Vírgula

Fazer download em docx, pdf ou txt
Fazer download em docx, pdf ou txt
Você está na página 1de 9

Vírgula

Por Dad Squarisi

Guarde isto. O emprego da vírgula independe de respiração ou de


preferências. Trata-se de pausa ditada pela sintaxe. Três regras orientam o
emprego do sinalzinho. Ele separa:

1. Termos coordenados
2. Termos explicativos
3. Termos deslocados

Pré-regras
No emprego da vírgula, há dois pecados mortais:
1. Separar o sujeito do verbo. Cair na esparrela é como isolar a cabeça do
corpo – mata a frase. Erro grosseiro, revela falta de domínio linguístico.
Para evitá-lo, localize o sujeito. Dobre a atenção se ele estiver depois
do verbo: Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva
(sujeito) presidiram o Brasil (predicado).
Receberam entusiasmado aplauso (predicado) os filmes que disputam o
Oscar (sujeito). É a grande atração entre as estreias dos cinemas da cidade
(predicado) o filme que mistura humor e crítica política (sujeito). Hoje se
iniciam (predicado) as aulas na escola pública (sujeito).
2. Separar o verbo do complemento. É, pois, proibido pôr vírgula entre o
verbo e o objeto (direto ou indireto): A Comissão Disciplinar da Fifa
aplicou (verbo) a pena de quatro jogos e mais 30 dias de suspensão
(objeto direto) ao jogador Edmundo (objeto indireto). O presidente
anunciou (verbo) que vai reunir os presidentes dos partidos políticos e
líderes do Congresso (objeto direto). Grave problema (objeto direto) o
governador (sujeito) vai enfrentar (verbo) no retorno das férias.

Termos coordenados
Coordenado significa colocado com, um ao lado do outro. É como os livros na
estante. A gente os organiza um ao lado do outro – e eles mantêm a
independência. Um não invade as páginas do outro. O mesmo ocorre com a
língua. Termos (sem verbo) e orações (com verbo) podem coordenar-se.
Basta ter mais de um:
● sujeito: Paulo, Luís e Maria foram ao cinema.
● objeto direto: Comprei carne, queijo, frutas, legumes, cereais.
● objeto indireto: Gosto de cinema, teatro, leitura.
● predicativo: Viviane é bonita, elegante e estudiosa.
● adjunto adnominal: Visite uma cidade limpa, organizada e charmosa.
● Adjunto adverbial: Ele vai ao clube hoje, amanhã e depois de amanhã.
Oe
Não há sinais inocentes. Separar os termos da enumeração por vírgula ou
pela conjunção e dá recados diferentes. A ausência do e significa que a
relação não chegou ao fim. Há mais. A presença do monossílabo diz o
contrário. É isso e nada mais. Compare: No mercado, comprei frutas, carnes,
bebidas, cereais. No mercado, comprei frutas, carnes, bebidas e cereais.
Etc.
Etc. é a abreviatura de (e) (t)antas (c)oisas. Mas, apesar da presença do e,
pode-se antecedê-lo de vírgula. Ou não. É que o danadinho é tão antigo (vem
do latim) que as pessoas de memória curta lhe esqueceram a origem.
Tratam-no como se fosse uma palavra qualquer. Oba! Com ele, é acertar ou
acertar: No mercado, comprei frutas, carnes, bebidas, cereais, etc. No
mercado, comprei frutas, carnes, bebidas, cereais etc.
Atenção
Etc. escreve-se com ponto no finzinho. Não se trata de escolha. Mas de
obrigatoriedade. Se o ponto coincide com o término do período, nada de dose
dupla. Fique com um só: Fez palestras para pais, aluno, professores etc.

Orações coordenadas

As orações coordenadas podem ser separadas por vírgula ou por conjunção


coordenativa. No primeiro caso, chamam-se assindéticas:
Cheguei, / vi, / venci.
Acordei, / liguei a máquina, /comecei a escrever.
No segundo, sindéticas:
Trabalhamos / e estudamos.
Não trabalhamos / nem estudamos.
Paulo fez campanha durante quatro anos, / mas perdeu a eleição.
Não fale alto, / pois estamos em uma biblioteca.
Fez competente campanha publicitária, / logo ganhou pontos na avaliação.
Ora chove, / ora faz sol.

Vírgula antes do e
Ao separar orações, a conjunção e só é antecedida de vírgula se preencher
duas condições: ligar orações com sujeitos diferentes e haver o risco de
ambiguidade:
Os Estados Unidos atacaram o Iraque, e a Rússia reagiu. ( Sem a vírgula, a
primeira leitura dá a impressão de que os Estados Unidos atacaram o Iraque
e a Rússia. Não é o caso.)
As orações coordenativas recebem o nome da conjunção coordenada que a
introduz. São cinco:

Conjunções coordenativas
aditiva: e, nem
adversativa: mas, porém, todavia, contudo, no entanto, entretanto
alternativa: ou…ou, ora…ora, já…já
explicativa: que, porque, pois
conclusiva: logo, portanto, pois.

Superdica
Como distinguir o pois explicativo do conclusivo?
1. O explicativo vem depois de ordem ou pedido: Feche a janela, / pois
venta forte. Por favor, não façam barulho, / pois o bebê está dormindo.
2. O conclusivo nunca introduz a oração. Aparece no meio: Tirei nota
baixa na prova, / não consegui, pois, classificação. Não trabalha nos
fins de semana; / pode, pois, sair com os filhos.

Termos explicativos

O termo explicativo tem várias caras. Uma é velha conhecida. Chama-se


aposto. Os professores ensinam que ele não faz falta. Verdade? Sim. A
ausência da ilustre criatura não causa prejuízo ao entendimento da frase. Por
isso, ela vem obrigatoriamente separada por vírgula ou travessões:
D. Pedro II, imperador do Brasil, morreu em Paris.
Brasília — a capital desta alegre Pindorama — tem atraído a curiosidade de
estrangeiros mundo afora.
Barack Obama, ex-presidente dos Estados Unidos, venceu duas eleições.
Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, está em Israel.

Explicativo e restritivo
Compare as frases:
A capital do Brasil, Brasília, localiza-se no Planalto Central.
A ex-capital do Brasil Salvador tem um carnaval animadíssimo.
Por que um nome vem entre vírgulas e outro não? É chute? Não. O segredo
reside no que vem antes de Brasília e Salvador. No primeiro caso, é capital
do Brasil. Quantas existem? Só uma. Brasília é termo explicativo. Funciona
como aposto. Daí as vírgulas.
Há mais de uma ex-capital – Salvador e Rio de Janeiro. Se não digo a qual
me refiro, deixo o leitor numa enrascada. Pode ser uma ou outra. Aí só há um
jeito: dar nome ao boi. Salvador é termo restritivo. Vem soltinho da silva.

Clareza
Meu filho Marcelo estudou na UnB.
Ops! Marcelo é termo restritivo ou explicativo? Depende do antecedente. Eu
tenho um filho ou mais de um filho? Se um, é termo explicativo. Separa-se
por vírgula. Se mais de um, restritivo. Aparece sem lenço nem documento.
Mais exemplos? Ei-los:
Minha mãe, Rosa, mora em São Paulo (só tenho uma mãe).
Minha tia Maria chega amanhã do Rio (tenho mais de uma tia).
Os netos de Carla Rogério e Daniel estudam nos Estados Unidos (Carla tem
mais de dois netos).

Abre e fecha
Faça o serviço completo. O termo explicativo vem presinho. Ora entre
vírgulas. Ora entre travessões. Ora entre vírgula e ponto. Ora entre travessão
e ponto:
Dom Casmurro, de Machado de Assis, é obra-prima do Realismo brasileiro.
Dom Casmurro – de Machado de Assis – é obra-prima do Realismo
brasileiro.
Comprei um Fit, carro da Honda.
Comprei um Fit – carro da Honda.

Orações explicativas

A língua é um conjunto de possibilidades. Flexível, oferece vários jeitos de


dizer a mesma coisa. Veja:
O aluno estudioso tira boas notas.
O aluno que estuda tira boas notas.
Ambas as frases dizem que há alunos e alunos. Não é qualquer um que tira
boas notas. Só chega lá quem se debruça sobre os livros. Numa, o termo
restritivo é adjetivo (estudioso). Noutra, oração adjetiva (que estuda). O
tratamento se mantém. Nada de vírgula.

Com as explicativas ocorre o mesmo:


O homem, mortal, tem alma imortal.
O homem, que é mortal, tem alma imortal.
Viu? Não existem homens mortais e homens imortais. São todos mortais. O
adjetivo e a oração adjetiva são explicativos. Vêm entre vírgulas.

Termos deslocados

A ordem direta – sujeito, verbo, complementos – é a preferida da clareza. Ela


evita erros comuns ao ritmo apressado do trabalho. Mas, volta e meia, a
inversa tem a vez. A vírgula, então, entra em campo. Com um cuidado:
mesmo deslocados, sujeito e objeto não se isolam: Maria comprou uma bolsa
na liquidação (ordem direta). Comprou Maria uma bolsa na liquidação (ordem
inversa). Uma bolsa Maria comprou na liquidação (ordem inversa).
Outros termos não gozam do privilégio. É o caso do adjunto adverbial e da
oração adverbial. O lugar deles é na rabeira. Observe:
Ordem direta: O presidente se encontrou com o primeiro-ministro de Israel
em Telavive.
Ordem inversa: Em Telavive, o presidente se encontrou com o primeiro
ministro de Israel. O presidente se encontrou, em Telavive, com o primeiro-
ministro de Israel.
Se quiser
É facultativo o emprego da vírgula se o adjunto adverbial tiver uma palavra:
Aqui, fala-se português. Aqui se fala português.
Ontem, visitei o Museu da República. Ontem visitei o Museu da República.
Visitei, ontem, o Museu da República. Visitei ontem o Museu da República.

Orações deslocadas
Na ordem direta, a oração principal vem na frente. A adverbial, atrás. Assim:
Ordem direta: O presidente disse isso quando chegou.
Ordem inversa: Quando chegou, o presidente disse isso.
Ordem direta: Correu muito porque temia perder o voo.
Ordem inversa: Porque temia perder o voo, correu muito.
Ordem direta: Trabalho nos fins de semana para aumentar minha renda.
Ordem inversa: Para aumentar minha renda, trabalho nos fins de semana.
Ordem direta: Fizemos o trabalho conforme combinamos com os professores.
Ordem inversa: Conforme combinamos com os professores, fizemos os
trabalhos.
Ordem direta: O presidente se encontrou com os ministros da área
econômica porque queria discutir a política de juros.
Ordem inversa: Porque queria discutir a política de juros, o presidente se
encontrou com os ministros da área econômica. O presidente, porque queria
discutir a política de juros, se encontrou com os ministros da área econômica.

Endereços

Ao escrever o endereço, use vírgula entre o nome do logradouro e o número


da casa ou edifício: Avenida Lins de Vasconcelos, 234; Avenida Paulista,
316, apartamento 13.
Nos endereços de Brasília, não use vírgula entre a indicação da quadra ou do
setor e o número: SQS 310, bloco C, ap.407; SCLN 208, bloco C, loja 5.

CEP, telefone e caixa postal


Sabia? A indicação do CEP, da caixa postal e do número do telefone não é
seguida de vírgula ou outro sinal de pontuação: CEP 70710-500; Caixa
Postal 134; Fone 316-2094.

Textos legais

Se a referência obedecer à ordem crescente (do menor para o maior), não


use vírgula. Caso contrário, sim: Inciso II do parágrafo 2º do artigo 5º da
Constituição Federal. Constituição Federal, art. 5º, parágrafo 2º, inciso II.
Sem mistura
Escolha a ordem de sua preferência. Mas misturar é proibido. Siga do
começo ao fim a crescente ou a decrescente.
Data
Ponha a data do texto também entre vírgulas: O Decreto 15.613, de 29.4.94,
autoriza… A Medida Provisória 45, de 6.6.93, regulamenta…

Vocativo

O vocativo não faz parte dos termos essenciais, integrantes ou acessórios.


Por isso vem sempre – sempre mesmo – separado por vírgula: Deus, ó Deus,
onde estás que não me escutas? Alô, Sílvio, tudo bem? Entre, Maria, que vai
chover.
O que é
A palavra vocativo vem do latim vocare (chamar). Pertence à família de
vocação (chamamento da alma). Seguir a vocação é atender a voz interior.
Sempre que você se dirigir a alguém, não duvide. Estará usando o vocativo.
“Paulo, tome banho”, manda a mãe. Paulo é o vocativo. Alô, Carlos, tudo
bem? Diz Maria ao telefone. Carlos é o vocativo. “Senhor Diretor”, começa o
ofício com o vocativo.
Truque
Há um truque pra identificar o vocativo – antecedê-lo de ó. Se soar bem, sem
forçar a barra, não duvide. Separe o termo por vírgula: Bem-vinda, ó Maria.
(ó) Maria, bem-vinda. Ó Paulo, tome banho logo. Alô, ó Carlos, tudo bem? O
que houve com você, ó criatura insensata? Acorda, ó Brasil. Até tu, ó Brutus.
Literatura
A literatura usa e abusa do vocativo. “Deus, ó Deus, onde estás que não me
escutas?”, pergunta Castro Alves em Vozes d´África. “Tu choraste em
presença da morte,/ Em presença de estranhos choraste? / Não descende o
covarde do forte. / Tu, covarde, meu filho não és”, escreve Gonçalves Dias
em I´Juca Pirama. “Entra, minha filha, senão vais virar prostituta”, ameaça a
experiente senhora. “Deus te ouça, minha mãe, Deus te ouça”, responde a
moça assanhada do poema de Ascenso Ferreira.

Você também pode gostar