necessária a adaptação ergonômica dos postos de trabalho.

São exemplos de riscos ergonômicos:


G esforço físico intenso,
G levantamento e transporte manual de carga,
G imposição de ritmos excessivos,
G controle rígido de produtividade,
G trabalho em turnos,
G trabalho noturno,
G jornadas prolongadas de trabalho,
G monotonia,
G repetitividade,
G outras situações causadoras de estresse físico e/ou psíquico.

Quando for solicitada a solução de um problema complexo relacionado


à ergonomia nos locais de trabalho, a Análise Ergonômica do Trabalho
(AET), metodologia obrigatória contemplada na NR 17, deverá ser rea-
lizada por um profissional específico, denominado ergonomista.

A AET pode contribuir na  análise das causas de um acidente e das


doenças ocupacionais, sempre que isso contemplar o estudo dos aspec-
tos físicos, ambientais, organizacionais e cognitivos correspondentes ao
trabalho. De uma maneira geral, a AET possibilita:
G Contemplar informações que auxiliam na construção do perfil de
saúde dos trabalhadores: o perfil de saúde demonstra o somatório
das informações relacionadas aos riscos ergonômicos da atividade de
trabalho e dos hábitos referentes ao estilo de vida dos trabalhadores.
Possibilita a elaboração de programas de saúde, voltados à qualidade
de vida no trabalho, reduzindo o absenteísmo, melhorando a
produtividade, prevenindo riscos e doenças ocupacionais, orientando
sobre hábitos saudáveis e aconselhando mudanças comportamentais.

314
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Para refletir
Você já participou de algum programa realizado no seu local de
trabalho que buscasse levantar o perfil de saúde dos trabalhadores?
Se afirmativo, teve conhecimento dos resultados?

G Elaborar o Programa de Controle Médico da Saúde Ocupacional O PCMSO é analisado com mais
(PCMSO-NR7) e o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais detalhes no próximo capítulo,
relativo à biossegurança.
(PPRA-NR9): o PCMSO é um instrumental clínico e epidemiológico
que busca rastrear, prevenir e diagnosticar precocemente possíveis
agravos à saúde dos trabalhadores, relacionados ao trabalho.
O PPRA busca o controle da ocorrência de riscos ambientais (riscos
físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes) existentes
no local de trabalho, considerando a proteção do meio ambiente e
dos recursos naturais. Ambos objetivam a proteção, a promoção e a
preservação da saúde dos trabalhadores.

Para refletir
O PCMSO estabelece exames periódicos a serem realizados pelos
trabalhadores, conforme os riscos existentes nas atividades de trabalho,
para conhecer e tratar os possíveis danos à saúde.
Você já realizou exames periódicos neste ano? Já teve a oportunidade
de saber se existe PPRA no local em que trabalha? Se não, procure
informações sobre o programa nos setores de recursos humanos ou de
segurança do trabalho.

O acidente de trabalho não é um


G Fornecer subsídios para a diminuição da alíquota do Seguro evento desejável para o profissional
de Acidente do Trabalho (SAT): a AET, ao identificar os riscos nem para a empresa. Além de
interferir na saúde do trabalhador e
ergonômicos e propor as recomendações a serem cumpridas, estará na produção da organização, gera
contribuindo para a redução de acidentes e doenças ocupacionais e, custos ao empregador e/ou ao Estado.
consequentemente, reduzirá o valor da alíquota do SAT.
G Fornecer subsídios para a elaboração de contraprova pela empresa
referente ao Nexo Técnico Epidemiológico junto à Previdência
Para saber mais sobre o Nexo
Social: a AET pode responder a uma contestação de um benefício Técnico Epidemiológico junto à
acidentário junto ao INSS, ao demonstrar a relação entre o agravo Previdência Social, acesse:
apresentado pelo trabalhador e a atividade de trabalho. Faz isso http://www.previdencia.gov.
br/a-previdencia/saude-e-
por meio de estudo ergonômico realizado no posto de trabalho, seguranca-do-trabalhador/
vinculando ou não a existência de patologias possíveis à atividade politicas-de-prevencao/
nexo-tecnico-epidemiologico-
laboral. A AET é, portanto, fundamental para esclarecer essas previdenciario-ntep/
questões junto à Previdência Social.

315
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Domínios da ergonomia
Até agora mencionamos três domínios da ergonomia: física, cognitiva
e organizacional, mas o que significam e como podemos relacioná-
-los com o trabalho da rede de frio de imunobiológicos? A seguir, cada
domínio traz a sua definição para um melhor entendimento.

1. Ergonomia física
Tem o foco voltado às características humanas anatômicas, antropo-
métricas, fisiológicas e biomecânicas e como elas se relacionam com as
exigências de ordem física, que incluem:
G posturas,
G manuseios de materiais,
G movimentos repetitivos,
G distúrbios musculoesqueléticos relacionados ao trabalho,
G desenho da disposição do mobiliário,
G máquinas e equipamentos necessários à atividade de trabalho
(leiaute),
G vibração.

Ergonomia física na rede de frio de imunobiológicos


• Ao chegarem à Cenadi, as vacinas são armazenadas em câmara fria
com temperaturas específicas para, depois, serem distribuídas aos locais
de destino. Para que essas ações ocorram, é necessário que o trabalhador
realize a atividade de levantamento, transporte e descarga de materiais.
De acordo com o espaço disponível, essas atividades poderão ser
facilitadas com a utilização de aparelhos mecânicos e/ou eletromecânicos
(paleteira, vagões, empilhadeiras, entre outros), minimizando, assim, o
esforço físico realizado pelos trabalhadores.
• Em algumas salas de vacinação, a ausência de maca ocasiona a adoção
de posturas forçadas, como flexão de tronco, para que se possa vacinar a
criança no colo da mãe, sentada na cadeira.

316
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho
Foto: Unicef Ethiopia (2014).

Atividade de vacinação em uma comunidade. Destaca-se a ergonomia física no que se refere ao


deslocamento de grandes distâncias; transporte e carregamento individual das caixas térmicas
contendo as vacinas, além de posturas desfavoráveis, como flexionar o tronco e/ou agachar para
possibilitar a aplicação da vacina.
Fonte: Flickr.

A figura, a seguir, demonstra as melhores posturas a serem adotadas no


carregamento de peso.

Figura 4 – Postura adequada para carregamento de peso

Os quadros a seguir compilam algumas informações com base nos


preceitos da ergonomia física, em algumas atividades (trabalho real)
realizadas na Cenadi. Essas informações podem auxiliar os gestores

317
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

a determinar o controle dos riscos ergonômicos e também promover


ações em prol da segurança e da saúde dos trabalhadores.

Quadro 1 – Ergonomia física na rede de frio de imunobiológicos

Setor Distribuição
Descrição da atividade Acondicionamento das caixas térmicas no local demarcado
Foto da atividade Riscos ergonômicos identificados Possíveis consequências

Elevação de membros superiores acima de 90º Dores nos membros e braços

Elevação de membros inferiores acima de 90º Dores na coluna vertebral, cintura pélvica

Manutenção de postura em pé Dores nos pés e nas pernas

Recomendações

As caixas térmicas empilhadas deverão estar em uma altura tal de forma que os membros
superiores do trabalhador não ultrapassem um ângulo de 90º.

É importante que a gestão busque capacitar os trabalhadores em técnicas de levantamento, transporte e manuseio de materiais,
equipamentos e exercícios de reforço corporal preventivo.

Flexão da coluna vertebral e rotação do corpo Dores na coluna vertebral

318
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Quadro 1 – Ergonomia física na rede de frio de imunobiológicos (cont.)

Setor Distribuição
Descrição da atividade Acondicionamento das caixas térmicas no local demarcado
Foto da atividade Riscos ergonômicos identificados Possíveis consequências

Transporte de carga com desnível de piso Dores na coluna vertebral

Esforço físico Dores na coluna vertebral

Recomendações
É importante que a gestão busque capacitar os trabalhadores em técnicas de levantamento, transporte e manuseio de materiais,
equipamentos e exercícios de reforço corporal preventivo.

Dores na coluna vertebral, ombros, braços,


Esforço físico
antebraços e punhos

Recomendações
É importante que a gestão busque capacitar os trabalhadores em técnicas de levantamento, transporte e manuseio de materiais,
equipamentos e exercícios de reforço corporal preventivo.

2. Ergonomia cognitiva
Refere-se à demanda por processos mentais, tais como: percepção,
memória, raciocínio e resposta motora. Abrange a carga de trabalho
mental, tomada de decisão, interação homem-máquina, estresse, vigi-
lância e desempenho de habilidades e capacitação.

Ergonomia cognitiva na rede de frio de imunobiológicos


• Para serem distribuídas, muitas vezes as vacinas são transportadas
por via aérea. O cancelamento e/ou o atraso dos voos provocam uma
preocupação (estresse) referente a diversos aspectos: a manutenção da

319
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

temperatura para atender às condições técnicas de qualidade, a extensão


do horário diário de trabalho, a reorganização do espaço fisco para
armazenagem, entre outros.
• Quando na sala de vacinação há um número insuficiente de
trabalhadores para vacinar um grande número de pessoas, isso gera
estresse, pois ocasiona cansaço e preocupação em realizar um bom
atendimento e com menor tempo de espera.

A seguir, um exemplo referente à ergonomia cognitiva do trabalho efe-


tuado na Cenadi. Observa-se que a atividade de empilhamento de pale-
tes solicita do trabalhador uma carga mental que exige conhecimento,
precisão e destreza.

Quadro 2 – Ergonomia cognitiva na rede de frio

Setor Câmara fria


Descrição da atividade Empilhar os paletes com caixas de imunobiológicos
Foto da atividade Riscos ergonômicos identificados Possíveis consequências

Exigência de atenção e habilidade Estresse

Recomendações

Manter espaços laterais suficientes entre os paletes para a movimentação segura da empilhadeira.

3. Ergonomia organizacional
Está relacionada com a otimização do sistema sociotécnico, incluindo
suas estruturas organizacionais, políticas e de processos. Tópicos perti-
nentes incluem (IIDA, 2005, p. 3):
G comunicações,
G projeto de trabalho,

320
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

G programação do trabalho em grupo,


G projeto participativo,
G trabalho cooperativo,
G cultura organizacional,
G organizações em rede,
G teletrabalho,
G gestão da qualidade.

Ergonomia organizacional na rede de frio de imunobiológicos


• Antes de usar a paleteira, o trabalhador deverá ter recebido capacitação
adequada às características tecnológicas do equipamento. Uma rota
deverá ser previamente determinada para garantir a segurança do
trabalhador e do ambiente.
• A caderneta de vacinação é uma forma de o indivíduo controlar e
informar as vacinas já realizadas e aquelas a realizar. Quando o indivíduo
vai ao posto de saúde querendo se vacinar e não apresenta o cartão
de vacinação, recebe todas as vacinas referentes à sua idade, conforme
orientação do Programa Nacional de Imunizações, do Ministério da Saúde.
A ausência de um sistema único informatizado com todos os dados dos
indivíduos dificulta o acesso às informações e pode aumentar o custo/
desperdício de doses repetidas de vacinas.

Em todo planejamento é funda-


mental que ocorra a interação entre
os trabalhadores e os gestores. A
ausência dessa relação pode oca-
Foto: Peter Ilicciev (2004).

sionar a ocorrência de riscos ergo-


nômicos organizacionais.

O Quadro 3 apresenta algumas si-


tuações ou atividades de trabalho
na rede de frio e suas possíveis con- O cartão de vacinação é, atualmente, o
documento utilizado para identificação e
sequências, quando não planejadas informação da situação das vacinas aplicadas.
ou planejadas incorretamente. Fonte: Fiocruz imagens.

321
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Quadro 3 – Ergonomia organizacional na rede de frio


Situações ou atividades de trabalho Possíveis consequências do planejamento
ou da realização incorreta
Manutenção dos maquinários Parada ou atraso da produção
Compra de caixas térmicas Impossibilidade de acondicionamento dos
imunobiológicos
Reuniões periódicas com as chefias Insatisfação dos trabalhadores, erros etc.
Acúmulo de tarefas Estresse, fadiga, erros etc.
Ritmo de trabalho acelerado Estresse, fadiga, erros etc.
Uso de equipamento de proteção individual de Desconforto, incidentes, acidentes etc.
má qualidade

A ergonomia organizacional deve valorizar uma cultura em que preva-


leça o diálogo, os projetos em equipe, a escuta do trabalhador, fazendo-
-o ser participativo para alcançar a gestão pela qualidade.

Para refletir
Agora que você conhece um pouco mais sobre ergonomia, consegue
perceber sua importância para o bom desempenho do trabalho e para
sua saúde, como trabalhador?
Refletindo sobre o seu ambiente de trabalho, como você avalia as
questões ergonômicas físicas, cognitivas e organizacionais?

Classificação da ergonomia
Iida (2005) classifica a ergonomia de acordo com o momento de sua
utilização. Diversos autores como Orselli (2008), Freitas, Freitas e Lopes
(2009) comungam da mesma classificação, conforme descrito a seguir.

Ergonomia de concepção
Ocorre na fase da elaboração do projeto da edificação, do mobiliário, do
produto, da máquina, do ambiente ou do sistema. Prevê as probabili-
dades de futuras modificações e, geralmente, segue as normas exigidas
pela legislação.

Ergonomia de correção
Atua na modificação do que já existe, quando se constata a necessidade
de corrigir problemas de segurança, fadiga excessiva, doenças dos tra-
balhadores, espaço físico, condições ambientais inadequadas, quanti-
dade e qualidade da produção. Envolve custos elevados, quando exige
substituição de máquinas ou materiais.

322
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

Pode atuar, por exemplo, na correção de posturas dos trabalhadores,


colocação de dispositivos de segurança, modificações na iluminação,
exaustão e ventilação, entre outras.

Ergonomia de conscientização
Busca, por meio da capacitação individual e/ou coletiva, desenvolver
nos trabalhadores a capacidade de identificar e corrigir os problemas
existentes no trabalho, além de ensiná-los a maneira mais adequada
de utilização dos diversos componentes presentes em suas atividades.

Ergonomia de participação
Objetiva encontrar soluções ergonômicas junto aos trabalhadores e
consumidores. A participação ativa de todos os implicados no problema
envolve singularidades que, aparentemente, não se fazem perceber
pelos analistas ou projetistas.

Importante!
É fundamental que o gestor da rede de frio de imunobiológicos se
aproprie das contribuições da ergonomia, especialmente nos momentos
de concepção, correção, conscientização e participação, porque é sua
atribuição recomendar a implantação de ações ergonômicas que protejam
a saúde do trabalhador.

Para finalizar nosso tema, vale ressaltar que não existe um modelo que
contemple todas as situações de trabalho, mas o Manual de Aplicação
da NR 17 apresenta as etapas mínimas que deverão ser contempladas
numa AET, assim como o seu Anexo II (BRASIL, 2002).

Considerações finais
Como vimos no decorrer do capítulo, existe uma forte relação entre a
tríade arquitetura-ambiência-ergonomia e a saúde e segurança dos tra-
balhadores. A arquitetura, ao projetar as edificações, poderá se utilizar
dos elementos humanizadores da ambiência para criar espaços constru-
ídos seguros, saudáveis e acolhedores. Os conhecimentos da ergonomia
irão, certamente, contribuir para um projeto arquitetônico humanizado,
que compreende e acolhe as necessidades dos trabalhadores no exercí-
cio de suas atividades, nos aspectos físico, cognitivo e organizacional.

Os processos de trabalho na rede de frio de imunobiológicos, dentre as


diversas caraterísticas que apresentam, necessitam de espaços arquite-
tônicos harmonizados com a ambiência, conforme as legislações vigentes

323
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

(objetividade), e as subjetividades de todos que utilizam determinado


ambiente. As diversas atividades realizadas nessa rede demandam
movimentos que exigem, dos trabalhadores, a adoção de posturas com
potenciais danos à saúde; nessas horas, valem os conhecimentos da
ergonomia, que, ao compreender os riscos, propõe mudanças para
garantir segurança e bem-estar aos profissionais.

Porém, todas essas questões só serão contempladas se houver uma ges-


tão participativa que escute e valorize as experiências singulares dos
trabalhadores, expressas por eles próprios, inclusive durante a constru-
ção, ou reconstrução, do mapa/mapeamento de riscos.

Por essas razões, é importante que você, trabalhador da rede de frio,


analise seu espaço de trabalho e busque, junto à gestão, a mudança dos
aspectos que demandam melhoria para alcançar uma boa ergonomia.

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324
Arquitetura, ambiência, ergonomia e saúde nos locais de trabalho

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326
14. Noções gerais sobre
biossegurança e a questão
do incêndio
Paulo Roberto de Carvalho e Marcello de Moura Coutinho

O planeta Terra vem se transformando rapidamente, e isso se deve ao


acelerado crescimento dos países, sustentado pelo avanço da ciência
e da tecnologia. Não resta dúvida que o progresso pode beneficiar a
sociedade, pois, até pouco tempo, vários bens não estavam disponí-
veis, tendo em vista o alto custo da produção. A produção de novos
medicamentos, produtos químicos e de vacinas, em geral, assim como
de diversos insumos utilizados na rede de frio de imunobiológicos é
oriunda da descoberta de novas tecnologias.

Outro exemplo de novas pesquisas, materiais e tecnologias na rede


de frio é a variedade de embalagens térmicas. Essas embalagens são
produzidas com material térmico do tipo poliuretano ou poliestireno
expandido, por exemplo, o isopor. Certamente, enquanto um profissio-
nal responsável pela organização das caixas térmicas, que vão garantir
a manutenção da temperatura de conservação dos imunobiológicos,
está envolvido nessa atividade, as indústrias do ramo das embalagens
térmicas também estão realizando pesquisas de outros materiais que
serão capazes de oferecer proteção ainda maior no transporte de pro-
dutos perecíveis, num futuro próximo.

O fato de a ciência e a tecnologia se desenvolverem aceleradamente


remete às instituições de saúde e às demais que desenvolvem atividades
correlatas a responsabilidade de se prepararem para acompanhar esse
desenvolvimento. Enquanto alicerces primordiais de uma instituição,
os trabalhadores e as equipes multiprofissionais precisam ser eficaz-
mente formados e capacitados, de forma a contribuir com resultados
confiáveis e de qualidade.
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Os trabalhadores menos experientes e sem formação adequada apre-


sentam maior dificuldade para reconhecer situações perigosas do que
os mais experientes e capacitados. Além disso, podem também não
estar cientes das responsabilidades exigidas para os cargos que ocupam,
bem como do direito de questionar se as atividades a serem executadas
são potencialmente perigosas.

Com o objetivo de lhe proporcionar uma reflexão sobre os riscos à sua


saúde e à segurança no trabalho, neste capítulo discutimos pontos rela-
cionados à biossegurança, como seus aspectos éticos, boas práticas e
Neste capítulo, são qualidade. Além disso, apresentamos também algumas noções gerais
apresentados aspectos mais
sobre a questão do incêndio.
gerais sobre a biossegurança,
com a finalidade de introduzir
essa questão. Orientações
mais específicas quanto Biossegurança
aos procedimentos no
âmbito da rede de frio de A biossegurança está diretamente ligada à Figura 1 – Símbolo internacional
imunobiológicos podem ser de biossegurança
vida, pois, etimologicamente, o significado
encontradas no Manual do PNI,
disponível em: http://bvsms. da palavra é compreendido por dois com-
saude.gov.br/bvs/publicacoes/ ponentes: a raiz grega bio, cujo significado

Imagem: Nicolas Raymond (2013).


manual_rede_frio4ed.pdf
é vida, e “segurança”, que exprime a qua-
lidade ou condição de estar seguro, livre de
danos e perigos eventuais (COSTA; COSTA,
2010; HOUAISS; VILLAR, 2009).

Retomando a discussão iniciada no capítulo


anterior, segundo a Anvisa, biossegurança Fonte: FreeImages.com.
refere-se à “condição de segurança alcan-
çada por um conjunto de ações destinadas a prevenir, controlar, reduzir
ou eliminar riscos inerentes às atividades que possam comprometer a
saúde humana, animal e o meio ambiente” (AGÊNCIA NACIONAL DE
VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2016).

No Brasil, a biossegurança se insere em dois momentos distintos.


O primeiro é sustentado pela Lei n. 11.105, de 24 de março de 2005,
que estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização
para a manipulação e comercialização de organismos geneticamente
Organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados, além das pesquisas com células-
modificados (OGM) são aqueles
cujo material genético foi alterado tronco embrionárias.
através de técnicas de engenharia
genética. Podem ser desenvolvidos
Num segundo momento, a biossegurança se faz presente nos locais de
apenas para fins de pesquisa ou, trabalho em que os OGM não estão presentes, ou seja, em ambientes
como é o caso de milho e soja, em que os agentes ocupacionais se fazem presentes – como é o caso da
por exemplo, para melhorias
rede de frio de imunobiológicos. A legislação referente a esse segundo
que otimizam a produção desses
alimentos, maximizando os lucros momento é a NR 32, que trata da segurança e saúde do trabalho em
com as safras.

328
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

estabelecimentos de saúde, aprovada pela Portaria n. 485, do Ministério


do Trabalho e Emprego, de 4 de novembro de 2005.
A biossegurança também abrange outras questões importantes nos dias
atuais, como as relacionadas aos impactos ambientais (CARVALHO, 2008;
COSTA; COSTA, 2010).

Para que executem as atividades sob suas responsabilidades de forma


segura, isto é, sem que se exponham às adversidades potencialmente
presentes no ambiente de trabalho, é essencial um esforço da instituição
para formação dos profissionais. Conceitos e preceitos de biossegurança
deverão compor o conteúdo programático de programas de capacitação
em prevenção de acidentes, tendo em vista sua relação direta com as
necessidades cotidianas dos profissionais em diversos setores da vida,
em especial no ambiente de trabalho.

Isso demandará da instituição mais do que a transmissão de informa-


ções para a execução da tarefa. Uma instituição deverá ser gestora e
promotora de saberes fundamentais e necessários para as práticas segu-
ras. Gerir conhecimentos em prevenção de acidentes é relevante para
que uma instituição garanta a integridade do seu quadro funcional,
bem como de suas instalações.

Para refletir
No seu entendimento, quais setores da sua instituição merecem ser
analisados no que tange à prevenção de acidentes? Existem pontos
evidentes, capazes de gerar situações de alta complexidade, mas
que não são observados pela maioria dos profissionais? Qual o seu
comportamento frente às situações complexas e quais suas atitudes
em relação a isso?

O ensino da biossegurança no ambiente de trabalho, por exemplo, No que se refere à capacitação do


abre possibilidades para reflexões, tendo em vista ser um campo de quadro funcional, e aqui inclui-
se a biossegurança, essa deverá
estudo que vai ao encontro das necessidades do trabalhador em geral, ser abrangente sob todos os
principalmente daquele que desempenha atividades profissionais em aspectos e adaptada ao nível de
conhecimento do pessoal.
condições potencialmente adversas. Nesse contexto se enquadra a
rede de frio de imunobiológicos, que engloba atividades relacionadas a
armazenamento, conservação, manipulação, distribuição e transporte
de imunobiológicos do PNI.

329
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Exemplo de situação envolvendo biossegurança na rede de frio


Na área de armazenamento e transporte de imunobiológicos, o gelo
Atenção! seco é frequentemente utilizado. Ele é composto de dióxido de carbono
O contato do gelo seco com (CO2), um gás de alta densidade e inodoro, que se mantém sólido a baixas
a água poderá aumentar temperaturas mas, em temperatura ambiente, volta ao estado gasoso.
a sublimação do dióxido
de carbono, acarretando o À medida que o gelo seco sublima (passa do estado sólido para o
aumento de asfixia. gasoso), o CO2 é liberado e fica disponível no ar, de forma que podemos
No que tange à proteção dos respirá-lo. Quando as concentrações de dióxido de carbono são
equipamentos, o CO2 em
contato com a umidade produz extremas (superior a 20%) em espaços confinados ou inadequadamente
o ácido carbônico, capaz de ventilados, pode ocorrer a anóxia (ausência de oxigênio no ar), que se
corroer alguns metais. traduz na possibilidade de acidentes graves e prejuízo para a saúde dos
trabalhadores. Em alguns casos, a vítima não percebe o processo da
asfixia. Demais sintomas podem incluir perda de consciência e de funções
motoras, aumento da taxa de respiração ou aceleramento dos batimentos
cardíacos. Danos ao sistema nervoso não estão descartados.
Além disso, o gelo seco apresenta a propriedade de gerar queimaduras
quando entra em contato com a pele. Esse contato direto, sem a devida
proteção, pode ocasionar o congelamento dos lábios. Em elevadas
concentrações é capaz de produzir dores de cabeça, sonolência, vertigem,
excitação, extrema salivação, vômitos e inconsciência.
Algumas medidas de segurança deverão ser adotadas, tendo em vista a
periculosidade da exposição ao material: obrigatoriedade do uso de luvas
isolantes, protetor para os olhos, pinças e vestimentas adequadas. No
que concerne ao ambiente onde é manipulado o gelo seco, esse deverá
ser dotado de sistema de ventilação eficaz, de modo a não permitir que o
oxigênio do ar seja deslocado na zona de respiração dos trabalhadores.

Essa diversidade de atividades favo-


rece a possibilidade de serem gera-

Foto: Guaracemyr Matos Martins (2016).


dos acidentes e danos à saúde do
trabalhador, em especial quando os
profissionais estão submetidos a esfor-
No tocante à biossegurança,
os agentes ocupacionais são ços repetitivos, movimentação de
classificados em cinco grupos, cargas, exposição a baixas tempera-
conforme tratamos no Capítulo
turas, ruídos e aos demais agentes
12,“Saúde e segurança do
trabalhador na rede de frio de ocupacionais, somados a uma poten-
imunobiológicos”: cial ausência de treinamento e Gelo seco.
Grupo 1- Agentes químicos;
Grupo 2- Agentes físicos;
capacitação.
Grupo 3- Agentes biológicos;
Grupo 4- Agentes Salas de vacinas são locais em que os cuidados referentes à biossegu-
ergonômicos; e Grupo
5-Agentes mecânicos.
rança também devem ser observados. A não observância das normas
de biossegurança, assim como imperícia, ausência de instruções sobre

330
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

o emprego de práticas seguras, ausência ou uso inadequado do EPI são


alguns dos fatores capazes de contribuir para a geração de acidentes.
Acidentes com material perfurocortante, em especial envolvendo as
seringas contendo vacinas, os cortes nas mãos derivados de ampolas Você não poderá, em nenhum
de vidro e a potencial projeção de material nos olhos desprotegidos momento, reencapar agulhas,
nem tentar retirá-las da seringa
são agravados, principalmente, quando os acidentados menosprezam com as mãos. Todo o conjunto
a situação e não percebem o risco, demorando a relatar os acidentes formado pela seringa e pela
e procurar o serviço de saúde (MACÊDO; FREIRE; ANDRADE, 2013; agulha deverá ser descartado
em caixas adequadas.
SILVA et al., 2010).

Com o objetivo de minimizar as situações de risco potencial para os


trabalhadores durante as suas atividades na rede de frio, há regras de
segurança e de prevenção. O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE),
a partir da Norma Regulamentadora n. 06, estabelece o uso obrigatório
de equipamentos de proteção individual (EPIs). Segundo essa norma,
EPI é “todo dispositivo ou produto, de uso individual, utilizado pelo
trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a
segurança e a saúde no trabalho” (Norma Regulamentadora n. 06)
(BRASIL, 2015).

Segundo a NR 32, a todo trabalhador de saúde deve ser fornecida,


gratuitamente, pelo PNI, imunização ativa contra tétano, difteria, hepatite
B e ao que foi estabelecido no PCMSO. Sempre que houver vacinas
eficazes contra outros fatores biológicos aos quais os trabalhadores estão
ou poderão estar expostos, o empregador deve fornecê-las gratuitamente
(BRASIL, 2015).

De acordo com as instruções preconizadas pela NR 32, os trabalhado- A NR 32 foi abordada no Capítulo
res que exercem atividades em serviços de saúde, bem como aqueles 12, “Saúde e segurança do
trabalhador na rede de frio de
que exercem atividades de promoção e assistência à saúde, igualmente imunobiológicos”, deste livro.
os trabalhadores que exercem funções em salas de vacinação, estarão
potencialmente protegidos se utilizarem adequadamente os EPIs e EPCs
(SILVA et al., 2010).

Os EPIs mais utilizados na rede de frio de imunobiológicos são


apresentados na Figura 2. Eles se destinam à proteção contra o frio
Relembrando o que foi
intenso das câmaras frias, onde são armazenados os imunobiológicos mencionado no capítulo anterior,
nas centrais de distribuição. os incidentes, em geral, não
causam danos, e a integridade
do profissional é mantida. Já os
Quando não são adotadas medidas de controle, a exposição aos agentes
acidentes, dependendo do tipo
ocupacionais presentes nos locais de trabalho pode produzir danos aos e da magnitude, são capazes de
trabalhadores e, também, comprometer a produtividade da instituição. gerar vítimas, em muitas situações,
afastando o acidentado temporária
São capazes de afetar a saúde do trabalhador a curto, médio e longo ou permanentemente de suas
prazos, gerando lesões e doenças variadas. Complexidades variadas estão funções.

331
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Figura 2 – EPI da rede de frio de presentes, em grande parte, nos locais de trabalho e, se soma-
imunobiológicos de uso obrigatório
das à ausência de informações e de conhecimentos acerca das
Touca balaclava medidas preventivas por parte dos profissionais, potenciali-
zam a geração de incidentes e de acidentes, muitas vezes de
Japona grande porte.
Luva

Para refletir
Faça uma análise minuciosa do seu ambiente de trabalho.
Calça Foto: Guaracemyr Matos Martins (2015). Você identifica eventos capazes de gerar potenciais situações
(macacão adversas? Esses eventos estão associados a um único tipo
frio) de agente ocupacional ou a um somatório de agentes? Que
medidas você percebe como capazes de mitigar ou eliminar a
situação?

Bota cano longo


com forro de lã A biossegurança é algo dinâmico, vai além do entendimento
dos conceitos inerentes ao tema e da aplicação e do atendi-
mento às normas de prevenção e controle nos ambientes de trabalho.
Além da capacidade de compreensão e execução, os indivíduos care-
cem de uma adequada e consistente formação educacional que os faça
hábeis para identificar, minimizar, controlar e eliminar situações capa-
zes de abalar a integridade física e/ou afetá-los por alguma doença que
os afastem temporária ou definitivamente de suas atividades (BONIS;
COSTA, 2009). Além disso, a instituição deverá dispor de toda a estru-
tura necessária para detectar, analisar e corrigir falhas, bem como
propor planos de treinamento e capacitação diferenciados. Planos de
intervenção imediata para mitigar, eliminar ou administrar incidentes
ou acidentes deverão estar disponíveis.

Aspectos comportamentais e éticos


A palavra ética é derivada A formação do trabalhador da rede de frio de imunobiológicos requer
do grego ethos, que significa não só a inclusão de conhecimentos inerentes às atividades rotineiras,
aquilo que pertence ao caráter, ou
seja, ao modo de ser de mas de outros que estimulem a capacidade cognitiva, a aquisição de
uma pessoa. saberes e novas competências e ampliem a autonomia do profissional.
Uma definição de ética foi
Nessa proposta de formação, aspectos comportamentais e éticos se
apresentada no Capítulo 10, somam e há troca de informações, resultando dessa permuta ações de
“Organização do trabalho”, promoção da qualidade de vida no trabalho.
deste livro.

Num ambiente de trabalho, o êxito na obtenção de resultados confiá-


veis e o sucesso profissional estão diretamente relacionados ao grau de
conhecimento do trabalhador e às relações interpessoais. Desse modo,
no mundo atual, ações que estimulem esse trabalhador a aprender a

332
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

conhecer (ou seja, tomar posse dos instrumentos da compreensão); a


aprender a fazer, para ser capaz de tomar decisões; a aprender a viver,
para participar e cooperar; e a aprender a ser são inquestionavelmente
relevantes (OS QUATRO..., 1996).

A questão ética exercida no ambiente de trabalho está intrinsecamente


relacionada à formação moral do indivíduo. O conjunto de valores
morais e princípios que norteia a conduta do ser humano na sociedade
faz parte da ética. Num sentido mais amplo, a ética está intrinseca-
mente relacionada ao exame dos hábitos do homem e do seu caráter,
em geral. Vários elementos compõem os princípios éticos, conforme
apresentados na Figura 3.

Figura 3 – Ética

Regras e
regulamentos

Regras de
Valores
conduta

ÉTICA
Práticas
Pesquisa
éticas

Princípios
morais

Fonte: Adaptado de http://carleton.ca/psychology.

A conduta ética aplicada ao trabalho merece reflexão, tendo em vista


que, raramente, o homem trabalha sozinho, pois faz parte de uma cole-
tividade de trabalhadores que são obrigados a conviver por várias horas,
dias, meses e anos. O viver bem em comunidade no trabalho remete
ao respeito ao próximo, ao cumprimento das diretrizes da instituição,
ao trabalho de acordo com as normas e os protocolos estabelecidos, a
saber receber instruções, incumbências e cumprir prazos, bem como à
observância dos preceitos de programas de prevenção em vigor.

Os princípios éticos e os princípios de biossegurança estão amplamente


alinhados. O limite entre eles pode ser muito tênue e, às vezes, classi-

333
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

ficado de acordo com as concepções das partes envolvidas. As áreas de


competências para a prática da ética em biossegurança no ambiente de
trabalho incluem: o cumprimento da legislação, assim como a utiliza-
ção de equipamentos de proteção individual e coletiva.

Os princípios éticos associados à biossegurança facultam aos trabalha-


dores a responsabilidade de exercer suas atribuições observando uma
série de atitudes, que nem sempre estão descritas nos códigos de todas
as profissões. No entanto, apesar da ausência de informações descritas,
isso não livra os profissionais do cumprimento do bom senso e dos
deveres. Qualquer que seja a categoria profissional, o conjunto de prin-
cípios e regras de conduta é fundamental para regular o exercício da
profissão. A opção por uma profissão é livre, mas, após a sua escolha,
o indivíduo assume a responsabilidade de buscar, atualizar e comple-
mentar saberes, para que, no desenvolvimento das atividades, essas
não resultem em constrangimentos, malefícios, danos à comunidade de
trabalhadores e à instituição.

A biossegurança está intrinseca-


mente relacionada à vida das pes-
soas – social, profissional e etica-
mente. Os indivíduos inseridos em
qualquer ambiente de trabalho não
podem perder a dimensão de que a
Bullying é um termo da língua
prática da biossegurança se sustenta
inglesa (bully significa valentão) por um conjunto de conceitos, pre-
que se refere a todas as formas ceitos e atitudes ético-profissionais.
de atitudes agressivas, verbais ou
físicas, intencionais e repetitivas, Somado a isso, aquele que está à
que ocorrem sem motivação frente de uma atividade profissional

Foto: Catalina Villamil.


evidente e são exercidas por um ou
mais indivíduos com o objetivo de
é responsável pela sua integridade
intimidar ou agredir outra pessoa física, bem como a dos seus pares e
que não tem possibilidade ou do patrimônio da instituição, de uma
capacidade de se defender, sendo
realizadas dentro de uma relação forma geral. Assim, a revisão da
desigual de forças ou poder e conduta pessoal, por parte do traba- Educação, respeito, honestidade, sigilo das
causando dor e angústia. informações, interlocução e cooperação entre
lhador, e a atualização dos conheci-
os trabalhadores, independentemente do
mentos técnicos relacionados aos grau hierárquico, propiciam um ambiente
saudável. A interlocução entre os atores são
aspectos éticos, legais e normativos elos de uma corrente de atitudes éticas.
são imprescindíveis. Fonte: FreeImages.com.

Para saber mais sobre práticas


éticas, leia Boas práticas
químicas em biossegurança, Atos e atitudes que infringem os preceitos éticos, tais como assédio moral,
de Paulo Roberto Carvalho. 2.
ed. Rio de Janeiro: Interciência, sexual, bullying, cyberbullying, não poderão ser tolerados no ambiente
2013. de trabalho, bem como as ofensas e violências físicas.

334
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

No que tange às tarefas programadas e relacionadas ao trabalho, essas


deverão ser executadas atendendo a normas e protocolos estabelecidos.
O reconhecimento, por parte do profissional, do seu limite de conheci-
mento deverá ser informado de modo que as atividades sejam realizadas
por pessoal qualificado. Um profissional desqualificado à frente de uma
tarefa poderá gerar uma situação extremamente grave, com exposição
dele próprio, da coletividade de profissionais e das instalações prediais.

Biossegurança no âmbito das boas práticas


Como os profissionais passam cerca de 1/3 de sua vida à frente de ati- No mundo do trabalho,
profissionais motivados,
vidades, desempenhando papéis importantes, na maioria dos locais de
qualificados e, acima de tudo,
trabalho, é necessário que esse profissional goze de bem-estar físico, saudáveis são essenciais para o
mental e social. Além disso, é importante reconhecer que os ambien- sucesso de uma instituição.

tes de trabalho inseridos em edifícios saudáveis são capazes de ofertar


conforto ao profissional e, ainda, de contribuir para um ambiente eco-
logicamente equilibrado.

Um edifício saudável é uma construção cujo desenho arquitetônico Edifícios saudáveis podem ser
dotados de comodidades como
ofereça as condições técnicas ideais para a segurança de seus ocupantes, academias, creches, local para
além de promover a qualidade ambiental. A qualidade do ar interior descanso e demais instalações que
(QAI) está entre as muitas questões a serem observadas a fim de se contribuam para o bem-estar.

evitar os impactos adversos sobre o bem-estar e a saúde dos ocupantes.

Uma variedade de compostos potencialmente perigosos presentes nos


ambientes e derivados das emissões dos materiais de construção, de
equipamentos e demais produtos específicos às atividades desenvolvi-
das é capaz de prejudicar a saúde das pessoas que ali estão inseridas. A umidade e a ventilação
A poluição atribuída a microrganismos, proveniente de espécies de deficientes são capazes
de contribuir para o
bactérias e de fungos, merece atenção, não devendo ser negligenciada desenvolvimento de agentes
(AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE, 2009). biológicos, potenciais
causadores de doenças.

O objetivo principal da adoção das boas práticas no ambiente de trabalho


é a garantia de que, no desenvolvimento das atividades, não ocorrerão
eventos estranhos às práticas corretas. A observância dos requisitos
operacionais, de segurança e de qualidade é fundamental para garantir o
bom andamento das atividades e o cumprimento das metas.

Uma boa prática importante é, como já dissemos, a formação dos pro-


fissionais. Os trabalhadores novatos e os estagiários deverão receber
atenção diferenciada para não se expor, desnecessariamente, aos agen-
tes ocupacionais. A eles serão garantidas as orientações e informações
pertinentes para a execução das tarefas.

335
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Metodologias do trabalho, demais informações específicas e princípios


de segurança deverão estar descritos em protocolos, preferencialmente
nos Procedimentos Operacionais Padronizados (POP) ou manuais,
que devem ficar à disposição de todos, sem distinção.

Procedimentos Operacionais Padronizados (POP)


POP se caracteriza por instruções escritas que visam à uniformidade de
uma função específica. Um POP adequadamente elaborado pode ser
usado para satisfazer os requisitos especificados de conformidade relativos
a um produto, processo, sistema, uma pessoa ou um organismo.
A conformidade está relacionada a processos que deverão gerar resultado
satisfatório, ou seja, que atendam a determinado requisito estabelecido
por normas, regulamentos e preceitos.
O POP é um tipo de documento recomendado para os procedimentos que
representam potenciais riscos para a saúde e a segurança do trabalhador.

O trabalhador deverá ser orientado a seguir o POP referente à sua


atividade, o qual deve ser atualizado, caso haja alterações nos proce-
dimentos. Além disso, atividades voltadas à prevenção de acidentes e
As atividades e os treinamentos às práticas seguras serão desenvolvidas sempre que forem necessárias,
referentes à prevenção
como parte da formação do profissional.
de acidentes deverão ser
igualitários, para todo o
conjunto de trabalhadores, O planejamento de atividades, elucidando todas as dúvidas dos traba-
sem distinção. Em termos de lhadores, também faz parte das recomendações de boas práticas. Tam-
segurança, a parceria entre
empregados e empregadores bém é indicada a realização de auditorias que visem à observância:
é mutuamente benéfica,
pois incentiva ambas as G do cumprimento das normas (como as coisas estão sendo feitas);
partes a assumirem suas
responsabilidades quanto à G da valorização do trabalho (se o que é importante está sendo
implantação de programas realizado);
de saúde.
G da compatibilidade social (profissionais se ajudando mutuamente
para cumprir metas e evitar acidentes);
Auditoria é o exame analítico
de uma empresa ou instituição. G do suporte organizacional (políticas de segurança, procedimentos
O papel da auditoria interna
é fornecer uma garantia
corretos, comunicação efetiva, incentivos etc.);
independente de que a gestão
de riscos de uma organização,
G da análise do ambiente de trabalho (senso de comunidade, visão
a governança e os processos compartilhada, cooperação entre os pares etc.), a fim de corrigir as
de controles internos estão não conformidades.
funcionando de forma eficaz.

No que tange à elaboração de programas de saúde abrangentes com


foco na biossegurança, as instituições poderão buscar parcerias com
outras instituições, fornecedores de produtos, de equipamentos, de
materiais e demais organizações de comprovada experiência no tema.

336
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

Alguns fatores deverão ser considerados nos ambientes de trabalho para


garantir que as ações de biossegurança sejam efetivamente garantidas,
dentre os quais se destacam:
G avaliação dos perigos no ambiente de trabalho, da saúde dos
profissionais, bem como dos gestores e demais membros da
administração superior da instituição;
G promoção de ações de treinamento em saúde; de exames
admissionais e periódicos e de vacinação para todos os membros da
coletividade de profissionais;
G realização de seminários com sessões educacionais que estimulem
melhorias de comportamento do quadro funcional em relação à
saúde;
G programas de orientação e apoio aos profissionais das áreas de
manutenção, projetos e engenharia para atender aos requisitos
inerentes às normas de biossegurança, no que diz respeito a
instalações, leiaute etc.

Qualidade no trabalho no contexto da


biossegurança
Qualidade nos resultados é o que se espera na maioria das ativida-
des profissionais. O desempenho e a obtenção de resultados confiáveis
estão atrelados a vários fatores, em especial, à cultura organizacional,
aos programas de gestão, às condições ambientais, à valorização dos
recursos humanos, às seguranças patri-
monial e pessoal, além de investimento
para a melhoria contínua dos processos.

Em um processo, a qualidade refere-se a


Imagem: Jurgen Appelo (2013).

Para que seja atingido um grau de


excelência, é fundamental atender
uma medida de excelência ou uma condi-
a vários requisitos específicos, a
ção da construção de algo livre de defei- fim de analisar o desempenho,
tos, deficiências e variações significativas. eliminar os conflitos, implantar
melhorias e alcançar resultados
É provocada pelo compromisso rigoroso e eficazes.
consistente com o cumprimento de nor-
O compromisso com normas e mas que permitam atingir a uniformidade
padrões para os procedimentos
e processos permite alcançar a de um produto, de modo a satisfazer as
qualidade nos resultados. necessidades explícitas ou implícitas.

As necessidades explícitas referem-se àquelas que são percebidas pelo cliente,


isto é, aquilo que o cliente procura encontrar em um produto, por exemplo,
que as fotos do seu novo celular apresentem níveis de qualidade excelentes.

337
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

As necessidades explícitas referem-se àquelas que são percebidas pelo


cliente, isto é, aquilo que o cliente procura encontrar em um produto, por
exemplo, que as fotos do seu novo celular apresentem níveis de qualidade
excelentes.
As necessidades implícitas são aquelas que não estão claras para o cliente.
Quando um produto é pensado para ser produzido, todas as necessidades
deverão ser contempladas, pois o cliente, em um dado momento, as
perceberá. Grosso modo é o que acontece, por exemplo, com o uso
dos softwares processadores de textos, em que, aos poucos, o usuário
descobre funções como o Ctrl + C; Ctrl + V; Ctrl + T etc., que ele não
sabia que existiam, mas que atendem às suas necessidades de agilidade.

As inter-relações entre a qualidade esperada nos experimentos cien-


tíficos, nas análises laboratoriais, na produção de fármacos e imuno-
biológicos e a biossegurança e as boas práticas laboratoriais são muito
intensas. A implantação das técnicas de qualidade nos procedimentos
de biossegurança é vital para garantir controles eficazes, padronização
dos sistemas de prevenção e manutenção da reputação da instituição.
Somando-se a isso, alguns benefícios poderão ser usufruídos a partir da
implantação da prática de qualidade em biossegurança.

Programas de qualidade em biossegurança, baseados em estratégias e


planos bem definidos, são capazes de melhorar as condições de trabalho
e atender às legislações no que tange à segurança dos trabalhadores e
aos potenciais impactos ao meio ambiente. Permitem, ainda, reduzir
custos por meio da revisão dos protocolos de trabalho e de processos de
compras de produtos, equipamentos e materiais em geral.

Para refletir
No seu local de trabalho existem normas e protocolos que visem manter
a qualidade nos processos realizados? Eles são de conhecimento do
conjunto de trabalhadores? São seguidos? Têm funcionado? O que você
sugeriria de melhorias?

A implantação de sistemas de certificação e de gestão da qualidade per-


mite a realização de auditorias, que são necessárias para averiguar o
cumprimento das disposições planejadas e/ou estabelecidas previamente
e se essas estão em conformidade ou não com os objetivos esperados.

A família ISO 9000, de normas internacionais, é considerada uma ferra-


menta capaz de auxiliar no desenvolvimento de planos para a implan-

338
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

tação da biossegurança, com foco na qualidade. As normas ISO se apli-


cam a campos distintos, como materiais, produtos, processos e serviços.
A utilização adaptada dessas normas serve de base para a elaboração de
planos de prevenção, pois contribui na organização das áreas de traba-
lho, em geral, aponta para a necessidade de planejamento, identifica a
necessidade de investimento na capacitação do quadro funcional, além
de estabelecer padrões de qualidade (COSTA, 2000; INTERNATIONAL
ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION, 2013).

ISO
A International Organization for Standardization (Organização Internacional
para Normalização) é a maior desenvolvedora mundial de normas Para saber mais sobre a ISO,
internacionais. A sigla ISO é uma referência à palavra grega iso, que apenas dispomos de uma boa
literatura na língua inglesa.
significa igualdade. A organização foi fundada em 1947 e está localizada Se você conhece esse idioma,
em Genebra, Suíça. Já publicou mais de 19.500 normas internacionais, recomendamos que leia:
abrangendo quase todos os aspectos da tecnologia e de negócios. International Organization for
Standardization. Disponível em:
As normas internacionais são o estado da arte das especificações para http://www.iso.org/iso/home.
produtos, serviços e boas práticas, ajudando a tornar as indústrias e html.
instituições em geral mais eficientes e eficazes. Desenvolvidas por meio de
consenso global, elas ajudam a quebrar as barreiras ao comércio internacional.

A atenção aos padrões de qualidade nos processos também é uma preo-


cupação da rede de frio de imunobiológicos. De acordo com o Manual
do PNI, a aferição da qualidade está relacionada ao aumento da garan-
tia da qualidade e segurança na conservação, no armazenamento e na
distribuição dos imunobiológicos (BRASIL, 2013).

Noções gerais sobre a questão


do incêndio
A questão da segurança contra incêndios é de grande relevância, uma
vez que o fogo é uma séria ameaça para qualquer unidade de trabalho,
principalmente aquelas que empregam materiais de fácil combustão, Algumas instalações
inflamáveis, e apresentam um quadro funcional desprovido das infor- merecem atenção redobrada,
mações necessárias para a prevenção e as respostas às emergências. principalmente quando,
nesses locais, estão inseridas
pessoas incapazes de ajudar a
As causas mais comuns de incêndios em instalações comerciais, indus- si próprias. Hospitais, clínicas,
triais, instituições científicas e hospitalares são o não cumprimento asilos, escolas e demais locais
frequentados principalmente
das regras de prevenção e a não implementação dos cuidados básicos
por crianças, idosos e aqueles
de manutenção de equipamentos e das instalações prediais. Casos de com mobilidade dificultada são
incêndios originados de atos criminosos, pela ação de vandalismo ou alguns exemplos de ambientes
críticos para se administrar
pela proximidade às comunidades carentes, onde não existe a conscien- incêndios.
tização da população para a prevenção, não estão de todo descartados.

339
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Foto: Rob Swystun (1980).


Incêndios podem destruir completamente o espaço de uma
instituição. A melhor solução é preveni-los.

Gás é um dos quatro estados Equipamentos defeituosos ou utilizados indevidamente são potenciais
fundamentais da matéria (sendo
os outros: sólidos, líquidos e o
fontes geradoras de incêndios, bem como sistemas de iluminação e
plasma). O que distingue um gás ventilação, instalações elétricas sobrecarregadas, improvisadas e fora do
de líquidos e de sólidos é a grande padrão. Tubulações de gases industriais, gás liquefeito de petróleo (GLP)
separação das partículas.
e gás natural, se não mantidas adequa-
damente, também são fontes geradoras e
alimentadoras de incêndios. As causas, as
circunstâncias e a extensão da propagação
do fogo variam de acordo com o tipo de
atividade executada (CARVALHO, 2013).

Foto: State Farm (2005).


A prevenção contra incêndios em locais
de armazenamento de materiais combus-
tíveis, tais como isopor, papelão, madeira,
papel etc., necessita de atenção refor-
O uso inadequado das tomadas
çada, em virtude do rápido consumo elétricas pode provocar sobrecarga,
desses materiais pelo fogo. gerando potencial risco de incêndios.

As instalações onde se promovem o armazenamento e a distribuição de


imunobiológicos necessitam da implementação de planos de prevenção
contra incêndios, de modo que a integridade física de seus ocupantes
esteja garantida.
Saídas de emergência e adoção de rotas de fuga são importantes, além do
treinamento para o uso correto desses elementos de segurança. As rotas
de fuga são meios estruturais, tais como: escadas de segurança, iluminação
de emergência, área de refúgio devidamente sinalizada. As rotas de fuga,
desobstruídas e seguras, devem ser capazes de assegurar a saída em
qualquer ponto da edificação até o ponto de encontro estabelecido, sem
que seja necessária a ajuda de terceiros (RODRIGUES et al., 2014).

340
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

Figura 4 – Triângulo do fogo O primeiro passo para iniciar uma reflexão


sobre controle e prevenção de incêndios é
entender como, de fato, eles acontecem.
Nos incêndios, três elementos importan-
tes são necessários para o fogo prosperar
e se espalhar nos ambientes. O combus-
tível que queima, o ar que alimenta o
fogo pela ação do oxigênio, e o calor que
permite que o fogo continue queimando.
Esses três elementos formam o Triângulo
Fonte: Ícone do fogo: sundeiparora (s/d).
do fogo (Figura 4).

Definições importantes para a configuração do


triângulo do fogo
Para controlar o fogo, pelo menos um dos lados do triângulo deverá ser
removido. Para melhor entendimento sobre a questão da configuração
do triângulo do fogo, algumas definições são importantes.

Combustível
Refere-se a qualquer material que possa ser queimado. Líquidos como Inflamar é o que ocorre com
materiais inflamáveis, ou seja, que
solvente de tintas, gasolina, tintas em geral à base de óleo estão incluí-
podem facilmente pegar fogo.
dos nessa categoria, uma vez que lançam gases que podem facilmente Um bom exemplo são os líquidos
inflamar e começar um fogo, sob as condições certas. Tanques que arma- altamente inflamáveis, como
álcool, éteres, cetonas e ésteres.
zenam gases (propano) são outra forma de material combustível. Vaza- É aconselhável mantê-los longe do
mento de combustível das empilhadeiras movidas a gás liquefeito de fogo e de eletricidade.
petróleo (GLP), quando esses veículos não recebem os cuidados neces-
sários no que tange à movimentação e à manutenção, pode ser conside-
rado um fator relevante para a geração de princípios de incêndios.

Os materiais combustíveis mais comuns são madeira, borracha, tecido e Ponto de ignição é a
alguns plásticos. Quando aquecidos a determinada temperatura, podem temperatura mínima na qual
os gases desprendidos dos
alcançar seu ponto de ignição. elementos combustíveis entram
em combustão apenas pelo
Os combustíveis são classificados quanto: contato com o oxigênio do ar,
independentemente de qualquer
G ao estado físico, em sólidos, líquidos e gasosos. São materiais que fonte de calor.

queimam em profundidade e extensão e deixam resíduos.


G à volatilidade, em:
• voláteis: aqueles que não necessitam de aquecimento para
desprender vapores inflamáveis, ou seja, emanam esses vapores
A classificação quanto à
à temperatura ambiente. São denominados produtos leves. volatilidade se aplica a
Exemplos: gasolina, éter, tolueno etc.; combustíveis líquidos.

341
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

• não voláteis: aqueles que necessitam de aquecimento para


desprender vapores inflamáveis. São denominados produtos
pesados. Exemplo: óleo combustível (diesel).

Quando o combustível é removido, o fogo se extingue. Esse processo


de remoção pode ser realizado por meio da queima controlada ou da
eliminação física do combustível, com estrita observância às normas
de segurança. Caso o fogo esteja fora de controle, a retirada do mate-
rial combustível deverá ser realizada por pessoal treinado (brigada de
incêndio), ou pelos bombeiros e equipes bem supervisionadas.

Ar (comburente)
O ar atmosférico é composto por um conjunto de gases em proporções dife-
rentes. Dentre eles, está o oxigênio (O2) que respiramos e que atua como
comburente em processos de queima, em volume de cerca de 20,93%.

Quando o ar é removido, o fogo se extingue pela falta de oxigênio.


Normalmente, a remoção do ar se faz por abafamento das chamas;
para tal, se lança mão dos extintores de espuma, de dióxido de carbono
(CO2) ou de pó químico seco (PQS). Esses compostos funcionam como
um cobertor de abafamento, isolando os combustíveis do oxigênio do
ar, diminuindo a concentração do comburente e, consequentemente,
inibindo o processo de combustão. No Quadro 1, é apresentada a con-
centração de oxigênio no ar para que ocorra a combustão.
Quadro 1 – Condições favoráveis para que ocorra a combustão

Concentração de oxigênio (%) Combustão


De 0 a 8 Não ocorre
De 8 a 13 Lenta
De 13 a 21 Viva
Fonte: Boas práticas químicas em biossegurança (CARVALHO, 2013).

Calor
Vapor, muitos líquidos, sólidos A remoção do calor, ou o resfriamento de um incêndio, é a forma mais
e combustíveis inflamáveis são
comum para a extinção do fogo. Um combustível entrará em combus-
de natureza volátil, ou seja,
evaporam rapidamente e estão tão, espontaneamente, quando os seus vapores atingirem a tempera-
continuamente emitindo vapores. tura de ignição. Essa temperatura é um fator determinante na fixação
A taxa de evaporação varia
muito de um líquido para outro e
das normas de segurança para produtos voláteis, como petróleo, óleo
aumenta com a temperatura. diesel e óleo combustível lubrificante.

Na maioria das extinções de incêndios, a água é o elemento primordial


utilizado para resfriamento do calor gerado pelo fogo. Esse calor trans-
forma a água em vapor, permitindo, com isso, que o calor seja retirado.
A água é capaz de agir para abafar as chamas e sufocar o fogo. Produtos

342
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

químicos podem ser adicionados à água para melhorar a capacidade de


remoção de calor ou melhorar a manutenção da integridade do com-
bustível não consumido.

No caso de incêndios nas unidades de trabalho, tais como estabele- Irradiação, condução e convecção
são conceitos trabalhados neste
cimentos de saúde, instituições de ensino e de pesquisa, indústrias, livro, no Capítulo 7, “Refrigeração
residências, meios de transporte e demais instalações em que se con- e equipamentos da rede de frio”.
centram pessoas e matérias combustíveis, os métodos de transmissão
ocorrem por três meios – irradiação, condução e convecção.

Figura 5 – Formas de transmissão de calor

É a forma de transmissão de calor por meio É a forma de transmissão de calor que É a forma de transmissão de calor através da
de ondas caloríficas que atravessam o ar, se processa de um elemento a outro, de circulação de um meio transmissor gasoso
irradiadas do corpo em chamas. molécula a molécula. ou líquido.

Classes de incêndios e agentes extintores


Existem quatro classes principais de incêndios no Brasil, conforme ilus-
tra o Quadro 2.
Quadro 2 – Classes de incêndios

São aqueles que envolvem materiais combustíveis comuns, como


madeira, papel, papelão, plástico, tecido e a maioria dos tipos de lixo.

A
Extintor de água é muito eficaz para a extinção desse tipo de incêndio,
no entanto, dependendo da área de trabalho (por exemplo, hospitais),
esses tipos de extintores não são facilmente encontrados, o que remete Em alguns países,
ao uso de extintor de PQS.
diferentemente do Brasil,

B
São aqueles que envolvem líquidos inflamáveis, gases, óleos, tintas e duas classes importantes de
graxas. Para esse tipo de fogo, o recomendado é o extintor de CO2 ou PQS. incêndios são consideradas:
A água não deve ser utilizada para incêndios dessa classe, tendo em vista a Classe E, que trata dos
que líquidos inflamáveis e água são incompatíveis em caso de incêndios. incêndios em instalações
que manipulam material
São aqueles que envolvem equipamentos elétricos de um modo geral, radioativo e químico, capazes

C
quadros elétricos, motores elétricos etc. Para esse tipo de fogo, o de comprometer a integridade
recomendado é o extintor de CO2 ou extintores com carga de produtos
física do homem; e a Classe
químicos secos e específicos. A água não deve ser utilizada para
incêndios dessa classe. O inconveniente de se utilizar PQS e demais K, que envolve atividades que
produtos químicos secos é que deixam nos equipamentos resíduos utilizam gordura animal e
difíceis de serem removidos. vegetal, no estado líquido ou
sólido (CARVALHO, 2013).
São aqueles que envolvem metais combustíveis (pirofóricos), tais como

D
magnésio ou sódio. A água pode reagir com o sódio e outros metais
alcalinos explosivamente, portanto não use água! Os extintores de
CO2 não são capazes de conter um incêndio da Classe D, portanto
devem ser utilizados somente extintores do tipo PQS.

Fonte: Norma 9.443:2002 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2002).

343
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

Indicações para o uso dos vários tipos de extintor, mencionados


no Quadro 3, são apresentadas a seguir.
Quadro 3 – Agentes extintores

Tipo de extintor Finalidades


São ideais para uso em ambientes em que existe a possibilidade da geração
PÓ QUÍMICO de múltiplos tipos de incêndios e oferecem uma excelente proteção geral.
SECO Os extintores PQS são a única solução eficaz para incêndios envolvendo
gases inflamáveis.
São ideais para uso em incêndios que envolvem materiais combustíveis sólidos
e são altamente eficazes em incêndios de líquidos inflamáveis. A camada
ESPUMA
de espuma aplicada por esses extintores ajuda a evitar a reignição após a
extinção do fogo.
Extintores de CO2 são adequados para uso em incêndios de líquidos
DIÓXIDO DE inflamáveis e são extremamente eficazes na extinção de incêndios envolvendo
CARBONO equipamentos elétricos. O CO2 é também um dos agentes de extintor mais
limpo e não deixa nenhum resíduo quando utilizado na extinção do fogo.
São adequados para utilização em ambientes que contêm materiais combustíveis
ÁGUA sólidos, tais como madeira, papel e têxteis. É importante lembrar que a água
conduz eletricidade e não deve ser utilizada em equipamentos elétricos.

Recomendações para o uso de extintores


Algumas regras devem ser observadas e cumpridas, obrigatoriamente,
no que tange ao uso dos extintores de incêndio:
1. Para que um extintor de incêndio seja utilizado, é necessária a
obediência estrita a normas brasileiras ou regulamentos técnicos do
Instituto Nacional de Metrologia e Qualidade Industrial (Inmetro).
2. Os extintores devem ser submetidos, mensalmente, a rigorosa
vistoria, quando são examinados aspecto externo, lacres,
manômetros (se pressurizados) e se os bicos de aspersão e as
válvulas de alívio não apresentam obstrução.
3. As informações inerentes ao extintor devem estar disponíveis na
etiqueta de identificação, presa, obrigatoriamente, ao corpo do
extintor, onde constam a data em que foi submetido à recarga,
a próxima data para recarga e o número de identificação. Essa
etiqueta deve ser protegida ao máximo, para não ser danificada, e
as informações, perdidas.
4. Os extintores de pressão injetada devem ser submetidos à pesagem,
de preferência semestralmente, para que seja garantida a totalidade
da recarga, que não deverá ter perda acima de 10% do peso
original. No caso de perda de peso, o cilindro deve ser submetido à
recarga.
5. Os extintores de espuma devem ser inspecionados e recarregados
anualmente.

344
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

6. Quanto à localização dos extintores, eles devem ser colocados em


locais de fácil visualização, de fácil acesso e, preferencialmente, em
um ponto cujo acesso não seja dificultado pelo fogo, em caso de
incêndio.
7. Os locais destinados aos extintores devem ser identificados
de acordo com as normas vigentes. No piso, o local deve ser
identificado por pintura de um quadrado de, no mínimo, 1m2, na
cor vermelha. Essa área deve estar livre de qualquer obstrução.

Como utilizar um extintor de forma segura


Para manejar um extintor de forma eficiente e segura, há alguns passos
a serem seguidos:

1. Segurar o extintor firmemente, puxar e rodar, concomitantemente, o


pino de segurança.
Atenção: esse pino garante a segurança para que o extintor não seja
acionado acidentalmente.

2. Aponte o bico do extintor em direção à base do fogo.


Atenção: mantenha uma distância de, pelo menos, 8 metros do fogo.
Observe a direção do vento. Se o vento estiver soprando em sua direção,
mude a posição em relação ao fogo.

3. Pressione a alça para descarregar o extintor.


Atenção: peça ajuda e tenha outros extintores nas proximidades, pois,
dependendo do tipo de extintor, a carga do componente poderá não ser
suficiente. Caso não consiga debelar as chamas, saia do local e chame o
Corpo de Bombeiros.

4. Varrer o bocal de trás para frente e de lado a lado até que as chamas
sejam extintas.
Atenção: fique atento, pois as chamas podem voltar a acender!

Considerações finais
Falar em biossegurança significa procurar cuidar da vida de forma ética.
Para tanto, os ambientes de trabalho da rede de frio de imunobiológicos
devem estar em condições adequadas, assim como os trabalhadores,
gestores e usuários devem conhecer as chamadas “boas práticas da
biossegurança”. Por isso, há extrema necessidade de educação perma-
nente dos trabalhadores para que eles possam acompanhar o avanço
tecnológico e realizar o trabalho de forma preventiva e resolutiva.

345
R EDE DE F RIO: GESTÃO , ESPECIFICIDADE E ATIVIDADES

O mesmo entendimento pode ser aplicado, também, à questão do


incêndio, pois tem íntima relação com a biossegurança. É muito impor-
tante ter conhecimentos gerais que possam auxiliar na redução das
possibilidades de geração de incêndio.

Portanto, é fundamental estar atento às normas e às boas práticas que


garantem não só a sua segurança, mas a de todos que dependem do seu
trabalho. Lembre que o aprendizado deve ser contínuo, com a finali-
dade de garantir a qualidade necessária para a prestação de serviços, no
tocante à rede de frio de imunobiológicos.

Referências
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Disponível em: <http://goo.gl/L6zta0>. Acesso em 5 ago. 2016.

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BRASIL. Lei n. 11.105, de 24 de março de 2005. Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1º do


art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização
de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados,
cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei
n. 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória n. 2.191-9, de 23 de agosto de 2001,
e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei n. 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 mar. 2005. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11105.htm>. Acesso em: 24 out. 2016. 

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das


Doenças Transmissíveis. Manual de rede de frio do Programa Nacional de Imunizações. 4. ed.
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CARVALHO, P. R. O olhar docente sobre a biossegurança no ensino de ciências: um estudo em


escolas da rede pública do Rio de Janeiro. Tese (Doutorado) - Instituto Oswaldo Cruz, Rio de
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CARVALHO, P. R. Boas práticas químicas em biossegurança. 2. ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2013.

346
Noções gerais sobre biossegurança e a questão do incêndio

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hospital universitário. Revista Gaúcha de Enfermagem, Porto Alegre, v. 31, n. 4, p. 615-622, 2010.

347
Formato: 205 x 260mm
Tipografia: Meridien LT Std e Frutiger Lt Std
Papel do Miolo: Offset 90g/m2
Papel e Acabamento Capa: Papel Cartão supremo 250g/m2
Ctp Digital: Walprint Gráfica e Editora
Impressão e acabamento: Walprint Gráfica e Editora

Rio de Janeiro, julho de 2017.


Marileide do Nascimento Silva
Regina Fernandes Flauzino
E esse diálogo torna-se evidente ao longo O Programa Nacional de Imunizações é
dos capítulos, quando são propostas uma iniciativa exitosa e reconhecida
reflexões sobre a prática dos profissionais mundialmente. Com metas ambiciosas
da rede de frio, os desafios e as e eficiência, tem assegurado à
dificuldades que marcam a gestão dessa população a proteção e prevenção de
rede; quando se estimula a articulação das doenças por meio de ampla e contínua

Organizadoras
Rede de Frio: gestão, especificidades e atividades versa sobre o complexo
práticas individuais com os princípios oferta de vacinas; também vem
sistema logístico adotado pela rede de frio de imunobiológico e imple-
teóricos discutidos na obra; e quando se ampliando, gradualmente, a cobertura
mentado por equipes com perfis profissionais diversificados, nos níveis
incentiva a autonomia do leitor para vacinal em todo o país, notadamente
nacional, regional, estadual, municipal e local, com a finalidade de garan-
buscar mais informações e continuar seu na faixa etária infantil. Conquistas
aprendizado ao longo da vida.
tir a eficácia e a qualidade dos imunobiológicos oferecidos aos cidadãos. como essas não seriam possíveis sem a
formulação e a implementação de uma
O livro analisa, sob a ótica do planejamento, da gestão e dos processos de complexa rede de armazenagem,
O compartilhamento de ideias por meio do
diálogo entre autores e leitores, condição
trabalho, os caminhos percorridos pelas vacinas dos laboratórios fabrican- conservação, manipulação, distribuição
fundamental para a construção de novos tes até as comunidades longínquas, de difícil acesso, ressaltando as condi- e transporte de vacinas, com atuação
saberes e novas práticas, reforça nosso ções requeridas para a manutenção da sua integridade e a observância em toda a extensão territorial do nosso

GESTÃO, ESPECIFICIDADES
convencimento do ineditismo e da das normas de manuseio dos imunobiológicos. Oferece uma visão comple- grandioso país – a Rede de Frio de
importância desta obra para qualificar ta de como opera, passo a passo, a rede de frio do Programa Nacional de Imunobiológicos.
a atuação dos profissionais e, por Imunizações no país, em diferentes realidades sociopolíticas, econômicas
conseguinte, aprimorar, fortalecer a gestão e culturais. Conforme sugere o título, Rede de Frio:
da rede de frio de imunobiológicos, gestão, especificidades e atividades
força-motriz do Programa Nacional de Publicada pela Editora Fiocruz, em parceria com a Escola Nacional de aborda uma complexidade de
Imunizações. Saúde Pública Sergio Arouca/Coordenação de Desenvolvimento Educacio- estruturas e processos que, no âmbito
nal e Educação a Distância (ENSP/CDEAD), a obra, por sua especificidade e da atenção básica, se entrelaçam,

E ATIVIDADES
Hermano Albuquerque de Castro aprofundamento, é leitura recomendada para todos os profissionais de se articulam, para assegurar o pleno
Diretor da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
ENSP/Fiocruz saúde da cadeia de frio e da sala de imunizações do Brasil. funcionamento da rede. Com essa
abordagem, a obra cumpre dupla
Anakeila de Barros Stauffer finalidade. A primeira, oferecer aos
Diretora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio
EPSJV/Fiocruz leitores um panorama das questões
relacionadas à gestão do processo de
trabalho em rede de frio; e a segunda,
apresentar, de forma didática, as
especificidades desse processo e suas
relações com as práticas de vacinação,
no contexto das políticas públicas de
saúde no SUS.

O livro reuniu autores de diversas


instituições, pesquisadores,
Ministério da Governo especialistas, professores, técnicos,
Saúde Federal
todos com larga experiência na área e
objetivos comuns, entre eles, dialogar
com os leitores.

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