Metodologia Do Ensino de Futebol e Futsal

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METODOLOGIA DO ENSINO DE FUTEBOL E FUTSAL

Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo


na sociedade brasileira e possuem vínculos com
aspectos culturais. Poucas manifestações artísticas
e esportivas representam tão bem a cultura
brasileira como esses esportes, que possuem
estilos próprios e personificam o estereótipo
do brasileiro. Com o tempo, eles evoluíram e
ganharam proporção de espetáculo, movimentando
muito dinheiro e interesses às vezes escusos,
mas, mesmo assim, sem perderem sua força de
encantamento junto aos jovens e às crianças.

Nesta obra, são levantadas questões importantes


para o desenvolvimento do jovem nessas
modalidades, como aspectos pedagógicos
e metodológicos aplicados ao futebol e ao
futsal, abordando os meios de potencializar a
aprendizagem técnica, tática, física e psicológica,
além de apresentar as particularidades do
processo de crescimento e maturação, as regras,
as leis e os direitos que regem os esportes. Tudo
isso sem se desconectar de uma visão holística,
pautada no entendimento de que o futebol e o
futsal são construídos sob relações humanas e
aliados à força atrativa que o esporte tem para
ser utilizado como ferramenta de educação e de
construção de valores de cidadania.

O objetivo desta obra é oferecer informações e


induzir reflexões para que o leitor consiga, por
meio do senso crítico, encontrar soluções para
os diversos desafios que emergirem durante sua
caminhada como educador-treinador. RICARDO C. ALVES FERREIRA

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6667-4

59520 9 788538 766674


Metodologia do ensino
de futebol e futsal

Ricardo C. Alves Ferreira

IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: EnvatoElements

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
F443m

Ferreira, Ricardo C. Alves


Metodologia do ensino de futebol e futsal / Ricardo C. Alves Ferreira. -
1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2020.
128p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6667-4

1. Futebol - Esporte. 2. Futsal - Esporte. 3. Educação física -


Estudo e ensino. 4. Professores de educação física - Formação. 5. Prática de
ensino. I. Título..
CDD: 796.3348071
20-64482
CDU: 796.33(07)

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Ricardo C. Alves Doutorando em Ciências do Movimento Humano pela
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Mestre
Ferreira em Engenharia Biomédica, com foco em fisiologia
do exercício, e graduado em Educação Física pela
Universidade do Vale do Paraíba (Univap). Professor no
ensino superior, ministrando as disciplinas de Futebol
e Futsal, Aprendizagem e Desenvolvimento Motor,
Fisiologia do Exercício, Biomecânica e Educação Física
Adaptada e Atividade Física em Condições Especiais. É
preparador físico e fisiologista em equipes de futebol
profissional, com experiência no Brasil e no exterior.
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SUMÁRIO
1 A história do futebol e do futsal  9
1.1 Origem e evolução do futebol  10
1.2 Futebol no mundo  12
1.3 Futebol no Brasil  16
1.4 Aspectos socioculturais  19
1.5 Origem e evolução do futsal  20

2 O ensino de futebol e de futsal  24


2.1 Reflexões acerca da formação do professor  25
2.2 Ambiente de aprendizagem  27
2.3 Métodos de ensino  29
2.4 Abordagens pedagógicas  32
2.5 Pedagogia dos jogos  35
2.6 Iniciação esportiva e capacidades motoras  37

3 Fundamentos técnicos do futebol e do futsal  41


3.1 Passe   42
3.2 Domínio   43
3.3 Condução   44
3.4 Drible   45
3.5 Chute   46
3.6 Cabeceio   48
3.7 Ações do goleiro   49
3.8 Relação jogador-bola   50

4 Princípios táticos do jogo  53


4.1 Modelo de jogo   54
4.2 Momentos do jogo   55
4.3 Princípios de jogo   58
4.4 Funções e posições no futebol   60
4.5 Sistemas táticos no futebol   61
4.6 Funções e posições no futsal   63
4.7 Sistemas táticos no futsal   64
5 Fisiologia e preparação física  69
5.1 Demandas fisiológicas   70
5.2 Treinamento do jovem   76
5.3 Jogos condicionantes   81
5.4 Avaliações físicas e controle de treinamento   83

6 A regra do jogo  89
6.1 Regras do futebol   89
6.2 Adaptações para categorias de base no futebol   97
6.3 Regras do futsal   99
6.4 Adaptações para categorias de base no futsal   103

7 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades  106


7.1 Papel do professor   107
7.2 Currículo de formação   110
7.3 Entendendo o contexto escolar   117
7.4 Planejando a aula   118
7.5 Futebol e futsal como ferramentas de desenvolvimento humano   122

Gabarito   125
APRESENTAÇÃO
Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo na sociedade brasileira e
possuem vínculos com aspectos culturais. Poucas manifestações artísticas e
esportivas representam tão bem a cultura brasileira como esses esportes, que
possuem estilos próprios e personificam o estereótipo do brasileiro. Com o
tempo, eles evoluíram e ganharam proporção de espetáculo, movimentando
muito dinheiro e interesses às vezes escusos, mas, mesmo assim, sem
perderem sua força de encantamento junto aos jovens e às crianças.
A sociedade também se modificou. As grandes áreas e o espaço fértil
para a brincadeira informal perderam lugar para a urbanização, e o futebol
aprendido em ruas, campinhos e vielas agora passa a ser responsabilidade de
professores em escolinhas e outros ambientes formais.
Nesta obra, são levantadas questões importantes para o desenvolvimento
do jovem nas modalidades, como aspectos pedagógicos e metodológicos
aplicados ao futebol e ao futsal, abordando os meios de potencializar a
aprendizagem técnica, tática, física e psicológica, além de apresentar as
particularidades do processo de crescimento e maturação, as regras, as leis
e os direitos que regem os esportes. Tudo isso sem se desconectar de uma
visão holística, pautada no entendimento de que o futebol e o futsal são
construídos sob relações humanas e aliados à força atrativa que o esporte
tem para ser utilizado como ferramenta de educação e de construção de
valores de cidadania.
O objetivo desta obra é oferecer informações e induzir reflexões para que
você consiga, por meio do senso crítico, encontrar soluções para os diversos
desafios que emergirem durante sua caminhada como educador-treinador.
Bons estudos.
1
A história do futebol
e do futsal
O futebol é, sem dúvida, um dos esportes mais praticados no
mundo. Os números contabilizam algo em torno de 265 milhões
de pessoas o praticando em todo o planeta – além dos adeptos,
torcedores e admiradores mundo afora. Muito mais do que so-
mente uma mera atividade esportiva, esse esporte se tornou um
fenômeno global que influencia costumes e hábitos. No Brasil, o
futebol e o futsal invadem a vida cotidiana das pessoas, o que o
aproxima muito mais de um conceito de dimensão cultural. Para
perguntas como “o que você vai ser quando crescer?”, não é difícil
escutar a resposta: “quero ser jogador(a) de futebol”.
Já reparou que usamos metáforas futebolísticas em nossas con-
versas quase a todo momento? Quando algo nos agrada, foi “show
de bola”, se alguém foi desprezado, foi colocado “para escanteio”,
a quase conquista de um objetivo significa que “bateu na trave”.
Tanta influência na vida das pessoas já justificaria tal curiosida-
de em entender melhor esse fenômeno e como atingiu tamanha
magnitude. Mas compreender a importância dele como elemento
e parte integrante de uma sociedade é um dos papéis do educa-
dor, já que um esporte com tanta força e relevância pode ser uti-
lizado como ferramenta de educação, proporcionando inclusão
social, oportunidades, acesso à informação e assistencialismo.
De fato, não é só futebol, caso seja um apreciador da modali-
dade, você pode, de repente, ter várias informações a respeito do
futebol moderno, mas você sabe como esse esporte começou?
A partir de agora te convidamos a uma viagem na história pelas
lentes do futebol.

A história do futebol e do futsal 9


1.1 Origem e evolução do futebol
Vídeo O esporte que conhecemos por futebol teve origem e se desenvol-
veu na Inglaterra no século XIV, porém versões alternativas do jogo
podem ter existido muito antes, em locais distintos e distantes. As in-
formações sobre esses jogos com bola, ancestrais do futebol, são im-
precisas, mas eles existiram e são considerados parte fundamental da
história do esporte.

Há grandes indícios de que o futebol tenha surgido na China, e


evidências levam os historiadores a crer que um jogo praticado com
gestos técnicos semelhantes ao que vemos no futebol de hoje era
praticado durante a dinastia Han, cerca de dois séculos a.C. Em um
espaço determinado e com gols nas duas extremidades, além de uma
espécie de rede presa a dois postes de bambu, os chineses chutavam
um objeto esférico feito de couro recheado com pele ou penas. Esse jogo
era chamado de cuju, que significa chutar bola. A prática era comumente
usada para treinamento militar (KITCHING, 2015, GOLDBLATT, 2007).

Alguns fatos também apontam para o Japão, mais precisamente em


Kyoto, durante o período Asuka (500-700 a.C.). Os japoneses pratica-
vam um jogo conhecido como Kemari, que tinha algo ritualístico e ceri-
monial em seu conceito, e a ideia básica era chutar a bola para cima,
fazendo com que os demais participantes precisassem golpeá-la sem-
pre para o alto.

Os povos romanos também praticavam jogos envolvendo diferentes


tipos de bolas, por exemplo, um jogo chamado harpastum. Acredita-se
que este possa ter sido adotado e adaptado de um jogo grego chamado
episkyros, após o domínio Romano. Esses jogos, em particular, também
são muito similares ao rúgbi, mas, ainda assim, eles representam formas
ancestrais do futebol e, como o cuju na China, o harpastum parece estar
bastante associado a treinamento e preparação militar.
Figura 1
Representação do Kemari em
Stray Toki/Shutterstock

evento folclórico no Japão

10 Metodologia do ensino de futebol e futsal


A prática de golpear uma bola parece atrair o ser humano há
muito tempo. Jogos contendo bolas estão presentes em quase todas
as culturas antigas ao redor do mundo. Exemplos ocorrem nas velhas
culturas mesoamericanas há mais de três mil anos, de acordo com
achados transcritos em rochas. É interessante o fato de que esses
povos tinham uma exclusividade na característica do jogo: a bola
quicava. Isso ocorria porque somente eles tinham a borracha, típica
das florestas indígenas tropicais.

O jogo tinha algo de ritual religioso e místico, fragmentos arqueo-


lógicos mostram que locais próprios para abrigar espectadores eram
construídos, com uma espécie de arquibancada de pedras. A bola de
borracha variava de tamanho, era movida entre uma linha central e
golpeada por dois oponentes ou dois times que se utilizavam dos
ombros, das canelas, dos quadris e das nádegas. Há vestígios de
variações desses jogos mesoamericanos e imprecisões quanto aos
rituais de sacrifício associados a eles, mas é possível, ainda, observar
jogos muito similares nas culturas indígenas atuais (KITCHING, 2015;
GOLDBLATT, 2007).

1.1.1 Futebol na Idade Média


Por volta do século IX, pessoas chutavam bolas feitas de bexiga de
porco nas ruas como forma de diversão. Alguns séculos depois, joga-
dores possuíam algo mais similar a uma bola e o esporte era pratica-
do em áreas abertas de grande escala, como grandes áreas verdes ou
em estradas. Entretanto, não havia nenhuma regra, eram permitidos,
então, empurrões, socos e pontapés, e parte do jogo era extrema-
mente rude e violento. Com um número incontável de jogadores que
tentavam chegar a determinadas áreas carregando a bola, frequente-
mente as partidas eram disputadas entre duas cidades ou vilas, com
o objetivo de chegar aos limites da cidade – alternativamente, o jogo
poderia ser dividido entre idade ou casados e solteiros. Um jogo pa-
recido chamado La Soule era, também, praticado aproximadamente
nesse período e parece ter se disseminado na França.

Eventualmente, o jogo ficava extremamente violento, o que o tornava


alvo de críticas. O Rei Edward III baniu o jogo em 1365 devido à sua extre-
ma violência e o Rei James I da Escócia o proibiu em 1424.

A história do futebol e do futsal 11


Figura 2
Selo em que está impresso o jogo praticado em 1827 Um outro exemplo de jogo similar, praticado fora
das áreas anglo-saxônicas e célticas, também con-
Sergey Goryachev/Shutterstock

siderado como precursor do futebol, é o Gioco del


Calcio. Era praticado no período medieval e início da
era moderna em Florença, na Itália, até quase desa-
parecer – possivelmente banido na metade do século
XVIII. Hoje, sobrevive somente como espetáculo para
turistas. As regras desse jogo foram publicadas por
Giovanni Bardi, em 1580.

1.2 Futebol no mundo


Vídeo O século XIX pode ser considerado um marco importante para o
futebol, já que a prática do jogo de bola já era bastante popular por ser
um modo comum de diversão entre o povo. Entretanto, era, de certa
maneira, discriminado pela aristocracia que, até então, preferia o crí-
quete e o jóquei. Apesar da disseminação da prática, uma característica
ainda permanecia: a falta de padronização do modo de jogar. Por um
longo período, não era clara a distinção entre futebol e rúgbi, havendo
muitas variações relacionadas ao tamanho da bola, ao número de joga-
dores por equipe, à dimensão do campo e ao tempo de duração.

O jogo era frequentemente praticado em escolas, as mais tradicio-


nais eram a Rugby e a Eton. Na Escola Rugby, por exemplo, as regras
permitiam segurar e correr com a bola nas mãos, dando origem ao rú-
gbi que conhecemos hoje. Na Eton, em contrapartida, a bola era gol-
peada com os pés; assim, o jogo praticado nessa escola era chamado
de the dribbling game, ou seja, o jogo de driblar. Enquanto o da Rugby
era chamado de the running game, traduzido como o jogo de correr.

Em 1848, Charles Thring, estudante da Universidade de Cambridge,


surgiu com a primeira tentativa de um código universal, as
regras de Cambridge. Essa ação é considerada
Figura 3
Modelo de chuteira e bola o momento crucial no desenvolvimento
utilizados no séc. XIX do futebol, com estudantes das várias
escolas se unindo para criar um código
que agradaria a todos. Entretanto,
não foi fácil, pois, anos depois,
BBBBBBBBB
BBBB
BBB
BB

12
B

Metodologia do ensino de futebol e futsal


cada uma das principais escolas – Eton, Harrow, Rugby, Westminster,
Winchester, Marlborough e Charterhouse – continuava utilizando suas
próprias versões do futebol. Até 1863, por exemplo, a prática de carregar
a bola com as mãos ainda ocorria em várias escolas.

Figura 4
Pintura representando a prática que deu origem ao futebol

Breskit/Wikimedia Commons
Podemos perceber que as dimensões do campo não eram claras. Constantemente, os
expectadores do lado de fora recolocavam a bola em jogo com os pés, não sendo possível
estabelecer quem era jogador ou expectador.

O desenvolvimento inicial de regras ajudou a tornar o futebol um jogo


Curiosidade
menos violento e brutal. O estabelecimento de regras continuou ao longo
Era possível observar uma
dos anos, sem, até aquele momento, a definição do tamanho do campo.
interessante diferença de estilos
O número de jogadores era variado de acordo com o tamanho do campo, naquela época: enquanto as
não havia uniformes para distinguir os jogadores de uma mesma equipe e equipes da Inglaterra preferiam
correr para frente, verticalizando
era comum os jogadores usarem chapéus durante a prática. o jogo, os escoceses tinham
Em 1867, os representantes dos onze clubes londrinos e um estilo de jogar priorizando
a troca de passes entre os
universidades marcaram uma reunião na Taverna Freemason para jogadores. Isso acontecia, talvez,
discutir os princípios e os valores morais do jogo, nascendo, assim, a pela forte influência do rúgbi na
forma inglesa de jogar.
Football Association, ou Associação do Futebol, primeira associação do
que conhecemos hoje como futebol (AGOSTINO, 2011).

1.2.1 Profissionalismo
Em 1872, foi disputada a primeira Football Association Cup, conheci-
da como FA CUP, uma tradicional competição atualmente. Pelas regras
da Associação de Futebol, os jogadores teriam que continuar sendo

A história do futebol e do futsal 13


Figura 5 amadores e seria proibida qualquer compensação financeira para jogar
Linha do tempo com a por qualquer time. Mas os jogadores se mostraram insatisfeitos com o
inserção de algumas das
regras do futebol moderno fato de terem que trabalhar em fábricas e ainda treinarem, enquanto os
clubes cobravam ingressos para os expectadores assistirem às partidas.
1871
Inserção do pênalti A popularidade do esporte continuou aumentando e o número de
no jogo. expectadores também. A partir desse momento, os clubes passaram
a pagar por seus jogadores. Para atrair mais público e conquistas,
donos das equipes – muitas delas atreladas a fábricas – contratavam
1909
jogadores de outras regiões, iniciando, assim, a caracterização da
Diferenciação do
profissionalização do futebol.
goleiro, que passa a
usar cores diferentes A Federação Internacional de Futebol (FIFA) foi fundada em 1904
dos demais jogadores.
e sua ata de fundação contou com signatários de representantes da
França, da Bélgica, da Dinamarca, dos Países Baixos, da Espanha, da
Suécia e da Suíça. A Inglaterra e os outros países britânicos não se
1970
Introdução dos juntaram ao grupo no início, pois diziam que, como eles inventaram o
cartões amarelo e jogo, não faria sentido serem subordinados a nenhuma associação. Os
vermelho na Copa.
britânicos passaram a participar da associação no ano seguinte.

No início do século XX, vários países já tinham suas ligas domésti-


1992 cas formadas e, em 1930, a FIFA organizou seu primeiro campeonato
Proibição do uso das mundial de seleções, a primeira Copa do Mundo. Essa competição foi
mãos pelo goleiro
realizada no Uruguai, escolhido para comemorar o centenário da sua
após um recuo.
constituição. Após esse ano, o torneio mais importante de futebol, que
até então ocorriam nos Jogos Olímpicos, passou a ser na Copa. As ligas
1992 domésticas se estabeleceram e aumentaram o número de participan-
Punição para tes, obrigando a criação de segundas e terceiras divisões.
carrinhos por trás
com cartão vermelho Em 1991, a primeira Copa do Mundo para mulheres foi organizada
direto. com sede na China e, desde então, a cada quatro anos o evento acon-
tece, assim como na categoria masculina.
2018
Utilização do VAR
(Video Assistant Referee) 1.2.2 Globalização
na Copa do Mundo
da Rússia para lances
As confederações surgiram para diferentes continentes, a criação delas
duvidosos. fomentou a profissionalização e fortaleceu o esporte. A Confederação
Fonte: Elaborada com base em FIFA, 2017; Sul-Americana de Futebol (Conmebol), entidade que rege o futebol
FIFA, 2020a; FIFA, 2020b
sul-americano e é responsável por organizar as competições eliminatórias
da Copa do Mundo da América do Sul, foi criada em 1916. Em junho de
1954, surgiu a União das Associações Europeias de Futebol (UEFA). No
mesmo ano, foi criada a Confederação Asiática de Futebol (AFC). Já em

14 Metodologia do ensino de futebol e futsal


1957 e 1961 foram criadas, respectivamente, a Confederação Africana de
Futebol (CAF) e a Confederação de Futebol da América do Norte, Central e
Caribe (Concacaf). Um pouco mais tarde, em 1966, surgiu a Confederação
de Futebol da Oceania (OFC).

No fim do século XIX, havia somente alguns clubes de futebol. Inglaterra


e Escócia tinham os primeiros jogos de clubes se enfrentando por volta
dos anos 1870, atualmente são mais de 211 países associados à FIFA.

Além disso, devido à globalização, houve um grande aumento de


países que participam das eliminatórias classificatórias para a Copa do
Mundo; em 1934 eram 32 países e hoje são mais de 200 participantes.

Quadro 1
Copas do Mundo realizadas pela FIFA

ANO CAMPEÃO PLACAR VICE SEDE


1930 Uruguai 4x2 Argentina Uruguai
1934 Itália 2x1 Tchecoslováquia Itália
1938 Itália 4x2 Hungria França
1950 Uruguai 2x1 Brasil Brasil
1954 Alemanha Ocid. 3x2 Hungria Suíça
1958 Brasil 5x2 Suécia Suécia
1962 Brasil 3x1 Checoslováquia Chile
1966 Inglaterra 4x2 Alemanha Ocid. Inglaterra
1970 Brasil 4x1 Itália México
1974 Alemanha Ocid. 2x1 Países Baixos Alemanha Ocid.
1978 Argentina 3x1 Países Baixos Argentina
1982 Itália 3x1 Alemanha Ocid. Espanha
1986 Argentina 3x2 Alemanha Ocid. México
1990 Alemanha Ocid. 1x0 Argentina Itália
1994 Brasil 0 x 0 (3x2 nos pênaltis) Itália E.U.A.
1998 França 3x0 Brasil França
2002 Brasil 2x0 Alemanha Japão/Coreia do Sul
2006 Itália 1 x 1 (5x3 nos pênaltis) França Alemanha
2010 Espanha 1x0 Países Baixos África do Sul
2014 Alemanha 1x0 Argentina Brasil
2018 França 4x2 Croácia Rússia
Fonte: Elaborado pelo autor com base em FIFA, 2020c.

A partir da Copa de 1954, na Suíça, um marco selou o destino do fu-


tebol: a invenção da televisão. A transmissão dos jogos para oito países

A história do futebol e do futsal 15


europeus colocava um fim no monopólio exercido pelo rádio. Em 1958,
na Copa da Suécia, primeira vencida pelo Brasil, quase todos os países da
Europa puderam acompanhar a transmissão ao vivo, enquanto outros
continentes assistiam os jogos com aproximadamente um dia de atraso.
Série Já em 1966, na Inglaterra, as redes de televisão começaram a
Recomendamos a pagar direitos de transmissão, já operando satélites artificiais que
minissérie The English
Game, produzida pela possibilitavam que os jogos ao vivo fossem vistos por dois bilhões de
Netflix. A história se passa pessoas. Só a final entre Inglaterra e Alemanha mobilizou trinta e seis
na Inglaterra no final
do séc. XIX e mostra a países e cerca de 400 milhões de telespectadores (AGOSTINO, 2011).
transformação do futebol
junto aos dilemas da
Daí em diante, fica ainda mais clara a projeção alcançada. Com
sociedade da época. maior interesse televisivo em transmitir jogos e mais marcas atraí-
Direção: Tim Fywell. Inglaterra: das pelo crescente número de consumidores, o esporte alcança um
Netflix, 2020.
patamar no qual os interesses esportivos se confundem com os co-
merciais. Isso fica evidente quando observamos o número de placas de
patrocinadores espalhadas pelo campo, a quantidade de anúncios nas
transmissões e nas camisas das equipes envolvidas, além das partidas
sendo jogadas em horários que atendam à grade televisiva.

1.3 Futebol no Brasil


Vídeo Você sabe quem foi Charles Miller? Ao mencionar a origem do fute-
bol no Brasil, o grande expoente é, sem dúvida alguma, Charles Miller,
figura conhecida quando se trata do assunto.

Segundo Agostino (2011), diferentemente do que você possa


imaginar, o futebol já era jogado aqui no Brasil antes da icônica
chegada de Charles Miller ao porto de Santos. Assim como em outras
cidades pelo mundo (Buenos Aires, Rio de Janeiro, Gênova, Hamburgo),
a disseminação do futebol se deu pelos próprios ingleses comerciantes,
engenheiros de estradas de ferro, instaladores de linhas de telégrafo,
estudantes ou educadores, e marinheiros ou soldados. Todos eram
jogadores em potencial, fazendo demonstrações do jogo em cidades
portuárias.

No entanto, um marco para a disseminação do esporte foi o


entusiasmo de Charles Miller, quem apresentou a modalidade de
maneira organizada aos clubes esportivos da época. Por esse motivo é
considerado por muitos o “pai” do futebol no Brasil. Nascido no Brasil e
filho de um escocês e uma brasileira de origem inglesa, ele passou boa
parte da sua infância e adolescência estudando na Inglaterra, e foi lá

16 Metodologia do ensino de futebol e futsal


que aprendeu a jogar o recém-criado futebol moderno. Ao voltar para
o Brasil, em 1894, para trabalhar em uma companhia de ferro, Miller
trouxe consigo duas bolas, uma bomba para enchê-las, um apito e um
livro de regras universais (OLIVEIRA, 2012).

Apesar de separados por muitas barreiras, trabalho e lazer se com-


pletavam, não sendo poucos aqueles que viam o último como uma
compensação para os sacrifícios que o primeiro impunha. Outra rea-
lidade, também bastante significativa para a difusão do jogo, foi a sua
promoção por meio das próprias companhias capitalistas, em muitos
casos considerando o esporte um mecanismo de disciplina e desenvol-
vimento físico e moral dos trabalhadores (AGOSTINO, 2011).
O futebol parece estar totalmente integrado ao modo de viver do
Brasileiro, a realidade é que a química do Brasileiro com o futebol,
Curiosidade
as interferências socioeconômicas e os atalhos encontrados para
a prática do esporte criaram um enredo próprio. (CARVALHO, Roberto Gomes Pedrosa, nome
dado ao antigo campeonato bra-
2012, p. 311)
sileiro de clubes, foi um jogador
O brasileiro se adaptou ao modo de jogar, o “jeitinho brasileiro” ou de futebol que iniciou sua carrei-
ra no Botafogo, disputou a Copa
futebol arte, como já ouvimos falar, nasceu de uma longa trajetória, do Mundo de 1934 pela Seleção
influenciada pela corrente migratória e pelas colônias britânicas e fran- Brasileira e, posteriormente,
tornou-se um importante
cesas. Essa mistura de características proporcionou ao brasileiro seu
dirigente, ocupando o cargo de
estilo próprio, além da criatividade e da capacidade de improvisação. O presidente da Federação Paulista
Brasil é hoje o país com o maior número de títulos de Copa do Mundo de Futebol.
e reconhecidamente uma das potências do esporte.

A Confederação Brasileira de Desportos (CBD) era a entidade res- Figura 6


ponsável pelo futebol no Brasil. De 1933 até 1954, a competição Pelé, considerado o Rei do
Futebol
principal era o Torneio Rio-São Paulo, que só era disputado
por clubes desses estados. A partir de 1967, a competição pas-
sou a contar com a participação de clubes de outros estados,
já com o nome de Torneio Roberto Gomes Pedrosa, ou
“Robertão”. O primeiro Campeonato Brasileiro de
B BB
BBB

Futebol, popularmente conhecido como Brasileirão,


BBB
BBBB

ocorreu em 1971. E, em 24 de setembro de 1979, foi criada a Confe-


BB
B BB B

deração Brasileira de Futebol (CBF) com a prerrogativa de garan-


BB
BB

tir a gestão independente do futebol brasileiro e das seleções


BB

brasileiras de futebol.

O futebol feminino, por sua vez, durante muito tempo foi


marginalizado e alvo de preconceito por
conta das políticas nacionais. Em 1941,

A história do futebol e do futsal 17


foi assinado um decreto que proibia a prática esportiva alegando-se
não ser condizente com a natureza feminina. Assim, as mulheres foram
proibidas de participarem de modalidades como futebol, futsal, rúgbi,
halterofilismo, lutas e etc.; esse decreto foi revogado somente em 1979
(BASTOS; NAVARRO, 2009).

A inserção da mulher no futebol e no futsal encontra forte relação


com os espaços e papéis conquistados na sociedade, por meio da des-
construção, ainda que pequena, da imagem do futebol como sendo um
esporte somente para homens. Hoje, após muito custo e luta, o futebol
feminino vem ganhando uma projeção importante, tendo sido criados
torneios nacionais e ligas. Estimulados pelas federações, os tradicionais
clubes passaram a contar com equipes de mulheres e dispor de cam-
peonatos organizados pela CBF, transmitidos por emissoras televisivas.
A ideia é de massificar o esporte e desconstruir preconceitos, atraindo
mais praticantes, potencializando, assim, o desenvolvimento das atletas.

Quadro 2
Campeonatos organizados pela CBF

Masculino Feminino

Campeonato Brasileiro (Séries A, Campeonato Brasileiro – Série A1


B, C, D) Campeonato Brasileiro – Série A2
Copa do Brasil Copa do Brasil
Copa do Nordeste
Copa Verde
Super Copa do Brasil

Livro Fonte: Elaborado pelo autor com base em Futebol..., 2020.


O livro Vencer ou morrer: futebol, A partir de 2010, a CBF passou a reconhecer os campeões dos tor-
geopolítica e identidade nacional
mergulha profundamente nos neios disputados entre 1959 e 1970 – o conhecido “Robertão” – com
aspectos sociopolíticos que títulos de campeão brasileiro.
envolveram o futebol ao longo de
sua história, as relações internas O futebol brasileiro é marcado pelo forte equilíbrio na disputa pelo
entre o Estado e a bola e a paixão
do torcedor como instrumento de
título de campeão, enquanto em outras partes do mundo os vence-
interesses pessoais. dores se limitam a três ou quatro equipes que se revezam historica-
AGOSTINO, G. Rio de Janeiro:
FAPERJ: 2. ed.: Mauad, 2011.
mente. No Brasil, dezessete clubes já ganharam o título da principal
competição nacional, o Campeonato Brasileiro.

18 Metodologia do ensino de futebol e futsal


1.4 Aspectos socioculturais
Vídeo Assim como na Inglaterra, o futebol que antes era praticado de ma-
neira bastante informal passou a ganhar espaço nos clubes elitistas.
Com o objetivo de impedir o acesso das classes sociais menos favore-
cidas, os primeiros torneios disputados não contavam com a partici-
pação da classe operária, os clubes estabeleciam rígidas demarcações
sociais e os colégios onde se praticavam o esporte só aceitavam o perfil
de estudantes da alta sociedade paulistana (CARVALHO, 2012).
Os principais times eram formados por profissionais liberais, ser-
vidores públicos e acadêmicos, e eram maioria nos campeonatos nos
bairros elitistas. Os negros começaram a se apresentar na modalidade
aos poucos até ganharem espaço. Isso começou a ocorrer somente em
1923, por meio do clube Vasco da Gama, que tem origem popular e
oportunizou a prática do esporte.

1.4.1 A Violência no futebol


O futebol possui uma capacidade incomum de unir povos, conectar
culturas, romper idiomas e aproximar diferenças religiosas e étnicas.
Entretanto, é importante ressaltar que esse mesmo futebol não está
isento das mazelas da sociedade e tem sido marcado por demons-
trações de violência e vários tipos de intolerância ao longo do tempo.
Relatos envolvendo a violência no futebol são tão antigos quanto as
próprias regras (AGOSTINO, 2011).
Como um esporte com características tão democráticas e que
transmite tanta alegria e paixão pode ser ao mesmo tempo tão violento?
O futebol reflete uma microssociedade compreendida em uma sociedade
maior, ou seja, ele revela uma face escondida na própria pessoa inserida
dentro dessa macrosociedade. Essa pessoa invariavelmente encontra
refúgio em grupos de torcedores com os quais se identificam, para expor
comportamentos de racismo, homofobia e misoginia. Assim também
acontece em redes sociais, manifestações políticas e etc.

1.4.2 O marketing e o capitalismo


O futebol tornou-se um esporte de bilhões, clubes grandes arre-
cadam com patrocinadores, venda dos direitos federativos do atleta,
exposição de suas marcas, direitos de imagem e venda de camisas e

A história do futebol e do futsal 19


de ingressos. Dessa forma, contratam jogadores cada vez mais caros e
pagam salários exorbitantes, recebendo, em troca, mais possibilidades
de conquistas esportivas e maior retorno financeiro.
Com a transformação do futebol, agentes e empresários encontra-
ram a mina de ouro descobrindo potenciais talentos, cheios de sonhos,
e depositando neles toda a expectativa de uma valorização e futura
venda. Não é incomum, nesse meio, histórias nas categorias de base de
jovens jogadores utilizados por investidores e especuladores que “cui-
dam dos atletas” e depois os vendem para faturar fabulosas quantias
sem se importar com a formação humana dos jogadores.
Esse panorama reflete a realidade de poucos clubes e jogadores. A
maior parcela da classe, na verdade, enfrenta duras realidades, com sa-
lários baixos e muitas vezes atrasados, pouca ou nenhuma infraestru-
tura, além de clubes que só disputam campeonatos estaduais. Ou seja,
esses jogadores só têm seus empregos por quatro meses, demonstran-
do a imensa diferença na pirâmide socioeconômica, assim como ocorre
em outros setores em nossa sociedade.
As brilhantes conquistas obtidas pelas seleções brasileiras ao longo
Filme da história exacerbaram o sentimento de amor pelo esporte e, junto
O filme Boleiros, Era uma
a isso, a identificação com o estereótipo do jovem pobre que se torna
vez o futebol traz em seu um astro bem-sucedido – principalmente em um país com séria desi-
enredo histórias caricatas
do futebol do século
gualdade social. Os jogadores de futebol passam a ser ídolos e heróis
passado contadas por um de crianças e jovens. Estes veem no futebol a oportunidade de mudar
grupo de ex-jogadores
de vida. Boa parte destes jovens, entretanto, não chega a se tornar pro-
nostálgicos.
fissional e muitos dos que se tornam não chegam nem perto de con-
Direção: Ugo Giorgetti. Brasil: Paris
Filmes, 1998. quistar as fortunas dos craques dos grandes clubes. Sendo essa uma
realidade que abrange menos de 5% dos atletas profissionais.

1.5 Origem e evolução do futsal


Vídeo Assim como em vários outros esportes, divergências existem
com relação à história do futsal, porém podemos afirmar que é um
jogo nascido na América do Sul. Na década de 1930, o futebol já era
extremamente popular e amplamente massificado, sendo o esporte
preferido em clubes e escolas.
No Uruguai, o professor de Educação Física Juan Carlos Ceriani
adaptou o tradicional jogo de futebol para a sua realidade. Para jogar
futebol, eram necessários 22 jogadores e um campo de dimensões

20 Metodologia do ensino de futebol e futsal


enormes, além dos fatores ambientais. Assim, para facilitar o jogo, ele Figura 7
foi adaptado a um ginásio desportivo, especificamente nas demarca- Linha do tempo de curiosi-
dades do esporte
ções da quadra de basquete do clube, utilizando traves do handebol.
1969
As divergências surgem porque em um período bem próximo, na Foi fundada a Confederação
década de 1940, o Futebol de Salão passou a ser jogado no Brasil. O Sul-Americana de Futebol de
Salão (CSAFS).
professor Habib Maphuz, de uma escola em São Paulo, também teve
a ideia de adaptar sua aula de futebol para um espaço menor e com 1971
menos participantes, possibilitando a prática do esporte aos moldes Foi fundada a Federação
Internacional de Futebol de Salão
possíveis. No Brasil, esse esporte se massificou rapidamente, e as esco- (Fifusa).

las tiveram um grande papel nesse sentido. O país também foi o maior
1982
divulgador da modalidade, incentivando sua internacionalização. No ginásio do Ibirapuera, em São
Paulo, a Fifusa organizou o 1º
Em 1965, o esporte já havia se difundido por toda a América do Sul, Campeonato Mundial de Futebol
de Salão, com a participação
resultando na criação da Confederação Sul-Americana de Futebol de de Brasil, Argentina, Costa
Rica, Checoslováquia, Uruguai,
Salão, composta por Uruguai, Paraguai, Peru, Argentina e Brasil. Após Colômbia, Paraguai, Itália,
México, Holanda e Japão. O Brasil
sua vinculação à FIFA, em 1989, o futsal começou a ter grandes torneios venceu a final contra o Paraguai
por 1 a 0.
organizados, permitindo que a modalidade alcançasse uma grande vi-
1985
sibilidade mundial. Realizou-se, na Espanha, o 2º
Campeonato Mundial de Futebol
Mas qual é o nome correto, futsal ou futebol de salão? Bom, é im- de Salão organizado pela Fifusa.
Novamente o Brasil venceu.
portante que saibamos que não estamos falando do mesmo esporte.
Apesar de ser bastante comum usarmos os dois termos, o futsal teve 1988
sua origem no futebol de salão; inclusive seu nome é uma abreviação Diante das dificuldades da Fifusa
e projetando um futuro melhor
do esporte original. para o futebol de salão, ficou
decidido que a FIFA passasse a
comandar internacionalmente
Devido à sua enorme projeção e na tentativa de normatizar as o esporte.

regras do esporte que se praticava aqui na América do Sul com as do


1989
indoor soccer praticado na Europa, para torná-lo um esporte olímpico,
Foi acordada a fusão FIFA/Fifusa
as regras do futebol de salão se modificaram. Com isso, popularizou-se e constituída, na FIFA, com
previsão estatutária, a Comissão
sem perder as referências do esporte original, surgindo, assim, o futsal. de Futsal.

Segundo Bastos e Navarro (2009), o futsal é o desporto que apre-


1990
senta o maior número de equipes e de atletas, participantes dos jogos
O Brasil desligou-se da Fifusa e
escolares em todas as suas categorias, inclusive com um grande cresci- passou a adotar as novas regras
de jogo emanadas da FIFA.
mento na área feminina. O desenvolvimento do futsal entre as mulheres
cresce em todo planeta. A mídia especializada considera as jogadoras 1992
brasileiras as melhores do mundo, além de serem hexacampeãs do Tor- As Copas do Mundo de
Futsal da FIFA passaram a
ser realizadas de quatro em
neio Mundial de Futsal Feminino e da Copa América de Futsal Feminino. quatro anos, seguindo o
mesmo modelo adotado para
o futebol.

1.5.1 Variações do futebol/futsal Fonte: Elaborada pelo autor com base em O


esporte..., 2020.
O futebol e o futsal, apesar de não serem considerados esportes
genuinamente brasileiros, ajudaram a fomentar modalidades coirmãs

A história do futebol e do futsal 21


tipicamente brasileiras, que contaram com a criatividade e a improvi-
sação. Alguns desses esportes são muito praticados e já conquistaram
projeção internacional.
•• Beach Soccer, ou futebol de areia: futebol, inicialmente praticado
nas areias de Copacabana, que ganhou o mundo e hoje é um
esporte olímpico.
•• Futevôlei: uma mistura interessante de futebol e vôlei amplamen-
te praticado nas cidades litorâneas brasileiras e que ultimamente
vem ganhando espaço nas cidades, com locais construídos para
sua prática.
•• Futebol society ou futebol de 5: praticado em grama sintética e
bastante difundido nas cidades como forma de lazer, o futebol
de 5 também é um esporte paraolímpico, jogado por cegos com
uma bola com guizo.
•• Futmesa: modalidade que começou como recreação dos joga-
dores de futebol – durante momento de lazer no clube ou no
vestiário antes de iniciar os treinos –, mas hoje já existem mesas
Livro
próprias para sua prática.
O livro O que é Futsal, de
Silvia Vieira e Armando
Essas modalidades, além de outros jogos associados ao futebol, são
Freitas, traz um panora-
ma sobre a história da comuns na nossa cultura e ajudam inclusive a abrir mercados alternativos.
modalidade.
O freestyle, por exemplo, é o nome dado a arte de controlar a bola de ma-
VIEIRA, S.; FREITAS, A. Santo André: neira livre, uma mistura de futebol com malabarismo que vem ganhando
Casa da Palavra, 2007.
espaço em eventos esportivos, como demonstração e competição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A história moderna do nosso país também pode ser contada por meio
da evolução do futebol e do futsal. Ao aprofundar nossa visão histórica da
modalidade, estamos também abrindo caminho para discutir os próximos
rumos e o papel desses esportes como transformadores em uma socie-
dade moderna, tecnológica e mais individualista.
O futebol está longe da neutralidade. Ele serviu, em diferentes contex-
tos, contra os poderes opressivos, e para ações revolucionárias. Desde sua
origem, o esporte vem servindo para ideais nobres, como a paralisação de
guerras civis, a luta a favor da liberdade e o combate à fome e ao racismo,
mas também já serviu de ferramenta para ditadores e políticos oportunistas.
Portanto, contextualizar o futebol e o futsal dentro da sociedade
possibilita aos educadores a criação de estratégias de utilização dessas
modalidades de forte apelo cultural e aproximá-las de outras disciplinas e

22 Metodologia do ensino de futebol e futsal


áreas de conhecimento. Contar a história do mundo por meio do futebol,
por exemplo, pode ser um meio de aproximar-se do educando. Ensinar
geografia, sociologia ou matemática baseando-se na evolução do futebol
pode parecer um impulso interessante.

ATIVIDADES
1. Estudar a história do futebol nos permite valorizar suas origens e
manter seus valores. O futebol nasceu como um esporte lúdico e,
como se vê, tornou-se uma grande indústria. Discuta essa ideia.
2. Apesar de ser um ambiente sempre recheado por machismo, hoje
podemos ver mulheres na arbitragem e em competições nacionais
organizadas pela CBF. Você acha que já podemos considerar que a
mulher já conquistou seu espaço no país do futebol?
3. O futebol brasileiro é reconhecido por ser celeiro de craques, pois a cada
geração temos um novo destaque chamando atenção dos grandes clubes
europeus. Descreva esse fenômeno pelo viés sociocultural e histórico.

REFERÊNCIAS
AGOSTINO, G. Vencer ou morrer: futebol, geopolítica e identidade nacional. 2. ed. Rio de
Janeiro: Mauad X, 2011.
BASTOS, P. V.; NAVARRO, A. C. O futsal feminino escolar. Revista Brasileira de Futsal e
Futebol, São Paulo, v.1, n.2, p.144-162, 2009.
CARVALHO J. E. Geopolitica: 150 anos de futebol. São Paulo: Ed. SESI-SP, 2012.
FIFA. London’s football history: Laws of the Game. FIFA, 2017. Disponível em: https://
www.fifa.com/the-best-fifa-football-awards/news/london-s-football-history-laws-of-the-
game-2902981. Acesso em: 21 maio 2020.
FIFA. From 1863 to the Present Day. FIFA, 2020a. Disponível em: https://origin.fifa.com/
about-fifa/who-we-are/the-laws/index.html. Acesso em: 21 maio 2020.
FIFA. History of the Laws of the Game - 1990-2000. FIFA, 2020b. Disponível em: https://
www.fifa.com/news/history-the-laws-the-game-1990-2000-435. Acesso em: 21 maio 2020.
FIFA. Archive. FIFA, 2020c. Disponível em: https://www.fifa.com/fifa-tournaments/archive/.
Acesso em: 21 maio 2020.
FUTEBOL brasileiro. CBF, 2020. Disponível em: www.cbf.com.br/futebol-brasileiro. Acesso
em: 21 maio 2020.
GOLDBLATT, D. The Ball is round: A Global History of Football. Ed Penguin UK, 2007.
KITCHING, G. Feature: modern sport: society and competition: the origins of football:
history, ideology and the making of ‘the people’s game’. History Workshop Journal, v. 79, n.
I, p. 127–153, 2015.
O ESPORTE da bola pesada que virou uma paixão. CBFS, 2020. Disponível em: https://www.
cbfs.com.br/futsal-origem. Acesso em: 21 maio 2020.
OLIVEIRA, A. F. Origem do futebol na Inglaterra no Brasil. Revista Brasileira de Futsal e
Futebol, São Paulo, v.4, n.13, p.170-174, set./out./nov./dez. 2012.
SARMENTO, C. E. A regra do jogo: uma história institucional da CBF. Rio de Janeiro: CPDOC,
2006.

A história do futebol e do futsal 23


2
O ensino de futebol
e de futsal
A popularidade do futebol e do futsal é um fato facilmente
observado em nosso país, onde escolinhas de futebol são muito
comuns. O jogo de rua, antes aprendido de maneira natural
e livre, é agora ensinado em espaços formais, seja em clubes
representados pelas chamadas categorias de base, em instituições
privadas (bastante comuns nos centros urbanos, geralmente com
campos de grama sintética) ou em organizações públicas, escolas
e secretarias de esportes. Dessa forma, o futebol de rua passa a
ser mediado, surgindo a figura do professor-treinador, responsável
por conduzir o ensino.
Nesse sentido, este capítulo pretende trazer reflexões acerca
da importância desse professor-treinador na iniciação ao futebol e
futsal e no seu ensino, assim como a relação com o ambiente que
cerca esse indivíduo. Ciente da sua relevância, esse agente deve
assumir protagonismo no processo de ensino-aprendizagem. O
contrário disso significaria destinar ao acaso a plenitude da cons-
trução das habilidades esportivas.
Além disso, trataremos da importância da criação de ambientes
favoráveis para que esse processo ocorra, a qual não se limita
ao espaço físico, mas atinge todo entorno. Isso implica repensar
a aula, pois cada aspecto se torna uma parte importante do
todo nessa trajetória. O ensino de qualquer habilidade exige
capacitação do profissional, mas esta é especialmente demandada
dentro do ambiente esportivo, carregado de paradigmas e com
forte ancoragem no empirismo, no qual a cobrança por resultados
e o olhar competitivo precoce podem ser muitas vezes um grande
empecilho para a formação. Por fim, discutiremos diferentes
métodos de ensino, abordando os processos pedagógicos e a visão
humanística, para que você domine o conteúdo e possa entender
mais sobre como ensinar futebol e futsal.

24 Metodologia do ensino de futebol e futsal


2.1 Reflexões acerca da formação do professor
Vídeo Mundo afora, o Brasil sempre despertou atenção por sua
capacidade de revelar talentos e praticar um futebol atrevido e
criativo. Mas que fenômeno é esse? Será um dom? Há algo diferente
no DNA do brasileiro que já nasce craque? Ao nos depararmos com
uma criança talentosa com a bola nos pés, não é difícil escutarmos
frases como: “esse já nasceu com o dom!” ou “esse é um goleador
nato!”. Contudo, será mesmo que o inatismo tem tanta presença
assim no talento?

Claro que questões genéticas podem interferir em vários fatores,


por exemplo, quanto às capacidades físicas, o tipo de fibra muscular
pode influenciar diretamente a capacidade de produção de força do
indivíduo. Porém, o fator realmente determinante para a construção
das habilidades é a interação com o ambiente. A criança aprende vi-
venciando e experimentando por meio da diversificação e da curiosida-
de e, de fato, o talento irá emergir das oportunidades oferecidas, pelo
interacionismo.

De acordo com Reverdito, Scaglia e Paes (2009), é possível estabele-


cer uma diferença entre as visões inatista e interacionista:

Visão inatista Visão interacionista

Traz a ideia de que o indivíduo já O talento é fruto das relações com-


nasce com determinada habilidade; plexas entre o indivíduo e o am-
o talento está na sua herança gené- biente que o cerca. A pedagogia é
tica e basta cuidar e esperar para baseada no planejamento de ações
que ele desabroche. e na construção de tarefas que favo-
reçam o desenvolvimento.

O talento é herdado. O talento é construído.

Dessa forma, romper com antigas ideias e quebrar paradigmas do


tipo “talento é genético” ou “está no sangue” é o primeiro passo para
assumirmos as rédeas do ensino de qualidade, formando professores
com visão ampla, que, em primeiro lugar, entendam o contexto em que
estão inseridos (esporte educacional, especialização ou alto rendimen-
to), ou seja, para quem se está ensinando.

O ensino de futebol e de futsal 25


Glossário O ensino de futebol evoluiu de uma prática empírica, pautada nas
crenças e nos padrões que se repetem, ou seja, o professor reproduz o
empirismo: visão que propõe
todo conhecimento como que ele aprendeu com seu professor que, por sua vez, também repassou
proveniente unicamente da o que sabia da maneira que aprendeu quando jogava. Além disso, o fute-
experiência, limitando-se ao
bol pode não conduzir ao alto rendimento, mas, ainda assim, não deixa de
que pode ser captado do mundo
externo por meio dos sentidos. ter importância na vida da pessoa. Ele pode trazer valores fundamentais
para a construção de uma sociedade melhor, como respeito, cordialidade,
companheirismo, resiliência, além de saúde e bem-estar. Essa visão torna
a formação e a capacitação do professor-técnico imprescindíveis, conside-
rando que, em mãos erradas, o esporte pode ter esses valores invertidos,
tornando-se indisciplina, raiva, impaciência e intolerância. Segundo Freire
(1989), por si só, o esporte não possui somente valores positivos. Ele pode
ser tudo, a grande questão é o que fazemos dele.
Assim, inevitavelmente, surgem relevantes questionamentos: es-
tamos ensinando bem o futebol? Respeitamos as fases de desenvol-
vimento e permitimos a natural capacidade criativa do jogador, ou
estamos extrapolando as exigências e mecanizando o ensino? Estamos
oportunizando a aprendizagem democraticamente ou privilegiamos os
mais hábeis tecnicamente ou mais aptos fisicamente? Estamos ensi-
nando somente o esporte em si ou proporcionando uma educação in-
tegral, alicerçada nos valores éticos e morais para a construção de uma
sociedade justa e com indivíduos mais bem preparados?
Com base nessas perguntas, temos os seguintes pilares do ensino
do futebol (FREIRE, 1998):

Ensinar O futebol é um jogo de decisões a serem tomadas


a todo momento, então, o sucesso depende da
bem capacidade de tomar decisões corretas e em curto
futebol espaço de tempo. Portanto, saber estimular a cria-
tividade e a autonomia do aluno é imprescindível.

Ao longo dos anos, o futebol tem permanecido


Ensinar um esporte machista e excludente: meninas são
bem desencorajadas a jogar desde cedo e os mais gor-
dinhos ou menos habilidosos são alvo de chacota.
futebol Nesse sentido, quebrar as barreiras e inserir todos
a todos de maneira democrática, independentemente de
limitações físicas ou cognitivas, é um dos pilares
do ensino de futebol. Para ensinar bem e a todos,
a escola ideal não deve tratar igualmente pessoas
diferentes que têm necessidades diferentes, as
quais devem ser respeitadas. Enfim, ela deve tra-
tar a todos com respeito.

(Continua)
26 Metodologia do ensino de futebol e futsal
Ensinar O professor-técnico deve estar alinhado às práti-
cas pedagógicas esportivas e, ao mesmo tempo,
mais do não deve esquecer que o futebol, pela sua força
que futebol sociocultural, tem papel preponderante na educa- Livro
a todos ção e formação humana.
Sugerimos a leitura do li-
vro Fora de Série – Outliers,
de Malcolm Gladwell. O
autor descreve, em dife-
Em modalidades como o futebol e o futsal, caracterizadas pela im-
rentes capítulos, histórias
previsibilidade, mecanizar o ensino parece ser pouco útil. Devemos re- que reforçam que o
talento surge do ambien-
pensar no método muito além do oferecimento de respostas prontas,
te onde o indivíduo está
de modo que possamos fazer as perguntas corretas e os alunos sejam inserido e da quantidade
de horas aplicadas para
capazes de construir suas respostas. O talento esportivo, assim como o
a construção de tal
talento em qualquer área, surge da qualidade e quantidade de estímu- habilidade.
los oferecidos, portanto, a responsabilidade do professor de potencia- Rio de Janeiro: Sextante, 2008.
lizar e otimizar o tempo do aluno em cada aula é crucial.

2.2 Ambiente de aprendizagem


Vídeo Os ambientes de aprendizagem mudaram bastante com a moderniza-
ção dos centros urbanos. Antes, o futebol era aprendido naturalmente e
em ambientes informais, jogado em campinhos improvisados, em espa-
ços de dimensões e formas geométricas diversas, em pisos que poderiam
ser de grama, areia, terra, asfalto ou lama. Também eram comuns traves
feitas com pedaços de madeira, garrafas ou improvisadas com chinelos, e
as bolas eram dos mais diversos tamanhos, pesos e materiais.

E quanto aos colegas e adversários? Também eram os mais diver-


sos: o time da rua debaixo, a turma da outra escola, os garotos de todas
as idades etc. Às vezes o tempo era marcado no relógio, às vezes o jogo
ia até escurecer o dia. O número de jogadores então... indefinido! Ou
seja, as regras eram adaptáveis.

Perceba que, muito mais do que um retrato do Brasil de outrora,


estamos destacando a quantidade de cenários possíveis e evidencian-
do a imprevisibilidade característica na qual o jogo era aprendido.
Todas essas nuances auxiliaram a construir o nosso estilo de jogar,
a melhorar a relação jogador-bola, a adaptar-nos constantemente a
novas condições todos os dias. Esses cenários cotidianos ensinaram
nossos maiores craques e os deram competências genuinamente
brasileiras, como a versatilidade e destreza para um drible, o caráter

O ensino de futebol e de futsal 27


improvisado. A diversificação dos ambientes proporcionou de modo
natural a esses indivíduos a essência do jogo de futebol: a imprevisi-
bilidade (MACHADO et al., 2018).

Atualmente, os cenários são outros em grande parte do país. A vida


urbana e cosmopolita se expandiu, os ambientes informais imergiram
e hoje é mais comum o futebol ser ensinado em locais próprios para
isso, como em clubes, escolas etc. E o ambiente, que antes era o princi-
pal mediador da construção das habilidades, foi substituído pela figura
do treinador. Se já não temos o ambiente imprevisível que exigia que o
indivíduo se adaptasse rapidamente durante o jogo e que estimulava
a capacidade criativa do jogador, agora, proporcionar essas competên-
cias passou a ser de responsabilidade do profissional envolvido com o
ensino (SCAGLIA, 1996; BETTEGA et al., 2019).

Criar um ambiente de aprendizagem é, acima de tudo, oportunizar


o ensino e oferecer aos alunos conteúdos pedagogicamente bem ela-
borados. É importante deixar claro que quando tratamos de ambiente
de aprendizagem, não estamos falando somente das estruturas físicas,
mas do contexto todo. Nesse sentido, a escola tem um papel funda-
mental e não deve se apoiar exclusivamente nos aspectos competiti-
vos, o que levaria a um caráter de exclusão.

2.2.1 O ambiente escolar


É sabido que nem todas as escolas possuem espaço adequado para
a prática do futebol ou do futsal. O mais comum é que tenhamos à
disposição uma quadra poliesportiva, nem sempre com dimensões
oficiais, utilizada para diversas atividades escolares simultaneamente
– o que proporcionaria maior dificuldade na criação desses cenários.
Livro
Essa realidade comum reforça ainda mais a importância do professor-
Na obra O Futsal e a
-técnico, pois ele deve ser capaz de criar e proporcionar atividades
Escola: uma Perspectiva
Pedagógica, os auto- nesse espaço, possibilitando uma melhor relação do aluno com a bola
res apresentam uma e instigando o gosto pela prática nos estudantes.
proposta pedagógica
para o ensino do futsal, O professor-técnico deve estar atento para que o cenário que está
destacando o papel da
escola junto ao esporte
construindo para a aula, ou sessão de treino, seja favorável à apren-
na construção de conhe- dizagem, visto que as habilidades são formadas em ambientes propí-
cimentos sociais, culturais
e psicológicos.
cios para seu desenvolvimento. Percebemos, então, que deve partir do
professor a iniciativa de manipular o ambiente e contextualizá-lo para
VOSER, R. C.; GIUSTI, J. G. M. 2. ed.
Porto Alegre: Penso, 2015. que seja possível atingir seu objetivo. Algumas ações que podem ser
desenvolvidas por esse profissional são:

28 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Fazer atividades dinâmicas Ter equidade no ensino, con-
Evitar uso de filas, pois isso
em que todos possam es- siderando que necessidades
tira o foco da criança e tor-
tar ativos a todo momento. diferentes merecem aten-
na o exercício chato.
ções distintas.

Cuidar para que não haja ex-


Mostrar igualdade no respei- Formular aulas estimulantes
clusão por sexo, idade, peso,
to e no ensino dos valores. e participativas.
altura ou habilidade prévia.

De acordo com Galatti e Paes (2006), quando tratamos do esporte na


educação física escolar, os propósitos devem estar claros e condizentes
com os pressupostos pedagógicos da escola, como a formação do indi-
víduo em sua integralidade, adotando métodos cuja ênfase é propor a
imprevisibilidade e os problemas a serem resolvidos pelos praticantes.

2.3 Métodos de ensino


Vídeo Até recentemente, na maioria dos locais onde a prática esportiva
é constante (principalmente o futebol), o ensino estava baseado uni-
camente em uma prática voltada a técnicas do jogo, o que não ne-
cessariamente resultava em jogar bem. Hoje, a ciência do esporte é
contundente em nos mostrar que o futebol e o futsal são modalidades
de características peculiares, pois o jogo se desenvolve em um ambien-
te desprovido de previsibilidade.

O ensino ideal do esporte é aquele com pressupostos metodológi-


cos pautados em necessidades reais e com uma pedagogia que respei-
te seus praticantes quanto à sua faixa etária, suas motivações e seus
interesses. Nesse sentido, a seguir, veremos alguns métodos de ensino
e suas diferentes características.

2.3.1 Método analítico


Também conhecido como método por partes, o método analítico
tem origem na ideia de ensinar as habilidades com base nos funda-
mentos de uma determinada modalidade e por meio da repetição dos
exercícios, destinados à aprendizagem dos gestos separadamente do
jogo formal. Ou seja, é um método que fragmenta o jogo em partes,
treina cada uma isoladamente, para depois juntá-las ao final.

O ensino de futebol e de futsal 29


O modelo tem sido usado há bastante tempo no Brasil e parte da
premissa de se eliminar os erros e se aprimorar os gestos. Com base
em uma visão empirista, as escolas de esportes e os clubes frequente-
mente vêm ensinando futsal e futebol, assim como outros esportes co-
letivos, dessa maneira. Ele também pode ser chamado de mecanicista,
porque, por exemplo, o fundamento de passe é treinado de maneira
repetitiva, isolada e exaustivamente na tentativa de especializar o
gesto.

Por um lado, a crítica a esse modelo está na ausência do próprio jogo,


tornando algo que é prazeroso para as crianças e jovens em algo meca-
nizado e descontextualizado. Muitas das vezes, eles nem entendem o
motivo das repetições. Por outro, esse modelo apresenta uma evolução
Figura 1 mais rápida e visível de determinada técnica e, como
Prática mais técnica e afastada da situação de jogo
o desempenho é perceptível nos resultados de jogos
SeventyFour/Shutterstock

e torneios, crê-se que esse método é eficaz.

A Figura 1 ilustra uma característica bastante


comum ao método analítico: o uso de equipamen-
tos que não fazem parte do jogo formal para trei-
nar determinadas habilidades ou ensinar técnicas
específicas.

Algumas características do método analítico são:

Distanciamento das situações


Repetição excessiva Diminuição do caráter
reais do jogo, como enfrenta-
de movimentos. coletivo.
mentos imprevisíveis.

Foco na avaliação e correção Apartamento da técnica da


Desinteresse da criança.
de um gesto isolado. tática e do físico.

Dessa forma, esse método preconiza o ensino e o aprimoramento


dos fundamentos, como passe, domínio ou controle de bola, condução,
drible, chutes e cabeceios, buscando desenvolvê-los sem oposição ou
enfrentamentos. Geralmente, são usadas séries de exercícios, deter-
minadas pelo tempo ou número de repetições, feitas individualmente,
em duplas ou utilizando colunas ou filas de jogadores, que realizam
determinado gesto, um por vez. Um exemplo seria o treino de passe
em dupla, no qual um indivíduo fica de frente para o outro em uma dis-
tância pré-determinada pelo professor tocando a bola alternadamente.

30 Metodologia do ensino de futebol e futsal


2.3.2 Método global
O método global, também conhecido como método do todo, consis-
te no ensino do esporte por meio de jogos de complexidade menor,
mas ainda com vínculos e semelhanças situacionais ao jogo formal.
Esse método preconiza o ensino das habilidades dentro do próprio Figura 2
jogo, criando tarefas específicas para ressaltar ou induzir determina- Treinamento técnico integrado
ao jogo
do gesto. O método global tem se mostrado muito mais importante
no processo formativo do indivíduo. Na questão motivacional, ele tem
ampla vantagem, já que permite variar os tipos de jogos, tornando
o ensino atrativo, além de permitir a imprevisibilidade característi-
ca do esporte. Além disso, oportuniza a criatividade e induz a to-
madas de decisão.

Para Garganta e Gréhaigne (1999) e Teoldo, Guilherme e

FFFFFF
Garganta (2015), o futebol, assim como os demais esportes

FFFFFF
coletivos, tem como característica a riqueza de situações im-

F F FF FFF
previsíveis. Durante o jogo, surgem tarefas motoras de

FFF
F
grande complexidade para as quais não existe um mo-
delo de execução e resolução fixo. Nesse contexto, não
há preocupação com a forma de execução, mas sim
com o cumprimento da tarefa. Assim, não há jeito certo
de fazer algo, contanto que seja feito. O futebol, por ser um jogo, deve
ser aprendido como tal, ou seja, jogando. O ensino pautado na fragmen-
tação do jogo em partes exclui a relação espaço-jogador e jogador-bola
e restringe drasticamente a eficiência do ensino (SCAGLIA et al., 2013).

Algumas características do método global são: Livro


Para entender um pouco
mais sobre a pedagogia e
A imprevisibili-
os métodos baseados em
Motivante, Participação de Semelhança dade estimula
jogos, sugerimos a obra
pois jogar é mais alunos ao com o jogo a criatividade Pedagogia do esporte:
divertido. mesmo tempo. formal. e as decisões Jogos esportivos coletivos.
mais rápidas. Os autores discutem o
papel dos jogos coletivos
na Educação Física, com
suas respectivas implica-
Segundo Garganta et al. (2003), o jogo de futebol tem por
ções no desenvolvimento
característica uma elevada versatilidade perceptiva, direcional de crianças e jovens nos
esportes coletivos.
e motora. Além disso, o desenvolvimento é condicionado por
NAVARRO, A. C.; ALMEIDA ,
múltiplos fatores, como a movimentação dos colegas de equipe e
R.; SANTANA, W. C. São Paulo:
dos adversários, os setores e espaços onde as ações acontecem, Phorte, 2015.

O ensino de futebol e de futsal 31


a distância entre os alvos, a velocidade da bola e a sua trajetória
etc. Isso tudo ainda muda de acordo com o momento do jogo
(momento ofensivo ou defensivo). Por isso, o método de ensino deve
contemplar a capacidade dos jovens em se organizarem e efetuarem
ações conforme o que o momento do jogo solicita.

2.4 Abordagens pedagógicas


1
Vídeo As abordagens pedagógicas e os estilos de ensino são norteado-
res no processo de aprendizagem e importantes no desenvolvimen-
to do trabalho do professor. A apropriação dessas teorias capacita
esse profissional para que ele tenha discernimento no momento da
elaboração de conteúdos, objetivos e estratégias da aula. A aborda-
1
gem do ensino do esporte na escola não pode estar limitada apenas
As abordagens são teorias apli-
cadas à pedagogia e os estilos à transmissão de técnicas e táticas, o que seria uma visão reduzida e
ou linhas de ensino se referem a fragmentada desse fenômeno.
como o professor interage com
o aprendiz. O esporte não é educativo por si só – aliás, o futebol pode ter tudo:
o bem ou o mal, a sapiência ou a ignorância, o inclusivo ou o exclusivo
–, e o professor é o responsável por transformá-lo em um objeto de
educação e transmissor de virtudes (GOULART, 2018). Para Paes (1998,
p. 112),
o esporte é uma representação simbólica da vida, da natureza
educacional, podendo promover no praticante modificações
tanto na compreensão de valores como de costumes e modo
de comportamento, interferindo no desenvolvimento individual,
aproximando pessoas que têm, neste fenômeno, um meio para
estabelecer e manter um melhor relacionamento social.

Portanto, o esporte na escola não pode ter como objetivo princi-


pal formar atletas, apesar de poder ser um efeito secundário, que não
pode ser desprezado. O objetivo maior do esporte deve ser a expan-
são de suas inúmeras possibilidades de atividades formativas. Dessa
forma, outras dimensões, além das esportivas, devem constar na pro-
posta pedagógica, como a atenção aos aspectos sociais, culturais, his-
tóricos, antropológicos etc. (FINCK, 2011).

Pessoas aprendem de maneiras diferentes, e cada uma traz consigo


histórias e vivências distintas. Transmitir informações é algo complexo e
as práticas bem-sucedidas de hoje não garantem o mesmo sucesso ama-

32 Metodologia do ensino de futebol e futsal


nhã, e assim também funciona com turmas diferentes. Logo, uma única
corrente não deve orientar a prática pedagógica, mas, sim, elementos de
diversas linhas (GOULART, 2018).

Humanizar as relações e enxergar dentro das equipes e pessoas são


um excelente início. Pessoas têm pontos de partidas diferentes e tra-
zem consigo heranças biológicas, ambientais e culturais distintas. Por-
tanto, um ambiente de ensino democrático é aquele que enxerga cada
indivíduo como único em sua necessidade (FREIRE, 1989).

2.4.1 A classificação das abordagens pedagógicas


A classificação das abordagens pedagógicas varia na literatura. Po-
demos observar diversos modelos – algumas vezes, diferentes somen-
te na nomenclatura ou na descrição das características, dependendo
do autor pesquisado. É importante entender esses conceitos, mais do
que definir exatamente todos. Desse modo, apresentamos algumas
abordagens possíveis, de acordo com Finck (2011) e Goulart (2018):

Desenvolvimentista Construtivista Crítico-Superadora

Defende que, na fase funda- O jogo assume papel de conteú- Sua finalidade é a transformação
mental do desenvolvimento do e estratégia, sendo o princi- social, tendo os temas cultura
motor, as crianças devem pal meio de ensino. Ele deve ser corporal e visão histórica como
ser envolvidas na exploração utilizado em um ambiente praze- parte fundamental e integrante
e experimentação das suas roso para o praticante. dos conteúdos. Além disso, visa
capacidades motoras. A aula desenvolver o senso crítico e
deve privilegiar a aprendiza- questionador do indivíduo, esti-
gem motora, cognitiva e afe- mulando sua compreensão de
tiva de acordo com o nível mundo.
de crescimento e desenvolvi-
mento do aluno.

Saúde Renovada Humanista

É voltada à valorização da prá- Caracteriza-se por valorizar o


tica do exercício físico, contri- aluno e não a atividade. Os pro-
buindo para uma conscienti- fessores ajudam a desenvolver
zação da importância de um atitudes positivas nos jovens
estilo de vida ativo e saudável. com relação ao papel da ativida-
de em suas vidas, dando signifi-
cação e proporcionado momen-
tos de escolha e criatividade.

O ensino de futebol e de futsal 33


Livro O conhecimento das abordagens pedagógicas e dos estilos de en-
Recomendamos a leitura sino nos ajudam a nortear nosso caminho como professores e nos
do livro A Educação Física
e o esporte na escola: coti- fazem refletir sobre a maneira que interagimos com os alunos e as
diano, saberes e formação, possibilidades de potencializarmos a aprendizagem. É importante
de Silvia Finck. O livro
trata, de maneira bastante que o professor possua um repertório amplo de técnicas e estilos –
abrangente, os métodos e trabalhando, principalmente, com turmas grandes e heterogêneas –,
as abordagens de ensino.
e que utilize várias linhas.
FINCK, S. C. M. Curitiba:
InterSaberes, 2012. Quadro 1
Benefícios do planejamento estratégico

Exemplo com
Estilos de ensino Filosofia
treinamento de passe

Centrada no professor, tradicional.


O professor explica, demonstra e espera
O aluno aprende conforme instrução, de-
Comandos que o aluno execute exatamente como foi
monstração e tomada de decisão do pro-
demonstrado.
fessor.

O professor explica e demonstra, e o aluno


O aluno tem maior responsabilidade no pro- pode, por exemplo, apresentar variações no
Tarefas
cesso de aprendizagem. posicionamento do tronco, do pé de apoio
ou na velocidade de execução.

Altamente centrada no aluno. O professor explica e demonstra, os alunos


O professor determina os objetivos e con- podem apresentar variações e o processo
Avaliação recíproca
teúdos e os alunos são incumbidos de parti- se dá por avaliação e feedbacks dos próprios
cipar da aprendizagem uns dos outros. colegas (trabalho em dupla, por exemplo).

Um número maior de decisões é transferido O professor explica e demonstra vários mo-


Programação ao aprendiz. dos de execução, com níveis de dificuldade
individualizada O aluno pode assumir seu próprio ritmo. diferentes, e o aluno executa aqueles de
Mostra respeito pelas individualidades. acordo com o seu grau de habilidade.

O professor separa pequenos grupos e os


O professor estabelece uma resposta pré- orienta sobre a tarefa, mas não especifica a
-determinada e esperada para o problema. forma de execução. Em alguns momentos,
Descoberta orientada
Então, faz perguntas considerando que elas ele interrompe a prática e faz questiona-
ou descoberta guiada
produzam a necessidade da busca de alter- mentos sobre o gesto, no sentido de esti-
nativas para a solução por parte dos alunos. mular que parta do aluno a descoberta da
melhor forma.

A tarefa, o modo (movimentando ou para-


O aluno é definitivamente o centro. Ele
do), a formação (duplas, trios), a execução
passa a ser o elemento ativo, formulando
(pé direito ou esquerdo) etc. são criados
Solução de problemas perguntas e buscando respostas. O
pelos alunos. Após a sessão, o professor
professor seleciona o conteúdo e estimula
discute com eles, propondo como é possível
a curiosidade.
melhorar.

Fonte: Adaptado pelo autor com base em Goulart, 2018.

34 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Com base nas teorias pedagógicas tradicionais e na busca de uma Vídeo
estrutura que possa ser mais eficiente, surge como nova perspectiva a No vídeo Ed Física Brasil
entrevista - João Claudio
chamada Pedagogia Não-Linear (PNL). Para Machado et al. (2018), a PNL Machado, o Prof. Dr. João
é representada em sua essência pelos jogos reduzidos e seu aspecto- Cláudio Machado, da
Universidade Federal do
-chave é a manipulação das tarefas, do ambiente e do indivíduo. Ela não Amazonas, fala sobre as
segue uma construção linear de conhecimento, mas oferece ajustes novas abordagens pedagó-
gicas aplicadas ao futebol.
para atender às necessidades do aluno. Também segundo os autores, Vale a pena conferir!
essa visão é baseada nos princípios do futebol de rua. Disponível em: https://youtu.
be/7W4Gkv6yMK0. Acesso em: 15
jun. 2020.

2.5 Pedagogia dos jogos


Vídeo Quando falamos de jogo, qual é a primeira coisa que vem à sua ca-
beça? Muita confusão é gerada com relação a essa definição. Quando o
assunto é jogo, para muitas pessoas, a primeira ideia que surge é o re-
sultado do jogo anterior do seu time de coração. Já para outras, a ideia
de jogo está atrelada à brincadeira ou à ludicidade. De fato, o jogo é
tudo isso e está no meio dessas duas ideias, sendo, então, tarefa difícil
defini-lo. Podemos entender que tudo que fica entre a brincadeira des-
compromissada e o esporte extremamente rígido poderia ser chama-
do de jogo. Segundo Huizinga (1999, p. 2), “no jogo, existe alguma coisa
‘em jogo’ que transcende as necessidades imediatas da vida e confere
um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa”.

As tarefas criadas dentro dos jogos devem obedecer ao grau de com-


plexidade condizente com as faixas etárias ou com o nível de adaptação
do indivíduo. Devem funcionar como ferramenta de estímulo para que a
criança aprenda a pensar de maneira crítica e a resolver problemas com-
plexos, trabalhe de maneira colaborativa, e comunique-se com eficácia.

Nesse sentido, é fundamental observarmos que diferentes tipos


de jogos dependem de tarefas e propostas distintas. Por exemplo, os
jogos cooperativos são aqueles em que não há competição entre os
participantes do time e o sucesso do jogo depende da participação
em conjunto. Já os jogos pré-desportivos são aqueles que procuram
se assemelhar ao esporte sobre o qual se pretende ensinar. Além do
mais, o jogo é uma atividade extremamente indicada para satisfazer
a necessidade de movimento do ser humano, é um conteúdo que
representa esforço e conquista, servindo como um importante veículo
de cultura (SCAGLIA et al., 2013).

O ensino de futebol e de futsal 35


O jogo funciona muito bem como ferramenta pedagógica, pois tem
por característica ser divertido e motivante. Afinal, quem não gosta
de jogar? Porém, esses aspectos se perdem caso as proposições do
jogo superestimarem a capacidade de entendimento do indivíduo, por
exemplo, se o jogo estiver complexo para aquela faixa etária, a crian-
ça provavelmente não o entenderá e logo se desmotivará. O contrário
também é verdadeiro. Subestimar a capacidade da criança, propondo
tarefas fáceis, fará com que ela perca o interesse.

Para melhor entender como os jogos podem ser utilizados dentro


de uma lógica pedagógica dos esportes coletivos, Scaglia et al. (2013)
propuseram uma divisão baseada na referência estrutural e funcional
do jogo e, com base nessas definições, a criação de matrizes de jogos
que auxiliam no processo de organização do método.

Referência estrutural Referência funcional

É tudo que está presente fisica- Rege o jogo, fazendo ele funcionar,
mente no jogo, como bola, baliza, como a lógica do jogo, as operações
dimensão do campo, número de e as regras.
jogadores etc.

Com base nesses conceitos, Scaglia et al. (2013) identificam as ma-


trizes de jogos e as classificam em: jogos conceituais, jogos conceituais
em ambiente específico, jogos específicos e jogos contextuais. Vamos
entender um pouco mais sobre eles?

Os jogos conceituais são aqueles cujas referências estruturais e


funcionais não respeitam fielmente a lógica do jogo esportivo coletivo
especificado. Logo, os conteúdos, evidenciados ao longo do processo
de organização, são diversificados, gerando a manifestação de inúme-
ras ações conceituais presentes em todos os jogos esportivos coleti-
vos, e não apenas no jogo esportivo coletivo que se almeja ensinar. Por
exemplo: um jogo de campo reduzido 4 x 4 m em que dois jogadores se
enfrentam com o objetivo de somente manter a posse de bola.

Os jogos conceituais em ambiente específico obedecem às


referências estruturais do jogo que se quer ensinar, por exemplo, no
futebol, o tamanho do campo e a presença das traves. Nesse tipo de
jogo, os conceitos desenvolvidos nos jogos conceituais são colocados
em um ambiente formal, dentro de um espaço físico semelhante ao
do jogo formal. Contudo, varia quanto ao cumprimento da lógica

36 Metodologia do ensino de futebol e futsal


formal (adaptada segundo o conceito trabalhado), pois o processo
de organização sistêmico terá ações diferentes das especificamente
exigidas no jogo esportivo coletivo pretendido, para a obtenção das
formas de pontuação provenientes das modificações das regras. Por
Livro
exemplo: em um espaço de quadra oficial e com número de jogadores
Sugerimos a leitura do
oficiais, somente será permitido o chute a gol depois de dez passes livro Homo ludens: o jogo
consecutivos na quadra ofensiva. como elemento da cultura.
Nessa interessante obra,
Nos jogos específicos, as referências estruturais e funcionais não o autor filosofa sobre a
ideia de enxergar uma
são alteradas em relação às da lógica do jogo pretendido. Assim, a maior espécie derivada do
aproximação ao jogo formal (regras oficiais) e os conceitos aplicados homo sapiens e destaca
que o jogo está implícito
fazem parte de um modelo de jogo pré estabelecido. Por exemplo: um na natureza, estando em
treino coletivo, no qual se estabelece previamente os comportamen- tudo e se relacionando
com o ser nas próprias
tos, como transição defensiva rápida e compactação da equipe. relações humanas. Dessa
forma, a reflexão reforça
Por fim, os jogos contextuais são idênticos a uma competição for- a importância do jogo.
mal. Eles devem manter as referências estruturais e funcionais asso-
HUIZINGA, J. São Paulo: Perspectiva,
ciados aos desafios emocionais da competição. Portanto, trata-se dos 1999.
jogos amistosos e oficiais.

2.6 Iniciação esportiva e capacidades motoras


Vídeo A iniciação ao futebol ou ao futsal costuma ser bastante precoce,
alicerçada ainda pela crença de quanto antes melhor. O nível de
compreensão e adequação do conteúdo oferecido aos jovens ainda é
pequeno, e é necessária a disseminação do conhecimento, que deve partir
de professores de Educação Física, principais mediadores dessa relação.

Iniciar precocemente no esporte não é o problema real, e, sim, a es-


pecialização e a imposição de gestos e ações motoras específicas a uma
criança, que podem trazer futuros prejuízos à saúde. A especificidade
do esporte, principalmente se direcionado ao âmbito competitivo, exi-
ge ações motoras para as quais o jovem nem sempre já está maturado,
sem contar com as exigências psicológicas oriundas das cobranças por
parte de pais e até de professores.

A iniciação esportiva deve estar pautada na ideia de ampliação do


universo cognitivo e motor. Para Goulart (2018), a infância é o melhor
momento para a estimulação cerebral, pois é quando ocorre a maior
plasticidade neural. Nesse contexto, as estratégias didáticas têm um papel
fundamental para o desenvolvimento neurológico. O futebol, por exemplo,

O ensino de futebol e de futsal 37


Leitura pode ser utilizado como pano de fundo para inserir a criança em práticas
Sugerimos a leitura da motoras variadas e lúdicas, que despertem o encantamento e a satisfação.
Base Nacional Comum
Curricular (BNCC), docu- É interessante ressaltar que, normalmente, o ser humano se interessa
mento que regulamenta pelas atividades prazerosas, e experiências negativas e traumáticas
o conteúdo essencial a
ser trabalhado nas esco- tendem a afastar a criança. Imagine uma criança cobrada excessivamente
las brasileiras públicas e e exposta diante de seus colegas por algum erro ou alguma derrota. Essa
particulares de educação
básica. experiência negativa poderia resultar em traumas incorrigíveis.
Disponível em: http:// A aula de Educação Física é a oportunidade de iniciar esse processo,
basenacionalcomum.mec.gov.br/
images/BNCC_EI_EF_110518_
que deve ser de longo prazo e multilateral, e o professor deve discernir
versaofinal_site.pdf. Acesso em: 15 o futebol ou futsal na escola da equipe de competição escolar. Ambos
jun. 2020.
podem ser incentivados, mas em momentos diferenciados. O futebol e
o futsal na escola fazem parte do conteúdo curricular da Educação Físi-
ca e de todas as suas dimensões. Já a competição é um instrumento
alternativo, que não deixa de ser importante, mas deve fazer parte do
processo de ensino e não deve atrapalhá-lo (FINCK, 2011).
Saiba mais O respeito às fases de desenvolvimento motor
O efeito da idade relativa é um fenômeno bastante comum também é imprescindível para o sucesso da forma-
observado em diversos esportes e com forte apelo no futebol. ção atlética a longo prazo. O desenvolvimento motor
Para entender do que estamos falando, basta fazer um
levantamento dos principais jogadores inscritos nas principais serve como suporte ao trabalho diário e é um pro-
competições esportivas e observar suas datas de nascimento. O cesso contínuo e dependente de todos os domínios
resultado observado será um número maior de atletas nascidos
do ser humano: cognitivo, afetivo-social e motor
nos primeiros meses do ano. Por que será? Será que algum
arranjo astral ou forças ocultas poderiam explicar o que leva os (GOULART, 2018). Crianças em período pré-púbere,
nascidos em janeiro, fevereiro, março e abril a serem mais bem por exemplo, não estão biologicamente aptas a re-
sucedidos esportivamente?
ceber determinadas cargas de treinamento, muitas
Não! Isso é explicado pela vantagem biológica momentânea. Sa-
bemos que as turmas são divididas por faixas etárias, mas existe vezes propostas com o intuito de fazê-las competir
uma vantagem biológica entre as crianças nascidas em janeiro melhor e conquistar vitórias. Porém, elas podem es-
em comparação com as nascidas em novembro. Essa vantagem tar ativamente abertas a receber outros estímulos
pode ser física (peso, altura, força, velocidade, agilidade etc.) ou
cognitiva (raciocínio, tomada de decisão etc.). Além disso, elas que não foram oferecidos. Isso se chama janela de
têm experiências, vivências e mais tempo de participação em oportunidade ou período sensível.
jogos e brincadeiras, afinal são dez meses a mais.
Quando o clube, a escola ou o professor prioriza o resultado Nesse sentido, na abordagem do esporte na es-
da competição, sobrepondo os títulos e troféus ao ensino do cola, o professor poderá utilizar alguns elementos
esporte, acaba privilegiando os que possuem a vantagem do jogo, principalmente o seu caráter lúdico. Além
momentânea, ou seja, chutam mais forte, correm mais rápido,
saltam mais alto. O problema reside na maturação. Aqueles ga- disso, algumas estratégias poderão ser aplicadas
rotos menos desenvolvidos de outrora possuem tanto potencial no encaminhamento do processo de ensino-apren-
esportivo (ou até mais) quanto os outros, mas lhes foi tirada
dizagem, como a adaptação das regras, o redimen-
a oportunidade de prática em uma fase importante e, como
vimos, o tempo de prática e a qualidade são imprescindíveis sionamento do espaço, a alteração do número de
para a formação esportiva. participantes e a composição das equipes.

38 Metodologia do ensino de futebol e futsal


CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ensino do futebol e do futsal em qualquer dimensão institucional
é contaminado por crenças e costumes, muitas vezes distantes de uma
prática responsável e clara. Dessa forma, o profissional de Educação Física
deve ter um olhar bastante atento às novas abordagens pedagógicas.
O ambiente escolar tem o potencial de ser o fio condutor de práticas
de ensino que se tornem referências para outras entidades. Na falta de
uma linguagem metodológica universal para o ensino do futebol, o exem-
plo pode partir de dentro da escola por meio de professores engajados.
Além disso, a escola deve ser um espaço democrático e alicerçado na con-
vivência, e os alunos devem ter acesso a competências diversas, sejam
elas cognitivas, motoras, afetivas ou sociais. A transmissão do conteúdo
deve ir além dos aspectos técnicos e táticos, alcançando os valores huma-
nos e éticos com o objetivo de construir a cidadania. A assimilação está
atrelada a um vínculo afetivo, então, o fato de o aluno se sentir acolhido
conta muito. Por isso, não esqueça: o afeto afeta.

ATIVIDADES
1. É comum olharmos um jogador de futebol habilidoso e pensarmos
que ele nasceu para jogar. Porém, o talento esportivo parece ter pouca
relação com o inatismo. Discorra sobre esse tema.

2. Considerando que o futebol também sofre bastante influência do


método analítico, comum no ensino de modalidades esportivas no
Brasil, explique esse método de ensino usando suas próprias palavras.

3. Observe o diálogo de duas crianças a seguir:


- Benício, qual jogo você acha mais legal?

- O jogo que eu sei jogar, ué!

Agora, reflita sobre a resposta simples, mas repleta de informação


dentro do contexto da pedagogia dos jogos, dada pela segunda criança
e anote suas considerações.

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O ensino de futebol e de futsal 39


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SCAGLIA, A. et al. O ensino dos jogos esportivos coletivos: as competências essenciais
e a lógica do jogo em meio ao processo organizacional sistêmico. Movimento, Porto
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SCAGLIA, A. J. Escolinha de futebol: uma questão pedagógica. Motriz, Rio Claro, v. 2, n.
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TEOLDO, I.; GUILHERME, J.; GARGANTA, J. Para um futebol jogado com ideia: concepção,
treinamento e avaliação do desempenho tático de jogadores e equipes. Curitiba: Appris,
2015.

40 Metodologia do ensino de futebol e futsal


3
Fundamentos técnicos
do futebol e do futsal
São conhecidas como fundamentos as técnicas tradicionalmen-
te usadas e consideradas fundamentais para a prática do futebol
ou do futsal. As ações técnicas do jogo são determinantes para o
sucesso da equipe ou do jogador em um duelo individual, desse
modo, é importante, então, desenvolver conhecimentos e compe-
tências que permitam saber organizar-se nas diferentes fases e
nos diferentes momentos do jogo, de acordo com possibilidades
de ações criadas e que surgem na partida (GARGANTA et al., 2013).
O ensino dos esportes coletivos, como o futebol e o futsal, tem
sido pautado tradicionalmente pela fragmentação. São observa-
das, com certa frequência, as ações técnicas sendo treinadas se-
paradamente do jogo; esse método é conhecido como tecnicista
ou analítico e consiste na repetição exaustiva dos gestos. Essa prá-
tica é criticada por especialistas da pedagogia do esporte por não
oferecer substancialmente o que se espera de um jogador, por
exemplo, competências cognitivas e tomadas de decisões rápidas.
Apesar de reconhecer a importância dos gestos técnicos, ensinar
a alguém como executar corretamente um movimento parece não
fazer sentido algum quando assistimos a uma partida de futebol
ou futsal, pois não existe um jeito certo, o jeito certo é o que resol-
ve o problema apresentado.
Neste capítulo, iremos destacar as ações técnicas mais comuns
utilizadas durante o jogo, sem a pretensão de esgotá-las e, muito
menos, de caracterizá-las como movimentos fechados. As ações
do jogo são próprias de cada jogador e podem ser modificadas
para atender ao momento da partida, portanto seria leviano nu-
merar e limitar os fundamentos técnicos, bem como selecionar o
fundamento certo ou errado para determinar o sucesso ou não
da tarefa.

Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 41


Bem sucedida será a tarefa se, por exemplo, o atleta conseguir
fazer a bola chegar a um companheiro, vencer um duelo com um
adversário ou ter êxito contra um goleiro. Não caberá aqui a indu-
ção de determinado gesto, mas apresentá-los com o cuidado de
que eles só tenham sentido dentro de um contexto e principal-
mente que o gesto não se sobreponha à ação, isso significa dizer
que o ensino deve estar pautado na intencionalidade, na resolução
dos problemas e não em um gesto mecanizado.

3.1 Passe
Vídeo O passe, caracterizado pelo ato de impulsionar a bola e fazê-la che-
gar a um companheiro de equipe, é uma das ações mais importantes
do jogo coletivo, aliás, é esse fundamento que dará sentido à coletivi-
dade, permitindo a interação entre os integrantes da equipe. A palavra
passe por si só já é autoexplicativa no que concerne à manutenção da
posse de bola.

O ato de passar a bola pode ser feito com diversas superfícies do


corpo, como os pés, a coxa, o peito, os ombros, a cabeça ou as mãos.
O mais comum é observarmos o passe com a parte interna do pé, pois
permite maior precisão, dependendo da orientação corporal. Porém,
variações das mais diversas são bem-vindas, por exemplo, o passe com
o lado externo do pé confere à bola um efeito extraordinário.

O passe apresenta direções, trajetórias e distâncias também variadas.


ednal/Shutterstock

Os passes de longas distâncias são chamados de lançamento e o passe


que precede uma finalização ao gol é chamado de assistência. Quanto
maior o repertório do jogador, mais habilidoso ele é considerado.

Entre os maiores passadores, podemos citar Paulo Roberto Falcão,


Andrés Iniesta, David Beckham, Zico, Ronaldinho Gaúcho, Franz
Beckenbauer, além de muitos outros que durante suas carreiras
ficaram conhecidos pela capacidade de fazer a bola chegar ao seu
destino com eficiência e oportunismo.

Para aprimorar o passe, é possível fazer um exercício conhecido


como Bobinho 4 contra 1. Nessa atividade, os quatro jogadores, em um
espaço de 6 x 6 m, devem manter a posse de bola com passes entre

42 Metodologia do ensino de futebol e futsal


eles. Só é permitido dar um toque na bola enquanto o jogador no cen-
tro da rodinha deve interceptar e roubar a bola. Após três intercepta-
ções, troca-se o jogador do meio.

Iesde Brasil
Vídeo
No canal SoccerCoachTV,
6m trajeto da bola
há vários vídeos que
intenção do jogador permitem visualizar, por
meio do método de jogo,
modelos de treinamento
técnico de aprimoramen-
to de passe praticados
por grandes equipes do
6m futebol mundial.

Esse exercício estimula os jogadores a treinar o passe dentro de Disponível em: https://www.
youtube.com/channel/UCgKCQ-
uma brincadeira comum e em situação de jogo. Com isso, os atletas
JCkYrRKwqr-17inQsQ. Acesso em:
precisam estar ativos, preparados para orientar o corpo de modo a 3 jun. 2020.
executar o movimento, já que a bola se apresenta em condições alea-
tórias, aumentando o repertório dos participantes.

3.2 Domínio
Vídeo O domínio, também chamado de controle ou recepção, é caracteriza-
do pelo ato de interferir na trajetória da bola, reduzindo sua velocidade
e a amortecendo, ao ponto de o jogador tê-la completamente sobre
seu controle. Assim como o passe, ele apresenta ações técnicas e graus
de complexidade bastante variados.

A área de contato do corpo com a bola pode ser desde os


pés, até a coxa, o peito e a cabeça, por exemplo. A dificuldade é
influenciada pela velocidade da bola empregada pelo passador,
quanto mais rápida a bola, menos tempo para se pre-
parar para a ação. O espaço para se executar tam- ednal/Shutterstock

bém influencia muito na complexidade. A distância


do oponente mais próximo, a altura da bola e seu
efeito só aumentam o desafio do executor.

No futsal, a ação de dominar a bola ganha


uma variação mais comum, denominada pisada.
Essa prática utiliza-se da sola do pé para o domínio, gesto que
também pode ser visto no futebol, mas com menos fre-
quência devido ao solado do calçado.

Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 43


Para exemplificar o domínio de bola é impossível não citar nomes
como Zinedine Zidane, Ronaldinho Gaúcho, Roberto Carlos e Johan Cruyff.

Para aprimorar o domínio da bola, uma sugestão é a realização de


exercícios como o Bobinho 5 contra 2. Nessa atividade, os cinco jogado-
res, em um espaço também de 6 x 6 m, devem manter a posse de bola
com dois toques obrigatórios de cada (domina e passa), enquanto os
dois jogadores no centro do círculo devem interceptar e roubar a bola.
Após três interceptações, troca-se os dois jogadores centrais.

Iesde Brasil
trajeto da bola
6m
intenção do jogador

Livro
A obra Futsal: metodolo- 6m
gia da participação, de
Santana, traz métodos O jogo se assemelha ao anterior e pode ser usado como progressão.
de ensino do futsal para
crianças, privilegiando a
O domínio é fundamental para que o jogo funcione e os jogadores
participação e desen- precisam estar atentos e dominar rápido para não perderem a bola.
volvendo o prazer pelo
esporte.
A orientação corporal mudará de acordo com a direção em que a bola
vem e o componente cognitivo (concentração, raciocínio, elaboração
SANTANA, W. C. 3. ed. São Paulo:
Companhia Esportiva, 2018. de estratégias e atenção) está presente mais uma vez, assim como no
exercício anterior.

3.3 Condução
Vídeo A condução consiste no ato de se deslocar em campo ou em quadra
mantendo a bola sob seu controle. Esse fundamento caracteriza uma
ação individualizada por meio de toques contínuos, normalmente utili-
zando os pés que garantem mais velocidade e precisão, porém outras
partes do corpo também podem ser utilizadas.

Essa técnica tem grande valia durante a transição ofensiva, ou seja,


logo após a recuperação da bola, esse é o ato de progredir com ela,
aproveitando o momento de desorganização do adversário. Conduzir a
bola em velocidade pode surpreender o sistema defensivo do oponen-
te e normalmente associa-se aos chamados contra-ataques.

44 Metodologia do ensino de futebol e futsal


No futsal, essa ação tem mais variações do que no futebol de cam-
po. Na quadra, a superfície e o solado do calçado permitem o uso da
sola do pé para a condução, conhecida como “pente”. No campo, a

ednal/Shutterstock
ação fica limitada devido à irregularidade do terreno.

Como exemplo de jogadores com ótima capacidade de condução


de bola, aliando técnica e velocidade, podemos citar Kaká, que du-
rante sua carreira protagonizou importantes momentos, além de
Kylian Mbappé e Neymar.

Para a prática e o aprimoramento dessa técnica, é


possível utilizar o jogo da condução. É uma brincadeira
que faz parte da cultura de rua e pode ser utilizada
como um jogo adaptado. Cada participante tem uma
bola e deve conduzi-la ao outro lado da quadra, o pegador
não tem bola e deve tentar pegar a bola de um dos participantes no
momento da travessia.
Iesde Brasil

trajeto da bola
intenção do jogador

Variações podem ser realizadas para adaptar o grau de dificuldade,


como o aumento ou a diminuição do espaço da quadra ou o aumento
do número de pegadores.

3.4 Drible
O drible é uma das técnicas mais difíceis e admiradas pelos torce-
Vídeo
dores. A habilidade nessa técnica depende muito da criatividade, da
versatilidade e da ousadia do executor. Esse recurso é utilizado para
transpor e se desvencilhar, desconstruir e desorganizar o sistema de-
fensivo do adversário por meio do duelo um contra um. Muito associa-
do à beleza do jogo, o jogador driblador normalmente é o protagonista
do momento ofensivo.

Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 45


O driblador pode ter estilos e características distintas e alguns dribles
são bastante conhecidos e ganharam nomes e apelidos, como “caneta” ou
ednal/Shutterstock

“rolinho”, “elástico”, “drible da vaca”, “chapéu” ou “touca”, “pedalada” etc.

Temos grandes exemplos de dribladores que abrilhantaram o


futebol com suas fintas desconcertantes e repertório surpreendentes.
Entre eles, podemos citar Pelé, Marta, Ronaldo Fenômeno, Ronaldinho
Gaúcho, Lionel Messi, Paulo Roberto Falcão, Maradona, Garrincha, Neymar
e Robinho.

Para treinar essa técnica, podemos utilizar o Jogo do enfrenta-


mento. Essa atividade é baseada em uma brincadeira de rua cha-
mada contrinha. Em um campo com dimensões reduzidas, de 10 x 10
Livro
m, por exemplo, os jogadores
O livro Futebol Sistêmico:
se enfrentam em um contra

Iesde Brasil
Conceitos e Metodologias
de Treinamento, de Belozo um, com o objetivo de fazer o
e Lopez, apresenta con-
ceitos voltados ao trei-
máximo de gols em um minuto
namento dos aspectos de jogo.

10 m
técnicos, táticos e físicos
G G
por meio dos jogos, tema O jogo vai exigir coragem e
bastante pertinente
para complementar os
induzir a criatividade. O partici-
estudos na área. pante irá tentar diversas vezes
BELOZO, F.; LOPEZ, C. Jundiaí: Paco fazer o gol com base no en-
Editorial, 2017.
frentamento. Podem ser utili-
zados goleiros ou golzinhos 10 m
– sem goleiro. trajeto da bola
intenção do jogador

3.5 Chute
Vídeo O chute, também conhecido como remate ou finalização,
é o ato final da construção da jogada, é a concretização da
estratégia de ataque e tem como objetivo fazer com que
a bola adentre a meta e vença o goleiro adversário. O
ednal/Shutterstock

chute geralmente ocorre no terço final do campo ou


logo após o meio da quadra de futsal. Além das jo-
gadas de construção, é chamado de chute também
o golpe de reposição de bola em jogo, normalmen-
te chamado de bola parada. Como exemplos, temos
o tiro de meta, tiro livre direto (cobranças de falta) e
penalidades.

46 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Há diversas variações quanto à superfície de contato com a bola.
As áreas do pé que tocam a bola podem ser a parte interna, externa,
o peito do pé, o bico do pé e o calcanhar. Essas superfícies de contato
podem proporcionar trajetórias e alturas das mais diversas.

O chute ganha versões e, consequentemente, diferentes nomencla-


turas de acordo com o modo executado e as situações exigidas. Alguns
exemplos são:
•• Chapada: é a finalização utilizando a parte interna do pé, confere
mais precisão e é usada nas situações próximas ao gol.
•• Voleio: a bola é chutada a meia altura sem tocar no chão previa-
mente, é um recurso utilizado quando o domínio é inviável.
•• Sem-pulo: a bola é chutada com o peito de pé após um salto.
•• Trivela: chute que utiliza a parte externa do pé, ganhando efeito
surpreendente.
•• Bicicleta: gesto complexo e recurso utilizado quando a bola vem
alta e o jogador está de costas para o alvo.
•• Bate-pronto: oferece a superfície do peito do pé para bater na
bola imediatamente após ela ter tocado o solo.

Destacar exímios chutadores, assim como nas outras ações, é uma


tarefa difícil e a escolha depende, também, de gosto individual, do jeito
de bater na bola, da força empregada e dos belos gols marcados. Aqui,
ousaremos citar Roberto Carlos e Branco, ícones no quesito força, mas
temos também outros exímios finalizadores, como Ronaldo, Romário,
Cristiano Ronaldo, Roberto Rivelino e Roberto Dinamite.

Como prática dessa técnica, temos o jogo da rebatida. A rebatida é um


jogo bastante conhecido na cultura das brincadeiras de rua com bola. Nes-
se jogo, são formadas duas equipes de dois componentes, cada equipe
tem direito a seis chutes (a aproximadamente 15 m do gol) – três chutes
de cada jogador –, enquanto a outra equipe se posiciona como defensor
e goleiro.

Se, com o chute, a equipe fizer um gol, ganha um ponto, mas se os


goleiros derem a rebatida, a dinâmica muda e um dos defensores sai
para tentar pegar a bola enquanto os atacantes devem tentar fazer o
gol, que nessa situação vale dois pontos. Caso a bola pegue na trave, o
gol passa a valer três pontos. Soma-se os pontos conquistados a cada
chute das equipes e a que tiver mais pontos ganha o jogo.

Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 47


Iesde Brasil
trajeto da bola
intenção do jogador

15 m

A rebatida é um exemplo de como uma brincadeira informal pode


ser mais eficiente para treinar técnicas do que o treino de fundamen-
tos, pois ela possui o chute como ponto de partida, mas tem também
drible, passe, defesa, emoção, competitividade e o principal: diversão.

3.6 Cabeceio
Vídeo O cabeceio é um recurso muito comum nas bolas altas. Nos mo-
mentos ofensivos do jogo, ele também é utilizado como passe para um
colega e para a finalização da jogada ao gol. Nesse caso, os protagonis-
tas da ação são os atacantes, especialistas em golpear a bola para o gol
adversário. Nos momentos defensivos, o recurso é utilizado para inter-
ceptação de um passe aéreo ou para afastar a bola para o mais longe
possível de sua meta em situações de perigo. Variações são observadas
no modo de contato com a bola dependendo da velocidade, força e
altura pretendida com a ação. Para a finalização ao gol no momento
ofensivo, é mais comum observarmos a utilização da área frontal da
cabeça, a chamada testada. Essa técnica é menos comum no futsal
do que no futebol, já que o esporte de quadra se caracteriza
por menos jogadas aéreas e mais bola no chão.

Quem você considera grandes cabeceadores? Entre os que


marcaram época, podemos citar Romário e Pelé como ícones do
cabeceio, além de Gabriel Batistuta, Cristiano Ronaldo, Jardel e Jürgen
Klinsmann.
ck
rsto

Para treinar essa técnica, podemos utilizar o jogo do cabeceio,


te
hut

ou futcabeça. Nessa atividade, a lógica do jogo formal permanece a


al/S
edn

mesma, mas a estrutura pode ser alterada, diminuindo as dimensões


do campo e só valem gols feitos de cabeça após lançamentos
para a área.
48 Metodologia do ensino de futebol e futsal
Iesde Brasil
Filme
O filme Pelé: O Nascimento
G G trajeto da bola de uma Lenda, de Michael
Zimbalist, narra a história
de vida e carreira do con-
siderado melhor jogador
de futebol de todos os
tempos.

Direção: Michael Zimbalist. Brasil;


Como só valem gols de cabeça, também serão trabalhados os EUA: Imagine Entertainment, 2016.
passes altos. Diminuindo as dimensões do campo, possibilitaremos
mais chances de finalização ao gol. Como variação, podemos sugerir
a não utilização dos goleiros, o que permite que as jogadas sejam
concluídas, não havendo saídas do gol e interceptações.

3.7 Ações do goleiro


Vídeo O goleiro tem uma função bastante especifica, e indiscutivelmente
foi a que mais evoluiu ao longo dos anos. Devido ao avanço técnico-tá-
tico-físico, o futebol se tornou muito dinâmico e veloz e o jogador dessa
função teve que se adaptar, aprimorando todos os aspectos pertinen-
tes ao jogo (GONÇALVES; NOGUEIRA, 2006).

Entre as ações mais comuns utilizadas pelo goleiro estão a pegada,


reposição com as mãos, reposição com os pés, entrada de frente, que-
da lateral (baixa, alta e meia altura), saída de gol por baixo e saída de
gol por cima. Como o jogo se desenha diferentemente em cada situa-
ção, as ações do goleiro não se limitam às citadas aqui e para cada ação
citada, variações são comumente observadas: vai depender da decisão
do indivíduo.

Diante de situações de jogo e modificações nas regras – antes era


permitido pegar com as mãos após o recuo de um colega –, é neces-
sário que o goleiro desenvolva, também, fundamentos dos jogadores
de linha, tais como: passe, lançamentos de média e longas distâncias,
domínio, chute, drible, cabeceio e proteção, entre outros.

Entre os goleiros de maior destaque podemos ci-


tar Gordon Banks, Gianluigi Buffon, Sepp
Maier, Cláudio Taffarel, Rogério Ceni
e Marcos.

ednal/Shutterstock
Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 49
Para o treino das técnicas dessa posição, são recomendados os jo-
gos com o goleiro. É um pequeno jogo de cinco contra cinco. Em um
campo de dimensões reduzidas, 40 x 30 m, esse jogo ficará extrema-
mente dinâmico e ocorrerão finalizações a todo momento, exigindo ex-
Vídeo trema atenção e reações rápidas dos goleiros.
Assista ao vídeo Treina-

Iesde Brasil
mento Específico Global de
Goleiros, publicado pelo
canal Luis Henrique de
Moraes, em que identifi-
camos o desenvolvimento

30 m
de algumas habilidades
técnicas por meio do
G G
treinamento específico
para goleiros com ações
combinadas.

Disponível em: https://www.you-


tube.com/watch?v=QCF0ZyM5wlo.
Acesso em: 3 jun. 2020.
40 m
trajeto da bola

Como o espaço está reduzido, as finalizações ao gol serão constan-


tes, os goleiros experimentarão chutes vindos das mais diversas di-
reções e trajetórias. Na variação para o futsal, é necessário reduzir a
quadra para 25 x 20 m.

3.8 Relação jogador-bola


Vídeo Não existe uma maneira correta de se efetuar um gesto, mas te-
mos várias ações e gestos mais comuns no futsal e no futebol, os quais
podemos enfatizar com a criação de tarefas para o desenvolvimento
de tais técnicas (JUNIOR, 1998). Cada ação técnica básica possui uma
função de auxiliar na resolução de uma tarefa, porém restringi-las é
um grande equívoco. Os diversos elementos que formam a técnica
criam a base do jogo e facilitam todas as ações táticas necessárias
para o sucesso da equipe.

O domínio da técnica do jogo depende da relação do jogador com a


bola, e essa relação não deve ser enxergada somente pelo gesto visível.
Uma boa relação com a bola inicia-se antes dela chegar até o jogador,
a inteligência deve preceder o gesto, entender a situação apresentada,
por exemplo, a velocidade da bola, a altura da bola, a orientação es-

50 Metodologia do ensino de futebol e futsal


pacial, a orientação corporal; e esses mecanismos mentais devem ser
trabalhados. Por essa razão, o ensino de futebol baseado somente na
mecânica em si parece ter, de fato, pouca relação com as necessidades
de ensino. Se as aulas ou os exercícios propostos dentro dessas neces-
sidades oferecerem condições diversificadas e oportunidades para os
jogadores vivenciarem e experimentarem diversos tipos de execução
de um domínio, por exemplo, eles serão muito mais inteligentes na
ação do que algum indivíduo que aprendeu a dominar a bola arremes-
sada com a mão pelo colega de treino.

Existe uma relação estreita entre excelência em recursos técnicos


e a quantidade de horas a que foram expostos a essa vivência.
Portanto, jogar bem está relacionado a jogar muitas vezes, e não
necessariamente a treinar a técnica várias vezes. Um pianista talentoso
de jazz que improvisa com eximia classe só atingiu esse nível tocando
e se relacionando com essa complexidade de música. No futebol e no
futsal é a mesma coisa, a relação corpo-bola no jogo é diferente da
relação corpo-bola no treino técnico. No treino técnico, o ambiente é
previsível, a bola chega várias vezes na mesma altura, com a mesma
velocidade e da mesma direção.

Uma forma de treinar as técnicas, é criar pequenos jogos, baseados


nos momentos do jogo formal no qual esses pequenos jogos privile-
giem alguma determinada técnica. Esse tipo de jogo deve ser ajustado
para induzir os jogadores a fazerem as ações dentro do contexto de
improvisações e aleatoriedades.

As habilidades técnicas dependem da relação corpo-bola nos mo-


mentos ofensivos e defensivos do jogo.
•• Ações defensivas exigirão a capacidade de recuperar a bola ou
neutralizar o adversário por meio de, por exemplo, carga com o
corpo, interceptação, desarme, carrinho e cabeceio.
•• Ações ofensivas exigirão a capacidade de manutenção da posse
de bola e progressão de jogo. Para tanto, podem ser usados: fin-
ta, domínio, passe, chute e cabeceio.

A dificuldade da técnica é determinada pelo grau de complexidade


do jogo, sendo o processo pedagógico baseado no aumento progressivo
das tarefas ou nas necessidades e potencialidades de cada aluno para
a plenitude do aprendizado.

Fundamentos técnicos do futebol e do futsal 51


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existe a preocupação eminente com o processo formativo a longo pra-
zo, principalmente no ensino de jovens e crianças. Por essa razão, o foco
não deve estar empregado na repetição e reprodução de gestos descon-
textualizados com o esporte.
Para a capacidade de execução das técnicas de maneira eficiente, a
competência motora é fundamental, assim como a coordenação dos mo-
vimentos elementares para a execução. No entanto, devemos pensar o
ensino do esporte não como a construção de gestos técnicos, mas com
ações de qualidade para que o atleta consiga se sair bem em qualquer
situação imposta pelo jogo.

ATIVIDADES
1. As ações técnicas são importantes para o desenvolvimento e a
construção do jogo, porém especialistas defendem que o ensino não
deve estar pautado só na execução do gesto. Discuta esse tema.

2. As habilidades técnicas podem ser divididas em ações de momentos


ofensivos e momentos defensivos. Isso significa que defensores
devem priorizar nos treinos as ações defensivas, correto? O que você
pensa sobre isso?

3. Suponha que você trabalhe em uma escola de futsal com crianças


de sete a oito anos. Sabendo que a relação com a bola é importante,
quanto mais repetir o gesto técnico, mais domínio sobre esse gesto
a criança terá e mais visível será a evolução. Quão vantajoso você
imagina que isso será no desenvolvimento esportivo a longo prazo?

REFERÊNCIAS
GARGANTA, J. et al. Fundamentos e práticas para o ensino e treino do futebol. In: TAVARES,
F. (org.). Jogos Desportivos Coletivos. Ensinar a jogar. Porto: Editora FADEUP, 2013.
GONÇALVES, G. Á.; NOGUEIRA, R. M. O. O treinamento específico para goleiros de futebol:
o uma proposta de macrociclo. Estudos, vida e saúde, Goiânia, v. 33, n. 4, p. 531-543,
jul./ago. 2006. Disponível em: http://seer.pucgoias.edu.br/index.php/estudos/article/
view/136. Acesso em: 2 jun. 2020.
JUNIOR, N. B. A Ciência do esporte aplicada ao Futsal. Rio de Janeiro: Sprint, 1998.

52 Metodologia do ensino de futebol e futsal


4
Princípios táticos do jogo
A palavra tática tem origem grega e significa manobra estratégica.
Inicialmente atribuída ao comando de tropas do exército, a expres-
são foi apropriada pelo esporte utilizando-a com o mesmo sentido:
elaborar estratégias para obtenção da vitória. Porém, elaborar es-
tratégias parte de um pressuposto de que há um plano de ação
em jogo. Para qualquer atividade cotidiana, organizar-se parece ser
imprescindível ao almejar o êxito. E no contexto do futebol e do fut-
sal, que são modalidades coletivas com alto grau de complexidade e
aleatoriedade, os planos de ação deverão ser ainda mais detalhados
entre os participantes e, além disso, alicerçados em movimentos
sincronizados.
Desde que o futebol e o futsal evoluíram para esportes profissio-
nais, as equipes passaram a se estudar mais e buscar meios de se
tornarem mais competitivas. Em um jogo em que a vitória depende
de fazer mais gols do que levar, é preciso pensar em estratégias e,
mais do que isso, executá-las com sucesso.
A execução dessas ações coordenadas, chamadas de táticas, de-
pende de práticas, ou seja, para isso, os jogadores precisam ter claro
entendimento do que deve ser feito, onde dever ser feito e por que
deve ser feito. As práticas que levam o indivíduo a se apropriar da tática
ou estratégia é também conhecida por nós como treino.
Bom, se o treino é importante, o que devemos treinar? Como pode-
mos potencializar o entendimento dos nossos jogadores? O que pode-
mos fazer para que cumpram sua função? Como deve ser a disposição
deles em quadra ou em campo? Este capítulo se propõe a responder
a essas perguntas com base na interpretação do próprio leitor sobre o
que está escondido por trás do jogo macro. A interação dos jogadores
em diversos momentos característicos pode ser entendida como jogos
menores dentro do próprio jogo, e moldar os comportamentos dos
jogadores nesses momentos específicos pode ser um ponto de partida
para tentar responder sobre o que devemos treinar.

Princípios táticos do jogo 53


4.1 Modelo de jogo
Vídeo O que quer dizer modelo de jogo? Esse termo ficou conhecido por
ser utilizado pelos estudiosos do esporte, mas poucas pessoas sabem,
de fato, ao que ele se refere. Você sabe? É bastante comum que haja
certa confusão entre modelo de jogo e sistema tático, porém o mo-
delo é muito mais do que a maneira com que o treinador posiciona
sua equipe em campo. Segundo Gouveia (2019), o modelo representa
a interação entre os jogadores e como eles expressam sua identidade
para cada momento do jogo.

Para Dias (2014), o modelo de jogo é tudo. É a aproximação do


que realmente acontece no jogo com o que o treinador gostaria
que acontecesse. Em outras palavras, é a materialização das ideias
do professor-treinador para sua equipe. Segundo Gouveia (2019), é
um padrão regular que orienta as ações de uma equipe dando a ela
identidade e forma. E, de acordo com Leitão (2009), o modelo de jogo
se refere ao conjunto de orientações e ações para a partida e o modelo
de organização de jogo constitui a originalidade da equipe, sendo com
base nisso que o treino para preparação coletiva e desenvolvimento
individual passa a fazer sentido. Para isso, torna-se imprescindível que
o treinador tenha claras suas intenções para aplicá-las a um modelo
que traduza suas ideias a algo concreto.

A escolha do modelo de jogo deve estar intimamente ligada ao local


onde se insere, pois nem sempre as ideias do treinador, por melhores
que sejam, funcionam em todos os contextos. Por isso, é importan-
te para o treinador o conhecimento adequado do ambiente onde está
inserido, como a cultura do país ou região, o clima local, o clube/insti-
tuição, sua história e valores, os jogadores que possui, os adversários
etc. (DIAS, 2014). O sucesso do modelo depende de o treinador adaptar
suas ideias a todo esse contexto e buscar a identidade que se espera.

De acordo com Gouveia (2019), mesmo que o modelo esteja defini-


do, ele nunca está completamente terminado, pois pode e deve evoluir
qualitativamente, por meio do diálogo, da melhor interpretação por
parte dos jogadores e de mais soluções aos problemas que surgem, po-
rém isso deve acontecer sem alterar a configuração da ideia principal.

Sabe-se que os jogos coletivos com características de invasão, como


o futebol ou futsal, devem ser entendidos conforme a sua totalidade, e

54 Metodologia do ensino de futebol e futsal


a construção do modelo ou estilo de jogar deve estar pautada nos di- Curiosidade

ferentes momentos de jogo, ou seja, o modelo de jogo será construído São classificados como esportes
de invasão aqueles que possuem
com base no que se espera do comportamento da equipe nesses vários
características comuns na sua ló-
momentos. O treinador pode se perguntar: “o que eu quero que a mi- gica de progressão e de conquista
nha equipe faça assim que recupera a bola? Finalize a jogada o mais rá- de terreno do adversário para
chegar à meta, como o futebol,
pido possível ou mantenha a bola por mais tempo?”, “e quando minha futsal, basquetebol, handebol,
equipe perde a bola? Pressione o adversário ou feche os espaços de rúgbi, futebol americano etc.
progressão?”. Esses são exemplos genéricos e mais adiante estudare-
mos melhor os diferentes momentos e exemplos de comportamentos. Site
Para buscar mais
Dias (2014) e Gouveia (2019) ainda salientam que não existe um mo- informações sobre
delo de jogo melhor ou pior, a criação depende de todo um processo o assunto, não deixe
de acessar o site
de acumulação de experiências e autocríticas para aprendizagem cons- da Universidade do
tante. O modelo vai se construindo na ideia original do treinador e nas Futebol. Lá é possível
acessar diversos
interações com os jogadores, sendo, também, importante a capacidade artigos, reportagens e
do treinador de se adaptar às intercorrências que afetam o processo. vídeos produzidos por
renomados especialistas
Assim, fica claro que o sistema tático, apesar de ser alvo das análises do futebol e do futsal.
de comentaristas e torcedores, não é o ponto mais importante, mas
Disponível em: https://
deve ser entendido como a estrutura que permitirá a execução mais universidadedofutebol.com.br/.
Acesso em: 24 jun. 2020.
adequada do modelo pensado.

4.2 Momentos do jogo


Vídeo O futebol e o futsal são classificados como esportes coletivos de
invasão e possuem características em comum. Durante a partida de
ambas as modalidades, podemos enxergar quatro momentos, que
surgem durante o jogo de maneira aleatória (DIAS, 2016). A identificação
desses diferentes momentos é o que deverá guiar o professor-
-treinador, facilitando a análise do jogo e o processo de estruturação
do treino. É com base nisso que o treino se dá e os comportamentos
são praticados, e isso explica a importância do treino.

Figura 1
Os momentos do jogo

Organização
ofensiva
Transição Transição
ofensiva defensiva
Organização
defensiva
Adaptada pelo autor com base em Gouveia, 2019.

Princípios táticos do jogo 55


Para modular a unidade de treinamento da equipe, o treinador deve
se perguntar qual comportamento coletivo e individual é esperado em
cada um desses momentos.

4.2.1 Momento de organização ofensiva


A organização ofensiva refere-se aos comportamentos que a equi-
pe assume quando possui a bola, começa a construir a jogada, procu-
ra progredir no terreno e cria as situações para gol. Essa organização
pode ter seu início no tiro de meta com o goleiro, ao passar pelo setor
de meio de campo, até chegar ao campo adversário, ou seja, ela pode
utilizar um extenso território, saindo, praticamente, de uma extremida-
de à outra e utilizando jogadores de diversas posições e funções. Com
base nessas características, surge a ideia de dividir esse momento em
fases ou submomentos de acordo com a zona de campo. Essa divisão
permite melhor entendimento da organização ofensiva.

A organização ofensiva é dividida em 3 fases ou submomentos:


•• 1a Fase – Fase de construção: é geralmente iniciada pelo golei-
ro na saída de bola e tem como objetivo avançar ao terreno do
Figura 2 adversário.
Fases da organização ofensiva
•• 2a Fase – Fase de criação: é o momen-
to de criação e tentativa de desequili-
brar a defesa adversária; acontece no
1ª - Fase de meio de campo.
construção
•• 3a Fase – Fase de Finalização: já pró-
ximos à meta adversária, os jogado-
res têm como objetivo criar situações
de finalização e gols.
2ª - Fase
Essa divisão em submomentos de acor-
de criação
do com as zonas do campo baseadas na
progressão (iniciando de cima para baixo)
é um facilitador para entender em qual
setor a equipe é mais frágil, auxiliando o
professor-treinador a mapear cada eta-
3ª - Fase de pa e construir tarefas mais específicas de
softpixel/Shutterstock

finalização
treinamento.

56 Metodologia do ensino de futebol e futsal


4.2.2 Momento de organização defensiva
A organização defensiva são os comportamentos assumidos pela
equipe quando os jogadores não possuem a bola e pretendem se orga-
nizar para impedir que a equipe adversária faça gols. A ideia é fechar os
espaços para minimizar as chances do adversário (DIAS, 2016). As ações
pré-determinadas aqui serão fundamentais para compor um modelo de
jogo e, nesse momento, o comportamento da equipe deverá ser treina-
do para que as ações sejam coordenadas. Um exemplo simples disso é a
adoção de uma marcação por zona – por setor –, ou marcação individual,
na qual cada jogador tem o seu oponente específico.

4.2.3 Momento de transição ofensiva


A transição ofensiva corresponde ao momento transitório entre a
ocasião em que a equipe recupera a bola e o momento em que começa
a se organizar ofensivamente, por isso também é chamada de transi-
ção defesa-ataque. Nesse curto espaço de tempo, observam-se atitudes
dos jogadores envolvidos e essas atitudes podem se transformar em
padrões. Em suma, corresponde aos comportamentos adotados logo
após a recuperação da bola, ou seja, melhorar a eficiência desse mo-
mento tende a surpreender a equipe adversária, valendo-se da desor-
ganização momentânea do oponente.

4.2.4 Momento de transição defensiva


A transição defensiva se refere às ações logo após a perda da bola.
Normalmente se espera que o comportamento de resposta deva ser
imediato a fim de não permitir que o adversário se aproveite da desor-
ganização momentânea. Os momentos de transição são considerados Site
fundamentais no futebol e no futsal modernos, pois possuem potencial Recomendamos a página
Pedagogia do Futsal, do
para desequilibrar. Assim, equipes que executam a transição defensiva
professor Wilton Santana,
imediata e de maneira coletiva conseguem se aproveitar dos segundos um dos maiores nomes
do esporte na atualidade.
de desordem ou de alguma indecisão proporcionados pelo time que
No site, é possível acessar
está atacando. vídeos de treinamento,
além de material didático
É importante salientar que essa divisão serve apenas de referência, para leitura.

ou seja, é uma orientação e se torna evidente somente no plano didá- Disponível em: https://
tico, pois durante os jogos esses momentos acontecem aleatoriamente pedagogiadofutsal.com.br/. Acesso
em: 24 jun. 2020.
e de modo imprevisível (GOUVEIA, 2019).

Princípios táticos do jogo 57


4.3 Princípios de jogo
Vídeo Os princípios de jogo correspondem a toda intenção traduzida em
comportamentos individuais e coletivos para construção das ideias de
jogo (DIAS, 2014). Esses princípios, ainda segundo o autor, podem ser
classificados em fundamentais, específicos e relacionados com a ideia
de jogo. Os princípios táticos são definidos como um conjunto de nor-
mas sobre o jogo que proporcionam aos jogadores a possibilidade de
atingirem rapidamente soluções táticas e, por possuírem esse caráter,
precisam ser subentendidos e estar presentes nos comportamentos
dos jogadores durante uma partida (COSTA et al., 2009).

Para Dias (2014), os princípios fundamentais se referem a recusar a


inferioridade numérica e criar superioridade numérica a todo momento
durante o jogo. Os princípios específicos são divididos em ofensivos (mobi-
lidade, espaço, progressão e penetração) e defensivos (cobertura, conten-
ção, equilíbrio e compactação). Já os princípios relacionados com a ideia
de jogo estão ancorados nos momentos de uma partida citados na sessão
anterior, as organizações e transições, tanto ofensivas como defensivas.

Observe a seguir alguns exemplos de princípios que podem ser ado-


tados a cada momento. Você irá perceber que, passo a passo, construi-
remos a maneira de jogar.

Princípios da organização ofensiva: posse de bola e rápida cir-


culação com verticalização das jogadas. O exemplo de princípio aqui
proposto por Dias (2014) deixa claro o objetivo para esse momento
e com o propósito preestabelecido fica mais fácil definir os conteú-
dos das sessões de treinamento, ou seja, adotaremos ao treinamento
tarefas que possibilitem alcançar essas metas. Suponha agora que o
princípio seja jogar com amplitude máxima do campo (CORREIA, 2014),
isso significa que quando minha equipe possui a bola, eu preciso criar
situações para que essa condição se concretize. Nesse contexto, en-
tram os subprincípios, ou seja, o que eu preciso fazer para o princípio
funcionar. Nesse caso, podemos citar troca de passe em segurança,
circulação da bola até provocar erro do adversário, e dar o menor nú-
mero de toques possível por jogador. Ao optar como princípio ofensivo
a verticalização e rápida finalização ao gol, temos, então, que propor
circunstâncias que induzam a esse comportamento coletivo desejado,
como a infiltração, a ultrapassagem e as jogadas de linha de fundo.

58 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Princípios da organização defensiva: defender por zona e manter
média pressão. Assim como no exemplo anterior, os princípios da orga-
nização defensiva podem conter derivações que ajudarão a condicionar
os jogadores a cumprirem a função. Exemplos são induzir o adversário
para o lado do campo, fazer a cobertura do colega e orientar o corpo
para fechar a possível progressão da bola. Observe que nesse exemplo
o professor-treinador terá como missão buscar meios para condicionar
os atletas a cumprirem esse princípio (GOUVEIA, 2019). Podemos usar
também como princípio da organização defensiva a compactação. Com
base nessa ideia, manipulamos o treinamento para que os jogadores se
adaptem e se posicionem próximos uns aos outros quando estiverem
sem a bola, a fim de inibir a progressão do oponente e fechar sua meta.

Princípios da transição ofensiva: aproveitar a desorganização


posicional do adversário. Para Dias (2018), com base nesse princípio,
o treino deve conter elementos que permitam êxito nesse aspecto,
como promover a saída da bola da área de pressão por meio de uma
movimentação de um jogador de frente, ou adquirir profundidade para
Livro
ganhar tempo na organização ofensiva da equipe (GOUVEIA, 2019).
Recomendamos a leitura
Podemos também utilizar como princípio o famoso contra-ataque, de Sport Lisboa e Benfica
que consiste em sair em maior velocidade possível para finalizar ao gol 2013/2014: uma visão
sobre o modelo de jogo
adversário após a recuperação da bola. de Jorge Jesus e sua ope-
racionalização, de Hugo
Princípios da transição defensiva: diminuir os espaços e investir ra- Dias. O autor analisa
pidamente contra o portador da bola. Nesse caso, o objetivo será pres- com detalhes o trabalho
do treinador Jorge Jesus
sionar imediatamente o adversário que possui a bola, evitando que ele (técnico do Flamengo),
a tire do setor e progrida. No caso de insucesso na reação imediata, durante sua temporada
no Benfica. O livro ainda
um comportamento adequado pode ser o de fechar o lado de dentro detalha os modelos e
do campo, impossibilitando a progressão diretamente ao gol. Outro princípios de jogo pre-
feridos e utilizados pelo
exemplo seria a contenção, ou seja, a indução do comportamento de treinador português.
atrasar a progressão do adversário, com o intuito de permitir que os DIAS, H. Estoril: Prime Books, 2014.
companheiros restabeleçam suas posições defensivas.

Com base no treinamento pautado nos princípios de jogo, adequados


ao modelo sugerido pelo professor-treinador, os jogadores passam a ado-
tar comportamentos individuais e coletivos que sincronizam e facilitam a
estratégia da equipe. O treino organizado pelos princípios auxilia os jo-
gadores na orientação corporal em relação à bola, na proteção à própria
baliza, nas ações diante aos adversários, nas relações com companheiros
e nas melhores respostas ao dinamismo do jogo (COSTA et al., 2009).

Princípios táticos do jogo 59


4.4 Funções e posições no futebol
Vídeo É possível encontrar definições e variações diversas para as po-
sições dos jogadores, ou seja, a distribuição obedece a uma divisão
simples do campo, que tem partes de defesa, meio-campo e ataque
(GUIMARÃES et al, 2014). As posições clássicas do futebol são as de
goleiro, zagueiro, meio-campo e ataque. Essas posições variam den-
tro do contexto da estrutura escolhida e suas funções também po-
dem ser diversificadas.

O goleiro tem como função proteger sua meta e, para isso, é permitido
a esse jogador o uso de qualquer parte do corpo dentro da área. Segundo
Guimarães et al. (2014), a posição de goleiro foi a que mais evoluiu, devido
às modificações das regras, como a proibição do uso das mãos no recuo
para dentro da área, o que aumentou a frequência do uso dos pés. Dessa
forma, passes médios e longos são pré-requisitos de um bom goleiro,
além de boa agilidade e rapidez nas decisões para saídas de gol.

Os zagueiros devem, principalmente, impedir a progressão do


adversário e proteger seu goleiro, ou seja, devem ocupar os espaços
do campo defensivo, sendo fortes no jogo aéreo e afastando a bola
em situações de perigo. No momento ofensivo são eles que iniciam a
construção da jogada. Geralmente, zagueiros têm menos mobilidade
do que os outros jogadores, mas procuram manter o setor resguardado
e organizado, precisando de velocidade para a cobertura defensiva.

Os laterais possuem importante função defensiva e, também, ofen-


siva. No momento da organização defensiva, geralmente preenchem o
espaço mantendo a linha dos zagueiros centrais e, em seguida, explo-
ram o corredor adversário ajudando a equipe a progredir (GUIMARÃES
et al., 2014). Comumente são jogadores que possuem boa capacida-
de física devido à exigência imposta para cumprir esse papel. Depen-
dendo da estrutura tática, esses atletas são chamados de alas e atuam
mais ofensivamente. Possuem como características boa técnica para
cruzamentos, força no duelo 1 contra 1, e entendimento de jogo para
reduzir os espaços do adversário com a bola (GOUVEIA, 2019).

Entre os meio-campistas há várias funções específicas e, nesse


caso, as nomenclaturas também podem variar. Os meias com funções
defensivas são chamados de volantes, que têm papel crucial, pois devem
dar equilíbrio e sustentação à estrutura da equipe (GOUVEIA, 2019).

60 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Os meias armadores são os criadores, responsáveis pela criatividade
da equipe. Os jogadores dessa função normalmente raciocinam com
extrema velocidade e ditam o ritmo da partida. Os meios extremos
possuem função semelhante à dos alas, sendo uma posição bastante
comum quando se opta por jogar com meio-campistas em linha. Jogam
Livro
próximos à linha lateral ofensiva e movimentam-se para abrir espaços
Indicamos o livro A pirâ-
para os laterais (COSTA et al., 2014).
mide invertida: a história
da tática no futebol, de
Os atacantes são os jogadores mais próximos das metas adversárias
Jonathan Wilson. Essa
e criam as maiores e melhores oportunidades de gol, com o dever de obra percorre a história
da tática do futebol
ter a capacidade de jogar entrelinhas. As variações comuns são as de
desde a origem do jogo
atacante de beirada de campo e atacante de área, também chamado com elementos de
cultura e curiosidades.
de centroavante. O primeiro tem características de muita mobilidade,
Várias ilustrações ajudam
geralmente é rápido e se move verticalmente para romper a linha o leitor a compreender as
estruturas táticas citadas.
adversária; o segundo possui competência destacada como finalizador
da equipe, boa capacidade de ocupação de espaços e, geralmente, é Wilson, J. Campinas: Grande Área,
2016.
bom cabeceador. É o jogador que tem a função de finalizar as jogadas
(GUIMARÃES et al., 2014).

4.5 Sistemas táticos no futebol


Vídeo O sistema tático é também chamado de estrutura e permite uma
distribuição dos jogadores no espaço de jogo para cumprimento das
propostas de organização da equipe (GOUVEIA, 2019). Ao longo dos
anos, o futebol evoluiu em diversos aspectos, inclusive na maneira dos
jogadores se organizarem em campo. Segundo Guimarães et al. (2014)
e Leitão (2009), o primeiro time a adotar esse sistema foi o Nottingham
Forest, em 1880, e em seguida copiado por diversas equipes britânicas,
originando o que ficou conhecida como formação clássica: goleiro, dois
zagueiros, três meias e cinco atacantes.

A partir de 1925 e da evolução das regras de jogo – principalmente


a do impedimento –, os jogadores adotaram uma estratégia para rom-
per a linha da formação clássica. Esse sistema ficou conhecido como
WM, que tinha estruturação 3-2-2-3 e é considerado pelos estudiosos
do futebol como o ponto de partida para todos os demais sistemas
modernos (LEITÃO, 2009).

Princípios táticos do jogo 61


Figura 3
Estruturação 3-2-2-3
Por volta da década de 1950, mais um defensor foi
adicionado à linha de defesa dando origem ao quarto
softpixel/Shutterstock

zagueiro e à linha de quatro defensores, originalmen-


te o 4-2-4. Em seguida, surge o 4-3-3 e logo o 4-4-3
com suas variações: losango e quadrado no meio de
campo (LEITÃO, 2009). Já na década de 1980 se popu-
larizou o 3-5-2. As estruturas táticas mais comuns,
apesar de diversificações, estão apresentadas na fi-
gura a seguir.

Figura 4
Formações 4-4-2 e variações (com quadrado no meio/com losango/com 2 linhas)

softpixel/Shutterstock
Livro
Para maior aprofunda-
mento nesse assunto
recomendamos o livro
Periodização Tática: o
futebol arte alicerçado
em critérios, que destaca
conceitos e aplicações
práticas destes, além de
propostas de organização Sistema 4-1-4-1 Sistema 3-5-2
e planejamento de treino,
como a estruturação do O sistema tático nada mais é que operacionalizar as ideias. Para
treino semanal dentro do
modelo de jogo. Leitão (2009), por exemplo, o esquema tático só faz sentido como re-
PIVETTI, B. São Paulo: Phorte, 2012. ferência se potencializar a ação dos jogadores e os comportamentos in-
dividuais e coletivos da equipe, para o cumprimento da lógica do jogo,

62 Metodologia do ensino de futebol e futsal


ocupação mais equilibrada do espaço de jogo, a manutenção da posse
da bola e a aproximação do alvo.

Então, não se trata de construir uma referência com fim em si mes-


ma. A lógica do jogo não pode, jamais, ser perdida de vista. De fato, o
sistema tático é unicamente a estrutura posicional que permitirá aos
jogadores melhor sintonia coletiva.

4.6 Funções e posições no futsal


Vídeo A evolução do futsal o tornou um esporte muito mais dinâmico que no
passado, ou seja, antigamente, as funções e os posicionamentos nesse
esporte eram mais específicos. No futsal contemporâneo, os jogadores
atuam no princípio de ocupação de espaços na quadra, então, o conceito
de posicionamento se tornou obsoleto. Assim, os atletas não possuem
mais posições fixas, mas funções, às vezes múltiplas, determinadas de
acordo com suas características (FERRAZ, 2013). Porém, tradicionalmen-
te, podemos reconhecer as seguintes funções e posições:

Figura 5
Posições tradicionais e distribuição em quadra

Ilya kovshik /Shutterstock

Goleiro
Fixo
Ala
Pivô

O goleiro tem como papel principal o uso das mãos para evitar gols
da equipe adversária. Fisicamente, ele se destaca pela agilidade e pelas
reações rápidas. Além dessas características já conhecidas, o goleiro de

Princípios táticos do jogo 63


futsal possui mais funções, ele é o primeiro jogador na fase de constru-
ção da equipe. Portanto, além das habilidades defensivas, o goleiro de
futsal é fundamental na reposição de bola e na participação com os pés
nos momentos ofensivos (BATISTA et al., 2014).
Livro
Recomendamos o livro
O fixo destaca-se pela capacidade de desarme e de liderança na or-
Futsal, de Antônio Navarro ganização defensiva da equipe, porém, assim como o goleiro, participa
e Roberto Almeida, que
aborda a iniciação espor-
ativamente da fase inicial da construção das jogadas. Por isso, o bom
tiva, o alto rendimento, a passe é uma das características para exercer bem essa função. Na fase
psicologia do esporte, a
fisiologia do exercício, a
de criação, o fixo geralmente inicia manobras ofensivas e se apresenta
educação física escolar, como alternativa para a finalização de média e longa distância.
o treinamento esportivo
(físico, tático e técnico) e Os alas normalmente atuam pelas laterais da quadra e têm função
convida a uma reflexão
fundamental na criação das jogadas. Possuem como característica mobili-
sobre a educação, as rela-
ções sociais e, até mesmo, dade e habilidade, sendo responsáveis pelas ações criativas de desequili-
econômicas, entre os que
brar o sistema defensivo da equipe adversária com dribles e fintas.
vivem do futsal.

NAVARRO, A. C.; ALMEIDA, R. São O pivô é o jogador referência do momento ofensivo, tanto para re-
Paulo: Phorte, 2008. ceber e distribuir as bolas comandando o ataque quanto para se mo-
vimentar, abrindo, assim, espaços para os demais jogadores chegarem
por trás. Normalmente o jogador que recebe essa função tem boa orien-
tação corporal para jogar de costas para o gol e boa capacidade física
para giros rápidos, além de excelente finalização (BATISTA et al., 2014).

4.7 Sistemas táticos no futsal


Vídeo No futsal, a estrutura tática – ou sistema tático – é o termo conhecido
para descrever o posicionamento de cada jogador dentro da formação
da equipe. Os sistemas utilizados dependem das características especí-
ficas dos jogadores, suas funções determinadas, adversário enfrentado
e situação do jogo. Não é incomum uma equipe variar sua estrutura
tática mais de uma vez dentro o jogo. A maneira de posicionar a equipe
em quadra varia conforme a intenção coletiva do time e para facilitar o
senso e a orientação de espaço em quadra, algumas referências espa-
ciais são utilizadas pelo treinador para facilitar a compreensão.
Os problemas relacionados ao espaço podem ser ilustrados da
seguinte maneira: para superar os adversários, a equipe deve
coordenar as ações ofensivas, com o intuito de finalizar de ma-
neira bem-sucedida; e defensivas, com o intuito de impedir a fi-
nalização adversária bem-sucedida. (BATISTA et al., 2014, p. 1042)

64 Metodologia do ensino de futebol e futsal


É denominada como sistemas de jogo a maneira como os atletas se
dispõem em quadra. Os sistemas comumente utilizados são as forma-
ções 2x2, 2x1x1, 3x1, 1x3, 4x0, 0x4, além dos sistemas em rodízio. O
sistema de jogo representa a base da formação da equipe e funciona
de modo interdependente com os padrões de jogo.

Para Michelin et al. (2012), com base na definição do sistema ado-


tado, o segundo passo é definir o tipo de marcação que a equipe de-
verá utilizar. Basicamente, pode-se definir a marcação zonal – ou por
zona –, em que cada jogador fica responsável por um setor da quadra;
marcação individual, em que cada jogador fica responsável por marcar
individualmente seu oponente, independentemente do local da quadra
em que se encontrar; ou marcação mista, que seria uma combinação
desses dois panoramas, em que se marca individualmente após o mo-
mento que o adversário adentrar determinada zona.

Na figura a seguir destacaremos algumas das formações de jogo


utilizadas no futsal, segundo Freitas, Henrique e Nolasco (2008).

Figura 6
Formações de jogo

Ilya kovshik /Shutterstock

2-2 2-1-1 3-1 1-3 4-0

Sistema 2x2

Esse sistema é o mais utilizado na iniciação ao esporte pela simpli-


cidade e facilidade de entendimento por parte das crianças. É conside-
rado o precursor de outros sistemas atuais e consiste em utilizar duas
linhas de dois jogadores. A posição inicial é formada por um fixo e um
ala posicionados um em cada lado externamente à área, ou outros dois
jogadores, pivô e ala, alinhados um em cada lado na quadra de ataque.

Princípios táticos do jogo 65


Sistema 2x1x1

O sistema 2x1x1 pode ser considerado uma progressão do sistema


anterior, relativamente simples e de fácil aprendizagem. Assim como a
ilustração da Figura 6, dois jogadores de defesa se posicionam normal-
mente ao lado da área, um dos alas em uma posição média e o pivô
buscando explorar o espaço mais próximo ao gol adversário.

Sistema 3x1

Esse é um dos sistemas mais utilizados no futsal, pois possibilita


inúmeras variações e implementações de jogadas ensaiadas, além do
surgimento das variações de rodízio. Possui excelente balanço defen-
sivo como característica, porém exige grande capacidade física para as
transições para o ataque. O pivô normalmente irá se posicionar próxi-
mo à marca do pênalti do adversário, os alas e o fixo se movimentam e
são responsáveis pela construção das jogadas e por encontrar o pivô.

Sistema 1x3

Nesse sistema, extremamente ofensivo, apenas um jogador perma-


nece fixo na defesa e três jogadores no ataque. Parece ser um sistema
viável para equipes de alto nível técnico e em situações extremas de
desvantagem no placar.

Sistema 4x0

Esse sistema é caracterizado pela colocação dos quatro jogadores


na parte defensiva da quadra, e é usado em situação de vantagem no
placar para a manutenção do resultado. É um sistema que exige expe-
riência dos jogadores e bom período de treinamento, portanto, é mais
Site
comum ser observado em equipes de alto rendimento.
Para aumentar o
conhecimento na área de Um termo bastante utilizado no futsal é padrão de jogo, que se refe-
treinamento tático, acesse
re a diversas formas de movimentação dos atletas nas quais ocorrem
a página Periodização
tática, de Vitor Frade. trocas de posições de modo planejado e organizado. Ele é representa-
O professor Frade é
do pelo modo como a equipe age sobre determinadas situações. Ape-
referência no assunto e o
site possui diversos artigos sar da imprevisibilidade do jogo, as equipes buscam a padronização
e matérias.
baseada nos eventos que se repetem ao longo do tempo, passíveis de
Disponível em: http:// serem modeláveis (BATISTA et al., 2014; FREITAS, HENRIQUE, NOLASCO,
periodizacaotactica.com/. Acesso
em: 24 jun. 2020. 2008). Os padrões seguem o sistema de jogo adotado e consistem em
movimentos coordenados denominados de manobras na literatura es-
portiva(MICHELIN, 2012).

66 Metodologia do ensino de futebol e futsal


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os pontos aqui apresentados permitem ao futuro professor com-
preender que a elaboração e estruturação do treino técnico-tático deve
obedecer a princípios para que faça algum sentido no jogo. Cada sessão
de treinamento, ou unidade de treinamento, deve possuir um propósito
para que os processos ou caminhos que levam a equipe ao sucesso ou
o jogador ao desempenho máximo sejam alicerçados. Portanto, só pode-
mos esperar que aconteça no jogo o que foi proposto em treinamento.
É comum nos depararmos com o professor ou treinador que se indis-
põe com a equipe, gesticula com veemência ou cobra excessivamente, às
vezes aos berros, devido ao erro coletivo numa jogada ou ação individual
equivocada. O treinador precisa pensar: “será que os preparei correta-
mente?”, “será que consegui transmitir o que eu quero?”, “será que sei
o que eu quero?”. O treino deveria servir exatamente para isso, ajustar
comportamentos para cada momento do jogo, e esses comportamentos
devem estar em concordância com as ideias de como jogar bem.

ATIVIDADES
1. Neste capítulo, foi abordada a importância de se adotar um modelo de
jogo, pois este parece ser um ponto fundamental para que as unidades
de treino tenham sentido e objetivo. Por qual razão o sucesso do
modelo depende da compreensão do contexto local?

2. A expressão jogar bem é subjetiva e pessoal, mas na busca por um


significado, é possível definir que o jogar bem resulta da coerência
entre o plano ideológico e o prático. O que isso quer dizer?

3. Suponhamos que você assuma o comando de uma equipe competitiva


de determinado colégio. Com base nos estudos deste capítulo, qual é
o critério para a escolha do esquema tático?

REFERÊNCIAS
BATISTA, N. R. et al. Modelo do jogo de futsal e subsídios para o ensino. Movimento, Porto
Alegre, v. 20, n. 3, p. 1039-1060, jul./set. 2014. Disponível em: http://www.redalyc.org/
articulo.oa?id=115332101010. Acesso em: 24 jun. 2020.
CORREIA, P.; RIBAS, T.; SILVA, V. Uma ideia de jogo, momento de organização ofensiva, 1 ed.
Estoril: Prime Books, 2014.
COSTA, I. T. et al. Princípios Táticos do Jogo de Futebol: conceitos e aplicação. Motriz, Rio
Claro, v. 15, n. 3, p. 657-668, jul./set. 2009.
DIAS, H. Sport Lisboa e Benfica 2013/2014: uma visão sobre o modelo de jogo de Jorge Jesus e
sua operacionalização. Estoril: Prime Books, 2014.

Princípios táticos do jogo 67


DIAS, H. A Construção de um jogar. Estoril: Prime Books, 2016.
FERRAZ, M. P. M. Análise das possibilidades táticas do sistema 3 x 1 no futsal. EFDeportes,
Buenos aires, ano 18, n. 180, 2013. Disponível em: https://www.efdeportes.com/efd180/
taticas-do-sistema-3x1-no-futsal.htm. Acesso em: 24 jun. 2020.
FREITAS, D. C.; HENRIQUE, J.; NOLASCO, R. C. Aspectos técnicos, táticos e regulamentares do
futsal sob a ótica de treinadores experts. Efdeportes, Buenos aires, ano 13, n. 125, 2008.
GOUVEIA, V. Futebol: treinar para jogar. 1 ed. Estoril: Prime Books, 2019.
GUIMARÃES, M. B. et al. As posições no futebol e suas especificidades. Bras Futebol, v. 7, n.
2, p. 71-83, jul./dez., 2014.
JUNIOR, N. B. A ciência do esporte aplicada ao Futsal. Rio de Janeiro: Sprint, 1998.
LEITÃO, R. A. A. O jogo de futebol: investigação de sua estrutura, de seus modelos e da
inteligência de jogo do ponto de vista da complexidade. Campinas, 2009. Tese (Doutorado
em Educação Física) – Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas.
Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/274779. Acesso em: 24 jun.
2020.
MICHELINI, M. C. et al. Futsal: Tática defensiva contemporânea e a teoria de ensino dos
jogos esportivos coletivos de Claude Bayer. Revista da Faculdade de Educação Física da
UNICAMP, Campinas, v. 10, n. 1, p. 20-37, jan./abr. 2012.

68 Metodologia do ensino de futebol e futsal


5
Fisiologia e preparação física
Para entendermos o papel que um programa de treinamento
pode desempenhar no organismo humano, adentraremos no uni-
verso da fisiologia do exercício, mais precisamente naquela aplicada
ao futebol e ao futsal. Por meio de adaptações fisiológicas, propor-
cionadas pelo treino, são promovidas melhorias nas capacidades e,
consequentemente, maior aptidão física para o esporte. O futebol,
assim como o futsal, é um esporte considerado de característica
acíclica e intermitente – ou seja, durante o tempo total de jogo, os
atletas se submetem a ações com diferentes tipos de esforços,
como corridas em diferentes velocidades e distâncias, saltos, arran-
ques, acelerações e desacelerações, mudanças de direção etc.
Neste capítulo, conheceremos as competências físicas impor-
tantes para o desempenho do jogador, pois é com base no enten-
dimento das demandas do jogo que se elabora e se estrutura o
treinamento. Também discutiremos os cuidados com o processo
de formação esportiva de crianças e jovens, denominado desenvol-
vimento esportivo em longo prazo.
É preciso que a formação do atleta seja vista como uma constru-
ção alicerçada por diversos blocos, que deverão estar devidamente
encaixados. Cada etapa desse processo exige um olhar especial, e
deixar de enxergar as crianças como adultos em miniaturas já é um
bom começo. Os modelos de desenvolvimento de crianças sempre
obedeceram ao critério da idade cronológica. Porém, novas pro-
postas de modelo vêm sendo estudadas para que a idade biológica
de cada uma seja respeitada, já que, dependendo do período ma-
turacional, a assimilação e acomodação dos conteúdos propostos
têm resultados diferentes. Com isso, será possível elaborar uma
estrutura de trabalho que leve em consideração o período propício
para determinadas capacidades físicas.

Fisiologia e preparação física 69


É com base nessas informações que o professor/treinador inicia
o processo de criação e passa a ser capaz de responder a estas per-
guntas: o que treinar? Quando treinar? Quem treinar? As demandas
fisiológicas dependerão de tudo o que acontece no jogo, do estilo
da equipe, da exigência do adversário, dos fatores ambientais e dos
aspectos psicológicos. Mas, apesar de cada partida oferecer uma
condição, é possível traçar um perfil das modalidades em questão.

5.1 Demandas fisiológicas


Vídeo O desempenho esportivo é determinado pelas características técni-
cas, táticas, físicas e psicológicas. Nas últimas décadas, o aspecto físico
tem sido grande alvo de interesse de pesquisadores na busca pelo en-
tendimento sobre como o treinamento pode alterar os fatores fisioló-
gicos e aumentar a performance (BANGSBO, 2015).
O futebol é uma modalidade que depende de muitas variáveis fisioló-
gicas. Assim, tanto o metabolismo aeróbio quanto o anaeróbio estão pre-
sentes, e os esforços de alta intensidade com curta duração se interpõem
aos períodos de menor intensidade e maior duração. Essa característica,
associada à diversificação de gestos, conceitua o esporte como intermiten-
te e acíclico, do ponto de vista fisiológico (BARROS NETO; GUERRA, 2004).
O treinamento pode ser considerado um conjunto de tarefas que
objetiva abalar a homeostase orgânica, ou seja, causar estresse físico.
A adaptação a essa sequência de estímulos levará ao que alguns auto-
res chamam de supercompensação – termo utilizado para identificar a
condição física melhorada. Porém, para que saibamos o que ou quanto
se deve ser treinado, é necessário possuirmos um aprofundado conhe-
cimento das características da modalidade. Desse modo, quais são as
demandas fisiológicas em uma partida de futebol ou futsal?
Para se ter uma correta informação sobre as cargas fisiológicas du-
rante a partida e para a estruturação racional do treinamento, as ob-
servações devem ser feitas em jogos oficiais. As sobrecargas impostas
durante uma partida, para melhor entendimento, são divididas em car-
gas internas e cargas externas.
As cargas internas correspondem às respostas do organismo
ao esforço. Frequência cardíaca (FC), lactato sanguíneo ou pres-

70 Metodologia do ensino de futebol e futsal


são arterial são algumas respostas fisiológicas ao estímulo recebido
(BOURDON et al., 2017). Já as cargas externas se referem à tarefa a
que o indivíduo é exposto (o que está fazendo), como a distância per-
corrida, o tempo de duração e os arranques realizados. Sendo assim,
os fatores a serem identificados são: distância total percorrida; por-
centagem da corrida em alta intensidade; tempo de jogo; número de
arranques e acelerações; e a frequência cardíaca, que corresponde à
carga interna (GOMES; SOUZA, 2008).

Para Bourdon et al. (2017), a mensuração das cargas é fundamental


e as cargas internas e externas devem ser utilizadas de maneira com-
binada para caracterizar o nível de esforço. A tecnologia hoje auxilia na
mensuração rápida e precisa de muitas dessas ações de jogo; a grande
maioria dos clubes, nas principais ligas, utilizam aparelhos GPS (global
position system) acoplados a um frequencímetro, o qual permite a leitu-
ra, em tempo real, das ações dos jogadores em campo.

Figura 1
Distribuição das médias de velocidade da distância total percorrida por uma equipe em uma partida

mais de 23 km/h com bola

de 19,1 a 23 km/h de 0 a 11 km/h

de 14,1 a 19 km/h

de 11,1 a 14 km/h

Fonte: FIFA, 2020, p. 126.

O gráfico apresentado na Figura 1 demonstra a distribuição das


velocidades, utilizadas pelos jogadores, dentro da média da distância
total percorrida. As características mudam bastante de acordo com a
função e posição em campo; porém, em média, um jogador percorre
uma distância total de 10 a 14 km, segundo FIFA (2020).

Podemos observar, pelo gráfico, que uma pequena parte desse to-
tal corresponde a altas intensidades, o que representaria, de acordo
com FIFA (2020), 500 a 800 m de corridas em alta intensidade (19 a
23 km/h) e 200 a 350 m de arranques (+ de 23 km/h). Apesar de haver
grande predominância dos deslocamentos de média e baixa intensida-

Fisiologia e preparação física 71


des, são as ações intensas, as quais definem o jogo, que poderiam supor
uma maior relevância do metabolismo aeróbio (FIFA, 2020).

Em uma análise feita com base em 370 jogos da Premier League


– primeira divisão da Inglaterra e um dos campeonatos mais importan-
tes do mundo –, durante a temporada 2005/2006, foram encontrados os
seguintes valores de corridas de alta intensidade e distância total percor-
rida por posição: meias extremos com 3.138 e 11.535 m; meios-campis-
tas com 2.825 e 11.450 m; laterais com 2.605 e 10.710 m; atacantes com
2.341 e 10.314 m; e zagueiros com 1.834 e 9.885 m (BRADLEY et al., 2009).

Figura 2
Variação da frequência cardíaca durante uma partida

100

90
% de FC máx.

80

70

60
00:00:00

00:15:00

00:30:00

00:45:00

01:00:00

01:15:00

01:30:00

01:45:00
Tempos de partida (hr:min:seg)
Fonte: FIFA, 2020, p. 125.

O treinamento físico tem como objetivo capacitar o futebolista a su-


perar as demandas físicas solicitadas durante o jogo. A Figura 2 repre-
senta a resposta média da frequência cardíaca (FC) durante uma partida
de futebol; a zona de 90 a 100 apresenta os valores acima de 90% da FC
máxima, demonstrando que, em boa parte do jogo, a equipe se mantém
nas zonas de 70 a 80 e de 80 a 90. Essa informação ressalta a importân-
cia de se ter um bom condicionamento do sistema cardiorrespiratório.

5.1.1 O treinamento aeróbio


Para Barros Neto e Guerra (2004), os objetivos do treinamento ae-
róbio são: aumentar a capacidade do sistema cardiovascular em trans-

72 Metodologia do ensino de futebol e futsal


portar oxigênio aos músculos solicitados; aumentar a capacidade dos
músculos em utilizar o oxigênio fornecido e em oxidar ácidos graxos;
e, por fim, aumentar a velocidade de recuperação após ações intensas.

O treinamento de resistência aeróbia é de importância substancial,


pois o aumento das capacidades aeróbias do organismo forma a base
funcional necessária para o aperfeiçoamento de outros aspectos. No
futebol e no futsal, essa é a base de apoio para a resistência específica
(GOMES; SOUZA, 2008).

Os exercícios mais eficientes para o desenvolvimento da capaci-


dade aeróbia devem ser feitos no nível um pouco abaixo do limiar
anaeróbio, ou seja, em intensidades nas quais os níveis de lactato
permaneçam entre 3 a 4 mol (BARROS NETO; GUERRA, 2004). Com
essa intensidade, é possível manter um equilíbrio entre os níveis de
FC, acidose e consumo máximo de oxigênio.

Para Bangsbo (2015), o treinamento aeróbio pode ser divido em três


áreas: aeróbio de baixa intensidade, de moderada intensidade e de alta
intensidade; além disso, ele pode ocorrer com base na frequência cardía-
ca. Em esportes coletivos, esse treinamento se dará em forma de jogo.

Resistência especial é o nome utilizado para se referir ao treina-


mento voltado ao aumento da capacidade aeróbia dentro das espe-
cificidades do jogo, utilizando-se da estrutura e da funcionalidade da
partida para se aproximar do aspecto biomecânico da atividade. Esses
aspectos serão abordados na sessão 5.3.

5.1.2 O treinamento anaeróbio


O treinamento anaeróbio pode ser dividido em lático e alático.
O primeiro possui o objetivo de aumentar a capacidade do músculo
em realizar atividades de alta intensidade e em um maior número de
vezes. Segundo Gomes e Souza (2008), o fator limitante da capacida-
de de produção de energia por esse sistema é a alta concentração
de lactato, produto da glicólise anaeróbia, que pode levar à diminui-
ção da capacidade contrátil dos músculos. Ao determinar a duração
do exercício para o treinamento, deve-se levar em consideração que,
por volta dos 20 a 40 segundos em intensidade alta, esse sistema
atinge seu limite. Portanto, o método mais eficiente para um melhor
aproveitamento desse sistema é o intervalado.

Fisiologia e preparação física 73


Já no treinamento anaeróbio alático, a fonte energética majoritária
é fornecida pelos fosfatos de alta energia, o ATP-CP (BARBANTI, 2010).
Esse treinamento tem por objetivo aumentar a força e a velocidade, as
quais propiciarão um consequente aumento da força de salto, acele-
ração e potência. Para o aumento da potência do sistema alático, os
exercícios propostos devem ser de curtíssima duração, com pausas
para a recuperação.

Para Bangsbo (2015), o intuito do treinamento anaeróbico é aumentar


o potencial de desempenho nos exercícios de alta intensidade, podendo
ser dividido em treino da velocidade e treino da velocidade resistida, por
meio do método intervalado. Ainda, segundo o autor, o treino da velo-
cidade corresponde à ação de alta intensidade em um curto período de
tempo. Já o treino de resistência de velocidade pode ser dividido em pro-
dução da velocidade e manutenção da velocidade, o que podemos ob-
servar na Tabela 1. Assim, a produção se refere ao exercício com duração
de até 40 segundos e a manutenção ao exercício que dura no máximo 90
segundos. É importante notar o tempo de recuperação entre elas.

Tabela 1
Princípios do treinamento de velocidade e treinamento de velocidade resistida

Intensidade Número de
Exercício(s) Recuperação
(%) repetições

Treinamento >10x o tempo


2 - 10 seg. 100 2 - 20
de velocidade de exercício

Resistência de
>5x o tempo
velocidade 10 - 40 seg. 70 - 100 2 -10
de exercício
(produção)

Resistência de
<3x o tempo
velocidade 10 - 90 seg. 40 - 100 2 - 15
de exercício
(manutenção)

Fonte: Adaptada de Bangsbo, 2015.

Segundo Barbanti (2010), o treinamento físico se baseia em três


princípios biológicos: sobrecarga, especificidade e reversibilidade. O
princípio da sobrecarga se refere a como as adaptações fisiológicas e
morfológicas do organismo dependem da sobrecarga imposta ao in-
divíduo pelo volume, pela intensidade e pela densidade de treino. O
princípio da especificidade se fundamenta no fato de que um treina-
mento específico tem efeitos específicos sobre o organismo; assim,

74 Metodologia do ensino de futebol e futsal


quanto mais próximo do jogo for o treino, melhor será a adaptação e
as respostas. Por fim, o princípio da reversibilidade é sobre como as al-
terações conquistadas com treinamento têm caráter transitório, isto é,
a inatividade ou o baixo estímulo tende ao retorno aos estados iniciais.

Figura 3
Capacidades condicionantes aplicadas ao futebol

Desempenho anaeróbio:
• máxima potência
Velocidade
anaeróbia;
• capacidade anaeróbia;
• frequência de
produção de energia.

Força Resistência

Força muscular: Desempenho aeróbio:


k
toc
ers

• concêntrica; • máxima potência


utt
Sh

• excêntrica; aeróbia;
/
05
r13

• isométrica; • capacidade aeróbia.


ste
Ma

• frequência de
produção de força.
Fonte: Elaborada pelo autor.

O treinamento de força ocorre com base nos valores porcentuais de


1 RM para mensuração da carga máxima (100%). Desse modo, a aplica-
ção das cargas próximas a 60% promove resistência muscular, a 80%
proporciona o aumento da força máxima e hipertrofia e acima de 90%
propicia a força neural (BARBANTI, 2010). Livro
A obra Treinamento de
Os tipos de contração muscular são: concêntrica, excêntrica e iso-
força em futebolistas
métrica. A força de contração concêntrica é caracterizada pelo encur- aborda, com detalhes, o
treinamento de força para
tamento da fibra e pode ser vista na ação do chute. A fase excêntrica é
futebolistas, além dos
definida pelo alongamento das fibras durante a contração e é comum conceitos e da contextua-
lização dessa capacidade
nas desacelerações, muito usadas no futsal. Já a contração isométrica
durante o jogo. O livro
é aquela cuja produção de força não gera movimento, ela é estática; destaca os cuidados e
também a importância de
podemos exemplificar a força isométrica com a estabilização após a
programas de força para
aterrissagem de salto para cabecear uma bola. jovens atletas.

A ciência atual já reconhece que é possível aumentar e desenvolver ARRUDA, M. de; HESPANHOL, J. São
Paulo: Phorte, 2009.
a força sem impor altas cargas, por meio de um modelo em que uma

Fisiologia e preparação física 75


carga média deslocada em alta velocidade permite os ganhos de força
compatíveis ao implemento de cargas altas. Apesar da literatura reco-
mendar a divisão das manifestações da força em força máxima, força
rápida e força resistente, todas elas dependem do potencial de força
máxima, ou seja, se esta aumentar, todas as outras também aumen-
tarão (BARBANTI, 2010; LOTURCO, 2018). Além do mais, o uso dessa
técnica no exercício de salto vertical apresenta íntima correlação com
as ações de alta velocidade.

5.2 Treinamento do jovem


Vídeo O treinamento de jovens e crianças requer muito cuidado por parte
do professor e dos treinadores. Um dos principais equívocos, que po-
demos observar na prática, é a tendência de reproduzir em crianças os
métodos e modelos de treino aplicados aos adultos. Dependendo da
fase ou do estágio de desenvolvimento, a carga ou o tipo de treino ofe-
recido à criança pode não produzir nenhum efeito benéfico ou, ainda
pior, pode acarretar respostas fisiológicas adversas.

Ao iniciar uma criança ou um jovem em uma estrutura esportiva, é


extremamente importante que o treinamento não seja visto como uma
unidade isolada, mas como parte de um processo de desenvolvimento
em longo período (LLOYD; OLIVER, 2012).

A busca por um modelo adequado de desenvolvimento esportivo,


em longo prazo, tem sido observada ao longo de décadas. Atualmente,
a ciência ajuda a entender algumas particularidades a respeito do or-
ganismo das crianças, norteando os caminhos para professores e trei-
nadores esportivos. Será que um jovem de 10 anos, por exemplo, está
apto para receber um treinamento de força? Qual o melhor momento
para se inserir a resistência? Com que idade se deve utilizar cargas?
Essas perguntas podem ser respondidas pelos períodos sensíveis.

Os períodos sensíveis são aqueles nos quais o indivíduo está mais


apto a receber certo conteúdo e responder bem a determinado estímulo.
O período sensível pode ser entendido, metaforicamente, como a janela
aberta. Desse modo, a janela de oportunidade vai estar mais ou menos
aberta em dados períodos. A fim de determinar os períodos sensíveis,
para receber e responder a treinos de força, resistência, velocidade e
habilidades, os marcadores maturacionais são usados como referência.

76 Metodologia do ensino de futebol e futsal


O modelo a seguir é proposto por Lloyd e Oliver (2012) para uma es-
truturação de trabalho pautado no desenvolvimento esportivo. O mo-
delo propõe a utilização dos períodos sensíveis ao treinamento como
norte para a elaboração do conteúdo de treino.

Figura 4
Representação do modelo de desenvolvimento esportivo em meninos e meninas

Idade
2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 +
cronológica
PRÉ-
MATURAÇÃO INFÂNCIA ADOLESCÊNCIA ADULTO
-INFÂNCIA

MENINOS IDADES PRÉ-PVC PVC IDADES PÓS-PVC

Movimentos fundamentais
Movimentos
específicos
QUALIDADES Força
FÍSICAS
Velocidade
Agilidade
Hipertrofia

MENINAS IDADES PRÉ-PVC PVC IDADES PÓS-PVC

Movimentos funda-
mentais
Movimentos
específicos
QUALIDADES
FÍSICAS Força
Velocidade
Agilidade
Hipertrofia
Fonte: Adaptada de Lloyd e Oliver, 2012.

As estratégias de desenvolvimento esportivo, propostas por Lloyd e


Oliver (2012), propõem que, nos períodos iniciais, antes do começo da
puberdade, as atividades sejam focadas no desenvolvimento das habi-
lidades fundamentais (saltar, correr, arremessar etc.), atribuindo maior
importância à variação de movimentos e menor importância à especia-
lização esportiva. Assim, conforme o período de puberdade vai se apro-
ximando, maior importância vai sendo atribuída aos treinos específicos.

Observe que a força é um componente que pode ser trabalhado


em todas as fases; porém, é importante ressaltar que o seu desenvol-
vimento não está necessariamente ligado à ideia de levantar pesos. Já

Fisiologia e preparação física 77


a hipertrofia – essa sim relacionada ao deslocamento de altas cargas –,
não deve ser iniciada antes do período púbere. Em diversos países, há
programas voltados para o estímulo e a participação de atividades que
contemplem o repertório motor da criança, construindo suas habilida-
des básicas até que ela esteja apta para receber os estímulos específi-
cos e melhorar as respostas aos treinamentos das capacidades físicas.

Estudos recentes mostram que a iniciação esportiva que contempla


atividades variadas ou multiesportivas constrói adultos mais ricos em mo-
vimento, com menor número de lesões e maior longevidade como atleta.
Com isso, desenvolve-se uma sociedade mais ativa, refletindo também na
saúde pública do país.

5.2.1 Maturação biológica


Você sabe qual é a diferença entre idade biológica e idade
cronológica?

Essa resposta pode auxiliar os professores a não negligenciarem o


processo de formação esportiva, algo que ainda vemos com alguma
frequência. A idade cronológica se refere aos anos de vida da criança,
enquanto a idade biológica diz respeito à maturação sexual. A matura-
ção biológica é um processo que ocorre em todos os tecidos, órgãos e
sistemas do corpo; a avaliação desse processo permite identificar o
progresso ou estado atual de maturação (MALINA et al., 2015).

Juntamente com a maturação sexual, ou puberdade, outras caracte-


rísticas também se apresentam; algumas são visíveis, outras nem tan-
Figura 5 to, mas o fato é que essas características influenciarão nas capacidades
Crianças da mesma idade motoras e cognitivas dos jovens. As crianças que maturam
em um treino de futebol
mais rapidamente e antecipam a idade cronológica são
chamadas de precoces. Já aquelas que demoram mais
tempo para atingir a puberdade (menarca ou esper-
marca) são denominadas tardias. A Figura 5 mostra
um exemplo dessa situação, na qual há crianças
inseridas em uma mesma turma, porém com
condições de maturação bastante distintas.

O grande problema dessas diferenças


reside no momento que, dentro do cenário
matimix/S

esportivo, essas crianças são expostas às mes-


hutterstock

78 Metodologia do ensino de futebol e futsal


mas cargas de trabalho, exigências ou competições, sendo comparadas
entre si. Obviamente, as crianças precoces terão ampla vantagem em
alguns quesitos fundamentais para o esporte – como força, velocidade
e agilidade – e, então, chutarão mais forte, saltarão mais alto e correrão
mais rápido. Se as deixarmos expostas ao mesmo tratamento, é possível
que estejamos cometendo grande injustiça.

O pico de velocidade de crescimento (PVC) diz respeito ao momento


que a estatura da criança aumenta mais rapidamente. Ele é conhecido
popularmente como estirão de crescimento e tem sido utilizado para ca-
racterizar o período de aumento de concentração hormonal, apresentan-
do transformações no desenvolvimento esportivo (LLOYD; OLIVER, 2012).

Assim como o PVC, as características sexuais secundárias também


indicam o estado maturacional. Elas são utilizadas por pediatras como
um método para identificar a idade biológica, estando relacionados
com o PVC (MALINA et al., 2015).

Figura 6
Curva do pico de velocidade de crescimento
PVC
10 PVC 10
Meninas - altura cm/ano

9 9
Meninos - altura cm/ano

8 fase de menarca 8
7 estirão 7
6 6
5 5
4 início do período 4
3 de estirão 3
2 2
1 1
0 0
4 6 8 10 12 14 16 18 4 6 8 10 12 14 16 18
a
seios b pênis
idade
pelos pubianos idade pelos pubianos
testículos
Fonte: Adaptada de Balyi, 2016.

Durante a puberdade, uma série de transformações são observadas


no jovem, o que é considerado um marco para o início da fase de espe-
cialização do indivíduo. Observe, na Figura 6, que as meninas possuem
o PVC próximo aos 12 anos de idade. Assim, após o pico de crescimento,
ocorre a menarca devido ao aumento da secreção do hormônio estra-
diol, que proporcionará transformações morfológicas, como o aumento
de gordura corporal, dos seios e do quadril (MALINA et al., 2015), poden-
do refletir negativamente no desempenho da jovem jogadora.

Fisiologia e preparação física 79


Já os meninos atingem o pico por volta dos 14 anos, dando início
à maturação. O modelo de desenvolvimento de atletas em longo pe-
ríodo, proposto por diversas instituições mundo afora, preza pela atri-
buição de cargas e competências físicas coerentes com as capacidades
biológicas da criança. A seguir, veremos algumas dessas capacidades e
suas características relacionadas ao desenvolvimento.
•• Força: o treinamento de força para crianças e jovens sempre foi
tema de discussão. Hoje, é aceitável que crianças possam, de ma-
neira segura, participar de atividades que envolvam a força, des-
de que de modo adequado e orientado (LLOYD; OLIVER, 2012).
Porém, é importante salientar que o desenvolvimento de força
está associado a vários fatores, como os neurais e hormonais.
Então, a janela de oportunidade para essa valência estará mais
aberta por volta de 12 a 18 meses após o PVC.
•• Velocidade: em concordância com o modelo, qualquer efeito de
treinamento será resultado de adaptações neurais. Pesquisas
indicam que o desenvolvimento da velocidade em jovens atle-
tas pode ser influenciado pela maturação. No entanto, durante
o período pré-púbere, há boas respostas para os treinamentos
de ativação neural, como arranques e treino pliométrico. Já para
o treino neural e estrutural (força e pliometria), são observadas
respostas melhores em adolescentes.
•• Hipertrofia: o modelo de desenvolvimento de atletas, proposto
por Lloyd e Oliver (2012), sugere que a hipertrofia deve ser inicia-
da por volta dos 14 anos para os meninos e aos 12 anos para as
meninas – período intimamente ligado ao PVC, no qual os níveis
de secreção hormonal aumentam. Portanto, os treinamentos vol-
tados para o aumento de volume muscular não terão efeito antes
do período proposto.
•• Potência: é a habilidade para produzir altos níveis de potência,
sendo fundamental para o sucesso esportivo; porém, a janela de
oportunidade para a potência parece estar mais aberta durante a
adolescência, permanecendo na fase adulta.
•• Mobilidade: o modelo propõe que um programa de mobilidade e
flexibilidade possa ser inserido na infância, de 5 a 11 anos de idade.
Essa capacidade servirá como uma das mais importantes estrutu-
ras para a saúde a longo prazo do indivíduo. Os meninos demons-
tram uma diminuição dessa capacidade após completarem 9 anos

80 Metodologia do ensino de futebol e futsal


de idade, por isso a importância de se trabalhar o quanto antes Vídeo
com a mobilidade, potencializando o período sensível. O vídeo Maturação e
idade biológica no esporte,
•• Agilidade: é considerada um componente bastante discutível e publicado pelo canal
cdechecchi, apresenta
com pouca base na literatura pediátrica. Apesar de não haver dú-
uma matéria original-
vidas de que é uma capacidade extremante importante para o mente exibida pelo
futebol e futsal, não há um período sensível determinado para canal esportivo SportTV,
que discute a matura-
essa valência no modelo de desenvolvimento. ção e a relação entre
idade biológica x idade
•• Resistência: anteriormente, era vista como uma capacidade a
cronológica de crianças e
ser trabalhada durante o período pré-púbere. Porém, como há adolescentes inseridos no
várias evidências de alterações no sistema cardiovascular central esporte, dando destaque
a quando esse fator
e periférico e na função neuromuscular e metabólica relaciona- é negligenciado por
das ao crescimento, o modelo de desenvolvimento não deter- treinadores na formação
esportiva.
mina um período específico, mas atenta para a importância do
Disponível em: https://
treino de resistência durante a infância, dando, também, atenção www.youtube.com/
especial ao momento próximo à fase adulta, quando os sistemas watch?v=zcn3QwANVs8. Acesso
em: 23 jun. 2020
cardiorrespiratórios parecem estar mais aptos.

Durante a idade pré-púbere, os meninos e as meninas seguem simi-


lares no que diz respeito à velocidade, coordenação, resistência e força,
portanto, é possível e recomendável a participação conjunta sem dis-
tinção. Desse modo, o modelo de desenvolvimento sugere que, nesse
período, seja oferecido e privilegiado, para meninos e meninas, um pro-
grama que contenha movimentos fundamentais básicos e atividades
que aumentem o repertório motor da criança (LLOYD; OLIVER, 2012).

5.3 Jogos condicionantes


Vídeo Refere-se a jogos condicionantes o método de treinamento que se
baseia na estrutura do jogo para o condicionamento físico; ele parte do
princípio de que o desenvolvimento das competências técnico-táticas,
dentro de uma lógica progressiva e evolutiva dos estímulos, gera adap-
tações físicas e psicológicas (DIAS, 2016).

Diferentemente de um planejamento chamado de periodização


tradicional, em que os aspectos físicos são pensados e treinados
isoladamente, nesse panorama mais moderno, chamado por al-
guns autores de periodização tática, o treino físico se integra ao
jogo por meio de jogos de dimensões menores ou jogos reduzidos.
No treino integrado, o treinador procura criar tarefas e exercícios,

Fisiologia e preparação física 81


dentro do jogo, que exijam comportamentos coerentes com a de-
manda fisiológica que se queira desenvolver (DIAS, 2016).

Os jogos reduzidos são exercícios modificados, jogados em espaços


menores; eles podem integrar todos os aspectos, desde os puramen-
te físicos até o comportamento técnico-tático. Esses jogos podem ser
utilizados como um meio eficaz de treinamento para a melhoria da ca-
pacidade aeróbia e de desempenho, visto que, quando comparados
com treinos de corridas tradicionais, não foram encontradas diferenças
significativas (GOUVEIA, 2019).

A lógica desse método é treinar o futebol jogando futebol, manipulan-


do a unidade de treino por meio da intensidade e do tempo de duração.
Diversos autores destacam que a maior parte do treinamento físico deve
ser feita com bola, pois assim podem ser atribuídas vantagens, como: o
desenvolvimento dos grupos musculares específicos e a associação das
técnicas e táticas, proporcionando otimização do tempo e maior motiva-
ção quando comparada ao treino físico sem bola (GOMEZ; SOUZA, 2008).

Na elaboração de tarefas de jogo para condicionamento, devemos


nos atentar a alguns fatores, como a dimensão do campo, o número
de jogadores, a presença ou não do goleiro, a inferioridade ou supe-
rioridade numérica e a intensidade, dependendo da exigência do jogo.

A literatura científica dá alguns caminhos para ajudar nessa elaboração


com base em respostas fisiológicas de jogos reduzidos. Assim, conforme o
número de jogadores participantes diminui, devemos aumentar a intensi-
dade do exercício, resultando em maior participação e toques na bola por
jogador; porém, quanto menos jogadores envolvidos, menos componen-
tes táticos são observados, já que os jogadores tendem a se movimentar
sem obedecer às suas funções específicas (TURNER; STEWART, 2014).

Tabela 2
Exemplo de formatos de jogos condicionantes em espaço reduzido

Número de Dimensão
Tempos Notas
jogadores do campo

6 x 1 min •• Componente tático limitado.


3 vs. 3 25 x 20 m •• Alto número de ações por jogador.
(1,5 min de pausa)
•• Alta intensidade.
•• Aumento das acelerações e desa-
6 x 2 min celerações e mudanças de direção.
4 vs. 4 30 x 25 m
(1,5 min de pausa)
(Continua)

82 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Número de Dimensão
Tempos Notas
jogadores do campo

•• Componente tático moderado.


4 x 4 min •• Moderado ou alto número de
5 vs. 5 40 x 30 m
(2 min de pausa) ações por jogador.
•• Moderada ou alta intensidade.
•• Aceleração/desaceleração e corri-
das de altas velocidades.
5 x 8 min
7 vs. 7 60 x 25 m
(2 min de pausa)
3 x 12 •• Alto componente tático.
8 vs. 8 70 x 40 m
(2 min de pausa) •• Baixo número de ações por jogador.
•• Baixa intensidade e aumento de
descanso entre as ações.
4 x 12 (2 min de •• Aumento das corridas de alta velo-
11 vs. 11 90 x 65 m
pausa) cidade.
•• Alta ênfase aeróbica.

Fonte: Adaptada de Turner e Stewart, 2014.


Vídeo
Outros estudos também apontam que os formatos com menor nú-
No vídeo 2v2v2+1
mero de jogadores, como os de 2 a 6 por equipe, podem possibilitar Possession Game for
Soccer!, publicado pelo
maiores ações de alta intensidade. Além disso, atentam que o estímulo
canal Championship
verbal por parte do treinador possui grande influência para o aumento Productions, é possível
observar alguns exem-
da intensidade do jogo (PASQUARELLI et al., 2010).
plos de jogos reduzidos
Para a elaboração das tarefas dos jogos, é importante ressaltar que possuem a finalidade
de aumentar as capacida-
que, quanto mais ampla a área de jogo, mais tempo haverá para des motoras, juntamente
as tomadas de decisão dos jogadores, o que normalmente torna as com a velocidade de
raciocínio e de tomada de
ações mais lentas. Em contrapartida, quanto menor o campo, me- decisão.
nos tempo haverá para as decisões e, com isso, ações mais rápidas Disponível em: https://
serão induzidas, inclusive constantes acelerações e desacelerações www.youtube.com/
watch?v=YcNJF0iSWtQ. Acesso em:
com mudanças de direção (TURNER; STEWART, 2014). 23 jun. 2020.

5.4 Avaliações físicas e controle de treinamento


Vídeo As avaliações físicas são fundamentais em qualquer esporte,
pois, ao conhecer profundamente o estado atual do indivíduo, po-
demos identificar suas necessidades e, consequentemente, elabo-
rar um plano adequado. Quando tratamos de esportes coletivos,
essa importância é ainda mais evidente. Os testes fisiológicos po-

Fisiologia e preparação física 83


dem fornecer informações referentes aos pontos fortes e fracos do
atleta (POWERS; HOWLEY, 2017).

Segundo Barros Neto e Guerra (2004), pelas características da mo-


dalidade, a avaliação da aptidão física deve contemplar a harmonia
entre a força, velocidade, flexibilidade e resistência geral e específica,
acompanhada da composição corporal.

Dentro desse contexto, alguns testes clássicos têm sido utilizados


para atender às demandas específicas do futebol e do futsal. A avaliação
do consumo máximo de oxigênio é aceita como a melhor forma de quan-
tificar a capacidade para exercícios prolongados. Além disso, há o padrão
ouro, que é o método direto, no qual se utiliza a espirometria para captar
as trocas gasosas durante o esforço na esteira (BARROS NETO; GUERRA,
2004). Todavia, existem diversos protocolos indiretos, com menor custo,
que podem ser usados como alternativas válidas cientificamente.

A avaliação anaeróbia estima a participação metabólica dos sis-


temas energéticos, do anaeróbio lático e do alático. Para a avaliação
anaeróbia, é essencial que o teste aplicado empregue os músculos
envolvidos no esporte em questão (POWERS; HOWLEY, 2017). Nessa
esfera, um dos testes bastante utilizado é o de saltos, horizontais e ver-
ticais, para mensurar o desempenho neuromuscular. Existem diversos
protocolos para atender às necessidades específicas do esporte, já que a
capacidade de produção de força nos saltos tem alta correlação com as
ações de velocidade.

Dois dos testes mais conhecidos são o Counter Moviment Jump (CMJ)
e o Squat Jump. Esses são testes utilizados e validados para a potência
de membros inferiores e força de membros inferiores, respectivamente
(TURNER, STEWART, 2014). Além de permitirem o acompanhamento da
evolução do atleta, de modo prático e rápido, também têm sido usados
como ferramenta para indicar fadiga no controle de carga.

Muita atenção tem sido dedicada a estratégias para diminuir o risco


de lesões esportivas. Essas lesões não só causam prejuízos esportivos
e financeiros, como também colocam em risco a saúde e o bem-estar
do indivíduo. Entre as diversas linhas de abordagem para conter esse
problema, está o controle da carga de treino. Controlar a carga é tão
importante quanto realizar o planejamento – se não mais importante.
O descontrole e, por via de regra, o excesso de treinamento podem

84 Metodologia do ensino de futebol e futsal


expor o jovem atleta ou adulto a condições extremas, nas quais o efeito
do treino passa a ser prejudicial.

O controle de carga é um ponto crucial para gerenciar a qualidade


do treino do atleta; a diminuição da força de salto juntamente a outros
critérios, por exemplo, pode representar uma fadiga neuromuscular
proveniente do exercício. Com o monitoramento frequente, é possível
identificar se o programa de treinamento traz benefícios e adaptações
positivas ou se traz possíveis quedas no rendimento, provenientes de
excessos de jogos e treinos. A identificação precoce de possíveis qua-
dros como esse permite uma intervenção imediata, reequilibrando as
cargas, reajustando a alimentação e cuidando da recuperação. Vídeo
Além do controle da fadiga neuromuscular, uma outra ferramen- O vídeo Segredos do
Esporte com Irineu Loturco
ta importante para a identificação da carga de treino é a percepção e o NAR-SP (ESPN), publica-
subjetiva de esforço (PSE). A PSE é um questionário simples e muito do pelo canal NAR-SP,
exibe uma matéria do
utilizado no treinamento desportivo; a escala indicada representa a canal esportivo ESPN,
estimativa da intensidade do exercício e os escores podem ser utili- em seu programa
Segredos do Esporte,
zados como indicadores do esforço, pois têm forte correlação com a que apresenta uma
intensidade do exercício (POWERS; HOWLEY, 2017). entrevista com o Prof.
Dr Irineu Loturco, um
A PSE é frequentemente usada como um modo de controlar a car- dos maiores nomes da
ciências do esporte e o
ga de treinamento, pois, com base nas respostas apresentadas pelos diretor do Núcleo de Alto
atletas, o treinador pode reajustar a sobrecarga. Estudos relacionados Rendimento (NAR-SP), na
qual ele discute o esporte
com overtraining têm demonstrado que indicadores psicológicos, como e treinamento.
a PSE, são mais sensíveis e consistentes do que indicadores fisiológicos
Disponível em: https://
(BOURDON et al., 2017). Além disso, medidas como a PSE podem ser www.youtube.com/
watch?v=t098ZXnbdcc. Acesso em:
aplicadas e reportadas em alguns minutos, enquanto biomarcadores
23 jun. 2020.
fisiológicos podem demorar dias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os treinos de futebol e de futsal devem estar intimamente ligados às
ações que ocorrem durante o jogo. Logo, entender bem as características
do esporte com o qual estamos lidando é um dos pilares para potencializar
as ações dos atletas. Dependendo da posição ou função do jogador, suas
demandas fisiológicas são diferentes. Então, o modelo de jogo adotado pela
equipe, a sincronia e a organização desta estão associados às exigências
motoras durante a partida. Uma equipe desorganizada será evidentemen-
te mais exigida; as dimensões física, tática, técnica e psicológica, apesar de
serem interdependentes, estão interagindo o tempo todo durante uma par-

Fisiologia e preparação física 85


tida. Portanto, a preparação física não deve ser vista como uma estrutura
afastada das outras dimensões, visto que elas fazem parte do mesmo jogo
e, por isso, o treino ou a preparação deve ter esse olhar ampliado.
Grande parte das pesquisas relacionadas à intensidade de jogo são
realizadas com o futebol. Isso porque, apesar da forte similaridade entre
os esportes, no futsal são necessárias mais pesquisas para identificar as
ações em quadra. Essa limitação pode ser explicada pela dificuldade de
utilizar o GPS em ambientes fechados, como o ginásio esportivo, no qual o
sinal é frágil. Nesses casos, a fidedignidade da coleta pode ser comprome-
tida, resultando em poucas publicações científicas sobre o tema.
A preparação do jovem atleta é uma constante preocupação e não
deve ser negligenciada. O processo de crescimento da criança possui par-
ticularidades fisiológicas e, por isso, o programa de treinamento deve res-
peitar as fases de desenvolvimento. A exposição do jovem ou da criança a
programas de treinamento com cargas elevadas e estímulos incoerentes
com sua capacidade de resposta pode acarretar prejuízos irreversíveis,
osteomusculares ou psicológicos, na formação desse indivíduo.
Tanto para adultos quanto para jovens e crianças o treinamento deve
ser muito bem planejado e pautado nos conhecimentos científicos, prin-
cipalmente em esportes coletivos, nos quais a quantidade e a heteroge-
neidade entre os atletas é comum, a complexidade e a responsabilidade
do treinador/professor aumenta ainda mais e o controle deve ser indivi-
dualizado e focado na necessidade de cada um. As demandas físicas nos
esportes coletivos são complexas, e o elemento chave precisa ser identi-
ficado para cada atleta. Além disso, o efeito de diversos tipos de treinos
para promover melhorias no desempenho precisa ser entendido antes do
programa de treinamento ser iniciado.
As divisões de turmas, seja na aula de Educação Física na escola ou em
treinos de equipes em clubes esportivos, normalmente seguem o critério
da idade cronológica. Por exemplo, em uma turma com meninas entre
10 e 12 anos, podem haver condições biológicas altamente distintas por
conta da maturação de cada uma das alunas. Esse panorama se repete
Brasil afora, refletindo o problema da formação esportiva. Desse modo,
expor esses indivíduos ao mesmo esforço físico, competindo entre si e
com mesmo nível de cobrança não parece justo, já que vimos que, quanto
mais próximo estiverem da puberdade, mais rápidos, mais fortes e mais
cognitivamente preparados estarão.
Os excessos àqueles que estão em estágios inferiores podem poten-
cializar os riscos de lesão, causar frustração esportiva por não conse-

86 Metodologia do ensino de futebol e futsal


guirem acompanhar a turma ou, até mesmo, resultar no abandono do
esporte. Para amenizar esse problema, políticas públicas devem ser pro-
postas para qualificar o ensino esportivo, assim como ocorre em países
como Canadá, Nova Zelândia e Austrália, que possuem planos estratégi-
cos para o desenvolvimento de esporte.
Fica claro, então, que planejar o treinamento não é tarefa fácil. Portan-
to, o profissional deve construir uma relação de respeito e empatia com
os comandados, para que seja possível minimizar os erros na formação
esportiva e obter desempenhos de alto rendimento no futebol e no futsal.

ATIVIDADES
1. Foi destacada a questão da idade biológica versus idade cronológica.
Descreva como esse aspecto pode influenciar a formação e o
desenvolvimento de crianças e jovens no esporte.

2. Se você fosse responsável pela estruturação de treinamento de


uma equipe e pelo desenvolvimento das capacidades físicas, de que
maneira você poderia potencializar o desempenho e minimizar os
erros de sobrecarga que poderiam resultar em lesões? Discuta o tema.

3. Basear o desenvolvimento das capacidades condicionantes nos


jogos rompe com o modelo tradicionalista de se focar na forma
física isoladamente. Quais as vantagens de se utilizar esse meio mais
moderno de preparação física?

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Fisiologia e preparação física 87


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TURNER, A. N.; STEWART, P. F. Strength and conditioning for soccer players. Strength and
conditioning journal, v. 36, n. 4, ago. 2014.

88 Metodologia do ensino de futebol e futsal


6
A regra do jogo
O futebol, comparado a outros desportos, é considerado um
esporte de regras simples e objetivas, o que parece ser um dos
motivos de sua massificação em qualquer parte do mundo. O
futsal, buscando conquistar seu espaço entre os europeus, se
modificou muito do original para chegar ao que conhecemos
hoje, apesar de manter sua essência.
Neste capítulo, você conhecerá as regras do futebol e do futsal,
curiosidades sobre elas e abordagens sobre as possíveis adapta-
ções para as categorias de base, na busca da inclusão das crianças
e de facilitar o processo educacional e pedagógico.
Este capítulo não pretende formar árbitros e/ou auxiliares
de arbitragem, mas fornecer um panorama para que o futuro
profissional de educação física possa conhecer o jogo e transmitir
para seus alunos as regras fundamentais.

6.1 Regras do futebol


Vídeo As primeiras regras do futebol foram originalmente elaboradas em
1863 e três anos depois foi criada a International Football Association
Board (IFBA), que até hoje, junto à FIFA, responde pelas regras do
esporte. Qualquer proposta de mudança de regras deve passar pela
aprovação da IFBA, que tem como função preservar ao máximo
as regras originais e a identidade do esporte. O reconhecido estilo
conservador da International Board se pauta em aspectos como
justiça, legitimidade, integridade, respeito, segurança, diversão dos
participantes e como a tecnologia pode beneficiar o jogo.

Apesar de serem consideradas simples, as regras do futebol esbarram


na subjetividade de lances interpretativos, o que pode causar polêmicas
e discussões. A autonomia, nesses casos, é toda do árbitro principal. Não
alheio às transformações tecnológicas e na tentativa de proporcionar mais

A regra do jogo 89
justiça no jogo, o futebol passou a contar com o árbitro de vídeo a partir
da Copa do Mundo de 2018, fato marcante para o esporte que passou
por poucas alterações ao longo dos anos. Conforme destacado na intro-
dução, nesta seção apresentaremos ao aluno um resumo das 17 regras
do futebol. Esse resumo está baseado no manual de regras mais recente
publicado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF, 2019).

Regra 1 – Campo de Jogo


O campo de jogo deve ser construído por completo com grama
natural ou artificial, ou até híbrido (grama natural e artificial), porém,
neste caso, não deve haver uma zona do campo apenas natural e ou-
tra apenas artificial. É importante ressaltar que, para o uso de grama
artificial, a permissão estará condicionada à aprovação dos órgãos res-
ponsáveis pela competição.
O campo de jogo obedecerá a forma retangular e deverá ter linhas
de marcação contínuas de 12 cm de largura. O campo será dividido ao
meio por uma linha que une uma lateral à outra, ao centro dessa linha
haverá um ponto central e um círculo com 9,15 m de raio. A dimensão
do campo deve ter entre 90 e 120 m de comprimento e 45 e 90 m de lar-
gura, porém, para partidas internacionais e, recentemente, para jogos
do Campeonato Brasileiro da primeira divisão foi adotada uma medida
padrão de 105 por 68 m (CBF, 2019).
A Figura 1 aponta as principais medidas e marcações que compõem
Figura 1
Campo de jogo com respec- um campo de futebol.
tivas marcações 90 – 120 m

Shutterstock/MaksymA
Linha de meio campo
16,5 m

5,5 m Grande
Meio de campo área

Gol
45 – 90 m

11 m
40,3 m

Círculo 7,31
9,15 m
9,1 central x
5m Marca 2,44 m
5,5 m do
pênalti
11m

1m
Fonte: Elaborada pelo autor.
90 Metodologia do ensino de futebol e futsal
Os postes de meta possuem duas traves verticais, unidos por uma
barra transversal horizontal chamada de travessão. A altura dos postes
é de 2,44 m e a distância entre eles é de 7,32 m.

Regra 2 – A bola

Toda bola deve ter circunferência entre 68 e 70 cm e peso entre 410


e 450 g, além de apresentar pressão equivalente a 0,6 – 1,1 atmosferas
(600 – 1100 g/cm2) ao nível do mar (CBF, 2019).

Regra 3 – Número de jogadores

É permitida a utilização de 11 jogadores para iniciar a partida em


cada equipe, sendo um deles obrigatoriamente o goleiro. Caso alguma
equipe possua menos de 7 jogadores, a partida não será iniciada ou
deverá ser interrompida, no caso de expulsão ou abandono.

Se o regulamento da competição determinar que os nomes de to-


dos os jogadores e dos substitutos devem ser relacionados antes do
início da partida, e se qualquer equipe começar o jogo com menos de Figura 2
Padrão de uniformes
11 jogadores, somente os jogadores e substitutos cujos nomes foram
indicados na relação inicial poderão completar a equipe e participar
da partida quando chegarem.

O número máximo de substituições em competições oficiais


das respectivas principais divisões de ambos os gêneros é três.

Em partidas eliminatórias e decisivas, em que após resultado

grebeshkovm
empatado haja a prorrogação, será permitida uma substituição a mais.
Em partidas amistosas, é possível a flexibilização dessa regra em co-

axim/Shutte
mum acordo entre as duas equipes e os árbitros para promover maior
participação (CBF, 2019).

Regra 4 – Equipamento rstock

Para atender medidas de segurança, não é permitido o uso de


joias, colares ou qualquer outro acessório. O material esportivo obri-
gatório é composto de camisa, calções, meiões, caneleiras e calçados.

As cores do uniforme das duas equipes devem ser diferentes en-


tre si e também diferentes do uniforme do árbitro. Já os goleiros de-
vem ter cores diferentes dos demais integrantes da partida, tanto os
jogadores de linha quanto os árbitros (CBF, 2019).

A regra do jogo 91
Regra 5 – O árbitro

O árbitro é o responsável pela partida, ele tem autoridade para fa-


zer cumprir as regras do jogo e deve controlar a violência e atuar como
cronometrista. Esse profissional tem a decisão final para os fatos que
ali acontecem, porém não pode mais alterar sua decisão após o reiní-
cio do jogo ou após o término do primeiro ou segundo tempo. Se após
um dos períodos o árbitro sair do campo de jogo para dirigir-se à área
de revisão ou para ordenar que os jogadores regressem ao terreno de
partida, continua sendo possível modificar uma decisão relativa a um
incidente ocorrido antes de finalizar um dos tempos do jogo.
Curiosidade
Se uma segunda bola, um
É papel do árbitro punir qualquer infração grave, e ele deve inter-
objeto ou um animal entrar no pretar conforme a regra, decidindo a punição com base no tipo de con-
campo de jogo e causar alguma tato físico e impacto que essa infração teve no andamento do jogo,
interferência, o árbitro deve
parar o jogo e recomeçá-lo com avaliando as medidas disciplinares com cartão amarelo ou expulsão.
uma bola ao chão. Essa regra O árbitro tem a prerrogativa de aplicar medidas disciplinares desde a
não é válida se a bola estiver
ocasião em que sobe no gramado até o momento de saída do campo
entrando na meta, e o árbitro
deve validar o gol caso a bola de jogo após o fim da partida. No caso de um jogador cometer uma
ultrapasse completamente a infração passível de expulsão antes do jogo, o árbitro tem autoridade
linha (CBF, 2019).
para impedir a participação do jogador (CBF, 2019).

Regra 6 – Os outros oficiais de arbitragem

Os árbitros assistentes são responsáveis por dar suporte ao árbitro


principal na condução do jogo. Eles indicam quando a bola ultrapassa
Figura 3
Árbitro assistente de vídeo a linha de campo e assinalam uma saída lateral ou para a linha de fun-
do. Além disso, têm a responsabilidade de apontar uma
posição de impedimento. Outra responsabilidade atri-
buída ao árbitro auxiliar é a condução da substituição
quando for solicitada.

O quarto árbitro tem a responsabilidade de veri-


ficar o material ou equipamento utilizado pelos jo-
gadores, controlar o entorno da partida e informar
ao árbitro principal sobre qualquer acontecimento,
vistoriar as bolas, apresentar o tempo de acréscimo
lumyai l sweet/Shutterstock

indicado pelo árbitro principal e conduzir a substituição.

O árbitro assistente de vídeo (VAR) é aquele que acompanha o jogo


de uma cabine equipada com monitores de vídeo e pode auxiliar o ár-
bitro da partida em situações de erro claro e óbvio ou incidente grave
cometido e não percebido. Os lances que permitem a intervenção do

92 Metodologia do ensino de futebol e futsal


VAR são situações de gol, pênaltis, cartão vermelho direto e na identifi-
cação incorreta de algum jogador (CBF, 2019).

Regra 7 – A duração do jogo

Uma partida de futebol oficial possui 90 minutos que são divididos


em dois períodos de 45 minutos cada, com um intervalo de 15 minutos.
Deve ser acrescido um tempo para compensar os minutos perdidos em
paralisações durante a partida, como, por exemplo, atendimentos mé-
dicos, substituições, paradas para a hidratação, comemoração de gols
e outras intercorrências (CBF, 2019).

Regra 8 – Início e reinício de jogo

Um tiro inicial é concedido nos dos dois períodos de jogo, um para


cada equipe. O tiro inicial também é utilizado logo após um gol para
um novo reinício de jogo. Outras formas de reiniciar o jogo podem ser
observadas nos tiros livres, pênaltis, arremessos laterais, tiros de meta
e escanteio, assim como a bola ao chão.

Para o tiro de saída do meio de campo, os jogadores, exceto o joga-


dor executante, devem permanecer atrás da linha da bola até que esta
seja tocada; enquanto os adversários devem permanecer a uma distân-
cia de 9,15 m da bola, ou seja, atrás da marca do círculo central. A bola
entra em jogo logo após ser tocada e nitidamente se mover. É possível
marcar um gol contra a equipe adversária no tiro de saída. Caso a bola
entre no gol da equipe executante do tiro de saída, será marcado um
tiro de canto para o adversário (CBF, 2019).

Regra 9 – Bola em jogo e fora de jogo

A bola só será considerada como fora de jogo se ultrapas- Figura 4


Somente a bola D está fora
sar completamente a linha, sendo lateral ou de meta, inde-
de jogo.
pendentemente da altura da bola, seja pelo chão ou pelo alto

wikimedia.commons
(CBF, 2019).

Também será considerada bola fora de jogo quando houver


uma interrupção da partida pelo árbitro por qualquer motivo,
por exemplo, para um atendimento médico a algum jogador ou
por imprevisto de qualquer natureza.

Regra 10 – Determinação do resultado do jogo

Será marcado gol quando uma equipe conseguir fazer com


que a bola ultrapasse a linha passando por entre os dois postes
e por baixo do travessão. Caso o goleiro lance a bola com as

A regra do jogo 93
mãos e ela entre na meta adversária, não será marcado gol, mas sim
um tiro de meta. O time que conseguir o maior número de gols vence
a partida. Se duas equipes obtiverem o mesmo número de gols ou não
marcarem, será decretado empate (CBF, 2019).

Regra 11 – Impedimento

O jogador estará em posição de impedimento se, quando estiver


na metade do campo adversário, qualquer parte de sua cabeça, cor-
po ou pés estiver mais próxima da linha de meta adversária do que
a bola e o penúltimo adversário. É importante salientar que estar em
posição de impedimento sem participar ativamente da jogada não
constitui infração.

Um jogador em posição de impedimento só deve ser punido se tiver


participação ativa do lance, por exemplo, ao encostar na bola passada
ou tocada por um companheiro. Além disso, é passível de punição nas
seguintes situações: ao impedir o adversário de jogar ou de poder jogar
a bola ao obstruir claramente sua linha de visão; ao disputar a bola com
o adversário; ao tentar claramente pegar a bola que se encontre próxi-
ma de si, quando essa ação causar impacto no adversário; ao praticar
uma ação óbvia que tenha impacto claro na possibilidade de o adversá-
rio jogar a bola; ao ganhar vantagem da posição de impedimento por
jogar a bola ou interferir em um adversário quando a bola tiver sido
desviada ou rebotada em um dos postes ou no travessão da meta, em
um oficial de arbitragem ou em um adversário, jogada por um adversá-
Figura 5 rio para fazer uma defesa deliberada (impedir que a bola entre em sua
Marcação de impedimento meta) (CBF, 2019).
softpixel/Shutterstock

Caso o jogador em posição de impedimento


receba a bola jogada deliberadamente por um
adversário, ele não deve ser punido. Uma defe-
sa deliberada se caracteriza quando um jogador
intencionalmente joga ou tenta jogar a bola que
vai em direção ou que está muito próxima de sua
G meta, com qualquer parte do corpo, exceto com
as mãos, a menos que seja o goleiro em sua pró-
pria área de pênalti (CBF, 2019).

Fonte: Elaborada pelo autor.


94 Metodologia do ensino de futebol e futsal
Regra 12 – Faltas e incorreções

Os tiros livres indiretos e diretos e o pênalti só podem ser marcados


por faltas e infrações cometidas quando a bola estiver em jogo.

Será concedido um tiro livre direto a favor da equipe adversária


do jogador que praticar uma das seguintes ações considerada pelo
árbitro como imprudente: contato temerário ou com uso de força
excessiva do tipo fazer carga em um adversário; saltar sobre ele; dar
ou tentar dar um pontapé no jogador adversário; empurrá-lo; golpeá-
lo ou tentar golpeá-lo; dar uma entrada ao disputar a bola com um
adversário; dar ou tentar dar um calço ou uma rasteira em um jogador
do time oponente.
I. Imprudência significa que um jogador demonstra falta de
atenção ou consideração; ou atua sem precaução em relação a
um adversário, quando participa de uma disputa com ele. Não é
necessária qualquer sanção disciplinar.
II. Temeridade significa que um jogador não considera o risco ou as
consequências para seu adversário. O jogador deve ser advertido
com cartão amarelo.
III. Uso de força excessiva significa que um jogador excede a força
necessária e assume o risco de causar lesão em um oponente. O
jogador deve ser expulso.

Será considerada infração e concedido um tiro direto caso um


jogador toque a bola com as mãos ou os braços de maneira volun-
tária, agarre um adversário, atrapalhe a movimentação, morda ou
cuspa em alguém.

Quanto à infração do toque de mão na bola, são geradas muitas


dúvidas e discussões e vale salientar que a infração será marcada se
a mão ou braço encontrar-se em arranjo não natural expandindo a
extensão do corpo para baixo, para os lados ou para cima (CBF, 2019).

Será concedido um tiro livre indireto quando houver uma jogada


perigosa ou um boqueio à progressão de um adversário sem qualquer
contato; quando um jogador usar linguagem inapropriada ou gestos
que caracterizem insultos ou ofensas; ou quando atrapalhar o goleiro.
Também será concedido tiro indireto se o goleiro conservar a bola nas
mãos por tempo superior a seis segundos ou usar as mãos para tocar
a bola após esta ter sido recolocada em jogo.

A regra do jogo 95
Em geral, as infrações devem ser punidas com advertência verbal.
Além disso, a reiteração dessas infrações ou as de natureza flagrante
podem ser punidas com cartão amarelo ou cartão vermelho. O cartão
amarelo é utilizado para comunicar uma advertência e o cartão ver-
melho para comunicar uma expulsão (CBF, 2019).

Regra 13 – Tiros livres

São conferidos a favor da equipe adversária do jogador que come-


ter alguma infração. Para indicar um tiro livre indireto, o árbitro deve
manter um braço levantado até que o tiro seja executado. Em um tiro
direto, o gol é confirmado se a bola entrar diretamente após a execu-
ção. Porém, na execução de um tiro livre indireto, se a bola adentrar
diretamente será marcado um tiro de meta.

Se a bola, na cobrança de um tiro livre direto ou indireto entrar di-


retamente na meta da própria equipe, será marcado um tiro de canto.
A execução dos tiros deve ser exatamente no local da infração, a não
ser que seja um tiro livre indireto a favor da equipe atacante cometido
na área de meta da equipe adversária. Nesse caso, será executado com
a bola posicionada em cima da linha de meta e no local mais próximo
da infração. Para a execução, a bola deve estar parada e o executor
deve dar apenas um toque até que seja tocada por outro jogador de
qualquer equipe. Antes ser tocada, todos os jogadores da equipe con-
trária devem estar no mínimo a 9,15 m da bola. Um tiro livre pode ser
executado levantando a bola com um pé ou com os dois pés simulta-
neamente (CBF, 2019).

Regra 14 – Tiro penal

O tiro penal, mais conhecido como pênalti, é concedido quando um


jogador comete uma infração em sua área penal. Para a execução, todos
os jogadores, com exceção do batedor, devem estar no mínimo a 9,15 m
da meta e o goleiro deve permanecer sobre a linha das balizas, de frente
para o executante e entre os postes da meta até a bola ser tocada. O bate-
dor tem que impulsionar a bola para a frente e não pode dar um segundo
toque consecutivo. Antes do primeiro toque, o goleiro deve ter um dos pés
tocando a linha (CBF, 2019).

Regra 15 – Arremesso lateral

É lateral para uma equipe quando seu adversário toca pela última
vez na bola antes desta sair pela linha lateral do campo, ultrapassan-

96 Metodologia do ensino de futebol e futsal


do-a por baixo ou por cima. Por meio de uma cobrança de lateral, não
pode haver gol diretamente se a bola entrar, nesse caso, será concedi-
do um tiro de meta.

Para a execução do arremesso lateral, o jogador deve se manter de


frente para o campo e ter os pés tocando a linha ou fora do campo de
jogo. A bola deverá ser arremessada com as duas mãos partindo da nuca
e passando por cima da cabeça. Vale ressaltar que o jogador que exe-
cutou o lateral não pode tocar a bola pela segunda vez, caso arremesse
intencionalmente em um adversário sem que aja de maneira agressiva, Site
o árbitro pode permitir que o jogo prossiga (CBF, 2019). Recomendamos uma
visita à página oficial da
Regra 16 – Tiro de meta
Confederação Brasileira
de Futebol. Nesse site, é
Quando a bola ultrapassar a linha de meta, pelo chão ou pelo alto,
possível consultar o Livro
após tocar em algum jogador da equipe atacante, será concedido um tiro nacional de Regras 2020,
além de notícias diversas
de meta à equipe defensiva. É possível e deve ser validado um gol após
do universo futebolístico
uma cobrança de tiro de meta, mas somente contra a equipe adversária; e também acessar uma
plataforma de cursos de
se na cobrança, por um acaso, a bola adentrar seu próprio gol, será con-
arbitragem e treinadores.
cedido um tiro de canto para a equipe adversária.
Disponível em: https://www.cbf.
Com a bola parada e em qualquer ponto da área de meta deve ser com.br/a-cbf. Acesso em: 3 jul.
2020.
executado por qualquer jogador da equipe, geralmente o goleiro ou
outro defensor. Os jogadores da equipe adversária devem encontrar-
-se fora da área penal até que a bola entre em jogo (CBF, 2019).

Regra 17 – Tiro de canto

Será concedido um tiro de canto quando a bola ultrapassar a linha


de meta, e tiver sido tocada por último por um jogador da equipe de-
fensora (CBF, 2019). Os gols feitos diretamente da cobrança de um tiro
de canto são válidos e chamados de gols olímpicos.

6.2 Adaptações para categorias


de base no futebol
Vídeo Apesar de consolidadas e serem reconhecidas mundialmente por sua
solidez, as regras podem e devem ser flexibilizadas para atender certas
demandas. Para que haja a democratização e a inclusão do esporte, é pos-
sível criar adaptações estruturais. Grande parte dos praticantes do futebol
são do público infantil e adaptar as regras permite adequar as realidades
possíveis à criança, proporcionando, acima de tudo, segurança.

A regra do jogo 97
Foi aprovada pela International Board a possibilidade de as federa-
ções e associações de cada país adotarem adaptações para as catego-
rias de base, principalmente nas fases iniciais. As adaptações podem
ser nas dimensões do campo, no tamanho e peso da bola, na altura e
largura das traves, no número de jogadores, no tempo de duração da
partida, no número de substituições, nas medidas disciplinares etc.

Além do quesito segurança, por exemplo, utilizando bolas mais le-


ves e diminuindo o tempo para não expor a criança a cargas altas, as
adaptações e flexibilizações são favoráveis à aprendizagem e ao de-
senvolvimento do esporte. Em um campo com medidas oficiais, 11 por
11, uma criança de 7 anos provavelmente tocaria pouco na bola e es-
taria desconectada do jogo. Imagine agora um goleiro de 10 anos de-
fendendo uma meta oficial, que tarefa injusta, não? O quão frustrante
seria a partida para esses exemplos citados. Essas alterações buscam
aproximar a criança do jogo, incluí-las, entusiasmá-las.
Figura 6 Segundo a FIFA (2016), por meio do seu progra-
Tamanhos de quadra
ma para crianças, para o melhor desenvolvimento
MaksymA/ Shutterstock

em diversos aspectos, as competições antes dos


10 anos de idade não são aconselhadas. Até essa
idade, torneios e festivais utilizando 5 contra 5 ou 7
40 m contra 7 seriam o mais adequado.
Jogo 7 x 7
Para as categorias sub-9 (abaixo de 9 anos), o
20 m
Jogo 5 x 5 recomendado é o uso do campo com dimensões
menores, representado na Figura 6 pela marcação
preta mais grossa, além de um tempo de jogo de
no máximo 30 minutos.
40 m
60 m

Para as categorias sub-11 (de 9 e 10 anos), o


recomendado é o uso do campo com dimensões
exemplificadas na figura pela marcação preta mais
fina e tempo de jogo de até 50 minutos. As traves
também podem ser reduzidas em suas dimensões e
a bola pode ter pesos e tamanho menores.

Ainda segundo o plano Grassroots (FIFA, 2016),


as traves ou balizas podem ser adaptadas para 5 x
7 m, além de eliminar a regra de impedimento.
Fonte: Elaborada pelo autor.

98 Metodologia do ensino de futebol e futsal


6.3 Regras do futsal
Vídeo O futsal, apesar de ter se originado do futebol e possuir semelhanças
nas suas ações técnicas, se difere bastante quanto às regras. São diferenças
significativas, por exemplo, nas reposições de bola, como laterais e tiros de
metas em que no futebol se utiliza as mãos e os pés para estas reposições,
respectivamente, enquanto no futsal essa ordem é contrária.

Assim como na Seção 6.1, aqui apresentaremos uma versão resumi-


da das regras, porém baseada na edição 2019/2020 do livro de regras
oficiais da Confederação Brasileira de Futebol de Salão (FPFS, 2019).

Regra 1 – Quadra de jogo

As dimensões da quadra devem obedecer às medidas de 25 a 42 m


de comprimento por 16 a 25 m de largura. Para jogos oficiais, o pa-
drão utilizado é a medida 40 m x 20 m. As traves, conhecidas também
como metas, possuem 2 m de altura e 3 m de largura. As marcações
devem ser bem visíveis, pois normalmente em quadras poliesportivas
Figura 7 há outras marcações. É necessário utilizar linhas com 8 cm de largura.
Quadra de futsal As linhas maiores são também chamadas de
16 a 25 m linhas laterais e as duas menores são chama-
Kanate/Shutterstock

das de linhas de meta ou linhas de fundo.

5m
A quadra deve conter uma linha que di-
vide suas duas metades. No ponto médio
10 m dessa linha há uma marca em forma de cír-
culo medindo 10 cm, usado para o início e
reinício de jogo e um círculo maior de 3 m
de raio.

A área tem um formato de semicírculo e


25 a 42 m

3m
possui raio de 6 metros. O ponto do tiro de
canto está nos cantos da quadra. Há ainda
uma marca para o tiro livre direto sem bar-
reira, também chamado de segundo ponto
penal, que fica a 10 m da meta adversária e
de frente para o gol e uma demarcação a 5 m
da linha de meta, que determina o limite do
goleiro na cobrança desse tiro (FPFS, 2020).
6m

3x2m
Fonte: Elaborada pelo autor.
A regra do jogo 99
Figura 8 Regra 2 – A bola
Bola oficial
O padrão da bola deve obedecer às medidas de no mínimo 62 cm
e de no máximo 64 cm, pesando de 410 a 430 g, e deve ser feita
BB
BB

com couro ou material similar (FPFS, 2020).


BB
B BB B
BBBBBBBBBBB

Regra 3 – Número de jogadores

Em uma partida de futsal são permitidos no máximo 5 jo-


BBBB

gadores em quadra, sendo quatro jogadores de linha e o go-


leiro. Caso uma das equipes esteja com menos de 3 jogadores,
a partida não deve ser realizada, e se uma equipe no meio da
partida ficar com menos de 3 jogadores por conta de expulsão ou
abandono, o jogo deve ser interrompido. Para a suplência ou o banco
de reservas, uma equipe pode contar com mais nove jogadores.

Uma recente modificação proposta pela FIFA determina que dos jogado-
res reservas somente 5 poderão permanecer em processo de aquecimen-
to, os demais deverão estar sentados no banco (FPFS, 2020).

Regra 4 – Equipamento dos jogadores

Não é permitido o uso de objetos considerados perigosos para a


saúde do jogador e demais participantes, portanto, joias, anéis, pulsei-
ras etc. devem ser retirados antes de adentrar a quadra de jogo. O
material exigido oficialmente é camisa de manga curta ou comprida,
calções, tênis, meias de cano longo e caneleiras. O uniforme do goleiro
deve diferir das cores dos demais participantes do jogo, seus compa-
nheiros, adversários e arbitragem (FPFS, 2020).

Figura 9 Regra 5 – Arbitragem principal e auxiliar


Sinais do árbitro para identificar os jogadores
Para a partida ser conduzida, haverá dois ár-
bitros, o auxiliar e o principal que deverão zelar
para o bom andamento da partida. Entre deveres
e poderes são 56 itens. Resumidamente, o árbi-
tro principal têm o papel de controlar e condu-
zir a partida com o auxílio dos auxiliares fora de
quadra, inibindo a violência e fazendo cumprir as
regras do jogo.

Cabe também ao árbitro apontar e identifi-


car ao anotador os jogadores que cometerem
infrações ou que fizerem gol. Na Figura 9 ob-

Fonte: FPFS, 2020.

100 Metodologia do ensino de futebol e futsal


servamos de que maneira o árbitro indica as respectivas numera-
ções dos jogadores (FPFS, 2020).

Regra 6 – Cronometrista e anotador

Além dos árbitros dentro da quadra, no jogo deve conter um cro-


nometrista e um xanotador, também conhecidos como mesários. O
cronometrista deve estar atento e controlar o tempo de jogo, e o
anotador confere as fichas dos jogadores inscritos para a partida e
anota na súmula as faltas cometidas, individuais e coletivas, os gols,
os cartões e outras possíveis ocorrências (FPFS, 2020).

Regra 7 – Duração da partida

A partida de futsal tem duração de 40 minutos, divididos em pri-


meiro e segundo tempo. Vale ressaltar que esses dois tempos de 20
minutos são cronometrados e o relógio para toda vez que a bola está
fora de jogo (FPFS, 2020).

Regra 8 – Bola de saída

A bola de saída – ou tiro de saída – é utilizada para início e reinício


de jogo. Antes de a partida começar será sorteada a equipe que sairá
com a bola no primeiro tempo e, consequentemente, seu adversário
o fará no início da segunda etapa. Após cada gol, o reinício se dá no
mesmo local (FPFS, 2020).

Regra 9 – Bola em jogo e fora de jogo

A bola será considerada como fora de jogo sempre que ultrapassar


completamente as linhas da quadra, laterais ou de meta, sendo por
cima ou por baixo. Estará fora de jogo também quando a bola tocar o
teto do ginásio ou se em alguma ocasião a partida for paralisada pelo
árbitro da partida (FPFS, 2020).

Regra 10 – Contagem de gols

Será gol quando uma equipe conseguir fazer com que a bola aden-
tre a meta adversária, ultrapassando completamente a linha de meta
(FPFS, 2020).

Regra 11 – Impedimento

Não há, para o futsal, uma regra de impedimento (FPFS, 2020).

Regra 12 – Faltas e incorreções

Falta é qualquer infração cometida por um jogador enquanto a bola


estiver em jogo. A infração pode ser punida com tiros livres diretos,

A regra do jogo 101


indiretos e pênaltis. Para tiros diretos, serão consideradas atitudes
como derrubar o jogador adversário, empurrar, bater, cuspir, segurar,
jogar com imprudência, jogar perigosamente etc. Caso essas situações
ocorram nos limites da área, será assinalada uma penalidade máxima.

Será concedido um tiro indireto para a equipe adversária quando


forem verificados atos como permanecer com a bola por mais de 4
segundos na área penal, ou caso o goleiro receba uma bola do compa-
nheiro de equipe após lateral ou escanteio, além de atrasar ou retardar
o tempo da partida e atrapalhar a reposição do goleiro.

Os cartões são usados como medidas disciplinares e têm como


objetivo coibir a violência. O cartão amarelo é utilizado em caso de
má conduta – também conhecida como conduta antidesportiva –, por
exemplo, desrespeitar os árbitros, atrapalhar ou impedir o reinício
do jogo e fazer simulações. Já o cartão vermelho é utilizado em
situações de violência do jogador, por meio de jogo desproporcional,
gestos obscenos, ofensivos; impedir com a mão, não sendo o goleiro,
a marcação de um gol; cuspir em alguma pessoa durante a partida;
comprometer a integridade física de um jogador; impedir de modo
ilegal a tentativa de finalizar um gol (FPFS, 2020).

Regra 13 – Tiros livres

Os tiros livres são concedidos como consequência de infrações ou


faltas cometidas pelo adversário. São chutes de reposição da bola após a
paralisação devido à infração, classificados em tiro livre direto e indireto.

O tiro direto acontece quando a falta representar imprudência, ação


temerária utilizando força excessiva. O tiro livre direto por falta acumu-
lativa ocorre a partir do momento em que uma equipe comete a sexta
falta, ou seja, assim que a equipe comete a quinta infração, o anotador
deve avisar aos jogadores que o limite de faltas coletivas se esgotou.
Assinalada a falta, a bola deverá ser posicionada na segunda marca
penal se o local da falta for atrás da referida marca, caso seja à frente
dela, a bola deve ser posicionada no local da infração. Os tiros livres
indiretos não são acumulativos (FPFS, 2020).

Regra 14 – Penalidade máxima

A penalidade máxima é conferida quando uma infração é cometida


dentro da área penal. É um tiro direto cobrado da marca do pênalti, lo-
calizada no limite da área penal de frente para o gol. Todos os jogadores,

102 Metodologia do ensino de futebol e futsal


exceto o executor do lance e o goleiro adversário, deverão estar atrás
da linha da bola. O batedor só pode dar um toque na bola e terá quatro
segundos para execução após o sinal do árbitro (FPFS, 2020).

Regra 15 – Tiro lateral

Acontece toda vez que a bola sai de jogo pela linha lateral da qua-
dra. Deve ser executado com os pés, no local onde a bola saiu. O exe-
Site
cutor deve estar de frente para a quadra e o adversário deve respeitar
Indicamos o site oficial da
uma distância mínima de 3 m para a execução. Se o chute saído da
Confederação Brasileira
lateral for para o gol, deverá ser validado somente se houver desvio de de Futebol de Salão, que
traz diversas informações
outro jogador (FPFS, 2020).
sobre o mundo do futsal,
além de disponibilizar
Regra 16 – Arremesso de meta
o livro de regras mais
Será concedido um arremesso de meta sempre que a bola, após ter recente, notícias sobre
a seleção brasileira e as
sido tocada pela última vez por jogador da equipe atacante, sair pela li- principais competições
nha de meta, ultrapassando-a completamente. Para a execução, a bola nacionais.

deve estar nas mãos do goleiro e este deve lançá-la de qualquer ponto Disponível em: https://www.cbfs.
com.br/. Acesso em: 3 jul. 2020.
de dentro da área (FPFS, 2020).

Regra 17 – Tiro de canto

É assinalado tiro de canto quando a bola é tocada por último pela


equipe que está defendendo e sai completamente pela sua linha de
meta. Para a execução, a bola deve estar posicionada dentro do quarto
de círculo e deve ser cobrado em 4 segundos. Se a bola entrar na meta
adversária após a cobrança, o gol é validado. Caso um gol seja feito
contra a própria meta, com ou sem desvios de outros jogadores, não
será validado (FPFS, 2020).

6.4 Adaptações para categorias de base


no futsal
Vídeo O futsal apresenta possíveis variações para democratizar a partici-
pação na modalidade, é importante que essas adaptações sejam feitas
coerentes com as respectivas idades e os respectivos graus de desen-
volvimento. Com relação às dimensões da quadra, não haverá tanta
necessidade de modificação, pois o futsal já possui espaço diminuído
em sua estrutura, porém quando a quadra possui dimensões máximas,
uma adaptação também é bem-vinda. A adequação dos jogos deve ser
enxergada com cuidado pelos professores e responsáveis.

A regra do jogo 103


Vídeo O futsal, em sua essência, já é uma adequação e adaptação do futebol.
No vídeo Benjamín A - Suas regras permitem a participação maior dos indivíduos, o número de
Levante UD (4-0, Semifinal
Íscar Cup), publicado
substituições ilimitado e o maior número de toques na bola por partida
pelo canal FC Barcelona, já demonstra essa característica. Ainda assim, podemos ser mais flexíveis
podemos observar uma
partida das categorias de
de acordo com a necessidade do público. Na organização de festivais de
base em que fica claro futsal, caberá ao professor de educação física, então, observar se as traves
que as competições para
crianças são organizadas
são muito altas, se a bola é muito pesada e se o tempo não é excessivo.
e adequadas para aten- Caberá a esse profissional ponderar sobre todas essas situações, além de
der às capacidades dos
conscientizar federações e ligas para tal importância.
pequenos aprendizes.

Disponível em: https:// No futsal, as bolas têm tamanhos e pesos diferentes para adequar-
www.youtube.com/ -se às categorias de base, conforme apresentado na tabela a seguir.
watch?v=4XZUwkvVQ7w. Acesso
em: 3 jul. 2020. Tabela 1
Classificação das categorias e suas respectivas bolas

Categoria Sexo Peso Circunferência

Adulto e sub-20 Masc./Fem. 410 g a 430 g 62,5 cm a 63,5 cm

Sub-17 e sub-15 Masc./Fem. 400 g a 440 g 62 cm a 64 cm

Sub-13 Masc./Fem. 350 g a 380 g 55 cm a 58 cm

Sub-11 e sub-9 Masc./Fem. 300 g a 330 g 52 cm a 55 cm

Inferior ao sub-9 Masc./Fem. 250 g a 280 g 49 cm a 52 cm

Fonte: Adaptada pelo autor com base em FPFS, 2020.

Existe a opção de também adaptar as dimensões da quadra para


atender à iniciação esportiva, isso se faz importante principalmente ao
treinar em quadras com dimensões oficiais (40 x 20 m).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O professor de futebol e futsal não precisa ter necessariamente forma-
ção em arbitragem para ser capaz de ensinar as modalidades em questão,
porém é imprescindível que tenha o domínio das regras para poder trans-
mitir os valores do jogo. O esporte não tem a pretensão de resolver todos
os problemas da educação, mas por trás do respeito às regras do jogo
está o respeito por toda regra, respeitar a ética do jogo ensina a respeitar
as éticas de civilidade e convivência.
O professor de Educação Física é o transmissor e divulgador das regras
do jogo por meio das aulas, dos treinos e das competições. É com ele que

104 Metodologia do ensino de futebol e futsal


o esporte informal começa a caminhar para a formalidade. Em escolas
ou demais instituições, a participação em campeonatos e festivais é uma
ferramenta educacional importante e motivadora. Normalmente, caberá
ao profissional de educação física a responsabilidade pela organização,
estruturação e arbitragem dos jogos. Sugerimos que você esteja atento às
modificações e às possíveis alterações das regras para manter-se sempre
atualizado, principalmente no futsal que historicamente apresenta mu-
danças nas regras praticamente todos os anos.

ATIVIDADES
1. Imagine que você é um árbitro de futsal e momentos antes de iniciar
a partida uma das equipes compareceu com apenas três jogadores.
Durante o jogo, um desses atletas foi advertido com o segundo cartão
amarelo e foi, consequentemente, expulso. Qual postura deve ser
adotada nesse caso? E se a competição fosse na categoria sub-9?

2. Se durante uma partida de futebol um defensor toca a bola com o


braço involuntariamente estando dentro da área, qual seria a decisão
do árbitro?

3. Na cobrança de um pênalti, o goleiro se adianta e um dos atacantes


invade a área antes de o batedor tocar a bola, que é defendida pelo
goleiro. Qual deve ser a decisão do árbitro?

REFERÊNCIAS
CBF. Livro de regras 2019-2020. CBF, 23 out. 2019. Disponível em: https://www.cbf.com.br/a-
cbf/arbitragem/aplicacao-regra-diretrizes-fifa/livro-de-regras-2019-2020-portugues. Acesso
em: 2 jul. 2020.
FIFA. Manual FIFA de futebol base. Grassroots, 2016. Disponível em: https://grassroots.fifa.
com/fileadmin/user_upload/pdfs/grassroots_2016__e.pdf. Acesso em: 2 jul. 2020.
FPFS. Livro nacional de regras 2020. FPFS, 2020. Disponível em: http://www.
federacaopaulistadefutsal.com.br/novo/wp-content/uploads/2020/03/Livro-Nacional-de-
Regras-2020-Paraguassu-em-PDF.pdf. Acesso em: 2 jul. 2020.

A regra do jogo 105


7
Futebol e futsal na
escola: currículo, desafios
e possibilidades
Você já se perguntou qual seria a função do futebol e do futsal nas
aulas de Educação Física? Será que esportes que já são praticados
em outros ambientes, ofertados em escolinhas e clubes, têm lugar na
escola? E o professor de Educação Física, qual seria o papel dele no
processo de ensino-aprendizagem? Quais seriam suas obrigações e
como ele pode conduzir o processo? Questões como essas reforçam
a importância de aprimorar os conhecimentos acerca das modalida-
des e qual seria a melhor forma de transmiti-las.
Apesar de se diferirem em alguns aspectos, como regras e di-
mensões espaciais, ambos os esportes possuem a mesma lógica e
consequentemente muita proximidade no quesito técnico-tático,
sendo aqui tratados como sinônimos muitas vezes. Aliás, na escola,
a modalidade se modifica e se adapta ao contexto, sem nomenclatu-
ra formal e específica. Quer um exemplo? Crianças jogando durante
o intervalo das aulas informalmente em uma disputa de 6 contra 6.
Não é futsal, nem futebol, mas os esportes em sua plena manifesta-
ção. As duas modalidades estão ali presentes.
O futebol e o futsal têm grande força de atração entre os
jovens e podem ser usados como ferramenta de integração com
outras disciplinas, ressignificando a Educação Física, muitas vezes
vista somente como recreação e extensão do intervalo. Aproveita-
-se desse aspecto afetivo do esporte para qualificar as aulas de
Educação Física, atribuindo a ela uma função mais ampla, ajudando
a despertar a atenção, a curiosidade e o interesse pela participação.
Assim, este capítulo pretende discutir o futebol e o futsal dentro
da escola e o papel dos professores nessa relação. Conhecer como
planejar o conteúdo para facilitar a operacionalização, entendendo
as dificuldades, respeitando as diferenças, democratizando o ensino.

106 Metodologia do ensino de futebol e futsal


7.1 Papel do professor
Vídeo Refletir sobre o papel do professor/treinador é imprescindível para
que possamos qualificar o ensino das modalidades dentro das organi-
zações, seja na escola, nos clubes ou nas escolinhas esportivas. Apesar
das diferenças presentes na finalidade e no funcionamento dos espor-
tes em diferentes contextos, a postura do mediador está pautada nos
mesmos princípios. Não há dúvidas de que o esporte escolar deve estar
alicerçado em valores educacionais que contribuam para a promoção de
inclusão, autonomia, inserção, cooperação e cidadania (GALATTI; PAES,
2006). Entretanto, valores como esses ficam comprometidos quando o
professor, influenciado pelo modelo de treinador de equipe profissional,
passa a dar maior importância para os resultados esportivos.
A competitividade exacerbada desnorteia o processo educativo e
o desenvolvimento esportivo, pois pressupõe a importância maior ao
imediatismo, além do resultado do produto acima do processo.
Diversos autores têm debatido sobre esse tema e sugerido
competências e ações que caracterizariam o papel do profissional que
atuará dentro da quadra ou do campo. A preocupação se justifica
quando são observados profissionais privilegiando a imposição física
como critério de seleção, ou seja, maior prestígio e atenção para alguns
poucos e consequente exclusão e desassistência para outros.
A busca por títulos em categorias de base é outro fator importante a
ser discutido. Essa postura pode estar submetendo crianças à cobran-
ça inadequada e à pressão psicológica, o que pode ter como resultado
a desmotivação ou a não aprendizagem plena, já que o foco foi dado
ao resultado e não ao aprendizado. Nos estudos condu-
zidos por Galatti e Paes (2006), os autores consideram Figura 1
Treinador/professor
fundamental que o professor seja
portador de boas práticas
e recomendam que,
para exercer a fun-
ção, o profissional
deve obedecer às
seguintes regras:
Shutterstock/matimix

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 107


1 Proporcionar a oportunidade para construção das habilidades motoras
básicas.

2 Ensinar e desenvolver elementos básicos que compõem a lógica do


jogo, os momentos de atacar e os momentos de defender.

3 Potencializar a técnica e tática por meio de treinos e experiências


específicas, para que essas ações façam sentido.

Estimular as competências cognitivas, por meio de tarefas condizentes


4 às capacidades individuais e do grupo.

5 Valorizar as múltiplas inteligências, enxergando que cada indivíduo


pode apresentar uma competência.

6 Despertar o prazer e interesse pela prática esportiva, como praticante


e espectador, despertando a convivência com esporte para a vida.

7 Possibilitar a transformação e o ensinamento de valores.

8 Promover autonomia, autoestima e autoconfiança.

9 Construir relações pessoais, cooperação, empatia e respeito.

10 Criar metáforas e conexões do esporte com a vida.

Compete ao professor estabelecer vínculos entre a aula de futebol ou


futsal e o projeto pedagógico da escola, adaptando-a ao contexto da insti-
tuição, número de alunos por turma, horário e faixa etária, com o objetivo
de favorecer o desenvolvimento em suas individualidades, respeitando
suas fases sensíveis de aprendizagem e proporcionando condições de se
aprender o esporte por meio dele mesmo (GALATTI; PAES, 2006).

108 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Independentemente da faixa etária ou do ambiente em que se ensina,
essas condutas são baseadas nas relações humanas e são importantes
para o processo pedagógico de qualquer natureza. O mediador da ativi-
dade deve ter plena certeza da sua influência no processo formativo dos
jovens. Nesse âmbito, faz-se necessário destacar alguns aspectos negati-
vos comumente observados em escolinhas de futebol, escolas ou clubes.
Para Garganta et al. (2013), os principais equívocos e comportamentos que
devem ser evitados no processo de desenvolvimento esportivo são:

1 Utilizar métodos de ensino extremamente tradicionalistas para ensinar


as técnicas do futebol, ao invés do ensino do jogo.

2
Planificar os treinos em função de jogos, campeonatos e torneios, além
de não prestigiar o calendário escolar, como provas, férias, trabalhos.

3 Expor os jovens antes do período adequado a competições e jogos,


colocando em confronto adversários de nível desigual às vezes.

4 Usar repetições excessivas de exercícios analíticos, transformando o


treino em monótono e desmotivador.

5 Especializar precocemente ao esporte e a funções específicas, sem que


se atenda a formação integral.

Vídeo

6
Indicamos o vídeo
Reprimir o erro, desencorajando a tentativa e a descoberta.
Passaporte SporTV: projeto
da federação alemã de
futebol desenvolve esporte
no país, publicado pelo
7
Comportar-se de maneira autoritária e inibir opiniões e expressões
site SporTV. Nesse vídeo
individuais. é apresentado o modelo
de desenvolvimento
esportivo para o futebol
O professor de Educação Física, como personagem mediador do pro- na Alemanha, onde es-
porte e educação andam
cesso ensino-aprendizagem no futebol e no futsal, deve estar ciente das
juntos.
suas responsabilidades na vida dos jovens e das crianças. A ele cabe a
Disponível em: http://sportv.
busca pelo conhecimento e a continuidade de seu processo evolutivo por globo.com/videos/copa-2014/t/
meio de capacitações e trocas de experiências com colegas. Além disso, es- ultimos/v/passaporte-sportv-
projeto-da-federacao-alema-
pera-se que ele seja autocrítico e se permita momentos de autorreflexão. de-futebol-desenvolve-esporte-
no-pais/3410696/. Acesso em: 6
Analisar os pontos positivos e negativos, após uma sessão de treino jul. 2020.
ou uma aula, por exemplo, é um exercício importante no processo

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 109


de crescimento do professor, pois assim como em qualquer área,
continuamos a nos desenvolver ao longo da vida e as experiências
durante esse trajeto nos tornam mais preparados e aprimoram nosso
processo criativo.

7.2 Currículo de formação


Vídeo É muito importante estabelecer diferenças para o esporte em sua
expressão de acordo com o nível de referência e experiência que o in-
divíduo possui. Segundo Rezer (2009), apesar de futebol e futsal apre-
sentarem regras específicas e diferenças estruturais, o ensino como
conteúdo pedagógico na escola na compreensão crítica e no conheci-
mento da cultura corporal de movimento são iguais, portanto são con-
ceituados como futebóis.

A construção de um currículo formativo e de desenvolvimento para


esses esportes está ancorada em valores como proporcionar ensino-
-treino organizado, estruturado na ideia de desenvolvimento a longo
prazo e proposta orientada pelo jogo, além de garantir o acesso a um
treino pautado no jogo e no jogador, estimulando-o a criar situações de
aprendizagem (GARGANTA et al., 2013).

Para diferenciar o conteúdo a ser entregue, Garganta (2013) o dis-


tingue em níveis básico, elementar, intermediário e especialização, de
acordo com as referências que o indivíduo possui do esporte. Essa di-
visão permite, então, nortear o planejamento e a estruturação de um
plano de treinamento a longo prazo.

Nível básico: Obsessão pela bola – caracteriza-se pela fase na qual


o entendimento do jogo é elementar, assim como a relação com a bola.
As técnicas não estão apuradas, o jogo fica desorganizado e é comum a
aglomeração ao redor da bola. Não há uma consciência clara do obje-
tivo do jogo, que é a marcação de gols, e tudo gira em torno do espaço
onde a bola se encontra, gerando problemas quanto ao envolvimento
e à participação no jogo.

Nível elementar: Iniciação ao jogo – os gestos técnicos ainda são fre-


quentes e a ocorrência de erros técnicos constantes influencia a fluidez
da partida, porém já se observam melhorias quanto ao entendimento
de jogo e de funções e posições ainda em estruturas simplificadas, como
jogos de 4 contra 4 ou 3 contra 3. Começam a aparecer alguns princípios
de jogo, como penetração, cobertura ofensiva e cobertura defensiva.

110 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Nível intermediário: Organização posicional da equipe – as técnicas já
possuem maior desenvolvimento e a diminuição de erros técnicos permi-
te maior continuidade no jogo. É possível observar, nessa fase, maior com-
plexidade nos princípios, como a mobilidade e o equilíbrio coletivo. Além
disso, há maior consciência de posicionamento e funções nos diferentes
períodos e momentos do jogo. Manifesta-se, também, a compreensão do
aspecto coletivo e das conexões setoriais em que a equipe se beneficia das
ações individuais.

Nível de especialização: Refinamento da dinâmica coletiva – o nível


agora permite maior organização e complexidade, pois os jogadores apre-
sentam qualidades técnicas e táticas de modo contextualizado em relação
às ações apresentadas. Além da constante mobilidade e do equilíbrio po-
sicional, o jogo é muito mais coletivo e interativo entre os participantes.

Quadro 1
Faixas etárias e respectivos conteúdos dos momentos ofensivos e defensivos

Defesa Ataque

5 anos – 8 anos

Jogos variados e diversificados com passagens pelas funções ofensivas e defensivas de maneira livre.

9 anos – 11 anos

Referências baseadas no oponente, pouca limitação Desenvolver jogo direto (passes longos), mas apre-
de espaço, ênfase na devesa por setor, ocupação sentando opções para um jogo de passes curtos.
de espaços e aproximação com abordagem, dobra Procurar equilíbrio setorial na distribuição dos joga-
de marcação, fechamento de linha. Posicionamento dores, pois as movimentações centram-se muito na
atrás e à frente da linha da bola, principalmente nos trajetória da bola. Referenciais que facilitem a orga-
momentos de recomeço do jogo (tiro de meta, falta, nização ofensiva no momento de recomeço do jogo.
lateral e escanteio). Busca por situações de superioridade numérica.

12 anos – 14 anos

Educar a defesa individual por setor em espaço de- Inserção de jogo de passes curtos. Reforçar movi-
limitado. Estimular compactação em largura e pro- mentos em compactação, movimentos com alter-
fundidade. Priorizar ações mais setoriais do que in- nância simples de posições durante a construção
dividuais. Pressionar o portador da bola, induzindo ofensiva. Incrementar movimentos com e sem bola
para o lado mais fraco. Apresentação de noções de para situações de superioridade numérica dese-
retorno para trás da linha da bola em momentos de quilibrando a defesa adversária. Usar espaços nos
quebra de marcação. Bloqueio de corredores, prin- corredores laterais do campo ofensivo por meio da
cipalmente o central. Desenvolvimento de ações ini- circulação da bola, para, assim, propiciar situações
ciais com o goleiro atuando na cobertura. de finalização.

(Continua)

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 111


Defesa Ataque

15 anos – 17 anos

Aperfeiçoar a defesa individual por setor com refe- Jogo com maior frequência de passes curtos, apro-
rências zonais. Constituir linhas defensivas e com- ximação e abertura de linhas de passe. Criação de
pactação do bloco. Criação de zonas de pressão. linhas de passe em todos os setores. Utilização do
Movimentações que consigam induzir a bola para goleiro como linha de passe facilitadora da manuten-
zonas de pressão. Estratégias coletivas para reequi- ção da posse de bola. Criação de movimentos mais
líbrio após quebras de linhas defensivas. Desenvol- frequentes com alternância de posições. Movimenta-
vimento de ações de pressing na busca da retomada ções para quebra de linhas defensivas do adversário
da posse de bola. e consequente abertura de espaços para infiltrações.

≥ 17 anos

Direcionado aos interesses inerentes ao modelo de jogo exposto pelo treinador.

Fonte: Adaptado pelo autor com base em Bettega et al., 2015

No primeiro estágio, a proposta é alicerçada no repertório motor e


em movimentos fundamentais. Além disso, não há a preocupação com
a especialização, por isso, jogos variados e bastante lúdicos são os mais
indicados nessa fase. Note que conforme as idades vão subindo, o grau
de complexidade aumenta, assim como as informações e o número de
tarefas. Isso acontece até o último estágio, no qual é caracterizada a con-
solidação das habilidades e o conteúdo vai depender do modelo de jogo e
dos princípios adotados pelo treinador. O jogador já possui elementos em
seu repertório e consegue adaptar-se às necessidades do modelo.

7.2.1 Vertentes do esporte


Para o profissional que pretende trabalhar com futebol e futsal, co-
nhecer as características do meio onde o esporte está inserido é de
fundamental importância, pois isso determinará o perfil de trabalho e a
postura adequada do professor. Assim como não devemos reproduzir
com crianças os treinos que atletas adultos e profissionais realizam,
também o comportamento do professor não deve ser semelhante aos
exemplos de treinadores de alto rendimento, ou seja, é preciso deixar
claro que são universos diferentes.

A Lei n. 9.615 de 24 de março de 1998, a Lei Pelé (BRASIL, 1998),


no Capítulo III, trata da natureza e das finalidades do desporto e os

112 Metodologia do ensino de futebol e futsal


classifica de modo a diferenciar em desporto educacional, desporto de
participação, desporto de formação e desporto de rendimento.

Segundo o artigo 3º, o desporto pode ser reconhecido em qualquer


das seguintes manifestações:
Desporto educacional, praticado nos sistemas de ensino e em
formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a
hiper competitividade de seus praticantes, com a finalidade de al-
cançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação
para o exercício da cidadania e a prática do lazer. Esta manifes-
tação está subdividida em Esporte Educacional e Esporte Escolar.
Ambas compreendem o ambiente escolar. (BRASIL, 1998)

O esporte educacional deve ser inclusivo, promover a participação


e incentivar a cooperação e a disciplina. De acordo com Tubino (2010),
o esporte escolar permite competições e é oferecido aos alunos com al-
gum interesse e talento esportivo, porém essa prática deve estar à frente
dos princípios da formação para a cidadania.
Desporto de participação, de modo voluntário, compreenden-
do as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de
contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida
social, na promoção da saúde e educação e na preservação do
meio ambiente. (BRASIL, 1998)

Também conhecido como esporte-lazer ou esporte comunitário, ele


é caracterizado por maior espontaneidade e está atrelado aos fins de
saúde e qualidade de vida. As regras podem ser oficiais, adaptadas ou
inventadas. Para Tubino (2010), o esporte-lazer tem como princípios a
participação, o prazer e a inclusão.
Desporto de rendimento, praticado segundo normas gerais
desta Lei e regras de prática desportiva, nacionais e internacio-
nais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e
comunidades do País e estas com as de outras nações. Também
conhecido como esporte de Desempenho, tem como objetivo
aumentar a performance e atingir resultados, vencer campeo-
natos, bater recordes e recompensas financeiras. Ainda assim
a ética deve ser uma referência como fio condutor nas relações
dos competidores em jogos e treinamentos. (BRASIL, 1998)

Nessa manifestação esportiva, dois tipos de termos são utilizados:


esporte de rendimento ou de alto rendimento (TUBINO, 2010). O alto rendi-
mento pode ser representado, por exemplo, por atletas de nível olímpi-
co. Já atletas do esporte de rendimento também buscam desempenho,
mas não necessariamente têm o esporte como profissão principal.

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 113


Desporto de formação, caracterizado pelo fomento e aquisição
inicial dos conhecimentos desportivos que garantam compe-
tência técnica na intervenção desportiva, com o objetivo de pro-
mover o aperfeiçoamento qualitativo e quantitativo da prática
desportiva em termos recreativos, competitivos ou de alta com-
petição. (BRASIL, 1998)

Nessa inclusão, ocorrida em 2015, a ideia foi diferenciar o rendi-


mento de adultos e jovens. O tratamento a esses grupos não deve ser
igual, sendo o desenvolvimento o foco dos jovens (TUBINO, 2010).

Quadro 2
Manifestações do esporte e princípios fundamentais

ESPORTE

Formas de exer-
cício do direito Esporte-educação Esporte-lazer Esporte-desempenho
ao esporte

Divisões das for-


Esporte Alto-
mas de exercício Esporte escolar Esporte-lazer Rendimento
educacional -rendimento
ao esporte

Participação
Educação Desenvolvimen- Participação
Desenvolvimento esportivo
Cooperação to esportivo Prazer
Princípios Competição – Êxitos
Responsabili- Espírito espor- Desenvolvimento
Superação
dade tivo esportivo
Inclusão
Fonte: Tubino, 2010, p. 44.

O esporte educacional possui características inerentes, muito dife-


rentes do esporte de alto rendimento, ou seja, o objetivo fundamental
do primeiro é a participação. Apesar de não possuir o mesmo apelo mi-
diático dos grandes eventos esportivos, o esporte educacional atinge o
maior número de pessoas, como fenômeno da inclusão social, promo-
vendo saúde e desenvolvimento intelectual e humano (TUBINO, 2010).

É fundamental que enxerguemos qualquer programa esportivo


como um potencial educativo. O benefício dessa participação é suprir
as necessidades da motricidade, enriquecendo o aprendizado de mo-
vimentos básicos e específicos do esporte. Além disso, é objetivo que
esse ambiente de aprendizagem transcenda as barreiras do jogo para
trabalhar os conceitos e valores intrínsecos ao esporte: a cooperação, o
respeito mútuo, a solidariedade, a inclusão social e o exercício da cidada-

114 Metodologia do ensino de futebol e futsal


nia, garantindo e aprimorando a inclusão e o desenvolvimento humano
(TUBINO, 2010). Ademais, cria-se uma cultura de movimento, reconheci-
damente benéfica à saúde física/psicossocial/mental das pessoas.

7.2.2 Esporte como direito


O esporte é, por lei, um direito do cidadão e deve ser concedido a
todos os indivíduos de 0 a 18 anos de idade com a perspectiva indispen-
sável de educação e lazer. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
em seu artigo 71, afirma que “a criança e o adolescente têm direito a
informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e produtos
e serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvol-
vimento” (BRASIL, 2017). A oferta deve ser concedida à participação de
todos sem distinção alguma, não apenas aos mais talentosos e com po-
tencial para se tornarem jogadores de futebol profissional, por exemplo.

Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2018), a edu-


cação física como componente curricular trata da cultura corporal de
movimento que se manifesta das mais diversas formas e com diversos
significados.

Para a Unesco, por meio da sua Carta Internacional da Educação Fí-


sica da Atividade e do Esporte, publicada em 2015, a educação física e
o esporte são um direito fundamental de todos e a participação deve
ser incentivada durante toda a vida. A carta reforça o discurso da im-
portância da prática, citando que as experiências positivas de jogos,
atividades lúdicas e esportivas devem ser disponibilizadas a todos. Ain-
da, a atividade física orientada pode ajudar a estabelecer uma base de
conhecimento, habilidade, atitudes e motivação, aspectos necessários
para a participação ao longo da vida na atividade e no esporte. A seguir
está o artigo 1º da referida carta internacional.
Artigo 1 – A prática da educação física, da atividade física e
do esporte é um direito fundamental de todos.
1.1 Todo ser humano tem o direito fundamental de acesso à edu-
cação física, à atividade física e ao esporte, sem qualquer tipo
de discriminação com base em etnia, gênero, orientação sexual,
língua, religião, convicção política ou opinião, origem nacional ou
social, situação econômica ou qualquer outra.
1.2 A liberdade de desenvolver habilidades físicas, psicológicas e
de bem-estar, por meio dessas atividades, deve ser apoiada por
todos os governos e todas as organizações ligadas ao esporte e
à educação.

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 115


1.3 Oportunidades inclusivas, assistivas e seguras para a partici-
pação na educação física, na atividade física e no esporte devem
ser disponibilizadas a todos os seres humanos, em especial
crianças de idade pré-escolar, pessoas idosas, pessoas com defi-
ciência e povos indígenas.
1.4 É um direito de toda menina e de toda mulher ter oportuni-
dades iguais de participar em todos os níveis e funções de su-
pervisão e decisão na educação física, na atividade física e no
esporte, seja para fins recreativos, para a promoção da saúde ou
para o alto rendimento esportivo.
1.5 A diversidade da educação física, da atividade física e do es-
porte é uma característica fundamental do seu valor e atração.
Jogos, danças e esportes, tradicionais e indígenas, também em
suas formas modernas e emergentes, demonstram o rico patri-
mônio cultural do mundo e devem ser protegidos e promovidos.
1.6 Todos os seres humanos devem ter oportunidades plenas
de alcançar um nível de realização que corresponda a suas ca-
pacidades e a seus interesses, por meio da educação física, da
atividade física e do esporte.
1.7 Todos os sistemas de educação devem considerar o devido lugar
e a importância da educação física, da atividade física e do esporte,
para estabelecer um equilíbrio e fortalecer os vínculos entre as ati-
vidades físicas e os outros componentes da educação. Da mesma
forma, eles devem assegurar que uma educação física inclusiva e de
Livro qualidade seja parte obrigatória do ensino primário e secundário,
e que o esporte e a atividade física, na escola e em todas as outras
O livro O futsal e a
escola: uma perspectiva
instituições educativas, tenham um papel integral na rotina diária
pedagógica, apresenta de crianças e jovens. (UNESCO, 2015, p. 4, grifos do original)
o futsal como uma
modalidade viável a ser A Carta Internacional da Educação Física, da Atividade Física e do Es-
desenvolvida na escola,
porte ainda destaca em seu artigo 2º , que “a atividade física e o esporte
proporcionando desen-
volvimento esportivo podem proporcionar uma ampla gama de benefícios às pessoas, às co-
sem se desprender do
munidades e à sociedade em geral” (UNESCO, 2015, p. 3). Portanto, po-
viés educacional, além de
aspectos relacionados líticas públicas devem ser estimuladas e cobradas para oferecer maior
à formação humana. O
abrangência nos programas socioeducativos. Isso é reforçado pelo ar-
material tem grande valia
aos profissionais de edu- tigo 3°: “todas as partes interessadas devem participar da criação de
cação física na constru-
uma visão estratégica que identifique as opções e as prioridades políti-
ção do planejamento e da
execução das aulas. cas” (UNESCO, 2015, p. 4).
VOSER, R. C.; GIUSTI , J. G. M. Porto A pesquisa e as evidências científicas também são temas contem-
Alegre: Penso, 2015.
plados pela Unesco e considerados aspectos indispensáveis para o de-
senvolvimento da educação física, da atividade física e do esporte. Vale
ressaltar, também, o destaque para a qualificação exigida ao profissional

116 Metodologia do ensino de futebol e futsal


e o valor dos espaços e das estruturas físicas de qualidade e seguros
para as práticas de educação física e, consequentemente, das práticas
esportivas em que se inserem o futebol e o futsal (UNESCO, 2015).

7.3 Entendendo o contexto escolar


Vídeo Um tema importante a ser discutido é o futebol e o futsal dentro do
contexto escolar. Como esses esportes podem contribuir para a edu-
cação? Aprender por meio do que nos dá prazer parece ser muito mais
eficiente. Se dentro da escola, na sala de aula, dermos a opção de os
jovens ficarem ou saírem, quantos ficariam ali? E se essa opção fosse
dada na aula de futebol lá do clube? Bom, se você concordar que ha-
verá uma grande diferença, então concordamos que o futebol tem o
papel de atrair.

Nesse sentido é que o poder público, as instituições de ensino e o


professor devem atuar, criando estratégias para que o futebol seja o
meio de auxiliar o indivíduo a se tornar melhor. Muitos paradigmas fo-
ram construídos ao longo do tempo dentro da educação física escolar,
como a utilização das aulas para a descoberta de talentos esportivos ou
o desenvolvimento da aptidão física e a formação de equipes competi-
tivas (FINK, 2011).

Essa visão ficou impregnada à imagem das aulas de Educação Físi-


ca. Do outro lado está a evidente importância da formação integral do
ser, a inclusão social e a participação a qual todos têm direito. Segun-
1
do a BNCC (2018), ao longo da educação básica , os
1
alunos devem desenvolver as competências gerais,
resultando em um processo de formação humana Correspondente à educação
infantil, ao ensino fundamental e
que aponte à construção de uma sociedade justa, ao ensino médio.
democrática e inclusiva.

Galatti e Paes (2006) reforçam que a educação


física escolar deve preocupar-se com a formação integral dos alunos,
atuando nos aspectos motor, cognitivo, afetivo e social. O esporte ofere-
cido pela escola conjectura a formação do indivíduo em sua totalidade,
pois aqueles que aprendem de fato o esporte desenvolvem habilidades
diversificadas que contribuirão para o melhoramento das qualidades fí-
sicas, além da ampliação de valores morais e sociais (CAVALCANTI, 2013).

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 117


Na escola, o futebol que prestigia a formação de equipes reduz seu
significado incluso no processo educacional. Mas isso não configura a
exclusão da competição esportiva e da valorização do talento, estas
também são bem-vindas e podem muito bem fazer parte do ambiente
escolar. Muitos dos jovens e das crianças matriculados nas escolas pú-
blicas espalhadas pelo país não têm condições de frequentar e praticar
esportes em clubes, devido às distâncias impostas pelas condições eco-
nômicas, sociais e geográficas. “A escola, tanto privada como pública,
deve oferecer espaço para o aprendizado e para o treinamento esporti-
vo, pois a maioria dos jovens não tem acesso a clubes socioesportivos”
(FINK, 2011, p. 107).

O futebol tem o dever de aproximar a atividade física e a educação do


jovem de maneira prazerosa e consensual. Qualquer relação impositiva
será superficial e trará desgastes no futuro, assim também é no espor-
te. Aulas que proporcionam experiências positivas tendem a refletir em
engajamento e continuidade. Entretanto, ambientes onde o professor
privilegia os melhores pensando no campeonato escolar, pressiona de-
masiadamente os alunos, atua com rigidez e autoritarismo e inibe suas
decisões e opiniões, o que tende a gerar experiências traumáticas, além
de causar afastamento e desinteresse pela aula ou pela atividade.

O método dos jogos pedagógicos na escola é uma boa alternativa.


Especialistas observam que, durante o jogo, os praticantes têm em co-
mum o gosto por ele e por quererem desfrutar possibilidades ofereci-
das. Assim, o ato de jogar dificilmente se tornará enfadonho, o mesmo
não se pode dizer com relação ao modo como, por vezes, o futebol é
ensinado e treinado (GARGANTA et al., 2013).

7.4 Planejando a aula


Vídeo A sessão semanal, ou microciclo, auxilia o professor a organizar a
distribuição de conteúdos em cada unidade de treino. Cada semana
deve possuir um objetivo que contenha os aspectos técnicos, táticos,
físicos e psicossociais inseridos de acordo com o nível de aptidão e a
necessidade identificada. O microciclo deve estar em consonância com
o planejamento macro, também chamado de macrociclo (planejamento
semestral/anual), porém salientamos que o microciclo deve ser flexível
e adaptável.

118 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Pessoas têm pontos de partida distintos e evoluem em diferentes
velocidades, ou seja, o desenvolvimento não é linear e reestruturar a
aula para se adaptar à necessidade do aluno é uma das grandes vir-
tudes do professor. Por esse motivo, o professor deve estar atento às
demandas pessoais e coletivas que se apresentam durante o processo
de desenvolvimento. Além disso, o planejamento e a construção dos
conteúdos não devem ser fechados, mas, sim, permitir a inserção e a
modificação de elementos que podem tornar o treinamento mais rico.

A sessão de treino é o último passo no processo de planejamento,


as sessões ou aulas devem ter relação com a que a precede e a subse-
quente. Cada sessão deve ser estruturada do mesmo modo, ou seja,
com a mesma estrutura organizacional, normalmente dividida em três
blocos que consistem em primeira parte ou aquecimento, parte princi-
pal e parte final. Essa divisão permite que o professor-treinador insira
os conteúdos e os distribua coerentemente de acordo com o tempo
destinado a cada um desses blocos.

Figura 2
Professor em momento de integração com os alunos

Shutterstock/ Rawpixel.com

Para a estruturação da sessão de treinamento, alguns componentes


são levados em consideração. Esses aspectos são flexíveis e auxiliam a
organizar a prática.

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 119


•• Espaço: mantenha a organização do espaço simples e entendível,
desde a organização inicial até pequenas alterações durante a
sessão. É importante o cuidado para não reconfigurar o ambiente
drasticamente, isso pode deixar a aula confusa e atrapalhar sua
dinâmica.
•• Tempo: o tempo do exercício pode ser flexível, permitindo
a fluência da atividade para atingir as metas da aula. Porém,
é importante o extremo cuidado com o excesso de volume,
2 principalmente para crianças. A utilização de pausas para
2
Feedback é um termo em inglês recuperação e feedbacks pode ser uma alternativa.
utilizado para sugerir uma in- •• Intensidade: é sempre preferível a utilização de períodos curtos
formação resposta ou avaliação
sobre algo realizado. de estímulo com intensidade elevada seguidos de pausas, pois
assim o jogo também se apresenta. As pausas podem ser estra-
tégicas e utilizadas para considerações e explanações por parte
do professor.
•• Regras: é possível usar diferentes regras para os jogos e as práti-
cas, adaptando-as às características dos jogadores participantes.
Assim, será possível a realização do exercício, além de torná-lo
estimulante.
•• Número de jogadores: a utilização de menos ou mais jogado-
res é uma alternativa importante para estimular as capacidades
técnicas, físicas e cognitivas. É possível criar superioridade ou in-
ferioridade numérica em uma das equipes para diminuir ou au-
mentar o grau de dificuldade do jogo.

A aula deve proporcionar um ambiente rico, com tarefas desafia-


doras que estimulem a curiosidade e o interesse. Fazer com que haja
participação e interação de todos durante toda a aula é fundamental
para a motivação dos alunos, por isso alguns comportamentos clássi-
cos devem ser evitados: não deixar os alunos em filas ou colunas, não
paralisar a aula a todo momento para correções e não deixar alunos no
banco de reserva ou esperando. É possível criar exercícios dinâmicos
que permitam a participação da turma.

Uma sessão de treino ou uma aula pode obedecer à seguinte


estrutura:

120 Metodologia do ensino de futebol e futsal


Quadro 3
Estrutura de treino

UNIDADES ATIVIDADES

Conversa inicial

Parte inicial (aquecimento)


Brincar
– 10 minutos

Ativação e preparação

Jogo conceitual com tarefa


simples

Parte principal
– 40 minutos Jogo mais complexo

Transferência

Volta à calma

Parte final – 10 minutos Diálogo de conciliação

Feedback de aprendizagem

TOTAL = 60 minutos

Fonte: Elaborado pelo autor.

No Quadro 3 podemos observar um modelo de distribuição de con-


teúdo. Nesse exemplo, propomos uma sessão dividida em três partes
ou unidades: i) parte inicial; ii) parte principal; iii) parte final. Porém,
vale deixar claro que pode-se utilizar quantas unidades forem necessá-
rias, ficando a critério do professor.

A parte inicial seria a fase de ambientação da atividade proposta, po-


pularmente chamada de aquecimento. Essa parte deve ser utilizada para
uma conversa inicial, apresentação das atividades e objetivos propostos.
Em seguida, uma brincadeira, que pode ser, preferencialmente, uma ati-
vidade lúdica relacionada à parte principal, ou uma preparação para os
gestos, contendo mobilidade, flexibilidade e ativação neuromuscular.

A parte principal pode ser subdividida, mas não necessariamen-


te. Em nosso exemplo foi planejado um jogo conceitual, jogos mais
simples em sua estrutura e funcionalidade (3 contra 3). Em seguida,
o grau de complexidade do jogo aumenta, assim como as dimensões

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 121


da quadra (3 contra 3 com apoio) e, depois, o jogo formal: 4 contra 4
com goleiro.

A parte final é utilizada como volta à calma, um momento de abran-


dar os ânimos, com diálogo e feedback. Isso favorece o momento de
reforço positivo e acomodação do aprendizado.

7.5 Futebol e futsal como ferramentas


de desenvolvimento humano
Vídeo Assim como já discutido anteriormente, o futebol e o futsal têm forte
apelo midiático e grande popularidade entre os brasileiros, sendo mo-
dalidades que ultrapassam a esfera esportiva e têm conotação cultural
em nosso povo. Características como essas não podem ser desperdiça-
das e devem ser utilizadas como ferramenta de desenvolvimento hu-
mano, auxiliando no processo educacional da criança e do jovem.

Por que não utilizarmos o futebol, por exemplo, para despertar o in-
teresse por geografia, conhecendo a localização e as características dos
países que disputarão a próxima Copa do Mundo? Ou que tal discutir
história ou política usando os países-sede, talvez debatendo estatística
e matemática para probabilidades de uma equipe ser bem-sucedida
em um torneio, além de outros aspectos que podem ser aproximados,
como saúde, meio ambiente, sexualidade, ética etc.

A escola deve ser um ambiente rico e democrático, assim como o fute-


bol. A aula de Educação Física é o elo que liga esses dois universos, e pensar
por esse aspecto permite refletir, além de favorecer o entendimento da
forte relação de interdependência existente entre eles. Atividades que des-
pertam o interesse das pessoas possuem essa responsabilidade agregada.

Ensinar pelo esporte traz maior significado à nossa profissão.


Segundo Garganta et al. (2013), a maior contribuição que podemos
oferecer é uma formação consistente, valorizando as competências dos
jovens e auxiliando-os a encontrar seu caminho. Os valores associados
a relações humanas já estão intrínsecos no esporte, mas devem ser
reforçados positivamente, como o companheirismo, a solidariedade, a
gentileza, o respeito às regras, a tolerância, além de valores individuais,
como a disciplina, a resiliência, a motivação e o entusiasmo (GARGANTA
et al., 2013; GALATTI; PAES, 2006).

122 Metodologia do ensino de futebol e futsal


O futebol e o futsal como manifestações esporti- Livro

vas devem ser compreendidos como um fenômeno Na obra Metodologia dos jogos condicionados
para o futsal e educação física escolar, o professor
social e imprescindível para assegurar os direitos à Balzano propõe reflexões sobre o jogo e sua
cidadania. Esse pressuposto reforça o reconheci- relação com o desenvolvimento humano. Além
disso, o autor destaca diretrizes metodológicas
mento do esporte como direito de todo cidadão já para o ensino do futsal na escola e oferece uma
garantido pela nossa constituição. O esporte é fruto coletânea de 178 jogos, divididos por objetivos,
idades e fundamentos, entre outros aspectos.
das relações humanas e esse princípio deve ser sem-
BALZANO, O. N. 1. ed. São Paulo: Fontoura, 2012.
pre lembrado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O esporte em suas mais diversas manifestações deve ser estimula-
do dentro da escola, porém com viés mais profundo, ou seja, além da
visão do esporte vendido pelos veículos midiáticos, trazendo significado
para o aprendizado da modalidade. Observamos atualmente as aulas
de Educação Física e manifestações esportivas perdendo cada vez mais
espaço na escola, sendo delegada essa função a clubes e outros espa-
ços específicos. Na contramão a esse movimento, a sociedade contem-
porânea vem valorizando cada vez mais os valores contidos no esporte.
Características como competitividade, senso de coletividade, trabalho em
equipe, respeito a regras e hierarquia, responsabilidade e disciplina, re-
siliência e flexibilidade são exigências do mercado de trabalho atual, por
exemplo, e claramente inerentes ao esporte.
Nesse processo, o professor tem papel fundamental e sua atuação nas
aulas de Educação Física deve incluir ações pedagógicas que favoreçam
a inserção do esporte na cultura e na vivência do indivíduo por toda a
vida, desenvolvendo os hábitos saudáveis que a prática esportiva pode
proporcionar. É importante sabermos que qualidades como amorosida-
de, empatia, respeito e tolerância são fundamentais para a bem-sucedida
prática pedagógica.
Independentemente da vertente do esporte e dos objetivos aos quais
se propõe, está claro que o futebol e o futsal são fenômenos culturais que
se manifestam por meio das relações humanas. Enxergá-los apenas pelo
viés da performance é reduzir a visão sobre uma condição humana com-
plexa. Independentemente da idade a qual se destinam e do ambiente em
que são oferecidos, o futebol e o futsal, pela sua magnitude, devem cumprir
o papel de promover a saúde mental e física.

Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e possibilidades 123


ATIVIDADES
1. Quanto às vertentes do esporte, a Lei Pelé diferencia as manifestações
esportivas pela sua finalidade. O futebol e o futsal inseridos nesse
contexto devem obedecer a essas diretrizes. Qual é a importância
dessa diferenciação?

2. A escola, tanto privada como pública, deve oferecer espaços para o


aprendizado e o treinamento esportivo, pois a maioria dos jovens não
tem acesso a clubes socioesportivos. Discuta sobre esse tema.

3. Como seria uma sessão de treino ou aula de futebol e futsal elaborada


por você? Como você dividiria a sessão e quais elementos inseriria?
Exercite sua criatividade baseada na estrutura demonstrada aqui.

REFERÊNCIAS
BETTEGA, O. B. et al. Formação de jogadores de futebol: princípios e pressupostos para
composição de uma proposta pedagógica. Movimento, v. 21, n. 3, p. 791-801, jul./set. 2015.
BRASIL. Lei n. 9.615, de 24 de março de 1998, Diário Oficial da União, Poder Executivo,
Brasília, DF, 24 mar. 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/Leis/
L9615consol.htm. Acesso em: 3 jul. 2020.
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente. Brasília, DF: Senado Federal, Coordenação
de Edições Técnicas, 2017. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/534718/eca_1ed.pdf. Acesso em: 3 jul. 2020.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2018.
Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_
versaofinal_site.pdf. Acesso em: 3 jul. 2020.
CAVALCANTI, L. A. Fatores que motivam alunos, professores e gestores na prática e
desenvolvimento do futsal escolar. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v. 5, n.
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em: 3 jul. 2020.

124 Metodologia do ensino de futebol e futsal


GABARITO
1 A história do futebol e do futsal
1. A profissionalização só faz bem ao esporte, já que organiza e
estabelece direitos e deveres. Entretanto, é importante que os valores
fundamentais do esporte não sejam desvirtuados e que cuidados
sejam tomados para que a busca pelo lucro não se sobreponha à
formação humana, intrinsecamente ligada ao esporte.

2. As mulheres conquistaram um espaço importante no cenário


futebolístico, mas isso ainda está longe do ideal. Mais oportunidades
poderiam ser oferecidas em diversos cargos, mas ainda vemos
preconceito nos estádios e nos clubes. A mudança já começou, porém
não pode estacionar.

3. O fenômeno pode ter relação com as constantes ondas imigratórias


no Brasil. Recebemos povos de diversas origens e captamos um
pouquinho de cada perfil. Com um país de dimensões territoriais
imensas, as interações podem ter contribuído para um jeito brasileiro
exclusivo de jogar.

2 Metodologia do ensino de futebol e futsal


1. O inatismo reflete a ideia de que alguém traz, em sua herança genética,
as habilidades de determinada área. Porém, essa ideia é limitada em
seu conceito, já que é possível comprovar que as habilidades também
são construídas com base em experiências e vivências de qualidade.
Portanto, o interativismo parece explicar melhor a construção do
talento esportivo.

2. O método analítico oferece um aprendizado específico das técnicas


e dos fundamentos do futebol e futsal, mas exclui a ideia da
imprevisibilidade presente no jogo e prioriza o gesto mecânico. Dessa
forma, ele desfavorece um ensino integrado e mais próximo da
realidade desse esporte.

3. Para que seja útil como ferramenta de ensino, o jogo deve contemplar
principalmente as competências das crianças de modo coerente com
as fases de desenvolvimento e momento biológico. Dessa forma,
deve principalmente atrair as crianças com tarefas plausíveis às suas
capacidades, senão a atividade será desmotivadora.

Gabarito 125
3 Fundamentos técnicos do futebol e do futsal
1. O ensino das técnicas deve estar pautado na ideia de contextualizar o
que está sendo aprendido. O foco somente no movimento desfavorece
o aprendizado do esporte como um todo, mecanizando e criando
repetidores de gestos e não pensadores do jogo.

2. As habilidades técnicas são divididas em ações de momentos ofensivos


e momentos defensivos, porém deve ser ofertada a oportunidade de os
alunos vivenciarem todos os aspectos do jogo. Portanto, principalmente
durante o processo de aprendizagem, o ensino não deve fragmentado.

3. A repetição contínua de determinado gesto tende, de fato, a proporcionar


uma especialização e tão logo uma execução mais desenvolta dessa
habilidade. A curto prazo, essa criança parecerá mais habilidosa do
que as outras, mas a longo prazo, essa repetição não será vantajosa,
pois os cenários mudam, assim como a dificuldade do jogo. Então, o
gesto aprendido em condição fechada nem sempre refletirá o jogo em
si. É importante ressaltar, também, o risco aumentado de lesões por
repetições excessivas, principalmente nas idades menores.

4 Princípios táticos do jogo


1. O sucesso do modelo depende de diversos fatores e o treinador deve
levar em consideração todos eles, por exemplo, a imposição de regras,
regimentos e métodos que deve estar alinhada com a cultura local, com
as condições climáticas e estruturais e com os costumes dos indivíduos
para não se tornar um empecilho. É importante que saibamos ajustar as
ideias iniciais ao ambiente de interação.

2. O jogar bem, segundo o autor, está associado com a materialização da


ideia inicial do professor, ou seja, quanto mais a realidade do jogo estiver
próxima ao que foi pensado na elaboração do plano. Portanto, jogar bem
está associado à execução do que foi treinado.

3. O critério de escolha do esquema ou sistema tático deve estar apoiado na


ideia e no modelo de jogo, assim como nas características dos jogadores
em realizar determinadas funções. Ou seja, o esquema deve estar de
acordo com as peças que possuímos para a melhor execução das ideias.

126 Metodologia do ensino de futebol e futsal


5 Fisiologia e preparação física
1. A idade cronológica é a contagem temporal dos anos do indivíduo,
já a idade biológica representa sua atual fase de desenvolvimento
do organismo. O grande problema relacionado a esse tema é que
a distribuição ou divisão das equipes utiliza o critério cronológico,
ou seja, inseridas na equipe podem haver pessoas em fases de
desenvolvimento bem distintas. Desse modo, não observar essas
particularidades pode induzir o professor a comprometer o processo
de formação. Alguns dos problemas observados são: exposição a
cargas excessivas, insucesso esportivo, subestimação de potencial,
menos participação em treinos e jogos, desmotivação etc.

2. Para minimizar os riscos de lesões esportivas e potencializar os ganhos


com o treinamento, é importante o controle de cargas. Por meio de testes
e avaliações, como o teste de salto vertical, é possível identificar a fadiga
neuromuscular do atleta e, assim, reorganizar o conteúdo de treino a ele
oferecido.

3. Diversos especialistas do treinamento esportivo concordam que treinar


em condições semelhantes à competição favorece melhores adaptações.
Estudos mostram que é possível desenvolver as capacidades físicas
por meio de jogos adaptados. Como vantagem, esse método aumenta
a inteligência de jogo, além de otimizar o tempo de trabalho, focando
exclusivamente na intensidade semelhante e esperada do jogo.

6 A regra do jogo
1. No caso citado, em uma partida oficial, o árbitro não deve permitir a
continuidade do jogo, encerrando-o, pois segundo a Regra 3, não é
permitida a realização de uma partida com uma equipe com menos de
três jogadores. Porém, a segunda parte da questão traz a necessidade
de enxergar com outros olhos a rigidez da regra. Caso não haja um
regulamento específico para essa competição nessa situação, caberá o
bom senso dos organizadores e professores envolvidos, ou seja, uma
suspensão temporária ou uma advertência verbal pode fazer com que a
regra seja mais flexível e não haja a necessidade de excluir o jovem.

2. Caso o toque na bola com as mãos ou os braços seja involuntário e a


posição desses membros não esteja ampliando a extensão do corpo,
por exemplo, braços abertos ou acima da cabeça, não será marcada
a infração. Por isso, é importante que o jogador esteja ciente de que

Gabarito 127
na utilização de qualquer gesto dos braços que dê margem a uma
interpretação contrária dessa citada, será assinalado o pênalti.

3. Nessa situação, deve ser repetida a cobrança de pênalti, pois os dois


jogadores cometeram a infração, tanto o goleiro quanto o jogador
invasor. Como o goleiro se beneficiou dessa infração, a cobrança deve
ser executada novamente.

7 Futebol e futsal na escola: currículo, desafios e


possibilidades
1. A diferenciação do esporte por suas diferentes manifestações, descrita
pela Lei Pelé, é importante para garantir a equidade esportiva e a
participação de todos, sem distinção de mais ou menos aptidão. Assim,
fica claro ao professor que deve se entender o contexto em que o esporte
está inserido e para quem ele está sendo oferecido. O indivíduo que se
destaca como potencial atleta deverá ser direcionado para um centro ou
um clube específico.

2. A escola é um ambiente que deve privilegiar a educação e formação


integral do indivíduo. Isso não significa excluir a oportunidade a
competições e jogos, até porque muitos dos locais no nosso país estão
distantes dos grandes centros urbanos, e poucos têm acesso a clubes,
seja por situação socioeconômica ou por oportunidade. Vale lembrar que
o acesso à competição deve obedecer aos devidos cuidados, além de
respeitar as individualidades.

3. É importante que a sessão de treino tenha começo, meio e fim. Que


seja bem planejada e atenda às necessidades da turma. Uma estrutura
de treino pode conter: parte inicial, com duração de dez minutos,
deve valorizar a integração e preparar para a próxima atividade com
brincadeiras e exercícios gerais; parte principal, com duração de quarenta
minutos, precisa de tarefas que estimulem a participação de todos e
atendam o objetivo principal da aula ou sessão de treino, com um mini
jogo e o jogo formal; e a parte final, que tem o objetivo de diminuir o calor
e a tensão proporcionados pelos exercícios, além de ser usada como
momento de reflexão e de conversa sobre o que foi aprendido na aula.
Tem duração de dez minutos.

128 Metodologia do ensino de futebol e futsal


METODOLOGIA DO ENSINO DE FUTEBOL E FUTSAL
Tanto o futebol quanto o futsal têm forte apelo
na sociedade brasileira e possuem vínculos com
aspectos culturais. Poucas manifestações artís-
ticas e esportivas representam tão bem a cultura
brasileira como esses esportes, que possuem
estilos próprios e personificam o estereótipo do
brasileiro. Com o tempo, eles evoluíram e ganha-
ram proporção de espetáculo, movimentando
muito dinheiro e interesses às vezes escusos,
mas, mesmo assim, sem perderem sua força de
encantamento junto aos jovens e às crianças.

Nesta obra, são levantadas questões importantes


para o desenvolvimento do jovem nessas modali-
dades, como aspectos pedagógicos e metodoló-
gicos aplicados ao futebol e ao futsal, abordando
os meios de potencializar a aprendizagem técnica,
tática, física e psicológica, além de apresentar as
particularidades do processo de crescimento e
maturação, as regras, as leis e os direitos que regem
os esportes. Tudo isso sem se desconectar de
uma visão holística, pautada no entendimento
de que o futebol e o futsal são construídos sob
relações humanas e aliados à força atrativa que o
esporte tem para ser utilizado como ferramenta de
educação e de construção de valores de cidadania.

O objetivo desta obra é oferecer informações e indu-


zir reflexões para que o leitor consiga, por meio do
senso crítico, encontrar soluções para os diversos
desafios que emergirem durante sua caminhada
como educador-treinador.
RICARDO C. ALVES FERREIRA

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6667-4

59520 9 788538 766674

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